Boletim Observatório Internacional Sep-23

OBSERVATÓRIO
INTERNACIONAL
DO SÉCULO XXI
Setembro/2023
OBSERVATÓRIO
INTERNACIONAL
DO SÉCULO XXI
COMITÊ EDITORIAL
José Luís Fiori
Maria Claudia Vater
Andrés Ferrari Haines
COLABORADORES DESTE NÚMERO

Alessandro Donadio Miebach José Luís Fiori
Andrés Ferrari Haines Karina Y. Kato
Clarice Menezes Vieira Maria Claudia Vater
Daniel Barreiros Mateus Ibelli Bianco
Elias Jabbour Nelson Delgado
Georges Flexor Wagner Sousa
SUMÁRIO
A DESORDEM MUNDIAL E A POLARIZAÇÃO

O BRASIL AMERICANA
6 40
BRICS + E A NOVA A BATALHA ARGENTINA

MAIORIA GLOBAL 45
11
A AMEAÇA À
O AVANÇO DA SEGURANÇA
DESDOLARIZAÇÃO ALIMENTAR
15 50
A “DESACELARAÇÃO” O DESCONTROLE
CHINESA CLIMÁTICO
20 55
A CRISE ALEMÃ E O O MUNDO MULTIPOLAR

FUTURO DA EUROPA DA SAÚDE
25 INTERNACIONAL
59
O GOLPE DE NÍGER
30 O G-20 E O DECLÍNIO
DO “MULTILATERALISMO
A ESCALADA DE TAIWAN OCIDENTAL”
35 65
OBSERVATÓRIO INTERNACIONAL DO SÉCULO XXI SETEMBRO/2023
a China, que deu alguns

passos diplomáticos
gigantescos à sombra da
Por José Luís Fiori própria guerra, na direção
do estreitamente de suas
N
esse momento,
relações econômicas e
quando se olha
estratégicas e do
para os desdo-
alargamento de sua
bramentos da
influência sobre o Oriente
guerra que está
Médio e a África.
sendo travada no território
Por outro lado, o
da Ucrânia, e para suas
insucesso das sanções
consequências imediatas, já
econômicas aplicadas à
se pode visualizar algumas
Rússia, pelos Estados
características e desafios
Unidos e seus aliados do G7
deste mundo que está
e da União Europeia, com
nascendo à sombra da
relação à suas próprias
guerra e da desordem
expectativas, trouxe de volta
mundial criada pelo declínio
a corrida armamentista
da supremacia euro-
para dentro dos países
americana, dentro do
europeus, assustados com a
sistema internacional.
superioridade tecnológica
A simples invasão russa
do armamento e da
do território da Ucrânia já
capacidade de resistência
rompeu com a “ordem
da economia russa. Uma
mundial” estabelecida pelos
“corrida às armas” que se
Estados Unidos e seus
intensifica na mesma
aliados da OTAN depois do
medida em que estes países
fim da Guerra Fria. Além
europeus percebem a
disso, a guerra acelerou a
posição cada vez mais
formação de uma aliança
defensiva dos Estados
estratégica entre a Rússia e
Unidos, ainda que não
6
menos agressiva, frente à quando a Rússia e a China

inciativa militar russa, e não compareceram à
frente à inciativa econômica Conferência das Nações
chinesa. Para não falar que Unidas sobre Mudanças
a maioria dos países do Climáticas realizada na
sistema mundial não cidade de Glasgow, um
acompanhou nem apoiou as evento preparado
posições euro-americanas cuidadosamente pela
nesta guerra. Neste sentido, Inglaterra e pelos Estados
olhando para a frente, pode- Unidos. E agora vai se
se antecipar que a repetir de novo na Reunião
hegemonia cultural dos do G20 que se realizará
valores europeus está agora no mês de setembro
ficando mais estreita, e que na Índia. Uma vez mais os
o império militar americano presidentes da China e da
global está encolhendo, Rússia estarão ausentes,
enquanto o mundo transita alegando motivos diferentes,
de um unilateralismo quase mas com o objetivo - em
absoluto para um última instancia – de
multilateralismo esvaziar um espaço de
oligárquico, que vai ficando discussão econômica que
cada vez mais agressivo, está perdendo sua
pelas próprias exigências ou importância paralisado pela
“regras” do sistema guerra econômica dos
interestatal. Isto explica o Estados Unidos contra a
esvaziamento atual das China, e pela guerra da
velhas instancias e Otan com a Rússia no
instituições multilaterais de coração da Europa.
negociação e gestão Como consequência, o
internacional, como já havia mundo eurocêntrico está
acontecido com a OMC, cedendo lugar a uma nova
ficou ainda mais claro configuração de forças no
7
continente eurasiano. Como do Sul, deverão aumentar

se fosse um movimento de seu poder regional e passar
retorno ao primeiro milênio a ter um papel maior à
da nossa era comum, e à escala global, sem chegar a
preeminência das grandes ameaçar o oligopólio
civilizações, religiões e imperial que deverá
impérios, e dos grandes controlar o sistema
circuitos comerciais internacional.
mesopotâmicos e asiáticos. Tudo indica que a China
Ao mesmo tempo que se não se propõe substituir os
clarifica o novo eixo Estados Unidos e seus
geopolítico mundial que aliados europeus como
deverá girar em torno de centro hegemônico do
quatro grandes Estados sistema mundial, pelo
“continentais” – Estados menos na primeira metade
Unidos, Rússia, China e do século XXI. Nem
Índia – que detêm, em tampouco a Rússia tem
conjunto, mais de um possibilidade de alcançar
quarto da superfície este objetivo. Mesmo assim,
territorial do planeta, e a aliança entre a força
cerca da metade da militar russa e o
população atual do mundo. extraordinário sucesso
Nessa nova geopolítica tecnológico e econômico da
destes “grandes impérios” China, deve ter um impacto
do futuro, a Europa deverá “exemplar” sobre o resto do
ter papel menor e mundo. Muito mais ainda,
subordinado aos Estados quando a China assume a
Unidos, mas algumas clara liderança do
outras “potências “desenvolvimentismo”
intermediárias”, como mundial, propondo-se
Brasil, Irã, Arábia Saudita, liderar a construção de um
Indonésia, Turquia, África “mundo inclusivo” e de
8
soma positiva entre todos os contínua pelo “poder

povos do mundo, mas com global”. A menos que no
destaque para os povos do século XXI, o sistema
chamado Sul Global, com interestatal regido em
uma ênfase particular na última instancia pelas
África. Como se pode estabelecidas a partir da
observar na própria Paz de Westfália, de 1648,
estratégia de expansão do vá sendo substituído por
BRICS, que se acelerou uma nova versão global do
nestes últimos dois anos, sistema “hierárquico-
sob a liderança estratégica tributário” que regeu as
da China, e à sombra do relações milenares da China
desafio vitorioso dos russos com seus povos vizinhos, e
ao projeto militar global dos que agora passaria a
Estados Unidos e de seus regular as relações dos
aliados do G7. Trazendo novos “grandes impérios”
para dentro do BRICS com suas velhas “zonas de
representantes de todas as influência”.
grandes civilizações que Neste momento, já na
dominaram o mundo até o terceira década do século
Século XVII. O grande XXI, e depois de um período
enigma, entretanto, com de retrocesso político e
relação ao futuro, é sobre a econômico, o Brasil optou
possibilidade de uma democraticamente por um
coexistência pacífica entre caminho diferente a ser
estes quatro grandes construído. E apesar da
“Estados-impérios” que destruição que o Estado e a
deverão liderar o sistema sociedade brasileira foram
interestatal durante o submetidos depois do Golpe
século XXI, um sistema de Estado de 2016, o Brasil
interestatal que foi sempre já adquiriu uma dimensão e
movido pela sua luta um peso internacional que
9
devem resistir e podem ser internacional, o terá que

restaurados. Assim mesmo, questionar inevitavelmente
para levantar-se sobre suas o status quo e os grandes
próprias pernas, o governo acordos geopolíticos em que
brasileiro terá que fazer se sustenta a ordem
algumas escolhas e tomar internacional. Como disse,
algumas decisões Norbert Elias, dentro deste
estratégicas fundamentais sistema interestatal, “quem
para viabilizar a construção não sobe cai”, mas ao
e sustentação interna e mesmo tempo há que estar
externa de um novo modelo preparado, porque quem
de sociedade e de sobe será sempre bloqueado
crescimento econômico, e e atacado, dentro e fora do
uma nova projeção país, e de forma cada vez
internacional dos seus mais intensa e coordenada,
valores e interesses por não submeter à vontade
nacionais. E terá que estratégica dos velhos
construir um bloco de poder donos do poder global.
nacional e um sistema
flexível de alianças
internacionais capazes de
sustentar o seu novo projeto
de futuro. Tendo claro de
antemão que ao escolher
este novo caminho deverá
sofrer inúmeros e
continuados ataques que
virão de todos os lados, de
dentro e de fora do país.
Neste ponto não há como
enganar-se: ao se propor
ascender dentro do sistema
10
geopolítica e econômica,
entre países situados fora
do núcleo central das
Por José Luís Fiori grandes potências
tradicionais, concentradas
sobre o eixo do Atlântico
D
e forma muito Norte. Países que não são
curta e direta: a atrasados, nem,
incorporação subdesenvolvidos, nem
dos seis novos dependentes e que já são,
membros do ou se propõem ser grandes
BRICS significa uma potências econômicas e
verdadeira “explosão políticas dentro de seus
sistêmica” da ordem inter- respectivos tabuleiros
nacional construída e regionais. Na verdade, o
controlada pelos europeus e próprio grupo original do
seus descendentes diretos BRICS já inclui três das
há pelos menos três cinco economias mais ricas
séculos. Mas seus efeitos e do mundo, tomando em
consequências mais impor- conta o seu “poder de
tantes não serão imediatos, paridade de compras”.
e irão se manifestando na Chamá-los de “sul global”
forma de ondas sucessivas, me parece ser uma forma
e cada vez mais fortes. anódina e geográfica
Exatamente porque o apenas, de renomear os
BRICS não é uma organi- antigos países do “terceiro
zação militar do tipo OTAN, mundo”, na sua maioria ex-
nem é uma organização colônias europeias. Os
econômica do tipo União números estão sendo
Europeia. Nasceu como um amplamente divulgados e
de ponto de encontro – todos já sabem que depois
quase informal – e um da incorporação dos seis
espaço de convergência
11
novos sócios o grupo do intensificação da compe-

