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CLA nº 500/2023

Senhora Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN


no Estado do Espírito Santo

Ref.: Resposta ao Ofício nº 2016/2023/IPHAN-ES-IPHAN


Processo nº 01409.000622/2015-01
Fazendas São Joaquim e Dourada Una (Bloco VI)

SUZANO S.A., pessoa jurídica de direito privado, devidamente qualificada nos autos do
processo administrativo em epígrafe, doravante simplesmente designada por Manifestante,
por meio de seu representante já habilitado, vem à presença de V. Sa. expor:

Considerando o acompanhamento desde ilustre órgão nas atividades executadas e os


produtos gerados no Projeto de Educação Patrimonial, serve da presente Manifestação para
apresentar respostas as recomendações técnicas realizadas no Parecer Técnico nº
156/2023/DIVTEC IPHAN-ES/IPHAN-ES, conforme documento em anexo.

Colocamo-nos à disposição para os esclarecimentos que eventualmente se fizerem


necessários.

Vitória/ES, 11 de dezembro de 2023.

Ismael Paranágua
Consultor Corporativo de Licenciamento Ambiental
Suzano S.A.

SUZANO S.A.
Av. Professor Magalhães Neto, 1752  10º andar  Salas 1009/1011  CEP 41810-012  Salvador  BA
www.suzano.com.br
Resposta ao Ofício o Nº 2016/2023/IPHAN-ES-IPHAN

Seguem os esclarecimentos das recomendações técnicas do PARECER TÉCNICO nº


156/2023/DIVTEC IPHAN-ES/IPHAN-ES :

I - Retificação ou esclarecimento da ausência de numeração do item 4 no sumário do relatório;

Foi realizado a atualização do sumário, e havia um erro na contabilização dos itens.

II - Esclarecimentos da equipe de pesquisa sobre os preparativos e previsão de entrega do último


relatório, para que se conste nos autos deste processo, sobre a entrega dos produtos que foram
traçados no Projeto Integrado de Educação Patrimonial. Segundo consta no documento haverá
entrega de: a) o site dinâmico, b) a edição e publicação de inventário de referências culturais, c)
a realização de palestras em escolas no entorno da comunidade (Ver p.21, SEI nº1447582)
Embora este último item talvez já esteja contemplado nas atividades anteriores, os dois
anteriores ainda não são claramente visíveis. Ainda há por parte da equipe técnica dificuldade
de compreensão sobre o uso da metodologia do INRC ou do Inventário Participativo.

a) O site dinâmico será diponibilizado pela empresa 2Tree;


b) A edição e publicação de inventário de referências culturais também serão realizadas
pela empresa 2Tree, contratante da equipe técnica;
c) A comunicação através de palestras nas escolas do entorno com base no
inventário serão desenvolvidas pela equipe técncia, após aprovação do inventário
pelas comunidades.
Por fim, a metodologia utilizada para a elaboração do inventário (Relatório 6 – Final),
conforme indicado nos relatórios parciais foi o “Manual de Aplicação - Educação
Patrimonial: Inventários Participativos (2016)*”. Nessa reta final, podemos afirmar que
a metodologia adotada em campo, e demonstrada nos cinco relatórios apresentados
pela equipe técnica, se pautou nos marcos do inventário participativo, pois ela foi
participativa desde o início, com uma abordagem etnográfica, ou seja, sem aplicação de
questionários, através de uma coleta qualitativa de dados.
A partir desse material empírico, foram sendo preenchidas em gabinete fichas de
inventário, a cada elaboração de relatorio parcial, que culminaram no Relatório 6 –
Inventário, ainda em fase de validação.
Dessa maneira, a validação final, que foi acordada entre a equipe técnica, comunidades
e contratante, será presencial na semana de 17 a 20 de dezembro. Nessa ocasião a
equipe técncia apresentará os resultados do Inventário às comunidades, que poderão
preencher colaborativamente eventuais lacunas.
Temos o INRC como baliza, dada a importância fundamental como marco de evolução
de metodologia de participação no âmbito dos processos de patrimonialização, todavia
nossa proposta é integrativa, alimentada pelos percursos profissionais da equipe de
pesquisa envolvida com formações multidisciplinares, numa perspectiva menos
instrumental, onde a racionalidade ética se sobrepõe à racionalidade instrumental.
*Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Brasil). Educação Patrimonial : inventários participativos : manual de aplicação / Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional ; texto, Sônia Regina Rampim Florêncio et al. – Brasília-DF, 2016.
Tomando o INRC como baliza, podemos dizer que o Inventário que foi (e está sendo)
gerado, atentou à escala micro das comunidades pesquisadas. Entre as diretrizes do INRC
aplicadas no PIEP podemos mencionar a participação estrutural dos comunitários desde
o início do projeto, como colaboradores inclusive, em muitos casos, remunerados, que
participaram de todas as etapas de campo. Imaginamos que o inventário produzido
contemplou em grande medida (80%) o INRC, mas para alimentar a plataforma seria
necessário um retrabalho, preenchendo pequenas lacunas que possam existir. Portanto,
ainda que se tenha gerado um volume de material compatível com o INRC, nesse
momento não está previsto o preenchimento do INRC, a equipe se atem aos objetivos
traçados pelo PIEP.

CRONOGRAMA
DEZEMBRO 2023 JANEIRO 2024
ATIVIDADE 1 1 1 1 2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 3 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2
6 7 8 9 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 0 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
Validação do X X X X X X X
Relatório 6 –
Inventário e
Mapas pelas
comunidades,
Divulgação nas
escolas do
entorno.
Adequação do X X X X X X X
Inventário às
demandas das
comunidades
RECESSO X X X X X
Revisão 2TREE X X X X X X X X X
e SUZANO
Disponibilizaç X
ão de site
dinâmico
Edição e X
publicação do
Inventário
PROTOCOLO X
junto ao
IPHAN-ES

*Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Brasil). Educação Patrimonial : inventários participativos : manual de aplicação / Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional ; texto, Sônia Regina Rampim Florêncio et al. – Brasília-DF, 2016.
PROJETO INTEGRADO
DE EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL

Fazendas São Joaquim e Dourada Una Comunidades da


AID – Água Preta e Valdício Barbosa Municípios de
Conceição da Barra e Pedro Canário/ES
Processo IPHAN nº 01409.000622/2015-01
QUINTO RELATÓRIO
SEXTA ETAPA DE CAMPO

Elaborado por:

Júlio Jader Costa


Letícia Moura Simões de Souza
Fernando Walter da Silva Costa

1
Sumário
1. APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 4
2. METODOLOGIA ............................................................................................................ 5
3. AÇÕES DESENVOLVIDAS NO ASSENTAMENTO VALDÍCIO BARBOSA ................. 6
3.1. Estratégia de aproximação .................................................................................. 6
3.2. Imersão comunitária ............................................................................................. 8
3.3. Situação Atual de Valdício Barbosa .................................................................. 12
3.4. Condições de acesso ......................................................................................... 13
3.5. Etnoregistros colaborativos na EEEF Valdício Barbosa dos Santos .............. 13
3.5.1. Arquitetura e auto eco organização do espaço escolar............................ 13
3.5.2. Pedagogias de Roda.................................................................................... 19
3.6. Oficina Educação para o Patrimônio Cultural .................................................. 27
3.6.1. Grupo 1: EJA – Círculo de Cultura - 31/05/2023......................................... 27
3.6.2. Grupo 2: Cultural Digital – 6º ao 9º ano – 02/06/2023 ................................ 36
3.6.3. Grupo 3: Cultura do Brincar - 1º ao 5º ano – 02/06/23 ............................... 41
3.7. Oficina de Cartografia Social e Cultura Digital – 6º ao 9º ano – 07/06/2023 .... 50
3.8. Etnoregistro de unidades domésticas e quintais produtivos .......................... 58
3.8.1. 30/05/2023..................................................................................................... 58
3.8.2. 31/05/2023..................................................................................................... 62
3.8.3. 03/06/2023..................................................................................................... 65
3.8.4. 04/06/2023..................................................................................................... 67
3.8.5. 06/06/2023..................................................................................................... 68
3.8.6. 07/06/2023..................................................................................................... 80
3.9. Etnoregistro de organizações associativas e grupos de afinidade ................ 87
3.9.1. Etnoregistro da AMAG– Associação de Mulheres Agricultoras de VB –
07/06/2023 ................................................................................................................... 87
3.9.2. Etnoregistro – Igreja Evangélica Assembleia de Deus – 04/06/2023 e
07/06/2023 ................................................................................................................... 89
3.9.3. Etnoregistro da Associação de Agricultores Familiares de Valdício
Barbosa (AAFVAB) - Projeto do Secador de 01 a 07/06/2023 ................................. 91
3.10. Etnoregistro - Memória das Águas – 30/05/2023 a 07/06/2023 ..................... 92
3.11. Etnoregistro: Direito à paisagem – 30/05/2023 a 07/06/2023 ........................ 95
4. Atividades desenvolvidas em Água Preta ................................................................ 97
4.1. Estratégia de abordagem e aproximação do campo ........................................ 97
4.2. Situação Atual de Água Preta ............................................................................ 98
4.3. Etnoregistro Memória e Presente Etnográfico das Águas ............................... 98

2
4.4. Etnoregistro dos Quintais produtivos ............................................................. 102
5.5. Etnoregistro colaborativo: Saberes do pilão ...................................................... 109
5.6. Etnoregistro Colheita de café .............................................................................. 113
5.7. Etnoregistro da cultura do brincar na infância ................................................... 114
5. Cenários e Desenhos de Futuros de Água Preta ................................................... 114
6. Referências Bibliograficas ...................................................................................... 116

3
1. APRESENTAÇÃO
A peça em tela refere-se ao trabalho realizado entre os dias 30 de maio e 08
de junho de 2023, compreendendo o campo 06 com as comunidades de Água Preta
e Valdício Barbosa. Nessa etapa a maior parte do tempo foi dedicada ao
Assentamento, uma vez que o trabalho junto à comunidade de Água Preta estava
mais avançado e caminhando para a finalização dos etnoregistros.
O Mapa da 6ª Navegação estipulou para Água Preta a validação do relatório 4
(RT4), além do arremate final dos etnoregistros colaborativos relacionados aos
saberes do pilão (mamona e urucum); quintais produtivos; memória e presente
etnográfico das águas.
Para o assentamento Valdício Barbosa a nave foi ancorada na escola para a
realização das oficinas 2 (Educação para o Patrimônio Cultural) e 3 (Cartografia
Social e Cultura Digital), além dos etnoregistros colaborativos da arquitetura e das
pedagogias circulares, incluindo místicas e outros modos de auto-eco-organização do
espaço e das atividades escolares.
Complementarmente, a baldeação pelos mosaicos produtivos dos quintais das
policulturas no assentamento manteve aberto o horizonte etnográfico para o registro
da tradicional colheita do café, de saberes-fazeres imateriais relacionados à
permacultura/ agroecologia e seus rizomas conectados com uso do pilão e de outros
artefatos ou estruturas rústicas, as quitandas e prazeres gastronômicos, o artesanato
em couro atrelado aos hábitos de montaria, além dos associativismos locais e grupos
de afinidade mútua como círculo de oração católica e cultos da igreja evangélica.
A metodologia adotada segue a mesma das etapas anteriores, que
reproduzimos. Em seguida, apresentamos as atividades desenvolvidas no
Assentamento Valdício Barbosa; e, por fim, as ações ocorridas na comunidade de
Água Preta.

4
2. METODOLOGIA

Nas atividades propostas, além da legislação vigente, Artigo 216 da Constituição


Federal de 1988 (BRASIL, 1988), IN 2015 (IPHAN, 2015) e Portaria nº 137/2016
(IPHAN, 2016) foi utilizado o referencial teórico-metodológico disponível no site do
IPHAN, como o Manual de Aplicação - Educação Patrimonial: Inventários
Participativos (2016), Educação Patrimonial, Histórico, conceitos e processos (2014),
mas, principalmente, foram tomados os ensinamentos do patrono da pedagogia da
autonomia (FREIRE, 1979, 1981, 1996, 1997, 2008).
As ações de cunho patrimonial sugeridas foram desenvolvidas no âmbito da
educação não formal que zela pelos conhecimentos e experiências partilhadas em
uma interação sociocultural. O processo de ensino/aprendizagem não formal
caracteriza-se, dentre outros critérios, pela inexistência de obrigatoriedade e
flexibilidade de tempos e espaços. Visa à capacitação do indivíduo para o mundo,
abrindo-o às janelas do conhecimento e envolvendo-o com os conteúdos relativos à
sua situação social e cultural.
A metodologia pode ser compreendida a partir das seguintes dimensões:
A primeira refere-se ao caráter integrativo dos produtos que compõem o PIEP.
Não obstante possuírem objetos distintos, a sinergia do PIEP opera estas ligações
em um conjunto (sistema) dotado de interações processuais. Resulta que os registros
de campo vão se acumulando e contribuindo progressivamente para uma melhor
aproximação com os detentores e a valoração de seus bens culturais em contextos
cotidianos que não se organizam segundo a “compartimentação de alguns domínios
do real”[1] típica das epistemes científicas (disciplinas).
Isto coloca um impasse inicial, pois não estamos aqui exercitando as ciências
duras ou exatas com esquemas rígidos e projeções matemáticas. Tampouco
operamos entre as ciências da vida (biológicas), onde o estudo dos organismos
permite inferir certos padrões de funcionamento e previsibilidade.
Nossos agenciamentos inscrevem-se no campo das Humanidades, com seus
cenários qualitativos não preditivos[2] e recheados de variáveis de incerteza social.
Aqui, jaz absolutamente fundamental a distinção entre a lógica formal e a lógica da
vida, notadamente se nos apoiamos em procedimentos de pesquisa etnográfica.
Esta constatação impõe como imperativo metodológico a flexibilidade na
implementação das ações, obedecendo a dois níveis distintos de respostas: 1º Nível

5
da Estratégia (Prescrição) - corresponde ao que é formalmente prescrito nas
normativas/instruções técnicas de salvaguarda, nas informações sistematizadas já
existentes sobre as comunidades e nos métodos de pesquisa em uso.
2º Nível das Táticas (Real) [3] - corresponde à realidade acontecimal dos
comunitários. A aproximação do método etnográfico das atividades cotidianas, bem
como sua capacidade de adaptar-se às mudanças situacionais imediatas é chamada
de tática. Seu objetivo é manter no horizonte de alcance a estratégia, isto é, os
objetivos de salvaguarda. O pacote de ferramentas técnicas de campo pode ser
acessado a partir de nomeações como “pólo acontecimal”, “horizonte dos detentores”,
“contextos cotidianos”, “sentidos êmicos" (auto atribuições), “configurações
rizomáticas” e “patrimônio imaterial como um todo”.
A este universo semântico juntam-se a palavra colaborativa, significado co =
junto; labor= trabalho e ativa = fazer, significando fazer o trabalho junto com…a
comunidade.
Sendo vivo o patrimônio imaterial e referindo-se aos detentores humanos e
seus grupos sociais, não poderia ser de outra forma. Nesta injunção construtivista,
os comunitários assumem posição ativa de trabalho na valoração de suas práticas
culturais.
Dadas estas preliminares, justificam-se as atualizações em tempo real no Mapa
de Navegação, aferido como bússola orientadora das tarefas, mas com capacidade
de operar em cenários sociais móveis e dinâmicos.

3. AÇÕES DESENVOLVIDAS NO ASSENTAMENTO VALDÍCIO BARBOSA

3.1. Estratégia de aproximação


Foi dada continuidade à estratégia traçada na reunião de validação e
autorização de uso de imagens (RT4-Etapa de Campo 5, item 6.1. pp. 27-29),
momento em que a coordenação do assentamento indicou uma responsável pela
interlocução no processo de construção colaborativa das atividades: a educadora
Cida.
O alinhamento foi feito de forma remota, incluindo a definição das datas e do
público-alvo das oficinas e ajustes na proposta inicial das duas oficinas de Educação
para o Patrimônio Cultural e Cartografia Social e Cultura Digital.

