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Assim que coloco os pés para fora da loja sinto o vento frio tocar meu
rosto e mesmo não sendo inverno ainda faz frio e não deixo de senti-lo.
Acredito que isso é algo que nunca irei me acostumar, pois sou de origem
mexicana e estou acostumada com sol e calor quase o ano todo.
Ando a passos rápidos para não me atrasar para pegar meu hijo[1] na
escola que fica a duas quadras depois da lojinha de conveniência, onde
trabalho durante três dias na semana. Ando tão apressada que não consigo
observar nada além dos meus pés se afastando de onde estava e me
aproximando de onde quero chegar. Avisto o portão gradeado[2] de pintura
descascada da escola e dou um leve sorriso, enquanto levanto minha mão
direita para abri-lo. Caminho pela parte recreativa até chegar ao corredor que
dá acesso as salas de aula, olho no relógio e constato que estou bem na hora.
Quando me vejo em frente a porta levanto os meus pés, observo o pequeno
vidro que tem nela e procuro meu menino entre tantas cabecinhas. Meus
olhos encontram meu pequeno e meu coração se enche de alegria, certamente
o melhor momento do meu dia é quando estou com ele. Meu hijo está com a
cabeça deitada em cima da sua mochila azul do homem aranha esperando o
momento de correr até a mim e me fazer sentir o calor dos seus braços em
volta do meu pescoço.
Dou uma leve batida na porta continuando nas pontas dos pés com o
pescoço erguido até ser vista pela professora que sorri, em resposta dou outro
sorriso e um tchauzinho com a mão em movimentos rápidos e repetitivos. A
professora é um amor, meu pequeno a ama e como consequência eu também
por cuidar tão bem dele. Ela chama Pietro, aponta para mim e sorrio. Meu
pequeno se levanta da cadeira arrumando as alças da mochila em seus
ombros, indo até a professora que se abaixa até sua altura e deixa um beijo na
sua bochecha. Depois todos se despedem dele, ele vem segurando com força
a alça da mochila e meu coração até dói ao vê-lo vir em minha direção. Amo
muito meu hijo e embora ele não tenha nascido do meu ventre, me sinto tão
mãe dele quanto a minha cunhada que nos últimos meses anda mais
descabeçada[3] do que nunca.
A porta se abre, como sempre ele corre para os meus braços e me
sinto a mulher mais completa do mundo neste momento. Seguro sua mão e
caminhamos até o ponto do ônibus.
— Como foi seu dia garotão? — pergunto balançando nossos braços
com os dedos das mãos entrelaçados.
— A tia contou uma história muito legal e o Benjamim deixou que eu
brincasse com o seu carrinho.
— Poxa, isso é muito bacana! — falo com um sorriso.
Vejo nosso ônibus apontar em uma distância considerável, dou dois
passos à frente e com a mão livre a balanço fazendo sinal para que ele pare.
Observo-o vindo desacelerando até parar onde estamos.Olho para o meu
sobrinho e opto por pegá-lo no colo para entrarmos mais rápido.
Assim que entramos procuro por um lugar vazio, finalmente encontro
um e me sento na beira colocando meu pequeno no canto. Sinto o ônibus
ganhar movimento, enquanto ouço meu sobrinho cantar a música que tinha
aprendido hoje na escola.
— O que passa em sua cabeça está manhã que está o deixando todo
distraído Joaquim?
Ouço a voz de Enzo atrás das minhas costas e penso um pouco antes
de lhe responder, são tantas coisas que nem sei por onde começarei a falar.
Respiro ainda pensativo, enquanto viro meu corpo lentamente até que
fico em frente para ele e nossos olhares se cruzam.
— Fim do ano está chegando e…
Suspiro mais uma vez, só que desta vez com a lembrança da conversa
que tive ontem com minha mãe por telefone.
— Preciso dar um jeito na minha vida cara, é isso... Não dá mais para
ficar assim.
— Assim como? — pergunta demonstrando uma atenção maior as
minhas últimas palavras.
— Esta minha solteirice cara. Está na hora de pôr um fim nesta fase
da minha vida — digo jogando toda frustração que sinto.
— Você está solteiro há dez anos Joaquim e isso é desde quando te
conheço... Não está interessado em relacionamentos e minha esposa acabou
com a cota de amigas solteiras para te apresentar — fala meu amigo rindo,
me fazendo me lembrar da época em que nos conhecemos.
Meu coração estava partido e desacreditado demais para mergulhar
em um relacionamento ou dar uma chance a quem quer que fosse.
— Preciso estar em um relacionamento sério para realizar o sonho
que tenho de ser pai. — Conto o que vem passando pela minha cabeça há
algum tempo.
Quando volto a olhá-lo vejo nitidamente o efeito das minhas palavras
na mudança da sua expressão ou na descrença nelas devido seu cenho
franzido expressando sua total incredulidade no que falo.
—O que você andou bebendo cara? Amo a minha senhora
esquentadinha... — diz com um sorriso de lado me fazendo acreditar que sua
mente voou até chegar aonde se encontra sua bela esposa. — ..., mas invejo
sua vida de solteiro. Cara se eu não tivesse encontrado o amor tão cedo, ter
ficado com medo de deixá-lo escapar e nunca mais o encontrar novamente,
certamente seria um puto.
Não consigo conter uma gargalhada que ecoa pelo cômodo do
escritório.
— Deixa de ser besta cara, não imagino você sem esta aliança na mão
esquerda, dormindo cada noite com uma mulher diferente — comento
deixando escapar mais uma risada rouca da minha garganta.
— Ah Joaquim, esta é a visão do paraíso para todo homem casado e
você é quem me mantém dentro do jogo mesmo estando fora dele há décadas,
mas nenhum homem casado é louco o suficiente para dizer isso em voz alta.
Quando te conheci não conseguia imaginá-lo tendo um relacionamento de
uma noite, devido esse seu jeito certinho e romântico e não venha me dizer
que você não é romântico e protetor. Só não encontrou a mulher que
despertasse este lado em você, mas depois de tantos anos acompanhando sua
vida de solteiro, vejo que é o que você mais tem na sua vida... Uma noite de
foda e tchau, você é um predador cara... Meu herói! — exclama me olhando
de lado.
— Isso vai acabar, ontem tive uma conversa com a minha mãe e falei
que estou em um relacionamento sério há alguns meses, quando ela me
perguntou se o motivo de não querer passar o Natal com eles seria devido
minha ex ser irmã da mulher do meu irmão. Afirmei para ela que estou em
outra e que Norah ficou no passado.
— Então isso significa que você terá que mudar seu estado civil em
sete meses? Ah,para! Diga-me onde irá encontrar essa santa? Diga-me onde
encontrará alguém que te deixe apaixonado em sete meses sendo que te
conheço há dez anos e nunca o vi assim por ninguém. Cara depois que sua ex
te sacaneou, seu coração bate na sola do pé — diz e dá uma risada alta
tombando a cabeça para trás.
