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Anais do V Seminário do Grupo de Pesquisa

Federalismo e Políticas Educacionais –


XI Encontro Estadual da Anpae – ES

SISTEMA NACIONAL DE
EDUCAÇÃO
DESIGUALDADES,
TERRITÓRIOS E DEMOCRACIA
(Publicação Eletrônica)

ISSN 2595-7481
Set. 2022
FICHA CATALOGRÁFICA

Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)


(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)

Seminário do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas


Educacionais - (5.: 2022: Vitória, ES)
S471a Anais do V Seminário do Grupo de Pesquisa Federalismo e
Políticas Educacionais - XI Encontro Estadual da ANPAE Seção Espírito
Santo: Sistema Nacional de Educação, desigualdades, territórios e
democracia [recurso eletrônico] / Gilda Cardoso de Araújo (organização)...
[et al.]. - Dados eletrônicos. - Vitória, ES: Associação Nacional de Política
e Administração da Educação–ANPAE, 2022.

ISSN: 2595-7481X
1. Educação e Estado. 2. Federalismo. 3. Políticas públicas –
Educação. I. Araújo, Gilda Cardoso de. II. Título.

CDU: 37.014.5

Elaborado por Clóvis José Ribeiro Júnior – CRB-6 ES-000383/O


ORGANIZAÇÃO DO EVENTO

ORGANIZADORES (Anais)
Gilda Cardoso de Araujo,
Rosenery Pimentel do Nascimento,
Lorrainy Ferrari,
Lilian Marques Freguete,
Gilvanna Carolina Ferreira Dalapicola

Adriana Sperandio
Ana Maria Ramos Pacheco
Carina Copatti
Deborah Gomes Moura
Eduardo Augusto Moscon de Oliveira
Fontele de Lima Junior
Franciely Lima
Gilda Cardoso Araujo
Itamar Mendes da silva
Júlia de Moraes Remydio
Lilian Marques Freguete
Lorrainy Ferrari
Maria da Graça Lobino
Michele Pazolini
Neide Cesar Vargas
Nicoly de Souza Moura
Patricia Luzorio Marques da Silva
Pedro Paulo Pimenta
Rodrigo Rodrigues
Rosenery Pimentel do Nascimento
Tatiana Peterle
Tatiana Silveira
Thaciana Lopes de Almeida
Thalia Campos de Oliveira

CONTATO
Endereço
Campus Goiabeiras – UFES, Centro de Educação de Educação Av. Fernando Ferrari, 514 – Goiabeiras, CEP: 29075-073, Vitória - ES/Brasil
E-mail do Grupo Federalismo E-mail da Anpae -ES
federalismo.ufes@gmail.com anpae.es@gmail.com
Site: www.federalismo.ufes.br
COMITÊ CIENTÍFICO
Coordenação:
Prof.ª Dra. Rosenery Pimentel do Nascimento – UFES
Prof. Dr. Eduardo Augusto Moscon de Oliveira – UFES

Pareceristas Ad Hoc
Profa. Dra. Alexsandra dos Santos Oliveira – UFF
Profa. Dra. Caroline Falco Fernandes Valpassos – UFES/LAGEBES
Profa. Dra. Daniela Patti do Amaral – UFRJ
Profa. Dra. Dulcinéa Campos Silva - UFES
Profa. Dra. Emilia Peixoto Vieira – UESC
Prof. Dr. Itamar Mendes da Silva – UFES
Prof. Dr. João Ferreira de Oliveira – UFG/GO
Profa. Dra. Liege Coutinho Goulart Dornellas – UNIPAC/GV
Profa. Dra. Luciene Martins de Oliveira Matos – FACELI/ES
Prof. Dr. Marcelo Siqueira Maia Vinagre Mocarzel – UFF
Profa. Dra. Maria da Graça Lobino – IFES/ES
Profa. Dra. Marlene de Fátima Cararo – UFES
Profa. Dra. Neide Cesar Vargas – UFES
Profa. Dra. Renata Duarte Simões – UFES
Prof. Dr. Rodrigo Ferreira Rodrigues – IFES/ES
Profa. Dra. Rosenery Pimentel do Nascimento – UFES/LAGEBES
Profa. Dra. Theresa Adrião – UNICAMP
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO..................................................................................................................... 9

EIXO 1 – Federalismo, políticas educacionais e financiamento .............................................. 12

A LEI 14.113/2020 E A INSERÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL NOS


CACS-FUNDEB ESTADUAIS .......................................................................................... 13
PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO: DOCUMENTO NORTEADOR DO
PLANEJAMENTO EDUCACIONAL NA ESFERA MUNICIPAL ......................................... 18
CAQ E EDUCAÇÃO ESPECIAL:A CONSTRUÇÃO DE PARÂMETROS PARA UMA
EDUCAÇÃO DE QUALIDADE ......................................................................................... 23
REVERBERAÇÕES DO CURRÍCULO DO “PROGRAMA ESCOLA VIVA” (2015-2019) NO
NOVO CURRÍCULO DO ENSINO BÁSICO DA REDE ESTADUAL DE EDUCAÇÃO DO
ESPÍRITO SANTO. FEDERALISMO EDUCACIONAL EM ANÁLISE. .............................. 27
FEDERALISMO E POLÍTICAS PÚBLICAS LOCAIS: A EXPERIÊNCIA DO ESPÍRITO
SANTO NO CUMPRIMENTO DA SEXTA META DO PNE ............................................... 31
A EXPERIÊNCIA MUNICIPAL NA DISCUSSÃO SOBRE QUALIDADE, JUSTIÇA E
EQUIDADE-OBSERVATÓRIO DO CUSTO ALUNO QUALIDADE DE VITÓRIA .............. 36
O PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE CACHOEIRO DE
ITAPEMIRIM: UM OLHAR SOBRE A EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA ................. 41
EVASÃO E POLÍTICAS DE PERMANÊNCIA ESCOLAR NO ENSINO MÉDIO TÉCNICO
INTEGRADO: PROBLEMATIZANDO A QUESTÃO. ........................................................ 46
SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO: A FALA AMAZÔNICA EM UMA DISCUSSÃO DE
DISPUTA TEÓRICO-POLÍTICA ....................................................................................... 51
A OFERTA DA EDUCAÇÃO BÁSICA NOS MUNICÍPIOS DE IBITIRAMA E MUNIZ
FREIRE, ESTADO DO ESPÍRITO SANTO: ESCOLA, ALUNOS E PROFESSORES ....... 57
A EDUCAÇÃO ESCOLAR EM TEMPO INTEGRAL NO MUNICÍPIO DA SERRA/ ES,
2015-2019 ........................................................................................................................ 62
A CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO E A MOBILIZAÇÃO PARA A
CONSTITUIÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ......................................... 67
A ALFABETIZAÇÃO FUNCIONAL COMO PROJETO DESENVOLVIMENTISTA DA
UNESCO PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE: O CASO BRASILEIRO (1945-2000)
......................................................................................................................................... 72
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA): CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL DA EJA
NOS MUNICÍPIOS DE ECOPORANGA E PONTO BELO, NO ESTADO DO ESPÍRITO
SANTO, NO PERÍODO DE 2010 A 2020 ......................................................................... 77
FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE
CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM: UM OLHAR PARA A ESCOLARIZAÇÃO DOS SURDOS
......................................................................................................................................... 82
EIXO 2 – Federalismo e gestão democrática da educação (Básica e Superior) ....................... 87

O FEDERALISMO EDUCACIONAL DOS EUA E DO BRASIL NO CONTEXTO DA CRISE


PANDÊMICA DA COVID-19............................................................................................. 89
PNE (2014-2024) E A GESTÃO DEMOCRÁTICA NA EDUCAÇÃO: (DES)CONSTRUÇÃO
DA META 19 EM TEMPOS DE CRISES .......................................................................... 94
PROPOSTA DE ORGANIZAÇÃO DO ANO LETIVO 2022 DA SECRETARIA MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO DE VITÓRIA-ES: FRAGILIDADE DA GESTÃO DEMOCRÁTICA .......... 99
ASSEMBLEIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DA SERRA/ES (AMED) - INSTÂNCIA DE
PARTICIPAÇÃO COLETIVA .......................................................................................... 104
GESTÃO ESCOLAR E EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA PÚBLICA: UMA
EXPERIÊNCIA COM O PROJETO TAMPINHA DO BEM .............................................. 108
A CRISE NA DEMOCRACIA BRASILEIRA E SUAS REPERCUSSÕES PARA A GESTÃO
DEMOCRÁTICA............................................................................................................. 118
GESTÃO DO SISTEMA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO: INFORMATIZAÇÃO DO ENSINO E
DA ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR NO ESPÍRITO SANTO ............................................. 122
EIXO 3 – Federalismo, regime de colaboração e organização da educação básica ............... 127

PLANO DE AÇÃO ESTRATÉGICO DA ESCOLA MUNICIPAL FAZENDO ARTE PARA O


RETORNO DAS AULAS NÃO PRESENCIAIS ............................................................... 128
IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA DE GESTÃO ESCOLAR (SGE) NAS PRÁTICAS
ORGANIZATIVAS DAS ESCOLAS DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE VILA
VELHA/ES ..................................................................................................................... 132
CONSELHOS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO E ARRANJO FEDERATIVO BRASILEIRO:
PERTINÊNCIA E CONEXÕES ....................................................................................... 137
FEDERALISMO COOPERATIVO NA AMAZÔNIA: REFLEXÕES DO LEVANTAMENTO
BIBLIOGRÁFICO. .......................................................................................................... 141
ENSINO MÉDIO E OBRIGATORIEDADE ESCOLAR: DIÁLOGOS ACERCA DA
IMPLEMENTAÇÃO DA META 3 DO PNE 2014-2024 .................................................... 146
SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO E REGIME DE COLABORAÇÃO: DISCUSSÕES
EM PAUTA ..................................................................................................................... 152
EIXO 4 – Federalismo, políticas curriculares e de avaliação ................................................. 157

REFORMAS CURRICULARES E AS POLÍTICAS DE AVALIAÇÃO: DESAFIOS À


EDUCAÇÃO ESCOLAR NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO ...................................... 158
DELINEAMENTOS E DESCONSTRUÇÕES NA BASE NACIONAL COMUM
CURRICULAR ................................................................................................................ 163
MOVIMENTOS CURRICULARES E PANDEMIA DA COVID-19: DIÁLOGOS POSSÍVEIS
ENTRE O PRESCRITO E O VIVIDO.............................................................................. 168
ARTICULAÇÃO INTERGOVERNAMENTAL E CORRESPONDÊNCIA ÀS LEGISLAÇÕES
NACIONAIS: UMA PROPOSTA DECOLONIAL SOBRE A TRAJETÓRIA DA MULHER
NEGRA .......................................................................................................................... 173
SENTIDOS ATRIBUÍDOS À AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO
INFANTIL EM CONTEXTOS EMPOBRECIDOS ............................................................ 178
UM ESTUDO COMPARADO ENTRE EXAMES ESTANDARDIZADOS DOS ESTADOS
DO ESPÍRITO SANTO E DA BAJA CALIFÓRNIA: DIFERENÇAS E APROXIMAÇÕES
ENTRE PAEBES E EXEIMS-BC .................................................................................... 183
EXAMES ESTANDARDIZADOS ESTADUAIS PARA O ENSINO MÉDIO: UMA ANÁLISE
DO PAEBES E DO EXEIMS-BC .................................................................................... 188
CURRÍCULOS MUTATIS MUTANDIS E O ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA COVID-19
....................................................................................................................................... 193
O “NOVO ENSINO MÉDIO”: O QUE PENSAM OS DISCENTES? ................................. 199
DESAFIOS E POSSIBILIDADES NA FORMAÇÃO DOS GESTORES PÚBLICOS DE
EDUCAÇÃO ESPECIAL NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO ...................................... 204
EIXO 5 – Federalismo, modalidades de ensino e práticas pedagógicas (Educação Especial,
Educação do Campo, Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional, Educação à
distância)................................................................................................................................. 209

INCLUSÃO DE ALUNOS PÚBLICO-ALVO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NOS ANOS


FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: REDES DE COLABORAÇÃO ENTRE
PROFESSORES DO ENSINO COMUM ........................................................................ 210
PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E INCLUSÃO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA
INTELECTUAL NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL ............................... 215
EDUCAÇÃO ESPECIAL NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: DIÁLOGOS SOBRE PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS INCLUSIVAS EM SALAS MULTISSERIADAS .................................... 220
FORMAÇÃO CONTINUADA NA/DA ESCOLA NA EDUCAÇÃO INFANTIL E A INCLUSÃO
DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIAS ............................................................................ 225
ESCOLARIZAÇÃO NO SISTEMA PRISIONAL, CIDADANIA E POBREZA: DIÁLOGOS
COM ALUNOS DO CENTRO DE DETENÇÃO PROVISÓRIA DE SERRA-ES............... 230
EDUCAÇÃO BILÍNGUE DE SURDOS: ANÁLISE DA NOVA MODALIDADE DE ENSINO
NO CONTEXTO DA LDB ............................................................................................... 235
IMPLICAÇÕES DA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA
PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR NO ESPÍRITO SANTO .............................. 240
JUVENTUDE E EDUCAÇÃO ESCOLARIZADA: MOVIMENTOS CULTURAIS EM
CONTEXTOS EMPOBRECIDOS ................................................................................... 245
EIXO 6 – Federalismo, democracia e disputas entre o público e o privado........................... 250

ATUAÇÃO DE MOVIMENTOS EMPRESARIAIS NA AGENDA EDUCACIONAL: O


SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM REGIME DE COLABORAÇÃO .................. 256
A PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA NA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE
CARIACICA-ES: MAPEAMENTO DOS ATORES PRIVADOS NO PERÍODO 2012 - 2022
....................................................................................................................................... 262
O ENSINO DE FILOSOFIA POLÍTICA A PARTIR DO PENSAMENTO DE ERNESTO
LACLAU E CHANTAL MOUFFE .................................................................................... 268
COOPERAÇÃO E COLABORAÇÃO FEDERATIVAS EM TERRITÓRIOS DA BAHIA: O
CONSÓRCIO PÚBLICO INTERMUNICIPAL COMO ARRANJO DE GESTÃO DA
EDUCAÇÃO ................................................................................................................... 273
EIXO 7 – Federalismo, formação, valorização e trabalho dos profissionais da educação ..... 279

OS IMPACTOS DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTAGIÁRIOS DA PREFEITURA DE VITÓRIA


NO ÂMBITO DAS POLÌTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES INSTITUÍDAS PELA
SEME ............................................................................................................................. 280
VALORIZAÇÃO OU (DES)VALORIZAÇÃO? O PROCESSO DE INFLEXÃO DA POLÍTICA
DE VALORIZAÇÃO DOCENTE...................................................................................... 286
LEI DE BONIFICAÇÃO POR DESEMPENHO DA SECRETARIA MUNICIPAL DE
VITÓRIA: POSICIONAMENTO DO CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO ............ 291
IGUALDADE E DIFERENÇA A ESCOLA COMO CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADE ..... 296
FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM ESPAÇOS FORMATIVOS,
REFLEXIVOS E COLABORATIVOS: RELATOS DE EXPERIÊNCIA DE UMA PRÁTICA
NO SISTEMA DE ENSINO DE VITÓRIA........................................................................ 301
9

APRESENTAÇÃO
O V Seminário do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais e o XI
Encontro Estadual da Anpae, ocorreu no período de 19 a 22 de setembro de 2022, no formato
online, sendo transmitido pela plataforma do YouTube no canal do Grupo de Pesquisa
Federalismo e Políticas Educacionais, e também pelo Facebook na página da seção Estadual da
Anpae – ES. O evento teve como tema: “Sistema Nacional de Educação: Desigualdades,
Territórios e Democracia”.

Na ocasião buscou-se refletir sobre a expectativa de aprovação da regulamentação do Sistema


Nacional de Educação (SNE), tendo em vista o apensamento do Projeto de Lei Complementar
(PLP) 25/19 à versão aprovada pelo Senado do (PLP) 235/19, e que tramita na Câmara dos
Deputados para a revisão.

Tal discussão é de fulcral relevância, considerando-se as históricas disputas conceituais e


políticas acerca da instituição do SNE e da articulação federativa para a oferta da educação
pública. Torna-se, portanto, necessário o debate sobre a consolidação da cooperação federativa
prescrita na Constituição Federal e a definição de padrões de qualidade numa perspectiva de
justiça social e equidade, pautadas nos princípios da gestão democrática, o que propiciará o
fortalecimento dos espaços e instâncias de participação e controle social, aspectos centrais na
instituição de um SNE.

Nesse sentido, torna-se fundamental o aprimoramento dos mecanismos de financiamento,


capacitando os entes a garantir insumos necessários para a concretização de uma educação
socialmente referenciada.

Destaca-se que, em sendo aprovado o PLP 235/19, estados, Distrito Federal e municípios terão
até dois anos para aprovar as normativas locais. Em tal cenário, a já consolidada parceria com
a Associação Nacional de Política e Administração – Seção Espírito Santo (ANPAE-ES)
somará forças para o enfrentamento dos desafios que se avolumarão para as redes e sistemas de
ensino, assim como para as unidades escolares do Estado do Espírito Santo, com fins de
universalizar o acesso à educação básica e erradicar o analfabetismo.

O V Seminário do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais e o XI


Encontro Estadual da Anpae, alcançou ampla participação e abrangência nacional,
destacando-se pela contiguidade de suas edições e pela relevância dos temas abordados no
10

campo do federalismo, da educação e das políticas educacionais. O evento contou com a


participação de estudantes da graduação e pós-graduação, pesquisadores/as, professores/as da
Educação Básica e do Ensino Superior, gestores/as de instituições escolares, dirigentes e
técnicos dos sistemas educacionais e profissionais da educação. Tal diversidade e
multiplicidade enriqueceu o debate, as análises e a socialização dos estudos, pesquisas e relatos
de experiências no campo educacional.

A produção dos anais foi organizada com a aprovação dos 58 trabalhos aprovados pelo Comitê
Científico, apresentados nas comunicações orais e sistematizados no formato de resumo
expandido, a partir dos eixos temáticos indicados na programação do evento, quais sejam:

EIXO 1 – Federalismo, políticas educacionais e financiamento

EIXO 2 – Federalismo e gestão democrática da educação (Básica e Superior)

EIXO 3 – Federalismo, regime de colaboração e organização da educação básica

EIXO 4 – Federalismo, políticas curriculares e de avaliação

EIXO 5 – Federalismo, modalidades de ensino e práticas pedagógicas (Educação Especial,


Educação do Campo, Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional, Educação à
distância)

EIXO 6 – Federalismo, democracia e disputas entre o público e o privado

EIXO 7 – Federalismo, formação, valorização e trabalho dos profissionais da educação

A comissão organizadora do evento, ressalta que os conteúdos e concepções apresentados nos


trabalhos são de inteira responsabilidade de seus autores, em relação ao caráter acadêmico e
ético da pesquisa.

A programação oportunizou relevantes debates, momentos de reverência e homenagens e


profícuas contribuições dos nossos professores convidados. Tivemos a oportunidade de
manifestar o nosso tributo à Professora e grande intelectual Dra. Lisete Arelaro, que nos deixou
em março de 2022, apresentando em nossa abertura a produção de um vídeo - homenagem com
uma síntese de sua biografia, o relato de ex-orientandos e ainda as pungentes palavras de sua
filha Camila Arelaro. Esse foi um momento singelo em que buscou-se expressar admiração e
reconhecimento pelo legado deixado pela professora Lisete na sua trajetória de luta em defesa
da democracia e da educação pública.
11

As reflexões e análises proferidas pelos professores Dr. Daniel Cara (USP) e Dr. Fernando
Abrúcio sobre: “Federalismo, Sistema Nacional de Educação: Desigualdades, Territórios e
Democracia”, desenharam um panorama do atual pacto federativo, e das demandas pela
instituição do SNE, destacando os desafios surgidos com as recentes rupturas relativas à
democracia, assim como o desmonte das políticas públicas e a ampliação das desigualdades
sociais e educacionais.

O encerramento do nosso evento contou com a participação do professor emérito Vitor Paro da
(USP), que ressaltou pertinentes questões sobre a “Educação no contexto pós pandemia”,
abordando os desafios políticos e o necessário posicionamento crítico diante da realidade, para
transformá-la. Após o deleite de suas reflexões, foi realizado o lançamento do seu livro: “O
Capital para educadores aprender e ensinar com gosto a teoria científica do valor”.
Completando a nossa programação final, foi realizada a reunião ampliada do Fórum de Gestores
da Educação Básica do Espírito Santo (Fogebes), que o oportunizou aos participantes um
espaço aberto de diálogo, debate e análise dos desdobramentos das políticas educacionais no
âmbito local, nos diferentes sistemas/redes de ensino, instituições e instâncias educacionais.

A realização do V Seminário do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais


e o XI Encontro Estadual da Anpae teve como propósito promover um intercâmbio entre os
pesquisadores e participantes, afirmando o lugar do conhecimento, da ciência no
aprofundamento e análise crítica das questões atuais no campo da educação.

Que os momentos compartilhados, nos debates e discussões elucidadas possam contribuir,


fortalecer e ampliar as perspectivas de novos estudos, pesquisas, projetos e ações que visem o
aperfeiçoamento do pacto federativo e da democracia.

Desejamos a todos/as uma boa leitura!


12

EIXO 1 – Federalismo, políticas educacionais e


financiamento
13

A LEI 14.113/2020 E A INSERÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL


NOS CACS-FUNDEB ESTADUAIS

Thalia Campos de Oliveira


Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
tcamposvsky@gmail.com

INTRODUÇÃO

Este trabalho faz parte dos resultados finais do subprojeto de Iniciação Científica intitulada “O
Fundeb permanente e as Organizações da Sociedade Civil nos Conselhos Estaduais de
Acompanhamento e Controle Social do Fundeb (CACS-Fundeb): atuações e incidências”. A
pesquisa está vinculada ao Projeto n° 11198/2021 Federalismo e Educação Básica no Brasil:
atores e disputas na configuração do Sistema Nacional de Educação e do Regime de
Colaboração, pertencente ao grupo de pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais, no
âmbito da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

A partir da Constituição de 1988, a Educação tornou-se um direito social. O financiamento


dessa área passou a contar com os seguintes elementos: a vinculação constitucional, em que a
União, os Estados e os Municípios, a partir do Art. 212 da CF/1988 devem destinar,
respectivamente, 18%, e 25% da receita de impostos e transferências para a educação.
(BRASIL, 1988). Outro mecanismo é o Salário-Educação, que consiste na alíquota de 2,5% da
folha de pagamento das empresas destinadas à esfera educacional. (BRASIL, 1988. redação
dada pela Emenda Constitucional 14/1996). No que tange à subvinculação de recursos, o Brasil
conta com as políticas de fundo contábeis: a partir de 1996, com o Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), aprovado
pela Emenda Constitucional (EC) 14/1996 e regulamentado pela Lei 9.424/1996. Após
discussões que apontavam a necessidade do fundo abarcar toda a educação básica
(MONLEVADE, 2007) foi aprovado, pela EC 53/2006 e regulamentado pela Lei 11.494/2007
o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb). Este, contudo, tinha validade até 2020. Diante disso,
muitos foram os debates em torno da necessidade de que o fundo se tornasse permanente.
Assim, no final de 2020, foi aprovado pela EC/108/2020 e regulamentado pela Lei 14.113/2020
o novo Fundeb. Houve muitas mudanças, e uma delas foi relacionada à composição dos
Conselhos de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb (CACS-Fundeb):de acordo com
14

a lei, as Organizações da Sociedade Civil (OSC) passariam a compor até duas cadeiras destes
conselhos fiscais. A partir disso, a pesquisa teve o seguinte objetivo: investigar quais foram as
OSC que passaram a ocupar as cadeiras dos CACS-Fundeb estaduais e do Distrito Federal a
partir de 2021, com a finalidade de investigar em quais áreas as mesmas atuam, para que
pudessem ser tipificadas e categorizadas. As análises foram balizadas por meio do aporte
teórico de Gramsci (1976, 2002), acerca da hegemonia e dos aparelhos privados e de Weber
(2016), sobre os consensos na política.

METODOLOGIA

O percurso metodológico da pesquisa consistiu na busca por meio de endereços virtuais das
secretariais estaduais de educação, notícias, leitura de Diários Oficiais, endereços eletrônicos
dos CACS-Fundeb estaduais e por pedidos formalizados por meio de e-SIC, pautados na Lei
12.527/2011 que versa sobre a transparência de dados públicos. Posterior a este processo, os
nomes das OSC foram organizados e partiu-se para uma busca virtual a fim de entender em
quais áreas essas organizações atuam. Doravante, com essas informações coletadas, as
organizações foram tipificadas por área de atuação e categorizadas de acordo com a Lei
13.019/2014, nomeada como o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil
(MROSC).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A partir da metodologia supracitada, verificou-se que grande parte dos estados não deu a
publicidade necessária às informações referentes à eleição das OSC que passaram a compor os
CACS-Fundeb, tendo os municípios se destacados numa maior transparência a estes dados, por
mais que os dados sobre estes não componham essa pesquisa. Nesse sentido, boa parte do nome
das OSC foi identificada por meio de pedidos e-SIC, recebidos, por meio de textos enviados
por e-mail que mencionaram os decretos estaduais que as nomeavam, memorandos e páginas
de decretos adquiridas por meio de pesquisa nos Diários Oficiais. Esses dados, junto às
informações sobre as OSC coletadas por meio de páginas de blogs, redes sociais, notícias e
dados referentes aos CNPJ, evidenciaram que boa parte das OSC não são da área educacional
e incidem em áreas que destoam consideravelmente desta última, como OSC ligada à
agricultura e à bandas musicais. Apesar da lei 14.113 liberar este tipo de situação, pois em seu
texto apresenta a conjunção alternativa “ou” educação, “ou” controle dos gastos públicos
(BRASIL, 2020), entende-se que as mesmas não são OSC apropriadas para lidarem com a
15

fiscalização dos recursos públicos destinados à Educação, problemática que já era apontada em
relação aos conselheiros que assumiam as cadeiras dos CACS-Fundeb por parte da revisão
bibliográfica antes da inserção destas organizações nos conselhos em questão. Além disso,
constatou-se que algumas OSC ocupam, de forma irregular, as cadeiras dos CACS-Fundeb,
pois recebem recurso do fundo ao qual fiscalizam e das administrações estaduais, aspecto que
é proibido pela lei. A revisão bibliográfica sobre a temática evidenciou que a necessidade de
ocupação da sociedade civil nestes conselhos não é recente e que estes são espaços marcados
por práticas patrimonialistas. A partir disso, entende-se que a lei deixou este aspecto em aberto,
como uma espécie de brecha, que pode ser interpretada pela busca de consenso nas esferas
políticas, uma perspectiva pautada por Weber (2016), ao estabelecer o consenso na política
como comportamentos baseados nas ações de outras pessoas ao verem a possibilidade que suas
expectativas e planos possam ser cumpridos. Além disso, diante das fontes da pesquisa e dos
dados coletados, é possível que o debate sobre a sociedade civil nos CACS-Fundeb estaduais
possa ser, de certa forma, usurpado, para dar lugar a grupos que nada ou pouco se debruçam
sobre as questões referentes à Educação Básica e/ou seu financiamento, ou que possuem
interesses escusos em relação ao fundo público da educação, como é o caso de determinados
atores privados. Nessa perspectiva, Gramsci (1976) aponta que a esfera educacional é uma das
áreas em que o setor privado mais incide em busca da hegemonia, que se configura enquanto
domínio de viés moral e intelectual, revestida pela coerção. (GRAMSCI, 2002). O mesmo autor
elucida que, no âmbito do Estado, há a relação entre a força e o consenso, que são dois vetores
do exercício da hegemonia. Para o autor, em ambientes políticos, é preciso que se tenha um
equilíbrio entre ambos. (GRAMSCI, 1976). A partir disso, entende-se que possa ocorrer uma
busca pela hegemonia nos espaços dos CACS-Fundeb estaduais pela ocupação das cadeiras das
OSC estabelecidas pela legislação.

CONCLUSÃO

Conforme visto na revisão bibliográfica sobre o tema realizada no período previsto no


cronograma da pesquisa, o debate em torno de uma maior participação da sociedade civil nos
CACS-Fundeb não é recente, ao contrário da inserção das OSC nestes conselhos. Apesar de
identificadas, categorizadas e tipificadas, de acordo com os objetivos deste trabalho, é
necessário maior aprofundamento sobre as OSC nos CACS-Fundeb, com a finalidade de
investigar as motivações do corpo do texto da legislação sobre as mesmas ter sido elaborado de
forma vaga, a fim de dar espaço a OSC que não se relacionam com a Educação.
16

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 13 ago. 2022.

BRASIL. Emenda Constitucional n° 14 de 12 de setembro de 1996. Modifica os arts. 34, 208,


211 e 212 da Constituição Federal e dá nova redação ao art. 60 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc14.htm. Acesso em: 15
ago. 2022.

BRASIL. Emenda Constitucional n° 53, de 19 de dezembro de 2006. Dá nova redação aos


arts. 7º, 23, 30, 206, 208, 211 e 212 da Constituição Federal e ao art. 60 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc53.htm. Acesso em: 15
de ago. de 2022.

BRASIL. Emenda Constitucional n° 108, de 26 de agosto de 2020. Altera a Constituição


Federal para estabelecer critérios de distribuição da cota municipal do Imposto sobre
Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de
Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), para disciplinar a
disponibilização de dados contábeis pelos entes federados, para tratar do planejamento na
ordem social e para dispor sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb); altera o Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias; e dá outras providências. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc108.htm. Acesso em 16
ago. 2022.

BRASIL. Lei n° 9.424 de 24 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e


Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, na forma prevista
no art. 60, § 7º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e dá outras providências.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9424.htm. Acesso em: 15 ago.
2022.

BRASIL. Lei n° 11.494, de 20 de junho de 2007. Regulamenta o Fundo de Manutenção e


Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação -
FUNDEB, de que trata o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; altera a
Lei n o 10.195, de 14 de fevereiro de 2001; revoga dispositivos das Leis nos 9.424, de 24 de
dezembro de 1996, 10.880, de 9 de junho de 2004, e 10.845, de 5 de março de 2004; e dá
outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2007/lei/l11494.htm. Acesso em 15 agos. 2022.

BRASIL. Lei n° 14. 113 de 25 de dezembro de 2020. Regulamenta o Fundo de Manutenção e


Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação
(Fundeb), de que trata o art. 212-A da Constituição Federal; revoga os dispositivos da Lei n°
11.494, de 20 de junho de 2007; e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L14113.htm. Acesso em: 16
agos. 2022.
17

BRASIL. Lei n° 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto


no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da
Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº
11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá
outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2011/lei/l12527.htm. Acesso em: 17 agos. 2022.

GRAMSCI, Antonio. Maquiavel, a política e o Estado Moderno. Tradução: Luiz Mário


Gazzaneo. Editora Civilização brasileira S.A. Rio de Janeiro, 1976.

GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere, Volume 3.3.ed. Rio de Janeiro. Civilização


Brasileira. 2002.

MONLEVADE. João Antônio. Para entender o Fundeb. Ceilândia, Idéa, 2007.

WEBER, Max. Metodologia das Ciências Sociais. Tradução de Augustin Wernet: introdução
à edição brasileirade Maurício Tragtenberg. 5ª edição. São Paulo: Cortez. Campinas, São
Paulo. Editora Unicamp, 2016.
18

PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO: DOCUMENTO NORTEADOR DO


PLANEJAMENTO EDUCACIONAL NA ESFERA MUNICIPAL

Edmar Lucas Ferreira Sehnem


Universidade Cidade de São Paulo (Unicid)
lucasferreirasehnem@gmail.com

Angela Maria Martins


Fundação Carlos Chagas (FCC) e Universidade Cidade de São Paulo (Unicid)
ange.martins@uol.com.br

INTRODUÇÃO

Este trabalho integra investigação maior que levantou, sistematizou e analisou os Planos
Municipais de Educação (PMEs) dos municípios que compõem a Região Metropolitana da
Baixada Santista (RMBS) do estado de São Paulo, Brasil. O estudo, ancorado no campo das
políticas públicas educacionais, lançou mão de abordagem de natureza qualitativa de modo a
analisar elementos textuais presentes nas redações dos PMEs da referida região, considerando
que estes documentos são fundamentais para direcionar e normatizar as políticas públicas
educacionais em esfera municipal.

METODOLOGIA

O levantamento documental foi realizado nos sítios eletrônicos dos municípios que compõem
a RMBS. Os PMEs constituem fontes documentais significativas de análise, visto que dispõem
de dados para estudo, reflexão, acompanhamento e avaliação das políticas educacionais
empregadas pelos municípios. Conforme Gil (2002, p. 45-46) “[...] há que se considerar que os
documentos constituem fonte rica e estável de dados. [...] subsistem ao longo do tempo, tornam-
se a mais importante fonte de dados em qualquer pesquisa de natureza histórica”.

Realizou-se breve panorama dos processos de elaboração dos PMEs da RMBS enfatizando os
contextos de produção, assim como metas, diretrizes e princípios que garantem a qualidade da
educação ofertada e a gestão democrática educacional nas municipalidades.

Objetiva-se, assim, identificar, por meio de elementos textuais revelados pelos documentos
oficiais, potencialidades, entraves e percursos de elaboração dos PMEs nas respectivas
municipalidades considerando seus contextos de produção e o quanto as equipes técnicas
19

responsáveis pela condução e elaboração dos PMEs convergiram no sentido de garantir o


princípio democrático e participativo para elaboração, avaliação e monitoramento.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Ressalta-se a importância da discussão das políticas públicas de educação adotadas pelas esferas
governamentais, em todos os seus âmbitos – federal, estadual ou municipal – especialmente, no
tocante à garantia de uma educação justa, de qualidade, acessível, equânime, democrática e
libertadora. Nessa direção, é essencial considerar a complexidade dos aspectos políticos,
econômicos, sociais, culturais e demográficos que incidem no contexto municipal, bem como
a diversidade de atores (governamentais e não governamentais) que influenciam diretamente
na implementação das políticas públicas educacionais e na efetivação da garantia da qualidade
da educação ofertada pela municipalidade.

Estudos sobre os processos de municipalização no estado de São Paulo assinalam que


municípios que integraram os anos iniciais da educação básica em suas redes de ensino
apresentam portes diferentes e, por conseguinte, capacidades institucionais diversas, para
corresponder a desafios em momentos adversos (ADRIÃO, 2008; MARTINS, 2004;
MARTINS et al., 2018).

A construção dos PMEs pelos entes federados é uma exigência do Plano Nacional de Educação
(PNE - Lei Federal n. 13.005/2014) que imputa às municipalidades a responsabilidade de
elaboração de seus próprios dispositivos legais a fim de que a educação básica municipal seja
norteada e subsidiada por diretrizes consoantes com suas necessidades e realidades. O PME,
como lei, tem o intento de preservar o que foi planejado para a educação municipal com foco
em inibir e/ou dirimir as nocivas descontinuidade das políticas educacionais recorrentes em
muitos municípios brasileiros em que, a cada troca de gestão, as políticas tendem a ser
“reiniciadas”, uma vez que por não se configuram como iniciativas propostas pelos “gestores
atuais”, mesmo quando considerados bons planos educacionais, com objetivos e estratégias que
exprimem as reais necessidades e enfrentamento de problemas locais.

A RMBS foi criada em 1996 por meio da Lei Complementar Estadual n. 815 e é composta por
09 (nove) municípios: 1) Bertioga que atualmente tem uma população de 64.526 habitantes; 2)
Cubatão com 130.025 habitantes; 3) Guarujá com 318.774 habitantes; 4) Itanhaém com 99.751
habitantes; 5) Mongaguá com 55.216 habitantes; 6) Peruíbe com 66.747 habitantes; 7) Praia
Grande com 321.008 habitantes; 8) Santos com 429.513 habitantes e 9) São Vicente com
20

360.262 habitantes. A RMBS abrange a porção central do litoral paulista ocupando uma área
de 2.419,93 km² o que corresponde a 1,0% do território do estado. Embora composta por apenas
09 (nove) municípios, é uma das Regiões Metropolitanas (RMs) mais importantes do Estado de
São Paulo, devido, principalmente, ao turismo dada sua localização na região sul da costa do
estado banhada pelo Oceano Atlântico.

No que diz respeito ao movimento de construção e aos processos de elaboração dos PMEs nos
municípios da RMBS é essencial considerar que as cidades possuem percursos sócio-históricos
de constituição federativo-municipais bastante distintos e muito peculiares em decorrência,
inclusive, do processo de colonização brasileira.

Vale destacar que os PMEs dos municípios em pauta deveriam estar em consonância com o
Plano Estadual de Educação (PEE). Contudo, o PEE do estado de São Paulo recebeu aprovação
somente em 2016, ano em que todos os PMEs da RMBS já estavam sancionados por seus
respectivos municípios. A elaboração dos PEEs, conforme indica estudo realizado por Souza e
Pires, se configurou como um processo complexo e destituído de autonomia regional, pois, nas
palavras dos autores “cumpre registrar [...] que os PEEs incorporaram também, em sua maioria,
as indicações feitas pelo PNE” (p. 79).

Nos PMEs observados da RMBS, construídos em sua grande maioria no ano de 2014 e
sancionados em 2015, é possível identificar linearidade textual e certa homogeneidade
discursiva. Percebem-se pequenas alterações pontuais ajustadas às realidades locais e aos
índices de melhoria na educação municipal, porém os textos que alicerçam as discussões, metas
e propostas revelam padronização em relação ao que é preconizado pelo PNE/2014.

Os achados corroboram com outros estudos já realizados em torno do tema. Martins e Novais
(2012), em investigação que analisou os PMEs das RMs de São Paulo aprovados entre os anos
de 2003 e 2004, observaram certa fragilidade textual, pois os documentos analisados pelas
autoras apresentavam “metas, objetivos e algumas poucas ações para alcançá-los”. Prosseguem
apontando o fato de que especialistas externos e pesquisadores acadêmicos atuaram na
formulação dos documentos, uma vez que os planos analisados apresentavam a mesma
estrutura: um histórico de constituição dos municípios; aspectos de construção das redes de
ensino. As autoras chamam atenção, ainda, para o fato de que alguns textos de municípios
diferentes repetiam dados educacionais idênticos, ou seja, não houve o cuidado de verificar ou
checar a veracidade das informações.
21

Identifica-se, inicialmente, que a análise textual dos PMEs da RMBS evidencia aspectos sócio-
históricos que se referem à diversidade de origem e desenvolvimento dos municípios da
Baixada Santista, o que provoca desdobramentos em virtude de diferentes capacidades
institucionais das Secretarias Municipais de Educação para consecução de diretrizes oficiais em
conformidade com as necessidades das redes de ensino e de seus profissionais, corroborando,
também, resultados de estudos que discutem questões acerca da fragilidade de poder local
(SCAFF; OLIVEIRA, LIMA, 2018).

CONCLUSÃO

O panorama histórico-político e dos contextos de produção e configuração dos documentos


oficiais que regem a educação nos municípios da RMBS permite-nos refletir sobre as carências
e os entraves encontrados pelos municípios em decorrência da ausência do PEE no estado de
São Paulo, promovendo linearidades textuais entre os documentos oficiais locais e metas
contidas do PNE. No cenário que emergiu por meio das análises textuais dos PMES da RMBS
identifica-se que é preciso aplicar garantias de acesso, participação e democratização da
educação nas municipalidades, principalmente no que se refere à avaliação e monitoramento
dos planos.

REFERÊNCIAS

ADRIÃO, Theresa. Oferta do ensino fundamental em São Paulo: Um novo modelo. Educ.
Soc., Campinas, v. 29, n. 102, p. 79-98, abr. 2008. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/S0101-73302008000100005. Acesso em: 26 ago. 2022

BRASIL. Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação –


PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 jun. 2014. Disponível
em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm. Acesso em:
26 ago. 2022.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

MARTINS, Angela Maria et al. Trajetórias de formação e profissionais dos diretores de


escolas municipais: Respostas declaradas ao questionário contextual da Prova Brasil (2015).
Jornal de Políticas Educacionais, v. 12, n. 13, jul. 2018. ISSN 1981-1969. Disponível em:
https://revistas.ufpr.br/jpe/article/view/58910. Acesso em: 16 mar. 2022.

MARTINS, Angela Maria; NOVAES, Glaucia Torres Franco. Planos municipais de educação
de regiões metropolitanas e temas curriculares: Uma análise de políticas educacionais.
Revista @mbienteeducação, 5(2): 143-51, jul./dez. 2012. Disponível em:
https://publicacoes.unicid.edu.br/index.php/ambienteeducacao/article/view/108. Acesso em
16 mar. 2022.
22

SCAFF, Elisangela Alves da Silva; OLIVEIRA, Marli dos Santos de; LIMA, Simone
Estigarribia de. O planejamento educacional frente às fragilidades do processo democrático
brasileiro. ETD - Educação Temática Digital, 20(4), 2018, p. 905-923.
https://doi.org/10.20396/etd.v20i4.8649255. Acesso em: 09 mar. 2022.

SOUZA, Ângelo Ricardo de; PIRES, Pierre André Garcia. As leis de gestão democrática da
educação nos estados brasileiros. Educ. rev., Curitiba, v. 34, n. 68, p. 65-87, abr. 2018.
Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/qLkpKmKtMCsK89ZY9yMN87H/?lang=pt.
Acesso em: 26 ago. 2022.
23

CAQ E EDUCAÇÃO ESPECIAL:A CONSTRUÇÃO DE PARÂMETROS PARA UMA


EDUCAÇÃO DE QUALIDADE

Patrícia Teixeira Moschen Lievore


PPGE/UFES
profpatriciamoschen@gmail.com

Douglas Christian Ferrari de Melo


PPGE/UFES; PPGMPE/UFES
dochris.ferrari@gmail.com

INTRODUÇÃO

Em 2007 foi implantado o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de


Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) através da Emenda Constitucional nº 53,
de 19 de dezembro de 2006 e regulamentado pela Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007 e pelo
Decreto nº 6.253, de 13 de novembro de 2007.

O Fundeb possibilitou um maior estímulo financeiro para as redes públicas expandirem as


matrículas e todas as etapas e modalidades são consideradas com pesos diferenciados na
distribuição, sendo que o valor mínimo por aluno/ano da educação especial passa a receber um
peso ponderado 20% superior ao valor por aluno de referência, em uma escala cujo valor mais
elevado alcança 30%. Vale ainda ressaltar, que a União passa a contribuir com um aporte bem
maior de recursos.

Outra conquista que vale ser destacada, foi o Decreto n. 6.571/2008, que garante a dupla
matrícula no ensino comum e no Atendimento Educacional Especial (AEE), alterando as regras
do Fundeb.

O novo Fundeb, aprovado pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC 26/2020), traz
importantes mudanças quanto ao financiamento da educação e que também contemplam a
educação especial. Uma delas é a que estabeleceu maior complementação da União, de 10%
para 23% até 2026, bem como, a criação do Custo-Aluno Qualidade (CAQ), que garante
recursos mínimos por estudante para qualidade do ensino

Nesse sentido, surge a seguinte problemática: quais parâmetros seriam necessários para calcular
um CAQ capaz de garantir uma educação de qualidade para os alunos público da educação
especial?
24

O presente estudo apresenta o objetivo de refletir sobre os parâmetros necessários para


garantir/assegurar uma educação de qualidade para os estudantes da educação básica com
deficiência visual, visando subsidiar a criação de um Custo-Aluno Qualidade para a educação
especial. Para tanto, faz-se necessário refletir sobre o direito à educação dos alunos público da
educação especial e estabelecer a relação entre o direito à educação e a necessidade da
regulamentação de um Custo-aluno qualidade para a educação especial.

METODOLOGIA

O presente estudo constitui-se de uma natureza qualitativa, já que o nosso objetivo é refletir
sobre o direito à educação dos alunos público da educação especial e os parâmetros necessários
para uma educação de qualidade para esses estudantes, levando em consideração que o
investigador da pesquisa de natureza qualitativa examina o mundo e a realidade a ser pesquisada
com a ideia de que nada é trivial, que tudo tem potencial para nos levar a compreender melhor
o nosso objeto de estudo (BOGDAN; BIKLEN, 1994).

Como metodologia, utilizamos a pesquisa bibliográfica dos estudos de Jamil Cury, a fim de
estabelecer um diálogo entre o direito à educação e a necessidade da criação de parâmetros
capazes de garantir o acesso a uma educação com qualidade para os alunos públicos da
educação especial.

E para analisarmos os documentos provenientes da criação do Novo Fundeb, faremos uso da


Pesquisa Documental, pois para Gil (2007), a análise documental é uma fonte rica de dados,
assemelhando-se à pesquisa bibliográfica, porém, a pesquisa bibliográfica utiliza-se das
contribuições dos diversos autores sobre determinado assunto, já a pesquisa documental é
composta por matérias que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem
ser reelaborados de acordo com os objetos de pesquisa.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Para Cury (2002) o direito à educação parte do princípio de que o saber sistemático é mais do
que uma importante herança cultural. Como parte desse legado, o sujeito passa a ter o direito e
se apossar desses padrões cognitivos e formativos, que garantam a ele a possibilidade de
constituir-se como cidadão, participando dos destinos da sociedade e colaborando com a sua
transformação.
25

Partimos desse princípio, para além da importância social da Educação Especial, que a
escolarização dos alunos com deficiência é um direito, pelo fato de serem sujeitos, e que assim,
como os demais alunos, têm o direito de ter acesso aos conhecimentos que possibilitarão a sua
participação e transformação da sociedade.

Conforme previsto na meta 20 do Plano Nacional de Educação (2014-2024), que apresenta


como uma das suas estratégias (20.7),

implementar o Custo Aluno Qualidade - CAQ como parâmetro para o financiamento


da educação de todas etapas e modalidades da educação básica, a partir do cálculo
e do acompanhamento regular dos indicadores de gastos educacionais com
investimentos em qualificação e remuneração do pessoal docente e dos demais
profissionais da educação pública, em aquisição, manutenção, construção e
conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino e em aquisição de
material didático-escolar, alimentação e transporte escolar (grifo nosso).

Nesse sentido, sendo a educação especial uma modalidade da educação básica, faz-se
necessário pensar em parâmetros capazes de indicar um padrão de qualidade da educação desses
estudantes. De acordo com a Nota Técnica PEC 26/2020, da Campanha Nacional pelo Direito
à Educação (p. 6),

o CAQ contempla as condições adequadas e os insumos materiais e humanos


necessários para que os professores consigam ensinar e para que os alunos possam
aprender. A ideia central é que a garantia de insumos adequados é condição
fundamental – ainda que não suficiente –, para o cumprimento do direito à educação.

Para tanto, os recursos do CAQ são calculados levando em consideração quatro dimensões: a
estrutura física e funcionamento, trabalhadores e trabalhadoras da educação, gestão
democrática e acesso e permanência, levando sempre em consideração que para se pensar em
uma educação pública de qualidade, temos que considerar os insumos que são destinados a ela.

Ao pensarmos mais especificamente nos parâmetros necessários para se garantir uma educação
de qualidade para os alunos público da educação especial, destacamos a necessidade de refletir
sobre os recursos para que esses alunos possam ter acesso ao conhecimento na escola,
considerando todas essas dimensões utilizadas para o cálculo do CAQ e outras que ainda
necessitam de pesquisas para que possam ser definidas e regulamentadas.

CONCLUSÃO

Uma educação de qualidade é direito de todos, entretanto, para que esse direito dos alunos
público da educação especial seja garantido, é necessário que eles tenham acesso à materiais,
tecnologias, espaços acessíveis, à profissionais de apoio escolar e a professores que tenham
uma formação específica, a fim de atender às subjetividades desses estudantes. Nesse sentido,
26

apenas garantir a igualdade de acesso à educação, que os demais alunos, não atenderia a todas
essas especificidades.

Podemos concluir assim que é urgente a regulamentação do CAQ, bem como a realização de
pesquisas que possam subsidiar e definição de um CAQ capaz de garantir o acesso ao
conhecimento dos alunos público da educação especial, levando em consideração as
especificidades de cada tipo de deficiência e todos os recursos e metodologias atuais capazes
de garantir a aprendizagem desses estudantes.

REFERÊNCIAS

BOGDAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação Qualitativa em Educação: uma introdução à


teoria e aos métodos. Porto – Portugal: Porto Editora, 1994.

BRASIL. Plano Nacional de Educação. PNE 2014-2024. Linha de Base. INEP. Ano 2015.
Disponível em: http://www.publicacoes.inep.gov.br/portal/download/1362. Acesso em: 20
jan. 2022.

CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO. Nota técnica PEC 26/2020:


Por que é imprescindível constitucionalizar o CAQ? Disponível em:
https://media.campanha.org.br/acervo/documentos/Fundeb2020_NotaTecnica_2020_08_12_
CAQ-SenadoFederal_FINAL.pdf . Acesso em: 02 set. 2021.

CURY, C. R. J. Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. Cadernos de


Pesquisa, n.116, p.245-262, jun. 2002.

GIL, A. 2010. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 6. ed., 3 reimpr., São Paulo: Atlas.
27

REVERBERAÇÕES DO CURRÍCULO DO “PROGRAMA ESCOLA VIVA” (2015-


2019) NO NOVO CURRÍCULO DO ENSINO BÁSICO DA REDE ESTADUAL DE
EDUCAÇÃO DO ESPÍRITO SANTO. FEDERALISMO EDUCACIONAL EM
ANÁLISE.

Vitor Martins Graciliano


Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
vitormartins_g@hotmail.com

Leon Alves de Freitas


Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
prof.leonfreitas@gmail.com

INTRODUÇÃO

No contexto do Federalismo, políticas educacionais e financiamento, o Espírito Santo destaca-


se no cenário nacional na última década pelo alto investimento financeiro, feito no Programa
de Escolas Estaduais de Ensino Médio em Turno Único, denominado “Escola Viva”. Teve
como principal teórico, Antônio Carlos Gomes da Costa e base metodológica amparada na
“Escola da Escolha” que no Brasil teve seu início nos anos de 2000, em Recife – PE.
(PETERLE, 2015, p.137).

A implantação desse modelo educacional em Pernambuco foi protagonizada pela parceria do


Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE) e o Governo do Estado de Pernambuco.
O ICE é uma entidade sem fins lucrativos e foi criado em 2003 por um grupo de empresários
que idealizaram um novo modelo de escola para resgatar a antiga excelência do então decadente
e secular Ginásio Pernambucano, localizado em Recife. (ICE 2021).

Nesse contexto, a Lei Complementar 799/2015, que criou o Programa Escola Viva, foi aprovada
em regime de urgência, o que dificultou o amplo debate e o diálogo com a sociedade capixaba
relacionado a amplitude do projeto. Tendo o ICE como principal parceiro e organizador do
projeto, nesses termos, foi visto, pela primeira vez na rede estadual de ensino, uma política
pública de educação tão ampla e impactante pautada na relação entre o público e o privado. O
projeto Escola Viva foi implantado no ano de 2015, durante o segundo governo Paulo Hartung
e vigorou até o ano de 2019, contando com 36 unidades escolares, ultrapassando a meta
estabelecida de 32 unidades, proposta pelo Governo capixaba (no plano estadual de educação?)
e pela ONG Espírito Santo em Ação (TEIXEIRA, 2017).
28

Substituído no ano de 2020 pelo Programa de Ensino Integral, criado pelo Projeto de Lei
Complementar (PLC) 58/2019 do governador Renato Casagrande, também aprovado em
regime de urgência na ALES, o programa Escola Viva foi substituído deixando inúmeros
questionamentos, indagações e um legado significativo no currículo da educação básica da
Rede Estadual de Ensino do Espírito Santo.

Dentre as mudanças iniciadas na Rede Estadual de Ensino Básico com o advento da “Escola
Viva” destacamos: a criação de uma nova figura na organização hierárquica gestora, o Professor
Coordenador de Área (PCA) e as novas disciplinas: Eletivas, Projeto de Vida (que no novo
currículo substituirá as aulas de filosofia e sociologia no terceiro ano do Ensino Médio) e Estudo
Orientado, por exemplo. Sendo as duas últimas implantadas também no Ensino Fundamental
nas séries finais a partir de 2021.

Essa pesquisa apresenta-se proeminente para que se entenda como o programa Escola Viva,
oriundo de uma parceria público-privada, conseguiu influenciar tão significativamente o novo
currículo estadual da Educação Básica. Entender os meandros ideológicos e sua influência nas
políticas públicas de educação é crucial para a compreensão de que direção segue a política
educacional do “Estado do Espírito Santo”, se a caminho da emancipação ou da alienação.

METODOLOGIA

Pela complexibilidade do projeto e suas múltiplas vertentes, entendemos que segundo a


classificação de pesquisas de GIL (2002) a mais adequada para os fins almejados seja a Pesquisa
Exploratória a partir de levantamento bibliográfico e análise de exemplos que “estimulem a
compreensão” (SELLTIZ ET AL, 1977, p.63), citado por (GIL 2002, p.41) da análise
comparativa entre os currículos. Desenvolvido a partir da análise dos currículos disponíveis nos
sites da Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo.

Por se tratar de uma pesquisa cuja abordagem principal é qualitativa, utilizamos como
procedimentos de coleta e produção de dados, a pesquisa documental e revisão de literatura,
conforme delimita GIL (2002, p. 43).

Foi feita a análise do currículo do programa Escola Viva e do Novo Currículo da Rede Estadual
de Ensino buscando a produção de dados dos principais pontos de convergência.
Consequentemente, foi realizado o fichamento dos livros, catálogos e artigos que compõem a
revisão bibliográfica e o quadro teórico, necessários à fundamentação da pesquisa. Contribuirão
29

tanto para a análise de nosso objeto de estudo, quanto na identificação dos fatores contextuais
responsáveis pela temática.

No passo seguinte, ocorreu o desenvolvimento de “Redes de conversações” (CARVALHO;


HOLZMEISTER, 2013) com professores que trabalharam e analisaram os currículos objeto
deste estudo. Buscando conhecer os discursos sobre seus objetos, por seus diferentes
intérpretes, para então produzir os textos pertinentes à pesquisa ou que discorrem sobre a
problemática do currículo.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A proposta de um Novo Currículo da Rede Estadual de Ensino do Espírito Santo que utiliza as
bases do Currículo do Programa Escola Viva, explicitamente formulado, gera várias perguntas
entre elas se destacam as seguintes:

Pode haver uma coordenação mais clara e mais democrática pelo órgão gestor da Rede de modo
a exercer as funções equalizadora e redistributiva?

Como aprimorar as competências das escolas de modo a propiciar um exercício harmônico do


currículo sob a coordenação mais incisiva das Superintendências?

É possível efetivar a autonomia e a democracia nas relações internas e externas das escolas de
modo a propiciar a efetivação do currículo no contexto do federalismo educacional?

Todavia, essas são perguntas que somente o desenvolvimento do Novo Currículo e a análise da
gestão da Rede educacional do Espírito Santo poderão responder.

CONCLUSÕES

Ao analisar os trabalhos desenvolvidos pelos estudantes e pesquisadores em educação e gestão


educacional sobre o Programa Escola Viva, chegamos ao seguinte denominador comum, que
as conclusões apresentadas pelos autores, convergem e são ratificadas pela seguinte afirmação:

o setor privado, ao obter o protagonismo, reduz a autonomia dos professores, com a


pretensão, a um só tempo: melhorar os resultados nas avaliações em larga escala e
nortear a gestão sob uma matriz gerencialista, a partir de modelos padronizados em
valores empresariais, pautados na produtividade, eficiência e eficácia.
(ALCÂNTARA; MATOS; COSTA, 2020, p.16).
A questão que se sobrepõe é, os fins justificam os meios? em nome de possíveis melhores
índices na educação, segundo os parâmetros neoliberais de avaliação da educação, os direitos
dos profissionais da educação, a liberdade de cátedra, podem ser subtraídos, retirados ou
ignorados pelo Estado. É essa educação que vai produzir cidadãos conscientes, democráticos,
30

protagonistas e críticos? Pela lógica não, para uma educação libertadora e emancipadora a
democracia é a regra magna que tem que ser a baliza de todo o processo, essa é a regra básica
para todo projeto.

REFERÊNCIAS

ALCÂNTARA, A. B.; MATOS, L; COSTA, R. Programa Escola Viva no Estado do


Espírito Santo: reflexões acerca da gestão educacional. Roteiro, v. 45, p. 1-20, 18/08/2020.
CARVALHO, Janete Magalhães. HOLZMEISTER, Ana Paula Patrocínio. Potência das
redes de conversações no cotidiano escolar: entre formas, forças e modos de
constituição. Disponível em: https://periodicos.ufjf.br/index.php/revistainstrumento/
article/view/18869. Acesso em: 7 mar. 2021.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. Antônio Carlos Gil. - 4. ed. -
São Paulo: Atlas, 2002.
OLIVEIRA, Eduardo Augusto Moscon de; SILVA, Itamar Mendes da; LIMA, Marcelo
(Organizadores) Política educacional e gestão na escola básica: perspectivas. Artigo de
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Editores, 2019. 2ª edição. 145 p.
PETERLE, Tatiana Gomes dos Santos. A política estadual de educação no Espírito Santo:
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Tatiana Gomes dos Santos Peterle. – 2015. 247 f.: il. Orientador: Marcelo Lima. Dissertação
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http://icebrasil.org.br/sobre-o-ice/. Acesso em: 25/01/2021.
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TEIXEIRA, A. Relatório Educação em tempo integral 2017. Educação: construindo um
futuro promissor. Atividades do Programa Escola em Tempo Integral 2014-2017. ES. 2017.
31

FEDERALISMO E POLÍTICAS PÚBLICAS LOCAIS: A EXPERIÊNCIA DO


ESPÍRITO SANTO NO CUMPRIMENTO DA SEXTA META DO PNE

Luiza Gava Andrêza


Graduanda do curso de direito da Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim – FDCI

Leonardo Roza Tonetto


Mestrando pela Universidade Federal do Espírito Santo - UFES; Bolsista da CAPES;
Especialista em direito constitucional; Professor da Faculdade de Ciências Contábeis e
Administração de Cachoeiro de Itapemirim - FACCACI e da Faculdade Venda Nova do
Imigrante - FAVENI; Advogado

Maria Deuceny da Silva Lopes Bravo Pinheiro


Pós-Doutora em Ciências da Educação da Faculdade de Psicologia e de Ciência da Educação
da Universidade de Coimbra; Professora da Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim
– FDCI, da Faculdade de Ciências Contábeis e Administração de Cachoeiro de Itapemirim –
FACCACI e da Faculdade América;

INTRODUÇÃO

O direito à educação, no Brasil, é entendido e positivado como uma garantia fundamental e


social para a formação cidadã e democrática do indivíduo. Desse modo, na busca de promover
o acesso à educação, a operacionalização das políticas educacionais é desenvolvida a partir do
modelo federalista cooperativo. Dentro dessa perspectiva, cada ente federado, dentro de sua
competência atribuída pela Constituição Federal, atua para garantir a manutenção e a
materialização do direito à educação.

Nesse prisma, ao partirmos do pressuposto de que as políticas públicas devem caminhar para a
universalização do direito educacional, o presente artigo propõe uma discussão no que tange às
políticas públicas existentes que visam atender a meta 6 disposta no Plano Nacional de
Educação, de modo especial no estado do Espírito Santo.

Para o desenvolvimento deste estudo foram utilizadas a pesquisa bibliográfica fundamentada


em artigos das publicações periódicas constantes nos repositórios e bases de dados e análise
documental das legislações brasileiras, além dos relatórios pertinentes ao eixo de abordagem.
Ao final, apresenta algumas reflexões sobre as lacunas existentes em relação à materialização
da meta, nomeadamente no que se refere às políticas locais e reforça a necessidade de se ter um
financiamento mais arrojado e colaborativo entre os entes federados, considerando que está
ainda é uma seara em construção.
32

DESENVOLVIMENTO

O modelo de federalismo acolhido no Brasil vem, historicamente, assumindo diferentes


dinâmicas de instrumentalização. Neste modelo, portanto, vigora a colaboração e o
compartilhamento no processo de tomada de decisão entre os entes federados (União, Estados
e Municípios).

Trata-se de um sistema político que busca um objetivo comum, sob a qual são distribuídos os
poderes e as funções entre o governo central e os governos regionais (CURY, 2010). Na
Constituição Federal de 1988, os fundamentos do federalismo são expostos no art. 3º da
Constituição Federal, guardando observância a uma matriz cooperativa de repartição de
competências, tanto nos aspectos legislativos, administrativos e tributários.

Dentro da configuração institucional, portanto, o modo de cooperação entre as unidades


federativas caracteriza-se como um conjunto de espaços de negociação, coordenação e
produção de políticas e serviços públicos, funcionando horizontal, vertical e setorialmente nas
diferentes esferas de governo. Daí se sobressai as transformações no modo de atuação dos entes
federados, induzidos pelos diversos interesses, de cooperação ou de competição.

Dentro dessa discussão, como leciona Soares (2010), o direito à educação esteve presente em
todas as constituições brasileiras, desde a Constituição Imperial outorgada em 1824, até a
Constituição Federal promulgada em 1988. Desse modo, o artigo sexto da Carta Cidadã positiva
assegura o direito à educação como uma garantia social, mas acima de tudo fundamental para
o desenvolvimento intelectual e cidadão do indivíduo.

Nesse ínterim, além dessa prerrogativa de garantia fundamental, a Constituição também


estabelece um rol de artigos que tem a finalidade de estabelecer os aspectos necessários para a
concretização do acesso à educação. Dentro dessa discussão, um dos caminhos para concretizar
o direito educacional, de acordo com Lagares, Cavalcanti e Rocha (2018), é a cooperação entre
os entes federados, sendo eles a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal. Assim,
o regime de colaboração em relação aos sistemas de ensino está fundamentado
constitucionalmente nos arts. 22, 23, 24, 25, 30, 35, 205, 206, 208, 209, 211, 212, 213, 214 e
no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que são responsáveis
por regular o sistema de repartição de competência entre os entes que compõem o sistema
federativo brasileiro (LAGARES; CAVALCANTI; ROCHA, 2018).
33

Ademais, é importante destacar que o direito educacional positivado na Constituição


Republicana de 1988 tem como principal objetivo garantir o acesso e a permanência do
estudante no ambiente escolar, de modo a contribuir para o exercício da cidadania e
desenvolvimento do trabalho. Nesse contexto, essa premissa contida dentro do ordenamento
jurídico brasileiro está intimamente ligada com as políticas internacionais. Dentro dessa
perspectiva, destaca-se a Agenda 2030, firmada no ano de 2015 e que se configura em um pacto
global organizado e firmado pela Organização das Nações Unidas.

Desse modo, o pacto é constituído por dezessete Objetivos de Desenvolvimento Sustentável,


denominados ODS. No que tange aos objetivos, destaca-se o de número quatro, visto que como
demonstra seu enunciado, o ODS-4 visa: “assegurar a educação inclusiva e de qualidade, e
promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos” (IPEA, 2019). Além
disso, baseado nesse objetivo, o Ipea (2019) informa ainda que o Brasil, até o ano de 2030,
possui como meta a assegurar que todos os estudantes, sejam meninas ou meninos, concluam o
ensino fundamental e médio, de forma equitativa e com qualidade, na idade adequada, de modo
a garantir a oferta gratuita na rede pública para conduzir a resultados de ensino e aprendizagem
relevantes e satisfatórios.

Baseado nas disposições constitucionais e com propósito de cumprir os objetivos estabelecidos


no documento internacional citado anteriormente, é de grande valia ressaltar o Plano Nacional
de Educação (PNE, 2014 - 2024) - Lei 13005/14 - que reforçou o compromisso dos entes
federados em cumprir as vinte metas estabelecidas. Dentro desse dispositivo encontra-se a meta
n° 6 que trata da Educação em Tempo Integral. Nessa discussão, vários dispositivos legais do
ordenamento jurídico brasileiro, como a Constituição Federal de 1988, o Estatuto da Criança e
do Adolescente, a Lei Orgânica da Assistência Social e o Sistema Único de Assistência Social,
criaram condições capazes de sustentar as propostas concernentes a educação integral, integrada
e em tempo integral (ZUCCHETI; FERREIRA, 2019).

Em âmbito nacional vale ressaltar a relevância de experiências recentes do Programa Mais


Educação em 2007 e do Novo Mais Educação em 2015, bem como os desafios enfrentados por
eles com a carência de financiamento, notadamente porque as políticas de Educação Integral
requerem investimentos financeiros para atender sua magnitude.

Com a paralisação do Programa, diferentes esferas administrativas têm assumido a coordenação


dessa política de educação integral em tempo integral. No caso do Estado do Espírito Santo, no
ano de 2006, o governo do Estado implanta o Programa Mais Tempo na Escola, abrigando
distintas formas de ampliação da jornada escolar, com carga horária de 25, 30 e 40 horas
34

semanais, propondo o desenvolvimento de atividades de enriquecimento curricular organizadas


em núcleos temáticos com base nas áreas de conhecimento e das orientações próprias da Rede
Estadual de Ensino, com projeto educativo próprio. (SPERANDIO E CASTRO, 2012; MAIS
TEMPO, 2009). O Programa Mais Tempo na Escola gradativamente foi ampliado na rede
estadual de ensino, recebendo, a partir do ano de 2009, apoio financeiro do Programa Mais
Educação, implantado no Estado no ano de 2010.

No ano de 2015, o governo estadual por meio da Lei complementar n. 700/2015 implantou o
Programa de Escolas Estaduais de Ensino Médio em Turno Único, denominado “Programa
Escola Viva”, com a proposta de organização e funcionamento de tempo único, com a a
metodologia da Escola da Escolha e no Projeto de vida do Estudante. Em 2019 o Programa foi
reestruturado por meio da Lei Complementar n. 928/19, que veio estabelecer as diretrizes para
a oferta da Educação em Tempo Integral nas Escolas Públicas Estaduais do Espírito Santo.

No ano de 2021 novamente o Programa de Educação em Tempo Integral foi remodelado. O


Governo do Estado institui o Programa Capixaba de Fomento à Implementação de Escolas
Municipais de Ensino Fundamental em Tempo Integral, por meio da Lei 11.393/21. Dentre os
objetivos destaca-se a proposta de promover ações compartilhadas entre os municípios
capixabas e o Estado visando a melhoria do ensino e a universalização do acesso à escola. Uma
preocupação evidente com a ODS n. 4 e com a sexta meta do Plano Nacional de Educação.

CONCLUSÃO

Diante da discussão proposta, foi possível perceber que há esforços por parte dos entes
federados em cumprir a meta seis do Plano Nacional de Ensino. Ademais, apesar das tentativas,
nota-se que há um distanciamento entre o plano formal e plano material para concretização das
metas estabelecidas, dado a magnitude dos Programas implantados. Os registros das
experiências locais e nacionais ainda procuram meios para se consolidarem, de fato, como
política pública. Desse modo, a pretensão de obter resultados imediatos tem provocado a
descontinuidade dos programas iniciados, uma vez que é preciso tempo de amadurecimento e
articulação dos programas indutores para alcançar resultados que expressem quantitativa e
qualitativamente os processos construtivos da aprendizagem. Espera-se que ass discussões
futuras relacionadas à abrangência das metas positivadas no PNE sejam o ponto central do
debate para a efetivação do direito à educação, de modo a articular os entes federados no regime
colaborativo.
35

REFERÊNCIAS

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.


