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A teoria musical nos permite identificar três grandes pilares, três elementos, presentes

nas mais diversas manifestações musicais existentes; a saber: melodia, harmonia e


ritmo.

voz
|ó|

nome feminino
1. Som produzido na laringe, pelo ar que sai dos pulmões
e da boca.
"voz", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-
2023, https://dicionario.priberam.org/voz.

Qual é o conceito de voz?


Sob o ponto de vista fisiológico, a voz humana pode ser definida como o som produzido pela
passagem do ar pelas pregas vocais e modificado nas cavidades de ressonância e estruturas
articulatórias.

Descrição
A voz falada é aquela utilizada normalmente no dia a dia e que segue o funcionamento natural de
cada indivíduo. É composta de respiração regular, pausas, entonação e articulação específicas para
o padrão da voz falada.
Já a voz cantada é aquela produzida no momento do canto e costuma demandar mais treino vocal
do indivíduo, desde a respiração, fonação, ressonância, projeção da voz, articulação dos sons,
pausas, ritmo e até mesmo postura.
Portanto, todo cantor precisa fazer um acompanhamento fonoaudiológico para adequar cada um
desses aspectos e, além disso, para prevenir o possível aparecimento de disfonias e patologias
vocais futuramente.
 ADRIANA RIBEIRO DE ALMEIDA

ARTIGO ORIGINAL

ALMEIDA, Adriana Ribeiro de [1]

ALMEIDA, Adriana Ribeiro de. Música como elemento e recurso estruturante da


cena. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 05,
Vol. 09, pp. 117-129. Maio de 2019. ISSN: 2448-0959

[Teatro] Relativo à cena, ao teatro e às apresentações teatrais. [Teatro] Que se


pode referir à representação teatral: show com elementos cênicos. Etimologia
(origem da palavra cênico). A palavra cênico deriva do latim "scenicus,a,um";
do grego "skenikós,é,ón", que significa de cena.

RESUMO

O presente artigo trata do uso da música, do som, dos efeitos sonoros na construção
cênica, destacando a importância da composição sonora para criar climas,
sensações e envolver o espectador na narrativa, mesmo quando não contém uma
linguagem verbalizada em sua totalidade.

O artigo ainda discutirá o papel da música na criação de imagens a partir dos sons, a
relação dos atores com os sons, tanto vocalizados, quanto os efeitos sonoros.

Para tal descrever-se-á o processo de montagem do espetáculo teatral ‘Prosódia


Bastiana ou traçados silenciosos de uma fé chorosa, de autoria e direção de
Matheus Menezes, que ilustra a preocupação com os elementos musicais na
narração de sua obra.

Palavras Chave: música, sons, efeitos sonoros.

INTRODUÇÃO

A presença da música nos trabalhos artísticos em suas diversas formas e


significados são incontestáveis. A musica assim como as artes interpretativas, vem
acompanhando a história e desenvolvimento da humanidade em muitas de suas
culturas e se fazendo presente dia após dia. Não somente como uma forma de
expressão artística, mas como filosofia de vida.

No Brasil a linguagem musical faz-se presente em suas diversas classes social e


também nas diferentes manifestações religiosas que se espalham por todo território
nacional. Embora sua linguagem seja diversificada, dependendo de onde venha essa
expressão cultural, a música acompanha o desenvolvimento e as relações
interpessoais em suas comunidades, bairros e cidades. Dessa maneira a musica é
forte componente na comunicação humana, permitindo que se fale, expresse
sentimentos, reflexões, memórias (…).

Existem muitas possibilidades de buscar as contribuições da música como


ferramenta contribuinte na educação, nas artes, nas ciências humanas . A relação
com a música, às vezes, já se inicia no ventre materno e segue no decorrer da vida.
Este fato ocorre em diferentes maneiras desde a canção de ninar no ventre da mãe,
como os cânticos religiosos marcantes nas diferentes crenças, assim e também,
como os sons da natureza que anunciam o dia que surge, ou que se põe, ou a
maneira como a pessoa se sente em certos momentos, exemplo: uma canção feliz
pontuando os sentimentos mais alegres, uma canção saudosa expressando
sentimentos de saudade; porém isto varia de individuo para individuo, mostrando a
pluralidade de interpretações oferecida pela musica, pelos sons, pela musicalidade
do ser.

