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Panton Pia'

Eremukon do circum-Roraima

Devair Fiorotti
Terêncio Luiz Silva
Intérpretes: Manaaka e Yauyo

Panton Pia'
Devair Fiorotti
Terêncio Luiz Silva
Copyright © Devair Antônio Fiorotti, Terêncio Luiz Silva 2019.
Panton pia’: Eremukon do circum-Roraima © Devair Antônio Fiorotti, Terêncio Luiz Silva.

Coordenação e concepção: Devair Antônio Fiorotti


Capa: Abraão Batista, Júlio César, Devair Antônio Fiorotti
Ilustração da capa e contra-capa: Obras “Parixara I” e “Parixara II”, de Jaider Esbell
Diagramação: Devair Antônio Fiorotti, Abraão Batista e Júlio César
Transcritor da frase musical: Terêncio Luiz Silva
Revisão de transcrição de macuxi: Tiago Simplício Napoleão
Estabelecimento do poema em português e língua indígena: Devair Antônio Fiorotti
Tradução: Terêncio Luiz Silva e Devair Antônio Fiorotti
Fotos: Devair Antônio Fiorotti
Gravação de áudio: Biosphere Records (Cláudio Lavôr)
Transcrição/Editoração das partituras musicais: Emílio Gomes Martins, Jucicleide Pereira Mendonça
dos Santos e Mozart Mendsan

Presidência da República
MICHEL TEMER
Ministério da Justiça
TORQUATO JARDIM
Fundação Nacional do Índio
WALLACE MOREIRA BASTOS
Museu do Índio
JOSÉ CARLOS LEVINHO
Editor do Museu do Índio
CARLOS AUGUSTO DA ROCHA FREIRE

Fiorotti, Devair Antônio e Silva, Terêncio Luiz.


Panton pia’ : Eremukon do circum-Roraima. Cantores Manaaka e Yauyo
1. ed. Rio de Janeiro: Museu do Índio, 2019.

332p.
Ilust.
Contém DVD

ISBN

1. Cantos indígenas 2. Circum-Roraima 3. Macuxi. 4. Taurepang 5.


Parixara 6. Tukui 7. Marapá 8. Areruya. Partitura. I Título
CDU 398

Museu do Índio
Rua das Palmeiras, 55, Botafogo.
Rio de Janeiro - RJ, Brasil, CEP 22270-070
(21) 3214-8702, www.museudoindio.gov.br
Aos povos macuxi e taurepang
Em especial a Terêncio Luiz Silva e Zenita Lima,
Manaaka e Yauyo.
Sumário
Carta do presidente da Funai | 9
Apresentação do diretor do Museu do Índio | 11
Prefácio | 13
Introdução | 17
Filhos de Makunaima [fotos] | 57
Eremukon | 71
Parixara | 73
Tukui | 121
Marapá | 203
Areruia | 215
Partituras | 239
Parixara | 240
Tukui | 264
Marapá | 304
Areruia | 309
Macuxi vivo [fotos] | 321
Carta do Presidente da Funai
Criado em 1953 no âmbito do Serviço de Proteção aos Índios – SPI, o Museu do
Índio integra atualmente a estrutura administrativa da Fundação Nacional do Índio
– Funai. Tendo como principal objetivo contribuir para a divulgação das culturas
indígenas, o Museu do Índio desenvolveu nos últimos anos importantes ações de
preservação e salvaguarda do patrimônio cultural desses povos brasileiros, por meio
de iniciativas que garantem a valorização desses saberes.
Nesse contexto, o Programa de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas
– PROGDOC é uma atividade em destaque da instituição.
Resultado de um intenso volume de ações junto a diversos povos indígenas,
o PROGDOC promove oficinas e cursos para capacitação de jovens no registro e
documentação de conhecimentos originários e tradicionais, condição essencial à
salvaguarda e à preservação de línguas e culturas. A participação desses jovens acontece
também como bolsistas nos projetos realizados pelo Programa. Foram concedidas
diversas bolsas anuais para pesquisadores indígenas. A intenção é permitir a esses
jovens dedicação aos projetos, cujas ações já beneficiam quase trinta mil indígenas,
abrangendo mais de cem aldeias em todo o território nacional.
Com a implementação da política cultural da Funai na área editorial, o Museu
do Índio vem ampliando e diversificando suas produções, permitindo que os não-
indígenas conheçam mais sobre a vida, as línguas e as práticas dos povos indígenas.
Somente nos últimos cinco anos, foram distribuídos mais de 100 mil exemplares,
referentes ao lançamento de 35 títulos, sendo algumas publicações assinadas por
especialistas e outras organizadas por professores indígenas.
Assim, contribuindo com o processo de valorização de línguas e culturas, é
com satisfação que a Funai, por meio do lançamento desta publicação, participa do
movimento de fortalecimento dos saberes e práticas culturais de diferentes povos
indígenas.

Wallace Moreira Bastos


Presidente da Fundação Nacional do Índio - FUNAI

9
Apresentação do diretor do Museu do Índio
O Museu do Índio, da Fundação Nacional do Índio – FUNAI, é uma
importante instituição de pesquisa sobre línguas e culturas indígenas, sua divulgação
e preservação. O empenho contra o preconceito aos povos indígenas e o intercâmbio
de ideias e informações sobre esses grupos têm pautado as ações do Museu do Índio ao
longo dos seus mais de 60 anos de história. Nesse percurso, a instituição se consolidou
como fonte de referência para estudos sobre várias questões - com destaque para os
destinados à demarcação de terras - e estreitou as relações com os povos indígenas,
dando visibilidade aos aspectos de sua cultura e apoio aos seus projetos para o futuro.
Em processo de expansão, o Museu do Índio, hoje, apresenta novos espaços
expositivos como o Muro do Museu, a Varanda do Museu e suas Lojas de Arte. A
instituição recebe, em média, 35 mil visitantes por ano, compartilha as suas informações
com, aproximadamente, 600 mil internautas e alcança 57.102 pessoas por meio da
itinerância de suas exposições. Recentemente, incorporou duas unidades fora do Rio
de Janeiro: o Centro Cultural Ikuiapá (MT) e o Centro de Formação Audiovisual de
Goiânia (GO).
A partir do ano de 2010, o Museu do Índio passou a sediar o Projeto de cooperação
técnica internacional para a documentação de línguas e culturas indígenas brasileiras,
cooperação firmada entre o governo brasileiro e a Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO. Ainda no âmbito do mencionado
convênio, em 2018 foi realizada a primeira fase do projeto Salvaguarda do patrimônio
linguístico e cultural de povos indígenas transfronteiriços e de recente contato na região
amazônica. O Projeto de Documentação de Línguas Indígenas (ProDoclin) produziu,
até o momento, a documentação de 19 línguas, distribuídas pelo território brasileiro e
por distintos agrupamentos genéticos, com produção de acervos digitais, publicações,
textos científicos, gramáticas descritivas e pedagógicas, dicionários multimídia e
documentários. Por outro lado, o Projeto de Documentação de Culturas Indígenas
(ProDocult) resultou no registro de aspectos culturais de 25 povos, apresentados em
publicações e novos acervos.
Temos a certeza de que a iniciativa de promover e divulgar as diferentes
formas de expressão das culturas indígenas por meio da política editorial desenvolvida
pelo Museu do Índio/FUNAI contribui para a democratização em uma sociedade
pluriétnica e multicultural.

José Carlos Levinho


Diretor do Museu do Índio

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Prefácio
Bruna Franchetto
Apresentação do Livro

Panton Pia’: Eremukon do circum-Roraima é fruto amadurecido e colhido no


caminho de um apaixonado por literatura e estudioso de literatura, Devair Antônio
Fiorotti, que se perdeu e se encontrou nas terras de Roraima, na fronteira, nas malocas
Macuxi e Taurepang. No caminho, ou melhor, nos caminhos, encontrou Manaaka
(Terêncio Luiz Silva) e Yauyo (Zenita de Lima). Manaaka é uma espécie de xerimbabo
de pajés, e o encontro com Manaaka-Terêncio, de pai taurepang e mãe macuxi,
aconteceu na cidade de Pacaraima-RR. Manaaka-Terêncio é pesquisador, desde os
anos 70, das tradições de seus povos e liderança reconhecida por ter sido, entre outras
coisas, membro fundador e diretor do Conselho Indigenista de Roraima (CIR).
Manaaka e Yauyo cantavam e cantam, dançavam e dançam, cantos e danças
parixara, tukui, marapá e areruia. No primeiro encontro, lembra Devair, Manaaka-
Terêncio tirou do bolso um punhado de papéis com as frases geradoras de muitos
cantos. Parece uma cena única, excepcional, mas sabemos que não é: tem não poucos
pesquisadores indígenas pelo Brasil ameríndio afora, com seus cadernos cheios,
desconhecidos do lado de cá, o lado da literatura eurocêntrica, da pesquisa “branca”
e desinfetada, que silencia línguas e falas faladas-cantadas da fronteira que, hoje, é
também aquela entre oralidade e escrita e de onde brotam novos, para nós, ritmos,
imagens, histórias, palavras. Manaaka-Terêncio passou a ser intérprete, transcritor de
frases musicais, tradutor e este livro é um exemplo do que pode resultar de uma longa
dedicação à pesquisa e de uma verdadeira colaboração autoral.
Convido para uma leitura-contemplação da transcrição e da transcriação em
tradução dos cantos parixaras, tukuis, marapás e areruias aqui e agora apresentados.
Convido, também, para uma leitura atenta da Introdução escrita por Devair Fiorotti,
onde estão as histórias que levaram ao livro e que dele fluem, bem como as chaves para
entender o que é uma poética indígena verbo-musical e os processos experimentados
de transcrição e de tradução. Afinal, estamos diante de “arte literária de textos oriundos
da tradição indígena, poemas de canções indígenas”, como diz Devair. Ainda chamo a
atenção para a inclusão das transcrições em partituras musicais na última parte do livro
e para as belíssimas obras de Jaider Esbell, reconhecido artista macuxi, que ilustram a
capa e a contracapa.
A publicação de Panton Pia’: Eremukon do circum-Roraima é acolhida e
concretizada pelo Projeto de Documentação de Línguas Indígenas (ProDoclin),
iniciativa da Fundação Nacional do Índio-FUNAI e UNESCO, por meio do Museu
do Índio, órgão científico-cultural sediado no Rio de Janeiro. Em 2009, foi iniciado
um amplo programa de documentação de línguas e culturas indígenas no Brasil,
desenvolvido em colaboração com diversas instituições e pesquisadores. O Museu
do Índio possui longa tradição na área de documentação, pesquisa e difusão do
patrimônio cultural indígena, de natureza material e imaterial. Por sua vez, a UNESCO
vem desenvolvendo, desde pelo menos o final dos anos 1990, programas de proteção
da diversidade linguística.
14
No contexto mundial e, em particular, sulamericano, o Brasil é um país onde se
encontra uma das maiores densidades linguísticas - ou diversidade genética. É, também,
o país onde se encontra a menor concentração demográfica por língua. Sabemos que
essas línguas pertencem a quarenta e uma famílias, dois troncos linguísticos e que há
pelo menos uma dezena de línguas isoladas, além de uma ‘língua crioula’. O número
de falantes pode chegar a vinte mil (Guarani, Tikuna, Terena, Macuxi e Kaingang),
assim como aos dedos de uma mão, ou mesmo a um único e último falante. A média é
de menos de 200 falantes por língua, mas mesmo entre as poucas línguas que contam
ainda com muitos falantes, não há nenhuma que possa ser considerada “segura”,
ou seja, da qual é possível afirmar que provavelmente será, nas próximas décadas,
diariamente usada e transmitida de uma geração a outra. Ao contrário, não são poucos
os casos de línguas faladas ou lembradas por somente poucas pessoas, usualmente
idosas, e que muito provavelmente desaparecerão dentro de poucos anos. A situação
dessas línguas não é uma exceção no cenário mundial. Não há línguas indígenas “a
salvo” no Brasil: são todas línguas minoritárias e dominadas pelo prestígio da língua
nacional nas escolas e nas mídias, em contextos submetidos a transformações crescentes
e profundas. Fatalmente, são muitas vezes estas línguas as menos conhecidas e cujo
registro e resgate são pedidos, frequentemente de modo dramático, pelos descendentes
desses últimos falantes.
A documentação das cerca de 160 línguas nativas ainda existentes no país,
a maioria concentrada na região amazônica, é, então, uma tarefa urgente. Estes
números podem impressionar o grande público, mas é pouco em comparação com as
estimativas de que teriam sido mais de 1200 línguas quando da chegada dos europeus
há 500 anos. Nos cinco séculos de conquista e colonização, mais de 80% dessas línguas
se perdeu e com elas desapareceram inteiras configurações culturais e muitos saberes.
Línguas vivas e reconhecidas na sua plenitude são repositórios de artes, tradições e
conhecimentos complexos e milenares, que, por elas, são transmitidos de uma geração
para outra. Preservar uma língua é a base de autoestima e afirmação, individual e
coletiva.
A documentação e divulgação de artes verbais indígenas são produtos por
nós acalentados. Este livro se destina: aos que mantiveram vivas essas artes e suas
belezas, na fala e no canto; aos jovens que entre cidades, escolas e igrejas, viram as
costas aos seus pantonkon e eremukon; aos povos indígenas que abrem suas línguas e
suas poéticas verbo-musicais para o encantamento de todos.

Rio de Janeiro, 30 de novembro 2017.

Bruna Franchetto
Coordenadora do Projeto de Documentação de Línguas Indígenas -
ProDoclin

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Introdução
Devair Antônio Fiorotti
Panton Pia’: diante da poeticidade dos eremukon do circum-
Roraima

Não conheço nenhum compêndio de literatura brasileira que traga em seu es-
copo textos oriundos da tradição indígena ou analise-os. Mesmo a historiografia e crí-
tica literária passaram longe da arte literária produzida por eles (ARARIPE JÚNIOR,
1958-1970; BOSI, 2010; CANDIDO, 1975; COUTINHO, 1968-1971; ROMERO, 1960;
VERÍSSIMO, 1969, 1977). Este trabalho se insere justamente nessa lacuna, pois bus-
ca apresentar poemas de canções indígenas do chamado circum-Roraima (COLSON,
1985), região circundante do Monte Roraima, na tríplice fronteira Brasil-Venezuela-
-República Cooperativista da Guyana, das etnias macuxi e taurepang, principalmente.
Pedro Niemayer Cesarino diz de um descompasso entre a etnologia, que aca-
ba relegando a um plano inferior a poética ameríndia, e outras áreas, Letras, por exem-
plo, que marginalizaram e estereotiparam as poéticas e estéticas indígenas, salvo rarís-
simas exceções (2011, p. 15-17). Por exemplo, em 10 anos de estudos em Letras (UnB),
nunca cheguei a ler um texto oriundo de poéticas indígenas, somente transmutados
como Macunaíma, de Mário de Andrade; O Guesa, de Sousândrade. Merecem des-
taque trabalhos que vão na contramão da historiografia e crítica literária brasileira e
mesmo da etnografia tradicional, como de Pedro Niemeyer Cesarino sobre os Marubo
(2011, 2013); de Lucy Seki, sobre os Kamaiurá (2010); de Rosangela de Tugny, sobre os
Maxakali, (2009a, 2009b e outros); principalmente a Coleção Narradores Indígenas do Rio
Negro, encabeçada pela FOIRN (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro,
vários volumes).
A interlocução com o indígena Terêncio Luiz Silva, da comunidade Ubaru,
Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol, RR, estava se encaminhando para ser como
muitas outras, dentro do projeto Panton Pia’: Narrativa oral indígena, registro e análi-
se nas Terras Indígenas (TI) São Marcos e Raposa Serra do Sol, RR.1 Até que, quando
questionado se saberia algumas canções, para minha surpresa, Terêncio Luiz Silva

1 Projeto iniciado em 2007, primeiro registrou 29 narradores indígenas de 17 comunidades da Terra


Indígena São Marcos. Depois, concluiu em 2014 as entrevistas de mais 10 narradores, de seis
comunidades, na TI Raposa Serra do Sol. Os narradores estão assim distribuídos: 27 homens e 12
mulheres, sendo por etnia: 24 macuxis; seis taurepangues; seis wapixanas; uma indeterminada.
Entre esses merece menção uma etnia cuja tribo enquanto tal não mais existe: uma sapará; e outro
que menciona wapixana e sua relação com o nome karapiwa, sinônimo de wapixana ou mesmo da
mistura de wapixana com macuxi (OLIVEIRA, 2014). Na terceira fase, iniciada em 2015, o projeto
está registrando e analisando cantos, rezas e supertições de indígenas dessas duas terras. Desde 2007
o projeto é financiado pelo CNPq. A metodologia de coleta e trato com as narrativas sustenta-se
18
principalmente na História Oral (ALBERTI, 2004).
retira da bolsa um feixe de folhas com dezenas de cantos com as frases centrais já
transcritos.
O projeto já havia registrado alguns cantos, como de Dona Letícia Barbosa,
da comunidade Santa Rosa, na TI do São Marcos, e do Senhor Alcuíno de Lima, da
comunidade do Taxi, na TI Raposa Serra do Sol. Contudo, nada parecido com o que
encontraria com Terêncio Luiz Silva. O primeiro contato se deu no dia 21 de fevereiro
de 2013, em que foi realizada a primeira entrevista. Já entre os dias 25 e 27 do mesmo
mês estavam sendo gravadas as músicas. Foram gravadas 79 músicas, assim distribu-
ídas: 23 parixaras, 40 tukuis, cinco marapás e 11 areruias.2
O parixara, pariisara3 em macuxi, está relacionado em geral à fartura das colhei-
tas, chegada da caça ou pesca com fartura e a datas comemorativas. Koch-Grünberg
diz que o “parischerá é a dança dos porcos e de todos os quadrúpedes (2006, p. 79).”
Nos cantos os animais são presentes, mas não somente eles. Há referência ainda, por
exemplo, a sapos (kunawa), a pássaros (yei-yei [ferreiro], kîrî-kîrî [periquito]). Quanto à
relação da dança com esses animais, já que nas festas dança e música não se separam,
poderia ser imitativa. Diz im Thurn que, além da dança mais coletiva, em geral em
círculo, “Occasionally, too, a man and a woman link arms and strut about slowly together,
bending their bodies forward and backward, this side and that, very grotesquely. Certain of the
dances are imitations of the movements of animals” (1883, p. 324). Esse aspecto imitativo
pode dizer respeito tanto ao parixara quanto ao tukui, mesmo porque im Thurn não se
utiliza desses nomes, mas se refere à dança e música em geral.
Quanto às caçadas e à presença dos animais, um parixara diz:4

parakamu keweyu xiri-xirimauya


pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
waikinmî keweyu xiri-xirimauya

parixara 4

parakamu keweyu xiri-xirimauya


parakamu keweyu xiri-xirimauya

2 Há variação na escrita desse nome, como veremos. Adoto aqui areruia, justamente por aceitar a
corruptela não somente no nome, mas na própria estrutura original do cristianismo proposto.
3 A escrita da língua macuxi que utilizo aqui não é fonética, mas o padrão atual mais utilizado na região

estudada por mim, inclusive utilizada em boa parte das escolas da região. Há certo conflito entre uma
tentativa oriunda dos linguistas, mais fonética, e a prática em sala de aula. De antemão esclareço que
esse não é um trabalho voltado à Linguística, mas, principalmente, aos estudos literários.
4 Primeiro apresento a frase geradora e, sem seguida, como é cantada. Por uma opção estética, não são

usadas vírgulas nem maiúsculas em praticamente todos os textos, sejam indígenas ou na tradução
dos cantos para o português.
19
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya

parakamu keweyu xiri-xirimauya


parakamu keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
waikinmî keweyu xiri-xirimauya
waikinmî keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya

[toco chocalho do catitu


toco chocalho da queixada
toco chocalho da anta]

Antes de prosseguir, esclareço que os textos dos cantos são tratados e reco-
nhecidos por mim como literários e poemas. Paul Zumthor (2001, 2007, 2010) chamou
atenção para textos poético-literários oriundos da oralidade. Nádia Farage (1997), ao
lidar com textos dos wapixanas, índios de afiliação linguística Arawak, sustentada em
partes em Zumthor, diferencia o uso coloquial da linguagem e seu uso retórico, esse
uso, narrativas mítico-históricas, cantos, é seu objeto central de estudo. Neil Whitehead
desenvolve seu trabalho sobre Kanaimà, adotando o termo poetic, buscando apresentar
e analisar uma poética do Canaimé e da violência, pois a construção de significados
vindos do Canaimé “must also be appreciated as a fundamental and complex cultural expres-
sion”, também porque essa expressão cultural “involve competence in the manipulation of
signs and symbols (2002, p. 2).” Bruna Franchetto, em caminho similar, dirá que

No interior da variedade de tais formas [de discurso oral], as execuções de fala


estilizada, formalizada, ritual, enquanto execuções de um estilo caracterizado
por traços poéticos e musicais bem marcados, têm ocupado a reflexão dos
pesquisadores envolvidos. São estilos que atraem a atenção e exercem fascínio
não só pelos elementos formais de sua organização interna, como também
pela linguagem metafórica de difícil tradução, mas altamente articulada com
significados cruciais da existência em sociedade e no cosmo (1989, s/p).

