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AVM Faculdade Integrada

Pós-graduação de Gestão Pública


Marcela Fernandes

A nova gestão pública e o desafio da desburocratização no


serviço público

Rio de Janeiro
2015
AVM Faculdade Integrada
Pós-graduação de Gestão Pública
Marcela Fernandes

A nova gestão pública e o desafio da desburocratização no


serviço público

Monografia apresentada à AVM


Faculdade Integrada como parte das
exigências da Pós-graduação de
Gestão Pública para obtenção do
certificado de conclusão do curso

Orientadora: Prof. Fernanda Marsaro


dos Santos
RESUMO

A administração pública brasileira foi pautada em três modelos, são eles:


patrimonialismo, burocracia e gerencialismo. O patrimonialismo surgiu em 1530,
perdurando até 1930; a burocracia de 1930 a 1985, retomando com a Constituição de
1988; e o gerencialismo, tendo como marco inicial o governo do Fernando Henrique
Cardoso. Apesar dos referidos modelos representarem o contexto da sociedade na qual
surgiram, não quer dizer que a implantação de um novo sistema tenha interrompido o
modelo anterior. Eles sempre coexistiram, representando o interesse de algumas
classes e da cultura brasileira. Nesse cenário de modelos enraizados do Estado que irá
surgir, no Brasil, o gerencialismo, como uma tentativa de modernização do Estado, com
a criação de uma emenda constitucional específica para respaldar toda mudança do
perfil do Estado, bem como criada uma estrutura para desonerar o Estado de
determinadas atividades que não necessitem de sua atuação ativa, para que ele possa
focar mais em sua função estratégica. Entretanto, para saber se esse modelo será
realmente eficaz na eliminação de vícios dos modelos antigos e na tarefa de
modernização, será necessário compreender a evolução da administração pública, o
marco histórico e sua reflexão na atual gestão. Por isso, o presente estudo irá realizar
uma retrospectiva dos governos brasileiros desde a época colonial, para que seja
possível a partir do conhecimento do passado, compreender o presente e vislumbrar o
futuro da administração pública no Brasil. Possibilitando, assim, verificar métodos que
diminuam as disfunções dos modelos antigos, principalmente da burocracia, ainda tão
presente na atualidade.

Palavras-chave: Administração pública. Patrimonialismo, burocracia e gerencialismo.


Modernização. Disfunções.
SUMÁRIO
Introdução ............................................................................................................................... 4

1 Do Patrimonialismo à Burocracia ...................................................................................... 6

1.1 Patrimonialismo – Conceito .......................................................................... 6

1.2 Brasil Colônia e Império .............................................................................. 7

1.3 República Velha (1889-1830) ........................................................................ 9

1.4 Burocracia – Conceito .............................................................................. 10

1.5 As disfunções da Burocracia....................................................................... 13

1.6 Getúlio Vargas e o surgimento da burocracia no Brasil ....................................... 15

2 Da Burocracia à Nova Gestão Pública ............................................................................. 17

2.1 Governo de JK e as reformas administrativas .................................................. 17

2.2 Reforma da administração pública – Decreto-Lei nº 200/67.................................. 17

2.3 Constituição de 1988 e a volta da burocracia ................................................... 19

2.4 Governo Collor e o neoliberalismo ................................................................ 20

2.5 Nova Gestão Pública – Conceito.................................................................. 22

2.6 Reforma de 1995 – Plano Diretor de Reforma do Aparelho Do Estado .................... 24

2.7 Emenda Constitucional nº 19 de 1998 ........................................................... 30


2.8 Reforma administrativa e a desburocratização ................................................. 30

Considerações finais ............................................................................................................ 32

Referências Bibliográficas ................................................................................................... 35


6

Introdução

A burocracia está intrinsecamente ligada à máquina estatal mesmo com a sua


modernização, seja nos procedimentos, seja na percepção da população acerca das
instituições públicas, nesse caso apresentando um cunho pejorativo.

Baseando-se nessa premissa, torna-se de extrema relevância estudar a origem do


termo e sua aplicação no Brasil. Isto é, contextualizar o momento histórico passado pela
administração pública, a implantação desse modelo e seus consequentes desvios. Para que
isso seja realizado, não basta apenas se ater ao momento em que ela foi instaurada no país,
mas fazer um retrospecto dos principais sistemas de administração implementados ao longo
dos anos.

Esse estudo aprofundado se faz imprescindível para que se consiga atender o objetivo
principal do trabalho, que é o de analisar se o novo modelo de gestão pública tem sido eficaz
na eliminação ou na redução das disfunções da burocracia, possibilitando uma resposta mais
rápida do serviço público, frente às demandas da sociedade.

Além disso, ao analisar os modelos administrativos estabelecidos no Brasil,


relacionando-os com o seu contexto histórico, será possível esclarecer os objetivos
específicos do trabalho, que são: aprofundamento no estudo da evolução da administração
pública no Brasil; comparação do modelo de gestão atual gerencial com os modelos
anteriores e a integração entre essas diferentes formas de administração; e identificação dos
impasses que ocorrem no serviço público por conta de um engessamento histórico,
verificando, assim, possíveis soluções para que esse se torne mais dinâmico às
necessidades da sociedade.

Assim sendo, a metodologia utilizada no presente estudo será de caráter exploratório,


através de um levantamento bibliográfico para obter um maior embasamento teórico sobre o
tema e, assim, orientar os objetivos e a formulação das hipóteses.
7

No capítulo 1, será discorrido sobre o surgimento do patrimonialismo no Brasil e a


implantação, posteriormente, da burocracia, como antagonista do primeiro modelo de
administração pública. Dessa forma, será traçado um panorama histórico, que vai desde o
Brasil Colônia até a República Velha, para entender o surgimento do patrimonialismo e o
motivo dele ser tão criticado pelos governos do século XX. Assim, será verificado o quanto
essa cultura patrimonialista está enraizada nos hábitos brasileiros e o quanto influencia, até
hoje, determinadas medidas político-administrativas do país.

No momento seguinte, será discorrido sobre o surgimento da burocracia e como esse


sistema, originado no final do século XIX, foi ferrenho no combate ao patrimonialismo,
existente até então. A partir do entendimento do contexto histórico do Brasil ao longo dos
anos, que se compreenderá a implantação da burocracia como uma forma de tentar
modernizar o Estado, enfraquecendo a cultura predominante de nepotismo e corrupção.
Assim sendo, serão evidenciados os governos que adotaram esse modelo no país e as
medidas tomadas para fomentá-lo.

Ainda no mesmo capítulo, serão apresentadas ao leitor as disfunções que a burocracia


trará para a administração pública como consequência de suas características principais.
Cujos desvios ainda perduram em nossa atual conjuntura, colaborando para a visão
pejorativa que boa parte da sociedade tem a respeito desse sistema.

Já no capítulo 2, a ênfase será nas medidas tomadas pelos diferentes governos para
tentar diminuir essas disfunções da burocracia e tornar a máquina pública mais flexível e
eficiente. A partir da análise dos principais governos que tentaram modernizar o Estado, o
leitor poderá compreender o quão árduo é para o Estado solucionar esses impasses
burocráticos, pois não há uma constante evolução, remetendo-nos ao movimento de um
pêndulo, em que uma hora oscila para o lado burocrático e em outra, para uma tentativa de
modernizar o aparelho estatal.

