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AULA 3
CONTEXTUALIZANDO
Todo texto faz parte de uma grande rede textual, ou seja, ele se
desenvolve a partir de outros que vieram antes dele e, se tudo der certo, será
referência para outros que virão. Isso é o que chamamos de intertextualidade.
No mundo digital, então, essa relação se torna ainda mais evidente do que o era
na época analógica – os hiperlinks não nos deixam esquecer.
Outro aspecto que ganha relevância nesse contexto de publicação é a
relação entre texto e imagem: quantos textos você lê na internet, hoje em dia,
que não estão acompanhados de imagens (fotos, desenhos, gráficos etc.)?
Pouquíssimos, não é verdade?
Do ponto de vista estilístico, uma questão que se coloca para o jornalismo
digital tem a ver com os níveis de formalidade. Se está na internet, tem de ser
informal? Como equilibrar o coloquialismo com a linguagem formal no texto
jornalístico?
Por fim, abordaremos um gênero clássico da escrita: o texto
argumentativo. Mais uma vez, o mundo digital nos coloca novos desafios: somos
constantemente chamados a opinar sobre os mais diversos assuntos. Mas como
escrever um texto de opinião com consistência? Como você pode ver, nesta
unidade analisaremos a produção textual sob vários aspectos que sofrem a forte
influência da comunicação digital. Venha comigo nessa breve jornada de
reflexão sobre a escrita para que, ao final, você tenha se tornado um escritor
mais eficiente e um leitor mais perspicaz.
Os temas abordados nesta aula são:
1. A intertextualidade: o texto dentro do texto;
2. O texto e a imagem no jornalismo;
3. Formalidade e informalidade no texto jornalístico;
4. O texto digital;
5. O texto de opinião.
Saiba mais
País de privilegiados, de Luigi Mazza e Renata Buono, na Revista Piauí.
Disponível em: <https://piaui.folha.uol.com.br/vida-nos-extremos/>. Acesso em:
15 jan. 2020.
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jornalismo acontece quando um texto cita outro como fonte de informação. Por
exemplo: “Em entrevista publicada no jornal Folha de São Paulo, edição de
10/04/2015, o presidente da empresa afirmou desconhecer quaisquer fatos
que...”. Em situações como essa, é comum incluir um link para o texto
mencionado. Outro aspecto importante desse caso de intertextualidade é que
ele se realiza por meio da paráfrase, ou seja, pela reescrita de parte do texto
original: o autor reproduz as informações daquele texto, mas usando suas
próprias palavras. A cópia de um trecho do texto original também é possível.
Neste caso, trata-se de uma citação direta, e o trecho copiado deve estar
devidamente identificado.
A paráfrase e a citação direta são duas estratégias típicas dos textos
científicos e acadêmicos. Nesse ambiente de escrita, o autor deve respeitar de
maneira muito cuidadosa a noção de autoria, sob o risco de cometer o plágio
(crime imperdoável). Todo texto acadêmico é essencialmente intertextual, pois é
construído a partir de outros que abordam o seu tema. Isso não significa, todavia,
que fazer referência a um texto implica concordar com ele. Ao se apropriar de
um texto anterior, o autor poderá utilizá-lo seja porque reforça seu ponto de vista,
seja porque discorda dele, e é de seu interesse debater essa visão contrária.
Outra forma de fazer intertextualidade é resgatar um texto famoso, de
conhecimento público, e utilizá-lo em um novo contexto de enunciação, que pode
não ter qualquer relação com o texto original. Ou seja, um autor se apropria da
força de um texto clássico, bem conhecido por todos, para dizer algo novo, sem
qualquer ligação com o conteúdo do texto original. “Ser ou não ser intertextual,
eis a questão”, percebe? Nesse exemplo, retomamos o questionamento clássico
de Hamlet, personagem de Shakespeare.
Vejamos um exemplo. O poema Canção do Exílio, de Gonçalves Dias, é
um texto que certamente pertence ao conjunto canônico da literatura brasileira.
