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18/03/24, 12:49 Antônio Sales Campos: Tio Beu

Antônio Sales Campos: Tio Beu


JOSÉ SOLON SALES E SILVA / 25 AGOSTO 2020

José Solon Sales e Silva

Titular da Cadeira nº 34

ANTÔNIO SALES CAMPOS: TIO BÉU

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Cresci ouvindo minha mãe falar carinhosamente do tio Béu. Em minha infância sabia que ele era tio

paterno da minha mãe, portanto meu tio avô. Já maior ouvia minha tia Beatriz, irmã de minha mãe, dizer que
tio Béu era homem de letras, bem situado, amigo do governador e que depois migrou para São Paulo.

Trata-se do poeta parnasiano, conhecido no mundo das letras como Sales Campos. Antônio Sales

Campos, filho do Dr. Francisco de Sales Ribeiro Campos e Dona Ana Ribeiro Cordeiro de Sales Campos,
tamborilenses com ascendência familiar nos colonizadores e sesmeiros do alto Acaraú, Capitão Luiz Vieira de

Souza (2º) casado com D. Ana Alves Feitosa fundadores da fazenda Tamboril. Sales Campos nasceu em

Tamboril em 24 de junho de 1894. O casal Francisco de Sales e Ana tiveram os seguintes filhos: José Acrísio
de Sales Campos nascido em 24/01/1883; Maria Luiza de Sales Campos; João Jacques de Sales Campos;

Antônio de Sales Campos e Joaquim Altino de Sales Campos. Tio Béu era o quarto de cinco irmãos e meu avô

o filho primogênito do casal.

O Tenente Coronel José Felipe Ribeiro Campos e sua mulher Raimunda Francisca de Vasconcelos,

mandaram o pai de Sales Campos estudar Direito em Olinda, assim Francisco de Sales Ribeiro Campos, após
retornar do Pernambuco, foi ser Juiz de Direito em Santa Quitéria e depois em outras cidades do Ceará. Dr.
Francisco de Sales repetiu o mesmo com o filho Antônio só que este veio estudar em Fortaleza, na Faculdade

de Direito do Ceará, que foi instaurada em 1903. Sales Campos chegou à capital do Ceará por volta de 1912,
tendo sido colega de turma de Henriqueta Galeno, Dolor Barreira e Leonardo Mota. Foi contemporâneo de
Manuel Antônio de Andrade Furtado, também poeta, professor e ensaísta. Os quatro integraram a Academia
Cearense de Letras.

Tio Béu foi contemporâneo na Academia Cearense de Letras, na reformulação de 1922, de Adonias Lima,

Alba Valdez (Maria Rodrigues Peixe), Alfredo de Miranda Castro, Álvaro Gurgel de Alencar, Andrade Furtado,
Antonino da Cunha Fontenele, Antônio Ferreira dos Santos, Antônio Luís Drumond da Costa, Antônio Sales,
Antônio Teodorico da Costa Filho, Antônio Tomás, Beni Carvalho, Carlos Câmara, Francisco Prado, Guilherme

Studart (barão de Studart), João Augusto da Frota, José Carlos de Matos Peixoto, José Costa Matos, José da
Cruz Filho, José Francisco Jorge de Souza, José Lino da Justa, José Sombra Filho, Júlio de Matos Ibiapina,
Júlio Maciel, Justiniano de Serpa, Leonardo Mota, Manuel Fernandes Távora, Manuel Leiria de Andrade, João

Otávio Lobo, Papi Junior, Quintino Cunha, Raimundo Leopoldo Coelho de Arruda, Raimundo Francisco Ribeiro,
Rodolfo Teófilo, Sebastião Moreira de Azevedo, Soares Bulcão, Tomás Pompeu de Sousa Brasil (2º) e Tomás
Pompeu Sobrinho.