BRICS terá mais de 40% da tição e de acirramento dos
população mundial e cerca conflitos entre esses países
de 40% do PIB mundial, o reunidos no G7 e os demais
que por si só já fala da países que eles agora
importância deste grupo e chamam de “sul global”,
de sua ampliação decidida apesar da incorreção
na reunião de Joanesburgo. geográfica da expressão
Agora bem ,apesar de que o uma vez que seu principal
BRICS tenha tido até hoje inimigo neste momento, a
uma postura muito mais Rússia, encontra-se ao
propositiva do que norte de quase todos os
contestaria, não há dúvida países do G7. Seja como for
que nos anos recentes, uma coisa é certa, depois de
devido a belicosidade Joanesburgo, o BRICS já é
crescente entre os Estados um ponto de referência
Unidos e a China, e devido incontornável dentro do
sobretudo à guerra no sistema internacional, e
território da Ucrânia entre dependendo da reação dos
os países da OTAN e a Estados Unidos e dos
Rússia, o BRICS acabou europeus, poderá se trans-
sofrendo uma mudança de formar nos próximos anos,
natureza, tornando-se uma num grupo de poder com
organização de resistência, capacidade de estreitar
sobretudo, com relação às cada vez mais o horizonte
estruturas e instituições do projeto de poder global
econômicas e financeiras dos Estados Unidos e seus
utilizadas pelos EUA e seus aliados do G7.
aliados europeus e Deste ponto de vista,
asiáticos, que operam como não há como não perceber
verdadeiras armas de que a partir de 2024 o
guerra nos momentos de Brics+ estará reunindo
12
alguns dos países entre os países-membros do

detentores das maiores grupo e desses países com
reservas de petróleo e gás todas as suas “zonas de
do mundo, além de incluir influência”. E este talvez
alguns dos seus maiores seja o maior golpe desferido
produtores de grãos e até hoje contra a hegemonia
alimentos. Para não falar do dólar, desde os Acordos
dos recursos minerais de Bretton Woods, em 1944,
estratégicos que se e desde o grande acordo
concentram nesses mesmos firmado entre os Estados
países, associados às velhas Unidos e a Arábia Saudita,
tecnologias nucleares e às logo depois da II GM,
novas tecnologia associadas quando ficou estabelecida e
à computação quântica, à garantida a intermediação
inteligência artificial e a do dólar, em todas as
robótica. Mas não há grandes operações do
dúvida que no médio prazo, mercado mundial do
o maior golpe econômico petróleo.
desferido contra os Assim mesmo, apesar do
interesses americanos e do sucesso da reunião de
G7 veio de outro lado, mas Joanesburgo, a imprensa
deverá atingir em cheio o brasileira tem feito várias
poder monetário e críticas ao que teria sido, i)
financeiro do Dólar e dos uma perda do peso relativo
Estados Unidos. De fato, a do Brasil dentro do grupo
reunião de Joanesburgo não do Brics; ii) o aumento da
criou uma nova moeda nem presença de países não
discutiu abertamente a democráticos dentro do
criação dessa moeda. Mas gruo; iii) e, finalmente, o
de forma discreta antecipou aumento da dependência
a substituição do dólar nas econômica brasileira com
transações energéticas relação à China. Com
13
relação à perda de peso grupo diplomático ou

relativo do Brasil dentro do comercial, frouxo e quase
grupo, devido ao aumento casual, para transforma-se
do número de seus num “grupo de poder” com
membros e do seu “colégio peso crescente dentro dos
eleitoral”, é necessário fóruns internacionais.
chamar atenção para dois Com relação à crítica à
aspectos deste problema: o polarização entre países
primeiro é que os países democráticos e autoritários
membros originários dentro do grupo, é
associados ao acrônimo do importante ter presente é
grupo manterão sempre que o Brics nunca se propôs
uma maior presença e peso a ser um grupo de países
relativo, pelo simples fato de democráticos, nem muito
que são seus “sócios menos um grupo
fundadores”. Sendo óbvio, missionário pregador da fé
entretanto que isto depen- na democracia. Trata-se de
derá muito de quem sejam um grupo pragmático e que
seus governantes e do grau tem por princípio a ideia
do apoio interno e da coesão chinesa do respeito
de que disponham da parte absoluto pela autonomia
de suas elites econômicas, política e cultural de cada
sociais e políticas. Por outro um de seus membros e dos
lado, a diminuição do “peso seus povos.
eleitoral” de cada um dos
Por fim, há que lembrar
membros originários do
que o Brasil não é o único
grupo é um preço inevitável
país do mundo que tenha
a pagar, uma vez que o
aumentado seu relacio-
grupo tenha tomado a
namento econômico com a
decisão, ou tenha sido
China, nestes últimos anos.
levado a expandir-se,
O mesmo aconteceu com
deixando de ser um mero
toda a América Latina e
14
África, mas também com a

Europa e os Estados
Unidos. Por isto mesmo, o
grande desafio da política Por Andrés Ferrari Haines e
externa brasileira neste Alessandro Donadio Miebach
momento é saber construir
U
uma resposta inteligente, ma das
flexível, e o mais consensual consequências
possível, de aproveitamento da Guerra na
das circunstâncias criadas Ucrânia é o
por esta nova realidade. movimento para
Exatamente o contrário do deslocar o dólar americano
que os Estados Unidos de sua condição de moeda
estão fazendo, e por isto internacional, o que
estão perdendo espaço no implicaria em uma
mundo, ao mostrar-se mudança estrutural na
incapazes se ajustar à ordem mundial. Análises
novas realidade, tentando convencionais consideram
fazer a roda da história quase impossível que o
parar ou voltar para trás. dólar abandone o seu papel
de moeda internacional.
Assim, no sistema
SWIFT o dólar é utilizado
em 84% das operações
comerciais e representa
quase 60% das reservas
internacionais do mundo.
Aproximadamente 80% dos
dólares existentes estão em
mãos de estrangeiros. As
participações globais,
embora crescentes, do yuan
15
e do seu sistema CIPS de Durante os anos

pagamentos internacionais dourados, o Ministro das
não se aproximam do Finanças francês, Valéry
SWIFT e do dólar. Além Giscard d'Estaing,
disso, a China mantém um denunciou os EUA por
controle rígido sobre o procurarem o privilégio
dinheiro que entra e sai do exorbitante de não terem de
país – o que revela que não se ajustar como todos os
é seu propósito que o yuan outros países. Privilégio que
ocupe o lugar do dólar como os Estados Unidos
moeda internacional. procuraram garantir
Porém a visão quando – terminando com
convencional desconsidera Bretton Woods – em agosto
que a desdolarização trata de 1971, acabaram com a
fundamentalmente do conversibilidade do dólar ao
desejo de vários países de ouro. Desde então, o dólar
impedir que os Estados passou a não ter nenhuma
Unidos continuem a usar a outra referência de valor
sua moeda nacional como que a determinada pelos
instrumento de poder no EUA.
sistema internacional. A Os EUA abriram o seu
compreensão do significado sistema financeiro e
da desdolarização é que a começaram a pressionar
onipresença do dólar como outros países a fazerem o
base monetária global mesmo – ao mesmo tempo
esconde o fato de este não que derrubavam barreiras
ser uma "moeda comerciais. As novas
internacional", mas uma receitas econômicas seriam
“moeda nacional” sendo logo pautadas como
usada como “moeda Consenso de Washington e,
internacional”. após a queda da URSS,
responderiam à nova ordem
16
mundial da globalização. mais de mais de US$ 2

Sem quaisquer restrições, a trilhões neste ano.
emissão de dólares pôde Os EUA também
expandir-se sem limites e os passaram a utilizar esse
outros países tiveram que poder aplicando sanções –
absorvê-la, aplicando-os em estima-se que afetam pelo
títulos de dívida do governo menos 40% da população
dos EUA, e compondo assim mundial – excluindo países
suas reservas do sistema SWIFT, para que
internacionais. não possam importar
A emissão de dólares produtos básicos e
serviu para financiar alimentos. Como disse o
guerras intermináveis, secretário de Estado Mike
intervenções militares, Pompeo ao Irã, ameaçando
armar grupos internos em impor sanções: “É melhor
conflitos civis, renovar e pensar no que está fazendo
expandir o arsenal de se quiser que o seu povo
guerra, e aumentar e coma”.
manter as oitocentas bases Na Guerra da Ucrânia,
e instalações militares. os EUA achavam que a
Líder em gastos militares, o economia russa não
orçamento militar dos EUA resistiria às sanções. O
excede a soma dos próximos resultado não foi esse
dez países em nível de devido à resiliência russa e
gastos. Isto prosseguiu até o porque a maioria dos países
presente, conforme expresso não ocidentais não
pelos mais de cem bilhões aderiram às sanções. Ao
de dólares que os EUA decidir continuar a negociar
enviaram à Ucrânia e pelo com a Rússia, tornou-se
orçamento do necessário encontrar
Departamento de Defesa de alternativas ao dólar.
17
Numerosas nações depositados no sistema

africanas, asiáticas, do financeiro em dólar. Essa
Golfo Pérsico e latino- medida extrema de sanções
americanas expressaram-se tinha sido pouco utilizada
neste sentido e os diálogos até então, nomeadamente
bilaterais se foram com a Venezuela, o Irã e no
solidificando através da Afeganistão – mas em muito
discussão em grupos de menor grau.
países fora do eixo ocidental A exclusão da Rússia do
– BRICS, Cooperação de SWIFT teve impacto na
Xangai, União Económica função meio de pagamento
Eurasiática, ASEAN, União da moeda que o dólar
Económica dos Países do exercia internacionalmente.
Golfo e União Africana. O confisco das reservas
Caso especial são os BRICS russas em dólares, por
que acabam de incorporar outro lado, foi um choque
seis novos membros e ainda para a sua função como
tem mais numerosos de reserva de valor
pedidos, e em conjunto têm internacional. Abalou a
dimensões relevantes, que confiança de muitos países
igualam ou excedem as na preservação dos seus
principais nações saldos em dólares, uma vez
ocidentais, no que diz que os EUA demonstraram
respeito às magnitudes do que tais reservas podem ser
PIB, dos recursos naturais, bloqueadas em caso de “mal
do território e da população. comportamento”.
Sem ter alcançado o seu Especial destaque foi
propósito através das que Arábia Saudita, após
sanções, os EUA adotaram negar o pedido dos EUA
o recurso extremo de para aumentar a produção
unilateralmente apreender de petróleo, passou a
US$ 300 bilhões da Rússia aceitar o yuan chinês como
18
pagamento por exportações. outra moeda nacional passe

Este fato foi reforçado pelo a ter essa capacidade.
sucesso da diplomacia Do ponto de vista das
chinesa em conseguir que o moedas internacionais,
país restabelecesse relações implicaria que, tal como no
com o Irã – sendo ambos passado, poderiam ser
novos membros dos BRICS. utilizadas, além do ouro,
Estes acontecimentos várias moedas nacionais ou
apoiam a especulação de multinacionais – que
alguns analistas de que o funcionariam também como
petroyuan estaria a emergir ativos de reserva. Esta é
para substituir o petrodólar, uma tendência que
que foi estabelecido na apresenta mais incógnitas
década de 70. Ou seja, o do que certezas em seus
yuan substituiria o dólar detalhes, mas que, sem
como unidade de valor dúvidas, solidamente está
internacional dada a em curso.
indispensabilidade global
Uma questão
desse recurso.
fundamental é também
No entanto, o dólar não observar como os Estados
será substituído como Unidos reagirão à perda de
moeda internacional no um instrumento de poder
sentido de que outra moeda fundamental – e
nacional tomaria seu lugar. extremamente barato – com
Os movimentos em curso o qual expandiram a sua
sugerem, antes, que presença global no último
surgirão mecanismos meio século. Ao mesmo
monetários para retirar do tempo cabe questionar
dólar a sua capacidade de como a economia global irá
ser um instrumento de construir alternativas à
poder nos Estados Unidos – relação de
sem qualquer vislumbre de complementariedade entre a
19
dívida pública dos EUA, e

os ativos do resto do
mundo, de 32 trilhões de
dólares, dado que estes Por Elias Jabbour
perfazem um terço do
produto global.
T
emos assistido,
Em suma, a nas últimas
desdolarização é semanas, a
irreversível, como uma verdadeira
argumenta o líder russo tempestade
Putin; mas como ocorrerá semiótica nos oferecendo
ainda é um caminho aberto. uma série de análises sobre
o inexorável declínio
econômico chinês, suas
consequências internas e
externas. Evidente que pode
gerar algum espanto nos
acostumarmos com a ideia
de um país crescer a dois
dígitos por cerca de 30 anos
para logo em seguida entrar
em uma etapa onde o
crescimento quantitativo
deixa de ser tão relevante.
Aqui está um ponto a ser
levantado: a transformação
do crescimento econômico
chinês em algo mais
qualitativo. Algo a ser
exposto também é sobre as
razões pelas quais os
grandes veículos de
20
comunicação e think tanks este ano: 12 milhões na

sediados nos Estados China. O país já alcançou
Unidos estarem protagonismo tecnológico
concentrando energia em em pelo menos 30 áreas
algo que os dados, sensíveis e caminha de
literalmente, não forma mais acelerada do
comprovam. Estaríamos que se imaginava para
vivendo uma distopia? alcançar os EUA nas
Aos fatos, a economia chamadas infraestruturas
chinesa tem previsão de de semicondutores.
crescimento para 2023, Mas, contradições
segundo o FMI, de 4,9%. Os surgem e ressurgem
Estados Unidos e Japão ciclicamente como em
deverão crescer 1,3% e a qualquer sociedade em
União Europeia deverá ter movimento, sendo
crescimento de 1,0%. Ou certamente seu motor
seja, a China deverá crescer primário. O desemprego
mais do que as três oficial entre jovens entre 18
economias citadas de forma e 24 anos alcançou 25%, o
combinada. Há quem que significa algum indício
sustente que pelo fato de a de desequilíbrios sociais à
China ainda contém uma vista cuja solução
grande parte de sua mão de demandará o melhor dos
obra ocupada na cerca de dois milhões
agricultura, logo existe economistas e engenheiros
“espaço” para maior de projetos responsáveis
crescimento e pela busca de solução de
produtividade. Acredito que grandes questões
os termos da equação são levantadas pela realidade.
outros. O primeiro deles o Desde que o governo chinês
número de empregos decidiu furar a bolha
urbanos a serem gerados imobiliária, o país convive
21
com cerca de 25% de sua últimas décadas, o setor