Escrito em 1843, enquanto o poeta estudava em Portugal, o poema é uma
manifestação da saudade pela terra natal, neste caso, o Brasil. Sua última
estrofe é composta dos seguintes versos:
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Onde canta o Sabiá.
Saiba mais
Leia a seguir a crônica Psiu, disponível em:
<http://maisocitocina.blogspot.com.br/2013/03/o-principe-encantado-e-as-
mulheres-luis.html>. Acesso em: 15 jan. 2020.
Difícil imaginar um leitor que não seja capaz de entender essa crônica
como uma paródia do clássico conto de fadas, não é mesmo? O autor emprega
a estrutura princesa-beija-sapo-que-vira-príncipe, mas não está interessado em
discutir seu enredo. Ele quer, na verdade, usar a força desse texto para promover
um novo olhar sobre a sociedade atual.
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TEMA 2 – O TEXTO E A IMAGEM NO JORNALISMO
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é a prática de publicar apenas a foto e sua legenda, sem acompanhar uma
reportagem, recurso usado atualmente em diversos sites.
Imagens ajudam a legitimar o discurso da verdade do jornalismo,
reforçando que o texto é baseado em fatos verificáveis. Mesmo em uma
reportagem construída com depoimentos, em que as informações não são
atestadas por uma imagem, é importante dar um rosto às falas que aparecem no
texto, humanizando e personalizando as informações.
Muitas vezes a indicação de quantas e quais imagens irão acompanhar o
texto pode vir já na pauta. Mas, como em todo o processo jornalístico, o repórter
precisa de flexibilidade e astúcia para compreender quando a reportagem leva
para outros caminhos, exigindo ou possibilitando a presença de outro tipo de
fotos, mapas, ilustrações, gráficos ou infográficos.
Saiba mais
O jornalista Mário Magalhães interpretou o fato a partir de uma foto do
líder maior do partido, o ex-presidente Lula: Uma foto para a história, disponível
em: <http://blogdomariomagalhaes.blogosfera.uol.com.br/2015/11/27/uma-foto-
para-a-historia/>. Disponível em: 15 jan. 2020.
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passar para o leitor, pois comunica o descontentamento do líder de maneira
impactante.
Saiba mais
O abutre, filme de Dan Gilroy estrelado por Jake Gyllenhaal e Rene Russo
é inspirado na história de Arthur “Weegee” Fellig, fotógrafo de Nova York que
nos anos 1930 instalou um rádio policial em seu carro e passava as madrugadas
registrando crimes com sua câmera, fazendo fotos sensacionalistas que vendia
para quem pagasse melhor. Assim como o Louis Bloom, o protagonista do filme,
Weegee chegou muitas vezes antes da polícia na cena de crime.
2.2 O infográfico
Saiba mais
Confira alguns exemplos de infográficos premiados da revista
Superinteressante: <https://super.abril.com.br/ideias/infograficos-da-super-
faturam-premios-internacionais-no-malofiej/>. Acesso em: 15 jan. 2020.
Onde vive e onde não vive ninguém no Brasil:
<https://www.nexojornal.com.br/grafico/2019/04/16/Onde-vive-e-onde-
n%C3%A3o-vive-ningu%C3%A9m-no-Brasil>. Acesso em: 15 jan. 2020.
Biomimetismo (revista Galileu):
<http://visualoop.com/media/sites/3/2012/08/5-Biomimetismo.jpg>. Acesso em:
15 jan. 2020.
Futurismo – tab que dispõe o conteúdo de texto e a imagem de maneira
fluida, explorando as possibilidades do html: <http://tab.uol.com.br/futurismo/>.
Acesso em: 15 jan. 2020.
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TEMA 3 – FORMALIDADE E INFORMALIDADE NO TEXTO JORNALÍSTICO
Pronominais
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro
© Oswald de Andrade.
