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Pequeno Curso de Controle de Constitucionalidade

Canal Resenha Forense


Prof. Marcelo Pichioli da Silveira

Pequeno Curso de Controle de Constitucionalidade

Canal RESENHA FORENSE

MARCELO PICHIOLI DA SILVEIRA


Professor. Mestre em Direito pela Universidade Estadual de Londrina/PR. Graduado em Direito pela Universidade
Estadual de Maringá/PR. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes (Rio de
Janeiro/RJ). Especialista em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes (Rio de Janeiro/RJ).
Parecerista da Revista Brasileira de Direito Processual (RBDPro). Membro do Conselho Editorial da Editora Thoth
(Londrina/PR). Editor, escritor e produtor do Resenha Forense.

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Pequeno Curso de Controle de Constitucionalidade
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Prof. Marcelo Pichioli da Silveira

Escrevi este material com o objetivo de ajudar os alunos do Canal Resenha Forense. A
playlist das aulas está aqui. Este curso é básico e não tem grandes pretensões. É uma versão
inicial que, talvez, passe por futuro aprofundamento.

Algumas palavras introdutórias


Posso afirmar que conheci três tipos de estudiosos do fenômeno jurídico. Este
universo é encontrado no enfrentamento geral daqueles que leram e daqueles que não leram os
jusnaturalistas e obras tomistas (p. ex.: JOHN FINNIS e o próprio SANTO TOMÁS DE AQUINO).
Daí se extraem as três estirpes: 1.ª) a dos que fingiram que o assunto é simplesmente incapaz
de tocá-los na alma, de maneira que imanentismos são capazes de preenchê-los; 2.ª) a dos
que aceitaram que o positivismo jurídico, embora sofra críticas injustas, realmente é
insuficiente perto da magnitude filosófica clássica; e 3.ª) a dos que, por preguiça intelectual
ou formação ainda insuficiente, não tiveram acesso efetivo aos escritos tomistas.
Passei a me colocar no segundo tipo referido acima, de maneira que um estudo de
controle de constitucionalidade, partindo de alguém assim, necessariamente passa por um
irresistível aparar de arestas inicial. Quanto ao leitor do tipo primeiro, há algumas perguntas
inconvenientes (todas lançadas neste vídeo meu aqui): estaria o poder constituinte originário
autorizado a instalar um regime nazista? Não há nada que, ex ante, limite uma assembleia
constituinte? Teria o legislador uma autorização “divina” para instalar o quarto Reich?
As respostas negativas — que, espero, sejam do leitor — são fundamentadas em
que tipo de teoria? O que faz que alguém diga, com convicção, que as respostas para as
perguntas acima sejam, todas, contrárias? O juízo valorativo detrás das respostas não pode
estar na matéria. A matéria não traz, em si, nenhum tipo de grau axiológico. Há algo que
transcende a matéria.
Naturalmente, as perguntas lançadas se dirigem a qualquer tipo de regime
autoritário: pense-se, p. ex., nos “campos de concentração” da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas, conhecidos como “gulags” (gulag vem de ГУЛаг, que abrevia Главное
управление исправительно-трудовых лагерей и колоний, ou seja: “Glavnoye upravleniye
ispravitelno-trudovykh lagerey i kolonij”)1, e também o Holodomor, genocídio ordenado por
STÁLIN sobre a Ucrânia — matar de fome toda uma população com a inanição. Os
bolcheviques, no entanto, insistiam no erro: “sabemos que milhões de pessoas estão

1
Imprescindível SOLJENÍTSIN, Aleksandr. Arquipélago gulag. Trad. Francisco A. Ferreira, Maria M. Llistó
e José A. Seabra. São Paulo: Círculo do Livro, 1975.
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morrendo. É lamentável, mas o futuro glorioso da URSS acabará por justificar”, como disse
GRIGORY IVANOVICH PETROVSKY, citado por PAULINE PERETZ2.
Há fundamentos ex ante que deslegitimam tudo isso. Quais são os tais fundamentos?!
Uma coisa é certa: tais bases “de bem” fundadas para um povo são inexplicáveis
cientificamente. É impossível demonstrar, cientificamente, que o nazismo é ruim. Por mais
impressionante que seja o estudo do átomo e por mais longe que tenha ido o ser humano,
nada, absolutamente nada, pode explicar o peculiar fator temporal daquilo que precedeu o próprio
universo. Aliás, a ciência não se autoexplica. Mas pressupõe ordem, lógica, sentido. Daí a
famosa colocação de WILLIAM LANE CRAIG: há muitas coisas que não podem ser explicadas
cientificamente, como i) verdades lógicas e matemáticas, já que a própria ciência as
pressupõe; ii) verdades metafísicas; iii) crenças axiológicas (no exemplo memorável: “você
não pode mostrar, pela ciência, se os nazistas nos campos fizeram algo mau em contraste
com os ‘cientistas das democracias’ ocidentais”); iv) juízos de estética; v) a ciência nela
mesma, que não pode ser explicada pelo método científico (p. ex.: “na teoria especial da
relatividade, a teoria toda depende da suposição de que a velocidade da luz é constante entre
quaisquer pontos A e B, mas isso estritamente não pode ser provado”, de maneira que
devemos apenas supor isso) etc.
Há uma magnífica discussão entre MANUEL CARREIRA (Padre, astrofísico e
membro do Observatório do Vaticano) e um jurista espanhol, ANTONIO TREVIJANO, onde
se percebe, com clareza solar, a necessidade de uma transcendência material para o encontro
de algum valor. Na ocasião, disse o Padre MANUEL CARREIRA que há um pressuposto lógico-
objetivo impossível de refutação: no ser humano, há uma atividade que não se pode atribuir
à matéria, a exemplo da percepção de que um poema é belo. A realidade humana não encerra
um amontoado de processos físico-químicos, porque nenhum fluxo biológico, físico,
químico poderá explicar uma poesia ou o desejo de conhecer, de encontrar a verdade, a
beleza e o bem. Aí está a grandeza humana. Sendo assim, a razão filosófica de quem é o ser humano
há que admitir uma realidade não material, inábil de desaparecimento apenas pela morte ou pela
doença. Após sofrer objeções de ANTONIO TREVIJANO, para o qual tudo se explica com
alguma derivação da evolução para o campo da neurologia, o Padre MANUEL CARREIRA lança
o questionamento do que seria, afinal, matéria. E matéria seria tudo aquilo que atua com
uma das quatro forças (1. eletromagnética; 2. gravitacional; 3. nuclear forte; e 4. nuclear
débil)3. O que explicaria uma poesia dentro dessa gama de forças? ANTONIO TREVIJANO
arrisca: “uma faculdade espiritual”, emergida... Da matéria (sic). Do que vem nova pergunta

2
“Nous savons que des millions d'hommes sont en train de mourir. C'est malheureux, mais le glorieux avenir de l'Union
Soviétique le justifiera” (PERETZ, Pauline, La Grande Famine ukrainienne de 1932-1933: essai
d'interprétation, Revue d'études comparatives Est-Ouest, n. 49, 1999, p. 46).
3
Sobre o assunto, ver ZABOT, Alexandre. Curso de Astrofísica Geral – O Universo faz Sentido? Programa
Astrofísica Para Todos (Programa de Extensão da Universidade Federal de Santa Catarina), tema 30.
Disponível em https://tinyurl.com/y7ju5w9q.
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de Padre MANUEL CARREIRA: e o que seria espírito?! A matéria, na lógica de ANTONIO


TREVIJANO, seria capaz de fazer algo que não seja matéria. Algo impossível.
Mencionada discussão torna possível partirmos da premissa de que um processo
físico-químico não será capaz de demonstrar as razões pelas quais achamos algo bom ou ruim
ou um fato justo ou injusto. O jusnaturalismo tomista parte de uma premissa segundo a qual
há necessidade de transcendermos a matéria para, então, concebermos juízos e lógicas de
justiça ou de injustiça. Não basta afirmar que o nazismo é ruim “só por instinto”. O único
ente dotado de capacidade intelectual para proceder com este raciocínio é o ser humano, e
este espírito transita fora da matéria.
Neste sentido, o fato de propormos um curso de controle de constitucionalidade
não implica, necessariamente, adesão simplista ao positivismo reinante. Trata-se, somente,
de mais um esforço dogmático. As palavras iniciais deste curso apenas deixam claro que o
controle de constitucionalidade (e a própria obediência às Constituições das Nações) não é
um remédio para a humanidade. O controle e o seu parâmetro pode, sempre, ser
embasado numa péssima régua axiológica. Basta que a “Norma Hipotética
Fundamental” de HANS KELSEN seja prenhe das piores sandices já verificadas na história...
Na visão do grande gênio austríaco, “a validade das normas jurídicas que fazem parte de um
determinado sistema jurídico, não dependerá, portanto, do seu conteúdo, mas, tão
somente, do modo pelo qual tiverem sido estabelecidas. A sua validade decorre da própria
estrutura lógica do sistema de normas no qual se integram” 4. Neste sentido, é correto
concluir que os fundamentos da teoria da validade de KELSEN são diferentes das doutrinas
“realistas”, já que elas “tendem à identificação da validade com a realidade da norma, isto é,
sua eficácia na sociedade histórica e concreta”. Ora, “estando a validade em Kelsen vinculada
a um postulado antimetafísico, a fundamentação de uma normatividade não pode estar fora
do direito: são válidos aqueles comandos de dever-ser que tem um sentido tornado objetivo
por outro comando superior na ordem hierárquica. [...]. Nesse ponto, Kelsen assume um
idealismo transcendental numa não pouco problemática filiação à filosofia de Immanuel Kant”5.
Em verdade, embora a teoria de KELSEN “tenha sido alvo de uma série de críticas, a
fundamentação normativa da validade do direito, núcleo da sua perspectiva dinâmica, ainda
figura no horizonte da teoria geral do direito, da dogmática jurídica e da prática cotidiana
do direito. Uma crítica à teoria pura do direito implica, portanto, uma crítica
ao modo preponderante pelo qual o direito é enfocado diariamente pelo

4
TAVEIROS, Alaide. A última expressão do pensamento de Hans Kelsen. Revista da Faculdade de Direito de
São Paulo, v. 48, 1953, p. 169.
5
SIQUEIRA PONTES, José Antonio. Fundamentos para uma leitura crítica de Hans Kelsen no século XXI:
em busca de um modelo kelseniano clássico. Revista da Faculdade de Direito de São Paulo, v. 110, 2015, p. 594.
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jurista brasileiro em seu ofício”6. Sobre este assunto, confira-se um outro vídeo da série
Esforço teórico pelo jusnaturalismo, do Canal Resenha Forense, aqui.
Sem desmerecer a grandeza de HANS KELSEN, mas sempre com avisos e
advertências, prossigamos.

Controle de Constitucionalidade e a pressuposição de


um parâmetro de validade
A ideia moderna de supremacia da constituição traz uma necessidade de permanentes
juízos de verificação da legislação infraconstitucional diante da Constituição. Como diz
MARCELO NOVELINO, “a supremacia da constituição impõe a compatibilidade vertical das
normas do ordenamento jurídico, fiscalizada por órgãos encarregados de impedir a criação
ou manutenção de atos normativos em desacordo com seu fundamento de validade” 7.
FLÁVIO MARTINS ALVES NUNES JÚNIOR explica que o “controle de constitucionalidade
consiste na verificação da compatibilidade das leis e dos atos normativos com a Constituição.
Decorre da supremacia formal da Constituição sobre as demais leis do ordenamento jurídico
de um país. Ora, se a Constituição é a lei mais importante do ordenamento jurídico, sendo
o pressuposto de validade de todas as leis, para que uma lei seja válida precisa ser compatível
com a Constituição. Caso a lei ou o ato normativo não seja compatível com a Constituição,
será inválido, inconstitucional”8. PINTO FERREIRA escreveu, a respeito, o seguinte: “o
princípio da supremacia constitucional é reputado como uma pedra angular, em que assenta
o edifício do moderno direito político. De feito, as regras constitucionais são dotadas de
uma superioridade profunda com relação às demais normas jurídicas. Essa hierarquia se
justifica, a fim de se melhor manter a estabilidade social do grupo, estabelecendo-se um
sistema de preceitos básicos a que se submete a conduta coletiva”9.
A norma infraconstitucional que afronte a Constituição da República será norma
nula. Há quem fale em inexistência, mas a conclusão é equivocada. Uma Lei Ordinária, por
exemplo, existe desde sua publicação (plano da VIGÊNCIA). A análise de seus pressupostos de
validade conduz, somente, à invalidade, e só o que existe pode ser nulo. Pense-se, só para

6
SCHAEFER ANDRADE, Luiz Fernando. A universalização do primado da norma: o obstáculo
epistemológico etnocêntrico da teoria pura do direito. Revista da Faculdade de Direito de São Paulo, v. 112,
2017, p. 738. Destaquei.
7
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 193.
8
NUNES JÚNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2017, p. 535.
9
FERREIRA, Pinto. Princípio da supremacia da Constituição e controle de constitucionalidade das leis.
Função constitucional do Supremo Tribunal Federal no Brasil. In: CLÈVE, Clèmerson Melin; BARROSO,
Luís Roberto. Doutrinas Essenciais – Direito Constitucional, v. 5. Defesa da Constituição. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011, p. 467-468.
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ilustrar, num negócio jurídico inválido por motivo qualquer. O negócio nulo existe. Se
chegou a ser inválido, necessariamente existiu.
Aliás, o que prevalece no Brasil, certamente, é a teoria da nulidade. FLÁVIO
MARTINS ALVES NUNES JÚNIOR arrola alguns juristas que defenderam este entendimento:
RUY BARBOSA, ALFREDO BUZAID e CASTRO NUNES10... Não bastasse a força da ideia na
doutrina, há também a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

A declaração de inconstitucionalidade reveste-se, ordinariamente, de


eficácia “ex tunc” (RTJ 146/461-462 – RTJ 164/506-509), retroagindo
ao momento em que editado o ato estatal reconhecido inconstitucional
pelo Supremo Tribunal Federal11.

Pressupostos inerentes ao Controle de


Constitucionalidade
Um controle de constitucionalidade exige a presença de alguns requisitos. São
eles:
• a Constituição tem de ser formal e rígida, tendo ela o atributo da supremacia;
• a Constituição deve ser o fundamento de validade para o ordenamento jurídico;
• há necessidade de um órgão dotado de legitimidade para realização do controle
(na maioria das nações, este órgão é do Poder Judiciário); e
• o juízo de inconstitucionalidade acarretará uma sanção, que é a invalidade da
lei ou ato normativo contrário à Constituição.

O que é uma norma constitucional?