Esses pequenos, porém significativos exemplos dão um breve panorama da


importância da música no desenvolvimento da vida, este fato não seria diferente no
desenvolvimento das artes cênicas, onde a musica tem estado presente de maneiras
a potencializar a construção da cena, do espaço, da comunicação.

Neste caso, entender mais sobre a importância da música e seus benefícios na cena
teatral, tornou-se campo de pesquisa do ator/diretor Matheus Menezes, para o
desenvolvimento de sua obra “Prosódia Bastiana ou traçados silenciosos de uma fé
chorosa”. Cuja proposta permeia a relação entre a memória e dramaturgia, levando o
espectador a experimentar sons de uma narrativa, onde a linguagem verbal apenas
pontua a finalização do espetáculo.

O desafio para Matheus Menezes fora o de construir a cena, sem o texto dito
verbalizado. Os dois atores em cena, criam o dialogo sem a palavra verbalizada e
sim a partir da comunicação corporal e musical, permitindo que, os atores criassem
uma comunicação singela com sons do cotidiano de suas rotinas e permitissem ao
espectador uma atmosfera verbal silenciosa, porém rica de significados sonoros, o
dialogo dito sem som da palavra.

Para Menezes, a maneira como os diversos sons podem ser produzidos, incluindo
músicas – trilha – e sons não convencionais, interferem diretamente na recepção de
uma obra, é algo que aguçava a curiosidade para esta relação entre a musica e a
cena, assim como o corpo e a cena, o espaço e a cena, tudo se relaciona de infinitas
maneiras (MENEZES, Matheus – Guaranésia; 2018). O que permitiu ao ator/diretor e
autor a diversidade sonora em sua obra. Quando se inicia os estudos em
dramaturgia sonora, percebe-se a que para os estudos da ‘musica em cena’
encontra-se, na maioria dos casos, um crescente estudo sobre as diversas maneiras,
os meios de se construir uma obra teatral, utilizando a musica como um dos recursos
estruturante.
Na obra de Matheus Menezes, constata-se uma opção por trabalhar com processos
que são muitas vezes implícitos na atuação, como pontuação dos gestos em cena,
pausas criadas para enfatizar uma ação, a leveza no olhar facial, o corpo no lugar na
palavra dita, (etc.) possibilitando a criação de uma atmosfera com recursos sonoros
cotidianos, ampliando as imagens cênicas do espectador, permitindo que este possa
familiarizar-se com a cena ou criar novas realidades. Para Fernandino a musica
como recurso da cena é um dos meios mais ricos de troca com o expectador,
quando propõe um encontro entre o silêncio dilatado e corpo falante.

De acordo com Jussara Fernandino:

A presença da Música no contexto teatral expressa-se de duas maneiras. Uma mais


evidente, em termos de material musical, como a sonoplastia e as eventuais
manifestações musicais do ator, como tocar, cantar e dançar. E outra, implícita nos
processos de atuação e encenação – dinâmica de cenas, construção de
personagens, movimentação e deslocamento no espaço, possibilidades gestuais,
plásticas e sonoras (corporais, vocais, dos objetos, do ambiente) –, processos esses
que constantemente utilizam elementos musicais em sua constituição, como
variações rítmicas, andamentos, pausas, alturas, timbres, dentre outros. Nesse
segundo tipo de manifestação, a Música rompe sua “lógica interna”, reconfigurando
seus materiais em função das interações com os demais discursos presentes no
âmbito cênico. (FERNANDINO, 2008, pág11).

Para exemplificar neste, compartilhar-se-á as experimentações e vivencias na


montagem do espetáculo teatral ‘Prosódia Bastiana ou traçados silenciosos de uma
fé chorosa, de autoria e direção de Matheus Menezes. O Autor/Dramaturgo e diretor
da obra, contribuiu para este com duas entrevistas, realizadas em 2018, nas cidades
de Guaranésia e Juiz de Fora, no estado de Minas Gerais, ambas em eventos
teatrais.

