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DIREITO PENAL I

2º ANO, 1º SEMESTRE

1º TESTE - DEZEMBRO 2017

NELSON RODRIGUES 20160601


DIREITO PENAL I – UAL - DIREITO 2017/18 – 2º ANO - 1º SEMESTRE - 1º TESTE

A – NOÇÃO DE DIREITO PENAL E DE CRIME......................................................................................................5


A.1 – DIREITO PENAL....................................................................................................................................5
A.2 – CRIME..................................................................................................................................................5
A.3 – DIREITO PENAL E CIÊNCIA PENAL........................................................................................................5
A.4 – DIREITO PENAL E O DIREITO PUNITIVO DO ESTADO............................................................................5
A.5 – NATUREZA DO IUS PUNIENDI..............................................................................................................5
A.6 –.............................................................................................................................................................6
A.7 – O PODER PUNITIVO E O ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO.............................................................6
B – FINS DO DIREITO PENAL E DAS SANÇÕES PENAIS.......................................................................................6
B.1 – DISTINÇÃO ENTRE FINS DO DIREITO PENAL E FINS DAS PENAS...........................................................6
B.2 – A LEGITIMIDADE DAS SANÇÕES – REMISSÃO......................................................................................6
B.3 – DIVERSIDADE DO DIREITO PENAL........................................................................................................7
B.3.1 – Fins do Direito penal e fins do direito...........................................................................................7
B.3.2 – Diversidade de fins imediatos do direito penal.............................................................................7
B.4 – FIM DE PREVENÇÃO GERAL DE CRIMES...............................................................................................7
B.4.1 – Prevenção Geral Negativa.............................................................................................................7
B.4.2 – Prevenção Geral Positiva..............................................................................................................8
B.5 – FIM DE REDUÇÃO DA VIOLÊNCIA ESTATAL..........................................................................................9
B.5.1 – Princípio da Intervenção Mínima (utilitarista)..............................................................................9
B.5.2 – Perspetiva Garantistico-Individual................................................................................................9
B.5.3 – Contenção da Reação violenta das vítimas.................................................................................10
B.5.4 – Outras Teorias sobre os fins do Direito Penal.............................................................................10
B.5.5 – Observações Finais sobre os fins do DP......................................................................................11
B.6 – NATUREZA E FINS DAS SANÇÕES PENAIS...........................................................................................11
B.6.1 – Pluridimensionalidade dos fins das sanções penais....................................................................12
B.6.2 – Natureza e fins das penas criminais................................................................................................12
B.6.3 – Natureza e fins das medidas de segurança.....................................................................................12
B.6.4 – Monismo e dualismo das penas e medidas de segurança..........................................................13
C – CARATERÍSTICAS ESSENCIAIS DO DIREITO PENAL.....................................................................................13
C.1 – CARÁCTER CULTURAL, NORMATIVO E VALORATIVO DO DIREITO PENAL..........................................13
C.2 – O DIREITO PENAL DO FACTO..............................................................................................................14
C.3 – Princípio da Autonomia.....................................................................................................................14
C.4 – PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE................................................................................................15
C.5 – PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE.......................................................................................................15

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C.6 – PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE.................................................................................................16


C.7 – OS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA JURISDICIONALIDADE.............................................................16
C.8 – PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE...........................................................................................................16
C.9 – PRINCÍPIO DA HUMANIDADE DAS PENAS E DA DIGNIDADE DA PESSOA...........................................17
C.9.1 – Pena como ultima ratio das sanções jurídicas............................................................................17
C.9.2 – A dignidade da pessoa humana como limite da duração e execução das penas........................17
C.10 – NATUREZA DO DIREITO PENAL........................................................................................................17
D – CLASSIFICAÇÕES DO DIREITO PENAL E DAS INFRAÇÕES PENAIS..............................................................17
D.1 – PARTE GERAL E PARTE ESPECIAL DO DIREITO PENAL........................................................................17
D.2 – DIREITO PENAL COMUM E DIREITO PENAL ESPECIAL........................................................................18
D.3 – DIREITO PENAL DE JUSTIÇA E DIREITO PENAL SECUNDÁRIO.............................................................18
D.4 – DP ESTRANGEIRO E DP INTERNACIONAL...........................................................................................18
D.5 – CLASSIFICAÇÃO DAS INFRAÇÕES PENAIS...........................................................................................18
D.6 – OUTRAS CLASSIFICAÇÕES..................................................................................................................18
E – O DIREITO PENAL E OUTROS RAMOS DO DIREITO....................................................................................19
E.1 – DIREITO PENAL E DIREITO CONSTITUCIONAL.....................................................................................19
E.2 – DIREITO PENAL E DIREITO CIVIL.........................................................................................................19
E.2.1 – A responsabilidade civil emergente do crime.............................................................................20
E.3 – DIREITO PENAL E DIREITO DISCIPLINAR.............................................................................................20
E.5 – DIREITO PENAL E DIREITO INTERNACIONAL.......................................................................................20
E.5.1 – Direito Internacional Penal.........................................................................................................20
F – O ILICITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL.................................................................................................20
F.1 – REGIME JURÍDICO DAS CONTRA-ORDENAÇÕES.................................................................................21
F.1.1 – Aplicação subsidiária do DP........................................................................................................21
F.1.2 – Agentes e forma de contra-ordenação.......................................................................................21
F.1.3 – Coimas e sanções acessórias.......................................................................................................21
G - AS CIÊNCIAS PENAIS. DOGMÁTICA JURÍDICO-PENAL...............................................................................21
G.1 – HISTÓRIA E FILOSOFIA DO DP............................................................................................................21
H- EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL..................................................................................................................22
H.1 – PERÍODO DA VINGANÇA....................................................................................................................22
H.2 – PERÍODO HUMANITÁRIO...................................................................................................................22
H.2.1 – O direito Penal e a “Filosofia das Luzes”.....................................................................................22
H.2.2 – Beccaria – “Dos delitos e das penas”..........................................................................................23
H.3 – DIREITO NATURAL E A SUA INFLUÊNCIA............................................................................................23
H.4 – ESCOLA CLÁSSICA..............................................................................................................................24
H.5 – PERÍODO CIENTIFICO OU CRIMINOLÓGICO.......................................................................................24

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H.5.1 – Determinismo.............................................................................................................................24
H.5.2 – Os evangelistas...........................................................................................................................25
H.5.3 – Movimento Positivista................................................................................................................25
I – HISTÓRIA BREVE DO DP PORTUGUÊS........................................................................................................25
I.1 – DAS ORIGENS ATÉ ÀS ORDENAÇÕES..................................................................................................25
I.2 – DAS ORDENAÇÕES AO CÓDIGO PENAL DE 1852.................................................................................26
I.2.1 – Constituição de 1822...................................................................................................................26
I.2.2. – Constituição de 1826..................................................................................................................26
I.3 – DO CÓDIGO PENAL DE 1852 AO CÓDIGO PENAL DE 1982..................................................................26
I.3.1 – Do CP 1852 ao CP 1886................................................................................................................26
I.3.2 – CP de 1982...................................................................................................................................27
I.3.3 – CP de 1982/1995..........................................................................................................................27
J – MÉTODO SISTEMA E PLANO......................................................................................................................27
J.1 – PRRESSUPOSTOS POLÍTICO-FILOSÓFICOS...........................................................................................27
J.2 – MÉTODO.............................................................................................................................................28
K – PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.......................................................................................................................28
K.1 – Evolução Histórica.............................................................................................................................28
K.2 – Dimensão Atual e Estado de Direito..................................................................................................28
K.3 – Garantias que contém o Princípio da Legalidade...............................................................................29
K.3.1 – Nullum Crimen, nulla poena sine lege previa..............................................................................29
K.3.2 – Nullum Crimen, nulla pena sine lege certa.................................................................................29
K.3.3 – nullum crimen, nulla pena sine lege scripta................................................................................29
K.3.4 – nulla poena sine judicio..............................................................................................................29
K.4 – FONTES DO DIREITO PENAL. RESERVA DE LEI E RESERVA RELATIVA DE LEI.......................................29
K.4.1 – Reserva de Lei e Leis penais em branco......................................................................................30
K.4.2 – Reserva de Lei e DI......................................................................................................................31
K.4.3 – Princípio da Legalidade e Integração de Lacunas - Analogia.......................................................31
K.4.4 – Conceção Formal ou substancial do crime – justificação das normas penais. A nomo dinâmica.
................................................................................................................................................................32

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A – NOÇÃO DE DIREITO PENAL E DE CRIME

A.1 – DIREITO PENAL


É a parte do ordenamento jurídico que estabelece quais são os comportamentos humanos
qualificados como crimes e os estados de perigosidade criminal, define os agentes dos crimes e
os sujeitos dos estados de perigosidade e fixa as penas e medidas de segurança a serem
aplicadas.

Direito Penal é o sistema de normas jurídicas que atribuem ao agente de certo comportamento,
como pressuposto, uma pena ou medida de segurança como consequência.

A.2 – CRIME
 Conjunto de pressupostos de que depende a aplicação ao gente de uma pena ou medida
de segurança criminal (artº 1º, do código de processo penal de 1987)
 Facto descrito e declarável passível de pena por lei e o estado de perigosidade cujos
pressupostos estejam definidos por lei e a que seja aplicável medida de segurança criminal
(artº 1º do CP)

A.3 – DIREITO PENAL E CIÊNCIA PENAL


Em sentido restrito (DP material) – A ciência do Direito Penal é o conjunto de conhecimentos e
princípios ordenados metodicamente de modo a tornar possível a elucidação do conteúdo das
normas penais e dos institutos em que elas se agrupam com vista à aplicação aos casos
correntes.

Em sentido amplo – A ciência penal tem por objeto não apenas as normas do direito penal
material mas também as do processo penal e do direito penitenciário.

Em sentido mais amplo – abrangendo a dogmática penal e outras ciências que se ocupam dos
crimes e dos criminosos.