A doutrina costuma afirmar que a norma constitucional há de atravessar dois
requisitos: os formais, que dizem respeito ao modo ou forma de produção da lei (o processo
legislativo está regulado na Constituição e, assim, deve respeitá-la); e os materiais, que dizem
respeito ao conteúdo da norma (sua matéria deve obedecer a Constituição).
Antes de prosseguirmos, convém procedermos com leitura de passagem de JOSÉ
AUGUSTO DELGADO sobre a lei inconstitucional:

10
NUNES JÚNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2017, p. 545.
11
STF, AgRg no RE n.º 395.902-6/RJ. Rel. Min. CELSO DE MELLO, 2.ª Turma. Julgado em 07 de março
de 2006.
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A unidade do ordenamento jurídico se desenvolve como um sistema


dinâmico que exige coerência para que possa ser útil aos seus objetivos.
Algumas regras dirigidas aos produtores de normas estão presentes nesse
sistema. São elas:
a) Nenhuma norma deve ser criada que seja incompatível com o sistema.
b) O legislador, ao enfrentar qualquer antinomia no processo de
elaboração das normas, deve procurar eliminá-la.
c) As normas de diferentes níveis devem obedecer à hierarquia
estabelecida pelo ordenamento jurídico.
d) O legislador ordinário não está proibido de formular sucessivamente
normas em oposição entre si.
e) Se, por acaso, há oposição entre a norma ordinária e a fundamental,
deve o Juiz eliminá-la a fim de manter coerente o ordenamento.
f) O ordenamento jurídico deve ser completo para que possa fornecer
ao Juiz, em cada caso, a solução adequada12.

Requisitos formais de constitucionalidade


A produção legislativa deve respeitar aquilo determinado na Constituição da
República. Uma norma que tenha desrespeitado o processo legislativo será inválida,
padecendo de inconstitucionalidade formal. MARCELO NOVELINO lembra que tal tipo
de inconstitucionalidade recebe o nome de “inconstitucionalidade nomodinâmica” 13.
E a própria inconstitucionalidade formal se desmembra em três espécies.
Espécie primeira — inconstitucionalidade formal orgânica: é aquela que
ocorre quando há descumprimento de regras de competências previstas na Constituição da
República. Exemplo claro disso seria uma Lei Estadual tipificando criminalmente uma
conduta qualquer, porque a União, e apenas ela, poderá legislar sobre direito penal (art. 22,
inciso I).
Espécie segunda — inconstitucionalidade formal por descumprimento
de pressupostos objetivos: ocorre quando algum requisito contextual de produção
legislativa, indicado na Constituição da República, é desrespeitado. O exemplo mais famoso
certamente reside na Medida Provisória eventualmente criada sem observância dos
requisitos de relevância e de urgência (art. 62, caput: “em caso de relevância e urgência, o

12
DELGADO, José Augusto. Lei inconstitucional (sua caracterização). In: CLÈVE, Clèmerson Melin;
BARROSO, Luís Roberto. Doutrinas Essenciais – Direito Constitucional, v. 5. Defesa da Constituição. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 405-406.
13
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 195.
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Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo
submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”).
Espécie terceira — inconstitucionalidade formal propriamente dita ou
stricto sensu: é a mais famosa, não por acaso a mais lembrada por todos nós. Haverá
inconstitucionalidade formal stricto sensu quando violada alguma regra do processo
legislativo, o que acaba abrangendo qualquer afronta aos arts. 59 a 69 da Constituição da
República.
Será subjetiva se o descumprimento se ligar à fase de iniciativa. P. ex.: Lei “X”
era de iniciativa privativa do Presidente da República, mas acabou sendo concebida, no
Congresso Nacional, por algum parlamentar. Aliás, vale lembrar, aqui, a redação contida
no art. 61, § 1.º, da Constituição da República:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a


qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado
Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao
Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-
Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta
Constituição.
§ 1.º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:
I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;
II - disponham sobre:
a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração
direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;
b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e
orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos
Territórios;
c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico,
provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União,
bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da
Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;
e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública,
observado o disposto no art. 84, VI; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 32, de 2001)
f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de
cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência
para a reserva. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
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Não sem razão, o Supremo Tribunal Federal entendeu pela inconstitucionalidade


de lei gaúcha que trazia procedimentos para contratação de servidores temporários,
vinculando o Poder Executivo, justamente porque a norma impugnada decorria de emendas
parlamentares (partiu dos Deputados Estaduais da Assembleia do Rio Grande do Sul, e não
do Chefe do Executivo), sendo que tal tema não está “incluído entre aqueles cujos projetos
de lei são de iniciativa privativa do Governador do Estado”14. Nesta esteira, o STF já teve a
oportunidade de decidir que “a iniciativa legislativa, no que respeita à criação de conta única
de depósitos judiciais e extrajudiciais, cabe ao Poder Judiciário. A deflagração do processo
legislativo pelo chefe do Poder Executivo consubstancia afronta ao texto da Constituição do
Brasil”15.
Confira-se outras ementas envolvendo nulificações por conta de desrespeito à
iniciativa privativa:

É inconstitucional, por extravasar os limites do inciso II do art. 96 da


Constituição Federal, lei que institui Sistema de Gerenciamento dos
Depósitos Judiciais, fixa a destinação dos rendimentos líquidos
decorrentes da aplicação dos depósitos no mercado financeiro e atribui
ao Fundo de Reaparelhamento do Poder Judiciário a coordenação e o
controle das atividades inerentes à administração financeira de tal
sistema. Matéria que não se encontra entre aquelas reservadas à iniciativa
legislativa do Poder Judiciário16.

Tratando-se de projeto de lei de iniciativa privativa do chefe do Poder


Executivo, não pode o Poder Legislativo assinar-lhe prazo para o
exercício dessa prerrogativa sua. Não havendo aumento de despesa, o
Poder Legislativo pode emendar projeto de iniciativa privativa do chefe
do Poder Executivo, mas esse poder não é ilimitado, não se estendendo
ele a emendas que não guardem estreita pertinência com o objeto do
projeto encaminhado ao Legislativo pelo Executivo e que digam respeito
a matéria que também é da iniciativa privativa daquela autoridade17.

Inconstitucionalidade formal. Vício de iniciativa. Competência privativa


do Poder Executivo municipal. Não ocorrência. Não usurpa a
competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que, embora crie
despesa para a Administração Pública, não trata da sua estrutura ou da

14
STF, ADIn n.º 2.583/RS. Rel.ª Min.ª CÁRMEN LÚCIA, Plenário. Julgado em 1.º de agosto de 2011.
15
STF, ADIn n.º 3.458-8/GO. Rel. Min. EROS GRAU, Plenário. Julgado em 21 de fevereiro de 2008.
16
STF, ADIn n.º 2.909/RS. Rel. Min. AYRES BRITTO, Plenário. Julgado em 12 de maio de 2010.
17
STF, ADIn n.º 546-4/DF. Rel. Min. MOREIRA ALVES, Plenário. Julgado em 11 de março de 1999.
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atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores


públicos18.

Viola a cláusula de reserva de iniciativa do chefe do Poder Executivo (art.


61, § 1º, II, a, extensível aos Estados-membros por força do art. 25 da
CF) a concessão de gratificação a policiais militares integrantes de
assessoria militar junto ao Tribunal de Contas estadual. O exercício
funcional junto a outros órgãos ou Poderes não desnatura o vínculo entre
esses servidores e seu cargo e órgão de origem19.

À luz do princípio da simetria, é de iniciativa privativa do chefe do Poder


Executivo estadual as leis que disciplinem o regime jurídico dos militares
(art. 61, § 1º, II, f, da CF/1988). Matéria restrita à iniciativa do Poder
Executivo não pode ser regulada por emenda constitucional de origem
parlamentar20.

E será objetiva se o descumprimento estiver na fase constitutiva ou na fase


complementar do processo legislativo, a exemplo de um Projeto de Lei Complementar
eventualmente aprovado sem a maioria absoluta exigida pelo art. 69 da Constituição da
República (“as leis complementares serão aprovadas por maioria absoluta”).

Requisitos materiais de constitucionalidade


Como visto, os requisitos materiais de constitucionalidade abrangem juízo de
conteúdo, a própria matéria ou substância normativa. MARCELO NOVELINO salienta que tal
inconstitucionalidade também é chamada “inconstitucionalidade nomoestática” 21.
Há forte tendência no sentido de inserir, no bojo do controle de constitucionalidade
material, análises do conteúdo qualitativo de atos administrativos e de atuações outras do Poder
Público, com exame da proporcionalidade. O poder público não pode atuar com o manto dos
excessos, nem de forma insuficiente. Nesse sentido, temos o princípio da proporcionalidade
enquanto princípio da proibição do excesso e, também, enquanto princípio da proibição da proteção
insuficiente. Este estudo demanda uma apreciação dos três subprincípios da
proporcionalidade: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

18
STF, Repercussão Geral no RE com Agravo n.º 879.911/RJ. Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário.
Julgado em 29 de setembro de 2016
19
STF, ADIn n.º 5.004/AL. Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, Plenário. Julgado em 12 de abril de 2018.
20
STF, ADIn n.º 2.966-5/RO. Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Plenário. Julgado em 06 de abril de 2005.
21
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 196.
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Alguns sistemas de controle de constitucionalidade


verificados em nações do mundo
Sem pretensão exauriente, façamos um rápido estudo dos sistemas de controle de
constitucionalidade existente em alguns Países.

O sistema dos EUA


A tradição jurídica dos Estados Unidos da América tratou de gestar um controle
difuso de constitucionalidade. A doutrina aponta a célebre decisão do Juiz JOHN MARSHALL
no caso Marbury vs Madison, de 1803, como o precedente mais decisivo inerente ao controle
de constitucionalidade americano.
Como se sabe, o controle americano (judicial review) não foi instituído de forma
direta na Constituição escrita dos Estados Unidos. Na verdade, a possibilidade de controle
jurisdicional das leis dos EUA “resulta de uma construção pretoriana, armada num tempo
de extrema tensão política, no contexto de disputa de poder, logo no início da vida
republicana, entre os partidos Federalista, que dominava o Congresso Nacional e o
Executivo até as eleições de 1800, e o Republicano (ou Antifederalista) – aquele, não se
abstendo de se valer de meios radicais para manter a posição hegemônica” 22. No ano de
1800, os federalistas perderam as eleições para o Congresso e para a Presidência da
República23. O Chefe do Executivo eleito na ocasião foi THOMAS JEFFERSON (republicano).
Ele sucederia o Presidente JOHN ADAMS (que era federalista), e que teria o bastão do cargo
até o mês de março de 1801. Os federalistas aproveitaram o lapso faltante até a posse para
dominar o Poder Judiciário. “Aprovaram, então, uma Lei do Judiciário, que criava dezesseis
tribunais federais em vários pontos do território americano. Cuidaram de preencher as vagas
com partidários federalistas. Esses tribunais viriam a liberar os juízes da Suprema Corte
americana das cansativas viagens por todo o país, que lhes ocupava a maior parte do ano.
Essas viagens eram necessárias, porque eram os juízes da Suprema Corte que, na companhia
de juízes estaduais, julgavam apelações em casos federais nos Estados-membros. Os cargos
que se abriram nos novos tribunais federais eram vitalícios e poderiam, assim, abrigar
próceres entre os federalistas de modo irreversível pelo novo governo”24.

22
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 50.
23
A respeito, com grande riqueza de detalhes, cf. PASLEY, Jeffrey L. A Revolution of 1800 After All: The
Political Culture of the Earlier Early Republic and the Origins of American Democracy. Conferência de dez. 2000.
Disponível em http://www.pasleybrothers.com/jeff/writings/Pasley1800.htm.
24
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 50.
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O 2.º Presidente dos EUA, JOHN ADAMS, Vencedor das eleições de 1800, THOMAS
teria mandato até março de 1801. Ele era JEFFERSON era republicano e assumiria o
federalista. cargo apenas em março de 1801.

Os federalistas, cientes da mudança política operada pela eleição, aproveitaram os


momentos restantes até a posse dos novos eleitos para criação de “numerosos outros cargos
de menor importância, ligados ao Judiciário, contando-se entre eles mais de quarenta cargos
de juiz de paz no Distrito de Colúmbia, em que se situa a Capital dos EUA. O cargo de juiz
de paz não era vitalício, sendo promovido para mandato de cinco anos”. E, a três meses da
posse do eleito (THOMAS JEFFERSON, republicano), já em 1801, deparam-se com a vacância
do cargo de ninguém menos que o Presidente da Suprema Corte dos EUA. O Pres. ADAMS,
federalista, certamente aproveitaria a ocasião para a sua casta política. E ele “não viu
ninguém melhor para ocupá-lo do que o seu próprio Secretário de Estado”, a figura decisiva
de JOHN MARSHALL.
É engraçado... Citando ACKERMAN, nota PAULO GUSTAVO GONET BRANCO que o
escolhido de ADAMS não seria, na verdade, JOHN MARSHALL. A primeira escolha recaiu
sobre JOHN JAY, que teria recusado o posto diante do cansaço com as viagens pelo país a que
eram submetidos os juízes da Suprema Corte naquela época. Mas “a recusa se deu sem que
Jay soubesse que, dias depois, essas viagens seriam suprimidas pela Lei federalista do
Judiciário”25. Por um fator aparentemente simplório, pode ser que toda a história
constitucionalista fosse completamente diferente da atual!

25
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 50.
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Prosseguindo. MARSHALL, a pedido de ADAMS, desempenharia as funções de


Secretário de Estado até o dia antecedente à véspera da posse de THOMAS JEFFERSON. Assim,
seria de MARSHALL o papel de “apor selo nos diplomas de nomeação e encaminhá-los aos
nomeados para os novos cargos do Judiciário, procedimentos necessários para as posses
respectivas”26. Às pressas, foram feitas nomeações de juízes aos tribunais federais e, também,
àqueles juízes de paz (afinal, ADAMS encerraria o mandato em breve). Daí sucede a bizarra
alcunha dos “juízes da meia-noite”, pois algumas nomeações ocorreram na noite anterior à
posse dos republicanos – “considering the fact that the nominations took place shortly before the end
of the president’s term and were a kind of ‘gift’ for the newly elected president, they went down in
history under the name ‘Midnight Judges’”, como explica MONIKA WRZOSZCZYK27 (tradução:
“considerando o fato de as nomeações terem sido feitas nos últimos momentos antes do
mandato presidencial e de constituírem um ‘presente’ para o mais novo presidente eleito,
elas entraram para a história com o nome de ‘juízes da meia noite’”).
E aí começa a ficar mais claro o precedente Marbury vs. Madison. Um dos
empossados, naquele contexto apressado detrás das nomeações de meia-noite,
envolvia a figura de WILLIAM MARBURY, já que ele “fora indicado Juiz de Paz pelo
Presidente da República [vale lembrar: por ADAMS, já nos últimos momentos de seu mandato],
confirmado pelo Congresso, no seu último dia ainda federalista. O selo foi aposto pelo
Secretário John Marshall, mas o diploma deveria, depois disso, ser enviado ao nomeado, o
que terminou por ser esquecido, no tumulto do último dia do governo Adams”. Irritados
com tantas manobras federalistas, os republicanos chegaram ao poder já sedentos por ele,
“o que torna fácil compreender por que, quando Marbury cobrou o envio do ato já assinado
e aprovado pelo Congresso Nacional, o novo Secretário de Estado” (que era JAMES
MADISON), “instruído por Jefferson [o novo Presidente dos EUA], o recusasse
peremptoriamente”28.
O resto é a história sempre lembrada... WILLIAM MARBURY processou JAMES
MADISON (por isso, claro, Marbury vs Madison), com utilização de uma ação criada por lei de
1789, “que adicionara um writ of mandamus à lista das ações cometidas à competência
originária da Suprema Corte. Com isso, pretendia obter uma ordem para que Madison lhe
enviasse o diploma indispensável para a sua posse”29.