Como desenvolvi em trabalhos anteriores (FIOROTTI, 2012, 2014), uso o ter-


mo Literatura para lidar com essas falas estilizadas, ritualizadas, como as narrativas
míticas, históricas, pois a priori não há diferença na organização do mythos (ARISTÓ-
TELES, s. d., v. 8.) dessas narrativas, seja em relação a aspectos formais ou mesmo
temáticos, por exemplo, se comparado com textos tidos como literários (FIOROTTI,
2012). Apesar de nomes distintos (poeticidade do oral; uso retórico, poético, estilizado
e ritual; literatura), há nesses usos um reconhecimento Literário (adjetivo em maiúscu-
20
lo) em textos oriundos da oralidade, textos que estão ao redor, na periferia da periferia
de eixos literários etnocêntricos e limitadores. Na periferia da periferia, pois mesmo
países como o Brasil são considerados periferia em relação à produção literária univer-
sal. O que falar de narrativas orais e de cantos de índios de Roraima?
Ainda lembro que, em grego, as artes poéticas estão relacionadas à lira, à mú-
sica. Os estudos dos gêneros literários, desde Aristóteles, se subdividem em lírico,
épico e dramático. Não somente, antes da biblioteca de Alexandria, o que chamamos
de poesia hoje era “melos”: “Ao invés de poesia, lírica, os autores anteriores ao período
helenístico chamariam suas criações de poesia mélica, termo derivado de mélos, ou
seja, canção, ou mesmo mousiké, ōidé ou áisma, todas palavras que remetem à ideia
do canto” (ROCHA, 2012, p. 85-86). Desde a origem, no que chamamos de mundo
ocidental, poesia está relacionada à música. Principalmente depois do Romantismo
Alemão, há o estabelecimento da poesia como a concebemos hoje.
Primeiramente a musicalidade do poema chama atenção. O poema acima, e
muitos outros deste livro, são paralelísticos. A estrutura se repete, modificando-se
apenas as primeiras palavras: parakamu, pinkîimi e waikinmî, no início das estrofes. Ce-
sarino (2006) e Franchetho (1989) tratam especificadamente do paralelismo em textos
orais ameríndios e relacionam tal figura de linguagem às suas artes verbais. Principal-
mente, irão aproximar o paralelismo a elas como característica fundamental, buscando
destacar a forma sofisticada presente nessas construções orais.
No texto original dos cantos, em língua indígena, mantive todas as repetições,
contudo isso não foi feito na tradução. Busquei, nela, principalmente estabelecer a fra-
se geradora do canto. Tal frase em quase totalidade dos cantos é curta, como um haicai.
Nessa frase encontra-se a imagem poética condensada. Esse aspecto será desenvolvido
adiante. Essa frase é facilmente identificada nos cantos, pois dessas frases eles nascem.
Terêncio Luiz Silva, quando me apresentou as letras das músicas, também me mostrou
somente a frase geradora.
Como conhecemos, essa frase se identificara mais com o que chamamos de
mote ou também conhecido como cabeça, “que funcionava como matriz do poema
(MOISÉS, 1974, p. 514).” Moisés diz ainda, ao se referir ao vilancete ou cantigas de vi-
lão, que a matriz é “seguida por um número variável de estrofes [...] em que se desen-
volvia a ideia poética inserida no mote (p. 514).” Ainda hoje o mote é frequentemente
usado por poetas, principalmente repentistas.
Contudo, algo se distingue: nos cantos indígenas deste compêndio raramente
são acrescentadas outras palavras. Todas as variações giram em torno das palavras
21
presentes no mote, e praticamente na mesma ordem da frase geradora, criando para-
lelismos contínuos nas estrofes e mesmo no canto como um todo. Além disso, o mote,
além de um mote para a letra da música, é um mote para o canto. Muito mais do que
variar a letra, varia-se a música dos versos, muitas vezes em improvisações musicais
e em intercalamentos de versos e mesmo estrofes. Letra e música tornam-se indisso-
ciáveis na composição e o estabelecimento do texto no papel, como proposto aqui, de
antemão é um considerável fracasso.
A musicalidade do poema, como me apresentada por escrito por Terêncio
Luiz Silva,

parakamu keweyu xiri-xirimauya


pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
waikinmî keweyu xiri-xirimauya

é reforçada pela estrutura paralelística (mais ainda se considerarmos como


cantada por ele), além de poder ser especificado outro tipo de repetição, a epífora: por
três vezes é repetida keweyu xiri-xirimauya, sendo que no canto são 12 repetições, no fi-
nal dos versos, ao mesmo tempo em que se enfatiza com isso o ato de tocar o chocalho,
sua importância no parixara. Além da repetição interna no texto, quando cantado, há
repetições de todos os versos, principalmente de pinkîimi keweyu xiri-xirimauya, presen-
te de forma dupla em todas estrofes. Ainda, a própria palavra xiri-xirimauya traz uma
repetição interna, inclusive onomatopeica do chocalho, principalmente de sementes.
Kewei diz de um nome genérico para chocalho, podendo ser também a semen-
te usada para confeccionar o chocalho, ainda uma vara de madeira resistente, como
pau pereira (Platycyamus regnellii), em que são amarradas sementes ou mesmo conchas
de ostras (como já vi, comuns em lagos e riachos do lavrado roraimense), unhas de
animais, todos na parte superior. No caso do poema em análise, podem estar amar-
radas unhas do parakamu, pinkîimi e waikinmî na confecção do kewei. Koch-Grünberg
menciona cascos de veados, acrescentando “metades de partes de frutos (2006, p. 78-
79).” É tocado batendo a haste inferior no chão. Ainda vi vários instrumentos e mesmo
adornos para o corpo usando a semente aguaí (Chrysophyllum marginatum) na região.
Outro parixara diz:

kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi


ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi

parixara 13

22 kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi


kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi

kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi


kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi

[recolhe a flor do kewei que caiu cunhatã


recolhe a flor do chocalho que caiu cunhatã]

As repetições paralelísticas epifóricas e anafóricas são uma recorrência e um


ponto forte na poética musical dos cantos registrados. Nesse poema, praticamente
toda estrutura se repete, variando somente kewei para ukeweyu. Funcionam muitas ve-
zes como uma espécie de mantra, essas canções, pois são repetidas por vários minutos
durante a dança, apesar de a frase geradora ser curta. Essa repetição paralelística da
frase geradora, tão frequente nos cantos, que algumas vezes é modificada pelo cantor,
gera outro âmbito de poeticidade: uma poética da repetição. Repetição essa que não
conseguimos efetivamente recuperar, pois está intimamente ligada à música e mesmo
à dança. O cantor ao repetir a letra necessariamente não repete a música: ele modifica
e estabelece novas nuances poéticas relacionadas principalmente ao som, e também
ao movimento. Nas gravações, por vezes, apesar de um ambiente artificial, com mi-
crofones, cabos, os cantores sentados na maioria das vezes, é possível ouvir os pés
deles, fazendo os movimentos da dança. Reforçando isso, Armellada e Salazar (2007)
descrevem o parichara, tukui, areruia e marakpa, todos como dança, nem se referindo à
música.
De forma metassocial, referindo-se à própria movimentação da dança, a músi-
ca pede que as partes dos instrumentos que estão se desprendendo do kewei, objetos
prendidos na vara e nos chocalhos sejam recolhidos. Parixara, tukui, marapá, arereuia,
antes de qualquer coisa, são ritmos intimamente ligados à dança, pertencem principal-
mente ao ambiente da festa. Se hoje eles foram gravados de forma diversa, sem a festa
e dança, essa não é a realidade de seu uso social anterior.
Quanto aos instrumentos utilizados, Koch-Grünberg refere-se a tubos feitos
de embaúba (Cecropia pachystachya) (2006, p. 77). Um dos cantos do parixara diz:

awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako


mamai warekeruwa mamai warekeruwa mamai warekeruwa

parixara 2

awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako


awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako 23
mamai warekeruwa
mamai warekeruwa
mamai warekeruwa

awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako


awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako

mamai warekeruwa
mamai warekeruwa
mamai warekeruwa

awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako


awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako

mamai warekeruwa
mamai warekeruwa
mamai warekeruwa

[ao ouvir o som do meu instrumento kamaini


mamãe dorme mamãe dorme mamãe dorme]

O uso da rede (atta’) pelos indígenas é múltiplo, feita de algodão e palha de


palmeiras, e os primeiros registros do circum-Roraima sempre falam de sua existência.
Em sua visita à região em 1911, Koch-Grünberg chega a mencionar forte comércio in-
tertribal para consegui-la (2006, p. 77). Além disso, registra uma narrativa sobre a rede,
contada por Mayuluaípu: “Como os humanos ganharam a rede de dormir” (MEDEI-
ROS, 2002, p. 101).5 É possível visualizar mamai, a mamãe, pela repetição, balançan-
do-se na rede enquanto o instrumento é tocado: Mamai warekeruwa mamai warekeruwa
mamai warekeruwa. O poema constrói uma paisagem, como num haicai clássico japonês
ou em poemas curtos, contemporâneos, como de Manoel de Barros. Kamaini é um
instrumento feito de embaúba usado no parixara, mesma embaúba tão conhecida e
presente nos paus-de-chuva.
Já im Thurn refere-se aos seguintes instrumentos utilizados nas festas, cha-
madas por ele de “pawari feasts” (1883, p. 329), festas, festivais do pajuaru, bebida fer-
mentada principalmente de mandioca: tambores, chocalhos, flautas feitas de ossos de
animais e de madeira oca, provavelmente embaúba e bambu. Terêncio Luiz Silva é
taxativo na hora de usar instrumentos para cantar: no parixara utiliza chocalho de vá-

5 Nessa obra organizada por Sérgio Medeiros são publicados os textos oriundos de “Mitos e lendas dos
índios taulipangue e arekuná”, recolhidos por Koch-Grünberg, entre 1911 e 1913. Tais textos tinham
sido publicados anteriormente na Revista do Museu Paulista, em 1953. Não há ainda uma publicação
específica do restante da obra de Koch-Grünberg no Brasil, somente o volume já referendado em
24
meu texto, de 2006.
rios tipos, três diferentes puderam ser utilizados no dia da gravação, mas na hora do
tukui, somente tambor, sem chocalho. Não usou, mas disse que também se usa flauta,
principalmente ruwe, de taquara.
O nome pariisara pode ser relacionado ao radical pari, que significa capim atu-
almente, principalmente um capim conhecido como rabo-de-burro pelo formato de
sua floração. Tiago Simplício Napoleão, indígena macuxi da comunidade Napoleão,
na Raposa Serra do Sol, me disse que esse capim era usado também para enfeitar-se
para a dança do parixara, junto com folhas novas de inajá (Maximiliana maripa) e buriti
(Mauritia flexuosa) em geral desfiadas. Mesmo as folhas dessas plantas, após desfiadas,
parecem com capim seco.
Assim Koch-Grünberg descreve a chegada de um parixara de 1911, na comu-
nidade Koimélemong, entre as TIs São Marcos e Raposa Serra do Sol, região do Suru-
mu, em Roraima:

Os dançarinos chegam numa longa fila, vindos de longe na savana. É uma


espécie de dança de máscaras. Usam singulares adornos de cabeça, feitos de
folhas de palmeira inajá, que cobrem parte do rosto. Longos penduricalhos do
mesmo material envolvem o corpo e cobrem as pernas. Eles tiram abafados
sons uivantes de tubos feitos da leve madeira embaúba, que têm na parte da
frente todo tipo de figuras de madeira, peixes também, pintadas de várias
cores, enquanto agitam os instrumentos para cima e para baixo. Chegam
dançando, dobrando os joelhos. A cada dois passos, batem com o pé direito
no chão, dobrando ligeiramente o tronco para frente. (2006, p. 77)

Essa chegada, quando da vinda de outras comunidades ou mesmo de uma


caça ou pesca comunitária maiores, é descrita por vários interlocutores do projeto Pan-
ton pia’ como um dos pontos altos da festa, eles chegam dançando e em geral ornados.
Koch-Grünberg também enfatiza o momento da chegada dos visitantes (2006, p. 77).
São recepcionados por mulheres com pawa,6 em que pode haver uma conversa entre os
líderes, quando a chegada é de indígenas de outras comunidades, descrita como for-
mal e monótona por im Thurn (1883, p. 323). Ainda, na chegada, não se tem distingui-
do quem está ornado para quê. Como veremos, os dançarinos de tukui ocupavam uma
situação diferenciada dentro da manifestação cultural, inclusive com ornamentos e
mesmo instrumentos distintos. Ainda é importante essa descrição de Koch-Grünberg
e de onde ela surgiu, pois os cantores Terêncio Luiz Silva e Zenita de Lima pertencem
à região do registro, inclusive ele estudou na missão religiosa instalada nos arredores
do Surumu, missão mencionada e visitada pelo próprio Koch-Grünberg.

6 Paiwa é uma referência oriunda principalmente dos Patamona, mas também conhecida pelos Macuxis. 25
Em macuxi é prakkari.
Há referência nos próprios parixaras registrados quanto aos trajes utilizados.
Um diz:

maripaya yarenpukape uipîi uipîi


kuwai yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi

parixara V

maripaya yarenpukape uipîi uipîi


kuwai yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi

maripaya yarenpukape uipîi uipîi


kuwai yarenpukape uipîi uipîi
maripaya yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi

maripaya yarenpukape uipîi uipîi


kuwai yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi

[venho tirando olho de inajá de buriti de bacaba


olho de inajá de buriti
de inajá de bacaba

venho eu venho tirando olho o olho


de inajá
de buriti
de bacaba
olho de bacaba]

O caminhar é destacado pela repetição do verbo uipîi. No caminho, “venho


tirando”, já que os indígenas às vezes se deslocavam grandes distâncias, em algumas
ocasiões se colhia a fibra e mesmo se confeccionavam os trajes de dança. O índio ma-
cuxi não vem tirando somente folha (yare’), mas yarenpukape, o olho do inajá, buriti e
bacaba (maripaya, kuwai e kunwaya, respectivamente). Essas são palmeiras importantes
em todo circum-Roraima. Além de alimento pelo fruto, as fibras macias do olho, do
broto novo das folhas novas eram utilizadas na confecção das roupas para dança do
parixara além de objetos artísticos como cestos, redes, cordas, vestimentas para danças.
Objetos artísticos, já que é tão difícil separar o que é artístico daquilo que é feito para o
uso entre os indígenas. Els Lagrou dirá que “a grande diferença reside na inexistência,
entre os povos indígenas, de uma distinção entre artefato e arte, ou seja, entre objetos
produzidos para serem usados e outros para serem somente contemplados [...]” (LA-
26 GROU, 2010). Pensar as artes indígenas exige essa torção. Lagrou conclui dizendo que
É exatamente esta distinção entre arte e artefato que a maioria das etnografias
sobre a produção de artefatos e artes indígenas vem negando há mais de
dez anos: não há distinção entre a beleza produtiva de uma panela feita
para cozinhar alimentos, uma criança bem cuidada e decorada e um banco
esculpido com esmero. (2010, p. 17)

Uipîi, o venho, o eu tão presente nesse poema merece um pouco mais de apro-
ximação. Se, por um lado, ele diz de quem compôs o texto, impossível de ser definido
aqui, já que hoje é um texto pertencente à memória coletiva7 do povo macuxi, por
outro lado, se relaciona e é acoplado aos cantores que revificaram o canto. Passado e
presente, o(s) índio(s) compositor (es), ou mesmo no feminino, se unem nesse eu.
Barthes dirá que “o sujeito da enunciação nunca pode ser o mesmo que agiu
ontem” (BARTHES, 2004, p. 20). O sujeito da enunciação se atualizaria num presente
e sempre num presente com a leitura (no caso aqui do estabelecimento dos poemas
originados dos cantos), com o canto de música (adequando à realidade de Manaaka
e Yauyo). Com isso, se ele só existe nesta atualização da leitura, do canto, só existe no
ato de ler, na presentificação da leitura; ou no ato de cantar. Barthes conclui, afirmando
que “o eu do discurso já não pode ser o lugar onde se restitui inocentemente uma pessoa
previamente guardada” (p. 20).
O advérbio “inocentemente”, nesse contexto, traz um pressuposto esclarece-
dor ao texto bartheseano: a questão não é que não se possa restituir, por exemplo, um
“eu” ao referente-nome, isso pode ser feito, só que não inocentemente. Principalmente,
não se pode fazer isso inocentemente porque o “eu” presente numa leitura, a priori,
é preenchido pelo antes “tu” e agora “eu” leitor na e da leitura. Também, outro pro-
blema é que, mesmo restituindo o “eu” ao nome próprio presente na capa deste livro
(Manaaka e Yauyo), esse nome já é uma criação da existência de uma obra de arte,
o presente livro de poemas, inserido em um arcabouço cultural diferente dos povos
macuxi e taurepang, dois quais fazem parte. Muitas vezes, é um “eu” a dialogar com
o indivíduo, a dialogar com o nome na capa, instalando um tipo diferenciado de inter-
textualidade, uma intertextualidade biográfica, entre a obra e seu autor.
Paul Valéry chama atenção a respeito do distanciamento do autor em relação
a sua obra. Diz ele que “nada é mais difícil de entrar no espírito das pessoas, e mes-
mo no da crítica, do que essa incompetência do autor a respeito de sua obra, uma vez
produzida” (1999, p. 159). A situação se complica ainda mais, pois é impossível de ser
restituída a autoria, como habitualmente se faz, nos poemas originados dos cantos,
principalmente porque eles originam-se de autores diversos desconhecidos e perten-

7 Ver, por exemplo, HALBWACHS, 2013.


27
cem à memória de mais de um povo, os indígenas do chamado circum-Roraima.
Ainda quanto à vestimenta, outro canto faz referência ao inajá:

mîirirî mîirirî nekokomamîi


upono pîrenmapî’pî nekokomamîi
mariipa pîrenmapî’pî nekokomamîi

parixara 6

mîirirî mîirirî nekokomamîi


mîirirî mîirirî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi

mîirirî mîirirî nekokomamîi


mîirirî mîirirî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi
mariipa pîrenmapî’pî nekokomamîi

mîirirî mîirirî nekokomamîi


mîirirî mîirirî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi

[assim estou vivendo


estou vivendo
com minha roupa estou vivendo

amanhecido com minha roupa


vestido de inajá
estou vivendo]

