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Maria Madalena

Publicado em 23/08/2010 por Blog Sétimo Dia


O que se pode entender, com base na Bíblia e
nos escritos de Ellen White, sobre a identidade
dessa mulher.
Seria possível dizer que Maria Madalena,
Maria de Betânia e a pecadora de João 8
seriam a mesma pessoa?

O Novo Testamento parece fazer referência a


oito Marias: a mãe de Jesus (Mt 1:18;
2:11; 13:55; At 1:14); a mãe de Tiago e de José
(Mt 27:56; Mc 15:40; 16:1; Lc 24:10); Maria
“chamada Madalena” (Lc 8:2; 24:10; Jo 19:25;
20:1); Maria de Betânia, irmã de Marta
e Lázaro (Lc 10:38-42; Jo 11:1-44) a “outra Maria” (Mt 27:61; 28:1); a esposa de
Cléopas (Jo 19:25); a mãe de Marcos (At 12:12); e mais uma que morava em
Roma (Rm 16:6).
Porém, é provável que Maria, mãe de Tiago e José, a “outra Maria” e Maria,
esposa de Cléopas, fossem a mesma pessoa. Maria, mãe de Tiago e José é
mencionada por Mateus juntamente com Maria Madalena, entre as demais
mulheres que estiveram na cena da crucifixão (Mt 27:55, 56). Logo em
seguida, ainda no contexto da morte e ressurreição de Jesus, Mateus fala de
Maria Madalena e da “outra Maria” (Mt 27:61; 28:1), o que nos leva a crer
que essa tenha sido a mesma Maria, mãe de Tiago e José. Quando cruzamos as
informações de Mateus, Marcos e João sobre as mulheres que estiveram junto à
cruz (Mt 27:55, 56; Mc 15:40; Jo 19:25), não é difícil concluir que Maria, esposa
de Cléopas, também consiste na mesma pessoa. Nesse caso, em vez de oito, as
Marias do Novo Testamento seriam seis.

Porém, neste artigo, vamos estudar as referências a duas delas: Maria Madalena
e Maria, irmã de Marta e Lázaro, na tentativa de descobrir se elas eram a mesma
pessoa. Também consideraremos a hipótese, até certo modo difundida nos
meios adventistas, de que a pecadora de João 8 também fosse Maria Madalena.

A Mulher Adúltera
Começando pela pecadora de João 8:2-11, o texto não informa nada a seu
respeito: seu nome, onde morava, nem seu estado civil. A tentativa de
apedrejamento após o flagrante de adultério não prova necessariamente que
fosse casada. Se fosse noiva, a pena seria a mesma. Porém, o castigo raramente
era aplicado nos dias de Jesus. Na verdade, o relato sugere que tudo não passou
de armação, a fim de pôr Jesus à prova, em público e, quem sabe, apanhá-lo em
algum deslize: se recomendasse o apedrejamento, perderia Sua
influência perante o povo, de quem Se dizia defensor. Se não, os líderes judaicos
O acusariam de descumprimento da lei de Moisés (Dt 22:22).

Foi brilhante Sua estratégia de escrever na areia os pecados dos acusadores (O


Desejado de Todas as Nações p. 461). Assim, Ele conseguiu inverter os papéis,
expor a hipocrisia dos acusadores e perdoar a mulher. Contudo, não há nada no
texto que permita ou impeça uma identificação com Maria Madalena.

Sobre a autenticidade do relato em si (aparece entre colchetes em várias versões


bíblicas), João 7:53-8:11 de fato não consta nos melhores e mais antigos escritos
gregos de João. Mas, há evidências ou indícios de sua antiguidade e
autenticidade histórica. Poucos duvidam de que a história seja autêntica, tendo
sido preservada oralmente ou mediante alguma tradição escrita
paralelamente, até que mais tarde acabou sendo incorporada nos
manuscritos do Novo Testamento. Temos apenas que nos lembrar de que Jesus
fez e falou muito mais do que foi registrado (Jo 21:25), e que diversas histórias
permaneceram vivas na memória da igreja por muito tempo, após os
evangelhos terem sido escritos.