economia (construção civil) público da economia passou
em sérias dificuldades, o o peso do setor privado
que já começou a afetar o entre as cem maiores
setor público da economia e companhias do país.
as empresas estatais que Assim sendo, mudam os
foram assumindo pedaços termos da questão. Como a
de grandes companhias China consegue crescer
como a Evergrande. A leve quase 5% em 2023 apesar
queda das exportações, desta gama de
importações e dos preços contradições? Em primeiro
internos contribuem com lugar, o país alcançou um
um quadro deflacionário nível de capacidade de
que preocupa o mundo, gerenciamento de seu
evidente. próprio futuro que o pode
Outra decisão a ser condicionar como e quanto
levada em consideração no crescer, a depender da
conjunto da análise é o contradição principal pela
enquadramento dos qual está exposta a sua
monopólios privados pelo sociedade. Algumas ideias-
Estado. A ofensiva contra o força são lançadas:
“avanço desordenado do “crescimento com
capital” em vários setores qualidade”, “civilização
da economia tem sido ecológica socialista” e
alegada como um dos principal delas,
motivos da queda brusca “prosperidade comum”. As
dos investimentos do setor questões com as quais se
privado. Estudo recém- defronta o Estado chinês
lançado do Peterson hoje são completamente
Institute for International diferentes daquelas do
Economics demonstra que, início das reformas
pela primeira vez nas econômicas. Atualmente o
22
eixo da contradição Krugman para quem o

principal deixou de ser o crescimento anterior chinês
baixo nível de baseou-se “em grande parte
desenvolvimento do país em ao acompanhar a tecnologia
face das necessidades ocidental”, mas agora
materiais da população enfrenta o problema de
para questões relacionadas demasiada poupança,
ao enfrentamento das demasiado investimento e
desigualdades sociais e muito pouco consumo.
regionais, a transição Precisa, portanto, de
energética e o desafio “reformas fundamentais”
geopolítico que o Estados para “colocar mais
Unidos impõe sobre o país. rendimento nas mãos das
Esse desafio externo que famílias, para que o
expomos explica muito da aumento do consumo possa
tentativa de impor a visão substituir o investimento
de um declínio chinês aos insustentável”.
olhos dos interesses dos Algumas questões são
Estados Unidos em geral e fundamentais: se a China
de Joe Biden em particular. deveria ter mais carros, mas
Aqui lanço dois pontos. O estradas ruins? Será que
primeiro é conceitual e se são necessários mais
encerra na proposta para televisores, mas menos
quem os chineses deveriam apartamentos para os
investir menos instalar? Será que a
investimentos e consumir população precisa de mais
mais. Esta falsa contradição alimentos e roupas, apesar
é primária em termos de de já estar, na sua maioria,
teoria econômica e falsa em bem alimentada e vestida
termos práticos. Vejamos o decentemente há três
renomado economista e décadas? Ou seja: 1) a
prêmio Nobel, Paul queda da taxa de
23
investimentos no país Golfo do México. O

provocaria uma verdadeira contrário é completamente
hecatombe em termos de verdadeiro.
consumo popular e 2) Em suma, a China
fundamental lembrar que os enfrenta uma série de
salários médios chineses pedras em seu caminho.
crescerem 270% nos Mas as perguntas a serem
últimos dez anos, ou seja, feitas estão longe da busca
acima do crescimento do de resposta ao seu declínio
PIB, da inflação e da econômico. Ao contrário.
produtividade do trabalho.
O outro ponto é mais
político e geopolítico. É
evidente que às pretensões
de Biden e de seu entorno é
importante vender a ideia
de um declínio chinês.
Afinal, diante de imensos
desafios internos a
agressividade externa
(chinesa) serviria como boa
resposta. Ou seja, montar
um cenário ideal para
mostrar a China como uma
ameaça à segurança
mundial é fundamental aos
EUA e Biden, independente
de não haver nenhuma base
militar chinesa próxima aos
EUA e não se ter notícia da
passagem de algum porta-
avião chinês passeando pelo
24
beneficiou (em detrimento

dos países do sul europeu, e
também da França) e em
aproximadamente três
décadas de relações
Por Wagner Sousa
relativamente pacíficas com
quase todas as nações do
mundo, com destaque para
O
pesquisador
Hans dois países que se tornaram
Kundnami, do cruciais para a economia
think tank alemã: a Rússia (supridora
britânico de energia e importante
Chattam House, ex-diretor mercado) e a China (o mais
acadêmico do European importante mercado, que
Council on Foreign superou, nos últimos anos,
Relations, na obra “The os EUA). Neste período, a
Paradoxx of German estratégia de expansão pela
Power”, dá à especificidade economia, estava assentada
do caso alemão, em sua na proteção da OTAN e no
inserção no contexto “guarda-chuva nuclear” dos
europeu, no período após o Estados Unidos na Europa.
fim da Guerra Fria, a O período descrito pelo
designação de “semi- economista francês Pierre
hegemonia geoeconômica.” Salama como
O livro explica como o país “hiperglobalização” foi
construiu sua liderança na também de “conforto
União Europeia lastreada geopolítico” e possibilidade
em sua altamente de expansão pela Eurásia e
competente economia outras partes do mundo, de
industrial exportadora (sem uma maneira que não era
rival no continente), na possível em tempos de
união monetária que o Guerra Fria.
25
Não mais. Na conclusão Moscou-Pequim” passa a

de sua obra, Kundnami ser lida por muitos como
pergunta o que será do ameaça à dominação
futuro da Alemanha. Na sua ocidental global dos últimos
visão, não estava mais três séculos, como também,
obrigada a estar atada ao em certos círculos políticos
Ocidente, a condição e acadêmicos, como
essencial para a pacificação “ameaça à democracia.”
com seus vizinhos após a
A interpretação de
derrota na Segunda Guerra
Kundnami acerca da
Mundial. Esta condição
política externa alemã,
teria passado a ser uma
como centrada
“opção”, com Berlim
fundamentalmente na
também podendo optar por
geoeconomia como “motor”
laços mais firmes à Leste,
do crescimento econômico e
numa aliança mais forte
expansão da influência
com Moscou e Pequim. Era
política na Europa e no
o cenário que se colocava
mundo; e do caráter
para o país, nesta
limitado de sua
leitura...até a Rússia cruzar
“hegemonia” na União
as fronteiras da Ucrânia e a
Europeia, justamente por
China passar a ser vista
estar lastreada na economia
não apenas como um
e não adicionalmente no
gigantesco mercado
hard power do poder militar
consumidor, mas como um
mostrou-se correta. Nesta
competidor econômico,
mesma análise, contudo, ao
político e tecnológico dos
buscar prever cenários
europeus. A eventual
futuros, o autor não utiliza
supremacia política
o mesmo raciocínio que
mundial de um “eixo
usou para definir como
26
“semi”, parcial, a hegemonia pelos norte-americanos)

alemã na Europa. O que se precisavam impedir a
coloca primariamente como aproximação entre a
limite ao poder alemão na potência que controla o
Europa é a OTAN e seu Heartland, a Rússia, e a
controle pelos Estados maior potência industrial da
Unidos. E no cálculo dos Europa, a Alemanha. O
cenários futuros para a estabelecimento do
Alemanha não aparece a gasoduto Nord Stream 2,
possiblidade de “veto” norte- entre a Rússia e a
americano para uma Alemanha, foi o ponto alto
expansão à Leste. Foi o que de uma relação
ocorreu quando os EUA geoeconômica marcada, na
provocaram a invasão russa maior parte tempo nas duas
da Ucrânia. últimas décadas, pelo
desejo mútuo de
Halford Mackinder,
aproximação e
geógrafo inglês, considerado
estreitamento de relações. O
um dos pais da geopolítica e
mercado consumidor russo
da geoestratégia em sua
se tornou importante para
obra “O Pivô Geográfico da
os alemães, mas
História”, criou o conceito
especialmente foram os
de Heartland, “o coração da
seus recursos energéticos
Terra”, localizado no centro
que se tornaram cruciais. O
da Eurásia. Na visão de
gás barato russo foi
Mackinder o controle do
essencial para a estratégia
Heartland estaria no centro
de exportações industriais
da disputa geopolítica
da Alemanha, assim como
global e ele entendia que os
se tornou bastante
britânicos (o que foi
relevante para outros países
posteriormente absorvido
27
europeus, como a Itália. A O que dizer do futuro

guerra entre Rússia e da Alemanha? A resposta
Ucrânia, não desejada pela não é fácil e depende de
maior parte da Europa, mas variáveis internas e
provocada por EUA e Reino externas. A extrema-direita
Unido, quando não do partido “Alternativa para
aceitaram nenhum tipo de a Alemanha” (AfD) vem
negociação prévia à guerra e crescendo nas pesquisas,
boicotaram as negociações está em segundo lugar nas
diretas entre Ucrânia e preferências (atrás apenas
Rússia está gerando dos democrata-cristãos,
enormes perdas à economia CDU) é anti-integração
alemã, assim como para a europeia e mais próxima da
Europa como um todo. Rússia. Até o momento as
legendas tradicionais
Também em relação à
rechaçam coligar-se com o
China, no contexto da
AfD. As legendas
disputa entre este país e os
tradicionais, com as forças
Estados Unidos, o governo
e ideias que atualmente as
alemão divulgou
controlam, tendem a uma
recentemente o documento
acomodação nesta situação
“Estratégia para a China”
de submissão renovada aos
em que pretende cortar a
EUA como um “sócio
dependência do país
menor” e tendem a
asiático em setores
participar ativamente do
considerados essenciais
rearmamento e reforço da
como insumos de saúde,
OTAN (o governo Scholz
baterias de lítio e
aprovou um orçamento
semicondutores.
militar recorde), inclusive
com deslocamento de parte
28
de suas forças para a Ásia, Kundnami pergunta se,

tendo a China como o país a após o fim da Guerra Fria
ser “contido.” Uma aliança teria ocorrido,
com a França e outros contrariamente ao que
europeus (sem o Reino defendeu Francis
Unido) para uma Fukuyama e a famosa
“autonomia estratégica” alusão ao “fim da História”,
europeia é objetivo muito com a vitória do liberalismo
difícil de ser alcançado pela político e do capitalismo, “o
multiplicidade de interesses retorno da História”, com a
envolvidos. Pouco evoluiu, volta da “questão alemã” na
até o momento. geopolítica europeia. A
Guerra da Ucrânia
Outra variável é a
demonstra que a resposta a
possiblidade de um futuro
esta pergunta é sim.
governo republicano nos
EUA (com Trump ou outro)
menos afeito às tradicionais
relações com a União
Europeia e mais próximo da
Rússia. O que aconteceria
com a União Europeia sem
o apoio ou com apoio menor
dos EUA? O bloco tem
futuro sem a coesão da
OTAN? Esta é uma questão
relevante porque foi
justamente a coesão dada
pelo cenário de Guerra Fria
que permitiu ao bloco os
seus maiores avanços.
29
produzida por centrais