Esse canto aborda justamente a vestimenta de palha, nesse caso inajá, usada
principalmente nas comemorações e danças de parixara, como destacou Terêncio Luiz
Silva, quando do processo de tradução dos cantos. Os indígenas macuxi e taurepang
em tempos atrás, cotidianamente, eram retratados usando moosa, conhecido como
rabo, uma tira de pano entre as pernas presa por um cordão na cintura, ou nus. No
dia a dia, não se usava saias e adornos dessas palmeiras. O canto está localizado no
contexto da festa e da dança do parixara e, de dentro desse contexto, o índio canta
a relação de seu traje com sua vida. No poema, há uma afirmação da vida indígena
relacionada à vestimenta confeccionada a partir do inajá. Há uma ênfase: nekokomamîi
é repetido três vezes na frase geradora e 12 no canto, “estou vivendo”, bem como o
modal mîirirî é repetido duas vezes na frase geradora e 12 vezes no canto, assim, deste
modo, estou vivendo com minha roupa de inajá. Amanheceu, a festa acabou, e ele
28 continua com os trajes de inajá.
Armellada e Salazar (2007, p. 148) apresentam o parixara como uma espécie
de dança em que se usam “halos” (adornos para cabeça), tangas de buriti, plumária,
instrumento de sopro (bototo) de embaúba. Há quem relacione o parixara ainda ao
mito do Urubu Rey, da Visita ao céu, história que se mistura também à do lago Piri-
piri.8 O parixara é hoje o ritmo indígena mais difundido em Roraima, principalmente
por causa do movimento cultural Roraimeira, surgido na década de 80 em Roraima
(OLIVEIRA; WANKLER; e SOUZA, 2009), em que se divulgou a dança, bem como
esse movimento cita o nome parixara em várias músicas. Já presenciei Eliakin Rufino,
um dos fundadores do Roraimeira, por exemplo, fazendo passos de parixara em
apresentações poético-musicais.
O termo história é usado neste trabalho como apresentado por Gordon
Brotherston (2015) bem como aludido por Lévi-Strauss (1990). Dada à dificuldade de
separar mito de lenda bem como a problemática do conceito mito quando aplicado às
culturas ameríndias, uso somente o termo história quando me refiro a mito e mesmo
lenda, como tido por alguns. Acrescento a isso o que me disse o ancião Severino
Barbosa, da comunidade São Jorge, quando pedi que ele contasse os mitos e lendas de
sua comunidade. Ele me disse: “isso é panton, para nós indígenas.” Panton em geral é
traduzido por história. Esse aspecto será retomado adiante.
O parixara também é cantado em outras ocasiões, quando da vinda de uma
caçada: o caçador vem cantando, e o tema é, em geral, o próprio objeto da caçada,
como vimos. Ainda, pode ser cantado nas madrugadas, quando se acorda e se espera o
dia amanhecer, enquanto os homens tomavam paiwa, bebida alcoólica principalmente
de kîse’, de mandioca. Im Thurn diz da existência de festas entre tribos, de festivais que
poderiam ser chamados de pawari feasts e que essa bebida seria the national beverage (1883,
p. 329). O parixara e mesmo o tukui estão relacionados a essas festas e principalmente
ao consumo de bebidas fermentadas, especialmente de mandioca, atualmente conhe-
cida entre os indígenas da região estudada como pajuaru e mesmo caxiri forte (já que
há o caxiri sem fermentar). Essas festas poderiam comemorar um casamento, um
funeral, uma nova casa ou o estabelecimento em um novo lugar, principalmente, diz
im Thurn, podem ser relacionadas a nada aparentemente especial (p. 329). A relação do
indígena dessa região com o consumo de paiwa, uma relação de frequência e excessos,
se aproxima bastante da descrita por Viveiros de Castro entre os tupinambá, em “O

8 Há informação a esse respeito no blog do indígena Elder Silva (2013). Relatos sobre o Piri-piri,
encontrei em narrativas do indígena Caetano Raposo, da comunidade Raposa, na TI Raposa Serra
do Sol. A esse respeito também pode-se consultar o volume II de Koch-Grünberg. Há uma tradução
do alemão para o português disponível em Sérgio Medeiros (2002) história 27, “A visita ao céu”.
29
mármore e a murta” (2011). Diz im Thurn sobre uma festa no circum-Roraima em
meados do sec. XIX: o paiwa era feito em canoas e servido abundantemente, “the actual
quantity of liquour consumed by each individual is tremendous” diz ele, isso numa festa que
durava por dias (1883, p. 323-325). A dança está intimamente ligada a esses momentos
de festas e consumo de paiwa.
Nos dias atuais, o parixara é usado principalmente em ocasiões comemorativas
ou mesmo festejos como representação do que era o parixara, sua história. Hoje se
fala em grupos de parixara, assim como grupos de danças, no sentido em que nós
usamos. Nas comunidades visitadas, em quase totalidade, o parixara não mais faz
parte de um uso coletivo como era no passado. Ainda, o parixara tornou-se sinônimo
de dança indígena, incluindo, às vezes, até outras músicas tradicionais, como tukui,
por exemplo, que são dançadas como sendo parixaras.
Na contemporaneidade dos interlocutores, o pariisara, proposital a escrita aqui
em macuxi, e mesmo outras manifestações são aparições (se me permitem usar essa
palavra) solitárias. Os ainda sabedores dos cantos, ao acordarem cedo, ainda cantam
suas histórias (como as encantadoras Dona Regina Tobias, da comunidade do Mel, e
sua parente Martina Tobias, da comunidade Kurapá), cantam sob reclamações dos
mais jovens que foram dormir tarde por vários motivos, como a televisão e a nova
realidade dos indígenas. (Tenho consciência do comprometimento e envolvimento
pessoal dos implícitos no final desse parágrafo.)
Já o tukui ou tukuxi (como presente em algumas músicas, um uso mais antigo
da palavra), significa beija-flor, e são cantos em geral relacionados à sabedoria dos
pajés, para se fazer intervenções na natureza, como chamar chuva, acalmar trovões,
e vale acrescentar que também eram dançados coletivamente. Armellada e Salazar
dizem que se formam duas rodas concêntricas, em que o tukui era dançado por fora
enquanto o parichara por dentro, além de se usar tambor e pitos de taquara (2007, p.
148 e 203).
O tukui está relacionado à flora, à floração, e pertencia principalmente aos
guerreiros e pajés sua dança. Esses cantos predominam aqui: são 40 de um total de 79.
Seus dançarinos usavam, além de saias de fibras, como buriti, beija-flores dessecados
como ornamentos, mesmo outros pássaros. Eles eram usados como ornamento
para cabeça ou enfeitavam um pequeno pau, sendo amarrados em sua ponta. Eram
retirados os órgãos internos e deixados para secar, com cinza na parte interna. Diante
da presença das religiões fundamentalistas, foi o ritmo mais atacado, pois relaciona-se
ao pajé e seus conhecimentos. Vários informantes se negaram a falar dele, propondo-
30
se somente a falar do areruia e mesmo do parixara.
Koch-Grünberg diz que o tukui é a dança de todos os pássaros, principalmente
beija-flor, e de todos os peixes. Narra que as pessoas

usam somente a tanga e estão pintados com motivos artísticos ou simplesmente


besuntados com argila branca, no cabelo também, o que dá a muitos uma
aparência extremamente selvagem. Em grupo de dois ou de três, parte deles
de braços dados, andam um atrás do outro, dobrando os joelhos, batendo
com o pé direito no chão. Os homens acompanham sempre o mesmo som de
madeira estridente num curto pedaço de taquara. (2006, p. 78-79).

Chamou atenção quando da tradução dos tukuis, a importância dada à tawa,


à tabatinga, à argila branca mencionada por Koch-Grünberg. Diz um canto

wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure


tawaake tawaake taraure9

tukui 4

wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure


wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

wa ke ta
ke wa ee rau
ta reee

tawaake tawaake taraure


wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

wa ke ta
ke wa ee
rau
ta reee
tawaake tawaake taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

wa ke ta
ke wa ee
rau
ta reee
tawaake tawaake taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

9 No estabelecimento do texto da música, houve um trabalho de espacialização na página do poema,


entre outras coisas, buscando dizer um pouco sobre a musicalidade, movimento presentes nos cantos.
31
wa ke ta
ke wa ee rau
ta reee
tawaake tawaake taraure

[tawaake tawaake
estou dizendo que marreca banha paturi banha
com tabatinga no lago
tawaake tawaake]

Segundo Terêncio Luiz Silva, os marrecos citados se banham na água suja,


barrenta de tabatinga. Os marrecos, na relação da música com o tukui, se enfeitam com
a cor branca da tabatinga. O tawa cria contraste na cor avermelhada e mesmo negra
desses marrecos,10 assim como o tawa cria contraste sobre o cabelo negro, sobre a pele
avermelhada do indígena ou enegrecida pelo karutuke, pelo jenipapo, tão presente
em vários cantos. Na dança, assim como os patos, pois eles estão a se banhar, a se
farfalhar no lago com tabatinga, os dançarinos faziam algo parecido (im Thurn fala do
processo imitativo dos indígenas na dança), se besuntando com tawa, como destaca
Koch-Grünberg, no corpo, no cabelo para dançar.
Outro canto diz: onorewape uipîi / tawa tawa imotamenpe uipîi [venho como
garça/ com ombros pintados de tabatinga]. Nesse poema, na bela imagem, o indígena
já vem pintado com barro branco, com tabatinga, com tawa. Ainda nesses dois últimos
textos indígenas, aparecem referências a aves: no primeiro a patos e, no segundo, à
garça. A garça, ave branca, é outra referência à cor branca da tabatinga. Mais que isso,
a garça é uma presença constante no circum-Roraima, em vários tamanhos. Tawa e
onorewape são, vamos assim dizer, sinônimos no lavrado. Há ainda mais três cantos
que se referem à tabatinga:

tuna tariiru
tawaake tuna tariitanîpîuya [tukui 18]11
[tuna
a cor d’água
com tabatinga eu pinto
eu pinto a água
tawake]

parixara iipî era’mato’pe


wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai

10 O informante não conseguiu especificar claramente os tipos de marrecos em português. O menor


(paturi) deve ser Netta erythrophthalma e o maior Cairina moschata. Essas são aves abundantes no
lavrado e mesmo na savana venezuelana.
11 Quando trouxer a indicação do canto, como aqui, não trarei todo ele como cantado, mas somente a
32
frase geradora.
tawake tawake wataramenkai
wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai
parixara iipî era’mato’pe
wataramenkai tawake wataramenkai wataramenkai [tukui 34]
[vamos ver a vinda do parixara
vamos ver
pinta-se com o jenipapo pinta-se
pinta-se com karutuke

vamos ver a vinda do parixara


vamos ver
pinta-se com tabatinga pinta-se
pinta-se com tawake

vamos ver a vinda do parixara


vamos ver
pinta-se com karutuke pinta-se
pinta-se com tawake]

watarai menukai
wîrixi’ya uyera’mato’pe tawake tawake
watarai menukai
tawa tawa umota menu uipî tanne
wîrixi’ya uyera’mato’pe
watarai menukai [tukui 38]
[vou pintar meu corpo[...]/com tabatinga/ pra cunhatã me ver/ com tawa
/eu venho pintado/ o ombro/ com tabatinga com tabatinga no ombro/ eu
venho pintado]

No primeiro poema, a água é pintada, é mesclada com tabatinga. Talvez para


poder se pintar com ela, para se conseguir a cor branca. O segundo conclama para que
alguém presente junto ao cantor e/ou compositor se pinte com tawa e karutuke, jeni-
papo, pois o parixara está vindo; no terceiro o indígena do circum-Roraima diz que
vai se pintar, para que sua irmã o veja, que pode significar também pretendente. Vale
lembrar, como também menciona Koch-Grünberg, que numa mesma festa se dança-
vam tanto parixara quanto tukui, além do areruia. De forma metafestiva, as próprias
opções de se pintarem com tabatinga se transformam em tema para as músicas. O
tawa, pintar-se com ele, faz parte da estética corporal indígena, relacionada diretamen-
te às festas e à dança. Esse uso, nas comunidades indígenas atuais em que trabalhei, é
praticamente inexistente, inclusive poucos sabem dele.
Ainda, foram registrados 11 areruias (hallelujah, aleluya, areruya). Como o
próprio nome remete, areruias seriam cantos surgidos já a partir do contato com o
não-índio. Stela Azevedo de Abreu (1995) faz uma revisão histórica a respeito do sur-
gimento do areruia, aqui entendido como manifestação religiosa global. A catequese
entre os indígenas do circum-Roraima teria iniciado em 1738 pelos morávios holande- 33
ses na região do Essequibo, na hoje Guiana Inglesa. A partir daí a autora mapeia seu
uso na região, principalmente via registros efetuados naquele país. Houve, a partir
desse período, certos momentos em que puderam ser registradas aglomerações signi-
ficativas de indivíduos no século XIX em torno da religiosidade cristã. Ela aponta 1845,
1863, 1885, como momentos áureos: principalmente relacionados à troca de pele, em
que o indígena viraria branco; à troca de língua, que seria feita por meio dos missio-
nários; e o advento da figura do messias, além de um culto ao papel como possuidor
do sagrado.
Ainda o areruia passa a ser mencionado como religião louca no início do séc.
XX, por missionários e cronistas (ABREU, p. 46). Principalmente, o jesuíta Cuthbert
Cary-Elwes, entre os indígenas no período de 1909-23 (apud ABREU, p. 48), menciona
o ritual como impedidor da evangelização, mas diz que “o canto e a dança convidam a
dançar mais efetivamente do que qualquer música que eu já ouvi, ou dança que já te-
nha visto. É quase irresistível.” O canto associado à dança é descrito pelo jesuíta como
algo exaustivo, levando a uma espécie de transe. Isso também é defendido por Abreu:
“Ao que parece, tudo isto nos coloca diante de uma religião que professa uma transfor-
mação cósmica e uma metamorfose mediada da humanidade. Para tanto, é necessário
cantar até a exaustão” (ABREU, p. 44). O areruia é apresentado mais contempora-
neamente como um culto, consistindo propriamente numa religião [a partir de Butt
Colson] (apud ABREU, p. 63); uma grande família de profetismos e messianismos,
baseada no cristianismo, entre povos ameríndios [a partir de Alfred Métraux] (apud
ABREU, p. 68); “movimentos religiosos baseados numa ética de purificação pessoal
pela continência sexual e pela repetição intensiva de cantos e danças [a partir de David
Thomas]” (apud ABREU, p. 68).
Koch-Grünberg em 1911 já registra num de seus cilindros o nome areruia e
chama tal gênero musical de caricatura do parixara, originado das missões religiosas
inglesas (2006, p. 80). O próprio Terêncio Luiz Silva irá dizer que:

Aí depois chegou um tal de areruia, mas areruia já foi um nome dado, imposto
pelo estrangeiro. Areruia já veio da palavra do inglês, da parte daí da Guiana,
porque areruia não existe, porque o que a gente conhece é tukui, parixara,
ware’pan, manau’ã.12

Nas visitas às comunidades dentro projeto Panton Pia’, o areruia é o tipo


de música mais difundido, mesmo quando informantes muitas vezes não sabem o
parixara, eles sabem algum areruia. Certo é que cantos areruias estão presentes em
34 12 Todas as informações não referenciadas e falas indígenas pertencem ao projeto Panton Pia’.
praticamente todas as comunidades, por causa de sua relação com a igreja. Contudo,
dos 39 entrevistados, nenhum informante disse professar o areruia enquanto religião:
são evangélicos ou católicos.
Incorporado à cosmogonia indígena, o surgimento do areruia recebe expli-
cações diversas, como a de Tiago Simplício Napoleão, da comunidade Napoleão, na
Raposa Serra do Sol: quem trouxe o areruia foi Akan, um mensageiro de deus, um
indígena que veio do céu e trouxe o areruia. Akan conversou com Paapa, com deus, e
trouxe-o para livrá-los das ‘coisas ruins’, como a poligamia, para livrá-los das guerras.
Surpresa foi ter sido apresentado a um estilo de música praticamente desco-
nhecido em Roraima, já que parixara, tukui e areruia são palavras de uso comum.
Segundo Terêncio Luiz Silva, o marapá significaria morcego. Armellada fala de ma-
rakpa, marapa e mesmo sapará13 como uma dança pertencente aos espíritos mawaríes
(1988). Os mawaríes seriam seres fabulosos que habitariam as montanhas e cascatas,
águas profundas e cristalinas, além de alguns animais também poder sê-los. Depois de
dançarem dias com as esposas de uma aldeia, enquanto os maridos estavam caçando,
os mawaríes teriam levado uma moça recém-púber. Os marapás teriam sido trazidos
aos homens por essa moça que teria sido engravidada: ela e seu filho ensinaram a
dança e os cantos aprendidos com os mawaríes (ARMELLADA, 1988). Dos 39 interlo-
cutores entrevistados, dentro das atividades do projeto Panton Pia', somente Terêncio
Luiz Silva informou sobre o marapá.

Os registros

As surpresas foram surgindo aos poucos. Depois de conseguir os instrumen-


tos, um tambor e um kewei de vara, além de uma saia com sementes, que foi utilizada
como chocalho, já que os instrumentos de Terêncio Luiz Silva estavam em sua comu-
nidade, a quase dois dias de caminhada, ele me chega acompanhado de sua esposa,
Zenita de Lima. Para alegria dos presentes, eles cantavam em duo e já se identificavam
como uma dupla de cantores, e muito entrosados, usando seus nomes em macuxi:
Manaaka e Yauyo.
Outra coisa que muito chamou atenção foi a origem dos cantos. Mais do que
algo adquirido naturalmente, Terêncio Luiz Silva aprendeu-os de forma vária: desde
a década de 70, do século passado, ele se interessou pela tradição de seus povos. Essa

13 Sapará: nome de uma antiga etnia de Roraima, sem falantes na atualidade, apenas alguns descendentes

esparsos.
35
foi outra surpresa: o pai era taurepang e a mãe macuxi, dos quais ele herdou as duas
línguas. Mas, como ele mesmo disse, com prioridade para a materna. Esse aspecto de
identificação na região com a origem materna é ressaltado por Koch-Grünberg (2006).
De posse das duas línguas, mais o português e um pouco de espanhol, Terêncio Luiz
Silva se tornou referência na cultura indígena da região.
Ele possui registros feitos em K7 da década de 70. De posse de um gravador,
registrou pajelanças, cantos, falas do surgimento da principal associação indígena de
Roraima, o Conselho Indigenista de Roraima (CIR). Principalmente, tornou-se alguém
interessado pela valorização de sua cultura. Por exemplo, na entrevista, quando per-
guntado a respeito da coisa mais triste que ele viu em sua vida, diz:

Não, a triste mesmo da vida, como dizia, é que eu não queria que acabasse essa
vida de indígena. Vamos dizer assim, a tradição indígena, a vida indígena.
Que o índio, que hoje a gente tá percebendo, basta chegar em uma cidade,
como aqui, Pacaraima, ou Boa Vista, que muitos dos nossos jovens, estão se
perdendo, estão se perdendo, deixando, se envergonhando do que são. Isso aí
deixa a gente muito triste.