Brasília, DF: Presidência da República. [2016]. Disponível em: https://
www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/518231/CF88_Livro_EC91_2016. pdf. Acesso
em: 23 fev. 2021.
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Romualdo Portela de; SANTANA, Wagner (Org.). Educação e federalismo no Brasil:
combater as desigualdades, garantir a diversidade. Brasília: UNESCO, 2010.
IPEA. Objetivos de desenvolvimento sustentável. Disponível em:
https://www.ipea.gov.br/ods/ods4.html. Acesso em: 20 ago. 2022.
LAGARES, Rosilene; CAVALCANTE, Jemima G. Barreira; ROCHA, Damião. Regime de
colaboração na educação–uma história em construção em um campo de disputa política e
conceitual. Research, Society and Development, v. 7, n. 4, p. 474171, 2018. Disponível em:
https://www.redalyc.org/journal/5606/560659011004/560659011004.pdf. Acesso em: 06 ago.
2022.
PARENTE, Cláudia da Mota Darós.Políticas de Educação Integral em Tempo Integral à Luz
da Análise do Ciclo da Política Pública. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 43, n. 2, p.
415-434, abr./jun. 2018. http://dx.doi.org/10.1590/2175-623661874
SOARES, Dilmanoel de Araújo. O direito fundamental à educação e a teoria do não
retrocesso social. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 47, n. 186, p. 291-301.
Disponível em:
https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/198687/000888837.pdf?sequence=1&is
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SPERANDIO, A. E; CASTRO, J. M. P. de. (2012). Mais Tempo na Escola: desafio
compartilhado entre gestores, educadores e comunidade escolar da rede estadual de ensino do
Espírito Santo. In: Moll, Jaqueline (Org.). Caminhos da educação integral no Brasil:
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ZUCCHETTI, D. T; FERREIRA, A. G. Da escola de tempo integral à educação integral: as
circunstâncias e o ideal do desenvolvimento humano. In: SEVERO, José Leonardo Rolim de
Lima; POSSEBON, Elisa Gonsalves (orgs.). Fundamentos e temas e pedagogia social e
educação não escolar. João Pessoa: Editora da UFPB, 2019.
36

A EXPERIÊNCIA MUNICIPAL NA DISCUSSÃO SOBRE QUALIDADE, JUSTIÇA E


EQUIDADE-OBSERVATÓRIO DO CUSTO ALUNO QUALIDADE DE VITÓRIA

Sumika Soares de Freitas


SEME/PMV
Sumika.freitas@gmail.com

Karla Veruska Azevedo


SEME/PMV
karla.veruska.azevedo@gmail.com

INTRODUÇÃO

O município de Vitória/ES, estabeleceu em seu PPA 2018 - 2019 a criação do Observatório


Custo Aluno Qualidade de Vitória – CAQVIX, tendo como uma de suas finalidades promover
pesquisas e alternativas para que as estratégias da Meta 20 do Plano Municipal de Educação,
Lei 8.829/2015, seja alcançada. Nesse sentido, o estudo apresentado é parte das atividades
desenvolvidas pelo Observatório CAQVIX, no qual apresentamos uma análise bibliográfica, a
partir de documentos legais e pesquisas na área das políticas educacionais. Tal experiência
relata a estratégia de implementação e aprofundamento do CAQ (Custo Aluno -Qualidade) no
âmbito municipal, que desde 2020 em que ampliou via GT CAQVIx (Custo Aluno Qualidade
de Vitória) a experiência de cálculo dos PQRs (Parâmetros de Qualidade Referência) das 102
Unidades de Ensino Municipais da Cidade de Vitória.

Para o desenvolvimento das atividades do Observatório, levou em conta as seguintes questões


que precedem a definição do CAQ para o município, tornou-se imperativo definir o conceito
de qualidade, justiça e equidade a partir das legislações e documentos produzidos por este
município e nas demais instâncias que afetam diretamente as políticas educacionais
desenvolvidas.

Entende-se que é necessário identificar o que os documentos produzidos e aplicados pelo


município de Vitória/ES, ao longo das últimas três décadas, traduzem sobre a qualidade, justiça
e equidade que se pretende para a criança e o estudante da rede pública municipal.

METODOLOGIA

A opção de percurso metodológico utilizado pelo Observatório, a princípio, foi a de leitura


circular, objetivando destacar e analisar os três conceitos, em cada documento. Considerando o
tempo/espaço destinado para as atividades, após avaliação da metodologia, mesmo considerada
37

positiva, foi necessária realizar uma adequação, distribuindo os documentos e legislações por
áreas: Educação Infantil; Ensino Fundamental; Tempo Integral; Diversidade, gênero e etnia;
Educação de Jovens e Adultos; Gestão democrática e participativa; Gestão de Pessoas;
Educação Especial; e por integrantes do GT, com a finalidade de que os destaques fossem
socializados com os demais, e os conceitos elaborados a partir do que já se é utilizado no
município.

Os três conceitos são complexos e envolvem aspectos legais, sociais, econômicos, políticos,
ideológicos, entre outros. Quando nos referimos a cada um deles de forma isolada, ou em
conjunto, estamos falando a partir de um contexto, de uma realidade e, neste estudo, estamos
tratando de qualidade, justiça e equidade tendo como foco de análise a educação do município
de Vitória/ES.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O conceito do Custo Aluno-Qualidade (CAQ) foi reafirmado na Conferência Nacional de


Educação (CONAE 2014) e no Plano Nacional de Educação (PNE 2015). Já Custo Aluno
Qualidade Inicial (CAQi) antecedeu o CAQ e, como uma proposta de justiça federativa, se
apresenta como uma possibilidade de ampliar e aprofundar a compreensão dos aspectos
políticos e pedagógicos, ao serem considerados os insumos necessários a ampliar a qualidade
de educação brasileira.

Carreira e Pinto (2007) entendem que o CAQ compõe-se de quatro categorias de insumos:
estrutura e funcionamento (construção e manutenção de prédios, materiais básicos de
conservação, equipamentos de apoio ao ensino); condições oferecidas pelos trabalhadores
(salário, plano de carreira, formação inicial e continuada); gestão democrática (participação da
comunidade, funcionamento dos conselhos, escolha democrática dos dirigentes, existência e
liberdade para associações de estudantes, professores e funcionários, construção conjunta de
projeto pedagógico); acesso e permanência na escola (alimentação, material didático, transporte
e vestuário). O documento final da CONAE 2010 propôs que o financiamento da educação
tenha como mecanismo de referência, o CAQ. O PNE (2014) afirma o CAQ como proposição
de implementação em curto prazo e de complementação federal para os entes que não o
atingirem.

QUALIDADE
38

O conceito de qualidade é complexo e envolve: (1) custeio adequado das atividades escolares
como aspecto fundamental e meio de garantir a aquisição de insumos em quantidades e
variedades apropriadas para assegurar condições objetivas para a oferta de uma educação
efetiva; articulado à (2) valorização dos sujeitos envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem nas atividades de organização e gestão da escola; (3) atenção aos aspectos
pedagógicos; e à (4) consideração das expectativas da comunidade escolar quanto à aquisição
dos saberes ministrados pela escola (ALVES, 2012).

Ainda envolve os aspectos: garantia de acesso; condições adequadas de permanência e


aprendizagem; a promoção do desenvolvimento do ponto de vista político, humano e social;
emancipação e inserção social; a não (re)produção de mecanismos de diferenciação e de
exclusão social.

Os documentos e legislações analisados pelo Observatório indicam que a posição em relação


ao conceito de qualidade vem sofrendo alternância conforme os contextos anteriormente citados
e em linhas gerais, acompanham o debate nacional. Assim, falar da garantia de qualidade,
implica em avançar no processo e na concepção de gestão educacional, tendo como elemento
norteador a participação e o protagonismo de toda a comunidade escolar; o fortalecimento
relacionado a dimensão político-pedagógica do ensino, que por sua vez é um dos eixos
responsáveis pela permanência e aprendizagem das crianças e estudantes nas unidades de
ensino; a valorização da educação por meio da busca constante de ampliar os recursos
destinados aos insumos e a valorização do magistério e profissionais da educação; os processos
de avaliação institucional local e externo, também são fontes de estudo para direcionar o
planejamento e a promoção de políticas educacionais voltadas para a qualidade da educação
pretendida no município de Vitória.

JUSTIÇA

É inerente da atividade escolar interagir e dialogar com as práticas sociais. A relação com o
social, o econômico, o cultural e o político é parte do cotidiano das unidades de ensino. Ser
guardiã de uma educação na perspectiva inclusiva em todas as suas dimensões é um
compromisso da escola.

O desenvolvimento integral das crianças e estudantes por meio do processo de aprendizagem,


das práticas de protagonismo estudantil, devem colaborar para que esse sujeito desenvolva o
senso de respeito para com as individualidades, considerando que cada ser é único e
39

compreendendo-se sujeito de sua história, praticando o respeito mútuo (Política de


Protagonismo Estudantil, 2019). Nesta era de globalização, tecnologia e informação em tempo
real, as crianças e estudantes devem desenvolver a habilidade de analisar criticamente a
realidade para reunir condições de transformá-la. Conhecer e se engajar na luta pela justiça
social, pela solidariedade humana e para o exercício da cidadania compromissada com o bem
comum, abrangendo questões sociais, culturais, educacionais, de violência, dentre outras.

EQUIDADE

Para dialogar com o conceito de qualidade e de justiça entendemos que é necessário trazer o
conceito de equidade que pode ser definida como o uso da imparcialidade para reconhecer o
direito de cada um, na busca de torná-los iguais, sem preconceitos ou privilégios. Assim, a
equidade busca garantir a oferta de oportunidades iguais a todos, tendo como objetivo uma
sociedade mais justa. É necessário olhar para as desigualdades de aprendizado entre as crianças
e estudantes de todas as realidades sociais, culturais, econômicas para garantir que estejam
aprendendo e aproveitando os processos educativos.

A relação entre qualidade e equidade que responderá pela justiça na educação, superando as
desigualdades sociais, garantindo a educação na perspectiva inclusiva e que todas as crianças e
estudantes estejam incluídos no processo democrático de direito (SOARES, 2005).

CONCLUSÕES

No município de Vitória, o banco de dados e publicações legitima a concepção da garantia do


direito à educação, ou seja, o direito à educação básica, conforme os estudos e análises de Cury
(2002), ou seja, “[...] com ela podem-se criar condições mais propícias não só para a
democratização da educação, mas também para a socialização de gerações: mais ou menos
injustas” (CURY, 2002, p. 347).

Agora, o movimento da política pública municipal educacional também avança em


compreender como se dá a garantia do direito à qualidade da educação (XIMENES, 2014), a
partir da relação com a valorização dos profissionais (formação, condições de trabalho,
remuneração) e demais elementos para o avanço no monitoramento do acesso e permanência
das crianças, adolescentes, jovens e adultos na educação municipal.

Os estudos e análise documental, a partir do Observatório do CAQVix, sinalizam a importância


de aprofundamento dos debates sobre a qualidade da educação nos territórios escolares, análises
40

dos Projetos Políticos e Pedagógicos, fortalecimento da gestão escolar e estudos aprofundados


sobre os PQRs das Unidades Escolares.

REFERÊNCIAS

ALVES, T. Desenvolvimento de um modelo de previsão de custos para planejamento de


sistemas públicos de educação básica em condições de qualidade: uma aplicação a
municípios de Goiás. 2012. Tese (Doutorado). Faculdade de Economia, Administração e
Contabilidade da Universidade de São Paulo, 2012.
CARREIRA, D., PINTO, J. M. R. Custo aluno-qualidade inicial: rumo à educação pública
de qualidade no Brasil. São Paulo: Global: Campanha Nacional pelo Direito à Educação,
2007.
CURY, C. R. J. Direito à educação: direito à igualdade, direito à diferença. Cadernos de
Pesquisa, São Paulo, n.116, p. 245-262, jul. 2002.
SOARES, J. F. Qualidade e Equidade na Educação Básica Brasileira: fatos e
possibilidades. In: Os desafios da educação no Brasil. Rio de Janeiro, 13, 2005. p. 87 – 114.
VITÓRIA. Política Municipal de Protagonismo Estudantil. Secretaria Municipal de
Educação, ES: Vitória, 2020.
VITÓRIA. Lei Nº 9.236, de 21 de dezembro de 2017. Dispõe sobre o Plano Plurianual –
PPA, para o período de 2018/2021. Disponível em:
http://camarasempapel.cmv.es.gov.br/Arquivo/Documents/legislacao/html/L92362017.html
acesso em: 19 jul. 2022
XIMENES, S.B. Direito à Qualidade na Educação Básica: teoria e crítica. São Paulo:
Quartier Latin, 2014.
41

O PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE CACHOEIRO DE


ITAPEMIRIM: UM OLHAR SOBRE A EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA

Hellen Abreu Nascimento Mangefeste


Mestranda em Ensino Educação e Formação de Professores Universidade Federal do Espírito
Santo – UFES/Alegre hellenabreu525@gmail.com

Marileide Gonçalves França


Professora Orientadora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino Educação e
Formação de Professores, Universidade Federal do Espírito Santo – UFES/Alegre
marileide.ufes@gmail.com

INTRODUÇÃO

O plano Nacional de Educação foi estabelecido na Constituição Federal de 1988 (CF/88), art.
214, com duração de dez anos com a finalidade de “[...] articular o sistema nacional de educação
em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação
para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e
modalidades [...]” (BRASIL, 1988). Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n°
9.394/96 (LDB/96), art. 9º, foi previsto que cabe a União a elaboração do Plano Nacional, em
colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

No ano de 2014, após quase quatro anos de tramitação entre o Ministério da Educação (MEC),
o Congresso Nacional e sociedade civil, o PNE foi aprovado pela Lei nº 13.005, de 25 junho,
com 14 artigos, 20 metas e 254 estratégias que, durante os próximos 10 anos, orientarão as
diretrizes e as políticas educacionais. Para a efetivação das diretrizes a Lei n° 13.005/2014,
determina:
Art. 8° Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar seus
correspondentes planos de educação, ou adequar os planos já aprovados em lei, em
consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas neste PNE, no prazo de 1
(um) ano contado da publicação desta Lei.
§ 1° Os entes federados estabelecerão nos respectivos planos de educação estratégias
que:
I – Assegurem a articulação das políticas educacionais com as demais políticas
sociais, particularmente as culturais;
II – Considerem as necessidades específicas das populações do campo e das
comunidades indígenas e quilombolas, asseguradas a equidade educacional e a
diversidade cultural;
III – Garantam o atendimento das necessidades específicas na educação especial,
assegurado o sistema educacional inclusivo em todos os níveis, etapas e modalidades;
IV – Promovam a articulação interfederativa na implementação das políticas
educacionais.
42

Assim, cabe aos entes federados a construção dos planos estaduais e municipais em articulação
com as diretrizes do Plano Nacional para o desenvolvimento de suas ações e políticas
educacionais, inclusive para as políticas de Educação Especial.

No que se refere à Educação Especial, a sua garantia como direito é ratificada na CF/88, no art.
208, Inciso I que assegura “[...] o atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino” (BRASIL, 1988) e na LDB/96,
Capítulo V que estabelece a Educação Especial como modalidade de ensino que perpassa os
diferentes níveis de ensino. No ano de 2008, foi publicada a “Política Nacional de Educação
especial na Perspectiva da Educação Inclusiva” – PNEE-EI/2008 – (BRASIL, 2008), que
passou a orientar os sistemas de ensino para a organização de serviços e recursos de educação
especial. Vale destacar que os princípios definidos na atual política do governo federal (PNEE-
EI/2008) foram confirmados, em 2010, pela Conferência Nacional de Educação (Conae), que
mobilizou, no território nacional, diferentes grupos sociais na discussão de diretrizes e
estratégias para a construção de um novo Plano Nacional de Educação (LAPLANE; PRIETO,
2010). No documento é ratificado “[...] o direito de acesso irrestrito à educação, pautado na
garantia de condições para a implementação de uma Política Nacional de Educação Inclusiva”
(LAPLANE; PRIETO, 2010, p. 927) às pessoas com deficiência, Transtornos Globais de
Desenvolvimento (TGD) e altas habilidades/superdotação nas classes comuns.

Diante desse cenário, buscamos nesse estudo refletir como a Educação Especial se configura
no Plano Municipal de Educação (PME) do município de Cachoeiro de Itapemirim-ES, com
vigência correspondente ao decênio 2015 a 2025.

METODOLOGIA

Para a realização deste trabalho partimos dos pressupostos da pesquisa qualitativa (MINAYO,
1994), a partir do desenvolvimento da pesquisa documental, na tentativa de identificar como se
configura a Educação Especial no PME do município de Cachoeiro de Itapemirim-ES, com
vigência para o período de 2015 a 2025. Shiroma, Campos e Garcia (2005, p.429) destacam
que as fontes documentais “[...] são relevantes tanto porque fornecem pistas sobre como as
instituições explicam a realidade e buscam legitimar suas atividades[...]”.

Desta forma, a análise documental abrange todo o processo de seleção, coleta, armazenagem e
consulta dos materiais que tendem a contribuir com o desenvolvimento da pesquisa, bem como
a análise e interpretação dos dados coletados.
43

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O PNE em vigência estabelece 20 “metas estruturantes para a garantia do direito à educação


básica com qualidade”. Para o presente estudo, daremos ênfase a Meta 4, que consiste em:

Universalizar, para a população de 4 a 17 anos com deficiência, transtornos globais


do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica
e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de
ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos
multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados
(BRASIL, 2014, p. 11).

A fim de promover a universalização e o acesso à educação básica e ao atendimento educacional


inclusivo, a Meta 4 do PNE/2014 apresenta 19 estratégias que tendem a contribuir para com a
efetivação da meta. Dentre as estratégias, ressaltamos que o PNE reafirma o apoio financeiro
do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (FUNDEB) e a dupla matrícula dos estudantes no atendimento
educacional especializado (Meta 4.1); determina a universalização do atendimento educacional
especializado e a implantação das salas de recursos multifuncionais (estratégias 4.2, 4.3, 4.4,
4.7, 4.8, 4.9); estimula a pesquisa e o trabalho integrado entre a saúde, assistência social e a
educação (estratégias 4.5, 4.6, 4.10, 4.11, 4.12, 4.18, 4.19); além, de incentivar a formação
inicial e continuada dos profissionais da educação de forma a contribuir com o processo de
ensino e aprendizagem pautado na educação inclusiva (estratégias 4.13, 4.14) (B RASIL, 2014).

No município de Cachoeiro de Itapemirim-ES, o PME foi instituído pela Lei n° 6.123/2008,


porém, com a publicação do PNE (2014-2024), o PME foi revisado e ajustado em consonância
a Lei n° 13.005/2014. Isso posto, foi fixado pelo município metas e estratégias para cada eixo
temático, considerando os diferentes níveis e modalidades de ensino.

Ao tocante da Educação Especial, o PME (2015) aponta na Meta 4 o foco em “Universalizar,


para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos, o atendimento escolar aos estudantes com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades ou superdotação”.
Observamos a articulação do PME ao PNE ao mencionar o foco na universalização do
atendimento escolar aos estudantes elegíveis para Educação Especial, conforme preconiza a
PNEE-EI (2008), deficiência, TGD e altas habilidades/superdotação. Além disso, identificamos
estratégias semelhante para o alcance da metas como: a disseminação de informações e a
consolidação de diretrizes municipais referentes a educação especial e a oferta do atendimento
educacional especializado no município (estratégia 1 e 2); o empenho na manutenção e
44

expansão da Educação especial por meio do gerenciamento de recursos e a ampliação de Salas


de Recurso Multifuncionais (SRM) (estratégia 3 e 4); o acompanhamento e avaliação da
Educação Especial no município (estratégias 6 e 13); o estabelecimento de parcerias entre as
secretarias de Secretaria de Educação, Saúde, Desenvolvimento Social, entidades filantrópicas
e instituições de ensino superior; e adesão aos programas do MEC (estratégias 7, 8 e 9); garantia
da oferta da educação bilíngue (Libras), adoção do Sistema Braille e oferta de formação em
Libras e Braille aos educadores interessados (estratégias 10, 11 e 12).

Desse modo, observamos que o município adota a perspectiva da Educação Especial na


perspectiva da Educação Inclusiva, a partir da previsão de políticas e ações que visam a inclusão
dos estudantes elegíveis dessa modalidade de ensino nas classes comuns e abrangem: a
ampliação da oferta de serviços, o atendimento educacional especializado, financiamento e a
formação continuada para os profissionais da rede municipal, embora restrita a área de Libras
e Braille. Contudo, identificamos que o município prevê o estabelecimento de parceria com
instituições privadas, sem fins lucrativos para o atendimento aos estudantes com deficiência,
TGD e altas habilidades/superdotação, o que pode representar a destinação de recursos públicos
às instituições privadas que ofertam serviços de educação especial. Nesse sentido, França
(2014, p. 172) destaca que o processo de tramitação e aprovação do PNE (2014-2024) “mais
uma vez apresentou as correlações de forças existentes, historicamente, na definição de políticas
da educação especial, marcadas pelas disputas entre os grupos das entidades privadas, as
organizações do setor público e o governo”, para a oferta do atendimento educacional e a
obtenção dos recursos públicos destinados à educação especial. Aspecto que também pode ter
acontecido no município, no processo de discussão e aprovação do PME. Temática que será
investigada em outro estudo pelas autoras deste trabalho.

CONCLUSÃO

Ao analisarmos a Educação Especial no Plano Municipal de Educação de Cachoeiro de


Itapemirim-ES, com vigência para o decênio de 2015/2025, identificamos que ela está prevista
no PME, em especial na Meta 4 e suas estratégias estão articuladas a Meta 4 do PNE (2014-
2024), na tentativa de contribuir com implementação das políticas de educação especial na
perspectiva da educação inclusiva e assegurar o processo de escolarização dos estudantes
elegíveis da educação especial nas classes comum no município.

REFERÊNCIAS
45

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:


Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional (LDB). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 23 de
dez. 1996. Seção 1.
BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação
(PNE) e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,
Brasília, 26 jun.
CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM. Lei n° 6.123, de 30 de maio de 2008. Dispõe sobre o
plano municipal de educação e dá outras providências. Diário Oficial [do] Município de
Cachoeiro de Itapemirim-ES. Cachoeiro de Itapemirim, 24 jun. 2008. Disponível em:
http://www.cachoeiro.es.gov.br/transparencia/diario/2008/diario3180.pdf. Acesso em: 12 dez.
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FRANÇA, Marileide Gonçalves. Financiamento da educação especial: complexas tramas,
permanentes contradições e novos desafios. 2014. Tese de Doutorado. Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2014.

LAPLANE, Adriana Lia Frisman; PRIETO, Rosângela Gavioli. Inclusão, diversidade e


igualdade na Conae 2010: perspectivas para o novo Plano Nacional de Educação. Educação
& Sociedade, Campinas, v. 31, n. 112, p. 919-938, jul./set. 2010.

MINAYO, Maria C.S. Interdisciplinaridade: funcionalidade ou utopia? Saúde e Sociedade,


São Paulo, v.3, n.2, pp.42-64, 1994. Disponível em: https://bit.ly/2sLcjIQ. Acesso em: 29 out.
2020.

SHIROMA, E. O.; CAMPOS, R. F.; GARCIA, R. M. C. Decifrar textos para compreender


a política: subsídios teórico-metodológicos para análise de documentos. v. 23 n. 2 (2005):
Dossiê - Políticas públicas e educação no contexto da globalização.
46

EVASÃO E POLÍTICAS DE PERMANÊNCIA ESCOLAR NO ENSINO MÉDIO


TÉCNICO INTEGRADO: PROBLEMATIZANDO A QUESTÃO.

Fernanda Vasconcelos de Lima Kanashiro


UNICID - Universidade Cidade de São Paulo
fernanda.vlima@yahoo.com.br

Ângela Maria Martins


Fundação Carlos Chagas
UNICID - Universidade Cidade de São Paulo
ange.martins@uol.com.br

INTRODUÇÃO

Este trabalho integra uma pesquisa em desenvolvimento que tem como objetivo discutir a
questão da evasão escolar e permanência no ensino médio integrado do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo - Campus Registro. As informações para a
construção deste trabalho estão sendo retiradas de documentos e dados públicos oficiais que,
após serem tratados, poderão compor uma base para implementação de novas políticas e
programas para aprimoramento de ações no local pesquisado.

Inicialmente, realizou-se o levantamento da bibliografia existente sobre o assunto com o


objetivo de aprofundar o entendimento sobre as questões que envolvem os movimentos de
evasão, seus principais entraves apontados em outras pesquisas e também, a verificação dos
dados recolhidos na Plataforma Nacional Nilo Peçanha1.

O objetivo geral do estudo é levantar, sistematizar e analisar fontes oficiais com base no acervo
documental do IFSP, com o intuito de ampliar as discussões disponíveis a respeito das políticas
e ações de permanência e êxito dos alunos do IFSP/Campus Registro do ensino médio
integrado. Os objetivos específicos são: relacionar e analisar os índices de evasão escolar do
IFSP de 2017 a 2021; sistematizar e analisar dados dos programas de permanência e êxito do
Campus Registro; delinear informações que possam subsidiar a instituição com vistas a ampliar
as políticas de combate à evasão escolar.

METODOLOGIA

Para o desenvolvimento da pesquisa, será utilizada a aplicação de entrevista estruturada com


análise documental e bibliográfica. Para Triviños (1987; p. 146) A análise através de

1
Disponível em: https://www.gov.br/mec/pt-br/pnp. Acesso em: 25 agos. 2022.
47

informações retiradas de entrevista pode colaborar para o surgimento de outras hipóteses que
possam surgir durante sua aplicação. De acordo com Gil (2002, p. 46), a pesquisa do tipo
documental permite acesso a uma fonte rica e estável de dados que possibilita o tratamento de
arquivos primários. Já a pesquisa do tipo bibliográfica permite ao investigador a cobertura de
uma gama de fenômenos muito mais ampla, ampliando a visibilidade do problema.

Foram reunidos dados extraídos da Plataforma Nacional Nilo Peçanha (PNP) sobre os números
da evasão escolar do IFSP - Campus Registro e confrontados com a média de outros campi
semelhantes do IFSP, com um recorte temporal de 2017 a 2021. Também foram sistematizados
e analisados documentos do mesmo período elaborados pela instituição como por exemplo, os
projetos político-pedagógicos, planos de desenvolvimento institucional, relatórios de gestão e
demais documentos levantados que foram julgados relevantes para o desenvolvimento desta
pesquisa.

Este trabalho apresenta e discute apenas questões referentes à taxa de evasão no Campus
Registro comparado ao grupo dos demais campus semelhantes, a partir do ano de 2020.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os resultados obtidos podem ajudar a compreender melhor os motivos que levam esses jovens
a abandonarem ou permanecerem na instituição. Os núcleos de apoio ao ensino e demais setores
correlatos do IFSP podem utilizar as informações a fim de determinar novas ações de combate
à evasão.

No tratamento inicial efetuado com os dados encontrados na Plataforma Nilo Peçanha,


identifica-se que houve um aumento da taxa de evasão no Campus Registro comparado ao
grupo dos demais campus semelhantes, a partir do ano de 2020.

Inicialmente, a informação que a plataforma disponibiliza do campus Registro sinaliza que


entre o exercício de 2017 até 2019 havia uma taxa relativamente menor que os demais campi,
sendo em 2019 seu ano de menor índice, 2,9% de evasão no IF -Registro, contra 5,1 % dos
demais. Mas nos anos seguintes, 2020 e 2021, o que se observa é a inversão do trajeto dos
dados, pois os outros campi da instituição passam a apresentar queda na taxa de evadidos,
principalmente no exercício do ano de 2020, onde o Campus Registro obteve 3,1%, contra
2,4 % dos demais, conforme se observa na tabela abaixo.

Tabela 1 – Taxas de evasão do ensino médio integrado do IFSP


48

Elaboração: as autoras, em 2022.


Vale ressaltar que, por mais que esta pesquisa seja direcionada às questões de permanência
escolar, não há como não discutir a evasão visto que esse fenômeno está interligado diretamente
à ausência de ações de enfrentamento ao fenômeno, sobretudo por meio das diretrizes da
Política de Assistência Estudantil (PAE), voltada ao êxito na permanência de alunos na referida
instituição.

Porém, considerando-se o cenário mundial da pandemia da COVID-19, é certo que o quadro


pandêmico contribuiu significativamente de forma negativa na economia de inúmeras famílias
da população brasileira, forçando-as a se reorganizar financeiramente. Com o orçamento mais
enxuto, as despesas que não são de necessidades primárias passam a ser deixadas em segundo
plano. Infere-se que o tempo que antes o aluno poderia ter totalmente dedicado aos estudos,
com a pandemia, levou-os ao mercado de trabalho com a finalidade de ajudar a compor a renda
familiar.

CONCLUSÃO

Inicialmente, vale ressaltar que os fatores que levam os alunos a evadirem do ensino médio
integrado ou permanecerem nele podem ser diversos. Os fatores de evasão encontrados no
levantamento bibliográfico desta pesquisa são multifacetados: falta de informações iniciais
sobre o curso escolhido; localização da instituição que dificulta o acesso e gera maior custo de
deslocamento; problemas familiares; nível de instrução diferente entre os alunos advindos da
rede pública e os da rede particular de ensino; incompatibilidade de horários, entre outros. Já
os motivos que levam à permanência podem ser direcionados às políticas de assistência social
consistentes; ao quadro de docentes qualificados e com dedicação exclusiva; ao status por fazer
parte de um grupo seleto e pequeno da instituição; à rede de apoio ao aluno composto por
profissionais como psicólogo, nutricionista, psicopedagogo e assistente social, entre outros.
49

Embora esse desafio marque o Ensino Médio também nas outras redes de ensino é
preciso considerar que os IFs apresentam condições mais propícias ao bom desempenho
dos alunos visto que contam com profissionais com melhor formação, maior
remuneração, professores com dedicação exclusiva o que possibilita o atendimento
mais individualizado aos alunos no contraturno. Contam também com programas de
assistência estudantil que auxilia financeiramente os estudantes com maior
vulnerabilidade socioeconômica para que permaneçam na escola. Em geral, contam
também com melhor infraestrutura e materiais pedagógicos. (MILLIORIN, 2018, p.
162)

A respeito dos arquivos institucionais disponibilizados no site oficial do Campus Registro,


verifica-se que houve um movimento efetuado pelo campus Registro na tentativa de conter o
avanço dos índices de evasão, justamente nos anos em que esse valor foi superior à média dos
demais campi, em 2020 e 2021. Naquele momento havia a desmedida instabilidade econômica
gerada pela circulação do vírus da Covid -19, fato altamente significativo nas questões da
permanência escolar dos jovens, principalmente nos mais vulneráveis.

Neste cenário de incertezas, o Campus Registro promoveu, através dos editais nº 024/2020 e nº
017/2020 os empréstimos de computadores/ tablets e distribuição do Auxilio Conectividade de
Inclusão Digital para os alunos que preenchiam determinados critérios de vulnerabilidade
social. Foram disponibilizadas pelo campus, ainda, 150 unidades de cestas básicas através da
Cotação Eletrônica nº 03586/2020, com o intuito de atender aqueles alunos que apresentavam
maior risco social e pudessem ter suas questões de desigualdade minimizadas.

Apesar de termos constatado o aumento do índice de evasão no IF – Registro, em relação ao


grupo de outros campi, não podemos ignorar o fato de que houve um declínio da taxa de evasão
de forma geral. Os campi tratados nesta pesquisa mostraram que apesar das adversidades,
encontraram meios para que os índices fossem melhorados paulatinamente, ano após ano. Isso
permite inferir que possivelmente as políticas de permanência estudantil podem ter refletido de
forma positiva na Instituição de modo geral.

REFERÊNCIAS

Edital de Cotação Eletrônica nº 03586/2020 [Aquisição de cestas básicas] Registro: Instituto


Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo - Campus Registro, Registro, 2020.
Disponível em
https://rgt.ifsp.edu.br/portal/arquivos/2020/06/Termo%20de%20Refer%C3%AAncia%20-%2
0Cestas%20b%C3%A1sicas.pdf. Acesso em: 25 agos. 2022.
Edital nº 017/2020 [Auxilio Conectividade de Inclusão Social] Registro: Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo - Campus Registro, Registro, 2020. Disponível
em:https://rgt.ifsp.edu.br/portal/sobre-o-campus/outras-noticias/1612-edital-017-2020-
aux%C3%ADlio-conectividade. Acesso em: 25 agos. 2022.
50

Edital nº 024/2020 [Empréstimo de computadores] Registro: Instituto Federal de Educação,


Ciência e Tecnologia de São Paulo - Campus Registro, Registro, 2020. Disponível em
https://rgt.ifsp.edu.br/portal/sobre-o-campus/outras-noticias/1622-edital-024-2020-
empr%C3%A9stimo-de-computadores. Acesso em: 25 agos. 2022.
GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2002.
MILLIORIN, Simone A. Atuação da rede federal na ampliação do direito à educação
básica: uma análise da oferta do ensino médio integrado nos institutos federais.
Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal do Paraná. Curitiba. 2018.
TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em
educação. São Paulo: Atlas, 1987
51

SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO: A FALA AMAZÔNICA EM UMA


DISCUSSÃO DE DISPUTA TEÓRICO-POLÍTICA

Geraldo Grossi Junior


Universidade Federal do Tocantins
geraldogrossi@gmail.com

Rosilene Lagares
Universidade Federal do Tocantins
roselagares@uft.edu.br

INTRODUÇÃO

Neste trabalho, com perspectiva materialista histórico-dialética, apresentamos resultados


parciais de revisão bibliográfica e pesquisas documental e empírica (observação)2 (SHIROMA;
CAMPOS; GARCIA, 2005), tendo por objetivo apreender a(s) concepção(ões) teórico-políticas
a respeito do SNE dos representantes da Amazônia Legal convidados a participar das
Audiências Públicas sobre o SNE, realizadas na Câmara de Deputados no período entre 2019 e
o primeiro semestre de 2021.

A discussão a respeito do movimento de institucionalização do Sistema Nacional de Educação


(SNE) é de longa data, recorrente na literatura da educação brasileira e perpassada por
controvérsias e disputas entre concepções teórico-políticas (CURY, 2000; SAVIANI, 2014;
LAGARES, 2014; 2015; MARQUES, 2014).

MOVIMENTO DE INSTITUCIONALIZAÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE


EDUCAÇÃO NA CÂMARA DOS DEPUTADOS

No período de 2014 a 2016, foram apresentados 03 (três) documentos a Câmara de Deputados


discutindo e propondo a implementação do SNE. No ano de 2014, o então Deputado pelo
PT/MT, Ságuas Moraes, apresentou o PL nº 413/2014 (CÂMARA FEDERAL 2014) e, em 1º
de abril de 2016, o Fórum Nacional de Educação (FNE), aprovou em sua Plenária uma proposta
de PL denominada “Sistema Nacional de Educação – documento propositivo para o debate
ampliado” (FNE, 2016). Esse documento apresentava a seguinte ementa: “Projeto de Lei
Complementar que institui o Sistema Nacional de Educação e regulamenta a seção da educação

2
Pesquisa em desenvolvimento no Programa de Doutorado em Educação da Amazônia em Rede/Polo
Palmas/Universidade Federal do Tocantins (PGEDA/Educanorte).
52

na Constituição Federal, especialmente, os art. 23 e 211, e dá outras providências”. Também, o


Ministério da Educação (MEC), em 2016, disponibilizou em seu sítio uma proposta de PL com
a ementa: “Regulamenta o parágrafo único do art. 23 da Constituição, institui o Sistema
Nacional de Educação e fixa normas da cooperação Federativa entre a União, os estados, o
Distrito Federal e os municípios, entre os estados e os seus municípios e entre os municípios”
(BRASIL, 2016). As propostas do FNE e do MEC não se tornaram PL.

A partir de 2019, foram apresentados outros 04 (quatro) Projetos de Leis Complementares


(PLP) tratando do tema, assim como da cooperação federativa e do regime de colaboração, que
tramitam na Comissão de Educação da Câmara Federal: nº 25/2019, de autoria da Deputada
Professora Dorinha Seabra Rezende – DEM/TO (CÂMARA FEDERAL, 2019a), ao qual foram
apensados 03 (três) PLP: nº 47/2019, de autoria do Deputado Pedro Cunha Lima – PSDB/PB
(CÂMARA FEDERAL, 2019b); nº 216/2019, de autoria da Deputada Professora Rosa Neide –
PT/MT (CÂMARA FEDERAL, 2019c); nº 267/2020, de autoria da Deputada Rose Modesto –
PSDB/MS.

Da análise dos conceitos, observamos que, embora o PLP nº 47/2019 esteja apensado a esse
conjunto, efetivamente, não trata da instituição do SNE. Os PLP nº 25/2019 e nº 267/2020,
também, trazem o elemento cooperação e acrescentam a colaboração, propondo que as relações
entre os entes federados sejam pela colaboração respeitando as normas de cooperação. Os
Projetos tratam, ainda, da institucionalização do SNE considerando-se a organização existente
– Sistema Federal, sistemas estaduais, Sistema Distrital e sistemas municipais, e introduzem
expressões, como “articulação colaborativa dos sistemas”, “esforço organizado autônomo e
permanente”, “articulação de sistemas.” Assim, mantêm a cooperação e a colaboração como
desafios para conceituação e materialização.

O LUGAR DE FALA DOS CONVIDADOS NAS AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

Para a realização de uma audiência pública em uma Comissão da Câmara Federal se faz
necessário um requerimento assinado por um ou mais deputados. No requerimento, devem
constar o nome da audiência, o tema a ser debatido e as pessoas que serão convidadas para o
debate. (https://www.camara.leg.br. Acesso em: 10 mar. 2021).

QUEM SÃO OS CONVIDADOS


53

Para identificar os convidados, buscamos resumos constantes na Plataforma Lattes ou


Escavador3. Nas seis audiências, fizeram uso da palavra 34 convidados, considerando inclusive
aqueles que se pronunciaram mais de uma vez.

Para este trabalho, foram utilizadas três categorias como recorte para identificar pessoas ligadas
ao Território da Amazônia Legal entre os convidados das audiências: naturalidade, local da
formação acadêmica e local de exercício profissional.

Dos 34 convidados para as seis audiências, são identificados como da Amazônia Legal, segundo
essas categorias, 07 convidados: Carlos Abicalil; Gilmar Soares Ferreira; Maria Goreth da
Silva e Souza; Flávia Nogueira; Gersem José dos Santos Luciano (Baniwa); Francisca
Novantino Pinto de Ângelo (Pareci); Wilder Kirliam da Costa Nascimento.

As Duas Concepção(ões) Teórico-Políticas em Disputa

Os Projetos se configuram em duas ações: a regulamentação do artigo 23 da Constituição e a


instituição do SNE.

Nas falas proferidas nas seis audiências públicas, nenhum dos convidados fez uma abordagem
específica a respeito de um único Projeto, tratando de forma genérica de pontos relacionados a
todos os PLP.

Em suma, na primeira, segunda e terceira audiências, os convidados, de modo geral, ratificaram


a necessidade da institucionalização do SNE, às vezes abordando sua existente previsão legal
e/ou a necessidade prática de se estabelecer uma coerência e uma unidade na organização da
educação brasileira. Também, levantaram pontos que, ao seu juízo, precisariam de atenção do
relator para aprofundar, modificar ou incluir nos PLP. A quinta audiência tratou,
exclusivamente, da questão Escolar Indígena. Na sexta audiência, o tema foi a inovação dos
contratos colaborativos, e os convidados, também, se posicionaram como se fosse ponto
pacífico a instituição do SNE e trataram do recorte do instrumento legal para viabilizar a
cooperação entre os entes federados.

A voz destoante se manifestou na quarta audiência, na qual os convidados foram unânimes em


afirmar a não necessidade de se instituir o SNE. Apresentam como principal alegação para
justificar essa posição contrária, a crença de que seria uma centralização das decisões,

3
Todos esses dados e informações foram colhidos nos dias 13 e 15 de agosto de 2021.
54

propondo, inclusive, a revogação da EC nº 59/2009. Não percebemos, nessa proposta, por parte
dos interlocutores, nem mesmo o cuidado de garantia dos demais temas abordados pela
Emenda, como por exemplo, a ampliação da obrigatoriedade da educação.

A FALA DOS INTERLOCUTORES DA AMAZÔNIA LEGAL

A Amazônia abrange cerca de 7 milhões de Km², dos quais 5,5 milhões são cobertos por uma
densa floresta tropical de clima úmido e quente que abrange nove países da América Latina
sendo: Suriname, Guiana, Peru, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana Francesa, Colômbia e o
Brasil, que absorve 60% de toda a composição geográfica.

No Brasil, é constituída pelos estados amazônicos, os quais são compreendidos como partes
constitutivas de um espaço geográfico denominado Amazônia Legal e é composta pelos estados
do Tocantins, Roraima, Maranhão, Amapá, Rondônia, Mato Grosso (com exceção do pantanal),
Amazonas e Pará (COSTA; BRASILEIRO, 2016).

A região é caracterizada por sua grande extensão territorial, com uma rica biodiversidade e
recursos naturais que a destacam como uma das mais ricas regiões do planeta. (COSTA;
BRASILEIRO, 2016).
Na fala dos sete representantes vinculados a Amazônia, não percebemos um posicionamento
ou referência específica a essa vasta e diversa territorialidade denominada Amazônia Legal.
Podemos supor que, por se tratar de um tema de abrangência nacional ou por estarem
representando instituições com capilaridade, também, nacional, os convidados tenham feito a
opção de não se referir especificamente ao Território Amazônico. Os convidados não
enquadrados nessas categorias, também, não fizeram referências direta ao seu lócus de origem
ou atuação.
Contudo, considerando o espaço representativos desses convidados amazônicos (sete entre
trinta e quatro) e, ao mesmo tempo, a necessidade de firmar a Amazônia Legal como território
produtor de conhecimento e cultura, muitas vezes não reconhecido nacionalmente, podemos
dizer que seria um espaço significativo de afirmação da cultura Amazônica.

CONCLUSÃO

Tendo por objetivo apreender a(s) concepção(ões) teórico-políticas a respeito do SNE dos
representantes da Amazônia Legal convidados a participar das Audiências Públicas sobre o
SNE, realizadas na Câmara de Deputados no período entre 2019 e o primeiro semestre de 2021,
55

no momento, podemos concluir que a tendência é pela instituição do Sistema, contudo o que
realmente irá determinar o passo a ser dado será a apreciação final dos Deputados e Senadores.
E neste caso, tudo pode acontecer.

No entanto, reiteramos que a disputa de projeto antagônicos na educação brasileira remonta sua
origem, como exemplos históricos recentes temos o processo de elaboração do PNE 2001 e da
própria LDB de 1996. E, com relação a instituição do SNE, não está sendo diferente. Mesmo
que convergente em muitos pontos, temos hoje em tramitação na Comissão de Educação da
Câmara de Deputados três Projetos e, ainda, encontra-se em apreciação no Senado Federal um
outro Projeto com o mesmo objeto.
Assim, além do que poderíamos chamar de dissonâncias convergentes, temos também espaço
para total oposição a instituição do SNE. A discussão deste tema no Congresso Nacional ainda
não está concluída. A correlação de forças se mantém e tem a tendência de se intensificar.

REFERÊNCIAS

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Nacional de Educação [...]. 2016a. Disponível em: www. fne.mec.gov.br.
BRASIL. Ministério da Educação. Projeto de Lei Complementar. Regulamenta o parágrafo
único Do art. 23 da Constituição, institui o Sistema Nacional de Educação e [...]. Brasília, DF,
2016b. Disponível em: www.mec.gov.br.
BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano
Nacional de Educação – PNE. Brasília, DF, 2014a. Disponível em: www.mec.gov.br.
BRASIL. Câmara Federal. Projeto de Lei Complementar nº 413/2014. Visa responder
especificamente às disposições do artigo 23 da Constituição Federal [...]. Brasília, DF, 2014b.
Disponível em http://www.camara.gov.br/sileg/integras/1270774.pdf.
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56

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BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino. O
Sistema Nacional de Educação: diversos olhares 80 anos após o Manifesto /Ministério da
Educação. Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino. Brasília: MEC/SASE, 2014.
SAVIANI, D. O Manifesto dos pioneiros da educação nova de 1932 e a questão do Sistema
Nacional de Educação. In: BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Articulação com
os Sistemas de Ensino. O Sistema Nacional de Educação: diversos olhares 80 anos após o
Manifesto. Brasília, DF: MEC/SASE, 2014.
SHIROMA, E.O.; CAMPOS, R.F.; GARCIA, R.M.C. Decifrar textos para compreender a
política: subsídios teórico-metodológicos para análise de documentos. PERSPECTIVA,
Florianópolis, v. 23, n. 02, p. 427-446, jul./dez. 2005.
COSTA, R. A. M; BRASILEIRO, T. S. A. Çairé: cultura Amazônia reinventada pelo mercado
para a mídia. In: BURGEILE, O; BUENO, J. L. P; PACÍFICO, J. M. (orgs.). Olhares da
mídia na Amazônia: movimentos e manifestações. Porto Velho: EDUFRO, 2016.
PL 8035 disponível em
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=node01txn2wgfy
kgap154whte861711840844.node0?codteor=831421&filename=PL+8035/2010
Lei 13.05/2014 disponível em https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2014/lei-13005-25-
junho-2014-778970-publicacaooriginal-144468-pl.html.
57

A OFERTA DA EDUCAÇÃO BÁSICA NOS MUNICÍPIOS DE IBITIRAMA E MUNIZ


FREIRE, ESTADO DO ESPÍRITO SANTO: ESCOLA, ALUNOS E PROFESSORES

Gabriel Pruculi e Prucoli


Universidade Federal do Espírito Santo
gppruculi1@gmail.com

Marileide Gonçalves França


Universidade Federal do Espírito Santo
leidemary8@gmail.com

INTRODUÇÃO

No Brasil, a responsabilidade pela oferta de educação escolar é compartilhada pelos entes


federados. Nessa direção, a educação foi ratificada como tarefa compartilhada entre União,
Distrito Federal, estados e municípios, sendo organizada sob a forma de regime de colaboração
(CF/1988, art. 211 e LDB/1996, art. 8º). Cada instância é responsável pela administração,
expansão e manutenção dos seus respectivos sistemas de ensino. No âmbito dessa Lei, ainda
foi enfatizado o papel coordenador e articulador da União em relação aos demais entes
federados (LDB/1996, art. 8º).

Na LDB/1996 também foi estabelecido o dever do Estado com a educação mediante a garantia
de “padrões mínimos de qualidade de ensino, definido como a variedade e quantidade mínimas,
por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem
(BRASIL, 1996, art. 4º, inciso IX).

Parte-se do pressuposto de que a política pública é a materialização da intervenção do Estado


na sociedade. Ou, nas palavras de Höfling (2001, p. 31), como “[...] responsabilidade do Estado
- quanto à implementação e manutenção a partir de um processo de tomada de decisões que
envolve órgãos públicos e diferentes organismos e agentes da sociedade relacionados à política
implementada”. Nesse sentido, tentou-se compreender como as políticas educacionais na
Região do Caparaó, Sul do estado do Espírito Santo asseguram o direito a educação, bem como
o acesso, a permanência e a qualidade de ensino.
Diante desse contexto, questionou-se: como se caracteriza a oferta da educação básica nos
municípios de Ibitirama e Muniz Freire, estado do Espírito Santo? Assim, buscou-se investigar
a oferta da educação básica nesses municípios, no período de 2009 a 2019. Compreende-se que
caracterizar a oferta da educação básica nos municípios contribui para refletir acerca das
58

políticas educacionais frente às necessidades de democratização da educação pública na Região


do Caparaó.

METODOLOGIA

Para o desenvolvimento do trabalho propôs-se a pesquisa documental na tentativa de analisar a


oferta da educação básica nos municípios de Ibitirama e Muniz Freire, no período de 2009 a
2019. A escolha do recorte temporal a partir do ano de 2009 considera as mudanças ocorridas
com o novo padrão de financiamento da educação adotado, com a finalização de sua
implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização
dos Profissionais da Educação (Fundeb), em 2009, que passou a abranger todas as etapas e
modalidades de ensino. Já a delimitação 2019, como o último ano, se deu porque são as
informações mais atuais disponíveis no site do Inep/MEC.

Desse modo, verificaram-se os dados disponíveis no Laboratório de Dados Educacionais


disponibilizados pela Universidade Federal do Paraná e no Censo Escolar/Sinopses Estatísticas,
nas páginas eletrônicas do Ministério da Educação (MEC), do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Para a organização, sistematização e análise
dos dados, optou-se pela análise de conteúdo. Nesse sentido, buscou-se, a partir da análise dos
conteúdos dos documentos, compreender os significantes e significados presentes nos textos.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

No município de Ibitirama, observou-se que, em 2009, havia um total de 2632 matrículas, sendo
que em 2019 o município contava com 2388. Observa-se ainda que a maior parte das matrículas
da série histórica encontra-se no Ensino Fundamental. Os números da Educação Infantil
apresentaram uma melhora de aproximadamente 67,02% no passar dos anos. O Ensino
Fundamental apresentou queda de 17,7%, mas com média de aproximadamente 1.689/ano. O
Ensino Médio teve uma queda de 38,85% durante os anos e o ano que contou com menor
quantidade de matrículas foi 2019, com 203 alunos.

O número maior de matrículas encontra-se na esfera municipal, mas houve uma queda de
10,28% no decorrer dos anos. Também existe grande quantidade de alunos na esfera estadual,
mas houve uma pequena queda de 6,88% de 2009 a 2019. Esses dados podem ser explicados
pelo fato de a CF/88 trazer a prerrogativa da oferta do Ensino Fundamental, que possui o maior
contingente de matrículas, para a esfera municipal e estadual. Além disso, o processo de
59

municipalização iniciado a partir da implementação do Fundo de Manutenção e


Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF, 1996-
2006), procedido pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e
Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB, 2007-atual), segundo Sales e Silva
(2013), podem ter contribuído tanto para um aumento no número de matrículas nas redes
municipais quanto para a transferência de matrículas das redes estaduais para as municipais.

Entretanto, apesar de a implementação do FUNDEB ter representado um aumento de recursos


financeiros destinados à educação, observou-se um decréscimo do número de matrículas da
Educação Básica de 9,27% de 2009 a 2019. Os dados do Relatório do Censo Escolar de 2020
confirmam o cenário encontrado no município de Ibitirama, demonstrando também uma
redução nas matrículas nessa etapa de ensino a nível de Brasil (BRASIL, 2020).

Constatou-se uma redução de 45,83% no número total de escolas do município de 2009 a 2019,
escolas de Ensino Fundamental foram as que mais tiveram queda, contanto com 22 escolas em
2009 e apenas 6 em 2019. Na Educação Infantil houve um aumento de 5 para 9 escolas, e no
Ensino Médio um aumento de 2 para 3. Também houve redução de 3 para 1 escolas que
ofertavam a EJA. Escolas que apresentavam matrículas em Educação Especial subiram de 2
para 6, levando em consideração o aumento do número de matrículas dessa modalidade. A
esfera municipal conta com o maior número de escolas sob sua jurisdição, mas com queda de
aproximadamente 52,38% a partir de 2009 (21 em 2009 e 10 em 2019). A esfera estadual se
manteve completamente estável em todos os anos da série histórica, com duas escolas por ano.

O Ensino Fundamental concentra o maior número de Docentes. Observou-se um aumento de


26,37% no número de docentes do Ensino Fundamental a partir de 2009. A Educação Infantil
vem logo depois em relação ao número de docentes, e apresentou aumento de 136,66%.

O número de docentes do Ensino Médio teve queda de 29,03% no decorrer da série histórica.
Apenas os anos de 2014, 2015, 2016, 2018 e 2019 apresentaram professores de Ensino Médio
Integrado ou normal (entre 6 a 9 professores), de acordo com a demanda de alunos nessa etapa
vistos nos gráficos anteriores. Os números da EJA tiveram um aumento de 57,14%.

Ao final observou-se que no ano de 2019 o município tinha 71 professores na educação infantil,
115 no ensino fundamental, 22 no médio, 2 em turmas multisseriadas e multietapas, 8 no Ensino
Médio Integrado e técnico e 22 na EJA.
60

Quanto ao município de Muniz Freire, a análise dos dados mostra que houve uma queda de
4610 matrículas em 2009 para 3791 em 2019. O contingente maior de matrículas se encontra
no Ensino Fundamental, com mais de 2000 matrículas em todos os anos da série histórica
estudada. Entretanto, os dados demonstram que houve uma queda de 20,41% do número de
matrículas dessa etapa de 2009 a 2019. Os números da Educação Infantil apresentaram uma
alta de 22,15% durante os anos, apesar de apresentarem queda de 19,57% de 2009 a 2012, e
aumento a partir desse ano.

Observou-se que o número de maior de matrículas encontra-se na esfera municipal. Também


se viu que houve uma queda de 16,24% nas matrículas da dependência municipal. A esfera
estadual vem em seguida, apresentando uma queda de 13,62% em suas matrículas.

Houve uma redução de 45,45% do número total de escolas no município de Muniz Freire. O
Ensino Fundamental também foi o que mais teve queda, com 37 escolas em 2009 e 17 em 2019.
A Educação Infantil teve pequeno aumento de 11 para 12 escolas, diferente do Ensino Médio,
que não teve alterações.

Percebe-se que o número maior de Escolas está sob a jurisdição da Dependência Municipal
(bem como o número maior de matrículas, como visto em gráficos anteriores). Entretanto,
houve uma redução de 50% no número de escolas municipais durante a série histórica, de 38
em 2009 para 19 em 2019.

O município apresentava um total de 244 docentes em 2009 e 241 em 2019. O maior número
de professores se refere àqueles que lecionam na etapa do Ensino Fundamental. Esse número
apresentou crescimento de 6,21% durante os anos da série histórica (de 161 em 2009 para 171
em 2019). Cabe destacar que também houve um aumento de 5,45% no número de docentes da
Educação Infantil, que tinha 55 em 2009 e 58 em 2019. O Ensino Médio também contou com
aumento, dessa vez de 10,2%. A esfera municipal concentra o maior número de professores, o
que confirma os dados anteriores que mostram um número maior de escolas e matrículas nessa
dependência. Houve uma queda de 10,5% neste número durante os anos. A esfera estadual vem
em seguida, apresentando uma alta de 7,04% no número de profissionais.

CONCLUSÃO

Esse estudo possibilitou compreender como se dá a oferta da Educação Básica nos municípios
de Ibitirama e Muniz Freire. Ao analisar os dados de número de matrículas, escolas e docentes
61

nesses municípios observou-se que, apesar do avanço das políticas educacionais promovidas
entre os anos de 2009 a 2016, como a implementação do FUNDEB, que amplia o financiamento
da Educação para toda Educação Básica, e a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos,
houve uma pequena redução no número de matrículas e de escolas nesses dois municípios.
Esses dados se articulam com o Relatório do Censo Escolar de 2020, que mostrou que desde
2016 houve uma redução no número de matrículas e escolas no Brasil. Mesmo com uma
redução, observou-se um aumento no número de docentes contratados pelos municípios
estudados.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] República Federativa do Brasil. Brasília:


Senado Federal, 1988.
______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional– LDBn.9.394, de 20 de dezembro de
1996. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 23 dez. 1996.
______. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo da
educação básica 2020: resumo técnico [recurso eletrônico] – Brasília: Inep, 2021. 70 p.: il.
HÖFLING, Eloisa de Mattos. Estado e políticas (públicas) sociais. CEDES, ano XXI, n. 55,
p. 30-41, nov. 2001.
SALES, Luís Carlos; SILVA, Magna Jovita Gomes de Sales. A Movimentação das
Matrículas no Ensino Fundamental no Estado do Piauí. Educação & Realidade, Porto
Alegre, v. 38, n. 4, p. 1283-1301, out./dez. 2013.
62

A EDUCAÇÃO ESCOLAR EM TEMPO INTEGRAL NO MUNICÍPIO DA SERRA/


ES, 2015-2019

Deborah Gomes Moura


Universidade Federal do Espírito Santo
deborahgmourag@gmail.com

Eduardo Augusto Moscon de Oliveira


Universidade Federal do Espírito Santo
eduardomoscon@hotmail.com

INTRODUÇÃO

A Educação Escolar em Tempo Integral está presente no cenário educacional há algumas


décadas. Atualmente se faz presente e tensiona as redes municipais e estaduais de ensino, por
conta das demandas sociais e devido ao Plano Nacional de Educação (PNE) - Lei 13.005/2014
- que na meta 6 trata da Educação Integral.

Face ao exposto, têm-se o seguinte problema de estudo: Quais processos foram desenvolvidos
pela Secretaria Municipal de Educação da Serra (SEDU/Serra), Espírito Santo (ES), no período
de 2015-2019, para o estabelecimento da Educação Escolar em Tempo Integral (EETI) no
Ensino Fundamental? A escolha do período de 2015-2019 tem relação com o PNE, já que uma
de suas metas trata de oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, cinquenta por cento
das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, vinte e cinco por cento dos (as) alunos
(as) da educação básica, no período de dez anos de vigência da lei, que teve início em 2014.

Para direcionar essa análise, os objetivos para o trabalho foram: identificar o histórico da EETI
no município, verificar se houve constituição de equipe específica, analisar os dispositivos
legais produzidos; investigar as motivações que conduziram o processo; apontar e analisar o
estabelecimento de parcerias/arranjos privados para a implementação da EETI e identificar o
planejamento para expansão.

A partir do mapeamento e análise do processo de implementação objetivamos subsidiar a


implantação da EETI em outros municípios, bem como contribuir com a expansão nas Redes
Municipais de Ensino que já iniciaram o estabelecimento de tal política, a partir de um
movimento que possibilite a consolidação da gestão democrática do ensino público.

METODOLOGIA
63

Para a realização da pesquisa, optamos pela pesquisa exploratória, bibliográfica, com


abordagem qualitativa, documental e de campo, em uma perspectiva crítica.
Em relação aos objetivos, a primeira etapa foi de natureza exploratória. Gil (1994) apud Moreira
e Caleffe (2008) ressalta que a pesquisa exploratória tem como finalidade desenvolver,
esclarecer e modificar ideais e conceitos. Por meio da pesquisa exploratória, foi possível
conhecer os modos de estabelecimento da EETI no município da Serra/ES e dessa forma,
contribuir com outros municípios nesse processo.

A pesquisa documental se constituiu um elemento, uma vez que analisamos documentos


referentes à implementação da EETI como: Decreto, Lei, Portaria e Política de Educação
Integral. A pesquisa documental ocorreu no diálogo com os técnicos e nos sítios eletrônicos da
SEDU/Serra. Moreira e Caleffe (2008) ressaltam que a pesquisa documental pode ser feita em
locais que sirvam como fonte de informações.

Os sujeitos envolvidos no estudo e entrevistados foram os dois técnicos da SEDU/Serra,


responsáveis pela implementação da EETI, denominados de TS1 (técnico Serra 1) e TS2
(técnico Serra 2).

A partir da metodologia apresentada, a pesquisa foi realizada, objetivando detectar e analisar


os caminhos que podem se tornar referenciais para o aprimoramento e transformação da oferta
da EETI em um direito social e como um percurso de consolidação da gestão democrática.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Apontaremos nesse tópico o percurso realizado para a implementação da EETI: o histórico da


Educação Integral no município da Serra, a constituição de equipe, os dispositivos legais
produzidos, as motivações que conduziram o processo de implementação, se houve o
estabelecimento de parcerias/arranjos e o planejamento para expansão desse formato de
escolarização.

A entrevista realizada com os técnicos da SEDU/Serra apontou o Programa Mais Educação


como elemento importante para a história da EETI no município da Serra: “[..] a oferta de
atividades que amplia a permanência dos alunos na escola tem se configurado a partir do
Programa Mais Educação [...] (TS1). Dessa forma, Perboni e Rosa (2019) afirmam que o
Programa Mais Educação se destacou com um dos mais significativos programas de ampliação
da jornada escolar.
64

A SEDU/Serra, ao ser indagada a respeito da constituição de equipe específica para a


implementação da EETI, pontua: “[...] para auxiliar no funcionamento, cada setor da
secretaria de Educação tem sua atuação, mas na Gerência de Ensino Fundamental há dois
assessores pedagógicos que acompanham o processo de implantação e funcionamento [...]”,
sinalizando que o processo de implementação foi considerado relevante.

Uma das justificativas para a implementação da EETI no município da Serra foi a questão
social: [...]os alunos que não ficam suscetíveis [...] daquela comunidade que trabalha fora,
[...], [..] aluno estar envolvido em atividades, ele estar dentro de um ambiente que propicia seu
desenvolvimento, [...] transmite segurança (TS1).

Nesse sentido, Cararo (2015) aponta que atualmente a escola pública é demandada como espaço
do processo de aquisição do conhecimento, de construção da cidadania e de preparação para o
mundo do trabalho, mas também tem sido tensionada a assumir atribuições relacionadas à
segurança, cuidado e proteção à vulnerabilidade social.

O município da Serra produziu alguns documentos legais que tratam da EETI: Decreto nº
4566/2014; Lei nº 4.432/2015; Portaria N nº 008/2019 e a Política de Educação em Tempo
Integral para o município da Serra.

O Decreto nº 4566/2014 transformou a Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) “Profª


Eulália Falqueto Gusmann” na primeira escola em tempo integral do município, e que
continuou até 2019, sendo a única escola que ofertava a EETI, como confirmou um dos
técnicos: “[...] Em 2019 [...] amplia o funcionamento e aí a EMEF de TI Profª Eulália Falqueto
Gusmann passa a ofertar a carga horária ampliada para mais de 7 horas com a permanência
do estudante sem o regime de contra-turno [...]”.

Em seguida, a Lei Nº 4.432/2015, aprova o Plano Municipal de Educação da Serra e aponta, na


meta 6, a oferta de educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de
forma a atender, pelo menos, 25% dos estudantes.

Na sequência, foi elaborada a Portaria N nº 008/2019, que dispõe sobre o funcionamento e


oferta da Educação em Tempo Integral nas Unidades de Ensino da Rede Municipal da Serra e
dá outras providências.

O último documento foi a Política de Educação em Tempo Integral para o município da Serra,
elaborado durante o ano de 2019 e que, segundo informações dos técnicos entrevistados, se
65

encontra no Conselho Municipal de Educação da Serra para análise, revelando assim, a tentativa
de construção coletiva e democrática do formato da EETI.

Em relação à ocorrência ou não de parcerias/ arranjos privados para a implementação da EETI,


a Política de Educação em Tempo Integral para o município da Serra aponta a necessidade de
efetivação de parcerias não-governamentais. Contudo, esse elemento não é mencionado nas
estratégias da meta 6 do Plano Municipal de Educação da Serra. Logo, constatamos uma
divergência entre o PMES e a Política de Educação em Tempo Integral. Durante a entrevista, o
técnico aponta que não há nenhuma efetivação de parcerias para a concretização das escolas
em tempo integral: [...] a grande maioria deles se firma no Movimento Espírito Santo em Ação
e a Serra inaugura sem esse vínculo, sem essa parceria com o setor privado, [...], Vitória fez,
o estado fez [...] iniciamos por conta própria [...]. (TS1). Peroni e Adrião (2009) esclarecem a
descaracterização do setor público ao realizar parcerias com o setor privado, já que o sistema
público assume a metodologia de gestão do setor privado ao adotar os princípios da
administração gerencial ou da chamada nova gestão pública.

O município da Serra apresenta perspectivas para ampliação da oferta da EETI, como segue no
relato abaixo: Tem uma previsão para o ano que vem de uma escola nova, em Divinópolis [...].
[...] uma escola maravilhosa [...]: laboratório de informática, auditório, uma escola
climatizada, com quadras [...] sala de artes, de ciências [...] (TS1). A partir da declaração,
notamos que a escola mencionada é resultado de uma construção que foi realizada para
inauguração de uma Unidade de Ensino de Educação Integral, com espaços e possibilidades
que poderão contribuir com a formação integral do sujeito.
No próximo relato, o técnico expõe a necessidade de investimento: [...] não estamos falando
de ampliar só transformando a escola, é necessário a ampliação da infraestrutura o que requer
investimento, o que requer concursos públicos [...]. (TS2)

CONCLUSÃO

Na análise realizada, constatamos que a SEDU/ Serra procurou desenvolver a política da EETI,
enfrentou desafios, porém está distante de cumprir o que apontou em seu plano municipal,
sendo uma justificativa, a ausência de recursos financeiros para o desenvolvimento e expansão
da política da EETI.

No que tange aos documentos legais, o município percorreu caminhos, como elaboração de
decreto, portaria, da política, bem como, seu envio ao Conselho Municipal da Serra (CMES).
66

O diálogo, debate e discussões promovidas no espaço do CMES retrata a tentativa de construção


coletiva da educação pública.
Sendo assim, a caminhada da SEDU/Serra para a implementação da EETI no período estudado,
2015-2019, sinaliza o apreço pela gestão democrática do ensino público, fortalecendo assim, a
democracia em solo brasileiro.

REFERÊNCIAS

ADRIÃO, T.; PERONI, V. A educação pública e sua relação com o setor privado:
implicações para a democracia educacional. Retratos da Escola, Brasília, v. 3, n. 4, p. 107-
116, jan./jun. 2009. Disponível em:
https://retratosdaescola.emnuvens.com.br/rde/article/view/105/294. Acesso em: 11 mai. 2022.
BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação -
PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 2014.
CARARO, M. de F. O Programa Mais Educação e suas interfaces com outros programas
sociais federais no combate à pobreza e à vulnerabilidade social: intenções e tensões.
2015. 339 f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-graduação em Educação,
Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2015.
Decreto nº 4.566/2014. Serra, 2014. SERRA, Prefeitura Municipal de.
Lei nº 4.432/2015. Serra, 2015. SERRA, Prefeitura Municipal de.
MOREIRA, Herivelto; CALEFFE, Luiz Gonzaga. Metodologia da pesquisa para o
professor pesquisador. Rio de Janeiro: Lamparina, 2008
PERBONI, F.; ROSA, É. T. O Projeto escola da autoria: uma análise da proposta de educação
em tempo integral para o ensino fundamental da rede estadual de Mato Grosso do Sul. In:
JEFFREY, D. C.; SILVA, J. F. (org.). Educação Integral em estados brasileiros: trajetória e
política. Curitiba: CRV, 2019. p. 99-110.
Portaria N Nº 008/2019. Serra, 2019. SERRA, Prefeitura Municipal de.
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DA SERRA. Política de Educação em
Tempo Integral para o município da Serra, 2019.
67

A CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO E A MOBILIZAÇÃO


PARA A CONSTITUIÇÃO DO SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO

Thaciana Lopes de Almeida


Universidade Federal do Espírito Santo
thacianalopesdealmeida@gmail.com

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa é vinculada ao Grupo de pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais, do


Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo,
integrando o Projeto aprovado na Chamada Universal do CNPq nº 01/2016 - Processo nº
427959/2016-0 - Regulamentação e Implementação do Sistema Nacional de Educação no
Brasil: Relações Intergovernamentais para a Garantia do Direito à Educação. Além disso,
também é parte de projeto de iniciação científica e de Trabalho de Conclusão de Curso em
desenvolvimento no âmbito da Universidade Federal do Espírito Santo, no curso de pedagogia.

Tem como objetivo analisar a influência e importância da CNDE para a constituição do SNE,
realizando uma análise de suas ações relacionadas à política educacional; contextualizar o
surgimento, a expansão e a atuação da CNDE para a promoção de uma educação democrática,
justa e igualitária; teorizar e problematizar a atuação da CNDE na constituição do CAQi/CAQ,
bem como a relação desses mecanismos com o regime de colaboração e o SNE e; analisar os
interesses da CNDE na definição no processo de implementação do SNE e do Regime de
Colaboração que servirá de base para a sua articulação.

Discorre acerca dos debates em torno da implementação do Sistema Nacional de Educação


(SNE), que ganharam maior incidência a partir da Constituição Federal de 1988 (CF/88) e da
realização da Conferência Nacional de Educação Básica (Coneb), em 2008, e da Conferência
Nacional de Educação (Conae), em 2010, na perspectiva das ações da Campanha Nacional pelo
Direito à Educação (CNDE), um movimento que surgiu em 1999, com um viés de defesa de
direitos educacionais, atuando fortemente na Educação Pública.