Posteriormente, no mesmo capítulo, será mostrado o modelo da nova gestão pública,


implantado no governo de Fernando Henrique Cardoso, o qual apresentou o mais exitoso
8

projeto de modernização do Estado. Sendo o plano uma quebra de paradigma em relação


aos modelos anteriores, que tinham como objetivo o progresso da administração pública,
mas não conseguiram se firmar na administração.

Assim sendo, será abordado o contexto histórico do seu surgimento, bem como
evidenciada as principais características do novo sistema e a metodologia adotada para
atingir o fim do serviço público, de atender aos interesses do cidadão. Mostrando a inovação
referente a esse novo objetivo, uma vez que é o primeiro modelo que coloca a sociedade
como foco das políticas públicas e não o próprio Estado.

Na conclusão, será realizada uma síntese dos sistemas implementados na


administração pública do Brasil, bem como serão mostradas as medidas que poderiam ser
adotadas para reduzir as disfunções da burocracia, presente em nosso governo até hoje.
Fazendo com que o leitor reflita sobre a nossa evolução administrativa e compreenda como
as nossas raízes históricas influenciam a seara política, administrativa e social do nosso
país.
9

1 Do patrimonialismo à burocracia

1.1 Patrimonialismo – Conceito

O patrimonialismo é um modelo de administração originado no feudalismo, onde a


nobreza se utilizava da máquina pública para atender a seus próprios interesses. Mesmo
com a evolução do feudalismo para o absolutismo, esse sistema não se enfraqueceu, pois os
reis continuavam fazendo uso desse mecanismo para governar os seus territórios.

Em outras palavras, não há a distinção, por parte dos políticos, do patrimônio público
em relação ao patrimônio privado, ou seja, o Estado é uma extensão do poder do soberano e
os servidores, possuem status de nobreza real. Por conta dessa não diferenciação entre res
publica (bem público) e res principis (patrimônio do príncipe), que temos uma administração
pautada no nepotismo, troca de favores e consequente corrupção. Nesse contexto, não se
fala em servir à população, muito menos em interesse público, já que a fruição dos cargos
era meramente para satisfação de interesse próprio e de seu grupo.

Dessa forma, a prática patrimonialista se tornou essencial para manter os privilégios e


poderes da nobreza, já que a nomeação para cargos públicos não levava em consideração
competência técnica, mas sim, interesses políticos e individuais, sendo um mecanismo
eficiente de troca de favores. Pode-se dizer, portanto, que esse sistema favoreceu
amplamente o nepotismo e a corrupção.

No Brasil, esse modelo perdurou de 1500 a 1930, abrangendo o período colonial,


imperial e a República Velha.

1.2 Brasil Colônia e Império


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A origem do patrimonialismo no Brasil se deu com o processo de colonização, pois boa


parte da nossa cultura organizacional foi herdada dos antigos costumes de Portugal. Essa
influência lusitana perpassou diversas gerações, fazendo parte intrinsecamente do nosso
processo evolutivo.

Para iniciar o processo de colonização, Portugal enviou ao Brasil funcionários do Reino


para ocuparem cargos administrativos. Diante dessa distância territorial e,
consequentemente, de controle, havia uma alta insubordinação à coroa. Portanto, os colonos
presentes no Brasil governavam segundo seus próprios interesses, sendo a venda e a troca
dos cargos utilizadas em benefício próprio.

Ou seja, ao mesmo tempo em que se tinha uma administração centralizadora que vinha
da metrópole, havia uma descentralização no poder local (províncias). Sendo a cultura
patrimonialista inerente a essa época, onde os recursos do patrimônio público (tributos) eram
gastos de maneira indiscriminada.

A mistura de centralismo excessivamente regulamentador, e geralmente pouco


efetivo, com o patrimonialismo local resume bem o modelo de administração
colonial. Essa situação começou a mudar em meados do século XVIII, com as
reformas pombalinas de Portugal, que geraram maior intervenção sobre os
assuntos da Colônia. Um novo impulso ao poder público foi dado pela chegada
da Família Real portuguesa, em 1808, que colocou o Brasil como centro do
Império português (ABRÚCIO; PEDROTI; PÓ, 2010, p. 176).

Foi no período pombalino que o Brasil começou a “respirar” ares de uma administração
mais organizada. O seu projeto de tornar a administração portuguesa mais eficiente e
racional acabou refletindo no país, já que formou lideranças político-administrativas para
atuarem nas Colônias, com um viés modernizador e estratégico para a época. (SILVA, 2014).

Para essa modernização, foram tomadas diversas medidas, tais como: o fim das
capitanias hereditárias, a transferência da capital do Brasil de Salvador para Rio de Janeiro,
11

criação de órgãos para aumentar a exploração de riquezas no nordeste, bem como


intensificar a fiscalização da exploração do ouro em Minas Gerais

Ainda assim, a suposta modernização não queria dizer o fim do patrimonialismo,


tampouco a sua diminuição, sendo apenas um maior controle por parte da Coroa sobre o
Brasil e os colonos.

Entretanto, o período marcante para o início de uma administração pública no Brasil foi
com a vinda da família real para o Brasil em 1808, devido ao conflito político entre Portugal e
França, no governo de Napoleão Bonaparte. Foi a partir dessa migração, que foram criadas
instituições governamentais e todo um aparato público para dar suporte à corte portuguesa
no Brasil.

Nesse momento, solidifica-se o patrimonialismo tradicional no Brasil, essencial para


manutenção de uma elite oligárquica, além da manutenção do status quo imperial, uma vez
que temos o aparelho estatal funcionando como extensão do soberano, enquanto a nobreza
mantinha sua condição nos cargos públicos, revestindo-se de regalias.

Com a queda de Napoleão e a reorganização política da Europa, D. João VI teve que


retornar à Portugal devido às pressões liberais no Porto em 1821, deixando o príncipe
herdeiro no Brasil. Com a sua maioridade, foram criados ministérios e todo um aparato
público para lhe dar suporte como o novo monarca do Brasil, principalmente no período pós-
independência do país, em que ele precisava de apoio político para controlar as crises e a
oposição. Diante disso, fez-se grande uso do nepotismo, inchando a máquina pública.

1.3 República Velha (1889-1830)

A República Velha se iniciou com a proclamação da República e perdurou até a


Revolução de 1930, havendo a manutenção do sistema patrimonialista de administração. O
poder era alternado entre Minas Gerais e São Paulo, na chamada “Política do Café com
12

Leite”, cujo objetivo era manter essa oligarquia no governo, garantindo os interesses da elite
agrária.

A população não participava da política e grande parte morava no campo e, por isso,
ficava sob influência dos coronéis, que possuíam grande força política e administrativa em
suas regiões, servindo como peças-chave para manutenção do referido regime. Portanto,
essa administração foi pautada sob um viés mais patriarcal e descentralizador, onde o poder
central dava maior autonomia ao poder local.

O governo federal ocupava-se de assegurar a defesa e a estabilidade e


proteger os interesses da agricultura exportadora através do câmbio e da
política de estoques, com reduzida interferência nos assuntos 'internos' dos
demais estados. Lá vicejavam os mandões locais, grandes proprietários de
terra e senhores do voto de cabresto, e as grandes oligarquias, que
controlavam as eleições e os governos estaduais e asseguravam as maiorias
que apoiavam o governo federal A política dos governadores garantia a
alternância na presidência da República de representantes de São Paulo e
Minas Gerais. (LUSTOSA, 2008, p.840)

Essa política arcaica e agrária foi se tornando disfuncional à transformação do Brasil,


que passava pelo crescimento da urbanização e pela organização política, devido ao
primeiro ciclo de industrialização, além da crise de 1929 e do conflito de interesses entre os
setores agrários. Assim sendo, houve um colapso na política oligárquica e na sua forma de
administração, abrindo espaço para a Revolução de 1930 e para implantação de um sistema
condizente com a nova realidade.

