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SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 1
Presidência da República
Luiz Inácio Lula da Silva
Coordenação-Geral de Ensino
Ana Claudia Bernardes Vilarinho de Oliveira
Coordenação Pedagógica
Joyce Cristine da Silva Carvalho
Gerente de Curso
Raimundo Carlos Viana Mendes
Conteudistas
Ynaê Lopes dos Santos
Thales Monteiro e Vieira
Jalba Santiago dos Santos Segundo
Revisão Técnica
Givânia Maria Sila
Lucilene Costa
Revisão Pedagógica
Evânia Santos Assunção Motta
Revisão Textual
Itamara Esteves da Cunha
Programação e Edição
Renato Antunes dos Santos
Fábio Nevis dos Santos
Designer
Zulmiro José Machado Filho
Design Instrucional
Luana Manuella de Sales Mendes
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO DO CURSO ................................................................................................... 3
OBJETIVOS DO CURSO ............................................................................................................. 3
ESTRUTURA DO CURSO ........................................................................................................... 4
MÓDULO I – HISTÓRIA DO RACISMO E SUA RELAÇÃO COM O DESENVOLVIMENTO DO
ESTADO BRASILEIRO ............................................................................................................... 5
APRESENTAÇÃO DO MÓDULO ................................................................................................. 5
OBJETIVOS DO MÓDULO .......................................................................................................... 5
ESTRUTURA DO MÓDULO......................................................................................................... 6
AULA 1 – O CONCEITO DE RACISMO ESTRUTURAL ............................................................... 7
AULA 2 – O PASSADO ESCRAVISTA E O HISTÓRICO DO RACISMO NO BRASIL................ 19
AULA 3 - O NASCIMENTO DA POLÍCIA MILITAR EM MEIO A UMA SOCIEDADE ESCRAVISTA
E RACISTA. ............................................................................................................................... 31
AULA 4 - RACISMO CIENTÍFICO E SUA CAPILARIDADE NO BRASIL: O NASCIMENTO DO
MITO DA DEMOCRACIA RACIAL.............................................................................................. 40
AULA 5 - O NASCIMENTO DA REPÚBLICA EXCLUDENTE ..................................................... 50
FINALIZANDO............................................................................................................................ 59
MÓDULO II – LETRAMENTO E SENSIBILIZAÇÃO ANTIRRACISTA ...................................... 60
APRESENTAÇÃO DO MÓDULO ............................................................................................... 60
OBJETIVOS DO MÓDULO ........................................................................................................ 60
ESTRUTURA DO MÓDULO....................................................................................................... 60
AULA 1 – O MITO DA DEMOCRACIA RACIAL E SUAS IMPLICAÇÕES CONTEMPORÂNEAS 61
AULA 2 – ESTIGMA, ESTEREÓTIPO E VIOLÊNCIA RACIAL ................................................... 66
AULA 3 – BRANQUITUDE, BRANQUEAMENTO E AS HIERARQUIAS DE HUMANIDADE ...... 73
AULA 4 - BRANQUITUDE E VIOLÊNCIA POLICIAL: REFLEXÕES SOBRE RACISMO
ESTRUTURAL NO BRASIL........................................................................................................ 76
AULA 5 – O ANTIRRACISMO COMO PRÁTICA ........................................................................ 84
FINALIZANDO............................................................................................................................ 87
MÓDULO III – SUSP E O ENFRENTAMENTO AO RACISMO .................................................. 88
APRESENTAÇÃO DO MÓDULO ............................................................................................... 88
OBJETIVOS DO MÓDULO ........................................................................................................ 88
ESTRUTURA DO MÓDULO....................................................................................................... 89
AULA 1 – RACISMO SOB A PERSPECTIVA INSTITUCIONAL ................................................. 90
AULA 2 – CURRÍCULO OCULTO ............................................................................................ 100
AULA 3 – GESTÃO ANTIRRACISTA ....................................................................................... 103
AULA 4 – RACISMO E O OPERADOR DO SUSP ................................................................... 110
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................ 113
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 3
APRESENTAÇÃO DO CURSO
Neste curso, iremos tratar de uma questão que é essencial para as ações dos
órgãos de Segurança Pública do Brasil: o enfrentamento da desigualdade racial no
país.
OBJETIVOS DO CURSO
Objetivo geral
Objetivos específicos
ESTRUTURA DO CURSO
APRESENTAÇÃO DO MÓDULO
OBJETIVOS DO MÓDULO
ESTRUTURA DO MÓDULO
Esse conceito é uma perspectiva analítica que defende que o racismo estrutura
as relações políticas, econômicas, sociais e culturais da modernidade das quais o
Brasil faz parte. Dito de outra forma, o racismo organiza a sociedade brasileira.
Nesta aula, iremos analisar, com mais cuidado, o que é o racismo estrutural,
reforçando, assim, uma afirmação que deve atravessar todo o curso: o Brasil foi, e
continua sendo, um país racista. E, para que isso mude, ações de diferentes naturezas
devem ser tomadas. A reeducação é uma delas.
Pois bem, essa é apenas a ponta do iceberg, a parte facilmente visível do racismo.
E, como veremos ao longo deste módulo do curso, acreditar que, no Brasil, o racismo
se restringe apenas a essas ações individuais foi uma ideia muito bem construída,
com o intuito de mascarar a força e a dimensão estrutural que ele teve, e continua
tendo, em nossa sociedade.
Um dos maiores argumentos daqueles que defendiam a ideia de que o Brasil era
um país no qual o racismo não era um problema de grandes dimensões estava na
comparação entre a sociedade brasileira e a sociedade estadunidense. Como nos
Estados Unidos existiram leis segregacionistas - conhecidas como as leis Jim Crow,
algo que não ocorreu no Brasil, se difundiu uma ideia equivocada de que, no Brasil, o
racismo seria mais brando e pontual. No entanto, é fundamental sublinhar que a
ausência de leis abertamente segregacionistas não significa ausência de racismo. O
que vamos ver aqui é que o Estado Nacional brasileiro e boa parte da elite do país
criaram diferentes tipos de dispositivos (inclusive legais) para garantir a segregação
racial como um elemento ordenador da nação, sem que isso ficasse explicitado. É
neste ponto que reside a grande diferença entre a experiência estadunidense e a
brasileira. Lá, o racismo é algo reconhecido; aqui, no Brasil, ainda existe uma espécie
de grande véu que encobre as profundezas do nosso racismo. Nosso objetivo aqui é
tirar esse véu.
ilustram o que é o racismo estrutural e a segregação social e racial que ele gera no
Brasil. Enquanto uma das atividades mais prestigiosas do país é ocupada quase que
exclusivamente por pessoas brancas, há uma predominância significativa de pessoas
negras numa atividade enquadrada como inferior ou menos qualificada. Além disso,
eis o que também é estarrecedor: essas imagens não causam nenhum espanto no
Brasil, porque nós fomos treinados a entender como normal que pessoas brancas
estejam em lugares de prestígio, enquanto pessoas negras se restringem à
subalternidade.