nucleares, sendo a
Por Daniel Barreiros economia francesa a mais
nuclearizada da Europa.
N
o pós-Guerra
Desse modo, a crise no
Fria, golpes de
Níger traz um desafio, e
estado na África
devemos, portanto, esperar
não chamaram
que o governo francês
tanto a atenção
aumente o grau de atrito
dos analistas internacionais
tanto com a junta militar
e dos governos ocidentais
nigerense quanto com
quanto o processo de
quaisquer poderes locais
ruptura institucional
(sem falar da Rússia e da
ocorrido no Níger em julho.
China) capazes de ameaçar
O Níger responde por 5% da
seus interesses energéticos,
exportação mundial de
na eventualidade de as
urânio, produzido em
negociações com Niamei
associação entre a Orano
resultarem em fracasso.
(uma companhia de capital
Ainda que o suposto
aberto, cujo 90% do
embargo das exportações de
controle acionário pertence
urânio para a França tenha
ao estado francês) e a
se provado apenas um
Société du Patrimoine des
boato, a postura do governo
Mines du Niger, uma estatal
nigerense caminha para
local. Cerca de um quinto
facilitar a operação de
das importações francesas,
empresas chinesas e russas
e um quarto das
nesse setor, o que esvaziaria
importações de toda a
o virtual monopólio
União Europeia, são de
desfrutado pela Orano. Em
origem nigerense. 70% de
qualquer caso, nessa
toda energia elétrica
renovada “corrida
consumida na França é
imperialista” na África
30
ocidental, parece disfarce para uma ocupação

importante considerarmos colonial extemporânea.
não só os movimentos das O sentimento antifrancês
potências, mas o modo pelo se espalhou pelo país,
qual os governos locais movido naturalmente pela
também se movem. memória histórica; e se
Há ainda a presença tornou um eficaz cavalo de
militar norte-americana e Tróia nas mãos de uma
francesa na região. Após contraelite que se
serem retiradas do Mali e de apoderava do poder,
Burquina Fasso com o depondo um governo
fracasso da Operação inequivocamente associado
Barkhane (voltada contra a Paris e a Washington. As
seções da Al-Qaida e do manifestações populares,
Estado Islâmico no Magrebe instigadas por grupos da
e no Sahel), forças militares sociedade civil como o
francesas encontraram no Movimento M62, e a efetiva
Níger uma base de presença russa na região
operações até então segura, logo se misturaram no
e lá se concentraram. O imaginário, tornando a
problema do extremismo Rússia, na narrativa
islâmico tem impacto popular, um agente anti-
ubíquo nas sociedades da imperialista.
África ocidental, A presença constante da
especialmente entre as bandeira tricolor russa nos
populações rurais. Então, protestos de rua não passou
os resultados minguados da despercebida pelos serviços
atuação francesa logo foram de inteligência ocidentais, e
sentidos, e o que fora todo o contexto foi visto
justificado como um “ato como um efetivo ponto de
humanitário” logo foi entrada a ser explorado por
interpretado como um Moscou. O fato é que o
31
fracasso da Operação de Niamei, e outra no centro

Barkhane, somado à do país, em Agadez. Nesse
história colonial nigerense, momento, ambas estão
deram à Rússia uma impedidas de efetuar
importante vantagem em operações aéreas, por
termos de status e prestígio ordem do governo
no Níger. Essa vantagem, nigerense. Restrita à
no campo imagético e operação de drones
político, vem sendo sediados em Djibouti,
insistentemente atacada Washington tenta resolver o
pelas potências ocidentais. imbróglio diplomaticamente,
Resta saber até quando o mas sem sucesso. E a se
Kremlin será capaz de considerar a fracassada
sustentar uma narrativa visita ao Níger da Secretária
anti-imperialista, ou mesmo de Estado Adjunta em
se a presença militar russa exercício, Victoria Nuland,
na África ocidental será já nos primeiros dias da
definitivamente crise, fica nítido que o
enfraquecida após a morte governo Biden vê a situação
de Yevgeny Prigozhin, em como grave.
23 de agosto passado. Neste momento, com a
No que diz respeito aos Guerra Russo-Ucraniana
Estados Unidos, o Níger é em curso, os Estados
um nó central na rede de Unidos tentam limitar novos
ISR (Intelligence, flancos e conseguir o
Surveillance, máximo de ganhos
Reconnaissance) da força diplomáticos no Níger
aérea norte-americana, em (evitando, inclusive,
seu monitoramento de todo reconhecer a natureza
o Magrebe. Duas bases de “golpista” do atual regime,
drones concentram esses em busca de manter canais
esforços: uma nos arredores abertos). E, se em alguma
32
medida, o conflito na fortalecimento

Ucrânia vem cumprindo um institucional, a
papel semelhante ao da dita instabilidade política
“Guerra ao Terror” - no Níger e em toda a
capturando extrema África ocidental
atenção de Washington, e seguirá sendo um
reduzindo a capacidade de ponto de entrada para
ação norte-americana em a alavancagem de
outros tabuleiros - isso interesses por parte
pode significar uma janela das potências
de oportunidade para os ocidentais, bem como
interesses chineses na de desafiantes como a
África ocidental (e talvez China e a Rússia.
também russos, enquanto 3. No curto-médio prazo,
essa presença em solo for a ameaça que paira
conduzida por sobre o futuro do
paramilitares). fornecimento de
Em resumo, temos os urânio à França, e
seguintes prospectos: sobre as condições
1. É improvável que uma excepcionais
estabilização do poder desfrutadas pelo
aconteça no Níger, em capital francês nesse
médio e longo prazo, setor, forçarão Paris a
tendo em vista as uma postura firme em
restritas condições de relação à junta militar
negociação e nigerense. Essa
pactuação entre elites postura não exclui, no
político-militares; nosso entender, uma
guerra entre a França
2. Dada a
e uma coalizão
impossibilidade
formada pelo Níger,
sociológica de acelerar
Burquina Fasso, Mali,
um processo de
33
e eventualmente, a país com proporções

Guiné. Considerando a econômicas,
complexidade dos demográficas e
conflitos geopolíticos militares
entre as nações da desproporcionais em
África ocidental, não é relação aos seus
inverossímil que países vizinhos, e nitidamente
da CEDEAO como indisposto a uma crise
Senegal, Gâmbia, de maiores proporções
Costa do Marfim e em sua fronteira norte.
Serra Leoa se juntem à 4. No médio prazo, caso a
França em uma ação presença russa perca
militar, caso esta força na África
possa ser justificada a ocidental (a partir de
partir de argumentos um enfraquecimento
humanitários e de operacional do Grupo
“restauração da Wagner), e sendo
democracia”. Ou capazes de negociar
ainda, o inverso: que a com Niamei sua
França use a CEDEAO presença militar, é
como um proxy, provável que os
apoiando e tirando Estados Unidos
proveito de uma rejeitem uma postura
intervenção militar agressiva da França
conduzida por em relação ao Níger. A
iniciativa desses ruptura do monopólio
países. Caso sejam francês na extração de
esses os urânio pode beneficiar
desdobramentos, empresas norte-
devemos ficar atentos americanas (ainda que
às movimentações do igualmente empresas
governo da Nigéria, russas e chinesas), e
34
nesse caso, os Estados

Unidos não teriam
qualquer benefício
imediato em ladear Por José Luís Fiori
com a França. A
chance de Washington
N
esta semana, a
sustentar uma postura administração
agressiva por parte de do presidente
Paris cresce caso a norte-
presença russa se americano Joe
consolide na África Biden anunciou que
ocidental, e o governo pretende fornecer a Taiwan
do Níger se mostre a primeira assistência
intransigente quanto à militar, no valor de cerca de
presença militar dos US$ 80 milhões (R$ 395
Estados Unidos no milhões), no âmbito do
país. chamado Programa de
Financiamento Militar
Estrangeiro que, de acordo
com o jornal chinês,
geralmente é destinado a
países soberanos
independentes.
Esse aumento da
agressividade militar e
diplomática americana na
região, entretanto, não está
sendo provocado apenas
pelo sucesso e pelo
aumento da importância
econômico mundial da
China, já vem de tempo e foi
35
provocado pelo crescimento tentasse retomar à força

geométrico do poder naval esse “penhasco” onde se
da China, a partir da refugiou, em 1949, o
primeira década do século general nacionalista Chiang
XXI, e em particular depois Kay-shek, junto com o que
da posse do presidente Xi restou de suas tropas
Jinping, em 2013, com seu derrotadas pela revolução
projeto de fazer da China comunista liderada por Mao
um poder militar global até Tse-tung. E é verdade que
meados do século XXI. em 1949, Taiwan tinha
Como resultado dessa apenas sete milhões de
decisão, a China adquiriu habitantes e só sobreviveu
ou já produziu nesse como “província rebelde”
período, 80 submarinos graças à proteção militar
convencionais e atômicos de dos EUA. Na prática,
que dispõe atualmente, ao Taiwan se transformou num
lado de 3 porta-aviões e “Estado vassalo” dos EUA,
mais 1.275 novos barcos com a pretensão irrealizável
que foram somados à sua de “reconquistar” e
guarda costeira, “reunificar” a China. O
transformando-a no maior mesmo objetivo invertido do
poder naval entre todos os governo chinês, uma vez
seus vizinhos asiáticos. que nenhum dos dois
Em 1954, o secretário de jamais aceitou a ideia
Estado norte-americano americana de criação de
John Foster Dulles afirmou “duas Chinas”. E foi aqui
que a ilha de Taiwan não que começou a história
passava de um “punhado de contemporânea desse
rochas”. Ao mesmo tempo, “penhasco”, que adquiriu
foi o próprio Dulles que importância estratégica
ameaçou a China com um cada vez maior com o
ataque atômico, caso passar das décadas,
36
confirmando a tese de que é vigorou uma espécie de

a luta pelo poder que define “coexistência combatente”
a importância da geografia, entre China e Taiwan, onde
mesmo quando ela não os EUA instalaram
disponha de nenhum finalmente suas próprias
recurso natural bases militares. No entanto,
significativo. Começando em a situação mudou
1954, logo depois do fim da radicalmente depois da
Guerra da Coreia, quando a assinatura do Comunicado
China tentou retomar as de Shangai, em 1972, que
ilhas de Quemoy e Matsu, consagrou a reaproximação
no “caminho” de Taiwan, entre os dois países depois
mas foi repelida pelos porta- do reconhecimento, por
aviões norte-americanos. parte dos EUA, de que o
Logo em seguida, foi território de Taiwan faz
assinado o “Acordo de parte e é inseparável do
Defesa Mútua”, que território chinês, porque só
transformou Taiwan existe uma China, com
também num “protetorado capital em Pequim. Depois
militar”, uma vez mais desse reconhecimento, os
defendido pelas forças EUA transferiram sua
norte-americanas em 1958, embaixada para Pequim,
quando as tropas chinesas cancelaram o Acordo de
voltaram a ser repelidas das Ajuda Mútua com Taiwan,
duas pequenas ilhas, e desmontaram sua base
quando a URSS ameaçou militar na ilha e finalmente
pela primeira vez utilizar retiraram suas tropas do
armas atômicas caso os território de Taiwan. E foi
EUA atacassem o território esta vitória chinesa que
chinês. abriu as portas para a
Desde então e até o integração econômica que
início da década de 70, fez de Taiwan o segundo
37
maior investidor economia chinesa, a