1.4 Burocracia – Conceito

O patrimonialismo tornou-se incompatível com o sistema capitalista industrial e as


democracias parlamentares que surgiram no século XIX. Portanto, foi necessário o
desenvolvimento de um modelo que tomasse como partida não só a distinção entre o público
13

e o privado, mas que, também, separasse o político e o administrador público. Surge, dessa
forma, a administração burocrática moderna racional-legal (BRESSER, 1996).

O surgimento desse modelo se dá a partir da descoberta dos estudos realizados por


Max Weber, sociólogo alemão e criador da Sociologia da Burocracia, e sua posterior
tradução inglesa, que possibilitou a disseminação dessa filosofia na Europa, final do século
XIX, nos EUA, no começo do século XX, e no Brasil, em 1936, com a reforma promovida
pelo Luís Simões Lopes e Maurício Nabuco, no governo de Vargas.

Dessa forma, a administração burocrática clássica surge como uma antagonista do


patrimonialismo, uma vez que ela se contrapõe às principais características desse sistema,
que envolvem a corrupção e o nepotismo. Portanto, para dar fim a esse modelo, a burocracia
apresentou grande preocupação nas rotinas de trabalho, exercendo maior controle sobre o
processo de produção, com o objetivo de dificultar qualquer procedimento escuso. Por conta
disso, as organizações se guiavam por regulamentos e normas que norteavam todo seu
funcionamento. Entretanto, apesar de primar pelo correto procedimento, deixou de
questionar se esse formalismo gerava um resultado eficiente.

O nepotismo e o empreguismo, senão a corrupção, eram a norma. Esse tipo de


administração revelar-se-á incompatível com o capitalismo industrial e as
democracias parlamentares, que surgem no século XIX. É essencial para o
capitalismo a clara separação entre o Estado e o mercado; a democracia só
pode existir quando a sociedade civil, formada por cidadãos, distingui-se do
Estado ao mesmo tempo que o controla. Tornou-se assim necessário
desenvolver um tipo de administração que partisse não apenas da clara
distinção entre o público e o privado, mas também da separação entre o político
e o administrador público. Surge assim a administração burocrática moderna,
racional-legal. (BRESSER, 1996, p.10)

A fim de atender ao interesse público e evitar o nepotismo, a burocracia exerce controle


rígido tanto na admissão de pessoal (concursos, provas e títulos), quanto na capacitação dos
mesmos, pois se utiliza da meritocracia para fins de promoção, inclusive com forte hierarquia
entre os cargos.
14

Dessa forma, cada cargo possui sua própria competência, não havendo flexibilidade
entre eles, já que tem de seguir estritamente o que está regulamentado. O que passa a ser
valorizado é o cargo e não a pessoa. Ou seja, toda rotina de trabalho e funcionamento da
organização é considerada previsível.

“Neste modelo Weberiano, pressupõe-se um comportamento funcional


perfeitamente previsível. Para Max Weber a burocracia é a organização
eficiente por excelência e para conseguir essa eficiência, a burocracia precisa
detalhar antecipadamente e nos mínimos detalhes como as coisas devem
acontecer”. (MANSOLDO, 2009, p.18)

Portanto, tomando-se como premissa a previsibilidade, o caráter flexível das


organizações deixa de existir, havendo um excesso de formalismos, uma vez que as regras
passam a ser prioritárias.

As principais características do sistema são1:

 Caráter legal das normas e regulamento: a legislação define com


antecedência como a organização deve funcionar

 Caráter formal das comunicações: todas as comunicações são feitas por


escrito e documentadas, pois isso é uma maneira de comprovação. Devido a ser
tudo por escrito, a burocracia faz largo uso de formulários e rotinas padronizadas
a fim de facilitar esse processo.

 Caráter racional e divisão do trabalho: há uma divisão sistemática do trabalho,


do direito e do poder. Cada um sabe sua tarefa e suas responsabilidades.

1 Weber, Max. Conceito sobre o advento do Estado Liberal de Max Weber. Disponível em:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_da_burocracia. Acesso em 14/06/15
15

 Impessoalidade nas relações: o cargo é mais importante que o ocupante do


mesmo, dessa forma, ocorre a despersonificação do relacionamento. A
obediência ao superior se dá apenas por conta do cargo que ela ocupa e não
pela pessoa.

 Hierarquia da autoridade: rígida hierarquização, onde as decisões são


tomadas somente pelos ocupantes de altos cargos. Não existe cargo sem
supervisão ou controle.

 Rotinas e procedimento: o subordinado só pode fazer o que a burocracia lhe


permite, sendo as atividades desempenhadas segundo padrões já definidos.

 Competência técnica e meritocracia: necessidade de exames, concursos,


avaliações, títulos para admissão de funcionários e promoção dos mesmos.

 Profissionalização dos participantes: cada funcionário é um especialista,


assalariado, nomeado por superior hierárquico, segue carreira dentro da
organização e etc.

1.5 As disfunções da Burocracia

Apesar de ser um modelo que preconiza o combate da corrupção e o nepotismo, não


se pode dizer que é uma administração voltada para o interesse da sociedade, pois é focada
em si mesmo, devido ao grande número de regras e procedimentos para o funcionamento da
administração pública. Essa forma de administração acaba por gerar uma série de
disfunções, refletindo direto na sociedade:

 Excesso de formalismos e dificuldade no atendimento ao cliente: o funcionário se


preocupa mais em cumprir as regras e regulamentos do que, propriamente,
oferecer um atendimento qualificado ao cidadão, personalizado com o tipo de
necessidade que esse apresenta. Ou seja, esse modelo acaba atingindo a
16

atividade-meio da administração e não a atividade-fim, que é a satisfação do


interesse público.

 Resistência à mudança: como tudo é considerado previsível e, portanto, as


rotinas do órgão são padronizadas, o funcionário torna-se apenas um executor
de tarefas. Dessa forma, por ter pleno conhecimento e segurança das suas
atribuições, acaba se acomodando em sua função e, com isso, qualquer
possibilidade de mudança na organização, acaba sendo vista com resistência.
Assim sendo, essa filosofia burocrata se mostra como um entrave da instituição
ao acompanhamento da evolução da sociedade e suas consequentes
necessidades, além de corroborar para um funcionário menos criativo e pró-
ativo.

 Relacionamento despersonalizado: Por se apoiar no prisma da impessoalidade


ao enfatizar os cargos e não os ocupantes dos mesmos, a burocracia acaba por
despersonalizar o relacionamento entre os funcionários, onde os colegas não
são reconhecidos pelos nomes pessoais, mas pelos títulos atribuídos ao cargo.

 Rígida hierarquia: Devido à rígida hierarquização da burocracia, as decisões são


tomadas apenas pela mais elevada categoria hierárquica, sem levar em
consideração se o ocupante do cargo possui conhecimento ou não sobre o
assuntou. Quando se atribui o processo decisório a alguém, somente pelo fato
da pessoa ocupar determinado cargo, deixa-se de buscar alternativas diferentes
para solução do problema, que poderiam até ser mais eficazes no resultado
prático.