CONSTRUINDO UMA NARRATIVA DE MEMORIAS DO AUTOR,


ATRAVÉS DO SENTIDO DO SOM

Ouvir, reproduzir, produzir, criar musica, sons é uma atividade cuja origem se perde-
se no tempo. Faz parte não apenas da vida cultural, mas principalmente de aspectos
emocionas de cada individuo. Neste caso como construir a dramaturgia sonora de
uma obra, cujo texto ou roteiro já esta criado, como narrar estas memórias escritas?

Menezes, conta que antes mesmo de pensar na trilha, na vestimenta, na luz (…) ele
pensou na história narrada. E como contar algo de sua própria história que fosse
sensível aos olhos e ouvidos do espectador.

Matheus Menezes, nascido na Bahia, na cidade de Jequié, que traz como tema de
sua obra, sua própria história de vida e trajetórias. Decide mudar-se de Jequié, para
estudar na cidade de Salvador. Para tal, Menezes, precisava deixar somente nas
memórias sua vida em Jequié e agarra-se ao sonho dos grandes centros. Chegando
a Salvador inicia os estudos na tão almejada graduação em Artes Cênicas na UFBA
(Universidade Federal da Bahia). Menezes é ator, diretor, dramaturgo, performer e
mediador cultural, atualmente licenciando em teatro pela UFBA. Enquanto mediador
trabalhou em 2017 nos festivais FILTE, FIAC, FESTAC e em 2018 no Festival Petiz.
Os estudos continuaram, mas o desejo de compartilhar as memórias era um fato
latente. Os primeiros passos vieram através da escrita e dos estudos dentro da
graduação, criando um texto, uma pesquisa, um trabalho de dramaturgia para suas
memórias, dessa forma, Menezes foi aos poucos organizando suas ideias,
memórias, emoções, pela escrita. Aos poucos o que parecia distante, toma forma no
papel.

Uma leitura realizada da forma escrita começa a traçar a mente criativa do ator e
autor. Mas somente a leitura, parecia um pouco limitador ao universo narrativo de
suas memórias. O texto/roteiro continham falas sobre o trabalho e a sobrevivência, a
solidão e a solitude, o amor que se constrói no meio a prédios e danos, através da
visão estética e afetiva de quem vive o êxodo de seu interior para a capital. Linhas
escritas e memórias revividas do autor, este fora o primeiro passo.

Porém, assim como a escrita, a leitura passa por uma decodificação, porque é um
processo de (re)atribuição de sentidos, mesmo quando escrevemos, ou lemos,
automaticamente podemos (re)atribuir um sentido novo, ou imprimir uma sensação
nova, ou própria daquele momento, então, a necessidade de um cuidado ao retratar
suas memórias e trajetórias, ou seja, para Menezes, ainda faltava algo, para
construir uma dramaturgia sensível, que levasse o espectador a criar suas imagens
à partir de suas próprias vivências, mas também permitir que o espectador ouvisse
suas memórias e pudesse recriar suas próprias sensações.

A construção de sentidos, seja pela fala, pela escrita ou pela leitura está diretamente
relacionada às atividades discursivas e as práticas sociais, as quais, o individuo têm
acesso ao longo de seu processo de socialização. O trabalho com a leitura
geralmente adquire caráter sócio-histórico do dialogo e a linguagem verbal que tende
a preencher um fator de representação social. Mas ainda assim para a completude
da obra teatralizada, parecia pouco significativo para o autor, ele almejava mais,
queria mais sensações em suas descrições, a cada escrita, a cada leitura uma
(re)atribuição de sentidos, isso tornava o trabalho mais difícil.

Porém, não impossível, o processo de escrever, descrever, detalhar,


cuidadosamente, para que não se perdesse a essência da poética em suas
trajetórias, era delicado e sensível, conta Menezes.

Assim, o teatro, a música, a plástica vão adquirindo cada vez mais espaço na
composição final, deixando e fazendo com que o autor se distribuísse nos papéis de
ator, encenador e escritor.

