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Destinos Cruzados

Aline Rabello
Este livro é dedicado especialmente a Nathalia Nunes e Pedro montuani. Meus
Betas e confidentes desta história, que por anos aguentaram muitos "lê essa cena e
me diz o que achou!". Sou eternamente grata a vocês! A Tati Sparrow, por todos
nossos anos de amizade. E a você, leitor, que agora passa a fazer parte desse meu
mundo tão particular!
Índice
Página do título
Dedicatória
Capítulo Um
Capítulo Dois
Capítulo Três
Capítulo Quatro
Capítulo Cinco
Capítulo Seis
Capítulo Sete
Capítulo Oito
Capítulo Nove
Capítulo Dez
Capítulo Onze
Capítulo Doze
Capítulo Treze
Capítulo Quatorze
Capítulo Quinze
Capítulo Dezesseis
Capítulo Dezessete
Capítulo Dezoito
Capítulo Dezenove
Capítulo Vinte
Capítulo Vinte e Um
Capítulo Vinte e Dois
Capítulo Vinte e Três
Capítulo Vinte e Quatro
Capítulo Vinte e Cinco
Capítulo Vinte e Seis
Capítulo Vinte e Sete
Capítulo Vinte e Oito
Capítulo Vinte e Nove
Capítulo Trinta
Capítulo Trinta e Um
Capítulo Trinta e Dois
Capítulo Trinta e Três
Capítulo Trinta e Quatro
Capítulo Trinta e Cinco
Capítulo Trinta e Seis
Páginas Perdidas
Não é o tempo nem a oportunidade que determinam a intimidade, é só a
disposição. Sete anos seriam insuficientes para algumas pessoas se conhecerem e
sete dias são mais que suficientes para outras.

- JANE AUSTEN, Razão e Sensibilidade.


Capítulo Um
Sexta-feira

Carrego a última caixa para dentro do meu novo apartamento,


fazendo um grande malabarismo para manter o celular preso entre o
ombro e o ouvido e ainda abrir a porta para poder entrar.

— Sim, mãe. Esta tudo bem sim. – digo, fechando a porta atrás
de mim. – Cheguei de viagem tem umas duas horas. Estou
terminando de trazer minhas coisas do carro e já vou começar a
arrumar tudo no lugar. Não quero começar a semana sabendo que
ainda estou enrolada aqui. – paro de falar, colocando a caixa no
chão, ao lado do sofá, prestando atenção às recomendações de
minha mãe. – Não sei. Vou ver se arrumo o telefone de alguma
pizzaria. Não se preocupe, farei minha própria comida. – adianto a
resposta antes que o sermão venha. – Também amo você, mãe.
Diga a todos que mandei um abraço e que amo todos vocês. Já
estou com saudades. – desligo o aparelho. – É, vai ser bem solitário
aqui. Mas vai valer e muito. – sento no chão ao lado da caixa,
verificando seu conteúdo.

No auge dos meus vinte e três anos e meio, nunca sai de São
Paulo, minha cidade natal, onde morei juntamente de meus pais e
dois irmãos: Camile, de dezessete anos e Thomas, de seis anos,
até ontem. Agora estou morando sozinha, no Rio de Janeiro, em
plena Copacabana.

Há cerca de três meses atrás recebi uma proposta para trabalhar


na BIT Technologies aqui no Rio, como programadora sênior. Isto foi
apenas um mérito por ter dedicado meus últimos quatro anos
trabalhando no escritório deles em São Paulo com Lucas. É graças
a ele que estou aqui. A ele e aquela ideia doida que tive desde que
terminei o colégio, de que seria um objetivo que eu deveria
conquistar: trabalhar na maior empresa de tecnologia do país e uma
das maiores entre as três Américas.

Claro que como qualquer pessoa que sonha em conquistar suas


próprias coisas, eu aceitei a proposta sem nem pensar duas vezes.
Essa oportunidade foi algo como meu voo para a maioridade e
independência.

Para ser sincera, quando aceitei esse trabalho, eu não estava


pensando muito bem. Era algo que eu estava sim querendo, mas
não fazia ideia de como faria para viver aqui. Foi onde, segundo
Lucas, o próprio Presidente da BIT liberou um de seus
apartamentos em um condomínio há quinhentos metros da praia de
Copacabana, o Golden Village. Isto apenas para que eu pudesse vir
o quanto antes, já que precisavam com certa urgência de um novo
funcionário.

Pelo que disseram lá no escritório, ele mora neste prédio. Só não


souberam dizer qual apartamento ou andar. E, por algum motivo
bem estranho, eu só consigo imagina-lo como um senhor bem de
idade já, com cabelos branco e quase careca de tanta preocupação
que deve ter com a empresa dele. Sei lá, é assim que imagino esse
presidente, já que ninguém deu mais detalhes a respeito.

Quando recebi essa oportunidade de vir para cá, eu namorava


há uns três anos e pensava ser apaixonada por ele. Até propus que
viesse comigo e morássemos juntos. Uma grande besteira, claro.
Mas também não quero pensar nisso. Afinal, segunda-feira já
começo a trabalhar na BIT e poderei, finalmente, conhecer aquele
paraíso de prédio, que desde que comecei a estagiar com Lucas,
sempre ouvi falar muito bem, obrigada. Se eu estou ansiosa por
isso? Bem, estou com algo que simplesmente não tem como
descrever. Tudo o que consigo é imaginar o que tem preparado para
esses cinco meses restantes nesse ano e pelo quanto devo
aprender daqui até lá.
— Pronto? – atendo ao interfone logo no segundo toque.

— Srta. Luara? – um homem pergunta do outro lado e confirmo


com um “Sim”, então ele prossegue: – Aqui é o José, o porteiro da
noite. – apresenta-se. – Estou ligando apenas para avisar que o
morador do apartamento quinhentos e dez chegou e encontrou o
porta-malas do seu carro aberto e pediu para que a avisasse.

— Ah meu Deus! – exclamo. – Esqueci completamente de fechar


quando subi com a última caixa!
— Não se preocupe. Ele se certificou de que o veículo estava
fechado.
— Muitíssimo obrigada, senhor José. De verdade. – agradeço. –
Agradeça ao senhor do quinhentos e dez por mim e diga que sou
muito grata pela gentileza dele, por favor.

Seu José diz algo que não compreendo exatamente, mas prefiro
não perguntar sobre o que se refere.

— Tudo bem. Direi a ele. – diz.


— Seu José, antes que eu me esqueça... – dou uma pigarreada,
tomando coragem para fazer a pergunta. – O senhor teria ai o
número de alguma pizzaria para salvar uma jovem paulistana que
acabou de se mudar e nem mesmo consegue andar em seu
apartamento? Por favor? – praticamente imploro a ele.

— Claro. – responde de imediato, rindo, já ditando os números. –


Precisando de mais algo, basta ligar.

— Obrigada. – coloco o fone novamente no gancho. – Gozado é


que meu apartamento é o quinhentos e oito. – digo, franzindo o
cenho. – O que quer dizer que quem avisou do carro foi o vizinho do
lado... – faço uma anotação mental, para lembrar-me de agradecê-lo
pessoalmente na primeira oportunidade que tiver. Eu poderia tocar
em seu apartamento e fazer isto agora, mas já esta ficando tarde e
pode ser que ele esteja com alguém. Então não seria educado.
Faço isso amanhã. – Parabéns, Luara! Você constatou o óbvio e
conseguiu provar que é boa em matemática. – rio de mim mesma.

Pego meu celular para ver se alguém deixou mensagem ou


ligou, mas não tem nada. Nem de casa, nem amigos e nem quem
quer que seja. É só então que finalmente sinto o peso da solidão
cair sobre mim, porque nunca, em toda minha vida, eu me vi tão
sozinha e longe de casa. O máximo que fiz foi dormir na casa de
amigos ou namorado. Só que agora é diferente. Eu estou sozinha e
assim estarei por todo o tempo, vinte e quatro horas por dia, sete
dias por semana. E agora tudo o que terei aqui no Rio será meu
trabalho. Ao qual pretendo me dedicar o máximo possível e
unicamente a ele.

Sinto meus olhos lacrimejarem. Apenas a droga do resultado de


se estar naqueles dias, passando por um momento entre querer
matar todo mundo e querer abraçar todos, mas não poder, porque
não tem ninguém para fazer isso.

Solto um suspiro cansado, discando o número da pizzaria. Uma


pizza pequena, metade calabresa, sem cebola e a outra metade,
chocolate. Minhas favoritas!

Meu estômago ronca quando a atendente diz que serão


quarenta e cinco minutos até que entreguem. Concordo, mesmo que
contra gosto, já que estou faminta. Mas vamos lá e aproveitar esse
tempo para tomar um banho para relaxar e tentar não dormir ainda.

No momento em que resolvi que deveria aceitar a proposta de


trabalho e me mudar aqui para o Rio de Janeiro, resolvi também que
era hora de largar tudo para trás e mudar minha pessoa também.

Nos últimos meses, depois que terminei meu namoro com


Felipe, passei por uma fase “rebelde”. Eu havia pintado meu cabelo
com um tom de louro escuro (algo que odiei desde o início. Mas já
que havia feito, deixei) e ele estava bem comprido. Então resolvi
voltar para o meu castanho natural e cortar as pontas, deixando
minhas ondas pouco abaixo dos ombros.
Após o término desse namoro, eu meio que aproveitei bastante
para curtir. Mas nos últimos trinta dias eu sai apenas com um colega
de trabalho. Ele queria que tentássemos um relacionamento à
distância, mas não é algo que eu queira para mim e muito menos
quero dar esperanças a ele, já que não sinto o mesmo. Tanto foi que
sai mais como amigos de que como um casal. Foi mais nas últimas
semanas que aceitei ficar com ele e ainda foi apenas um beijo.
Assim como também foi com os outros com quem sai. Achei que o
mais sensato seria terminar com ele e deixar claro que não daria
certo entre nós.

Também acabei fazendo uma tatuagem, na qual meus pais não


tem o menor conhecimento dela e pretendo que assim fique por
algum tempo ainda. Tenho escrito Orbis non sufficit no seio
esquerdo, do lado. É algo como o mundo não é suficiente, que é
bem como eu me sinto em alguns dias. Mas isto não é algo da qual
eu me arrependa de ter feito. Muito pelo contrário.

Larguei para trás também várias outras coisas que vinha


juntando já há anos. Coleções desnecessárias, digamos assim. Mas
algo que jamais poderei deixar no passado são meus livros. Estes
foram meus melhores amigos desde que consigo me lembrar. Por
tanto, os primeiros a serem embalados e já estão no quarto onde
farei de escritório para trabalho. O que será mais conhecido como
Escritório barra biblioteca.

Sim, meu acervo é simplesmente enorme. São todos os gêneros


que se pode imaginar. Desde aquele romance mais clichê do
Nicholas Sparks (que por acaso amo), até Bernard Cornwell, que
não tem nada a ver com romance. Tenho também os bons e velhos
clássicos, como A Divina Comédia até o último lançamento de
alguma série que eu esteja acompanhando no momento. Mas, meu
favorito, é claro, são os da J.K. Rowling. Todos os títulos dos
melhores autores brasileiros e estrangeiros. Apenas amo. Por isso é
que não poderia largá-los assim, já que entramos em um
“relacionamento sério” quando eu tinha apenas seis anos de idade e
ganhei meu primeiro livro, chamado Marcelo Marmelo Martelo.
Meus banhos não costumam demorar tanto, mas este merecia
algo mais. Algo duradouro e que de fato tirasse toda essa tensão
que estou sentindo por todo meu corpo, depois de dirigir meu
Crossfox por quase cinco horas seguidas.

Tudo bem. Você pode dizer que eu poderia simplesmente ter


pegado um avião e feito o mesmo caminho em muito menos tempo.
Mas onde ficado aquela aventura envolvida em dirigir entre dois
estados? Isto faz toda a diferença do mundo quando você é solteira
e tem minha idade e um espírito aventureiro.

A campainha toca.

Tem cerca de cinco minutos desde que o porteiro interfonou


avisando que o entregador havia chegado. Não fazia ideia de que
demorasse tudo isso para subir até o vigésimo quinto andar.

— Já estou indo! – grito do quarto, vestindo uma camisa velha e


meu short, correndo para a sala. – Quanto é? – pergunto logo que
abro a porta.

— São trinta e quatro reais. – responde um rapaz moreno. – O


guaraná é por conta da casa. – explica ao perceber o espanto em
meu rosto quando me entrega o refrigerante. – Estamos com uma
promoção.

— Maravilha! – exclamo. – Fique com o troco. – digo, entregando


ao rapaz duas notas de vinte. Ele acena com um gesto de cabeça e
se vira para o elevador.

Em minha defesa, posso dizer que esta talvez tenha sido a


melhor pizza que provei até hoje. O que certamente me obriga a
salvar o telefone deles para o caso de uma emergência.

Ainda não sei dizer se foi pela qualidade ou se realmente estava


com fome, já que não parei para almoçar durante a viagem. Mas,
milagrosamente, consegui comer mais da metade da pizza, tendo
acabado com quase toda a parte de chocolate.

Guardo o restante na geladeira para o café da manhã e faço


uma anotação mental para ir ao mercado logo que terminar de
arrumar tudo no lugar. Não posso simplesmente abandonar tudo o
que aprendi em casa e viver de comida pronta. Afinal, minha mãe é
chefe de cozinha em um restaurante em São Paulo.

Sem conseguir manter os olhos abertos por muito mais tempo,


resolvo que é hora de descansar e que terminarei de arrumar tudo
amanhã.
Capítulo Dois
Domingo

Meu sábado, em um resumo, foi uma total correria. Colocar os


móveis no lugar que me agradasse de verdade, e não como eles
estavam. Ligar para os meus pais. Arrumar minhas roupas no
armário, arrumar a cozinha. Ligar para casa, limpar a casa. Fazer
uma compra básica para um simples almoço de domingo, tomar
banho, comer. Ligar para casa uma última vez. E, por fim e
totalmente entregue a exaustão do dia: dormir. Meu Deus! Eu quase
gritei quando finalmente pude deitar na minha cama e sentir o
colchão balançar sob meu peso. Sentir o efeito que ele teve sobre
meu corpo depois da viagem e de toda a correria das últimas
quarenta e oito horas para mim... Aquilo foi como um remédio vindo
em boa hora.

É... Foi bastante cansativo. Fiquei acordada até basicamente


duas da manhã para poder deixar tudo do meu agrado e ver se
conseguiria uma folga hoje, para não chegar amanhã tão cansada
ao trabalho. Ao menos consegui isso e, depois do almoço, pretendo
ir dar uma volta pela praia, para conhecer a redondeza um pouco.
Principalmente se considerar que ainda não conheço nem mesmo o
caminho que farei para o trabalho, além das linhas do trem que terei
que pegar para ir e voltar. O que, ao menos, já é um bom começo.

— Alô? – digo, prendendo o celular entre o ombro e a orelha,


enquanto corto os temperos para o molho da macarronada.
— Mal se muda e já esquece as amigas! – exclama a voz tão
familiar do outro lado da linha, me fazendo sorrir em resposta. –
Achei que nossa amizade significasse mais para você do que isso,
Brudosck.
— Julie! – exclamo em resposta. – Desculpa. É que esses
primeiros dias foram uma correria terrível aqui arrumando as coisas.
— Sei, sei. Você deve é estar se pegando com algum gostoso ai
nesse momento. – ela me provoca, rindo.
— Quase isso. – rio. – Estou “me pegando” com um cheiro verde
e carne para o molho da macarronada.

Ouço a risada de Julie do outro lado.

— O que pretende fazer ai hoje? – pergunta, mudando


completamente de assunto. – AAAAAAAAAAH! Você deveria estar
aqui... – sua voz fica um pouco chorosa de repente. Quase tanto
quanto quando nos despedimos na sexta-feira. – Nós iriamos lá
para a Paulista curtir o dia. Está um dia de sol e estou no tédio,
totalmente sozinha aqui, agora que minha melhor amiga me
abandonou para ir viver sua aventura em outro estado.

Sorrio ao ouvir suas palavras. Julie tem sido minha melhor amiga
há quase treze anos já e desde que nos conhecemos, não consigo
lembrar-me de uma época em que tenhamos passado mais do que
dois dias sem nos ver.

— Pois é... – concordo. – Mas veja: você poderá vir para cá no


feriado e iremos a melhor boate do Rio de Janeiro, só para pegar
alguns gatinhos aleatórios. – comento, esperando a reação já tão
familiar.

— Não respondeu minha pergunta, Luara. O que você vai fazer


hoje?
— Caminhar na praia. Ou isso ou dormir a tarde toda. Estou
exausta ainda.
— Vá para a praia. – diz com seu tom autoritário. – Sério. É seu
dever de casa.
— Tudo bem, mamãe. – eu a provoco. – Mais algo que eu deva
fazer?
— Sim. Venha me visitar logo. Estou com saudades de você,
poxa!

Ficamos conversando nesse ritmo por quase uma hora ainda. O


que significa que fiz todo meu almoço enquanto conversávamos
sobre vários assuntos, desligando apenas quando Ju disse que a
bateria do celular dela estava acabando. Mas prometeu que me
ligaria mais tarde, para saber como foi minha caminhada. Não que
algo possa acontecer em uma caminhada, além da probabilidade de
oitenta por cento de eu me perder.

Já passa um pouco das quatro da tarde quando acordo do meu


“rápido cochilo” de depois do almoço.

Tomei um banho rápido apenas para me refrescar e acordar de


vez, vestindo uma camisa regata, shorts e tênis de caminhada. Sei
que a praia fica a exatos quinhentos metros do condomínio,
seguindo em uma linha reta. Então as chances de eu me perder até
chegar lá são menores de que na volta.

— Certo, Luara. Siga sempre em frente. – digo a mim mesma,


trancando a porta do apartamento.

Assim que saio do elevador, percebo que não é o Seu José


quem esta tomando conta da portaria hoje. O que significa que: ou
ele esta de folga hoje, ou seu turno será à noite. Até agora, ele foi à
única pessoa com quem conversei aqui e provavelmente assim será
por alguns dias ainda.

Cumprimento o porteiro com um sorriso educado e sigo para a


rua. Calculo cerca de vinte minutos até chegar à praia, andando em
um ritmo calmo.

Domingo, Rio de Janeiro e praia de Copacabana. Claro que


essas três combinações levariam a um lugar superlotado. Mas, por
ser final de tarde, as pessoas já começam logo a recolher suas
coisas para seguir caminho de volta até suas casas.
Retiro meu tênis e caminho à beira mar, para sentir a água em
vez de somente a areia. Ajusto a playlist no aplicativo em meu
celular enquanto caminho. Geralmente isso me ajuda a relaxar e
distrai.

Sigo para a direita, alongando-me no início.

O vento sopra uma leve brisa, trazendo até mim o cheiro da


água salgada e do mar. Um aroma que há muito não sentia e resisto
à tentação de entrar na água por pouco.

Enquanto caminho, observo as crianças correrem atrás de suas


enormes bolas coloridas, que seus pais provavelmente só
compraram após elas insistirem muito. Vejo as jovens tomando
banho de sol para se bronzearem e alguém que certamente se
esqueceu da importância de usar protetor solar. Tenho que segurar
para não rir.

Observo também, vários banhistas pouco mais a frente, voltarem


a areia e outros surfistas, aproveitando as ondas que o mar traz
para eles.

— Ei! – ouço a voz de alguém quando uma música termina,


dando lugar a outra.

Imagino como será o dia de amanhã. Ter que levantar bem mais
cedo que o necessário, para não correr o risco de me perder e
chegar atrasada. Afinal, tenho que manter minha fama de pontual e
estar lá na hora certa.

— Oi? – sinto a mão de alguém tocar meu ombro, fazendo-me


parar. Meu corpo gela no mesmo instante em que sinto o toque.
— Mas que... – começo a dizer um pouco alterada pelo volume
da música, então retiro os fones do ouvido, tentando não gritar.

— Desculpe assustá-la. – o intruso diz, dando um passo para


trás. Observo tudo ao meu redor e vejo que ainda tem várias
pessoas por aqui. Ele não seria louco de tentar algo contra mim.
Quer dizer, tem várias pessoas ao nosso redor e, se ele me tocar,
eu grito. Muito.

Um calafrio que percorre toda a linha da minha coluna quando


ele volta a falar.

— É que te vi passar a pouco e não resisti. – ele diz com calma e


franzo o cenho ao som destas palavras. Ah, certo. Eu posso jogar
meu tênis nele e correr, se tentar algo. – Deus! Como isso soou
estranho. – completa rindo e percebo uma covinha se formar em
seu sorriso por detrás da barba.

— Concordo. – é a única palavra que consigo dizer.


— Não resisti a sua camisa. – ele aponta para mim, dando um
sorriso sem graça.

Só então é que percebi qual camisa havia vestido. É uma frase


da qual gosto e me identifico muito: Liberdade é pouco. O que eu
desejo ainda não tem nome.

— Clarice Lispector. – diz. Ahn... Sério?


Olho para ele com o cenho franzido, tentando ignorar seu
comentário.
— Sim. – concordo.
— Sou um grande fã de literatura. – ele explica. – E não é muito
comum ver alguém com uma camisa dessas. Principalmente na
praia.

— Pois é... – digo um tanto confusa, sentando-me na areia. –


Peguei a primeira que achei e sai para caminhar. – sento-me na
areia, retirando o boné da cabeça e jogo no rosto um pouco d’água
que trouxe comigo apenas para me refrescar. Por que estou me
explicando para um completo desconhecido?

É só quando estou sentada que realmente reparo em quem me


parou. Ou melhor, como ele é.
Ele é alto. Realmente alto. Deve ter por volta de 1,85m ou
1,90m, o que me torna uma completa baixinha, mesmo com meus
1,70. Chuto sua idade entre vinte e cinco, vinte e seis anos. Seu
cabelo castanho claro e arrepiado, dando um ar de quem acabou de
transar. Bem, talvez ele tenha acabado. Seus olhos têm uma
tonalidade quase cinza claro, algo que eu realmente nunca vi antes
em toda minha vida. O que o torna ainda mais lindo. Sua camisa
branca estrategicamente jogada sobre seu ombro chama toda
atenção para os largos ombros e peitoral bem definido. Posso jogar
com todas minhas fichas que ele faz ponto na academia todas as
manhãs. Mas, diferente da grande maioria que vi em São Paulo, ele
treina perna. O que acaba tornando-o simplesmente... Maravilhoso.
E o bronzeado... UAU!

Não consigo evitar deixar meu queixo cair um pouco diante de


tudo isto. Ainda mais deste ângulo que tenho aqui de baixo. Ele é
como se fosse um deus grego do pecado e eu me perderia muito
fácil. SE RECOMPONHA, LUARA!

— Se importa se eu caminhar com você? – sua voz rouca chega


aos meus ouvidos após longos segundos de total transi e solto um
suspiro.

Péssima ideia, Luara. Péssima ideia.

— Não. De maneira alguma. – respondo, recolocando o boné na


cabeça. – É bem solitário caminhar sozinha. – O quê?! Você ficou
maluca ou o que?! Esta ouvindo bem o que você esta falando?! –
Ainda mais em um estado novo. – ele estende a mão para me
ajudar a levantar e a seguro. Sua mão é grande e grossa, com um
aperto forte e firme. – Obrigada.

Ele sorri, mostrando aquelas lindas covinhas mais uma vez.

— Deixe-me adivinhar: está no Rio curtindo férias e acabou de


chegar? – desta vez quem sorri sou eu.
— Quase isso. – respondo. – Acabei de me mudar. Cheguei aqui
recente e só ontem consegui terminar de arrumar meu apartamento
e sair um pouco dele. – explico e retomamos a caminhada.

Ele fica em silêncio por alguns instantes, enquanto caminhamos


pouco afastados um do outro. Fica claro nesta sua atitude que ele
não tem intenção de me fazer mal. Ou pelo menos não demonstra

— Legal. – diz, trazendo-me de volta a praia. – Seu sotaque é de


paulista. – arrisca.
— Paulistana. – corrijo de imediato.
— Certo. Vocês são iguais a nós. Cariocas: Rio de Janeiro.
Outras cidades: fluminense.
— Quase isso. – sorrio.

E mais uma vez ali estão suas covinhas. Ele tem um sorriso um
pouco torto, um pouco sem graça, mas lindo. Seus olhos cinza
brilham quando ele sorri. Sinto meu rosto se aquecer quando me
olha, guardando as mãos no bolso da bermuda.

— E você trabalha com o que? – pergunta com um breve olhar


para mim.

Ah, vamos brincar um pouco.

— Sou ginecologista. – digo séria e ele me olha, sem acreditar


muito em minha resposta. Não consigo conter a risada com a
expressão em seu rosto. – Nem. É brincadeira. – eu o tranquilizo. –
Sou Analista de Sistemas. Programadora. A “garota do programa”,
como muitos gostam de me chamam. – dou de ombros. – Mas cá
entre nós, acho um pouco ofensivo.

— Bacana. – diz, olhando na direção do mar. – Espera! Você


disse “programadora”? – concordo com um gesto de cabeça. – Uau!
Digo, caramba... Estou simplesmente sem palavras. Quer dizer... –
sorrio com sua reação, colocando minha garrafa dentro do tênis,
trocando-os de uma mão para a outra. Essa não era exatamente a
reação que eu esperava, mas é uma boa também. – Em toda minha
vida nunca vi uma mulher que trabalhasse com isso. – ele volta a
falar. – Ouvi falar de vocês, mas nunca vi uma pessoalmente. E uma
bonita ainda. – sinto meu rosto corar com seu comentário final e ele
ri. Infeliz.

— Engraçadinho. – ironizo a palavra, não conseguindo segurar o


sorriso bobo que surge em meu rosto.
— Posso fazer uma breve análise a seu respeito? – ele pede.
— Manda ver. – digo, lançando a ele um rápido olhar. – Sempre
quis saber qual era a primeira visão que costumo passar as pessoas
estranhas com quem costumo não conversar.

E, acrescente aqui, que esta é uma grande loucura. Estou em


um estado completamente diferente do meu, onde não conheço
uma única pessoa, caminhando no final da tarde com um estranho
que acabei de conhecer e não faço ideia de qual seja seu nome.
Mas, apesar de tudo, gosto de sua companhia. Quer dizer, existem
exceções, certo? Ele parece legal e divertido. Um gato super
gostoso e inteligente, isso não tem dúvidas. Acho que ele é minha
primeira exceção, afinal.

— Vejamos... – começa. – Paulistana formada há... Dois anos.


— Três. – corrijo.

— Certo. Formada há três anos. Então talvez eu tenha que


mudar sua idade de vinte e dois para vinte e três. – ele faz uma
pausa, provavelmente esperando que eu o corrija. O que não faço,
já que está certo. – Trabalhar com computadores significa que é
apaixonada por tecnologia e tudo o que diz respeito a eles. –
confirmo com um gesto de cabeça, atenta a sua descrição. Ele é
bom nisso. – Sua camisa diz claramente que é apaixonada por livros
também. – olho para ele com o cenho franzido. – Não me olhe com
essa cara. – censura-me, chamando minha atenção para ele outra
vez. – Você esta usando uma camisa com frase da Clarice Lispector
em plena Copacabana. – diz. – Geralmente as garotas na sua idade
preferem biquíni.

— Não trouxe o meu. – digo, fazendo-o sorrir.


— Pela frase, posso deduzir também que, mesmo tendo
conquistado sua liberdade, finalmente podendo morar sozinha e em
outro estado, tendo largado família, amigos e talvez até mesmo
namorado para trás, você ainda não sabe o quê realmente deseja
na vida. – mordo o lábio inferior, afastando para longe a lembrança
que isso me trás. De fato deixei um namorado para trás. Mas foi
para que permanecesse no passado para sempre. Não alguém na
qual eu queira me encontrar aqui. Mas eu não digo isso a ele. –
Você não tem o nome da “coisa”. – retoma a palavra, descrevendo
aspas no ar para dar mais destaque ao que diz. – Além de uma
mulher linda, inteligente e independente, uma nerd em todos os
sentidos.

Sinto meu rosto se aquecer com seu elogio, ficando sem


palavras. Não sei o que dizer e nem se devo agradecer. Não
esperava por isso vindo dele.

— Onde foi que escondeu o Radar de Personalidade? Dentro da


bermuda? – meus olhos se arregalam no instante em que as
palavras saem de minha boca e me arrependo na hora. Ele sorri
com um toque de malicia. Péssima escolha de palavras, Luara!
— Tenho algo em minha bermuda e posso te garantir que não é
nada disso. – diz, tirando as mãos do bolso, como se mostrasse que
não tem nada ali. Meu rosto se aquece ainda mais. – Meu trabalho
me obriga a analisar as pessoas em um curto prazo. – explica.
— Certo. Você é psicólogo. – arrisco.
— Errada. – sorri. – Sou empresário e gosto de entrevistar os
novos funcionários, saber se eles estão capacitados para o cargo ou
não.

— Minha única análise e erro. – digo, fingindo estar chateada. –


Descreva-se então. Sr. Empresário-Analista. – peço.

— Bem, vejamos... – ele leva a mão ao queixo, coçando a barba.


– Sou empresário e tenho apenas vinte e seis anos e tenho 1,92 de
altura. – ele me olha de relance. – Sou um grande amante de livros,
como já havia dito antes e de jogos também. Afinal, preciso de um
passatempo mais tranquilo. – franzo o cenho, sem entender seu
comentário. – Faço ponto na academia todas as manhãs, como já
deve ter percebido pelo meu maravilhoso tanquinho. – completa,
correndo a mão por cada gominho de sua barriga, com um sorriso
torto que diz tudo e sinto uma pequena vontade de fazer o mesmo.
Mas eu afasto essa vontade para longe.

Algo dentro de mim se revira e minhas pernas estão prestes a


me deixar no chão. Literalmente. Posso ouvir meu cérebro soando o
alarme de PERIGO para todo meu corpo, mas este parece
realmente não se importar e diz que quer se aventurar.

Ele entrelaça as mãos atrás da cabeça e fecha os olhos. Sinto


meu estômago se revirar com a tranquilidade deste homem.

— E, ao contrário do que você deve estar imaginando, não sou


formado nem em ADM e muito menos em RH. – diz. – Sou
programador também.
— VOCÊ O QUE?! – exclamo um pouco mais alterada do que
planejava.
— Na verdade, sou engenheiro de Software. – Bem, por essa eu
realmente não esperava. Para mim ele era formado em algo mais na
área dele, não nisso. – Fui o nerd da turma e apanhei muito no
colégio. Os “valentões” se aproveitavam de mim e, até meus vinte
anos, eu não passava de um estudante de computação virgem, feio
e com espinhas no lugar de barba, que se quer sabia como falar
com uma garota.

— Esta mentindo.
— Sim. – ri. – Menos sobre ser virgem e não saber como falar
com uma garota bonita. Não na época, pelo menos. E aqui estou eu,
caminhando com uma, que mal conheço, em um final de domingo,
como se fossemos amigos há anos.
Sim, por incrível que pareça, eu sinto o mesmo. É como se nos
conhecêssemos há muitos anos e apenas tivéssemos nos
reencontrado depois de algum tempo. Não sinto medo em sua
companhia, embora meu cérebro ainda me diga que ele é perigo.

Nos minutos seguintes, caminhamos em completo silêncio. Ao


longe, vejo o sol começar a baixar. Algo que nunca antes eu havia
visto em São Paulo.
Novamente minhas pernas parecem dispostas a me abandonar e
o alarme recomeça a soar. É então que ouço sua voz rouca chegar
aos meus ouvidos:

— Para onde exatamente estamos indo? – pergunta.


— Não sei. – respondo. – Apenas caminhando em linha reta,
sem rumo algum. Só espero encontrar o caminho de volta depois. –
lanço um olhar por cima do ombro e ele ri.
— Sabe, fazem uns quinze metros que estamos na parte deserta
da praia. – explica. – Ninguém vem para esta área.

O que? Ah, merda!

— Sério? – pergunto parando, levemente interessada.

— Não ninguém exatamente. As famílias não costumam vir para


cá. Mas as chances de encontrar alguém por aqui há essas horas
são mínimas.
— Acho que é nossa área de retorno então. – falo, embora uma
parte minha queira continuar essa caminhada por mais algum
tempo.
— Tem um lugar aqui na frente que costumo vir quando estou
chateado ou algo está errado comigo. – ele começa a dizer. – É bem
tranquilo. O melhor pedaço do mar da vista para ele. Queria te levar
lá.
— Costuma relevar seu esconderijo a todas as garotas
estranhas que aborda na praia? – eu o provoco, arqueando a
sobrancelha. Diz que não, por favor. Você é legal.

— Na verdade você foi a primeira pessoa com quem fiz isso. –


sua voz parece verdadeira, embora uma parte minha duvide disso. –
Só é um lugar que talvez possa ser bom para você quando se sentir
sozinha aqui. E também porque gostei de você. Seria errado negar
isto a alguém assim.

Arqueio as sobrancelhas, surpresa com sua confissão.


— Tudo bem, então. – digo. – Mostre-me o que você tem de
melhor.

Ele sorri em resposta, provavelmente percebendo minha


péssima escolha de palavras. Mas, ao invés de fazer algum
comentário, se oferece para carregar meus tênis. O que recuso e
agradeço educadamente, claro.

Por alguns minutos, apenas caminhamos direção a uma área


mais montanhosa, com algumas moitas de matos escondendo algo.
Uma pequena gruta. O mar cristalino ao redor possibilita a visão dos
pequenos peixes que nadam em uma poça.

— Este é simplesmente o melhor lugar para espairecer as


coisas. – ouço sua voz pouco atrás de mim e me viro, vendo-o
apoiado em uma rocha. Os braços cruzados junto ao peito,
deixando os bíceps firmes.

— É lindo. – concordo. O que é bem verdade. Esse lugar me


passa certa calma interior. O som que a água faz quando bate
contra as rochas e a brisa do vento, soprando meus cabelos presos
pelo boné...

— É tranquilo. – ele diz com a voz rouca, dando um passo em


minha direção e tira meu boné, que cai no chão ao meu lado. Meu
coração dispara forte contra meu peito quando sinto seus braços
fortes envolverem minha cintura.

— É perigoso. – sussurro a resposta, passando meus braços por


sua nuca e ele se inclina um pouco para frente.

Ele apoia sua testa na minha, ficando a poucos milímetros do


meu rosto. Aquele mesmo alarme de antes soa alto dentro de mim,
mas eu o ignoro. Eu o quero como nunca quis ninguém antes. É
como se... Eu não sei. Eu quero, mas também não quero. Meu lábio
se entreabre automaticamente, querendo sentir tudo o que ele pode
me causar.
Desço minha mão por seu peito, sentindo cada músculo rígido
sob meu toque. Sua pele é quente e macia e seu coração está
acelerado, assim como o meu. Por quê? Ele fecha os olhos e apoia
a testa novamente na minha, enquanto movo minha mão por sua
barriga e quadril.

Ele tenta uma breve investida, tocando meu lábio inferior com o
dele e sinto como se uma pequena corrente elétrica percorresse ali.
Sei que deveria me afastar, mas tudo o que consigo fazer diante do
desejo que sinto pelo perigo que este homem tem a me
proporcionar, é prender minhas mãos ao cós de sua bermuda,
permitindo que ele me beije com uma calma que chega a doer
dentro de mim. Meu corpo se aquece com seu toque quando me
puxa para perto e sinto o dele reagir ao meu toque, lá em baixo.

Sorrio contra sua boca, fazendo-o aprofundar nosso beijo,


puxando-me para mais perto, me fazendo sentir sua ereção que
cresce cada vez mais, preenchendo o espaço restante entre nós.

Ele sorri, descendo a boca para meu pescoço, explorando meu


corpo todo com as mãos. Em um momento elas estão em minhas
costas e, no outro, em minha bunda. Subindo a perna do short,
erguendo a barra da camisa... E eu as quero em cada parte minha.
Em mim.

Um arrepio percorre todo meu corpo quando ele se afasta


ofegante e pousa um beijo leve em meus lábios. Uma parte minha
se desfaz com a ideia de que acabou, enquanto outra me diz para
correr antes que eu termine de perder o pouco do juízo que me
resta. Se é que ainda tenho algum.

— Tem um espaço lá dentro. – diz com a voz rouca e pesada,


puxando o lóbulo da minha orelha entre os dentes. – É confortável e
gostoso.
— Certo. – sussurro, direcionando minha boca até seu pescoço,
dando uma leve mordida ali.
Quando ele segura minha mão, eu sinto a sua tão quente e
grande, enquanto a minha, tão pequena, esta fria. Bem diferente de
todo restante do meu corpo, que se aquece a cada vez mais.

Ele se apoia contra a parede, puxando-me outra vez para perto


de si e me beija, correndo as mãos por minhas costas.

— Tem certeza disso? – pergunta em um sussurro rouco,


segurando a barra de minha camisa.
Fecho os olhos com seu toque.
— Sim. – sussurro de volta.

— Você tem alguém? – torna a pergunta e nego várias vezes


com a cabeça, fazendo-o sorrir. –Que bom. – diz. – Por que eu
quero você só para mim hoje. – sorri e, com um único movimento,
retira minha camisa, jogando-a ao seu lado no chão.

Tomando-me em seu colo, escorregamos para o chão e fico


montada sobre ele, sentindo sua ereção sobre minhas pernas. Eu o
beijo, não querendo perder nenhuma parte sua. Minhas mãos
passeiam por seu peito nu, pescoço e cabelos, puxando-o com
força, sem parar de beijá-lo. Já ele, sem desviar a atenção de minha
boca, procura pelo fecho do meu sutiã na parte de trás e o abre,
deixando meus seios a mostra. É só então que ele para de me
beijar, mantendo o olhar fixo em mim.

Sei que deveria me cobrir e sair de cima dele. Ir para casa e


esquecer tudo isso. Mas... Eu nunca me senti tão desejada antes.
Já tive outros homens, mas nenhum foi assim. Não como ele. E eu
também nunca quis alguém como o desejo neste instante.

Sinto sua mão escorregar para dentro do meu short e seus


dedos serem passados entre mim lá. Meu corpo se aquece ainda
mais com seu toque e tenho que afundar o rosto em seu pescoço
para abafar o gemido que me escapa. Em resposta ao seu toque, eu
me movo em seu colo, deixando-o ainda mais excitado.

— Cabem perfeitamente em minhas mãos. – sussurra,


envolvendo meu seio com a mão livre e fecho os olhos, jogando a
cabeça para trás, como que implorando para que ele faça o que tem
que ser feito. – Eu posso te fazer gozar assim. – murmura em meu
ouvido, beliscando o bico do meu seio de maneira suave, deixando-
o ainda mais enrijecido. – Você quer isso? – pergunta e paro de me
mover para sentir seu toque.

Ele se afasta, provavelmente esperando por minha resposta, que


dou com um movimento de cabeça.

— Me diz. – ele praticamente implora.


— Por favor. – gemo.
Em resposta ao meu pedido, ele desce a boca para meu queixo,
pescoço, colo e seios, sugando meu mamilo para dentro da boca,
puxando o outro entre os dedos. Sua outra mão, a que estava
dentro de mim, agora me aperta contra seu quadril.

— Por favor... Eu quero você. – imploro e sinto seu sorriso em


meu seio.

Ele me desce um pouco para o meio de suas coxas,


vasculhando o bolso da bermuda a procura de algo, que logo
descubro ser um preservativo. Ainda sem desviar os olhos de mim,
ele desabotoa a bermuda e puxo seu membro latejante para fora,
que praticamente salta, ficando entre nós. Ele é grande. Nunca que
vai caber tudo isso em mim. Mas não me intimido e ele percebe isso
quando estende o pacote laminado em minha direção e o rasgo com
os dentes e ele sorri, vestindo o preservativo em si.

— Você controla. – diz, descendo o zíper do meu short,


ajudando-me a tirá-lo. – Eu não quero te machucar. Está bem? –
concordo com a cabeça, realmente nervosa. Será que ele vai me
machucar? Uma parte minha quer isso. De uma maneira boa e
prazerosa, claro. Já a outra está realmente nervosa.

Ele segura meu quadril, ajudando-me a descer sobre ele e o


posiciono para entrar em mim. Sinto um pouco da dor, mas
realmente não ligo. Ele me para mais ou menos na metade e
começo a me mover sobre ele, que beija meu pescoço com força,
enquanto uma de suas mãos cuida do meu seio e a outra mantém o
ritmo dos meus movimentos.

— Oh, céus! – ele geme quando desço até o fim e me sinto


realmente poderosa por conseguir causar isto em um homem como
ele. Suas mãos me movimentam para frente e para trás e eu o beijo
com força, depositando neste gesto um pouco do meu desejo. Sinto
que estou perto do meu clímax e sinto que ele também esta.

Corro minhas mãos pelo rosto deste homem, que agora mantêm
a mão firme em meu rosto, fazendo-me olhar em seus olhos
brilhantes. Seco uma gota de suor que escorre em sua face antes
que ela se perca entre os pelos da barba. Em resposta, ele me
levanta, começando seus próprios movimentos, provavelmente
suaves demais até mesmo para mim, mas o suficiente para me
fazer gozar.

— Mulher, você vai me fazer ficar louco desse jeito. – é a


primeira coisa que ele diz. O que me faz rir, totalmente sem graça,
finalmente sentindo meu rosto se aquecer com algo além de desejo.

— Achei que eu fosse só uma garota. – eu o provoco, fazendo-o


rir.
— Não. Você decididamente não é só uma garota. – responde,
beijando-me com força.
Estou deitada sob as roupas do Louco Gostosão, no chão da
gruta. Ele está nu, deitado ao meu lado, passando a mão em meu
cabelo, a ponto de me fazer quase adormecer com seu toque. Estou
deitada em seu braço, sentindo o perfume que passa dele para mim.
Minha perna cai na pequena lagoinha que tem no centro da gruta e
sinto pequenos peixinhos tentando mordê-lo, o que me causa
cócegas.

Apoiando uma mão em seu peito, eu sento.

— Já escureceu. – comento. Ele ergue o corpo apenas o


suficiente para olhar para fora, tornando a deitar.
— Já passa das sete. – diz em resposta.
— Preciso voltar. Tenho que estar disposta para amanhã.
Procuro atrás de mim pelo meu sutiã, para poder me vestir de
volta, mas não o encontro.
— Procurando por algo? – ele pergunta, chamando minha
atenção. Ele balança meu sutiã de um lado a outro e tento puxá-lo
para mim.
— Devolve! – exclamo, tentando parecer brava. Mas tudo o que
consigo é fazê-lo rir.
— Você fica melhor sem ele. – diz.

Franzo o cenho, ignorando o rubor que sobe por meu rosto e ele
entrega o sutiã, que visto de imediato.

— Ainda acho que você fica melhor sem ele. – repete. – Sutiã
priva uma das melhores visões. – vejo um sorriso em seu rosto
quando passo a camisa pela cabeça.

— O que foi? – pergunto.


— Nada. – diz, sem desviar o olhar de mim. – Eu nem lembro
mais como é ter um primeiro dia de trabalho.
— Imagino o quão difícil deve ser a vida de quem escolhe se
alguém fica ou não com a vaga de emprego. – digo com sarcasmo,
jogando sua camisa em seu rosto.

— É bem difícil mesmo. – concorda. – Algumas pessoas tentar


usar da compaixão para conseguir. – ele faz uma pausa para vestir
a camisa. – “Eu tenho quatro filhos para cuidar, moço... Minha
esposa esta adoentada e tenho gastos caríssimos com
medicamentos para ela.”, ou então: “O senhor não faz ideia de como
é passar dificuldades...”. – ele suspira um tanto irritado. – Eu
realmente gostaria de poder dar a vaga para cada um deles, mas
não posso ser tão “humano”. Preciso pensar na minha empresa e no
que meus clientes esperam de nós. Não posso dar o lugar para
qualquer um, sendo que tem alguém que realmente está apto para
aquilo.

Eu o encaro por algum tempo, completamente boquiaberta. Não


esperava por esse desabafo dele.
— Certo. Retiro meu sarcasmo. – falo um pouco na defensiva. –
Isto deve ser terrível se você tiver um pouco de compaixão.

Quando termina de se vestir, ele se levanta, estendendo a mão


para me ajudar, dando um sorriso travesso quando a seguro.

— O que foi? – pergunto com o cenho franzido, percebendo algo


de errado em seu olhar. A resposta vem quando ele me puxa forte,
me fazendo apoiar em seu peito para não cair.
— Idiota! – exclamo, dando um tapa em seu peito, fazendo o
sorrir. Sinto seus lábios junto aos meus, me fazendo fechar os olhos.
Seu beijo há muito já se tornou familiar para mim e para todo meu
corpo.

— Sabe, eu geralmente recomendo essas pessoas para outras


empresas. – ele começa a dizer e levo algum tempo para entender
que se refere aqueles que não passam pela entrevista. – Não é
porque não conseguiram comigo, que não podem tentar em outro
lugar. – concordo com um sorriso. – Vou te acompanhar até seu
prédio. Já esta tarde para andar por ai e muito menos quero ser o
responsável por você se perder.

Tenho que rir com seu comentário. Afinal, ele não faz ideia do
quão provável é isso.

Caminhamos agora pelo calçadão, com apenas o mar e o vento


falando entre nós. À noite esta linda e uma lua cheia e sem nuvens
paira sob o mar, iluminando todo o caminho a nossa volta. Nenhum
de nós ousa falar qualquer coisa que seja e interromper o dialogo da
noite. Embora eu deva admitir que um dos principais motivos para
eu não falar, seja o fato de estar um pouco arrependida de ter feito o
que fiz. Não arrependida exatamente. É algo que não sei descrever
exatamente. Eu não sou assim. Essa não sou eu e, com ele, eu fui.
E talvez fosse novamente.

— É aqui. – sussurro, reconhecendo o lugar próximo a uma


barraquinha. Os altos prédios iluminam tudo a nossa volta. – Ou
pelo menos o ponto em que eu segui para vir para a praia. – dou de
ombros. – Depois tem que virar e...
— Quer conversar sobre o que te aflige? – ele me interrompe,
parando.
— Não é nada. – respondo, apertando os braços ainda mais
contra o peito, evitando seu olhar.

— Esta arrependida pelo que aconteceu lá atrás e agora esta se


culpando por isto? – arrisca.
— Não, sim. Não sei. Talvez. – a verdade é que eu realmente
não sei.

Ele fica de frente para mim e passa as mãos em torno de minha


cintura.

— Não se culpe por nada. – diz, para que apenas eu possa ouvi-
lo. – Tenho tanta culpa quanto você nisto. Na verdade, sou o único
culpado. – ele da um passo para frente e apoio as mãos em seu
peito, sentindo os movimentos de sua respiração. – Você apenas
estava caminhando e eu fui atrás de você.

Não acho que ele seja o único culpado. Eu poderia ter recusado
sua companhia desde o início. Poderia ter dito para que
voltássemos desde o ponto em que ele avisou que havíamos
passado da área civilizada. Em momento algum ele me forçou ou
obrigou a fazer qualquer uma das coisas que tenhamos feito. Eu
quis, desejei, cada um de seus beijos, durante todas as vezes que
ele o fez.

Mordo o lábio inferior, incapaz de expressar meus pensamentos


em voz alta.

— É estranho ver você com uma camisa. – digo, mudando de


assunto. Passo minha mão de leve pelo tecido em seu corpo.
— Se te deixar melhor, posso tirar.
— Não precisa. – sorrio.
— Podemos continuar, então? – pergunta, colocando uma
mecha chata do meu cabelo para trás da orelha e concordo com a
cabeça. Ele envolve minha cintura com o braço, retomando nossa
caminhada. Uau! – Só um instante. – diz, tornando a parar. – Fala. –
ele ouve a outra pessoa do outro lado. – Voltando para casa.
Aconteceu algo?

Tento me afastar, para dar privacidade para ele, que aperta a


mão em meu quadril, me impedindo de fazer isto. Meu coração
acelera com seu toque.

— Como você está? – pergunta. – Foda-se o carro, Felipe! Isso


é o de menos para mim. – ele parece realmente irritado por algo
quando corre a mão pelo rosto. – Onde você está? Tá. Estou a
caminho. Ligo para o seguro do caminho e eles veem o que dá para
fazer.

— O que houve? – pergunto quando ele guarda o celular de


volta no bolso. Ele olha para algo além de nós e percebo um ponto
de táxi do outro lado da rua. Ah...
— Emprestei o carro para um amigo e bateram nele. – diz.
— Meu Deus! – exclamo. – Está tudo bem com ele?
— Machucou de leve. Nada de mais. Só o carro que não deve
ter ficado muito bonito.
— Sinto muito.
Ele então solta um suspiro.
— Vou ter que te deixar. Preciso buscar ele no hospital.

Dou um sorriso um pouco decepcionada. Uma parte minha tinha


planos de convidá-lo para subir e, sei lá... Continuarmos a apenas
conversar e, quem sabe, descobrir o nome desse homem com quem
passei minhas últimas horas em companhia e praticamente a
primeira com quem conversei de verdade.

— Não. Tudo bem. Eu posso ir sozinha. Não é longe daqui até o


condomínio. – falo um pouco rápido demais. – Posso ir sozinha. Não
se preocupe.

Ele me encara com o cenho franzido.


— Tem certeza? Esta tarde para andar por ai assim.
— Não se preocupe. Caso precise, tenho pernas. Posso correr. –
arqueio uma sobrancelha, rindo. – Ou chutar.
Ele ri, dando um passo instintivo para trás, percebendo o que
quero dizer.

— Você foi simplesmente incrível lá atrás. – comenta, puxando-


me para perto. – Eu nunca antes tive alguém assim como você. –
sorri.

Sinto meu rosto não se aquecer com seu comentário, mas sim
pegar fogo. Torço para que as luzes do poste não revelem a ele o
quanto estou vermelha com suas palavras.

— Não se torture pelo que fizemos. – volta a falar. – Não vou me


arrepender de ter beijado você no meu “esconderijo secreto” ou de
ter apresentado ele a você. E muito menos de tudo o que fizemos lá.
– sorrio ao sentir seus dedos no cós do meu short, juntando nossos
corpos o máximo possível. – Gostaria que também não se
arrependesse por isso.

— Posso ao menos saber seu nome? – pergunto.


— Que tal um acordo? – ele pergunta em resposta. – Vamos
deixar nossos nomes como um mistério. Se for para nos
reencontrarmos, acontecerá. E, quando este dia chegar, levarei
você para um jantar e responderei todas suas perguntas.

— E se isto não acontecer? – torno a perguntar. – Vou ser


torturada o restante da minha vida com a lembrança de ter beijado
um homem culto, educado e bastante atraente? E que, além de
beijar bem, é um piteco. – sorrio, encorajada por suas palavras.

Eu realmente quero encontrá-lo outra vez. Descobrir seu nome e


o que mais puder. Mas, dentro desta cidade, as chances disso
acontecer são mínimas.

— Bem eu realmente gostei do que aconteceu. Então... – ele tira


o celular do bolso. – Se não encontrar você como aconteceu dessa
vez, terei que fazer da maneira antiga.

Sorrio quando ele aponta o celular para mim, tirando uma foto.

— Isso é sério? Foto? – rio.


— Sei que você mora por aqui. Sou capaz de ir de prédio em
prédio, perguntando se esta garota da foto mora nele.
Principalmente se chegar a meu limite.
— Não é justo. – digo.
— O que? – pergunta com o cenho franzido.
— Você ter uma foto minha e eu só à lembrança.
— Não seja por isto. – diz, tirando meu celular do bolso traseiro
do meu short, tirando uma foto de si mesmo. – Pronto.
— Da para espantar as baratas que aparecerem no meu
apartamento. – provoco. O que é bem mentira. Ele é lindo.

Sinto suas mãos me puxarem para perto novamente e ele me


beija. De vagar no início, aumentando a pressão entre nossos lábios
a cada instante e sinto seu amigo começar a reagir.

— Você precisa ir. – digo e ele ri.


— Adorei conhecer você. – ele sussurra em meu ouvido. – Já
estou a caminho! – exclama ao telefone, encerrando a chamada no
instante em que atende.
— Me de uma letra. – peço, como um último recurso de
descobrir seu nome. Ele sorri.

— A. – diz. – E a sua?

Mordo o lábio inferior e, tomada por uma onda de coragem, eu o


beijo com força, sentindo sua barba pinicar em meu rosto e é como
se uma pequena energia corresse de mim para ele quando faço isto
e tenho a sensação de que ele sente o mesmo.

— L. – murmuro contra seus lábios e ele se afasta, pouco antes


de correr para atravessar para o outro lado da rua para pegar o táxi.
Capítulo Três
Segunda-feira

Foo Fighters começa a tocar baixinho e distante, aumentando o


som e é como se aproximasse mais e mais a cada nota que toca.
Só quando esta em um tom relativamente alto é que me dou conta
de que é o alarme do meu celular, dizendo que já esta na hora de
pular para fora da cama, para o meu primeiro dia de trabalho. E é o
que eu faço.

Na verdade, eu me arrasto para fora da cama, já que ainda não


são nem mesmo seis horas da manhã direito. Mas como é meu
primeiro dia e não conheço nada por aqui direito e tenho que chegar
a BIT até as nove horas para me apresentar, prefiro me adiantar um
pouco a acabar me atrasando e causar uma má primeira impressão.

Nestes primeiros dias, irei de trem até descobrir exatamente o


melhor caminho que devo fazer para ir de carro até o centro. O que
me dará quase uma hora a mais de sono. Ou, pelo menos, assim
espero que aconteça.

Depois de um demorado banho morno para acordar, tomo um


rápido café da manhã apenas para não ficar de estômago vazio por
muito tempo e começo a me arrumar para poder sair: jeans preto,
camisa social branca de manga três quartos com um coletinho cinza
por cima e sapatos de salto baixo, também pretos e, para finalizar,
deixo o cabelo solto com uma maquiagem leve e um par de brincos
que ganhei da minha irmã, há alguns meses, junto de uma leve
borrifada do meu perfume favorito. Acho que com isto sou capaz de
aguentar o que vier pela frente hoje.

Para minha total alegria, a viagem de trem foi bem mais rápida
do que eu havia imaginado. Junte isto e o fato de eu não ter me
perdido na linha, no caminho para cá.

Assim que sai da estação, já pude ver o enorme edifício da BIT,


que ficava há umas duas quadras de lá. Pelo que contei, são um
total de trinta andares, fechando provavelmente três ou quatro
quarteirões de grande tamanho, junto de um galpão ao fundo e o
estacionamento para os funcionários. Foi mais fácil reconhecer o
local pelo logo dizendo BIT Technologies na frente, entre os andares
vinte e nove e trinta.

— Posso ajudá-la, senhorita? – o segurança pergunta assim que


me aproximo.
— Oi. Acho que sim. Eu... Hmmm... Sou Luara Brudosck. –
apresso a me apresentar. – A nova funcionária no setor de TI.
— Um momento. – diz ele, examinando algo no computador
dentro da portaria. – Sim, seu nome está aqui. Mas seu horário é
somente às nove.
Rapidamente, vejo que ainda são oito e quinze no relógio em
meu pulso. Falta bem mais do que eu esperava.
— Não conheço nada por aqui. – explico.
— A senhorita pode entrar. – diz. – Basta que se apresente para
Daiane na recepção.
— Tudo bem. Obrigada.

Caminho por cerca de cinquenta metros até a entrada do prédio,


onde as portas se abrem automaticamente quando me aproximo,
trazendo para mim uma lufada de ar gelado. Um ar realmente
acolhedor, considerando o calor que faz na cidade.

Assim que entro, reconheço a recepção. Meus olhos correm por


todo um ambiente realmente acolhedor. Na parede do fundo,
novamente vejo o logo da BIT Technologies e, ao lado, algo
parecido com um escorregador, que parece vir do andar de cima.
— Bom dia! – a voz animada da recepcionista que aparece de
repente me assusta. – Em que posso ajudá-la? – pergunta.
— Bom dia. – respondo com um sorriso um pouco sem graça. –
Sou Luara Brudosck. A nova fun... – começo a me apresentar, mas
ela me interrompe.
— Sim, sim. A moça transferida do escritório de São Paulo.
Estávamos a sua espera. – diz com um sorriso. – Pode subir até o
vigésimo sétimo andar. Saberá que está no lugar certo pelos pufes
espalhados assim que sair do elevador. Avisarei Pedro que você já
chegou. Sinta-se à vontade.

— Obrigada. – digo com um sorriso sincero.

Funcionários educados e gentis. Acho que já comecei a gostar


daqui.

Assim que saio do elevador, algo chama minha atenção. São


alguns pufes cuidadosamente posicionados logo à frente, com
escritas: ESC, CRTL, ALT e DEL, em uma espécie de bar-
lanchonete. As outras que estão espalhadas pelo lugar também são
teclas. Algumas foram colocadas formando palavras.

Tudo aqui é realmente lindo e criado para parecer um bar dos


anos setenta. Os Pufes, a decoração... Os discos de vinil e a música
ambiente. Se eu não soubesse, jamais diria que este lugar é uma
empresa de tecnologia.

— Ah meu Deus! – exclamo baixinho, finalmente notando algo


em um canto, pouco mais para a esquerda. – Só pode ser disso que
o Victor estava falando!

Caminho até onde uma mesa de bilhar personalizada em uma


réplica de um Ford Mustang, modelo de 1965 esta.

— Legal, né? – ouço uma voz dizer atrás de mim.


— É incrível! – exclamo, virando para a pessoa que acaba de
chegar.
— Você deve ser Laura Brudosck. – diz, estendendo a mão para
mim e a aperto em um rápido cumprimento. – Sou Pedro.
Responsável pelo setor de TI e Software. Supervisor, caso queira
colocar assim. – ele sorri, ainda segurando minha mão. – Mas, por
hoje, serei seu guia aqui na BIT e irei te apresentar tudo o que
precisar saber a nosso respeito. Aproveite o passeio e tire todas e
quaisquer dúvidas que surgirem.

Pedro solta minha mão e dou um sorriso, tentando disfarçar o


fato de ele ter me chamado de “Laura”. Quer dizer, não gosto que
me chamam assim e não quero parecer indelicada ou chata ao
corrigi-lo. Então tenho que me conter.

Em poucos segundos, eu observo a fisionomia de Pedro. Ele tem


mais ou menos minha altura ou talvez poucos centímetros a mais.
Seu cabelo preto e curto, bem cacheadinho. Olhos de cor castanha,
escondidos por detrás de um par de óculos de armação marrom
claro. A fala suave e a maneira com que conversa me diz que há
algo de diferente nele.

— Aceita um café, chá, leite, suco ou qualquer coisa antes de


começarmos nossa “pequena” excursão? – ele oferece.

— Um suco. Obrigada.

— Uma programadora que não toma café? – Pedro pergunta


quase rindo e percebo a ironia em suas palavras. – Querida, sua
vida vai mudar drasticamente depois que realmente começar a
trabalhar aqui.

Franzo o cenho ao ouvir suas palavras. Se certa forma, sei que


isso é verdade. Eu só espero que seja de uma maneira boa.

— Querido, eu sou, naturalmente, quase uma máquina de


programar. – digo imitando o jeito de um amigo falar. – Se eu
tomasse cafeína, ficaria mais agitada que uma criança hiperativa
depois de comer todo doce que a mãe disse para ela não comer.
— Menina, sabe que gostei de você? – ri. – Anda, temos muito
que te mostrar ainda. – e começa uma caminhada. – Alias, aqui é
onde você fará suas refeições. Não se preocupe, porque é tudo por
conta da casa e de excelente qualidade. Nada do que consumir será
cobrado.

— Legal. – digo, acompanhando-o.

É oficial: Estou perdidamente apaixonada! A BIT é simplesmente


incrivilhosa! Cada andar que conheço é algo diferente.

O chão no décimo oitavo andar é todo coberto pelo mapa do


mundo. Um mapa perfeitamente desenhado nos mínimos detalhes e
extremamente realista. No primeiro andar, o oceano Atlântico
fazendo jus ao território brasileiro. Tem até mesmo algumas
pequenas ilhas para poder pisar, caso tenha sensação de se
afundar e, confesso que acabei usando elas.

O único andar que não conheci foi o último que, segundo Pedro,
é onde fica a sala do Presidente e que, também segundo ele, estava
em reunião e não poderia me receber hoje. Eu me pergunto o tipo
de visão que ele tem do trigésimo andar.

— Você provavelmente irá conhecê-lo agora só na reunião


mensal. Para seu azar, a deste mês já foi. – Pedro explica. – As
garotas aqui costumam babar em cima dele, mas ele não é do tipo
que se envolve com nenhuma funcionária, para o azar de todas
vocês que trabalha, aqui.

— Por alguma razão que desconheço, achei que ele fosse, sei
lá, um senhor de mais idade. Provavelmente na casa dos quarenta e
todos ou cinquenta e poucos anos.

— Você não vê muito TV nem lê revistas de fofoca, né? – Pedro


pergunta, rindo. – Se aquele homem tem cinquenta anos, preciso
descobrir a fórmula da juventude dele. – a porta do elevador se abre
e ele dá espaço para que eu saia na frente. – Bem, de qualquer
forma, verei com a Daiane se ele não está com horário livre na
agenda para conhecê-la antes da reunião. Estranhei que não tenha
te chamado hoje.

Pedro segue até o balcão da recepção, onde Daiane trabalha de


forma bastante útil e fico mais para trás, dando privacidade a
conversa dos dois.

— Eu não entendo. – Pedro diz. – Bem, se ele marcar algo ao


longo da semana, avise-me que pedirei para que ela suba.
— Pode deixar. – Daiane diz. – Alias, Pedro?
— Sim?
— O crachá da senhorita ficou pronto. – ela entrega para ele um
pequeno cartão.
— Luara M. Brudosck. – Pedro lê. – Vocês escreveram errado. É
Laura.
— Na verdade é Luara mesmo. – finalmente eu o corrijo.
— E você me deixou chamá-la de Laura o dia todo?! – exclama,
virando para mim e me entrega o cartão com minha foto. – Você não
precisa usar isto. Só o tenha sempre por perto, porque precisará
para acessar certas coisas.
— Ok.

— Bem, Luara, já são quatro horas e não tenho mais nada para
te mostrar. – diz. – Alguma dúvida sobre o que terá que fazer?

— Nenhuma. – respondo de imediato. Afinal, serei programadora


sênior. Não há lá tanta coisa nova para mim além de que terei que
responder diretamente com ele as vendas dos aplicativos que eu
fizer e algumas outras coisas necessárias, da qual ele não
mencionou. Mas não acho que seja lá algo complicado.

— Então esta liberada por hoje. – volta a falar. – Pode ir para


casa descansar e não precisar chegar tão adiantada amanhã.

Sorrio sem graça e ele se despede de mim, já voltando para o


elevador. Se todos os dias por aqui forem como este, posso nunca
mais querer sair dessa empresa. Dessa cidade.
Quando entro no meu apartamento, já passa um pouco das
cinco, então aproveito para tomar um rápido banho e ir ao
supermercado, para fazer as compras para o mês. Estou sem
absolutamente nada no armário até mesmo para esta noite. Não
posso viver de lanche e pizza o tempo todo. Não apenas minha mãe
me mataria se eu fizesse isso.

— Alô? – digo prendendo o celular no ombro, empurrando o


carrinho pelo mercado.
— VOCÊ NÃO LIGOU! – explode a voz do outro lado.
— Julie. – digo, reconhecendo minha melhor amiga.
— Achei que tivesse dito para me ligar quando voltasse da praia
ontem!
— Achei que você tivesse dito que me ligaria. – defendo-me.
— Sério? Achei que tivesse dito o contrário. – ela ri.
— Você bebeu e esqueceu? – provoco.
— E ai? Como foi lá?
— Foi só uma caminhada na praia, Ju. – digo, de repente
lembrando-me o que realmente aconteceu nessa “simples
caminhada”. Durante todo o dia eu tentei me manter distraída para
não pensar Nele. Mas agora, sozinha e nesse assunto... – Hm... O
que de mais poderia acontecer em uma caminhada na praia?
— Me diz você, porque suas perguntas autodefensivas sem
acusação dizem o contrário.
— Não estou fazendo perguntas autodefensivas, Julie. – digo,
jogando a embalagem de um molho de tomate no carrinho.
— Aonde esta a sujeira, Luara? – pergunta com seu tom
autoritário.
— Não tem sujeira alguma. – respondo, seguindo agora para a
sessão de frutas e verduras.
— Aonde esta a sujeira? – insiste.

— Certo! Certo! Conheci alguém na praia ontem. Caminhamos


juntos por algum tempo. Ele me acompanhou até o lugar que eu
conhecia para voltar para casa e depois foi embora. Fim. – digo
rapidamente, lutando para afastar as imagens da gruta da cabeça.
— VOCÊS SE BEIJARAM! – ela grita do outro lado da linha e
tenho que afastar o celular do ouvido.
— Não! Nós não nos beijamos. – minha voz baixa para um
sussurro e sinto meu rosto se aquecer.
— Não minta para mim, Lu. Eu te conheço melhor do que
ninguém. – sim, ela me conhece melhor até mesmo que eu mesma.
Mas existem coisas que não devem ser ditas assim.

Permaneço em silêncio por alguns minutos, enquanto coloco


mais algumas coisas dentro do carrinho, riscando minha lista de
compras.

— Ju, eu estou no supermercado. – volto a falar. – Não posso


ficar falando sobre esse tipo de coisa em um lugar desses. As
pessoas vão ficar me olhando.
— Achei que eu fosse sua melhor amiga e que contássemos
tudo uma a outra. – diz, tentando soar ofendida.

— E você é! – exclamo. – Só não quero falar sobre isso aqui e


nem agora. Depois te ligo. – e desligo.

Conheço Julie o suficiente para saber que ela não atenderá


minhas ligações pelos próximos dois dias, no mínimo. Mas ela terá
que entender meus motivos quando fizer isso e que simplesmente
não consegui contar para ela assim, dentro de um supermercado,
que transei com um estranho, embora incrivelmente sexy e gostoso,
na praia. E, que nem mesmo sei seu nome além da inicial dele ou
se um dia tornarei a vê-lo. O que eu acho que nunca ira acontecer.
Talvez seja melhor assim...
Capítulo Quatro
Sexta-feira

Essa última semana me fez pensar bastante no que eu faria se


ainda estivesse em São Paulo. Provavelmente saindo com Julie,
jogando videogame com Tommy ou fazendo algo com Camile. Eu
não sei exatamente. Mas, provavelmente, eu não teria passado
todas as minhas noites trabalhando em aplicativos e ideias para
melhorar o que estou fazendo no trabalho. Na verdade, nunca fui
uma mulher que leva trabalho para casa. Gosto de deixar as coisas
separadas e isso foi apenas uma pequena exceção para melhor me
adaptar aqui no Rio de Janeiro. E isso ajudou.

A correria do dia a dia, os desvios e breves percas no caminho


de volta para casa quando comecei a vir para o trabalho de carro...
Tudo fez com que essa primeira semana aqui passasse mais rápido
do que eu esperava. Mais um dos motivos pela qual levei trabalho
para casa e evitar dormir tão cedo.

Na quarta-feira nós tivemos reunião com um novo cliente e eles


querem que desenvolvamos um aplicativo para a empresa deles. É
algo simples e que deve levar pouco tempo, mas é algo
interessante.

Pedro me colocou como responsável para cuidar do site deles e,


até o que vi agora, é uma desordem total! Sério, logo no início da
página tem algo como “clique aqui para conferir nossas ofertas”,
então que eu cliquei para conhecer. Só que em vez de redirecionar
para onde deveria, fui jogada direto para a área de códigos, onde
programamos. O que me fez pensar que um cliente não entende o
porquê de aquilo acontecer, já que esperava ver os produtos para
poder efetuar a compra. Eu tive que rir para não xingar a pessoa
que fez aquilo.

Bem, a questão aqui é que já comecei a trabalhar nesse e estou


praticamente no final. Quer dizer, eu criei outro site, porque não
tinha condições de trabalhar naquele em pouco tempo. Eu perderia
mais tempo do que se fizesse da maneira com que preferi.
Provavelmente entre segunda ou terça já devo terminar.

Para ser mais sincera, minha vontade era a de ficar aqui até
mais tarde e adiantar esse trabalho, porque não gosto de deixar
trabalho de uma semana para outra assim. Mas Pedro deve passar
na minha sala dentro de aproximadamente dez minutos, para irmos
a um barzinho aqui perto. Segundo informações, o pessoal do TI vai
quase toda sexta depois do expediente para lá e, como sou a
“novata” da vez, serei a “amiga do bem”, como eles chamam aqui.

— Luara, vamos, menina! – ouço a voz de Pedro da porta. – Já


estão todos à sua espera.
— Só um segundo. Estou... – começo a dizer, mas sou
interrompida.
— Nem meio segundo! – exclama. – Você é nossa amiguinha e
deve cumprir com seus deveres.
— Eu ia dizer que só daria um “Ctrl S” aqui e salvar meu trabalho
e que já estava indo. Mas alguém interrompeu. – digo calmamente,
pegando minha bolsa sobre o armário.

Como faço todos os dias, desligo o computador, ar-condicionado


e fecho a sala quando saio.

— Está sabendo da última? – Pedro pergunta assim que


entramos no elevador.
— Creio eu que não. – respondo. – O que houve?
— Bruno está interessado em você. – diz com certa calma
aparente e vejo um sorriso em seu rosto.
Encaro a porta do elevador enquanto ela se fecha e assim
permaneço por alguns instantes. Bruno é um rapaz do mesmo setor
que eu. Resumindo: vinte e seis anos, 1,80 de altura, cabelo loiro
escuro bem cortado. Porte físico mediano, bonito e cobiçado por
várias garotas de vários setores e, pelo que já me disseram, já saiu
com algumas delas também.

Em outros tempos eu não pensaria duas vezes antes de topar


ficar com ele. Mas devo admitir até mesmo para mim mesma que
minha cabeça ainda se volta para as lembranças de domingo e de
tudo o que aconteceu naquela gruta.

Fecho os olhos, contendo o impulso de levar a mão ao bolso


para pegar o celular e ver sua foto. Aquele sorriso é a única coisa
verdadeira que pode provar que tudo aquilo foi real, não apenas um
sonho erótico.

Quando reabro os olhos, vejo pelo meu reflexo no espelho do


elevador tudo começar a acontecer. A maneira com que seus lábios
quentes tocaram minha pele, percorrendo meu corpo. Suas mãos
brincando com meu cabelo e o mesmo calafrio daquele percorrer
meu corpo, pelo caminho que seus lábios fizeram em mim... A
maneira com que minhas pernas se prenderam em sua cintura,
enquanto ele se movimentava suavemente sob mim, minhas mãos
correndo por suas costas, acariciando seu cabelo de suave
fragrância. O perfume que até hoje parece estar impregnado em
meu corpo...

— Oi? Alô? Terra para Luara! – ouço Pedro chamar, estalando


os dedos na minha frente, enquanto segura a porta aberta do
elevador com a outra mão. – Vamos, garota!
— Desculpa. – peço baixinho, passando por ele. Sinto todo meu
corpo terrivelmente quente e posso “enxergar” o rubor em meu rosto
com a lembrança que acabei de reviver mais uma vez.
— Já estava tendo pensamentos inapropriados com ele, né? –
pergunta, rindo.
— Quê?! – exclamo chocada. – Não! De onde você tirou isto?
— Está mais vermelha que um pimentão, querida. – ri. – Então
ele tem chances?
— Não posso. – respondo após alguns instantes, ainda evitando
seu olhar enquanto caminhamos para fora do prédio.
— Como assim “não posso”? – repete.

Quando abro a boca para responder sua pergunta, já estamos


no estacionamento. Todos já nos esperando, próximos ao meu
Crossfox.

— A propósito: você terá de pagar castigo esta noite.


— O que quer dizer com isso? – pergunto, embora a resposta
venha em 3D quando Bruno caminha em minha direção com um
chapéu de hélice em cima, escrito NOOB na frente. – Sem chances
de eu usar isso! – exclamo, tentando me desvencilhar de suas
mãos.
— Ah, vai usar, sim. A noite toda ainda. – ele sorri.
— Não vou mesmo! Não estou mais na faculdade para receber
trote.
Mais uma vez Bruno sorri para mim e dessa vez consigo ver um
ar de malícia em seu sorriso, que chega até ser bonito. Ele é bonito.

— Bom, sua outra opção é pagar a conta. – diz calmamente,


com o pequeno chapéu “bobo” pairando pouco acima de minha
cabeça. – E não economizaremos.

Fecho a cara para Bruno, que me olha fixamente. Suas mãos


ainda estão acima da minha cabeça, enquanto seguro seu punho,
impedindo-o de colocar o chapéu mais idiota que já vi.

— Eu me rendo. – digo, soltando-o e ele desce o boné,


ajustando-o em minha cabeça.
— Siga em frente, vire à direita e continue por duas quadras,
logo na esquina. – ele diz com um sorriso vitorioso, caminhando
para o lado do carona.

Assim como Bruno, Igor também vai para o outro lado e destravo
o carro para que eles entrem e levo a mão à porta do motorista para
fazer o mesmo quando sinto um calafrio percorrer minha espinha e
é como se alguém estivesse me observando.

E eu procuro, ainda sentindo algo esquisito, mas tudo o que vejo


são outros funcionários caminhando até seus carros.

— Quem é aquele lá em cima, Pedro? – pergunto, finalmente


notando um pontinho bem pequeno na enorme janela de vidro do
último andar do prédio.
Pedro segue meu olhar.

— Seu querido chefinho. Um sonho de consumo. – responde.


— E, pelo que eu já soube inacessível para todas aqui. – as
palavras praticamente me escapam.
— Ei! Eu não esperava isso de você! – exclama, parecendo
chocado.
— Ué. As pessoas falam muito dele por aqui. – respondo, ainda
tentando enxergar a figura provavelmente de terno, que parece
observar a cidade do topo de um castelo. É como se ele tomasse
conta do seu reino. – Mas não é como se eu fosse ser uma dessas.

— Vocês vão ou não? – ouço agora a voz de Bruno, nos


apressando.

Pedro entra no carro, enquanto ainda tento, em vão, formar uma


fisionomia para o homem que parece nos observar lá de cima.
Infelizmente, minha visão não é tão boa quanto a dele deve ser.

De repente sinto como se algo me faltasse.

— Vocês falaram para ela? – Igor pergunta assim que sento no


meu lugar, dando partida no carro para sairmos.
— Me disseram o que? – pergunto desconfiada, olhando pelo
retrovisor.
— Não. – Pedro responde. – Acham melhor esperar chegar lá ou
damos a chance dela se preparar?
— PELO AMOR DE DEUS, COMEÇOU AGORA TERMINA! –
explodo.
— Digamos que você terá que ser “divertida” esta noite. – Bruno
diz do meu lado e olho para ele de canto, saindo com o carro.
— Como assim? – pergunto ainda mais desconfiada.
— O suficiente a ponto de não precisar usar esse chapeuzinho
dentro da BIT durante a próxima semana inteira. – Pedro responde,
colocando a mão em meu ombro, numa falha tentativa de me
animar.

Paro no semáforo fechado, voltando o olhar para cada um deles.

— Vocês só podem estar de sacanagem. – digo. – Querem que


eu divirta três bêbados?
— Desafio lançado, gata. – conclui Bruno, dando uma piscada
para mim.

Volto novamente minha atenção para o trânsito.

Não tenho a menor ideia de como farei isso. Até consigo me


visualizar na próxima semana: independente da roupa que use,
estarei sempre com esse chapéu infantil e bobo, sendo motivo de
piada por onde quer que eu vá.

— Desafio aceito, gato. – digo ao parar no semáforo seguinte,


também piscando para Bruno e aprecio o som de
“ooooooooooohhhh!” vindo do banco traseiro.

Estaciono meu carro não em um bar qualquer e sim em um Bar


Discoteca dos anos oitenta, com nome Los Tres Chicos, segundo o
letreiro que pisca com uma luz vermelha, ao lado de um vinil antigo.

— Los Tres Chicos. – Bruno diz, parando ao meu lado. – Três


amigos que vieram para o Brasil ainda crianças. Os três
basicamente com a mesma história de vida. Mas, nenhum do
mesmo país. Um mexicano, um chileno e um espanhol. – explica. –
Eles abriram o lugar no final dos anos oitenta e o sucesso que tem
aqui hoje é algo quase que inexplicável.

— Bacana. – comento.
Assim que entro na discoteca, percebo o fascínio pelo lugar. É a
coisa mais incrível que já tive a oportunidade de ver até agora. O
chão todo com piso xadrez, o teto pintado coberto por centenas,
talvez até milhares de discos de vinil. Uma bicicleta antiga,
pendurada em uma das paredes e as pessoas que dançam ao som
de uma música saída de um Jukebox ao canto, que reconheço
sendo Girls Just Wanna Have Fun.

Esse lugar é exatamente o tipo de lugar que costumava não


frequentar em São Paulo. Não que não goste, é claro. Apenas
porque nunca tive a oportunidade de conhecer.

— É incrível! – exclamo.
— Anda. Tem uma mesa ali no canto. – Pedro diz, tocando
minhas costas, guiando-nos até lá.
— Como vocês acharam isso aqui? – pergunto.
— Algum tempo atrás, nós estávamos realmente bêbados e
queríamos algo novo. – Bruno começa a explicar. – E então vimos
umas luzes piscando e viemos ver o que tinha e boom! – o “Boom”
foi acompanhado da explosão com suas mãos, o que me fez rir.

— E vocês foram atraídos para cá como três vaga-lumes. –


comento, observando o globo que emite um brilho ao som da
música.
— Exatamente.
— Vou pegar nossas bebidas. – Igor diz. – Luara, o que vai
querer?
— Qualquer coisa que não tenha álcool. Pode escolher. –
respondo, retribuindo seu sorriso.
— Vou com você. – Pedro sai em seu encalço.

Sentada no sofá, no canto mais afastado, eu observo tudo a


minha volta. Isso tudo aqui é tão lindo, que não me canso de
admirar. Tenho que trazer a Ju aqui um dia desses...

— Por que vocês não me contaram que viríamos a um lugar


como esses? – pergunto para Bruno, que está sentado ao meu lado
no sofá. Acompanho com os olhos o movimento do globo. – Eu
poderia ter me vestido a caráter!

— Eu ia adorar ver você assim. – ele responde com um sorriso


de canto, acomodando-se sobre a perna para ficar virado para mim.
– Tenho certeza de que ficaria linda com um vestido de bolinhas.
Não que já não esteja só com essa blusa. – diz.

Lembro-me do que Pedro contou quando estávamos no elevador


e meu rosto se aquece para bem além do calor que faz aqui dentro.

— Está tudo bem? – pergunta, tocando a manga da minha


camisa. Por impulso, eu puxo o braço para me afastar.
— Bruno, eu não... – começo a dizer, mas sou interrompida.
— Pedro te contou. Não foi? – apenas dou de ombros. – Certo.
Agora estou totalmente sem graça. Não era para ele ter dito nada
para você.

Bruno torna a se sentar voltado para a mesa. Os cotovelos


apoiados sobre a mesa, enquanto observa algo ao longe. Uma coisa
eu não posso negar: ele é bonito. Um perfil bastante atraente e
olhos azuis, que parecem brilhar.

— Por que eu? – pergunto com o cenho franzido. – Existem


muitas garotas dentro da BIT que realmente se interessam por você.
— Justamente por isso. Estou cansado disso. E você não esta...
– ele começa a dizer, mas para. – A menos que você tenha um
namorado em São Paulo. Então isso explicaria tudo.
—Só tem uma semana que cheguei ao Rio de Janeiro. Eu mal te
conheço. – respondo. – E não. Nós terminamos meses atrás.

— Então por que não? – pergunta, mais uma vez sentando de


frente para mim. Sua mão percorrendo meu braço até chegar ao
ombro e pescoço.
— Isto não quer dizer exatamente que eu esteja no mercado. –
digo um pouco mais rude do que planejava, tirando sua mão de
mim. – Muito menos que eu já não esteja interessada em outro. – e
viro para o lado do bar, para ver se Igor e Pedro já estão voltando.
— Mas você está aqui! – exclama. – E ele em São Paulo. Por
que querer algo assim? – ele pergunta, agora segurando meu rosto
para ele e encaro seus brilhantes olhos azuis. Bruno pode ser lindo
ou o que for, mas o que sinto por ele é menos do que Pedro poderia
sentir por mim. Ou eu por ele. – Ele está aqui, não esta? Ele
trabalha na BIT? É isso?

Franzo o cenho. Que droga de interrogatório é esse? Não devo


satisfações da minha vida pessoal a ninguém.

Tiro suas mãos de mim.

— Sim e não. – respondo, não me importando mais em parecer


rude ou não. – De qualquer forma, você não é uma das pessoas
com quem eu conversaria sobre isso.

Ele balança a cabeça em afirmativo e sorri, ainda que agora


seus olhos digam algo inelegível.

Pedro e Igor voltaram com nossas bebidas alguns minutos


depois, trazendo cervejas e um suco para mim.

Não posso dizer que o clima não ficou estranho pela maior parte
da noite, mas eu não permiti que isso interferisse na minha tarefa de
diverti-los mesmo estando sóbria. O que foi um grande sacrifício.

Depois de algumas bebidas e vários sucos, consegui convencer


cada um deles a dançarem comigo e, para ser justa, a única pessoa
aqui que realmente sabia dançar era Pedro, que passou a maior
parte do tempo dizendo que eu deveria mexer mais os quadris.

— Se divertindo? – Bruno pergunta enquanto dançamos.


— Bastante. – respondo, dançando ao som de That’s The Way (I
Like).
— Eu também. – ele sorri e jogo meus cabelos por cima do
ombro, tentando ignorar o fato de que está perto demais do meu
espaço para uma música agitada.
— Você é um péssimo dançarino! – digo um pouco mais alto,
logo que a música termina, dando lugar a Please Don’t Go.
— Eu sei. – concorda. – Mas sou bom em outras coisas.

Bruno sorri, aproximando-se ainda mais de mim. Em resposta,


eu seguro seu braço, fazendo-o aumentar o sorriso e, ao contrário
do que ele deve estar esperando de mim, eu o afasto.

— Qual é? – pergunta. – Nem mesmo um beijo?


— Lamento. – respondo, dando de ombros. – Acho que você vai
ter mais sorte se for tentar conversar com alguma outra garota por
ai. Têm várias dessas aqui.
— Eu quero você. – diz, mais uma vez se aproximando. – Só um
beijo e prometo não insistir mais nisso.

Bruno está perto. Mais perto do que eu gostaria de admitir e isso


faz com que eu me sinta claustrofóbica.

No início da noite eu achei que o fato de não querer nada com


ele, era por ter encontrado aquele rapaz na praia antes. Mas, quanto
mais tempo passo em sua companhia, mais percebo o quão
parecido ele e Felipe são. A insistência, o hábito de beber além do
que deveria. Isso... Não dá.

— Eu vou ao banheiro. – digo, dando as costas para ele, abrindo


espaço por entre as pessoas que ainda dançam e sinto minha
cabeça girar. – Cheio demais. Muito cheio... – murmuro para
ninguém além de mim mesma.
— Já estava achando que você tivesse ido embora e se
esquecido de nós. – Pedro diz assim que sento entre ele e Igor.
— Precisava tomar um pouco de ar. – respondo. – Está muito
abafado aqui.

Uma garota ruiva coloca três cervejas e um coquetel em nossa


mesa, junto de um prato de salgadinhos.

— Achei que eu não fosse poder beber esta noite. – digo quando
ela coloca o coquetel na minha frente.
— Não tem álcool. – Igor ri.
— Ah... Acho que posso sobreviver com isto. – respondo,
provando da bebida que mais se parece com um suco de morango
comum, com um morango e um guarda-chuvinha na borda. O sabor
é algo que não consigo descrever com exatidão. – Isso é
simplesmente maravilhoso! – exclamo.
— Coquetel Primavera. – Pedro diz. – Caju, maçã, abacaxi,
morango e leite condensado.
— Não posso nunca me esquecer destes ingredientes. –
comento mais para mim mesma, tomando mais um gole.
— Seu querido chefinho quem pagou para você. – Pedro
sussurra em meu ouvido. – “Algo especial para a bela dama”. Foram
exatamente essas as palavras que ele usou.

Quase engasgo com seu comentário.

— Ele queria te conhecer. – sorri, claramente debochando de


mim.

Sinto o rubor subir por meu rosto e tento disfarçar o


constrangimento que a brincadeira de Pedro me dá.

— Qual era o assunto? – pergunto, tentando mudar de assunto.


— Estávamos conversando sobre mulheres. – Bruno responde,
lançando um olhar para mim. – As daqui esta noite estão
simplesmente incríveis. – ri.
— Você namora, Igor? – pergunto, virando para ele, ignorando o
comentário de Bruno.
— Até semanas atrás, sim. Mas parece que tenho dedo podre
pra coisa.
— Duas ex em dois meses. – Bruno acrescenta. – Não é “dedo
podre”. É mau gosto mesmo. – torna a rir.

Lanço um olhar severo em sua direção, numa falha tentativa de


fazê-lo parar.

— Você não tem dedo podre. – falo. – Apenas ainda não


encontrou a garota certa para passar seus dias. – toco seu ombro
com o meu, dando-lhe um sorriso. – Se quiser posso te apresentar
algumas amigas. – ele sorri em resposta.
— Se elas forem gatas como você, eu acho que vou querer
conhecer todas. – responde.

Ao longo da conversa, descobri que a primeira garota que Igor ficou


na adolescência se assumiu homossexual poucos dias depois de
terem terminado e o mesmo aconteceu com as duas seguintes. Sua
segunda namorada de verdade terminou com ele depois de quase
um ano de relacionamento à distância, porque havia conhecido
outro cara. Mas, mesmo depois de meses, ainda fica no pé dele,
mandando mensagens com indiretas. E a última, que ele chegou a
compor uma música, terminou o namoro depois de dois meses,
aparentemente sem motivo algum.

— Menino – Pedro começa a dizer assim que Igor para de falar.


–, semana que vem iremos você e eu para um lugar, só para tirar
essa Zica de você. Urgente!
— Já disse que não vou a nenhuma boate gay com você. – Igor
solta quase que de imediato. O que me faz rir.
— Não seja tão bobinho, querido. – Pedro diz, passando a mão
pelo cabelo cacheado de Igor. – Apenas não posso dizer para onde
iremos.
— Certo! – Bruno exclama, arrastando sua cadeira para trás. –
Já chega dessa baboseira para mim. Podemos ir embora?
Reviro os olhos. Sério que ele achou que eu fosse querer ficar
com ele?
— Quem é o primeiro que vou deixar? – pergunto também me
levantando.
— Eu. – Pedro responde. – Minha casa fica há quatro quadras
daqui.
— Então vamos lá.

Depois que deixei Pedro na casa dele, Igor insistiu para que
fosse junto deixar Bruno no apartamento. Pelo que ele disse,
conhecia-o o suficiente para saber que bêbado, ele daria mais
trabalho do que dois dele. O que me fez ter que reajustar o GPS e ir
como se fosse para a BIT, seguindo por duas quadras de lá.

O prédio que Bruno mora é bem mais simples e vários andares a


menos que o Golden Village.

— Vocês vão subir? – Bruno pergunta quando estaciono o carro


frente a portaria do seu prédio.
— Eu não arriscaria deixar você pegar o elevador sozinho. – Igor
responde, ajudando-o a sair do carro.

Saio do carro, indo fazer o mesmo, passando o braço de Bruno


por meus ombros, segurando-o pela cintura.

— Pode segurar mais embaixo de se quiser. – diz com a voz


enrolada, rindo. – Eu sei que é isso que você quer.
— Estou bem aqui. – respondo.

Subimos os três em silêncio até o sexto andar. Igor, que estava


com a chave do apartamento, sai na frente, para poder abrir a porta.

— Vou preparar o banheiro para poder dar um banho gelado


nele. – informa. – Acha que da conta sozinha por enquanto?
Franzo o cenho, jogando Bruno no sofá.
— Acho que sim.
— Você é ainda mais gata vista deste ângulo, sabia? – Bruno
pergunta.
— Sei.
— Por que não se senta aqui do meu lado? – pergunta, batendo
com a mão no lugar vazio ao seu lado. – Eu não mordo.
— Quanto a isto tenho minhas dúvidas. – respondo, cruzando os
braços contra o peito, olhando para o corredor em que Igor saiu.
— Qual é, Luara? – pergunta. – Já entendi que você não quer
nada comigo e que tenho mais chances com as ex-namoradas
lésbicas do Igor de que com você. Mas ainda podemos ser amigos.

Ele então levanta do sofá, caminhando em minha direção.


Instintivamente, dou um passo para trás.
— Não podemos?
— Quando você estiver sóbrio de novo, conversaremos sobre
isto. – respondo, dando outro passo para trás, topando contra a
parede.
Com uma agilidade que chega a surpreender, Bruno tira a
própria camisa, jogando-a ao chão, dirigindo-se até mim. Olho mais
uma vez para o corredor, na esperança de que Igor esteja voltando.
Na certa ele está esvaziando o tanque depois de toda aquela
cerveja que tomou.

Por um instante eu considero a hipótese de gritar.

— Acha mesmo que isto pegaria bem para sua imagem na


empresa? – pergunto a ele, juntando meus braços mais uma vez
contra o peito, de maneira protetora. – O que todas suas fãs
pensariam a seu respeito?

Ele ri e não é uma risada agradável. Animada. Mas sim, sombria.


Bruno esta praticamente em cima de mim agora. Não me faça fazer
algo da qual você vá se arrepender, Bruno.

— Apenas que fui um louco apaixonado. – sorri.


— Eu realmente pensei que você fosse uma pessoa bacana. –
comento, tentando mantê-lo distraído de qual quer que seja suas
intenções. – Mas depois desta noite... Sinto muito, mas você
realmente perdeu qualquer chance comigo.
Mais uma vez ele ri.
— Acha mesmo que eu preciso de alguma chance, garota? –
pergunta.

Mantenha o controle, Luara. Eu lembro-me. Se ele tentar algo


contra você, você sabe o que tem que fazer.

Antes que eu perceba, suas mãos estão em meu corpo,


descendo por uma perna, fazendo-me sentir um calafrio percorrer
por minha espinha e, posso dizer com toda certeza do mundo, que
não é um calafrio de excitação.
— Não faria isto se fosse você. – advirto, mantendo um olhar
firme sobre ele.
— Ou o que? – pergunta, aproximando seu corpo do meu,
prendendo minhas mãos contra a parede atrás de mim,
impossibilitando de empurrá-lo para longe. Seu hálito quente e
enjoativo, bem próximo ao meu pescoço.

Eu normalmente não faria o que estou perto de fazer. Mas isto é


porque normalmente não sou forçada a fazer o que estou fazendo.
Normalmente os homens iguais a Bruno, bêbado, são os que
costumo manter longe de mim. Normalmente...

Quando Bruno toca meu pescoço com seus lábios, ergo a perna,
acertando meu joelho em cheio no meio de suas pernas, levando-o
ao chão quase que instantaneamente.

— BRUNO! – ouço a voz de Igor vinda do corredor quando eu o


acerto, fazendo-o gritar de dor.

Ainda sentindo todo meu corpo tremer e uma raiva imensa, pulo
por cima de Bruno, que mantêm as mãos entre as pernas,
contorcendo-se de dor, e vou para perto de seu sofá, sentando.

— Belo sofá você tem aqui. – digo, cruzando as pernas, lutando


para manter a voz firme.
— Que merda aconteceu aqui? – Igor pergunta ao ver Bruno no
chão. – Que porra você fez agora, cara?!

— SOU EU QUEM ESTÁ CAÍDO NO CHÃO! – ele urra em


resposta. – FOI ESSA VADIA QUEM FEZ. NÃO EU!
Igor olha de mim para Bruno e de volta para mim.
— Você está bem? – pergunta. – Ele te fez alguma coisa?
Fecho os olhos, inspirando o mais fundo possível e solto o ar
lentamente.
— Estou bem. – minto.
— Vai para casa. – diz e me levanto. Também acho que não
posso continuar aqui. – Você está bem mesmo? – pergunta, abrindo
a porta para mim.
— Eu não sei. – respondo com sinceridade. – Eu só...
— Olha, desculpa por isso. Ele geralmente costuma ser divertido
quando está bêbado e raramente é esse idiota que foi hoje.
Principalmente com você. Eu não devia ter deixado você sozinha
com ele. Não esperava que ele fosse te atacar.

Uma risada me escapa.

— Ainda bem que o pai da minha melhor amiga era do exército e


me ensinou algumas coisas. – minha resposta faz Igor rir.
— Sim. Sem dúvidas. – concorda. – Vou ter uma boa conversa
com ele sobre essa atitude. Desculpa. De verdade.
— Vou ficar bem. – respondo, dando um rápido abraço nele e
viro para o elevador.

Ouço a porta se fechar pouco antes de a porta do elevador se


fechar por completo. Meu corpo ainda esta trêmulo pela adrenalina.

— Anda, atende. – digo, abrindo a porta do meu apartamento,


segurando o celular no ouvido. – Por favor, Ju...
— Alô? – reconheço a voz de sono de Julie do outro lado.
— Achei que não fosse mais querer falar comigo.
— Meu Deus! O que aconteceu, Lu?

Eis aqui um fato: não importa qual o tamanho da distância que


exista entre dois melhores amigos, ele sempre vai perceber quando
o outro estiver mal. Nunca foi diferente entre Julie e eu.

Tranco a porta, colocando minha bolsa sobre o rack ao lado da


porta.

— Por que você está chorando, amor? – pergunta. – Fala


comigo.

Sento no sofá, contando para Julie tudo o que tem acontecido na


última semana, sem poupar um único detalhe. Conto desde minha
viagem de carro para cá, até o que minha caminhada na praia no
domingo acabou resultando. Como já esperava que fizesse, ela
insistiu para que eu o descrevesse exatamente como Ele era e ficou
boquiaberta quando contei que não sabia seu nome, além de sua
inicial e que só tinha uma foto dele no meu celular.

— Você vai me mandar esta foto. – diz quando eu termino de


contar sobre A. – Mas, primeiro, por favor, me conta o que
aconteceu para você ter ficado assim.

Conto então sobre a discoteca e a primeira tentativa de Bruno


em me beijar. Sobre o chapéu bobo, as danças e o coquetel de
frutas que, segundo Pedro, foi meu Querido Chefinho quem pagou
para mim. Sobre o que aconteceu no apartamento dele depois e sua
segunda tentativa em me beijar a força, terminando com a joelhada
que dei no saco dele e sobre ele rolando de dor.

— Que cretino filho da puta! – Ju exclama. – Babacão, infeliz,


miserável, desgraçado! Como ele ousa tentar isso com você?! Foi
mais do que merecido o que você fez. Eu faria até mais que isso. –
e, considerando que aprendi com Julie, ela realmente faria muito
pior do que apenas uma joelhada no saco. – Consigo imaginar
perfeitamente a cena daqui: Você pula por cima do corpo inerte da
sua última vítima, senta-se em seu sofá e diz: “Sofá bacana você
tem aqui.”. Foi como dizer: “É, eu chutei seu saco e você tá ai
chorando de dor. Foda-se, seu trouxa.”.

Pela primeira vez desde que tudo isso aconteceu, eu consegui


rir.
— O que o Igor disse quando viu? – pergunta após nos
recompormos.
— Pediu mil desculpas pela atitude dele e que não devia ter me
deixado sozinha com Bruno. – começo a dizer, forçando-me para
lembrar suas palavras. – Disse para que viesse embora, que
precisava ter uma conversa séria com ele.
— Gostei desse Igor. – Ju comenta. – Embora ele realmente
tenha errado por te deixar sozinha com um bêbado que deu em
cima de você a noite toda.
— Eu estava mesmo pensando em apresentar vocês um ao
outro, quando você vier para cá. – digo, fazendo uma pausa para
esperar por sua resposta.
— Você não muda nunca mesmo. – ri.
— Por você? Jamais, amor!

Devo ter conversado com Julie por aproximadamente uma hora,


colocando toda a conversa em dia.

Ela me contou que está saindo com um estagiário novo do seu


trabalho, mas deixou bem claro que as coisas com ele não vão
gerar em nada, que é só diversão. Ju também me fez prometer que
caminharia no domingo, no caso amanhã, já que já passa das duas
da manhã, para tentar encontrar com o Gostosão da Praia, como ela
bem o apelidou. Algo que, para ser sincera, eu já pretendia fazer.
Caminhar na praia, digo.

Tomo um rápido banho, apenas para apagar todo e qualquer


vestígio desta noite do meu corpo. A canseira e exaustão dessa
primeira semana finalmente começam a tomar conta do meu corpo.

Ligo o ar-condicionado no quarto, para deixar o ambiente mais


fresco e conseguir dormir mais fácil. Então eu me jogo na cama,
sentindo o colchão balançar sob meu peso.

Estou quase adormecendo quando começo a ouvir algo. Desligo


o ar novamente, para prestar mais atenção ao barulho.

— Isto... Oh! Sim! Mais para baixo, querido! – é a voz de uma


mulher. Gemendo. Do outro lado da parede do meu quarto!
— Mas que merda é essa? – pergunto, franzindo o cenho.
— Você vai se arrepender disto. – um homem responde,
seguindo ao som de barulhos de tapas e mais gemidos.

Daqui eu consigo ouvir tudo o que eles estão fazendo do outro


lado. E não estão fazendo apenas para os dois, mas sim para todo o
condomínio.
Os gemidos aumentam, seguidos por mais tapas. Isso não é
uma mulher. Sim uma puta.

— VOCÊS SÓ PODEM ESTAR DE SACANAGEM COMIGO,


NÉ? – grito contra a parede, batendo com a mão para chamar a
atenção. – PELO AMOR DE DEUS, OLHA QUE HORAS SÃO!
— Vem para cá também, amor. – o homem responde e percebo
sua voz pesada. Na certa está mais do que bêbado. – Vem
participar da nossa festinha. A casa é grande. Cabe você também.

Ouço a mulher rir do outro lado, soltando outro gemido.

— Não quero participar de merda de orgia nenhuma! – respondo


com um soco na parede. Minha mão dói. – Só quero dormir em paz!
Será que é pedir muito, droga?!

Ele não responde mais nada, mas também não para com o
barulho. Ao contrário, já que só fez aumentar.

Sentindo minha cabeça doer pelo sono, junto meu edredom, indo
para a sala e bato a porta do quarto atrás de mim. Já é bem mais de
três da manhã e essa putaria.

— Juro que se continuar ouvindo essa putaria, vou ser a vizinha


chata e reclamo com o síndico. – digo a mim mesma, puxando o
sofá-cama para poder deitar. – Quer fazer as coisas? Faça a
vontade. Mas ninguém precisa ouvir nada.

Para meu completo azar, esqueci-me de pegar o travesseiro.


Prefiro dormir sem a ter que voltar no quarto e ouvir aquele pornô
explícito outra vez.

Já estou quase adormecendo quando me lembro de mandar a


foto para Ju. Então faço isso antes que esqueça por completo e ela
acabe brigando comigo de verdade.

Por algum tempo eu observo a foto em meu celular, tentando


memorizar cada mínimo detalhe desse deus grego que cruzou meu
caminho logo que cheguei, mostrando para mim que eu precisava
ser forte se quisesse chegar a algum lugar.

— Será que um dia vou te encontrar de novo? – pergunto,


encarando os olhos cinza do Gostosão da Praia. Seus olhos
parecem brilhar contra a luz das estrelas daquela noite.

Adormeço e sonho com algo que provavelmente nunca vai


acontecer.
Capítulo Cinco
Domingo

Ontem quando acordei por volta das cinco da manhã para ir ao


banheiro, aproveitei para ir até meu quarto e ver se a putaria do meu
querido vizinho continuava ou se haviam terminado a festinha, para
poder deitar na minha cama. Para minha felicidade, sim.

Aproveitei minha folga ontem para fazer uma faxina e ficar a


tarde toda assistindo filmes na Netflix. Uma grande coletânea entre
romances, comédias e terror, que muitas vezes é melhor do que
comédia.

Depois, quase no final da tarde, liguei para meus pais e fiquei


horas conversando com eles, fazendo um resumo aceitável do que
minha primeira semana aqui no Rio de Janeiro havia sido.

Meu irmãozinho, Tommy, chegou a brigar comigo enquanto


conversávamos, alegando que eu havia ficado de ligar para ele
todos os dias. O que foi bem complicado, porque eu não sabia como
fazer para explicar para uma criança de cinco anos que não temos
tanto tempo assim. Mas, por fim, entendeu e me perguntou que
horas eu costumava chegar do trabalho, porque iria ele mesmo me
ligar. É, eu sei que tenho o melhor irmão do mundo. Os melhores, já
que Cami também é o amor da minha vida. Tommy também me fez
prometer que iria ao seu aniversário no mês que vem. O que não
precisava nem pedir, já que eu jamais me perdoaria se isso
acontecesse.
No final, quando tive que desligar, eu só conseguia sentir
saudades de todos eles. É terrível.

— Mas esta já é a segunda noite seguida que isto acontece! –


exclamo levemente alterada.
— Sei que este ocorrido é bastante incomodo de se ouvir assim.
– o síndico começa a dizer. – Mas o que a senhorita quer que eu
faça? Ele é praticamente o dono deste prédio.
— Seu Rogério... – digo, encarando a figura de baixa estatura e
gordinho, com entradas no cabelo, que é o síndico. Seus dedos
penteiam seu bigode de minuto em minuto. O que me incomoda
bastante. – Eu realmente entendo o lado do senhor. Que ele é o
dono disto tudo aqui. Mas... Sei lá. Poderiam ao menos reforçar as
paredes de um apartamento para o outro, para evitar esses
acontecimentos.

— Pedirei a ele para que maneire. – informa. – Peço-lhe


desculpas pelo inconveniente.
— Por favor. – peço, lançando a ele um sorriso gentil. Se é que
isso é possível vindo de mim, quando se trata daquele vizinho. – Eu
só quero poder dormir uma noite inteira na minha cama.

Volto para meu apartamento para preparar meu almoço, ciente


de que a conversa com o síndico não resultara em nada. “Ele é
praticamente o dono...”. Ora, se fosse eu, na certa estaria sendo
chamada de “vadia” para cima. Mas não. Só é um homem podre de
rico.

Na verdade, eu não sei o que chega a ser pior: o fato do canalha


do meu vizinho insistir em fazer sexo com o alto-falante ligado ou o
fato de ele ser um galinha que a cada noite leva uma mulher
diferente para cama.

Preparo minha famosa macarronada a bolonhesa. Receita da


mãe da minha mãe, que vem sendo passada de geração em
geração desde sei lá eu quando. Provavelmente bem antes de a
minha avó ter nascido.
— Alô? – digo ao telefone, com a voz grogue de sono.
— Não acredito que você estava dormindo, Luara. – Julie...
— Eu não diria “dormindo”, exatamente. – defendo-me, ainda
que o bocejo me entregue completamente.
— Ah, não. Imagina né, Luara? Mas não importa. Saia desta
cama, vista sua melhor roupa e vá para praia para caminhar!
— Sabe que eu não tenho dormido direito à noite, né? – começo
a dizer, mas sou interrompida.
— Você está gorda, Lu! Entenda isto de uma vez por todas. Você
está ficando com uns pneuzinhos ai e precisa caminhar para
compensar. – ela solta as ofensas como se fossem elogios. – Sei
que você tem jantado pizza todo sábado e provavelmente
macarronada aos domingos. – percebo por sua voz que está
segurando para não rir. – Sabe Deus o que você come durante a
semana. Então, como sua melhor amiga, é minha obrigação te
dizer: VAI CAMINHAR, MOLIER!

— Sabe que isso foi bem ofensivo. Não sabe?


— Eu sei. Desculpa. – sussurra. – Mas, amiga, você tem que
encontrar o Gostosão da Praia de novo. Por mim. Por nós!
— Eu vou. Prometo. – respondo. – Só estava precisando
descansar mesmo.
— Aham.

Vestindo um jeans e moletom velho, eu sigo pelos quinhentos


metros até a praia, já com o fone no ouvido ao som de Photograph,
do Ed Sheeran.

O sol brilha fraco por entre as nuvens que o escondem, deixando


um clima incrivelmente fresco. Até o final do dia deve chover.

Chego à barraquinha de lanches onde vi o Gostosão pela última


vez. O lugar onde ele teve que me deixar para ir buscar seu amigo
que havia se acidentado. Ao menos foi o que ele disse. E se tiver
sido verdade aquela ligação, ao menos foi um motivo nobre. Afinal,
eu teria feito o mesmo. As folhas da paineira balançam com o vento
que sopra. Vir à praia com este tempo? Péssima ideia. As únicas
pessoas por aqui são alguns surfistas restantes e poucas crianças,
que estão brincando com suas bolas coloridas.

Caminho desta vez mais afastada da água, seguindo


exatamente pelo mesmo caminho que fiz na semana passada. Não
que eu espere encontrá-lo por aqui ou algo do tipo... Mas você quer
que isso aconteça. Sim, eu quero. É só que as chances são
menores do que mínimas.

“Eu costumo vir aqui sempre que algo está errado comigo. Ajuda
a me acalmar...” – suas palavras veem em minha cabeça ao som de
sua própria voz, que me pergunto se realmente pertence a ele ou se
é algo projetado por minha mente.

Começo a correr de vagar, sentindo meus pés afundarem na


areia conforme aumento os passos. Pensamentos desses últimos
dias começam a ressurgir em minha mente, prestes a transbordar.

Lembro-me da sensação de liberdade que senti enquanto dirigia


para o Rio, nunca antes tendo vindo para cá. Lembro-me do vento
batendo em meus cabelos, jogando-os para trás, para fora do
carro... Sinto falta de casa. Sinto saudades de Tommy pegando no
meu pé para levá-lo ao parquinho. Sinto falta da implicância de
Cami comigo e de Ju. Das conversar que tínhamos até tarde em
nossa adolescência, quando dormíamos na casa uma da outra. Das
vezes que fugíamos para a balada escondidas dos nossos pais e
das poucas vezes que eles nos pegaram, nos deixando de castigo.

Aumento o passo, sentindo o vento gelado bater em meu rosto e


o cheiro salgado vindo do mar.

Sei que tudo isso parece besteira, que só estou aqui há uma
semana e que ainda tenho que me adaptar a todas essas
mudanças, porque elas são necessárias para que eu possa crescer
e amadurecer longe da proteção da minha família. Longe do
conforto que meus pais sempre me proporcionavam. Essa
mudança, a minha mudança, é o que sou agora. É onde deixo de
ser aquela garota que esperava que as coisas acontecessem para
me tornar a mulher que vai lá e faz.

Você tem que ser forte. – eu me repreendo. – Você tem que lutar
contra o desejo de voltar para casa a cada tombo que levar. Tem
que saber levantar quando cair e mostrar que apesar do tombo,
ainda pode lutar. Ou vai querer desistir assim, sem nem mesmo se
dar ao trabalho de lutar?

O vento sopra ainda mais forte, indicando a chegada da chuva.

Corro o mais rápido que consigo, tentando não atolar meus pés
na areia que vai molhando conforme a chuva cai pesada.

Vai voltar para a mamãe e o papai? – novamente o pensamento


me atormenta.

Vejo a gruta do Gostosão a menos de três metros de distância.


Aumento a velocidade para tentar não me molhar tanto. Não que
ainda reste algo seco em mim.

Dentro da pequena gruta, ouço a chuva cair do lado de fora,


fechando a entrada. Vejo os mesmos peixinhos que me lembro de
ter observado na semana passada em uma pequena poça d’água.
Ou seriam novos? O espaço aqui é bem maior do que me lembrava.
Há uma pedra bem no canto, que uso para me sentar e, quem sabe,
me proteger, caso uma maré suba e acabe invadindo aqui. O que
torço para que não aconteça.

Tenho sérias dúvidas se vir para cá foi uma boa ideia. Quer dizer,
ninguém vai aparecer aqui com esse tempo, além da louca aqui.

Sinto meu celular vibrar no bolso da calça e o pego para ver. É


uma foto de Julie jogando videogame com Tommy, junto da
mensagem:

Estou aqui nos seus pais.


Tommy me chamou para jogar PS3 com ele.

Disse que você nunca o deixava ganhar. Que péssima irmã


você!

— Eu não deixava ganhar porque ele sempre fazia isso por


conta própria! – respondo para a tela do aparelho.

Tenho vontade de ligar e dizer isto a ela. Principalmente para


contar sobre a brilhante ideia que foi vir para cá com este tempo.
Mas de que adiantaria? Continuarei ilhada aqui por algumas horas.
Provavelmente.

Já passa das seis horas quando entro em casa, ensopada, indo


direto para o banheiro, para tomar um banho quente.

Apesar de ficar bem de frente com o mar, a água não entrou na


gruta, além da poça que mantém os peixinhos, que percebi serem
renovados a cada dia. Possivelmente.

Aproveitei essas últimas horas lá dentro para pensar e decidi


que, não importa o que me aconteça daqui para frente, enfrentarei
de cabeça erguida. Não posso querer desistir só porque um bêbado
idiota passou a mão em mim. Amanhã encararei o Bruno de cabeça
erguida e manter o profissionalismo. Há essas horas, Pedro
provavelmente já deve estar sabendo do que aconteceu e sei que
as coisas não serão fáceis. Mas Lucas não disse que seria quando
me ofereceu o trabalho.

Também não posso ficar brigando com o idiota do meu vizinho


todas as vezes que ele arrumar uma vadia aleatória para sua cama.
Mas isto também não quer dizer que não o farei, se continuar
infernizando minha vida.
Capítulo Seis
Sexta-feira

Dentro de alguns dias completo um mês morando sozinha aqui


para o Rio de Janeiro. Um mês que comecei a trabalhar para a BIT
Technologies e dentro de exatamente dezessete dias será
aniversário de Tommy.

Como o aniversário dele cai bem no feriado de sete de setembro,


irei para lá no sábado pela manhã e só volto na segunda-feira à
tarde, já que sua festinha será no domingo.

Ainda não consigo acreditar que meu irmãozinho caçula já vai


completar seis anos. Quer dizer, passou voando esses anos.

Hoje mais cedo Pedro passou daqui dizendo que haviam


remarcado a data da reunião mensal da empresa para a próxima
quarta-feira e pediu também para que eu terminasse o programa na
qual estou trabalhando ainda hoje, porque precisava entregar ao
presidente na reunião que terá com ele. E é exatamente o que estou
fazendo aqui: trabalhando até o fim. Literalmente falando.

— Lu, vamos almoçar? – Isabeli pergunta parada a porta da


minha sala.
— Já? – pergunto de volta. – Claro. Vamos. – respondo, já
salvando meu trabalho, bloqueando o computador antes de sair
atrás dela.

Isabeli trabalha no setor de telecomunicações, no andar


dezesseis (eu fico no vigésimo sexto, onde é o TI). Ela é a
responsável pelas vendas dos produtos para empresas
terceirizadas. Como nosso horário de almoço é o mesmo,
começamos a almoçar juntas, junto de algumas outras garotas.

— Esta ansiosa pela reunião? – pergunta enquanto caminhamos


até o elevador.
— Por que estaria? – pergunto de volta.
— Ah, você vai finalmente conhecer nosso chefe. – responde e
consigo ver seus olhos brilharem ao meu lado. – Só acho uma pena
que não se envolva com ninguém daqui. – conclui, soltando um
suspiro.

Bem, ainda bem que você namora também...

— Sei lá. Acho que isso é ser bem profissional. – digo. – Imagina
a situação dele: você namora a funcionária “X” por alguns dias, mas
então o relacionamento não dá certo e você termina com ela. Dias
depois, o empenho dela na empresa começa a cair. – faço uma
breve pausa em meus argumentos enquanto peço meu almoço na
lanchonete. – Ela começa a faltar sem justificativa, não apresenta
um atestado médico nem nada do tipo. Você pensa seriamente em
mandar embora, já que não esta te dando lucro. Mas, se fizer isto,
todos na certa vão pensar que você está sendo antiprofissional e
levando para o lado pessoal.

— Seus argumentos são bons, garota. – Isabeli concorda. –


Seria bem difícil não pensar isto, já que é ele quem contrata e
demite.
— Quando comecei a trabalhar aqui, achei que fosse passar por
alguma avaliação ou qualquer coisa do tipo com ele. Mas não. –
digo, tomando um pouco do meu suco de laranja.

— Vai ver não teve a necessidade, já que foi indicada de um dos


escritórios dele. Não me surpreende. – diz. – Além de que as
recomendações foram absurdas.

Franzo o cenho ao ouvir suas palavras. Eu nunca cheguei a ficar


sabendo exatamente o que Lucas disse a meu respeito quando me
indicou para o cargo.

— E parece que você tá prestes a receber uma oferta que ira


melhorar ainda mais seu currículo aqui. – Antônia entra na
conversa. – Alias, alguma de vocês é boa em bilhar?
— Costumava jogar com meus amigos em São Paulo. –
respondo. – O que quer dizer com “esta prestes a receber uma
oferta ainda melhor”? – pergunto curiosa.
— Saberá na hora certa. – é tudo o que diz a respeito. – Agora,
por favor, termine logo seu almoço e vamos jogar. Os rapazes do TI
estão desafiando nós para uma partida.

Termino meu almoço e subo com as meninas até a sala de


jogos.

Já tem algum tempo desde a última vez que joguei bilhar, mas
ainda lembro exatamente como se faz e tenho certeza de que posso
vencê-los com uma das mãos nas costas.

— Ora, ora. Se não é a Luara. – Igor diz logo que me vê entrar. –


Veio me ver bater nessas garotinhas? – sorrio em resposta.
— Antônia – chamo, virando para ela. –, pensei que tivesse dito
que os rapazes estavam nos desafiando. Não as “mocinhas da BIT”.
– provoco, arqueando uma sobrancelha para Igor.
— Achamos a desafiante perfeita! – ele diz, virando-se para a
pessoa atrás dele e só então me dou conta de quem será sua dupla.
Bruno.

Depois do que aconteceu na discoteca, eu não mais vi ou falei


com ele, já que tenho evitado todos os lugares por onde ele passa.
Tudo o que eu soube foi que naquela semana, ele recebeu uma
advertência e três dias em casa.

— Você e Bruno? – pergunto, rindo. – Podem vir os dois.


Ouço Antônia, Isabeli e Viviane os vaiarem atrás de mim.
— Não tem graça se formos dois contra uma. – diz Bruno,
tomando seu taco em mãos.
— Não será “dois contra uma”. – respondo. – Será vocês dois
contra mim. – dou de ombros. – Quem perder paga três rodadas
para todos aqui na próxima sexta-feira. E, vai ter que usar aquele
chapéu bobo no bar, sem o direito de beber. – arqueio a
sobrancelha. – Ou estão com medo e já vão desistir?

Novamente ouço o trio atrás de mim e eles cochicham algo entre


si.

Algo que poucas pessoas sabem a meu respeito, é que eu


costumava participar de campeonatos de bilhar em São Paulo. Em
casa tenho seis troféus que ganhei, sendo dois deles na mesma
noite. Isto, fora o prêmio em dinheiro, que não foi pouco. Então
acrescento aqui: parte do dinheiro para comprar meu carro veio
desse campeonato, que economizei desde meus dezesseis anos
para comprar algo que fosse do meu agrado e consegui com o
tempo de serviço com o Lucas.

Fora os campeonatos, eu nunca joguei por dinheiro. Apenas


para me divertir com os amigos. Mas isto, hoje, é por uma questão
mais pessoal, depois do que Bruno me fez passar.

— Não vá achando que pegarei leve com você só por ser uma
garota. – Bruno tenta me provocar.

— Não vá você achando que pegarei leve, só porque é uma


garotinha chorona. – retruco, dando as costas para ele, pegando o
taco que Isabeli me oferece.

Uma hora e meia de almoço é tempo suficiente para jogarmos


quatro partidas. Metade do pessoal que costuma sair nesse horário
veio aqui para o salão de jogos para verem nosso pequeno
“campeonato”.

— Você está roubando! – Igor diz durante nossa terceira partida,


depois de perder as duas primeiras.
— Como posso roubar com tantas testemunhas? – pergunto.
Apenas para mostrar como sou boazinha, começo a errar
minhas jogadas propositalmente, para ver se conseguiriam ganhar.
— Eu sabia que você estava roubando! Na sua cara, Luara! – ele
me provoca. Apenas sorrio, fazendo uma última jogada que me leva
a vitória.