A.4 – DIREITO PENAL E O DIREITO PUNITIVO DO ESTADO


D Penal em sentido subjetivo ( ius puniendi) – é a faculdade que os estado tem de determinar
quais os comportamentos humanos que são crimes, ameaçar os agentes desses comportamentos
com penas ou medidas de segurança e aplicar as sanções a quem violar os preceitos.

Direito Penal em sentido Objetivo (Ius poenale) – complexo de normas e princípios consagrados
na lei, que dirigem e disciplinam concretamente o exercício da faculdade de punir, definindo os
crimes, as respetivas consequências jurídicas e as condições e modo de aplicação.

O Estado encontra no Direito Objetivo a fonte, o modo e o limite da própria ação punitiva

A.5 – NATUREZA DO IUS PUNIENDI


O poder punitivo do estado pode ver-se de 3 formas:
a) Definição das normas incriminadoras (definir crimes e sanções);
b) Aplicação da norma por meio do processo
c) Execução da pena concretizadora na sentença condenatória

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A.6 –
Considerando a perspetiva do poder de punir como poder do estado de definir quais os
comportamentos criminosos e por isso proibidos. Pode afirmar-se que o dto penal é um poderoso
instrumento de estruturação política e social da sociedade. O dto penal compartilha com todas as
outros ramos do direito a ambição de obter das pessoas que conformem o seu comportamento a
um certo projeto, o projeto definido pelo poder.

A.7 – O PODER PUNITIVO E O ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO


O princípio do estado de direito visa, no que ao direito penal diz respeito, apenas sancionar atos
ou comportamentos contrários ou desviantes da ordem jurídica. O Estado encontra-se limitado por
um conjunto de valores e princípios também no direito penal.
Inere ao estado de direito democrático que as incriminações sejam justificadas por razões
materiais.

B – FINS DO DIREITO PENAL E DAS SANÇÕES PENAIS


Direito penal em sentido Amplo – Abrange todos os ramos do direito que direta ou indiretamente
tratam da criminalidade.

Direito Penal em sentido restrito – Conjunto de normas que proíbem ou impõem determinado
comportamento humano sob ameaça de uma pena criminal aos violadores dos seus comandos e
ainda as que definem os pressupostos dos estados de perigosidade e as medidas de segurança
criminais aplicáveis às pessoas julgadas perigosas.

A análise dos fins do direito penal pode equacionar-se em 3 perspetivas: a do ser, a do dever ser
expresso pelo direito positivo e a do dever ser sem limitação a qualquer direito positivo.
 Perspetiva do ser: funções sociais do direito penal. Cabe no âmbito das ciências sociais
 Dever ser do direito positivo – quais os fins que um direito penal positivo se propõe
 Dever ser sem limitações – construir uma teoria legitimadora do direito penal

B.1 – DISTINÇÃO ENTRE FINS DO DIREITO PENAL E FINS DAS PENAS

As penas criminais, como as sanções jurídicas, são uma consequência desfavorável


normativamente prevista para o caso de violação de uma norma e pela qual se reforça a sua
imperatividade. As sanções não são condição de essência do direito embora sejam muito
importantes para a sua vigência.

As sanções são instrumentais relativamente aos fins do direito e servem para reforçar a
imperatividade das normas, que por sua vez têm por finalidade ordenar a vida social conforme à
justiça.

No aspeto prático a natureza das sanções é frequentemente utilizada para distinguir o Direito
penal dos demais ramos do direito.

B.2 – A LEGITIMIDADE DAS SANÇÕES – REMISSÃO

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O direito penal, enquanto limitador da liberdade das pessoas, impondo-lhes e proibindo-lhes


certos comportamentos é por si só um mal, só sendo tolerável, e por isso legítimo, quando
necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses também dignos de proteção jurídica.

As sanções penais consistem num sofrimento imposto ao agente do crime como consequência do
facto ilícito praticado, e nessa medida, constituem um mal. As diversas teorias sobre os fins das
sanções penais buscam a legitimação deste mal.

A busca desta legitimação tem sido feita por duas vias:


 Considerando que o mal da sanção não é um mal, antes um bem, porque nega o mal do
crime e restaura o direito;
 Considerando que o mal da sanção é um mal útil, um mal menor, um mal necessário.

B.3 – DIVERSIDADE DO DIREITO PENAL

B.3.1 – Fins do Direito penal e fins do direito

Quando nos interrogamos sobre os fins do direito penal questionamos a razão por que deve existir
um ramo do direito de tão gravosas consequências. O denominador comum das respostas é de
que o direito penal é legítimo porque é um fator redutor da violência na sociedade. Sendo um mal
é um mal menor perante o mal maior que evita.

O direito penal tem um efeito dissuasório, de prevenção, que limita a violência. Ao mesmo tempo
impede que os cidadãos ofendidos se sintam compelidos a fazer justiça pelas suas próprias mãos.
Por fim, limita o poder punitivo do estado, limitando os possíveis abusos dos seus agentes.

Sendo limitador da liberdade é legítimo porque é criador de maior espaço de liberdade.

B.3.2 – Diversidade de fins imediatos do direito penal

A legitimação do direito penal resulta da conjugação de:


 Fins utilitaristas – Fruto do movimento iluminista. Assenta na ideia de prevenção.
 Fins Garantisticos – De defesa da pessoa (em termos formais) e de defesa contra os
abusos do poder punitivo do estado e a violência dos demais.

B.4 – FIM DE PREVENÇÃO GERAL DE CRIMES

Assenta em considerações utilitaristas de que o direito penal evita ou mantém a violência social
em níveis toleráveis, constituindo, desta forma, um mal menor do que o que resultaria da sua
ausência.

A norma penal, ao proibir ou impor, afirma o desvalor do comportamento social em


desconformidade com o preceito. Significa a vontade do sistema em que não se pratiquem factos
em desconformidade com o que a lei impõe ou proíbe.

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B.4.1 – Prevenção Geral Negativa

Para tentar que os comportamentos sejam conformes à lei o sistema prevê consequências
desfavoráveis para os violadores. A previsão das consequências do incumprimento (sanções
penais) teria um efeito preventivo na medida em que as pessoas quereriam cumprir a norma para
não sofrerem o mal em que a sanção se traduz.

Foi esta a formulação de Feuerbach, segundo a qual, para dissuadir o potencial delinquente da
prática de um crime seria necessário ameaça-lo com um mal superior ao que lhe resultaria da
renúncia à sua prática. Esta teoria baseia-se na ideia do homem como um ser que pondera
racionalmente as vantagens e inconvenientes que lhe podem advir da prática de um determinado
ato.

A teoria da prevenção negativa corresponde a uma visão utilitarista do direito penal.

Críticas
 Pode conduzir a ameaçar e castigar uma pessoa não responsável, se isso se mostrar
como necessário ou útil para evitar um mal social grave.
 Poderá subverter as exigências da proporcionalidade ao mal do crime e à culpabilidade do
agente;
 Será necessário demonstrar que o direito penal pode exercer essa prevenção com
eficácia.

Na sua função de prevenção o direito penal não se mede pela irradiação do crime mas ela sua
contribuição para a contenção da criminalidade e que esta função resulta não da gravidade da
sanção mas essencialmente da grande probabilidade da sua aplicação.

O efeito dissuasório do DP não resulta simplesmente da sua existência e da sua efetiva aplicação,
mas sobretudo do conhecimento da existência da lei e da sua efetiva aplicação. Além desse
conhecimento, o grau de probabilidade de o agente vir a ser descoberto, julgado e condenado tem
também grande importância.

O efeito intimidatório diverge em relação ao tipo de delinquente.

Os efeitos da prevenção geral negativa são tanto maiores quanto estes têm mais a perder no
plano social com a punição.

Acresce que a orientação das pessoas para a legalidade pela intimidação, pelo medo da pena é
incompatível com o ideal democrático que assenta no culto da liberdade.

B.4.2 – Prevenção Geral Positiva

As teorias da prevenção geral positiva assentam na educação, na integração, na reafirmação dos


valores comunitariamente assumidos, na prevenção pela integração.

Esta teoria considera que o DP não pode, nem deve, limitar-se à intimidação, mas deve procurar
influir positivamente sobre a comunidade para lhe reforçar a consciência jurídica e a sua
disposição para cumprir as normas.

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B.5 – FIM DE REDUÇÃO DA VIOLÊNCIA ESTATAL

Desde que o DP moderno existe que se lhe reconhece, ao lado da prevenção geral do crime, a
missão de reduzir ao mínimo a própria violência estatal.

Kant e Von Liszt consideram o DP como a “magna Charta” do delinquente.

 Princípios utilitaristas – restrição da intervenção penal, na medida em que esta constitui um


mal, ao mínimo necessário em termos sociais.
 Princípios de Garantia Individual – Justiça, proporcionalidade, humanidade.

B.5.1 – Princípio da Intervenção Mínima (utilitarista)


Se o estabelecimento de uma pena menos grave, ou ate a descriminalização de determinado
comportamento, não redundar em menor eficácia punitiva deve atuar-se em conformidade. O
Contrário também é válido.

As incriminações, porque limitadoras da liberdade dos cidadãos, e as penas, porque se traduzem


em sofrimento infligido, devem limitar-se ao mínimo indispensável para a realização dos seus fins.

O princípio da intervenção mínima exprime a ideia de que o DP há-de reduzir a sua intervenção só
aos casos em que seja absolutamente necessária em termos de utilidade social geral.

A ideia de que a pena criminal só é admissível quando não haja outro mal menor que cumpra a
mesma finalidade tem duas manifestações:
 Deve prescindir-se da incriminação sempre que seja possível esperar efeitos similares
preventivos, da intervenção de meios menos lesivos;
 Deve prescindir-se de uma sanção penal mais grave sempre que possa esperar-se efeito
similar de outra sanção penal menos gravosa.

B.5.2 – Perspetiva Garantistico-Individual


A prevenção não se limita a si própria. A introdução de critérios limitadores da prevenção é uma
questão cultural, de modelo do estado, do estado liberal de direito.

Os limites ao ius puniendi, em defesa das pessoas em face do poder punitivo do estado, assume-
se como fim do DP.