Muitos podem afirmar que não se trata de um problema racial, mas social, uma
vez que as fotos retratam pessoas de classes sociais distintas. Sim, isso é verdade,
mas, no Brasil, a questão racial ordena as classes sociais. Então, para que isso fique
evidenciado, convido todos e todas a examinarem, com calma, o gráfico abaixo:
Esse gráfico demonstra que, mesmo dentro da mesma classe social, ainda existe
uma disparidade salarial entre a população negra e branca - uma realidade que
aparece em meio à população mais pobre, e que vai se tornando cada vez mais
acentuada à medida que o recorte socioeconômico se torna mais alto. Quanto mais
rica é a classe social, maior a diferença salarial entre negros e brancos (mesmo
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 11
quando ambos têm instrução superior). Que outra razão poderia explicar essa
disparidade senão o racismo?
A segunda situação que gostaria de tratar aqui diz respeito, diretamente, ao tema
do nosso curso: a segurança pública no Brasil.
Na Prática
Uma maneira simples de explicar o que é racismo estrutural seria exatamente essa: a
normalidade com a qual encaramos e experimentamos as diferenças raciais no Brasil, como
se fosse “natural” que negros que concluíram o Ensino Superior ganhem menos do que seus
colegas brancos de profissão; ou então que seja quase banal o fato de que a população
negra segue sendo desproporcionalmente atingida por ações violentas das forças de
segurança.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 13
A questão é que essa aparente normalidade não existe na natureza, não faz
parte do “ar que respiramos”. Ela é fruto da construção de um sistema de poder
que tem uma história longa, de raízes profundas. Esse sistema de poder é o que
chamamos de racismo.
Sendo assim, uma das formas mais eficientes de entender a dimensão estrutural
do racismo é justamente entendê-lo como um sistema de poder. Essa é uma
percepção fundamental, porque permite que tenhamos uma compreensão mais densa
do que ele é e de como ele funciona. No Brasil, é comum que o preconceito racial,
quando reconhecido, seja tratado como um “problema do negro”. Existem estudos de
diferentes áreas do conhecimento que tentam compreender como o racismo impacta
a vida da população negra. Embora essa seja uma dimensão importante, pois negros
e negras são as vítimas do racismo, é crucial perguntarmos: qual a implicância que a
população branca tem numa sociedade racista? Ou melhor dito: quais as
responsabilidades e os privilégios que as pessoas brancas têm numa sociedade
racista? Se olharmos para o Congresso Nacional brasileiro, as Supremas Cortes, os
tomadores de decisões em relação aos destinos de nosso país, as camadas mais
favorecidas e o mundo empresarial, não demoramos para encontrar a resposta.
Esse sistema tem como premissa o fato (irreal) de que a humanidade está dividida
em raças. Por muito tempo, acreditou-se que essas eram biologicamente diferentes,
e essas crenças foram cruciais na organização de uma sociedade, que tomava as
características fenotípicas como atributos para hierarquizar as experiências humanas.
Foram construídos estereótipos negativos sobre a população negra baseadas em
traços físicos, capacidade intelectual, moralidade e cultura, tornando-os bases para
inferioridade, definindo, assim, que existiam alguns tipos de vidas humanas que eram
superiores a outros tipos. Ou seja, existiam umas que importavam mais do que outras.
Embora, desde o começo do século XX, a ciência já tenha comprovado que raças
humanas não existem, o conceito de raça continuou fazendo sentido para entender e
explicar a organização social, política, econômica e cultural do mundo.
Um exemplo fácil que comprova esse aspecto do contrato racial está no fato de
não nos referirmos às pessoas brancas como pessoas brancas; na lógica do racismo,
essas são apenas pessoas. Mas, quando estou me referindo a um sujeito não-branco,
a sua condição racial é rapidamente acionada. Isso acontece em situações do nosso
dia a dia, quando descrevemos ou nos referimos a alguém, ou quando, na escola,
aprendemos a história da Europa como se ela fosse a história universal (e,
consequentemente, a mais importante).
Esse sistema nos faz crer que tudo que advém da Europa, por ser universal,
abarca toda a existência humana. Um exemplo clássico disso é o pouco (ou quase
nada) que estudamos nas nossas trajetórias escolares sobre os demais continentes.
O africano, por exemplo, da forma como é apresentado nos livros didáticos, nos leva
a construir uma ideia de país, e não de um continente com diversos países, cultura,
idiomas, economias, biomas, organizações sociais e políticas diferentes. Para falar do
continente africano, o foco sempre se volta para as guerras, a fome e a miséria.
Ou seja, o contrato racial que funda o sistema de poder, que é o racismo, também
define que as instituições sejam racistas - não um aberto e declarado que costuma
aparecer em situações de governos mais autoritários e extremistas, mas por meio de
leis e costumes que entendem as desigualdades existentes entre brancos, negros e
indígenas como atributos naturais da experiência humana. Um exemplo bem
elucidativo é o fato de, no Brasil, termos pouquíssimos presidentes de empresas
negros, e isso não ser um problema ou fator de indignação.
Como explicar que, num país no qual 56% da população se autodeclara negra,
nem 10% dos maiores empresários sejam negros? Será que eles não se esforçam o
suficiente, ou será que apesar dos esforços, há um sistema que impede ou limita as
possibilidades de ascensão social de um homem e de uma mulher negra? Outro
exemplo pode ser atestado pela baixa representatividade negra no Congresso
Nacional. É complexo encontrar outra resposta que nos mostre o porquê de, num país
que tem mais da metade da população autodeclarada negra, apenas 20% dos
parlamentares sejam negros, que não o racismo.
Na Prática
Como foi dito no começo desta aula, a violência endêmica das forças
policiais contra as pessoas negras e indígenas do país é a ponta de um iceberg,
que nada mais é do que nosso racismo estrutural. Mas essa ponta também é
parte do problema, e deve ser bem estudada.
Este curso é uma das medidas necessárias para que comecemos a (re)conhecer
o caráter estrutural do racismo no Brasil e, a partir de então, elaborarmos ações e
políticas públicas que coloquem em xeque a ordem racista que nos estrutura. O
preconceito racial é uma das principais engrenagens da sociedade brasileira. Assim,
como bem disse a advogada e professora Thula Pires, é fundamental que coloquemos
pedras para interromper o funcionamento dessas engrenagens. Há séculos, negros e
indígenas vêm sendo as pedras massacradas pelas máquinas do racismo, mesmo
porque não tenha havido, e ainda haja, muita escolha para essas populações. Desse
modo, quem se compromete com a luta pelo fim da desigualdade racial está se
propondo a ser pedra também. Essa é uma escolha que causará incômodos, dores,
angústias, mas é a única forma de mudarmos a estrutura racial que temos.
