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RESUMO: Este trabalho descreve alguns aportes do ator e diretor de teatro russo Constantin Stanislavski
(1863-1938) sobre a prática teatral, concentrando-se na sua relação com o fenômeno musical,
fundamental em sua teorização sobre as técnicas de atuação no teatro. Stanislavski foi diretor do Estúdio
de Ópera Bolshoi a partir de 1918. O diretor russo apoiava seu trabalho de ator e encenador fortemente na
discussão sobre o papel do tempo e do ritmo na prática do ator. Existem também importantes partes de
seu trabalho, principalmente o anexo do livro El Trabajo del Actor Sobre Sí mismo en el Proceso
Creador de la Encarnación, que não foram traduzidos nas edições ocidentais e que serão aqui tratados.
PALAVRAS-CHAVES: Voz; Teatro; Musicalidade.
ABSTRACT: This paper focus in some musical aspects of the theatrical work of the director Constantin
Stanislavski (1863-1938). Stanislavski was the main director of the Bolshoi Opera Studio (1918b). The
Russian director supports his acting work strongly in rhythm and time as the bases of his actor´s and
director´s work, and there are many substantial parts of his work that is not translated to English or
Portuguese and it will be focused here, mainly some aspects of the El Trabajo del Actor Sobre Sí mismo
en el Proceso Creador de la Encarnación.
KEY WORDS: Voice; Drama; Music.
1
Sadamov e por jovens do Conservatório de Música de Moscou, procurando juntar
experientes cantores e atores. Sua metodologia principal, tal qual nos mostra
Stanislavski (1988), consistia na prática de seu sistema, exercícios musicais, treino de
posições corporais e movimento no espaço, liberação de tensões corporais e,
principalmente, o canto de árias e baladas. Tudo isto antes de encenar qualquer
produção. Toda essa preparação contava ainda com a ajuda de sua irmã Zindaida
Sololova - responsável pela partitura interior da personagem “inner score” - e seu irmão
Vladimir Alexeiev, importante pianista, que aprofundava a parte lidada ao ritmo. Já no
desenvolvimento da dicção cantada e da ortofonia, seguiam-se os conselhos de M.
Safonov.
Stanislavski reconhece a importância do ator trabalhar intensamente a sua
corporeidade sob as mais diversas modalidades, reportando-se à música e seus
princípios como uma ferramenta fundamental. O mesmo Stanislavski (1964), em seu
livro A preparação do ator, declara que o trabalho corporal de um ator deve ser feito de
forma consciente, com possibilidades para desenvolver a organização espaço-temporal,
a resistência, a flexibilidade, reconhecendo a importância fundamental da preparação
musical para os atores.
Através de seu heterônimo, Tórstov1, Stanislavski revela em seus livros,
como os atores em um processo de ensaio podem aprender com o tempo-rítmo. A
relação deste diretor russo com a música era de tal forma intrínseca que ele a utilizava
de forma permanente e crítica. Um dos métodos de ensino de seu estúdio foi o de
Dalcroze, o qual Stanislavski conhecia tão bem que chegava a utilizá-lo de maneira
crítica. Deste modo, formas de ginástica rítmica eram comuns em seu processo de
ensino-aprendizagem.
Infelizmente a compreensão plena do trabalho deste ator, diretor, pedagogo
e escritor não é conhecida, pois as traduções ao inglês e as de todo o ocidente, assim
como a respectiva ao português, possuem partes centrais eliminadas de seu trabalho que
são oriundas da edição norte-americana. Felizmente, na Argentina 2, na década de 1970,
1
Nome da personagem fictícia que, em alguns de seus livros, é um respeitado professor de teatro.
2
Estas foram “[...] através de Salomón Merecer, traduzidas diretamente do russo [...]” (MAUCH e
CAMARGO 2008, p. 4414). Colocamos aqui os nomes dos livros de Stanislavski traduzidos diretamente
do russo para o espanhol e, entre parênteses, os seus respectivos nomes traduzido, a partir da versão
norte-americana, ao português: Mi Vida en el Arte (Minha Vida na Arte), El Trabajo del Actor Sobre Sí
Mismo en el proceso Creador de las Vivencias (A Preparação do Ator), El Trabajo del Actor Sobre Sí
mismo en el Proceso Creador de la Encarnación ( A Construção da Personagem) e El Trabajo del Actor
2
foram feitas traduções, ilegais, nas quais se buscou a totalidade das idéias do autor.