 Exibição de autoridade: Como a hierarquia é valorizada pela burocracia, o poder


acaba se tornando um meio de exposição profissional de quem o ocupa. Diante
disso, há a necessidade de utilizar símbolos que representem esse poder, desde
de uma localização privilegiada da sala até a utilização de uniformes e
17

determinados tratamentos exclusivos. Esse cenário é muito presenciado no


militarismo, por exemplo.

Para melhor ilustrar os efeitos negativos de determinadas características desse modelo,


o quadro seguinte relaciona cada particularidade da burocracia com a disfunção que ela
ocasiona:

Quadro 1: características x disfunções da burocracia

Características da burocracia Dis Disfunções da burocracia

1. Caráter legal das normas 1. Internalização das normas


1 . Caráter formal das comunicações 1. Excesso de formalismo e papelório
2. Divisão do trabalho 2. Resistência a mudanças
4 . Impessoalidade no relacionamento4. Despersonalização do relacionamento

5. Hierarquização da autoridade 5. Categorização o relacionamento


6. Rotinas e procedimentos 6. Superconformidade
7. Competência técnica e mérito 7. Exibição de sinais de autoridade
8. Especialização da administração 8. D Dificuldades com clientes

Fonte: http://www.fcsh.unl.pt/apsociedade

Por conta dessas disfunções, a burocracia acabou recebendo uma conotação negativa
por parte da população, exprimindo lentidão e ineficiência. Dessa forma, o cidadão faz largo
uso desse termo para criticar o serviço público. Entretanto, poucos sabem da importância
que esse modelo representou para o Brasil, sendo uma forma de diminuir o patrimonialismo,
tão enraizado na nossa cultura. As disfunções acabam tendo relevância maior na concepção
da opinião público que a meritocracia e legalidade instaurada por esse sistema.
18

1.6 Getúlio Vargas e o surgimento da burocracia no Brasil

Conforme explicitado no presente estudo, houve uma conjuntura muito favorável para
que fosse aplicado o golpe revolucionário de 30 e Getúlio Vargas chegasse ao poder.

Devido à quebra da Bolsa de Nova Iorque, os mercados consumidores de café,


principalmente Estados Unidos e Europa, diminuíram suas exportações do produto e, com
isso, o valor dessa commoditie desvalorizou rapidamente no mercado internacional. Sem
poder exportar seu principal produto, a economia brasileira não tinha como importar os
produtos demandados pela população.

Para superar esse cenário alarmante, Getúlio Vargas tomou medidas alternativas a fim
de evitar um colapso ainda maior no país, uma delas foi se voltar ao mercado interno,
através de incentivos a indústrias, modernização da máquina estatal e criação de barreiras
aos produtos estrangeiros.

Com a aceleração da industrialização e, ao mesmo tempo, a perda de poder do


mercado agrícola diante da crise, muitos trabalhadores migraram para as grandes cidades,
estabelecendo-se um outro cenário político, bem distinto da República Velha, uma vez que o
poder econômico e político concentrava-se agora nas grandes cidades.

Por conta disso, percebeu-se que o modelo patrimonialista não era mais condizente
com a realidade, não tinha como se adequar a uma economia industrial cada vez mais
complexa e competitiva.

Nesse contexto, foi criado o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP),


responsável por implantar esse novo modelo de administração burocrática no Brasil.

O DASP foi efetivamente organizado em 1938, com a missão de definir e


executar a política para o pessoal civil, inclusive admissão mediante concurso
público e a capacitação técnica do funcionalismo, promover a racionalização de
métodos no serviço público e elaborar o orçamento da União. O DASP tinha
seções nos estados, com o objetivo de adaptar as normas vindas do governo
central às unidades federadas sob intervenção. (COSTA, 2008, p. 845)
19

Com isso, os principais objetivos do DASP eram: racionalizar os métodos, processos e


procedimentos; definir política de recursos humanos, de compra de materiais, centralização e
reorganização da administração pública federal (RENNÓ, 2015).

Carreiras que eram consideradas de grande relevância para o êxito do novo Estado
(auditores, diplomatas), faziam uso do concurso público e do sistema de mérito, capacitação,
garantias e salários competitivos. Entretanto, nas carreiras de nível mais baixo, ainda se via
resquícios do clientelismo e patrimonialismo devido às nomeações políticas, salários
defasados e ausência de meritocracia. Dessa forma, termos uma clara convivência da
burocracia com o patrimonialismo.

Com o fim da Segunda Gerra Mundial, houve um clamor da população brasileira pela
democracia, enaltecendo o conceito de liberdade difundido pelos Estados Unidos. Essa onda
ideológica e política fez com que o regime ditatorial sofresse um desgaste, refletindo no
governo de Getúlio Vargas.

O término do governo, em 1945, fez com que o DASP perdesse muita força, passando
a fazer um trabalho mais rotineiro e menos modernizador. Com o regime democrático, os
hábitos patrimonialistas voltaram com grande força, uma vez que servia de barganha para
troca de interesses entre o Legislativo e o Executivo.
20

2 Da Burocracia à Nova Gestão Pública

2.1 Governo de JK e as reformas administrativas

O governo de Juscelino Kubitschek foi marcado por uma administração mais pacífica,
de forma a evitar os conflitos, portanto, caso houvesse algum problema em uma estrutura do
governo, o presidente preferia criar uma outra (em geral, autarquia) para resolver o impasse.
Com esse mecanismo de governo, essa fase foi marcada por uma administração paralela à
administração pública.

O plano de metas do governo era executado com base nessa filosofia, logo a
coordenação ficava a cargo de grupos executivos, escolhidos diretamente por ele. Chamado
de “ilhas de excelência”, esses órgãos concentravam um corpo técnico altamente
capacitados, não contratados por concurso, mas sim por mérito, com salários mais altos que
os da administração direta. Foi, portanto, um período marcado pelo clientelismo e por uma
administração descentralizada, pautada em autarquias, empresas públicas e grupos
especiais. (COSTA, 2008)

2.2 Reforma da administração pública – Decreto-Lei nº 200/67


21

O governo militar norteou sua proposta de governo sob um viés modernizador, com o
objetivo de conter a inflação causada, principalmente, pelos altos salários e gastos
excessivos dos governos anteriores.

Assim sendo, foram implementadas uma série de medidas para estabilizar a economia
e tornar concreto o plano desenvolvimentista do governo militar, como por exemplo: criação
do Banco Central, reforma tributária, restrição de crédito, entre outros. (RENNÓ, 2015)

Entretanto, implementar melhorias no plano econômico sem se atentar para o


administrativo, não surtiria muito efeito prático, uma vez que o desenvolvimento acabava por
se limitar no modelo de gestão burocrático do país. Portanto, para se conseguir um avanço
no país, deveria ser enfraquecido o modelo centralizador e formalista da máquina pública,
além de haver uma maior distribuição das tarefas do Estado, já que sua principal
competência deveria ser a de planejar.

Diante da ênfase no planejamento, foi assinado em 1967, o Decreto-Lei 200, cujo


objetivo era a descentralização da administração pública, transferindo as competências
técnicas para órgãos especializados, que fariam parte da administração indireta, além de
flexibilizar a rotina dessa administração.

O Decreto-Lei promoveu a transferência das atividades de podução de bens e


serviços para autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista,
consagrando e racionalizando uma situação que já se delineava na prática.
Instituíram-se como princípios de racionalidade administrativa o planejamento e
o orçamento, a descentralização e o controle dos resultados (…) Através da
flexbilização de sua administração buscava-se uma maior eficiência nas
atividades econômicas do Estado, e se fortalecia a aliança política entre a alta
tecno-burocracia estatal, civil e militar, e a classe empresarial (BRESSER, 1996,
pg.13).

