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PRIMEIRA PARTE: MARIOLOGIA BÍBLICA.


De mãe de um judeu marginal à Rainha do céu

CAPÍTULO I: A MÃE DE UM JUDEU MARGINAL

 Não há notícias históricas a respeito de Maria. Pelas notícias de Jesus (Flávio Josefo e Tácito) podemos
nos aproximar de sua figura histórica.
 Os Evangelhos não possuem intenção de fazer história, mas de apresentar a fé que histórica.
 Por isso, recorremos a autores não-cristãos e historiadores como ponto de partida de notícias históricas
sobre Jesus e sua mãe.

I. O FILHO DE MARIA, UM JUDEU MARGINAL

 Maria é conhecida porque Jesus é conhecido (não da mesma com José). Sua fama crescia à medida que
aumentava o número de crentes.
 Jesus não foi um personagem notório, famoso aos seus contemporâneos. Os historiadores interessaram-
se mais pelo movimento cristão que por seu fundador.
 Foi um judeu marginal de um movimento marginal, de uma província marginal.

1. O testemunho de Flávio Josefo.


 Fez-se famoso na Igreja e na Tradição por causa das citações dos Padres da Igreja. Assim ficou
conhecido no Ocidente cristão.
a) Uma testemunha não cristã.
 O interesse era apologético: demonstrar que o cristianismo tinha raízes na antiguidade provadas em seus
livros Antiquitatis e Contra Apion.
 Josefo afirmava que a queda de Jerusalém devia-se ao pecado de Israel, por ter condenado Jesus à morte;
assim era como Josefo era lido pelos cristãos.
 Também transmite dados que corroboram com o Novo Testamento: censo de Quirino, governador da
Síria, a crueldade de Herodes, etc.
 Sua objetividade histórica era afetada por sua aliança com o imperialismo romano, com a aristocracia
judaica e por seu oportunismo.
 Defendia a elite judaica, era pro-romano, anti-revolucionário, etc.
b) A imagem de Jesus na obra de Flávio Josefo
 Na obra Antiguidades judaicas de 96-98, Josefo dá um testemunho sobre Jesus. O texto é autêntico,
embora com interpolações cristãs.
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 Emerge a figura de um Jesus homem sábio que manifesta sua sabedoria em fatos surpreendentes. Possui
seguidores e foi morto na cruz.
 Seus seguidores permanecem fiéis e a tribo dos cristãos continuou. Josefo fala também de João Batista,
mas sem nenhuma ligação com Jesus.
c) Dados sobre a família de Jesus.
 O texto 20 de Antiguidades judaicas narra a morte de Tiago, irmão do Senhor por Ananias, sumo-
sacerdote.
 Este nome era comum. Josefo o especifica como irmão do Senhor, como aparece no Novo Testamento e
em Hegesipo (séc. II).
 Porém, Josefo e Hegesipo se diferem no relato da morte de Tiago: o primeiro afirma que morreu
apedrejado e o segundo, a pauladas (+ 70).
2. O testemunho de Tácito.
 Governador da província da Ásia, historiador (56/57 – 118 d.C), narra a situação da Palestina no tempo
de Jesus.
 Fala de Jesus em sua obra Os anais, citando Nero e suas maldades.
 Possui um tom anticristão. Os cristãos são depreciados por seus vícios abomináveis e perigosa
superstição moral.

3. As fontes rabínicas e seu testemunho


 São várias fontes (Mishna, Talmud, Targuns, Midrashim). A Mishna é o mais antigo. Mas são os rabinos
do século II que falam de Jesus em reação à pregação dos cristãos.
a) Jesus, bem Pantera.
 É a história da literatura rabínica onde uma jovem judia manteve relações ilícitas com um soldado
romano chamado Pantera e cujo filho era chamado Bem Pantera. (Orígenes, no Contra Celso, 248).
 Celso (178) refere esta história a Maria: seu marido era carpinteiro que a repudiou após ter dado à luz em
segredo; vai para o Egito onde Jesus trabalha como mago (deus).
 Pode-se supor que esta história já circulava na diáspora judaica do século II. Porém, Justino não a
conhecia (+ 150) no Diálogo com Trifão.
 Celso relata algumas características de Mateus. Isto quer dizer que os judeus da diáspora do século II
conheciam Mt 1,18-25 e quiseram refutar inventando uma paródia.
 Por ter surgido na diáspora e não na Palestina, questiona-se a historicidade.
 Vários escritos judeus falam de Jesus Bem Pantera, mas sem referência direta a Jesus.
b) Jesus, mago sedutor.
 O Talmud babilônico fala de Yeshu que enganou Israel e foi apedrejado nas vésperas da Páscoa.
 Diversos documentos falam que Jesus foi para o Egito e lê aprendeu bruxaria. Tudo para fazer ridícula a
figura de Jesus.
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II. MARIA E A FAMÍLIA DE JESUS

1. Os nomes familiares
a) Se chamava Maria
 Maria era um nome comum tanto no Antigo Testamento quanto no Novo. A irmã de Moisés e Aarão
assim se chamava (Myriam; Ex 2,4-9) e outra Maria é mencionada em 1Cr 4,17.
 No século I, nomes como Jesus, Maria e José eram reacionários. Receber um nome de um patriarca era
identificar-se como judeu autêntico em meio à helenização.
 Ao renascimento da identidade nacional e religiosa judaica era forte na Galiléia, que sofria muito de
influência pagã, por isso, os nomes patriarcais na família de Jesus.
 Lutero afirma: “O nome Maria significa mar amargo; de acordo com o ambiente circunstancial em que
vivem. O povo encontra-se apenado e amargurado”.
b) Lhe porás o nome de Jesus
 Jesus era um nome abreviado, derivado do herói Josué. Foi um nome popular até o início do século II
d.C. Cristo era usado para distinguir de tantos outros.
 Yeoshua significa “que Yahweh ajude”, ou “que Deus salve”. É um nome em contraste com a
helenização que tem a ver com o desejo de restaurar o povo de Israel.

2. Jesus, filho legítimo?


 Mateus e Lucas conheciam uma tradição da concepção ilegítima de Jesus. Por seu machismo ocultaram e
camuflaram como concepção virginal, afirma Jane Scharberg.
a) O logion 105 do evangelho de Tomé
 Ela supõe que no evangelho de Tomé contenha frases anteriores aos canônicos.
 Diz o logion: “Aquele que conhece o pai e a mãe será chamado filho de prostituta?”.
 Parece que este logion não se refere à origem histórica de Jesus e é improvável que contenha dados
anteriores aos Evangelhos.
b) Filho de Maria (Mc 6,3)
 Por falar: “Não é este o filho de Maria?” alguns vêem a negação da legitimidade de Jesus. Outros
manuscritos apresentam: “Não é este o filho do carpinteiro?”.
 É provável que esta seja uma acomodação de Marcos a Mateus e Lucas.
 Chamar um homem de “filho de sua mãe” não indica ilegitimidade no Antigo Testamento e no Novo. É
o exemplo da Sérvia, irmã de Davi (1 e 2Sm, 1 e 2Rs).
 Os nazarenos estranham a novidade de Jesus, diante de um passado que não demonstra nada de
extraordinário. Filho de Maria pode referir-se à sua viuvez.
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c) Nós não nascemos da fornicação
 Os judeus afirmam que são filhos legítimos de Abraão, por isso, são livres e não são escravos. Porém
Jesus rebate dizendo que não são filhos de Deus porque atuam contra a vontade de seu Pai.
 Quem ataca é Jesus. Os judeus defendem sua legitimidade espiritual afirmando que não nasceram da
fornicação.
 Portanto, sobre os textos anteriores se projetam questões posteriores hostis ao cristianismo e sobre a
concepção ilegítima de Jesus.

3. Mãe de um carpinteiro ou de um camponês?


 Talvez Jesus e sua família se dedicassem em tempo parcial ao cultivo da terra. Os cristãos palestinos
apresentavam a família de Jesus como lavradora.
 Isto pode explicar porque a maioria das parábolas inspira-se na agricultura.
 Maria e Jesus viviam em ambiente agrário. Carpinteiro é mencionado em um único versículo (Mc 6,3a) e
nunca é mencionado nas pregações de Jesus ou outros pontos do Novo Testamento.
 além de carpinteiro englobava as funções de pedreiro e ferreiro. Muitas ferramentas se
construíam com madeira.
 Ser  implicava bastante habilidade técnica e uma boa dose de força muscular.
 Na Galiléia havia poucos ricos (Herodes Antipas, dignatários da corte...). O grupo médio incluía
comerciantes e artesãos e lavradores independentes.
 Na escala inferior estavam os servos contratados, artesãos ambulantes e lavradores sem terra e por fim,
os escravos.
 O reinado de Herodes Antipas (4-39 d.C) foi próspero e pacífico, permitindo Jesus empreender sua
missão itinerante durante vários anos.
 Alguns afirmam que Jesus e José viajavam muito e trabalhavam ocasionalmente em outras cidades.

4. O núcleo familiar de Jesus


 O indivíduo não era uma pessoa isolada, mas fazia parte de uma unidade mais ampla: a família que dá
segurança comunitária e identidade social.
 Ao cortar estes laços, Jesus entrava num novo contexto de identidade.
 Em Nazaré havia muitas pessoas parentas. Quando Jesus tinha 30 anos talvez José já tivesse morrido.
Maria tinha 14 anos quando Jesus nasceu e 48 ou 50 quando morreu.
a) Irmãos e irmãs de Jesus
 No ocidente a partir de Jerônimo (383) começou-se a dizer que os irmãos eram primos. No oriente se
dizia que eram frutos de um matrimônio anterior de José.
 Em Mt 1,25 fala que José não teve relações com Maria até que ela deu a luz. “Até que” não indica
descontinuidade ou alteração do que se realizou até então (Sl 109).
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 Não precisamos entender que José e Maria tiveram relações após o nascimento de Jesus.
 Em Mt 13,55 fala dos irmãos de Jesus, levando pensar que Maria e José tiveram outros filhos.
 Marcos não fala de José como Mateus; e, neste último, a ordem é diferente. Nele dá a impressão que os
irmãos estão ligados a sua mãe biológica, formados por laços de sangue.
b) Primos e primas de Jesus
 Epifânio de Salamina (315/402) afirma que os irmãos e de Jesus são filhos de um matrimônio anterior de
José, portanto, meio irmãos de Jesus.
 Jerônimo foi o primeiro Padre a afirmar que os irmãos de Jesus eram seus primos e a defender a
virgindade de Maria e de José.
 Ele argumenta-se na palavra hebraica ‘âh (irmão) que traduz no grego como adelphos (primo). No
Antigo Testamento esta palavra algumas vezes, significa primo ou sobrinho (Gn 29,12; 24,48).
 Não está certo que adelphos era usado no Antigo Testamento para indicar primo. Paulo chama a Tiago
de irmão do Senhor (Gl 1,19) como também Flávio Josefo. Além disso, primo em grego é 
 No Novo Testamento adelphos se usa em dois sentidos:
 Firgurativo ou metafórico: para os seguidores de Jesus, cristãos primitivos, os judeus, etc.;
 Real: para irmão de sangue, legítimo ou meio irmão (com um ou dois pais comuns).
 Diferentes são os argumentos:
 Para Blinzler Simão e Judas eram filhos de Clopas, um irmão de José e a mãe de Santiago era uma
outra Maria, ligados de alguma forma a Jesus.
 Para McHung, uma Maria, irmã de José, desposada por um desconhecido deu a luz a Tiago e José;
Clopas, irmão de José, era casado com outra Maria, da qual nasceu Simão; portanto, todos eram
primos de Jesus, que foram criados por José após a morte do pai.
 Eusébio na História Eclesiástica fala que Hegesipo relata o martírio de Tiago a quem chama “irmão do
Senhor” e menciona um tio e um primo de Jesus, Simão, filho de Cleofas, tio de Jesus.
 Não dá para saber se este Simão é o mesmo identificado em Mateus e Marcos. O mesmo quando fala de
Judas, irmão do Senhor, segundo a carne.
 Tertuliano afirmava que eram irmãos verdadeiros, combatendo Marcião com sua visão doceta da
humanidade de Jesus.
c) Perplexidade diante dos dados históricos
 O dado é complexo, e por isso, muitos aceitam que Jesus teve irmãos, filhos de Maria.
 Mas, quem assim afirma não percebe que o Novo Testamento usa irmãos do Senhor, mais como título.
Flávio Josefo, que não entendia o significado, usou irmãos de Jesus.
 Também não se diz que são filhos de Maria, nem de José.
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III. NA MARGINALIDADE

 Importante para saber quem foi Jesus e Maria.


1. Nazaré: uma aldeia marginal
 Flávio Josefo e o Talmud não citam nenhuma vez Nazaré. Só aparece pela primeira vez no século III e
IV d.C.
 A arqueologia revela que Nazaré sempre foi muito pequena, judia na época romana e sua atividade
principal era a agricultura, sem prosperidade.
 Está no extremo sul da baixa Galiléia, aldeia isolada dos caminhos mais freqüentados, a 4 ou 6 Km de
Séforis.

2. A mãe de um crucificado pelos romanos


 A crucifixão era uma pena de morte romana. Os romanos queriam acabar com a esperança judia da vinda
do Messias rei (anti semitismo).
 Maria é uma mulher entre as tantas que compartilham seus sofrimentos.

IV. CONCLUSÃO: MÃE DE UM JUDEU MARGINAL

 1. Para as histórias profanas e judias Jesus não teve tanta importância. Por isso, elas lhe dedicavam
alguns comentários, ainda que negativos.
 2. Elas falam da morte de seu irmão Tiago e do caso de Maria com Pantera.
 3. Jesus e Maria forma personagens marginais. Jesus, um marginal do sistema.
 4. A marginalidade de Jesus explica a marginalidade nas atas dos historiadores oficiais, como também a
do seu grupo.
 5. A mãe e os irmãos de Jesus só são mencionados para ofendê-lo.
 6. As notícias da família de Jesus são interessantes quando lidas no contexto do século I (nomes
patriarcais e matriarcais).
 7. Não temos dados históricos concretos sobre o nascimento de Jesus, além dos Evangelhos.
 8. Jesus era carpinteiro ou artesão? Imaginamos num contexto agrário e próspero.
 9. Quanto aos irmãos de Jesus, não podemos chegar a uma conclusão certa.
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CAPÍTULO II: A MAE DO REI DOS JUDEUS

Jesus é o “Filho de Deus!” A Sagrada Escritura nos assegura que Jesus não é filho de varão.

A TRAMA DO EVANGELHO DE MATEUS E SEU PRÓLOGO CRISTOLÓGICO

1. A trama interna do Evangelho de Mateus


Desenvolve-se a partir do nascimento de Jesus precedido por uma genealogia que remonta a Abraão
e culmina na parusía.
A rejeição do messianismo de Jesus – depois de haver ensinado, pregado e curado em Israel – é outro
tema importante. Daí pra frente, o Evangelho foi dirigido aos gentios.

2. O prólogo Cristológico
Segundo F. J. Matera, vai até o Mt 4,11, conclui com as tentações de Jesus. Na Genealogia: De
Abraão a Davi; de Davi ao Êxodo; do Êxodo a Jesus, mostra, assim, a historia profética, messiânica e
apocalíptica, vendo nelas uma preparação para a vinda de Jesus. Belém, José e Maria, o nascimento
do menino, a fuga ao Egito e o regresso a Nazaré, mostram a trama. Para entender a Mariologia de
Mateus, é preciso ler o relato de forma global.

MARIA NA TRAMA DO PRÓLOGO CRISTOLOGICO

1. A genealogia do “rei dos judeus” e as seis mulheres


Ao mostrar a Genealogia de Jesus, Mateus o apresenta como um autêntico “filho de Davi”. José era
chamado filho de Davi, por isso Jesus é legitimamente dito “rei dos Judeus”.
As seis mulheres: Tamar, Raab, Rute, a mulher de Urias e Maria – esta não tem relação sexual com
José, filho de Davi. Depois disso fala da “alamah”, a virgem, uma mulher anônima. Todas têm elementos
comuns entre si: irregularidade ou condição de pecadoras; estrangeiras; instrumentos do Espírito Santo. Há
também aspectos diferentes entre elas.
a) Tamar “ao enganar fez uma obra santa” (Gn 38,6-30)
Depois de casar-se com Er, filho de Judá, ela ficou viúva. Casou-se com outro filho, Onán, e
novamente se enviuvou. Judá prometeu que quando seu filho mais novo crescesse, ela se casaria com ele.
Um dia, Judá tinha ido apascentar o rebanho, Tamar soube e foi lá seduzi-lo disfarçada de prostituta, este
deitou-se com ela e ela concebeu Fares e Zara. Na liturgia judaica, Tamar era proclamada santa. Pois ao
enganar ela fez uma obra santa, pois por ela Deus realizou o seu desígnio. Com Fares se iniciou os imediatos
descendentes de Davi.
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b) Raab e Rut, duas estrangeiras na genealogia messiânica.
Raab: Era prostituta em Jericó. Soube que havia um Deus que fazia coisas maravilhosas
acompanhava um povo pelo deserto. Alguns espiões desse povo chegaram à sua casa e ela os escondeu dos
oficiais do rei. Depois que os hebreus tomaram a cidade, só ficou viva a família de Raab. Dela nasceu Booz,
outro antepassado de Davi. Nela se dizia que o Espírito Santo teria repousado antes que os israelitas
chegassem à terra prometida.
Rut: nome ligado à cidade de Belém. Ela não pertencia ao povo de Deus, mas faz parte da imediata
descendência de Davi. Raab é a mãe de Booz. Este é esposo de Rut. E Rut é a mãe de Obed que gerou Jessé,
pai de Davi. Era conhecida como mulher virtuosa, e se dizia que Deus a tirou de sua esterelidade.
Semelhança com Maria: mãe em Belém; achou graça aos olhos de Deus; por graça dão continuação à
bênção de Judá.
Por essas mulheres, vê-se que Davi era “nascido de mulher”. Por essas três, Deus continuou o seu
projeto de bênção em situações difíceis. Tamar, Raab e Rut antecipam a figura de Maria. Nelas e em Maria,
Jesus é dito “nascido de mulher”.
c) A mulher de Urias
A figura de Davi num gravíssimo conflito. Ele usurpa os direitos de Urias sobre a sua legítima
mulher. Mandou matar Urias e a tomou por esposa. Ela perdeu seu primeiro filho, e ele só conseguiu que
tivessem Salomão depois que ele fez penitência. Betsabéia é conhecida como aquela que assegurou ao filho
de Jessé a primogenitura real: Salomão.
Comparação: Davi rouba. José tenta repudiar. Davi manda matar Urias. José não quer denunciar Maria. O
primogênito de Davi é filho do pecado. O filho de Maria é filho de Deus.
d) A esposa de José: a quinta mulher
José era o descendente de Davi e o portador da legitimidade genealógica. No entanto, foi Maria a
protagonista da vinda do messias. Por Maria e José Jesus foi o “filho de Davi”, messias salvador. O
feminino foi escolhido por Deus para realizar a promessa da salvação mostrou a originalidade da salvação
que suplantou o escalão masculino da tradição judaica.
e) A “Almah” de Is 7,14: a sexta mulher
Maria virgem na qual age o Espírito Santo é para Mateus a gênesis da filiação divina de Jesus e ao
mesmo tempo da condição humana. Maria-virgem e o Espírito Santo seriam os que engendraram ao Filho.
Dá-se uma relação íntima entre o Espírito Santo e a virgem. Mas a tradução de Almah (heb) por partenos
(grego) leva conotação messiânica apenas em Mateus, para dar a entender que Jesus é o Emanuel, o
cumprimento da promessa feita a Davi.
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2. A Geração e nascimento do Messias Jesus
A genealogia de Jesus está a serviço do seu nascimento.
a) O texto do relato: Mt 1,18-25
Mostra não só como Jesus foi descendente de Davi, mas também, e, sobretudo, Filho de Deus.
A perícope se desenvolve em forma de quiasmo:

b) A gênese de Jesus
A palavra “gênese” (Mt 1,18) faz referência a todo o processo de gerações através das quais chega a
bênção: salvação do povo e purificação dos pecados. Com Jesus essa bênção é total.
Se o conflito entre José e Maria não se resolvesse não seria obstáculo à concretização do plano de
Deus: messias filho de Deus e filho de Davi.
c) “Sua mãe, Maria, se achava grávida por obra do Espírito Santo” (v. 18)
O que vem ressaltado é o fato de ser mãe e não ser esposa. “Estava prometida”: mostra que a
promessa de Deus se realiza diante de testemunhas. O que acontece a Maria é inimaginável: o que se lhe
acontece a surpreende porque está fora de sua decisão.
O Espírito santo exerce uma função ativa, mas que não é a de esposo. O homem que Maria engendra
é uma criatura do Espírito. Maria em sua maternidade é atuada pelo Espírito. E, de fato, Jesus, em Mateus, é
o homem sobre quem op Espírito Santo baixou. Cristo é concebido pelo Espírito Santo e a Virgem, diz o
credo. Maria é o centro da inauguração do reino de Deus e do novo Povo.
d) O conflito de José e sua decisão
Descendente de Abraão é chamado filho de Davi, seu pai imediato é Jacó. Um homem diferente dos
outros judeus que buscava a justiça e o reino de Deus.
O conflito se dá porque “sua mulher” aparece grávida do Espírito Santo. José pretendia castigar
Maria segundo a lei, mas a intervenção do anjo faz que ele resolva o conflito e a receba por esposa.
e) Revelação e mandato do anjo do Senhor
O anjo diz a José que Maria continuara sendo sua esposa e que ele não deve temer, pois o que ela
concebeu é obra do Espírito Santo. O temor de José revela o temor diante do incompreensível e do
nascimento do homem novo. O anjo, porém, confere a Jose a missão de dar um nome ao filho, Jesus. Por um
nome era o mesmo que dizer: “este é meu filho”.
f) O cumprimento da palavra profética de Isaias
Mateus fala do seu cumprimento na vida de Jesus. Mateus mostra isso com todos os detalhes para
dizer que quem negasse a legitimidade da genealogia e do messianismo de Jesus, estaria negando o próprio
Deus que o havia prometido pelos profetas. Ao Fiat do Criador, foi necessário o Fiat de Maria.
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g) A paternidade de José e a filiação davídica de Jesus
José levou Maria pra sua casa, mas não teve relação sexual com ela. Respeitou-a ate que o menino
nascesse. Ao assumir legalmente Jesus como filho, José assume também a paternidade. Por meio da
paternidade legal de José, Jesus também é filho de Davi.
h) conclusão
- O Espírito Santo é o protagonista;
- Em Jesus a salvação chegou a todos os povos (Emanuel);
- Maria aparece como a mãe do messias (grávida do Espírito);
- Depois é acolhida por José e por sua paternidade legal;
- Jesus é “filho de Davi” por ser filho de José, pois José lhe deu o nome;
- Sobre o temor e o conflito sobrevém a paz trazida pelo anjo;
- Cumpriu-se a promessa de Deus anunciada pelos profetas.

3. A paixão, incrustada no nascimento


Mateus apresenta já no prólogo a condição sofredora do filho de Davi, diante da sua aceitação ou
rejeição.
a) Alguns magos que vêm do Oriente adoram ao verdadeiro rei dos judeus

Os magos que tinham o poder pessoal divino nas mãos, segundo definição de sua própria função, de
forma física e tangível. Aqui eles aparecem confirmando a legitimidade do poder de Cristo, enquanto que
normalmente eles questionavam o poder espiritual. O menino aparece como rival de Herodes. Ele é o
verdadeiro rei dos judeus, enquanto Herodes é o usurpador, o falso rei. Os magos adoraram Jesus e lhe
deram presentes, o que confirma os planos de Deus.
b) Raquel – a sétima mulher – e a mãe do povo no novo êxodo
José, avisado em sonho, foge para o Egito com Jesus e Maria. Deus libertara seu povo do Egito como
um pai livra o filho do inimigo. Paradoxalmente, o Egito agora é um lugar de refugio para o salvador,
enquanto Jerusalém é uma cidade de ameaças e morte. Com Maria e José e Jesus acontece o mesmo a
Moisés: é-lhes anunciado que voltem a Israel, pois os inimigos já não estão mais aí. Raquel era invocada
como uma das grandes mulheres que edificaram a casa de Israel. Ela chorou pelo povo que foi ao desterro,
destruído. Ela foi a mãe do povo oprimido no Egito. Agora, Maria é a mãe do novo povo libertado. Raquel é
a mãe morta; Maria é a mãe que foge da ameaça. O menino que leva, representa o povo de Israel, por isso, é
a mãe do novo povo.
O êxodo de Jesus, depois que volta com seus pais do Egito, só se consumara no caminho da cruz,
mostra as mulheres que o seguem, os seus discípulos, está inaugurado o reino de Deus; o messianismo de
Jesus está realizado: o filho de Deus caminha na direção da sua morte na cruz. Maria acompanha a Jesus
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desde que fora reconhecido como filho de Davi até o momento em que ele é condenado à morte. Ela
acompanha Jesus no novo êxodo como a mãe do novo povo.

CAPÍTULOIII: A MÃE AGRACIADA E CRENTE

I-A TRAMA DO PRÓLOGO CRISTOLOGICO DE LUCAS.

Divide-se em 4 partes: 1-Prólogo cristológico ou origem de Jesus; 2- o que Jesus fez; 3-o que Jesus
enquanto subia para Jerusalém; 4- paixão, morte e ressurreição de Jesus.

1.Os caminhos de Deus na introdução cristológica de Lc.


Lc começa com um dinâmico ir e vir de personagens. Nesses movimentos Deus inicia seu projeto de
transformação. Movimento “para”. Para o Santuário,...