Olho para ele refletindo verdade em suas palavras.
— Você mentiu para sua mãe, Joaquim? — pergunta e para de rir na
mesma hora, quando se dá conta do que tinha feito.
— Menti cara e o pior é que ela espalhou a notícia para toda família
que não só irei para o Natal como também estarei acompanhado pela minha
noiva. — Passo a mão no meu cabelo me dando conta do tamanho da
enrascada em que eu me meti.
Tudo isso só para mostrar para minha mãe que estava bem e que
minha ex não me deixou estragado para o amor.
— Puta merda cara! — diz em alto e bom som e rio desanimado.
— Põe merda nisso Enzo, agora vou ter que arrumar uma mulher
para se passar por minha noiva, enquanto ainda procuro uma para ser mãe do
meu filho — digo desanimado ao chegar a conclusão de que precisava
mesmo era de um milagre de Natal para este ano.
— Já ouviu falar de encontros às cegas, Joaquim? Comece marcando
ponto lá, quem sabe não encontre uma mulher tão desesperada quanto você
para ter uma família que aceite toda essa loucura sem muitos
questionamentos.
— Não gosto desses tipos de encontros, embora seja uma ótima
oportunidade de conhecer muitas mulheres ao mesmo tempo. Talvez com
isso possa vir encontrar uma mulher mais rapidamente para que atinja minhas
expectativas. Não estou à procura de um amor, quero uma companheira,
alguém que posso confiar e contar.
— Joaquim você sabe que tem sérios problemas de confiança ainda
mais quando se trata do sexo feminino — diz em um tom sério de alerta.
— Nem sei por que fui te contar isso, deve ser para sair daqui mais
desanimado com a minha situação do que entrei — falo em um curto
resmungo de lamento.
— Porque sou seu melhor amigo — diz com um sorriso amarelo e eu
me jogo na cadeira a sua frente.
— Vamos ao trabalho, já jogamos conversa fora demais hoje. Quando
sair daqui tenho que passar no banco, agora me diga como estão as coisas.
Passamos as próximas horas acertando os últimos detalhes do projeto
dos móveis do chalé de uma cliente.
Um mês depois
— Olha você ficou maluco cara, mas se esta loucura está te fazendo
bem, então como seu amigo fico feliz.
Sorrio para ele olhando para o relógio.
— A futura senhora Fullin vai chegar a qualquer momento. Está
ansioso para vê-la em trajes de noiva?
— Deixa de ser bobo, sabe que o casamento é só no civil e não vai
funcionar na prática como está pensando.
— Acho que já está funcionando Joaquim, só você que ainda não se
deu conta, não sai para caçar tem duas semanas. Está na coleira e nem
percebeu — diz rindo.
— Enzo vou ser pai, não dá para ficar na putaria com a mãe do meu
filho dentro de casa esperando por mim e mesmo que não sejamos um casal
de verdade não tem como levar a minha vida como se não estivesse
acontecendo uma grande mudança. Foi eu que decidi por ela e estava cansado
da vida que estava levando.
— Ok, se é você quem diz... Quem sou eu para poder falar qualquer
coisa contra — fala e levanta os braços se mostrando derrotado diante dos
meus argumentos.
— E quando vai ser a inseminação? — pergunta recostando-se a
mesa.
— Ela está tomando uns remédios que a médica disse que é para ficar
mais fértil e tudo indica que isso vai acontecer depois de amanhã — falo
esfregando a minha mão de ansiedade, só em imaginar um filho meu e da
Alba correndo pela casa.
— Vai gozar mesmo no potinho para fazer seus filhos? — pergunta
em um tom incrédulo.
— Já gozei — respondo tombando a cabeça para trás e soltando uma
gargalhada baixa.
— Putz! Você não comentou sobre isso — fala contendo a risada com
uma mão na frente da boca.
—Você acha que iria te contar que me masturbei feito um adolescente
vendo revista de mulher pelada em uma sala fechada? Foi constrangedor
demais para mim. — Olhei para ele há tempo de vê-lo soltar uma risada alta e
bater a mão na perna.— Mas, estou apreensivo quanto uma coisa... A Alba é
teimosa demais e eu fiz a loucura em concordar com ela quando me disse que
ficaria no emprego até os patrões arrumarem outra pessoa, mas isso faz um
mês desde que ela falou com eles e nada. Não quero que ela corra o risco de
perder meu filho carregando caixas para cima e para baixo em uma loja —
falo em um tom preocupado.
Ouço batidas na porta, logo vejo a porta sendo aberta e minha
secretária entrando.
— Pode entrar — digo olhando para a porta fechada.
— Bobeira da sua parte, minha mulher trabalhou até as últimas
semanas da gravidez e não afetou em nada a gravidez — fala me dando um
tapa no ombro.
Ele havia se encostado do meu lado e nem tinha percebido.
— É, pode ser, mas quero tanto esse filho que não quero que nada
atrapalhe quando acontecer.
— Joaquim tem uma mocinha lá fora que está falando que você está
esperando por ela.
— Ah sim, se ela se apresentou como Alba, é verdade. Pode pedir
para que suba, por favor. — Ergo meu corpo desencostando da mesa.
Passando alguns minutos, vejo um pequeno furacão entrar na sala e
pular no meu colo.
— Tio Joaquim.
— Ei molecão — falo arrumando meu corpo que pendeu para trás
pelo impacto do seu peso, rio e deixo um beijo na sua testa.
Enquanto olho por cima dos seus ombros, sua tia entra na sala e
quando a vejo esqueço o que é respirar por alguns segundos.
Ela está linda!
— Essa então é a futura senhora Fullin?
Estou embasbacado olhando para ela e só percebo a minha falta de
atenção a tudo que acontece à minha volta quando ouço a voz de Enzo me
trazendo para a realidade.
— Boa tarde, tudo bem? — diz com um sorriso iluminando o
ambiente em que estamos.
Vou na sua direção, a cumprimento com um beijo no rosto e falo
perto do seu ouvindo o quanto está linda. Quando afastei o meu rosto do dela
olho-a novamente e percebo que suas bochechas estão levemente
coradas. Seu olhar se abaixa até seus pés por alguns segundos transferindo
para eles toda a timidez que meu elogio trouxe. Ando encantado por esta
menina, ela é doce, educada, inteligente e responsável demais para sua idade.
— Vocês vão se casar? Oh, meu Deus! Você não disse nada a respeito
e enchi sua agenda de trabalho, acabei ocupando uma boa parte do seu dia —
diz minha secretária com a mão em sua boca espantada.
Ela tem 60 anos e é uma viúva encantadora. Contratei-a de imediato
após nosso primeiro contato e isso foi quando fiz uma seleção. Vi como as
moças mais jovens a olhavam com deboche por sua idade, mas mal sabiam
que não estava à procura de uma secretária jovem que pudesse me levar a
perdição e enfrentar um processo jurídico por assédio. Não que na época
fosse acontecer isso, pois estava machucado demais para me envolver com
qualquer mulher que fosse mesmo sendo só para sexo. Estava à procura de
competência, de alguém que confiasse de olhos fechados e foi assim que ela
entrou na minha vida tomando mais espaço que o normal.