Nas próximas aulas deste módulo, iremos fazer um passeio sobre a história do
Brasil, em meio a uma perspectiva crítica, para que possamos entender como e por
que a Segurança Pública brasileira foi, e continua sendo, ordenada pelo racismo.
Imaginamos que esse possa ser um bom começo para as mudanças necessárias.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 19
Por muito tempo, a história inicial do Brasil foi marcada por uma abordagem
superficial e preconceituosa, especialmente em relação à mudança na força de
trabalho explorada pelos portugueses. Gerações de brasileiros aprenderam, nas
escolas, que a substituição da mão de obra indígena era justificada pela alegada
aversão dos nativos ao trabalho árduo em contraposição à suposta superioridade
física dos africanos. Essas visões, de teor marcadamente racista, perpetuaram a ideia
errônea de que os indígenas eram preguiçosos, enquanto os africanos eram
considerados "animais de carga", destinados a realizar trabalhos pesados.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 22
eram punidos pelos pecados cometidos por seus antepassados, e a punição residia
justamente no fato de eles serem negros.
Como o Brasil era uma colônia de dimensões continentais, o que se observou foi
que, a partir de meados do século XVII, africanos escravizados passaram a trabalhar
em atividades vinculadas ao mercado externo, e a presença de indígenas
escravizados era mais frequente em espaços destinado à economia interna da
colônia, mas, muitas vezes, esse padrão foi alterado. De todo modo, o que tivemos,
ao longo da experiência colonial, foi a confirmação reiterada de um dos primeiros
pressupostos do racismo científico: o fato de que apenas os grupos racializados eram
passíveis de serem escravizados.
africanos escravizados tornou-se uma das empresas mais lucrativas de todo o mundo,
viabilizando a) criação de fortunas, b) acumulação primitiva de capital, c)
financeirização da economia mundial e surgimentos de bancos. Durante 200 anos,
nada dava mais dinheiro no mundo do que comprar e vender gente negra.
Fonte: Gravura publicada em 1830 no livro Notices of Brazil in 1828 and 1829, de R. Washl. Domínio
público, Arquivo Nacional – Ministério da Justiça Disponível em: https://multirio.rio.rj.gov.br/index.php/historia-
do-brasil/america-portuguesa/8739-o-tr%C3%A1fico-negreiro.
É preciso repetir, uma vez mais, que a desumanização de africanos negros foi o
ponto de partida, e o ponto de chegada da empresa mais lucrativa que existiu entre
os séculos XVII e XIX. Foi esse processo que permitiu que o tráfico transatlântico de
africanos escravizados se expandisse ao longo dos séculos, atingindo o seu apogeu
no século XIX. O comércio impulsionou consideravelmente a entrada de africanos na
América portuguesa, consolidando a escravidão como um sistema profundamente
enraizado. A presença e o papel dos traficantes brasileiros foram fundamentais para
o influxo maciço de africanos, estabelecendo um ciclo de comércio bilateral que
fortaleceu os laços entre o Brasil e algumas sociedades africanas. Não por acaso, o
Brasil foi a localidade das Américas que mais recebeu africanos escravizados: 4,8 dos
12 milhões de africanos sequestrados de suas terras de origem desembarcaram e
trabalharam no Brasil - o último país a abolir a “escravidão” nas Amáricas.
Esse enorme volume do tráfico é o principal fator que explica por que o
escravizado se tornou o tipo de propriedade privada mais acessível em toda a colônia
e também nas primeiras décadas do Império do Brasil. A alta lucratividade na compra
e venda de pessoas africanas fez com que muitos brasileiros se tornassem traficantes,
o que, por sua vez, facilitou o acesso da população aos escravizados. Ainda que o
africano escravizado fosse uma propriedade significativamente cara, até mesmo
pessoas de condições mais módicas poderiam comprá-lo, pois os traficantes
brasileiros criaram cartas de crédito que facilitavam a aquisição de um cativo.
É necessário pontuar que boa parte dessas atividades eram executadas a partir
de saberes e tecnologias que africanos e africanas trouxeram de suas sociedades de
origem, tais como a pecuária extensiva e a metalurgia (ambas desconhecidas pelos
portugueses), e uma série de processos de cura executados pelos mestres
sangradores, pelas parteiras e pelos boticários. A presença dos escravizados era
tamanha que, durante a vigência da escravidão, eles podem ser entendidos como
sinônimo de trabalho - uma condição que era herdada pelos seus descendentes,
mesmo aqueles que conseguiam comprar sua liberdade por meio da carta de alforria.
No Brasil, até 1888, os negros e as negras eram, antes de mais nada, trabalhadores
e trabalhadoras.
Não por acaso, boa parte dos órgãos de repressão que foram criados
contaram com a participação efetiva da população pobre e, muitas vezes, negra
e mestiça. Muitos capitães-do-mato eram homens de cor livres, que ganhavam
a vida capturando escravizados negros foragidos. O Terço dos Henriques (uma
milícia armada do período colonial formada apenas por homens negros e
mestiços) era um corpo militar frequentemente solicitado quando o assunto era
o desmantelamento de mocambos e quilombos. Ainda que negros e mestiços
fossem vistos como seres inferiores, era fundamental que existisse uma
diferenciação dentre eles para que o fomento de uma identidade racial não
acontecesse. Dito de outra forma, uma maneira eficaz de manter a ordem
escravista no Brasil colônia e no Brasil Império era organizar forças de
repressão compostas por homens negros (livres e libertos). Essa foi uma lição
que o Estado brasileiro aprendeu muito bem, e que foi adaptada para a
experiência republicana, até porque, quando organizadas de acordo com os
interesses que visavam à manutenção dos privilégios, a presença negra e
mestiça nesses órgãos de repressão garantiam que o lado mais frágil das duas
pontas às ações policiais fossem pessoas negras.
Voltando para o período colonial, é possível afirmar que uma das maiores
heranças legadas para o Império do Brasil foi a escravidão negra. Isso significa dizer
reconhecer não só a dependência que o Brasil tinha em relação ao trabalho realizado
pelos escravizados, como também pontuar que essa dependência criou uma
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 29
sociedade na qual o oposto de ser escravo era ser senhor de escravos. Isso mesmo:
no Brasil, uma das condições mais almejadas durante séculos era ser proprietário de
alguém, e esse alguém sempre era uma pessoa negra.