O trabalho de pesquisa permeia as relações afetivas do autor, que interferem


diretamente na construção plástica e sonora da obra. A convivência, cada vez mais
intensa, baseada em relações de igualdade e não de poder, vai permitindo todas as
formas de expressão de se unirem (corpo, voz, fala, sons, gestos, objetos) e se
tornarem-se harmônicas, como em uma composição musical. Porém a
experimentação estava apenas nos início.

Lívio Tragtenberg, (1999) acredita, ‘que o compositor deve possuir sempre a sua
própria impressão e concepção de trabalho musical a ser desenvolvido numa
encenação’. Para Menezes era claro as marcas da própria impressão na construção
de sua obra teatral, o desafio estava em como realiza-la de maneira, tocante e
afetiva, de maneira que não precisasse de uma comunicação propriamente dita
verbal, que através de um som, de uma musica o espectador fosse atravessado por
afetividades sonoras e construísse suas imagens. Ao apresentar a obra, os atores se
tornarão mediadores desta narrativa, permitindo que o espectador tenha suas
próprias vivencias e possa construir tanto suas imagens partindo de seus afetos
pessoais, quanto serem tocados pelos afetos oferecidos pelos atores.

(…) todo trabalho sonoro de uma encenação deve ser construído sob uma
concepção(…) Portando, a composição sonora dever ser concebida e tratada como
um todo, reforçando a unidade de encenação (mesmo que essa unidade se expresse
como fragmentariedade e montagem). (TRAGTENBERG, Lívio, 1999, pág. 45)

Assim como em uma composição, Matheus Menezes construiu os detalhes sonoros


a partir da narrativa escrita e descrita por ele próprio, contendo sua trajetória, desde
o caminhar de um lugar ao outro, a experimentação de comer pipocas de micro-
ondas. Cada detalhe significativo ao invés de ser dito verbalmente era dito
sonoramente.

Para melhor ilustrar este momento, citar-se-á neste uma das passagens no
espetáculo, em dois distintos momentos fantásticos (deixando claro que existem
outros): O ator sutilmente, mergulhado na dilatação do silêncio, atravessa a cena,
onde se ouve apenas o tilintar dos sapatos durante toda a travessia entre lugar de
encenação e espectador, o espectador levado ao silêncio dilatado em todo espaço,
se torna observante fiel de cada detalhe narrado; a personagem em seguida ao
adentrar o espaço cênico, pega uma sombrinha, como se observasse o tempo, olha
de um lado ao outro, com gestos pontuais e enfatizados pelo contorno do corpo e o
figurino, o mesmo esta a espera de alguma coisa, e aos pouco vai ficando claro para
o espectador que ele começa a sentir pequenas gotas de chuva, a personagem
estava a espera de uma chuva; mas como reproduzir, o momento da chuva sem
recursos mecânicos?

Neste ponto o espectador, imerso, é levado pelo estado corpóreo do ator em sintonia
com a personagem, cujos movimentos de sentir os pingos da chuva eram tão reais e
poéticos, que a chuva já estava estabelecida, porém, Menezes, vai além e para
surpresa do espectador, sutilmente, com gestos detalhados, a personagem/interprete
abre a sombrinha, meio gasta, velha, azul e começa a cair da sombrinha aos poucos
caroços de arroz, que ao bater no chão emitem o som mais sensível e forte ao
mesmo tempo das chuvas de verão; a musica vindo da sombrinha era tocante, o
som da chuva no final da tarde, com entardecer do sol, era uma das imagens claras,
gosto, cheiro, som e forma de memórias estabelecida entre o espaço de encenação,
os efeitos sonoros e o espectador.

Outro momento e apresentado pela caminhada do ator até um velho micro-ondas,


que esta localizada na lateral da cena, neste momento, o único som durante alguns
minutos era da pipoca estourando, acompanhada pelo cheiro de manteiga, ou seja
além das afetações sonoras, proporcionados pelos efeitos sonoros, pela
musicalidade apresentada na cena, o espectador muitas vezes despertava outros
sentidos, como o do olfato, este fato não somente ocorrera com as pipocas, mas
também com o cheiro do arroz que cai da sombrinha, ou da sopa que estava em um
pequeno baú próximo ao micro-ondas.