2. Os cinco movimentos.
Lc apresenta cinco movimentos fundamentais:
1)- Zacarias contempla o anjo de Deus que lhe comunica a boa noticia. Zacarias vai do templo para a
sua casa.
2)- Parte de Deus, do céu. O anjo é enviado a uma cidade da Galiléia, chamada Nazaré à casa de Maria.
3)- De Nazaré à cidade de Davi, Belém. Protagonistas: José e Maria (esta estava grávida).
4)- De Nazaré à Jerusalém para celebrar a páscoa (Jesus fica lá).
5)- Paralelismo entre Jesus e João, já adultos iniciando suas próprias missões.

II- ANUNCIAÇÃO DE JOÃO: DO SANTUARIO À CASA DE ZACARIAS

1.Apresentação dos pais de João


O lugar é o templo de Jerusalém, lá dentro, na zona mais especial. Zacarias e Isabel possuíam um
passado honroso e nobre. O presente era santo e digno. Ler Lc1, 6. Porém, estava sem futuro, pois, não
tinham filhos (maldição).

2.Uma boa noticia para o povo


Ainda que a espiritualidade e a missão de João não tenham nada a ver com o templo, onde foi
anunciado. O motivo é porque no templo é onde se reúne o povo. A revelação tem a ver com o povo. O
anuncio interessa ao povo.
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3.A incredulidade do sacerdote ante a irrupção da novidade
A parte central do relato é Lc 1,18 “de que modo saberei disso?” No evangelho de Lc a incredulidade
responde à palavra de Deus. Zacarias é o primeiro da longa lista de pessoas incrédulas ante à proposta de
Deus em Jesus. A incredulidade parece norma e a fé é exceção.

4.O anjo apocalíptico


O anjo revela a sua identidade: Gabriel: Força de Deus. O mesmo é enviado primeiro a Zacarias e
depois à virgem.
5.A impaciência do povo
O povo fica impaciente, percebe que algo está acontecendo, porém não tem acesso a ele. O transmissor
fica mudo.

III - A VOCAÇÃO-FÉ DE MARIA: DA CASA DE MARIA À DE ZACARIAS

A maioria define como “anunciação de Jesus”. Poucos “a vocação de Maria e anunciação”. Lc 1,26-56.
Nesta perícope se inclui tanto a vocação-anunciação como a visitação. Na primeira parte deste relato dá-se
em uma cidade da Galiléia, Nazaré. A segunda; numa cidade da Judéia que não menciona o nome. No centro
temos a resposta de Maria:”eis aqui a serva do senhor...).

1. Apresentação de uma nova personagem: Maria de Nazaré. (Lc 1,26).


São apresentados dois protagonistas da ação: Gabriel e Maria. Sugere uma dupla origem de Jesus - “de
Deus” e “da casa de Davi”. Nesta narração há dois casais: Zacarias e Isabel, Maria e José. O primeiro não
tinha filhos porque era estéril e Maria porque era virgem.

2. Saudação em tom escatológico (Lc 1, 28-30).


- “Alegra-te”; ainda sem ter nenhum titulo social e sem pertencer a nenhum grupo importante Maria é
objeto de respeito especial. Deus lhe envia um anjo apocalíptico. A destinatária desta mensagem é Maria.
Alegra-te é a primeira palavra de saudação que Lc Poe na boca do anjo. Esse “alegra-te” encabeça o anuncio
da Boa-Noticia que se estenderá por todo o mundo.
-“Encantadora, agraciada”; o anjo explica em que consiste a honra de Maria ante Deus: ela é agraciada,
a que encontrou graça diante de Deus. Dela nasce o novo e definitivo povo de Deus e Deus lhe concede uma
assistência muito particular. Maria foi agraciada por Deus para a maternidade messiânica (Lc 1,31). Graça
vem acompanhada de “o Senhor está contigo”, Senhor é a sua força.
-“Perturbação”; Zacarias perturbou-se diante do anjo. As mulheres a quem apareceram dois homens
ante o sepulcro de Jesus se consternaram e encheram de medo. Maria reage ante as palavras e não ante a
visão.
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3.O chamado a ser a mãe do filho do altíssimo, do filho de Deus
No centro está a pergunta de Maria: “como vai ser isso, eu não conheço homem algum?”.
a)- Para Deus nada é impossível: Esta perícope começa e termina afirmando que em Deus está a graça, a
onipotência.
b)-Eis que conceberás: Deus confia a Maria uma missão ser mãe através de três ações: conceberás em seu
seio, darás a luz a um filho, que lhe porá o nome de Jesus.
c)-A identidade do filho de Maria: tem titulo de grandeza “será chamado filho do altíssimo”. Grandeza e
santidade duas qualidades divinas. Sua grandeza se manifesta em três verbos: o Senhor Deus lhe dará o
trono de Davi, ele reinará (...), seu reino não terá fim. Jesus é apresentado como filho de Deus em sentido
real e transcendente.
d)- Não conheço homem: Zacarias e Maria empregam o verbo “conhecer”. O primeiro no futuro
afirmativo. Maria no presente negativo. O não conheço de Maria está conectado a sua condição de virgem.
O mais questionável não é o como e sim o que.
e)-O Espírito virá sobre ti: Jesus será não só grande, mas santo. Sua identidade será a santidade e a
transcendência, a superação do profano. Pertence a esfera do Divino. Estará no filho de Maria a gloria de
Deus.Maria é reveladora desta presença.
f)-O sinal: “a estéril concebeu”:a fecundidade da estéril Isabel é só um sinal que antecipa o grande milagre.
Maria é destinatária privilegiada de uma mensagem que é boa noticia para todo o povo.

4.Eis aqui a serva do Senhor


No centro da perícope encontra-se um duplo encontro; o de Maria com o anjo e de Maria com Isabel.
Nestes encontros encontra a resposta de fé e a acolhida de Maria. “Fiat”. Maria sempre manteve desde o
começo uma atitude de serviço, obediência e disponibilidade ante o mistério de seu filho.

5-O encontro entre a mãe de João e a mãe do Senhor (Lc 1,39-46)


a)- Maria em caminho, portadora da Boa nova: foi o anjo que entrou onde estava Maria, agora é Maria
deixa Nazaré e vai a uma cidade da Judéia e entra na casa de Zacarias. Lc apresenta Maria como a primeira
portadora da Glória de Deus, da Boa noticia de sua presença.
b)- A voz da saudação: Isabel cheia do Espírito Santo anuncia o acontecido em Maria. E Maria reconhece
que é o epicentro de todo o que acontece com a vontade de Deus nela. Maria é proclamada “bendita entre as
mulheres”.
c)- O hino à fé e à maternidade de Maria: Isabel cheia do Espírito Santo interpretou profeticamente o
movimento do menino em seu ventre. Então ela proclama um cântico de louvor de caráter hínico. Primeiro o
anjo dirigiu louvor a Maria, depois sua parenta. Sobre Maria desceu a gloria de Deus para ela nasceu o
Messias, o Bendito, o Santo, o Filho de Deus. Depois do anuncio Maria se lança vai para a região
montanhosa. A fé da palavra e da mobilidade. A fé de Maria tem muito a ver com palavras. Seu coração é o
14
centro de todo esse processo de escuta e atuação da palavra. Maria em sua humilde fé degusta por
antecipação da felicidade escatológica.

6-O hino da mãe do Senhor: Magnificat


Leitura tradicional: Lc põe na boca de Maria por razoes de critica textual em primeiro lugar e por
razões de evidência interna dentro da lógica do texto. O magnificat é o ponto culminante do encontro entre
Maria e Isabel (Lc 1,47-56).
a)- Minha alma proclama a grandeza do Senhor: minha alma, meu eu, declara grande o Senhor.
b)- Olhou para a humilhação de sua serva: O Deus grande manifesta a sua grandeza olhando a pequenez.
O Deus forte se mostra débil em favor do pequeno, fixa-se na sua humildade.
c)-Todas as gerações me chamarão bem-aventurada: seu canto se volta para o futuro e faz profecia
incomensurável: todas as gerações! O nascimento do filho de Maria repercutirá no futuro da humanidade.
d)-Porque fez grandes coisas por mim: Maria reconhece que é agora que está produzindo um novo Êxodo.
Deus aparece como um guerreiro que luta em favor de seu povo. Tudo isso tem inicio no que está
acontecendo em Maria.
e)- O evangelho para os humilhados: Para Maria este Deus é Santo e Misericordioso. Mostra seu amor
fazendo aliança de amor com o seu povo, e misericordioso com os humilhados.
“Pobres”-são aqueles que dependem de tudo de Iavé e recorrem e gritam a Ele nas suas aflições. Os
pobres do Magnificat são aquele a quem Deus tem ajudado e libertado, que estão realizando o último e
definitivo êxodo. O evangelho do Reino é a boa nova dos pobres e humilhados.
Deus cumpre a promessa realizada a Abraão e a sua descendência.

7-Conclusao do relato de Lc1,26-56


Lc nos disse que Maria esteve por três meses na casa de Isabel. Depois voltou para sua casa lugar de
sua vocação. Maria se torna em tenda itinerante e vivente da Glória do Senhor, a arca da nova aliança. Maria
leva esta presença como mãe e em virtude disso é objeto de benção ao mesmo tempo em que se bendiz o
fruto do seu ventre, a Cristo, filho de Deus.

IV. DINAMISMO EM TORNO DE JESUS, O FILHO DE MARIA

1. A Glória de Deus em uma criança envolta em panos e deitada num presépio


a) “Quando se cumpriram os dias”
A ação se inicia com a viagem de José e Maria de Nazaré para Belém. Põe de relevo a obediência
de José e Maria tanto para com a Lei quanto para com o anjo quando aos oito dias circuncidam o menino e
lhes põe o nome de Jesus.
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b) O nascimento de Jesus e o sinal
No relato do nascimento de Jesus, Maria assume todo o protagonismo: é ela que dá a luz a seu
Filho primogênito em Belém, a que o envolve em panos e a que o deita em um presépio. No alojamento, o
Filho de Deus, o Santo, o Senhor da Glória, o Rei do Reino eterno não encontra lugar. Por isso será um
sinal. Envolver uma criança em panos era um costume normal. Sem lugar, envolto em panos e deitado em
um presépio é uma tríplice situação inicial de Jesus que se repete novamente no final de sua vida:
expulsado da cidade, envolto em um lençol e deitado em um sepulcro.
O sinal que é oferecido aos pastores não é para robustecer a fé, pelo contrário, supõe a fé. Como
é possível que uma criança nessas condições possa ser a manifestação do poder de Deus? A impotência se
converte em sinal do poder de Deus.
c) Os primeiros destinatários da grande notícia
Os destinatários da notícia são os pastores: “Nasceu hoje um salvador que é o Cristo e Senhor”
(Lc 2, 11). Eles tiveram que pôr a caminho para ver o recém-nascido. Também Maria, depois de receber a
boa notícia, se pôs a caminho para a casa de Isabel. Os pastores se convertem em mensageiros dos anjos, em
portadores da revelação, Maria leva a revelação em si mesma.
Os primeiros elegidos para anunciar a boa nova, depois de Gabriel e Maria, são imagem daquele
que é a impotência, a pequenez. Os pastores não são poderosos, nem grandes deste mundo, nem sábios, mas
sim, pequenos, humildes. Deus atua sempre assim.
d) Ligados à palavra
Esses servidores vigilantes, Maria e os pastores, estão em atitude de acolher a palavra-
acontecimento de Deus. Vão ver a palavra, e depois de terem visto dão a conhecer a palavra-acontecimento,
se convertem em testemunhas. Lucas apresenta Maria ligada à palavra. Maria é o protótipo do discípulo que
não se contenta em escutar a palavra, mas a guarda em seu coração.

2. A Glória de Deus chega ao Templo


Obedientes à Lei: “quando chegou o tempo da purificação deles” (Lc 2, 22)
Novamente José e Maria se puseram a caminho, só que agora para o Templo, para cumprir a Lei
do Senhor: “a purificação deles”. Os exegetas se perguntam: a quem se referem quando diz “deles”? A
Maria e a José? A Maria e a Jesus? Aos três? Segundo a Levítico 12, 1ss, era considerada impura
unicamente a mãe, e só ela, por isso, deveria purificar-se. Ela era considerada impura durante os 40 dias
posteriores ao nascimento do filho; nesse intervalo de tempo não poderia ir ao Santuário. Jesus como
primogênito devia ser consagrado ao serviço de Deus, mas, dado que deste serviço se encarregava a tribo de
Levi, os primogênitos eram dispensados mediante o pagamento de 20 denários, que deviam ser pagos no
Templo, daí a apresentação do Senhor no Templo (Lc 2, 22-23).
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a) A Glória entra no Templo de Jerusalém
Para Lucas é mais importante que o cumprimento do rito, foi a entrada do Filho de Deus, pela
primeira vez, no Templo, e com ele, a Glória de Deus. Nesse momento se cumpriram várias profecias e uma
delas foi: “... o senhor a quem buscais chegará de repente a seu Templo...” (Ml 3, 1). Então, aparece no
átrio do Templo um certo Simeão, homem justo e piedoso que aguardava o consolo de Israel. Movido pelo
Espírito Santo ele testemunha o destino da criança apresentada no Templo. A mesma coisa fez uma anciã
profetiza, Ana de Fanuel.
b) O complicado texto da profecia de Simeão
As palavras de Simeão diante dos pais de Jesus, depois do hino “Nunc dimittis”, são uma
autêntica crux interpretum. Epifânio interpretou a espada como morte violenta à espada, e a piedade popular
interpreta como espada de dor ou o sofrimento da Mater dolorosa ao pé da cruz, outros interpretam como a
espada do juízo, outros como a espada da dúvida de Maria durante a paixão, outros como espada salvadora.
c) A espada e suas interpretações
Segundo do profeta, uma espada (ρομΦαία) atravessará, passará através de (δειλεύσεται) da alma
de Maria. No Novo Testamento, a espada é o símbolo da revelação divina, que ao mesmo tempo atua como
juiz e obriga aos homens a manifestar as intenções ocultas de seu coração, produzindo neles uma divisão.
Jesus mesmo disse “Eu não vim trazer a paz, mas a espada” (Mt 10, 34). No contexto de Lc 2, 35a, “a
espada deve significar a divisão de Israel antes da paixão de Jesus (da que o v. 34 não fala explicitamente).
Se a espada é anunciada a Maria, é porque ela será desgarrada, como seu filho, pela divisão do povo”. Neste
sentido, a espada da descriminação teria chegado também a Maria. Com a figura de uma espada
atravessando a alma de Maria, Lucas descreve presumidamente o difícil processo pelo qual aprende que a
obediência à palavra de Deus transcende os laços familiares.
Em todo caso, “espada” nunca significa a dor na Escritura. Símbolos de dor no Novo Testamento
são as “lágrimas” e o “pranto”. Lucas não entende o sofrimento de Jesus como uma tragédia, mas sim, como
um triunfo, uma ressurreição. E, o verbo “atravessar”, que expressa a ação da espada, não significa
“perfurar, ferir”, mas “passar através de um lugar”.
d) A espada que passa através de Maria sem feri-la
O que significa então a misteriosa “espada” anunciada por Simeão? Ele que primeiro anunciou a
salvação que chegava com Jesus, agora anuncia à Maria o “dia da caída”, a espada, tão freqüente no livro de
Ezequiel. Uns cairão. Outros se manterão em pé. O ancião segue anunciando que seu filho será “um sinal de
contradição” e que, precisamente ao contradizê-lo, muitos judeus cairão. De fato, Jesus “deitado na
manjedoura” foi um sinal que só compreenderam os pastores.
Maria, no entanto, não cairá. Ela ficará de pé diante da espada que passará por toda sua vida. A
espada que anuncia Simeão como a praga exterminadora ao passar pelas casas de Israel no Egito, não pode
atingir Maria. Ela representa o povo de Israel que escutou a palavra, por isso, ele não cairá. A espada que
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fará cair a quem recusar o Messias, segundo anuncia Simeão, não afetará, no entanto, o povo de Israel,
representado por Maria.
V. O FILHO DO PAI SE AUTOREVELA.

Essa última perícope do amplo prólogo de Lucas está dividido em cinco blocos:
1. Perdido durante três dias na festa da Páscoa
A família de Nazaré, e nela o jovem Jesus, aparece como modelo de piedade. Obedecem a lei e
sobem em peregrinação litúrgica a Jerusalém para celebrar a Páscoa. Era, pois, costume de Maria e de toda
sua família celebrar a Páscoa em 14 de Nisán em Jerusalém.
A fuga de Jesus é um ato profético que prediz a paixão. Os três dias da separação anunciam os
três dias de sua morte. Ambas as cenas acontecem na Páscoa. As palavras de Jesus a seus pais “porque me
buscais?” evocam aquelas dos dois varões às mulheres: “por que buscais entre os morte aquele que está
vivo?” (Lc 24, 5). Na cena do templo a figura de José fica eclipsada tornando Maria a protagonista.

2. “Nas coisas do Pai”


As palavras de Jesus constituem o ponto central da cena: “Por que me buscais? Não sabíeis que
eu devo cuidas das coisas de meu Pai?” Essa frase recebeu diversas interpretações e traduções, mas seja qual
for a tradução, o ponto essencial é a autoproclamação de Jesus como “Filho do Pai” e como aquele que deve
estar com seu Pai no templo. Certamente estas palavras se pronunciam no templo, propriedade e lugar da
presença do Pai. Não enquanto templo do sacrifício, mas templo do ensinamento da palavra. Jesus antecipa
qual será sua atividade predominante, a que dará sentido total à sua vida: o serviço à palavra do Pai. A cena
indica a emancipação de Jesus dos laços familiares para dedicar-se e pertencer exclusivamente a Deus Pai.
Neste contexto Maria não é especialmente considerada enquanto mãe.
Jesus é Filho de Deus Pai. Os pais de Jesus não compreenderam isso, mas essa falta de
compreensão não deve nos estranhar, pois os discípulos de Jesus só compreenderam isso depois da
ressurreição. Ninguém podia compreender ainda, nem sequer seus pais, mas não porque não queriam, mas
porque o mistério não se tinha revelado.

3. Um Jesus que desconcerta


Desde sua primeira manifestação Jesus se desconcerta: manifesta sua sabedoria, mas, ao mesmo
tempo, mostra também sua falta de submissão diante dos pais. No entanto, desobedecendo a seu pai de
Nazaré, obedece na realidade a seu de Jerusalém. José não é seu pai, disse Jesus. As primeiras palavras de
Jesus no Evangelho de Lucas declaram com toda evidencia qual é sua identidade, sua filiação, sua origem.
18
4. A genealogia de Jesus em Lucas
Essa genealogia está situada depois do relato do batismo de Jesus, onde o Pai diz “este é meu
filho, muito amado, nele me compadeço”. A genealogia é como um comentário a essas palavras.

VI. MARIA, A MÃE DE JESUS E SEUS IRMÃOS.

O evangelista se mostra muito respeitoso a Maria e aos irmãos de Jesus, mesmo com todas as
dificuldades que a tradição tinha trazido.

1. Silêncio no contexto de incredulidade


Jesus visita seus conterrâneos e eles ficam admirados pela sabedoria que sai de sua boca. Segundo
Lucas, eles não fazem referencia nem a Maria, nem aos irmãos, nem à profissão de carpinteiro. No
Evangelho de João, num contexto paralelo, os judeus questionam o messianismo de Jesus perguntando: “não
é este Jesus, o filho de José, cujo pai e cuja mãe conhecemos? Como pode dizer agora que tem descido do
céu?” (Jo 6, 42). É curioso que Marcos, que não conhecia a concepção virginal, ponha na boca dos
conterrâneos de Jesus a frase “filho de Maria”, e Lucas que a conhece, a frase “filho de José”. Mateus omite
a referência aos parentes (Mt 13, 57); Lucas omite a referência aos parentes e à própria casa. Ele não quer
colocar Maria e os irmãos de Jesus num contexto de incredulidade.

2. Elogio da mãe e dos irmãos


A cena do encontro de Jesus com seus familiares é modificada por Lucas. Ele a situa no contexto
da parábola do semeador. Nessa cena de Lc 8, 19-21, Jesus comenta com elogio que sua mãe e seus irmãos
são os que ouvem a Palavra de Deus e as põe em prática. Um sentido semelhante tem a cena na qual Maria é
chamada bem-aventurada por ter levado no seio e amamentado Jesus. Neste contexto, Jesus indica que bem-
aventurança de Maria consiste em formar parte do grupo dos que ouvem a Palavra de Deus e a guarda.
A imagem de Maria durante o ministério de Jesus é sumamente positiva. Luca a situa entre os
primeiros discípulos de Jesus que são perseverantes na fé. Santo Agostinho disse que “Maria cumpriu, com
toda perfeição, a vontade do Pai, e por isso é mais importante como discípulo que como mãe de Cristo... Por
isso, Maria foi bem-aventurada, porque, antes de dar a luz a seu mestre, o levou em seu seio...”.

3. Presença de Maria no Pentecostes na Igreja


A esta cena corresponde outra que se encontra no final da primeira parte do livro dos Atos
(evangelho). Nela se fala de “uma tal Maria”. Na sua casa estavam muitos congregados e em oração (Lc 12,
12). Essa Maria estava presidindo a comunidade cristã reunida em sua casa. Ela é “mãe” de João, chamado
Marcos – o primeiro evangelista. Esta Igreja estava orando pela libertação de Pedro.
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É interessante este paralelismo entre a cena da comunidade que espera em oração a chegada do
Espírito Santo e a comunidade que espera em oração a libertação de Pedro. Em ambas as cenas está Maria, a
mãe. Para Lucas, Maria não forma parte de nenhum dos três grupos (apóstolos, mulheres e irmãos de Jesus),
mas ela constitui um personagem à parte.

CAPÍTULO IV: A MÃE AGRACIADA E CRENTE


A MÃE DO VERBO QUE FEZ CARNE
 O quarto Evangelho foi escrito nas comunidades do discípulo amado que é um personagem
misterioso.
 Provavelmente foi testemunha ocular do mistério de Jesus e inicialmente discípulo de João Batista.
 O discípulo amado só aparece com este nome na hora de passar deste mundo ao pai (Jo: 13,1),
quando Jesus havia amado os seus até o extremo. Foi então quando se constituiu sua identidade. Até
então, o “discípulo amado”, de Jesus não era de fato, pois, ainda não tinha entrado de cheio no
mistério.
 O quarto Evangelho manifesta uma certa preferência por mostrar a certas pessoas como modelo,
figuras, tipos ou símbolos de uma peculiar forma de reagir ante Jesus e sua mensagem.
 Coloca teologicamente numa mesma perspectiva dois planos distintos:
 A atividade terrena de Jesus, e;
 A vida da Igreja. ;
 Ou seja, contempla o Jesus terreno à luz das situações posteriores da Igreja.
 No momento da morte de Jesus na cruz, os pagãos são chamados ou “atraídos” ao redil.
 Em ambas as partes do Evangelho aparece a “mãe de Jesus”, no início ministério terreno (Jo 2,1ss) e
no momento da hora (19,25-27). Mas cabe perguntar-se se também ela está mencionada no prólogo
cristológico com o qual o 4ª evangelista inicia sua obra (como MT e LC).

IV. I. MARIA NO PRÓLOGO CRISTOLÓGICO DE JOÃO:


“Não nascido da vontade de varão”
 Diferentemente de LC e MT, o prólogo de João se apresenta numa perspectiva Teológica e mística.
Seu prólogo tem forma de hino e de cântico de louvor que celebra o mistério do verbo encarnado.
 Não interessa saber se o prólogo do 4ª Evangelho conhece o nascimento virginal de Jesus ou o
pressupõe.
 João, fora do prólogo, fala em duas ocasiões de Jesus como filho de José (1,45; 6,42). No prólogo se
fala de alguém não nascido de sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade de varão (1,12-13).
20

1. As duas versões de João: 1 12-13.


A) Uma falsificação?
 Os grandes manuscritos gregos do quarto Evangelho (posteriores a 300) referem estes versículos 12-
13 aos crentes, não a Jesus.
 É estranho que autores da época (100 a 200) citem João 1, 13 empregando a leitura no singular.
Somente no final do século II encontramos a leitura plural. Isto ocorre em Alexandria (Egito).
 Tertuliano dá uma explicação: se trata de uma falsificação de Jo 1, 13; para fundamentar num texto
bíblico suas teorias sobre a origem divina e o renascimento dos eleitos, dos espirituais ou perfeitos,
os gnósticos valentinianos fizeram esta mudança.
B) A lógica do quarto Evangelho e a leitura singular
 Argumentos que avalizam a leitura singular em João: 1 12-13:
 Quando João fala de novo nascimento dos cristãos, emprega o verbo em perfeito não em
aoristo que é reservado para Cristo, tal como em João: 1, 13;
 O fim do que se fala em João: 1, 12 se refere ao ser do filho. Tem, pois, sentido o singular no
versículo 13;
 Nunca o quarto Evangelho propõe uma qualidade de vida cristã sem antes propor uma
qualidade em Cristo. Vai contra sua lógica apresentar a origem divina dos crentes sem propor
previamente a origem divina de Jesus: chegamos a ser filhos de Deus à medida em que
cremos naquele que foi gerado por Deus, o Filho de Deus;
 As três negações do versículo 13, têm caráter polêmico; no entanto, a polêmica só tem
sentido se do que se fala é de um nascimento corporal, ao que se negam certas modalidades:
o que se explica muito bem se se trata da encarnação de Cristo.
CONCLUSÃO DE POTERRIE
 Em Jo: 1,12-13 Cristo é apresentado em sua encarnação, como o modelo do novo nascimento dos
cristãos.
 Os versículos 12-13 com palavras mais simples dizem o seguinte: “a todos nos é dada a
possibilidade de vir a ser filhos de Deus, na medida em que cremos no nome daquele que foi
gerado por Deus”.