“estrangeiro”, na economia situação ficou intolerável
continental da China. Uma para os chineses. Estes
situação que se modificaria agora já podem se propor a
uma vez mais na década de controlar o Mar do Sul da
90, quando o primeiro China e vencer os EUA em
governo eleito de Taiwan todos os cenários de guerra,
propôs a independência da além de dispor do poder
ilha, mesmo sem contar naval, aéreo e terrestre para
com o apoio explícito dos ocupar Taiwan, mesmo no
EUA. A proposta provocou caso do envolvimento de
imediata mobilização militar tropas americanas, a menos
da China, trazendo de volta que os EUA decidam utilizar
ao Estreito de Taiwan os armamento atômico, com
porta-aviões da Sétima consequências imprevisíveis
Frota dos EUA, fato que foi para os dois lados, uma vez
decisivo para o que a China provavelmente
rearmamento naval da responderia utilizando suas
Chaval. próprias armas atômicas
Os EUA controlam hoje táticas.
todos os pontos estratégicos Os norte-americanos
entre o mar do Japão, o sabem que o controle de
Oceano Indico e o Pacífico Taiwan deixou de ser
Sul capazes de bloquear apenas uma disputa
instantaneamente os fluxos territorial chinesa, e passou
comerciais e energéticos a ser uma condição
indispensáveis à essencial para que a China
sobrevivência diária da tenha acesso soberano ao
China. Depois da decisão Pacífico e ao Mar da Índia.
chinesa de criar um poder E os EUA também sabem
naval próprio, e após o que os chineses podem
gigantesco crescimento da ocupar e vencer Taiwan em
38
poucos dias ou semanas, americanos ultrapassassem

mesmo com a intervenção a “linha vermelha” definida
americana. Ao mesmo pelos chineses. Mas o que
tempo, sabem que sua estamos assistindo neste
derrota na batalha em torno momento são os Estados
da ilha afetaria seu poder Unidos tomando a iniciativa
naval no sul do Pacífico, e de escalar o jogo e
sua credibilidade frente a atravessar a “linha
seus aliados regionais e em vermelha” traçada pelos
todo o mundo. chineses, e o que seve
Por isso, uma análise espertar é uma resposta
objetiva das forças em chinesa cada vez mais ativa,
presença nos leva a pensar e neste contexto um
que os chineses estão com eventual “erro de cálculo”
as “pedras brancas”, numa doa norte-americanos terá
eventual partida de xadrez e consequências catastróficas
que lhes caberia fazer a para toda a Ásia. Por isto se
primeira jogada. Mas os pode dizer que neste
norte-americanos possuem momento, o mundo talvez
a “vantagem da defesa” de esteja muito mais próximo
que falava Carl von do imprevisível e de uma
Clausewitz, e só deveriam grande catástrofe em
mover suas “pedras pretas” Taiwan, do que na Ucrânia.
depois dos chineses. E
dentro desta configuração
ideal, se a China atacasse
Taiwan, teríamos uma
ordem mundial; mas senão
o fizesse, teremos uma
outra “ordem” inteiramente
diferente, e o mesmo
aconteceria caso os norte-
39
condenem, evitando assim a

possibilidade instalação do
que chamou de “uma
Por Andrés Ferrari Haines e empresa criminosa na Casa
Matheus Ibelli Bianco Branca”. Trump chamou
Pelosi de “bruxa malvada” e
“psicopata maluca”, a qual
A
pós a queda residirá no inferno após a
da URSS, os morte.
EUA
Por trás das declarações
projetaram
grotescas, reside uma
um mundo de
população que irá às
democracias. Em 2024, um
eleições em 2024 sob uma
novo presidente deverá ser
divisão que parece
eleito num contexto de
irremediável entre
enorme divisão e violência
democratas e republicanos.
crescente.
Assim, enquanto 84% dos
Recentemente, a primeiros aprovam as
democrata Nancy Pelosi, acusações contra Trump e
que presidiu a referida 67% sustentam que este
Câmara entre 2019-23, terá um julgamento justo
declarou que Donald Trump na Geórgia, apenas 16% e
não pode ser presidente 10%, respetivamente, dos
novamente: se o fosse, republicanos o acreditam.
“seria o fim dos EUA”.
Os números se invertem
Imediatamente a seguir, quando se trata das
Pelosi afirmou que as denúncias de corrupção
acusações pelas quais feitas contra o filho do atual
Trump acabava de ser preso presidente, Hunter Biden.
na Geórgia eram “lindas”. A Embora 92% dos
democrata espera haver republicanos acreditem que
grandes chances de que o o filho se beneficiou do
40
cargo de pai, apenas 14% com o parlamento. Cerca de

dos democratas pensam sete em cada dez
assim. Se Trump é o réu no estadunidenses (72%) dizem
governo Biden, o que veem o Congresso de
republicano já anunciou forma desfavorável. Esta
que é Biden quem o será em percepção é agravada pelo
um eventual retorno à fato de mais de 60% da
presidência, como havia população revelar
feito na campanha anterior. insatisfação com ambas as
Este corte partidário partes. A opinião
reflete-se em alguns desfavorável dos dois
números: 78% dos partidos passou de 6% em
republicanos têm uma visão 1994 para 27% hoje.
positiva de Trump, Durante esse período,
enquanto 88% dos 58% dos estadunidenses
democratas têm uma afirmam que as suas
negativa. No caso de Biden, condições de vida
88% dos democratas têm diminuíram, enquanto 19%
uma imagem positiva, mas afirmam que são as
ela é negativa para 91% dos mesmas; esta percepção é
republicanos. Enquanto consistente com a
72% dos republicanos percepção de 77% de sua
acham que os democratas população que acreditam
são imorais, 63% dos que vivenciam um sistema
democratas dizem o mesmo econômico que é injusto
sobre os republicanos. para a maioria da
Mas a divisão partidária população. De fato, a
tem como pano de fundo desigualdade de riqueza nas
um crescente descrédito ao últimas décadas
sistema democrático. A aprofundou-se
princípio, essa situação se acentuadamente. Desde
expressa na insatisfação 1978, o 1% mais rico do
41
país viu a sua riqueza No entanto, desde 2009,

crescer, passando a possuir a inflação aumentou. Houve
35% do total do país, picos devido à pandemia de
enquanto a metade mais Covid e como efeito da
pobre sofreu uma redução guerra na Ucrânia, estando
de um ponto percentual em nos valores mais elevados
relação aos 2,5% que das últimas quatro décadas.
possuía. A Reserva Federal, apesar
Os atuais 1% mais ricos, da queda dos salários reais,
corrigidos pela inflação, considera que o aumento
estão 527% acima do seu dos preços se deve ao
património líquido em 1976, excesso de demanda. Como
enquanto os rendimentos consequência, respondeu
dos 50% mais pobres estão aumentando a taxa de
apenas 30% acima do seu juros, afirmando que
nível em 1976. continuará nesse caminho.
Os rendimentos dos Como resultado, um

0,01% mais ricos nos EUA quarto da população
dispararam quase 600% manifesta dificuldades em
nesse período. Mas o salário fazer face às despesas
mínimo aumentou básicas de alimentação ou
nominalmente, desde 1981 habitação. Esta magnitude
até ao presente, em apenas ultrapassa 50% quando se
cinco anos. Por outro lado, trata de pessoas de baixa
entre 1970 e 2022, a renda: 10% dos domicílios
inflação acumulada foi afirmam passar fome e, em
quase o dobro do aumento 2022, 41 milhões tiveram
cumulativo do salário que recorrer ao Programa de
mínimo. Desde 2009 o Assistência Nutricional
salário mínimo não Suplementar (SNAP).
apresenta elevações. A situação não é pior
pois milhões sobrevivem
42
com crédito. O saldo devido anos. A habitação é agora

pelos estadunidenses em menos acessível do que em
cartões de crédito é superior qualquer outro momento
a um trilhão de dólares. desde a década de 1980.
Mas com os juros deste Neste marco, o futuro
empréstimo a atingirem não é visto com esperança
mais de 20% e as pelos estadunidenses: 66%
dificuldades de fazer acreditam que em 2050 a
pagamentos, os saldos dos economia estará fraca, 77%
cartões de crédito crescem acreditam que estarão mais
cada vez mais e divididos internamente e
aumentaram 45 bilhões de 81% consideram que a
dólares entre abril e junho. distância entre ricos e
Consequentemente, o pobres irá aumentar.
número de pessoas que Apenas 12% sentem-se
lutam para pagar suas confiantes no futuro do
contas está aumentando. País. 97% da população
Pela primeira vez na está preocupada com a sua
história, o número de situação económica e 71%
estadunidenses que está assustada ou zangada.
acumulam dívidas de cartão Esse contexto vem
de crédito mês a mês é agravando o estado mental
maior do que o número de da população. Mais de 70%
pessoas que pagam admitem alguma
integralmente suas contas. preocupação com a sua
As extensas dificuldades saúde física e mental – os
económicas deixaram mais números mais elevados já
de 10 milhões de pessoas registrados. Embora o
sem casas ou à beira de número de pessoas que
perdê-las: as hipotecas recorrem a um profissional
atingiram o seu valor mais de saúde mental tenha
elevado em mais de 20 duplicado desde 2004,
43
chegando a quase 25%, últimas votações

perto de 40% afirmam não presidenciais.
ter condições para fazê-lo – Num sistema
mesmo considerando seus bipartidário em que a
desconfortos. grande maioria da
A tensão existente população diz não se sentir
manifesta-se no aumento representada, a única
da violência. Os casos de sincronia em que mais de
tiroteios em massa metade dos Democratas e
continuam a aumentar, Republicanos parecem
ocorrendo agora em média a concordar é acreditar que o
cada 12 horas. Estas país é incapaz de resolver os
afetam o aumento seus principais problemas.
acentuado da taxa de
mortalidade por armas de
fogo entre crianças e
adolescentes que, com uma
média diária de 12 mortes e
32 feridos, é a mais elevada
já registrada.
Além da retórica política,
as pesquisas revelam um
país violentamente dividido.
Com a Guerra na Ucrânia
sem perspectiva de uma
resolução próxima aos
moldes pretendidos pelos
objetivos dos EUA, as
próximas eleições ainda
carregarão o peso de que o
partido perdedor questionou
o resultado das duas
44
velha proposta da
“integração carnal” com os
norte-americanos volta ser
esgrimida pelo candidato da
extrema-direita, Javier
Milei, que está liderando as
Por José Luís Fiori pesquisas eleitorais
argentinas. Uma
G
uido di Tella, recorrência trágica na
ministro das história de um país que já
Relações foi um dos mais ricos do
Exteriores do sistema internacional.
governo
Basta reler a sua
argentino de Carlos Menem
história para saber que, de
em 1991 e 1993, foi quem
1870 a 1920, Argentina
defendeu pela primeira vez
viveu um período de
e de forma mais explícita,
que a grande solução para a extraordinário crescimento
Argentina seria estabelecer econômico e expansão
“relações carnais”’ com os territorial. Em 40 anos, seu
Estados Unidos, ou seja, território mais que triplicou;
transformar-se diretamente sua população multiplicou
num vassalo ou colônia dos por cinco; sua rede
norte-americanos. A mesma ferroviária passou de 500
estratégia tentada por para 31.100 km; e seu PIB
outros caminhos pela cresceu a uma taxa média
sangrenta ditadura militar
anual de cerca de 6% (talvez
argentina entre 1975 e
a maior do mundo, no
1983, sempre com o mais
período), enquanto sua
absoluto fracasso, do ponto
renda per capita crescia a
de vista econômico. E agora
de novo, esta mesma e uma taxa média de 3,8%.
Como resultado, no início
45
do século XX, a Argentina todas as condições para se

estava entre os sete países transformar na sua
mais ricos do mundo, e sua potência hegemônica, e
renda per capita era quatro talvez, numa potência
vezes maior que a dos econômica mundial. Mas
brasileiros, e o dobro da dos não foi isto que aconteceu,
norte-americanos. sobretudo depois de 1930,
apesar de que sua economia
Nesse período, seu
tenha seguido crescendo e
crescimento econômico foi
se industrializando, e que
liderado pela exportação de
sua sociedade tenha
bens primários, mas se deu
seguido enriquecendo e
também na indústria, e
melhorando sua qualidade
contou com os
de vida. Mesmo depois da
investimentos na
Segunda Guerra Mundial, a
construção da rede
economia argentina cresceu
ferroviária que integrou o
a uma taxa média de
seu mercado nacional,
3,78%, entre 1950 e 1973; e
antes do fim do século XIX.
de 2,06%, entre 1973 e
Ao redor de 64% da sua
1998.
população trabalhava na
indústria, comércio ou setor Depois de 1930,
de serviços, e um terço dos entretanto, seu crescimento
argentinos viviam em se deu de forma cada vez
Buenos Aires, uma cidade mais instável, através de
com alto nível educacional e ciclos cada vez mais curtos
cultural. Ou seja, na altura e intensos. Raul Prebisch
da Primeira Guerra atribuiu essa inflexão às
Mundial, a Argentina era o mudanças internacionais, e
país mais rico do continente à forma como operava o
latino-americano e tinha novo “centro cíclico” da
46
economia mundial, os EUA, assinatura da Constituição