Toda essa experimentação sonora levava o espectador a se manter no silêncio,


apenas ouvindo a narrativas. Tal ação era traçada desde a entrada do ator em cena
a sua finalização.

Já no começo do espetáculo percebemos uma pequena mudança, não tem como de


costume os três sinais, neste não há nenhum tipo de sinalização de início de
espetáculo, aviso/pedido de desliguem o seu celular, ou um boa noite (…) assim
como em um traçado de fé silenciosa, não há de inicio nenhum aviso, e sim um
pedido vindo do tilintar dos sapatos; a entrada do próprio Matheus em cena,
caminhando geralmente a partir do fundo do lugar de encenação, onde é possível
ouvir apenas o som de seus sapatos, com solados de madeira que anunciam a
caminhada de alguém, provoca no espectador o estalo, é como se fosse traçado
naquele momento um acordo com o publico assim que ocorre a entrada do ator para
cena.

Peter Brook declara que o ator, para alcançar uma total clareza de intenções, deve
trabalhar a perfeita harmonia entre pensamento, sentimento e corpo, o que se traduz
por meio de três estados: “vivacidade intelectual, emoção verdadeira, um corpo
equilibrado e disponível” (BROOK, 2002, p.15).

E assim, se faz a entrada de Matheus Menezes em cena. O ator mantinha uma


emoção verdadeira em cada gesto feito em meio ao seu silêncio, que ia se
alastrando por toda atmosfera, com os efeitos sonoros, ou os sons que ele
proporcionava vindo de algum objeto (como um despertado que ele carregava ao
longo da peça que soava em alguns momentos), ou até mesmo vindo de uma
musica especifica tocado por ele ao pegar uma pequena sanfona. Estes detalhes
percorriam todo o espetáculo.

O som apresentado pelo ator, que se estabelece do caminhar até o local da


encenação, é acompanhada pelo peso do silencio da personagem, sua
indumentária, que traçam este acordo com o publico no local, o silencio vai se
dilatando por toda atmosfera, a comunicação sonora estabelecida pelos sapatos,
acompanhando o corpo de uma senhora, a personagem em questão que percorre a
plateia até adentrar o local da encenação e vai tomando conta de todo ambiente.

Nesse sentido, ressalta-se aqui a importância do silêncio na estética do autor, a


comunicação é intensificada primeiramente a partir do silêncio, que constrói com os
sons que vão surgindo todas as falas não verbalizadas do espetáculo.

Figura 1 – Matheus Menezes – ator/diretor; Prosódia Bastiana ou traçados


silenciosos de uma fé chorosa.
Foto
por Sidnaldo Lopes, Bahia 2017.

Figura 2 – Matheus Menezes – ator/diretor; Prosódia Bastiana ou traçados


silenciosos de uma fé chorosa.
Foto por Diego
Siqueira – Guaranésia 2018.

MEMÓRIAS, DRAMATURGIAS SONORAS NA ENCENAÇÃO


TEATRAL DE PROSÓDIA BASTIANA

Descrever ou escrever sobre uma memória, pode parecer simples, mas quanto mais
pesquisa sobre seus afetos emocionais, maior é a riqueza da escrita dramatúrgica.
Matheus Menezes, não só atuou como escreveu e construiu a dramaturgia de seu
espetáculo, assinando também parte da direção geral. Porém, para vivacidade de
certos detalhes em sua trajetória, precisou de uma olhar a mais e também de dividir
o palco com mais um artista.

O convite foi feito a um amigo da graduação, tanto para compor a atuação, quanto
para assinar a direção. Sidnaldo Lopes agracia o espetáculo e também assina a
direção geral. Sidnaldo Lopes, amigo da graduação, é ator, produtor e Licenciando
em Teatro pela UFBA, formou-se como ator a partir do XXIX Curso Livre de Teatro
da UFBA. No ano de 2017 fez a produção de espaços no Festival Internacional de
Dança VIVA Dança. Recentemente assumiu a direção de produção do espetáculo
‘’Puta: Filha da que te Pariu’’.
Agora eram, dois pesquisadores, atores, dramaturgos e diretores, traçando a costura
e encenação da obra. Com a chegada de Lopes e a pedido de Menezes, o texto foi
revisado e juntos começaram a dar voz ‘sonora’ a tudo que então estava na escrita.