Nesse contexto, inclusive a contratação de determinadas entidades poderia ser feita


através da CLT, possibilitando, assim, maior paridade com o mercado privado e, portanto,
maior versatilidade da administração. ,
22

Além dessas medidas, o DASP foi extinto, reforçando o combate feito pelo regime
militar ao estigma burocrático do Brasil. Pode-se dizer que esse Decreto-Lei foi o primeiro
passo para administração gerencial.

Contudo, apesar dos avanços quanto a descentralização, o decreto acabou resultando


em três efeitos indesejáveis: contratação pautada pela CLT, o que gerou a ressurgência de
práticas patrimonialistas e clientelistas; e não atenção à administração direta ao deixar de
realizar concursos e investir na capacitação de altos administradores, levando a um
enfraquecimento do Estado como núcleo estratégico; e criação de uma tensão entre os
servidores e os celetistas.

Em 1979 foi realizada outra tentativa para combater a burocracia do serviço público
através do Programa Nacional de Desburocratização, comandado por Hélio Beltrão, cujo
objetivo era focar no interesse público, ou seja, o Estado deveria redirecionar a máquina
pública para atender ao cidadão e não ao procedimento em si. Diante disso, o plano buscava
simplificar e racionalizar os métodos, além de enxugar a máquina pública. Nesse contexto,
deu-se, também, as privatizações, onde o Estado não poderia mais se preocupar com
atividades que não fossem primárias à sua função.

2.3 Constituição de 1988 e a volta da burocracia

A Constituição de 1988 foi um marco para a redemocratização brasileira, garantindo


uma série de princípios que respeitam a individualidade do cidadão e a sua liberdade de
expressão, bem como normas que garantem o controle social do Estado por parte da
população, dando força à soberania popular.

Através dessa Constituição, que foi delineada a nova administração do governo,


pautada pelas garantias fundamentais, bem como repartição dos poderes e sua
independência. Sendo fundamental para instauração de um regime democrático no Brasil.
23

Todavia, ainda que ela tenha representado um progresso na legislação brasileira,


mostrou-se um retrocesso no que tange à administração pública. Devido à temeridade de
arbitrariedade em um novo governo, que não respeitasse a liberdade e à democracia, bem
como fizesse uso do clientelismo para preenchimento de cargos públicos, foram criados uma
série de mecanismos para dar segurança aos poderes.

Dessa maneira, aplicou, indiscriminadamente, a estabilidade de servidores públicos,


dificultou a contratação direta de pessoas do mercado com mais competência e estendeu o
Regime Jurídico Único à administração indireta. Ao garantir essa estabilidade e não estimular
um sistema de incentivo de pessoal, acabou por fomentar a não eficiência dos servidores,
havendo uma piora na qualidade da administração pública, além do inchaço da mesma.

A Constituição de 1988 ignorou completamente as novas orientações da


administração pública (…) Viram que o Estado havia adotado estratégias
descentralizadoras – as autarquias e as fundações públicas – que não se
enquadravam no modelo burocrático-profissional clássico. Notaram que essa
descentralização havia aberto espaço para o clientelismo, principalmente ao
nível do Estados e municípios – clientelismo esse que se acentuara após a
redemocratização. Não perceberam que as formas mais descentralizadas e
flexíveis da administração, que o Decreto-Lei 200 havia consagrado, eram uma
resposta à necessidade de o Estado administrar com eficiência as empresas e
os serviços sociais. E decidiram completar a revolução burocrática antes de
pensar nos princípios da moderna administração pública. (BRESSER, 1996,
pg.14)

Apesar de a Constituição adotar a burocracia como uma forma de combater o


clientelismo vigente na Ditadura Militar, isso não se mostrou eficaz na prática, uma vez que
determinadas normas corroboravam para continuidade desses privilégios. Nesse contexto,
pode-se citar a aposentadoria integral implementada para os servidores públicos que, a
priori, não estabelecia tempo de serviço prestado ao Estado; assim como a transformação
dos celetistas das fundações e empresas públicas em estatutário, fazendo com que tivessem
direito à estabilidade e à aposentadoria integral, elevando enormemente o ônus orçamentário
do Brasil.
24

Essas medidas onerosas vão de encontro ao cenário de crise econômica e fiscal que o
Brasil passava com o fracasso do Plano Cruzado e a elevada inflação. Portanto, era preciso
recuperar a poupança pública, desonerar o Estado de todas as atividades e estabelecer uma
administração que acompanhasse o ritmo da sociedade, sendo mais ágil e eficiente no
atendimento dos interesses da população. Entretanto, somente a partir dos anos 90, que o
governo se atenta para essa transformação, através do polêmico governo do presidente
Collor.

2.4 Governo Collor e o neoliberalismo

No governo de Collor se iniciou a abertura comercial ao mercado internacional, através


do incentivo às importações, além de privatizações e do enxugamento dos gastos do
governo, na tentativa de promover o ajuste fiscal. Sendo instituído, em 1990, o Plano
Nacional de Desestatização

Isso se deu porque, no final do Governo Sarney – seu antecessor –, a inflação atingiu
72%, tornando mais grave a crise econômica do país. Esse cenário alarmante fez com que o
novo presidente se visse obrigado a tomar medidas reacionárias para contornar a situação,
implantando esse plano de estabilização.

Apesar de medidas para tentar modernizar o país e diminuir a inflação, esse período foi
bem conturbado para a população e para a administração pública, pois além do
congelamento de preços e violento ajuste fiscal, houve o confisco da poupança. Gerando,
assim, uma crise política sem precedentes, além da redução drástica do quadro do
funcionalismo público, sem se atentar para os efeitos negativos dessa ação aleatória.
25

Foram extintos órgãos, demitidos servidores, reduzida as suas remunerações, ou seja,


transferido o ônus da má gestão da máquina pública aos servidores do Estado. Dessa forma,
ao desprestigiar a classe, essa se tornou desmotivada e não mais capacitada para operar de
forma eficiente na administração pública, assolando mais ainda a crise do país.

Com a política neoliberal de Estado Mínimo, pautada nas privatizações e nas


importações, a classe empresarial e industrial se viu em dívidas, já que não estava
preparadas para competitividade com o mercado externo; e a abertura financeira do país ao
eliminar o controle de entrada e saída de capitais, culminou na perda de controle sobre a
taxa de câmbio.

Em outras palavras, apesar de se pautar em uma ideologia modernizadora, Collor não


conduziu de forma correta essa reforma, pois as medidas de desmantelar a máquina pública
e de conter a inflação geraram uma crise política e econômica ainda maior no país, sendo
um período bem traumático para a população. Todas essas ações, fora os casos de
corrupção em seu governo, terminaram por resultar no seu impeachment, criando um abalo
nas instituições democráticas do Brasil .

2.5 Nova Gestão Pública – Conceito

Devido às expansões das funções econômicas e sociais do Estado, bem como a


globalização e o desenvolvimento tecnológico mundial, surge, na segunda metade do século
XX, um modelo administrativo gerencial que visa a acompanhar as transformações da
sociedade e suas necessidades. Dessa forma, seu objetivo é se mostrar mais flexível que o
sistema burocrático, que não consegue lograr esse êxito num cenário neoliberal.

