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Psicologia Social II – ano 2021

ALUNA: RAÍSSA EDUARDA ALVES MOREIRA

Analise a música: “Fim de semana no parque” , de Racionais MC’s para responder as


seguintes questões:

1 – Cite quatro demandas psicossociais desta comunidade.

- Falta de incentivo financeiro no lazer da comunidade, bem como os recursos para as


crianças

- Facilidade do acesso das crianças e jovens às armas e às drogas

- Alcoolismo

- Violência e morte de jovens

2 – Utilizando como base os textos e aulas sobre Psicologia Social Comunitária,


explique qual seria o foco do trabalho do profissional da Psicologia nesta
comunidade.

Martín-Baró, em "O papel do psicólogo", extrai o conceito de conscientização da obra


de Paulo Freire para delimitar o "quefazer" na práxis do psicólogo, e aponta:

"O processo de conscientização supõe três aspectos:

a. o ser humano transforma-se ao modificar sua realidade. Trata-se, por conseguinte, de


um processo dialético, um processo ativo que, pedagogicamente, não pode acontecer
através da imposição, mas somente através do diálogo.

b. Mediante a gradual decodificação do seu mundo, a pessoa capta os mecanismos que a


oprimem e desumanizam, com o que se derruba a consciência que mistifica essa
situação como natural e se lhe abre o horizonte para novas possibilidades de ação. Esta
consciência crítica ante a realidade circundante e ante os outros traz assim a
possibilidade de uma nova práxis que, por sua vez, possibilita novas formas de
consciência.

c. O novo saber da pessoa sobre sua realidade circundante a leva a um novo saber sobre
si mesma e sobre sua identidade social. A pessoa começa a se descobrir em seu domínio
sobre a natureza, em sua ação transformadora das coisas, em seu papel ativo nas
relações com os demais. Tudo isso lhe permite não só descobrir as raízes do que é, mas
também o horizonte do que pode chegar a ser. Assim, a recuperação de sua memória
histórica oferece a base para uma determinação mais autônoma do seu futuro.

A conscientização não consiste, portanto, em uma simples mudança de opinião sobre a


realidade, em uma mudança da subjetividade individual que deixe intacta a situação
objetiva; a conscientização supõe uma mudança das pessoas no processo de mudar sua
relação com o meio ambiente e, sobretudo, com os demais."

O psicólogo social conceitua em sua obra o termo "fatalismo", que diz respeito a um
sistema ideológico originado das estruturas sociopolíticas e favorecedor das classes
dominantes. Ele se enraíza na estrutura psíquica dos indivíduos das comunidades e os
induz à aceitação de sua realidade social. A ideia fatalista faz com que acontecimentos
sociais se tornem fenômenos naturais sem quase nenhuma possibilidade de mudança.
Ele é prejudicial pois leva o sujeito a crer que não pode ser transformador da própria
história.

Portanto, a ruptura do fatalismo se pautaria principalmente na modificação da relação


indivíduo-sociedade, necessariamente implicando em alterações das condições reais da
vida social dos indivíduos. O processo é dialético.

Ignácio Martín-Baró (1998) definiu orientações para a ação na Psicologia Social da


Libertação, e tais orientações serviram de práticas norteadoras e importantes também
para a Psicologia Social Comunitária. São elas: o replanejamento de sua bagagem
teórica (que é em suma pautada na psicologia social tradicional) e o fortalecimento das
instâncias populares. Ele definiu algumas tarefas como urgentes na práxis da Psicologia
da Libertação:

a) a desideologização da experiência cotidiana, que implica no processo de


conscientização citado acima;

b) a recuperação da memória histórica dos povos, que age diretamente no movimento de


ruptura do fatalismo;

c) o estudo sistemático das formas de consciência popular;

d) a potencialização das virtudes populares;

e) e a análise das organizações populares como instrumento de libertação histórica.

Feito esse apanhado teórico embasado na obra de Martín-Baró (que posteriormente teve
contribuição de diversos outros teóricos da psicologia social), e guiando-se pelos
“princípios norteadores e respectivas categorias conceituais para formar a práxis em
Psicologia Social Comunitária” postulados por Maria de Fátima Quintal de Freitas
(2015), pode-se começar a pensar agora mais claramente no foco do trabalho do
psicólogo e na intervenção e ação prática na comunidade introduzida na canção "Fim de
Semana no Parque" dos Racionais MC’s.
A começar pelas demandas psicossociais da comunidade, que envolvem problemas
como: a facilidade do acesso das crianças e jovens às drogas e bebidas, a falta de
estrutura e investimento no lazer, e a violência e morte dos jovens da periferia.