Para Menezes, a dramaturgia estabelece uma comunicação entre o texto, seu


desenvolvimento e a cena e pode conter neste sentido diversas formas de
dramaturgia, afinal tudo é dramaturgia, tudo tem sua dramaturgia (MENEZES, 2018).

Dessa forma, reforça a ideia de que a dramaturgia contém elementos capazes de se


relacionar e produzir significados maiores.

FIGURAS – As figuras (fotos) acima em destaque foram captadas por atores, que
acompanharam o processo de montagem e realização do espetáculo, nos anos de
2017 e 2018. Atores atuantes na técnica do espetáculo em destaque. Todas as fotos
foram autorizas para publicação.

(…) A dramaturgia se configura então em uma pluralidade de elementos que


interagem entre si a fim de obter um significado total para a obra e para o
espectador. Dentro desta dramaturgia final pode-se citar diversas ramificações
dramatúrgicas que auxiliam na construção do significado da obra, como a
dramaturgia do cenário, dramaturgia do espaço, dramaturgia do ator, dramaturgia da
iluminação, a própria dramaturgia do texto, dramaturgia sonora (…) (CARVALHO,
2015, pág. 15)

Partindo deste pensamento Menezes e Lopes, começam toda composição teatral,


contendo a ação verbal e dando voz a ação musical e sonora. O que antes era
estrutura pela escrita, agora era pelo som. Matheus relata que a busca por uma nova
postura de suas interpretações foram encontradas, o fato de não falar propriamente
dito, permitiu um novo lugar, uma nova voz, uma comunicação ampla na gama de
imagens, permitindo uma relação com o espectador através do silêncio, ampliando
todo seu estado corpóreo e o espaço da encenação que era limitado para maior
intimidade com o espectador, porém agora lhe parecia gigantesco.

Prosódia Bastiana ou traçados silenciosos de uma fé chorosa, narra a transformação


pessoal, a trajetória e mudanças na vida do interprete, que conta com apenas mais
um ator em cena, dividindo as memórias, os encontros marcantes, e também a
técnica geral do espetáculo, desde Jequié a Salvador.

Cuja estética do espetáculo nos leva a sensações de um pequeno vilarejo, com


areia, tons pastel, certo verde nas plantas, o detalhe no cheiro do café, da sopa e da
pipoca. A composição gestual detalhada em cada movimento, a respiração
pontuada, o iniciar do dia com o som do despertador, a sensação da chuva com os
grãos de arroz tocando o chão.

Neste espetáculo a figura do ator se torna o articulador, o mediador entre os sons e


a plateia, de modo que não há neste primeiro contato nenhuma linguagem verbal,
toda comunicação é estabelecida poeticamente com sons que pontuam a narração
corpórea e a utilização de acessórios e objetos em cena.

É através do silencio que o espectador percebe a potencialidade da cena e dos


efeitos sonoros oferecidos pelos interpretes. Para a construção cênica, o autor e
diretor destaca algumas estratégias vivenciadas para descrever as cenas e as
passagens de ambiente, optando pelo fato de não verbalizar o que havia escrito, a
dramaturgia sonora foi uma valiosa ferramenta para as possibilidades expressas
advindas de objetos como despertador, caneca de alumino, o tilintar dos saltos de
madeira, o pequeno banco de madeira, os acessórios que constroem a vestimenta
dos interpretes (…). Ou Seja a riqueza oferecida por toda e em toda cena.

Destaca-se ainda a presença de elementos musicais instrumentados com o pequeno


acordeom (sanfona). E próximo a finalização o canto realizado pela personagem de
Matheus Menezes, como um cantão de fé e angustia.

