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2020v26n2p73
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RESUMO: O presente texto objetiva refletir sobre as relações teóricas entre currículo,
disciplina escolar, prática pedagógica e saber disciplinar, com foco para a História –
acadêmica e escolar. Parte-se de uma perspectiva teórica crítica do currículo, que o
entende como uma construção social negociada, enredada em relações de poder. Nesse
sentido, assinala-se a necessidade de investimentos cada vez maiores em pesquisas
acerca da História das disciplinas escolares, para que se compreenda como elas foram
sendo socialmente construídas em cada contexto histórico, social, político, cultural e
curricular de cada país e em cada momento específico, assim como as relações
estabelecidas com os saberes disciplinares correspondentes e com a prática pedagógica.
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ABSTRACT: The present work aims to think over the theoretical relations among
curriculum, school subject, pedagogical practice and subject knowledge, focusing on
History – at colleges and schools. It starts from a critical theoretical perspective of the
curriculum, which comprehends it as a negotiated social construction, entangled in power
relations. In this way, it is highlighted the necessity of higher investments in researches
about the History of school subjects, in order to comprehend how they were socially built
on each country historical, social, political, cultural and curricular context and on each
specific moment, as well as the established relations with the correspondent subject
knowledges and with the pedagogical practice.
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Introdução
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2 Utilizamos como exemplo o conhecimento escolar Guerra do Paraguai por este já se constituir em
um assunto amplamente discutido pelo autor. Mas podemos estender este exemplo, guardadas
as devidas proporções, para os conhecimentos históricos escolares de uma maneira mais ampla.
Em outras palavras, o conhecimento histórico escolar, em geral, passa por um duplo processo de
constituição, primeiro precisa ser considerado um evento de relevância, digno a figurar nos
currículos e livros escolares; em seguida, precisa-se realizar o processo de ‘reelaboração didática’
desse evento histórico selecionado. É evidente que essas seleções e elaborações são sempre
construções histórica e socialmente delimitadas, enredadas em teias de poderes.
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Para Forquin (1993, p. 24), por sua parte, “uma teoria do currículo supõe
sempre levar em consideração o que se passa no interior da ‘caixa preta’ das
salas de aula e das escolas e não apenas o que se passa na entrada e na saída”.
Forquin, baseando-se em Lawton, destaca que tanto as escolas como os
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francesa, o autor chega a defender a autonomia dos saberes escolares frente aos
saberes acadêmicos – ou ciência de referência. Não obstante, sem desconsiderar
a relativa autonomia das disciplinas escolares, concordamos com as ponderações
feitas por Bittencourt (2004, p. 39-40):
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Entendemos, como posto por João Francisco de Souza (2007, 2009), que a
prática docente é uma das dimensões da prática pedagógica, sendo esta última o
“fazer da instituição escolar” (SOUZA, 2009, p. 27). Em outras palavras,
devemos ter o cuidado de não reduzir a segunda à primeira. O referido autor
assinala ser mais adequada a expressão práxis pedagógica para se referir a ação
coletiva que acontece na instituição educativa. Nesse sentido, aponta a:
Segundo João Francisco de Souza, por ser uma “ação social coletiva da
instituição”, a Práxis Pedagógica é uma:
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4 Esse conjunto de práticas docentes se dá, inclusive, em uma instituição específica, conjuntamente
com outras práticas e sujeitos, configurando assim uma práxis pedagógica. Como afirma Souza
(2009, p. 24), “a professora e o professor não têm prática pedagógica. Têm prática docente. A
prática docente é apenas uma das dimensões da prática pedagógica interconectada com a prática
gestora, a prática discente e a prática gnosiológica e/ou epistemológica.”
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de uma maneira geral, não podem ser universais. Nesse sentido, falas de
professores – sujeitos de pesquisas diversas no campo da Educação, poderão dar
luz a alguns desses questionamentos, relacionados especificamente aos saberes
disciplinares dos professores e ao conhecimento histórico escolar.
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5 Em concordância com Abud (2008, p. 29), entendemos que “a História como disciplina escolar da
escola secundária [brasileira] se efetivou com a criação do Colégio D. Pedro II, no final da
regência de Araújo Lima, em 1837”. Contudo, como problematiza Bittencourt (2004), a formação
dos profissionais de História em nível superior no Brasil só se verificará a partir da década de
1930, com a criação das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras, isto é, basicamente um século
depois da criação da História enquanto disciplina escolar. Isto quer dizer que a História, enquanto
conhecimento escolar, no Brasil, precedeu a História, enquanto curso superior responsável pela
formação dos profissionais da área do magistério.
6 Durante muitas décadas dos séculos XIX e XX, a instituição legitimadora do conhecimento
histórico no Brasil foi o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), cuja criação data do
mesmo ano do Colégio Pedro II, 1837, e pelas mãos das mesmas forças sociais. Então, não
podemos perder de vista que já havia, desde o século XIX, uma produção historiográfica,
legitimada pelo IHGB, portanto, em instituição que não a universidade, que influenciava a
História escolar e a produção de materiais didáticos da época. É nesse sentido que Abud (2008,
p. 29) afirma que “a História disciplina não nasceu sozinha. Foi sua irmã gêmea a História
acadêmica”.
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dois campos de saberes, mas tão somente estamos buscando destacar que,
dentre aqueles, o que nos interessa particularmente são os saberes disciplinares
da História.
Relevante destacar, ainda, que os saberes disciplinares estão presentes,
com destaque de tempo, espaço e poder, na formação – inicial e continuada – de
professores, mas não se restringem ao espaço formativo. Os saberes
disciplinares são mobilizados pela prática docente, assim como estão
sistematizados em pesquisas que se convertem em leituras especializadas, sejam
elas oriundas de trabalhos de dissertações, teses e artigos acadêmicos ou como
produto do mercado editorial, materializada em livros – autorais e/ou coletivos –,
em periódicos de divulgação e, mais recentemente, em sites especializados em
História, Educação e ensino.
Outros locais nos quais os saberes disciplinares circulam são nos encontros
acadêmicos, em que pesquisadores podem discutir e difundir trabalhos
referentes às suas mais recentes pesquisas. No Brasil, podemos citar como
exemplo os encontros nacionais e regionais realizados pela Associação Nacional
de História (ANPUH), que ocorrem bianualmente. A apropriação de saberes
disciplinares, portanto, não está restrita ao processo formativo inicial do
professor e do bacharel em História, mas incorpora também a troca entre os
pares, em que são possíveis realizar discussões e divulgações de ideias e de
resultados de pesquisas, seja através de palestras, conferências, grupos
temáticos de discussões ou de publicações em anais de eventos.
Considerações finais
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Referências:
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DOSSE, François. A história. Tradução Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Editora
UNESP, 2012.
SOUZA, João Francisco de. E a educação popular: quê?? uma pedagogia para
fundamentar a educação, inclusive escolar, necessária ao povo brasileiro. Recife:
Bagaço, 2007.
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YOUNG, Michael. Para que servem as escolas?. Educ. Soc., Campinas, v. 28, n.
101, p. 1287-1302, set./dez. 2007.
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