Dentre as principais ações da CNDE, destacou-se sua grande incidência política na elaboração,
desde 2002, dos mecanismos do Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi) e do Custo Aluno-
Qualidade (CAQ), e sua participação na implementação do Plano Nacional de Educação 2014-
2024 (PNE), acompanhando e movimentando as instâncias federativas para o cumprimento dos
68

prazos e metas estabelecidos (Lei nº 13.005/2014), além de ter seus mecanismos de CAQi e
CAQ inclusos no plano.

METODOLOGIA

A CNDE posiciona-se fortemente na defesa de um SNE “que promova a cooperação federativa


e o regime de colaboração em matéria educativa” (CAMPANHA, s.d.). Por isso, é importante
compreender a CNDE como ator de grande importância para a efetivação do SNE, sendo
necessário analisar os interesses que norteiam as ações desta.

Com isso, a metodologia está pautada no conceito de ação social que, segundo Weber (2002),
se refere à conduta de um ator, seja este uma pessoa ou um grupo de pessoas. Divide-se em
quatro tipos ideais, sendo: ação social com relação a um objetivo, quando escolhas e caminhos
traçados pelo ator visam atingir determinado propósito; ação social com relação a um valor, em
que o ator traça escolhas de acordo com seus valores, visando manter sua honra; a ação afetiva
ou emocional, que seria uma reação emocional que depende do estado de humor do ator, não
sendo racional e; ação tradicional, que seriam hábitos e crenças do sujeito que estão enraizadas
em seu subconsciente, não racional. (WEBER, 2002; ARON, 2000).

Com vistas a analisar a intencionalidade da CNDE enquanto ator social, quando se envolve em
projetos, movimentos, eventos e/ou posiciona-se frente aos debates dentro do campo das
políticas educacionais, considera-se os tipos de ação social racional, em que cada ator realiza
as ações tendo um fim ou considerando um valor específico importante para si. Entretanto, os
tipos ideais, majoritariamente, agem concomitantemente nas escolhas e caminhos dos atores,
não sendo realizados de maneira isolada.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

De acordo com os dados obtidos no site da campanha e a partir de levantamento bibliográfico,


é possível perceber que a discussão a respeito da implementação do SNE é tema recorrente nos
debates sobre qualidade socialmente referenciada na educação, articulações entre o setor
público e privado para a oferta educacional e a implementação de políticas públicas no campo
da educação. Entretanto, poucas foram as pesquisas identificadas que discorrem
especificamente sobre a atuação da CNDE como ator social relevante nesta disputa. Por isso,
faz-se necessário um breve histórico de suas ações em consonância com o SNE e o Regime de
Colaboração, e uma análise da intencionalidade desse ator (WEBER, 2002).
69

Com a dificuldade em alavancar as políticas públicas educacionais no país, surge a CNDE, com
o objetivo de “somar diferentes forças políticas, priorizando ações de mobilização, pressão
política e comunicação social, em favor da defesa e promoção dos direitos educacionais”
(CAMPANHA, s.d.). Um dos principais focos da CNDE é a promoção de estratégias que gerem
maior investimento na educação básica pública, considerando o financiamento como peça-
chave para a promoção de um SNE efetivamente consolidado.

Em 2001, promoveu a defesa na derrubada de vetos do então presidente Fernando Henrique


Cardoso a determinados pontos do PNE (2001-2011), como destinar o equivalente a 7% do
Produto Interno Bruto (PIB) para a educação, o que significaria um avanço em relação ao
financiamento (HERMIDA, 2006). Em 2002, iniciou a elaboração dos mecanismos CAQi e
CAQ. A CNDE realizou eventos para discutir o conceito de qualidade que nortearia o
mecanismo. Reuniu diferentes organizações, grupos, movimentos e pesquisadores(as) para
dialogar com várias instâncias da sociedade civil, governos e universidades, ouvindo
estudantes, famílias, educadores(as) de diversos estados brasileiros, visando compreender o que
eles entendiam como uma boa escola (CAVALCANTI, 2016). O mecanismo teve sua primeira
versão publicada em 2007 no livro “Custo Aluno-Qualidade inicial: rumo à educação pública
de qualidade no Brasil”.

Para compreendermos a influência do CAQi/CAQ na educação, considera-se necessário


compreender por que o financiamento é uma das principais questões para promoção do SNE.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em seu Artigo 4º, especifica “padrões mínimos de
qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos
indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem”. Na prática, ao
observar a realidade escolar, é visível a heterogeneidade desta oferta, quando algumas regiões
e localidades, especialmente o norte e nordeste do país, lidando com falhas na estrutura, falta
de recursos, entre outros. De acordo com a CNDE, essa falta de investimento está atrelada à
falta de especificação a respeito da dita qualidade (CAMPANHA, 2018). Afinal, não há clareza,
em bases legais, de quais seriam os padrões mínimos de qualidade de ensino e insumos
indispensáveis dos quais a LDB trata em seu Artigo 4º.

Somada à não especificação dos padrões mínimos de qualidade, ressalta-se a falta de


responsabilização quanto ao investimento na educação, já que, de acordo com Araujo (2010),
as possibilidades de melhoria das políticas de acesso e permanência na escola e a equidade entre
sistemas e redes de ensino dos entes federados são reduzidas pela falta de regulamentação do
70

regime de colaboração, havendo uma fragmentação orçamentária de caráter municipalista, que


compromete o direito de acesso e permanência ao ensino com qualidade e a igualdade de
capacidade técnica, orçamentária e administrativa nas diferentes regiões do país. Ou seja, não
há efetivamente um SNE que articule a educação com equidade em todo o país.

Assim, o CAQ/CAQi propõe uma inversão no cálculo de financiamento, não mais


subordinando o investimento ao valor disponível de acordo com a distribuição de recursos em
cada área, mas calculando o custo necessário por aluno a ser investido em educação, pautando-
se na igualdade de oportunidade para todos. Define-se, então, um CAQi, como processo inicial
para atingir o CAQ, que foi debatido, apresentado e aprovado em conferências nacionais e
também na meta 20 do PNE (2014-2024) (Lei nº 13.005/2014), lei que se propõe a garantir
melhorias significativas na educação de forma gradativa ao longo dos anos, prevendo, em seu
art. 13, a instituição do SNE. O CAQ também foi, através da Emenda Constitucional nº 108 de
2020, incluso na CF 88.

Assim, as propostas da CNDE demarcam uma intencionalidade na promoção da educação


pública, equânime e de qualidade socialmente referenciada, visando valores de justiça social e
com o fim de promover políticas públicas efetivas para a melhoria da educação no país
(WEBER, 2002). Compreende-se a importância desse movimento para o campo da gestão
educacional.

CONCLUSÃO

Embora a CNDE não seja destacada em um grande volume de pesquisas, sua contribuição para
o tema não deve ser descartada. Isso porque mostrou-se um importante movimento que busca
efetiva participação da sociedade civil frente às políticas educacionais, principalmente na
promoção de qualidade na educação socialmente referenciada. Ainda há muito a avançar nesse
campo, principalmente tendo em vista que, embora haja pressupostos legais em torno da
responsabilização dos entes federados, como no PNE, na CF (1988) e na LDBEN, esses ainda
não se consolidam em uma articulação clara e bem desenvolvida.

REFERÊNCIAS

ARON, R. As etapas do pensamento sociológico. Tradução por Sérgio Bath. 5ª Edição. São
Paulo: Livraria Martins Fontes Editora Ltda, 2000.
ARAUJO, G. C. Direito à educação básica: a cooperação entre os entes federados. Revista
Retratos da Escola, Brasília, v. 4, n. 7, p. 231-243, jul./dez. 2010
71

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada


em 5 de outubro de 1988.
BRASIL. Plano Nacional de Educação (PNE). Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014.
Brasília: MEC, 2014.
CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO. Campanha Nacional pelo
Direito à Educação, s.d. Disponível em: <https://campanha.org.br>. Acesso em: 12 de agosto
de 2022.
CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO. O CAQi e o CAQ no PNE:
quanto custa a educação pública de qualidade no Brasil? . São Paulo, 2018.
CAVALCANTI, C. R. Tensões federativas no financiamento da educação básica:
equidade, qualidade e coordenação federativa na assistência técnica e financeira da União.
Tese (Doutorado em educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de
Educação. Belo Horizonte, p. 337, 2016.
HERMIDA, J. F. O Plano Nacional de Educação (Lei 10.172), de 9 de janeiro de 2001.
Educar, Curitiba, n. 27, p. 239-258, 2006. Editora UFPR.
WEBER, Max. Conceitos básicos de sociologia. São Paulo: Centauro, 2002.
72

A ALFABETIZAÇÃO FUNCIONAL COMO PROJETO DESENVOLVIMENTISTA


DA UNESCO PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE: O CASO BRASILEIRO
(1945-2000)

Martinho Guilherme Fonseca Soares4


Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE)
Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes)
martinhoesoares@gmai.com

INTRODUÇÃO

O desenvolvimentismo, via de rega associado a uma estratégia político-econômica de caráter


nacionalista, encontra-se ligado a princípios e ideologias que nos permitem situá-lo, assim, no
campo das ideias. Trata-se, portanto, de um conceito plurivalente. Seu hermetismo taxonômico,
tal como define Salomão (2017, p. 422), nos permite enxergá-lo sobre múltiplos olhares quer
seja o da Ciência Política, o da Economia e, aqui, em específico, o da Política Educacional sob
o prisma da formulação de conceitos como o de alfabetização funcional que, defendemos,
esteve associado ao projeto desenvolvimentista levado a cabo no Brasil no contexto da segunda
década do século XX.

Tal abordagem visa contribuir para o debate acerca das políticas públicas de alfabetização que
tiveram — como ficará demonstrado nas páginas subsequentes —, lugar de destaque nas
inciativas da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco)
para a Região da América Latina e do Caribe no século que antecede o nosso, mas que, como
decorrência da criação de vários organismos internacionais dedicados ao que, em um primeiro
momento, se configura como campos específicos de atuação — a exemplo da Organização
Europeia de Cooperação Econômica (OECE) criada em 1948 — tendenciam a análise
historiográfica.

Sistematizar as iniciativas da Unesco no campo das políticas de alfabetização para a América


Latina e o Caribe como parte do projeto desenvolvimentista para a Região, constitui o objetivo
desta comunicação que toma o caso brasileiro como exemplum. Partimos do princípio de que o
termo desenvolvimentismo, usualmente, remete às teorias cepalinas estando, no Brasil,

4
Professor do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes). Doutorando em Educação pelo Programa de Pós-
Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) sob orientação da prof.ª Dr.ª
Cláudia Maria Mendes Gontijo.
73

associado aos governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek, mas também aos governos
militares. Mesmo com o rompimento político-democrático ocorrido em 1964, os militares
continuaram implementando políticas desenvolvimentistas (FONSECA, 2004, p. 225) ao
aderir, por exemplo, às iniciativas da Unesco em termos de matéria educacional, o que se faz
perceber mediante o envio de signatários do País às reuniões da própria Unesco no período em
tela.

Como parte do esforço de análise anunciado, a periodicidade, tão cara aos historiadores, é o
primeiro recurso de que nos valemos ao propor analisar o conjunto de ações voltadas para o
combate do analfabetismo no século XX. Para tanto, estamos atentos aos mecanismos
formulados para a América Latina e o Caribe pela Unesco que, desde sua fundação, em 1945,
tem direcionado esforços para, conforme define o preâmbulo de sua Constituição, [...] fazer
avançar, através das relações educacionais, científicas e culturais entre os povos do mundo, os
objetivos da paz internacional, e do bem-estar comum da humanidade [...] (UNESCO, 2002, p.
1).

Em seus primeiros anos, contudo, as iniciativas da Unesco concentraram-se, quase que


exclusivamente, na ajuda financeira prestada a seus países-membros no processo de
reconstrução de escolas, bibliotecas e museus que haviam sido destruídos por ocasião de toda
sorte de conflitos armados da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Pouco tempo depois, em
1947, a Unesco deu início a uma parceria com o Bureau Internacional de Educação (BUE) com
vistas a organização da Conferência Internacional de Instrução Pública, de onde sairiam uma
série de relatórios e recomendações relacionados a educação de maneira mais abrangente:
estruturação das salas de aula, formação de professores, assistência técnica e financeira dentre
outros temas.

Até 1963, 57 recomendações foram publicadas a partir das reuniões da Conferência. Nesse
contexto, vale destacar a Recomendação nº 23, de 1948, intitulada O Ensino da Escrita, abrindo
o leque de inciativas da Unesco relacionadas à alfabetização. Uma vez incumbida das iniciativas
direcionadas à promoção da educação em sua mais diversas facetas, a Unesco empreenderá, nas
décadas seguintes, um esforço significativo, em especial, na América Latina e no Caribe, na
forma de programas, publicações e recomendações voltados ao combate do analfabetismo, cuja
discussão travamos aqui, de maneira a sistematizar quais foram essas iniciativas.

METODOLOGIA
74

Por tratar-se de uma investigação de caráter documental e cientes de que “o estudo do passado,
remoto ou recente, requer método [...]” (LUCA, 2020, p. 14), a metodologia de pesquisa aqui
empregada consiste na exploração, à luz da concepção bakhtiniana de linguagem, de uma
seleção de documentos oficiais produzidos pela Unesco entre os anos de 1945 e 2000. O
documento, contudo, não é inócuo. “É antes de mais nada o resultado de uma montagem,
consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziu [...] O documento
é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas [...]” (LE GOFF, 1990, p. 547).

Assim sendo, este texto baseia-se na sistematização e interpretação de publicações produzidas


pela Unesco no curso do século XX voltados, em especial, ao combate do analfabetismo para a
região da América Latina e do Caribe. Sob esse olhar, produzido no interior de uma dada
sociedade, “todo texto tem um sujeito, um autor (que fala, escreve)” (BAKHTIN, 1997, p. 329),
não existe neutralidade no texto, uma vez que “a palavra é o fenômeno ideológico por
excelência” (BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2010, p. 36) e, assim sendo, buscamos identificar a
intencionalidade presente nos documentos emanados da Unesco em matéria de política
educacional.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

No tocante as iniciativas da Unesco para se combater o analfabetismo na região latino-


americana, garantindo a pretensa qualidade da educação nos moldes por ela concebidos,
destaca-se a formulação do conceito de alfabetização funcional que dá nome a esta
comunicação. O conceito aparece sistematizado uma primeira vez em publicação da
Organização datada de 1970, na qual é definido como toda operação por meio da qual
alfabetização é tida como um componente de projetos de desenvolvimento econômico e social
(UNITED NATIONS EDUCATIONAL, SCIENTIFIC AND CULTURAL ORGANIZATION,
1970, p. 9).

A promoção do conceito de alfabetização funcional opõe-se ao de alfabetização tradicional. Por


funcional, entende-se a operação por meio da qual a alfabetização é vista não mais como um
trabalho isolado com um fim em si mesmo, mas como método que possibilita tratar o analfabeto
como indivíduo em um contexto de grupo, em relação a um determinado ambiente e com vista
ao desenvolvimento social. Deste modo, por sua natureza, um programa de alfabetização
funcional está relacionado a necessidades coletivas e individuais precisas. É “feito sob medida”,
diferenciado de acordo com o meio ambiente e com objetivos econômicos e sociais específicos
(UNITED NATIONS EDUCATIONAL, SCIENTIFIC AND CULTURAL ORGANIZATION,
1970, p. 9).
75

Sob essa perspectiva do fazer-se “sob medida”, identificamos a criação do Projeto Principal de
Educação para a América Latina e o Caribe (PPE), concebido a partir da Conferência Regional
de Ministros da Educação e de Ministros Encarregados do Planejamento Econômico dos
Estados membros da América Latina e do Caribe ocorrido na Cidade do México, em dezembro
1979. Sua formulação, no contexto de uma reunião cujo nome explicita o termo “planejamento
econômico” não deixa dúvida acerca da criação do PPE como instrumento político-econômico
associado à concepção de alfabetização funcional. O Programa, desenvolvido entre os anos de
1980 e 2000, inicia suas publicações e orientações em 1982, somando ao longo dos vinte anos
de sua vigência, cinquenta boletins que sistematizam as ações adotadas pela Unesco e os países
signatários do PPE, dentre eles o Brasil, em favor da alfabetização funcional na Região latino-
americana.

CONCLUSÃO

A alfabetização, sob a ótica funcional adotada pelas publicações oficiais da Unesco, em


especial, na forma dos boletins do PPE, é tida como eixo motriz do projeto desenvolvimentista
para a América Latina e Caribe e, portanto, para o Brasil, signatário dos documentos. Ao tomar
parte dessas iniciativas, os países latino-americanos alçam a alfabetização a uma condição
necessária para o crescimento sustentado e de longo prazo que não deixa de estar associado a
uma visão mais tradicional do desenvolvimentismo atrelado, conforme defende Fonseca (2004,
p. 225), a um processo da industrialização.

Ao associar alfabetização ao desenvolvimento quer seja agrário — tal como elencado em


Functional literacy: why and how (1970) — ou mesmo industrial, por meio de programas
específicos baseados no conceito de alfabetização funcional que defendem, ao fim e ao cabo, a
aplicação prática, em especial, no mundo do trabalho, das informações adquiridas graças a um
conhecimento da leitura e escrita (UNITED NATIONS EDUCATIONAL, SCIENTIFIC AND
CULTURAL ORGANIZATION, 1970, p. 10), esvazia-se a dimensão cultural e crítica da
alfabetização que, nesse modelo, fica reduzida de produção e reprodução do capital.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Conferências Internacionais de Instrução


Pública: recomendações (1934-1963). Brasília: INEP, 1963.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A
CULTURA (UNESCO). Constituição da Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura. Brasília: Representação da Unesco no Brasil, 2002.
76

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A


CULTURA (UNESCO). Proyecto Principal de Educación en América Latina y el Caribe:
boletín, no. 2. Santiago: Unesco, 1982.
UNITED NATIONS EDUCATIONAL, SCIENTIFIC AND CULTURAL ORGANIZATION
(UNESCO). Functional literacy: why and how. Paris: Imprimerie Chaix-Desfosse's-
Ne'ogravure, 1970.
OBRAS DE APOIO
COMAR, S. R. Avaliação no contexto do Laboratório Latino-Americano de Avaliação da
Qualidade da Educação. Estudos em Avaliação Educacional, v. 28, n. 68, p. 572-598, 2021.
FONSECA, P. C. D. Gênese e precursores do desenvolvimentismo no Brasil. Revista
Pesquisa & Debate, v. 15, v. 26, n. 2, p. 225-256, 2004.
LE GOFF, J. História e memória. Campinas: Unicamp, 1990.
LUCA, T. R. Práticas de pesquisa em história. São Paulo: Contexto, 2020.
SALOMÃO, I. C. As origens do desenvolvimentismo brasileiro e suas controvérsias: notas
sobre o debate historiográfico. Nova Economia, v. 27, n. 3 p. 421-442, 2017.
77

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA): CARACTERIZAÇÃO DO PERFIL


DA EJA NOS MUNICÍPIOS DE ECOPORANGA E PONTO BELO, NO ESTADO DO
ESPÍRITO SANTO, NO PERÍODO DE 2010 A 2020

Aingrid Fabiane de Souza


aingrid.souza@edu.ufes.br

INTRODUÇÃO

Em 26 de junho de 2014, o Congresso Federal, sancionou o Plano Nacional de Educação (PNE),


Lei nº 13.005/2014, que estabelece metas, estratégias e monitoramento para a educação
nacional, contemplando responsabilidades compartilhadas entre a União, os estados e
municípios, com prazo limite de cumprimento até o ano de 2024. A Meta 9 do PNE ambiciona
elevar a taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais para 93,5% até 2014 e, até o
final da vigência do PNE em 2024, erradicar o analfabetismo absoluto e reduzir em 50% a taxa
de analfabetismo funcional.

O Brasil em 2019, conforme gráfico 1, apresentou taxa de alfabetização de 93,4% (BRASIL,


2020). Em 2019 não alcançamos a meta estabelecida para o ano de 2014, o que aponta
incertezas sobre o cumprimento da Meta 9 até o ano de 2024.

Gráfico 1 - Gráfico 1 - Taxa de alfabetização da população de 15 anos ou mais de idade

Fonte: Elaborado pela Dired/Inep com base em dados da Pnad contínua/IBGE 2012-2019). Meta: Taxa de
alfabetização igual a 93,5% em 2015 e 100% até 2024.

Verificamos, ainda no gráfico 1, que o país está 6,6% abaixo da meta estipulada para 2024.
A região sudeste é a que apresenta maior índice de alfabetização do país com 96,7%
(Gráfico I), sendo que em 2019 o estado do Rio de Janeiro possuía 97,9% da população
alfabetizada, São Paulo 97,4%, Espírito Santo 94,7% e Minas Gerais 94,5%.
78

O Espírito Santo, estado da região sudeste, apresentou queda de 2,7% na taxa de analfabetos
entre 2010 e 2019, enquanto no âmbito nacional a redução foi de 3% no mesmo período,
conforme aponta a tabela 1. Estes percentuais apontam reais fragilidades no alcance da
meta de erradicação do analfabetismo prevista para o ano de 2024. Os dados evidenciam
ainda que há demanda pela modalidade de Educação de Jovens e Adultos5 (EJA) a nível
nacional e estadual.

Tabela 1 - Taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos ou mais de idade, Brasil e


Espírito Santo - 2000, 2010 e 2019.
Ano Brasil Espírito Santo
2000 13,6% 10,9%
2010 9,6% 8,0%
2019* 6,6% (11 5,3% (170 mil)
milhões)
Fonte: Nota Técnica 40 - Instituto Jones dos Santo Neves (2010)

A Nota Técnica 40, publicada pelo Instituto Jones do Santos Neves em 2012, traz um
panorama sobre a evolução da taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais no
Espírito Santo e identifica os municípios de Água Doce do Norte, Brejetuba, Ecoporanga,
Ibitirama, Irupi, Mantenópolis, Mucurici e Ponto Belo com taxa de analfabetismo acima de
18%, fato que chama atenção, uma vez que o estado apresenta índice geral de analfabetismo
de 8% no mesmo período. Conforme tabela 2, elaborada com base nos dados do Censo
Demográfico de 2010 do IBGE, o município de Ponto Belo, dentre os municípios citados,
é o que apresenta maior índice de analfabetismo entre as pessoas de 15 anos ou mais,
correspondendo a 22,0% desta população, seguido do município de Ecoporanga com
19,8%, ambos localizados na região do extremo norte do estado e que fazem fronteira entre
si.

Tabela 2 - População alfabetizada, população não alfabetizada e população total com


15 anos ou mais nos municípios de os municípios de Água Doce do Norte, Brejetuba,
Ecoporanga, Ibitirama, Irupi, Mantenópolis, Mucurici e Ponto Belo, no estado do
Espírito Santo
Total da %
%
Não Populaçã População
Região Município Alfabetizada Populaçã
Alfabetizada o Não
o
de 15 Alfabetiza
Alfabetiz
anos ou da
ada
mais
Água Doce
7.088 1.715 8.803 80,52% 19,48%
do Norte
Ecoporanga 13.697 3.422 17.119 80,2% 19,8%
Norte Mantenópolis 8.111 1.980 10.091 80,38% 19,62%

5
A partir deste ponto optamos por referenciar a modalidade Educação de Jovens e Adultos, em alguns momentos,
apenas como EJA a título de fluência na escrita e na leitura.
79

Mucurici 3.482 853 4.335 80,32% 19,68%


Ponto Belo 4.096 1.149 5.245 78,00% 22,00%
Brejetuba 6.891 1.607 8.498 81,09% 18,91%
Sul Ibitirama 5.140 1.272 6.412 80,16% 19,84%
Irupi 7.030 1.540 8.570 82,03% 17,97%
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 2010 - Consulte o site do Datasus e site do IBGE para maiores informações
- Adaptada pelo autor (2021)

Diante deste quadro emerge a necessidade de nos aproximar da realidade da EJA nos
municípios de Ecoporanga e Ponto Belo.

METODOLOGIA

Análise documental para coleta de dados secundários da Estatística da Educação Básica6


do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Educacionais Anísio Teixeira (INEP), no
período de 2010 a 2019. Os dados coletados na base de dados do INEP, Sinopses
Estatísticas da Educação Básica de 2010 a 2020, foram tratados com base na estatística
descritiva7, por meio do software Excel para Windows, mapeando as seguintes variáveis
quantitativas: população não alfabetizada por faixa etária; matrículas por faixa etária;
número de docentes e formação acadêmica; total de matrículas por unidade administrativa
e etapa de ensino. A análise se dá em diálogo com as obras de Miguel Gonzalez Arroyo
(2005), LDB 1996, Ferraro (2009), Paulo Ricardo Bittencourt Guimarães (2008), Maria
Tereza Daroz Modelli (2018), Demerval Saviani (2013) Edna Castro de Oliveira et al.
(2010) e outros.

O recorte temporal da pesquisa é definido pelos seguintes critérios: no ano de 2010 temos
os dados consolidados sobre analfabetismo no Espírito Santo, conforme publicação do
Instituto Jones dos Santos Neves, e por ser o ano do último recenseamento no Brasil; em
2019 a EJA completa 23 anos de existência, o que nos leva a supor que houve tempo hábil
para a concretização e implantação das ações educacionais para a modalidade; O
recenseamento de 2020 foi suspenso devido a pandemia da Covid-19 o que nos deixou sem
os índices oficiais consolidados de 2010 a 2020 sobre educação. Pesquisar o período de
2010 a 2020 permitirá construir uma visão atualizada do perfil da EJA e pode possibilitar

6
As Sinopses Estatísticas do Inep correspondem a um conjunto de tabelas com dados recolhidos por suas
pesquisas estatísticas, avaliações e exames. As informações são organizadas por temas e distribuídas de
acordo com as regiões brasileiras, suas respectivas unidades da federação e município. Disponível em
https://www.gov.br/inep/pt-br/acesso-a-informacao/dados-abertos/sinopses-estatisticas.
7
O objetivo da estatística descritiva é resumir as principais características de um conjunto de dados por meio de
tabelas, gráficos e resumos numéricos. Descrever os dados pode ser comparado ao ato de tirar uma fotografia da
realidade (GUIMARÃES, 2008).
80

inferir sobre o possível cumprimento da meta 9 do PNE até 2024 pelos municípios de Ponto
Belo e Ecoporanga.

CONCLUSÕES

Pesquisar e traçar o perfil quantitativo da EJA no município de Ecoporanga e Ponto Belo,


no estado do Espírito Santo possibilitou concluir que o estado e os municípios precisam
agir de forma contundente para mudança da realidade da população de analfabetos. Para
que erradicação do analfabetismo se torne uma realidade possível nos próximos anos é
necessário maior atenção e ações para população de analfabetos da faixa etária de 40 anos
ou mais, pois estes representam em Ecoporanga a 87,93% da população total de analfabetos
e Ponto Belo 90,86% e o percentual médio de matrículas para esta faixa etária no período
analisado em Ecoporanga foi de apenas a 8,72% e em Ponto Belo 24,76% do total de
matrículas na modalidade EJA.

Mesmo que o estado do Espírito Santo venha investindo na oferta vagas, dentro das 156
escolas da rede estadual de ensino, e venha trabalhando para o fortalecimento do Pacto pela
Aprendizagem do ES é necessário ações mais contundentes para mudança da realidade dos
municípios que apresentam os maiores índices de analfabetismo.

Sinterizar e analisar os dados, disponibilizados pelo INEP e IBGE, revelou o cumprimento


deficiente por parte do Estado em assegurar os direitos dos cidadãos e, ainda, nos ofereceu
uma ferramenta que possibilita a sociedade observar a realidade e cobrar ações para que os
seus direitos sejam atendidos.

As análises revelaram a existência de desafios presentes na erradicação do analfabetismo


nos municípios de Ponto Belo e Ecoporanga, suscitando urgência em investimentos,
políticas públicas e campanhas que incentivem os jovens e adultos analfabetos a procurar
as instituições de ensino, para que a erradicação do analfabetismo seja uma realidade nos
próximos anos.

A sociedade precisa acompanhar a atuação do Estado permanentemente no que tange às


ações voltadas à educação, para que possa assegurar que investimento e ações estão sendo
fomentadas e, também, para que possa agir cobrando e propondo soluções. Uma sociedade
alijada do direito à educação, torna-se refém da realidade imposta por um sistema político
e econômico em que está inserida.

Em trabalhos futuros é necessário desvelar os motivos do baixo número de matrículas para faixa
etária de 40 anos ou mais e, a partir disso, buscar compreender quais propostas precisam ser
81

implementadas para atender as necessidades deste público para que sejam integradas ao sistema
de ensino. Há necessidade de levantar juntos as instituições de ensino o relatório de matrículas
e aprovação por série para análise mais detalhada da realidade da EJA dos municípios de
Ecoporanga e Ponto Belo (ES).

REFERÊNCIAS

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responsabilidade pública. In: SOARES, Leôncio (Org.). Diálogos na educação de jovens e
adultos. São Paulo: Autêntica, 2005.

BRASIL. Plano Nacional de Educação (PNE): Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, Aprova
o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá outras providências. Brasília: Câmara dos
Deputados/Ed. Câmara, 2014.

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico 2010:


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______. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de


Domicílios Contínua - PNAD Contínua 2019.

______.Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Agência de Notícias. Necessidade de


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<https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-
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OLIVEIRA, Edna Castro de; BREGONCI, Aline de Menezes; SCOPEL, Edna Graça;
CANHAMAQUE, Helton Andrade..Ensaio: Trajetória da escolarização de jovens e adultos
no Brasil: de plataformas de governo a propostas pedagógicas esvaziada. aval. pol. públ.
Educ., Rio de Janeiro, v. 18, n. 67, p. 389-410, abr./jun. 2010.
82

FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL DA REDE MUNICIPAL DE


ENSINO DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM: UM OLHAR PARA A
ESCOLARIZAÇÃO DOS SURDOS

Charles de Castro Leite


Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ensino, Educação Básica e Formação de
Professores PPGEEDUC/UFES/Alegre
ccleite89@gmail.com
Profª. Dra. Marileide Golçalves França
Professora do Programa de Pós-Graduação em Ensino, Educação Básica e Formação de
Professores PPGEEDUC/UFES/Alegre
leidemary8@gmail.com

INTRODUÇÃO
A educação como prática social favorece apropriação dos conhecimentos historicamente
produzidos pela humanidade e a produção de novos saberes (DOURADO, 2007). Portanto,
contribui para a formação integral e cidadã do indivíduo para que viva em sociedade de forma
atuante, crítica e transformadora. A Constituição Federal de 1988, em seus arts. 206 e 214,
estabelece a qualidade do ensino como um princípio legal que, por sua vez, significa
financiamento por parte do Estado, na tentativa de prover recursos disponíveis e progressivos,
a fim de assegurar o direito a educação a todos (XIMENES, 2014).

Contudo, o desafio que se institui no cotidiano escolar é garantir o ensino e aprendizagem a


todos os estudantes, independentemente de suas singularidades, dando-lhe a oportunidade e
meios para se apropriarem do conteúdo, partilharem experiências e se desenvolvam em
comunhão com todos (SILVEIRA; ENUMO; ROSA, 2012).

Em relação ao processo de inclusão escolar do estudante surdo é imprescindível a compreensão


de que o indivíduo surdo é constituído pela experiência visual, cultural e linguística nos
diferentes contextos, que por sua vez, é distinto das concepções dos não surdos. Desse modo, a
sociedade necessita de informações e conhecimentos para compreender, acolher e incluir o
surdo e, assim, saber conviver e comunicar-se com ele (MACHADO, 2017). Além disso,
a escolarização do estudante surdo pressupõe aporte financeiros para garantir acesso,
permanência e qualidade de ensino nos sistemas educacionais públicos.

Nesse sentido, emerge a seguinte indagação: como se caracteriza o financiamento da educação


especial na rede municipal de ensino de Cachoeiro de Itapemirim/ES, no que tange ao processo
de escolarização do discente surdo? Nesse texto, recorte da pesquisa da dissertação em
83

desenvolvimento, objetivou-se realizar um levantamento de estudos que investigaram o


financiamento da educação especial, no que se refere ao processo de escolarização do estudante
surdo, no período de 2002 a 2022.
METODOLOGIA
Para o início deste estudo, realizou-se um levantamento no banco de dados da Capes; Scielo,
BDTD e Fineduca, por meio das palavras-chave: “educação especial - Cachoeiro de
Itapemirim”; “educação inclusiva - Cachoeiro de Itapemirim”; “financiamento - educação -
Cachoeiro de Itapemirim”; “ educação - surdos - Cachoeiro de Itapemirim”; "financiamento -
surdez"; "financiamento da educação dos surdos"; “financiamento da educação especial -
surdos”; e “educação de surdos - financiamento”.
A busca limitou-se ao intervalo de publicações entre os anos de 2002 a 2022. O ano inicial de
2002, considerou a publicação da Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002 - que dispõe sobre a
Língua Brasileira de Sinais (Libras) e dá outras providências e 2022, por ser o último ano em
que o levantamento foi realizado. O intuito foi observar se ocorreram mudanças significativas
para a educação de surdos nos âmbitos nacional e municipal, após duas décadas da publicação
da lei supracitada. O critério de inclusão exclusão de dos trabalhos considerou a leitura dos
títulos, dos resumos e conclusões.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Na busca por teses, dissertações e artigos publicados sobre o financiamento da educação
especial, em relação ao processo de escolarização dos surdos, não se identificou nenhum estudo
que se relacionava diretamente ao objeto de pesquisa. Mediante tal resultado, lançou-se mão de
descritores mais abrangentes, correlacionados a temática, resultando em um levantamento de
mais de 500 trabalhos. A partir da leitura dos títulos e resumos selecionou-se aqueles que se
articulam ao financiamento da educação especial e mencionaram o processo de escolarização
dos surdos dentre os quais elencaram-se algumas produções (Tabela 1) para análise e possível
composição para revisão de literatura, com intuito de subsidiar a delimitação do objeto de
estudo, bem como favorecer a articulação dos diversos saberes sobre aquilo que se deseja
conhecer.
Tabela 1- Levantamento de dissertações e teses correlacionadas ao financiamento da educação
especial e educação de surdos
84

Nº Ano Tipo Título Autor Fonte

O direito à libras como língua BDTD - Uni-

Dissertação
materna: um estudo sobre a política Nascimento, Anne versidade Fede-
1 2017 educacional de educação infantil Caroline e Silva ral do Paraná
para crianças surdas na rede Goyos
municipal de ensino de Curitiba

2012 Fagliari, Solange BDTD –


Dissertação

A educação especial na perspectiva Santana dos Santos Universidade de


2 da educação inclusiva: ajustes e São Paulo
tensões entre a política federal e a
municipal

2014 Sotero, Mariana da BDTD –


Dissertação

Política de educação especial da Cunha Universidade de


3 Secretaria Municipal de Educação de São Paulo
Campinas no período de 2005 a 2012

2015 Viana, Mariana BDTD –


Dissertação

Recursos financeiros Peleje Universidade de


4 descentralizados para a escola São Paulo
pública: uma política necessária

Financiamento da educação França, Marileide BDTD – Uni-


especial: complexas tramas, Gonçalves versidade de
5 2014
Tese

permanentes contradições e novos São Paulo


desafios

Financiamento das instituições Oliveira, Gildásio BDTD – Uni-


Dissertação

especializadas na política de Macedo de versidade Fede-


6 2016 educação especial no estado do ral do Espírito
Espírito Santo (2012-2015) Santo

O financiamento público da Teixeira, Agda BDTD –


Dissertação

educação especial em Goiás – 2010 Lovato Universidade


7 2016 a 2013 Federal de
Goiás

Financiamento da educação especial Vanessa Dias Bueno BDTD –


no município de Campinas-SP no de Castro Universidade de
8 2020
Tese

período entre 2012 e 2017 São Paulo

Fonte: Elaborado com base nos dados disponíveis na BDTD (2022)


85

CONCLUSÃO
A temática de financiamento da educação básica é de extrema relevância, afinal, para que de
fato a educação contribua para que o sujeito se aproprie dos conhecimentos historicamente
produzidos, ela necessita ocorrer de forma equitativa, sendo um direito inalienável.
Na revisão de literatura, observou-se algumas lacunas no que diz respeito ao financiamento da
educação de surdos em abrangência nacional e municipal, ou seja, o tema tem sido pouco
explorado e, por isso, carece de aprofundamento investigativo. Considerando que as produções
acadêmicas permitem análises minuciosas e reflexões valiosas para o planejamento de ações e
políticas públicas desenvolvidas nos sistemas de ensino, e, em especial na luta em defesa pela
qualidade e acesso do ensino dos surdos, que será possível mediante uma política de
financiamento educacional.
A análise dos trabalhos permitiu conhecer as complexidades e desafios do financiamento da
educação especial, como, por exemplo, a precariedade da implementação de um sistema escolar
inclusivo, evidenciando a necessidade de ampliação de investimentos do Estado na oferta dessa
modalidade de ensino.
Concernente ao processo de escolarização dos surdos, os estudos analisados apresentam as
particularidades que devem ser consideradas na política educacional, na gestão educacional e
na prática escolar com vistas a garantir um padrão mínimo de qualidade, tais como: o uso
consciente de recursos visuais; a formação continuada dos professores, quanto à cultura surda
e conscientização da Libras como primeira língua dos surdos brasileiros pela comunidade
escolar; materiais didáticos adaptados; profissionais com formação específica, tais como
professor de Libras, intérprete de Libras – Língua Portuguesa e professor de ensino de Língua
Portuguesa; atendimento educacionais especializado, entre outros, em conformidade à Lei nº
10.436/2002 e ao Decreto nº 5.626/2005. Desse modo, apontam elementos que envolvem a
necessidade de recursos financeiros que garantam o processo de inclusão escolar dos surdos no
ensino regular.
Partindo do primado que a educação é um ato social e que, segundo Strobel (2008), em relação
a cultura surda, compreendida como o modo pelo qual o sujeito surdo entende o mundo e o
modifica a fim de torná-lo acessível e habitável, ajustando-o com as suas percepções visuais,
abrangendo sua língua, ideias, crenças, costumes e hábitos do povo surdo, torna-se de grande
significância a produção de novas pesquisas no campo do financiamento da educação especial
com um olhar voltado à escolarização dos surdos, visto que compete ao Poder Público assegurar
a todos o acesso, à permanência e à qualidade de ensino nos sistemas educacionais brasileiros.
86

REFERÊNCIA
DOURADO, L. F. Políticas e gestão da educação básica no Brasil: limites e
perspectivas. Educação & Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 921-926, out. 2007.
Disponível em:

https://www.scielo.br/j/es/a/w6QjW7pMDpzLrfRD5ZRkMWr/?lang=pt&format=pdf. Acesso
em: 25 ago. 2022.

MACHADO, A. D. Oficina de Libras: uma ação de extensão necessária à sociedade nos


diferentes contextos; histórico, político e social. Viver IFRS, n. 5, p. 65-69, 2017.

SILVEIRA, K. A.; ENUMO, S. R. F.; ROSA, E. M. Concepções de professores sobre


inclusão escolar e interações em ambiente inclusivo: uma revisão da literatura. Revista
Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 18, n. 4, p. 695-708, out./dez., 2012.

STROBEL, K. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis: Ed. UFSC, 2008.
XIMENES, S. Direito à qualidade na educação básica: teoria e crítica. São Paulo:
QuartierLatin, 2014b.
87

EIXO 2 – Federalismo e gestão democrática da


educação (Básica e Superior)
88
89

O FEDERALISMO EDUCACIONAL DOS EUA E DO BRASIL NO CONTEXTO DA


CRISE PANDÊMICA DA COVID-19

Lilian Marques Freguete


Universidade Federal do Espírito Santo – UFES/Brasil
lilian.freguete@hotmail.com

Rosenery Pimentel do Nascimento


Universidade Federal do Espírito Santo – UFES/Brasil
rose@rosenerypim.com

INTRODUÇÃO

O regime federativo criado pelos norte-americanos no século XVIII, como forma de


organização de seu Estado-nação recém estabelecido, tornou-se modelo para vários países nas
décadas que se seguiram8. Contudo, não há uma única definição para federalismo, tendo em
vista que cada país desenvolveu sua própria estrutura institucional e constitucional a partir da
sua herança histórica (ANDERSON, 2009; DALLARI, 2019).

As diferenças entre os vários pactos federativos ao redor do mundo, implicam diretamente na


distribuição de competências e na materialização de suas políticas sociais, tendo em vista que
num regime federativo é em grande medida preservada a autonomia dos entes, dentro dos
limites estabelecidos constitucionalmente. Portanto, muito embora o Brasil tenha se espelhado
no modelo dos Estados Unidos da América (EUA) por ocasião da Proclamação da República,
em 1889, os dois países apresentam desenhos federativos bastante distintos. No Brasil, a
república nasce de um Estado unitário imperial em que as antigas províncias são transformadas
em estados federados, o que diverge da formação centrípeta dos EUA, onde as 13 colônias
independentes abriram mão de sua plena soberania em favor da União Federal, porém,
mantendo a autonomia nas matérias não citadas pela Constituição, e também não restringidas
aos estados.

O modelo federativo de governo está diretamente associado à democracia. Por conseguinte,


espera-se que em tais governos as políticas sociais sejam foco de atenção, visto ter na
descentralização uma maior proximidade com as demandas da população e maior rapidez e

8
Os países de regime federativo, hoje, cobrem uma parte territorial considerável do mundo, abrigando
mais de 40% da população global, assim como são responsáveis por grande parte do produção econômica mundial,
considerando-se em conjunto os países federativos e os quase-federativos, tais como Reino Unido, Espanha e
Itália. (CHATTOPADHYAY et al., 2022)
90

flexibilidade na resolução das necessidades surgidas, embora Arretche (2020) seja contrária a
tal premissa, defendendo que a efetividade está muito mais associada ao nível de autonomia
dada aos entes em suas próprias jurisdições e o quanto participam das decisões em nível
nacional (self-rule or share-rule), seja em regime federativo ou unitário.

Brasil e EUA, não obstante serem governos federativos, apresentaram nos 12 primeiros meses
da pandemia da Covid 19, os maiores números nas estatísticas mundiais, tanto no que diz
respeito à contaminação quanto nas perdas de vidas pela doença. Tal fenômeno nos instigou a
investigar as semelhanças e distanciamentos entre os dois países no que tange à gestão da crise
educacional decorrente da suspensão do ensino presencial provocado pela crise sanitária.

O trabalho está ancorado nas pesquisas realizadas pelo Grupo de Pesquisa Federalismo e
Políticas Educacionais, do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal
do Espírito Santo. O estudo tem abordagem qualitativa e trata-se de uma pesquisa documental
bibliográfica, em que buscamos responder a seguinte questão norteadora: Qual o papel exercido
pelos governos federais do Brasil e dos EUA em prol à mitigação dos efeitos destrutivos da
Covid-19 no campo da educação pública?

CONTEXTUALIZAÇÃO POLÍTICA

A ruptura política em nível federal no Brasil e nos EUA reflete uma tendência ao populismo
autoritário que encontra fértil terreno na crescente insatisfação popular quanto às políticas
sociais de seus países. Tal movimento ocasionou grandes manifestações da sociedade civil 9,
como culminância do esgarçamento da ordem liberal-democrática. Os vigentes modelos
econômicos extremam as desigualdades e ameaçam as bases democráticas, provocando um
retrocesso sociopolítico que desemboca em “Eventos anômalos e inesperados como a Brexit e
a eleição de Donald Trump e Jair Bolsonaro” (ABRANCHES, 2020, p. 76). Os dois presidentes
foram eleitos num momento de desestabilização política provocada pela decadência econômica
nos dois países e, no Brasil, ampliada pelas medidas de austeridade fiscal implementada por
meio da EC 95/2016, entre outros fatores. Por aqui, ainda somou-se a este cenário uma intensa
polarização entre esquerda e direita expressa por um sentimento antipetista manifesto em uma
boa parcela da população, sentimento este exacerbado pela massiva exposição na mídia dos
casos de corrupção potencializados nos governos de Lula e de Dilma.

9
No Brasil, uma das maiores manifestações foi o “vem pra rua” ocorrido em 2013, deflagrada pelo aumento das
tarifas de transporte público em São Paulo, e que se espalhou por todo o país.
91

Nos EUA, a Constituição sequer cita o termo Educação em seu texto. Assim, cabe ao governo
federal apenas uma pequena parcela do financiamento da educação pública obrigatória (cerca
de 9% em 2022) por meio de programas de auxílio a minorias em vulnerabilidade. A liberal
filantropa Betsy DeVos foi nomeada Secretária do Departamento de Educação e trouxe consigo
o firme propósito de promover na educação pública o sistema de escolha escolar por meio de
vouchers, ampliando as possibilidades de ação do mercado no campo educacional daquele país.

Jair Bolsonaro notoriamente espelhou-se na figura de Donald Trump, desde sua campanha
eleitoral, operacionalizando sua visibilidade de forma ostensiva nas redes sociais, evocando
slogans com valores religiosos referentes à igreja, à pátria e à família e alcançando com essa
estratégia, muitos votos do eleitorado conservador e de direita, em sua maioria ligado aos
militares e às igrejas cristãs. A postura mimética de Bolsonaro continuou após sua eleição em
2019. O presidente demonstrou pouca (ou nenhuma) articulação política confrontando
desafetos e promovendo uma verdadeira guerra entre poderes e instâncias de pactuação
federativas.
O campo da Educação Pública foi, e já era desde quando ainda era deputado, uma de suas
principais frentes de combate e cujas estruturas parece ter sido um dos itens que tinha em mente
quando disse “O Brasil não é um terreno aberto onde nós pretendemos construir coisas para o
nosso povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer muita coisa [...]o nosso Brasil
caminhava para o socialismo, para o comunismo”10, por considerar as políticas educacionais
elaborados pelo MEC pautadas em bases ideológicas perniciosas. Nessa intenção, empossou
dentro no Ministério da Educação uma sequência de ministros que se sucederam sem que
nenhum programa relevante.
Nesse contexto administrativo de plena tentativa de mercantilização da educação pública, nos
EUA, e de constantes conflitos e desarticulação do governo federal com os demais entes
federados, no Brasil, é que eclodiu em março de 2020 a crise da Covid-19, interrompendo as
atividades presenciais nas redes de ensino de todo o Brasil e de quase todo os EUA, assim como
na maior parte do mundo.

AS AÇÕES NA PANDEMIA

10
O excerto citado é parte da fala de Bolsonaro num jantar com lideranças conservadoras, dentre os quais estava
Olavo de Carvalho, ocorrido em 17/03/2019, quando de sua visita a Washington. Valor Econômico. (2019)
disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2019/03/18/nos-temos-e-que-desconstruir-muita-coisa-diz-
bolsonaro-durante-jantar.ghtml Acesso em 01 set. 2022
92

As ações de Bolsonaro, sempre par e passo às do governo de Trump, refletiram-se diretamente


na gestão da crise sanitária e decorrente crise educacional. Ambos adotaram a postura de
negação ao distanciamento social e criticaram duramente os governos locais que implemetaram
lock-downs, na tentativa de conter a difusão do vírus. Também passaram a incentivar o uso de
medicamentos de eficácia não comprovada desprezando, a princípio, a gravidade da pandemia.
O uso de máscaras é um exemplo que demonstra o alinhamento dos dois presidentes. Bolsonaro
sempre se mostrou resistente à medida de proteção aparecendo em locais públicos sem elas.
Trump, por sua vez nunca emitiu um mandato para que o equipamento fosse obrigatório em
propriedades do governo federal ou em transportes interestaduais, o que era de sua alçada. O
presidente Joseph Biden emitiu a normativa imediatamente após sua posse em 20 de janeiro de
2021. (KINCAID; LECKRONE, 2022).

Na educação, o governo federal no Brasil limitou-se a emitir algumas normativas tais como os
decretos de suspensão da atividade presencial que regulamentava o ensino remoto, mantidos os
200 dias letivos, e a antecipação dos recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar
(PNAE) para a distribuição de kits alimentação para as famílias mais vulneráveis. Também
instituiu o Comitê Operativo de Emergência (COE)11 em 11 de março de 2020, que congregava
representantes governamentais e da sociedade civil para discutir ações emergenciais, porém,
não houve partindo do COE nenhuma ação relevante de coordenação para enfrentamento das
adversidades surgidas na educação básica.

CONCLUSÃO

Conforme atesta Nóvoa (2020, p.9) “as melhores respostas à pandemia não vieram dos
governos ou dos ministérios da educação, mas antes de professores que, trabalhando em
conjunto, foram capazes de manter o vínculo com os seus alunos para os apoiar nas
aprendizagens”.

O dito “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil” perpetua-se de forma
acentuada na gestão de Bolsonaro, tendo em vista a inoperância do executivo central no campo

11
O COE/MEC é composto pelo Ministério da Educação (MEC), Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE), Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), União
Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal
de Educação Profissional e Tecnológica (Conif); Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de
Ensino Superior (Andifes) e, agora, pelo Conselho Nacional de Educação (CNE).
93

educacional. No entanto, na ausência de coordenação das políticas educacionais foi


desconsiderada a abissal diferença entre as estruturas federativas dos dois países.
O que se evidencia na ausência do Estado em suprir as necessidades emergenciais para garantia
do direito à educação, é que se oportuniza a entrada de agentes externos e do setor privado que
ofertam seus produtos e serviços fazendo do direito público subjetivo um “bom negócio” pelos
reformadores empresariais.

REFERÊNCIAS
ABRUCIO, Fernando Luiz et al. Combate à COVID-19 sob o federalismo bolsonarista: um
caso de descoordenação intergovernamental. Revista de Administração Pública [online].
2020, v. 54, n. 4, pp. 663-677. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/0034-761220200354
https://doi.org/10.1590/0034-761220200354x>. Acesso em: 1 set. 2022

ANDERSON, George. Federalismo: uma introdução. Editora FGV, 2009.

ARRETCHE, Marta Estados federativos e unitários: uma dicotomia que pouco revela. Revista
de Sociologia e Política [online]. 2020, v. 28, n. 74 Disponível em:
https://doi.org/10.1590/1678-987320287403 Acesso em 01 set. 2022

DALLARI, Dalmo de Abreu. O estado federal. São Paulo. 2. ed. Saraiva Educação, 2019

KINCAID, John; LECKRONE, J. Wesley COVID-19 and American federalism First-wave


responses. In CHATTOPADHYAY, Rupak et al. Federalism and the Response to COVID-
19: A Comparative Analysis. Taylor & Francis, 2022. Disponível em:
https://library.oapen.org/handle/20.500.12657/51423 Acesso em 01 set. 2022

NÓVOA, António. A pandemia de Covid-19 e o futuro da Educação. Revista Com Censo:


Estudos Educacionais do Distrito Federal, v. 7, n. 3, p. 8-12, 2020.
94

PNE (2014-2024) E A GESTÃO DEMOCRÁTICA NA EDUCAÇÃO:


(DES)CONSTRUÇÃO DA META 19 EM TEMPOS DE CRISES

Lucas de Vasconcelos Soares12


Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa)
lukasluph123@gmail.com

INTRODUÇÃO

O estudo visa analisar as propostas de Gestão Democrática no atual Plano Nacional de


Educação (PNE), de duração decenal (2014-2024), identificando desafios quanto à
implementação da Meta 19 no Brasil em tempos de crise.

Dentre os objetivos propostos, buscou-se: a) compreender as definições legais indutoras da


Gestão Democrática na educação, chegando até o PNE vigente; e b) sistematizar desafios e
perspectivas sobrepostos ao alcance da Meta 19 (PNE) no Brasil.

As análises realizadas são fruto de pesquisa bibliográfica e documental, contemplando, entre as


técnicas de coleta de dados, o uso de levantamento teórico (DOURADO, 2006; LÜCK, 2011;
SAVIANI, 2018; SOARES; COLARES; OLIVEIRA, 2020) e análise documental (BRASIL,
2014) sobre o tema.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O termo Gestão Democrática, recentemente adotado no campo educacional, é resultante do


período conhecido como de redemocratização da educação nacional (DOURADO, 2006). Sua
concretização se dá, efetivamente, na Constituição Federativa do Brasil de 1988 (Artigo 206,
inciso VI) como um modelo de gestão pautado nos princípios de democracia e participação
coletiva dos sujeitos educacionais (LÜCK, 2011), incorporando-se nos documentos legais e
expandindo-se até a escola pública.

Na existência de discrepâncias quanto à conceituação do termo na literatura, adotou-se em Lück


(2011) uma definição para este novo modelo de gestão, pautando-se na ideia de superação de
seus anteriores (principalmente, da Administração Escolar), projetado para corrigir erros e
suprir necessidades nos processos desempenhados nas instituições e sistemas de ensino,

12
Docente do Magistério Superior na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Campus Óbidos. Mestre
em Educação. Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas “História, Sociedade e Educação no Brasil –
HISTEDBR/Ufopa”.
95

visando à construção de relações democrático-participativas em prol da qualidade, gratuidade


e acessibilidade no ensino público (SOARES; COLARES; OLIVEIRA, 2020). Em outras
palavras, a Gestão Democrática emerge para sanar carências de “a) [...] orientação e de
liderança clara e competente, exercida a partir de princípios educacionais democráticos e
participativos; b) [...] uma perspectiva de superação efetiva das dificuldades cotidianas”
(LÜCK, 2011, p. 23-24).

No Plano Nacional de Educação, instituído pela Lei Nº 13.005/2014 e sendo este um


instrumento do Estado Democrático de Direito direcionado as fragilidades do campo
educacional, previsto desde a Constituição de 1988 (Artigo 204), o compromisso em torno da
Gestão Democrática é mantido, sistematizado em uma meta (Meta 19) contendo oito estratégias
(19.1, 19.2, 19.3, 19.4, 19.5, 19.6, 19.7, 19.8). Imbuída na premissa governamental, a Meta 19
visa:

[...] assegurar condições, no prazo de 2 (dois) anos, para a efetivação da gestão


democrática da educação, associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à
consulta pública à comunidade escolar, no âmbito das escolas públicas [...] (BRASIL,
2014).

Quanto às estratégias interventivas em torno desta, é visível inúmeros mecanismos articulados


com a proposta da efetivação de um modelo democrático de gestão, com foco na inserção
integral dos sujeitos educacionais nos processos desempenhados. Assim, entre as principais
iniciativas, destacam-se: a criação dos planos estaduais (PEE) e municipais (PME) de educação
(19.1); criação e ampliação de programas fiscalizadores da educação, a exemplo, da
implementação de políticas e aquisição de recursos (19.2); realização de fóruns e conferências
de educação (19.3); formação e implementação de órgãos representativos na escola (19.4);
criação de órgãos consultivos e deliberativos que fiscalizem o trabalho da gestão (19.5);
fomento a participação dos atores educacionais nos projetos e ações da escola (19.6);
formulação e implementação de políticas que favorecem a autonomia na gestão (19.7); e
definição de normas que promovam o acesso à gestão educacional por critérios democráticos
(19.8), substituindo práticas como a indicação política, a exemplo.

Ao analisar as orientações do PNE em torno da Gestão Democrática e sua implementação no


campo educacional, constata-se um cenário colaborativo de mudanças, especialmente, na
(re)formulação de práticas e processos em busca da autonomia, democratização e coletividade
nas relações desempenhadas nestes campos/espaços (SOARES; COLARES; OLIVEIRA,
2020). Se aplicado integralmente, este documento tornar-se-á um agregador de potencialidades
96

e intervenções humanas compenetradas na premissa do desenvolvimento da qualidade da


educação brasileira.

No entanto, apesar das condições favoráveis projetadas pelo PNE quanto à Meta 19, tal
compromisso mantém-se permeado de desafios, inviabilizadores de sua incorporação, entre
eles: o cenário político-educacional em crise (SAVIANI, 2018) e o conjunto de relações
internas da escola (SOARES; COLARES; OLIVEIRA, 2020). Portanto, empecilhos em âmbito
macro e, também, micro na educação brasileira.

Para Saviani (2018), o cenário político-educacional em crise no Brasil, fruto do contexto do


pós-golpe de 201613, ascende mecanismos ideológicos, excludentes e privatizantes sobre a
educação, induzindo a retrocessos no campo dos direitos públicos, inviabilizando a
implementação de políticas educacionais, incluindo o Plano Nacional de Educação (2014-
2024), bem como os estaduais e municipais, dado que “várias metas [...] já venceram sem serem
atingidas” e as outras, ainda em andamento, “já se encontram inviabilizadas pela Emenda
Constitucional14 que o governo fez aprovar [...] limitando, por 20 anos, os gastos públicos [...]”
(SAVIANI, 2018, p. 302) com educação e saúde. Consequentemente, inviabiliza-se a Meta 19
e suas estratégias, uma vez que esta não foi alcançada, marcando-se pela inexistência de
indicadores que mostrem sua evolução ao longo dos anos (2014-2020), conforme dados do
Observatório do PNE15.

Por outro lado, Soares, Colares e Oliveira (2020), em estudos sobre a Gestão Educacional,
apontam o próprio conjunto de relações internas da escola como elementos enfraquecedores da
Gestão Democrática, com destaque para: ausência de participação da comunidade educacional,
conflitos internos, indicação política ao cargo de gestor, inoperância das políticas e projetos
educacionais, falta de autonomia, cobranças em avaliações externas e distanciamento de órgãos
representativo-deliberativos e a gestão. Ações estas que enfraquecem o compromisso
democrático-participativo, pairando certo incômodo na seguinte questão: como a escola poderá
ser democrática se esta não vive, de fato, uma democracia no conjunto de relações internas
existentes? Reflitamos.

13
Referente ao processo de Impeachment da presidenta Dilma Rouseff.
14
Emenda Constitucional Nº 95/2016 que limita os gastos públicos, por 20 anos, em Educação e Saúde.
15
Disponível em: https://www.observatoriodopne.org.br/.
97

Assim, vislumbra-se, tanto em âmbito macro como em micro da educação, desafios


correlacionados quanto à implementação da Meta 19 no Brasil, uma vez que, apesar da válida
contribuição nos documentos legais, a escola pública não está preparada para viver de fato uma
democracia (SOARES; COLARES; OLIVEIRA, 2020) e, tampouco, promover o direito
participativo dos sujeitos educacionais (LÜCK, 2011). Há necessidade de corrigir demandas de
dentro para fora, e não o contrário.

CONCLUSÃO

A análise em torno do PNE e dos estudos sobre a Meta 19 é de grande importância para refletir
sobre as ações propostas (escrito) e as práticas existentes (feito) na escola pública, identificando
distanciamentos e proposições entre estas. Os autores adotados corroboram no sentido de
elencar a própria realidade, e suas condições, como empecilho para a implementação da Gestão
Democrática e a efetividade da condição participativa aos sujeitos educacionais. Conforme
destaco em estudo anterior, talvez o problema maior esteja nas condições de promoção ao cargo
de gestor, prevalecendo à indicação política, destituindo assim, um sentido coletivo-
democrático-participativo.

Desse modo, ao invés da elaboração de gigantescos documentos afirmando que a escola é


democrática, quando esta não é, faz-se necessário investigar a própria realidade, identificando
conflitos e meios de resolução, dotando-se de aporte teórico-conceitual, implementando
práticas contínuas de participação, planejamento e avaliação, etc. Feito isso, a escola pública
estará pronta para uma mudança racial em sua estrutura: a incorporação da Gestão Democrática.
Enquanto isso, permanecemos na linha tênue entre o feito e o escrito em tempos de crise no
Brasil.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei Nº 13.005 de 25 de junho de 2014. Brasília: Câmara dos deputados, 2014.
Disponível em: http://pne.mec.gov.br/18-planos-subnacionais-de-educacao/543-plano-
nacional-de-educacao-lei-n-13-005-2014 Acesso: 30 abr. 2020.

DOURADO, Luiz Fernandes. Gestão da Educação Escolar. Vol. 6. Brasília: UnB, 2006.

LÜCK, Heloísa. Concepções e processos democráticos de gestão educacional. 7ª ed.


Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.

SAVIANI, Dermeval. Política Educacional no Brasil após a ditadura militar. Revista


HISTEDBR On-line, v. 18, n. 2, abr./jun., 2018, p. 291-304. Disponível em:
98

https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/histedbr/article/view/8652795 Acesso: 29 abr.


2020.

SOARES, Lucas de Vasconcelos; COLARES, Maria Lília Imbiriba Sousa; OLIVEIRA,


Lílian Aquino. Concepções de Gestão Educacional: práticas e desafios no interior da
Amazônia. EDUCA – Revista Multidisciplinar em Educação, Porto Velho, v. 7, n. 17, p.
232-256, jan./dez., 2020. Disponível em:
http://www.periodicos.unir.br/index.php/EDUCA/issue/archive Acesso: 16 abr. 2020.
99

PROPOSTA DE ORGANIZAÇÃO DO ANO LETIVO 2022 DA SECRETARIA


MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE VITÓRIA-ES: FRAGILIDADE DA GESTÃO
DEMOCRÁTICA

Aguinaldo Rocha Souza


Mestrando do programa de Mestrado Profissional em Educação da UFES
Professor da Rede Municipal de Vitória - ES

Zoraide Barboza de Souza


Mestra do Programa Educação: História, Política, Sociedade da PUC-SP
Professora Especialista de Educação Infantil da Rede Municipal de Vitória - ES

INTRODUÇÃO

A Gestão Democrática e o regime de Colaboração do funcionamento do ensino no Brasil é


regulamentado na LDB Lei nº 9.424/96, possibilitando assim, condições de autonomia para os
municípios direcionarem as políticas educacionais a partir do contexto local.

Na busca de se adequar a nova ordem do país, o município de Vitória se constitui em Sistema


de Ensino em 27 de julho de 1998, por meio de publicação da Lei 4747/1998. Na mesma data
é publicada a Lei 4746/1998 que dispõe sobre a organização e funcionamento do Conselho
Municipal de Educação de Vitória (COMEV), definindo o órgão colegiado com as funções de
caráter normativo, consultivo e deliberativo.

A partir dessas legislações, o Sistema de Ensino se institui no município de Vitória – ES,


estabelecendo a autonomia e criando situação para que o município se responsabilize pela
política pública educacional local. “[...]Assim, os SME, ao serem constituídos, representam
avanços em relação ao princípio da gestão democrática, que deve reger a administração político-
administrativa do país” (FLACH, 2022, p. 222).

O COMEV considerando sua função normativa, produziu, e foi homologada pela SEME
(Secretaria Municipal de Educação de Vitória-ES) por meio da Portaria 055/2008, a
Resolução/COMEV nº 07/2008 que fixou normas relativas à organização e funcionamento do
Ensino Fundamental na Rede Municipal de Ensino de Vitória - ES.

No entanto, em 2021 a SEME tomou a decisão de fazer alteração da organização do currículo


das Unidades de Ensino. Depois de apresentar a proposta a alguns segmentos da sociedade,
100

solicitou por meio de ofício no dia 25 de outubro de 2021, ao COMEV alteração dos artigos 5º
e 6º da Resolução COMEV Nº 07/2008.

A partir da solicitação da SEME, o Conselho tomou várias providências para elaboração,


apresentação e aprovação do Parecer nº 22/2021: Proposta de Organização do Ano Letivo 2022
e alteração da Resolução COMEV no 07/2008, de autoria da Secretaria Municipal de
Educação de Vitória-ES

O Parecer finaliza suas considerações com alguns questionamentos e dois deles trazemos como
referência para discutir neste estudo:

1- [...]a Secretaria Municipal de Educação marcou reuniões com os segmentos que


compõem a Comunidade Escolar – professores, crianças, estudantes, famílias,
representações comunitárias, Conselhos de Escola? Se marcou, qual/quais foram os
resultados dessas reuniões? Se não realizou, por que não realizou, considerando que
a proposta de mudança afeta direta ou indiretamente a vida dessas pessoas que
compõem esses segmentos?
[...]
4- A proposta apresentada pela SEME retira a possibilidade de planejamentos
coletivos, desconsiderando a importância desses espaços/tempos, no avanço da
qualidade da educação ofertada na Rede Municipal de Ensino. Qual o plano para
minimizar esses impactos e não perdermos a dimensão da coletividade da Educação,
nas Unidades de Ensino? (VITÓRIA, 2021, p. 17)

Nesse sentido, focaremos a discussão sobre a participação coletiva da comunidade escolar a


respeito da elaboração da proposta curricular da Rede Municipal de Educação de Vitória, 2022,
considerando os preceitos da LDB em seu “Art. 15. Os sistemas de ensino assegurarão às
unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de
autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de
direito financeiro público.”. Dessa forma, questionamos quais os espaços coletivos que a SEME
construiu com as Unidades de Ensino e COMEV na elaboração de sua proposta pedagógica ao
alterar dos artigos 5 e 6, da Resolução COMEV nº 07/2008? E quais os espaços tempos de
planejamento coletivo na organização pedagógica do ano de 2022 são possíveis nas Unidades
de Ensino, haja vistas, foram retirados 30min em cada turno, em que eram usados como espaço
tempo de planejamento coletivo?

O objetivo deste estudo é identificar a existência de espaços coletivos por parte da SEME na
elaboração da proposta pedagógica de 2022, estabelecendo diálogo com a Gestão Democrática,
pois a organização dos espaços tempos nas Unidades de Ensino precisa ter como referência a
participação da comunidade escolar.

METODOLOGIA
101

Este trabalho é um estudo qualitativo, pois seu processo foi desenvolvido a partir de um
problema, considerando a temática estabelecida para o estudo, na busca de uma organização
coerente e consistente. (TRIVIÑOS, 1987). Esta é uma pesquisa documental, pois nossa fonte
primária são os documentos: Parecer nº 22/2021 e Resolução/COMEV nº 07/2008 que
envolvem o tema e também buscaremos estratégias para lidar com a subjetividade dos
documentos. (GIL, 2002)

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Ao observarmos o Parecer nº 22/2021 identificamos o percurso realizado pela SEME. No dia


25/10/2021 solicita inclusão de ponto de pauta, na 15ª Sessão Plenária do COMEV, prevista
para o dia 27/10/21 para apresentação da proposta. Esta é encaminhada à CLN (Comissão de
Legislação e Normas) para elaboração do Parecer.

O LAGEBES/UFES (Laboratório de Gestão da Educação Básica do Espírito Santo /


Universidade do Espírito Santo) em parceria com o COMEV realizou no dia 18/11/2021 uma
live no seu canal do YouTube. E, em seguida, o COMEV elaborou “Fórum com Conselhos de
Escolas - Ano letivo 2022: educação em debate'' no canal do YouTube.

A Promotoria de Justiça da 7ª Vara Cível de Vitória promoveu Audiência Pública no dia


06/12/2021 com a participação da Secretária de Educação, a presidente do COMEV, duas
professoras da UFES para realização do debate das questões teóricas e legais, contando com o
envolvimento do Fórum de Educação de Vitória, Fórum de Diretores, Fórum EJA, Sindicato
dos Servidores Municipais de Vitória (SINDSMUV), Professoras/es Associadas/os pela
Democracia em Vitória (PAD-Vix), profissionais da educação, representantes do Conselho de
Escola e familiares dos/das estudantes.

Enfim, no dia 30/12/2021, após aprovação na CLN, o COMEV em plenária extraordinária


aprova o Parecer negando a solicitação da SEME. Foi possível identificar, a partir do Parecer
em diversas atividades realizadas pelo COMEV, LAGEBS/UFES e Ministério Público, que a
proposta da SEME apresenta argumentos frágeis, “[...]Os professores fizeram considerações
acerca do documento que traz as mudanças para organização das escolas, apontando
fragilidades e soluções simplistas e ineficazes para problemas complexos.” (VITÓRIA, 2021,
p. 04). Outro aspecto é o tempo de apresentação da proposta, pois a mesma foi comunicada em
outubro para se realizar no ano letivo seguinte.
102

As considerações evidenciadas no Parecer indicam que a proposta da SEME traz em seu bojo
a gestão pública neoliberal com base em FREITAS (2018, apud, VITÓRIA, 2021, p. 07),
argumenta também que a justificativa da SEME em relação ao resultado dos índices do IDEB
é frágil, considerando a contribuição da ESTEBAN (2018, apud, VITÓRIA, 2021, p. 08) “[...]o
discurso oficial adota os dados das avaliações externas para justificar uma possível melhoria da
educação. No entanto, as avaliações externas pouco contribuíram, ao longo dos anos, para a
educação e para a melhoria da aprendizagem. [...]”.