O Decreto Estadual Nº 1.375 de 15 de setembro de 1916, criou a Inspetoria Geral de Instrução Pública,

predecessora da atual Secretária de Educação do Estado do Ceará. A Inspetoria foi criada com o objetivo da
inspeção do ensino primário do Ceará. Justiniano José de Serpa foi Presidente do Ceará (cargo hoje
equivalente a governador) no período de 12 de julho de 1920 a 12 de julho de 1923, tendo deixado o governo

para tratamento de saúde no Rio de Janeiro onde foi realizar uma cirurgia da qual veio a falecer em 01 de
agosto do mesmo ano. Justiniano era governador no momento da reformulação da Academia Cearense de

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Letras, em 1922, fato este ocorrido em 17 de julho, no próprio Palácio da Luz, hoje sede da Academia. No seu
governo Justiniano convida Antônio Sales Campos para ocupar a função de diretor da Instrução Pública. Neste

período, Sales Campos elaborou a coletânea “A Poesia Cearense no Centenário”, obra solicitada por Justiniano
de Serpa, em comemoração ao centenário da independência brasileira. O livro foi impresso na Tipografia
Moderna - F. Carneiro - Rua Barão do Rio Branco, 130, com duzentas e noventa e duas páginas. Nesta obra o

autor fez a seguinte dedicatória: "Ao Dr. Justiniano de Serpa, egrégio presidente do Estado, sob cujos auspícios
foi publicado este livro". Na coletânea, que de acordo com Raimundo Girão “foi muito apreciada”, Sales Campos
incluiu versos de Antônio Sales, pe. Antônio Tomás, Alf. Castro, Antônio de Castro, Antônio Furtado, Beni

Carvalho, Cruz Filho, Clóvis Monteiro, Carlos Gondim, Epifânio Leite, Irineu Filho, José Albano, Júlio Maciel,
Juvenal Galeno, Leão de Vasconcelos, Mário Linhares, Otacílio de Azevedo, Quintino Cunha, Rodolfo Teófilo,
Rodrigues de Andrade, Soares Bulcão, Sabóia Ribeiro e obviamente também os seus versos.

Em 22 de março de 1924 na Praça Filgueira de Melo, em frente a Escola Normal que comemorava seu

quadragésimo aniversário de fundação, inaugurava-se uma herma a Justiniano de Serpa, escultura criado pelo
escultor carioca Correia Lima. Nesta solenidade que contou com a presença do presidente Ildefonso Albano, o
orador oficial da referida inauguração seria Antônio Sales que não pode comparecer por motivo de saúde.

Antônio Sales escolhe o amigo Sales Campos para ler o discurso em seu nome. Antônio Sales era amigo e
compadre de Justiniano de Serpa.

Outro amigo do tio Béu foi Carlos Torres Câmara que sempre o convidava para os saraus na Escola de
Aprendizes Artífices que neste período funcionava no antigo prédio do Batalhão de Segurança, vizinho ao
Teatro José de Alencar. Carlos Câmara, contemporâneo de faculdade de Sales Campos intensificou o aspecto

cultural na Escola e ali realizava os saraus contando com declamações de poesias e outras atividades
artísticas/culturais.

Fato curioso é que Sales Campos conviveu com os confrades e dentre eles Antonino Fontenelle, um dos
fundadores da Faculdade de Direito do Ceará e que fora seu professor naquele curso. Anos depois um contra

parente de tio Béu casa-se com uma das filhas do Prof. Antonino. Maria Barreira Fontenelle e Silva casou-se
José de Arimatéia Farias e Silva, na Igreja do Rosário, em Fortaleza, em 27 de agosto de 1943. Arimatéia era

contra parente de Sales Campos, pois era um dos filhos de uma de suas concunhadas, Maria das Dores Araújo

Farias e Silva, conhecida pelo hipocorístico de Dolores, todos eles tamborilenses.

Outro recanto frequentado por Sales Campos na Fortaleza dos anos 20 foi o Salão Juvenal Galeno,
fundado pelo próprio Juvenal em 27 de setembro de 1919. Tio Béu foi colega de faculdade de Henriqueta

Galeno, que a pedido do pai desistiu da carreira jurídica para dedicar-se a ele. Sua presença era constante nos

saraus promovidos por Henriqueta a quem sempre prestigiou. Em 1936 o Salão transformou-se em Casa de
Juvenal Galeno e sempre foi um espaço onde a cultura cearense é prestigiada.

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Fortaleza dos anos 20 contou com uma vida cultural intensa, uma destas atividades era o Grêmio

Dramático Familiar fundado por seu amigo Carlos Câmara em 1918. Funcionando no Boulevard Visconde do
Rio Branco, bairro do Joaquim Távora, ficava na periferia da cidade de Fortaleza que contava com não mais de

100.000 habitantes. Sales Campos prestigiava as peças montadas pelo Grêmio Dramático Familiar de Carlos

Câmara nas imediações de onde hoje é o Colégio das Dorotéias ou Faculdade Mauricio de Nassau.