Durante nosso intervalo de dez minutos para a última jogada,


vou até a lanchonete buscar um suco para me recompor.

— EI! – ouço alguém me chamar.


— Oi. – digo com pouco interesse ao ver Bruno atrás de mim
quando estou voltando para a sala.
— Luara, me desculpe por aquele dia. – pede, tentando
acompanhar meus passos. – Sei que fui um completo idiota por
fazer aquilo.
— É, você realmente foi um grande canalha mau caráter. –
concordo.
— Qual é?! – exclama. – Não há nada que eu possa fazer para
que você me desculpe?

Paro, finalmente virando para ele.

— Tem uma coisa. – digo, despertando seu interesse. – Fique


longe de mim. – e entro na sala. – Que tal uma nega? Quem ganhar
esta, ganha todas as outras? – sugiro em alto e bom tom, para que
todos me ouçam.
— Você está louca, Lu? – Isabeli pergunta em meu ouvido. –
Você está ganhando!
— É! – Antônia concorda. – Não estou a fim de pagar nada para
ninguém.
— Vocês não irão. – sorrio. – Temos quinze minutos até que eu
tenha que voltar ao trabalho. – digo, consultando a hora em meu
celular, programando o cronometro e entrego para Isabeli. –
Estaremos, literalmente, correndo contra o tempo. Quem estiver
com mais bolas na mesa perde.
— Estou dentro. – Igor diz quase que de imediato. Ah, claro que
esta. Sorrio.
— Eu topo. – Bruno diz, já começando sua jogada.
Eles estão com as bolas pares e eu com as ímpares por motivos
óbvios.

Ainda faltam sete minutos quando encaçapo minha última bola,


deixando-os com quatro restantes na mesa.

Ouço os aplausos a nossa volta e faço uma breve reverencia em


agradecimento.

— Não se esqueçam de usar o chapéu na sexta, rapazes. –


digo, entregando meu taco para Igor, que faz careta para mim e dou
as costas para eles, para voltar ao trabalho e terminar meu
aplicativo para entregar para Pedro antes das três horas.
Capítulo Sete
Sábado

Acordo sentindo um raio de sol bater em meu rosto, atravessando


a janela do quarto. Devo ter me esquecido de fechá-la quando
cheguei ontem.

Vagas lembranças sobre a noite passada começam a surgir em


minha cabeça.

Lembro-me de ter saído com algumas garotas para irmos a uma


festa em um lugar onde se, alguém me perguntar em que lugar
ficava, eu não saberei responder. Não fiquei lá até mais do que até
onze horas.

Quando cheguei, já passava um pouco da meia-noite. Lembro-


me de jogar a bolsa no sofá e me arrastar para o quarto, onde meu
querido, mas nada querido vizinho já estava praticando seu
previsível ato de acasalamento com mais uma de suas Vadias
Aleatórias, que ele provavelmente deve encontrar em uma esquina
por ai.

Em vez de perder meu tempo discutindo com ele, eu apenas


peguei meu travesseiro e cobertor, dando meia volta e fui deitar no
sofá. A dor de cabeça que estava sentindo naquela hora me
impossibilitava de qualquer discussão a respeito do barulho. Em
algum momento no meio da noite devo ter voltado para cá. O que
explica o fato de a janela estar aberta, já que nunca durmo com ela
assim.
— Ai! – exclamo, sentindo uma forte dor começar a latejar em
minha cabeça.

Saio à procura de uma Dipirona ou Advil, mas não encontro nada


para melhorar a dor. Faço então uma anotação mental para ir a uma
farmácia comprar algo.

Volto para o quarto e tomo um banho frio. O calor que faz ajuda
para que eu consiga isso e a dor começa a aliviar. Embora, por
experiência de anos, saiba que não vai segurar por muito tempo.

— Bom dia, Seu José. – cumprimento o porteiro assim que saio


do elevador.

Seu José é um senhor já na casa dos sessenta e cinco anos,


mas em muito boa forma devido aos anos que serviu ao estado
como policial. Seu porte alto e magro faz com que seja alguém de
ainda mais respeito e impõe grande autoridade com as crianças do
condomínio.

— Bom dia, Luara. – responde com seu sorriso gentil. – O que


faz fora da cama há essas horas, pleno sábado de manhã?

Olho brevemente meu celular e só então me dou conta de que


ainda são sete horas.

— Uma dor de cabeça e a necessidade de encontrar uma


farmácia urgente. – dou de ombros.
— Tem uma que é vinte e quatro horas, virando a esquina pela
esquerda, logo na segunda quadra. – informa.
— Obrigada, Seu José. O senhor acabou de impedir que eu me
perdesse procurando por uma.

Ele ri.

— Quando precisar, eu posso ligar pedir para que entreguem


para você também.
— Tudo bem. – respondo. – Preciso dar uma passada no
supermercado também. Obrigada.

Mal viro a esquina do Golden e já avisto a farmácia descrita pelo


Seu José. É um grande prédio de esquina, com uma fachada em
vermelho.

— Posso ajudar? – pergunta uma senhora já de idade assim que


entro.
— Claro. – respondo, levando a mão automaticamente até a
cabeça. – Preciso de um remédio para dor de cabeça e outro para
cólica. O que você tiver de melhor.
— Só um minuto. – diz e sai, voltando instantes depois. –
Caixinha mesmo?
— Sim.

Compro também meu anticoncepcional antes que acabe me


esquecendo dele. Aproveito também para pegar um copo d’água e
tomar o Advil, para já ir fazendo efeito e deixo o de cólica para
quando realmente for precisar.

No caminho de volta, passo no supermercado para comprar


coisas básicas para o fim de semana: um refrigerante, um pacote de
Doritos e outro de Rufles. Uma pizza semipronta, alguns doces e, é
claro que não pode faltar chocolate. Afinal, sou uma mulher adepta
das necessidades que passamos nesses dias que tanto mexe com
nossos sentimentos. Então, já que estou aqui, por que não?

--

De volta ao meu apartamento, sinto minha cabeça começar a


perder aquela pressão de antes e o efeito sonífero que sempre tem
em mim. O que me faz sentir as pálpebras pesarem.

— O que foi? – ouço uma voz de mulher vinda do outro lado da


parede. Ótimo! O vizinho ainda está com sua “companhia”.
Reviro os olhos para eles.
— Ela não disse nada hoje. – ele responde e não consigo evitar
o interesse repentino que surge.
— O que você está dizendo? – torna a perguntar. – “Ela” quem?
— Nada. – ele diz um pouco frio demais para quem
provavelmente acabou de passar a noite toda fazendo sexo com a
coitada. – Você precisa ir. Já esta tarde e ainda tenho que ir para o
trabalho.

Então as vozes vão se afastando do quarto e consigo imaginar a


cena perfeita entre eles:

— Você vai me ligar mais tarde?


— Claro.
— Eu te amo.
— Tá... Preciso me arrumar. Ligo para você amanhã.
Mas nunca liga. É claro.

A imagem em minha cabeça me faz rir. Isto é algo tão clichê, tão
frequente nos dias de hoje, que às vezes me fazem questionar
qualquer coisa sobre relacionamentos. Não que eu não acredite
neles mais. É só que... Não sei se serei capaz de amar alguém de
verdade um dia. Naquilo de me entregar de cabeça aos meus
sentimentos e tudo o mais.

--

Minha cabeça esta levemente zonza e parece que o quarto está


girando. Girando. Girando. Girando...

— Ainda bem que estou deitada. – murmuro, fechando os olhos


para evitar cair. Nunca se sabe.
— Oi? – uma voz distante chama. Ignoro. – Está ai?
— O que você quer? – pergunto, começando a ficar irritada.
— Hm... Nada. É só que você não me xingou desta vez... –
responde e sinto um tom divertido em sua voz.
— De que adianta brigar com você, se todo final de semana você
faz a mesma bagunça de sempre? – retruco.
— Você está bem? – pergunta.
Ahn?... Franzo o cenho. Por que ele está perguntando isso?

Ainda que não tenha me dado motivos, sinto uma vontade


crescente de xingá-lo de todo e qualquer nome baixo que começam
a surgir em minha mente. Uma vontade de jogar nele por toda noite
mal dormida no sofá que tive nas últimas semanas, devido suas
“festinhas particulares”.

Respiro fundo e conto até dez antes de dizer qualquer coisa e


ser grossa. Não é porque ele é um idiota que eu também tenho que
ser uma.

— Você não tinha que trabalhar? – jogo contra ele, virando para
o lado. – Agora não me torra e me deixa dormir.

Ouço a campainha tocar horas mais tarde, tirando-me do meu


sono profundo.
Levanto da cama, quase que tropeçando no edredom que joguei
para o chão.

— Quem pode ser a uma hora dessas? – pergunto, colocando


meus óculos e vou até a sala. Na verdade, eu não tenho nem ideia
de que horas são.

Olho pelo olho mágico, mas não vejo ninguém do outro lado.
Abro a porta e também não há ninguém no corredor deserto. O que
me surpreenderia mais se tivesse, já que no andar só há dois
apartamentos e ninguém sobe aqui.

Quando começo a fechar a porta de volta, algo no tapete de


entrada chama minha atenção. É uma pequena cestinha com alguns
chocolates dourados e um bilhete.

Olho mais uma vez pelo corredor, para o lado da porta do outro
apartamento, mas não vejo ninguém. Apenas ouço o barulho da
porta do vizinho se fechar.
Pego a cestinha do chão, tirando o bilhete para ler.

Dizem que chocolates costumam acalmar os ânimos nestes dias.


Particularmente, eu não sei. Mas espero que sim.
Fique bem.

Viro o bilhete em minha mão, procurando por mais algo. Mas não
há nenhuma assinatura. Nenhum nome. Nada além de uma
caligrafia perfeita em tinta preta em um papel branco, com um A.G.
grafado em dourado no canto.

— Ao menos agora sei quais as inicias da pessoa que estou


xingando há quase um mês. – digo, fechando a porta, voltando para
o quarto.
Capítulo Oito
Terça-feira

Cheguei do trabalho hoje um pouco mais tarde do que costumo


chegar e já estou de saída, já que, não me pergunte o porquê,
aceitei sair com um amigo do Pedro. Diego. Acho que é esse o
nome dele.

No domingo à noite, sai com Pedro e alguns amigos dele e esse


Diego estava lá. Nós conversamos por algum tempo, mas nada
demais. Ele deve de ter coisa de 1,80m de altura e cabelo preto,
espetado. Ele é bonito e tem uma boa conversa. Além de ser bem
mais acessível para mim de que o Gostosão da Praia, que muito
provavelmente nunca mais tornarei a vê-lo.

— Pronto? – digo, atendendo ao interfone.


— Luara – diz o porteiro da noite. –, estou com um senhor
chamado Diego aqui na portaria. Ele diz ser seu amigo.
Amigo não é bem o termo correto. Mas tudo bem.
— Já estou descendo. Obrigada, Seu Lucio. – e coloco o fone
novamente no lugar.

Confiro minha roupa no espelho uma última vez, apenas para ter
certeza de que estou vestida adequadamente para ir ao cinema.
Jeans preto, All Star e uma blusa branca. Meu cabelo eu mantenho
preso em um rabo de cavalo para o alto, já que faz um calor
insuportável hoje.

— Está ótimo. – digo, apertando o laço do cabelo. Não estou


indo para agradar ninguém mesmo.
— Oi. – Diego me cumprimenta com um beijinho em cada
bochecha assim que chego ao Hall da portaria. – Você está linda. –
sorri.

Corro o olhar por seu corpo. Ele está de jeans e camisa preta de
uma banda que não reconheço. Nada exagerado também.

— Obrigada. – sorrio de volta. – Você também não está tão mal.


— Ora! Obrigado. – ri. – Podemos ir?
— Claro.
Diego sai um pouco na minha frente, para poder abrir a porta
para mim.
— Já sabe o que vai querer assistir? – pergunta, destrancando
seu carro.
— O que estiver passando. – respondo. – Não tenho nem ideia
do que está em cartaz esse mês.

— Achei que você não fosse aceitar sair comigo quando te


chamei. – Diego comenta, enquanto trava uma batalha épica com os
Hashis, depois do cinema. Acabamos por ver Quarteto Fantástico. –
Pedro disse que você deu o fora durante uma noite inteira em um
cara.

Ah... Por que o Pedro tem que espalhar essas coisas?

— Ele não era tão legal. – dou de ombros, colocando um sushi


de salmão na boca. – Você não é muito de comer comida japonesa,
né? – pergunto, segurando para não rir.
— Só comi uma vez. – responde. – E de garfo.

Faço uma careta ao imagina-lo usando garfo para comer sushi.

— É só você usar como se segurasse duas canetas na mesma


mão. – explico, mexendo com meu Hashis, para que ele veja como
é.
— Você faz parecer fácil.
— Porque é fácil.
— Para você que é japonesa naturalizada. – diz, colocando os
pauzinhos de lado. – Ainda bem que eu sou brasileiro. – e enfia o
sushi na boca, usando a mão.

Fico boquiaberta com sua atitude, dividida entre o choque e a


vontade de rir.

— Não sou japonesa. – respondo, tomando do meu suco.


Ele ri.
— Não, não é. – sorri. – Então, você joga algo?
— Atualmente só meu sapato quando chego do trabalho. – dou
de ombros. – Essa mudança foi bem mais significante do que eu
imaginava.
— Entendo.
— Mas tenho um videogame no meu apartamento para os finais
de semana. – respondo. – Quando não estou assistindo algum filme
ou seriado, jogo um pouco.
— Você deve ser boa. – dou um sorriso de lado, sentindo meu
rosto corar com seu elogio.
— Nem tanto. Meu irmãozinho sempre ganha de mim quando
jogamos. E ele ainda tem cinco anos.
— Aposto como você o deixa ganhar para mostrar como é legal.
Franzo o cenho.
— Ou talvez não.

Vejo no painel do carro que já são dez e meia quando Diego


para frente a portaria do Golden. Imagine Dragons tocando ao
fundo, baixinho...

— Chegamos. – ele diz, desligando o motor do carro.


Olho para fora da janela, para o último andar do alto prédio e
vejo uma janela solitária com a luz acessa.
— É o que parece. – digo, olhando de volta para ele.
— Odeio esses momentos tensos. – comenta, tamborilando o
volante com os dedos.
Por que não?
— Acho que posso ajudar com isso. – minha voz sai sussurrada.
— Como assim? – ele pergunta, olhando em minha direção.
Em resposta, seguro seu rosto, sentindo meu coração um pouco
angustiado dentro do peito e o beijo, sentindo sua barba não feita
roçar em meu rosto.
Nosso beijo não dura mais do que poucos segundos e sou a
primeira a afastar.
— Uau! – ele diz. – Você me pegou desprevenido aqui.
Sorrio sem graça.
— Desculpa. – peço, sentindo meu rosto corar, então ele me
beija uma segunda vez, dessa vez demorando um pouco mais.
— Melhor? – pergunta quando afasta e vejo seu sorriso de lado
sob a luz do poste.
— Acho que sim. – sussurro. – Quer subir? – pergunto. – Para
pegar o filme que falei?
— Claro. – diz. – Só... Espera.
Ele abre a porta e sai, indo abrir a minha.
— Obrigada.
— Apartamento legal. – Diego diz, entrando na minha sala. – E
há uma bela altura também.
— Vantagens de se trabalhar em uma empresa importante. –
digo, como se isso não fosse nada, colocando minha bolsinha sobre
o rack. – Quer beber algo?
— Desculpa então, Srta. Eu Trabalho Para a BIT Technologies. –
ri. – Não. Obrigado.
Onde foi que deixei?

Tento ignorar a sensação estranha que é ter outra pessoa em


meu apartamento, que não seja o Gostosão da Praia. Quer dizer,
por dias eu sonhei que estava trazendo ele para cá e agora eu estou
com outro homem, que nem de longe é ele. É tão... Estranho.

— Quarto! – exclamo para mim mesma.


— Desculpa?
— O filme está no meu quarto. – respondo. – Eu já venho.
— Certo.
Sigo pelo corredor que leva para o meu quarto, acendendo a luz,
procurando pela pasta onde guardo meus filmes.
— Aqui esta você!
— Ai! – ouço a voz de Diego atrás de mim e me viro, segurando
o DVD na mão.
— Está tudo bem? – pergunto.
— Estou. Só bati o pé. – sorri sem graça.

Sentindo meu coração disparado contra o peito, dou alguns


passos para mais perto dele, ficando a poucos centímetros. Você
consegue, Luara. – penso. – Você já fez isso antes. E, com esse
pensamento em mente, seguro minhas mãos em sua camisa,
puxando-o para mais perto e o beijo.

— Você é boa nisso. – Diego sussurra em meu ouvido,


apertando-me contra si.
Dando alguns passos para trás, eu nos levo até minha cama,
sentando com ele ao meu lado.
— Você tem certeza? – ele pergunta.

Se eu tenho certeza de que quero estar na cama com outro


homem além daquele que não tem estado em outro lugar além dos
meus pensamentos nas últimas semanas? Merda! Não! Eu não
quero isso. Mas...

Fecho os olhos, inspirando fundo. Eu nunca mais vou tornar a


vê-lo de novo. Ao menos... Quem sabe assim o idiota do meu
vizinho não prova um pouco do próprio veneno?

— Tenho. – digo, após o que me parecem horas.


— Certo. Eu só... – diz, mantendo a mão em minha coxa, tirando
o DVD da minha mão para colocá-lo de lado. – Só preciso colocar
isso aqui e...
Vejo seus olhos brilharem contra a luz e congelo.

Merda! Eu não posso fazer isso.

Seguro em seus braços, mantendo-o a uma distância de mim.


Eu quero. Mas também não quero.
— Gata? – chama.
— Desculpa. Eu não posso. – digo com os olhos fechados. – É
melhor você ir.
— Que...
— Trabalho cedo amanhã e não posso perder hora. – explico.
Ah, como se você fosse perder hora só por isso.

Diego concorda com um movimento da cabeça, levantando para


sair da cama. Pego o DVD, indo atrás dele para fora do quarto.

— Leva. – digo quando chegamos de volta à sala.


— Tem certeza? – confirmo. – Você pareceu gostar bastante
desse filme. – É uma cópia de Eu sou o Número Quatro.
— Eu o tenho no meu computador. – respondo. – E o livro é bem
melhor. Você realmente tem que ler essa saga.

— Beleza. Obrigado. – sorrio ainda constrangida.


— Olha, isso que aconteceu... – começo a dizer, mas então paro,
sem saber o que dizer. – Eu não...
— Está tudo bem, Luara. – diz. – Você não é obrigada a nada
que não queira de verdade. Ainda mais isso.

Sorrio ainda mais sem graça que antes, sentindo meu rosto se
aquecer.

— Achei que pudesse. – digo a primeira coisa que me vem à


cabeça. Melhor a verdade de que mentir.
— Não sou sexualmente atraente o suficiente para você? –
pergunta meio sério, meio sorrindo.
— Antes o pior fosse isso. – opto pelo mais fácil.
— Certo. – diz. – Bem, eu vou indo. Não quero ser a causa do
seu atraso amanhã. Obrigado pelo filme. Vou assistir amanhã
mesmo.
— Me diga o que achar.
— Direi. – diz, dando dois beijinhos em cada bochecha minha
outra vez. – Adorei a noite com você.
— Eu também. Principalmente sobre sua luta livre com os
Hashis. – ele ri.
— Bem, sou brasileiro. Não sirvo para isso.

De volta ao conforto e solidão do meu quarto, eu me jogo em


minha enorme cama, sentindo o colchão balançar sob meu peso,
tentando ignorar tudo o que aconteceu aqui há poucos minutos.

Será que ele está?


— Você está ai? – chamo, virando de barriga para cima, olhando
para o teto escuro.
Ele não responde.

— Como você consegue? – torno a perguntar. – A cada dia você


está com uma mulher e eu não consigo fazer isso, por mais que
tente.

Cubro os olhos com o braço, sentindo as lágrimas querendo se


formar. Não vou chorar. Não vou chorar...

— É preciso sangue frio. – sua voz rouca chega aos meus


ouvidos. – Você tem que realmente querer uma relação assim.
Concordo com a cabeça, ainda que seja impossível de ele me
ver.
— Eu quero. – sussurro. – Quer dizer. Eu não sei.
— Você não é assim, vizinha.
— Fui uma vez. – minha voz sai ainda mais baixa, fazendo-me
lembrar do momento que tive com ele. Com o A. – Achei que
conseguiria. Mas ele foi o único que despertou isso em mim.

Quase todos os dias, todas as noites, eu tenho pensado naquele


final de tarde e na nossa conversa. Pensado sobre possíveis
encontros ocasionais, onde conversaríamos por horas.

É claro que isso não passa da droga de uma ilusão.

— Desculpa. – peço. – Não sei nem porque estou te dizendo


essas coisas. – minha voz fica mais pesada conforme tento impedir
as lágrimas de caírem. – Não é como se você quisesse saber dos
meus problemas depois de eu tentar te fazer passar um pouco pelo
que passo com você.

Ele ri, incrivelmente conseguindo me fazer sorrir junto e imagino


como seu sorriso deve ser. Como ele deve ser.

— Estamos quites agora. – responde.


— Acho que sim. – concordo.
Capítulo Nove
Quarta-feira

— Eu simplesmente não consigo acreditar no tamanho da minha


sorte. Logo quando eu mais preciso essa droga de celular não
desperta! – explodo para ninguém, jogando o aparelho no banco do
carona enquanto dirijo pelo trânsito do Rio. – Graças a você, agora
estou atrasada e bem quando não posso me atrasar.

Não é realmente verdade. Acordei trinta minutos depois do meu


normal e de carro eu costumo chegar bem mais cedo que de trem.
Ainda consegui tomar um banho rápido e me vestir adequadamente
para a ocasião, que no caso foi: camisa social branca com um
coletinho vermelho por cima, calça jeans e um sapato de salto. O
que não consegui mesmo foi tomar meu café da manhã. Mas isto é
o de menos.

Também não é verdade que meu celular não despertou. Ontem,


depois do meu breve “desabafo” pela parede do quarto com o
vizinho, eu acabei ficando acordada, lendo, até bem mais tarde do
que deveria. Acho que eu precisava daquilo depois do que tinha
acontecido, para evitar pensar em tudo isso e não chorar mais. O
que, considerando que estou na TPM, não é algo difícil de
acontecer.

— Ele pode ser um canalha de alto padrão. – digo, colocando


um bombom na boca quando paro no sinal fechado. – Mas não
posso negar uma coisa: aquele idiota do meu vizinho tem um
excelente gosto para chocolate.
Depois de muito pesquisar, acabei por descobrir que a cestinha
de bombom na minha porta era da Kopenhagen e é simplesmente a
melhor coisa que já provei na vida. Até agora, pelo menos.

— Senhorita Brudosck! – Daiane chama minha atenção assim


que coloco os pés para dentro do prédio da BIT. Merda! O que eu fiz
agora? Consulto o relógio em meu pulso. Ainda tenho vinte minutos.
Não estou realmente atrasada. – Isto aqui é para a senhorita. – diz,
entregando-me um bilhete com algo preso em uma das pontas.

— Ah! – sorrio, sentindo um alívio. – Obrigada. – guardo os dois


no bolso, já correndo para o elevador, apertando o botão para que
suba até o vigésimo andar, que é onde será a reunião hoje.

A cada andar, uma pessoa sobe ou desce. E isso é irritante,


porque eu estou atrasada e eles não colaboram comigo.

Minha ansiedade começa a crescer mais e mais. Afinal, essas


reuniões costumam acontecer com o Presidente da empresa.

— Oi, Lu. – Isabeli me cumprimenta, entrando no elevador no


décimo quinto andar.
— Olá.
— Pronta para conhecer o homem mais gostoso desta cidade? –
pergunta com sua já famosa risadinha de sempre.
— Não muito. – respondo, não querendo entrar no assunto.

Como ninguém mais chama o elevador pelos andares restantes,


terminamos de subir bem mais rápido, embora isso não faça com
que minhas mãos parem de suar por nervoso.

Eu as coloco no bolso para disfarçar a ansiedade, sentindo a


pequena bolinha, lembrando-me do bilhete que Daiane me deu. Eu
o tiro para ler.

— Legal! – Isabeli exclama ao meu lado. – Você já recebeu seu


cartão de um mês.
Olho para ela com o cenho franzido, sem entender bem a
princípio. Então eu leio as palavras tão perfeitamente posicionadas
no centro do papel branco, um pouco envelhecido:

Parabéns por seu primeiro mês de trabalho.


Espero que continue empenhando sempre seu melhor,
Pois as oportunidades são grandes.
Obrigado.
Andrew Giardoni,

Presidente CEO, BIT Technologies.

Termino a leitura e começo a analisar o papel em minhas mãos.


A caligrafia perfeita em tinta preta, muito provavelmente escrita com
uma caneta tinteiro. O A.G. dourado, gravado no canto direito do
papel...

Algo me parece estranhamente familiar. As iniciais A.G. rondam


por minha cabeça, fazendo-me pensar.
— Andrew Giardoni. – sussurro.

No momento em que o elevador para, lembro-me da bolinha


dourada presa ao papel. Um chocolate Kopenhagen idêntico ao que
ganhei do meu vizinho. A caligráfica perfeita.

A porta se abre quando finalmente me dou conta do porquê de


tudo ser assim tão familiar.

Mesmo com todas as pessoas entrando e saindo da sala de


reuniões, eu o vejo ali, parado a pouco mais, pouco metros de
distância de onde estou agora, de frente para o elevador,
conversando com Pedro.

— AH MEU DEUS! – as palavras me escapam alto demais e


levo as mãos à boca para esconder meu espanto. O chocolate vai
parar no chão, ainda colado no bilhete.

— O que houve? – Isa pergunta, preocupada. – Esqueceu algo?


– eu nego, ainda incapaz de me mover. Minhas pernas estão moles,
perto de me levar ao chão em uma queda. Você já caiu. Apenas não
se deu conta ainda.

Sinto suas mãos em minhas costas, forçando-me a sair do


elevador. Ele está aqui... Minhas pernas não me obedecem. A
poucos metros de mim. Meu coração bate tão forte contra meu peito
que parece querer pular para fora.

— Anda, Lu. – Isabeli sussurra em meu ouvido, finalmente me


fazendo andar. Eu o encaro, totalmente petrificada.

Ainda que desta vez ele esteja usando um terno preto


perfeitamente alinhado e uma gravata de mesma cor, com uma
única listra branca logo abaixo, eu o reconheço. Reconheceria em
qualquer mundo. Seu cabelo em uma tentativa fracassada de ser
penteado, formando um pequeno topete, ainda sem esconder
aquele ar de quem acabou de transar. Hoje eu não duvido que ele
tenha feito isso.

Seus olhos cinza agora se fixam em mim e nossos olhares se


cruzam. Seu rosto levanta um sorriso de lado discreto para mim e
vejo as covinhas por detrás de sua barba por fazer. Minhas mãos
ainda escondem minha boca, mas não o espanto em meus olhos ao
encontrá-lo logo aqui.

— O que aconteceu? – ouço Pedro dizer, agora de frente para


mim. Ele se foi. – Parece que viu um fantasma.
Solto o ar que não havia me dado conta de que estava
segurando.
— Eu não... Eu não estou muito bem. – digo a primeira coisa que
me vem à cabeça. – Deve ser o calor.
— Vão logo sentar no lugar de vocês que a reunião já vai
começar. – Pedro diz todo mandão. – E te aquieta, Luara!
Concordo com a cabeça, permitindo Isabeli me levar até dois
lugares vagos, na segunda fileira da frente.

Um milhão de pensamentos perturbam minha mente. Eu encaro


fixamente o palco ainda vazio na minha frente, observando cada
objeto posto nele.

Uma mesa no canto, com um notebook em cima, provavelmente


ligado ao projetor, que está posicionado no meio da sala, iluminando
um telão ao fundo do palco, exibindo o logo da BIT Technologies.

Por que eu fui aceitar sentar logo aqui?

— Ele é lindo. Não é? – Isabeli pergunta ao meu lado.


— Quem? – pergunto, ainda encarando Andrew enquanto ele
conversa com alguém que, acredito eu, seja do RH.
— Quem?! – ela pergunta de volta, rindo. – Você não para de
secar ele desde que sentamos aqui!

— Bom dia, pessoal. – a voz grave de Andrew chega aos meus


ouvidos pelo microfone, dando início a reunião e poupando-me de
ter que dar a resposta. – Houve alguns imprevistos este mês, que
me fizeram ter que antecipar nossa tão esperada reunião. Mas eu
não acho que isto seja algo ruim para alguns de vocês, já que foram
poupados de ter que esperar até o próximo mês. – sua empolgação
só faz aumentar conforme ele fala. – Pois bem. Além do que já
conhecemos como sendo o monótono desenvolvimento dos setores
e crescimento da nossa empresa dentro do mundo tecnológico,
teremos, finalmente, a grande revelação...

— CONTA LOGO! – ouço alguém gritar do fundo da sala.


— Calma. – ele pede com um sorriso lindo no rosto. – Não
vamos estragar o melhor do dia, hein?

Slides com gráficos de tudo quanto é tipo passam no telão,


mudados por alguém que não reconheço. Cada um deles vem
acompanhado de uma detalhada explicação. Vendas no mercado,
ações, tudo. É até interessante, mas não consigo manter minha
atenção em nada do que ele esteja dizendo. Tudo o que minha
cabeça faz é me forçar a reviver as últimas semanas e, em especial,
o dia de ontem e minha fracassada tentativa de transar com alguém
apenas para provocar o idiota do meu vizinho.

Levo à mão a testa.


— Está tudo bem? – Isa sussurra para mim.
— Esta. É só uma dor de cabeça. – minto. – Logo passa.
— Qualquer coisa eu tenho remédio na bolsa. – concordo com a
cabeça.
— Obrigada.

Isabeli volta à atenção, cheia de suspiros, para frente, enquanto


eu pego meu celular, digitando uma mensagem para Julie:

Ju, por favor, me tira daqui. Não aguentando mais.


Quero largar tudo e fugir para bem longe. Muito longe.
O mais longe que puder. E enfiar minha cabeça num buraco!

Merda! O que foi que eu fiz?!


Sua resposta chega instante depois:

O que aconteceu? Por que diz isto assim?


Achei que vc estivesse gostando dai.

Mordo o lábio inferior, olhando para frente. O Presidente está


agora de costas para mim, explicando sobre algo que não me dou
ao trabalho de entender.

Acredita se disser que meu chefe é meu vizinho canalha?


Que, obviamente eu deveria ter associado esse detalhe.
Julie:
Tá de brincadeira, né?! Não acredito MESMO!!!

Antes fosse só isso. Tem mais…

Julie:
Ele não é tão gostoso quanto os boatos que espalharam?

Demoro um pouco mais para responder. Meus olhos se enchem


de lágrima. Maldita TPM!

O Gostosão da Praia... Eles são... ELES SÃO A MESMA


PESSOA!

Merda, Ju! Meu CHEFE! Meu vizinho idiota e ele... Eu transei


com meu chefe, que é meu vizinho, que a cada dia do final de
semana leva uma Vadia Aleatória para casa.

Me tira daqui, por favor.

Julie:
Eu não sei se isso é sorte ou se você realmente é azarada.
Quero dizer, você reencontrou o Gostosão da Praia, o que é
bom. Mas acabou descobrindo que é ele quem tira seu sono (e não
estou dizendo no bom sentido!). Mas tb tem a vantagem de ser a
única mulher dai que pode dizer com toda certeza o quão bom ele é.
Ai, amiga...

Eu só consigo me sentir arrasada com tudo isso…

Torno a guardar o celular no bolso, voltando a prestar atenção no


que estão falando.

— Bem, para os que já não estão mais se aguentando de fome,


faremos um intervalo de trinta minutos para que vocês possam
aproveitar do café da manhã. – Andrew diz, retomando o lugar no
centro do palco. – Para os que não estão aguentando de ansiedade
e curiosidade, darei a boa notícia quando voltarmos.

Era tudo o que eu precisava.

Pego minha bolsa do lugar vago ao meu lado, levantando para


sair junto dos demais.

— Eu vou ao banheiro. – informo Isabeli, que concorda com um


gesto de cabeça.

Em uma pequena sala ao lado da de reunião, foi servido uma


enorme mesa com bolos, café, salgados e sucos. Coisas que eu
normalmente me deliciaria. Principalmente por não ter conseguido
tomar café da manhã antes de sair de casa. Só que toda aquela
fome que sentia enquanto vinha para cá simplesmente sumiu,
dando lugar a uma ansiedade que só faz crescer cada vez mais.

Eu me vejo procurando por Andrew em cada canto, sentindo um


calafrio na espinha a cada pessoa que passa ao meu lado.
— Luara. – ouço uma voz rouca me chamar, fazendo com que
todo meu corpo estremeça. Fecho os olhos. Por favor, agora não... –
Preciso falar com você.
— O que você quer? – pergunto de volta. O nervosismo
estampado em minha voz, deixando-me incapaz de virar para
encará-lo de frente.
— Pode me acompanhar até minha sala?
Posso sentir seu hálito fresco em minha nuca.
— É sobre trabalho?
— Sim. – responde. Não, é o que eu ouço.

Mesmo contra todas as lógicas do universo, eu concordo com


um gesto de cabeça, virando para segui-lo até o elevador, para sua
sala.

Pela postura dele, não consigo descobrir se está tranquilo com


isto ou se tão nervoso quanto eu. Só sei que minha mente esta uma
pilha de nervos desde que eu o vi na porta da sala com Pedro, que
não tenho nem ideia do que ele quer conversar comigo. Talvez ele
vá me demitir... Estremeço com a simples ideia. Isso seria terrível
para mim. Eu... Eu nunca espalharia para quem quer que fosse
sobre o que tivemos. Na verdade, você vai apagar aquela foto e
esquecer tudo aquilo.

Andrew para, chamando o elevador, que abre quase que


imediatamente e entro, já mantendo o olhar fixo ao painel de botões,
acompanhando cada andar que subimos.

O elevador para e ele me deixa sair na frente. Sei que esta há


poucos passos de mim. O que não ajuda em nada na minha
tentativa de controlar meus batimentos cardíacos. O que vai
acontecer agora? Ele abre uma grande porta, deixando-me entrar
na frente e não consigo deixar de notar seu tamanho. Dizer que é
grande seria dizer pouco. Afinal, ela é realmente grande e tem uma
mesa de madeira ocupando uma boa parte do espaço próximo às
janelas, um sofá em outro canto e, em uma das paredes, vários
quadros que não reconheço.
Em qualquer outra situação, eu me aproximaria de cada um
deles, para conhecer um pouco do trabalho. Mas não hoje, quando
tudo o que mais quero é correr para meu apartamento e me
esconder de baixo do edredom. Ao invés disso, eu cruzo os braços
junto ao peito, criando coragem para fazer a pergunta que vem
rondando minha mente:

— Por que você não me contou naquela noite?


— Teria feito diferença? – ele pergunta.
Rio, não conseguindo esconder a ironia em sua pergunta. Além
de toda? Ele é meu chefe, caramba!
— Se teria feito alguma diferença? – pergunto de volta. – Além
de toda? Não. Diferença alguma. Imagina.
— Olhe para mim. – ele me pede quase sussurrando as palavras
para mim.

— Sabe quando me senti quando te vi naquela sala e descobri


que as três pessoas totalmente diferentes que eu vinha idealizando
ao longo dessas semanas eram simplesmente a mesma pessoa? –
pergunto, ignorando seu pedido. – Conheci um cara bacana na praia
e aconteceu algo entre nós. Ele gosta de livros e é intelectual. Um
safado gostoso com uma pitada de romântico. – balanço a cabeça,
sem acreditar no que estou dizendo. – Mas claro que ele era apenas
uma fantasia louca, já que as chances de nos reencontrarmos eram
mínimas.

Sinto lágrimas embargarem minha voz, mas eu as impeço de


sair.

— Meu vizinho é um canalha idiota que eu só consigo odiar a


cada dia. Mas no sábado ele conseguiu conquistar uma pequena
parte de mim, com um gesto bonito que fez. E teve ontem... – faço
uma pausa, inspirando o mais fundo que consigo. Não posso me
permitir lembrar daquilo. Meu chefe sabe que sou um fracasso com
homens quando se trata de sexo sem compromisso. – E meu chefe
é uma lenda dentro do meu trabalho novo. – sussurro. – Todas as
mulheres o desejam. Mas ele mantêm o respeito, sendo o mais
profissional possível, evitando se relacionar com elas. Sabe o
quanto eu te defendi cada vez que alguém mencionava algo a
respeito de você não fazer isso com ninguém aqui? – explodo, por
fim virando-me para ele, com lágrimas escorrendo por meu rosto.

Andrew mantém certa distância de mim, com as mãos no bolso.


Seu olhar fixo ao meu.

— Eu não sabia que era você. – ele responde. – Ou talvez eu


soubesse. Eu só... – acompanho seu olhar para fora do prédio,
vendo um céu azul e limpo, tornando a olhá-lo. – Acho que as pistas
sempre estiveram lá. Tanto para você quanto para mim.
Provavelmente mais para mim, já que tinha mais informações.

Ah, com toda certeza você tinha bem mais informações de que
eu.

Levo a mão ao rosto para secar as lágrimas que insistem em dar


as caras no pior horário.

— Eu devia ter ligado tudo o que você me disse. Sua mudança,


seu trabalho e a profissão. Mas eu não queria que você fosse à
mesma pessoa que trabalharia aqui. Eu te procurei por dias. – ele
de ombros. – Voltei à gruta no domingo seguinte, na esperança de
encontrar você lá. Mas estava chovendo. – O que?! Não! Você não
fez isso! Não no final da tarde, pelo menos. Eu estava lá. Fiquei
presa... – Quais eram as chances de uma garota como você estar
no meio do nada, com toda aquela chuva que estava caindo? Ou
aparecer por lá em algum momento daquele dia? Fui embora sem
nem mesmo descer do carro. – ele então nega com a cabeça,
parecendo lutar contra algo. – Usei aquela foto sua e sai de prédio
em prédio, procurando se aquela garota morava lá. A resposta era
sempre a mesma, claro. O único lugar que não perguntei, foi no
Golden Village. Só a ideia era ainda mais absurda.

Ele então para de falar, mantendo um olhar cinzento fixo em


mim, causando-me calafrios dos pés a cabeça. Por alguns instantes,
eu só consigo ouvir o silêncio entre nós.
— Nem por isso você deixou de levar aquelas... – faço uma
pausa, procurando pela palavra certa para dizer neste momento. –
Aquelas Vadias Aleatórias para o seu apartamento todo fim de
semana, só para transarem como dois animais selvagens. – ele ri. –
Qual é a graça?

— A graça, Luara, é que você brigava comigo a cada dia,


enquanto eu procurava nelas o que até então eu havia encontrado
somente em você. – franzo o cenho ao ouvir suas palavras. Claro
que encontrou. Encontrou um sexo fácil com uma idiota solitária! – E
toda noite eu acabava frustrado, enquanto eu só precisava tocar a
campainha do apartamento ao lado do meu. – acho é muito bem-
feito para você. Ou mal feito. Idiota.

Ele dá um passa para frente, o olhar fixo em mim. Dou um para


trás.

— Você não levou ninguém domingo. – sussurro, sentindo meus


batimentos acelerados.
— Não. Não levei. – concorda. – Não achei certo e não estava
ajudando em nada.
— Não achou certo? – pergunto, sem entender.
— Eu não sei.

Toda aquela raiva de antes começa finalmente a se acalmar,


finalmente me permitindo raciocinar direito.

Ele diz que me procurou, assim como havia dito que faria pouco
antes de nos despedirmos. Diz que foi a gruta onde eu estava
abrigada. Se ele foi, porque não entrou?

— Suas palavras quase me convencem. – digo. Andrew penteia


o cabelo para trás, acabando com o pouco que restava de seu
penteado.
— Imagino que deve ser difícil acreditar. – ele concorda. – Ainda
mais depois do que você ouviu. E eu sinto muito por ter feito aquilo.
— Sente mesmo? – pergunto desconfiada, arqueando a
sobrancelha. Ele concorda.
— Sou um canalha idiota. Um patife que não sabe a merda que
faz fora dessas paredes. – diz, mostrando com as mãos toda a sala.
– Você tinha razão ao dizer essas palavras. E eu sinto muito por
isso.

Ele dá dois passos para frente, fechando os olhos.

— Não vou cair na sua rede de novo. – digo, lutando para me


manter de pé. – Você não se relaciona com suas funcionárias.
Lembra?
— Pena que tudo isto tenha começado antes de você começar a
trabalhar aqui. – sussurra, parando a centímetros de mim, fazendo-
me sentir seu perfume tão perto de mim e meus batimentos
acelerarem ainda mais. Se é que isso é possível.

Sinto sua mão pousar em meu quadril, puxando-me para ele,


prendendo-me.

Eu luto contra todo o meu corpo, tentando manter dentro de mim


a vontade de tocá-lo. Depois de tudo o que ouvi, de saber que ele é
o Presidente CEO do meu trabalho. Isso... Isso não é o que eu
quero. Eu só queria o Gostosão da Praia.

— Infelizmente isso é o que eu sou, Luara. – sinto seu toque em


meu rosto no mesmo instante em que suas palavras chegam aos
meus ouvidos. – Um idiota que tudo o que quer nesse instante, é
poder beijar uma linda garota uma segunda vez, só para ter certeza
de que não está sonhando.

— Por que eu? – pergunto.


— Eu esperava que você pudesse me dar à resposta para essa
pergunta. – responde, correndo o polegar por minha bochecha. – Eu
não sei o porquê, mas você nunca foi uma delas.

Sinto sua outra mão ainda em meu quadril, presa ao cós da


calça, enquanto a outra parece fazer uma massagem em meu rosto.
Cadê aquele maldito alarme para soar em minha cabeça e me
impedir de cometer uma loucura?!

Por impulso, ou apenas a vontade que tenho reprimido nas


últimas semanas, eu toco sua barba, sentindo-a espinhar meus
dedos. Ele fecha os olhos, como se permitisse a si mesmo sentir
isto que estou fazendo com ele.

— Senhor Giardoni? – ouço uma voz feminina do outro lado da


porta. Rapidamente eu tiro minha mão dele. – A reunião recomeça
em cinco minutos. – ela informa.
— Desço em quatro, Ana. – responde, impedindo-me de me
afastar.
— Sim, senhor.

Ele olha para a porta, parecendo esperar por mais algo.

— Pelo menos me deixe cumprir com minha promessa e te levar


para jantar. – pede, apoiando a testa em meu ombro e tenho que
conter a vontade de abraçá-lo. Isso seria arriscado demais.
— Tenho compromisso para o restante da semana. – minto. Não
posso me permitir cair nessa tentação de olhos cinza novamente.

Ele se afasta e percebo um brilho em seu olhar.

— Eu realmente gostaria de poder conquistar o direito a um


horário em sua agenda. – sorri. – Acho que você deve ter muitas
perguntas.

Se eu tenho perguntas? Tenho centenas, talvez milhares delas.


Mas... Eu não posso. Isso seria pedir demais. Eu esperei tanto por
isso e agora que eu o tenho aqui, na minha frente, tenho que pensar
além daquela fantasia idiota.

— Talvez seja melhor não nos deixarmos seguir por este


caminho. – peço, sentindo meus olhos lacrimejarem. Eu o aperto
com força, evitando chorar na sua frente outra vez.
— Tudo bem. – suas duas pequenas palavras parecem me ferir
de alguma maneira.

Sinto seu dedo em minha cintura, pouco antes de tirar a mão de


mim e se afastar. Eu o encaro, vendo um sorriso em seu rosto. Ele
parece triste, como se realmente quisesse esse jantar. E você
também quer! Por que não aceita o convite dele?!

– É melhor você sair na frente. Assim ninguém desconfia de que


estávamos juntos. Eu espero aqui.

— Desculpa. – a palavra sai sem som algum, mas sei que ele
entendeu. Minha voz esta embargada e rouca demais para que
alguém consiga me ouvir.

Todo aquele sonho. Toda aquela esperança de reencontrar o


Gostosão da praia. Eu não posso ter. Sempre soube que aquilo não
estava certo. Ele é meu chefe, droga!

Abro a porta de sua sala, indo a passos rápidos até o elevador,


ainda tentando não chorar.

Sentada novamente no meu lugar ao lado de Isabeli, olho para a


porta, na espera pelo momento em que Andrew ira passar por ela,
para retornar a reunião.

Enquanto descia, eu me obriguei a colocar tudo o que estou


sentindo de lado e só me permitirei sentir de fato quando estiver em
meu apartamento, sozinha. Não posso dar sinal de nada do que
estou sentindo aqui.

— Irei direto ao ponto. – a voz chega aos meus ouvidos antes


mesmo de encontrá-lo.

Andrew caminha a passos rápidos para o palco. Sua postura


ereta e inabalada. Se eu não estivesse lá, ninguém jamais me
convenceria de que o que aconteceu em sua sala é verdade. E você
ai se lamentando.
— Estamos com uma proposta de melhoria em alguns setores,
juntamente da Nex Ae. – uma garota corre até ele no palco, para lhe
entregar o microfone, mas acaba sendo despachada mais rápido do
que se imagina. Postura inabalável? – Nosso principal objetivo com
eles este ano é melhor o trabalho da empresa, qualificando um
profissional da área de Software, já que é nossa maior
especialidade. Alguns dos funcionários desta área já participaram
deste treinamento, tal como outros de outras áreas também já
tiveram sua oportunidade. – ele olha para todos os lados, então
ergue a mão, fazendo sinal para que fiquem em silêncio. – Antes
que julguem precipitadamente, conversei com todos os principais
responsáveis nos setores, diretoria e RH, tal como também com
Pedro, encarregado do setor. Todos concordaram depois de algum
tempo, que a nova funcionária, Luara Brudosck, devera participar do
treinamento que ocorrera em Nova Iorque este ano.

Arregalo meus olhos ao ouvir meu nome. Devo ter escutado


errado. Não sou eu.

Olho para Isabeli ao meu lado e ela parece tão surpresa quanto
eu. Mas, ao contrário de mim, ela sorri.

— Alguma objeção? – Andrew pergunta em alto tom. Ninguém


diz nada.

Com o silêncio que faz aqui, sinto meu corpo afundar na cadeira
em que estou. Quero levantar e sair correndo para bem longe, onde
ninguém possa me encontrar.
Olho para ele, na esperança de poder sinalizar um não. Mas ele
parece mais interessado em não querer olhar para mim, prestando
atenção a qualquer coisa que se mova.
— Ótimo. Considerarei isto como uma aprovação.

Dito isto, ele sai do palco, caminhando a passos rápidos para


fora da sala. Uma senhora usando saia cinza sai atrás dele.
Afundo na cadeira ainda mais, tentando não demonstrar o
desespero que é essa situação. Quer dizer, eu... Não! Por que ele
não olhou para mim, merda?!
Capítulo Dez
Quinta-feira

Já passa das seis horas e ainda estou aqui, trancada em minha


sala aqui na BIT, terminando um aplicativo que fiquei de entregar até
amanhã para que Pedro pudesse repassar para o gerente. Só
faltam mais alguns códigos e poderei ir para casa.

Meu celular toca, tirando-me completamente de minha música,


que pauso imediatamente, apenas para ver o nome da minha irmã
na tela.

Que estranho. Ela nunca me liga de semana. Atendo no segundo


toque.

— Fala coisinha linda.


— Tata, onde você esta? – ela pergunta e imediatamente
percebo que algo não esta certo.
— Estou no trabalho. – respondo, apertando a caneta na mão. –
Aconteceu algo? – pergunto, preocupada.
— Sim. Hm...
— Cami, por favor, vá direto ao assunto. – peço.
— É que a vovó... – ela começa, mas então para quando sua voz
embarga.
— Não! – deixo escapar. – Isso não. Por favor.

Camile ri, parecendo realmente nervosa.

— Ela enfartou esta tarde. A tia a levou para o hospital. Nossos


pais estão com ela lá. As coisas não estão boas, Tata.
Levo a mão à boca, enquanto com a outra tento segurar o celular
junto ao ouvido. O olhar fixo a porta fechada. Minha vó não, por
favor!

— Onde você e o Tommy estão? – pergunto após o que me


parece ser uma eternidade.
— Em casa. – responde. – A Ju esta aqui conosco.

Mil coisas passam pela minha cabeça nesse instante. Minha avó
já é bem de idade, mas é forte. Mas isso...

Fecho os olhos, sentindo as lágrimas surgirem. Não posso


chorar.

— Eu acho que ela não vai aguentar muito, Tata. – Camile é a


primeira a falar. – Eu só... Vem pra cá, por favor.

Corro a mão pelo cabelo, prendendo uma mecha chata atrás do


cabelo, mas ela torna a cair no rosto.

— Eu vou ver se consigo falar com alguém. – minha voz falha ao


dizer as palavras. – Qualquer coisa você me liga. Tudo bem? –
Camile concorda com um “Uhum”. – Eu vou para casa agora.
Qualquer coisa mesmo entendeu? Vou ver se consigo falar com
meu supervisor. Sei lá.

— Tudo bem. – ela sussurra. – Estou com saudades. – e, com


estas palavras, eu me sinto a pior irmã e filha do mundo.
— Eu também. – respondo.

Salvo meu trabalho, desligando meu computador, já pegando


também minha bolsa para sair. Por que logo hoje fui vir de trem para
o trabalho? Tranco a porta da sala, indo até o elevador.

— Assim que eu chegar em casa ligo para ter notícias. – digo,


chamando o elevador. – Amo vocês.
— Eu também. – diz, então desliga.
A porta do elevador abre quase que de imediato e entro,
apertando o botão do térreo.

— Que droga. – digo, apertando várias vezes o botão do térreo,


como se isso fosse fazer a porta fechar mais rápido para que eu
possa sair daqui ainda mais rápido. ANDA!

Sinto meus olhos queimarem. Não aguento. Minha avó não, por
favor.

A porta finalmente fecha, dando início a uma longa e tortuosa


descida.

— Por que logo, droga? – as lágrimas embargam minha voz e


sinto um nó em minha garganta. – Por que ela, Deus?

Dou alguns passos para trás, secando uma lágrima que escorre
por meu rosto, encarando o painel iluminado na minha frente.

Como eu posso ir para lá assim, logo depois daquela notícia?

Aperto minha bolsa contra o peito, sentindo uma forte dor dentro
de mim. É como se tudo isso, a cada dia...

Com um passo para trás, sinto algo macio atrás de mim, pouco
acima da minha bunda. Algo que não deveria estar aqui.

— O que... – começo a dizer, levando a mão para trás, sem ter


coragem de virar, e sinto algo grande e macio, que parece ficar mais
duro conforme toco. Ai, merda!
— Por favor... – ouço uma voz rouca em meu ouvido e uma mão
grossa que segura a minha. – Não aperta.

Eu simplesmente congelo ao ouvir essa voz. PUTA MERDA!

Sentindo meu corpo tenso, começo a me virar, apenas para


comprovar minha pior suspeita.
Ele esta bem atrás de mim, ainda segurando minha mão... Lá.
Eu a puxo, pulando para longe dele.

— DESCULPA! – peço, sentindo meu corpo se aquecer de


vergonha da ponta do dedinho do pé até o último fio de cabelo. – Mil
desculpas. Eu não vi você ai e...

Andrew sorri, ajeitando seu... Hm... UAU! Ele realmente ficou...

Desvio o olhar dele quando começa a falar:

— Tudo bem. Eu deveria ter tossido, pigarreado ou qualquer


coisa do tipo para mostras que estava aqui.
— Ou eu deveria prestar mais atenção ao que esta a minha
volta. – respondo, olhando para o painel. Ainda estamos no terceiro
andar.
— Você esta bem? – pergunta.

Olho novamente para ele, que agora esta com as mãos no bolso,
afastando a frente da calça.

Fecho os olhos com força. Se eu disser algo, não vou aguentar.


Então, ao invés disso, eu nego com a cabeça, sentindo algumas
lágrimas me escaparem.

— Não fique assim, Anjo. – sua voz suave chega até mim,
fazendo com que mais lágrimas desçam por meu rosto. Então sinto
seu toque em minha bochecha.

Abro os olhos e vejo que já estamos no térreo.

— Me desculpa. – peço, praticamente correndo para fora daqui.


Não posso. Tudo isso é mais do que eu consigo aguentar.
Primeiro minha avó. Agora isso.

— LUARA! – ouço sua voz atrás de mim e o ignoro, aumentando


os passos. – EI! Quer esperar. Por favor?
Andrew me segura, fazendo-me virar de frente para ele.
— O que foi? – pergunto.
— Você vai embora de que? – franzo o cenho.
— Que?!
Ele revira os olhos.
— Seu carro não esta ai.
— Ah... – passo a mão pelo rosto, tentando controlar minhas
emoções. – Eu vou de trem. – respondo. – Deixei meu carro na
oficina pela manhã.
— Vem comigo. – O quê?! – Nós vamos para o mesmo lugar.
Não vou deixar você andar assim por ai. É só uma carona. –
acrescenta.
— Eu posso pegar um táxi. – digo. – Estou bem. Sério.
Andrew olha para os lados, parecendo procurar por algo.
— Não estou pedindo para você sair comigo. – sua voz é mais
autoritária. – Você está chorando. É obvio que não esta nada bem.

Mordo o lábio inferior, tentando impedir que mais lágrimas


desçam.
— Só quero te ajudar. – diz. – Não precisa me contar o que
aconteceu se não quiser.

É só uma carona, Luara. – digo a mim mesma. – Ao menos


assim você chega antes para ver como seus irmãos estão e sua
mãe. Droga! Minha mãe deve estar péssima com isso.
Concordo com a cabeça.

Andrew pede para carregar minha bolsa, assim como vez aquela
vez na praia. Desta vez, eu a entrego para ele, sentindo sua mão
em minhas costas enquanto caminhamos.

Enquanto Andrew dirige pela cidade, eu apenas olho para a rua,


para o céu escuro e a lua cheia, que por tantas vezes chamou
minha atenção. Não tem uma única nuvem no céu e ainda assim
tudo o que sinto é uma dor terrível dentro de mim.

Já estamos em Copacabana, há poucas quadras do Golden.


Desde que entramos no carro, ele não disse uma única palavra para
me fazer dizer o que havia acontecido ou por qualquer outro
assunto. O que, para mim, foi bom. Isso me ajudou a me acalmar e
controlar um pouco as coisas que estou sentindo para quando for
ligar para meus pais.

Olho para Andrew quando ele para em um semáforo fechado e


ele retribui meu olhar, levantando um sorriso de lado que é lindo,
que infelizmente não consigo retribuir. Ao invés disto, eu olho para
fora.

— Minha avó esta internada. – digo quando ele digita sua senha
da garagem no painel do seu lado.

O carro para, desta vez em sua vaga. Andrew desliga o veículo,


deixando tudo escuro, iluminado apenas pela fraca luz no alto da
garagem.

— Você quer conversar sobre isso? – pergunta.

Olho em sua direção e pela primeira vez desde que o reencontrei


ontem, não vejo meu chefe, na qual eu apalpei sem querer dentro
do elevador. Ou meu vizinho. Mas sim aquele homem que conheci
na praia.

— Eu não sei. – decido por dizer a verdade. – Nesse instante,


tudo o que eu quero é tomar banho e ligar para minha família. – ele
concorda, saindo do carro. Ah...

Sinto como se algo dentro de mim se desfizesse. Mas isto dura


apenas alguns segundos, até que o vejo do meu lado, abrindo a
porta para mim.

— Acompanho você até sua porta. – informa, estendendo a mão


para mim.
— Obrigada. – sorrio em resposta, segurando sua enorme mão.

Andrew aperta minha mão, entrelaçando nossos dedos enquanto


caminhamos até o elevador. A mão dele é realmente quente.
Saio do elevador, ainda segurando a mão de Andrew.

— Tudo bem? – pergunta.


— Já estive melhor. – respondo, apertando minha mão na sua,
parando de frente com minha porta. – Eu só... Obrigada pela
carona.

Andrew sorri um sorriso lindo, dando um passo para frente e


beija meu rosto, fazendo tudo dentro de mim se revirar. Sorrio ao
sentir sua barba pinicar minha bochecha, também beijando seu
rosto.

— Se precisar de algo, sabe onde me encontrar.


— Obrigada. – sussurro, destrancando a porta do meu
apartamento para entrar.

Depois de tomar um banho gelado, liguei para minha mãe, para


saber como ela estava. Só que quem atendeu foi meu pai. Minha
mãe estava no quarto com a mãe dela e ele tinha ficado com o
celular, para o caso de Camile ligar.

Até onde ele sabia minha avó esta estável, mas de observação.
Além do infarto, ela teve mais algo que não conseguiu explicar
direito, mas os médicos estão fazendo tudo o possível para mantê-la
bem.

Quando desliguei com meu pai, liguei para Ju, para saber como
meus irmãos estavam e, como eu já esperava, quem mais esta
sentida é Cami, que sempre foi mais chegada a nossa avó. Tommy
não entende muito dessas coisas, mas fica triste por ver a irmã triste
e, consecutivamente, eu me sinto mais uma vez péssima por estar
tão longe deles quando mais precisam de mim.

A campainha toca e eu a ignoro, não conseguindo nem mesmo


sair do sofá. E toca uma segunda vez.

— Já vai. – digo, abrindo a porta, deparando-me com Andrew. O


que ele faz aqui? – Oi.
— Surpresa? – sorri.
— Um pouco. – respondo, sentindo um cheiro delicioso de pizza.
— Achei que você não fosse jantar. – começa a explicar. – Então
assei uma pizza e acho que talvez ela seja demais apenas para
uma pessoa só e... Bem, já que você não aceitou sair para jantar
comigo...

Ele para de falar e me sinto realmente mal por minha atitude de


ontem. Ele esta tentando ajudar, poxa. Sem ter a menor obrigação
comigo.

— Entra. – convido, sem saber exatamente o que dizer.

Andrew entra, parecendo analisar minha sala. Fecho a porta e


olho ao redor, para me garantir de que tudo esteja no lugar. A última
vez que arrumei isso aqui foi na terça-feira.

— Bonito apartamento. – ele diz e não consigo descobrir se esta


sendo sincero ou sarcástico. – Onde eu... – então aponta para o
prato em sua mão.
— Pode colocar na mesa. – peço.
— Eu pensei em fazer um suco de laranja para nós. – ele diz. –
Mas não sabia do que você gostava. Então preferi deixar que você
escolhesse.

Sorrio completamente boba. Esse homem não é o meu vizinho.

— Laranja está ótimo. – digo. – Deixa que eu prepare o suco.


Você já fez muito.
— Está sendo sarcástica comigo? – ele pergunta ao virar-se
para mim. A sobrancelha erguida. Sorrio.
— Achei que você estivesse sendo quando falou do meu
apartamento. – retruco.

— NÃO! – ele ri. – Eu realmente gostei dele. É pequeno e tem


um aroma feminino que meu apartamento só tem quando minha
governanta aparece por lá. Ainda assim ele não dura muito.
— Obrigada então. – respondo, totalmente sem graça. – Eu vou
preparar nosso suco.
— Onde posso pegar pratos e talheres? – ele pergunta atrás de
mim.
— No armário. – respondo da cozinha.

Sigo para a cozinha e aponto o armário para ele, que vem atrás
de mim. Pego algumas laranjas lavadas e as corto para colocar na
máquina de suco.

— Desculpa. – ouço. – Eu nem perguntei se você queria isso. –


viro para ele, sem entender.
— Isso? – pergunto.
— Pizza. Suco. Jantar. – da de ombros. – Você estava realmente
triste quando te deixei aqui há trinta minutos e parece ainda mais
chateada agora. Talvez você nem queira companhia.
— AH! – exclamo, entendendo seu ponto. – Eu não ia jantar. Só
ia deitar no sofá mudando os canais, tentando não pensar no fato de
estar tão longe de casa. Então: obrigada por fazer isso por mim.
— Às vezes é bom ter companhia. – ele diz mais para si mesmo,
pegando dois dos meus pratos. – Sabe, prefiro usar a mão quando
estou sozinho. – diz, virando para mim. – Você se importa?
— Nunca imaginei ouvir um CEO me dizendo algo desse tipo. –
provoco.
— Alguma vez já se imaginou jantando com um CEO antes? –
pergunta. Faço que sim com a cabeça. – Imaginou? – concordo
novamente. – Quando?
— Ontem à noite. – sussurro, sentindo meu rosto se aquecer.

Ouço o som vindo da TV, mas não presto atenção em uma única
coisa do que dizem no filme. Ou do que ele se trata. Estou distraída
demais para qualquer coisa além do que se passa nesse pequeno
espaço entre o rack, o sofá na qual Andrew está encostado e o
tapete felpudo que estamos sentados no chão.

Depois de jantarmos, viemos os dois para cá, para “ver um


filme”. Acho que nenhum de nós esta prestando atenção. Eu porque
só consigo pensar em minha avó e no fato de estar deitada no colo
desse homem, tentando entender o porquê de ele estar aqui
comigo. Tentando descobrir se ele esta aqui porque quer algo ou se
apenas esta tentando ser meu amigo. Talvez seja pelas duas
coisas.

Fecho os olhos, sentindo seu toque em meu cabelo, fazendo


com que eu quase adormeça. Hoje não.

Será que seria pedir demais para que ele ficasse aqui comigo,
até tudo isso passar?

— Como ela é? – sua voz chega aos meus ouvidos quando ele
para de mexer em meu braço.
— Por favor, não para. – peço, segurando sua mão,
recomeçando os mesmos movimentos que ele estava fazendo. –
Está tão bom.

Andrew fecha sua mão na minha, me fazendo sentir um calafrio


percorrer por todo meu corpo.

Viro de barriga para cima, para poder olha-lo. Ele esta com o
cabelo todo bagunçado, de quem saiu do banho e só vestiu uma
roupa qualquer para poder se apresentar.

Na verdade, ele esta usando uma bermuda de praia que fica


levemente pendida em sua cintura, junto de uma camisa regata
branca.

— Ela quem? – pergunto de volta, comparando o tamanho entre


nossas mãos, fechando-a novamente na dele.
— Sua avó. – diz, beijando minha mão e sinto-me me aquecer
sob seu toque.
— Ela é incrível. – respondo. – Eu ia todo final de semana na
casa dela quando estava em São Paulo. Quando não, ela ia passar
a noite conosco. Sempre levava presente para o Tommy, meu
irmãozinho e chocolate para mim e Camile, minha irmã.
Fecho os olhos, sentindo uma lágrima se formar. Não sei se sou
capaz de falar sobre isso com ele. Mas preciso.

— Eu tenho medo, sabe? – volto a falar, ainda de olhos


fechados. – Ela sempre foi forte, mesmo tendo quase oitenta anos.
Ela é meu espelho de independência e sempre me disse...

Sinto a mão de Andrew em meu rosto, secando as lágrimas.

— O que ela dizia? – pergunta.


— Para nunca desistir. – reabro os olhos. – Eu só espero poder
vê-la novamente e bem, entende?
Ele concorda com a cabeça.
— Você vai. – sorri. – Diga a ela como se sente. Que a ama. Por
que você não vai ver ela?
— Eu tenho um trabalho novo, Andrew. – respondo. – Embora
fosse ser bom passar alguns dias longe da pornografia do idiota do
meu vizinho. – ele sorri com minha resposta.
— Me pergunto o que ele acharia se ouvisse isso.
Não consigo deixar de rir com sua resposta.
— Também gostaria de saber. – respondo, arqueando uma
sobrancelha. Existem muitas coisas que eu gostaria de saber, para
ser sincera. – E tem esse treinamento que eu praticamente fui
convocada a fazer e não acho que meu chefe aprovaria se eu
faltasse do trabalho logo agora.

— Acho que ele relevaria isso. – diz. – Quer dizer, é sua família.
Eles precisam de você lá. Ele não pode ser tão cruel a esse ponto.

Por alguns instantes, eu apenas o observo. Observo cada


mínimo traço em seu rosto. Seu olhar cinzento, a maneira com que
ele sorri para mim. A maneira com que seu cabelo pende para o
lado, mostrando que precisa ser cortado.

Ele franze o cenho, então sorri, fazendo com que mil e um


pensamentos inapropriados tomem posse de minha mente.
Eu me levanto apenas o suficiente para ficar da sua altura,
apoiando a mão em sua coxa, sentindo sua pele quente em minha
palma.

— O que foi? – ele pergunta com a voz rouca.


Nego com a cabeça.
— Eu só... Tem uma coisa que eu quero fazer.
— E o que é? – pergunta outra vez.

Fecho os olhos, tentando controlar meus batimentos. Você pode


fazer isso, Lu. Aproximo meu rosto do dele, passando a mão por
sua nuca.

— Algo que eu quero fazer de novo desde que te conheci. –


sussurro próximo de sua boca. – Mais ainda depois de ontem.

Sinto meu corpo estremecer quando as palavras me deixam.


Minha mão escorrega para o ombro de Andrew quando ele segura
meu rosto, deixando-me há poucos centímetros dele. Eu encaro
seus olhos cinzentos, tentando controlar cada batida do meu
coração.

Sentindo meus batimentos acelerados, eu contorno seu rosto e


sorrio para ele.

Andrew me da um beijo leve demais para o meu gosto. Estou


praticamente explodindo aqui e ele faz isso comigo?! Independente
de suas intenções, eu o correspondo, depositando nesse pequeno
gesto tudo o que estou sentindo neste momento. Ele me puxa para
seu colo e segura meu quadril com uma das mãos, prendendo meu
cabelo com a outra para poder beijar meu pescoço, causando uma
onda de calafrios por todo meu corpo. UAU!

— Meu Deus. – praticamente gemo ao sentir seus lábios em


minha pele e seguro seu rosto, trazendo-o de volta para mim.

Envolvo minhas pernas ao seu redor e o beijo da mesma


maneira com que ele fez comigo. Uma calma que parece tentar me
acalmar, mas acaba me deixando ainda mais louca por ele. Um
beijo lento, que me faz sentir como se tivesse procurado por isso
durante anos...

— Meu Deus. – ele repete no instante em que me afasto,


incapaz de tirar minhas mãos de seu rosto, acariciando sua barba.

Fecho os olhos por poucos segundos e, quando os abro


novamente, Andrew me encara. Seus olhos negros como a noite.
Um desejo crescente entre nós. Minha respiração bem mais
acelerada do que sou capaz de controlar e ele me encara. Como
pode um homem como esse, que tem tudo, estar aqui comigo?

Andrew apoia o rosto em meu peito, fazendo-me sentir seu


perfume. Um cheiro que me faz querer subir pelas paredes.

— O que foi? – sussurro, segurando a parte de trás de seu


cabelo.
— Eu te procurei por dias. – diz, depositando um beijo em meu
peito, acima do coração, fazendo com que ele salte ainda mais
dentro de mim. – Você havia sumido do mapa. – ele balança a
cabeça, como se desacreditasse de algo. Eu é que não sou capaz
de acreditar nisso que esta acontecendo aqui. – Eu só precisava
tocar a campainha ao lado do meu apartamento para te encontrar.

— E ao invés de fazer isso, você saiu por ai, caçando um monte


de Vadias Aleatórias para transar. – eu o provoco, embora seja a
verdade. Ele ri. – Qual a graça?
— A primeira vez que fiz isso depois de nos encontrarmos, eu
achei que tivesse visto você em uma discoteca. – Ele começa a rir,
me fazendo rir junto. – Eu procurei uma garota de cabelos
castanhos, que dançava com alguém. – se com isto ele quer dizer
“dançando com Bruno”, sim, eu cometi esse erro. – Mas ela
simplesmente sumiu. Depois encontrei Pedro.

— “... Seu querido chefinho quem pagou para você. Algo


especial para a bela dama...” – lembro-me perfeitamente das
palavras dele naquela noite. – Você estava lá aquele dia. – Andrew
concorda.

— Foi logo depois de ter achado que a vi. – diz. – Você, no caso.
Eu estava irritado com aquela “visão” e queria sair de lá, porque
pensei que estivesse vendo coisas. – ele franze o cenho. – Eu
poderia ter esperado você voltar do banheiro ao invés de sair com
outra. – Concordo!

Observo Andrew por alguns instantes. É como se... Todos os


lugares... Nós sempre estávamos no mesmo ambiente, apenas não
nos encontrávamos e ainda assim estávamos procurando pelo
outro.

Começo a rir.

— Isso é loucura! – exclamo ao me dar conta do quão louco tudo


isso é. – Eu... Nós sempre estivemos tão próximos um do outro,
mas ainda assim... – paro de falar. Isso é só um sonho. É isso.

Não consigo mais formar palavra alguma para dizer. É tudo


muito louco e ele é meu chefe. Além de ser um mulherengo que leva
um monte de mulheres para a cama. Isso nunca que vai dar certo
entre nós.

Andrew segura meu pulso, deitando-me no tapete, ficando sob


meu corpo. O QUÊ?! AQUI? AGORA?! Meu coração bate ainda
mais forte e meu cérebro tenta raciocinar tudo isso que esta
acontecendo. Não tem alarme nenhum para me impedir de fazer
isso e eu realmente o quero. Não importa de qual maneira, ainda
que esteja mais do que obvio que eu vou me machucar ainda mais
quando isso acabar.

Entrelaço minhas pernas em seu quadril, prendendo-o para mim.


Seja o que tiver que ser.

— Sabe que eu não vou fazer isso com você, né? – ele
pergunta, apoiando com os cotovelos em cada lado meu. Não? Ele
me da um beijo na testa e outro em cada bochecha.

Franzo o cenho.

— Ah... Ahn? – Como assim? Depois de me provocar dessa


maneira? – Por quê? – pergunto, não conseguindo esconder minha
decepção.
Ele sorri.
— Quero você completamente focada quando fizermos isso de
novo. – responde, colocando meu cabelo atrás da orelha. – Já
cometi um erro ao tirar proveito de você aquele dia.
— Você não tirou proveito de mim. – Como se eu fosse alguma
donzela indefesa e não pudesse decidir o que quero ou não. Acho
que já deixei isso bem claro. – Eu também quis.

— Mas seria tirar agora. – faço bico, tentando convence-lo a


mudar de ideia. Mas ele ignora. – Você vai ir ficar com sua família
amanhã. – diz, mudando completamente de assunto. – Apenas ligue
para o Pedro para avisar. Arrume algum atestado para justificar sua
falta e fique com sua avó o tempo que for preciso.

Eu o encaro. Então é isso. Ele realmente esta aqui para ficar


comigo quando mais preciso de alguém ao meu lado.

— Sem arrependimentos, Luara. – diz. – Não entre nós. Muito


menos com ela.
Jamais. Sorrio, concordando com a cabeça.
— Obrigada. – e, nesse instante, eu quero agarrar seu pescoço
e beija-lo, apenas para mostrar o quão grata sou por sua companhia
e por me dizer isso. Mas eu me controlo, sabendo que ele tem mais
algo para dizer.

— Talvez ela tenha algum sábio conselho para te dar, assim


como minha avó sempre tem um para mim. – diz. – E começo a
achar que ela está certa quando diz aquilo.

Franzo o cenho, sem entender a que ele se refere.


— E o que é? – pergunto realmente curiosa.
Ele da de ombros. Andrew e seus mistérios.

No fim, sei que quero descobrir cada um de seus mistérios,


saber mais sobre os três homens que ele indiretamente me mostrou
nessas últimas semanas. Mas, para isso, preciso saber se é
realmente isso que ele quer de mim.

— Por que você esta aqui? – pergunto.


— Como assim? – ele pergunta de volta.
— Você voltou para ficar comigo aqui. – falo. – Sempre achei
que um Presidente CEO levasse trabalho para casa. No entanto,
você está aqui, com a garota que conheceu na praia e não é por
causa do sexo. – Que você recusou.

Ele aproxima o rosto do meu e seguro o dele, novamente


acariciando suas bochechas sob a barba. Ele é realmente lindo de
barba.

— Estou tentando descobrir isso. – sussurra e me beija. – Só


preciso que você me ajude com isso.

Sim, eu posso fazer isso. Descobrir o que aconteceu entre nós é


o que mais estou querendo desde que o conheci. Entender o motivo
do fascínio. Ou pelo menos poder ter um tempo maior do que o que
tivemos da primeira vez.

Eu o puxo para mim, devolvendo seu beijo, sentindo seu toque


por todo meu corpo.

— Se você me ajudar a entender também. – digo, afastando-me


e ele concorda com a cabeça, me beijando outra vez.
Capítulo Onze
Sábado

Estou sentada nessa poltrona não tão confortável no quarto da


minha avó aqui no hospital. Ela está deitada em um sono tranquilo
depois de ter tomado alguns dos vários remédios que a enfermeira
trouxe para ela.

Eu a observo, tentando guardar cada mínimo detalhe em seu


pequeno corpo. Ela é baixinha, assim como minha mãe também é.
Mas não tão baixinha também. Seu cabelo é cortado curtinho e tem
um tom platinado, entre o branco e o preto. Seus olhos são
castanhos claros, assim como os meus também são. Ela tem um
sotaque sulista, como se nunca nem mesmo tivesse saído do
Paraná em toda sua vida. Mas, o que eu sempre gostei mais, foi
quando ela ficava brava com um dos netos e começava a nos xingar
em italiano. Ou pelo menos eu sempre achei que ela estivesse
fazendo isso, já que a expressão em seu rosto era sempre séria
nessas horas.

Embora brava, ela também sempre foi um amor de pessoa.


Lembro quando ela sentava comigo no chão e ficávamos brincando
por horas, assim como também fez com Camile e faz com Thomas.
O mesmo se repetiu com todos meus primos.

É estranho ver ela aqui assim, em um quarto de hospital. Acho


que eu nunca antes me imaginei aqui com ela, já que sempre foi um
poço de saúde. Ainda assim, o médico disse que poderemos levá-la
para casa, porque já está melhor do que o esperado e poderá seguir
com o tratamento de lá.
Depois da minha conversa com Andrew na quinta e de ele ter me
incentivado a vir ficar com ela, mesmo com todo medo que eu
sentia, eu sabia que ele estava certo, que precisava ficar com ela
para que não houvesse arrependimentos. De fato, eu nunca me
perdoaria se não pudesse vê-la depois de tudo o que fez para mim.
E aqui estou eu, desde ontem cedo, tomando conta da minha
vovozinha, ansiosa para poder leva-la para casa e ficar com ela até
amanhã à tarde, quando eu for voltar para o Rio de Janeiro.

Pego meu celular, vendo que já passa um pouco do meio-dia.


Meu estômago ronca, lembrando-me de que ainda não coloquei
nada no estômago além de água.
Abro a agenda, vendo o primeiro nome na lista: Andrew
Giardoni.

Ele me deu seu cartão de visitas na quinta, antes de voltar para


o apartamento dele, pedindo para que ligasse para dizer como as
coisas estavam. E eu já tentei, várias vezes, ligar para ele, mandar
uma simples mensagem dizendo que eu estava bem, que minha avó
vai poder ir para casa e o quanto eu gostei que ele tenha ficado
comigo aquele dia e agradecer por aquilo. Mas não consigo. Eu não
consigo colocar essas simples palavras para fora. E me sinto
péssima por isso.

Eu ainda sinto seu beijo, suas mãos por todo meu corpo... Até a
menor lembrança de sua barba em mim já faz todo meu corpo
estremecer.

Eu lembro também de quando ele disse que queria saber o que


estava acontecendo entre nós e que precisava de mim para ajudá-lo
a entender. Do quanto suas palavras me deixaram feliz e confusa ao
mesmo tempo.

Feliz, porque talvez isso signifique que não sou só um número


para ele. Confusa porque não faço ideia do que ele realmente queira
e não sei se estou pronta para me decepcionar assim outra vez. Ou
até mesmo se quero que isso aconteça. Mas eu quero saber o que
existe entre nós e o porquê de ele ter ido ficar comigo, de ter se
preocupado e me oferecido carona para casa. Por ele ter afagado
meu cabelo quando eu estava chorando. Eu só não quero me
machucar mais, porque isso dói.

Apesar de todos os contras para que eu aceitasse seu pedido,


eu aceitei ajuda-lo a entender e em troca ele me ajudaria também.
Tudo é muito confuso e recente para nós. Além de que ele é meu
chefe e que as pessoas vão falar horrores a meu respeito no
instante em que souberem que nos envolvemos uma vez que fosse.
Mas ainda assim, eu quero correr esse risco com ele.

— Liz... – uma voz baixinha chama minha atenção, tirando-me


de meus pensamentos.
— Oi, vovó. – sussurro em resposta, segurando a mão que ela
estende para mim. – Sou eu.
— Oi, Lu. – ela sorri. – Onde estamos?
— No hospital. – respondo, olhando rapidamente para a porta. –
Meus pais foram buscar algumas roupas para a senhora poder ir
para casa.
Ela fecha os olhos, como se voltasse para o seu sono.
— E como você está? – pergunta ao reabri-los. – Como é morar
lá?
— É lindo. A praia, a cidade. Meu trabalho... As pessoas lá são
sempre gentis.
— Você parece feliz. – diz, dando um sorriso para mim. – Você
conheceu alguém?
Sinto meu rosto corar com sua pergunta. Fora Julie, ninguém
mais sabe sobre Andrew.
— Sim. – respondo a verdade. – Eu o conheci logo que cheguei
ao Rio, quando fui à praia. Só nos vimos aquele dia, mas descobri
que ele é meu vizinho.
Minha avó da uma risada divertida, fazendo com que eu ria junto.
— E o que mais? – pede.
— Bem, sendo sincera com a senhora, tem algo que complica
um pouco as coisas.
Ela franze o cenho, encarando-me.
— Ele é meu chefe. – respondo sua pergunta silenciosa. – Não
sei bem o que há entre nós ainda. Mas espero descobrir.
— Como ele é?
— Alto. – respondo a primeira característica de Andrew que me
vem à cabeça.
— Alto? – pergunta de volta e confirmo, fazendo-a rir. – Tão alto
assim para ser a primeira coisa que se lembra?
Torno a rir.
— Bem, ele é realmente alto. – reforço, franzindo o cenho. – Do
tipo que a senhora saberia que é ele mesmo que estivessem em
uma multidão. E bonito também. – ela sorri, incentivando-me a
continuar. – Tem olhos cinza e um cabelo que eu nunca vi no lugar.
– cabelo de quem acabou de transar, na verdade. Coro com meu
próprio pensamento. – E tem um sorriso lindo.

— Ele te faz rir? – pergunta, apertando minha mão na sua.


Não preciso pensar para responder essa.
— Sim.
Com minha resposta, minha avó fica mais contemplativa,
olhando para o teto, até que volta a falar:

— Ele me faz lembrar seu avô. Sempre sorrindo e me fazendo


rir. Nós nos dávamos bem e quase nunca brigávamos. – ela faz uma
pausa, olhando para mim. – Bem, quase. No começo ele era um
homem difícil, mas sempre gentil. E eu também tinha uma parcela
de culpa. – ri. – Mas as reconciliações eram sempre as melhores.

Arregalo os olhos, entendendo o que ela quer dizer. Ela ri.

— Como ele se chama? – pergunta.


— Andrew. Andrew Giardoni. – respondo, sentindo meu coração
pular contra o peito ao som de seu nome.
Ela franze o cenho, olhando para mim outra vez e sorri.
— And. – diz. – Você parece gostar de homens com essas
iniciais.
Olho para ela, um pouco confusa.
— Tolice minha, querida.
— A senhora não é tola, vovó.
— Mas seria interessante se você o encontrasse outra vez... –
ela faz uma pausa, fechando os olhos.
— Vovó? – chamo, aproximando-me dela.
—Estou bem. – responde com uma voz calma. – Só cansada. –
sorri. – Você gosta dele?
— Eu não sei. – respondo a verdade outra vez. – Sei que sinto
algo diferente quando estou com ele. Mas ainda é cedo para dizer
algo assim.
— E ele?
Dou de ombros.
—Ele me pediu para ajudá-lo a entender o que está acontecendo
entre nós.
— Homens e sua necessidade de precisar de ajuda para
entender os sentimentos. – ela ri, fazendo-me rir junto dela. – Ouça
minha querida: você sempre soube que eu não gostava daquele seu
antigo namorado. Eu quis dar uma festa quando soube que vocês
haviam terminado.
— E a senhora sempre disse que ele era um idiota.
Ela ri.

— Um idiota dos grandes. – concorda. – Em quatro anos que


vocês ficaram juntos, nunca vi você com esse olhar no rosto. – volta
a falar. – Sei que vai dizer que é cedo, que estão se conhecendo.
Qualquer coisa. Mas... Se você souber, se você sentir que o ama
assim como seu avô e eu nos amávamos, ou qualquer outro homem
que te faça sentir como se fosse a única mulher no mundo... Mas se
for ele. Se ele for o seu And...

Sinto sua mão apertar a minha quando ela para de falar.

— Vovó? – chamo, aproximando-me dela. – Vó? – bato de leve


em sua mão, tentando acorda-la. Não, por favor. – Por favor, não faz
isso comigo, vovó.

Ainda segurando sua mão, eu me sento ao seu lado na cama,


tentando acorda-la. Mas, ainda que seu corpo esteja quente, ela não
está mais aqui.
Sinto meus olhos se encherem de lágrimas e como se o mundo
desabasse.

— Lu? – reconheço a voz da minha mãe da porta e levanto o


olhar para ela. – NÃO! – ela grita, correndo para junto de nós na
cama. – Mãe. Mamãe, por favor. – ela chama, imitando meu gesto
de antes. Vejo meu pai na porta, totalmente imóvel. Fecho os olhos,
impedindo as lágrimas de caírem.
— Liz, venha. – meu pai diz.
— Não. Não, Ricardo!
Abro os olhos outra vez, a tempo de ver os braços de meu pai se
envolver ao redor do pequeno corpo da minha mãe, tirando-a da
cama em um abraço. Quero me juntar a eles, quero poder dizer que
ela está bem agora e que minha avó está apenas dormindo. Mas
não posso. Não consigo dizer nada sem acabar desabando
também.

O médico entra no quarto, seguido de uma enfermeira. Aperto


forte a mão inerente de minha avó, sentindo um aperto no coração.
Ele diz algo que não chego a ouvir direito. Ela não terminou de me
dizer o que estava falando.

Meu pai me chama para que eu possa sair do quarto com ele e
minha mãe. Ela estava me dizendo algo importante. Meu pai chama
outra vez, mas só me levanto quando sinto duas mãos tocarem
meus ombros, dizendo algo em meu ouvido. Ju... Ela me chama
para ir comer algo, mas não estou com fome. Ainda assim eu
concordo, indo com ela para fora do quarto.

— O que houve? – pergunta quando nos sentamos em uma


mesa, no canto da cafeteria.

Seguro a xícara de chá entre as mãos, olhando a fumaça que


sobe. – Lu?

Ergo o olhar para minha melhor amiga, sentindo as lágrimas se


formarem em meus olhos outra vez e, assim como da primeira vez,
eu as afasto para longe.
— Nós estávamos conversando. – sussurro, apertando a xícara.
– Ela apenas adormeceu Ju.
Balanço a cabeça de um lado a outro, incapaz de aceitar.
—Eu sinto muito. – diz, apertando minhas mãos. – Eu estava
com seus irmãos lá embaixo quando sua tia ligou pedindo para tirar
você de lá.
— Minha tia? – pergunto.
—Sim. Você não...
Franzo o cenho. Eu não vi minha tia no quarto em momento
algum.
Julie tira um bolinho de chocolate da embalagem, colocando-o
na minha frente.
— Você precisa comer algo. – diz.
— Estou sem fome.
— Lu, você não pode fazer isso logo agora. – ela me repreende.
– Sua mãe precisa de você. Seus irmãos...

E é isso: o motivo de eu ter que ser forte, mesmo quando tudo


dentro de mim parece ter desmoronado. Mesmo depois de eu ter
visto minha avó falecer na minha frente, não tendo terminado de me
dar seu “sábio conselho”, assim como Andrew havia dito que ela
poderia fazer.

Quando eu cheguei ontem, eu disse que a amava e que iria ficar


com ela até amanhã, que voltaria na semana que vem para visitá-la,
quando viesse para o aniversário de Tommy. Conversamos um bom
tempo desde que cheguei e só sai do seu lado para ir ao banheiro,
quando minha mãe estava aqui.

Mordo o lábio inferior, sentindo meus olhos brilharem pelas


lágrimas. Julie aperta forte minhas mãos, como se tentasse dizer
algo com este gesto. Eu nunca vou saber o que ela tinha para me
dizer.

Aperto forte as mãos de Julie, vendo o castanho de seus olhos


brilharem. Ela cresceu comigo, conviveu com minha avó. Ela sabe...
— Eu só preciso ficar sozinha um pouco. – digo, soltando sua
mão, arrastando a cadeira para trás. – Fique com meus irmãos
enquanto isso.

Ela concorda e me levanto, saindo a passos rápidos do hospital,


sentindo uma chuva fina que começa a cair por meu rosto e cabelo.

***

Uma forte chuva cai do lado de fora do Golden Village quando


estaciono meu carro na minha vaga, ao lado de um Civic preto, no
final da tarde de domingo. Desligo o motor e fico apenas olhando
para frente, para o estacionamento mal iluminado. Tudo o que sinto
neste momento, tudo o que estou sentindo desde ontem, é muito
confuso para mim. Até agora, tudo o que eu tenho feito é guardar
minha própria dor no bolso para ajudar aqueles que amo.

Minha mãe, Camile, Tommy, que passou o velório inteiro me


perguntando o porquê da Vovó Zelinda estar naquela caixa de
madeira e não na nossa casa. O porquê de ela não ter acordado
desde ontem. E eu tive que dizer para ele que nossa avó não iria
mais acordar, que ela estava dormindo com nosso avô agora e que
finalmente eles estavam juntos depois de anos. Camile ouviu tudo, é
claro.

Para cada lado que eu olhava, eu via algum amigo da minha


avó, na qual eu sei que cresceu com ela e viviam um na casa do
outro. Meus tios e meus primos. Cada um deles. Todos
demonstrando seus sentimentos tão abertamente, mas tudo o que
eu conseguia fazer, era abraçar meus irmãos e dizer que tudo iria
ficar bem, que logo a dor que eles estavam sentindo iria passar e
que ela estava bem.

Saio do carro, sem nem mesmo me dar ao trabalho de ativar o


alarme, indo até o elevador, para subir até meu andar e ficar
trancada lá dentro, sem comunicação com ninguém, até amanhã de
manhã, quando terei que levantar para ir para o trabalho. Ou talvez
eu nem vá. – penso. – Eu já estou com a droga desse atestado aqui.
Talvez eu o use por um tempo a mais.

O elevador abre e eu entro, apertando o botão do meu andar


mais vezes do que realmente é necessário.

Desde que deixei Julie na cafeteria do hospital ontem, não parou


mais de chover em São Paulo. Mas eu esperava que aqui no Rio
estivesse ao menos um sol e que isso pudesse me ajudar a sair de
casa, talvez até mesmo para ir correr na praia e evitar pensar em
tudo que esta acontecendo. Só que nem tudo acontece como
esperamos. Assim como eu esperava que fosse ver minha avó nos
meus pais semana que vem e que teria passado mais tempo
conversando com ela, do que passei.

O elevador para no meu andar e saio, pendurando minha


mochila no ombro, lançando um rápido olhar para a porta do
apartamento de Andrew.

Sinto vontade de ir até lá e abraça-lo com força, mas ele tem


seus próprios problemas para querer envolve-lo com os meus. Isso
é coisa apenas minha e não tenho motivo para compartilhar com ele
ou qualquer outra pessoa. Além de que não somos nada um para o
outro, além de vizinhos e do fato de que ele ainda é meu chefe no
trabalho. Nada.

Sigo para o meu apartamento e, abrindo a porta, sinto um aroma


fresco de algo que não estava aqui quando sai sexta-feira, na qual
eu ignoro completamente, apenas para jogar minha mochila sob o
sofá e ir até meu quarto a procura de um short e uma camisa para
usar depois do banho e me livrar de toda essa roupa com cheiro de
cemitério que fui obrigada a usar.

***

Quando o alarme do meu celular toca dizendo que é hora de


levantar para me arrumar e ir trabalhar, já estou pronta e apenas
esperando o horário para poder sair. Pronta, mas não com vontade
de fazer isso.

Na verdade já tem umas duas ou três horas que estou aqui


deitada no sofá assistindo seriado, porque não conseguia mais
dormir.

Quer dizer, todas as vezes que cochilei esta noite, eu via minha
avó em algum sonho. Ou eu tinha alguma lembrança do passado ou
alguma conversa que tivemos em algum momento. E isso me fazia
sorrir, mesmo que involuntariamente. Mas... O que me fez acordar e
não querer mais fechar os olhos para voltar a dormir, foi quando a vi
naquele caixão. Ela estava com as mãos cruzadas junto ao peito e
tinha um terço entrelaçado entre seus dedos. Um que lembro ter
ajudado minha mãe escolher para dar a ela. E seus pequenos olhos
azuis estavam fechados para sempre.

Levanto e vou para a cozinha atrás de algo para comer, mas


acabo voltando de mãos vazias. E não é porque não tenho nada no
armário ou na geladeira, mas sim porque não tenho apetite algum.
Não tive ontem quando ainda estava em São Paulo e não tive
quando cheguei. Assim como continuo sem ter vontade de colocar
qualquer coisa que seja no estômago.

Com um suspiro, vou até o quarto pontualmente às oito horas


apenas para pegar minha bolsa e poder sair para ir ao trabalho, na
esperança de conseguir distrair minha cabeça de tudo o que tem me
rondado, porque continuar trancada dentro de casa não tem me
ajudado em nada.

A caminho do elevador, não consigo deixar de olhar para a porta


fechada do apartamento de Andrew e sentir aquele frio do estômago
que sempre me ronda quando penso nele.

Ele nem mesmo apareceu para saber como eu estava. – O


pensamento vem em minha cabeça bem quando saio do elevador e
vejo sua vaga desocupada, dizendo que ele já saiu para o trabalho.
– E você queria mesmo que ele fizesse isso? Porque você nem se
deu ao trabalho de mandar uma mensagem para ele e dizer o que
havia acontecido. Ou para apenas dizer que já havia voltado.

Bufo, irritada comigo mesma e sento atrás do volante do meu


carro, na qual eu abraço logo após jogar minha bolsa no banco do
passageiro. Só que ao invés de sair, fico apenas encarando uma
lâmpada no teto que pisca, pisca e pisca por várias e várias vezes.
E isso me trás lembranças. Memórias e sentimentos que tenho
reprimido desde que tudo aconteceu. E quando um dos vizinhos
joga o farol de seu carro no meu quando sai, deixando-me no
escuro outra vez, eu me sinto desmoronar de todas as formas que
tenho fugido e tentado evitar, desejando internamente que ele
estivesse aqui comigo. Que ele me deixasse abraça-lo outra vez.

— Deixa de ser idiota, Luara. – digo e tiro os óculos do rosto


para secar cada uma das lágrimas que me escapam. Mas, ao
contrário do que eu queria, isso só faz com que elas aumentem
mais.

Sinto o vento batendo em meus cabelos, fazendo com que caiam


sobre meu rosto e não dou a mínima para tira-los dali.

Já é pouco mais de uma da tarde e estou sentada no balanço do


Playground aqui do Golden ao invés de estar no trabalho. Eu tentei,
mas não consegui de forma alguma sair esta manhã. Não consegui
nem mesmo ir até a praia ou quem sabe à gruta. Assim como
também não me dei ao trabalho de atender a Isa, Vivi, a Tati e nem
mesmo a Ju. Ou minha mãe e menos ainda...

Olho para o celular em meu colo, vendo o sorriso de Andrew na


tela com sua ligação. Esta já é a terceira vez que ele liga e, por mais
que queira ouvir sua voz, não vou conseguir atende-lo.

Desligo o celular, guardando-o no bolso.

A última coisa que preciso agora é alguém como ele tendo pena
de mim.
— Oi. – a palavra chega aos meus ouvidos, assim como o
calafrio percorre todo meu corpo e olho para o lado apenas para ver
o par de duas cumpridas pernas, cobertas por uma calça caríssima
e sapatos tão caros quanto ou talvez até mais.

Ele então senta no balanço ao meu lado.

— Oi.
— Eu sinto muito. – ele diz e ergo o olhar por não mais do que
breves segundos.
— É. Eu também. – respondo, agarrando as correntes do
balanço, movendo-me lentamente neles. – Desculpa não ter ligado.
Eu tentei várias vezes. Mas não estava nada bem.
— Imaginei que não estivesse. – Andrew sussurra a resposta. –
E eu sinto muito mesmo por você ter que passar por isso logo
agora.

Fecho os olhos, permitindo que as palavras saiam de minha


boca assim como ela chegam, não me permitindo nem mesmo
pensar a respeito, porque se fizer não as direi.

— Eu fiquei com ela o máximo que pude. Eu estava com ela


quando... Aconteceu.
Olho para Andrew, que me oferece sua mão para mim e a
seguro.
— Nós estávamos conversando. – digo, apertando forte sua
mão. – Ela estava me dizendo algo e, de repente, parou.

Volto a olhar para frente, tentando evitar que ele me veja


chorando. Não quero parecer fraca perto dele, mas sei que é tudo o
que sou nesse instante. Já perdi outras pessoas queridas antes,
mas nunca alguém que eu amasse tanto.

— O que ela estava dizendo? – Andrew pergunta e olho para


ele, rindo. – Era tão engraçado assim? – volta a perguntar com um
sorriso lindo e não consigo corresponder com nada além do que um
rápido e fraco sorriso.
— Era sobre você. – respondo, voltando a rir.
— Oh. – ele diz com o cenho franzido. – Era algo ruim? –
pergunta curioso.
— Ela sabia que eu havia conhecido alguém só de olhar para
mim. – confesso. – Ela disse que eu parecia feliz e perguntou como
você era.

— Aposto como você fez uma descrição exagerada a meu


respeito, dizendo o quão gostoso eu era e o quanto eu beijava bem
e isso e aquilo. – ele diz de brincadeira e sorrio internamente. Não
cheguei a dizer isto em voz alta, mas sim.

Aperto sua mão antes de responder:

— Eu disse que você era alto. Tão alto que seria possível saber
que era você mesmo que estivesse em uma multidão.
— Não sou tão alto assim. – diz como se estivesse ofendido.
— Para mim, sim. – respondo, voltando a olhar para ele e não
consigo mais segurar as lágrimas que me rondam, porque tudo
dentro de mim esta doendo em uma proporção que nunca antes
experimentei.

— Ei! – exclama. – Não fique assim. Por favor. – pede e o vejo


ajoelhar na minha frente, ainda segurando minha mão. – Ela esta
bem agora. Ela descansou. – diz e isso só me faz querer chorar
ainda mais.
— Eu nunca vou saber o final do que ela tinha a me dizer, And. –
sussurro com a voz embargada e até um pouco enrolada,
abraçando-o forte. E sei que não deveria me surpreender quando
ele me aperta de volta em seus braços, mas surpreendo. E seu
abraço é quente, protetor e reconfortante, assim como achei que
seria. – Eu nunca vou poder saber qual era o último sábio conselho
da minha avó para mim, porque ela morreu na minha frente, no meio
de uma frase.

— Está tudo bem. – diz e o sinto afagar minhas costas quando


afundo o rosto em seu pescoço. – Eu estou aqui. Você não está
sozinha. Esta bem?
Quando me afasto, talvez depois de horas ou apenas minutos,
sinto seus dedos em meu rosto, percorrendo toda a bochecha com
um toque quente.

— Por favor, não chore, Anjo. – ele pede. – Eu gosto de ver seus
castanhos no tom natural. Por favor, não prive isso de mim.

Balanço a cabeça de um lado a outro, tentando disfarçar o


sorriso que ele me causa.

— Por que você esta aqui?


— Para ficar com você. – And responde com o cenho franzido. –
Porque sei como é se sentir sozinho depois de perder alguém de
quem você ama e não ter com quem compartilhar isso.
— Não é isso. – falo e vejo a confusão estampada em seu rosto.
– Você sempre vem. – digo e fecho os olhos, sentindo seu toque
outra vez em minha pele. – Você voltou na quinta e veio hoje. Por
quê?
— Eu não sei. – responde.
— Precisamos descobrir isso. – digo, tocando seu rosto apenas
para sentir sua pele. Seu perfume ainda é o mesmo que eu
lembrava e ele confirma com nada além do que um gesto com a
cabeça.

Vendo que Andrew esta de olhos fechados e sentindo meu


coração disparado contra o peito, pouso um beijo sem jeito em seus
lábios. Um rápido beijo.

— Eu achei que você não fosse querer que eu te ligasse. – digo


qual era meu maior medo todas as vezes que pegava o telefone
para ligar.

— Deus, Luara! – exclama. – Eu passei o fim de semana


preocupado com você, tentando não me xingar por não ter pego seu
telefone para saber se estava tudo bem.
— Você teria me feito desmoronar se tivesse feito isso. E eu não
podia deixar que isso acontecesse.
Afrouxo o aperto em seus ombros para poder olha-lo melhor bem
quando Andrew segura meu queixo e me beija, arrancando um
sorriso bobo de mim.

— No caminho para cá, passei em um lugar e comprei algo para


comer. – ele diz, visivelmente mudando de assunto. –
Provavelmente vamos ter que dividir, mas acho que dá para os dois.
— Eu estou sem fome. Mas obrigada. – respondo, fazendo com
que ele arqueie a sobrancelha para mim.
— Bem, então vou te fazer comer na marra. – Andrew diz todo
sério. – Ou você come, ou não ganhar sobremesa.
— Sem sobremesa.
— Por favor, ao menos tente. – pede e vejo seus olhos brilhando
para mim.
— Qual a sobremesa? – pergunto, ainda que realmente não
esteja interessada em comida e nem mesmo doce.
— Sorvete de creme. – responde e olha para o saco pardo ao
seu lado. – Ou suco de creme, se demorar muito para subir.

Concordo com um sorriso fraco e ele se levanta, oferecendo sua


mão para me ajudar a levantar e volta a abaixar para pegar o
almoço ao lado do balanço que estava sentado e, quando
começamos a andar de volta ao prédio, sinto seu braço em minha
cintura, fazendo com que meus órgãos internos deem piruetas
dentro de mim.

Pego a chave do meu apartamento no bolso para poder abrir a


porta enquanto caminhamos até ele.

— Sabe, acho que precisamos sair para aquele jantar. – digo


meio que comigo mesma.
— Mudou de ideia? – Andrew pergunta atrás de mim e confirmo
com um gesto rápido.
— Existe muita coisa acontecendo aqui que eu não estou
entendendo direito. – falo. – E eu realmente estou interessada em
entender melhor tudo isso.
— Estou perdidinho da Silva com tudo isso. – ele concorda e
sorri para mim. – E você prometeu que iria me ajudar a descobrir. –
diz. – Sexta-feira está bom para você?
— Vou consultar minha agenda para ver se estou livre. –
respondo, destrancando meu apartamento e entro, deixando-o para
trás. – É. Acho que pode ser.
— Te pego às sete horas então. Esteja pronta. – diz e concordo.
– O suco de creme precisa ir para o freezer. – diz de repente,
balançando o pote.
— Deixa que guardo. – peço, segurando o pote com as duas
mãos. – Só... Obrigada.
— Pelo que? – pergunta e dou de ombros.
— Por ficar comigo. – respondo. – Eu achei que fosse ser mais
fácil depois que eu saísse de lá. Mas não foi. Eu levantei para ir
trabalhar hoje, mas não consegui sair com o carro. Estava doendo
muito.

Com a mão livre, Andrew segura meu rosto e pousa um beijo em


meus cabelos, fazendo meu coração dar outra pirueta dentro do
peito e, ainda com minhas mãos segurando o pote de sorvete, que
está equilibrado na sua, fico na ponta dos pés para alcançar seu
rosto e o beijo devagar, sentindo sua mão ainda segurar meu rosto,
enquanto a minha desliza por seu peito.

Apenas o fato de que ele esta aqui comigo já me deixa feliz e me


faz esquecer tudo ao menos por algum tempo.
Capítulo Doze
Sexta-feira

O dia de hoje pareceu ter se arrastado. Todas as vezes que eu


olhava para o relógio, é como se ele estivesse parado no tempo,
porque não via o ponteiro se mover. E eu olhava para o relógio
pendurado na parede da minha sala a cada três minutos, que mais
parecia uma eternidade. Quando ele finalmente marcou cinco da
tarde, eu apenas peguei minha bolsa e corri para o estacionamento,
porque não podia me atrasar nem mesmo um segundo que fosse.
Agora faltam apenas alguns poucos minutos para o horário na qual
combinei com Andrew na segunda-feira de ele passar daqui para
sairmos para jantar.

Confiro no espelho meu penteado, certificando-me de que nem


mesmo um único fio de cabelo esteja fora do lugar. Confiro também
para me garantir de não ter passado mais maquiagem do que o
necessário, mas acabo por me lembrar de que não passei nada.

— Esta pronta? – ouço a voz de Andrew do outro lado da parede


do meu quarto, arrancando de mim um pequeno sorriso.
— Quase. – respondo, terminando de colocar meus brincos.

Com o calor que faz lá fora mesmo durante a noite, tudo o que
consegui pensar em vestir foi um vestido champanhe simples e uma
sapatilha de mesma cor. Segundo a mensagem que Andrew me
mandou hoje pela manhã, quando perguntou se ainda iriamos sair,
ele disse que eu não precisaria usar nada muito “exagerado”,
porque o lugar aonde iria me levar não era nada tão “extravagante”
a esse ponto. Claro que isso só atiçou ainda mais minha
curiosidade.

Passo um batom rosinha nos lábios, apenas para dar uma cor a
mais neles.

Depois de segunda-feira e de ter passado algum tempo


conversando com Andrew e ele ter ido para o apartamento dele para
trabalhar, eu liguei para Pedro e contei o que havia acontecido e que
não estava me sentindo muito bem para ir trabalhar. Ele entendeu
minha situação e disse para ficar em casa, que era para ligar caso
precisasse.

Na terça de manhã, ele me mandou alguns programas para que


eu terminasse e não deixasse material parado por muito tempo.
Aquilo sem dúvidas foi a melhor coisa, porque eu não precisava
aguentar os “lamentos” dos meus colegas do trabalho e também
não ficava pensando em coisas que me deixavam triste. Já na
quarta, eu voltei para o trabalho e tudo o que tive foi “eu sinto muito
pelo que aconteceu com sua avó. Se precisar de algo...”. Eu apenas
sorria, ainda sentindo um pouco de toda aquela dor. Na verdade,
ainda sinto, mas agora acho que comecei a aceitar melhor o fato de
que não poderei vê-la outra vez e que nunca saberei o que tinha a
me dizer.

A campainha toca, tirando-me por completo de meus


pensamentos. Apenas este toque já faz meu estomago revirar, já
que não vejo Andrew desde segunda a noite.

— Já vou! – grito ainda do quarto, borrifando um pouco do meu


novo perfume.
— Oi. – Andrew me cumprimenta assim que abro a porta. Ele
sorri para mim.
— Oi. – sussurro em resposta, observando-o.

Como já esperava dele, Andrew esta usando uma calça jeans,


camisa social branca de manga três quartos e tênis. O cabelo
perfeitamente bagunçado, como já é de costume. Nada esperado,
na verdade. Seu olhar fixo em mim, deixando uma pequena linha de
um sorriso mal intencionado a mostra.

— Você esta linda. – ele sussurra em meu ouvido, dando um


beijo em minha bochecha, segurando meu rosto com uma das
mãos. Seu perfume... UAU!
— Obrigada. – sussurro em resposta, também dando um beijo
em seu rosto.
— Podemos ir? – pergunta, ainda sem desviar os olhos de mim.
Concordo com a cabeça, virando para fechar a porta do meu
apartamento.

Quando torno a virar para Andrew, ele sorri, apoiando sua mão
em minhas costas, guiando-me para o elevador, não a tirando dali
nem mesmo quando paramos para esperar até que ele chegue.

— Você esta cheirosa. – ele comenta, mais para si mesmo de


que para mim, quando dou um passo para frente, entrando no
elevador. Meu rosto se aquece no instante em que suas palavras
chegam até mim.

A descida até o estacionamento foi um tanto quanto


constrangedora. Silenciosa, distante e cheia de troca de olhares.
Andrew ficou, literalmente, do outro lado do elevador, apenas me
encarando. Foi engraçado até, porque ele não conseguia ficar
realmente sério, como planejava. Penso eu, pelo menos.

A porta abre e ele segura minha mão para sairmos juntos.

— Este é seu carro? – pergunto completamente boquiaberta ao


ver um Audi preto estacionado ao lado do meu. Em resposta, ele
destrava o alarme do carro. – Devia ter suspeitado que você não
tivesse apenas o Civic. – comento para mim mesma. Não que o
Civic seja “apenas” o Civic.
— Nervosa? – Andrew pergunta, abrindo a porta para que eu
entre. A mão ainda segurando a minha para me ajudar.
— Por que estaria? – pergunto de volta, sentando-me no lado do
carona, sentindo o banco de couro roçar em minhas pernas.
Ele beija as costas da minha mão antes de falar:
— Bem, eu estou. – e sorri, instantes antes de fechar a porta
para contornar o veículo e ir sentar-se ao meu lado. ELE ESTA O
QUE?!

Andrew permanece em completo silêncio enquanto dirige. Nem


mesmo se da ao trabalho de responder minha pergunta sobre qual
lugar estamos indo. É até como se ele tivesse ficado mais sério
depois de dizer que está nervoso. Mas... Será que é por conta
disso? De estarmos saindo para jantar juntos? Não. É claro que
não. Por que ele estaria nervoso?

Franzo o cenho, olhando para ele, que mantem o olhar fixo no


transito o tempo todo.

— Você vai tirar minha concentração se continuar babando em


mim desse jeito. – ele diz, olhando por breves segundos para mim e
sorri.
— Não estou babando por você! – exclamo, cruzando os braços
contra o peito, olhando para fora.

A verdade é que eu também estou nervosa com isso. Sair com


ele. Eu esperei por esse momento a semana toda e agora que
estamos aqui, tenho medo de que algo de errado aconteça. Medo
de que isso termine.

— Chegamos. – Andrew informa, estacionando o carro próximo


da praia, no lado oposto em que moramos.
— Aqui? – pergunto após algum tempo. – Não tem nada aqui. Só
areia e mar.
Ele ri, dando de ombros.
— Não aqui, exatamente. – responde. Tem uma barraquinha
logo ali na frente. Pensei que fosse querer comer algum lanche.
Lanche? Que... Franzo o cenho.
— Isso, definitivamente, não é algo na qual eu esperava de você
para um primeiro encontro. – confesso fazendo-o rir.
— Estamos em um encontro? – ele me pergunta, virando para o
meu lado, fazendo-me sentir meu rosto se aquecer. Péssima
escolha de palavras, Luara. Dou de ombros. – Certo. – ele sorri,
saindo do carro, contornando para vir do meu lado e abrir a porta
para mim. – Apenas confie em mim. – diz, estendendo a mão para
mim e a seguro. – Não sou o maior fã de lanches assim. Tenho algo
especial reservado para hoje.

— Voto de confiança. – concordo.

Andrew me leva pela areia por alguns metros, sem dizer uma
única palavra, mas também sem soltar minha mão. Eu sinto seu
polegar roçar em meu dedo, fazendo-me sorrir feito uma boba.

Assim que passamos por algumas rochas, eu vejo um


restaurante. Ele é todo construído com madeira antiga e uma área
reservada de frente para o mar, com mesas expostas por um
espaço fechado na praia. Cada uma delas, iluminada por velas.
Mais para o outro lado, vejo as paineiras, dando um charme lindo ao
lugar todo.

— É lindo. – sussurro. – Como você encontrou esse lugar?


— Posso ajudar os senhores? – uma mulher morena pergunta,
lançando um olhar para Andrew mais demorado do que o
necessário. Aperto minha mão na dele, como se mostrasse que ele
já esta acompanhado.
— Tenho uma reserva para esta noite. – Andrew diz, sorrindo
para ela. Ah, seu... Argh! Ao menos disfarce!
— Qual o nome? – a morena pede, consultando um caderno de
capa preta.
— Andrew Giardoni.
Ela ergue o olhar para ele e sorri.
— Por aqui. – diz, caminhando até a praia, na área reservada. –
Os senhores ficam aqui.
Andrew puxa a cadeira para que eu me sente e sorrio,
observando-o ir sentar-se de frente para mim.

A morena nos entrega dois cardápios, dizendo:


— Quando escolherem basta chamar.
— Para mim o de sempre. – Andrew diz, recusando o cardápio. –
E para beber, um Anjo.
O que seria um “Anjo”?
— E para a senhora, senhora Giardoni? – pergunta agora para
mim.
Sinto o sorriso de Andrew em mim quando ela diz isso e todo
meu corpo se aquece.
— O mesmo que ele. – seja lá o que ele tiver escolhido. – E uma
Apple Martini.
Ela anota nossos pedidos e se retira, levando com ela a atenção
de Andrew.

— Senhora Giardoni. – ele diz, voltando a olhar para mim e ri.


— Não tem graça.
— Não, mas você esta vermelha.

Mais uma vez somos tomados pelo silencio, mas eu não o sinto
pesar entre nós. Muito pelo contrario. Eu sinto o vento balançando
as folhas das paineiras, as estrelas iluminando o céu, sem uma
única nuvem e sinto também o cheiro do mar. É tudo tão lindo e
natural.

— Por que você não entrou na gruta aquele dia? – pergunto


após uma eternidade.
— Estava chovendo forte quando finalmente consegui chegar lá.
– responde. – A maré estava subindo. Era óbvio que não te
encontraria lá.
— Por que não entrou? – insisto.
Antes que ele possa responder, o garçom vem trazendo nossos
pedidos.

— Um Anjo para o senhor e Apple Martini para a senhora. – diz,


servindo-nos com as bebidas e os dois pratos.
Nosso jantar é camarão e peixe empanado, arroz, salada de
alface e molho.
— Não entrei porque era óbvio demais que não encontraria
ninguém lá. – Andrew repete sua resposta anterior quando o garçom
sai.
— Certo. – digo, provando da minha bebida. Não tenho certeza
se devo dizer agora que eu estava lá.
— Quem diria que a Maluca da Praia ia acabar sendo minha
vizinha. – ele diz, molhando o peixe em seu prato.
— Maluca? – repito, franzindo o cenho.
Ele sorri, colocando o molho de lado, dando o peixe em minha
boca. Sorrio um tanto sem graça com seu gesto.

— Bem, essa foi à maneira “agradável” que Felipe arrumou para


te chamar. – explica. – Eu tinha o “L”, mas não falei sobre isso com
ele.

— Enquanto isso – começo, fazendo uma pausa para tomar um


pouco da bebida em meu copo. –, minha melhor amiga te apelidou
de “Gostosão da Praia”. – deixo um longo suspiro me escapar. –
Mas agradeça a ele por isso.
— Claro. – sorri. – Agradeça a sua amiga por isso também. – rio
com sua resposta. – De qualquer forma, para mim você continua
sendo gostosa. – acrescenta, sorrindo para mim e arqueia uma
sobrancelha, com aquele olhar que não precisa dizer mais nada.
Meu corpo se aquece apenas de sentir seu olhar assim em mim.

— Você disse que era uma barraquinha e que tinha lanches. –


mudo de assunto. – Não um restaurante a beira mar e com
camarão. – ele da de ombros.
— Talvez eu tenha mentido para não estragar a surpresa.
Sorrio, concordando, voltando à atenção unicamente para o meu
jantar.

Depois de terminarmos o jantar e de algumas perguntas, Andrew


me convidou para uma caminhada na praia, para aproveitarmos a
noite um pouco mais. E é isso o que estamos fazendo: andando
sem rumo ou direção pela areia, sentindo o aroma do mar e o vento
bagunçando nossos cabelos.

— O que você esta achando do Rio de Janeiro? – Andrew


pergunta, quebrando o silêncio da nossa caminhada à luz da lua e
das estrelas. Ele aperta a mão na minha, puxando-me para mais
perto.

— Quente e aconchegante. – respondo, aceitando seu braço em


meu ombro, passando o meu por sua cintura. – As coisas que estão
acontecendo comigo são... – começo a dizer, mas paro, olhando
para uma estrela solitária no céu. – Sei lá. Eu nunca imaginei passar
por tudo isso.

— Viver sozinha tem suas vantagens e desvantagens. – diz,


dando um beijo em meu cabelo. – Ainda mais quando se esta em
outro estado, sem absolutamente ninguém do seu lado para te dar
um ombro amigo.
Olho para ele e sorrio.
— Eu tive você quando precisei. – respondo.
— Bem, você teve sorte.
— Sorte? – pergunto e ele confirma. – Pelo que?
— Não sou exatamente a pessoa que goste de ajudar os outros
assim. Eu só... Muita coisa mudou para mim nas últimas semanas.
Talvez seja a idade chegando.

Sua resposta me faz rir.


— Com certeza é a idade. – digo e ele ri. – Fora as várias vezes
que você me fez dormir no sofá, você foi uma pessoa muito
agradável comigo. Mesmo quando não sabia quem eu era você me
deu chocolates. E eu amo chocolates!

— Isso é porque estou querendo te levar para dormir na minha


cama. – ele responde e me olha com um sorriso de lado.
Fico boquiaberta com sua resposta e sinto meu rosto corar. Quer
dizer, eu sei muito bem que não iriamos dormir se isso acontecesse.
Mas, ouvir sua menção sobre isso, decididamente faz com que algo
dentro de mim se acenda.

— Obrigada. – sussurro. Ele me olha, confuso.


— Pelo que? – pergunta. – Por querer tirar seu vestido?
Rio, sentindo não meu rosto se aquecer, mas todo meu corpo
pegar fogo.
— Você é um completo safado. Sabia? – UAU! Ele esta sendo
extremamente direto!

— Eu sei. – ele sorri, parando de frente para mim. As mãos em


cada lado do meu quadril, puxando-me para mais perto. – Você
ficou linda nesse vestido. – sussurra.
— Obrigada. – sorrio, tirando sua mão de mim. Ele franze o
cenho, deixando óbvia sua decepção. Não vamos apressar as
coisas. Certo?

Abaixo-me, tirando as sapatilhas para sentir a areia fria em meus


pés e corro.

— Para onde você vai? – Andrew pergunta atrás de mim.


— Quem sabe? – pergunto por cima do ombro e o vejo correndo
atrás de mim.
Envolvo uma paineira com a mão, abraçando e girando em torno
dela. Andrew esta do outro lado, com uma mão segurando a árvore
e a outra envolve minha cintura.

Ouço aquele mesmo alarme da primeira vez, gritando dentro da


minha cabeça. Ele soa alto e, assim como antes, eu o ignoro,
passando a mão livre pela nuca de Andrew, sentindo seu olhar
cinzento em mim, fazendo com que meu coração dispare contra o
peito quando nossos lábios se tocam e ele me puxa para mais perto,
prendendo-me entre a paineira e ele, colocando a perna entre as
minhas.

Sinto os lábios quentes e macios de Andrew passeando por meu


pescoço, apertando as mãos em minha bunda. Sinto também um
calor que decididamente não tem nada a ver com a temperatura. Ele
posiciona uma de suas pernas entre as minhas, sem parar de beijar
meu pescoço.

— Sabe que não vai conseguir isso de mim hoje, né? – pergunto,
tentando controlar minha respiração e meus batimentos, passando
as mãos por seus cabelos, puxando-o quando morde meu pescoço
em um ponto que... UAU!
— Eu sei esperar. – sussurra em meu ouvido, pressionando sua
ereção contra minha barriga, puxando o lóbulo de minha orelha,
causando arrepio por todo meu corpo.
— Precisamos ir. – gemo, puxando seu cabelo para afasta-lo.
— Para onde? – pergunta, indo até meu decote. – Para cá? –
pergunta, olhando-me por cima e sorri de um jeito cretino.
— Você é um completo safado, Andrew Giardoni. – digo,
segurando seu rosto entre minhas mãos, para garantir de que não
fará nenhuma nova tentativa de me atacar. – Eu viajo cedo amanhã.
— Não sou o único safado por aqui. – ele sorri.
— Pelo amor de Deus! – exclamo. – Estou tentando ser a
pessoa sensata entre nós dois. Colabora!
Ele ri de mim. NA MINHA CARA!
— Eu sei que você esta sendo tão safada quanto eu nesse
joguinho de sedução. – ele provoca. – Mas tudo bem. Eu desisto.
Você ganhou. Por hora.
— Obrigada! – exclamo completamente desesperada. Afinal,
mais um pouco que ele insistisse nesse “joguinho de sedução”, não
sei se seria capaz de aguentar.