2- As três negações “o qual não nasceu do sangue, nem da vontade carnal, nem da vontade de varão”
 O quarto evangelho nega três modalidades de nascimento de Cristo.
 As duas primeiras parecem supor a concepção virginal. A terceira é como uma expressão
extrema.
 Peter Hofricher em sua tese doutoral diz que a palavra sangue no plural descrevia, em primeiro
lugar, o derramamento de sangue em atos violentos como um crime ou uma batalha e, em
21
segundo lugar, uma perda de sangue na menstruação da mulher em parto (alguns textos do AT e
depois da tradição judia)
 Nas traduções modernas, o vocábulo άιματα sangue se traduz sempre no singular.
 Portanto, o que se quer dizer é que no nascimento de Jesus não houve perda de sangue em sua
mãe, nem tampouco impureza ritual.
 Em “De La Potterrie” há correspondência entre Jo: 1,12-13 e Lc: 1,34-35.
 Segundo esta concordância, o nascimento virginal é o sinal da filiação divina de Jesus.
 João chama a Maria, sempre de “a mãe de Jesus”. Contudo, Jesus é sempre para o 4º evangelista,
o filho único de Deus, o Templo de sua presença. Filho de Deus feito homem e que tomou sua
humanidade de Maria.

3- O Filho de José
 O evangelho de João fala duas vezes de Jesus, o “filho de José” (1,45 e 6,42);
 Aí, não expressa sua convicção, mas sim o modo de falar da gente, de Felipe.
 Quando quer expressar a identidade de Jesus, sua filiação, o faz sempre em referência a Deus Pai.
 Na boca de Jesus e na do Evangelista, o pai de Jesus é sempre Deus. São os “outros” que falam
de Jesus como filho de José. (Em Jo: 1,45 é Felipe; em Jo: 6,42 são os “judeus”; falar de Jesus
como filho de José é “julgá-lo segundo a carne” J. Willemse.

II – A Mãe de Jesus nas bodas messiânicas de Cana da Galiléia

 O contexto anterior:
 Nas bodas de Caná, a mãe de Jesus ocupa um lugar importante.
 No evangelho de João há um grande acúmulo de afirmações cristológicas;
 Com todo este transfundo se chega ao relato de Cana, o que manifesta ao leitor quem é
Jesus:
a) o Logos para quem tudo foi feito
b) a vida, a luz dos homens, o Filho unigênito do Pai, não nascido da carne, nem do desejo de um
varão, aquele cujas as sandálias João Batista não era digno de desamarrar.
c) Cordeiro de Deus;
d) Messias;
e) Filho do Homem;
f) o Senhor, o Rei, o anunciado pelos profetas;
g) o Rabi sobre quem posou o Espírito Santo.
22
 Tem-se a impressão de que a fé dos primeiros discípulos necessitava de uma ratificação. O relato de
Caná se apresenta como o momento em que essa fé se confirma.

2. Estrutura do relato das Bodas de Caná


 Este relato tem recebido várias e diferentes interpretações:
a) alegórica (Padres e Teólogos da Idade Média);
b) histórica
c) reliongeschichtlich (nega a historicidade do relato, e busca sua origem
na mitologia pagã);
d) histórico-crítica (quando e como se formou este relato?);
e) simbólico-teológica;
f) estruturalista e lingüística.

 O relato está estruturado em cisco partes que forma um quiasmo (usual na literatura hebraica) Cfr:
pág: 132.
 No primeiro momento: ignorância da mãe de Jesus, posto em relevo por Ele ao perguntar: “Que
queres de mim, mulher?”
 No quarto momento: ignorância do mestre-sala “De onde procede o vinho bom?”
 Nos segundo e quarto momentos: aparecem os servidores que recebem a recomendação para
obedecer à palavra do Filho. Portanto, sabiam da procedência do vinho.
 No terceiro momento: central do relato. Jesus e sua palavra oculta ocupam a cena:
a) Jesus pronuncia três mandatos: enchei!; tirai! Levai!;
b) Os servidores obedecem a tudo o que Jesus manda. Obedecendo Jesus,
obedecem ao que Maria (a Mãe) havia pedido antecipadamente (“Fazei
tudo o que Ele vos disser”)
 A palavra de Jesus e a colaboração obediente dos servos, produz o Sinal, o começo dos sinais.

3. Os primeiro e último momentos: “Se fez uma boda... e viram sua glória”
a) UM EFEITO SIMBÓLICO
 Lendo o texto se adverte que o redator se atém aos detalhes informativos. Nada diz a respeito
da esposa; o noivo só aprece no final e indiretamente; não se fala do rito do casamento...;
 Tudo isto indica que se trata de um relato simbólico, o simbolismo nasce de sua totalidade;
 O quarto evangelho apresenta os sinais de Jesus “para que creiais”;
 Em Caná, Jesus realiza um sinal demonstrativo e expressivo de sua pessoa e de sua glória.
b) O PRIMEIRO DOS SINAIS
 Não é só um sinal, mas o primeiro dos sinais, o proto-sinal, ou o começo dos sinais
23
 “desde o começo” em João, se refere ao início da revelação de Jesus: “O que temos visto e
ouvido”;
 “Começo” em João:
 Não se identifica com o testemunho de João Batista;
 Não se identifica com a pregação inicial de Jesus;
 Nem tampouco com a vocação dos primeiros discípulos;
 Identifica-se o primeiro sinal, em Caná.
 Este é o começo dos sinais, o arquétipo que prefigura e encerra toda a série dos sinais;
 No Evangelho de São João os sinais:
a) são atos simbólicos através dos quais Jesus se manifesta como Messias e Filho de Deus;
b) são gestos do Verbo que se faz carne e habita entre vós.
 O que aconteceu em Caná é um símbolo, um caminho de acesso a algo que o supera em
grandeza. A cena de Caná, constitui a chave do quarto Evangelho.
MANIFESTA-SE A GLÓRIA
 Na realização do primeiro sinal se manifesta:
 A glória do messianismo e a filiação divina de Jesus;
 A glória do Filho Unigênito do Pai;
 A glória do Logos feito carne.
 As bodas de Caná são o símbolo da encarnação do Logos, da união da divindade com a
humanidade. Cfr: nota 24, pág: 136, texto de Santo Agostinho.

4. Os segundo e quarto momentos: a mulher e a hora


a) “Não tem vinho”
 Na Escritura o vinho é um dos elementos mais importantes do festim messiânico;
 Principais textos proféticos que falam do vinho: Amós: 9, 13-14; Joel: 2, 24; 4, 18; Isaías: 25,
6.;
 No Evangelho de Mateus, Jesus fala expressamente do vinho da Nova Aliança;
 No judaísmo posterior, este simbolismo geral do vinho se especifica e se precisa cada vez
mais;
 Nos Targumins e escritos rabínicos, o vinho é um dos símbolos preferidos da Torah;
 Na fé cristã, o vinho é chamado a ser o grande sinal eucarístico do sangue de Jesus, da carne
sacrificada do Senhor;
 O “não tem vinho” evoca, portanto, uma situação pré-eucarística.
b) O que queres de mim, mulher?
 A mãe de Jesus não é apresentada com seu nome próprio;
24
 Ela é a mãe da Palavra eterna. Por isso, tem sentido sua presença nas Bodas pois simboliza a
encarnação da Palavra;
 Quanto à frase: “Que queres de mim, mulher?” é uma expressão muito conhecida no mundo
semítico e greco-romano. Na maioria dos casos esta frase expressa inimizade. Portanto, só pode ser
entendida da seguinte forma:
 Ou como distanciamento de Jesus com respeito à sua Mãe;
 Ou como falta de compreensão, de diálogo, como mal entendido.
 Provavelmente, a segunda opção é o sentido da pergunta.
 À pergunta: por que razão uma falta de vinho é motivo de distanciamento entre Jesus e Maria? A
frase seguinte de Jesus pode nos explicar o sentido: “todavia, não é chegada a minha hora”.
c) “Todavia não é chegada a minha hora”
 No quarto Evangelho se fala da “hora” em vários sentidos: cronológica (João: 2, 4; 3, 24; 6, 17;
7, 6.8...), teológica e cristológica (João: 7, 30; 8, 20; 12, 27; 16, 14). Embora prevaleça a teológica.
 Na Tradição Bíblica a “hora” é a dos últimos tempos (Cfr: Dan: 11, 40.45 – LXX), é o momento
da consumação final (Dan: 12, 4).
 “Hora” no quarto Evangelho significa irrupção contínua de acontecimento escatológico da
revelação (Jo: 7, 30; 8, 20; 12, 23.27; 13, 1; 17, 1).
 Em Caná, a referência à hora provavelmente está relacionada com a horta do acontecimento
narrado em João: 19, 27. Se trata, pois, da hora da Paixão, pois é a este momento que sempre o termo hora
está relacionado em João. Muitos autores, entretanto, defendem que se trata da “hora” dos milagres, como
por exemplo: H. Smith, Soutarm Genyt, Lohfink.
 Resulta que naquela “hora”, a mãe de Jesus não exercerá mais sua função materna a respeito
d’Ele.
 Jesus antecipa a hora, distanciando-se de sua mãe, chamando-a de “mulher” como fará na cruz.
 A frase “Que queres de mim, mulher?” remete à cruz! Visto neste prisma, a cena de Cana se
refere ao Calvário.
d) “Mulher”
 Quando chega a sua hora Jesus não mantém com sua mãe a relação familiar.
 O exegeta Mercedes Navarro, destaca vários significados da palavra “mulher” com a qual Jesus
se dirige à sua mãe:
 Relacionada com a função da mulher do Gênesis: 2, 3.
 Aqui a mulher é a primeira diferenciada a partir de ’ada genérico (Gen: 2, 22-34);
é a primeira que põe palavra aos desejos humanos; é a primeira em ascender ao
conhecimento do bem e do mal. (Em João: é a que põe palavra a uma carência;
inicia os servidores no conhecimento e, por isso, eles sabem de onde vem o vinho;
com sua palavra, os remete a Jesus).
25
 A exclamação: “Mulher!” antecipa o diálogo de Jesus com a Samaritana (Jo: 4, 21)
 A cena junto ao poço, humana e teologicamente falando, como em Caná, é
fundamental. Evoca os sentidos das Bodas, sem que por isso, necessitássemos
assinalar Jesus como noivo ou Maria como noiva. A mulher de Caná inicia e a mulher
de Samaria estende.
 Mulher! Antecipa João: 19, 27.
 A mulher que se dirige a Jesus realizou o que havia iniciado em Caná e da forma
que a mulher de Samaria havia ampliado no sentido de universalidade
 Antecipa também João: 20, 15.
 O sepulcro tem uma pedra à entrada. Também em Caná se fala de pedras.
 Em Caná a mulher pede que façam o que Jesus disser;
 A Samaritana se encaminha ao povo e lhe anuncia o que Jesus lhe havia dito;
 Maria Madalena anuncia aos irmãos.
 Maria está relacionada em plano simbólico com outras duas mulheres bem distintas através do
termo “mulher”. É significativo que não tenha nome nem a mãe de Jesus, nem a Samaritana.
e) As palavras da mãe aos servos
 Nos evangelhos, “Fazei tudo o que Ele vos disser” são as últimas palavras de Maria.
 As palavras da mãe de Jesus reproduzem uma fórmula técnica que aprece várias vezes no Antigo
Testamento e sempre em relação com a Aliança.
 São as palavras de aceitação da Aliança.
 O exegeta A. Serra observa que as palavras de Maria aos servos de Caná podem ser postas em
paralelo com a formulação da Aliança: “Nós temos tudo quanto tem dito Iahweh”. Maria utiliza a fórmula da
Aliança. Personifica, em certo sentido, o povo de Deus num contexto de Aliança: “João põe nos lábios de
Maria a profissão de fé que toda a comunidade do povo eleito pronunciou um dia diante do Sinai”.
 A tarefa de Maria consistiu em ser mediadora entre Jesus e os servidores.
 O quarto evangelho não fala de serventes (δουλоις), mas de servos (διακονοις).
 Os servos que obedecem a Jesus representam o novo povo de Deus, aos discípulos de Jesus que
seguem fielmente ao seu Mestre, lhe servem e se mantêm a seu lado.
f) O mestre-sala e o noivo
 O mestre-sala reconhece o acontecimento, mas ignora ação de Jesus.
 O esposo não atua como a maioria dos homens.
 A imagem bíblica do esposo evoca a Deus no Antigo Testamento, esposo de seu povo, mas é
comparado com um homem pelo mestre-sala.
 Mais tarde, João Batista define Jesus como o esposo e a si mesmo como “o amigo do esposo”
(Cfr: Jo: 3, 29).
26
 A pergunta do mestre-sala sobre a origem da água convertida em vinho é a pergunta que sempre
faz o quarto evangelho sobre a origem de Jesus, a Palavra encarnada.

5. O terceiro mundo: a água e o vinho


 Água – símbolo universal de vida (aparece nos mitos da criação).
 Para Walter Lutgehetmann água e vinho são símbolos do Logos e da carne.
 Vinho – símbolo da carne, da humanidade, do sangue.
 A transformação de Caná representa o mistério insondável da Encarnação.
 Segundo o exegeta Aristide Serra:
 O vinho de Caná é figura da nova Lei cujo revelador é Jesus;
 Esta Lei se manifesta em plenitude no terceiro dia, quando chega sua hora;
 Cruz: cume da revelação.

III – A mãe de Jesus no terreno do amor esponsal em Jerusalém


 A cena muda de cenário no quarto evangelho: de Caná da Galiléia, onde se celebraram as Bodas
Messiânicas à Jerusalém, ao lugar chamado Gólgota ou Calvário, onde Jesus é crucificado e junto à
cruz, está sua Mãe.

1. As sete cenas como contexto


 Ver quiasmo da página 144.
a) O lugar da crucifixão e da sepultura
 É significativo que o Evangelho segundo João inicie a paixão de Jesus no horto do Getsêmani (18, 1)
e a conclua no horto do Gólgota onde Jesus foi crucificado e sepultado (19, 41) e onde apareceu a
Maria Madalena (20, 15).
b) Desnudado e despojado, enrolado e embalsamado
 No horto das Oliveiras, Jesus é despojado de tudo pelos soldados (Cfr: Jo: 19, 23-24).
c) Os dois testemunhos do discípulo amado
 O discípulo amado aparece nas duas cenas correlatas;
 Na terceira cena, se encontra com a mãe de Jesus, a irmã de sua mãe, a mulher de Cléofas e Maria
Madalena (personagens femininos);
 Na quinta, surge como testemunha do que pedem os judeus a Pilatos, do que fazem os soldados com
os dois crucificados e o que faz um soldado com Jesus (= a lança!);
 Ainda na quinta cena, Jesus é apresentado como o Cordeiro de Deus, o novo Cordeiro Pascal
(conexão simbólica com Caná).
d) A sede de Jesus e a entrega do Espírito
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 Jesus ocupa todo o espaço desta cena;
 Já não é mais sua mãe quem o torna consciente da falta de vinho, mas Ele mesmo tem sede;
 Muitos pontos de contato entre Caná e Calvário:
 Em Caná se vislumbra a glória; no Calvário, se oculta;
 Em Caná primeiro é servido o vinho menos bom; no Calvário, o último vinho é mal;
 Jesus começa seu ministério oferecendo a todos o vinho bom. Conclui seu ministério
tomando, Ele mesmo, o vinho mal;
 Em Caná a mãe se dirige ao Filho; no Calvário, o Filho se dirige à mãe;
 Em Caná a mãe diz: “Não tem vinho”; no Calvário, o Filho fala: “Tenho sede”.
 A cena central e última é aquela em que Jesus, depois de haver cumprido a missão e ter entregado
tudo, clama sua sede de Deus, sua sede de amor. Este é o momento de sua máxima solidão. Jesus
entrega o espírito à esposa e morre por ela.

2. A Mãe de Jesus, mãe do discípulo amado.


a) Junto à cruz estavam...
 Lucas: depois da morte de Jesus, estavam à distância sua mãe e parentes (23, 49);
 João: antes de morrer Jesus, estava junto à cruz, sua mãe... (19, 23)
 Segundo Alfonso Simóm Muniz o verbo ̉ίστημι não apenas tem o valor habitual de “estar em pé”,
mas de “vir”, “apresentar”, sobretudo quando se atende ao transfundo semítico de seu uso por parte
de João e Lucas;
 O objetivo do quarto evangelho não é descrever a posição de Maria na cruz, mas de relatar o que os
sinóticos não dizem: que Maria se aproximou até a cruz, em contraste com os que se aproximaram
ainda que tenham ficado distante.
b) Uma revelação: o novo filho da mãe de Jesus
 As palavras de Jesus dirigidas a Maria e a João formam parte de um esquema de revelação: Jesus
vendo sua mãe e o discípulo amado, declara, revela a cada um deles quem são um para o outro.
 Jesus revela uma realidade existente, no entanto, oculta: a “mulher” é mãe do discípulo e que o
discípulo é seu filho e, por conseguinte, é irmão de Jesus.
 Contudo, não se trata de palavras “sacramentais” que institui uma realidade não existente antes, mas
se trata de palavras de revelação que manifestam o que estava oculto.
 Mãe-filho espirituais no contexto de discipulado de Jesus.
 De acordo com Mercedes Navarro ser filho (Cfr: João: 1, 12-13) no quarto evangelho equivale a
assemelhar-se a Jesus, Filho de Deus.
 Jesus às portas da morte revela algo muito importante à mãe: sua maternidade biológica é abolida.
c) Significado transcendente, simbólico
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 Na proclamação feita por Jesus de Maria ser mãe do discípulo amado a Tradição Eclesial a
maternidade espiritual de Maria sobre toda a Igreja.
 Para muitos exegetas, o discípulo amado é meramente simbólico que representa a comunidade
joanita.
 No quarto evangelho, o discípulo amado é confrontado com personagens históricos, reais não
simbólicos (Pedro – João: 21, 20-23; A mãe de Jesus – João: 19, 25-27).
 Este discípulo amado:
 Senta-se em lugar de honra na última Ceia (João: 13, 23-26);
 É testemunha ocular da morte do Senhor (João: 19, 26-27);
 É testemunha do túmulo vazio; o primeiro que creu na Ressurreição entre os discípulos
(João: 20, 3-10);
 Parece viver em Jerusalém onde tinha boas relações com o sumo sacerdote (João: 18, 15);
 No mesmo evangelho é excluída a hipótese do discípulo amado se identificar com João,
filho de Zebedeu (João: 21, 2.7)
 O caráter simbólico do discípulo amado é reconhecido pela maioria dos exegetas:
 R. Bultmann: “A mãe de Jesus que persevera na cruz, representa o judeu-
cristianismo que supera o choque da cruz. O pagão-cristianismo,
representado pelo discípulo amado fica orientado a aceitar àquEle como sua
mãe, pois dela nasceu, e venera-lo”
 R. Schnackenburg: partindo do aspecto simbólico desta figura, entende que
é um personagem histórico, como outros personagens típicos do quarto
Evangelho.
 A maternidade de Maria não se trata de algo inventado pelos discípulos, mas, de uma maternidade
que lhe foi oferecida, como estava previamente estabelecida por Jesus, que a Palavra de Deus.
 O discípulo que deve permanecer até que venha Jesus em sua Parusia (João: 21, 22-23), deve
acolher a Maria como sua mãe.
 Não se pode ser discípulo amado de Jesus se não acolher Maria como Mãe!

CAPÍTULO V:
MARIA E AS DEUSAS: O CONTEXTO RELIGIOSO DA ÁSIA MENOR

Os excessos no culto mariano são muito antigos. Não poucas vezes, Maria foi situada no panteão das
deusas. O culto às deusas apresenta notáveis semelhanças com o culto a Maria. O patriarcalismo favoreceu
uma imagem de Deus bastante masculinizada, de modo que ficou a descoberto a necessidade de descobrir
Deus sob outras perspectivas, especialmente a feminina. Aqui se encontra o lugar compensatório ao culto da
29
divindade sob a imagem das deusas. Em parte, temos aqui o lugar eclesial a devoção a Maria, como rosto
feminino de Deus.

I. A MULHER APOCALÍPTICA: UM TEXTO BÍBLICO DE TRANSIÇÃO


O significado da mulher que aparece em Ap 12 é controvertido. Alguns optaram por ver nela uma
imagem da Igreja, outros de Maria.
Embora no Apocalipse não se mencione Maria, aparece com freqüência o termo “mulher” com
significado positivo e negativo: a mulher que dá vida e a mulher prostituta. No capítulo 12, refere-se à
mulher mãe do Messias. No capítulo 17, à grande prostituta.
1. O sinal da mulher que dá a luz
O capítulo 12 está situado no septenário das sete trombetas e no que poderíamos chamar
“ramificações da sétima trombeta” (Ap 11,15-15,8).
Ressoa a sétima trombeta, que conclui o anúncio da chegada do reino. E o Reino chega sobre o monte de
Sião acompanhado de símbolos no céu, de imagens bestiais que lutam contra imagens angélicas. Um
sinal de grande importância é o daquele que no mostra uma mulher que vai dar a luz. Evocamos o sinal
que propõe Is 7: uma virgem que vai dar a luz.
2. O símbolo da mulher e do dragão
a) Contexto mítico
Segundo a mentalidade mítica, o céu e a terra formavam uma unidade primigenia que no processo
cosmogônico o deus Cronos destruiu violentamente. Embora Céu (Urano) e Terra (Gaia) apareceram
separados, estão chamados a uma estranha unidade. Amam-se, e de seu amor durante a noite nasce cada dia
o Oceano, o Sol. Ordinariamente o céu se entende com masculino e a terra como feminino. A vida na terra
surge da separação de céu e terra.
Também na Bíblia se faz eco, não de forma clara, desta mentalidade. Para o tempo se espera a
reunificação de céu e terra.
Esta grande reunificação é sinalizada no simeion de Ap 12,1. Aqui se inicia o drama escatológico, a
partir do qual se eliminará a distancia entre céu e terra e a separação entre Deus e o homem. Tudo isso se
produzirá através de uma mulher.
b) As características da mulher
Sol, lua e estrelas eram atributos das divindades celestiais. O vestido expressa sua personalidade;
indica como este personagem deve olhado pelo resto do mundo. Para os gregos e romanos, o sol é
“pantokrator”, alma do cosmo, energia, luz do cosmo. O vestido da Mulher significa que está assimilada ao
princípio divino, unida a Deus.
30
Sob seus pés está a lua. Esta era personificada como feminino e associada com as funções femininas.
Na mitologia popular, a lua era contemplada como a esposa de Hélio. Esta é a perspectiva de Ap 12. A
mulher está unida ao divino e em sua pessoa, que está sobre a lua, o sol e a lua são unidos em um
matrimônio sagrado cósmico. A imagem remete à festa do matrimônio escatológico do fim do Apocalipse.
A mulher está coroada e a coroa está formada por doze estrelas. Ap se refere às doze tribos de Israel
e aos doze apóstolos.
Se nos situamos no âmbito da astrologia, é provável que qualquer grego ou romano que lesse esta
descrição da mulher apocalíptica, pensaria na constelação Virgo, o sexto signo do zodíaco. É representado
como uma mulher que leva uma espiga de trigo e tem asas. A Virgo deixou o mundo quando começou a
proliferar o mal e o pecado. Esperava-se o seu retorno no tempo final, na idade do ouro. Segundo a
mitologia greco-romana, o retorno da Virgo era o sinal de que “o fim está próximo”. Isto é o que Ap 12
indica. O signo de Virgo aparece no céu.
Virgo no uso religioso greco-romano podia se referir a qualquer das deusas virgens: Deméter, Juno,
Isis, Artagatis, Celeste e Afrodite.
Contudo, esta mulher, para o autor cristão, não é uma deusa, mas a mãe do Messias.
c) A mulher que dá à luz
A mulher está grávida. Quem nasce não é um povo, porém o Messias. A mulher é mãe. Seu filho é o
resultado da união do céu e da terra. Neste nascimento se restabelece a unidade primordial entre céu e terra.
O vidente apocalíptico nos fala do nascimento-exaltação do Messias. Contudo, este nascimento,
embora faça referência à história, acontece em um marco cósmico, transcendente, exemplar. O menino é
uma figura transcendente, aparentada com as forças cósmicas, que entra em contato episódico com este
mundo.
d) A outra mulher: a prostituta (Ap 17)
Outra visão de uma mulher cujas vestes expressam sua identidade: a grande prostituta – a grande
cidade, Roma. Porém, há elementos que fazem pensar em uma deusa pagã.
A associação desta mulher do Apocalipse com uma cidade evoca o tipo de associação com as deusas
pagãs. Estas deusas eram muitas vezes protetoras das cidades e identificadas com o “gênio” de uma cidade
particular. A cidade é como uma mulher que engendra, alimenta e protege a seus filhos. A cidade é mulher
em sentido simbólico. Em Ap 17 a grande prostituta está associada a uma entidade pecadora, Babilônia, que
está em contraste com a nova cidade, a Jerusalém que vem do alto, de Deus, como uma noiva adornada para
seu esposo. A cidade como a grande prostituta representa o caos, a nova cidade é o lugar santo em que o
caos é superado e conquistado. Esta mulher poderia ser Cibele. Para o apocalíptico, está associado a todas as
forças demoníacas, era Babilônia, a cidade que faz nascer, alimenta e protege a todas as forças e atividades e
inimigas do governo de Deus.
31
A rainha prostituta e a rainha do céu são pólos irreconciliáveis: uma está em aliança com os
elementos do caos, a outra se opõe a eles. O íeros gamos de uma é fornicação, o da outra é a consumação da
união escatológica entre o céu e a terra.
e) Interpretação cultural
Texto apocalíptico utiliza símbolos de grande densidade e significado universal: imagens do
princípio e do fim, a separação do céu e da terra, do masculino e feminino e sua eventual reintegração e
unificação. A mulher representa tudo o que Celeste significava para os habitantes de Cartago, a Dea Syria
para seus devotos em Hierápolis, a Grande Mãe dos deuses para Juliano o Apóstata. Ela é o aspecto
feminino do grande mistério chamado Deus.
Em Ap 12 deve-se ver a figura de uma mulher e não uma alegoria como a Sinagoga ou a Igreja. É a
rainha do céu, Maria, a quem chamarão “Mãe de Deus”.
3. Primeiras interpretações cristãs da mulher vestida de sol
Hipólito, bispo de Roma (+ 235), foi o primeiro que abordou este tema. Interpreta a mulher como
uma figura da Igreja que possui a palavra de Deus cujo brilho supera o sol. Metódio, bispo mártir de Tiro na
Fenícia (+ 312): a mulher é o sinal da Igreja. O Apocalipse fala do presente e do futuro, não do passado,
portanto, não fala de Jesus. Epifânio (+ 403), referindo-se a Ap 12,4 diz que este texto pode cumprir-se em
Maria, porém não está seguro desta interpretação. Provavelmente foi o primeiro autor que identificou a
mulher com Maria.
A interpretação mariológica de Ap 12 não é muito antiga na Igreja cristã. Foi Ecumênio, no século
VI, quem a identificou. Os demais autores a identificam com a Igreja. Desde o 400, cristianismo e
paganismo eram competidores, e nesta batalha o cristianismo não podia adotar a terminologia pagã. A
mulher do Ap 12 não podia ser chamada Maria. Era a Igreja, e a Igreja estava associada a Maria. Quando o
cristianismo venceu o paganismo e desde que, no Concílio de Éfeso (431), foi proclamada Maria como
Theotokos, as dificuldades foram superadas.