Podemos observar nestas traduções algumas afirmações que podem ajudar no melhor
entendimento da música em sua propositura para o teatro.
A partir dos escritos do título “I. Materiales Suplementarios para el Tercer
Tomo”, o qual se inserem no capítulo “Apendices” do livro El Trabajo del Actor Sobre
Sí mismo en el Proceso Creador de la Encarnación, podemos verificar melhor esta
relação música e palavra.
No subtítulo “I. Sobre la Musicalidad de Lenguaje” (a musicalidade da
linguagem), a primeira informação relevante é esta comparação que Stanislavski faz da
voz falada com o canto:
─ Al declamar, yo trataba de hablar del modo más simple posible, sin un fino
patetismo, sin falso canturreo, sin una exagerada medida de los versos,
siguiendo el sentido interior de la obra, su esencia. No se trataba de una
mezquina simplificación, y seguía siendo un lenguaje hermoso. Contribuia a
ello que las sílabas de las frases tenían sonoridad, como un canto, y esto
les daba nobleza y musicalidad (STANISLAVSKI 1997, p.316 – Grifos
nossos).
[...] Tem que saber não somente desfrutar pessoalmente com a própria
linguagem, mas, também, dar aos espectadores a possibilidade de captar,
entender e assimilar o que é digno de atenção. Tem que se transmitir, de
3
modo imperceptível, as palavras e a entonação ao ouvido de quem escuta. É
fácil tomar um caminho errado e começar a exibir ante o espectador a
própria voz, coquetear com ela, vangloriar- se da maneira de falar.
[...] Hay que saber no sólo disfrutar uno mismo con el proprio lenguaje sino,
también, dar a los espectadores la posibilidad de captar, entender y asimilar
lo que es digno de atención. Hay que transmitir, de modo imperceptible, las
palabras y la entonación al oído del escucha. Es fácil tomar un camino
errado y empezar a exhibir ante el espectador la propia voz, coquetear con
ella, vangloriarse de la manera de hablar (STANISLAVSKI, 1997, p.316).
Assim sendo este diretor russo aborda problemas muito comuns até hoje na
voz falada dos atores e cantores de teatro 3, que é a capacidade de um ator/atriz, que ao
dominar aspectos técnicos da voz e procura mostrar ao seu público principalmente este
aspecto de “virtuose”.
Sobre a utilização da linguagem junto às técnicas sonoras, Stanislavski
continua:
3
Constatamos isto através de nosso trabalho empírico desenvolvido junto aos atores e estudantes teatro
desde 1970.
4
Novamente, Stanislavski, mostra a voz falada como uma melodia e acentua
a capacidade do ator trazer, a partir dela e do uso parcimonioso da técnica, uma
determinada atmosfera para o público.
Em primeiro lugar temos aquele ator que tem ciência sobre as técnicas e
nelas sabe desenvolver o som, de certa forma estruturada e racional. Mas quer o diretor
russo sublinhar o trabalho do ator, que sabe se servir do ritmo para “brincar” com as
palavras, trazendo através dele os sentimentos da personagem.
Em terceiro lugar, um ator que sabe “saborear” as palavras, as frases e a
idéia do autor, levando através da sonoridade criada, o espectador para junto dele em
palco. Por último, um ator magistral. Este, além de trazer o espectador para junto dele
em cena, por meio de suas entonações, cria imagens para o público através da voz,
apresenta estas imagens que estão em seu interior para o exterior, mostrando-as para que
o assiste e faz viver a ludicidade desta criação total. O diretor moscovita completa:
Quando o ator que controla seus movimentos, completa com eles o que dizem as
palavras e a voz, parece-me que escuto o acompanhamento harmonioso de uma
magnífica canção [… ](STANISLAVSKI 1997, p.316 – 317)”4.