— Vamos nos casar agora a pouco, vou tirar algumas horas a mais de
almoço, mas depois voltamos — digo com um sorriso olhando Mary.
— Ah, meu Deus! Por isso está essa belezura toda? — pergunta
ajeitando minha gravata. — Você não é o homem mais arrumado do mundo,
o cabelo sempre está revoltado, embora seja liso e fácil de arrumar — diz
com um sorriso, encantada e eufórica pela notícia do meu casamento.
— Ei, não começa a falar mal de mim na minha frente — falo me
mostrando chateado.
Ela me dá um tapa no ombro e rio.
— Ela é linda, onde você encontrou este tesouro?
— Ela que me encontrou. — Olho intensamente para Alba que sorri.
Tomo meu copo de uísque duplo com duas pedras de gelo em frente a
janela, alheio ao movimento da rua com o pensamento nas palavras de Enzo.
E se ele estivesse certo?
Como isso pode me acontecer?
Como pode em tão pouco tempo me apaixonar pela minha esposa de
mentirinha?
Isso é tão ridículo que chega ser engraçado.
Não, não pode ser!
É claro que não!
Ela acabou de completar 24 anos e eu estou com 34, daqui dois meses
completo 35 anos.
— A noite está linda. — Viro meu corpo e vejo Alba em uma
camisola até os joelhos em um tom de vinho que realça sua pele morena.
— Não tão linda quanto você. — As palavras pulam da minha boca e
vejo o efeito delas através dos seus olhos que brilham feito cristais.
— Muito obrigada. — Agradece e abaixa a cabeça, atiçando meu
instinto de caça.
Avanço alguns passos em sua direção pensando em tudo que meu
amigo disse mais cedo. Tenho vontade de descobrir se ele está certo sobre o
que sinto e se sou eu o único tentando enganar a mim mesmo com medo de
sofrer mais uma vez.
— Hein, o que está fazendo? — pergunta afastando a cabeça para trás
para me olhar melhor por causa da nossa proximidade.
— Ainda não sei, mas quero descobrir se você me permitir —
confesso me sentido abalado pelo cheiro que vem da sua pele.
— O quê? — pergunta e abre mais os olhos.
Olhos esses que me fascina.
— Talvez poderíamos tentar ser um casal de verdade. Você não tem
ninguém e eu também não. Por que não? — pergunto verbalizando meus
pensamentos quanto a nós dois.
— Às vezes também acho Joaquim, mas se der errado e não tivermos
maturidade para lidar isso? Talvez tenha um pedacinho seu e meu crescendo
aqui e não quero colocar tudo a perder por uma atração.
Não consigo desviar meus olhos dos dela, me dói ter que concordar e
deixar tudo que quero fazer com ela morrer em meus pensamentos.
Acordo com meu corpo dolorido devido a noite de ontem, olho para o
lado onde meu marido dormiu e vejo o lugar vazio. Puxo seu travesseiro
levando-o até o nariz e quando sinto seu cheiro, solto um sorriso bobo
apaixonado que agora não preciso mais ter medo de demonstrar.
Enrolo-me no lençol e vou até o banheiro, deixando-o cair após ligar
o chuveiro e acertar a temperatura da água. Debaixo do jato de água morna,
fecho meus olhos e toco meu corpo com carinho me lembrando de cada toque
que Joaquim deu nele.
Que homem incrível!
Jogo a água do chuveiro para cima e sorrio ao vê-la cair.
Já pronta desço a escada com cuidado e ouço uma risada gostosa que
conheço bem o dono dela. Ao chegar à mesa vejo Pietro no colo de Joaquim
todo faceiro.
— Bom dia, família — falo com um sorriso iluminado em meu rosto.
Olhos para todos e paro no Joaquim que me analisa por alguns
segundos, chego perto dele dou um beijo no meu sobrinho e como de
costume um cheiro.Ainda sendo analisada por Joaquim, me sento ao lado
dele na cadeira que está vazia. Acredito que não se sentaram já pensando em
mim e sorrio por dentro com esta ideia.
— Bom dia amor — falo olhando em seus olhos.
Sorrindo ele parece varrer qualquer ideia errada que dominava sua
mente. Talvez ele pudesse estar pensando que tenho me arrependido de ter
feito amor com ele, mas o que me arrependo é de ter demorado tanto. Ele se
aproxima mais de mim e toca os meus lábios com os seus de uma maneira tão
leve que sinto como se fosse quase uma carícia.
— Dormiu bem?
— Como um bebê — fala e sorri mais uma vez para mim.
Meu sobrinho desce do seu colo e vai para perto da minha sogra que o
chama, com isso Joaquim aproxima as nossas cadeiras e toca minha barriga.
Dando bom dia para o nosso filho, entrelaça nossos dedos e me beija mais
uma vez.
— A noite foi boa ontem, hein? — meu cunhado diz olhando para
gente.
O que me deixa com vontade de me enfiar embaixo da mesa.
Será que está tão na cara assim, Senhor?
— Você não tem casa, não? Fica só aqui na mãe, enchendo o saco e
cerrando café da manhã, almoço e janta.
— Casa eu até tenho, mas nada se compara a comida da mãe. Agora
vocês do jeito que estão, está escrito na cara de vocês que a noite foi boa e
estão morrendo de vontade de repetir.
— A noite foi boa sim, mas para de deixar minha linda mulher sem
graça. Não percebeu que ela é tímida?
— Desculpe-me cunhadinha, não foi a minha intenção — fala sem
graça.
Balanço a cabeça, sussurrando um tudo bem, mas meu desejo era
sumir daqui.
— Não se preocupa com a gente Alba, meu velho e eu já tivemos a
idade de vocês e sabemos como são as coisas. Oh saudade, de um tempo que
não volta mais — fala minha sogra com os olhos parados no ar, o que nos faz
entender que sua mente divagava em épocas distantes, mas se obrigou a
voltar e me olhou estendendo a mão em cima da mesa, a peguei e estendeu a
outra para o filho que a pega, unido nossas mãos.
— Não tem preço ver vocês juntos depois de tudo que meu filho
passou, te encontrar foi um bálsamo para as feridas dele. Quando o vejo
sorrindo e te olhando sei que encontrou a felicidade, assim como encontrei ao
lado do pai dele.
Com aquelas palavras ela me faz derramar lágrimas, beijo sua mão e
agradeço o acolhimento e carinho com o que está tratando meu sobrinho e a
mim.
O restante do café foi tranquilo sem mais emoções até que Joaquim
saiu meio misterioso me deixando com a sua mãe e me avisando que não
demoraria, mas percebi em seus olhos que me escondia algo.