Maria Madalena
Tem-se como certo que o nome “Madalena” (em grego, Magdaléné) seja alusão a
Magdala, pequeno vilarejo na praia ocidental do Mar da Galileia, um pouco ao
sul de Cafarnaum. Alguns antigos manuscritos se referem a esse vilarejo como
“Magdã”, e é assim que ele é citado na maioria de nossas versões de Mt 15:39.
Não há dúvida de que Maria “Madalena” era assim chamada por ser originária
de Magdala, ou pelo menos por ter morado ali parte de sua vida.

Maria Madalena só é mencionada pelo nome uma vez nos evangelhos, antes do
relato da paixão de Cristo (Lc 8:2). Depois, ela é citada no contexto da
crucifixão. Em companhia de outras mulheres que haviam acompanhado o
Mestre desde a Galileia, ela presenciou a morte de Jesus (Mt 27:55, 56; Mc
15:40, 41; Jo 19:25), Seu sepultamento (Mt 27:61; Mc 15:47) e depois o
túmulo vazio (Mt 28:1-7; Mc 16:1-8; Lc 23:55-24:22; Jo 20:1). João é o único a
relatar o aparecimento de Jesus, após a ressurreição, exclusivamente a Maria
Madalena (Jo 20:11-18). A sequência dos fatos talvez tenha sido a seguinte:

Maria foi com as demais mulheres ungir o corpo de Jesus no domingo


de madrugada, mas adiantou-se a elas e chegou primeiro ao sepulcro,
encontrando a pedra revolvida. Então, ela contou a Pedro e a João o que
havia acontecido, sendo depois alcançada pelas demais mulheres. Em
seguida, teria voltado em companhia de Pedro
e João ao sepulcro, onde permaneceu chorando depois que todos foram
embora. Foi nesse momento que ela viu os dois anjos e, em seguida, o
próprio Cristo ressuscitado. No diálogo que se seguiu, Jesus lhe disse: “Não
Me detenhas; porque ainda não subi para Meu Pai” (Jo 20:17). Ele
precisava ascender ao Pai; queria ter a certeza de que Sua morte havia sido
aceita como sacrifício pela humanidade pecadora (O Desejado de Todas as
Nações, p. 590).

Maria de Betânia
Irmã de Marta e Lázaro, essa Maria é mencionada pelo nome apenas nos
evangelhos de Lucas e João (Lc 10:38-42; Jo 11:1). O povoado de Betânia estava
localizado do outro lado do Monte das Oliveiras, distante de Jerusalém
aproximadamente três quilômetros, na estrada para Jericó.

Seis dias antes da Páscoa, Jesus esteve novamente em Betânia, onde


Lhe ofereceram um banquete. Marta servia; Lázaro estava com Jesus à
mesa. Maria, “tomando uma libra de bálsamo de nardo puro, mui precioso,
ungiu os pés de Jesus e os enxugou com os seus cabelos; e encheu-se toda a casa
com o perfume do bálsamo” (Jo 12:3).

João menciona apenas que quem O ungiu foi Maria, irmã de Marta e Lázaro, e
que o fato se deu em Betânia. Os demais evangelhos também contêm um
episódio de Jesus sendo ungido por uma mulher (Mt 26:6-13; Mc 14:3-9; Lc
7:37-50). A dificuldade é saber se os quatro relatos se referem ao mesmo
episódio. Os relatos de Mateus e Marcos são praticamente idênticos entre si e
muito semelhantes aos de João, embora nem Maria, nem Marta nem Lázaro
sejam mencionados, e Jesus foi ungido na cabeça e não nos pés. Sabemos,
porém, que o episódio ocorreu em Betânia, como em João, e há outros
detalhes na narrativa que também são muito parecidos àqueles mencionados
por João. Outra diferença, de natureza secundária, é que tanto Mateus quanto
Marcos mencionam que o banquete foi oferecido por um tal Simão, ex-leproso,
informação essa omitida por João. No geral, porém, não há porque negar que
tanto João quanto Mateus e Marcos se referem ao mesmo episódio.