Essa era uma condição tão entranhada na sociedade brasileira que, em meio a
uma das transformações políticas mais significativas da nossa história – o Processo
de Independência em 1822 -, as elites brancas do país refizeram o pacto em nome da
escravidão e da segurança de seu lugar como proprietário de escravizados. Essa
talvez tenha sido a maior aposta daquele período; o Brasil, independente e soberano,
apostava na escravidão para o futuro.
Desse modo, como bem colocado pelo historiador Luis Felipe de Alencastro: o
Brasil foi uma nação que apostou na escravidão, lançando-a para seu futuro. Foi a
partir do lugar de senhor de escravo que as elites brasileiras se reconheceram e
construíram o Império do Brasil. Essa foi uma aposta tão pactuada que fez com que
essas mesmas elites e o Estado Nacional brasileiro se colocassem contra uma lei que
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 30
havia sido elaborada e promulgada pelo Congresso do país. Explico: depois de anos
de pressão, em 1831 o governo regencial finalmente assinou a lei que abolia o tráfico
transatlântico no Brasil. Os principais portos de desembarque foram desativados e
políticos mais progressistas comemoraram o feito. No entanto, a crescente demanda
do mercado internacional pelo café brasileiro fez com que os cafeicultores (muitos
deles políticos brasileiros) exercessem forte pressão pela reabertura do tráfico. Em
1835, num grande acordo entre cafeicultores e esses políticos, o tráfico transatlântico
de escravizados foi reaberto, só que essa reabertura se deu na ilegalidade com a
anuência do Estado Nacional. Entre 1835 e 1850, mais de 800 mil africanos
escravizados entraram no Brasil, a despeito das leis do próprio país.
Esse acordo é uma das maiores provas do peso que a escravidão exerceu no
Brasil Independente (por meio de uma escolha deliberada das elites do país), e da
responsabilidade que o Estado Nacional brasileiro (independente e soberano) teve na
manutenção do tráfico e na propagação da escravização ilegal de africanos em
território nacional. A constatação dessa ilegalidade do Estado foi um dos principais
argumentos para que, em 2012, o Supremo Tribunal Federal fosse convencido da
necessidade em aprovar as cotas raciais nas universidades brasileiras. Essa
aprovação era o reconhecimento da implicância do próprio Estado frente às piores
condições econômicas, sociais e políticas que a população negra tinha - uma
população que era descendente de homens e mulheres negros que foram ilegalmente
escravizados.
Não por acaso, o Intendente Geral de Polícia da Corte tinha status de ministro,
ficando responsável por:
Em 1831, a Guarda Real foi extinguida pelo Regente Antônio Feijó. Vale lembrar
que esse foi um ano especialmente atribulado na história política do país, marcado
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 33
Desse modo, a ideia de uma polícia que fosse racional e cuja atuação se desse
por meio da vigilância não aconteceu. O que se observa, ao longo do século XIX, é a
atuação de uma polícia mal remunerada (por vezes vítima de castigo físico), com
pouquíssima instrução e que fazia uso da força e da brutalidade na sua forma de agir.
Um dos exemplos notórios disso ocorreu quando a Guarda Permanente esteve sob o
comando do major Luís Alves de Lima e Silva, futuro Duque de Caxias. Além de
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 36
sufocar duas rebeliões – fazendo uso deliberado da violência, o então major também
redefiniu as atribuições das duas corporações recém-criadas.
Essa era uma equação difícil de ser executada, porque a alta concentração de
escravizados nas maiores cidades do Brasil fazia com que esses fossem espaços
potencialmente perigosos. Fuga de escravizados, maltas de capoeiras, constituições
de mocambos e quilombos, pequenos motins, e até mesmo rebeliões foram
protagonizados nesses espaços, o que fazia com que a preocupação com a população
escravizada fosse constante. A imagem abaixo é uma litogravura que foi feita pelo
artista britânico Augustus Earle, que esteve no Brasil na década de 1820. A obra
retrata um jogo de capoeira jogado, provavelmente, por escravizados da cidade do
Rio de Janeiro que estava prestes a ser interrompido pela ação de um soldado da
Guarda Real.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 37
Fonte: Augustus Earle, Negroes fighting, c. 1820, Biblioteca Nacional da Austrália. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Augustus_Earle#/media/Ficheiro:CapoeiraEarle.JPG.
Figura 4 - Policiais da Província de São Paulo tentando impedir a fuga de escravizados em Campinas
Fonte: Revista Illustrada. Rio de Janeiro: [s.n], ano 12, n. 468, 1887. Disponível em
http://www.memoriaescravidao.rb.gov.br/revista_ilustrada.php?pg=4
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 39
Figura 5: Militar britânico Gordon Robley e sua coleção de cabeças humanas tatuadas e secas (1895)
Fonte: Henry Stevens (1843-1925) (original photo). Requested image credit: Wellcome Images. - Wellcome
Library, London.
Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Horatio_Gordon_Robley#/media/Ficheiro:Robley_with_mokomokai_collection_2.jpg
Conforme dito, ao longo do século XIX, esse tipo de racismo teve status de ciência
e, por isso, suas proposições tiveram grande impacto na produção do saber e,
sobretudo, na legitimação do racismo.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 43
O debate ganhou novo fôlego com a chegada do livro "A origem das espécies",
de Charles Darwin, em 1859. A partir daí, o conceito de raça passou por duas
mudanças significativas. Por um lado, o termo raça saiu do campo da Biologia e se
estendeu para discussões culturais e políticas. Por outro lado, começou a ser
associado à ideia de evolução, sendo distorcido ou "adaptado" pelas correntes
científicas e filosóficas que debatiam a origem do homem (monogenismo e
poligenismo) de acordo com suas próprias conveniências.
A imagem abaixo mostra alguns dos estudos feitos com a medição de crânios,
cujas conclusões eram utilizadas pela polícia.
Assim como em outras partes do mundo, o Brasil foi diretamente impactado pelo
racismo científico. Se, por um lado, o pressuposto da inferioridade de negros,
quilombolas e indígenas não era uma novidade no Brasil (graças ao longo passado
de colonização e escravização), o racismo científico oferecia novas explicações, não
só para a manutenção da escravidão de africanos e seus descendentes, mas também
para a manutenção de políticas de extermínio ou de marginalização da população
indígena.