Para intervir, primeiramente o psicólogo deve entender como se dão a construção da


vida cotidiana da comunidade, suas relações pessoais e sociais, e as influências do meio.
Então, para elaborar uma práxis, é necessário integrar equipes multiprofissionais de
trabalho multidisciplinar e coletivo, que saibam trabalhar em grupo e atender às
demandas considerando as necessidades dos agentes internos e as problemáticas
envolvidas. Os profissionais devem se dedicar para que haja o processo de
conscientização, e que ele seja derivado da relação de reciprocidade e colaboração entre
eles, os agentes externos, e os agentes internos. A comunidade tem voz própria e seus
sujeitos são membros ativos, com capacidade de tomar e executar suas próprias decisões
e, por isso, devem ser incluídos no processo de construção do conhecimento e de ação
comunitária (Montero, 2004 como citado em Ansara & Dantas, 2010, p.99).

Não se pode deixar de citar a indispensabilidade do caráter pedagógico da formação e


politização no cotidiano, que diz respeito aos processos de participação e
conscientização, como também a construção participativa que seja composta por
relações horizontais, dialógicas e partícipes. Por fim, Freitas (2015) destaca a
temporalidade do trabalho e sua continuidade que dependem diretamente dos resultados
da avaliação que a comunidade faz. Dependendo do impacto sentidos pela comunidade,
e do grau de importância, o trabalho pode ou não continuar. Nesses resultados poderá
(ou não) se verificar a coerência e a horizontalidade na relação entre a comunidade e os
profissionais.

A comunidade que os Racionais MC’s trazem em “Fim de semana no parque” precisa


que o foco do trabalho do psicólogo não seja apenas em conseguir recursos que
melhorem o lazer da comunidade, e nem que se prenda no paternalismo e
assistencialismo (Freitas, 2015). O foco desse trabalho precisa ir além dos limites que
existem no imaginário do senso comum, além da cultura de se adentrar na periferia e
praticar “atos de caridade”, que substancialmente nada mudam, apenas causam
constrangimento e o sentimento de que as pessoas que estão sendo ajudadas falharam
em seus projetos de vida. Chamo a atenção para a necessidade do psicólogo e da
psicóloga não usarem de seus conhecimentos para se sentirem numa posição autoritária
de seres totalmente conscientes e livres de equívocos, pois não o são.
3 – Elabore uma proposta de trabalho, na perspectiva da Psicologia Social
Comunitária, para atender 1 demanda desta comunidade.

A grande problemática presente em se pensar em uma proposta de trabalho para atender


às demandas psicossociais, é a de que o psicólogo social não intervém diretamente nos
mecanismos socioeconômicos e nas relações de poder (Sawaia, 2014), então de que
outra maneira poderia solucioná-las? De fato, sozinho o psicólogo não é capaz de
alcançar a transformação social, mas não significa que ele não possa criar redes de
apoio, grupos de pessoas de dentro e de fora da comunidade, de diferentes áreas
interessadas na mudança de realidade e emancipação social dos sujeitos, dos agentes
internos dessa comunidade.

Tomando a falta de incentivo ao lazer na comunidade como a demanda a ser atendida,


uma proposta de trabalho que pode ser executada é a de melhoria do centro comunitário
(no caso da música, que cita um centro que é um “fracasso”).

Para realizar isso, criar uma rede de apoio envolvendo profissionais e estudantes de
psicologia, serviço social, educação física, músicos, artesãs, professores e pedagogos.
Iniciando projetos de pesquisas com esse objetivo e ofertando estágios não remunerados
nessas áreas como incentivo aos alunos e oportunidade de experiência de campo para os
profissionais. Melhorar a estrutura do centro com mutirões que envolvam também os
membros da comunidade, com pintura e revitalização de quadra esportiva e parquinho
(ou a construção deles, caso não existam). Dentro da proposta também está a de
convocar ongs que trabalhem com esse foco e possam auxiliar nesses projetos
comunitários.