somadas à fragilidade de 1853, que criou o Estado
industrial endógena das Nacional da Argentina.
economias “primário- Mesmo contra a resistência
exportadoras”. Mais tarde, de Buenos Aires, que só se
os ortodoxos e neoliberais submeteu definitivamente
atribuíram a culpa dessa em 1862. Depois disto, a
mudança de rumo Argentina participou da
argentina às políticas Guerra do Paraguai, entre
econômicas populistas do 1864 e 1870, e logo em
governo Juan Domingos seguida o Estado argentino
Perón, apesar de que Perón iniciou suas guerras de
só tenha governado entre “Conquista do Deserto”, que
1945 e 1955, e entre 1973 e duraram toda a década de
1974. 1870. A conquista militar
do “oeste argentino”
Existe, entretanto,
permitiu a
outra maneira de olhar para
expansão/ocupação
a história da Argentina,
econômica contínua de
entre a Revolução de 25 de
novos territórios, até o fim
Maio de 1810, e a
da década de 1920.
destituição do presidente
Hipólito Yrigoyen, no dia 6 Por isso, se pode dizer
de setembro de 1930, início que o Estado “liberal”
do que os argentinos argentino nasceu de uma
chamam de sua “década guerra civil que durou meio
infame”. Depois da Guerra século e se consolidou
da Independência (1810 e através de uma estratégia
1816), a Argentina viveu expansiva de ocupação de
meio século de guerra civil novos territórios que durou
quase permanente, até a mais meio século,
47
financiada pelo sucesso do entre 1976 e 1983 optou

seu “modelo primário- pelo caminho do
exportador”. E foi ultraliberalismo, e ficou
exatamente no fim dessa marcada pela política
expansão que se instalou a econômica do seu ministro
crise política responsável Martines de Hoz, que foi
pela desorganização ministro da Economia do
periódica do Estado e pela governo ditatorial de Jorge
polarização definitiva da Videla, entre 1976 e 1981.
sociedade argentina. E após o fim da ditadura, o
governo de Carlos Menem e
Durante as ditaduras
seu ministro da Fazenda,
militares argentinas dos
Domingos Cavallo, tentaram
anos 50 e 60, seus vários
uma vez mais levar à frente
governos praticaram
uma política econômica de
políticas econômicas
dolarização e transformação
keynesianas e chegaram
ultraliberal da economia
mesmo a iniciar um
argentina. Fracassaram, e a
ambicioso programa de
cada novo fracasso destas
industrialização, idealizado
tentativas ultraliberais, a
pelo próprio Raul Prebisch.
Argentina optou de novo por
O que lhes faltou,
um projeto alternativo de
entretanto, foi uma nova
construção de um país
estratégia expansiva e de
soberano, as vezes
longo prazo, e um grupo
identificado com o
capaz de transformar a
peronismo, apesar de que
economia argentina num
fosse peronista o governo
instrumento de sua própria
ultraliberal de Carlos
acumulação de poder
Menem e Domingo Cavallo.
internacional. Depois, a
Mas este projeto alternativo
sangrenta ditadura militar
48
ao neoliberalismo nunca aceitação no grupo do

logrou ser formulado BRICS, a partir de 2014. E
plenamente, nem tampouco tudo indica que este será o
teve sucesso imediato, grande tema, e o grande
provocando um movimento ponto de clivagem, da
campanha eleitoral
de tipo pendular, como se
argentina, até o dia 22 de
fosse uma gangorra que ora
outubro. Na verdade, será a
aponta para um horizonte
primeira grande batalha
ultraliberal, ora aponta para
entre o G7, e sua “camisa
um horizonte mais de força financeira”, e a o
nacionalista, sem que novo “projeto
nenhum dos projetos tenha desenvolvimentista global”,
conseguido tirar a Argentina proposto pelo BRICS + e seu
de sua prolongada crise Banco de Desenvolvimento.
política.
E agora de novo, nas

próximas eleições de
outubro, a Argentina parece
estar repetindo seu velho
movimento pendular,
atraída uma vez mais por
uma proposta ultraliberal
cada vez mais radical. Mas
a Argentina ainda tem a
oportunidade de escolher
novo caminho diferente,
optando por uma nova
estratégia econômica, e uma
nova estratégia de inserção
internacional que lhe está
sendo oferecida pela sua
49
fatores responsáveis pela

deterioração do estado da
segurança alimentar no
mundo, nesses últimos
anos, foi a alta dos preços
Por Georges Flexor, dos alimentos.
Nelson G. Delgado e
Karina Y. Kato Como indica a figura 1,
os preços das principais
commodities agrícolas
A
pós um longo
tiveram altas expressivas
período de
entre o início da pandemia e
declínio, a
meados de 2022. Entre
insegurança
março de 2020 e junho de
alimentar
2022, as cotações da
voltou a crescer desde o
tonelada de soja dobraram
início da pandemia.
(+94,52%), assim como as
Segundo o relatório das
de milho (+107%). O índice
Nações Unidas sobre o
de preços da carne
estado da segurança
vermelha também se
alimentar e nutricional
valorizou de forma
(UNICEF, 2023), a fome
significativa (+ 37%). O
global, medida pela
valor da tonelada de arroz,
prevalência de subnutrição
uma commodity alimentar
(PoU) (Indicador ODS 2.1.1),
bem menos transacionada
ainda que tenha
nos mercados
permanecido relativamente
internacionais, subiu no
inalterada de 2021 a 2022,
primeiro ano da pandemia
está muito acima dos níveis
(+12%), mas a cotação caiu
pré-pandêmicos da COVID-
na segunda metade de
19, afetando cerca de 9,2%
2021.
da população mundial em
2022, contra 7,9% em O comportamento mais
2019. Um dos principais crítico dos preços ocorreu
50
no mercado de trigo, desencadeou uma série de

commodity fundamental na crises alimentares.
dieta de bilhões de pessoas
Figura 1 – Índices de preços
e um dos produtos agrícolas
alimentares do Fundo Monetário
mais importantes no Internacional (IMF) 2020/23
comércio internacional, cuja
oferta de exportações
depende sobremaneira da
produção russa e
ucraniana. Após ter subido
103% entre o começo da
pandemia e fevereiro de
2022, as cotações de trigo Na África, por exemplo, a
cresceram ainda mais elevação dos preços do trigo
(+27%) nos três meses e do arroz afetou muitos
seguintes ao início da paises dependentes das
invasão da Ucrania. A importações desses cereais
pandemia e a guerra como Egito, Sudão, Etiópia,
impactaram igualmente as Algéria, Nigéria, Costa do
cotações do óleo de Marfim e Marrocos. O
Girassol, uma commodity comportamento das
para a qual a produção cotações do trigo impactou
ucraniana é fundamental. também o custo de vida nos
Num contexto de crise tradicionais importadores
econômica provocada pela do Oriente Médio,
pandemia e seus efeitos desencadeando revoltas
deletérios sobre o emprego e populares como, por
os rendimentos das exemplo, no Irã em maio de
pessoas, principalmente as 2022. O aumento das
mais pobres, o curto ciclo cotações internacionais do
de preços – com uma óleo de girassol, de 174%
elevação rápida e intensa – entre março de 2020 e maio
51
de 2022, teve igualmente logísticas começaram a se

consequencias sociais recuperar e como a guerra
bastante negativas, na Ucrânia impactou os
estimulando revoltas custos de produção do trigo
decorrentes da inflação dos e do óleo de girassol.
alimentos em paises como O custo do frete
Bangladesh (dezembro de marítimo, por exemplo,
2022). A isso somou-se a cresceu 725% entre março
forte valorização da soja e de 2020 e setembro de
do milho, e seus reflexos 2021! Após ter caído
sobre os preços das significativamente até
proteínas animais, com janeiro de 2022, voltou a
consequências bastante aumentar, porém de modo
negativas sobre a segurança não tão dramático. A guerra
alimentar em quase todas na Ucrania, sobretudo,
as regiões do mundo. impactou sobremaneira os
Esse ciclo de preços preços do cloreto de
resultou, em grande parte, potássio e, em menor
de fatores afetando a oferta, medida, do fosfato. Ao
como custos logísticos e prejudicar as exportações
custos de produção. O desses insumos pela Rússia
comportamento dos índices e a Bielorrússia, segundo e
medindo o custo do frete terceiro exportadores
marítimo (Baltic Dry Index) e mundiais de potássio, a
de insumos agrícolas guerra provocou um
fundamentais como o aumento dramático dos
cloreto de potássio e o preços desses insumos. O
fosfato (figura 2) mostra índice de preços do
como a pandemia potássio, por exemplo,
desorganizou o comércio aumentou mais de 200%
mundial, como a partir do entre janeiro e novembro de
final de 2021 as condições 2022. Nesse mesmo
52
intervalo de tempo, as provável que os mercados

cotações de fosfato mundiais de commodities
cresceram 87%. estejam, dessa vez, muito
A partir de meados de mais capazes de lidar como
2022 as capacidades os estresses geopolíticos
logísticas começaram a se provocados pelo conflito na
recuperar e a oferta de Ucrânia.
exportação de insumos Figura 2 – Índices de preços do
agrícolas se reorganizou, frete marítimo e de insumos
evitando dessa forma a agrícolas
materialização de um
cenário dramático do lado
da oferta e estimulando as
cotações das commodities
agrícolas mencionadas na Para além desse
Figura 1 (com exceção do comportamento recente dos
arroz) a iniciarem um preços alimentares, importa
movimento de baixa. também destacar
temporalidades mais longas
No final de julho de
quando se pretende
2023, a decisão da Rússia
“pensar” em cenários a
de não prolongar o acordo
respeito do futuro alimentar
de liberação do comércio de
e suas implicações
grãos no Mar Negro – Black
geopolíticas. As mudanças
Sea Initiative de julho de
climáticas despontam como
2022 – gerou temores de
a maior ameaça à
que um novo ciclo
segurança alimentar
expansivo dos preços das
mundial e seus efeitos já
commodities possa voltar a
estão presentes. Parte da
se formar. Nas semanas que
recente crise alimentar foi
seguiram, no entanto, não
causada por perdas
houve sinais de que ele
agrícolas derivadas de secas
esteja em andamento. É
53
extremas – na África do segurança alimentar global.

Norte, no Oriente Médio, na Numa situação em que
África do Leste e na América melhorias rápidas da
do Norte – de intensificação segurança alimentar global
sem precedentes do calor na se tornaram mais difíceis de
Índia e nos países do Cone alcançar, porque não se
Sul ou de enchentes pode mais contar com a
devastadoras no Paquistão China para puxá-las,
e na Australia. O fato de "pensar" o futuro do
que o desvio padrão (uma contexto alimentar global é
proxy da volatilidade) dos um desafio
índices de preços multidimensional
alimentares na década considerável, onde a
passada esteja bem geopolítica mundial, as
superior àquele observado mudanças climáticas e o
na década de 1990, por comportamento das
exemplo, sinaliza que as corporações transnacionais
condições climáticas já exigem atenção particular.
estão afetando a formação
dos preços nos mercados
alimentares. O Índice
Padronizado de
Precipitação-
Evapotranspiração (SPEI)
elaborado pelo Global
Drought Monitor
(https://spei.csic.es/index.
html) sinaliza também que
as mudanças climáticas
estão criando contextos
alimentares bem mais
incertos e ameaçadores à
54
Mudança do Clima (IPCC),

em março de 2023, que
incorporam os
Por Clarice Menezes Vieira compromissos de redução
de emissões de gases do
efeito estufa declarados
P
arece ironia que
pelos países em 2021 (as
a Conferência
iNDCs, Intended Nationally
da ONU sobre o
Determined Contributions), é
Clima deste ano
“provável” que a
de 2023 (a 28ª
temperatura aumente em
Conferencias das Partes, ou
mais do que 1,5ºC até 2050
apenas COP-28) vá ocorrer
(relativamente aos valores
em Dubai, capital de um
médios pré-industriais); e
dos maiores exportadores
“dificilmente” se manterá
de combustíveis fósseis do
abaixo de 2ºC até o fim do
mundo; e que seja presidida
século. O IPCC já havia
pelo CEO da Abu Dhabi
estabelecido em 2ºC o limite
National Oil Company, a
para que fossem evitadas as
estatal petrolífera dos
consequências mais
Emirados Árabes Unidos
dramáticas das mudanças
(EAU). Pesa sobre ela não
climáticas. Com este
apenas o acúmulo de
cenário, portanto, além da
ocorrências climáticas
frequência e da intensidade
extremas quase diárias,
dos eventos extremos
mas também a notícia, em
continuarem aumentando
julho, do recorde para a
(enchentes, ampliação do
mais alta temperatura
volume de chuvas,
registrada na Terra.
estiagens prolongadas,
Segundo os cálculos do incêndios florestais,
último relatório lançado intensificação de ciclones,
pelo Painel entre outros), diversos
Intergovernamental sobre
55
pontos de inflexão (os mas que só seria