No evangelho de Lucas, as diferenças são bem maiores. Ali, o episódio parece


ter ocorrido na Galileia, quando João Batista ainda estava na prisão (Lc 7:18-
35), e não na Judeia, onde ficava Betânia, pouco antes da morte de Jesus. Lucas
também não menciona o nome de Maria nem de seus irmãos, e é o único que
identifica a mulher como sendo “uma pecadora”, cujos muitos pecados
tinham sido perdoados por Jesus (Lc 7:37, 39, 47-50). Por outro lado, ele
difere de Mateus e Marcos, ao dizer que foram os pés de Jesus, e não a
cabeça, que a mulher ungiu. Vários outros detalhes da narrativa também são
diferentes, o que tem levado a maioria dos intérpretes modernos a postular dois
episódios distintos: um descrito por Lucas, o qual teria ocorrido na Galileia,
mais cedo no ministério de Jesus, e outro pelos demais evangelistas, ocorrido
em Betânia poucos dias antes da crucifixão.

É importante destacar que nem todas as diferenças são


necessariamente contraditórias; muitas delas são, na verdade,
complementares. Talvez seja por isso que diversos pais da igreja tentavam
harmonizar os relatos, dizendo, por exemplo, que Lucas descreve o mesmo
episódio, só que num contexto diferente, e que, portanto, Maria de Betânia teria
realizado a unção. Isso não é totalmente impossível, ainda mais se
considerarmos o fato de que Lucas nem sempre segue uma ordem
estritamente cronológica em seu evangelho. Além disso, como ele diz que Jesus
havia curado Maria Madalena, expulsando dela sete demônios (Lc 8:2), o
passo seguinte de vários escritores cristãos foi identificá-la como a
“pecadora” mencionada no capítulo 7, por causa de sua profunda expressão de
gratidão, ao ungir Cristo. Foi assim que Maria Madalena, Maria de Betânia e a
“pecadora” mencionada por Lucas acabaram identificadas pela tradição da
igreja como a mesma pessoa. O cenário estava formado para se dizer que a
adúltera de João 8 era também a mesma mulher.

Informações Adicionais
Ao escrever sobre esse assunto, em seu livro O Desejado de Todas as Nações (p.
557-568), Ellen G. White trata o relato de Lucas como tendo sido o mesmo que
ocorreu seis dias antes da crucifixão e que é relatado pelos demais evangelistas.
Ela também informa que o banquete fora oferecido por Simão pelo fato de Jesus
lhe haver curado da lepra. Quanto à identificação de Maria, ela claramente dá a
entender que se trata mesmo de Maria Madalena, embora não a cite pelo nome.
Refere-se a esta Maria como sendo a mesma de quem Jesus expulsou sete
demônios e que, mais tarde, acompanharia os eventos de Sua morte e
ressurreição.

“Foi Maria que se assentou aos pés de Jesus e dEle aprendeu. Foi ela que Lhe
derramou na cabeça o precioso unguento, e banhou os pés com as próprias
lágrimas. Achou-se ao pé da cruz e O seguiu ao sepulcro. Foi a primeira junto ao
sepulcro, depois da ressurreição. A primeira a proclamar o Salvador
ressuscitado” (p. 568). Bastante esclarecedora também é a informação de que
fora o próprio Simão que induzira Maria ao pecado e que, por isso, a
desprezava: “Fora por ele profundamente prejudicada” (p. 566).