Com a evolução da sociedade, a administração pública precisa ser eficiente e dinâmica


para atingir o interesse do cidadão, logo, tomar medidas como redução de custo e aumento
na qualidade do serviço, tornam-se essenciais para garantir que o cidadão seja o maior
beneficiário dos serviços do Estado. Para atingir essa eficiência, a nova administração se
26

utiliza do modelo privado para traçar suas diretrizes, já que esse mercado consegue
acompanhar a dinâmica desse mundo globalizado.

A administração pública gerencial inspira-se na administração de empresas,


mas não pode ser confundida com esta última. Enquanto a receita das
empresas depende dos pagamentos que os clientes fazem livremente na
compra de seus produtos e serviços, a receita do Estado deriva de impostos, ou
seja, de contribuições obrigatórias, sem contrapartida direta. Enquanto o
mercado controla a administração das empresas, a sociedade - por meio de
políticos eleitos - controla a administração pública. Enquanto a administração de
empresas está voltada para o lucro privado, para a maximização dos interesses
dos acionistas, esperando-se que, através do mercado, o interesse coletivo seja
atendido, a administração pública gerencial está explícita e diretamente voltada
para o interesse público. (PLANO DIRETOR DA REFORMA DO APARELHO
DO ESTADO, 1995, pg.16)

Entretanto, apesar de se pautar no modelo mais avançado, utilizado pelas empresas


privadas, não estabelece o rompimento completo com a burocracia, pois determinados
princípios desse sistema ainda são essenciais para o funcionamento da máquina pública,
como: a admissão por concurso público, existência de um sistema estruturado de
remuneração, avaliação de desempenho e capacitação permanente.

Ou seja, a divergência desse sistema com a burocracia está na maneira de como é


sustentada essa nova forma de administração pública, pois o foco deixa de ser relacionado
aos procedimentos (meio) para se relacionado aos resultados (fim), às políticas públicas.
Assim, o atual modelo administrativo fundamenta-se no princípio da confiança, o que gera
uma descentralização da decisão, uma vez que o subordinado passa a ter maior poder de
decisão, incentivando a criatividade e a horizontalização da estrutura. Com isso, garante-se a
flexibilidade, essencial para o dinamismo do serviço público.

Se o objetivo do gerencialismo é melhorar a qualidade na prestação dos serviços


públicos, então torna-se necessário valorizar o funcionário que presta esse atendimento. Por
isso da importância do investimento em recursos humanos, já que a administração é algo
orgânico, que possui vida e dinamismo por conta do seu corpo técnico.
27

Como mencionado acima, esse novo modelo tem como base a confiança no
funcionário, logo, para existir essa descentralização, faz-se necessário o treinamento de
quem recebe o trabalho, não somente de quem delega. Além disso, essa credibilidade leva a
uma aproximação do líder com o subordinado, gerando um resultado final mais favorável,
com maior segurança.

Em todos estes contextos apresentados, a adequação de recursos humanos da


Administração Pública se tornou tarefa prioritária. Sendo exigida uma política
que oriente a captação de novos servidores, o desenvolvimento de pessoal, um
sistema remunerado adequado que estimule o desempenho através de
incentivos e a instituição de carreiras compatíveis com as necessidades do
aparelho do Estado modernizado. (MANSOLDO, 2009, pg. 34)

Através de estímulo dado aos servidores públicos, busca-se atingir a motivação para
que eles tenham um desempenho melhor, já que, do contrário, a chance da cultura de
comodismo permanecer é muito grande, continuando o setor público engessado e, por isso,
não alcançando o resultado pretendido. Portanto, é fundamental para o funcionamento da
máquina pública, humanizar o trabalho, levando em consideração as necessidades e
particularidades de cada indivíduo.

Nesse viés de foco no resultado, o cidadão passa a ser visto como contribuinte de
impostos e, consequentemente, como cliente da prestação de serviço do Estado, sendo o
beneficiário direto dos resultados da administração pública. Para atingir esse fim, a estratégia
da nova gestão se pauta em três pilares, que são:

 Definir objetivos que cada unidade deverá alcançar;

 Garantir a autonomia do administrador na gestão dos recursos humanos,


materiais e financeiros para que possa atingir as metas traçadas;

 Controlar os resultados atingidos, em que os indicadores de bom desempenho


estão pautados no atendimento das necessidades do cidadão-cliente.
28

No Brasil, esse modelo foi implantado em 1995, através do Plano Diretor da Reforma do
Aparelho do Estado (PDRAE). Apesar das inúmeras tentativas do governo – como extinção e
criação de órgãos e constituição de uma estrutura paralela visando alterar a rigidez
burocrática – para realizar essa modernização da administração pública, somente no
governo de Fernando Henrique Cardoso que se deu a efetividade da implantação do modelo
gerencial, introduzindo as diretrizes e a cultura gerencial moderna na administração pública.

2.6 Reforma de 1995 – Plano Diretor de Reforma do Aparelho Do Estado

Apesar da crise mundial nos anos 70, apenas na década de 80 que começa a se sentir
a crise no Brasil, que envolve a crise fiscal e o esgotamento do plano de substituição de
importação. Soma-se a isso o fato de a máquina estatal ser considerada rígida,
centralizadora e com excesso de normas e procedimentos, o que dificulta sua adaptação ao
contexto.

Como pode ser visto ao longo do presente estudo, no governo do Fernando Collor, a
técnica adotada para contornar a crise foi se pautar numa ideologia neoliberal, de Estado
Mínimo, entretanto, essa não foi a solução da crise, pois só agravou a situação fiscal, uma
vez que a população ficou desamparada dos programas de governo. Somente nos anos 90
que surgiu uma proposta mais consistente de contornar essa crise pela qual o país passava,
através de uma reforma política, econômica e social do Estado.

Após o êxito no combate à inflação realizado no governo de Itamar Franco, que


fortaleceu a economia do país, seu Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, não
teve dificuldade para ser vitorioso na eleição da sucessão da presidência em 1995.

O objetivo era dar continuidade as medidas da gestão anterior, além de implementar e


intensificar as reformas do Estado. Nesse cenário, via-se uma necessidade de reduzir o
papel do Estado de executor à regulador em atividades relacionadas ao desenvolvimento do
Brasil. Dessa forma, a finalidade era a desoneração dos cofres públicos, já que o Estado não
precisaria estar a frente de atividades que podem ser realizadas pelo mercado privado,
29

ganhando, assim, mais condições para promover as políticas públicas, essenciais à


população.

Para isso, será necessária uma mudança em três planos: no plano institucional-
legal, através da reforma da Constituição e das leis do país; no plano cultural,
através da internalização de uma nova visão do que seja administração pública;
e no plano de gestão, onde afinal se concretiza a reforma. (LUSTOSA, 2008,
pg. 864)

Para aplicar essas transformações, seria imprescindível modernizar a administração


pública, a fim de que fosse capaz de colocar em prática o plano do governo. Por isso, seria
necessário, também, a reformulação do modelo administrativo para modernização do Estado.
Diante disso, o governo criou o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE),
liderado pelo ministro Bresser Pereira, promovendo significativos avanços do ponto de vista
administrativo.

Esse plano tinha como objetivo implementar a administração gerencial na no Brasil,


tendo como uma das principais influenciadores do plano a reforma ocorrida na Inglaterra. O
objetivo não era voltar à filosofia de Estado Mínimo, até porque a população ainda queria que
o governo provesse determinados serviços públicos, e sim, adotar medidas para que essa
prestação fosse mais eficiente.