Durante toda a viagem de volta até o Golden Village, Andrew, em


momento algum, tirou a mão da minha perna, além das vezes que
precisava mudar a marcha. Sua mão vez ou outra subia a saia do
meu vestido, ficando muito próximo da calcinha. E eu sei que ele
sabia que estava ali perto e por isso voltava, refazendo todo o
percurso.

— Vai ficar com a família o final de semana? – Andrew pergunta


enquanto subimos de elevador até nosso andar.
— Vou passar o feriado prolongado em casa. – respondo. –
Segunda é aniversário do meu irmãozinho. E tem a missa da minha
avó amanhã.
— Dê os parabéns a ele por mim. – diz. – E tente não pensar
muito na sua avó, se não for por alguma boa lembrança. –
concordo, dando a ele um pequeno sorriso.
A porta do elevador se abre e sinto um desejo quase que
desesperador de ter Andrew e, antes que eu raciocine direito, eu o
puxo pela camisa, para um beijo que é correspondido quase que de
imediato.

— Achei que tivesse dito que precisava dormir cedo. – ele diz.
— Você pode, por favor, calar a boca por alguns instantes? –
peço, puxando-o para fora do elevador.
— Calando a boca. – ele sorri, tornando a me beijar.
Andrew beija minha nuca, enquanto tento encontrar as chaves
do meu apartamento.
— Acho que perdi. – digo ao me dar conta de que não estou com
as chaves do meu apartamento.
— Eu tenho camisinha. – Andrew responde, beijando meu
pescoço.
— Estou falando das chaves do meu apartamento, idiota. –
respondo e ele ri.
— Você me deu isso quando saímos. – ele diz, balançando um
chaveiro familiar na minha frente.
— Obrigada. – digo, virando para abrir a porta.

Quando destranco a porta, Andrew a empurra, levando-me para


dentro do meu próprio apartamento.

— O que você esta fazendo? – pergunto, tentando não rir.


Andrew empurra a porta com o pé para fechar, tirando a bolsa de
minha mão, para só então responder:
— Se vou ter que passar o final de semana inteiro sozinho, com
minha mão, esperando você voltar, eu quero ter uma prévia do que
estamos perdendo.
— Você não disse isso realmente. – falo, realmente segurando
para não rir. Ele franze o cenho, mostrando que não esta com
brincadeiras. Engulo em seco. Merda. – O que você quer dizer com
isso? – pergunto dividida entre o medo, o desejo e a curiosidade.
— Isso.

Andrew joga minha bolsa para o chão, prendendo-me contra a


porta e me beija com força. Um beijo nada delicado e cheio de
língua, que não tenho o que fazer a não ser seguir seu ritmo
ofegante. Suas mãos estão em meus braços, pernas, cintura,
barriga, costas, seios... Afinal, quantos braços esse homem tem? Eu
sinto seu toque em cada parte do meu corpo, enquanto tento, em
vão, acompanhar o ritmo de sobe e desce.

— Merda. – ele diz para si mesmo quando desce até meu


pescoço, voltando para meu rosto. – Você é muito gostosa.

Sinto suas mãos espalmarem minha bunda, arrancando um


gritinho de mim e ele sobe meu vestido.

Com uma habilidade incrível, Andrew me toma em seu colo e


prendo minhas pernas ao seu redor, apertando-o contra mim,
sentindo sua ereção latejando contra a calça. Ele nos vira, levando
para um lugar na qual não importo. Eu poderia transar com ele aqui
no chão mesmo. Ou no elevador, mesmo odiando aquele lugar.
Qualquer lugar desde que seja com ele.

Aperto meus braços ao redor de seu pescoço, beijando-o ali. Ele


geme, pouco antes de me deitar no sofá e fica me encarando. Os
olhos escuros como os de um predador.

— Essa previa está além dos meus limites. – sua voz é rouca.
— Dos meus também. – concordo quando ele cai em cima de
mim, puxando minha perna para cima de seu quadril e o enlaço,
apertando-o contra mim. Ele começa um movimento de sobe e
desce enquanto me beija. – Andrew. – seu nome me escapa em um
gemido desesperado.

Eu o quero. Desesperadamente. Como nunca quis outro homem


antes. Talvez como nunca vá desejar outro novamente em toda
minha vida.

Desço minha mão pela lateral de seu corpo, chegando até a


barra de sua camisa, onde a ergo, deixando sua barriga à mostra.
Mas não o ajudo a tirá-la. Meu objetivo aqui é outro.
Torno a descer minha mão, indo agora para a calça, onde eu o
sinto quente e pulsando contra o jeans, como se tentando se libertar
de toda essa roupa.
— Não faz isso. – Andrew pede. Os olhos fechados.
— Fazer o que? – pergunto, fazendo-me de inocente,
esfregando a mão por seu pau, sentindo-o pulsar.

Quero tirá-lo para fora, apreciar seu membro que me deixou


dolorida e acordada por quase uma semana inteira, apenas
sonhando com o dia em que eu o teria dentro de mim outra vez.
Mas eu não faço isso. Eu apenas seguro o volume, grande,
apreciando o resultado no rosto de Andrew.

— Você vai me fazer gozar, Anjo. – ele diz e, pela primeira vez,
esse apelido faz todo meu corpo estremecer. Desde que nos
reencontramos que ele me chama assim, ainda que provavelmente
sem perceber. – E eu não quero gozar na minha cueca nova. –
completa, tirando minha mão dele e, sentando no sofá, colocando
minhas pernas em seu colo, apoia a cabeça no encosto, tentando
controlar a respiração e me pego imitando seu gesto.

— Isso não é previa. – digo após horas, minutos, dias ou apenas


segundos. Não sei exatamente. Ele concorda com a cabeça.
— Você esta me castigando por todas essas semanas. – sua
resposta me faz rir.

Eu me sento do seu lado, colocando uma mão em sua coxa e a


outra em seu rosto, virando-o para mim e o beijo, desta vez em um
ritmo lento e sensual.

— O que você está fazendo? – sussurro, acariciando seu rosto.


Ele sorri.
— O que você está fazendo comigo? – repete, também tocando
meu rosto. – Acho que te dei muito que pensar por esses dias. –
sorrio, concordando. – Aproveite o final de semana com seus pais. –
diz. – E tente não ficar triste com o que aconteceu semana passada.
Desço minha mão por seu peito, parando em cima do coração,
onde ele bate acelerado.
— Você podia ir comigo para São Paulo. Tenho certeza de que
meus pais te receberiam super bem. – solto sem pensar, mas não
me arrependo. – Sem falar que você e Tommy passariam horas
jogando.
— Não posso. Tenho que ir a BIT resolver algumas coisas
pendentes.
— Mas é sábado e é feriado prolongado! – exclamo. – Espera.

Procuro meu celular no bolso da calça de Andrew, que sei que


ele guardou ainda na praia e disco o número de casa.

— Alô? – ouço a voz sonolenta de minha mãe do outro lado.


— Oi mãe!
— Lu. Oi. O que houve? Esta tudo bem? – pergunta preocupada.
— Esta sim. Eu só queria fazer uma pergunta.
— Pode fazer, querida.
Olho para Andrew, que me encara com o cenho franzido.
— Tudo bem se eu levar alguém amanhã?
— Namorado novo? – posso sentir seu sorriso daqui.
— Não, mãe! – meu rosto se aquece outra vez. Somos qualquer
coisa, menos namorados. – É um amigo do trabalho.
— Claro que pode trazê-lo.
— Certo. Obrigada. Agora volte a dormir que também estou indo
para cama. Boa noite.
— Boa noite, querida. E cuide-se durante a viagem.
Desligo o telefone, colocando-o no móvel ao meu lado.
— Agora você não tem mais desculpas para não ir. – digo para
Andrew, que me encarava durante toda minha conversa com minha
mãe.
— Tenho que assinar alguns documentos importantes na
empresa. – responde. – Não posso.
— Bem, você é quem sabe. – solto um suspiro longo e cansado,
não conseguindo esconder minha decepção. Ao menos por um
segundo achei que ele fosse aceitar. – O convite esta de pé, caso
queira. – sorrio, olhando-o nos olhos. – Se comigo aqui do lado você
já faz toda aquela putaria com aquelas Vadias Aleatórias, não quero
nem imaginar o que vai fazer enquanto estiver fora.
— Provavelmente uma coisa muito louca. Você não confia
mesmo em mim, não é?
— Nem um pouco. – confesso.
— Se realmente faz diferença para você, então aceito o convite.
– diz. – Vou ligar para meu vice-presidente e pedir para que em meu
lugar.
— Sério?! – ele confirma.
— Acho melhor irmos dormir, então. A viagem vai ser longa.
Concordo, aceitando sua mão estendida, acompanhando-o até a
porta.

Uma parte minha quer pedir para que ele fique e passe a noite
aqui comigo. Mas... Em troca de que ele faria isso? Não posso dar o
que ele mais quer nesse momento. Seria apenas uma grande
tortura para os dois se ficássemos apenas nesses amassos. Se bem
que isso também não é uma má ideia.

— Tem certeza mesmo de que quer que eu vá? – ele pergunta


quando abro a porta.
— Que? – pergunto de volta, voltando a realidade. – Sim.
Desculpa. Eu só estava pensando longe.
— Tem certeza mesmo de que esta bem? – pergunta,
aproximando de mim outra vez. Sorrio, envolvendo sua cintura e
aperto sua bunda, beijando-o.
— Saímos às seis da manhã. – digo e ele me beija de leve,
concordando.
Mesmo contra minha vontade, eu o solto, deitando a cabeça no
batente da porta e sorrio, lembrando-me de algo.

— A propósito?
— Sim?
Faço sinal com a mão, pedindo para que ele se aproxime outra
vez e seguro sua nuca para poder falar em seu ouvido:
— Eu estava na gruta aquele dia durante a chuva. – sussurro,
beijando seu rosto e entro, trancando a porta atrás de mim.
Capítulo Treze
Sábado

Já tem algum tempo que Andrew e eu pegamos a estrada, rumo a


São Paulo. Uma hora e meia, para ser mais exata.

Com a ansiedade que eu sentia ao saber que ele iria comigo


para a casa dos meus pais, praticamente não consegui pregar os
olhos a noite toda. Basicamente fiquei virando na cama, rodando de
um lado para o outro, me perguntando se ele estava ou não
dormindo e me perguntando sobre várias outras coisas que diziam
respeito a nós dois. Acabou que sai da cama exatamente às quatro
e meia, para começar a me arrumar e podermos sair ainda às seis
horas.

Observo Andrew enquanto ele dirige seu Civic, completamente


focado no trânsito, enquanto luto para manter meus olhos abertos e
a vontade de toca-lo.

— Por que você não dorme? – sinto sua mão em minha perna no
mesmo instante em que faz a pergunta.
— Não posso. – sorrio.
— Por quê? – torna a perguntar.

— Porque isso me faria perder uma linda visão. – Andrew me


olha por breves segundos. O cenho franzido. – Que no caso seria
você dirigindo. – completo e ele me olha outra vez, parecendo
chocado ou surpreso. Um dos dois. – Você pode, por favor, prestar
atenção no trânsito? – provoco.
— Fica difícil se você continuar me paquerando desse jeito. – ele
sorri.
Fecho a cara para ele, fingindo estar brava e aperto sua mão na
minha.
— Você vai ter um final de semana inteiro para isso. – diz,
soltando minha mão para segurar o volante com as duas mãos e me
sinto repentinamente solitária sem seu toque. – Descanse.

Concordo com a cabeça, ligando o som do carro para ouvir algo.


Não preciso dizer o tamanho da minha surpresa ao ouvir Not a Bad
Thing, do Justin Timberlake, invadir os alto falantes em uma melodia
baixa.

Fecho os olhos, prestando atenção na letra.

— Luara. – ouço meu nome ser sussurrado em meu ouvido,


causando um calafrio em todo meu corpo. – Acorda.

Sinto o toque suave de uma mão em meu rosto, acariciando a


bochecha.
— Já chegamos? – pergunto, ainda sem abrir os olhos.
— Não. – Andrew responde. – Só uma parada para tomarmos
café da manhã. Sei que você não comeu nada antes de sair.

Concordo, mas o que realmente me faz acordar é o toque suave


em meus lábios, vindo em forma de beijo de Andrew.

Puxo seu lábio inferior quando ele afasta.

— Você sabe mesmo como acordar uma mulher. – digo,


finalmente abrindo os olhos. Ele sorri para mim.
— Obrigado. – diz. – Acabei de descobrir essa tática.

Franzo o cenho, formulando a pergunta, mas acabo mudando de


ideia quando meu estômago ronca. Oportunidades para perguntar
sobre isso não faltarão.
Enquanto termino de comer minha fatia de bolo de chocolate,
Andrew me observa, sem nem mesmo piscar. Ele já esta assim há
alguns minutos e não diz nada. É um pouco incomodo, para ser
sincera. Afinal, ninguém nunca me olhou desse jeito antes. Vejo
suas pupilas se dilatarem, deixando seus olhos escurecidos e
brilhantes.

Corto um pedaço do bolo, levando até ele, parando com o garfo


suspenso no ar e leva alguns instantes para que perceba o que
estou fazendo. Então pisca. Ele piscou!

— Coma. – peço, sentindo o sorriso bobo se formar em meu


rosto. Ele abre a boca somente um pouco, aceitando o bolo e acabo
sujando o canto de sua boca.

Sem pensar muito no que estou fazendo, mas com o coração


acelerado, eu o limpo, arrancando um pequeno sorriso de seu rosto.

Andrew segura minha mão, levando meu dedo para dentro da


boca e o chupa com uma lentidão que chega a doer dentro de mim.
Os olhos ainda fixos em mim.

— O que você esta fazendo? – pergunta ao tirar meu dedo de


sua boca, sem soltar minha mão. Sua voz esta rouca.
Dou de ombros.
— Estava apenas limpando você. – responde e ele desce minha
mão, segurando-a acima da mesa. – Você estava muito sério e
concentrado.

Ele balança a cabeça em negativo.

— Estava pensando. – diz, acariciando meu dedo.


— Em quê? – pergunto.
Sua resposta é curta, mas o suficiente para me deixar no chão.
— Você. – responde. UAU!

Sinto todo meu corpo começar a se aquecer dos pés a cabeça.


Cada molécula, cada partícula e cada milímetro do meu ser se
remexem com sua resposta, deixando-me ainda mais
desconfortável de que quando ele estava apenas me olhando.

— Pensando o quê sobre mim? – arrisco, fazendo-o sorrir de


maneira que o entrega por completo. Ah, seu cretino!
— Em nós. – PORRA! Arregalo os olhos, chocada. Eu... “Nós”?
Simples assim?! – Próxima pergunta. – ele pede, ainda sorrindo
para mim.
Por que não?
— Antes de sairmos do carro você disse que havia acabado de
descobrir uma nova maneira de acordar uma mulher. Por quê?
Andrew solta minha mão, passando a sua em sua barba, como
se procurasse pelas palavras certas para essa pergunta.
— Nunca dormi com ninguém. – responde. – Nunca precisei
acorda-las.
Franzo o cenho.
— Mas e as...
— Elas geralmente vão embora ainda durante a noite. – ele me
interrompe. – As que ficam dormem no quarto ao lado do meu, que
também faz divisa com o seu. Eu geralmente fico na sala, vendo TV
ou no escritório, trabalhando. – ele então suspira. – “Ficava” e “iam”.
– corrige. – Elas nunca nem mesmo entraram no meu quarto.
— Nunca na sua cama. – completo seu pensamento. Ele
confirma. – Por quê?

— Nunca quis a marca dos meus erros com as mulheres na


minha cama. – Andrew me da um sorriso tímido, que não é nada
típico dele. – Mas, no entanto, eu quero você nela.
Arregalo os olhos, boquiaberta e em choque.
— COMÉ QUE É?! – exclamo mais alto do que deveria,
chamando a atenção das outras mesas. Ele ri.
— Eu disse que estava pensando em nós dois. – ele da de
ombros. – Mais alguma pergunta?
— Acho que acabaram as perguntas. – sussurro, colocando o
último pedaço de bolo na bola. Andrew levanta, estendendo a mão
para mim, que seguro de imediato. – Você não parece o mesmo
vizinho idiota que me fazia dormir no sofá.
— Não? – ele pergunta e confirmo. – Deve ser porque estou
tentando te levar para minha cama. – sorri, guiando-nos até o
balcão do outro lado. – Vou pegar algo para comer no caminho,
caso te de fome. – informa.

— Tem algo que eu quero comer, mas não posso. – comento de


maneira sugestiva, apertando sua mão.
— Dieta? – pergunta, fazendo-me rir.
— De certa forma sim. – respondo.
— Massa? Doce? – pergunta. – Podemos pegar algo mais leve
também. – ele franze o cenho. – Embora eu tenha te visto comer
bolo ainda pouco.
— Uma boa massa. – respondo, piscando para ele. – E um doce
também.
— Sem massa e sem doces então. – sorri. – O que vai querer?
— Uma coxinha de frango. – peço para a atendente, chamando
a atenção de Andrew, que estava escolhendo entre dois chocolates
diferentes. Ele franze o cenho para mim, parecendo confuso, mas
não diz nada.

Seguimos agora para o caixa em silencio e Andrew não me


deixa pagar nada do que peguei. O que, por conta da TPM, me
deixa irritada. Um pouco, pelo menos.

—Achei que você estivesse de dieta. – ele diz assim que


passamos pela porta. – Se bem que eu não vejo a necessidade de
você estar de dieta. – olho para ele e o vejo erguer a sobrancelha.
— Você não entende mesmo. Não é?
— Não. – responde com sinceridade. – Desculpa, mas sou novo
nisso.

Suspiro, parando a meio caminho do carro e viro para ele,


segurando sua jaqueta.

— Desculpa. – sussurro. – Eu dormi mal à noite e isso me deixa


com um humor terrível. E esses “dias” me deixam muito instável.
Não quis falar com você assim quando esta sendo um doce comigo.
Andrew sorri, concordando.
— Posso relevar isso. – diz. – Quer chocolate? – tenho que rir
para não chorar. Literalmente falando.
— Chocolate é sua resposta para tudo?
— Quando diz respeito a você, ao menos por hora, sim. –
responde prontamente. – Vai querer ou não, Srta. Mil Faces?
— Eu não tenho mil faces! – exclamo, batendo em seu peito,
fazendo-o rir.
—Algo me diz que até o final dessa viagem vou descobrir muito
mais sobre todas as suas “caras e bocas” e ainda mais sobre você.
— Espero que você me conte um pouco mais sobre isso quando
descobrir. – peço, tirando a barra de chocolate de sua mão. –
Enquanto isso, esta delicinha aqui esta confiscada. – ele ri. – O que
foi? – pergunto, cruzando os braços junto ao peito.

— Existe muita coisa na qual eu poderia fazer nessa


combinação. – diz, voltando a andar e o acompanho. – Essa
equação “Luara + Chocolate + Andrew” me parece extremamente
tentadora e ainda mais apetitosa. – sinto seu olhar em mim, mas o
ignoro, fingindo não ter entendido.

— Prefiro mais “Luara + Chocolate”. – respondo, sorrindo,


olhando de maneira provocativa para ele.
— Prefiro mais você e eu na minha cama. – ele joga de volta,
abrindo a porta do carro para que eu entre. – De preferencia você
nua. Mas isso esta mais difícil de acontecer do que eu esperava. – e
fecha a porta.
Espero até que ele esteja do meu lado para poder fazer minha
próxima pergunta.
— O que foi? – ele pergunta, ligando o carro.
— Você quer me conhecer melhor?
A pergunta não era essa exatamente, mas sim outra totalmente
diferente. Essa apenas escapou.
— Descobri essa manhã que sim. – ele responde, novamente
sendo sincero, e sai do estacionamento, seguindo de volta para a
rodovia.
Quando acordo, vejo que já estamos dentro de São Paulo e levo
apenas alguns segundos para reconhecer o bairro em que nasci e
fui criada.

Da última vez em que eu estive aqui, chovia muito. Ao contrario


de hoje, que faz um lindo sol, sem nenhuma nuvem.

Eu sinto meu coração acelerar ao lembrar-me do velório da


minha avó e da minha família. Até mesmo da maneira com que eu
fui embora no domingo passado, apenas para poder-me ver livre de
todas as lembranças que este lugar me trás. É tudo muito recente e
faz com que eu lembre de que há apenas uma semana, eu estava
no hospital com ela, conversando.

Exatamente uma semana desde que ouvi sua voz pela última
vez. O que também faz com que lembre de que hoje será sua missa
de sétimo dia...

Fecho os olhos, sentindo as lágrimas se formarem em meus


olhos e uma mão segurar a minha, sem dizer nada. Sinto as
palavras de Andrew na segunda-feira, quando tudo estava doendo
de maneira que eu achava que não poderia aguentar.

— Esta tudo bem. – ele diz, acariciando os nós em meus dedos.


Vejo que o carro já esta parado de frente com o portão branco,
fechado, entre dois sobrados. Um verde e outro amarelo. – Eu estou
aqui com você.

Olho para nossas mãos em meu colo, entrelaçando nossos


dedos.

Olho para Andrew, que devolve meu olhar e sorrio sem graça. Se
ele não tivesse vindo comigo, se eu estivesse aqui sozinha...
Mesmo sendo aniversário de Tommy na segunda, não sei se daria
conta de encarar tudo isso sozinha.

— Obrigada. – sussurro, afastando as lágrimas para longe. Ele


sorri e concorda. – Que venham as perguntas sobre o que somos
um do outro. – sorrio.
— Disse para sua mãe que eu era um amigo do trabalho. – diz,
arqueando a sobrancelha.

— Bem, amigos não se beijam, não trocam caricias e muito


menos fazem nada do que fizemos ontem à noite. – respondo,
recordando-me dos nossos amassos no sofá da minha sala.

— Amigos com privilégios. – ele ri. – Somos o que você quiser


dizer que somos. – sussurra, dando-me um beijo leve antes de sair
do carro, dando a volta para abrir a porta para mim.

Quando saio, eu o puxo para um beijo de verdade. Sei que não


poderei fazer isso muito enquanto estivermos aqui, então preciso
aproveitar esse momento.

— Até que descubramos. – sussurro, afastando.


— Espero descobrir antes. – ele concorda.
— CHEGAMOS! – anúncio em voz alta, abrindo a porta da sala
para entrarmos.
— Estamos na cozinha. – ouço a voz da minha mãe em
resposta.
— Vamos lá. – digo, virando para Andrew. – Coloque as coisas ai
no canto. Depois levamos para o quarto.
— Tudo bem. – ele concorda, colocando as duas mochilas no
lugar onde pedi e seguro sua mão, puxando-o para o corredor.
— AAAAAAAAAAAAAAH! – uma vozinha grita, correndo em
nossa direção. – SOLTE MINHA IRMÃ AGORA! – ele grita, parando
em posição de ataque com sua espada de brinquedo.
— Tudo bem, rapaz. – Andrew diz, soltando minha mão,
erguendo os braços para o ar em rendição. – Não vamos nos
precipitar e partir para a violência.
— Quem é você e o que faz aqui? – Tommy pergunta bravo. –
Você não foi convidado a entrar neste castelo!
— A princesa concedeu a autorização, Lord Thomas. – digo para
ele, rindo.
— Ah, droga! – ele diz com desanimo, baixando a espada. – Oi
tata.
— Oi, maninho. – digo, apertando-o em um abraço, beijando sua
bochecha e recebendo outro. – Estava com saudades de você.
— Eu também.
— Onde a mamãe esta?
— Na cozinha preparando as coisas para minha festa amanhã. –
Tommy responde. – Quem é ele? – pergunta olhando para Andrew,
soltando-se de mim.
— Um amigo do trabalho. – respondo, sorrindo para Andrew.
Eu realmente gostaria de dizer que somos algo que não seja
isso, mas não tem nada que seja melhor para dizer.
— E ai, campeão? – Andrew o cumprimenta, sorrindo.
— Qual seu nome? Quais são suas intenções com a princesa? –
Tommy pergunta, tornando a erguer a espada. – RESPONDA!
— Hm... – Andrew olha para mim e faço gesto para que entre na
brincadeira. – Sou Sir Andrew Giardoni. Cavalheiro designado para
acompanhar a princesa de volta até o castelo do Rei e da Rainha. –
Ora! Ele é bom nisso. Quem diria.
— Sua missão já foi concluída, Sir André. – Tommy diz. – Seus
serviços já não são mais necessários. Pode se retirar.

Abro a boca para responder, mas minha mãe é mais rápida.

— Não é nada educado expulsar as visitas, Thomas. – ela diz,


aparecendo na porta da cozinha, secando as mãos em um
guardanapo. – Ainda mais se for o novo namorado da sua irmã.
— Mãe! – exclamo, sentindo minhas bochechas se aquecerem
com seu comentário. Andrew ri ao meu lado e olho para ele, que
apenas da de ombros para mim.
— O que eu disse demais? – ela pergunta. – Prazer, sou
Elizabeth, mãe da Luara. – apresenta-se, abraçando Andrew. – Mas
pode me chamar de Lizzy ou Liz.

— Andrew Giardoni. – ele se apresenta assim que minha mãe


afasta. – Sinto muito pela mãe da senhora. Luara me contou sobre o
ocorrido. Eu diria que com o tempo melhora, mas a saudade
aumenta.
Nossa, ouvindo falar assim nem tenho como dizer que é o
mesmo homem que tem ficado comigo esses dias todos.

Com o comentário de Andrew, minha mãe me olha surpresa.

— Ele meio que me deu o ombro quando precisei. – digo na


defensiva. Defensiva demais.
— Ah! O “amigo”. – ela ri. – Venham. Estou terminando de
preparar os docinhos para a festa de amanhã. – diz, entrando
novamente na cozinha, seguida por Tommy.
— Quantos anos disse que seu irmão tinha mesmo? – Andrew
cochicha em meu ouvido.
— Cinco. – respondo, sentindo o calafrio de suas palavras em
meu ouvido e viro para ele. – Ao menos por mais um dia e algumas
horas. Por quê?
— Me pareceu bastante assustador. – sua resposta me faz rir.
— Um baita marmanjo como você com medo de um garotinho de
cinco anos? – Andrew ri um tanto quanto sem graça.
Estou deitada na sala, tentando dormir, enquanto ouço Andrew e
minha mãe conversarem.
— Você trabalha com o que lá? – minha mãe pergunta.
— Em parte sou responsável pela contratação dos novos
funcionários. – Andrew responde. – Sou eu quem entrevista os
candidatos, quem promove ou demite, caso seja necessário. – ele
não diz a parte de que também é o Presidente CEO Fodão da porra
toda, o que me deixa em parte aliviada. Talvez mais tarde eu conte
isso, caso ele concorde.
— Parece um trabalho bem interessante.

— É bem complicado e legal ao mesmo tempo. – ele concorda. –


Só não gosto muito de ter que demitir. Faço isso apenas nos casos
em que não tem mais como manter alguém que não faz por
merecer.

Abro um olho e vejo Andrew sentado de frente para mim. Ele me


pega olhando para ele e fecho os olhos outra vez.
— Você não me parece estranho. – minha mãe diz. – Mas não
consigo descobrir de onde te conheço.
— Revistas, jornais. Algumas entrevistas na TV. – ele ajuda.
— Pode ser. Você é um homem bonito. Deve representar bem a
empresa.
— Aquele lugar é minha vida. – Disso eu não tenho a menor
dúvida.
— Você entrevistou a Lu também? Foi assim que se
conheceram? – minha mãe pergunta e sinto meu rosto corar. Eu me
viro de costas para eles para que não percebam meu desconforto.
— Não. – responde. – Ela foi indicada por nosso escritório aqui.
Não houve a necessidade de uma entrevista, já que ela
indiretamente já era nossa funcionária há alguns anos.
Basicamente, ela recebeu uma promoção no cargo e esta se
empenhando muito bem para mostrar que mereceu a promoção.
— Lu sempre foi assim. – minha mãe diz. – Desde a escola. Os
trabalhos sempre eram feitos com antecedência, para poder fazer
outras coisas que quisesse.
— Antes todos fossem assim.
— Mamãe, eu quero leite com chocolate. – Tommy os
interrompe.
— Eu já volto. – informa.

Ouço os passos se afastarem, seguindo para a cozinha.

— Você não esta dormindo! – Andrew exclama, jogando uma


almofada em mim.
— Estou sim! – respondo, jogando a almofada de volta nele. –
Vocês estão se dando bem. Não precisa de mim. Então eu posso
dormir.
Viro para a parede outra vez.
— Não faz isso. – ele sussurra, mas não respondo mais.
— E quanto aos seus pais? – minha mãe pergunta assim que
volta. – Trabalham lá também?
— Não. Eles não vivem aqui no Brasil. – responde. – Estão
vivendo na Europa há três anos. Quase quatro já.
— Que sonho!
— Pois é. Eu só os vejo alguns dias a cada três ou quatro
meses, mais ou menos.
— Filho único?
— Sim.
— Eu ia perguntar sua idade, mas acho que esse interrogatório
já esta indo um pouco longe para quem só é amigo.
Andrew ri, provavelmente percebendo o ponto inicial ai outra vez.
Mais cedo ou mais tarde Luara e eu vamos ter que conversar sobre
isso.
— Tenho vinte e seis. – respondo.
— Bom dia. – a voz de Andrew chega baixa até mim logo que eu
acordo. Viro para ele, sentindo seu olhar e sorrio.
— Bom dia.
— Dormiu bem? – pergunta com um sorriso de lado lindo.
— Uhum. – sorrio de volta.
— Onde posso guardar as coisas?
— Você ficou ai esse tempo todo? – pergunto, sentando no sofá.
– Eu me esqueci de te levar até o seu quarto. Desculpa.
— Tudo bem.
— Venha. – digo, pegando minha mochila do lado do sofá,
esperando que Andrew pegue sua mochila.
— Quer que eu leve? – ele pergunta.
— Não. Tudo bem. Só tem algumas poucas coisas. – sorrio e,
dando um beijo em seu rosto, seguro sua mão, levando-o pelo
corredor. – Este é meu antigo quarto. – falo assim que passamos
por ele. – Mas óbvio que você vai ficar no quarto de hóspedes, que
fica no final do corredor, ao lado do quarto dos meus pais.

Porque estou dizendo isso, eu não sei. Não é exatamente como


se eu esperasse por uma visita noturna sua. Ainda que a ideia seja
bem tentadora. Principalmente depois dos nossos beijos e caricias
de ontem, que apenas serviram para me deixar ainda mais na
vontade.

— Bem que eu suspeitei da ideia de dormir com você. – eu o


olho, pronta para dizer algo, mas acabo mudando de ideia. É melhor
não provocar enquanto estivermos aqui.
Continuamos nossa caminhada, chegando ao último quarto.
— E aqui será o seu. – informo, abrindo a porta.

Nosso “quarto de hóspedes” não chega exatamente a ser um


quarto. Ele é o antigo escritório do meu pai. Mas, como ele construiu
um novo para fora quando Tommy nasceu, aproveitando que iria
fazer um quarto para que ele não dormisse comigo nem com
Camile, acabamos com o tempo transformando aqui em um quarto
para as visitas.

— A cama era minha. – digo, olhando para Andrew, apenas para


ver qual sua reação.
— Isso explica os adesivos nela. – ele sorri.
— Eu tinha dez anos quando os colei. – retruco. – O banheiro
fica ali naquela porta. – indico a porta fechada pouco à frente e ele
olha para ela.
— Tudo bem. – diz, voltando a atenção para mim. – Preciso
fazer uma ligação.
— Tá. Tudo bem. Eu vou te deixar a vontade. – digo as palavras
um pouco no automático. – Qualquer coisa eu estou na cozinha
ajudando minha mãe.
Viro para sair, mas sinto sua mão segurar meu punho, me
fazendo parar.
— Espera. – ele pede quase num sussurro, causando uma
reação instantânea em todo meu corpo.
— O que foi? – pergunto.

Andrew olha pelo corredor e me pego imitando seu gesto.

Sinto seu beijo antes mesmo de me dar conta do que esta


acontecendo e ainda assim eu o correspondo, sentindo seu corpo
colado ao meu, sentindo sua ereção começar a crescer em minha
barriga.

Eu me afasto, completamente sem folego e apoio a cabeça em


seu peito, sentindo seu coração batendo acelerado. Ele beija meu
cabelo, colocando-o atrás da orelha.
— Só para deixar claro que sou um amigo com privilégios. – diz,
fazendo-me rir.
— Eu vou me lembrar disso. – concordo, beijando seu peito. – A
missa vai ser às sete horas... – começo, mas não consigo terminar.
— Eu vou com você. – ele responde minha pergunta silenciosa.
– Não vou te deixar sozinha.
— Obrigada. – sussurro. – Acho que meu pai deve estar
chegando a qualquer momento.

Ele confirma com a cabeça, então me solta para poder ver a


hora em seu relógio.

— Só vou fazer uma ligação e vou tomar banho para me


arrumar. Não devo demorar.
— Onde o papai e a Camile estão? – pergunto para minha mãe
na cozinha, depois de fazer uma breve parada no meu quarto para
deixar minhas coisas.
— Camile foi ontem dormir na casa de uma amiga e só volta
amanhã.
— Quanta consideração. – resmungo, sentando na cadeira.
— E seu pai foi passar o dia na sua avó e depois ia ao shopping
para comprar o presente de Tommy. Mas já deve estar chegando
para irmos à missa.
— Sobre isso... – começo a dizer, mas minha mãe me
interrompe.

— Lu, esta tudo bem. – diz, sentando na cadeira ao meu lado. –


Eu entendo o porquê de você ter ido embora mais cedo semana
passada, além de que você tinha que trabalhar no dia seguinte. –
ela sorri. – Eu não consigo imaginar o que você sentiu quando
aconteceu e eu sinto muito que tenha sido assim. – dou um sorriso
fraco, percebendo seus olhos brilharem. – Fico feliz que você tenha
conversado com alguém lá, que você não ficou completamente
sozinha. Julie estava bastante preocupada.

— Eu não sei como teria suportado se não fosse Andrew


comigo. – sussurro. – Ele foi um grande amigo para mim, mesmo
que nos conheçamos há tão pouco tempo. – dou um sorriso sem
jeito para minha mãe, apertando sua mão. – Vou ligar para Julie
depois e obriga-la a ir à missa conosco. – Não que eu vá precisar de
tanto, já que ela irá apenas por mencionar o nome de Andrew e
também por já ter me dito durante a semana que iria.

Minha mãe levanta, voltando para o bolo que esta fazendo,


enquanto eu a observo.

Ela é baixinha e tem apenas 1,57 de altura. Não vai mais dois
anos para que Tommy a ultrapassa. Tem uma aparência fofa, com
seu rosto redondo e cabelos sempre mantidos na altura dos ombros.

— Onde esta seu namorado? – ouço a pergunta, tirando-me de


meus pensamentos.
— Ele não é meu namorado. – respondo. – Somos amigos do
trabalho.
— Claro. – diz. – Por isso que você o trouxe de tão longe para
passar o feriado conosco? – pergunta, lançando seu olhar de “Você
não me engana”. – Eu vi vocês dois se beijando lá fora quando
chegaram.

Sinto meu rosto esquentar mais do que brasa quente com essa
descoberta. Minha mãe viu Andrew e eu, nos beijando! Posso sentir
daqui a fumacinha subindo por minha cabeça, como se evaporasse
de tão quente que estou.

— Vi também a maneira com que vocês se olham. – ela


continua. – Se ainda estão nessa de “apenas amigos”, estão
perdendo tempo. Vocês formam um casal lindo.

Internamente eu concordo com ela, mas não digo nada. A última


coisa de que eu quero é criar expectativas por algo que não existe e
talvez nunca exista. Além de que Andrew também não é lá a pessoa
que mais conversa sobre esse tipo de coisa. A quem estou
querendo enganar? Tenho tanta culpa nisso quanto ele.
Capítulo Quatorze
Domingo

Levanto um pouco mais cedo de que o normal para poder ajudar


minha mãe com os últimos preparativos para a festa de Tommy, já
que os amiguinhos dele devem começar a chegar por volta das
onze horas.

Meu pai foi buscar Camile na casa da amiga dela e de lá irão ao


supermercado para comprar mais refrigerantes.

— Bom dia, mãe. – eu a cumprimento assim que entro na


cozinha.
— Oi querida. – diz. – Tem bolo no balcão.
Corto um pedaço de bolo de laranja, servindo um copo com o
suco e me sento à mesa quando Andrew aparece seguido por
Tommy.
— Oi, Tata. – ele me cumprimenta, dando um beijo.
— Oi, maninho. – respondo, também beijando seu rosto. – Bom
dia, Andrew.
— Bom dia. – ele responde com um sorriso de canto para mim.
— Andrew, querido, sente-se e tome café conosco. – minha mãe
o convida, puxando a cadeira ao meu lado para que ele se sente.
— Obrigado.

Olho para Andrew, tentando descobrir o que há de diferente nele


hoje. Ele esta usando uma camisa regata preta, que fica colada em
seu corpo de maneira provocativa. Seu perfume chega até mim
junto de mais algo.
— O que foi? – ele pergunta, levando seu copo com leite até a
boca.
— Tem algo diferente em você. – falo.
— Sério? – torna a perguntar.
— É. Mas... – franzo o cenho. – Espera. Você tirou a barba! –
quase grito ao me dar conta do que há de tão diferente. Sem barba,
Andrew parece um pouco mais moço, embora ainda fique lindo, não
como aqueles homens que parecem crianças. Como pude levar
tanto tempo para perceber logo isso?
— Ele estava me ensinando a fazer a barba. – Tommy diz.
— Onde esta aquela insuportável da minha irmã? – reconheço a
voz de Camile vinda da sala.
— A insuportável acabou de chegar. – respondo. – A mais legal
esta na cozinha.
— Quanto amor. – Andrew diz ao meu lado.
Não demora mais do que poucos segundos até que Camile entre
na cozinha praticamente correndo e me levanto para abraça-la.

— Ainda não acredito que, em um mês que passei fora, você


esteja maior que eu. – comento assim que nos afastamos.

Grande parte das pessoas que nos vê juntas costuma dizer que
somos parecidas. Certo exagero, em minha opinião. Ainda mais
agora que Camile esta maior. Tá, nós parecemos um pouquinho.
Mas ela tem cabelos liso e castanho claro, com olhos verdes, assim
como nossa mãe. Sem mencionar o fato de que ela ainda esta no
auge dos dezessete anos.

— Você é a baixinha agora. – ela responde, rindo de mim. – E


este ai, quem é? – pergunta, notando Andrew na mesa.
— Sou Andrew. – ele se apresenta e da um sorriso para ela.
— Você é um gato! – exclama. – Se deu bem desta vez, ein
maninha?
Abro a boca para responder, mas Tommy entra na frente:
— Eles são só amigos.

Sinto o olhar de Andrew em cima de mim. Ele arqueia a


sobrancelha, como se esperasse que eu dissesse algo sobre a
resposta de Tommy, mas tudo o que consigo é sentir meu rosto se
aquecer quando ele sorri.

— “Amigos”, né? – Cami sussurra em meu ouvido e abro a boca


para responder outra vez, mas fecho, não tendo exatamente o que
dizer.

A cada lado que olho nesta casa, eu vejo crianças correndo, aos
berros e sinto seus gritos ecoarem em meus ouvidos, fazendo com
que minha cabeça lateje.
Vejo presentes dispostos em uma mesa ao canto da sala, onde
Tommy passara horas sentado, abrindo cada um deles.

— Por que você e Andrew não vão dar uma volta por ai? – minha
mãe pergunta. – Convide-o para ir conhecer a Liberdade ou o
Ibirapuera. Ou qualquer outro lugar que ele ainda não conheça.

Sorrio, tendo um pensamento improprio. Se eu pudesse, não o


convidaria para conhecer nenhum desses lugares. Mas sim algum
hotel com uma cama. Suspiro, lembrando-me de que ainda não
estou podendo com isso. Só mais hoje...

— Ele esta conversando com meu pai lá no quintal dos fundos.


— Perdeu o namorado, ein? – ela ri.
— Mãe!
— Qual o problema? Já disse o que penso sobre isso.
— Eu vou para o meu quarto. – digo, levantando do sofá. –
Estou com um pouco de dor de cabeça.
— Tem remédio no armarinho do banheiro.
Concordo com a cabeça, seguindo pelo corredor.
Para minha sorte, o barulho não chega aqui no fundo.
Pego um livro que acabei deixando para trás e deito na cama
para ler um pouco.

— Não sei como pude demorar tanto para começar a ler este. –
digo após algumas páginas. Minha dor de cabeça aliviou um pouco,
mas ainda a sinto.
— Tata? – ouço Camile me chamar da porta.
— Entra. – digo.
— Como estão indo as coisas lá? – ela pergunta, sentando-se ao
pé da cama.
— Está indo bem. Bem mais corrido de que aqui, para ser
sincera.

Conversamos por quase uma hora, sobre vários assuntos.


Conto sobre o prédio da BIT e que ganhei uma aposta de bilhar
lá dentro de dois homens, jogando sozinha contra eles. Sobre a
discoteca e como é morar em um apartamento em Copacabana e
poder ir à praia sempre que sentir vontade e o quanto espero que
eles me visitem logo.

— EI! – ela exclama.


— Que foi? – pergunto finalmente me sentando.
— O que há entre você e Andrew? – ela vai direto ao assunto.
— Hmmm...
— Não minta para mim. – repreende.
— Eu não disse nada! – exclamo.
— Vocês não são apenas amigos. – ela me olha fixamente, sem
nem mesmo piscar para ter certeza de que não vou esconder nada
dela. – Está estampado na cara de vocês dois isso.
— Virou a irmã mais velha enquanto estive fora? – pergunto,
tentando fugir do assunto.
— Tommy ainda prefere você. Então, não. – diz. – Agora
responda de uma vez por todas, por favor!
Olho para a TV desligada na parede do outro lado, tentando
descobrir o que dizer.
— Não sei o que somos. – digo, por fim. – Trabalhamos juntos,
indiretamente falando, é claro. E estamos nos conhecendo. Não
somos exatamente amigos, mas também não somos namorados,
como vocês pensam. – olho para ela. – Estamos tentando descobrir
isso.

— Vocês ficaram. – não é uma pergunta. Desvio o olhar


novamente para a cômoda do outro lado. – VOCÊS FICARAM! –
afirma com ainda mais certeza. – EU SABIA!
— É. Você me pegou.
— Bem, se você insistisse em dizer que eram “apenas amigos,”
eu ia perguntar se estava tudo bem se eu ficasse com ele, porque,
convenhamos, ele é muito gato!

Deito outra vez na cama e pego meu livro de volta, sentindo


minha dor de cabeça querer voltar.

— Por mim tanto faz. –digo e na mesma hora me arrependo


destas palavras, sentindo meu estômago se revirar. Não é “tanto
faz”. Tanto faz, sim!

Alguém bate na porta, anunciando sua presença. Baixo o livro


apenas o suficiente para ver Andrew debruçado no batente, com os
braços cruzados ao peito. Quanto dessa conversa ele ouviu? Sinto
seu olhar em mim, deixando-me completamente quente.

— Oi, Andrew. – Camile o cumprimenta. – Sabe, acabei de ter


uma conversa aqui com minha irmã. Perguntei se realmente eram
só amigos e se tudo bem se eu ficasse com você.

Sinto uma breve, mas não pequena vontade de bater nela com
Um Homem de Sorte. Mas me controlo, apenas respirando fundo.

— Sério? – pergunta e vejo por cima do livro que ele me olha. –


E o que ela respondeu?
— Que por ela tanto faz, já que realmente são amigos.
— Tanto faz? – ele pergunta agora para mim. – Verdade isso?

Mais uma vez nossos olhares se cruzam, demorando-se alguns


instantes. Será mesmo que ele acredita que falei isso a sério? Quer
dizer, depois de tudo?

— Sim. – a palavra me escapa antes que eu possa pensar


direito. Baixo o olhar novamente para o livro, sentindo meu
estômago se revirar dentro de mim outra vez.
— É. Somos só amigos. – ele diz agora para Camile.
— Quer ir para o meu quarto? – pergunta. – Quero te mostrar
uma coisa.
— Claro. Vamos lá.

Os dois saem, deixando a porta entreaberta e jogo o travesseiro


contra ela com toda força que consigo reunir para um objeto leve. O
barulho que faz ao bater é apenas uma pequena parte do quanto
quero gritar com esses dois.

QUE ÓDIO DESSES DOIS IDIOTAS!

Espero até que dez minutos se passem e saio do quarto. O de


Camile fica bem ao lado do meu e vejo a porta fechada. Paro de
frente com ela, tentando escutar algo e tudo o que ouço são suas
risadas abafadas.

— Certo. – Eu é que não vou ficar aqui para ouvir isto. – digo a
mim mesma, pegando o celular no bolso do short, discando o
número de Julie. Ela atende no segundo toque. – Esta em casa? –
pergunto.
— Estou sim. Por quê?
— Estou indo ai.
— Então venha logo, porque estou doida para saber sobre essa
história do seu mais novo paquera estar na sua casa!

Desligo o celular e pego a chave do carro de Andrew no


chaveiro. Lembro de que ele comentou durante a viagem que tinha
costume de deixar o documento dentro do carro, porque sempre
esquecia.

— Vou dar uma saída. – anúncio aos meus pais que estão na
sala assistindo filme. Nenhum deles pergunta nada.

A casa de Julie fica há vinte quadras da minha. Mas, se for pela


rodovia é bem mais rápido de que por dentro da cidade. Então é o
que eu faço, seguindo pela principal. Meu pé indo cada vez mais
fundo, já nos 120km/hr.
— Esse carro é bom mesmo. – digo, aumentando o volume da
música. Conforme toca, pensamentos começar a fluir por minha
cabeça, como se me torturasse.

Por que fiquei assim? – pergunto a mim mesma. – Por que estou
sentindo tanta raiva dele?

Sei que Cami não faria este tipo de coisa comigo ou com
qualquer outra pessoa, que na certa ela roubou alguma coisa do
meu quarto e estava mostrando para ele, assim como já fez várias
outras vezes. Mas isso que estou sentindo...

— Na verdade, você é um grande filho da puta, Andrew! – grito


para o acento vazio ao meu lado. – Sem ofensas, senhora Giardoni.
– acrescento. – Claro que te trazer para cá era um erro. Quer dizer,
você passou um mês inteiro infernizando minha vida, transando com
um monte de vadias e ainda ousou dizer na minha cara que
procurava nelas o que tinha encontrado só em mim. – rio, realmente
irritada. – POUPE-ME! Encontrou o que em mim? O fato de eu ter
sido a transa mais fácil que já conseguiu na sua vidinha de
milionário?

Pego a primeira entrada de volta para os bairros, parando em


seguida em um semáforo.

— Ou seja lá quantos cifrões existam na sua conta bancária!


“Procurei nelas o que encontrei em você...”, agora conheceu minha
irmã, né? Somos iguais assim também? Pois saiba que ela ainda é
menor de idade, seu grande idiota! – finalmente explodo, sentindo
as lágrimas começarem a escorrer.

Eu acreditei nele, merda! Acreditei que, mesmo depois das


noites no sofá, apenas por ele ter ficado do meu lado quando minha
avó faleceu, achei que ele pudesse ser diferente de tudo aquilo que
me fazia pensar antes.

Seco as lágrimas quando o semáforo abre e piso no acelerador


para sair. Uma buzina desenfreada chega aos meus ouvidos,
chamando minha atenção para a esquerda, onde um Palio vermelho
vem com tudo para cima de mim.

— Merda!

Meu cérebro começa a trabalhar rápido, tentando encontrar algo


a fazer. Se eu parar, ele bate em cheio na porta do meu lado.
Acelero e viro o volante para minha direita, desviando dos outros
carros e piso no freio, também puxando o freio de mão.
Consigo desviar dos carros, mas não do muro da casa de
esquina quando subo na calçada, que reconheço ser a casa de
Julie.
Minha cabeça dói e sinto algo começar a escorrer pela lateral do
rosto. Devo ter batido antes de o air bag ativar.
Vejo pelo canto do olho, ainda que minha visão esteja
embaçada, várias pessoas se amontoando em volta do carro.

— Meu Deus. É a Luara. – alguém diz. Uma voz familiar. Mas


não reconheço seu dono. – Alguém liga para a emergência!

Então tudo fica escuro.


Ouço vozes ao meu redor, mas não reconheço nenhuma delas.

— Lu, amorzinho, por favor, acorde. – alguém diz, segurando


minha mão.
— Só mais um minuto. – sussurro em resposta.
— Ela esta acordando! – uma mulher diz ao meu lado.

Ao som da voz, sinto uma leve pontada na cabeça e levo a mão


até a testa, mas alguém me impede.

— Não toque. Eles tiveram que dar ponto.


— Ju? – chamo confusa, finalmente abrindo os olhos.
— Sou eu. – ela responde.
— O carro... – começo a dizer, mas não consigo completar a
frase.
— Andrew acionou o seguro.
— Você o conheceu? – pergunto, fechando os olhos outra vez.
— Garota, ele de fato é o Gostosão da Praia! – sorrio ao ouvir
suas palavras.
— É sim. – concordo, não conseguindo manter o sorriso por
muito tempo, já que me lembro do que fiz com o carro de Andrew e
de que ele provavelmente esta uma fera comigo.

Julie e eu somos amigas desde o fundamental. Crescemos e


mudamos juntas em tudo. São poucos os meses que a tornam mais
velha de que eu e alguns centímetros que me tornam maior de que
ela, com seus 1,62 de altura.

— Luara Brudosck. – ouço um homem chamar e Julie sussurra


para mim que é meu médico. – Você já pode ir para casa. – olho
para ele e vejo que tem uma prancheta em mãos, que usa para citar
minha situação: – Você sofreu alguns leves arranhões e cortou a
testa. Sete pontos. – UAU! – Deixei com sua mãe uma receita com
recomendações e alguns remédios para você tomar, caso sinta dor.
— Tudo bem. – digo quando ele termina de falar.
— Seus pais e seu namorado estão ai fora para te levar para
casa. – informa, finalmente se retirando, deixando-me sozinha com
Ju.
— Legal. Ele esta ai.
— Vocês brigaram? – Julie pergunta, me ajudando a levantar.
— Não exatamente.
— Seja lá o que tiver acontecido, vai ter que enfrentar.
Franzo o cenho.
— Fora o fato de eu ter destruído o carro dele? – ela ri ao meu
lado e acabo rindo junto.

Passo o braço pelo ombro de Julie, caminhando até a porta.


Estão todos aqui. Meu pai, minha mãe e Andrew, meu suposto
namorado.
Minha mãe levanta, vindo até mim e vejo seus olhos vermelhos,
entregando que esteve chorando, fazendo meu coração se apertar
dentro do peito.

— Que bom que você esta bem, minha menina. – minha mãe
diz, envolvendo-me em um abraço forte e tudo o que consigo fazer é
correspondê-la.
Vejo Andrew parado pouco atrás de nós, com os braços
cruzados e um olhar sério.
— Me desculpe. – sussurro para ele.
— Lu, eu vou deixar você descansar. – Ju diz, dando um beijo
em meu rosto. – Amanhã eu passo de lá para te ver.
— Obrigada. – sorrio, realmente sem graça. Essa não era a
visita que eu esperava ter feito para ela.

Meu pai dirige, levando-nos direto para casa. Desde que


entramos no carro, nenhum deles disse ou perguntou qualquer coisa
que fosse a respeito do acidente.

Olho para Andrew e ele olha para fora, desviando o olhar do


meu, me fazendo imaginar o quão irritado comigo deve estar.
Suspiro, também olhando para fora, começando a sentir uma leve
dor de cabeça.

Reconheço o toque da mão de Andrew em minha perna,


chamando minha atenção para ele, que segura minha mão e a
aperto com força.

— Esta tudo bem. – leio as palavras em seus lábios, junto de um


sorriso que me parece sincero. Não esta nada bem.

Ele solta o cinto, sentando ao meu lado e me abraça, fazendo


meu coração bater mais acelerado dentro do peito. Apoio à cabeça
em seu ombro, sentindo o seu beijo em meus cabelos.

Passo por Camile e Tommy na sala, deixando todos para trás,


indo direto para meu quarto, para tomar um banho e tirar esse
cheiro horrível de hospital que parece estar impregnado em mim.

— Mas que droga! – exclamo, esfregando o cabelo com


shampoo.

Antes de sairmos, a enfermeira disse que eu deveria deixar o


machucado “respirar” o máximo possível, porque assim ele iria
cicatrizar com mais facilidade, que, dentro de dez dias, eu devo ir ao
Posto de Saúde ou qualquer coisa do gênero, para retirar os pontos.
Disse também que eu não deveria estranhar, caso eles
começassem a soltar sozinho, já que significava que estava
cicatrizando. Que bela semana de trabalho eu vou ter!

— Pelo menos agora vou ter uma cicatriz na testa. – digo,


lutando para passar a camisa pela cabeça sem tocar no
machucado. – Luara Potter. – rio, embora não ache realmente
engraçado.

Como não sou fã de sangue e sei que a coisa não esta nem de
longe bonita, eu evito me olhar no espelho e assim farei, até que
consiga.

Depois do banho, passo da cozinha para pegar algo para poder


comer, mas não pego nada. Qualquer fome que eu pudesse sentir
se foi. Ao invés disso, sigo para o quintal dos fundos e me sento na
varanda, olhando para o jardim que meu pai fez.

— Queria que Julie tivesse vindo. – digo para mim mesma.


— Ela não esta. Mas pode ser eu? – ouço a voz grade de
Andrew atrás de mim e ele senta ao meu lado. – Você esta bem? –
pergunta.
— Estou com a testa quebrada e seu carro provavelmente
destruído. – respondo sarcasticamente. – Como acha que estou?
— Bem sexy com essas pontas de linha preta ai no meio. – diz,
apontando para minha testa.
— Não tem nada sexy nisso. – respondo, não conseguindo
disfarçar a irritação. – Só depois que tirar, porque finalmente
consegui o que desejei por vinte e dois anos.
— E o que desejou? – pergunta.
— Uma cicatriz na testa.
— É, tem razão. Isto sim é sexy. – concorda, virando para mim. –
Por que fez isto? Pegar o carro e sair assim?
— Eu não sei. Você foi para o quarto com minha irmã. – eu evito
olhar em sua direção enquanto falo. – Quando passei na porta,
vocês estavam rindo. Acho que fiquei com ciúmes. – admito, por fim.
— Você com ciúmes?! – exclama. – Está ai algo que nunca
imaginei.
— Não se faça de idiota.

Ele então conta sobre o álbum da minha formatura que Camile


roubou do meu quarto e estava mostrando para ele.

— Teria visto quando piscou para mim, se não estivesse enfiada


atrás daquele livro.
— E você prontamente aceitou.
— Você estava dizendo para todos que éramos “apenas
amigos”! – exclama levemente alterado. – O que mais queria que eu
fizesse? Isso me irritou.

— Que negasse, talvez! – exclamo de volta, finalmente olhando


para ele. – Ela é minha irmã. Uma criança!

Andrew desvia o olhar para o jardim, correndo as mãos pelo


rosto.

— Luara. – diz meu nome de vagar, voltando a me olhar. – Eu


não vim para cá para conhecer sua irmã. Nem mesmo sabia que
tinha uma. Vim para poder ficar com você, para que nos
conhecêssemos um pouco melhor e descobrir o que esta
acontecendo entre nós. – ele leva a mão ao cabelo, bagunçando-o.
– Não menti quando disse que te procurei e nem sobre o porquê de
dormir com aquelas vadias, como você mesma gosta de colocar.
— Vadias Aleatórias. – corrijo.
— Fiquei preocupado quando recebi a ligação do seguro dizendo
que haviam batido meu carro. Mas foda-se ele! Eu posso comprar
quantos quiser. Mas você...

Por algum tempo, nós apenas nos encaramos. Os olhos de


Andrew brilham, fazendo meu estômago se revirar.

Sei que fui infantil por ter saído daquela maneira, que quem
começou com isso de dizer que éramos amigos foi eu e que, mais
ainda, era só eu ter aberto a porta que veria exatamente o que
estavam fazendo. Que, mesmo sabendo como Andrew é, sei que
ele jamais desrespeitaria minha irmã. Principalmente depois das
últimas semanas, na qual ele se mostrou mais meu amigo e
realmente interessado em nós, ao invés de nas várias mulheres que
ele podia ter. Inclusive as que ele dispensou para estar aqui comigo.

Não é tão arriscado assim, afinal. Fecho os olhos, sentindo meu


coração bater acelerado. Gostar dele... Se ele se preocupou
comigo, se esta aqui, eu não posso estar sozinha. Ou posso?

— Você fica melhor de barba. – sussurro, tocando seu rosto,


sentindo sua barba já começar a crescer.
— Eu sei. – ele sussurra de volta, me puxando para mais perto.

Ele prende uma mão em meu short e a outra em minha nuca. Já


eu, seguro seu rosto para mim, sentindo o batimento acelerado de
seu coração, provavelmente na mesma sincronia do meu.

Seus olhos brilham completamente escurecidos e o beijo, como


quis fazer a muito tempo. Um beijo lento e urgente, em uma
sincronia intensa e absoluta.

— Eca! Vocês estão trocando baba! – Tommy grita da porta,


fazendo Andrew sorrir e copio seu gesto.
— Quer ver um filme? – pergunto, acariciando seu rosto.
— Claro. – responde, pousando um selinho em meus lábios.

Faço uma rápida parada na cozinha, pegando alguns docinhos


que sobraram da festa. Penso em preparar pipoca para nós, mas
prefiro não.

— Que filme quer assistir? – Andrew pergunta assim que termino


de escolher.
— Posso só colocar? – pergunto de volta. Não me atrevo a dizer
o nome do filme que escolhi.
— Tudo bem. – responde, encostando a porta.
— Não fecha. – peço. – Meus pais. Sabe...
Ele concorda, deitando em minha cama do lado da parede,
enquanto ligo o notebook à TV.

— Love, Rosie. – diz. – Nunca vi.


— Eu gosto. – respondo, deitando na cama com ele.
— Sua cabeça dói? – Andrew pergunta?
— Um pouco. Tomei uma dipirona na cozinha. – respondo. –
Esta aliviando a dor.
— Qualquer coisa você me avisa. – sussurra, beijando meu
pescoço.

Pauso o filme na metade para poder ir ao banheiro. Terminada


uma longa semana de tortura desejando esse homem, finalmente eu
me vejo livre para que possamos aproveitar até tarde da noite
quando voltarmos para o Rio de Janeiro.

— Você que encostou a porta? – pergunto, voltando para o


quarto. Ele ergue a cabeça.
— Não sai daqui. – responde.
— Sei lá então. – digo, voltando a deitar, ficando mais próxima
dele.
— Posso? – ele pergunta e ergo o olhar, vendo sua mão próxima
ao meu quadril. Sério que ele esta pedindo permissão para me
tocar?
— Acho que sim. – sorrio quando ele me puxa para perto de si e
afunda o rosto em meu pescoço.
— Você esta animadinho demais. – comento, sentindo sua
ereção encaixar em minha bunda.
— Desculpa. – diz, afastando.
— Tudo bem. Eu gosto. – olho para ele por cima do ombro,
pousando a mão em seu quadril, puxando-o para perto de mim outra
vez. Sinto meu rosto se aquecer, mas... Já fizemos coisas
suficientes para não evitarmos mais coisas boas como essa. – Quer
dizer, é engraçado porque, quando uma mulher deixa um homem
excitado, significa que ele realmente esta interessado. É fofo.

— Me pergunto onde você estava todos esses anos. – comenta,


fazendo-me rir e deito em seu braço.
Até hoje eu me perguntava o porquê de ter colocado a cama
encostada na parede, ao invés de dê frente para a TV, já que seria
melhor para assistir, não precisando ficar de lado. Encontrei a
resposta hoje.

Fecho os olhos, passando minha mão de leve pela de Andrew,


que esta em minha barriga, apertando-me contra ele. Sua
respiração em minha nuca é suave, quase como se estivesse
dormindo.

— Quer mais brigadeiro? – pergunto.


— Não. – responde, beijando meu cabelo. – Quero outra coisa.
Olho para ele por cima do ombro e pergunto curiosa:
— O que?
— Beijinho. – sussurra, sorrindo.
— Hmmm... – murmuro, virando novamente para frente,
pegando o último beijinho do prato. – Fecha os olhos. – peço e ele
me obedece quase que de imediato. – Abre a boca. – obedece
novamente, embora abra mais do que o necessário. – Desse jeito
parece que você quer todos de uma só vez!

Ele ri, finalmente deixando a boca aberta somente um pouco.


— Assim. – sussurro e ele corre a língua pelo lábio inferior.

Sinto meu coração bater mais acelerado com o que estou


prestes a fazer, mas é uma oportunidade. E eu realmente quero
fazer isso.

Prendo o doce entre meus dentes, aproximando-me de sua boca


e ele recebe, sorrindo e me puxa para um beijo quando tento me
afastar fazendo-me sorrir contra seus lábios.

— Esse beijinho estava realmente bom. – sussurra.


— Sim. – concordo, reabrindo os olhos.
Andrew pega o último brigadeiro do prato, puxando-me para
junto dele, me fazendo sentir sua ereção bem maior do que antes.
Apenas seu toque é mais do que o suficiente para fazer todo meu
corpo se acender em brasa quente.

Ele prende meu short na parte de trás, apoiando a testa na


minha, evitando o lugar machucado.

— Você é cruel. – sussurro, dando um sorriso travesso.


— Mais cruel do que imagina. – concorda, colocando o
brigadeiro em minha boca, segurando meu queixo e me beija,
pegando-me de surpresa.

Sinto sua mão livre em minha bunda, apertando-me contra ele,


fazendo-me gemer em seus lábios.

Passo minha mão por sua barriga, sentindo sua ereção ainda
maior dentro da bermuda, pressionada contra mim. Paro com a mão
no botão, louca para abri-lo. Com a respiração acelerada, Andrew
fecha os olhos e, quando os abre outra vez, estão escurecidos como
a noite.

Quero que ele me toque, assim como fez na sexta-feira. Quero


sentir suas mãos em cada parte do meu corpo e, ao invés disso, ele
se afasta, deixando-me na mão.

— E esta é sua cara de desejo. – diz. A voz rouca e pesada.


— Eu não vou passar mais vontade. – digo, espalmando seu
peito, virando-o de barriga para cima e subo nele, beijando-o.
— Pelo amor de Deus. – ele geme quando começo a me
movimentar sobre ele. – Isso é demais. Não vou aguentar.
— Não precisa aguentar. – sorrio, beijando seu pescoço.
Para minha decepção, ele me afasta, segurando meus braços.
— Você esta menstruada. – diz.
Então esse é o problema. Eu não comentei nada sobre o dia que
terminaria.
— Terminou ontem. – sorrio. – Não é nada daquilo mais. Mas eu
realmente quero você aqui.
Cubro meu rosto, sentindo-o aquecer com essa confissão.
Apenas o risco de podermos ser pegos por um dos meus pais já faz
com que o desejo aumente bem mais.

— Esperei muito para ouvir isso. – Andrew sussurra, beijando


minha boca, invertendo nossas posições. – Tem certeza de que quer
isto? – pergunta, agora beijando minha boca e confirmo. – Tem
camisinha ai? As minhas estão todas na mochila. Eu não esperava.
— Bolsinho interno da mochila. – gemo quando ele faz uma leve
pressão em mim para poder sair de cima.
— Seus pais não... – começa a perguntar assim que encontra a
embalagem preta no lugar que falei.
— Há essas horas dormindo. – respondo antes mesmo que
termine a frase, puxando-o pelo pescoço e ele se move em mim. –
Hm.
— Shiii! – ele faz, cobrindo minha boca. – Você tem que ficar
quieta.
Sorrio, mordendo sua palma.
— Vai ter que rebolar muito para me fazer ficar quieta, gatão. –
eu o provoco, embora saiba que qualquer barulhinho suspeito...

Ele então afasta para poder tirar meu short, tirando também sua
camisa e a coloca embaixo de mim, provavelmente para não sujar o
lençol. Como se isso fosse necessário.

Entrego para ele o preservativo assim que desce a bermuda e a


cueca até as coxas, deixando sua ereção livre para meu deleito e
apreciação.

Não há muito que possamos fazer aqui hoje. Mas deve segurar
as coisas até amanhã. Não podemos ter preliminares e muito menos
toques. Para mim, poder senti-lo latejando dentro de mim já é mais
do que suficiente. Por hora.

Eu o observo colocar a camisinha com o olhar fixo em mim.

— Se alguém escutar, isso vai dar problema para nós dois. –


sussurra, deitando sobre mim. Eu o sinto em minha coxa, tão
quente, mesmo com o preservativo e quero gritar para que ele
termine com essa tortura de uma vez por todas. – Por mais que eu
adoraria te ouvir gritar, vai ter que ficar para outro dia. – sorri. Outro
dia!

Levanto-me apenas o suficiente para beijar seu peito,


praticamente implorando para que me penetre de uma vez por
todas.
Deito outra vez e ele levanta, passando seu pau em mim em
uma tortura terrível.
— Se machucar você me avisa. – sussurra sem desviar os olhos
dos meus e concordo, sentindo-o entrar em mim.
Abro a boca para gritar quando o sinto de verdade. Ao invés
disto, aperto minhas unhas em suas costas, sentindo seus
movimentos aumentarem.

— Você é muito apertada. – ele sussurra em meu ouvido,


fazendo-me rir.
— Acho que você é que é um bruto de grosso. – gemo em seu
ouvido, apertando-o ainda mais contra mim.

Sinto seus movimentos lentos. Seus beijos que correspondem


meu desejo. Sinto tudo.
Ele me beija desta vez com mais força, fazendo-me atingir o
clímax e sei que ele gozou comigo.

— É melhor do que eu me lembrava. – ele diz, beijando meu


rosto.
— Sim. – concordo, segurando seu rosto para mim. – Ou foi à
adrenalina de sermos pegos.
— Os dois. – diz, dando um selinho em mim.
— Preciso tomar um banho.
— Eu te machuquei? – pergunta, saindo de mim e faço uma
careta.
— Não. Eu só... – começo, mas paro, sem saber o que dizer. –
Nunca fiz isso nesses dias. Ainda que esteja terminado. É estranho.
Ele concorda, tirando o preservativo e o amarra, erguendo a
bermuda de volta.
— Bem, pelo menos você não sangrou. – comenta, tirando sua
camisa da cama e jogando no chão.
— Nada gentil. – digo, indo para o banheiro.
Ele ri.
— Desculpa.

Já não sei mais que horas são. Talvez já passe da meia-noite,


talvez ainda seja mais cedo. Na verdade, enquanto estou aqui,
deitada com Andrew, nada me importa.

A expressão no rosto dele demonstra nada além de desejo,


assim como no meu. Seus olhos brilham, mostrando para mim um
sentimento contido por de trás de tudo isso que vem acontecendo
entre nós, fazendo-me perceber que, o que realmente faz com que
nos apaixonemos por outra pessoa, não é aquilo que dizem para
nós, mas sim a maneira com que nos olha. E, deitada aqui com ele,
é isso o que eu sinto, ainda que negue para mim mesma, é isso que
aconteceu: eu me apaixonei pelo meu vizinho depois de tanto brigar
com ele.
Capítulo Quinze
Segunda-feira

Acordo com o celular de Andrew tocando em algum lugar da cama,


enquanto ele procura pelo aparelho.
— Andrew. – ele diz, com uma voz rouca e sexy. – Depois do
almoço? Tá, tudo bem. Vocês podem trazer? O endereço? Claro. Só
um momento.
Viro para ele, ditando o endereço aqui de casa e ele repete para
a pessoa do outro lado. Enquanto ele espera, brinco com minha
mão em sua barriga, fazendo-o sorrir.
— Ficarei no aguardo então. Obrigado. – e desliga, virando para
mim. – Vão trazer um carro até depois do almoço. – diz, pousando a
mão sobre minha cintura. – Pedi para que trouxessem para cá.
— Que tipo de seguro você tem? – pergunto, apoiando com o
cotovelo na cama. – Eles levaram em um domingo e terminaram no
feriado! – ele ri.
— É um bom seguro. – responde, pousando um beijo em meu
rosto.

Viro de barriga para cima, fitando o teto ainda escurecido. Tem


algo que quero perguntar para Andrew, mas... Não tenho certeza de
que seja uma boa ideia fazer isso agora. Ou hoje. Ou amanhã. Ou
qualquer outro dia.
Sento na cama, tentando não pensar muito no que aconteceu
aqui ontem.
— Quer conversar sobre isso? – ele pergunta.
Mordo o lábio inferior, virando para ele de lado, sentando sobre a
perna.
— Eu quero. Só... – balanço a cabeça. – Outra hora. Não aqui
nem agora. – sorrio, sentindo meu rosto se aquecer. – Ainda estou
com medo de que alguém tenha nos escutado. De estar dormindo e
você não estar aqui de verdade. Mas sim lá no Rio, com várias
mulheres.
Andrew me olha, atento a cada palavra minha.
— Eu poderia estar. – diz e tenho de concordar. – Mas não
estou.
— Só podemos falar sobre isso outra hora? – peço, levantando.
Ele concorda, encarando-me enquanto troco de blusa.
— O que foi? – pergunta.
— Nada. É só que... – faço uma pausa, passando a camisa pela
cabeça. – Você disse que não dormia com as mulheres que levava
para o seu apartamento. Mas disse que queria dormir comigo. –
franzo o cenho, tentando entender isso.
— Bem, não tive muitas namoradas para isto. Então... – ele faz
uma pausa, me observando enquanto escolho entre um short e
outro. – O jeans. – opina. – Sempre tem uma primeira vez.
— Namorada? – pergunto realmente curiosa. – Somos
namorados?

Por algum tempo Andrew apenas me olha. O cenho franzido,


como se pensasse em algo. Então levanta, indo até a porta. Certo,
fui longe demais. E para, mantendo a mão na maçaneta.

— Não. Somos apenas amigos. – diz e sai, fechando a porta


atrás de si.
— Eu mereci isso. – sussurro para mim mesma, vestindo uma
camisa social xadrez por cima da outra, sentando no chão perto da
cômoda para separar algumas roupas para levar.
— Toc, Toc. – ouço alguém na porta do meu quarto, anunciando
sua presença e me viro para ver quem é.
— Julie! – exclamo ao ver minha amiga.
— Vim ver como esta minha testa quebrada favorita. – ela sorri
para mim e entra, fechando a porta atrás de si.
— Não sinto nada. – respondo, também sorrindo para ela. – Às
vezes ainda acho que estou sob efeito da anestesia.
— O que aconteceu, menina? – pergunta, sentando-se em
minha cama. – Por que você saiu daquele jeito?

Suspiro e, sem parar de arrumar as roupas, conto a ela o que


aconteceu, sem poupar um único detalhe.

— Não acho que Camile faria isso com segundas intenções. –


Julie diz assim que termino. – Digo, no lugar dela eu teria feito a
mesma coisa só para te provocar ciúmes. – ela deita em minha
cama, folheando meu livro. – Não foi legal você ficar dizendo para
todo mundo que eram “apenas amigos”, sendo que ficavam se
agarrando pelos cantos. Isso chateia.

— Eu sei. – concordo. – Só não entendo tudo isso. Quer dizer,


quando me mudei para o Rio, a última coisa que eu queria era me
envolver com outro tão já. – coloco uma calça jeans no monte para
levar, finalmente olhando para ela. – Não tem tanto tempo desde
que Felipe e eu terminamos.

— Talvez seja por isso que esteja acontecendo. Veja – ela deita
de bruços, apoiando na cama com os braços. –, você se livrou de
um relacionamento que na maior parte do tempo só foi um peso
morto para você. Vocês só brigavam e ele te tratava como um lixo.
Além de que nunca se preocupou com você.

— E Andrew fez isso sem ter a menor obrigação comigo. –


concluo.
— Só aproveita a chance, Lu! – exclama, tornando a sentar. –
Olha o homem lindo que praticamente caiu no seu colo e tá maluco
por você!
— Ele não esta maluco por mim. – digo, jogando uma blusa para
o monte de doações. – Isso tá acontecendo só para mim.
Julie me olha por algum tempo.
— Quando ele chegou ao hospital com seus pais, estava
preocupado. – diz. – Não com o carro. Com você. Talvez ele não
demonstre ou você que não esteja querendo aceitar isso só porque
ele é seu chefe.
— Só vamos ver no que dá. Tudo bem?
— É assim que se fala! – exclama. – Agora me conta: rolou ou
não essa noite?
— Como você...
— Camile abriu a porta e contou que vocês dormiram juntos. –
ela interrompe.
Então foi ela quem fechou a porta... Sinto meu rosto corar com a
ideia.
— Há! – exclama. – Vocês fizeram! Eu sabia! Eu sabia! –
cantarola. – Como foi? Foi intenso? Selvagem? Romântico? – ela
solta as perguntas sem nem mesmo dar tempo para as respostas. –
Ele tem jeito de ser tudo isso e ainda mais. – ri. – Foi como na praia
ou foi melhor?
Sorrio, sentindo meu rosto se aquecer ainda mais.
Ao invés de responder suas perguntas, abraço uma almofada
que estava ao meu lado, virando para ela.
— Eu não sei. – digo após algum tempo.
— COMO ASSIM “VOCÊ NÃO SABE”?! – exclama, parecendo
realmente chocada. – Vocês fizeram. Isso está na sua cara e ele
também parecia bem mais relaxado de que ontem quando o vi no
hospital.
— A adrenalina de sermos pegos pelos meus pais, sabe? –
começo. – Eu estava morreeeeeeendo de medo de que algum deles
nos escutasse. E ele também estava preocupado. Sempre tomando
cuidado para não fazer nenhum barulho.
Julie ri, percebendo o ponto que quero chegar.
— Seu pai mataria vocês dois. – concordo, também rindo.
— Mas ainda assim foi perfeito. – sussurro, afundando o rosto na
almofada, ouvindo a risada abafada de Julie.

Quando todos nós terminamos o almoço, Tommy chamou,


gentilmente, cada um de nós para jogar Banco Imobiliário com ele.
Sendo sincera, minha paciência com esse jogo já esta igual ao
Alaska: abaixo de zero. Mas, para mostrar que ainda sou uma boa
irmã, e depois de ele ter dito que viu Andrew sair do meu quarto, eu
aceitei desde que pudesse ficar como banqueira.
— Anda logo, Lu! – Ju grita para mim. – Vem logo!
— Achei! – exclamo, finalmente encontrando a barra de
chocolate que roubei de Andrew no posto quando paramos. Isso vai
servir direitinho. – Já estou indo.

Sirvo também um copo de suco, indo para fora, onde todos estão
sentados à mesa. Na certa algum deles deve estar querendo
receber do banco e Tommy não quer deixar mexer, para evitar
“desvios de verba”.
— Alguém quer chocolate? – pergunto assim que volto. Arqueio
uma sobrancelha, olhando para Andrew.
— Achei que você estivesse de dieta, Tata. – Camile diz.
— Estava. – concordo, ainda olhando para ele, que segura meu
olhar. – Mas agora estou oficialmente saindo dela. – ele sorri para
mim, provavelmente percebendo a que eu me refiro.
— Eu aceito. – Andrew diz. – Afinal, esse chocolate era meu.
Sorrio em resposta, mas Tommy é mais rápido que eu:
— Não dá chocolate para o Babão, não! – exclama, subindo na
cadeira.
— Babão? – minha mãe pergunta.
— É! – exclama. – Ele e a Tata estavam se beijando ontem
depois que chegam do hospital. – diz, fazendo cara de nojo e me
sento ao lado de Andrew, tentando ignorar o que ele diz. – Eca!
— Você não é mais um bom irmãozinho, Thomas. – digo,
quebrando uma fileira de chocolate, levando para minha boca.
— Ele apenas é sincero. – Andrew diz, tirando o chocolate de
mim, comendo quase tudo de uma só vez e me devolve o último
quadradinho quando olho para ele, realmente chocada. O que ele
quis dizer com isso?

Mais uma hora se passa enquanto jogamos. Camile e meu pai


vão a falência. Minha mãe desiste pouco depois e passa suas
propriedades para Tommy, que acaba ganhando quando Andrew
recebe uma ligação do seguro e vai para a rua, esperar até que
tragam o carro e Julie também fali.

— É! – Tommy grita. – Eu ganhei! Ganhei!


— Vitória de aniversário, maninho. – digo.
Termino de guardas as últimas peças do jogo e deixo para que
Julie e Camile guardem a caixa no lugar e saio, indo para a rua
atrás de Andrew. Ele esta sentado na guia da calçada, olhando para
frente. Os braços apoiados em suas pernas.
— Desculpa por ter dito aquilo. – ele diz assim que me sento ao
seu lado, entrelaçando seu braço.
— Não. Tudo bem. – respondo, imediatamente percebendo que
não se refere ao chocolate ou ao fato de Tommy ser sincero. – Eu
mereci aquilo. Falei muito aquilo para todo mundo esses dias.
Inclusive para você.
Andrew olha para mim e sorri, fazendo algo dentro de mim se
aquecer.

— Realmente falou. – concorda. – Mas eu também disse que


seria um amigo com privilégios. – rio ao lembrar-me disso.
— E disse que seriamos o que eu quisesse. – suspiro,
lembrando o tamanho da burrada que cometi ao coloca-lo logo
como amigo. – Eu só não consigo entender o que esta rolando. –
falo. – Nós nos conhecemos na praia uma vez, totalmente por acaso
e então acontece um monte de coisas que eu normalmente fugiria.
Isto nunca vai dar certo.
— Por quê? – pergunta, segurando minha mão.
— Porque você é meu chefe.
Ele ri.
— Não sou seu chefe aqui fora. – diz. – E nem lá dentro.
— Claro que é! – exclamo, afastando dele para olha-lo nos
olhos. – Você é o Presidente CEO da BIT Technologies. O Poderoso
Chefão que é cobiçado por todas as mulheres e gays lá dentro.
— Oh! Sim. Isso é bem cansativo. – responde. – Por isso não
costumo sair da minha sala a menos que seja realmente necessário.
— E tem também essa viagem para Nova Iorque. – recomeço. –
Se souberem que ficamos ao menos uma vez, todos vão dizer que
só consegui tudo isto por estar transando com você.

Andrew endireita a postura ao meu lado e percebo algo diferente


em seus olhos.
— Eu nem sabia que era você a nova funcionária! – exclama. –
Não dou a mínima para o que vão dizer ou não. Estou cansado de
todos querendo tomar conta da minha vida. Estou cansado de
continuar com a vida que estava levando, que não me levava para
nada.

Ele então passa a mão pelo rosto, como se tentasse se controlar.


Já eu, ainda estou assustada com a maneira com que ele diz estas
coisas.

— É. Eu sou só um homem, Luara. – diz, segurando minha mão


e entrelaço nossos dedos. – Apenas um mero mortal, assim como
todo mundo.
— E o que acontece se não der certo? – pergunto, não
conseguindo disfarçar meu medo. – Como fica o clima entre nós lá
dentro? Se eu me envolver com outro cara ou você com outra
mulher? O que, convenhamos que você é bem rápido com isso.
— Nem vem que você também quase foi para a cama com outro
cara. – diz. O cenho franzido. – Só para provocar a mim. – ele me
olha, ainda mais intrigado. – Sério que ele tinha que ficar falando
tudo o que ia fazer? Quer dizer, ele precisou avisar que ia colocar a
camisinha! – exclama. – Ou vocês realmente chegaram... – então
para de falar, desviando o olhar para outro lado. Eu rio, achando
toda a graça do mundo com sua ideia sobre aquela noite com
Diego. – Qual a graça? – pergunta.
— Nós não chegamos nem perto de fazer isso que você esta
pensando, And. – digo. – O que você ouviu que ele falou que
precisava colocar, foi o DVD que eu estava segurando. Eu desisti
antes mesmo de tentarmos. – dou de ombros. – A questão é que eu
não consigo fazer qualquer coisa que seja com uma pessoa,
estando com a cabeça em outra. E eu estava com a cabeça no
Gostosão da Praia aquela noite.
Andrew sorri com minhas palavras.
— Não quero ser apenas um “amigo com privilégios”. – ele diz
quando uma Mercedes prata para de frente conosco. – Só vamos
ver no que da isso tudo. – e levanta, estendendo a mão para me
ajudar.
— Sem Vadias Aleatórias enquanto estivermos tentando? –
pergunto e ele sorri.
— Sem caras que não sabem colocar uma camisinha. –
concorda. – Ou qualquer outro além de mim.

Desta vez sou eu quem concorda e o beijo de leve nos lábios, já


que um rapaz loiro desce do carro, vindo cumprimenta-lo.

Passa um pouco das três da tarde quando Andrew e eu


terminamos de guardar as coisas de volta no carro emprestado do
seguro dele para podermos vir embora. Eles trouxeram uma linda
Mercedes C180 para ele, e ele ainda não ficou feliz! Sério! QUAL O
PROBLEMA DESSE HOMEM?! Se bem que, se eu dirigisse um
Audi, também não me contentaria com qualquer outro modelo.

— Volte mais vezes, querido. – minha mãe diz, abraçando


Andrew. – Será sempre muito bem vindo em nossa casa.
— Obrigado, Elizabeth. – ele responde, abraçando-a de volta. –
Quando vier a trabalho para cá outra vez, ligarei avisando. – minha
mãe sorri, concordando.
Eu realmente odeio me despedir deles. Parece que a cada vez
fica mais doloroso.
— Não vai, Tata. – Tommy choraminga, agarrando em minhas
pernas. – A Caca não é igual a você. E ai esta o biquinho dele.
— Ei! – Camile exclama. – Não me culpe se ela faz todos os
seus gostos.
— Vêm cá vocês dois. – puxo Camile também para um abraço e
ficamos assim por algum tempo. Não vou chorar. Não vou chorar.
Repito o mantra várias vezes.
— Me desculpe por fazer aquilo. – Cami diz em meu ouvido.
— Esta tudo bem. – respondo. – Foi merecido. – sorrio, olhando
para Andrew. – Aquilo meio que nos ajudou em algo. Então...
Obrigada. – ela ri.
— Bem, então, por nada.
— Será que posso ter minha vez agora? – meu pai pergunta
parado ao nosso lado. Camile e Tommy se afastam, indo para perto
de minha mãe e Ju, que conversam com Andrew. – Espero que
vocês sejam felizes. – ele sussurra em meu ouvido, envolvendo-me
em um abraço apertado.

Meu pai na maior parte do tempo é do tipo “caladão”. Mas


quando da para falar, não há quem segure esse homem. Ele é bem
mais alto de que eu, mas não tanto quanto Andrew. Seus cabelos já
estão platinados, quase completamente brancos. Os olhos são de
um tom mel, assim como os de Tommy. Ele também não é a melhor
pessoa para se conviver em certos dias e devo isto em mim a ele.
Mas também é o melhor pai que se pode imaginar.

— Obrigada. – sussurro, abraçando-o forte.


— Me conte os mínimos detalhes. – Ju sussurra em meu ouvido
quando finalmente consegue me afastar dos outros. – Eu vou ir
atormentar você no Rio nas minhas férias! – anuncia em voz alta,
pulando em mim. – Não achou mesmo que ia se ver livre de mim tão
fácil. Achou, Testa Quebrada?
— Nunca. – respondo, rindo.
Já é noite quando Andrew desliga o motor do carro no
estacionamento do Golden Village. Pela primeira vez em vários dias
estamos completamente sozinhos, sem nada que nos impeça de
terminar o que começamos ontem.
— Deixa isso ai. – digo para ele, segurando sua mão e fecho o
porta-malas. – Isso pode ficar para depois. Tem algo que
precisamos fazer agora. – ele sorri, aceitando que o leve para o
elevador.

— Este vai dar direto no meu apartamento. – explica enquanto


aperta o botão ao lado do elevador que uso. A porta do elevador se
abre e sorrio para ele, puxando-o para dentro do elevador, beijando-
o.

Sem me afastar, Andrew digita o código do nosso andar e o levo


para o fundo, onde ele me prende contra o espelho e vejo nosso
reflexo em todos os cantos. Muitos Andrews em muitas Luaras. Ele
me beija com força, arrancando um gemido de mim.
— Não acha que está com muita pressa? – pergunta quando tiro
sua camisa, jogando para o chão.
— Esperei muito tempo por isso. – sussurro quando ele me
prende contra a parede outra vez, pressionando sua ereção contra
minha barriga.
— Vem cá. – Andrew diz quando a porta do elevador se abre,
tomando-me em seu colo. – O quarto vai ter que esperar um pouco.
– beijo seu pescoço, entrelaçando minhas pernas em seu quadril,
apertando-o.
— Achei que me quisesse na sua cama. – provoco, puxando seu
cabelo com uma mão e acariciando seu rosto com a outra.
Andrew me pousa no braço do sofá, tirando minha camisa com
cuidado.
— Um lugar é apenas um lugar. – responde. – Não importa onde.
Sinto suas mãos em minhas costas, procurando pelo fecho do
meu sutiã. Seu toque faz com que todo meu corpo se arrepie,
fazendo meus batimentos acelerarem.

— Como senti falta deles. – sussurra tocando meu seio com uma
das mãos e o outro com a boca. Sua língua circulando...
— Ah! – gemo quando ele puxa meu mamilo com os dentes. –
And... – até mesmo seu nome me foge da cabeça com seu toque
em mim.
— Tão perfeitos. – ele diz, olhando para mim.
— Por favor... – puxo seus cabelos, sentindo sua boca. Sua mão
livre desce pela lateral do meu corpo, passando pela barriga até
entrar em meu short, em minha calcinha. Tortura! Tortura! Tortura –
AH! – grito ao sentir um de seus dedos deslizarem para dentro de
mim e puxo seu rosto para mim.
— O que você quer? – ele pergunta. Sua voz esta rouca e baixa.
Os olhos de um cinza escuro.
— Você. – digo, olhando dentro de seus olhos. – Dentro de mim.
Agora!

Ele então tira as mãos de mim e me empurra para trás, para que
me deite no sofá, arrancando de mim um gritinho, junto do meu
short e a calcinha, levando com eles minhas sapatilhas.
— Você tem ideia de como fica gostosa nua assim no meu sofá?
– pergunta, encarando-me.
— Você tem ideia de como fala? – jogo de volta, fazendo-o sorrir.
– Acho que já passou da hora de você calar a boca e fazer algo que
não seja falar.
Bingo!
Com estas palavras, em um único movimento, Andrew tira a
cueca e a calça, deixando seu amigo livre, completamente ereto e
tenho de me conter para não cair de boca nesse pau dele.
Antes que eu possa fazer algo que vá leva-lo ao delírio, ele veste
o preservativo.
— E que tal se você me fizesse calar? – pergunta, puxando
minhas pernas para ele, deixando-me com o quadril sobre o braço
do sofá.
Sorrio em resposta, vendo-o se ajoelhar diante de mim e, apenas
com esta visão, sou capaz de entrar em ebulição.
— AH! – gemo, sentindo sua língua circular meu clitóris, indo
para dentro de mim. – ANDREW! – seu nome me escapa em um
desespero e tento me levantar, mas sou impedida pelo seu braço,
que alcança meu seio e puxa meu mamilo. Tortura! Tortura!
— Achei que me quisesse de boca calada. – ele sussurra,
soprando em mim e, inutilmente, luto para escapar de seu aperto. –
Ou era isso que você queria? – pergunta, ficando de pé, entrando
em mim com uma força que eu não esperava, arrancando de mim
um gemido que vem do fundo da garganta e fecho os olhos,
apertando-os. Meu Deus! Ele é muito...

Sinto Andrew dentro de mim, mas ele não faz nenhum


movimento. Abro os olhos outra vez e o vejo apenas me olhando.

— Terminou? – pergunto, embora saiba a resposta.


— Eu te machuquei? – pergunta de volta.
— Não. – respondo. – Só me pegou desprevenida. Só vai com
calma por enquanto.
Ele concorda, passando minhas pernas ao redor dele e as aperto
em sua bunda.
— Tem ideia de como você fica sexy com esse olhar? – pergunto
quando ele começa a se mover e o sinto cada vez ir mais fundo.
— Provavelmente não tanto quanto você. – sussurra, puxando-
me para sentar no braço do sofá e me beija e envolvo meus braços
em seu pescoço, sorrindo, correspondo seu toque, passando as
mãos por seu cabelo, pela barba e ombros largos e musculosos...

Andrew me tira do sofá e sai de dentro de mim, levando-me por


um corredor escuro, até que cheguemos ao que reconheço ser seu
quarto e, deitando em mim outra vez, ele me penetra.
— Você é tão pesado. – sussurro, envolvendo os braços por
suas costas, apertando-o para senti-lo de todas as maneiras
possíveis.

Aperto minhas unhas nele, fazendo-o gemer enquanto me beija.


Levo minhas mãos de suas costas para os cabelos.
— Eu te procurei por todos esses anos. – sussurra. – Eu estive
com todas as pessoas erradas, quando precisava apenas te
procurar no lugar certo.

Seguro seu rosto para mim e vejo o brilho em seu olhar. Em


momento algum ele para de se mover e começo a sentir meu corpo
se contrair. Seu olhar quando goza... Seu olhar dentro de mim...

— Onde você esteve todo esse tempo? – pergunta, beijando-me


outra vez e puxo seu lábio inferior antes de responder.
— Com as pessoas erradas, assim como você. – sussurro,
acariciando seu rosto e ele sorri, saindo de dentro de mim para tirar
a camisinha e joga para o chão.
— Então eu quero você para mim. – sussurra, puxando-me para
cima dele.
— Como assim? – pergunto, tocando sua barba outra vez e ele
fecha os olhos. – O que você quer dizer?
— Eu não sei. – diz assim que reabre os olhos. – Mas quero
tentar algo com você. Algo de verdade. – franzo o cenho, sorrindo.
— Tipo namorados? – pergunto curiosa, sentindo que meu
coração pode saltar para fora do peito.
Ele desvia o olhar de mim, então responde:
— Acho que sim. Quer dizer, se você quiser tentar isso, claro. –
sua resposta me faz rir e o beijo, sentindo suas mãos se apertarem
em minha cintura.
— And – digo seu nome de vagar. –, eu estava com medo de me
machucar com você. – confesso. – Eu estava com medo de
começar a sentir algo por você e estar apenas me iludindo, porque
você não é o tipo de cara que se relaciona. – dou de ombros. – Não
por mais de uma noite. Além de ser quem você é. – Além de tantas
outras coisas, que me fazem ter ainda mais medo.

Sinto a mão de Andrew em meu rosto quando ele prende uma


mecha atrás da orelha.

— Ou talvez não me relacione assim por querer encontrar


alguém que realmente despertasse meu interesse. – responde. –
Você foi à garota que fugiu de todos os meus princípios.
Começando por ser mais nova.

Suas palavras me fazem rir. Por graça, por nervoso e também


por medo. Não imaginei discutir um relacionamento com Andrew,
nua em sua cama, depois de termos acabado de fazer sexo. E, no
entanto, estamos os dois aqui, nus, discutindo nosso possível
namoro.

— É sério isso? – pergunto. – Você considera idade em um


relacionamento?
— Não. – responde, descendo a mão por meu corpo, fazendo-o
se acender outra vez. – Eu evito por geralmente serem
problemáticas. Mas não você.
— E você quer tentar um relacionamento comigo. – digo e ele
concorda. – Sem Vadias Aleatórias? – pergunto, arqueando a
sobrancelha.
— Sem caras querendo mostrar o pau pra minha garota também.
– responde, me fazendo rir. – O que foi? – pergunta.
— Repete. – peço.
— O que?
— O que você disse no final da frase.
Sinto seu pau crescer um pouco embaixo de mim e ele inverte
nossas posições, ficando em cima de mim, soltando seu peso aos
poucos.
— Minha garota. – diz, beijando meu pescoço. – Minha linda
garota. – sorrio, segurando seu rosto. – E minha aquilo que você
disse antes.
Fecho a cara para ele, tentando parecer brava.
— Você não sabe ser romântico por muito tempo, né? – pergunto
e ele confirma. – É algo simples de se dizer. Só repete: minha
namorada. – ele franze o cenho e sorrio. – Não custa tentar. – digo
rindo. – Eu digo: meu namorado. – sussurro, puxando-o para mais
perto. – Meu lindo namorado.

Eu o beijo de vagar, sentindo seu membro crescer ainda mais


em minha perna.

— Minha namorada. – sussurra em meu ouvido, passando a


mão em meu braço. – Só tem uma coisa. – diz, afastando e eu o
olho. – Ao menos por enquanto, ninguém pode saber sobre nós
dois.

Mesmo contra toda minha vontade, concordo. Afinal, ele ainda é


meu chefe e as fofocas não serão poucas quando todos souberem
que estamos juntos.

— Não quero te prejudicar no trabalho e muito menos que falem


a seu respeito qualquer coisa. – continua. – Se acharmos que é isso
mesmo, que vamos realmente dar certo como um casal, nós
dizemos que começou em Nova Iorque. Até porque seria bem mais
fácil fazê-los aceitar a ideia depois de prender nós dois em outro
país por um mês, sabendo que teria uma grande chance de em
algum momento eu dar em cima de você. – ele sorri, mas eu não.
Algo está extremamente errado aqui.

— ESPERA! – exclamo, segurando seus braços para afasta-lo. –


VOCÊ VAI?!
— Sim. – Andrew responde calmo demais. – Tenho alguns
assuntos para tratar com a Nex Ae. – explica. Quem é Nex Ae?
Franzo o cenho para ele. – Mas ainda teremos um bom tempo livre
para te apresentar à cidade e fazer as coisas acontecerem entre
nós.

Sua confissão me pega completamente desprevenida. Nunca me


imaginei indo para Nova Iorque em companhia de alguém neste
treinamento. Para mim seria apenas um mês de trabalho, sem
conhecer qualquer pessoa ou qualquer outro lugar, onde muito
provavelmente eu me perderia. Mas, no entanto, irei Andrew
Giardoni, meu chefe e namorado. Essa palavra é estranha quando
direcionada a ele.

— Ah... Por essa eu não esperava. – digo após um tempo,


puxando-o para perto de mim outra vez.
— Talvez você devesse tirar seu passaporte o quanto antes. –
sussurra, beijando meu rosto e desço minha mão para seu pau,
agora completamente ereto. – Você é uma garota muito faminta. –
diz. A voz rouca. – Mas posso dar conta disso fácil, fácil.

Sorrio e ele se afasta para pegar outro preservativo e o veste,


entrando em mim de uma vez, mas desta vez não me assusto ou
sinto incomodo, já que estou um pouco mais acostumada com seu
tamanho.
Capítulo Dezesseis
Terça-feira

Acordo e levo alguns instantes para descobrir onde estou. Não é


minha cama, estou certa disso.
Ainda de olhos fechados, sinto um perfume masculino que paira
no ar. Um perfume novo e inebriante de shampoo e loção pós-
barba. Estou no apartamento do Andrew.

— Bom dia, dorminhoco. – sorrio, procurando por ele ao meu


lado, mas tudo o que encontro é seu lugar vazio. – O quê...
Sento na cama e o lençol escorrega por meu corpo.
— Andrew? – chamo, esfregando a mão no rosto para poder
acordar por completo e olho para o lado, acendendo o abajur e vejo
que ao meu lado tem uma bandeja com algumas coisas.
— O que é isso? – pergunto, pegando o bilhete para ler, onde
tem aquela mesma caligrafia caprichada.

Meu Anjo,
Sai mais cedo para uma corrida na praia. Devo estar de volta lá
pelas sete e quarenta.
Eu gostaria de poder te levar para o trabalho, mas
provavelmente quando chegar você já terá saído e eu ainda não
posso fazer isso, o que é uma grande maldade. Ter que esconder
minha namorada de todos assim.
Quando acordei, passei algum tempo olhando você dormir e
parecia tão calma e serena para te acordar. Achei que seria errado
fazer isso depois da noite que tivemos.
Graças a você, agora eu tenho respostas para algumas coisas.
Mas não convém lhe dizer através de um papel. Afinal, cada coisa
ao seu tempo.
Quanto ao café, fui eu quem preparou. Espero que goste.
PS: Vejo você à noite?
Andrew.

Termino a leitura e puxo o lençol de volta para cima, para só


então me dar conta de que estou completamente nua. Nem uma
única pecinha de roupa e ele esteva me olhando dormir assim! Não
que faça alguma diferença depois dessa noite.

Deito novamente, sentindo cada parte minha doer.


Principalmente as pernas. O que me faz sorrir, porque é mais do
que uma simples lembrança de uma noite de sexo. Foi nossa
primeira noite de muitas. A primeira de verdade.

Sento outra vez, puxando a bandeja com o café da manhã. Ele


preparou suco de laranja, torradas com geleia, cereal com aveia,
morango e mel e mais outro suco vermelho, que não reconheço o
sabor.

— Vai ser difícil me acostumar com isso. – digo, dando uma


pequena mordida na torrada.

Terminei de tomar do café que Andrew preparou e sai à procura


de minha roupa, encontrando apenas no balde de roupas sujas no
banheiro dele, junto das roupas que ele estava usando ontem. O
que me fez ter que pegar uma camisa dele no armário para poder ir
até meu apartamento e me arrumar para o trabalho.

Depois disso, levei a louça suja para a cozinha e lavei, para


deixar tudo como estava na noite anterior. O mesmo fiz com sua
cama, só para então me permitir olhar melhor seu apartamento, nos
poucos cômodos que me permiti fazer isso, que foram: sala, cozinha
e o quarto dele. Vi também o que ficava ao lado e não tinha nada
demais lá além de uma cama e um armário.

Procuro por um papel e caneta para escrever um bilhete para


deixar para ele:

Bom dia, And.

Obrigada pelo café. Estava tudo uma delícia. Assim como a noite
com você.
Peguei uma camisa sua emprestada, porque alguém jogou toda
minha roupa para lavar, provavelmente pensando que eu sairia pelo
corredor, sem roupa alguma.
PS: se você cozinhar tão bem quanto faz sexo, acho que estou
mais do que feita com você.
Sobre o seu PS: Eu espero que sim.
Tenha um bom dia de trabalho.

Lu.

Já são oito horas e estou pronta para ir para o trabalho. O único


problema é que não encontro minhas lentes em lugar algum e não
estou mais com tanto tempo para ir procurar no apartamento do
Andrew. Principalmente porque há essas horas ele já voltou e deve
estar se arrumando para sair. O que provavelmente acabaria
fazendo com que os dois se atrasassem.

Ao invés disso, vou até meu quarto e pego meus óculos junto da
bolsa para sair, guardando o chaveiro de avião com a chave do
apartamento de Andrew no bolso da calça, ainda que somente a
noite vá poder devolver para ele, já que não o vejo no trabalho.

Mal entro em minha sala depois de uma breve conversa com


Pedro e o telefone em minha mesa já toca.
— Luara. – atendo.
— Srta. Luara, bom dia. Aqui é Ana, secretária do Sr. Giardoni. –
ela apresenta-se e, apenas por ouvir o sobrenome de Andrew, já
sinto algo dentro de mim se desmanchar. Quer dizer, não é normal
receber um telefonema logo dela. – Estou ligando a pedido do Sr.
Andrew, que solicitou sua presença na reunião que ocorrerá está
tarde, na sala de reuniões no andar 29.

Franzo o cenho com a notícia. Por que Andrew pediria minha


presença na reunião? Mordo o lábio inferior. Algo não está certo
aqui.

— Claro. – respondo. – Estarei lá.


— Ótimo. – Ana diz. – Tire seu almoço até meio dia, para o caso
de não atrasar.
— Tudo bem. Obrigada. – Ana agradece e desliga. – Que coisa
estranha. – comento comigo mesma, finalmente sentando em minha
mesa.

Ainda faltam alguns minutos para as treze horas. Mas, como


estou nervosa demais para continuar esperando, já estou subindo
para a sala de reunião e para diminuir toda essa tortura. Eu sequer
consegui prestar à devida atenção no meu trabalho à manhã toda,
só por estar nervosa com isso. Quem dirá almoçar direito.

O elevador para e saio, avistando a mesma senhora que foi atrás


de Andrew na reunião da empresa, no final do mês.
— Boa tarde. – eu a cumprimento. – Ana. Certo?
Ela sorri para mim.
— Luara, oi! – exclama de maneira calorosa e imediatamente
gosto dela. – Sim, sou a Ana. Eles já estão todos no aguardo. Pode
entrar.

Murmuro para ela “obrigada” e, com a mão trêmula, bato de leve


na porta e a abro, anunciando minha presença.
— Com licença. – digo.
— Entre. – Andrew diz em resposta, sentado à ponta da mesa e
indica um dos lugares.

Fora Andrew, tem outros dois homens. Um baixinho quase


careca e outro mais alto e bem magro. Sento-me há dois lugares de
distância de Andrew, sentindo minhas pernas bambas. Isso não
pode ser nada bom.

— Então é ela quem irá fazer o treinamento conosco? – o


baixinho pergunta com um português carregado, mostrando que não
é daqui.

Estou perdida. Perdidinha da Silva.

Ouço a conversa de Andrew com o homem que descobri que se


chama John, que é brasileiro, mas sempre morou nos EUA e o
americano chamado James, que é bem mais agradável de
conversar.

Eles conversam sobre o treinamento que irei fazer, mas não


chegam a entrar em detalhes sobre o quê irei fazer em Nova Iorque
nesse mês que ficarei lá.

Já faz duas horas que estamos aqui e eu ainda não entendi


muito bem o porquê de terem pedido minha presença. Talvez tenha
sido apenas para que os dois americanos pudessem me conhecer,
já que ocupei grande parte do assunto.

Estou conversando com James, treinando um pouco do meu


inglês, enquanto Andrew conversa com John sobre alguma coisa
que não consigo escutar daqui. Estou bem mais calma agora que
sei que não era nada com que eu deveria me preocupar e sinto-me
tola por ter ficado com medo de qualquer coisa que tenha passado
por minha cabeça quando Ana ligou para mim pedindo minha
presença aqui.
— Você precisa tirar um tempo para conhecer Central Park. –
James diz. – Na verdade, existem vários lugares onde uma turista
de primeira viagem tem por obrigação de ir conhecer.
Sorrio, concordando.
— Só espero conseguir fazer tudo isso que o senhor esta me
recomendando. – digo, desviando o olhar para Andrew e o pego
olhando para mim, arrancando-me um sorriso.
— Ah! – exclama. – Seu mês não será tão carregado assim. –
diz, chamando minha atenção de volta para ele. – Só na maior parte
do tempo.
— Bem, obrigada por esta informação, Sr. Smith. – digo um
pouco irônica. – Agora me sinto bem mais tranquila quanto a isso.
Ele ri, concordando.
— James, pare de flertar com a garota. Temos compromisso –
John chama, fazendo o homem na minha frente virar para ele e rir.
— Espero que possamos sair para tomar uma cerveja enquanto
estiver por Nova Iorque, amigo. – ele diz agora para Andrew.
— Claro. Sempre tem um tempo para coisas assim. – Andrew
sorri em resposta, indo acompanhar os dois homens até a porta,
voltando para mim. – Você tem passaporte?
— Não, senhor. – respondo.
— Tire um dia ainda esta semana e faça isso. – diz.
— Sim, senhor. – sorrio, segurando seu olhar, sentindo meu
coração bater mais acelerado.
Andrew aproxima de mim e me coloca em cima da mesa.
— Continue me chamando assim que não irei me responsabilizar
por meus atos.
Ele então prende meu cabelo, pousando a outra mão em minha
bunda e me aperta.
— Pedro tinha razão. – começa a dizer, passando a barba por
meu pescoço, onde me beija, causando um calafrio por todo meu
corpo. – Você tem uma bela bunda. – e torna a me apertar.

— Aqui não, And. – gemo, afastando-o.


Andrew segura minha mão para me ajudar a descer e arrumo
meu cabelo, assim como meus óculos.
— Não sabia que você usava óculos.
— Esqueci minhas lentes no seu apartamento. – respondo. – Ou
isso ou perdi em algum lugar. – ele concorda com a cabeça,
parecendo realmente surpreso por ter descoberto que uso óculos. –
A propósito. – digo, tirando sua chave do meu bolso. – Isso é seu. –
estendo a mão para ele, que apenas olha para o objeto.
— Fique para você. – diz com o cenho franzido e arregalo os
olhos. – Para o caso de precisar em alguma emergência. –
acrescenta.
— Acho que vou ter que dar uma chave do meu apartamento
para você agora. – rio, um pouco nervosa, guardando o chaveiro de
volta no bolso. – Mas realmente não precisava fazer isso.
Como se me ignorasse, Andrew pega suas anotações em cima
da mesa e me beija de leve nos lábios ao virar novamente para
mim, indo para a porta.
— Ana. – ele chama.
— Senhor?
— Ligue para Solange e peça para que adiante o quanto antes o
visto de Luara. – diz. – Preciso disso pronto até o final do mês.
Aproximo-me dele, vendo Ana do outro lado. Ela sorri para mim.
— Sim, senhor.
Andrew me olha outra vez, como se quisesse me dizer algo e,
voltando à atenção novamente para Ana, acrescenta:
— Espero você na minha sala para revisarmos a agenda da
semana. – e vai para o elevador.
— Ele é uma boa pessoa. – Ana diz, chamando minha atenção
para ela.
— Desculpa? – digo, sem entender.
— Não é nada, querida. – ela sorri, fazendo meu rosto se
aquecer. – Posso te fazer uma pergunta?

Franzo o cenho.

— Claro.
— Esses pontos ai... – começa a dizer, parecendo sem graça. –
O que houve?
— Ah! – exclamo. – Foi um pequeno acidente. Nada de mais. –
rio. – Um idiota me fechou no trânsito em São Paulo e acabei
batendo no volante. Por sorte foi apenas isso.
— São Paulo? – torna a perguntar e vejo um olhar intrigado em
seu rosto.
— Sim.
— Curioso. – ela sorri outra vez. – Bem! Preciso voltar ao
trabalho. – Ana bate uma mão na outra e sorri. – Como bem viu,
preciso revisar uma agenda ainda, que por acaso estava fora da
programação. Foi bom conhecê-la, Luara.
Seu comentário sobre a programação me faz rir.
— Digo o mesmo. – respondo, seguindo com ela para o
elevador.
— Sabe, Andrew bateu o carro dele em São Paulo esse final de
semana também. – Ana diz, apertando o botão para o último andar.
– Recebi uma ligação do seguro dele esta manhã. Graças a Deus
ele não se machucou. Porque esse menino sabe correr quando
quer.
— O trânsito é realmente uma completa loucura nos finais de
semana. – concordo, prendendo meu olhar no espelho do elevador,
sentindo meu rosto se aquecer para além de cem graus. Ana
cantarola algo para si mesma e o elevador para.
— Irei mandar um e-mail com uma lista de algumas coisas que
preciso para poder adiantar seu visto. – diz já saindo. – Até mais.

Tudo o que consigo fazer é sorrir até que o elevador feche por
completo.
Capítulo Dezessete
Sábado

Pouco mais de uma semana já se passou desde a última vez em


que eu vi Andrew. Ele viajou para Londres, para uma reunião com
uma empresa de lá e para passar um tempo com os pais. Quando
me contou isto, não pude deixar de sentir uma pontinha de inveja.
Mas, depois de tantos dias separados, amanhã ele finalmente
estará de volta e tenho que ser sincera, estou com saudades dele.

Aproveitei o dia de ontem para ir resolver algumas últimas


pendencias sobre meu passaporte, assim como Pedro havia me
orientado a fazer. Agora falta apenas aguardar a entrevista para tirar
meu visto, que já está agendado para dentro de alguns dias.

Como lá não demorou tanto tempo como da primeira vez,


aproveitei a tarde livre para comprar minha roupa para o baile de
décadas que irei com Pedro hoje e para fazer uma faxina aqui em
casa, porque realmente estava precisando.

No quarto que estava vazio, usei para montar meu escritório-


barra-biblioteca-quarto-de-hóspedes e ficou lindo, assim como havia
imaginado. Exceto por ainda ser um quarto. Mas como tenho
apenas dois aqui, vai ter que ser assim até que eu consiga comprar
meu próprio apartamento. Até porque as chances de eu receber
uma visita são mínimas e não tem uma necessidade de ter um
terceiro quarto.
Ouço o toque de meu celular e corro para atender, vendo o nome
de Pedro na tela.
— Mudança de planos. – ele diz do outro lado da linha. – Passo
para te pegar as oito. Tudo bem?
— Não precisa. – respondo. – Vou com meu carro mesmo. Não
pretendo ficar até tarde. – franzo o cenho. – Ou não pretende beber
hoje?
— Claro que sim! – exclama rindo. – Mas não disse que te
buscaríamos com o meu carro.
— Ah! Tudo bem então. – digo, entendendo o porquê do plural
em sua resposta. – Qualquer coisa eu volto de metrô ou táxi então.
— Ótimo. Agora... – ele faz uma pausa. – Só tenho um pedido
para te fazer.
— Sim? – pergunto com o cenho franzido. O quê mais ele pode
querer pedir?
— Fique linda e arrase esta noite, garota! – ele praticamente
grita, fazendo-me rir.
— Pode deixar.
Desligo o telefone e volto para o meu quarto, para terminar de
arrumar minhas coisas para a noite, deixando tudo em cima da
cama. Não quero acabar perdendo tempo para procurar algo e
receber gritos histéricos na minha cabeça. Não que Pedro já tenha
feito isso comigo alguma vez, claro.

Depois do almoço, pego meu livro e deito no sofá para ler um


pouco e, como a última vez que conversei com Andrew foi ontem à
noite, eu pego meu celular, digitando uma mensagem para ele:

Hoje vai ser o baile de décadas no Los Tres Chicos.


Pedro insistiu para que eu fosse com ele, então vou ir.
Mas pretendo estar em casa cedinho, para poder te receber
amanhã.
Faça uma boa viagem.
Entre uma cena e outra de A Viagem do Peregrino da Alvorada,
eu acabo adormecendo.

Quando acordo, percebo pelo tempo mais fresco que choveu.


Está bem mais gostoso de que antes.

Aproveitando isso, vou para um banho morno e deixo a água


escorrer por todo meu corpo, levando a canseira embora, deixando-
me bem mais relaxada.

Julie bem que poderia estar aqui. – penso. – Ela na certa iria
adorar esse baile. Sem mencionar que seria a oportunidade perfeita
para apresentar ela e Igor.

Já tem alguns dias desde a última vez que conversei com minha
amiga, mesmo que ligue quase diariamente para minha família. Mas
é que essa história de ter alguém dentro da BIT querendo acabar
com minha carreira lá antes mesmo de ter começado tem me
deixado bem nervosa. Ainda mais na ausência de Andrew. Isso e
além da suspeita de Bruno estar ou não sabotando alguns trabalhos
lá dentro... Pedro esta de olho nele já há dias. Coisa de antes de
And ter viajado.

Para ser sincera, eu ainda não entendo o porquê de eles não


terem dispensado ele até agora, já que apronta tanta coisa.

O problema de ser o possível “alvo” de uma armação, é que


tenho que trocar a senha do meu computador diariamente, enquanto
os outros trocam a cada dois dias. O que tem me deixado sem
ideias fortes para senhas. Então torço para que isso acabe logo.

Um baile dos anos sessenta, em uma discoteca dos anos


oitenta, exige nada mais, nada menos do que uma caracterização
de alto nível. O que me levou ao seguinte visual esta noite: uma saia
marrom com bolinhas brancas e uma blusinha de alcinha, marrom
bem clarinho. Um sapato de salto baixo de mesmo tom, fita branca
para o cabelo e óculos escuros personalizados.
O cabelo eu deixei todo solto, apesar do calor e passei uma
maquiagem bem fraquinha, apenas para dar uma cor a mais no meu
rosto. O batom é de um rosa clarinho também e, finalizando, um par
de luvas, na qual vou deixar para colocar quando estiver lá.

— Ainda falta algo. – digo, olhando-me no espelho.


Encontro em uma caixinha sob minha cama, uma rosa marrom,
na qual prendo na alça de minha blusa e volto para o espelho.
— Agora sim está ótimo. – sorrio para o meu reflexo quando a
campainha toca. – JÁ VAI! – grito em resposta, indo abrir a porta
para Pedro.

Pelo olho mágico, apenas confirmo minhas suspeitas, já que


havia deixado seu José avisado de que ele poderia subir sem
precisar informar. Ainda que já soubesse, não consigo deixar de
sentir o desapontamento por saber que ele não esta aqui. Que não
irei vê-lo até amanhã sabe-se lá que horas.

— Oi. – cumprimento Pedro com um sorriso assim que abro a


porta, recostando sob ela com um braço e o outro na cintura.
— UAU! Você A-R-R-A-S-O-U, garota! – exclama, tirando minha
mão da cintura, fazendo me girar. –O que foi que você fez aqui?!
Saiu direto de um filme e caiu no Rio de Janeiro, queridinha? – ele
ri. – Onde esta o Dom Juan que te fez trabalhar assim?
— A caminho. – respondo quase num sussurro, permitindo sua
entrada. Bem, tecnicamente ele está a caminho de casa. Suspiro ao
lembrar-me disso.
— Achei que precisaria trabalhar em você, mas pelo visto meu
trabalho já esta mais do que feito aqui.
— Então podemos ir? – pergunto, sentindo que se ficarmos aqui
mais dois segundos sou capaz de desistir de sair.
— Claro. Vamos. – ele estende a mão para mim e pego minha
carteira no móvel ao lado da porta, apoiando minha mão na sua e
saímos, parando apenas para trancar a porta. – Quero que você
conheça alguém esta noite. – diz.
— Claro. – concordo. – Desde que não esteja querendo arrumar
ninguém para mim.
Ele ri e passo na frente para chamar o elevador.
— Menina, você tem um traseiro incrível.

Sorrio realmente sem graça, sentindo que foi um completo


desperdício ter passado maquiagem para deixar minhas bochechas
mais rosadas, já que elas acabaram de ficar completamente
vermelhas.

Gastamos quase uma hora para chegar ao Los Tres Chicos e,


contando pela enorme fila, eu diria que toda a cidade veio para cá
hoje.

— Ali estão eles. – Pedro diz, levando-me até um grupo bem


mais à frente na fila e vejo Igor com uma garota que não reconheço,
mas que provavelmente é uma das duas da boate gay. Têm também
outros dois rapazes: um se chama Rodrigo, que é o novo namorado
de Pedro e ele é um gato. Sem tirar nem por. Alto e forte, com
cabelo estilo de índio e de pele morena, também igual índio. Talvez
ele seja descendente. O carro que viemos era o dele.

E o outro rapaz, Pedro apresentou como Felipe. Embora não o


conheça, seu nome não me é estranho. Ele é alto, provavelmente
com 1,85 de altura. Ombros largos e fortes, mostrando que também
é um frequentador de alguma academia. Seus olhos castanhos e
cabelo de mesma cor, penteados para trás, tendo adotado um
topete. Ele é tão gato quanto Rodrigo, mas não chega a ser igual a
Andrew. Não para mim, pelo menos.

— É um prazer conhecer a senhorita. – ele diz, pegando minha


mão para beija-la. Seu sorriso levantado somente em um canto de
sua boca.
— Como sinto falta do cavalheirismo da década de sessenta. –
comento com um sorriso divertido.

Só então é que percebo que todos eles estão basicamente com


o mesmo estilo de roupa e penteado, o que me faz rir.
Quando finalmente conseguimos entrar, Pedro procura pelo dono
para confirmar se nossa mesa está reservada e não demora até que
volte com um funcionário em sua cola, que nos leva até a parte
reservada.