Fica claro na fala a relação densa com a história de seu povo. Ainda, contri-
buindo para tornar o que ele hoje é, soma-se o fato de ter vivido no colégio interno na
região do Surumu, na hoje Raposa Serra do Sol, local em que foi levado aos 11 anos
para aprender o português na chamada missão, lá criada em 1909 pelos beneditinos
(KOCH-GRÜNBERG, 2006, p. 133-4). Também, contribui o fato de ter sido uma impor-
tante liderança indígena, principalmente de 78 a 82, quando foi membro fundador e
diretor do Conselho Indigenista de Roraima (CIR).
Segundo Terêncio Luiz Silva, quatro teriam sido as fontes das músicas que
ele canta: Bento Luiz, seu pai; Alfredo Giron, da comunidade indígena Manakrü, em
Santa Elena de Uairén, na Venezuela; avô Luiz, da comunidade indígena Lago Verde,
no município do Uiramutã; e avô Simplício, da comunidade indígena Santa Isabel,
município de Pacaraima, ambos os municípios de Roraima, Brasil. Desde os 18 anos
de idade, quando saiu da região do Surumu, Terêncio Luiz Silva vive em região bem
isolada. Indo para as serras, primeiro morou em Kumaná, na região da TI Raposa Serra
do Sol, e depois mudou para Ubaru, perto de Kumaná, ambas as comunidades a ca-
minho do Parque do Monte Roraima. Sem estrada que possa passar carro, cada ida ou
vinda em geral leva em média dois dias de viagem a pé.
Ainda ao aprender os cantos, Terêncio Luiz Silva preocupou-se em entender
o que neles estava sendo dito, principalmente porque pouco entendia o que tinha ali:
a linguagem presente nos cantos, além de poética, possuía vocabulário antigo e com
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muitas palavras em desuso, mesclando as línguas macuxi e taurepang, muitas vezes.
Literalmente Terêncio Luiz Silva vive numa situação de fronteira: seja fisica-
mente, na fronteira Brasil-Venezuela, Ubaru fica próximo do marco fronteiriço; seja na
fronteira de povos a priori distintos: os macuxis e os taurepangues, línguas de origem
caribe. A região habitada por ele há 48 anos, quando da entrevista, pertence ao cir-
cum-Roraima. Colson ajudado por Armellada (COLSON, 1985, 1996, 2009) e Santilli,
parece-me baseado nela (Santilli, 2001), distinguem essas comunidades em Kapón e
Pemón. Os primeiros seriam os Ingaricó, Patamona, e os segundos, os Kamarakoto,
Arekuna, Taurepang, Macuxi. Sérgio Meira apresenta uma classificação com diferen-
ças, com um grupo maior chamado de pemonguiano, tendo dentro dele os Kapon,
macuxi e os Pemon, onde estaria o taurepang (2006). Dessas etnias, Terêncio Luiz Silva
teve mais contato, nessa ordem, com os Macuxi, Taurepang, Wapixana, e os cantos se
originam dos dois primeiros. Deve-se considerar, ainda, a possibilidade de esses can-
tos serem utilizados também por outras etnias, já que o contato entre esses povos foi e
é contínuo.
A transcrição foi um problema à parte e, apesar de possuir cantos taurepangues
e em língua taurepang, foi adotado o sistema usual entre os macuxis, principalmente
porque os transcritores, Terêncio Luiz Silva e Tiago Simplício Napoleão, dominavam
esse padrão de escrita. Digo problema pois, na Venezuela, já há padronização mínima
da língua taurepang, coisa que entre os macuxis ainda não se consolidou efetivamente.
O texto dos cantos foi trazido por Terêncio Luiz Silva somente com a frase ge-
radora e a contribuição da tradução se deu nessa frase e fase. A versão atual dos cantos,
com todas as repetições paralelísticas, foi estabelecida por mim a partir da audição dos
cantos. Principalmente estabeleci outros objetivos além da mera inclusão da letra: dar
movimento (mesmo que mínimo, se comparado à dança com a música); criar imagens
que, entre outras coisas, pudessem dialogar com os poemas em português; certo rit-
mo aos versos e estrofes. Buscando isso, alguns versos foram colocados minimamente
inclusive em formato espacial do áudio, seguindo sua partitura, como no parixara 16:

ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’

A leitura da frase deve seguir a ordem de surgimento das palavras, levando


em consideração a que surgir primeiro da esquerda para direita. O verso ficaria assim: 37
uyapî’ sarinmî uye’nyaripe. Além disso, muitos versos são modificados no espaço, mas
há versos iguais na estrofe, que facilitam a leitura por analogia.
Por uma questão estética e estilística, e também por causa do trabalho visual
com os cantos, tanto a tradução quanto a letra da música não apresentam uso de pon-
tuação nem de letra maiúscula, com raras exceções para a caixa alta. Ainda, a separa-
ção com espaço entre muitas estrofes foi sacrificada em prol da construção de imagens
a partir das letras dos cantos, mas as estrofes são facilmente identificadas a partir do
áudio dos cantos, caso seja necessário.
O primeiro tradutor encontrou sérias dificuldades, apesar de ser professor de
macuxi e já ter traduzido livros para sua língua materna. Recordo que estavam quatro
falantes nativos macuxis lidando com a tradução dos cantos e praticamente não enten-
diam o que estava sendo dito neles. Isso se deve à origem diversa dos cantos, podendo
ser de dialetos do próprio macuxi, como dos Iliang,14 Monoicó, grupos que princi-
palmente se diluíram, formando o que hoje se entende genericamente por macuxi. A
primeira tradução foi praticamente toda inutilizada.
A segunda tradução foi feita com o próprio Terêncio Luiz Silva. Nesse mo-
mento, pude entender algumas coisas que ainda estavam obscuras. Primeiro, ouvir
dele aquilo de que já estava quase certo: nos cantos estávamos diante de línguas an-
tigas e não contemporâneas. Eram todos cantos oriundos de já idosos e da tradição
oral. Os cantos, assim como as rezas e superstições, têm sido pesquisados por mim há
algum tempo.
Principalmente, nos cantos, há referências a uma realidade mítico-histórica
dos taurepangues e macuxis que praticamente não existe na maioria das comunidades
atuais, destacadamente nos mais jovens: histórias como do Lago Piri-piri, do Rato’;
evocações em rezas de Insikiran, Anikê, como se fossem deuses. Os cantos, segundo
Terêncio Luiz Silva, pertencem a uma época em que essa realidade mítico-histórica
era efetiva na vida dos indígenas dessa região. Manaaka, o nome indígena de Terêncio
Luiz Silva, é bem significativo: significa uma espécie de xerimbabo dos pajés, aqueles
que trabalham nas sessões de cura, se comunicando entre os mundos. Efetivamente
Terêncio Luiz Silva é um ponto de comunicação entre passado e presente.
A tradução feita por mim e o sábio Terêncio resumiu-se em estabelecer o sig-
nificado das palavras e, dentro do possível, suas funções sintáticas. Posteriormente,
quando eu já havia estabelecido os versos e as estrofes dos cantos, como aqui apresen-

14 Por exemplo, os iliangues são extremamente estigmatizados, por causa da fama de serem comedores
de gente e de serem Canaimé, personificação do mal. Conheço alguns iliangues que se negam a se
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identificar como tal e se identificam como macuxi genericamente.
tados, foi feita, primeiro, uma tradução literal dos cantos, todos os versos e estrofes,
que foi quase toda descartada, para dar lugar ao que é aqui apresentado, principal-
mente uma tentativa de estabelecer imagens poéticas condensadas em poucas pala-
vras, como muitas vezes encontramos nas frases geradoras dos cantos. Buscava uma
linguagem como se tivesse diante de haicais, traduzindo e construindo imagens: pois
essa construção imagética foi a que sempre se destacou mais, a meu ver, desde o pri-
meiro contato com os cantos.
Quanto à linguagem, o vocabulário apresentou-se muito distinto do uso con-
temporâneo. Tenho encontrado neles referências que não mais são do uso atual: no vo-
cabulário, no significado de palavras. Terêncio Luiz Silva me lembrou isso várias ve-
zes. Dizia ele: “professor, ninguém fala mais assim, essa é uma linguagem dos antigos,
não se sabe quantos anos”. Falou-me que muitas palavras ele mesmo não as entendia
e teve de buscar, à época, com os cantores seus significados, todos hoje já falecidos.
Os sapinhos da floresta são nomeados distintamente, palavras como tukuxi,
beija-flor, agora são usadas como tukui tanto em macuxi quanto em taurepang. Assim
como essa, outras palavras e referências, como a aspectos dos rituais da época, não
pertencem mais à contemporaneidade da maioria dos falantes das TIs Raposa Serra
do Sol e São Marcos. Primeiro, pois grande parte dos indígenas dessa região não sabe
mais a língua materna e, ainda, porque o contato com a sociedade de consumo bem
como a presença de religiões fundamentalistas nas comunidades têm modificado pro-
fundamente a relação com a tradição nos indígenas (FIOROTTI, 2012, 2013).
Trabalhei com três dicionários: Diccionario pemón, de Cesáreo de Armellada
e Mariano Gutierrez Salazar (2007); Dicionário da língua macuxi, de Celino Alexandre
Raposo (2008); e Língua macuxi-macusi maimu: guia para a aprendizagem e dicionário
macuxi, de Emanuelle Amodio e Vicente Pira (1996). Contudo, com exceção em partes
do primeiro, a incursão nesses dicionários era na quase totalidade infrutífera, pois
as palavras não estavam dicionarizadas. Logo, Terêncio Luiz Silva foi efetivamente a
fonte para a tradução.
Terêncio Luiz Silva e Zenita de Lima se mostraram muito mais intérpretes,
no sentido usual da palavra, do que falantes nativos que adquiriram naturalmente os
cantos por meio de seus rituais. Por meio de um processo de audição e gravação, Te-
rêncio Luiz Silva teve acesso à maioria dos cantos. Além de ter esse acesso, quando da
tradução em conjunto, presenciei inclusão de palavras, pois assim, segundo ele, ficava
melhor. Logo, há uma presença individual e não somente de reprodução, e uma me-
mória coletiva. O texto dos cantos é uma presença contemporânea das possibilidades literárias
39
indígenas. Ainda, vale mencionar que ele analisou vários usos “estranhos” nas pala-
vras, como repetições e inclusões de sufixos como aspectos necessários à musicalidade
da letra, ao ritmo da música.
Presenciei uma acusação em relação ao que Terêncio Luiz Silva fez e faz até
hoje, como se ele tivesse “tomado” cantos que não seriam dele, de sua comunida-
de, que seriam cantos de outras comunidades. Sem se prolongar muito, esses cantos
pertencem a uma memória coletiva dos taurepangues e dos macuxis (e talvez até de
outras etnias do chamado circum-Roraima), etnias e memória coletiva de que Terên-
cio Luiz Silva faz parte. Por outro lado, ele vive num entre lugar étnico: macuxi e
taurepang, e não macuxi ou taurepang, prova disso que ele adquiriu as duas línguas
e passeia literalmente pelas culturas desses povos. No mais, o seu caso não é exceção,
os casamentos entre etnias são muito comuns em toda região do São Marcos e Raposa
Serra do Sol, conforme se pode comprovar nos 39 entrevistados até o momento, e len-
do Koch-Grünberg.

Mais perto dos poemas indígenas


Aparuya uyeori’na uyepori’na
iwîîtî ramonoripo uyepori’na [parixara 1]
[a água me encontra
na beira do igarapé]

awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako


mamai warekeruwa mamai warekeruwa mamai warekeruwa
[parixara 2]
[ao ouvir o som do meu instrumento kamaini
mamãe dorme mamãe dorme mamãe dorme]

wai patau wai pataurî eserrunkî


uikînî uikînîrî uikînî uikînî wayaurariwa [parixara 3]
[ em cima da casa
canta o passarinho
passarinho meu passarinho
passarinho corrupião]

Esses são as frases geradoras e as traduções das três primeiras músicas cantadas
por Terêncio Luiz Silva. São parixaras. A primeira característica dos cantos registrados
que elenco é a brevidade da frase geradora e a forma condensada como essa frase gera
imagens poéticas. Como é possível recuperar na letra do canto completa desses três
primeiros parixaras, apesar de a frase geradora ser curta, dois versos nesses exemplos,
ela se desdobra em novas estrofes. Ainda, as gravações têm em média um minuto
40
cada canção mas, durante as danças na comunidade, esse tempo pode ser bem maior,
levando a novas repetições e mesmo improvisações da letra.
Algo que chama atenção é a forma como esses poemas captam a realidade
indígena: água no igarapé, instrumento kamaini, uma mãe na rede, passarinho sobre
a maloca são poetizados. Sucintamente, ela é capturada numa atmosfera densa e fe-
chada. O significado está ali, preso, sendo que há uma relação direta do homem com
a natureza, neles, sem separação. Os poemas, como veremos, não contam exatamente
aspectos históricos, mas estão inseridos nesses aspectos, muitas vezes significando e
mesmo resignificando uma longa narrativa, condensado-a numa frase. Principalmen-
te, por exemplo,

imantî pî pona’
maroko watarikuma [parixara 21]
[lá na subida da cachoeira
os peixes se enfeitam]

ou

kanaimî wai uwai tunpauya [tukui 13]


[o som do meu instrumento é igual ao do espírito dos animais]

Pensar essas dois poemas, um parixara e um tukui respectivamente, a partir


do ponto de vista ocidental, levaria a estabelecer de repente uma relação metafórica.
Mas não é bem isso. Essa relação cultura (homem) e natureza percebida nas histórias
indígenas coletadas no projeto Panton Pia’ diferencia-se muito da forma como hoje
nos relacionamos com a natureza, principalmente, a priori, porque não há uma
hierarquização do homem sobre ela, sobre os animais na realidade mítico-histórica
ancestral destes indígenas.
No tempo mítico-histórico das narrativas coletadas e dos cantos aqui apresen-
tados, animais falam, se casam, têm filhos com humanos. Vivem uns com os outros
num mesmo patamar de igualdade, como é possível ver na história do Timbó, contada
pelo Senhor Manoel Flores, taurepang da comunidade Sorocaima I (FIOROTTI, 2012),
e em muitos cantos daqui. História que já havia sido registrada por Koch-Grünberg
(MEDEIROS, 2002), na mesma região, mais ou menos 100 anos antes, com o nome de
“Como os venenos azá e inég, para matar peixe, vieram ao mundo.” Nessa história,
um menino é levado para ser criado por uma raposa, depois por uma anta com quem
se relaciona e tem um filho de nome Timbó.
Mayuluaípu, índio taurepang informante de Koch-Grünberg, comenta a fala
do também informante Akúli, índio arekuna, em que aparecem animais: “Todos estes
animais eram gente nos tempos antigos (MEDEIROS, 2002, p. 87).” Noventa e oito 41
anos após essa fala de Mayuluaípu, em 2009, a indígena macuxi, Dona Arlene Lima da
Silva, da comunidade Sabiá, na TI São Marcos dirá:

Que Macunaima era, antes do dilúvio, uma pessoa igual a nós mesmos
aqui. Era raça, era raça. Só que ele era muito corajoso. Ele era pajé. Ele, de
primeiro, ele não batia assim como nós batemos. Eles não matavam como nós
matamos. Os animais todos eram amigos com ele. Tudinho, eram amigos.
Eles cruzavam, como eu tava falando, depois que gerou ele, começou a gerar
homens e eles cruzavam com animais.

Descola também alerta a respeito dessa forma distinta em que muitos indígenas
organizam sua estrutura sócio-histórica. Forma que se distancia da tradicional
dicotomia cultura e natureza. Ele relacionou essa forma ao conceito de animismo,
além de ter apresentado ainda o conceito de totemismo (1996, p. 88-102). Viveiros de
Castro apresenta a proposta de Descola, descartando o totemismo para se pensar as
sociedades tradicionais ameríndias, pois ele estaria relacionado às diferenças entre as
espécies naturais, “utilizadas para organizar logicamente a ordem interna à sociedade,
isto é, onde a relação entre natureza e cultura é de tipo metafórico e marcada pela
descontinuidade (intra e interséries) (1996, p. 120).”
A relação anímica seria simétrica, diferenciando da totêmica, havendo uma
organização entre os humanos e as espécies naturais, estabelecendo um vínculo ori-
ginário entre eles. Viveiros de Castro dirá que “Em suma, os animais são gente, ou se
veem como pessoas”, e acrescenta que os mitos seriam “povoados de seres cuja forma,
nome e comportamento misturam inextricavelmente atributos humanos e animais, em
um contexto comum de intercomunicabilidade idêntico ao que define o mundo intra-
-humano atual” (1996, p. 117-8).
É nesse ambiente sócio-histórico que os cantos se inserem. Lévi-Strauss da dé-
cada de 80 também entende isso. Quando perguntado por Didier Eribon sobre o que é
um mito, ele responde:

Não é uma pergunta simples, é exatamente o contrário, porque se pode


respondê-la de vários modos. Se você interrogar um índio americano, seriam
muitas as chances de que a resposta fosse: uma história do tempo em que os
homens e os animais ainda não eram diferentes. (1990, p. 178)

Dentro dessa concepção em que homens e animais eram parecidos, se mis-


turavam, em que a história dos indígenas era assim constituída, também diz Senhor
Severino (em 2011 quando da entrevista com 85 anos, da comunidade São Jorge, na
TI Raposa Serra do Sol) após ser perguntado sobre as histórias do Macunaima: “Tudo
42 aquilo ali Panton. Isso que você tá querendo chama panton.” Depois ele insiste em es-
clarecer o que ele estava falando: “Aí lá vem o Jabuti, na Onça né? Hã, panton, história,
nós chamamos panton, panton.” Em outro momento: “Onça abriu a boca lá e o Jabuti:
Pouuuu, na boca dele, pegou na testa e a Onça morreu. Ele comeu a Onça, perdeu a
Onça, Onça perdeu pro Jabuti. É a história, panton.” Durante toda narrativa, ao se re-
ferir a mitos de origem ou mesmo fábulas, a palavra usada era sempre história, que
ele estava contando história. A esse respeito, há nove anos, fui alertado ainda quando
estava conseguindo autorização para iniciar minhas pesquisas por uma liderança indí-
gena. Ela me disse: “isso que você chama de mito, fábula, é a nossa história.”15
Joanna Overing apresenta e discute a dificuldade que, do ponto de vista da ci-
ência, há em entender a estrutura histórica dos indígenas, ela fala a partir dos piaroas.
Diz ela, por exemplo, “Na historicidade piaroa, o processo histórico sempre incorpora
eventos míticos. O tempo mítico da historicidade piaroa não é o tempo passado (mor-
to e enterrado).” Completa dizendo que o “tempo mítico tem eternamente o poder de
agir sobre o tempo presente, o efeito do tempo mítico sobre o atual é tão imprevisível
quanto as intenções específicas de agentes míticos individuais (1995, p. 134).” Pensar
a realidade indígena, respeitando sua organização histórica (indissociabilidade entre
os mitos, os animais e as próprias ações indígenas), exige essa torção na forma de con-
ceber as ações humanas. Por mais que tenha havido contato, ainda hoje boa parte dos
indígenas entrevistados não tem dúvida de que foi Macunaima quem transformou
animais, pessoas em pedras na região do circum-Roraima e isso faz parte da História
(em maiúsculo) desses povos.
Uma das coisas que mais marca o texto dos cantos é justamente a relação esta-
belecida com a natureza, com a história dos macuxis e taurepangues. Dentre os cantos,
por exemplo, quatro fazem referência ao Lago Piri-piri:

piri-piri ku’pîyaka
uwairi kamaini marirumîi’ warekeruwa
warekeru warekeru warekeruwa [parixara 7]
[no lago piri-piri
mergulhei meu instrumento kamaini16
ge gent gente minha gente]

toronope wawinipe uipîi


wayupatau wayupatau uipîi
piri-piri ku’pîri kuwaka [tukui 27]
[venho como passarinho, como marreca
de dentro do lago do piri-piri

15 Não direi o nome da liderança, pois não tenho autorização oficial para isso, de todas as outras
narrativas, cantos, referências aqui há autorização da comunidade envolvida.
16 Instrumento feito de embaúba, em geral longo. 43
venho pra casa
como passarinho e como marreca]

piri-piri ku’pîri kuwaka


maiwaka esapausapauma [tukui 9]
[no lago do piri-piri
o pato bate as asas n’água]

piri-piri ku’pî mamurakai17


wawini wawini wawini kuwa [tukui 10]
[no lago piri-piri
toma banho barrento a marreca]

Dentre os 39 entrevistados até o momento, somente dois fizeram referência


a esse lago.18 Um é Senhor Caetano Raposo, da comunidade da Raposa, na TI Rapo-
sa Serra do Sol, e outro é o Terêncio Luiz Silva em seus cantos. Almellada e Salazar
mencionam a existência de um “piri-piri-kupue” no tepui Kukenán (ARMELLADA;
SALAZAR, 2007, p. 157), um lago piri-piri que ficaria nos arredores do mítico Monte
Roraima, no parque Canaima, na Venezuela.
Nas narrativas coletadas por Koch-Grünberg, não encontrei referência ao
nome piri-piri, pelo menos nas histórias do volume II, “Mitos e lendas dos índios tau-
lipangue e arekuná”. Isso chama atenção, pois a história narrada por Mayuluaípu “A
visita ao céu” apresenta enredo similar à narrativa contada por Caetano Raposo, sendo
que o lago nessa história recebe o nome de Kapepiákupe: “onde se começou a fazer o
mundo”, esclarece Mayuluaípu (MEDEIROS, 2002, p. 110).
A história contada por Caetano Raposo apresenta diferenciações significativas
com a contada por Mayuluaípu, principalmente no final, em que o parente (indígena
com nome de Maitxaúle em ”A visita ao céu”) morre ao comer em demasia, já que
havia tempo que não comia, pois na terra do Urubu-rei só se comia coisas podres,
enquanto que na história coletada por Koch-Grünberg ele traz da terra do Urubu-rei
o milho para os indígenas no final, já que não o conheciam. Contudo, o que mais inte-
ressa é que os lagos terão de ser esgotados, principalmente com a ajuda das libélulas,
apesar dos nomes distintos. No final da narrativa do lago Piri-piri, com a morte do
parente, pergunto ao Senhor Caetano Raposo:

DF: E assim acaba a história?


CR: Eh.

17 Mamurakai diz que ele toma banho e por causa disso a água vai ficando barrenta.
18 Essa informação tem de ser moderada, pois como eu também não sabia da história do Piri-piri,
também não perguntei. Contudo, sempre fazia perguntas genéricas, como “o senhor (a) tem alguma
44
história ainda para contar dos antigos?”
DF: Onde fica o lago Piri-piri? Em que lugar?
CR: Ele fica pra cá do Céu.
DF: Pra cá do Céu.
CR: Pra cá do Céu aqui, aí em cima do Céu.