A violência existente em boa parte das ações policiais contra a população negra,
tinha agora argumentos “científicos”. A própria ideia de que todo negro era um
suspeito em potencial ganhou ainda mais força, porque o racismo científico
corroborava com esse pressuposto, defendendo que a condição biológica e
inferiorizada da população negra a enveredava para o caminho do crime. Sendo
assim, o racismo científico deu um “verniz científico” para as atrocidades que já eram
cometidas contra as populações negras e indígenas, além de tomá-las como objetos
de análise científica, como demonstra a imagem abaixo.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 47
Figura 7 - Galeria de tipos negros fotografados por Alberto Henschel. Pernambuco, 1869
Em uma tacada só, Von Martius (esse pensador e cientista europeu) resolvia boa
parte dos problemas da intelectualidade brasileira. Por um lado, ele apresentava o
Brasil como um país multirracial, se distanciando das perspectivas negativas que o
determinismo científico europeu pregava. Por outro, ela reforçava que os portugueses
eram superiores aos outros grupos raciais que compunham a matriz brasileira. Para
Von Martius, o Brasil nascia da confluência de três raças humanas, e isso era
potencialmente positivo. No entanto, Martius compartilhava o pressuposto de que
havia uma hierarquia entre essas raças: como ele mesmo disse, o sangue poderoso
era o português, e era ele que deveria absorver os pequenos confluentes dos negros
e dos indígenas.
Não por acaso, a proposta de Von Martius foi bem recebida e amplamente
propagada em todo Brasil, tendo papel fundamental na criação do Mito da Democracia
Racial, uma teoria equivocada, que defende que o Brasil é um país multirracial sem
racismo. Esse é um ponto que será analisado com mais cuidado no Módulo II deste
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 49
curso. Todavia, é fundamental sublinhar que a ideia que o Brasil seria uma espécie
de paraíso racial, no qual as três raças viveriam de forma harmoniosa e pacífica,
surgiu no século XIX, durante a vigência do racismo científico como quadro teórico
que explicava o mundo. O que ocorreu ao longo do século XX foram atualizações
deste mito. Ter a dimensão histórica da construção do Mito da Democracia Racial é
um indicador crucial na compreensão de como o Brasil, e a própria ideia de brasilidade
foram conformados a partir de pressupostos abertamente racistas numa história que
tem quase 200 anos.
Além disso, engana-se quem imagina que o racismo científico só vigorou no Brasil
durante a o período da escravidão. O que observamos após a Abolição da Escravidão
em 1888 é um Estado Nacional e elites política e intelectual eminentemente brancas,
desenvolvendo novos modelos explicativos e políticas públicas, que seguiam
apostando na desigualdade entre as raças e na supremacia branca. E, como será
tratado na última aula deste módulo, assuntos correspondentes à segurança pública
e ao policiamento seguiram sendo aspectos especialmente reveladores dessa lógica
racista.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 50
Apesar dessa estrutura racial e racista, no mesmo século, a histórica luta negra
por liberdade encontrou, no Abolicionismo, um grande aliado pelo fim da escravidão.
É verdade que, muitas vezes, esse aliado comungava da premissa que os negros
estavam num degrau abaixo da escala da evolução humana - temos alguns exemplos
de importantes abolicionistas de pele preta que defendiam a inferioridade da
população negra. No entanto, não há como negar que o Abolicionismo, primeiro
grande movimento social da história, teve papel crucial para que a tenebrosa
instituição finalmente fosse abolida em 13 de maio de 1888.
Uma das heranças que o Brasil Império deixou para o Brasil República foi a
crença de que uma nação só seria moderna e civilizada caso ela seguisse o
modelo europeu. Não podemos ignorar que a abolição da escravidão em 1888 e
a Proclamação da República em 1889 foram transformações significativas na
história brasileira. A ausência do imperador simbolizou a descentralização do
poder em prol do federalismo. A separação da Igreja também foi notável,
estabelecendo o caráter laico do Estado. Novos grupos sociais, especialmente a
alta cúpula militar, emergiram como detentores de poder político e o exercício da
cidadania não era mais sombreado pela escravidão. Todavia, a transição do
regime Imperial para o republicano não resultou em uma sociedade mais inclusiva
e democrática. Ao contrário disso, nos primeiros 40 anos da experiência
republicana no Brasil, foi estabelecido um Estado que manteve as exclusões
racial, social e política como bases da sua força motriz central.
É possível pontuar que essa política teve duas grandes ações que estavam
completamente interligadas. A primeira delas foi o desenvolvimento de uma política
massiva de imigração europeia para o Brasil. A segunda foi a criação de uma série de
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 52
dispositivos cujos objetivos eram dificultar que a população negra pudesse se inserir
na sociedade de classes e usufruir dos direitos cidadãos - o que, em tese, estavam
assegurados pela Constituição de 1891. Como ainda veremos, as forças policiais
tiveram função importante nessa segunda ação desenhada pelo Estado Nacional
republicano. Mas comecemos pela política de imigração.
1 Disponível em:
https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=LIM&numero=601&ano=1850&ato=8350TPR9EeJRVT
7f0,
2 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1950-1969/D55891.htm
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 53
Cabe, então, a pergunta: por que não aproveitar esse contingente nacional de
trabalhadores e trabalhadoras brasileiros(as) (negros, em sua maioria)? Para
responder a essa pergunta, precisamos entender que a política de imigração foi
pensada dentro de uma lógica abertamente racista, que, conforme dito, queria tornar
o Brasil um país branco, à imagem e semelhança da Europa Ocidental. Isso fica
evidente já no primeiro parágrafo da Lei de Imigração de 1890:
Essa recusa foi uma das tantas formas por meio das quais o racismo
científico se fez presente na formulação de políticas públicas brasileiras. Vale
dizer que, nesse período, os principais intelectuais brasileiros mantinham uma defesa
fervorosa da inferioridade inata dos africanos. O médico Raimundo Nina Rodrigues
(1862-1905), considerado pai da medicina legal do país, era um dos maiores
expoentes dessa perspectiva, e exerceu forte influência, tanto nos cursos de Medicina
Legal, como de Direito Penal - áreas fortemente marcadas pelos pressupostos do
racismo científico.
Sua crença no primitivismo dos negros era tamanha que Rodrigues chegou a
elaborar um documento chamado As Raças Humanas e a Responsabilidade Penal no
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 54
Brasil (1894), no qual ele propunha alterações no código penal brasileiro com o
argumento de que, pelo fato de os negros terem uma tendência natural para o crime,
eles deveriam ter penas diferenciadas, pois não teriam “culpa” de sua natureza
criminosa. Segundo Nina Rodrigues:
O documento não foi aprovado, no entanto ele guarda aspectos que eram
abertamente comungados dentre as elites brasileiras. De tal modo, eram necessárias
duas medidas distintas: enquanto a imigração europeia apontava para o futuro
(promissor) da nação brasileira, as ações dos órgãos de repressão do país deveriam
garantir que a ordem e o progresso, estampados na bandeira brasileira, se
efetivassem em meio a uma população formada por homens e mulheres de raças
inferiores, passíveis de atos selvagens e criminosos.