Em relação ao foco deste estudo, podemos sinalizar que o espaço democrático de participação
e produção coletiva pode ter sido desconsiderado, tendo em vista que segundo o histórico do
Parecer nº 22/2021, a SEME não construiu espaço de participação nas Unidades de Ensino e
nem no COMEV, o que sinaliza a falta de participação dos envolvidos do Ensino do município,
fragilizando a gestão democrática, pois o participar está entranhado nos mecanismos da Gestão
Democrática. Ressalta-se que o princípio da democracia “[...]explica, noutros termos, o sentido
performativo da prática de autodeterminação de membros iguais e livres de uma associação
estabelecida livremente[...]” (HABERMAS, 1997, p. 145).

Nesse sentido, faz-se necessário o entendimento que a legitimidade de uma norma depende de
amplo debate com todos/as envolvidos/as baseado nos argumentos livres e racionais. Pode-se
arriscar, que a SEME negligenciou o “fazer com” e tomou a decisão de “fazer para”, deixando
à margem os sujeitos do processo educacional.

CONCLUSÃO

Ao fazer análise do Parecer nº 22/2021 é possível identificar que a SEME não considerou o
princípio da gestão democrática, escamoteou da elaboração da proposta de organização do Ano
Letivo 2022 e alteração da Resolução COMEV no 07/2008 a contribuição da Comunidade
Escolar, bem como do COMEV. Quando identificamos a ausência de participação na feitura da
normatização educacional, podemos considerar que a gestão democrática se fragiliza em todo
o processo educacional, correndo risco da não observância da LDB.

Outro ponto de estrangulamento em relação aos espaços coletivos na proposta da SEME é o


encerramento do planejamento coletivo nas Unidades de Ensino, considerando que foram
retirados os 30 minutos nos finais de cada turno, em que a escola aproveitava. Dessa forma, as
Unidades de Ensino não disponibilizam espaço tempo coletivo de planejamento aos/às
trabalhadores/as da educação.
103

REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 2016.

CHAUÍ, Marilena. Cultura e democracia. Crítica y Emancipación, 53-76, junio, 2008.


https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4657030/mod_resource/content/1/Chaui%20Cultura
%20e%20Democracia.pdf. Acesso em: 5 agos. 2022.

FLACH, Simone de Fátima. A gestão democrática nos sistemas municipais de ensino do


Paraná: uma análise a partir dos conselhos municipais de educação. Ensaio: Avaliação e
Políticas Públicas em Educação; Rio de Janeiro, v.28, nº106, p.221-240, jan./mar. 2020
https://www.scielo.br/j/ensaio/a/6d3GCZvWg7kgJ8zTqf9smmM/?lang=pt. Acesso em: 5
agos. 2022.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2002
HABERMAS, Jürgen, Direitos e democracia: entre facticidade e validade. Vol. I. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
TRIVIÑOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais. São Paulo:
Atlas, 1987.
VITÓRIA. Parecer nº 22/2021: Proposta de Organização do Ano Letivo 2022 e alteração
da Resolução COMEV no 07/2008, de autoria da Secretaria Municipal de Educação de
Vitória-ES. Vitória: COMEV, 2021.

VITÓRIA. Resolução COMEV no 07/2008, de autoria da Secretaria Municipal de


Educação de Vitória-ES. Vitória: COMEV, 2008.
104

ASSEMBLEIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DA SERRA/ES (AMED) - INSTÂNCIA


DE PARTICIPAÇÃO COLETIVA

Dalira da Fonseca Bittencourt


dalirab@yahoo.com.br

Marcia Saraiva Prudencio


marciasaraivap2008@hotmail.com

Sue Elen Lievore


suelievore@gmail.com

INTRODUÇÃO

Esse relato tem como objetivo descrever e analisar a Assembleia Municipal de Educação da
Serra/ES (Amed) realizada pelo Conselho Municipal de Educação da Serra/ES (CMES). A
AMED está prevista no Art. 3º, Inciso X do regimento interno do CMES e deve ser realizada,
no mínimo uma vez por ano, com o objetivo de avaliar a política educacional do município,
com o apoio da Secretaria Municipal de Educação (Sedu), A AMED é organizada pelo CMES
que, mediante a seleção de um tema, convida palestrantes externos e internos da rede municipal
para analisar a temática proposta.

METODOLOGIA

Segundo Dias Sobrinho (1996), um processo de avaliação não se restringe apenas a aspectos
organizacionais e gerenciais de uma instituição, mas vai além, é muito mais abrangente.

Assim, toda e qualquer avaliação mostra-se como um movimento primordial, visto que objetiva
a melhoria da educação pública em todas as suas particularidades, bem como a prestação de
contas à sociedade.
A assembleia é o instrumento utilizado para avaliar a Política Educacional Municipal. Após
explanação do tema pelos/as palestrantes, abri para escuta aos participantes, como forma de
pesquisar a educação municipal. Segundo Gil, 2002, p. 46, “As pesquisas exploratórias têm
como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias, tendo em vista
a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores”.
Assim, a partir da escuta aos participantes, faz-se os encaminhamentos necessários, com vistas
a buscar informações mais precisas e soluções em relação aos temas/problemas debatidos.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
105

A AMED reúne uma quantidade significativa de pessoas entre profissionais da educação da


rede municipal de ensino da Serra, pais ou responsáveis e comunidade local.

Nesse sentido, ressaltamos a AMED como um importante instrumento para fortalecimento da


gestão democrática na rede municipal de ensino e para reflexão coletiva acerca das políticas
educacionais implementadas no município. Segundo Gadotti (2014) a gestão democrática não
é somente um princípio pedagógico, mas também um preceito constitucional, com destaque
para dois pilares – a democracia representativa e a democracia participativa (direta), entendendo
a participação social e popular como princípio inerente à democracia.

Ainda, Conforme Maria da Glória Gohn (GOHN, 2008, p. 335), os movimentos sociais são
“ações sociais coletivas de caráter sociopolítico e cultural que viabilizam distintas formas da
população se organizar e expressar suas demandas”. AMED é mais um instrumento de gestão
democrática utilizado pelo CMES. Nesse sentido, pensar em uma educação democrática, uma
rede de ensino democrática, é pensar sobre a participação de toda a comunidade escolar nos
rumos da educação municipal. Com efeito, outro aspecto importante a ser observado é que o
CMES não limita seu trabalho às paredes da sua estrutura física, conforme palavras de Paulo
Freire (BRASIL, 2004a, p. 9).

Assim, no planejamento da AMED as entidades que compõem o CMES buscam alinhar as


temáticas elencadas para a reflexão na rede municipal aos debates ocorridos em âmbito nacional
sobre as políticas educacionais em disputa.

Um desafio relacionado à organização da AMED refere-se à garantia de participação


profissionais da educação da rede municipal, pais ou responsáveis e comunidade local,
considerando a ausência de um espaço físico adequado que comporte todos/as.

Nesse sentido, entre os anos de 2016 a 2019, participavam da AMED alguns profissionais da
educação indicados pela unidade de ensino e os demais ficavam nas Unidades de Ensino
estudando e debatendo os textos propostos pelo CMES.

Com o advento da pandemia em 2020 foi adotado o modelo virtual de assembleia mediante
realização de uma live transmitida pelo canal do Youtube do CMES. Na prática, esse formato
possibilitou a participação ampla de profissionais da educação da rede municipal, bem como de
alguns pais ou responsáveis e representantes da comunidade local, sendo percebida pelo número
106

pessoas acompanhando de forma online, pelas mensagens digitadas no chat e pela lista de
presença.

Destacamos a experiência do ano de 2022, com o tema “Avaliação da política educacional do


município de Serra/ES”, na qual teve como encaminhamento a construção de uma carta em
defesa de uma educação pública, gratuita e de gestão pública e democrática, em favor da
aplicação dos recursos públicos na educação pública, contra os diferentes mecanismos de
privatização e mercantilização da educação que consomem recursos públicos e a produção de
um relatório a partir das demandas do chat a ser encaminhada para o executivo, secretaria de
educação e demais órgãos competentes, como documento final da AMED.

CONCLUSÃO

Conforme introdução o objetivo da AMED e de avaliar a política educacional do município da


Serra. Nesse sentido entende-se que a metodologia da AMED tenha alcançado o seu objetivo
quanto a avaliação da política educacional municipal. Em termos da sua efetividade objetiva,
certamente isto deixa uma expectativa.

Ademais, compreende-se que mais momentos, como o da AMED são necessários para uma
discussão mais aprofundada acerca da política educacional municipal. Ainda, observa-se
também, que o caminho para efetivação da política educacional com característica participativa,
o envolvimento da sociedade civil na AMED é peça fundamental.

Finalmente, cabe ainda destacar a importância do esforço do CMES em garantir a AMED no


seu Regimento interno, e assim, de forma democrática, promover um debate forte acerca das
políticas educacionais implementadas no município. No contexto atual, de fragilidades nas
instituições democráticas, convém destacar a relevância de tal ação, pois contribui para o
fortalecimento dos instrumentos de gestão democrática constituídos historicamente pelos
movimentos sociais.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos


Escolares. Caderno 1 - Conselhos escolares: democratização da escola e construção da
cidadania. Brasília: 2004b.

DIAS SOBRINHO, J. Avaliação Institucional: Marco Teórico e Campo Político. In: Ver.
Avaliação. Rede de Avaliação Institucional da Educação Superior, Ano 1, N° 1, Julho Brasil,
1996.
107

GADOTTI, Moacyr. Gestão democrática da educação com participação popular no


planejamento e na organização da educação nacional. Brasília: Conae, 2014.

GOHN, Maria da Glória. O protagonismo da sociedade civil: movimentos sociais, ONGs e


redes solidárias. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar Projetos de pesquisa. 4. ed. - São Paulo: Atlas, 2002.

SERRA. RESOLUÇÃO CMES N.° 199, de 20/12/2019. Aprova Regimento Referência para
as Unidades de Ensino da Rede Municipal da Serra. Serra, 2019.
108

GESTÃO ESCOLAR E EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA PÚBLICA: UMA


EXPERIÊNCIA COM O PROJETO TAMPINHA DO BEM

Elandia Aparecida Pereira Rodrigues


Mestranda do Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Matemática
EDUCIMAT – IFES
Diretora escolar - Secretaria Municipal de Educação da Serra
elandiapereira@hotmail.com

INTRODUÇÃO

As ações antrópicas provocadas pelo uso indevido dos recursos naturais vêm causando
problemas ambientais severos e impactando a qualidade de vida da população e demais seres
vivos. Mais especificamente, podemos citar o elevado consumo de produtos e serviços como
fator preponderante no acúmulo de resíduos sólidos.

Atualmente, o plástico é um dos produtos mais utilizados na sociedade. Sabe-se que, ao ser
descartado corretamente por pessoas e empresas, o plástico, poderá passar por um processo de
reciclagem que garantirá seu reaproveitamento na produção do plástico reciclado, bem como a
preservação do meio ambiente. Segundo pesquisas desenvolvidas pelo Setor do Plástico, o
plástico reciclado tem praticamente todas as características do plástico comum, podendo ser
100% reutilizado, sem problemas para as indústrias, colaborando ainda, significativamente,
com o meio ambiente, sendo mais uma importante forma de preservação ambiental, como
também, uma fonte de geração de trabalho, emprego e renda.

Neste tocante, a Educação Ambiental (EA), como processo pedagógico no âmbito escolar, pode
ser a base para ações coletivas possibilitando a adequada gestão desses resíduos
(CEMBRANEL; FRANCISCHETT; RODRIGUES, 2019). Já para Loureiro et al (2009), “a
Educação Ambiental deve promover o desenvolvimento de hábitos e atitudes sadios de
conservação ambiental e respeito à natureza, a partir do cotidiano de vida da escola e da
sociedade”.

Assim, as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Ambiental, Resolução nº 2, de 15 de


junho de 2012, em seu Art. 2116, reforçam a legitimidade e obrigatoriedade para que os sistemas
de ensino propiciem condições às escolas a fim de que estas, através da integração dos

16
Resolução CNE/CP nº 2, de 15 de junho de 2012 - Educação Ambiental estabele as Diretrizes Curriculares
Nacionais para Educação Ambiental. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=10988-rcp002-12-
pdf&category_slug=maio-2012-pdf&Itemid=30192
109

currículos, constituam-se em espaços educadores sustentáveis (BRASIL, 2012).

Acreditando que a consciência ecológica parte da educação ambiental trabalhada através de


temas transversais em sala de aula, faz-se necessário primeiramente, uma intervenção
pedagógica no âmbito escolar. De acordo com os PCN’s (Parâmetros Curriculares
Nacionais17):
vê-se a importância de incluir Meio Ambiente nos currículos escolares com o tema
transversal, permeando toda prática educacional. É fundamental, na sua abordagem,
considerar os aspectos físicos e biológicos e, principalmente, os modos de interação
do ser humano com a natureza, por meio de suas relações sociais, do trabalho, da
ciência, da arte e da tecnologia.

De acordo com Maria e Zanon (2012) a criança pode ser formada no ambiente escolar onde
se aprende por meio do diálogo a refletir, questionar, adotar posturas e eleger valores, uma vez
que “a educação é uma forma de intervenção no mundo” (FREIRE, 2004, p. 38). É nos anos
iniciais do ensino fundamental que a criança desperta a curiosidade e desenvolve interesse
para atividades práticas. Porém, as provocações precisam fazer sentido em sua na vida para
que haja uma reflexão-ação. Neste processo, Dickmann e Stanqueviski (2019) enfatizam a
necessidade de uma educação crítica e emancipatória servindo como um guia para as
atividades que tenham propostas libertadoras.

Com o objetivo de promover ações que visem a promoção da Educação Ambiental por meio
da coleta seletiva, foi que surgiu o “Projeto Tampinha do Bem: desenvolvendo a educação
ambiental em uma perspectiva crítica”.

METODOLOGIA

A experiência aconteceu através do Programa Tampinha do Bem, sendo este motivado por uma
parceria do município de Serra com o Sindicato do Plástico do Espírito Santo – Sindiplastes. O
“Projeto Tampinha do Bem: desenvolvendo a educação ambiental em uma perspectiva crítica”,
constituiu-se de ações de coleta e arrecadação de tampinhas plásticas que seriam encaminhadas
para empresas de reciclagens. Além disso, foi possibilitado momentos formativos de
professores e alunos sobre conscientização ambiental.

LOCAL E PÚBLICO-ALVO

A intervenção aconteceu na escola pública municipal Manoel Vieira Lessa (MVL) que atende

17
Parâmetros Curriculares Nacionais. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/introducao.pdf
110

estudantes dos Anos Iniciais do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental I sendo esta localizada no
bairro Cantinho do Céu, no município da Serra e recebe também alunos dos bairros adjacentes:
José de Anchieta I, II e III, Vista do Mestre, Jardim Tropical, entre outros.

Nos dias atuais, os moradores do bairro Cantinho do Céu convivem com questões
socioambientais relacionadas ao descarte indevido de resíduos sólidos (principalmente nas
proximidades dos córregos da região), queima de lixo e incêndios nas áreas de vegetação de
turfa.

Não há movimento para realização de coleta seletiva, gerenciamento de resíduos sólidos e/ou
associações de catadores de materiais possíveis de serem reaproveitados. Porém, alguns
moradores (inclusive familiares de alunos) trabalham como catadores independentes
selecionando estes materiais entre os depósitos de lixo que foram se formando em terrenos
baldios, principalmente no entorno da escola. Percebe-se, contudo, que alguns alunos se sentem
desconfortáveis ao mencionar seus familiares como “catadores”.

As ações realizadas por meio do Projeto Tampinha do Bem tiveram como público-alvo: diretora
escolar, alunos, professores e demais funcionários (merendeiras, porteiro, auxiliares de serviços
gerais e secretárias).

A AÇÃO

O “Projeto Tampinha do bem: desenvolvendo a educação ambiental em uma perspectiva


crítica”, iniciou com as ações no mês de julho de 2021 e teve sua culminância em novembro do
mesmo ano. Contou com a participação de aproximadamente 580 alunos e 50 funcionários.
Inicialmente, todos os profissionais da escola participaram de uma formação, em uma empresa
recicladora de plástico, sobre a coleta e destinação do plástico. Já os alunos foram oportunizados
à uma visita na Escola Senai do Plástico, onde experienciaram o aproveitamento do material
plástico recolhido sendo transformado em objetos através da impressora 3D. Além destas ações,
a diretora da unidade escolar promoveu apresentações e dinâmicas que tratavam sobre o tema
coleta seletiva. Coletores de tampinhas plásticas (garrafões de água mineral) doados por uma
empresa, foram posicionados nas salas de aula e na entrada da escola. Tal grande foi a demanda
que estes coletores foram substituídos por caixas d’águas. E assim, os recursos financeiros
advindos desta parceria seriam, então, utilizados para construção e manutenção de uma horta
escolar.
111

RESULTADOS

Faz-se necessário compreender que a educação ambiental é uma prática política, sendo preciso
promover a participação e a construção de espaços onde ocorra a interação dos saberes que
estimulem a organização coletiva e a construção de ambientes colaborativos. De acordo com
Guimarães (2004, p. 48), “a EA crítica volta-se para uma práxis de transformação da sociedade
em busca de uma sustentabilidade calcada em novos paradigmas, condições materiais, posturas
éticas- políticas, entre outros”.

Nesta perspectiva, é notório enfatizar a participação dos envolvidos no projeto, demonstrando


satisfação e empenho. Em três meses de execução, arrecadou-se quase 600 quilos de tampinhas
plásticas que poderiam ter sido descartados indevidamente. Além disso, a prática da coleta
seletiva foi estimulada entre os participantes no sentido de estabelecer mudanças de hábitos.

Figura 1 – Visita de todos os funcionários da escola à empresa de reciclagem de plástico/


coletores de tampinhas/painel de fotos.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Diretrizes Curriculares Nacional para
Educação Ambiental. Brasília, 2012.
CEMBRANEL, Adir Silvério; FRANCISCHETT, Mafalda Nesi; RODRIGUES, Carla
Regina. Educação ambiental com estudantes e famílias na gestão dos resíduos sólidos
urbanos. Revbea, São Paulo, v. 14, n. 1, p. 171-185, 2019.

DICKMANN, Ivo; STANQUEVISKI, Claudemir. Pedagogia da resistência: aportes


críticos para uma Educação Ambiental freiriana. Quaestio, Sorocaba, v. 21, n. 1, p. 59-
80, jan./abr. 2019.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Anca/MST, 2004.

GUIMARÃES, Mauro. A formação de educadores ambientais. São Paulo: Papirus, 2004.


112

174 p.

MARIA, Elisangela Castelo; ZANON, Angela Maria. A educação ambiental a partir de um


olhar freiriano. Remea - Revista Eletrônica do Mestrado em Educação Ambiental, v.
28, p. 62-71, jan./jul. 2012. Disponivel em: https://doi.org/10.14295/remea.v28i0.3105.
Acesso em: 20 ago. 2022.
113

CONSELHOS MUNICIPAIS: INSTÂNCIAS DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL


DEMOCRÁTICA DE GARANTIA AO DIREITO À EDUCAÇÃO.

Rodrigo Ferreira Rodrigues


Professor Permanente PPGEH – IFES
rodrigo.rodrigues@ifes.edu.br

Kátia Cristina Maurício Bastos Gonçalves


Prefeitura Municipal de Cariacica
kcbastos@uol.com.br

INTRODUÇÃO

Os Conselhos Municipais de Educação são espaços legítimos e que fomentam de modo


orgânico e sistemático a gestão democrática na política educacional. Os debates sobre o papel
e importância dos conselhos municipais de educação nas últimas décadas no Brasil,
manifestam-se por meio de movimentos de superar a herança colonial de centralização de
poder, das decisões que, por vezes, ignoram e silenciam a capacidade da comunidade em
participar, integrar e implementar políticas públicas, na contramão do centralismo das decisões
sobre a vida e as políticas públicas

Com o movimento pela redemocratização da sociedade, da educação e pela participação social


direta na defesa de interesses e processos decisórios de políticas públicas na reconquistados na
década de 1980 com a intensificação da participação social a partir dos Conselhos nas políticas
públicas, garantidos com a promulgação da Constituição Federal (CF/1988), em razão desta
garantir como fundamentos do sistema de governo do país a soberania, a cidadania e a gestão
democrática como princípios norteadores às políticas públicas e ao ensino.

O contexto do processo de democratização da gestão pública passou a requerer dos


conselhos de educação nova configuração em sua natureza: a passagem de órgãos
técnicos de governo para o exercício de funções de Estado. Fundados nas novas
categorias de pertencimento e participação, os conselhos se tornam a expressão de
uma institucionalidade cidadã e passam a representar, hoje, uma estratégia
privilegiada de democratização das ações do Estado (BORDIGNON, 2017, p. 25).

Constituído por uma associação de pessoas representando diferentes segmentos que compõe o
sistema educacional, o conselho, como colegiado que privilegia a participação popular tem e
deve ter natureza pública, para proceder de forma a aconselhar, emitir parecer, deliberar com
relação a questões de interesse público em sentido amplo ou restrito. Dessa forma um Conselho
deve ser representado por meio de pluralidades, expressando as expectativas e vozes do grupo
social. Estas manifestações ocorrem inicialmente por meio de assembleias legitimadas, e
114

posteriormente por normas escritas sobre assuntos de interesse do ente nacional e/ou
subnacional, da política para a elaboração de política pública. Os conselhos organizam-se e
compõe-se sob os seguintes princípios: o caráter público, a voz plural representativa da
comunidade, a deliberação coletiva, a defesa dos interesses da cidadania e o sentido de
pertencimento (CURRY, 2000).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Na esteira dessas compreensões introdutórias o Conselho Municipal de Educação de Cariacica


- COMEC foi instituído pela Lei nº. 2067/1990, com o objetivo de elaborar, deliberar e
fiscalizar a política e o sistema educacional do município de Cariacica, posteriormente a Lei
4.172/2003 revoga a anterior e suprimi a função fiscalizar. Em seguida a Lei 4701/2009 revoga
totalmente as leis 4460/2007 e 4473/2007 e define no Regimento Interno as competências do
COMEC:

[...] órgão de deliberação coletiva, de natureza participativa e representativa, o qual


exerce funções de caráter normativo, consultivo, deliberativo e de assessoramento ao
Secretário municipal de Educação nas questões que lhe são pertinentes [...].
(CARIACICA, 2009).

O Regimento do COMEC foi aprovado pela Portaria 294/2009, neste documento no artigo 2º,
o Conselho trata-se de um:

[...] órgão que atua sobre a Política Educacional Municipal, que tem por finalidade
planejar, orientar e disciplinar as atividades de ensino público municipal [...]
(CARIACICA, 2009).

Em sua estrutura, organização e funcionamento constam plenárias, câmaras específicas,


comissões, a representação do poder executivo e da sociedade civil totalizando 44 membros
titulares e suplentes. (GONÇALVES & DUBBERSTEIN, 2018)

Como relato de experiência cumpre explorar a trajetória da pesquisadora integrando o COMEC.


Em 2006 efetivo no município de Cariacica como pedagoga na EMEF Vista Mar e como
professora na EMEF Joana Maria da Silva, escola recém municipalizada. Em maio de 2006, eu
e outras professoras efetivadas nos apresentamos na escola como determinado e ao chegarmos,
a surpresa, as professoras regentes estavam na escola, assim como nós, não sabiam da mudança,
ou seja, não houve transição. A então diretora encerraria as atividades no final do ano, antes do
encerramento e, dando voz a comunidade escolar, a Secretaria de Educação, oportunizou a
comunidade escolar a se manifestar quanto ao cargo, eu e uma colega fomos indicadas, após
avaliação e entrevista, a SEME me nomeou para o cargo de diretora, permaneci na unidade até
115

o final do processo de indicação. Em 2011, foi instituído a Lei Complementar nº 035/2011 que
“Dispõe sobre a Gestão Democrática do Ensino Público Municipal de Cariacica”
(CARIACICA, 2011), com essa Lei iniciou o processo então eleitoral para os cargos de diretor
e vice-diretor, mesmo com o apoio da Comunidade de Castelo Branco, que é extremamente
participativa e democrática, optei em não me candidatar, e assim, retornaria para a EMEF
Ayrton Senna18, onde compus a chapa como vice-diretora, eleitas, permanecemos por 02
mandatos até o final de 2014. Em 2015 fui atuar na SEME, e designada para o cargo de
assessoria técnica do COMEC, atendendo e assessorando a rede pública do município de
Cariacica e as escolas particulares de educação infantil. Assim que assumi o executivo me
deslocou me enviou para a Gerencia de Ensino, após 04 meses solicito o retorno ao Conselho,
fui atendida mas logo em seguida assumi como secretária executiva do CAE19. Observa-se que
há sempre interferência do executivo na Casa dos Conselhos20. Nos mandatos do COMEC
(GESTÃO 2015/2017 e 2017/2019), fui indicada pelo executivo para participar como membro
e nas plenárias de 2018 houve uma crescente oferta de programas/parcerias educacionais
associados a governos, ONGs e/ou organizações privadas sem fins lucrativos.

Conforme Adrião (2018) o estabelecimento das parcerias permite que o Poder Público possa
ressarci instituições e/ou empresas de direito privado, e assim, temos visto situações que
indicam a “privatização da gestão da educação pública” de forma lenta e velada não só pelo
discurso da melhora dos índices e por uma educação de qualidade, e são apresentados dados,
poucos se manifestam, os dados promovem uma inércia no órgão que poderia/deveria
questionar. Um dos dilemas que observamos é o fato da Casa dos Conselhos estar situada na
SEME, faz com que não reconheçam o Conselho como órgão independente, permitindo que
diversos secretários de educação e técnicos da secretaria não entendam a autonomia do
Conselho, desse espaço propiciando interferências e fragilidades. A falta de formação induz a
membros a diálogos próximos ao senso comum. O medo da exposição e suas consequências,
bem como a presença maciça do executivo nas plenárias facilita a aprovação dos projetos, as
discussões até existem, mas não são abordados por especialistas/estudiosos. Por exemplo, o
programa Pacto Pela Aprendizagem no Espirito Santo – PAES, iniciou em 2017, na época a
SEME havia refutado o programa. Entretanto, nesse mesmo ano o assumiram a adesão do

18
Na época a EMEF Ayrton Senna era denominada EMEF Vista Mar.
19
Conselho Municipal de Alimentação Escolar
20
Casa dos Conselhos é composto pelo Conselho Municipal de Educação – COMEC, Conselho Municipal de
Alimentação Escolar – CAE, Conselho Municipal do Novo Fundeb de Cariacica – COMFUC e Fórum
Municipal de Educação – FME.
116

Município. Assim, o COMEC iniciou a discussão em março de 2018 e ao longo do ano em


praticamente todas as plenárias o PAES foi ponto de pauta, com a mudança de secretário, o
Conselho convocou o novo secretário de educação e, o mesmo solicitou um prazo considerando
que havia acabado de assumir, ao retornar na segunda convocação o mesmo defendeu o
programa e deixou claro que iria trabalhar para mantê-lo, considerando os dados apresentado.
O Conselho se debruçou e no final do ano apresentou um relatório em plenária onde informa
que em consonância com os relatos, entendiam que naquele momento não havia o que pontuar
a respeito do PAES no município.

CONCLUSÃO

Por fim, toda fragilidade observada no Conselho nos remete a diversas questões que necessitam
serem revistas como o espaço físico, formação de conselheiros, o fortalecimento da sociedade
civil que é algo que necessita ser revisto, muitos conselheiros não participam por acreditarem
que serão demitidos de seus empregos, e na verdade não há como garantir ou provar
posteriormente que possa ou não acontecer. É preciso mostrar exemplos públicos de sucesso
para a comunidade escolar, e que os avanços da educação não acontecem porque existe uma
instituição privada gerindo o processo, é a participação popular que vai oportunizar uma política
educacional com avanços. O Conselho necessita que os membros e representantes
compreendam a importância dos assuntos a serem debatidos pelo Conselho que por sua vez se
percebe enquanto porta voz da sociedade, enquanto órgão que atua sobre as Políticas
Educacionais que visa garantir direitos a todos e que promova a educação democrática.

REFERÊNCIAS

ADRIÃO, Theresa Maria de Freitas. Dimensões da Privatização da Educação Básica no


Brasil: um diálogo com a produção acadêmica a partir de 1990. Brasília: ANPAE, 2022. E-
book. Disponível em: https://bit.ly/3c6ifTH. Acesso em: 20 ago. 2022.

BORDIGNON, G. Conselhos Municipais de Educação. In: LIMA, A. B. de. (Org.). CMEs no


Brasil – qualidade social e política da educação. Campinas-SP: Alínea Editora, 2017.
BRASIL. Conselho Municipal e suas Articulações com as Políticas Públicas. Diretoria de
Fortalecimento Institucional e Gestão Educacional. Florianópolis-SC: MEC/SEB/UFSC,
2008.
BRASIL. Constituição Federal Brasileira. Constituição da República Federativa do Brasil.
Senado Federal: Presidência da República, Casa Civil. Brasília-DF, 1988.
CARICICA. Lei 4172/2003, 08 de agosto de 2003. Dispõe sobre a reestruturação do Conselho
Municipal de Educação do município de Cariacica. Cariacica, 2003. disponível em:
117

http://www.legislacaocompilada.com.br/cariacica/Arquivo/Documents/legislacao/html/L4172
2003.html. Acesso em: 20 ago. 2022.
CARIACICA. Lei 4701/2009, 24 de abril de 2009. Dispõe sobre o Conselho Municipal de
Educação. Cariacica, 2009. Disponível em: https://bit.ly/3Kd1mD6. Acesso em: 20 ago. 2022.
CARIACICA. Lei Complementar 035/2011, 17 de agosto de 2011. Dispõe sobre a Gestão
Democrática no Ensino Público Municipal de, 2011. Disponível em:
http://www.legislacaocompilada.com.br/cariacica/Arquivo/Documents/legislacao/image/C352
011.pdf. Acesso em: 20 ago. 2022.
CARIACICA. Portaria 294/2009, de 25 de novembro de 2009. Aprova o regimento Interno do
Conselho Municipal de educação. Disponível
em:https://www.cariacica.es.gov.br/static/files/REGIMENTO_COMEC_2009.pdf. Acesso em
20 ago. 2022.
CURY, C. R. J. Os Conselhos de Educação e a gestão dos sistemas. In: FERREIRA, N. S. C.;
AGUIAR, M. A. (Orgs.). Gestão da educação: impasses, perspectivas e compromissos. São
Paulo: Cortez, 2000
GONÇALVES, Katia Cristina Mauricio Bastos. DUBBERSTEIN, Flavia Costa Lima.
Reflexões sobre pobreza no espaço do Conselho Municipal de Educação de Cariacica. In.
Anais do III Seminário Federalismo e Políticas Educacionais. Publicação Eletrônica / Grupo
de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais, PPGE, UFES, Vitória, ES, 31 de outubro a
1º de novembro - 2018.
118

A CRISE NA DEMOCRACIA BRASILEIRA E SUAS REPERCUSSÕES PARA A


GESTÃO DEMOCRÁTICA

Tatiana de Santana Vieira


Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo
vieira.s.tatiana@gmail.com

Elizângela Ribeiro Fraga


Secretaria Municipal da Educação de Serra
elizangelafraga@gmail.com

INTRODUÇÃO

O trabalho situa a crise democrática estabelecida no Brasil desde o golpe de 2016, tomando a
gestão democrática educacional como um cenário possível de observação das consequências
desse processo de enfraquecimento das instituições democráticas e da participação popular.
Com isso, o objetivo geral é relacionar a crise democrática e o arrefecimento do neoliberalismo
às políticas educacionais e suas consequências na efetivação da gestão democrática na educação
pública brasileira. O problema investigativo levantado foi: como a crise da democracia
brasileira tem impactado a consolidação da gestão democrática na educação pública brasileira?
Em relação à metodologia, a pesquisa é classificada como exploratória, sob orientação
metodológica da pesquisa bibliográfica, na qual, por meio do método dedutivo (MARCONI;
LAKATOS, 2012), utilizou estudos nos campos das ciências humanas e das políticas
educacionais como fontes de análise da democracia, especialmente a brasileira, e suas interfaces
com a gestão democrática.

A redemocratização brasileira, após 21 anos de Ditadura Civil-Militar (1965-1985) não foi forte
o suficiente para evitar um novo processo de abalo institucional. Estudos como o de Miguel
(2019) apontam que o sentido do golpe de 2016 foi reduzir o peso do campo popular nas
decisões políticas e interromper o projeto de construção de uma sociedade justa e democrática.

Voltamos ao momento do desemprego, da redução de compra dos salários, do


desinvestimento nos serviços públicos. [...] desmonte da legislação trabalhista e
previdenciária, criminalização da juventude, beneplácito legal à violência policial,
legislação retrógrada no campo da família e da sexualidade. A direita, em vez de se
civilizar, radicalizou seu programa e seu discurso (MIGUEL, 2019, p. 87).

O cenário exposto por Miguel situa o Brasil no período pós golpe de 2016, entretanto, é preciso
considerar que a redemocratização ocorreu quase que em paralelo com a instituição do
neoliberalismo no país, no contexto anunciado por Francis Fukuyama como o fim da história,
que seria marcado pelo fim da União Soviética e a consolidação do sistema capitalista como
119

caminho inevitável. Embora o liberalismo à moda brasileira tivesse ressignificado as ideias


liberais do centro do capital mundial, também negava a importância das políticas sociais em
detrimento do aprofundamento da relação capital e trabalho. Com isso, a tese de Ianni (1992
apud BEHRING; BOSCHETTI, 2016) de que o Brasil é movido por um desenvolvimento
desigual e combinado, em um presente impregnado de vários passados, é uma leitura lúcida
sobre a formação social brasileira e a consolidação do capitalismo. As políticas sociais e as
legislações voltadas para o mundo do trabalho, somente conseguiram emergir, assim como em
outros países, após a incessante luta das classes trabalhadoras e populares, tensionando o Estado
e o sistema capitalista.

A compreensão da realidade latino-americana, brasileira no limiar do século XXI, marcada pelo


neoliberalismo, pela reestruturação produtiva, pela crise da democracia e pela pós-modernidade
perpassa a tese freireana (FREIRE, 2011) da dicotomia entre opressores e oprimidos. A
transformação radical desta realidade historicamente opressora será possível pela compreensão
da humanização e do diálogo.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

No que tange ao presente lócus de análise, a marca do esquecimento das experiências e da


gestão democrática estão evidenciados em políticas públicas frágeis, fragmentadas ou ausentes,
estigmatizadas como políticas compensatórias, que ainda as posicionam em um espaço de
disputa e tensões (BEHRING; BOCHETTI, 2016). Soma-se a isso, a lógica neoliberal que tem
orientado as políticas educacionais dentro da perspectiva da Agenda Globalmente Estruturada
para a Educação (AGEE) (DALE, 2004), por meio de mecanismos, processos e eventos que
evidenciam a reconfiguração do Estado voltado para o mercado, em detrimento de outras
políticas de redução da pobreza e de promoção da alfabetização, por exemplo (FRAGA, 2017).

A sobrevivência da humanidade só se efetivará por meio da formação humana em uma


sociedade democrática. A condição para isso é a transposição da racionalidade que organiza o
mundo atual, centrada na concorrência seja no Estado, seja na subjetivação dos indivíduos
(DARDOT; LAVAL, 2016).

No campo legal das políticas educacionais brasileiras, a gestão democrática do ensino público
já estava assegurada na Constituição de 1988 (Art. 206) e em outros ordenamentos jurídicos,
entre eles o Plano Nacional de Educação (PNE). De acordo com Cury (2013) o PNE existe para
assegurar a oferta do direito à educação, garantindo assim um direito social e contestando o
mercado como bem absoluto. O mais recente PNE (2014-2024) foi sancionado pela Lei nº
120

13.005, de 25 de junho de 2014, que define as bases da política educacional brasileira para a
década seguinte. Embora o projeto tenha sido enviado pelo governo federal ao Congresso em
dezembro de 2010, foi aprovado somente em 2014. Esse atraso de quatro anos para sancionar
a Lei denota as disputas que já cercavam as políticas educacionais brasileiras no período,
podendo representar um indício da fragilidade democrática do Estado brasileiro no que
concerne na defesa das políticas públicas voltadas para assegurar direitos fundamentais da
população e fortalecer as relações democráticas nos diversos campos sociais.

O PNE apresenta dez diretrizes objetivas e 20 metas, seguidas das estratégias específicas de
concretização. O texto prevê ainda formas de a sociedade monitorar e cobrar cada uma das
conquistas previstas. A diretriz VI do PNE apresenta a “promoção do princípio da gestão
democrática da educação pública”. A mesma legislação estabelece como meta 19 “assegurar
condições, no prazo de 2 (dois) anos, para a efetivação da gestão democrática da educação,
associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade
escolar, no âmbito das escolas públicas, prevendo recursos e apoio técnico da União para tanto”.
A existência de conselhos municipais de educação e as formas de nomeação de gestores
escolares constituem alguns dos vestígios de desenvolvimento ou retração da gestão
democrática nas redes públicas de ensino.

CONCLUSÃO

No período final de cumprimento do PNE a insegurança e as dificuldades em assegurar o


cumprimento da meta 19 dificulta a participação cidadã e, por conseguinte, a educação
enquanto direito de todos os cidadãos brasileiros. As reflexões possíveis, a partir da conjuntura
atual, nos chama a retomar as palavras do prof. Jamil Cury (2013, p. 32), no contexto de
definição do PNE, como chamamento e responsabilidade ética-política:

A diferença que marca a atual proposta de um Plano Nacional de Educação é a da


participação dos interessados em sua elaboração e na sua concretização. [...] A
identificação de problemas, de caminhos, de como percorrer os caminhos, de
enunciação de valores comuns envolvem os que fazem a educação de cada dia e disso
o atestam a Conferência Nacional de Educação de 2010 e o Fórum Nacional de
Educação. Os educadores identificados com a pesquisa, os docentes da educação
básica, entre outros, querem mais do que ser sujeitos ao processo, querem se
estabelecer como sujeitos do processo. O conceito de cidadania abriga essa dinâmica
da presença do sujeito ativo, que monitora, avalia e decide.

Em consonância com a mobilização proposta por Cury, Paulo Freire nos deixou como legado
que política e educação não podem ser facilmente separadas devido à contradições e tensões na
elaboração e no desenvolvimento de políticas educacionais. Com isso, o compromisso consiste
em ratificar o papel transformador da educação, superando sua utilização como instrumento do
121

estado capitalista, para exercer seu papel emancipador e fortalecedor dos princípios
democráticos.

REFERÊNCIAS

BEHRING, Elaine Rossetti; BOCHETTI, Ivanete. Política Social: fundamentos e história.


São Paulo: Cortez, 2016.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,


DF: Senado Federal, 1988.

BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá


outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 jun. 2014.

CURY, Carlos Roberto Jamil. Planos Nacionais de Educação no Brasil. In: FERREIRA, Eliza
Bartolozzi; FONSECA, Marília (Orgs.). Política e planejamento educacional no Brasil do
século 21. Brasília: Liber Livros, 2013, p. 25-34.

DALE, Roger. Globalização e educação: demonstrando a existência de uma "cultura


educacional mundial comum" ou localizando uma "agenda globalmente estruturada para a
educação"? In: Educ. Soc., Campinas, vol. 25, n. 87, p. 423-460, maio/ago. 2004.

DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade
neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.

FRAGA, Elizângela Ribeiro. Política educativa de jovens e adultos no Brasil no contexto


da agenda globalmente estruturada para a educação. Tese (Doutorado em Educação) –
Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Educação. Vitória, 2017.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia do trabalho


científico: procedimentos básicos, pesquisa bibliográfica, projeto e relatório, publicações e
trabalhos científicos. São Paulo: Atlas, 2012.

MIGUEL, Luis Felipe O colapso da democracia no Brasil: da Constituição ao Golpe de


2016. São Paulo: Expressão Popular, 2019.
122

GESTÃO DO SISTEMA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO: INFORMATIZAÇÃO DO


ENSINO E DA ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR NO ESPÍRITO SANTO

Simone da Penha Davel Giestas21


UFES
simone_giestas@yahoo.com.br

INTRODUÇÃO

Neste texto analisamos o processo de implantação da informatização do sistema estadual de


ensino do Espírito Santo. Com base em nossa observação direta durante anos na gestão de
escola e na superintendência de ensino bem como na docência destacamos aspectos vivenciados
que dão conta de importantes consequências do presente processo de plataformização dos
registros escolares informados pelos docentes e secretaria escolar, sinalizando suas implicações
para o trabalho docente e de gestores escolares e suas deficiências para o trabalho de
administração das unidades de ensino. Dialogando com Jesus, Fávero e Nunes (2011) e
acessando alguns documentos podemos observar questões que envolvem o processo de trabalho
escolar e, portanto, acreditamos que tal iniciativa poderia ir além da compra de produtos
privados e ter como foco o interesse público. Outrossim, acreditamos que as iniciativas de
informatização de dados de atividades de ensino e da administração das unidades de ensino
deveriam se pautar pelo interesse público apoiando e facilitando o trabalho docente e
sistematizando informações de modo a agilizar e melhorar o trabalho da secretaria escolar.
Ademais, tais aquisições e desenvolvimentos de softwares poderiam emergir da colaboração
dos entes federados (união, estados e municípios) no sentido de não sobrecarregar os docentes
e gestores e de propiciar o desenvolvimento de sistemas mais integrados e mais adequados que
propiciem o armazenamento, a produção de informações necessárias para geração de
documentos do interesse dos usuários, facilitando a troca de informações entre estados,
municípios, união bem como sistemas de ensino e unidades escolares.

DESENVOLVIMENTO

A Secretaria estadual de Educação do Estado do Espírito Santo (SEDU-ES) visando modernizar


a administração do conjunto de unidades de ensino sob sua gestão adquiriu, implantou e vem
implementando processo de informatização de dados sobre as atividades de ensino e de
administração escolar cujo objetivo seria de dar mais celeridade, objetividade e transparência

21
Professora da EPT em escola pública estadual, Tecnóloga em Análise e Desenvolvimento de Sistemas pelo
IFES e graduanda em História pela UFES. Especialista e Educação Pobreza e Desigualdade Social pela UFES.
123

aos dados educacionais produzidos cotidianamente nos processos de trabalho docente, de


secretaria escolar e da gestão escolar. Para tanto a SEDU-ES adquiriu em 2008 uma plataforma
de informação denominado GESTÃO ESCOLAR, mas no ano de 2016 o substituiu pelo
Sistema Estadual de Gestão Escolar denominado SEGES do centro de Políticas Públicas e
Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (CAEd/UFJF)22. Tais
plataformas possibilitariam a inserção e processamento de dados relativos à pauta docente
(conteúdos de ensino, frequência e avaliação escolar) e ao fluxo escolar (matrícula, evasão e
repetência) identificando educandos relacionados com esses vários aspectos da dinâmica
escolar em geral, o que permitiria a geração mais ágil e precisa relatórios adequados bem como
documentos demandados pelos usuários como históricos escolares etc.

Em nossa vivência de trabalho na superintendência da SEDU em nosso município e na


administração da escola Afonso Cláudio, e atualmente como docente no curso técnico em
informática para internet na mesma unidade de ensino, percebemos vários problemas. Uma
grande dificuldade apresentada na troca dos sistemas foi a incompatibilidade de migração do
banco de dados do software de gestão anterior para o atual, fazendo com que os trabalhadores
das secretarias escolares precisassem utilizar por um longo tempo dois aplicativos diferentes.
Quando o programa antigo foi descontinuado completamente não houve a devida migração para
o novo sistema de modo que se garantisse a disponibilidade das informações nele inseridas
anteriormente, o que exigiu que os profissionais das unidades de ensino precisem buscar dados
em arquivos físicos registrados em papel.

Atualmente as tecnologias de informação e Comunicação (TICs) fazem parte do cotidiano de


todos e vem revolucionando as formas de trabalho trazendo mais segurança na informação. O
amplo acesso à informação é fundamental para uma boa gestão, e com o sistema SEGES havia
a promessa de sanar as lacunas deixadas pelo software anterior, o utilitário seria mais robusto,
com uma interface mais funcional, e nele ficaria registrado todas as informação da infraestrutura
da instituição, da vida escolar dos estudantes dos professores, e assim, os secretários escolares
não precisariam mais digitar manualmente todos os documentos escriturados pela secretaria,
bastaria a inserção dos dados no sistema e estes estariam disponíveis, através de relatórios
emitidos pelo programa, para impressão sempre que necessário.

22
Em ambos os casos, não foi possível localizar informações referente as formas de contratação, valores
empenhados, nem nos portais de transparência nem mesmo com a equipe responsável pelo setor de gestão escolar
na SEDU, uma breve pesquisa online mostrou que sistemas parecidos com esse adquiridos por secretarias
municipais de educação, possui valores que variam entre R$ 70.000,00 e R$ 300.000,00, e seria necessário uma
pesquisa mais profunda para checar tais informações.
124

A partir de janeiro de 2018, a SEDU Instituiu definitivamente o Diário de Classe Digital, em


substituição aos diários de classe impressos, em todas as escolas da rede estadual do Espírito
Santo, através da portaria Nº 021-R, de 26 de janeiro de 2018. Em agosto de 2020, através da
portaria 087-R de 03 de agosto de 2020 atualizou as regras e procedimentos para uso do diário
de classe digital incluindo mais funcionalidades de inserção de dados e discriminando as
responsabilidades de cada setor. Porém, após sete anos de sua implantação nas escolas sob
coordenação da SEDU, a plataforma apresenta falhas contínuas, inclusive com perda de dados
já inseridos causando um retrabalho para os profissionais envolvidos. O sistema sequer muitas
informações em janelas diferentes, fazendo com que os professores precisem reiniciar todos os
lançamentos a partir da página inicial, além de que caso um aluno apresente um atestado
médico, este precisa ser inserido individualmente por cada um dos professores que lecione na
turma, ao tempo que este lançamento poderia ser único e atender a todas as disciplinas.

O software não gera documentos básicos como histórico escolar e Certificado de conclusão,
com isso os profissionais da secretaria precisam escriturar tais documentos manualmente em
uma planilha de Excel sujeito a erros por falhas humana durante a digitação. Além disso, esse
tipo de aquisição e compra assim como outros insumos educacionais adquiridos do mercado
educacional muitas vezes atende mais os interesses dos fornecedores além configurar processo
interno de privatização. Ademais, essas escolhas não emergem de uma escuta cuidadosa com
os profissionais da gestão das unidades de ensino. Particularmente, as últimas gestões da
secretaria estadual de educação, tem sido marcada por uma postura prescritiva e arbitrária com
os profissionais da educação.

A decisão de aquisição dessas plataformas e seus desdobramentos práticos ocorreu sem o amplo
diálogo com os professores e pessoal de secretaria escolar. Também é visível nos comentários
dos colegas forte demanda do trabalho dos profissionais da educação que vem sendo obrigados
a fornecer segundo eles próprios muitas informações sobre sua atividade educativa nas planilhas
desses programas que requerem informações diárias, as quais anteriormente eram registradas a
mão, mas a posteriori ao processo de ensino aprendizagem. Essa tarefa vem se sobrepondo num
contexto de pouca valorização profissional e numa realidade onde as condições salariais e de
infraestrutura escolar não são as mais adequadas23. Recentemente, recebemos a informação que

23
Segundo JESUS, FÁVERO e NUNES (2011) Os profissionais da educação gastam muito tempo, devido ao
retrabalho gerado por sistemas de informações ineficientes que traz um acúmulo de trabalho, fazendo com que
esses profissionais fiquem sobrecarregados e estressados, e assim, muitos acabam por adoecerem, gerando uma
grande número de atestados médicos recebidos frequentemente pelas escolas, e com a ausência de um profissional
125

o atual aplicativo será substituído no próximo ano (2023), e fica a dúvida, será que todas as
informações contidas no banco de dados serão perdidas novamente? Até quando os
profissionais da educação precisarão fazer trabalhos tão onerosos para serem posteriormente
deletados?24

CONCLUSÃO

Do nosso ponto de vista observamos que a utilização de programas de informatização de dados


educacionais no interior das unidades de ensino podem estar aumentando indevidamente o
trabalho docente sem gerar os benefícios anunciados de maior agilidade e precisão de
indicadores educacionais sem beneficiar a gestão da escola e a gestão da secretaria estadual de
educação, servindo mais aos interesses dos governos de plantão e gerando por fim muito
trabalho e retrabalho, fazendo com que os profissionais se dediquem mais tempo ao suporte
lógico do que no planejamento de aulas interessantes e atrativas e mesmo assim não emite as
informações necessárias para o acompanhamento do desempenho dos estudantes. Tal situação
poderia ser minimizada, evitando que interesses privados se sobressaiam às necessidades das
instituições de ensino, para tanto, levando em consideração minha experiencia em diversos
setores da SEDU, e minha formação como analista e desenvolvedora de sistemas apresento
duas possíveis estratégias. A primeira delas seria concurso público para contratação de
profissionais da área de Tecnologia da informação (TI) para implementar e gerenciar um
software específico para a rede estadual de educação de acordo com as necessidades das escolas
disponibilizando informações em tempo real que poderia ser disponibilizado também aos
municípios visando uma gestão democrática e eficiente.

A segunda opção, mais ousada, seria a união implementar um programa de gestão escolar a
nível nacional, e disponibilizado para todos os estados e municípios, como já acontece com a
plataforma do censo escolar, porém diferente desta plataforma que recebem os dados apenas
para recenseamento, seria um aplicativo em tempo real, facilitando inclusive a movimentação
documental de estudantes transferidos de um estado para outro. Uma única plataforma nacional

os demais ficam ainda mais sobrecarregados para suprir a falta do colega gerando um círculo vicioso de
profissionais afastados por motivo de saúde.
24
JESUS, FÁVERO e NUNES (2011) destacam ainda que em sua pesquisa não localizaram nenhum software
livre, com as características necessárias para a gestão da informação do cotidiano escolar, com todos os módulos
imprescindíveis para atender as especificidades necessárias, pois esse tipo de software seria uma alternativa para
reduzir o gasto com a compra de softwares proprietário, mas que mesmo que no futuro apareceram software livre
direcionado a tais funções dificilmente ele se adequaria totalmente às necessidades das instituições de ensino, e
careceria de ajustes e implementação de novas funções no próprio sistema, necessitando de investimentos em
formação para os profissionais na adequação do programa.
126

para gerenciar o diário escolar e todos os documentos gerados a partir das informações
inseridas.

REFERÊNCIAS

ESPÍRITO SANTO. Secretaria Estadual de Educação. PORTARIA Nº 021-R, DE 26 DE


JANEIRO DE 2018. Publicada no D.O do ES, de 29/01/2018. Disponível em
https://ioes.dio.es.gov.br/portal/visualizacoes/html/3998/#e:3998/m:374063. Acesso em: 1
ago. 2022.
ESPÍRITO SANTO. Secretaria Estadual de Educação. PORTARIA Nº 087-R, DE 03 DE
AGOSTO DE 2020. Publicada no D.O do ES. de 04/08/2020. Disponível em
https://ioes.dio.es.gov.br/portal/visualizacoes/html/5027/#e:5027/m:602901. Acesso em: 1
ago. 2022.
JESUS, Renata Gomes de; FÁVERO, Rutinelli da Penha; NUNES, Vanessa Battestin.
Informática na gestão escolar. In: Informática na Educação: Um Caminho de Possibilidades e
Desafios. 1ª ed. Vitória: Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, 2011, p. 229-
255. Disponível em https://educimat.ifes.edu.br/images
/stories/Publica%C3%A7%C3%B5es/Livros/Livro-PIE-Caminhos-de-Possibilidades-
2011.pdf. Acesso em: 1 ago. 2022.
127

EIXO 3 – Federalismo, regime de colaboração e


organização da educação básica
128

PLANO DE AÇÃO ESTRATÉGICO DA ESCOLA MUNICIPAL FAZENDO ARTE


PARA O RETORNO DAS AULAS NÃO PRESENCIAIS

Nayhara Mirelli Moraes da Silva


Escola Municipal Fazendo Arte
nayharamireli@hotmail.com

INTRODUÇÃO

Este Plano de Ação Estratégico dispõe sobre organização e direcionamentos no âmbito escolar,
para a execução das aulas não presenciais, bem como, descrição minuciosa de como foi
desenvolvida as atividades não presenciais, quais instrumentos de mediação e interação
utilizados com alunado da Escola Municipal Fazendo Arte considerando a Lei 9394/96 que fixa
as Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDBEN, consoante a Lei nº 2.162/08, alterada pela
Lei nº 2.327 de 28/05/2012, que instituí o Conselho Municipal de Educação de Cáceres
(CMEC) e a Lei nº. 2.319 de 03 de abril de 2012, que constituí o Sistema Municipal de Ensino
de Cáceres-MT, e, Resolução 005/2020-CMEC/MT, Resolução 006/2020 – CMEC/MT,
Resolução 025/2020 CMEC, Resolução 004/2021 CMEC, Parecer CNE/CP 19/2020, Lei
Complementar 158, 11 de março de 2021, Orientativo Pedagógico ano 2020 e 2021 da
Secretaria Municipal de Educação (SME) Cáceres-MT.

METODOLOGIA

O plano de ação estratégico é de abordagem qualitativa e descritiva, na qual relatamos a


experiência de organização das aulas não presenciais na rede municipal de ensino de Cáceres-
MT, da Escola Municipal Fazendo Arte.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Considerando a suspensão das aulas presenciais na Rede Municipal de Ensino desde o mês de
abril/2020, conforme orientação do Ministério da Saúde através da Portaria 188/GM/MS, de
04/02/2020, e posteriormente Decreto Municipal 120 de 18/03/2020, declarando Emergência
em Saúde Pública de Importância Nacional, em razão da infecção humana pelo novo
Coronavírus (Covid-19), como um conjunto de ações para prevenir sua disseminação. Com a
finalidade de apoiar a continuidade da aprendizagem dos alunos durante o período de
distanciamento social foi necessária a retomada das atividades escolares de forma não
presencial. A Secretaria Municipal de Educação estabeleceu ao calendário escolar, um
129

replanejamento com atividades a serem executadas de forma não presencial pelos alunos, em
conformidade com o Ministério da Educação, favorecendo a aprendizagem e a continuidade de
seus estudos.

A Rede Pública Municipal de Ensino de Cáceres-MT, retoma as aulas com atividades escolares
não presenciais conforme Decreto 372/2020, como medida de prevenção e combate ao contágio
do novo Coronavírus (Covid-19) e objetivando cumprir carga horária mínima obrigatória,
conforme estabelece a Lei n° 9.394/96, Medida Provisória n° 934/2020, Parecer n° 005/2020-
CNE e Resolução Normativa n° 005/2020-CMEC, a Secretaria Municipal de Educação propõe
as atividades escolares não presenciais a partir de 15 de julho de 2020.
Conforme as orientações a respeito da Resolução 005/2020/CMEC, e o Orientativo Pedagógico
da SME ano 2020 e 2021 sobre o retorno das aulas com atividades escolares não presenciais foi
criado o grupo de WhatsApp de cada turma, pois esse era um canal de comunicação entre eles
e a escola. No entanto, para os pais que não possuem WhatsApp disponibilizamos de forma
impressa as atividades com orientativos e através das ligações manter o contato e o vínculo com
a família da criança.

Foram disponibilizadas nos grupos das turmas as atividades em três formatos: word, pdf,
imagem e o impresso juntamente com orientativo que estava na escola, conforme data marcada
para a entrega. No entanto, para aqueles pais que não buscarem as atividades no dia marcado,
a gestão entrou em contato para saber o motivo e justificar na Planilha de Avaliação da criança.

Os orientativos com atividades lúdicas foram encaminhadas pelo professor para coordenação
para que sejam feitas as cópias. A impressão foi realizada pela equipe gestora e auxiliar de
desenvolvimento infantil (ADI). E a entrega das atividades impressas realizada por cada
professor, com auxílio da ADI, auxiliar de serviços gerais (ASG) e equipe gestora, de forma
escalonada, exceto os profissionais que fazem parte do grupo de risco.

Para entrega das atividades realizamos um cronograma do dia e da hora que cada pai ou
responsável deverá ir à escola para retirar as atividades. Toda a entrega e a devolutiva das
atividades foram rigorosamente registradas em planilhas com a data de entrega. Também
respeitou todas as exigências sanitárias e de distanciamento com álcool 70%, viseira protetora,
máscara individual, luvas, sinalização do espaço.

Após a criança desenvolver a atividade proposta orientamos os pais que realizem as devolutivas
por meio de fotos, vídeos ou ligações, para evitar o contato com o material impresso, e
130

consequentemente, o vírus, resguardando a segurança dos pais, alunos e professores. Somente


entregará as atividades por meio físico aqueles pais que não possuem o WhatsApp ou recursos
tecnológicos. No final da experiência o professor fez um Relato de Experiência e preencheu
uma Planilha de Avaliação do aluno, que foi encaminhado à SME para emitir o parecer e depois
enviar para o CMEC para validação das atividades escolares não presenciais.

Todas as atividades trabalhadas estão pautadas na BNCC/DRC/MT, PPP da escola norteadas


pelos eixos da interação e brincadeiras direcionadas para a Educação Infantil.

Orientações para o professor:

Turmas de 2 e 3 anos: mediações pedagógicas possíveis com as crianças através de grupos de


WhatsApp, vídeos, bem como orientações por escrito para aqueles que não disponibilizarem de
recursos tecnológicos. Sendo às atividades pautadas na ludicidade e na interação através de
músicas, brincadeiras, contação de histórias e outros. Orientação aos pais que o feedback das
atividades será via fotos e vídeos das atividades desenvolvidas, exceto os pais que não
disponibilizarem de recursos tecnológicos terá via impresso na escola o orientativo das
atividades propostas através do planejamento do professor.

Turmas de 4 e 5 anos: mediações pedagógicas possíveis com os alunos através de grupos de


WhatsApp, vídeos, bem como orientações por escrito para aqueles que não disponibilizarem de
recursos tecnológicos. Sendo às atividades pautadas na ludicidade e na interação através de
músicas, brincadeiras, contação de histórias, jogos e algumas atividades em meios digitais
(histórias, jogos e músicas) quando for possível. A ênfase é proporcionar brincadeiras,
conversas, jogos, desenhos, entre outras para os pais ou responsáveis desenvolverem com as
crianças. Orientação para as famílias estimular e criar condições para que as crianças sejam
envolvidas nas atividades diárias, transformando os momentos cotidianos em espaços de
desenvolvimento e aprendizagem. Além de fortalecer o vínculo, este tempo em que as crianças
estão em casa podem potencializar dimensões do desenvolvimento infantil. Para o envio das
orientações das atividades lúdicas aos pais/responsáveis, será elaborado um texto orientativo
referente às atividades planejadas. Orientação aos pais que o feedback das atividades será via
fotos e vídeos das atividades desenvolvidas, exceto os pais que não disponibilizarem de recursos
tecnológico terá via impresso na escola o orientativos das atividades propostas através do
planejamento do professor e/ou por meio de ligação explanar o que foi desenvolvido.

CONCLUSÃO
131

Sendo assim, o Plano de Ação Estratégico para as aulas não presenciais da Escola Municipal
Fazendo Arte do município de Cáceres-MT, foi criado a partir da necessidade de adequar-se ao
atual momento vivenciado isolamento causado pela pandemia do COVID-19. Planejado a partir
de discussões coletivas, por meio de videoconferência, tanto por meio das reuniões entre
gestores, quanto pelos professores da unidade escolar. Através do Projeto Político Pedagógico,
documento que norteia o trabalho pedagógico da unidade escolar, foi criado este Plano de Ação
Estratégico, em consonância com as Diretrizes Curriculares de Mato Grosso – DCN/MT, a Base
Nacional Comum Curricular – BNCC, que norteiam os conjuntos de ações dos planejamentos
e a realização das aulas não presenciais.

Para o acompanhamento da aprendizagem da criança, na tentativa de favorecer a aprendizagem


da criança em tempo de pandemia, a escola contou com o apoio da família solicitando um
feedback dos pais de forma que registrem por meio de vídeo, foto, tudo que possa subsidiar a
mediação entre o aluno e a escola. Para que o professor consiga fazer o acompanhamento do
processo de aprendizagem da criança foi realizado um RELATO DE EXPERIÊNCIA e o
preenchimento da PLANILHA DE AVALIAÇÃO DO ALUNO descrevendo as ações e a
evolução das aulas, a interação dos alunos, os meios de comunicação utilizados para as aulas
não presenciais.

REFERÊNCIAS

RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 005/CMEC/MT de 01 de julho de 2020, que dispõe sobre:


Normas a serem adotadas pelas Instituições de Ensino do Sistema Municipal de Ensino
de Cáceres-MT, enquanto perdurar as orientações públicas e sanitárias sobre a situação
de pandemia pelo COVID-19. Cáceres, 2020.

SME. Secretaria Municipal de Educação. Orientativo Pedagógico 2020: preparação para o


retorno das aulas não presenciais. Cáceres, 2020.
SME. Secretaria Municipal de Educação. Orientativo Pedagógico 2021. Cáceres, 2020.
132

IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA DE GESTÃO ESCOLAR (SGE) NAS PRÁTICAS


ORGANIZATIVAS DAS ESCOLAS DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE VILA
VELHA/ES

Miriene Manzoli Rogge


GETAE/PMVV
mirienemrufes@gmail.com

Eduardo A. Moscon Oliveira


UFES
eduardomoscon@hotmail.com

INTRODUÇÃO

O estudo faz parte da dissertação de mestrado vinculada ao Programa de Pós-Graduação em


Educação da Universidade Federal do Espírito Santo e adota como tema central a constituição
e implementação do Sistema de Gestão Escolar (SGE), no município de Vila Velha. O SGE é
compreendido como um programa de computador, que possibilita a integração dos elementos
que fazem parte do processo educacional por meio de computadores, notebooks, tablets ou
smartphones e pode ser acessado a qualquer tempo, em qualquer lugar do planeta, carecendo
apenas de conexão com a rede mundial de computadores.

O SGE foi idealizado e desenvolvido na esfera pública municipal, de forma democrática, com
a participação da comunidade escolar com um olhar pedagógico e administrativo que pudessem
atender às demandas e necessidades diárias da escola. Isso sem a participação, contratação ou
compra de serviço ou consultoria privada. O sistema permite aos profissionais das escolas
acompanharem os alunos e as turmas (frequência, rendimento, acompanhamento pedagógico e
disciplinar, dentre outros), assim como fazer o registro das atividades pedagógicas (organização
curricular, plano de ensino, conselhos de classes, atividades complementares e plano de
trabalho pedagógico da Educação Especial). Além disso, o SGE gera relatórios que
caracterizam a unidade de ensino e que exibem resultados e indicadores (matrícula,
aprovação/reprovação, distorção idade/série, abandono), auxiliando na análise e na tomada de
decisões.

Dessa maneira, mediante à implementação do Sistema de Gestão Escolar, motivamo-nos a


trazer a temática para a realização do presente estudo a partir da seguinte problemática de
pesquisa: como se constituiu a implementação do Sistema de Gestão Escolar na rede municipal
de ensino de Vila Velha/ES e que avaliação os profissionais das unidades de ensino elaboram
133

acerca da referida política quanto à realização do trabalho administrativo e pedagógico das


escolas? Assim, delineamos como objetivo geral do estudo: compreender o processo de
implementação do Sistema de Gestão Escolar na rede municipal de ensino de Vila Velha/ES e
analisar a avaliação dos profissionais das unidades de ensino acerca da referida política na
realização do trabalho administrativo e pedagógico das escolas.

A pesquisa analisa, na área da Educação, as atividades relacionadas à gestão escolar que


permeiam as práticas organizativas escolares de maneira que possam ser evidenciadas a
utilização de políticas públicas que delineiam o processo da gestão educacional por meio das
tecnologias.

METODOLOGIA

O estudo se baseia nos pressupostos da pesquisa qualitativa. A escolha do tema e o caminho


metodológico foi definido em virtude da pesquisadora ser professora da rede municipal de Vila
Velha/ES. O interesse foi aumentando à medida em que as indagações e a pesquisa sobre a
questão apontaram poucos materiais próprios da rede que tratam da temática do Sistema de
Gestão Escolar. Acrescendo à pesquisa qualitativa, trazemos o estudo de caso, que é uma forma
de mergulhar na realidade do outro.

A pesquisa foi desenvolvida em cinco unidades de Ensino Fundamental do Sistema de Ensino


de Vila Velha/ES, uma de cada região administrativa do município. O estudo envolveu três
grupos de profissionais da educação. O primeiro grupo se reporta àqueles vinculados à
secretaria Municipal de Educação de Vitória/ES, rede de ensino pioneira na implementação
dessa política pública na capital. O segundo grupo envolve servidores da rede municipal de
educação de Vila Velha/ES, envolvidos na implantação do Sistema de Gestão Escolar na
municipalidade. Além disso, constituiu um terceiro grupo, diretores, pedagogos, coordenadores
de turnos e professores em atuação nas cinco unidades de ensino.

Busca interlocuções teóricas com o conceito de administração e de gestão escolar em Paro,


Sander e Libâneo, além das discussões sobre as tecnologias, a internet e suas inserções no
campo da educação em Castells e Lévy. Adota como procedimentos: a) solicitação aos órgãos
competentes para a realização da pesquisa; b) consulta documental; c) realização de entrevistas;
d) aplicação de questionários. A partir das entrevistas e questionários, as respostas foram
organizadas por eixos.
134

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O estudo analisa, na área da Educação, as atividades relacionadas à gestão escolar que


permeiam as práticas organizativas escolares de maneira que possam ser evidenciadas a
utilização de políticas públicas que delineiam o processo da gestão educacional por meio das
tecnologias

Com a implementação do SGE, o trabalho se tornou mais conectado e acessível, pois os dados
são obtidos por meio de relatórios que o próprio sistema é capaz de gerar. Percebe se que há
um olhar positivo quanto a utilização, funcionalidades e contribuições que o SGE trouxe para
a dinamicidade do trabalho administrativo e pedagógico das escolas. De acordo com Paro
(2010), os instrumentos de trabalho que podem ser materiais ou conceituais se tornam objeto
de utilização direta para se chegar a um objetivo final e as técnicas contribuem como intermédio
para essa produção. Libâneo, Oliveira e Toschi (2012, p. 436) declaram que “[...] organizar
significa dispor de forma ordenada, dar estrutura, planejar uma ação e prover as condições
necessárias para realizá-la”.

Em relação a infraestrutura das escolas para utilização do Sistema de Gestão Escolar, foi
possível compreender que ainda há desafios a serem superados e que o ambiente escolar não é
capaz de garantir, por completo, o acesso à rede, para os profissionais que necessitam da internet
para realização do trabalho diário. Ademais, foi possível reconhecer que o SGE não é garantia
de maior qualidade no desenvolvimento das práticas organizativas escolares se elas não forem
utilizadas como alternativas de organização para dinamizar os processos da rotina escolar, visto
que as TICs vão além de ser simplesmente mais ágil, mas trata-se de fazer de forma
diversificada.