Mais tarde
—É a primeira vez que meu pai fica tão animado assim com uma
festa de aniversário e isso acho que se deve a culinária que sua mãe trouxe
para festa. Meu pai sempre gostou de conhecer coisas novas.
— Nossa culinária é rica e confesso que estava morrendo de saudade
da comida de casa, só vou evitar a pimenta para não passar mal. Quero provar
de tudo um pouco e poder sentir meus pés tocando no meu país novamente
— falo me lembrando das festas animadas que sempre fazíamos.
— Senti saudade do México, Alba?
Percebo um ar de preocupação na voz de Joaquim.
— Amo o meu país, a culinária, nossas músicas, mas agora o meu lar
é você e nosso filho — falo olhando em seus olhos.
Ele sorri e acaricia o meu rosto em um toque delicado.
Seguro sua mão e ele a leva nos lábios a beijando, me deixando mais
encantada do que já me encontro por ele. Sempre quis ser tratada do jeito que
ele me trata e ser olhada como ele me olha. Por fim, sinto seus lábios tocando
os meus, iniciando um beijo tranquilo e seguro. Sempre quis ser beijada desta
maneira e principalmente amada exatamente deste jeito. Às vezes acho que
ele saiu de um conto de fadas, mas nunca me vi como uma princesa, então o
melhor é considerar que isso não seja verdade, pois não quero perder meu
príncipe.
— Nossa estes tacos estão uma delícia — fala meu sogro se
aproximando de nós, assim que Joaquim afastou seus lábios dos meus.
— Este que o senhor está comendo é recheado de que? — pergunto
olhando para suas mãos. Vejo que ele está enganado e aquilo não é taco, mas
sim tortilhas.— Humm, meu sogro acho que o senhor se confundiu. Eles são
parecidos, mas não são iguais. Esta tortilha é uma espécie de panqueca, feita
de trigo ou milho, mas a minha mãe sempre faz com milho.Minha mãe
considera mais saborosa e pode ser comida com carnes e vegetais. Para
acompanhar, nada melhor que uma boa tequila, mas isso é para os fortes —
falo e dou risada.
— Está me chamando de fraco? — indaga meu sogro como se tivesse
o desafiado a provar o contrário.
—Não, que isso... Imagina... Longe de mim pensar uma barbaridade
desta do senhor, mas vamos deixar a tequila para outra hora, né meu sogro?
— Eu tomaria uma dose caso tivesse — fala com um sorriso travesso.
— Pai, se tivesse eu te acompanharia.
— Vocês estão falando de tequila? — meu pai diz e vem sorrindo na
companhia das minhas duas irmãs.
— Paiii! Não me diga que o senhor trouxe tequila?— pergunto sem
acreditar, me fazendo pensar o que mais eles haviam trazido na mala de
viagem.
Rio imaginando o que poderia ser tais coisas, poderia ser inclusive
Margô, a galinha de estimação da minha mãe, mas ela ficou em casa.
Isso me fez rir mais uma vez por imaginar a confusão que seria trazer
uma galinha para cá.
—Se não trouxesse uma da boa, não seria eu — fala com ar orgulhoso
me levando a rir.
— Então pega lá para nós! — meu sogro pede com um ânimo
contagiante.
Alguns minutos depois meu pai surge com a garrafa debaixo do
braço.
— Vou ensinar como se toma tequila, segure o copo com apenas uma
das mãos, coloque o sal entre o dedão e o indicador da mão em que segura o
copo e com a outra mão segure o limão — fala rindo.
— Vamos falar e fazer os movimentos de arriba,abajo, al centro y
adentro[13].
Meu pai como um bom professor ensinou os movimentos, não que
alguns já não os soubessem, mas ele amava fazer isso. Foi ele que me
ensinou na minha primeira vez e o treco desceu pegando fogo por onde
passava na minha garganta. Após todos elevarem o copo ao centro,
mandaram para dentro, as mulheres gritaram e os homens, especialmente meu
marido balançou a cabeça e ficou vermelho me fazendo ri.
Mais tarde todos foram dormir e subi para o quarto. Joaquim tinha
subido antes para tomar banho e quando entrei no quarto ele estava saindo se
secando.
— O que aconteceu para você mudar de uma hora para outra?
— pergunta enxugando a água do cabelo recém-lavado, tentando desvendar
meus olhos.
— A sua ex veio me chamar de boa farsante — falo o olhando
intensamente, pois queria ver qual seria sua reação.
Ele bufa e dá uma risada que me parece ser de desgosto.
— Como ela pode ir tão longe? Eu sabia que algo ia acontecer.
— Por que você contou para ela sobre nós, se antes mesmo da gente
se acertar você desejava que isso ficasse apenas entre nós?
— Eu não contei nada para ela... Contei para o meu irmão, porque
nunca tivemos segredos um com o outro e ainda disse para ele que eu estou
apaixonado há meses por você, mas me mantinha firme em não avançar o
sinal para não colocar tudo a perder — fala terminando de vestir uma blusa
cinza, se deita ao meu lado e me puxa para mais perto.
— Ela quer você. — Minha voz saiu presa na minha garganta pelo
medo que sinto em perdê-lo.
— E eu quero você — fala me beijando no nariz e depois me ajeitou
em seus braços dando aquele assunto como encerrado.
“O casal perfeito não é aquele que nunca tem problemas,
mas sim aquele que apesar dos obstáculos
sempre permanece junto.”
Autor desconhecido.
Manhã Seguinte
Desço a escada para tomar café e vejo que mais uma vez dormi mais
que a cama.
Olho meu relógio de pulso e são dez horas da manhã. Nunca tive
tanto sono assim em toda a minha vida e parece que resolvi dormir pelos
próximos meses que não dormirei por ter um bebê recém-nascido em casa.
— Bom dia meus sogros, onde está o restante do pessoal? — pergunto
preocupada, pois não vejo minha família.
— Seus pais e irmãs saíram logo depois do café da manhã animados
para conhecer a cidade e a minha nora foi acompanhá-los no passeio turístico.
Ela me pediu para te avisar que não te chamou, porque queriam bater perna e
você se cansa por causa da barriga. Levaram o Pietro e ele estava todo
animado — minha sogra fala com um sorriso.
— E o Joaquim, onde está?
Vejo minha sogra neste momento mudar a expressão no seu rosto e
me olhar pensativa antes de responder.
— Aconteceu alguma coisa que eu não estou sabendo?
Ela respira fundo antes de me responder.
Sempre fui rápida em meus pensamentos e mais rápida ainda em
expressá-los.
Ela assente com a cabeça aumentando minha preocupação por não
saber onde meu marido está.
— O Henry esteve aqui junto com a Norah para tomar café com a
gente como sempre fazemos depois do aniversário do meu velho. É um
costume nosso comer o bolo com um café bem forte, mas ela e o marido
tiveram um pequeno desentendimento e Joaquim está com ela na sala de TV
ajudando-a se acalmar — fala e olha para o marido que toca sua mão.