B.5.2.1 – A Formalização como caraterística do DP


Uma caraterística do DP é o seu alto grau de formalização. Esta formalização preside ao exercício
do ius puniendi, mostrando-o como um exercício limitado por garantias estabelecidas em favor do
delinquente e das vítimas.

A formalização expressa-se em princípios formais e materiais: legalidade, proporcionalidade,


humanidade, igualdade e ressocialização.

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B.5.2.2 – Fim da proteção jurídica dos bens jurídicos e da proteção da vítima


O DP tem um objetivo prático e socialmente útil: proteger aqueles bens ou interesses de cuja
tutela depende a garantia de uma convivência pacífica, os bens essenciais para uma ordenada
convivência humana. A tutela penal de bens ou interesses de importância secundária seria
desproporcionada, por excessiva.

O acento posto na proteção dos bens jurídicos faz olvidar a vítima dos crimes.

No pós guerra nasceu a vitimologia e as atenções da doutrina passaram a prestar atenção à


vitima, primeiro numa perspetiva das causas do crime, depois com a preocupação de atender às
suas necessidades e de proteger os seus interesses.

A consideração da vítima no plano criminal tem incidências em vários domínios, nomeadamente


na atribuição de indemnizações por parte do estado na atuação policial e no procedimento penal.
Manifesta-se no plano da reparação de danos causados pelo crime como componente da sanção,
e na escolha da espécie e na determinação da medida penal aplicada.

B.5.3 – Contenção da Reação violenta das vítimas


A disciplina do ius puniendi tem a importante função de conter a reação das vítimas dos crimes e
consequentes excessos. Tem a função de limitar a justiça privada. Ao deixar para o estado a
função de vingar a vítima previne-se o perigo de novos crimes.

B.5.4 – Outras Teorias sobre os fins do Direito Penal

B.5.4.1 – Teorias da Redistribuição


Assentam no pressuposto do desvalor meta jurídico dos comportamentos violadores do preceito
penal. Concebem a pena como fim em si mesmo, isto é, como castigo, compensação, reparação
ou retribuição do mal do crime, independentemente da utilidade que pode resultar da punição.
Pune-se “quia peccatum est”, porque a pena é justa em si.

A caraterística comum destas teorias é o conceito de retribuição do mal com o mal, como relação
entre o crime e a pena. A legitimidade externa da pena não está condicionada por fins
extrapunitivos, como sucede com as teorias utilitaristas.

Estas doutrinas dividem-se consoante o valor religioso, moral ou jurídico atribuído à retribuição.

Esta conceção gira em torno de três ideias de cariz religioso: vingança, expiação e reequilíbrio.

Estas ideias entraram em crise durante o iluminismo, mas foram relançadas no Séc. XIX.
 Kant – A pena é uma retribuição ética justificada pelo valor moral da lei violada;
 Heggel – A pena é uma retribuição jurídica justificada pela necessidade de reparar o direito
violado com uma violência contrária que restabeleça a ordem legal.

B.5.4.2 – Teorias da Prevenção Especial


 Mediante a prevenção
 Mediante a intimidação efetuada com a aplicação da pena;
 Mediante emenda do delinquente.

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Propõem-se desviar o homem do crime pelos efeitos sobre o próprio delinquente a quem a pena é
aplicada, ao contrário das teorias da prevenção geral que pretendem exercer a sua influência
sobre as pessoas em geral.
B.5.4.3 – Doutrinas pedagógicas da emenda
São as mais antigas. Assentes numa concessão espiritualista do homem baseado no livre arbítrio,
desenvolvem uma antiga ideia repressiva segundo a qual os delinquentes podem não só ser
castigados mas também coagidos a corrigirem-se.
Os defensores desta doutrina consideram que a pena deve sobretudo impedir a recaída do
delinquente no crime, o que se consegue mediante o arrependimento do criminoso. O fim da pena
nestas doutrinas é a reeducação e recuperação moral do delinquente.

B.5.4.4 – Doutrinas terapêuticas da defesa social


A ideia central desta orientação é que o delinquente é um ser antropologicamente inferior, mais ou
menos desviado ou degenerado. Nesta perspetiva as penas assumem o caráter de medidas
técnicas apropriadas para as exigências terapêuticas de defesa social. Teve origem em Itália na
escola positiva de Ferri.

Em contraposição às doutrinas da emenda assentes no livre arbítrio, estas teorias consideram o


homem como entidade animal carente de liberdade e completamente sujeito às leis da
necessidade natural.

B.5.4.5 – Programa de Marburgo


Franz Von Liszt elaborou um modelo de direito penal como instrumento da ressocialização,
neutralização ou intimidação segundo os diferentes tipos de delinquentes.

B.5.4.6 – Apreciação Crítica


Estas tendências doutrinárias consideram o crime como patologia e as penas como terapia
política através da cura ou da eliminação. Em todos os casos é a pessoa, mais do que o crime, o
que passa para primeiro lugar para determinação dos fins e quantidades das penas. Justificam
modelos de DP totalitário e tendencialmente ilimitado. São incompatíveis com o respeito da
pessoa humana. Contradizem o valor da liberdade e da igualdade ao pressuporem o delinquente
como ser anormal ou inferior.

B.5.5 – Observações Finais sobre os fins do DP


Ao ideal democrático é inerente o reconhecimento de que todos os seres humanos são dotados
de direitos inalienáveis e o culto da liberdade e tolerância, o que não significa a renúncia à
coerção para defesa dos valores essenciais de uma sociedade livre. O estado democrático não
pode, por isso, renunciar ao DP quando necessário para defesa dos valores fundamentais da
democracia.

B.6 – NATUREZA E FINS DAS SANÇÕES PENAIS


As sanções penais são instrumentais relativamente ao DP. São meios de tutela e de tutela
repressiva porque aplicáveis em consequência da violação de uma norma jurídica. A aplicação
das sanções tem por fim imediato satisfazer os interesses originados pela violação das normas.

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O que há de caraterístico na tutela repressiva é a mesma constituir uma reação do direito contra
factos ilícitos; logo que estes ocorram segue-se-lhes como necessário efeito jurídico a adscrição
de suportar uma privação de bens.

À privação dá-se o nome de sanção; à necessidade de suportar a sanção dá-se o nome de


responsabilidade.
A ideia de pena tem implícita a de castigo.

A evolução histórico-social influi sobre os fins imediatos das penas e sobre os tipos de castigos
adotados como penas.

O conceito de sanção penal no DP moderno abrange as penas e as medidas de segurança.


 Pena – traduz a reação jurídica à culpabilidade do delinquente pelo mal do crime
 Medida de segurança – Traduz a reação jurídica à perigosidade do delinquente.

B.6.1 – Pluridimensionalidade dos fins das sanções penais.

 Retribuição – A pena deve servir para compensar a culpa pelo mal cometido. A aplicação
da pena ao culpado de um crime atua como ato de apaziguamento das emoções sociais
causadas pelo crime. A retribuição do mal do crime com o sofrimento da pena imposta ao
criminoso visa destruir os efeitos do crime mediante a justa compensação penal,
restabelecendo o equilíbrio, a autoridade, a confiança e a segurança perturbadas pelo
comportamento criminoso.
 Prevenção Geral – A efetiva aplicação da pena serve para afastar a generalidade dos
cidadãos da prática de crimes, quer pelo temor do castigo (prevenção geral negativa), quer
pelo conhecimento, compreensão e consequente orientação em ordem aos valores que o
sistema jurídico consagra.
 Prevenção Especial – Assenta sobre a ideia e que a aplicação da pena serve para evitar
que esse agente cometa novos crimes no futuro. O fim da pensa seria evitar a futura
delinquência.

B.6.2 – Natureza e fins das penas criminais


A pena traduz a reação à culpabilidade do delinquente pelo mal do crime e é repressão porque,
originada pelo crime, se dirige não somente para o futuro, mas para o passado. A pena é castigo
imposto a quem merece e justifica-se como reafirmação de um valor consagrado pela lei; é a
maneira de se fazer valer o valor cuja positividade a lei reconhece.

B.6.3 – Natureza e fins das medidas de segurança


A medida de segurança traduz a reação à perigosidade do agente e, por isso, pode mesmo ser
aplicada a agentes de factos objetivamente ilícitos, mas em que o agente atua sem culpa, porque
inimputável.

A finalidade da medida de segurança não é a de castigar, tendo uma finalidade essencialmente


curativa, de afastamento da perigosidade do agente, indiciado pela prática de factos tipicamente
ilícitos que revelam o estado de perigosidade criminal e da sua recuperação social.

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O crime tem, para a aplicação de medidas de segurança, valor sintomático e de prova, mas nunca
é o fundamento dessas medidas. A medida de segurança é útil na perspetiva do interesse social –
como meio de combate à perigosidade -, e sob a perspetiva do interesse individual – como meio
de recuperação da própria dignidade e liberdade interior do homem.

A impossibilidade de justificar as medidas de segurança só pela utilidade social é comprovada por:


 Não pode haver medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade com carácter
perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida (30, nº1 CRP)
 Só quando a perigosidade se basear em grave anomalia psíquica e na impossibilidade de
terapêutica em meio aberto, poderão as medidas de segurança ser prorrogadas
sucessivamente (30, nº2 CRP)

B.6.4 – Monismo e dualismo das penas e medidas de segurança


As medidas de segurança são aplicáveis tanto a delinquentes imputáveis como a inimputáveis
perigosos.
Sucede frequentemente que a perigosidade do delinquente excede os limites da sua culpa no
caso concreto. Nestes casos a questão é se devemos aplicar medidas diversificadas
correspondentes à diferenciação da culpa e da perigosidade (sistema dualista) ou uma só medida
penal que realize simultaneamente os fins da pena e da medida de segurança (sistema monista).

O sistema dualista atenta na separação de pressupostos da pena e da medida de segurança:


culpabilidade e perigosidade. O sistema monista atende à estrutura similar de execução da pena
de prisão e da medida de segurança privativa da liberdade.