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Assim como muitas outras questões envolvendo o jeito como se escreve
no jornalismo, é a linha editorial do veículo que irá determinar o grau de
liberdade conferido aos jornalistas para serem mais ou menos informais
em seus textos. Tabloides sensacionalistas, como o Extra, do Rio de Janeiro,
ou o Super Notícias, de Belo Horizonte, primam pela linguagem popular,
enquanto jornais voltados à economia, como o Valor Econômico ou o Jornal do
Comércio, que trazem textos mais sisudos, raramente permitem coloquialismo
em suas matérias. O estilo é, inclusive, parte de sua estratégia de
convencimento.
Observe a capa de jornal Extra <https://extra.globo.com/capas-jornal-
extra/2019-03-30-23545175.html?mesSelecionado=Mar&ano=2019>. Publicada
em 23 de março de 2019, ela é um exemplo da linguagem informal que
caracteriza o discurso desse tipo de jornal. A foto que ocupa a maior parte da
página vem acompanhada do texto Sandy, é você?, fazendo uma provocação
ao leitor, chamando-o para uma matéria do caderno de entretenimento. Ao lado,
outra foto com uma “celebridade” apresenta o texto Justiça manda DJ parar na
‘gaiola’. Nenhum desses títulos seria empregado em um jornal “sério”, como
Folha de S.Paulo, O Globo, Gazeta do Povo etc.
Em geral, os jornais, mesmo os mais sérios, permitem que seus nomes
de destaque se manifestem livremente em colunas de opinião. No Brasil, hoje, é
difícil pensar em um colunista mais informal do que Xico Sá, atualmente no El
País.
Saiba mais
Leia o trecho que reproduzimos a seguir:
A mulher busca um homem que não existe
Bora começar com um grande título de livro: “Um bom homem é difícil de
encontrar”, assim a que é teu gênia Flannery O’Connor, nega fodona norte-
americana da Georgia (1925-1964). Esta coletânea de contos você pode
encontrar no Brasil nas melhores casas do ramo e nos melhores atchins dos
sebos, vilge, vale muito a pena.
O homem bom, de tudo bom, não existe. Além, muito além da exigência
feminina, nossa fraqueza mesmo já mostramos de cara. Mesmo o fofo, aquele
que você, amiga, julga como quase uma versão personificada de uma música
fofíssima de Los Hermanos, nem sempre foforiza por mais de três encontros. Até
acho que o fofo, o cara que promete-promete-promete e não entrega, é o novo
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canalha! Este engana muito mais do que o cara de quem você não espera nada
mesmo.
SÁ, X. A mulher busca um homem que não existe. El País, 09 out. 2015. Disponível em:
<http://brasil.elpais.com/brasil/2015/10/09/opinion/1444392564_573803.html>. Acesso em: 19
dez. 2019.
Leituras complementares
Uma rápida referência sobre o desenvolvimento da internet:
<https://www.olivetreefilmes.com.br/blog/entenda-evolucao-da-web-1-0-2-0-e-3-
0/>. Acesso em: 15 jan. 2020.
A linguagem jornalística na web: uma análise teórica, artigo de Paulo
Negri Filho e Lousanne Barbosa Paiva:
<http://www.periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/tematica/article/view/21359>.
Acesso em: 15 jan. 2020.
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mas já bastante revolucionária, como o próprio nome sugeria. A internet era uma
teia de informação que nascia com a lógica intertextual já presente em sua
gênese. Mas as coisas mudariam, de fato, na revolução seguinte.
A web 2.0, surgida no começo dos anos 2000, mudou tudo por ser
colaborativa. Não há mais separação entre quem produz e quem compartilha. É
a internet dos blogs, das redes sociais e dos comentários. É a internet do texto
de opinião, da polifonia e da polissemia. Todos podem ser produtores de
conteúdo, com direito a um pitaco definitivo sobre qualquer assunto. É a internet
da leviandade, mas também da construção coletiva do conhecimento. A
Wikipédia, as ferramentas de produção coletiva de textos e as redes sociais são
a sua cara. Além disso, a web 2.0 não se restringe ao texto escrito. Novas
tecnologias permitem ao texto se integrar com o espaço virtual onde se lê,
mesclando vídeos e imagens, aumentando o potencial informativo da leitura.