A localização também é a mesma da história “A visita no céu”. Esse lago mí-


tico, de onde se começou a fazer o mundo, como diz Mayuluaípu, é o lago cantado
por Terêncio em quatro músicas herdadas de seus ancestrais. Sendo um lago mítico,
chama atenção as letras: na primeira canção, o indígena mergulha seu instrumento no
lago; depois ele vem como marreca passando pelo lago; em seguida, a marreca bate
as asas n’água; e, por fim, a marreca de bico vermelho toma banho ali. O indígena do
texto está em contato com esse lago, assim como os animais. Ele historicamente, nesse
imbricado enredo em que é tecida a estrutura cosmogônica indígena do circum-Rorai-
ma, banha seu instrumento nas águas do lago no céu, como diz Caetano Raposo.

Uma mirada para o oriente

Além do conteúdo, destaca-se a brevidade da frase geradora dos cantos, conte-


údo e brevidade que lembram muito um estilo de composição oriental: o haicai (além
de poesias contemporâneas curtas, poemas pílulas, aspecto que não será o foco aqui).
O haiku ou haicai como é conhecido em português é uma forma breve, 17 sílabas em
três versos no geral: 5, 7, 5, que expressa um instante, um insight (GIROUX, 1974).
Convém ressaltar que nas traduções muitas vezes essa organização não é rígida. O
haicai mantém relação estreita com o Zen Budismo e com a natureza, principalmente
Matsuo Bashô (1644-1694). Ele estabeleceu o chamado shofu haikai, o estilo Bashô de
fazer haicai, marcado por uma forte relação com a natureza, sendo ela parceira por
excelência do poeta.19
Interessa aqui o que Giroux irá enfatizar no capítulo III: The haiku moment do
referido livro: as coisas ordinárias, do dia a dia fazem parte das possibilidades do hai-
cai, justamente porque ele busca captar instantes, instantes esses que buscariam unir
o poeta ao objeto de expressão (GIROUX, 1974). São sintomáticos do que estou desta-
cando aqui, por exemplo, o famoso poema de Bashô:

19 Para um maior aprofundamento sobre haicai, ver a própria obra de GIROUX; principalmente
YASUDA, Kenneth. Japanese Haiku: Its Essential Nature and History. Boston; Tokyo: Periplus Editions,
2011.
45
Olha o velho lago –
Após o salto da rã
O barulho da água.20

Nesse haicai, o instante é captado e a temática é ordinária, a princípio: o salto


de uma rã no lago e o barulho produzido. Um poema indígena cantado por Seu Terên-
cio do circum-Roraima diz:

no lago do piri-piri
o pato bate as asas n’água

Ocorre nesse poema algo muito parecido com os haicais tradicionais japone-
ses, apesar da forma entre eles não ser a mesma: o instante, a temática de coisas da
natureza, hodiernas, sem arroubos: um pato que bate asas n’água. Não sabemos se ao
levantar voo ou se numa espécie de brincadeira, mas é possível ouvir o barulho, os
sons desse bater n’água. Principalmente, nos dois poemas, o haicai e o indígena, algo
se sobressai: a construção de uma imagem poética. Nitidamente captamos o instante,
por meio da construção textual, a imagem se realiza em nossas mentes.
Yasuda, em Japanese haiku: its esential nature and history, dedica uma parte da
obra para mostrar a relação do haicai com as pinturas tradicionais japonesas, ao mes-
mo tempo diz de certa dificuldade que os ocidentais teríamos de perceber a dimensão
dessas imagens poéticas, principalmente as monocromáticas da Dinastia T’ang. A ima-
gem no haicai falaria por si, ele não nos daria o significado, mas os objetos concretos
possuiriam significado. A imagem surgiria desse condensamento e da capacidade do
poeta em captar esse instante, por isso Yasuda (2011) investe um capítulo comparan-
do-o à pintura. Pintura é construção de imagem.
Num texto clássico da Teoria Literária, a “Arte Como Procedimento”, Chklo-
vski o inicia assim:

“A arte é pensar por imagens”. Esta frase pode ser tanto de um bacharel,
como de um sábio filólogo que a propõe como ponto inicial de uma teoria
literária qualquer. Esta idéia está enraizada na consciência de muita gente;
entre o número de seus criadores, é preciso necessariamente apontar Potebnia:
“Não existe arte e particularmente poesia sem imagem”, diz ele (Notas sobre
a Teoria da Literatura, p. 83). “A poesia assim como a prosa é antes de tudo,
e sobretudo, uma certa maneira de pensar e conhecer”, diz ele adiante (ibid.,
p. 97). A poesia é uma maneira particular de pensar, a saber um pensamento
por imagens. (1973, 39)

20 As informações sobre autores e textos poéticos japoneses pertencem ao site http://www.nippobrasil.

com.br/ Ele apresenta uma cronologia dos principais escritores de haicai japoneses bem como os
46
autores e seus principais poemas.
O foco central do texto de Chklovski é a linguagem desautomatizada que a
literatura proporia, na criação de uma imagética particular. Não ignoro as críticas a
essa tentativa de conceituação, Terry Eagleton (1997), por exemplo, é bastante duro em
relação a ela, mostrando como no discurso cotidiano também estamos rodeados por
metáforas, por imagens distintas, e nem assim estaríamos diante de literatura. Mas, ao
mesmo tempo, há uma construção sintética da imagem nos haicais e nos cantos indí-
genas, que parece propiciar uma fruição rápida e forte da imagem. E a palavra fruição
está aqui propositadamente: nos cantos indígenas e nos haicais, apesar da forma, há
objetivos distintos quanto ao uso da palavra e a construção imagética parece ser o pon-
to central desses poemas.
Octavio Paz, em El arco y la lira (1990), dedica um capítulo à parte sobre a ima-
gem. Coincidentemente, ele parte da realidade oriental para chegar a afirmações do
tipo: a imagem do poeta tem sentido em diversos níveis. O primeiro seria a expressão
de uma visão ou experiência de mundo por parte do poeta; a segunda, as imagens se-
riam objetivas, pois seriam obras, criações por parte do poeta, valendo somente dentro
de seu universo; depois, as imagens diriam algo sobre o mundo e sobre nós mesmos,
revelando o que seríamos. Para ele, a imagem se explica a si mesma, sendo sentido e
imagem a mesma coisa: o sentido último da imagem poética seria ela mesma. Ao final,
destaca que a experiência poética se expressa e se comunica na imagem. A poesia seria
entrar no ser, e a imagem um dos meios para isso.
Mesmo depois de conhecer as críticas de Eagleton às tentativas de definição
de literatura, posições como de Octavio Paz me parecem plausíveis ou pelo menos
iluminadores do efeito surgido a partir dos poemas presentes nos cantos e dos haicais:
a base do que vivenciamos neles enquanto efeito sustenta-se na elaboração imagética
condensada. É por meio dessa elaboração que vivenciamos a experiência poética.
N’outro haicai, Bashô dirá:

Sobre o galho seco


Um corvo pousado –
Entardecer de outono.

Ou num canto indígena:

em cima da casa
canta o passarinho
passarinho meu passarinho
passarinho corrupião

47
Nesses dois casos, o que efetivamente se destaca: uma construção imagética
que nos faz vivenciar essa construção, enquanto efeito poético. A aproximação que
faço aqui entre os poemas vindos dos cantos com o haicai possui ainda outro ponto
a ser destacado. Lévi-Strauss dirá ao tratar da relação entre o Japão e outras culturas:

O problema não se limita ao Velho Mundo: encontramos nesses antigos textos


muitos temas ou motivos mitológicos presentes também na América. Mas,
neste ponto, impõe-se a prudência: todos esses temas comuns à América
indígena e ao antigo Japão se encontram na Indonésia, e vários só são bem
comprovados nessas três regiões. Pode-se excluir de saída a hipótese de uma
invenção independente, de tal forma os mitos das três regiões se correspondem
até nos detalhes. Portanto, devemos nos empenhar, como se fez no passado,
em descobrir neles uma só origem, seja porque os mitos indonésios, ou
japoneses, tenham viajado independentemente em duas direções, seja porque,
partindo da Indonésia, tenham primeiro alcançado o Japão e depois passado
para a América? Descobertas pré-históricas recentes na prefeitura de Miyagi
trouxeram à luz um conjunto de ferramentas líticas de 40 mil ou 50 mil anos
de idade, vestígios de um estabelecimento humano que foi talvez, em razão
de sua posição setentrional, um lugar de passagem entre o Velho e o Novo
Mundo. (2012, p. 18-19)

Os textos indígenas elencados e analisados aqui podem ter relações mais pro-
fundas com o Japão do que consigo comprovar em minha análise.

A relação dos cantos com a história

Koch-Grünberg diz “Todos os cantos para dança são mitos em forma poética,
transmitidos de pai para filho” (1996, 104). Na fala do etnógrafo alemão se destacam
três coisas: a primeira diz da origem dos cantos, sua relação com os mitos; a segunda,
que a construção desses mitos, por estarem em cantos, suas letras, estaria sendo orga-
nizada de forma poética; e a terceira da forma como esses cantos se perpetuam. Quan-
to ao segundo, todo esse texto é uma defesa da poeticidade dos cantos e, ao terceiro, já
foi desenvolvido quando falado sobre a origem dessas músicas, cantadas por Terêncio
Luiz Silva.
Confesso que o pronome “todos” me causa suspeitas. Efetivamente acho pra-
ticamente impossível provar isso. Há cantos que parecem não estar ligados a um mito
propriamente dito, como

epakakîkin wîrisi
uwai itun etaapa [parixara 15]
[acorda cunhatã
para ouvir o som do meu instrumento]
48
Parece-me, salvo melhor juízo, que esse canto pode estar relacionado a uma
convocação para o canto, para a dança, para que a irmã venha dançar também, sem
necessariamente se relacionar a um mito (ou a uma história como vem sendo desig-
nado aqui). Todavia, em muitos cantos, a relação com as histórias é evidente, como já
foi mostrada com o lago Piri-piri. O próprio Koch-Grünberg ajuda a estabelecer essa
evidência pelo menos em dois momentos. Como já mostrado,

lá na subida da cachoeira
os peixes se enfeitam

Essa imagem é muito bonita, dos peixes se enfeitando na subida da cachoei-


ra. Terêncio Luiz Silva, quando me auxiliava a entender o texto, chegou a dizer que
os peixes se enfeitavam com flores. Surpresa foi ter encontrado uma referência a ela,
quando da ida de Koch-Grünberg ao monte Roraima em 1911, antes de chegar lá. Diz
ele diante de uma cachoeira: “Os índios chamam essa catarata de Moró-melú, ‘catarata
do peixe’, pois segundo sua lenda, durante a cheia os peixes se reúnem aqui para rea-
lizar seus bailes (1996, p. 105).” O canto diz que os peixes se enfeitam; Koch-Grünberg
diz que naquela catarata os peixes se reúnem para fazer sua festa. A relação entre essas
imagens pode ser uma coincidência, mas seria uma bela coincidência: os cantos reuni-
dos aqui pertencem a essa região; além disso, pertencem a um período histórico dos in-
dígenas antigos, como enfatizou o próprio cantor Terêncio e mesmo Koch-Grünberg,
ao dizer que os cantos são passados de pai para filho.
Ainda para

rato’ rato’ wayupa kenî seporîi


yamî yaka senta’ka seporîi [tukui 20]
[encontrei a casa do Rató
Rató Rató
sim, eu encontrei a nova casa]

Rato’ Rato’ wayupa yamerukayaitî


Waita waita Rato’ Rato’ wayupa yamerukayaitî [tukui 22]
[eu acabei com a casa do Rató
eu acabei com a casa do Pacu e do Rató Rató]

Esses dois cantos têm como personagens centrais o indígena do circum-Ro-


raima, aquele que age na estrutura verbal, e o Rato’. Tiago Simplício, conferidor de
transcrição, diz que ele seria o nome dado ao dono dos peixes, um ser invisível. Bicho
d’água místico que pegava e comia pessoas. Terêncio Luiz Silva completa dizendo
que o Rato’ pega o espírito das pessoas dentro do rio, come só as unhas, sendo um
ser oculto e misterioso. Parecido com isso, Koch-Grünberg, a partir de Akúli, diz que 49
Rato’ seria um espírito das profundezas das águas, a temida mãe-d’água, uma gigan-
tesca cobra d’água (1996, p. 154). Nesses casos e em muitos outros, é nítida a relação
do conteúdo dos cantos com aspectos das histórias, como aqui definida, dos indígenas
em questão.

As partituras

Os 79 cantos também foram transcritos e editados em partitura musical e en-


contram-se na parte final do livro, foram realizados dentro das atividades do projeto
Panton Pia’. 58 cantos foram transcritos e editorados em partitura por Emílio Gomes
Martins e 21 por Jucicleide Pereira Mendonça dos Santos e Mozart Mendsan. Emílio
Gomes Martins, músico profissional e transcritor há 23 anos de músicas para partitu-
ras relatou os desafios enfrentados e os padrões usados na transcrição.
Ele destacou a complexidade presente nos cantos, principalmente “nas inter-
pretações melódicas (identificação das notas musicais na melodia) e métrica musical.”21
Como pode ser visto nas partituras, “as melodias e ritmos sofrem variações constantes
devido à característica musical dos cantos. As melodias e ritmos têm suas transfor-
mações em cada canto executado, sejam eles parixara, tukui, marapá e areruia.” Diz
ele ainda que por causa dessa complexidade, nem todas as partituras editadas repre-
sentam na integra as melodias e ritmos dos respectivos cantos, mas a base melódica
estrutural dos cantos, que em geral se repete. Essa base, como a frase geradora, foi o
foco a ser estabelecido na partitura. Essas partituras representam somente uma tenta-
tiva de representação gráfica dos cantos e nada mais que isso, objetivando auxiliar em
pesquisas sobre a estrutura musical dos eremukon.
Outro aspecto importante destacado por Emílio Gomes Martins é que os can-
tos foram cantados por idosos, de forma continua e eram muitos cantos a serem exe-
cutados. Isso ocasionou cansaço dos cantores. Com isso, percebe-se certo cansaço na
voz, algumas vezes semitonando e oscilando o ritmo. No entanto, ao transcrever para
a partitura, foram realizadas as correções melódicas e rítmicas ocasionadas principal-
mente pelo cansaço. Isso foi feito, pois há acesso ao canto, na íntegra e idêntico ao que
foi cantado, nos áudios.
Descritivamente, os cantos estão editados em uma partitura de característica

21 Solicitei ao músico que relatasse o processo de trabalho. Essa parte de meu texto é feito a partir
do texto produzido por Emílio Gomes Martins. As citações entre aspas pertencem a esse relatório.
50
Dados do projeto Panton Pia’.
vocal a duas vozes, com o acréscimo de uma pauta musical para os instrumentos per-
cussivos como o chocalho e o tambor. Sendo que, na primeira pauta, na clave de sol,
está representada a voz feminina “Voz F”, na segunda pauta, porém na clave de fá, está
representada a voz masculina “Voz M”. Já na terceira pauta, estão os instrumentos
percussivos mencionados. As vozes formam um dueto em uníssono, sendo que a voz
feminina, em grande parte dos cantos, inicia-se após a voz masculina. Destacam-se
também os instrumentos percussivos que, em suas finalizações, permanecem tocando
após o termino da melodia devido às comemorações que os cantores fazem ao final de
cada canto. Isso acontece em quase todos os cantos.
Quanto a esses sons feitos pelos cantores, certos gritos masculinos e um som
bem específico feito por Zenita Lima, movimentando a língua na boca, eles não apare-
cem na partitura nem no poema estabelecido pelos cantos. Eles indicam fim da música
bem como um clima festivo alegre e se repetem em vários cantos.
Diz o músico Martins que as tonalidades e andamentos variam muito de canto
para canto, sejam parixaras, tukuis, marapás ou areruias. Os parixaras e marapás são
mais acelerados, em seus múltiplos compassos, variando em 2/4 “binário simples”,
3/4 “ternário simples” e em alguns casos 6/8 “binário composto” e 12/8 “quaterná-
rio composto”. Já os tukuis e areruias são preponderantemente mais lentos nos com-
passos 2/4 “binário simples” 3/4 “ternário simples”, 4/4 “quaternário simples”, 6/8
“binário composto” e 5/4 “quinário”, que chamamos de compasso alternado, sendo
gerado pela fusão dos compassos 2/4 e 3/4 ou o contrário: 3/4 e 2/4. Com destaque
aos cantos tukuis 12 e 16, e areruia 7 que têm seus compassos modificados de 2/4 para
3/4, para melhor ajuste da linha melódica e rítmica dos cantos.

*
Esse trabalho apresenta caráter bem provisório: primeiro por causa do pro-
cesso de tradução, segundo porque lidar com aspectos culturais como dos indígenas
do circum-Roraima traz insegurança por si só. Não estamos falando de uma etnia, ou
de cantos oriundos de uma etnia. Há na região uma confluência de línguas e tradições
cujos cantos são originários, no caso aqui em questão, principalmente taurepang e
macuxi.
Terêncio Luiz Silva, enquanto interprete de sua complexa tradição, é uma pes-
soa rara, pelo conhecimento que adquiriu naturalmente ou buscou adquirir, mas prin-
cipalmente pela sabedoria que surgiu dessa relação. Nas gravações estamos diante de
instrumentistas e cantores que trazem, a meu ver, forte musicalidade, seja por repre-
sentar a tradição ou mesmo pela qualidade individual desses indígenas, como será 51
possível comprovar ouvindo as músicas.
Principalmente esses 79 cantos, a priori anônimos, pertencentes à memória
dos povos indígenas do circum-Roraima, têm muito a nos ensinar sobre a relação des-
ses indígenas com a composição de seus cantos: imagens fortes e sucintas, relaciona-
das a uma intricada forma animista de se relacionar com a natureza. Destacadamente,
esses poemas oriundos das músicas pertencem a uma tradição literária distinta da
que costumamos conhecer, tradição que se funda na oralidade e na memória coletiva
de um povo, bem como no processo criativo do interprete. Ignorar tal tradição é um
empobrecimento dos estudos literários e musicais seja regional, nacional ou mesmo
universal, como pode ser comprovado com a comparação com o haicai.
Não busco aqui algo que seja intocável, “puro”, bucólico, de um bom selva-
gem, isolado. Esse índio, pelo menos nas comunidades em que trabalhei, não existe.
De forma complexa, esses índios são nossos contemporâneos. Esses cantos são também
fruto do contato existente desde a chegada europeia na América, principalmente pela
forma como os cantos chegaram até mim. A forma como Terêncio Luiz Silva gravou
parte deles em K7, é também fruto desse contato. A presença da letra dos cantos no
papel, a possibilidade de uma tradução livre como fiz, esse artefato cultural ocidental:
livro, gravação em áudio, é fruto desse contato. Busco, sim, apresentar e, em estudos
futuros mais específicos, buscar realocar artefatos culturais, como estas letras dos can-
tos, como literatura contemporânea ameríndia, brasileira.

Pacaraima, fim das chuvas de 2018.

52
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Site

http://www.nippobrasil.com.br/

56
Filhos de
Makunaima
Fotos: Devair Antônio Fiorotti
Em sequência
Eunison,
Sofia,
Bruno,
Andrio,
Gilciany,
Itelvis,
Andria,
Gilciany.

Crianças da comunidade Nova


Morada, Roraima. Todos
macuxis, parentes de Terêncio
Luis Silva.
Eremukon
Manaaka e Yauyo
Serenka sîrîrî etanen wanîya makusi wanîya, taurepan wanîya etaiya. Ekare-
mekîuya sîrîrî etakonpa anumîkonpa eserenkompa. Pata’ wei remmapîkaisîrî Mîrîye-
nen eesepiatî sîrîrî parisarape
[Eu vou cantar agora em macuxi, depois em taurepang. Vou contar agora e cantar
pra vocês aprenderem durante todo dia. Por isso, vou começar agora com parixara.]