O CP segue a tendência monista ao consagrar a pena relativamente indeterminada que pretende


assegurar tanto a punição como a realização do fim de prevenção social, mediante a
ressocialização do delinquente (83 a 90)

Na pena indeterminada, a fixação da pena corresponde à culpabilidade enquanto a sua


prorrogação se justifica como medida de segurança em função da perigosidade criminal.

C – CARATERÍSTICAS ESSENCIAIS DO DIREITO PENAL

C.1 – CARÁCTER CULTURAL, NORMATIVO E VALORATIVO DO DIREITO


PENAL
Sendo a cultura a ação que o homem exerce sobre a realidade visando a sua transformação para
outra mais realizadora da sua humanidade, o direito, como realização do espírito humano, tem
natureza cultural: é instrumento de cultura e realidade cultural.

A ordem jurídica, como a ordem social, não é uma ordem da necessidade mas uma ordem da
liberdade, uma ordem da cultura.

O DP, como todo o direito, tem carácter normativo. Diz-se ético ou normativo quando só se
compreende do ponte de vista do dever ser. Não se limita à descrição de condutas humanas,
antes procura orientá-las, estabelecendo como as pessoas devem conformar os seus
comportamentos sociais.

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A ordem que o direito impõe é imperativa, tem a sua finalidade, realizar a justiça, a segurança e o
bem comum, aspira ao progresso e à cultura e tem força de agrilhoar as consciências,
condicionando a liberdade.

Numa perspetiva particular, o DP não tem apenas natureza sancionatória de comportamentos


humanos valorados por outras ordens normativas, mas contém nos seus próprios preceitos juízos
de valor sobre as condutas, e por isso as impõe como um dever ser, como comportamentos que
devem ser observados em razão da sua própria valoração.

C.2 – O DIREITO PENAL DO FACTO


O crime é um facto, um comportamento humano. O Artº 1º do CP dispõe que só pode ser punido
criminalmente o facto. “cogetaciones poena nemo patitur” (ninguém deve sofrer pena pelos seus
pensamentos), exprime uma exigência de segurança sob o risco de se punir meras intenções.

Nem sequer os atos preparativos devem ser puníveis porque equívocos, salvo quando representar
por si só um perigo grave para os bens jurídicos tutelados pelo direito penal (artº 21).

C.3 – Princípio da Autonomia


Existe a ideia de que as leis penais nada comandam, autorizam ou proíbem e que se limitam a
sancionar imperativos preestabelecidos noutras leis constitutivas da ordem jurídica,

Esta doutrina do carácter minimamente sancionador do DP tem a ve com a estrutura técnica das
normas penais. O preceito penal esconde o juízo de valor e o imperativo de conduta social para
apresentar somente o imperativo de punição. Não diz “matar constitui um crime e por isso não
matarás”, mas sim “quem matar outra pessoa é punido com pena de prisão de X anos.” Este
imperativo pressupõe o prévio juízo de valor sobre o facto e o imperativo, o comando dirigido a
todas as pessoas que não matem outros.

Toda a norma é desdobrável em 3 preposições ou juízos. Veja-se o exemplo do artº 131 do CP


a) Matar uma pessoa constitui um mal para a vida em sociedade;
b) Não mates outra pessoa;
c) Quem matar será punido.

O DP surge-nos em 3 modalidades no sistema da ordem jurídica:


1. Como exclusivo criador de normas para tutela do bem jurídico. Quando a tutela do bem
jurídico só resulta da norma penal. Antes de o comportamento lesivo ser pressuposto na lei
como crime, tal não podia ser considerado ilícito (ex: proteção da vida através da
incriminação do homicídio).
2. Como concorrente, em pé de igualdade, com outros ramos do direito na tutela de bens
jurídicos. – Bens jurídicos que se encontram protegidos também por outros ramos do
direito (proteção do património, protegido pelo direito civil e pelo direito penal)
3. Como complemento da tutela concedida por outros ramos do direito. Quando o direito
penal parece não ter autonomia, emprestando as suas sanções a preceitos de outros
ramos (quando uma lei administrativa se encontra um artigo punindo com a pena de crime
a desobediência).

O DP é um verdadeiro direito autónomo, cujas normas são primárias, novas, resultantes de


considerações diversas das que originaram as outras regras do direito.

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A razão pela qual devemos excluir o carácter puramente sancionador do DP está no interesse
coletivo especial que existe sempre a dominar a norma penal.

Da autonomia do DP resulta que as leis se devam interpretar autonomamente, sem atender ao


modo como os outros ramos do direito defendem os interesses por eles tutelados.
Uma outra perspetiva da autonomia do DP respeita ao seu relacionamento com a moral. O DP é
entendido como correspondendo ao mínimo ético indispensável à vida em comunidade e nesta
perspetiva estaria subordinado à oral social perdendo autonomia. Na verdade o DP não visa obter
a conformidade de comportamentos humanos com quaisquer imperativos morais, tão só a sua
conformação com os imperativos jurídicos que são determinados em razão da sua utilidade social
e não para formar ou reforçar a consciência moral das pessoas.

As regras morais e as jurídicas, ainda que com conteúdo rigorosamente idêntico, são regras
diversas, impondo-se por sim mesmas. A distinção entre direito e moral não significa
necessariamente separação: autonomia não é oposição.

C.4 – PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE


Também denominado princípio da proibição do excesso, é um princípio geral do direito, que num
sentido muito amplo preconiza o justo equilíbrio entre os interesse em conflito, obrigando os
operadores do direito a resolver o mesmo em função dos valores subjacentes e os fins
prosseguidos.

A restrição legítima da liberdade pressupõe a proibição do excesso dessa restrição e em


consequência a adequação, a necessidade e a proporcionalidade das restrições e das sanções
penais aplicáveis e aplicadas ao crime previsto e cometido.

 Princípio da adequação – As normas e as sanções devem revelar-se adequadas para a


prossecução dos fins visados pela lei.
 Princípio da necessidade – concretiza-se no princípio a intervenção mínima, significa
que as normas e as sanções devem revelar-se necessárias, porque os fins prosseguidos
pela lei não podem ser obtidos por outros meios menos onerosos.
 Princípio da proporcionalidade Strictu Sensu – Os meios e os fins devem situar-se
numa justa medida, determinada pela gravidade do mal causado e censurabilidade do seu
autor. Exige a limitação da gravidade da sanção à gravidade do mal cometido, com base
na adequação da pena ao fim que deve cumprir.

De referir, como observou Bentham, que a ideia da proporcionalidade da pena ao crime não
oferece nenhum critério objetivo de ponderação dado que não existem critérios naturais, mas só
critérios pragmáticos baseados em valorações ético-políticas.

A dificuldade na definição da qualidade da pena e a sua relação com o crime respeita à noção da
gravidade do crime.
 Visão objetiva – mede a gravidade do crime
 Visão subjetiva – Mede o grau de culpabilidade.

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C.5 – PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE


Só se deve recorrer ao DP como instrumento de tutela de bens jurídicos quando a incriminação for
necessária e adequada.
 Sentido restrito – o recurso ao DP é injustificado ou supérfluo quando a tutela do bem for
eficaz mediante sanções de natureza não penal
 Sentido amplo - a solução penal seria a preferível sempre que a função estigmatizante do
DP fosse útil para os fins de uma mais forte reprovação do comportamento e
consequentemente mais enérgica tutela do bem jurídico

C.6 – PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIEDADE


È um aspeto do princípio da subsidiariedade. A escolha dos comportamentos que merecem
sanção penal faz-se de modo fragmentário:
 Nem todos os factos socialmente danosos constituem crimes, só aqueles que o legislador
qualifica como tais.
 Nem todo o comportamento lesivo dos bens que são alvo da tutela penal constitui ilícito
penal, só aquele que ocorre nos termos da previsão legal. Só o facto típioco é penalmente
ilícito.

Se a opção penal deve representar a ultima ratio é consequente que se recorra à previsão
incriminadora só para as agressões mais graves de um bem merecedor de tutela penal, para os
quais o interesse público impõe o meio extremo de punição penal.

C.7 – OS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA JURISDICIONALIDADE


Característica do DP é a legalidade, garantida no artº 2º da CRP e no artº 1º do CP, segundo a
qual ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare
punível a ação ou omissão, nem sofrer medida de segurança cujos pressupostos não estejam
fixados em lei anterior, nem serem aplicadas penas ou medidas de segurança que não estejam
expressamente cominadas em lei anterior.

Outra caraterística é a jurisdicionalidade (29 e 32 da CRP, 80 do CPP), que significa que a


competência para decidir a matéria penal e aplicar penas e medidas de segurança é da exclusiva
competência da jurisdição.

C.8 – PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE


É considerado como fundamento e limite de qualquer política criminal num estado de direito. Este
princípio pretende preservar uma série de garantias.

Significa que a pena se funda na culpa do agente pela sua omissão ou ação, isto é, em um juízo
de censura do agente por não ter agido em conformidade com o dever jurídico, embora tivesse
podido conhecê-lo, motivar-se por ele e realizá-lo.

A culpa pressupõe a consciência ética, isto é, a capacidade de a pessoa dominar e dirigir os


próprios impulsos psíquicos e de ser motivado por valores e a liberdade de agir em conformidade,
sem admissão das quais não se respeita a pessoa nem se entende o seu direito à liberdade.

A exigência constitucional da culpabilidade deduz-se do princípio da dignidade da pessoa


humana.

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Ninguém é classificado como delinquente por ter certas caraterísticas segundo os critérios sociais
dominantes. O homem é delinquente por ter agido, violando o dever de não agir, ou omitindo o
cumprimento de um dever jurídico de agir, por própria opção, comm consciência e vontade de
desobedecer à lei.

Consequências deste princípio:


1. Exigência de dolo ou negligência e consequente afastamento da responsabilidade
simplesmente objetiva.
2. A necessidade de que a pena se refira a facto próprio.
3. A necessidade de ter em conta a situação concreta em que o agente se encontrava ao
tempo de cometer o crime para que as circunstâncias concorrentes possam exercer o seu
papel excludente ou redutor da pena.
4. Exigência de que a pena seja proporcionada à culpa do agente, isto é, que entre o castigo
e o facto exista um equilíbrio.