A descentralização dos grandes conglomerados de mídia, permitindo que
qualquer pessoa se tornasse um “repórter”, junto ao potencial multimidiático das
plataformas online, fez com que veículos nascidos para a internet ganhassem
mais e mais notoriedade. Todos já entenderam que as mídias digitais são tão
importantes quanto as mídias tradicionais, por isso merecedoras de sua atenção.
Para o jornalismo, os dois conceitos próprios da web 2.0 que mais
importam são os blogs e as redes sociais, o que gera complicações específicas
dentro do que vínhamos discutindo. Afinal, eles (blogs e redes sociais) podem
ser pensados como veículos próprios e independentes, como parte de um
contexto maior de produção de conteúdo – caso em que se constituem em uma
maneira particular de escrita –, ou ainda como elementos dentro de uma linha
editorial mais ampla, como os blogs dentro do site de um jornal, por exemplo.
Saiba mais
Para conhecer dois exemplos de blogs culturais, acesse:
1. Chico Barney no UOL: <https://chicobarney.blogosfera.uol.com.br>. Acesso
em: 15 jan. 2020.
2. Cinema com Rapadura: <http://cinemacomrapadura.com.br/>. Acesso em: 15
jan. 2020.
No caso de Chico Barney, seu blog funciona com a mesma lógica de uma
coluna em um jornal impresso. Seus textos refletem diretamente sua opinião e
são publicados sem precisar passar pelo crivo de um editor, desde que respeitem
a linha editorial do UOL. Ou seja, seu espaço possui uma lógica própria em
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diálogo com a do veículo que o suporta. Já o blog Cinema com Rapadura, por
outro lado, é um veículo próprio, que segue regras de funcionamento com a sua
própria linha editorial. Mesmo sendo parceiro do Diário do Nordeste (como o
header indica), o conteúdo do jornal não tem vinculação direta com o conteúdo
produzido no blog.
Como os blogs são próprios da cultura pop, é fácil pensá-los como sempre
voltados ao entretenimento ou mesmo à lógica confessional, de onde surgiu seu
nome (weblog, ou seja: acesso pessoal de rede, o que o levou a ser usado
originalmente como um “diário virtual”). Mas há muitos blogs de linha bem séria,
dedicados a assuntos “duros”, como a política.
Os blogs não têm uma linguagem específica, por isso podem ser
facilmente adaptáveis para qualquer tipo de projeto editorial, seja ele particular
ou integrado em um contexto maior de mídia. Também a natureza do conteúdo
pode ser de grande diversidade: é possível ter um blog para uma organização
científica, para uma empresa, uma escola, um hospital, um cachorro – sim, há
cachorros que têm blog – etc. Já nas redes sociais, a formatação e a linguagem
tendem a ser bastante específicas, e, em alguns casos, até os conteúdos são
bastante direcionados. Cada uma delas exige um tom específico, o que torna um
desafio trabalhar um conteúdo central em diversos veículos distintos. A
brevidade do Twitter, cuja informação completa precisa caber em 280
caracteres, traz um desafio de ordem completamente diferente da informalidade
do Facebook, que exige imagens de destaque e um texto pendendo para o
sensacionalismo, atraindo comentários, curtidas e compartilhamentos, os quais
deverão resultar em acessos ao site principal. O Instagram, por sua vez, tem um
apelo visual bastante pronunciado e tornou-se o hábitat por excelência dos
slideshows e vídeos curtos.
Dar uma opinião sobre qualquer assunto sempre será uma questão
bastante pessoal, pois o caráter dessa opinião estará intimamente ligado à
vivência de seu proponente, o que ele ou ela sabe sobre o assunto e quais são
seus interesses em defender uma determinada ideia. Por isso, o texto opinativo
é necessariamente autoral, diferentemente do texto informativo, que muitas
vezes não traz a assinatura de seu autor.