A utilização do sistema permite sair das concepções cotidianas para explorar o real e ter como
essência o fato de mediar a busca dos objetivos e utilizar de forma racional os recursos para
realização de determinados fins (PARO, 2012). Esse pensamento vai ao encontro da concepção
de Castells (2015) ao declarar que a educação é determinante no que se refere às oportunidades
que a conexão em rede oferece ao ambiente educacional, porém, essa educação necessita de
mudanças. No entendimento de Paro (2010), significa um ambiente apropriado e equipado com
materiais disponíveis e necessários para o desenvolvimento das atividades administrativas e
pedagógicas das escolas propiciando alcançar os objetivos com maior facilidade. Para Lévy
135

(2003), quando as tecnologias são bem aplicadas, o trabalho é facilitado, possibilitando a


construção de um pensamento mais contemporâneo. Consequentemente, a compilação de dados
pode proporcionar melhor organização do ambiente escolar propiciando melhor qualidade na
aprendizagem do educando.

Seguindo o pensamento do autor acreditamos que o poder público precisa investir em políticas
públicas, além de oferecer condições favoráveis para o desenvolvimento das atividades
laborais, aperfeiçoando cada vez mais as práticas organizativas escolares com maior
dinamicidade. Consideramos que o SGE é o mesmo para todos, no entanto, é diferente para
cada um por ser um canal de comunicação organizacional que fornece uma base material de
informação e a apropriação da capacidade de intercomunicação em seu alcance e em seus usos.

CONCLUSÃO

A sociedade contemporânea, por meio dos setores políticos e pedagógicos, demanda


paulatinamente uma reflexão sobre a gestão educacional por parte dos agentes que compõem a
comunidade escolar. A escola, por ser um espaço de participação integrada e democrática, cada
vez mais necessita empenhar-se em alcançar um espaço para o exercício da cidadania e
melhoria da qualidade da educação.

Por meio dessa produção, foi possível analisar e compreender os fundamentos da gestão e
administração. Os achados da pesquisa proporcionaram conhecer a idealização do projeto e o
desenvolvimento do Sistema de Gestão Escolar (SGE) no município de Vitória/ES e a
implementação desse mesmo sistema na cidade de Vila Velha, além de compreender a
operacionalização da ferramenta por parte dos usuários no ambiente escolar ou mesmo fora
dele.

No desenvolvimento do estudo, pode ser percebido pontos positivos na implementação do SGE


nas práticas organizativas das escolas da rede municipal de ensino de Vila Velha/ES, mas,
constatou-se também pontos qualificados como delicados, como, por exemplo, a má qualidade
da internet nas escolas, o que interfere diretamente no trabalho realizado por quem depende do
SGE. A pesquisa revelou também que a implementação do Sistema de Gestão Escolar na rede
municipal de ensino de Vila Velha/ES trouxe celeridade no desenvolvimento das práticas
organizativas escolares, sejam elas administrativas ou pedagógicas.
136

Ainda por meio da pesquisa, foi possível constatar que o SGE é um sistema que funciona como
uma engrenagem e se correlaciona com dados administrativos e pedagógicos e, por meio das
TIC, é possível perceber uma mutação no modo de lidar com as práticas organizativas escolares.
Contudo, é necessário garantir ao profissional da educação, condições para o desenvolvimento
de suas atividades laborais, no local em que atua, de maneira que ela não seja despersonificada
por falta de equipamentos, internet, dentre outros, em que o funcionário necessite levar afazeres
para casa gerando dupla jornada de trabalho. O estudo também propicia elementos pertinentes
para compreender que a utilização das Tecnologias de Informação e Comunicação podem
suplementar a gestão da educação pública no âmbito administrativo e pedagógico,
principalmente quando relacionadas aos dispositivos de armazenamento de informações.

REFERÊNCIAS

CASTELLS, Manuel. O poder da comunicação. Tradução de Vera Lúcia Mello Joscelyne.


1. ed. São Paulo/Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.

LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. 4. ed. São
Paulo: Loyola, 2003.
LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, João Ferreira de; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação
escolar: políticas, estrutura e organização. São Paulo: Cortez, 2012.
PARO, Vitor Henrique. A organização do trabalho na escola. VIII Semana da Educação.
Ribeirão Preto, nov. 2010 (Palestra: informação verbal).
137

CONSELHOS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO E ARRANJO FEDERATIVO


BRASILEIRO: PERTINÊNCIA E CONEXÕES

Adriane Peixoto Câmara


Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
adrianecamara@gmail.com

INTRODUÇÃO

Este texto é parte de pesquisa maior, em andamento, sobre o papel dos Conselhos Estaduais de
Educação (CEEs) na organização da educação nacional; e seu objetivo é examinar a pertinência
e as conexões entre o arranjo federativo brasileiro em educação – as atribuições e competências
entre os entes federados em matéria educativa –, para a análise do papel dos CEEs em seus
respectivos sistemas de ensino. Em última análise, este texto examina se os estudos e debates
sobre o arranjo federativo brasileiro em educação contribuem para a análise sobre o papel dos
CEEs na organização da educação nacional.

METODOLOGIA

Trata-se de estudo que se apoia na Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011), para examinar as
duas leis de diretrizes e bases da educação nacional, a saber: LDB/1961 (BRASIL, 1961); e a
LDB/1996 (BRASIL, 1996), com o objetivo de levantar o conteúdo normativo sobre os CEEs.
As seguintes unidades de análise foram importantes para o presente estudo: i) atribuições e
competências dos entes federados; ii) formação dos sistemas de ensino; iii) natureza dos CEEs;
iv) atribuições e competências dos CEEs.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A LDB/1961 (BRASIL, 1961), em arranjo federativo bipartite, institucionalizou os CEEs em


âmbito nacional, conferindo-lhes a natureza e as atribuições nos sistemas de ensino estaduais.
Mesmo presentes e atuantes em alguns estados brasileiros, em períodos que datam do Império,
– é o caso do CEE do estado da Bahia, cuja fundação é do ano de 1842 – a LDB/1961 (BRASIL,
1961) foi um importante mecanismo indutor para os atos de criação, assim como a presença
contemporânea destes órgãos nos sistemas de ensino estaduais (CURY, 2001).

A Lei Federal nº 5.692, de 11 de agosto de 1971 (BRASIL, 1971) manteve a organização da


educação nacional por meio dos sistemas de ensino estaduais, apesar de promulgada sob o
regime ditatorial, de caráter centralizador no que diz respeito às decisões políticas do Executivo
138

Federal (ABRUCIO, 1998). Neste caso, a novidade foi que os CEEs teriam a opção de delegar
parte de suas funções aos Conselhos Municipais de Educação (CMEs), em municípios que
considerassem oportuno.

A discussão sobre o papel dos CEEs nos sistemas de ensino estaduais ficou mais complexa,
especialmente a partir da redemocratização do país, após o fim da Ditadura Militar (1964-1985).
A Constituição Federal (CF/1988) (BRASIL, 1988) estabeleceu um novo contexto jurídico-
normativo para as políticas sociais no país, sobretudo a Educação, a Saúde e a Assistência
Social. Assim, a premissa estabelecida pela CF/1988 (BRASIL, 1988) é a de que a satisfatória
condução das políticas públicas no Brasil seria por meio do estabelecimento dos conselhos
gestores de políticas, de forma a democratizar o acesso aos serviços públicos. Além disso, a Lei
Maior estabeleceu que os usuários pudessem, por meio da participação direta, formular políticas
que se aproximassem da realidade de seus usuários ou, ainda, fiscalizar e controlar a prestação
destes serviços (DAGNINO, 2002; PERISSINOTO; FUKS, 2002; SOUZA, 2006; 2008;
GOHN, 2011).

No caso da Educação, tal perspectiva democrática pode ser entendida por meio da “gestão
democrática do ensino público, na forma da lei” disposta no Art. 206, inciso VI da CF/1988
(BRASIL, 1988). Embora suscite uma série de interpretações e debates sobre o assunto, que
fogem aos objetivos do presente texto, o fato é que, a própria noção de “regime de colaboração”
está relacionada à gestão democrática. O que importa registrar aqui é que, tanto o “regime de
colaboração” entre os entes federados, previsto nos Arts. 211 e 214 (BRASIL 1988), bem como
as “formas de colaboração” entre os entes federados, previstas no § 4º do Art. 211 (idem), ou
ainda as “normas de cooperação”, previstas no Art. 23, inciso V, Parágrafo Único (ibidem)
oportunizaram o debate público sobre a condução das políticas educacionais no Brasil,
ratificando, portanto, o princípio da gestão democrática na educação brasileira.

A LDB/1996 (BRASIL, 1996), elaborada no contexto democrático e de arranjo federativo


tripartite, ratifica a premissa da gestão democrática na educação brasileira, especialmente por
meio do Art. 3º, inciso VIII: “gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da
legislação dos sistemas de ensino” (BRASIL, 1996), e do Art. 14 “os sistemas de ensino
definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo
com as suas peculiaridades [...]” (idem). Embora ratifique o princípio democrático na educação
brasileira, a LDB/1996 (BRASIL, 1996) não mencionou diretamente os CEEs. Desse modo, os
conselhos de educação – estaduais e municipais – foram relacionados de forma genérica, pela
139

nova legislação educacional federal (BRASIL, 1996), como órgãos normativos dos respectivos
sistemas de ensino.

O aprofundamento da análise das duas LDBs permite a construção de conexões importantes


para a análise dos CEEs na organização da educação nacional, a saber: as repartições de
atribuições e competências entre os entes federados, em matéria educativa, definem também o
alcance dos sistemas de ensino estaduais e seus respectivos CEEs. A análise de conteúdo da
LDB/1961 e da LDB/1996 demonstrou não somente arranjos federativos distintos –
respectivamente, federação bipartite e federação tripartite. O que é possível perceber é que, os
diferentes arranjos federativos em educação acabaram por engendrar diferentes formas de
referenciar a natureza, e as atribuições dos CEEs nos sistemas de ensino, delimitando o alcance
destes em seus sistemas de ensino.

CONCLUSÃO

O levantamento das normas, regras e procedimentos que instituíram os CEEs apontam para a
grande importância da legislação educacional nacional na definição da natureza, atribuições e
competências destes órgãos normativos e deliberativos. A escolha por examinar a legislação
educacional nacional, por meio do arranjo federativo brasileiro em educação oportunizou um
maior aporte de referências para pensar o contexto histórico e processual (IMMERGUT, 1998)
em que estão imersos o CEEs.

REFERÊNCIAS

ABRUCIO, Fernando Luiz. Os barões da federação: os governadores e a redemocratização


brasileira. São Paulo: Hucitec, 1998.

BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. São Paulo: Ed. 70, 2011.

BRASIL. Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação


Nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 27 dez., 1961.

BRASIL. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa as Diretrizes e Bases do Ensino de 1º e


2º Graus e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,
Brasília, 12 ago., 1971.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil [1988]. Diário Oficial [da]


República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da


Educação Nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 23 dez.,
1996.
140

CURY, Carlos Roberto Jamil. Os Conselhos Estaduais de Educação nas Constituições


Estaduais brasileiras. Revista Educação Legislativa e Cidadania, v. 4, p. 15-33, Recife,
2001.

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SOUZA, Donaldo Bello de (org.). Conselhos Municipais e controle social da educação:


descentralização, participação e cidadania. São Paulo: Xamã, 2008.
141

FEDERALISMO COOPERATIVO NA AMAZÔNIA: REFLEXÕES DO


LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO.

Telma Guerreiro Barroso


Faculdade de Educação/ICED/UFPA
telmacgb@ufpa.br

Durbens M. Nascimento
PPDSTU/NAEA/UFPA
durbens@ufpa.br

INTRODUÇÃO

Este estudo é parte da pesquisa intitulada “Federalismo Cooperativo e Arranjos de


Desenvolvimento da Educação na Amazônia: expressões conceituais e de organização sob a
ótica dos regulamentos locais”, desenvolvido no estágio pós-doutoral, do Programa de Pós-
graduação em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido, do Núcleo de Altos Estudos
Amazônicos, da Universidade Federal do Pará (PPDSTU/NAEA/UFPA), no período de 2021 a
2022, sob a supervisão do prof. Dr. Durbens Martins Nascimento. O estudo não teve auxílio
financeiro. O objetivo geral da pesquisa foi o de identificar, em cinco Regiões Metropolitanas
(RMs), vinculadas a Região da Amazônia Legal, regulamentação que fundamenta a existência
de relações cooperativas entre as unidades federativas, com vistas ao desenvolvimento da
educação básica, no período histórico de 2015 – 2020. E nas legislações locais analisar o
entendimento (concepções) e as ações propostas (ou os modos de operação, ou metodologias)
que expressem a cooperação ou colaboração federativa.

Um dos objetivos específicos do estudo foi o de realizar levantamento de bibliografia que trata
sobre as relações de colaboração intergovernamentais em três plataformas virtuais: na
(CAPES25); na (ANPAE26); e na (ANPED27), no período de 2018- 2020. É o resultado desse
objetivo específico que apresento neste resumo expandido. O estudo optou por uma abordagem
de tipo qualitativa, com enfoque crítico-dialético, com vistas a desenvolver aproximações

25
CAPES: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Disponível
http://portal.mec.gov.br/ultimas-noticias/212-educacao-superior-1690610854/51461.
26
ANPAE: Associação Nacional de Política e Administração da Educação. Cf. Brenno SANDER. Introdução à
história da ANPAE como sociedade civil no campo da educação. DISPONÍVEL
https://www.anpae.org.br/website/documentos/estudos/estudos_01.pdf
27
ANPED: Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. ANPED. 40 ANOS DE ANPED -
Editorial • Rev. Bras. Educ. 24 • 2019 Disponível https://doi.org/10.1590/S1413-24782019240059
142

interpretativas dos dados coletados de tal modo que se busque uma análise objetiva da realidade
estudada.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O federalismo consiste em uma forma de governo que procura organizar o modus operandi de
um Estado nação frente aos cidadãos que integram o seu território28 e às demais nações
mundiais, quando se apresenta soberanamente. É um território de territórios, pois sua
composição integra vários membros que resguardam sua autonomia administrativa, financeira
e política, sua diversidade seja histórica, cultural, populacional, a partir de um pacto jurídico,
confirmado por uma Carta constitucional onde se expressam a estrutura, organização,
atribuições de competências concorrentes e exclusivas proporcionando uma interdependência
entre o governo central, também denominado de União ou governo federal e os demais
governos designados de subunidades ou Estados-membros ou ainda como unidades federadas.

Ao longo da caminhada republicana outras cinco constituições federais do Brasil (1934, 1937,
1946, 1967/69 e 1988) foram firmando a organização do Estado nacional, como um governo
federal. Mas, foi a Constituição Federal de 1988 na escrita de seu texto, após longo período de
restrições de direitos individuais, políticos e sociais havidos com a ditadura cívico-militar, que
trouxe mais novidades para a federação brasileira a começar com o Art. 1º do Título I que
anuncia em seus princípios fundamentais a República federativa como a união indissolúvel de
seus membros Estados, Municípios e Distrito Federal. Contudo, o Art. 18 é incisivo ao
assegurar que os Municípios passariam a integrar a federação com novas características e
competências. Assim, deixaram de ser apenas integrantes territoriais e subordinados ao Estado
e a União e passaram a ter um protagonismo considerável na organização político-
administrativa no Estado nacional, assumindo responsabilidades como as dos demais membros
da federação, mesmo em condições materiais objetivas diversa.

Uma segunda e importante novidade da Constituição Federal de 1988 (CF/88) está diretamente
integrada com as formas de organizar as ações do Estado e de suas unidades administrativas, a
União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, por meio da determinação de atribuições
destinadas aos entes federativos, redefinindo as competências que devem ser sobretudo
promovidas pela articulação direta dos membros da federação. Por se tratar de Carta Magna,
isto é, um documento com as determinações e orientações gerais para toda sociedade brasileira,

28
Território entendido como espaço geofísico, social, cultural, histórico, material, território usado. (Milton
SANTOS. Território, globalização e fragmentação, passim.)
143

a própria CF/88 já adverte que algumas matérias devem receber regulamentação jurídica
complementar. Papel a ser cumprido pelo Congresso Nacional, na formação do aparato jurídico
necessário a efetivação dos preceitos legais.

Com relação as demandas sociais, ressalto do Título VIII (Da ordem social), o Art. 193 que
determina ao Estado brasileiro o dever de exercer a função de planejamento das políticas sociais
com a participação da sociedade em várias etapas de sua elaboração e na execução por meio
dos “processos de formulação, de monitoramento, de controle e de avaliação dessas políticas.”
(BRASIL, EC nº 108, 2020). Assim, a escrita sobre as políticas sociais trouxe novidades em
todas as áreas que procuraram firmar direitos sociais, individuais e coletivos, os políticos,
econômicos, previdenciários, na saúde pública, por exemplo, reestruturou sua oferta como
direito de todos e dever do Estado, mediante a garantia de políticas sociais orientadas para
prestação de serviços, com a destinação de recursos vinculados para efetivar as ações de saúde
ao constituírem um sistema único. Mas, a Seção I, contendo dez Artigos e tendo acrescido, mais
recentemente, o Art. 212 A29 que trata da educação, reteve minha atenção nos estudos.
(BRASIL, 1988)

Historicamente a escrita de uma seção específica que trata amplamente da educação nacional
foi uma vitória de movimentos sociais organizados em torno das bandeiras da educação
nacional30 que firmou o dever do Estado com a educação; indicou princípios e garantias para
oferta da educação; orientou quanto à organização de sistemas de ensino em cada ente federado,
sob um regime de colaboração, atribuindo as responsabilidades prioritárias e conjuntas para a
oferta da educação como direito social público. Por fim, assinalou vínculos financeiros
obrigatórios para cada unidade federativa e estabeleceu que o plano nacional de educação tem
por objetivo “articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração [...]”.
(BRASIL, 1988)

29
Artigo acrescido pela Emenda Constitucional nº 108, de 2020, com produção de efeitos financeiros a partir de
1º/1/2021. (BRASIL, 2020)
30
Cf. Dermeval SAVIANI, A nova lei da educação: LDB- trajetória, limites e perspectivas. 1999. Nesse livro o
autor apresenta alguns movimentos do setor da educação nacional antes mesmo da escrita da seção Educação na
CF/88 e manifestações em favor da (re)escrita de uma lei de diretrizes e bases para a educação nacional. As
Constituições anteriores a 1988 em geral conjugavam educação com a cultura (1934, 1937 e 1946) ou com a
família e a cultura (1967/69). Apenas a CF/88 tratou da educação em seção específica que articulou somente esse
setor das políticas sociais. A importância desse destaque ocorre pelo crescente papel que tomou a educação pública
frente à organização da própria sociedade nacional, bem como a organização da categoria de trabalhadores e
trabalhadoras da educação começando (ou retomando) a formação de associações e sindicatos específicos da
educação.
144

A declaração para que as unidades federadas atuem em regime de colaboração federativa é tida
como um salto qualitativo indicado para promover as políticas sociais de Estado. O artigo 23
da CF/88 ao falar da competência comum entre a União, os Estados, os Municípios e o Distrito
Federal, determina em seu parágrafo único que sejam criadas Leis complementares com o
objetivo de estabelecer o “equilíbrio de ações” para o desenvolvimento da cooperação
(BRASIL, 1988). Alguns estudiosos, ao longo dos quase 35 anos de existência da CF/88, vêm
se dedicando em pesquisas que procuram observar o estado de desenvolvimento das relações
federadas, sob a recomendação do regime de colaboração, para a executar políticas sociais.
Alguns desses estudos aparecem na amostra abaixo.

O levantamento bibliográfico realizado nas plataformas virtuais exibe um total de seis registros
de artigos sobre a temática do federalismo, no período de dois anos, 2018-2020. A ANPED não
teve artigos notados com essa temática publicado no período de coleta. A plataforma que mais
teve artigos registrados sobre o federalismo foi a CAPES, um total de quatro. Cinco dos artigos
refletem o federalismo e a educação nos dois níveis da educação, são eles: Strelec; Costa e
Calderon (ANPAE, 2018); Carvalho (ANPAE, 2019); Araújo (CAPES, 2018); Almeida e Cabral
Neto (CAPES, 2018); Carvalho e Anderi (CAPES, 2020). Destaca-se o que há de mais
expressivo como tendências e preocupações apresentadas nos artigos.

Dois estudos pesquisaram em diferentes realidades, como se desenvolvem acordos de


cooperação entre os entes federados: Strelec, Costa e Calderon (2018), examinaram o Consórcio
de Educación de Barcelona, falaram da inexistência no Brasil de consórcios públicos
exclusivamente voltados para a educação nos termos da Lei de Consórcios Públicos (Lei nº
11.107/2005) e salientaram que as “preferências e heranças dos governos” podem atrapalhar o
desenvolvimento dos acordos. (RBPAE, 2018, p. 689). A autora Carvalho (2019) pesquisando
sobre ADE-Granfpolis em parceria com o Instituto Positivo, indicou que os “ADEs se
configuram como nova oportunidade de negócios educacionais para as organizações do setor
privado.” (RBPAE, 2019, p. 57).

O artigo de Araújo (2018) demonstrou que “omissões e as ambivalências quanto à


regulamentação da cooperação federativa [...]” colaboram para que organizações empresariais
alcancem mais espaços no cenário nacional, em detrimento da regulamentação da matéria por
meio de Lei Complementar. (EDUC. E SOC., 2018, p. 908). Autores como Grin e Abrucio
(2018) estudaram a execução do Comitê de Articulação Federativa (2003); o Sistema Único da
Assistência Social (2005), e, o Programa de Modernização da Administração Tributária e dos
145

Setores Sociais Básicos Automáticos (PMAT), (1997). Concluíram que “com tantas rotas,
produzir e implantar políticas públicas no federalismo brasileiro é um verdadeiro
caleidoscópio.” (REV. SERV. PÚBLICO, 2018, p. 85). O artigo de Almeida e Cabral Neto, ao
pesquisar sobre o PAR e suas redes semânticas, analisaram a necessidade de compartilhamento
de poder e comunicação para superar áreas de ações sobrepostas. (REVISTA BRASILEIRA
DE EDUCAÇÃO, 2018, p. 1). Finalmente Carvalho e Anderi, estudaram a educação superior
nos Planos Estaduais de Educação para observar desafios na tensão com o PNE (2014-2024), o
resultado foi que poucos Estados brasileiros firmaram compromisso com a expansão da
educação superior por meio de suas UEs. (REVELLI, 2020, p. 1)

CONCLUSÃO

O levantamento de bibliografia destaca as análises históricas da caminhada e tentativas de


desenvolver as relações colaborativas no Brasil, a partir da CF/88; discute as articulações
realizadas; aponta descaminhos e prejuízos com vistas aos preceitos legais do regime de
colaboração e o avanço do empresariado sobre educação pública. Este levantamento contribuiu
para alargar a leitura em busca de uma análise objetiva da realidade federativa da Região da
Amazônia Legal quanto ao regulamento das relações cooperativas para o desenvolvimento da
educação básica, no período histórico de 2015 – 2020.

REFERÊNCIAS

ANPAE. Associação Nacional de Política e Administração da Educação. Disponível


https://www.anpae.org.br/website/documentos/estudos/estudos_01.pdf
ANPED. Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Disponível
https://doi.org/10.1590/S1413-24782019240059
BRASIL. Constituições (1891-1988). Senado Federal, [on-line], [20--]. Disponível em
<https://tinyurl.com/3ks97ztf>. Acesso em: 22 jan. 2022.
CAPES. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Disponível
http://portal.mec.gov.br/ultimas-noticias/212-educacao-superior-1690610854/51461.
SANTOS, Milton. Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1994.
SAVIANI, Dermeval. A nova lei da educação: LDB- trajetória, limites e perspectivas. São
Paulo: Autores Associados, 1999.
146

ENSINO MÉDIO E OBRIGATORIEDADE ESCOLAR: DIÁLOGOS ACERCA DA


IMPLEMENTAÇÃO DA META 3 DO PNE 2014-2024

Jaqueline Ferreira de Almeida


Universidade Estadual Paulista (UNESP)
jaqueferreiraalmeida@gmail.com

INTRODUÇÃO

As atuais políticas educacionais no Brasil inserem-se no contexto mais amplo de reformas e de


esvaziamento dos direitos sociais, dentre os quais encontra-se a educação, e “atravessam” e
desqualificam lutas históricas no campo da educação, dentre as quais destacamos a ampliação
do acesso e permanência na educação básica, a universalização da educação infantil e do ensino
médio e a redução das desigualdades educacionais.

Em um cenário de incertezas, com reformas constantes e corrosão dos direitos sociais, coloca-
se a necessidade de assegurar o direito à educação circunscrito na Constituição Federal (CF) de
1988 e reforçado nos demais dispositivos legais, bem como a garantia do cumprimento dos
objetivos e metas estabelecidos no Plano Nacional de Educação 2014-2024.

Com o expressivo quantitativo da população de 15 a 17 anos as quais se encontram no ensino


fundamental, e os altos índices de pessoas dessa faixa etária que se encontram fora da escola
(BRASIL, 2020), o Estado há de desenvolver políticas que possibilitem a ampliação do acesso
e da permanência na educação básica, principalmente à última etapa da educação básica, de
maneira a garantir o direito à educação.

Nesse direcionamento, a partir de 2009 com a promulgação da Emenda Constitucional 59, a


obrigatoriedade e a gratuidade da educação ampliaram-se para a faixa etária dos 4 aos 17 anos,
faixa etária na qual considera-se a inserção da população de 15 a 17 anos no ensino médio,
possibilitando a ampliação do direito à educação. Acerca do debate da educação básica como
direito, Cury argumenta que a educação básica como direito, “[...] significa um recorte
universalista próprio de uma cidadania ampliada e ansiosa por encontros e reencontros com
uma democracia civil, social, política e cultural” (CURY, 2008, p. 294).

Ante o exposto, o presente trabalho justifica-se haja vista as incertezas e o conjunto de reformas
que perpassam a educação na atualidade, e que desconsideram as políticas em curso como a
universalização e ampliação do acesso ao ensino médio, por intermédio da Emenda
147

Constitucional 59/2009 e pelo conjunto de metas propostas para o ensino médio no Plano
Nacional de Educação 2014-2024.

A partir do contexto ora delineado, o presente trabalho suscita o seguinte problema: Quais os
desafios para a implementação da Meta 3 do Plano Nacional de Educação 2014-2024, com
vistas a garantir o acesso ao ensino médio e a ampliação da obrigatoriedade escolar? No intuito
de responder ao questionamento, delineamos como objetivo geral: Discutir os desafios para a
implementação da Meta 3 do Plano Nacional de Educação 2014-2024, com a finalidade de
garantir o acesso ao ensino médio e a ampliação da obrigatoriedade escolar.

METODOLOGIA

Como metodologia para alcançar o objetivo proposto, utilizou-se a análise documental e como
fonte de dados legislações que amparam o direito a educação no país, a Lei 13.005/2014, que
aprova o PNE, e o Relatório de Monitoramento do PNE, articulando os dados com os debates
que possuem como pressuposto a educação básica como direito.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O ENSINO MÉDIO E A AMPLIAÇÃO DA OBRIGATORIEDADE ESCOLAR: O


CONTEXTO DA EMENDA CONSTITUCIONAL 59/2009

A garantia da obrigatoriedade e da gratuidade do acesso ao ensino médio sofreram alterações,


ao longo dos anos, nos documentos normativos. A Constituição Federal (CF) de 1988, quando
de sua promulgação, assegurava a obrigatoriedade e a gratuidade apenas para o ensino
fundamental, e estabelecia a progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade do ensino
médio (Art. 208, inciso II). Em 1996 com a Emenda Constitucional (EC) 14/96, o texto do
inciso II do Art. 208, foi substituído por “progressiva universalização do ensino médio gratuito”
(BRASIL, 1996a).

No ano de 2009, mais uma Emenda Constitucional altera o Art. 208 da CF: a Emenda
Constitucional 59/2009. Esta EC converte o inciso I do Art. 208 da Constituição Federal,
alterando a obrigatoriedade e gratuidade previstos anteriormente para o ensino fundamental e
ampliando-os para “educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete)
anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram
acesso na idade própria” (BRASIL, 2009).
148

A ampliação por via da faixa etária compreende, em teoria, o percurso educacional da educação
infantil ao ensino médio. Em teoria tendo em conta que o percurso educacional não é igualitário
no Brasil, haja vista as desigualdades econômicas, sociais, culturais e a distorção idade-série,
de maneira que nem todos os jovens na faixa etária de 15 a 17 anos, idade considerada
apropriada para cursar o ensino médio, encontram-se inseridos nessa etapa da educação básica
nesse período considerado apropriado (BRASIL, 2020; SILVA, 2020).

O ENSINO MÉDIO NO CONTEXTO DO PNE: DESAFIOS PARA A AMPLIAÇÃO DO


ACESSO A ÚLTIMA ETAPA DA EDUCAÇÃO BÁSICA

O Plano Nacional de Educação 2014-2024 (PNE), aprovado pela Lei 13.005/2014, possui um
conjunto de 20 metas, as quais desdobram-se em diferentes estratégias para a educação
brasileira a serem implementadas no período de 10 anos. No que concerne ao ensino médio, o
PNE propõe na Meta 3 “Universalizar, até 2016, o atendimento escolar para toda a população
de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos e elevar, até o final do período de vigência deste PNE, a
taxa líquida de matrículas no ensino médio para 85%” (BRASIL, 2014).

No intuito de atingir ao objetivo proposto na Meta 3, o Indicador 3A possui por finalidade


mensurar o percentual da população de 15 a 17 anos que frequenta a escola ou já concluiu a
educação básica, e engloba como meta alcançar 100% de matrícula na educação básica da
população de 15 a 17 anos, estabelecendo o ano de 2016 para o cumprimento desta meta
(BRASIL, 2020).

Após decorridos 5 anos da aprovação do PNE, em 2019 o percentual da população de 15 a 17


anos que frequenta a escola ou já concluiu a educação básica é 92,9% (BRASIL, 2020). Cabe
destacar que em 2012, 89,1% da população de 15 a 17 anos frequentava a escola ou havia
concluído a educação básica (BRASIL, 2020).

Outro indício que sinaliza para o cumprimento da Meta 3, é o Indicador 3B que busca verificar
o percentual da população de 15 a 17 anos que frequenta o ensino médio ou possui educação
básica completa, e contém como meta atingir 85% de matrícula líquida no ensino médio até o
ano de 2024 (BRASIL, 2020).

Em 2019, o Indicador 3B apontou que apenas 73,1% da população de 15 a 17 anos frequenta o


ensino médio ou possui educação básica completa (BRASIL, 2020). Ressalta-se que em 2012,
apenas 63,9% da população de 15 a 17 anos frequentava o ensino médio ou havia concluído a
149

educação básica (BRASIL, 2020), indicando o aumento de aproximadamente 9 pontos


percentuais no período de 7 anos e sinalizando que a meta não será atingida até o ano de 2024.

Os dados evidenciam a distorção da idade-série ao apontar que 92,9% da população de 15 a 17


anos encontra-se frequentando a escola, mas apenas 73,1% encontram-se no ensino médio,
etapa considerada para esta faixa etária.

No que tange ao acesso escolar dos jovens de 15 a 17 anos, o acesso não foi universalizado no
período estabelecido na Meta 3 do PNE, que foi 2016. Os dados de 2019 apontam ainda que
680 mil jovens, de 15 a 17 anos, encontram-se fora da escola e cerca de 1,9 milhão de jovens
de 15 a 17 anos que frequentam a escola ainda estão matriculados no ensino fundamental
(BRASIL, 2020).

As informações ora apresentadas corroboram com a pesquisa apresentada por Silva (2020).
Para a autora a Meta 3 do PNE justifica-se e virtude do histórico de exclusão do acesso ao
ensino médio no Brasil, apontando que ao fim do século XX menos de 25% da população em
idade de frequentar o ensino médio encontrava-se matriculada nessa etapa da educação básica
(SILVA, 2020). Ante à negação do direito ao ensino médio que ainda persiste no cenário
brasileiro, recorremos a Cury, que nos afirma que:

Do direito nascem prerrogativas próprias das pessoas em virtude das quais elas
passam a gozar de algo que lhes pertence como tal. Estamos diante de uma
proclamação legal e conceitual bastante avançada, mormente diante da dramática
situação que um passado de omissão legou ao presente (CURY, 2008, p. 296).

A partir da afirmativa de Cury, assinala-se a garantia do acesso e da permanência ao ensino


médio como um dos desafios para a consolidação do direito a educação, considerando-se o
passado de negação do acesso ao ensino médio, a exclusão das camadas mais pobres da
população à esta etapa educacional e a desigualdade educacional e social mais nítida na última
etapa da educação básica, em que os jovens se veem forçados a se inserir no mundo do trabalho,
necessitando abandonar a escola.

CONCLUSÃO

A efetivação do direito a educação, principalmente do direito ao ensino médio, é uma luta


histórica no Brasil e, na atualidade, enfrenta desafios para a sua consolidação, diante de políticas
austeras de contenção e congelamento dos recursos financeiros para políticas sociais, dentre as
quais insere-se a educação. Os desafios para a ampliação da obrigatoriedade e gratuidade do
150

ensino médio ainda perpassam pela reforma do ensino médio e pela implementação da Base
Nacional Comum Curricular, os quais esvaziam e reduzem a formação humana, incentiva as
parcerias com instituições privadas, e, dentre outros retrocessos, desqualifica avanços
alcançados na educação brasileira.

No que tange ao Plano Nacional de Educação 2014-2024 e o cumprimento da Meta 3, indicamos


como um dos desafios para a efetivação do direito ao ensino médio a correção do fluxo escolar
e a redução das desigualdades de acesso e permanência na etapa final da educação básica,
questões essas herdadas de um passado de exclusão à educação escolar.

Outro ponto a se destacar é a viabilidade de cumprimento dos objetivos estabelecidos na Meta


3. Faltando pouco para o fim da vigência do PNE (3 anos), os dados sinalizam para a não
universalização do ensino médio, e para um aumento tímido no indicador 3B, que objetiva o
aumento na taxa líquida de matrículas da população de 15 a 17 anos na última etapa da educação
básica.

Por fim, indica-se que a ampliação da obrigatoriedade e da gratuidade preconizados por


intermédio da Emenda Constitucional 59/2009, necessita de um longo percurso para alcançar a
sua efetividade, considerando-se os retrocessos que “atravessam” a educação pública brasileira
nos tempos atuais.

REFERÊNCIAS

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Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc59.htm

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151

2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-


2014/2014/lei/l13005.htm

BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).


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CURY, Carlos Roberto Jamil. A educação básica como direito. Cadernos de Pesquisa, v. 38,
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SILVA, Monica Ribeiro da. Ampliação da obrigatoriedade escolar no Brasil: o que aconteceu
com o Ensino Médio? Ensaio: aval. pol. pub. Educ., Rio de Janeiro, v.28, n.107, p. 274-291,
abr./jun. 2020. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/ensaio/a/mqfqFrxbKWWpcjhwrGNqsgn/?format=pdf&lang=pt.
152

SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO E REGIME DE COLABORAÇÃO:


DISCUSSÕES EM PAUTA

Júlia de Moraes Remydio


Graduanda em Ciências Sociais
Bolsista de Iniciação Científica pela Universidade Federal do Espírito Santo, financiada pelo
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq),
juliamoraesremydio@gmail.com.

INTRODUÇÃO

Este trabalho está vinculado ao Projeto n° 11198/2021, Federalismo e Educação Básica no


Brasil: atores e disputas na configuração do Sistema Nacional de Educação e do Regime de
Colaboração (2009-2022), aprovado e financiado na Chamada CNPq/MCTI/FNDCT 18/2021
na faixa de Grupos Consolidados, bem como ao Projeto Base Federalismo e Políticas
Educacionais do grupo de pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais da Universidade
Federal do Espírito Santo (Ufes). O presente estudo tem como objetivo reunir e analisar as
discussões, em âmbito público e privado, acerca do Sistema Nacional de Educação (SNE) e o
Regime de colaboração entre 2009 e 2019, sendo o SNE um sistema que se estabelece como
uma forma plena de organização no campo educacional, dada uma federação como a brasileira,
que dispõe de um arcabouço jurídico comandado pela constituição (SAVIANI, 2010). Tendo
em vista as desigualdades educacionais brasileiras, com ofertas diferentes para espaços
diferentes do território, ou seja, alunos de diferentes estados ou municípios têm acesso a escolas
com níveis de qualidade diferentes, fato que impede que se alcance mínima equidade entre os
estudantes brasileiros, e o debate a respeito da regulamentação do Art. 23 da Constituição
Federal de 1988 (CF/88), que determina a educação como responsabilidade da federação
brasileira, sendo ela competência comum dos entes federativos, e o Art. 211, que prevê que a
União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal devem se organizar em Regime de
Colaboração seus sistemas de ensino.

METODOLOGIA

A metodologia deste trabalho dá-se a partir de pesquisas bibliográficas organizadas de acordo


com a metodologia de Bardin, uma análise documental formando uma reunião de informações
com o objetivo de gerar “[...] classificação e análise categórica temática” (BARDIN, 2011),
153

contando com revisão de documentos oficiais públicos, como Projetos de Lei que versam sobre
o SNE, o Regime de colaboração, financiamento da educação e instâncias de pactuação
federativa, e o documento oficial da extinta Secretaria de Articulação com os Sistemas de
Ensino (SASE), documentos oficiais de iniciativas privadas, como o Todos Pela Educação e
audiências públicas sobre o SNE. Sendo assim, elencou-se o material documental supracitado
de atores públicos e privados, com foco em discussões do âmbito legislativo, em câmara alta e
baixa. O estudo baseia-se na esquematização dos dados coletados, organizados em planilha
objetivando atingir uma correlação de atores interessados na implementação do SNE, a partir
das informações reunidas e categorizadas. Tendo como aporte teórico os conceitos de Estado,
Hegemonia e aparelhos privados de Antônio Gramsci, estabelecemos que as políticas
educacionais são relações de força, segundo o autor, o Estado se comporta como força e
consenso, detentor do domínio intelectual e moral, um aliciador de hegemonia, representando
a vontade suprema, portanto o Estado é “[...] o ponto de contato entre a sociedade civil e a
sociedade política, entre o consenso e a força” (GRAMSCI, 2000, p. 265). A hegemonia como
controle de consensos, e o Aparelho Privado de Hegemonia (APH) representam as relações de
poder, segundo Gramsci (2000) responsáveis pela difusão das concepções, comportamento,
cultura e valores dominantes na sociedade.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A reunião de documentos oficiais do âmbito público legislativo, como Projetos de Lei


Complementar (PLP), principalmente o PLP n.º 25/2019 da Professora Dorinha Seabra
Rezende (DEM) e o PLP n.º 235/2019 de Flávio Arns (REDE-PR), audiências públicas acerca
dos PLs e discussões na Câmara dos Deputados e no Senado, contando também com
contribuições feitas pela esfera privada ao debate, como grupos empresariais, conferências
nacionais e documentos oficiais disponibilizados pelo movimento Todos Pela Educação.

No âmbito legislativo, as discussões sobre o SNE voltam ao centro da educação em 2014, com
o PLP n.º 413/2014, de autoria do deputado Ságuas de Moraes, do Partido dos Trabalhadores,
no Mato Grosso, primeira grande proposta desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB), de 1996, que versa sobre o Plano Nacional de Educação, trazendo o art. 23 da
CF/88. Outras propostas são apresentadas ao longo dos anos seguintes, trazendo para o debate
outros atores como Fórum Nacional de Educação (FNE), apresentando medidas de articulação
dos entes federados visando alcançar metas do PNE (PONTES e LÍCIO, 2020). Assim como o
154

PLP n.º 448/2017, de autoria do deputado Giuseppe Vecci (PSDB), de Goiás, que traz o Fórum
Nacional dos Conselhos Estaduais de Educação (FNCE), feito a partir das discussões sobre o
SNE, abordando a visão de outros atores sobre o sistema. Em 2019, com o PLP n.º 25/2019 da
Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM), e seus apensados PLP n.º 235/2019 de Flávio Arns
(REDE-PR), PLP n.º 47/2019 de Pedro Cunha Lima (PSDB-PB), PLP n.º 216/2019 da
Professora Rosa Neide (PT-MT), PLP n.º 267/2020 de Rose Modesto (PSDB-MS). Os
documentos supracitados se dedicam na proposição da implementação do SNE e o regime de
colaboração, tratando de instâncias de pactuação federativa, além de tangenciar as discussões
quanto ao financiamento da educação, como tratado no PLP PLP n.º 235/2019, por exemplo,
que discorre sobre o CAQ, Custo Aluno Qualidade, uma forma de regular e nivelar por aluno,
ferramenta que objetiva calcular os gastos por aluno de forma que todas as escolas sejam
atendidas de acordo com suas necessidades, tendo em vista as desigualdades enfrentadas pelos
alunos que dependem da educação pública.

Os atores da esfera privada se mostram presentes ao decorrer de todas as discussões em


audiências públicas, sendo possível identificar uma participação ativa, incentivando o debate e
introduzindo os interesses da iniciativa privada, que segundo Araujo:

[...] os setores empresariais ligados ao TPE, aproveitando as brechas, indefinições e


fragilidades conceituais, políticas e jurídicas do que deveria se constituir o “regime de
colaboração” para a oferta educacional no Brasil, introduziu um modelo empresarial,
simplificador, fragmentário e que desqualifica o debate público sobre o tema.
(ARAUJO, 2012)

Sendo assim, no que tange a participação da esfera privada na regularização da legislação,


mobiliza-se o conceito de aparelhos privados de hegemonia, sendo mecanismos de força e
consenso, tendo em vista as disputas de poder dentro do contexto político educacional.

CONCLUSÃO

A instituição do SNE como lei, e sua efetivação na realidade material é essencial para que se
crie um ambiente estudantil igualitário e acessível, impedindo que o contexto socioeconômico
e geográfico limite a trajetória estudantil de brasileiros e brasileiras. No entanto, as análises
feitas até a produção deste texto revelam que, apesar de ser foco de discussões e debates há
muitos anos, o SNE ainda se mantém distante de sua concretização. Atualmente, mesmo com a
tramitação do PLP n.º 25/2019 apensado ao PLP n.º 235/2019 na Câmara dos Deputados, após
155

aprovação em câmara alta, o processo ainda caminha a passos lentos e largos, e a conjuntura
educacional brasileira não possui perspectiva de mudança num futuro próximo. Como mostra
Araujo (2018), essa é uma batalha há muito travada dentro do contexto político educacional
brasileiro: “[...] tanto o artigo 23 quanto o artigo 211 precisam de regulamentação por meio de
Lei Complementar, o que, após 30 anos de promulgação da CF de 1988 e 4 anos de aprovação
do PNE (2014-2024), ainda não foi feito.” (ARAUJO, p.965, 2018).

Fatores como a introdução de interesses privados no debate público, como citado anteriormente,
tornam ainda mais complexo o delineamento das responsabilidades de cada ente federado,
mesmo que prometa o contrário. Dessa forma, a participação civil não cresce de forma
concomitante à participação privada, afastando o debate da população.

REFERÊNCIAS

ARAUJO, Gilda Cardoso de. FEDERALISMO COOPERATIVO E EDUCAÇÃO NO


BRASIL: 30 ANOS DE OMISSÕES E AMBIVALÊNCIAS. Educação & Sociedade
[online]. 2018, v. 39, n. 145, pp. 908-927.

ARAUJO, Gilda Cardoso de. Federalismo Cooperativo e Arranjos de Desenvolvimento da


Educação: O Atalho Silencioso do Empresariado para a Definição e Regulamentação do
Regime de Colaboração. In: 35a Reunião Anual da Anped, 2012, Porto de Galinhas-PE.
Educação, cultura, pesquisa e projetos de desenvolvimento:O Brasil do século XXI. Rio de
janeiro: Anped, 2012. v. 1.

BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Tradução: Luis Antero Reto, Augusto Pinheiro.
São Paulo: Edições 70, 2011.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,


DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

DOURADO, Luiz Fernandes. Sistema Nacional de Educação, Federalismo e os obstáculos


ao direito à educação básica. Educação & Sociedade [online]. 2013, v. 34, n. 124, pp. 761-
785.

GRAMSCI, Antônio. Cadernos do cárcere. Tradução de Carlos Nelson Coutinho com a


colaboração de Luiz Sergio Henriques e Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Editora
Civilização Brasileira, 2000b. v. 2.
SAVIANI, Dermeval. Sistema Nacional de Educação articulado ao Plano Nacional de
Educação. Revista Brasileira de Educação [online]. 2010, v. 15, n. 44 [Acessado 13 Agosto
2022] , pp. 380-392.
156

PONTES, Pedro Arthur de Miranda Marques. LÍCIO, Elaine Cristina. Mapeando o debate
sobre o Sistema Nacional de Educação: o que dizem as propostas sobre a criação de uma
nova instância de pactuação. Texto para discussão / Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada.- Brasília : Rio de Janeiro: Ipea , 1990- ISSN 1415-4765.
157

EIXO 4 – Federalismo, políticas curriculares e


de avaliação
158

REFORMAS CURRICULARES E AS POLÍTICAS DE AVALIAÇÃO: DESAFIOS À


EDUCAÇÃO ESCOLAR NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

Carina Copatti
Departamento de Educação, Política e Sociedade - UFES
carina.copatti@ufes.br

INTRODUÇÃO

Compreender os atuais desdobramentos das políticas educacionais requer que se considere o


papel do Estado e a atuação de grupos empresariais ligados ao mercado financeiro na
proposição de reformas curriculares e na padronização dos processos educativos escolares por
meio de modificações nas políticas de avaliação em larga escala. Diante disso, tem-se por
objetivo debater sobre as reformas atuais e os processos de padronização das avaliações,
constituindo um caminho para a regulação da educação escolar a fim de mensurar sua
“qualidade”.
Frente às situações que vêm sendo delineadas no contexto educacional brasileiro, questiona-se:
De que modo a regulação dos processos educativos escolares, via avaliações externas à escola,
tem sido evidenciada em escolas estaduais do Espírito Santo a partir das reformas curriculares
recentes?

METODOLOGIA

Esta pesquisa resulta de estudos sobre a relação entre reforma curricular e políticas de avaliação,
iniciados no contexto de atuação na Disciplina Política e Organização da Educação Básica
(POEB), e debate os processos de padronização e maior controle sobre a educação escolar sob
um modelo pautado na racionalidade neoliberal. Sendo assim, quanto à abordagem do
problema, desenvolve-se uma reflexão pautada em análise qualitativa. Quanto aos objetivos,
ancora-se na perspectiva crítico-hermenêutica, e com relação aos procedimentos, ampara-se em
uma abordagem bibliográfica.

Nesse sentido, o recorte ora apresentado limita-se à fase de construção téorico-bibliográfica,


ancorada em autores vinculados com a temática, como Pasinato e Fávero (2020); Peroni,
Caetano e de Lima (2017); Oliveira, Duarte e Clementino (2017); Oliveira e Araujo (2005). E
está em desenvolvimento a produção de dados junto a escolas estaduais da Região
159

Metropolitana da Grande Vitória, a fim de avançar estudos sobre este tema a partir da realidade
vivenciada nos contextos escolares capixabas.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O modelo de regulação proposto a partir dos anos 1990, amparado na racionalidade neoliberal
e sob a perspectiva da Nova Gestão Pública (NGP), tem se tornado, conforme Oliveira, Duarte
e Clementino (2017), um instrumento na relação de governação entre os atores do Estado e da
sociedade civil. Isso ocorre não somente no Brasil, mas interfere em outros países da
Latinoamérica.
Grande parte de países da América Latina desde os anos 1990, reestruturando o Estado
por meio de princípios fundamentados na empresa capitalista, sob o argumento de
necessária modernização. Ela se insere em um discurso reformista que chega até a
escola baseado na eficácia e eficiência nos serviços públicos. (OLIVEIRA; DUARTE;
CLEMENTINO, 2017, p. 2).

O desdobramento das políticas neoliberais tem explicitado situações como o empresariamento


da educação, o qual pode ser observado em diferentes realidades, como a de instituições
escolares, com distintas características e sob variadas denominações. Fávero e Pasinato (2020,
p. 2), destacam que:

Numa perspectiva neoliberal, cabe à educação o papel de legitimar novos e velhos


processos de exclusão verificados na sociedade de forma difusa e no contexto
educacional de forma sistemática. Para isso, devem difundir-se, no interior do sistema
educacional, as relações mercantis de concorrência, onde a educação deixa de ser parte
do campo social e político para ingressar no âmbito econômico e funcionar de forma
similar ao mercado.

Nesse sentido, os princípios da NGP, de acordo com Oliveira, Duarte e Clementino (2017), se
baseiam em um discurso reformador no âmbito do Estado e da educação, e impõe nova
orientação para as políticas públicas, traduzindo-se em normas, procedimentos administrativos
e em práticas que vão transformando valores e identidades junto aos docentes. Araujo (2011)
considera que tal processo acaba gerando:

[...] uma nova forma de regulação estatal que se dá não mais pela execução direta,
mas pela transferência de encargos, gastos e responsabilidades para outras instâncias
administrativas subnacionais, para as escolas e mesmo para as famílias, ao mesmo
tempo em que os marcos regulatórios do Estado são redefinidos a partir da lógica
típica do mercado de prescrição de metas, objetivos e controle de produtos e
resultados.

Assim, novas lógicas de organização e gestão tem sido usadas, tomando como meta os
resultados quantificáveis que colocam, muitas vezes, os professores no centro de
questionamentos, vistos como os únicos responsáveis pela qualidade ou pelos problemas da
escola e do processo de aprendizagem. Esse modelo de regulação traz à centralidade a avaliação
160

externa como dispositivo para mensurar a “qualidade da educação” ou sua “qualidade total 31”,
como mencionam Oliveira e Araujo (2005), Pasinato e Fávero (2020).

Como indicam Pasinato e Fávero (2020), no momento em que o Estado passa ao papel de
regulador, legislador e avaliador da execução, possibilita um mercado para as empresas e porta
de entrada para o capital, por meio do fornecimento de apostilas, cursos e materiais para
formação continuada para professores, assessorias, etc. Tal iniciativa resulta, atualmente, não
somente em maior interferência dos grupos empresariais ligados ao mercado em ações que
seriam de papel do Estado, mas também influenciam reformas educacionais, a exemplo da
Reforma do Ensino Médio (2017) e na aprovação da Base Nacional Comum Curricular (2018).
Conforme Peroni, Caetano e de Lima (2017, p. 418):
As reformas na educação brasileira fazem parte de um projeto que não dialoga com
os principais envolvidos nas propostas em curso – professores, alunos, comunidade
escolar – e apresenta-se como uma afronta à democracia. Os principais envolvidos no
processo de construção de uma base nacional comum curricular e do novo ensino
médio se apresentam como sujeitos individuais ou coletivos através de instituições
públicas e privadas que atuam no setor educacional, institutos e fundações ligados a
grandes empresas nacionais e internacionais, bem como instituições financeiras
ligadas ao mercado de capitais, visando construir um projeto hegemônico de educação
e de sociedade.

Tais reformas vão na contramão da perspectiva de avaliação amparada em processos


qualitativos e democráticos, tomando como base um modelo de regulação da escola e os
professores por meio de avaliações quantificáveis, mensuradas por resultados padronizadas e
sob processos que diminuem a autonomia e fragilizam a autoria docente.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB n. 9.394/1996), no artigo 24, Inciso V
menciona que, dentre os aspectos para verificação do rendimento escolar deve-se considerar a
avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos
qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais
provas finais. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s, 1998) consideram que o processo
avaliativo deve acontecer de forma contínua e sistemática por meio da interpretação qualitativa
do conhecimento construído pelo aluno.

Com a aprovação da BNCC, que visa o alinhamento de outras políticas e ações, em âmbito
federal, estadual e municipal, referentes à formação de professores, à avaliação, à elaboração
de conteúdos educacionais e aos critérios para a oferta de infraestrutura adequada para o pleno

31
Conforme Pasinato e Fávero (2020), a concepção de Qualidade Total na Educação é uma proposta ideológica
que visa, na esteira da política neoliberal, ajustar a educação enquanto campo estratégico, a lógica empresarial
voltada às necessidades de mercado.
161

desenvolvimento da educação. E avança a ideia de “construir e aplicar procedimentos de


avaliação formativa de processo ou de resultado que levem em conta os contextos e as
condições de aprendizagem, tomando tais registros como referência para melhorar o
desempenho da escola, dos professores e dos alunos (BRASIL, 2018, p. 19).

A BNCC reitera que compete à União promover e coordenar ações e políticas em âmbito
federal, estadual e municipal, referentes à avaliação e outros processos voltados à educação
escolar, o que consideramos importante pelo regime de colaboração. No entanto, o tipo de
avaliação tomado como parâmetro a partir das reformas curriculares vem consolidando as
marcas do modelo neoliberal. Para Silva et. al. (2020, p. 110-111):
A partir do momento que se constrói no Brasil uma “cultura da avaliação” e rankings
passam a ser produzidos, nota-se da parte dos cidadãos uma maior preocupação com
a nota que a escola e o sistema de ensino do município e do estado onde vivem obtém
em exames. Assim, propostas políticas de governos municipais, especialmente que
incluam maior controle da educação e melhoria da qualidade do ensino, expresso no
Ideb, são bem aceitas.

Os processos de avaliação propostos, principalmente em larga escala, restringem a concepção


de avaliação da aprendizagem ao desempenho do aluno e, consequentemente, à atuação do
professor. Nesse sentido, conforme Chirinéia e Brandão (2015, p. 470), caberá à avaliação
captar o desempenho e, assim, o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) se torna
instrumento “mobilizador da lógica meritocrática e um dos desdobramentos disso é considerar
o conteúdo da avaliação como currículo oficial”. Diante de tal situação, tem-se como
continuidade deste estudo, uma fase de produção de dados em escolas estaduais do ES, no
sentido de compreender, pelo diálogo com gestores escolares, como se evidenciam as políticas
de avaliação externa e de que modo ocorrem os processos de padronização que se dão via
reformas curriculares.

CONCLUSÃO

As reformas curriculares recentes e as mudanças no que tange às políticas de avaliação escolar


tem evidenciado maior ênfase nos resultados, geralmente obtidos a partir de provas e exames
externos à escola, o que gera maior controle sobre escolas, professores e seus processos. Isso
pode ser observado em diferentes instituições escolares brasileiras. No estado do Espírito Santo,
conforme estudos de Silva et. al. (2020), as políticas criadas pelos municípios com vistas à
promoção de melhorias da qualidade repetem fórmulas antigas e não tocam na questão da
equidade, ainda, utilizam-se dos resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
162

(Ideb) como fonte de informação para planejamento de políticas, o que se demonstra


insuficiente para atender as realidades educacionais locais e promover, de fato, maior qualidade.
Estas evidências tornam necessário o avanço em estudos sobre as situações enfrentadas pelas
equipes de gestão educacional e pelos docentes que atuam nas escolas estaduais capixabas,
tendo em vista as reformas curriculares, a ampliação da atuação de grupos privados por meio
de parcerias com o governo estadual e, ainda, a necessidade de considerar cada contexto
educativo e a garantida da qualidade da educação, indo além de resultados padronizados que
são gerados a partir de provas e exames externos, com foco na mensuração, na competitividade
e na culpabilização das equipes escolares.

REFERÊNCIAS

ARAUJO, Gilda Cardoso de. Estado, política educacional e direito à educação no Brasil: “O
problema maior é o de estudar”. Educar em Revista, Curitiba, Brasil, n. 39, p. 279-292,
jan./abr. 2011.
CHIRINÉA, Andréia Melanda; BRANDÃO, Carlos Fonseca. O IDEB como política de
regulação do Estado e legitimação da qualidade: em busca de significados. Ensaio: Avaliação
e Políticas Públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 23, n. 87, p. 461-484, abr./jun. 2015.
OLIVEIRA, Romualdo Portela de. ARAUJO, Gilda Cardoso de. Qualidade do ensino: uma
nova dimensão da luta pelo direito à educação. Revista Brasileira de Educação. n. 28, Jan
/Fev /Mar /Abr., 2005.
OLIVEIRA, Dalila A.; DUARTE, Alexandre W.; CLEMENTINO, Ana Maria. A nova gestão
pública no contexto escolar e os dilemas dos(as) diretores(as). RBPAE, v. 33, n. 3, p. 707-
726, set./dez. 2017.
PASINATO, Darciel. FÁVERO, Altair A.; As políticas neoliberais no brasil: sua influência
na educação básica e superior. Revista Atos de Pesquisa em Educação. Blumenau, v.15, n.3,
p.903-928, jul./set., 2020.
PERONI, Vera. CAETANO, Maria Raquel. DE LIMA, Paula. Reformas educacionais de
hoje. As implicações para a democracia. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 11, n. 21, p.
415-432, jul./dez. 2017.
SILVA, Itamar M. NAJJAR, Jorge N. V.; LADEIRA, ANGELA M. A. S.; SANTOS, Anna
C. R. IDEB e políticas educacionais em quatro municípios da grande vitória. Estud. Aval.
Educ., São Paulo, v. 31, n. 76, p. 104-133, jan./abr. 2020.
163

DELINEAMENTOS E DESCONSTRUÇÕES NA BASE NACIONAL COMUM


CURRICULAR

Angela Terezinha Oliveira Brancher


UNICENTRO/PR
angeela.oliveira@hotmail.com

Carlos Eduardo Laurentino Brancher


UNICENTRO/PR
carloscomuna@hotmail.com

INTRODUÇÃO

A elaboração de uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) foi prevista pela Constituição
de 1988, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9394/96 e pelo Plano
Nacional de Educação (PNE), Lei 13005/14. Esse processo contou com três versões, sendo a
primeira etapa iniciada com a organização e direção da Secretaria de Educação Básica (SEB) e
do Ministério da Educação e Cultura (MEC), através de uma comissão de especialistas, os quais
foram responsáveis pela sistematização das duas primeiras versões da BNCC. Segundo Aguiar
(2018a), a comissão que trabalhou na primeira fase do documento era constituída por 116
especialistas, de 37 universidades, além de professores e membros do Conselho Nacional de
Secretários de Educação (CONSED) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação (UNDIME). A nomeação da comissão ocorreu em junho de 2015 e a conclusão da
proposta preliminar em 15 de setembro do mesmo ano.

Aguiar (2018b) informa que a primeira versão do documento foi disponibilizada


eletronicamente para consulta pública em 2015.

Segundo dados do MEC, houve mais de 12 milhões de contribuições ao texto, com a


participação de cerca de 300 mil pessoas e instituições. Contou, também, com
pareceres de especialistas brasileiros e estrangeiros, associações científicas e
membros da comunidade acadêmica. As contribuições foram sistematizadas por
profissionais da Universidade de Brasília (UnB) e da Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro (PUC-RJ), e subsidiaram o MEC na elaboração da “segunda versão”
(AGUIAR, 2018b, p. 11).

A segunda versão foi concluída em 24 de junho de 2016, sendo disponibilizada e submetida à


discussão por cerca de 9 mil educadores em seminários realizados pela UNDIME e pelo
CONSED, em todo o país (AGUIAR, 2018b).
164

Em maio de 2017, a Comissão Bicameral do Conselho Nacional de Educação deliberou pela


realização de cinco audiências públicas nacionais, no total de uma para cada região do país. O
resultado das discussões nessas audiências implicou o agrupamento dos assuntos abordados em
uma planilha. A desconsideração dos resultados das consultas públicas e suas contribuições,
além da forma atropelada na qual se conduziu o processo, são destacados por Aguiar (2018b,
p.14), para quem a versão final da BNCC privilegiou especialistas e subalternizou “[...] o
diálogo com as comunidades educacionais e escolares, em um modelo centralizador de tomada
de decisões”. Além disso, resultou de um insuficiente debate sobre os consensos e dissensos
que deveriam ser pedagogicamente tratados como requer a matéria.

Neste sentido, o problema desta pesquisa é elaborado a partir da seguinte questão: Quais as
consequências e a quem interessou a implantação da última versão da Base Nacional Comum
Curricular?
Em sintonia com esse problema, o objetivo geral consistiu em refletir sobre as consequências
da implantação da Base Nacional Comum Curricular e identificação dos interessados nas
diversas mudanças nas políticas educacionais através do referido documento.

METODOLOGIA

O estudo ensaístico é de caráter bibliográfico e documental. O fundamento teórico ampara-se


nas reflexões de Aguiar e demais autores que analisam e discutem a Base Nacional Comum
Curricular. Com relação à pesquisa documental, o estudo volta-se para a análise introdutória da
Base Nacional Comum Curricular, lançada em 2018.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Beltrão, Taffarel e Teixeira (2020) ressaltam que a reforma do Ensino Médio e a proposição da
BNCC resultaram em um processo conflituoso com uma oposição popular considerável
observada a partir de ocupações de escolas, notas públicas, protestos e mobilizações que foram
impulsionadas tanto por alunos e professores quanto por sindicatos e entidades científicas que
reivindicavam o fim das mudanças. Em contrapartida, veículos de mídia, fundações com
vínculos empresariais e setores da iniciativa privada manifestavam apoio e buscavam reforçar
a necessidade da reforma.
165

Kuenzer32 (2017) é referendada por Beltrão et al. (2020), para afirmar que a escolha de apenas
uma área de conhecimento no Ensino Médio é fundamentada no pragmatismo, a fim de atender
as trajetórias de vida e projetos futuros. Nesse sentido, o conhecimento que não se articular ao
projeto escolhido, torna-se inútil, pois a utilidade à vida produtiva laboral e o atendimento às
demandas atuais do modo de produção capitalista tornam-se os critérios para definir se um
conhecimento é bom e valoroso.

Dessa forma, alguns componentes curriculares foram reduzidos ou até mesmo suprimidos do
currículo. Tais proposições são evidenciadas a partir da análise da carga horária destinada à
formação comum, que anteriormente à reforma era de 3.200 horas e que agora não poderá ser
superior a 1.800 horas.

Mesmo em meio a tantos questionamentos e contrapontos apresentados antes da edição final, a


terceira versão da BNCC foi publicada em 2018, deixando de lado o Ensino Médio, pois
naquele momento esse nível de ensino contava com o encaminhamento de uma reforma
curricular, estabelecida pela Lei 13.415/2017.

Na concepção de Aguiar (2018a), a Base Nacional Comum Curricular consistiu em uma


contrarreforma da educação, conduzida pelo governo Michel Temer, desde o impeachment da
presidenta Dilma Rousseff, objetivando desmontar as conquistas democráticas e populares no
que tange ao direito à educação e às políticas educacionais – o que foi possível mediante a
substituição de vários integrantes do Conselho Nacional da Educação – a fim de alinhar a
tomada de decisões aos interesses empresariais.

Para Martineli et al. (2016), a BNCC responde a um conjunto de reformas e ações políticas para
garantir uma formação com a disseminação de valores e princípios do modelo de organização
social vigente, respondendo assim às necessidades de reestruturação produtiva. Grando et al.
(2019) reforça tal concepção ao afirmar que a flexibilidade do currículo e os itinerários
formativos que compõem a BNCC, têm caráter reducionista de acesso ao conhecimento com
uma formação direcionada aos projetos de vida e escolhas juvenis em detrimento da formação
geral básica, com uma preparação centrada no imediatismo que o mercado de trabalho exige,
buscando atender as necessidades do sistema capitalista.

32
A autora Acacia Zeneida Kuenzer publicou em 2017 o artigo intitulado “Trabalho e escola: a flexibilização do
ensino médio no contexto do regime de acumulação flexível”.
166

O desenvolvimento de competências, segundo a BNCC, possibilitará aos estudantes inserirem-


se de forma ativa no mundo de trabalho cada vez mais complexo, a fim de que sejam capazes
de se adaptar as novas condições de ocupação e aperfeiçoamento. Para Beltrão, Taffarel e
Teixeira (2020) o preparo para o trabalho ganha conotação de preparo para o emprego.

Beltrão, Taffarel e Teixeira (2020) comentam que os defensores da reforma do Ensino Médio
já empreendiam esforços há anos visando incorporar na educação pública processos
característicos do campo empresarial, dentre eles a meritocracia, a gestão por resultados, a
competição, a concorrência, a desregulamentação, os incentivos, os pagamentos por mérito, a
testagem, a responsabilização vertical e maior participação da iniciativa privada. Na visão de
Sena (2019), a reforma do Ensino Médio é a substituição da gestão democrática pela gestão
empresarial.

A reestruturação do Ensino Médio e as diversas alterações favoreceram a privatização da


educação pública possibilitando a desregulamentação da contratação de professores; a
fragmentação e flexibilização do currículo; a oferta de parte do currículo por entidades não
estatais e instituições de educação a distância não conveniadas, o que já vem ocorrendo no
estado do Paraná com a atuação da Universidade Cesumar33 na coordenação de cursos técnicos
da grade escolar, que anteriormente eram dirigidos por professores do Quadro Próprio do
Magistério (QPM) ou Contratados em Regime Especial pelo Processo Seletivo Simplificado
(CRES/PSS).

CONCLUSÃO

Conclui-se a partir deste ensaio que, a publicação negligente e apressada da BNCC acarretou
no atendimento às demandas do modo de produção capitalista com uma formação que
dissemina valores e princípios, reduzindo o acesso ao conhecimento e a formação geral básica.
Trata-se assim de uma preparação centrada no imediatismo exigido pelo mercado de trabalho.
Tais mudanças beneficiam e interessam principalmente às fundações com vínculos
empresariais e setores da iniciativa privada, resultando em um desmonte de conquistas
democráticas e populares.

REFERÊNCIAS

33
Para mais informações consultar: https://www.aen.pr.gov.br/Noticia/Educacao-fecha-parceria-para-ofertar-
tres-cursos-tecnicos-do-Ensino-Medio-Profissional Acesso em 05 de março de 2022.
167

AGUIAR, M. A da S. Política educacional e a Base Nacional Comum Curricular: o processo


de formulação em questão. Revista Currículo sem Fronteiras, v 18(3), 2018a, p. 722-738.
Disponível em: https://www.curriculosemfronteiras.org/vol18iss3articles/aguiar.pdf Acesso
em 25 fev 22.

AGUIAR, M. A da S. Relato da resistência à instituição da BNCC pelo Conselho Nacional de


Educação mediante pedido de vista e declarações de votos. In: AGUIAR, M. A da S;
DOURADO, L.F (Orgs.). A BNCC na contramão do PNE 2014-2024: avaliação e
perspectivas. Recife: ANPAE, 2018b.

BELTRÃO, José, Arlen. TAFFAREL, Celi, Nelza, Zulke. TEIXEIRA, David, Romão. A
Educação Física no Novo Ensino Médio: implicações e tendências promovidas pela
reforma da BNCC. Revista Práxis Educacional, Vitória da Conquista, v. 16, n. 43, p. 656-
680, 2020.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB. 9394/1996.

BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Base Nacional Comum Curricular. Brasília,


2018. Disponível em
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_site.pdf.
Acesso em: 26 abr. 2021.

GRANDO, Daiane. LABIAK, Osni. MATTES, Veronika, Volski. MADRID, Silvia,


Christina, Oliveira. A Educação Física na Base Nacional Comum Curricular: pressupostos,
avanços e retrocessos. In: Congresso Norte Paranaense de Educação Física Escolar –
CONPEF, IX., 2019, Londrina. Anais eletrônicos [...] Londrina: Universidade Estadual de
Londrina, 2019. p. 1 – 16. Disponível em:
http://www.uel.br/eventos/conpef/portal/pages/arquivos/ANAIS%202019%20-%20ARTIGO
S%20COMUNICACAO%20ORAL%20E%20CARTAZ/A%20EDUCACAO%20FISICA%2
0NA%20BASE%20NACIONAL%20COMUM%20CURRICULAR.pdf Acesso em: 22 fev.
2022.

MARTINELI, T. A. P., MAGALHÃES, C. H., MILESKI, K. G., ALMEIDA, E. M. A


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Motrivivência, v. 28, n. 48, p. 76-95, 2016.