climate tippings points – formalmente implementado
CTPs, ou seja, situações a em 2005, é um claro
partir das quais as exemplo de como a pauta
mudanças climáticas ambiental esteve submetida
tornam-se irreversíveis) às disputas geopolíticas e
serão atingidos, incluindo o geoeconômicas
derretimento das calotas internacionais. O que
polares da Groelândia e da parece inevitável, dado que
Antártida. o tema esbarra em um dos
Se os prognósticos elementos nevrálgicos
ambientais são alarmantes, daquelas disputas, ou seja,
o histórico das conquistas a matriz energética. A
obtidas no âmbito das dinâmica das negociações
Conferências do Clima em nas COPs, portanto, tendeu
mais de três décadas de a reproduzir em linhas
negociações só piora este gerais a evolução dos
quadro. De fato, a grandes conflitos
(in)capacidade da ONU em internacionais.
obter resultados concretos A partir de fins da
no tema do meio ambiente primeira década do século
se assemelha ao padrão que XXI, quando a ordem
a Organização obteve ao interacional começa a se
longo de sua história, ou transformar, tanto por
seja, esses só foram conta das disputas
possíveis quando os EUA e envolvendo EUA, China e
as demais potências Rússia, como em função do
acordaram previamente os surgimento das chamadas
termos dos acordos. “potências médias” e de
De fato, o imbróglio novos blocos regionais, a
envolvendo o Protocolo de complexidade da agenda
Kyoto, firmado em 1992, ambiental vem se
56
amplificando, enquanto Na última Conferência, a

diminuem as possibilidades COP-27 realizada em 2022
de acordos no âmbito das no Egito, os países menos
COPs dado que suas desenvolvidos deram um
deliberações necessitam de passo além, tentando
consenso. pautar separadamente o
Desde a instituição do tema das perdas e danos,
arcabouço climático pós- pois este aponta com ainda
Kyoto, com o Acordo de mais clareza para a
Paris de 2015, os países transferência de recursos
menos desenvolvidos vêm dos países ricos através da
pressionando para que seja criação de fundos para
pautado de forma mais indenizações e
contundente o tema da compensações, e, por sua
adaptação, especialmente vez, para o delicado assunto
os mecanismos de das reparações históricas. A
financiamento e de Conferência aprovou a
transferência de tecnologia criação de um novo fundo,
necessários para que porém todas as decisões
possam lidar com as relativas às suas regras,
consequências do inclusive quem realizará os
aquecimento global. A partir aportes, foram adiadas para
do caráter regional da a COP-28 deste ano.
adaptação (frente ao caráter Como se já não
global da mitigação), o tema bastassem todas estas
desloca a agenda ambiental dificuldades, a Guerra da
para as questões da pobreza Ucrânia, e a crise energética
e da desigualdade, por ela disparada,
especialmente considerando engrossaram ainda mais o
a desproporção dos efeitos caldo das pressões
das mudanças climáticas colocadas sobre a questão
entre países pobres e ricos. ambiental. O aumento dos
57
preços do petróleo e dos que Emirado Árabes, Irã,

lucros das supermajors Arábia Saudita (a maior
(ExxonMobil, Chevron, BP, fornecedora de petróleo
Shell e Total) levou ao para a China), Egito, Etiópia
anúncio, no segundo e Argentina ingressaram no
semestre de 2023, da BRICS; e que a Síria foi
ampliação de seus incluída na Liga Árabe e
investimentos em convidada para participar
exploração e da da Conferência. Não por
concomitante diminuição acaso, portanto, ela vem
dos compromissos de sendo chamada de “COP do
redução na produção de petróleo”. A proposta de
petróleo. Estima-se que a eliminação gradual do uso
indústria de combustíveis de combustíveis fósseis,
fósseis seja responsável por portanto, que chegou a ser
75% das emissões apoiada por 80 países na
responsáveis pelo efeito COP-27, e que não foi
estufa; e que somente a incluída por ação do Grupo
manutenção da Árabe, da Rússia e da
infraestrutura atual de China, parece excluída de
exploração eliminaria qualquer horizonte de
qualquer possibilidade de possibilidades.
evitar aumentos superiores Enquanto os
a 1,5ºC, exceto se a estes economistas seguem
fossem incorporados tentando convencer CEOs e
sistemas efetivos de captura governos da rentabilidade
de carbono. dos investimentos verdes,
Além de sediada nos John Kerry, enviado
EAU e de presidida por um especial do clima dos EUA,
representante da indústria procura convencer o mundo
de petróleo, a COP-28 de que as políticas públicas
acontece no mesmo ano em conduzidas pelo governo
58
Biden, assim como as

mudanças legislativas
aprovadas no mandato de
Biden, são caminhos
possíveis para reverter o
aquecimento global, cujos
efeitos resistirão ao Por Maria Claudia Vater
eventual retorno do Partido
Republicando ao poder.
N
Mas, como nenhum o último mês
compromisso foi obtido em vem sendo
sua recente visita à China, e destaque, na
como a produção de imprensa e na
petróleo segue batendo mídia social, a
recordes históricos, estas reunião do G20 de 2023,
apostas são, para dizer o realizada nos dias 9 e 10 de
mínimo, bastante setembro em Nova Delhi,
improváveis. conquanto esvaziada pela
ausência dos presidentes da
China e da Rússia. Esse
encontro parece ter se
transformado num espaço
de posicionamento dos
países da “nova maioria
global” em relação aos
países do “ocidente anglo-
europeu”. Os primeiros,
mais preocupados com
temas mais propositivos e
estruturais do sistema
interestatal capitalista,
como a questão do clima, da
desigualdade, da fome e da
59
saúde internacional, praticado de forma oficial

enquanto os últimos mais em inúmeros países da
direcionados em Ásia, da África e de outras
conseguirem apoio para a partes do mundo, incluindo
guerra da vez. vários países pertencentes
ao que hoje se chama de
Neste sentido, chama
“ocidente reduzido”, o
atenção que a Organização
espaço preferencial da
Mundial da Saúde tenha
biomedicina baseada em
realizado, nos dias 17 e 18
evidências que nasceu junto
de agosto, na cidade de
com a “modernidade
Gandhinagar, Gujarat,
europeia”.
Índia, a “Primeira Cimeira
Global da Medicina No relatório de 2019, do
Tradicional (MT)”, em universo de 194 Estados-
paralelo à reunião dos membros da OMS, 170
ministros de Saúde, entre (87,6%) declararam utilizar
as reuniões preparatórias medicina tradicional. Entre
do G 20. Participaram desta estes países, 113
reunião o diretor-geral e os reportaram a prática de
diretores regionais da OMS, acupuntura; 110, de ervas
os ministros da Saúde do medicinais; e 109, de
G20 e convidados de alto medicina tradicional
nível de países das seis indígena. A homeopatia e a
regiões da OMS. medicina tradicional
Participaram também chinesa são utilizadas em
cientistas, profissionais de 100 Estados-membros; a
saúde e membros de medicina Unani, por 82
organizações da sociedade países; e a medicina
civil. Ayurveda, em mais de 90, o
mesmo número declarado
O programa de medicina
para a naturopatia,
tradicional da OMS
quiroprática e osteopatia.
começou em 1976 e hoje é
60
Por fim, a biodiversidade tradicional, identificando

e o conhecimento indígena tendências outrora difíceis
foram considerados pilares de serem explicadas pela
fundamentais da medicina biomedicina. “A medicina
tradicional, da saúde e do tradicional pode
bem-estar, especialmente desempenhar um papel
para os povos indígenas, importante e catalisador na
reconhecendo-se que 80% consecução do objetivo da
da biodiversidade cobertura universal de
remanescente no mundo saúde e no cumprimento
estão em territórios ou das metas globais
terras indígenas, enquanto relacionadas com a saúde
a conservação da [...]”,(*) disse o Dr. Tedros
biodiversidade é uma Adhanom Ghebreyesus,
questão fundamental diretor geral da OMS. Ao
relacionada com o uso mesmo tempo, “este avanço
sustentável de da ciência na medicina
medicamentos tradicionais. tradicional deve obedecer
aos mesmos padrões
As discussões giraram
rigorosos que em outras
em torno às contribuições
áreas da saúde. Isto pode
do conhecimento indígena e
exigir um novo pensamento
da medicina tradicional
sobre as metodologias para
para o bem-estar das
abordar estas abordagens
sociedades e economias
mais holísticas e
atuais. Analisou-se a forma
contextuais e fornecer
como a inteligência artificial
evidências que sejam
(IA) revolucionou o estudo e
suficientemente conclusivas
a prática dos sistemas de
e robustas para levar a
cura tradicionais e permitiu
recomendações políticas”,(*)
aos investigadores
segundo o Dr. John Reeder,
explorarem o extenso
diretor do Programa
conhecimento médico
61
Especial da OMS para que, durante demasiado

Pesquisa e Treinamento em tempo, separou diferentes
Doenças Tropicais e Diretor abordagens de medicina e
do Departamento de saúde.” [...] e iremos
Pesquisa em Saúde. colaborar ainda mais para
encontrar formas ideais de
A reunião dessa Primeira
colocar a medicina
Cimeira explorou a
tradicional, complementar e
investigação e a avaliação
integrativa sob a égide dos
da medicina tradicional,
cuidados de saúde
incluindo metodologias que
primários e da cobertura
podem ser utilizadas para
universal de saúde. [...]
desenvolver uma agenda de
Reiteramos como é crucial
investigação global e
obter melhores evidências
prioridades, bem como
sobre a eficácia, segurança
desafios e oportunidades
e qualidade da medicina
baseados em 25 anos de
tradicional e complementar.
investigação em medicina
Isso significa metodologias
tradicional. O objetivo é
inovadoras para avaliar e
promover revisões
avaliar resultados”.(*)
sistemáticas da medicina
tradicional e da saúde, A reunião da OMS
mapas de evidências de permitiu também explorar
eficácia clínica e um mapa as tendências regionais e
de investigação global de discutir as melhores
inteligência artificial sobre a práticas, destacando a
medicina tradicional. implementação do capítulo
26 sobre medicina
Hans Kluge, diretor
tradicional na mais recente
regional da OMS para a
Classificação Internacional
Europa, destacou no seu
de Doenças, a CID-11,
discurso de encerramento,
publicada em fevereiro de
que “Juntos, abalamos
2022.
suavemente o status quo
62
Atualmente, a OMS está recursos e direitos locais.