6
O acréscimo da “cultura digital” foi uma sugestão da coordenação pedagógica
da escola Valdício Barbosa, uma vez que os jovens, ao verem a equipe registrar
momentos cotidianos da escola e da comunidade com equipamentos digitais,
demostraram interesse em manusear as câmeras. Sendo o assentamento intenso em
agendas, surgiu uma demanda de qualificação sobre o registro fotográfico (como
fotografar, a melhor maneira de registrar) para que tais estudantes possam contribuir
para futuras atividades na comunidade, na ausência de uma equipe externa.
Deste modo, quando a equipe chegou ao campo as ações já estavam pré-
programadas e foi realizada no dia 30∕05/23 uma reunião para os arremates finais de
atividades, datas e horários, com as educadoras Ronimárcia M. Lima e Maria
Aparecida Pereira da Silva (Cida) na Escola Estadual de Ensino Fundamental Valdício
Barbosa dos Santos (EEEFVBS).
Nessa ocasião foram apresentadas as estratégias previstas de avaliação das
oficinas mediante questionário semiestruturado, entretanto essa proposta avaliativa
não teve aderência das educadoras.

FOTOS 01-02: reunião de alinhamento das Oficinas 2 e 3 do PIEP com a equipe pedagógica.

Antecedendo a reunião, a equipe teve a oportunidade de conhecer os trabalhos


desenvolvidos pelas estudantes durante o primeiro trimestre letivo, que culminava nas
apresentações realizadas naquela ocasião, mais uma oportunidade para a equipe
registrar a comunidade escolar em suas vivências.
Após o devido alinhamento com as educadoras, a equipe produziu o material
gráfico para divulgação junto à comunidade das Oficinas 2 e 3. A oficina de Educação
para o Patrimônio Cultural foi realizada para os estudantes da EJA no período noturno
e para os estudantes do fundamental, 1º ao 9º ano matutino. Já a oficina de
Cartografia Social e Cultura Digital foi direcionada aos estudantes do 6º ao 9º ano
matutino.

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FIGURAS 01-05: Material gráfico de divulgação do PIEP.

3.2. Imersão comunitária


A imersão manteve-se nos parâmetros metodológicos das navegações
anteriores, quer seja, aproximação pela via do afeto e abordagens informais em
pontos de convívio cotidiano, como bancos de madeira rústica sob as árvores, na
frente das casas, nas lavouras, na escola ou onde estivessem os comunitários,
procurando acompanhar e não atrapalhar sua rotina.

8
9
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11
FOTOS 03-32: Momento da sensibilização comunitária no Assentamento Valdício Barbosa.
Data 30/05/23 a 07/06/23.

3.3. Situação Atual de Valdício Barbosa


A situação atual (S3) será apresentada tendo como parâmetro de medição os
desenhos de futuro descritos no Relatório 4 - Etapa de Campo 5. item 6.2.(p.29).
No período de realização do campo, a agenda do assentamento manteve a
intensidade de atividades que vinha sendo colocada como dificuldade para execução
do PIEP. Pois, após o abril vermelho, nos meses de maio e junho estava programada
a colheita de café que mobiliza integralmente toda a comunidade.
Ocorre que na validação retroativa realizada na etapa de campo anterior, ficou
esclarecido que, em conformidade com a perspectiva etnográfica, todas as atividades
expressivas da vitalidade produtiva e cultural da comunidade somavam-se aos
objetivos do PIEP.
Portanto, ao contrário da impressão prevalente até então, o impacto da agenda
de atividades do assentamento lograva efeitos positivos sobre o programa, na medida
em que permitia a ampliação do campo empírico mediante o etnoregistro da
tradicional colheita de café e extensivamente dos quintais produtivos com seus bens
imateriais associados, entre os quais se incluem as farinheiras.

12
Outro ponto relevante para a descrição da situação atual é a problemática da
municipalização da Escola Estadual Valdício Barbosa, cujo desfecho foi favorável ao
assentamento. Isto porque foi decidido que as escolas do MST vão continuar sob
jurisdição da secretaria estadual de educação. E serão as únicas entre as escolas
rurais que manterão este status, alcançado com mediação do MP-ES.
Menos do que resultado da pressão política que refletiu o grau organizativo do
movimento, esta conquista está relacionada com especificidades da proposta de
educação no campo praticada pelo MST em Valdício Barbosa, como será descrito a
seguir.

3.4. Condições de acesso


No período de 30 de maio a 7 de junho não houve chuvas. Portando, as
estradas se mantiveram secas e de fácil acesso, embora em muitos trechos ainda
esburacadas, carecendo de manutenção. Uma alteração positiva identificada no
caminho foi a fixação da placa de sinalização do assentamento Valdício Barbosa,
produzida pelo comunitário Valmir Paim, para facilitar o acesso dos visitantes.

FOTOS 33-34: condições das estradas de acesso às comunidades durante a atividade de


campo.

3.5. Etnoregistros colaborativos na EEEF Valdício Barbosa dos Santos

3.5.1. Arquitetura e auto eco organização do espaço escolar

Em Vigiar e Punir, Michel Foucault (2004:117-189) inscreve a escola moderna


em meio aos estabelecimentos que surgiram com a expansão capitalista nos séculos

13
XVII e XVIII e cujos objetivos miravam disciplinar corpos e mentes através de uma
vigilância contínua e hierárquica.
Nesta medida, a arquitetura ocupa um papel central na tarefa de estender para
toda a sociedade o princípio da “eficiência econômica panóptica” cujo modelo
exemplar seriam as prisões (BENTHAM, 2000:31-34).
Esta dimensão atrelada ao controle disciplinar é patente, especialmente nas
áreas urbanas, ao observarmos a arquitetura dos espaços escolares com seus muros
altos, gradis, espaços quadriculados e câmeras de vigilância.
Todo este aparato tem se apresentado ineficaz frente ao desafio de garantir
uma cultura de paz nas escolas. E, lamentavelmente, por todo o país temos assistido
a tristes episódios de violência que vitimizam crianças e famílias inocentes.
A escola Valdício Barbosa se apresenta como o oposto de tudo que
assinalamos acima. A arquitetura elege como regra de design a circularidade dos
espaços abertos. Em cada canto em que se observe, é possível enxergar uma roda,
como que ratificando o convite para o encontro, a prosa saudável e a boa convivência.
Rompendo com a perspectiva do isolamento prisional e fabril, a escola em
Valdício Barbosa é indissociável da história e do presente etnográfico do
assentamento, configurando-se como espaço aberto à comunidade e integrada ao
cotidiano, sendo também local de encontro para tarefas organizativas e de lazer.

14
FOTOS 35-40: Onipresença dos círculos na escola de inspiração freiriana.

Mais ainda, a configuração circular dos espaços físicos apresenta perfeita


harmonia com a prática educacional libertária de inspiração freiriana, refletida nas
atividades pedagógicas e na organização do espaço escolar.
Designamos esta perspectiva como auto eco organizadora em função de duas
vertentes constitutivas que circulam no cotidiano da escola – a autogestão e a
ecologia.
A autogestão manifesta-se através da organização dos núcleos de
educadores que problematizam as concepções dominantes sobre as especificidades
profissionais, sendo compostos horizontalmente por todos os profissionais que atuam

15
no equipamento, incluindo os da cantina e limpeza. Em outros termos, além das
atribuições próprias de cargo, todos são igualmente designados como educadores e
assumem atribuições comuns no tocante a organização da rotina escolar.
Atualmente são 04 núcleos de educadores: Dandara, Marielle Franco, Paulo
Freire e MST como força política.
Cada um dos núcleos está assentado, isto é, possui um ponto referenciado no
espaço físico da escola, compondo elementos geométricos circulares e naturais como
flores e árvores.

FOTOS 41-44: Assentamentos dos núcleos de educadores em pontos circulares da escola.

A autogestão na prática pedagógica se estende para além dos educadores até


os educandos, através da organização das seguintes turmas: Bandeira
Vermelhinha – educação infantil; Terra é Força - 1 º e 2º ano; Sem-terrinha - 3º ano;
Campo em Harmonia - 4 º e 5º ano; Adolescentes do futuro - 6ºano; Jovens
Estudantes- 7º ano; e Juventude em Movimento - 8º e 9º ano.
Assim como o núcleo de educadores, cada turma de estudantes possui um
assentamento fincado em pontos paisagísticos e circulares.

16
Outra característica comum aos núcleos de educadores é que cada turma de
alunos possui uma palavra de ordem que demarca uma identidade própria de seus
componentes. Além disso, as turmas são divididas em núcleos responsáveis por
tarefas específicas no coletivo. 1

FOTOS 45-50: Turmas Bandeira Vermelhinha, Terra é Força e Sem Terrinha

1 Todos estes componentes serão minuciosamente detalhados no inventário final.

17
FOTOS 51-54: Turmas Campo em Harmonia e Adolescentes do futuro.

FOTOS 55-58: Turmas Jovens estudantes e Juventude em movimento.

18
A autogestão generalizada socialmente expande-se tanto em direção às tarefas
pedagógicas, quanto para as atividades rotineiras da escola. Sob a perspectiva construtivista
são pactuados combinados que funcionam como horizonte ético norteador das condutas
dentro e fora da sala de aula. As turmas vão se revezando em compromissos organizativos
no pátio, nas salas de aula e na cantina. No tocante aos processos pedagógicos, elaboram
planos de estudo e de auto-organização sobre os temas geradores trimestrais, de cuja
escolha participam ativamente.

FOTOS 59-62: Aspectos da auto-organização dos processos pedagógicos e da rotina escolar.

3.5.2. Pedagogias de Roda

As pedagogias de roda não são meros ambientes artificialmente produzidos para fins
de registro do PIEP. Bem ao contrário, constituem-se em rotinas no presente etnográfico da
Escola Estadual de Ensino Fundamental Valdício Barbosa dos Santos e teriam acontecido
independente da presença da equipe técnica em campo.
Sua inclusão no mapa de navegação constituiu-se em agradável surpresa, dado o
potencial de alimentar os processos de inventariamento em curso.

Perspectiva ecológica e decolonial das Místicas – de 01/06/2023 até 07/06/2023

19
As místicas constituem-se em atividade diária da qual participam, sem exceção, todos
os colaboradores da escola. Como já assinalamos, estes compõem-se de educadores e
alunos. Visitantes e convidados também integram a atividade, que é a primeira do dia,
realizadas nos espaços circulares do pátio, antes da distribuição dos alunos para as salas de
aula.
Diariamente, um núcleo de educadores ou turma de alunos é responsável pela
preparação da atividade. O exercício matinal dura em torno de 15 minutos. Cada mística
começa com o hino do coletivo responsável, seguido dos hinos de todos outros coletivos de
educadores e estudantes. Este processo se repete no final da atividade. Antes, porém são
dados vivas, cantos e salvas de palmas para aniversariantes. Tanto no início quanto no fim
outros hinos como do MST e palavras de ordem podem ser puxados.
Um ponto central das místicas é a exaltação e a presença de motivos naturalistas
como sementes, plantas, mudas, folhas, frutos, terra, plantio. Estes repertórios refletem o
esforço educativo cotidiano de exaltação da ecologia e do meio ambiente. Retratam também
o compromisso da escola com a promoção e perpetuação de saberes sobre a terra
estritamente vinculados com os princípios e a vocação do MST.
Sob a perspectiva decolonial, são acionadas técnicas de reverberação circulares que
demolem o império cognitivo centrado no mental, abrindo cena para afetos e corpos unidos
pela musicalidade e outras expressões da arte, como dramatizações e uma cenografia que
incorpora elementos dos repertórios e contexto local como ferramentas, chapéus de palha,
bandeiras e outros adereços.
O ciclo completo de místicas matinais finaliza depois que todos os núcleos de
educadores ou turmas de alunos fazem sua apresentação, portanto após onze rodadas, que
é o somatório entre o número de núcleos de educadores e turmas2.

2 Na etapa em relato foram realizados etnoregistros de místicas apresentadas por 07 coletivos. Apesar
de não ter documentado o ciclo completo, devido ao esgotamento do cronograma de campo, pensamos
que a amostra é suficiente para a descrição do bem cultural que para fins de inventariamento será
integrado ao conjunto das pedagogias de roda, cujo escopo incluirá ainda duas místicas registradas
durante a oficina de memória e história e no aniversário do assentamento.

20
FOTOS 63-68: etnoregistro das místicas todas as manhãs, às 7:30 h.

Rodas de Leitura - 01/06/2023

Atividade realizada após a mística. Neste dia, excepcionalmente, os


estudantes foram todos para a quadra e se sentaram no chão em círculo.
Como aquecimento, a diretora Cida e alguns professores prepararam charadas
do tipo “o que é o que é?” e endereçaram para a roda onde a meninada se deleitava
em busca das soluções, sempre acompanhada de salva de palmas.
Em seguida, foi apresentada uma caixa no interior da qual estavam ocultas
pequenas frases acompanhadas do nome da turma. Estas foram tiradas por sorteio
do fundo da caixa, lidas e cada turma conclamada se levantava e dirigia para
diferentes pontos do pátio, previamente preparados com cenários que incluíam panos
forrados no chão para acomodação, cesta de livros para leitura, além de outros
elementos.

FOTOS 69-70: Frase de Fernando Pessoa destinada à turma Campo em Harmonia.

21
Do sorteio participaram convidados do Assentamento Paulo Vinha e da
coordenação de educação do MST que haviam participado da mística, bem como a
equipe técnica do PIEP.
Este momento, inclusive, constituiu-se em uma espécie de rito de iniciação dos
pesquisadores na dinâmica horizontal da escola, pois também participaram de uma
roda com educadores e convidados. Nessa, a leitura circulou entre todos os presentes
e o livro que teve um capítulo destrinchado foi “História do Menino que Lia o Mundo”,
de Carlos Rodrigues Brandão (Editora Expressão Popular) e que conta em prosa o
trajeto de Paulo Freire, cujo busto também compunha o cenário.

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FOTOS 71-79: rodas de leitura de estudante e coletivo de visitantes e educadores.

Roda de apresentação dos Temas Geradores do 1º trimestre - 30/05/2023

Em seu título, a atividade faz referência direta ao conceito de Paulo Freire,


remetendo à problematização da realidade a partir de repertórios contextuais locais.
A indicação da família como tema gerador por si só já coloca uma reflexão, na
medida em que circula na sociedade outra concepção atrelada a visões
conservadoras e que buscam denegar as diferenças, contrastando radicalmente com
as pautas da diversidade incorporadas ao programa do MST.
Escolhidos a cada trimestre, os temas geradores são trabalhados nas salas de
aula, valendo-se da dialética teoria-prática e da utilização intensiva da arte-educação
via escrita, livro e leitura, música, teatro, dança, dramatizações, corporalidades, artes
visuais (desenho, maquetes) e outras multilinguagens potencializadas pela
confluência da criatividade infanto-juvenil com o compromisso libertário da pedagogia
de Paulo Freire, que inclui em seu programa a demolição de impérios cognitivos,
culturais e comportamentais impostos como padrões dominantes desde os primórdios
da colonização.
A apresentação final dos temas geradores constitui-se em momento de
socialização onde cada turma, na sequência crescente das séries, dos mais novos e

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pequeninhos até os adolescentes e jovens, vai circulando no coletivo da roda sua
potência criativa e reflexiva integrada com os conteúdos da Base Nacional Comum
Curricular (BNCC).