Manaaka.
Parixara
em geral acompanhados por
chocalhos e flautas

73
aparuya uyeori’na
uyepori’na
aparuya uyeori’na
uyepori’na
iwîîtî ramonoripo
uyepori’na
aparuya uyeori’na
uyepori’na
aparuya uyeori’na
uyepori’na
iwîîtî ramonoripo
uyepori’na
aparuya uyeori’na
uyepori’na

aparuya uyeori’na
uyepori’na
aparuya uyeori’na
uyepori’na
iwîîtî ramonoripo
uyepori’na
aparuya uyeori’na
uyepori’na

74 parixara 1
a água me encontra
na beira do igarapé

parixara 1 75
awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako
awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako

mamai warekeruwa
mamai warekeruwa
mamai warekeruwa

awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako


awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako

mamai warekeruwa
mamai warekeruwa
mamai warekeruwa

awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako


awairi kamaini itun etaato’pe makatairîmîko mamako

mamai warekeruwa
mamai warekeruwa
mamai warekeruwa

76 parixara 2
ao ouvir o som do meu instrumento kamaini
mamãe dorme mamãe dorme mamãe dorme

parixara 2
* Kamaini: instrumento feito de embaúba (Cecropia pachystachya), em geral longo. 77
wai patau
wai pataurî eserrunkî
wai patau
wai pataurî eserrunkî

uikînî
uikînîrî
uikînî
uikînî wayaurariwa

wai patau
wai pataurî eserrunkî
wai patau
wai pataurî eserrunkî

uikînî
uikînîrî
uikînî
uikînî wayaurariwa

wai patau
wai pataurî eserrunkî
wai patau
wai pataurî eserrunkî

uikînî
uikînîrî
uikînî
uikînî wayaurariwa

78 parixara 3
em cima da casa
canta o passarinho
passarinho
meu passarinho
passarinho corrupião

parixara 3 79
parakamu keweyu xiri-xirimauya
parakamu keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya

parakamu keweyu xiri-xirimauya


parakamu keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya

waikinmî keweyu xiri-xirimauya


waikinmî keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya
pinkîimi keweyu xiri-xirimauya

80 parixara 4
toco
toco chocalho do catitu
toco chocalho da queixada
toco chocalho da anta
toco

parixara 4 81
maripaya yarenpukape uipîi uipîi
kuwai yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi

maripaya yarenpukape uipîi uipîi


kuwai yarenpukape uipîi uipîi
maripaya yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi

maripaya yarenpukape uipîi uipîi


kuwai yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi
kunwaya yarenpukape uipîi uipîi

82 parixara 5
venho tirando olho de inajá de buriti de bacaba
olho de inajá de buriti
de inajá de bacaba

venho eu venho tirando olho o olho


de inajá
de buriti
de bacaba
olho de bacaba

parixara 5 83
mîirirî mîirirî nekokomamîi
mîirirî mîirirî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi

mîirirî mîirirî nekokomamîi


mîirirî mîirirî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi
mariipa pîrenmapî’pî nekokomamîi

mîirirî mîirirî nekokomamîi


mîirirî mîirirî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi
upono pîrenmapî’pî nekokomamîi

84 parixara 6
assim estou vivendo
estou vivendo
com minha roupa estou vivendo

amanhecido com minha roupa


vestido de inajá
estou vivendo

parixara 6 85
piri-piri ku’pîyaka
piri-piri ku’pîyaka
uwairi kamaini marirumîi’ warekeruwa
warekeru warekeru warekeruwa

piri-piri ku’pîyaka
piri-piri ku’pîyaka
uwairi kamaini marirumîi’ warekeruwa
warekeru warekeru warekeruwa

piri-piri ku’pîyaka
piri-piri ku’pîyaka
uwairi kamaini marirumîi’ warekeruwa
warekeru warekeru warekeruwa

piri-piri ku’pîyaka
piri-piri ku’pîyaka
uwairi kamaini marirumîi’ warekeruwa
warekeru warekeru warekeruwa

86 parixara 7
no lago piri-piri
mergulhei meu instrumento kamaini
ge gent gente minha gente

parixara 7 87
karutuke ranakake patai ramenukase
karutuke ranakake patai ramenukase
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî
karutuke ranakake patai ramenukase
karutuke ranakake patai ramenukase
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî
karutuke ranakake patai ramenukase
karutuke ranakake patai ramenukase
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî
karutuke ranakake patai ramenukase
karutuke ranakake patai ramenukase
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî
kupi kupiwa paxirî

88 parixara 8
com jenipapo brabo pinto meu corpo
kupi
como kupiwa
moça

parixara 8

* Kupi refere-se a uma espécie de pássaro, de cujo o interlocutor não se lembra o nome em português.
Kupiwa é esse mesmo pássaro, só que fêmea. Provavelmente, segundo Terêncio Luiz Silva, o
89
indígena poderia estar pintando com tinta de jenipapo o pássaro no corpo.
warekepea uyekama wareke paxi
warekepea uyekama wareke paxi
warekepe paxi onoiwa paxi
onoiwa paxi onoiwa paxi

warekepea uyekama wareke paxi


warekepea uyekama wareke paxi
onoiwa paxi onoiwa paxi
onoiwa paxi onoiwa paxi

warekepea uyekama wareke paxi


warekepea uyekama onoiwa paxi
onoiwa paxi onoiwa paxi
onoiwa paxi onoiwa paxi

90 parixara 9
como sapinho wareke
me chama a sapinha wareke

a sapinha onoiwa
a sapinha wareke
a sapinha onoiwa

parixara 9
* Wareke: Tipo de sapo colorido, optou-se em manter a referência na língua originária.
** Onoiwa: Referência a outro tipo de sapinho, optou-se em manter a referência na língua originária. 91
aparurî meurumai kunawa kunawaruwa
aparurî meurumai kunawa kunawaruwa
kunawa kunawaruwa kunawa kunawaruwa
aparurî meurumai

yei yei pereexi yaino kunawa kunawaruwa


yei yei pereexi yaino kunawa kunawarwa
aparurî meurumai kunawa kunawaruwa
aparurî meurumai kunawa kunawaruwa

aparurî meurumai kunawa kunawaruwa


aparurî meurumai kunawa kunawaruwa
wereke’pe meurumai
kunawaruwa kunawa kunawaruwa
aparurî meurumai kunawa kunawaruwa

92 parixara 10
fala de dentro de sua água
kunawa kunawaruwa
kunawa kunawaruwa

no oco do pau ele mora


kunawa kunawaruwa
kunawa kunawaruwa

com os peixes n’água


kunawa kunawaruwa
kunawa kunawaruwa

fala de dentro de sua água


kunawa kunawaruwa
kunawa kunawaruwa

parixara 10

* Kunawa: tipo de sapo. Indagado sobre a terminação “kunawaruwa”, Terêncio Luis Silva disse de
aspectos sonoros no processo de composição da música. É acrescentado por ele por isso. 93
wakî pena’ apororo nai wana wanari
wakî pena’ apororo nai wana wanari
apaatamî’ nekokomamîi nekokomamîi
ta koo
apaa mî’ ne koo ma mîi

wakî pena’ apororo nai wana wanari


wakî pena’ apororo nai wana wanari
apaatamî’ nekokomamîi nekokomamîi
ta koo
apaa mî’ ne koo ma mîi

wakî pena’ apororo nai wana wanari


wakî pena’ apororo nai wana wanari
apaatamî’ nekokomamîi nekokomamîi
ta koo
apaa mî’ ne koo ma mîi

wakî pena’ apororo nai wana wanari


wakî pena’ apororo nai wana wanari
apaatamî’ nekokomamîi nekokomamîi
ta koo
apaa mî’ ne koo ma mîi

94 parixara 11
dono
dono da casa
o seu terreiro tá pronto pra festa?
você vive no seu lugar prevenido pra festa?
vive no seu lugar prevenido?

parixara 11 95
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uipi sîrîrî paapa
uipi sîrîrî paapa
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uipi sîrîrî paapa
uipi sîrîrî paapa
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uipi sîrîrî paapa
uipi sîrîrî paapa
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uipi sîrîrî paapa
uipi sîrîrî paapa
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uipi sîrîrî paapa
uipi sîrîrî paapa
tiwiyupe wei tapi’se
tiwiyupe wei tapi’se
tiwiyupe wei tapi’se
kesera’ uyepî paapa
kesera’ uyepî paapa
tiwiyupe wei tapi’se
tiwiyupe wei tapi’se
tiwiyupe wei tapi’se
kesera’ uyepî paapa
kesera’ uyepî paapa
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uweyupe wei tapi’se
uipi sîrîrî paapa
uipi sîrîrî paapa
uweyupe wei tapi’se

96 parixara 12
estou vindo agarrado na luz do sol
venho agora meu deus

ela vem agarrada na luz do sol


a maniva está vindo meu deus

venho agarrado na luz do sol


a maniva está vindo

parixara 12 97
kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi

kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi


kewei yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi
ukeweyu yari’ku atariku’ka yanunmîkî wîrisi

98 parixara 13
recolhe a flor
recolhe a flor do kewei que caiu cunhatã
recolhe a flor do meu chocalho que caiu cunhatã
recolhe cunhatã

parixara 13 99
xiriripan tuna yenatau tuna yenatau
xiriripan tuna yenatau tuna yenatau
xiriripan tuna yenatau tuna yenatau
xiriripan tuna yenatau tuna yenatau

xiriripan tuna yenatau tuna yenatau


xiriripan tuna yenatau tuna yenatau
xiriripan tuna yenatau tuna yenatau
xiriripan tuna yenatau tuna yenatau

morokope tuna yenatau tuna yenatau


morokope tuna yenatau tuna yenatau
morokope tuna yenatau tuna yenatau
morokope tuna yenatau tuna yenatau

tu ye
xiriripan na natau uyepîi uipîi

tu ye
xiriripan na natau uyepîi uipîi

parixara 12
* Quando da gravação, Terêncio Luiz Silva acabou esquecendo parte da música. Posteriormente
100 estabeleceu a letra do canto.
pela água do igarapé
como um peixe
pela água do igarapé
estou vindo

pela água do igarapé estou vindo

parixara 12 101
epakakîkin wîrisi
epakakîkin wîrisi
uwai itun etaapa
uwai itun etaapa
epakakîkin wîrisi

epakakîkin wîrisi
epakakîkin wîrisi
uwai itun etaapa
uwai itun etaapa
epakakîkin wîrisi

epakakîkin wîrisi
epakakîkin wîrisi
uwai itun etaapa
uwai itun etaapa
epakakîkin wîrisi

uwai itun etaapa


epakakîkin wîrisi
epakakîkin wîrisi
uwai itun etaapa
uwai itun etaapa
epakakîkin wîrisi

102 parixara 15
acorda cunhatã
para ouvir o som do meu instrumento
acorda

acorda
para ouvir o som
o som do meu instrumento
acorda cunhatã

parixara 15 103
kîrî-kîrî worantî uutî na’mî
kîrî-kîrî worantî uutî na’mî
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’
kîrî-kîrî worantî uutî na’mî
kîrî-kîrî worantî uutî na’mî
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’

kîrî-kîrî worantî uutî na’mî


kîrî-kîrî worantî uutî na’mî
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’

kîrî-kîrî worantî uutî na’mî


kîrî-kîrî worantî uutî na’mî
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’
ri
uya sa nmî uye’nyaripe
pî’

104 parixara 16
estou indo
como periquito
meus braços são minhas asas

parixara 16 105
yei parantarîpo parantara
yei eserumkî
yei parantarîpo parantarai
yei eserumkî

yei parantarîpo parantara


yei eserumkî
yei parantarîpo parantarai
yei eserumkî

yei parantarîpo parantara


yei eserumkî
yei parantarîpo parantarai
yei eserumkî

106 parixara 17
canta o ferreiro
no galho da árvore

parixara 17 107
waitiripe waitiripe uyepîtanne uyepîtanne
manata ikonekakî manata ikonekakî manata ikonekakî
ikonekakî ikonekakî manata ikonekakî

waitiripe waitiripe uyepîtanne uyepîtanne


manata ikonekakî manata ikonekakî manata ikonekakî
ikonekakî ikonekakî manata ikonekakî

waitiripe waitiripe uyepîtanne uyepîtanne


manata ikonekakî manata ikonekakî manata ikonekakî
ikonekakî ikonekakî manata ikonekakî

waitiripe waitiripe uyepîtanne uyepîtanne


manata ikonekakî manata ikonekakî manata ikonekakî
ikonekakî ikonekakî manata ikonekakî

108 parixara 18
venho como quatá quatÁA
arruma a porta

parixara 18 109
iparawa nonori nonoripo
iparawa nonori nonoripo

ui nî ka seru
yaka ne tai

ya
iparawa nonori nonoripo
iparawa nonori nonoripo
iparawa nonori nonoripo

ui nî ka seru
yaka ne tai

ya
iparawa nonori nonoripo

iparawa nonori nonoripo


iparawa nonori nonoripo

ui nî ka seru
yaka ne tai

ya
iparawa nonori nonoripo

iparawa nonori nonoripo


iparawa nonori nonoripo

ui nî ka seru
yaka ne tai

ya
iparawa nonori nonoripo

110 parixara 19
na terra da ilha do mar
meu gavião ouviu outros cantos

parixara 19 111
ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne
ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne
wainai ko’ko’ wainai ko’ko’
atari’kuma tanne
atari’kuma tanne

ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne


ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne
wainai ko’ko’ wainai ko’ko’
atari’kuma tanne
atari’kuma tanne

ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne


ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne
wainai ko’ko’ wainai ko’ko’
atari’kuma tanne
atari’kuma tanne

ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne


ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne
wainai ko’ko’ wainai ko’ko’
atari’kuma tanne
atari’kuma tanne

ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne


ramonporo uipî tanne atari’kuma tanne
wainai ko’ko’ wainai ko’ko’
atari’kuma tanne
atari’kuma tanne

112 parixara 20
ko’ko’
ko’ko’ ko’ko’
ko’ko’ ko’ko’ ko’ko’

quando estava vindo


pelo campo
me pintando
escutei ko’ko’

ko’ko’ ko’ko’ ko’ko’


ko’ko’ ko’ko’
ko’ko’

parixara 20
* Ko’ko’: tipo de gavião, cujo nome em macuxi seria onomatopaico do som emitido por ele. Fonte
Terêncio Luis Silva. 113

i tî pona
man a
imantî pî pona’
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma

i tî pona
man a
imantî pî pona’
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma

i tî pona
man a
imantî pî pona’
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma

i tî pona
man a
imantî pî pona’
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma
maroko watarikuma

114 parixara 21
lá na subida da cachoeira
os peixes se enfeitam

parixara 21 115
wakîpena’ apaata nai wayurari wayurari
wakîpena’ apaata nai wayurari

wakîpena’ apaata nai


wakîpena’ apaata nai wayurari wayurari
waklipena’ apaata nai wayurari

wakîpena’ apaata nai


wakîpena’ apaata nai wayurari wayurari
waklipena’ apaata nai wayurari

wakîpena’ apaata nai


wakîpena’ apaata nai wayurari wayurari
waklipena’ apaata nai wayurari

wakîpena’ apaata nai


wakîpena’ apaata nai wayurari wayurari
waklipena’ apaata nai wayurari

116 parixara 22
teu lugar tá bom
anta?
teu lugar tá bom?

parixara 22 117
weyo-weyo motariyai uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
iwootope piinipe uipîi
iwootope piinipe uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
iwootope piinipe uipîi
iwootope piinipe uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
iwootope piinipe uipîi
iwootope piinipe uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
iwootope piinipe uipîi
iwootope piinipe uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
iwootope piinipe uipîi
iwootope piinipe uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
weyo-weyo motariyai uipîi
iwootope piinipe uipîi
iwootope piinipe uipîi

118 parixara 23
pelo boqueirão da serra weyo-weyo estou vindo
como caça como queixada
pelo boqueirão estou vindo

parixara 23 119
Tarîpai yanunmî konpa tukui kupîuya sîrîrî umaimuta makusita yanunmî konpa
ikupîkonpa ayenîkonta’sima.
[Agora vou cantar em minha língua macuxi o tukui pra vocês aprenderem quando
estiverem em suas casas.]

Manaaka.
Tukui
em geral acompanhado por
tambor, flautas feitas de
taquara.

121
maxi maxi ayapîninmo wiriyamo
maxi maxi ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo

maxi maxi ayapîninmo wiriyamo


maxi maxi ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo

maxi maxi ayapîninmo wiriyamo


maxi maxi ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo

maxi maxi ayapîninmo wiriyamo


maxi maxi ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo
ikîrîru ayapîninmo wiriyamo

122 tukui 1
cuidado pro maxi maxi não te pegar
minha gente
cuidado pro ikîrîru não te pegar
minha gente

tukui 1
* Maxi é o espírito do campo, e Ikîrîru é o espírito da serra, segundo Tiago Simplício Napoleão. Já
Terêncio Luis Silva disse de tipos de bebida fortes, até mesmo venenosas. Inclusive maxi pode ser
visto como um adjetivo para amargo e venenoso. 123
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
morokokope werawîmai
purumaite werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
morokokope werawîmai
purumaite werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
morokokope werawîmai
purumaite werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
morokokope werawîmai
purumaite werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai
wayu paatau werawîmai

124 tukui 2
estamos chegando
estamos vindo
estamos chegando na casa
como peixe
como matrixã

tukui 2 125
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more
kaikuxi more maraxi
kusariwa more more

126 tukui 3
também
filho de onça é pintada
filho de veado mateiro
também

tukui 3 127
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

wa ke ta
ke wa ee rau
ta reee
tawaake tawaake taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

wa ke ta
ke wa ee rau
ta reee
tawaake tawaake taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

wa ke ta
ke wa ee rau
ta reee
tawaake tawaake taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
wawini nekutumarî reponi nekutumarî taraure
taaa

wa ke ta
ke wa ee rau
ta reee
tawaake tawaake taraure

128 tukui 4
tawaake tawaake
estou dizendo que marreca banha paturi banha
com tabatinga no lago
tawaake tawaake

tukui 4 129
piya piya napîrîkîtîpî
piya piya napîrîkîtîpî
kamara tî kamara aramak ît aramak
kamara tît aramak kamara tît aramak
piya piya napîrîkîtîpî
piya piya napîrîkîtîpî
kamara tî kamara aramak ît aramak
kamara tît aramak kamara tît aramak
piya piya napîrîkîtîpî
piya piya napîrîkîtîpî
kamara tî kamara aramak ît aramak
kamara tît aramak kamara tît aramak
piya piya napîrîkîtîpî
piya piya napîrîkîtîpî
kamara tî kamara aramak ît aramak
kamara tît aramak kamara tît aramak
piya piya napîrîkîtîpî
piya piya napîrîkîtîpî
kamara tî kamara aramak ît aramak
kamara tît aramak kamara tît aramak

130 tukui 5
o homem pegou o eco
no princípio
prendeu kamara
prendeu
com ele aprendeu a falar

tukui 5 131
ru
wa ya
ri
kî xi ree
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
wakî xiriru yare
wakî mapara yare
ru
wa ya
ri
kî xi ree

132 tukui 6
bom é olho de buriti
olho de mapará

boa é a folha de mapará


a palha de buriti

tukui 6 133
uraixama ipîrî urariwa ipîrî
uraixama ipîrî urariwa ipîrî
yaxikomatanekî wanîwan paxi
yaxikomatanekî wanîwan paxi
yaxikomatanekî wanîwan paxi
uraixama ipîrî urariwa ipîrî
uraixama ipîrî urariwa ipîrî
yaxikomatanekî wanîwan paxi
yaxikomatanekî wanîwan paxi
yaxikomatanekî wanîwan paxi
uraixama ipîrî urariwa ipîrî
uraixama ipîrî urariwa ipîrî
yaxikomatanekî wanîwan paxi
yaxikomatanekî wanîwan paxi
yaxikomatanekî wanîwan paxi

134 tukui 7
caxiri uraixama
caxiri urariwa
venha coar minha abelhinha

tukui 7 135
wamaa ke ruwe ke wamaa ke ruwe ke
wamaa ke ruwe ke wamaa ke ruwe ke
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm
wamaa ke ruwe ke wamaa ke ruwe ke
wamaa ke ruwe ke wamaa ke ruwe ke
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm
auya auya
pata wakîm pata wakîm

136 tukui 8
com meu wamaa com meu ruwe
vim animar este lugar
wamaa ke ruwe ke

tukui 8
* Ruwe: flauta pequena feita de taboca. 137
piri-piri ku’pîri kuwaka
piri-piri ku’pîri kuwaka
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma

piri-piri ku’pîri kuwaka


piri-piri ku’pîri kuwaka
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma

piri-piri ku’pîri kuwaka


piri-piri ku’pîri kuwaka
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma

piri-piri ku’pîri kuwaka


piri-piri ku’pîri kuwaka
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma

piri-piri ku’pîri kuwaka


piri-piri ku’pîri kuwaka
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma
maiwaka esapausapauma