C.9 – PRINCÍPIO DA HUMANIDADE DAS PENAS E DA DIGNIDADE DA


PESSOA

C.9.1 – Pena como ultima ratio das sanções jurídicas


A pena criminal é um ato de força, a ultima ratio de que a sociedade lança mão para fazer
respeitar as suas normas. Cumprindo o DP uma função de proteção da sociedade e da pessoa, a
aplicação da pena só pode ser aceite quando seja necessária para essa proteção. O poder
punitivo deve ajustar-se simultaneamente ao humanitarismo como manifestação de respeito pelas
pessoas e como necessidade social de castigo.

C.9.2 – A dignidade da pessoa humana como limite da duração e execução das


penas
O Princípio da humanidade das penas, enquanto limite do poder punitivo do estado, é aquele que
melhor carateriza a evolução do sistema penal contemporâneo. É incompatível com sanções que
atinjam a própria dignidade da pessoa. Tem ainda a ver com o modo de execução das penas,
especialmente com a pena de prisão, mas não só. O arguido ainda que condenado e a cumprir
pena criminal não perde a sua dignidade nem os direitos que lhe são inerentes e reconhecidos
pela lei a todas as pessoas.

C.10 – NATUREZA DO DIREITO PENAL


A maioria dos autores entende que o DP é direito público quer atendendo ao critério do interesse
protegido, quer ao critério da posição dos sujeitos, quer à natureza da tutela concedida aos seus
preceitos. Existem, no entanto, opiniões diversas, como a do Professor Oliveira ascenção.

D – CLASSIFICAÇÕES DO DIREITO PENAL E DAS INFRAÇÕES


PENAIS

D.1 – PARTE GERAL E PARTE ESPECIAL DO DIREITO PENAL


A parte geral corresponde aos princípios comuns a todos os crimes. A parte especial corresponde
aos crimes em particular.

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Uma parte completa a outra, a parte geral sem a especial não faz sentido e as regras da parte
especial têm de ser completadas com as da parte geral para se determinarem as normas de
conduta.

A parte geral tem a pretensão da universalidade, isto é, ser aplicável aos crimes do DP e a todos
os crimes previstos em legislação avulsa se esta não dispuser especialmente.

D.2 – DIREITO PENAL COMUM E DIREITO PENAL ESPECIAL


 Comum – tem assento no texto fundamental, normalmente o código penal, e corresponde
às disposições básicas do DP aplicáveis também às demais leis penais que não constam
desse texto base, quando estas não disponham diversamente.
 Especial – É o que se encontra nas leis penais que não constam do texto base,
denominadas frequentemente como leis penais extravagantes. Também conhecido como
DP complementar e DP particular.

D.3 – DIREITO PENAL DE JUSTIÇA E DIREITO PENAL SECUNDÁRIO


 DP clássico ou de justiça – tutela os bens jurídicos fundamentais da vida comunitária ou da
personalidade (vida, integridade física, etc)
 DP secundário – tutela os bens jurídicos que se relacionam com a atuação da
personalidade do homem como fenómeno social, aqueles bens de criação ou manutenção
de uma certa ordem social, mais ou menos indiferentes à ordem moral.

D.4 – DP ESTRANGEIRO E DP INTERNACIONAL


Há casos em que os tribunais portuguesas devem aplicar a lei penal estrangeira (6º, nº 2 e 5º CP)

DP Internacional é o direito penal estrangeiro. É um DP emergente de factos normativos


internacionais (8º CRP)

D.5 – CLASSIFICAÇÃO DAS INFRAÇÕES PENAIS


As classificações fundamentais são 4:
 Segundo a gravidade – distinguem-se as infrações penais e as contravenções
 Segundo o regime jurídico – distinguem-se em crimes comuns e crimes especiais
 Segundo o regime jurídico tutelado – crimes contras as pessoas, crimes contra o
património, contra a paz, a humanidade, etc
 Segundo a natureza da ofensa ao bem jurídico – crimes de perigo e crimes de dolo

Contravenção – Facto voluntário, punível, que unicamente consiste na violação ou na falta de


observância das disposições preventivas das leis e regulamentos independentemente de toda a
intenção maléfica. O elemento de distinção é o elemento objetivo da infração, que nas
contravenções se reduz à desobediência das disposições preventivas das leis e regulamentos.

O crime de dano carateriza-se pela efetiva lesão do bem jurídico tutelado. No crime de perigo o
crime fica completo independentemente da lesão. Pode ser presumido pela lei (crime de perigo
abstrato) ou ser exigida a sua efetiva verificação no caso concreto, como elemento do próprio
crime (crime de perigo concreto)

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D.6 – OUTRAS CLASSIFICAÇÕES


Crimes Económicos
Crimes Tributários
Crimes políticos
Crimes ambientais
Crimes informáticos
Crimes militares
Crimes de imprensa

E – O DIREITO PENAL E OUTROS RAMOS DO DIREITO


Há interpenetração de disposições pertencentes a diversos ramos do direito, todos integrando a
ordem jurídica que é uma só.

Já foram referidas as relações que o DP tem com o Direito Processual Penal e com o Direito
penitenciário, de tal forma que DP em sentido amplo abrange também o direito processual penal e
o direito penitenciário.

E.1 – DIREITO PENAL E DIREITO CONSTITUCIONAL


O DP está intimamente relacionado com o DC tendo por objeto o estatuto jurídico do político e não
apenas a estrutura do estado e as funções, atribuições e limites dos órgãos de poder político.

O DP funda-se na constituição uma vez que as normas do DP ou são formalmente constitucionais


ou são autorizadas ou delegadas por outras normas constitucionais e ainda porque as opções
axiológicas constitucionais devem ser respeitadas pelas normas penais que lhe são subordinadas.

A constituição não contém normas penais incriminadoras mas contém normas que condicionam o
conteúdo das normas penais: as que proíbem a pena de morte (24/2), Tortura (25), penas ou
medidas de segurança com carater perpétuo ou de duração ilimitada ou indefenida (30), privação
por motivos políticos da cidadania (26) e que delimitam o sentido e o âmbito de aplicação no
tempo das normas penais (29) e as suas fontes (168/1/c).

É as constituição que estabelece o quadro de valores fundamentais da ordem jurídica portuguesa.


No domínio penal emanam da constituição o princípio da culpa, da subsidiariedade, legalidade,
proporcionalidade, humanidade e jurisidicionalidade da aplicação do DP.

Há todo um conjunto de princípios do DP que fazem parte da essência do estado de direito e do


estado constitucional, como sucede com o princípio da legalidade nas suas diversas
manifestações.

E.2 – DIREITO PENAL E DIREITO CIVIL


O DP distingue-se formalmente do Direito civil pela natureza das sanções aplicáveis aos
respetivos ilícitos.

Não há diferença substancial ou ontológica entre o iliciot penal e o ilícito civil: h´+a diferença nas
sanções. O ilícito civil determina sempre, como consequência jurídica, ou a execução forçada, ou
a obrigação de indemnização, ou a obrigação de restituição da coisa ou a nulidade do ato. O DP
acarreta uma consequência especial, a pena ou medida de segurança penais que consistem num

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mal infligido ao autor do facto ilícito e que afetam ou podem afetar a própria pessoa do autor. O
ilícito civil determina, em regra, coação patrimonial, o ilícito penal determina coação pessoal.

O ilícito civil afeta de modo principal o interesse de cada pessoa ou de um grupo, isoladamente
considerados, enquanto o ilícito penal representa um dano ou perigo público e geral.

E.2.1 – A responsabilidade civil emergente do crime


A sanção civil é essencialmente um remédio, enquanto a sanção penal é um castigo, já nada
remedeia, tendo por função principal a prevenção futura da criminalidade. Sucede que o facto
criminoso pode causar, e causa geralmente, danos patrimoniais e morais ao ofendido e a pena
criminal não é adequada a reparar esses danos.

É hoje geralmente aceite que a indemnização por perdas e danos causados pelo crime tem pelo
menos uma função adjuvante da pena criminal e não falta quem entenda que ela pode ou deve
ser estruturada como um tertium genius das sanções penais. Isto porque o interesse da vitima é
muitas vezes mas bem servido através da reparação dos danos que sofreu do que através da
aplicação ao agente de uma pena de prisão ou de uma multa.

E.3 – DIREITO PENAL E DIREITO DISCIPLINAR


São ambos direitos punitivos, mas distinguem-se pela natureza da sanção e pelos fins que cada
um prossegue. O direito disciplinar prossegue o bom funcionamento dos serviços, das empresas e
de certas atividades profissionais mediante a imposição de deveres funcionais.

As sanções disciplinares têm fins idênticos aos das penas criminais: reprovam e procuram
prevenir faltas idênticas por parte de quem quer que seja obrigado a deveres disciplinares em
especial àquele que as violou.
 O ilícito disciplinar é diverso do ilícito criminal
 As sanções disciplinares são independentes das penais, podendo existir sem elas ou
acumular-se com elas.

E.5 – DIREITO PENAL E DIREITO INTERNACIONAL


Segundo Benthom, o DP Internacional aproxima-se do direito internacional privado pois ume
outro são direitos nacionais. O direito penal internacional seria o direito interno destinado à
resolução de potenciais conflitos, constituído por normas cuja função é a de determinar a lei
aplicável a factos criminoso e que podem entrar em conexão com várias ordens jurídicas.

E.5.1 – Direito Internacional Penal


É o ramo do Direito público internacional que determina as infrações, estabelece as penas e fixa
as condições de responsabilidade penal internacional dos estados e dos indivíduos. A relevância
interna deste direito está expressa no artº 29/23 da CRP.

F – O ILICITO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL


Como referido no DL 433/82, a distinção entre crime e contra-ordenação “terá, em última
instância, de ser jurídico-pragmática e, por isso, também necessariamente, formal”

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O critério utilizado pelo prof. Figueiredo Dias para a distinção da ilicitude de mera ordenação
social da criminal é o da relevância ou irrelevância ética das condutas – critério material,
qualitativo e não apenas formal.