26
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 50.
27
WRZOSZCZYK, Monika. The idea of judicial review in the United States of America. The context of
creating and early judgments of the Supreme Court. Orbis Idearum, v. 7, 2019, p. 49.
28
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 51.
29
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 51.
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WILLIAM MARBURY JAMES MADISON

E, para ser mais preciso, um trecho fac-símile da própria decisão:

Para o Presidente eleito e agora já empossado, THOMAS JEFFERSON, não poderia a


Suprema Corte dos EUA obrigá-lo a praticar o pleito de WILLIAM MARBURY. Ao mesmo
tempo, o Congresso (que, agora, era dominado por republicanos) decidiu, em represália
política, alterar o calendário de funcionamento da Suprema Corte, atingindo justamente a
data agendada para julgamento do writ (ano de 1802). E pior: o Congresso resolveu revogar
aquela Lei do Judiciário que tornaria mais fácil e menos cansativa a vida dos juízes: eles
teriam que voltar a viajar por todo os EUA... O caos seria claro.
Além de tantos outros incidentes, chegamos ao decisivo ano de 1803. Foi neste
contexto intenso que a Suprema Corte dos EUA afirmou “o seu poder de declarar a
inconstitucionalidade das leis do Congresso Nacional e a superioridade da sua interpretação
da Constituição, deitando as bases do judicial review. Essa proclamação de força do Judiciário
não provocou reações incendiárias por conta da habilidade com que foi concatenada” 30.
Talvez tudo se explique pelo mérito da decisão. Alguém desavisado poderá pensar:
“JOHN MARSHALL certamente favoreceu WILLIAM MARBURY, já que era federalista”. Errado!

30
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 51-52.
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JOHN MARSHALL reconheceu que a retenção do título necessário para a posse de WILLIAM
MARBURY era inadequada, mas negou a ordem impetrada, argumentando que seu writ
foi gestado por uma lei ordinária, quando, na verdade, “a competência originária da Suprema
Corte estava fixada pela Constituição, não podendo ser alargada por diploma
infraconstitucional. A lei que o pretendesse fazer entraria em atrito com o Texto Magno.
Aqui, então, desenvolveu a tese de que a lei inconstitucional é inválida e de que cabe ao
Judiciário declará-la”31. LUIZ GUILHERME MARINONI escreveu, a respeito, o seguinte:

Ao analisar o ‘poder’ – a competência – da Suprema Corte para apreciar


e conceder o mandamus, Marbury viu conflito entre o § 13 do Judiciary
Act de 1789 e o art. 3.º da Constituição. O § 13 da Lei de 1789 alterou
a competência originária da Suprema Corte, atribuindo-lhe poder para
apreciar e julgar outras ações originárias, como a proposta por Marbury.
Marshall interpretou o art. 3.º da Constituição como norma que fixou e
limitou a competência originária da Suprema Corte, concluindo que o
Congresso poderia alterar apenas a sua competência recursal. Diante do
claro conflito entre o § 13 do Judiciary Act de 1789 e o art. 3.º da
Constituição, Marshall enfim chega à questão cuja solução outorgaria
imprevisível valor ao precedente: o problema passou a ser o de se a lei
que conflita com a Constituição é válida e a Suprema Corte possui poder
para invalidá-la ou, ao menos, deixar de aplica-la32.

Com habilidade política, o juiz JOHN MARSHALL acabou dando força para o Judiciário, que teria a
palavra final do controle de constitucionalidade.

31
GONET BRANCO, Paulo Gustavo. O valor da Constituição – perspectiva histórica. In: MENDES, Gilmar
Ferreira; ______. Curso de Direito Constitucional. 12.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 52.
32
MARINONI, Luiz Guilherme. Controle de Constitucionalidade. In: SARLET, Ingo Wolfgang; ______;
MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 2.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 811.
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No próprio julgado, lê-se o seguinte:

Trecho fac-símile da decisão. O destaque em vermelho, evidentemente, é de minha autoria.


Este pdf pode ser encontrado neste link: https://tile.loc.gov/storage-
services/service/ll/usrep/usrep005/usrep005137/usrep005137.pdf

MARCELO NOVELINO lembra, ainda, que antes mesmo de Marbury vs Madison


surgiram dois casos na jurisprudência americana que já teriam gestado a ideia do controle
difuso: i) Hayburn’s Case; e ii) o Case Hylton versus United States33. Mas é Marbury vs Madison,
mesmo, o precedente, no sentido jurídico e americano da palavra. Não sem razão, LUIZ
GUILHERME MARINONI aponta que Marbury vs Madison constitui o “precedente judicial no
qual a Suprema Corte norte-americana, pela primeira vez, reconheceu sua competência para
declarar inválidos atos legislativos contrários à Constituição”34. Igualmente, a autorizada
doutrina de NEIL MACCORMICK: Marbury vs Madison foi “o caso decisivo”35. Entre os
italianos, TANIA GROPPI também sugere que foi em Marbury vs Madison que “il controllo di
costituzionalità delle leggi era stato per la prima volta realizzato da un giudice, negli Stati Uniti,
nella forma del judicial review of legislation” (tradução: foi em Marbury vs Madison que o

33
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 205.
34
MARINONI, Luiz Guilherme. Controle de Constitucionalidade. In: SARLET, Ingo Wolfgang; ______;
MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 2.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 792.
35
MACCORMICK, Neil. Retórica e Estado de Direito. Uma Teoria da Argumentação Jurídica. Rio de Janeiro:
Editora Elsevier, 2008, p. 145.
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controle de constitucionalidade das leis foi pela primeira vez realizado por um juiz, nos
Estados Unidos, sob a forma do judicial review)36.
O controle de constitucionalidade consagrado nos Estados Unidos, de matiz
judicial, é difuso, feito diante da concretude (in concreto), pela via da defesa (através de
exceção), de forma incidental, no bojo de um processo subjetivo (“dentro da lide”, digamos
assim), com efeitos inter partes.

O sistema da Áustria
É impossível deixar citar HANS KELSEN no estudo do sistema austríaco de controle
de constitucionalidade e, de consequência, na própria análise do controle abstrato e
concentrado. Daí se falar, aliás, que ele foi o “pai intelectual” do modelo institucional não
só da Áustria, mas também da Alemanha (“der geistige Vater des österreichischdeutschen
Institutionsmodells”, como expressaram KRISZTA KOVÁCS e GÁBOR ATTILA TÓTH37). Aliás, o
nome de KELSEN também é tradicionalmente associado ao nascimento da primeira República
da Áustria: “nella ricca letteratura fiorita attorno alla sua opera, Hans Kelsen è stato spesso definito
«padre della Costituzione austriaca del 1920», «ideatore della Corte costituzionale»; il suo nome è
stato tradizionalmente associato alla nascita della prima Repubblica d’Austria e al sistema di controllo
giurisdizionale delle leggi”38.
HANS KELSEN nasceu em 1881, em Praga, região austríaca do Império Austro-
Húngaro. Com três anos de idade, KELSEN mudou-se com sua família para Viena, onde
cursaria direito. Na verdade, KELSEN desejava estudar filosofia, mas acabou decidindo pelas
ciências jurídicas. Inicialmente, KELSEN não demonstrava maior apreço pelo direito. Com o
passar do tempo, na graduação, KELSEN acabou demonstrando constante e crescente
interesse pela matéria, ao ponto de obter o doutorado em 1906. Sua Habilitation — o topo
do doutoramento da época — possibilitou-lhe ingressar na carreira acadêmica, logrando,
em 1911, a cadeira de Teoria do Estado e de Filosofia do Direito na Universidade de Viena.
Durante a 1.ª Guerra Mundial, KELSEN foi Ministro da Guerra; em 1918 tornou-se professor
associado de direito da U. de Viena. Depois da 1.ª Guerra, a República da Áustria logrou
sua independência como um país de fala alemã. Na época, KARL RENNER era o chanceler
daquele Estado, e, em governo provisório da Áustria, nomeou HANS KELSEN na tarefa de

36
GROPPI, Tania. Origini e caratteri della giustizia costituzionale in Europa. Napoli: Jovene, 2004.
37
KOVÁCS, Kristza; TÓTH, Gábor Attila. Aufstieg und Krise: Wirkung der deutschen
Verfassungsgerichtsbarkeit auf Ungarn. In: BOULANGER, Christian; SCHULZE, Anna, WRASE, Michael.
Die Politik des Verfassungsrechts. Interdisziplinäre und vergleichende Perspektiven auf die Rolle und Funktion von
Verfassungsgerichten. Recht und Gesellschaft - Law and Society, v. 6, 2013. p. 4.
38
LAGI, Sara. Kelsen e la Corte costituzionale austriaca: un percorso storico-politico (1918-1920). Giornale
di Storia costituzionale, Periodico del “Laboratorio Antoine Barnave”, n. 11, Università di Macerata, 2006, p.
165.
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ajudar a Áustria a redigir uma Constituição. Foi neste contexto que KELSEN estabeleceu a
ideia de uma Corte Suprema de caráter constitucional, com funções jurídicas específicas 39.
O resto é história... Ele, que foi o principal autor da Constituição de sua nação, teve chance de
assumir uma cadeira na Corte Austríaca que ele próprio concebeu, recusando a proposta do
Partido Social-Democrata de sua época:

Hans Kelsen, the main author of the Austrian Constitution, could have returned
to the Constitutional Court upon a proposal made by the Social-Democratic
Party, but vehemently refused to do so. He accepted a chair at the University of
Cologne and left Austria, profoundly embittered by personal attacks and the
circumstances of the Court’s depoliticisation40.

A previsão de HANS KELSEN, para a Constituição da Áustria de 1920, foi a de prever


um órgão judicial competente para proceder a verificação da constitucionalidade das normas
infraconstitucionais. Daí a criação de uma Corte específica para tanto: o
Verfassungsgerichtshof.

Prédio do Verfassungsgerichtshof, na Áustria.

39
Estas informações biográficas foram obtidas da nota introdutória de A. JAVIER TREVIÑO, tradutor da obra
Philosophischen Grundlagen der Naturrechtslehre und des Rechtspositivismus (a Teoria Geral do Direito e do Estado), de
HANS KELSEN, para o inglês (cf. KELSEN, Hans. General Theory of Law & State. Nova Brunswick e Nova Jersey:
Transaction Publishers, 2006, p. i-xxxiii).
40
VERFASSUNGSGERICHTSHOF ÖSTERREICH. Historic Case Law. 1927: Dispensation instead of
divorce. Disponível em https://tinyurl.com/y9cffe3s.
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Juízes do Verfassungsgerichtshof numa sessão.

Em HANS KELSEN, é clara a noção segundo a qual a jurisdição tem o condão de criar
o direito: há, nessa função estatal, uma atividade criativa. A unicidade da jurisdição, em
KELSEN, deriva justamente da sua visão de unicidade (Ausschliesslichkeit, nos textos originais),
também, daquilo que chama de “ordem soberana”. Um sistema jurídico é apegado a uma
ordem soberana (“no sentido próprio da palavra, que é a ordem total”), sendo impossível
que o atributo soberania pertença, “simultânea e igualmente, a vários sistemas de normas ou
a várias comunidades jurídicas”41. Por isso, todo sistema normativo é uno, único. É por isso
que HANS KELSEN falava do “princípio da não-contradição”, igualmente aplicável ao
“conhecimento normativo”42.
Esta forma de pensar gerou um sistema judicial de controle, de matiz concentrado,
onde apenas um órgão jurisdicional teria atribuição para tanto. O controle kelseniano é
abstrato (ou seja: em tese), pressupondo, inclusive, ações específicas. Logo, o controle
austríaco se dá pela via principal, sendo rotineira a menção doutrinária de que este controle
perfaz um processo objetivo (“sem lide”). A sentença terá efeitos erga omnes, vinculando toda
a máquina estatal. Embora as ações de controle brasileiro gerem efeitos ex tunc, o fato é que
a previsão originária de HANS KELSEN era um pouco diferente: na verdade, “a decisão de
inconstitucionalidade, no esquema kelseniano, não teria efeitos retroativos. A Corte
Constitucional, ao decidir pela inconstitucionalidade, expulsaria a norma do ordenamento
jurídico com eficácia ex tunc, a menos que a Corte entendesse que era o caso de manter a

41
KELSEN, Hans. Teoria Geral do Estado. Trad. Fernando de Miranda. Saraiva: 1938, p. 46.
42
KELSEN, Hans. Teoria Geral do Estado. Trad. Fernando de Miranda. Saraiva: 1938, p. 46.
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norma em vigor por período que não poderia superar um ano. Daí a Corte Constitucional
ser comparada a um ‘legislador negativo’”43.
O modelo austríaco teve muito sucesso, sendo adotado: a) pela Constituição da
Itália de 1948; b) pela Lei Fundamental Alemã de 1949; c) pelos países ibéricos na década
de 1970; d) por países da América Latina na década de 1980; e) pelo Leste Europeu e pela
África do Sul nos anos 199044.
Note-se que os casos citados não são “puros”, quero dizer, não são homogêneos
entre si. O sistema brasileiro de controle abstrato não é rigorosamente idêntico ao modelo
kelseniano (a começar pela diferença de efeitos da decisão: aqui, a regra é a eficácia ex tunc;
em KELSEN, a proposta foi ex nunc, como visto acima), embora haja inegável inspiração do
modelo adotado na Áustria.
Na Itália, e. g., a Corte Constitucional “atua, basicamente, por meio de ação direta
e em caráter incidental: no primeiro caso, diante de requerimento estatal contra as leis
regionais e de requerimento regional em face de leis estatais ou de outras regiões; no
segundo, mediante requerimento de qualquer juiz, no curso de um processo” 45. O efeito
decisional, segundo a Constituição Italiana, é ex nunc (o que mostra mais adesão ao sistema
de KELSEN): “quando la Corte dichiara l’illegittimità costituzionale di una norma di legge o di atto
avente forza di legge [134], la norma cessa di avere efficacia dal giorno successivo alla pubblicazione
della decisione” (art. 136), ou seja: “quando o Tribunal declara a ilegitimidade constitucional
de uma norma de lei ou de um ato tendo força de lei, a norma cessa de ter eficácia a partir
do dia seguinte à publicação da decisão”.
BRENO LOBATO CARDOSO notou que “mesmo na Áustria e nos Estados Unidos tem
se verificado que as teorias de Kelsen e Marshall têm sofrido atenuações”, e o julgamento
Linkletter vs Walker, de 1965, provaria este ponto de vista, já que, na ocasião, a Suprema
Corte dos EUA afirmou que “a Constituição não proíbe, nem exige o efeito retroativo. Ficou
decidido que a Corte determina se a aplicação do efeito retroativo ou prospectivo é
apropriada, levando-se em conta as reações e condutas particulares, os direitos reclamados,
enfim, trata-se de uma questão de política judiciária a ser analisada caso a caso”46.

43
MARINONI, Luiz Guilherme. Controle de Constitucionalidade. In: SARLET, Ingo Wolfgang; ______;
MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 2.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 817-
818.
44
MARINONI, Luiz Guilherme. Controle de Constitucionalidade. In: SARLET, Ingo Wolfgang; ______;
MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 2.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 820.
45
MARINONI, Luiz Guilherme. Controle de Constitucionalidade. In: SARLET, Ingo Wolfgang; ______;
MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 2.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 822.
46
CARDOSO, Breno Lobato. A necessária modulação dos efeitos na declaração de inconstitucionalidade de
incentivos fiscais de ICMS decorrentes da guerra fiscal. Revista Abradt Fórum de Direito Tributário - RAFDT,
Belo Horizonte, n.º 2, jul./dez. 2017, p. 82.
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De qualquer maneira, a previsão de uma Corte Constitucional para a Áustria divide


com o controle difuso dos Estados Unidos o posto de principais “protótipos” históricos de
institucionalização de controle de constitucionalidade no mundo47.