4. As duas mulheres: capítulos 12 e 17 do Apocalipse


Compreende-se quem é a Mulher do capítulo 12 do Apocalipse quando confrontada com a Mulher,
amiga do Dragão e de sua Fera, do capítulo 17.
A Mariologia apocalíptica situa Maria em um campo de forças, no meio da batalha escatológica que
ainda hoje está se libertando. A Mariologia apocalíptica se converte em Eclesiologia apocalíptica. Em
paradigma para um novo modelo de Igreja, menos cúmplice, mais profética e denunciadora. Maria do
Apocalipse é aquela Mulher que nos faz compreender a inconsistência de todos os impérios, que nos sentir
como o Mal é tão débil que a inocência e a docilidade angélica da vontade do que está sentado no Trono é
capaz de abater em só instante.

II. UM RELATO APÓCRIFO: O PROTO-EVANGELHO DE SÃO TIAGO


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1. Evangelhos apócrifos
Através da literatura apócrifa dos primeiros séculos da Igreja, podemos entender como vivia e sentia
a Igreja; como o povo acolhia o mistério de Maria. Nos evangelhos apócrifos não encontramos elementos
raros, estranhos; buscando, porém, preencher vazios informativos, concatenando acontecimentos.
2. Maria no proto-evangelho de São Tiago
Guilherme Postel (+ 1582) descobriu e traduziu para o latim esta obra.
O objetivo deste livro era glorificar Maria. É uma obra anterior aos dogmas, à doutrina desenvolvida
pelos Santos Padres. Reflete crenças populares.
a) Vida de Maria até o nascimento de Jesus
b) O nascimento de Jesus
3. Interpolações cristãs em apócrifos do Antigo Testamento
Descobre-se a figura de Maria nos apócrifos vetero-testamentários, nos quais autores cristãos
interpolaram sua própria visão das coisas.
No apócrifo Ascensão de Isaías (século II), diz-se que o profeta viu uma mulher, da estirpe de Davi,
chamada Maria; era virgem e estava desposada com um homem chamado José, cujo oficio era de artesão,
oriundo de Belém e de sangue davídico. O curioso é que, segundo o relato, Jesus teria nascido após dois
meses de gravidez de Maria, de forma milagrosa.
Também o Testamento dos doze tem interpolações marianas.

III. AS DEUSAS NO MUNDO GRECO-ROMANO


O culto das deusas é um importante aspecto da religião nos primeiros tempos. Deus se revelava
feminino nelas. Uma deusa era uma era uma figura onipotente na sociedade em que viviam os primeiros
cristãos. As mais importantes eram Celeste, Isis, as deusas sírias e Cibele.
1. Celeste, a deusa de Cartago
Em Cartago se encontrava um dos templos mais influentes do Império romano. Era a sede da Rainha
do céu, Dea caelestis. Quando da destruição de Cartago pelos romanos (146 a. C.), uma nova deusa foi
imposta no lugar de Tanit, a deusa-lua: Juno caelestis. Tornou-se uma deusa extremamente popular.
Os Padres da Igreja do norte da África (Tertuliano, Cipriano e Agostinho) criticaram e atacaram
implacavelmente a Celeste. Em 399, o templo de Celeste foi convertido em igreja cristã. Em 421, o templo
foi destruído e o lugar se converteu em cemitério cristão. Os cartagineses permaneceram ligados à sua
Rainha. Não apenas os pagãos, também os cristãos.
2. As deusas Isis (Deméter) no Egito, Ásia Menor e Roma
Isis era a deusa mais popular no Egito; depois o foi em Roma, ao ser reconhecida oficialmente por
Calígula (34-41 a. C.). Com a helenização Isis se converteu em Deméter. Quando os cristãos lutaram contra
a idolatria, o culto de Isis lhes opôs resistência.
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Um traço especial dos mistérios de Isis era a participação de mulheres como sacerdotisas. As
mensagens de Isis chegavam em sonhos, em incubação. Parece que a religião de Isis não favorecia as más
condutas sexuais.
O culto de Isis era próprio de uma religião cósmica que mantinha e esperança na salvação através de
uma reintegração profunda na totalidade. A totalidade era representada pelas águas primordiais.

3. Cibele, a Grande Mãe, na Ásia Menor


O culto a Cibele começou uns 6000 anos antes de Cristo. Em 204 a. C. os romanos levaram sua
estátua a Roma desde Pérgamo para lhes ajudasse a vencer Aníbal. Os romanos instituíram algumas festas,
as Megalênsia, para honrá-la no mês de abril.
O culto a Cibele era caracterizado pela dança ou movimentos descontrolados dos membros do corpo
e da cabeça. Pela musica, pelo transe e delírio coletivo. Alguns seguidores de Cibele se castravam, usavam
roupas femininas e adotavam formas femininas de comportamentos. A castração situava um homem em uma
condição que não era nem masculina nem feminina; concedia uma identidade andrógina. A pessoa castrada
era como uma virgem que exercia uma função de mediação entre Deus e a humanidade.

IV. MARIA SOB A IMAGEM DAS DEUSAS: MOVIMENTOS HETERODOXOS


As deusas pagãs serviam de referência para o pensar e sentir de Maria.
1. A Grande Mãe e o montanismo
O montanismo possuía pontos de contatos com o culto a Cibele. Ressaltou a dimensão feminina na
experiência religiosa e cristã. Os montanistas “chamavam à bem-aventurada Maria divina (divam); dizem
que um archon se uniu a ela e assim foi gerado o Filho de Deus” (Maruta de Maioherkat, + 420).
Partindo de que em Cristo não há masculino e feminino e que no céu todos serão como anjos de
Deus, os montanistas não consideravam as diferenças sexuais e de forma proléctica o anteciparam em sua
organização eclesial. Na igreja montanista as mulheres eram também bispas e presbíteras.
O montanismo mostrou um profundo apreço pelo divino feminino. Foi provavelmente um dos
grandes impulsionadores da devoção popular a Maria nos primeiros séculos do cristianismo.
As primeiras especulações teológicas cristãs sobre a maternidade de Maria, sob a forma do
paralelismo bíblico Eva-Maria procederam de teólogos cujas raízes estavam no Mediterrâneo oriental, a
zona da Igreja mais exposta ao montanismo: Justino (+ 165) e Irineu (130-202).
2. Culto à Rainha do céu: as coliridianas
Na Trácia e na Arábia floresceu uma seita cuja principal característica era que suas aderentes
sacrificavam pão a Maria e que somente mulheres participavam em seu culto. Atuavam como sacerdotes.
Faziam de Maria uma deusa, a Rainha do céu.
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A oferenda de pão ou cereais era freqüente nos ritos das religiões do Ocidente e de Roma. A oferenda das
coliridianas não era eucarística.
3. Maria como a deusa-terra
a) A deusa-terra
Para os antigos, a terra revelava o divino feminino. Em sua fecundidade descobre o mistério que se
repete em cada mulher quando tem um filho. A Terra se converteu na personificação da Mãe por excelência.

b) Maria, deusa-terra
Ambrósio identificava Maria com a terra virgem sobre a que havia caído a palavra criadora de Deus.
Muitos cristãos viam em Maria o que os pagãos na deusa-terra que dá a vida, o feminino sublime. Na
concepção, ela foi Terra com a qual o Céu se uniu. Foi o componente feminino do divino. A Igreja confessa,
por outro lado, que ela é também parte da humanidade criada. Seu filho e filho de Deus é a primeira pessoa
da nova humanidade. Assim a deusa-Terra se converteu em uma figura cristã. Maria não é Cibele ou Isis, ela
é a Mãe de Deus, de Jesus.
Havia outras figuras divinas femininas cujos devotos puderam transferir sua devoção a Maria quando
se fizeram cristãos. É possível que em certos casos estátuas pagãs foram batizadas e re-dedicadas como
objetos de veneração a Maria.
4. Maria, “Regina coelis”
Maria foi recebendo os mesmos títulos das deusas. O título mais sublime foi o de Rainha. Um nome
aplicado a Juno, a Isis. No Concílio de Éfeso (431) o povo nas ruas da cidade saudou Maria com os mesmos
títulos com séculos antes havia saudado Artemisa. Durante a Idade Media, quando o título se tornou comum,
muitas imagens de Maria foram coroadas.
Porém, a entronização oficial ocorreu em 1954, quando Pio XII publicou a encíclica Ad Coeli
Reginam, estabelecendo a festa litúrgica em honra de Maria.
As deusas gregas e romanas estavam encarregadas de todas as funções femininas, presidiam
matrimônios, nascimentos e acontecimentos semelhantes. O povo cristão vem a Maria com os mesmos
problemas que o povo pagão com suas deusas.

SEGUNDA PARTE:
MARIOLOGIA HISTÓRICA ESTRUTURAL E DOS PRIVILÉGIOS

Ao longo dos séculos, também nós, acolhemos Maria no nosso mundo espiritual. Cada geração acolheu e
a refletiu sob uma determinada forma.
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No início da geração cristã ela sempre esteve presente para garantir valores irrenunciáveis do
cristianismo: a Encarnação contra o docentismo e para garantir a divindade e filiação divina de Cristo: Mãe
de Jesus e Theotokós.
Maria foi uma herança para todos. Nesta segunda parte estudaremos mo desenvolvimento mariológico na
ortodoxia e heterodoxia: no primeiro milênio a partir dos dogmas cristológicos. No segundo os
mariológicos: Imaculada Conceição e Assunção.

Capítulo VI
A nova Eva: Maria, a Igreja
Os gnósticos cristãos queriam interpretar a Revelação com categorias filosóficas e religiosas novas.
Estas reduziam e eram arriscadas e muitos capitularam. Os primeiros grandes pensadores cristãos, a partir da
Revelação buscaram reconduzir a reflexão ao caminho reto. Maria era imprescindível para questões
essenciais da fé.
O ambiente religioso cultural circunstante, a feito ao divino feminino provocava o cristianismo.
Maria era a resposta e correção. Os Santos Padres estavam atentos ao perigo da idolatria. O corretivo veio
com o simbolismo eclesiológico.
Neste contexto, nos séculos II e III são compreendidos. Cristo e a salvação eram o centro; Maria
completava a reflexão.

I – O gnosticismo como desafio global


Protologia e escatologia eram o foco de interesse da reflexão a partir, não da Revelação, mas do
ambiente cultural. O que deles sabemos nos vem pelos Padres. (Antonio Orbe).
1. Princípios básicos da gnosis: Prima Femina, Eva, Maria
Gnosis: Conhecimento de Deus e de si mesmos (profissionais).
Conheciam a Sagrada Escritura a fundo, mas dependiam da antropologia platônica (corrupção
inerente da carne - σάρξ -, desprezo pelo sensível). Queriam “modernizar” o Cristianismo e libera-lo da
pobreza cultural do Judaísmo. Criaram uma Teologia complexa, coerente, unitária, sugestiva.
a) O Deus escondido, Pai verdadeiro: Não Iahweh!
Iahweh não era Deus, o Escondido, mas um Demiurgo criador:
 criou, a modo de eflúvios (arcontes; anjos racionais; com um sopro: Adão);
 era legislador, cria-se Deus e se apresentava como tal;
 ignorava a realidade espiritual: não podia conhecer o Deus Escondido, Puro Espírito;
 Não foi Iahweh quem enviou seu Filho ao mundo.
Iahweh plasmou Adão de uma substância irracional vivente e infundiu sua substância racional criando
uma relação de paternidade e filiação com os homens. Até o Evangelho o homem espiritual viveu no regime
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da ignorância. Com a sua vinda, o Salvador o despertou: o fez conhecer o Salvador e o Pai. Por isso, os
valentinianos se criam superiores a Iahweh.
b) A “Prima Femina”
Antes da criação por Iahweh, o Deus Escondido estava só. Era: não-Pai (=sem filho); não-Senhor (=
sem universo); masculino e fecundo: juntava solidão masculina com a fecundidade (feminina).
Segundo os valentinianos, o Deus supremo coexistia com uma consorte: Ennoia, Charis ou Sigê, não
eram ser pessoal. Os gnósticos adotavam uma linguagem mítica, matrimonial: de Bythós/Sigê, por livre
vontade nasceu uma família. Deus saiu de sua solidão concebendo em seu interior um princípio de todas as
coisas. Depositou essa idéia, como semente em Sigê, como em matriz que deu à luz um intelecto,
semelhante e igual ao emitente, o único capaz de compreender a magnitude do Pai. Intelecto = Unigênito =
Pai = Princípio de todas as coisas.
Se “ab æterno” Deus não é Pai, então, o Unigênito que o é.
Para evitar equívoco Ptolomeu chamou Pai, o Deus supremo, e Filho o Unigênito. A consorte de
Bythós exercia uma função materna, mas não era chamada de mãe nem pelos ofitas nem pelos valentinianos.
Admitiam uma tradição não pessoal: Filho – Noûs – Filho Salvador (Filho vindo de Ennoia –
verdade da economia do universo).
c) O Filho, o Cristo
A passagem do Filho imanente no Pai ao exterior se realiza, segundo os ofitas, com a ajuda do Espírito
Santo, denominado também “Prima Femina” (= mulher e esposa comum ao Pai e ao Filho).
Enamorados dela, a ela se uniram fecundando-a e geraram dela o Cristo, que era considerado homem em
dupla perspectiva:
A irmã de Cristo, destinada a Ele em matrimônio era Sofia ou “Prima Femina”: pré-existente, sabedoria
no mundo e mãe dos viventes. (Cristo – Sofia; Adão – Eva).

d) O pecado primordial
Primeiro na pré-existência e depois na existência.
e) Redenção ou emenda (διόρθωσις)
Para gnósticos e cristãos dos séculos II e III, Cristologia e Soteriologia estavam unidas: dizer Filho
era dizer Salvador.
Σωτηρ – regenerador “desde” baixo para cima;
Sofia – degenera “desde” cima para baixo.
Não destrói o que faz sua esposa, mas reconduz!
Sofia aparentemente má: inserção na corrupção e morte (analogia com a semente na terra).
f) A Encarnação progressiva
Cristo e suas três assunções: 1) espiritual – divina;
“Através dos céus planetários” 2) animal – arcôntica;
37
3) material – terrena.
A encarnação era última fase: vestição da carne sensível no seio materno.
Da vertente divina não havia problema na encarnação, mas na humana sim, posto que o corpo era
incapaz de salvação.
A demiurgia do corpo de Jesus era obra do Filho que entreteceu para si o “instrumento” de sua
economia [em Gabriel falava o Filho].
No Batismo, Jesus recebeu o Espírito (= Corpo divino) que reformou o corpo recebido de Maria
habilitando para a salvação.
Anjo: pessoalmente;
Batismo: corporalmente
Para um platonizante: 1) o verdadeiro corpo não é de carne e osso.
2) o carnal só tem realidade “doxa”
g) Nascido “ex Maria virgine” ou “per Mariam”
Jesus teve dois nascimentos: Divino – da Virgem celeste
Humano – da Nazarena.
EX – indicava as duas origens. A maioria dos gnósticos atribuem uma origem real desde Maria;
PER – poucos, os valentinianos o faziam proceder do Demiurgo per Mariam não recebendo
substancia humana.
 Ebionitas – Jesus gerado do sêmen de José.
 Evangelho segundo Filipe: έξ Іωσήφ αύτόν γεγενήσθαι: -batismo: Espírito (masculino) sendo
assumido pelo Cristo superior para o anuncio do Evangelho.
-pessoalmente unido ao Unigênito a´te antes de sofrer a paixão.
 Hipólito (+325): Hermógenes afirmava que primeiro nasceu da virgem, depois do Espírito (contra os
docentas).
A nazarena é ícone da virgem celeste, sombra sensível do espírito virginal incorruptível.
A virgindade de Maria estava no seio de Deus antes, in et post partum (antes, durante e depois do
parto).
A virgindade de Maria era um sinal ou imagem do espírito virginal de Deus. Para os gnósticos
Maria não era uma deusa.

2. Relatos gnósticos populares


a) Não nasceu de mulher, mas do Espírito feminino
O Evangelho dos Hebreus, graças a alguns padres temos notícias: Clemente de Alexandria, Epifanio,
Orígenes, Jerônimo. O Evangelho mencionado nega a Encarnação.
Maria = nome da potestade Miguel.
Ruah (feminino) é a mãe de Jesus ???
38
Orígenes manifesta sua perplexidade ao ler neste Evangelho a frase atribuída a Jesus: “faz pouco,
minha mãe, o Espírito Santo, pegou pelos cabelos e me transportou ao monte Tabor”.
O Evangelho de Felipe, classificado por Epifanio, entre os escritos gnósticos, expressa essa idéia
radical: “o Pai de todos tem se unido à Virgem que tem descendido”, ou seja, o Espírito Santo. O texto
procede explicando como “Adão foi gerado por duas virgens: o Espírito e a Terra virgem” e assim, “por
esta razão, Cristo tem sido gerado por uma Virgem”, ou seja, o Espírito Santo.

b) Jesus, como o Anjo Gabriel


A carta dos apóstolos é outro escrito apócrifo que tenta responder às heresias disseminadas pelos
falsos apóstolos Simão e Cerinto. Foi escrito, provavelmente no Egito, até o ano 150. Seu autor manifesta
predileção pelo quarto evangelho. Sua confissão de fé é esta: “Sabemos isto: nosso Senhor e Salvador Jesus
Cristo é Deus, Filho de Deus, enviado por Deus... Cremos em Deus Senhor, Filho de Deus: Palavra que tem
tomado carne da Santa Virgem Maria, suscitada em seu seio pelo Espírito Santo, não foi gerada pelo prazer
da carne, mas por vontade de Deus; foi envolta em panos e manifestada em Belém”.
c) O Evangelho de Tomás
Tinha como meta informar sobre a vida de Jesus desde a Apresentação no Templo até os doze
anos. A Respeito de sua mãe, conta uma anedota:
“Quando tinha seis anos, sua mãe deu um cântaro para que fosse enchê-lo de água e o levar à
casa. Mas Jesus tropeçou no caminho com a gente e se rompeu o cântaro. Então estendeu o manto com o
qual ia coberto, o encheu de água e o levou a sua mãe.Sua mãe ao ver esta maravilha se pôs a beijar Jesus
e conservava em seu interior todos os mistérios que os via realizar”.
Narra também a perca de Jesus no Templo.
“Os escribas e os fariseus diziam: ‘és tu, por ventura, a mãe deste menino?` Ela respondeu:
‘Sim, sou!’ Eles replicaram: ‘pois bendita és tu entre as mulheres, já que o Senhor tem abençoado o fruto
de teu ventre; porque glória, virtude e sabedoria semelhantes não as temos visto nem ouvido jamais’. Jesus
se levantou e seguiu a sua mãe. E era obediente a seus pais. Sua mãe, por sua parte, reunia todos estes fatos
em seu coração”.

3. Juízo global
Antonio Orbe estima que a mariologia gnóstica está muito pouco estudada: “digna de exame
ulterior se me apraz a mariologia: desde a figura de da Prima Femina, esposa do Bythos (= Deus
desconhecido), Mãe (do seio e espírito masculino) do Cristo superior, até a mulher de José em sua eficácia
sobre o Corpo de Jesus (homem). Por caminhos superiores a toda suspeita,previam os gnósticos um
problema hoje controvertido: a transcendência de Maria ou sua prioridade sobre a Igreja. A Virgem
superior, seio do Pai, era anterior à concepção e origem do Logos; com prioridade paralela, a nível
39
exemplar, à de Santa Maria a respeito a Jesus.A Igreja mesmo espiritual, esposa do Logos, era imagem da
Virgem (masculina) ou Maria superior”.
Os gnósticos:
o enalteceram o divino e sacrificaram o humano por negarem o “secum carnem”;
o os padres combatendo não aprofundaram. Suas preocupações eram: docentismo e
adocionismo;
o foram sensíveis ao feminino: Verbo – Sofia; Eva pré – pós existente também com Adão.

II – Recapitulação, recirculação: Maria e Eva


Os padres da Igreja trataram de dar uma resposta a esta visão gnóstica do mundo da história.
Os padres alexandrinos: Clemente e Orígenes, como platonizante, entenderam a salvação como
realidade que afeta a alma: o homo ratio (homo = anima: salus animæ). Outros, Irineu e Tertuliano,
entenderam a salvação como realidade que afeta a carne ou corpo: o homo car (salus carnis).
Os padres alexandrinos rechaçaram:
a) a concepção antropológica das três espécies (hílica, psíquica e
pneumática);
b) a distinção entre Deus Ignoto e Iahweh;
c) a reserva da revelação para os dias de Jesus.
Irineu cria na preexistência do Filho, antes da criação, mas não “ab æterno” (Deus era Deus, mas
não Pia). A cristologia estava em evolução.
A formação do feminino pelos gnósticos, o ambiente cultural e religioso da Ásia, a veneração de
Eva pelos montanistas influenciavam que se centravam em Maria na sua relação com Eva e no influxo que
dela emana; Justino, Irineu e Tertuliano contribuíram pára esta perspectiva.

1. Maria, a mulher, a nova Eva no mistério da recapitulação.


Segundo Ef 1,9, Deus decidiu recapitular tudo em Cristo, o céu e a terra. Em Cristo todas as
coisas tornaram à perfeição que tinha no principio e recupera sua primeira beleza e bondade. Justino, Irineu
tem esta perspectiva teológica e aplicam a Maria.
Tertuliano: “Cristo junta em si o Alfa, e o Omega, e principio. Adão foi recapitulado em
Cristo,pra que o mortal fosse devorado na imortalidade, e Eva foi recapitulada em Maria, parta que uma
virgem desatasse e desfiasse com sua obediência de virgem à desobediência de uma virgem”.
Justino, com suas obras: Apologia (150) e o Dialogo, contemplou à virgem Maria neste
paralelismo com a virgem Eva.
 Eva concebeu da palavra de serpente a desobediência/morte.
 Maria acolheu com fé e alegria a palavra do anjo, e por isso nasceu dela o Filho de Deus/Salvador.
Irineu de Lyon vê em Maria a emergência deste cooprincipio de recapitulação e recirculação.
40
 A primeira Eva foi a virgem desobediente por cuja culpa o ser humano caio ferido e morreu.
 Maria, a segunda Eva, foi uma virgem obediente à palavra de Deus por causa da qual o ser humano
foi gerado de nova para a vida e recebeu a vida.
 Encarnação – recapitulação do homem todo e de todos; novo Adão/ nova Eva, se fazia necessário.
 Jesus - novo adão na cruz;
 Maria - nova Eva na anunciação
=Cf. na Pág.208
A relação de princípios de recapitulação de maternidade e filiação

2. Maria, a mulher, a nova Eva no mistério da recirculação


A discussão sobre o tema, posto que não coincide com a compreensão linear da historia por
Irineu.
Cristo recapitula circula, isto é, faz voltar a Adão sua imortalidade.
Irineu: “por isso a Lei chama aquela que estava comprometida a u homem, ainda virgem,mulher
daquele que tinha tomado como esposa, indicando o movimento re-circular que vai desde Maria até Eva...”.
A recapitulação de Adão em Cris e de Eva em Maria permite descobrir analogias em ambos os
extremos:
a) ambas são virgens;
b) desposadas, destinadas: Maria a José e Eva a Adão;
c) ambas são chamadas uxores por Gn 2,25; Lc1,27;2,5;
d) recebe a mensagem de um anjo (bom - Maria, mal – Eva);
e) consentiram a mensagem (Maria obedece a Deus, Eva o desobedece);
f) seus atos tem alcance social.
Paralelismo: Maria é o protótipo de Eva! Cristo de Adão!
Lc – regeneração “in vitam”.
Mt – os nós da posteridade de Eva.
Maria desatou com a obediência o que Eva atou com a desobediência ou incredulidade.