TABELA 1: TEMAS GERADORES DO PRIMEIRO TRIMESTRE DE 2023 – EEEF VALDÍCIO BARBOSA DOS SANTOS
Turma Eixo Temático Tema Gerador
INFANTIL Bandeira Vermelhinha Identidade e Cultura Eu e minha história
1º ANO Terra é Força Identidade e Cultura A Casa da minha família
2º ANO Terra é Força Identidade e Cultura A História da minha família
3º ANO Sem Terrinha Identidade da Família A Identidade da Família
4º ANO Campo em Harmonia Identidade da Família A História da Comunidade
5º ANO Campo em Harmonia Identidade da família A participação da família na
organização da comunidade
6º ANO Adolescente do Futuro As relações de trabalho e produção O trabalho na família
7º ANO Jovens Estudantes As relações de trabalho e produção A diversificação da produção
agropecuária
8º ANO Juventude em Movimento Os elementos Organizativos e As organizações sociais em nossa
Políticos do Campo região
9º ANO Juventude em Movimento Os elementos Organizativos e A luta por reforma agrária
Políticas do Campo

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25
FOTOS 80-97: culminância das atividades do primeiro trimestre de 2023 na EEEF Valdício Barbosa
dos Santos.

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3.6. Oficina Educação para o Patrimônio Cultural
As oficinas constituem-se nas atividades alinhadas pelas educadoras da
EEEFVBS e a equipe técnica do PIEP. Estavam cercadas de expectativas em função
da conexão positiva estabelecida pela equipe técnica com os assentados de forma
geral, em função da profundidade etnográfica alcançada pelas navegações anteriores
e dos afetos decorrentes.
Neste contexto, para a oficina de educação patrimonial foi acolhida a proposta
de atender o maior número de alunos, contemplando as turmas de Educação de
Jovens e Adultos (EJA) e os estudantes do 1º ao 9º ano matutino do ensino
fundamental. Portando, apenas as crianças da educação infantil não foram
diretamente beneficiadas.
Outra estratégia de sensibilização foi o material gráfico para divulgação junto
ao grupo de WhatsApp da comunidade.

3.6.1. Grupo 1: EJA – Círculo de Cultura - 31/05/2023


O desafio e a responsabilidade de conduzir, como visitantes, a oficina em uma
escola alicerçada nos princípios e práticas de Paulo Freire, não poderia ser diferente.
A banca foi aberta diretamente com os assentados adultos e jovens, alguns da melhor
idade, que labutam no campo diurnamente e encontram tempo para o engajamento
noturno em prol da transformação individual e coletiva que tem por nome a educação.
A atividade configurou-se como um círculo de cultura freiriano clássico, em
homenagem ao patrono da educação nacional e em celebração à fidelidade da escola
à pedagogia problematizadora da realidade e construtora de utopias para a
transformação social. Também foram valorizados elementos das místicas em função
de seu potencial de ressonância e de reverberação dos afetos no cotidiano das
práticas escolares.
Além dos educandos, vários educadores acompanharam a atividade que pode ser
desdobrada nos seguintes momentos:

1º Momento: Apresentação e Místicas de Integração


Após a apresentação da atividade e dos visitantes feita pela educadora
Ronimárcia, a condução foi passada para a equipe técnica.
Dispostos em arena circular, os participantes se levantaram para girar
caoticamente nos sentidos horário e anti-horário em torno de uma mesa colocada no

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centro da roda. Foram instados a entrar em uma experiência sensorial mediante a
fruição de características dos alimentos como cor, cheiro, forma. Em seguida, foram
questionados sobre a origem das quitandas, através de reflexões como “o que são?”,
“quem fez?”, “quem sabe fazer?”.
Além do cafezinho, estavam na mesa bolos e beiju feitos por assentadas, que
foram sendo reconhecidas nos alimentos. Ao serem indagados sobre “quem sabia
fazer o beiju?” vários participantes levantaram a mão, o que permitiu alcançar o
objetivo de entrada da oficina, ou seja, refletir a respeito do patrimônio a partir dos
repertórios próprios dos participantes.
Nesta toada, ainda em volta da mesa, teve início uma reflexão coletiva sobre
as quitandas, os saberes e prazeres gastronômicos da comunidade, com seus pratos
típicos regionais e locais. Após este menu de entrada, todos degustaram as iguarias
e retornaram para seus assentos no círculo de cultura.

FOTOS 98-99: Ronimárcia apresenta a equipe do PIEP e o propósito da Oficina.

FOTOS 100-101: Mística do alimento.

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Em seguida teve início a segunda mística, com fins de apresentação e
integração da turma e equipe técnica. Novamente no centro, foi colocado um balaio e
uma bandeira do MST. A palavra foi circulando entre todos os presentes, que foram
convocados a colocar dentro do cesto um objeto representativo de um valor ou
sentimento pessoal de cada um, algo que fosse importante para sua memória. Nessa
medida, iniciando a reflexão sobre o que consideram como patrimônio individual, o
que vale a pena preservar, ou manter na memória. Ainda sem apresentar nenhum
desses conceitos, mas sim, deixando a livre expressão.
Os participantes extrapolaram, além de artefatos colocaram de tudo no balaio:
ferramentas de trabalho (foicinha, batedeira de pimenta, carteira de motorista), som,
chuteira de futebol, garrafa de café, uma fotografia, animais de estimação (cachorro,
bezerra, papagaio), pessoas queridas, família, aliança de casamento, berço do
primeiro filho que está a caminho, educação, bolsa de estudos, lápis e trator e a
bandeira do MST. Foi um momento catártico e de muita emoção, com risos e choros.
A aprendizagem é que na escala de valores dos assentados as potências vivas se
sobrepõem aos objetos inanimados e, no final, a síntese do balaio cheio, com o que
ele mais continha, foi a palavra AMOR!

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FOTOS 102-107: Mística de apresentação e integração.

2º Momento: Propulsão do tema gerador e escolha circular dos repertórios


Após o aquecimento e descontração promovidos pelas místicas teve
início a tempestade de ideias sobre o tema gerador: “o que é o patrimônio?”
Recapitulando o fio das reflexões sobre o beiju e a quitanda a palavra
circulou novamente na roda e os presentes se manifestaram sobre os vários
sentidos da palavra, tais como “uma coisa de valor”, “algo que é meu”,
“histórico”, “o que é público”, “o que tem valor cultural”, “a bandeira do MST”,
“o MST patrimônio nacional”, “propriedade ou bens, dinheiro e terra”, entre
outros significados.
O rodeio semântico atingiu o objetivo de explicitar a polissemia contida
na palavra patrimônio e contribuiu para a propulsão do tema gerador.
A roda pôs-se a girar novamente para que os participantes pudessem
escolher entre os quatro grupos de repertórios cujo conteúdo estava oculto,
pois foram colocados no chão com a face para baixo ∕ verso para cima.
Os repertórios usados consistiram em imagens impressas pela equipe
técnica para aprofundamento em grupos reflexivos do tema gerador,
destacando o esforço de manter a gravitação o máximo possível próxima do
universo êmico dos comunitários.
Em outros termos, a exemplo da oficina de educação patrimonial de
Água Preta, a reflexão criativa teve como piso os repertórios singulares dos

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assentados e foi galgando progressiva e dialogicamente os degraus dos conteúdos
formais e normativos das políticas de salvaguarda preconizados pelo IPHAN.

FOTOS 108-113: Tempestade de ideias sobre o tema gerador e escolha dos repertórios.

3º Momento: Reflexão crítica e criativa dos repertórios


Após a escolha dos repertórios, cada grupo se reuniu em ambiente separado
dos outros para aprofundar a reflexão criativa. A instrução era para darem asas à
imaginação e aos sentidos, intuindo ou analisando as imagens que representavam
desenhos, figuras, mensagens e outros repertórios semióticos. A escrita foi
dispensada e exaltada a oralidade e a expressividade para apresentação das sínteses
criativas agenciadas por cada grupo.

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FOTOS 114-117: Grupos reflexivos aprofundando os repertórios.

4º Momento: Enunciação coletiva das sínteses criativas


Momento em que foi socializada a problematização dos repertórios feitos em
grupos.
O primeiro grupo apresentou síntese criativa de repertórios relacionados com
a polissemia do patrimônio, apropriações do termo segundo estratégias de diferentes
grupos sociais desde o contato colonial e reflexos na contemporaneidade,
abrangendo aspectos da diversidade cultural, desigualdade e concentração agrária
do país. Também foram refletidas as categoriais do patrimônio cultural.
O segundo grupo apresentou síntese criativa de repertórios associados à
ocupação cultural dos povos indígenas em âmbito geral no país e regionalmente. A
violência associada aos processos de contato, aspectos da territorialidade e da
cultura material e imaterial dos povos indígenas pretéritos e atuais do Espírito Santo.
O terceiro grupo apresentou síntese criativa de repertórios associados à
diáspora africana, os processos históricos de resistência à barbárie escravista, o
combate ao racismo, as políticas de afirmação da diversidade étnica na promoção da
igualdade de direitos e oportunidades, o legado e presente etnográfico da cultura
negra em âmbito nacional e suas manifestações e ocorrências no contexto local.
O quarto grupo apresentou síntese criativa em torno de experiências concretas
de patrimonialização, incluindo exemplos diretos de como o MST vem aproximando e
fazendo uso das categorias e políticas de salvaguarda, como nos casos da
declaração da feira da reforma agrária como patrimônio imaterial carioca, o
reconhecimento da curva do S como patrimônio cultural do Pará e até mesmo um
caso de tombamento de um conjunto de edificações no assentamento Dênis
Gonçalves localizado na zona da mata mineira.

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FOTO 118-122: Socialização dos repertórios pelos grupos.

As apresentações foram realizadas dialogicamente, sendo complementadas


por observações, questões e comentários. Um ponto em que merece atenção e que
corrobora a importância do auto atribuição no tocante a valoração de um bem imaterial
foi a crítica, feita por alguns presentes, que problematizaram a patrimonialização
cultural da curva do S onde teria ocorrido o massacre de Carajás. Pois, seria “algo
negativo, tão ruim e doloroso, ao passo que o MST tem muitas experiências positivas
para ser patrimônio”.
Fato é que, na medida em que as sínteses eram enunciadas e
problematizadas, as imagens eram coladas na lousa compondo um vasto painel que
pode ser considerado o TEXTO final do círculo de cultura.

FOTO 123: painel do círculo de cultura.

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5º Momento: Apresentação expositiva da equipe do PIEP
Este momento apresentou como desafio introduzir de forma dialógica questões
universais associadas ao patrimônio cultural e que o definem como ciência
multidisciplinar integrada. Mais uma vez, a equipe insistiu no esforço de operar com
materiais empíricos recolhidos, sempre que possível, nos contextos locais e regionais,
procurando encurtar a distância entre os repertórios dos comunitários e os conteúdos
de educação patrimonial prescritos no âmbito das normativas de proteção e
salvaguarda de bens culturais.
A este respeito, de forma geral foi mantida a apresentação utilizadas na oficina
de educação patrimonial de Água Preta (Terceiro Relatório- 4ª Etapa de Campo: Parte
de Água Preta; pp.26-43), acrescida da propositura de uma cronologia de ocupação
regional que recuava até o período pré-colonial chegando aos dias atuais, transitando
pelas principais estruturas e diferentes materiais arqueológicos até o período do
contato e histórico, onde foram arrematados os conteúdos trabalhados no círculo de
cultura.
Os conteúdos visualizados propiciaram profícuo debate entre os presentes.

FOTOS 124-127: momento expositivo da oficina.

6º Momento: Avaliação e Mísitica de Encerramento – a Dança do Coração da Terra

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Neste momento a palavra circulou entre todos os educadores e estudantes que
agradeceram o empenho e trabalho da equipe técnica, destacando a relevância da
atividade para a história da EJA da EEEFVBS.
Em tempo, a equipe introduziu uma mística final chamada Dança do Coração
da terra, que consiste numa variação do toré com todos girando e marcando o
compassado com a pisada acompanhada de gritos como hey (passo á frente) e how
(passo atrás), animados pelo instrutor que exclamava frases como “a cultura em
Valdício é como o coração da terra e não pode parar!” “ tá batendo muito fraco e
devagar este coração, acho que vai morrer”, “acelera e firma a pisada!” e outras
expressões do tipo. Os presentes foram acelerando e batendo cada vez mais forte,
se aproximando do centro onde bem juntinhos gritaram um grande hoooowww!!!
A oficina terminou em júbilo e foi coroada com uma pizza produzida por uma
assentada de alcunha “Loira”, gerando comentários adicionais sobre os efeitos
gastronômicos positivos oriundos do encontro dos povos, uma vez que a pizza é de
origem italiana, mas disseminada no Brasil e saboreada com prazer na comunidade.

FOTOS 128-131: finalização e avaliação positiva dos participantes.

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FOTOS 132-133: fruição gastronômica final, pizza produzida no assentamento.

FOTO 134: lista de presença da Oficina Educação para o Patrimônio Cultural – EJA.

3.6.2. Grupo 2: Cultural Digital – 6º ao 9º ano – 02/06/2023

Na terminologia êmica da escola foram beneficiadas as turmas “Adolescentes


do Futuro”, “Jovens estudantes” e “Juventude em Movimento”.
A escolha foi por manter os repertórios trabalhados com os estudantes da EJA.
Todavia, em função da potência de motricidade típica da faixa etária foi conferida

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primazia à expressão corporal e dramatizações na propulsão do tema gerador e na
reverberação dos repertórios.
Além disso, foi criado um quinto grupo de cultura digital para documentar o
processo reflexivo criativo. Esta demanda foi reiterada no percurso do PIEP pela
direção do assentamento e educadores, e também apontada como vertente a ser
potencializada em confluência com o protagonismo juvenil e a vocação deste público
para operar mais facilmente com suportes digitais.
Foi ressaltada também a necessidade de que o manejo de suportes info-tele
midiáticos se desdobre em ganhos permanentes, qualificando os processos de
documentação e registro pela própria comunidade.
Qualificada nestes termos, as multilinguagens ativadas na oficina compõem
suportes do teatro∕ dramatização, audiovisual, música e sonorização, poesia,
patrimônio cultural material e imaterial.

1º Momento: Roda de expressividade corporal cômico-criativa


Na roda de abertura, os estudantes experimentaram vários exercícios cômico-
criativos para potencialização da expressão corporal e cênica. O aquecimento
contribuiu para arrefecer as couraças e dar vazão a potência de motricidade juvenil.

FOTOS 135-138: Roda de expressividade.

2º Momento: Propulsão do tema gerador roteirização criativa dos repertórios

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Os educandos fizeram a escolha aleatória dos repertórios e passaram à
reflexão crítica e criativa com a tarefa de roteirizar os conteúdos semióticos
apresentados nas imagens, preparando uma apresentação apoiada na dramatização
e expressão corporal.
Em apoio, a equipe técnica valeu-se de referência do Teatro do Oprimido de
Augusto Boal:
O Teatro do Oprimido é um teatro participativo que fomenta formas de
interação democráticas e cooperativas entre os participantes. É um "teatro
ensaio" praticado por ‘espect-atores’ (não espectadores), que têm a
oportunidade tanto de atuar quanto de observar processos de diálogo e
pensamento crítico empoderadores. No Teatro do Oprimido, o ato teatral é
vivenciado como uma intervenção consciente, como um ensaio para uma ação
social baseada na análise coletiva de problemas comuns.” (Fonte:
https://hemisphericinstitute.org/pt/hidvl-collections/itemlist/category/393-
boal.html . Consulta em 17/08/23).

Também foram incorporados ao cenário vários brinquedos em madeira como


espadas, lanças, arco e flechas, estilingues etc.; e cujo fabrico é comum pelos alunos
em seu contexto de vida rural, além de adereços e elementos de figurino usados nas
místicas como chapéus, ferramentas, botas, folhas, plantas, entre outros.

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FOTOS 139-144: Propulsão do tema gerador roteirização criativa dos repertórios.