O sistema da França
O sistema francês tem algumas peculiaridades. A graduação brasileira geralmente
exibe os modelos estudados anteriormente (Áustria e Estados Unidos), numa ênfase
completamente natural, já que o controle judicial do Brasil é de tipo misto, ou seja, difuso e
concentrado a um só tempo.
Na França, a Constituição de 1958 (Constituição francesa da Quinta República) criou
o Conseil Constitutionnel, um órgão dotado de competências “para exercer o controle de
constitucionalidade de normas”48. Este órgão (Conselho Constitucional francês) é composto de
nove membros (nomeados), além dos membros vitalícios. Dos nomeados, três são
escolhidos pelo Presidente da República, três são escolhidos pelo Presidente da Assembleia
Nacional e três são escolhidos pelo Presidente do Senado. Os membros exercem mandato
de nove anos, sendo impossível, em regra, a recondução. Será possível recondução,
excepcionalmente, “se um membro tiver sido inicialmente nomeado para substituir outro e
o tempo de substituição for inferior a três anos (art. 12 da Ordonnance de 7 de novembro de
1958). Assim sendo, o tempo máximo de permanência no Conselho pode chegar a 12 anos”.
Há renovação de um terço dos membros a cada três anos. E, “além dos nove membros
indicados, os Presidentes da República tornam-se automaticamente membros vitalícios do
Conselho Constitucional após o fim de seus mandatos. Historicamente, só dois entre eles
(Vincent Auriol e René Coty) participaram efetivamente dos trabalhos do Conselho”49.

47
Assim: GAMPER, Anna; PALERMO, Francesco. The Constitutional Court of Austria: Modern Profiles
of an Archetype of Constitutional Review. Journal of Comparative Law, 2008, n. 3, p. 61.
48
LUNARDI, Soraya Gasparetto. Controle de constitucionalidade na França: vantagens e inovações. Revista
Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte, n. 103, jul./dez. 2011, p. 288.
49
LUNARDI, Soraya Gasparetto. Controle de constitucionalidade na França: vantagens e inovações. Revista
Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte, n. 103, jul./dez. 2011, p. 288.
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Fachada do Conseil Constitutionnel francês.

Diferentemente do Brasil que, em tese, exige “notório saber jurídico” para que
alguém ocupe o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, “aos membros designados
para o Conselho Constitucional não é feita nenhuma exigência nem é imposta condição
objetiva de conhecimento jurídico-constitucional. Vale a vontade política de quem os
nomeia e falta qualquer possibilidade jurídica de controle da nomeação por outras
autoridades”50. Como se nota, o sistema francês é essencialmente político. Além de
tantas peculiaridades (bem exploradas por SORAYA GASPARETTO LUNARDI, sendo
recomendável leitura integral de seu texto referenciado neste trabalho), pode-se dizer que
o controle francês: a) tem viés preventivo; b) deve ser provocado; c) admite alguns controles
repressivos; d) admite controles oficiosos, conforme o caso; e e) tem um parâmetro
alargado, pois abrange a própria Constituição francesa e o chamado bloc de constitutionnalité
(bloco de constitucionalidade)51, que, por decisão de 27 de dezembro de 1973, abrange
princípios da Declaração de Direitos do Homem (1789), além dos preâmbulos das
Constituições de 1946 e de 1958. “Portanto, a criação do bloc ampliou sensivelmente as
possibilidades do controle, na medida em que a obra ordinária do Parlamento passou a ser

50
LUNARDI, Soraya Gasparetto. Controle de constitucionalidade na França: vantagens e inovações. Revista
Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte, n. 103, jul./dez. 2011, p. 289.
51
Cf. FAVOREU, Louis; PHILIP, Loïc. Les grandes décisions du Conseil constitutionnel. 8.ª ed. Paris: Dalloz,
1995, p. 277 em diante.
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confrontada com normas supraconstitucionais de ambição e aceitação universais, muitas


delas já fazendo parte da consciência político-filosófica de boa parte do mundo”52.
O assunto é bem resumido por MICHEL TROPER:

Desta feita, a famosa decisão pela qual o Conselho Constitucional incluiu


na Constituição aquelas regras que não estão explicitamente escritas no
documento constitucional está definitivamente pautada em uma
interpretação do termo “Constituição” do art. 61. De acordo com o art.
61, “Leis Institucionais, anteriormente à sua promulgação, bem como as
regras e procedimentos das Assembléias Parlamentares, antes que sejam
promulgadas, deverão ser submetidas ao Conselho Constitucional, o
qual deverá decidir acerca de suas conformidades com a Constituição”.
Mas, em 1971, o Conselho decidiu controlar a conformidade de uma lei
não apenas com os artigos enumerados da Constituição, mas também
com o seu preâmbulo e todos os princípios, escritos ou não, aos quais se
referia o preâmbulo, particularmente os princípios fundamentais
reconhecidos pelas leis da República, i. e., reconhecidos pelas leis
ordinárias, as quais são, desta feita, promovidas à mesma estatura das
normas constitucionais [16 de julho de 1971 Décision n. 71-44 DC, Loi
complétant les dispositions des articles 5 et 7 de la loi du 1er juillet 1901 relative
au contrat d'association, Recueil 29; RJC 1-24; Louis Favoreu, Loic Philip, Les
Grandes Décisions du Conseil Constitutionnel 19 (11 ed., 2001)]. Desta feita,
posteriormente, o termo “Constituição” passou a significar toda a
coleção de normas constitucionais, o que é chamado pelo Direito
Constitucional francês como “bloc de constitutionnalité”53.

O sistema do Brasil
O Brasil é, mesmo, um país curioso. Na teoria das ações, os processualistas
(inspirados nos italianos, é verdade — ENRICO TULLIO LIEBMAN) encamparam um conceito
“misto” ou “eclético”, suavizando a abstração do direito subjetivo de ação. Com o controle
de constitucionalidade judicial não seria diferente: inicialmente, por marcante influência de
RUI BARBOSA, a Constituição da República de 1891 encampou um controle difuso 54. Ele,
“que postulava a democracia federativa ligada à independência dos três Poderes, em face da
impossibilidade de contar com o Parlamento, proporia como freio ao Executivo a criação
de um poder Judiciário forte. O Judiciário seria fundamentado no modelo americano”55.

52
GOMES, Joaquim B. Barbosa. A quebra de mais um tabu no mundo jurídico: implantação e evolução da
jurisdição constitucional na França. Interesse Público - IP, Belo Horizonte, n.º 19, mai./jun. 2003.
53
TROPER, Michel. Interpretação constitucional. Revista Brasileira de Estudos Constitucionais – RBEC,
Belo Horizonte, n.º 7, jul. 2008.
54
Recomenda-se, a respeito: VIANA FILHO, Luiz. A vida de Rui Barbosa. São Paulo: Martins Fontes, 1965.
55
ROCHA, Leonel Severo. A Institucionalização do Republicanismo no Brasil: o papel de Rui Barbosa na
Constituição de 1891. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; STRECK, Lenio Luiz (orgs.). Entre Discursos
e Culturas Jurídicas. Coimbra: Coimbra editora, 2006, p. 65.
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Com o avançar da história, porém, acabamos criando um sistema misto, já que o


ordenamento brasileiro adere, a um só tempo, o controle difuso e concreto (tipicamente
americano) e um controle concentrado e abstrato (gestado na Áustria).
Este estudo abrange, com maior densidade, o controle judicial e repressivo.
Nada impede, contudo, um rápido deslumbrar de controles brasileiros mais sutis: i) o
controle político preventivo; ii) o controle político repressivo; e iii) o controle judicial
preventivo.

O controle político preventivo


O controle político e preventivo é feito pelos Poderes Legislativo e Executivo,
ainda no rito procedimental de confecção da lei. A atuação é preventiva justamente por ocorrer
durante o processo legislativo. É fácil notar, assim, que “o objetivo do controle preventivo é
impedir, vedar ou dificultar a vigência de normas indubitavelmente inconstitucionais; é
evitar que um ato jurídico inconstitucional, especialmente uma norma inconstitucional,
venha a ser promulgada e se torne válida e eficaz”56.
No Brasil, pode-se afirmar que este controle é feito, primordialmente, pelas
Comissões de Constituição e Justiça (presentes na Câmara dos Deputados e no Senado Federal),
e pelos vetos presidenciais, tratados pelo § 1.º do art. 66 da Constituição da República: “se o
Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou
contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis,
contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao
Presidente do Senado Federal os motivos do veto”.

O controle político repressivo


O controle político e repressivo é feito pelo Poder Legislativo, pelo Poder
Executivo e pelo Tribunal de Contas.
Dois exemplos de atuação política e repressiva pelo Poder Legislativo residem na
própria Constituição da República: a rejeição de Medidas Provisórias após deliberações em
cada uma das Casas do Congresso Nacional (§ 5.º do art. 62); e a competência exclusiva do
Congresso Nacional de sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do
poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa (inciso V do art. 49).

56
CUNHA FERRAZ, Anna Candida da. Notas sobre o controle preventivo de constitucionalidade. Revista
de Informação Legislativa, Brasília, n.º 142, abr./jn. 1999, p. 281.
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Quanto ao controle repressivo e político do Poder Executivo, entende-se, até na


jurisprudência, que “o Poder Executivo deve negar a execução a ato normativo que lhe
pareça inconstitucional”57. Em sede doutrinária, alguns administrativistas também
defenderam este entendimento, a exemplo de HELY LOPES MEIRELLES58 e de GUSTAVO
BINENBOJM59. O assunto, contudo, é bastante complexo, sendo inseguro cravar, num
pequeno curso como este, que há posição firmada neste ou naquele sentido.
Finalmente, o Supremo Tribunal Federal tradicionalmente reconhecia a
possibilidade de o Tribunal de Contas proceder com controle político e repressivo. Neste
sentido, lê-se do enunciado n.º 347 da súmula de sua jurisprudência dominante, justamente,
que “o Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a
constitucionalidade das leis e dos atos do poder público”. Mas tal entendimento vem
sofrendo abalos no STF, ainda que tímidos. P. ex.: em dezembro de 2017, o Min.
ALEXANDRE DE MORAES, em decisão monocrática proferida nos autos de MC no MS n.º
34.410, sustentou a tese de que é inconcebível “a hipótese do Tribunal de Contas da União,
órgão sem qualquer função jurisdicional, permanecer a exercer controle difuso de
constitucionalidade nos julgamentos de seus processos, sob o pretenso argumento de que
lhe seja permitido em virtude do conteúdo da Súmula 347 do STF, editada em 1963, cuja
subsistência, obviamente, ficou comprometida pela promulgação da Constituição Federal
de 1988”. Em decisão anterior, de 2006, o Min. GILMAR MENDES também sinalizou que “a
própria evolução do sistema de controle de constitucionalidade no Brasil, verificada desde
então, está a demonstrar a necessidade de se reavaliar a subsistência da Súmula 347 em face
da ordem constitucional instaurada com a Constituição de 1988” (autos da MC no MS n.º
25.888, decisão de 22 de março de 2006). Oficialmente, o verbete sumular não foi
cancelado, sendo observado por outros membros da Corte, como se nota de decisão
monocrática do Min. MARCO AURÉLIO, nos autos da MC no MS n.º 31.439, onde se diz que
“descabe a atuação precária e efêmera afastando do cenário jurídico o que assentado pelo
Tribunal de Contas da União. A questão alusiva à possibilidade de este último deixar de
observar, ante a óptica da inconstitucionalidade, certo ato normativo há de ser apreciada em
definitivo pelo Colegiado, prevalecendo, até aqui, porque não revogado, o Verbete 347 da
Súmula do Supremo. De início, a atuação do Tribunal de Contas se fez considerado o
arcabouço normativo constitucional” (decisão de 19 de julho de 2012).

57
STJ, REsp n.º 23.121/GO. Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, 1.ª Turma. Julgado em 06 de
outubro de 1993.
58
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 10.ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 538.
59
BINENBOJM, Gustavo. A Nova Jurisdição Constitucional Brasileira – Legitimidade democrática e instrumentos de
realização. 4.ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2014, p. 276.
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O controle judicial preventivo


Mais raramente, é possível que haja um controle judicial no iter de produção da
norma. Como ainda não houve o desfecho do processo legislativo, a doutrina chama este
controle de “preventivo”, já que atinge o próprio projeto divulgado pelo Legislador. Segundo
o Supremo Tribunal Federal, a legitimidade ativa para buscar este tipo de controle é, tão-
somente, do parlamentar, que terá de provocar a jurisdição constitucional com um mandado
de segurança60. Advirta-se que esta via preventiva é excepcionalíssima, deixando o STF
claro o seguinte:

Constitucional. Mandado de segurança. Controle preventivo de


constitucionalidade material de Projeto de Lei. Inviabilidade.
1. Não se admite, no sistema brasileiro, o controle jurisdicional de
constitucionalidade material de projetos de lei (controle preventivo de
normas em curso de formação). O que a jurisprudência do STF tem
admitido, como exceção, é “a legitimidade do parlamentar - e somente
do parlamentar - para impetrar mandado de segurança com a finalidade
de coibir atos praticados no processo de aprovação de lei ou emenda
constitucional incompatíveis com disposições constitucionais que
disciplinam o processo legislativo” (MS 24.667, Pleno, Min. Carlos
Velloso, DJ de 23.04.04). Nessas excepcionais situações, em que o vício
de inconstitucionalidade está diretamente relacionado a aspectos formais
e procedimentais da atuação legislativa, a impetração de segurança é
admissível, segundo a jurisprudência do STF, porque visa a corrigir vício
já efetivamente concretizado no próprio curso do processo de formação
da norma, antes mesmo e independentemente de sua final aprovação ou
não.
2. Sendo inadmissível o controle preventivo da constitucionalidade
material das normas em curso de formação, não cabe atribuir a
parlamentar, a quem a Constituição nega habilitação para provocar o
controle abstrato repressivo, a prerrogativa, sob todos os aspectos mais
abrangente e mais eficiente, de provocar esse mesmo controle
antecipadamente, por via de mandado de segurança.
3. A prematura intervenção do Judiciário em domínio jurídico e político
de formação dos atos normativos em curso no Parlamento, além de
universalizar um sistema de controle preventivo não admitido pela
Constituição, subtrairia dos outros Poderes da República, sem
justificação plausível, a prerrogativa constitucional que detém de debater
e aperfeiçoar os projetos, inclusive para sanar seus eventuais vícios de
inconstitucionalidade. Quanto mais evidente e grotesca possa ser a
inconstitucionalidade material de projetos de leis, menos ainda se deverá
duvidar do exercício responsável do papel do Legislativo, de negar-lhe
aprovação, e do Executivo, de apor-lhe veto, se for o caso. Partir da
suposição contrária significaria menosprezar a seriedade e o senso de
responsabilidade desses dois Poderes do Estado. E se, eventualmente,

60
STF, MS n.º 24.642/DF. Rel. Min. CARLOS VELLOSO, Plenário. Julgado em 18 de fevereiro de 2004.
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um projeto assim se transformar em lei, sempre haverá a possibilidade


de provocar o controle repressivo pelo Judiciário, para negar-lhe
validade, retirando-a do ordenamento jurídico.
4. Mandado de segurança indeferido61.