— Pequeno desentendimento é delicadeza da minha esposa, a coisa
foi feia Alba e acredito que aqueles dois não tem mais jeito — declara meu
sogro em um tom de voz que julgo ser preocupado.
— Entendo, espero que tudo fique bem para ela. É ruim ver um casal
com anos de história se separando, mas espero que ela não use isso como
desculpa para continuar dando em cima do Joaquim. Desculpe-me meus
sogros, mas não gosto de como ela se comporta na frente do meu marido
— falo tomando meu café e comendo um pedaço de bolo.
Minha real vontade era voar na sala para ver o que estava
acontecendo, mas até terminar meu café me manterei firme aqui. Assim que
termino percebo que Joaquim ainda continuava trancado com ela na sala de
TV, me levanto e aviso aos meus sogros que iria ver Joaquim.
Caminho pensativa até lá com o meu coração apertado, empurro
levemente a porta tão leve que não cheguei a ser notada pelos dois.
— Sei que você ainda me ama e só inventou toda esta loucura de
casamento porque não queria vir sozinho e que eu soubesse que ainda não me
esqueceu — fala envolvendo os braços ao redor do pescoço dele, o puxando
para mais perto de si e o beijou.
Até ali, mesmo não gostando do que estava vendo, aceitava por ser
somente ela o beijando, mas quando ele colocou a mão em volta da sua
cintura, não foi preciso que visse mais nada, até porque minhas lágrimas
embaçaram minha visão me impedindo de ver qualquer coisa que fosse.
Saio dali e subo a escada limpando minhas lágrimas com as costas das
mãos, entro no quarto que Joaquim e eu nos amamos. Lugar onde ele me
disse não só uma e sim várias vezes que me amava, mas depois de ter visto
aquela cena me senti uma idiota por ter acreditado em cada palavra que saiu
da sua boca. Visto-me para sair, preciso tomar um ar clarear para minha
cabeça e entender tudo que acabei de ver. Pego a minha carteira e o celular e
saio de casa.
— Meu Deus Alba, quando você me disse por telefone que estava
grávida, não achei que estivesse tão grávida assim — fala passando a mão em
meu ventre e sorrio, controlando o desejo absurdo que sinto de chorar.
— Estou com seis, quase sete meses.
— Sabe o sexo? — indaga curiosa.
— Ainda não, todas as ultrassonografias que fiz ele ou ela estava em
uma posição que não favorecia, mas todos estão chutando que é uma menina.
—Entra, por favor, fiquei tão apaixonada pela sua barriga que até me
esqueci de te mandar entrar.
— Tudo bem, eu que te devo um pedido de desculpas por invadir sua
casa faltando dois dias para o Natal, mas precisava respirar um pouco de ar
puro e pensar no que vou fazer, antes de fazer uma loucura.
— Conte-me o que aconteceu — fala e me segura pelo braço.
Caminhamos até a cozinha e me sento em uma cadeira encostando as
minhas costas.
— Vi o meu marido beijando a ex dele hoje pela manhã e na noite
anterior tínhamos conversado sobre isso. Eu disse para ele que ela ainda tinha
esperanças de que eles pudessem reatar e ele me afirmou que não tinha, mas
hoje vejo um grudado na boca do outro.
— Você fez o que? Deu na cara dele e na dela, não é?
— Não eu saí e mandei uma mensagem para minha mãe cuidar do
Pietro por algumas horas, pois precisava sair. Andei sem rumo até me
lembrar que você não morava muito longe de onde estava, te liguei e agora
estou aqui.
— Vou fazer um chocolate quente para gente e pare de chorar pelo
amor de Deus Alba.
Tento limpar as minhas lágrimas e fazer o que Nancy pediu, mas é
inútil. As lágrimas estão vindo com força e por mais que tente não consigo
parar de chorar, pois a vontade de continuar é maior do que eu.
— Não estava à procura de alguém, mas Joaquim me pareceu tão
perfeito que não conseguir dizer não. Passei por tantas coisas e ele apareceu
no momento que eu mais precisava com aqueles olhos azuis incrivelmente
bonitos, acompanhado de uma voz que me faz arrepiar toda vez que a escuto.
Nunca me sentir assim com ninguém Nancy — reclamei perdida em minhas
lembranças.
— Estou vendo... Nunca te vi assim por ninguém — fala me
entregando a caneca de cerâmica.
Pego a caneca e envolvi minhas mãos nela para esquentá-las, porque
lá fora está frio e parece que mesmo estando aqui alguns minutos ainda sinto
o frio percorrer o meu corpo.
— Vocês transaram ou ainda é a mulher de mentirinha dele? Amiga
me senti lendo um livro da Sabrina ao ouvir suas histórias — fala se sentando
em frente a mim com um pequeno sorriso ao divagar no meu romance que
estava mais para uma tragédia no momento.
— Sim e foi maravilhoso, ele disse que me amava várias vezes e que
a partir daquele momento iria me fazer sua mulher. — Respiro fundo com a
lembrança. — Ledo engano da minha parte, olha só no que deu aquele açúcar
todo.
— Não sei não Alba, você deveria ter ficado e tirado satisfação e não
sair como uma menina assustada que você nunca foi. Esta não é a Alba que
conheço.
— Esta mulher que ele estava beijando, não é a ex dele que o traiu
perto do casamento?
Afirmo positivo com a cabeça, levando a caneca na boca, soltando um
gemido prazeroso ao sentir o gosto do chocolate quente e instintivamente
fecho meus olhos. Mesmo me sentindo pior que no dia em que recebi uma
cagada de pombo no meu cabelo recém-lavado, chocolate me deixa feliz.
—Esta mulher quer seu marido para ela, Alba. Você saindo, deixa o
caminho livre para que ela consiga o que pretende. Ele não me parece ser o
tipo de homem traidor.
— Talvez você tenha razão, mas será que posso ficar aqui pelo menos
esta noite e colocar minhas ideias no lugar?
— Claro, vou adorar ter a minha amiga por uma noite e relembrar os
velhos tempos. O que você acha de comer, filmes e séries?
— Hum, é tudo que eu mais preciso.
Noite de Natal
A casa está linda!
Observo cada detalhe da decoração da mesa vendo o toque da minha
mãe e da família da Alba como uma união perfeita para mim.
Estou amando a comida mexicana, embora no início fiquei receoso
pela fama dos mexicanos colocar pimenta em tudo e não sou muito chegado
nisso, mas eles vêm me ensinando que nem toda pimenta precisar arder e
confesso que isso tem me fascinado.
Viro-me em direção as vozes animadas que me chamam para me
sentar na sala. Sorrio e caminho em direção ao meu pai que está animado
com a viagem que ele e minha mãe resolveram fazer depois do Ano Novo
para o México, aceitando o convite da senhora Consuelo e do senhor
Manolito, mas mudo de ideia e direciono meus passos junto com meu olhar
para o anjo que desce a escada com um vestido branco. Sorrio e levanto
minha mão para que ela tenha onde apoiar ao descer o último degrau.