3º Momento: Enunciação coletiva das sínteses criativas


Na apresentação, cada grupo escalou uma voz solo para narrar o roteiro.
Munidos da parafernália cenográfica a tarefa dos demais integrantes foi expressar,
como coro corporal integrado à narrativa, as sínteses criativas operadas a partir dos
repertórios e conteúdos refletidos criticamente.
A sucessão cronológica dos grupos de repertórios favoreceu a elaboração de
uma série criativa da linha de tempo de ocupação do território norte do Espírito Santo
e pautas atreladas do patrimônio cultural de grupos indígenas, africanos escravizados
e seus descendentes, além da população campesina de forma mais geral.
Como um corpo-texto-imagem em movimento, as sínteses criativas de cada
grupo foram integradas em suportes de cultura digital pelos estudantes que faziam o
registro.

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FOTOS 145-152: enunciações criativas.

4º Momento: Apresentação expositiva da equipe do PIEP e encerramento


A exposição manteve-se no padrão oferecido para a turma da EJA.
Contudo, no caso dos adolescentes e jovens do ensino fundamental,
observamos uma maior interatividade com os conteúdos históricos e patrimoniais,
uma vez que eles já haviam feito visitas e excursões para alguns dos locais
mencionados, como o Museu de Itaúnas. Também apresentaram desenvoltura e
conhecimento introdutórios sobre artefatos e estruturas que funcionam como
marcadores cronológicos da ocupação regional, como os sambaquis.

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FOTOS 153-156: Momento expositivo e lanche final com os estudantes do ensino fundamental.

3.6.3. Grupo 3: Cultura do Brincar - 1º ao 5º ano – 02/06/23

A oficina de patrimônio cultural direcionada aos estudantes dos anos iniciais do


fundamental teve uma dinâmica lúdica, evitando ao máximo o formato expositivo e
convidando os educandos a pensar o patrimônio cultural a partir de suas vivências
particulares.

1º Momento: Promoção da cultura do brincar na infância


No início da atividade a meninada foi convidada a brincar de ciranda,
remetendo a práticas tradicionais. A turma do infantil, que se divertia no parquinho
naquele instante, ficou interessada na dinâmica. Então, a equipe do PIEP convidou os
Bandeira Vermelhinha para que entrassem na brincadeira. Os pequenos participaram
fazendo uma roda no centro da anteriormente formada pelas turmas Terra é Força,
Sem Terrinha e O Campo em Harmonia.

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FOTOS 157-158: momento inicial, cirandas e cantigas de roda.

2º Momento: Elaboração criativa de desenhos a partir dos repertórios


Para esse grupo os repertórios foram alterados, focados em elementos do dia
a dia dos quintais produtivos e das unidades familiares, que encontram ressonância
entre a meninada, como animais domésticos, sementes, árvores e plantas em geral.
Pedimos que desenhassem para as pessoas que não os conhecem, pois moram nas
grandes cidades, como é a vida no assentamento. “O que eles plantam?”, “Como
vivem?”. A equipe disponibilizou materiais para a expressão artística das turmas.

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FOTOS 159-175: apresentação dos participantes.

As apresentações começaram com cada turma entoando suas palavras de


ordem, como o fazem nas místicas. Primeiro apresentaram os Sem Terrinha, seguidos
da Terra é Força e finalizando com O Campo em Harmonia. Cada criança explicou o
seu desenho. Em geral, a meninada expressou a simplicidade de suas casas, desde
os tempos da lona até construções de madeira, barro e alvenaria. A exuberância da
natureza foi retratada pelas paisagens representadas, os animais e a riqueza da
agricultura familiar. A figura abaixo sintetiza as palavras ditas nas apresentações:

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FIGURA 06: palavras ditas pelos estudantes do 1º ao 5º ano.

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FIGURAS 07-16: Sem Terrinha – desenhos de autoria de Kauelly, Alessandra, Pedro Lucas,
Mayhara, Allyson, Jackson, Gabriel, Jhenyffer, Wanderson e Miguel.

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FIGURAS 17-28: Terra é Força – desenhos de autoria de Bernardo, Vitor, Heithor, Ivo, Maria Laura,
Manuella, Maria Klara, Nicolly, Anna Karolyna, Ludmila, Davi Luiz e Livya.

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FIGURAS 29-42: Campo em Harmonia - desenhos de autoria de Dani, Rener, Elizeu,
Anderson, Kemilly, Maria Luara, Kauã, Lavynia, Natan, Pedro Gabriel, Matheus, Fernanda, Arthur e
Ederlan.

3º Momento: Apresentação expositiva e encerramento

Evitando ao máximo o formato de palestra, a equipe explorou por meio de


imagens o patrimônio regional de forma conectada com a expressão artística das
crianças ao retratarem seus quintais, terrenos produtivos e sua vida na comunidade.
Importante destacar que nesse grupo estavam presentes crianças de Água Preta,
que já haviam participado das oficinas do PIEP.

Inicialmente perguntamos o que eles entendiam por patrimônio? Um estudante


respondeu que “patrimônio é cultura”. Em seguida perguntamos: Quem chegou aqui
primeiro, nesse lugar onde vocês moram? E a respostas foram “Léo”, “Valdício
Barbosa”, “O meu tataravô”, “Os índios”.

A partir disto apresentamos a cronologia do assentamento e destacamos a


alteração na paisagem ao longo do tempo, desde os primeiros habitantes do Brasil
até os dias atuais. Nessa apresentação falamos brevemente sobre os sítios
arqueológicos através de algumas imagens, entre as quais as da exposição do
museu do parque de Itaúnas. Imediatamente eles se manifestaram, dizendo que
estiveram no local e conheceram a exposição.

Finalizamos explicando a cronologia do assentamento, demonstrando que a


luta do MST pela terra se aproxima à luta de povos tradicionais, como a dos
quilombolas e indígenas, que existe em virtude de uma escolha do passado (a Lei de

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Terras). Essa é uma controvérsia que perpassa os séculos, desde 1500 existem
diferentes visões sobre esse chão que a gente pisa, a mãe terra é um ser vivo ou
uma propriedade? O encontro de diferentes cosmologias deu origem ao Brasil atual.
E até hoje, há uma diversidade de opiniões sobre o que fazer com essa terra, o que
plantar e como plantar. Pelas apresentações vimos que o assentamento opta pelo
plantio diverso, a agroecologia.

FIGURAS 43-44: Linha do tempo apresentada aos estudantes.

Após essa explanação perguntamos quem sabe fazer beiju? E quem gosta de
comer? As crianças se manifestaram, a maioria adora e tem alguém da família que
faz. Então convidamos todos a experimentarem o beiju e outras delícias produzidas
no assentamento acompanhadas de suco de maracujá.

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FOTOS 176-178: Momento expositivo junto à meninada do 1º ao 6º ano.

FOTOS 179-180: momento final da oficina, degustação das quitandas feitas no assentamento.

3.7. Oficina de Cartografia Social e Cultura Digital – 6º ao 9º ano –


07/06/2023
A oficina de Cartografia Social e Cultura Digital foi direcionada aos estudantes
do 6º ao 9º ano matutino. A escolha desse público pela equipe pedagógica se deu
porque no dia 08 de maio de 2023 esses educandos haviam participado de uma
palestra do Senhor Adelso Rocha Lima sobre Reforma Agrária.
Segundo relatórios redigidos pelos estudantes nas pastas de Registro do Plano
de Estudo, na palestra “A Luta pela Terra” Adelso Lima mostrou o Assentamento via
imagens de satélite do Google:
O senhor Adelso nos fez uma explicação sobre a luta pela terra. Primeiro
falamos sobre o assentamento olhando-o de cima por satélites no google
Maps, vimos as matas ciliares que são as matas que protegem as águas como

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cílios. Falamos sobre alimentos e produção do ASS. (...) (Jovens Estudantes
– 6º ano).

(...) Adelso começou mostrando um mapa do Assentamento Valdício Barbosa


dos Santos no google falando sobre os rios, as matas ciliares, as plantações,
a função social da terra, a distribuição da terra no Assentamento e na fazenda
São Joaquim. (Jovens Estudantes – 7º ano).

(...) A qual nos mostrou o Assentamento no satélite pelo google, mostrou a


nossa escola, rios, lagos, represas e córrego, mostrou as nossas plantações,
as matas ciliares existentes no assentamento. (...) Também falou sobre as
diferenças entre mata ciliar e outros plantios presentes no Assentamento.
(Juventude em Movimento - 8º e 9º ano).

Para a coleta dos dados e a localização da equipe na área de interesse em


tempo real, via GPS, ao longo dos trabalhos foi utilizado o aplicativo de smartphone
Avenza Maps, no qual é possível introduzir um mapa em formato .pdf
georreferenciado da região ou utilizar a versão Beta que possui um mapa de base em
escala global. Os trechos percorridos e os pontos de interesse para o trabalho foram
registrados no aplicativo e posteriormente exportados em formato .kmz (arquivo
utilizado no software GoogleEarth).
Na etapa de compilação dos dados coletados, os softwares de Sistema de
Informação Geográfica – SIG operados foram o ArcGis e o GoogleEarth. No
GoogleEarth são obtidas as imagens para subsidiar os produtos e a oficina. No ArcGis
os arquivos oriundos do Avenza Maps são convertidos em shapesfiles e a partir daí
os produtos para a socialização na Oficina de Cartografia Social são concebidos.
Após a compilação, os dados cartográficos socializados para apreciação da
comunidade em atividade de reflexão criativa. Aos estudantes e educadores
trouxemos a experiência de utilizar o aplicativo Avenza em tempo real, caminhando
pela escola e marcando seu trajeto.
A escolha pelo aplicativo Avenza, substituindo o Google Earth da proposta
inicial, ocorreu em função da baixa qualidade do sinal de internet na escola. Durante
os preparativos os educadores alertaram para a dificuldade de obter sinal, ainda mais
com vários aparelhos celulares conectados ao mesmo tempo. O Avenza não
necessita de sinal de internet, utiliza apenas os satélites, funcionando como um GPS.
Aqui o acesso à internet é muito complicado, é muito precário. Essa questão
do celular, você viu que a maioria dos alunos tem, e eles ficam muito
interessados em aprender, ter acesso, aprender a usar o aplicativo.
Tem dia que não abre nada, tem dia que ninguém consegue. Tem dia que
funciona muito mal, um ou outro. Não tem dia ótimo.
(...) O problema é esse acesso, às vezes, ali de imediato você não tem. Caso
que, às vezes, em outra localidade é mais fácil o acesso, porque é via fibra
ótica. Aqui é via rádio e muito mal.

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Tem hora que a gente fica aqui incomunicável. Várias vezes a gente saiu aqui
da escola, pegamos a moto e saímos procurando sinal para ter alguma
informação urgente ou alguma coisa. Ou às vezes, já aconteceu de algum pai
avisar de alguma criança e a gente não conseguir, não receber a informação.
Ou seja, não tem acesso à internet nem ao sinal telefônico, então é bem
complicado. (Relato da professora de geografia, Graciele, 07-06-2023)

Além disso, conforme solicitado pela equipe pedagógica, foram aplicadas


algumas noções básicas de fotografia com aparelhos celulares, como adequação da
luz, enquadramento, posição do aparelho para fotos e vídeos etc.

Momento 1: Parte expositiva, mapa e imagens aéreas do Assentamento

A parte expositiva teve início com uma breve introdução sobre cartografia,
momento em que foram recapitulados pontos trabalhados nas aulas de geografia,
como tipos de mapas, procurando alinhar uma visão geral do tema a partir dos
repertórios dos participantes.

Considerando que a palestra do Sr. Adelso já havia trabalhado pontos de


referências locais por imagens de satélite, optamos por explorar com os estudantes o
Assentamento em relação ao contexto local, ampliando a escala e recuando na
cronologia. Dessa maneira, começamos com fotos autorais da paisagem do
assentamento. Na sequência apresentamos imagens da década de 1950, extraídas
do blog Estação Capixaba:

Um croqui feito por um engenheiro que atuou na região (Acervo da família


Appel):

FIGURA 45: croqui de 1950. Fonte: http://conceicao-da barra.blogspot.com/2012/04/fotos-


antigas-do-municipio-de-conceicao.html

52
Fotos da construção de uma ponte sobre o rio Itaúnas, próximo a Pedro
Canário:

FOTOS 181-183: construção de uma ponte sobre o rio Itaúnas próximo a Pedro Canário,
acampamento próximo, porto de São Mateus, na década de 1950. Fonte: http://conceicao-da
barra.blogspot.com/2012/04/fotos-antigas-do-municipio-de-conceicao.html

Apresentamos uma imagem de 1970 onde vê-se a área do Assentamento, o


bairro Camata e a comunidade de Água Preta. Destacamos que essa imagem foi
extraída de uma fonte confiável, a geobase do site do IEMA
(https://geobases.es.gov.br/downloads).

FIGURA 46: Assentamento Valdício Barbosa na década de 1970.

Em seguida, demonstramos que ainda que as ferramentas digitais sejam muito


práticas e úteis, devem ser utilizadas com senso crítico, caso da cronologia das
imagens aéreas disponíveis no Google Earth, que apresentam falhas na continuidade
e provável erro cronológico da linha do tempo do assentamento .

53
Na sequência mostramos a localização do Assentamento em relação às
comunidades quilombolas da região e ao porto de São Mateus, além das já
mencionadas referências do bairro Camata e da comunidade de Água Preta.

FIGURA 47: contexto regional, presença negra expressa pelos quilombos e o porto de São Mateus.

Momento 2: Explicação do modo de usar o aplicativo Avenza


Na sequência apresentamos um mapa com os pontos coletados no RAIPI, os
quais foram checados em campo pela equipe do PIEP. Apresentamos os pontos
obtidos no PIEP, como um exemplo para etapa seguinte, quando ensinamos o modo
de usar o aplicativo AVENZA.

FIGURAS 48-50: Mapa com pontos do RAIPI, pontos e caminhamento do PIEP,


demonstrativo de utilização do aplicativo AVENZA.

O primeiro passo para utilizar o aplicativo AVENZA foi instalá-lo nos celulares.
Foi enviado por mensagem pelo grupo da escola um demonstrativo para instalação e
um mapa em pdf, para que todos já chegassem na oficina com os arquivos instalados,
sem necessitar de acesso à internet durante a Oficina.
Durante a Oficina ensinamos a maneira de inserir o mapa georeferenciado em
formato pdf no aplicativo. O mapa disponibilizado possuía como referência prévia a
localização da escola e o limite do Assentamento. Após obterem a imagem no

54
aplicativo, ensinamos a inserir pontos no mapa e gravar trajetos. Para tanto
convidamos os estudantes a caminharem pelos diferentes espaços da escola. O fato
que mais chamou atenção dos estudantes foi a marcação do trajeto.

FIGURAS 51-54: explicação de como instalar o aplicativo e inserir o mapa (pdf).

FIGURA 55 / FOTOS 184-186: mapa da oficina, os participantes acompanhando pelos celulares a


demonstração de como usar o aplicativo.

Momento 3: Os participantes utilizaram o aplicativo na prática


Aos estudantes trouxemos a experiência de utilizar o aplicativo Avenza em
tempo real, caminhando pela escola, marcando pontos e seu trajeto. A maioria
dispunha de celulares, aos que não puderam trazer a equipe do PIEP disponibilizou

55
um aparelho, onde ficou registrado o caminhamento e alguns pontos tomados, como
a localização da igreja católica, a quadra de esportes, as salas de aula das turmas
Juventude em Movimento e Sem Terrinha.

FOTOS 187-190 / FIGURA 56: os estudantes utilizando o aplicativo AVENZA, resultado do


caminhamento.