SENA, I. P. F. S. Convite ao questionamento e à resistência ao abismo lançado pela Base


Nacional Comum Curricular - BNCC. In: UCHOA, A. M. C.; SENA, I. P. F. S.(Orgs.)
Diálogos Críticos: BNCC, educação, crise e luta de classes em pauta. Porto Alegre, RS:
Editora Fi, 2019.
168

MOVIMENTOS CURRICULARES E PANDEMIA DA COVID-19: DIÁLOGOS


POSSÍVEIS ENTRE O PRESCRITO E O VIVIDO

Carlos Frederico Jordão Ghidini


carlos.ghidini@edu.ufes.br
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

Adriana Sperandio Martinelli


adrianasperandio@yahoo.com.br
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

Rosangela Gabry do Carmo


rosangela.gabry@hotmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

INTRODUÇÃO

O presente estudo, vinculado ao Programa de Pós-Graduação de Mestrado Profissional em


Educação da Universidade Federal do Espírito Santo, buscou compreender os movimentos
constituídos por uma escola de Ensino Médio da Rede Estadual do Espírito Santo para o trato
com as questões curriculares no período de isolamento social produzido pela Pandemia da
COVID-19. A unidade de ensino se encontra localizada no Bairro Nova Rosa da Penha, no
município de Cariacica-ES, e conta com aproximadamente 600 alunos no Ensino Médio, com
equipe composta por 50 profissionais do magistério e 20 de apoio escolar. O território no
entorno retrata a realidade das comunidades situadas nos bairros de periferia, compostas por
famílias com renda igual ou inferior a três salários-mínimos, em vulnerabilidade social.

Com a pandemia da COVID-19, a unidade de ensino desenvolveu estratégias para o


planejamento e a mediação curricular e buscamos, nesse estudo, refletir sobre os processos de
reinvenção da escola para o enfrentamento de questões que emergem do cotidiano social e que
implicam o direito social à Educação.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa qualitativa que se realiza por meio dos pressupostos do estudo de
caso. Segundo André (2013), o método busca pela produção de conhecimentos sobre um certo
elemento colocado em análise, estabelecendo relações entre ele e situações mais amplas que o
afetam. Segundo a autora, “[...] estudos de caso podem ser usados em avaliação ou pesquisa
169

educacional para descrever e analisar uma unidade social, considerando suas múltiplas
dimensões e sua dinâmica natural” (ANDRÉ, 2013, p. 97).

Os dados foram coletados em dezembro de 2020, por meio dos seguintes procedimentos: a)
pedido de autorização à gestão da escola; b) aplicação de questionário por meio do formulário
google. Participaram da pesquisa profissionais da escola e estudantes do Ensino Médio, com
adesão de 100% dos professores e 60% dos estudantes. O questionário apresentava algumas
questões de múltipla escolha e outras abertas, organizadas em sessões, contemplando aspectos
emocionais, sociais e econômicos, além de sessão específica voltada para os processos de
ensino-aprendizagem.

Os dados foram organizados em categorias e analisados à luz de referenciais teóricos dedicados


a estudar a gestão da escola e os currículos, apontando possibilidades para a escola refletir sobre
seus movimentos e o que pode/precisa ser realizado com os estudantes para enfrentamento das
questões trazidas pelo ensino remoto e o isolamento social.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os dados do estudo apontam que a unidade de ensino buscou constituir um conjunto de ações
para o trabalho com o currículo do Ensino Médio, considerando o período de isolamento social
produzido pela Pandemia da COVID-19. Destacamos, a partir da análise das respostas aos
formulários, três questões: a) a reorganização curricular; b) a criação de estratégias pedagógicas
para promover a acessibilidade curricular pelos estudantes; c) o processo de mediação realizada
pelos profissionais da escola para o trato das questões curriculares.

Sobre a primeira questão - a reorganização curricular - a unidade de ensino buscou selecionar


os conteúdos a serem trabalhados com os estudantes de modo a explorá-los por meio de áreas
de conhecimento e não de disciplinas. Os dados apontaram que a escola promoveu uma seleção
de conteúdos, buscando articulá-los aos debates sobre a Pandemia da COVID-19. A
reorganização curricular demandou ações coletivas pela escola, bem como reflexões sobre o
que se colocava primordial à formação dos estudantes, considerando que, com o retorno ao
ensino presencial, seria necessário retomar conteúdos frente à problemática trazida pelo
isolamento social no trabalho pedagógico realizado com os estudantes do Ensino Médio.

A análise de uma pedagoga sinaliza o desafio vivido pela escola: “[...] como trabalhar o
currículo durante o período de isolamento social? Reorganizar o currículo foi um dos grandes
170

desafios que a pandemia nos trouxe, inclusive porque sabíamos que teríamos que trabalhar com
um continuum curricular. Mas o que ensinar? O que era essencial?”. Diante da provocação,
concordamos com Paraíso (2015, p. 52), quando problematiza que o trabalho com os currículos
precisa ser movido pela diferença, considerando que “[...] tudo metamorfoseia, para levar vida
a um currículo. É necessário que algo aconteça, toque e que convenha para a vida daqueles/as
que ali estão”.

A segunda questão de análise trazida pelos dados se relaciona às estratégias metodológicas


adotadas pela escola (em consonância com as orientações da Secretaria de Estado da Educação)
para o trabalho com os currículos no período de isolamento social produzido pela Pandemia da
COVID-19.

Desde o fechamento das escolas, em março de 2020, o ensino remoto passou a fazer parte da
vida dos estudantes da Rede Estadual do Espírito Santo, por meio do Programa Escolar que se
efetivou por intermédio de aulas pela TV, mediante convênio de cooperação firmado com a
Rede Estadual do Amazonas. Tal política gerou desconforto entre os profissionais da educação,
pois as aulas não retratavam a realidade capixaba. Esse “entrave” levou o governo do Estado a
criar o Programa Ideação, ou seja, aulas elaboradas pelos professores da rede Estadual do
Espírito Santo que foram gravadas em estúdio e socializadas com os alunos.

Além disso, atividades impressas foram produzidas para que os estudantes retirassem na escola
e as levassem para casa, assim como a criação de um aplicativo (um tipo de plataforma digital)
para a cessão de vídeos, atividades, textos e outros recursos necessários para o trabalho
curricular do Ensino Médio. Essas estratégias foram avaliadas pelos estudantes, professores e
familiares, considerando a democratização da escola que se efetiva pela participação coletiva,
de modo que o envolvimento de cada pessoa venha expressar os interesses da sociedade local
(PARO, 1998).

O último eixo de análise traz o processo de mediação realizada pelos profissionais da escola
para o trato com as questões curriculares. Destacam-se: reuniões remotas realizadas entre
professores, pedagogos e a gestão da escola para o planejamento curricular. Além disso, a
utilização de mídias e estratégias para a realização das aulas e acompanhamento aos alunos.
Foram criados grupos de WhatsApp para cada turma e para os responsáveis pelos estudantes.
Como dito, muitas aulas foram gravadas e socializadas, assim como atividades impressas
171

disponibilizadas nas escolas, com professores buscando a mediação entre os currículos e os


estudantes.

O processo de mediação evidenciou que os professores buscaram compor articulações


pedagógicas para apoiar os estudantes nos processos de apropriação do conhecimento,
considerando os desafios trazidos pelo isolamento social. Buscaram, mesmo com vários
desafios, reafirmar a função social da escola, a formação humana, a importância das
reinvenções curriculares e o respeito às diferenças e às subjetividades.
O envolvimento dos professores na formação dos estudantes nos leva a concordar com Macedo
(2018, p. 752) quando afirma que o trabalho com os currículos perpassa pelo compromisso com
a formação do outro e pela ideia de que tal ação “[...] só existe incrustado na própria diferença
diferenciante, na diferença diferenciando, com a alteridade já emaranhada na tessitura do
endereçamento”.

CONCLUSÃO

O estudo evidencia o quanto é primordial prescrutar o momento da Pandemia para repensar


políticas públicas de educação, dentre elas, os currículos e a relação humanizadora e aberta às
demandas/mudanças advindas da realidade social. Dentre essas mudanças, emerge uma maior
aproximação entre escolas, mídias digitais e linguagens midiáticas, sempre em diálogo com a
prática pedagógica.

Os desafios da educação pública não são poucos, no entanto, acrescido pelos efeitos da
Pandemia da COVID-19, adaptações curriculares tiveram que ser repensadas e/ou adaptadas no
contexto escolar. Entendemos que, diante dessa realidade imposta pelo distanciamento social
das pessoas, novos percursos e diferentes formas de ver, sentir e desenvolver as atividades
escolares produziram necessárias mudanças no âmbito das dimensões administrativas,
financeiras e pedagógicas da escola, que nos impulsionou e nos provocou o repensar sobre as
práticas participativas, dialógicas e democráticas com todos os envolvidos no processo
educacional.

Sendo assim, novas trilhas organizacionais de gestão escolar e ações no âmbito do planejamento
didático e curricular desse contexto educacional contaram com articulações didáticas para o tão
sonhado retorno do ensino presencial. Foi a partir desse currículo vivido que a avaliação das
atividades planejadas norteou o Plano de Ação da Unidade de Ensino e demais projetos
educacionais para os estudantes, profissionais, Conselho de Escola e comunidade local.
172

Nesse sentido, a escola analisada percorreu caminhos mediados pelo diálogo, acompanhamento
e avaliação desses tempos/espaços apresentados, objetivando a qualidade do ensino público, o
acesso, a permanência e aprendizagem dos discentes.

Sabemos que não podemos “voltar” a uma “vida normal” (nem sabemos se um dia a tivemos),
pois ações e prioridades tiveram que ser reinventadas/implementadas no novo cenário causado
pela Pandemia da COVID-19, que vão desde os investimentos financeiros municipais, estaduais
e federais à aquisição de equipamentos tecnológicos e didáticos adquiridos pela verba do
Conselho de Escola.

Assim, a Educação, como direito público social e subjetivo, precisa ser sustentada por políticas
públicas educacionais, tendo em vista a formação integral dos estudantes, a apropriação do
conhecimento e a formação para a cidadania. Compreender que somos pertencentes a esse
espaço social e educacional nos possibilita refletir em prol de uma sociedade mais significativa
e menos excludente e desigual.

REFERÊNCIAS

ANDRÉ, Marly. O que é um estudo de caso qualitativo em Educação? Revista da FAEEBA


– Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 22, n. 40, p. 95-103, jul./dez. 2013.

MACEDO, Elizabeth. O currículo no portão da escola. In: MACEDO, Elizabeth;


RANNIERY, Thiago (Orgs.). Currículo, sexualidade e ação docente. Petrópolis, RJ: DP et
Alii, 2017.

PARAÍSO, Marlucy Alves. Um currículo entre formas e forças. Educação (Porto Alegre,
impresso), v. 38, n. 1, p. 49-58, jan./abr. 2015.

PARO, Vitor Henrique. A gestão da educação ante as exigências de qualidade e produtividade


da escola pública. In: SILVA, Luiz Heron da (Org.). A escola cidadã no contexto da
globalização. 1ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
173

ARTICULAÇÃO INTERGOVERNAMENTAL E CORRESPONDÊNCIA ÀS


LEGISLAÇÕES NACIONAIS: UMA PROPOSTA DECOLONIAL SOBRE A
TRAJETÓRIA DA MULHER NEGRA

Janneyde Pascoal Silva


Professora efetiva SEDU/ES
Mestranda PPGEH/Ifes
janneyde35@gmail.com

Rodrigo Ferreira Rodrigues


Professor Permanente PPGEH Ifes.
rodrigo.rodrigues@ifes.edu.br

Aldieris Bras Amorim Caprini


Professor Permanente PPGEH Ifes.
aldieris@hotmail.com

INTRODUÇÃO

A disciplina eletiva foi prevista na legislação do Novo Ensino Médio em consonância com a
nova BNCC (Base Nacional Curricular Comum) e compõe o grupo de componentes
integradores do novo currículo do Estado do Espírito Santo. Por meio delas serão desenvolvidas
temáticas que se articulem com os componentes curriculares juntamente com os interesses e
projetos de vida dos estudantes. Segundo as diretrizes pedagógicas da secretaria de educação
do Espírito Santo, SEDU (2021, p.22), “as eletivas ocupam um lugar central no que tange à
diversificação das experiências escolares, oferecendo um espaço privilegiado para a
experimentação, a interdisciplinaridade e o aprofundamento dos estudos”.

Essa experiência de ensino foi realizada na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio
“Misael Pinto Netto”, localizada no município de Aracruz. A escolha seguiu a partir da
apresentação das propostas para todas as turmas do matutino e vespertino e os alunos se
inscreveram em diversos componentes e atividades ofertadas segundo seus interesses.
Uma das atividades propostas como eletiva concentrou-se em refletir sobre o lugar e papel das
mulheres negras tema que não surge como uma simples demanda associada a necessidade de
se pensar numa temática para a disciplina. Ela nasce, fruto de anos de escuta e de outro trabalho
já realizado na escola, onde meninas, na sua maioria negras, compunham um grupo mediado
por psicólogas denominado “Cuide-se”.
174

O projeto que tinha como estratégia a escuta e diálogo de questões voltadas para a autoestima,
violência psicológica e física e empoderamento seguiu como uma dinâmica que favorecesse a
ideia de pertencimento a unidade escolar, empatia e sororidade. A contribuição desse estudo se
encontra no entendimento da própria realidade de forma a encorajar a participação social, muita
das vezes inibida pelo vazio da informação.

Diante das inúmeras possibilidades de temáticas a serem trabalhadas, deseja-se verificar a


seguinte questão: é possível, por meio dessas atividades eletivas favorecer a diversificação da
experiência escolar a partir de uma reflexão decolonial acerca da trajetória da mulher negra no
Brasil?

METODOLOGIA

A eletiva teve início com a construção da árvore genealógica a partir das memórias e histórias
orais contadas por seus familiares, leituras da história “A eterna luta das mães negras” de Maciel
de Aguiar (1995), pesquisa e socialização de histórias de mulheres negras, tais como Elza
Soares, Ruth Rocha, Antonieta de Barros, Carolina Maria de Jesus, Dandara, dentre outras, que
se tornaram símbolo de resistência e identidade negra.

Como uma forma de interação com toda a escola e familiares foi realizado a produção e
divulgação de cartaz sobre a origem do nome “bolo da nega maluca”, textos e poemas sobre o
dia internacional da mulher, socialização da história e confecção das bonecas abayomi, bem
como, reflexão com as famílias sobre suas impressões sobre as mesmas.

Foram realizados momentos de debates e reflexão por meio da análise de vários vídeos que
tratavam de reflexões sobre empoderamento feminino negro, a valorização do cabelo afro e as
mudanças na indústria dos cosméticos, pensamentos da filósofa Djamila Ribeiro, análise
reflexiva do filme “Felicidade por um fio”, que traz à tona questões muito pertinentes como
autoconhecimento, empoderamento e preconceito.

Como encerramento tivemos um momento com uma exposição de um ensaio fotográfico de


algumas de nossas alunas negras, a socialização do caderno de memórias que foi construído ao
longo do trimestre e, por fim, um e-book com algumas das produções realizadas em sala de
aula.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
175

A primeira proposta de construção de identidade na eletiva foi apresentada por uma psicóloga
que desenvolveu uma vivência onde os (as) estudantes foram convidados a montarem sua
árvore genealógica fora do padrão europeu, onde valorizou-se a memória e as histórias orais
contadas por seus parentes em detrimento ao uso exclusivo de documentos escritos. Essa
proposta foi materializada por meio de palavras escritas que representavam essas lembranças.

Nas palavras de Galvão (2005, p.330) “Histórias orais dão passado histórico às pessoas nas suas
próprias palavras”. A proposta conseguiu atingir essa finalidade, e ainda mais, o exercício de
ouvir a história do outro fez emergir o sentimento de empatia, em virtude de aproximações de
experiências parecidas relacionadas ao alcoolismo e violência.

Seguindo a intencionalidade da abordagem decolonial acerca da história da mulher em nosso


país, Mignolo (2003, 2010), Maldonado-Torres (2007), Restrepo; Rojas (2010) trazem um
conceito fundamental para a efetivação dessa eletiva como tentativa de rompimento com as
heranças coloniais. Trata-se da ideia de colonialidade do ser que pode ser definida como uma
realidade do mundo moderno colonial, onde um grupo de pessoas passam a ser inferiorizadas
segundo critérios estabelecidos pelo colonizador, logo, uma forma de se destituir a existência
humana através da criação de estereótipos.

Estabelecido por meio de diferenças que visam inferiorizar grupos através de um processo de
desumanização e pela perda da essência do ser, a colonialidade do ser visivelmente se manifesta
ainda hoje através dos altos índices de violência contra mulheres negras, situações onde as
mesmas são vítimas de racismo, além da dificuldade de romperem com o ciclo da exclusão
expressos nos dados de escolaridade e salários nas pesquisas do IBGE.

Momentos de estudo, debate e reflexão como este, possibilitam desenvolver a percepção sobre
si mesmo, a confiança em suas próprias capacidades, questionando a realidade, aprendendo a
se posicionar contra a discriminação e compreendendo a cidadania enquanto participação social
e política.

Conhecer histórias de superação e conquistas contribuiu para reflexão e crítica/autocrítica para


muitas falas e experiências socializadas que abarcavam subtemática como: sexualidade,
religiosidade, estereótipos, autoaceitação, mundo da moda, violência virtual, empoderamento,
dentre outras. Uma prova de que o conhecimento se constitui a melhor arma contra a violência,
a discriminação e a ignorância, abrindo espaços para reflexão sobre a democracia racial e,
sobretudo para a construção de um país com menos injustiças e desigualdades.
176

Figura 134 Figura 235 Figura 336

CONCLUSÃO

Uma proposta de reflexão e estudo com duração de um trimestre escolar não finda a necessidade
emergente de se pensar em como a historiografia oficial ainda pautada pela história de um único
continente e em como a diversidade cultural ainda é tão silenciada em nome de um
monoculturalismo justificado pela mestiçagem e pelo mito da democracia racial em nosso país,
porém se constitui uma marca de resistência, uma voz que ecoa em meio a tamanha violência
imposta a grupos, como as mulheres negras, negligenciadas pelo currículo oficial.

A experiência indica também uma importante percepção de articulação intergovernamental na


implantação dos currículos atendendo a legislações nacionais e subnacionais quando se
implanta a BNCC sem negar os princípios que regem a Lei Nº 11.645, de 10 março de 2008,
bem como o Plano Nacional de Educação (Lei 13005/2014) no que tange à educação étnico
racial para as diversidades.

Compreende-se, dessa forma a necessária articulação de um Sistema Nacional de Educação que


atenda às expectativas institucionais e legais das legislações nacional e da BNCC em particular
em consonância com as demandas e necessidades locais mais específicas.

REFERÊNCIAS
GUIAR, Maciel de. Constância d'Angola : a eterna lutadas mães negras. São Mateus, ES: Ed.
Brasil-Cultura: Centro Cultural Porto de São Mateus, 1995.
BRASIL. Lei nº 11.645, de 10 de marco de 2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de
1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e

34
Bonecas Abayomi confeccionadas durante a eletiva.
35
Dinâmica realizada a partir da apresentação da proposta da eletiva.
36
Produção de árvore genealógica construída com base nas memórias e histórias contadas por seus familiares.
177

bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a


obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Brasília:
Presidência da República, 2008. Disponível em:
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2008/lei-11645-10-marco-2008-572787-
publicacaooriginal-96087-pl.html . Acesso em: 10 mar. 2022.
BRASIL. Lei nº Lei nº 13.005, 25 de junho de 2014. Aprova o Plano nacional de Educação -
PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF., 26 de junho de 2014.
Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm.
Acesso em: 20 ago. 2022.
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em:
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2022.
GALVAO, Cecília. Narrativas em educação. Ciência educ. [online]. 2005, vol.11, n.02,
pp.327-345. ISSN 1516-7313. Disponível em
http://educa.fcc.org.br/pdf/ciedu/v11n02/v11n02a13.pdf. Acesso em:15abr. 2022.
MALDONADO-TORRES, N. Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de
un concepto. El giro decolonial. Reflexiones para una diversidad epistémica más allá del
capitalismo global, p. 127-167, 2007.
MIGNOLO, W. Historias locales/disenos globales: colonialidad, conocimientos subalternos
y pensamiento fronterizo. Madrid: Akal, 2003.
RESTREPO, E.; ROJAS, A. Inflexión decolonial: fuentes, conceptos y cuestionamientos.
Popayán: Universidad del Cauca. 2010. Disponível em:
https://biblio.flacsoandes.edu.ec/libros/digital/43099.pdf Acesso em: 13 nov. 2016.
SEDU. Diretrizes para o ensino Médio. Vitória: SEDU, 2021.
178

SENTIDOS ATRIBUÍDOS À AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO


INFANTIL EM CONTEXTOS EMPOBRECIDOS

Shellen de Lima Matiazzi


Universidade Federal do Espírito Santo – UFES
shematiazzi@hotmail.com

Renata Duarte Simões


Universidade Federal do Espírito Santo – UFES
renasimoes@hotmail.com

Alexandro Braga Vieira


Universidade Federal do Espírito Santo – UFES
allexbraga@hotmail.com

INTRODUÇÃO:

Este estudo37 versa sobre processos avaliativos desenvolvidos por profissionais que atuam em
Centros Municipais de Educação Infantil de Vitória/ES, de modo a problematizar como se têm
considerado os contextos de vida de crianças em situação de pobreza e extrema pobreza,
refletindo sobre as desigualdades sociais existentes e os impactos provocados no contexto
escolar. Ao desenvolver o estudo, nos atentamos ao fato de aproximadamente de 11% 38 da
população da cidade de Vitória conviver em contextos de pobreza e de extrema pobreza,
todavia, buscamos abranger outras carências sociais para além da condição de renda.

Dessa forma, questionamos como as escolas têm considerado as vivências da pobreza e da


extrema pobreza nos processos avaliativos, uma vez que, no percurso histórico da humanidade
e das instituições escolares, a avaliação sempre esteve associada à mensuração das
aprendizagens, constituindo-se como mecanismo de classificação entre aqueles que aprendem
e não aprendem, ampliando as desigualdades sociais e cognitivas, excluindo aqueles que não
conseguem obter os resultados preestabelecidos, estando, nesse último grupo, muitos estudantes
atravessados pela pobreza e extrema pobreza (ESTEBAN, 2006).

Assim, elaboramos reflexões sobre os processos avaliativos e suas consequências sociais,


analisando os modos como eles desconsideram as realidades sociais e culturais e impactam a

37
Proveniente da pesquisa de Mestrado “Avaliação da Aprendizagem na Educação Infantil e os contextos de vida
de crianças empobrecidas na cidade de Vitória-ES”, defendida no Programa de Pós-Graduação de Mestrado
Profissional em Educação da Ufes.
38
Dados referentes as famílias cadastradas e beneficiárias do Programa Bolsa Família no ano de 2020 na cidade
de Vitória, conforme disponível no sítio virtual do Ministério da Cidadania.
179

vida das crianças. Salientamos que, na Educação Infantil, com base na legislação vigente (Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 e a Resolução CNE/CEB nº 05/2009),
a avaliação da aprendizagem deve ser realizada por meio de instrumentos de registros
descritivos de caráter processual e contínuo, com o objetivo de refletir sobre os percursos de
aprendizagem. No entanto, observa-se que as práticas classificatórias e seletivas de avaliação
de outras etapas/níveis de ensino têm adentrado a etapa de ensino da Educação Infantil,
desconsiderando as especificidades da infância e desse nível escolar.

Diante disso, torna-se necessário fortalecer os saberes-fazeres dos profissionais que atuam na
Educação Infantil e as propostas pedagógicas das unidades de ensino para compreender a
criança a partir de suas especificidades e problematizar os modos como as práticas avaliativas
e os relatórios descritivos consideram os contextos de vida das crianças, dentre vários aspectos,
as vivências da pobreza e da extrema pobreza. Assim, é fundamental reconhecer a existência
das desigualdades sociais e os modos como elas estão vinculadas ao contexto escolar,
objetivando contribuir com modos diferenciados de se pensar a avaliação no contexto da
formação de crianças na primeira infância.

METODOLOGIA

O estudo se utiliza dos pressupostos da pesquisa qualitativa e da pesquisa-ação. Tal método


busca constituir alternativas para problemáticas existentes no campo investigado, compondo
processos reflexivos e a interação entre pesquisador e participantes, mostrando-se como uma
possibilidade formativa (FRANCO; BETTI, 2018). Como procedimentos, foram adotados: a)
solicitação aos órgãos competentes (SEME Vitória e escolas) e aos participantes; b)
constituição de processos de formação continuada para estabelecer diálogos sobre a avaliação,
a Educação Infantil e os contextos de vida das crianças em situação de pobreza e extrema
pobreza.

Participaram da pesquisa-formação, 27 profissionais que atuam na Educação Infantil. Todos


assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Selecionamos profissionais de três
unidades de ensino e com eles realizamos movimentos formativos-participativos-reflexivos-
propositivos. Os dados foram assim armazenados: gravação em vídeo e áudio; registros das
narrativas em diário de campo; elaboração de atividades com os participantes sobre os debates
realizados.
180

A pesquisa acabou por constituir um curso de extensão, organizado em sete encontros


presenciais e com atividades não-presenciais, realizado no período de março a julho de 2019.
Para tanto, foram desenvolvidas rodas de conversa, palestras, atividades em grupos, debate
sobre as legislações nacionais e municipais relacionadas à avaliação da aprendizagem na
educação infantil e a análise de relatórios descritivos de crianças matriculadas nos CMEI da
rede de ensino de Vitória-ES. Para o tratamento dos dados, realizou-se a transcrição dos
encontros, a leitura e a análise das atividades realizadas pelos participantes e, por fim, o
entrecruzamento dos dados com o referencial teórico para discutir as interrelações entre
avaliação, educação infantil e contextos empobrecidos.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A pesquisa-formação buscou considerar o direito à educação para as crianças pequenas no tripé:


acesso, permanência e aprendizagem com qualidade socialmente referenciada, direcionando
atenção para as práticas avaliativas. Para tanto, desencadeou debates sobre a avaliação em três
perspectivas: a) a avaliação e contextos políticos e a legislação; b) a avaliação e a documentação
pedagógica; c) a avaliação e a produção textual a partir da análise de relatórios descritivos.

Discutiu-se com o grupo, a avaliação da aprendizagem na educação infantil na interface com a


legislação educacional vigente, conferindo a importância de se considerar as subjetividades
infantis, os modos de pensar e de agir de crianças, suas experiências de vida, abrindo espaços
para problematizar os contextos sociais nos quais as crianças estão inseridas. Além disso, pôde-
se refletir sobre a avaliação e a documentação pedagógica e a importância de se documentar as
vivências das crianças e os processos constituídos no âmbito escolar, superando a ideia da
avaliação que se finda em um relatório, mas que se constitui como um percurso de
aprendizagem. Assim, adentrou-se em debate sobre caminhos alternativos para se registrar os
processos de avaliação na Educação Infantil: diário de campo, anedotários, vídeos, fotografias,
murais e afins.

Por fim, constituíram-se reflexões sobre a produção de relatórios descritivos. Notou-se a


necessidade de se aprofundar (com os professores) os diálogos sobre como os relatórios são
pensados, sistematizados, registrados, como transitam no ambiente escolar e são apresentados
às famílias. Abriram-se oportunidades para se refletir sobre os impactos da pobreza e da
extrema pobreza na formação das crianças e sobre práticas para o enfrentamento do fenômeno,
ganhando espaço as avaliações formativas.
181

Além dos momentos formativos dialógicos, os participantes realizaram a análise de cinco


relatórios descritivos. Para tanto, foram organizados em pequenos grupos. Nesta análise,
perceberam o uso de critérios de classificação/seleção na avaliação da Educação Infantil, tais
como: bom/razoável, alcança/não alcança, sabe/não sabe. Tais classificações expressam um
caráter classificatório e seletivo que, para Hoffmann (2012), desconsideram-se os saberes
trazidos pelas crianças, as mediações realizadas, os movimentos de escuta, as várias
possibilidades de observações docentes e os modos como a criança interage com os outros
sujeitos e com os espaços. Os critérios mencionados estabelecem relações de comparação entre
as crianças e processos de classificação, como destaca uma cursista: “[...] dependendo da
escrita, a professora está aprovando ou reprovando, [agindo] na mesma perspectiva da nota, é
a mesma coisa” (PEDAGOGA, 2019).

A pesquisa-formação evidenciou que mesmo sem usar notas, a avaliação da aprendizagem na


educação infantil tem se aproximado da perspectiva classificatória, comparando as crianças em
termos de desempenho (HOFFMANN, 2012). Para os participantes, os relatórios descritivos
não têm considerado a perspectiva curricular pensada para a educação infantil e ainda indicam
a concepção de criança como um sujeito passivo e pouco participativo nos processos
pedagógicos. Tampouco evidencia-se estratégias que possibilitassem às crianças que vivem em
contexto de pobreza e de extrema pobreza mais alternativas para terem seus direitos à Educação
resguardados.

CONCLUSÃO

O estudo destaca a necessidade do debate acerca da avaliação da aprendizagem na educação


infantil, pensando em movimentos de ação e reflexão sobre práticas educativas-avaliativas que
considerem as subjetividades infantis. Por meio da pesquisa-formação foi possível adensar o
conhecimento docente sobre práticas avaliativas, os contextos sociais das crianças
empobrecidas, as alternativas de registro pedagógico e o respeito às subjetividades infantis,
evidenciando processos educativos e avaliativos mais democráticos e inclusivos.

Para os profissionais envolvidos na pesquisa, ao se compreender que as crianças possuem


saberes e experiências diversas e que precisam ser consideradas nas práticas escolares, é
imprescindível romper com perspectivas de avaliação padronizadas e fundamentadas em um
modelo a ser seguido dentro de um padrão a ser atingido pelas crianças. Diante disso, entendem
a necessidade de se dar centralidade às crianças no processo educativo, assumindo que a escola
182

possui uma função política e social possível de provocar mudanças nas vidas desses sujeitos,
quando as ações pedagógicas pensam as realidades dessas crianças (ARROYO, 2019).

REFERÊNCIAS

ARROYO, M.G. Imagens Quebradas. Rio de Janeiro: Vozes, 2019.

BRASIL. Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em:


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm. Acesso em: 14 ago. 2022.

BRASIL. Resolução nº 05 de 20 de dezembro de 2009. Dispõe sobre as diretrizes


curriculares nacionais para a educação infantil. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=2298-
rceb005-09&category_slug=dezembro-2009-pdf&Itemid=30192. Acesso em: 14 ago. 2022.

ESTEBAN, M. T. O que sabe quem erra. Rio de janeiro: DP&A, 2006.

FRANCO, M. A. S.; BETTI, M. Pesquisa-ação: por uma epistemologia de sua prática. In:
FRANCO, M. A. S; PIMENTA, S. G. (Orgs.). Pesquisa em educação: a pesquisa-ação em
diferentes feições colaborativas. São Paulo: Edições Loyola, 2018, p.15-24.

HOFFMANN, J. Avaliação e educação infantil: um olhar sensível e reflexivo sobre a


criança. Porto Alegre: Mediação, 2012.
183

UM ESTUDO COMPARADO ENTRE EXAMES ESTANDARDIZADOS DOS


ESTADOS DO ESPÍRITO SANTO E DA BAJA CALIFÓRNIA: DIFERENÇAS E
APROXIMAÇÕES ENTRE PAEBES E EXEIMS-BC

Ian Puppin Lopes


Universidade Federal do Espírito Santo
ian123569@gmail.com

Heitor Lopes Negreiros


Universidade Federal do Espírito Santo
heitornegreiros@gmail.com

Wagner dos Santos


Universidade Federal do Espírito Santo
wagnercefd@gmail.com

INTRODUÇÃO

Os exames estandardizados, também conhecidos como exames padronizados, em larga escala


e de sistemas, constituem-se como ferramentas avaliativas dos sistemas educativos de
diferentes países, como avaliações nacionais (a exemplo do Enem, no Brasil, e do Enlace, no
México) e internacionais (como o Pisa, da OCDE). Esses exames têm como intuito balizar
políticas, programas, projetos e ações educativas em âmbito macro (nacional) e micro
(estaduais, municipais e das unidades de ensino).

Chama-nos a atenção os exames que acontecem no estado do Espírito Santo (Brasil), o


Programa de Avaliação da Educação Básica do Espírito Santo (Paebes), e no estado da Baja
California (México), o Exemen Estatal de Ingreso a Media Superior (Exeims-BC), pois são
representativos do estabelecimento de uma cultura político-educacional para a América Latina.
Esse movimento foi constituído a partir de demandas externas, principalmente com a influência
dos organismos multilaterais (Banco Mundial, OCDE e FMI, para citar alguns) nesses países
desde a década de 1990.

Assim, o estado do Espírito Santo (Brasil), vem desenvolvendo e aprimorando o Paebes desde
2000 que tem como principal objetivo “[...] avaliar o desempenho da rede pública estadual de
ensino fundamental e médio” (ESPÍRITO SANTO/SEDU, 1999, p. 13). O estado da Baja
California implementou o Exeims-BC em 2012, com o objetivo de: “[...] fornecer algumas
características específicas potenciais dos alunos para ingressar no nível MS [Médio Superior]”
(BAJA CALIFORNIA, 2012).
184

Destacamos que tanto o Brasil como o México se constituem como Estados Federados, ou seja,
possuem uma organização estatal federativa com a divisão de competências e responsabilidades
entre os entes que os constituem. No Brasil existem três entes federados: União, estados e
municípios. No México existem dois: Federação e os estados. Um ponto de congruência entre
os países se dá na educação, pois tanto no México como o Brasil é de responsabilidade dos
estados a oferta: do ensino médio, no Brasil e da educação primária e secundária, no México.

Diante do exposto, objetivamos realizar uma análise comparativa entre o Paebes e o Exeims-
BC a partir de duas categorias: Histórico e Estrutura das provas.

Este trabalho se justifica pela necessidade de ampliação de pesquisas que discutem os exames
estandardizados nas políticas de avaliação e por não termos encontrado produções acadêmicas
que comparem esses exames.

METODOLOGIA

Caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa, de natureza crítico-documental (BLOCH, 2001)


e se fundamenta no método comparado (BLOCH, 1998), tendo como fontes os documentos
oficiais produzidos com o intuito de regulamentar e direcionar as ações do governo do estado
do Espírito Santo em relação ao Paebes, bem como do governo do estado da Baja California
em relação ao Exeims-BC. Esses documentos foram obtidos mediante consultas aos websites
dos respectivos governos estaduais.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Histórico do Paebes e do Exeims-BC

As análises preliminares dos documentos referentes ao Paebes e do Exeims-BC, nos


possibilitou organizar a Figura 1, considerando os anos de implementação e de continuidade
das políticas avaliativas conforme as suas fases. Diante disso, são apresentadas possibilidades
de análise comparativa entre os exames.
185

Figura 1 – Linha do tempo dos exames Paebes e Exeims-BC


Elaborada pelos autores.

Entre os anos dos exames encontramos as seguintes diferenciações: a) antes da primeira edição
oficial do Exeims-BC foram feitos dois testes pilotos, o que não ocorreu com o Paebes; b) os
exames foram implementados em anos diferentes, o Paebes em 2000 e o Exeims-BC em 2012;
c) O Paebes ocorria de quatro em quatro anos em suas três primeiras edições e o Exeims-BC
anualmente, desde a sua criação; d) de 2000 a 2009 só existia o Paebes (que ocorria no final do
ano), em 2009 iniciou o Paebes-Alfa (voltado para a alfabetização) e em 2015 o Paebes-Tri
(aplicado pelos próprios professores), o Exeims-BC sempre foi um exame único.

Nesse sentido, em relação às aproximações entre eles, encontramos: a) ambos os exames


ocorrem anualmente; b) os dois exames nascem de um contexto que tem a demanda
internacional como um dos pontos de partida; c) são dois exames que avaliam a educação
estadual; d) os dois exames ocorrem em países latino-americanos e federativos.

Todavia, os objetivos que norteiam os exames se diferenciam: enquanto o Paebes busca avaliar
o desempenho da rede pública estadual de ensino fundamental e médio de uma maneira ampla,
o Exeims-BC objetiva fornecer características específicas potenciais dos alunos para o ingresso
no nível Médio Superior. Mesmo que ambos possam fornecer elementos para a elaboração de
políticas educacionais, o Exeims-BC não tem isso como um dos seus focos explícitos, como o
faz o Paebes.

Estrutura das provas do Paebes e do Exeims-BC


186

Os exames apresentam uma configuração diferente de acordo com sua proposta e


funcionalidade. Notamos como diferenças: as séries avaliadas, anos de aplicação, quantidades
de vezes aplicadas ao ano, número de questões, áreas, disciplinas avaliadas e o formato de
aplicação, conforme Quadro 1:

Quadro 1 – Estrutura do Paebes e do Exeims-BC

Elaborada pelos autores.

Em relação ao número de questões, encontramos uma quantidade parecida: 144 do Paebes e


140 do Exeims-BC. Todavia, destacamos que o Paebes é destinado ao 5º e 9º ano do ensino
fundamental e 3ª série do ensino médio, e o Exeims-BC é aplicado no último ano da educação
secundária, o que evidencia a processualidade do Paebes no que tange aos finais de ciclo e da
pontualidade do Exeims-BC ao avaliar o aluno na conclusão da educação média mexicana.

Ademais, o Paebes Alfa e o Paebes Tri têm menos da metade das questões do Exeims-BC, esse
processo pode ser explicado ao levarmos em consideração o objetivo desses exames: o Paebes
Alfa avalia o processo de alfabetização dos anos iniciais do ensino fundamental e o Paebes-Tri
se caracteriza como uma avaliação trimestral para o acompanhamento da aprendizagem dos
alunos pela escola e pelo professor (é aplicado e corrigido pelos professores).

Nas áreas e disciplinas avaliadas observamos a ênfase em linguagem e em matemática tanto no


Paebes, como no Exeims-BC. O ponto de maior divergência é o formato, enquanto o Paebes
ocorre de forma presencial, o Exeims-BC possui o formato digital.

CONCLUSÃO
187

O Paebes e o Exeims-BC possuem características que os aproximam, sendo a principal delas se


tratar de exames estandardizados de estados que compõem países federativos. Todavia, as
distinções entre eles são mais relevantes.

Em relação ao tempo de existência, o Paebes ocorre há 22 anos, enquanto o Exeims-BC, há 10.


Entendemos que há maior amadurecimento do Paebes em relação ao Exeims-BC, ao
considerarmos a temporalidade como critério. Entretanto, isso não significa que o Paebes tenha
encontrado o seu formato definitivo, haja vista a criação das versões Paebes-Alfa e Paebes-Tri
como seus desdobramentos.

Além disso, há maior clareza na finalidade do Exeims-BC, que foi desenvolvido para permitir
aos estudantes o ingresso no ensino Médio Superior (equivalente ao nosso ensino técnico), do
que no Paebes, que tem como função avaliar o desempenho da rede pública estadual com vistas
à melhoria da qualidade da educação. No que tange à qualidade, esta se constitui como foco de
críticas entre os pesquisadores (LIMA; FASSARELLA, 2021), pois não fica claro o que se
compreende por qualidade, tampouco há a participação dos professores na elaboração das
provas e da política de avaliação como um todo. Por fim, destacamos a política de bonificação
dos professores baseada no resultado do Paebes como uma característica primordial dessa
política, o que não acontece no caso do Exeims-BC.

REFERÊNCIAS

BLOCH, M. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,


2001.
BLOCH, M. Para uma história comparada das sociedades europeias. In.: BLOCH, M.
História e historiadores. Lisboa: Teorema, p. 119-150, 1998.
ESPÍRITO SANTO. Secretaria de Estado da Educação. Programa de Avaliação da
Educação Básica do Espírito Santo. Vitória (ES): Sedu, 1999.
GAJARDO, M. Reformas Educativas em América Latina. Balance de uma década.
Santiago: Chile, 1999.
LEONARDELI, P. B.; FLEISCHMANN, F. P. Avaliações externas no contexto das parcerias
público-privada: o Paebes capixaba como limitador da prática leitora. Humanidades &
Inovação, v. 9, n. 3, p. 92-106, 2022.
188

EXAMES ESTANDARDIZADOS ESTADUAIS PARA O ENSINO MÉDIO: UMA


ANÁLISE DO PAEBES E DO EXEIMS-BC

Kézia Alves Moreira Dutra


Universidade Federal do Espírito Santo
keziadutra@hotmail.com

Heitor Lopes Negreiros


Universidade Federal do Espírito Santo
heitornegreiros@gmail.com

Wagner dos Santos


Universidade Federal do Espírito Santo
wagnercefd@gmail.com

INTRODUÇÃO

Os exames estandardizados têm assumido um lugar de considerável relevância no delineamento


das políticas educacionais contemporâneas, no âmbito nacional. Trata-se de ferramentas
avaliativas, desenvolvidas principalmente por órgãos governamentais como forma de balizar
políticas, programas, projetos e ações educativas no âmbito escolar e comunitário.

Em sua trajetória histórica esses exames apresentaram como objetivos: promover mudanças nos
padrões comportamentais dos estudantes, dar respostas significativas às perguntas que
envolvem essas avaliações, estabelecer metas aos currículos e tomar os seus resultados como
principal indicador de qualidade das escolas e construir um banco de dados quantitativo para a
criação de padrões avaliativos nacionais com vistas à comparação com os exames
internacionais, para citar alguns.

Este trabalho se justifica pela necessidade de ampliação de pesquisas que discutem os impactos
das avaliações de sistemas nas políticas educacionais que envolvem as diferentes etapas e níveis
de ensino em contexto estadual, nacional e internacional (GATTI, 2016) e pela tímida produção
do conhecimento sobre os exames estandardizados envolvendo o estado do Espírito Santo.
Assim, objetiva analisar as especificidades, aproximações e/ou distanciamentos entre os
exames estandardizados Paebes/Brasil e o Exeims-BC/México, compreendendo e
problematizando a constituição de uma cultura política (BERSTEIN, 1998) focada nos exames
estandardizados, o período de implementação destes, levando em consideração os organismos
responsáveis por sua elaboração e natureza, correlacionando-os com as concepções que lhe
oferecem suporte.
189

Consideramos, ainda, o Sistema Educacional Brasileiro, em especial o do Ensino Médio, que


está passando por uma reconfiguração política desde a aprovação da Reforma do Ensino Médio
(Lei nº 13.415/2017), marcada pela elaboração da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
Esse documento estabelece as diretrizes dos currículos educacionais de escolas públicas e
privadas brasileiras, desconsiderando as diversidades regionais, culturais, sociais e econômicas
do país, que transcendem a escola.

Nesse sentido, também se faz necessário investigar no âmbito estadual (brasileiro e mexicano),
pois o ensino médio no Brasil é de competência dos estados de acordo com o Pacto Federativo,
presente nos artigos 21, 22, 23 e 24 da Constituição Federal Brasileira, e, no México, também
existe a competência da oferta da educação por nível da federação e dos estados. Além do mais,
a “padronização” do ensino pode afetar a autonomia da escola e dos atores que nela atuam, a
partir da limitação do desenvolvimento de ações voltadas a atender às suas especificidades.
Esses estudos podem contribuir para a construção da escola como um lugar plural, democrático
e de formação humana, pensando no fortalecimento da educação pública.

METODOLOGIA

Caracteriza-se como pesquisa qualitativa de natureza exploratória (CRESWELL; PLANO


CLARK, 2013), que assume o método comparativo (BLOCH, 2001) como abordagem teórico-
metodológica. Utilizamos como fontes os documentos que constituem os exames Paebes/Brasil
e Exeims-BC/México. Nesse caso, interessa-nos por empregar o método comparativo às
sociedades distintas, que apresentam um fenômeno compartilhado: a presença de uma política
de avaliação educacional em nível estadual que assume o exame estandardizado como
orientadora da constituição de uma cultura político-educacional. Berstein (2009, p. 31) define
a cultura política como: “[...] um grupo de representações portadoras de normas e valores que
constituem a identidade de grandes famílias políticas”.

Estabelecemos como eixos de análises: a) período de implementação; b) instituição responsável


por sua elaboração e aplicação; c) característica dos exames estandardizados por país; d)
aproximações dos exames na lógica e na sua forma de organização. Após a realização do
mapeamento inicial das categorias supracitadas, foram desenvolvidas análises em relação às
especificidades, aproximações e/ou distanciamentos entre o Paebes e o Exeims-BC.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
190

Considerando as especificidades do Paebes e do Exeims- BC, é possível estabelecer


aproximações e distanciamentos entre eles, para tanto, recorremos às classificações de como
aspectos específicos de cada exame podem ajudar a indicar as comparações e suas respectivas
análises, conforme evidenciado na Tabela 1.
Tabela 1. Sentido institucional dos exames estandardizados
Formato
Ano de Órgão Responsável/
Exames Natureza Função de
criação Atribuição
aplicação
Secretaria de Educação do Avaliar o
Espírito Santo (Sedu)/ desempenho dos
High stakes Prova
Paebes 2000 Centro de Políticas estudantes da rede
(alto risco) impressa
Públicas e Avaliação da pública do estado do
Educação (CAEd/UFJF) Espírito Santo
Sistema Estadual de
Diagnosticar o nível
Ensino (Sistema Educativo
de aprendizagem dos
Exeims- Estatal- SEE)/ Diretoria de High stakes
2012 alunos e possibilitar o Digital
BC Avaliação Educacional (alto risco)
ingresso no ensino
(Dirección de Evaluación
técnico
Educativa)
Fonte: Adaptado de Álvarez-López e Matarranz (2020, p. 87).

Ano de Criação do Paebes e Exeims-BC

Ao analisar os exames estandardizados em nível estadual (Paebes e Exeims-BC), levamos em


consideração o ano de criação. Dessa maneira, evidencia-se o período em que foram realizados
os testes desses exames, a sua implementação e quando foi reformulado. Feito isso, foi possível
comparar esses dois estados e compreender as aproximações e distanciamentos entre eles,
através de indícios oferecidos ao analisar os documentos.

Órgão Responsável/Atribuição pelo Paebes e Exeims-BC

Baseado na Tabela 1, identificamos que para a realização desses exames estandardizados


existem órgãos responsáveis por coordenar as políticas gerais de avaliação dos sistemas
educativos, bem como a divulgação de informações a respeito delas (ÁLVAREZ-LÓPEZ E
MATARRANZ, 2020, p. 88). Além dos órgãos responsáveis, existem aqueles que colaboram
para a realização da avaliação no estado do Espírito Santo/Brasil, como, por exemplo,
destinando verbas (Sedu) e/ou atuando como apoio para a elaboração e divulgação dos
resultados dos exames (CAEd/UFJF). Já no caso de Baja California/México, o Exeims-BC tem
como órgão responsável o SEE em contribuição com a Dirección de Evaluación Educativa.

Natureza do Paebes e Exeims-BC


191

Ao analisar os exames estandardizados, sobretudo a sua natureza, percebemos a existência de


duas classificações predominantes, high stakes e low stakes, pois segundo Orfield e Wald
(2000) essas classificações designam a natureza das avaliações padronizadas mediante aos
resultados. Os testes considerados como de alto risco são aplicados em contexto nacional e os
resultados obtidos através deles impactam diretamente na vida dos alunos, pois servem para
tomar decisões importantes. Já os exames de baixo risco não apresentam consequências diretas
às pessoas envolvidas no processo, todavia fornecem elementos para subsidiar políticas
públicas educacionais.

Função do Paebes e Exeims-BC

Os exames estandardizados, como o Paebes e o Exeims-BC, emergem com o intuito de melhorar


os sistemas educativos e sustentar as políticas públicas educacionais. Esse interesse surge na
década de 90, devido a uma série de fatores relacionadas: à pressão da economia em relação à
educação; ao ensino como meio de desenvolvimento; a reavaliação do Estado como prestador
de serviços; o incômodo gerado nas últimas décadas como resultado de expansão e lotação dos
sistemas educativos; a inquietação em relação à excelência e equidade; o desapontamento
provocado devido os movimentos de reformas da educação.

Formato de aplicação do Paebes e Exeims-BC

O Paebes é realizado nas diferentes instituições do estado do Espírito Santo e se configura como
uma prova impressa, sendo que os professores são orientados em alterar o seu planejamento,
uma vez que, a escola se mobiliza para darem ênfase aos conteúdos que são abordados nas
provas. De maneira a isso, os resultados do exame são disponibilizados às escolas através de
um site de acompanhamento mediante a uma plataforma digital, no qual apenas o corpo
pedagógico da escola tem acesso (FASSARELLA; LIMA, 2021). No Brasil, prevalecem
aspectos tradicionais, no sentido de avaliar os alunos por meio de uma prova escrita
(ABICALIL, 2002). o Exeims-BC é realizado de maneira digital e, como preparação, os jovens
possuem acesso a um guia temático. A sua aplicação ocorre dentro de uma sala com os recursos
acessíveis: computadores e internet.

CONCLUSÃO

Entendemos que a cultura político-educacional desses países tem em sua zona de abrangência
valores partilhados por organismos multilaterais (como a OCDE, o Banco Mundial e a Unesco)
192

que inseriram nos países latinoamericanos a concepção de educação entendida como adequada
para os países subdesenvolvidos (como o Brasil e o México). O Paebes e o Exeims-BC são
componentes importantes da cultura político-educacional estabelecida nesses países, de modo
que se constituem como indícios de uma concepção de educação e de uma cultura política que
é mais ampla, sobretudo ao considerarmos as relações entre os países latinoamericanos, os
países desenvolvidos e os organismos multilaterais.

REFERÊNCIAS

ABICALIL, C. A. Sistema nacional de educação básica: nó da avaliação?. Educação &


Sociedade, v. 23, p. 253-274, 2002.
ÁLVAREZ-LÓPEZ, G.; MATARRANZ, M. Calidad y evaluación como tendencias globales
en política educativa. Revista Complutense de Educación, Madrid, v. 31, n. 1, p. 83-93,
2020.
BERSTEIN, S. A cultura política. In: RIOUX, J. P.; SIRINELLI, J.F. (Org). Para uma
história cultural. Lisboa: Editorial Estampa, 1998. p. 349-363.
BLOCH, M. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
2001.
CRESWELL, J.; PLANO CLARK, V. Pesquisa de métodos mistos. 2. ed. Porto Alegre:
Pensó, 2013.
GATTI, B. Avaliação de sistemas educacionais no Brasil. Sísifo, n. 9, p. 7-18, 2016.
LIMA, R. P.; FASSARELLA, L. S. Programa de avaliação da Educação Básica do Espírito
Santo: repercussões nas escolas e no Ensino de matemática. Ensaio: Avaliação e Políticas
Públicas em Educação, 2021.
193

CURRÍCULOS MUTATIS MUTANDIS E O ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA


COVID-19

Letícia Maria Borlini Mendes


Mestranda do Programa de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Educação
Universidade Federal do Espírito Santo
leticia_borlini@hotmail.com

Moema Lima Pereira Masters Aguiar


Mestranda do Programa de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Educação
Universidade Federal do Espírito Santo
moema.aguiar@edu.ufes.br

Pedro José Garcia Júnior


Mestrando do Programa de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Educação Universidade
Federal do Espírito Santo
pedro.j.garcia@tutor.ufes.br

INTRODUÇÃO

Este artigo visa contextualizar, a partir do olhar dos professores de uma escola filantrópica
localizada em Vila Velha, ES, algumas problematizações basilares sobre o currículo, bem
como evidenciar as adaptações concernentes a necessidade Mutatis Mutandis dos currículos
a partir dos desafios trazidos para o enfrentamento da pandemia COVID-19, tendo em vista
que as instituições de ensino também se viram diante do desafio de adotar novas estratégias
para acesso às aulas, exigindo a reinvenção da educação por parte dos professores, demais
profissionais da educação, alunos e suas famílias.

Entendemos com Janete, Silva e Delboni (2018) currículo como um processo de conversação e
ação complexa como forma de afetar e ser afetado na produção do trabalho coletivo. Um
currículo que seja humanizado; que respeite as subjetividades; que liberte; que traga esperança;
que quebre as barreiras aprisionadoras. Um Currículo Mutatis Mutandis “que mude o que
precisa ser mudado”.

Dialogamos também com os teóricos Deleuze (1988) no viés da diferença, respeito,


singularidade e multiplicidade, que devem ser construídos em comunicação com a escola,
dentro e fora de seus portões, com Macedo (2017) na singularidade acima das prescrições
normativas, com Paraíso (2015) nos movimentos que deformam as formas e reativam forças e
ativam alegrias. Fomos desafiados a investirmos na "potência de agir” (SPINOZA, 2007) ao
nos depararmos com o momento pandêmico da COVID-19, que dentre tantos desafios, nos
trouxe o de experienciar a produção de currículos que emergiram das dores e tristezas
194

vivenciadas neste novo contexto da realidade social.

É então, que nos perguntamos: investimos em outros possíveis curriculares? Evidenciamos a


necessidade de se viver currículos abertos baseados na realidade dos contextos vivenciados
nos cotidianos e a partir deles? A realidade pandêmica mundialmente vivida repercutiu em
muitos cortes de formas curriculares, no arriscar seguindo os movimentos vivenciados no
momento pandêmico.

METODOLOGIA

A metodologia utilizada no trabalho foi a pesquisa qualitativa, a partir dos olhares dos
professores de uma escola filantrópica, localizada em região de vulnerabilidade social do
município de Vila Velha, ES, ofertante de bolsas de estudos de 100% de gratuidade, por meio
de análise socioeconômica, conforme Lei 12.101/2009, a aproximadamente 400 crianças,
adolescentes e jovens ingressantes desde o 6º ano do Ensino Fundamental II até a 3ª série do
Ensino Médio.

Para verificação e interpretação dos dados utilizamos a análise de conteúdo proposta por Bardin
(1997) que tem como base a qualificação do sujeito, refletindo sua percepção e sua relação com
o objeto pesquisado e seus fenômenos. Partindo do método de análise escolhido, tivemos como
Sujeitos os professores da escola acima referenciada; como objeto, os currículos praticados
durante a pandemia COVID-19 e quanto ao fenômeno, as multiplicidades das pessoas (alunos
e professores) envolvidas no coletivo da escola. Sendo assim, foi aplicado questionário online
composto por três perguntas com questões abertas onde os professores participantes puderam
relatar nas respostas suas concepções sobre currículo e seus desdobramentos no período de
isolamento social e aulas remotas, provocados pela pandemia COVID-19.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Partindo do pressuposto de que o currículo acontece através dos conhecimentos escolares


praticados em sala de aula, da relação e interação entre professor e aluno, dos saberes e culturas
presentes dentro da escola, a primeira pergunta direcionada aos participantes desta pesquisa
foi sobre a concepção de currículo:

Quadro 1 – Concepção de Currículo


Professor 1 Conjunto de conteúdos que visam nortear o processo de ensino.
Professor 2 São as informações sistematizadas que norteiam o processo ensino
aprendizagem
Professor 3 É uma relação entre os saberes teóricos de cada disciplina associado à
realidade
escolar de cada segmento. Sempre atendendo à vivência que os alunos
195

trazem como bagagem de vida.

Professor 4 No âmbito escolar, é um norteador de onde se pretende chegar, com os


conteúdos,
habilidades e competências.
Professor 5 Conteúdos a serem abordados, atividades, habilidades e competências a
serem desenvolvidas.
Professor 6 Base de estudos, conteúdos norteadores do processo de ensino e que
contém os eixos
estruturantes do ensino-aprendizagem
Professor 7 Orientações de conteúdo para alinhamento do processo educacional.
Professor 8 Práticas pedagógicas que envolvem os conteúdos a serem estudados
Elaboração: os autores
Podemos notar que a maioria dos professores possuem uma concepção mais tradicional de
currículo, voltados para normas, conteúdos, teorias, padronizações, dentre outros contidos no
quadro, que na definição de Silva (2005), são aquelas que dão ênfase ao ensino, aprendizagem,
avaliação, metodologia, planejamento e objetivos.

A segunda pergunta direcionada aos participantes buscou entender se durante o período de


Pandemia COVID-19 o currículo seguido por eles precisou sofrer algum tipo de
modificação/adequação e se mediante a esta situação eles, enquanto professores, precisaram
também realizar algum tipo de adequação em sua prática docente:

Quadro 1 – Modificações e adaptações no currículo


Professor 1 O currículo se manteve por conta de determinação da instituição.
Professor 2 Sim, os alunos ficaram muito defasados em relação ao conteúdo
Professor 3 Sem dúvidas. Com as aulas remotas, online, a tecnologia se tornou
fundamental no processo de ensino aprendizagem. Atividades lúdicas,
aulas experimentais, através da
criação de vídeos, posts, mapas conceituais, dentre outros.
Professor 4 Sim, foram muitos os desafios. A adaptação se deu através do ensino via
Home Office.
Professor 5 Muitas. Desde o começo da pandemia, as estruturas escolares sofreram
alterações que, a meu ver, vieram pra (sic) ficar. As adaptações
tecnológicas são umas dessas mudanças que vieram pra (sic) ficar.
Adaptações de currículo são necessárias com ou sem pandemia, pois o
desenvolvimento de uma série pode ser diferente de uma turma
para outra.
Professor 6 Não, a adaptação se deu pelo processo de ensino.
Professor 7 Foram feitos ajustes em relação a troca de conteúdos e resgate de
habilidades anteriores.
Professor 8 Sim. Foi preciso aprender/desenvolver técnicas para aulas on-line.
Elaboração: os autores

De acordo com Chagas (2020), Rondini, Pedro e Duarte (2020) professores e escolas tiveram
que se adaptar aos novos modelos educacionais que foram adotados em circunstância da
196

pandemia. Os professores precisaram adaptar tanto aulas, quanto conteúdo para serem
replicados em plataformas digitais, utilizando tecnologias digitais da informação, muitas vezes
sem preparação nenhuma para o desempenho desta atividade, tornando-se uma preparação
superficial, apenas para suprir as novas formas de transmitir conteúdos geradas pela situação
de pandemia. Percebemos, entretanto, que as respostas dadas pelos professores trazem
adaptações de currículo apenas em torno de conteúdos e de metodologias, sem adentrar na
diferença entre os estudantes e nas suas singularidades, de modo a alcançar “encontros
potentes” (PARAÍSO, 2015, p. 52) que os levariam, quem sabe, a caminhos mais
recompensadores.

A terceira e última pergunta foi direcionada aos participantes no intuito de verificar se estes
consideraram que durante o momento pandêmico as adaptações curriculares voltadas para a
nova forma de ensino foram capazes de atender todos os sujeitos envolvidos no processo:

Quadro 3 – Inclusão dos estudantes ao currículo praticado


Professor 1 Não. Principalmente no momento de aulas EAD, o processo de ensino
aprendizagem
ficou muito unilateral, não permitindo um protagonismo tão grande dos
alunos.
Professor 2 Não, pq (sic) o acesso às informações não aconteceu de forma
igualitária.
Professor 3 Acredito que sim. Tivemos que nos adaptar à uma nova realidade, à
novas propostas de ensino e, principalmente as tecnologias propostas.
Aprendemos junto com os
alunos, que, sem dúvida, nos auxiliaram muito nas novas tecnologias,
visto que é algo significativo para eles.
Professor 4 Não incluem, devido a precariedade nos lares no que tange o acesso à
internet.
Professor 5 Nem sempre. Alunos de classes econômicas mais baixas foram muito
prejudicados em seu desenvolvimento pedagógico por falta de
estruturas físicas adequadas. A tecnologia necessária para o
desenvolvimento do currículo proposto durante a
pandemia não foi igualitária e isso influenciou muito a exclusão
acadêmica de muitos de nossos educandos.
Professor 6 Não, muitos alunos sem acesso à tecnologia
Professor 7 Os professores fizeram os currículos se aproximarem dos educandos
com adaptações
e simplificações, mas acredito que não foi o suficiente.
Professor 8 Não. Muitos alunos não têm acesso à Internet.
Elaboração: os autores

Fatores como falta de acesso à internet, falta de aparelhos adequados, espaços adequados para
os momentos de estudos, como nos mostra Rodrigues (2020) ao apresentar o conceito de
197

divisão digital, evidencia a acesso ou a falta dele por parte dos alunos e professores quanto às
tecnologias:

[...] apenas o acesso à tecnologia inviabilizava o reconhecimento de complexas


nuanças da inclusão digital correlacionada a proficiência e ao letramento digital, ao
uso da tecnologia, ao engajamento e os contextos culturais e sociais. Com a pandemia,
a substituição da educação presencial pela educação remota emergencial acelerou
estratégias e políticas públicas de inclusão digital a comunidades
socioeconomicamente vulneráveis (RODRIGUES, 2020, p. 30).
CONCLUSÃO

Partindo da perspectiva de que existem tensões de caráter social, político, econômico, cultural
e histórico que interferem diretamente nos currículos aplicados nos cotidianos escolares, nos
parece ainda tradicional a concepção de currículo esboçada pelos professores entrevistados e
não como um acaso, mas apenas um reflexo do modelo que temos de Escola, a que busca o
currículo normatizado em detrimento do humanizado.

Num segundo ponto, observamos que não foi total consenso a existência de adaptações
curriculares diante da situação de pandemia, o que pode ser reflexo dos entrevistados
ministrarem disciplinas diferentes, mas também, e muito provável, trata-se do resultado de
uma situação avassaladora que exigiu das escolas, assim como dos professores em suas “novas
salas de aula”, adaptações e estratégias nunca antes pensadas.

Por fim, compreendemos que para um Currículo Mutatis Mutandis que “mude o que precisa ser
mudado” e que encoraje o aluno a atravessar o portão da escola deixando seus medos do lado
de fora, assim como trata Paraíso (2015), precisamos estar atentos e abertos a acolher as
singularidades dos estudantes, num processo de encontros potentes e transformadores.

REFERÊNCIAS
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. 225 p.

CARVALHO, J.; SILVA, S.; DELBONI; T. Currículos como Corpos Coletivos.


Currículo sem Fronteiras, v. 18, n. 3, p. 801-818, set. /dez. 2018.

CHAGAS, J. V. Pandemia COVID 19: do ensino remoto emergencial às desigualdades


sociais no ensino público pela percepção das professoras. 2020. 20f. Artigo Cientifico
(Especialização em Educação). Faculdade de Educação - Universidade Federal de
Pelotas– UFPEL, Rio Grande do Sul, 2020.

DELEUZE, G. Diferença e repetição (L. Orlandi & R. Machado, Trads). Rio de Janeiro:
Graal, 1988.

MACEDO, E. O Currículo no Portão da Escola. In.: MACEDO, E.; RANNIERY, T.


(orgs). Currículo, sexualidade e ação docente. Petrópolis: DP Et alli, 2017, p. 17-44.
198

PARAÍSO, M. A. Um currículo entre formas e forças. Educação. Porto Alegre


[online]. 2015, vol.38, n.1, p.49-58. Disponível
em:<https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/view/18443#:~:text
=Resumo,a s%20for%C3%A7as%2C%20dividir%20e%20desanimar>. Acesso em: 17
jul. 2022.

RODRIGUES, E. N. As percepções dos professores e alunos no contexto da pandemia de


covid-19: uma revisão de literatura. In: LACERDA, T. E. de.; GRECCO JÚNIOR, R (org.).
Educação remota em tempos de Pandemia: ensinar, aprender e resignificar a
educação. 1. ed. Curitiba: Editora Bagai, 2021.

RONDINI, C. A.; PEDRO, K. M.; DUARTE, C. S. Pandemia da COVID-19 e o ensino


remoto emergencial: mudanças na prática pedagógica. Revista Interface Científica –
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https://periodicos.set.edu.br/educacao/article/view/9085>. Acesso em: 12 jul. 2022.

SPINOZA, B. E. Tradução e notas de Tomas da Silva. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.


199

O “NOVO ENSINO MÉDIO”: O QUE PENSAM OS DISCENTES?

Cidimar Andreatta
FACELI Faculdade de Ensino Superior de Linhares
cidimar.andreatta@faceli.edu.br

Luciane Martins de Oliveira Matos


FACELI Faculdade de Ensino Superior de Linhares
lucianemartins,matos@gmail.com

INTRODUÇÃO

Este trabalho, resulta de uma pesquisa qualitativa de análise bibliográfica, documental e


aplicada, em desenvolvimento, que busca analisar a implementação do chamado “Novo Ensino
Médio” na rede estadual do Espírito Santo, mediante às percepções dos discentes da 1ª série do
ensino médio. Os resultados da pesquisa demonstram que o processo de implementação da Base
Nacional Comum Curricular (BNCC) no ensino médio apresenta descompasso no processo de
implementação produzindo distintas percepções dos estudantes frente a escolha dos Itinerários
Formativos.

METODOLOGIA

A pesquisa em questão adota uma abordagem qualitativa por meio de análise documental,
bibliográfica e pesquisa de campo, pois pretende analisar aspectos do “novo ensino médio” em
uma escola estadual, localizada no município de Linhares, estado do Espírito Santo. O objetivo
é analisar a implementação do novo ensino médio frente a escolha dos itinerários formativos
por parte dos estudantes da primeira série do ensino médio.

O cenário exploratório desta pesquisa é do tipo pesquisa-ação, pois é concebida e realizada em


estreita associação com uma ação, em que pesquisadores e participantes da pesquisa estão
envolvidos de modo cooperativo e participativo (THIOLLENT, 2008). Esta pesquisa faz parte
do Grupo de Pesquisa vinculado a Faculdade de Ensino Superior de Linhares – FACELI que
apresenta resultados preliminares do questionário aplicado por meio do formulário online
intitulado “Percepções dos discentes sobre o “novo ensino médio: os itinerários formativos” a
189 estudantes da 1ª série.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
200

O Novo Ensino Médio no estado do Espírito Santo (ES) vem sendo implementado pautado na
Lei 13.415, de 16 de fevereiro de 2017 e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio, Resolução nº 3, de 21 de novembro de 2018. Dentre suas propostas, o aprimoramento do
protagonismo juvenil, a valorização do projeto de vida e a integração do estudante de forma
consciente e autônoma na vida social e no mundo do trabalho são condições fundamentais para
a valorização da aprendizagem e o desenvolvimento integral do estudante.

Em maio de 2021, a CI/SEDU/SEEB Nº30 (ESPÍRITO SANTO, 2021), informa que “As
instituições ou redes de ensino devem orientar os estudantes no processo de escolha do seu
itinerário formativo” (BRASIL, 2018). Assim, a Secretaria de Estado da Educação (SEDU)
anuncia as novas diretrizes para o ensino médio e divulga um documento orientador do processo
de implementação do Novo Ensino Médio denominado de “Guia do Estudante”. Este guia tem
com o objetivo de informar aos estudantes do 9º ano do Ensino Fundamental as principais
mudanças ocorridas no novo ensino médio. Neste intuito, buscamos investigar de que forma as
redes de ensino público divulgaram e orientaram as novas diretrizes do ensino médio.

Os resultados da pesquisa de campo indicam que 69,3% dos estudantes - oriundos da rede
municipal - não obtiveram informações das diretrizes curriculares do ensino médio. Isto quer
dizer que a divulgação de informações alcançou apenas 30,7% dos estudantes - número
equivalente às matrículas de 9º ano na rede estadual, conforme censo escolar 2021. Em relação
aos estudantes que tiveram acesso às informações e ou orientações, declaram, notadamente que
a escola (67,2%) foi o maior canal de informação; 13,8% pelas mídias sociais e os demais
declaram que não receberam. Estes dados confirmam-se com o número de respondentes na
pesquisa aplicada pela SEDU: no universo de 4.057 respostas de estudantes da rede municipal
do ES, cerca de 37 (0,8%) estudantes da rede municipal de Linhares responderam ao
questionário online, explicitado na figura 1 (SEDU, 2021).
Figura 1 – Questionário online

Fonte: Sedu (2021)


201

As diretrizes apontam no Art. 8º, inciso V, que a escolha do Itinerário Formativo deve se alinhar
ao projeto de vida do estudante (BRASIL, 2018) e ao aprofundamento de estudos que deseja.
Assim, de que forma os discentes oriundos das escolas públicas vêm se apropriando destas
mudanças que impactam sua trajetória escolar, pessoal e profissional? 67,2% dos respondentes,
advindos da rede municipal, responderam que não estudaram as disciplinas de Projeto de Vida
(PV) e Estudo Orientado (EO), enquanto 32,8% correspondente à rede estadual estudaram.
Conforme previsto na Resolução CEE

ES nº 5.190/2018, as disciplinas de Projeto de Vida e Estudo Orientado devem compor a parte


diversificada como componentes integradores da organização curricular do ensino fundamental
anos finais. Os dados indicam que um descompasso no processo de implementação do novo
ensino médio entre a rede estadual e a rede municipal, pois 65,7% dos estudantes afirmam que
não obtiveram atividades educativas para a construção do seu projeto de vida nos anos finais
do ensino fundamental, enquanto que 34,4% responderam que tiveram.