Ainda sobre a política de imigração, vale pontuar que ela foi divulgada oficialmente
pelo Estado brasileiro durante o Congresso Mundial das Raças, que aconteceu em
Londres, em 1911. Nessa ocasião, e a mando do presidente Hermes da Fonseca, o
antropólogo João Lacerda apresentou para mundo a política de embranquecimento:
Figura 8 - Infográfico apresentado por Lacerda no Congresso Mundial das Raças, 1911
Fonte: LACERDA, João Baptista de. Informações prestadas ao Ministro da Agricultura Pedro de Toledo. Rio
de Janeiro: Papelaria Macedo, 1912
trabalho, que era não só disputado, como também racialmente hierarquizado. Essa
dimensão fica especialmente evidente nos anúncios de jornais feitos por muitos
empregadores, que tinham clara preferência em empregar brancos.
Embora saibamos que questões, como loucura e alcoolismo, têm razões sociais
muito mais determinantes do que possíveis predisposições genéticas, não era isso
que era defendido nos primeiros anos da nossa república. Sendo assim, os órgãos de
repressão do Estado brasileiro, ordenados pela perspectiva racista do Estado,
respondiam com truculência e violência àquilo que eles entendiam como distúrbio da
ordem. Vale lembrar que o Código Criminal vigente na época, tipifica a vadiagem como
crime. E quais eram os homens mais propensos a serem vadios, por terem maiores
dificuldades para conseguir empregos? Os homens negros. Não é coincidência que a
maior parte das prisões por vadiagem vitimaram homens negros, aumentando, assim,
um circuito fechado:
negros eram inferiores > por isso tinham maior dificuldade em conseguir
empregos > muitos ficavam na ociosidade > muitos eram presos por vadiagem
> a prisão por vadiagem corroborava sua inferioridade e propensão a
comportamentos que poderiam levar a execução de crimes.
Era um fechamento que corroborava com uma máxima existente desde o período
da escravidão: todo negro é um criminoso em potencial e por isso deve ser
tratado como suspeito. E não era só a polícia que prendia um número cada vez
maior de homens (e também mulheres) negros. Conforme dito, alcoolismo e loucura
eram comportamentos que foram relacionados diretamente à inferioridade inata
da população negra. De tal modo, o começo do século XX foi marcado pelo
encarceramento compulsório da população negra em instituições asilares, como os
hospícios e as colônias. Ainda que essa tenha sido uma prática mais frequente nas
primeiras décadas da República, como uma das marcas da implementação de
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 57
políticas higienistas e sanitárias, a ideia falaciosa que negros tinham mais propensão
à loucura atravessou todo o século XX, como bem demonstra o livro "O Holocausto
brasileiro", de Daniela Arbex.
Não restam dúvidas de que a população negra criou uma série de estratégias para
lutar contra a agenda racista implantada pela Primeira República. A história do Brasil
também é fruto dessas lutas, e nós somos herdeiros delas. Mas a ordenação
racista do país conseguiu manter algumas máximas, e aqui cito duas: a primeira delas
é a suspeição generalizada contra a população negra (quer pelos órgãos policiais,
quer pelo sistema de Justiça), que segue sendo vista como potencialmente criminosa;
a segunda é a desumanização sistemática e naturalizada da população negra
que, como apontado no início deste módulo, faz com que pessoas negras sejam as
maiores vítimas dos confrontos policiais, independentemente do lado em que elas
estejam. Essa manutenção se fez sentir nas estratégias de repressão e tortura
desenvolvidas durante a Ditadura Militar, no encarceramento em massa que vivemos
hoje, no assassinato de jovens negros a cada 23 minutos e nas ações policiais mal
planejadas que, frequentemente, resultam na morte de civis (negros em sua maioria).
Saiba mais!
FINALIZANDO
o peso que a escravidão teve na história do Brasil e como ela foi uma
instituição que estruturou nossa história por mais de 300 anos;
APRESENTAÇÃO DO MÓDULO
OBJETIVOS DO MÓDULO
ESTRUTURA DO MÓDULO
Palavra do Especialista
O mito da democracia racial no Brasil tem suas raízes no século XIX, quando
intelectuais, como Gilberto Freyre, desenvolveram a ideia de que a convivência
amigável entre raças foi possibilitada pela miscigenação. Freyre, em sua obra
"Casa-Grande & Senzala", descreveu a relação paternalista entre senhores e
escravizados como uma base de convivência harmônica, ignorando a
brutalidade e desigualdades subjacentes.
Aqui, reside uma das principais questões do mito da democracia racial e suas
implicações, pois, ao se defender, de forma errônea, que a miscigenação é fruto de
uma convivência harmoniosa entre as raças, ignora-se a escravização, seus efeitos e
as dificuldades encontradas pela população negra no pós-escravização. Além disso,
a miscigenação é enxergada como uma forma de embranquecimento da população,
já que seria, também, uma maneira de apagar os traços negros através das gerações.
O mito da democracia racial no Brasil, uma construção que, durante muito tempo,
obscureceu as profundas desigualdades raciais, está sendo cada vez mais desafiado
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 63
Negligência institucional:
a crença no mito da democracia racial pode levar a uma negligência por parte das
instituições governamentais e privadas em abordar questões específicas que
afetam a população negra. A falta de políticas públicas eficazes para combater a
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 64
Naturalização da discriminação:
Estigmatização e preconceito:
Impacto psicológico:
seus privilégios: aceitação com ser universal, status de poder e de dominação que,
em muitos casos, são transformados em opressões contra as pessoas negras;
racial, nos períodos analisados, aos negros eram aplicadas penas mais severas em
comparação aos brancos, e que a estrutura judicial brasileira privilegiava esse tipo de
conduta.
Um exemplo desse tipo de tratamento está nos estudos de VARGAS (1999), que
verificou que, em crimes de estupro, na fase judicial do oferecimento da denúncia, a
porcentagem de brancos e negros acusados é próxima, entretanto, na fase da
sentença, há mais condenação para pretos e pardos. Publicada nos anos 2000, uma
pesquisa da Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) analisou todos
os registros criminais relativos aos crimes de roubos, no estado de São Paulo, entre
1991 e 1998. A constatação foi que réus negros são, proporcionalmente, mais
condenados que réus brancos e permanecem, em média, mais tempo presos durante
o processo judicial (LIMA; TEIXEIRA; SINHORETTO, 2003).
É por isso que refletir sobre as desigualdades raciais é um caminho importante para
uma prática policial mais justa, efetiva e transformadora.
Nesse caminho, é importante afirmar que, quando estamos falando de raça, não
estamos o fazendo do ponto de vista biológico. A ciência, através dos estudos sobre
genética, já provou que não há diferenças significativas entre pessoas negras,
brancas e indígenas que justifiquem algum nível de diferenciação genética. Se não há
essa diferença biológica, o que faz com que, do ponto de vista histórico e social, as
diferentes raças estejam em posições sociais desiguais? A população branca –
embora também existam brancos pobres – permanece em vantagem em todos os
indicadores sociais, e a população negra, em desvantagem econômica, de
expectativa de vida, de acesso à saúde e aos serviços públicos.