Prosódia Bastiana ou tratado de uma fé chorosa provoca o questionamento sobre


qual a relação entre a linguagem verbal e não verbal, e o que acontece quando o
som e o gesto se tornam palavra. A partida, a mudança, a saudade, as trajetórias
que diluem-se no dia a dia, na expectativa das ilusões oferecidas pelas capitais, que
ao mesmo tempo se tornam desilusões, a necessidade de comunicar algo de si para
o outro, traçam toda a poética deste trabalho.

Vedar um sentido para aguçar o outro, transpor em sons o que a palavra na atingia,
para apresentar as angustias das memórias de um jovem sobre a luta de fazer uma
graduação saindo do interior para a capital, a solidão do silêncio gritado pelo mundo.
Matheus Menezes adiciona toda essas sensações de maneira organizada, para
retratar sua história. Sons organizados no lugar da fala verbal, comunicando toda
esta vivência.

A musica, os sons, os efeitos sonoros, estão presentes desde o inicio ao final do


espetáculo, como um todo. As possibilidades oferecidas pelos interpretes em
comunicar com instrumentos e objetos que podem sugerir outros sons é fantástico.

Schafer, em seu livro Ouvinte Pensante, propõe um jogo de perguntas e respostas a


seus alunos afim de entender o que eles sabem sobre o que é musica e também os
oferece provocações de como dar som a objetos, situações, atmosferas, de forma a
organizar sonoramente estes sons, para que eles sejam ouvidos. Quando os sons,
se encontram organizados e promovem algum tipo de sensação, afetação, este sim
se torna um componente musical. “Música é uma organização de sons (ritmo,
melodia, etc.) Com intenção de ser ouvida”. (SCHAFER, Murray pág. 23, 2012)

Para Menezes, sua trajetória foi contada e foi contando com as maiores riquezas de
detalhes através dos sons e musicas que compuseram a obra.

(…)emudecimento do cansaço em uma nova cidade em que o caos, o drama, a


saudade e o tempo líquido são constantes. Os únicos sons que são projetados
durante toda a cena são dos guizos de bode pendurados na minha vestimenta e dos
sapatos com o salto de madeira, fazendo menção a limitações, visto que as sinetas
que os animais carregam o pescoço são alarmes de fuga ao criador ou sinalização
áudio-espacial, bradamos em silêncio então: eu estou aqui e eu estou pisando este
chão. A dilatação e aceleração surgiram na analise aparente do tempo no interior e
na analise do tempo na capital. Percebo uma agitação nos grandes centros e uma
maior exaustão corpórea pela distância, contingente e processos locomotivos (…)Um
tempo menos caótico no interior, uma memória retratada na dilatação do silêncio,
que grita no grande centro, os sons que falam mais que palavras, traçando uma fé
silenciosa. (MENEZES, Juiz de Fora; 2018)
UMA NARRATIVA QUE ENVOLVE E TOCA A ALMA PELO SOM

Utilizando do ultra-documental para emergir críticas e explanar sentimentos


subjetivos de um interiorano na capital, Menezes e Lopes, deixam claro a poética de
seu trabalho impresso no campo sonoro e interpretativo do espetáculo. Trazer um
enredo real vivido pelo próprio ator, mas não necessariamente dito ao público de
forma épica, clara ou com elementos da realidade – explicam os artistas, que
completam: “usamos o silêncio em todo o espetáculo, a não voz, em metáfora ao
emudecimento do cansaço em uma nova cidade em que o caos, o drama e o tempo
líquido são constantes”. (MENEZES, Matheus e LOPES, Sidnaldo, 2018 – Juiz de
Fora).

Elementos cênicos como a mala, trazem as mazelas do êxodo, tópicos específicos e


subjetivos são tratados: o teatro do interior e o teatro de capital, além do
afeto/desafeto.