Momento 4: Explicação do modo de fotografar e filmar com celular

Por fim, explicamos o modo de fotografar e filmar com celular e câmera,


abrangendo diversos aspectos como qualidade da imagem, recursos de tratamento
e edição, aplicativos, seguido de exercício prático dos participantes.

56
FOTO 191-194: oficina de cultura digital – fotografando com celular.

Momento 5: Sobreposição de técnicas cartográficas e etnoregistros


Nunca é demais lembrar o caráter participativo e sensorial da elaboração
cartográfica sobre os bens culturais do assentamento Valdício Barbosa.
Um fator positivo da realização da oficina de cartografia com os mesmos
estudantes do 6º ao 9º que fizeram a oficina de patrimônio cultural é a confluência
entre os exercícios reflexivos sobre os mapas com os bens culturais em processo de
registro e inventariamento.
Isto significa que, mesmo que a oficina tenha sido encerrada, os pontos
referentes aos bens culturais que são alvo do PIEP poderão ser complementados
pelos estudantes, permitindo o avanço nas representações cartográficas que irão
subsidiar o inventário final (Relatório 6), momento em que serão objeto de validação
final. Contribui a favor desta perspectiva a participação e engajamento da professora
de geografia, Graciele, assim como os demais professores (Cida, Thiago e Ariel) na
oficina e sua colaboração nos futuros desenvolvimentos cartográficos.
Adicionalmente, após o encerramento das oficinas e demais atividades na
Escola Estadual de Ensino Fundamental Valdício Barbosa dos Santos, o mapa de
navegação abriu-se para a vertente dos etnoregistros, possibilitando agregar
informações adicionais às representações cartográficas, como no caso dos quintais
produtivas e das unidades domésticas que passamos a descrever em seguida.

57
3.8. Etnoregistro de unidades domésticas e quintais produtivos
Neste momento do PIEP optaremos por adotar o conceito de unidade
doméstica, coletivo formado pela tríade casa-quintal-terreiro, em função do seu
potencial de expressar elementos identitários e socioculturais associados ao modo
local de apropriação do território e da paisagem3. A mesma tríade se traduz em outra
terminologia comumente usada no assentamento: o “lote produtivo”.
No âmbito etnográfico, a bússola é deslocada para os mosaicos policuturais
dos quintais e rizomas estabelecidos com saberes e fazeres nas unidades
domésticas, tais como quitandas, artesanato, farinheiras e saberes do pilão.
Em Valdício Barbosa algumas unidades domésticas com seus quintais
produtivos estão localizadas separadamente no núcleo histórico irradiador da
agrovila. Outras se expandiram ao longo do tempo com a distribuição dos lotes mais
amplos e descentralizados, após o efetivo assentamento. Portanto, o padrão de
localização dos grandes plantios de café, pimenta do reino e maracujá em relação às
unidades domésticas é variável. Algumas unidades são adjacentes, outras nem tanto.
Frente a este cenário, optamos por apresentar um sumário descritivo
cronologicamente fiel à sequência de captura das lentes etnográficas, reservando
para o inventario final a categorização e sistematização junto ao bem imaterial
correspondente.

3.8.1. 30/05/2023
Dando largada ao campo, celebramos a radicalidade etnográfica praticando o
método da deriva para abordagem direta de assentados que estavam trabalhando
nas áreas repletas de cafezais e pimenteiras.
O objetivo era observar a situação do Assentamento durante o trabalho no
campo, interferindo ao mínimo na atividade, através de técnicas como “escuta ao pé
da enxada”, “dedinho de prosa ao pé do coqueiro” e similares.
A proposta se mostrou bastante profícua e realizamos vários registros com
foco especial na lavoura do café, desde o plantio de novos pés, até a colheita das
plantas adultas carregadas de grãos, o manejo (poda) e a secagem. Ao longo dos
etnoregistros foram sendo coletados relatos do histórico dos plantios, a cooperação

3
Neste sentido, “é possível dizer que o resultado da dinâmica cotidiana de um grupo
na paisagem remete ao ethos daquele grupo.,” (NASCIMENTO, 2011:79).

58
dos agricultores, da mão de obra e proventos, da produção para consumo e
comercialização.
Também registramos a alternância de plantios, como café e maracujá, café e
pimenta do reino, bananeiras, cana de açúcar, aipim, laranja etc.
Colheita de café

FOTOS 195-196: morador há 5 meses no assentamento, trabalhando no plantio de novas mudas de


café.

Cleidson de Oliveira Santos, filho do Sr. Amilto Lima dos Santos, mora no
assentamento desde os tempos da Lona, veio quando tinha 3 anos de idade, hoje
está com 29 anos. Na ocasião do etnoregistro podava o plantio do vizinho (4 a 5 mil
pés), mas indicou que tem em seu lote cerca de 6 a 7 mil pés de café.

FOTO 197: Cleidson Santos, trabalhando no cafezal do seu vizinho.

O Sr. José tem 65 anos, vive há cerca de 21 anos no assentamento, veio de


Sergipe. Ele tem aproximadamente 2 mil pés de café. Na ocasião da conversa tratava
de mudas de pimenta no lote de sua filha. Ele disse que de início vendia sua produção
na Feira de Pedro Canário, antes da pandemia, ia no ônibus “Mar Aberto” para vender
laranja, aipim, jiló, feijão, café, pimenta etc. O ônibus não circula mais. Atualmente
fornece ao P.A., através da sua companheira Luzia, associada da AMAG.

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FOTO 198: Sr. José.

Romário Rodrigues da Silva, no assentamento há 6 anos, veio de


Jaguaré/ES. Ele contou que deixou de ser jogador de futebol pela lavoura. Embora
encontre desafios, como se deparar com cobras, escorpião, e ter que se dedicar ao
café durante o ano inteiro, se refere ao seu plantio com afeto, como uma família. O
futebol o levaria para longe dela, então escolheu ficar.

FOTO 199: Romário Rodrigues da Silva.

Além do contato com os assentados, no cafezal do Cássio identificamos


trabalhadores rurais com longa experiência de diaristas na colheita de café. Eles são
de várias procedências, desde o próprio assentamento como Dona Márcia e sua filha
até de áreas do sul da Bahia e norte do Espírito Santo, como o Sr João.
Pela primeira vez no assentamento, Sr. João estava no cafezal do Cássio
quando o abordamos. João trabalha há mais de 30 anos colhendo café, trabalhou em
Jaguaré, Sooretama, Linhares, Bananal, Nova Venécia, Pinheiros, “esses cantos por
aí tudo”, na semana seguinte ia colher café na fazenda Palmeirinhas, em Pinheiros.
Sr. João começa a jornada por volta das 6 h da manhã e termina entorno de
16 h. Ele contou que o café do Assentamento é conilon e explicou que está colhendo
grãos maduros e ainda verdes, porque falta mão de obra, se deixar os verdes
amadurecerem no pé, por falta de quem colha, o café pode perder, vai secar, vai cair.
“Mas aquele café arábica, aquele lá de fora, da terra fria, esses eles
já colhem madurinho”.

60
Ele explicou ainda que separa as folhas dos grãos porque elas podem pegar
fogo na hora da secagem.
“O café conilon é assim, já o arábica não, o arábica você pode deixar
a folha que não tem problema, já esse aqui você tem que tirar a folha
toda senão ele pega fogo no secador”.

Ele conhece de café arábica, porque já trabalhou em Ibatiba.


“Lá, os café (sic.) lá é tudo morro, só morro! Lá o café lá é madurinho,
só que eles não tiram a folha assim não.”

FOTO 200: Sr. João.

FOTOS 201-202: Dona Márcia e sua filha, moradoras do Assentamento Valdício Barbosa,
trabalhando na colheita do cafezal do Cássio.

61
3.8.2. 31/05/2023
Unidade domiciliar - Tatiana
Tatiana mora no assentamento com o marido desde o final de 2020, início de
2021. Eles vieram de Sooretama, onde o sogro dela tem terra. No assentamento o
casal plantou maracujá (cerca de 3 mil pés) e café (28.500 pés). Ela contou que 5
meses após o plantio de maracujá chega a colher de 100 a 200 caixas por semana.
Ela trabalhou na AMAG, mas atualmente se dedica apenas ao plantio e aos
cuidados da casa. Ela conta com a ajuda do marido e dos parentes, que moram fora,
mas ajudam na roça deles durante a semana (sogro e cunhado). Além do café e do
maracujá planta para consumo quiabo, cebolinha e berinjela, quando sobra, vende na
AMAG.

FOTO 203-204: Unidade domiciliar da Tatiana

Unidade domiciliar - Sr. José Vitorino


Sr. José Vitorino colhia laranjas para consumo próprio quando o abordamos.
Ele chegou no assentamento nos tempos da lona, tem 75 anos e mora com sua
companheira Dona Zilda. Atualmente gasta muito dinheiro “por causa de doença”, por
isso não consegue investir no seu plantio. Antigamente plantava muita mandioca.
Disse que torceu para que a farinheira do assentamento, que ficava na agrovila, não
acabasse, mas “não teve jeito”.

FOTO 205-206: unidade domiciliar do Sr. José Vitorino.

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Unidade domiciliar – Edenilson e seu pai Elvino
A prosa com Edenilson se deu na sombra de seu pomar, onde ofereceu à
equipe laranjas e mexericas. No seu lote produtivo havia ainda cafezais maduros e
recém-plantados (há cerca de 2 meses), pimenteiras e coqueirais. Ele relatou que o
coco é para consumo e para dar de comer às galinhas e porcos, uma vez que para a
comercialização os compradores da região oferecem muito pouco (R$ 0,50 por coco).
Ele está no Assentamento desde “moleque”, seu pai é do tempo da lona. Sobre
seu Elvino ele contou:
Meu pai tá (sic.) com 72 anos, meu pai é forte, meu pai pega café,
meu pai cata pimenta, meu pai capina, meu pai faz de tudo. É, o bicho
é bruto.

Sobre os mais velhos no Assentamento ele trouxe a seguinte reflexão:


Às vezes tem o titular da terra e é o casal, já são muito velhinhos, não
trabalha mais. Às vezes eles quer (sic.) ir embora, quer arrumar uma
casinha na cidade, ficar quietinho para lá, acabar os dias para lá. Eles
olha (sic.) a terra, não aguenta trabalhar mais, aí dá tristeza. Aí eles
prefere (sic.) ir embora pra (sic.) um lugarzinho mais sossegado, fica
alí, mora pro resto da vidinha deles.

FOTO 207-209: unidade domiciliar do Edenilson e seu pai Elvino.

Unidade doméstica – Nilcimara e Jairo


- Pão com fermento de Cristo, bolos e quitandas – Detentora: Nilcimara
A abordagem foi oportunizada pela encomenda de pães e bolos para as
oficinas que ocorriam na escola. Os produtos foram indicados como um diferencial
por outros assentados e comunidade escolar, dado que pôde ser comprovado
empiricamente pela equipe técnica. O destaque é o pão feito com fermento de Cristo.

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FOTOS 210-213: Nilcimara (Mara), fazendo o pão com “fermento de Cristo”.

Mara contou que já sabia fazer desde criança, mas começou a produzir
quitandas para vender quando sua filha de 7 anos era pequena de colo. Ela saia com
a filha de porta em porta no Assentamento e em Pedro Canário, vendendo seus pães
e bolos. Hoje ela não precisa fazer isso, pois vive das encomendas de uma clientela
estabelecida. Ela gosta de produzir pães com gordura da nata comprada de um
vizinho (na ocasião não tinha, por isso utilizou margarina) e fermento de Cristo, sobre
o fermento ela explica:
“Ele é um líquido, uma muda que você ganha. Não coloco ele na geladeira,
porque não dá nem tempo”.

O Jairo, esposo da Mara, trabalha com produção de gesso, começou com um


ateliê na sua unidade doméstica e já expandiu os negócios, hoje possui uma loja em
Pedro Canário. Além de café e pimenta a unidade mantém o padrão da policultura
familiar. No quintal é destacada a valorização da infância, o casal instalou uma
casinha de madeira, ao lado da oficina do Jairo, para a filha, que é estudante da
EEEFVBS e seria contemplada pela Oficina de Educação para o Patrimônio Cultural
– Cultura do Brincar.

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FOTOS 214-215: casinha da filha do casal, instalada ao lado da oficina de geso do Jairo.

Como o casal é evangélico, o Etnoregistro serviu de ponte para contato mais


estreito com o pastor evangélico da igreja, que existe no assentamento desde sua
origem.
Além da detentora, outras mulheres assentadas exercitam saberes
gastronômicos na comunidade, como foi demonstrado na oficina junto ao EJA uma
grande parte faz beiju, chimango, bolos e até mesmo pizza é produzida e
comercializada.

3.8.3. 03/06/2023
Unidade doméstica – Sr. Avelar e dona Regina
A unidade já havia sido visitada em mais de uma ocasião durante o PIEP, onde
foram realizados ertnoregistros das quitandas e da torra de café pisado no pilão, além
de colaborações valiosas para acesso e conteúdo de memória da região.
Para o relatório em tela consideramos o etnoregistro da farinheira, de
instalação mais recente entre as que operam no assentamento. Também é mais
moderna e mecanizada e seu processo produtivo será detalhado na fase seguinte do
PIEP (Inventário – Relatório 6).

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FOTOS 216-219: farinheira do Sr. Avelar e dona Regina.

Também acompanhamos a colheita de café, com participação do Sr. Avelar e


Dona Regina. Adicionalmente, além de registros já efetuados em campos anteriores,
faz-se menção aos animais como ovelhas e patos circulando livremente pelo quintal.

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FOTOS 220-225: colheita de café e animais livres no lote do casal Avelar e Regina.

3.8.4. 04/06/2023
Unidade doméstica – Maria Aparecida e Adelso
Maria Aparecida Pereira da Silva (Cida) e Adelso Rocha Lima revelaram que
em seu quintal já chegaram a contar vinte e duas espécies frutíferas, então, aos
poucos foram pensando no quintal e nomeando o que lembravam:
“(...) tem jambo, manga, carambola, abacate, jaca, seriguela, acerola, coco, pinha,
graviola, laranja, jabuticaba, três tipos de banana, pitaia, cana de açúcar, mamão,
romã, biribiri e canela”.

Após essa conversa sobre os quintais produtivos do Assentamento, Adelso


trouxe algumas reflexões, contestando a tese de que o ser humano é devastador:
É como se onde tivesse gente, tivesse devastação. (...) Não, não é que o ser humano
é devastador. É o modelo de desenvolvimento que é implementado. Não é para se
generalizar. E outra, onde tem gente não é devaste. Aqui era só capim. Isso aqui é
uma floresta e antes era só capim.
Onde tem casa, tem chácara. É raridade, são poucas as famílias dos agricultores que
entorno da casa não tem chácara. Alguns mais, outros menos, mas tem.

O casal fazia um preparo de milho quando visitamos a unidade da família.


Conversávamos sobre a permanência e as modernizações das práticas culturais,
quando ele trouxe outra reflexão, remetendo à vida deles no início do assentamento:
Olha, aqui em casa, eu descasquei o milho, Cida cortou, bateu no liquidificador, pronto.
Mas quantas vezes nós já fizemos ali, furando a lata de óleo, que era lata furada com
prego para ralar.

Cida completou:

Nós viemos para cá, não tinha energia e nós fizemos pamonha, cozinhamos ali assim.
Nós trouxemos o milho da roça, ralou, pegou uma taboa, fez na lata de óleo, ralamos
aquele tanto de milho, aí depois coamos na peneira mesmo grande e botamos para
cozinhar no fogo, na panela grande ali no chão, as pamonhas. Detalhe, fizemos tudo
isso, cozinhamos e tivemos que distribuir para os vizinhos, porque não tinha geladeira
para conservar.

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FOTO 226-228: Adelso e Cida preparando o milho para fazer uma deliciosa papa, gentilmente
oferecia e degustada pela equipe do PIEP.