Desta forma, o autor de Minha Vida na Arte, vai elaborando uma sinfonia na
palavra falada do ator, que se conclui com a diferenciação dada pelas pausas e pelos
acentos. Para elaborar este exemplo ele nos oferta a seguinte frase “Eu sem você não
posso viver (STANISLAVSKI 1997, p.316 – 317)” 5, através da qual ele expõe:
De que modos diferentes, sempre novos a cada vez, pode-se cantar esta
frase! Quantos significados diversos contêm, que numerosos e distintos
estados de ânimo se pode extrair dela! Façam a prova de distribuir em
diferentes formas as pausas e os acentos e obterão, sem cessar, novos
significados! Pausas breves, junto com o acento, separam precisamente a
palavra principal, apresentam literalmente em uma bandeja e a servem
separadamente das outras. As pausas largas e silenciosas dão a
possibilidade de satisfazê-las com um novo conteúdo interior. Ajuda a este o
movimento, a mímica, a entonação. De estas trocas surgem constantemente
novos estados de animo, originam-se novo conteúdo de toda a frase.
De qué modos diferentes, nuevos cada vez, se pueden cantar esta frase!
¡Cuántos significados diversos contienen, qué numerosos y distintos estados
de ánimo se pueden extraer de ella! Hagan la prueba de distribuir en
diferentes formas las pausas y los acentos, y obtendrán, sin cesar, nuevos
significados! Pausas breves, junto con el acento, separan precisamente la
palabra principal, la presentan literalmente en una bandeja y la sirven
4
“Cuando el actor que controla sus movimientos, completa con ellos lo que dicen las palabras e la voz,
me parece que escucho el acompañamiento armonioso de una magnifica canción […]
5
“¡Yo sin ti no puedo vivir!
5
separadamente de las otras. La pausas largas y silenciosas dan la
posibilidad de colmarlas con un nuevo contenido interior. Ayudan a esto el
movimiento, la mímica, la entonación. De estos cambios surgen
constantemente nuevos estados de ánimo, se originan un nuevo contenido de
toda la frase (STANISLAVSKI 1997, p.318 – Grifos nossos).
6
“...Por conseguinte, el actor actúa en la escena con la palabra, mediante las entonaciones (subidas y
bajadas), los acentos (fuerza) y las pausas (detenciones)”.
7
“[...] en agrupar las palabras de la frase e indicar las paradas del lenguaje o pausas [...] cada signo de
pontuación requiere la entonación características que le corresponde [...]
6
CAMARGO, Robson Corrêa. O Espetáculo do Melodrama. Tese de doutorado em
Artes Cênicas. Orientação: Ingrid Dormien Koudela. Escola de Comunicação e Artes/
Universidade de São Paulo: São Paulo, 2005
ENCYCLOPÆDIA BRITANNICA. Konstantin Sergeyevich Stanislavsky.
Disponível em:<http://www.britannica.com/EBchecked/topic/563160/Konstantin-
Sergeyevich-Stanislavsky>. Acesso em 30 de ago de 2009.
GUINSBURG, Jacó. Stanislávski e o Teatro de Arte de Moscou. São Paulo:
Perspectiva, 2006.
MAUCH, Michel; CAMARGO, Robson Corrêa de. O Método Stanislavski: a edição
de A Construção da Personagem em português e espanhol, um estudo
comparativo. In: XVI Seminário de Iniciação Científica (In: V Congresso de Ensino
Pesquisa e Extensão), 2008, Goiânia: UFG, 2008. p. 4411-4425.
STANISLAVSKI, Constantin. El Trabajo del Actor Sobre Sí mismo en el Proceso
Creador de la Encarnación. Tradução de Salomón Merecer. Buenos Aires: Quetzal,
1997.
______. A Construção da Personagem. Tradução: Pontes de Paula Lima. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1986.
______. On Opera. Theatre Arts Book. NY: Março 24, 1998. (1974 1. Ed.).
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