Em contrapartida, os dados nos revelam que apesar de estudarem as disciplinas dos


componentes integradores PV e EO, 51, 9% afirmam que não se sentiam preparados para fazer
a escolha do itinerário formativo para o novo ensino médio, enquanto 41,1% responderam que
se sentiram preparados. Em relação a que se basearam para fazer a escolha do itinerário
formativo, 54,4% afirmam que a base para sua escolha foi área de conhecimento de maior
interesse em se aprofundar. No entanto, 45,6% tiveram influências distintas: 19,6% pela escola
de sua preferência, 11,6% pelos pais e responsáveis, 9% por pessoas e 5,3% por um professor.

Nota-se que há um número expressivo de escolhas que não coadunam com o projeto de vida
dos estudantes. Estes dados refletem em relação ao conhecimento das mudanças no novo ensino
médio e a escolha do itinerário formativo pela família (pais/responsáveis) do estudante de 9º
ano: 57,1% responderam que sim, enquanto 42,9% responderam que não tinham informações.
Verifica-se a inconsistência do que se estabelece em documentos e o que é efetivamente
materializado. Em relação a fazer a escolha do itinerário formativo, 43,4% concordam
totalmente e 40,2% concordam parcialmente, enquanto que 10,1% discordam de forma parcial
e 6,3% totalmente. Soma se 16,4% que de alguma forma discordam.

Pode-se afirmar que os desafios da implementação do chamado novo ensino médio ficará a
cargo da escola, em face aos estudantes que fizeram escolhas de itinerários formativos sem
conhecimento e ou informações nos anos finais do ensino fundamental. Apesar de afirmarem
202

que são favoráveis às mudanças, os dados revelam incertezas e dúvidas dos estudantes em
concluir a educação básica por meio de um itinerário formativo. A nova arquitetura curricular,
a partir da oferta de matrícula em 2022 para os estudantes matriculados na 1ª série, se
consolidará com a implementação dos Itinerários Formativos de Aprofundamento na 2ª e 3ª
séries do ensino nos anos de 2023 e 2024, respectivamente.

CONCLUSÃO

As análises realizadas nos documentos normativos e bibliográficos traz um discurso simplista


que a inclusão dos componentes integradores como Estudo Orientado e Projeto de Vida é a
estratégia eficiente para consolidar o postulado de que a educação pública terá qualidade e
sentido para os jovens estudantes. Para Matos (2020), “O receituário é implantar modelos
pedagógicos “inovadores”, racionais e conectados com as novas exigências do mundo
globalizado e com o projeto de vida do estudante, cujo fito é preparar para o competitivo
mercado de trabalho”.

Para autora, as novas diretrizes curriculares vêm sendo implantada na educação capixaba a
partir do Programa Escola Viva (2015-2018) cujo modelo alinha-se ao projeto empresarial
arquitetado por atores privados como Instituto de Corresponsabilidade para Educação (ICE),
que influenciam na gestão da educação por meio do currículo, da gestão e da pedagogia.
Notoriamente, o currículo implementado em âmbito capixaba segue princípios norteados pela
gestão empresarial na educação pensado pelo ICE [...] “O projeto empresarial é trazer um
modelo “inovador”, batizado de Escola da Escolha, “com foco no Jovem e na construção de
seu Projeto de Vida” (ICE, 2015). A crítica à referida disciplina, na trajetória escolar dos
estudantes, confere a compreensão que os seus objetivos se encontram desvinculados da
concretude contraditória da realidade social, econômica e política.

O caráter prescritivo do currículo arquitetado sem a participação de todos os atores da das redes
de ensino, como ocorrido na comunidade escolar do município de Linhares, reafirma a
dimensão excludente e reitera uma perspectiva de proposição de implementação autoritária de
governos. O discurso que o protagonismo dos jovens estudantes capixabas poderá escolher o
itinerário formativo do seu projeto de vida é uma premissa limitada às condições estruturais da
rede de ensino. Isso quer dizer que há elementos condicionantes que podem interferir na oferta
de itinerários formativos, ou seja, do projeto de vida do estudante, já que as normativas
permitem que as secretarias de estado da educação definam a oferta e o número de itinerários
203

formativos, de acordo com as possibilidades da escola.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Altera as Leis n º 9.394, de 20 de


dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e 11.494, de
20 de junho 2007.

BRASIL. Resolução nº 3, de 21 de novembro de 2018. Atualiza as Diretrizes Curriculares


Nacionais para o Ensino Médio. Brasília-DF, 2018.

ESPÍRITO SANTO. Secretaria de estado da educação (SEDU). Documento orientador para


escuta e estudo do guia do estudante sobre o novo ensino médio. Vitória, 2021.

ESPÍRITO SANTO. Secretaria de estado da educação (SEDU). Jovens capixabas, queremos


ouvir vocês! Disponível em: <https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSdq9VKHjbgjQ

d0JGWB8exKjbsqAM5bGnB2rqoIMT1LxnO11w/Viewanalytics. Acesso em: 30 jul. 2021.

MATOS, Luciane Martins de Oliveira Matos. Programa Escola Viva (es): uma análise do
modelo de gestão educacional / Luciane Martins de Oliveira Matos. Rio de Janeiro, 2020. 203
f. Tese. (Doutorado em Educação) – Universidade Estácio de Sá, 2020.

THIOLLENT. M. Metodologia da Pesquisa-Ação. 16 ed. São Paulo: Cortez, 2008.

ICE Introdução às bases teóricas e metodológicas do modelo escola da escolha. 2015c, 1ª


ed.
204

DESAFIOS E POSSIBILIDADES NA FORMAÇÃO DOS GESTORES PÚBLICOS DE


EDUCAÇÃO ESPECIAL NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

Islene da Silva Vieira


Prefeitura Municipal da Serra
islenes@gmail.com

Isalém Angelo Vieira da Silva


Universidade Federal do Espírito Santo
isalemangelo@yahoo.com.br

Cassia Machado de Oliveira


Prefeitura Municipal de Irupi
cmo.cassia@gmail.com

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, impulsionados por movimentos sociais de lutas contra a discriminação e a
favor das diferenças, temos observado avanços relacionados com o direito à educação dos
alunos com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades e/ou
superdotação, considerados público-alvo da educação especial (PAEE). Tais avanços são
perceptíveis tanto no campo das legislações e políticas educacionais, quanto no âmbito das
escolas que passam a receber esses grupos supracitados, antes excluídos do processo de
escolarização comum aos demais alunos.

Assim, entendemos que inclusão é um princípio educacional que deve ser assumido por ações
políticas, culturais, sociais e pedagógicas, desencadeadas em defesa do direito a todos os alunos
de estarem juntos, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. Como nos
assevera Ainscow (2009, p. 19), o desenvolvimento da inclusão “[...] nos envolve na tarefa de
tornar explícitos os valores que servem de base para nossas ações, práticas e políticas, e para a
nossa aprendizagem sobre como melhor relacionar as nossas ações a valores inclusivos”.

No Estado do Espírito Santo, as políticas de Educação Especial buscam articulação com as


nacionais, com o objetivo de “[...] prover condições de acesso, participação e aprendizagem no
ensino regular aos alunos” (ESPÍRITO SANTO, 2010). Segundo os autores Almeida, Melo e
França (2019, p. 7), esse conjunto de leis, em âmbito nacional e estadual, impulsionou para o
desenvolvimento de ações nas redes municipais e estadual do Espírito Santo, tentando “[...]
materializar as diretrizes estabelecidas pela resolução estadual em articulação com a PNEE-
PEI” (BRASIL, 2008).
205

O nosso trabalho se dedica a compreender de que modo os grupos discursivos na perspectiva


crítica podem contribuir com as ações implementadas pelo gestor de Educação Especial no
Estado do Espírito Santo.
É nesse contexto que nos interessamos em compreender: quais impactos de um processo de
formação continuada na perspectiva da pesquisa-ação colaborativo-crítica nas ações dos
Gestores Públicos da Educação Especial no Estado do Espírito Santo?

METODOLOGIA

Buscamos com esse recorte de trabalho, por meio da pesquisa-ação colaborativo-crítica,


baseada nos pressupostos da teoria crítica de Habermas (2012) e na colaboração autorreflexiva
entre pesquisadores e participantes (CARR; KEMMIS, 1988), compreender nosso problema de
investigação. Apostamos, portanto, no discurso e na autorreflexão crítica para alcançar o
entendimento mútuo e a emancipação dos sujeitos evolvidos no processo de pesquisa.

Neste estudo, desenvolvemos uma pesquisa de natureza qualitativa que busca uma exploração
das opiniões e representações sociais do tema que pretende investigar, porém não precisa
abranger a totalidade das falas e expressões dos interlocutores porque, em geral, a dimensão
sociocultural das opiniões e representações de um grupo que tem as mesmas características
costuma ter muitos pontos em comum, ao mesmo tempo em que apresentam singularidades
próprias da biografia de cada interlocutor (GOMES, 2010)

Durante o processo de investigação, utilizamos diferentes instrumentos de produção de dados:


análise documental e bibliográfica das produções científicas; observação participante nas
reuniões do colegiado e nas plenárias do Fórum de Gestores de Educação Especial, com
registros em diário de campo e gravações com posteriores transcrições; narrativas escritas pelos
gestores; além de diálogos formais e informais presenciais e/ou virtuais (por mensagens em
grupos de WhatsApp, e-mail e telefone)

RESULTADO E DISCUSSÕES

Apresentaremos um recorte da análise da criação do Fórum de Gestores de Educação Especial


do Estado do Espírito Santo (Forgees). Para organização desse movimento, os integrantes, em
plenária, definiram um colegiado de forma voluntária para o Forgees com o discurso de que
“Todos vamos fazer juntos” e “Todos são responsáveis”, que entendemos pela ação do grupo
proposta por Barbier (2007), alertando que todos devem se envolver, participar e se implicar
206

com o processo. Consideramos que todo esse movimento de investigação envolvendo


colaboração, ação e implicação se apresenta como possibilidade de trabalho em grupo, porém
cabe destacar que também existem desafios, por exemplo, os diferentes níveis de implicação e
comprometimento com as demandas apresentadas pelo movimento, mas isso foi reconhecido
na atividade autorreflexiva desses movimentos iniciais:

Gestora-pesquisadora: Penso que deveria ser mais ativa (Atividade escrita, 2020).

Gestor-pesquisador: Acho que tenho muito a aprender com esse movimento. Às vezes
fico muito absorvido com as demandas de meu município e o fórum vai ficando num
plano secundário. Não que ele seja menos importante. Penso que, à medida que o
fórum [...] for ajudando as questões peculiares de nossos municípios, ele vai
ganhando um papel mais destacado (Atividade escrita, 2020).

Outros se veem como implicados e ativamente comprometidos com as demandas:


Gestora-pesquisadora: Totalmente ativa e atuante. Sempre estou disposta a
contribuir com as iniciativas no que se refere ao fortalecimento do grupo (Atividade
escrita, 2020).

Gestora-pesquisadora: Atuei de forma efetiva no fórum a partir de 2019,


participando de todos os encontros, trabalhando de forma colaborativa e
contribuindo nas discussões apresentadas (Atividade escrita, 2020).

Gestora-pesquisadora: Meu envolvimento com o Fórum de Gestores aconteceu de


maneira automática, pois o movimento iniciou-se junto com o meu início como
gestora da Educação Especial no município de Serra e em busca de conhecimento e
articulação com outros municípios. Participei ativamente de tudo, enriquecendo meu
conhecimento e potencializando minhas ações no município (Atividade escrita, 2020).

Gestora-pesquisadora: Participo nos diálogos e temas de sugestão de debates sobre


a Educação Especial na perspectiva inclusiva. Defesa da política estadual. Participo
das reuniões e das escritas das notas públicas (Atividade escrita, 2020).

Esses aspectos de implicação da pesquisa-ação colaborativo-crítica são observações


importantes (CARR; KEMMIS, 1988), pois referem-se à participação ativa no processo, ao
envolvimento dos gestores-pesquisadores nas discussões e organização do Forgees. Porém,
segundo Celio Sobrinho (2009, p. 51), “[...] o envolvimento ativo dos indivíduos e grupos em
um trabalho sistemático de mudanças e de transformação não está estabelecido de antemão”.

Compreendemos que esses movimentos de entrelaçamentos são possibilitados pela pesquisa-


ação, em que todos os envolvidos colaboram e se formam juntos, pois “[...] a maior implicação
é perceber que ao fazer parte desse diálogo estamos interferindo, bem como algo interfere em
nós, na formação do ser” (GIVIGI, 2007, p. 204). Assim, consideramos como uma inovação o
processo vivido nesta investigação, coerente com a nossa perspectiva teórico-metodológica,
que assume um interesse crítico-emancipatório, compreendendo que a pesquisa:
207

[...] deverá oferecer respostas que indiquem estratégias de ação, inovadoras ou


transformadoras, de acordo com o tipo de mudança proposta, a quantidade e a
amplitude das informações recolhidas, sistematizadas e organizadas e,
fundamentalmente, segundo o tipo de abordagem teórico-metodológica utilizada
(SÁNCHEZ-GAMBOA, 2007, p. 122).

Nesse sentido, buscamos trilhar um caminho de forma coletiva e colaborativa, firmando


parcerias entre pesquisadora-colaboradora, gestores-pesquisadores, grupos de pesquisa e
universidade. Esse percurso realizado com ação-reflexão-ação mostrou-nos a possibilidade de
transformação e mudança da realidade, visando à autonomia de todos os envolvidos.

CONCLUSÃO

Consideramos que a pesquisa-ação colaborativo-crítica nos permite uma aproximação e


envolvimento com os participantes-autores-colaboradores, possibilitando um ambiente
confortável e confiável para conduzirmos e sermos conduzidos durante o desenvolvimento do
trabalho.

Compreendemos, que a formação continuada, na perspectiva crítica, é um desafio, mas,


conforme os dados apresentados, ela também se mostrou uma possibilidade possível e viável.
Vimos, assim, um comprometimento de um grupo de profissionais dispostos a descontruir o
modelo tradicional e tecnicista de formação e, se desafiarem em um trabalho coletivo, de grupo,
aproximando a universidade das redes de ensino e partindo das demandas do contexto vivido.
Apresentamos, neste trabalho, alguns consensos provisórios que foram sendo delineados
durante esse processo, sem a intenção de impor e/ou procurar uma verdade absoluta
(HABERMAS, 2012). Muitos foram os desafios para garantir o trabalho colaborativo e
autônomo desta investigação, porém entendemos que, por meio do diálogo, exposição de ideias
e consensos provisórios, é possível realizar e construir coletivamente espaços, visando à
reflexão e ação, como espaços formativos que considerem as demandas dos sujeitos envolvidos.
REFERÊNCIAS

AINSCOW, M. Tornar a educação inclusiva: como essa tarefa deve ser conceituada? In:
FÁVERO, O. et al. (org.). Tornar a educação inclusiva. Brasília: Unesco, 2009. p. 11-24.
ALMEIDA, M. L.; MELO, D. C. F.; FRANÇA, M. G. Repercussão da política nacional de
educação especial no Espírito Santo nos últimos dez anos. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 45,
2019. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ep/v45/1517-9702-ep- 45-e217129.pdf.
Acesso em: 17 jun. 2022.
BARBIER, R. A pesquisa-ação. Brasília: Liber Livro, 2007.
CELIO SOBRINHO, R. C. A relação família e escola a partir da processualidade de um
fórum de famílias de alunos com deficiência: contribuições de Norbert Elias. 2009. Teses
208

(Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal


do Espírito Santo, Vitória, 2009.
CARR, W.; KEMMIS, S. Teoría crítica de la Enseñanza: la investigación-acción en la
formación del profesorado. Tradução de Bravo Martinez Roca. Barcelona: Editora, 1988.
ESPÍRITO SANTO. Conselho Estadual de Educação. Diretrizes da educação especial na
educação básica e profissional para a rede estadual de ensino. Vitória: Sedu, 2010.
GIVIGI, R. C. N. Tecendo redes, pescando idéias: (re)significando a inclusão nas práticas
educativas da escola. 2007. 234 f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-
Graduação em Educação, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2007.
GOMES, R. Análise e interpretação de dados de pesquisa qualitativa. In: MINAYO, M. C. S.
(org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes, 2010. p. 79-
108.
HABERMAS, J. Teoria do agir comunicativo: racionalidade da ação e racionalização
social. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
SANCHEZ-GAMBOA, S. A pesquisa como estratégia de inovação educativa: a formação
continuada e os problemas da educação básica. Revista Pedagógica, Chapecó, v. 15, n. 31, p.
265-280, 2013.
209

EIXO 5 – Federalismo, modalidades de ensino e


práticas pedagógicas (Educação Especial,
Educação do Campo, Educação de Jovens e
Adultos, Educação Profissional, Educação à
distância)
210

INCLUSÃO DE ALUNOS PÚBLICO-ALVO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NOS ANOS


FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: REDES DE COLABORAÇÃO ENTRE
PROFESSORES DO ENSINO COMUM

Isalém Angelo Vieira da Silva


Universidade Federal do Espírito Santo
isalemangelo@yahoo.com.br

Cassia Machado de Oliveira


Prefeitura Municipal de Irupi
cmo.cassia@gmail.com

Maxcione Vieira Alves Resende


Secretaria Estadual de Educação
maxcione_resende@hotmail.com

INTRODUÇÃO

Presenciamos, a partir dos anos 2000, um aumento no número de matrículas de pessoas com
deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas
escolas públicas brasileiras, influenciado pelas políticas educacionais na perspectiva inclusiva
(Matos & Mendes, 2015). Com isso, os processos de ensino-aprendizagem vêm se
desenvolvendo e se reelaborando ao longo do tempo, por meio da utilização de ferramentas que
visam ao desenvolvimento pedagógico e à aprendizagem do educando, respeitando suas
especificidades.

Diversos autores (GATTI, 2009; VIEIRA, HERNANDEZ-PILOTO, RAMOS, 2019) revelam


desafios presentes nas escolas atravessando a inclusão desses estudantes, como: questões
arquitetônicas, acessibilidade curricular, formação de professores, existência/articulação das
redes de apoio com o ensino comum, avaliação da aprendizagem ainda com cunho positivista,
dentre outros.

Percebemos que esses desafios se intensificam quando falamos do Ensino Fundamental II e do


Ensino Médio, dada a organicidade dessas etapas quando se fragmenta muito mais o ensino em
disciplinas; conta-se com um número maior de professores; dispõem-se de docentes com menor
tempo com os estudantes em sala de aula, inviabilizando, ainda mais, os estudantes público-
alvo da Educação Especial, dentre tantas outras questões que podemos aqui enumerar.
Os desafios quanto às articulações pedagógicas entre os saberes curriculares e diálogos entre os
diferentes profissionais da escola, focando no trabalho colaborativo e no acesso aos
211

conhecimentos por todos os estudantes independentemente de suas especificidades, também se


colocam como outra questão que preocupa as políticas de Educação Especial em uma
perspectiva inclusiva e a própria pesquisa realizada pela área.

Diante do exposto, as inquietações explicitadas direcionam essa investigação pela seguinte


pergunta-problema: que ações colaborativas podem ser constituídas entre professores do ensino
comum visando à aprendizagem de alunos público-alvo da Educação Especial matriculados em
uma turma do 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola da Rede Estadual de Ensino,
localizada em Irupi/ES?

Para refletir sobre a questão, nos desafiamos a constituir ações colaborativas entre professores
do ensino comum visando ao fortalecimento dos processos de ensino-aprendizagem de alunos
público-alvo da Educação Especial matriculados no 9º ano do Ensino Fundamental de uma
escola da Rede Estadual de Ensino, localizada em Irupi/ES.

METODOLOGIA

Abordaremos nesse estudo a perspectiva teórico-metodológica fundamentada pela investigação


qualitativa e a pesquisa-ação colaborativo-crítica. Assumimos assim, uma construção coletiva,
participativa e colaborativa com os participantes, almejando contribuir com o processo
emancipatório dos indivíduos envolvidos. A pesquisa qualitativa e a pesquisa-ação
colaborativo-crítica nos orientam sobre a produção e organização dos dados.

Para tanto, dialogamos com diferentes autores: Barbier (2007), Almeida (2019), Minayo
(2010), dentre outros, pois nos ajudam a compreender e a interpretar o objeto de uma maneira
mais crítica e propositiva. Utilizamos diferentes procedimentos para o registro dos dados, sendo
eles: diário de campo e uso do celular para gravações de áudios e registros de fotos. Para Barbier
(2007, p. 134), o diário de itinerância nos permite registrar nossos “[...] pensamentos,
sentimentos, desejos, sonhos muitos secretos”.

Diante da proposta de pesquisa, definimos as estratégias para coleta de dados e sua análise.
Grupos focais para levantar diferentes pontos, compreensões e ações visando uma perspectiva
inclusiva. Com isso, objetivamos: a) compreender como tem se desenvolvido o trabalho
pedagógico na perspectiva inclusiva; b) analisar os movimentos que podem promover maior
conectividade entre as diferentes áreas de conhecimento; c) fomentar trabalhos colaborativos
no ambiente escolar, objetivando o acesso ao conhecimento de todos os alunos.
212

Como modo de armazenar os dados, opta-se pela gravação dos grupos focais que ao serem
transcritos, permitem-nos capturar as observações/considerações dos participantes sobre as
temáticas elencadas.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Na fase inicial do estudo, tornou-se necessário o aprofundamento na legislação brasileira e em


estudos científicos que compreendem as diferentes possibilidades de colaboração. Diante dessa
inquietação nos ancoramos na Constituição Federal Brasileira de 1988 que determina, no seu
artigo 23, como competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios “[...] proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia,
à pesquisa e à inovação”.

A responsabilidade com a educação é reforçada na Lei de Diretrizes e Bases, quando nos diz
que a educação é “[...] dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos
ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (Lei n. 9.394, 1996,
art. 2º).

Os dados preliminares do estudo apontam algumas reflexões. É importante ouvir os professores


para compreender os conhecimentos que acumulam sobre o direito à Educação para os
estudantes público-alvo da Educação Especial. Estratégias como grupos focais possibilitam tais
compreensões e o diálogo entre os profissionais da Educação para que possam pensar juntos a
potência da interdisciplinaridade e do trabalho colaborativo.

Outra questão perpassa pela importância do planejamento. Se desejamos uma escola inclusiva,
precisamos pensá-la com nossos pares. Precisamos romper com práticas solitárias que levam
os professores a planejarem e a mediarem os processos de ensino-aprendizagem de modo tão
individual e caminharmos rumo a ações mais coletivas. Precisamos pensar que não
escolarizamos um aluno recortado que lida com o conhecimento de modo fragmentado. A
colaboração potencializa a ação docente e o modo como o estudante significa o que lhe é
ensinado.

O trabalho pedagógico por meio de projetos ajuda o estudante a pesquisar e a conectar um saber
com o outro. Nesse momento de pandemia, essa estratégica didática permite o discente a se
213

sentir mais apoiado pelos professores em sua coletividade e a não se ver diante do compromisso
de cumprir um conjunto de atividades que não se articulam e dialogam entre si.

Por último, a importância da avaliação formativa no acompanhamento do trabalho pedagógico


e de apropriação do conhecimento pelo estudante. O estudo nos permite perceber que quando
passamos a ouvir o outro e com ele compor alternativas de trabalho pedagógico, professores e
estudantes se formam em comunhão, como ensina Freire (2003). No caso da escolarização de
alunos público-alvo da Educação Especial, ajuda a escola a avaliar seu planejamento e de como
se adequar para que esse discente acesse o currículo e tenha as suas necessidades específicas de
aprendizagens contempladas.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, compreendemos a necessidade da construção do conhecimento por meio do


diálogo de forma colaborativa. Apostamos na articulação entre diferentes disciplinas, buscando
garantir o acesso ao conhecimento para os estudantes público-alvo da Educação Especial.

Acreditamos ser necessário reforçar o trabalho colaborativo dentro da unidade escolar e a


efetivação e o fortalecimento da parceria com as famílias nos processos de escolarização dos
estudantes público-alvo da Educação Especial. Torna-se necessário o contato constante com as
famílias para compreender a realidade e as condições sociais dos estudantes, buscando garantir
o acesso ao conhecimento curricular.

Nesse sentido, a pesquisa aposta na articulação entre os diferentes componentes curriculares,


buscando novas/outras possibilidades de se pensar a prática pedagógica em uma perspectiva
inclusiva, garantindo o direito à cultura e ao conhecimento para todos os alunos, dentro e fora
dos muros da escola, buscando outras/novas formas de expressão, interação e leitura de mundo,
possibilitando que todos os envolvidos possam encontrar/descobrir uma forma de comunicação
e expressão.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, M. L. Diálogos sobre pesquisa-ação: concepções e perspectivas. São Carlos:


Pedro & João Editores, 2019. 155 p.
BARBIER, R. A pesquisa-ação. Brasília: Liber Livro, 2007.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição [da] República Federativa do Brasil. Brasília:
Senado Federal, 1988.
214

BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Brasília, 1996. Disponível em:


https://www.jusbrasil.com.br/topicos/11686667/artigo-60-da-lei-n-9394-de-20-de-dezembro-
de-1996 em 17-05-2019. Acesso em: 10 jan. 2022.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 27. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2003.
GATTI, B. A. Formação de professores: condições e problemas atuais. Revista Brasileira de
Formação de Professores, Cristalina-GO, v. 1, n. 1, p. 90-102, maio 2009.
GIL, Antonio Carlos. Métodos e Técnicas de pesquisa social. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2008.
Disponível em: https://ayanrafael.files.wordpress.com/2011/08/gil-a-c-mc3a9todos-e-
tc3a9cnicas-de-pesquisa-social.pdf. Acesso em: 01 abr.2022
GOMES, Romeu. Análise e interpretação de dados de pesquisa qualitativa. In: MINAYO, M.
C. S. (Org.). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes, 2010.
p. 79-108.
JESUS, D. M. et al. Diálogos reflexivos tecidos no 2º colóquio de políticas de educação
especial na perspectiva da inclusão escolar no Estado do Espírito Santo. In: SEMINÁRIO DE
POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCLUSÃO ESCOLAR NO RIO GRANDE DO SUL, 1.,
2010, Porto Alegre. Anais eletrônicos [...] Porto Alegre: Faced/Nepie/UFRGS, 2010. 1 CD.
MATOS, S. N.; MENDES, E. G. Demandas de professores decorrentes da Educação
Inclusiva. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 21, n. 1, p. 9-22, jan.-mar.
2015.
MEIRIEU, P. O cotidiano da Escola e da Sala de Aula o fazer e o compreender. Porto
Alegre: Artimed, 2005.
MINAYO, M. C. S. O desafio da pesquisa social. In: ______. (Org.). Pesquisa Social: teoria,
método e criatividade. 29. ed. Petrópolis: Vozes, 2010. p. 9-29.
VIEIRA, A. B.; HERNANDEZ-PILOTO, S. S. de F.; RAMOS, I. de O. BaseNacional
Comum Curricular: tensões que atravessam a educação básica e a educaçãoespecial.
Educação, v. 42, n. 2, p. 351-360, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.15448/1981-
2582.2019.2.27599. Acesso em: 5 mar. 2022.
215

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E INCLUSÃO DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA


INTELECTUAL NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Ricardo Tavares de Medeiros


Universidade Federal do Espírito Santo – UFES
ricardopedagogo@hotmail.com

Andressa Caetano Mafezoni


Universidade Federal do Espírito Santo - UFES
andressamafezoni@yahoo.com.br

INTRODUÇÃO

Os processos de inclusão de estudantes com deficiência intelectual vêm sendo impulsionados


por documentos e normativas internacionais e nacionais (UNESCO, 1994; BRASIL, 1996,
2008), convocando os sistemas de ensino/escolas a constituírem ações para que esses estudantes
tenham acesso, condições de permanência e acessibilidade ao conhecimento nas escolas
comuns. Dentre as ações a serem constituídas, o planejamento e a mediação de práticas
pedagógicas inclusivas se colocam como um dos caminhos possíveis, tendo em vista envolver
a mediação do currículo.

Por considerarmos que historicamente as práticas pedagógicas foram pensadas a partir de


padrões de aprendizagem, desconsiderando os estudantes com deficiência intelectual,
ingressamos no Programa de Pós-Graduação de Mestrado Profissional em Educação da
Universidade Federal do Espírito Santo para desenvolver a dissertação de mestrado intitulada
“As Práticas Pedagógicas e a inclusão de estudantes com deficiência intelectual nos anos finais
do Ensino Fundamental, cujo objetivo é problematizar as possibilidades e os desafios que
atravessam as práticas pedagógicas mediadas por professores do ensino comum e de Educação
Especial no tocante à escolarização de estudantes com deficiência intelectual matriculados no
7° ano do ensino fundamental de uma escola da Rede Municipal de Vila Velha/ES.

Para tanto, buscamos respaldo teórico nos pressupostos da matriz histórico-cultural que
compreende aprendizagem humana na interação do indivíduo com a cultura e com o meio
social, processo mediado, tendo, o professor, a incumbência de criar condições pedagógicas
para a relação entre o estudante e o conhecimento. As práticas pedagógicas permeadas por
momentos de planejamento, mediação do conhecimento, utilização de recursos didáticos
diversificados e a criação de apoios tem papel fundante na relação que o estudante com
deficiência intelectual estabelece com o conhecimento, colocando-se como uma alternativa
216

mediadora entre alguém que tem o direito de aprender e o que foi historicamente produzido
como cultura.

METODOLOGIA

O estudo se realiza por meio da pesquisa qualitativa e do Estudo de Caso. Segundo Ludke e
André (2013), o método se fundamenta no pressuposto de que ao analisar uma certa situação
em particular, pode-se articular interpretações sobre o objeto analisado com questões mais
amplas que a afeta.

Como procedimentos, adota: a) solicitação para realização do estudo à Secretaria Municipal de


Educação de Vila Velha/ES e à unidade de ensino; b) apresentação do estudo aos professores e
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; c) observação do cotidiano de uma
turma de 7º ano do Ensino Fundamental com a matrícula de estudantes com deficiência
intelectual para acompanhar/compreender o trabalho com as práticas pedagógicas
desenvolvidas com esses sujeitos; d) realização de entrevistas semiestruturadas com professores
do ensino comum, de Educação Especial, coordenação pedagógica e de turnos e gestão da
escola.

O processo de coleta de dados tem sido constituído no transcurso do ano letivo de 2022. Os
participantes do estudo são: quatro (04) professores do ensino comum, quais sejam: das
disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, História e Geografia. Nessa perspectiva, foi
convidada uma professora de Educação Especial que atua na turma. Para fomentar e constituir
esse trabalho, também contou com a participação de um (01) pedagogo, (01) uma coordenadora
e a diretora, perfazendo um total de 08 profissionais envolvidos na pesquisa. A pesquisa foi
aprovada no Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal do
Espírito Santo e os dados vêm sendo categorizados e analisados com as contribuições dos
pressupostos da matriz histórico-cultural e autores dedicados a estudar a Educação Especial na
perspectiva da inclusão escolar.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A pesquisa em andamento aponta a crescente matrícula de estudantes com deficiência


intelectual na unidade de ensino pesquisada que funciona em três (03) turnos. No matutino,
com o quantitativo de 310 alunos. No vespertino, 308 e, no noturno, com a modalidade da EJA
– Educação de Jovens e Adultos, com 80 alunos. Logo, perfaz um total de 698 estudantes no
217

ano vigente de 2022. Dentre esses estudantes, há a matrícula do seguinte quantitativo de


estudantes público-alvo da Educação Especial: deficiência intelectual (21 estudantes),
deficiência auditiva (02 alunos) e autismo (14 discentes).

O Estudo de Caso se realiza em uma turma do 7° ano do ensino fundamental. Quanto aos
estudantes público-alvo da educação especial, temos matriculados dois discentes. Trata-se de
dois estudantes com deficiência intelectual, ambos com doze anos de idade. Para tanto, uma
professora de educação especial busca desenvolver seu trabalho de maneira colaborativa com
os demais professores do ensino comum.

Três eixos de análise têm sustentado a produção do conhecimento sobre a relação entre práticas
pedagógicas inclusivas e a inclusão de estudantes com deficiência intelectual nos anos finais
do Ensino Fundamental. O primeiro diz respeito à necessidade de articulação dos
planejamentos entre os professores do ensino comum e de Educação Especial. Nos processos
de inclusão de estudantes com deficiência intelectual no ensino comum na referida unidade de
ensino, verificamos que alguns professores do ensino nutrem certo medo e resistência,
responsabilizando o docente de Educação Especial pela aprendizagem dos estudantes com
deficiência intelectual.

Diante disso, é necessário o trabalho do coordenador pedagógico na organização de horários


coletivos para planejamento de práticas pedagógicas que promovam maiores interações entre
os profissionais envolvidos com a escolarização desses estudantes. Coletivamente, podem
planejar projetos, sequências didáticas, atividades, maneiras diferenciadas de explorar os
conteúdos com os alunos, aproximando as ações da classe comum com as do atendimento
educacional especializado.

O segundo eixo se dirige para o que chamamos de trabalho coletivo. Segundo a Política
Nacional de Educação Especial na perspectiva da inclusão escolar (BRASIL, 2008), o
atendimento educacional especializado se coloca como um conjunto de ações pedagógicas de
caráter complementar/suplementar ao currículo escolar. Diante disso, o trabalho coletivo na
escola aponta caminhos para se pensar em como garantir a acessibilidade curricular para os
estudantes com deficiência intelectual na classe comum para se articular o que será realizado
pelo atendimento educacional especializado de como a complementar/suplementar a formação
desses sujeitos.
218

A Educação Especial em uma perspectiva inclusiva prevê a elaboração, constituição,


planejamento pedagógico e a construção de práticas pedagógicas que fomentem uma proposta
de currículo acessível. Diante disso, é relevante pensar de modo coletivo na escola, as ações e
as estratégias de ensino alternativo, objetivando, inclusive, a participação de outros agentes da
escola, docentes e não docentes, das famílias e até mesmo dos estudantes, como protagonistas
do próprio processo de ensino e aprendizagem.

O último eixo diz respeito a importância de ampliação das políticas de formação continuada em
Educação Especial para os professores que atuam nos anos finais do Ensino Fundamental.
Falamos de profissionais da Educação que trazem para os cotidianos escolares conhecimentos
ainda superficiais sobre os processos de escolarização de estudantes com deficiência intelectual
e se veem desafiados a promover a acessibilidade curricular e ações coletivas com os
professores do atendimento educacional especializado, mas sem conhecimentos teórico-
práticos que apontem os caminhos alternativos necessários.

Tal demanda perpassa pelo reconhecimento da escola como espaço-tempo de formação


continuada, assim como políticas voltadas para investimentos no direito à formação docente,
valorização do magistério e criação de melhores condições de trabalho. Percebe-se que as
políticas de formação contínua em Educação Especial ainda se voltam para os profissionais que
atuam na modalidade de ensino, necessitando que os sistemas de ensino voltem suas atenções
para outros sujeitos que atuam com esses estudantes e necessitam ampliar seus saberes-fazeres
para planejar e mediar práticas pedagógicas comprometidas com a apropriação do
conhecimento com qualidade socialmente referenciada.

CONCLUSÃO

O estudo destaca a necessidade do debate acerca das práticas pedagógicas numa perspectiva
inclusiva, visto que o ambiente escolar deve ser considerado como plural, um espaço
heterogêneo e diverso, por isso, é preciso pensar sobre as práticas docentes considerando o
direito de aprender do estudante com deficiência intelectual. Nesse caminho, temos o professor
como um dos profissionais essenciais do saber por representar um elo intermediário entre o
estudante e o conhecimento. Nessa via, Vigotski (1997) afirma que é fundamental a
responsabilidade dos educadores no ambiente escolar quando favorece o desenvolvimento dos
educandos por meio do ensino e da aprendizagem pela vida da mediação, pois, podemos dizer
que apropriação do conhecimento é uma atividade mediada. Entendemos por mediação a
219

criação de caminhos alternativos para criar um elo entre um objeto e um sujeito que busca
aprender.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Educação. Política pública de educação especial na perspectiva da


educação inclusiva, 2008. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf. Acesso em: 20 ago. 2022.
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 23 de dez.
1996. Seção 1.
ANDRÉ, M. E. D. A. O que é um estudo de caso qualitativo em educação? Revista da
FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 22, n. 40, p. 95-103, 2013.
Disponível em: https://www.revistas.uneb.br/index.php/faeeba/article/view/753. Acesso em:
21 ago. 2022.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A
CULTURA. Declaração de Salamanca e enquadramento da ação: necessidades
educacionais especiais. Salamanca, Espanha, 1994.
VIGOTSKI, L. S. Obras escogidas. Tomo V. Madrid: Visor, 1997.
220

EDUCAÇÃO ESPECIAL NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: DIÁLOGOS SOBRE


PRÁTICAS PEDAGÓGICAS INCLUSIVAS EM SALAS MULTISSERIADAS

Juliano Bicker Pereira


julianobicker@gmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

INTRODUÇÃO

O estudo faz parte da dissertação de mestrado vinculada ao Programa de Pós-Graduação em


Educação da Universidade Federal do Espírito Santo e adota como tema central a Educação
Especial na interface com Educação do Campo, constituindo diálogos sobre práticas
pedagógicas inclusivas em salas multisseriadas. Pensar as interfaces entre a Educação Especial
e a Educação do Campo é uma ação necessária para se discutir e se fortalecer a Educação como
direito social para os povos campesinos que possuem deficiências, principalmente, por estarmos
atravessando um momento político e ideológico (no Brasil) marcado pela
negação/enfraquecimento de vários direitos sociais, dentre eles, a Educação.

Considerando a Educação um direito social assegurado pela Constituição Federal de 1988,


percebemos o quanto historicamente os sujeitos do campo com deficiências foram excluídos
dos processos de escolarização. A escassez de políticas públicas culmina em processos de
exclusão desses alunos das escolas comuns influenciando diretamente no direito à Educação.
Os povos do campo, historicamente, acabaram sendo coletivos sociais excluídos dos processos
de escolarização e quando algum deles possui alguma deficiência, as barreiras parecem se tornar
mais espessas, pois a precarização da política pública faz com que homens e mulheres
campesinos sejam impedidos/afastados dos bancos escolares, mostrando-se a realidade mais
complexa quando pensamos na existência de um sujeito com comprometimentos de ordem
cognitiva.

No campo da Educação Especial, também há de buscar por maiores compreensões sobre a


oferta do atendimento educacional especializado como rede de apoio disponível na escola –
tanto no turno quanto no contraturno – relacionando-o aos currículos escolares. Além disso, há
de se pensar em como articular os saberes curriculares, os saberes do campo, o atendimento às
demandas específicas de aprendizagem dos alunos na classe e as intervenções no contraturno.

METODOLOGIA
221

O estudo tem como objetivo constituir práticas pedagógicas com professores e alunos de uma
sala de aula multisseriada da Rede Municipal de Educação de Domingos Martins/ES visando
fortalecer à escolarização de estudantes com deficiências nas interfaces entre Educação
Especial e Educação do Campo.

Para responder a esse objetivo, foram estabelecidos os seguintes objetivos específicos: a)


compreender as políticas públicas de Educação e de Educação Especial presentes na rede
municipal de ensino de Domingos Martins/ES; b) analisar o currículo da referida rede de ensino
e a política de atendimento educacional especializado; c) observar o cotidiano de uma sala de
aula multisseriada da rede de ensino investigada; d) articular espaços-tempos de planejamento
e de mediação visando ao trabalho com práticas pedagógicas; e) problematizar os desafios e as
possibilidades existentes nas interfaces entre Educação do Campo e Educação Especial em
Domingos Martins/ES com relação às práticas pedagógicas. O estudo se realiza em uma turma
multisseriada do 3º ao 5º ano por apresentar a maior matrícula de estudantes público-alvo da
Educação Especial.

Como participantes da pesquisa, elegemos: a) a professora regente que leciona na turma do 3º


ao 5º ano; b) duas docentes de Educação Especial; c) uma auxiliar de Atendimento Educacional
Especializado.

Apoia-se na pesquisa qualitativa e tem como método a pesquisa-ação colaborativo-crítica.


Realiza-se por meio de pedido de autorização à Secretaria de Educação, à escola e seus
profissionais; análise de documentos; observação do cotidiano escolar; participação nos
espaços-tempos de planejamento e de trabalho pedagógico na classe comum; realização de
entrevistas semiestruturadas. Adota como referencial teórico, as bases sociológicas do
conhecimento de Boaventura de Sousa Santos (2006, 2008, 2018) e Arroyo (2004) e autores da
Educação Especial e da Educação do Campo.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O estudo aponta que a Educação em contextos do campo é marcada por lutas e movimentos
sociais que almejam uma política de educação pensada com os povos do campo visando
escolarização e acesso aos conhecimentos escolares. Desvela que esses conhecimentos
necessitam estar em diálogo com a realidade campesina que, durante décadas, foi invisibilizada
em detrimento de outros conhecimentos considerados hegemônicos, o qual Santos (2006)
chama de racionalidade técnica monocultural ou razão indolente.
222

Quando relacionamos essa linha pensamento hegemônico capitalista ao campo, ele é


considerado como espaço de atraso, sem valor, sem cultura, portanto, tudo que será de
incumbência do Estado pode ser mínimo e, em consequência disso, convive-se com políticas
precárias voltadas à educação, saúde, lazer e infraestrutura para sujeitos vistos também como
precários. De acordo com Arroyo (2004), o campo foi encarado, por muitos anos, como lugar
de atraso e a cidade como um espaço-tempo inovado repleto de avançadas tecnologias, portanto,
um lugar desenvolvido. Sendo assim, o atraso da educação rural se respalda na falta de demanda
de trabalhadores escolarizados e qualificados, pois, para muitos, no campo, não há demanda de
mercado, no entanto, não é necessária uma educação de qualidade, nem investimentos de
políticas públicas.

Para superar essa realidade, a Educação do Campo possui legitimidade nos processos didáticos
por ela desenvolvidos, tornando-os significativos e em defesa de um projeto de
desenvolvimento social, ecológico e economicamente justo. Neste projeto, a escola do campo
possui um papel estratégico, contemplado em suas especificidades e em suas propostas e
práticas pedagógicas. Portanto, na escolarização dos alunos público-alvo da Educação Especial
em salas multisseriadas do campo, compreendemos o quanto os currículos dessas escolas
necessitam reconhecer o Campo como um território repleto de modos de existência, saberes,
costumes, culturas ancestrais que precisam ser reconhecidos como válidos e explorados nas
práticas pedagógicas realizadas com os alunos. Por isso, Santos (2018) propõe reverter toda
lógica que engessa novas/outras possibilidades de produção das subjetividades humanas.

Acreditamos que investir na possibilidade de reinventar o currículo escolar em escolas


multisseriadas do campo, por meio do processo de tradução (SANTOS, 2018) dos
conhecimentos e de práticas pedagógicas inclusivas, se coloca como uma postura ética frente
ao direito de aprender de estudantes público-alvo da Educação Especial, assumindo, aqui, o
papel da escola de visibilizar e reconhecer a pluralidade de conhecimentos capazes de conceber
as subjetividades humanas como plurais e motoras da constituição de sociedades e escolas mais
justas, igualitárias e inclusivas.

Precisamos constituir movimentos de resistência para defender currículos que advoguem, como
afirma Boaventura de Sousa Santos (2008), por conhecimentos prudentes que levam a uma vida
decente. Falamos de currículos que possibilitem os estudantes encontrarem sentido no que lhes
é ensinado para analisar criticamente os processos de exclusão e desigualdade social tão
presentes nas sociedades capitalistas. Currículos que reconheçam a ecologia de saberes
223

existentes e que os estudantes têm o direito de se apropriar. O estudo aponta que currículos mais
acessíveis e comprometidos com a vinculação do estudante com a sociedade promove
emancipação e a formação de cidadãos capazes de buscar alternativas para enfrentamento da
desigualdade social e cognitiva que assola a trajetória de muitas pessoas. Currículos dessa
natureza são fundamentais para fortalecermos as escolas inclusivas que buscam se readequar
para atender aos itinerários de aprendizagem dos alunos.

Outro destaque se reporta à formação do professor para atuar em escolas do campo. Precisamos
trazer a temática para a formação inicial e garantir que ela tenha se expanda para a formação
continuada. Os povos do campo demandam de currículos que se comprometam com a mediação
dos conhecimentos, vistos não dentro de uma lógica monocultural, mas plural. Diante disso,
esse educador demanda se apropriar de conhecimentos a serem mediados com a turma; das lutas
e produções de homens e mulheres do campo e a do direito que cada estudante possui de ter a
sua diferença reconhecida, sem apagar a igualdade do direito de acessar o conhecimento. Diante
disso, a formação de professores precisa articular teoria e prática e ajudar esse profissional a
compor práticas pedagógicas que agucem a curiosidade discente e o desejo de aprender. Por
isso, os professores além do direito à formação, precisam contar com as redes de apoio para
fazer da sala de aula um lugar de aprendizagens.

CONCLUSÃO

O estudo está em fase de produção dos dados, mas nos possibilita fazer algumas reflexões que
corroboram a constituição de elementos responsáveis pela produção de conhecimento sobre as
interfaces da Educação Especial com a Educação do Campo.

Diante do que foi dito, compreendemos a necessidade de visibilizar os saberesfazeres dos


profissionais da educação, possibilitando espaçostempos de articulação entre currículo e o
atendimento educacional especializado na Educação do Campo, visando à construção de uma
proposta curricular inclusiva. Faz-se necessário fortalecer as lutas de homens e mulheres do
campo em defesa da Educação como direito social e garantir processos educativos inclusivos
realizados nas escolas do campo.

O processo de escolarização de alunos público-alvo da Educação Especial nas escolas


multisseriadas do campo perpassa por uma série de questões no âmbito cultural, social e político
que vem implicando no direito social à Educação. Lutas sociais vem sendo historicamente
224

firmadas para se combater a exclusão e a desigualdade de acesso ao conhecimento que tanto


afeta a aprendizagem.

Por este motivo, falar de Educação Especial como modalidade de ensino, dentro de uma outra
modalidade de educação, como na Educação do Campo, requer de nós professores-
pesquisadores um olhar atencioso e minucioso para o cotidiano escolar, a vistas de desconstruir
paradigmas, romper preconceitos e buscar por maiores possibilidades de articulação entre essas
modalidades e entre os currículos e o atendimento educacional especializado, objetivando
garantir aos estudantes público-alvo da Educação Especial a aprendizagem para além dos muros
escolares.

É inevitável discutir Educação do Campo sem considerar as propostas curriculares adequadas


a esta perspectiva de educação, bem como práticas pedagógicas que estejam de acordo com a
realidade dos sujeitos que a modalidade busca contemplar. A Educação do Campo apresenta a
necessidade de uma educação construída no âmbito da coletividade em que contemple os
anseios e as expectativas de suas populações. Tratar da educação das comunidades campesinas
é lançar um olhar sobre todo o processo em que se dá a relação ensino-aprendizagem, desde as
questões de infraestrutura até as propostas curriculares. Neste sentido, os diálogos constituídos
com os participantes no estudo vêm sendo fundamentais para compreender questões que
atravessam as práticas pedagógicas em classes multisseriadas, relacionando-as à inclusão de
alunos público-alvo da Educação Especial.

REFERÊNCIAS

ARROYO, M. G. Por um tratamento público da educação do campo. In: MOLINA, M. C;


JESUS, S. M. S. A. de (Org.) Contribuições para a construção de um projeto de Educação
do Campo. Brasília, DF: Coleção Por uma Educação do Campo, nº5, 2004.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
SANTOS, B. S. A gramática do tempo: para uma nova cultura política. São Paulo: Editora
Cortez, 2006.
SANTOS, B. S. Na oficina do sociólogo artesão: aulas 2011 – 2016. Ed. Cortez. São Paulo,
2018.
SANTOS, B. S. Um discurso sobre as ciências. 5. ed. - São Paulo: Cortez, 2008.
225

FORMAÇÃO CONTINUADA NA/DA ESCOLA NA EDUCAÇÃO INFANTIL E A


INCLUSÃO DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIAS

Clayde Aparecida Belo da Silva


claydeaparecidabelomariano@gmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

Alexandro Braga Vieira


allexbraga@hotmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

INTRODUÇÃO

O estudo buscou constituir processos de formação continuada com professores de uma unidade
de Educação Infantil da Rede Municipal de Cachoeiro de Itapemirim/ES, visando fortalecer a
inclusão de crianças pequenas com deficiências na primeira etapa da Educação Básica. Dentre
os desafios que atravessam a inclusão dessas crianças encontra-se o necessário investimento na
formação continuada dos professores, tendo em vista muitos desses profissionais vivenciarem
processos de formação inicial sem o aprofundamento teórico-prático acerca da Educação
Especial em uma perspectiva inclusiva, apresentando conhecimentos ainda superficiais sobre a
temática, além de frágeis políticas de formação continuada para os professores em atuação na
Educação Infantil.

A pesquisa foi realizada a partir do pressuposto que denominamos de formação na/da escola,
entendida como aquela realizada nos espaços-tempos escolares e a partir da escola. Diante
disso, objetivamos apresentar dados da pesquisa que desencadeou processos de formação
continuada na/da escola, visando à inclusão de crianças pequenas público-alvo da Educação
Especial e matriculadas na unidade de ensino pesquisada.

METODOLOGIA

O estudo busca sustentação em pressupostos qualitativos e na pesquisa-ação colaborativo-


crítica que busca constituir alternativas para os desafios e para as tensões existentes na realidade
investigada (FRANCO, 2005). Desenvolveu-se a partir dos seguintes procedimentos: a)
autorizações da Secretaria Municipal de Educação e da escola; b) observação do cotidiano
escolar para compreender os processos de inclusão escolar das crianças pequenas público-alvo
da Educação Especial na unidade de ensino; c) momentos de formação na/da escola,
226

considerando a interação entre a literatura da área e o que foi observado no transcorrer da coleta
de dados.

Os processos de formação na/da escola foram desenvolvidos nos espaços-tempos de


planejamento previstos na organização da escola. A unidade de ensino atende a crianças de dois
a cinco anos de idade, possuindo um quantitativo de 210 discentes – 100 no matutino e 110 no
vespertino –, dentre eles, cinco crianças com diagnóstico de deficiência intelectual.
Participaram da pesquisa: a dirigente escolar, uma coordenadora pedagógica, duas professoras
de classes comuns com matrícula de alunos público-alvo da Educação Especial e a docente do
atendimento educacional especializado. A pesquisa se realizou no período de março a dezembro
de 2017, com intervenções três vezes na semana (segundas, quartas e sextas-feiras) e adotou
como instrumento de registros: o diário de campo e o uso de gravadores para os momentos de
formação. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O processo de formação na/da escola desencadeou um conjunto de possibilidades de


adensamento do conhecimento teórico-prático docente acerca da inclusão das crianças
pequenas com deficiência na unidade de ensino de Educação Infantil analisada. Um primeiro
destaque diz respeito a importância de se articular as redes de apoio ao trabalho pedagógico da
classe comum. Em várias oportunidades formativas, o grupo de profissionais envolvidos no
estudo pôde refletir sobre a necessidade de fortalecer a participação das crianças público-alvo
da Educação Especial no currículo da classe comum, tendo em vista tal ação trazer um conjunto
de indícios do que deveria ser complementado/suplementado pelo atendimento educacional
especializado.

Conforme orienta a PNEE/2008, o atendimento educacional especializado disponibiliza


programas de enriquecimento curricular, com caráter complementar/suplementar, envolvendo
o ensino de linguagens e códigos específicos de comunicação e sinalização, ajudas técnicas e
tecnologia assistiva, dentre outros serviços que estarão presentes ao longo de todo processo de
escolarização, devendo estar articulados com a proposta pedagógica do ensino comum
(BRASIL, 2008).

Em assim sendo, a formação na/da escola colocou em análise a importância de envolvimento


das crianças pequenas com deficiências nos currículos da Educação Infantil, fortalecendo as
relações entre o educar, o brincar e o cuidar, buscando, nessas relações, o que cada
227

criança/grupo de criança trazia de mais específico a ser complementado/suplementado nos


momentos em que eram atendidas pelos professores de Educação Especial nas intervenções de
contraturno.

Outro eixo de debate trazido nos momentos de formação na/da escola se reportava aos modos
como as crianças público-alvo da Educação Especial eram significadas pela escola e que
mudanças de olhar/percepção se colocavam como necessárias. Muitas vezes, essas crianças são
simplificadas em suas condições, fazendo sobre elas recair um conjunto de prognósticos que
acenam para não possibilidades de aprendizagem e de desenvolvimento. Diante das questões
observadas no transcorrer da pesquisa, colocou-se em análise a necessidade de se reconhecer
que o humano é educável e capaz de aprender. Assim, os participantes da pesquisa eram
convidados a refletir sobre os impactos dos modos como subjetivavam as crianças, fazendo,
sobre elas recair laudos produzidos pelos modos como olhamos/significamos as trajetórias
daqueles que trazem demandas mais específicas de aprendizagem para os cotidianos escolares.
Esse eixo de discussão nos ajudou a refletir sobre o que Vieira (2015) denominou de “laudos
de olhar”, ou seja, rótulos que colocamos naqueles que fogem de modo mais drástico do que é
considerado padrão pela sociedade contemporânea. Tais “laudos” tem levado os profissionais
da Educação a inserirem um conjunto de “nãos” nas trajetórias escolares de estudantes com
deficiências, produzindo narrativas como “não aprendem”; “não conseguem”; “não devem estar
nas escolas”. A reflexão crítica sobre tais modos de produção de diagnósticos convidou o grupo
participante da pesquisa a colocar em análise os impactos dos modos como olham/avaliam as
crianças no usufruto do direito social à Educação.

Além dos laudos do olhar, o grupo foi convidado a refletir que o diagnóstico em Educação
Especial demanda debates na formação docente e nas práticas organizativas das escolas, tendo
em vista a dependência desses dispositivos para matrícula nas escolas comuns,
encaminhamentos ao atendimento educacional especializado e a crença de que os alunos com
laudo têm o direito de progressão automática. Bueno (2008) problematiza o olhar faltoso e
patológico sobre a escolarização e o desenvolvimento dos alunos, discutindo o quanto a escola
desmerece o que a pesquisa em Educação Especial aponta: um conjunto de elementos que criam
barreiras para acesso aos conhecimentos sistematizados. Diante disso, o diagnóstico em
Educação Especial precisa não somente colocar o estudante como o centro do processo
investigativo, mas também os sistemas de ensino atuando de modo mais amplo para que os
profissionais da escola possam requerer e constituir as condições objetivas para a realização do
228

trabalho pedagógico, o envolvimento dos alunos nos currículos e o atendimento às necessidades


específicas desses discentes.

O terceiro eixo trazido nos momentos de formação na/da escola constituídos pela investigação
se direcionou sobre os modos como os professores também se avaliavam/significavam como
professores de estudantes público-alvo da Educação Especial. Muitas vezes, mediante a
matrícula dessas crianças nas escolas de ensino comum, os docentes desenvolvem um
sentimento de paralisia docente, ou seja, um sentimento de que nada sabem para a mediação do
conhecimento com esses sujeitos. Diante disso, passamos a refletir sobre o que também
sabemos e, no caso da Educação Infantil, os conhecimentos docentes sobre as dimensões do
brincar, cuidar e educar. Descobrir o quanto o professor também dispõe de conhecimentos
necessários à inclusão das crianças com deficiências na primeira etapa da Educação Básica se
coloca como um caminho profícuo para se estreitar as redes de apoio com a classe comum e o
que pode ser complementado/suplementado pelo atendimento educacional especializado para a
criança ter maiores oportunidades de acessibilidade curricular.

CONCLUSÃO

A formação na/da escola associada à reflexão crítica da prática e a referenciais teóricos


comprometidos com o direito social à Educação pode se colocar uma política capaz de
fortalecer a acessibilidade curricular, o diálogo entre a classe comum e as redes de apoio e a
possibilidade de o atendimento educacional especializado se colocar
complementar/suplementar à escolarização de crianças público-alvo da Educação Especial na
Educação Infantil. Para tanto, há se constituir condições de trabalho, formação e valorização
para os profissionais da Educação para encontrar na escola possibilidades de reconhecê-la como
lócus de formação a partir da intrínseca relação teoria e prática. Tal perspectiva formativa
atrelada aos pressupostos da Educação Especial em uma abordagem inclusiva incentiva os
docentes a valorizarem a diversidade e a diferença como aspectos constitutivos dos processos
de ensino-aprendizagem e de sentirem mais capazes de constituir ações didáticas
comprometidas com a educabilidade humana, diminuindo os processos de exclusão que podem
se desenhar dentro da própria escola ou da sala de aula.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Educação. Política pública de educação especial na perspectiva da


educação inclusiva, 2008. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf. Acesso em: 20 ago. 2022.
229

BUENO, José Geraldo Silveira. As políticas de inclusão escolar: uma perspectiva de


educação especial? In: BUENO, José Geraldo Silveira; MENDES, Giovana Mendonça
Lunardi; SANTOS, Roseli Albino dos (org.). Deficiência e escolarização: novas perspectivas
de análise. Araraquara: Junqueira & Marin, 2008. p. 43-63.
FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia da pesquisa-ação. Educação e Pesquisa, São
Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, set./dez. 2005.
VIEIRA, Alexandro Braga. Táticas e estratégias constituídas por professores para a
articulação do currículo e o atendimento educacional especializado. 2015. Relatório de
PósDoutorado (Pós-Doutoramento em Educação) – Programa de Pós-Graduação em
Educação, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2015.
230

ESCOLARIZAÇÃO NO SISTEMA PRISIONAL, CIDADANIA E POBREZA:


DIÁLOGOS COM ALUNOS DO CENTRO DE DETENÇÃO PROVISÓRIA DE
SERRA-ES.

Flávia Induzzi Passos


Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
flaviainduzzi@hotmail.com

Flávio Gonçalves de Oliveira


Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
pflavio.filosofia123@gmail.com

INTRODUÇÃO

O crescimento da população carcerária brasileira evidencia a incontroversa negação de direitos


fundamentais à expressiva parcela da população, a ausência de políticas prisionais mais
definidas, o baixo investimento nas estruturas penitenciárias, o alto índice de encarcerados sem
condenação e a ausência de penas alternativas para as ocorrências mais leves.

Diante dessa realidade, o Estado não consegue suprir as necessidades básicas dos encarcerados
e muito menos de lhes proporcionar as mínimas condições para a manutenção da dignidade
humana. A superlotação, a ausência de atendimento básico à saúde e à educação, as precárias
condições de higiene, dentre outros problemas, resultam na violação de direitos que, para
muitos, já vinham sendo negados ao longo da vida.

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2021) pontua que o total de pessoas privadas de
liberdade no sistema penitenciário brasileiro, no ano de 2020, era de 753.966 presos. Ao
analisarmos a realidade social desses sujeitos, os dados mostram que 397.816 ou 66,3% dos
presos no país são pretos, 722.353 são homens, 24,6% pertencem à faixa etária de 18 a 24 anos
e 24,0% entre 25 e 29 anos, indicando, assim, que a população carcerária brasileira tem um
perfil definido: homens, pretos, jovens e pobres.

No centro dessas questões, está a histórica negação de direitos de sujeitos que vivem em um
país que foi e continua sendo excludente, governado por um Estado e por uma legislação que
criminalizam os pretos, os periféricos, os não escolarizados e, sobretudo, os pobres e os
extremamente pobres. A esses sujeitos, inúmeros direitos foram negados: o direito a uma vida
digna, à alimentação, à moradia, ao trabalho, à segurança, ao lazer. Por terem uma história
marcada pelo empobrecimento ao longo da vida e por estarem expostos a todo o tipo de
231

violência, esses sujeitos violam as leis elaboradas pela sociedade e por ela são condenados ao
sistema prisional.

Mediante esses apontamentos, destacamos algumas problemáticas que instigam e movem esta
pesquisa. A primeira delas evidencia a falta de consciência dos encarcerados em relação a
diversos direitos que lhes foram negados, o que compromete o exercício da plena cidadania.
Considerando que estamos lidando com sujeitos privados de liberdade, uma segunda
problemática está relacionada à negação do acesso à educação no sistema prisional. A falta de
oportunidades de forma igualitária e a injusta sociedade de classes, responsável pelos históricos
processos de exclusão que atingem os pobres e os extremamente pobres, também
impossibilitam o acesso dos detentos a um processo educacional de qualidade.

Com isso, destacamos a urgência em trazer para o debate os efeitos da pobreza e da extrema
pobreza na vida desses sujeitos, entendendo a pobreza como resultado da negação de direitos,
e as possibilidades de enfrentamento dessa condição social por meio da educação formal e de
qualidade, inclusive no sistema prisional.

METODOLOGIA

No intuito de dialogar com os alunos custodiados, a partir da realidade social e educacional em


que se encontram, evidenciamos a necessidade de entender como se dá o processo de
escolarização no cárcere e como a histórica negação de direitos a esses sujeitos impossibilita o
acesso à plena cidadania. Pensando na educação como um direito social que contribui para a
elaboração e fortalecimento da cidadania, direito frequentemente negado, esta pesquisa busca
compor momentos dialógicos e formativos com detentos do Centro de Detenção Provisória da
Serra (CDPS), matriculados em duas turmas multisseriadas de 1º segmento dos Anos Iniciais
do Ensino Fundamental.

Para a concretização do estudo, optamos pela pesquisa-ação colaborativa por busca o caráter
participativo através da escuta sensível e contínua, permitindo a intervenção do pesquisador na
realidade vivida pelo sujeito pesquisado. Recorremos a Franco e Pimenta (2018, p. 51) quando
afirmam que “a pesquisa-ação vem sendo proposta há algumas décadas, por incluir os
participantes e promover possibilidades de transformação da realidade social”.

Com base nas escolhas metodológicas, realizamos um curso de formação dentro da sala de aula
do Centro de Detenção e, no decorrer desse processo, dialogamos com os participantes, alunos
232

e professores, como forma de entender e interpretar a realidade dos sujeitos encarcerados. O


CDPS é uma unidade prisional pública, masculina, de caráter provisório, criada em julho de
2009, localizada na zona rural de Queimados, município de Serra, com capacidade de
atendimento de 548 detentos, mas que, atualmente, atende 1031 custodiados. A estrutura física
para ensino, de acordo com dados do Governo do Estado do Espírito Santo, constitui-se de uma
sala de aula adaptada, uma biblioteca e duas salas para cursos.

A unidade prisional é atendida pela Escola Estadual de Ensino Fundamental Professora


Adevalni Azevedo, caracterizada como escola referência pelo acompanhamento administrativo
e pedagógico das duas turmas multisseriadas de 1º segmento (1ª a 4ª etapa) da Educação de
Jovens e Adultos (EJA), que funcionam dentro do Centro de Detenção. Os participantes da
pesquisa são os alunos dessas 2 turmas, totalizando, em média, 30 estudantes do sexo
masculino, e cada turma é ofertada em um turno. O grupo selecionado para os movimentos
dialógicos é composto por detentos que respondem à acusação de crime sexual, tendo como
faixa etária entre 30 e 50 anos, em sua maioria solteiros, pais e pardos.

Na composição dos movimentos dialógicos e formativos, realizamos quatro encontros de duas


horas por turma, totalizando oito encontros e dezesseis horas de diálogo. Os encontros
abordaram as seguintes temáticas: 1º) pobreza e direitos humanos; 2º) pobreza, educação e
cidadania; 3º) pobreza e políticas públicas; 4º) educação, pobreza e reinserção social.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A partir dos diálogos estabelecidos, observamos que a problemática da pobreza e da extrema


pobreza está presente nos relatos dos alunos e que maioria deles vivenciou/vivencia essa
condição desde a infância, o que se estende ao longo da vida. Muitos tiveram que trabalhar para
ajudar no sustento da família quando crianças e não conseguiram concluir a educação básica,
nem ao menos o Ensino Fundamental I.

Cararo (2015) argumenta que a pobreza é um acontecimento historicamente enraizado na


sociedade brasileira, com dimensões múltiplas, que ultrapassa a questão econômica e se
expande para a desigual distribuição de renda, a falta de acesso a serviços públicos básicos, a
não garantia à participação social e política.

A condição de pobreza também exerce influência no destino dos encarcerados do CDPS, visto
que apenas 10% dos alunos pesquisados têm assistência jurídica de um advogado particular e
233

os demais são assistidos pela defensoria pública, o que pode se constituir como um entrave para
os julgamentos, levando anos até que recebam a sentença. O que frequentemente foi apontado
pelos detentos é o desejo pela garantia de direito de investigação, defesa e julgamento.

A grande maioria demonstrou preocupação com a vida e a reinserção social após o cumprimento
da pena. “Como vou conseguir emprego depois que sair daqui? Eles procuram saber e não
contratam a gente porque somos ex-presidiários”. Apontaram que os crimes pelos quais foram
presos gera ainda mais preconceito e que estão cientes de que dificilmente serão aceitos em
outro meio, o que provoca insegurança.

No tocante à educação, manifestaram o desejo de aprender, de estar na escola, por entenderem


que a escola é uma via possível de superação para a condição de pobreza e de encarceramento
na qual se encontram. Demonstraram, ainda, vontade de aprender a ler e a escrever, para
“arrumar emprego”, “aprender mais”, “alcançar objetivos na vida”.

Cabe ressaltar que a educação, antes de tudo, é um direito universal que deve ser assegurado a
todas as pessoas, independentemente da condição social. É um direito que potencializa o
exercício de outros direitos como o trabalho, a saúde, a segurança e a participação cidadã. A
educação auxilia e permite a obtenção dos objetivos centrais de (re)habilitação que incidem em
resgate social em uma dimensão de autonomia, sustentabilidade e minimização da
discriminação, auxiliando os custodiados no processo de reconstrução social.

Ainda que a compreensão sobre a importância da educação esteja presente na sociedade e a


garantia do acesso à escola seja respaldado por lei, para muitos detentos, o presídio é o espaço
onde a ação educativa é iniciada. Mendes (2011, p. 24) aponta a condição de criação desses
indivíduos: sem afeto, sem oportunidade de lazer nas comunidades onde viviam, com uma
escola excludente e sem a oportunidade de exercício da cidadania, “afastando-se dela e do
direito de pertencer a uma sociedade”.

Apesar de educação brasileira ser alienante, elitizada, focada na acumulação do capital e para a
sujeição ao trabalho, o processo de escolarização é importante para que o indivíduo se liberte e
consiga enxergar um horizonte que não seja o mundo do crime (FERREIRA, 2010).

CONCLUSÃO
O processo educacional de qualidade compreende fortalecer a noção de cidadania nos sujeitos
através de práticas emancipadoras criadas a partir de mediações pedagógicas concretas. Assim,
234

a educação precisa ser garantida a todos os sujeitos, inclusive aos encarcerados, para que seja
consolidada a construção da cultura do direito, da participação, da democracia e do exercício
da cidadania.