3.8.5. 06/06/2023
Unidade Doméstica – Dona Maria de Fátima
Fomos recebidos por Dona Maria de Fátima de Jesus Souza, cujo esposo
Jorge Ferreira Gomes estava imerso no cafezal adjascente para a tarefa da colheita.
A unidade doméstica possui a configuração padrão com terreiro limpo à frente, casa
de alvearia sem reboco e quintal ao fundo com diversidade de cultivos e margeando
o curso d´agua. Destacam-se várias árvores fruiferas e sombreiras como
mangueiras, bananeiras, coqueiros. Identificamos ainda horta e plantas usadas como
condimentos, tais como o urucum. A anfitriã nos apresentou o secador de pimenta e
o secador de café, registrando que estas atividades são realizadas diretamente na
unidade doméstica.

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FOTOS 229-234: unidade doméstica da Dona Fátima, o secador de café do Sr. Jorge, registrado
no RAIPI, permanece em uso.

Unidade Doméstica – Dona Rosalina


A anfitriã foi abordada no terreiro defronte à casa, no momento em que estava
espalhando café para secar ao sol sobre uma lona. Nesta unidade uma parte dos plantios de
café e pimenta estão dentro dos mosaicos no quintal e outra parte logo ao lado. Tem de tudo
plantado e o destaque é o grande número e variedade de animais domésticos, sendo criados
leitões, vacas e aves que impressionam pela quantidade e diversidade, pois além de galinhas
caipiras e de angola observamos patos, codornas e até um faisão. Uma chocadeira elétrica
é utilizada para incubação de ovos.

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FOTOS 235-243: unidade doméstica da Dona Rosalina.

Outra ocorrência relevante na unidade doméstica é uma farinheira desativada


que no momento da visita estava sendo utilizada para armazenamento e apoio à
colheita de café pelo filho e pela nora da Dona Rosalina. Ela nos informou que
questões de saúde foram determinantes para o abandono da atividade. Na época do
RAIPI ela ainda funcionava e vendia beiju, goma e farinha numa venda na entrada do
seu lote produtivo, atualmente desativada.

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FOTOS 244-249: farinheira e venda da Dona Rosalina, atualmente desativadas.

Unidade Doméstica – Dona Maria Zilda


Mais uma vez fomos recebidos por uma anfitriã, dona Maria Zilda de Souza
Pereira, uma vez que o esposo, José Pereira de Souza, estava imerso no grande
cafezal. Dona Zilda está no assentamento desde os tempos da lona. No quintal
destacam-se duas estruturas – um secador de pimenta e um poço para criação de
peixes.
A água para este último é bombeada no córrego Água Preta, que fica logo
abaixo. Na ocasião dona Zilda estava desanimada com a piscicultura e preocupada
com as mudanças que vão ocorrer na Fazenda São Joaquim.
Além da variedade faunística alimentar e ornamental são criados galinhas e
patos. A detentora ainda produz óleo de azeite e urucum no pilão. No local havia uma
vara de pescar com molinete o que reforça a tradicionalidade de práticas pelo núcleo
familiar.

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FOTOS 250-257: unidade doméstica da Dona Zilda.

Unidade doméstica – Sr. José Antônio


Na unidade do senhor José Antônio Ferreira dos Santos (Zezão), na vizinhança
da dona Zilda, visitamos uma unidade doméstica onde encontramos uma jovem. Ela
nos apontou a direção do cafezal onde estava o pai. Desta vez arriscamos e
adentramos no plantio e encontramos com Sr. Antônio, de 58 anos, natural de
Joaíma-MG e que se mudou para o local há cerca de 13 anos. Além da filha compõem
a unidade familiar a esposa e o filho. Possui outra filha que é professora e mora perto
da escola (Jéssica).
A plantação de café chega a 3 mil pés de café, mas também planta mandioca,
banana, pimenta. Explora algumas áreas mais próximas ao brejo onde construiu um
viveiro e planta açaí e ingá.

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FOTOS 258-263: unidade doméstica do Sr. José Antônio (Zezão).

Unidade doméstica – Sr. Joaquim Dutra


O Sr. Joaquim, morador dos tempos da lona, embaixo de uma frondosa
mangueira, em meio a um terreiro extremamente limpo, ele contou muitos casos
daquela época. Ele é evangélico, viúvo de dona Alfalina Vieira Dutra, mineiro, já foi
vaqueiro, foi missionário, contou sobre as missões que lhe foram reveladas na vida,
entre elas a luta pela reforma agrária.
Ele disse que está no MST desde 1992, não conheceu Valdício Barbosa, mas
conheceu Zé Rainha, viveu 4 anos e 2 meses de baixo de lona. Durante a proza foi
revelando sua trajetória no Movimento:
Naquele tempo era muito difícil. Agora não, porque a democracia mudou e tal,
mas o negócio naquele tempo era muito mal. Naquele tempo se matava gente.
Era aquela confusão danada.
Acampamos no Vale da Vitória, perto de Nova Venécia, depois de São
Mateus, lá nós ficamos 1 ano e 6 meses de baixo de lona.
Voltamos, depois ocupamos outra fazenda de Dr. Antônio, foi 4 meses de tiro
sem parar. A gente ficava deitado no chão e as balas passando. Aí viemos pro
Jundiá.

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Aí fomos lá para Aracruz. Conhece aquele assentamento lá? Nós fomos lá
para Aracruz, perto daqueles índios. Lá ficamos mais 11 meses, ficou um cado
de gente lá, porque não cabia tudo. Aí viemos parar aqui. Aqui tem 28 anos.

Ele contou que trabalhou bastante no início do Assentamento Valdício


Barbosa, no seu lote plantou café, 550 pés de coco, mamona, inhame etc. Depois foi
diagnosticado com câncer e o médico o proibiu de sair de dentro de casa pelo resto
de sua vida.
Ele pensou que ainda ia viver muito tempo, por isso, contou, acabou com tudo,
cortou os coqueirais e montou um açougue. Ele disse que teve dificuldade para
encontrar quem o ajudasse, pois não tinha condições de ter funcionários. Acabou por
distribuir seu lote entre filho e neto e atualmente vive numa casinha pequena, no
quintal e a maior deixou para os seus familiares. Ele não se expõe ao sol, mas não
consegue ficar parado:
No quintal tem abacate, laranja, mexerica, coco, manga. Ali eu plantei um
cafezinho que tá (sic.) desse tamanho, para não ficar sem fazer nada. Porque
um fazendo nada não tem quem aguenta, principalmente para mim que nasci
com o serviço.

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FOTOS 264-270: Unidade doméstica do Sr. Joaquim.

Unidade doméstica – Rosiene e sua mãe Dete


A unidade domiciliar é organizada segundo princípios da permacultura e
denota um conhecimento sobre agro ecossistemas por parte de suas moradoras –
Rosiene dos Santos Lima (Nininha) – que é presidente da associação das mulheres
agricultoras (AMAG), sua mãe, dona Dete e suas três filhas.
Possui uma vistosa horta com plantações de coentro, cebolinha, rúcula, batata
doce, inhame, salsa, alecrim, couve, alface, tomate, abóbora, beringela, jiló, quiabo,
cenoura, beterraba, milho, abobrinha, alho-poró etc. Em meio aos pés de pimenta é
plantado feijão de porco, que além de fonte de alto valor nutricional serve de adubo.
Há também um viveiro e inúmeras árvores e espécies frutíferas com seus pés
carregados.

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FOTOS 271-278: unidade domiciliar da Nininha.

Como estrutura se destacam um tanque de psicultura onde são criados


tucunaré, tilápia, traíra e tambaqui e uma represa confinante com a unidade
doméstica do professor Thiago. Há também pimenteira e um chiqueiro integrado ao
sistema de permacultura. Entre outros bichos de estimação até mesmo um jabuti
chamado Nick é criado. Impressiona a abundância e a diversidade das fontes
alimentares que abastecem a unidade doméstica.

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FOTOS 279-287: abundância e diversidade das fontes alimentares.
Dona Dete mora no Assentamento há 26 anos, conta que quando chegou
estavam construindo a casa da Agrovila. As lonas do início foram montadas no terreno
onde ela vive, perto da represa. O inhame que elas têm até hoje é dessa época, fazem
questão de manter, de plantar hoje o “inhame original”. Ela contou também um caso
que ilustra sua vivência no MST:
“Tinha uns 2 anos que eu já morava aqui, vieram me pedir, um pessoal que
estava lonado em beira de estrada foi expulso e eles precisavam de um local
para ficar, até conseguir terra para eles irem. Ninguém aqui quis dar eles,
porque diz que não ia dar, que eles iam acabar invadindo tudo aqui.
Eu nem sabia que eles estavam questionando isso, peguei e arrumei, essa
parte aqui dessa margem até na porteira, da estrada pra (sic.) cá eles
encheram de lona e ficaram aí. É tanto que me ajudaram a limpar minha roça,
tinha um cafezinho aqui pouquinho, quase mil mudas de café.
E ficou (sic.) aí, até que eles conseguiram uma beira de estrada para eles ir
(sic.). Aí, quando fez (sic.) mais ou menos uns 6 meses, 7 meses, eles
pegaram e foram. Mas tudo começou foi aqui.”

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Nininha contou que ainda pretende montar uma farinheira, ela cresceu vendo
a mãe trabalhar nesse lote e sente falta da farinheira que dona Dete tinha e foi
destruída pelo fogo. Ela contou que parte das peças foi vendida para sr. Raimundo,
pai do professor Thiago. Lavynia, sua filha mais velha, contou para mãe que comeu
beiju na escola, ressoando a Oficina de Educação para o Patrimônio Cultural – Cultura
do Brincar:
“O beiju foi (sic.) eles que trouxe (sic.), mãe.”

Lavynia, por já estar familiarizada com a equipe do PIEP, mostrou todos os


detalhes da sua unidade produtiva em vídeos, que serão disponibilizados no
inventário. Mas uma fala, em especial, vamos descrever a seguir, pois expressa o
entendimento da estudante em relação aos temas trabalhados na oficina que ela
participou, ela teve a sensibilidade de demonstrar para a equipe seus conhecimentos
sobre saberes ancestrais dos povos originários e revelar seu interesse de aprender
mais:
“Eu até já levei para escola (o urucum).”
Como faz a tinta do urucum? Perguntou o Alisson (que filmava a Lavynia).
“É bem assim, você pega o urucum não tão, um pouco verde, não tão seco.
Aí o que é que você faz? Você pega ele e coloca numa água. Uma água em
temperatura ambiente. Você vai abrir e vai tirar, só assim (Lavynia tirando as
sementes, após abrir o fruto) ele já solta uma leve tinta. Você vai colocar só
um pouquinho de água e vai espremer ele assim, que ele vai soltar uma tinta
bem forte. Aí minha vó também sabe fazer o corante, porque aqui a gente não
compra corante, a gente só faz. Aí você aperta, ou então vai com algum
pedacinho de pau e você vai apertando e vai soltando essa tinta ó, vai ficando
bem vermelho”.

FOTOS 288-289: Lavynia explicando como faz a tinta de urucum.

“Eu tô (sic.) doida pra descobrir como faz a tinta de jenipapo. E se eu descobrir
eu vou levar para escola. Da outra vez que eu fiz, que eu fui levar para
apresentação que a gente fez dos índios, eu fiz a tinta do urucum e fiz também
a tinta do carvão. Peguei carvão e fiz”.

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Unidade doméstica - professor Thiago e familiares
A abordagem já tinha sido feita na parte da manhã do dia 30 de maio, momento
em que estivemos com o irmão do professor, Romário (foto 199), colhendo café.
Apesar da exaustão, após o dia inteiro de trabalho, retornamos ao pôr do sol para
registramos os pais. A diversidade de cultivos e o grande número de estruturas e
artefatos rústicos de madeira mostrou que valeu a pena. Além dos saberes do pilão,
que entre outras pisadas é ativado para fazer paçoca de amendoim, identificamos
uma engenhoca e um batedor de pimenta anexo ao secador.
O senhor José Raimundo da Silva, 82 anos, pai do Thiago, é um senhor
engenhoso. Ele que construiu uma série de objetos de madeira, inclusive uma
engenhoca e o pilão da família. Ele disse:
“Não tem coisa que eu não sei fazer.”
A dona Dilzete Rodrigues Cosme contou que veio morar no Assentamento há
11 anos, primeiro veio o filho Thiago, há 15 anos, para dar aulas na escola. Mas ela
está no MST há muito tempo, veio do Assentamento Córrego da Areia, o primeiro do
estado (37 anos), situado em Jaguaré.

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FOTOS 290-296: Sr. Raimundo e Dona Dilzete e artefatos de madeira conformados por ele.

Além disso, identificamos um carrinho de madeira carregado com mandioca


para processamento na farinheira, cuja escala atual é restrita ao sustento, mas que
possui planos de incremento para comercialização.

FOTO 297-300: Farinheira do Sr. Raimundo.

3.8.6. 07/06/2023
Considerando que esta data era o último dia do campo, o esforço inicial do dia
previa secundarizar a deriva em prol da checagem de pontos georreferenciados
durante o RAIPI (2018) para atualização da situação dos bens, tais como as
farinheiras.

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Unidade doméstica – Luciano (presidente da AAFVAB)
Contudo, devido a variação e imprecisão de alguns pontos, aconteceram
alguns desvios que se mostraram bastante produtivos. O primeiro deles nos levou até
a unidade de Luciano, presidente da associação de agricultores do Valdício Barbosa.
No local havia pimenta secando ao sol sobre uma lona e um curral onde Luciano
apresentou-nos uma sela e falou sobre seus hábitos de montaria. Em seguida nos
indicou a direção do ponto que estávamos buscando.

FOTOS 301-306: unidade familiar do sr. Luciano.

Unidade doméstica - Jeferson e Dora


É habitada pelo Jeferson e sua companheira Dora há pouco mais de 2 anos,
uma vez que o Sr. Antônio e a esposa, que mantinham uma farinheira no local,
aposentaram-se e mudaram-se. A farinheira foi desmontada e está em ruínas. Sua

81
condição conforma um padrão: na medida em que a idade dos mais antigos avança
o bem vai perdendo vitalidade no assentamento, pois os que chegam são mais afins
a outras labutas com a terra.
Na unidade existe outro imóvel onde mora a irmã de Luciano com o esposo.
Os cultivos são diversos e há uma pequena horta bem em frente às residências.
Jeferson trabalha no secador comunitário e vive no assentamento há 10 anos. Nesse
lote (2 alqueires de terra) ele disse que tem pimenta e vai plantar café aos poucos.
Também tem couve, tomate, mamão, coco, cupuaçu, caju, manga, limão, aipim,
abóbora, além da criação de porco e galinha.

FOTOS 307-309: unidade doméstica do Jeferson, farinheira em ruínas que


pertenceu ao Sr. Antônio.

Unidade doméstica – Sr. Aurindo, dona Alzira e sua filha Cleidineia


Dos tempos de lona, Sr. Aurindo nos brindou com algumas fotos antigas, que
contribuem para a reconstituição da linha do tempo do assentamento. Entre elas está
uma em que destaca seu amor antigo pelas montarias, sendo um dos poucos do
assentamento que possui cavalos.
Na ocasião, dona Alzira estava doente, se preparava para ir ao pronto
atendimento na companhia do sr. Aurindo, pois era o dia em que o médico atende na
agrovila. Entre as fotos antigas, há uma do casal ainda jovem em sua casinha de
madeira no assentamento e outra em que Alzira utiliza um pilão.

82
Sua filha Cleidineia (Neia) mora uns 300 metros ladeira abaixo com o esposo,
Pedro, que é artesão em couro produzindo celas e outros artigos de montaria, além
de sapatos, vassouras de cipó, cestarias e outras artes. É também mestre pilãozeiro
e no local tinha um dos grandes em processo de construção.
Cleidineia é uma das fundadoras da AMAG e mostra bem ali em frente da sua
casa a árvore onde surgiu o coletivo de mulheres. Durante o registro, ela estava
preparando a diversidade dos produtos para o caminhão recolher e levar à entidade
onde seria documentada a venda para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)
de Conceição da Barra.