3. O novo Paraíso
Os capadócios explicitaram um pouco mais Irineu, mas sem paixão paixão contra os gnósticos.
Gregório Nazianzeno (+390): “Por isso, o novo substitui o velho e mediante a Paixão aquele
que havia caído em seu sofrimento foi restituído ao estado primitivo. Para cada uma das coisas que nos
ocorre, foi pago um resgate por aquilo quer está sobre nós. E aconteceu um novo mistério: aquela
economia de salvação que ocorre por filantropia em favor de quem havia caído a causa de sua
desobediência. Por isso, houve geração e virgem ,houve presépio e Belém. Houve geração sobre a
41
plasmação, a Virgem sobre a mulher, Belém traz o éden, o presépio trás o paraíso, coisas pequenas e
visíveis como conseqüência das grandes e distante dos olhos”.
Gregório de Nissa (+392): retoma o paralelismo: Eva-Maria. “Chegando o Anjo a Maria onde
ela estava, disse: alegra-te agraciada. Aquela tua predecessora Eva, ao transgredir a Lei, recebeu a
sentença de pari os filhos com dor. A ti, embora, te compete alegrar-te. Ela deu à luz a Caim e com ele a
inveja e o assassinato. Tu, ao contrário, darás à luz um filho que trará a vida e a incorrupção. Alegra-te e
dança. Alegra-te e pisa a cabeça da serpente. Alegra-te, agraciada. Tem sido cessada a maldição,
eliminado a corrupção, as coisas tristes passaram. Florescem as alegrias, se faz o bem pregado em outro
tempo pelos profetas. Já o Espírito Santo apontou a ti quando pela língua de Isaías disse: ‘tem aqui que
uma virgem conceberá e dará à luz um filho’. Tu és aquela virgem... encontraste um esposo que conservará
tua virgindade e não a corromperá.”
Epifânio de Salamina (+403): aconteceu a antítese morte – vida : Maria mãe dos viventes: “De
fato, Eva teria sido chamada mãe dos viventes depois de haver ouvido as palavras ‘és terra e à terra
retornarás’ Gn: 3, 19, quer dizer, depois da queda. Parece estranho que ela receba um título tão grande,
precisamente depois de haver pecado. Vendo as coisas desde fora, se adverte que Eva é aquela de quem
nasceu todo o gênero humano de toda a terra. Maria Virgem, ao contrário tem introduzido realmente no
mundo, a vida mesma pelo fato de ter gerado o Vivente, de modo que se tem convertido na mãe dos
viventes... Eva se converteu para os homens causa de morte, porque através dela a morte entrou n o mundo.
Maria, ao contrário, foi causa de vida, porque através dela, a vida chegou a nós. Por isso o Filho de Deus
vindo ao mundo e onde abundou o pecado, superabundou a graça Rm: 5, 20. De onde teve origem a morte
vindo também a vida, para que esta sucedesse àquela; se a morte vinda da mulher, a morte foi excluída por
aquela que, por meio da mulher, se converteu em nossa vida”.

III – Maria e a Igreja


A partir de Tertuliano, por causa da possível ambigüidade do paralelismo Eva-Maria, começa a
aparecer o de Eva-Igreja.
Eva emerge como as esposa de Igreja, nascida da costela do novo Adão ‘adormecido’ na Cruz.

1. O duplo paralelismo de Eva: Eva-Maria. Eva-Igreja


Dependendo da correlação, Eva aprece distintamente.
Zenon de Verona (+380) – ler texto à página: 214.
Após Zenon, todos os padres adotaram o duplo paralelismo.
Eva: Fiat em Nazaré; união na cruz
Eva Maria – Eva Igreja
Origem da salvação – Participação na salvação
Transitório – permanente supre nossa indigência esposa e mãe (séc: VIII).
42
Cooperação na obra salvífica.

2. O Paralelismo Maria-Igreja
A partir de Tertuliano: no NT Maria é prefiguração da Igreja.
Ambrósio e Agostinho estavam familiarizados com esta perspectiva (Ler texto à página: 215/6).
Na virgindade corporal de Maria, Agostinha via a virgindade espiritual da Igreja.
Em poucas ocasiões se aludia a união com Deus, o Espírito Santo que a fecunda e a união da
Igreja com o mesmo Espírito (Ambrósio), o paralelismo se dá com José e a Igreja – hierarquia ou com
Cristo.
A iconografia se foca na maternidade, não no calvário. O paralelismo com a Igreja não é ide
identificação, mas de comparação. Bernardo (II milênio) o explorará.

3. A precedência: Maria ou a Igreja


Em Hermas, no seu pastor, é a Igreja “anciã”, primeira criatura. Entre os judeus tudo havia sido
criado em favor de Israel.
Igreja rejuvenescida – esposa que gera seus filhos. Assim, a Igreja é: virgem, mãe e preexistente.
Igreja mulher de apocalipse 12.
Na segunda carta de Clemente (autor anônimo): afirma-se à preexistência da Igreja em
referencia a Gn 1,27. Chamando a Igreja de mulher, sugere sua maternidade.
 Igreja virgem – virgindade da fé.
 Mãe – esponsalidade
Acta Achelai de Hegemônio, metade do século IV no Oriente, (antes de 350):
 Ecclesia
 Virgem castíssima; Igreja Imaculada.
Cirilo: Marie é chamada Igreja em Éfeso.
Ambrosio: tipos da Igreja que recebeu o Evangelho.
Cromacio de Aquiléia: Igreja = casa de Maria.
Textos pág (219/20).
Aquilo que Maria fez fisicamente, a Igreja o faz espiritualmente.
Maria – Eva exisgia Maria Igreja, para que fosse compreendida como esposa do novo Adão.
O culto a mão-deusa entrou sob a categoria Ecclesia como mãe espiritual ou nova Eva.
Houve um processo confuso até Maria fosse declarada mãe de Deus. A mariologia é uma forma
cósmica de observar a realidade da diferenciação sexual, da fecundação, do divino e do humano, o espiritual
e o terrestre.

4. A nova Eva na perspectiva do Vaticano II


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No segundo milênio rompeu-se o paralelismo Maria - Igreja e a mariologia se converteu em
mariologia dos privilégios e da devoção, unindo intimamente mãe e Filho no mesmo destino e projeto.
Igreja: societas supernaturalis. Analogia Maria – igreja não era mais necessária. Somente com a
eclesiologia mistérica a analogia retorna. O renascer da Igreja nas consciências produziu também o da
mariologia.
O Vaticano II reintegrou Maria na Igreja.
A cristotipologia e a eclesiotopia se confrontaram e produziu-se um equilíbrio. Maria foi re-
incluida na Igreja como mistério.
Maria faz parte da Igreja chamada à santidade e da Igreja triunfante e glorificada.
LG VIII (64,53,58): o tema Maria – Eva cede lugar ao de “sócia do Redentor”. Primeira
redimida.

IV. Conclusão: A nova Eva e os novos equilíbrios


1. O gnosticismo tentava penetrar os mistérios de Deus e se perdia em elucubrações. A figura de Eva
adquire transcendência e preexistência.
2. Justino e Irineu situavam o feminino como principio de salvação da carne, na economia, mesmo que
sem autonomia. O novo Adão tinha o primado absoluto. Maria – Eva estava-lhe associada: os princípios
masculinos e femininos recapitulam e recirculam até as origens.
3. A imagem de Eva e traduzida em chave esponsal: Eva – esposa do novo Adão – Igreja que unida a
Cristo se converte em mãe.
Jesus é origem de Eva (não mãe). Maria é esposa de José que concebe pelo Espírito. A Igreja é esposa
quando Cristo morre na cruz.
4. Maria – Igreja: a Igreja precede no simbolismo da mulher. A Igreja é “Anciã” (Hermas) – Ap 12,
nasce virgem, Imaculada do lado de Cristo. Sua fé é virgindade, esponsal pela fidelidade, maternidade
fecunda pela sua missão e sacramentos.
5. A imagem esponsal e maternal supõe a nova Eva nascida na cruz, sócia do Redentor.
Protótipo da fé, da santidade, da maternidade: Igreja nascente: maternidade, virgindade, santidade se
verificam em Maria.
6. A mariologia dos padres não é isolacionista, mas estrutural dando respostas ao seu tempo.
7. Ressaltaram os gnósticos, o paralelismo judeu: ao endeusamento de Maria corrigia-se com a
eclesiologia.
8. O Vaticano II conseguiu o equilíbrio, sem uma visão “inclusiva” do feminino no divino. Esta é uma
nova zona de turbulência [a teologia feminista está tateando].

Capítulo VII
Maternidade Virginal de Maria.
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A Virgindade de Maria tem sido confessada de modos diferentes ao longo da tradição da Igreja.
Nos três primeiros séculos a virgindade adquiriu a dignidade da autentica confissão Cristológica, como
forma de confessar a maternidade transcendente de Maria, por ser mãe do Filho de Deus.

I- A concepção Virginal de Jesus ou a Virgindade de Maria


Orígenes
A virgindade de Maria é um requisito imprescindível da santidade necessária para aquela missão
de trazer a salvação a este mundo.

1- A virgindade de Maria, Mistério de Cristo


Inácio de Antioquia
Maria é aquela que tem engendrado a Cristo, que lhe tem dado uma carne verdadeira e real; por
isso ele depois sofre, morrer. Neste sentido, Cristo é em primeiro lugar de Maria e depois de Deus. A
ausência de pai põe em relevo que Inácio pressupõe a concepção virginal. A virgindade de Maria não
significa o ser estado virginal dela, mas a concepção virginal de Cristo em seu seio. O símbolo batismal
romano confessa que Cristo “nascido do Espírito Santo e da Virgem Maria”, e Inácio defendia que o
privilegio de Maria ser virgem estava no fato de pertencer a Cristo.

2- A terra virgem, origem de Adão e de Cristo


Irineu e Tertuliano
A Virgindade de Maria formava parte da estrutura teológica da recapitulação e recirculação.

a- A terra virgem
Para Irineu
Existem, portanto, paralelismo entre a origem do corpo de Adão e o do Salvador. Adão veio da
vontade da sabedoria de Deus e de uma terra virgem, a Encarnação tem lugar no seio de uma virgem sem
obra de Varão seu fruto será um homem nascido do Espírito Santo e de uma mulher virgem. Por ser origem
do Espírito será Filho de Deus; por sua mãe virgem será, filho do homem.
Tertuliano
Para iniciar uma nova forma de nascer prescindindo da velha e corrompida semente, necessitava
de uma nova semente espiritual, este novo nascimento esteve prefigurado na terra virgem não violada pelo
trabalho da qual Deus formou Adão. Essa virgem da que nasceu Cristo foi contraposta a virgem Eva. Esta
concebeu a morte e teve um filho assassino, aquela, a vida e teve um filho salvador de todos.
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O símbolo da terra virgem é autenticamente feminino. Trata-se de uma visão mística, que de
certa maneira tenta afirmar a precedência ontológica da maternidade virginal sobre a maternidade não
virginal.
b- a Virgindade de Eva e de Maria
Irineu e Justino
Declararam na virgem Eva o tipo da virgem Maria, mãe do Filho de Deus segundo a carne. A
carne virginal de Eva levava a morte. O pecado de Eva consiste na desobediência. Eva pecou por
pensamento e desejo, ainda, que, permaneceu por algum tempo virgem. Maria, segundo Irineu, não é
requerida por qualquer tipo de indignidade, que se assinale ao matrimônio humano. Nela existiu uma
exigência do plano de Deus, que quer recapitular, todas as coisas em Cris to e salvar o mundo.

3- Desenvolvimento da fé na concepção virginal


A fé na concepção virginal, estreitamente vinculada a fé na filiação divina de Jesus, não teve
grandes contraditores. Os reformadores protestantes aduziram belas reflexões teológicas e bíblicas para
explicar admirável concepção de Jesus Cristo por obra do Espírito Santo e de Maria a virgem. A virgindade
de Maria emerge neles como o grande dado Cristológico, que explica perfeitamente e identidade do Filho de
Deus. Mas nunca vêem na concepção virginal um fenômeno afastado da ação do espírito como protagonista.

Virgindade de Maria in partu.


O proto-evangelho de São Tiago, falava do parto virginal de Jesus. Daí em diante não poucos
padres dá Igreja começaram a falar da virgindade in partu. Clemente de Alexandria aceitou essa posição
outros se opuseram:
a- Tertuliano
Afirmava que Maria tinha sido virgem unicamente ante do parto. Quem abriu o seio de Maria foi
Jesus. A partir daí já não era mais virgem, mas mãe e esposa.
Orígenes: Afasta a doutrina da integridade de Maria no Parto.
Argumento de conveniência
O valor cultural da virgindade enquanto tal dos séculos III –V induz explicar a virgindade de
Maria no parto desde outros pressupostos. Santo Efrem e Gregório de Nisa defensores da integridade e
corporal de Maria no parto de Jesus, conectam esse tema com o paralelismo Eva Maria. Enquanto uma dá a
luz na dor e os sofrimentos Eva – outra na alegria, Maria.

b- A dialética
O resumo da tradição eclesiástica ortodoxa a respeito da virgindade de Maria no parto: “os
padres da Igreja viram tanto na concepção como no parto de Cristo um acontecimento prodigioso realizado
por Deus e encontraram para isso apoio bíblico. Contudo, alguns não resolveram manter a idéia segundo a
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qual Cristo conservou a integridade corporal de sua Mãe ou a restituiu de novo, mas nascendo de seu seio
através do caminho traçado pela natureza”.
Disse o Vaticano II: Jesus mesmo é o consagra a virgindade de Maria. Não diminui e não destrói.

Virgindade de Maria post-pastum


O proto-evangelho de São Tiago afirma que Maria não teve Filhos depois do nascimento de
Jesus. Os chamados irmãos de Jesus eram filhos de um matrimonio antecedente de José.
a – a exigência da consagração de Maria pelo Espírito
Orígenes para valorizar o ideal acético da virgindade acrescenta: “a consagração de Maria pelo
Espírito a habilitava para a maternidade de tal maneira que não foi necessário o varão”. Em oposição a
Tertuliano que afirmava que Maria se uniu com José e tiveram outros Filhos depois de nascimento de Jesus.
b- Sensus Fidelium e Imagens ilustrativas
Tanto Epifanio como Basílio defenderam a virgindade perpetua de Maria. Eles não encontraram
provas na sagrada escritura, porem Basílio recorre aos sentidos dos fieis onde se afirma que os amigos do
Cristo não suportam que se diga que Teotokos deixou de ser virgem em determinado momento.
c - O propósito da virgindade de Maria
Gregório de Nisa explica a cena anunciação afirmando que Maria ao dizer que não conhecia
Varão estava referido-se ao propósito de guardar a virgindade.
d- Virgindade de Maria e José
Jerônimo afastou a solução do proto-evangelho de São Tiago e introduziu um elemento novo e
hipotético: José permaneceu também virgem.
e- Os Irmãos de Jesus segundo os reformadores
Os reformadores protestantes afirmam conjutamete a virgindade perpetua de Maria. Segundo eles
os irmãos do senhor eram somente primos. Para Lutero, Maria, sob o véu de esposa ocultava a virgindade
antes e depois do nascimento.
Zuinglio afirma que: o objetivo do seu matrimonio com Jose foi para sua ajuda e proteção, não para
engendrar filhos.

II- Maria Mãe de Deus


1. Mãe do Filho de Deus encarnado
a- Afastamento da Encarnação
Os ebionitas afastavam a encarnação estrita do Verbo. Os gnósticos negavam a encarnação do
Filho de Deus no seio de Maria, ou por que Jesus não era Filho de Deus (Ofitas), ou porque o fruto do seio
de Maria não era rigorosamente seu (ex Maria). Encarnou-se simplesmente por Maria (per- Maria –
Valentinianos).
b- Ex Maria: Pressuposto necessário da redenção
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As respostas teológicas de Justino, Hipólito e Noeto clarificam o sentido da maternidade de
Maria.

c- Maternidade para Kenosis


Os padres do século II entediam a maternidade de Maria como o meio que Deus escolheu para
abaixar-se até nós, ou seja para sua Kenosis. As palavras condescendências “katabasis” Kenosis explicava
esta ação de Deus.

2 - Teotokos
Paulo de Samosata afirma que Maria é mãe de Jesus e não do Logos. O povo proclamava a Maria
a Teotokos (a que engendrou Deus)
a- O Filho consubstancial ao Pai: Nicéia.
O concilio de Nicéia estabeleceu definitivamente a divindade de Cristo: Jesus é consubstancial ao
Pai.
b- E o humano no Filho? O debate em torno do concilio de Eféso.
O se centro na humanidade de Jesus. O problema é: como o divino se fez homem? Nas vésperas
do concílio o significado da Teotokos era Cristologico e não Mariologico. Cilirio de Alexandria, como
representante do Papa, realizou uma cessão em 22 de Junho onde excomungou Nestorio e Aprovou
solenemente o titulo de Teotokos incluindo na linguagem eclesiástica teológica. Os padres de eféso não
pretendiam privilegiar a Maria, mas dá conta dá sua fé Cristologica: afirmar e confessar que o Filho de Deus
nasceu de mulher foi verdadeiro homem. Só quando se desenvolveu o tema da imaculada concepção é que
se pode entender a encarnação, como um autêntico acontecimento cósmico, que dizer em Maria, a
imaculada, o Divino se uniu com o humano Antes do pecado, por isso pode iniciar-se uma nova criação.
c- o equilíbrio de Calcedônia
O Concílio de Calcedônia defendeu e determinou teologicamente a constituição da personalidade
de Cristo no instante de sua geração virginal: a natureza divina e natureza humana assimida por ele se
uniram na pessoa do Deus –Logos de forma não confusa inseparada.

3- Posterior desenvolvimento
A reflexão teológica sobre Maria como Mãe de Deus, esteve fortemente ligada, no ocidente, ao
desenvolvimento dogmático da imaculada, à assunção, à co-redenção, à mediação.

III- Conclusão
A maternidade virginal de Maria
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1- A fé na concepção virginal de Jesus pertencem ao NT. As introduções Cristologicas de Mateus,
Lucas e João, fala da ação de Deus do Espírito em Maria. Jesus é filho “De spiritu Sanctu ex Maria
Virgine”
2- Segundo os padres (Inácio de Antioquia, Irineu, Tertuliano e Hipólito), Maria engendrou Jesus Cristo
e lhe deu uma carne verdadeira e real, passiva e capaz de sofrer e morrer. A virgindade de Maria é
meio de Konosis e ao mesmo tempo memória das origens virginais do mundo.
3- O pecado de Eva se converteu na desobediência não na perca da virgindade.
4- Foi se fazendo coda vez mais comum a crença de que o parto de Jesus foi bem aventurado,
sustentado pelo Espírito Santo, e que Nele não teve efeito a primeira maldição “dá a luz os filhos
com dor”.
5- A maioria dos padres defenderam a virgindade permanente de Maria. Dizia-se que os que amam a
Cristo não toleram os que se opõem a esta realidade.
6- Contra os gnosticos a Igreja confessou a encarnação ex Maria.
7- A Igreja confessou – em sua ortodoxia, que Jesus é o Filho de Deus consubstancial ao Pai e
consubstancial a nós, em unidade de pessoa que é Divina. Por isso, dada à intercomunicação entre
sua natureza divina e humana, Maria é autentica Teotokos.

Capítulo VIII
A IMACULADA E A ASSUNÇÃO

Passados os primeiros séculos, a Igreja foi progressivamente centrando-se em Maria, como mulher
individual e privilegiada. Descobriu nela sua santidade única, dons que não dividia com ninguém, a não ser
seu Filho, como a imaculada conceição e assunção em corpo e alma ao céu.

A Santidade única de Maria


O termo usado para definir Maria no Oriente foi “panaghia”, a toda santa ou santíssima. A tradição
ortodoxa fala de Maria como mulher possuída pelo Espírito. A Santa Theotókos, era objeto de culto
litúrgico e da reflexão teológica.

O culto litúrgico a imaculada conceição de Maria


A Igreja do Oriente instaurou já desde o século VII a festa da conceição da Virgem. Por trás da festa
da anunciação e concepção de Jesus, Maria era celebrada como a mulher que não teve o menor rastro de
pecado. No contexto de adoração a Santidade de Deus emergia durante a ação litúrgica a Theotókos, a sem
mancha entre outros. Os hinos litúrgicos a denominavam santa, santíssima, imaculada, sem defeito. A
oração Mariana mais antiga “Sub tuum paesidium” chamava a Maria “santa Dei Genetrix... virgo gloriosa et
benedicta”.
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A santidade de Maria se celebrava no ocidente por meio da festa imaculada. Começou na Inglaterra,
primeiro de 1060 a 1066, e depois a partir de 1127. o objetivo da festa era sobretudo na santificação de
Maria no sei de Ana. Somente no final do século XV, a Igreja de Roma adotou oficialmente esta festa.

A doutrina dos Padres orientais sobre a Panaghía


a) Os defeitos de Maria
Antes do concílio de Éfeso era unânime considerar Maria como mulher de santidade única: os
apócrifos, os Padres. Não obstante, alguns autores tiveram dúvidas sobre a completa e perfeita santidade.
Para ressaltar que Maria tinha passado de uma vida segundo a carne para uma vida segundo o Espírito, que
Maria cresceu espiritualmente como nós, alguns Padres não tiveram inconveniente em admitir em Maria
imperfeições e defeitos, baseados na leitura de certos textos evangélicos.
Tertuliano – que a maternidade de Maria tivera feito perder a virgindade;
Orígenes – Maria era chamada a crescer através da purificação interior, produzida pela redenção de
Cristo;
João Crisóstomo – comentando Mt 12,47, lhe atribuía a Maria um “excessivo amor próprio” e,
portanto, algumas imperfeições;
Cirílo de Alexandria via na espada de dor, profetizada por Simeão, a espada da dúvida;
Efrén – não eximia Maria do caminho da fé, sujeito às provas e as dúvidas.

b) Maria e o Espírito Santo


A santidade de Maria era posta em relação com o Espírito Santo, principalmente no acontecimento
da encarnação. Estabelecia-se assim, um paralelismo do Espírito Santo e a Santa Virgem. No símbolo de
Niceno-constantinopolitano põe em relevo a íntima conexão entre o Espírito Santo e Maria no mistério
da encarnação; mas demonstra perplexidade quando busca entender o modo da relação.
c) A toda santa
Assim como Cristo nasceu do Espírito e de Maria, assim nasce todo crente do Espírito Santo e do
Fiat da Virgem. Segundo os Padres a Virgem personifica a santidade da Igreja: em sua infinita pureza, a
virgem é toda santa, e por isso é figura da Igreja: a santidade de Deus na santidade humana. Cirílo de
Alexandria no discurso do concílio de Éfeso comparava a santidade do corpo de Maria, em que habitou o
Filho de Deus e da qual nasceu, com a santidade do templo: “Salve, Maria, templo donde Deus habita,
templo santo, como o chama o profeta Davi quando diz: ‘Tu templo és santo e admirável em sua justiça’
(Sal 64,6). Salve, Maria, a criatura mais preciosa da criação; salve, Maria, pomba puríssima”.
Para Gregório de Nissa, Maria era imaculada: “A plenitude da divindade que residia em Cristo
brilhou através de Maria, a imaculada”. André de Creta disse dela: “O corpo da Virgem é uma terra que
Deus tem trabalhado, a primicia da massa adamítica que tem sido divinizada em Cristo...”. E em outra
ocasião: “Eu proclamo a Maria a única santa, a mais santa entre todos os santos”.
50

As doutrinas das Igrejas orientais


A Igreja ortodoxa bizantina segue a André de Creta (+ 740), para quem Maria é pura em tudo e
sobrepassa ao céu em santidade, donde tem o primeiro lugar depois de Deus. Quando os teólogos e poetas
religiosos bizantinos utilizavam a palavra “imaculada” não lhe davam o sentido que tem nos teólogos
latinos. Não incluíam a exceção da Theotókos do pecado original, dado que a teoria do pecado original não
existia entre eles. Afirmavam unicamente a santidade perfeita de Maria desde a origem.
Teologia Ocidental sobre a imaculada conceição de Maria
O tema da santidade de Maria foi abordado numa perspectiva diferente: a exceção de todo pecado,
até do pecado original. Para eles era necessário provar que Maria nunca, em nenhum momento, foi presa do
pecado, nem sequer do pecado original. Por isso, ao falar da santidade de Maria era necessário combinar
deferentes temas: o pecado, o pecado original, a concepção.
Para os teólogos ocidentais, o problema consistia em aceitar que Maria estivera isenta do pecado
original. As discursões estiveram motivadas pelos conhecimentos científicos da época a respeito da
concepção do corpo (conceptio) e a infusão da alma (animatio), que não coincidiam num mesmo momento,
senão que prescindia uma da outra. Só quando se anulou a diferença de tempo entre “conceptio” e
“animatio” se encontrou o caminho livre para resolver o problema.
a) A Grande dificuldade: defender a universalidade da redenção
A partir de Agostinho se ressaltava a universalidade do pecado original, para apresentar a
necessidade universal da salvação e da graça de Deus em Cristo Jesus. Afirmar que Maria não teve pecado
original, implicava negar que tivera sido redimida e salvada por Jesus Cristo e assim mesmo comportava a
negação de sua ação redentora universal.
O Papa Leão Magno confessava: “entre os filhos dos homens, só Jesus Cristo veio ao mundo sem
pecado, porque só Ele foi concebido sem a contaminação da concupiscência da carne”.
Redenção moral, santificação pelos pecados
Os grandes escolásticos não quiseram admitir a exceção de Maria do pecado original por causa do
dogma da redenção universal, mas não exigiram já uma purificação de Maria na Anunciação como não
poucos Santos Padres. O problema que suscitava era como conciliar a preservação de Maria do pecado
original com sua necessidade de redenção.
Raimundo Lulio (+1315) compôs um tratado sobre a Imaculada Conceição, se Maria é primícia da
nova criação, não podia encontrar-se em uma situação pior a dos primeiros pais antes do pecado; portanto,
Maria não esteve submetida ao pecado original.
Era a afirmação tradicional e universal a plena santidade de Maria. Ela não pecou pessoalmente
porque foi santificada no seio de sua mãe, libertada da fome peccati, mas não num primeiro instante, senão
no segundo (animatio). Assim pensavam Tomás de Aquino e Boaventura. Assim, santa Maria no primeiro
51
instante de sua concepção não foi imaculada. Graças a Jesus Cristo foi redimida do pecado original no
segundo instante: foi santificada.
b) A perspectiva: o “Perfeitissimus Mediator” (Duns Scoto+1308 )
Respondeu as objeções anteriores nos seguintes argumentos: se opôs a opinião de Tomás de Aquino e
outros, segundo a qual a dignidade de Cristo como redentor ficaria menosprezada pela isenção de Maria do
pecado original, porque, se Cristo é o “perfeitíssimo Mediador”, tinha a disposição de Maria um ato
perfeitíssimo de mediação. E a respeito da concepção de Maria, Scoto estabeleceu três possibilidades: 1) que
ela nunca tivera estado submetida ao pecado original; 2) que o tivera estado por um instante; 3) que tivera
sido libertada dele depois de um certo tempo. Sua resposta foi a seguinte: “Só Deus sabe qual destas três
possibilidade levou a cabo. Em todo caso, se não está em contradição com a autoridade da Igreja e da
Escritura, me parece provável atribuir a Maria o que é melhor”. Para ele, o Perfeitíssimo Mediador não é só
aquele que redime e restaura a ordem quebrada, senão aquele que previne o pecado, “Maria necessitou do
Mediador que a prevenisse do pecado”. Assim, não há nenhum perigo de negar a redenção universal e a
necessidade de redenção que Maria tinha. Para Scoto, já no primeiro instante da concepção de Maria, ela
recebeu a plenitude total da graça, porque foi a mais redimida perfeitamente por o mais Perfeito Redentor.
Foi redimida sendo preservada. Assim “não poderíamos chamar a Cristo perfeitíssimo Redentor nem a
Maria perfeitíssima redimida se não afirmássemos a preservação do pecado original”.
c) Até a definição dogmática
Nos séculos XV e XVI continuaram as lutas entre os maculistas e imaculistas. Nos séculos XVII –
XVIII nem se condenou nem se afirmou a doutrina imaculista. Não obstante desde a bula “Sollicitudo” de
Alexandre VII (8 de dezembro de 1661) ficou praticamente resolvida a questão em favor da conceição de
Maria, preservada de toda mancha de pecado desde o primeiro instante de sua existência.
O papa Pio IX, o dia 8 de dezembro de 1854, definia dogmaticamente a imaculada conceição de
Maria nos seguintes termos: “Para honra da santa e indivisa Trindade, para a glória e honra da Virgem
Mãe de Deus, para exaltação da fé católica e crescimento da religião cristã, com a autoridade de nosso
Senhor Jesus Cristo, dos bem aventurados Pedro e Paulo e com a nossa, declaramos, proclamamos e
definimos que a doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria foi preservada imune de toda mancha
de culpa original no primeiro instante de sua concepção por singular graça e privilégio de Deus onipotente,
em atenção a méritos de Cristo Jesus Salvador do gênero humano, está revelada por Deus e deve ser,
portanto, firme e constantemente crida por todos os fiéis”.