— Quero ser o primeiro a te elogiar esta noite, você parece mais um
anjo.
Ela sorri em resposta, tirando de mim a próxima batida do meu
coração para si.
— Senhor Fullin, também está muito bonito esta noite — fala com um
sorriso que me arrebata mais uma vez.
Pietro vem correndo até nós, abraça a cintura de Alba e beija sua
barriga. Ele está encantado com a ideia de ser o primo mais velho como um
irmão, foi o que explicamos para ele quando contamos sobre o bebê e que ele
poderia ensinar todas as coisas legais que ele sabe fazer como brincadeiras e
alertar sobre lugares perigosos quando o bebê estiver aprendendo a andar. O
que nos deixou aliviados, pois não queríamos que em momento nenhum ele
venha se sentir colocado de lado pela chegada do bebê.
Caminho com Alba até nossos pais e somos recebidos com carinho
por eles. Meu pai abre um espaço no sofá para Alba se senta e minha mãe faz
o mesmo comigo. Pietro corre para se sentar no colo da vovó Consuelo, que
não desgruda dele desde que chegou afirmando que está recuperando o tempo
perdido, já que só o vê uma vez ao ano. Isso me faz pensar com uma pequena
tristeza que acontecerá o mesmo com nosso filho, pois não terá como ela
acompanhar o crescimento do pequeno, a não ser pelas muitas chamadas de
vídeos que tenho certeza de que minha mulher fará com gosto
— Joaquim está preparado para engordar uns três quilos esta noite?
— pergunta Ben animado.
— Ah sim, com a minha sogra e a mamãe na cozinha não tem como
não estar preparado para comer e engordar.
— Trouxe um pouco das delícias do meu país para a mesa de vocês e
com isso alegro mais a minha filha que morre de saudade da comida da nossa
Terra.
— Ai mãe, se pudesse, faria a senhora ficar para sempre, não é só da
comida que vou morrer de saudade quando a senhora, papai e minhas irmãs
se forem — fala minha esposa quase em um lamento e eu a entendo, pois
mesmo não tendo convivido a vida toda com sua família sentirei falta deles
quando partirem.
— Se pudesse me dividir ficaria metade aqui e outra metade voltava
para o México, mas parte do mim sempre esteve aqui com você e o seu irmão
desde que vieram para cá.
As palavras da minha sogra são tão carregadas de sentimento que
chega a se fazer quase palpável no ar, fazendo com que me sinta
envergonhado pelo tempo que não venho para casa passar o fim de semana
ou feriados. Nunca mais vou deixar que isso aconteça novamente, pois me
afastar da minha família por não querer estar no mesmo ambiente que a
minha ex, foi o pior erro que cometi e quem saiu perdendo mais nesta história
foi eu. Dou graças a Deus por meu pai ter superado tudo que passou e minha
mãe ter exigido minha presença este ano, pois foi dessa maneira que a vida
me deu uma segunda chance e serei eternamente grato a isso.
— Mãe me desculpa — falo com a voz embargada deitando minha
cabeça no seu ombro.
— Por que devo te desculpar meu filho? Você não fez nada de errado.
— Ah mãe, fiz sim... Não venho para casa há dez anos e se não fosse
pela atitude da senhora em me obrigar, nunca mais pisaria aqui. Isso me fez
perder dez anos de convivência em família, afinal não era sempre que você
podia ir para lá para estar comigo e me sinto péssimo por isso.
— Está tudo bem, todos cometemos erros... O importante é que
tivemos tempo de repará-los, me ressinto de não poder fazer nada para deixar
você mais confortável aqui Joaquim.
Entendia o que ela queria dizer com aquilo e por mais que ela
quisesse tirar o acesso livre da Norah a sua casa tinha muitas coisas que a
impediam. Norah é irmã da Robbin, mulher do meu irmão, filha dos seus
melhores amigos e tudo isso tinha um peso enorme que nos afastou por dez
anos.
Minha mãe beija o topo da minha cabeça, levo sua mão até meus
lábios e beijo com carinho.
— Boa noite.
— Vovô e vovó. — Festeja meu sobrinho abrindo a porta.
Vejo os amigos de anos dos meus pais entrarem com algumas bolsas e
uma travessa com algum tipo de comida para completar a nossa ceia. Todo
ano é assim, eles ceiam com a gente, foi por isso que meu irmão e eu nos
apaixonamos pelas filhas deles. Foi algo extremamente fácil e natural.
Nossas famílias sempre foram unidas, nossos pais se conheceram na
faculdade e nunca mais se desgrudaram.
Logo depois deles entrarem, vejo Norah, seu marido e as crianças
entrando na sala. Olho para Alba que notando a presença da minha ex
claramente muda sua fisionomia, mas é algo que infelizmente a gente teria
que aprender a lidar devido a amizade que meus pais têm com os pais de
Norah.
— Vaiola minha querida, todo ano você é maravilhosa com a
decoração da casa, mas este ano você conseguiu me surpreender — fala
Quiara depois de abraçar minha mãe e correr com os olhos pelo ambiente.
Robert, o seu marido, abraça meu pai que apresenta meu sogro para o
meu ex sogro. Isso soa tão estranho que chega a ser engraçado ou talvez
dramático.
— Joaquim, quanto tempo — fala Quiara me abraçando tão forte que
chego a sentir um certo desconforto com seu abraço e não era para menos,
pois realmente fazia tempo.
Quiara me viu nascer, crescer e por isso entendo sua saudade.
Confesso que também senti e não posso negar isso.
— Quiara, quero que conheça uma pessoa — falo após deixar seu
abraço.
Sigo até Alba e a ajudo se levantar.
— Esta aqui é Alba, minha mulher — falo com um sorriso nos lábios,
enquanto me acomodo atrás de Alba, envolvendo sua cintura com meus
braços.
— Muito prazer Alba, me chamo Quiara e sou amiga antiga dos pais
do Joaquim bem antes dele nascer. Sou mãe da Robbin e da Norah que você
já deve conhecer. Você é linda! Joaquim sempre teve bom gosto — fala e
sorri gentilmente para minha esposa depois de abraçá-la.
— Você em breve será papai Joaquim, quanta surpresa boa em tão
pouco tempo... Quando sua mãe me contou, quase surtamos juntas — fala
com uma risada alegre, o que nos faz rir junto.
Alba parece estar menos tensa e mais animada, depois de conversar
com a Quiara, o que me deixa mais tranquilo.
Algum tempo depois estávamos todos felizes conversando e as
crianças correndo em volta da mesa, enquanto beliscavam uma coisa aqui e
outra ali.
— Joaquim, quero que você venha comigo um pouco ao nosso quarto
— diz Alba me tocando com suavidade, fazendo minha mente pensar besteira
na mesma hora.