A psicóloga social Silvia Lane (1996) em uma entrevista à revista Psicologia &
Sociedade, deu essa fala sobre psicologia comunitária e nos leva a seguinte reflexão:

SILVIA: Estou me lembrando do núcleo de psicologia comunitária, de um grupinho de meninas


de famílias tradicionais se chocando horrivelmente ao entrar em contato com a pobreza de
Osasco, a favela em Osasco e em outros lugares. Foi um conflito de valores violento. Então elas
me perguntaram: "mas, afinal, então todo psicólogo tem que ir para a periferia, trabalhar na
periferia?" Eu não tive dúvida: "gente, o que eu estou fazendo dentro dessa sala de aula? Eu não
estou na periferia, eu estou trabalhando com vocês!, classe média alta, então, o que é que eu
estou fazendo? Que significa isso?" O mal-estar das meninas desse grupo era o choque de
valores. Estavam se deparando coma diferença de valores em classes sociais diversas e era muito
natural pararem para pensar um pouquinho. Por que esta diferença de valores? Havia um aluno
que chegava e dizia "bom, Sílvia, então você está propondo a revolução?" Respondia: "Não.
Estou propondo que cada um reflita sobre a realidade que está vivendo - o seu dia-a-dia, o que é
o país, o que é o Brasil, o que nós somos, o que é história - e opte por uma ação política que ache
que deve optar. Se a grande maioria decidir por uma revolução, a revolução vai acontecer. Se a
grande maioria decidir pela não revolução, a revolução não vai acontecer. E é por aí que nós
vamos..."
Finalizando minha resposta para a questão, é uma proposta que envolve um número
considerável de pessoas e possíveis barreiras no caminho, mas não é impossível de ser
executada.
4 - Escolha 3 (três) pressupostos da Psicologia Sócio-Histórica e explique,
relacionando com o conteúdo da música.

- Existe condição humana: o homem constrói as formas de satisfação de suas


necessidades e faz isso com outros homens. A ideia de condição humana leva à
concepção sócio-histórica do homem. Na música esse pressuposto é bem representado
pelos versos em que os Racionais MC’s cantam do cotidiano da periferia: “Na periferia
a alegria é igual / É quase meio-dia a euforia é geral / É lá que moram meus irmãos,
meus amigos / E a maioria por aqui se parece comigo / E eu também sou o bam, bam,
bam e o que manda / O pessoal desde às 10 da manhã está no samba...”

- O homem é um ser ativo, social e histórico: a relação do homem com a natureza e com
os outros homens, conforme pratica suas atividades é o que constitui o ser humano. A
atividade sobre esse mundo é um processo histórico e constante, e a relação com os
outros é um processo social. Na música isso se verifica nos versos em que ele fala das
pessoas da sua comunidade e seu fim de semana dada sua realidade: “Automaticamente
eu imagino / A molecada lá da área como é que tá/ Provavelmente correndo pra lá e pra
cá / Jogando bola descalços nas ruas de terra / É, brincam do jeito que dá”

- O homem concreto é objeto da Psicologia: ela deve compreender o indivíduo inserido


na sociedade, no caso da música, inserido na realidade da comunidade da periferia, e
não isoladamente. Na psicologia sócio-histórica o individual e o social não se separam,
e o indivíduo só pode ser realmente compreendido singularmente se estiver inserido na
totalidade social e histórica, que determina e dá sentido a ele. Não se pode analisar ou
entender qualquer sujeito da comunidade sem levar essa instância social em
consideração.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FREITAS, Maria de Fatima Quintal de. (2015). Práxis e formação em Psicologia Social
Comunitária: exigências e desafios ético-políticos. Estudos de Psicologia (Campinas),
32(3), 521-532. https://doi.org/10.1590/0103-166X2015000300017
Ansara, S. & Dantas, B. S. A. (2010). Intervenções psicossociais na comunidade:
desafios e práticas. Psicologia & Sociedade, 22(1), 95-103.

Quintal, M. (2016). Desafios atuais e antigas sutilezas nas práticas da psicologia social
comunitária. Psicología, Conocimiento y Sociedad, 6(1), 131-163. Recuperado de
http://revista.psico.edu.uy/index.php/revpsicologia

Sawaia, Bader Burihan. (2014). Transformação social: um objeto pertinente à psicologia


social?. Psicologia & Sociedade, 26(spe2), 4-17. https://doi.org/10.1590/S0102-
71822014000600002
Martín-Baró, Ignácio. (1997). O papel do Psicólogo. Estudos de Psicologia (Natal),
2(1), 7-27. https://doi.org/10.1590/S1413-294X1997000100002

Lane, S. T. M. (1996b). Parar para pensar e depois fazer. Entrevista. Psicologia &
Sociedade. São Paulo, 8(1), 3-15.

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