A lei distingue crime de contra-ordenação por um critério formal, ao definir no artº 1º, nº1 do DL
433/82 “constitui contra-ordenação todo o facto ilicito e censurável que preencha um tipo legal no
qual se comine uma coima”.

F.1 – REGIME JURÍDICO DAS CONTRA-ORDENAÇÕES


Segundo o DL 433/82, o mesmo facto pode constituir simultaneamente um crime e uma contra-
ordenação. A distinção material verifica-se ao nível da tipicidade da conduta.
 Contra-ordenação – neutralidade ética que integra o ilícito
 Ilicito penal – desvalor da conduta

F.1.1 – Aplicação subsidiária do DP


Por força do 32º do DL 433/82, as normas do CP são subsidiariamente aplicáveis no regime da
contra-ordenação. O mesmo se passa com o Código de processo penal. Esta aplicação
subsidiária nem sempre é fácil pois pressupõe a existência de uma lacuna. Só pela interpretação
das normas primariamente aplicáveis se pode determinar se a matéria está ou não
completamente regulada, e só concluindo pela insuficiência do regime diretamente aplicável se
recorrerá ao direito subsidiário.

F.1.2 – Agentes e forma de contra-ordenação


As coimas podem aplicar-se tanto às pessoas singulares como às pessoas coléticas e estas são
responsáveis pelas contra-ordenações praticadas pelos seus órgãos no exercício das suas
funções.

Os agentes das contra-ordenações podem ser autores, instigadores ou cúmplices, sendo


aplicáveis subsidiariamente os artº 26 e 27 do CP.

F.1.3 – Coimas e sanções acessórias


Ás contra-ordenações são aplicadas:
 Sanção principal – Coima (quantia em dinheiro)
 Sanção acessória: perda de objetos pertencentes ao agente, interdição do exercício de
profissão, etc.

As sanções acessórias configuram-se como uma componente de uma pena mista, aplicável em
função da gravidade da infração e da culpa do agente.

G - AS CIÊNCIAS PENAIS. DOGMÁTICA JURÍDICO-PENAL


A ciência do direito chama-se dogmática jurídica porque se trata de ciência de normas
estabelecidas pelo legislador e que constituem o dado primário fundamental. Trata-se de ciência
do “Dever Ser”, cujo objeto é constituído por normas que estabelecem um preceito e uma
consequência jurídica para a sua violação.

O método da ciência do DP é o técnico-jurídico, cujos meios nos levam ao conhecimento das


normas. É um método de natureza lógico.abstrata.

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G.1 – HISTÓRIA E FILOSOFIA DO DP


Nem a história nem a filosofia do DP são ciências autónomas.

Filosofia – Conceito e ideia do direito, o que é, e para que serve. Não se pode elaborar o preceito
penal sem prévio juízo de valor, e esse juízo é operação ética, do domínio da filosofia de valores.
Maggiore afirma que a noção de crime, pena, etc, começam por ser conceitos filosóficos antes de
serem categorias jurídicas.

História – Importante para o conhecimento do DP vigente.

H- EVOLUÇÃO DO DIREITO PENAL


O homem em evoluído vivendo em sociedade. Esta interação, no entanto, nem sempre é
harmónica pois o homem acaba por revelar o seu lado instintivo: a agressividade. O Direito Penal
surge com o intuito de defender a coletividade e promover uma sociedade mais pacifica. Se
houvesse a certeza de que se respeitaria a vida, a honra, a integridade fisica e demais bens
jurídicos, não seria necessária a existência de um conjunto de normas punitivas garantidas por um
aparelho coercivo capaz de o pôr em pratica. Não existia o “Ius Puniendi”, cujo titular exclusivo é
o estado. Por isso o direito penal tem evoluído com a humanidade, desde os primórdios até à
sociedade atual. “ o Direito penal surge com o homem e acompanha-o através dos
tempos….”(magalhães Noronha).

O direito penal pode ser analisado em períodos históricos, os quais, no entanto, não guardam
absoluta independência entre si.

H.1 – PERÍODO DA VINGANÇA


Tem início nos tempos primitivos e prolonga-se até ao séc. XVIII.
Nos tempos iniciais não existia um sistema orgânico de princípios gerais, e as sociedades e os
indivíduos regiam-se e viviam num ambiente mágico e religioso. Fenómenos naturais eram
considerados castigos divinos. Podem distinguir-se várias fases:
 Fase da vingança privada
 Fase da Vingança Divina – Acreditava-se que os deuses eram os guardiões da paz e do
eventual crime cometido era considerado uma afronta às divindades. Caraterizava-se pela
crueldade das penas.
 Fase da Vingança Pública – Deixou de ter teor teocrático e a reprimenda passa a ser
resposta oficial do estado, tendo como objetivo proteger a sociedade. Deu azo a situações
despóticas. Não havia segurança jurídica.

H.2 – PERÍODO HUMANITÁRIO


Este período transcorre entre 1750 e 1850
Tem o seu início no decorrer do iluminismo e foi marcado pela atuação de pensadores que
contestavam as ideias absolutistas. Por esta altura pregava-se a reforma das leis e da
adminsitração da justiça fiscal. Os povos estavam saturados de tanto barbarismo sob o pretexto
da aplicação da lei. Por isso este período surge como reação à arbitrariedade da administração
da justiça penal e contra o carater atroz das penas.

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Neste período destacam-se Montesquieu, Voltaire, Rosseau e D’Alembert.


O pensamento dominante ia de encontro a qualquer crueldade e rebelava-se contra qualquer tipo
de arcaísmo.

H.2.1 – O direito Penal e a “Filosofia das Luzes”


Os Séc. XVII e XVIII ficaram marcados pela crescente importância da burguesia, classe que
liderava o desenvolvimento do capitalismo. Existia um conflito de interesses entre a burguesia e a
nobreza, de onde surgiu um sistema de ideias que deu origem ao liberalismo burguês,
nomeadamente através do movimento cultural conhecido como iluminismo.
Os pensadores desta corrente defendiam uma ampla reforma do ensino, criticavam a intervenção
do estado na economia e achincalhavam a igreja e os poderosos. Nem mesmo Deus escapou às
discussões da altura. Segundo Voltaire, o Deus Iluminista era o “grande relojoeiro”. Deus era
encarado como expressão máxima da razão, legislador do universo, respeitador dos direitos
universais do homem e da liberdade de pensamento e de expressão. Era, ainda, o criador da “lei”.
Segundo Montesquieu lei era a relação necessária que decorre da natureza das coisas.
Foram os escritos destes pensadores que prepararam o advento do humanismo e o início da
transformação liberal e humanista do Direito Penal. Estes pensadores fudaram uma nova
ideologia, o pensamento moderno, que se viria a repercurtir na aplicação da justiça: à
arbitrariedade contrapôs-se a razão; à determinação caprichosa dos delitos e das penas opos-se
a fixação legal das condutas delitivas e das penas.
Lock – Ensaio sobre o entendimento humano
Montesquieu – O espirito das leis (defendia a separação dos 3 poderes do estado)
Voltaire – Criticas ao clero, à intolerância religiosa e à prepotência dos poderes
Rousseau – “O contrato Social” “discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens”

H.2.2 – Beccaria – “Dos delitos e das penas”


“é melhor prevenir o crime do que castigar”
Criticava a forma de aplicação e a linguagem utilizada pela lei, a desproporção entre os delitos e
as penas, a utilização indiscriminada da pena de morte, a utilização da tortura como meio legal de
obtenção de provas e as condições das prisões.

Esta obra tornou-se o símbolo da reação liberal ao panorama penal então vigente e que era
considerado desumano.

Os princípios base por si defendidos alicerçaram o direito penal moderno e muitos desses
princípios foram adotados pela Declaração dos Direitos do Homem da revolução francesa.
 Deveria ser vedado ao magistrado aplicar penas não previstas na lei.
 Alei seria obra exclusiva do legislador ordinário
 A crueldade das penas era inútil, odiosa e contrária à justiça.
 Dizia que as prisões do seu tempo “eram a horrível mansão do desespero e da fome”,
faltando dentro delas a piedade e a humanidade.

A sua obra revolucionou o direito penal e significou um largo passo na evolução do regime
punitivo.
Também John Howard defendia um tratamento mais digno ao preso e a construção de
estabelecimentos prisionais adequados às funções carcerárias.

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H.3 – DIREITO NATURAL E A SUA INFLUÊNCIA


A escola do direito natural surgiu na fase racionalista (Sec. XVI a XVIII) através de Hugo Grócio,
Hobbes, Spinoza, Puffendorf, Wolf, rousseau e Kant, e assentava no seguinte:
 Natureza humana como fundamento do direito
 Estado de natureza como suposto racional para explicar a sociedade
 Contrato Social
 Direitos naturais inatos

Esta escola concebeu o Direito natural como eterno, imutável e universal. Desta escola nasceu o
jusnaturalismo que se prolongou até à atualidade.

Romagnosi, um dos fundadores da escola clássica, fundamentou a sua obra “Génesis do Direito
Penal” concebendo este como um direito natural, imutável e anterior às convenções humana. O
jusnaturalismo atual constitui um conjunto de amplos princípios a partir dos quais o legislador
deverá compor a ordem jurídica. Os princípios mais apontados são o direito à vida, á liberdade e à
participação na vida social.

Existe uma correlação entre o direito natural e o direito penal. Os princípios defendidos pelo jus
naturalismo estão devidamente enquadrados no rol dos bens jurídicos assegurados pelo direito
penal. Esta corrente influenciou o período humanitário onde se buscava a valorização dos direitos
intocáveis dos delinquentes e a consequente suavização das sanções criminais.

H.4 – ESCOLA CLÁSSICA


Dá-se este nome ao conjunto de pensadores, filósofos e doutrinadores que adotaram as teses
ideológicas base do iluminismo, expostas por Beccaria.
 Romagnosi (itália) – Direito penal como um direito natural, imutável, anterior às
convenções humanas, que deve ser exercido mediante a punição dos delitos passados
para impedir o perigo de crimes futuros.
 Bentham (Inglaterra) – A pena justificava-se pela sua utilidade: impedir que o réu cometa
novos crimes, emendá-lo, intimidá-lo, protegendo assim a coletividade.
 Feurbach – O fim do estado é a convivência dos homens conforme a lei jurídica. A pena
Coagina fisicamente para punir e evitar o crime.