Não estava interessado em discutir com os neoliberais o grau de intervenção do


Estado na economia, já que acredito que hoje já se tenha chegado a um
razoável consenso sobre a inviabilidade do Estado mínimo e da necessidade da
ação reguladora, corretora, e estimuladora do Estado. (BRESSER, 2001, pg.24)

Segundo Bresser Pereira, essa reforma atuaria em duas frentes: facilitar o ajuste fiscal
e modernizar a administração pública. O ajuste fiscal seria realizado no âmbito do
funcionalismo público ao reduzir a máquina pública com a exoneração de servidores; definir
o teto remuneratório; e aumentar o tempo de serviço para a aposentadoria, tornando-a
30

proporcional à contribuição. A primeira medida de redução foi realizada no âmbito dos


Estados e Municípios, já que a União não tinha excesso de quadro, enquanto as demais
foram aplicadas, também, à União.

Já no aspecto da modernização, não se pode falar em centralização, como as ocorridas


em 1936 e 1988, tampouco em descentralização, como o programa de 1967. Ou seja, a ideia
não era continuar com o processo cíclico de centralizar e descentralizar, presente ao longo
da história da administração pública no Brasil e, sim, fortalecer a administração direta,
representada pelo “núcleo estratégico do Estado”, bem como garantir mais autonomia à
administração indireta, ocorrendo ambos processos de forma simultânea. A ligação entre
entre essas administrações se dá pelo “contrato de gestão”, no qual o Estado se torna
responsável por definir e controlar as políticas públicas, e as agências e organizações, a
executar.

Para que seja mais fácil o enfrentamento de obstáculos que venham a surgir na
implementação desse novo modelo de gestão, além de identificar estratégias específicas
para cada segmento, foi definido um modelo conceitual para separar o aparelho do Estado
em quatro setores:

 Núcleo Estratégico: responsável pela definição das leis e políticas públicas. É a


natureza da função estatal, onde as decisões estratégicas são tomadas. Abrange
o Poder Executivo, Legislativo, Judiciário e o Ministério Público.

 Atividades Exclusivas: serviços prestados exclusivamente pelo Estado, pois


exerce o poder extroverso, que incluir poder de regulamentar, fiscalizar e
fomentar. Exemplo: cobrança de imposto, polícia, previdência social, fiscalização
do cumprimento de normas sanitárias, fiscalização da aviação e etc.
31

 Serviços Não Exclusivos: O Estado atua neste setor juntamente com outras
organizações, sejam elas públicas ou privadas. Não possui poder de Estado,
entretanto envolve serviços essenciais para a população, como educação e
saúde, ou produzem ganhos que não podem ser apropriadas por esses serviços
através do mercado, exemplo: universidade, centro de pesquisa, museus e etc.

 Produção De Bens E Serviços Para O Mercado: São atividades econômicas


voltadas para o lucro, mas que ainda permanecem no aparelho do Estado como,
por exemplo, as do setor de infraestrutura. Ainda fazem parte do Estado, pois
faltou capital do setor privado para investir nesse setor ou fazem parte de
atividades naturalmente monopolistas, como a Petrobrás. Caso a instituição seja
privatizada, necessita-se de intensa regulamentação.

Após essa setorização, o plano direcionou os tipos de modelo administrativo –


burocrático e gerencial – mais adequado para cada área. No caso do núcleo estratégico, é
essencial que as decisões sejam efetivamente cumpridas e que atendam ao interesse
público. Logo a efetividade é mais importante que a eficiência. Já nos demais setores, a
eficiência se torna mais relevante, pois o atendimento à população brasileira tem de aliar boa
qualidade a baixo custo, logo esse critério se sobressai ao da efetividade.

Partindo desse princípio, a burocracia, também, torna-se adequada ao núcleo


estratégico, pois apresenta a vantagem de segurança e efetividade das decisões, ou seja,
possibilita ao gestor ver as medidas obedecidas e implementadas, já que passa por um
rigoroso processo de implantação. Já o modelo de administração pública gerencial tem de
prevalecer nos demais setores, pois são áreas mais competitivas, que exigem respostas
mais rápidas do Estado, de contato direto com o cidadão.
32

Para facilitar a compreensão do leitor acerca dos tipos de modelos adequados a cada
setor, o PDRAE traçou um esquema de organização que representa essa divisão:

Quadro 2: Setores do Estado e Tipos de Gestão

Ao
analisar a proposta do Plano Diretor, percebemos cinco diretrizes para aplicação das
medidas2 :

 Instituicionalização: a reforma só poderia ser, de fato, concretizada a partir da


reforma da própria Constituição e das leis que engessam a administração;

 Racionalização: aumentar a eficiência através de cortes nos gastos, mas sem


perder a produção;

2 COSTA, F. L. “Brasil: 200 anos de Estado; 200 anos de administração pública; 200 anos de
reforma.” Revista de administração pública, 2008.
33

 Flexibilização: maior autonomia aos gestores públicos na administração de


recursos financeiros, materiais e humanos, fazendo o controle após os
resultados, e não anteriormente;

 Publicização: transferência de determinadas competências não exclusivas do


Estado (devolution), flexibilizar as atividades. Nesse campo estão incluídas as
áreas de saúde, educação, cultura, ciência, meio ambiente, etc;

 Desestatização: privatização, terceirização e desregulamentação

2.7 Emenda Constitucional nº 19 de 1998

O marco legal da reestruturação do Estado foi através da Emenda Constitucional nº 19


de 1998, que implementou importantes mudanças referentes à Administração Pública e ao
servidor público, interferindo na admissão de pessoal, na política de remuneração, na
estabilidade e na descentralização das funções das entidades administrativas.

Modifica o regime e dispõe sobre princípios e normas da Administração Pública,


servidores e agentes políticos, controle de despesas e finanças públicas e
custeio de atividades a cargo do Distrito Federal, e dá outras
providências.(Dispositivo da EC nº19/1998)

Além de discorrer sobre mudanças na estrutura da administração, foi inserido, também,


na Constituição, o princípio da eficiência, que faz jus ao que preconiza o Plano Diretor do
governo FHC, sendo o princípio fundamental para servir de norte a toda reforma do aparelho
do Estado.

Esse princípio obrigou o servidor público a realizar suas atribuições com mais
qualidade, agilidade e perfeição, sendo passível de perda do cargo, caso não se mostre
eficiente.
34

Essa emenda foi criticada por muitos, uma vez que viram nela o objetivo predominante
de alterar o regime jurídico a fim adequá-lo aos novos requerimentos da política gestacional.
Entretanto, há de se afirmar, que ela representou um grande avanço para disciplinar as
atividades do Estado, já que, através de seus dispositivos, deu respaldo legal para a efetiva
participação do cidadão e para a qualidade do serviço prestado.

2.8 Reforma administrativa e a desburocratização

Essa reforma implementada pelo PDRAE não foi suficiente para eliminar as disfunções
da burocracia, pois ainda há uma cultura burocrata muito arraigada em nossas instituições
devido à crença de que o patrimonialismo possui alta prevalência no Brasil. Entretanto,
apesar do nepotismo e da corrupção estarem presente, não são mais a regra, pois além de
termos uma fiscalização maior por parte da população, ainda contamos com medidas legais
para combater esses desvios, como a lei da improbidade administrativa.