Controle de constitucionalidade difuso e concreto


A esta altura, não será surpreendente para o aluno atento que o controle difuso é
realizado concretamente, por qualquer magistrado, pela via da exceção (defesa),
incidentalmente, no bojo de um litígio. É tradicional no sistema brasileiro, já que teve
previsão expressa na Constituição Federal de 1891. Aliás, “desde então, vigora no Brasil o
controle de constitucionalidade difuso, sendo pacificamente aceito o poder dos juízes para
dizer se o ato normativo está em conformidade ou não com a Lei Suprema”62.
Naturalmente, poderão as partes de qualquer processo invocar a tese da
inconstitucionalidade concreta. O controle também é franqueado ao Ministério Público
(fiscal que é da ordem jurídica), além de poder ser realizado oficiosamente pelo magistrado.
É importante frisar que, nos Tribunais, o controle difuso precisa observar a regra
contida no art. 97 da Constituição da República, i. e., a cláusula de reserva de
plenário. Segundo tal dispositivo, “somente pelo voto da maioria absoluta de seus
membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”. A exigência de reserva de
plenário sempre é lembrada no contexto do controle difuso, mas é de bom alvitre salientar
que o Supremo Tribunal Federal já cravou a necessidade de observá-la, também, no controle
concentrado63.
A respeito do tema, escreveram GILMAR FERREIRA MENDES e LENIO LUIZ STRECK
o seguinte:

O art. 97 da Constituição de 1988 contém comando peremptório no


sentido de exigir que a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato
normativo somente ocorra pelo voto da maioria absoluta dos membros
do tribunal julgador. O dispositivo, em verdade, incorpora a regra do
full bench, full court ou en banc criada pela jurisprudência norte-americana
no século XIX como uma existência de prudência e até mesmo de

61
STF, MS n.º 32.033/DF. Rel. orig. Min. GILMAR MENDES; Rel. p/ Acórdão Min. TEORI ZAVASCKI,
Plenário. Julgado em 20 de junho de 2013.
62
MARQUES, Andreo Aleksandro Nobre. Evolução do instituto do controle de constitucionalidade no
Brasil. Da Constituição Imperial à Emenda Constitucional n.º 45/2004. Revista de Informação Legislativa,
Brasília, n.º 170, abr./jun.2006, p. 18.
63
STF, RE n.º 240.096-2/RJ. Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, 1.ª Turma. Julgado em 30 de março de
1999.
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autorrestrição (self restraint) dos tribunais no enfrentamento de questões


constitucionais.
Desde a ainda incipiente prática da judicial review, os tribunais norte-
americanos constataram a importância de seguir essa orientação, que
surgiu muito mais como uma regra de conveniência (rule of propriety) do
que como uma obrigação constitucional. A real possibilidade de que o
precedente firmado com “quorum” mínimo fosse posteriormente revisto
com a presença da totalidade dos membros do tribunal, assim como a
dificuldade que decisões assim tomadas tinham para formar stare decisis,
constituíram, inicialmente, razões decisivas para o surgimento dessa
orientação jurisprudencial nos tribunais norte-americanos64.

Há quem critique a ideia da reserva de plenário, como se nota dos escritos de FÁBIO
CARVALHO LEITE: “é chegado o momento de lançarmos um olhar crítico sobre esta regra,
cuja prática tem revelado dificuldades e problemas de ordem democrática que a sua
irretocável teoria oculta e – vou além – que até comprometem a legitimidade de que ela
aparentemente se reveste”65. Justificando sua proposta, o autor também dá o interessante (e
realmente instigante) exemplo do Tribunal de Justiça São Paulo:

Tomemos como exemplo o Tribunal de Justiça de São Paulo, cujo pleno


conta com 355 desembargadores, e o órgão especial, com 25. No âmbito
desta Corte, se 13 desembargadores que integram o referido órgão
(maioria absoluta) entenderem que uma lei é inconstitucional, esta será
“a posição do Tribunal”, ainda que (hipoteticamente) todos os outros 342
desembargadores que integram o mesmo tribunal entendam de outra
forma – e com a agravante, deve-se lembrar, de que as leis presumem-
se constitucionais. Ou seja, o controle é exercido por uma minoria, e
seu resultado, imposto à maioria. A diferença, convenhamos, é gritante
– de modo que, para os fins do presente estudo, e nos momentos em
que for relevante ressaltar a diferenciação, chamarei de “cláusula de
reserva de órgão especial” a regra prevista no art. 97 da CRFB quando o
controle de constitucionalidade for exercido por este órgão66.

De qualquer maneira, a ideia ainda é consagrada no texto constitucional brasileiro,


razão pela qual há necessidade de vislumbrá-la dogmaticamente. Aliás, entende-se até que
da decisão que declara inconstitucionalidade de lei federal sem observância de reserva de

64
MENDES, Gilmar Ferreira; STRECK, Lenio Luiz. Comentário ao art. 97. In: CANOTILHO, José
Joaquim Gomes; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK; Lenio Luiz (coords.).
Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 1.333.
65
LEITE, Fábio Carvalho. Pelo fim da “Cláusula de Reserva de Plenário”. Direito, Estado e Sociedade, n.º 40,
jan./jun. 2012, p. 92.
66
LEITE, Fábio Carvalho. Pelo fim da “Cláusula de Reserva de Plenário”. Direito, Estado e Sociedade, n.º 40,
jan./jun. 2012, p. 93.
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plenário, caberá Recurso Extraordinário para nulificação do decisum afrontoso67. Em termos


procedimentais, aliás, há agora os arts. 948 a 950 do Código de Processo Civil de 2015.
Num fluxograma, a reserva de plenário seguirá, basicamente, o seguinte:

A parte alega a inconstitucionalidade de


uma norma


O relator, depois de ouvir o Ministério
Público e as partes, submeterá a questão à
Turma ou à Câmara à qual competir o
conhecimento do processo


A arguição pode ser... REJEITADA, caso em que o
processo prosseguirá normalmente para o
julgamento

ACOLHIDA, de maneira que


o órgão reconhece que o assunto merece
ser levado ao plenário (ou órgão especial)
deve, mesmo, passar por exame de
(in)constitucionalidade


Cópia do acórdão é encaminhada
para os julgadores
Se acolhida...
O presidente do Tribunal designará
uma data para a sessão de julgamento

67
STF, RE n.º 432.884/GO. Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, 2.ª Turma. Julgado em 26 de junho de 2012.
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Observações:
• os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão
especial a arguição de inconstitucionalidade quando já houver
pronunciamento destes ou do plenário do STF sobre a questão;
• nada impede que as pessoas jurídicas de direito público responsáveis pela
edição do ato questionado possam manifestar-se no incidente de
inconstitucionalidade se assim o requererem, observados os prazos e as
condições previstos no regimento interno do tribunal;
• a parte legitimada à propositura das ações previstas no art. 103 da
Constituição da República poderá manifestar-se, por escrito, sobre a questão
constitucional objeto de apreciação, no prazo previsto pelo regimento
interno, sendo-lhe assegurado o direito de apresentar memoriais ou de
requerer a juntada de documentos; e
• considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes,
o relator poderá admitir, por despacho irrecorrível, a manifestação de outros
órgãos ou entidades.

Como se percebe, “o pronunciamento do plenário ou do órgão especial deve se


restringir à análise da inconstitucionalidade da lei em tese (antecedente), sendo o julgamento
do caso concreto feito pelo órgão fracionário (consequente), com base naquele
pronunciamento”68.
É importante salientar que “a cláusula de reserva de plenário dirige-se somente aos
tribunais. Não se aplica às decisões de juízes singulares nem de juizados especiais” 69. Neste
sentido, decidiu-se, justamente, que “o art. 97 da Constituição, ao subordinar o
reconhecimento da inconstitucionalidade de preceito normativo a decisão nesse sentido da
“maioria absoluta de seus membros ou dos membros dos respectivos órgãos especiais”, está
se dirigindo aos Tribunais indicados no art. 92 e aos respectivos órgãos especiais de que trata
o art. 93, XI. A referência, portanto, não atinge juizados de pequenas causas (art. 24, X) e
juizados especiais (art. 98, I), os quais, pela configuração atribuída pelo legislador, não
funcionam, na esfera recursal, sob regime de plenário ou de órgão especial”70. Afirma-se,
também, que “no Supremo Tribunal Federal, há decisão considerando dispensável a
observância desta regra quando do julgamento de recurso extraordinário”71. Embora já tenha

68
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 210.
69
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 210.
70
STF, AgRg no RE com Agravo n.º 792.562/SP. Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, 2.ª Turma. Julgado em 18
de março de 2014.
71
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 210-211.
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sido reconhecida repercussão geral sobre o assunto72, sem fixação definitiva da tese, o fato
é que o STF parece, sempre, reconhecer que as Turmas poderão, isoladamente, decidir pela
inconstitucionalidade sem necessidade de “verificação” do Plenário. Neste sentido, veja-se o
trecho da ementa adiante:

O STF exerce, por excelência, o controle difuso de constitucionalidade


quando do julgamento do Recurso Extraordinário, tendo os seus
colegiados fracionários competência regimental para fazê-lo sem ofensa
ao art. 97 da Constituição Federal73.

Ainda no tocante à reserva de plenário, é importante lembrar que o STF fixou


entendimento segundo o qual “viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a
decisão de órgão fracionário de Tribunal que, embora não declare expressamente a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no
todo ou em parte” (Súmula Vinculante n.º 10). O entendimento sempre foi tradicional na
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que reputa como “declaratório de
inconstitucionalidade o acórdão que – embora sem o explicitar – afasta a incidência da
norma ordinária pertinente à lide para decidi-la sob critérios diversos alegadamente
extraídos da Constituição”74. Enfim: “ao dispor sobre o afastamento da incidência no todo ou
em parte, o enunciado deixa clara a necessidade de submeter a questão ao plenário não apenas
quando do reconhecimento da inconstitucionalidade de toda a lei ou ato normativo, mas
também quando este juízo decidir sobre alguns dos dispositivos (artigos, parágrafos, alíneas,
incisos), palavras ou expressões nele contidas”75.
Em arremate, também é preciso deixar claro alguns aspectos analíticos
importantes: a reserva de plenário se impõe para a declaração da INCONSTITUCIONALIDADE.
Por isso, é perfeitamente possível declarar a constitucionalidade sem necessidade de seguir o
fluxo procedimental acima estudado. Também não há necessidade de reserva de plenário
quando o julgador realiza técnica de intepretação conforme. Finalmente, não se impõe
reserva de plenário para casos nos quais há análise de recepção ou não de normas pretéritas
ao texto constitucional reinante.

72
STF, Repercussão Geral no AI n.º 838.188/RS. Rel. Min. CEZAR PELUSO, Plenário. Julgado em 23 de
junho de 2011.
73
STF, EDcl no RE n.º 361.829/RJ. Rel.ª Min.ª ELLEN GRACIE, 2.ª Turma. Julgado em 02 de março de
2010.
74
STF, RE n.º 240.096-2/RJ. Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, 1.ª Turma. Julgado em 30 de março de
1999.
75
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 211.
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Eficácia da decisão proferida no contexto do controle


difuso concreto
Como se sabe, os efeitos da decisão proferida em sede de controle difuso e concreto
são ex tunc e inter partes (regra). Nada impede modulação eficacial sobre aspectos temporais
por razões de segurança jurídica, como sucedeu no famosíssimo caso envolvendo o
Município de Mira Estrela/SP, que acabou fixando onze vereadores (quando, segundo as
normas vigentes, o máximo seria de nove). Como os onze já foram eleitos e já foram
diplomados, seria absurda decisão que pungisse efeitos ex tunc. Sendo assim, a situação
excepcional (aliás, excepcionalíssima) justificaria a modulação temporal do controle: efeitos
ex nunc, não ex tunc. Leia-se a ementa do caso:

Recurso Extraordinário. Municípios. Câmara de Vereadores.


Composição. Autonomia Municipal. Limites constitucionais. Número
de vereadores proporcional à população. CF, artigo 29, IV. Aplicação
de critério aritmético rígido. Invocação dos princípios da isonomia e da
razoabilidade. Incompatibilidade entre a população e o número de
vereadores. Inconstitucionalidade, incidenter tantum, da norma
municipal. Efeitos para o futuro. Situação excepcional.
1. O artigo 29, inciso IV, da Constituição Federal, exige que o número
de Vereadores seja proporcional à população dos Municípios,
observados os limites mínimos e máximos fixados pelas alíneas a, b e c.
2. Deixar a critério do legislador municipal o estabelecimento da
composição das Câmaras Municipais, com observância apenas dos limites
máximos e mínimos do preceito (CF, artigo 29) é tornar sem sentido a
previsão constitucional expressa da proporcionalidade.
3. Situação real e contemporânea em que Municípios menos populosos
têm mais Vereadores do que outros com um número de habitantes várias
vezes maior. Casos em que a falta de um parâmetro matemático rígido
que delimite a ação dos legislativos Municipais implica evidente afronta
ao postulado da isonomia.
4. Princípio da razoabilidade. Restrição legislativa. A aprovação de
norma municipal que estabelece a composição da Câmara de Vereadores
sem observância da relação cogente de proporção com a respectiva
população configura excesso do poder de legislar, não encontrando eco
no sistema constitucional vigente.
5. Parâmetro aritmético que atende ao comando expresso na
Constituição Federal, sem que a proporcionalidade reclamada traduza
qualquer afronta aos demais princípios constitucionais e nem resulte
formas estranhas e distantes da realidade dos Municípios brasileiros.
Atendimento aos postulados da moralidade, impessoalidade e
economicidade dos atos administrativos (CF, artigo 37).
6. Fronteiras da autonomia municipal impostas pela própria Carta da
República, que admite a proporcionalidade da representação política em
face do número de habitantes. Orientação que se confirma e se reitera
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segundo o modelo de composição da Câmara dos Deputados e das


Assembleias Legislativas (CF, artigos 27 e 45, § 1º).
7. Inconstitucionalidade, incidenter tantum, da lei local que fixou em 11
(onze) o número de Vereadores, dado que sua população de pouco mais
de 2600 habitantes somente comporta 09 representantes.
8. Efeitos. Princípio da segurança jurídica. Situação excepcional em que
a declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria
grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente. Prevalência do
interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro
à declaração incidental de inconstitucionalidade. Recurso extraordinário
conhecido e em parte provido76.