FOTOS 310-317: unidade doméstica do Sr. Aurindo e dona Alzira, da filha Cleidineia e seu esposo
Pedro.

Unidade domiciliar – Sr. Carlos

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O sr. Carlos Silva da Paixão mora no assentamento há 15 anos, quando
chegou começou o plantio de mandioca e feijão, porque não dispunha de recursos.
Aos poucos conseguiu “umas vaquinhas na meia”. Mas, em 2015, quando teve uma
seca muito grande, que prejudicou a criação, ele acabou se desfazendo das vacas de
leite, embora ainda pretenda retomar. Atualmente ele se dedica ao plantio de pimenta
e café, também tem coqueiros, mas, ao que tudo indica, gosta mesmo é do gado de
leite. Explicou que não retoma ainda por uma preocupação com a água. De todo
modo, ele planta um “capim-assú” para manter a muda, caso retome a criação já
poderá expandir a plantação para fazer silagem. No terreno dele passa um córrego:
De 2016 para cá começou a chover, começou a chover. Às vezes tinha
canhão. Até por isso que eu acabei com as vaca (sic.) de leite, se quer dá
piquete. Aí eu falei, eu vou acabar com as vaca (sic.) de leite, né. Isso aqui
(mostrando o sistema de irrigação) no projeto economiza muita água e no
canhão não, no canhão você tem que trabalhar bastante, né. Por causa do
pasto.
E aí, por isso, né, eu acabei com o negócio de gado, por causa disso aí. Mas
tenho vontade de um dia ainda voltar com as vaca (sic.) de leite. Mas só que
hoje, quando eu der de voltar, com um pouquinho a menos. Porque no pasto
gasta muita água.

FOTOS 318-321: unidade domiciliar do Sr. Carlos, com destaque para o “capim assú”, que ele cultiva
para futuramente fazer novas mudas e voltar a criar vacas leiteiras, e para o sistema de irrigação mais
eficiente.

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Antiga farinheira do Sr. Antônio
A equipe seguiu seu percurso até a próxima farinheira georreferenciada pelo
RAIPI e que pertencia ao Sr. Antônio, esposa e filhos. No local deparou-se com as
ruínas e mais uma vez o motivo alegado para o desalento dos mais antigos que se
mudaram da unidade foi as limitações físicas impostas pela idade avançada.

FOTOS 323-325: Farinheira desativada.

Unidade doméstica – sr. Ernandes e dona Zeni


Por fim, chegamos até a unidade doméstica do Sr. Ernandes e Dona Zeni. Ele
tem 73 anos, ela 63 e estão juntos há 35 anos. Sr. Ernandes informou que tem sua
farinheira desde quando chegou no assentamento, nos tempos da lona.
A idade avançada e a dispersão dos filhos levam progressivamente ao
abandono de atividades, como a criação das poucas cabeças de gado que foram
vendidas, além da redução do uso da farinheira para fins restritos de subsistência. A
estrutura é desde a época em que foi assentado, mas está em excelentes condições,
entretanto usada com pouca frequência. O motivo é mais uma vez a idade avançada
do casal de detentores.

85
Nós vendia (sic.) (farinha) de primeiro, mas eu adoeci. Ela sozinha não
trabalha. Ela faz um quilo de farinha para consumo. Faz beiju, a goma não tá
tirando não.

A mandioca é colhida ali mesmo no quintal, que mantém o padrão de


diversidade já identificado em todas as unidades visitadas, com destaque para frutas
como jaqueira, manga e coco. Mantém a plantação de café e pimenta do reino sendo
que no quintal foi identificado um secador.

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FOTOS 326-333: Farinheira e secador do sr. Ernandes.

3.9. Etnoregistro de organizações associativas e grupos de afinidade

3.9.1. Etnoregistro da AMAG– Associação de Mulheres Agricultoras de VB –


07/06/2023
Após a verificação da situação atual das farinheiras, nos dirigimos até a
Associação de Mulheres para acompanhar a venda dos alimentos. Chegamos no
exato momento em que o caminhão tinha acabado de sair. As caixas estavam vazias,
mas algumas agricultoras estavam por lá.
Além disso, já havíamos encontrado algumas em suas unidades domésticas,
bem como a Iasmim, na frente da unidade familiar, aguardando o caminhão para
embarque da produção e a Cleidineia, a quem ajudamos a escoar sua produção até
o caminhão.
A Iasmim é filha de Éder, neta de Avelar e dona Regina. Ela contou que estuda
em Pedro Canário. Acorda cedo, vai trabalhar na roça com sua mãe e ao meio-dia
pega o ônibus que a leva à escola. Na ocasião em que a encontramos ela havia
separado mandioca, acerola, quiabo de metro e berinjela para vender ao PAA.

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FOTOS 334-335: Iasmim, aguardando o caminhão para efetuar sua entrega ao PAA, via AMAG.

As informações sobre a AMAG já haviam sido colhidas nas unidades


domiciliares de sua presidente, Nininha, de uma de suas fundadoras, a Neia e
também de uma associada, que chegou a trabalhar como secretária da associação,
a Tatiana. Os detalhes de sua fundação e funcionamento irão constar no inventário,
mas cabe destacar que seu surgimento ocorreu a partir da participação da Nininha
como presidente na AAFVAB.
Ela contou que, durante sua gestão na AAFVAB, procurava motivar a
participação de outras mulheres na associação, que já existia no assentamento
(documentada pelo RAIPI). Mas verificou que muitas mulheres não se sentiam
confortáveis em opinar sobre as decisões coletivas e, muitas vezes, se calavam
diante das posições de seus parceiros. Foi quando ela iniciou uma busca ativa à
participação dessas mulheres, indo de porta em porta, em suas casas. A partir dessa
busca começaram a surgir reuniões apenas de mulheres, embaixo de uma
mangueira, em frente à casa de Neia. No início elas se consideravam um grupo de
mulheres do Assentamento Valdício Barbosa, até que se fez necessário formalizar
esse grupo em uma Associação.
Elas não se sentiam à vontade de se colocar, seu ponto de vista, e dar
ideia de algum projeto, o que correr atrás. Eu sempre ia na casa,
conversava com elas, porque por eu ser mulher a minha intenção era
vir trazer uma quantidade maior de mulheres.
Então decidimos reunir, uma reunião pequena de 5 mulheres, depois
passou para 8. (...) Elas viram a necessidade da gente se tornar mais
forte, convidar outras mulheres (Nininha, sobre o surgimento da
AMAG).

A ocasião também propiciou o acesso à sede da entidade, onde as mulheres


relataram algumas atividades desenvolvidas como produção de uniformes escolares,
de estampas para copos e oficinas para crianças.

88
FOTOS 336-342: Sede da AMAG.

3.9.2. Etnoregistro – Igreja Evangélica Assembleia de Deus – 04/06/2023 e


07/06/2023
Nessa etapa foi possível conhecer alguns detalhes da organização interna do
templo e a divisão dos obreiros em grupos de homens, mulheres e crianças.
O registro se estendeu para uma entrevista com o Pastor Zilto no Bairro Camata, onde
reside com sua esposa, ambos já muito idosos. Pioneiro do assentamento desde os

89
tempos da lona, ele nos brindou com fotos antigas e valiosas contribuições para a
reconstituição final da linha do tempo que será apresentada no inventário.

FOTOS 343-350: culto da igreja evangélica Assembleia de Deus de Valdício Barbosa.

90
3.9.3. Etnoregistro da Associação de Agricultores Familiares de Valdício
Barbosa (AAFVAB) - Projeto do Secador de 01 a 07/06/2023
Durante esta etapa de campo foram feitos vários registros, diurnos e noturnos,
do secador de café em potência total de funcionamento. O material empírico será
juntado a registros de campos anteriores, inclusive do Aniversário do Assentamento,
quando ocorreu a inauguração da estrutura, para ser descrito com detalhes no
inventário final.

91
FOTOS 351-358: processamento dos grãos de café para comercialização pela COOPTERRA.

3.10. Etnoregistro - Memória das Águas – 30/05/2023 a 07/06/2023


Transversalizando a navegação pelas unidades domésticas, foram indicados
os pontos de água existente na comunidade e verificada a abundância desse recurso,
fundamental para a sobrevivência dos assentados, para que possam exercitar a
prática do cultivo.
Relatos sobre a escassez no passado, notadamente no ano de 2015, trazem
péssimas recordações em torno da perda de uma safra pela seca e dificuldades para
pagar um empréstimo rural utilizado para compra de sementes. Os relatos do Sr.
Carlos Silva da Paixão e do Sr. José Antônio (Zezão) coincidiram com uma informação
do documentário “Itaúnas Sempre Vivo da Foz à Nascente”, exibido por uma ong. da
bacia do rio Itaúnas (SAPI – Sociedade Amigos por Itaúnas) na EEEFVBS dia
06/06/2023, registrada pela equipe do PIEP.
No documentário, por volta do minuto 22:00, se iniciam relatos sobre o final de
2016, quando o rio Itaúnas ficou totalmente seco. Kleilson Martins Rezende, secretário
executivo CBH Itaúnas e Secretário de Agricultura de Meio Ambiente de Pedro
Canário, diz no documentário que, nessa época, do ponto entre o Assentamento
Castro Alves até Pedro Canário se andava a pé pelos rios. Foi preciso fazer um

92
trabalho junto aos produtores rurais para liberar as represas, de modo que a pouca
água disponível voltasse a correr.
Durante a navegação etnográfica, nas conversas com os assentados,
verificamos uma preocupação com a manutenção da riqueza hídrica, seja retomando
as situações de carência do passado recente (2015-2016), seja indicando mudanças
de hábitos para evitar desperdícios, ou mesmo atuando ativamente na preservação e
no reflorestamento das matas de galeria nas margens das nascentes, córregos e rios
que cortam seus lotes produtivos. A despeito do entorno, no assentamento vê-se uma
preocupação com a educação ambiental.

93
FOTOS 359-365: diferentes pontos de água registrados no Assentamento VB.

FOTOS 366-367: exibição do filme “Itaúnas Sempre Vivo da Foz à Nascente” pela ONG SAPI, 06-06-
2023, às 19h.

FOTOS 368-369: sistema de irrigação da lavoura de pimenta do Sr. Carlos Silva Paixão, comum em
vários lotes do assentamento.

94
3.11. Etnoregistro: Direito à paisagem – 30/05/2023 a 07/06/2023
Ao longo do campo e, extensivamente em todo o percurso do PIEP, foram
sendo coletados dados sobre componentes da paisagem revestidos de valor simbólico
para os assentados.
Transversalizando com a memória das águas, no presente momento é possível
destacar duas configurações que serão aprofundadas no inventario.
As árvores como marcadores territoriais – tendo em vista uma melhor
orientação espacial, já que o plantio de eucalipto, por homogeneizar a paisagem é
apontado como fator de desorientação, sobretudo para visitantes que vem
acompanhar as festas, realizar pesquisas ou parcerias comerciais. A mangueira numa
esquina, rente à porteira do Sr. Avelar, a castanheira marcando a bifurcação para a
escola e um pé de cajazinho do mato, indicando o caminho da Agrovila, são alguns
exemplos de orientação espacial possível nas estradas do Assentamento.

FOTOS 370-372: mangueira, castanheira e cajazeira, orientações na paisagem do Assentamento.

Pontos de Visada
Estão relacionados com fruição visual e permitem estabelecer contrastes entre
as áreas de cobertura vegetal nativa ou resultantes da policultura familiar com a
paisagem de outras culturas e do pasto extenso da Fazenda São Joaquim.

95
FOTOS 373-375: pontos de visada no Assentamento VB.

4. Cenários e Desenhos de Futuros para o Assentamento Valdício Barbosa


Após a 6ª etapa de campo, estão concluídos os etnoregistros colaborativos em
Valdício Barbosa e Água Preta. Por sua vez, as oficinas ocorridas em Valdício
Barbosa permitiram a valoração e auto atribuição dos bens culturais pelos próprios
comunitários.
Tomando como régua de medição o Diagnóstico Cultural Colaborativo (DCC -
Relatório 1), os resultados até o momento geraram um grande volume de material
empírico.
Considerando a metodologia etnográfica e sinérgica do PIEP, assentado na
participação estrutural dos comunitários em todas as etapas, todo o material
produzido está sendo revisitado e sistematizado para alimentar o inventário final.
Outrossim, o grande volume de trabalho e esforço de sistematização não pode
obliterar, na reta final, a perspectiva metodológica do PIEP.
No que concerne às etapas anteriores, todas as atividades tinham sido
validadas retroativamente e houve participação e validação remota dos comunitários
via whatsapp, sobre o Relatório 4, assim como ocorre em relação ao presente
relatório.

96
Todavia, em virtude da dificuldade de agenda com a comunidade, para a
sétima etapa de campo, o inventario final e a devolutiva final do PIEP serão enviados
por mensagem (via whatsapp), uma vez que a instabilidade do sinal de internet nas
comunidades não permitiria a realização de uma transmissão on-line. As sugestões e
complementações dos comunitários serão acatadas, assim como ocorre com o
presente relatório.
Pretendemos, nesta direção, na medida do possível, agregar o conhecimento
acumulado pelos esquemas construtivistas e colaborativos à perspectiva dos
inventários de referências culturais balizados pelo IPHAN.

4. Atividades desenvolvidas em Água Preta

4.1. Estratégia de abordagem e aproximação do campo


Devido à intensa agenda em Valdício Barbosa e ao fato do plano de navegação
em Água Preta mirar ações complementares para finalização dos etnoregistros, foi
realizada uma abordagem mais direta, se comparada aos campos anteriores.
Por outro lado, mantiveram-se em relevo os locais sombreiros de encontro e
prosa, como os troncos rústicos de pequi e eucalipto sob a tradicional castanheira4.
Exatamente quando chegava ao referido local, a equipe foi surpreendida por
um curto-circuito que explodiu e fragmentou os cabos da rede elétrica. O estouro
seguido de faíscas gerou correria desenfreada e a fiação ficou exposta, gerando certo
risco para comunitários e transeuntes.
Após o susto inicial, o trecho próximo à figueira foi interditado com galhos até
que a companhia elétrica responsável chegasse para o conserto, o que aconteceu
algumas horas depois.

4Aqui faz necessária uma retificação de informação apresentada no Terceiro Relatório (quarta etapa
de campo), mais precisamente no tópico “Conjunto Paisagístico Receptivo da Comunidade”. Ao
descrever os elementos que compõem a paisagem sombreira sob a tradicional castanheira, transcreve
erroneamente a suspira como madeira nobre de dois bancos rústicos que, na verdade, são de
pequizeiro. Assim posto, a redação corrigida passa a ser “Sob sua sombra estão dois troncos rústicos
de madeira nobre (pequizeiro) que funcionam como bancos. Há um outro banco plainado de eucalipto
conformando a cena receptiva e acolhedora “(Relatório 3: p.12).