A Assunção de Maria em corpo e alma ao céu


Paralelamente surgiu a necessidade de celebrar e refletir sobre o destino final da Virgem; descobrir em
que acabou toda a sua história e como cumpriu Deus nela suas promessas. E ao mesmo tempo se percebia a
necessidade de explicar que tipo de presença a mantinha na comunidade de fé.
52
A festa do trânsito
Desde o século VII a assunção de Maria em corpo e alma ao céu tem sido crida, tanto na Igreja do
Oriente como na do Ocidente. Já no século VI se introduziu a festa do Trânsito, dormição ou assunção de
Maria no dia 15 de agosto. O objetivo da festa não estava bem definido: umas celebravam a morte de Maria,
outras celebravam a assunção ao céu. Em torno ao ano 600 se introduziu no ocidente a festa da dormição ou
Pausatio de Maria. Desde Roma a festa se expandiu a Inglaterra e a França; foi a partir dos papas Adriano I
(+795) e Pascual I (824) a festa passou a ser chamada Assunção.

As primeiras notícias: Epifanio


Devemos a Epifanio umas das primeiras reflexões sobre a morte de Maria entre os anos 374-377. O
que lhe motivou foi uma preocupação pastoral: na piedade popular, havia uma tendência de venerar Maria
como uma deusa, de pensá-la como uma figura sem carne, sem história, sem nascimento e sem morte.
Depois de algumas investigações chegou a conclusão de que não havia informação válida a respeito nem na
Escritura ou Apócrifos, nem nos escritos eclesiásticos. Assim, Epifânio propôs três hipóteses de solução: 1)
Maria morreu mártir (Lc 2,34); 2) Maria simplesmente morreu; 3) Maria foi assunta ao céu sem morte
precedente (Ap 12). Epifanio afirmou que não havia ouvido nada sobre a morte de Maria. No século IV, não
havia nenhum tipo de tradição jerosolimitana sobre a assunção. Mas, em meados do século V se falava de
uma casa no vale de Josafá e em Getsemani donde haviam vivido João e Maria. Jugie conclui: “Fica incerto
até o fato da morte e da sepultura de Maria... Incluso em Jerusalém não se fala da sua tumba. Com maior
razão não se encontra nada sobre a gloriosa ressurreição. A meados do século VI a situação era que nada se
sabe como foi o fim terreno da mãe de Deus”.

Os relatos apócrifos
Independentemente do seu valor histórico, o relato intenta imaginar-se o fim de Maria em coerência
com o que foi sua vida e as relações que ela manteve com a comunidade de seu Filho. Descreve um belo
final, que intenta substituir o que foi um fim totalmente escuro, anônimo, apagado da memória histórica.

As primeiras reflexões teológicas – pastorais


a) Passo dos apócrifos as reflexões teológicas
Wenger publicou em 1955 um sermão do bispo Teotecno de Lívia. Ele afirmava claramente, no final do
século V, a assunção de Maria em corpo e alma ao céu. Não falava de dormição. Segundo M. Jugie, o
primeiro testemunho “donde a doutrina católica da assunção ao céu é explicitamente afirmada” é um sermão
do patriarca Modesto de Jerusalém (+634).
b) Os argumentos teológicos da Assunção de Maria
Um dos princípios teológicos fundamentais para justificar a Assunção de Maria em corpo e alma ao céu
foi dito pelo papa Leão Magno (440-461): “Se Adão tivesse atuado perseverantemente segundo esta
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incomparável dignidade concedida a sua natureza, observando a lei que lhe foi dada, sua alma intacta teria
sido conduzida a glória celestial com aquela parte dele mesmo que era seu corpo”.
Para German de Constantinopla (+733), André de Creta (+740) e João Damasceno (+749), o motivo
fundamental da assunção é a maternidade divina. Por isso, ela esteve exenta de pecado, foi sempre virgem.
Para o primeiro, a assunção era a conseqüência da ação de Deus sobre o corpo de Maria. Ele utilizava o
argumento da conveniência, segundo o qual teria sido impossível que a morada de Deus, o templo vivo da
santíssima divindade do Unigênito fora presa da morte na tumba. E por estar assunta ao céu, exerce a função
de mediadora e intercessora. Para o segundo, a assunção de Maria sobrepassa nossa compreensão e
conhecimento; reconhecia que não havia sobre ela nenhuma tradição positiva, mas exclui que o corpo de
Maria pudesse apodrecer no sepulcro, porque não convinha nem a sua maternidade divina, nem a sua
santidade, nem a sua virgindade perpetua. E o terceiro, utilizava o argumento de conveniência. Maria era
considerada por ele como mediadora e intercessora. E o grande motivo da assunção parecia ser a pureza
imaculada de Maria, preparada assim para ser mãe de Deus. A celebração da Assunção foi se consolidando
na consciência dos fiéis essa verdade religiosa. Não se sabe se, neste caso, a celebração foi um meio para
expressar a fé ou se chegou a provocar a fé.

A favor da Assunção no Ocidente


Na obra atribuída a Agostinho, intitulada de “De Assumptione Beatae Mariae Virginis” afirma: i) Maria
não compartiu a maldição de Eva e deu a luz a seu filho sem dor, conservando intacta sua virgindade;
conheceu a morte, mas não foi sua prisioneira; ii) ficou intacta a virgindade de seu corpo, por que Jesus não
podia preservar a seu corpo da corrupção? Se a carne de Cristo é a carne de Maria, se um filho tem que
honrar sua mãe, se Senhor orou para que seus discípulos estivessem lá onde ele estaria, como não levará ao
céu o corpo e a alma de sua mãe? “Tenho medo de afirmar que o corpo santíssimo do qual Cristo tomou sua
carne... tenha tido a mesma sorte que todos os demais”. Por isso, teria que concluir que Maria está em Cristo
e junto a Cristo. Aquele que não permite que nem um cabelo da cabeça de seus santos caia sem sua
permissão, não irá conservar integro o corpo e a alma de sua mãe? Pôde-se preservar Daniel dos leões, não
irá a preservar a sua mãe “sempre incorrupta?”.

A Justificação Teológica
Desde a época carolíngia até o século XIII, os teólogos prepuseram argumentos de conveniência. Há
aqui um exemplo:
- A mãe e o filho estão unidos segundo a carne;
- O Filho é glorificado em seu corpo;
- Sob pena de romper a unidade da mãe e do Filho, convém glorificar corporalmente a mãe com seu
Filho.
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No século XIII se explicava a relação de Jesus e Maria deste modo: Maria deu o corpo Àquele de
quem procede toda a graça (Jô 1,17). Manteve com ele uma profunda relação pessoal. Por isso recebeu de
Jesus a graça perfeita que a conduziu a gloria completa (Rm 8 10-11). Em razão de sua união com Cristo,
Maria escapou dos laços da morte. Por não ter pecado, Maria não podia ficar retida e cativa pelas
conseqüências do pecado.

A Definição Dogmática
Entre os anos 1921 aos 1940 chegaram à sede Romana petições de mais de mil bispos residenciais,
numerosas congregações religiosas e inumeráveis fiéis de todo o mundo. Antes de 1944 73% das dioceses
episcopais residenciais tinham pedido a definição dogmática da Assunção.
a) A favor e em contra: antes da definição
Nos interessa a conhecer as razões com as quais fundamentam esta definição. Alguns criam que o
dogma estar explicitamente revelado na Sagrada Escritura. Outros apelavam para a tradição oral, não escrita,
procedente dos apóstolos. A maioria se fundava na fé unânime da Igreja. O fato eclesial era mais que
suficiente para uma definição dogmática. Não havia unanimidade em explicar o porquê do dogma da
assunção. Uns pensavam como conseqüência do dogma da maternidade divina, outros da virgindade de
Maria, outros de sua Imaculada Concepção, outros de sua função soteriológica. Teve teólogos católicos que
se opuseram à definição do dogma por não encontrar motivações bíblicas, históricas, nem teológicas. Estas e
outras críticas fizeram ver que o dogma da Assunção não podia ser fundado (ver pg 277).
Os únicos motivos que pareciam aducibles eram os argumentos de conveniência e a reflexão realizada
a partir da “analogia da fé” e a evolução dos dogmas. Pareceu que o argumento mais sólido era aquele que
partia de uma contemplação global do mistério de Maria dentro do Mistério de Cristo.
b) A Definição Dogmática
No dia 1º de novembro de 1950, o papa Pio XII proclamou a definição da Assunção de Maria nestes
termos (ver pg 278). O dogma define a Assunção como divinamente revelada, sem indicar como concluiu
Maria sua vida terrena. “O princípio fundamental está constituído por aquele único e idêntico decreto de
predestinação no que, desde a eternidade, Maria está unida misteriosamente, por sua missão e seus
privilégios, a Jesus Cristo em sua missão de salvador e de redentor, em sua glória, em sua vitória sobre o
pecado e em sua morte”.
III PARTE
MARIOLOGIA SISTEMÁTICA
Diante dos posicionamentos ora contra ora a favor da verdade sobre Maria, a teologia sente a
necessidade de dar respostas e explicar as contradições e harmonias, as definições dogmáticas e as
experiências marianas.

I. A mariologia no campo da contradição


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Resulta difícil harmonizar os dados que a respeito de Maria procedem da Escritura, da tradição
teológica, da tradição patristica e do magistério normativo ou dogmático. A mariologia tem se desenvolvido
parelamente a cristologia e eclesiologia, no entanto nos últimos dois séculos fez-se afirmações dogmáticas
sem precedentes, como, o dogma da Imaculada Conceição e o da Assunção de Maria. Um parecer que
excede o âmbito do revelado. Não se encontra dados na Bíblia nem na patrística a respeito dos dois dogmas.
O magistério traiu e não respeitou as normas elementares de fidelidade e obediência a Escritura e a
Tradição?
Hoje se põe em questão a realidade da «concepção virginal» tanto do ponto de vista histórico-crítico
como, de sua centralidade no símbolo da fé. Existem teólogos que se pudessem excluiriam do símbolo da fé
“incarnatus est de Spiritu Sancto ex Maria virgine”. Tendo como chave de interpretação mero
theologumenon ou christologumenon. Desse modo, a virgindade de Maria “antes do parto” seria
insustentável teologicamente. O título de Maria mãe de Deus seria uma divinização ilegítima.
Muitos teólogos, inclusive protestantes contestam a mariologia. O magistério da Igreja está vigilante
sobre esta questão, para evitar o reducionismo teológico dos contestadores.
Além da questão teológica se vê crescer entre os crentes a indiferença afetiva ante a virgindade de Maria,
ante sua maternidade e ante seu mistério. O mistério de Maria e sua própria vida estão intimamente ligados
à existência da Igreja.
Os que contradizem a doutrina mariológica da Igreja optam pelo reducionismo teológico, seja de sinal
escético ou dogmático.

II - A verdade sobre Maria


A Igreja se mostrou desde suas origens, interessada em conhecer a verdade sobre Maria. Ela penetrou na
zona misteriosa de Maria fazendo dela objeto de sua reflexão teológica e sapiencial. Mateus, Lucas e João
dão uma maior relevância e a colocam em importantes contextos teológicos. Os evangelhos apócrifos, em
particular o protoevangelho de Tiago, na época patrística serviram como fonte de estudo sobre a virgindade
e santidade de Maria. Ela esteve sempre presente na espiritualidade do povo de Deus: no culto e no caminho
espiritual. A Igreja a proclamou theotokos. Na concepção virginal de Jesus se descobre o grande símbolo da
filiação divina. Ela foi vista como a nova Eva, que recapitula a primeira e se converte em causa de salvação.
a. Os dogmas marianos
O dogma da virgindade de Maria antes, durante e depois do parto se fundamenta no conhecimento
conatural do mistério de Cristo Jesus que o tem sido concedido. Não é a satisfação de uma curiosidade
histórica que explica a afirmação dogmática, mas é expressão de uma experiência do mistério de Cristo, o
que se deduz que por Ele, Maria foi sempre virgem.
Maria é proclamada theotokos por uma motivação profundamente cristológica, que se baseia na
divindade de Jesus. O conhecimento místico de Cristo tem como conseqüência conhecer o mistério de sua
mãe. A Igreja não tem como referência os dados sobre Maria, mas o conhecimento do mistério de Jesus. Os
56
Padres ligaram a identidade do Filho à identidade da Mãe e que a identidade da mãe se converteu em
símbolo da identidade do Filho.
Os dois últimos dogmas marianos: Imaculada conceição e Assunção de Maria tiveram como
motivações: a gloririficação de Deus, a glorificação de Maria e o bem do povo. Nem todos os teólogos
estavam de acordo com a proclamação dos dois dogmas, mas o acordo fundamental estava no povo que já
celebrava estas festas marianas desde fazia séculos, que se identificava com a liturgia e alimentava nela sua
piedade Mariana. O povo cristão contemplava a Maria, desde sua relação materna com seu Filho Jesus e
viam nela a fonte humana do “todo Imaculado Jesus”, a primeira pessoa redimida, salva e glorificada
totalmente por seu Filho. A devoção mariana, às vezes chegou a excessos, mas a teologia e o magistério
trataram de corrigi. Maria não foi idolatrada, mas reconhecida como a dimensão mais acessível ao sagrado.
Maria tem sido bem patrimonial mais do povo simples e dos santos que dos teólogos. É uma realidade que
se deve levar em consideração quando tratar da hermenêutica das verdades ou definições dogmáticas
marianas.

b. A lógica interna dos dogmas marianos


Os dogmas marianos não são afirmações autoritárias de quatro privilégios de Maria escolhidos
aleatoriamente aos quais lhes acrescentaria outros. São resultados de um processo unitário, de um itinerário
gnosiológico e espiritual, cheio de complexidade. Trata-se de um processo seguido milhões de comunidades
crentes ao longo dezenove ou vinte séculos.
A Igreja age com prudência antes de proclamar um dogma. É inteligente perguntar-se pela lógica
interna dos dogmas marianos, para compreender sua verdade. Eles surgem dentro de um contexto vital,
como exigência da vida. A Maternidade divina, a Virgindade permanente, a Imaculada concepção e a
Assunção não são quatro privilégios com os quais Maria tem sido agraciada, como se pudesse ter sido
agraciada com outros diferentes. Deus a escolheu desde sempre para ser a mãe de Jesus e ela correspondeu
com amor. Portanto, a este mistério sacrossanto respondiam as festas marianas iniciadas no primeiro
milênio.

III - Qual é a verdade e como se chega a ela?


A Igreja tem seguido de modo adequado e legítimo o caminho para conhecer a verdade sobre Maria?
A verdade e a lógica
Para a lógica a verdade evolui à base de silogismo, premissas e conclusões. Considera-se a pessoa como
uma máquina pensante e não como inteligência que sente. De acordo com essa visão intelectualista, a
evolução da verdade sobre Maria dependeria da capacidade silogística dos cristãos, da sábia utilização de
todos os ingredientes teológico-bíblicos que permitiriam um conhecimento mais adequado de sua pessoa.
Os filósofos clássicos e, cristãos, nos diziam que quando nossa linguagem ou nossa forma de atuar
expressa algo que é tal como se comporta na realidade, ou quando nosso entendimento capta adequadamente
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aquilo que entende então acontece a verdade. Afirmavam que o fundamento da verdade intelectual e moral é
a capacidade que tem tudo o que existe de descobrir-se e manifestar-se em si mesmo a mente humana: esta é
a verdade que se confunde com tudo o que é. Tudo o que existe é, por sua vez, verdadeiro, porque depende
da verdade por antonomásia: o princípio absoluto da verdade.
Segundo essa perspectiva, a verdade sobre Maria se produz quando a Igreja expressa em sua doutrina
ou em seus dogmas algo que coincide com a realidade histórica de Maria, quando a mente da Igreja capta
adequadamente o dado objetivo mariano que trata de expor. Sua verdade é necessariamente irradiante, se
exterioriza e as faz conhecer.
1. A verdade e a ecológica
Neste momento do “pensamento débil” da “democracia das verdades”, o tema da verdade não está tão claro
como o pensamento clássico suponha. Muitos pensadores colocam a questão em discursão. A partir de
Newton se pensou que o objeto da ciência era o conhecimento certo; mas na atualidade, demonstra-se que o
conhecimento deve tentar negociar com a incerteza. A lógica aristotélica nos tem ensinado a pensar a partir
da conexão entre causas e efeitos. Deus, nós temos concebido como primeira causa, da que tudo mais é
efeito.

2. O acesso à verdade sobre Maria pela lógica da complexidade


A lógica da complexidade requer um acesso múltiplo à verdade de Maria, que abre mil caminhos sem
absolutizar nenhum. Pode-se seguir a via da simplificação ou da complexidade. Ela esteve sempre presente
na memória da Igreja em seu mistério de vida totalmente transcendente e, sobretudo na vida do povo de
Deus.
1. A verdade como acontecimento
A verdade é um acontecimento da vida, que se assiste e no qual se participa. Para a filosofia clássica,
conhecer consistia em representar uma realidade desde fora, enquanto que para a “ecologia do espírito”,
conhecer é construir a realidade que se pensa, que se vai descobrindo.
2. As simplificações da verdade sobre Maria
A verdade sobre Maria se vai construindo na medida em que me introduzo no mundo que ela é e representa,
no mundo dos testemunhos que se tem dado sobre ela. Os protestantes só aceitam como verdade o que a
Palavra de Deus, o N.T. disse sobre Maria. Uma posição reducionista.
Portanto, a verdade sobre Maria é uma realidade que se vai descobrindo na vida comunitária, eclesial, na que
colaboram não poucos fatores e, cada vez mais, não poucas comunidades.

V. Critérios para interpretar as definições dogmáticas sobre Maria


1. O magistério da Igreja não está sobre a Revelação
A Igreja reconhece a revelação. Um dogma é reposta da Igreja à revelação de Deus. Ela está a serviço da
Palavra de Deus e não sobre ela (DV 10).
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2. Toda afirmação dogmática nos leva a escutar as Escrituras e a compreender em maior


profundidade a revelação
O dogma é um convite a escutar as Escrituras e a Tradição, a descobrir o impacto da
revelação na alma da Igreja em todos os séculos, e em cada um de nós.
A revelação é a proposta de Deus para o encontro com o homem de todos os séculos. A verdade da
revelação se vai realizando progressiva e historicamente na medida em que vai sendo acolhida por diferentes
gerações e comunidade humanas.

3. Escutar a particularidade na totalidade da Sagrada Escritura


A verdade sobre Maria é deduzida nos quatro evangelhos e em sua totalidade bíblica, desde Gênesis
a Apocalipse.

4. Não são novos dados, mas novas perspectivas.


A chave de interpretação dos dogmas marianos deve ser o conhecimento mais profundo das três dimensões:
A Imaculada Conceição (Protológica), Maternidade virginal permanente (histórica) e Assunção (histórica).

5. Cada dogma forma parte de um conjunto de verdades e entre elas há uma hierarquia
A revelação é um acontecimento que culmina em Jesus Cristo. A fonte de todos os dogmas consiste
na fé em Deus Pai, em Jesus Cristo, no Espírito Santo e à Igreja.

6. As afirmações dogmáticas e seu significado em distintos ecossistemas teológicos

As afirmações dogmáticas devem ser entendidas em seu contexto histórico e cultural. Os


ecossistemas teológicos estão em constante evolução.
A Igreja tem se preocupado por descobrir a verdade sobre Maria. Ela faz parte da história da
salvação. Mistericamente está presente na memória e coração dos que crêem. A Igreja tem tratado de chamá-
la de bem-aventurada nos diversos momentos da história. O Espírito tem concedido um conhecimento mais
profundo de sua verdade.

CAPÍTULO X
MATERNIDADE TRANSCENDENTE DE MARIA.
“ET INCARNATURS EST DE SPIRITU SANCTO EX MARIA VIRGINE”

Se Jesus fosse um mero homem, falar de sua origem humana não resvestiria especial importância.
Quando Jesus, entretanto, é reconhecido é reconhecido como Messias, Filho de Deus, Unigênito, Logos de
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Deus encarnado, falar de sua origem humana é surpreendente. Como nasceu o Filho de Deus? Existe alguma
característica especial que manifesta sua procedência divina?
A Igreja sempre confessou (Symbolum Romanum, símbolo niceno-constantinopolitano): Jesus, o
Senhor, nasceu de mulher, da virgem Maria, e que ela unicamente, sem concurso de varão, foi sua origem
nesta terra. A maternidade humana e não a paternidade é o que explica a origem humana do Senhor. Maria é
Theotókos. A expressão “mãe de Deus” não traduz adequadamente aquela antiga invocação. A tradução
exata em latim seria “Deipara” ou “Dei Genitrix”, mas não “mater Dei”. Os dois primeiros termos fazem
referencia à ação de gerar e dar a luz. “Mater Dei” faz referencia à relação permanente que se estabelece
entre mãe e filho. As afirmações de fé da Igreja primitiva e proclamadas no Credo, requerem hoje ser
meditadas, debatidas, clarificadas.

1. “MARIA MÃE-VIRGEM” SEGUNDO OS DOIS MODELOS CRISTOLÓGICOS:


ASCENDENTE E DESCENDENTE.
Dois modos de enterder Jesus Cristo no NT: Paulo e João (cristologia descendente) e sinóticos
(ascendente). A origem humana de Jesus num destes modelos leva a distintas apreciações da figura da “mãe
de Jesus”.

1. Cristologia descendente: a maternidade como “kénosis”


Paulo e João falam de uma modalidade da existência divina de Jesus: preexistiu como Logos, como Filho
de Deus, antes de ser viando ao mundo. O Verbo eterno de Deus foi enviado ao mundo e assumiu a
existência de uma criatura humana. O Filho de Deus como salvação do mundo.
A origem humana de Jesus é explicada nesta cristologia como “kenosis”, “anonadamiento” ou
“abajamiento”. Para Paulo a figura de Maria não comporta nenhuma importância especial. É tal a admiração
que produz o abaixamento do Filho de Deus, que não presta particular atenção a sua origem materna ou
paterna. São irrelevantes seus pais e seu nascimento virginal. A origem humana de Jesus não é devida ao
Espírito, mas a ação do Pai que envia o Filho, ou a ação do mesmo Filho que assume a carne humana. Para
João, a Palavra se fez carne sem proceder da vontade da carne. Ela é gerada por Deus. João falara
unicamente de “mãe de Jesus” e nunca de Maria.
Esta perspectiva cristologica entrou grande acolhida nos Padres gregos. Neles, ao contrario, a figura da
mãe adquiriu grande relevância sobretudo para combater a negação gnóstica da encarnação.

2. Cristologia ascendente: a maternidade virginal como “símbolo”


Os sinóticos partem de baixo, do homem concreto que é Jesus. Eles não perguntam como o Filho
eterno do Pai se fez homem, mas como este homem pode ser chamado e ser Filho de Deus. Não lhes
interessa nenhum tipo de preexistência. Mt e Lc tentam unicamente explicar como este homem, Jesus de
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Nazaré, é o Filho de Deus desde o momento de sua concepção. Jesus é varão não graças ao varão, mas ao
Espírito que produz em Maria o ser-homem de Jesus, e, ao mesmo tempo, seu ser “santo” e “grande”, seu
“ser Filho de Deus”, seu “nome”. Na origem de Jesus segundo Mt e Lc não existe causa segunda, não existe
ato de geração humana. O homem Jesus existe só “do Espírito Santo... ex Maria virgene”. Esta cristologia
supera a cristologia adocionista, pois não houve tempo em que Jesus não fosse Filho de Deus; foi concebido
assim por obra do Espírito no seio de Maria, a virgem. Os prólogos cristológicos dos sinóticos têm uma
enorme importância para a compreensão de todo o Evangelho. Oferecem a grande chave de leitura na
origem humana de Jesus: “de Espírito Santo ex Maria Virgene”.