Havia debate relativamente acalorado a respeito do que se costuma denominar-se


“abstrativização do controle difuso” no caso do recurso extraordinário, cujo julgamento se
dá pelo Supremo Tribunal Federal, consoante art. 102, inciso III, da Constituição da
República. Ora, trata-se de tutela recursal vocacionada ao controle difuso no Supremo
Tribunal Federal. A partir da Emenda Constitucional n.º 45/2004, o recurso extraordinário
passou a exigir o requisito da repercussão geral, filtro de admissibilidade recursal que, para
GILMAR FERREIRA MENDES, acabou levando em si um desígnio dualizado: i) “o de assegurar
que ações sobre questões constitucionais incidentais – que, por sua irrelevância, não devem
ser analisadas pelo Supremo Tribunal –, efetivamente não sejam admitidas nesse tribunal e
alcancem um término mais rápido” e ii) “o de propiciar o desafogamento do Tribunal dos
inúmeros processos que são levados a ele inutilmente, permitindo que julgue, mais
celeremente, as questões sobre as quais deva se pronunciar”. Seria isso, prossegue GILMAR
FERREIRA MENDES, a confirmação de que a repercussão geral veio a admitir o que se
convencionou denominar de “feição objetiva do recurso extraordinário” 77. Em linha de
raciocínio parecida, LUIZ GUILHERME MARINONI e DANIEL MITIDIERO, citando MELVIN
EISENBERG, reconhecem duas funções primordiais dos tribunais: “(i) resolver controvérsias
(‘resolution of disputes’) e (ii) enriquecer o estoque de normas jurídicas (‘enrichment of the
supply of legal rules’)”, entrelaçando essa segunda função ao Supremo Tribunal Federal.
Essa forma de pensar — dizem, desta vez embasados por ANDRÉ TUNC — perfaz o
pensamento jurídico contemporâneo, que se inclina “firmemente nesse [...] sentido” 78. Ao
que parece, na linha de pensar de LUIZ GUILHERME MARINONI, essa tarefa também deveria
se destinar ao Superior Tribunal de Justiça79, embora este não seja o foco deste trabalho.

76
STF, RE n.º 197.917/SP. Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, Plenário. Julgado em 07 de maio de 2004.
77
MENDES, Gilmar Ferreira. A Reforma do Sistema Judiciário no Brasil: elemento fundamental para garantir
segurança ao investimento estrangeiro no País. Disponível em: http://goo.gl/Q9n9or. Acesso em 13 mai. 2020.
78
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Repercussão Geral no Recurso Extraordinário. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2012, p. 15-21.
79
Cf. MARINONI, Luiz Guilherme. O Superior Tribunal de Justiça enquanto Corte Suprema: de Corte de
Revisão para Corte de Precedentes. Disponível em: http://goo.gl/IGoQML. Acesso em 30 set. 2015.
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No texto acima referenciado, GILMAR FERREIRA MENDES noticia que a aplicação


deste requisito no juízo de admissibilidade do recurso extraordinário (repercussão geral)
acabou por significar, no ano de 2008, uma redução de 41,9% dos processos no STF. Sendo
assim, “na medida em que contribui para reduzir o número de processos que chegam à Corte
e para limitar o objeto dos julgamentos a questões constitucionais de índole objetiva, a nova
exigência da repercussão geral no recurso extraordinário abre promissoras perspectivas para
a jurisdição constitucional no Brasil, especialmente quanto à assunção, pelo Supremo
Tribunal Federal, do típico papel de verdadeiro tribunal constitucional [...]. Evidentes,
portanto, os benefícios deste instituto para a celeridade e efetividade da justiça e,
consequentemente, para o fomento da segurança jurídica no Brasil”80.
CEZAR PELUSO, por sua vez, escreveu que “o instituto da repercussão geral tem o
propósito de assegurar que a Corte Suprema brasileira, desafogada dos mais de cem mil
(100.000) recursos que lhe eram dirigidos anualmente, possa debruçar-se com mais
acuidade sobre os casos de reconhecido impacto sobre a sociedade como um todo”. Sendo
assim, a repercussão geral constituiu uma “alteração significativa no [...] recurso
extraordinário”, sendo ele um “filtro preliminar”, concebido “sob a clara inspiração do writ
of certiorari norte-americano, como requisito prévio que separa, por juízo discricionário e
irrecorrível do Supremo Tribunal Federal, as causas constitucionais relevantes, que
merecerão a análise da Corte, e as demais ações constitucionais que, por serem destituídas
de repercussão geral, serão indeferidas liminarmente e não terão o mérito analisado”81.
Tudo o que se disse acima reforçou a discussão a respeito do controle difuso
operado, pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de recurso extraordinário. Faria sentido
um recurso dotado de “repercussão geral” com eficácia decisional meramente inter partes? O
questionamento levou LUIZ GUILHERME MARINONI a afirmar que uma “decisão de questão
constitucional dotada de repercussão geral com efeitos não vinculantes constitui contradição
em termos”82.
A estrutura original da Constituição da República tinha (na verdade, tem) um
procedimento específico para a eficácia erga omnes da decisão de controle concreto do Supremo
Tribunal Federal: o art. 52, inciso X, prevê a competência privativa do Senado Federal para
“suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão
definitiva do Supremo Tribunal Federal”.
Conforme ANNA CANDIDA DA CUNHA FERRAZ, desde a introdução desta norma no
cenário constitucional do Brasil, várias teses foram formadas a respeito da natureza jurídica

80
MENDES, Gilmar Ferreira. A Reforma do Sistema Judiciário no Brasil: elemento fundamental para garantir
segurança ao investimento estrangeiro no País. Disponível em: http://goo.gl/Q9n9or. Acesso em 13 mai. 2020.
81
PELUSO, Cezar. Constituição, Direitos Fundamentais e Democracia: o Papel das Supremas Cortes.
Disponível em: http://goo.gl/5PF98g. Acesso em 13 mai. 2020.
82
MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 472.
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e do alcance do papel do Senado neste caso: 1.ª) a função senatorial seria a de “mera
publicidade” da decisão do STF, como defenderam LÚCIO BITTENCOURT e PEDRO CHAVES;
2.ª) o Senado não seria “mero cartório de registro das decisões de inconstitucionalidade do
STF”, conforme FRANCISCO CAVALCANTI PONTES DE MIRANDA, FERREIRA FILHO e PAULO
BROSSARD; 3.ª) a resolução senatorial é ato político, conforme certas decisões do STF; e
4.ª) o Senado exerce uma “função complementar”, não jurisdicional, mas “político-jurídico”
e “quase legislativo”83.
O passar dos anos revelou a posição maioral do Supremo Tribunal Federal que,
hoje, praticamente encerra a discussão: seria necessário proceder com uma “releitura” do
texto constitucional, impondo-se, na prática, uma “mutação constitucional”. A visão merece
críticas, porque, na realidade, trata-se de interpretação que, extrapolando as balizas textuais,
simplesmente emenda a Constituição com base numa vontade, numa “criatividade hermenêutica”. Ora,
“a mutação do art. 52, X, rompe completamente o sentido da norma ao esvaziar a
competência do Senado e desequilibra a relação entre os poderes, dando primazia desmedida
ao STF. É certo que a norma não se confunde com seu texto. No entanto, existe um limite
semântico que deve ser respeitado sob pena de se permitir arbitrariedades judiciais através de
uma interpretação que desborda do texto. Essa compreensão ainda tem como resultado o
reforço de um único modo de controle de constitucionalidade pelo STF (a abstrativização
do controle difuso e concreto e a objetivação do RE). Se o texto do art. 52, X é obsoleto ou
mau usado pelo Senado, não seria mais adequado reformá-lo por PEC?”84.
De qualquer modo, lê-se do Informativo n.º 886, do Supremo Tribunal Federal, que
a Corte realmente caminha para a abstrativização do controle difuso. O Min. CELSO DE MELLO
“considerou se estar diante de verdadeira mutação constitucional que expande os poderes
do STF em tema de jurisdição constitucional. Para ele, o que se propõe é uma interpretação
que confira ao Senado Federal a possibilidade de simplesmente, mediante publicação,
divulgar a decisão do STF. Mas a eficácia vinculante resulta da decisão da Corte. Daí se
estaria a reconhecer a inconstitucionalidade da própria matéria que foi objeto deste processo
de controle abstrato, prevalecendo o entendimento de que a utilização do amianto, tipo
crisotila e outro, ofende postulados constitucionais e, por isso, não pode ser objeto de
normas autorizativas”. A Min.ª CÁRMEN LÚCIA aduziu que o STF “está caminhando para uma
inovação da jurisprudência no sentido de não ser mais declarado inconstitucional cada ato
normativo, mas a própria matéria que nele se contém”. O Min. EDSON FACHIN “concluiu
que a declaração de inconstitucionalidade, ainda que incidental, opera uma preclusão

83
CUNHA FERRAZ, Anna Candida da. Comentário ao art. 52, X. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes;
MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK; Lenio Luiz (coords.). Comentários à
Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva/Almedina, 2013, p. 1.065-1.066.
84
FERNANDES, Bernardo Gonçalves; GODOY, Miguel Gualano de. Como o Supremo expandiu seus
poderes no caso do amianto? Jota Info, nov. 2019. Disponível em https://tinyurl.com/y724ffrq.
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consumativa da matéria. Isso evita que se caia numa dimensão semicircular progressiva e
sem fim”85.
Mesmo com a orientação atual do Supremo (que parece definitiva), ainda há algum
sentido prático na utilização de resolução, pelo Senado Federal, baseado no art. 52, inciso
X, da Constituição da República. O Decreto n.º 2.346/1997, que “consolida normas de
procedimentos a serem observadas pela Administração Pública Federal em razão de decisões
judiciais, regulamenta os dispositivos legais que menciona, e dá outras providências”, prevê
que “as decisões do Supremo Tribunal Federal que fixem, de forma inequívoca e definitiva,
interpretação do texto constitucional deverão ser uniformemente observadas pela
Administração Pública Federal direta e indireta, obedecidos aos procedimentos
estabelecidos neste Decreto” (art. 1.º, caput), sendo que, “transitada em julgado decisão do
Supremo Tribunal Federal que declare a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, em
ação direta, a decisão, dotada de eficácia ex tunc, produzirá efeitos desde a entrada em vigor
da norma declarada inconstitucional, salvo se o ato praticado com base na lei ou ato
normativo inconstitucional não mais for suscetível de revisão administrativa ou judicial” (§
1.º), e que “o disposto no parágrafo anterior aplica-se, igualmente, à lei ou ao ato normativo
que tenha sua inconstitucionalidade proferida, incidentalmente, pelo Supremo Tribunal
Federal, após a suspensão de sua execução pelo Senado Federal” (§ 2.º). Sendo assim, o
Senado Federal poderá pungir a eficácia ex tunc ao Executivo, que ficaria
vinculado temporalmente diante de resolução senatorial.

Controle de constitucionalidade concentrado e abstrato


O controle concentrado pressupõe ações específicas, já que a nascente teórica da
proposta abstrata, como visto, é de HANS KELSEN. No caso do Brasil, impõe-se, doravante,
estudo das seguintes ações:
• Ação Direta de Inconstitucionalidade;
• Ação Declaratória de Constitucionalidade;
• Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão;
• Ação Declaratória de Inconstitucionalidade Interventiva; e
• Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.

Ação Direta de Inconstitucionalidade

85
STF, ADIn n.º 3.406/RJ e ADIn n.º 3.470/RJ. Rel.ª Min.ª ROSA WEBER, Plenário. Julgado em 29 de
novembro de 2017.
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A primeira ação de controle abstrato a ser estuada é a Ação Direta de


Inconstitucionalidade. Conforme aponta o art. 102 da Constituição da República, compete
ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar, originariamente, a Ação Direta de
Inconstitucionalidade “de lei ou ato normativo federal ou estadual” (inciso I, alínea a,
primeira parte). É rotineira a menção, na doutrina, de que o embrião da Ação Direta de
Inconstitucionalidade foi a Emenda Constitucional n.º 16/1965, que trouxe a chamada
“representação de inconstitucionalidade”86 para a Constituição então vigente (1946).
A Ação Direta de Inconstitucionalidade é “verdadeira ação”, inaugurando um
“processo objetivo”, vocacionado “à defesa da ordem constitucional objetiva, sem a existência
de lide, controvérsia subjetiva e partes (entendidas no sentido material) que lhe componham o
fundo. Daí ser instrumento de verificação da validade de norma em tese ou em abstrato. Por
ser processo especial, constitucional, admite, com cautela, a recepção de normas da
legislação processual subjetiva”87.

Legitimados da Ação Direta de Inconstitucionalidade


Os legitimados da Ação Direta de Inconstitucionalidade constam do um rol
taxativo presente no art. 103 da Constituição da República. Tal dispositivo é assim redigido:

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação


declaratória de constitucionalidade:
I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito
Federal;
V o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

86
Cf. CLÈVE, Clèmerson Merlim. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Revista de Informação Legislativa,
Brasília, n.º 179, jul./set. 2008, p. 143.
87
Cf. CLÈVE, Clèmerson Merlim. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Revista de Informação Legislativa,
Brasília, n.º 179, jul./set. 2008, p. 143.
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Interessa anotar que o Supremo Tribunal Federal consagrou jurisprudência


segundo a qual certos legitimados precisam demonstrar uma pertinência temática para
propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade. Há um texto de BEATRIZ BATISDE
HORBACH sinalizando certa possibilidade de rediscussão da matéria no STF, mas, por
enquanto — até pelo tom cauteloso proposto pela autora88 —, prevalece que a pertinência
temática segue viva entre nós.
Basicamente, a visão do STF acaba criando dois grupos de legitimados: os que
contam com uma legitimação universal e os que são chamados de legitimados não universais.
Os primeiros têm caráter público inerente a eles (não precisam demonstrar interesse de
agir/pertinência temática para propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade). São
legitimados universais: o Presidente da República, a Mesa do Senado, a Mesa da
Câmara, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da OAB e o Partido Político
com representação no Congresso Nacional. Finalmente, os não universais precisam
demonstrar o interesse de agir (pertinência temática) para propositura da Ação Direta de
Inconstitucionalidade. São legitimados não universais: os Governadores dos Estados ou
do Distrito Federal, a Mesa de Assembleias Legislativas ou do Distrito Federal e a
confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional89.
Quanto aos partidos, entende o Supremo Tribunal Federal que a aferição de sua
legitimidade, ou seja, de sua representatividade no Congresso Nacional se dá somente no
momento da propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade. Logo, a perda
superveniente da representação parlamentar não desqualifica sua prévia legitimidade90.
Sobre a classe de âmbito nacional, entende-se que deve haver presença associativa
em mais de nove Estados da federação 91. A cláusula constitucional também admite, como
entidade de classe de âmbito nacional, as chamadas “associações de associações de classe”, ou
seja, a entidade “na qual se congregam associações regionais correspondentes a cada unidade
da Federação, a fim de perseguirem, em todo o País, o mesmo objetivo institucional de
defesa dos interesses de uma determinada classe”92.

88
HORBACH, Beatriz Batisde. A gradual supressão da exigência da pertinência temática em controle
abstrato. Consultor Jurídico, São Paulo, fev. 2019. Disponível em https://tinyurl.com/yd9msbdx. Acesso em
13 mai. 2020.
89
Para detalhes, cf. QUEIROZ NETO, Vicente de Medeiros. A Pertinência Temática como Requisito da
Legitimidade Ativa para o Processo Objetivo de Controle Abstrato de Normas. Revista do Tribunal Regional
Federal 1.ª Região, Brasília, v. 15, n.º 7, jul. 2003.
90
STF, AgRg no AgRg na ADIn n.º 2.618-6/PR. Rel. orig. Min. CARLOS VELLOSO; rel. p/ Acórdão Min.
GILMAR MENDES, Plenário. Julgado em 12 de agosto de 2004.
91
STF, AgRg na ADIn n.º 3.617/DF. Rel. Min. CEZAR PELUSO, Plenário. Julgado em 25 de maio de 2011.
92
STF, AgRg na ADIn n.º 3.153/DF. Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Plenário. Julgado em 12 de agosto
de 2004.
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Quando cabe ADIn? E quando não cabe?