— Hum amor, também estou cheio de vontade de ficar a sós com
você — falo caminhando com ela pelo corredor, a apertando de uma maneira
mais insinuativo, enquanto roço meu nariz no seu pescoço.
Observo seus pelos se eriçarem naquela região e sorrio me sentindo
feliz por despertar prazeres na minha mulher.
— Deixa de ser safado Joaquim, não te trouxe aqui para isso, embora
mais tarde quero tudo que você prometeu — fala com um sorriso travesso.
— Ah não? — pergunto intrigado erguendo uma sobrancelha.
— Há sete meses, quase oito conheci uma senhora que pedia ajuda
com uma lata de leite na rua. Depois que a ajudei, ela parecia me conhecer,
pois disse coisas que me fizeram acreditar nisso e me deu uma carta — fala
fazendo o meu coração soltar de dentro do peito.
Não sei por que, mas me fez me lembrar da carta que recebi da
senhora cega que também parecia me conhecer. Desde aquele dia ando com a
carta para onde quer que vá dentro da carteira, me perguntando quando iria
completar a oração, pois quando conheci Alba senti que não precisava
conhecer mais ninguém.
Alba vai até a bolsa, pega sua carteira e tira um envelope da mesma
cor que recebi da senhora. Sinto meus olhos arderem, não sou um cara
emotivo e nem acredito nessas paradas estranhas, mas este é um daqueles
momentos que faz minha inteligência parar de questionar as coisas que não
entendo e acreditar no poder do universo.
Alba vem em minha direção e eu só consigo pensar na carta que está
dentro da minha carteira no bolso de trás da minha calça.
— Alguns minutos antes de te conhecer fiz esta oração — fala
olhando para o pequeno relógio no pulso e sorri. — São exatamente 23:15
horas, o mesmo horário que fiz a oração como a senhora me disse que era
para ser feito.
Meu coração deu outro salto quase saindo pela boca, quando a abri de
surpresa com o que Alba me falava, me fazendo crer pela primeira vez na
minha vida que o universo parece juntar todas as coisas no lugar certo, quem
dirá duas pessoas certas na hora exata. Não existe acaso, muito menos
coincidência e Alba e eu estávamos predestinados a nos encontrarmos
naquele dia e naquela mesma hora.
— Eu te amo Joaquim e se não for você, a pessoa que tem uma parte
desta oração e eu outra deixo de acreditar em milagres. Desde que te conheci,
ouço a voz daquela senhora na minha cabeça me dizendo para não ter medo
das grandes decisões que precisaria tomar. Acreditei que ela fosse um anjo
enviado por Deus, porque estava necessitada de um milagre e todos nós seres
humanos nos consideramos especiais para ter um anjo enviado por Deus, em
um momento tão difícil como aquele que eu estava passando. Foi aquela voz
que me fez dizer sim para o filho que carrego agora em meu ventre — fala e
sorri.
— Tenho o início desta oração — falo com o nó quase massacrando
minha voz.
Tiro a minha carteira do bolso detrás, pegando o envelope da mesma
cor do da Alba dobrado. Olho para ela o mostrando, ela me sorri entre
lágrimas e se senta na beira da cama. Caminhei até ela com meu coração
reavivado de algo novo que não consigo explicar, diferente de Alba que tem
fé e acredita em anjos e milagres, eu nunca acreditei. Sempre fiz o bem,
porque ele está em mim devido o que meus pais me ensinaram desde
pequeno, mas nunca me senti merecedor de tanto.
— Vamos fazer a nossa oração de amor, meu amor? — pergunta
tocando meu braço.
— Agora e sempre meu amor, eu começo...“Que neste momento
nossos corações se unam em uma única batida à procura um do outro, para
que nunca mais possamos nos sentir sozinhos novamente…
— Que as nossas almas se unam como uma só e que nunca mais
precise andar sozinha, mesmo que não esteja com você em presença te levarei
em força e pensamento…
— Que tenhamos sabedoria para reconhecer no outro a minha outra
metade, nos tire Senhor todo o medo do desconhecido, tire a venda dos
nossos olhos e nos permita ver mais, sentir mais e amar mais e que a partir de
agora nos reconhecemos como um, como o Senhor mesmo desejou. Que o
nosso amor seja como uma semente plantada em terra fértil que cresce,
floresce e dê frutos na época certa...Que nos alimente em momentos de fome
e nos conforte em momento de solidão. Que o nosso amor seja simples como
o vento que leva e transporta as sementes, assim como profundo e abundante
como o rio. Amém.” — Finalizamos juntos.
“Você nunca será bom o suficiente para todos,
mas sempre será perfeito para aquela pessoa que te merece.”
Autor desconhecido.
Alguns minutos mais tarde, saímos da sala com a Alba toda sem graça
ajeitando o cabelo que estava como um ninho de passarinho e eu com cara de
que tivemos uma boa foda.
— Onde você estava Joaquim? Procurei-o por toda parte.
Olho para Enzo com cara de quem viu um arco-íris.
— Ah, não procurou... Se tivesse me procurado em toda parte como
diz, é claro que teria me encontrado — falo dando um sorriso.
— Alba! — fala, mas não a cumprimenta a analisando.
Alba consegue com isso ficar mais sem graça do que já estava.
— Mostrou para ela os móveis e estavam escolhendo o colchão para a
cama do bebê?
— Móveis e colchão? — pergunta Alba perdida sem entender o que
ele estava querendo dizer.
— Ainda não, é melhor eu nem tentar te explicar o que estava
mostrando para ela aqui dentro, se não vai ser mais constrangedor do que já
está essa cena e Alba vai querer virar um avestruz e enterrar a cabeça no
primeiro lugar que encontrar.
— Ah, assina aqui para mim, era para isso que estava te procurando
— fala Enzo contendo a vontade de rir para não deixar Alba mais
constrangida do que já estava por ter sido pega cheirando a sexo e saindo do
quarto onde guardamos colchões para venda.
Tínhamos intimidade para isso, mas Alba e ele não. Por isso assinei as
folhas e ele saiu o mais rápido que pôde de perto de nós.
— Está vendo, não falei com você que isso não iria dar certo. Olha a
vergonha que acabou de me fazer passar — fala dando um tapa no meu
ombro, o que leva o canto dos meus lábios tremerem em um quase sorriso.
— Diga-me que não gostou?
Ela fica um instante em silêncio e sorrio safado.
— Eu também amei fazer amor com você lá dentro, pode ficar
tranquila que não vou perder meu emprego por causa de você ter vindo aqui
me seduzir e ter feito que eu perdesse a cabeça em pleno horário de trabalho
— falo rindo dando um beijo no seu pescoço.
Seu corpo ainda estava sensível ao meu toque e sua cara era de uma
fera enjaulada que eu vou adorar amansar.
— Deixa de ser abusado Joaquim, nunca mais o deixarei me colocar
em uma situação vergonhosa como essa que acabo de passar outra vez, pode
ter certeza.