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Assim, para efeitos didáticos, podemos opor estes dois tipos de texto: o
opinativo, em que se argumenta em favor de uma ideia, por isso expressa a
opinião de alguém, e o informativo, em que o objetivo principal é transmitir
informações de forma imparcial, o que em muitos casos torna sua autoria pouco
ou nada relevante. Na prática, porém, não é tão fácil separar esses dois tipos de
texto. Por um lado, o texto opinativo deverá fornecer informações confiáveis para
embasar seus argumentos se realmente quiser convencer seu leitor. Por outro,
o autor de um texto informativo seleciona e apresenta as informações de uma
determinada maneira, o que pode revelar intenções que vão além da mera
reprodução de dados concretos sobre o mundo.
Saiba mais
Que tal fazermos um teste? Leia as cinco frases dispostas a seguir. Julgue
se o que é dominante nelas é uma informação concreta ou uma opinião de
alguém, e classifique-as a partir desse julgamento como informativas (I) ou
opinativas (O).
1. O aborto é uma questão de saúde pública. (__)
2. O Brasil não é um país racista. (__)
3. A “teoria da evolução das espécies”, de Charles Darwin, explica como
o homo sapiens surgiu na terra. (__)
4. Quanto mais dinheiro uma pessoa tem, mais provável é que ela seja
feliz. (__)
5. Maltratar animais é tão errado quanto maltratar seres humanos. (__)
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imparcial ou não, e sua escolha terá efeitos bastante concretos no resultado do
texto.
Hoje em dia, somos bombardeados por informações ininterruptamente, já
que vivemos conectados a “fontes de informação” inesgotáveis – o Facebook, e-
mail, WhatsApp, portais de informação etc. Também somos frequentemente
pressionados a nos posicionar nas redes sociais sobre as polêmicas do
momento, sejam elas oriundas do último caso de corrupção no Governo Federal,
ou sobre a nova gatinha de uma celebridade qualquer. Uma certa descrença no
poder último da ciência em determinar o que é verdade, associada às pressões
midiáticas pela nossa opinião a todo instante, produz um cenário de confusão
em que se poderia facilmente cair na falácia de que tudo é opinião e de que todas
as opiniões são igualmente válidas. Nada mais falso. Há dois aspectos centrais
que podem nos iluminar nesse “caos opinativo”: a argumentação e a análise de
pontos de vista distintos. Um bom texto opinativo é aquele que consegue
construir uma argumentação sólida, o que não é possível quando não se
conhecem pontos de vista diferentes dos que você defende. Qualquer redator
que deseje escrever bons textos opinativos, portanto, deverá saber como
manusear esses dois elementos no texto. Vejamos agora, a partir de alguns
textos da imprensa, como eles se manifestam.
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por sua vez, expressam sua opinião nos editoriais, que podem ser assinados
por uma única pessoa, o editor, ou representar um grupo de editores.
Saiba mais
Vejamos um exemplo desse tipo de texto, do qual extraímos alguns
excertos.
Resposta necessária
Em boa hora a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) ajuizou ação no
Supremo Tribunal Federal na qual pede a declaração de inconstitucionalidade
da recém-aprovada Lei do Direito de Resposta. (...)
Imagine-se que um juiz deu razão a uma pessoa que tenha se declarado
ofendida por determinada reportagem; a sentença obriga o órgão a publicar a
resposta; deve fazê-lo em 24 horas, sob pena de precisar pagar multa elevada.
Caso queira se defender dessa decisão, o órgão poderá, naturalmente, contar
com o reexame da situação por um tribunal. Precisará esperar, entretanto, que
um colegiado de desembargadores se reúna; caso isso não aconteça a tempo –
o que decerto constituirá a regra–, terá de arcar com os termos da sentença.