Segundo orientações doutrinárias e jurisprudências, podemos afirmar que cabe
Ação Direta de Inconstitucionalidade, só para exemplificar, nos seguintes
casos:
• contra emendas constitucionais, inclusive emendas de revisão 93;
• contra leis complementares;
• contra leis ordinárias;
• contra todos os demais tipos normativos primários, i. e., leis delegadas,
medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções do Poder Legislativo;
• contra qualquer espécie normativa, ainda que tenha efeitos concretos (embora
já tenha havido muito debate sobre isso) — “o Supremo Tribunal Federal deve
exercer sua função precípua de fiscalização da constitucionalidade das leis e dos
atos normativos quando houver um tema ou uma controvérsia constitucional
suscitada em abstrato, independente do caráter geral ou específico, concreto
ou abstrato de seu objeto. Possibilidade de submissão das normas
orçamentárias ao controle abstrato de constitucionalidade”94;
• contra deliberação administrativa de Tribunais, como, p. ex., resolução eu
determine pagamento de reajuste decorrente de conversão da URV em R$
(Plano Real) aos juízes e servidores95;
• contra resoluções do TSE96;
• contra resoluções do CNJ97, bem como contra seu regimento interno98;
• contra resoluções do CNMP99, bem como contra seu regimento interno100;
• contra regimento interno de Tribunal de Justiça101;
• contra regimento interno de Tribunal Regional Federal 102;

93
STF, ADIn n.º 2.024/DF. Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Plenário. Julgado em 03 de maio de 2007.
94
STF, MC na ADIn n.º 4.048/DF. Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário. Julgado em 14 de maio de 2008.
95
STF, QO na QO na ADIn n.º 1.244/SP. Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário. Julgado em 19 de
dezembro de 2019.
96
STF, ADIn n.º 5.122/DF. Rel. Min. EDSON FACHIN, Plenário. Julgado em 03 de maio de 2018.
97
STF, ADIn n.º 6.259/DF. Decisão monocrática do Min. ALEXANDRE DE MORAES. Julgamento em 16 de
dezembro de 2019.
98
STF, MC na ADIn n.º 4.412/DF. Decisão monocrática do Min. GILMAR MENDES. Julgamento em 27 de
novembro de 2019.
99
STF, ADIn n.º 5.434/DF. Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, Plenário. Julgado em 26 de abril de 2018.
100
STF, MC na ADIn n.º 5.125/DF. Decisão monocrática do Min. GILMAR MENDES. Julgamento em 08 de
fevereiro de 2017.
101
STF, ADIn n.º 2.763/PE. Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário. Julgado em 28 de outubro de 2004.
102
STF, ADIn n.º 3.566/DF. Rel. orig. Min. JOAQUIM BARBOSA; rel. p/ Acórdão Min. CEZAR PELUSO,
Plenário. Julgado em 15 de fevereiro de 2007.
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• contra tratados internacionais103;


• contra Constituição Estadual104;
• contra Regimento Interno de Assembleia Legislativa Estadual 105;
• contra Portaria do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego106;
• contra decreto do Poder Executivo, desde que autônomo107;
• contra Lei Distrital, desde que envolva exercício da competência estadual do
Distrito Federal108; e
• de acordo com o STF, “leis orçamentárias que materializem atos de aplicação
primária da Constituição Federal podem ser submetidas a controle de
constitucionalidade em processos objetivos”109 etc.

Cabe, agora, exibirmos uma segunda lista, desta vez exibindo casos nos quais a
doutrina e a jurisprudência não admitem Ação Direta de
Inconstitucionalidade. Assim, não cabe Ação Direta de Inconstitucionalidade:
• contra norma constitucional emanada do próprio poder constituinte originário:
“a tese de que há hierarquia entre normas constitucionais originárias dando azo
à declaração de inconstitucionalidade de umas em face de outras é incompatível
com o sistema de Constituição rígida”110. O assunto, aliás, foi exaustivamente
estudado por OTTO BACHOF, da Universidade de Tübingen, na monografia
Erfassungswidrige Verfassungsnormen? (ou seja: “Normas Constitucionais
Inconstitucionais?”)111;
• contra norma que tem vigência anterior ao dia da promulgação da Constituição
da República – neste caso, o exame é de recepção, não de constitucionalidade112.
No caso de “cogitação sobre a inconstitucionalidade da norma impugnada em

103
GASPAROTO, Carlos Henrique. Controle de Constitucionalidade dos Tratados Internacionais. Revista
Jurídica da Universidade de Franca, Franca, n.º 14, 2005.
104
STF, ADIn n.º 2.461/RJ. Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário. Julgado em 12 de maio de 2005.
105
STF, ADIn n.º 4.587/GO. Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Plenário. Julgado em 22 de maio de
2014.
106
STF, ADIn n.º 3.206/DF. Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Plenário. Julgado em 14 de abril de 2005.
107
STF, ADIn n.º 1.258/PR. Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, Plenário. Julgado em 26 de maio de 1995.
108
STF, AgRg na ADIn n.º 1.68-2/MG. Rel. Min. CARLOS VELLOSO, Plenário. Julgado em 20 de setembro
de 1995.
109
STF, Referendo na MC na ADIn n.º 5.449/RO. Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, Plenário. Julgado em 10 de
março de 2016.
110
STF, ADIn n.º 815-3/DF. Rel. Min. MOREIRA ALVES, Plenário. Julgado em 28 de março de 1996.
111
BACHOF, Otto. Normas Constitucionais Inconstitucionais? Trad. José Manuel M. Cardoso da Costa.
Coimbra: Atlântida Editora, 1977.
112
A respeito, cf. HERANI, Renato Gugliano. Direito pré-constitucional e “a crise do Supremo”. Revista de
Informação Legislativa, Brasília, n.º 182, abr./jun. 2009.
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face da Constituição anterior, sob cujo império ela foi editada, não constitui
óbice ao conhecimento da argüição de descumprimento de preceito
fundamental, uma vez que nessa ação o que se persegue é a verificação da
compatibilidade, ou não, da norma pré-constitucional com a ordem
constitucional superveniente”113. É dizer: para tais casos, cabe ADPF, não
ADIn;
• contra norma que já foi revogada, até porque, em regra, a Ação Direta de
Inconstitucionalidade é julgada prejudicada diante da revogação do ato
impugnado, havendo, no caso, “perda superveniente de seu objeto”114. Mas essa
regra sofre temperamentos. Com farta citação jurisprudencial, JORGE
OCTÁVIO LAVOCAT GALVÃO e SOPHIA GUIMARÃES arrolaram quatro
exceções. São elas:
1.ª) continuidade da cadeia normativa viciada — “aqui, mesmo que a redação
do dispositivo questionado e daquele que o substituiu sejam distintos, entende-
se que a razão de ser da medida legislativa estaria mantida”;
2.ª) fraude processual — “se houve revogação propositada da norma a fim de
evitar a apreciação de sua (in)constitucionalidade por parte do Supremo
Tribunal Federal, não há que se falar em perda do objeto, por estar configurada
hipótese de abuso de direito”;
3.ª) ausência de comunicação da revogação da lei ao tribunal; e
4.ª) casos em que o Supremo Tribunal Federal evita decretar a perda do objeto
de ações que apreciam leis revogadas ou de eficácia exauridas quando entende
relevante regular as relações estabelecidas durante a sua vigência — “ mais
interessantes para demonstrar como o Supremo tem se valido do controle
concentrado para sair do plano normativo e avaliar as consequências concretas
produzidas pela lei revogada”115;
• contra decretos não autônomos do Poder Executivo, já que o plano de
validade, nesses casos, é a legalidade, e não, diretamente, a Constituição da
República — “é firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal no sentido de
que a questão relativa ao decreto que, a pretexto de regulamentar determinada
lei, extrapola o seu âmbito de incidência, é tema que se situa no plano da
legalidade, e não no da constitucionalidade”116;

113
STF, ADPF n.º 33-5. Rel. Min. GILMAR MENDES, Plenário. Julgado em 07 de dezembro de 2005.
114
STF, ADIn n.º 3.778/RJ. Rel.ª Min.ª CÁRMEN LÚCIA, Plenário. Julgado em 31 de outubro de 2007.
115
GALVÃO, Jorge Octávio Lavocat; GUIMARÃES, Sophia. A subjetivação do controle abstrato e a perda
de objeto em ADI. Consultor Jurídico, São Paulo, jul. 2019. Disponível em https://tinyurl.com/ybg7stdo.
Acesso em 13 mai. 2020.
116
STF, ADIn n.º 2.387-0. Rel. orig. Min. MARCO AURÉLIO; rel.ª p/ Acórdão Min.ª ELLEN GRACIE.
Plenário, Julgado em 21 de fevereiro de 2001.
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• contra legislação municipal, pois a Constituição da República é clara: só cabe


ADIn contra lei ou ato normativo federal ou estadual. Nada impede a Ação
Direta de Inconstitucionalidade Estadual. Note-se, porém, o seguinte: “na
hipótese de conflito normativo entre lei municipal e preceito da Constituição
Estadual que esteja a repetir o disposto na Constituição Federal, cabe distinguir
as normas de reprodução obrigatória, que decorrem do caráter compulsório da
norma constitucional superior, das normas de imitação, que consistem na
adesão voluntária do constituinte estadual a determinada disposição
constitucional superior”117. Isso porque, para o STF, caso a Lei Municipal
contrarie a Constituição Estadual e, mais precisamente, uma norma de
reprodução obrigatória da própria Constituição da República, admitir-se-á
interposição de recurso extraordinário, cuja decisão teria eficácia erga omnes. A
lição parece perder, agora, relevância prática, pois todo recurso extraordinário
teria efeitos “abstratizados”, como visto anteriormente. De qualquer maneira,
o STF deixa claro que o recurso extraordinário só será cabível se ficar
demonstrado que o parâmetro da ADIn Estadual, i. e., a norma da Constituição
Estadual, era mesmo de reprodução obrigatória118;
• contra “jurisprudência consultiva” do TSE, até porque, segundo o art. 23,
inciso XII, do Código Eleitoral, compete privativamente ao TSE “responder,
sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese por autoridade
com jurisdição, federal ou órgão nacional de partido político”. A rigor, não há
“jurisdição consultiva”, pois a atividade consultiva não é propriamente
jurisdicional119. Já decidiu o STF, outrossim, que a consulta é “ato normativo
em tese, sem efeitos concretos, por se tratar de orientação sem força
executiva com referência a situação jurídica de qualquer pessoa em
particular”120. Tanto é que “não cabe mandado de segurança contra
pronunciamento de Tribunal em sede de consulta”121. Note-se que o TSE só
conhecerá a consulta se se observarem, cumulativamente, três requisitos: i)

117
NASCIMENTO, Adriana Valentim Andrade do. Controle de Constitucionalidade das Leis ou Atos
Normativos Municipais no Direito Brasileiro. In: SLAIBI FILHO, Nagib (coord). Série Aperfeiçoamento de
Magistrados, n. 2. Curso de Controle de Constitucionalidade. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011, p. 12.
118
STF, AgRg no RE n.º 596.108. Rel. Min. DIAS TOFFOLI, 1.ª Turma Julgado em 18 de junho de 2013.
119
Assim, cf. LAGES, Cintia Garabini; LIMA, Renata Mantovani. A legitimidade da atuação do Tribunal
Superior Eleitoral no exercício das funções consultiva e normativa. Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica
(RIHJ), Belo Horizonte, n. 19, jul./dez. 2015.
120
STF, RMS n.º 21.185/DF. Rel. Min. MOREIRA ALVES. Julgado em 14 de dezembro de 1990.
121
TSE, AgRg em MS n.º 3.710/DF. Rel. Min. CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS. Julgado em 20 de maio
de 2008.
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pertinência temática (o tema deve ser de matéria eleitoral); ii) formulação em


tese (abstração)122; e iii) legitimidade do consulente;
• contra enunciados de súmula;
• contra Súmula Vinculante;
• “não cabe ação direta de inconstitucionalidade de lei do Distrito Federal
derivada da sua competência legislativa municipal” (enunciado n.º 642 da
súmula da jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal) etc.

Fluxograma procedimental da Ação Direta de


Inconstitucionalidade
A procedimentalística da Ação Direta de Inconstitucionalidade vem regrada na Lei
Federal n.º 9.868/1999. Com o propósito de tornar tudo mais didático, segue-se abaixo
um fluxograma procedimental com propósito puramente didático.

Provocação do STF – petição inicial da ADIn



A petição deve indicar o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado e os
fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações, além do
pedido, com suas especificações. Ela deve vir acompanhada de instrumento de procuração,
quando subscrita por advogado, será apresentada em duas vias, devendo conter cópias da
lei ou do ato normativo impugnado e dos documentos necessários para comprovar a
impugnação

Um relator apreciará a inicial, podendo considerá-la inepta se não preencher os requisitos
da lei

O relator também tem o poder de considerar o pedido manifestamente improcedente,
proferindo decisão de rejeição liminar que admite recurso de agravo

122
“1. É assente na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral que ‘não compete ao TSE responder a
consulta fundada em caso concreto, ainda que verse sobre matéria eleitoral’ (Cta n.º 1.419, rel. Min Cezar
Peluso). 2. Consulta não conhecida” (TSE, Ac. n.º 22.699, de 12 de fevereiro de 2008).
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Caso a inicial seja recebida, porém, o relator intimará a autoridade responsável pelo ato
normativo impugnado, que terá prazo de 30 dias

Depois, intima-se o Advogado-Geral da União, que terá 15 dias para defender o ato
normativo

Entende-se que o Advogado-Geral da União não tem a obrigação de defender a lei quando
o STF já decidiu que a lei é inconstitucional123; ou, ainda, quando os interesses da União
convergirem com os do autor da demanda124

Os autos são encaminhados ao Procurador-Geral da República, que terá prazo de 15 dias
para dar seu parecer

O relator lança relatório com cópia aos Ministros, solicitando sessão de julgamento (nada
impede que ele solicite participação de amicus curiae, realização de audiências públicas etc.)

O julgamento da ADIn deve respeitar o quórum de julgamento, que é de 8 Ministros. O
quórum de decisão é de 6 Ministros (i. e.: para desprovimento ou provimento)

O STF pode realizar modulação de efeitos, desde que haja concordância de dois terços dos
votos (= pelo menos 8 Ministros)

Ação Direta de Constitucionalidade


Novidade pitoresca consagrada pela Emenda Constitucional n.º 3/1993, a Ação
Direta de Constitucionalidade. Conforme aponta o art. 102 da Constituição da República,
compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar, originariamente, a Ação Direta
de Constitucionalidade “de lei ou ato normativo federal” (inciso I, alínea a, segunda parte).
A proposta da Ação Direta de Constitucionalidade, como indica o próprio nome,
é a de reafirmar a presunção de constitucionalidade, afastando qualquer insegurança do
ordenamento jurídico.