2. A síntese das duas perspectivas: o símbolo da fé.


Alguns teólogos protestantes insistem na diferente perspectiva dos dois modelos cristológicos para
desvalorizar a crença na concepção virginal de Jesus. Emil Brunner: a fé na preexistência torna
desnecessário o recurso à concepção virginal. Wolfhart Pannenberg: sustenta que o relato da concepção
virginal surgiu como correção a uma cristologia adocionista, segundo a qual Jesus começou a ser Filho de
Deus da descida do Espírito sobre ele no batismo. Os relatos, entretanto, dizem que não foi assim. O Espírito
desceu sobre Jesus antes, em sua concepção. A cristologia foi retroagindo. Pannenberg vê no paralelismo
Eva-Maria um perigo: atentar contra Jesus, o único representante da humanidade de Deus, fazendo de Maria
outra representante igualmente válida.
Estes teólogos advertem justamente as diferenças existentes entre as duas linhas ou concepções
cristológicas fundamentais do NT. Entretanto, elas não se contradizem, mas se completam mutuamente. A
Igreja primitiva fundiu a perspectiva da preexistência com o nascimento por obra do Espírito na virgem. O
“incarnatus est de Spiritu Sancto ex Maria virgine” é a síntese dogmática e crente. Suscitou muitas reações:
para uns é desnecessária, impossível, mito, secundária, para outros absolutamente necessária.

II. “EX MARIA VIRGINE”: UM DEBATE AMPLO.


Por que enquanto para uns este artigo de fé é necessário e para outros é impossível, explicável (mas
não histórico), desnecessário e secundário?

1. Desnecessário à causa do pecado original


Para Agostinho o pecado original se transmitia através do prazer da geração, da libido. Com Jesus
não assim, porque foi concebido virginalmente. Isto é o que ratifica o relato da concepção virginal. Detrás
desta teoria está a desvalorização da sexualidade humana e materialização do pecado. Nunca foi aceita pela
doutrina oficial da Igreja.
Schleiermacher se assemelha a Agostinho. O pecado original distanciou a humanidade de Deus. A
reprodução natural também está sob este influxo. Por isso, a atividade sexual não pode germinar o Redentor.
É necessário um ato criador suscitado por Deus sobre a pessoa nascente de Jesus. A geração natural nunca
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obteria tal resultado. Paul Althaus: o nascimento virginal é uma parábola, mas não uma condição real da
nova criação de Deus. O artigo de fé é entendido como formulação parabólica da importância de Jesus como
novo adão; a essência da pregação é a ressurreição de Cristo. A fé da Igreja primitiva é pascal, sem
nascimento virginal. Enfim, esta é a forma generalizada do protestantismo moderno.

2. Impossível, absurdo!
A concepção virginal contradiz a concepção mecanicista do mundo e nega a plena humanidade de
Jesus.
a) Dentro de uma concepção mecanicista do mundo
Iluminismo, deísmo: a concepção virginal “é a mais vistosa desviação de todas as leis naturais”
(Strauss). A teologia não soube responder adequadamente e contentou em afirmar o poder de Deus para
realizar milagres oportunos. Entendia os milagres como intervenção nas leis da natureza e ruptura de sua
lógica interna.
b) Porque pressupõe a negação da plena humanidade em Jesus
Emil Brunner: um ser gerado sem pai pode ser verdadeiramente homem? Na doutrina da concepção
virginal existe um certo docetismo unido à desvalorização da geração sexual própria do ascetismo helenista.
Aquela concepção favoreceu o ascetismo monástico e um culto a Maria alheio à Bíblia.

3. Explicável, mas não histórico, mas sim mitológico e arquetípico.


Exegese histórico-crítica: intencionalidade do relato e seu gênero literário.
a) A insuficiência de informação histórica
Não temos testemunho pessoal de Maria e de José. Emil Brunner: o relato não pode proceder de
Maria ou de uma fonte próxima a ela. Porque as genealogias de Jesus remete só a paternidade masculina?
Por que a família de Jesus se manifesta cética em relação a ele (Mt 3,21)? Por que todos os outros
testemunhos bíblicos se calam a respeito? A resposta é: porque criam na eterna filiação de Jesus desde Deus.
Paul Althaus: a historicidade do natus ex de virgene não pode ser demonstrada nem rejeitada, porém
a dogmática não tem argumentos para afirmar este dado, do qual temos poucas noticias na Escritura.
b) A explicação mítica
Defensores: David Friedrich Strauss, A. Harnack, J. Hilmann, M. Dibelius. O mito dava expressão
lingüística a determinadas representações, esperanças, aspirações e idéias religiosas. Por suas características
literárias, o relato da concepção virginal não tem caráter histórico e expressa de forma mítico-legendária a fé
em Jesus como grande homem de Deus.
c) Explicação antropológico-psicológica
Feuerbach: o relato da concepção virginal seria explicável como projeção antropológica ou psicológica
do ser humano. Os primeiros cristãos projetaram seus sonhos de família no amor profundo do Pai e Filho.
Para completar a família divina sentiram a necessidade de uma terceira pessoa (feminina).
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Jung: explicitou mais que Feuerbach o caráter projetivo do relato. A “criança divina”, nascida da
virgem, é um protótipo, uma dessa imagens que ficaram armazenadas no inconsciente e que nos foram
transmitidas geneticamente desde tempos remotos. É um grande símbolo do não-gerado, do não-feito em
nossa psique individual ou coletiva.
Drewermann: psicoterapeuta, interpreta o relato na perspectiva de Jung. O relato do nascimento e
infância do salvador representa os estágios que cada ser humano tem de recorrer necessariamente na vida
para encontrar a si mesmo, tendo a Deus como ponto de partida. Descreve o território e o drama de nossa
própria alma na busca de sua identidade.

4. Um elemento secundário dentro da fé da Igreja


Teólogos católicos recorreram à doutrina do Vat II sobre a hierarquia de verdades (Unitatis
Redintegatio 11). A virginitas ante partum não seria comparável com a verdade da ressurreição, fundamento
da fé cristã.

III. “EX MARIA VIRGINE”: A RESPOSTA


Ante aquelas objeções que resposta hoje a teologia pode dar? Devemos nos contentar em explicar o
artigo do Credo “et incarnatus est de Spiritu Sancto ex Maria virgine” de forma tíbia, desapaixonada e
esceptica? Concordaremos com Hans Küng (“o relato da concepção virginal é um símbolo”)?

1. Não o pecado original, mas a graça original!


A concepção virginal não é requerida para evitar em Jesus a transmissão do pecado original. A
doutrina de Agostinho nunca foi assumida pela Igreja. Mt e Lc não vão nesta direção. A finalidade do relato
é mostrar como o fato único da origem do Filho de Deus leva em si uma forma única de geração humana. O
fato de não ser uma concepção sexual bilateral para a gênese de seu Filho é um grande sinal da graça.
Ninguém ganha de Deus! O ser humano nunca poderá merecer seu redentor e muito menos gera-lo. No AT a
virgindade não é poder, mas debilidade, incapacidade de gerar. Aqui é o ponto de partida do mistério da
Natividade. A pobreza virginal de Maria é o sinal do ágape divino. Não é portanto, a libido como
transmissora do pecado o motivo que faz necessária a concepção virginal. É a graça e nada mais.

2. Porque impossível e absurdo?


a) Quem decide a concepção virginal é o Deus Criador
Os racionalistas afirmam ser absurdo a concepção virginal. A teologia tem dado respostas
apressadas, recorrendo ao voluntarismo de Deus. Hoje estamos em melhores condições. A eco-teologia
conta como o evento surpreendente dentro da eco-evolução do mundo; conta com o inexplicável, o ilógico,
mas sim eco-lógico. A relação entre Deus e o mundo está sobre o sinal da complexidade: porque é imanente
até o máximo e transcendente até o máximo. O funcionamento do mundo é categoricamente autônomo e
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transcendentalmente heterônomo. O milagre é entendido como ação de transcendente em sua criação, sinal
de sua presença, de seu senhorio, de sua vontade, de seu reinado. Pode dirigir o mundo sem destruir a
eficácia de sua própria criação. Enfim, o que se contrapõe não é ciência e fé, mas duas concepções
filosóficas da realidade.
b) O Espírito de Deus é quem faz Jesus plenamente humano
Calcedônia: duas naturezas em Cristo perfeitas, não mescladas. Isto não supõe a negação do
nascimento virginal? Como poderia ser igual a nós sem pai humano?
O Logos, o Verbo, é igual a nós no ser humano que assumiu, mas não é igual a nós no modo como se
fez homem.

3. Histórico e simbólico: o grande mito do novo Gênesis


A informação-documentação que possuímos para afirmar a concepção virginal como fato histórico e
real é insuficiente? É excessivo conceder tal realismo histórico ao que parece fora de nossa verificação?
a) As tradições e os prólogos cristológicos
Coincidência total entre Mt, Lc e Jo: a concepção virginal nos prólogos. Os evangelistas não pedem
interpretações simbólicas; querem transmitir um fato histórico, real; nos transmitem uma ruptura no modo
normal da geração dos seres humanos; não existe aversão a uma possível concepção não-virginal.
H. Schürmann: a notificação do fato histórico da concepção virginal proveio de uma intima tradição
familiar, em ultima instancia de Maria e Jose, e que, pela natureza do assunto, um fato assim se contaria ao
principio com muita reserva e se transmitiria em pequenos círculos. Demorou para que chegasse aos grandes
centros eclesiais. Lucas e Mateus elaboraram uma construção literária e teológica para dizer que Jesus
realmente é Filho de Deus desde sua concepção.
R. E. Brown: o fato foi conhecido desde os tempos de Jesus. Os cristãos, para explicar que Jesus não era
fruto do pecado explicavam de forma positiva: “por obra do Espírito Santo, Maria concebeu virginalmente”.
O interesse primário de Mt e Lc e teológico e cristológico.
J. de Freitas Ferreira: para ambos (Mt e Lc) o milagre da concepção deve ser atribuído ao Espírito Santo.
Ato insondável da onipotência de Deus, de seu poder criador, do Espírito. A concepção virginal não é um
ato constitutivo da filiação divina de Jesus, mas um sinal de sua origem divina.
b) Se relata um fato incomparável e único
Todos os que estudaram a fundo cientificamente os relatos da concepção percebem que não há
dependência literária e ideológica com nenhum mito da antiguidade. Não temos informação para chegar à
fonte originária de informação, mas podemos supor que a fonte primaria só pode ser Maria.
c) A legítima re-mitologizaçao de uma história real
Resposta à explicação da concepção virginal como projeção antropológica-psicológica: a Bíblia é
história e não mito. Ela é um documento único na história das religiões, pois faz uma crítica radical dos
mitos em nome do único Deus. Na religião bíblica o eterno aparece no tempo. Cuidado com o monopólio
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psicanalítico na interpretação da SE, que dilui a figura histórica, singular e inconfundível, de Jesus de
Nazaré no estado anímico de qualquer pessoa.
4. Um artigo de fé cristológica fundamental
a) A não-equiparação entre paternidade de Deus e maternidade de Maria
“Nascido da virgem Maria” é uma confissão de fé que proclama que um indivíduo humano, Maria,
por meio de sua fé, gerou o Messias e que, através dela, Deus mesmo se comunicou plenamente ao gênero
humano. Uma maternidade que transcende qualquer outro tipo de maternidade. J. Ratzinger: “A filiação
divina de Jesus se baseia, segundo a fé católica, não no fato de que Jesus não teve pai humano. Não é um
fato biológico, mas ontológico”.
b) Jesus não é um deus transformado em homem
O ser de Jesus enquanto Filho de Deus consiste no fato de que existe como ser humano
exclusivamente graças a Deus em um sentido absoluto, e não condicionado por uma cooperação criatural
dos pais. Para os Padres a virgindade de Maria era o sinal da Encarnação, que manifestava que Jesus era
filho de Deus (transcendência) e, ao mesmo tempo, filho de uma mulher (imanência).
c) Entre o documento histórico e o testemunho autêntico da fé
Mt e Lc mostram que todo o ser de Jesus está sob a ação do Espírito, desde seu nascimento. O que eles
nos transmitem é mais importante que o testemunho pessoal e histórico de Maria. Ela não receber o
ministério do testemunho apostólico, que ficou reservado aos apóstolos. A validade teológica do “et
incarnatus est de Spiritu Sancto” depende na medida em que ele procede da pregação e tradição apostólica.
O “ex Maria virgine” fica situado num marco de impressionante riqueza teológica. O reducionismo
biologista do fato é pornografia teológica. O importante é contemplar o mistério em sua totalidade. A via de
acesso ao mistério da encarnação virginal é a acolhida do testemunho da fé.
d) É essencial ao Credo este artigo de fé?
Sim. O dogma da concepção virginal é uma confissão do ilimitado caráter secreto do vere Deus vere
homo e da incomensurável maravilha do temor reverencial e da gratuidade que sentimos. A virgindade de
Maria num sentido global, que abraça sua existência espiritual-corpórea, é sinal real do fato de que este
homem Jesus, no qual Deus se faz presente, não pode ser o resultado das potencialidades da criatura.

IV. MATERNIDADE VIRGINAL NO PARTO


A Igreja entende a virgindade de Maria no âmbito global da maternidade.
1. As razoes de uma crença
Posicionamentos:
- É absurdo falar do parto virginal. não valoriza os mecanismos naturais postos pelo Criador na biologia
humana. Priva Jesus da autentica humanidade.
- Modo popular e imaginativo, revestindo o acontecimento de prodígios e milagres. Ex: Protoevangelho
de Tiago.
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- Se Maria é a nova Eva como conceberia ao novo Adão tal como a antiga Eva, por maldição, concebia
seus filhos? Deste modo a crença na virgindade no parto foi se impondo como doutrina comum.
- Teologia: deve fazer uma elaboração crítica e não se levar por impressões do momento.
- A doutrina sobre a virginitas in partu: proposta pelo Magistério ordinário e extraordinário.

2. O parto da Theotokos: interpretação da “virginitas in partu”


- Reduzir a afirmação de fé a definições fisiológicas é reducionismo, seccionar uma realidade viva.
Interpretar com outras chaves.
- O mais importante é a maternidade, não a virgindade. O substantivo é mãe, o adjetivo virgem. É a
virgindade que está a serviço da maternidade transcendente de Maria e não vice-versa. Mas também não é
virgindade abstrata.
- O mais importante nesse parto não é o desenvolvimento fisiológico dele, mas a relação que se
estabelece entre mãe e filho. Nesse momento, Maria não deixa de ser mãe-virgem, não deixa de dar a luz ao
filho de Deus, não deixa de ser o que precisamente é: a Theo-tokos. O que faz tal parto inigualável é o
nascimento do Filho de Deus. Dor ou sem dor, ruptura ou não do hímem, são aspectos sobre os quais não é
necessário falar, mas que por respeito ao mistério, não haverá o que mencionar. O importante é afirmar a
conexão entre a concepção virginal e o parto como momento expressivo e culminante da concepção.
Processo unitário correlativo. Maria não é bem-aventurada pelo seu seio mas porque acolheu a Palavra e pôs
em prática (Lc 11,27). O parto não é objeto de fé enquanto acontecimento fisiológico-biológico, mas
enquanto acontecimento espiritual-pessoal: Maria-Cristo.
- Com Maria emerge um novo gêneses, um novo mundo que supera a maldição (distância homem-Deus)
do primeiro (Gn 3, 16-19).

V. MATERNIDADE VIRGINAL PERMANENTE


1. Outro ponto de debate: mãe só de Jesus?
- Algumas confissões cristãs negam esta doutrina para acentuar a centralidade Cristo e acabar com
qualquer forma excessiva de culto a Maria como Mãe de Deus.
- Exegetas e teólogos: alguns, católicos e protestantes, se vêem encurralados ante uma crença
bimilenaria na Igreja e sobre a qual não podem dar razões convincentes. Optam por dizer que os irmãos de
Jesus são “físicos”, de sangue. Rejeitam outra solução.
- Indiferença: recorrem à hierarquia de verdades. Reflexão secundária.
- Todas estas posições negam a maternidade virginal de Maria como sua grande missão nesta terra e,
com isso, uma certa destruição de sua figura e seu significado na historia salvífica.

2. Que motivos foram dados para falar da virgindade permanente?


- Padres (exceto Tertuliano): defendem a virgindade permanente de Maira. Os “irmãos de Jesus” eram
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filhos de um matrimônio de José (evang. de Tiago). Jerônimo: os irmãos na verdade eram primos de Jesus.
Orígenes: a virgindade permanente era o resultado, o efeito co-natural da consagração do Espírito que Maria
recebeu para ser mãe de Jesus. Enfim, para os Padres existe uma compreensão global da maternidade divina
de Maria, qualificada como “virginal”.
- Os argumentos a favor, do ponto de vista histórico e literário, são insuficientes. Então, a solução é não
emitir nenhum juízo?

3. A razão da “sem-razao”
- Pode haver razão dogmática que supere a falta de razão histórica?
- Virgindade permanente de Maria: confissão de fé desenvolvida nos séc. II, II, IV e definida no V. A
chave teológica é a concepção virginal. Tudo deriva daí: parto virginal e vida virginal. a Igreja sabe por
experiência que quando uma pessoa é tocada por Deus, ex: Paulo, fica para sempre entregue a Ele. Maria de
Nazaré, surpreendida pela Graça e envolta pessoalmente no mistério da concepção de Jesus por obra do
Espírito, acolheu um Fiat generoso a missão recebida; se entregou sem reservas à maternidade virginal; esta
experiência marcou-a de tal maneira que sua vida adquire sentido deste fato. Nunca deixou de ser virgem.
Qualquer novo acontecimento se integrava à experiência central.
- Quem encontrou o Amor irá por aí mendigando afetos?
- Quem foi agraciada com a mais impensável e sublime maternidade, pensará em colocar seu corpo a
serviço de outra maternidade física, esquecerá o Espírito para seguir o ritmo da geração humana?
- Afirmações sobre a maternidade virginal de Maria resultam de uma sabedoria espiritual coletiva.
Descobriram no “sempre virgem” o paradigma de toda autêntica experiência vocacional que envolve toda a
vida, lhe dá sentido e unidade.

4. Maternidade virginal da esposa de José


- Maria é virgem no contexto da maternidade, da esponsabilidade e da família. Sua virgindade é
paradigmática: sinal para casados, solteiros e celibatários.
- Na relação esponsal de Maria com José ficou cancelada a condenação de Gn 3,16. Por amor do Reino,
Maria, a mulher totalmente possuída pelo Espírito, aceitou ser acolhida na casa e na convivência de Jose e
estabeleceram uma vida de comunhão. O amor do Reino tem a capacidade de transfigurar o Eros e converte-
lo em veículo de oblatividade, de êxtase, de entrega abnegada ao mutuo serviço e, sobretudo, à atenção
esmerada à nova vida que se desenvolve na família: Jesus. Para Maria, a virgindade não é isolamento, mas
relação, comunicação.
- O pecado destruiu a comunhão e afetou a entranha do matrimônio. O eros e o thánatos (personificação
da morte) são os grandes símbolos dessa situação existencial. Jesus, Maria e José formaram a primeira
comunidade do novo Gêneses.
- Maria viveu sua virgindade desde a castidade, virtude e força do Espírito Santo: unificada, pacificada,
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íntegra em todo seu ser. Sua castidade virginal foi força integradora, que unificou a Maria em sua relação
pessoal com Jesus e com José, sua família, e que integrou sua pessoa em seu próprio ser.

VI. MARIA, A MÃE DO FILHO DE DEUS.


Os pensadores medievais plasmaram a sentença “tota mulier in útero”. Reduziam o ser da mulher a
mero receptáculo passivo, disposto a receber o sêmem ativo masculino. Esquilo: “a mãe é um vaso onde o
germe do pai se desenvolve”. Mas no principio não foi assim, a mulher era entendida como o lugar da
fecundidade, da regeneração física e espiritual. Ex: Grande Mãe na mitologia.

1. Vocação de mãe
O relato da anunciação de Jesus em Lucas tem a estrutura de um relato de vocação: a vocação de
Maria e a maternidade (messiânica). Maternidade plena (Lc 1,31), pneumática e virginal.
a) O mistério da maternidade física
- Para que Maria é com-vocada? Deus quer dispor dela, de seu corpo, para fazer dela a mãe de seu
Filho. Deus predispôs que seu Filho nascesse de mulher (Gl 4,5).
- Impossível duvidar do realismo desta maternidade. Jesus realmente foi gerado por ela e posteriormente
educado e atendido por ela. A maternidade leva em si relações pessoais e vitais muito significativas entre
mãe e filho; leva em si toda amplitude do ser humano, que vai desde a célula biológica até a pessoa livre.
Enfim, se converte em relação pessoal. Maria é para sempre a “mãe de Jesus”. O levou sempre em seu
coração.
b) Maternidade a partir do amor e da fé
- Maria realizou a maternidade em liberdade, com um admirável espírito de reflexão, de acolhida
consciente, de fé. Medita os acontecimentos e os correlaciona. “Maria concebeu em seu espírito antes que
em seu seio” (Sto Agostinho).
c) Missão à maternidade, chamada a transcender-se
- A vontade de Deus pediu a Maria que entregasse a Ele seu Filho, que aceitasse desprender-se dele.
Durante o ministério de Jesus Maria se situa entre o autênticos seguidores dele. Aos pés da cruz recebe a
missão de testemunha silenciosa da humanidade de Cristo. Em pentecostes está com a Igreja.

2. Theotókos, Mãe de Deus


- A origem humana de Jesus não se reduz unicamente a Maria. Nasceu de Israel, de sua história e
cultura. Revela o sentido do AT, o enche de transcendência, simbolismo e significado. Quando Jesus é
reconhecido como Messias, como Filho de Deus, a figura de Maria adquire um novo significado. Depois da
Páscoa sua figura recebe um trans-significação.
- Gerou um homem que é Deus, ela é Theo-tókos. Este termo indica uma formulação hiperbólica, que
indica que, através da maternidade Maria, a humanidade recebeu a máxima autocomunicação de Deus;
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indica que uma mulher foi de fato a mãe do “Filho de Deus” (Lc 1,32).

CAPÍTULO XI
A santidade de Maria, princípio e fim.

Maria mãe do Messias, mãe do Filho de Deus. Através dela o espírito concebeu em nossa historia e
trouxe-nos Jesus nosso Salvador. Maria foi a primeira conquistada pela graça e é com certeza um ponto de
referência para os que querem experimentar o amor de Deus.
Não podemos refletir sobre a santidade e a Imaculada Conceição de Maria vendo isso como um
privilégio seu, mas como graça de Deus a qual Maria esteve aberta. Tudo o que aconteceu a Maria nos
interessa, porque nos traz em verdade a salvação que nós necessitamos. Os dogmas marianos não podem ser
compreendidos quando se reduzem a especiais condecorações de Deus a Maria que Deus reconhece e por
isso recompensa-la a mãe de Jesus Cristo. Os dogmas são sim símbolos da totalidade do projeto de salvação
de Deus: a totalidade numa parte.
João Paulo II, em sua encíclica Redemptoris Mater, interpreta o relato da vocação-anunciação de Maria
a luz de Efésios 1,3-7, que fala para com cada um de nós e esta se realiza em Cristo Jesus que fomos eleitos
antes da criação do mundo. Assim, todos nós somos chamados a santidade, remidos pelo sangue de Cristo
somos chamados a um dia estarmos com ele nos céus. Quando tudo isso é dito de Maria fica claro que
Maria não está situada fora de nossa humanidade ou de nossa historia, fora do povo de Deus. A graça que
faz de Maria mulher bendita é a mesma que faz bendita a humanidade. Maria não é privilegiada, exceção, é
sim uma expressão máxima da bondade amorosa de Deus Pai sobre o mundo.

Maria envolvida pela graça de Deus


Maria cotidianamente envolvida com o mistério de Deus, não podia ser de outra maneira. Todas as
suas obrigações de mãe levavam a um contato direto com o Filho de Deus, pensar nele, cuidar dele e por
isso podemos afirmar que estava assim envolvida pela graça.

1. O mistério da santidade de Deus


A santidade é a transcendência de Deus, sua plenitude e seu poder. Não é um objeto concebível como
realidade, é inalcançável para nossa razão e sensibilidade. Nós só podemos ir a Deus quando ele se revela e
auto se comunica, porém, quando faz isso não deixa de ser Deus apesar de o conhecermos não superamos o
grande mistério, temos acesso a uma dimensão do divino, enquanto outra certamente maior permanece
oculta.
A santidade de Deus é dinâmica, ativa, se impõe e se realiza. A santidade de Deus é sua glória
escondida. Sua glória é sua santidade descoberta.
No Novo Testamento Jesus é a imagem humana do santo, é a revelação mais transformadora da
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santidade de Deus no humano.
A santidade de Deus consiste no fato de o Pai ter gerado o Filho. Enquanto o Espírito é a santidade
divina em pessoa, como diziam os padres da Igreja, o Todo santo, o Espírito é o dom de Deus.