Portanto, essa desconfiança nos administradores públicos, só corrobora para manter a


cultura centralizadora que confere menor autonomia aos funcionários em todas as
dimensões do órgão, seja ela nas áreas de recursos humanos, seja na de materiais e na
área financeira. Daí, explica-se o motivo de, até hoje, haver rigidez em determinados
procedimentos, que deveriam ser mais céleres para atender o interesse público, como no
caso do processo licitatório.

Soma-se a isso, a meritocracia defendida pela burocracia, a qual o servidor ascende


lentamente na sua profissão, que se mostra defasada devido a um longo plano de carreira
para ascensão profissional. Não acompanhando, assim, a dinâmica da sociedade
contemporânea, onde os jovens não estão mais dispostos a esperar os 50 anos para atingir
o topo da carreira.

Em outras palavras, é necessária a profissionalização do serviço público através de um


sistema de promoção que, de fato, leve em consideração o mérito e não o tempo de serviço,
35

fazendo com que os mais aptos tenham chances efetivas de ascender rapidamente, sem
serem barrados pela rigidez burocrática.

Ainda na parte de recursos humanos, seria interessante gerar a “motivação negativa”3,


ou seja, penalizar àqueles que não apresentam desempenho satisfatório. Pois, apesar de
existir mecanismos para discipliná-los, como a avaliação de desempenho, na prática, a
sanção não é muito recorrente, apenas em casos graves relacionados à improbidade
administrativa. Ou seja, ao adotar uma postura rígida relacionada a resultados no trabalho,
diminuem-se comportamentos e hábitos comodistas. Influenciando, assim, positivamente o
atendimento do cidadão no serviço público e, seu consequente, atingimento do objetivo da
nova gestão.

Considerações finais

O presente estudo revela que a evolução da administração pública se deu através de


três modelos: patrimonialismo, burocracia e gerencialismo. Sendo cada um predominante em
uma determinada época, sem acarretar o rompimento do sistema anterior quando o seguinte
fosse implementado. Nesse caso, podemos exemplificar o contexto atual, no qual é regido

3 Termo retirado do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, 1995.


36

pela administração pública gerencial, porém, ainda, com práticas burocráticas e resquícios
patrimonialistas.

No patrimonialismo, o Estado é usado para atender aos interesses da classe


dominante, não havendo distinção de patrimônio público e privado. Nesse modelo, prevalece
o nepotismo e a corrupção, utilizados amplamente para “troca de favores”. Conforme foi visto
ao londo do estudo, esse modelo é o mais duradouro em termos de aplicação, uma vez que
se originou nos primórdios do Brasil e, até hoje, está presente na administração, mas com
menor força.

Já a administração pública burocrática surgiu com a finalidade de combater o


patrimonialismo, sendo a antítese desse modelo ao criar normas e regramentos que
dificultem essa prática patrimonialista, além de criar um sistema que incentiva o funcionário
através do mérito. Percebe-se que a burocracia se mostrou de grande utilidade no período
do Estado Novo, reorganizando a máquina pública e colocando a preferência nacional à
frente das preferências individuais. Tornando-se, assim, essencial para o desenvolvimento
do país no período e sendo carro-chefe do governo de Getúlio Vargas com sua política
nacionalista.

Entretanto, esse modelo não conseguiu acompanhar a evolução da sociedade, uma vez
que não possuía flexibilidade para se adaptar às mudanças. Com essa rigidez excessiva,
suas características, que antes lhes eram de grande valia para o contexto histórico,
acabaram por gerar disfunções na administração pública, levando ao “engessamento” do
Estado.

Posteriormente, uma série de medidas foram realizadas para diminuir essas disfunções
e tornar a máquina estatal mais rápida frente às mudanças. Dessa maneira, podemos
destacar a reforma administrativa, realizada no período militar, no ano de 1967, que buscou
descentralizar a administração pública através da criação de uma administração indireta,
com maior autonomia.
37

Porém, o que parecia ser uma medida eficaz para a maleabilidade do Estado, acaba se
tornando um atrativo para volta de práticas clientelistas, uma vez que a maior liberdade
concedida às empresas públicas, criadas pelo Decreto-Lei de 67, permitia nomeação de a
cargos públicos sem critério e, portanto, servindo como uma moeda de troca entre as
autoridades. Além de não ter dado a devida importância a administração direta, que acabou
enfraquecida por conta da falta de investimentos.

Devido à volta do patrimonialismo e a má gestão dos recursos públicos levada pelos


militares – o que gerou uma grande dívida ao Brasil –, a Constituição de 1988 restaurou a
dinâmica burocrata para gerir a máquina estatal, representando um retrocesso na
flexibilidade que se foi conseguida ao longo dos anos. O retorno da burocracia acaba por
representar um excesso de gasto aos cofres públicos e engessamento do Estado, gerando
uma crise fiscal e econômica no país.

Diante disso, no governo Collor, para tentar conter a inflação e a crise econômica,
adotou-se o neoliberalismo, com a defesa de um Estado Mínimo, com redução de gastos ao
extremo, além de criação de medidas impopulares para conter a inflação. Entretanto, como
era de se esperar, o plano de ação do governo acabou sendo ineficaz para a recuperação do
Brasil e se instaura uma das mais memoráveis crises política e econômica do governo,
culminando com o impeachment do presidente.

Para tentar conter essa desvalorização crescente da moeda e a crise fiscal, o governo
de Itamar Franco cria o Plano Real, sob direção do Ministro da Fazenda Fernando Henrique
Cardoso, conseguindo estabilizar a economia e dando esperança a uma população
desacreditada. Em meio a euforia do período, elege-se para o cargo de sucessor na
presidência o, então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, dando início a uma
nova gestão pública.

A moeda já estava estabilizada e a inflação já controlada. Mas, para continuar com o


plano de desenvolvimento do Brasil, seria necessário a reformulação de toda administração
pública, uma vez que os avanços poderiam ser limitados pela ineficiência do aparelho estatal
38

em gerir os seus recursos e a sua administração. Diante disso, formulou-se, sob a direção de
Bresser Pereira, o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, cujo objetivo era
modernizar toda a administração pública através da implantação de um modelo gerencial.

Para consolidar essas mudanças, foi aprovada a Emenda Constitucional nº 19 de 1998,


que promoveu alterações no quadro do funcionalismo público, bem como criou mecanismos
para desonerar o Estado com serviços que não eram essenciais como provedor, legitimando
a privatização de inúmeras estatais.

Apesar da modernização alcançada por esse plano, não podemos dizer que seu
modelo foi efetivo, pois a máquina pública ainda apresenta deficiência em atender o
interesse público, pois ainda há lentidão nos processos administrativos, não sendo
eliminados os desvios da burocracia e as práticas do patrimonialismo, com o uso de
nepotismo e corrupção (presente em órgãos menores, onde a fiscalização é mais precária).

Por tudo exposto, percebe-se que o Brasil ainda tem um longo caminho pela frente para
evoluir na administração pública, pois todos esses modelos antigos ainda perduram em
nossa atualidade de forma negativa. Entretanto, a população tem um papel cada vez mais
crucial nesse processo, uma vez que sua participação ativa em relação ao governo, através
da fiscalização e cobrança, corrobora para evolução da nossa máquina pública. Isso porque,
ao longo do texto, foi possível notar o quanto o modelo administrativo se torna reflexo da
sociedade que o representa, logo uma população que não seja passiva, que exija seus
direitos, acaba por pressionar o país a adotar uma política de maior qualidade na sua
prestação de serviço.

Referências Bibliográficas

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