123
STF, ADIn n.º 1.616/PE. Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, Plenário. Julgado em 24 de maio de 2001.
124
STF, QO na ADIn n.º 3.916. Rel. Min. EROS GRAU, Plenário. Julgado em 03 de fevereiro de 2010.
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Em termos procedimentais, há muita semelhança com a Ação de Direta de


Inconstitucionalidade, de maneira que muito do que já se disse anteriormente se aplica, aqui,
com as adaptações (objeto [só federal]; legitimidades etc.).
É importante lembrar, ainda, que a Ação Direta de Constitucionalidade tem
caráter dúplice. Por isso, sua improcedência significa conclusão pela inconstitucionalidade. O
inverso se verifica na ADIn, já que seu pedido, se improcedente, gera, obviamente,
conclusão de constitucionalidade. É por isso que se diz que o Supremo Tribunal Federal
aceitará reunir pedidos de ADIn e de ADCon numa única demanda de controle concentrada:
“já há, por certo, diversas decisões” do Supremo “admite a fungibilidade entre as ações do
controle concentrado de constitucionalidade, notadamente em relação à ADI e à ADC, dada
a natureza dúplice das decisões delas decorrentes (constitucional/inconstitucional)”125.

Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão


A Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão é uma espécie de
controle concentrado no STF vocacionada a declarar a inconstitucionalidade de uma omissão
dos Poderes Públicos em não tornar efetiva norma constitucional, inviabilizando algum
direito fundamental contido na Constituição da República. Diferentemente da ADIn
“comum”, que ataca uma comissão, aqui temos ação de controle abstrato atacando uma
omissão.
Ganha relevo, aqui, a clássica sistematização das cargas eficaciais proposta por JOSÉ
AFONSO DA SILVA, que recebe, até hoje, a maior adesão por parte da literatura constitucional
nacional126. Em apertada síntese, JOSÉ AFONSO DA SILVA aduz que as normas constitucionais
podem ser encaradas em três grandes grupos: i) normas de eficácia plena; ii) normas de
eficácia contida; e iii) normas de eficácia limitada. As normas constitucionais de eficácia
plena seriam aquelas que não demandariam quaisquer tarefas do legislador ordinário. As
normas constitucionais de eficácia contida seriam “aquelas em que o legislador
constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas
deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do Poder
Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nela
enunciados”127. Finalmente, as normas de eficácia limitada guardariam conexão a

125
ARABI, Abhner Youssif Mota. STF aceita reunir pedidos de ADI e ADC em ação de controle concentrado.
Consultor Jurídico, São Paulo, jun. 2015. Disponível em https://tinyurl.com/yck4yda4. Acesso em 13 mai.
2020.
126
Cf. SARLET, Ingo Wolfgang. Do Poder Constituinte e da Mudança Constitucional. In: ______;
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2013, p. 178.
127
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, p.
79 e 105.
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aqueles dispositivos que têm sua aplicabilidade efetivamente reduzida, não podendo operar,
por si sós, no plano real. Reclamariam, pois, um processo legislativo específico 128.
Como se pode presumir, o campo fértil da Ação Declaratória de
Inconstitucionalidade por Omissão está nas normas constitucionais de eficácia limitada. Ora,
normas de eficácia plena e normas de eficácia contida já bastam em si: só as de eficácia
limitada precisam de atuação legislativa suplementar para gozarem de aplicabilidade.
Tudo o que já se disse sobre a ADIn “comum” se aplica aqui, com adaptações. Em
termos procedimentais, há poucas diferentes. Mais uma vez, adota-se a técnica de exibição
didática e simplória. Vejamos:

Provocação do STF – petição inicial da ADIn por omissão



Autoridade omissa é intimada. Ela tem um prazo de 30 dias para se manifestar

O relator pode solicitar participação do Advogado-Geral da União, que terá prazo de 15
dias para manifestação

Depois, o Procurador-Geral da República é intimado para manifestação, em 15 das (caso
não tenha sido o autor da ADIn por omissão, claro)

Outros legitimados ativos poderão se manifestar a respeito da omissão alegada, podendo
até juntar memoriais

Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva


A Ação Declaratória de Inconstitucionalidade Interventiva é pensada para a
declaração de inconstitucionalidade de alguma conduta do Estado ou do Distrito Federal que
tenha afrontado o que se chama, corriqueiramente, de “princípio sensível” da Constituição
da República (arrolados que estão no art. 34, inciso VII). Trata-se, assim, de um parâmetro
bastante peculiar e enxuto. Não é qualquer inconstitucionalidade que legitimará a
intervenção: é apenas um menoscabar de um princípio sensível.

128
SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982, p.
79, 106 e seguintes.
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Embora tenha um cunho jurídico (que é a tutela do texto constitucional, pois


alguma declaração de inconstitucionalidade haverá, no caso de procedência), a ADIn
interventiva acaba tendo um quid político, já que fará com que a Presidência da República
decrete a intervenção federal no ente.
Não bastassem tantas peculiaridades, também há diferenças procedimentais e,
também, de legitimidade. Só o Procurador-Geral da República poderá provocar o Supremo
Tribunal Federal neste sentido. A procedimentalística da ADIn interventiva é regulada pela
Lei Federal n.º 12.562/2011. Doravante, arrolam-se os itens mais pertinentes e relevantes,
sempre com a didática que norteou este curso:

Provocação do STF – petição inicial da ADIn interventiva (o autor só pode ser o


Procurador-Geral da República)

A inicial, evidentemente, tem de indicar qual é o “princípio sensível” violado pelo ente
federado, acompanhada de dados instrutórios pertinentes para o caso

O relator realiza um juízo de admissibilidade da peça inicial

O indeferimento da inicial desafia agravo (prazo de 5 dias)

Admitida a peça inicial, o ente envolvido terá prazo de 10 dias para contraditório

O Advogado-Geral da União é intimado, tendo prazo de 10 dias para se manifestar

Finalmente, fala o Procurador-Geral da República, também em 10 dias

Nada impede que o relator solicite informações adicionais para a ADIn interventiva

De resto, tudo igual ao que já estudamos na ADIn

Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental


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A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental tem funcionalidades


interessantes, já que acaba funcionando como uma “salvação” para todos os casos que não
admitem ADIn. Inexiste, como visto, possibilidade de Ação Direta de Inconstitucionalidade
em face de lei municipal. A ADPF tem, portanto, um critério de subsidiariedade. E “o
juízo de subsidiariedade”, escreveu GILMAR FERREIRA MENDES, “há de ter em vista,
especialmente, os demais processos objetivos já consolidados no sistema constitucional.
Nesse caso, cabível a ação direta de inconstitucionalidade ou de constitucionalidade, ou,
ainda, a ação direta por omissão, não será admissível a arguição de descumprimento. Em
sentido contrário, não sendo admitida a utilização de ações diretas de constitucionalidade ou
de inconstitucionalidade, isto é, não se verificando a existência de meio apto para solver a
controvérsia constitucional relevante de forma ampla, geral e imediata, há de se entender
possível a utilização da arguição de descumprimento de preceito fundamental”129.
Note-se que a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental não deixa
de ser uma ação de controle concentrado. O objetivo dela é o de impedir lesões aos
chamados “preceitos fundamentais” da Constituição da República. Pode impugnar atos do
poder público e servir de ferramenta de combate à controvérsia constitucional em relação a
lei federal, estadual ou municipal, inclusive anterior à Constituição da República de 1988.
Sendo assim, a ADPF é ação adequada não somente para o controle stricto
sensu, mas também para o exame das recepções legislativas pré-1988.
Os legitimados da ADPF são os mesmos da ADIn, já estudamos anteriormente (ver
art. 103 da Constituição da República).
Abaixo, dentro das estratégias já adotadas, arrolam-se os itens mais pertinentes e
relevantes da procedimentalística da ADPF (Lei Federal n.º 9.882/1999):

Provocação do STF – inicial da ADPF indicando um “preceito fundamental” em jogo, com


documentos pertinentes

Relator examina a inicial, tendo em vista a subsidiariedade da ADPF

Contra decisão de não admissão da ADPF, cabe agravo

129
MENDES, Gilmar. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental: demonstração de
inexistência de outro meio eficaz. Revista Jurídica Virtual Palácio do Planalto, n.º 13, jun./2000, p. 1-2.
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Se a ADPF for admitida, a autoridade será intimada para prestar informações, com prazo
de 10 dias

Depois, os autos seguem para o Procurador-Geral da República, que tem prazo de 5 dias
para manifestação (isso, claro, se ele não for o autor da ADPF)

Nada impede que o relator solicite participação de amicus curiae, peritos, audiências
públicas etc.

Regras de julgamento (quórum): as mesmas já vistas na ADIn

Exame analítico e didático-comparativo da ADCon, da


ADIn e da ADPF
A tabela abaixo é de autoria de MARCELO NOVELINO. Diante da didática
extremada, optamos por, respeitosamente, transcrevê-la130:

ADC ADI ADPF

Competência STF STF STF


• Ato do poder
• Lei/ato • Lei/ato
público
normativo normativo
• Federal/estadual
Objeto • Federal • Federal/estadual
/municipal
• Posterior ao • Posterior ao
• Anterior/posteri
parâmetro parâmetro
or ao preceito
constitucional violado constitucional violado
fundamental violado
• Norma • Norma
formalmente formalmente
Constitucional Constitucional
• Tratados e • Tratados e
Parâmetro Convenções Convenções • “Preceito
Internacionais de Internacionais de fundamental”
Direitos Humanos Direitos Humanos
(aprovados por 3/5 dos (aprovados por 3/5 dos
membros em dois membros em dois
turnos) turnos)

130
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 13.ª ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 256.
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• Universal:
- Presidente da República
- Procurador-Geral da República
- Mesa do Senado
- Mesa da Câmara
Legitimidade - Partidos políticos com representação no Congresso Nacional
- Conselho Federal da OAB
• Especial:
- Governadores
- Mesas das Assembleias Legislativas estaduais e da Câmara Legislativa do DF
- Confederações sindicais
- Entidades de classe de âmbito nacional
• Eficácia erga
• Eficácia erga
omnes e efeito
omnes e efeito
vinculante
vinculante
• • Suspende
Eficácia erga • Suspende a
omnes e efeito processos, efeitos de
validade da norma
vinculante decisões judiciais ou
Liminar impugnada e o
qualquer outra medida
• Suspende julgamento de
relacionada à matéria
julgamento dos processos que a
(salvo se decorrentes da
processos envolvam
coisa julgada)
• Eficácia
• Eficácia
temporal: ex nunc
temporal: ex nunc
(regra)
(regra)
• Eficácia erga omnes e efeito vinculante
Decisão de • Eficácia temporal: ex tunc (regra)
mérito • Modulação temporal: quórum de dois terços; razões de segurança jurídica ou
excepcional interesse social

Notas sobre o controle estadual de constitucionalidade


Obviamente, a marca peculiar do controle estadual de constitucionalidade está no
parâmetro da validade: a Constituição Estadual. O objeto da Ação Direta de
Inconstitucionalidade Estadual será a lei ou o ato normativo estadual ou municipal que
afronte as normas do poder constituinte estadual.
A competência para processar e julgar a ADIn Estadual será do Tribunal de Justiça
respectivo. Usualmente, a ADIn Estadual é chamada “representação de
inconstitucionalidade estadual”.
Legitimidade para ajuizar representação de inconstitucionalidade
estadual: conforme aduz o § 2.º do art. 125 da Constituição da República, “cabe aos
Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos
estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação
para agir a um único órgão”. Como se pode notar, há certa margem de discricionariedade
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normativa franqueada ao constituinte estadual, que só não poderá prever apenas um


legitimidade para a ADIn Estadual.
Não custa repetir, ademais, que não se admite “ADIn comum” (ou “ADIn federal”,
que seja) contra legislação municipal, pois a Constituição da República é clara: só cabe ADIn
“normal” contra lei ou ato normativo federal ou estadual. Nada impede a Ação Direta de
Inconstitucionalidade Estadual, como agora já parece evidente. Note-se, porém, o seguinte:
“na hipótese de conflito normativo entre lei municipal e preceito da Constituição Estadual
que esteja a repetir o disposto na Constituição Federal, cabe distinguir as normas de
reprodução obrigatória, que decorrem do caráter compulsório da norma constitucional
superior, das normas de imitação, que consistem na adesão voluntária do constituinte
estadual a determinada disposição constitucional superior”131. Isso porque, para o STF, caso
a Lei Municipal contrarie a Constituição Estadual e, mais precisamente, uma norma de
reprodução obrigatória da própria Constituição da República, admitir-se-á interposição de
recurso extraordinário, cuja decisão teria eficácia erga omnes. A lição parece perder, agora,
relevância prática, pois todo recurso extraordinário teria efeitos “abstratizados”, como visto
anteriormente. De qualquer maneira, o STF deixa claro que o recurso extraordinário só
será cabível se ficar demonstrado que o parâmetro da ADIn Estadual, i. e., a norma da
Constituição Estadual, era mesmo de reprodução obrigatória 132.
Ainda neste contexto da reprodução obrigatória, há que se registrar um fenômeno
relativamente raro, mas interessante: o que acontece no caso de propositura de
ADIn para o STF e, “simultaneamente”, de ADIn Estadual? A primeira terá, como
parâmetro, a Constituição da República. A segunda, claro, terá como juízo de valoração a
Constituição Estadual (que repetiu norma da Constituição Federal). Isto ocorreu, só para
exemplificar, em março de 2006, tendo o Min. CELSO DE MELLO proferido decisão
monocrática assim ementada:

Ajuizamento de Ações Diretas de Inconstitucionalidade tanto perante o


Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, i, “a”) quanto perante tribunal
de justiça local (CF, art. 125, § 2.º). Processos de fiscalização
concentrada nos quais se impugna o mesmo diploma normativo emanado
de Estado-membro ou do Distrito Federal, não obstante contestado,
perante o Tribunal de Justiça, em face de princípios inscritos na carta
política local impregnados de predominante coeficiente de federalidade
(RTJ 147/404 – RTJ 152/371-373). Ocorrência de “simultaneus
processus”. Hipótese de suspensão prejudicial do processo de controle
normativo abstrato instaurado perante o Tribunal de Justiça local.

131
NASCIMENTO, Adriana Valentim Andrade do. Controle de Constitucionalidade das Leis ou Atos
Normativos Municipais no Direito Brasileiro. In: SLAIBI FILHO, Nagib (coord). Série Aperfeiçoamento de
Magistrados, n. 2. Curso de Controle de Constitucionalidade. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011, p. 12.
132
STF, AgRg no RE n.º 596.108. Rel. Min. DIAS TOFFOLI, 1.ª Turma Julgado em 18 de junho de 2013.
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Necessidade de se aguardar, em tal caso, a conclusão, pelo Supremo


Tribunal Federal, do julgamento da Ação Direta. Doutrina.
Precedentes133.

Neste caso, o que sucede é o seguinte: ou o STF julga improcedente a ADIn de sua
competência, de maneira que a ADIn Estadual voltará a tramitar no Tribunal de Justiça (que
reavaliará a lei impugnada, segundo os ditames da Constituição Estadual); ou o STF julga
procedente a ADIn de sua competência, de maneira que a lei é evidentemente
inconstitucional, não havendo mais razão para que o Tribunal de Justiça enfrente a ADIn
Estadual.

133
STF, ADIn n.º 3.482/DF. Decisão monocrática do Min. CELSO DE MELLO. Julgamento em 08 de março
de 2006.
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