No que se refere à pena propriamente dita havia 3 teorias:


 Absoluta – A pena era a exigência da justiça.˜
 Relativa – A pena tinha um fim prático de prevenção geral e especial
 Mista – Resulta de uma fusão das anteriores, ou seja, a pena era simultaneamente uma
utilidade e uma exigência da justiça.

Nesta escola distinguiram-se 2 grandes períodos:


 O filosófico ou teórico – Beccaria
 Jurídico ou prático – Francisco Carrara.

Carrara define o crime como “infração da lei do estado, promulgada para proteger a segurança
dos cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo, normalmente
imputável e politicamente danoso”.

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H.5 – PERÍODO CIENTIFICO OU CRIMINOLÓGICO


“A justiça deve conhecer o homem”

H.5.1 – Determinismo
“Para cada facto há razões que o determinam”
Segundo esta filosofia todos os fenómenos do universo são subordinados a leis e causas
necessárias.

Lapalce – Corresponde ao carater de uma ordem os factos no qual cada elemento depende de
outros, de tal modo que se pode prevê-lo, provocá-lo ou controlá-lo segundo se conhece,
provoque ou controle a ocorrência desses outros.

O direito, como facto jurídico, deveria também obedecer a esta correlação determinista, já que por
trás de cada crime haveria sempre razões suficientes que a determinaram.

O determinismo nega o livre arbítrio.

H.5.2 – Os evangelistas
César Lambroso, autor do livro “L’Uomo delinquente” apontou os novos rumos do direito penal
através do estudo do delinquente e a explicação causal do delito. O ponto nuclear é a
consideração do delito como fenómeno biológico e o uso do método experimental para o estudar.
Criou a “Antropologia Criminal”
Ferri – Criou a sociologia criminal
Garofalo – “Criminologia”

Os 3 são os fundadores da escola positiva.

Lambroso afirmava a existência de criminosos natos, caraterizados por determinados estigmas


somato-psiquicos.
Ferri – Ressaltou a importância de um trinómio causal do delito: Fatores antropológicos, sociais e
fisicos. Dividiu os criminosos em 5 categorias: Nato, louco, habitual, ocasional e passional
Garofalo – fez estudos sobre o delito, o delinquente e a pena

Estes 3 pensadores afirmavam que a pena não tem um fim puramente retributivo mas também
uma finalidade de proteção social que se realiza através dos meios de correção, intimidação ou
eliminação.

H.5.3 – Movimento Positivista


O movimento científico do Séc. XVIII, que pregava a supremacia da investigação experimental em
oposição à indagação puramente racional, influenciou o direito penal. Numa época de domínio do
pensamento positivista no campo da filosofia (augusto Comte) e das teorias evolucionista de
Darwin, das ideias de John Stuart e Spencer, surgiu a escola positiva.

Enquanto para a escola clássica o direito preexistia o homem, para os positivistas o direito é o
resultado da vida em sociedade e sujeito a variações no tempo e no espaço, consoante a lei da
evolução.

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I – HISTÓRIA BREVE DO DP PORTUGUÊS


I.1 – DAS ORIGENS ATÉ ÀS ORDENAÇÕES
Nos primeiros tempos da nacionalidade as fontes do P eram constituídas sobretudo pelos
costumes locais e pelos forais, com influência do código visigótico e dos cânones dos concílios.
As primeiras leis gerais de natureza penal foram do reinado de D. Afonso II, nas cortes de
Coimbra em 1211.

Nos primórdios da Monarquia o rei não tinha força para dominar os costumes que vigoravam e os
abusos da justiça pessoal eram numerosos. Desde a cúria de 1211 que se verificou uma
constante tendência para coartar esses abusos e disciplinar as várias formas de justiça privada e
a par do direito escrito através de leis que os monarcas iam promulgando, procurando marigerar
os costumes, arrogando-se o direito de os aprovar ou revogar.
Primitivamente as famílias dos crimes mais graves eram autorizadas a tirar desforço do autor do
crime, perseguindo-o até à morte, destruindo a sua casa, os seus campos e as suas culturas, mas
pouco a pouco passou a exigir-se que a inimizade fosse previamente sancionada pelos
magistrados e a ser imposta a composição nos crimes mas graves.
A par da composição – reparação dada diretamente pelo ofensor ao ofendido (podendo ser “per
aver, per açoutes, ou per guisa”), havia o pagamento de uma multa, a pena de morte era comum e
abundavam as penas infamantes. Consagravam-se o confisco e a morte civil.

I.2 – DAS ORDENAÇÕES AO CÓDIGO PENAL DE 1852


As ordenações recolhem o direito anterior, reunindo-o numa compilação. Eram uma obra de
despotismo; procurava conter-se o homem por meio do terror.
No reinado de D. José foi publicada muita legislação penal, definindo-se
 Crimes de lesa majestade de 1ª e 2ª cabeça
 Crimes atrocíssimos – Pena de morte.

A legislação era tão severa que muitas das leis caíram em desuso e com a queda do marquês de
Pombal e o movimento das ideias iluministas iniciou-se a reforma da legislação penal nos quadros
da escola clássica.

O movimento liberal expurgou da nossa legislação a crueldade antiga, fazendo-a penetrar do


espírito humanitário da época.

I.2.1 – Constituição de 1822


 Supressão de todos os privilégios de foro nas causas de crime (artº 9º)
 Princípio de que nenhuma lei, e muito menos a penal, seria estabelecida sem absoluta
necessidade (artº 10º)
 A proporcionalidade da pena ao crime, e o princípio da personalidade das penas, abolição
da tortura, da confiscação de bens, dos açoutes, do baraço e todas as mais penas cruéis
ou infamantes (artº 11)

I.2.2. – Constituição de 1826


 Dispôs que se organizasse um código penal fundado na justiça e na equidade.
 Dispôs que as cadeias serão seguras, limpas, arejadas, havendo diversas casas para a
separação dos réus conforme suas circunstâncias e natureza dos crimes.

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I.3 – DO CÓDIGO PENAL DE 1852 AO CÓDIGO PENAL DE 1982


I.3.1 – Do CP 1852 ao CP 1886
Inspirado nas doutrinas de Rossi, Chauveau e Hélie, e tendo como base os Códigos Francês de
1810 e espanhol de 1848.
Tipificavam os crimes, proibindo a incriminação por analogia e a interpretação intensiva.
Estabelecia 3 tipos de penas: penas maiores (morte, etc); penas correcionais; penas especiais
para os empregados públicos

O Código Penal de 1861 (Levy Maria Jordão), definia que a intimidação não era o fim principal,
antes a correção moral do delinquente. Até 1982 houve várias alterações, todas no sentido de ma
maior humanização e respeito pela dignidade humana.

I.3.2 – CP de 1982
Os princípios diretores da política criminal deste código eram:
 Conformidade da matéria penal com a ideia do estado de direito que se traduz na plena
consagração do princípio da legalidade;
 Congruência entre a ordem axiológica constitucional e a ordem legal de bens jurídicos. “
O DP só pode e deve intervir para a proteção de bens jurídicos, não para tutela de
normas morais ou de uma qualquer moralidade”
 Culpa como fundamento e limite da punição. É um instrumento indispensável da garanti
da pessoa, fundada na dignidade da pessoa humana.
 Humanidade – proibição da pena de morte e prisão perpétua. Penas mais suaves.
 Monista das reações criminais – não aceita que ao mesmo delinquente fossem
aplicadas, pelo mesmo facto, uma pena e uma medida de segurança, o que se alcançou
através da pena relativamente indeterminada e da restrição das medidas de segurança
privativas da liberdade.

I.3.3 – CP de 1982/1995
Um dos propósitos da revisão foi a necessidade de corrigir o desequilíbrio entre as penas
previstas para os crimes contra o património e contra as pessoas, com estes últimos a sofrerem
uma substancial agravação.
Houve alterações significativas no domínio das sanções criminais.
“Privilegia-se a aplicação de penas alternativas às penas curtas de prisão, com particular
destaque para o trabalho a favor da comunidade e a pena de multa.”
“A finalidade a prosseguir com as penas e medidas de segurança é a proteção de bens jurídicos e
a reintegração do agente na sociedade”
De 1995 até ao momento o CP já sofreu muitas alterações.

J – MÉTODO SISTEMA E PLANO


Dentro do fim comum ao direito em geral – realização do bem comum, o DP tem um fim específico
– garantir contra os atentados mais graves, a paz social, protegendo os bens jurídicos que a
sociedade considera essenciais para a convivência social e desenvolvimento individual e coletivo.

A ciência do DP tem de ser uma ciência útil ao prático, isto é, tem de servir adequadamente a
finalidade de aplicação da lei para o que necessariamente terá de utilizar uma metodologia
adequada.
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Assim sendo a jurisprudência dos tribunais deve ser tida em conta como material base de
trabalho, quer revelando o direito, quer os problemas com mais interesse para a vida efetiva do
DP.

J.1 – PRRESSUPOSTOS POLÍTICO-FILOSÓFICOS


Os pressupostos base são os que vêm expresso na CRP, que através da definição dos Direitos,
liberdades e garantias, estabelece o quadro de valores fundamentais da ordem jurídica
portuguesa.

Como pressupostos político-filosóficos se deduzem de:


 Dignidade da pessoa humana e direito à liberdade (1 e 27 da CRP)
 Princípio democrático; igualdade (13 CRP); humanidade (23, 25 e 26 CRP) – eu presidem
ao regime das sanções criminais, quer na definição quer na sua execução e que assenta
na preposição de que a pessoa humana é naturalmente imperfeita mas recuperável
socialmente.

J.2 – MÉTODO
O trabalho do jurista realiza-se em 3 planos:
 No plano da descrição ou da fixação do objeto
 No plano da explicação e sistematização
 No plano da aplicação à realidade.

K – PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

K.1 – Evolução Histórica


Tem uma natureza essencialmente política – visava terminar com os abusos do Ancien Regime.