Em um artigo publicado na revista The Signs of the Times (09/10/1879), sob o


título “A oferta de amor”, Ellen White se refere a Maria como aquela de quem
Jesus expulsou sete demônios, declarando que, em Sua misericórdia, Ele lhe
havia perdoado os pecados, “os quais eram muitos e graves, e seu coração estava
repleto de amor por seu Salvador”. Ainda mais significativa é a informação dada
no mesmo periódico (09/05/1900), cujo título é “Na casa de Simão”. Nesse
artigo, ela declara que Simão era tio de Lázaro, o que significa que também era
tio de Maria. Quando nos lembramos de que fora ele mesmo quem a induzira ao
pecado, não é difícil imaginar o que teria de fato acontecido.

Então, a Sra. White faz aquela que talvez seja a revelação mais
surpreendente, sugerindo que essa Maria seja, de fato, a mulher apanhada em
adultério (Jo 8): “Essa penitente mulher tornou-se um dos membros mais fiéis
do círculo de amizade de Jesus. Ela retribuiu Seu perdão e compaixão com um
ato de amor e adoração de profundo desprendimento [a unção na casa de
Simão?]. Mais tarde, quando estava cheia de pesar ao pé da cruz [Maria
Madalena?], seu coração foi traspassado novamente ao ver a agonia de morte na
face de seu Senhor e ouvir-Lhe o brado pungente. Ela sabia que esse sacrifício
era por causa do pecado, e sua responsabilidade como alguém cuja enorme
culpa havia ajudado a trazer tal angústia ao Filho de Deus parecia mesmo muito
pesada” (The Signs of the Times, 23/10/1879; “A sabedoria e a compaixão de
Jesus”).

Prudência
Na Bíblia, não temos informações suficientes que nos permitam
identificar Maria Madalena com Maria de Betânia, irmã de Marta e
Lázaro, muito menos com a pecadora de João 8. Ellen G. White, porém,
não apenas confirma tal identificação, explicitamente no caso das duas Marias e
implicitamente no caso da pecadora de João 8, como também fornece
importantes detalhes que muito enriquecem nossa compreensão dos fatos. Com
base nesses detalhes, não é difícil reconstruirmos a história de Maria, ainda
que hipoteticamente. Induzida ao pecado pelo próprio tio, acabou fugindo
para o norte, para os lados de Magdala, onde sua dor e complexo de culpa
a conduziram ainda mais fundo no pecado e no vício. Foi assim que Jesus a
encontrou, totalmente entregue às forças do mal, e a curou. Depois disso, ela se
juntou a outras mulheres que passaram a segui-Lo e ajudá-Lo no trabalho de
evangelização.

Mais tarde, de volta a Betânia, Jesus conheceria seus irmãos e Se tornaria


hóspede frequente da família. Foi então que, talvez por causa de seu passado
nada recomendável, ela teria sido usada como isca pelos líderes judaicos
desejosos de pegar Jesus em alguma falha. Induzida novamente ao adultério, foi
apanhada em flagrante e levada perante Ele que, mais uma vez, a perdoou.
“Maria fora considerada grande pecadora, mas Cristo sabia as circunstâncias
que lhe tinham moldado a vida” (p. 568). E, seis dias antes da crucifixão,
ela expressou sua gratidão num ato cuja memória jamais devia ser apagada (Mt
26:13). Quando Jesus morreu, ela permaneceu ao Seu lado e teve a honra de ser
a primeira a testemunhar a ressurreição (Jo 20:11-18).

Sem dúvida, uma bela história. Porém, é necessário prudência ao contá-la.


Pessoas não familiarizadas com os escritos de Ellen G. White podem não
entender ou aceitar essa reconstituição. Mas, seu uso interno na igreja não devia
necessariamente causar estranheza. Mesmo assim, permanecem algumas
dúvidas, pois a sugestão de que a mulher adúltera seja Maria Madalena não é
feita pela Sra. White senão apenas uma vez. Seja como for, é importante que nos
atenhamos ao ponto principal, que foi a forma extraordinária como Jesus a
perdoou e lhe deu nova chance (Jo 8:10, 11).
Artigo escrito por Wilson Paroschi, professor no Seminário
Teológico do Unasp (Eng.Coelho, SP), publicado na Revista
Ministério de Mar/Abr de 2010.

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