Esta noite o salão esta ainda mais retro que o normal. O Jukebox
toca músicas ainda mais antigas e as pessoas dançam
animadamente. Os discos de vinil pendurados no teto refletem as
luzes emitidas pelo globo.

— O que gostariam de beber? – pergunta o rapaz que nos


guiava, assim que nos acomodamos em uma mesa ao canto.
Espero até que todos tenham feito seus pedidos, para somente
então fazer o meu:
— Um duplo Apple Martini. – digo e ele anota, já se retirando.
— Estou de carona hoje. – respondo dando de ombros.
— Estou disposto a pagar tudo o que você consumir hoje,
apenas para poder te ver bêbada. – ele diz, olhando diretamente
para mim.
— Ela não é tão boa assim. – Igor ri, sentado a dois lugares de
mim.
— Isso é um desafio? – pergunto, arqueando uma sobrancelha,
devolvendo seu olhar.
— Fiquei sabendo que ela é boa com desafios. – comenta a
outra garota, que na verdade chama Natália e não é nenhuma das
duas garotas da boate. – Não é, Igor? – ele não responde.
— Estou disposto a correr esse risco. – Felipe responde.
— Espero que esteja com a carteira cheia então, porque vai ter
que pagar tudo o que a Nath e eu consumirmos.
— É isso ai, garota! – ela exclama, erguendo a mão para um Hi-
five.
— Façam suas apostas, crianças! – Rodrigo diz. – Eu aposto na
Luara. Ela tem fibra e vai vencer essa facinho.
— Eu fico com o Felipe. – Igor diz. – É óbvio que os homens são
bem mais resistentes e melhores que as mulheres.
— Provavelmente foi por isso que você perdeu no bilhar para
mim. – comento como quem não quer nada e os outros riem dele.
— Aposto na Luara também. – Natália diz. – E dobro a aposta do
Igor, só para provar como ele está errado.
— Sabe, Igor, sua fala pegou bem mal. – comento. – “Fico com o
Felipe”. Sempre achei que você fosse mais homem de que isso.
O garçom finalmente chega com nossos drinks e petiscos.
— Que os jogos comecem! – exclamo, tomando um pouco do
meu.
Faz apenas uma hora que estamos aqui e já sinto minha cabeça
levemente zonza, mas não chego a estar completamente bêbada. É
apenas um nível divertido além da conta e nada que possa dar
trabalho a qualquer um.

Igor saiu para dançar com Natália e Pedro foi aprontar algo com
Rodrigo já tem algum tempo, o que me faz ter a sensação de que
estão armando algo para cima de mim.

— Quer dançar? – Felipe pergunta ao meu lado, fazendo-me


lembrar de que não estou aqui sozinha.
— Se não se importar de eu pisar em seu pé. – respondo com
um sorriso sem graça e ele nega, estendendo a mão para mim.

Na pista de danças, um rock bem anos sessenta toca, animando


todo mundo.

— Sinto falta da época em que essas músicas eram o auge. –


grito para que Felipe possa me ouvir apenas da música alta.
— Você fala como se tivesse vivido naquela época. – ele
responde com um sorriso encantador.
— E quem te garante que não vivi? – respondo e a música
muda, dando lugar a uma mais romântica e lenta, fazendo com que
Felipe se aproxime de mim e sinto seu hálito fresco quando fala em
meu ouvido:

— Com essa roupa, eu não duvido nada que realmente tenha


vivido. Mas não podemos negar uma coisa. – ele faz uma pausa. –
Você é a velha mais gostosa e em forma que já encontrei em toda
minha vida.
Seu comentário me faz rir, porque sei que ele esta tirando com
minha cara. Apoio minhas mãos em seus ombros para que
continuemos a dançar.
Aqui com Felipe, eu não sinto medo algum com sua proximidade.
Bem diferente de como me senti enquanto dançava com Bruno e
suas tentativas de me beijar a força. Mas também não sinto desejo
por ele, de qualquer maneira que seja. Bem diferente de como eu
me sinto quando estou com Andrew. Seria até aceitável se eu
ficasse com ele. Fecho os olhos com o pensamento. Afinal, quem
me garante se ele não saiu com alguma inglesa bonitinha em
Londres?
Sinto uma repulsa dentro de mim com as duas ideias. Isso
jamais!
— O que está acontecendo comigo? – murmuro para mim
mesma.
— Desculpe? – Felipe pergunta sem entender.
— Nada. – respondo, balançando a cabeça de um lado a outro. –
É só que você me deve um drink e ainda estou longe de ficar
realmente bêbada.
— Longe?! – exclama. – Você está trançando as pernas, garota!
Não dou mais copos para que esteja correndo para o banheiro. – ri.
— Ok! – digo, puxando-o até o bar. – Me vê uma caipiroska
mista de frutas. – peço ao barman. – E para o cavalheiro aqui,
uma... – viro para Felipe, sem ter a menor ideia do que ele bebe.
— Tequila Sunrise. – responde. – Não sou tão fraco quanto você.

Quando voltamos para nossa mesa juntos dos outros, Pedro me


olha com uma cara que diz exatamente: “Eu sei o que vocês
estavam aprontando, seus safadinhos” e sorri para mim. Mas não
era nada do que ele possa pensar.

— Ela esta bebinha já. – Felipe informa, sentando-se.


— Engano o seu. – digo, sentando entre Natália e Igor no sofá
do canto. – Dou conta de muito mais do que você tem para oferecer.

É só quando todos começam a rir e Pedro a ter uma crise que


percebo o duplo sentido em minha frase. O que me faz sentir uma
vergonha tremenda, porque não pensei nisso.

— Como você aguenta? – Natália pergunta depois de provar da


minha bebida.
— Sei lá. Deu vontade de provar desse e bem...
— Não! – ela me interrompe, rindo. – Como você aguenta o Igor.
— Ah! – exclamo também rindo. – Não aguento. Ele é um idiota
e passa grande parte do tempo indo na minha sala para jogar coisas
em mim só para provocar. – explico. – Mas ele é fraco e ruim em
qualquer coisa, o que me da uma boa vantagem em cima dele. –
novamente começo a rir. – Mas, apesar disso ele é um bom amigo.

Ouço a história animada de Pedro sobre como conheceu


Rodrigo na noite em que levou Igor para a boate gay. Uma história
até bonitinha de se ouvir se eu não estivesse com a cabeça
alucinando. Talvez não devesse ter bebido tanto só para provar
algo, sua doida. Franzo o cenho, olhando para além de Felipe.

— O que foi? – ele pergunta e franzo o cenho ainda mais, numa


falha tentativa de disfarçar o sorriso que começa a se formar em
meu rosto.
— Acho que ela se apaixonou. – Igor provoca.
— O que você esta fazendo aqui? – praticamente grito, fazendo
com que todos se virem, denunciando a presença de Andrew, que
está parado pouco atrás de Felipe.
— Não fale assim, Luara! – Pedro exclama. – Ele é seu chefe.

Andrew sorri sem tirar os olhos de mim.

— Não hoje, Pedro. – diz com a voz levemente rouca e o olhar


preso em mim. Minha vontade é de pular por cima dessa mesa, na
frente de todos apenas para poder abraça-lo. – Houve um
cancelamento em um voo mais cedo. Então aproveitei que cheguei
antes e resolvi aceitar seu convite, Pedro.

Embora diga para todos aqui, seu olhar não sai de mim em
momento algum. Ouvir suas palavras faz com que meu coração
bata mais acelerado dentro de mim.
— Só faltava você aqui. – Pedro diz em resposta, pulando para a
cadeira ao lado para que Andrew sente-se junto de Felipe.
— O que esta aprontando? – pergunta para ele.
— Ah, o de sempre. Apenas provocando a jovem ali. – responde,
apontando para mim com a cabeça, fazendo com que Andrew olhe
para mim outra vez, com uma das sobrancelhas arqueadas, como
se me pedisse uma explicação a respeito. – Você tinha razão. – diz
baixando a voz, mas ainda consigo escuta-los.
— Eu sei. – Andrew me da um sorriso de lado.
— Ai, droga! – exclamo. – Merda! Merda! Merda! – repito várias
e várias vezes, escondendo meu rosto entre as mãos.
— O que houve? – Natália pergunta preocupada.
— Hm... Nada. – respondo, olhando para Andrew rapidamente. –
Eu só... Preciso ir ao banheiro. Urgente. – e levanto, enfiando-me
entre as várias pessoas, direção as placas iluminadas que indicam
os banheiros Masculino e Feminino.
— Como eu pude ser tão idiota e considerar ficar logo com o
melhor amigo dele? – pergunto ao meu reflexo no espelho. – Eu
nunca me perdoaria se fizesse algo desse tipo.

Fecho os olhos, correndo a mão pelo rosto, levando meu cabelo


para trás.

Não é exatamente como se Felipe tivesse tentado qualquer coisa


comigo. Muito pelo contrário. É como se, durante todo esse tempo,
estivesse apenas me testando. E eu, idiota que sou quase que cai.
Ou pelo menos por uma breve fração de segundos, já que recuei
bem antes disso. Mas ainda assim, apenas o pensamento é
imperdoável.

Saio do banheiro e sigo para o bar, que agora está bem mais
vazio de que antes. Consulto meu celular, notando pela primeira vez
que já passa da meia noite. O que significa que passei mais de meia
hora escondida no banheiro.

— Uma água sem gás, por favor. – peço ao barman e ele me


entrega uma garrafa.
Tomo metade de uma só vez, como se isso fosse me dar
coragem para voltar lá e fazer de conta que não sinto nada por
Andrew e que não sou apaixonada por ele. Para fazer de conta que
sua presença não me afeta em nada.

— Vamos lá. – digo, tomando o restante da água e jogando a


garrafa no lixo.
—... Ela esta vindo ai. – Igor diz, apontando com a cabeça para
mim. Virei o assunto enquanto estive fora?
— Alguém quer dançar? – pergunto parada atrás de Andrew e
Felipe, ignorando a frase que ouvi.
— Eu passo. – Felipe responde, olhando para mim. – Você é
uma péssima dançarina.
— Sou melhor que você. – defendo-me.
— Você não é nada cavalheiro. – Andrew diz, levando sua
cadeira para trás e levanta. – Me concede está dança linda
senhorita? – pergunta, estendendo a mão para mim, fazendo com
que todos meus órgãos internos se revirem quando pouso minha
mão sobre a sua e ele me puxa para perto, pousando um rápido
beijo ali, sem desviar os olhos de mim.

— Aprenda a ser mais gentil, Felipe. – digo, dando as costas


para eles, levando Andrew para a pista de dança, enquanto ouço as
risadas atrás de nós.

Embora eu pareça forte, minhas pernas estão moles pelo toque


dos lábios de Andrew em minha mão.
Enquanto dançamos, nenhum de nós diz uma única palavra. Não
que tenha como com essa música.
Andrew acompanha meu ritmo e deixo uma pequena distância,
ainda lutando contra uma vontade louca de abraça-lo e beija-lo e
fazer tantas outras coisas. Mas sei que não posso fazer nada disso,
então deixo minha mente vagar com a música até que ela termine.

— Quando você chegou? – pergunto assim que o silêncio se faz.


— Tem algumas horas. – ele responde. – Fui direto ao seu
apartamento, achando que você estivesse lá.
— Não está cansado? – pergunto olhando de um lado a outro.
Outra música começa a tocar.
— Morrendo. – ele ri. –Mas queria ver você ainda hoje. – da de
ombros. – Prioridades são prioridades.
— Sou uma prioridade? – pergunto contendo o riso.
— Não sei. – diz. – A recepção que tive antes...

Merda! Aquela cena que dei... Paro de dançar, fazendo com que
ele também pare. É melhor dizer a verdade a esconder isso dele.

— Desculpa. – peço. – Eu meio que me senti culpada por ter


considerado ficar com Felipe só porque você estava longe. –
balanço a cabeça de um lado a outro. – Ele não tentou nada, claro.
Eu só... Eu não sabia se você estava com alguém lá e isso mexeu
comigo. E quando você chegou e sentou do lado dele, percebi o
porquê de achar o nome tão familiar.

— Achei que tivesse dito que não haveria “Vadias Aleatórias” ou


qualquer outro entre nós enquanto estivéssemos nisso. – ele diz
com o cenho franzido, ignorando todo o restante do que eu disse.
Volto a dançar para não chamar atenção de ninguém. – Eu nunca
faria isso.

— E foi por isso que me senti péssima pelo que diz. – confesso.
– Ou pensei em fazer.
— Você faria? – ele pergunta quando a música termina mais
uma vez.
— Você sabe que não fiz quando pude, And. – respondo. – É
claro que não.
Andrew sorri, puxando-me para perto dele pela primeira vez e
dançamos ao som de Yes, de Tim Moore.

— Você está linda com essa roupa. – sussurra em meu ouvido,


guiando-me ao seu ritmo e repouso minhas mãos não em seus
ombros, assim como fiz com Felipe. Mas no peito, sentindo seu
coração acelerado, assim como o meu.

— Senti sua falta. – sussurro, apoiando a cabeça em seu peito.


— Senti sua falta também. – suas palavras arrancam um sorriso
de mim.
Andrew segura em meu quadril, enquanto mantenho minhas
mãos presas em sua camisa.
— O que houve? – pergunto quando ele para de dançar e fica
me encarando com uma expressão estranha até.

— Thomas disse que você gostava de mim. – Eu não acredito


que ele fez isso! Fui traída pelo meu próprio irmão! Sinto todo meu
corpo ficar tenso enquanto ele me olha. – Foi antes do seu acidente.
– completa, tocando minha testa. – E isso me fez pensar em
algumas coisas...

— E isso é algo ruim para você? – aperto sua camisa entre


minhas mãos, sentindo um nó no estomago. Ele sorri de lado.
— Quero saber de você. Não dele. – responde, apoiando a testa
na minha, enquanto dançamos The Time Of My Life.
Desvio o olhar de Andrew, incapaz de continuar segurando por
muito tempo, mas volto a olha-lo outra vez, decidida a dizer a
verdade, seja lá qual for sua reação.

— Uma parte minha não queria sentir – digo, encarando seu


peito. –, mas não é como se eu tivesse tido muita escolha.
Sinto seu toque em meu queixo, fazendo-me olhar para ele.
— Apenas me diga: sim ou não. – pede. – Eu preciso saber isso
por você e mais ninguém.
Mordo o lábio inferior, sentindo seu coração bater mais acelerado
de que antes.
— Sim. – sussurro. – E eu não sei se isso é algo bom ou ruim,
porque eu também não sei o que você espera disso tudo que esta
acontecendo entre nós.

Andrew envolve meu rosto com as mãos, segurando meu olhar


unicamente para ele.

— Espero que isso possa responder sua pergunta. – sussurra,


beijando-me com força, deixando óbvio seu desejo por mim e me
pego correspondendo seu gesto com igual intensidade.
Desço minhas mãos por seu peito, parando apenas no quadril,
onde o envolvo em um abraço forte e ele prende meus cabelos,
guiando por um beijo mais tento.

— Isso mais do que responde qualquer dúvida que eu pudesse


ter sobre isso. – sussurro contra sua boca, sorrindo.
— Que bom. – diz, puxando meu lábio inferior. – Porque não sou
muito bom em dizer certas coisas.

Sorrio ao ouvir suas palavras. Suas mãos agora estão em meu


quadril e sinto meu coração muito, muito acelerado.
E eu o beijo, prendendo seus cabelos bagunçados com uma
mão, sentindo meus pés se elevarem alguns centímetros do chão
enquanto nos beijamos.

— AI MEU DEUS! – ouço alguém gritar atrás de Andrew e me


afasto imediatamente. – O QUE VOCÊS ESTÃO...

Andrew vira para ver quem é, sem tirar suas mãos de mim. Já
estou sinto-me petrificada ao ver Pedro nos olhando. As mãos na
cabeça e um olhar de completo espanto no rosto.

— Ai, eu sei que vocês estão se pegando. Mas... Tão rápido? –


sua pergunta é direcionada para mim. – Ele acabou de chegar,
Luara. E o Felipe ficou em cima de você a noite toda!
— Ele não faz exatamente meu tipo. – sussurro, apertando a
mão de Andrew.
— Seguinte, vem cá. – Andrew diz após certificar de que mais
ninguém esteja nos olhando e arrasta Pedro pela gola, sem soltar
minha mão.
— Achei que você não ficasse com ninguém do trabalho. – ele
diz quando viramos no corredor que leva aos banheiros.

— E não fico. – Andrew responde. – Isso aqui – aponta de mim


para ele. – começou antes de ela começar a trabalhar lá.
— Mais ou menos. – interrompo. – Eu...
— Meu Deus! – Pedro exclama, andando de um lado para o
outro. – Foi por isso que você sumiu na reunião. Os dois.
— Não tínhamos ideia de que era a mesma pessoa que
conhecemos antes. – explico. – Foi só depois do velório da minha
avó... Ele foi o único amigo que tive aqui e a única pessoa com
quem consegui me abrir a respeito.

Toda a emoção que estava sentindo até instantes atrás parece


ter sumido. De repente é como se tivéssemos cometido um grande
erro ao nos expormos de tal maneira, tão cedo.

Pedro para de andar, como se tivesse completado um grande


quebra-cabeça.

— Espera. – diz, virando para nós dois. – Você – aponta para


Andrew. – defendeu ela na reunião para escolher quem iria para
Nova Iorque, mas não sabia que era ela.

Andrew passa as mãos pelos cabelos e sei que esta ficando


irritado. Se ele já não havia aderido o “topete anos sessenta”, agora
esta ainda mais longe disso.

— Pedro, presta atenção. – diz, segurando-o pelos ombros. –


Ninguém pode saber que estamos juntos. Entendeu? Não até a
viagem.
— VOCÊS ESTÃO JUNTOS?! – grita. – Menina, o que você tem
para conseguir isso assim?
Sinto o olhar de And e meu rosto se aquece.
— Pedro... – Andrew começa, mas é interrompido.
— Eu não vou contar nada para ninguém. – diz. – Se alguém
souber, não terá sido por mim. – sorri. – Mas, se for realmente sério,
por favor, assumam isso na viagem. – And concorda com um gesto
de cabeça e Pedro ri. – Eu vim perguntar se queria carona para
voltar, mas parece que você já esta muito bem acompanhada. Vou
dizer ao pessoal que você encontrou com uma amiga que mora aqui
perto e foi para casa e Andrew saiu com alguma estranha.
Olho para Andrew quando ele diz tudo isso. O alivio é quase que
de imediato. Aperto a mão de And.

— Obrigado. – ele diz.


— Estou torcendo por vocês. – Pedro responde, cruzando os
dedos e sai com um sorriso de lado a lado.
— Eu achei que ele fosse simplesmente surtar e começar a dizer
uma lista enorme do porque isso não poderia acontecer. – desabafo.
— Antes daquela reunião ele estava dizendo que eu poderia ficar
com você em Nova Iorque, porque seria totalmente normal. – And ri.
– Só que ele disse que, dependendo do que acontecesse, ninguém
aqui precisaria ficar sabendo.

Entreabro minha boca, tentando acalmar minha respiração e


meus batimentos. Andrew passa o polegar por meus lábios.

— Mal sabe ele que pretendo usar isso como uma desculpa para
assumir nossa relação. – sussurra, pousando um beijo em meus
lábios e sorrio.
— Só me leva para casa. – peço. – Eu ainda estou tremendo
aqui. – ele sorri e concorda.
— Fica comigo essa noite. – diz em resposta. – Não posso te
garantir que conseguiremos fazer algo, porque estou realmente
cansado e não sei como vou fazer para voltar. Mas...
Ele para de falar e fecha os olhos, inspirando fundo.
— Quero passar a noite com você. Apenas isso.

Sorrio com suas palavras e ele abre os olhos outra vez. Quando
foi que chegamos a esse ponto?

— O que você esta fazendo comigo? – pergunta, passando o


braço por minha cintura para que possamos sair. Balanço a cabeça,
sem conseguir acreditar no que acabou de acontecer. Tanto pela
conversa com Pedro e no fato de ele nos ter pegado nós dois no
flagra, como também pelo beijo em publico.

— Você é o único homem aqui que não esta com jaqueta de


couro e topete. – comento, olhando para Andrew. Ele esta usando
jeans e uma camisa regata preta colada ao corpo.

— Sou mais o estilo Bad-boy. – responde quando chegamos do


lado de fora. – Mas precisei trazer uma, para o caso de ser traje
obrigatório esta noite.

Andrew está deitado ao meu lado em sua cama. Sua mão,


insistente e teimosa, penteando uma mecha de cabelo para trás da
orelha, ora acariciando minha bochecha. Seu toque me faz fechar
os olhos, mas sei que é ele quem está cansado. Sinto-me
completamente dispersa por conta dos drinks que tomei.

— Por que você não descansa? – pergunto ao abrir os olhos


outra vez.
— Não estou com sono. – mente. – Quero conversar.
— Aham. – sorrio. – E sobre o que você quer conversar? –
pergunto, agora sentando sobre minhas pernas. Ele apenas da de
ombros em resposta. – Então vira de bruços. – peço, fazendo-o
franzir o cenho. – Apenas confie em mim, And.

Com um sorriso cansado, mas lindo, ele me obedece, virando o


rosto para o meu lado.

— E agora? – pergunta e, em resposta, subo em seu quadril,


apoiando minhas mãos em suas costas. – O que você está
fazendo? – torna a perguntar.

— Massagem. – respondo, sentindo um sorriso infantil tomar


forma em meu rosto. – Posso ver no seu rosto que está cansado. Só
é teimoso como uma porta.

Andrew ri enquanto passo minhas mãos por suas costas,


apertando em alguns pontos.

— Não sabia que portas eram teimosas. – diz quando aperto um


de seus ombros para baixo.
— Já viu aquelas que você insiste em deixar aberta e elas
insistem em fechar se não tiver algo segurando? – pergunto, agora
correndo minhas mãos por seus braços, trazendo de volta para as
costas.
— Meu Deus! – ele exclama junto de um gemido. – Você tem
mãos de Anjo!

Sinto meu rosto se aquecer com seu elogio, mas não digo ou
faço nada além de continuar com a massagem por mais algum
tempo, até que sinta seu corpo relaxar sob o peso do meu e pulo
para o seu lado, para poder apenas passar a mão por suas costas
até ter certeza de que ele esteja dormindo, o que não leva muito
tempo para acontecer.

Deitando ao seu lado, pouso um beijo em seus lábios antes de


me arrumar para dormir junto dele.

Acordo em algum momento da noite, sentindo um calor imenso,


assim como um peso em minhas pernas e costas. Andrew está
agarrado em mim, mantendo-me presa a um abraço quente e
apertado. Qualquer tentativa de sair daqui por qualquer coisa que
seja ele acorda.

Mas ainda assim eu tento, porque estou suando muito.

— Fica aqui. – ouço a voz rouca de And atrás de mim quando


tento levantar seu braço.
— Está quente! – exclamo quando me puxa para mais perto,
fazendo-me sentir sua ereção em minha bunda.
Andrew esfrega o nariz em meu pescoço, fazendo com que todo
meu corpo se arrepie com seu toque. Sua barba por fazer a uns dois
dias não me ajuda muito.

— Eu quero você. – sussurra em meu ouvido, puxando o lóbulo


de minha orelha para dentro da boca. – Mesmo que só uma vez. – e
torna a esfregar o nariz em meu cabelo e pescoço.
— Você está dormindo, Andrew. – digo, conseguindo virar para
ele, que enfia uma de suas pernas entre as minhas. – Bem, mais ou
menos, pelo menos. – concluo ao sentir sua ereção novamente. Ele
ri.
Esticando o braço para trás, Andrew acende o abajur e consigo
enxerga-lo melhor e, virando outra vez para mim, ele segura minha
mão, pousando um beijo nela. Seus olhos estão escurecidos,
apesar da luz fraca. Mesmo que negue, eu também o quero. Por
mim teríamos feito à noite toda, até que não aguentássemos mais.
Então daríamos um pequeno intervalo, apenas para recuperar as
energias e voltaríamos a fazer até que o final de semana
terminasse.

Coloco minha mão em seu quadril, prendendo meu polegar no


elástico de sua cueca. Não vou negar meus desejos por esse
homem incrível.

Andrew sorri.

— Tinha certeza que não iria fazer isso comigo. – diz, puxando-
me para um beijo lento.
— Precisei lutar contra todas minhas vontades para te fazer
dormir ao invés de fazermos sexo. – sorrio quando se afasta,
apoiando a testa na minha. – Você não é o único que tem desejos.
— E qual é o seu desejo nesse instante? – pergunta. Sua voz
bem mais rouca.
— Ter você agora. – respondo.
— Seu desejo é uma ordem, minha linda. – diz, colocando-se
acima de mim e prendo seu rosto com as mãos para beija-lo,
sentindo as suas em cada parte do meu corpo, causando-me
calafrios. – Como eu senti falta disso aqui. – sussurra para si
mesmo, descendo a boca entre meus seios.

— Apenas deles? – pergunto apenas para provocá-lo e, em


resposta, Andrew toma meu mamilo com a boca, puxando-o. Suas
mãos, de maneira incrível e de se admirar, tiram minha calcinha,
fazendo o mesmo com sua cueca e o sinto roçar em minha perna. –
Por favor... – gemo, prendendo o lençol debaixo de mim.

— Não vamos apressar o melhor da noite, linda. – diz, olhando-


me por cima. – Vamos com calma. Parte por parte. Apenas nós essa
noite. Quero te sentir gozar na minha boca. Quero te sentir
estremecer e te fazer gemer com meu toque. – então desce,
beijando minha barriga em cada parte, demorando-se um pouco
mais próximo ao umbigo, como se prolongasse sua tortura. Até que
sinto seu dedo entrar em mim, assim como também sinto sua boca
me beijando. Lá!

— AH! – gemo alto, prendendo seu cabelo com a mão,


contorcendo-me com sua tortura. – And... – seu nome me escapa
em um gemido baixo e rouco enquanto sinto sua língua me
molhando, levando-me a um orgasmo intenso.

Andrew afasta para pegar o preservativo que colocou sobre o


criado quando chegamos e vejo seu sorriso enquanto o veste.
Virando para mim, vejo o olhar desejoso em seu rosto.

— Está pronta? – pergunta, abrindo minhas pernas para ficar


entre elas.

Com a respiração ainda ofegante, eu sorrio. Não sei se tenho


forças para responder.
Andrew passa seu pau em minha entrada, colocando a cabeça e
tira novamente. Então passa dos lados, provocando.

— Por favor... – gemo quando coloca na entrada outra vez. Meus


olhos apertados por uma fraca tentativa de controlar meu desejo.
— Você não me respondeu. – sussurra.
Abro os olhos, rindo.
— Porra, Andrew! – exclamo. – Tem certeza de que você ainda
quer uma resposta para isso? Quer dizer, você sabe que estou
louca por você desde que chegou naquela boate e ficou me
encarando com aquela cara de “eu quero foder você atrás desse
salão. No banheiro, em cima da mesa para que todos nos vejam...”.
– solto um suspiro, tentando não rir com minhas palavras. – Se quer
uma resposta, aqui esta: eu quero que você me foda, porque estou
há dez dias sem transar com você e estou quase subindo pelas
paredes, porque quero me lembrar do motivo de estar toda dolorida
quando acordar amanhã.
Andrew sorri para mim como se minhas palavras não tivessem
efeito sobre ele. Ao invés disso, continua passando seu membro de
um lado a outro, com um sorriso no rosto.

— Na verdade eu quero fazer isso com você desde que disse


que gostava de mim. – ele sussurra, colocando-se em mim de
vagar. – Quero transar com você até amanhã de manhã e por todo o
dia.

Eu o sinto latejando dentro de mim. Tão quente, apesar da


camisinha. Enquanto se move de vagar, levando-me ao seu ritmo,
arrancando vários gemidos de mim.

— É só porque você me disse a verdade sobre o que eu temia. –


diz, pairando seu rosto a centímetros do meu. – E aquilo me deu
mais um milhão de coisas para pensar. Mas quando me perguntou o
que eu sentia... Aquilo. – então fecha os olhos, dedicando-se
apenas aos movimentos que nos leva ao ápice da nossa relação.
Suas estocadas agora são mais fortes e arrancam gemidos mais
altos de mim. – Merda! Goza para mim, Luara! – pede, estocando
com ainda mais força e sinto meu corpo se entregar ao seu pedido
quando gozo, sentindo Andrew também se entregar a mim. – Eu
poderia fazer isso com você minha vida toda. – sussurra, beijando
meus lábios com uma lentidão que chega a me doer mais do que
qualquer coisa. Seu membro ainda dentro de mim, pronto para a
segunda rodada.

— Eu quero de novo. – sussurro movendo meu quadril, atiçando


seu pau em mim. – Já que você me acordou, então arque com as
consequências.

Andrew sorri e sai de mim para poder tirar a camisinha e pegar


outra. Assim como eu havia imaginado, ele está duro como o bom
amigo de qualquer mulher deve ser.
Quando ele volta para a cama, eu o empurro para que deite e
desço minhas mãos por sua barriga, envolvendo seu pau com
minha boca.
— PORRA! – Andrew exclama quando o escorrego até o fundo
da garganta sem engasgar.
Capítulo Dezoito
Sexta-feira

Nem consigo acreditar que semana que vem já vai fazer dois
meses desde que me mudei aqui para o Rio de Janeiro. Apenas
dois meses e tanta coisa já mudou na minha vida em tão pouco
tempo. Às vezes eu meio que sinto que fui forçada a mudar para
poder acompanhar tudo isso que vem acontecendo na minha vida e
agora tem essa viagem para o exterior também, que decididamente
não estava nos meus planos para tão já. Com ela vem à chance de
uma grande proposta para subir de cargo e ser mais do que o que
sou atualmente.

Mudanças são de fato necessárias e com elas sempre vem


nosso amadurecimento. Agora faltam apenas duas semanas para
meu grande dia em Nova Iorque. Duas semanas e cedo recebi uma
ligação dizendo que meu passaporte havia atrasado, mas que
entregariam na segunda-feira. Máximo terça. Assim espero, pelo
menos. Ou então Andrew irá sozinho, já que não posso ir a lugar
algum sem ele.

Pensar no tempo em que falta para que eu embarque, faz pensar


também que faltam somente duas semanas para o meu aniversário.

Até poucos dias atrás eu tinha planos de ir para São Paulo no


final de semana dele, para passar meu aniversário com minha
família, assim como sempre fiz desde minha existência. Mas
infelizmente estarei há muitas milhas de distância, já que viajaremos
um dia antes, na quarta. Acho que não preciso nem mesmo dizer o
tamanho da irritação que senti com isso quando Andrew me disse a
data. Por outro lado, sei que é importante para mim, que não posso
largar tudo para trás assim apenas por um capricho meu. Para falar
a verdade, ele apenas soube como me senti a respeito disso por ser
meu namorado. Do contrário, tudo o que eu poderia ter feito seria
ficar chateada quando Pedro me deu a notícia oficialmente.

O telefone em minha mesa toca e atendo.

— Luara, chegou um pacote aqui na recepção para você. –


Daiane informa. – Preciso que assine o recibo para mim.
—Já estou descendo. Obrigada. – digo, colocando o fone de
volta no lugar, levantando-me para sair.

No início da semana comprei pela internet um equipamento de


espionagem, digamos assim. É uma caneta espiã e outras duas
micro câmeras, e pedi para que entregassem aqui, já que é onde irei
usa-las.

Em uma conversa que tive com And no domingo, ele me contou


que Pedro havia lhe passado algumas informações sobre o pessoal
aqui do TI andar reclamando de Bruno, sobre algum problema que
estava dando no computador deles. De fato vi e ouvi o Cláudio e o
Mateus conversando sobre isso. Mas, o que realmente me fez
querer comprar esse material, foi depois que Andrew comentou
sobre John ter dito para que ficasse de olha em mim, porque alguém
havia falado mal de mim para ele. Não exatamente nessas palavras.

Hoje pela manhã eu instalei no meu computador um programa


que registrasse cada coisa que eu fizer nele. Cada página aberta ou
senha digitada. Cada código de um programa que eu esteja
trabalhando... E apenas eu terei acesso a ele, já que é um programa
oculto. A pessoa, ele ou ela, teria que ser muito hacker para
conseguir descobri-lo. O que, considerando que estou em uma
empresa de tecnologia, as chances de ter alguém que seja assim
não são poucas.

Agora, as câmeras são exclusivamente para o caso de alguém


estar entrando em minha sala para mexer em qualquer coisa.
A caneta vai ficar junto das minhas, posicionada para capturar a
face do “visitante indesejado”. As câmeras ficarão em um quadro
que tem na parede atrás de mim e a outra ao meu lado. Tenho tudo
pronto e planejado para isso.

Ok. Talvez eu esteja ficando paranoica um pouco. Mas a questão


é: eu estou trabalhando dia e noite em um trabalho na qual terei que
apresentar para a Nex Ae no final do treinamento e já soube que o
pessoal lá é exigente. Será o mesmo que apresentar meu TCC para
a banca da faculdade. Só que com um pessoal muito mais rigoroso.
E é exatamente por isso que estou tentando me prevenir, já que
ninguém tomou uma providencia maior.

— Onde elas estão? – pergunto para Daiane assim que chego à


recepção e ela tira uma caixa de debaixo de sua bancada,
colocando-a em cima, entregando o recibo para que eu assine.

Não é um pacote grande, nem pequeno. Para qualquer pessoa


que me veja com ele dirá que comprei mais alguns livros, assim
como já fiz algumas outras vezes aqui. As únicas pessoas que
sabem o que realmente é somos Andrew, eu e o vendedor da loja
que comprei online.

— Obrigada. – sorrio, devolvendo o recibo para ela, pegando a


caixa para voltar até minha sala e instalar tudo como planejado.

Em menos de meia hora, tenho tudo devidamente instalado e em


seus devidos lugares. Faço os testes para ter certeza de que
conseguirei ver o que preciso. E sim, tudo como imaginei antes.
Sinto algo bater em minha cabeça e uma bolinha de papel cair
em minha mesa.

— Cuidado com a cabeça, Brudosck! – ouço a voz de Igor vinda


da porta.
— Joga papel na mãe, seu infeliz! – grito para ele, jogando a
bolinha de volta para ele. – Se não tem mais o que fazer, então
arruma algo!
Do outro lado da porta ouço alguém rir e o vejo fechar a porta,
fazendo com que a bolinha bata contra ela.

Faltam apenas três horinhas para o fim do expediente e minha


folga, na qual tenho planos de fazer absolutamente nada nesses
dois dias, além de ficar em meu apartamento com uma bela caixa
de bombom, pipoca, filmes e seriados. Só que eu acho que Andrew
não vai desistir tão fácil de tentar me convencer a ir para aquele tal
“lugar misterioso” com ele.

Sentindo uma vontade enorme de usar o banheiro, saio de


minha sala, percebendo apenas quando já estou nele que deixei a
porta de minha sala aberta. Apertada do jeito que estou, nem em
sonho posso pensar em voltar lá antes de fazer xixi.
— Luara! – ouço alguém me chamar quando estou voltando para
minha sala. É Isabeli.
— Olá. – digo.
— O que você pretende fazer hoje? – ela pergunta e faço uma
breve retrospectiva sobre meus planos: N-A-D-A.
— Até onde eu saiba nada. – respondo, mantendo o olhar longe,
para o corredor que leva para minha sala. Já tem algum tempinho
que sai e não estou me sentindo muito confortável.
— As meninas e eu iremos a um barzinho hoje. Não quer ir? –
convida. – Tem muitos solteiros por lá. Aposto como você iria se
deliciar.
Faço gesto para ela, para que me acompanhe até minha sala.
— Para ser sincera, Isa – digo quando começamos a andar. –,
eu realmente tenho planos para não fazer nada durante o final de
semana. Até já me chamaram para sair, mas não estou afim.
— Qual é, Lu?! – exclama. – Vamos! Vai ser legal.
Sorrio para ela.
— Sei que sim. Mas tenho esse projeto para terminar e tanta
coisa para fazer, que não tenho dormido direito durante a semana
toda. Então...
— Ah, tudo bem, então. Mas caso mude de assunto você tem
meu número.
— Irei me lembrar disso. – respondo e ela se despede, deixando-
me sozinha pelo caminho restante.

Paro de frente para a porta fechada da minha sala e fico


encarando a madeira por um tempo. Tenho mais do que certeza de
que a deixei aberta quando sai e mais ainda que os meninos não se
da à mínima quando vê a porta do outro quando vê que a sala esta
vazia.

Uma parte minha quer ficar plantada aqui, até que alguém saia lá
de dentro, provando minhas suspeitas. Já a outra quer escancarar a
porta e pegar o filho da mãe no flagrante. E é exatamente essa
parte de mim que dou ouvidos, porque ela esta na TPM e ficando
muito “puta”.

Abro a porta de uma só vez, fazendo com que a maçaneta bata


contra a parede e volte para mim. Ao ouvir o barulho da batida, uma
cabeleira loura atrás do monitor em minha mesa pula para ver o que
esta acontecendo. Ou por ter sido pega no pulo.

— O QUÊ VOCÊ ESTA FAZENDO AQUI?! – praticamente grito


para a pessoa.
— L-Luara. – ela gagueja, enroscando-se em minha cadeira ao
tentar levantar. – O que você esta fazendo aqui? Eu...
Tenho que rir com sua pergunta.
— Eu é que devo fazer essa pergunta. O que você esta fazendo
na minha sala?
— Eu precisava falar com você, mas quando cheguei não...
— Sua mesa fica logo ali na frente. – eu a interrompo. – Você
obviamente me viu sair e sabia que não havia voltado ainda.
Portanto, suas desculpas não justificam seus atos.
Dou alguns passos para frente, fazendo-a recuar contra a
parede.
— Mesmo que não tivesse me visto voltar, nada te daria o direito
de mexer em meu computador, Daniela.
— Não estava mexendo em nada. – defende-se.
— Então o que você esta fazendo ai? – pergunto cruzando os
braços junto do peito, parada há poucos centímetros dela. Uma
sobrancelha arqueada.

Eu saio por menos de quinze minutos e o que encontro quando


volto? A secretária sentada no meu lugar, mexendo no meu
computador de trabalho.
Franzo o cenho ao ver um pedaço de papel saindo do bolso de
sua calça.

— O que é isso? – pergunto, tomando-o para mim antes que ela


pudesse escondê-lo.
— Isso é meu! – exclama, tentando pega-lo de volta. Mas sou
mais rápida e me afasto.

Quando desdobro o papel que ela havia amassado


provavelmente ao guarda-lo às pressas, sinto meu queixo cair,
assim como meu sangue se aquecer por todo meu corpo.

De um lado estão todas minhas senhas desta semana. Coisa


que eu nunca faria, porque na vez que Neville Longbottom fez isso,
o Sirius Black, que na época supostamente havia matado os pais do
Harry, as encontrou e usou para passar pelo Sir Cadogan e entrar
na Sala Comunal da Grifinória. Ou seja: é uma burrice enorme.

Do outro lado tem uma parte do meu projeto com algumas


alterações. Tudo anotado em uma caligrafia corrida, quase ilegível.
Claramente não é a dela, mas sim de algum homem.

— Como você conseguiu isso? – pergunto, fechando o cenho


para Daniela.
— Caiu do seu bolso quando saiu da sala. – responde de
imediato. – Eu apenas vim devolver para você.
— NÃO MINTA! – grito novamente. – Essa letra não é minha. –
baixo a voz, numa falha tentativa de manter a calma. – Quem te deu
isso? – repito a pergunta.
— Eu já disse...
— Era isso o que você estava mexendo ai? – interrompo sua
mesma desculpa e, pela primeira vez, resolvo ir até ela para ver o
que ela tanto olhava.
Não me surpreendo muito quando vejo meu trabalho aberto na
tela, exatamente na parte onde está marcado com alterações no
papel.
— É você quem esta sabotando o trabalho do pessoal. – digo,
tornando a olhar para ela.
— Você não tem como provar nada disso. – ela diz com uma
calma que chega a me irritar. – Você não tem prova alguma de que
mexi no seu computador ou qualquer coisa do tipo. Afinal, isso já
estava assim quando você saiu.
Passo a mão pelo rosto, tentando não rir.
— É ai que você se engana, querida.
Fecho os olhos, tentando manter a respiração controlada, para
evitar perder a calma.
Nesse instante, minha vontade é agarrar essa vadia pelos
cabelos e arrasta-la daqui até a sala dos diretores para que
resolvam de uma vez por todas esse “mistério” que tem rondado
justamente no setor que essa piranha trabalha.
— O que esta acontecendo aqui? – ouço Pedro dizer da porta.
Reabro os olhos e o vejo parado de frente para mim.
— Por que você esta gritando desta maneira, Luara?
— Pergunte para ela o porquê deu estar gritando. – digo em
resposta, olhando para o lado de Daniela.
— E então? – pergunta desta vez para ela, que apenas da de
ombros. – Olha, eu tenho mais o que fazer. – diz. – Ou vocês falam
de uma vez por todas ou...
Solto um suspiro irritado, estendendo o papel para Pedro, que
começa a ler.

— Para sua sorte eu sei me prevenir contra pessoas como você.


– digo, voltando-me para Daniela. – Ao contrario do que você
imagina, eu tenho toda prova do mundo para provar que você
estava mexendo no meu computador.
— Dani, Dani... – Pedro começa a dizer, passando a mão pelo
rosto. – Por que você fez isso, garota? – ele balança a cabeça de
um lado a outro, parecendo realmente desapontado por algo. – Por
favo, me acompanhe até a sala dos diretores. – diz. – Luara, preciso
que leve essas imagens para lá também. Isso é uma acusação
séria.
— Dez minutos e estarei lá. – ele concorda e sai, levando
Daniela junto.

Sento em minha cadeira, abrindo os arquivos recém-salvos e a


vejo fazendo as alterações, copiando o código do papel para o
computador. Suas olhadas para a porta, a espera do momento em
que eu pudesse voltar. Se ela tinha tanto medo assim, por que se
rebaixar por tão pouco? Franzo o cenho com tudo isso. Afinal, ela
precisaria já ter acessado meu computador ou estar a par do que
estou trabalhando para saber no que deveria mexer. O que
significa...

— Apenas leve isso para lá e deixe que eles resolvam, Luara. –


digo para mim mesma, salvando tudo em meu pen drive,
bloqueando o computador antes de sair.
— Está tudo bem? – Igor pergunta assim que apareço na porta e
me assusto.
— Depois conversamos sobre isso. Agora preciso ir lá para cima
e bem... – ergo a mão com o pen drive, sem saber o que dizer.
— Qualquer coisa que precisar estarei aqui. – sorrio para ele.
— Obrigada.
— Com licença. – peço assim que abro a porta da sala de
reuniões da diretoria. Andrew faz gesto com a cabeça para que eu
entre e o obedeço, fechando a porta atrás de mim.

Andrew está sentado na ponta da mesa, provavelmente em seu


lugar de costume durante as reuniões. A expressão em seu rosto é
algo na qual nunca vi antes. Não até hoje. Ótimo. Porque ele não é
o único assim por aqui hoje.

Já Daniela está sentada a três cadeiras de distância, enquanto


Pedro está de pé, próximo a um notebook ligado ao projetor.
— Me de aqui. – ele pede, estendendo a mão para mim. –
Sente-se.
Conectando o pen drive, Pedro coloca as imagens para rodar,
mostrando Daniela entrando em minha sala, olhando para todos os
lados com certo pavor em seu rosto antes de sentar na cadeira para
fazer o que havia levado ela até lá.

O segundo vídeo é o da caneta. Seus olhares constantes para a


porta, até que seu celular toca e ela atende, recebendo as
informações de quem quer que seja.
O terceiro, e último, é o programa que mostra exatamente onde
os códigos batem com as anotações do papel. Enquanto vemos os
códigos sendo alterados, eu entro na sala, batendo a porta.

— Chega. – Andrew diz e Pedro para tudo no mesmo instante.


Olho para ele, sentindo meu sangue gelar. – Como conseguiu isso?
– pergunta para Daniela, que mantinha a cabeça baixa o tempo
todo. Ela não responde. – Sabe que isso é informação confidencial e
pessoal. Correto?
— Sim, senhor.
— Quem te deu isso? – torna a perguntar. – Se colaborar
comigo, posso reconsiderar sua situação quanto ao que devo ou
não fazer com você.
— Eu já disse que encontrei.
— Certo. – ele diz, cruzando as pernas ao lado da mesa, virando
para ela. – Pelo que entendi você encontrou um papel com
anotações de senha, que obviamente não pertence à outra parte
envolvida e resolveu testar. – ele faz uma pausa, apoiando o queixo
com a mão. – Você tem que concordar comigo que foi uma enorme
coincidência ter ido direto ao computador na qual estas anotações
pertencem. Correto? Ou a senhorita saiu testando de sala em sala,
até descobrir que pertencia à senhorita Luara?

— Estava de frente para a sala dela. – Daniela defende-se.


Respiro fundo para não começar a perder a cabeça novamente.
Realmente não sei do que eu seria capaz se isso acontecer.
— Todo setor tem um supervisor na qual é o responsável por
cada funcionário e trabalho de cada um deles. – Andrew volta a
falar. – Pedro, como você bem sabe, é o supervisor do seu andar.
Se realmente encontrou este papel, sua obrigação seria entrega-la a
ele. Não fazer o que você fez.
— Com quem você estava falando ao telefone? – Pedro
pergunta.
— Era meu namorado.
— Ele trabalha aqui? – Andrew pergunta com o cenho franzido.
Algo me diz que ele tem alguma suspeita, mas precise apenas de
uma prova maior. – Conhece Luara?
— Quem esta com você nisso? – Pedro entra no meio outra vez.
– Colabore, garota!
Contenho um sorriso divertido ao ver a reação de Pedro. Nunca
antes eu o vi tão irritado como agora.
— Eu não sou obrigada a passar por isso! – Daniela exclama,
arrastando sua cadeira para trás. – Não estou aqui para ser
acusada injustamente por um gay e uma puta mal comida. – então
da de costas para sair.
Levo minha cadeira para trás, perdendo todo meu autocontrole.
— Puta mal comida é uma ova! – exclamo. – Não há acusações
em vão coisa alguma! Você viu todas as imagens, sabe muito bem o
que fez e por quem fez. Arque com as consequências de seus atos!
— AH! Agora você quer se fazer de santa? – pergunta ao virar-
se para mim. – Não te faz, garota. Acha mesmo que ninguém sabe
o que está rolando entre vocês dois?

— Cale a boca, sua loira oxigenada! – exclamo, dando um passo


para frente. – Tudo o que você está tentando fazer é tirar o seu da
reta.
— Luara, por favor... – ouço Andrew atrás de mim, mas o ignoro
completamente.
— Meu bem, acha mesmo que ninguém percebeu as reuniões
de vocês dois? – Daniela joga contra nós outra vez. – As vezes que
ficaram sozinhos?

Realmente houve algumas vezes em que ficamos sozinhos após


alguma reunião, para resolvermos algum último detalhe. Assim
como seu pedido para que desse início a algum trabalho pessoal.
Mas Ana sempre estava do outro lado da porta, além de que nunca
nem mesmo nos tocamos aqui dentro. Andrew é mais do que
cauteloso com nosso relacionamento e procura não misturar sua
vida amorosa com a profissional. E também nunca permiti sua
aproximação, que foi apenas uma vez. Dentro desse prédio, ele é o
Presidente CEO e eu uma funcionária qualquer, assim como tantas
outras.

— Ser escolhida para este treinamento não foi por mérito


profissional, não é mesmo? – pergunta rindo. – Claro que você deve
estar dando e muito para ele para compensar os gastos dessa
viagem. Qual outra maneira de conseguir subir tão rápido assim?

Menos de dois metros me separam de Daniela. Uma vontade


crescente de agarra-la pelos cabelos e esfregar sua cara na parede.
Não sou de briga, mas também não sou mulher para aceitar
acusações em vão desta forma.

— Vocês duas, chega! – Andrew exclama, segurando meu braço


com força, para me impedir de cometer algo da qual eu vá me
arrepender. – Você não tem o mínimo direito de expor minha vida
pessoal desta maneira, Daniela. Nem a minha e muito menos a de
Luara ou qualquer outro funcionário que preste serviço para minha
empresa. – puxo o braço de volta, fugindo de seu aperto. Vejo as
marcas de seus dedos em minha pele onde ele me segurava. – Não
é de assunto desta empresa se temos ou não um envolvimento
amoroso, como a senhorita bem colocou. Mesmo se tivéssemos,
não seria da sua conta.

— Então você admite. – ela ri.


— Esta tentando arrumar motivos para se livrar, é? – eu a
provoco. – Por que você não confessa de uma vez por todas que foi
o Bruno quem te deu estas anotações? Até porque, eu conheço a
letra dele e sei que é essa.

— Se sabe, então por que todo o teatro para saber quem havia
me dado?
Bingo! A piranha mordeu a isca.
— Para mim já basta. – Andrew diz ao meu lado. – Seus
serviços não são mais necessários para esta empresa. Pedirei para
que o RH entre em contato com a senhorita.
— Espero que pague todos meus direitos. – Daniela diz,
dirigindo-se para a porta. – Babaca. – murmura para si mesma
antes de bater a porta atrás de si.
— E ESPERE PELO PROCESSO NA SUA CASA, SUA VADIA
HOMOFÓBICA! – Pedro dispara contra a porta, completamente
vermelho.

Todo meu corpo esta tremendo, tomado pela raiva do que


acabou de acontecer. Andrew está parado ao meu lado e sei que
esta me olhando. Assim como Pedro. Mas não tenho forças,
vontade ou estruturas para olhar para qualquer um deles. Muito
menos para Andrew. Porque, se eu fizer, eu vou desabar. E isso é a
última coisa que quero que aconteça.

— Com licença. – digo, caminhando até a porta e saio,


fechando-a de vagar atrás de mim.
— Que droga! – exclamo, batendo a porta do meu apartamento
com toda força atrás de mim e jogo minha bolsa no sofá, indo direto
para o banheiro. Preciso urgente de um banho para poder me
acalmar. Esquecer aquela filha da mãe e tudo o que aconteceu
nessa última hora. – Mas que droga foi tudo aquilo? – pergunto a
mim mesma, tirando a última peça de roupa, abrindo o chuveiro no
máximo para que a água fria caia por meu corpo e encosto a cabeça
na parede, respirando fundo, tentando me acalmar.

Em meu braço, vejo uma marca vermelha no local onde Andrew


segurou. Sei que suas intenções eram apenas de me impedir de
cometer uma burrice, o que sei que teria feito. Mas... Por que tanta
força? Ele poderia apenas ter tocado meu braço discretamente que
eu já teria recuado. Não precisava tanto.

Ou talvez ele apenas precisasse se controlar. E não a mim.


Fecho os olhos, permitindo que as lágrimas que acumulei naquela
“reunião” e por todo o caminho de volta finalmente se libertem.
Choro, mas não por tristeza ou qualquer coisa assim, mas sim por
raiva reprimida. Uma droga de defeito que tenho que passar sempre
que fico assim.

Depois do jantar, deito no sofá para tentar ler um pouco.

Estou bem mais calma de que quando cheguei, mas ainda estou
chateada por tudo o que aconteceu. Quando instalei aquelas
câmeras eu não esperava que de fato houvesse alguém tentando
interferir no meu trabalho. Menos ainda que fosse descobrir tão
rápido que era verdade. O que me faz pensar se alguém já não
havia feito isso antes. Principalmente por saber qual programa
estava trabalhando e onde deveria mexer.

Foi pensando nisso que decidi que vou refazer ele todo amanhã,
apenas para não correr riscos.
Ouço a campainha tocar, mas a ignoro. Só tem uma pessoa que
viria aqui há essas horas e não estou disposta a conversar. Andrew
já me ligou um total de quatro vezes desde que o deixei na BIT com
Pedro. As outras ligações foram de Julie e de casa, que também
não atendi.

A campainha toca uma segunda vez e me levanto apenas para


poder confirmar pelo olho mágico de que realmente seja ele.

— Eu sei que você esta ai. – Andrew diz do outro lado. – Abre.
Por favor.
— E o que você quer? – pergunto.
— Me desculpar com você.

Destranco a porta e a abro apenas o suficiente para ver seu


rosto. And está debruçado no batente. O rosto voltado para mim.
Sua expressão não diz nada na qual eu consiga ler.

— Já se desculpou. Agora, tchau. – digo fechando a porta de


vota, mas não consigo. Olho para baixo e vejo seu pé a segurando.
– Sai! – exclamo.
— Não até me deixar entrar. – insiste.
— Vou chamar o sindico. – eu o ameaço.
— Achei que já tivéssemos passado dessa fase. – responde,
fazendo-me sorrir mesmo que involuntariamente. Ele sorri de volta.
– Por favor.
Afasto-me, permitindo sua entrada.
— Você tem dez minutos. – falo, deixando-o entrar e fecho a
porta. – Se você não sair, eu grito. – completo, sentando em meu
sofá e ele faz o mesmo, mantendo um espaço vazio entre nós. Ele
sabe que minha ameaça não passa de um blefe. Eu nunca gritaria
ou chamaria o sindico para ele. Não mais, pelo menos.

Por algum tempo ele fica apenas me encarando, sem dizer uma
única palavra e sinto meus olhos queimarem, se enchendo de
lágrimas outra vez.
Andrew aproxima um pouco, tomando meu braço em seu colo,
passando os dedos pela marca nele.

— Eu não quis fazer isso com você. – ele sussurra.


— Mas fez. – digo em resposta, puxando meu braço e ele
segura.
— Eu não vou dizer que te segurei para que você não fosse para
cima. – começa a explicar. – Ainda que eu ache que você teria feito
isso muito bem. – sinto meu rosto corar com seu comentário.
Andrew continua passando a mão de leve por meu braço. – Apenas
foi para mim. E eu te machuquei por egoísmo meu. – ele fecha os
olhos como se lutasse contra algo. – Com tantas acusações sobre
nós dois, eu só conseguir sentir vontade de dizer toda a verdade.
Mas não é para ela que devo satisfações sobre minha vida.

Quando And abre os olhos novamente, eu os vejo brilharem sob


a luz.

— Por meses Daniela se insinuou para mim e nunca dei bola


para ela. – volta a falar. – E quando disse que você era uma “puta
mal comida”... Porra! Você não é puta, Luara! – exclama irritado. – E
muito menos mal comida! Eu tenho me certificado disso muito bem
nas últimas semanas.

Suas palavras me fazem rir e And acaba me acompanhando.


— Bem, quanto a isso eu não posso reclamar. – sorrio em
resposta. – Eu só não aguento mais isto, Andrew. Não é justo.
— Sei que não. – ele concorda, entrelaçando nossos dedos. –
Eu nunca quis que fosse assim. Não com você. Você... Merece mais
do que apenas isso.

Andrew baixa o olhar para nossas mãos, brincando com nossos


dedos. É como se estivesse tentando me dizer algo e não tivesse
coragem para soltar as palavras. Ou forças para dizê-las.

— Eu sempre soube no que estava me metendo quando resolvi


te levar para São Paulo. – digo com o olhar fixo em nossas mãos. –
Fiz aquilo para me assegurar de que não fosse dormir com
nenhuma das suas Vadias Aleatórias enquanto eu estivesse fora. Eu
tive ciúmes quando aceitou a provocação com minha irmã e veja o
que consegui com isso.
Andrew me olha, dando um meio sorriso.
— Uma bela cicatriz, por sinal. – comenta. Seu olhar esta triste e
um pouco confuso. – Eu nunca ficaria com outra mulher depois de
ter encontrado a garota da praia. A maneira como você mexeu
comigo naquele dia... Ninguém nunca tinha feito àquilo comigo
antes.

Nossos olhares se cruzam pela primeira vez e sinto uma lágrima


escorrer por meu rosto. Andrew ergue a mão para seca-la.

— Não me importa o que Daniela tenha dito lá. – Andrew volta a


falar. – Por mim todos ficariam sabendo sobre nós dois e o que esta
acontecendo aqui, porque não me envergonho nenhum pouco de
sentir o que estou sentindo.
— E o que você esta sentindo? – pergunto com a voz
embargada, sentindo meu coração disparar.

— Bem, eu não sei exatamente. – responde com o cenho


franzindo. – É estranho e não é fome, porque comi um lanche antes
de vir embora. Ainda que ele estivesse meio estranho e possa estar
me dando uma dor de barriga, o que explicaria meu estômago estar
se revirando desse jeito quando seguro sua mão. – sorrio com a
maneira em que ele descreve como se sente. – É só me pedir que
assumiremos nosso relacionamento para todo mundo. Para a mídia,
para a empresa e para os seus pais, para que saibam de uma vez
que não somos “apenas amigos”. Ainda que eles não tenham
acreditado naquilo.

Sinto como se todo meu jantar estivesse querendo sair e meu


estômago se revira. Tudo o que mais quero é poder dizer para todos
que estou namorando o homem mais lindo de todo o Rio de Janeiro.
Que ele é meu. Mas não posso fazer isso ainda.

— Ainda estou disposto a esperar com você até depois dessa


viagem. – diz.
— Já tem quase um mês que tudo isso começou. – comento
baixinho.
— Sem dúvidas o melhor mês da minha vida. – ele responde,
aproximando-se. – Você esta fazendo comigo o que meus pais
sempre quiseram que alguém fosse capaz de fazer. E eu estou
gostando de sentir isso por você. – sussurra, pousando a cabeça
em minha mão e passo os dedos por seu rosto.

— Esse mês também foi incrível para mim. – sussurro. – Eu não


esperava que fosse conseguir sentir o que sinto por você em tão
pouco tempo. Talvez aquele mês que você me colocou para dormir
no sofá tenha ajudado um pouco, embora eu devesse te odiar por
aquilo.

— Desculpa por ter feito aquilo. – Andrew diz. – Eu preferia ter te


colocado para dormir na minha cama.

Suas palavras fazem meu estômago revirar ainda mais e meu


coração é como se estivesse saindo pela boca. Fecho os olhos,
inspirando lentamente.

— Eu preciso de um tempo para pensar. – as palavras saem de


minha boca de maneira automática e percebo mesmo de olhos
fechados quando ele se afasta sem soltar minha mão.
— Uau. – diz.
— É apenas para pensar. – digo, desta vez retribuindo seu olhar.
– Era por isso que não queria falar com você hoje. – explico. – Eu só
quero ficar sozinha um pouco e pensar em tudo isso que tem
acontecido. Então isso não te da o direito de sair por aquela porta
para arrumar alguma vadia para transar. – acrescento de imediato.

— Ainda posso te levar para aquele lugar no domingo? –


pergunta e faço que sim, sentindo uma lágrima escorrer por meu
rosto e sua mão seca-la. – Ok. – diz, dando-me um beijo molhado,
sua mão soltando a minha lentamente. O peso no sofá ao meu lado
se levantando.

Ouço o barulho da porta fechando.


Quando abro os olhos novamente, estou sozinha.

— O que foi que eu fiz? – pergunto, deitando no sofá.

***
Estou cansada do dia que eu tive hoje. Ainda que eu não tenha
feito muita coisa produtiva, sinto meu corpo realmente exausto.

Cedo sai para correr na praia e foi a melhor escolha para uma
manhã de sábado. Depois liguei para casa e para Julie, tendo que
explicar o motivo de não ter atendido suas ligações ontem. O que foi
bem chato, porque ela fez perguntas sobre como estávamos e o
porquê de eu ter pedido um tempo de Andrew, se eu estava feliz
com ele.

Para ser sincera, eu também não sei bem o porquê. Mas


naquele momento eu só queria ficar sozinha. Não ter um tempo
dele. Mas sim de tudo. Sou assim às vezes e isso me ajuda a
pensar melhor. Eu apenas fico um tempo sozinha com meus
pensamentos e os organizo. E ter esse dia livre de tudo me ajudou
nisso. Só que eu senti falta dele, já que não tive uma única ligação
ou simples mensagem sua durante todo o dia.
Deito na cama, acomodando-me para continuar minha leitura.
Faz poucas horas que comecei a ler este há poucas horas e já
estou quase no fim. Resultado de se passar um dia sem nada para
fazer.

[...]
Observei a forma como eles se olharam. Qualquer idiota veria
que estavam apaixonados, mesmo sendo dois idiotas que não
conseguiam se apaixonar.
Meu peito doeu e pensei em Ethan.

A peça que falta


Meu fôlego
Meu coração
Minha lembrança
Eu
A outra metade
A metade que falta.
Pare.
[...]

E eu parei a leitura, colocando o livro no criado-mudo para poder


dormir. Não quero pensar em Andrew outra vez, sabendo que nós
dois somos esses dois idiotas apaixonados na qual Lena citou no
livro. Vi isso no rosto dele ontem quando começou a se enrolar todo
dizendo que poderia estar tendo uma dor de barriga por conta do
lanche que comeu.

Assim como ele, não consigo dizer o que sinto. Talvez eu seja
até pior, já que ele conseguiu me perguntar se gostava dele e eu
nem mesmo tive coragem de perguntar isso ontem, mesmo que ele
estivesse tentando me dizer.

Coloco meus óculos junto do livro e cubro o rosto, mandando


para longe todo esse pensamento. Meu celular vibra ao meu lado e
decido ver amanhã quando toca outra vez. São duas mensagens de
And.
Meus planos eram ter levado você para lá esta manhã, mas
imprevistos acontecem com qualquer um.

Então esteja de pé antes do sol nascer, pois partiremos as 6hrs


em ponto.

Prepare também algumas coisas para levar (roupa, sapatos...),


vai ser um longo dia.

Durma bem.

A outra é apenas uma frase, mas que me faz pensar sobre


minha atitude:

Por que você devolveu a chave?

Por que devolvi sua chave? Bem, ele não aceitou a minha
também. Não era certo.

Você também não aceitou a minha, então não fazia sentido ficar
com ela.
Até porque, nunca a usei. Só queria o chaveiro para mim...
Posso saber aonde iremos? Ou o senhor vai continuar fazendo
mistério e me torturar?
Espero por sua resposta, mas ela chega apenas dez minutos
depois:

Talvez eu a aceite depois de ontem.


Pode vir a ser útil em um futuro ;)

Franzo o cenho. O que ele quer dizer com isso? Digito a


resposta, fazendo o máximo de drama possível:

TORTURAAAAAAAAAAAA!!!! Você é cruel, Sr. Giardoni!

Estou aqui sofrendo para saber onde você quer me levar e tudo
o que diz é isso?!

Isso vai ter volta. Pode apostar!

Ouço sua risada do outro lado e sorrio. Não era bem isso que eu
esperava ter de volta.

Estarei esperando ansiosamente por isso.

— E muito menos isso. – murmuro para mim mesma, colocando


o celular sobre meu peito, criando coragem para dizer o que
realmente sinto.

Senti sua falta hoje. Você não me ligou e eu não sabia se podia
fazer isso.
Mordo o lábio inferior, sem saber se realmente fiz bem em dizer
isso. Não era exatamente isso que eu pretendia dizer.

Duas mensagens suas chegam seguidas uma da outra, fazendo


meu coração disparar e pego o celular para ler:

Amanhã conversaremos sobre isso.

Agora, apenas durma. Sonhe comigo, minha linda.

Com os anjos.

Sorrio com sua cara de pau ao pedir para que sonhe com ele.
Decido provoca-lo.

Todas as noites, meu lindo.

A resposta é verdadeira, mas ele terá que me perguntar para


saber se falei serio ou não.

Coloco o celular de lado, virando para dormir com um sorriso


bobo no rosto.
Capítulo Dezenove
Domingo

Uma música começa a tocar baixinho, bem lá longe e começa a se


aproximar conforme a música aumenta. Tateio no escuro a procura
do meu celular para poder desligar o alarme, ainda que não me
lembre de ter programado para que despertasse. Ainda mais em um
domingo. O toque insiste.

— O que você esta fazendo ai? – pergunto ao vê-lo caído no


chão, em cima de um tênis meu. – Alô? – digo, atendendo a ligação,
sem nem mesmo ver quem era.
— Essa sua voz de sono me deixa louco. – alguém diz do outro
lado, fazendo-me franzir o cenho.
— Quem esta falando? – pergunto enquanto me sento na cama.
— Ai! – exclama. – Não me vai dizer que esqueceu tão rápido
assim de mim. – sua voz sai mais sussurrada, com uma rouquidão
sexy demais para o meu gosto. O que faz com que um calafrio
percorra todo meu corpo.
— Andrew. – digo finalmente reconhecendo e ele ri.
— Bom dia, linda. – sinto o sorriso em sua voz.
— Sabe que horas são? – pergunto voltando a deitar. - Vai
dormir And!
— São exatamente quatro horas e trinta e sete minutos. –
responde. – Você tem menos de uma hora e meia para se arrumar.
— Levanto às cinco horas então. – respondo e desligo o celular
na cara dele, virando para o lado para poder voltar a dormir.
Novamente ouço o toque do meu celular, mas desta vez ele não
esta no chão. Vejo que já são cinco e vinte e cinco.
— Ah meu Deus! – exclamo, pulando para fora da cama,
procurando meus óculos no criado-mudo.

Acendo a luz do quarto, indo até meu armário para separar


minhas roupas. Calça jeans, uma blusinha e uma camisa social
xadrez e mais uma muda, assim como Andrew recomendou que
fizesse em sua mensagem. E, apenas por precaução, separo
também minha jaqueta, no caso de esfriar em algum momento. O
que eu duvido que aconteça. Guardo tudo na mochila, indo para o
banheiro para um banho morno para despertar e me arrumar.

Passo um batonzinho vermelho claro, apenas para dar uma cor a


mais em meus lábios e prendo meus cabelos em um rabo de cavalo
para cima. A campainha toca quando passo pela sala a caminho da
cozinha.

Abro a porta, debruçando-me sobre ela. Andrew está parado


diante de mim, olhando-me de cima a baixo, fazendo com que meu
corpo todo se acenda como brasa quente. Ele usa apenas um jeans
escuro e camisa preta, que da uma forma incrível ao seu peitoral.
— Oi, lindo. – eu o cumprimento, dando espaço para que ele
entre.
— Oi, linda. – responde com um sorriso de lado, pousando um
beijo no canto de minha boca ao passar por mim. – Podemos ir?
— Claro. Eu só estava indo pegar algo para comer no caminho.
— Acho que alguém realmente dormiu mais do que devia e
perdeu a hora. – comenta.
— Não é bem a verdade. É só que... – faço cara de ofendida,
mas ele não vê, já que esta pegando minha mochila que deixei no
sofá.
— Bem, eu nem dormi muito. – diz. – É só isso que tem para
levar? – pergunta, verificando o peso. – Se for, vamos. Eu preparei
alguns lanches para o caso de alguém dormir mais do que deveria.
Pode comer no carro. Só não faça sujeira.

Andrew então segue de volta para a porta, parando no vão dela.


Permaneço imóvel no mesmo lugar.
— Você não vem?
— Duas perguntas. – digo em resposta. – Primeiro: por que você
não dormiu a noite?
— Ao contrario do que deve estar pensando, eu não estava com
ninguém. – diz. – Apenas passei grande parte pensando em
algumas coisas. Planos. Qual a segunda pergunta?
Franzo o cenho para ele.
— Não pensei que você estivesse com outra. – retruco. – Mas tá.
Segundo: você preparou sanduíches?

Ele sorri, tornando a entrar em meu apartamento e segura minha


mão, pousando um beijo nela e, aproximando o rosto do meu, diz
bem baixinho em meu ouvido:

— “... Se você cozinhar tão bem quanto faz amor, acho que
estou mais do que feita com você. Amo você.”.

Congelo no mesmo lugar, sentindo meu rosto não esquentar,


mas sim pegar fogo como se fosse um prédio em chamas. Ele
decorou cada palavra do que escrevi naquela manhã! Franzo o
cenho, sentindo seu perfume próximo a mim.

— Eu não disse que te amava. – digo, apoiando minha mão em


seu braço. Pelo menos não que me lembre. Mas acho que saberia
se dissesse algo assim para alguém. Ainda mais ele.
— Não, você não disse. – concorda. – Mas de qualquer forma,
você vai provar da minha comida hoje. – sussurra. – E eu espero
que seja das duas maneiras.
Sinto um calafrio percorrer por todo meu corpo quando beija meu
pescoço.
— Acho que nós estamos fincando atrasados. – digo, tentando
ignorar o efeito que Andrew tem em cima de mim, dando um beijo
no canto de sua boca. Ele tenta me beijar de volta, mas me afasto,
seguindo para o elevador, deixando que ele tranque a porta.
— Que deliciosa visão! – ele exclama atrás de mim e o ignoro.
— Andrew? – eu o chamo assim que saímos do elevador.
— Sim? – ele pergunta parando ao meu lado.
— Algo está estranho aqui.
— Por quê?
— Onde está seu carro? – pergunto, olhando para sua vaga
vazia ao lado da minha.
— Não vamos com o Civic hoje. – responde, começando uma
caminhada direção ao fundo do estacionamento. – E nem com o
Audi.
— Não? – torno a perguntar, acompanhando-o.
— Eu queria ir de moto – ELE O QUÊ?! –, mas vai chover hoje.
Então vai que você se molha e sua maquiagem sai e eu descubro
que você não é exatamente como eu imagino e a paixão acaba? –
ele olha rapidamente para mim. – Então vamos com essa belezinha
aqui. – conclui, parando ao lado de uma caminhonete preta enorme.
– Linda, não é?

Fico em silêncio por alguns instantes, apenas admirando a


imagem dessa bela S10 cabine dupla, provavelmente do ano. Mas,
o que me mantem parada não é isso.

— Repete. – peço.
— Que eu queria ir de moto? – pergunta de volta. O cenho
franzido.
— O que você disse depois disso e de sair à maquiagem.
— Que vamos com essa belezinha aqui? – ele pergunta
parecendo realmente confuso.
— Esquece. Devo ter escutado errado. – suspiro. – Tenho
apenas duas coisas para te dizer, Andrew Giardoni.
— E quais seriam? – pergunta e me viro para ele.
— Primeiramente: Você já me viu sem maquiagem uma centena
de vezes e sabe muito bem que não sou isso que você insinuou. –
fecho a cara para ele. – Inclusive estou sem neste instante.
— Certo. Isto é verdade. Você é natural e é linda por isso. – sorri.
– E qual seria a segunda coisa? – pergunta, dando um passo para à
frente.
— A segunda é que não vai chover hoje. – ele ri com minha
afirmação.
— Quer apostar quanto que vai? – desafia.
— O que você quiser apostar. – digo em resposta, cruzando os
braços diante dele.

Andrew passa a mão pelo queixo, fazendo-me notar pela


primeira vez que se barbeou. Ele me olha como se estivesse me
analisando. Ou analisando as possibilidades do que pode querer de
mim.

— O que eu quiser? – pergunta, arqueando a sobrancelha.


— O que você quiser. – concordo.
— Quero você oficialmente como minha namorada.

Meu queixo vai parar lá nos pés com sua resposta. Arregalo os
olhos, tentando descobrir se ouvi direito ou se esqueci de lavar os
ouvidos quando tomei banho. Abro a boca para falar, mas torno a
fechar por não encontrar palavras. Abro e fecho por pelo menos
mais duas vezes, para só então conseguir emitir algum som.

— Sem nenhuma interferência, sem ninguém se metendo na


nossa vida. Sem Vadias Aleatórias e menos ainda aqueles caras
que querem mostrar o pau para você. – Andrew diz as palavras todo
sério, sem desviar o olhar de mim em momento algum.
— Ok. – concordo, sorrindo para ele. Não sei bem o que dizer
exatamente. Eu esperava por qualquer resposta espertinha. Mas
decididamente não esperava por isso. – E o que eu ganho se não
chover? – pergunto, embora a essas alturas só tenha uma coisa que
eu queira.

— Algo da qual você realmente não vai se arrepender de ter. –


diz, prendendo minha camisa com a mão e me beija como já não
fazia desde quinta à noite. Mas, quando seguro sua camisa ele se
afasta, fazendo-me apenas sentir sua barba em meu rosto.

— Droga! – exclamo baixinho, fazendo-o rir. Certo. Se ele quer


jogar, então vamos jogar. E não costumo perder, ainda que ele seja
bem melhor que eu nisso. – And. – chamo quando ele abre a porta
para que eu entre.
— Sim?
— Que bela abundância você tem. – digo, apertando sua bunda
ao passar por ele, passando por baixo de seu braço para entrar no
carro.
— Gostou? – pergunta quando viro para ele. Apenas dou de
ombros e sorrio. – A sua também é bem gostosa. – diz. – Acho que
podemos dividir bons momentos entre as duas no lugar aonde
iremos.

Vejo o sorriso maroto tomar conta de seu rosto quase no mesmo


instante em que sinto sua mão em minha bunda, apertando-me,
fazendo com que eu pule no lugar.

— Vou pensar no seu caso. – digo em resposta, mostrando a


língua para ele antes de me sentar no carona.
— Pense bem a respeito então. – diz, fechando minha porta,
indo até o outro lado. – Porque seu tempo está bem limitado até que
chova.
— Acho que independente de quem estiver certo, os dois saem
ganhando. – comento comigo mesma e ele sorri ao meu lado,
saindo com o carro.

Já tem aproximadamente uma hora desde que saímos do Rio de


Janeiro. Tempo suficiente para que eu tenha comido quase metade
dos sanduíches que Andrew preparou, só pelo fato dele ainda não
ter revelado para onde estamos indo.

— Para onde vamos, afinal? – pergunto provavelmente pela


centésima vez, virando de lado para olhar melhor para Andrew. Ele
tem um perfil incrível.
— Não vai me deixar fazer surpresa mesmo, né? – pergunta de
volta.
— Não. Isso é sequestro.
Andrew ri ao meu lado.
— Qual a graça? – pergunto, cruzando os braços para ele.
— Não é sequestro quando se vem de tão boa vontade. – diz em
resposta, olhando-me por breves segundos.
— Nisto você tem razão. – concordo, voltando a atenção
novamente para a estreada.
— Seria sequestro se eu parasse com o carro no acostamento e
te levasse para o banco de trás.

A maneira com que ele diz isto quase me faz acreditar que esta
falando sério. O que me faz rir, porque uma parte minha quer que
ele faça isso.

— O que? – ele pergunta quando começo a rir com minha ideia.


— Você não vai mesmo fazer isso aqui, né? – pergunto, notando
que ele diminuiu a velocidade.
— A ideia é bem tentadora e realmente estou com vontade de te
levar para trás agora.
— Aqui não, Andrew. – digo, apoiando a cabeça contra a porta.
O sono tomando conta de mim outra vez. – Não no meio do nada e
na estrada assim. – ele ri.
— A ideia é justamente essa. – diz. – Mas tudo bem. Não vou
fazer isso com você a menos que queira. – sinto seu olhar em cima
de mim, mas não olho de volta para ele. – Petrópolis.
— Oi? – pergunto sem entender.
— Você quer saber para onde estamos indo. Então: Petrópolis.
— Petrópolis. – repito.
— Meus pais tem uma fazenda lá. – explica. – Eles não estão
aqui já há alguns anos, mas o caseiro cuida dela. Tenho certeza de
que vai gostar.
— Tem cavalos? – pergunto, começando a me animar de
verdade.
— Já andou a cavalo antes? – pergunta com o cenho franzido.
— Eu não diria que “andei a cavalo”, exatamente. Mas pode-se
dizer que já cavalguei algumas vezes. – sorrio para ele de maneira
sugestiva, fazendo-o me olhar dividido entre espanto, surpresa e
talvez desejo.
— Cavalgou, é? – pergunta curioso e confirmo. – Onde?
Passo a mão pelo encosto de seu banco, aproximando-me dele
para sussurrar em seu ouvido:

— Com você. No seu apartamento. – e beijo seu pescoço,


fazendo com que se arrepie.
— Precisamos cavalgar, então. – diz com toda certeza. – Sem
dúvida alguma você precisa fazer isso.
Afasto-me dele sem conseguir conter a risada.
— Você acha graça fazer isso com um cara que esta se
aguentando há dois dias, né? – pergunta, fingindo estar bravo. –
Isso é crueldade.
— E como é lá? – pergunto, voltando para o meu lugar.
— Isso já é algo que você precisa ver com seus próprios olhos. –
diz em resposta, pousando a mão em minha perna e a seguro.
— Quanto tempo mais? – pergunto após algum tempo, mudando
o assunto da conversa.
— Uns dois quilômetros. – responde, pegando uma estrada de
terra à direita.

Ao longe, vejo altas montanhas e o campo verde quando Andrew


para de frente para uma porteira e desce para ir abri-la.
Pulo para o lado do motorista e entro, mas não paro para
espera-lo, fazendo com que ele caminhe cem metros, enquanto
divirto-me ao vê-lo pelo retrovisor.
— Não adianta você tentar me deixar para trás. – diz quando
senta ao meu lado. – Não sabe onde é.
— Bem, considerando que já estamos nela, acho, eu diria que é
aquela casa maior lá na frente.
— Só não bata meu carro de novo. – recomenda e sinto meu
rosto corar. – Eu não me daria ao trabalho de acionar o seguro
daqui.

Olho para ele, contendo a resposta na ponta da língua. Mas


prefiro não fazer isso. Não quando estamos no meio do mato e
provavelmente sem sinal de celular.

Olhando pelo campo, vejo aproximadamente umas cinquenta


vacas, patos e gansos que nadam em um pequeno lago e mais
alguns outros animais que não consigo identificar.

Assim como havia dito, a casa enorme que vimos lá da porteira


era a principal. E quando digo “enorme”, quero dizer que é
realmente enorme. Ela é toda construída com tijolinho à vista com
uma varanda na frente e vista para as montanhas lá longe.

— É lindo. – digo assim que saio do carro.


— Isto não chega a ser nem uma parte dela. – Andrew responde,
passando o braço por minha cintura.
— Senhor Giardoni. Que bom revê-lo. – um senhor caminha em
nossa direção, trajando roupas do campo. – E acompanhado de
uma bela senhorita. – ele me cumprimenta com um gesto de
cabeça, apertando a mão de Andrew logo em seguida.
— Esta é Luara. – Andrew me apresenta. – Uma amiga. – diz,
dando destaque na palavra “amiga”. Apenas olho de lado para ele.
— Prazer. Sou Marcelo, o responsável por manter tudo aqui em
ordem quando os Giardoni não estão por perto.
— Oi. – digo totalmente sem jeito, apertando sua mão.
— Pode selar dois cavalos para mim? – Andrew pede. – Separe
a Cisne Branco para a Luara. Ela nunca cavalgou.
— Sim, senhor. – Marcelo sorri. – Maria preparou o café da
manhã para vocês.
— Tudo bem. – Andrew então vira para mim: – Sei que você
comeu quase tudo o que preparei, mas é melhor comermos algo
antes de sair para cavalgar. Não sei se voltaremos na hora para o
almoço.
— Por mim tudo bem. – respondo. – Aposto que Maria cozinha
bem melhor que você. – ele sorri.
— Claro. – concorda. – Acho que depois de hoje você vai
precisar fazer muito exercício para perder alguns quilos. – sorri,
apertando minha barriga e dou um tapa em sua mão que pare.
Como ele ousa?!
— Irei selar os cavalos. – Marcelo informa, retirando-se.
— Esta insinuando que sou gorda? – pergunto quando ficamos a
sós.
— Não. Apenas que tenho um bom exercício para queimar
calorias. – diz, piscando para mim. – Anda. Vamos tomar café.
Sinto sua mão em minhas costas, levando-me para dentro da
casa.
— Quem é “Cisne Branco”? – pergunto.
— Rainha de Nárnia que reinou algum tempo antes da Feiticeira
Branca. – explica. – Dizem que ela era tão bela que sua beleza
podia ser comparada com a de uma estrela e que se ela olhasse
seu reflexo na água, ele permaneceria lá por um ano.
— Você acabou de me dar spoiler do livro que ainda estou lendo.
– digo, parando de andar e viro para ele.
— Me desculpa! Não foi a minha intenção. De verdade. – ri. –
Cisne Branco é a melhor égua que temos aqui. Você vai gostar dela.
— Isso não tem perdão, Andrew. – fecho a cara para ele. –
Realmente não tem.
Ele abre a boca, parecendo chocado.
— Existe algo que eu possa fazer para me redimir? – pergunta,
envolvendo minha cintura com as mãos, puxando-me para mais
perto.
— Talvez. – digo, apoiando minhas mãos em seu peito.
— E o que seria?
— Vou pensar na melhor maneira de você fazer isso. – sussurro,
beijando o canto de sua boca, afastando antes que ele possa
aprofundar.

Andrew segura minha mão, levando-me até a sala de jantar,


onde vejo uma mesa disposta com vários tipos de coisas gostosas.

Observo todo o caminho que fazemos. Tudo nessa casa é lindo.


Parece até aquela coisa de novela das seis que se passa no século
XVII, XVIII. Consigo até mesmo imaginar escravos vivendo nesse
lugar, o que me causa um calafrio.

— Com frio? – And pergunta, passando a mão por meu braço.


— Estou bem. – sorrio para ele, servindo-me de suco e bolo.
— Aproveite e desfrute de tudo o que tem direito. – diz. – Não
voltaremos até meio-dia.
— E também guarde um pouco para o caso do seu “amigo” não
cozinhar tão bem quanto se gaba. – completo sua frase. – Esta uma
delícia! – exclamo, sentindo o sabor do bolo de chocolate.

Minha mãe que me perdoe, mas isto passou a fazer uma


concorrência pesada com o bolo dela.
— É tudo cultivado aqui. – Andrew comenta ao meu lado,
enquanto me observa. – Todo o cultivo da fazenda fica para Marcelo
e Maria para que não gastem com a alimentação deles e dos filhos.
— Só os dois trabalham aqui? – pergunto me lembrando do
tamanho dele lugar.
— Não. – ri. – Eles são apenas os caseiros. Cuidam da casa,
mantém as coisas em ordem. É como se fosse o assistente do meu
pai enquanto não estamos. Mas há outros funcionários. Do
contrario, não terminariam os afazeres nunca.
— Foi o que pensei. – comento para mim mesma, encarando um
relógio na parede do outro lado. Até mesmo ele parece tão antigo.
— Vem. – Andrew diz. – Você não pode sair no sol desse jeito.
— E que outro jeito eu deveria sair? – pergunto. – Não fazia ideia
de que viria para uma fazenda, já que alguém não quis me contar.
— Pode apenas vir comigo? – pede, estendendo a mão para
mim e a seguro. Ele leva minha mão até a boca e a beija,
entrelaçando nossos dedos.

Seguimos por um corredor cheio de portas fechada e enorme.


Tudo o que consigo fazer é imaginar a história desse lugar e o
tamanho de cada um desses possíveis quartos.

— Pode usar este aqui para se aprontar. – And diz, abrindo uma
das portas, mostrando um quarto que muito provavelmente da
metade de todo meu apartamento. – Não se esqueça de calçar uma
bota. Não sabemos como vai estar lá fora.

Entro no quarto e sinto como se realmente estivesse vivendo em


uma novela de época. As cortinas, os móveis tão antigos, mas ainda
tão bem conservados...

— Se pelo menos eu tivesse uma bota aqui. – comento,


sentando na cama.
— Pode usar essa que tem ai. – diz. – É da minha primeira
namorada.
— Você a trouxe para cá? – pergunto, olhando para ele.
Pergunta errada, Luara. Andrew sorri.
— Uma vez.
— Quanto tempo faz? Que terminaram?
— Não muito. Estamos apenas dando um tempo. – diz em
resposta. – Espero que sirva para você. Vou me arrumar também e
já volto para ver como esta. – dando um beijo em minha cabeça, ele
sai, fechando a porta atrás de si.

Olho ao redor, notando uma caixa de sapatos em cima de uma


cômoda e me levanto, indo até ela.
É uma bota nova, ainda com um forte cheiro de couro. No fim,
não faz tanto tempo assim que eles terminaram.

— Desgraçado. – digo baixinho, tirando a bota da caixa. Ela é


linda, com as laterais com um cordão de flores.

Sento-me na cama para calça-la. Ao menos tem meu número.


Alguém bate na porta.

— Entre. – digo.
— Com licença. – diz e vejo uma senhora de cabelos grisalhos
entrar. – Desculpe invadir seu quarto assim.
— Imagina. – sorrio em resposta. – A senhora que é a Maria? –
pergunto e ela assente. Imediatamente eu me levanto, indo até ela e
seguro suas mãos. – A senhora é simplesmente uma das melhores
cozinheiras que já conheci.
— Obrigada. – diz totalmente sem jeito. – Quando Ma disse que
Andrew havia trazido uma garota para cá, eu não acreditei muito.
Precisava ver com meus próprios olhos e vejo que ele não mentiu
quando disse que era tão gentil.
— Mas ele já trouxe a namorada aqui. – digo com o cenho
franzido.
— Estou nessas terras desde muito antes daquele menino
nascer e posso te garantir que nunca o vi com uma mulher. – diz. –
Menos ainda uma namorada.

— Mas e essas botas? – pergunto. – Ou ele que usava? – tento


descontrair a seriedade rindo.
— Oh! Elas serviram perfeitamente. Gostou?
— Sim, são lindas. A outra garota tinha bom gosto.
— Que outra garota? – Maria pergunta sem entender.
— A dona da bota.
—Andrew pediu para que comprássemos esta semana, quando
ligou pedindo para que preparasse a casa para vocês. – explica e
me deixo cair na cama. – Fiquei tão triste quando ele ligou ontem
dizendo que não poderia mais vir para passar o final de semana,
que seria apenas hoje.
— Filho da mãe! – exclamo, sentindo-me totalmente sem graça.
– A senhora achou que elas ficaram bem em mim?
— Tem seu estilo. – sorri.
— Toc-Toc? – Andrew abre a porta.
— Preciso ir. – Maria se levanta. – Bom dia, querido. – diz ao
passar por ele, dando um beijo em seu rosto.
— Bom dia. – responde com um sorriso lindo, também a
beijando. – Esta pronta?
— Claro. Era só calçar isso aqui. – respondo, erguendo o pé um
pouco. – Serviu direitinho.
Andrew caminha até mim, usando agora uma camisa social com
os últimos três botões abertos, bota e um chapéu de cowboy
marrom escuro em sua cabeça. As mãos sempre nas costas.
— Gire. – pede.
— O que você tem ai? – pergunto, tentando ver o que ele trás.
— Feche os olhos.
— Para que?
— Apenas faça. – e eu fecho, mesmo contra minha vontade,
sentindo quando ele coloca algo em minha cabeça, ajeitando com
cuidado.

— Agora sim você esta linda. – diz e sinto seus lábios tocarem
os meus.
Abro os olhos novamente, levando as mãos à cabeça, notando o
chapéu bege.
— Vamos. – diz, tomando minha mão. – Cisne Branco e Pluma
já estão prontos, apenas nos aguardando.
Sorrio, reconhecendo o nome do cavalo de Nárnia.
— Quantos cavalos! – exclamo ao ver um estabulo lotado. Talvez
quinze ou vinte. Não consigo contar direito.
— Nem todos são treinados ainda. Os nossos estão lá do outro
lado. – Andrew diz, continuando a caminhada, levando-nos para um
pouco mais a frente, onde dois cavalos estão. – Você vai com essa
daqui. – diz, acariciando uma égua toda branca. – Consegue subir?

Paro próxima a ela, que me olha seriamente. Ou pelo menos é a


sensação que tenho.

— Não tenho tanta certeza disso. – digo.


— Fica calma. – diz, parando atrás de mim e segura meu quadril.
– Ela não vai te fazer nada.
— Oi, Cisne Branco. – cumprimento a égua, passando a mão por
sua cabeça. Ela tem uma pelagem macia. – Acho que posso fazer
isso. – falo, permitindo que Andrew me ajude a subir na Cisne
Branco, enquanto explica como devo segurar e o que fazer para não
cair. Depois vai até Pluma, que é um cavalo caramelo, com calda
preta e o monta.
— Vamos. – diz, tomando a frente em nossa cavalgada.
Seguimos por uma trilha que entra pela mata e não consigo
manter o olhar em uma única direção.

— Tem um rio que corre por ali. – Andrew aponta para um lado,
parando. Presto atenção para ver se consigo ouvir o som da água
correndo.
— É tão lindo aqui.
— Sim. – ele sorri.
Caminhamos por mais algum tempo, indo de volta para o campo
aberto. Não sei se são as mesmas, mas tem mais umas cinquenta
vacas pastando aqui também.

— And. – chamo.
— Sim?
— Vamos parar um pouco.
— Claro.
Encostamos perto de algumas árvores e ele desce, prendendo
Pluma em uma.
— Quer ajuda? – pergunta.
— Posso fazer isso sozinha. – digo em resposta, mas meu pé
enrosca.
— Você não precisa ser sempre tão teimosa. – ele ri. – Cuidado.
Põe o pé aqui. Isso. Assim. – instrui, segurando meu quadril e desço
para o chão. Nossos corpos se encostam e sinto seu pequeno
amigo roçar em mim. – É ruim ser pequena? – pergunta próximo ao
meu ouvido. Sua respiração pesada e quente, enquanto suas mãos
ainda me prendem.

— Não sou baixinha. – viro para ele, que não me solta. – Tenho
o tamanho normal que qualquer pessoa normal tem. Nem todo
mundo é um Nefilin como você. – dou de língua para ele, que tenta
segurar. O que nos levaria a um beijo, mas desvio de sua investida,
fugindo por baixo de seus braços.

— Vai ter que me pegar se quiser. – digo andando de costas,


olhando para ele.
— Você vai cair. – ele grita para mim.
— Só porque você quer né.
— Você vai cair. – repete, correndo até onde estou.

Quando viro para poder fugir, meu pé escorrega em alguma


coisa e vou direto para o chão, sentindo minhas costas melarem.

— Você esta bem? – Andrew pergunta, olhando-me por cima.


— Como acha que estou? – pergunto de volta.
— Esperamos que apenas com lama. – ri, estendendo a mão
para me ajudar a levantar e seguro. Quando faz força, puxo contra e
ele cai, vindo direto para cima de mim. Suas mãos tocam o chão
antes que caia. – Você esta brincando com fogo, Luara. – diz,
prendendo-me contra o chão. – Não adianta reclamar de tempo
depois.

— Eu gosto de brincar com fogo. – respondo com um sorriso


malicioso. – É perigoso e excitante.
Ele levanta, novamente dando a mão para me ajudar.
— Você esta brincando comigo. – diz sério.
— Não estou brincando com você. – defendo-me quando ele sai
na frente, indo de volta para onde estão os cavalos. – Não acredito
que ele levou isso a sério! – exclamo para mim mesma. – Andrew! –
chamo, correndo atrás dele. – Por favor, para!

Mas ele não o faz até que chegue perto dos cavalos, onde senta
sobre a sombra de outra árvore.

— Achei que fosse me deixar aqui. – digo quando finalmente o


alcanço, sentando ao seu lado.
— Eu ia. – responde. – Por que faz isso? – pergunta ainda sem
olhar para mim.
— Não estou brincando com você. – digo. – Eu queria brincar.
Mas não desse jeito que você esta insinuando. – franzo o cenho. –
Faz algum sentido para você?
— Não muito.
— Só me deixe saber mais sobre você. – peço, colocando a mão
em seu braço, finalmente conseguindo sua atenção.
— O que quer saber?
— Por que disse que a bota era da sua primeira namorada e que
estavam dando um tempo?
— Porque são. Próxima pergunta.
Reviro os olhos para sua resposta, mas deixo para lá.
— Você disse que não era o tipo de homem para ter esse tipo de
relacionamento. – Andrew suspira pesado ao me ouvir.
— Tive uma namorada quando estava no fundamental. –
começa. – Eu era perdidamente apaixonado por ela. Fazia de tudo e
ela dizia sentir o mesmo por mim.

Ele então faz uma longa pausa, talvez tentando lembrar-se do


que aconteceu.

— O que aconteceu? – pergunto e ele olha de volta para o


campo.
— Eu a peguei transando com meu melhor amigo atrás do
colégio.
No momento em que ouço suas palavras, cubro a boca com as
mãos, completamente espantada.
— A classe toda fofocava, mas eu não acreditava. – volta a falar.
– Eu achava que ela me amasse e que ele nunca faria algo desse
tipo comigo. – então olha para mim e seguro sua mão, entrelaçando
nossos dedos. – Até que me irritei com aquela conversa e fui atrás
para tirar satisfações e os peguei juntos. Antes de sair, só teve uma
coisa que fiz.
— O que você fez? – pergunto.
— Quebrei o nariz dele. – ri. – No dia seguinte, nenhum dos dois
estava mais na escola.
Passo meus dedos pela mão de Andrew, incapaz de dizer
qualquer coisa. Tenho a sensação de que ele já não toca nesse
assunto há muitos anos.

— Eu nunca mais quis saber desses sentimentos. – diz. – Mas


depois de alguns anos, eu conheci uma garota e eu realmente me
interessei por ela. Só que nunca mais a vi. – ele me olha com um
sorriso triste. – Foi com ela com quem perdi minha virgindade. Mas
não foi por isso que me apaixonei por ela. O que depois disso
percebi que o que sentia por essa garota da escola não era nada
além de uma paixonite.

— Isso é terrível. – digo.


— Tanto faz. – ele da de ombros. – Por isso que me tornei
assim. Um galinha. O horror da minha mãe, incapaz de dar um neto
a ela, se nem mesmo consigo me relacionar direito com uma
mulher. – ri.
— Você não é galinha. – digo, fazendo com que olhe para mim.
Seus olhos brilham, refletidos pelo sol. – Apenas não teve a sorte de
encontrar a pessoa certa ainda. Talvez essa garota que você foi
apaixonado fosse ser. Mas...
— Como pode ter tanta certeza? – pergunta sério. – Eu fiz com
você o mesmo que fiz com todas as outras. E tinha aquela foto sua
no meu celular, que toda vez que pegava para apagar não
conseguia. E eu queria apagar ainda mais por isso.
— Você se arrepende de não ter feito isso? – pergunto, sentindo-
me um pouco triste.
— Não. – seu olhar é sincero. – E também não teria feito
diferença, porque você estava aqui. – diz, apontando para sua
cabeça. Sorrio em resposta.
— Você não foi o único que teve uma experiência amorosa ruim.
– digo. – Então pode ter certeza de que eu nunca vou fazer qualquer
coisa para te machucar.
Ele franze o cenho com meu comentário e acabo contando o
resumo da droga que foi meu namoro.
— Veja só. – Andrew diz logo que termino. – Eu te trago para tão
longe com outras intenções e acabamos virando dois bobos
sentimentais.
— Este não é você. – respondo rindo.
— A culpa é toda sua.
— Minha? Você que é um... – começo a dizer, mas ele me
interrompe.
— Um gostosão muito sexy e bom de cama, com uma entrada
para o mau caminho que é incrível, que fica ainda mais sexy sem
camisa? – completa.
— um riquinho metido e extremamente convencido. – corrijo.
— Não sou riquinho metido. – diz ofendido.
— É. Isso você decididamente não é.
Andrew então me prende contra o chão, mantendo minhas mãos
presas acima da cabeça, enquanto sobe minha camisa.
— Diga: um gostosão sexy e bom de cama, com uma deliciosa
entrada para o mau caminho e que estou louquinha para beijar. –
sussurra próximo ao meu rosto.
— Não vou dizer isso.
— Vai. Por bem ou por mal. – Quando diz, sua boca desce até
meu pescoço e sinto um espasmo percorrer todo meu corpo. – Você
é um homem sexy e bom de cama, com uma entrada para o mau
caminho muito sexy e tentadora, que eu estou terrivelmente louca
para beijar. – digo com o pouco de força que ainda me resta.

Ao ouvir minhas palavras, sua boca sai do meu pescoço e vem


até a minha, pairando a poucos centímetros. Puxo seu lábio inferior,
tentando beija-lo. Mas ele afasta.
— Não vou beijar você. – diz sem desgrudar nossos lábios.
— Você o quê?!- exclamo.
— Quero fazer isso só quando ganhar nossa aposta. – ele sorri.
– E você vai ver como vai ser bem melhor.
— Ah, é?
— É. – diz, fazendo pressão entre nossos membros.
— Então agora completo: e péssimo na cozinha. – digo quando
meu estômago ronca, avisando que estamos atrasados.

Caminhamos de volta ao estabulo, levando Cisne Branco e


Pluma atrás de nós.
Andrew os leva para o cercado, para poderem pastar e tomar um
pouco d’água. Depois seguimos até a casa.
— Por que esse lugar me intimida tanto? – pergunto, parando de
frente para ela.
— Como se fosse um antigo casarão da época da escravidão,
com muitas histórias por trás?
— Sim! – exclamo.
— É porque ela é esse casarão. – diz e entra.
— Quê?!

Depois de comermos uma deliciosa macarronada preparada por


Andrew, deitamos no sofá da sala para ver TV. Não me envergonhei
ao admitir que ele era bom na cozinha. O que me fez questionar
sobre o porquê dele nunca ter feito nada para nós.

Não sei se foi pela caminhada ou pelo fato de ter acordado tão
cedo, mas peguei no sono em poucos minutos depois que deitamos
para assistir. Mas, sobre não conseguir acordar, tenho quase
certeza que o motivo seja por estar deitada com a cabeça no braço
desse homem que insiste em mexer no meu cabelo, deixando-me
ainda mais sonolenta.

— Acorda minha linda. – ouço sua voz sussurrada em meu


ouvido.
— Só mais um pouquinho. – respondo, virando para seu lado,
jogando minha perna por cima das suas.
— Isso é um convite? – Andrew pergunta e abro somente um
olho.
— Convite para o que? – pergunto sem entender. Ele olha para
baixo e sigo seu olhar. Minha perna entre as suas, devidamente
colocada ao meio. Ergo um pouco, lentamente e o sinto, fazendo
com que Andrew feche os olhos. – Ainda não. – sorrio, tirando
minha perna dele.
— Isso realmente tem que valer a pena.
— Aonde iremos agora? – pergunto, sentando.
— Tem uma piscina no fundo da casa. – responde. – Mas pensei
em te levar na cachoeira.
— É daquele rio que passamos perto?
— Sim.
— Cachoeira. Sem dúvida alguma.

O sol já está bem alto no céu. Um calor quase insuportável toma


conta do lugar e sinto um alívio por estar aqui e não no Rio, porque
lá na certa esta bem pior.

— O que está achando daqui? – Andrew pergunta ao meu lado,


passando o braço por minha cintura, puxando-me para mais perto
enquanto caminhamos.
— Não dá vontade de ir embora nunca. – respondo, olhando
para ele, que beija minha testa.

— É assim que sinto toda vez que venho para cá. – responde. –
O que acontece desde que eu consigo me lembrar.

Caminhamos abraçados e em silêncio pelo restante do caminho,


até que ouço o barulho pesado da água caindo alguns metros mais
a frente e corro para chegar mais rápido.

— É LINDA! – exclamo, olhando para o topo da cachoeira.


— Você parece uma garotinha de cidade grande que nunca
esteve perto de uma dessas. – Andrew comenta parando atrás de
mim.
— Talvez porque eu seja essa garota que nunca esteve perto de
uma cachoeira de aproximadamente quinze metros.
— Eu poderia fazer qualquer coisa que quisesse com você aqui.
– ele diz quando sento na beira do rio, colocando as pernas para
dentro da água. – Ninguém ouviria você gritar.
— Então por que não faz? – eu o desafio.
— Por mais que eu queira fazer isso, não seria a mesma coisa. –
responde, sentando ao meu lado.

Ouço alguma espécie de pássaro cantar ao longe, fazendo-me


pensar em quais tipos de animais vivem aqui. Ou melhor, quais
seriam as chances de um animal mais selvagem aparecer por aqui?

— O que está fazendo? – pergunto ao ver Andrew levantar,


desabotoando sua bermuda.
— O que mais você acha que estou fazendo? – pergunta de
volta.
Milhões de pensamentos passam por minha cabeça e tenho
certeza de que nenhum deles seja algo apropriado, embora todos
sejam tentadores.

— Vou nadar. – responde no meu lugar. Definitivamente eu não


tinha pensado nisso.
— Assim? – pergunto.
— Na verdade eu queria nadar nu. Mas não acho que seja muito
saudável. – diz, jogando a bermuda em meu rosto.

Pego sua bermuda, dobrando para colocar ao meu lado. Quando


volto o olhar novamente para ele, vejo-o me encarando com aqueles
olhos cinza. A malícia estampada em seu sorriso.

Desço o olhar por todo seu corpo perfeitamente esculpido. Cada


músculo me chama a atenção. Continuo descendo. Sua tatuagem
que ainda não descobri o significado, sua entrada... A única coisa
que me impede de ataca-lo é sua cueca branca, ajustada em seu
corpo, como se tivesse sido feita justamente feita para ele. Ou talvez
ela seja quem mais me atraia para fazer isso.

— Meu Deus, Andrew! – exclamo, notando o volume que se


forma em sua perna. – Por que tinha que ser logo branca?! – ele
apenas ri.
— Você devia fazer o mesmo. – diz, ignorando totalmente minha
reação. – Ou vai se arrepender por não ter aproveitado até o último
segundo.
— Eu até entraria. Mas só tenho mais esta roupa.
— Tira. – não é um pedido. – Esta ótima. – diz assim que entra.
— Não sei...
— Esta gelada. – ele se aproxima mais da beirada e estende a
mão, chamando-me para entrar com ele. – Tenho certeza de que
não vai se arrepender.
— Então vira. – peço, fazendo-o franzir o cenho.
— Isso é meio ilógico.
— Por quê? – pergunto, embora saiba muito bem o porquê.

— Tem algo ai que eu já não tenha visto? – pergunta. – Por que


se tiver, pode ter certeza de que quero dar uma conferida melhor
para descobrir.
— Não precisa. – digo, tirando a blusa. Seu olhar grudado em
mim. – Pode ao menos piscar?
— Eu não perderia esse espetáculo por nada no mundo. –
responde. – Até porque, você quase me agarrou quando tirei a
bermuda.
— Não vou responder por mim quando você sair daí. – comento
baixinho, entrando com ele na água. Quente e fria é a temperatura
que sinto.

Depois de uma terrível sessão de tortura na qual Andrew me fez


passar, na qual também fui recusada sexualmente, embora ele
tenha me feito um... Bem! Ele tentou me afogar algumas vezes,
enquanto também me beijava outras várias.

E eu tentei fazer o mesmo com ele, só que não tive tanta sorte,
já que é bem mais forte que eu. Com exceção da parte dos beijos,
porque isso ele deixava.

— O que foi isso? – pergunto, segurando seus braços para


mantê-lo afastado.
— Pareceu um trovão. – responde, olhando para o céu e acabo
imitando-o. Parece que anoiteceu bem antes da hora.
— Acho que não. – digo, voltando a olhar para ele. – Deve ter
sido um leão.
— Não tem leões aqui.
— Hienas? – tento de novo.
— Também não.
— Antílopes?
— Parece que alguém vai perder certa aposta. – diz. – É melhor
voltarmos.
Nado até a beirada do rio e sinto a mão de Andrew em meu
quadril, erguendo-me para ajudar a sair. Corro onde deixei nossas
roupas para poder me vestir de volta. O tempo parece realmente
feio.

— Onde você... – começo a dizer, virando para ele, mas acabo


esquecendo totalmente o que ia perguntar. Era uma pergunta ou o
que?

Andrew está parado atrás de mim. A água escorrendo por seu


corpo. Meus olhos acompanhando uma gota solitária que se perde
em seu umbigo. Porra! Esta tão transparente e... UAU!

— O que você ia dizer? – ouço a pergunta. Meu olhar preso em


sua ereção. – Luara?
— O que?
— Você ia me perguntar algo?
— Melhor você se vestir. – digo, jogando a bermuda para ele e
me viro. – Concentre-se, Luara. Mantenha o foco!
Mais um trovão preenche o céu quando Andrew segura minha
mão.
— Pronta? – pergunta.
— Sim.

Então corremos como se não existisse o amanhã. Corremos até


que estejamos no campo aberto e eu esteja com a cabeça em outro
lugar que não seja na cueca transparente de Andrew.
Outro trovão cai e uma chuva forte começa a cair quando
chegamos perto da caminhonete, deixando-nos ainda mais
ensopados.

Andrew para e vira para mim.


— Parece que alguém está me devendo uma aposta. – diz.

— Não vai querer esperar para se certificar de que é realmente


uma chuva? – pergunto, dando um passo para mais perto dele. –
Pode ser só uma garoinha passageira.
— Esperei tempo demais já. – responde, terminando de
preencher o vazio entre nós e eu o beijo, como nunca fiz antes. Algo
mais especial e significativo. Completo até. Qual foi a última vez que
realmente me senti assim? Nunca, provavelmente. E é como se
aquela frase da Clarice Lispector começasse a fazer sentido para
mim. “Não procure alguém que te complete. Complete a si mesmo e
procure alguém que te transborde.”.

E é exatamente assim que me sinto nesse instante.

Seguro Andrew pela cintura, que me aperta contra si. A chuva


cai forte em nós e ele afasta meu cabelo do rosto quando me afasto,
olhando para ele. Meu coração disparado como se fosse sair pela
boca.

— Eu nunca vou esquecer isso. – diz, beijando meu pescoço e


sorrio, fazendo com que olhe para mim. – Foda-se esse negócio de
tempo. – e, tomando-me em seu colo, ele nos leva para dentro.

Prendo minhas pernas ao redor de sua cintura e ele entra, sem


se quer dar pausas em seus beijos.

Envolvo o pescoço de Andrew em meus braços, mantendo-o


próximo a mim. Ele consegue transformar algo simples em um jantar
chique. Um simples momento no mais especial possível e tornar
uma dor terrível mais suportável. Ele me deixa bem mais alegre com
o pouco que faz.
E eu o amo por isso e muito mais.

— And. – chamo baixinho em seu ouvido, para que não


corramos o risco de que alguém possa nos ouvir. Ele me coloca de
volta no chão apenas quando entramos no que deduzo ser seu
quarto. – Mesmo que não tivesse chovido, eu ia aceitar ser sua
namorada. Assim como já havia aceitado quando voltamos de São
Paulo.

— Que bom. – responde com um sorriso lindo. – Assim não


tenho que usar dos meus meios de persuasão para te convencer a
ser minha.

Tudo o que acontece é apenas resultado do que sabíamos que


aconteceria desde o inicio dessa viagem. E sinto uma felicidade
enorme ao lembrar que fui à primeira mulher que ele trouxe para cá.

— Sabe como terminou aquela história com minha primeira


namorada? – pergunta de frente para mim, arrumando meu cabelo
atrás da orelha.
— Como? – pergunto interessada.
— Nós voltamos.

Meu coração dispara no mesmo instante, assim como aconteceu


quando ainda estávamos lá na cachoeira.

— E esta feliz com isso? – pergunto, passando minha mão por


seu cabelo, beijando-o.
— Como nunca. – sorri, mantendo a mão em minha nuca,
colocando-me em seu colo outra vez.

Andrew senta, deixando o rosto bem próximo ao meu e sinto sua


ereção entre minhas pernas.

Abro a boca na esperança de conseguir dizer que estou


apaixonada por ele, que ele me faz feliz. Ou qualquer outra coisa
que o faça entender como eu me sinto.
— Eu também estou feliz com isso. – sussurro, passando minha
mão por sua barba, sentindo-a pinicar. – E... Eu...

Paro de falar quando sinto sua barba em minha barriga e


começo a rir.

— Andrew, por favor! – exclamo, tentando afastar seu rosto de


mim. – Eu estou tentando falar algo sério aqui! – rio.
— Já conversamos mais do que o necessário. – diz, jogando-me
contra a cama, colocando-se dentro de mim outra vez. – Eu já sei o
que você esta querendo dizer. – sussurra, beijando-me com força.
Capítulo Vinte
Terça-feira

Acordo um pouco antes do normal para poder passar algumas


informações para Julie enquanto eu estiver no trabalho.

Para minha total surpresa (e espanto), ela me ligou ontem já


eram mais ou menos umas oito da noite, quase nove, pedindo para
que fosse busca-la no aeroporto, porque havia pegado férias
“forçadas” depois do chefe dela tê-la ameaçado por “estar
acumulando muitas férias”. O que, em defesa da minha amiga, não
é bem verdade. Julie apenas ama aquele trabalho dela como
arquiteta e não liga para descanso. Às vezes até penso se ela não
viveria no escritório se pudesse.

Mas agora, indo totalmente contra minha melhor amiga, preciso


dizer que ela me ligou em um horário totalmente errado! Eu estava
na cama com o Andrew depois de termos tomado banho juntos pela
primeira vez e no meu apartamento ainda por cima! Tínhamos
acabado de transar no meu banheiro, na minha cama e ele ainda
jogou algo sobre fazermos contra o espelho do meu armário. O que,
sendo bem sincera, estou quase subindo nas paredes com a
insinuação dele.

Na verdade, eu meio que sonhei com isso essa noite, já que ele
não passou a noite comigo para que eu pudesse conversar com
Julie e matar as saudades dela. E depois que ele saiu, nós ficamos
até tarde conversando sobre vários assuntos. Tipo que consegui
convencer ela a fazermos algo na sexta-feira para que eu pudesse
apresentar Igor para ela.
E nada disso foi suficiente para me fazer esquecer o And me
pressionando contra o espelho...

Solto um suspiro longo e me arrasto para fora da cama até o


banheiro, para poder tomar um banho frio e esfriar as coisas aqui.

— Hora de acordar a bela adormecida. – digo a caminho da


cozinha, indo pegar um copo de água gelada para acordar Julie que,
ao contrario de mim, sempre teve um sono bem mais pesado.
Principalmente quando não precisa acordar cedo. – Caceta! – a
palavra me escapa quando tropeço em algo no chão escuro do
quarto, fazendo com que eu quase caia.

Olho para Julie na cama, mas tudo o que ela faz é virar para o
outro lado e continuar dormindo.

— Vamos acordar, Princesa Jujuba. – digo baixinho, molhando


as pontas dos dedos, levando até seu rosto para que caia nela, que
apenas passa a mão no rosto, secando-o. – Vamos lá, Ju. – insisto
e nada! – Queria eu conseguir dormir assim.

Impaciente, viro lentamente o copo pouco acima de sua cabeça,


deixando que a água caia nela até que comece a se debater
assustada.

— FILHA DA...
— Bom dia. – sorrio, fingindo não saber o que aconteceu.
— Bom dia, né? – pergunta irritada e cobre a cabeça, virando
para a parede outra vez.
— Se você dormir de novo juro que jogo um balde.
Julie senta no mesmo instante.
— Já acordei!

— Preciso passar algumas informações para você antes de sair.


– falo.
— Então começa me contando tudo então. – diz. – Cada detalhe.
O que aconteceu. Onde foram no domingo. O que fizeram o dia
todo. E por último, mas nem de longe menos importante: como que
esse “tempo” que você pediu acabou tão rápido?!
— Eu devia ter saído sem te acordar. – respondo, cruzando os
braços. – Dai não adiantaria nem você me ligar dizendo que estava
perdida.
— Você não devia era ter me acordado. Isso sim. – ela retruca. –
Então agora desembucha, porque não vou te dar sossego até
contar.
— Então você vai tomar café da manhã comigo. – dou de
ombros. – É uma troca justa.
— Ok. Ok. Mas só porque não sai de São Paulo e vim até aqui
para te deixar sozinha assim também.

Sorrio, puxando-a pelas mãos antes que possa deitar na cama e


torne a dormir.

Faço um resumo censurado sobre o que aconteceu na fazenda


do And no domingo. Conto que estamos oficialmente juntos, mas
que ainda não podemos ficar juntos publicamente por conta do
trabalho, o que é claro que ela já sabia e um dos motivos pela qual
não ficamos na pizzaria ontem. Conto que andei a cavalo com ele e
nadamos em uma cachoeira linda e gelada. Julie me faz prometer
que a levaremos para conhecer lá quando puder.

Conto cada coisa que consigo me lembrar, mas não que fizemos
sem proteção no domingo e muito menos ontem. Acho que ela me
mataria. O que também me lembra de que preciso passar de uma
farmácia, mesmo que tome pílula.

Quando termino a história, Julie solta um gritinho vitorioso:

— Eu sabia! Eu estava certa e você estava errada. – ela ri. –


Diga que eu sou demais, vai.
— Você é muito convencida. Isso sim. – respondo, ignorando
seu pedido e tomo o restante do meu suco.
— Ah, Lu! Qual é? Vocês são tão bonitinhos juntos. – sorrio,
sentindo meu rosto corar. – Vocês são totalmente OTP.
Franzo o cenho.
— OTP? – pergunto.
Julie sorri ainda mais.
— One True Pairing. – diz. – É a combinação única de dois
personagens. – franzo o cenho com sua explicação. – Quer dizer
que vocês formam um casal perfeito, Lu.
— Ah...
— Eu fico imaginando a hora que vocês vão finalmente poder se
assumir para todo mundo e aparecerão em todas as revistas, sendo
notícia do mais novo casal do momento. – vejo um sorriso divertido
no rosto da minha amiga. – Luara namorando o dono da maior
empresa tecnológica das três Américas. Quem diria.
— Teoricamente ele é filho do fundador. – murmuro mais para
mim mesma. – Ele assumiu o lugar do pai há quase cinco anos, mas
os escritórios em outros estados são todos dele.
— Independente, sua chata! – exclama. – Afinal, quais eram as
instruções?

— Ah, sim. Claro. – puxo na memória as coisas que tinha para


dizer. – Bem, você pode ficar aqui à vontade. – começo. – Se quiser
ir à praia, siga sempre em frente, depois que passar pela portaria.
Da uns quinhentos metros. Mais ou menos três quadras. – franzo o
cenho, olhando para ela. – Não tem como você se perder. Nem eu
me perdi.

— E isso já é algo. – ela interrompe.


— Calada. – rio. – Se quiser almoço, tem tudo no armário. Só
deixa tudo limpo e no lugar, por favor. Mas, se quiser algo diferente,
de uma interfonada na portaria. Vou deixar avisado lá que você esta
comigo para o caso de precisar. Mas também tem a internet, pode
escolher o que você quiser.
— Por quanto tempo você comeu Fast Food depois que se
mudou? – Ju pergunta.
— Só no primeiro dia. – respondo. – Sabe que não gosto muito
disso.
— Tudo bem. Mais alguma coisa, mamãe?
— Sim. Não fale com estranhos. – sorrio, levantando para levar
minha louça até a cozinha.
— Mas não é justo! – exclama atrás de mim. – Por que você
pode e eu não?! E se um desses for meu futuro namorado?
—Porque eu já tenho alguém para te apresentar. – respondo,
virando para ela.
— Espero que realmente valha a pena. – diz. – Não quero voltar
para Sampa sem pegar ao menos um carioca. Isso seria crueldade.
— Alguma vez te apresentei alguém que não tenha te rendido
bons momentos? – pergunto, cruzando os braços, apoiando-me na
pia.
— Bem, não.
— Alguma vez você me apresentou alguém que tenha me
rendido bons momentos?
— Não. Mas você passou os últimos três anos com aquele idiota
do seu ex. Então não conta.
— Tecnicamente eu passei o último ano inteiro sozinha, já que
ele estava estudando fora.
— Você tirou o ano de celibato e saiu dele quando conheceu o
Andrew. – corrige e sorrio.

— A questão é que você esta em divida comigo.


— Não que você precise de ajuda com isso, né. – resmunga.
— Não estraga Ju! – exclamo, fazendo com que ela ria. –
Preciso ir. Não quero me atrasar.
Dou a volta no balcão indo até onde ela esta e beijo seu rosto.
— Se for dar sumiço deixa a chave na portaria. Por favor!
— Vou tentar me lembrar disso. – diz também beijando meu
rosto. – Bom trabalho.
Sorrio ao ouvir sua frase. Já faz um bom tempo que não ouço
essas palavras.
— Obrigada!
— Igor! – chamo assim que o vejo na cantina, no horário do
almoço. – Tenho novidades para você.
— O que houve agora? – ele responde, sentando comigo.
— Lembra que ontem você disse para te ligar quando a Ju
viesse para cá?
— Hmmm... Acho que sim.
— Ontem mesmo ela chegou. Totalmente de surpresa!
— Você se esqueceu de ir buscar sua melhor amiga no
aeroporto/rodoviária? – pergunta desconfiado.
— Não! Eu não esqueci! – exclamo. – Nunca que eu esqueceria
minha melhor amiga assim. – fecho a cara para ele. – O importante
é que ela esta aqui e pensei em fazermos uma noite de jogos lá em
casa, porque eu não posso ser vista com o...