Há, portanto, uma estrutura social baseada na cor da pele que desiguala e
estigmatiza cidadãos que não estão no topo da hierarquia, que não são brancos.
O que está colocado do ponto de vista da criação de estigma, a partir do fenótipo,
é uma hierarquização de humanidades. “Por definição, é claro, acreditamos que
alguém com um estigma não seja completamente humano. Nós acreditamos
nisso. Com base nisso, fazemos vários tipos de discriminações, através das
quais efetivamente, e muitas vezes sem pensar, reduzimos as chances de vida
do estigmatizado”. (GOFFMAN, 1981)
Haver diversidade e diferença não era para ser algo problemático, mas se torna
quando transformamos atributos de diferença em atributos de desigualdade: esse é o
ponto sobre como raça incide na produção de hierarquias, porque se transforma em
desigualdade o que deveria ser apenas diferença.
Esse curso apresenta uma grande inovação aos estudos da Sociologia do Direito
e na compreensão das questões raciais que balizam nosso sistema jurídico; pensar
uma estrutura que é racialmente desigual, a partir da branquitude, inverte uma lógica
acadêmica histórica que trata das questões raciais a partir da normatividade branca e
do estranhamento com outros grupos sociais. Ademais, os estudos pregressos nesse
tema consideram a “questão racial” como sendo um problema dos negros, isentando
o branco da problemática. O Estado não pode ficar em silêncio frente a tudo isso. É
preciso buscar respostas para combater suas próprias armadilhas, entre elas a da
criação e do fortalecimento dos privilégios brancos. Assim sendo, criar, efetivar e
fortalecer políticas públicas voltadas para equidade racial, apresenta-se como um
caminho viável.
Para BENTO (2002), o que ocorre na branquitude brasileira seria o conceito “pacto
narcísico”, isto é, os brancos procurariam unir-se para defender seus privilégios
raciais. A autora sustenta a tese de que, através da branquitude, sujeitos acumulam
vantagens e reproduzem desigualdades raciais. Em outras palavras, para
compreender melhor as desigualdades raciais em nossa sociedade, seria importante
entender o pacto entre os brancos, ou seja, seria necessário refletir sobre os
preconceitos e práticas racistas que ocorrem “por interesse”, porque tanto a prática
racista oriunda da ignorância (que leva ao preconceito), quanto por interesse, resultam
na manutenção dos privilégios da branquitude.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 79
Um exemplo marcante dessa ideologia pode ser encontrado na obra "A Redenção
de Cam", pintada por Modesto Brocos em 1895. A pintura retrata um homem negro,
Cam, que, na tradição bíblica, foi amaldiçoado por seu pai Noé. No entanto, na
interpretação de Brocos, Cam é apresentado como um homem negro submisso e
agradecido, sendo "redimido" por um homem branco, possivelmente Noé. A cena é
carregada de simbolismo e reflete a crença de que a miscigenação com europeus
"purificaria" as raças inferiores, como a negra. O quadro, então, personifica a ideologia
do embranquecimento ao retratar a subserviência e a necessidade de redenção do
homem negro diante do homem branco. A pintura não apenas reforça a noção de
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 80
inferioridade racial, mas também sugere que a "redenção" do negro está vinculada à
sua assimilação e miscigenação com o branco, como se a branquitude fosse o
padrão de superioridade a ser alcançado.
Essa ideologia não se limitou à arte, mas permeou muitos aspectos da sociedade
brasileira, influenciando políticas de imigração e até mesmo padrões estéticos. A
busca pelo clareamento da população, frequentemente enfatizando a beleza europeia
como o ideal, levou à promoção de produtos e práticas para clarear a pele e alisar o
cabelo. Apesar de serem profundamente enraizados, os resquícios dessa ideologia
persistem de maneira menos explícita na contemporaneidade. O sistema educacional,
a representação midiática e os conceitos de beleza continuam refletindo padrões
eurocêntricos, contribuindo para a perpetuação de estereótipos e desigualdades
raciais. Desmantelar a ideologia do embranquecimento requer uma abordagem
abrangente que reconheça sua influência passada e presente. Isso envolve a
promoção da educação antirracista, a valorização da diversidade cultural e
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 81
conscientização sobre as raízes históricas desse fenômeno e como ele ainda ressoa
na sociedade atual.
Na Prática
A interseção entre antirracismo e Segurança Pública é um ponto crucial
no cenário de luta por igualdade e justiça. Historicamente, as comunidades
marginalizadas, especialmente as pessoas negras, têm sido
desproporcionalmente afetadas por práticas discriminatórias no âmbito da
segurança pública. O movimento antirracista busca desafiar esses viéses
arraigados e reformar as instituições de segurança para garantir um tratamento
equitativo para todos os cidadãos, independentemente de sua cor de pele.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 86
FINALIZANDO
APRESENTAÇÃO DO MÓDULO
Concluiremos, então, com uma narrativa voltada para o ponto de vista do operador
de segurança pública. Também trataremos da prática deste operador, apontando suas
responsabilidades individuais no enfrentamento ao racismo, e os caminhos legais,
técnicos e doutrinários a serem seguidos.
OBJETIVOS DO MÓDULO
ESTRUTURA DO MÓDULO
A cultura possui três características: ela não é inata, e sim aprendida; suas distintas
facetas estão inter-relacionadas; ela é compartilhada e de fato determina os limites
dos distintos grupos. A cultura é o meio de comunicação do homem. (HALL, 1978,
p.80, citado por, MACEDO e PIRES, 2006, p.84)
A partir de uma definição mais ampla, iremos abordar o que é tal prática
organizacional e a sua importância.
Art. 9º É instituído o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que tem como
órgão central o Ministério Extraordinário da Segurança Pública e é integrado pelos
órgãos de que trata o art. 144 da Constituição Federal, pelos agentes penitenciários,
pelas guardas municipais e pelos demais integrantes estratégicos e operacionais, que
atuarão nos limites de suas competências, de forma cooperativa, sistêmica e
harmônica.
I - polícia federal;
III - (VETADO);
IV - polícias civis;
V - polícias militares;
IX - (VETADO);
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 94
XV - agentes de trânsito;
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998).
Uma vez que existe uma hierarquia entre as normas, podemos presumir que,
inevitavelmente, haverá também harmonia entre elas, já que qualquer contradição
será dirimida pelo direcionamento da lei superior. Assim, qualquer tratado
técnico/doutrinário, (incluindo-se aqui os de técnicas e táticas de policiamento e
demais atividades de segurança pública) que, porventura, exista nas instituições de
segurança pública direcionando o operador a um comportamento racista, já se mostra
com vício de origem, pois a própria Constituição veda o tratamento discriminatório
pela raça ou qualquer outro fator, como demonstrado abaixo.