138 tukui 9
no lago do piri-piri
o pato bate as asas n’água

tukui 9 139
piri-piri ku’pî mamurakai
piri-piri ku’pî mamurakai
wawini wawini wawini kuwa
wawini wawini wawini kuwa

piri-piri ku’pî mamurakai


piri-piri ku’pî mamurakai
wawini wawini wawini kuwa
wawini wawini wawini kuwa

piri-piri ku’pî mamurakai


piri-piri ku’pî mamurakai
wawini wawini wawini kuwa
wawini wawini wawini kuwa

piri-piri ku’pî mamurakai


piri-piri ku’pî mamurakai
wawini wawini wawini kuwa
wawini wawini wawini kuwa

piri-piri ku’pî mamurakai


piri-piri ku’pî mamurakai
wawini wawini wawini kuwa
wawini wawini wawini kuwa

140 tukui 10
no lago piri-piri
toma banho barrento a marreca

tukui 10 141
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
tawa tawa imotamenpe uipîi
tawa tawa imotamenpe uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
tawa tawa imotamenpe uipîi
tawa tawa imotamenpe uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi
tawa tawa imotamenpe uipîi
tawa tawa imotamenpe uipîi
onorewape uipîi
onorewape uipîi

142 tukui 11
venho como garça
com ombros pintados de tabatinga

tukui 11 143
tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi

tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi


tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi

tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi


tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi

tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi


tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tiwîpîrî imotarîyai tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi
tewenasen tukuxi tewenasen tukuxi

pîrî
tewe sen
tiwî i tarîyai na tukuxi
mo

144 tukui 12
no boqueirão da montanha
passeia o beija-flor

tukui 12 145
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya

kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya


kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya

kanaimî wai uwai tunpauya


kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya

kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya


kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya kanaimî wai uwai tunpauya
146 kanaimî wai uwai tunpauya tukui 13
kanaimî wai uwai tunpauya

kanaimî wai uwai tunpauya


kanaimî wai uwai tunpauya
o som do meu instrumento
é igual ao do espírito dos animais

tukui 13 147
wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
maxi maxi tukuxi
urariwa tukuxi

wokî ra’mai tukuxi


wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
maxi maxi tukuxi
urariwa tukuxi

wokî ra’mai tukuxi


wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
maxi maxi tukuxi
urariwa tukuxi

wokî ra’mai tukuxi


wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
maxi maxi tukuxi
urariwa tukuxi

wokî ra’mai tukuxi


wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi
wokî ra’mai tukuxi

148 tukui 14
vamos ver a bebida beija-flor
tukui tukuxi
bebida maxi maxi beija-flor
tukui tukuxi
bebida urariwa beija-flor
tukui tukuxi

tukui 14
* Maxi maxi e urariwa são espécies de bebida forte, servidas nas festas. 149
yei yei wayuna ipî wakapu motawoino
ruweke motawoino
wakapu motawoino wakapu motawoino wakapu motawoino

yei yei wayuna ipî wakapu motawoino


ruweke motawoino
wakapu motawoino ruweke motawoino wakapu motawoino

yei yei wayuna ipî wakapu motawoino


wakapu motawoino wakapu motawoino

yei yei wayuna ipî wakapu motawoino


ruweke motawoino
wakapu motawoino wakapu motawoino wakapu motawoino

yei yei wayuna ipî wakapu motawoino


ruweke motawoino
wakapu motawoino

yei yei wayuna ipî wakapu motawoino


ruweke motawoino
wakapu motawoino ruweke motawoino wakapu motawoino

yei yei wayuna ipî wakapu motawoino


ruweke motawoino
wakapu motawoino

150 tukui 15
madeira preparada se encaixa na forquilha do esteio
se encaixa madeira boa
na forquilha do esteio

madeira preparada se encaixa na forquilha do esteio


madeira boa
se encaixa na forquilha do esteio

tukui 15 151
uwai itun
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe

uwai itun ruwe ruwe


uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe

uwai itun ruwe ruwe


uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe
uwai itun maru’paka yapîkuwai kenamîi
uwai itun ruwe ruwe

152 tukui 16
ecoa
ecoa o som
ecoa o som da flauta
ecoa o som da flauta ruwe ruwe
o som da flauta ecoa antes do cantar do nambu
que o canto do nambu nunca ecoe depois
o canto do nambu nunca ecoe depois
do nambu nunca ecoe depois
nunca ecoe depois
ecoe depois
depois

tukui 16 153
ru
pî ya tawari

ya pî
tariika tariika tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika
ru
pî ya tawari

ya pî
tariika tariika tariika tariika
yapî yapî tawariru
tariika tariika

154 tukui 17
no corrego
há barro colorido
pra se pintar

tukui 17 155
a tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru
tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya

tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru


tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tawaake tuna tariitanîpîuya tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya tawaake tuna tariitanîpîuya

tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru


tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tawaake tuna tariitanîpîuya tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya tawaake tuna tariitanîpîuya

tuna tar
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tu
tuna tariiru tuna tariiru tuna tar
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tu
tuna tariiru tuna tariiru tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya
tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya

tuna tariiru tuna tariiru


tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru
tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya

tuna tariiru tuna tariiru


tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru
tuna tariiru tuna tariiru
tawaake tuna tariitanîpîuya
tawaake tuna tariitanîpîuya

156 tukui 18
riiru tuna tariiru
una tariiru
riiru tuna tariiru tuna tariiru tuna tariiru
una tariiru tuna
a cor d’água
tuna tariiru tuna tariiru
com tabatinga eu pinto
eu pinto a água
tawa
tawake
tuna tariiru tuna tariiru

tukui 18 157
wai samerukai wai samerukai
samerukai wai samerukai
wai samerukai samerukai wai samerukai wai
samerukai samerukai

moroko wai purumai wai


samerukai wai samerukai wai samerukai
semerukai wai samerukai wai samerukai
samerukai
moroko wai purumai wai
samerukai wai samerukai wai samerukai
semerukai wai samerukai wai samerukai
samerukai
moroko wai purumai wai
samerukai wai samerukai wai samerukai
semerukai wai samerukai wai samerukai
samerukai
moroko wai purumai wai
samerukai wai samerukai wai samerukai
semerukai wai samerukai wai samerukai
samerukai

158 tukui 19
raspei a cabaça
raspei
a cuia raspei
raspei a cabaça

raspei
raspei

a cabaça de peixe
de matrinxã
raspei a cuia
raspei
a cabaça
raspei

tukui 19

* Comeu todo peixe que estava dentro da cabaça, da cuia. Comia-se em cabaça, pois é tradição no
circum-Roraima fazer um caldo principalmente de peixe temperado com pimenta, chamado de
damurida.
159
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
rato’ rato’ wayupa kenî seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi
yamî yaka senta’ka seporîi

160 tukui 20
encontrei a casa do Rató
Rató Rató
sim
eu encontrei sua nova casa
Rató Rató

tukui 20 161
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
tukui’ wa’notootî tukui’ wa’notootî
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai
xiparanaku’pî yaka wai xipararukai

162 tukui 21
tukui tukuxi
preparando-se pra dança beija-flor

do lago xiparana eu tiro água para preparar


o caxiri
tukui tukuxi

tukui 21 163
rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî
rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî
waita waita rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî

rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî


rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî
waita waita rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî

rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî


rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî
waita waita rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî

rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî


rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî
waita waita rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî

rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî


rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî
waita waita rato’ rato’ wayupa yamerukayaitî

164 tukui 22
eu acabei com a casa do Rató
eu acabei com a casa do Pacu e do Rató Rató

tukui 22 165
enu’

ni ku pe
yauxi era’ma to’
yauxini enu’ku era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe enu’
tukururi enu’ku era’ma to’pe
tukururi enu’ku era’ma to’pe ni ku pe
era’ma to’peya era’ma to’pe yauxi era’ma to’
era’ma to’peya era’ma to’pe yauxini enu’ku era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe
enu’ tukururi enu’ku era’ma to’pe
tukururi enu’ku era’ma to’pe
ni ku pe era’ma to’peya era’ma to’pe
yauxi era’ma to’ era’ma to’peya era’ma to’pe
yauxini enu’ku era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe
tukururi enu’ku era’ma to’pe
tukururi enu’ku era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe
era’ma to’peya era’ma to’pe

166 tukui 23
vamos ver subir o festejo
eu vou ver
vamos ver
vamos ver tukururi subir
eu vou ver
vamos ver
eu vou ver
vamos ver passar o festejo

tukui 23

* Festa dos peixes, na época da piracema, canto da pesca da piracema.


** Tukururi: espécie de peixe grande. Não encontrado em dicionários disponíveis de Macuxi e o
interlocutor não soube dizer o nome do peixe. 167
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi
wana-wanari pororo samerukai tukuxi

168 tukui 24
beija-flor
tukuxi
wana wana wanari
estou dançando no terreiro do wana wanari
dançando tukui tukuxi
wana wana wanari
wana wana tukuxi
estou dançando no terreiro do wana wanari

tukui 24

* Wana wanari: podendo ser o nome dos donos da casa, bem como de um tipo de flauta usada no
tukui. Dançando, pisando o terreiro com a dança. Wana foi também identificado como instrumento 169
de sopro.
kuwipiri kuyeurumai kuyeurumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
paata ramonoriipo uipîtanne
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai

taa i ta

paa ramono po u nne


rii
kuwipiri kuyeurumai kuyeurumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
paata ramonoriipo uipîtanne
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai

taa i ta

paa ramono po u nne


rii
kuwipiri kuyeurumai kuyeurumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
paata ramonoriipo uipîtanne
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai

taa i ta

paa ramono po u nne


rii
kuwipiri kuyeurumai kuyeurumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
kuwipiri kuwipiripe kuyerumai
paata ramonoriipo uipîtanne
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai
kuwiipiri kuyerumai kuyeurumai

170 taa i ta tukui 25

paa ramono po u nne


rii
Kuwiipiri me falou
me contou
me cantou
quando eu vinha pelo lavrado

Kuwiipiri me falou
como um kuwiipiri ele me falou
quando eu vinha pelo lavrado
Kuwiipiri me falou
me cantou

tukui 25

* Kuwiipiri: tipo de passarinho, o interlocutor não soube dizer o nome em português. 171
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru

amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru


amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru

wayupapau eserunkî nakayîrîmî wayuwaru


wayupapau eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru

amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru


amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru
amîrîpe eserunkî nakayîrîmî wayuwaru

172 tukui 26
eu disse pra você cantar corrupião
pra cantar na casa
eu disse pra você cantar
cante corrupião

tukui 26 173
toronope wawinipe uipîi
toronope wawinipe uipîi
piri-piri ku’pîri kuwaka
piri-piri ku’pîri kuwaka
toronope wawinipe uipîi
toronope wawinipe uipîi

toronope wawinipe uipîi


toronope wawinipe uipîi
toronope wawinipe uipîi
toronope wawinipe uipîi

wayupatau wayupatau uipîi iîpiu uatapuyaw uatapuyaw


wayupatau wayupatau uipîi iîpiu uatapuyaw uatapuyaw
toronope wawinipe uipîi iîpiu epiniwaw eponorot
toronope wawinipe uipîi iîpiu epiniwaw eponorot

piri-piri ku’pîri kuwaka akawuk irîp’uk irip-irip


piri-piri ku’pîri kuwaka akawuk irîp’uk irip-irip
toronope wawinipe uipîi iîpiu epiniwaw eponorot
toronope wawinipe uipîi iîpiu epiniwaw eponorot

wayupatau wayupatau uipîi


wayupatau wayupatau uipîi
toronope wawinipe uipîi
toronope wawinipe uipîi

piri-piri ku’pîri kuwaka


piri-piri ku’pîri kuwaka
toronope wawinipe uipîi
toronope wawinipe uipîi

174 tukui 27
venho como passarinho, como marreca
de dentro do lago do piri-piri

venho pra casa


como passarinho e como marreca
de dentro do lago do piri-piri

tukui 27 175
wataramenkakî tukuxi tukuxi
wataramenkakî tukuxi tukuxi

wataramenkai
karutuke tukuxi
wataramenkai
karutuke tukuxi

wataramenkakî tukuxi tukuxi


wataramenkakî tukuxi tukuxi

karutuke tukuxi
wataramenkai
karutuke tukuxi
wataramenkai
karutuke tukuxi
wataramenkai
karutuke tukuxi
wataramenkai

karutuke wataramenkai tukuxi


karutuke wataramenkai tukuxi
karutuke wataramenkai tukuxi
karutuke wataramenkai tukuxi

176 tukui 28
beija-flor beija-flor se enfeite
beija-flor beija-flor se enfeite
beija-flor me enfeito com jenipapo
tukuxi me enfeito com jenipapo

beija-flor me enfeito com jenipapo


beija-flor me enfeito com jenipapo
beija-flor beija-flor se enfeite
tukuxi me enfeito com karutuke

tukui 28 177
wai wai iparanatau iparanatau
wai wai iparanatau iparanatau
iparanatau

wai wai iparanatau iparanatau


wai wai iparanatau iparanatau
iparanatau

wai wai iparanatau iparanatau


wai wai iparanatau iparanatau
iparanatau

wai wai iparanatau iparanatau


wai wai iparanatau iparanatau
iparanatau

wai wai iparanatau iparanatau


wai wai iparanatau iparanatau
iparanatau

wai wai iparanatau iparanatau


wai wai iparanatau iparanatau
iparanatau

178 tukui 29
tem algo no cocho?
wai wai
tem bebida nesse cocho?
wai wai
no cocho?

tukui 29

* Durante a festa, provavelmente referência à bebida que era servida em espécies de canoas, cochos. 179
wayupa kenî seporîi
wayupatau wayupa kenî seporîi
wayupamî wayupa kenî seporîi
wayupamî wayupa kenî seporîi

kino kino wayupa kenî seporîi


kino kino wayupa kenî seporîi
teperene teperenepo seporîi
teperene teperenepo seporîi

wayupatau wayupa kenî seporîi


wayupatau wayupa kenî seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi
teperene teperenepo seporîi
teperene teperenepo seporîi

wayupatau wayupa kenî seporîi


wayupamî wayupa kenî seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi

teperene teperenepo seporîi


teperene teperenepo seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi
kino kino wayupa kenî seporîi

180 tukui 30
eu encontrei a casa
na casa grande eu encontrei a casa
sim na casa encontrei a verdadeira casa
encontrei a casa do japu
encontrei no morro em cima do morro

na casa grande eu encontrei a casa


encontrei a casa do japu
sim eu a encontrei
no morro em cima do morro

sim sim na casa grande eu encontrei a casa


encontrei a verdadeira casa

no morro em cima do morro


encontrei no morro em cima do morro
a casa do japu
sim eu encontrei a casa do japu
no morro em cima do morro

tukui 30 181
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari
nî ya a’r k y ri

ay en ta’ rî k arî ka
îtî nî nt a’rî ka ya

upîtînî yapurîtarî kayari

en ta’ rî k ay k ya
up a ye yap pur î ka aya ri

ay yen ta’ urît tarî ari i


up îtî ye nt ’rî ka

ta rî ay ar ay ri
up îtî ye nt ur îta ya ri

a en p rî ay ar ya ri
ay en pu rît ay ari ya ri ayenta’rî kayari

up îtî ye nt ur îta ya ri

’rî ka a i ar
up a aye ent a’rî

îtî nî nt a’rî îta rî ri

ay î ya apu ’rî k kay î ka aya


ay î ya apu ’rî k kay î ka aya
ri

up a e yap pur î ka aya


îtî nî nt a’rî îta rî ri

ka ya ri
ayenta’rî kayari
t
ay yen

n y a
r k
a

ya ri
upîtînî yapurîtarî kayari

ri
a

ya ri ar i upîtînî yapurîtarî kayari

up îtî ye nt
ka ya ay ar
ta rî tar î k i

a
en ta’ rî ar ar

y
’rî ka î k ay

up a aye
îtî nî nt a’rî
ayenta’rî kayari

nî ya a’r k
ayenta’rî kayari
n y a

ri

i
a

r k

ri
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari upîtînî yapurîtarî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari upîtînî yapurîtarî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari upîtînî yapurîtarî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari
upîtînî yapurîtarî kayari upîtînî yapurîtarî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari up a aye
u pît ay ent pu rîta aya ri
a yen ap urî kay ar aya ri

ayenta’rî kayari ayenta’rî kayari


a
ay î ya apu ’rî k kay
a î y ap ’rî kay î k aya
îtî înî ent a’rî rîta rî ri

up îtî ye nta
ri

îtî nî nta ’rî


r k

îtî înî ent a’rî

nî ya ’r k
a
u pît ay ent

up a ye yap pur î ka yar


a
a yen ta urî tar ar i

n y a
’rî î ka aya ri yar i
r

ayenta’rî kayari
ay
en ta’ ’rî k kay î k aya
a yen ta ’rî tar î k i

up îtî ye nta ur îta yar i


i

îtî nî nta ’rî îta rî k i


ayenta’rî kayari
a a

n y ’ k r a
ayenta’rî kayari ay î ya apu rî k ay î ka yar
n y a

ay en pu rî ay ari yar i
u
ay yar i

ayenta’rî kayari
r

ay en ta’ rît tarî ari i


a i

upîtînî yapurîtarî kayari


ay en ta’ rî k arî ka
ri

en ta’ rî k ay ka ya
upîtînî yapurîtarî kayarita rî ay ar ya ri
t r

u
k

ayenta’rî kayari
p

’rî ka a i ri
ka ya ri
a

ayenta’rî kayari ya ri
y

upîtînî yapurîtarî kayari


ri
upîtînî yapurîtarî kayari
ayenta’rî kayari
ayenta’rî kayari

182 tukui 31
arara
eu fico no seu lugar
no local onde você está
arara

tukui 31 183
pa pa

ri ri
ra wenairî ra wenairî
xa xa
werawîmai
parixara wenairî parixara wenairî
werawîmai
tuna xiuxiwape tuna xiuxiwape
anaapîtai’na
tuna xiuxiwape tuna xiuxiwape
anaapîtai’na
parixara wukuru parixara wukuru
anaapîtai’na
parixara wukuru parixara wukuru
anaapîtai’na
parixara wukuru parixara wukuru
anaapîtai’na
pa pa

ri ri
ra wenairî ra wenairî
xa xa
werawîmai
parixara wenairî parixara wenairî
werawîmai
tuna xiuxiwape tuna xiuxiwape
anaapîtai’na
tuna xiuxiwape tuna xiuxiwape
anaapîtai’na
parixara wukuru parixara wukuru
anaapîtai’na
parixara wukuru parixara wukuru
anaapîtai’na
parixara wukuru parixara wukuru
anaapîtai’na

184 tukui 32
junto ao parixara
vou dançando

como xiuxiwape na água


como xiuxiwape na água
eu vou me aproximando

da bebida do parixara
eu vou me aproximando

como xiuxiwape na água


como xiuxiwape na água
eu vou me aproximando

tukui 32

* Xiuxiwape: inseto que fica sobre a água se movimentando rapidamente, vai e volta, da família
Gerridae. Também pode ser traduzido como marola da água, espécie de banzeiro. Referência à
própria roda de parixara, que abre e fecha, dança para frente e para trás, batendo o pé, em geral para
frente, em círculo, sempre com muito consumo de caxiri, pajuaru. 185
mainake mainayaka
mainake mainayaka
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
mainake mainayaka
mainake mainayaka
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
mainake mainayaka
mainake mainayaka
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
mainake mainayaka
mainake mainayaka
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
mainake mainayaka
mainake mainayaka
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru
kesera’ atapîriru

186 tukui 33
na roça
lá na roça
a maniva está sendo desfolhada

tukui 33

* Referência à colheita dos galhos da maniva para o novo plantio. 187


parixara iipî era’mato’pe
parixara iipî era’mato’pe
wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai
wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai

tawake tawake wataramenkai


tawake tawake wataramenkai
wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai
wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai

tawake tawake wataramenkai


tawake tawake wataramenkai
wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai
wataramenkai karutuke wataramenkai wataramenkai