Paro de falar, mordendo a língua.

— Então é verdade? – ele pergunta.


— O que é verdade? – pergunto de volta.
— Você e ele? – Igor olha para o lado, certificando de que
estamos sozinhos. – Você sabe de quem estou falando.

— Pedro te contou? – pergunto baixando a voz e ele confirma. –


Claro que ele não aguentaria guardar segredo por muito tempo.
— Na verdade eu meio que já estava desconfiado. – diz. – Ele
apenas confirmou e, bem, depois de ontem ficou mais do que óbvio.
Quer dizer, a maneira com que ele agiu durante minha briga com
Bruno e seus olhos brilhantes, exalando endorfina para todo mundo.
– Igor sorri para mim, batendo com o ombro no meu. – Fico feliz por
vocês.

— Estava tão na cara assim? – pergunto, sentindo meu rosto


corar.
— Você esta apaixonada, Lu. – responde. – Seus olhos estão
brilhando só por termos começado esse assunto.
Escondo meu rosto entre as mãos.
— Então todos já devem ter notado. – murmuro.
— Na verdade, não. – Igor diz e ergo o olhar para ele. – Quando
Bruno começou a briga ontem, ele veio me enchendo o saco com
essa história. Ameaçou espalhar para todo mundo se não te
convencesse a sair com ele.
Abro e fecho a boca sem ter o que falar.
— Eu estava sozinho com os rapazes. – continua. – Depois as
três garotas chegaram e ele foi mexer com elas. Foi ai que...
— Obrigada. – digo, apertando-o em um abraço. – De verdade.
Você tem sido um dos poucos amigos meus aqui que sinto que
posso confiar.
— Acha seguro me abraçar aqui assim? – pergunta assim que
afasto. – Não corro risco de ser demitido também?

Sua pergunta, embora de brincadeira, me faz rir.


— Claro que não! – exclamo. – Ele não é assim. Você vai ver na
sexta.
— Se é que eu ainda estarei vivo depois de amanhã. – diz.

— Vai sim. – sorrio, incentivando-o. – Já tive algumas reuniões


com ele e alguns diretores e sócios e os carai a quatro por conta
desse treinamento e ele foi à pessoa que mais me deixou
confortável no meio de todos. Mas acho que só na terceira que fui
me sentir realmente segura.
— Isso porque vocês estão se agarrando as escondidas.
— Diz isso porque não viu os sermões que ele me deu quando
mostrei meus primeiros esboços do projeto para Nova Iorque. – faço
uma careta, me lembrando de quando apresentei um modelo de
jogo para Andrew logo depois que ele me pediu para deixar algo
semi pronto. – Achei que ele fosse me jogar pela janela.
— Não acho que seja tanto. – Igor ri.
— Se eu sobrevivi, você também consegue.
Levanto para poder ir jogar meu lixo na lata e volto até ele.
— Depois mando meu endereço por mensagem.
— Tudo bem.
— E, por favor, não comente nada com ninguém sobre isso. –
peço. – Pelo menos por um tempo.
— Seu segredo está bem guardado comigo e os rapazes. –
franzo o cenho. – Eles estavam junto quando aconteceu. Mas já
conversei com eles. Esta tudo bem.
Aceno com a cabeça, concordando.
— Obrigada então.
— Devo levar algum jogo? – pergunta.
— Ah, por favor! Os meus ficaram todos em São Paulo e não sei
se seriam tão bons a esse ponto.
— Tenho um que é bem interessante. – diz também levantando e
seguimos para o elevador, para voltarmos ao trabalho.
As duas horas que seguem depois do meu almoço, utilizo para
melhorar meu projeto para apresentar depois do treinamento. Eu
não tenho nem ideia de como vou apresentar ele e muito menos
para quem, o que me deixa ainda mais nervosa. Ou se irei
conseguir fazer isso. Ou vender minha ideia, como Pedro disse que
eu deveria fazer nessa apresentação. Ou qualquer outra coisa que
eu tenha que fazer.

Quer dizer, só de imaginar que terei várias pessoas


desconhecidas analisando meu trabalho já é mais do que suficiente
para me fazer desistir dessa viagem no mesmo instante, porque não
sei se sou capaz disso.

Cruzo os braços sob a mesa, apoiando a cabeça sobre eles.

— Eu não consigo fazer isso. – murmuro quando meu celular


toca ao meu lado. – Alô?
— Por favor, gostaria de falar com Luara May Brudosck. – uma
mulher diz do outro lado.
— Sou ela. – digo, endireitando-me. – Quer dizer: Sou eu.
— Boa tarde, Luara. Aqui é a Solange, do DPF. – ela apresenta-
se. – Estou ligando para avisar que seu passaporte ficou pronto e
me desculpar pelo atraso. – Um belo atraso, por sinal. Eu viajo
semana que vem e achei que não fosse poder ir! – A senhorita pode
comparecer aqui ainda esta tarde ou amanhã cedo para retira-lo?

Hoje acho que seria melhor. E é bem mais garantido que Pedro
me libere.

— Claro. – digo. – Passo ai dentro de algumas horas.


— Tudo bem. Estarei no seu aguardo. É só me procurar. –
Solange diz. – Até daqui a pouco.
— Até.
Encerro a chamada, colocando meu celular no mesmo lugar de
antes e olho para meu notebook, onde tenho meu projeto aberto.
— Talvez eu tenha mais sucesso se tentar ver isso de casa. –
resmungo, fechando-o e o guardo na mochila. – Agora só preciso
encontrar Pedro e pedir para que me libere.

Andei por todo o andar do TI a procura de Pedro, mas não


encontro em lugar algum e ninguém soube me dizer onde ele pode
estar. Então, como estamos sem nenhuma secretaria no setor, estou
descendo até a recepção, na esperança de que Daiane possa me
ajudar com isso.

— Daiane, oi! – exclamo assim que saio do elevador, já indo até


onde ela esta. – Preciso da sua ajuda.
— Claro. – ela sorri. – O que houve?
— Pode me dizer onde encontro o Pedro? – peço. – Preciso
muito falar com ele.
— Agora são duas e vinte e três. – diz, consultando o relógio em
seu pulso. – Ele esta em reunião com o Presidente junto dos outros
encarregados. – informa.
Ótimo! Agora só preciso conseguir tirar ele de lá.
— Será que não tem como falar com ele?
— É importante? – faço que sim com a cabeça e ela pega o
telefone, discando algum ramal. – Vou ver o que posso fazer por
você. – sorrio agradecendo. – Passa para o Pedro, por favor.

Não demora muito até que Daiane volte a falar, desta vez com
Pedro:

— Pedro, boa tarde. – diz. – Estou com a Luara aqui comigo e


ela disse que precisa falar com você... – e faz uma pausa,
esperando. – Claro. Vou dizer. Obrigada. – desliga. – Ele pediu para
que suba até a sala de reuniões do vinte.
— Obrigada! – digo já correndo para o elevador e o programo
para que suba direto.

Fixo o olhar no painel dos andares, contando cada bolinha que


pula. Um, dois, três, quatro... Dezoito, dezenove, vinte.
A porta abre no vigésimo andar e saio apressada, caminhando
até a porta fechada em um corredor, onde marca Sala de Reunião
em uma pequena placa cromada e em letras pretas.

Dou duas leves batidinhas na porta, anunciando minha


presença.

— Entre. – ouço uma voz feminina do lado de dentro e abro a


porta de vagar, entrando apenas o suficiente para poder chamar
Pedro. Ao todo devem ter quinze pessoas aqui. Isso sem contar
Andrew. – O que você precisa, querida? – acredito que a mesma
mulher de antes seja essa. É uma senhora baixinha de cabelos
loiros e de cara fechada. Eu já a vi antes em algum andar e na
reunião que teve final do mês passado.

— Por favor, preciso falar com o Pedro. – digo, procurando por


ele, que se levanta, vindo até mim e por uma breve fração de
segundos, meu olhar cruza com o de Andrew, que me da um sorriso
discreto e me vejo retribuindo.
— O que aconteceu? – Pedro pergunta. – Onde é o incêndio,
garota?
— Recebi uma ligação da Solange. – informo. – Posso ir buscar
meu passaporte? Prometo pagar as horas que ficar fora amanhã
sem falta.
— Espera. Já vamos resolver isso.

Ele entra outra vez, indo conversar com And e volta menos de
um minuto depois.

— Pode diz. – diz. – Pegue uma declaração com ela e não terá
que compensar o tempo fora. Eles já são acostumados a fazer isto
para nós.
— Obrigada. Prometo compensar isso amanhã sem falta.
— Tá, tá. Preciso voltar.

Não chego a gastar nem mesmo uma hora para chegar ao DPF,
apesar do congestionamento monstruoso que costuma fazer essas
horas.
Deixo meu carro no estacionamento e entro no prédio, onde
várias outras pessoas já aguardam na frente.

— Boa tarde. – digo a uma mulher na recepção. – Falei com


Solange a pouco e ela pediu para passar daqui para pegar meu
passaporte.
— Qual seu nome? – pergunta.
— Luara May Brudosck. – respondo e ela começa uma busca no
computador.
— Em nome da BIT Technologies? – torna a perguntar e
confirmo. – É só aguardar ali que ela já lhe atendera.
— Obrigada. – digo.

Hoje tem pelo menos vinte pessoas aqui. Um número


consideravelmente menor do que o que tinha da última vez em que
estive aqui. Talvez seja até mesmo pelo horário, não sei.

Sento-me em um banco próximo da janela, tirando meu celular


do bolso e digito uma mensagem para Julie:

Chego mais cedo hoje. Topa jantar fora?

Julie responde em poucos segundos:

Estou entediada!
Sem dúvidas! Seu amigo tb vai?
Ou seremos apenas nós duas?

Só nós duas, como nos velhos tempos.


Por que não saiu?

Noite das garotas! Hahaha


Sai cedo, mas não tinha muito que fazer à tarde.
— Luara Brudosck. – ouço alguém chamar e guardo o celular de
volta, levantando.

Sigo até onde uma mulher bastante atraente esta parada à porta
com uma prancheta em mãos.

Eu a observo no pouco espaço em que nos separa: morena,


baixinha de seios fartos (quase tanto quanto Julie!). Seus óculos
pendem na ponte de seu nariz, como se quisessem cair.

— Boa tarde. – diz. – Sou Solange. – ela estende a mão para


mim e a cumprimento. – Entre e sente-se, por favor.

Faço o que Solange diz e ela contorna sua mesa, começando


uma busca por algo em suas gavetas.

— Aqui esta você. – diz, colocando uma pasta com meu nome
sob a mesa. – Quando me disseram que a pessoa que havia
ganhado a viagem para Nova Iorque este ano era uma garota e que
iria viajar com Andrew, eu não acreditei. – começa a dizer enquanto
pega uma caneta junto das outras. – Precisava ver com meus
próprios olhos para ter certeza.

— Não que isso seja algo demais. – respondo, cruzando as


pernas por debaixo da mesa. – É só um treinamento para o
trabalho. Apenas iremos viajar no mesmo avião e talvez ficaremos
no mesmo hotel. – dou de ombros.

— Claro que não. – ela sorri de maneira debochadora. – Você é


apenas a funcionaria dele. Não é mesmo? – ri. – Jamais saberá o
que é ter aquele homem.

Ai. Que ótimo. Agora só falta ela me dizer que dormiu com ele,
que isso e aquilo. Reviro os olhos com a ideia. O que não duvido
nada que tenha acontecido.

— É uma pena que ele não se relacione com pessoas como


você. Você é bonita até. – diz, passando algumas folhas em minha
pasta. – Quando nós saímos, foi a melhor noite da minha vida. O
corpo daquele homem. Seu tamanho... Ah! – ela solta um suspiro
misturado com um gemido. Sério isso?

Passo a mão pelo cabelo e começo a balançar a perna. Apenas


resultado da minha irritação chegando.

— Por que tão tensa? – Solange ri. – Não acha que realmente
seja uma pena você trabalhar com ele? Imagine vocês dois
sozinhos naquela cidade por um mês...

— Não, eu não acho que seja uma pena. – solto as palavras no


automático. – Mesmo que eu não possa me relacionar com ele,
porque sou apenas uma funcionária, como a senhora bem colocou,
ao menos eu o vejo. Estou no mesmo lugar que ele todos os dias e
posso ter algum possível delírio com a real imagem dele. Não com
algo que ficou no passado dele e que pouco deve se lembrar. –
sorrio, balançando a cabeça. – Se é que ele se lembra do que
aconteceu. – troco a perna de cima pela outra. – E como você
também bem colocou: estaremos sozinhos em uma cidade estranha
e apaixonante, em outro país. Quem sabe o que não pode
acontecer em um lugar desses?

Arqueio a sobrancelha para Solange, apreciando a tensão em


seu rosto. Na certa ela esperava que eu fosse dar qualquer tipo de
resposta. Só queria falar e falar e me que eu baixasse a cabeça e
ficasse quieta, porque, afinal, eu sou “apenas a funcionária”. Mas
ele é meu namorado, droga!

— Esta insinuando algo, querida? – pergunta de volta. Seu tom


de voz levemente alterado.

— Não estou insinuando nada, querida. Apenas constatei os


fatos pelo que você mesma me disse aqui. – O que estou fazendo?!
– Você até mesmo gemeu na minha frente quando falou da possível
noite de vocês.
Não consigo conter a risada ao vê-la corar e fechar a cara para
mim.

— Assine aqui para mim. – diz, jogando alguns papeis do meu


lado da mesa, entregando a caneta para que eu assine e o faço o
mais rápido possível para poder sair daqui o quanto antes.
— Pode me arrumar uma declaração de comparecimento? –
peço quando ela me entrega o passaporte. – Preciso justificar a
ausência.
— Claro. – diz e imprime o papel com tudo o que preciso,
assinando no final.
— Obrigada. – digo assim que me levanto. – Posso fazer uma
pergunta?
Solange me olha ainda mais séria de que antes, mas tenta
disfarçar sua raiva que esta sentindo de mim.
— Pois não?
— Quanto tempo já faz desde que vocês dormiram juntos? –
pergunto e me arrependendo no mesmo instante em que a faço.
Mas preciso saber, porque, afinal, ela esta falando do meu
namorado. E não é como se eu estivesse desconfiada do And. Sei
que ele não faria isso.
— Dois meses. – responde sem desviar os olhos de mim.
Certo. Sorrio aliviada. Isso quer dizer que isso foi bem depois de
mim.

Ao mesmo tempo em que sinto alivio, também sinto uma irritação


por saber que ela pode ter sido uma das várias Vadias Aleatórias
que não me deixaram dormir a noite por fazer escândalo.

Caminho até a porta para sair, mas não consigo segurar a


resposta e me viro para ela novamente. As palavras praticamente
saltando em sua direção:

— Se me permite dizer uma coisa: se já passou tanto tempo e


ele não te procurou, quer dizer que não foi tão bom para ele assim
como você imagina. – sorrio. – Tenho certeza que do contrário ele
teria te ligado.
Abro a porta e saio, deixando-a com esta dúvida na cabeça.
Andrew não ligou e nem nunca vai ligar para qualquer outra,
porque vou me certificar muito bem de que ele não tenha motivos
para querer fazer isso.

Entro no meu carro, jogando minha bolsa no banco do


passageiro. Meu celular toca no exato instante em que coloco a
chave no lugar para dar a partida e sair. Eu o pego apenas para ver
a imagem de Andrew e depois recuso sua chamada.

Segundos depois ele liga de novo e atendo.


— Esta tudo bem, Anjo? – pergunta preocupado.
— Claro. Por que não estaria? – ironizo minhas palavras. Eu
quero bater, socar ele, mas tanto. Tanto! Mesmo que seja por um
motivo bobo como este e que ele não tenha lá culpa de que uma
das vadias resolveu se insinuar para mim.
— Topa uma caminhada na praia hoje à noite? – pergunta com
uma voz suave e sexy, fazendo com que eu me sinta mal por minha
grosseria.
— Não vai dar. Combinei de levar a Ju para jantar.
— Estou sendo trocado por sua amiga? – sinto o sorriso em sua
voz, mas os seios de Solange pulam na minha frente outra vez.
— O nome “Solange” significa algo para você? – pergunto
realmente irritada.
— Merda! – exclama. Então a vadia não mentiu! Bufo, sem
conseguir conter a raiva. – O que ela te disse? – pergunta
preocupado.
— Nada. Só que você foi a melhor transa que ela teve e que esta
esperando sua ligação para a segunda noite. – começo a dizer da
maneira mais calma que consigo. – Disse também que era uma
pena que eu não passasse de uma reles funcionária sua e que
nunca saberia como é isso.
Faço uma pausa, soltando a respiração.
— Você sabe que isso não é verdade, minha linda. – diz. – O
que foi que você respondeu para ela?
— Preocupado com sua amiguinha?
— Não. Só não imagino que você tenha ficado calada.
— Falei que se em dois meses você não a procurou, não havia
sido bom como ela imaginava. Que do contrario você teria ligado.

Andrew ri com minha resposta e preciso me segurar para não


fazer o mesmo. Tenho que mostrar que estou brava com ele por isso
e ainda sinto vontade de bater nele.

— Eu nunca fui atrás de nenhuma mulher. – ele diz. –


Independente de quem ela fosse.
— Foi atrás de mim. – digo, arqueando a sobrancelha. – Pelo
menos foi o que me disse.
— Solange não foi exceção. Você sim. – Andrew suspira do
outro lado e ouço algo bater contra a madeira. – Acha mesmo que
menti sobre aquilo?
— Andrew, tem um guarda do outro lado da rua que esta me
olhando feio. – digo em resposta, olhando para o senhor do outro
lado. – Não estou afim de tomar multa.
— Apenas me diz antes. – insiste.
— Eu não acho que tenha mentido And. – digo baixando a voz. –
É só que aquela mulher me irritou e eu devo estar entrando na TPM,
porque quero dizer um monte de coisas para você e nenhuma delas
é boa neste momento. – suspiro. – E ela tinha aquele jeito de ficar
dando volume aos seios e não parava de olhar para os meus como
que dissesse: “Você nunca poderá satisfazer os desejos carnais
daquele homem. Você não tem conteúdo para o que ele tem para
dar a uma mulher.”.

Engulo em seco. Eu realmente disse isso?

— Eu adoro seus seios. – Andrew diz com uma calma


surpreendente, fazendo-me rir. – Eles são lindos e empinadinhos.
Além de que cabem perfeitamente em minhas mãos.
— Me diz que não tem ninguém ai com você. – peço, ainda rindo
sem graça, sentindo meu rosto corar.
— Estou aqui trancado na minha sala com alguns contratos que
estão errados e droga, estou cansado!
— Isso explica a pancada que ouvi antes.
— Estou cansado de ter que mandar as pessoas fazerem as
coisas direito. E irritado. – ele suspira. – E merda! Quando é que
você vai me deixar ter você aqui?
Arregalo os olhos com a mudança repentina de assunto.
— Tá. Não precisa responder agora. Mas por favor, pense com
carinho. Estou doido por isso.
— Vou pensar. – sorrio, olhando outra vez para o lugar onde
antes havia um guarda.
— Se seu medo é sobre você não ser suficiente para mim, passe
do meu apartamento quando voltar que te darei a resposta para
isso.
— E a resposta é “sexo”? – pergunto interessada.
— Não hoje. – diz. – Não para isso, pelo menos.
— Vou tentar não voltar muito tarde.
— E eu vou tentar não dormir tão cedo hoje. – sorrio com sua
resposta. – Espera.
Ouço Andrew falar com alguém do outro lado, mas não consigo
ouvir o que essa pessoa diz.
— Preciso desligar. – ele fala assim que volta comigo na linha. –
Tenho uma reunião daqui a pouco e depois poderei ir para casa.
Vejo você à noite então?
— Sim, claro. – respondo. – Estou com saudades de dividir a
cama com você. – sussurro.
— Então essa noite eu não vou deixar você sair de perto de mim.
– sussurra de volta.

Quando chego ao Golden, Julie já esta toda pronta e trabalhada


no look verão carioca, apenas esperando para que possamos sair.
Deixo minhas roupas separadas em cima da cama, indo direto para
o banho.

— Não demora que eu estou faminta! – ela exclama assim que


me vê passar pelo quarto.
— Relaxa xuxu. – respondo. – É só me trocar agora.
Visto um short e uma rasteirinha, fazendo uma pausa para
arrumar meu cabelo.
— O que você fez o dia todo? – pergunto assim que Ju entra,
jogando-se em minha cama.
— Deixe-me ver... Cedo caminhei na praia, almocei e dormi
quase que a tarde toda, até que você me mandou mensagem. – ela
da de ombros. – É bem solitário assim.
— Desculpa. – peço enquanto visto uma blusa.
— Tudo bem. Estou mesmo precisando descansar, afinal. – ela
sorri para mim pelo espelho. – Além de que, eu já sabia que vir para
cá quando você esta no auge da sua carreira como “garota de
programa” significava não termos tanto tempo juntas.
Fecho a cara para ela, mas acabo sorrindo.
— Vamos? – pergunto.
— Tem certeza de que não quer Andrew junto? – pergunta
quando me viro para ela.
— Noite das garotas. – respondo. – Vou vê-lo mais tarde.
Apenas me faça o favor de decorar o caminho de volta.
— Só não me de trabalho. – responde abraçando minha cintura
e passo o braço por seu ombro. – Embora eu ache que não seja
seguro você encher a cara e depois ir ficar com ele.
— Não quero encher a cara. Apenas me divertir com minha
melhor amiga.

O restaurante que vamos nem de longe é algo exuberante. Muito


pelo contrario, já que é apenas um que fica perto da praia, de frente
para o calçadão.

Eu almocei lá em um domingo sozinha e a comida deles é muito


saborosa e de um cardápio bem variável. Além de que também tem
alguns drinks especiais na qual quero provar

— Lu, eu acho que você deveria ir com um pouco mais de calma


com isso ai. – Julie recomenta ao ver a garçonete deixar nossos
pedidos.

— Não sabe o quanto é bom. – digo, provando da minha Apple


Martini. De jantar fiquei com: arroz, fritas, salada e filé de peixe.
— Imagino que sim. Mas não está para mim hoje.
— Vai estar na sexta. – faço cara de apaixonada para ela. –
Alias, até quando pretende ficar?
— Por mim me mudaria de vez para cá. Então... – ela faz uma
pausa, tomando um pouco de seu suco de abacaxi com hortelã. –
viajo na terça-feira à tarde, já que você vai me abandonar na quarta.
— Um mês em terras internacionais! – exclamo, erguendo meu
copo para um brinde imaginário.
— Me traga presentes. – ela pede.
—Claro! Para todos vocês! Mesmo que seja uma coisinha
minúscula.
— Não quero uma coisinha minúscula. – Ju franze o cenho. –
Quero algo importante.
— Para você trarei uma parte da Estátua da Liberdade. – sorrio.
– O melhor para minha melhor!
— É o mínimo que você pode fazer por todos esses anos que
tenho aguentado sua chatice.
Faço cara de ofendida, mas acabo sorrindo.
— Você merece um brinde. – ergo novamente meu copo e desta
vez Julie se junta a mim. – A melhor amiga que eu poderia ter neste
mundo!
— Onde fica a famosa gruta? – Ju pergunta enquanto
caminhamos abraçadas pela praia. Na verdade, ela meio que esta
com medo de que eu caia. Mas eu apenas estou feliz. Não bêbada.

— Lá. – aponto para o escuro, bem longe.


— Não vejo nada.
— É porque fica bem longe daqui. – respondo rindo. – Quando
você vem do condomínio, vira à direita. É bem de frente com o mar
em uma área mais rochosa. Quase ninguém vai lá. Segundo And.
— Mas você foi e se deu bem. – lembra.
— Mas eu fui e me dei muito bem! – corrijo rindo e ela me
acompanha.
— Temos que voltar. Você não esta nada bem.
— Você tem razão toda!
Deito na areia fria, de maneira que Julie tem que me puxar pelas
mãos para me ajudar a levantar novamente.
— Toma a chave. – estendo meu chaveiro para Julie, ainda
dentro do elevador.
— Você não vem? – pergunta.
— Tenho coisas pendentes. – sorrio em resposta.
— Não acho que você esteja em boas condições para isto.
— Tudo bem. Não estou tão mal assim.
— Se insiste. – ela sorri.

O elevador chega ao último andar e espero até que ela tenha


entrado em meu apartamento, para só então ir tocar a campainha
na porta oposta a minha.

Como Andrew demora a responder, toco mais duas vezes,


apenas para ter certeza de que ele ouviu.

— Já vai. – ouço sua voz do lado de dentro e toco mais uma


apenas para provoca-lo.
— Oi. – sorrio, debruçada em sua porta assim que a abre.
— Apressada. – diz, dando um beijo leve em meus lábios.

Observo Andrew, que esta usando apenas uma cueca boxe


preta. Seu cabelo todo bagunçado, assim como seu rosto também
está marcado pelo travesseiro, provando que ele já estava
dormindo, embora ainda sejam dez horas.

— Atende todas suas visitas assim? – pergunto sem desviar os


olhos de sua tatuagem.
— Só as que me convém. – responde, seguindo meu olhar e
sorri. – Em que lhe devo a honra?
— Quero saber se sou ou não mulher suficiente para suprir todos
os seus desejos carnais. – digo, voltando a olhar em seus olhos,
vendo seu sorriso malicioso.
— Acha mesmo que estaria com você se não fosse? – pergunta
e o ignoro, empurrando-o de volta para dentro de seu apartamento e
fecho a porta. O volume em sua cueca tão visível e convidativo.

Analisando minhas opções, sei que o quarto de And fica muito


longe e que por experiências anteriores, seu sofá não é nem de
longe um lugar ruim para isso. Até mesmo seu tapete é bem
confortável. Qualquer um dos dois é mais do que suficiente para o
que tenho em mente. Ou o gelado de seu piso.

Seguro as mãos de And, levando-o até o sofá e o empurro para


que se sente, sentando em seu colo e ele rapidamente tira minha
camisa e beijo seu pescoço enquanto exploro seu corpo com todo
meu desejo.

Sinto minha cabeça doer e começar a girar, assim como também


sinto um gosto amargo subindo pela garganta e minha barriga doer.
Paro.

— O que houve? – Andrew pergunta quando afasto.


— Desculpa. – peço, correndo até seu banheiro, colocando todo
meu jantar para fora.
— Você está bem? – ouço a voz preocupada de Andrew do outro
lado da porta e me sento no chão frio, ainda sentindo meu estômago
doer.

Já tomei bem mais do que apenas três doses e sei que não sou
tão fraca a este ponto. O que diz que muito provavelmente o que
mexeu comigo foi à comida.
Lavo o rosto com água gelada e enxaguo a boca com o
enxaguante bucal.

— Você esta com uma cara péssima. – Andrew diz assim que
apareço na porta, debruçando-me nela.
— Eu me sinto péssima. – murmuro em resposta, aceitando seu
abraço.
Andrew me leva até seu quarto e me deita na cama.
— Vou pegar um remédio para dor de estômago e enjoo. – ele
informa, pousando um beijo em minha cabeça antes de sair,
voltando instantes depois. – Toma.
— Obrigada. – sorrio, aceitando o comprimido e a água.
— Acho que eu te devo uma resposta. – diz, deitando na cama
ao meu lado e apoio a cabeça em seu peito, abraçando-o.
— Deve. – concordo. – Mas agora eu só quero que você fique
aqui comigo. Isso pode ficar para outra hora.
— Você esta um pouco quente. – ele diz, encostando o rosto em
minha testa. – Tem certeza de que esta bem?
— Pode ter certeza de que aquele lugar perdeu uma cliente.

Andrew ri, cobrindo a nós dois.

— Bem, de fato o que eu tinha a falar pode ficar para outra hora.
Agora a prioridade é cuidar de você. – diz. – Só me avisa se sentir
alguma coisa.
Capítulo Vinte e Um
Sexta-feira

Sinto como se essa última semana tivesse passado voando.


Ter a companhia de Julie aqui em casa tem sido ótimo. Já fazia
um bom tempo que não ficamos sozinhas, acordadas até tarde
vendo filme ou jogando conversa fora. Tê-la aqui comigo me fez até
mesmo esquecer por algum tempo o fato de que dentro de quatro
dias e meio estarei embarcando para Nova Iorque. O que, em sua
maioria, tem me deixado louca. Em todos os sentidos.

Mas também consigo ficar a cada dia mais ansiosa por esse
momento. A parte ruim é que não conseguirei ir para São Paulo
antes de viajarmos e que, pela primeira vez na vida, vou passar meu
aniversário longe da minha família, já que será na quinta-feira e
estarei há milhas de distância.

Quando terminou o expediente, vim direto para casa para buscar


a Ju e podermos ir ao mercado para comprar algumas coisas para
nossa Noite de Jogos. Coisas como: salgados, carne para um
churrasco e inauguração da churrasqueira elétrica que ganhei do
meu pai (na qual achei que nunca fosse usar), algumas bebidas,
refrigerantes e doces e chocolates para mim, porque estava com
vontade.

Falando a verdade, depois de passar toda a noite de terça


vomitando e com o estômago ruim, decidi que não vou beber mais
nada além de uma taça de vinho por um boooooom tempo. Menos
ainda comer em lugares que não são tão confiáveis quanto eu
imaginava. O que explica os refrigerantes.

Julie, ao contrario de mim, não quis seguir o mesmo. Até porque


ela não bebeu nada aquele dia e também passou mal. Segundo ela,
apenas não foi me chamar para não “atrapalhar” minha noite com
And. Mal sabia ela que eu estava igual ou até pior que ela.

— Que horas eles chegam? – Ju me pergunta bem quanto o


interfone toca.
— Pronto?
— Senhorita Luara, boa noite. – diz o senhor do outro lado. –
Estou com um rapaz chamado Igor aqui comigo.
— Pode deixa-lo entrar.
— Tudo bem. – ele diz, já encerrando.

Eis aqui a maior novidade da semana: Seu José foi oficializado


porteiro da manhã e passara a trabalhar apenas durante a semana.
Sem sábado e domingo e muito menos feriados. O que deu a ele
bem mais tempo com a família e que me deixou muito feliz, porque
ele é um amor de pessoa.

— Já esta subindo. – informo Ju, certificando-me de que as


coisas estão todas no devido lugar: churrasqueira já assando a
carne em cima do balcão da cozinha, bebidas sendo refrigeradas e
o bolinho de carne com queijo que Ju quis colocar para assar.
A campainha toca.
— Atende para mim, Ju. – peço ainda da cozinha, mas fico
escondida na porta para ver se tem alguma reação especial entre
eles. Mas, para minha surpresa, quem chegou era Andrew.
— Hm... Desculpa. Acho que toquei no apartamento errado. –
ele diz já virando de volta para o corredor.

— Na verdade sua namorada esta ali escondida. – Julie diz um


pouco mal humorada.
— Achei que fosse Igor. – respondo dando de ombros, parando
ao lado de Julie e puxo And para dentro pela camisa, que me da um
beijo de cumprimento.
— Acho que ele está subindo ali. – indica com a cabeça bem
quando o elevador para e corro para fechar a porta antes que Igor
apareça.
A campainha toca pela segunda vez.
— Atende para mim, Ju. – peço novamente e me sento com
Andrew no sofá.
— Idiota. – ela resmunga, mas vai abrir a porta.
— Oi. – Igor a cumprimenta. – É aqui mesmo que mora a Luara?
— Sim. – Ju diz. – Ela esta ali sentada se divertindo da minha
cara enquanto me faz de porteira particular. – ela ironiza cada
palavra, fazendo-me rir. – Pode entrar.
— Com licença.
— É só isso? – pergunto. – Cadê aquela coisa toda onde vocês
finalmente se conhecem depois de muito ouvir falar do outro? Que
seus olhos brilham e se apaixonam a primeira vista?
— Isso só funciona com vocês dois. – Julie diz, fazendo careta
para mim.
— Trouxe os jogos. – Igor informa.
— Temos que fazer esses dois ficarem juntos. – sussurro no
ouvido de And.
— Temos? – pergunta de volta com o cenho franzido.
— Sim. Você vai me ajudar. Não vai? – sorrio para ele.
— Vou ficar te devendo. – diz. – Essas coisas não funcionam
comigo. Geralmente sou a pessoa que quer tirar os amigos dessas
furadas que envolvem sentimentos.

Solto a mão que Andrew segurava, olhando diretamente para


ele, sem conseguir esconder minha indignação com suas palavras.
Ele parece estar realmente falando sério.

— Me conhecer realmente foi bem contra todos os seus


princípios, né? – pergunto e levanto, indo de volta para a cozinha.
Sério?!

Tiro a carne da grelha e as coloco em uma bandeja, onde já


deixei um pouco de farofa e alguns outros aperitivos. Depois, pego
quatro copos no armário, meu refrigerante e uma batida de frutas
feita por Julie. Não existe a menor chance de conseguir levar tudo
isso de uma só vez.

Quando viro, Andrew está parado quase atrás de mim com um


pedaço de carne a meio caminho da boca.

— Esta boa. – diz, jogando-a para dentro. – Me desculpa. –


pede. – Eu não quis dizer nada daquilo.
— Mas disse. – digo, cruzando os braços junto ao peito. – E me
magoou.
— Aquilo foi antes de você. – Andrew começa a explicar. –
Quando algum amigo meu dizia que estava se interessando por
alguma mulher que havia conhecido e que estavam saindo juntos,
eu dizia para cair fora, que não valia a pena. – ele da um passo em
minha direção. – Não posso mais fazer isso, porque hoje sou o cara
que esta afim de uma garota. – da de ombros, jogando as mãos
para o alto. – A grande maioria dos meus amigos sabe que estou
com alguém e todos estão doidos para saber quem foi à vitoriosa
que conseguiu me fazer isso.

Vejo no rosto de Andrew sua parcela de culpa pelo que disse


antes. Ele da mais um passo para frente.
— Meu melhor amigo está saindo com a garota que ele saia e
não conseguir ser contra. – volta a falar. – Ele esta feliz e estou feliz
por ele. Assim como também esta por mim.
— Espera! – exclamo. – Felipe está saindo com a Natalia?! –
baixo a voz e And confirma.
— Desde o início dessa semana.
— Por isso que ela não conseguia focar no Igor. – rio.
— Estou perdoado? – Andrew pergunta agora pousando as
mãos em meu quadril e seguro seus braços.
— Só depois que me ajudar a levar essas coisas lá para sala. –
respondo, ficando na ponta dos pés para poder beija-lo.
—Recompensa antecipada. – ele ri, colocando meu cabelo atrás
da orelha. – Estou gostando disso.
— Seu bobo. – respondo, virando para poder pegar a bandeja e
And pega o restante.
Assim que entramos na sala, vejo que Ju e Igor já arrumaram os
jogos. Ao todo são quatro: War, Interpol, Batalha Naval e Twister.

— Não acho que consigamos comer e jogar Twister ao mesmo


tempo. – digo, colocando os aperitivos na mesinha de centro.
— Sempre rabugenta. – Julie diz.
— Eu conseguiria comer e jogar Twister ao mesmo tempo. –
ouço a voz sussurrada de Andrew em meu ouvido, junto de sua
barba roçando em mim. Meu corpo quase que entra em combustão
no mesmo instante.
— Ela é assim mesmo? – Igor pergunta para ela, que confirma. –
Achei que fosse só comigo.
— Para com isso, And! – exclamo, dando uma cotovelada em
sua barriga, sentindo sua mão em minha bunda. – Agora não. – ele
ri atrás de mim.

— Qual vai ser então? – Andrew pergunta e aperta minha bunda,


fazendo-me pular.
— Qual o problema de vocês dois? – Ju pergunta. – Eu voto em
Twister.
— Estou com ela. – Igor a acompanha.
— Vou dar um jeito de segurar esse jogo aqui na sua casa. –
And diz para mim. – Eu realmente preciso experimentar isso com
você.

Pela primeira vez eu viro para ele, sentindo meu rosto corar,
finalmente entendendo o que ele quis dizer com essa insinuação.

— Você esta de brincadeira, né? – pergunto espantada.


— Por quê? – ele sorri.
— Porque você não pode mesmo estar dizendo que... Isso... –
olho para o tapete de Twister colocado no espaço vazio de maneira
quase imperceptível. Andrew apenas da de ombros.
— Talvez seja uma boa experimentarmos um dia.
— Vocês vão jogar ou não?
Nunca fui boa em Twister. Nem mesmo estive perto de ser boa.
E Tommy sabia disso desde o início, porque era um dos poucos
jogos que ele conseguia me vencer e consegue até hoje e não é
porque eu deixo. Meus colegas do colégio também sabiam muito
bem disso.

Quer dizer, não é como se eu não tivesse equilíbrio suficiente


para isso. Apenas não consigo com tanta gente praticamente em
cima de mim. O que não foi novidade alguma quando cai desta vez,
levando Andrew comigo, que acabou me puxando para cima dele
numa falha tentativa de não cair ele em mim. Segundo palavras
vindas diretamente dele.

Julie, como sempre, ganhou.

— Quem topa verdade ou consequência? – pergunto sentando


no chão, girando uma garrafa vazia.
— Meu Deus! – Ju exclama juntando-se a mim. – Não jogo isto
desde a época da escola!
— Acho melhor entrarmos no joguinho delas ou estamos fritos
essa noite. – Andrew diz para Igor um pouco alto demais para quem
estava cochichando. Seus olhos fixos em mim. – Principalmente eu.
– ele ri. – Estou dentro. Mas que fique claro que não tenho mais
quinze anos para receber aqueles desafios infantis. – diz, sentando-
se de frente para mim e Igor fica do meu lado direito, fechando
nosso pequeno círculo.
— Agora sim os jogos vão começar! – digo, mais uma vez
girando a garrafa, desta vez para valer. Ela para entre Ju e Igor, com
a pergunta para ela.
— Verdade. – ele diz antes mesmo da pergunta.
— Os boatos de que você é gay são verdadeiros?
— Quê?! Que boatos são esses?
— Você foi a uma boate gay há alguns dias. – Julie ri assim que
Igor vira para mim, mas não diz nada. – Foi o que me contaram.
— Sai com um colega do trabalho que é. – ele explica. – Ele me
levou e sai com duas na mesma noite. Então, sejam lá quais forem
esses boatos, são falsos.
— É isso ai, garoto! – Andrew exclama erguendo a mão para um
hi-five e Igor toca, enquanto eu lanço um olhar feio para And, que ri.

Igor gira e a garrafa para bem entre nós.


— Verdade. – solto de uma vez. Não estou muito certa quanto ao
nível de desafio que vão passar e não quero ser a primeira a
escolher.

— Assim não tem graça. – Igor reclama. – Verdade que você


ficou tão bêbada a ponto de vomitar no início dessa semana?
— Ah, sim! – exclamo. – Tomei tantas que passei a noite inteira
no banheiro.
Andrew ri, porque sabe bem a verdade.

A brincadeira segue pelo restante da noite. Quem não aceita o


desafio proposto tem que beber. O que me faz ter a sensação de
que Julie recusou alguns desafios apenas para poder tomar mais da
batida, porque nem todos eram pesados. Ou difíceis. Igor
igualmente. Já Andrew escolheu apenas desafio até agora e
cumpriu todos. Quanto a mim, estou dividida entre os dois e também
cumprindo meus desafios da maneira com que consigo.

Julie gira e cai para Igor.

— Verdade ou consequência? – pergunto.


— Consequência.
Sorrio, porque finalmente consegui o momento que esperei a
noite toda. Minhas “verdades” foram todas coisas íntimas e meus
desafios foram coisas como dançar Ragatanga ou qualquer loucura
que viesse à cabeça no momento. E agora Igor está bem alterado.

— Beije Ju. – digo.


Assim que ouve minhas palavras, vejo os lábios de Julie
formatem um “o que?!” para mim e sorrio, fazendo-me de inocente.

Igor levanta e vira o rosto de Julie para ele, beijando-a. And esta
do outro lado, distraído com sua bebida, muito provavelmente para
não ter que ver os dois se beijando na nossa frente. Ou o fato de
que não estamos próximos.

Julie é a primeira a afastar e Igor senta no mesmo lugar de


antes, pegando a garrafa e a gira.

— Vai ter troco. – ela diz para mim.


A garrafa para entre nós duas e viro o restante do meu
refrigerante, para só então fazer minha escolha:
— Consequência.
Vejo a malicia estampada no rosto de Julie e sei que coisa boa
não vai sair dela.
— Faça Body Shot no Andrew. – diz, lançando-me um sorriso de
lado. – Na coxa. – completa.

Claro que ela se vingaria na primeira oportunidade. Olho para


Andrew, que tem no rosto um olhar ainda pior que o de Julie. Ele
esfrega as mãos uma na outra com um sorriso travesso de moleque
arteiro.

— Claro. Hm... – franzo o cenho. – Só preciso que me digam o


que é.
— Ela não vai fazer isso. – Igor diz.
— Meu amigo, você não faz ideia do que essa mulher é capaz
de fazer. – Andrew diz, piscando para mim e pego uma almofada de
cima do sofá, jogando-a nele. Meu rosto queima com a menção do
que esse pervertido quis dizer. – Que foi que eu disse? – ri.
— Idiota. – resmungo.
— Lu, é bem simples. – Julie começa. – Você tem que fazer uma
carreirinha de sal na coxa do Andrew, tomar um pouco de tequila no
corpo dele, no caso: na coxa. E a melhor parte: tomar limão direto
da boca dele.

Novamente olho para Andrew, que ajeita o boné em sua cabeça,


dando tapinhas em sua coxa.

Até agora eu não tinha a menor ideia do que era um “Body Shot”.
Mas, qualquer escolha que eu faça, tenho que beber. Então...
Levanto-me, indo até a cozinha, onde pego um limão e o sal e
volto, sentando agora ao lado de And e ergo sua bermuda de futebol
para que fique na altura da perna de sua cueca e faço uma carreira
com o sal. Com a faca, corto uma fina rodela de limão e coloco na
boca dele, virando logo em seguida um pouco da bebida bem perto
de sua virilha.

— Só não pode ficar excitado, ein? – Julie ri.


Coloco minha mão por dentro da perna de Andrew de maneira
que eu possa sentir sua cueca e baixo o rosto, subindo por sua coxa
enquanto retiro o sal. Meus dedos brincam em sua coxa e chego até
a bebida, que a essas horas já escorreu grande parte. Mas ainda
tomo o pouco que resta.

Ergo o olhar para And e o vejo de olhos fechados, mas ele os


abre assim que percebe que me afastei.

Com a mão esquerda na perna dele, uso a direita para tirar seu
boné e colocar de lado em minha cabeça e seguro seus cabelos que
precisam ser cortados. Sua boca brinca com o limão, para cima e
para baixo, convidando-me. Aproximo-me lentamente. Meus olhos
fixos em sua boca, até que encontro seu olhar escurecido pouco
antes de tomar para mim o limão.

Andrew me puxa para um beijo demorado, deixando-me quase


sentada em seu colo de maneira que sinto sua ereção roçando
minha perna. Procuro pela almofada ao seu lado, colocando-a em
seu colo para cobri-lo e ele sorri.

— Não foi pior do que dar um primeiro beijo na frente da melhor


amiga. – ironizo minha frase, mostrando a língua para Ju.
— Depois dessa vou até embora. – Igor diz já levantando. –
Quer ir dar uma volta? – pergunta para ela.
— Claro. Acho que esses dois tem muito que fazer depois dessa
preliminar ai.
— Só não demorem! – digo para Ju.
— Estou levando a chave. – ela responde, fechando a porta
quando sai.
— Tem um lugar lá em cima que quero te mostrar. – Andrew diz,
estendendo a mão para mim.
— Sempre achei que este fosse o último andar. – digo,
segurando sua mão e ele me puxa para perto.
— Estou falando da cobertura. – ele sorri de maneira que faz
todo meu interior estremecer.

Subo com Andrew pela escadaria de incêndio, que fica no final


do corredor, até a cobertura e dou de cara com um céu limpo e sem
nuvem alguma, deixando vista para as estrelas e a lua, que brilham
da maneira mais linda que já vi. Um vento forte sopra, bagunçando
meus cabelos.

— Eu poderia passar todas minhas noites aqui, apenas


apreciando a visão. – digo, olhando para o horizonte, onde vários
outros prédios iluminam a noite. Do outro lado consigo ver o mar e
imagino a calma que ele possui durante a noite. Seu silêncio sendo
quebrado somente pelas ondas quando colidem contra a areia fria
da praia. E imagino sua textura em meus pés, deixando-me
relaxada.

Do outro lado, pouco mais longe, vejo luzes coloridas e


brilhantes, que tomam forma de uma roda gigante e, vários outros
brinquedos em um parque, em algum lugar desta grande cidade.

— É tão tranquilo. – digo, virando-me para Andrew.


— É um dos meus lugares favoritos nessa cidade. – ele sorri e
seguro meu cabelo, impedindo-o de voar para o rosto.
— Já conheço dois dos seus lugares favoritos. – sorrio de volta,
dando um passo em sua direção. – Existe algum outro?
— Dois. – responde. – Um é o alto da minha sala. Quando puder
pretendo te levar lá para poder ver.
— Vou cobrar. – And concorda, envolvendo-me em seus braços
e passo os meus por suas costas, apertando-o. – E qual é o último?
— Eu não diria último. – responde. – Talvez o primeiro.
Franzo o cenho, ficando ainda mais curiosa.
— E qual seria?
— Bem aqui. – ele me aperta junto de si. – Ou qualquer outro
lugar com você.
Abro a boca para dizer algo, mas não encontro palavras. Andrew
prende meu cabelo, colocando-o por cima do meu ombro.
— Eu queria ter trazido você para cá domingo passado para
vermos o eclipse. Mas como choveu e acabou atrasando nosso
retorno, não consegui. – ele da de ombros. – Depois faríamos amor
ali daquele outro lado.
— Acho tão fofo quando você faz essas coisas. – digo,
apertando-o em meus braços.
— “Essas coisas”? – pergunta curioso e apoio a cabeça em seu
peito, sentindo seu coração acelerado. – Tentar transar com você
em lugares diferentes? Tipo no tapete de Twister do seu amigo?

— Você cria momentos, And. – digo, ignorando sua insinuação. –


Mesmo que você fuja deste seu lado a maior parte do tempo, ele
esta com você.
— Não fujo. – diz, apoiando a cabeça na minha. – Eu apenas
não conheço. – completa baixinho.
Ficamos assim algum tempo, em total silêncio, apenas ouvindo o
vento soprando agora mais calmo, sem nenhum indicio de chuva.

Afasto-me de And, pousando um beijo leve no canto de sua


boca, puxando-o para um canto onde tem uma cabine que protege
do vento.

— O que esta fazendo? – pergunta.


— Vou realizar seu sonho. – respondo, sentindo meu rosto corar.
— Qual deles? – sinto o sorriso em sua pergunta e, ao invés de
responder, viro de frente para ele, puxando-o para mim e o beijo. –
Acho que estou começando a lembrar de qual sonho é esse. – And
sorri contra minha boca, levando-nos até a cabine. – E esta um
tempo delicioso para isso. – sussurra em meu ouvido, descendo a
mão por meu corpo, apertando-me contra si.
— Esse começou a ser meu sonho também. – murmuro,
enroscando meus dedos em seus cabelos logo que tira minha blusa,
jogando-a para o chão logo atrás de sua própria camisa.
— Próximo passo é o Twister então. – diz, descendo por meu
seio, fazendo-me rir com a menção do jogo.

Estou deitada no chão com Andrew ao meu lado, observando as


estrelas do céu. Fecho os olhos para poder apenas sentir tudo isto,
assim como senti nosso momento de a pouco enquanto fazíamos
amor sobre a luz das estrelas. E foi uma experiência mais do que
incrível. Sinto o toque da mão dele na minha, entrelaçando nossos
dedos e reabro os olhos.

Andrew está deitado ao meu lado e estou com a cabeça em seu


peito, em um silêncio pleno. Sua outra mão acaricia meu cabelo
ainda mais desgrenhado, fazendo minha visão pesar pelo sono que
só faz aumentar com o vendo.

Seus lábios tocam minha mão e viro para ele, passando meu
braço por seu peito, fazendo-o sorrir.

Ouço um barulho bem distante. Ou seria perto? Não tenho a


menor ideia. Apenas a de que minha mente se distancia cada vez
mais enquanto adormeço nos braços de Andrew, sentindo seu toque
em mim, até que ele também adormeça.

A segurança que sinto quando estou nos braços de Andrew é


algo que nunca antes imaginei ser possível sentir com qualquer
pessoa.
Capítulo Vinte e Dois
Sábado

Acordo ao sentir uma mão quente tocar meu rosto, tirando o cabelo
dele. Abro os olhos e enxergo Andrew, mesmo que embaçado,
deitado ao meu lado, apoiado em seu cotovelo. Ele sorri para mim
assim que me vê acordada.

— Bom dia. – sussurra com sua voz rouca.


— Bom dia. – sussurro de volta, procurando por meus óculos ao
meu lado. – Onde estão?
— Procurando por isto? – ele pergunta, virando para o outro
lado, voltando novamente para mim com meus óculos. – Você
dormiu com eles ontem. – sorri quando o pego, colocando-o no
rosto. – Melhorou?
— Muito melhor. – respondo. – Nós dormimos a noite toda aqui?
– pergunto, de repente lembrando-me de ter adormecido com And
na cobertura, depois de termos feito amor lá em cima. Meu rosto se
aquece apenas por me lembrar do que fizemos.
— Se com “aqui” você quer dizer “na minha cama”, então sim. –
responde. – Acordei em algum momento durante a noite e trouxe
você para cá. Estava esfriando para ficarmos lá e você não estava
lá com muita roupa.
Franzo o cenho.
— Você me trouxe para o seu apartamento e eu nem acordei? –
pergunto curiosa.
— Mais ou menos. – diz. – Você resmungou alguma coisa
enquanto descíamos, mas não entendi direito. – ele suspira, virando
de barriga para cima. – Depois que entramos não consegui dormir
mais.
— Por que não me acordou?
Ele sorri, olhando em minha direção.
— Porque você estava dormindo tão tranquila e despreocupada
que até parecia uma criança inocente. – explica. – Não podia fazer
isso.
— Ficou me vendo dormir? – pergunto e ele confirma.
— Já fiz isso algumas vezes antes. Mas hoje você estava
diferente.
— Diferente como? – pergunto realmente curiosa, sentando-me
e ele faz o mesmo.
— Vamos deixar isto para lá. Tudo bem? – e, levantando, ele vai
até seu armário, onde pega uma cueca.
— And, por favor! – peço. – Me conta.
— Na hora certa você vai saber. – diz, pousando um beijo em
minha testa. – Vou tomar um banho e preparar café para nós.
— Sempre me vencendo pelo estômago. – resmungo e ele
estende a mão para mim, que seguro para poder levantar. – Mas
não vá pensando que vai me enrolar e me fazer esquecer essa
história. – digo, dando um beijo em seu rosto.
— Não espero. Só preciso de um tempo para entender melhor.
— Tempo?
— Não o mesmo que o seu. Se for isto que esta pensando.
— Não pensei. – falo, passando meus braços por sua cintura. –
Mas você me deve um café da manhã digno. Ou já esqueceu?
— Primeiro um banho. – responde. – Depois comemos. – ele
sorri, aproximando o rosto do meu. – Ou podemos tomar banho e
comer ao mesmo tempo. – sussurra em meu ouvido, beijando meu
pescoço. Um calafrio percorre todo meu corpo no mesmo instante.
— Eu voto na segunda opção. – respondo quase que de
imediato. – E depois café da manhã na mesa.
— Eu posso fazer isso.
— Andrew! – exclamo chocada. – Você esta me saindo muito
esfomeado para o meu gosto.
— O quê? – ele ri. – Apenas estou tentando dar conta de tudo o
que consegui.
Mordo o lábio inferior, tentando não dar a resposta espertinha
que ele quer ouvir. Mas, ao invés disto, guio a nós dois até seu
banheiro, ajudando-o a tirar sua bermuda, permitindo que ele tire
minha roupa.

— O que foi? – pergunto depois do café, notando que Andrew


me olha com uma expressão estranha já há algum tempo.
— Nada. Só não me canso de te olhar. – diz em resposta,
passando a mão pela minha. – O que pretende fazer hoje?
Franzo o cenho de maneira pensativa.
— Ir ao shopping comprar roupas novas para a viagem. –
respondo. – Vou ver se a Ju vai comigo e talvez mais algo que ela
queira fazer. Por quê?
— Vai para Nova Iorque por um mês e ainda quer fazer compras
aqui? – sinto um leve tom de ironia em sua pergunta.
— Ao contrário de uns e outros, eu tenho que trabalhar para me
sustentar, pagar minhas contas e a parte do aluguel do meu
apartamento. – digo, cruzando os braços sob a mesa. – Não faço
isso apenas por hobby e menos ainda tenho dinheiro suficiente para
fazer compras em uma cidade como essa.

— Tenho uma proposta para te fazer. – Andrew diz sem desviar


os olhos dos meus. – É quase tão tentadora quanto ir conhecer seus
pais. – sorrio em resposta. – Se topar, levo você para fazer compras
em Nova Iorque onde você quiser e prometo que não vou reclamar
de carregar suas sacolas ou da sua indecisão para escolher um
vestido. Ou sapato.

Suas palavras me fazem rir, mas ele continua sério, o que


mostra que está falando sério.

— Dê-me seu lance e decido se compro ou não.


— Vou visitar meus avós hoje. – diz. – Passar o dia com eles
antes da viagem, passar algumas ordens aos acompanhantes deles.
Conversar com meu avô sobre um assunto. Essas coisas.
— Está me convidando há passar o dia com sua família? –
pergunto sem acreditar muito. Quer dizer, não estou preparada para
conhecer a família de And, mesmo que ele já tenha conhecido a
minha e bem antes de realmente termos algo. Como seus pais
vivem na Europa, eu nunca havia imaginado isso.

Por outro lado, sinto uma alegria imensa por seu convite.
Conhecer os avós é quase como conhecer os pais. Principalmente
se ele é próximo deles, como sei que é.

— Sei que não é tão interessante quanto ir ao shopping com a


amiga, enfrentando toda aquela lotação de pessoas. – ele da de
ombros.
— É legal ser a primeira em algumas coisas na sua vida. – sorrio
enquanto seguro seu olhar. – Claro que aceito. Só não acho que eu
possa me apresentar ao Sr. e Sra. Giardoni assim.
— Não vejo porque não. – ri.
— A que horas você pretende sair?
— Assim que me aprontar. – responde. – Acho que em uma
hora. – ele franze o cenho. – Se for suficiente para você.
Levanto-me da mesa e a contorno, indo até ele.
— Aonde você vai? – pergunta sem entender.
— Se tenho apenas uma hora, preciso começar a me arrumar
agora. – respondo dando um selinho de despedida. – Até daqui a
pouco, lindo.

Procuro no meu armário por um vestido de verão simples e


acabo ficando com um rendado bege clarinho lindo. Para completar,
calço um sapato de salto baixo.
— Vai aonde vestida desse jeito uma hora dessas? – as palavras
de Julie chegam até mim, assustando-me e viro para vê-la parada
na porta do meu quarto.
— And me convidou para ir visitar os avós dele. – respondo. –
Me ajuda aqui. – peço, dando as costas para ela, que fecha o zíper
do vestido atrás.
— Como foi essa noite? – pergunto, olhando para ela pelo
espelho enquanto trabalha em meu cabelo, trançando-o.
— Não sei se percebeu, mas Igor não estava realmente bêbado.
— Já sai com ele vezes o suficiente para saber que não se
entrega tão fácil assim.
— Foi o que pensei. – ela sorri um pouco sem graça. – Fomos
caminhar na praia e ficamos sentados lá durante horas, olhando
para o mar e conversando sobre arquitetura. – começa a contar. –
Ele falou algumas coisas do trabalho de vocês e sobre o “trágico
histórico amoroso” dele a meu pedido.

Ju faz uma pausa para prender o lacinho no meu cabelo,


deixando as pontas soltas.
— Ficamos assim até mais ou menos duas da manhã. Depois
ele me trouxe para cá e você não estava. Então ele foi embora e,
antes que você pergunte, não rolou mais nada depois daquele beijo
que você nos obrigou a dar.
— Me diz que vocês vão sair hoje de novo. – peço, finalmente
virando para ela.
— É... Nós vamos. – ela da de ombros.
— No mínimo você ganha um bom amigo. – comento com um
sorriso.
Julie me ajuda a passar uma maquiagem levinha, apenas para
dar um tom a mais. Por fim, passo meu perfume favorito.
— Como estou? – pergunto, girando no lugar.
— Bem gata. – ela responde e ouço a campainha tocar. – Deixa
que eu atendo. – diz, passando por mim. – Fique aqui.
Sento em minha cama, esperando pelo momento que devo
aparecer.
— O que você fez para a minha amiga? – Julie pergunta.
— Por quê? Aconteceu algo? – Andrew pergunta de volta todo
preocupado.
— Sim. Ela acordou radiante hoje. – Ju diz. – A pele
naturalmente corada, os olhos brilhantes.
And ri.
— Onde ela esta?
— LU!
Com a deixa, saio do quarto, dando de cara com Andrew logo na
entrada para o corredor. Ele esta usando uma calça jeans escura e
camisa de manga três quartos. O que me deixa aliviada por saber
que não exagerei.
— Sempre pontual. – comento, sorrindo para ele, mas não tenho
resposta. And apenas me encara.
— Melhor irmos antes que eu te leve para um lugar onde não
tenha nada a ver com meus avós. – diz passando a mão por meu
quadril e Julie ri.
— Tchau, Ju. – digo.
— Se cuidem, crianças! – ela diz em resposta. – E não
esqueçam: usem sempre camisinha! – grita quando me viro para
fechar a porta, fazendo com que meu rosto fique vermelho como
pimentão.
— Ela sabe de algo? – Andrew pergunta enquanto chama o
elevador.
— Sobre o que? – pergunto parando ao seu lado.
— O comentário.

— Ah! – exclamo. – Não. Não conto essas coisas assim também.


— Achei que sempre contassem tudo uma a outra.
Olho para ele antes de entrar no elevador, mas apenas respondo
quando já estamos descendo:
— Não conto nossas intimidades assim. – murmuro. – Isso é
algo apenas nosso e não acho que mais alguém deva saber o que
fazemos entre quatro paredes.
Andrew segura minha mão, passando o polegar por meus dedos.
— Nem sempre entre quatro paredes. – diz consigo mesmo bem
quando a porta do elevador reabre agora no estacionamento.

Levamos pouco menos de uma hora até chegam a uma mansão


linda e cercada por altas montanhas que, segundo Andrew,
fica no Leblon, na área mais afastada possível.
Ele para o carro logo na entrada do carro e desce, dando a volta
para abrir a porta do meu lado.

— Apresento-lhe o lugar em que cresci. – diz quando seguro sua


mão, olhando para todos os lados, tentando capturar cada imagem.
Alguns pássaros cantam ao longe.
— Eu não sairia nunca daqui. – comento, virando para ele.
— Se esta impressionada com o terreno, precisa ver lá dentro. –
diz, passando o braço por minha cintura. – Ou o jardim dos fundos.

Dentro da casa, vejo que os móveis são todos planejados.


Principalmente os da sala de estar, onde em um canto tem uma
cascata d’água.
— Andrew, meu querido! – uma senhora diz, chamando nossa
atenção para as escadas. – Há quanto tempo não vem nos ver.
— Vim semana passada, vó. – And responde indo até ela,
aceitando seu abraço e um beijo em cada bochecha.

A senhora, a avó de And é pouca coisa menor de que eu. Ou


talvez tenha a altura da minha mãe e me faz lembrar bastante minha
falecida avó. Ela tem os cabelos compridos e brancos como a neve,
manchados de roxo e, em outras partes, azul.

— Quem é sua amiga? – ela pergunta, de repente notando


minha presença e Andrew se afasta, dando a mão para mim,
levando-me até sua avó, no pé da escada. – Não me diga que é
mais uma daquelas suas “amigas” que você trazia para fazer
trabalho da escola, ein.
— Não faço mais isso desde a escola. – ele ri. – Como eu posso
fazer isso? – pergunta mais para si mesmo de que para qualquer
uma de nós.
— Ai, Andrew...

Andrew me coloca bem ao seu lado, passando a mão por minha


cintura e percebo que estufa o peito, como se tentasse tomar
coragem para dizer as palavras. Olhando em seu rosto, vejo que
pela primeira vez esta corado.

— Vó, esta é Luara, minha namorada. – diz de uma só vez,


tropeçando nas palavras. – Luara, esta é minha avó: Anna Giardoni.
— Eu já não disse para não brincar assim comigo, Andrew?! – a
senhora o repreende. – Não vejo a menor graça nessas suas
brincadeiras.
Ao ouvir as palavras da avó, Andrew solta o ar.
— Não é brincadeira. – diz sério.
— Isto é verdade, minha querida? – a Sra. Giardoni pergunta
para mim. – Ele não esta mentindo, não?
— Não senhora. – respondo sem graça e ela ergue minha mão
direita, como se procurasse por algo.
— Não vejo uma aliança de compromisso aqui.
— Colocar uma aliança ai só daria mais motivos para que
dessem em cima dela. – Andrew resmunga, fazendo-me rir. – Não
foi à senhora que disse que eu deveria arrumar alguém de verdade?
Aqui esta: minha namorada.
— De qualquer forma, fico feliz por ser uma moça tão bonita
como você. – ela diz e sinto meu rosto se aquecer.
— Onde esta o vovô? – Andrew pergunta para mudar de
assunto. – Preciso falar com ele.
— No escritório.
— Vou falar com ele para saber como vai ficar nesse tempo que
estarei fora. – informa e vira para mim. – Tudo bem?
— Tá. Tudo bem. Vai lá. – sorrio, aceitando seu beijo e And
segue por um corredor que leva para além da sala.
— Como disse que se chama mesmo? – a Sra. Giardoni
pergunta assim que ficamos a sós.
— Luara. – respondo imediatamente. – Luara Brudosck.
— Bonito nome.
— Obrigada. – dou um sorriso tímido.
— Gostaria de algo? – pergunta. – Água? Suco? Chá? Bolo?
— Não, obrigada, Sra. Giardoni.
Ela sorri.
— Ora! Não precisa me chamar assim, querida. Não precisamos
ser tão formais assim, já que você é a namorada do meu neto. Pode
me chamar apenas de Anna.
— Tudo bem. – sorrio ainda mais sem graça.
— Quer conhecer o quintal dos fundos?
— Claro. Se já gostei do que vi na frente, mal posso esperar
para ver o que tem lá.

Anna concorda e me da o braço para que a acompanhe.


A caminho do quintal, passamos por outra sala e pela cozinha,
para só então chegamos à porta dos fundos, onde tive uma das
mais lindas visões que se quer imaginei ter. A varanda é
simplesmente enorme, dando vista para uma piscina tão grande
quanto as de clube, só que bem mais limpa e decorada, já que tem
todo um lindo jardim de rosas muito bem cuidado.

— Deve ser uma sensação maravilhosa essa de acordar e poder


olhar pela janela e dar de cara com montanhas e os pássaros
cantando. – comento, observando cada coisa ao meu redor. Aqui
atrás é tão grande quanto à frente.
— Andrew adorava caçar esses pássaros quando menino.
Sempre foi tão levado. – ela sorri com a lembrança e tudo o que
consigo é imaginar um garotinho montando uma armadilha para
pegar animais. – Nunca que eu imaginei que ele fosse trazer alguém
como você aqui. – diz. – Sempre foi tão desapegado a essas coisas
que por anos pensei que morreria sem ver meu único neto com
alguém.
— Não pense assim senhora Giardoni. – digo. – A senhora vai
viver por tempo suficiente para acompanhar todas as mudanças que
ele passar.
— Anna. Chame-me de Anna. – ela pede outra vez.
— Desculpa.
— Venha. Vamos nos sentar.

Acompanho Anna até a mesa, puxando a cadeira para que ela


possa sentar. Em poucos instantes, uma mulher aparece trazendo
uma bandeja de suco para nós.
— Como vocês se conheceram? – Anna pergunta quando
tornamos a ficar sozinhas.

E este é aquele momento onde meu filme com Andrew passa por
minha cabeça, fazendo com que me lembre de como nos
conhecemos, deixando de lado nem mesmo o menor detalhe.

E eu conto nossa história para Anna. Sobre a caminhada na


praia logo que me mudei de São Paulo, o tempo que ficamos
apenas na lembrança do outro, o encontro na reunião e meu
pequeno ataque de pânico ao descobrir que os três homens
diferentes que me rodeavam eram o mesmo. Conto quando ele me
ajudou com minha avó e como aquele foi o ponto inicial para eu ter
começado a gostar de verdade dele.

Anna me olha admirada. Seus olhos azuis tão brilhantes fixos em


mim, enquanto conta também como conheceu seu marido, Otto,
logo que desembarcou no porto de Santos, vindo de Veneza com
sua família.

Ela tinha dezesseis anos e ele dezoito, servindo ao exército. Ela


não falava nada de português e ele pouco entendia o que ela dizia,
mas nunca desistiram um do outro. Como os pais deles eram
amigos, não foi difícil para que pudessem se ver e em menos de um
ano começaram a entender perfeitamente o que o outro falava.
Quando ela completou dezoito anos foi quando começaram a
namorar. Aos vinte, casaram-se e estão juntos até hoje, quase
cinquenta anos depois.

E a história dos dois é apenas a prova de que se pode encontrar


o amor verdadeiro, ainda que ele demore anos para chegar. Ou no
caso deles, que é saber esperar no porto por sua chegada.

Anna quis saber também sobre meus pais e se tenho irmãos. A


idade deles e coisas assim. Contou também várias histórias sobre
And. Coisas que jamais imaginei que ele tivesse feito, como, por
exemplo: aulas de piano, atuado no papel principal em uma peça no
primário. Ou como quando o pegou, literalmente, de bunda para o ar
com uma garota na cama aos dezessete anos, pouco antes de
chegarem ao ato em si e que o proibiu de trazer suas amigas para
“trabalhos da escola”.

Tá. Essa foi à única coisa que não me surpreendeu.

Mas, entre todos, o que mais gostei foi quando mostrou para
mim as fotos de crianças dele e vi o quanto And foi um menino lindo
desde que nasceu e se tornou uma criança ainda mais linda, de
olhos cinza e cabelos castanhos claros, assim como o conheço.
— As senhoritas não vão almoçar? – Andrew pergunta parando
atrás de mim e sinto suas mãos em meus ombros, massageando-
os. – A senhora não fez isso. – ele diz, provavelmente
reconhecendo seu álbum em cima da mesa.
— Fiz o que? – Anna pergunta, dando uma piscadinha para mim.
— É. Fez o que? – pergunto, olhando para ele por cima.
— Não se façam de inocentes. – ele diz, apontando para os
álbuns, mas vai ajudar a avó a levantar.
— Não tem motivos para ter vergonha, And. Você foi à segunda
criança mais fofa e linda que já conheci.
— Fui né. – ele sorri para mim. – E quem era a primeira?
— Eu. É claro. – respondo, beijando seu rosto.
— Bom saber. – diz. – Vou pedir suas fotos da próxima vez que
formos à casa dos seus pais.

Na sala de jantar, uma mesa enorme foi servida para quatro


pessoas com vários pratos diferentes, suco de laranja natural e
outro de abacaxi que, segundo And, o fruto foi cultivado no pomar
mais além do quintal que, também segundo ele, vai bem além do
que eu vi.

Sento-me à mesa ao lado de Andrew e Anna fica de frente para


o neto, deixando a cabeceira para o marido.

— Não podiam esperar por mim não, seus esfomeados? – ouço


uma voz grave chegar por trás de nós.
— Estávamos com fome querido. – Anna responde.
Ao que ergo o olhar para o senhor que puxa a cadeira ao lado do
neto, deparo-me com um homem tão alto quanto Andrew. Seus
cabelos curtos e brancos, os olhos cinza iguais ao do neto e um
físico forte, apesar da idade.
— Você deve ser Luara. – ele diz para mim assim que senta.
— Sim, senhor. – respondo, sentindo que meu coração está há
poucos milésimos de segundos de parar de bater. Ou saltar pela
garganta.
— A garota que meu neto teve a sorte de ganhar. – ele sorri,
estendendo a mão para me cumprimentar. – Sou Otto Giardoni.
Ouvi muito a seu respeito.
Engulo em seco, olhando para And, que está distraído com seu
prato.
— Você já havia contado ao seu avô, mas não a mim? – Anna
pergunta para o neto, parecendo indignada.
— Devo ter comentado há algumas semanas sobre estar
interessado em uma pessoa. – And responde, passando a mão pelo
queixo. – Logo que começamos a sair.
— Estou inconformada com você, Andrew. – ela diz, fazendo-me
rir.
— Não ligue Luara. – Otto diz para mim. – Minha querida esposa
às vezes pode ser um pouco dramática.

Andrew olha para mim e arqueia uma sobrancelha e sorri,


voltando a atenção novamente para seu prato.

— Ah, eu posso garantir que ela não se importa. – diz. –


Principalmente porque também sabe ser dramática quando quer.
Fecho a cara para ele, sentindo meu rosto se aquecer. As únicas
vezes que fiz drama para ele foi quando queria chocolate ou não
queria sair da cama para ir trabalhar cedo. Ou coisas assim. Franzo
o cenho. Ou por algumas outras vezes, mas todas elas não foram
realmente a sério.

O almoço correu tudo perfeitamente bem. Tivemos mais algumas


perguntas a nosso respeito e sobre como estou com a proximidade
da viagem. SIM! Eles sabem que sou a funcionária que ganhou o
treinamento e não se importaram em nada. O que quase fez meu
coração parar de vez, porque tanto Anna quanto Otto nos apoiaram
e disseram que fizemos o certo por escolher esperar até a viagem
para nos assumirmos publicamente.

And, para minha total surpresa, também admitiu ter contado para
a mãe dele sobre nós e que ela estava feliz, o que me deixou ainda
mais ansiosa para conhecê-la.

— Ah! – Anna exclama, colocando a taça de sorvete ao seu lado,


agora na sala de estar. – Otto, meu querido. Acho que você me
deve algo.

— Devo o que? – ele pergunta.

— Não diga que se esqueceu de nossa aposta, meu doce


amado. – franzo o cenho. Isso foi uma ironia?

— Ora, e nós lá fizemos alguma aposta ultimamente? – torna a


perguntar, embora dessa vez pareça estar se fazendo de
desentendido.

— Na verdade já tem alguns anos. Mas me lembro de desta


perfeitamente.
Percebo o olhar maldoso e divertido por de trás daqueles
cabelos branco-roxo-azul, que acabei descobrindo ser efeito do
shampoo.
— Quer mesmo que diga na frente deles?
— Se já cobrou, qual o problema?
— Estávamos sentados na varanda do nosso quarto a três anos,
logo que nosso filho aposentou e pouco antes de passar a empresa
para Andrew. – ela faz uma pausa, olhando para o neto. –
Conversávamos sobre ele nunca ter trazido uma namorada para nos
apresentar e você disse que ele nunca faria isso, enquanto eu, falei
que quando a mulher certa caísse dentro daquela empresa...

— Tá. Tá. Chega. – Otto a interrompe. – Quanto é que eu te


devo?
— Vou pensar em algo merecedor para que faça para nós. –
responde com uma piscada para o marido.
— Eles falam como se eu nem mesmo estivesse aqui. – Andrew
resmunga ao meu lado, fazendo-me rir.
— Você não tem lá uma credibilidade muito alta com eles. – digo
baixinho, para que apenas ele me ouça.
— Até você? – pergunta. O cenho franzido. – Minha maior
prioridade todo esse tempo era meu trabalho. Ser Presidente exigia
de mim uma dedicação maior e em período mais integral. Só agora
que fui começar a considerar essa de ter relacionamento.
— Depois da praia? – pergunto, apertando sua mão.
— Pode-se dizer que por sua causa, sim. – ele diz em resposta,
segurando meu queixo para que possa olha-lo e sorrio. – É a
verdade.

Mais ou menos no final da tarde e depois te assistirmos a um


filme na TV, Andrew e eu saímos para andar. Ele me levou para
conhecer o pomar e sua coleção de carros, mas não os de
brinquedo, os de verdade. São seis ao todo, fora o Civic que viemos
e mais três motos. Todos modelo esporte e importados. Daqueles
bem caros e carrões mesmo.

— Terei que dar um jeito de trazer o Civic para cá antes da


viagem. – ele comenta, passando o braço por meu ombro e abraço
sua cintura. – Não posso deixa-lo parado por um mês.
— Você pode trazer ele na terça-feira. – arrisco.
— Poderia.
— Poderia?
— É... Recebi uma ligação do escritório de São Paulo enquanto
conversava com meu avô e terei que ir para lá na terça de manhã, já
que na segunda estarei em Belo Horizonte. – explica. – Parece que
estão tendo alguns problemas lá.
— Com que frequência você vai para São Paulo? – pergunto.
— Pelo menos uma vez ao ano. Por quê?
— Porque trabalhei três anos lá e nunca vi você.
— Às vezes viu, mas não se lembra. – ele responde. – Apesar
de que também não me lembro de ter visto você.
— Acho que me lembraria de ter visto um homão que nem você
por aquele recinto de homens. – comento e ele me encara sério. –
Quando volta? – pergunto, virando para ele, abraçando-o.
— Saio de BH na segunda no final da tarde e vou para São
Paulo. De lá fico até quarta no início da manhã. – diz. – Tenho que
deixar minhas malas prontas até no máximo amanhã de manhã.

— Não vamos nos ver antes de estarmos em Nova Iorque


então? – pergunto, sentindo-me levemente chateada. Tudo bem. O
que são dois dias longe dele, perto de um mês praticamente
sozinhos?

— Ei! Eu vou embarcar com você daqui. – diz segurando meu


rosto com as duas mãos. – Não vou deixar você viajar sozinha
assim e perder a oportunidade de fazermos sexo nas alturas. – seu
comentário me faz rir. – Na pior das hipóteses, peço para que Felipe
leve minha bagagem para mim no aeroporto e depois ele deixa meu
carro aqui.

Mesmo relutante, concordo com as condições. Afinal, imagino o


quão duro seja o trabalho dele e o tamanho de sua responsabilidade
com a empresa e o escritório. E sei que BH envolve um trabalho
bem grande, porque alguns programadores foram com Pedro para
lá para uma reunião com Roger e não pude ir junto por conta da
viagem.

O problema é que terei de passar a comemoração do meu


aniversário, na qual Julie insistiu em antecipar para que eu pudesse
comemorar com todos meus amigos daqui e com ela, sem meu
namorado. O que é quase tão ruim quanto passar o dia do meu
aniversário sem ver minha família.
Capítulo Vinte e Três
Terça-feira

Faltam exatamente dezoito horas e dezesseis minutos para que eu


embarque rumo à Nova Iorque. Estou surtando de todas as
maneiras que se é possível imaginar e também em todas que não
se pode imaginar. E eu me sinto completamente sozinha aqui,
mesmo que Julie esteja comigo.

Na verdade hoje é meu último dia com ela. Amanhã assim que
eu embarcar, ela também vai embora. E Andrew há essas horas já
esta em São Paulo, com todos meus antigos colegas de trabalho.
Ou esteve, se considerar que já são sete da noite.

E ontem foi a reunião mensal, que acabou acontecendo apenas


com o Vice-Presidente. Só que ainda assim foi cheia de sermões
por conta do que aconteceu lá na semana passada e acho que
ninguém nunca mais vai querer abusar da sorte.

Por falar em “sorte”, a minha foi que não tive que ir para o
trabalho hoje, já que fui dispensada para poder terminar de arrumar
minhas coisas com tudo o que precisava. O que usei para ir às
compras com Julie e aproveitei para comprar algumas
lembrancinhas para mandar para minha família para compensar
esse tempo que não poderei ir para lá e por já fazer um mês desde
minha última visita e que farão dois meses quando puder ir.

— Está pronta? – Julie pergunta, aparecendo na porta do meu


quarto.
— Só um segundinho... – peço, terminando de prender metade
do meu cabelo. – Agora estou!

Como tem se tornado nossa marca, iremos ao Los Tres Chicos


para comemorar meu aniversário e minha despedida. Julie esta
quase tão ansiosa para conhecer aquele lugar quanto
provavelmente estou com minha viagem.

— Vai assim? – ela pergunta, encarando-me dos pés à cabeça.


Viro para o espelho, tentando ver se tem algo de errado com
minha roupa. Mas não, esta tudo da maneira com que deveria estar.
O que consiste de: jeans, uma blusinha sem manga, meu All Star e
uma maquiagem leve.

Ao contrário de mim, Ju está toda produzida quanto eu na noite


do Baile de Décadas. Ou quase. Ela esta com um vestido meu, que
de alguma maneira surpreendente, ela transformou em algo da
década de oitenta. Emprestei também minhas botas, para que
entrasse ainda mais no clima e ela esta simplesmente linda. Não
posso negar isso.

— Bem como mais eu poderia ir? – pergunto de volta.


— Um pouco mais a caráter, talvez. – responde, tirando-me da
frente do espelho com uma bundada, tomando meu lugar.
— Ao contrário de você, eu não estou querendo impressionar
ninguém. – mostro a língua para ela.
— Não estou querendo impressionar ninguém. – ela se defende.
– Até porque eu não tento impressionar. Eu apenas vou lá e arraso.
– completa com uma piscada, fazendo-me rir.
— É assim que se fala!
Julie ri junto de mim, passando o braço pelo meu e pego minha
bolsa junto das chaves do carro e do apartamento para podermos
sair.

Uma das principais exigências que fiz para concordar com esta
saideira bem na véspera do meu Grande Dia foi que ninguém
poderia beber nada que tivesse álcool. Ou seja: tem que ser natural.
Avisto Pedro junto de Igor na entrada da discoteca, no exato
lugar onde havíamos combinado de nos encontrarmos. Junto deles
esta uma garota que reconheço de imediato e que se certa forma é
estranho vê-la aqui. Mas não sou eu quem vai dizer qualquer coisa,
principalmente se ela e Igor resolveram serem amigos, que também
é bem legal.

— Nath! – exclamo assim que nos aproximamos do grupo. –


Como tem passado?
— Bem. E você? – ela sorri.
— Ah... Sabe como é, né? Uma loucura total com a proximidade
do grande dia.
— Seu aniversário?
— Também. Mas não. Minha viagem.
— Ah! – ela ri. – Vai dar tudo certo lá. Fique tranquila.
— Bem, deixem-me apresentar. – seguro a mão de Julie,
trazendo-a para frente. – Pessoal, está aqui é a Julie. Ju para os
amigos e Princesa Jujuba para a melhor amiga.
— Já disse para você parar com isso. – ela diz.
— Ju, este é Pedro, meu Supervisor. – ele da um beijo em cada
uma de suas bochechas junto de um abraço. – Esta é a Natalia,
uma amiga do grupo. – elas apenas trocam um cumprimento formal.
– E este eu não preciso apresentar, porque vocês já se conheceram.
— Julie, eu tenho que dizer. – Pedro começa. – Você está uma
gata!
— Obrigada. – Ju diz sem graça.
Passo meu braço pelo de Ju e o outro no de Nath, deixando os
rapazes para trás e entramos na frente.
— Nossa mesa esta reservada, Pedro? – pergunto por cima do
ombro e ele confirma. – Para o fundo, garotas! – exclamo.

Se compararmos as outras vezes que vim aqui, este lugar esta


parecendo um barzinho de rock para amigos com nada mais do que
umas vinte pessoas, contando com nós. Uma música bem tranquila
toca, deixando o ambiente todo bem mais agradável para a ocasião.
Sento-me no sofá do canto entre Julie e Natália. Igor e Pedro
ficam nos bancos de frente para nós.
— O que vão beber? – um rapaz com não mais do que seus
dezoito anos pergunta assim que nos acomodamos.
— Para mim um coquetel primavera. – peço. – E um x-salada.
— Achei que nenhum de nós pudesse tomar nada alcoólico. – Ju
observa.
— Na verdade esse “Coquetel primavera” é um suco com várias
frutas. – Igor explica.
— Ah! Então eu vou ficar com o mesmo que ela.
— Para comer também? – o rapaz pergunta e ela confirma. – E
os outros?
— Uma coca diet para mim e o combo dois do japonês. – Pedro
pede. – Vocês querem dividir?
— Claro. – Igor e Natália respondem juntos.

Enquanto comemos, Pedro é quem mais faz perguntas a


respeito de como é ser arquiteta e planejar prédios e casas, para
depois vê-los sendo construídos da maneira com que ela havia
imaginado quando colocou no papel.

— Já pensou em construir um edifício bem grande, no meio da


capital? – ele pergunta.

— É meu sonho. – Ju sorri. – Tenho um desenho há anos deste


prédio no centro de São Paulo. Na minha imagem ele fica ao lado
da prefeitura, junto de todas àquelas construções antigas. Mas claro
que aceitaria em qualquer outro lugar também.
— Me manda um desenho seu. – Pedro pede. – Eu adoraria
conhecer seu trabalho.
— Mando sim. – diz. – Já deixei essa chata aqui avisada que se
ela não me deixar fazer o desenho da casa dela, acabou amizade.
— Ah! Consegui! Caramba! – exclamo quando finalmente
consigo passar de um nível difícil no jogo do meu celular. Isto me
custou todas minhas vidas, mas finalmente consegui. – Espera.
Vocês estavam falando de mim? – pergunto voltando a atenção para
eles.
— Julie estava dizendo que você é uma péssima amiga quando
esta jogando. – Igor diz e olho para ela, que da de ombros.
— Não sou assim. – defendo-me. – Contou para eles como você
é quando estamos jogando no vídeo game? – pergunto.
— Acho que ninguém precisa saber disso. – Ju ri sem graça. –
Eu estava falando que você vai ter que me deixar fazer sua casa,
porque do contrario eu arrumo outra pessoa para cuidar do meu
computador e de tudo quanto é coisa tecnológica que eu tenha ou
venha a ter no futuro.

Franzo o cenho, virando para ela.

— O quê que você quer dizer com isso, Julie? – pergunto. –


Claro que você vai fazer minha casa. Uma linda e grande igual a
que tem na casa dos avós do... – paro de falar quando o mesmo
rapaz de antes chega, colocando um pequeno bolo na minha frente,
com uma única vela já acessa em cima.

Pedro puxa o coro dos parabéns, levando até o “Com quem


será”, mas inventa um nome qualquer ao invés de dizer o verdadeiro
e assopro a vela, que torna a acender.
— UAU! Além de velha você também esta precisando de um
aparelho para te ajudar a respirar melhor. – Igor provoca.
— Sou mais nova que você, idiota. – digo, tornando a assoprar a
vela, que desta vez se apaga.
— AEEEEEEEE! – Igor grita. – Para quem vai o primeiro
pedaço? – pergunta quando corto o bolo.
— Para mim! – exclamo, colocando um pedaço vantajoso em um
dos pratinhos que o rapaz deixou. – Mentira. Vai para a gastíssima
da minha melhor amiga, porque ela merece um brinde só por me
aguentar a treze anos. Quase quatorze já.
— Então um brinde a amizade! – Pedro diz, erguendo seu copo
de coca com uma rodela de limão. – A amizade!
— A Amizade! – todos brindam, fazendo os copos tilintarem.
— Mas agora o segundo pedaço vai para mim. – digo, cortando
um segundo pedaço também vantajoso. – Isto esta uma maravilha!
– exclamo. – É leite ninho? Eles fazem isso aqui?! Por que ninguém
nunca me contou?!
— Foi a Julie quem fez. – Igor diz e me viro para ela.
— Sério? – pergunto e ela confirma. – Quando foi que você fez?
Por que eu saberia se tivesse um bolo na minha geladeira.
Ela ri.
— Não achou mesmo que eu fosse deixar um bolo surpresa na
sua vista né, amor? – pergunta. – Mas, respondendo sua pergunta:
fiz no domingo.
— Ah... Entendi. – sorrio, lembrando-me que ela havia dito que
iria passar o dia com Igor “turistando”. Então era isso que eles foram
fazer. – É por isso que você é minha melhor amiga. – digo, dando-
lhe um abraço forte. Talvez mais forte do que deveria para um
simples agradecimento. Mas nós duas sabemos que não é apenas
por isso.

— “Foi o tempo que dedicaste à tua rosa que a fez tão especial e
importante.” – Ju recita em meu ouvido.
— Você vai me fazer chorar. – digo em resposta e ela me aperta.
– Alias, não tem “especial” na frase.
Ela afasta, mantendo as mãos em meus ombros.
— Você tem que ser mesmo chata, né? – dou de ombros, rindo e
ela me acompanha.
— Gente, eu não quero ser a chata, mas eu preciso dormir o
máximo que conseguir hoje, porque duvido que consiga fazer isso a
noite toda. – digo, consultando o relógio em meu celular.
— Saudades da época que passei em Nova Iorque. – Pedro diz.
– Você vai se sair bem lá. Você tem mais do que potencial para isso.
Do contrario Andrew não teria aceitado você quando propus.
— Acredite: não teria mesmo! – Igor concorda. – Não fui para lá
por isso. – franzo o cenho, encarando-o. – Fui para Porto Alegre na
época. – diz. – Foram duas semanas e meio incríveis.
***
Estou a apenas dez horas de embarcar naquele avião e não
consigo pegar no sono de maneira alguma. Ainda são três da
madrugada e tudo o que consegui dormir até agora deve ter sido
uma hora e isto desde as dez da noite, que foi quando cheguei com
Julie. Do restante apenas cochilei e não quero acordar Julie, porque
ela também estava cansada.

Há umas duas horas que desisti de dormir e resolvi me certificar


de que não estou esquecendo nada.

Já levei todas minhas malas para sala e não é pouca coisa.


Afinal, será um mês inteiro e não posso ficar repetindo à roupa a
semana toda. Tá. São duas malas e uma mochila.

— Está faltando algo. – digo, observando minhas malas no


canto. – Livro! – exclamo, correndo para meu quarto. – Não posso
viajar sem pelo menos um.
Procuro pelo meu exemplar de As Crônicas de Nárnia, que ainda
não terminei de ler por estar aproveitando os dias com Julie, mas
que agora é uma chance ótima para terminar.
— Certo. Onde você esta? – pergunto, procurando por ele em
cada canto. Tenho que organizar isso aqui antes de sair.

Para minha total surpresa e espanto, eu o encontro de baixo da


cama. Como ele foi parar lá é que é o mistério, porque me lembro
de tê-lo colocado no criado mudo.

Sento na cama e abro na página que parei, começando a ler.

O tempo parece passar bem mais rápido quando leio.


Principalmente quando estou em Nárnia a bordo do Peregrino,
lutando contra a escuridão. C.S. Lewis tem uma escrita que parece
que te suga para dentro da história de maneira que você só
consegue sair quando termina o conto, mas fica doida para voltar de
novo.

Faço uma pausa rápida apenas para poder mandar uma


mensagem para And.

Acordado?
Sua resposta chega logo em seguida:
Existe um termo mais apropriado que “semi acordado”?
Estou entre dormir e acordar. Está estranho aqui.

Sorrio com suas palavras, digitando minha resposta:

Talvez acormindo seja a palavra que você busque.


Não que esta palavra exista de fato. Onde você esta?

Adoro quando você cria palavras novas.


Mas, infelizmente não posso dizer onde estou.

Viro na cama para o outro lado, sentindo-me um pouco


desconfortável. Por que ele não contaria?

Tem alguém ai com você?

Mordo a ponta do meu polegar enquanto espero por sua


resposta, que não demora muito a chegar.

Se você considerar que estão em outros quartos e já dormindo,


sim.
Estou na casa de alguns amigos. Você gostaria de estar aqui.

Achei que estivesse em algum hotel.

Estava até ontem.


Mas quando vim fazer uma visita, insistiram para que ficasse.

Sortudos eles.
Por quê?

Posso sentir o sorriso dele daqui, o que me faz sorrir junto.

Por nada.

Eu só queria que você estivesse aqui comigo esta noite

O telefone em minha mão toca e atendo-o no mesmo instante.


— Então você esta com saudades. – Andrew diz em uma voz
baixa e sussurrada.
— Eu diria que quase morrendo. – respondo. – Tem duas noites
que não durmo direito e já arrumei minhas malas pela “sei lá
quantagéssima vez”.
— Não fique assim, linda. – diz. – Teremos um mês inteiro
apenas para nós. E eu prometo te compensar por cada um desses
dias longe.
— Continue. Estou gostando desta ideia. – peço, mas acabo
rindo ao imaginar sua cara.
— Não vou dizer. Apenas fazer. E bem feito. – Andrew baixa o
tom da voz a cada palavra, fazendo com que um calafrio percorra
minha espinha. – Mas agora precisamos dormir, porque amanhã
será um dia longo.
— Concordo. – digo.
Fecho os olhos, de repente sentindo todo o sono tomar conta de
mim. Antes que acabe dormindo, reabro os olhos outra vez.
— And? – chamo em um sussurro.
— Estou aqui. – mordo o lábio inferior, ficando em silencio,
dividida entre dizer ou não o que estou querendo. – O que foi? –
pergunta.
— Nada. Só... Sonhe comigo.
— Todas as noites, Anjo. – sorrio com suas palavras.
— Eu também. – digo em resposta. – Anjo...
Capítulo Vinte e Quatro
Quarta-feira

Acordo com a luz do sol clareando toda a sala, o que me faz


perguntar como foi que eu vim parar aqui, porque a última coisa da
qual me lembro, era estar no telefone com Andrew e no meu quarto.

Vejo que já são nove horas, então vou para o quarto, onde deixo
algumas roupas separadas em cima da cama antes de ir tomar meu
banho. Sinto meu corpo todo dolorido por ter dormido toda encolhida
no sofá. Além de não ter dormido nada.

— Lu? – Julie me chama, abrindo a porta do quarto.


— Oi?
— Esta tudo bem? – pergunta e saio do banheiro ainda enrolada
na toalha.
— Se com esta pergunta você quer saber se estou ansiosa,
nervosa, em pânico, perto de dar a luz, desesperada e desistindo,
então, sim!
Ela sorri, sentando em minha cama.
— Calma. Vai dar tudo certo lá. – solto um suspiro longo,
vestindo minha calça. – Andrew ligou enquanto você estava no
banho. – diz e olho para ela, pedindo para que prossiga. – Disse
que vai se atrasar um pouco e que era para você pegar um táxi para
ir até o aeroporto.
— Atrasar quanto? – pergunto de volta, sentindo um frio
percorrer toda minha espinha.

— Só o suficiente para não vir buscar as malas dele. – responde.


– Parece que um tal Felipe vai levar para o aeroporto e ele só vai
descer de um avião, almoçar com a gente para vocês subirem no
outro.
Visto minha camisa, colocando uma blusa fina por cima apenas
para espantar o frio que sinto pelo ar, indo logo em seguida arrumar
meu cabelo.
— O problema é que eu não conheço nenhum táxi aqui perto. –
digo, olhando para Ju pelo espelho.
— Vai de carro. – ela sugere. – Posso deixar ele lá em casa esse
tempo que você estiver fora. Ou nos seus pais.
— Você faria isso por mim? – pergunto, virando para ela, que
confirma. – Eu não sei o que seria de mim sem você aqui. – digo. –
Ou do meu carrinho. – ela sorri.
— Então termina de se aprontar logo e vem tomar café comigo. –
pede. – Eu já estou pronta para irmos. Mas não posso sair de
estômago vazio.
— Acho que nem eu. Principalmente porque não dormi.
— Eu percebi isso pela louça suja na pia.
— Eu estava com fome. – respondo, dando de ombros.
Ainda faltam duas horas e meia para o embarque quando paro
com meu carro no estacionamento do aeroporto e Julie sai para
pegar um carrinho para minha mala, voltando instantes depois.
— Primeiro check-in. Depois procurar algum lugar que seja fácil
do And nos encontrar quando chegar. – digo, empurrando meu
carrinho. – E até agora nem mesmo um sinal dele.
— Quem é Felipe? – Julie pergunta quando paramos na fila.
— Quem? – pergunto de volta, tentando localizar Andrew em
algum lugar.
— Felipe. O que vai trazer as coisas do Andrew.

— Ah! – exclamo, voltando a olhar para ela. – É melhor amigo


dele. – digo. – Vai tomar conta do nosso apartamento enquanto
estivermos fora. Abrir as janelas para entrar um ar, conferir que tudo
esta dentro do acordo. Essas coisas. – franzo o cenho. – Só espero
que ele não leve nenhuma mulher para o meu apartamento. Porque
se ele fizer isso, juro que o mato.

Julie ri ao meu lado.


— E quão nervosa você esta?
— Em uma escala de quanto?
— Zero a cem.
Faço o check-in, indo com Julie até dois bancos vazios, onde
poderei ver quando And chegar. Ou assim pretendo.
— E então? – Ju insiste.
— A ansiedade. Certo. – murmuro. – De zero a cem,
provavelmente mil e um.
— Muita ansiedade. – ela sorri, sentando ao meu lado.
— Sério?! – viro de lado para Julie, ficando sentada sobre minha
perna. – Tem noção de como é estar à uma hora e meia de
embarcar em uma viagem de dez horas, para outro país, onde você
vai ficar um mês longe de toda sua família e amigos? Sem todas as
pessoas que você ama? – ironizo cada palavra da melhor maneira
que consigo. – É super tranquilo, Jujuba!
— Por outro lado – ela começa a dizer, aproximando seu rosto
do meu. –, você vai estar muito bem acompanhada pelo mesmo
período, em um lugar onde ninguém conhece vocês.
Sorrio, sentindo meu coração acelerar. Ao menos uma das
pessoas que amo vai estar lá. Ainda que ele não saiba disso.
— Você volta para São Paulo quanto? – pergunto para mudar de
assunto. Não quero pensar muito em Andrew quando ele esta longe.

— Como volto a trabalhar só na sexta, pensei em ficar aqui mais


amanhã e ir embora ao final da tarde.
— Você e Igor...
— Nós estamos vendo. – diz. – Talvez ele vá para São Paulo no
final de semana.
— Desde que você me conte depois. – peço. – E não bata meu
carro...

Só mais uma hora e meia para o embarque e nada de Andrew


chegar e isto esta começando a me deixar realmente impaciente.
Quer dizer, ele já deveria estar aqui! Desse jeito ele pode acabar se
atrasando ou até mesmo perder o voo. A menos que ele tenha
mudado de ideia e vá embarcar direto de lá...
Passo a mão pelo rosto, sentindo minha impaciência crescer
cada vez mais. Ju ainda esta sentada no banco, enquanto estou de
pé, tentando alguma maneira de me acalmar.

— Lu. – ela chama, mas não dou atenção. – Luara. – insiste.


— O que foi? – pergunto, virando para ela.
— Olha para trás.
— Que...?
— Só faz o que estou pedindo.
Reviro os olhos para ela, mas obedeço, vendo-o se aproximar de
nós junto de Felipe, fazendo-me sorrir. Sua camisa preta com o
último botão aberto e a gola para cima, seu cabelo todo
bagunçado...
Andrew retribui meu sorriso, parando a pouca distância de nós e
vou até ele, abraçando-o forte.
— Senti sua falta. – digo baixinho.
— Percebi isso pela nossa conversa durante a madrugada. –
sussurra em meu ouvido, fazendo-me corar. – E eu também senti
sua falta. – completa, pousando um beijo em meu cabelo. – Estão
com fome? – pergunta assim que afasta seu rosto, mas não me
solta.
— Faminta. – Ju diz em resposta.
— Você não precisa fazer check-in antes? – pergunto.
— Fiz antes de vir te procurar. – And responde, dando um beijo
em minha testa. – Vai almoçar com a gente? – pergunta agora para
Felipe.
— Quer dizer que eu ainda estou aqui? – pergunta de volta. –
Em primeiro lugar: – diz, voltando-se para Julie. – Sou Felipe
Mazzon. – ele a cumprimenta com um beijo no rosto e vejo minha
amiga ficar realmente vermelha. E quando digo vermelha, quero
dizer naquele tom vermelho biscate mesmo. – Sei que meu amigo
não tem toda essa formalidade quando está apaixonado, mas ele é
uma boa pessoa quando quer.
Julie ri sem graça
— Acho que você deveria ir se ferrar. – Andrew diz. – Como vai,
Julie?
— Estou bem. – ela responde. – Mas ainda estou com fome.
— Este era meu segundo ponto. Podemos ir comer algum
lanche? Estou com tanta fome que seria capaz de comer um x-
infarto.
— Espero que você não enfarte comendo isso. – comento, fazendo
Andrew rir.
— Talvez um dia nós levemos vocês duas para comer um
desses. – ele diz, quando começamos a andar. – Fica em uma
cidadezinha lá em Minas.
— Não estou certa quanto a isso. – começo a dizer bem quando
sinto a mão de Julie em meu braço, puxando-me para trás e solto
Andrew. – O que foi? – pergunto.
— Por que foi que você não me apresentou esse amigo?! – Julie
pergunta indignada. – Quer dizer, Igor é legal e tals. Mas esse
amigo do Andrew é... UAU!

Minha boca se abre em um o dividido entre um sorriso e


indignação.
— Você ficou interessada nele!
— NÃO! – Julie exclama talvez bem mais alto do que deveria. O
que acaba chamando a atenção dos dois rapazes na nossa frente. –
Não é bem assim também. – sussurra.
— Acho que elas não estão com tanta fome assim. – Andrew diz,
voltando a olhar para frente e Felipe sorri para nós.
— Ele não esta disponível exatamente. – digo. – Mas se não der
certo com Igor...

Na lanchonete, sento-me ao lado de And e Ju fica junto de


Felipe, de frente para nós.

— Não sei vocês, mas eu estou morrendo de fome. – Andrew diz


logo que uma moça deixa nossos pedidos na mesa.
— Não tomou café na casa dos seus amigos antes de sair? –
pergunto olhando para ele, que sorri.
— Tomei. Mas você acha mesmo que é fácil manter todo esse
corpo aqui?
— Imagino que não. – respondo, fazendo uma pausa para tomar
um pouco de suco. – Mas com dois lanches esse corpinho vai pelo
ralo.
Felipe ri, dando uma grande bocada em seu lanche.
— São lanches naturais. – Andrew da de ombros. – Além do
mais, tenho um método bastante eficaz para manter a boa forma. –
ele pisca para mim e sinto todo meu corpo se aquecer. Julie e Felipe
riem ainda mais.

— Amiga, acho melhor você deixar isso para lá.


— Não é segredo nenhum que ele vai passar as tardes na
academia do hotel. – digo em resposta.
— Academia do hotel. Claro.
Arqueio a sobrancelha, olhando para Felipe, que finge estar
distraído com seu lanche. Ele retribui meu olhar e sorri com um ar
divertido.

— Eu apenas constatei o fato de que a academia que ele vai


frequentar em Nova Iorque tem nome e sobrenome. – ele diz. – E
não tem tantos andares assim.
— Felipe! – exclamo boquiaberta, mas Andrew ri. – Achei que
fossemos amigos.
— Em sua defesa – Andrew começa a dizer, virando para mim.
–, eu vou passar pelo menos uma hora na academia à tarde. Mas
pelo restante da noite eu quero frequentar outro lugar.
— Uau! Estou pasma com vocês três. De verdade. – balanço a
cabeça de um lado a outro, tentando conter o sorriso. – Podemos
mudar de assunto? Isso esta me constrangendo já.
— Então ela assume a parcela de culpa. – Felipe comenta com
Julie, fazendo-a rir.

Ainda faltam poucos minutos para começar a chamar nosso voo


e tudo o que consigo fazer é sentir uma ansiedade enorme! Além da
vontade de querer sair correndo daqui até onde meu carro esta,
voltar para casa, me enfiar debaixo do cobertor e ficar lá por um
mês.

— Com medo? – Andrew pergunta, desviando a atenção de


Felipe para mim.
— Eu já nem sei mais o que estou sentindo. – respondo.
— Eu sei que vou sentir muito sua falta. – Ju diz, abraçando-me
forte e me vejo correspondendo seu aperto. – Você nem imagina o
quanto.
— Eu também. – digo, afundando o rosto entre seus cabelos. –
Obrigada por ter vindo ficar comigo esses dias.

— Tá brincando, né?! – exclama. – Achou mesmo que eu ia


deixar você ficar livre de mim assim?
Sorrio, sentindo meus olhos lacrimejarem.
— Se cuida, tá? E me mande noticias a cada dia. Principalmente
quando chegarem lá, por favor.
— Tá. – solto Ju contra toda minha vontade, indo dar um abraço
em Felipe. – Se eu ficar sabendo que você levou mulher no meu
apartamento, juro que vou castrar você. – digo para ele, arrancando-
lhe uma expressão dolorosa.
— Você não disse nada sobre ela ser tão horripilante, Andrew. –
ele diz para o amigo, envolvendo-me em um abraço caloroso. – Fica
fria, tampinha. Eu não faço mais essas coisas não. – sorrio em
resposta.
— É sério com a Nath? – pergunto baixinho e ele apenas da de
ombros. – Porque se não...
— Estamos apenas saindo. Nada é sério até ter essa coisa que
vocês dois tem. – Felipe diz, dando um beijo em meu rosto. –
Façam uma boa viagem.
— Obrigada.

Andrew e Felipe trocam um rápido abraço e aperto de mão, bem


típico de homens, enquanto Ju me puxa para um abraço de
verdade.
— Lu. – ouço And atrás de mim, assim como sinto sua mão tocar
minha cintura em um gesto rápido.
— Tá. – digo e me afasto, secando uma lágrima que me escapa.
— Você vai voltar de que? – Felipe pergunta para Julie. – Se for
de táxi posso te dar uma carona.
— Não precisa se incomodar. – ela responde, ficando toda
vermelha e sem jeito.
— Não é. – ele sorri. – É só dizer para onde vai que te levo.
Ju olha para mim e tudo o que faço é sorrir, deixando-a a sorte.

— É que a Lu veio de carro, então vou voltar com ele. – explica.


– Mas se você puder me guiar até de volta ao apartamento dela eu
realmente agradeço. Porque não sei andar nada por aqui e preciso
pegar minhas coisas.
Ele ri.
— Claro. Vamos lá então.

Ouço anunciarem nosso voo pela segunda vez e aceno para os


dois, seguindo com And pelo caminho restante, sabendo que estou
embarcando na maior loucura da minha vida e talvez a coisa que
mais vá me mudar. Principalmente pelo lado profissional. Mas já que
estou aqui, tenho que ir até o fim.

— Eu não posso fazer isso. – digo para Andrew, que caminha há


poucos centímetros de distância.
— Fazer o que?
— Entrar em um avião desse tamanho. – respondo e ele ri. –
Quer dizer, olha o tamanho disso!
— Nunca voou? – torna a perguntar.
— Olhe bem para minha cara de quem vai até a esquina de
jatinho particular né, querido.
Andrew ri ainda mais e segura minha mão.
— Você já chegou até aqui, não tem porque ter medo logo agora.
– diz. – Além do mais, estou com você.
Fecho a cara para ele, tentando ficar brava para que, na menor
das hipóteses, consiga esquecer o medo. Mas não consigo.
— Nossos lugares ficam ali. – Andrew diz, apontando para uma
área reservada.
— Ali é a primeira classe. – observo, olhando para ele, que sorri.
– Oh! Desculpe. Não estou acostumada a isso.
— Com o que? – pergunta curioso.
— Para começar: o máximo que já viajei foi de ônibus. Agora
estou indo para o exterior e de primeira classe.
— Odeio a classe econômica. – ele responde, indicando nossos
lugares e me sento do lado da janela, ainda que isso possa acabar
piorando minha situação. – Então fiz um upgrade por minha conta
na sua passagem para que ficasse comigo. – completa ao sentar do
meu lado. – E também quero que você aproveite ao máximo, porque
isso é um privilegio de trabalhar para a BIT e tudo o que você gastar
será custeado por ela.
— Qualquer coisa? – pergunto.
— São investimentos necessários para capacitar nossos
funcionários.
— Viagens turísticas nas horas vagas, alimentação,
hospedagem?
— Sim. – responde com o cenho franzido. – Por quê?
— Sei lá. Acho que estou gostando ainda mais de trabalhar para
essa empresa. – sorrio.
— Só da empresa que esta gostando mais? – pergunta,
baixando o tom de voz e sinto seus olhos fixos em minha boca,
cheio do mesmo desejo que sinto por até agora não ter conseguido
toca-lo além de maneira discreta. Respiro fundo e solto o ar bem de
vagar, tentando não demonstrar meu nervosismo.
— Gostando? Sim. Mas tem algo...

Paro de falar quando a aeromoça comunica a decolagem e


prendo meu cinto, obedecendo a uma de suas orientações,
agarrando os braços de minha poltrona, o que faz Andrew rir.

— Você fica uma gracinha com medo.


— Não sei onde fica a graça nisso. – retruco.
O avião começa a se mover e fecho os olhos, sentindo-o
começar a sair do chão e abro apenas um olho para poder ver pela
janela.
— AI MEU DEUS! – exclamo.

— Tá tudo bem. – Andrew diz, colocando a mão na minha. –


Você tem mais chances de morrer atravessando a rua de que em
uma viagem de avião.
Olho para ele pronta para dar a resposta que quer ouvir.
— Obrigada por me confortar da pior maneira possível, Sr.
Giardoni!
— Estou aqui para isso e mais algumas coisas, caso queira. –
diz e da uma piscada sínica para mim.
— Vou me lembrar disso. – rio.

Já estamos há uma boa distância do chão e alinhado


novamente. Meu coração também está de volta ao seu devido lugar
e já não sinto mais aquele nervosismo de quando decolamos.

— Sabe, até que é reconfortante. – falo. – Já viu o tamanho da


cidade lá embaixo?
Olho para pequena janela e And aproxima de mim para poder
olhar também, fazendo com que eu sinta seu perfume.
— Você parece comigo quando voei pela primeira vez. – diz,
baixando a voz a cada palavra. – Só que eu tinha sete anos. –
sussurra em meu ouvido e sinto seus lábios em minha nuca.
***
Acordo o que me parecem ser horas depois do embarque e
continuo de olhos fechados. Andrew esta com o braço sobre meu
ombro e a mão em meu braço, mexendo em minha pele de maneira
suave, enquanto estou recostada nele, fazendo-o de travesseiro.
Com um bocejo, puxo o braço para cima, repousando em cima
de sua barriga e a aperto.

— Ei! – ele exclama. – Ai não. – diz em meu ouvido. Abro os


olhos para descobrir que o que apertei não foi bem sua barriga, mas
sim a virilha.

— Desculpa. Foi automático. – sorrio, vendo que ele esta


assistindo a algum filme. – Esta assistindo o que? – pergunto.
— Indiana Jones. – responde dando um beijo no alto de minha
cabeça. – Com fome?
— Um pouco. Que horas são? – torno a perguntar enquanto me
endireito em meu lugar, olhando para fora, onde consigo ver as
nuvens de maneira que nunca antes imaginei ser possível.
— Quase seis. – And responde.
—Eu dormi quase metade da viagem!
— Isso que era sono. – diz em resposta. – Pedi seu jantar
quando passaram. Tem problema?
— Não. Nenhum. Obrigada.
Olho de volta para Andrew bem quando ele recoloca os fones no
ouvido para prestar atenção em seu filme.
Daqui tenho uma visão que chega até mesmo a ser maldade.
Seu perfil já é naturalmente lindo, mas quando ele deixa sua barba
por fazer por dois ou três dias é mais do que covardia. E seu cabelo
todo bagunçado, entregando que se quer se deu ao trabalho de
arruma-lo quando saiu da cama pela manhã. E tem também a gola
de sua camisa ainda para cima, completando a desordem mais sexy
que já vi.
— O que você esta fazendo? – ele pergunta, retirando os fones.
— Um empresário não pode usar a camisa assim. – digo em
resposta, arrumando a gola no lugar. – Além de que esta
atrapalhando minha visão.
— Que visão?
— A que tenho do seu pescoço. – sussurro, aproximando meu
rosto do seu e ele apoia a testa na minha. Meu desejo por ele só faz
aumentar. – Quanto tempo nós ainda temos até trazerem o jantar? –
pergunto a Andrew, passando o polegar pelo contorno de seu rosto,
enquanto repouso a outra mão em sua coxa.
— Alguns minutos. – diz com um olhar tenso. – Por quê?
Paro com a mão em sua nuca, aproximando meu rosto do seu
para poder dizer baixinho em seu ouvido:
— Porque de repente comecei a sentir muito enjoo e talvez eu
precise da sua ajuda lá no banheiro.
Pouso um beijo molhado em seu pescoço e me afasto para
soltar o cinto e levantar.
— Me de três minutos e irei ver como está. – leio as palavras em
seus lábios quando levanto, levando as duas mãos a boca para
fingir enjoo e saio à procura do banheiro.

A primeira classe estaria vazia se não fosse por algumas poucas


pessoas, o que chega a me surpreender, porque a econômica
estava praticamente lotada quando passamos por ela mais cedo.

Encontro à porta do banheiro e a abro para poder entrar. E


acredite quando eu digo que o que encontrei do outro lado não era
nada do que eu havia imaginado em nenhuma das vezes quando
pensei em “banheiro de avião”. Este é grande, espaçoso, brilhante e
cheiroso. O mármore da pia funcionaria perfeitamente como espelho
de tão lustroso, descartando totalmente o que tem aqui.

— Isso é que é luxo. – digo em um assovio, caminhando até a


pia para lavar o rosto e arrumar o cabelo.
— Sou eu. – ouço a voz de Andrew do outro lado bem quando
conto os três minutos que ele havia pedido. – Está tudo bem ai?
Franzo o cenho, estranhando sua pergunta e vou até lá para
abrir a porta.

— Está tudo rodando. – digo em resposta, lançando um olhar


para trás dele, para o caso de haver alguém próximo. And sorri e o
puxo para dentro comigo, fechando a porta atrás dele.
— Então vai rodar bem mais. – sussurra ao me tirar do chão e
caminhar comigo até o lavatório. – Eu já estava ficando louco com
essa espera toda. – diz enquanto me beija e o puxo para mim,
prendendo seus cabelos com a mão. – Nós teremos que ser rápidos
antes que alguém de pela nossa falta lá.
Ele desce a boca por meu pescoço, fazendo com que todo meu
corpo se aqueça com seu toque.
— Ah! – um gemido me escapa do fundo da garganta e seguro
sua camisa dos dois lados, afastando-o. – Você consegue, lindo. –
digo, passando a mão por cima de sua calça e ele fecha os olhos. –
Por mais que eu ame nossas preliminares, precisamos pular dessa
vez. – digo as palavras enquanto desabotoo sua calça e desço o
zíper. – Mas vamos compensar ela quando chegarmos ao hotel. –
sorrio, puxando o Pequeno And para fora e o And sorri para mim.

— Como eu senti falta desse seu atrevimento. – diz com a


respiração acelerada enquanto brinco com ele. – Mas agora é
comigo. – completa, dando-me um beijo de tirar o fôlego e afasta
para também tirar minha calça e logo a vejo no chão aos seus pés.
– Tão linda. – murmura tocando a mão em mim e aproxima o rosto
do meu. – E tão pronta.
Fecho os olhos para poder apenas sentir seu toque, mas a única
coisa que eu sinto é seu beijo antes de me penetrar de vagar,
fazendo-me prender os braços a suas costas.

— Quente. – a palavra me escapa quando começa a se mover


dentro de mim.

— Era isso que você queria o tempo, não era? – pergunta


segurando meu queixo, dando estocadas mais fortes e fecho os
olhos outra vez. – Me responde. – pede e confirmo. – Olhe para
mim. – desta vez eu nego com a cabeça, sentindo-me incapaz de
qualquer outra coisa além de senti-lo me levar às nuvens. De uma
maneira até mesmo literal. Como não obedeço, Andrew para dentro
de mim e o sinto pulsar.

— And... – chamo em uma voz rouca, abrindo os olhos e o pego


olhando para mim. Seus olhos estão de uma cor cinza quase
negros.
— Quero olhar em seus olhos quando você gozar. Entendeu? –
pergunta apertando um pouco minhas bochechas e confirmo,
recebendo seu beijo e ele retoma os movimentos bem quando
alguém bate na porta. – Sim? – pergunta com a voz rouca.
— Senhor? – uma moça diz do outro lado. – Alguns passageiros
informaram tê-lo visto entrar com uma mulher ai. Está tudo bem?
— Dedos duros. – resmungo em resposta e Andrew sorri.
— Minha namorada estava com muito enjoo depois que acordou.
Precisei vir ver se estava tudo bem.
— Desculpem. – ela pede. – O jantar já está sendo servido.
— Obrigado.
Andrew mantém o olhar preso em mim enquanto ouvimos o salto
da aeromoça que se afasta. Só então começo a rebolar,
provocando-o.
— Você ainda está durinho. – sorrio.
— Desculpa. – ele pede, fazendo-me franzir o cenho sem
entender, mas percebo a que se refere quando sai e entra com um
pouco mais de força, arrancando um gemido alto de mim. – Shiiiiii!
Por favor, linda.
Seguro a mão em sua nuca e a outra em suas costas, assim
como também prendo minhas pernas ao seu redor, sentindo-o de
mover agora mais suave até me fazer derreter ao seu redor e que o
sinta dentro de mim ao gozar.

— Você tem olhos lindos. – ele diz, pousando um beijo em meus


lábios e sorrio.
— Podemos repetir isso no aeroporto quando pousarmos? –
pergunto quando ele sai de dentro de mim, arrumando sua calça e
abaixa para pegar a minha e me entrega. – Por favor. – completo
com uma carinha de criança desesperada e ele sorri.
— Claro. – diz. – Se você não estiver exausta com a diferença
do fuso-horário, eu adoraria que fizéssemos isso de novo.
Visto minha calça, virando para o lavatório para poder lavar o
rosto e arrumar meu cabelo ainda mais desgrenhado de que antes.
— Melhor secar isso ou podem desconfiar. – falo, passando uma
toalhinha pelo rosto de Andrew para secar o suor. – E talvez agora
seja melhor deixar sua gola para cima, porque isso vai ficar marca. –
sorrio, erguendo a gola da maneira com que estava antes e ele
segura minha mão no lugar.
— Falei sério quando disse que havia sentido sua falta nesses
dias. – diz. – Eu não achei que fosse sentir, mas enquanto estava lá
em Belo Horizonte eu só conseguia pensar que queria te apresentar
tudo aquilo. E o lugar que passei a noite em São Paulo ontem...

Ele então para de falar e por um instante parece que vai dizer
mais algo, então muda de ideia.

— É melhor sairmos daqui ou vão nos deixar sem jantar. – diz no


lugar do que quer que fosse dizer antes. – E eu vou tirar qualquer
suspeita deles de cima do que fizemos aqui. – completa com um
sorriso lindo que faz meu coração bater bem mais acelerado.

— Eu também senti sua falta, And. – sussurro, segurando seu


rosto para mim. – Sem você minha cama parecia apenas grande e
vazia. Até mesmo minha despedida ontem pareceu mais vazia sem
você. Mesmo com o que fizemos pelo telefone.
Sinto a mão de Andrew em meu rosto, puxando-me para um
beijo lento, molhado e que faz meu coração se desfazer ao seu
toque de maneira que nunca antes me aconteceu.

— Anda, vamos sair logo daqui antes que acabemos no segundo


tempo e não tenhamos mais como disfarçar seu enjoo. – diz
puxando-me pela mão e da um beijo em meu rosto abrindo a porta.
– Você está melhor mesmo? – pergunta parecendo de repente
preocupado.
— Um pouco. – respondo com o cenho franzido. – Sinto tudo
girar, mas acho que consigo aguentar até chegarmos.
— Você devia ter trazido seu remédio, linda. – diz, passando o
braço por meu quadril enquanto andamos até de volta aos nossos
lugares. – Qualquer coisa que sentir você me avisa. Tudo bem? –
pede e confirmo.
— Tudo bem. – sussurro. Ele sorri para mim.
— Isso me deixa muito feliz. – diz, pousando um beijo em meu
cabelo e toca minha cintura, permitindo que eu passe na frente para
podermos nos sentar em nossos lugares.