97
FOTOS 376-377: registro do rompimento da rede elétrica na entrada da comunidade de Água Preta.

4.2. Situação Atual de Água Preta


A situação atual (S4) será apresentada tendo como parâmetro de medição a
situação anterior (S3) descrita no RT4- Etapa de Campo 5.
No presente momento a maior parte dos moradores de Água Preta estavam
trabalhando em fazendas vizinhas na colheita do café. A equipe aproveitou a ocasião
para fazer o etnoregistro da colheita, e conseguiu uma agenda em fim de tarde e no
dia de folga para completar os etnoregistros dos saberes do pilão (óleo de mamona e
corante/urucum).
Em tela as estratégias produtivas de plantio adotadas pelos comunitários que
reafirmam a circulação em Água Preta de um saber sobre a terra que inclui também
o manejo sustentável de recursos naturais e da paisagem rural.
Outra demanda que merece evidência e que é abordada de pronto a seguir
são os problemas enfrentados pela comunidade na estrutura de bombeamento da
água para provisão e uso doméstico e os questionamentos feitos pelos comunitários
sobre a cor e a qualidade da água a que têm acesso. Conforme a Resolução da
Assembleia Geral da ONU 64/A/RES/64/292, de junho de 2010, o acesso à água
potável e ao saneamento básico é um direito humano essencial, fundamental e
universal, indispensável à vida com dignidade. Portanto, a falta de acesso pode
configurar uma violação dos direitos humanos e risco à saúde dos comunitários, entre
os quais se incluem idosos e crianças.

4.3. Etnoregistro Memória e Presente Etnográfico das Águas

Ao tratarmos da memória das águas no relatório anterior, chamamos atenção


para o fato de soar anacrônico uma exaltação do passado de abundância hídrica
com forte conotação simbólica expressa nos topônimos, na oralidade e nas práticas
98
territoriais tradicionais, contrastando com a situação atual caracterizada pela
escassez e dificuldade de acessar fontes de água compatíveis com os parâmetros
exigidos pelo consumo doméstico.

A redução do volume de água em relação ao passado tem como evidência


maior o córrego Água Branca, do qual restou apenas um filete escorrendo pelo leito.

Todavia, a situação do Córrego Água Preta, que abastece a comunidade


também é lastimável, sendo alvo de queixas recorrentes dos comunitários desde o
início da execução do PIEP, sobressaindo nas falas indicadores como “coceiras
após o banho”, “roupas amareladas após lavagem”, infinidade de caramujos etc.

A impropriedade da água que abastece a comunidade para uso doméstico


exige o deslocamento até o bairro Camata, em Pedro Canário, onde é feito o
abastecimento dos galões de 20 litros. Porém, poucos moradores possuem carro e
ficam na dependência de vizinhos ou parentes para garantir água para beber e
cozinhar.

FOTOS 378-381: Água turva e com caramujos impõe abastecimento externo no bairro
Camata.

Além da precária qualidade da água, problemas de bombeamento são


rotineiros e, não raro, os comunitários precisam se deslocar até o córrego para lavar

99
vasilhas. Na presente etapa de campo, tal situação foi identificada e, para solucionar
o problema, os comunitários fizeram uma “vaquinha” para aquisição de nova bomba,
uma vez que a que estava em uso queimou de vez.

FOTOS 382-383: Água Preta em 06/06/2023.

100
FOTOS 384-389: Labuta dos comunitários para lavar vasilhas no corrégo Água Preta, 06/06/2023.

Diante da calamidade da situação, uma das primeiras inciativas da


associação comunitária, após sua fundação, foi diligenciar junto à Suzano o
pleito para a construção de um poço artesiano próximo à entrada da
comunidade, exatamente no local em que fica uma bolsa para coleta de
resíduos.

A demanda foi agraciada pela empresa, contudo entraves foram


identificados junto ao executivo municipal. Não estão claros os motivos do
embrago da prefeitura à benfeitoria, se decorrem de normatizações ambientais
ou de questões políticas locais, mas o fato é que já se passaram quase 06

101
meses desde que o ofício foi protocolado junto ao executivo municipal e o
problema permanece sem solução.

FOTOS 390-392: Texto e fotos do ofício solicitando mudança na fonte de abastecimento de


água.

A persistência deste quadro de acesso precário à água de qualidade


constitui-se em gritante violação dos direitos humanos e ambientais básicos
dos comunitários, colocando em risco direto a saúde dos mesmos e exigindo
medidas urgentes para a solução do problema.

4.4. Etnoregistro dos Quintais produtivos


Quintal do Mauro

Em um primeiro plano foi percorrido o espaço integrado à unidade


doméstica, onde um volume considerável de pimenta do reino estava secando
ao sol. Para esta produção de 175 pés está prevista uma colheita de 200 quilos
ao preço de R$14,00 o KG.

102
Segundo o agricultor, o ciclo de vida da pimenta do reino dura em média
de 8 a 10 anos, sendo que os primeiros cachinhos já estão disponíveis após
doze meses e a colheita robusta é incrementada a partir do 3º ano.

FOTO 393-394: Mauro e sua produção atual de pimenta do reino.

Além da pimenta, o quintal possui hortaliças como repolho e alface,


frutíferas como mangueira e bananeira. Também está em experimento o
plantio de feijão, mas o destaque maior é a mandioca (macaxeira ou aipim),
cujo desterro exigiram esforço de quatro braços masculinos dado o volume e
a massa galgados pela raiz.

FOTO 395-396: Mandioca colhida no quintal do Mauro e gentilmente doada à equipe do


PIEP.

Atualmente o cultivo de pimenta do reino passa por expansão favorecida


pelo apoio do edital de pequenos projetos da Suzano, que contemplou a
família de Mauro com R$10.000,00, os quais foram utilizados na compra de
estacas e mudas. Para o intento, foi necessário um comodato com a área de
um vizinho, que foi desbastada parcialmente para dar lugar ao novo cultivo, já
tendo iniciado o plantio de 800 pés e outros 800 estavam previstos em seguida,
o que totalizará aproximadamente 1975 pés produtivos nos próximos anos.
Segundo Mauro, a empreitada exigirá a contratação de mão de obra e em
períodos de colheita ao menos 5 pessoas durante 30 dias.

103
FOTOS 397-398: Área de expansão do plantio de pimenta do reino.

A inciativa de Mauro de expandir os cultivos reafirma a vocação rural de


Água Preta e encontra ressonância em outros comunitários já mencionados
no PIEP, como o caso de Geraldo que ocupou o entorno da escola e Sueli que
visualiza a possibilidade nos fundos da igreja. Em comum em todos os casos
há a escassez de terras para cultivo, uma vez que os quintais familiares são
de pequenas dimensões e colocam desafios para superar o padrão de plantio
de subsistência.

Sem área suficiente para o plantio próprio, os comunitários não vêm


outra alternativa senão oferecer o saber sobre a terra e a força de trabalho aos
fazendeiros para a colheita de café e outras monoculturas, perpetuando a
condição de campesinato em situação de heteronomia.

Outro desafio é a água. Para o caso de Mauro, ele instalou mais de 300
metros de canalizações puxando diretamente do córrego Água Preta, através
de uma pequena bomba elétrica. Esta alternativa foi adotada como única
capaz de garantir segurança hídrica para a plantação, dado os já mencionados
problemas recorrentes no abastecimento geral da comunidade.

FOTOS 399-400: Mauro mostra o sistema de canalização de água do seu plantio.

104
Dona Albertina
Nos recebeu fazendo a pilagem da pimenta colhida no quintal. O seu
quintal repete o padrão de outras unidades domésticas percorridas ao longo
do PIEP, com destaque para jiló fresquinho colhido no pé, vultosa plantação
de taioba e lindas flores de múltiplas cores.

FOTOS 401-406: quintal produtivo da dona Albertina.

105
Dona Morenita

A anfitriã nos recebeu ao lado do fogão à lenha de limpeza impecável,


seguido do esclarecimento de que é mantido nesta condição permanente
devido ao barro branco que busca frequentemente na matinha. Revela, pois,
novo saber extrativista.

Adentrando pelo quintal, emergem várias árvores e plantas frutíferas


como feijão verde, castanheira, bananeira, coco, cana, maxixe e limão. Uma
pequena horta com leguminosas, cebolinha, alecrim e capim da lapa (cidreira),
revela a coabitação entre espécies alimentíceas e medicinais usadas na
preparação de chás caseiros.

106
FOTOS 407-411: Quintal produtivo de Dona Morenita

Uma ocorrência que merece menção especial no quintal de Dona Morenita é o


Urucum (corante), que estabelece rizoma transversal com os saberes do pilão, que
serão abordados no tópico seguinte.

Dona Imaculada
A detentora apresentou sua horta com couve, cebolinha, mostarda, taioba, jiló,
entre outras espécies comestíveis.
Dispersos pelo quintal uma variedade de árvores frutíferas com os pés
carregados de romã, jaboticaba, abacate, coco, mamão, acerola, bananas e
presenteou a equipe com uma deliciosa pitaia. Destaca-se um jardim ornamental com
flores e espécies medicinais como carqueja, capim da lapa, entre outros.

107
FOTOS 412-415: Quintal produtivo de Dona Imaculada.

Dona imaculada é mais que uma detentora, é uma mestra de saberes e fazeres
tradicionais sobre a terra, cujo potencial de estabelecer rizomas com outros bens
imateriais já foi demonstrado em vários momentos da execução do PIEP.

Restando-nos, pois, finalizar o intenso período de aprendizagem com Dona


Imaculada apresentando a seguir a conclusão do feitio dos óleos mamona e de
dendê.

108
5.5. Etnoregistro colaborativo: Saberes do pilão

Dona Imaculada – Feitio de óleo de dendê e óleo de mamona

Tendo apresentado nos relatórios anteriores a coleta e secagem das espécies,


cumpre-nos finalizar a cadeia operatória de produção destes extratos feitos
artesanalmente.

Considerando que o processo será retomado conjuntamente em todas as suas


etapas para descrição detalhada no inventário final, tomamos como referência para o
registro em tela a pilagem e o cozimento em fogão de lenha.

Para o caso da mamona, após a prensa no pilão destacam-se dois tipos de


óleos, sendo um deles tóxico. A sabedoria prática do cozimento consiste exatamente
em separar estes dois componentes, retirando com uma colher a espuma que flutua
na medida em que avança a fervura, ao passo que o óleo de mamona (rícino) vai
paulatinamente decantando no fundo.

Como o processo depende da intensidade do fogo e da quantidade de matéria-


prima, não é possível estabelecer um tempo padrão para o cozimento, e o ponto final
depende do olhar e observação da detentora.

Após o cozimento, o óleo é resfriado em ambiente natural e em seguida


envazado em recipientes pet.

Dona Imaculada é enfática ao assinalar a trabalheira implicada no feito do óleo


de mamona, afirmando que na experiência em tela foram realizadas 3 pilagens para
obter menos de 1 litro de extrato.

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FOTOS 416-421: Dona Imaculada, pilando e cozinhando a mamona para gerar o óleo.

A produção de óleo de dendê é mais simples e rápida do que a de mamona. O


cozimento se dá em duas etapas. A primeira fervura tem por objetivo amolecer o
bagaço ou caroço para separá-lo da polpa, processo que é completado no pilão.
Em seguida é feita a lavagem em água junto com peneiramento. O líquido é
novamente levado ao cozimento e o azeite vai flutuando e sendo retirado com uma
colher, ao passo que a água decanta no fundo junto com a borra.

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FOTOS 422-424: Produção de óleo de Dendê por Dona Imaculada.

Além dos óleos de dendê e mamona, Dona Imaculada produz óleo de coco.
Todavia, neste caso, não faz uso do pilão.

Dona Morenita – Feitio do corante - urucum


O feitio começa com a coleta do urucum no próprio quintal.

FOTOS 425-426: Dona Morenita, colhendo urucum no seu quintal, após um dia de trabalho na
lavoura de café.

Já dentro de casa, rente ao fogo de lenha, procede caprichosa limpeza do pilão e


da mão de pilão. O passo seguinte é no fogão onde os grânulos de urucum são
levemente torrados junto com um pouco de óleo. Em seguida o material é misturado
com 1 kg de fubá em uma bacia de metal.
Só então o material é despejado no pilão e tem início a pisada. Gradativamente,
a mistura vai sendo pilado dando origem ao corante avermelhado nos moldes em que
é usado na culinária.

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FOTOS 427-431: Feitio de corante por Dona Morenita.

112
5.6. Etnoregistro Colheita de café

Dada a condição histórica campesina, trata-se de atividade que mobiliza


praticamente todos os comunitários de Água Preta para trabalho nas fazendas do
entorno.
A produtividade da colheita depende de experiência e técnica apurada. No
chão é forrada uma lona para receber os grãos que são destalados de uma única vez
junto com as folhas. Quando a longa enche, os grãos são separados das folhas e
armazenados em sacos de linhaça.
O preço da saca varia de 14,00 até 20,00 reais. Para a colheita em tela o valor
foi de 17,00 reais. O preço foi considerado bom por Dona Imaculada.
A diária começa cedo, com saída em grupo às 5 horas da manhã. Antigamente,
costumavam seguir um caminho direto, mas, devido à expansão dos cultivos, agora
geralmente precisam percorrer rotas mais longas.
Outro dado que merece menção é o crescimento, nos últimos anos, de
oportunidades de colheita no assentamento Valdício Barbosa.

FOTOS 432-435: Comunitários de Àgua Preta colhendo café.

113
5.7. Etnoregistro da cultura do brincar na infância
A finalização dos etnoregistros não poderia deixar passar em branco a
cultura imaterial do brincar que esteve onipresente em todos os momentos de
execução do PIEP.

É digno de menção e nota o quantitativo de crianças que pululam na


comunidade e que, na ausência de meios materiais, transformam qualquer
objeto em brincadeira.

A equipe técnica do PIEP obteve êxito em incorporar este público infantil


nas oficinas. Todavia, o significativo número de crianças e o ambiente rural
propício impõem a necessidade de ir mais além, pautando o livre exercício da
cultura do brincar nos etnoregistros como forma de contribuir para a reflexão
sobre o futuro destas crianças em uma paisagem em transformação.

FOTOS 436-439: cultura do brincar na comunidade de Água Preta.

5. Cenários e Desenhos de Futuros de Água Preta


Após a 6ª etapa de campo, estão concluídos os etnoregistros colaborativos em
Água Preta. Por sua vez, as oficinas permitiram a valoração e auto atribuição dos
bens culturais pelos próprios comunitários.

114
Tomando como régua de medição o Diagnóstico Cultural Colaborativo (DCC -
Produto 1), os resultados até o momento geraram um grande volume de material
empírico.
Considerando a metodologia etnográfica e sinérgica do PIEP, assentado na
participação estrutural dos comunitários em todas as etapas, todo o material
produzido será revisitado e sistematizado para alimentar o inventário final. Outrossim,
o grande volume de trabalho e esforço de sistematização não pode obliterar, na reta
final, a perspectiva metodológica do PIEP.
Na etapa em tela, em função da agenda intensa de atividades em Valdício
Barbosa e devido ao fato de que as oficinas estavam finalizadas em Água Preta, não
foi possível reunir os comunitários dessa comunidade numa arena coletiva comum
para devolutiva da etapa anterior (oficina de cartografia) e a validação teve que ser
feita concomitantemente aos etnoregistros e em núcleos familiares separados. Tal
arranjo foi parcialmente possível devido à profundidade da imersão da equipe técnica
junto à comunidade e ao caráter cumulativo e sinérgico dos produtos.
Todavia, em virtude da dificuldade de agenda com a comunidade, para a
sétima etapa de campo, o inventario final e a devolutiva final do PIEP serão enviados
por mensagem (via whatsapp), uma vez que a instabilidade do sinal de internet nas
comunidades não permitiria a realização de uma transmissão on-line à associação,
recém-criada, uma vez que a instabilidade do sinal de internet nas comunidades não
permitiria a realização de uma transmissão on-line. As sugestões e complementações
dos comunitários serão acatadas.
Pretendemos, nesta direção, na medida do possível, agregar o conhecimento
acumulado pelos esquemas construtivistas e colaborativos à perspectiva dos
inventários de referências culturais balizados pelo IPHAN.

115
6. Referências Bibliográficas

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do Espírito Santo 1850 - 1888. Dissertação (Mestrado em História),
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história de pessoas, de letras e de palavras. Editora Expressão Popular, 2014.

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