desenvolvendo o próximo Os resultados apoiarão o
módulo do capítulo da desenvolvimento de uma
medicina tradicional, que nova estratégia de medicina
incluirá termos de tradicional 2025-2034,
diagnóstico dos sistemas de solicitada pelos Estados-
medicina Ayurveda, Unani e membros na Assembleia
Siddha. Mundial da Saúde, em maio
de 2023.
Em 2022, com o apoio
do governo da Índia, a OMS A presidência indiana do
criou o Centro Global de G20 deu um grande
Medicina Tradicional da destaque ao fato de que o
OMS, em resposta ao primeiro-ministro e o
crescente interesse e governo da Índia tenham
procura globais por apoiado a criação desse
medicina tradicional Centro Global de Medicina
baseada em evidências. É o Tradicional da OMS em
primeiro e único centro Jamnagar, Gujarat, Índia,
global da OMS dedicado à como um bem global. Trata-
medicina tradicional com o se de um movimento
objetivo de trabalhar em indiano que coincide com a
parcerias, estabelecer ampliação recente do grupo
evidências e dados, orientar do BRICS, que incorporou
o uso sustentável da seis novos países-membros
biodiversidade e estimular a na sua última reunião de
inovação para otimizar a Joanesburgo. E também,
contribuição da medicina junto com esses países, as
tradicional na cobertura tradicionais culturais e
universal de saúde e no civilizatórias não europeias
desenvolvimento – egípcia, persa, etíope e
sustentável, guiado pelo árabe – ao lado das
respeito pelas heranças, civilizações chinesa e
63
indiana, que já faziam parte medicinais que estiveram

do mesmo grupo. colocadas na sombra nos
últimos três séculos de
Isso é motivo suficiente
hegemonia mundial de
para que se possa pensar
origem europeia.
que os Estados nacionais
que ascenderam na nova
ordem mundial já estão
(*) Disponível em
solicitando passagem para https://www.who.int/news/item/1
suas racionalidades 0-08-2023-who-convenes-first-
terapêuticas, numa visão high-level-global-summit-on-
traditional-medicine-to-explore-
multipolar do que seja
evidence-base--opportunities-to-
saúde e bem-estar para accelerate-health-for-all)
todos, muito além da
categoria de análise
“doença”, conceito
estruturante do programa
de pesquisa científica
proposto pelos anglo-
europeus no século XIX –
também conhecido como o
século britânico.
Numa clave simbólica, é

como se, em Gujarat,
estado de nascimento de
Gandhi e onde aconteceu a
Dandi Satyagraha, ou a
Marcha do Sal, a OMS
estivesse, nesse momento,
anunciando ao planeta a
passagem de um movimento
global de afirmação de
formas e práticas
64
compareceu à cúpula de
líderes desde seu início, em
2008. Alguns explicaram a
ausência de Xi Jinping por
certas tensões entre a
China e a Índia, devido às
Por Andres Ferrari e José Luís Fiori disputas fronteiriças que
resultaram em um breve
conflito entre suas tropas
em 2020, e pela recente
N
a recente
cúpula do G20 publicação, na China, de
na Índia não um mapa que reivindica
estiveram todo o seu território em
presentes os disputa. No entanto, a
líderes máximos da China China participou da recente
nem da Rússia. E não há cúpula virtual, organizada
dúvida de que essa pela Índia, da Organização
ausência colocou em de Cooperação de Xangai,
questão os limites de um na qual seus Estados-
grupo que vai sendo membros "acordaram os
esvaziado pelo aumento da contornos da ordem
intensidade dos conflitos mundial emergente". As
que dividem seus membros mesmas postura e relação
neste momento. E a prova que mantiveram a Índia e a
mais palpável desta perda China – uma visão que
de legitimidade e de eficácia continuou dias atrás
foi sua declaração final, durante a reunião dos
anódina e sem BRICS+ na África do Sul,
compromissos reais entre onde Xi Jinping e Narendra
seus participantes. Modi, o primeiro-ministro
da Índia, se encontraram
Foi a primeira vez que
separadamente para
um presidente chinês não
65
discutir e acordar a que os países deliberem

declaração final desse sobre questões econômicas
evento. Assim, apesar dos e financeiras globais, e não
conflitos bilaterais, ambos é um fórum para questões
os países parecem geopolíticas, ao contrário da
compartilhar a visão de posição defendida pelos
colaborar na formação de Estados Unidos e pelo G7.
uma nova ordem global
Nessa reunião, e pela
diferente da ocidental.
primeira vez, a Índia refere-
Portanto, a despeito das se a si mesmo nos
inúmeras tentativas de criar documentos oficiais desta
fissuras e atritos entre os reunião como Bharat –
membros da “nova maioria expressão contemplada no
global”, todos os primeiro artigo de sua
movimentos dos dois países Constituição, de 1950, e
sugerem que, em última que é a designação para a
instância, Índia e China Índia em algumas línguas
compartilham uma mesma do país, como o sânscrito.
visão crítica a respeito da Embora não tenha havido
“ordem baseada em explicações oficiais a
normas” criada e tutelada respeito, não há a menor
pelas potências euro- dúvida de que esta foi uma
americanas. É esta posição forma – talvez a mais
crítica que explica que, radical e “ghandiana” – de
apesar das pressões, os dois romper seus últimos laços
países asiáticos tenham se com a Grã-Bretanha, sua
mantido firmes em não antiga potência colonial.
conceder um convite ao Fontes próximas ao governo
líder ucraniano Volodymyr afirmaram explicitamente
Zelensky para a Cúpula do que este foi um movimento
G20. A Índia argumentou a favor de uma designação
que o G20 foi criado para não colonial, em contraste
66
com o nome "Índia", como principais objetivos

vinculado ao Império para o G20. A Índia já se
Britânico. Além das posicionou assim em
disputas internas, mediante janeiro, quando convocou
a nova nomenclatura, a quase 125 países em
Índia quer sugerir que desenvolvimento para a
superou a mentalidade Cúpula da Voz do Sul
colonial e agora se Global, para discutir a
posiciona como um dos questão da falta de
grandes líderes da nova alimentos. Também
ordem internacional que concordou com os demais
está sendo proposta e membros dos BRICS+ na
desenhada declaração de
progressivamente pela Johannesburgo II, ao
“nova maioria global”. expressar preocupação com
as medidas restritivas ao
O primeiro-ministro
comércio que são
Modi enfatizou o
incompatíveis com as
crescimento inclusivo como
normas da OMC, incluindo
uma das prioridades da
medidas unilaterais ilegais,
presidência do G20 do país.
como as sanções que
Apresentou o modelo
afetam o comércio agrícola –
“Sabka Saath Sabka Vikas”,
esta última frase
que significa
diretamente dirigida às
“desenvolvimento para
sanções contra a Rússia
todos”, afirmando que
devido à Ucrânia.
"independentemente do
tamanho do PIB, cada voz A Índia, juntamente com
importa". Por isso, ele o Brasil, é uma das vozes
afirma ter colocado as mais críticas da velha
preocupações do “Sul ordem tutelada pelos países
Global” – escassez de do chamado “ocidente
alimentos e fertilizantes – restrito”, que priorizam a
67
transição energética por vínculos militares e

questões climáticas em estratégicos muito sólidos,
detrimento da questão da que a Índia vem
“desigualdade” e das preservando a despeito de
necessidades mais urgentes todas as pressões e
dos países pobres. Ambos vantagens que vêm sendo
os países também alertam oferecidas insistentemente
para o fato de que as pelos Estados Unidos. Além
antigas potências ocidentais disso, a Índia aumentou
não têm cumprido os significativamente suas
compromissos assumidos. importações russas,
sobretudo de petróleo, após
Não apenas a China se
as sanções impostas à
manifestou de forma
Rússia por um grupo de 40
semelhante repetidamente,
países liderados pelos
mas a Rússia, cujo
Estados Unidos, quase
presidente Putin foi o outro
todos pertencentes ao velho
grande ausente no G20. O
eixo euro-americano. Por
ministro das Relações
tudo isso, é muito difícil
Exteriores russo, Lavrov,
imaginar que a Índia rompa
declarou no encontro dos
com a Rússia, a despeito de
BRICS que "as promessas
que sua movimentação
ocidentais de ajudar os
estratégica não se restrinja
países africanos – no valor
a suas alianças e acordos
de 10 bilhões de dólares por
asiáticos.
ano – simplesmente foram
esquecidas, no contexto da O ministro das Relações
generosa ajuda ocidental a Exteriores da Rússia,
Kiev”. Sergey Lavrov, colocou o
“dedo na ferida” que
Deve-se lembrar aqui a
esvaziou a reunião de Nova
importância histórica e
Delhi, ao falar do desejo dos
econômica da Rússia para a
euro-americanos de
Índia: os dois países têm
68
"ucranizar" a reunião de uma verdadeira guerra

Nova Dehli, buscando econômica dos Estados
inserir o tema da Ucrânia Unidos contra a China, e
em cada questão – inclusive por um enfrentamento
na Declaração final – algo militar direto da OTAN com
que a Rússia não aceitaria. a Rússia. Está chegando ao
Os líderes ocidentais fim o multilateralismo
acreditavam na ocidental, sacramentado
possibilidade de isolar os pela afirmação do
russos e de pressioná-los, a presidente Lula, numa
fim de aceitarem incluir a entrevista paralela à
questão da Ucrânia, mas reunião do G20, de que
isto não aconteceu: a receberia no Brasil o
Rússia não só não foi presidente Putin,
isolada como conseguiu desconhecendo ordem do
fazer prevalecer sua Tribunal Internacional
oposição na declaração final criado pelos euro-
da reunião. O resultado americanos.
desse complexo embate
diplomático foi uma
declaração branda, para
dizer o mínimo, que não
condenou a conduta de
Moscou nem se rendeu à
pressão euro-americana,
mas reiterou o princípio da
integralidade territorial das
nações.
Esse “consenso mínimo”

logrado na cúpula do G20 é
o retrato fiel de um mundo
dividido e fragmentado por
69
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O conteúdo dos artigos é de responsabilidade exclusiva do(s)

autor(es) dos mesmos, não refletindo necessariamente a
opinião institucional do Observatório Internacional do
Século XXI nem de seus editores, ou de qualquer outro
autor.

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OBSERVATÓRIO

COLABORADORES DESTE NÚMERO

A DESORDEM MUNDIAL E A POLARIZAÇÃO

BRICS + E A NOVA A BATALHA ARGENTINA

A CRISE ALEMÃ E O O MUNDO MULTIPOLAR

a China, que deu alguns

menos agressiva, frente à quando a Rússia e a China

continente eurasiano. Como do Sul, deverão aumentar

soma positiva entre todos os contínua pelo “poder

devem resistir e podem ser internacional, o terá que

novos sócios o grupo do intensificação da compe-

alguns dos países entre os países-membros do

relação à perda de peso grupo diplomático ou

África, mas também com a

e do seu sistema CIPS de Durante os anos

mundial da globalização. mais de mais de US$ 2

Numerosas nações depositados no sistema

pagamento por exportações. outra moeda nacional passe

dívida pública dos EUA, e

comunicação e think tanks este ano: 12 milhões na

com cerca de 25% de sua últimas décadas, o setor

eixo da contradição Krugman para quem o

investimentos no país Golfo do México. O

beneficiou (em detrimento

Não mais. Na conclusão Moscou-Pequim” passa a

“semi”, parcial, a hegemonia pelos norte-americanos)

europeus, como a Itália. A O que dizer do futuro

de suas forças para a Ásia, Kundnami pergunta se,

produzida por centrais

ocidental, parece disfarce para uma ocupação

fracasso da Operação de Niamei, e outra no centro

medida, o conflito na fortalecimento

e eventualmente, a país com proporções

nesse caso, os Estados

provocado pelo crescimento tentasse retomar à força

confirmando a tese de que é vigorou uma espécie de

maior investidor economia chinesa, a

poucos dias ou semanas, americanos ultrapassassem

condenem, evitando assim a

cargo de pai, apenas 14% com o parlamento. Cerca de

país viu a sua riqueza No entanto, desde 2009,

Os rendimentos dos Como resultado, um

com crédito. O saldo devido anos. A habitação é agora

chegando a quase 25%, últimas votações

do século XX, a Argentina todas as condições para se

economia mundial, os EUA, assinatura da Constituição

financiada pelo sucesso do entre 1976 e 1983 optou

ao neoliberalismo nunca aceitação no grupo do

E agora de novo, nas

fatores responsáveis pela

no mercado de trigo, desencadeou uma série de

de 2022, teve igualmente logísticas começaram a se

intervalo de tempo, as provável que os mercados

extremas – na África do segurança alimentar global.

Mudança do Clima (IPCC),

pontos de inflexão (os mas que só seria

amplificando, enquanto Na última Conferência, a

preços do petróleo e dos que Emirado Árabes, Irã,

Biden, assim como as

saúde internacional, praticado de forma oficial

Por fim, a biodiversidade tradicional, identificando

Especial da OMS para que, durante demasiado

Atualmente, a OMS está recursos e direitos locais.

indiana, que já faziam parte medicinais que estiveram