Menos sete minutos depois de voltarmos aos nossos lugares,


uma aeromoça vem trazer nosso jantar.

— Boa noite, senhores. – ela nos cumprimenta, colocando


nossos pratos no lugar.
— Consegue comer, Anjo? – Andrew pergunta de repente,
demonstrando uma preocupação que quase me faz crer que eu
realmente estive passando mal.

— Acho que sim. – respondo baixinho, embora a resposta


verdadeira seja: “Eu estou morrendo de fome! Você acabou de me
comer no banheiro e estou mole até agora. Pelo amor de Deus!
Olha a pergunta que você me faz!!!”. Mas claro que eu não posso
dizer nada disso enquanto ela estiver aqui.
— Ela esta de quanto tempo? – a moça pergunta enquanto serve
meu prato e vejo um sorriso feliz em seu rosto. Arregalo os olhos,
sentindo um calafrio percorrer todo meu corpo apenas por pensar
nisso.
— Ela enjoa fácil em viagens. – Andrew responde. – De qualquer
tipo. – olho para ele, que da um sorriso de lado para mim e sei que
ele esta se divertindo com a situação.
— Oh! Desculpem-me! Eu só... Mil perdões.
— Tudo bem. – digo com um sorriso sem graça e ela sai às
pressas logo que termina de colocar o prato de And.
— De quanto tempo você esta? – ele pergunta em meu ouvido e
aperta a lateral de minha barriga.
— Não tem graça! – exclamo, tirando sua mão de mim com um
tapa.
— Consegue comer mesmo? – pergunta, pousando um beijo em
minha bochecha.
— Acabamos de transar no banheiro do avião. – digo em
resposta, cortando um pedaço da carne em meu prato. – O que
mais você acha?

Pelo canto do olho, vejo o sorriso que cresce no rosto de


Andrew.
— Acho que você comeria muito mais do que apenas o que tem
ai.
— Não vejo a hora de chegarmos. – dou de ombros.

Assim que terminamos de jantar, Andrew pegou no sono,


provavelmente não se aguentando mais acordado. O que acabou
me fazendo procurar algo para assistir e acabei encontrando o
último filme do Harry Potter para ver. E bem, eu não poderia passar
o canal, né?

— Senhores passageiros, estaremos pousando dentro de dez


minutos. – ouço uma voz anunciar, fazendo meu estômago revirar.
Não sei dizer se por ansiedade por finalmente estarmos chegando
ou se por medo. Provavelmente ambos.
— And. – chamo baixinho. – And, acorda. Já estamos quase
chegando.
Para tentar acorda-lo, toco sua barba, cabelo e até mesmo dou
um beijo em seus lábios, só que não consigo causar efeito algum.
— Amor, acorda. – sussurro em seu ouvido, pousando um beijo
em seu rosto, correndo as costas de minha mão por ele e nada! –
Desisto. – digo por fim, voltando à atenção para o filme.

Olho para a janela, vendo o céu americano. As luzes lá embaixo


sob um céu negro e provavelmente frio por conta da chegada do
outono. Não consigo nem mesmo dizer o que sinto por estar aqui
depois de tantas semanas de espera e tanto me preparar.

Pelas minhas contas, restam apenas quatro minutos para o


nosso pouso. O filme já acabou. Para minha sorte, porque odiaria
parar logo no final. Isso se eu fosse aceitar descer antes dele
terminar. O que poderia acabar fazendo com que And me leva-se
daqui para fora jogada em seus ombros.

Andrew se mexe ao meu lado, esfregando o rosto e viro para ele.

— Bom dia. – digo ainda que há muito já seja noite.


— Oi. – ele responde com um sorriso lindo.
— O que houve? – pergunto, sorrindo de volta.
— Nada. Só tive um sonho meio doido. – ele volta a sentar,
passando a mão pela barba e cabelo. – Que filme estava vendo?
— Harry Potter. Que sonho?
— E nem me chamou?
Cruzo os braços, voltando a olhar para frente.
— Como se você fosse fácil de acordar quando não posso usar
das minhas melhores armas. – minha resposta apenas faz com que
ele ria ao meu lado, aproximando-se de mim para sussurrar em meu
ouvido:
— Sonhei que você me chamava de “amor” e me beijava. – ele
beija meu rosto e afasta, fazendo meu corpo se aquecer. Ele
escutou o que eu disse, só que pensa que foi um sonho.
— Só podia ser sonho mesmo. – digo, tentando disfarçar a
verdade. – Já estamos para pousar.
— Recomendo apertar o cinto então. – diz e olho para ele a
tempo de ver seu sorriso.
— Por quê? – pergunto embora já saiba a resposta.
Sinto o baque da descida e agarro os braços de minha poltrona.
Quero olhar pela janela, mas não sou capaz nem mesmo de abrir os
olhos.
Andrew segura minha mão e a aperto forte.
— Medrosa. – ele ri.
— Não brigo com você agora porque estou mais preocupada
com minha vida. – respondo, fazendo com que ele ria ainda mais
alto.

Os movimentos que o avião faz chegam a parecer que levam


meus órgãos para lá e para cá, até que ele finalmente pare.

— Pode abrir os olhos.


— Não.
— Você vai ficar aqui sozinha então. – Andrew diz e abro os
olhos quando ele levanta. A primeira coisa que faço é olha pela
janela para poder ver o aeroporto JFk. É como se fosse um sonho
se tornando realidade.

— Eu ainda não acredito que você fez compras mesmo depois


de eu ter dito que te levaria para comprar roupas aqui. – Andrew diz
sentado ao meu lado no banco traseiro de um táxi a caminho do
nosso hotel. – Por que você fez isso?

Desvio a atenção do trânsito da cidade para ele.

—Por que eu deveria aceitar isso? – pergunto de volta.


— Talvez porque eu queira te dar algo? – reviro os olhos para
ele, sorrindo.
— Agradeço sua boa intenção, And. – digo, segurando sua mão
entre o espaço vazio entre nós. – Mas não quero que você gaste
dinheiro comigo assim. Se quiser mesmo me dar algo, algo seu, que
você tenha escolhido e que vá me fazer pensar em você toda vez
que eu olhar, eu aceito. Mas isso não. Não quero seu dinheiro.
— Um presente? – pergunta, arqueando a sobrancelha e sorrio.
– Que tipo?
— Sei lá. Surpreenda-me, gatão.
— Certo. – ele sorri. – Eu tenho um apartamento no Brooklyn
aqui. – começa a dizer, mudando de assunto. – Mas nós vamos ficar
em um hotel, porque as regras da empresa são estas.

Ele volta à atenção para os prédios do outro lado, ainda


passando o dedo por minha mão.

— Temos dois quartos reservados. Um no seu nome e outro no


meu. – volta a dizer. – E nós teremos que fazer check-in nos dois e
gastar nos dois ao menos por um tempo. – ele olha para mim outra
vez e vejo seu cenho franzido. – A menos que você não queira ficar
no quarto comigo.

Sorrio, notando o ponto da questão que fez a ruga surgir em sua


testa.

— Não vejo porque não aproveitarmos esse momento que


teremos sozinhos. – digo, passando o dedo pelo v em sua testa. –
Talvez uma hora ou outra um de nós vá precisar de espaço para não
enjoar rápido do outro, mas ainda assim. – sorrio. – E também
poderemos revezar. Uma noite no seu quarto, outra no meu.

Volto à atenção para fora, começando a me assustar de verdade


com tudo isso. Principalmente porque não havia considerado muito
a ideia de passar tanto tempo em companhia de And, praticamente
o dia todo, durante um mês inteiro, sem nenhum conhecido.

Observo pelo vidro do carro os altos prédios. É tudo tão diferente


de qualquer coisa que já vi até hoje. Tudo tão... Lindo e encantador.
O carro para de frente com um hotel bem iluminado e And paga
a corrida, dando ao motorista uma gorjeta bem generosa.

— Não vejo a hora de pegar meu carro e não precisar andar em


táxi mais. – ele diz, abrindo a porta para que eu possa sair e me
pego girando ao redor de mim mesma, olhando para o alto.
— É lindo! – exclamo, voltando a olhar para ele.
— Bem vinda à Nova Iorque. – ele sorri em resposta. – Vem,
vamos fazer check-in. – diz, tocando meu quadril quando o
funcionário do hotel vem para levar nossas malas em um carrinho,
dizendo que as levara até nossos quartos. – Eu adoraria te beijar
aqui mesmo. Mas vou ter que esperar até que estejamos no quarto.

— Eu gostaria disso. – sussurro em resposta.


Enquanto Andrew da entrada em nossos quartos, eu aproveito a
oportunidade para ver melhor o hotel, que mais parece ter saído de
um filme de sucesso de que da realidade. Antes eu estava tentando
entender o que a moça da recepção dizia, mas ela tem um sotaque
muito forte.

— Vamos? – ouço Andrew atrás de mim e permito que ele me


leve até o elevador. – Não precisa se assustar. Não é todo mundo
que tem sotaque igual ao dela.
— Você tem sotaque britânico. – observo.
— Eu sou britânico. – Andrew diz em resposta, apertando o
botão do elevador e viro para ele.
— Como é que é?! – pergunto realmente surpresa.
— Minha mãe é londrina e meu pai carioca. – ele faz uma pausa
enquanto entramos no elevador para subir. – Quando ela
engravidou, fez questão de ter o filho em Londres e foi o que
fizeram. Segundo me contam, passei meu primeiro ano de vida lá e
só depois vim para o Brasil. – ele franze o cenho. – Mas claro que
nesse meio tempo já havia me levado ao Brasil para que meus avós
me conhecessem. Meu último ano da faculdade foi um intercambio
em Cambridge.

— UAU! – exclamo quando ele termina de contar. – Eu estou


namorando um britânico. – sorrio sem conseguir acreditar muito. – É
claro que todo esse material não seria fruto apenas brasileiro. Ainda
que essa sua bunda obviamente seja brasileira.

Andrew ri ao meu lado.

— O seu material é todo brasileiro pelo que sei. – comenta. – E


eu quero saber a origem dele também.
Andrew destrava a porta do seu quarto no último andar, dando
licença para que eu entre na frente e a primeira coisa que vejo
quando entro é uma enorme parede de vidro, que da vista para toda
a cidade aqui do quadragésimo andar. Sei que meu quarto fica no
andar vinte e cinco. Mas isso.

— Amanhã mesmo vou pedir um segundo cartão dos nossos


quartos. Por que apenas uma? – Andrew diz atrás de mim e
caminho até a parede, sentindo uma necessidade absurda de ver
tudo isso mais de perto. – Anjo?
— É tão lindo. – sussurro, mantendo uma distância do vidro por
medo de me aproximar.
— Sim, é lindo. – ele concorda ao meu lado, dando alguns
passos à frente para apoiar-se ao vidro.
— Não quebra? – pergunto, aproximando-me mais dele.
— Não. – diz, olhando para mim. – Podemos fazer amor aqui
muitas vezes. – e sorri.
— Eu não faria isso. – respondo, afastando-me.
— Alguma vez se imaginou fazendo no banheiro do avião? –
pergunta, virando para mim.
— Bem, não. – Nem mesmo nos sonhos mais malucos.
— Eu já. Mas não achei que fosse ser tão bom. – ele diz. –
Principalmente com uma aeromoça intrometida e tendo que falar
com ela naturalmente, enquanto eu estava quase, quase lá e meu
amigão latejando dentro de uma mulher tão incrível e gostosa,
disposta a fazer altas loucuras comigo. – sorrio com sua descrição.
– Então, sim, eu toparia ficar com minha bunda colada neste vidro
para que toda Nova Iorque me visse, enquanto eu fodia você.

Encaro Andrew totalmente sem palavras.

— Hm... – franzo o cenho. – É. O Pequeno And foi bem


resistente àquela hora.
Tapo a boca no mesmo instante em que solto as palavras e
Andrew ri.
— Deu nome para o meu pau? – pergunta com ar divertido e
nego com a cabeça, ainda sem tirar as mãos da boca. – Responde.
– pede, segurando minhas mãos. – Qual é? Você disse “Pequeno
And”. Eu escutei muito bem.
— Não disse, não!
— Por que “pequeno”? – pergunta ainda mais curioso.
— É um apelido irônico. Me deixa. – tento escapa, mas ele me
segura, levando-me até o vidro e me prende ali.
— Não vou deixar até dizer a verdade.
Mais uma vez Andrew tenta me fazer falar e permito que desça
minha mão. Tudo o que ele faz é descê-las por seu peito, parando
sobre seu coração, que bate acelerado assim como o meu.
— Está vendo o que você faz comigo? – ele pergunta,
encarando-me com aquele par de olhos brilhantes que sempre
fazem com que eu me derreta perto dele. – É só estar perto de você
que ele fica assim. E isso me assusta tanto! – diz, fechando os olhos
com força e o abraço forte. O mais forte que consigo. Meu coração
bate acelerado contra ele e sinto seu batimento contra meu peito na
mesma frequência.

Andrew passa os braços por minha cintura, também me


abraçando forte. É como se eu estivesse segurando todo o meu
mundo em meus braços. Não posso solta-lo. Nunca.

— É aterrorizante. – sussurro, apoiando a cabeça em seu peito.


— Muito.
Capítulo Vinte e Cinco
Quinta-feira

Acordo com o despertador do meu celular tocando e o pego


apenas para ver que já são sete horas e desativa-lo.
— Bom di... – começo a dizer, virando-me para o lado a fim de
acordar Andrew. Mas para minha surpresa seu lugar está
completamente vazio. – And? – chamo, sentando-me. – Andrew?
Levanto para ir atrás dele no banheiro e o encontro
completamente vazio, com apenas suas roupas jogadas dentro do
cesto de roupas sujas.
— Que estranho. – digo, voltando para o quarto e me deparo
com algo sobre o travesseiro dele, na qual não havia reparado
antes. – O que é isso? – pergunto a mim mesma, pegando o papel
com a caligrafia de And.

Anjo, bom dia.


Precisei dar uma saída para buscar algo. Não demoro a voltar.
Espero que você já esteja de pé quando chegar, pois quero sair
para tomar café da manhã com você em um lugar especial.
Ps: Recomendo que ajuste a hora do seu celular. Aposto como
esta pensando que já é tarde.
Sempre seu,
Andrew.

— Que lugar especial ele pode estar querendo me levar hoje? –


pergunto. Deve ser algo pelo meu aniversário. Sorrio com a ideia e
pego meu celular para ajustar o horário. Não sei se deveria, mas me
surpreendo ao descobrir que ainda não apenas seis horas da
manhã. O que me faz perguntar: Onde Andrew teria ido tão cedo e o
que ele foi buscar?

Saio da cama e vou à procura de algo para usar. Como minhas


roupas não estão aqui e sim no meu quarto, pego uma camisa do
And e a coloco junto da calça que usei ontem na viagem, apenas
para poder ir ao meu quarto tomar banho.

O quarto que estou não chega nem mesmo a ser metade do que
é a cobertura de Andrew, mas é tão lindo quanto. Ele é grande de
maneira normal, não exagerada. E também não tem aquela parede
de vidro que da para a cidade. O que é compreensível. Mas tem
uma sacada, assim como também tem lá em cima e eu consigo ver
muita coisa brilhante daqui. Na verdade, talvez eu queira ficar por
aqui mesmo depois desse mês de treinamento. De repente a Nex
Ae precise de um novo programador ou algo do tipo.

Sigo para o banheiro, jogando minha roupa no chão mesmo e


coloco a camisa de And no cabide para não amarrotar. Ela ainda
pode me servir por algum tempo quando ele não estiver comigo.
Depois disso, abro o chuveiro, permitindo que a água morna caísse
por meu corpo, relaxando cada músculo meu, fazendo-me notar
dores em lugares que nem mesmo imaginei que fosse possível
sentir. E cada minuto que passo aqui, eu sinto meu sono aumentar
mais e mais...

Sinto uma mecha de cabelo ser colocada atrás da orelha e essa


mesma mão descer por minhas costas, apertando delicadamente
cada músculo nos pontos que mais me doem.

— Isto sem dúvida é a melhor coisa que existe. – murmuro, de


repente sentindo a respiração de Andrew atrás de mim, assim como
seu corpo colado ao meu.
— Tem certeza disso? – ele sussurra em meu ouvido, descendo
a mão para o quadril, parando com ela entre minhas pernas,
passando o dedo por mim lá embaixo.
Fecho os olhos, sentindo seu toque em mim. Seu dedo grosso
sendo passado ao redor dela... Por meu clitóris... Um “sobe e desce”
na minha entrada...

— AH! – grito ao sentir seu dedo me penetrar, enquanto continua


passando seu polegar no clitóris.
— Tem mesmo certeza de que a massagem é “a melhor coisa
que existe”? – ele torna a perguntar. Aperto o lençol da cama,
sentindo uma gota de suor escorrer por minhas costas. – Me
responda.
— Não acho que eu esteja com muita capacidade de dizer
qualquer coisa neste momento. – digo e aperto o lençol ainda mais
quando enfia outro dedo dentro de mim, começando com
movimentos um pouco mais bruscos.
— Por que você veio para cá? – pergunta, pressionando sua
ereção em minha bunda e tenho vontade de pular em seu colo, tirar
sua calça e cair de boca nele. – E não me venha com essa desculpa
outra vez.
— Eu precisava de um banho! – exclamo para reprimir um
gemido. – E minhas roupas... Oh! Por favor, And!
— Sabe o que eu senti quando cheguei ao meu quarto e não
encontrei você? – pergunta outra vez e nego com a cabeça. – Eu
fiquei louco de preocupação.

— Não me parece ter se preocupado tanto. – minha voz sai


rouca, mas consigo o efeito que desejava. Ou até mais do que
planejava. Não que eu tenha pensado muito nisso.
Andrew tira a mão de dentro de mim, virando-me de barriga para
cima e prende minhas mãos acima da cabeça.
— Tem ideia de como foi difícil deixar você dormir nua assim
depois que finalmente te encontrei?
— O quê?!
— Essa sua bunda toda empinada para cima. – diz, virando-me
de costas para ele e sinto seu peso cair em meu corpo. – Sabe
como eu sou doido para comer você assim, de quatro. Por trás...
Sorrio com suas palavras, sentindo sua mão em minha bunda.

— Então por que não aproveita a oportunidade e mata sua


vontade? – provoco de volta, esfregando minha bunda contra sua
ereção, arrancando um gemido dele.

Em resposta, tudo o que Andrew faz é penetrar dois dedos em


mim novamente e puxo seu rosto para mim, para poder beija-lo
enquanto sinto-o me levar ao melhor orgasmo sem penetração.

— Porque temos horário reservado no Brunch e não quero


perder a reserva. – diz, caindo em cima de mim e sinto sua ereção
ainda mais que antes. – Por mais que eu queira você agora, terei
que esperar.
— Eu não me importaria de não sair do quarto se for para ficar
na cama com você o dia todo. – digo em resposta e ele sorri,
pousando um beijo em meu ombro. – Além do mais, você está
excitado e é até pecado deixar meu homem assim.

— Bem, talvez ainda tenhamos uma hora sobrando antes de


irmos para lá. – ele diz, rendendo-se e afasta para poder abrir a
calça e o sinto me penetrar, arqueando meu quadril para cima. –
Adoro como você esta sempre tão pronta para mim. – sussurra em
meu ouvido, beijando meu pescoço.
— É porque você sabe como me deixar assim. – sussurro de
volta, beijando-o.
— Eu vou ter que insistir em dizer que você está ótima vestida
assim como esta. – Andrew diz, sentando na cama enquanto
procuro por roupas para ir ao “Café da manhã Especial” com ele.
— Você passou os últimos trinta minutos dizendo isso. –
respondo, virando-me para ele. – E agora é por isso que nós
estamos atrasados.
— Então ficamos aqui mesmo! – exclama saindo da cama e vem
até onde estou. – Não era isso o que você queria desde o início? –
pergunta, soltando o lençol de seda que me mantinha vestida e o
tecido desliza por meu corpo.
— Isso foi antes de você me deixar com fome suficiente para
três, lindo. – respondo, descendo a mão por sua barriga nua,
parando com ela no V que leva ao Pequeno And. – Agora a situação
é totalmente diferente. – Andrew fecha os olhos, provavelmente
imaginando que irei toca-lo. – Quando voltarmos, podemos ficar o
restante do dia aqui.
— Tenho um lugar para te levar mais tarde. – sua voz é rouca
quando reabre os olhos. – E você precisara decidir se jantaremos
aqui no quarto ou no restaurante.
Franzo o cenho.
— Tem que ser agora? – pergunto e ele ri.
— Não tenha pressa.

Andrew afasta, indo até suas roupas que estão jogadas no chão
ao lado da cama e as pega, vestindo a cueca.

— Se vai ficar apenas secando minha bunda – começa a dizer,


caminhando de volta para mim. –, permita-me então leva-la de volta
para a cama. – e abaixa, passando os braços por meu quadril para
me jogar no ombro, passando a mão por minha bunda, onde da um
tapa.
— ANDREW! – exclamo alto quando me joga na cama, vindo
deitar comigo. – Depois não vá jogar a culpa toda para cima de mim
se perdermos sua reserva.

Ignorando-me por completo, Andrew pousa um beijo em meus


lábios e vai descendo (pescoço, seios, barriga.), até que chega lá,
onde parece disposto a me fazer alcançar o céu como nunca antes,
arrancando um gemido de mim que parece vir do fundo da minha
alma.

— Pronto. – diz, afastando-se e o vejo correr a língua pelos


lábios. – Acho que agora podemos ir.
— O QUÊ?! – minha voz sai rouca e expressa minha completa
indignação. – Você não pode fazer isso comigo! – choramingo.
— Não só posso como também vou. – diz com um sorriso sínico.
— Ah, é?
— Sim.
— Pode apostar que vai ter volta então, Sr. Giardoni! – exclamo
saindo da cama e vou pegar as roupas que coloquei em cima da
cômoda, indo para o banheiro, onde tranco a porta para que não
venha atrás de mim.

Como ele pode fazer isso?! Depois de tantas... ARGH! Pode


apostar que isso vai ter volta e vai ser bem quando ele menos
esperar.

Quando chegamos do lado de fora do hotel, descobri que


Andrew havia saído para buscar seu Audi R8, que estava na casa
de um amigo dele não sei onde.

O carro é todo preto com vidro fume bem escurecido. Mas o


interior... AH! Esse cheiro de couro novo! Os bancos todos de couro
preto e um painel que chega a brilhar de tão lustroso. A
quilometragem baixa... O ronco dele... A maneira com que ele
parece apenas deslizar pela rua enquanto And dirige por Nova
Iorque. Tudo faz ser bem compreensível tamanha paixão deste
homem por carros e motos esportes.

— Aonde iremos? – pergunto, mas não obtenho resposta


alguma.
Volto à atenção para as ruas, para os vários outdoors com suas
várias propagandas e as pessoas que caminham de um lado a
outro, assim como fazem em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Algumas outras, que reconheci serem turistas, andam de vagar para
poder fotografar praticamente tudo.
— O que acha da Times Square? – Andrew pergunta quando
para em um semáforo, tirando-me de meus pensamentos.
— É aqui que estamos? – pergunto de volta e ele confirma.
— Pedi para que Ana fizesse a reserva em um Brunch para nós
no início da semana.

Mordo o lábio inferior, de repente lembrando-me de meu último


encontro com Ana, onde ela comentou com uma risadinha bastante
suspeita que And havia batido seu carro em São Paulo e que ela
tinha recebido uma ligação de seu seguro.

— And... – chamo e ele olha para mim. – Ela, a Ana, ela... Bem...
— Se Ana sabe de nós? – completa meu pensamento e
confirmo. – Suspeito eu que sim. Quer dizer, ela fez algumas
reservas para mim que são para duas pessoas.
— Então ela sabe que nós temos algo. – digo baixinho,
desviando o olhar para frente.
— Ela gostou de saber que tínhamos “algo”. – Andrew diz,
pousando a mão em minha perna. – Não tem porque se preocupar
com ela.
— Não estou. – respondo, segurando sua mão. – Inclusive, acho
que ela sabe que fui eu quem bateu seu carro. – meu rosto se
aquece por alguns graus.
— Sabe, sim. – ele ri.
— Oh, céus! – exclamo.
— Fique tranquila, Anjo.
— Certo! Certo! – olho novamente para Andrew, ainda
segurando sua mão, para poder perguntar: – Então, esse Brunch?
Ao invés de responder, Andrew estaciona o carro em uma vaga
reservada e desce, contornando o veículo para poder abrir a porta
para mim.
— Madame. – diz, estendendo a mão para mim e a seguro.
Pouco atrás dele, leio a fachada: Blue Fin.

Tento, embora de maneira bastante inútil, manter meus olhos


fixos apenas nos meus waffle com geleia e no suco. Mas, para ser
mais do que apenas “sincera”, é impossível!
Este Brunch tem uma decoração sofisticada. A iluminação fraca,
as mesas ocupadas por vários casais. Eu seria capaz de passar
todo meu dia aqui.

— Quantas vezes você já veio para cá? – pergunto para Andrew,


que me observa com uma expressão divertida no rosto.
— Aqui? – pergunta de volta e nego.
— Nova Iorque.
— Ah! – exclama. – Algumas. – diz, franzindo o cenho. – Não sei
dizer exatamente, porque eu costumava vir bastante com meus pais
quando era garoto.
— Imagino o tanto de vezes que isto signifique. – olho pela
janela, para as ruas da Times Square, incapaz de me cansar de
admirar tamanha beleza.
— A primeira garota que beijei era daqui. – Andrew comenta e
volto a olha-lo. Ele me da um sorriso maroto.
— Achei que tivesse sido sua namoradinha da escola. – ele ri.
— Não. Foi bem antes dela. Eu sempre tive tendência de ser
pegador.
Reviro os olhos para ele.
— Mas perdeu a virgindade com vinte anos. – retruco. – Embora
eu ainda duvide bastante disso, porque até eu perdi com menos.
— Aposto que ele não era tão bom quanto seu namorado atual.
– comenta com um sorriso de lado, tomando um pouco de suco de
laranja. – Ou era? – pergunta, arqueando a sobrancelha para mim,
como se me desafiasse a dizer que ele era. Ainda que seja mentira,
resolvo brincar com ele:
— Sim. Muito melhor...
Como esperado, Andrew fecha a cara para mim, voltando à
atenção para suas panquecas, onde corta um pedaço. Para
provoca-lo ainda mais, seguro sua mão bem quando a ergue para
leva o garfo à boca, trazendo-a para mim.
— Ele era muito melhor do que meu ex. – completo, correndo a
língua pelo canto da minha boca para tirar o mel. – Já eu não tenho
nem como saber em qual posição da sua lista eu estou, porque ela
não deve ter nem mesmo fim.

Andrew sorri e se aproxima de mim.

— Ela começou com uma garota de dezessete anos e terminou


com uma de vinte e três. – sussurra, tocando meu rosto. – Ambas
estão totalmente fora do que eu era acostumado antes e ambas
foram a melhor exceção que já abri. – ele franze o cenho. –
Literalmente falando. – e sorri. – Mas, sem dúvida alguma, você é a
melhor. Em vários sentidos. Não tem com quê ou por que se
preocupar com isso.
Ele completa com um beijo bem no canto da minha boca, tirando
o restante do mel de sua panqueca.

— Isso não é algo com que você devesse se preocupar.


Concordo com a cabeça, voltando para meus waffle.
— Você também não devia. – sorrio.

Enquanto caminhamos sobre o tempo frio do outono, tento não


me afastar e ser levada pela multidão de pessoas que passam por
nós. É tudo tão lindo e provavelmente impossível manter os olhos
em uma única direção.

Sinto a mão de And na minha, puxando-me para mais perto,


quando alguém esbarra em mim, tirando-me de perto dele por
alguns poucos centímetros.

— Esta ouvindo isso? – pergunto e paro de repente, ouvindo


uma música que parece vir de lugar nenhum.
— É uma trilha sonora. – Andrew sorri.
— A nossa trilha sonora. – sorrio de volta. – Eu poderia dançar
ao som dessa batida para todo o sempre.
— Eu posso dançar com você se quiser. – diz, tomando minha
mão com a sua, passando sua outra por meu quadril.
— Aqui?! – pergunto, arregalando os olhos.

— E por que não? – pergunta de volta. – Ninguém te conhece ou


vai se importar se você fizer feio aqui. Apenas liberte-se e seja livre,
Luara!

E, pela primeira vez desde que chegamos, consigo sentir aquela


libertada que sempre imaginei.
Olho para o céu ainda segurando a mão de Andrew enquanto ele
nos leva ao ritmo da música, enquanto uma mulher canta lá longe
sobre poder amar quando esta com medo de cair e todas suas
dúvidas irem embora de alguma forma.

E é exatamente assim que eu me sinto quando estou nos braços


de Andrew. A maneira com que ele me abraça quando estamos
sozinhos. Vejo lá no alto as fortes luzes que nunca me cegam e
sinto aquele grande amor que me deixa tão insegura, mas ao
mesmo tempo também me faz sentir tão segura. Aquele amor real
que sempre evolui, fazendo-me entender que eu não seria capaz de
mudar nada do que aconteceu nesses últimos meses, porque é tudo
perfeito.

Paro no mesmo lugar e a música continua sem nós até que


termine, dando lugar a outra. Ficamos assim, abraçados e vejo
pessoas paradas ao nosso redor que nos aplaudem e sinto meu
rosto corar. Eu não tinha a menor ideia de que alguém tivesse
parado para nos ver. Quem dirá tantas pessoas assim.

— Você pode ser quem você quiser ou ter quem você quiser. –
Andrew começa a dizer. – Ninguém vai realmente se importar com
suas decisões, suas atitudes ou qualquer outra coisa, até que elas
sejam erradas ou um erro. Ou que as incomode.
— Existem duas coisas da qual tenho plena certeza de ter
acertado nesses últimos meses. – digo, passando o polegar pelo
contorno de sua barba.

— E quais são?
— Uma delas é sobre ser exatamente quem eu sou.
And sorri para mim, concordando.
— E a outra?
— É aquele de quem quero ter por um bom tempo – sussurro,
passando os braços por sua cintura. – e espero que ele também
queira isso.
— Sei bem com quem eu quero estar e estou feliz por esta
escolha. – diz. – Não me importa se isso incomoda aos outros. Só
importa a nós dois.

Afundo o rosto no peito de Andrew, segurando as duas partes de


sua jaqueta enquanto ele passa as mãos por minhas costas. Eu não
sei se tenho coragem de me afastar e descobrir que todo mundo
ainda esta olhando para nós.
Depois de uma tarde incrível, conhecendo coisas maravilhosas e
uma loja com brinquedos enormes, na qual Andrew prometeu me
levar outra vez para que eu pudesse comprar algum presente para
Tommy. Estamos finalmente voltando para onde ele estacionou o
carro cedo para voltarmos ao hotel.

E, por mais que ele tenha feito por merecer, não estou mais
pensando em vingança por ter me deixado na vontade.

— Está esfriando. – comento, tentando me aquecer esfregando


minhas mãos um na outra.
— Avisei que apenas essa sua blusinha não seria suficiente até
o final da tarde. – Andrew diz ao meu lado.
— Não é “só uma blusinha”, And. – repreendo. – Comprei essa
aqui antes da viagem e é linda!
— Não estou dizendo que não seja. – começa a dizer de
maneira defensiva. – Você está bem sexy e linda com ela. Mas aqui
é frio e estamos no outono. E eu acredito que você não queira ficar
resfriada logo na primeira semana. Ou vai?

And sorri para mim e fecho a cara para ele, mostrando a língua.
— Anda. Vista isso. – diz, jogando sua jaqueta em meus ombros.
— Não vai passar frio? – pergunto vestindo-a.
— Sou um homem experiente. Não vim apenas com uma.
— Eu poderia brigar com você, mas não consigo. – digo e ele ri,
passando os braços por meu ombro para me aquecer. – Bem
melhor assim.

Quando paramos em uma esquina para poder atravessar, tiro


meu celular da bolsa para ver se alguém mandou mensagem me
desejando os parabéns. Mas não há nada. Nem mensagem e muito
menos ligação. Talvez o sinal aqui esteja ruim.

Olho para Andrew e solto o braço de sua cintura quase no


mesmo instante, colocando as mãos no bolso.

— O que houve? – pergunta estranhando.


— Nada.
— Sério? – pergunta de volta, tentando me abraçar de volta e
me afasto. – O que aconteceu, linda?
— Não é nada. Eu só... Pensei que tivesse alguma mensagem
de casa. Ou de Julie.

O sinal abre e saio na frente.


Não importa o quão mágico tenha sido passar meu aniversário
conhecendo a Times Square com Andrew. Ele simplesmente se
esqueceu de que dia é hoje! Ou talvez não saiba. Mas lembro-me
muito bem de ter relutado contra a data e te ter dito qual era meu
motivo. Ele deveria ao menos se lembrar de algo vagamente.

— Sabe que seu número de lá não funciona aqui, né? – Andrew


pergunta quando chegamos do outro lado e olho em sua direção. –
Ele tem as mãos guardadas nos bolsos da calça. – Se te mandaram
algo só vai conseguir saber com o wi-fi do hotel ou se pegar um
número local. – Ótimo! Eu esqueci totalmente desse pequeno
detalhe.

— Ao menos eles têm alguma desculpa então. – resmungo.


— Desculpa?
— Não é nada. Eu devo estar entrando na TPM e qualquer coisa
me irrita. Desculpa por esse pequeno acesso de raiva.
— Só acho que você deveria relaxar e aproveitar um pouco mais
seu momento antes de começar realmente a enlouquecer com o
tempo que for passar aqui. – ele segura minha mão e baixo o olhar
para elas. – Aproveita sua folga e tenta pensar um pouco menos no
fato de que seu celular possa estar te escondendo algo.

— Você esta escondendo algo de mim? – pergunto desconfiada


e ele sorri.
— Por que acha isso? – pergunta de volta.
— Eu não sei. – digo com o cenho franzido. – Você pareceu
misterioso depois do almoço e sumiu por algum tempo.

Mais uma vez ele sorri, mas disfarça quando abre a porta do
carro para mim e vai até o lado do motorista.
Talvez minha irritação não passe de TPM, talvez ela seja fruto de
uma canseira pelas horas da viagem ontem ou pelo dia que tivemos
hoje. E eu sei que terei de dar um jeito de convencer And a
passarmos o final de semana trancados no quarto para que eu
possa descansar o máximo possível e me habituar ao clima e fuso-
horário aqui, ainda que não seja tão diferente do Brasil nesta época
do ano. Mas preciso estar cem por cento para a segunda-feira,
quando for para a Nex Ae.

Definitivamente minha irritação era sono. Sinto-me bem melhor


depois de ter cochilado o caminho de volta para o hotel. Ainda que
eu queira subir e ficar na cama até amanhã cedo.

— Decidiu se jantaremos no restaurante ou no quarto? – Andrew


pergunta logo que entramos no hotel.
— Restaurante ou quarto? – pergunto mais para mim mesma de
que para ele.

No quarto teremos toda a privacidade possível. Um cardápio


bem resumido, mas não precisarei me vestir apropriadamente para
isso. E tenho certeza de que Andrew se sentiria muito bem se
propusesse jantarmos apenas com roupa de baixo.

Já no restaurante teremos muito mais opções e terei que me


vestir de maneira adequada. O que dará mais trabalho. Mas, por
outro lado, será nosso primeiro jantar onde não correremos o risco
de encontrar algum conhecido.

— Já tem quase dois meses que começamos a namorar. – digo


baixinho, tomando minha decisão.
— Vou confirmar a reserva. Já venho.
Andrew sai, deixando-me sozinha na recepção.

Acho que nunca jantei em um hotel antes. Na verdade e para ser


mais honesta, não me lembro de já ter ficado em um hotel. Pelo
menos não em uma época da qual eu possa me lembrar.
Vejo And conversando com um funcionário do hotel e acenar
para mim ao notar meu olhar, mudando de posição logo em seguida,
como se eu pudesse ouvir o que quer que estejam conversando.

— Quanto mistério. – digo dando as costas.


— Espero que tenha comprado um vestido elegante para uma
ocasião especial. – ouço sua voz em meu ouvido, causando um
calafrio por todo meu corpo.
— Eu não chamaria de elegante, exatamente.
— Bem, como ainda não levou suas coisas lá para cima, talvez
você deva se arrumar no seu quarto e nos encontramos no
restaurante. – ele propõe bem quando o elevador abre para que
possamos entrar.
— Achei que fossemos aproveitar o tempo livre que temos até o
jantar para... Sei lá. Tomarmos banho juntos, talvez? – digo, virando
para ele, que apenas sorri.
— Não quero distrações. – responde. – Já estou resistindo a
muita tentação desde cedo. Você também vai ter que ser mais forte
que isso.
— Diz isso porque não foi você quem ficou na vontade. –
comento baixinho. – Mas o que é seu ainda está guardado.
— Estou ansioso por isso. – diz em resposta.

Quando saio do banho, vou até onde deixei minha roupa já


separada para adiantar as coisas. Mas, antes de me vestir, passo
hidratante por todo meu corpo e um pouco de perfume. Colocando
também um par de brincos pratas e um anel com pequenas pedras
de cristal. Ambos os presentes meu pai deu para mim quando me
formei. Por fim, arrumo meu cabelo com uma trança fina e a amarro
atrás da cabeça, deixando o restante solto e caído, dando um
destaque incrível às ondas, passando por último uma maquiagem
levinha, apenas para dar um tom a mais.

Terminado esta parte, coloco um vestido vermelho sem alça que


vai até meus joelhos e um cinto fino preto, calçando também uma
sandália preta de salto fino que deve me ajudar a ficar um pouco
mais alta perto de Andrew.
Confiro no espelho para me garantir de não ter exagerado e
menos ainda de estar esquecendo qualquer coisa.

— Acho que já posso ir. – digo, virando para a porta. – O que é


isto? – pergunto, de repente notando um bilhete e uma caixinha
preta e felpuda sob a cômoda, na qual não estava ali quando entrei
para tomar banho.

Tomo o bilhete em minha mão, reconhecendo de imediato à


caligrafia de Andrew. Ele diz apenas duas pequeninas palavras:
Use-me. Franzo o cenho, colocando-o de lado para pegar a
caixinha. Meu coração há essas horas já mais do que acelerado.

Dentro, deparo-me com um colar provavelmente de ouro branco


com um pingente de algo que representa uma lua minguante e um
coração no centro, todo coberto por pequenas pedras brilhantes,
que acredito serem diamantes.
Caminho de volta ao espelho, tirando o colar da caixa,
colocando-o em meu pescoço. O pingente fica caído sob o decote
do vestido, refletindo a luz que bate nele.

— É lindo. – sussurro com um sorriso de lado a lado.

Desço os poucos degraus que levam ao restaurante. Andrew


está sentado em uma mesa no canto, próximo à janela. Estamos no
quinto andar, o que dá uma vista linda para a cidade.

— Oi. – digo, parando ao seu lado e ele sorri, levantando-se para


puxar a cadeira para que eu possa me sentar.
— Vejo que encontrou o presente. – diz em meu ouvido quando
sento. – Ficou lindo em você.
— Ele é lindo. – respondo, observando sentar-se de frente para
mim. – Obrigada. De verdade. – dou um sorriso tímido e ele sorri de
volta. – É ouro mesmo? – pergunto apenas por curiosidade.
— Passei em um lugar cedo. – é tudo o que diz. – Com fome?
— Um pouco.

Na verdade, estou mais nervosa de que com fome. Não sei bem
o porquê, mas estou. Já tem um bom tempo que não me sinto assim
em companhia de Andrew. Costumava acontecer antes de
começarmos a sair e mais ainda quando ele ficou comigo no meu
apartamento, quando minha avó estava internada e depois que ela
faleceu.

O garçom trás dois cardápios para nós. Como nada me soa


familiar, deixo para que And escolha.

— Vamos ficar com a sugestão do Chefe e... Vinho ou


champanhe? – pergunta para mim.
— Vinho. – respondo rapidamente.
— Traga o melhor que tiver. – diz ao rapaz, devolvendo os
cardápios.
— Voltarei logo.
— “O melhor que tiver?” – repito suas palavras.
— É uma ocasião especial.

Sorrio, concordando. Meu coração ainda mais acelerado


enquanto nos olhamos.
Na verdade, Andrew parece disposto a me deixar sem jeito hoje.
Ele me olha fixamente, sem nem mesmo ousar piscar.

— Está fazendo uma bela noite. – comento, olhando pela parede


de vidro ao meu lado.
— Sim.
— Você não vai parar?
— Não posso parar.
— Por quê? – pergunto franzindo o cenho.
— Porque você é muito bonita para que eu desvie os olhos de
você e isso pode ser perigoso. – ele responde e sinto meu rosto
corar.
— Por que perigoso? – pergunto novamente, tentando ignorar a
sensação que ele me causa.
— Porque tenho mede de te perder.
UAU! Por essa resposta eu não esperava. Ele conseguiu me
desarmar por completo, como sempre.
— Não tenho mais perguntas depois dessa sua resposta. – digo
bem quando o garçom retorna com nossos pedidos e Andrew sorri
para mim.
— Você não é muito boa com palavras, né? – pergunta,
observando o rapaz servir nossos pratos e o vinho. Espero até que
ele se retire para poder responder:

— Não tenho muito jeito com elas ditas. Existem algumas coisas
que eu nunca disse a ninguém e são coisas que eu gostaria de ter
coragem de dizer a você. Mas eu não sei como fazer isso.

Mordo o lábio inferior, tomando um pouco do meu vinho e And


faz o mesmo.

— Eu sou melhor no papel. – diz, colocando sua taça de lado e


pega a faca para cortar um pedaço de salmão. – Dizer estas
mesmas palavras da qual você se refere... Isso é novo para mim. –
sorrio, concordando.
— Na hora certa elas apenas saem. – ele sorri em resposta. –
Esse vinho é uma delícia.
— É sempre a melhor pedida. Independente da ocasião.
— E essa é uma excelente ocasião. – concordo.
— Sim. – concorda. – Uma excelente ocasião.
O restante do jantar decorre em um silêncio leve e gostoso. Uma
música ambiente tocando baixinho ao fundo, deixando o clima ainda
mais agradável.
— Você esta bêbada? – Andrew pergunta.
— Não estou bêbada. Tomei apenas duas taças de vinho. – dou
de ombros. – Ainda dá para levar o restante lá para o quarto e
fazermos bom uso dele. – pisco para ele, fazendo-o rir.
— Há uma possibilidade de fazermos isso. – confessa. – Talvez
até possamos pular a sobremesa e irmos direto para lá. Ou a
levemos lá para cima.
— Não! – exclamo rindo. – Primeiro a sobremesa. Depois
subimos. Mas se quiser levar alguma outra sobremesa...
O mesmo garçom de antes volta, trazendo nossa um Sundae à
Americana, que consiste basicamente de: sorvete de creme e
morango – cobertura de marshmallow, chantilly, maçã, castanha e
cereja.
— Talvez eles vendam uma lata de chantilly para que possamos
levar lá para cima, então. – Andrew comenta logo que ficamos
sozinhos outra vez. – Adoraria te lambuzar com isso.
— Eu gostaria disso. – digo baixinho, molhando uma cereja no
chantilly e tiro o doce dela, sem desviar os olhos de And, que tem
uma expressão tensa no rosto por conta do meu gesto. – Sabe,
você tem sorte por eu estar temporariamente impossibilitada de
cozinhar. Eu adoraria fazer algo para nós.

— Bem, eu ainda tenho um apartamento aqui. Não precisa


esperar tanto.
— Vou querer visitar ele um dia dessas então, apenas para
poder calar essa sua boquinha gostosa e nervosa sobre as vezes
que disse que eu não era boa na cozinha.
Com minhas palavras, percebo a respiração de Andrew se
acelerar e suas pupilas dilatarem.
— Não precisa de tudo isso para calar minha boca. – sua voz sai
rouca e cheia de desejo.
— And... – chamo após algum tempo.
— Sim?

Faço gesto com o dedo, chamando-o para mais perto e ele


aproxima o rosto do meu, fazendo-me sentir seu delicioso perfume
masculino e sua colônia pós-barba. Seguro seu rosto com uma mão,
com o meu próximo de seu ouvido.

Fecho os olhos e inspiro fundo, apreciando o aroma deste


homem.

— Você nunca vai me perder. – sussurro em seu ouvido,


voltando para o meu lugar.
Andrew permanece imóvel na mesma posição, também de olhos
fechados.
— Isso já é sacanagem, linda. – diz com cara de menino que
está lutando contra a vontade de comer todo o doce que a mãe
proibiu.

Dou um sorriso maroto, correndo a língua pelos lábios antes de


me levantar, dando as costas para ele. Sinto seu olhar em mim,
pouco antes de tê-lo ao meu lado e assim caminhamos
naturalmente até o elevador, deixando um espaço seguro.

Assim que a porta do elevador abre para que possamos entrar,


noto a presença de um senhor e Andrew o cumprimenta, logo
depois programando para que suba até o último antes e vamos ficar
bem no fundo.

No sexto andar, o senhor desce e ninguém mais entrar pelos


andares seguintes. Uso o espelho para arrumar alguns fios soltos
em meu cabelo.
— Sabe que é inútil fazer isso. – Andrew diz em meu ouvido,
virando-me de frente para ele, prendendo-me contra a parede.

Seus lábios descem até meu pescoço e me beija ali, fazendo


com que um calafrio percorra todo meu corpo.
— Como eu esperei por isso. – ele diz, arrancando de mim um
gemido e sobe para minha boca.

Desço minhas mãos por suas costas até chegar a sua bunda e o
aperto contra mim apenas para poder sentir sua ereção.

O elevador para e rapidamente nos afastamos antes que a porta


se abra, para que um casal possa entrar. Noto no painel que ainda
falta um andar para chegarmos ao quarto dele.
Andrew esta ao meu lado com um sorriso bobo no rosto e com o
cabelo bagunçado, mas não tanto quanto o meu.

O elevador para e descemos. O corredor está vazio.


— Abre. – Andrew pede atrás de mim, entregando seu cartão.
Franzo o cenho sem entender muito bem, mas o aceito,
passando na frente para poder abrir a porta. Ele coloca as mãos em
meu quadril, beijando meu pescoço.

— Aqui não! – digo, tentando inutilmente escapar de suas mãos.


Não que eu tenha tentado com muita vontade.

Abro a porta somente um pouco e já vejo uma fraca luz saindo


de dentro de seu quarto. Viro para And e ele da de ombros. Abro-a
por completo para ver o que é.

O chão está todo repleto de pétalas de rosas vermelhas,


formando um caminho de velas até a cama do outro lado. Nela, esta
um lençol branco, também coberto com as mesmas pétalas,
formando um enorme coração. No criado-mudo, um balde com
champanhe e duas taças. Do outro lado, vejo exatamente cinco
pacotes de presentes.

Novamente viro-me para Andrew, que sorri.


— Não são meus.
— Planejou tudo isso sozinho?
— A maior parte. – da de ombros. – Só não podia deixar as velas
acessas. Seria muita loucura.
Olho bem dentro de seus olhos e vejo o reflexo das vezes. Meu
coração bate disparado, quase siando pela boca.
— Ninguém nunca fez algo assim por mim antes. – sussurro.
— Isso é bom. – responde.
Andrew fecha a porta, que trava automaticamente.
— Feliz aniversário. – diz.
— Achei que você tivesse esquecido. – digo, aceitando seu
abraço, ficando na pontinha dos pés, apesar do salto. Ele afasta
somente o suficiente para olhar em meus olhos.
— Eu nunca esqueço.

Andrew coloca Let’s Stay Together do Al Green para tocar e volta


até onde estou.
— Nervosa? – ele pergunta.
— Um pouco. – confesso e ele sorri, passando a mão por minha
nuca e a outra por minha cintura. Seguro sua camisa com as
minhas.
— Eu estou muito. – sussurra em meu ouvido, beijando-me de
maneira lenta.

Sem nos afastar, Andrew caminha de costas até uma poltrona


em um canto do quarto onde se senta e subo em seu colo,
passando as mãos por sua nuca, descendo para seu pescoço.

Faço uma pausa, dando um pequeno espaço para poder olha-lo


nos olhos. Suas mãos ainda estão em meu quadril e começo a
desabotoar sua camisa. Um por um. Seus olhos fixos a cada gesto
meu, ainda brilhando com a luz.

No terceiro botão, já com seu peito a mostra, beijo-o sobre o


coração, sabendo o efeito que o gesto causa nele.
Minhas mãos continuam trabalhando em sua camisa, até que ela
esteja jogada no chão.

— Ainda não consegui descobrir o que está escrito aqui. –


comento, passando o dedo por sua tatuagem e ele baixa os olhos.
— Omnia causa fiunt. – diz e ergo o olhar, ainda mais confusa
que antes. – “Tudo acontece por uma razão.” – traduz. – É latim.
— Por isso que eu nunca consegui decifrar. – comento e ele
sorri.
— Observadora você.
— Você já a tinha naquela vez? – pergunto curiosa.
— Ou não tão observadora. – faço bico com sua insinuação. –
Fiz no último ano da faculdade, em uma viagem que fiz a Portugal.
— Sou mais observadora de que você.

— Eu sei bem o que você tem aqui. – diz, tocando meu seio
esquerdo do lado. – Orbis non sufficit.

Ele olha bem dentro dos meus olhos e faz a temperatura subir
mais alguns graus.
Suas mãos descem o zíper do meu vestido, jogando-o também
para o chão, tirando também meu sutiã.

— O que acontece é que quando eu estou aqui. – diz, descendo


a boca até onde esta a tatuagem. – Estou sempre mais preocupado
com outras coisas. – e olha para mim por cima, fechando a boca em
meu mamilo e o puxa entre os dentes.

Ao sentir seu toque em mim, eu fecho os olhos e agarro seus


cabelos, permitindo que um gemido me escape.

— Esperei a tarde toda por isso. – sussurra. – E uma espera


nunca valeu tanto para mim.

Puxo sua cabeça para trás, forçando-o a olhar para mim e o


beijo com força, sentindo o Pequeno And crescer de baixo de mim.

Andrew segura meu quadril e nos levanta sem nem mesmo dar
pausa para respirarmos e me repousa na cama, puxando minha
calcinha para fora, deixando-me apenas com o salto. Então afasta
para tirar a calça, que vai parar junto de todo o restante.

Levo as mãos acima da cabeça, pegando um punhado de


pétalas, na qual deixo cair em minha barriga. Faço tudo, sentindo o
olhar de Andrew em cima de mim, até que deixe comigo.

— Eu quero você. – sussurro em seu ouvido. Ele sorri, entrando


em mim e o sinto quente, como todas as outras vezes.

Andrew segura minhas mãos para cima enquanto se movimenta


em um ritmo suave e enlouquecedor. Sua respiração ofegante e
quente contra a minha. Seco uma gota de suor em seu rosto e o
beijo.

Existem várias coisas que consegui sentir das outras noites. Mas
o que sinto nesta é diferente. Talvez seja pelo lugar, talvez sejam as
coisas ficando mais fortes e intensas entre nós. Eu não tenho noção
do que possa ser.
Ele afasta, virando-me de frente para si, penetrando-me outra
vez. Seguro seu quadril, apertando-o contra mim. Andrew me olha
bem dentro dos olhos e me sinto nua de maneira que vai bem além
de nossas roupas.

Viro-o de barriga para cima, subindo em seu colo, colocando-o


dentro de mim o máximo possível. Deito em sua barriga, tomando
meus próprios movimentos.

— Tudo bem? – pergunta.


— Esta sim. – respondo, segurando seu rosto entre minhas
mãos e o beijo. Ele senta comigo ainda em seu colo.
— Acho melhor tirarmos isso antes que você se machuque. –
diz, soltando as duas sandálias dos meus pés. – Quer experimentar
algo novo? – pergunta com um sorriso de lado e faço que sim, ainda
que tenha dúvidas a respeito.
Andrew me tira de seu colo e assopra uma das velas no criado-
mudo, onde o champanhe ainda espera fechado por nós.
— Vou precisar que fique de costas.

— O que você vai fazer? – pergunto com um pouco de medo.


— Confia em mim?
Franzo o cenho.
— Sim. – respondo, deitando de costas para ele e sinto seu beijo
em meu ombro.
— Está no ponto certo. – ouço-o dizer e tento virar para ver a
que se refere. – Shiii! Fique assim.
Um líquido quente cai em minhas costas e dou um pulo por
reflexo.
— Ai!
— Está muito quente? – pergunta preocupado.
— Não. Esta morninho. O que é?

No lugar da resposta, sinto o líquido cair em vários pontos ao


longo do meu corpo e duas mãos fortes começarem uma massagem
desde meus ombros até os pés.
— O quê é isso? – pergunto, sentindo-me relaxada.
— Vela aromática para ocasiões especiais. – diz em meu ouvido.
— Isso é bom.
And levanta meu quadril, passando um pouco do óleo por minha
barriga, descendo a mão para a virilha.
— Está secando. – diz, parando com a massagem, beijando ao
longo das minhas costas.
Por cima do ombro, eu o puxo para mim e o beijo. Levo a mão
até o Pequeno And para que retomemos de onde havíamos parado.
Andrew beija o lóbulo de minha orelha, penetrando-me de vagar da
primeira vez. Já as outras são bem mais bruscas e excitantes.

— Já faz algum tempo que estou louco para fazer isso com você.
– diz em meu ouvido e solto um gemido alto de dor. – Linda. – ele
geme meu segundo apelido predileto, dando estocadas fortes.

— And. – gemo seu nome, mas não consigo completar a frase.


Ele entrelaça os dedos por meus cabelos, puxando-os para trás e
beija minha nuca, vindo para minha boca quando um gemido me
escapa. – And... – tento uma segunda vez e ele segura meu rosto.
Seu olhar é o mais sério que já vi.

Meu corpo se contorce em um orgasmo incrível e sinto Andrew


gozar dentro de mim. Ele joga meu cabelo de um lado e me beija.
Caindo do meu lado na cama e assim ficamos por segundos,
minutos ou horas. Não sei.

Sua mão acaricia meu rosto, como se pudesse perder qualquer


mudança nele.

— Esse colar ficou lindo em você. – ele comenta, segurando o


pingente.
— Ele é lindo. – corrijo. – Por que a lua?
— Porque ela me lembra de você. Um trocadilho com seu nome.
– diz. – Você é uma lua cheia de fases.
— Isso sim é lindo. – digo, dando um beijo em seu rosto e ele
sorri.
— Estes presentes são de sua família. – começa a dizer de
repente. – Passei da sua casa na terça e eles tinham isto para você.
— Foi lá que você passou a noite. – digo e ele concorda.

Sento na cama ainda de frente para Andrew, sentindo meus


olhos se encherem de lágrimas. Nunca imaginei que pudesse haver
surpresa maior do que tudo o que ele já fez por mim.

— Se você for um sonho, não quero nunca acordar. – sussurro.


— Se tem algo que não sou é sonho, linda. –responde. – Bem,
não exatamente. Existem muitas mulheres por ai que sonham ter
uma noite comigo.

Subo em suas pernas, passando minhas unhas por sua barriga.


— Vão continuar sonhando.
— É? – pergunta com um sorriso de lado. – Por quê?
— Porque sou a mulher que não vai deixar a próxima existir. –
sussurro.
***
Acordo de madrugada e vejo que ainda são três horas. Andrew
dorme tranquilo ao meu lado e levanto para ir ao banheiro,
aproveitando para desligar a TV que acabou ficando ligada quando
adormecemos.

Quando volto, reparo nos cinco embrulhos ainda fechados do


meu lado da cama e acendo o abajur para poder ver o que são.

O primeiro que abro é de Julie. O último livro da saga Legados


de Lorien: O Destino da Número Dez. A pergunta é: COMO ELA
CONSEGUIU ESSA EDIÇÃO SENDO QUE AINDA NEM MESO
SAIU NO BRASIL?!

Dos meus pais ganhei uma jaqueta nova e o último livro do John
Green que faltava na minha biblioteca.
O quarto é uma caixinha com mais ou menos um palmo de
altura, que atiça minha curiosidade ainda mais. Abro-o sem demora
e vejo a imagem de um boneco à embalagem.
— Ai. Meu. Deus! – exclamo, sentando-me sobre minhas pernas.
– Isso só pode ser brincadeira.
Abro a embalagem, tentando não danifica-la. E sim, é um
boneco super fofo do Harry com vestes de Quadribol e sua linda
Firebolt em uma das mãos e o pomo de ouro na outra.

— Que coisa mais linda! – exclamo ainda mais alto, fazendo com
que Andrew acorde.
— O que aconteceu? – ele pergunta um pouco desnorteado. –
Está tudo bem?
— Desculpa. – peço. – Eu só... – mostro o boneco para ele.
— Bem que Camile disse que você iria surtar com isso dai. – diz,
coçando a cabeça enquanto senta ao meu lado.
Coloco o Harry ao lado do abajur para abrir o último embrulho.
Ele é bem fininho e menor que um livro.
— Tommy sempre me surpreende nos presentes. – comento,
olhando para a foto que tiramos no aniversário dele. Meus pais
estão de um lado meu e And do outro, com Tommy sentado em
seus ombros. Ju e Cami na nossa frente. Todos abraçados de
alguma forma.

Essa foto foi tirada logo depois que tirei o curativo da testa, mas
os pontos não estão visíveis. Sorrio com a simples lembrança
daquele dia e meus olhos se enchem de lágrimas ao vê-los.

And me abraça, puxando-me para perto de si.


— Eles estão com saudades de você. – diz, pousando um beijo
em meu cabelo.
— Provavelmente tanto quanto eu. – sussurro.
— O que te fez acordar tão cedo? – pergunta curioso. – Ou tão
tarde, dependendo da maneira que você colocar.
— Às vezes acontece. Dai vi os embrulhos lá e, bem...
— E então resolveu gritar às três horas da madrugada, porque é
supernormal alguém fazer isso.
— Desculpa. – sorrio sem graça por tê-lo acordado.
— E que tal se eu não te deixar dormir pelo restante da noite? –
pergunta, prendendo-me contra o colchão. – O que você acharia?
— Muita maldade, porque não fiz por querer e já te pedi
desculpas. – respondo, tentando me soltar de suas mãos, embora
não tente de verdade.
— Não vai conseguir. – sussurra em meu ouvido e fecho os
olhos. – Tá. Depois. Preciso ir ao banheiro.

Ele afasta, fazendo-me rir.


Meus piques da madrugada costumam durar muito pouco tempo.
Normalmente apenas o suficiente para ver a hora e já volto a dormir.
Sinto o colchão afundar ao meu lado e reabro os olhos. And sorri
para mim, também não aguentando mais de sono.
Passo a mão por seu cabelo, repetindo o mesmo gesto várias
vezes.

— Eu posso me acostumar a isso. – sussurra, fechando os


olhos. Ele desce minha mão por todo seu rosto, parando com ela
apenas em sua boca, onde a beija.
— Sua mão é tão grande e grossa perto da minha. Tão quente. –
observo e ele reabre os olhos, entrelaçando nossos dedos,
movendo o polegar pelo meu.

Percebo sua respiração ficar mais acelerada quando aproxima o


rosto para mais perto de mim, colocando meu cabelo para trás da
orelha.

— Eu amo você, Luara. – arregalo os olhos ao ouvir suas


palavras. ELE O QUÊ?! Meu coração para de bater no mesmo
instante. – Tenho tentado criar coragem para te dizer isso há dias já,
mas não existe momento “perfeito” para dizer como nos sentimos. E
essa é a verdade: eu me apaixonei por você de maneira que nunca
achei que fosse acontecer novamente. Mas aconteceu desde que
nos encontramos na praia e meu único arrependimento desde então
foi não ter acompanhado você até sua casa aquele dia ou pego seu
telefone.

Quero rir de nervoso. Quer dizer, eu não estava esperando por


isso. Ele me pegou completamente de surpresa.
Ao invés de rir, passo a mão por sua nuca, trazendo-o para mais
perto de mim, onde sussurro baixinho em seu ouvido:

— Eu também amo você, Anjo. – e então eu o beijo, sabendo


que não preciso dizer mais nada, porque, se eu tentasse fazer isso,
acabaria me enrolando toda. Mas é o que eu sinto quando estou
com ele. – Só não me peça para falar como você. Isso acabaria em
uma catástrofe. – digo quando ele afasta, fazendo-o sorrir.
— Verbos intransitivos não possuem complementos. – diz em
resposta, puxando-me para seu colo. – E agora você me fez perder
todo sono. Então não reclame de ficar acordada a noite toda.
— Eu te fiz perder o sono?! – exclamo rindo. – And, meu lindo,
você me pegou desarmada aqui. Sou sua. De corpo e alma. Como
nunca fui de ninguém.
— E você ainda diz que não é boa com as palavras.

Ajeito o Pequeno And entre minhas pernas, deslizando-o para


dentro de mim.
Capítulo Vinte e Seis
Segunda-feira

Durante toda a noite, eu não devo ter dormido mais do que poucos
minutos. Se eu gostasse de café, certamente eu tomaria umas duas
garrafas antes de sair só para poder ter certeza de que não entraria
em pânico. Mas eu odeio aquilo e não consigo entender como as
pessoas conseguem gostar de uma coisa tão amarga.

Já tomei meu banho, comi algumas bolachas apenas para não


ficar de estômago vazio a manhã inteira e estou pronta, apenas
esperando Andrew acordar para podermos ir a Nex Ae. Pelo que ele
me contou ontem, terá uma reunião em vídeo conferencia entre as
duas empresas e ele passara a manhã toda com eles, resolvendo
coisas de diretores.

Por falar em Andrew, tivemos o melhor final de semana de todos.


Esses últimos dias não saímos para nenhum passeio mais
cansativo, mas ficamos juntos a maior parte do tempo. Na verdade,
ficamos juntos o tempo todo.

Ele me ajudou a elaborar algumas ideias novas para o meu


projeto, desviou minha atenção do projeto. Pediu para que eu
fizesse um pequeno aplicativo para mandar para o Pedro na sexta-
feira e eu o fiz sem o menor trabalho aparente. Novamente ele me
interrompeu para um “intervalo por recompensa” e eu gostei muito
desses intervalos.

No sábado fomos dar uma volta aqui pelas redondezas e


almoçamos/tomamos café da manhã em um Brunch que tem aqui
perto. Depois voltamos para o hotel e ficamos vendo seriado na TV
e almoçamos no quarto. O mesmo no domingo. E isso me ajudou
bastante a esquecer de tudo o que terei que enfrentar hoje.

Ainda são seis horas da manhã. Tem mais uma hora antes de
sairmos, então desço até ao que deveria ser meu quarto para
buscar algumas coisas que espero precisar ao longo do dia, que
são: caderno para anotações, um estojo com canetas (uma nunca
basta para mim) e um pacote de Trident que comprei no aeroporto,
porque sempre é bom ter algo desse tipo por perto em caso de
emergência.

Hoje não levo meu notebook. Dependendo de como for levo


amanhã ou quando julgar ser necessário. Mas o caderno é algo de
extrema importância para um programador, para que ele possa fazer
seus projetos de mesa antes de começar a desenvolver um novo
trabalho. Ou no meu caso de imediato: algo que vai me ajudar a me
adaptar mais rápido ao trabalho do pessoal da Nex Ae.

A campainha toca e corro até a porta para olhar pelo olho


mágico apenas para ter certeza de que é And.

— Bom dia. – digo assim que abro a porta e ele me da um beijo


de bom dia.
— Achei que você tivesse fugido quando não te vi lá em cima.
— Eu não consegui dormir essa noite. Então que vim buscar
algumas coisas.
— Que não dormiu percebi pela maneira com que virava na
cama. – diz com um sorriso, mas não consigo retribuir. – Está tudo
bem? – pergunta e eu nego.
— Estou mais nervosa do que nunca antes. Sinto como se algo
ruim pudesse acontecer até o final do dia e isso esta acabando
comigo.

— Nada de ruim vai acontecer com você lá, linda. – diz, abrindo
os braços e me escondo entre eles, aceitando seu abraço. – Se
perceber que algo está saindo do seu controle, lembre-se de que eu
estarei lá. Você pode me chamar à hora que precisar.
— Como o Superman? – pergunto.
— Não sou muito fã do cara, mas pode colocar assim.
Sorrio, concordando.
— Mas você não vai estar em reunião o dia todo?
— Só a manhã. – responde. – À tarde estarei livre e você
provavelmente também. – franzo o cenho, mas não pergunto mais
nada.
And mantém nossos corpos colados por algum tempo e o aperto
forte junto a mim.
— Vai dar tudo certo. – ele sussurra, dando-me um verdadeiro
beijo de bom dia.

O caminho até a Nex Ae leva exatamente uma de carro do hotel.


Segundo Andrew, ela fica bem no meio do hotel em que estamos e
seu apartamento no Brooklyn, coisa de quinze minutos mais perto
de lá. Apenas mais um dos motivos pela qual não consigo entender
o porquê de que ele também tenha que ficar no hotel. Mas acho que
ele e os diretores e toda a equipe sabe o que faz nesse tipo de
viagem.

And estaciona o carro em uma vaga reservada como BIT –


Presidente e olho para o lado do enorme prédio que ele havia me
mostrado quando ainda estávamos há uma quadra daqui. Pelo que
ele me explicou, o lugar é todo oval, com vários corredores que
levam para vários setores da empresa e cada um leva a três deles.
Ao todo são muitos.

Ele desliga o veículo e vira de lado para mim.

— Ainda esta nervosa? – pergunta, apoiando a mão em minha


perna e a seguro.
— Um pouco. – respondo, fechando minha mão na sua. – Nem
quando comecei a trabalhar na BIT fiquei assim. Acho que lá eu
fiquei só ansiosa depois de um tempo.
— Por quê?
— Eu não sei. – dou de ombros. – Acho que esperei tantos anos
para conseguir aquilo, que quando estava lá, era como se eu
estivesse chegando a Orlando no parque de HP.
— Se você se sair bem, posso considerar te levar lá antes de
voltar. – ele diz em resposta e sorrio.
— Sério? – pergunto e And confirma. – Tá. Agora sim estou
vendo vantagem nisso. – ele ri. – Estou brincando. Não precisa
fazer isso. Eu vou lá, vou fazer esse treinamento, porque sei que
você foi contra vários dos diretores e sócios para que eu pudesse
estar aqui. Talvez seja isso.
— O que? – pergunta com o cenho franzido.
— Eu estou de experiência ainda e você e o Pedro confiaram em
mim.
— Fizemos isso porque sabíamos que você se daria bem, linda.
– diz, prendendo meu cabelo para trás da orelha. – Confiamos em
você para isso.
— Por favor, não diga que sabe que eu consigo fazer isso. –
peço, apertando sua mão e ele ri.
— Vem cá. – diz, passando a mão livre por minha nuca,
puxando-me para perto e me beija. – Se te ajudar, saiba que tenho
outro lugar para te levar hoje quando sairmos daqui.
— Jantar? – pergunto, fazendo-o rir outra vez.
— Tão bom quanto.
— Sexo? – tento, embora saiba que não seja isso.
— Podemos fazer depois.
— Certo. Agora vou passar a manhã inteira esperando por isso.
Seguro sua camisa, puxando-o para outro beijo e apenas seu
toque em meus lábios é mais do que suficiente para fazer meu
coração pular contra o peito.

— É melhor nós entrarmos ou você vai acabar atrasando. – ele


diz assim que afasta e sorrio, concordando.
— Posso ajudar? – uma mulher pergunta assim que nos vê
entrar no prédio. Ela esta sentada em uma mesa no canto, ao que
deduzo ser a recepção.
— Bom dia. – And a cumprimenta com seu lindo inglês britânico,
que o tornou ainda mais sexy desde que descobri sua
nacionalidade. – Esta aqui é Luara Brudosck. – a mulher olha para
mim e sorrio sem graça. – Vai começar treinamento em nome da
BIT. E eu tenho uma reunião com os diretores.
— Senhor Giardoni, correto? – pergunta e And confirma. – Os
senhores estão marcados aqui. Sua reunião começara às noves
horas. Pode esperar na sala de reuniões lá em cima. Sabe onde
fica?
— Sei sim.
— O senhor pode ficar a vontade. Qualquer coisa que precisar é
só pedir a secretária. – ela então vira para mim, como se acabasse
de me notar pela primeira vez. – A senhorita esta marcada para ser
conduzida pela Srta. Sarah Orwell, supervisora chefe. Ela chegará
dentro de alguns minutos, então pode aguardar aqui mesmo.
— Tudo bem. Obrigada.

And me acompanha até o sofá e pega dois cafés, entregando um


para mim.
— Eu não tomo. – digo e ele franze o cenho.
— Bem, não sei por que peguei dois, porque também não bebo
café. – diz. – Eu te daria um beijo de boa sorte. Mas não posso mais
fazer isso aqui.

— Não se preocupe. Vou te cobrar com juros mais tarde. – sorrio


para ele.
— Tudo bem. Pode fazer isso. – diz e sorri de volta para mim. –
Antes de qualquer coisa: tenha cuidado com Sarah. Ela não é flor
que se cheire e muito provavelmente não vai gostar de você.
— Por que diz isso?
— E não acredite em nada do que ela disser a meu respeito.
— Andrew...
— Não, nós não tivemos nada. – ele responde antes mesmo que
eu possa verbalizar meus pensamentos. – Não que ela não tenha
tentado e não possa tentar novamente. Só acredite em mim, por
favor.
— Tudo bem. Eu vou acreditar em você. – digo e ele sorri. – E,
And.
— Sim?
— Eu amo você. – gesticulo para não correr o risco de alguém
aparecer e acabar ouvindo.
Ele apenas sorri, fazendo gesto indicando que conversaremos
depois e sento em uma das poltronas, vendo-o se afastar até o
elevador e sumir lá dentro.

Vinte minutos já se passaram e nada dessa tal Sarah Vadia


Orwell chegar. Toda a ansiedade e nervosismos que And havia me
ajudado a amenizar com os beijos no carro quando chegamos,
agora deram lugar a uma impaciência tremenda.

— Srta. Brudosck. – ouço alguém chamar e me viro, dando de


cara com a recepcionista. – Preciso que a senhorita use isto
enquanto estiver aqui. – diz, entregando um crachá com a mesma
foto que tenho no meu da BIT e a palavra TRAINEE logo abaixo do
meu nome.

— Tudo bem. – digo.


— A Srta. Orwell já esta a caminho. Ocorreu um pequeno
imprevisto e ela acabou atrasando.
— Tudo bem. Obrigada.
Ela sorri e se retira, então prendo o crachá em minha blusa,
voltando a atenção para a revista que estava folheando antes.
— Onde ela esta? – ouço alguém dizer logo atrás de mim e me
viro bem quando uma loira de farmácia vem caminhando até onde
estou. – Você que é a garota daquela empresa brasileira? –
pergunta parando ao meu lado. – BIT?
— Sim, senhora.

Sinto seu olhar ir dos meus pés à cabeça e arqueio a


sobrancelha quando nossos olhares se cruzam, lembrando bem do
que Andrew havia me dito pouco antes de sair. Apenas pela
expressão “Piriguete de Farmácia” estampada na cara dela eu já sei
que nada do que ele disse é mentira e que não nos daremos nada
bem. Pelo menos não no lado pessoal.

— Sou Sarah Orwell. – apresenta-se. – E você, é?


— Luara Brudosck.
—Venha comigo. – Sarah diz, seguindo em frente e vou atrás
dela até um corredor. – Nós teremos muito trabalho a fazer ao longo
deste mês. – começa. – Introdução ao nosso trabalho aqui,
desenvolvimento da BIT entre outras coisas.

Ela faz uma pausa para entrarmos no elevador e ela o programa


para ir até o segundo andar apenas e me pergunto em qual das
centenas de sala que devem existir aqui é a que And esta.

— Depois vamos começar a trabalhar com você, para que possa


elaborar sua própria ideia para, quem sabe, conseguir conquistar
um novo cliente para a BIT.
— O projeto eu já tenho. – é a primeira coisa que consigo
realmente falar.
— Tem? – pergunta como se estranhasse. – Do que se trata?
Não ele todo, mas o mercado?
— É uma ideia para o mercado automobilístico. – respondo de
imediato.
— Original. – diz e arqueio a sobrancelha, tentando descobrir se
está sendo sarcástica ou o que. – Os outros rapazes ficaram presos
a ideias tecnológicas apenas para computadores e coisas desse
gênero.
O elevador para e saímos direto em uma sala enorme, com
vários computadores dispostos em várias mesas e um mais ao
fundo.
— Entre e sente-se onde quiser. – Sarah diz, indo direto para o
fundo. – Não vai precisar fazer nada nesses computadores hoje,
mas talvez queira trazer um a partir de amanhã, caso já não esteja
com ele ai.
— Claro. – digo mais para mim mesma enquanto sento-me em
uma mesa quase no centro da sala para não ficar nem muito perto,
nem muito longe da Srta. Loira de Farmácia.
— Devo dizer que fiquei bastante surpresa ao ver que mandaram
a secretária esse ano. – ela diz assim que liga o computador lá da
frente. – Esperava que viesse alguém que já esteja na área que a
empresa propõe. Não alguém que está tentando subir de cargo.

Franzo o cenho ao ouvir estas palavras, também sentindo meu


sangue se aquecer a cada instante.
Sinto meu celular vibrar com a mensagem que chega, mas o
ignoro.

— Não sou secretária. – digo, cruzando as pernas ao lado da


mesa. – Vai perceber ao longo do treinamento o motivo de eu ter
sido escolhida pelo presidente da empresa a qual presto meus
serviços como programadora sênior.

Sorrio ao deixar o duplo sentido em minha frase. Ela vai ter uma
grande decepção quando descobrir.

— Bem, então vamos começar!


Só quando Sarah da às costas é que pego meu celular para ver
a mensagem de Andrew. São palavras mais do que suficientes para
me ajudar a enfrentar essa manhã.

Linda, eu estou louco para poder te levar para aquele lugar e


almoçar com você. Tenho certeza de que vai adorar o que estou
preparando para nós hoje.

Ainda mais depois de não ter me deixado levá-la a lugar nenhum


nos últimos dias.

E eu estou morrendo aqui com esse tanto de homens, sabendo


que você está aqui por perto em alguma sala.

Sorrio para a mensagem, sentindo-me a pessoa mais boba e


apaixonada da face da Terra. Algo que nunca antes me aconteceu.

Olho para Sarah e a vejo distraída procurando por algo. Sei por
que posso ver no projetor atrás dela. Então digito a mensagem:

Estou mais do que ansiosa para descobrir o que você está


aprontando para hoje, lindo. Minha manhã longe de você na certa
vai ser uma enorme tortura.
Mas agora eu preciso ir, porque a Srta. Loira de Farmácia está
olhando para mim de cara feia (para variar!).

Guardo o celular de volta no bolso, tirando meu caderno e uma


caneta para fazer anotações sobre “Introdução ao mercado da Nex
Ae”.

As primeiras duas horas da manhã eu passei trancada dentro


daquela sala com Sarah, apenas assistindo há vários vídeos sobre
trabalhos tecnológicos e algumas empresas que trabalham com
carros e buscam sempre inovar. O que acabou por me fazer ter altas
ideias para melhorar meu projeto, na qual precisarei começar a
trabalhar o quanto antes.

Depois disso ela me apresentou alguns dos setores que terei


acesso ao longo desse mês, que são basicamente os mesmos que
tenho na BIT.

Acho que a melhor noticia do dia foi quando ela me disse que na
terceira semana de treinamento eu passaria com outra pessoa, que
era para elaborar o desenho do meu trabalho e que como essa
pessoa, na qual ela não me disse o nome, não estaria na empresa
até sexta-feira, eu teria que esperar para poder conhecê-la.

E agora eu estou aqui, descendo o elevador para retornar a


recepção pela primeira vez desde que sai de lá cedo, para me
encontrar com Andrew para irmos almoçar aquele “lugar especial”
na qual ele me prometeu o dia todo.

— Não, Pedro. Eu não vou importuna-la com isso logo agora. –


reconheço a voz de Andrew logo que saio do elevador, vendo-o logo
mais a frente, próximo das poltronas onde sentei pela manhã,
andando de um lado a outro com o celular no ouvido. – Não, de
maneira alguma. – caminho de vagar até ele, parando a pouca
distancia, observando-o apertar alguns botões na maquina,
escolhendo dois tipos de doces e passar seu cartão nela. – Contrate
alguém. Luara não vai trabalhar daqui. Sinto muito.

Franzo o cenho ao ouvir meu nome. Andrew vira para mim,


sorrindo a me ver parada atrás dele.

— Ótimo. Conversei com o RH e peça para que agilize isso. –


volta a dizer, abrindo um pacote de M&M e me oferece, mas recuso.
– Quando tiver o candidato ligue para mim que o entrevistarei.
Certo. Espera. – ele afasta o celular do rosto para falar comigo. –
Pedro quer saber se você não ajuda a fazer uma manutenção
remota na sexta-feira à tarde no servidor. – pergunta baixinho.

— Claro. Ajudo, sim.


Ele sorri para mim, balançando a cabeça.
— Sinto muito, Pedro. Ela esta com a agenda lotada essa
semana com o treinamento. – diz. – Sabe como é. – ele ri. – Você
tem vários homens capacitados por ai. Tenho certeza de que vocês
conseguem fazer isso sem ela. Bem, disso eu não tenho dúvida
alguma. Tá. Contrate até quinta e me passe por conferencia. Ok.
Tchau.

Andrew desliga o celular, guardando-o no bolso da calça jeans,


na qual ele não estava usando quando o vi pela última vez.

— Oi. – ele sorri para mim.


— Oi. – sorrio de volta.
— Carro. Agora. – diz, seguindo para a porta de saída e vou
atrás dele.
— Esta tudo bem? – pergunto sem sucesso de resposta. –
Andrew! – insisto quando já estamos do lado de fora, mas é só
quando para ao lado do carro é que me responde:

— Estou com fome. – diz, abrindo a porta do meu lado. – Nos


dois sentidos possíveis para se usar isso.
Arregalo os olhos, contendo um sorriso divertido. Entro no carro,
esperando para que venha sentar ao meu lado.
— Antes de qualquer coisa... – ele para de falar bem no meio da
frase, puxando-me para perto dele e me beija com força, como se já
não fizéssemos isso há dias ou semanas e não apenas poucas
horas.
— Senti sua falta também. – sussurro, passando a mão por seu
rosto, arrancando de And um sorriso malicioso.
— Eu achei que essa reunião não fosse acabar nunca. – diz,
colocando a chave na ignição e da à partida. – Geralmente eu não
me importo por participar de reuniões longas. Mas hoje não dava...

Ele começa a dizer enquanto sai com o carro e só volta a falar


quando já estamos do lado de fora.

— Não é apenas pela duração, mas o assunto em si. Vim paca


cá principalmente para deixar em andamento um projeto que quero
começar a desenvolver o quanto antes. – ele para em um semáforo
e passa a mão pelo rosto, parecendo realmente irritado. – E isso vai
levar o nome da nossa empresa lá no topo e ser realmente
reconhecida mundialmente.

— Achei que a BIT já fosse reconhecida desta maneira. –


comento.
— Sim, ela é. – ri. – Mas de certa forma ela é “fechada” para o
produto x. Quero internacionalizar e expandir isso. Abrir essa filial
em Londres vai ser a maior jogada da minha carreira.
— Ah meu Deus! – exclamo ao entender a que ele se refere.
Andrew olha para mim com uma expressão divertida. – É sério
isso?!

— Não era para ter te contado. Por favor...


— Eu precisaria explicar como eu soube disso, querido. – sorrio
para ele. – Agora está bem explicada toda essa tensão sua.
— Ter o apoio da Nex Ae nisso vai me ajudar bastante. Eles têm
todos os contatos mundiais e mais importantes. – explica. – Não
estou lutando para conseguir esse apoio, mas sim conversando com
eles sobre a melhor maneira de fazer isso. De colocar a BIT em
Londres e trazer o crescimento.
— Eu fico tão feliz por você, And! – exclamo bem quando ele
para em outro semáforo e seguro seu rosto para mim, pousando um
beijo rápido em seus lábios. – Isso sim merece uma comemoração
mais do que especial.

Ele sorri para mim.


— Especial como irmos para o hotel e fazermos amor à tarde
toda? – pergunta.
— É uma ideia. – respondo rindo. – Mas precisamos almoçar
antes. – completo quando meu estômago ronca.
— E o que você acha de um piquenique no Central Park? –
arrisca.
— Quê?!
— Quando sai da reunião, passei de um mercado e fui comprar
algumas coisas. – diz. – Lanche natural, suco, bolo de chocolate,
porque sei que você gosta. Alguns doces, porque sei que você é
viciada e mais uma coisa. – e para de falar, deixando-me com seu
sorriso mais malicioso e que esconde sua perversidade.

— Que outra coisa? – pergunto realmente curiosa.


— Chantilly. – leio a palavra em seus lábios, sentindo meu rosto
se aquecer.

Andrew estaciona o carro em uma garagem e caminhamos por


mais alguns metros, até que estejamos na entrada principal do
parque.
— Central Park. – digo ao reconhecer a entrada que vi em tantos
filmes americanos. – Você realmente deveria ser guia turístico. –
Andrew ri ao meu lado e aperto sua mão.
— Isso não é algo que terminaria muito bem. – diz, arrumando a
mochila no ombro. – Por favor, duas bicicletas. – ele pede a uma
senhora já de idade em uma banquinha com vários vasos de flor.
Ela entra na loja e retorna instante depois. – Vamos precisar disto
aqui para ganhar tempo lá dentro. – explica. – Obrigado.
— Façam um bom passeio. – a senhora diz com um sorriso
gentil.
— Obrigada. – digo, retribuindo ao sorriso.
— Onde você quer almoçar? – Andrew pergunta logo que
entramos.
— Não sei... Vamos apenas andar por ai sem um rumo certo a
seguir e ver onde vai dar.
— Tenho um lugar então. – diz em resposta e subimos nas
bicicletas.

Pedalamos de vagar para que eu possa ver cada uma das lindas
coisas que este parque tem a oferecer. É tudo coisa na qual por
várias vezes pude ver na TV. São milhares de árvores, pessoas e
tantas outras coisas. Até mesmo um castelo.

— O quê é aquilo? – pergunto, parando com a bicicleta a certa


distância do lugar.
— Belvedere Castle. – diz. – Está ai desde 1865. Hoje é um
Museu de História Natural e centro de observação. – viro para ele,
surpresa com sua explicação. – Existem várias espécies de aves
migratórias ai dentro, dentre muitas outras coisas também.

— Andrew também é cultura.


— Sou muitas coisas, Anjo. Mas eu realmente estou com fome.
Concordo com ele e voltamos a andar, até que estejamos perto
de um lago, a sombra de uma árvore.
— Piquenique na beira do lago. – sorrio.
— Achei que fosse gostar.
— É lindo, And. – digo, descendo da bicicleta e a encosto ao
lado da dele, na árvore. – É só que a cada dia que passo com você,
acredito menos naquela fachada de “Galinha pegador de Vadias
Aleatórias”. – fico de frente com ele. – Não existe nada disso no
homem que eu conheço.
— Você não diria isso se tivesse me conhecido um final de
semana antes de te encontrar. – responde, passando as mãos por
minha cintura, levando-me para perto dele e o abraço de volta. Seu
perfume é tão bom.

Curvado de frente para mim, consigo ver por cima dos ombros
de Andrew.
Não muito longe de onde estamos tem um aglomerado de
pessoas depositando flores perto de uma estatua de alguém que
não me é estranho, embora não me lembre de quem ele se pareça.
Pouco mais a frente, as crianças brincam. E, ainda mais adiante,
vejo um homem com Sobretudo e chapéu pretos, escondido atrás
de uma árvore, com uma câmera em suas mãos.

— Isso é realmente estranho. – comento.


— O que? – And pergunta preocupado e me afasto.
— Lembra-se daquele senhor que encontramos no elevador
quinta à noite? – pergunto e ele confirma. – Quando você estava
conversando com a recepcionista no sábado, ele passou por mim e
me cumprimentou. Até ai normal. – Andrew presta atenção em cada
palavra minha. – Depois passou um homem, olhou para mim e
depois para você. E agora este mesmo homem está ali atrás, nos
encarando com uma câmera apontada para nós.

Quando termino, And olha por cima do ombro e de volta para


mim.

— Estava demorando a acontecer.


— O que é? – pergunto.
— Já viu aquelas revistas de fofoca? – pergunta de volta. –
Fotógrafos loucos por dinheiro quando reconhecem alguém de
nome importante? Esse é um deles.
— Paparazzi. – sussurro e ele concorda.
— Vou buscar alguma coisa para nós. Espere aqui.
— Não vá fazer nada que possa te prejudicar. – peço e ele ri.
— Não faço nada que prejudique o nome da minha família ou da
nossa empresa. – diz. – Mas se aquelas imagens vasarem agora
nós estaremos ferrados. Principalmente os falatórios que sairão a
seu respeito.

Não digo mais uma única palavra. Ele tem razão. Se essas
possíveis fotos vazarem não terá adiantado de nada esconder
nosso namoro por quase dois meses.
Sento-me na sombra da árvore, observando Andrew ir direção
ao homem misterioso. Ele ainda esta lá no mesmo lugar, embora
agora disfarce fotografando outras coisas.

Dez minutos já se passaram desde que Andrew saiu e começo a


ficar realmente preocupada com sua demora. Olho de um lado a
outro, mas não o vejo em lugar nenhum.
— Onde é que você se meteu? – pergunto, voltando a olhar para
o lado, onde casais passeiam de barco.

— Segura! – ouço-o atrás de mim e, ao que me viro, Andrew


joga uma câmera fotográfica em minhas mãos, que quase vai parar
no chão, sendo salva apenas pelo cordão.
— O que é isso? – pergunto.
— O preço que tive que pagar pela nossa privacidade. –
responde, sentando-se ao meu lado. – Liga para ver.
— Ele aceitou assim tão fácil?
— Na verdade não. – diz, passando o braço por meu ombro e
vou passando as imagens. – Essa belezinha ai saiu bem mais cara
do que realmente é. Mas pelo menos é uma profissional. – ele ri. –
Fica para você.

Passo cada uma das imagens, ficando cada vez mais surpresa
com o que vejo. São fotos nossas desde o aeroporto quando
desembarcamos. Nosso jantar no meu aniversário e imagens de
quando chegamos ao parque. O que faz com que um calafrio
percorra meu corpo, imaginando alguém que estivesse a nossa
espreita desde que saímos cedo.

— Ele não era muito experiente com isso. – comento. – Quer


dizer: que profissional deixa o trabalho de tantos dias na câmera,
sabendo que ela pode dar problema?
— Sorte a nossa então. – And diz. – Mas não acho que isso vá
parar por ai.
— Isso é horrível.
— Eu não queria que você tivesse que passar por esse tipo de
coisas. – começa a dizer, olhando para o lago. – Eu queria, quero, te
assumir para todo mundo dentro e fora da BIT. Já teria feito isso há
semanas se não fosse por essa viagem e o quanto as más línguas
falariam.

— Não é isso o que quero dizer, lindo. – digo. – Sei que na hora
certa vou poder esfregar na cara daquela vadia do DP que não sou
“apenas uma funcionária qualquer” como ela insinuou que eu era. –
And ri com a maneira com que digo isso. – Horrível é imaginar que
alguém jovem como você tenha que lidar com essas coisas
provavelmente desde sempre e não poder agir da maneira como eu
agiria, porque não tenho paciência para nada disso.

— Não conhecia esse seu lado violente. – ele diz com um sorriso
de lado.
— Existem vários lados meus que você não conhece. Alguns até
vai preferir não conhecer.
Andrew aproxima o rosto de mim, tomando o meu em suas
mãos.
— Quero conhecer cada lado seu. Bom ou ruim. E quero que me
conheça por completo. – sussurra em meu ouvido. – Mas não agora,
porque estou com mais fome de que antes.

Ele então puxa a mochila para perto e a abre, tirando de dentro


uma toalha xadrez vermelha e branca e a estende no chão onde
estamos, colocando sob ela nossos lanches, o suco, bolo, dois
brigadeiros grandes e dois potes de pudim.

Deitada na perna de Andrew, eu observo as nuvens baixas que


passam acima de nós, tomando forma. Conforme a tarde cai,
começo a sentir o tempo esfriar.

Ouço cascos de cavalo no caminho atrás de nós e levanto a cabeça


a tempo de ver uma carruagem passar. É um cavalo lindo igual
àqueles que têm na fazenda. A mulher nela aponta para o lago,
indicando uma ave e o homem ri de algo.

— Muito clichê. – Andrew diz, seguindo meu olhar.


— É romântico. – retruco. – Você não entende dessas coisas.
— De fato eu não entendo nada dessas coisas. – concorda. –
Isso tudo é novo para mim. – olho de volta para ele, sentindo sua
mão em meus cabelos. – Quer dar uma volta?
— Achei que fosse clichê. – sorrio, provocando-o.
— Alguns clichês valem à pena se for com a pessoa na qual
você está apaixonado. – diz e envolvo sua nuca com a mão,
puxando-o para um beijo.
— Mas e as bicicletas? – pergunto quando ele afasta um pouco.
— Devolvemos à senhora e pegamos uma carruagem. – diz e
me sento. – Já esta ficando tarde mesmo.

Ajudo And a guardar de volta nossas coisas na mochila, junto do


meu mais novo brinquedo, na qual vou adorar passar as fotos para
o meu laptop para ver melhor cada uma delas, porque têm várias
que talvez possa aproveitar para guardar de lembrança, pegando
depois as duas bicicletas e voltamos caminhando até a saída.

— Mas já vão? – a mesma senhora de cedo pergunta.


— Ela quer andar de carruagem. – And responde com uma cara
de quem está fazendo o maior sacrifício do mundo.
— Oh! É um excelente passeio, querida. – diz para mim. – Não
vai se arrepender de nenhum momento. Principalmente se for sua
primeira vez.
— É sim. – respondo um pouco sem graça e ela me chama para
mais perto dela, sussurrando em meu ouvido:

— Aproveite da melhor maneira possível. É uma experiência


única.
— Vou sim. Obrigada. – sorrio de volta para ela.

Enquanto caminhamos até onde o cocheiro esta, vários outros


passam por nós. Mas, uma carruagem em especial, com um cavalo
branco lindo, talvez o mais belo de todo o parque, está parado em
um canto. O homem parece falar algo para a mulher, que mantém
as mãos na boca. Posso deduzir que ela esta surpresa com o que
ele diz.
— Sim! – ela exclama e abraça o namorado, beijando-o. Ele
afasta para colocar uma aliança em sua mão esquerda e eles se
beijam outra vez.
— Isto sim é um verdadeiro clichê. – Andrew diz ao meu lado.
— O amor em si é um grande clichê que todos nós ao menos
uma vez já sonhamos viver. Mas, quando verdadeiro, ele nunca
perde sua beleza. – digo ainda observando o casal que agora segue
com o passeio. – Ou vai dizer que você nunca desejou isso? –
pergunto para And, que me observa com um olhar sério.

— Se pensei em pedir uma mulher em casamento no meio do


Central Park? – pergunta de volta. – Não. Nunca pensei. E para ser
sincero também não faria isso.
— Ogro. – digo, voltando a andar e o deixo para trás.
Sinto a mão de And segurar meu braço, forçando-me a parar
outra vez.
— Você sabe bem o porquê de nunca ter pensado nisso. –
começa a dizer. – Acho clichê tudo essas coisas “bonitinhas” que
eles colocam nos filmes de romances. – ele para de falar, passando
a mão pelo cabelo. – Se for para eu pedir uma mulher em
casamento um dia, pode apostar que vou dar meu melhor para
surpreender minha garota com algo realmente especial e que ela
nunca vai esquecer. Porque eu sei como vocês são com isso.

Eu o encaro por algum tempo, cruzando os braços junto ao peito,


tentando parecer brava, mas falho miseravelmente.

— Não parece você falando. – rio.


— Já disse que você não esta me fazendo muito bem. – ele me
abraça de volta e retomamos a caminhada até o lugar onde estão as
carruagens. Um senhor está desocupado. Seu cavalo tem uma linda
pelagem marrom e sua carruagem é branca, enfeitada com várias
flores ao lado.
And me ajuda a subir e partimos.
— Os senhores têm algum lugar especial que queiram ir? –
pergunta.
— Qual roteiro nos recomenda? – And pergunta.
—Para um jovem casal tão belo, tenho o melhor.

Enquanto o cavalo gentilmente puxa a carruagem e ouço as


rodas chacoalharem, o cocheiro, que se apresentou para nós como
John, conta incríveis histórias sobre o parque. Como, por exemplo:
os arquitetos tiveram que importar terras de Nova Jersey para
poderem plantar as árvores, pois a área era muito rochosa. E
também que tudo aqui foi projetado, exceto as rochas, que já estão
aqui há milhares e milhares de anos.

Viro as páginas de um álbum de fotografias que John me deu,


notando as mudanças no parque nos últimos cem anos. And faz
várias perguntas a respeito de cada uma delas, enquanto eu apenas
ouço a conversa, completamente encantada com tudo aqui.

— Tenho que admitir. – And diz ao virar-se para mim. – De clichê


isso aqui não bem nada. – sorrio, passando o braço por sua cintura
e beijo seu rosto, para só então provoca-lo:
— Eu disse que até o maior dos clichês era belo. – mostro a
língua para ele, que passa o braço por meus ombros.
— Não disse, não. – ele sorri de volta.
— Claro que disse! – exclamo. – Tenho testemunhas.
— E quem são elas? – pergunta com um olhar desafiador e
procuro ao redor por alguém apenas para disfarçar, olhando até
mesmo para o céu azul.
— Bem, tenho certeza de que algum pássaro ouviu nossa
conversa. – respondo, fazendo-o rir. – O que é aquilo? – pergunto
quando passamos outra vez pela multidão de pessoas que
continuam a carregar flores.
— Isso eu sei explicar. – And diz ao meu lado e olho para ele. –
Aquela é a área Strawberry Fields. É lá que esta a estatua do John
Lennon.
John para com a carruagem e posso ver os mosaicos de pedras
em preto e branco que formam a palavra Imagine.
— Hoje seria o aniversário dele. – And volta a falar. – Já virou
tradição dos fãs virem até aqui a cada ano para prestar
homenagens a ele.
—Isso explica as flores. – sorrio. – Você sabe bastante sobre
isso.
— Meu pai era fã dos Beatles. Vim muito aqui quando era
garoto. O que mais eu poderia fazer?
— Agora tudo faz sentido.
Fecho os olhos, atenta a cada som a minha volta, até que sinto
algo em meu cabelo, fazendo com que eu reabra os olhos. And esta
com uma margarida branca na mão, tentando coloca-la atrás da
minha orelha. Permito que ele o faça, notando seu rosto corar
quando termina.

— Nossa excursão termina aqui. – John informa, parando no


mesmo lugar onde havíamos começado.
Andrew desce, ajudando-me a descer também.
— Obrigada pelo passeio, John. – digo. – Adorei ouvir suas
histórias. É tudo tão incrível, mas ouvir algo de alguém que
realmente viveu é tão diferente!
— São pessoas como à senhora que me fazem ter gosto por
este trabalho. – ele diz, despedindo-se com aquele gesto com o
chapéu, que todos que usam um costumam fazer.
— Senhora Giardoni. – And diz logo que nos viramos para a
saída do parque.
— Luara May Brudosck-Giardoni. – digo apenas para ver como
soaria. – Estranho. – concluo com o cenho franzido.
— Estranho é esse “Mei”. É como se você fosse apenas metade
de algo. – Andrew ri da própria piada.
— Metade porque preciso encontrar a parte que me falta. –
respondo.
— Ainda precisa encontrar? – pergunta.
— Não sei. – olho para ele, mas seu olhar está fixo em algo mais
à frente.
— Espero que não. – ele responde e eu o abraço.
— A peça que falta. Meu folego. Meu coração. Minha lembrança.
Eu. A outra metade. A metade que falta. – recito baixinho o mesmo
verso que li no livro quando pedi um tempo para And.
Capítulo Vinte e Sete
Sábado

As últimas duas semanas passaram como se tivessem voado por


tamanha correria que meus dias foram na Nex Ae. Foram tantas
pesquisas que tenho feito para melhorar meu projeto e apresentar
no final do mês, que quase não tenho conseguido ficar com Andrew
direito.

Quer dizer, sempre que as reuniões acabam mais cedo, ele me


espera para que possamos voltar juntos para o hotel. Ele nunca
nem mesmo me deixou voltar para lá de metrô ou táxi. Quando não
é ele quem espera, fico na Starbucks lá na frente do prédio tomando
algo e comendo algum bolinho. Os dias que mais tempo temos para
ficar juntos é sábado à noite e domingo, que tenho evitado ficar
trancada no meu quarto aqui no hotel trabalhando, para poder
passar o dia todo com ele. Às noites também ficamos sempre
juntos, mas acaba sendo mais apertado.

Andrew tem se mostrado a melhor companhia nesses últimos


dias também. Além de entender minha dedicação (e surto) para com
esse trabalho. Sempre que pode ele me passa alguma dica do que
devo ou não fazer para melhora-lo. O que, devo acrescentar aqui,
ter um namorado que é engenheiro de Software também ajuda e
muito, porque as ideias dele são excelentes!

A cada dia que passo com ele, como namorados, meus


sentimentos por ele só fazem aumentar e noto sua mudança
também. Andrew é aquele tipo de homem que aguenta toda e
qualquer mudança de humor minha, que na última semana tem
ocorrido com bem mais frequência do que deveria (indo de um “eu
só quero ficar aqui deitada com você o dia todo” até um “fica longe
de mim!”). Em um momento estou à pessoa mais amável do mundo.
Já no outro, sou a que ninguém quer ficar por perto, porque estou
há um passo de explodir o mundo. Principalmente com And. Mas
sempre que faço isso ele sai e volta com alguns chocolates, dizendo
que estou “perto dos meus dias sombrios e que é seu dever manter
minha sanidade”.

Por falar em chocolates, preciso começar uma dieta urgente.


Sinto que os mimos do meu namorado estão começando a me fazer
engordar, ainda que não de maneira significativa. Mas também não
quero abusar da minha sorte, porque ainda tenho quinze dias aqui
antes de voltarmos para o Brasil, o que de certa forma também me
chateia quando lembro. Não quero ir embora.

— O que você está fazendo? – Andrew pergunta quando me vê


jogando todas minhas coisas para o chão.
— Estou procurando por meus óculos.
— Por que você parou de usar a lente? – pergunta outra vez,
começando a me ajudar a procurar pelos óculos. Sento no chão
com uma bolsa no colo.
— Estou ficando com a visão muito irritada quando as uso. Não
sei por quê.
— Estão velhas?
— Não. Eu as troquei antes da viagem. – respondo. – Nem
quando comecei a usar sentia isso.
— Se quiser posso te levar a um oftalmo na segunda para ver o
que esta acontecendo.

— Pode ser. Mas por hora, preciso dos meus óculos para poder
enxergar.

And ri, indo até o banheiro.


— Achei! – ele exclama de lá e levanto, correndo até o banheiro.
And os coloca em meu rosto um pouco desajeitado. – Já disse o
quanto você fica sexy assim? – pergunta arrumando meu cabelo
para trás e o prende em um rabo de cavalo.
— Hmmm... Não que eu me lembre. – sorrio em resposta e ele
aproxima do meu ouvido, sussurrando:
— Você fica muito sexy assim. – e me beija.
— Não canso de ouvir isso de você. – respondo, puxando-o para
mais perto de mim.

Desamarro o cordão que prende a bermuda de Andrew e ela cai


em sua cintura, deixando sua cueca preta a mostra. Puxo-o para
fora do banheiro e ele sorri maliciosamente para mim.
— Tenho reunião dentro de uma hora, Anjo.
— Imprevistos acontecem. – respondo. – Quero você só para
mim hoje. – passo meus braços por sua cintura, colando nossos
corpos. Meu desejo cresce cada vez mais dentro de mim. E dentro
da cueca dele.
— Sou seu agora e do João pela próxima hora. – ele diz,
beijando-me. – Tentarei encurtar o máximo possível o assunto para
poder ficar com você o restante do dia.

Sorrio, sentindo-me vitoriosa e desço minhas mãos por sua


bunda, apertando-o forte contra meu corpo. Sua ereção cresce
contra mim.

Andrew fecha os olhos, segurando minha cintura e vou passando


minhas mãos por suas costas, arranhando-o conforme beijo seu
pescoço e peito. Sua respiração fica mais tensa com meu gesto e
acabo realmente arranhando suas costas.

— Foda-se essa reunião. – ele diz, tomando-me em seu colo,


levando-me para a cama.
— Eu não ia admitir uma derrota para o vice-presidente. – digo
em seu ouvido assim que me deita sob a cama.
— Só não esqueça que essa conversa é para podermos ficar no
apartamento o restante da viagem. – ele diz, descendo a boca por
meu pescoço, indo até o seio. – E que isso vai significar oficialmente
que estamos juntos.

Prendo seu cabelo com a mão, abraçando-o com as pernas,


sentindo sua boca em minha barriga, onde sua barba me espinha.
Andrew esta em vídeo conferencia com João, o vice-presidente
da BIT, explicando para ele o motivo pela qual quer fazer check-out
em nossos quartos, para que possamos ir para o seu apartamento
no Brooklyn pelo restante do mês.

Para mim, é estranho ver que o Presidente precise da aprovação


do vice para algo de sua vida particular. Por outro lado, também é
uma atitude madura, uma vez que também envolve tanto o
profissional dele como também o meu.

— Há quanto tempo vocês estão nisso? – ouço a voz de João


pelo computador e olho para And, que está sentado da escrivaninha
de costas para mim. Por via das dúvidas, ele está sozinho no quarto
e eu no meu desde que chegamos. Não que essa desculpa vá colar
muito, já que somos dois adultos que podem dormir juntos na
mesma cama.

— Uma semana e meia. – Andrew mente. – Apenas aconteceu


de nos aproximarmos mais nestes últimos dias e do restante não
preciso entrar em detalhes. – ele da de ombros.
— Tem ideia do que isto significa para o nome da empresa da
sua família, Andrew?
— Tenho plena consciência dos meus atos, João. – ele responde
um pouco rude. – Não vou mentir e dizer que não a olhava com
outros olhos durantes nossas reuniões. Ela é uma mulher linda,
atraente e bem mais do que inteligente. E isso chamou minha
atenção para bem mais do que eu podia conhecer no lado
profissional. Eu queria conhecer a mulher que ela é fora da BIT.
— Aquela vez na reunião, que você queria...
— Não! – Andrew o interrompe e olho para ele outra vez. – Eu
nunca tinha visto ela até a reunião mensal. Acho que foi lá.

Franzo o cenho, desejando que And pudesse olhar para mim,


mas ele não o faz.
— Ela não é igual a nenhuma outra com quem tenha passado
antes. Menos ainda qualquer outra mulher que trabalhe ai. – ele
começa a explicar. – Você me conhece desde que eu era garoto.
Sabe tão bem quanto eu como sou com essas coisas e que não sou
moleque para me deixar levar por qualquer uma.
— Ela realmente tem que ser especial para te fazer querer
assumir um relacionamento. – João ri e vejo um sorriso surgir de
lado no rosto de Andrew. – Se tem certeza do que deseja fazer, que
é realmente isso que seu coração está mandando, não sou o
homem que ira contra o amor. – ele baixa o tom da voz. – Faça o
que achar que é melhor para vocês dois.
—Sairemos do hotel na segunda. – And diz agora mais calmo. –
Dependendo de como as coisas correrem entre nós, assumirei
nosso relacionamento com ela antes que a mídia acabe inventando
mentiras.

— Seus pais ficariam realmente orgulhosos se te ouvisse falar


assim. – ouço a risada dele e And apenas sorri sem graça. – Te
desejo o melhor, meu amigo. A vocês dois. Sei que ela é uma garota
especial apenas pelo pouco de tempo que tive com ela. Agora
imagine vocês ai.

Andrew fecha o laptop e senta de lado na cadeira, olhando para


mim pela primeira vez na última hora, mas não diz nada.

Pela expressão em seu rosto, posso ver o alívio por finalmente


ter contado sobre nós para alguém de mais importância dentro da
BIT e por ter conseguido seu apoio. Sei que João é o vice-
presidente de lá desde a fundação e também amigo de infância de
seu pai. O que provavelmente deve significar ainda mais para ele.

And vem em silêncio até a cama e deita ao meu lado, ainda sem
dizer uma única palavra. Por algum tempo nós apenas nos
encaramos, até que ele sorri para mim.

— Isso merece aquele prometido jantar. – digo, passando o


braço por suas costas, não conseguindo aguentar a emoção dentro
de mim.
— Só faltou ele confessar que já desconfiava de nós. – ele ri. –
Sei que vindo dele, não precisaria me preocupar. Mas, se algum dos
sócios ou diretores souber antes...
— Nunca ficamos realmente sozinhos lá, And. – digo. – Isso não
chegou a acontecer nem mesmo três vezes direito, porque Ana
sempre estava por perto e nós nunca tínhamos um contato mais
“físico” lá dentro.

Ele ri e vira de barriga para cima, puxando-me para seu colo.

— Nós realmente precisamos desse jantar.

À noite esta mais fria hoje, mas nada forte o suficiente para nos
fazer adiar nosso jantar outra vez. O motivo dele agora é ainda
maior do que antes.
Visto minha calça jeans e minha jaqueta, calçando também
minhas botas. Os cabelos eu deixo soltos.

— Está pronta? – And pergunta e pego minha bolsa, indo até


ele.
Andrew esta também usando jeans e jaqueta de couro preta. O
cabelo arrumado o máximo possível, mas ainda todo bagunçado,
dando aquele ar como se tivesse acabado de transar.
— Já podemos ir. – sorrio para ele, aceitando sua mão
estendida.

No caminho até o restaurante, Andrew e eu não conversamos


muito. Ele, como sempre, fez o máximo de suspense sobre o lugar
que iriamos e, quando chegamos, senti meu queixo cair. O
restaurante era lindo, lindo, lindo e lindo! Bem aquele tipo de lugar
que somente em sonho você vai, ainda que o meu tenha sido
realidade.

— Quando penso que não posso mais ser surpreendida por


você, você vai lá e supera todas minhas expectativas. – digo,
sentando-me.
— Passei muitos anos sendo privado de coisas desse tipo por
medo do que poderia acontecer. – ele começa a dizer, sentando de
frente para mim. – Não vou mais bancar o idiota por medo.
— Às vezes eu preferia ter bancado a idiota de que ter sido feita
de idiota por tanto tempo. – falo baixinho. – Você privou sua dor e
sofrimento por quem não valia a pena. Eu só fui idiota.

— Acho que nós dois aprendemos nossa lição, linda. – ele diz,
tocando minha mão. – E o que eu puder fazer para mostrar o quanto
amo você, vou fazer.
— Posso dizer que farei o mesmo, lindo. – sorrio um pouco sem
graça. – Mas não acho que o propósito de sairmos para jantar fora
seja isso.

Para comemorarmos nosso quase dois meses de namoro,


segundo Andrew, porque pelas minhas contas isto só fara quando
voltarmos ao Brasil, ele pediu o melhor vinho da adega e o melhor
prato que já provei em toda minha vida. Certo. Talvez eu esteja
sendo generosa demais com esta frase nos últimos dias. Mas esta é
a verdade.

Depois do jantar, saímos para caminha pela vizinhança. Mesmo


com o vento frio soprando meus cabelos, deixando meu rosto a
cada instante mais gelado, eu não quis voltar para o hotel até que
fosse muito tarde para continuar na rua.

— No Natal está rua fica linda. – Andrew comenta, parando


próximo de um poste e me abraça. – Eles iluminam tudo por aqui. E
com a neve... Você com certeza ficaria apaixonada.
— Mais? – pergunto, envolvendo seu quadril em um abraço.
— Mais. – ele sorri, pousando um beijo em minha testa.
— Deve ser mágico então.

Não sei dizer ao certo por quanto tempo ficamos aqui abraçados,
apenas olhando para as pessoas que passavam por nós. Perguntar
isso é o mesmo que pergunta a um relógio quanto tempo ele já
marcou desde sua criação: provavelmente impossível.

No caminho de volta para o hotel, Andrew ficou mexendo com


meus instintos o tempo todo. Sempre que tinha uma oportunidade,
sua mão estava em meu pescoço ou apertando minha coxa.
Quando não era isso, era sua boca quem estava em mim.
Aproveito a subida do elevador para começar minha vingança:
guardo minha mão no bolso da calça de Andrew, como se quisesse
aquece-la. Mas, na verdade, o que quero é deixa-lo excitado ao
ponto de não se aguentar mais. Então aperto o Pequeno And,
fazendo com que meu lindo se contraia com meu toque.

— Você me provocou o dia todo com isso. – ele começa a dizer


e finjo desentendimento. – Não se faça de inocente, Luara. Porque
nós dois sabemos que isso você não é. – sua voz sai bem mais
rouca de que o normal.
— Não faço ideia do que esta dizendo. – digo em resposta.

A porta do elevador abre e ele dá espaço para que eu saia na


frente, mas tenho que esperar até que ele abra a porta do quarto, já
que não trouxe meu cartão.

— Com licença. – peço quando ele fecha minha passagem,


impedindo-me de entrar no quarto.

Ao invés de apenas me deixar entrar, Andrew segura meu braço,


puxando-me para dentro e fecha a porta atrás dele logo que
entramos. Ele ajuda a tirar minha jaqueta, jogando-a de qualquer
jeito em cima da mesa e ela vai parar no chão. O mesmo acontece
com a dele.

Com sua boca em meu pescoço e com certa dificuldade, And tira
minha blusa, soltando o sutiã logo em seguida e ajudo a tirar sua
camisa também, abrindo o único botão de sua calça e logo as
únicas peças de roupas em nossos corpos seja sua cueca branca,
deliciosamente marcada em seu corpo e minha calcinha vermelha.

— Não posso ir embora daqui antes de fazer uma coisa. –


sussurro, passando a mão por seu pescoço.
— E o que seria? – pergunta.

No lugar de responder sua pergunta, junto minhas mãos em seu


quadril, fazendo com que ele ande de costas até a parede de vidra e
o prendo contra ela, fazendo-o rir ao entender minhas intenções.
Lentamente, desço sua cueca por suas pernas, sorrindo ao ver
que o Pequeno And já esta tão deliciosamente pronto para mim.
Corro minha língua ao longo de sua extensão até que ouço o
gemido de prazer de And e sua mão se prende em meus cabelos,
juntando-os para trás.

Olho para ele por cima, tão indefeso e sobre meu controle.

Subo de volta, beijando cada parte de seu corpo nu, esculpido


de maneira tão perfeita. Beijo a parte de dentro de sua coxa, seu
umbigo, sua barriga. Indo até o peito, onde beijo no lugar do
coração, até que, sem conseguir mais resistir, me puxa para ele,
beijando-me como tenho desejado desde sempre.

Sinto o Pequeno And em minha barriga quando colo meu corpo


ao dele, apertando-o contra o vidro e, mordendo de leve sua orelha,
sussurro:

— Exposto para que toda Nova Iorque possa ver sua bunda.
Andrew sorri, invertendo nossas posições. Sei que deveria me
sentir exposta nessa situação, mas tudo o que sinto é meu desejo
ainda maior.

— Ninguém pode ver aqui dentro, Anjo. – ele diz, brincando com
seu membro entre minhas pernas e as sinto amolecerem.

Fecho os olhos e prendo a mão em seus cabelos enquanto eu o


sinto. Sinto o toque de seus lábios em meus seios e sua barba
áspera em minha pele. Sua mão em minha barriga, subindo para o
outro seio e puxa meu mamilo. Seu pênis lutando contra a vontade
de estar dentro de mim.

Puxo seus cabelos, forçando-o a olhar para mim.

Andrew me toma em seu colo e o sinto deslizar entre minhas


pernas quando me penetra, arrancando de mim um gemido rouco.
Nossas respirações mais pesadas se misturam. Ele me olha cheio
de cobiça e mordo seu lábio inferior bem quando prende minhas
mãos acima da cabeça, deixando-me entregue a sua vontade.

Ele se move com delicadeza e cuidado enquanto beija meu


pescoço e preciso me conter para não fechar os olhos conforme eu
o sinto ir mais fundo. Ele se move rápido e com força. De vagar,
fraco. Seus olhos sempre presos aos meus.

Fecho os olhos, entregando-me completamente a ele.


— Olhe para mim. – pede, soltando minhas mãos e as escorrego
por seus cabelos, abraçando seu pescoço.
Sinto-me entregue por completa. Sou dele por inteira. Para o
meu homem. Passo meus braços por suas costas, cravando minhas
unhas em sua pele. Quanto mais forte ele se movimenta, mais eu o
aperto. Quanto mais eu o aperto, mais forte ele me aperta contra o
vidro.
Capítulo Vinte e Oito
Quarta-feira

— Onde é que você pensa que está indo? – ouço a voz de Sarah
atrás de mim quando começo a guardar todas minhas coisas de
volta na mochila.
— Estou indo tirar minha hora de almoço. – respondo,
arrastando a cadeira para trás, ficando de frente com ela. Sem os
saltos, Sarah é uns cinco centímetros menor que eu. – Caso você
não tenha percebido, era para eu ter saído há uma hora.
— Não me recordo de ter liberado você para isso. – ela diz,
batendo com sua agenda na mesa.
— Primeiro: você não é meu chefe. Suas ameaças não
funcionam comigo. – fecho a mochila com força, voltando a olhar
para ela. – Segundo: se quiser que eu fique aqui com você até
passar mal, por mim tudo bem. – cruzo os braços junto ao peito,
olhando de cara fechada para ela.
— Esteja aqui às duas horas em ponto.
Não consigo conter a risada ao ouvir suas palavras.
— Coisa nenhuma. – respondo. – Eu tenho direito à uma hora de
descanso de você. Não vou te dar meu único descanso.
Jogo a mochila no ombro e passo por Sarah, indo para a porta.
— Eu adoraria descobrir o que Andrew acharia dessa sua falta
de comprometimento com a oportunidade que ele deu a você.
Inspiro fundo. Controle-se, Luara. Viro para ela.
— Eu também adoraria saber o que ele pensaria sobre alguém
como você impedindo uma pessoa de se alimentar no horário. – dou
a ela o sorriso mais cínico que consigo. Melhor do que ninguém
aqui, eu sei que Andrew, por educação de sua mãe, não gosta que
ninguém passe do horário de almoço.

Sarah me encara por algum tempo e retribuo seu olhar, na espera


que diga mais algo. Como ela não o faz, dou as costas outra vez e
abro a porta, seguindo direto para o elevador.

— Loira de Farmácia. – xingo baixinho enquanto chamo pelo


elevador.

Os últimos três dias tem sido de completa tortura para mim.


Parece até que Sarah desenvolveu um senso de implicância por
mim que não consigo compreender. Nada do que eu faço está bom
para ela, ainda que seja exatamente como ela me pediu. Tudo é
errado. Minhas respostas, minhas anotações, meu projeto. TUDO. O
que eu esperava que fosse ser um mês incrível por estar tendo essa
oportunidade está se tornando a droga de uma tortura quando estou
trancada na mesma sala que ela. Mas ao menos é apenas com ela,
porque do restante é tudo perfeito.

— Oi. – alguém me cumprimenta logo que chego à lanchonete e


viro para ver quem é.
— Oi, Charles. – sorrio para ele.
Charles é um rapaz da área de suporte. Uma das poucas
pessoas com quem consegui fazer amizade por aqui.
Ele é bem comum: tem meu tamanho, um cabelo preto com
visual de japonês e olhos puxados, embora ele insista em dizer que
não descende de japoneses. Seu físico é normal para um homem
normal. Atraente até. Usa um par de óculos de armação preta e sua
maior tristeza é não conseguir fazer sua barba crescer além de
alguns poucos fios no queixo, ainda que ele tenha a mesma idade
que eu.
— Como vai? – pergunta.
— Tentando manter a calma. – respondo enquanto sirvo meu
almoço. – E você?