Chamados a santidade
Não se é santo por natureza, por essência, mas por participação. O único santo é Deus. O termo santo
indica uma relação de pertença total a Deus.
O que torna difícil no mandato divino que o homem seja santo é o fato de que não se trata de adquirir
uma conformidade moral com Deus, mas sim uma correspondência ontológica com ele. Para entrar nesta
esfera de santidade é necessária uma purificação, uma consagração. Santo é o que pertence a esfera de Deus.
Ser santos como Deus é lei do Espírito é o resultado do dom da imanência do Espírito Santo em nós. Só
o Espírito nos purifica de toda mancha.
A santidade de Maria
Maria teve a graça de participar na geração do Filho de Deus neste mundo. A santidade divina a
cobriu com sua sombra e a consagrou. Maria foi santa na consagração maternal ela é a “Imaculada
Conceição”.
Maria gera o Filho de Deus e cobrindo-a com sua sombra, o Espírito impregnava o coração da
serva do Senhor. A união de Maria com o Filho esteve estreitamente vinculada a sua união com o Espírito
Santo. A cheia de graça recebeu a plenitude do Espírito Santo com todo o conjunto de seus dons.
Santidade radical e original
Falar da santidade de Maria parece algo duvidoso sem provas documentais, porém é algo presente e com
uma firme convicção nos padres da Igreja. E ainda nas distintas Igrejas tanto do Oriente quanto do Ocidente
e isto se dá depois de uma olhada profunda a Maria no mistério da encarnação e na sua resposta de fé a
graça. O sim de Maria tem uma grande dimensão, dimensão esta que afeta toda a história da salvação.
A santidade de Maria foi expressa de diversas maneiras, no Oriente em termos de teologia total e
perfeita e no Ocidente em termos de preservação do pecado original.
Como o projeto criador e redentor de Deus querem que sejamos santos e imaculados e como somos
manchados pelo pecado original lutamos a cada dia para dar a Deus uma resposta positiva de amor e
correspondência ao seu chamado. Maria foi esta que durante toda sua vida correspondeu a esse projeto de
santidade de Deus, vivendo conforme a sua condição ontológica, foi assim à perfeita consagrada pelo
Espírito, como expressão de “Imaculada Conceição” do Filho de Deus.
Santidade permanente
Maria foi agraciada com a revelação do nome de Deus, o santo aproximou-se do ser de Maria e foi
integrado ao seu nome. Jesus o Filho de Maria é o santo por excelência. Mesmo sem conhecer totalmente o
mistério de Deus, Maria viveu na fé e conservou tudo em seu coração.
A santidade de Deus, sua glória escondida se difunde sobre Maria e ela em correspondência era ativa na
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fé, faz de Deus o seu Senhor e o glorifica.
Para os santos padres a verdade do ser humano se revela na encarnação-Jesus Filho de Deus e também
em Maria nova Eva.
A santidade de Maria não é principalmente uma santidade moral, mas ontológica, é a santidade da
presença do Espírito de Deus nela. Voltada para este vive em pureza, em fé e caridade como autêntica
propriedade de Deus. É santa porque pertence a esfera de Deus.
Bases históricas
Tendo surgido diversos questionamentos quanto à definição dogmática da Imaculada Conceição
devido à ausência de certos termos relacionados a este dogma nas Escrituras e até mesmo na tradição
patrística ocidental. Diante de todo este panorama de duvidas a Igreja apresenta alguns dados históricos
com bases na teologia.
Como resposta às questões feitas quanto a Imaculada Conceição de Maria devemos voltar a
atenção às únicas bases históricas das quais dispomos e também as bases teológicas que são oferecidas.
A única base bíblica é a imagem com a qual nos dispomos numa leitura atenta e global do Novo
Testamento a luz do Antigo Testamento. Dois fatores que nos ajudam nesta compreensão.
Maria é a mãe de Jesus, o santo, o grande, não só pelo fato de sua virgindade mas sim pela
presença do Espírito Santo e o poder de Deus que nela atua. A outra é que Maria não é mãe de forma
passiva, mas o seu sim é inquebrantável. Maria ao contrário de Eva creu e obedeceu e por isso é apresentada
pelos padres apostólicos como nova Eva, mãe de todos os viventes. Outros a identificam como a Igreja santa
e Imaculada.

Fundamentação teológica
Esta ressalta que o dogma que proclama a Imaculada Conceição de Maria em sua concepção,
não quer dizer que o momento no qual o ser humano é gerado seja pecaminoso, pois a geração é um ato
da criação divina.
O dogma, contudo, faz menção ao pecado original e a preservação de Maria dele. E como a Igreja
afirma o pecado original não é uma herança biológica, mas sim que Adão tendo recebido a santidade e
justiça original não só para ele, mas para toda a natureza humana e cedendo ao tentador Adão e Eva
cometem um pecado pessoal que afeta toda a natureza humana e assim o pecado é transmitido por
propagação a toda a humanidade.
Experimentamos o pecado original como influencia de múltiplas mediações negativas que
impede o homem de uma comunhão com o projeto de Deus.
Quanto a Maria não se quer dizer que isenta do pecado original na sua concepção ocorrera um
fenômeno biológico especial, pois o pecado original não é uma herança biológica. Nem tão pouco porque
Deus deixou de colocar nela o pecado, pois, este não é castigo de Deus. Isenta de toda mancha de pecado
quer dizer varias coisas entre elas: Maria recebeu uma liberdade liberada não passível e volúvel entre o
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bem e o mal. Maria emergiu um novo tipo de mulher, recebeu a graça, energia de Deus. A graça
sobrenatural do seu Filho Jesus. Em seu Filho Jesus Maria tinha a fonte do seu ser. A nova mulher que
nasce de Adão. E a Igreja nascida do lado aberto de Cristo.
Maria situada na historia dos homens onde estava a dramática batalha do bem e do mal é
preservada das forças do mal e habilitada para vencer as forças e mediações negativas pela graça de Deus.
Segundo a definição dogmática Maria foi preservada “por singular graça e privilegio de Deus onipotente, em
atenção aos méritos de Jesus Cristo salvador do gênero humano”.
Assim a existência de Maria deve ser considerada como uma existência de comunhão total com
Cristo desde a origem até ao fim. Com a salvação Cristo converte-se no sacramento de Deus salvador,
também parta Maria Jesus Cristo é o libertador.

A Igreja está autorizada para afirmar tudo isso de Maria?


A Igreja fixando os olhos em Maria no decorrer dos séculos faz uma “leitura patológica” do dogma da
Imaculada Conceição. Contemplando Maria como aparece no Novo Testamento. Pergunta-se assim pela
raiz-principio (em sentido ontológico e cronológico) de tudo o que a ela sucedeu. Movida pelo Espírito
Santo e guiada pela palavra de Deus, descobriu que toda criação cristã tem sua pré- historia “Deus nos
chama desde o ventre materno” como afirma Jeremias, assim foi a vocação de Maria: foi eleita para ser a
mãe do Salvador e a promessa de que Deus nos chama para sermos santos e imaculados diante dele realizou
de modo especial em Maria. Se Maria pronunciou um sim, um Fiat, incondicional a palavra de Deus, foi por
resposta a todos os dons em sua vida e assim foi agraciada e a Igreja a reconhece como nova Eva.
O mistério da Imaculada Conceição de Maria é o mistério do admirável chamado de Deus e de uma
resposta humana.

Simbolismo do dogma
A) Significado cristológico do dogma
Proclama antes de tudo que Cristo é o redentor. Maria foi o protótipo, a primícia da redenção.
A Igreja apresenta uma experiência integral da redenção-salvaçao e isto se realizou de forma
paradigmática em Maria por obra do Espírito Santo e de Jesus. Já que Maria viveu sua vocação-anunciaçao
em verdadeira comunhão com Jesus seu salvador. Foi, portanto esta comunhão com o Filho e a ação do
Espírito Santo que a preservou do pecado.
Esta profunda intimidade com o Filho foi como que um remédio contra todo pecado e uma semente da
graça que em Maria foi crescendo.
B) Significado eclesiológico do dogma
O dogma nos ensina como fomos salvos, não só libertos do pecado, mas, sobretudo preservados.
Maria não foi à única preservada, mas sim a primeira. É a obra mestra da redenção, mas não é a única.
A redenção de Jesus é universal e afeta a todo homem e isso é o que nos indica o dogma.
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K. Rahner afirma: “O segundo Adão é muito mais poderoso sobre todo novo ser que nasce que o influxo
do primeiro Adão. Batalha entre a graça e o pecado, porém, onde a graça escatologicamente já é
vitoriosa”.”Isto vale não somente para os cristãos, mas para todos os homens de boa vontade” (GS 22).
Maria a primeira crente é por isso mesmo “Igreja nascente”. É a Ecclesia immaculata. “Maria é para a
Igreja um modelo permanente” (Redemptoris Mater 42).
Assim a Igreja reconhece em Maria a mais perfeita imagem, quando ela diz “sim” a palavra é vista como
um exemplo vivo de comunhão com Cristo redentor e com o Espírito Santo.
C) Significado pneumatologico: Maria a consagrada pelo Espírito Santo.
O dogma expressa ainda que desde o inicio mesmo de sua existência, Maria se viu agraciada pela
comunicação do Espírito Santo, sem mérito algum de sua parte e desde aí preservada do pecado original e de
qualquer pecado pessoal.
Teria o Espírito Santo a santificado desde o ventre materno desde o primeiro instante de sua concepção.
Assim a Igreja afirma que Maria não foi consagrada só no momento da sua anunciação-vocaçao como nos
relata Lucas, mas desde o instante de sua concepção. Isto conforme ensina a Igreja se deu de maneira
permanente até o fim de seus dias aqui na terra.

Assunção de Maria em corpo e alma ao céu.


Como no caso do dogma da Imaculada Conceição, o ponto de partida só pode ser a imagem
bíblica de Maria, lida e interpretada numa chave unitária.
Sobre a morte ou possível sorte final de Maria não se diz nada no Novo Testamento. Nenhum dos
evangelistas teve interesse de narrar algo relacionado aos últimos dias de Maria na terra.
Já na escatologia do período intertestamentário se admite a possibilidade de ressurreições
individuais. No Novo Testamento isso se deu de forma culminante em Jesus Cristo, apesar de São Paulo
afirmar que se não há ressurreição dos mortos, tão pouco Cristo ressuscitou, assim Paulo afirma que a
ressurreição dos mortos é inicio e fundamento da ressurreição de Jesus.
Mesmo diante deste pensamento de não haver ressurreição individual, a Igreja afirma que Maria
nova Eva, associada intimamente ao Redentor, é assumida em corpo e alma a gloria, inicia em Maria o
ultimo dia. “A Assunção da santíssima virgem constitui uma participação singular na ressurreição de seu
Filho e uma antecipação da ressurreição dos demais cristãos” (Catecismo da Igreja Católica, 966).
A Igreja realiza uma leitura escatológica
A Igreja quando canoniza os seus mártires e santos faz uma leitura escatológica, contemplando a luz do
Espírito Santo e da palavra e olhando o exemplo de vida dos crentes, afirma neles o cumprimento das
promessas de Deus.
No caso da Assunção de Maria a Igreja faz algo parecido e não faz isso por uma “nova” revelação
e nem por uma descoberta no sentido histórico, mas sim por uma intuição de fé, iluminada pelas promessas
de Deus a quem se identifica com o Seu Filho.
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Diante de tantos questionamentos quanto ao fim de Maria aqui na terra, analisando que Maria foi
aquela que nunca esteve do domínio do maligno, que nenhum poder do mal atuou sobre ela, como pode ter
sido submetida às forças da morte conseqüência do pecado?
Assim a igreja faz a seguinte reflexão:
Desde que o discípulo amado a acolheu em seu próprio mundo Maria começou a ser parte integrante do
universo dos cristãos. Nós a reconhecemos como mãe e exemplo de vida.
Todo o ser de Maria foi vivificado porque Deus realiza essa vivificação-ressuscita todo aquele que
tem germes da graça e Maria foi esta que soube amar e cumprir a vontade de Deus em tudo e por isso a
igreja reconhece-a como aquela que está junto ao Filho intercedendo por cada um de nós.

Capítulo XII
MARIA É NECESSÁRIA? SUA FUNÇÃO NA SALVAÇÃO.

I- COMO FOI ESTABELECIDA A FUNÇÃO DE MARIA NO PROJETO DE SALVAÇÃO?

1. Doutrina tradicional sob a mediação de Maria.


A doutrina tradicional sobre a mediação de Maria, poderia resumir-se em três pontos.

Primeiro: Cristo Jesus é o mediador entre Deus e os homens por excelência, como causa principal.
Maria é mediadora por analogia, como causa secundária. Ela coopera com Cristo tanto no ato redentor como
na acolhida da ação redentora por parte de cada indivíduo.
Segundo: A mediação universal de Maria é a missão que ela tem de solicitar a Deus todo tipo de
graças (temporais e eternas) e distribui-las entre os homens. Divergem os mariológos em explicar se esta
missão de Maria é devida a um influxo moral que ela exerce sobre Deus ou a um influxo físico-instrumental,
enquanto que Deus se serve de Maria para conceder aos homens sua graça.
Terceiro: Maria intercede pelos homens para obter-lhes a graça de Deus; e mais, ela, enquanto
corredentora, atua na aplicação destas graças a cada um dos homens.

2. MEDIAÇAO DE MARIA NO VATICANO II.


O Vaticano II se deteve mais na maternidade espiritual de Maria, entendida já não só como
cooperação histórica no acontecimento histórico salvífico, se não como permanente intercessão em favor dos
homens que vai desde a assunção ao céu até a perpetua coroação dos eleitos.
A função de Maria se funda na mediação de Cristo, depende dela, está subordinada a ela, dela obtém
toda a sua eficácia.
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II. TEOLOGIA DA MEDIAÇÃO: ALGUNS ASPECTOS.

1. A MEDIAÇÃO RELIGIOSA.
Próprio da categoria de mediação é também, segundo as religiões, unir o que está separado, Deus e o
homem. Mediação é re-união. Mediador é aquele que, em nome e por encargo de Deus, efetua a
reconciliação. Sua função não consiste em salvar a Deus da irreconciliaçao, do distanciamento do
homem, por que Deus mesmo tem a iniciativa da ação mediadora: Deus é o sujeito e não o objeto da
mediação; ele não necessita reconciliar-se com o homem; ele é que pede ao homem que se reconcilie
com ele. Mediador é como o sacramento de Deus, que quer reconciliar o homem consigo.

2. JESUS CRISTO MEDIADOR.


Deus se revela a nos e nos reconcilia com ele através do único mediador, Jesus Cristo. Deus é sempre
aquele que atua e o mediador é aquele através de quem ele atua. Jesus Cristo representa, pois a Deus ante
o homem; mas também o homem ante Deus.
A salvação nos chega através do seu ser filial, através de sua relação de filho com Deus Pai, levada a
sua culminação no acontecimento pascal; e através de seu ser fraternal e diaconal, que chega a si mesmo
a sua plenitude quando morreu e ressuscitou por nós.
3- NO ESPÍRITO SANTO.
Jesus não exerce sua função de mediador autonomamente. Sem o Espírito, Jesus não seria o
mediador. Jesus chega a ser enquanto atua como mediador, graças ao Espírito. A humanidade de Jesus é
mediadora enquanto tem a unção do Espírito.
A auto-revelação do Pai se completa em outra forma de revelação, que é a efusão do Espírito Santo
sobre o Filho. Deus Pai atua através de suas mãos, o Verbo e o Espírito.
Quando o Filho concluiu sua kénosis na glorificação total e na ascensão, então concluiu a kénosis no
Espírito e se produziu o Pentecostes. Assim como o Pai enviou o Filho pelo Espírito Santo per Spiritum
Sanctum na encarnação, do mesmo modo o Filho enviou aos apóstolos per Spiritum Sanctum
comunicando-lhes seu Espírito.
4- O ESPÍRITO COMO MEDIAÇAO.
A função mediadora do Espírito é estruturalmente diferente da de Jesus Cristo. O espírito não se fez
homem como Jesus. É o Espírito de Jesus e é nosso Espírito. O mesmo em todos. O Espírito não
interfere na mediação de Cristo, leva-a a sua plenitude.

5- ECCLESIA MEDIATRIX.
A- A Igreja, sacramento do único Mediador e da única mediação.
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A mediação da Igreja é sacramento da mediação única de Jesus. É a mediação da Esposa que forma
um só corpo com a Esposa. A Igreja é autenticamente a Igreja de Jesus Cristo quando toda ela é reflexo
da única mediação, quando toda sua luz é só o reflexo da luz das Gentes que é Cristo.
Por instituição de Jesus, o mediador, os elementos constitutivos da Igreja se convertem em
mediações. Entre as diversas mediações eclesiais, os sacramentos ocupam um lugar eminente, pois neles
está comprometido todo o ser da Igreja e manifestam com a máxima transparência o único Mediador.
A Igreja é o sacramento do Único Mediador e a única Mediação espiritual.
Esta mediação espiritual se faz particularmente efetiva na “communio sanctorum”, que tem seu
âmbito privilegiado na Igreja triunfante ou glorificada.
B- A mediação da Igreja triunfante.
O ponto de partida é a afirmação da função permanente do Senhor Ressuscitado como mediador:
Cristo levantado ao alto da terra, atrai a si os homens; está sentado a direita do Pai e “sem cessar atua no
mundo para conduzir os homens a sua Igreja e por ela uni-los a si mais estreitamente e, alimenta-los com
o seu próprio Corpo e Sangue, faze-los participes de sua vida gloriosa”. (LG 48).
Os que são assumidos na gloria do Senhor, exercem sobre nós um influxo benéfico através de sua
permanente intercessão a Deus. “Os que chegaram já à pátria e gozam da presença do Senhor, por Ele,
com Ele, e nEle não cessam de interceder por nós diante do Pai”. (LG 49).
Os santos, as santas, são para nós, os crentes, símbolos mediante os quais Deus se manifesta e se faz
presente entre nós. São os ícones vivos de Deus. Através deles Deus Pai nos fala, nos manifesta seu
reino, nos atrai para ele, nos une e identifica com Jesus Cristo.

II- MARIA, PARADIGMA DA MEDIAÇAO DE JESUS CRISTO, DO ESPIRITO E DA


IGREJA.
1- A CHAVE CRISTOLÓGICA: EXPRESSÃO, SIMBOLO DA MEDIAÇÃO DE CRISTO.
Sem Jesus, Maria haveria sido como um broto cortado da vida, como uma escrava sem redentor,
como um ventre materno sem fruto, como uma mulher sem graça de Deus.

2- A CHAVE PNEUMATOLÓGICA: MARIA TRANSPARÊNCIA DO ESPÍRITO- MEDIAÇÃO.


A descida do Espírito Santo na sua anunciação não se reduz, pois, à sua concepção e dar a luz; depois
da concepção, Maria não ficou privada da graça. O Espírito Santo “não a abandonou depois do
nascimento de Cristo, senão que permaneceu com ela por todos os séculos e com toda a força da
anunciação. Por isso, sua dei-maternidade, sua relação com o Verbo Encarnado, dura também
eternamente”. (Bulgakov).
A presença de Maria no Pentecostes Eclesial revela a profunda e intima sintonia que se estabeleceu
entre Maria, os doze e todos os demais crentes.
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Mas Maria não é equiparada ao Espírito no aspecto da mediação. Maria tem acesso ao Pai por Cristo
graças a mediação do único Espírito (Ef 2, 18). Maria não pode ser mãe, discípula de Jesus por si
mesma: só mediante o Espírito. Maria nunca é uma pessoa entre muitas pessoas; não habita
imediatamente nos outros; não é “o nós” de onde se realiza o encontro com Deus e os homens. Não
teremos acesso imediato a ela, a glorificada, a não ser “mediante o Espírito e mediante Jesus o Senhor”.
Não é equiparada a função de “advocatus” (Paráclito) do Espírito e a função de “advocata” de Maria; “a
intercessão de Maria só pode ser concebida na dependência da do Espírito Santo, enquanto este é a
mediação que se comunica a si mesma, e em subordinação absoluta a uma última”. (H. Muhlen).
A função materna de Maria de maneira alguma obscurece, diminui a dimensão do Espírito, se não
que é um sinal de seu poder; e ela depende em tudo do Espírito.

3- MARIA, SÍMBOLO DA MEDIAÇÃO DE CRISTO E O ESPÍRITO.


Maria é a mediadora enquanto símbolo de mediação, e enquanto símbolo ela abre um espaço de
mediação. Trata-se, evidentemente de um símbolo pessoal, que estabelece um tipo de relação autônoma
com o simbolizado, diferente do símbolo material, que é pura passividade.
A mediação Mariana não é um complemento da única mediação de Cristo e do Espírito. É seu
símbolo. Qual é a identidade teológica desta mediação? Maria é mediadora como o é a Igreja. É
mediadora da Igreja triunfante.

4- MARIA E A MEDIAÇÃO DA IGREJA.


O Concílio se preocupa em ressaltar a diferença essencial existente entre a mediação própria de
Cristo e a mediação de Maria (LG 62). A Igreja não duvida em atribuir esta função subordinada à Maria
(LG 62).
A mediação de Maria é, pois, mediação participada. Dentro da Igreja se dão diferentes modos,
inclusive essencialmente distintos, de participar da mediação, tal como sugere a comparação conciliar ao
comparar a mediação com o sacerdócio de Cristo.(LG 10).
Maria ocupa um lugar único na Igreja em sua condição de mãe-virgem de Jesus, primeira crente e
mãe espiritual do discípulo amado.
Maria é a imagem original e o centro pessoal da Igreja-Esposa, é a esposa arquétipica de Cristo, por isso
pode ser denominada mãe e esposa espiritual do Filho.
Quando Maria, na cruz e no pentecostes se converte em Igreja, conclui e coroa seu caminho de
cumprimento da vontade do Pai, de seguimento de Cristo e de docilidade do Espírito.

IV- A NOVA EVA E O MISTÉRIO DE SUA MATERNIDADE ESPIRITUAL.


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1- A NOVA EVA?
Meu ponto de vista é que quando Irineu e os demais Padres da Igreja descobrem em Maria a nova
Eva e assinam a função no ministério da salvação, estão fazendo referencia a um esquema de fundo
mítico. Com ele indicam que a salvação deve ser total, holística.
Todos estão chamados a colaborar na salvação que tem como protagonista principal o novo Adão,
aquele que recapitula a toda a humanidade, masculina e feminina. Mas homens e mulheres, na medida
em que seguimos a Jesus, entramos em comunhão de vida com Ele, colaboramos em sua ação salvífica.
Maria foi a primeira e a mais excelente colaboradora. O foi com sua maternidade física e na fé. Mas não
foi a única. Ela representa o melhor da Igreja. Mas atrás dela estão todos aqueles e aquelas que se
associam a Jesus e com Ele se entregam à salvação do mundo.

2- MARIA, MÃE ESPIRITUAL.


A maternidade espiritual é maternidade no Espírito. Na Igreja falamos de “pai espiritual”, mãe
espiritual”. É verdade que Jesus nos pediu que não chamássemos pai a ninguém na terra, pois só temos
um Pai: o do céu.
Quando falamos de maternidade ou paternidade espirituais, estamos referindo-nos a um fenômeno
espiritual, que tem o Espírito como protagonista, e na pessoa a que nos referimos, seu instrumento, sua
mediação. O Espírito Santo é a alma da Igreja, de todo novo nascimento.

CAPITULO XIII
A MULHER NA PLENITUDE DOS TEMPOS

Cf. Gl 4,5. “Nascido de uma mulher” põe em relevo o abaixamento, a knosis do filho de Deus que em tudo
faz semelhante a nós.
I-A mulher da carta aos Gálatas
Paulo aborda o tema da liberdade cristã a respeito a qualquer tipo de opressão e de escravidão.

1- A experiência de Paulo
Ele se define paradoxalmente como “servo de Jesus Cristo”. E apostolo para anunciar o evangelho de Cristo
e proclamar que se entregou para livrar-nos deste mundo perverso.

2-Da maldição à benção


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Ser um homem, uma mulher agraciada com o espírito da liberdade. O que faz livre é a fé em Deus. A lei não
trás benção e sim maldição. O justo vive pela fé. Jesus é o herdeiro não para cumprir a lei e sim para acolher
a promessa feita a Abraão.

3-Deus enviou seu filho, nascido de mulher


A benção de Abraão, a de Maria, a benção a causa da fé e não das obras. Porem, a cruz de Jesus é a nossa
gloria, nossa liberdade. Disse João que sua mãe aproximou da cruz. Ela compartilhou a maldição que gera
benção.
a)- O texto de Gl 4,1-7
No centro da frase fala sobre o envio do filho na plenitude dos tempos.
b)- As duas formas de escravidão e de liberdade
Paulo apresenta a escravidão sob duas perspectivas: sob os elementos do mundo e sob o da lei.
Os que vivem as obras da lei incorrem em maldição. A lei não é libertadora. Quem submete a lei e
aos elementos do mundo é filho da escrava, de Agar.

c)- O filho de Deus, filho da mulher livre


O filho de Deus é por excelência Jesus. É filho da mulher livre. “Nascido de mulher”. A maternidade
da mulher fica por isso, revestida de transcendência. Jesus nasce de mulher. Não segundo a carne, mas
segundo o espírito. Se converte na bendita entre todos as mulheres. No principio nossa genealogia
pneumática está a mulher, da que nasceu Jesus Cristo.
d)-A mulher e o Espírito
Indicaria com isso que o filho de Deus se submete assim a duas instâncias de knosis, de humilhação.
Quem faz nascer o filho de Deus na plenitude dos tempos não é um varão. É o filho de Deus. E só nasce de
mulher e por ser filho da promessa, do espírito.
e)- Ela é nossa mãe, a Jerusalém de cima
A cidade de Deus, a nova Jerusalém, era simbolizada em um mulher vestida como uma noiva que vai
receber seu esposo. A descendência da mulher é perseguida pelo dragão. Este queria reduzi-la de nova a
escravidão. Porém a mulher consegue a liberdade e com ela sua descendência.

II- “Ad maiorem Dei gloriam”: Conclusões.


1- Porém, Maria não é Deus, mas sim, uma personagem histórica. Nossa irmã. Porém, se a mariologia não
dispusesse de um fundamento histórico, poderia converter-se em mariolatria, ou teologia mítica.

2- Falar de Maria como “rosto materno de Deus” ou “rosto feminino de Deus” pode levar a convertê-la em
uma deusa.
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3- Maria é em outras ocasiões, excessivamente identificada com a trindade.
Deus do contrario é ato puro, essencialmente ativo. Em Maria emergia um novo principio da
redenção, de satisfação que não era plenamente identificável com o principio cristológico. O avanço da
cristologia e da pneumatologia serviu para situar a mariologia em seu autentico âmbito teológico.

4- Maria nos projeta fora dela mesma, à transcendência de Deus, ao mistério insondável. A autêntica
mariologia é aquela que tem como finalidade “ad maiorem Dei gloriam”.

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