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação. (CF,1988)
a Carta Magna, em seu artigo 59, estabelece aquilo que se denominam instrumentos
primários de introdução de normas no direito brasileiro.
institucional destaca-se por ser “como uma prática que tem caráter rotineiro e
contínuo, sistêmico, às vezes burocrático, e que pode variar entre aberta ou
encoberta, visível ou escamoteada da visão pública.” (BENTO, 2022, p.48)
Bento, durante sua pesquisa para o livro supracitado, entrevistou Moema, uma
mulher branca que trabalha como psicóloga organizacional. Nesse sentido, durante a
conversa, Moema reconheceu que tem preconceitos e que eles surgem de acordo
com o convívio próximo no ambiente de trabalho, por exemplo. Tal declaração ressalta
a forma complexa com a qual pessoas negras são integradas ao mercado de trabalho,
demonstrando que a premissa de haver neutralidade e objetividade não existe em
sociedades historicamente preconceituosas, como o Brasil.
Lembro-me de um caso relatado por meu irmão anos atrás, quando ele assumiu a
liderança da área de contabilidade de uma grande empresa. Entre as contratações
que fez à época, estavam três pessoas negras, e um colega o questionou se ele
pretendia “enegrecer a empresa”. O fato é que, enquanto o departamento era
composto exclusivamente de pessoas brancas, questionamentos sobre raça não
existiam, mas bastou a contratação de três funcionários negros — no meio de
quarenta brancos — para que se sentissem ameaçados. (BENTO, 2022, p.50).
voltadas para o reforço normativo e doutrinário nos espaços de trabalho para combater
práticas ilícitas e indesejadas, bem como para alcançar a isonomia de processos e de
práticas.
[...]o conjunto de atitudes, valores e comportamentos que não fazem parte de forma
explícita do currículo formal, os quais são ensinados por meios das relações sociais,
dos rituais e práticas que são desenvolvidas na escola. (ROSA, SILVA, DA SILVA.
2023. p.5).
O currículo oculto serve tanto quanto o currículo real. A diferença parcial é que um
torna-se basicamente uma representação que deve melhorar, mas não pode ser
trabalhado e o outro é a realidade estudada e transmitida. A supressão de
conhecimento ou de propostas que podem ser estudadas para melhoria do
favorecimento educacional, é também representado pelo currículo oculto. (MATOS,
COSTA, LIMA, SILVA, CHAVES, SOUSA, 2020. p 327)
Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e cria a Política
Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS), com a finalidade de
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, por
meio de atuação conjunta, coordenada, sistêmica e integrada dos órgãos de
segurança pública e defesa social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, em articulação com a sociedade.
Por sua vez, a Carta Magna estabelece, no capítulo III, sobre Segurança
Pública:
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 104
À DESIGUALDADE RACIAL?
Existe uma diferença entre ser um mero gerente e ser um líder. Para
implementar uma gestão antirracista em uma sociedade que ainda está imersa em
uma cultura de práticas racistas, o exercício da gestão exige uma liderança ativa
e orientada ao antirracismo.
O gerente tem seu apoio nas regras, normas e procedimentos, enquanto o líder se
apoia em suas capacitações, habilidades e nas pessoas que trabalham sob seu
comando. Para o gerente, a rotina diária é uma batalha constante a ser vencida;
enquanto, para o líder, ela é o reinício de novas oportunidades. Para o gerente, as
crises são problemas desgastantes e aborrecidos. Para o líder, são situações
inevitáveis que têm de ser enfrentadas com competência e discernimento. Diante
disto, e apesar do valor do gerenciamento nas empresas, dentro da visão e situação
atual das organizações, há maior necessidade de liderança do que gerenciamento
(BOTELHO, 1992, citado por, ARRUDA, CHRISÒSTIMO e RIOS, 2010, p.4).
Nota-se que uma gestão antirracista vai além de ações pontuais que
fornecem apenas respostas a acontecimentos racistas no âmbito da instituição. Dessa
maneira, o gestor deve fomentar ações preventivas, contra o racismo, que surtam
influência, tanto no campo estrutural da instituição, quanto no campo particular dos
membros da organização. No estrutural, podemos exemplificar ações na esfera
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 107
direitos humanos. Essa é a principal referência de uma atuação técnica para atender
aos anseios de justiça e legalidade do sistema democrático, sem prejuízo da eficiência
e da força na prevenção e repressão do crime (BRASIL, 2014, p. 114).
Nessa perspectiva, o operador de segurança pública deve compreender
que a proteção dos direitos fundamentais da pessoa humana é uma obrigação
do Estado e do governo em favor da sociedade, sendo ele próprio um dos agentes
que promove e protege esses direitos.
Assim sendo, espera-se que esse profissional atue para garantir o respeito
aos direitos humanos de indivíduos em situação de vulnerabilidade, tais como
mulheres, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência, lésbicas, gays,
bissexuais, travestis, homens e mulheres trans, pessoas idosas, vítimas da
criminalidade do abuso do poder, usuários e dependentes de drogas, pessoas em
situação de rua, negros (afro-brasileiros), indígenas e ciganos (BRASIL, 2014, p.
114).
Além disso, é crucial que os agentes de segurança pública cumpram as
normas estabelecidas por cada instituição. É importante salientar que os princípios da
administração pública e os requisitos do ato administrativo não se limitam aos serviços
prestados, mas requerem um comportamento probo para aqueles que, de forma
voluntária, representam o Estado.
Essa exigência é particularmente relevante para a segurança pública, uma
vez que as ações administrativas de agentes de segurança pública, em muitos casos,
envolvem restrições de direitos e a possibilidade de ações letais contra pessoas.
Apesar dos avanços, no âmbito da segurança pública, na promoção e na
garantia dos direitos humanos da pessoa em situação de vulnerabilidade, o racismo
presente na sociedade brasileira, por vezes negado pelo discurso, também influencia
comportamentos e condutas no âmbito das organizações. Ele é uma mácula nas
instituições que, ao se tornar uma prática habitual de seus operadores, repercute na
cultura organizacional, prejudica a imagem institucional e, também, da classe
trabalhadora.
Em contraste com a prática de comportamentos racistas, especialmente no
que diz respeito à atuação policial, pesquisadores e profissionais discutem um modelo
de segurança pública que possibilite, aos seus operadores, uma atuação humanizada,
fundamentada no uso da inteligência e na valorização profissional.
SUSP E O ENFRENTAMENTO DA DESIGUALDADE RACIAL NO BRASIL 112
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