Outro contemporâneo da Faculdade de Direito foi o ipuense Abílio Martins nascido em Ipu em 21 de

novembro de 1883, nove anos mais velho que tio Béu. Abílio Martins ingressou inicialmente na Faculdade de

Medicina do Rio de Janeiro, desistindo do curso e retornando ao Ceará, foi estudar direito. Voltou a conviver
mais amiúde com Sales Campos durante o governo de Justiniano de Serpa quando foi Chefe de Polícia entre

1920 e 1923. Abílio era um repentista, humorista e poeta. Morreu prematuramente aos 40 anos e teve sua

produção poética reunida postumamente por Antônio Sales, de quem também foi amigo, no livro “Versos
Alegres” impresso em 1950.

No final dos anos 20 migra para São Paulo e dedica-se totalmente ao magistério ensinando no Colégio

Universitário, aonde ministrava literatura brasileira, Liceu Rio Branco e Colégio Estadual Franklin Delano

Roosevelt assim como na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, predecessora da Universidade de São
Paulo, USP.

De acordo com Raimundo Girão (1984) atuou de forma efetiva nos meios intelectuais cearenses como

autor de inúmeros versos publicados em revistas e jornais. No entanto travou uma polêmica acirrada com o

diretor de um dos jornais da cidade. Diante deste fato achou melhor mudar-se para São Paulo, aonde pudesse,
sem maiores consequências, continuar sua produção literária aliada ao magistério.

O Liceu Rio Branco foi fundado pelo Prof. Savério Cristófaro em 1925 como escola preparatória aos

exames de admissão. Além de Savério compunha o grupo fundador Antônio de Sampaio Dória, Roldão Lopes

de Barros, Almeida Júnior, Manoel Bergstrom Lourenço Filho, dentre outros. Em 1926 passa a denominar-se
Liceu Nacional Rio Branco e é considerado até hoje um dos melhores e mais tradicionais colégios de São

Paulo. O Prof. Lourenço Filho é nomeado diretor da Instrução Pública do Ceará em substituição a Sales

Campos. Veio ao Ceará para implantar a escolanovista no estado. Provavelmente em Fortaleza conheceu Sales
Campos e o convidou, quando este já estava em São Paulo, no final da década de 20 para ensinar no Liceu Rio

Branco de vez que Lourenço Filho era membro do Conselho Deliberativo da Sociedade Lyceu Nacional Rio

Branco. Foi Diretor deste estabelecimento de ensino, o que comprova sua competência e capacidade na área
educacional. Esta escola, em seus primeiros dez anos abrigou os filhos de boa parcela da elite política e

econômica da cidade de São Paulo.

Outra instituição de ensino onde tio Béu exerceu o magistério foi o Colégio Estadual Franklin Delano

Roosevelt. Criado por meio da Lei Nª 88 de 18 de setembro de 1892, do estado de São Paulo e instalado em
1894, ano de nascimento de Sales Campos. Em 1943 transforma-se em Colégio do Estado da Capital para, em

1945 denominar-se Colégio Estadual Franklin Delano Roosevelt. Posteriormente, em 1956, passa a denominar-

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se Colégio Estadual de São Paulo. Supõe-se que Sales Campos passou a ensinar nesta instituição
provavelmente após a 2ª grande guerra, pois, conforme José Murilo Martins em sua obra “Academia Cearense

de Letras: história e acadêmicos” de 2013, utiliza a nomenclatura desta escola como Colégio Estadual Franklin

Delano Roosevelt.

No âmbito do ensino superior foi livre docente de Literatura Brasileira na Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras de São Paulo. Esta Instituição de Ensino Superior foi criada em 1934. Logo após sua criação surge a

Universidade de São Paulo a partir da união desta Faculdade com as já existentes Escola Politécnica de São

Paulo, Escola Superior de Arquitetura Luiz de Queiroz, Faculdade de Medicina, Faculdade de Farmácia e
Odontologia e Faculdade de Direito. Na USP foi professor do curso de Letras pois sua produção bibliográfica

centrou no português e na literatura na área de poesia.