Não espanta que esse estapafúrdio juízo colegiado não figure em nenhuma outra
parte do ordenamento jurídico brasileiro. Sua existência contraria os princípios
do contraditório e da ampla defesa, duas garantias banidas somente por
governos ditatoriais. (...) Esta Folha, não custa repetir, tem defendido a criação
de uma lei específica para regular o direito de resposta. Isso é necessário tanto
para assegurar prazos razoáveis a ambas as partes como para definir os
parâmetros de sua utilização. Obviamente, nada disso pode ser feito em
desrespeito à Constituição. Dessa lição básica, contudo, o legislador se
esqueceu – e só o Supremo Tribunal Federal, agora, pode aplicar o devido
corretivo.
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desse ponto de vista. Nesse sentido, o texto expõe, hipoteticamente, as
consequências da lei e as qualifica como resultado de um “estapafúrdio juízo
colegiado”.
Por fim, o texto mostra-se favorável à inspiração da lei, reconhecendo que
ela é necessária, ainda que sua forma atual seja equivocada. Aqui temos,
portanto, muito mais do que a mera exposição de um fato seguida de um
julgamento de valor sobre ele: temos a formulação de hipóteses que reforçam
esse julgamento e o reconhecimento parcial do ponto de vista contrário, qual
seja, a necessidade da criação de uma lei que verse sobre o assunto.
Vejamos agora um exemplo de outra natureza, no caso de um texto de
colunista. Maria Rita Kehl era colunista do jornal O Estado de São Paulo, em que
publicou o texto Dois Pesos..., durante a corrida presidencial de 2010, quando
José Serra e Lula se enfrentaram no segundo turno. O texto causou muita
polêmica e resultou na sua demissão. Mais tarde, ela alegaria que fora demitida
por “um delito de opinião”. Abaixo reproduzimos trechos do texto.
Leitura complementar
Dois pesos...
Este jornal teve uma atitude que considero digna: explicitou aos leitores
que apoia o candidato Serra na presente eleição. Fica assim mais honesta a
discussão que se faz em suas páginas. O debate eleitoral que nos conduzirá às
urnas amanhã está acirrado. Eleitores se declaram exaustos e desiludidos com
o vale-tudo que marcou a disputa pela Presidência da República. As campanhas,
transformadas em espetáculo televisivo, não convencem mais ninguém. Apesar
disso, alguma coisa importante está em jogo este ano. Parece até que temos
luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido soterrada pelos
últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é maquiada, mas na internet o
jogo é duro.
Se o povão das chamadas classes D e E – os que vivem nos grotões
perdidos do interior do Brasil – tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse
contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O
argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das
políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto
quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam
sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola.
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KEHL, M. R. Dois pesos... O Estado de São Paulo, 02 out. 2010. Disponível em:
<http://cultura.estadao.com.br/noticias/geral,dois-pesos-imp-,618576>. Acesso em: 19 dez.
2019.
Saiba mais
Entrevista com Maria Rita Kehl, a respeito de seu polêmico texto de
opinião, seguida por uma entrevista com um diretor do jornal:
<http://observatoriodaimprensa.com.br/imprensa-em-questao/fui-demitida-por-
um-delito-de-opiniao/>. Acesso em: 15 jan. 2020.
TROCANDO IDEIAS
NA PRÁTICA
FINALIZANDO
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Depois discutimos a questão da formalidade do texto, o que nos remete
às discussões em torno do estilo da escrita. Vimos como a linha editorial tem um
papel definidor nesse aspecto.
Nosso quarto tema tratou do texto digital. Discutimos as características e
tendências relacionadas à escrita no ambiente virtual.
Por fim, abordamos um gênero textual clássico, o texto de opinião. Em um
universo midiático tão afoito por polêmicas, nos tornamos comentaristas de tudo.
Mas, para escrever um bom texto opinativo, é preciso saber argumentar. Foi o
que vimos por meio de alguns exemplos.
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REFERÊNCIAS
SÁ, X. A mulher busca um homem que não existe. El País, 09 out. 2015.
Disponível em:
<http://brasil.elpais.com/brasil/2015/10/09/opinion/1444392564_573803.html>.
Acesso em: 19 dez. 2019.