— Alba para de fazer promessas que sabe que não poderá cumpri-las,
gosto de sexo em lugares diferentes e quando nosso bebê tiver seguro fora de
você vou te levar para conhecer uma montanha russa de prazeres. Não quero
você somente na nossa cama, a quero no capo do meu carro e até na escada
de incêndio de um shopping. Sei que você vai gostar de ser pega por mim em
todos estes lugares — falo com um sorriso de lado safado e mordo meu lábio
inferior ao imaginar a delícia que vai ser.
Passo a língua nos meus lábios sentindo uma fome enorme dela em
todos esses lugares que falei e mais outros que sugeria, ela fica com a boca
aberta tentando se convencer do que acaba de ouvir como se não fosse
verdade, mas ela vai descobrir da maneira mais gostosa no futuro.
Não resisto, beijo e mordo os lábios.
— Vem comigo, quero te mostrar uma coisa que fiz. — Levo-a em
direção ao lugar que estava quando ela chegou e mostro os móveis.
— São lindos, você é muito talentoso — comenta passando os
dedos nos detalhes da porta do guarda-roupa.
— Você gostou mesmo? — pergunto ansioso.
Quero que o quarto do nosso filho seja exatamente como ela imagina.
— Claro amei, é muito lindo! O berço, o guarda-roupa, a cômoda e
até a cadeira de amamentação é linda demais. Estes modelos são novos para a
loja?
— Não, este é para o quarto do nosso filho — falo e ela desvia os
olhos dos móveis me olhando com os olhos brilhantes pelas lágrimas.
— Meu Deus, Joaquim, eles são lindos! Vão ficar perfeitos no
quartinho dele ou dela — fala me abraçando e beijo o topo da sua cabeça.
— Muito obrigada, meu amor.
— Eu que tenho que agradecer por tudo que tem feito por mim desde
que entrou na minha vida e iluminou o meu mundo com a sua presença. Eu te
amo Alba e te daria o mundo caso fosse possível.
— Eu não quero o mundo, só quero você meu amor... Isso já é mais
do que o suficiente — fala me beijando, o que enche meu peito de calor.
“Nada é pequeno no amor.
Quem espera as grandes ocasiões
para provar a sua ternura não sabe amar.”
Laure Conan.
Um Novo Recomeço
“Há sempre alguma loucura no amor.
Mas há sempre um pouco de razão na loucura.”
Friedrich Nietzsche.
O dia tinha começado mal e pareceu ficar ainda pior quando tive que
sair no meio do expediente para resolver problemas que não eram meus e de
quebra fiquei meia hora na fila do banco.
— Estava a sua espera.
Sou despertado das minhas lamúrias internas por uma senhora e
quando olho para o lado me arrependo por estar sempre puto com tudo.
Quase não a tinha visto para oferecer o braço para chegar ao outro lado da
rua.
— Boa tarde senhora, como vai?
Ela sorri gentilmente, levanta a mão que pego com carinho e coloco
debaixo do meu braço.
— Estou me sentindo maravilhosa hoje, às vezes ficamos tão
preocupado com as coisas do nosso dia a dia que não somos capazes de parar
para ver a beleza nas pequenas coisas. Eu nem sempre fui cega Peter, mas
sabia que existem vários tipos de cegueira?Uma das piores é essa que você
vive te impedindo de enxergar as cores do mundo a sua volta e de permitir
amar e ser amado.
Olho para ela confuso a achando louca por agir de tal forma, mas suas
palavras têm tanta verdade que me impedem de virar as costas e seguir meu
caminho.
— Para onde a senhora vai? Posso te levar até um ponto de ônibus?
— pergunto solícito.
— Não precisa meu jovem, minha missão acaba aqui e sua vida
começa a ganhar sentido hoje — fala com uma convicção que faz meu peito
se esquentar com suas palavras e sorrio sem perceber.
Ela tira um envelope vermelho, desliza entre seus dedos até me
entregar e olho sem entender.
— Esta é uma oração de amor que você fará hoje às 23:15 horas e
onde quer que esteja a sua amada, vocês irão se unir nesta noite com a mesma
oração. O mundo está sedento por amor e às vezes recebo a missão de ajudar.
Olho para a carta e quando levanto minha cabeça não a vejo mais, se
não fosse a carta na minha mão poderia me achar um louco. Coloco o
envelope no bolso e procuro sair o mais rápido daqui, mas antes leio em voz
alta.
— Nossa oração de amor.
Às vezes, só às vezes os seres humanos são tão cabeças duras que
precisam claramente de uma intervenção dos céus com os anjos.
OBRAS DA AUTORA
Quando você chegou
Sinopse
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Wattpad
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[1]
Filho.
[2]
Que tem grade; cercado.
[3]
Maluca, desmiolada.
[4]
Filha.
[5]
Nossa Senhora de Guadalupe ou Virgem de Guadalupe é a denominação de uma aparição mariana da
Igreja Católica de origem mexicana, cuja imagem tem como seu principal local de culto a Basílica de
Guadalupe, localizada no sopé do monte Tepeyac, ao norte da Cidade do México.
[6]
Mãe.
[7]
Mamãe.
[8]
Tia.
[9]
Pessoa ou coisa que se mostra gasta, acabada; caco, farrapo.
[10]
Movimento do corpo ou de uma de suas partes.
[11]
Sejam bem-vindos família da Alba.
[12]
Sim, sou eu.
[13]
Para cima, para baixo, para o centro e dentro.
[14]
Com altivez ou orgulho; orgulhoso, soberbo, vaidoso.
[15]
É uma palavra derivada da junção dos seguintes termos em japonês: e + moji. Com origem no
Japão, os emojis são ideogramas e smileys usados em mensagens eletrônicas e páginas web.
[16]
Diz-se da voz muito aguda ou estrídula.
[17]
Pinhata ou Pichorra, se trata de uma brincadeira, que, normalmente, se dedica às crianças, contudo
pode ser jogado por adolescentes e até adultos. Consiste em uma panela, recheada de doces, totalmente
coberta por papel crepom, suspensa no ar a uma altura média de dois metros, onde o
participante, vendado, tenta quebra-la com um bastão e, consequentemente, liberar os doces. É
especialmente popular no México, onde é comum em aniversários, sob a forma de uma estrela de cinco
pontas.
[18]
Massa em forma de pequenos chapéus tricornes recheados.
[19]
É uma articulação entre os corpos das vértebras adjacentes, que funciona de modo a conferir rigidez
e flexibilidade à coluna, na qual é necessário para o suporte de peso, movimentação do tronco e ajuste
de posição indispensável para equilíbrio e postura.
[20]
Os tecidos moles incluem os vasos sanguíneos, vasos linfáticos, músculos, tecido gorduroso,
aponeuroses, tendões, nervos e os tecidos sinoviais (revestimento das articulações) equivalendo a cerca
de 50% do peso corporal de um adulto.