— Ah... O de sempre. Tentando manter tudo funcionando. – ele


termina de se servir, acompanhando-me até onde costumo me
sentar. – Como esta sendo com a Sarah?
— Um inferno. – respondo agora sentada. – Mas não quero falar
sobre isso com você. Vocês trabalham juntos há anos e eu sou a
pessoa que precisa dela para pegar meu certificado no final do mês.

Na verdade eu queria dizer que Sarah é uma grande idiota


bipolar. Quer dizer, até sexta-feira passada ela estava me tratando
quase tão bem quanto Julie me trata. Era como se fossemos amigas
já há anos e quase cheguei a acreditar que estávamos finalmente
nos dando bem. Ela contou sobre sua nova conquista amorosa
daquela semana e que as noites amorosas com ele eram incríveis
(o que, para mim, foi um comentário de extrema falta de
necessidade. Não sou a pessoa que gosta de saber o que alguém
faz entre quatro paredes com o namorado, assim como também não
sou a pessoa que conta o que faz.). Que ele fazia de tudo por ela,
mas que estava com medo de não conseguir corresponder ao que
ele queria.

Quando chegou segunda, ela simplesmente me odiava outra


vez. Não falava comigo direito, mandava fazer algo sem explicar
direito como queria e quando fazia do meu jeito, não estava bom.

And sabe de tudo o que tem acontecido entre nós, assim como
também sabe que não estou nos meus melhores dias de humor com
a proximidade da apresentação. O que o faz se questionar sobre o
como tenho conseguido manter a calma durante tanto tempo. Quer
dizer, eu sou paciente mais do que eu gostaria de ser às vezes. Mas
não hoje. Hoje apenas quero que Sarah exploda da pior maneira
possível e sou capaz de ajudar para que isso aconteça.

— Qual é? – Charles chama minha atenção, fazendo com que


eu saia do meu círculo de pensamentos. – Quando entrei aqui, tive
que fazer um treinamento pior de que esse, porque eram dois
meses. Sei exatamente como é passar o dia todo com ela e não foi
tão agradável como você deve pensar.
— Eu tenho uma hora livre Srta. Loira de Farmácia. – digo ainda
calma. – Se você quiser conversar sobre qualquer coisa comigo,
tudo bem. Mas eu realmente não quero falar dela ou vou acabar
tendo uma indigestão.
— Srta. Loira de Farmácia? – ele ri. – Isso é seu? – arqueio a
sobrancelha para ele. – Tudo bem. Desculpa. Não vou mais falar
dela.
— Obrigada.
Volto à atenção para o meu almoço quando reparo que Charles
mexe em seu prato parecendo desconfortável.
— O que houve? – pergunto com o cenho franzido.
— Errr... Eu posso te fazer um convite? – pergunta todo sem
jeito, desviando o olhar de mim.
— Acho que sim.
— Sábado o pessoal do suporte vai fazer uma festa de
Halloween. Sabe. Nada demais. – ele olha para mim outra vez. –
Você não quer tipo... Sei lá. Aparecer por lá? Sarah não vai ser
convidada. Pode ficar tranquila.
Eu o observo em silêncio por alguns instantes. Para ser sincera,
minha preocupação nem de longe é com Sarah, mas sim com
Andrew.
— Charles eu... – começo a dizer, mas ele me interrompe.
— Você pode levar seu... – ele franze o cenho, olhando para o
prato. – Bem, eu não faço ideia do que ele seja seu. Mas é aquele
homem alto com quem você sempre chega. Já vi o jeito com que
vocês se olham.

Desvio o olhar de Charles. A lanchonete está bem mais vazia do


que estou acostumada, mas, algo mais à frente me chama a
atenção.

Vejo Sarah conversando com um homem que está de costas


para mim e segurar o braço de seu terno preto, perfeitamente
alinhado. O homem o puxa de volta, fazendo com que ela o solte.
Parecem até estar discutindo. Será que é ele a nova “conquista
amorosa” da semana passada? O homem vira o rosto de lado e o
reconheço de imediato. Andrew. Novamente ela tenta segura-lo e
desta vez ele afasta, dando um passo para longe dela. Sinto meu
estômago querer voltar tudo.
— É exatamente assim que vocês se olham. – ouço a voz de
Charles. Por um momento, esqueci completamente de que estava
aqui com ele.

Andrew caminha em minha direção, fazendo com que meu


almoço pese ainda mais em meu estômago. Seu olhar cai em cima
de mim por alguns instantes e percebo a tensão em seus olhos. Ou
seria surpresa por não esperar me ver aqui a estas horas? Seguro
seu olhar de volta, até que ele siga por um corredor, sumindo de
vista.

— Só mais dez minutos, Brudosck. – Sarah diz assim que passa


por mim, indo para outro corredor. Quero ir atrás dela e ensinar a
não se meter com o homem de outra mulher. Mas, ao invés disso,
apenas respiro fundo, tentando manter o pouco de calma que me
resta.
— Me passa o endereço depois. – finalmente respondo a
pergunta de Charles. Minha voz oscila um pouco e sinto minha visão
embaçar. – Quem sabe não apareço por lá? – pergunto e levanto
para ir levar a bandeja com o restante do meu almoço. Nada mais
vai descer.

Ainda que não tenha ninguém aqui mais, não me atrevo a olhar
para trás enquanto sigo para o banheiro, trancando-me lá dentro.

Sei que o que vi não significa nada, que tudo o que aconteceu foi
Sarah tentando segurar Andrew por algum motivo e ele recusando
seu toque duas vezes. Mas não consigo conter o sentimento dentro
de mim. Raiva? Ciúmes? Para ser sincera, eu não sei dar um nome
exato.

Encaro meu reflexo no espelho, notando meus olhos um pouco


vermelhos e marejados. Fecho-os para tentar impedir que as
lágrimas caiam. Se eu estou perto daqueles dias, isso é novo até
mesmo para mim, porque nunca fiquei tão sensível assim.
Lavo o rosto com água fria e prendo o cabelo em um rabo de
cabelo bem para o alto, colocando os óculos de volta no rosto.
Mesmo contra todas minhas vontades, preciso voltar para lá e
enfrentar aquela Loira Oxigenada por mais algumas horas.

— Está atrasada. – Sarah diz assim que abro a porta e olho para
o meu relógio imaginário em meu pulso.
— Aqui diz que estou na hora em que falei que voltaria. –
respondo, sentando no mesmo lugar de antes.
Ligo meu notebook e abro o caderno sobre a mesa. Não tenho
mexido no meu projeto aqui em momento algum. Mas tem um novo
que comecei para poder colocar em prática algumas coisas novas.
Enquanto Sarah faz seu discurso incansável e irritante que já sei
de cor e salteado, acrescento algumas coisas interessantes nesse
aplicativo que estou trabalhando e que mandarei para Pedro assim
que terminar.
A melhor parte das tardes é que ela costuma colocar algum
vídeo aula de aproximadamente quarenta e cinco minutos cada e
não preciso ouvir sua voz por todo esse tempo. Além de que elas
são bem mais proveitosas de que quando ela fala.

Meu celular vibra na mesa, mostrando uma mensagem de And.


Pego o aparelho apenas para ler sua mensagem.

Onde você está?

Coloco o celular de volta na mesa bem quando ele vibra.

Você tem dois minutos para me responder.


Se não fizer vou te deixar aqui e vai embora de táxi.

Fecho a cara como se Andrew estivesse aqui na minha frente.


Pois deixe. Posso me virar muito bem sozinha. Cruzo os braços e
começo a balançar as pernas por debaixo da mesa.

Nenhuma mensagem sua chegou mais e os dois minutos já se


passaram.
Coloco uma caneta atrás da orelha enquanto uso outra para
escrever no caderno.

— Entre. – Sarah diz quando alguém bate na porta e me viro


para ver quem é.
— Com licença. – fecho os olhos ao ouvir sua voz, sentindo meu
corpo gelar. Merda.
— Andrew! – Sarah exclama mais animada do que deveria. O
que faz toda minha raiva de antes voltar com ainda mais força. – A
que devo a honra de sua visita?
— Preciso falar com você. – ele responde, mas não se referindo
a ela. Sim a mim.
Volto à atenção para o vídeo outra vez, mordendo a tampa da
caneta, fingindo que não é comigo.
— Ela não pode falar agora. – Sarah diz.
— É de assunto importante. – sei que ele diz para mim,
ignorando-a de propósito.
Bato com as mãos na mesa, empurrando a cadeira para trás e
levanto, indo até ele, que pede para que eu saia.
— Achei que tivesse ido embora e me deixado aqui para ir de
táxi. – digo, cruzando os braços.
— Minha vontade era. – responde assim que fecha a porta. –
Pegue suas coisas. Você vai sair mais cedo hoje.
Franzo o cenho. Como assim?
— Não posso. Estou terminando aquela vídeo-aula e...
— Tenho certeza de que você pode fazer isso do apartamento e
que posso te ajudar a tirar qualquer dúvida sobre minha empresa
mais do que ela pode fazer. – ele me interrompe. – Tenho uma
reunião com Pedro dentro de duas horas e quero que você esteja
comigo.
— Aconteceu algo? – pergunto preocupada.
— Vá pegar suas coisas. Explico no caminho.
Concordo, voltando para dentro da sala e começo a guardar
minhas coisas outra vez.
— O que pensa que esta fazendo? – Sarah pergunta.
— Recebi uma ordem de alguém que realmente pode fazer algo
contra mim e temos uma reunião com nossa empresa. – respondo,
contendo a resposta que realmente quero dar. – Não que isso seja
da sua conta. – dou as costas para ela e saio.
— Agora entendo bem o motivo de não ter me respondido. –
Andrew comenta quando passo por ele.

Durante todo o caminho de volta, mantenho o olhar fixo para a


rua.
Desde segunda fazemos o caminho oposto ao de antes, vindo
para o Brooklyn e agora somos apenas Andrew e eu. O irônico é
que, ainda que estejamos lá há três dias, ainda não fizemos uma
faxina digna além do que ele pagou para a diarista para que
pudéssemos entrar em seu apartamento.

— Não vai me dizer por que esta assim comigo? – Andrew


pergunta, abrindo a porta do apartamento. Apenas olho para ele
pelo canto do olho.
— Você sabe bem o motivo.
— Claro. Eu passei a manhã inteira em reunião e sei o que
aconteceu com você.
Fecho ainda mais a cara para ele, entrando no apartamento,
colocando minha bolsa em cima do sofá.
— Vi vocês dois na lanchonete no almoço. – digo.
— E eu vi você e aquele japonesinho almoçando juntos. – ele
cruza os braços, parando diante de mim. – Mas nem por isso estou
bravo, porque confio em você.
— Posso te garantir que ele nunca tentou me levar para cama.
Ao contrario da Sarah, pelo que você mesmo disse.
Ele ri.
— Já eu posso te garantir de que é exatamente isso o que ele
esta querendo.

Seguro seu olhar por algum tempo e acabo notando em sua


expressão uma preocupação para além do que qualquer discussão
boba entre nós. Ou por quem quer que esteja querendo levar o
outro para a cama ou não.

— De qualquer forma, não é em você que não confio. Mas sim


nela.
Andrew passa as mãos pelo cabelo como se tentasse não se
irritar;
— Apenas lembre-se de uma coisa: o toque dela me enoja. Não
existe nem nunca existiu desejo algum meu por ela, assim como
nunca existira nada entre nós.
Uma parte minha quer brigar com ele. Gritar, socar seu peito até
minhas mãos doerem e acabarmos na cama. Mas a outra diz
apenas para eu me controlar, porque isso não faz sentido algum.

Fecho os olhos e respiro fundo, sentindo uma lágrima se formar


no canto do olho.
— Por que você quis que eu viesse embora com você? –
pergunto com a voz embargada.
— Bruno tentou entrar na BIT outra vez e os seguranças o
prenderam. – explica. – Preciso conversar com Pedro a respeito,
porque ele não explicou exatamente o que aconteceu. Não que
tivesse como fazer isso de lá.
— Preso? – pergunto estranhando o uso da palavra.
— Delegacia. Xadrez. Cadeia. Como você quiser colocar a coisa.
Arregalo os olhos.
— Meu Deus. – murmuro.
— Eu não queria te deixar sozinha. – diz. – Sei que tem andado
estressada com a proximidade da sua apresentação. Só toma um
banho e descansa um pouco. Depois te conto o que quer que tenha
acontecido. – concordo com a cabeça, sem saber exatamente o que
dizer. – Sei que mais do que ninguém, você deve querer saber o
que se passa naquela cabeça oca que ele tem.
Sorrio para ele, aceitando seu beijo, que tem um efeito calmante
em meu organismo apenas por nossos lábios se tocarem por
poucos segundos.

Não tenho nem noção de por quanto tempo eu dormi, mas


quando acordo, vejo pela janela aberta do quarto que já começou a
escurecer. Olho pela porta, notando a luz acessa da cozinha e um
cheiro gostoso que vem até mim, fazendo meu estômago roncar de
fome.
Deito de lado na cama, notando o porta-retratos com a imagem
de um Andrew e um Felipe seis anos mais novos. Desde que eu vi
essa foto pela primeira vez, logo que viemos para cá no início da
semana, tenho sentido uma sensação estranha. Algo como se eu
conhecesse And já naquela época. Só que, por mais que eu tente
me lembrar, é tudo um grande buraco negro aqui na minha cabeça.
E eu já passei horas encarando a imagem dele, tentando lembrar se
não foi alguma outra foto que sua avó tenha me mostrado quando a
visitamos, se eu não o vi alguma vez no escritório de São Paulo,
mesmo que por poucos segundos, em uma de suas visitas. Ou, o
que também é bem provável: posso tê-lo visto em algum site anos
atrás ou até mesmo revista.

Sinto o lugar atrás afundar atrás de e um braço ser passado por


minha barriga, assim como também sinto um beijo em meu pescoço.
E eu afasto apenas o suficiente para recolocar o porta-retratos de
volta no lugar, ficando de frente para Andrew, que tem o cabelo todo
molhado do banho.

— Desculpa. – sussurro, apoiando a cabeça em seu peito nu. –


Eu não sei o que esta acontecendo comigo nesses últimos dias.

— Tudo bem. – responde. – Às vezes também é difícil para mim.


Só precisamos respirar fundo e tentar manter o controle ao invés de
perder a cabeça.
Olho para ele por cima dos óculos e ele beija minha testa.
— Antes era mais fácil. – respondo. – Como foi com Pedro? –
apenas a menção do nome de Pedro é mais do que o suficiente
para deixa-lo tenso.
— Resumindo: Bruno tomou alguns remédios fortes que ele faz
uso e encheu a cara e foi lá cheio de “coragem” – ele desenha
aspas no ar para enfatizar a palavra. – para falar comigo. Mas,
como já havia deixado todos os seguranças avisados, ele está
terminantemente proibido de passar por aqueles portões,
independente do motivo. – sento-me na cama para poder olhar para
And melhor e ele vira de barriga para cima.
— Ah meu Deus! – exclamo boquiaberta.
— Pedro disse que ele confessou ter tentado te forçar a ficar
com ele algumas vezes quando saíram na sua primeira semana,
assim como também fez com outras duas garotas que acabaram
saindo meses antes de você chegar. – And cobre o rosto com o
braço. – Confessou até mesmo que pagou para que Daniela
entrasse na sua sala daquela vez.
Mordo o lábio inferior, sentindo um calafrio percorrer por todo
meu corpo.
— E só com sua ameaça ele conseguiu nos afastar. – digo
baixinho.
— Ele não vai conseguir nos separar, linda. Não importa há
quanto tempo ele saiba de nós.
Andrew senta na cama ao meu lado, segurando meu rosto virado
para ele antes de dizer:
— Bruno tentou te ameaçar naquele dia que eu o demiti. Vou ter
que tomar algumas precauções antes de voltarmos ao Brasil.
— Tipo?
— Tipo colocar câmeras de segurança no meu apartamento e no
seu e no corredor do nosso andar.
— And, me desculpa, mas... Não acha que esta sendo um pouco
exagerado?
— Qual parte do “Bruno te ameaçou” você não entendeu? – ele
pergunta de volta.
— Bruno me ameaçou? – pergunto outra vez. – Andrew, o que
você esta me escondendo?
— Por favor, não quero brigar com você por causa dele. – diz. –
Ou por qualquer outro motivo. Só me deixe fazer o que é certo e
evitar o pior.
Por algum tempo eu o encaro, tentando descobrir que tipo de
ameaça Bruno fez para que ele queira colocar câmeras de
segurança em nossos apartamentos, mas não consigo.
— Eu também não quero brigar. Por isso ou qualquer outra
coisa. – digo por fim. – Se você acha que é o certo a fazer, tudo
bem, pode colocar essas tais câmeras. Mas com uma condição.
— Qual seria?
— Você não vai colocar no meu banheiro e menos ainda no
quarto. – percebo um sorriso em seu rosto e fecho o cenho para ele.
– Andrew. – repreendo.
— Acho que eu posso tanto ver você nua como também te ver
dormir quando quiser. Não preciso fazer isso. – diz quase rindo. –
Tem uma equipe que faz a segurança dos meus avós na mansão há
anos. Amanhã falo com Felipe e peço para que ele veja isso para
mim.
Concordo, ainda que em parte contra minha vontade e decidida
a descobrir que tipo de ameaça Bruno fez contra mim.
— Pedro contou também que algumas revistas no Brasil já estão
saindo com notícias sobre nosso “suposto envolvimento amoroso”. –
ele diz, chamando minha atenção de volta para ele. – Segundo ele,
três revistas de fofocas já saíram com nossos rostos estampados
nelas, mostrando cada uma um lugar diferente que visitamos.

— É compreensível o motivo de você nunca ter namorado. –


digo em resposta e ele me puxa para mais perto, fazendo com que
me deite sobre seu peito.
— Acho que todos esses anos eu apenas estava esperando a
garota certa, para não me decepcionar com ninguém.
Sorrio com suas palavras, passando a mão por sua barba
recém-feira, acariciando seu rosto e ele fecha os olhos com meu
toque.
— Charles me convidou para ir a uma festa de Halloween que o
pessoal do suporte esta organizando. – lembro-me.
— Aquele japonesinho PP? – pergunta abrindo os olhos outra
vez.
— Japonesinho PP?
— Pinto Pequeno.
— Andrew! – exclamo indignada. – Não é nada gentil falar de
alguém assim. – repreendo. – Além do mais, ele disse para levar
você também.
— Você é tão inocente as vezes que chega a me surpreender. –
diz. – Ele esta interessado em você, linda. Ele disse para me
convidar na esperança de que você apenas aparecesse por lá
sozinha. A verdade é essa: ele quer o que é meu.
Fecho a cara para ele.
— De qualquer forma, tenho outros planos para sábado à noite.
— E qual seria? – pergunto realmente curiosa.
— Tem uma casa noturna não muito longe daqui. – começa a
dizer. – Todo ano eles enfeitam a casa ao nível profissional mesmo.
Então que consegui duas entradas Vips para nós.
— Sério?! – exclamo e ele confirma. – Você precisa me levar
para comprar minha fantasia então.
Andrew sorri ao ouvir minhas palavras.
— Deixa isso por minha conta. – diz. – Única coisa que vai
precisar fazer é dizer, educadamente, que tem outros planos para
sábado e que não poderá ir à festinha do PP.
— And... – começo a dizer, mas ele, para variar, me interrompe e
acabo nem mesmo lembrando mais o que ia dizer.
Capítulo Vinte e Nove
Sábado

Estou a cinco dias de fazer minha apresentação final para a Nex


Ae. Não há mais nada a ser feito no meu projeto, a não ser treinar
minha apresentação com um público imaginário, já que ninguém
pode saber do que se trata.

Andrew sabe, é claro. O que tem sido de grande ajuda, porque


eu costumo usa-lo para treinar a apresentação e, sempre que
termino, ele diz que preciso melhorar isso e mais naquilo. Manter
mais o olhar focado para frente ao invés dos meus slides para que
eu possa passar mais confiança ao cliente alvo, que será uma
empresa automobilística de grande importância e que, segundo ele,
existe uma chance de eles aceitarem.

Na mais remota possibilidade de conseguir este feito, vender e


ser a primeira pessoa da BIT a chegar a este ponto, provavelmente
haverão alguns carros por ai com uma placa solar no teto como uma
“fonte coletora de energia sustentável”, ao invés de ser movido ao
combustível que conhecemos e mais usamos. Ainda que seja uma
ideia boa, pelo pouco que consegui trabalhar nesses dois meses e
mais ainda nas últimas semanas, ele ainda precisa ser trabalhado e
melhorado. Nada, é claro, que um bom engenheiro não seja capaz
de fazer (algo que eu estou bem longe de ser, já que formulei mais a
parte de programação da ideia). O que, sem dúvida alguma, eles
têm os melhores.

Terminada a apresentação, teremos uma confraternização na


“casa” da Presidente da Nex Ae com todos os que estiverem
presentes para me ver, junto de seus acompanhantes. E, sendo
sincera, isso sem dúvida é o que mais esta me deixando nervosa,
porque sei que eles me farão perguntas de todos os tipos e não
saberei o que responder. Terei Andrew ao meu lado, mas não
poderei de maneira alguma me esconder atrás dele. Isso ele já
deixou bem claro, porque quer que eu me apresente aos executivos
como a mulher que sou, e não a tímida garota. E, terminado isso,
sábado logo depois do almoço embarcaremos de volta para casa e
eu estou de certa forma chateada por isso. Depois desse mês eu...
Não sei. Tanta coisa.

MAS esta noite não quero pensar em nada disso. Sem


pesadelos com minha apresentação, sem ficar chateada por estar
quase indo embora daqui nem nada, porque esta será a minha
primeira vez em uma festa de Halloween de verdade e And arrumou
para nós, ou para mim, uma fantasia de policial sexy, na qual resolvi
trabalhar nela um pouco mais apenas para poder provoca-lo.

Não posso dizer que ele não foi criativo, mas ainda tenho
duvidas sobre passar frio ou não com a minha, que consta
basicamente de: um vestido preto bem decotado e colado ao corpo,
na qual a saia não chega nem mesmo ao meio de minhas coxas,
uma gravata na qual deixei levemente frouxa no pescoço, botas de
cano longo, um rádio para me comunicar com And, luvas de couro e
o quepe, que ainda não coloquei. Meu toque pessoal foi apenas
este: uma cinta liga preta.

— Já esta pronta, linda? – And pergunta da sala e termino de


arrumar meu cabelo em um rabo de cavalo bem para o alto,
colocando o quepe na cabeça, ainda que ache que vá ser um pouco
inútil.

— Agora estou. – respondo, indo até ele na sala, caminhando o


mais sexy possível.

Ao me ver, Andrew levanta do sofá, olhando-me dos pés a


cabeça e faço o mesmo. Ele esta usando um colete sem manga,
calça jeans preta e sapato social de mesma cor. O quepe, uma faixa
escrita POLICE no braço e uma algema presa a sua cintura. Vê-lo
desta maneira me faz ter centenas de ideias e nenhuma delas nos
levara a esta festa.

— Ficou bem melhor do que eu havia imaginado. – ele diz


quando nossos olhares se cruzam.
Caminho até ele e seguro sua algema com uma das mãos,
dando um puxão forte para mais perto de mim.
— Precisamos passar de uma loja de lingerie e comprar mais
dessas para você. – diz com a voz pesada.
— Temos muitos crimes para combater esta noite, gatão. –
sorrio, correndo o polegar por sua barba por fazer.
— Estou mais a fim de ser o criminoso mais procurado da noite,
apenas para poder ser preso na sua cama. – sussurra em meu
ouvido, segurando meu quadril para mais perto dele e sinto o
Pequeno And em minha barriga.
— É uma pena que tenhamos essas entradas já. – digo,
tentando me fazer de inocente. – Se não... – And me interrompe,
rindo.
— Acha mesmo que essas entradas podem me obrigar a algo? –
torna a rir. – Depois de te ver assim, pode apostar que eu só vou lá
por uma ou duas horinhas, que é para você não ficar brava comigo.
Depois vou te prender na minha cama e te fazer gritar a noite toda.
— Então é melhor nós irmos andando, lindo. – sussurro para ele
e minha voz sai um pouco rouca, resultado do frio que tem feito nas
últimas semanas.

A boate fica a apenas algumas quadras do prédio onde estamos.


Então que nos juntamos com a multidão fantasiada em uma
caminhada coletiva.

Várias crianças pedem doces pelas ruas e achei o máximo


quando tocaram a campainha pedindo. And me deixou dar apenas
para que eu “não passasse vontade”. E devo admitir que eu gostei
de ter feito isso.

— A que horas começa? – pergunto, segurando a mão de


Andrew.
— Onze em ponto eles abrem para que o pessoal entre. –
responde. – Mas como estamos de VIP nós entramos na frente.

Enquanto andamos, reparo na decoração das casas. Cada uma


delas tem um toque especial e muito bem trabalhado. Abóboras com
vela dentro, com várias caretas diferentes, corpos cheio de sangue,
como se tivessem sido mortos de uma maneira extremamente lenta,
cruel e doloroso.

Teve até mesmo uma casa com a porta da garagem cheia de


teia de aranha e uma Aragogue descendo pela porta. Aquela sim
me deu até calafrios apenas por passar perto.
— Chegamos. – And informa, parando frente a um enorme
prédio.
— Terror House. – leio o letreiro quase apagado, que insiste em
piscar.
— Com medo? – pergunta.
— Por que eu estaria? É só uma fachada.
Ele sorri e vamos até onde o segurança esta para poder mostrar
nossas entradas.
— Boa sorte. – um homem moreno e alto diz com um inglês
forte.

Do lado de dentro quase não há iluminação além da que vem


das abóboras penduradas no alto e uma fraca luz vermelha que
pisca. Ao fundo, uma trilha sonora de algum filme de terror e um
telão que ocupa toda uma parede, passando algum filme de terror
que não reconheço.

— É legal e tudo o mais – começo a dizer, encarando a mesa


coberta por uma toalha cheia de mãos ensanguentadas e as partes
do corpo de alguém, deixando a vista todos os órgãos internos, os
dedos servidos em uma travessa, outra com olhos que giram com o
líquido na qual estão dentro e um que parece muito com sangue. –,
mas será que tem algo para comer que não seja do corpo de
alguém? Ou para beber, que não seja feito de algum sangue de
segunda.
Andrew ri ao meu lado e aperto sua mão.
— O bar é normal. – responde. – Aqui é apenas para quem
realmente curte a coisa toda. Não esperava que você fosse pirar
com isso, já que nem mesmo eu curto.
— Estou me sentindo em um filme de terror. – digo, agarrando-
me ao seu braço.
— Essa é a ideia deles. – diz, dando um beijo em minha cabeça.
– Anda, vamos lá para cima ver o que eles prepararam esse ano.
Franzo o cenho.
— Não tenho certeza se quero enfrentar um serial killer disposto
a me matar.
— Até parece que eu deixaria isso acontecer. – diz e acabo
seguindo-o até as escadas, onde desde o corrimão já posso ver o
tema: aranhas.
Teias grossas e gigantes, com pequenos filhotes de Aragogue
que fazem aquela da casa parecer coisa de criança. Elas sobem
como se indicassem o caminho até sua depressão, onde na certa
encontraremos uma centena de vezes maior de que essas.
— Sigam as aranhas. – murmuro, apertando a mão de Andrew
ainda mais.
Silêncio é tudo o que ouço. Ou melhor: tudo o que não ouço.
Eu não consigo enxergar nada que esteja além de um palmo do
meu nariz, o que me faz apertar a mão de And o máximo que
consigo.
Conforme subimos, as escadas começam a ranger sob nossos
pés e ouço batidas em uma porta quando chegamos ao topo.
— Espera. – And sussurra em meu ouvido e paro no mesmo
lugar. Outra vez batem na porta e me escondo um pouco atrás dele.

A luz acende e torna a apagar em questão de poucos segundos,


seguindo por um grito de mulher e sons de algo que não consigo
distinguir. A luz acende outra vez e algo cai bem na minha frente,
arrancando de mim um grito quase tão alto quanto o da mulher no
fundo. A luz apaga tão rápido que não consigo saber o que esta na
minha frente.

— Eu quero voltar. – digo.


— Não podemos voltar.
— Ah, nós podemos sim. – digo em resposta, virando de volta
para as escadas que eu tinha certeza de que estavam atrás de mim
ainda pouco. – O que...
— Uma vez aqui, não podem sair. Ao fim devem chegar se para
casa querem voltar. Correr você pode, mas não se esconder. – uma
voz extremamente macabra começa a dizer vinda de algum lugar. –
Estranhos, cuidado. Vocês foram avisados. Para sair, ao fim devem
chegar se para casa você quer voltar.
A voz para de falar, dando lugar a uma risada de palhaços, como
se eu estivesse vivendo em It e eu grito ainda mais que antes,
porque sinto algo puxar meu braço.
— Sabe aquela história de me prender na cama? – pergunto
agarrada a Andrew. – ESQUEÇA!
— É melhor nós irmos andando antes que mais alguém suba. –
é tudo o que ele diz, começando a andar.

Aranhas. Palhaços. Assassinos em série. O que mais tem por


ai? Bruxas, lobisomens?
— Tudo o que eu queria era uma festa de Halloween normal,
Andrew. – digo um pouco irritada. – E para onde você me trás? Para
uma casa mal assombrada!
Ouço um grito vindo de algum dos cômodos atrás de nós. Um
grito de mulher de verdade, não uma gravação ou algum dos
personagens. Na certa um dos palhaços de It pegou alguém.
— Só temos mais um cômodo, linda. – And diz, passando o
braço por minha cintura. – Olha lá.
Vejo seu braço estendido apenas por conta de um reflexo que
passa rápido por nós, mas um telão se acende no fundo, mostrando
uma cena de algum filme de terror. Na legenda posso ver o nome:
As fitas de Poughkeepsie.
— Acho que você não vai querer ver esse. – diz, levando-me por
um corredor agora iluminado, na qual a porta dos fundos indica a
saída.
— Tinha uma saída esse tempo todo? – pergunto olhando para
ele, notando o vídeo de uma garota que passa no telão.
— É claro que tem.
Olho para And pelo canto do olho, tentada a xinga-lo por alguma
coisa, mas prefiro não fazer isso.
— Sãos e salvos. – diz, abrindo a porta para mim e passo por
ela.
— Se voltarem, não tornará a ter a mesma sorte que tiveram. – a
mesma voz de antes diz e sinto uma brisa entrar quando a porta
bate.
— Não tenho a menor intenção de voltar aqui. – digo, encarando
a porta. – Eu não acredito que você me trouxe para um lugar
desses. – sussurro, agarrada ao colete de Andrew, escondendo-me
nele.
— Achei que não fosse mais se agarrar a mim. – ele ri,
envolvendo meu quadril com as mãos.
— Cala a boca.
— Você quer comer algo? – pergunta dando um beijo em minha
testa.
— Só se for algo que não pareça com o braço de alguém ou que
não tenha sangue. – só de imaginar tudo isso meu estômago já
embrulha.
— Salgadinhos no bar.
Descemos o restante da escada em silêncio, indo até o bar para
pegar alguns aperitivos e duas bebidas: uma batida de frutas para
mim e uma mais forte para Andrew.

Enquanto conversamos, sentados da mesa, observo casais e


grupos de amigos subirem às escadas, sempre esperançosos de
que algo realmente bom possa lhes acontecer lá em cima. Por
alguns, não consigo evitar rir. Para outros, sinto pena. Eu mesma
não voltaria lá nem que Andrew me pagasse para fazer isso.

Quando revolvemos ir embora, já são quase três da manhã.


Andrew tomou umas a mais, mas quem não está bem sou eu. Acho
que apenas o efeito do cheiro enjoativo da decoração ou algo assim.
— Você esta bem? – And pergunta quando paro apoiando a mão
em um poste.
— Um pouco enjoada e com a cabeça explodindo. – respondo,
apertando os olhos. Andrew passa o braço por meu quadril como se
me segurasse.
— Já estamos quase chegando, linda. – diz dando um beijo em
meu rosto e concordo.
— Acho que consigo ir.
Quando eu levanto, sinto tudo girar e um gosto horrível subir por
minha garganta e acabo colocando para fora tudo o que comi.
— Oh, Anjo. – And diz, tirando meu cabelo do ombro, passando
a mão por minhas costas. – Colocar para fora é melhor do que
engolir.
— Eca!
— Tem uma farmácia ali na frente. Vamos passar de lá e pegar
um remédio para você e uma água.
Concordo, passando o braço por seu quadril para andarmos
juntos. Minha cabeça ainda dói, mas ao menos o enjoo passou um
pouco.
Logo que entramos no apartamento, corro para tomar um banho
morno e deito na cama de baixo de dois edredons. Andrew vem
atrás com um copo de água com o remédio para enjoo que
compramos. O balconista disse que era leve, mas que deveria dar
muito sono.

And senta na cama ao meu lado e sinto seu perfume que faz
aquele gosto horrível subir pela garganta outra vez.
— And... – começo, mas não consigo dizer.
Cubro a boca, correndo para o banheiro, terminando de jogar
fora o que quer que reste.
— Você precisa de um banho. – murmuro ao vê-lo pelo canto do
olho. Ele esta encostado na porta com uma expressão preocupada.
Seu perfume que tanto adoro faz tudo se revirar dentro de mim.

— Bem que eu queria. – responde vindo até onde estou e me


ajuda a levantar. – Melhor você lavar a boca antes de tomar água. –
diz. – Se não vomitar mais eu te dou o remédio.
— Li e aceito os termos de uso. – respondo e ele sorri ao meu
lado.
— Bom ver que você mantem o humor mesmo passando mal. –
diz agora me levando de volta para o quarto e deito-me na cama
para que ele me cubra. – Isso quer dizer que você é uma bêbada
divertida.
Faço uma careta, aceitando o copo que me oferece e o
comprimido que ele estende para mim e os engulo com um pouco
de dificuldade.
— Se você não vomitar de novo, isso vai te ajudar a dormir. –
Andrew tira os óculos do meu rosto e os coloca do lado da cama. –
Vou tomar um banho para tirar o cheiro do bar. Qualquer coisa a
porta vai estar aberta.

Sorrio para ele, aceitando seu beijo de boa noite, observando-o ir


até o banheiro e deixar a porta aberta para mim.

Não demora muito até que eu comece a sentir a visão pesar e


um sono que parece tomar conta de mim. Algo não está certo
comigo... Minha cabeça vai ficando levemente zonza. Não sou tão
fraca para bebidas assim... Visão mais embaçada. Eu jurava até ser
imune a isso... Fecho os olhos. E agora estou tão fraca que não sou
capaz nem mesmo de aguentar o perfume de And, que tanto adoro
sentir... E não vejo mais nada.
***
Saio da cama quando meu relógio marca sete horas da manhã,
sentindo-me incapaz de continuar deitada. Passei praticamente a
noite toda virando de um lado a outro na cama por estar com uma
coisa na cabeça e preciso tirar essa dúvida o quanto antes.

Vou até o banheiro para lavar o rosto e trocar de roupa para


poder sair. Não quero que Andrew me veja saindo para que não
pergunte onde estou indo. Quer dizer, essa é a primeira vez que vou
sair sem ele, mas não vejo outra maneira de fazer isso.
Principalmente para ter coragem de fazer.
Fecho a porta do apartamento, indo logo para o elevador.
Depois de muito pensar a noite toda, depois de fazer muitas
contas, percebi que já faz algumas semanas que estava atrasado
para mim. Algo que nunca aconteceu antes.

Era para ter descido pouco depois de termos chegado à Nova


Iorque, mas isso nunca aconteceu. Sei que tenho tomado pílula
todos os dias, regularmente, assim como meu médico sempre
recomendou. Mas também me dei conta de que sobraram dois
comprimidos da outra cartela. O que significa que houve dois dias
na qual não me lembrei de tomar. Duas noites na qual eu esqueci
completamente de tomar e suspeito que tenha sido quando pedi um
tempo para Andrew.

Dobro uma esquina e vejo o enorme prédio da farmácia do outro


lado da rua. Apresso os passos até lá e assim que entro uma moça
poucos anos mais velha me cumprimenta com um sorriso educado.
— Por favor, que eu esteja errada. – sussurro. – Oi. Eu preciso
de um... – inspiro fundo, tentando lembrar qual a palavra certa para
ser usada nessas horas. É como se eu tivesse esquecido
completamente o que vim fazer aqui.
— Brasileira? – ela pergunta ao perceber meu desconforto.
— Meu Deus, sim! – exclamo aliviada. – Você é a primeira
pessoa que encontro por aqui que fala português. – digo e ela sorri.
— Meu pai é brasileiro. – explica. – Vivi por alguns anos lá até
que meus pais resolveram se mudar de vez para cá. Mas isso não
importa. Precisa de algo?
Respiro fundo, tomando coragem para pedir o que vir comprar.
Ela é paciente e apenas aguarda.
— Quer se sentar? – pergunta.
— Não. Estou bem... Eu só... Preciso de um teste. – minha voz
baixa até que não seja nada além de um sussurro.
— Teste de gravidez? – pergunta baixinho, percebendo minha
tensão e confirmo com um gesto de cabeça. – Espere aqui. Eu já
volto.

Ela então sai, indo para trás do balcão e volta novamente até
onde estou com uma pequena caixinha em suas mãos.
— Temos este aqui. – diz. – Ele mostra até mesmo quanto tempo
esta se o resultado for positivo.
Mordo o lábio inferior, fixando o olhar no produto em sua mão e
de volta para ela. Um tremor percorre todo meu corpo.
— Será que eu posso usar seu banheiro? – peço.
— Claro.
A atendente me leva até o fundo, abrindo a porta que da para
seu estoque, mostrando-me a porta que leva ao banheiro.
— Obrigada. – sussurro ao passar por ela, indo até lá.

No banheiro e com as mãos mais tremulas do que jamais


imaginei ser possível, tiro o teste de dentro da embalagem, lendo as
instruções na caixa de como fazer. Nunca antes fiz um desses e
menos ainda imaginei que tão cedo precisaria fazer.

Faço o que preciso e abaixo a tampa do vaso, sentando nele a


espera do resultado. São cinco minutos. Cinco. Longos. Minutos,
que mais parecem horas longas e eternas.
Deixo o teste no chão entre meus pés e escondo o rosto entre as
mãos para evitar olha-lo o tempo todo. Minhas mãos estão frias e
suadas.
— Por favor. – sussurro de olhos fechados. – Por favor, não.

Quando reabro os olhos, percebo que já passou até mais tempo


do que necessário e que estava chorando. Então pego o teste,
sentindo meu coração pulsar contra meu peito.

— Não! – exclamo ao ver o resultado. São três semanas. O teste


escorrega por entre meus dedos, indo direto para o chão. Minha
visão fica embaçada por lágrimas que não consigo impedir que
caíssem. É como se meu próprio mundo estivesse escapando por
minhas mãos junto deste teste. Isso não pode estar acontecendo.

Não tenho nem como dizer o que estou sentindo. Na verdade,


nem mesmo sei se sinto algo ou não. Somente uma dor muito forte.
Uma dor tão forte que é como se me faltasse o ar. Três semanas.
Com as mãos tremulas, pego o teste outra vez. Isto não pode estar
acontecendo. Eu não posso estar grávida. Levanto, indo até a pia
para lavar o rosto. Como posso olhar para o Andrew e dizer para ele
isso? Como eu vou...

— Como eu queria que você estivesse aqui, Ju. – sussurro,


secando o rosto. Não posso passar o restante da minha vida aqui,
ainda que seja exatamente isso o que eu queira. Seria bem mais
fácil de que voltar para aquele apartamento e encarar And.

— Esta tudo bem com você? – a mesma moça de antes


pergunta assim que apareço de volta na loja e vem até mim. – Você
está pálida. – diz, ajudando a me sentar em uma cadeira. – Como
foi?
Ao invés de responder, ergo a mão para ela, para que veja com
seus próprios olhos “como foi”.
— Eu não sei nem o que dizer.
— Nem eu.

— Fique aqui. Vou pegar um copo d’água para você. – diz já


saindo e retorna instante depois com um copo em sua mão e me
entrega. Tomo um pouco, mas o gosto que sinto é estranho. Como
se estivesse estragado. Não que esteja de fato ruim. Mas sou eu.
— Ele sabe? O pai? – ela pergunta e nego.
— Não sei nem como vou contar isso para ele.
— No momento certo você vai saber e tenho certeza de que vai
se surpreender, porque ele vai ficar feliz. – diz com a mão em meu
braço. – Você vai ver.
— Tomara que você esteja certa. – sorrio para ela, sentindo
meus olhos marejarem. – Você pode me dar outro desse? Só para
ter certeza.
— Claro.
Mais uma vez ela vai até o mesmo lugar de antes e volta com
outro teste nas mãos. Levanto-me para pagar e voltar para o
apartamento. Há essas horas Andrew já deve estar acordado e na
certa preocupado.
— Pode me tirar uma dúvida... – começo a dizer, pela primeira
vez notando o crachá preso em seu uniforme, mostrando seu nome.
– Isabeli?
— Qualquer uma que estiver ao meu alcance. – ela sorri em
resposta.
— Eu tomo pílula todos os dias. Só que no final do mês eu me
esqueci de tomar uns dois dias, mas o tempo não bate com o que
esta marcando.
— A porcentagem de engravidar com uso da pílula é muito
baixa, mas existe uma chance ainda que mínima e ela aumenta um
pouco se você não tomar sempre no mesmo horário. – Isabeli
explica. – Em todo caso, o correto seria manter o preservativo
sempre.

— É uma pena que agora seja tarde para manter o uso. – solto
um suspiro cansado pela noite não dormida.
— Faça um exame de sangue, procure seu médico e tire as
dúvidas com ele. – recomenda. – Assim você vai poder saber se a
data esta certa. Além de que precisa fazer um acompanhamento
mais adequado.
— Vou sim. Obrigada. – sorrio, entregando o dinheiro para pagar
os dois testes. – Não sei nem o que eu teria feito se eu estivesse
sozinha.
Aproveito para perguntar também a respeito do remédio para
enjoo que compramos durante a noite e Isabeli diz que é o próprio e
que posso manter o uso, mas que se não funcionar como deveria,
devo procurar meu médico.
— Muito obrigada, Isabeli. E desculpa por ter segurado você
tanto tempo assim.
— Estamos aqui justamente para isso. – ela sorri. – Boa sorte.
Com o pai e o baby.
— Acho que vou precisar.

No caminho de volta, desvio até o mercado para comprar


algumas coisas para o café da manhã. Só um bolo e alguns
docinhos. Na verdade, quando entrei a ideia era apenas comprar o
bolo. Mas quando vi os doces... Aproveitei também para comprar os
ingredientes para fazer brigadeiro.

Abro a porta do apartamento bem de vagar, tentando não fazer


barulho.
— Veja só quem é que apareceu. – ouço a voz de Andrew antes
mesmo de vê-lo sentado no sofá com o celular na mão. – Acordo,
nada de Luara na cama. Procuro por ela em todo lugar, mas não a
encontro. “Onde ela foi?”, pergunto a mim mesmo. Nem sinal dela, é
claro. Resolvo ligar e adivinha. – ele ergue meu celular no ar.
— Fui à padaria comprar algumas coisas para nós. – digo na
defensiva, colocando duas sacolas em cima da mesa.
— Por duas horas? – pergunta, arqueando a sobrancelha para
mim.
— Fui à padaria e dar uma caminhada para... Espairecer
algumas coisas.
— Podia ao menos ter deixado um bilhete dizendo onde estava
indo. – ele se levanta, vindo até mim. – Achei que tivesse se perdido
ou sei lá, sido assaltada. – mordo o lábio inferior, sentindo-o tremer.
– Você virou na cama a noite toda. Esta se sentindo melhor?
Meu corpo todo treme enquanto tento segurar o olhar de Andrew.
Quero contar para ele toda a verdade. Dizer que estou grávida. Mas
não posso. Não sei como fazer isso.
No caminho de volta decidi que guardaria isso apenas para mim
por um tempo, até que estivesse mais forte emocionalmente e fosse
capaz de dizer em voz alta. Encarar sua reação sem fraquejar, seja
ela qual for.
— Linda, o que houve? – And pergunta preocupado.
— Só me abraça. – respondo com a voz embargada, sentindo as
lágrimas escorrerem por meu rosto. Andrew abre os braços e me
escondo neles, sentindo seu aperto junto de mim.
— Sabe que uma hora você vai ter que me dizer o que esta
acontecendo, né? – pergunta, dando um beijo em meu rosto e
balanço a cabeça contra seu peito, confirmando.
— Só não me peça para fazer isso agora. Eu não consigo. –
respondo e o aperto ainda mais.
— Eu estou aqui, Anjo. Vai ficar tudo bem, eu prometo. –
sussurra em meu ouvido enquanto passa a mão em minha cabeça.
– Quando se sentir melhor, por favor, me conte. Eu quero saber o
que aconteceu para te deixar assim.
Passamos a tarde toda assistindo filmes e deitados na cama
comendo brigadeiro e os docinhos que comprei.

Depois do almoço, enquanto Andrew fazia o brigadeiro para nós,


fui tomar um banho e aproveitei para fazer o segundo teste que
apenas confirmou o primeiro: positivo, três semanas. Se a data for
exata pode ter sido no meu aniversário.

Não chorei como no primeiro. Acho que, de certa forma, estou


mais conformada. É estranho, mas se realmente for verdade, pelos
próximos oito meses e meio terei uma criança crescendo dentro de
mim. Uma criança que se puxar para o pai, não será tão pequena
quanto uma criança comum.

O que mais me assusta em tudo isso é imaginar a reação de


Andrew quando contar para ele e imaginar o que será de nós daqui
para frente. Isto sem contar meus pais, que não vão ficar nada
felizes por saber.
— Eu estou ferrada. – murmuro, escondendo o rosto no
travesseiro.
— Pelo quê? – Andrew pergunta, reaparecendo no quarto outra
vez.
— Acredite, se eu te contar você vai surtar. – minha voz sai
abafada por conta do travesseiro. – Pode acreditar no que digo.
Sinto suas mãos em meu quadril, rolando-me para cima dele.
— Então me conte o que esta acontecendo. – pede. – Quero
saber. Estou preocupado com você.
Endireito-me em seu colo, notando sua camisa azul dos
Cowboys. Agora à noite iremos ver o jogo deles.
— Certo. Você não quer me contar. Tudo bem. – ele volta a falar.
– Só espero que você confie sua dor a mim outra vez.
— Sei que uma hora ou outra vou ter que fazer isso, mas não
consigo dizer agora. Não quando nem mesmo eu consigo aceitar
direito. Só... Está confuso. Entende?
Andrew concorda e deito em seu peito, escondendo o rosto em
seu pescoço.

Eu consigo ficar bastante tensa sempre que assisto algum jogo.


Mesmo que não esteja entendendo muita coisa a respeito de como
futebol americano funciona e And tenha que me explicar de maneira
bem paciente até. E eu vibro por cada ponto que os Cowboys
fazem.
Agora ele está sem sua camisa, uma vez que a roubei para mim
e ela mais ficou parecendo com um vestido de que camisa.

Deito no colo dele, que começa a mexer em meu cabelo,


fazendo com que minha visão fique um pouco embaçada e pesada,
entregando-me quase ao sono. Mas não quero perder o final do
jogo. Estamos ganhando do New York de vinte e quatro a quatorze
e já está no final. Não posso me render logo agora.

— Eu já venho. – Andrew diz levantando e volto para o meu


lugar, prestando o máximo de atenção no jogo. Só mais alguns
segundos e o juiz anuncia o final da partida.
— GANHAMOS! – grito. – Eu poderia assistir aos jogos durante
todo o torneio e não me cansaria. – digo quando And retorna da
cozinha.
— Você pode assistir. – responde, sentando na cama ao meu
lado. – Se não acabar mudando de ideia e torcendo por outro time,
posso até mesmo pensar em te dar uma camisa dessas.
— Não quero uma camisa dessas.
— Achei que tivesse gostado dela. – diz com o cenho franzido.
— Gostei. Mas não quero uma dessas. Quero essa. A sua
camisa, porque ela tem seu cheiro e me faz sentir protegida.
— Certo. Você me convenceu. Pode ficar com ela. Mas apenas
por essa noite.
Andrew baixa o rosto para bem perto do meu e posso sentir sua
respiração pesada. Eu envolvo sua nuca com a mão, trazendo-o
para mais perto de mim. Sinto meu desejo refletido em seus olhos
quando me beija lenta e demoradamente.
Passo minha mão por suas costas e ele se posiciona bem acima
de mim, pressionando sua ereção em minha perna. Sua respiração
mais acelerada.
E então, como se jogassem um balde de gelo em cima de mim,
não consigo.
— And. – chamo, mas é como se ele não me ouvisse, já que
apenas desce por meu pescoço, beijando meu seio por cima da
blusa. – Andrew. – insisto, segurando seu rosto com as mãos e ele
me olha. – Desculpa. Eu não consigo fazer isso. Eu quero muito
fazer amor com você. Mas não consigo. Minha cabeça não esta
focada nisso e não vou conseguir. Desculpa.
— Você não tem nada que pedir desculpas por isso, minha linda.
– diz, pousando um beijo em meus lábios. – Eu achei que isso fosse
te tirar dessa tensão, mas sexo nem sempre pode resolver as
coisas. Percebo isso agora.

Dou um sorriso fraco e ele sai de cima de mim para deitar ao


meu lado, mas ao invés de me afastar, ou se afastar, ele me puxa
para junto de si e desliga a TV.
— Acho que podemos só passar à noite agarradinhos assim. –
diz.
— Obrigada. – sussurro contra seu pescoço.
— Somos um casal. É assim que as coisas funcionam, não é?
— Acho que sim.
Capítulo Trinta
Terça-feira

Caminho com Andrew as duas quadras até o supermercado para


fazermos as compras para o almoço de hoje e para os próximos e
últimos dias que teremos aqui em Nova Iorque. Mas, antes de
sairmos, demos uma boa faxinada no apartamento para que
pudéssemos sobreviver esses dias e ele se convenceu a pedir para
que algum amigo dele aqui abra o lugar pelo menos uma vez por
mês para deixar entrar ar e para que alguém possa limpar, para o
caso de precisar voltar e não ter que ficar em hotel. Ou até mesmo
para quando algum amigo seu venha e possa se hospedar.
— O corredor da perdição. – comento quando passamos pelo
corredor de doces.
— Pode pegar o que você quiser. – And diz ao meu lado e olho
para ele.
— Essa frase para mim soa como aquela: “Você pode andar em
todos os brinquedos que quiser” para uma criança no parque de
diversões. – comento rindo.
— Certo. – diz. – Então corrigindo: você pode pegar o que quiser
desde que tenha uma alimentação equilibrada com coisas
saudáveis. – ele pega um pacote de bombons e o coloca no
carrinho. – Pareço tanto minha mãe quando digo coisas assim.
— Ela deve ser uma mulher incrível.
— O melhor de tudo nela, é que tem uma irmã gêmea idêntica. –
diz. – Quando eu era garoto e tentava aprontar algo, minha tia fingia
ser ela para brigar comigo e eu ficava arrasado por ter
decepcionado minha mãe. – olho para ele, tentando controlar a
vontade de rir.
— Você não conseguia diferenciar as duas? – pergunto de
repente curiosa. – Voz? Nada?
— Meu pai achou uma diferença nas duas quando namoravam.
– começa. – Ele era afim da minha tia, mas ela gostava de outro e
minha mãe gostava dele. Então que as duas trocaram de lugar e
eles começaram a sair. Quando ele descobriu que não era a mesma
pessoa se sentiu um pouco decepcionado, mas dai já era tarde.
— Tarde?
— É... – Andrew sorri. – Ele descobriu que a irmã que gostava
era mesmo minha mãe, não a irmã. Só que deram nomes errados
para ele quando as conheceu.
— Que confusão! – exclamo rindo. – Mas qual era a diferença
entre elas?
— Minha mãe tem uma pinta na mão esquerda. – responde,
mostrando sua própria mão e vejo nela, entre o indicador e o dedão,
uma bolinha um pouco disforme, como se formasse um pequeno
coração. – Minha tia não tem.
— Você tem um coração na mão, And. – sorrio, segurando sua
mão para poder ver melhor e de fato ela se parece com um. Eu já a
havia visto antes, mas não me atentado ao seu formato.
— Você tem uma lua minguante no ombro direito. – ele diz como
se estivesse se defendendo.
Paramos na sessão de hortifrúti e escolho algumas maçãs e
laranjas. And escolhe verduras.
— Sabe – recomeça. –, talvez pareça besteira o que vou dizer
agora.
— O que? – pergunto, olhando para ele, dando um laço no
saquinho de laranjas. Seu rosto está um pouco corado e ele evita
meu olhar.
— É que eu sempre pensei que se um dia fosse para ter filho,
que fossem gêmeos, sabe? – ao ouvir suas palavras eu congelo no
mesmo lugar. – Na verdade eu queria ter tido um irmão. Vocês
aprontam de tudo juntos, vão estar sempre juntos. Nunca ficam
sozinhos.
Mordo o lábio inferior, desviando o olhar para outro lado. É como
se ele soubesse que estou escondendo algo dele e a que se refere.
Sinto meu coração acelerar como se quisesse sair pela garganta.

Escolho algumas outras frutas do outro lado. Ele não sabe de


nada, Luara. Isso é só uma conversa aleatória de algo que ele
sente. Não significa nada. Fecho os olhos, apertando-os forte.

— Queria saber qual magia você usa. – ouço sua voz atrás de
mim, assustando-me. – Calma.
— Como assim? – pergunto, sentindo minha voz tremida.
— Nunca falei a respeito disso com ninguém além de Felipe. –
explica. – E ainda foi em uma época antes de tudo, onde eu ainda
acreditava nessas coisas todas. – ele continua a escolher frutas,
uma por uma, procurando sempre a melhor. – E então você chega
como se caísse de paraquedas e começa a mudar tudo na minha
vida.
Ah, não.
— Desculpa. – sussurro, colocando no carrinho tudo o que
estava segurando.
— Na verdade não é uma desculpa. É um agradecimento. – diz.
– Meu. Sei lá... É estranho dizer. Ainda mais em um lugar como
esse. Mas até conhecer você melhor, eu achava que tivesse perdido
esse meu lado “responsável”. – dou um sorriso um pouco sem
graça, sem saber o que dizer. Talvez esse seja um sinal, sua boba
medrosa. Conte a ele a verdade logo!

Balanço a cabeça de um lado a outro, afastando o pensamento.


Aqui não!

— Você ainda esta estranha. – ele diz quando voltamos a andar.


– Será que em algum momento vai me dizer o que esta
acontecendo com você?
— Vou. Claro que vou. – respondo. – Só não agora. Eu estou
tentando organizar algumas coisas aqui dentro de mim e...
— Tudo bem. – ele me interrompe. – Não vamos tocar nesse
assunto agora se te deixa tão desconfortável assim. – Andrew olha
para mim e sorri. – Gosta de jogos? – pergunta para mudar de
assunto.
— Tenho um videogame no meu apartamento. – respondo,
sorrindo de volta. – Quando estou estressada costumo jogar. Eu
realmente gostaria de ter um para me ajudar aqui.
— Então vamos resolver isso. – diz e percebo que estamos no
corredor de jogos. Ele chama um funcionário da loja para poder
pedir alguns jogos e o rapaz os dispõe sobre o balcão para que
possa escolher.
— De qual você gosta? – And pergunta para mim e fico ao seu
lado, observando os vários jogos.
— Corrida, fase. – dou de ombros. – Nada que me faça ter que
ficar pensando muito.
Ele sorri para mim e escolhe diversos gêneros. Desde estratégia
até os que sugeri.
— Obrigado. – agradece ao rapaz, colocando todos no carrinho.
— Você não deveria comprar o console também? – pergunto.
— Não. Eu tenho um Playstation no apartamento já. E esta
funcionando perfeitamente.
— Foi por isso que demorou tanto para limpar os quartos?
Ele ri.
— Confesso minha culpa neste crime.

Depois de guardarmos as compras, And foi para a cozinha,


proibindo-me de ir até lá. Não vou mentir e dizer que não sinto uma
ponta de curiosidade em saber o que esta escondendo, mas não
vou atrás dele ainda. Quero apenas ficar aqui na sala com este livro
que achei na estante dele, tentando não pensar em nossa conversa
de antes sobre ele dizer que gostaria de ter filhos gêmeos se fosse
para acontecer e que estou grávida e ele não sabe. Por mais que eu
queira contar a ele, não sei como fazer. Não é como chegar a
alguém e simplesmente dizer: “Comprei um livro novo para você.
Espero que goste.”. É uma criança que não tem culpa alguma de ter
a mãe irresponsável que ela vai ter.
Cruzo as pernas em cima do sofá, passando as paginas do livro
da Clarice Lispector até parar em um trecho que chama minha
atenção.

"...O amor é tão mais fatal do que eu havia pensado, o amor é


tão mais inerente quanto à própria carência, e nós somos garantidos
por uma necessidade que se renovará continuamente. O amor já
está, está sempre. Falta apenas o golpe da graça – que se chama
paixão...."

— Acho que isso não era bem o tipo de texto que eu esperava
encontrar na biblioteca particular do Andrew. – digo, passando para
outra página.
— Eu ganhei esse livro da minha avó. – ouço sua voz atrás de
mim e me viro em sua direção. – Não o li ainda, mas foi bom ter me
lembrado dele. Vou leva-lo de volta para o Rio.
— Não sabia que gostava da Clarice.
— Ela é uma mulher incrível. – ele sorri em resposta. – Era. –
corrige.
Levanto e vou até a estante para colocar o livro de volta no lugar,
virando outra vez para Andrew quando um cheiro chega até mim.

— O cheiro esta uma delícia. – comento.


— Você vai gostar do que estou fazendo aqui. – ele sorri,
voltando para a cozinha e vou atrás dele.
— E o que o Chefe tem no cardápio hoje? – pergunto,
observando-o pegar a colher de pau para mexer na panela no fogo.
Apoio-me na mesa para vê-lo trabalhar.
— Abre. – ele pede e obedeço. – Só cuidado que está quente.
— Ai. Meu. Deus! – exclamo ao sentir o sabor de seu molho. –
Isso esta uma delícia! – ele sorri com meu elogio, parecendo
satisfeito. – And, você esta no ramo errado.
— Já pensei em abrir um restaurante, mas é muita
responsabilidade. – responde, virando outra vez para o fogão e
franzo o cenho.
— Mais do que uma empresa do porte da BIT?
— Bem mais. – ri. – Por exemplo: muitas mulheres poderiam se
apaixonar por mim por conta do meu tempero e me querer. – ele
coloca a colher apoiada na panela e vira para mim outra vez. –
Muitas mulheres poderiam se apaixonar por mim por conta disso. E
eu já sou apaixonado por uma única mulher.
And apoia as mãos na pia, encarando-me.
— Eu não as culparia por se apaixonarem por você. – respondo.
– Mas dai eu teria que interferir em defesa do que é meu. Por que...
– sinto minha respiração acelerar um pouco. – Não foi fácil
conquistar você.

Percebo o sorriso no rosto de Andrew e seu olhar em cima de


mim. Tudo o que consigo fazer é retribuir seu sorriso, sentindo meu
rosto corar. Seus olhos estão mais escuros e brilhantes, o que faz
com que meu coração dispare ainda mais contra o peito.

— O que foi? – pergunto, mas não tenho respostas. – Seu molho


está começando a queimar. – tento e, para minha surpresa, ele vira
para o fogão, voltando para mim outra vez.

— Não tem nada queimando. – diz e me aproximo dele, cobrindo


o espaço que havia entre nós e o beijo, sentindo uma lágrima
escorrer por meu rosto.

Enquanto corresponde ao meu beijo, Andrew passa o polegar


por meu rosto, secando uma lágrima e se afasta, mantendo suas
mãos em meu rosto.

Desvio o olhar o dele, secando outra lágrima que insiste em cair


e And me faz olhar para ele outra vez, apoiando sua testa na minha.
Meu coração bate acelerado.

Tê-lo tão perto de mim assim me faz ter medo do que pode
acontecer quando contar para ele. Do que será de nós quando eu
disser essa frase que tem me deixado acordada nas últimas noites.
E, ao mesmo tempo, sinto-me terrível por estar escondendo isso
dele.
— Eu amo você, Anjo. – ele sussurra, fazendo com que meu
coração pare de bater no mesmo instante e sinto minhas pernas
amolecerem. Talvez eu apenas não caia por ter suas mãos apoiadas
em mim.
— Eu amo você também. – sussurro de volta, sentindo as
lágrimas descerem por meu rosto insistente.
— Por favor, não chore. – pede. – Isso vai acabar salgando o
molho do macarrão.

Apoio minhas mãos em seu peito, sentindo seu coração bater


acelerado. Ele esta sem camisa, ainda que esteja frio por causa da
chuva que cai lá fora.

— Prometo não salgar seu almoço. – sorrio para ele. – Não vou
mais chorar. Prometo também.
— Que ótimo, porque preciso de ajuda com a salada.
— Tudo bem. Acho que posso cortar alguns tomates sem acabar
chorando.
— É cebola que faz chorar. – ele corrige.
— Bem, eu sei. Foi justamente por isso que eu disse que não iria
chorar pelo tomate.
Andrew ri, apertando minha cintura.
— Você fica linda com essa minha camisa. – diz, dando um beijo
em meu rosto.
Durante o almoço, And e eu entramos em um acordo de
passarmos a tarde assistindo algum filme e deixaríamos os jogos
para mais a noite. Então é por isso que estou aqui deitada em seu
peito terminando de assistir a uma comédia romântica.
— Quer ver outro? – pergunto, ainda que minha vontade seja
apenas abraça-lo forte até pegar no sono e só acordar quando
estiver no Rio de novo.
— Na verdade não. – ele responde. – Quero conversar com
você.
Meu coração para de bater no mesmo instante. Olho para
Andrew, que senta na cama, apoiando-se à cabeceira. Sento na
cama ao seu lado, puxando o travesseiro para meu colo.
— Sobre o que? – pergunto.
— Tenho sentido você realmente distante de mim nesses dias. –
diz. – Aconteceu algo?
— Não. – minto. – Esta tudo bem. – sorrio para ele, mexendo na
renda da fronha.
— É sua família? Ou Julie? – ele insiste. – Está tudo bem com
eles?
— Não falo com nenhum deles desde sábado à tarde. –
respondo. – Estou com saudades. Mas não é isso.

Andrew vira para mim e me sinto levemente desconfortável.


Talvez essa seja minha oportunidade, mas não consigo fazer isso.

— Olha, eu quero que saiba que não importa o que seja que
tanto te incomoda, que eu estou aqui. – diz, segurando meu rosto
para ele. – Quero que saiba que sempre vai poder contar comigo
para o que quer que esteja te machucando e que vou te ouvir e ficar
ao seu lado sempre. E quero que você me diga se eu tiver te
magoado com alguma atitude.

Certo. Coragem.
Abro a boca para falar, mas o que sai é outra coisa.
— Eu sei. – sorrio. – Obrigada.
Covarde!
— Certo... Sobre o que mais podemos conversar? – pergunta
agora olhando ao nosso redor e tudo o que consigo é me sentir
péssima comigo mesma.
— Estou sem ideia alguma. – dou de ombros e ele sorri de
maneira maliciosa.
— Bem, então eu tenho uma.
Arqueio a sobrancelha, curiosa para saber qual é sua nova ideia,
mas ainda aliviada por ele não ter insistido em saber o que me
incomoda.
Andrew vira para mim e se aproxima, subindo em minhas
pernas, deitando-me na cama outra vez e sorrio ao perceber quais
são suas intenções. Ele vem subindo por minha barriga, fazendo
com que minha camisa suba e ele passa a barba por ela.
— And, para! – peço, sentindo cócegas.
— Eu não posso parar. – diz, começando uma tortuosa subida,
vindo até o pescoço, soltando o peso em mim. – Como eu sinto sua
falta, linda. – sussurra instante antes de me beijar e prendo minhas
mãos em suas costas, apertando-o contra mim. – Mas não vou
tentar usar disso para te deixar melhor. Embora eu ache que isso
possa resolver seus problemas.
Ele sorri e o empurro de volta para a cama, sentando em seu
colo.
— Sobre o que você quer conversar agora? – pergunto e ele me
da um sorriso malicioso.
— Quero saber como foi sua primeira vez. – suas palavras
fazem meu rosto corar no mesmo instante.
— NÃO! – exclamo. – Qualquer coisa, menos isso.
— Eu conto a minha. Uma troca justa.
— Isso é chantagem. Não troca. – faço uma careta para ele,
tentando parecer ofendida. Levanto de seu colo apenas para poder
me acomodar melhor em cima dele.
— Troca justa. – sussurra.
— Ok. Tudo bem. – digo, apoiando a mão em seu peito e desço
até o elástico de seu short.
Olho para o teto, tentando me lembrar daquela noite.
— Tenha um pouco de paciência. – peço. – Não lembro muito
bem como gostaria.
— Foi tão ruim assim? – ele pergunta e olho para ele outra vez.
— Foi o suficiente para me apaixonar por ele mesmo sabendo
que nunca mais o veria. – respondo. – Eu tinha dezessete anos e
estava no meu último ano da escola. Era perto da formatura e tinha
acabado de receber a notícia de que havia passado na faculdade
que eu queria e com bolsa integral. Era uma festa na casa de um
amigo nosso, como sempre fazíamos todos os meses, porque
muitos da turma não iriam mais se ver. – franzo o cenho. – Os pais
desse amigo tinham ido viajar. Então você já viu.
— Claro. – Andrew sorri, como se me incentivasse a continuar.

— Eu estava feliz pela bolsa de estudos, então que bebi bem


mais do que deveria e foi uma mistura. Caipirinha, vinho... Eu
sempre comia, antes que você brigue comigo. – acrescento rápido.
– A certa altura da festa, apareceu um carinha lá que eu nunca
havia visto na escola e acabei deduzindo que era primo de alguém e
provavelmente já estava na faculdade, porque na certa não era mais
nenhum garoto como os meninos da minha turma. E ele veio falar
comigo... – faço uma pausa e And me entrega a garrafa d’água do
seu lado. – Obrigada.

— E esse rapaz resolveu abusar da sua fraqueza? – pergunta.

— Não. – sorrio. – Ele foi tão gentil... Nós conversamos por


horas a fio. Ou pelo menos foi o que me pareceu na hora, porque eu
já estava um pouco zonza. Descobri que ele tinha vinte anos e
estava na faculdade. Ele era lindo, todo educado e gentil. Um
homem como poucos. – sinto meu rosto corar com a lembrança. –
Ele disse que eu devia parar de beber daquele jeito, porque era
bonita demais para aquilo e eu disse que estava feliz por ter
acabado de descobrir que iria para a faculdade e ele me perdoou. –
rio um pouco sem graça. – Em algum momento, eu o beijei e foi a
melhor coisa que eu havia feito. Seu beijo fez meu coração se
aquecer, porque ele me correspondeu com igual desejo e eu nunca
tinha feito aquilo antes. Tomar a iniciativa. – franzo o cenho. – E ele
não ia fazer, porque parecia querer me respeitar. Nós tínhamos uma
sincronia que era como se já tivéssemos feito aquilo antes.
Conversamos mais um pouco e eu o levei para o quarto do Hugo,
que era meu melhor amigo naquela época.

— Lá em cima já não tinha ninguém, porque só os amigos mais


íntimos podiam subir. Ele trancou a porta para que ninguém
aparecesse de surpresa e começamos a nos pegar para valer. –
sinto meu rosto se aquecer para valer. – Eu nunca tinha sentido
tanta vontade de fazer aquilo antes e me sentia confortável com ele.
Eu sabia que estava pronta para fazer aquilo desde que fosse com
ele. – cubro o rosto com as mãos, sentindo um pouco de vergonha e
Andrew segura, colocando-as em seu peito. – Ele estava tão
perdido quanto eu. Mas eu pensei “Ele tem vinte anos e esta na
faculdade. Já deve ter feito isso muito. Ele não é virgem...”. Mas na
verdade ele era. O que explicou bem o motivo dele ter sido tão
delicado comigo. Tão... Ele era realmente generoso, And. Grande,
digo. E eu senti muita dor no começo, porque ele era... Igual a você.
– ele fecha a cara para mim. – Não me culpe. – digo rindo. –
Provavelmente deixei alguma cicatriz nas costas dele.

Termino minha história, sentindo-me um pouco sem graça. Há


anos não pensava nisso. Mas o ponto que não conto é que, mesmo
sem ter descoberto o nome dele, por meses fui apaixonada por ele e
esperei poder encontra-lo outra vez.

— Diz alguma coisa. – peço, sentindo um desconforto terrível


com o silêncio de Andrew.
— Vocês se viram novamente? – pergunta.
— Não. Eu não perguntei o nome dele e ninguém conhecia. –
respondo. – Não era primo nem conhecido de ninguém da nossa
turma. Só foi alguém que apareceu por um acaso e sumiu do
mesmo modo. – olho para o lado. – Procurei por ele por mais ou
menos seis meses, mas nunca o encontrei. Pouco depois disso
comecei a namorar, mas não durou mais do que um mês e fiquei
sozinha por uns três anos até começar a sair com meu ex.

Para meu completo espanto e desconforto, Andrew começa a rir


de mim.

— Da próxima vez não conto nada para você. – digo irritada,


indo para o meu lado da cama.
— Desculpa. Mas é que... – ele para de falar, passando a mão
pela cabeça. – Quais são as chances de termos tido nossa primeira
vez um com o outro? – pergunta e fecho a cara para ele.
— Muito engraçado Haha.
— Eu tinha vinte anos e estava no meu segundo ano da
faculdade. Foi em São Paulo em uma festa onde não conhecia
ninguém. Nem mesmo a garota. – começa a contar, mas finjo não
ter interesse. – Ela tinha dezessete anos e lembro que ela estava
toda feliz por ter conseguido passar na faculdade. – olho para ele. –
A única diferença é que depois do que aconteceu, nós fomos dar
uma volta de carro e conversamos por mais algum tempo antes de
leva-la para casa.
— Um opala vermelho quase caindo aos pedaços. – digo,
lembrando-me do carro que sai da festa.
— Um opala 1970 vermelho quase caindo aos pedaços. – ele
corrige. – Ainda o tenho, mas fiz uma bela reforma no menino.
— Ah meu Deus! – exclamo, pulando por cima dele para pegar o
porta-retratos com sua foto. – É ELE! – grito. – Quer dizer. É você.
Por isso a familiaridade com sua imagem.

Deixo o quadro cair na cama, levando às mãos a boca, sentindo


meu coração acelerado. Andrew o pega, mantendo o olhar na
imagem dos dois jovens.

— Precisei voltar para o Rio de Janeiro logo na manhã seguinte


e não pude levar ela ao cinema como havíamos combinado. Eu
devia ter pedido o telefone dela, mas tínhamos um acordo de não
perguntar o nome do outro até nos encontrarmos. – ele ergue o
olhar para mim e seco uma lágrima que escorre por meu rosto. – Ela
foi à primeira garota por quem me apaixonei de verdade. – Isso não
pode estar acontecendo.

Como eu pude não notar isso antes? Toda essa familiaridade


que eu sentia com sua foto desde que viemos para cá não era
apenas por alguma revista ou notícia da internet. Mas sim porque o
Andrew da foto foi o mesmo que conheci aquele dia.

Olho para ele, incapaz de acreditar que minha primeira vez foi
justamente com ele, em uma época cheia de mudanças em minha
vida e que, sete anos depois eu o reencontrei em outro estado,
tornando a perdê-lo de vista uma segunda vez. Agora eu me lembro
de ter dito para que me chamasse de Lu, enquanto ele se
apresentou como And.

Se não tiver sido o destino, eu não sei mais o que poderia ter no
unido desta maneira.

— Você melhorou bastante desde aquela vez. – And ri ao meu


lado. – E eu também.
— Para mim chega. – murmuro para mim mesma, fazendo com
que ele olhe me olhe. Não posso continuar escondendo isso dele
assim. – And, eu preciso te contar algo importante.
— Eu imaginei que tivesse. – diz em resposta, mas percebo que
agora ele esta perdido em pensamentos próprios. Meu estômago
embrulha e tudo o que consigo fazer é correr para o banheiro para
vomitar.

Estou sentada no chão frio do banheiro, apoiada na parede.


Minha cabeça esta bem zonza por ter acabado de colocar para fora
tudo o que comi o dia todo. Mas, por outro lado, não sinto mais
aquele enjoo todo. Tudo o que sinto é raiva de mim mesma, por
mais uma vez ter fracassado em contar para ele.

— Está tudo bem? – And pergunta do quarto e olho para a porta


aberta, sentindo meu coração palpitando. Vamos lá.

Levanto-me usando a parede para me apoiar e lavo o rosto,


voltando para o quarto logo em seguida.

Andrew está sentado na beirada da cama com o cotovelo


apoiado nas pernas.

— O quê esta acontecendo, Lu? – pergunta com uma expressão


confusa. – Não diga mais que não é nada que eu sei que você esta
me escondendo algo.
— Eu não posso mais fazer isso. – sussurro, indo até a cômoda
onde está minha bolsa e a abro para pegar o embrulho de papel
pardo onde tenho guardado os dois testes e vou até And na cama,
entregando para ele. Seja lá o que tiver que ser.
— O que é isso? – pergunta, segurando o pacote. Sento-me ao
seu lado na cama, mas seu olhar está para o que acabei de
entregar.
— Abre. – sussurro, apertando os olhos com força e o lençol
embaixo de mim.
Ouço o barulho do embrulho de papel sendo desfeito e meu
coração para de bater como se estivesse apenas esperando pela
resposta que esta por vir. O barulho continua como se o tempo
corresse mais de vagar e sinto lágrimas se formando em meus
olhos, demonstrando o medo que sinto.
— Faz quanto tempo? – pergunto com a voz baixa, como se
alguém pudesse nos ouvir e solto a respiração, olhando para ele.
Em cada uma de suas mãos está um dos testes.
— Domingo.
— Isso explica porque você voltou tão estranha da sua suposta
caminhada. – diz, encarando os testes. – Três semanas. – mordo o
lábio inferior. – Por que você não me contou?

Pela primeira vez, Andrew olha para mim e vejo uma expressão
confusa em seu rosto e seus olhos brilharem um pouco marejados.

— Tive medo da sua reação. – confesso e desvio o olhar para


outro lado. – Tive medo de que você brigasse comigo e dissesse
que fiz de propósito. Mas, And, por favor, acredite em mim: eu não
queria. Filho para mim era só daqui há cinco ou seis anos, depois
que eu tivesse um cargo legal em qualquer que fosse meu trabalho
daqui cinco anos, depois que eu tivesse meu escritório próprio e
trabalhasse para mim mesma e tivesse meu apartamento ou uma
casa que fosse minha de verdade. – conforme falo, sinto minha voz
embargar. – Eu tive medo de você. Medo do que as pessoas vão
começar a dizer... Eu quis te contar desde o momento em que
descobri lá na farmácia e mais ainda quando fiz o segundo teste
aqui.

Faço uma pausa, tomando fôlego.


— Na verdade eu queria que você estivesse do meu lado,
porque eu me senti completamente sozinha.
— Eu disse que estaria do seu lado, droga. – diz. – Eu venho te
pedindo para me contar o que estava acontecendo desde domingo e
você não falava. Por que então?
— Porque eu não sabia como fazer isso. Porque eu estou me
sentindo a pior pessoa do mundo por ter considerado todo tipo de
coisas desde que descobri que estava grávida.
— Como o que?
— Como imaginar como vai ser ter essa criança quando ela
chegar e até mesmo em não te contar e tirar quando voltássemos
para o Brasil. – sussurro. Meu peito dói como se uma mão
apertasse meu coração.

Sim, eu considerei fazer isso por uma pequena fração de


segundos. Mas eu nunca faria, porque Andrew nunca foi e jamais
será qualquer pessoa na minha vida. Não foi atoa que aconteceu e
agora mais do que nunca eu seria capaz de algo assim.

— Eu me senti um monstro por ter considerado fazer isso com


meu próprio filho. – digo. – Só de lembrar...

And não faz mais pergunta alguma e menos ainda diz qualquer
outra coisa sobre isso. Seu silêncio é o que mais me machuca,
porque não tenho como saber como ele esta se sentindo com essa
notícia. Seu silêncio é apenas resultado da tortura emocional que
tenho enfrentado sozinha há dias e que terei que aguentar quando
for contar aos meus pais e mais ainda quando minha barriga
começar a crescer.

— Você pretendia me contar? – sua voz rouca chega até mim.


— A cada segundo dos meus dias. – respondo. – Eu não
conseguia olhar para você sabendo que estava te escondendo isso.
Não conseguia te beijar sem sentir culpa e só de pensar em
fazermos amor...
— Quando comentei com você no supermercado que gostaria de
ter gêmeos – ele me interrompe. –, aquilo não significou nada para
você?
— A principio pensei que você tivesse descoberto por conta
própria e estivesse tentando arrancar a verdade de mim de alguma
maneira. Quando me dei conta de que era apenas seu desejo mais
intimo, não isso, eu quis te contar naquele instante mesmo, mas
fazer isso em lugar público não era certo. Não quando você não
quer, pelo menos.
Sinto o colchão balançar e olho para o lado, vendo Andrew
levantar.
— Aonde você vai? – pergunto, ainda que não mereça sua
resposta.
— Preciso ficar um pouco sozinho. – é tudo o que diz antes de
sair, deixando-me sozinha.

Fecho os olhos para não vê-lo sair do quarto, mas isso não me
impede de ouvir quando a porta da frente abre e fecha bem mais
suave do que eu esperava, mostrando que agora estou realmente
sozinha nesse lugar tão estranho, bem mais do que eu estive
nesses últimos dias, porque, até agora, eu tinha Andrew.

Ainda que ele não soubesse o que estava acontecendo, eu o


tinha aqui comigo e disposto a me ouvir. Agora, depois de eu ter
escondido dele minha gravidez, não tenho nem ideia do que ele esta
sentindo. Ou o que vai acontecer quando voltar para cá. E talvez o
motivo de sua saída seja justamente por não ter contado quando
descobri. Do contrario ele poderia ter ficado aqui comigo. Mas não
agora.

Deito na cama, sentindo tudo dentro de mim se desmanchar.


Cada sentimento meu indo por água abaixo. Uma sensação
estranha, uma dor que não consigo descrever. E eu permito que as
lágrimas caiam por meu rosto, molhando o lençol da cama até que
não reste mais nada dentro de mim para ser sentido além de um
enorme vazio. Ou até que eu adormeça e não consiga mais sentir.
Capítulo Trinta e Um
Quarta-feira

Provavelmente muitas horas já se passaram desde que Andrew


saiu, deixando-me aqui sozinha.

Eu devo ter ficado no quarto que dividimos por coisa de uma


hora a mais, apenas sentindo por tudo isso. Sentindo por ter
acontecido desta forma e por não ter sido capaz de contar a Andrew
a verdade e poupado a nós dois tudo isso ao invés de ter feito
depois dele dizer que me amava. Eu senti o suficiente para que
fizesse minha cabeça começar a doer. Então eu enxuguei o rosto e
fui tomar um banho quente e tomei um remédio para dor de cabeça,
porque não estava mais aguentando. Depois disso eu vim aqui para
o outro quarto, para o caso do And voltar e não querer ficar comigo.
Afinal, sou apenas uma hospede em seu apartamento.

Ouço o barulho da chuva que bate contra a janela do quarto e


permaneço de olhos fechados para não ter a certeza de que estou
aqui sozinha ainda.

O cheiro do perfume de Andrew chega até mim, provavelmente


de quando ele esteve aqui horas atrás e me pergunto há quanto
tempo isso foi. Viro para o outro lado, abraçando o segundo
travesseiro e escondo meu rosto nele, porque sentir seu perfume é
o mesmo que ter ele aqui comigo. Algo que não é verdade.

— Eu sou um completo covarde. – ouço uma voz dizer baixinho,


como se estivesse bem longe de mim. – Eu não tinha o direito de
deixar você sozinha daquele jeito. – ele faz uma pausa e ouço um
suspiro.

Franzo o cenho ao ouvir as últimas palavras, abrindo o olho para


ver se tem alguma luz acessa no corredor que mostre que Andrew
tenha voltado. E, para minha surpresa, quando faço isso, percebo
que tem. Mas não é apenas a luz que vem do corredor. Também é
uma sombra sentada no chão de costas para mim e de cabeça
baixa. Ele esta apoiado contra a cama.

Ver Andrew aqui faz com que meu coração dispare contra o peito
no mesmo instante.

— Eu agi como um moleque irresponsável. – ele volta a falar. –


Um moleque irresponsável e infantil que não pode ter isso na vida.
Um filho... – mesmo de costas, percebo o sorriso em sua voz. Fecho
os olhos ao notar o movimento para virar para mim. – E estou sendo
ainda mais covarde por estar dizendo tudo isso para você enquanto
dorme. – sinto sua mão na minha, acariciando as costas de minha
mão. Há quanto tempo ele esta aqui? – Eu estou com muito medo,
Lu. – diz. – Ou pelo menos eu tive medo quando você me contou.
Ainda que eu tenha confessado para você aquele meu desejo, para
mim ele nunca se realizaria. Não os gêmeos. Mas ter um filho. Não
que eu não quisesse, mas que eu não seria capaz de ter alguém
que me desse essa alegria.

Ele para e por algum tempo apenas ouço a chuva agora mais
forte e sinto o espaço vazio do colchão afundar com seu peso e, não
conseguindo mais continuar assim, abro os olhos e tudo o que vejo
é sua imagem embaçada. Andrew me da um sorriso fraco, voltando
a falar:

— Eu fiquei feliz quando você me contou que teríamos um filho.


Como não ficar? – sua pergunta parece direcionada a si mesmo. –
Mas não consegui demonstrar isso para você, porque estava com
medo.
Novamente o silêncio se faz e And baixa o olhar para nossas
mãos unidas.

— Quando sai, eu precisava entender o que tudo isso significaria


para nós. Então sai sem rumo algum e apenas dirigi. – volta a falar.
– Eu dirigi por uma linha reta e parei em uma rua escura e deserta,
perguntando a mim mesmo: “Qual o problema de ter um filho agora?
Você tem tudo, Andrew. Tudo. Tem um trabalho que você ama, tem
o apartamento que sempre quis. Tem todos os carros que quiser e
agora tem uma namorada que te ama simplesmente pelo que você
é e não pelo seu dinheiro. E você a ama como nunca imaginou que
amaria alguém. Mas você é um covarde, porque deixou essa garota
sozinha no momento em que ela mais precisa de você. Quando
vocês deveriam sentar e conversar como dois adultos.” – ele faz
uma pausa e inspira fundo, soltando o ar de vagar. – Ter descoberto
agora que você era aquela garota da festa me fez pensar algumas
coisas, mas não chegou nem perto do quanto essa criança me fez
pensar.

Andrew abaixa para pegar algo no chão e coloca essa coisa em


minha barriga.

Com a luz fraca que entra no quarto, apenas consigo ver o


contorno de um ursinho lindo e fofo.

— Comprei esse ursinho quando percebi que estava na Times


Square, parado pouco antes da Toys R Us. – explica. – Eu me
lembrei de como te vi lá aquele dia e como pensei em Thomas
brincando por lá. – And aperta minha mão, levando-a até seu rosto.
– Eu não quero que você tire nosso filho, linda. Eu deveria ter dito
isso logo que sugeriu, mas não consegui. – sinto uma lágrima sua
escorrer até onde esta minha mão e passo o dedo por ela, secando
também uma segunda. – Eu quero criar essa criança com você.
Quero ser o pai que ela merece ter e dar a ela tudo o que estiver ao
meu alcance. Não me importa que não sejam gêmeos. – sorrio ao
ouvir suas palavras. – Eu não consigo imaginar outra pessoa com
quem eu gostaria de ter um filho além de com você, ainda que não
tenhamos planejado isso. Mas eu vou ama-lo. Eu prometo.
— Você não faz ideia da felicidade que sinto por ouvir isso de
você. – digo com a voz um pouco embargada por conta das
lágrimas que tenho segurado. – Saber que tenho você do meu lado
significa muito para mim.

— Eu só precisava de um tempo para entender o que tudo isso


significava. – diz, entregando o ursinho para mim e o abraço forte,
permitindo que as lágrimas corram por meu rosto. – Mas agora não
vou mais a lugar algum. – completa, puxando o edredom e deita do
meu lado da cama e me puxa para junto de si. O ursinho fica entre
nós dois como se fosse um bebê. – Agora sim posso dizer que
tenho um anjo na minha vida. – sussurra, tocando minha barriga e
me beija. Um beijo salgado e molhado.

— Agora durma, meu pequeno Anjo. – And sussurra para mim,


apoiando sua testa na minha. – Durma, porque amanhã bem cedo
vou ligar para um amigo meu que é médico para podermos fazer um
exame logo que voltarmos.

— O QUÊ?! – exclamo espantada. Ele ri.

— Acredito que você precise fazer todo esse negócio de


acompanhamento pelos nove meses para ter certeza de que a
criança esta bem. – diz com uma calma surpreendente. – E, eu não
sei você, mas eu gostaria de saber exatamente de quanto tempo
você esta. Porque, pelas minhas contas, nós podemos ter feito essa
criança em terras americanas e no seu aniversário.

Sinto meu rosto aquecer com seu comentário.

— A menos, é claro, que os dois testes na qual fiquei encarando


nas últimas horas tenha uma margem de erro para mais ou para
menos. – diz. – O que também poderia ser engraçado, porque
nesse caso teríamos rido da aeromoça sendo que ela estava certa
ao nos perguntar de quanto tempo você estava.

— And, meu lindo, por favor, você esta me assustando. – digo. –


Sei que preciso fazer tudo isso. Que tenho que fazer esse exame e
tudo o mais, mas eu ainda estou em fase de adaptação e não quero
pensar muito nisso agora, porque minha cabeça esta doendo. Tudo
bem se quiser agendar essa consulta com seu amigo, mas eu estou
assustada de verdade.

Ele ri, puxando-me para junto de si o máximo que consegue.

— Eu não acredito que tive tanto medo da sua reação. –


murmuro contra seu peito, mas ele não diz mais nada.
Capítulo Trinta e Dois
Quinta-feira

Hoje tem exatamente uma semana desde a última vez que eu


estive aqui na Nex Ae. Uma semana desde minha quase briga com
Sarah e o término do meu treinamento, porque no dia seguinte,
quando And veio para uma reunião, ela comunicou que não iria mais
trabalhar comigo, porque eu era muito irresponsável e não sabia
aproveitar o que tinha em mãos. Mas até o final daquele dia ela
também ligou para se desculpar comigo pelas últimas semanas,
mais especificamente os últimos dias e disse apenas que eu não
precisava mais do treinamento, porque já tinha tudo para conseguir
passar pela banca.

Para ser sincera, ainda acho que isso teve coisa do Andrew e
mais alguém, porque foi muito repentino.

Mas hoje, hoje, eu encerro de vez essa etapa, concluindo com


minha apresentação. Só que se alguém chegar até mim e me
perguntar se estou nervosa, apenas direi que não. Sendo sincera,
não estou mesmo. Quer dizer, o que é uma simples ansiedade perto
de apresentar um trabalho sem nexo e infantil para engenheiros e
diretores da BMW? Isso é algo que até me faz rir só de imaginar o
mico que vou pagar lá com eles.

Sarah me ligou ontem para finalmente dizer que era com eles
que eu iria trabalhar hoje, mas que eu deveria manter o foco no que
havíamos trabalhado. Ela disse isso como se fosse piada até. Ao
menos foi o que pareceu para mim naquela hora.
Fora And, das pessoas que eu conheço e sei que estará lá,
apenas Sarah.

Reparo nas centenas de pessoas que passam apressadas para


lá e para cá, provavelmente indo até seus setores para trabalhar.
Mas tem um grupo de senhores que passam todos de terno e
gravata que são ainda mais estranhos. Um deles trazia uma pasta e
há uma possibilidade de que seja o grupo da BMW, porque todos
me cumprimentaram e vi um deles dizer algo no ouvido do colega.

No almoço de hoje, Andrew disse que uma boa refeição iria me


ajudar a manter a calma e preparou para nós um prato especial que
Lílian preparava para ele quando precisava. Esse prato era
composto basicamente por coisas leves e muita verdura, legumes,
suco natural, para hidratar e sem sobremesa, porque isso poderia
mexer comigo. Na verdade eu não entendi direito o que ele quis
dizer com aquilo, mas achei melhor não perguntar.

Para ser sincera, eu teria trocado tudo o que ele preparou por
uma enorme barra de chocolate. Ninguém aqui tem ideia do quanto
estou precisando de uma. Mas And e eu fizemos um acordo e ele
me prometeu chocolate depois da apresentação. O que foi bem
injusto, mas acabei aceitando sua chantagem.

Por falar em Andrew, passamos o dia de ontem quase todo


conversando sobre minha gravidez e sobre nós. Como vamos fazer
daqui para frente e tudo. Ele realmente quer que eu vá ao médico
logo que voltarmos para casa para saber como o bebê esta e de
quanto tempo estou. Essas coisas que eu obviamente já faria de
qualquer forma. Mas, saber que ele esta do meu lado, que está
disposto a ir comigo para São Paulo para contarmos juntos aos
meus pais sobre isso... Isso me deixa consideravelmente mais
tranquila.

E tem Julie também, que ainda não encontrei uma maneira


simples de dar a notícia e sei que vai virar uma fera quando eu
contar. Tanto pela demora a dizer como também por eu ter deixado
que isso acontecesse. Mais um dos motivos pela qual estou
empurrando isso por alguns dias.

— Srta. Brudosck. – ouço a voz da recepcionista, que há


algumas semanas que descobri que se chama Sandy, me chama. –
Estão todos prontos apenas à sua espera. – ela informa.
— Já posso subir?
— Sim. Quarto andar, sala de auditório.
Inspiro fundo e viro para pegar minha mochila com o laptop no
sofá, levantando.
— Obrigada, Sandy. – dou um sorriso nervoso para ela,
seguindo até o elevador. – Certo, Lu. Mantenha a calma que vai dar
tudo certo. – murmuro para mim mesma, enquanto aperto o botão
para o quarto andar. – Você consegue fazer isso, gatona!
Sorrio para o meu reflexo no espelho, sentindo-me de repente
bem confiante.

Para essa ocasião tão especial, vesti um conjunto social preto e


um terninho de mesma cor, na qual estou usando pela primeira vez
e até que gostei. And também, na verdade. Coloquei também um
conjunto de lingerie novo apenas para me dar uma sensação de
mais poder e And aprovou até mais do que todo o restante. E para
finalizar, meu cabelo está todo solto e optei por um salto alto para
mostrar que nada aqui vai me intimidar hoje.

A porta do elevador abre e eu saio, seguindo até a porta aberta


no final do corredor, na qual uma plaquinha cromada indica
Auditório.

— Senhorita! – um senhor exclama logo que me vê chegar à


porta. – Eu estava justamente a sua procura.
— John. Boa tarde. – eu o cumprimento, reconhecendo-o de
nossa reunião logo após anunciarem meu treinamento.
— Está com todo o material pronto? – pergunta, ignorando toda
a formalidade.
— Sim, claro. – respondo já abrindo a mochila para tirar o
notebook e o coloco sob a mesa no centro do palco. John o conecta
ao projeto e já deixo meu trabalho pronto para apenas dar inicio.
— Fique com isto. – diz e me entrega um pequeno controle. – É
para mudar os slides.
Franzo o cenho
— Obrigada. – É claro que é para mudar os slides. Para que
mais seria?
— A senhorita pode sentar-se ali naquela cadeira. Só estamos
aguardando para que o Sr. Giardoni e a Sra. Stohl cheguem.
— Tudo bem. Obrigada. – sorrio para ele, que logo vai tomar seu
lugar ao lado de James, que também reconheço de sua visita a BIT.
Ele sorri para mim em um cumprimento.
Tomando meu lugar, faço uma rápida observação, notando dez
lugares reservados. Oito deles já ocupados, sobrando apenas o
como A. Giardoni e outro como M. Stohl. Ao lado esquerdo de
Andrew, estão sentados dois engenheiros e dois diretores da BMW.
Não demoro muito o olhar neles, que é para evitar que meu almoço
volte.

Do lado direito da M. Stohl estão: John, James, Sarah e o senhor


que, se não me falha a memória, é diretor de produção.

— Desculpe-nos o atraso. – reconheço o sotaque rouco de


Andrew e olho para o lado da porta. Ele está acompanhado de uma
mulher bastante elegante e que provavelmente esta na casa dos
trinta anos. Ela ocupa o lugar reservado para M. Stohl, Presidente e
tudo o que consigo fazer é me perguntar o que aquele M significa.
— A senhorita pode começar. – John diz e levanto-me, indo
tomar meu lugar ao centro. Certo, Lu. Vai dar tudo certo.
Olho para onde Andrew esta e ele me da um pequeno e
disfarçado sorriso, mas que é mais do que suficiente para me deixar
mais confiante.

— Boa tarde. – começo a dizer com meu inglês agora bem mais
praticado. – Quero finalmente compartilhar com todos aqui, meu
projeto final para este treinamento que tive o prazer de participar e
aprender bem mais do que antes. – minha voz sai calma e forte, de
uma maneira até que surpreendente, porque geralmente eu falo
com a voz baixa e calma apenas. – Eu não tenho um nome oficial
para ele ainda, mas isto será o de menos por hora. – faço uma
pausa para mudar o primeiro slide, onde um carro com teto solar
aparece. – A ideia inicial era apenas fazer algo diferente de todos os
outros, mas, conforme eu trabalhava nisso, descobri que temos
vários meios de combustíveis que ainda precisamos trabalhar. E foi
ai que eu pensei em um tipo de combustível eficiente e sustentável
que pudesse usar algo que está presente no nosso dia a dia.

Meu projeto diz respeito basicamente a um aplicativo que é


instalado no teto solar e no painel interno de um carro equipado
para captar energia solar, com a intenção de transforma-la em um
tipo de combustível.

O “teto” funcionaria como a placa solar que geralmente se instala


nas casas para capturar o sol e gerar a energia. No motor teríamos
todo o trabalho realizado por um engenheiro, onde ele utilizaria e
armazenaria a energia durante todo o dia para que pudesse fazer
com que o carro se locomovesse.

Então você me pergunta: “Mas e durante a noite? Como que ele


vai andar, sendo que não tem sol?”. Bem, é ai que entra o tanque de
armazenamento.

Enquanto explico tudo isso para todos da maneira com que


treinei várias e várias vezes nesta última semana, eu olho para cada
uma das dez pessoas que estão na minha frente, dando um pouco
mais de atenção aos engenheiros da BMW, que parecem estar
animados com a ideia. E conforme eu falo, percebo que minha
animação com isso também é maior do que era nas vezes que eu
ensaiei. Minha voz parece mais confiante até.

Mudo para o último slide, voltando minha atenção para onde


Andrew está sentado com as pernas cruzadas e não consigo deixar
de retribuir o sorriso que ele me dá. E não é um discreto.

Encerro esse último slide com uma pequena animação de um


carro andando por uma estrada deserta.
— A senhorita teria um modelo deste trabalho para nos mostrar?
– um dos engenheiros pede logo que termino.
— Claro. Só um momento, por favor.
Vou até o laptop e maximizo o segundo arquivo já havia deixado
em aberto.
— Ele não é o melhor nos desenhos, mas passa exatamente a
ideia que o produto oferece. – explico como se me desculpasse por
ser péssima com desenhos e já dou o play no vídeo, que mostra
todos os pontos de funcionamento.

O vídeo todo não chegar à dura nem mesmo quatro minutos,


mas acredito que é o suficiente para mostrar o que tentei explicar
desde o início.

— Tudo isto é projetado através de um aplicativo, na qual


chamarei por hora de “Arquivo X”, que é colocado nessa placa solar
no teto. Ele liga direto no motor e o painel interno do veículo. –
explico.

As perguntas começam e isso me deixa um pouco nervosa. Mas


treinei isso também. Ainda que a maioria delas sejam todas novas e
eu precise pensar por alguns instantes antes de falar coisa errada.

Um dos diretores ergue a mão, pedindo a palavra.

— Qual a garantia que a senhorita pode nos dar de que este...


Como é mesmo o nome que a senhorita usou? – ele passa a mão
pela barba como se procurasse a palavra.
— Combustível eficiente. – um dos engenheiros o ajuda.
— Sim. Combustível eficiente. – diz. – Qual é a garantia de que o
produto realmente vá cair no mercado automobilístico?

Para minha sorte, Andrew fez esta mesma pergunta para mim
ontem enquanto treinávamos. Então que eu sei exatamente qual a
resposta que devo dar.

— Eu não posso dar uma garantia em cem por cento. – começo.


– Mas, considerando a eficiente e praticidade de se ter um veículo
que seja movido a energia solar, quem não gostaria de poder
apenas viajar por ai com um carro sem ter que se preocupar em
acabar o combustível? – sorrio para ele.

— E se o dia for chuvoso? – outro homem pergunta.


— Dai é onde entra o tanque de armazenamento. – respondo de
primeira. – Digamos que o senhor tenha esse carro e que por uma
semana inteira o senhor não saiu com ele, mas foi uma semana que
tenha feito muito calor na sua cidade e o seu carro esteve lá,
tomando todo esse calor. Ele armazenou essa energia, ou
combustível, dentro do seu tanque. Com a capacidade desse tanque
sendo X, poderá andar vários quilômetros ainda que não tenha sol.

— Eu certamente iria querer um carro desses para mim. – outro


diretor diz. – Do jeito que minha esposa sai com o meu, isso seria
muito bom. Principalmente porque não precisaria me preocupar em
ter que abastecer o tanque para ela. – ele ri.

A Sr. Stohl levanta e vem até onde estou.

— Isto da fim ao trabalho da nossa colega aqui. – ela diz para o


diretor que fez a piada com a esposa. – Agora devo pedir para que
os senhores se reúnam e cheguem a um acordo a respeito do que a
Srta. Brudosck ofereceu. – ela então vira para mim e sinto como se
um calafrio percorresse por todo meu corpo. – Tem uma cozinha no
final do corredor. – começa. – Peço para que a senhorita aguarde
até lá enquanto eles chegam a um acordo e assim que terminarem
pedirei para que alguém vá chama-la.

— Tudo bem. – sorrio para ela, já descendo do palco.

Olho rapidamente para onde And está sentado, na esperança de


que nossos olhares se cruzem e eu consiga descobrir algum sinal
dele. E esse sinal vem em forma de um sorriso e uma piscada. Isso
tem que ser algo bom.
Já tem uns bons trinta minutos que fui chutada aqui para a
cozinha. Embora eu esteja mais calma desde que vim para cá,
ainda não chego estar nos cem por cento. Ao contrário, já que está
espera me mata a cada instante. Tanto é que já comi uns três
pedaços de bolo de chocolate e mais um de laranja e tomei três
copos de suco de laranja. O que jaja vai me fazer precisar ir ao
banheiro. Que Andrew não fique sabendo disso, porque apenas a
imagem dele brigando comigo por isso já me faz rir.

— Srta. Brudosck. – alguém me chama. – A senhorita já pode


voltar.

Levanto da cadeira e sigo a moça pelo corredor direção a sala


do auditório, mas ela não entra comigo. Todos já estão em seus
devidos lugares, com exceção da Sra. Stohl, que aguarda no palco.

— Queira ocupar seu lugar, por favor. – ela diz e vou sentar-me
na mesma cadeira de antes. – Bem, Luara. – diz agora para mim. –
Todos aqui conversaram e chegaram a um acordo.

— Estou pronta para o que for necessário. – digo, ainda que


meus órgãos internos não entendam nada disso muito bem.
Um dos diretores da BMW se levanta e vem até o palco. Consigo
ler na cadeira dele o nome Douglas Lewis.
— Srta. Brudosck – começa. –, não sou um homem de
enrolação, então irei direto ao ponto. – Por favor! – Meus
engenheiros adoraram sua ideia e estão loucos para poder trabalhar
em cima dele a fim de melhora-lo ainda mais. – diz. – Foi uma ideia
ótima essa que a senhorita nos apresentou e que, se trabalhada
com uma boa equipe, tem de tudo para ser um sucesso. – ele vira
para os outros homens ainda sentados e diz: – Ainda que eu ache
que algumas empresas petrolíferas não vão gostar muito dela. –
eles riem.

Como que se soubesse o efeito que isso tem em mim, Douglas


faz uma pausa bem mais longa do que eu gostaria. É claro que tem
um “mas”. Sempre tem um “mas” nas coisas.
— A grande maioria aqui presente também foi a favor e lhe
deram excelentes notas, ainda que não todos. – ele olha para os
outros mais uma vez e ri. – Devo pedir para que a senhorita deixe
seu contato com a secretária da Sra. Stohl para que possamos ligar
para a senhorita assim que fecharmos o contrato com nossa equipe
para que possamos começar a trabalhar no seu projeto.

— Uau. – digo um pouco confusa, sem saber direito se estou


ouvindo direito ou não. Quer dizer, isto é mesmo real ou estou
apenas sonhando e nem mesmo sai da cama? Procuro por And no
meio dos outros e ele sorri para mim, fazendo com que meu coração
de um salto contra o peito. – Vou deixar sim. Obrigada. – sorrio para
Douglas, apertando sua mão.

— Senhores – a Sra. Stohl diz, tomando a frente. –, como


havíamos conversado antes, houve algumas mudanças e nossa
pequena celebração foi remarcada para esta noite, na minha casa,
às oito horas. – ela faz uma rápida pausa e sorri. – Espero que isso
não atrapalhe os planos de nenhum de vocês, porque estou
realmente ansiosa por este momento e gostaria que todos
comparecessem.
— Ora, Morgan. Estar em sua companhia é sempre uma honra.
– Douglas diz. Então este é o nome dela.
— Sandy irá entregar a cada um de vocês o convite com o
endereço. – ela o ignora totalmente. Gostei dela. – Mas, se me
permitem, agora tenho uma reunião de equipe. – e, voltando-se para
Sarah, John e James, ela pede para que a acompanhe. – Srta.
Brudosck, parabéns.
— Obrigada.

Andrew está conversando com alguns engenheiros, mas não tira


os olhos de mim. Também estou conversando com um dos homens
da BMW, mas não consigo focar em mais nada, porque a alegria
que sinto é algo sem limites.

— Parabéns, linda. – ele diz logo que consegue escapar e me da


um abraço tão forte, que tudo o que consigo fazer é corresponder
com toda vontade, apertando-o de volta. – Minha garota é a primeira
programadora a conseguir vender um produto para alguém dentro
desse treinamento. – And diz com certo tom de orgulho na voz. –
Isso é para mostrar a todos que uma mulher quando quer, faz bem
feito e não tem homem que passe a perna nela.

Sorrio um pouco sem graça e ele me aperta ainda mais em seus


braços, dando um beijo no canto da minha boca, que faz meu
coração saltar outra vez.

Afasto dele somente o suficiente para ver seus olhos e percebo


que ninguém estava atento a nós e que por isso que me beijou aqui
assim.

— Está tudo tão perfeito que tenho medo de acordar e descobrir


que ainda estou em São Paulo. – sussurro, aproximando meu rosto
do seu outra vez.
— Você não esta. – responde com um sorriso lindo. Aquele
mesmo que fez com que eu me apaixonasse por ele desde a
primeira vez que conversamos. – E eu estou tão orgulhoso de você.
***
Assim que entramos no apartamento, tudo o que consigo fazer é
pensar no quê devo usar para esta noite e que penteado devo fazer.
Sei que tive tempo para decidir isso, mas não quero repetir o
mesmo vestido que usei no jantar do meu aniversário e para
penteado realmente não sei. Precisava ser algo mais digno para
uma ocasião como essa. Não que aquele vestido não seja lindo.
Mas And já me viu com ele esse mês...

— Como você vai? – pergunto a Andrew, colocando minha


mochila em cima do sofá.
— Onde? – ele pergunta de volta.
— No jantar na casa de Morgan? – pergunto outra vez, notando
a expressão pensativa no rosto dele.
— Formal, mas não tanto. – diz. – Eu não sei ainda.
— Para vocês homens é sempre tão simples. – solto um suspiro
cansado. – O primeiro terno que encontrar já está ótimo.
Ele ri e sinto sua mão tocar a minha, fazendo com que eu vire
para ele.
— Neste momento eu não estou pensando em roupa alguma. –
diz, passando as costas de sua mão por meu rosto e fecho os olhos.
– Estou apenas pensando em te levar para o quarto e fazer amor
com você o restante da tarde, por toda a noite a fora e amanhã o dia
todo.

— Então por que não faz isso? – pergunto em um sussurro


rouco, sentindo minha respiração acelerar com sua proximidade.
Sinto falta dele, ainda que a última vez que estivemos juntos tenha
sido ontem a tarde, por um pequeno intervalo.

Ao invés de me responder, Andrew continua passando a mão por


minha bochecha, passando o dedo por meus lábios e continuo de
olhos fechados para poder apenas sentir o efeito que seu toque, por
mais inofensivo, causa em mim.

E eu sinto seus lábios junto aos meus em um beijo lento e eu o


beijo de volta, envolvendo meus braços ao redor de seu pescoço,
puxando-o para mim, sentindo o Pequeno And roçar em minha
barriga.

— Eu tenho uma proposta para te fazer. – ele murmura contra


minha boca.
— E eu tenho uma contraproposta. – murmuro de volta, fazendo-
o sorrir.
— Você primeiro. – ele diz.
— É uma contra proposta, Andrew. – sorrio, afastando-me dele.
— Tá. Ok. – ele sorri de volta. – Pedi para um amigo meu, que é
cabeleireiro, viesse até aqui para cuidar de você. Para te ajudar,
antes que brigue comigo.
Franzo o cenho e desço a mão por seu peito, prendendo sua
camisa.
— Eu não ia brigar com você.
— Precaução, linda. – diz. – Nunca se sabe. – fecho a cara para
ele, que me ignora. – Quanto a sua roupa, por favor, deixe comigo.
— And, eu não posso aceitar isso.
— Apenas deixe eu te dar um presente. – pede. – Você deu duro
para conseguir isso hoje.
Fecho a cara para ele outra vez, mas acabo aceitando.
— Qual sua contraproposta? – ele pergunta e acabo sorrindo
mesmo que involuntariamente.

— A que horas seu amigo chega? – pergunto de volta e ele


consulta o relógio em seu pulso.
— Dentro de vinte minutos. – responde. – Por quê?
— Porque minha contraproposta é te levar para a cama. – digo já
o ajudando a tirar sua camisa e ele senta no sofá.
— Ou podemos ficar por aqui mesmo. – diz em resposta,
puxando-me para sentar em seu colo.
Ouço o toque de uma campainha muito, muito longe e a ignoro,
porque provavelmente é em algum apartamento vizinho. Mas então
começo a ouvir ela mais perto... E perto...
— And. – chamo, jogando meu braço por seu peito nu e subo a
perna por sua virilha de maneira que eu possa sentir o Pequeno And
repousando em sua coxa. – And... – chamo outra vez e ele tira meu
braço de seu peito para poder levantar.
— Já vai! – ele grita para a porta, procurando por sua cueca. –
Acho melhor você vestir isso. – diz, jogando para mim sua camisa e
eu a visto. – Bem na hora, Tom.
— Ela esta ai? – ouço uma voz desconhecida do outro lado e
And permite sua entrada. Mas que merda! Eu não estou vestida
ainda, Andrew! – Oi, querida. – Tom meu cumprimenta e junto às
duas partes da camisa, tentando não deixar nenhuma parte minha a
mostra. Não que só isso possa cobrir minhas pernas.
— Oi. – murmuro um pouco envergonhada.
— Vou precisar que você nos deixe sozinho, Andrew. – Tom diz.
– E que demore pelo menos umas duas horas para voltar, para que
eu possa trabalhar nesta garota para deixa-la com menos cara de
quem acabou de fazer sexo apaixonado com o namorado no chão.

Arregalo os olhos, sentindo meu corpo aquecer mil graus.

— And. – chamo, mas ele apenas sorri para mim, indo pegar sua
calça para poder vestir.
— Só vou pegar uma camisa e já saio. – informa, já indo para o
quarto.
— Qual seu nome? – Tom pergunta para mim.
— Luara.
— Nome diferente. – diz. – E bonito. Sou Thomas, mas todos me
chamam de Tom. – ele me da dois beijinhos em cada uma de
minhas bochechas e isso faz com que eu me sinta um pouco mais
confortável com sua presença. Mas não tanto, uma vez que estou
seminua na frente de alguém que nunca vi na vida. – Deixe-me ver
o que podemos fazer aqui.
Tom puxa uma cadeira para que eu possa me sentar e começa a
mexer em meu cabelo, erguendo uma mexa aqui e outra ali, indo de
um lado a outro.
— Minha primeira sugestão seria pintarmos com outra cor. –
começa a dizer, mas para no momento que Andrew reaparece agora
devidamente vestido.
— Duas horas, Tom? – pergunta e este confirma. – Até depois,
linda. – ele diz para mim, pousando um rápido beijo em meus lábios,
seguindo para a porta e me deixa sozinha com Tom outra vez.
— Voltando. – Tom diz. – Estou sabendo que você esta proibida
de usar química no cabelo por alguns meses, então já descantei
essa possibilidade e tenho algo ainda melhor. – franzo o cenho ao
ouvir seu comentário. – Sim, ele me contou e eu fiquei muito feliz
por saber da notícia. Vai ser uma criança linda, porque vocês dois
são muito lindos. Parabéns.
— Obrigada. – sussurro, sentindo meu rosto corar outra vez.
— Acho que não preciso dizer que você deve ser muito boa.
Porque para ter conquistado aquele homem não deve ter sido nada
fácil. – ele para de frente para mim. – Já sei o que iremos fazer com
você.
— E o que faremos? – pergunto.

— Não, não, não! – exclama. – Você não precisa saber de nada


até que esteja pronto. – ele sorri. – Não vou perguntar se já tomou
banho, porque já vi que cheguei em uma péssima hora. – ri. – Então
vá tomar um banho e não demore. Mas antes... – ele vira para pegar
alguns produtos em sua maleta e me entrega. – Lave seu cabelo
com isto.
Pego os produtos e vou, sentindo-me bem mais aliviada agora
que poderei vestir uma roupa de verdade.
— E NÃO DEMORE! - ele grita lá da sala e fecho a porta do
banheiro.
Quando volto do banho, vejo que Tom já esta com tudo pronto
para começar a trabalhar. Uma maleta de maquiagem, secador,
tesoura. Tudo o que precisa.

Franzo o cenho, sem saber o que vai acontecer comigo. Mas


como já sei que não adianta nem perguntar que não vou saber, eu
apenas me sento outra vez na cadeira.

— Não importa o que você vai fazer – começo a dizer. –, apenas


não me deixe com o cabelo curto. – ele ri.
— Fique tranquila. – diz. – Apenas farei com que seu homem se
apaixone ainda mais por você.

Enquanto Tom cortava meu cabelo, descobri que ele e And são
amigos já há anos. Ele é brasileiro (o que explica muita coisa.
Como, por exemplo, ele falar português) e vive em Nova Iorque
desde os vinte e quatro anos, tendo passado dois anos em Londres,
fazendo um curso com um cabeleireiro renomado lá. Hoje, com
trinta anos, ele é casado com um rapaz que também é cabeleireiro e
juntos são sócios de um dos melhores salões de Manhattan e estão
tentando adotar uma criança, porque são loucos para ter um filho.

Na verdade eles estão tentando adotar um casal. A menina tem


cinco anos e chama Mary Elizabeth e o menino tem quatro anos e
chama Henry. E eu achei o máximo isso.

— Está pronta! – ele diz com uma expressão maravilhada no


rosto. – Começo a entender o que meu amigo viu em você. – sorri. –
Você não é uma mulher como as outras.
Sorrio um pouco sem graça, mas ainda mais curiosa.
— Posso ver agora? – peço, desconversando o assunto.
Tom pega um espelho que carrega em sua maleta e o trás até
mim. Eu encaro meu reflexo por algum tempo. Essa não sou eu.

As simples ondas de meus cabelos estão com um pouco mais de


volume e bem solto nas pontas. Em cima ele usou uma mecha para
prender meu cabelo da mesma maneira que eu costumo fazer,
colocando uma única presilha em formato de flor do lado esquerdo.
A maquiagem está bem levinha e quase imperceptível.

— Eu vou colocar você na minha mala e te levar embora comigo.


– sussurro realmente admirada. – Está lindo!
— Vou considerar isso como um elogio. – ele sorri. – Agora,
preciso que aguarde no seu quarto, porque tenho mais um trabalho
a fazer, mas não com você.
No momento que ele diz isto, a campainha toca.
— Anda, anda! Já para dentro!
Entro e fecho a porta do quarto, mas ainda posso ouvir a voz de
Andrew do outro lado. Sento-me na cama e fico apenas olhando
para o teto, tentada a me deitar para descansar um pouco.
— Seu último toque. – Tom diz, abrindo a porta somente um
pouco e coloca um pacote em cima da cama.

Abro o zíper do pacote e encontro dentro dele um vestido longo


de cor champanhe, com algumas pedras no busto.
— É lindo. – digo baixinho e me levanto para poder me trocar.
O vestido tem um caimento tão perfeito em meu corpo, que sinto
como se eu tivesse ido pessoalmente tirar as medidas e não que
Andrew tivesse escolhido. No quadril, cintura e busto. Tudo.
Coloco um salto alto com uma cor mais neutra para combinar.
— Está pronta? – ouço a voz suave de Andrew do outro lado da
porta e caminho até lá. Quando ergo a mão até a maçaneta, ele me
impede, dizendo: – Não abre.
— O que foi? – pergunto com o cenho franzido.
— Pronto. – diz, dando três leves batidinhas na porta,
arrancando de mim um sorriso lindo, na qual ele retribui assim que
abro a porta.
And está usando um terno preto com uma gravata champanhe,
que combina com meu vestido. Ele também fez a barba e cortou o
cabelo, que de alguma maneira surpreendente, Tom conseguiu
deixa-lo penteado para trás.
— Você esta ainda mais linda do que costuma ser. – sussurra,
tirando de trás de suas costas um boque de rosas vermelhas.
— São lindas. – digo, aceitando-as e ele sorri e aproxima seu
rosto do meu.
— São para comemorar uma ocasião mais do que especial. –
sussurra, beijando meu rosto e sinto seu perfume suave. – O colar
ficou lindo, como sempre. Mas nada se compara ao brilho que vejo
em seus olhos essa noite.
— Diz isso porque não é capaz de ver o que eu vejo nos seus
todas as vezes que olho para você. – digo, segurando seu rosto
com a mão e o viro para poder beija-lo.
— É melhor nós irmos ou essa conversa vai nos levar a
antecipar o final da noite. – diz, dando licença para que passe na
frente e vou até a cozinha para pegar uma jarra para colocar as
rosas e podermos sair.

Gastamos quase duas horas para chegar ao endereço da


mansão Stohl. É uma casa bem grande e cheia de luzes. Bem
aquela coisa que você vê nos filmes e tenho a leve sensação de que
ela já esta se preparando para o natal.

— Quais nomes? – o segurança pergunta logo que paramos no


portão de entrada.
— Andrew Giardoni e Luara Brudosck. – And informa de
imediato.
— Estão aqui. – ele diz já abrindo o portão para nos deixar
entrar. – É só seguir em frente.
— Obrigado.
— É a primeira vez que sou convidada para uma festa dessas. –
digo, olhando admirada ao longo do jardim que passa do lado da
minha janela.
— Será a primeira de muitas. – And sorri e pousa a mão em
minha perna. – Terão vários jornalistas e fotógrafos por toda parte
essa noite. – começa. – Eles farão perguntas sobre sua
apresentação, sobre como conseguiu a viagem. Coisas desse tipo.
Mas fique tranquila, porque tenho certeza de que vai tirar de letra.
— Não são as perguntas sobre isso que estão me assustando. –
comento e ele estaciona o carro, virando para mim.
— Luara, você esta pronta para assumir publicamente nosso
relacionamento? – pergunta com um sorriso malicioso e aperto sua
mão na minha, sentindo todos meus órgãos internos se revirar.
— Eu não diria exatamente que estou pronta. – respondo
baixinho e ele ri para mim.
— Bem, pois posso dizer que estou ansioso por isso.
— Eu estou nervosa, lindo. Muito. – digo.
— Por sorte eu trouxe seu remédio para enjoo então.
Sua resposta é mais do que suficiente para me fazer rir.
— Espere aqui. – Andrew pede e sai do carro, contornando o
veículo para poder abrir a porta para mim. – Senhorita. – diz,
estendendo a mão e a seguro, passando meu braço pelo seu para
que possamos entrar.