188 tukui 34
vamos ver a vinda do parixara
vamos ver
pinta-se com o jenipapo
pinta-se
pinta-se com karutuke

vamos ver a vinda do parixara


vamos ver
pinta-se com tabatinga
pinta-se
pinta-se com tawake

vamos ver a vinda do parixara


vamos ver
pinta-se com karutuke
pinta-se
pinta-se com tawake

tukui 34 189
uwairi itunrî
wama wama itunrî
wîrixi wîrixamo uwairî wîrixamo uwairî
wîrixi wîrixamo uwairî
uwairî

wîrixamo itunrî
uwairi itunrî
etapa apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
wîrixi
apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
wîrixi
wama wama itunrî
ruwe ruwe itunrî
etapa apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
wîrixi
wîrixamo uwairî
wîrixamo uwairî
etapa
apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
wîrixi
apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
wîrixi
wama wama itunrî
ruwe ruwe itunrî
etapa apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
wîrixi
apakakî wîrixi
apakakî wîrixi
wîrixi
190 tukui 35
o som do meu instrumento
o som do wama wama
cunhatã os instrumentos das mulheres
os instrumentos
as mulheres
os sons das mulheres
o som do meu instrumento
cunhatã acorde para escutar
cunhatã acorde
cunhatã
minha irma acorde
acorde

o som do wama wama


o som do ruwe ruwe
cunhatã acorde para escutar
cunhatã acorde
acorde
cunhatã
o instrumento das mulheres
o instrumento das mulheres
pra escutar
cunhatã acorde
acorde
cunhatã
acorde pra escutar
o som do wama wama
o som do ruwe ruwe
cunhatã acorde para escutar
cunhatã acorde
acorde
cunhatã

tukui 35 191
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
wîrixiru ataxininpa ataxininpa
uyapontî tuya kai’masa’ne ataxininpa

192 tukui 36
está alegre
pensando que vai dormir comigo
cunhatã
está animada
animada
pensando que vai dormir comigo

tukui 36 193
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî
yei-yei nesewayumai
yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yei-yei nesewayumai
yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yei-yei nesewayumai
yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai
194 yakîrirî nakîto’rî yei-yei nesewayumai tukui 37
yakîrirî nakîto’rî
yei-yei nesewayumai
yei-yei nesewayumai
nesewayumai yakîrirî nakîto’rî
corta o pau
derruba o pau
corta o pau
derruba o pau
o besouro-serrador corta o pau
corta o pau
derruba o pau
corta o pau
derruba o pau
o besouro-serrador corta o pau
corta o pau
derruba o pau
corta o pau
derruba o pau
o besouro-serrador corta o pau

tukui 37 195
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
tawake
wîrixi’ya uyera’mato’pe
tawake
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
uipî tanne
tawa tawa umota menu
tawa tawa umota menu
uipî tanne
wîrixi’ya uyera’mato’pe
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
tawake
wîrixi’ya uyera’mato’pe
tawake
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
tawa umota menu uipî tanne
tawa
wîrixi’ya uyera’mato’pe
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai

wîrixi’ya uyera’mato’pe
watarai men ukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai
watarai menukai

196 tukui 38
vou pintar meu corpo
meu corpo
corpo
vou pintar
meu corpo vou pintar
com tabatinga
pra cunhatã me ver
com tawa
eu vou pintar meu corpo
meu corpo
vou pintar
eu venho pintado
o ombro
com tabatinga com tabatinga no ombro
eu venho pintado
pra cunhatã me ver
vou pintar meu corpo
meu corpo
corpo
vou pintar
com tabatinga
meu corpo vou pintar
com tawa
vou pintar meu corpo
meu corpo
corpo
vou pintar
com tawa
eu venho pintado no ombro
com tawake
pra cunhatã me ver
vou pintar meu corpo
meu corpo
corpo
vou pintar
meu corpo vou pintar

pra cunhatã me ver


vou pintar meu corpo
vou pintar meu corpo
vou pintar meu corpo
vou pintar meu corpo
vou pintar meu corpo

tukui 38 197
itakuya wenuipî tawari kutumai
tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai

itakuya wenuipî tawari kutumai


tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai
tawari kutumai
itakuya wenuipî tawari kutumai

198 tukui 39
venho pintar com pó de tabatinga
com pó de pintura
venho pintar

tukui 39 199
sapîyanpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
anpai o sapîyanpai akanawî sapîyanpai o sapîy
sapîyanpai o sapîyanpai awukuru sapîyanpai o
wukuru sapîyanpai o sapîyanpai awukuru sapîy
sapîyanpai o sapîyanpai akanawî sapîyanpai o
npai o sapîyanpai akanawî sapîyanpai o sapîya
o sapîyanpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
sapîyanpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai

anpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai


akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
npai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
a pî pai a pî pai

wukuru sa yan o sapîyan wukuru sa yan o sapîyan

pai pai
pai
anpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
yanpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
pîyanpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
sapîyanpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
sapîyanpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai

akanawî sapîyanpai o sapîyanpai


akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai

akanawî sapîyanpai o sapîyanpai


anpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
npai a pî pai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
a pî pai
wukuru sa yan o sapîyan
wukuru sa yan o sapîyan
pai
pai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
pai
anpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
anpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
yanpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
pîyanpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
sapîyanpai awukuru sapîyanpai o sapîyanpai
200 tukui 40
sapîyanpai akanawî sapîyanpai o sapîyanpai
anpai o sapîyanpai akanawî sapîyanpai o sapîy
sapîyanpai o sapîyanpai awukuru sapîyanpai o
yanpai
o sapîyanpai
yanpai o sapîyanpai
o sapîyanpai
anpai
i

vou pegar
vou pegar no teu cocho na tua canoa
pegar tua bebida
vou pegar
vou pegar tua bebida

tukui 40 201

yanpai
o sapîyanpai
Mîrîrî marapaa unamumî’pî amooko Alfredo wenî mana’ krî pon.
[Esses marapá eu aprendi do vovô Alfredo, da comunidade mana’ krî.]

Manaaka.
Marapá
em geral acompanhado
com tambor, também
flautas

203
anî’kin pi’pî anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno
akuri pi’pî arawata pi’pî asanpurari pîkîno
anî’kin pi’pî anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno
akuri pi’pî arawata pi’pî asanpurari pîkîno
arawata pi’pî iwarîka pi’pî asanpurari pîkîno

anî’kin pi’pî anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno


anî’kin pi’pî anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno
akuri pi’pî arawata pi’pî asanpurari pîkîno
arawata pi’pî iwarîka pi’pî asanpurari pîkîno

anî’kin pi’pî anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno


akuri pi’pî arawata pi’pî asanpurari pîkîno
arawata pi’pî iwarîka pi’pî asanpurari pîkîno

anî’kin pi’pî anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno


akuri pi’pî iwarîka pi’pî asanpurari pîkîno
arawata pi’pî iwarîka pi’pî asanpurari pîkîno

anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno


anî’kin pi’pî asanpurari pîkîno
akuri pi’pî arawata pi’pî asanpurari pîkîno
arawata pi’pî iwarîka pi’pî asanpurari pîkîno

204 marapá 1
de quem é o couro do tambor
de cutia de guariba é o couro do tambor
de quem é o couro do tambor
de cutia de guariba é o couro do tambor
de guariba de macaco é o couro do tambor

de quem é o couro do tambor


de quem é o couro do tambor
de cutia de guariba é o couro do tambor
de guariba de macaco é o couro do tambor

de quem é o couro do tambor


de cutia de guariba é o couro do tambor
de guariba de macaco é o couro do tambor

de quem é o couro do tambor


de cutia de macaco é o couro do tambor
de guariba de macaco é o couro do tambor

de quem é o couro do tambor


de quem é o couro do tambor
de cutia de guariba é o couro do tambor
de guariba de macaco é o couro do tambor

marapá 1 205
tapomporo tenukupî’sem
tapomporo tenukupî’sem
tapomporo tenukupî’sem
wiiii
tapomporo tenukupî’sem
yo-yo wiiii wara
wiiii
yo-yo wiiii waraka
yo-yo wiiii wara
yo-yo waraka
tapomporo tenukupî’sem yo-yo wiiii waraka
ka
tapomporo tenukupî’sem yo-yo waraka
wiiii ka
yo-yo wiiii wara
yo-yo wiiii waraka
yo-yo waraka
tapomporo tenukupî’sem
ka
tapomporo tenukupî’sem
wiiii
yo-yo wiiii wara
tapomporo tenukupî’sem yo-yo wiiii waraka
tapomporo tenukupî’sem yo-yo waraka
wiiii ka
yo-yo wiiii wara
yo-yo wiiii waraka
yo-yo waraka
ka

tapomporo tenukupî’sem
tapomporo tenukupî’sem
wiiii
yo-yo wiiii wara
yo-yo wiiii waraka
yo-yo waraka
ka

206 marapá 2
sobe ele sempre o mesmo caminho

wiiii
yo-yo wiiii
yo-yo wiiii
yo-yo

macaco

marapá 2

* Yo-yowi onomatopeico do som produzido pelo macaco. 207


kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
waitupiri’ kuratiki’ye’ waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
waitupiri’ waitupiri’ waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
waitupiri’ kuratiki’ye’ waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
waitupiri’ waitupiri’ waitupiri’
kuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
wuratiki’ye’ ponkon waitupiri’
waitupiri’ kuratiki’ye’ waitupiri’

208 marapá 3
em cima do caimbé
sempre passeia o waitupiri’
o waitupiri’ o waitupiri’

marapá 3

* Pássaro, parecido com o tié-vermelho, mas o informante não soube dizer o nome em português. O
canto dele é onomatopeico com o nome. Vive em geral no lavrado, sobre os caimbés. 209
xiu ka’
xiu kî parikuwa
xiu ka’ ru
xiu kî parikuwa
xiu ka’ ru
xiu kî parikuwa xiu ka’
xiu ka’ ru xiu kî parikuwa
kî parikuwa xiu ka’ ru
ru xiu kî parikuwa
tururia tururi tururiana xiu ka’ ru
tururia tururi tururiana xiu kî parikuwa
xiu ka’ xiu ka’ ru
xiu kî parikuwaru kî parikuwa
xiu ka’ ru
xiu kî parikuwaru tururia tururi tururiana
tururia tururi tururiana
xiu ka’
xiu kî parikuwaru
xiu ka’
xiu kî parikuwaru
xiu ka’
xiu kî parikuwa
xiu ka’ ru
xiu kî parikuwa
xiu ka’ ru
xiu kî parikuwa
xiu ka’ ru
kî parikuwa
ru
tururia tururi tururiana
tururia tururi tururiana
xiu ka’
xiu kî parikuwaru
xiu ka’
xiu kî parikuwaru

210 marapá 4
tururia tururi tururiana
tururia tururi tururiana

cante parikuaru
xiu xiu ká ku
aqui acolá
lá acolá
cante parikuaru
xiu xiu ká ku
aqui acolá
lá acolá

tururia tururi tururiana


tururia tururi tururiana

marapá 4 211
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
awukuruî ikurumapa
apaiwarîrî ikurumapa
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
awukuruî ikurumapa
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
uwai riru itun etapa
wama-wamari itum etapa
apakakî wîi wîriwîri
apakakî wîi apakakî wîi
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
awukuruî ikurumapa
apaiwarîrî ikurumapa
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
uwai riru itun etapa
wama-wamari itum etapa
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
ruwe-ruwerî itun etapa
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
apakakî wîi wîri wîri
awukuruî ikurumapa
apaiwarîrî ikurumapa

212 marapá 5
acorda mulher
para coar a bebida coar o apaiuá
acorda mulher mulher acorda
mulher pra coar a bebida

escuta o som do meu instrumento


do wana wana

acorda mulher
para coar a bebida coar o apaiuá
acorda mulher mulher acorda
mulher pra coar a bebida

escuta o som do meu instrumento


do ruwe ruwe

acorda mulher
para coar a bebida o apaiuá
acorda mulher mulher acorda
mulher pra coar o apaiuá

marapá 5

* Apaiuá: bebida fermentada de beiju que diferencia-se do pajuaru, pois é fermentada no alto, sobre
um jirau, enquanto o pajuaru é fermentada sobre a terra. Fonte Tiago Simplício Napoleão. A feitura
das bebidas era de exclusividade das mulheres, inclusive meninas púberes eram “tratadas” na boca
para fazerem a bebida, já que a saliva contribuía para o processo de fermentação.
* Wana: provavelmente um tipo de flauta.
213
Areruia
acompanhado de tambor
e mais raramente jocalhos,
principalmente amarrados
pelo corpo.

Aprendeu Terêncio Luiz Silva com seu pai e


o vovô Simplício. A versão para o macuxi foi feita
pelo senhor Terêncio, segundo ele, inglês vindo
da Repúbica Coopetariva da Guiana Inglesa.
215
pri’ya e to’pee pri’ya eto’pe areruia
pri’ya e to’pee pri’ya eto’pe areruia
pri’ya e to’pee
rî an
tîî mo

mo kî tîî o paa
rî an kî paaaa
morî antîîkî morî antîîkî o paa pa
pri’ya e to’pee pri’ya eto’pe areruia
pri’ya e to’pee pri’ya eto’pe areruia
pri’ya e to’pee
rî an
tîî mo

mo kî tîî o paa
rî an kî paaaa
morî antîîkî morî antîîkî o paa pa
pri’ya e to’pee pri’ya eto’pe areruia
pri’ya e to’pee pri’ya eto’pe areruia
pri’ya e to’pee
rî an
tîî mo

mo kî tîî o paa
rî an kî paaaa
morî antîîkî morî antîîkî o paapa

216 areruia 1
pra estar com saúde
dai-me o bem meu pai
areruia
areruia
areruia

areruia 1 217
makui niken inumpaiman
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
makui niken inumpaiman
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
makui niken inumpaiman
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
makui niken inumpaiman
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
makui niken inumpaiman
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe
morî niken eto’pe

218 areruia 2
vamos deixar as coisas ruins

pra ficar com as boas

areruia 2 219
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita waita
mai’ perukanen waita

mai’ perukanen waita


mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita waita
mai’ perukanen waita

mai’ perukanen waita


mai’ perukanen waita
mai’ perukanen waita waita
mai’ perukanen waita

220 areruia 3
o pacu come frutas fortes
o pacu o pacu come frutas
o pacu come frutas amargas e azedas
o pacu come frutas

areruia 3 221
krixinpe o areruia areruia areruia
areruia areruia areruia areruia areruia
krixinpe o areruia

krixinpe o areruia areruia areruia


areruia areruia areruia areruia areruia
krixinpe o areruia

krixinpe o areruia areruia areruia


areruia areruia areruia areruia areruia
krixinpe o areruia

krixinpe o areruia areruia areruia


areruia areruia areruia areruia areruia
krixinpe o areruia

krixinpe o areruia areruia areruia


areruia areruia areruia areruia areruia
krixinpe o areruia

222 areruia 4
estamos unidos oh areruia
areruia areruia areruia
estamos unidos areruia

areruia 4 223
makuipeman taa tanne
iripeman taa tanne
makuipeman taa tanne
iripeman taa tanne
ekonekakîn sîrîrî
epîremakîn sîrîrî
kesera’pe e’to’pe
ekonekakîn sîrîrî
makuipeman taa tanne
iripeman taa tanne
makuipeman taa tanne
iripeman taa tanne
ekonekakîn sîrîrî
epîremakîn sîrîrî
kesera’pe e’to’pe
ekonekakîn sîrîrî

makuipeman taa tanne


iripeman taa tanne
makuipeman taa tanne
iripeman taa tanne
ekonekakîn sîrîrî
epîremakîn sîrîrî
kesera’pe e’to’pe
ekonekakîn sîrîrî
makuipeman taa tanne
iripeman taa tanne
makuipeman taa tanne
iripeman taa tanne
ekonekakîn sîrîrî
epîremakîn sîrîrî
kesera’pe e’to’pe
ekonekakîn sîrîrî

224 areruia 5
os demônios estão por aí
espíritos ruins também
continuarei forte
sendo a mesma maniva

areruia 5

* Essa música é cantada quando se vai plantar a maniva, no momento de pôr a maniva na cova. 225
ko’ko ko’ko

ko
ko’ko erenmapîpe
ko’ko erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanenpai erenmapîpe
uyurumanenpai erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe

ko’ko
uyurumanen erenmapîpe
ko’ko erenmapîpe
ko’ko erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanenpai erenmapîpe
uyurumanenpai erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
ko’ko erenmapîpe

ko’ko
ko’ko erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanenpai erenmapîpe
uyurumanenpai erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe
uyurumanen erenmapîpe

ko’ko
226 areruia 6
vovó, ko’ko, me orientava muito cedo
já não tenho quem me oriente cedo mais

areruia 6 227
morî pepîn parau naipîi krixoxi
morî pepîn parau naipîi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi
morî pepîn parau naipîi krixoxi
morî pepîn parau naipîi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi

morî pepîn parau naipîi krixoxi


morî pepîn parau naipîi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi

morî pepîn parau naipîi krixoxi


morî pepîn parau naipîi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi
morî pepîn parau naipîi krixoxi
morî pepîn parau naipîi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi
krixo krixo krixoxi krixoxi

228 areruia 7
tá vindo água do mar que não é boa
tá vindo doença aí
cristo cristo
meu cristo cristo meu

areruia 7

* A tradução do segundo verso, ouvi da indígena Letícia Barbosa, comunidade do Sabiá, TI São
229
Marcos, RR.
paapa mainmu pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
o areruia pî’ tikomansen xixira
o areruia pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî’ tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
o areruia pî’ tikomansen xixira
o areruia pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî’ tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
o areruia pî’ tikomansen xixira
o areruia pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî’ tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
o areruia pî’ tikomansen xixira
o areruia pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî’ tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
o areruia pî’ tikomansen xixira
o areruia pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî’ tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî tikomansen xixira
o areruia pî’ tikomansen xixira
o areruia pî tikomansen xixira
paapa mainmu pî’ tikomansen xixira

230 areruia 8
a gente vive de acordo com a palavra de
a gente vive falando aleluia deus
a gente vive de acordo com a palavra de

areruia 8 231
morî pena’ moronan
morî pena’ moronan
morî pena’ moronan
morî pena’ moronan
morî pena’ moronan
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai

morî pena’ moronan morî pena’ moronan


morî pena’ moronan morî pena’ moronan
morî pena’ moronan morî pena’ moronan
morî pena’ moronan morî pena’ moronan
morî pena’ moronan morî pena’ moronan

morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai

morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai morî pena’ moronan
morîpe enanpî’wai morî pena’ moronan
morî pena’ moronan
morî pena’ moronan
morî pena’ moronan

morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai
morîpe enanpî’wai

232 areruia 9
você tá bem aí?
sim estou ficando bem
tô bem aqui

areruia 9 233
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman

paapa mainmuperî tîwî e’nîpaiman


paapa mainmuperî tîwî e’nîpaiman

tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
upaatakonpo tîwî e’nîpaiman
upaatakonpo tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman

makuxiperî tîwî e’nîpaiman


makuxiperî tîwî e’nîpaiman

tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
makuxiperî tîwî e’nîpaiman
makuxiperî tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman
tîwî e’nîpaiman

234 areruia 10
vamos ser vamos
ser o que somos

vamos ser o que somos com a palavra do pai

vamos ser vamos


ser o que somos

em nosso lugar vamos ser o que somos

vamos ser vamos


ser o que somos

como macuxi vamos ser o que somos

vamos ser vamos


ser o que somos

como macuxi vamos ser o que somos

areruia 10 235
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen

o paapa seni’ nonpo o paapa seni’ nonpo


o paapa xinni’ ka’po o paapa xinni’ ka’po

o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen


o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen

o paapa seni’ nonpo o paapa seni’ nonpo


o paapa xinni’ ka’po o paapa xinni’ ka’po

o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen


o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen
o paapa tîwîrî tiwasen o paapa tîwîrî tiwasen

o paapa seni’ nonpo


o paapa xinni’ ka’po

236 areruia 11
oh pai que é sempre procurado
pai aqui na terra
pai lá no céu

'

areruia 11 237
Partituras 239
240
241
242
243
244
245
246
247
248
249
250
251
252
253
254
255
256
257
258
259
260
261
262
263
264
265
266
267
268
269
270
271
272
273
274
275
276
277
278
279
280
281
282
283
284
285
286
287
288
289
290
291
292
293
294
295
296
297
298
299
300
301
302
303
304
305
306
307
308
309
310
311
312
313
314
315
316
317
318
319
Macuxi vivo Manaaka e Yauyo
Fotos: Devair Antônio Fiorotti
Formato:
21 x 27,5 cm

Tipologia:
Book Antiqua
Bookman Old Style

Papel
Couchê super fosco 150g (miolo)

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