De acordo com a crítica literária tio Béu, estreou na poética ainda muito jovem. Aos 25 anos lança seu

primeiro livro “Alameda do Sonho”, em 1919, em Fortaleza, com 112 páginas. Antônio Sales, seu confrade da
Academia, quando do lançamento desta obra teceu as seguintes considerações: “Pelo feitio geral de seus

versos, Sales Campos, como todos os novos, é um parnasiano: todos usam a opa da mesma confraria da

Forma, naturalmente porque continuam a pensar que a Forma prima a ideia, como os alemães pensam que a
Força prima o Direito. [...] A música e a doçura são qualidades características dos versos do poeta cearense, [...]

porém em algumas composições do livro a espontaneidade é como que sacrificada pela preferência do autor

às rimas difíceis.”

Ainda sobre a temática da literatura escreveu “Origens e Evolução dos Temas da Primeira Geração de

Poetas Românticos”, pela Gráfica Paulista, São Paulo, 1945, com 318 páginas. Este livro surge da sua tese de

livre docência, na USP, realizada em 1945 que de acordo com a Profa. Gilda Neves da Silva Bittencourt, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul: “Ainda no âmbito universitário, data de 1945 o aparecimento da

primeira tese em Literatura Comparada, realizada por Antônio de Salles Campos, que estudou as origens e a

evolução dos temas da primeira geração de poetas românticos brasileiros.” Portanto, Sales Campos trouxe
grande contribuição ao ensino da literatura no Brasil tendo defendido como tese, assunto inédito no campo da

Literatura Comparada no país.

Em sua atuação como professor de língua portuguesa nos colégios de São Paulo, teve grande produção

literária editando e reeditando livros didáticos nesta área. O primeiro veio a lume em 1949, “Português Colegial
1ª Série” pela Editora Melhoramentos, de São Paulo. Um ano depois é publicado “Português Colegial” também

pela Melhoramentos. Outra edição desta obra é lançada em 1957. Já em 1960 a Melhoramentos publica

“Português Colegial 2ª Série”. Em 1961, a mesma editora lança “Português Colegial 1ª Série do Ciclo Colegial”.
Por fim, em 1962 é publicado outra edição de “Português Colegial”. Raimundo Girão informa em revista da

Academia Cearense de Letras de 1984, que existem mais dois livros didáticos de Sales Campos, “História da

Literatura Portuguesa” e “História da Literatura Brasileira” embora não se tenham encontrado registros destas
obras.

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Durante o Governo de Raul Barbosa, no Ceará, (1951/1954) inauguraram-se a 17 de fevereiro de 1952 a


Escolas Reunidas Sales Campos. Era secretário da educação e saúde o Dr. José Valdemar de Alcântara e Silva.

Este governo presta justa homenagem a Antônio Sales Campos, apondo seu nome a este educandário de

ensino. Já na gestão do Governador Stênio Gomes da Silva em 06 de novembro de 1954 a escola é elevada à
categoria de Grupo Escolar Sales Campos e passa a funcionar na Rua Jacinto de Matos, 730, Jacarecanga,

Fortaleza, endereço onde encontra-se até os dias de hoje. Com a reforma do ensino passa a ser Escola de
Ensino Fundamental e Médio Sales Campos.

Em casa se dizia que tio Béu gostava de compartilhar das ideias dos outros, sendo um homem sensível e

eminentemente prático e que também era um sonhador, mas dono de profunda honestidade. Mamãe também
dizia que ele era um homem dotado de grande inteligência.

À guisa de conclusão segue um dos poemas de seu livro de estreia:

SINFONIA

Na serpentina liana a minh 'alma se enreda;

Em vão me exauro, em vão anseio, em vão prossigo ...

Como hei-de penetrar essa estranha “Alameda”,

Se tu, criatura ideal, tu não vieres comigo?

Não me deixes seguir, a sós, de queda em queda,

Vendo em todo sarçal a traição e o perigo!

Vem! Tudo aqui te espera: O vento, que segreda,

A fresca alfombra, o fulvo sol, o luar amigo!...

Essa bela região me é por demais ingrata:

Em cada canto medra, à sombra, a mancenilha

Cada corola oculta o veneno, que mata.

Mas tudo há-de sorrir ao teu perfil risonho!

E, a este sidério luar, que em teus olhos rebrilha,

Penetremos, cantando, a Alameda do Sonho.

FONTE: CAMPOS, Antônio Sales. ALAMEDA DO SONHO. Fortaleza: 1919, p. 14.

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