A este fato podemos concluir que o espetáculo teatral “‘Prosódia Bastiana ou


traçados silenciosos de uma fé chorosa”, nos permite entender todo o conceito da
musica, dos efeitos de som, da musicalidade, à perspectiva Sonora, que é entender
o espetáculo como um meio-ambiente acústico constituído por diversos
componentes sonoros, e a relação entre eles em dois âmbitos: horizontal e vertical.
O âmbito horizontal inclui a exploração sonora que fez parte do processo de
pesquisa, criação e produção das sonoridades que compõem o espetáculo. O âmbito
vertical se trata da execução final apresentada e da interação do conjunto das
sonoridades, em coerência com o todo do espetáculo: dramaturgia, visualidades,
atuações, etc. A Comunicação Sonora de um espetáculo tem a ver com envolvência
do público, uma vez que as ondas sonoras ocupam todo o espaço e atravessa os
corpos tocando diretamente a nossa sensibilidade. Assim, todo o percurso da
apresentação propõe um atravessamento poético de sentimentos ao mesmo tempo
em que é atravessado pelo silêncio dilatado no ambiente de encenação.

Figura 3 – Matheus Menezes; Figura 4 – Matheus Menezes; Figura 5 – Matheus


Menezes tocando acordeom; Figura 6 – Matheus Menezes e Sidnaldo Lopes; Cena
em Prosódia Bastiana ou traçados silenciosos de uma fé chorosa.
Fotos captadas pela atriz Danyela Silvério, apresentação realizada em 2018 no
espaço Estação Palco – II Mostra InventaIncena de Artes Cênicas 2018 em Juiz de
Fora.

FIGURAS – As figuras (fotos) acima em destaque foram captadas pela atriz Danyela
Silvério no momento da apresentação em 2018. Todas as fotos foram autorizas para
publicação.

REFERÊNCIAS

CARVALHO, Alves Monique. Dramaturgia sonora: um diálogo entre a teoria e a


prática da utilização dos sons na cena. Pelotas/RS, 2015.

CASTILHO, Jacyan. A musicalidade da cena. Salvador/BA, 2008.

FERNANDINO, Jussara. MÚSICA E CENA: Uma proposta de delineamento da


musicalidade no teatro. Belo Horizonte/MG, 2008.
MENEZES, Matheus. Entrevista para artigo. Cidades de Juiz de Fora e
Guaranésia/MG, 2018.

PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro (1947). Tradução de: J. Guinsburg e Maria


Lúcia Pereira. 3ª ed. São Paulo: Perspectiva, 2011.

SCHAFER, Murray. Ouvido Pensante. São Paulo/SP: Editora Unesp, Edição 2ª,
2012.

TRAGTENBERG, Livio. Musica de Cena. São Paulo/SP: Editora Perspectiva, 1999.

TRAGTENBERG, Livio. Música de cena: dramaturgia sonora. (Signos da música;


6) São Paulo: Perspectiva, 2008.

http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/handle/1843/JSSS-7WKJB4; acesso em
dezembro de 2018.

https://wp.ufpel.edu.br/teatro/files/2015/12/TCC.-MONIQUE-CARVALHO.-
Dramaturgia-Sonora; acesso em dezembro de 2018.

http://www.revistarepertorioteatroedanca.tea.ufba.br/11/arq_pdf/
amusicalidadedacena; acesso em dezembro de 2018.

Mestranda em Artes Cênicas pela Universidade Federal de São João DelRei; Pós
[1]

Graduada em Metodologia do Ensino das Artes – FACINTER; Graduada em Letras,


Licenciatura Plena pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora – CES; Graduada
em Produção Cênica, pela Faculdade Machado Sobrinho; Membro da Diretoria da
APAC – Associação dos Produtores de Artes Cênicas JF e Membro da diretoria da
FETIMINAS e do Circuito Minas de Teatro do Interior.

Enviado: Fevereiro, 2019.

Aprovado: Maio, 2019.

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ADRIANA RIBEIRO DE ALMEIDA

Mestranda em Artes Cênicas pela Universidade Federal de São João DelRei; Pós Graduada em
Metodologia do Ensino das Artes - FACINTER; Graduada em Letras, Licenciatura Plena pelo Centro de
Ensino Superior de Juiz de Fora - CES; Graduada em Produção Cênica, pela Faculdade Machado
Sobrinho; Membro da Diretoria da APAC – Associação dos Produtores de Artes Cênicas JF e Membro da
diretoria da FETIMINAS e do Circuito Minas de Teatro do Interior.

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