Se a fachada da casa de Morgan já era linda, dentro é ainda


mais lindo. Ela tem vários quadros e objetos realmente valiosos, que
eu só vi em museus históricos ou algo assim.

— Andrew. Luara. Que bom vê-los novamente! – Morgan


exclama assim que nos vê. – E juntos pelo que estou vendo. – diz
com um sorriso divertido, endireitando a gravata de And, que já
estava arrumada. – Foi combinado? – pergunta para ele, olhando
para o meu vestido.
— Mais ou menos. – responde. – Estamos atrasados?
— Não, senhor. Douglas ainda não chegou. Venham.
Ela então se vira, levando-nos até uma sala realmente espaçosa.
— Está gostando de Nova Iorque? – pergunta para mim.
— Estou perdidamente apaixonada. – respondo, admirada com
tamanha beleza.
— Pela cidade ou pelo bonitão ai? – pergunta outra vez e sinto
meu rosto corar no mesmo instante. Andrew ri ao meu lado e aperto
seu braço. – Ora! Não precisa ficar assim. – diz. – Ele é lindo. Você
é linda. Ambos solteiros. Você é solteira, certo? – dou de ombros e
ela ri. – Viajam juntos para longe e completamente sozinhos. Os
dias passam, a química chega. O clima do outono aumentando.
Passeio no Central Park. Piquenique na beira do lago. O romance e
a chama da paixão acendendo dentro dos dois e voici la passion!
Franzo o cenho, completamente perdida com o que ela disse.
— Aqui está a paixão. – And sussurra em meu ouvido. – Morgan
é como um imã para detectar as coisas. – explica. – Sim nós
estamos nos conhecendo melhor.
— Começou aqui mesmo ou foi antes? – ela pergunta para mim.
— Foi sim. – minto, ainda que minha vontade foi dizer que
começou quando ele invadiu a festa da minha turma há sete anos.
Mas dizer isso seria loucura. – Eu não gostava muito dele antes. –
Andrew olha para mim e sorrio. – Ele parecia muito superior dentro
da BIT.
— Já eu não posso dizer o mesmo. – ele começa a dizer. – Eu
tinha muitos fetiches sexuais com ela durante nossas reuniões. Era
proibido e ela não me deixava nem mesmo chegar perto, então eu
gostava do perigo que era me aproximar para sentir aquelas faíscas
que saiam quando nos encostávamos.
Os dois riem enquanto meu sinto meu rosto entrar em ebulição.
— Mas deixemos este assunto de lado por hora. Onde está
Edward?
— Viajando a trabalho. – Morgan responde. – Irei para Londres
me encontrar com ele amanhã e passaremos o final de semana por
lá.
— Morgan é casada com o Vice-presidente da Nex Ae. – Andrew
explica para mim. – Ambos assumiram os lugares dos pais.
— Nos odiávamos durante a infância. – ela acrescenta. – Mas,
assim como vocês, uma viagem mudou nossa vida e já estamos
juntos há dez anos. – diz com um sorriso. – Se me dão licença,
preciso ir recepcionar mais algumas pessoas.
— Toda. – And diz.
— Fetiches sexuais? – pergunto logo que ficamos sozinhos.

— Sou doido para te colocar em cima da minha mesa. – ele diz


em meu ouvido. – Rasgar sua calcinha e te foder lá em cima. – sinto
sua respiração começar a ficar mais acelerada. – Quando você
começou a esfregar meu pau dentro do elevador, tudo o que eu
mais quis foi te prender contra aquela parede e te comer ali mesmo.
E ainda vou fazer isso, porque sei que você também é louca pelo
perigo.
— Isso de repente me parece uma ideia realmente tentadora. –
murmuro, sentindo minha voz mais rouca e minhas pernas ficarem
moles.
— Eu sabia que você não me deixaria sozinho assim. – ele ri e
pisca para mim.
— Com licença. Posso tirar uma foto de vocês? – um rapaz
pergunta para nós. Ele tem uma câmera em suas mãos.
— Claro. Aqui está bom? – And pergunta.
— Está ótimo.
Andrew passa o braço por meu quadril, puxando-me para mais
perto e tudo o que consigo fazer é sorrir, porque sei que essa foto
vai acabar parando na capa de alguma revista de fofocas. Ou essa
ou alguma outra que vão tirar de nós esta noite.

Durante a maior parte da noite, tudo o que tive que fazer foi
responder todo tipo de pergunta de várias pessoas. Inclusive de
Douglas, que achou engraçado quando contei que tive a ideia para
meu projeto enquanto participava de uma conversa sobre energia
com alguns amigos. Mas, em sua maioria, as perguntas eram
normais. Sobre os lugares que conheci e quais lugares Andrew não
havia me levado, se estou preparada para voltar ao Brasil ou algo
nesse sentido. Embora um deles tenha perguntado se eu era
solteira, o que arrancou um olhar um pouco irritado de And.

— Estou até agora maravilhado com sua apresentação. –


Douglas diz e toma um pouco de seu champanhe. – Eu estava
esperando por algo mais... Comum.
— Ela não teria conseguido sem minha ajuda. – Sarah se mete
na conversa, aparecendo sabe-se lá de onde. – Boa noite, queridos.
– cumprimenta Douglas e James.
— Não vou negar que você deu algumas dicas até que boas. –
falo. – Mas tudo o que fiz nele, cada esboço, desenvolvimento e
elaboração, tudo, foi trabalho unicamente seu, querida. – Sarah me
lança um olhar desafiador e apenas sorrio, tomando um pouco do
meu suco.
— Garotas, garotas. Não vamos brigar. Certo? – Douglas diz,
dando tapinhas nas costas de Sarah, que parece deixa-la ainda
mais irritada. – Foi um trabalho de equipe. Vocês foram ótimas. Mas,
devo dizer que você foi surpreendente, Luara.
— Obrigada, Douglas. – sorrio para ele, sentindo como se
tivesse acabado de ganhar um grande prêmio.
— Como vai seu amigo Charlie, Luara? – Sarah diz. – Achei que
você fosse convida-lo para vir com você para que não viesse
sozinha.
— Não. Eu já estou acompanhada e muito bem. – sorrio para
And, que chega por trás dela.
— Sobre o que vocês estão falando? – ele pergunta.
— As senhoritas estão tendo uma pequena disputa. – James diz
e Douglas ri. Andrew olha para mim com o cenho franzido. Tudo o
que faço é revirar os olhos e sei que ele entende meu motivo.

— Andrew, meu amor. – Sarah exclama em alto tom, agarrando-


se ao braço dele como se estivesse tomando posse de uma
propriedade. – Eu estava justamente me perguntando por onde você
andara.

Mesmo contra minha vontade, lanço um olhar irritado para os


dois, sentindo uma enorme vontade de jogar essa Loira de Farmácia
pela janela.
— Por vários lugares. – And responde, soltando o braço dela.
— Eu adoraria ir para um desses lugares com você. – ela insiste,
dando uma piscada de maneira bastante sugestiva. – Se é que me
entende.
— Claro. – ele diz. – Mas por que você não vai com nosso amigo
Douglas aqui? Ele é muito mais rico de que eu e é bem bonitão
também.
— Prazer garantido, senhorita. – Douglas diz e mexe a
sobrancelha algumas vezes, o que me faz rir.
— É melhor do que acabar ficando sozinha. – dou de ombros e
sorrio para And.
— Não por isso, querida.
Sarah vira para o lado de Andrew, agarrando-se ao seu pescoço
para beija-lo. Aqui. Na frente de todo mundo! Sinto coração parar de
bater no mesmo instante em que eu vejo isso e meu sangue ferver
em uma raiva que nunca senti antes.
O beijo, que não chega exatamente a ser um beijo, não dura
mais do que três segundos.
— Ficou maluca?! – Andrew exclama irritado, afastando-a dele.
— Eu pensei que...
— Você não deveria pensar nada quando diz respeito a me
beijar. – ele a interrompe. – Já te disse isso uma centena de vezes.
Não. É simples de entender.

Por um momento, sinto uma pequena pontinha de pena de


Sarah. Mas não muita. Minha raiva é bem maior do que jamais senti
antes e preciso controlar meus nervos, ainda que minha vontade
seja a de jogar o restante do meu suco no rostinho esnobe e perfeito
dela.

Ao invés disso, apenas vou até a mesa de bebidas, onde pego


uma taça de champanhe e seguro em minhas mãos.

Vejo Sarah sair apresada pela porta da frente, enquanto Andrew


continua conversando com Douglas e James, provavelmente
tentando fingir que nada daquilo aconteceu.

Seguro minha taça entre as mãos, passando o dedo pela borda.


Em momento algum eu a levo a boca. Sei que não posso mais
tomar nada que tenha álcool por um booom tempo.

Douglas acompanha James até outro canto da sala e And vem


até onde estamos. Viro para o lado da mesa, evitando o contato
com ele.
— Não acho que seja saudável beber isso.
— Não estou bebendo nada. – respondo, entregando minha taça
para ele, que toma de uma só vez.
— Sabe que eu não a correspondi.
— Não fala nada, And. – sinto minha voz ficar um pouco rouca
quando digo estas palavras. – Por favor.
— Como posso não dizer quando você se quer olha para mim? –
ele insiste e me viro para ele, voltando à atenção para a sala.
— Eu estou normal. Eu só... Sei lá.
— Esquece a Sarah, por favor. – pede. – Ela sabe que estamos
juntos. Contei para ela no dia que você nos viu conversando na
lanchonete semana passada. Ela fez aquilo para te provocar.
— É claro que fez. – murmuro. – Não é segredo algum que
aquela Loira Oxigenada de Farmácia fez aquilo só para me
provocar.

Andrew sorri, tocando meu rosto.


— Tem uma coisa que sei que vim fazer e que é o principal
motivo de estarmos aqui ao invés de na cama. – diz, virando-se
para pegar uma taça e vai um pouco mais para o meio. – Pessoal,
peço um minuto de sua atenção, por favor. – ele pede em alto tom,
chamando a atenção de várias pessoas.

And lança um rápido olhar para mim, que é mais do que o


suficiente para fazer com que minhas pernas amoleçam a ponto de
quase me levar ao chão.

— Ahn... Eu nunca fiz isso em toda minha vida, então me


perdoem se fizer algo errado. Mas realmente preciso compartilhar
algo com todos vocês aqui presentes.

— Ai meu pai! – leio as palavras nos lábios de Morgan e um


sorriso que mais parece uma mistura de diversão e orgulho que se
forma em seu rosto.

— Faz algumas semanas que tive o prazer de voltar para esta


cidade. – Andrew começa a dizer. – Mas esta, diferente de todas as
outras, foi totalmente diferente. Eu não vim sozinho ou
acompanhado do meu pai ou qualquer outro funcionário homem da
minha empresa. – ele olha para mim outra vez e sorri. – Eles
escolheram logo uma mulher para passar um mês comigo. Vocês
têm noção do perigo que ela correu com isso? – alguns deles riem e
me pergunto qual o tamanho de sua fama no mundo todo. – Mas
quem correu perigo maior desta vez fui eu, porque ela não é igual a
nenhuma outra mulher que tenha cruzado minha vida.

Ver Andrew falar sobre nosso namoro assim tão abertamente


para tantas pessoas é realmente estranho. Por dois meses, tudo o
que tivemos foi um segredo para o mundo todo e às vezes até
mesmo para nós dois. E agora ele está contando como nos
aproximamos nestas últimas semanas, como me levou para
conhecer a cidade e começamos a ter uma amizade maior, que
acabou avançando para algo.

Em momento algum ele mente. Este mês serviu justamente para


isso. Mas nossa amizade começou mesmo quando ele ficou do meu
lado no dia que recebi a notícia de que minha avó havia sido
internada e como ele se prontificou a ficar do meu lado mesmo que
não tivesse obrigação alguma comigo. E como ficou comigo quando
eu a perdi. Aquilo para mim foi a maior coisa que alguém poderia
me fazer.

— QUEREMOS BEIJO! – alguém grita e saio do meu transe.

Ainda estou perto das bebidas quando vejo Andrew caminhando


em minha direção com um sorriso sexy em seu rosto. Uma de suas
mãos toma minha cintura logo que ele se aproxima de mim e com a
outra ele junta meu cabelo, puxando um pouco para trás, de
maneira que me faz ficar com o queixo erguido. Sinto seu hálito
quente bem próximo do meu rosto.

Sem pensar, envolvo seu quadril em meus braços,


correspondendo seu beijo da única maneira que consigo fazer,
enquanto sinto minhas pernas tão moles, que tenho a sensação de
que apenas estou de pé porque ele esta me segurando.

Aqui, nesta sala, sinto como se não houvesse chão. Mas isso
não me importa, pois estou segurando meu mundo e é tudo o que
preciso neste momento.
Andrew afasta, pousando um último beijo em meus lábios e sorri,
ainda segurando meu quadril para ele. Um sorriso bobo que vai de
um lado a outro e correspondo seu sorriso com outro igual.

— Isso é que é beijo! – reconheço a voz de Douglas no meio de


uma salva de palmas e sinto meu rosto queimar de vergonha.

— Senhores, senhoras. – Morgan começa a dizer, chamando a


atenção de todos para ela. – Sei que os apaixonados estão dando
show aqui, mas o cozinheiro deu um show lá na cozinha também e
pediu para avisar que o jantar já esta sendo serviço.
— Já estava na hora.
— Com fome? – And pergunta em meu ouvido quando
começamos a acompanhar as outras vinte e cinco pessoas até a
sala de jantar.
— Morrendo. – sorrio em resposta. – Mas não apenas de
comida. – completo, apertando sua bunda e ele ri.
— Posso cuidar disso no carro se quiser.
Sorrio, mas não respondo.
— Será que posso tirar uma foto dos senhores? – o mesmo
fotógrafo de antes nos para antes que possamos entrar na sala de
jantar e And me deixa na sua frente, abraçando-me pela cintura e
posso sentir sua ereção roçar atrás de mim.
— Prepare-se para ser manchete em todos os jornais amanhã. –
ele sussurra em meu ouvido e posso ver seus olhos cinza brilhar de
maneira que nunca vi antes e neste momento posso ter certeza de
que não poderia ter feito escolha melhor quando resolvi aceitar
aquela proposta para trabalhar no Rio de Janeiro. Ou quando aceitei
seu convite para jantar.
Capítulo Trinta e Três
Quarta-feira

Lembro-me de estar com Andrew dentro do avião, esperando pela


decolagem e no quanto eu estava ansiosa para voltar para minha
casa, porque eu sabia que logo poderia ir visitar minha família e
entregar os presentes que comprei para cada um deles, mesmo que
isso significasse ter de contar sobre minha gravidez e também que
as coisas não ficariam lá muito bonitas.

Foi então que eu desisti dessa visita no mesmo instante em que


coloquei meus pés em solo brasileiro e tenho evitado esse encontro
já tem quase três semanas e isso de certa forma me leva a receber
uma enorme cobrança da minha mãe todas as vezes que ligo para
saber como eles estão ou quando algum deles me liga. O que me
leva a estar neste momento na linha com minha mãe.

— Mãe, eu não estou fugindo de ninguém. – resmungo ao


telefone, passando a mão pelo cabelo, sentindo um pouco de
irritação. – Pode dizer ao Tommy que os presentes dele ainda estão
todos guardados. É só que meu trabalho acumulou muito por ter
ficado fora e por isso não consegui ir ver vocês ainda.
— EU NÃO QUERO FALAR MAIS COM ELA! – ouço a vozinha
de Tommy ao fundo e minha mãe chamar sua atenção.
— Filha, esta tudo bem entre você e Andrew?
— Está sim. – digo quase num sussurro. – Ele tem sido um amor
comigo em tudo desde que viajamos e mais ainda depois que
assumimos nosso relacionamento.
— Fiquei tão feliz quando Cami me mostrou a notícia na internet.
– sinto o sorriso em sua voz. – Mas sabe o que me deixaria ainda
mais feliz?
— O quê?
— Poder ver a filha que não vejo há quase três meses. – diz e
sinto meu coração se desfazer dentro do peito. – Eu sinto como se
você estivesse me escondendo algo importante, minha filha.
Fecho os olhos, sentindo tudo desmoronar dentro de mim.
— Telefone não é o meio na qual quero falar sobre isso, mãe. –
digo em um sussurro.
— Então estou certa em dizer que algo esta acontecendo.
— Sim.
— E talvez eu também esteja certa em dizer que seu pai não
ficara nada feliz com isso.
Mordo o lábio inferior. Eis ai meu maior medo de ir para lá.
— Provavelmente nenhum pouco.
— Julie sabe? – pergunta.
— Só contei no começo da semana. – respondo. – Ela não esta
falando comigo porque não ter falado nada quando descobri. Eu
só... Preciso de um tempo para aceitar isso melhor, entende? Eu
estou enrolando para ir ao médico desde que voltamos e And já
marcou esse consulta umas três vezes, mas não posso desmarcar
essa de hoje. Por que...
— Oh, filha. – minha mãe me interrompe e sinto uma lágrima
escorrer por meu rosto, seguida de outra.
— Só não conta nada para o meu pai, por favor. – peço. – Nem
para Camile. Nós vamos pegar férias já na semana que vem. Então
vou para ai no sábado, ainda que as coisas não vão ficar nada
agradáveis para o meu lado.
— Tá. Não. Isso não. – ela ri um pouco sem graça. – Meu
Deus... Eu nunca pensei.

— Mãe.
— Desculpa. Eu só... Estou feliz e um pouco confusa.
Alguém bate na porta e a abre. Vejo apenas parte do rosto de
Igor.
— Mãe, eu preciso desligar. – digo. – Estão me chamando aqui.
— Tudo bem, meu amor. Vai nessa consulta e depois me diz
como estão as coisas, por favor. E cuidado.
— Pode deixar. Obrigada.
Encerro a chamada e coloco o celular em cima da mesa,
enfiando o rosto entre as mãos enquanto sinto uma dor de cabeça
terrível começar a tomar conta de mim.
— O que você vai fazer na sexta, Brudosck? – Igor pergunta
abrindo o restante da porta.
— Provavelmente trabalhar até mais tarde para terminar esse
aplicativo e depois ir para casa para dormir cedo. – respondo sem
olhar para ele.
— Qual é? É o último dia de trabalho e depois férias! – ele
exclama. – Tire uma folga. Faz um bom tempo que você não sai
com a gente.
— Acho que a palavra “férias” já define bem o conceito de
“repouso”. – digo irritada.
— Nós precisamos de um amigo do bem. Vamos lá! – ele insiste.
— Sério? – pergunto de volta. – Se vocês precisam de alguém
para cuidar de vocês quando estiverem bêbados, chame a nova
secretária. Lembro que foi o que fizeram comigo quando comecei a
trabalhar aqui.
Depois que Daniela foi demitida, demorou um bom tempo para
que encontrassem alguém de confiança que pudesse substitui-la.
Depois foi mais algum tempo para que Andrew pudesse aprovar a
nova, já que estava fora e não queria fazer entrevista por vídeo
conferência. Ainda que ele tenha feito isso com o Guilherme.
— Não é a mesma coisa. – Igor diz e apoio o queixo na mão e o
cotovelo na mesa, encarando-o. – Você é a nossa Garota de
Programas. É uma de nós.
— Agradeço pela sinceridade, mas não vou poder ir.
— Preciso dizer para Julie que a amiga dela está bem mudada e
mal humorada ultimamente.
Pronto. Ele conseguiu acabar com o que me restava de
paciência.
— Faça isso. Mas, para o seu próprio bem, me deixa sozinha.
Tudo o que Igor faz é rir, deixando-me ainda mais irritada.
— Você só pode estar na TPM. – diz. – Tenho até pena do
Chefinho.
— Cala a boca.
— Ou isso ou então ele não esta dando conta do recado mais. –
lanço a ele um olhar de repreenda, mas parece não funcionar. –
Acho que peguei no ponto da ferida agora. – ri.
— VAI SE FERRAR, IGOR! – explodo. – Some daqui e me deixa
trabalhar em paz, pelo amor de Deus!
— Eu só vim fazer um convite, sua estressadinha. – diz,
fechando a porta outra vez.
— O que está acontecendo aqui? – ouço uma voz do outro lado
da porta.
— A Srta. Estresse que não consegue mais ser pacifica.
Ouvir as palavras e a voz de Igor apenas me faz sentir uma
vontade enorme de enfiar a cabeça dele na privada e dar descarga.
A porta começa a se abrir outra vez e pego um enfeite que tenho
em cima da mesa, jogando contra ela.
— Eu já não disse para você me deixar em paz?! – exclamo e a
porta fecha antes que o enfeite chegue e o vejo se espatifar contra a
porta. – Eu não gostava disso mesmo.
Levanto e vou até lá para recolher os cacos.

— Tem mais? – reconheço a voz de Andrew quando a porta abre


outra vez e só então é que me dou conta de que era ele quem
estava falando com Igor lá fora.
— Feche a porta. – peço e levanto para ir jogar os cacos no lixo.
— O que foi? – ele pergunta, encostando a porta.
Caminho de volta até ele, prendendo-o contra a porta.
— Eu disse para fechar. – digo, apertando a trava. — Assim
ninguém vai entrar aqui sem ter sido chamado.

Andrew fixa os olhos em mim e sei no mesmo instante que esta


considerando fazer a mesma coisa que eu. Estou irritada e chateada
pelos últimos ocorridos e sei que só tem uma pessoa que é capaz
de me ajudar a diminuir isso que estou sentindo neste momento.

— O que você tem? – And pergunta com a voz rouca, que faz
uma excitação crescer dentro de mim.
— Eu tenho uma coisa e quero outra. – dou um passo para mais
perto dele, fixando seu olhar tenso.
— E o que você tem? – pergunta.
— Você.
— E o que você quer? – seu sorriso corresponde o que surge em
meu rosto.
Passo a mão por sua nuca, trazendo-o para mais perto de mim.
— Você. – sussurro em seu ouvido e me beija, guiando-me para
algum canto atrás de mim.

And passa as mãos por todo meu corpo, fazendo com que meu
vestido suba.
— Sério? – ele pergunta contra minha boca, passando o polegar
no lugar onde deveria estar minha calcinha, na qual tirei antes
mesmo de minha mãe ligar, já com a intenção de aproveitarmos
antes da consulta.

— Facilidade, lindo. – sorrio para ele, esfregando minha mão


pelo Pequeno And, deixando-o mais excitado.
Afasto-me apenas o suficiente para descer o zíper de sua calça
e puxo meu mais novo melhor amigo para fora, levando a nós dois
até minha cadeira.
— É como se um dos meus sonhos estivesse tornando
realidade. – Andrew geme quando toco seu peito, fazendo com que
ele sente.
— Não esqueça que ainda temos sua sala. – sento em seu colo
e beijo seu pescoço, sentindo seu pau roçar em minha perna. – E o
elevador. E talvez o banheiro. A cobertura da sua fortaleza. Depois
no carro.

A cada novo lugar que sugiro, beijo uma parte do corpo de


Andrew, arrancando dele um gemido rouco. Eu queria poder tirar
sua camisa para poder beijar seu peito nu, mas não posso fazer isso
agora.

Andrew baixa o apoio de braço da cadeira, de modo que deixa


mais confortável e sobe meu vestido e depois a mim, apenas para
poder me sentar outra vez em seu colo e o sinto deslizar por entre
minhas pernas.
Ele desce a alça do meu vestido e puxa o busto do sutiã para
baixo, deixando meu seio empinado para cima.
And sorri quando prendo seu cabelo, puxando para mim e ele
me arranca um gemido rouco quando puxa meu mamilo. Suas duas
mãos estão presas em meu quadril, ajudando no movimento de
sobe e desce.

— Me lembre... – começa a dizer entre pausas ofegantes. – De


pedir... Provoque... Mais.

Puxo seu rosto para mim e o beijo com força, sentindo meu
corpo começar a se contorcer junto ao dele quando gozamos.

Andrew desce a boca por meu pescoço e sinto sua barba


espinhar, provavelmente deixando um vermelho vivo. Eu rebolo em
seu colo ainda com ele dentro de mim, louca para que pudéssemos
ir ali para o outro lado e fazer isso uma segunda vez.

— Você não faz ideia do quanto sou feliz por ter você comigo. –
And sussurra e tomo seu rosto entre minhas mãos, sentindo meu
coração acelerado.
— Eu ficaria com você aqui até amanhã de manhã. – respondo,
pousando um beijo em seus lábios.
— É uma pena que você tenha médico daqui a pouco. – diz e me
afasto rapidamente. Tinha fugido por completo isso.
— Que horas são? – pergunto e ele ergue o punho do terno para
consultar seu relógio.
— Cinco horas.
— Droga, And! Temos que correr.
Ele ri e me segura.
— Vai com calma, Anjo. – diz, erguendo-me de seu colo. – Acho
que com todo esse seu apetite, você não vai querer machucar o
Pequeno And.
— Essa sem dúvida alguma é a última coisa que quero no
mundo todo. – respondo e saio de seu colo, pegando minha bolsa
onde guardei a calcinha e a visto de volta. – Principalmente porque
pretendo continuar isso com você quando voltarmos para casa.
Sorrio para ele, observando-o arrumar sua calça.

— Nem imaginário o que as pessoas iriam pensar se te vissem


todo amarrotado assim. – digo, alisando seu terno para poder deixa-
lo um pouco mais apresentável.

— Provavelmente que acabamos de fazer o melhor sexo do


mundo. – responde com um sorriso lindo e sexy.
— E não acabamos? – pergunto.
— Segundo tempo assim que chegarmos em casa. – responde,
correndo o polegar por meus lábios e fecho os olhos. – E terceiro...
Quarto...
Sinto minha respiração pesar e tudo se acender dentro de mim
outra vez.
— Cinco minutos. – sussurro, pousando um beijo em sua boca e
me afasto.
Andrew chega ao estacionamento, onde seu carro esta,
exatamente cinco minutos depois de mim. Por algum motivo que
não consigo entender, todo o pessoal foi liberado um pouco mais
cedo hoje, então que poderíamos até mesmo ter saído juntos da
minha sala que ninguém teria nos visto.
— Você tem alguma coisa a ver com isso? – pergunto, lançando
um olhar para ele quando abre a porta para que eu possa entrar no
carro.
— Sobre não ter ninguém aqui mais? – pergunta de volta e
confirmo. Apenas o sorriso em seu rosto já me da à resposta. –
Talvez eu tenha ido até sua sala com a intenção darmos uma
rapidinha e precisava me prevenir sobre outras coisas.
— Então você dispensou todo mundo. – arqueio a sobrancelha
para ele e não vejo culpa alguma em seu rosto.
— Alguns ainda estão por ai. – ele da de ombros e vai para o
outro lado do carro. – Se quiser podemos dar mais uma aqui no
estacionamento mesmo.
— Andrew! – exclamo, mas acabo rindo. – Não acho que fazer
isso aqui seja uma boa. – sussurro olhando para o meu colo. – Não
há essas horas pelo menos.
Andrew ri do meu lado e sai com o carro.

— Já chegamos? – pergunto logo que And para com o carro em


um estacionamento. Para mim o consultório ficaria um pouco mais
longe da BIT.
— Eu disse que poderíamos ter ficado por mais vinte minutos
que daria tempo.
— Você não disse não, mentiroso. – digo e ele ri.
— Nervosa? – pergunta.
— Quer saber se estou nervosa por estar perto de saber
exatamente de quanto tempo que estou grávida? – pergunto de
volta e ele confirma com um ar divertido no rosto. – Bem, pelas
minhas contas eu estou de sete semanas. Quase entrando na
oitava.
And apoia a mão em minha perna e a aperto forte.
— Estou entrando em desespero, And. – sussurro, apertando
ainda mais sua mão entre a minha.
— Fica calma, linda. – diz, passando o polegar por meus dedos.
– Quer que eu entre com você? – pergunta e faço que sim. – Ótimo.
Eu não estava gostando muito da ideia de que Marcus ficasse
sozinho com você.
— Bobo. – digo e ele sorri antes de abrir a porta e dar a volta no
carro para abrir a minha para que eu desça. – Eu estou bem. É só
que... Caramba, você já parou para pensar que ele só vai confirmar
que de fato tudo isso está acontecendo com a gente?
— Que ele vai confirmar que fui contra todos meus princípios
me apaixonando, fazendo sexo sem proteção, que por sinal é
fantástico, que consegui engravidar uma mulher gostosa sem nem
mesmo ter tentado? – ele diz tudo isso como se fosse à coisa mais
natural do mundo. – Eu estou tão assustado quanto você, Anjo. –
diz. – Mas estou aqui para você. Sempre estarei.
— Obrigada. – sorrio e desço do carro, tomando sua mão na
minha para que possamos entrar.

Enquanto andamos, percebo que a mão de Andrew esta


tremendo um pouco, como se ele estivesse com frio.
Apoio minha cabeça em seu ombro, apertando sua mão.
— Quero que você entre comigo. – digo e ele assente, dando um
pequeno sorriso para mim.
— Temos uma consulta com o Dr. Marcus. – ele diz para a
recepcionista logo que nos aproximamos. – Está em nome de Luara
Brudosck.
— O doutor já vai atendê-la.
— Obrigado.
Não tenho tempo nem mesmo de me virar para ir sentar em uma
das poltronas que o médico já chama, fazendo com que meu
coração bata mais acelerado e sinto um enjoo leve subir pela
garganta.
— Andrew, há quanto tempo, meu amigo! – o Dr. Marcus o
cumprimenta. – Como tem passado?
— Depois de passar um mês inteiro em Nova Iorque? – And
pergunta de volta e passa o braço por minha cintura, puxando-me
para mais perto dele.
— Nunca imaginei que um dia iria vê-lo por aqui para
acompanhar a mãe do seu filho. – ele diz e sinto meu rosto queimar.
– A mamãe veio para saber de quanto tempo está?
— Sim. – respondo baixinho. – Só fiz aquele teste de farmácia,
mas não me restam dúvidas de que tem um bebê aqui. – acrescento
e ele ri.
— Então vamos ver como o pequeno de vocês está. – diz. –
Deite-se, por favor.

Subo na cama enquanto ele prepara algo no outro canto da sala.


Andrew está parado do meu lado, ainda segurando minha mão e
sinto como se ele estivesse quase tão tenso quanto eu.

O Dr. Marcus é, basicamente, aquele tipo de médico que pelo


menos a grande maioria das mulheres já desejou ter. O que
dispensa uma descrição mais detalhada e, considerando sua mecha
branca no cabelo, chuto sua idade já por volta dos quarenta anos,
mas muito bem apanhado.
— Da para saber quantos são? – And pergunta quando o médico
passa um gel gelado por minha barriga, preparando para o meu
primeiro ultrassom. A princípio eu sinto um pouco de desconforto,
mas acabo me acostumando.
— Ainda é muito cedo para dizer com certeza. – ele responde. –
A mamãe aqui esta para completar a oitava semana de gestação
apenas. – explica. – Mas ele esta se desenvolvendo muito bem.
Vejam.
Ele então indica na tela o lugar onde supostamente meu filho
está, mas tudo o que enxergo é um borrão preto e uma pequena
manchinha.
— Daqui alguns meses vocês poderão fazer o 3D. – diz. – Com
ele podem ver perfeitamente como o bebê esta.
— Até mesmo se forem dois? – Andrew insiste e olho para ele. O
Dr. Marcus ri.
— Sim, principalmente se forem gêmeos.
— O que o senhor recomenda para ajudar no desenvolvimento?
– pergunto, sentindo-me um pouco desconfortável com a ideia de ter
gêmeos.
— O principal de tudo é sempre manter uma alimentação
saudável, sempre atenta ao que pode ou não fazer mal. – diz. –
Evitar pegar peso, tomar bebida alcoólica, fumar. Isso geralmente
prejudica.
— Detesto cigarro. – faço uma careta e sinto outro enjoo apenas
por imaginar o cheiro.
— Da alimentação pode ter certeza que vou cuidar. – And diz. –
E do álcool ela não vai tomar nada além de suco de fruta natural.
— Sim, senhor, papai. – sorrio para provoca-lo.
— Vou pedir para que Karina imprima uma lista para você e
poderá segui-la.
— Obrigada.
— Vou pedir para que você retorne dentro de um mês, para que
possamos acompanhar direitinho e garantir que tudo corra bem. –
ele começa a dizer enquanto faz alguma anotação em sua agenda.
– E desta vez sem ficar atrasando. Certo?
Sinto seu olhar em mim e meu rosto corar.
— Certo.
— Você tem sentido enjoos ou alguma outra coisa?
— Enjoos muito fortes. – respondo. – Mas estou tomando um
remédio que comprei na farmácia que, segundo o farmacêutico,
ajuda bastante para isso.
— Está com ele ai? – pergunta e rapidamente tiro a cartela
restante de dentro da bolsa. – Sim, pode continuar com o uso.
Apenas não vá abusar e, caso deixe de fazer efeito ou algo
aconteça, quero que me procure no mesmo instante.
— Tudo bem.

Dr. Marcus passa algumas recomendações a mais como


medicamentos que posso usar e outros que tenho a obrigação de
me manter longe. O que não será difícil, uma vez que não gosto de
tomar remédios. Isso sem contar a lista de coisas que posso comer
e às que não posso, que da um total de duas páginas para cada.

Acho que consigo dar conta nessa primeira etapa. Tudo o que
preciso fazer é cuidar de mim mesma com mais atenção que estarei
cuidando dele.

— Está tudo bem com você? – And pergunta assim que abro a
porta do meu apartamento e jogo minha bolsa no sofá.
— Por que não estaria? – pergunto de volta, indo para o quarto.
Sinto que preciso tomar banho urgente.
— Porque você não falou comigo o caminho todo e agora esta
fugindo de mim. – ele diz, vindo atrás de mim. — O que esta
acontecendo?
— Não estou fugindo de você. – viro para ele, que está parado
no vão da porta.
— Está sim. Está nos seus olhos. Eles estão brilhantes. Você
esta quase chorando.
— Só estou cansada. – digo baixinho, secando os olhos com a
costa da mão, mas tudo o que consigo fazer é piorar.
— Linda. – ele insiste, dando um passo a mais em minha direção
e envolvo sua camisa, escondendo o rosto em seu peito.
— Eu estou assustada, And. – confesso por fim. – Eu estou feliz
por saber que esta tudo bem com o nosso Pequeno. Mas... – aperto
os olhos, sentindo as lágrimas escorrerem por meu rosto. – Eu falei
com minha mãe antes do Igor invadir minha sala e ela foi jogando
algumas indiretas e acabei contando para ela. Na verdade ela já
sabia, só queria ouvir de mim.

And me afasta de maneira que possa olhar em meus olhos e


passa os polegares por meu rosto.

— Ela ficou brava? – pergunta e nego. – Bem, isso é algo. Eu


acho.
— Meu medo é meu pai, And. – digo após um tempo. – E eu
disse que iria para lá assim que entrasse de férias, o que já é essa
sexta.
— Eu vou com você. – ele diz, segurando meu rosto. – Você não
fez isso sozinha. Não vou permitir que seu pai brigue com você por
algo que também tenho culpa e, meu Deus, se termos esse filho for
um erro, eu vou errar com você de novo.

Sorrio e fecho os olhos ao sentir as lágrimas se formarem em


meu rosto outra vez.

— Eu tinha que fazer isso sozinha, And. – sussurro.


— E você fez sozinha por acaso? – ele pergunta um pouco
irritado. – Ou eu tive participação nisso?
— Não é questão de quem fez ou não. – digo. – Não quero que
você e meu pai acabem brigando por causa disso. Quero que vocês
se entendam. Vocês se deram bem da outra vez.
— Linda, eu acho que deixar você ir sozinha apenas o faria
sentir mais raiva, se a coisa for ficar assim. – começa a dizer. – Seja
como for, quero que ele saiba que não estou fugindo do meu dever
como pai.
— Acho que não adiantar eu tentar dizer “não”, não é mesmo? –
pergunto e ele sorri.
— Pode apostar que não.
— Tudo bem.
Capítulo Trinta e Quatro
Sexta-feira

Passei todo o início da noite de ontem com Andrew, preparando a


decoração de natal aqui em casa e depois fomos para a dele, que
acabou se rendendo de tanto que insisti e dizer que ficaria mais
agradável. Claro que precisamos ir ao shopping para comprar
enfeites antes de começarmos, porque foi meu primeiro ano fazendo
isso e como ele não passa as festas aqui, não tem costume de fazer
nada disso por ser “coisa que mulher gosta de fazer e ele sempre
estava sozinho para querer fazer isso”.

Enquanto trabalhávamos lá, surgiu o assunto sobre onde


passaríamos as festas. Assim como meu aniversário, nunca passei
longe de casa e mesmo que as coisas não estão lá muito seguras
para o meu lado, ainda quero ir à casa da tia da Ju, como fazemos
todos os anos no natal. Por outro lado, And quer que eu vá com ele
para Londres para conhecer seus pais e só a ideia já foi mais do
que suficiente para me assustar. Mas também é justo, já que ele
conhece meus pais e ainda não conheci os dois. E também
concordei em parte, porque ele quase não os vê.

Não sei bem se foi ele quem propôs ou se fui eu, mas acabamos
entrando em um acordo mais do que amigável, que foi: passamos o
Natal com meus pais e logo no dia seguinte embarcamos para
Londres, para passar o ano novo com os pais dele. Tudo o que
lembro de pouco depois desse acordo, é de estarmos ambos nus no
tapete de sua sala e só consigo rir ao me lembrar de como tudo
aconteceu.
Hoje, por outro lado, não o terei comigo esta noite. Ainda que
tenha sido o último dia em que a BIT funcionou este ano, ele
precisou viajar para uma cidade aqui perto a negócios e só voltara
amanhã pela manhã. Ele queria que eu fosse com ele, mas não
podia deixar meu trabalho e simplesmente ir. Ainda mais agora que
algumas pessoas olham para mim com cara feia só porque sabem
que estou namorando o Presidente da empresa. Mas sim, eu queria
muito ter ido com ele para Cabo Frio, mas vai ter que ficar para
outro dia.

Sobre sair com Igor e os meninos, até considerei ir quando And


me contou que não estaria aqui, mas acabei desistindo, porque não
estava me sentindo muito bem. Então que tudo o que eu fiz foi vir
para casa de táxi para tomar um banho morno e depois preparei
minha janta com o cardápio especial A La Andrew.

Sento no sofá com um pratinho com um pouco de brigadeiro e


meu suco de laranja do lado para poder terminar de assistir a quarta
temporada de The Big Bang Theory bem quando meu celular toca e
tenho que pausar o episódio outra vez.

— Olá, Julie. – atendo sua chamada, sabendo que ela muito


provavelmente esta ligando para brigar comigo outra vez.
— Ainda estou brava com você. – é a primeira coisa que diz. –
Mas quero saber: como foi no médico?
— Dessa vez eu fui. – digo e ela ri do outro lado. – Estava
bastante assustada quando chegamos lá, mas o And também
estava.
— Uma gravidez assim deve assustar para valer.
— Você não faz ideia. – respondo. – O Dr. Marcus disse que ele
esta crescendo bem e que eu estava para entrar na oitava semana.
Acho que fiz isso ontem. Pelas minhas contas, pelo menos. Ele
mostrou o bebê no ultrassom, mas só vi um borrãozinho e mais
nada. – Ju ri do outro lado e acabo fazendo o mesmo. – Viu a foto
que te mandei?

— Estou brava com você por não ter me contado antes, não com
o meu sobrinho. – ela responde. – Eu também não consegui
enxergar nada, mas sei que esta ali. – sorrio ao ouvir suas palavras.
– Lu, eu quero me desculpar com você pelo que disse quando você
me contou. Sei que não foi fácil quando descobriu e menos ainda
quando Andrew saiu e te deixou sozinha depois que contou para
ele. Eu não fui muito sua amiga. Deveria ter ficado do seu lado.

— Esta tudo bem. Eu deveria ter criado coragem, mas não


consegui fazer isso. Devo desculpas a você também. Principalmente
por ainda não ter ido ver vocês até hoje, mesmo que já tenha
voltado há três semanas.
— Bem, isso deve mesmo. – concorda. – Principalmente porque
eu me lembro de que alguém havia ficado de me trazer um pedaço
da Estátua da Liberdade.
— Não é bem um pedaço, mas sim uma miniatura dela. –
respondo. – Espero que sirva.
— Acho que sim.
Sorrio, mas não muito animada.
— Você tem falado com minha mãe? – a pergunta me escapa
antes que eu possa processar o que a resposta vai significar para
mim. Quer dizer, eu não falo com minha mãe desde quarta.
— Saímos para almoçar juntas hoje. – Ju responde e mordo o
lábio, dividida entre fazer ou não a pergunta seguinte. – Ela esta
bem chateada com você.
— É claro que esta. – sussurro. – Decepcionei meus pais da pior
maneira que consegui.

— Não é verdade, Lu. É só que essa notícia pegou a todos nós


de surpresa.
Não consigo conter a risada irônica que me escapa.
— Sério? Só vocês? E como acha que me senti quando fiz o
teste na farmácia? Acha que dei salto mortal? Que quis estourar
fogos de artifícios? – solto as perguntas uma atrás da outra, sem
esperar por nenhuma resposta. – Melhor do que ninguém você sabe
que isso não estava nos meus planos agora. Quando descobri, eu
pensei em...
Paro de falar e levo a mão livre ao rosto, sentindo as lágrimas
acumularem.
— Você não fez isso.
— Sim, eu pensei. – digo. – Eu estava sozinha, Julie. Sozinha e
assustada. Não sabia como Andrew iria reagir quando contasse.
— Eu nunca perdoaria você se tivesse feito isso com meu
sobrinho.
— Acha que eu me perdoaria? – pergunto. – Eu nunca iria me
perdoar. Já não consigo me perdoar por apenas ter pensado. É meu
filho. Meu pequeno pedacinho. Meu e do And.
Conforme falo, minha voz vai baixando, ficando mais rouca e
sinto um enjoo, mas logo passa sem que eu tenha que correr para o
banheiro.
— Quando você vem para cá? – Ju pergunta, tirando-me de
meus pensamentos.
— Como And só volta amanhã de viagem e vai estar cansado,
pensamos em ir ou na segunda ou terça-feira.
—Considerando que seu pai tenha um faniquito quando você
contar...
— Fico em um hotel. – eu a interrompo. – Andrew quer ir para
conversar com meus pais, então na certa coisa boa não vai dar. –
solto um suspiro cansado e deito no sofá.

— Fica na minha tia se isso acontecer. – ela diz. – Quer dizer,


você não vai deixar de passar o Natal com a gente só por causa do
seu pai, vai?
— Por um momento eu considerei isso no caso de as coisas
ficarem muito ruim.
— Lu.
— Tá. Eu vou ficar lá e não no hotel.
— Acho bom mesmo que você não discuta comigo, mocinha. –
Ju diz com um tom de repreenda, mas acaba rindo. – Estou tão
louca para ver sua barriguinha.
— Acho que vai ter uma pequena decepção quando descobrir
que ainda não da para ver nada. – respondo.
— Quero que me mande uma foto então. Só para matar a
curiosidade.
Sorrio com seu pedido, mas acabo me rendendo.
Ainda não são nem mesmo nove horas direito e tudo o que
consigo fazer é pensar em ir para a cama. Mas estou tão entretida
com esse seriado que não consigo sair daqui para ir até a cozinha e
lavar a louça que sujei, mesmo que depois eu possa continuar a
assistir do quarto.
Meu celular toca, mas desta vez é apenas uma mensagem de
Andrew e não ligação.

Queria ter insistido mais para que você viesse comigo.


Não gosto de eventos sociais e estou jantando com um
executivo.
E ele é um chato.

Sorrio com sua mensagem e digito logo uma resposta:

Queria ter sido menos chata e aceitado sua proposta de ir com


você.
Eventos sociais parecem interessantes,
Mas não tanto quanto você na minha cama.

Sua resposta chega menos de um minuto depois:

Neste momento estou tentado a voltar para o


RJ só para te levar para cama.
Como esta se sentindo?

Jantei seguindo o cardápio A La Andrew, comi um pouco de


brigadeiro e tomei suco.

Tomei um remédio para dor de cabeça e agora estou deitada no


sofá assistindo TBBT.

Estou lutando para ir até a cozinha lavar a louça e quero você na


minha cama, porque estou me sentindo muito sozinha.
Quando termina o episódio, coloco o celular no bolso do short e
vou para a cozinha antes que perca o pouco da coragem que acabei
criando.
Sinto meu celular vibrar com outra mensagem, mas deixo para
responder quando terminar de lavar a louça, porque sei que vou ser
distraída com qualquer resposta provocadora dele.
— Agora sim posso ver o que ele respondeu. – digo a mim
mesma, já tirando o celular do bolso e voltando para a sala.

Estou voltando para casa agora.


Não posso deixar minha mulher passando vontade.
Ainda mais que ela esta grávida.

Arregalo os olhos ao ler as palavras “minha mulher”. Imagina-lo


dizendo isso é mais do que suficiente para fazer meu coração dar
um salto mortal.

Vou até a TV para poder desliga-la e começo a digitar a


mensagem:

Estarei esperando por você na minha cama,


Ansiosa para ouvir você me dizer essas palavras.
E também para dizer o quanto eu amo

Meu celular vai parar no chão quando sinto algo tocar minha
barriga, abraçando-me por trás e um calafrio percorre meu corpo
quando sinto um hálito quente em minha nuca.

Viro para ver quem esta aqui e posso dizer com toda certeza do
mundo que não é quem eu gostaria que fosse.

— Bruno. – sussurro ao vê-lo parado atrás de mim. Como esse


desgraçado entrou no meu apartamento?
— Sentiu minha falta? – ele pergunta com um sorriso descarado.
Sua aparência não esta nada agradável. Seu cabelo loiro está
desbotado e sua barba muito grande esta precisando ser aparada.
— Como você entrou aqui? – pergunto, lançando um olhar para
a porta, que esta com uma pequena fresta aberta. Mas eu tranquei
quando cheguei do trabalho!
— Eu tenho uma chave. – responde como se não fosse nada. –
A segurança daqui não é lá muito boa. Você precisa ver isso.
— Claro. Eu vou ver isso hoje mesmo. – digo e ele ri.
— Não. Hoje, não.
Bruno ri outra vez e sinto sua voz soar um pouco áspera.

— Seu namorado fez uma coisa muito feia comigo, Luara. – ele
começa a dizer enquanto passa as costas de sua mão por meu
rosto. – Precisei arrumar um bom advogado para me tirar da cadeia
e só consegui sair hoje. – ele sorri. – Não imagina o tamanho da
minha felicidade quando descobri que aquele babaca não estava na
cidade e que você estava aqui sozinha.

— Seja lá quem foi que deu essa informação, está enganado. –


digo e ele ri ainda mais.
— Tem certeza? Por que não estou vendo ele aqui então? –
pergunta. – APAREÇA, SEU DESGRAÇADO! VAMOS LÁ,
ACABOU!
Quando Bruno vira, tento correr para outro lado, mas ele segura
meu pulso, puxando-me para perto dele.
— Não tão cedo, coração. – ele diz e cobre minha boca com
alguma coisa com cheiro forte. Muito... Forte...
E eu sinto uma pancada forte na minha cabeça antes de apagar.

Acordo sentindo uma dor terrível na parte de trás da minha cabeça.


Não uma dor de cabeça, mas sim uma dor na cabeça.

Aperto o lençol da minha cama, sentindo minhas lembranças


vagas, como se eu tivesse um buraco bem grande onde elas
deveriam estar. Algo como... Como eu vim para o quarto? Franzo o
cenho, tentando me lembrar de algo. Mas está tudo muito escuro.
Lembro-me de estar digitando uma mensagem para Andrew e...
Viro de barriga para cima quase no mesmo instante em que uma
luz se acende, seguido de uma voz grave e irritada que chega aos
meus ouvidos, que apenas faz com que minha cabeça doa ainda
mais:

— MAS QUE MERDA É ESSA AQUI?! – reconheço a voz de


And e abro os olhos para poder vê-lo.

Andrew está parado na porta do quarto, mas tudo o que consigo


fazer é enxergar tudo embaçado, então procuro por meus óculos e o
encontro ao lado da cama, voltando à atenção novamente para ele.

Sorrio para And, mas ele não retribui. Sua expressão é séria e
vejo seus olhos negros como a noite. Algo que eu nunca antes vi
nele. Não é como se fosse uma irritação, apenas não sei dizer o que
há de diferente.

— O que esse desgraçado está fazendo na sua cama, Luara? –


ele pergunta sem desviar os olhos de mim.
Quem? – pergunto a mim mesma, só então me dando conta de
que o lugar que And normalmente ocupa está com outra pessoa.
Sento na cama, puxando o edredom para mim. Estou nua?
Como...? Vejo que quem esta ao meu lado é Bruno. E usando
apenas uma cueca. Eu... Eu não posso ter feito isso. Eu nunca me
perdoaria.
Balanço a cabeça algumas vezes.
— And, eu não fiz isso. Eu juro. – digo em negação. – Eu não
posso ter feito... – minha voz embarga e tento me lembrar de algo
que tenha acontecido.
Andrew vem em minha direção e sinto como se assistisse a um
filme em câmera lenta. Seus olhos expressam raiva, ódio... Ódio de
mim?

Vejo-o puxar Bruno do meu lado, que acorda ao sentir o aperto


da mão de Andrew em seu pescoço e ele tenta segurar a mão para
aliviar o aperto, mas não consegue.
Puxo o edredom junto ao meu corpo, como se ele fosse à única
coisa capaz de me proteger nesse momento, enquanto tento
entender o que aconteceu. Vejo o rosto de Bruno ficar mais
vermelho. Tudo escuro... Negro.

Andrew acerta um soco em cheio no rosto de Bruno, jogando-o


contra o chão.
— LEVANTE, SEU COVARDE! – ele ordena. Sua voz esta rouca
de maneira como nunca antes vi.
Como Bruno não obedece, Andrew o puxa pelo pescoço,
deixando seus pés fora do chão, acertando outro soco nele.

— ME SOLTA! – eu grito com a voz abafada, sentindo um cheiro


horrível invadir meus pulmões. – Me solta!
Ainda que em vão, eu luto contra o aperto de Bruno.
— Ninguém vai te ouvir. – ele ri. – Seu herói não vem hoje. – diz,
dando um beijo em meu rosto e fecho o cenho, tentando chuta-lo
por trás de mim. – Agora, durma...
— Não... – resmungo contra o lenço que ele mantem preso
contra minha boca e nariz, tentando soltar suas mãos de mim. –
Andgrew. – tento chama-lo e então algo bate na parte de trás da
minha cabeça, deixando-me desacordada.

Com lágrimas nos olhos, eu vejo Andrew acertar outro soco em


Bruno, jogando-o para o chão e o vejo se levantar, indo para cima
de And, que se defende segurando-o pela barriga. É como assistir a
luta livre.

— Era isso que você sempre quis fazer, não é? – Bruno ri. –
Deve estar se sentindo satisfeito agora.
O peito de Andrew sobe e desce rápido demais, provavelmente
tentando controlar sua raiva.
— Agora eu entendo porque você a quis apenas para você. –
Bruno provoca. – Ela é boa. Muito boa. Faz coisas incríveis com
essa boca. – ele ri.

Andrew olha para mim e sinto o mundo se desmanchar ao meu


redor. Seus olhos parecem aflitos. Quase em um desespero cego.
— Não. – a palavra me escapa em um sussurro baixo e rouco.
Balanço a cabeça em negativa para que ele me entenda. – Eu não
fiz isso. – cubro a boca com as mãos, sentindo as lágrimas se
formarem em meus olhos. – Eu não posso ter feito.
Aproveitando a distração de Andrew, Bruno acerta o rosto dele
em cheio, fazendo com que uma pequena mancha roxa surja
próximo ao seu olho quase que no mesmo instante.

— And, eu não fiz isso. – digo em um desespero, sentindo a


batida acelerada e dolorida do meu coração contra o peito.
Sinto minha pele roçar contra o tecido de quê? Da minha cama,
talvez. Isso! Estou na minha cama! Mãos deslizam por meu corpo,
tirando cada peça de roupa minha, jogando-as ao chão.
— Isso vai ser incrível de se ver. – ele ri.
Sinto o toque áspero de Bruno em meu rosto, sentindo logo em
seguida sua mão soltar meu sutiã.
— Tão pequenos. – ele ri com certo tom de deboche e me
contraio. – Mas não me importa. Eu quero ver a cara dele quando
encontrar a Namoradinha Perfeita na cama com outro, bem quando
ela sabia que ele não estaria na cidade.
Sua risada é a última coisa que ouço antes de apagar por
completo.

Andrew acerta várias sequências de socos por todo o corpo de


Bruno. Sinto um enjoo terrível ao ver o sangue em seu rosto e
aperto o cobertor ainda mais contra meu corpo e fecho os olhos, de
repente sentindo frio. Muito frio.

— Andrew, para! Você vai matar ele. – uma voz estranhamente


familiar chega aos meus ouvidos e abro os olhos outra vez,
deparando com Felipe atrás do amigo, segurando os braços dele.
— Some daqui! – Andrew rosna e sinto seu olhar cair sobre mim.

Como se ainda devesse obediência a Andrew, Bruno recolhe


suas roupas e sai. Felipe vai atrás dele e a última coisa que vejo
antes dos dois saírem do meu campo de visão, é a mão de Felipe
na nuca de Bruno, provavelmente apertando-o.
Andrew me encara com um olho roxo e um filete de sangue
escorrendo pelo canto da boca, bem onde Bruno o acertou. Quero
levantar e ir até ele. Quero cuidar dele. Mas estou com medo. Muito
medo.
Mesmo longe, sinto sua respiração pesada e ele não pisca. Suas
mãos estão cheias de sangue e o cheiro me enjoa ainda mais.
— Eu não fiz isso, And. – digo com a voz rouca. Além do sobe e
desce ritmado de seu peito, nenhum outro músculo em seu corpo
parece se mexer. – Eu nunca faria isso com você. Nem com
ninguém. – minha voz embarga, enquanto ele apenas continua a me
encarar.
Coloco as pernas para fora da cama e enrolo o cobertor no
corpo, reunindo o máximo de força e coragem para tentar me
aproximar dele.

— Minha cabeça esta com um grande buraco negro aqui dentro.


– começo. – Eu não me lembro de nada do que aconteceu depois
da pancada na minha cabeça. – levo a mão até o lugar onde sinto
doer e sinto um pequeno caroço se formar. – Estávamos nos
falando por mensagem, fui lavar a louça e voltei para a sala. –
explico. – Eu estava digitando uma resposta para sua última
mensagem quando senti alguém tocar minha barriga e uma
respiração quente no meu pescoço.

Aperto os olhos, sentindo um calafrio percorrer todo meu corpo e


mais lágrimas se formam.

— Ele disse que tinha uma chave do meu apartamento. – volto a


falar. – Eu não sei como. Ele disse que você tinha feito algo muito
feio com ele e que precisou de um advogado para tira-lo da cadeia e
que ficou feliz por saber que você não estava e havia me deixado
sozinha. Ele sabia. De alguma forma.

Paro de falar, sentindo uma dor de cabeça de verdade e seco as


lágrimas.

— Eu não estou sentindo nada. – murmuro, apoiando a cabeça


em seu peito. Penso sentir um rápido e breve toque em meu braço,
mas então sua mão afasta. – Por favor, acredite em mim. – peço.

— Andrew. – a voz de Felipe chega aos meus ouvidos e Andrew


afasta, virando para a porta. – A polícia o levou. – começa a dizer,
baixando o tom para quase um sussurro. – Quando você me ligou,
achei que pudesse ter acontecido algo. Então liguei para eles
pedindo que viesse até aqui.

Andrew olha para mim com uma expressão estranha e tudo o


que consigo sentir é um emaranhado de confusão e dor. Por que ele
não quer falar comigo? Por que ele não acredita em mim?

Meus olhos se enchem de lágrimas outra vez e sinto tudo girar


ao meu redor. É como se eu estivesse em um brinquedo no parque
de diversões e ele girasse muito rápido. Rápido o bastante para que
eu deixasse de sentir o chão debaixo dos meus pés. Ou até mesmo
como se eu fosse o Taz, girando... Girando... Girando... E girando...

— And. – eu o chamo, mas não vejo mais nada.


***
Acordo e por algum tempo fico apenas olhando para o teto do
meu quarto, que agora é iluminado por uma fresta de luz que passa
pela janela entreaberta, que também trás uma brisa gelada com o
cheiro do mar.

Olho para o teto, tentando descobrir se o que penso que


aconteceu aqui foi verdade ou se foi apenas um sonho horrível e se
Andrew realmente esteve aqui há o que? Quanto tempo foi aqui? Eu
não tenho mais noção de nada, apenas da dor latejante em minha
cabeça.

Para mim, Andrew esteve aqui. Felipe esteve aqui e também...


Bruno.

Um calafrio percorre meu corpo quando penso em seu nome e


aperto o cobertor para me aquecer. Tudo esta escuro para mim, mas
o perfume de Andrew no meu quarto não me deixa enganar. E
também o fato de que ainda estou nua e que ele não esta aqui
comigo.

Puxo o cobertor para cobrir a cabeça, tentando não pensar no


que isso tudo significa.

Se for verdade, se tudo isso que esta me atormentando for


mesmo verdade, isso significa que eu posso ou não ter transado
com Bruno, ainda que contra minha vontade, porque eu nunca faria
isso. Fecho os olhos e o aperto com toda força possível. Por favor,
Deus. Que ele não tenha feito isso comigo. Pelo meu filho, ainda
que não por mim.

Arrasto-me para fora da cama, deixando o edredom cair no chão


e vou até o banheiro para poder tomar um banho quente e tirar cada
vestígio de lembranças da minha cabeça, mas não consigo fazer
isso antes de vomitar pelo menos duas vezes.

Ouço a campainha tocar uma vez, bem longe, enquanto termino


de me vestir. Então toca uma segunda vez.

— Já vai! – grito para a porta, passando um moletom fino pela


cabeça. Meu banho me ajudou a enxergar que tudo o que eu pensei
que fosse sonho, era na verdade uma realidade cruel, na qual
Andrew realmente havia se recusado a falar comigo, me tocar ou
até mesmo a acreditar no que eu dizia. – Isso e essa coisa horrenda
aqui. – resmungo, fazendo uma careta para pegar uma meia de cor
marrom, furada e fedida com um pedaço de papel higiênico e vou
até a cozinha para colocar fogo na peça. A campainha toca pela
terceira vez. – JÁ VAI!

Caminho até a porta e destranco. De que adianta isso, se ele


tinha uma chave?
— Oi. – cumprimento Felipe.
— Oi. – ele sorri um pouco sem graça. – Te acordei?
— Não sei bem se eu dormi um se vivi um pesadelo. – respondo.
— Esta tudo bem? – ele pergunta e dou de ombros. – Que fedor
é esse? – ele pergunta outra vez, fazendo uma careta.
— Achei uma meia no chão do meu quarto e tenho certeza de
que não era do... – paro de falar, lançando um olhar pelo corredor.
Mais especificamente para a porta do apartamento dele.
— Quer uma carona para o médico? – pergunta, provavelmente
notando minha excitação em completar a frase. – Depois do que
você passou essa noite é melhor ver se esta tudo bem com o bebê.
E também com você.
— Obrigada. – respondo, dando licença para que ele possa
entrar. – Eu estava me arrumando para ir ao hospital mesmo. Minha
cabeça esta doendo muito e estou com um galo aqui atrás.
— Tinha cacos com um pouco de sangue caído atrás do seu
sofá. – diz, apontando para o lugar onde me lembro de Bruno ter me
apagado com um lenço fedido. Instintivamente levo a mão ao caroço
em minha cabeça, para me certificar de que não esta sangrando. –
E um lenço que foi embebedado por Clorofórmio.
— Por que eu não me lembro de nada? – pergunto, sentindo-me
realmente desorientada.
— É um efeito. – ele responde de imediato. – Tanto o lenço como
os cacos eu juntei e entreguei para um detetive, que vai cuidar do
caso.
— Obrigada. – murmuro. – Eu só vou pegar minha bolsa. –
Felipe apenas concorda com a cabeça e sigo para o quarto, onde
pego a bolsa e um relógio de pulso, mas não encontro meu celular.
Que estranho.

Franzo o cenho, prendendo o relógio ao pulso e vejo que horas


são.
— Ainda é sete horas e meu mundo já esta de ponta cabeça. –
digo mais para mim mesma enquanto volto para a sala. – E eu acho
que não tenho nem mais meu celular e menos ainda um namorado.
Aparentemente.
Felipe nada diz a respeito do meu comentário, além de abrir a
porta e deixar que eu passe na frente. Ele tira a chave de dentro e a
tranca.

— Ainda acho isso à coisa mais inútil a ser feita depois dessa
noite. – resmungo, indo para o elevador. Mas não sem olhar para a
porta de Andrew mais uma vez. Por que ele estaria me evitando
desse jeito, se tiveram tantas provas?

Solto um suspiro cansado e entro no elevador. Felipe o programa


para que desça até o estacionamento.
— Tente não pensar muito nele agora, Luara. – Felipe diz ao
meu lado. – Andrew às vezes tende a ser um pouco impossível e
desorientado.
— Desorientado? – rio sem humor algum. – Sabe quem esta
desorientada, Felipe? Eu estou desorientada. Tudo o que consigo
lembrar é de um homem, na qual eu tenho repulsa, tirando minha
roupa e me deitando na cama. Eu me lembro do toque áspero dele
por meu corpo, mas não sei onde as mãos dele estiveram em mim.
Eu lembro de que ele me deu um beijo no rosto, mas não sei se foi
em mais algum outro lugar. Ou se nós...

Paro de falar, incapaz de dizer isso em voz alta. Se eu tiver


transado com Bruno, sou capaz de desinfetar meu corpo de alguma
maneira.

— Se ele tiver violentado você, será apenas mais uma acusação


contra ele. – Felipe começa a dizer. – Nós vamos ao hospital, você
vai fazer todos os exames necessários e vamos ao seu médico para
ter certeza de que esta tudo bem. Depois vou te levar a delegacia
para que preste queixa a respeito do que aconteceu.

— MAS EU NÃO LEMBRO NADA, FELIPE! – grito para ele e o


elevador para. – Está tudo escuro como a noite, droga.
— Eu sinto muito. – ele diz e saímos do elevador. Eu apenas o
sigo até onde um i30 prata esta.

— Desculpa. – peço logo que paro ao lado do carro e Felipe o


destrava. – Saber isso tudo só me deixa irritada. – volto a falar
quando estamos os dois dentro do veículo. – Era para ele estar aqui
comigo. Não você. Ele que é meu namorado. Ou era. – minha voz
vai baixando a cada palavra. – No entanto, ele não acredita em mim.
Então que eu não sei mais nem se ele ainda é meu namorado ou
não.
— Sabe, eu nunca entendi porque você preferiu ele a mim. –
Felipe diz quase rindo. – Quer dizer, eu não sou bonito o suficiente?
Não sou alto o bastante para você? – pergunta e acabo rindo.
— Você é. Mas...
— Sempre tem um “mas”. – ele me interrompe. – Andrew teve
que resolver algumas coisas. Como disse antes: ele ficou
desorientado com o que viu. Não é como se não acreditasse em
você. Ele precisa de um pouco de espaço. E você também. Ou vão
acabar brigando.
— Quando você entrou no quarto, achei que isso fosse
acontecer. – balanço a cabeça. Felipe sai com o carro, seguindo
pela rampa de saída e digita o código de acesso, provavelmente de
Andrew, para que o portão abra.
Gastamos cerca de duas horas para ir do Golden Village ao
hospital, de lá para o consultório do Dr. Marcus e deste para a
delegacia. E agora estou sentada com Felipe em uma lanchonete
para comer algo.
No hospital eles fizeram alguns exames em mim e um curativo
na minha cabeça, que estava apenas com um machucadinho e a
enfermeira disse que eu fiz bem em ter levado para tirar o sangue e
feito os primeiros socorros, pois poderia infeccionar. Algo da qual eu
não me lembro de ter feito. Meu braço também estava com uma
mancha roxa onde Bruno apertou quando tentei escapar dele.

Com o Dr. Marcus, ele me garantiu de que meu filho estava bem,
mas que eu precisaria começar a tomar precaução para evitar
qualquer coisa. O que eu o ouvi dizer foi: “Tome cuidado ou você
pode acabar abortando”. Aquilo foi mais do que suficiente para
acabar comigo.

Por outro lado, ele também me tranquilizou dizendo que a


pessoa não havia me violentado e que por isso eu não sentia nada.
Perguntou quando eu havia tido minha última relação com And e
constatou que não havia nenhum vestígio de esperma em mim. O
que eu fiz uma oração silenciosa tanto por saber isso, quanto por
saber que meu filho estava bem. Por fim, ele me deu uma vitamina e
já a comprei.
Depois fomos à delegacia e tive de reviver tudo mais uma vez.
Foi um dia horrível, na verdade. E eu terei que voltar ao hospital na
segunda-feira para buscar o resultado dos exames.

— Você esta um pouco pálida. – Felipe observa e tomo o


restante do meu suco de laranja.
— Neste momento, estou com tanta coisa na cabeça, que por
pouco não me arrependo de ter aceitado quando Lucas me propôs
esse trabalho aqui no Rio. – respondo, correndo o dedo pela borda
do meu copo. – Eu só não consigo me arrepender porque existe
muita coisa boa nisso tudo.
— Andrew e o filho de vocês. – ele arrisca e concordo. – Um
momento. – ele pede e remexe no bolso da calça, tirando seu
celular de lá. – Pronto. – diz assim que o atende.

Enquanto Felipe conversa ao telefone, volto à atenção para as


pessoas que passeiam pela calçada, do outro lado do vidro da
lanchonete. Não preciso me atentar ao que ele diz para saber que
esta falando com Andrew e, já que ele não quer falar comigo, não
serei a pessoa da relação que vai atrás.

— Acho que já tomei muito do seu tempo. – digo assim que


Felipe desliga.
— Você não está tomando meu tempo. – diz com um sorriso de
lado, guardando o telefone novamente no bolso. – Somos amigos
também.
— Era ele. Não era? – pergunto apenas para ter certeza.
— Quer que eu vá lá.
— Então é melhor voltarmos. – digo já pegando minha bolsa na
cadeira do meu lado. – Ele é seu melhor amigo. É prioridade.
— Luara... – Felipe começa a dizer, mas não termina. E é melhor
assim, porque sei que minhas palavras não são verdadeiras e que
elas servem apenas como um tiro no escuro, tentando acalmar a dor
que sinto por não saber o motivo de Andrew querer me afastar. A
única coisa que eu queria, além de um amigo com quem conversar,
seria o abraço que apenas ele é capaz de me dar. Mas nem isso eu
tenho mais.
Quando passamos pela portaria, seu José me chamou para
entregar um molho de chaves do meu apartamento. A princípio eu
estranhei, porque nenhuma daquelas chaves era de fato minha. Mas
depois que Felipe me deixou em casa e foi direto para o
apartamento de Andrew, na qual eu pedi para que não comentasse
nada a respeito do que conversamos, descobri que as chaves eram
sim do meu apartamento.

Provavelmente Andrew ligou para o chaveiro e pediu para trocar


toda a fechadura, porque tinha mais outras duas trancas e uma
trava com corrente para dar mais proteção. Ainda que alguém
consiga abrir a porta, se eu trancar com a chave de corrente, não
entra. Percebi também que todas as janelas estavam com novas
travas e cadeados.

O normal seria eu achar tudo um pouco exagerado demais, mas


depois do que passei, não vejo exagero nenhum em ter um pouco
mais de segurança aqui.

Depois de conferir cada trinco e trancar de volta, fui tomar outro


banho para tirar o cheiro de hospital e o da delegacia e acabei
encontrando meu celular em cima do criado-mudo ao lado da minha
cama. E isso foi algo estranho, porque me lembro de ter procurado
no quarto todo antes de sair e não tinha nada. Provavelmente ele
estava com Andrew.
— Lu? – Julie chama do outro lado da linha e reabro os olhos.
— Estou aqui ainda. – respondo, mudando de canal, para ver se
encontro algum programa mais interessante.

Passei a tarde toda na cama depois de trocar todo o jogo de


lençol e coloca-lo no saco de lixo (na verdade eu queria colocar
fogo). O mesmo fiz com a roupa que estava ontem. Fiquei vendo
filme e comendo pipoca de vários sabores que antes eu nunca nem
mesmo havia me permitido provar. Mas hoje foi por motivos de
forças maiores e abri uma exceção.

Quando o primeiro filme terminou, liguei para Julie para saber


como meu carro estava e se ela estava cuidando bem dele ou não.
Acho que nunca senti tanta falta dele como senti hoje. E Julie
acabou percebendo que eu não estava bem e contei a ela tudo o
que aconteceu e isso foi de certa forma bom.

— Você não falou com Andrew até agora? – ela pergunta em um


tom baixo.
— Ele apenas não quer falar comigo, Ju. – respondo baixinho. –
Não tive notícias dele o dia todo. Ele poderia ter vindo falar comigo
depois que Felipe foi embora, mas não foi o que ele fez.
— Vocês tem que conversar Lu.
— Eu sei. – respondo, mordendo o lábio inferior. – Mas e se isso
apenas significar que... – paro de falar, sentindo as lágrimas
acumulando em meus olhos outra vez.

É até um pouco estranho, mas tem uma parte minha que não
quer ver Andrew. Ou falar com ele. Sinto como se ele não tivesse
acreditado em nada do que eu disse, mesmo que eu tenha pedido
para que fizesse isso. E eu o odeio por ter me deixado sozinha o dia
todo, sem dar nem mesmo um sinal que fosse. Sem ligar ou mandar
mensagem para perguntar como eu estava. A última ligação que tive
dele, foi antes da meia-noite, depois do meu celular ter enviado para
ele a mensagem que eu estava digitando antes do Bruno me atacar
na sala. Na verdade, havia dez ligações perdidas em poucos
minutos de diferença.

Por outro lado, quero estar com ele outra vez, ter a proteção que
só fui capaz de sentir enquanto estávamos juntos. Quero que tudo
volte a ser como era antes e que montemos outra vez a decoração
de Natal juntos e que acabemos nos distraindo com coisas mais
importantes. Na raiva, depois que cheguei, eu acabei tirando tudo,
porque tudo na minha sala me lembrava dele.

Não foi pelo Andrew empresário que eu me apaixonei e menos


ainda pelo cara rico que é meu chefe ou pelo safado. Mas sim pelo
homem gentil que me recebeu logo que cheguei a esta cidade e
aquele mesmo que ficou do meu lado quando eu precisei. Que me
deu um abraço quando era a única coisa que eu precisava. Eu me
apaixonei pela simplicidade daquele homem, mesmo sendo quem
ele é; eu me apaixonei pelos momentos que tínhamos, por nossas
conversas e até mesmo pela maneira com que ele enrolava meu
cabelo nos dedos para que eu dormisse mais rápido. E saber que
ele não esta aqui machuca. E eu não consigo simplesmente “odiá-
lo”, porque existe muita coisa entre nós. Ou existiu.

— Lu? – Julie me chama baixinho outra vez, tirando-me por


completo de meus pensamentos.

— Eu vou dormir. – digo já encerrando a chamada e abraço o


ursinho que And me deu na noite que contei para ele que estava
grávida. A única coisa dele que me resta além de sua camisa dos
Cowboys, que acabei guardando junto das minhas coisas quando
voltamos. E ela ainda tem o cheiro suave de lavanda e hortelã que
sempre sinto no corpo dele depois que tomamos banho.

Aperto o ursinho contra o peito, não conseguindo mais conter as


lágrimas que segurei o dia todo.
Capítulo Trinta e Cinco
Segunda-feira

Antes eu achava que aquela primeira noite sozinha tinha sido


horrível, mas hoje sei que não, que ela foi apenas o começo de
tudo. Inclusive da minha vontade de pedir demissão do meu
trabalho e voltar para São Paulo, mas não para a casa dos meus
pais. Talvez nem mesmo para a cidade. Apenas um lugar onde eu
não conheça ninguém e possa começar uma vida, talvez até mesmo
com outro nome.

Por mais que eu tente dormir, tudo o que eu consigo fazer é


pensar no resultado que irei pegar dentro de algumas horas e no
fato de que Andrew não fala comigo.

Agora que estou um pouco mais calma, também estou pensando


em procura-lo para conversar. Para saber como estamos e se ainda
estamos juntos. Eu só não sei como vou fazer isso. Não sei se vou
até a BIT para conversar com ele logo que pegar o exame (segundo
Felipe, ele terá uma reunião com João amanhã pela manhã) ou se
espero até que ele volte à noite. As duas opções me assustam, para
ser sincera. Mas só vou saber como fazer quando chegar a hora da
verdade e como vou estar me sentindo até amanhã de manhã.

Pego meu celular para ver a hora quando acordo pela sei-lá-
quantagéssima-vez. Mas não por não estar conseguindo dormir,
ainda que, segundo meu celular, eu tenha conseguido apenas tirar
um cochilo de vinte minutos, já que ainda não é nem mesmo meia-
noite. Eu acordei com um barulho estranho, que pareceu estar vindo
do quarto de And.
Sento na cama, tentando prestar atenção ao som que atravessa
a parede.

Ele começa baixo e vai aumentando cada vez mais em um ritmo


alterado e ofegante. Rápido. Depois vem um gemido de mulher, que
parece ser capaz de fazer meu coração parar de bater. Um gemido
de mulher que vem seguido de uma risada e sinto meus olhos
encherem de lágrimas ao ouvi-los.

— Eu acho que vou vomitar. – digo, já correndo para o banheiro,


onde acabo colocando para fora tudo o que comi e não comi o dia
todo. O que não foi lá muita coisa. - É claro que ele não ficaria
sozinho. – murmuro, limpando a boca com o punho e me apoio na
pia para levantar.

Ouvir isso hoje apenas me fez ter a certeza de que acabou entre
nós. De que tudo o que existiu, se é que existiu para ele e não
apenas para mim. Por tudo o que ele me dizia, pelas vezes que
disse que me amava... Eu achei que se um dia nós largássemos,
um término que não fosse apenas um afastamento, isso acabaria
acontecendo. Eu só não esperava que fosse ser tão rápido.

Lavo a boca com pasta e enxaguante bucal e volto para o quarto


apenas para pegar meu travesseiro e ir para a sala e fecho a porta
do quarto atrás de mim, apenas para o caso dos dois se animar
mais e o som conseguir chegar até aqui.

Jogo-me no sofá e ligo a TV e coloco qualquer coisa para


“assistir”. Acabou. Sem mais nem menos. Sem discussão, sem
conversa. Sem chance de retorno. Não tem mais como haver
conversa entre nós depois disso. Não sem acabarmos brigando e
talvez seja melhor deixar assim como esta, porque não preciso que
ele jogue na minha cara que pode ter quantas mulheres quiser e
que só precisa estalar os dedos para que se joguem aos seus pés.
Ou para saber que fui uma dessas idiotas por acreditar que ele me
amava.
O alarme do meu celular toca exatamente às sete horas e no
mesmo instante pulo para fora do sofá, indo direto para o banheiro
para poder tomar banho e tirar essa expressão cansada do meu
rosto. Se eu tiver dormido uma hora corrida durante toda a noite foi
muito.

Mudo a temperatura do chuveiro para morno e apenas permito


que a água escorra por meu corpo, levando embora tudo o que sinto
de ruim. Por cada vez que, durante essa noite, pensei em ir até o
apartamento de Andrew e dizer algumas verdades a ele. Por cada
vez que eu o xinguei. Por cada lágrima que permiti que rolasse por
meu rosto. Por mais tempo que fique aqui, a água não é capaz de
levar embora tudo o que estou sentindo. Nem mesmo a raiva, que
apenas cresce dentro de mim.

Não há mais retorno. Nenhuma chance. Se eu considerei isso,


se considerei que com uma conversa nós pudéssemos voltar ao que
éramos na sexta-feira de manhã, tudo foi embora quando ele
começou a transar com outra mulher logo no quarto que faz divisa
com o meu, o que é óbvio que foi proposital, porque ele sempre
soube que eu ouvia tudo.

Enrolo a toalha no meu corpo e vou para o quarto, para poder


vestir a roupa que deixei separada.

Se ele acha que vou ir atrás dele para pedir ajuda para criar meu
filho, está muito enganado! Nunca precisei de homem algum para
me ajudar em nada e não vou fazer isso agora nem nunca. Seremos
apenas meu filho e eu.

— Eu não devia ter deixado Julie ir para São Paulo com meu
carro. – resmungo depois de fazer uma busca pelas chaves dele. –
Ou eu devia ter ido busca-lo logo que chegamos. Mas nããããão!
Para quê eu precisaria do meu carro, não é mesmo?!

Pego bolsa com tudo o que preciso e meu novo chaveiro e saio,
passando a tranca em cada uma das fechaduras que Andrew
mandou colocar. Não existe outra pessoa que possa ter sido tão
paranoica a esse ponto.

Programo o elevador para que desça até a garagem, sentindo


que tudo o que mais preciso nesse momento é sentir aquela
liberdade e adrenalina que só consigo sentir quando estou atrás do
volante, indo a mais de 100km/hr. Mais nada.

Desço todos os vinte e cinco andares e mais o do subsolo sem


nenhuma interrupção de nenhum vizinho. Às vezes eu tenho certa
dúvida se mais alguém mora aqui, porque raramente encontrou
outro morador. Não que eu passei muito tempo em casa, claro.

Saio do elevador, indo a procura do meu carro, para só então me


dar conta, ainda que tenha procurado pelas minhas chaves antes de
sair, que estou sem ele.

— Mas que droga eu vim fazer aqui? – reviro os olhos em uma


repreenda. – Besta! – não consigo deixar de rir um pouco nervosa e
me viro para voltar ao elevador. Mas quando faço isso acabo
trombando em algo atrás de mim, que até poucos minutos não
estava ali.

— Cuidado. – ouço a voz chegar aos meus ouvidos no mesmo


instante que solto um pedido de desculpas. Uma mão grande
segura meu braço, impedindo que eu caísse com a topada que dei
nele. Não é algo, mas sim alguém. E esse alguém eu conheço muito
bem, obrigada.

Encaro o peito forte escondido por baixo da camisa social


sempre bem alinhada e o terno Armani que ele usa por cima. Tento
passar a orem para que minhas pernas se afastem dele, mas não
consigo. Meu coração está acelerado demais para que meu cérebro
consiga passar qualquer outra ordem para o restante do meu corpo.

Ele estava transando com outra essa noite, você quer mesmo
continuar aqui?! Sinto o polegar de Andrew roçar meu braço e pulo
para trás, afastando-me dele e vou direto para o elevador.
Quando entro e aperto o botão para o térreo, ele ainda esta lá,
completamente imóvel, o braço ainda erguido e sua mão
provavelmente da mesma maneira que estava enquanto me
segurava.

Pouco antes de a porta se fechar por completo, ele vira e pela


primeira vez olho para seu rosto. Um sorriso fraco e talvez até
mesmo sentido. Um olhar triste e olheiras por noites não dormidas,
assim como eu. Antes de a porta fechar, penso ver seus olhos
brilharem, mas não pela luz fraca do estacionamento, algo como
uma lágrima, talvez.

— Bom dia. – digo ao rapaz no balcão do hospital logo que me


aproximo. – Vim buscar o resultado de dois exames que fiz no
sábado.
— Qual o nome?
— Luara May Brudosck. – respondo.
— Pode soletrar o sobrenome? – ele pede e sorrio de maneira
educada.
— M-A-Y. B-R-U-D-O-S-C-K.
— Só um momento.
O rapaz arrasta sua cadeira para trás e leio o nome Paulo de
relance no crachá. Ele vai até outra sala onde ficam as impressoras
e retorna instante depois, dobrando o papel para poder colocar no
envelope e peço para que não lacre.
— Tem alguém que pode me dizer o que tem aqui? – peço e
Paulo apenas retira o papel outra vez.
— Você esta grávida de oito semanas. – ele lê. – Seus
resultados estão ótimos e o feto também. – faço uma careta para a
maneira com que se refere ao meu filho, mas não digo nada. – Sem
amostra de esperma nas últimas vinte e quatro horas do resultado.
Sem drogas, sem álcool. Nenhum sinal de pressão alta, diabetes
nem nada com que se preocupar.
— Obrigada. – digo com a voz fraca.
— Você esta bem? – Paulo pergunta parecendo realmente
preocupado.
— Estou. Eu só... É só um enjoo. Já vai passar. – sorrio e ele
concorda.
— Quer ver um médico?
— Não precisa. Já estou me sentindo melhor. Obrigada.

Logo que sai do hospital, peguei o primeiro táxi que encontrei e


pedi para que me trouxesse até a BIT, decidida a esfregar na cara
de Andrew esse resultado e provar que eu não tive merda nenhuma
com aquele desgraçado. O único problema é que não sei como vou
dizer isso ou como vou me sentir por encontra-lo novamente, ainda
mais depois da trombada que dei nele mais cedo. Só sei que não
posso vacilar enquanto tivermos essa conversa.

— Luara! O que você faz aqui? – o segurança, que reconheço


como Alex, me cumprimenta.
— Bom dia, Alex. – eu o cumprimento. – Vim falar com Andrew.
Ele esta aqui ainda?
Ele franze o cenho para mim, provavelmente estranhando minha
pergunta, mas não diz nada a respeito.
— Está sim. Esta em reunião com o João.
— Posso subir para falar com ele? – peço. – É rapidinho.
— Claro. Só vou avisar, por que...
— Não! É surpresa. Por favor. – sorrio para Alex e ele balança a
cabeça quase que rindo.
— Sala de reuniões, vigésimo andar. – ele informa já abrindo o
portão
— Obrigada!
Apresso os passos para dentro do enorme prédio e sinto como
se estivesse vindo aqui pela primeira vez, embora já tenha quase
cinco meses desde que isso aconteceu. A única diferença é que
hoje o lugar está bem vazio, já que todos do escritório estão de
férias.
Paro de frente para a porta fechada da sala de reuniões,
tentando controlar tanto meus batimentos cardíacos como também
minha respiração. Ainda não sei o que vou dizer, mas preciso fazer.
Bato de leve na porta três vezes.
— Entra. – João responde com a voz abafada e abro a porta
somente o suficiente para ver seu interior e me identificar. Andrew
está sentado no seu lugar de sempre. – Acho que é para você. – ele
diz a Andrew, que se endireita em sua cadeira.
— O que você precisa? – pergunta em um tom frio e franzo o
cenho para ele.
— Falar com você. – respondo tão fria quanto.
— Estou em reunião. Se quiser pode esperar lá fora.
João olha para ele e depois para mim com uma expressão
confusa.
— Não acho que seja um assunto que possa esperar. – digo,
cruzando os braços junto ao peito. – Mas se quiser posso falar aqui
mesmo. Acho que você não deveria ter segredos com seu vice-
presidente.
— Pode ir. Eu espero.
Com muito custo, Andrew levanta e vem em minha direção.
Fecho a porta novamente, esperando por ele do lado de fora. Fica
calma.
Fecho os olhos e inspiro fundo. Não posso vacilar logo agora.
— O que você precisa? – ouço sua voz rouca atrás de mim.
Solto o ar lentamente e viro para ele.
Andrew esta com os braços cruzados, encostado na parede. Sua
barba por fazer a uns cinco dias.
— Tem certeza de que quer conversar aqui? – pergunto.
— Estou no meio de uma reunião.
— Claro. – fecho os olhos outra vez e concordo com a cabeça,
sentindo o peso de suas palavras e sua falta de interesse no que
tenho para falar.
Caminho até ele, preenchendo o espaço vazio entre nós. And
mantem o olhar fixo em mim, mas nunca olha diretamente em meus
olhos.

— Aqui esta a droga do exame que prova que eu nunca tive


merda nenhuma com aquele desgraçado do Bruno. – rosno,
batendo com o envelope no peito de Andrew e ele da um passo
para trás. – Não que eu tenha que provar algo para você. Mas é só
para que saiba que eu nunca tive nada com nenhum outro homem
desde que nos conhecemos, bem diferente de você, que se quer foi
homem para terminar um relacionamento antes de arrumar outra. –
empurro seu corpo ainda mais para trás. – Essa criança aqui dentro
de mim era sua, mas não se preocupe, porque você não vai ter que
assumir. Eu não quero nada que seja seu. Nunca quis e não vai ser
agora que vou querer.
Andrew descruza os braços para poder pegar o envelope antes
que ele caia e nossas mãos se tocam por alguns instantes.
— Se isso é tudo o que tem a dizer, eu tenho uma reunião para
continuar. – suas palavras são frias, mas nem mesmo de longe
verdadeiras.
Sempre tive essa coisa mais particular com olhos. Eles são
como se fossem a janela para nossa alma e, ainda que nossa boca
diga uma coisa, eles sempre dizem outra.
Os olhos de Andrew não são diferentes e sempre o entregaram.
Eles estão brilhantes e um pouco lacrimejados, assim como também
estavam quando o vi no estacionamento. Eles parecem dispostos a
me dizer algo que não consigo entender, mas sua boca não permite.
Pude perceber isso com mais clareza quando nossas mãos se
tocaram e ele excitou como se quisesse segurar a minha. E eu
desejei poder segurar a dele também porque, droga, eu o amo.

— Agora você está livre para voltar a transar com suas vadias,
assim como já estava fazendo essa noite. – sussurro com a voz
embargada, secando uma lágrima que escorre por meu rosto e dou
as costas para ele, incapaz de continuar aqui sem demonstrar o
quanto estou sentida com toda essa droga que esta acontecendo
entre nós.
Capítulo Trinta e Seis
Sexta-feira

— Não, mãe. Eu não sei que horas vou chegar ai. – respondo
enquanto fecho o zíper da mala de presentes e a coloco em cima da
cama, que é para não me esquecer de levar isso. Do contrário,
Tommy é capaz de me fazer voltar aqui só para busca-la. – Eu vou
pegar o primeiro ônibus que estiver para passar. – solto um suspiro
cansado. – Sim, a Ju vai me buscar. Não se preocupe.

Respondo cada pergunta da minha mãe mais no automático de


que realmente prestando atenção no que ela diz. Ela esta nervosa,
porque sabe que vou ter que conversar com o meu pai e ela o
conhece melhor do que ninguém.

Permito que ela fale por algum tempo, enquanto decido se levo
ou não meu jeans novo para usar na noite de Natal. Ontem à noite
conversei com Julie e ela me convenceu a ir com ela para a casa da
tia no campo, para que eu pudesse “esquecer”. Não que isso vá ser
algo fácil.

Quer dizer, arrumar todas minhas coisas já esta sendo uma


tarefa difícil. Eu tento não pensar em Andrew e em tudo o que
fizemos juntos em Nova Iorque, nos passeios que fizemos aqui no
Rio essas últimas semanas. Mas o perfume dele continua
impregnado na minha casa, no meu quarto, no meu corpo e na
minha alma.

Olho para a parede de cabeceira da minha cama e resmungo


algo para que minha mãe pense que estou ouvindo ela. Sei que
existe uma chance muito grande de Andrew estar ali do outro lado,
deitado em sua enorme cama, talvez lendo, talvez dormindo ou até
mesmo trabalhando. Sei disso porque muitas vezes fiquei apenas
observando ele fazer uma dessas coisas, ainda que fossem raras as
vezes que ele levou o laptop para o quarto para trabalhar, dizendo
que preferia fazer isso no escritório (que fica em outro cômodo, na
qual não cheguei a ter a oportunidade de conhecer).

Na verdade, acho que quanto mais tempo eu passar longe de


tudo e de todos, melhor vai ser. Eu não estou pronta para responder
todo um questionário interminável a respeito do porque Andrew e eu
não estamos mais juntos e menos ainda quero ouvir qualquer
pessoa dizendo que sabia que não duraria e que ele não presta.
Que só quis se divertir comigo, mas que quando viu as coisas
ficando sérias, resolveu que era hora de pular fora.

Não. Eu não sou obrigada a ouvir esse tipo de coisa e também


não vou permitir que qualquer pessoa que seja, queira falar mal dele
para mim, porque as únicas pessoas que sabem a intensidade que
tudo isso teve na vida um do outro, somos apenas nós dois.
Ninguém de fora jamais vai ser capaz de entender algo assim.

— Não, ele não vai. – respondo a pergunta de minha mãe sobre


Andrew ir comigo.
— Aconteceu algo? – pergunta desconfiada.
— Não é nada. Ele vai precisar antecipar a ida para Londres por
conta do trabalho, então que não vai poder passar as festas aqui. –
minto.
— Sinto muito por isso, querida. – ela diz e olho mais uma vez
para a parede.
— Eu também. – sussurro. – Vou desligar mãe. Tenho que
terminar de arrumar tudo aqui para descansar e poder viajar
amanhã.
— Tudo bem, filha. – diz. – Faça uma boa viagem. Vou esperar
por você aqui. Mande um beijo para Andrew e diga que estou
morrendo de saudades deles.
Solto um suspiro cansado.
— Mando sim, pode deixar. – dou um sorriso fraco. – Até
amanhã, mãe. Amo você.
— Eu também amo você, meu bem.
Encerro a chamada e coloco o celular ao meu lado na cama,
levantando para colocar a mala no chão ao lado da porta e acabo
chutando algo logo que coloco os pés no chão.
— O que é isso? – pergunto, abaixando-me para pegar o
pequeno objeto, que não tem mais do que dez centímetros.

É um pequeno globo de neve com a miniatura de Manhattan e


do Brooklyn, exatamente na parte em que os dois bairros são
ligados pela ponte. Lembro-me que And me deu este no último dia
em que estávamos em Nova Iorque, pouco antes de pegarmos o
táxi para irmos ao aeroporto.

Sento-me na cama e agito o globo, fazendo os pequenos “flocos


de neve” flutuar no “ar” e os observo enquanto caem.

Até esse instante eu não me lembrava dele. Do contrário estaria


na minha sala ou no meu escritório.
A cada floco de neve de glitter que cai, uma nova lembrança me
vem à mente. Desde nossa chegada aquele país, até o momento
que chegamos neste. E cada uma dessas lembranças me faz sentir
uma dor terrível. Uma terrível dor de perca que nunca achei que
sentiria. E eu sinto que cada um daqueles momentos, por menor
que tenha sido, nenhum deles foi pequeno. Todos eles foram
suficientes para se tornarem inesquecíveis. Assim como ele...

Aperto os olhos com força, tentando afastar tudo isso para longe
de mim. Tentando não me lembrar de todos esses últimos dias e do
quanto eu queria entender o motivo dele não ter me procurado para
conversarmos. Tentando entender porque ele quis simplesmente se
afastar de mim e mais ainda entender o motivo dele ter levado outra
para cama em tão pouco tempo.

E eu sinto as lágrimas começarem a escorrer por meu rosto


outra vez, como sempre acontece toda vez que eu tento entender
isso.
— EU ODEIO VOCÊ, ANDREW! – grito contra a parede do
quarto, sem nem mesmo saber se ele esta ali ou não. Mas que se
foda! – Eu te odeio! – afundo o rosto nas mãos, incapaz de conter
as lágrimas. Simplesmente não consigo.

— Esta tudo bem? – sua voz chega abafada pela parede.

— Não esta nada bem! Nada esta bem nessa droga de vida! –
grito de volta e um soluço me escapa. – Só me faz um favor e
esquece que eu estou aqui. Esquece que eu existo, tá legal?

Coloco o globo em cima da cama e levanto, indo para a porta.


Preciso sair daqui. Preciso manter o máximo de distância dele
quanto for possível. Ficar longe e totalmente fora de contado.

Ouço o som de algo bater contra a parede, mas não me viro.


Quando chego à porta, ainda que muito baixinho, eu consigo ouvir
suas palavras como se fossem ditas ao vento:

— Eu não posso te fazer esse favor e simplesmente esquecer


que você existe. Você ainda está aqui dentro de mim. – seguro a
mão no trinco da porta e a puxo para fechar. Suas últimas palavras
chegam ainda mais baixas: – E sempre vai estar, Anjo.

Bato a porta atrás de mim com força e ouço o som de algo se


espatifar do lado de dentro.

Distância! Não era isso o que ele queria? Então é o que vai ter
agora!
***

Entro em meu quarto para poder separar minha roupa e ir tomar


um banho quente. Ainda que sejam apenas seis horas da manhã,
também preciso tomar café e serão longas horas até chegar a São
Paulo. O que eu espero conseguir aproveitar para dormir um pouco,
para quem sabe poder compensar todos esses dias. Digo: todo o
meu corpo esta dolorido por ter passado mais uma noite no sofá. O
que consecutivamente me trás uma dor de cabeça bem chata.
E eu que achava que gravidez realmente fosse capaz de colocar
uma mulher para dormir o dia todo.

— Mas ao que parece você não entende isso muito bem, não é
mesmo? – pergunto, olhando para minha barriga e por instinto eu a
toco. Um pequeno sorriso bobo surge em meu rosto quando noto
que é a primeira vez que faço isso. – O que é isso? – pergunto
quando uma melodia estranhamente familiar começa a tocar e vai
aumentando o volume a cada nota. Franzo o cenho, tentando
descobrir o porquê de sentir isto.

Fecho os olhos, deixando-me levar pela nota, com toda atenção


à letra e a voz da mulher que canta.

Na minha cabeça eu vejo Andrew e suas mãos em meu quadril,


guiando-me por uma dança fora de ritmo e eu escondo meu rosto
em seu peito, sentindo vergonha pelas várias pessoas que nos
veem dançar assim no meio da Times Square. Mas também me
sinto livre pela primeira vez em semanas.

Vejo as luzes ao nosso redor e os altos prédios cheios de


outdoors.

— É a nossa música. – sussurro, reabrindo os olhos, incapaz de


conter o sorriso que surge em meu rosto quando finalmente me
lembro de onde conheço a música.

Depois daquele dia, eu nunca mais ouvi esta música em


qualquer outro lugar que fosse e nunca antes tinha escutado. Era
como se ela não existisse além de na minha cabeça e a de And. No
entanto, ela esta aqui e mais uma vez eu desejo poder falar com
ele.

— Não vá por esse caminho, Luara. – repreendo-me, seguindo


para o banho. Se não fosse tão cedo, eu poderia mudar de ideia e
decidir tomar um banho frio, que é para não pensar nele. Mas como
não sou a maior fã disso, prefiro manter a temperatura agradável.
*
Pauso a música que toca no meu celular e enrolo um robe
vermelho em meu corpo apenas para poder sair do banheiro e ir me
trocar no quarto, onde já deixei separado um jeans, uma camiseta
preta do Pink Floyd e meu All Star. Como é apenas uma viagem de
ônibus, não tem porque eu me enfrescar toda.

A campainha toca, chamando minha atenção para além dos


meus planos. Quem pode ser agora? Franzo o cenho e junto às
duas partes do robe, indo até a sala.

Pelo olho mágico vejo uma pessoa andando de um lado a outro


e passar a mão pelo cabelo.

E mais uma vez ele toca a campainha.


— Linda, eu sei que você esta ai. – ele diz com a voz um pouco
rouca. – Abre, por favor.
Viro de costas para a porta, apoiando-me nela. O que ele esta
fazendo aqui? Merda! Eu não... Inspiro fundo, sentindo meu coração
bater acelerado contra o peito.
— Anjo.
— O que você quer? – pergunto.
— Conversar com você. – ele responde. – Me desculpar pelo
que fiz.
Não consigo evitar a risada de deboche que me escapa.
— Um pouco tarde para querer conversar agora. – digo. – Você
teve a semana inteira para conversar e mesmo assim preferiu me
ignorar.
— Eu estava tentando fugir do que estava sentindo. Por favor,
me deixa entrar. – torna a pedir. – Me deixa explicar.
Fugir do que estava sentindo? – o pensamento me vem à tona. –
Você só vai descobrir se deixa-lo explicar. Apoio à mão na testa e
fecho os olhos, sentindo minha dor de cabeça querer voltar. Não era
isso o que você queria? Ele esta ai. Acabo cedendo e me afasto
para poder abrir a porta.
Assim que abro, vejo que Andrew esta com cada braço apoiado
em um lado do batente e de cabeça baixa.
— Oi. – ele diz, olhando para mim e me da um sorriso fraco. A
expressão em seu rosto parece cansada como se não deitasse na
cama há dias.

— Oi. – respondo e aperto o robe em meu corpo. Como não


esperava por visitas, não me dei ao trabalho de pegar a cinta para
amarra-lo. E não tive tempo de vestir nada além dele. O que chega
a ser um pouco mais reconfortante de que toalha.
— Bonito robe. – And diz com um sorriso de lado. – Posso
entrar? – dou licença para que ele entre e fecho a porta atrás de
mim.
— O que você quer? – pergunto outra vez.
— Te pedir para ficar. – ele diz sério.
— Faça-me rir, Andrew.
— Posso me sentar? – pede e aponto para o sofá, onde ele se
acomoda. Já eu continuo de pé no mesmo lugar perto da porta e
com os braços cruzados. Ele me encara como se soubesse que
estou nua por baixo disso e tento disfarçar a sensação de
desconforto e desejo que sinto. Traída pelos meus hormônios!
— Tudo bem! – exclamo, indo me sentar ao seu lado no sofá e
ele sorri como se estivesse se divertindo com isso. Babaca.
— O que você quer saber primeiro? – pergunta. – Sei que você
deve estar cheia de perguntas e estou aqui para sanar todas suas
dúvidas.
— Por que você estava me evitando? – pergunto antes que
consiga processar tudo isso. Mas eis o que mais tenho pensado
durante todos esses dias e provavelmente é a causa de eu não
dormir a noite.
Andrew apoia o cotovelo nas pernas, fixando o olhar para frente.
Posso notar por sua postura que algo o está incomodando.
— Quando você me mandou aquela mensagem faltando parte e
com algumas palavras estranhas, tentei te ligar umas vinte vezes,
mas você não atendia nunca. – começa a dizer. – Sai do jantar
dizendo que havia acontecido algo e precisava vir embora.
Demorou, mas Felipe atendeu e pedi para que viesse ver como
você estava até que eu chegasse. Mas você não atendia e eu
estava ficando louco de preocupação, pensando que pudesse ter
acontecido algo.
— De fato aconteceu. – eu o interrompo.
— Com você e o bebê. – explica. – Eu não conseguia deixar de
pensar no tamanho do erro que havia cometido por sair e deixar
vocês sozinhos, sem proteção alguma. Eu devia ter insistido mais
para que fosse comigo. Você é minha namorada!
Sinto um arrepio percorrer todo meu corpo ao ouvir suas
palavras. Principalmente a última.
— Eu não queria ter feito nada daquilo. – recomeça. – Mas fiquei
cego quando te vi na cama com ele. Tudo o que eu pensava em
dizer naquele momento, cada palavra, seria no calor do momento.
Da raiva. E eu não queria machucar você.
— Eis aqui uma novidade, Andrew: você não apenas me
machucou como também me magoou. E muito. – cruzo os braços
junto ao peito, internamente desejando que ele olhasse para mim.
— Eu sinto muito por isso.
— Sério?! – solto a pergunta um pouco irônica. – Porque não me
pareceu sentir. Você não pareceu sentir quando não me abraçou
quando me aproximei de você, não pareceu sentir quando
interrompi sua reunião, que era bem mais importante do que tudo o
que tivemos e pareceu sentir menos ainda quando quem me
acompanhou ao hospital foi seu melhor amigo, não você.
— Eu não sei o que dizer a respeito disso. – sussurra. – Dizer
que sinto muito não vai fazer com que você me desculpe por meus
atos.
Andrew apoia a cabeça em suas mãos, olhando para o chão. Eu
não tenho nem mesmo chance de saber o que ele esta sentindo.

Como um grito de desespero, eu tomo sua mão entre a minha,


finalmente conseguindo chamar sua atenção. Seus olhos estão em
um tom de cinza claro e vermelhos.
— Felipe pode ser meu amigo – começo a dizer. –, mas você,
Andrew, você, é meu namorado. Eu não precisava de um amigo.
Precisava do meu namorado para apenas me dar à mão para que
eu pudesse segurar. Você não precisava dizer mais nada.
Sinto minha voz embargar e aperto os olhos para impedir que as
lágrimas me escapem.
— Você desmaiou nos meus braços, linda. – ele diz e reabro os
olhos.
— Espera! – eu o interrompo outra vez. – Eu desmaiei? –
pergunto e ele confirma.
— Você chamou “And” e quando me virei você estava pálida. Só
tive tempo de te segurar. Então eu te deitei na cama e fiquei algum
tempo tentando acorda-la. Mas nada. – explica. – Vi a mancha de
sangue no travesseiro e me lembrei dos cacos de porcelana na sala
e procurei por algum machucado que ele tivesse feito em você.
— Foi você quem fez o curativo na minha cabeça.
— Quando você acordou, disse que estava cansada e pediu
para que me deitasse com você e eu fiz isso. Depois quando você
dormiu, eu ainda estava preocupado com você e nosso filho. Mas
tinha um lugar que eu precisava ir e que não podia esperar.
— O que era mais importante do que ficar com sua namorada
que precisava do namorado? – pergunto e cruzo as pernas, mas me
arrependo disto no mesmo instante.
— Não diria que era “mais importante”. – ele responde. – Até
hoje o síndico esta com medo de mim. – franzo o cenho e ele
prossegue: – Fui falar com ele sobre a droga de segurança que
contratou e pedi para que me deixasse ver as imagens de
segurança da portaria e do nosso andar.
— Você quis ver as imagens para saber se eu o havia deixado
entrar? – pergunto, soltando sua mão e ele a puxa de volta.
— Meu Deus, Luara. Não! – exclama. – São provas. Ele tinha
uma cópia da sua chave. Eu a encontrei na sua porta do lado de
fora. Ela estava aberta. Quando você disse, ela já estava comigo.
Foi por isso que mandei que colocassem tudo aquilo. – diz,
apontando para a porta. – Depois disso sai do prédio.
— Onde você foi? – pergunto, olhando para nossas mãos e ele
passa o polegar por meus dedos.
— Andar. – franzo o cenho com sua resposta vaga e ele sorri. –
Eu falhei, Anjo. Com vocês dois. Não podia aceitar aquele erro.
— Passou pela sua cabeça que poderíamos ter poupado tudo
isso se tivéssemos conversado no domingo? Ou na segunda? –
pergunto e ele confirma.
— Quando você esbarrou em mim no estacionamento eu quis
fazer isso. Queria te levar para o meu carro e não te deixar sair até
que resolvêssemos. – diz. – E na reunião. Estava difícil para mim,
linda. Eu precisava ficar sozinho. Sou mais acostumado assim.
Desculpa.
— Acredite, o que eu senti foi pior do que qualquer coisa que
você possa ter sentido.
Levanto, sentindo-me incapaz de continuar sentada ao lado dele.
Sentindo que não quero mais conversar sobre isso ou qualquer
outra coisa. Principalmente porque mais uma vez ouço aquela
risada dentro de minha cabeça.
Fecho os olhos para afastar tudo isso para longe de mim.
— Quer saber? – pergunto para ninguém, virando para ele outra
vez. – Eu tinha seu silêncio e sua recusa em falar comigo. – começo
a dizer e vou até ele, dando a mão para que a segure. Quando ele o
faz, eu a puxo para que se levante e começo a nos levar para o
outro cômodo.

— Linda? – ele chama quando entramos no quarto.


— Você tinha outra mulher na sua cama enquanto eu chorava
por você todas as noites. – digo irritada, virando-o de costas para
minha cama. – Talvez seja hora de eu começar a transar como você
faz também.
Toco minha mão em seu peito e o colchão balança quando ele
senta na cama. Seu rosto expressa nada além de espanto e
surpresa por minha atitude.
— Quê?! – exclama. – Do que você esta falando?
— Eu ouvi tudo, Andrew. Sempre ouvi. Você sabe.
— Agora eu entendo. – ele sorri e fecho a cara. – Era um vídeo.
– diz. – Sinto vergonha de mim mesmo por ter tentado provocar
ciúmes em você com um vídeo pornô.
— Por que você faria isso?
Andrew levanta outra vez e fica bem de frente para mim. Seus
olhos fixos aos meus.
— Porque sou um idiota e foi por isso que acabei sendo proibido
de deixar minha barba crescer até ser um homem de verdade. – ele
da de ombros e pela primeira vez noto que esta sem a barba. Sem
ela, And parece ser pelo menos dois anos mais novo. – Se você
quiser fazer amor, eu posso tentar. Mas o Pequeno And esta tão pra
baixo quanto eu esses dias. Não sei se ele se animaria logo agora.
Mordo o lábio inferior, sentindo-me idiota por ter tentado usar do
sexo, a coisa que mais sonos compatíveis, para me vingar dele. Isso
nunca daria certo.
— Eu só consigo ser melhor quando estou com você. – diz,
segurando meu rosto. – É como se...
And para de falar e por algum tempo é como se olhasse apenas
para o vazio.
— Se...? – insisto e ele sorri.
— Você é a pessoa certa para mim, mas não estou pronto para
você ainda. – arregalo os olhos ao ouvir suas palavras, sentindo
meu coração doer para valer. – Você merece alguém que seja
realmente seja capaz de te fazer feliz. – sussurra e pela primeira vez
não tenho a impressão de ver uma lágrima escorrer por seu rosto,
mas sim a certeza de que ela esteve ali. – Sou egoísta demais para
te deixar partir.
Fecho os olhos quando sinto seu polegar seguir o contorno do
meu rosto e entreabro os lábios, sentindo minha respiração mais
acelerada com esse simples toque.
— Talvez você não tenha que me deixar partir.
— Ou terminar. – ele conclui e concordo com um movimento de
cabeça. – Não quero que tudo isso termine e cada um vá para um
canto, onde fiquemos tempos sem nos ver e quando isto acontecer
tudo o que nos reste seja a lembrança do que fomos um dia. Quero
ser sua realidade todos os dias, porque você é a minha. – Andrew
entrelaça nossas mãos e aperto forte a sua. – Quero criar nosso
filho com você. Fazer diferente. Fazer da maneira como deveríamos
ter feito desde o começo.
— E como seria? – pergunto.
— Meu erro começou logo que começamos a sair. – diz. – Eu
deveria ter agido mais como seu namorado de que como seu chefe.
Faço bico para sua resposta, mas acabo sorrindo.
— Eu gosto do meu chefe safado. – digo em resposta e ele sorri.
– Mas só quando ele é assim comigo.
— Vou deixar sua sugestão anotada aqui. – concordo com a
cabeça e ele prossegue: – Sei que apenas essa conversa não vai
ser o suficiente para deixar as coisas melhores entre nós logo de
cara e que provavelmente os dois precisem de espaço para colocar
tudo em ordem antes de voltar. Quer dizer, eu quero esquecer tudo
o que aconteceu sábado.
— Eu já esqueci. – sorrio, embora essa verdade seja horrível. –
O que foi? – pergunto quando ele fecha a cara. – And?

— Vá para São Paulo com meu carro. – diz, mudando


drasticamente de assunto. – Você não precisa ir de ônibus, sabe
disso. Seu carro só esta com Julie por minha causa. Por favor, vá
com meu carro. Depois peço para que alguém o busque para mim.
Ou você fica com ele e mando trazerem o seu.
— Eu preciso do tempo da viagem para pensar, And. – digo por
fim.
— Pensar?
— Até alguns minutos atrás era em uma forma de matar você
quando eu voltasse. – ele ri com minha resposta. – Mas agora...
— Pelo menos me deixe ir a São Paulo com você para conversar
com seus pais. – insiste.
— Eu já disse que você precisaria viajar para Londres antes do
previsto. – respondo. – Seria estranho você aparecer por lá agora.
— Mudança de planos, Anjo.
— Quero conversar com eles sozinha. Sei que não vai ser fácil,
mas preciso fazer isso.
— Quero que você me avise quando for fazer. – pede. – Se não
conseguir sozinha, eu vou até lá. Eu voltaria de Londres apenas
para ter essa conversa com seus pais. Afinal, eu sou o pai do seu
filho.
Andrew sorri ao dizer isto, mas o efeito de suas palavras tem
resultado diferente em mim.

Jogo meus braços ao redor do pescoço de And e o beijo,


sentindo meus pés saírem do chão quando ele envolve os braços
em meu quadril, puxando-me para cima. E eu sorrio contra sua
boca, abraçando-o com as pernas.
— Por favor. – peço e ele nos leva para a cama, onde me deita e
por algum tempo fica apenas encarando o sobe e desce acelerado
do meu peito, até que tira a própria camisa e o cinto, deitando em
cima de mim. – Por que você tem sempre que me fazer sentir tanta
raiva de você? – pergunto, puxando-o para perto de mim e o beijo.

Ele prende minhas mãos acima da minha cabeça e sinto seus


lábios em meu pescoço.
— Porque eu amo você. – sussurra.
***
Andrew para com o Audi no estacionamento da rodoviária
quando é quase uma da tarde. Eu já deveria estar em São Paulo há
essas horas. Mas... Algo me impediu de sair na hora planejada. Ele
desliga o motor do carro, levando as mãos ao pescoço para tirar
algo.
— Quero que você fique com isso. – diz, passando seu colar
pelo meu pescoço e seguro o crucifixo entre minhas mãos. Isso é
ouro puro!
— And...
— Você me devolve quando eu voltar. – franzo o cenho para ele.
– Eu vou para Londres na segunda-feira. Quero que fique com ele.
— Então você realmente vai. – sussurro e desvio o olhar para
frente, de repente querendo ir logo para a plataforma.
É claro que ele vai para Londres. Ele já ia antes para poder
passar um tempo com os pais e eu ia junto. Mas saber disso agora,
depois de termos ficado praticamente a manhã toda na cama
juntos... Eu não esperava. Não depois de tudo o que
compartilhamos e conversamos. Não depois de eu ter pensado que
tudo estaria bem. É claro que nada estaria bem. Bruno ainda esta
enfiado entre nós. Não vai ficar bem enquanto as coisas
continuarem assim.

— Anjo? – ele chama e seco uma lágrima que escorre por meu
rosto. – Anjo, por favor, olhe para mim.
— O que foi?! – pergunto irritada.
— Se você disser que não me ama mais... – começa a dizer,
mas eu o interrompo:
— Isso não tem nada a ver com amar ou não, And. Sei que indo
para São Paulo não tenho muito direito de cobrar algo de você.
Muito menos a respeito disso, porque eu nunca competiria com seus
pais. Ainda mais depois de não ter deixado você ir comigo conversar
com os meus.
— Apenas me responde. Por favor.
— Você sabe que não posso dizer isso, Andrew. – sinto minha
voz embargar ainda mais e ele sorri, como se minha resposta fosse
tudo o que precisava ouvir.

Andrew pega algo na porta do seu lado e sai, vindo para o meu
lado.
Assim que desço, ele toma meu rosto entre suas mãos,
puxando-me para perto de si e me beija da mesma maneira com
que fez naquele dia na praia. Um beijo suave.
Prendo minhas mãos em sua camisa e as lágrimas escorrem por
meu rosto enquanto correspondo ao seu beijo, seu toque... And me
puxa para mais perto, envolvendo todo meu corpo em um abraço.
— Me desculpa por ter te feito passar por isso. – sussurra em
meu ouvido e o aperto forte, sentindo um medo terrível do que suas
palavras possam significar.
— Não faz isso. – peço e ele afasta. – And.
— Não abre agora. – diz, entregando-me um envelope
totalmente vermelho com a palavra “Anjo” escrito no meio e um
adesivo de coração, lacrando-o.
Sinto sua mão tocar minha barriga e sigo seu olhar para onde ela
repousa em mim e eu a cobro com minha própria mão.

— O que foi? – pergunto quando ele sorri.

— Eu usei este colar por anos. – diz. – Eu estava com ele na


noite em que nos conhecemos em São Paulo e parei de usa-lo
pouco depois. Quero que você fique com ele para que saiba que eu
não vou desistir de você.
— Então talvez eu precise te dar algo para manter as Vadias
Britânicas longe de você. – ele sorri.

— Dentro deste envelope tem tudo o que não consegui te dizer


aqui. – diz e aperto o envelope contra o peito como se o abraçasse.
– Qualquer coisa que acontecer, eu quero que você me ligue.
Concordamos que não nos afastaríamos nessas semanas.

— Eu só vou para o interior, And. Talvez meu celular fique sem


sinal, mas como você mesmo disse: concordamos em continuar.
Mas precisamos esquecer isso.

Outra vez ele me abraça, ainda que desta vez com força
suficiente para me tirar do chão e sinto meu mundo ruir.

— Eu amo você. – sussurro em seu ouvido, abraçando-o tão


forte quanto.

— Eu sei. – sussurra de volta e sinto seu beijo em meu rosto.


Páginas Perdidas
Véspera de Natal

Duas semanas já se passaram desde que me despedi de Andrew


na rodoviária. Duas longas semanas desde a última vez em que nos
vimos e do nosso último beijo... E, mesmo com todo esse tempo
entre nós, ainda não consigo esquecer quando seus lábios tocaram
o meu e tenho dúvidas de que um dia seja capaz de algo assim.
Não até que voltemos de vez. A maneira com que ele me abraçou...
Ter o calor de seu corpo junto ao meu foi como ter... Como ter de
volta algo que há muito havia perdido, mas não tinha me dado conta
do quanto sentia falta daquilo. E agora que eu sei o que perdi e o
valor disto, eu sinto todos os dias.
Naquela primeira segunda-feira, pouco antes dele embarcar, nós
conversamos até que chamassem por seu voo. And queria saber se
eu já tinha falado com meus pais e como as coisas tinham ido. Dizer
que foi péssimo seria falar pouco.
Quer dizer, como minha mãe já sabia há algum tempo, porque
acabei entregando de vez suas suspeitas, ela ficou do meu lado
quando meu pai não concordou com nada daquilo. Ele dizia que não
tinha criado ninguém para ser mãe solteira, que não ia ajudar a criar
filho de ninguém e que por isso eu não deveria contar com ele para
nada. E eu estava chateada com o que estava acontecendo com
Andrew e irritada com o que Bruno me fez. Eu não estava em um
momento que nem de longe era bom. Então que eu respondi a
altura cada coisa que ele me dizia. Falei que não precisava dele
para isso e que era mulher suficiente para criar uma criança ainda
que fosse sozinha. O que não seria o caso, porque meu filho teria
um pai.
Eu não contei nem metade da conversa para Andrew, porque sei
que ele teria trocado a passagem no mesmo instante e eu não
queria que ele fizesse nada disso. Eu só queria ficar sozinha e
incomunicável com o mundo. Sem celular, sem mensagens. Até
mesmo sem sinal de fumaça. E eu dei graças a Deus quando Julie
passou de casa com meu carro no dia seguinte, para que
pegássemos a estrada rumo a Botucatu, porque isso significava que
eu teria tudo o quê mais precisava: paz. Paz para ler todos meus
livros atrasados, sem ter que me preocupar com mais nada.

Depois daquela conversa, acho que parei de sentir por algum


tempo.
Saber que Andrew estava em Londres me tirava toda esperança
de que ele pudesse aparecer aqui em São Paulo para que
terminássemos o que havíamos começado naquele último dia.
Porque eu o desejo a cada instante, apesar da raiva que sinto dele.

E eu já li sua carta umas mil vezes ou mais, mas sua ausência


ainda me causa uma dor terrível, mesmo que eu saiba que isso seja
para o nosso próprio bem e que posso ir vê-lo em Londres quando
quiser, porque ele me deu uma passagem para lá sem data
marcada. Mas fazer uma viagem como essa me assusta. Não
porque sei que vou encontra-lo, mas sim porque terei que ir sozinha,
sabendo que eu deveria ter ido com ele assim como havíamos
combinado de ir depois do Natal.

E agora eu estou aqui deitada no porta-malas do meu carro,


lendo sua carta outra vez, esperando pelo dia que eu irei vê-lo
novamente. Esperando pelo dia que eu poderei abraça-lo e beija-lo
outra vez, porque nossas raras conversas ao telefone há muito já
não me bastam mais.

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