Historicamente vem do final do Séc. XVIII, com o desenvolvimento da doutrina da divisão de


poderes e a sua função era a de submeter à lei o exercício dos poderes do estado, garantido que
fosse legal e que não pudesse transformar-se em arbítrio.

Para garantir a segurança do cidadão perante o estado e a garantia da igualdade de tratamento, o


essencial está na lei penal; é essencialmente a lei penal que garante a supressão do arbítrio e da
opressão.

A tradução em termos jurídico-penais do fundamento do princípio da legalidade ocorre no início do


séc. XIX com Feuerbach, que o liga à questão do fundamento da pena: A prevenção geral.

K.2 – Dimensão Atual e Estado de Direito


No plano político este princípio é indissociável do estado de direto.

No plano científico postula a prévia determinação dos factos criminosos e da penalidade que é
aplicável aos seus agentes.

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A proibição da analogia, da retroatividade, da imprecisão das incriminações e das penas


(exigência do princípio da legalidade) eram abandonadas à medida que se punham em causa o
estado de direito (por exemplo o regime nazi).

Depois da II Guerra o princípio da legalidade ressurgiu como elemento fundamental dos sistemas
jurídicos da maioria dos países e foi reconhecido e consagrado na DUDH (artº 11), na convenção
europeia dos direitos do homem e das liberdades fundamentais (artº 7º) e no pacto internacional
sobre os direitos civis e políticos (artº 15).

O princípio da legalidade é hoje um postulado de garantia que compõe a parte formal do princípio
do estado de direito, posto que é a essência do estado de direito a segurança contra a
prepotência e o arbítrio.

K.3 – Garantias que contém o Princípio da Legalidade


A enunciação legal do princípio vem no artº 29, 1 e 3 da CRP e 1º do CP.
“nullum crimen, nulla poena sine lege”

K.3.1 – Nullum Crimen, nulla poena sine lege previa


Significa que nenhum facto pode ser considerado crime nem nenhuma pena pode ser aplicada ao
agente de facto sem que uma lei anterior qualifique o feito como crime e estabeleça a natureza e
quantidade da pena que lhe corresponde.

Daqui deriva: proibição da analogia para qualificar factos como crime; proibição da retroatividade
das leis penais prejudiciais ao agente do facto.

A CRP e o CP abrangem neste princípio não só os crimes e as penas mas também os


pressupostos dos estados de perigosidade e as medidas de segurança

K.3.2 – Nullum Crimen, nulla pena sine lege certa

A norma penal incriminadora tem de ser certa, isto é, determinar com suficiente precisão o facto
criminoso. O crime não pode consistir numa situação, qualidade ou atitude pessoal. Também o
facto não pode ser inferido da lei, tem de ser definido na lei.

Não é válida a norma incriminadora cujo teor se apaga numa cláusula geral que remete o seu
preenchimento para o arbítrio do julgador.

K.3.3 – nullum crimen, nulla pena sine lege scripta

Fica excluído o costume como facto normativo relativamente às normas incriminadoras.

K.3.4 – nulla poena sine judicio

A este princípio, como garantia da liberdade dos cidadãos, está ligado o principio da
jurisdicionalidade. A aplicação da lei penal pelos tribunais é uma das mais importantes garantias
da atuação do direito. Vem consagrado no 29, 1 e 5 da CRP, 32 da CRP, 10 DUDH.

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K.4 – FONTES DO DIREITO PENAL. RESERVA DE LEI E RESERVA RELATIVA


DE LEI.

O artº 168, nº1 alinea c) dispõe que constitui matéria da reserva legislativa da AR a definição dos
crimes, penas e medidas de segurança e respetivos pressupostos.

O Artº 164, alínea g) refere que compete à AR conceder amnistias e perdões genéricos.

Apenas a AR e o governo, este mediante autorização legislativa, têm competência para legislar
em matéria penal.

O princípio da reserva de lei apenas abrange as normas penais que estatuem penas ou medidas
de segurança, isto é, restringe-se ao núcleo do direito penal constituído pelas:
normas positivas – todas as que prevêem crimes e as respetivas sanções e todas as que
estabelecem critérios positivos de punibilidade.
normas negativas – As que garantem ou favorecem os direitos individuais.

O princípio da legalidade tem a função de garantir os direitos individuais na medida em que são
sacrificados ou limitados pela aplicação de penas ou medidas de segurança.

O princípio da legalidade implica a exigência de conexão formal entre os pressupostos das penas
e das medidas de segurança e as respetivas penas e medidas de segurança aplicáveis (artº 29
CRP) – é necessário que por lei seja estabelecida a conexão entre o pressuposto e a respetiva
sanção.

Compete à AR a criminalização e a descriminalização. A definição dos crimes não respeita


apenas à determinação dos seus elementos constitutivos, mas à conformação da ordem jurídica,
isto é, à determinação de quais os comportamentos que são qualificados como crimes na ordem
jurídica.

Em virtude do princípio da reserva de lei o costume está excluído como facto normativo
relativamente às normas incriminadoras. Pode apenas interpretá-las e preencher o conteúdo de
conceitos normativos, nomeadamente o artº 7º, nº 1 do CC dispõe que a lei só deixa de vigorar se
for revogada por outra lei, pelo que o costume também não pode revogar as leis penais. O
costume internacional pode ser fonte do DP.

A jurisprudência não é fonte do DP embora assuma o papel de legislador complementar no


domínio da concretização das cláusulas gerais e dos conceitos indeterminados.

K.4.1 – Reserva de Lei e Leis penais em branco

Leis penais em branco são leis incompletas. Tal sucede quando na previsão do tipo legal falta
elemento necessário para completar a norma incriminadora (CP 277, 278 e 279).

O que releva e é exigido pelo princípio da legalidade é que a norma incriminadora determine a
ilicitude e oriente suficientemente os destinatários da norma quanto às condutas que são
efetivamente proibidas de modo a não deixas a descoberto qualquer elemento essencial para a
compreensão da conduta proibida.

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O cerne do proibido, ou seja, o núcleo essencial da conduta punível tem de ser revelado na lei
penal, fundamentando-se na sua violação a culpa do agente. O que não é aceitável, por violar a
legalidade, é a pura e simples delegação na administração ou em diploma legislativo de hierarquia
inferior, a definição de conduta proibida.
 Será inválida a norma que remeta para a autoridade administrativa a definição da conduta
proibida, limitando-se a norma penal a sancioná-la.
 Será válida a norma que estabelece a conduta proibida, reenviando para a violação de
outras normas regulamentares a definição dessa conduta.

K.4.2 – Reserva de Lei e DI

No que respeita ao DI ver o Artº 8º e 29, nº2 da CRP

Relativamente ao direito da EU, o direito penal interno sofre os efeitos da prevalência das normas
comunitárias e por isso não deve ser aplicada pelo tribunal a norma penal interna que esteja em
conflito com um regulamento comunitário. Aplica-se o mesmo aos tratados.

Já não se passa o mesmo com as diretivas, pois estas só vinculam os estados membros a
adotarem as medidas necessárias à realização dos fins prosseguidos com a diretiva.

A EU carece de competência em matéria penal, pelo que os interesses da EU só podem ser


tutelados penalmente pelo direito interno dos estados membros.

A influência das normas do DUE no direito interno pode ser:


 Formal – Através da promoção de tratados penais ou pela via de diretivas ou
regulamentos que imponham a adoção de normas penais internas.
 Informal – Jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades, segundo o qual
nenhum cidadão europeu pode ser condenado em virtude de uma norma contrária ao
direito comunitário ou que em alguma medida afete o desenvolvimento das comunidades.

Para acautelar a aplicação uniforme do DUE pelos estados o tratado prevê um mecanismo de
cooperação entre o juiz nacional e comunitário: a questão prejudicial. Segundo este procedimento
o tribunal nacional pode suspender a decisão e consultar o Tribunal de Justiça Europeu sobre a
validade ou interpretação. Acresce a possibilidade de recurso para o Tribunal de Justiça das
Comunidades Europeias da decisão judicial interna que aplique norma penal que esteja em
conflito com norma comunitária.

Para que a norma comunitária prevaleça sobre a interna é necessário que possua eficácia direta e
tê-la-á sempre que “as suas disposições sejam claras e precisas e não deixem nenhum poder
discricionário ao legislador nacional para a sua aplicação”.

K.4.3 – Princípio da Legalidade e Integração de Lacunas - Analogia

Através da analogia aplica-se a lei a hipótese por ela não prevista.

Para que se deva recorrer à analogia é necessário que exista uma lacuna. DE acordo com o
princípio da legalidade não se admitem lacunas, por isso o nº1 do artº 3º do CP proíbe a analogia

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para “qualificar o facto como crime, definir um estado de perigosidade ou determinar a pena ou
medida de segurança que lhes corresponda.”

Nos termos do Artº 10º do CC a integração analógica não é aplicável às normas excecionais,
sendo que é excecional a norma que interrompe a projeção lógica de uma norma de carater geral.

Atenta a ratio garantistica da proibição da analogia, a proibição não é aplicável in bonam partem, à
criação de normas permissivas, nomeadamente às normas sobre circunstâncias dirimentes ou
atenuantes da responsabilidade criminal. As normas que prevêm causas de justificação e de
exclusão da culpabilidade não são normas excecionais, mas emanações de princípios gerais do
sistema jurídico.

K.4.4 – Conceção Formal ou substancial do crime – justificação das normas penais.


A nomo dinâmica.

A conceção do crime em sentido formal consiste simplesmente em afirmar que é impossível


qualificar como crime um facto que seja estranho à previsão formal da lei. Isto porque não pode
existir crime sem previsão legal. Só são crimes os factos que como tal sejam qualificados pela lei
(tipicidade dos crimes).

A esta exigência de verificação continua da capacidade do estado e da justificação do uso da


força corresponde a nomo dinâmica, ou seja, a dinâmica, o movimento das leis, o mecanismo de
alteração do sistema através de novas incriminações e da descriminalização. Este movimento
tende para um certo equilíbrio entre as possibilidades e as utilidades da incriminação.

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