Concordamos que a sociedade precisa avançar em políticas públicas para que o acesso à escola
seja garantido a todos e os saberes escolares façam sentido para os alunos (TASONIERO,
2018). As problemáticas se acumulam e se confirmaram nos encontros no CDPS. Contudo,
apostamos que escolarização dos sujeitos encarcerados se apresenta como possibilidade de
enfrentamento da condição de pobreza, compreendendo-os como um público oriundo de
processos de exclusão que precisam ser superados para que tenhamos uma sociedade mais justa
e igualitária.

REFERÊNCIAS

CARARO, M. de F. O Programa Mais Educação e suas interfaces com outros programas


sociais no combate à pobreza e à vulnerabilidade social: intenções e tensões. Tese
(Doutorado em Educação). Universidade Federal do Espírito Santo. Vitória. 2015.
FERREIRA, A. R. Crime-prisão-crime: o círculo vicioso da pobreza e a reincidência no
crime. Dissertação (Mestrado em Serviço Social). Universidade Federal de Juiz de Fora. Juiz
de Fora. 2010.
Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Anuário Brasileiro de Segurança Pública. ISSN
1983-7364. Ano 15. 2021. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-
content/uploads/2021/07/anuario-2021-completo-v6-bx.pdf. Acesso em: 26 set. 2021.
FRANCO, M. A. S.; PIMENTA, S. G. (org.). Pesquisa em educação: a pesquisa-ação em
diferentes feições colaborativas. São Paulo: Edições Loyola, 2018.
MENDES, F. C. de F. Um mundo dentro de outro mundo: educação prisional no estado de
Pernambuco. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal de Pernambuco.
Recife. 2011.
TASONIERO, G. A educação nas prisões: um estudo sobre a perspectiva de emancipação
humana. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Estadual do Oeste do Paraná.
Cascavel. 2018.
235

EDUCAÇÃO BILÍNGUE DE SURDOS: ANÁLISE DA NOVA MODALIDADE DE


ENSINO NO CONTEXTO DA LDB

Erica Esch Machado


Instituto Nacional de Educação de Surdos
ericam78@yahoo.com.br

Elizabeth Serra
Instituto Nacional de Educação de Surdos
serra@ines.gov.br

INTRODUÇÃO

O presente estudo tem como objetivo analisar as mudanças operadas pela Lei 14.191/21,
estatuto que dispôs sobre a modalidade Educação Bilíngue de Surdos (EBS) no texto da atual
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), n. 9.394/96.

A educação de surdos tem ganhado cada vez mais destaque nos debates sociais e acadêmicos.
Nas últimas duas décadas, a comunidade surda vem propugnando por uma educação bilíngue39,
pela valorização da Língua Brasileira de Sinais (Libras) e pelo reconhecimento da singularidade
sociolinguística e identitária dos surdos (SKLIAR, 1999; QUADROS, 2006; SOUZA, 2006;
STUMPF, 2009). Nesse contexto, os movimentos surdos40 advogam pela implementação de
classes e escolas bilíngues de surdos e pelo fortalecimento das já existentes41.

A intensificação do processo de luta por uma educação bilíngue e dos Estudos Surdos ocorreu
nos anos de 1990, indo ao encontro de um processo já existente em outros países. Iniciava-se,
pois, a construção de um arcabouço epistemológico em que os surdos passavam a ser
compreendidos não como deficientes, mas como um grupo político/linguístico minoritário

39
Abordagem pedagógica que leva consideração as especificidades dos estudantes surdos, tendo a Libras como
língua de instrução e a Língua Portuguesa, na sua modalidade escrita, como segunda língua. O presente texto irá
utilizar o termo “educação bilíngue” para se referir a essa abordagem e a sigla EBS para tratar da nova modalidade
instituída pela Lei 14.191/21.
40
A rigor, existem vários itinerários quando se trata de movimentos surdos; há aqueles que defendem a
singularidade linguística dos surdos e o reconhecimento da língua de sinais, assim como aqueles que propugnam
pelo uso de tecnologias para possibilitar a audição e a oralização – a exemplo do movimento Surdos que ouvem.
Contudo, considerando a delimitação do escopo deste trabalho, serão abordados apenas os primeiros tipos de
movimentos surdos indicados acima, os quais, por sua vez, embora reivindiquem os direitos linguísticos dos
surdos, não possuem, de certo, uma proposta monolítica frente aos processos de contestação/resistência/luta na
sociedade. Desse modo, a sua indicação se mantém pluralizada no presente texto: movimentos surdos.
41
Segundo informação disponível no sítio do Ministério da Educação (2021), baseada em dados do Inep (2020),
no Brasil, atualmente, existem 64 escolas bilíngues de surdos, com 63.106 educandos surdos matriculados.
236

(FERNANDES, MOREIRA, 2014), deslocando-se (ou buscando se deslocar), portanto, do


âmbito da educação especial.

Nesse sentido, indaga-se: considerando as demandas dos movimentos surdos, quais os


principais avanços contidos no texto da Lei 14.191/21? Quais as possíveis lacunas e/ou limites?

METODOLOGIA

Para atingir o objetivo da pesquisa, foi realizada uma pesquisa do tipo documental (GIL, 1991),
tendo como principal objeto de estudo a Lei 14.191/21, a qual, como acenado, dispõe sobre a
modalidade EBS. Esse tipo de pesquisa, segundo Gil (ibid, p. 52), constitui uma “fonte rica e
estável de dados”. Utilizou-se como referência para a análise as principais demandas dos
movimentos e Estudos Surdos em relação à abordagem educacional bilíngue.

RESULTADOS E DICUSSÕES

Ao longo dos anos, os movimentos surdos lograram importantes conquistas; no que se refere
aos ordenamentos, podem ser citados os seguintes textos, os quais, apesar de seus limites,
reconhecem direitos linguísticos e educacionais: Declaração Universal dos Direitos
Linguísticos (1996), Lei 10.436/02, Decreto 5.626/05, Decreto 6.949/09 (que aprovou a
Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência), Lei 13.005/14 (que
aprova o Plano Nacional de Educação), Lei 13.146/15 (Lei Brasileira da Inclusão) e a Lei
14.191/21 – documento objeto de estudo deste trabalho. No Decreto 5.626/05, a pessoa surda
foi conceituada como “aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo
por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua
Brasileira de Sinais – Libras” (BARSIL, 2005). Contudo, no texto da LDB, até 2021, não havia
referência ao termo “surdos” e à língua de sinais.

Quanto à Lei 14.191/21, destacam-se, inicialmente, dois elementos fulcrais ao atendimento das
demandas históricas dos movimentos surdos: a inclusão de um novo princípio à educação
nacional que consigna “o respeito à diversidade humana, linguística, cultural e identitária das
pessoas surdas, surdo-cegas e com deficiência auditiva” (BRASIL, 2021) e o reconhecimento
da educação bilíngue de surdos como uma modalidade de educação escolar própria (art. 60-A).
A conceituação dessa nova modalidade endossou o já previsto no inciso IV do art. 28 da LBI
no que se refere ao reconhecimento da Libras como primeira língua, mas acrescentou outros
aspectos, especificando os sujeitos que poderiam optar por esse tipo de ensino (surdos, surdo-
237

cegos, com deficiência auditiva sinalizantes, surdos com altas habilidades ou superdotação ou
com outras deficiências associadas) e fazendo referência aos loci formativos (escolas bilíngues
de surdos, classes bilíngues de surdos, escolas comuns ou em polos de educação bilíngue de
surdos)42. Sobre o conceito apresentado no art. 60-A, nota-se a ausência de referência a questões
pedagógicas que envolvem o oferecimento da educação bilingue de surdos (currículo,
planejamento, metodologias, formas de avaliação etc.) e que vão além da presença da Libras
como como língua de instrução. De todo modo, no âmbito das Disposições Gerais da LDB,
foram acrescentados alguns dispositivos envolvendo esses temas, tal como será visto mais
adiante.

Em relação ao oferecimento da EBS, a Lei 14.191/21, indicou o início ao “zero ano” e,


diferentemente dos ordenamentos anteriores, fez referência à EBS ao “longo da vida”. A
despeito das críticas que se possa fazer a esse conceito – em geral, com enfoque mercadológico
(GADOTTI, 2022) –, é interessante notar a preocupação em não restringir a EBS à educação
básica.

No que tange à formação docente, a Lei 14.191/21 determinou a necessidade de se assegurar


“professores bilíngues com formação e especialização adequadas, em nível superior” (art. 60-
B); e a garantia de participação das entidades representativas das pessoas surdas em “processos
de contratação e avaliação periódica dos professores” bilíngues (§ 1º do art. 60-B). Não fica
claro, porém, quais os cursos que ofereceriam essa formação adequada. Ademais, o texto não
sinaliza a periodicidade, os critérios, as formas de avaliação dos docentes bilíngues e quais
atores integrantes dessas entidades poderão participar da avaliação. A redação não especifica,
ainda, se tal avaliação seria ou não um pré-requisito para atuação docente ou para continuidade
dessa atuação. Entende-se que, a despeito de a avaliação ser fundamental no processo
educacional, é preciso considerar sempre a forma como ela é realizada e os objetivos a que
serve.

O referido documento, porém, não altera o artigo § 3º do art. 32, que define que o ensino
fundamental regular deve ser “ministrado em língua portuguesa”, assegurando (somente) às
comunidades indígenas a utilização de suas línguas maternas. A rigor, esse artigo reafirma o
que está previsto na Constituição de 1988 e, talvez, por isso, não tenha sido alterado. Porém,
vale lembrar que o Decreto 6.949/09, que tem status de Emenda Constitucional, garante que a

42
Vale advertir que, nos termos inscritos na LBI (caput do art. 28 e seu §1º), o oferecimento da educação bilíngue
de surdos foi definido como obrigatoriedade apenas do poder público e não das instituições privadas.
238

educação de pessoas surdas e surdocegas seja ministrada nas línguas mais adequadas a esses
indivíduos.

Além da introdução do novo princípio da educação nacional e da destinação de um capítulo


próprio para a EBS (V-A), a Lei 14.191/21 adicionou dois parágrafos no campo das Disposições
Gerais da LDB. O primeiro (78-A) trata de programas integrados de ensino e pesquisa a serem
desenvolvidos pelos sistemas de ensino, em regime de colaboração. O outro artigo (79-A) traz
a responsabilidade da União, em termos de apoio técnico e financeiro aos sistemas de ensino,
no provimento da “educação bilíngue e intercultural às comunidades surdas” (BRASIL, 2021),
por meio de “programas integrados de ensino e pesquisa” (ibid, ibid), com a participação das
comunidades surdas e de entidades representativas das pessoas surdas. Tais programas devem,
de acordo com o § 2º, ser incluídos no PNE. Os programas têm uma preocupação com a
formação de profissionais da educação e com o desenvolvimento de questões pedagógicas
(currículo, métodos, práticas e material didático) da educação bilíngue.

CONCLUSÃO

A análise realizada mostrou que a Lei 14.191/21 apresenta importantes conquistas se forem
consideradas demandas dos movimentos surdos, mesmo com os seus não-ditos e limites. Nesse
documento, os programas para o desenvolvimento da educação bilíngue de surdos devem ser
construídos de forma participativa, sendo entendidos como compromissos do Estado brasileiro
(posto que precisam ser inseridos no PNE) e não como propostas de governo. Além disso, a
nova lei faz referência ao papel da União (em relação à implementação da EBS e/ou ao seu
aprimoramento), ao regime de colaboração e ao PNE. Todos esses temas são muito caros à
educação, mas a tônica das atuais políticas governamentais tem sido a desresponsabilização da
União no provimento da coisa pública – com consequente sobrecarga dos demais entes
federados, especialmente, dos municípios –, o autoritarismo e a desconsideração do PNE como
plano do Estado brasileiro. Desse modo, embora a nova lei apresente relevantes avanços, eles
nascem num terreno devastado, totalmente infértil aos processos democráticos e à produção de
políticas verdadeiramente públicas.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei 14.191, de 3 de agosto de 2021. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de


1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), para dispor sobre a modalidade de
educação bilíngue de surdos. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
2022/2021/Lei/L14191.htm. Acesso em: 3 ago. 2021.
239

FERNANDES, S.; MOREIRA, L. C. Políticas de educação bilíngue para surdos: o contexto


brasileiro. Educar em Revista, Curitiba: UFPR; Edição Especial n. 2, p. 51-69, 2014.
Disponível em: https://revistas.ufpr.br/jpe/article/view/40307. Acesso em: 15 dez. 2014.
GADOTTI, Moacir. Educação Popular e Educação ao longo da vida. Disponível em:
https://www.paulofreire.org/images/pdfs/Educacao_Popular_e_ELV_Gadotti.pdf. Acesso em:
23 fev. 2022.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 1991.
SKLIAR, Carlos. A localização política da educação bilíngue para surdos. In: ______ (Org.).
Atualidade da educação bilíngue para surdos: processos e projetos pedagógicos. 4. ed. Porto
Alegre: Mediação, 2013, p. 7-14.
QUADROS, Ronice Müller de. Situando as diferenças implicadas na educação de surdos:
inclusão/exclusão. Ponto de Vista, Florianópolis, n. 5, p. 81-111, 2003. Disponível em: <
http://projetoredes.org/wp/wp-content/uploads/quadros.pdf>. Acesso em: 20 ago. 2021.
SOUZA, Regina Maria de; GOÉS, Maria Cecília Rafael de. O ensino para surdos na escola
inclusiva: considerações sobre o excludente contexto da inclusão. In: SKLIAR, Carlos. (Org.).
Atualidade da educação bilíngue para surdos: processos e projetos pedagógicos. 4. ed. Porto
Alegre: Mediação, 2013, p. 163-188.
STUMPF, Mariane Rossi. A educação bilíngue para surdos: relatos de experiências e a
realidade brasileira. In: QUADROS, Ronice Müller; STUMPF, Mariane Rossi (Orgs.).
Estudos Surdos IV. Série Pesquisas. Petrópolis, RJ: Arara Azul, 2009, p. 425-450.
240

IMPLICAÇÕES DA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA


PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR NO ESPÍRITO SANTO

Alexandro Braga Vieira


allexbraga@hotmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

Shellen de Lima Matiazzi


shematiazzi@hotmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo – UFES

INTRODUÇÃO

Elaborada por um Grupo de Trabalho nomeado pela Portaria nº. 555/2007, prorrogada pela
Portaria nº. 948/2007 e entregue ao Ministro da Educação, em 07 de janeiro de 2008, a Política
Nacional de Educação Especial em uma perspectiva inclusiva (PNEE/2008) apresentou um
conjunto de orientações político-pedagógicas direcionadas a subsidiar os processos de
escolarização de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades-superdotação nas escolas de ensino comum. Encaminhamentos quanto ao público-
alvo da Educação Especial, financiamento, perspectiva político-pedagógica do atendimento
educacional especializado, funcionamento das salas de recursos multifuncionais e formação de
professores são alguns elementos que compõem o documento supracitado.

Diante da assertiva, realizamos um estudo com as redes públicas de ensino do Espírito Santo
para compreender as implicações da PNEE/2008 nas políticas locais, envolvendo profissionais
da Educação Especial que atuam no atendimento educacional especializado e em Secretarias de
Educação, buscando pela produção de conhecimentos comprometidos em fortalecer as ações
político-pedagógicas necessárias aos processos de escolarização dos alunos nas escolas
comuns.

METODOLOGIA

O estudo teve por objetivo cartografar as políticas locais de Educação Especial impulsionadas
pela PNEE/2008, envolvendo municípios localizados no Estado do Espírito Santo, tendo em
vista o fortalecimento do direito à Educação para estudantes com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.
241

Por meio de grupos focais, realizados remotamente, no segundo semestre de 2020 e primeiro
de 2021, envolveu professores do atendimento educacional especializado e gestores de
Educação Especial de Secretarias Municipais de Educação e da Rede Estadual para analisar
atravessamentos do documento nos seguintes âmbitos: a) matrícula; b) redes de apoio; c)
atendimento educacional especializado; d) público-alvo da Educação Especial; e) gestão das
unidades de ensino em uma perspectiva inclusiva; f) dentre outros. Para tanto, envolveu redes
de ensino da: a) região metropolitana de Vitória; b) serrana; c) sul; d) norte. Foram constituídos
subgrupos de pesquisa entre professores da Ufes, mestrandos, doutorandos e bolsistas de
iniciação científica para coordenar os grupos focais em cada uma dessas regiões. Ao todo,
estiveram envolvidos em torno de 80 (oitenta) participantes na investigação.

Como caminho teórico-metodológico, recorre aos pressupostos da pesquisa qualitativa e da


cartografia em Educação, buscando sustentação em Boaventura de Sousa Santos (2007, 2008)
para compor conhecimentos sobre os impactos da PNEE/2008 nas várias políticas públicas de
Educação Especial e no enfrentamento dos desafios que ainda atravessam o direito à Educação
para essa população específica de estudantes.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O estudo evidenciou (a partir da análise dos dados produzidos nos grupos focais) os
movimentos que foram impulsionados no Estado do Espírito Santo com a publicação da
PNEE/2008. Uma primeira questão versa sobre a crescente matrícula de alunos com
deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas
escolas comuns capixabas, situação que dialoga com o referido documento quando reafirma o
direito à Educação para esses estudantes nas escolas comuns, assegurando “[...] políticas
públicas promotoras de uma educação de qualidade para todos os alunos” (BRASIL, 2008, p.
5).

A matrícula desses estudantes tem impulsionados a criação de redes de apoio nas unidades de
ensino, situação que busca se efetivar na contratação de professores de Educação Especial,
estagiários, cuidadores, intérpretes de Libras, dentre outros. Percebe-se que documentos como
a PNEE/2008 quando se colocam impulsionadores do direito social à Educação para os
estudantes aqui mencionados, acabam por também fomentar a constituição de várias políticas
para que os professores encontrem maiores condições de trabalho e os discentes o acesso ao
conhecimento.
242

A formação de professores também se apresentou como uma política que vem se fortalecendo
no Espírito Santo a partir da PNEE/2008, tendo em vista o referido documento sinalizar que
“[...] para atuar na educação especial, o professor deve ter como base da sua formação, inicial
e continuada, conhecimentos gerais para o exercício da docência e conhecimentos específicos
da área”. O citado documento também se reporta aos professores do ensino comum e convoca
os sistemas de ensino a ampliarem as políticas de formação para todos os professores, de modo
tal que formação comtemple “[...] conhecimentos de gestão de sistema educacional inclusivo,
tendo em vista o desenvolvimento de projetos em parceria com outras áreas, visando à
acessibilidade arquitetônica, os atendimentos de saúde, a promoção de ações de assistência
social, trabalho e justiça” (BRASIL, 2008, p. 18).

Quanto ao atendimento educacional especializado, os participantes sinalizaram o crescimento


da instalação de salas de recursos multifuncionais nas escolas comuns para intervenções mais
específicas com os estudantes a partir de suas demandas de aprendizagem. No entanto, apontam
a necessidade de trazer tal debate para os momentos de formação de professores para que se
possa adensar os conhecimentos teórico-práticos sobre o que vem a ser as atividades
complementares/suplementares a serem desenvolvidas com esses estudantes. Além disso, há de
se ampliar a compreensão sobre o atendimento educacional especializado para que ele esteja
presente em todas as atividades pedagógicas e não fique restritivo às salas de recursos
multifuncionais. Conforme assegura a PNEE/2008, “[...] o atendimento educacional
especializado identifica, elabora e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade que
eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando as suas necessidades
específicas” (BRASIL, 2008, p. 16).

Sobre o alunado a ser contemplado pelas políticas de Educação Especial, os participantes dos
grupos focais sinalizaram que o conceito outrora utilizado “estudantes com necessidades
educacionais especiais”, trazido em outros documentos internacionais e nacionais – como a
Declaração de Salamanca de 1994 e a Resolução nº 2/2001 de 11/09/2001) –, levava as redes
de ensino a encaminharem todos os alunos com trajetórias mais diferenciadas de aprendizagem
para os serviços de Educação Especial. Em contrapartida, com a PNEE/2008, foram delimitados
“aqueles com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação”, no entanto, mediante o fato de no Espírito Santo se (e até no
contexto brasileiro de modo mais amplo) significar a Educação Inclusiva na Educação Especial,
a delimitação desses três grupos de alunos e a inexistência de outras redes de apoio para outros
estudantes, as escolas acabam por ficar sem apoios, produzindo o que podemos chamar de
243

deficiência socialmente produzida, para que o aluno venha ter algum tipo de apoio. Como
afirma Santos (2007, p. 30), convivemos em uma sociedade que “[...] não se sabe pensar
diferenças com igualdade; as diferenças são sempre desiguais”. Diante disso, emerge a
necessidade de criação de redes de apoio plurais para apoio a estudantes diversos e
investimentos na formação dos profissionais da Educação para entender as aproximações e
singularidades entre os pressupostos da inclusão escolar e a Educação Especial.

A gestão das escolas e dos currículos se colocaram como eixos de análise, tendo em vista a
importância de as escolas de reorganizarem para acolhimento das trajetórias de aprendizagem
dos alunos. Os participantes reiteraram a relevância de se ampliar as reflexões sobre a Educação
Especial com os gestores das unidades de ensino, tendo em vista a necessidade de incorporação
da temática nos Projetos Políticos Pedagógicos e nos Planos de Ação. Compreendem que a
Educação Especial ganhou impulsos a partir de documentos e normativas nacionais e
internacionais (como a PNEE/2008), necessitando muitas unidades de ensino ainda se
readequarem arquitetonicamente e no campo curricular para garantir aos estudantes a
acessibilidade curricular. Os participantes no grupo focal compreendem avanços nos processos
de inclusão dos alunos quanto analisam as matrículas e as políticas de permanência, mas
reconhecem que o direito à apropriação do conhecimento se coloca repleto de desafios, situação
que nos leva a concordar com Santos (1996, p. 37) quando nos leva a pensar na constituição de
uma sociedade e escola a partir “[...] do paradigma de um conhecimento prudente para uma
vida decente”.

Os participantes da pesquisa apontam movimentos sendo impulsionados pela PNEE/2008 no


Estado do Espírito Santo, por isso há de se enfrentar qualquer documento ou política que venha
enfraquecer os avanços obtidos na ainda tênue caminhada em função da defesa da escola para
todos e a Educação Especial em uma perspectiva inclusiva.

CONCLUSÃO

A pesquisa apontou que a PNEE/2008 tem fortalecido os movimentos que vêm sendo
constituídos no Estado do Espírito Santo para a garantia de acesso, permanência e aprendizagem
na escola comum para os estudantes com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento
e altas habilidades/superdotação.

Nenhuma política, documento e normativa está finalizando, mas, mesmo reconhecendo o


quanto a PNEE/2008 necessita passar por processos de refinamento, ela se coloca como
244

indutora de políticas comprometidas com o direito social à Educação, por, dentre vários
motivos, convocar o Estado a assumir o seu papel na implementação de políticas para que as
escolas se configurem inclusivas e reafirmar o direito à Educação na igualdade/diferença.
Podemos dizer que no Estado do Espírito Santo, há um mosaico de políticas visando à
escolarização dos estudantes aqui mencionados nas escolas comuns, assim como um conjunto
de desafios a serem enfrentados, no entanto, precisamos sempre avançar e enfrentar quaisquer
linhas de pensamento que busquem enfraquecer direitos socialmente conquistados, dentre eles,
o da Educação das pessoas com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Ministério da Educação. Política pública de educação especial na perspectiva da


educação inclusiva, 2008. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf. Acesso em: 20 agos. 2022.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. 8. ed. Porto: Afrontamento,
1996.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Renovar a teoria crítica e reinventar a emancipação
social. São Paulo: Boitempo, 2007.
245

JUVENTUDE E EDUCAÇÃO ESCOLARIZADA: MOVIMENTOS CULTURAIS EM


CONTEXTOS EMPOBRECIDOS

Flávio Gonçalves de Oliveira


pflavio.filosofia123@gmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Flávia Induzzi Passos


e-mail: flaviainduzzi@hotmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Renata Duarte Simões


renasimoes@hotmail.com
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

INTRODUÇÃO

A pesquisa dialoga com as culturas juvenis em contextos escolares empobrecidos e tem como
objetivo central compor movimentos culturais com jovens matriculados no ensino médio, em
uma escola pública estadual localizada no município de Cariacica/ES, visando elaborar
possibilidades de enfrentamento da pobreza e da extrema pobreza que impactam a vida de
parcela considerável desses sujeitos nos espaços/tempos escolarizados.

Constatamos que as práticas escolarizadas têm se distanciado das expressões culturais


elaboradas pelas juventudes, principalmente daquelas produzidas em contextos empobrecidos,
tomadas, quase sempre, como problemas à ordem social ou como manifestações de rebeldia.
Tal comportamento reforça o olhar estereotipado sobre os jovens pobres, vistos como sujeitos
vulneráveis ou como “alunos problemáticos”. Assim, há um hiato entre a escolarização e as
sociabilidades expressas nas culturas juvenis, o que requisita alternativas de diálogo com esses
sujeitos.

Provocados a buscar novas orientações e rotas de contato (PAIS, 2006), dialogamos com as
juventudes empobrecidas direcionando olhares para as potencialidades e destacando as
sociabilidades produzidas pelos jovens ao organizarem as próprias vivências. As conversações
apontam que os jovens que adentram os espaços/tempos escolares são identidades singulares,
que produzem conhecimentos e saberes que não podem ser negligenciados pela educação
formal. Pesquisadores como Abramo (1994) e Dayrell (2003; 2007), entre outros, evidenciam,
em seus estudos, a diversidade de formas com que a condição juvenil é vivida e experimentada
e nos convidam a pensar os jovens como sujeitos sociais.
246

Considerando os aspectos supracitados, indagamos: como a educação escolar vem pensando as


culturas juvenis nos contextos empobrecidos? Que redes de diálogo podem ser compostas nos
espaços/tempos escolares, no intuito de buscar aproximações com sociabilidades constituídas
pelos jovens?

Diante de tais indagações, apostamos na composição dos movimentos culturais como


espaços/tempos dialógicos e formativos, em caráter colaborativo, com as juventudes
atravessadas pela pesquisa. Buscamos, no âmbito da educação escolarizada, constituir outras
relações com os jovens empobrecidos por meio da afirmação de saberes e conhecimentos que
dialoguem com suas sociabilidades.

METODOLOGIA

Para responder ao problema de pesquisa, optamos pela abordagem qualitativa. Por ser uma
investigação de cunho social e empírico, essa abordagem busca conhecer a maneira com que os
sujeitos se relacionam e significam os cotidianos. Assim, a pesquisa visa construir, na interação
com os participantes, possibilidades de adentrar e intervir nos contextos sociais (MINAYO,
2001).

Na composição dos movimentos culturais com os jovens, adotamos os procedimentos da


pesquisa-ação, cujo princípio fundamental é o diálogo contínuo entre o pesquisador e os
participantes da pesquisa, com o desafio de construir coletivamente possibilidades de
transformação da realidade (BARBIER, 2007). A pesquisa-ação possibilita intervir na realidade
vivenciada pelos sujeitos e, em um intenso esforço de reflexão e ação, pensar alternativas para
o enfrentamento do problema colocado.

A pesquisa-ação se realiza por meio dos movimentos culturais com jovens entre 15 e 17 anos,
matriculados no ensino médio, marcados, em sua maioria, pela condição de pobreza e extrema
pobreza. Selecionamos os participantes considerando a configuração socioeconômica dos
sujeitos, oriundos de famílias atendidas por programas sociais e de transferência de renda ou
que recebem algum benefício social.

Para concretização da pesquisa, recorremos a Borelli (2008, 2019), Dayrell (2003, 2007, 2016)
e Groppo (2004, 2016, 2017), que apontam as especificidades com que os jovens organizam os
seus modos de vida e produzem as culturas juvenis.
247

As composições dialógicas estão ocorrendo em forma de rodas de conversa, exibição e análise


de audiovisuais, diálogos formativos e oficinas culturais, permitindo outras relações com os
jovens empobrecidos, fundamentadas em vivências que esses sujeitos compartilham nos
espaços/tempos escolares (DAYRELL, 2007).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Juventude é uma categoria conceitual polissêmica que aponta para um universo amplo de
abordagens e definições. Groppo (2004, 2016, 2017) indica que estamos lidando com uma
construção histórica e social e que não se prende a marcadores etários fixos ou à uma fase da
vida. Essa concepção dialoga com os estudos de Abramo (1994) e Dayrell (2003) quando
apontam que os jovens organizam um amplo de vivências, segundo valores específicos e modos
singulares de compreender a realidade. Ser jovem é uma experiência vivenciada sob diferentes
matizes, que não está presa a aspectos específicos da vida ou regida por marcadores
universalizantes e definitivos.

Os jovens partilham de modos de vida diferentes, materializados em estilos variados, gostos e


tendências distintas, o que reforça o argumento de que as expressões de culturas juvenis não
obedecem a critérios fixos e marcadores delimitados. Esses sujeitos, constroem e reconstroem
suas singularidades transitando por vários espaços ao mesmo tempo, estabelecendo redes de
relações e sociabilidades plurais, portanto não há uma experiência unidimensional do que é ser
jovem, mas relações fluídas e dinâmicas, que vão constituindo subjetividades diversas.
Portanto, tomamos a expressão “juventudes” em sua forma plural, para dialogar com as
múltiplas representações constituídas pelos jovens a partir de universos singulares.

A pobreza, entendida como fenômeno macroestrutural e diverso (CARARO, 2015), é uma das
graves condições sociais que atravessam os jovens. As juventudes empobrecidas que chegam à
escola pública apresentam, em seus corpos e relações, vivências e saberes que não podem ser
desconsiderados, manifestam modos de vida e valores que fazem parte de suas singularidades
e são tradutores de sentido. Desse modo, entendemos que as culturas juvenis que chegam à
escola tensionam a cultura escolar tradicional e provocam outras possibilidades de diálogos.

A educação escolar, edificada sob bases institucionais e pressupostos normativos, acaba se


confrontando com a maneira fluida com que as culturas juvenis ocupam esse espaço. A
predominância da cultura escolar enrijecida e de modelos padronizados que não dialogam com
os jovens que transitam nos espaços/tempos escolares acaba produzindo um mundo aleatório a
248

esses sujeitos e desprovido de sentido concreto. Para Pais (2006, p. 13), “[...] é importante
desvendar as sensibilidades performativas das culturas juvenis em vez de nos aprisionarmos a
modelos prescritivos com os quais os jovens não se identificam”.

Dayrell (2007) aponta que os jovens, além de alunos, são sujeitos marcados por experiências
vividas e sentidas, que transcendem os espaços/tempos escolares. Desse modo, as relações que
vão se estabelecendo no interior da escola, entre os grupos juvenis e deles com demais atores,
carregam as marcas da própria condição humana, seja como contradição ou (re)criação.

Assim, ao longo dos encontros formativos, temos buscado dialogar com os jovens levando em
consideração as experiências vivenciadas por esses sujeitos em seus contextos de vida, os
saberes que já possuem, a capacidade que eles expressam quando lidam com aspectos mais
dinâmicos da realidade, como arte, cultura, tecnologia.

Dayrell (2016) sugerem que o movimento de aproximação das sociabilidades juvenis e,


consequentemente, o diálogo com elas seja orientado por uma “pedagogia das juventudes”. Tal
proposição indica o deslocamento da abordagem tradicional de educação, cuja preocupação
central está no caráter institucional da escola e nos conhecimentos formais e sistematizados,
para a perspectiva dos sujeitos, portanto uma mudança de postura na relação com os jovens.

Concluímos, até o presente momento, que os espaços/tempos escolares podem se constituir


como lugares para a afirmação de saberes que foram, historicamente, silenciados e
desqualificados. Os movimentos culturais, constituídos na dialogicidade com as culturas
juvenis, aproximam-se de uma “pedagogia das juventudes”, ou seja, partem da concepção de
que os jovens são sujeitos que têm suas próprias demandas e promovem redes de interações
entre os grupos juvenis, fortalecendo suas identidades e potencializando suas iniciativas
(DAYRELL, 2016).

CONCLUSÃO

A pesquisa tem demonstrado que os espaços/tempos de educação formal não têm conseguido
dialogar com os jovens empobrecidos. Muitos desses sujeitos, por viverem em contextos
precários e desiguais, acabam naturalizando a condição de pobreza e as violências.

Entretanto, compreendemos que a escola pode oportunizar rupturas com padrões/estruturas


sociais e a superação de condições precárias de existência. As práticas escolarizadas compostas
de forma colaborativa e participativa podem contribuir para o diálogo com as sociabilidades
249

juvenis e para a compreensão dos modos de vida e das experiências constitutivas desses
sujeitos. Além disso, podem fomentar questionamentos e a conscientização diante de realidades
tão desiguais que atravessam as juventudes, seguindo o que Arroyo (2014) pontuou: “os pobres
têm o direito de se saberem pobres” e de conhecerem as estruturas que os empobrecem.
REFERÊNCIAS

ABRAMO, H. W. Cenas juvenis: punks e darks no espetáculo urbano. Página Aberta: São
Paulo, 1994.
ARROYO, M. G. Outros Sujeitos, outras pedagogias. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2014.
BARBIER, R. A Pesquisa-Ação. Brasília: Liber, 2007.
BORELLI, S. H. S.; ROCHA, R. M. Juventude, midiatizações e nomadismos. Comunicação,
mídia e consumo, São Paulo, v. 05, n. 13, jul, p. 27-40, 2008.
BORELLI, S. H. S. et al. Cultura como vetor de proteção: protagonismo de crianças e
adolescentes. São Paulo: EDUC, 2019.
CARARO, M. F. O programa mais educação e suas interfaces com outros programas
sociais federais no combate à pobreza e à vulnerabilidade social: intenções e tensões. Tese
(Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal
do Espírito Santo, Vitória, 2015.
DAYRELL, J (org.). Por uma pedagogia das juventudes: experiências educativas do
Observatório da Juventude da UFMG. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2016.
DAYRELL, J. O jovem como sujeito social. Faculdade de Educação. Universidade Federal
de Minas Gerais, n. 24, set./dez., p. 40-52, 2003.
______. A escola faz as juventudes? Reflexões em torno da socialização juvenil. Educação e
Sociedade. Campinas, v. 28, n. 100 - Especial, p. 1105-1128, out. 2007.
GROPPO, L. A. Juventudes: sociologia, cultura e movimentos. Alfenas: Universidade
Federal de Alfenas, 2016.
______. Introdução à sociologia da juventude. Jundiaí: Paco Editorial, 2017.
GROPPO, L. A. Dialética das juventudes modernas e contemporâneas. Revista do
COGEIME. Piracicaba, v. 13, n. 25, p. 9-22, 2004.
MINAYO, M. C. S. (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes,
2001.
PAIS, José Machado. Buscas de si: expressividades e identidades juvenis. In: ALMEIDA,
Maria Isabel e EUGÊNIO, Fernanda (org.). Culturas jovens: novos mapas do afeto. Rio de
janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006.
250

EIXO 6 – Federalismo, democracia e disputas


entre o público e o privado
251

SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO E O REGIME DE COLABORAÇÃO: UM


CONTEXTO DE HEGEMONIA ÀS AVESSAS (2006-2016)

Lorrainy Ferrari
Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Espírito
Santo
ferrarilorrainy@gmail.com

INTRODUÇÃO

Este trabalho vincula-se ao projeto aprovado e financiado na Chamada CNPq/MCTI/FNDCT


No 18/2021 - Faixa B - Grupos Consolidados, intitulado “Federalismo e Educação Básica no
Brasil: atores e disputas na configuração do Sistema Nacional de Educação e do Regime de
Colaboração (2009-2022)”; além de compor as análises feitas na dissertação em andamento,
intitulada “Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (Sase) na instituição do
Sistema Nacional de Educação e na regulamentação do Regime de Colaboração (2011-2016)”,
financiada pela Capes. Para tanto, este resumo objetiva analisar o contexto da política
educacional no que se refere ao Sistema Nacional de Educação (SNE), no recorte temporal de
2006 a 2016 – da criação do Todos Pela Educação (TPE), até o golpe jurídico-midiático-
parlamentar. Para isso, será utilizado como arcabouço teórico-metodológico, as contribuições
de Antônio Gramsci, André Singer e Francisco de Oliveira.

A promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88), também denominada como


Constituição Cidadã, reinaugurou o debate federativo sobre o SNE e o Regime de Colaboração,
dados os avanços nos direitos sociais. Desde o Programa de Governo do primeiro mandato
presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006), já era previsto a criação de um SNE, a
substituição do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério pelo Fundo de Manutenção (Fundef) para o Fundo de
Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e a criação do Fórum Nacional de Educação
(FNE). Todavia, as ações concretizadas não direcionaram para a instituição do SNE e nem para
a regulamentação do Regime de Colaboração.

METODOLOGIA

O aporte teórico-metodológico se baseia nos conceitos de Estado e hegemonia de Antônio


Gramsci, de lulismo com base nas obras de André Singer e no conceito de hegemonia às
avessas, elaborado por Francisco de Oliveira.
252

O Estado em Gramsci é resultado de “[...] sociedade política + sociedade civil, isto é, hegemonia
couraçada de coerção” (GRAMSCI, 2002, p. 244), além de ser um espaço privilegiado de
disputa pela hegemonia. A partir do consenso das massas – as relações de confiança do grupo
dominante – e da coerção, que pode ser tanto do ponto de vista legal – refere-se à disciplina.
Para que um grupo invista na disputa pela hegemonia, é lançado mão de vários artifícios como
religião, educação, mídias, produção de consenso a partir de intelectuais, bem como, alianças
na sociedade.

Sendo a disputa pela hegemonia, a relação de um grupo buscando a dominação de outro, o


Estado constitui-se como parte essencial para essa relação. No caso brasileiro, especificamente
no recorte temporal de 2006 a 2016, esses imbricamentos perpassam o fenômeno social do
Lulismo, caracterizado sob “[...] o signo da contradição. Conservação e mudança, reprodução
e superação, decepção e esperança num mesmo movimento. É o caráter ambíguo do fenômeno
que torna difícil a sua interpretação” (SINGER, 2012, p. 9). Ou seja, o delineamento das
políticas em constante movimento pendular, sempre agindo e pactuando com perspectivas
antagônicas. Ocorre que, esse truncamento, revela não só contradição, mas uma forma
aperfeiçoada de disputa pela hegemonia. Na versão brasileira da hegemonia, sob o fenômeno
do lulismo, a contradição subsidia a sensação de direcionamento, de atendimento das suas
demandas e representação. A base da hegemonia às avessas de forma simplificada, está
ancorada na manutenção do poder da classe dominante, ao abrigo da aparência “[...] que os
dominados dominam, pois fornecem a “direção moral” e, até fisicamente, estão à testa de
organizações do Estado, direta ou indiretamente, e das grandes empresas estatais.”
(OLIVEIRA, 2018, p. 121).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O ano de 2006 demarca dois acontecimentos importantes no cenário da política educacional: a


substituição Fundef para o Fundeb – que representou um grande avanço para o financiamento
da educação - e a criação da organização Todos Pela Educação (TPE), que, aglutina várias
empresas como Fundação Bradesco, Fundação Lemann, Instituto Unibanco, Instituto Natura,
Itaú Social e outras. Além desses mantenedores, outras alianças foram pactuadas, vale o
destaque, com o Ministro da Educação à época – Fernando Haddad – sendo sócio fundador. O
que explica o fato de que com apenas um ano de existência, em 2007, o TPE conseguiu emplacar
parceria com o Ministério da Educação (MEC) com a formulação do Plano de Metas
Compromisso Todos Pela Educação e o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Em
uma versão germinal dos Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADE) como um possível
253

instrumento de Regime de Colaboração com precárias concepções de territórios, esvaziamento


da pactuação federativa e pouca transparência, que traçam um “atalho silencioso para o
empresariado” (ARAUJO, 2012, p. 515). No ano seguinte, em 2008, ao passo que as primeiras
experiências dos ADE eram concretizadas, também foi realizada a Conferência Nacional da
Educação Básica (Coneb) que reuniu uma gama de profissionais da educação para discutir a
construção do SNE – com isso, percebe-se o início do movimento pendular do lulismo. Ao
mesmo tempo se privilegiou um instrumento frágil e de matriz empresarial, também foi aberto
espaço de diálogo e aparente deliberação para educação básica.

Em 2009, com a Emenda Constitucional 59/2009, algumas alterações quanto ao federalismo


educacional foram alteradas. Dentre elas, vale o destaque para o reforço quanto ao Regime de
Colaboração entre os sistemas de ensino no Art. 211 da CF/88 e no Art. 214, a indicação do
Plano Nacional de Educação (PNE) para articular o SNE em Regime de Colaboração. É
importante destacar, que as normas de cooperação, de acordo com o Art. 23 da CF/88,
necessitam da criação de leis complementares para o regulamentar e, por essa deixa, o avanço
dos ADE seguem na política educacional.

Em 2010 foi realizada a Conferência Nacional da Educação (Conae), abrangendo todos os


níveis da educação e tendo como eixo central, mais uma vez, o SNE. Em decorrência da
conferência, no mesmo ano foi criado o Fórum Nacional de Educação (FNE) como um espaço
de interlocução entre o MEC e a sociedade e com ampla representação de entidades e órgãos
educacionais, além disso, uma das suas atribuições era coordenar e convocar as próximas
Conaes. Outra resposta às demandas da Conae, foi a criação da Secretaria de Articulação com
os Sistemas de Ensino (Sase) em 2011, cujo objetivo era apoiar ações para instituição do SNE.
Em contraste esses possíveis avanços, em 2011 e em 2012 os ADE ganharam materialidade no
campo jurídico com o Parecer 9/2011 CEB/CNE, a Resolução 1/2012 MEC e o Grupo de
Trabalho (GT) sobre os ADE que a Sase criou em 2012. O movimento produzido no âmbito do
MEC é avanço na criação e manutenção de espaços democráticos de construção de políticas
educacionais, como é o caso das Conferências, do FNE e da própria Sase, e, ao mesmo, de
atendimento das demandas de matriz empresarial. “[...] Parece que os dominados comandam a
política, pois dispõem de poderosas bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado.”
(OLIVEIRA, 2018, p. 121), e porque estão presentes nas instâncias criadas pelo MEC.

Em 2014, o PNE foi aprovado em dissonância das deliberações da Conae, indicando os ADE
como forma de colaboração e ao contrário do Art. 214 da CF/88, o PNE aponta a criação do
SNE para articular PNE. Posterior a aprovação do PNE, a Conae de 2014 é realizada com a
254

temática do SNE mais uma vez. Nos anos seguintes, a Sase lançou, em parceria com alguns
acadêmicos, textos curtos sobre o SNE, mas sem exequibilidade. Além disso, em 2015, a
secretaria também criou um GT sobre o Custo Aluno Qualidade (CAQ), que, assim como os
textos sobre o SNE, não subsidiou elementos para institui-lo. Por fim, com o golpe jurídico-
midiático-parlamentar da presidente Dilma Vanna Rousseff, tanto a Sase, o FNE e a Conae
tiveram sua composição reconfiguradas.

CONCLUSÃO

O recorte temporal deste resumo data a criação do TPE como uma organização representante
dos interesses da classe dominante que disputa a hegemonia e, de fato, conseguiu enraizar
espaço no MEC, como parte do Estado. O que se percebe é que o contexto político do lulismo
com movimentação de ações pendulares e antagônicas, revela na verdade, uma disputa pela
hegemonia em moldes diferentes do que Gramsci sistematizou.

A hegemonia às avessas não é uma dominação direta, ela abre espaços de diálogo e delibera
avanços para subsidiar a sensação de progresso, de participação e controle político – todavia,
trata-se de uma aparência e com isso pode-se exemplificar com base na realização da Coneb e
das Conaes, a criação de espaços como a Sase e o FNE. Quando analisado com o conjunto das
ações no âmbito do MEC discorrido neste trabalho, evidencia-se, na verdade, a pavimentação
dos ADE, a partir falta de regulamentação do Art. 23, para pactuação entre entes federados e a
iniciativa privada – com especial destaque ao TPE. Tal ação esvazia a dimensão federativa,
precariza as possibilidades de instituição do SNE e da regulamentação do Regime de
Colaboração e contribui para o avanço da dominação hegemônica neoliberal.

Por fim, as ações do MEC no recorte temporal de 2006 a 2016, indicam pequenos avanços
educacionais que fornecem elementos para os profissionais da educação se sentirem à frente da
política, entretanto, ao passo que lhe eram concedidos avanços, os interesses do empresariado
eram privilegiados na tomada de decisões.

REFERÊNCIAS

ARAUJO, Gilda Cardoso de. Federalismo cooperativo e arranjos de desenvolvimento da


educação: o atalho silencioso do empresariado para a definição e regulamentação do regime
de cooperação. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação-Periódico
científico editado pela ANPAE, v. 28, n. 2, 2012. Disponível em:
https://seer.ufrgs.br/rbpae/article/view/37419/24160. Acesso em: 2 abr. 2019.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere, Volume 3.3.ed. Rio de Janeiro. Civilização
Brasileira. 2002.
255

OLIVEIRA, Francisco de. Brasil: uma biografia não autorizada. 1. Ed. São Paulo. Boitempo.
2018.
SINGER, André. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador – 1. ed. São
Paulo: Companhia das Letras, 2012.
256

ATUAÇÃO DE MOVIMENTOS EMPRESARIAIS NA AGENDA EDUCACIONAL: O


SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM REGIME DE COLABORAÇÃO

Valdeney Lima da Costa


Universidade Estadual do Piauí.
valdeneylima@bjs.uespi.br

INTRODUÇÃO

O presente texto é um desmembramento de discussão realizada em minha tese de doutoramento


sobre a temática das Formas de colaboração em Educação (COSTA, 2019). O objetivo geral
que me move a partir desse Resumo expandido é refletir sobre as formulações teóricas de
movimentos empresariais sobre o Regime de Colaboração em Educação, focalizando as ideias
dos arranjos de desenvolvimento da educação. Apesar de ciente da tramitação do Sistema
Nacional de Educação no Congresso Nacional, penso ser necessário o debate crítico, nesse
momento, sobre os arranjos educacionais materializados em vários Estados e municípios
brasileiros, por meio da atuação de organizações ligadas aos Movimentos Colabora e Todos
pela Educação.

METODOLOGIA

A discussão teórica desse resumo está ancorada nos estudos de Araújo (2012, 2013) e Cassini
& Nascimento (2018). Como procedimento metodológico, consultamos fontes documentais
virtuais (artigos, ensaios e textos postados em páginas eletrônicas) disponíveis nos endereços
eletrônicos dos Movimentos Colabora e Todos pela Educação, nos quais se encontra um
conjunto de publicações sobre a temática em tela.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Na perspectiva de debater sobre o Sistema Nacional de Educação (SNE), determinados


institutos ou organizações sociais vem propondo ações no sentido de influenciar os governos
na formulação de uma agenda de políticas públicas, porém, de maneira desburocratizada.
Destacamos, entre essas organizações, o Movimento Colabora, que agrega diferentes
instituições parceiras no debate sobre questões educacionais, dentre as quais o regime de
colaboração e, mais recentemente, o Sistema Nacional de Educação, São partícipes desse
257

movimento o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e institutos e fundações ligadas


ao Todos pela Educação.

De acordo com informações expressas em sua página eletrônica, o Movimento Colabora


defende que a governança e as práticas colaborativas entre os entes federados são os pilares do
desenvolvimento do regime de colaboração, com vistas à melhoria da aprendizagem e equidade
educacional (MOVIMENTO COLABORA, 2022). Esses princípios são reforçados em algumas
publicações elaboradas pelas instituições parceiras, a saber: Fundação Itaú Social, Instituto
Natura e Instituto Positivo.

A Fundação Itaú Social, como é de nosso conhecimento, atua em vários municípios brasileiros,
realizando serviços de consultoria na formulação e acompanhamento de políticas públicas. Em
relação ao tema do regime de colaboração, publicações disponíveis no acervo documental
digital do Movimento Colabora indicam que a referida fundação vem, desde 2013,
empreendendo ações na organização de Consórcios Intermunicipais, propondo ainda a criação
de Câmaras Técnicas da Educação.

O Instituto Natura desenvolve “ações educacionais” em vários estados e municípios brasileiros,


a exemplo de debates temáticos sobre Escola de Tempo Integral, Regime de Colaboração e a
difusão da ideia da Comunidade de Aprendizagem, além da produção de conteúdo direcionados
aos professores e gestores públicos.

Já o Instituto Positivo também elaborou estudos temáticos, focalizando experiências de


Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs) em curso em diferentes lugares do país,
sendo uma dessas publicações coordenadas pelo pesquisador Fernando Abrúcio.

Também com a pretensão de influenciar a agenda política para a institucionalização do SNE,


assim como o de estabelecer o consenso de suas ideias, outro movimento empresarial
denominado por Todos pela Educação (TPE) – igualmente associado ao Movimento Colabora
- desenvolve ações diferenciadas que perpassam a elaboração de material temático, a
organização de seminários sobre o tema, a publicação de notas e artigos de opinião na imprensa
nacional, até a veiculação, na própria mídia, de depoimentos e entrevistas sobre a problemática
em questão.

Endossando o ideário dos arranjos na perspectiva territorial, o TPE disponibiliza, em sua


biblioteca virtual, publicações sobre o tema do Sistema Nacional de Educação. Antes mesmo
258

da discussão sobre o SNE, o referido movimento já propagava suas ideias por meio de artigos
e livros digitalizados. Uma das obras em destaque foi o livro denominado Regime de
Colaboração e Associativismo Territorial, organizado por Mozart Ramos e Fernando Luiz
Abrúcio, que apresenta as bases conceituais e normativas dos arranjos de desenvolvimento da
educação e algumas experiências exitosas pelo país. Destaco os textos escritos por Abrúcio,
Ramos e Cruz, que reforçam a ideia da implementação desses arranjos como essenciais para o
fortalecimento do regime de colaboração na educação brasileira. (TODOS PELA
EDUCAÇÃO, 2022)

Já no volume ‘Regime de Colaboração: textos para consulta’, ressalto o artigo de Fernando Luiz
Abrúcio, apresentando sete aspectos que ele considera fundamentais para o fortalecimento e a
consolidação do regime colaborativo: 1º)instituição de fóruns federativos, reunindo diferentes
instituições; 2º) redirecionamento e indução do papel de coordenação no nível estadual; 3º)
apoio ao associativismo intermunicipal e o fortalecimento da cooperação; 4ª) reorientação das
ações encaminhadas pelo Governo Federal, estimulando um modelo de relações
intergovernamentais mais articuladas com os governos subnacionais; 5º) estabelecimento de
mecanismos de estímulo à cooperação federativa, orientado sob os princípios da gestão por
resultados, conforme ocorre nos ADEs; 6º) levantamento de experiências exitosas de
coordenação federativa e 7º) aperfeiçoamento do padrão federativo de financiamento da
educação. (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2022).

O terceiro referencial bibliográfico é o artigo intitulado Por um Plano Nacional de Educação:


Nacional, Federativo, Democrático e Efetivo, de autoria do Prof. Carlos Roberto Jamil Cury.
Trata-se de texto que versa sobre o PNE, no qual o autor enfatiza a necessidade de criação de
uma Lei de Responsabilidade Educacional, que force os governantes a cumprir coerentemente
suas responsabilidades, assim como estabeleça sanções, em caso de omissão do Poder Público,
no cumprimento das metas ou objetivos educacionais definidos para o sistema de ensino. No
artigo, portanto, Cury reitera a obrigação do governo em legislar sobre a regulamentação do
regime de colaboração e, em nenhum momento, aborda a implementação de arranjos para
materializar o referido regime (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2022). Nesse ano de 2022,
observa-se que a página eletrônica do Todos pela Educação disponibiliza um conjunto de
materiais sobre a temática do Sistema Nacional de Educação.

Em visão distinta às formulações conceituais dos movimentos supracitados sobre a


institucionalização do Sistema Nacional de Educação por meio do Regime de Colaboração,
259

Araújo (2013), expressa sua inquietação com a atuação do empresariado e a sua aposta na
organização dos ADEs. Segundo a autora, convém lembrar que as influências do setor
empresarial extrapolam a criação de agendas e organização de fóruns para o debate sobre o
tema, mas, principalmente, replicam ideias que buscam a redefinição da ação e atuação dos
entes federativos, sobretudo a esfera federal, com vistas a transformar os ADE numa política
de Estado que abarque as instâncias federativas.

Ainda para Araújo (2012), foi após a aprovação do Parecer da Câmara de Educação Básica do
Conselho Nacional de Educação (CEB/CNE) nº09/2011, que outras possibilidades de
interlocução entre as instâncias administrativas públicas e privadas foram gestadas, a exemplo
dos arranjos de desenvolvimento da educação (ADEs). Diga-se de passagem, essa ideia de
arranjos esteve presente anteriormente, no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE),
elaborado no ano de 2007 e se manifesta também no Plano Nacional de Educação (2014/2024),
até então vigente.

Para Cassini & Nascimento (2018), o que acontece é o emprego recorrente do termo “regime
de colaboração” em práticas associadas à coordenação e/ou forma de colaboração e as políticas
indutoras da União, revelando-se, portanto, segundo elas, equívocos conceituais, jurídicos e
administrativos.

Como se compreende, a partir de Araújo (2013), regime de colaboração não é o mesmo que
formas de colaboração, uma vez que, adverte a autora, o primeiro pressupõe estabilidade e
continuidade, uma vez garantida sua institucionalização por lei complementar, em
contraposição ao segundo, que pode consistir em uma ação pontual, esporádica ou momentânea
nas relações entre os entes federados.

Concordo com os pesquisadores que entendem que devem ser aclarados nos textos dos projetos
de lei sobre o SNE, quais serão os mecanismos de cooperação federativa para a efetivação e
garantia do direito à educação por parte do Estado brasileiro.

CONCLUSÃO

Entendo que estudos dessa natureza são importantes, considerando que se encontra em
tramitação a regulamentação do Sistema Nacional de Educação no Congresso Nacional, por
meio do Projeto de Lei Complementar (PLP) 235/19. Como se sabe, a não instituição desse
sistema até o momento de escrita desse texto, é resultante também da arena de disputas entre
260

concepções políticas e educacionais no âmbito do Congresso Nacional. A ausência de sua


regulamentação, somada aos efeitos da Pandemia da COVID-19, corroboram, a meu ver, para
com a ampliação das desigualdades na oferta educacional em nosso país, colocando em risco o
direito do acesso à educação obrigatória.

Nesse sentido, é importante que possamos não apenas acompanhar os debates sobre a instituição
do SNE, mas, sobretudo, estarmos atentos aos textos dos PLP 235/2019 e o PLP 25/2019
sobretudo no que diz respeito às relações federativas, financiamento e a participação da
sociedade civil para a consolidação do referido sistema.

Conforme mencionado nesse texto, as entidades ligadas ao Movimento Colabora e Todos pela
Educação vem participando ativamente dos debates sobre as temáticas do Regime de
Colaboração e, desta feita, do Sistema Nacional de Educação. O ativismo dessas organizações
se manifesta em publicações, assessorias e participações em eventos e audiências públicas no
Congresso Nacional.

Concluo ressaltando que os Movimentos Colabora e Todos Pela Educação buscam, pela via de
estudos técnicos, a inserção e o convencimento de suas ideias educacionais e modelos de
experiências intergovernamentais- baseadas em arranjos territoriais -no debate sobre a
construção do Sistema Nacional de Educação.

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Gilda Cardoso. Federalismo cooperativo e arranjos de desenvolvimento da


educação: o atalho silencioso do empresariado para a definição e regulamentação do regime
de cooperação. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação - v. 28, n. 2, p.
515-531 mai/ago. 2012.
_______. Federalismo e políticas educacionais no Brasil: equalização e atuação do
empresariado como projetos em disputa para a regulamentação do regime de colaboração.
Educação & Sociedade, Campinas, v.34, n.124, p.787-802, jul-set,2013.
CASSINI, Simone Alves; NASCIMENTO, Andreas. A indução federal nas políticas
educacionais: a questão da colaboração e da coordenação federativa. In: ARAÚJO, Gilda
Cardoso de; RODRIGUES, Rodrigo Ferreira. Federalismo e Políticas educacionais: entre
velhos dilemas e novos desafios. Campos dos Goytacazes, RJ: Brasil Multicultural, 2018.
COSTA, Valdeney Lima da. Formas de colaboração na educação (integral) em tempo
integral: indução / sedução das municipalidades? (Tese de Doutorado). Universidade Federal
do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, 2019.
MOVIMENTO COLABORA, 2022. Quem somos? Disponível em
https://movimentocolabora.org.br/o-movimento. Acesso em: 31 ago. 2022
261

TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2022. Quem somos? Disponível em:


https://todospelaeducacao.org.br. Acesso em: 31 ago. 2022.
262

A PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA NA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO


DE CARIACICA-ES: MAPEAMENTO DOS ATORES PRIVADOS NO PERÍODO
2012 - 2022

Eliete Brito da Silva


UFES
elietebster@gmail.com

Liudimila Katrini Proximozer


UFES
liuketryn@yahoo.com.br

Eduardo Augusto Moscon Oliveira


UFES
eduardomoscon@hotmail.com

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como temática central a privatização da educação básica na rede
pública no município de Cariacica. Objetiva sistematizar e analisar informações acerca dos
programas e projetos em vigência no período pesquisado, bem como fazer um mapeamento dos
atores privados responsáveis pela execução dos mesmos em “parceria”43 com a Secretaria
Municipal de Educação de Cariacica. Optamos pelo recorte no período entre 2012 a 2022 para
analisar a incidência desses programas/projetos na última década.

Na atual conjuntura da sociedade capitalista, com o avanço do neoliberalismo, o Estado


enquanto garantidor do direito à educação tem transferido atividades e bens sob sua
responsabilidade para organizações privadas, corporações com ou sem fins lucrativos. Estas
vão desde as famílias até os grandes organismos internacionais. Para Ball e Youdell (2007), as
privatizações acontecem de forma encoberta, podendo ser endógenas ou exógenas. As
interferências privatistas cada vez mais têm sido introduzidas no sistema público de educação
com vistas a uma educação mercadorizada, gerencialista, individualista e competitiva. Para
além das categorias de análise desenvolvidas por Ball e Youdell, também iremos trabalhar com
o conceito de privatização da educação nas três dimensões desenvolvidas por Theresa Adrião.

43
Segundo Adrião 2022, o termo parcerias é uma expressão que não transcreve na íntegra seu significado, pois
não é uma relação colaborativa entre setores que atuam horizontalmente, trata-se de processos pelos quais a
educação pública brasileira se subordina a setores privados por meio da transferência de responsabilidades do
Estado ou da flexibilização de regulamentações para atuação daqueles setores.
263

Adrião (2022) alerta que, no Brasil, a partir da Constituição de 1988, não deveria pairar dúvidas
de que a Educação é dever do ESTADO e da família e um direito das crianças e adolescentes,
portanto os processos de privatização da educação pública é uma transferência da
responsabilidade do Estado, prevista na Constituição de 1988, para o setor privado. Ela
categoriza essa privatização em três dimensões: privatização da oferta, da gestão e do currículo.
Discorre também sobre o movimento do empresariado na gestão pública por meio das
“parcerias” público-privadas na execução de projetos na educação.

De acordo com a autora, a privatização da oferta “operacionaliza-se por meio de três formas:
financiamento público, aumento das matrículas em estabelecimentos particulares e introdução
de políticas ou programas de escolha parental” (ADRIÃO, 2018. p. 4). Já a dimensão da gestão,
a autora caracteriza em dois âmbitos, a saber: a privatização educacional que atua sobre os
processos decisórios da política educativa do sistema de ensino; e a privatização da gestão
escolar, quando a interferência se dá na gestão de escolas. E, na dimensão da privatização do
currículo, os atores determinam a organização e concepção curricular por meio de fornecimento
de formação de professores, materiais didáticos, tecnológicos como software, plataformas
digitais, dentre outros. Essa incidência abrange as relações entre professores e estudantes.
(ADRIÃO, 2018).

METODOLOGIA

A abordagem metodológica escolhida para realização da pesquisa foi o estudo de caso


qualitativo, entendido por Trivinos, 1987, como “uma categoria de pesquisa cujo objetivo é
uma unidade que se analisa aprofundadamente” (TRIVINOS, 1987, P. 1333). Para tanto, está
sendo realizada uma pesquisa documental - reportagens, acordos de cooperação e contratos de
distintas abrangências entre outros - que estão disponíveis nos sítios da prefeitura municipal de
Cariacica, fundações, ongs, institutos e outros “parceiros” públicos e privados. Também foi
utilizada a produção bibliográfica relacionada à temática.

RESULTADO E DISCUSSÕES

O presente estudo, que ainda está em curso, foi realizado, no primeiro momento, por meio de
pesquisa documental no site da prefeitura municipal de Cariacica e nos sites das fundações,
institutos, ongs e empresas. Encontramos diversas matérias, contratos, termos de cooperação
que foram analisados e, a partir desta pesquisa, produzimos a tabela a seguir. Inicialmente,
mapeamos 13 programas implementados na rede municipal de Cariacica no período de 2012 a
264

2022; atores responsáveis pela execução dos mesmos; sobre quais dimensões educacionais
(oferta, currículo e gestão) incidem; qual público-alvo pretende alcançar, ano de início e prazo
de vigência.

Constata-se uma crescente adesão aos programas de privatização da educação e, com base nos
dados elencados, percebe-se que Cariacica tem sido pioneiro no Espírito Santo quanto a adotar
a maioria destes programas. Grande parte dos programas se encontra na dimensão do currículo,
tendo como público-alvo, principalmente, os professores. Atuam em processos formativos com
vistas à melhoria dos resultados nas avaliações de larga escala, concebendo a educação
mercadorizada com a finalidade de preparação de capital humano (LAVAL, 2004).

Quadro 1 - PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA PÚBLICA NO MUNICÍPIO


DE CARIACICA (2012 – 2022)

PROGRAMA ATORES DIMENSÃO PÚBLICO- INÍCIO/


S PEDAGÓGICA ALVO VIGÊNCIA
Ensina Brasil Espírito Santo Currículo Estudantes do 2019 até o
em Ação/ Ong: fundamental II presente
Ensina ES / momento
FAPES
Programa Fundação Gestão Professores, 2019 até o
Formar Lemann e gestores e presente
Instituto Gesto secretários de momento
educação.
Google For Google/ Estudantes, 2020 até o
Education GetEdu Currículo professores, presente
famílias, momento
gestores.
EDP nas EDP-ES/ Currículo Estudantes 2020
escolas: Instituto EDP
educação
empreendedora
Pacto pela Espírito Santo Currículo Estudantes 2017 até o
aprendizagem em Ação presente
no Espírito momento
Santo - PAES
"Mobilização Fundação Currículo Estudantes 2012 até o
Cariacica" ArcelorMittal e presente
ArcelorMittal momento
Cariacica
Escolas de Espírito Santo Currículo e gestão Estudantes 2022
Tempo Integral em Ação e
Associação
Empresarial de
265

Cariacica
(AEC)
"Boas Energias EDP-ES Currículo Professores, 2019 até o
na Escola" pedagogos e presente
diretores. momento
Eduq+ MGovBrasil/ Currículo Famílias 2019 até o
presente
momento
Política de Fundação Vale Currículo Professores da Setembro de
direitos educação 2019 até janeiro
humanos infantil de 2021
Economia Prolata Currículo Professores 2021 até o
circular no Recicladores e presente
contexto escolar Associados momento
Prestação de R1 Projetos, Currículo Estudantes 2021 até o
serviços Tecnologia e presente
técnicos para entretenimento momento
produção de LTDA
conteúdos
digitais
pedagógicos
Melhoria da WiLivro Currículo Estudantes 2022
proficiência em Soluções
língua Tecnológicas
portuguesa e Educacionais
matemática LTDA
Fonte: Elaboração própria, com base em dados dos sites da prefeitura de Cariacica, Espírito Santo em Ação e
Ensina Brasil.

CONCLUSÃO

Observamos um crescimento exponencial no movimento de privatização da educação pública


tanto no cenário nacional quanto no cenário internacional. Mediante os dados expostos, conclui-
se que os movimentos de privatização da educação pública têm sido implementados no
município de Cariacica e se agudizado nos últimos anos.

Outras etapas desta pesquisa serão realizadas com vistas à descrição mais detalhada de cada
programa, buscando compreendê-los em sua totalidade para, dessa forma, sair apenas da
aparência e procurar traçá-los à luz do desenvolvimento econômico, político e social do
município e as influências da política partidária. A proposta planejada pretende aprofundar a
análise das questões econômicas a fim de desvelar as ações privatistas em relação ao
aligeiramento do neoliberalismo. Para tanto, será solicitado, baseando-nos na lei de acesso à
informação, cópia detalhada de todos os programas executados pela Secretaria Municipal de
266

Educação, bem como a aplicação de entrevistas semiestruturadas, tendo como público-alvo


gestores da Secretaria de Educação e professores.

REFERÊNCIAS

ADRIÃO, Theresa. Dimensões e formas da privatização da Educação no Brasil:


caracterização a partir de mapeamento de produções nacionais e internacionais. Currículo
sem Fronteiras, v. 18, n. 1, p. 8-28, jan./abr. 2018.
ADRIÃO, Theresa. Dimensões da privatização da Educação Básica no Brasil: um diálogo
com a produção acadêmica a partir de 1990. Brasília: ANPAE, 2022.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Congresso
Nacional, 1988.
BALL S.; YOUDELL, D. Privatización encubierta en la educación pública, internacional
de la educación. Bruxelas, 2007. Disponível em:
https://observatorioeducacion.org/sites/default/files/ball_s._y_youdell_d._2008_la_privatizaci
on_encubierta_en_la_educacion_publica.pdf. Acesso em: 20 ago. 2022.
CARIACICA. Notícias: Cariacica marca presença no encontro nacional “Redes que
Transformam”, em São Paulo. Disponível em:
https://www.cariacica.es.gov.br/noticias/70795/cariacica-marca-presenca-no-encontro-
nacional-redes-que-transformam-em-sao-paulo. Acesso em: 19 ago. 2022.
CARIACICA. Notícias: Google For Education traz diversas possibilidades mantendo a
qualidade que já existe. Disponível em:
https://www.cariacica.es.gov.br/noticias/68540/google-for-education-traz-diversas-
possibilidades-mantendo-a-qualidade-que-ja-existe. Acesso em: 21 ago. 2022.
CARIACICA. Notícias: Incentivo ao protagonismo juvenil dos estudantes é tema em
formação on-line de professores. Disponível em:
https://www.cariacica.es.gov.br/noticias/68427/incentivo-ao-protagonismo-juvenil-dos-
estudantes-e-tema-em-formacao-on-line-de-professores. Acesso em: 21 ago. 2022.
CARIACICA. Notícias: Cariacica adere ao Paes e será primeira cidade a receber creche
pelo convênio. Disponível em: https://www.cariacica.es.gov.br/noticias/49576/cariacica-
adere-ao-paes-e-sera-primeira-cidade-a-receber-creche-pelo-convenio. Acesso em: 21 ago.
2022.
CARIACICA. Notícias: Escolas integradas ao projeto 'Mobilização' apresentam avanços
significativos nos resultados de aprendizagem. Disponível em:
https://www.cariacica.es.gov.br/noticias/19926/escolas-integradas-ao-projeto-mobilizacao-
apresentam-avancos-significativos-nos-resultados-de-aprendizagem. Acesso em: 23 ago.
2022.
CARIACICA. Notícias: Parceria entre Seme e EDP capacita professores sobre questões
ambientais. Disponível em: https://www.cariacica.es.gov.br/noticias/67639/parceria-entre-
seme-e-edp-capacita-professores-sobre-questoes-ambientais. Acesso em: 23 ago. 2022.
267

ENSINA BRASIL. Relatório de atividades 2020 - 2021. Disponível em:


https://www.ensinabrasil.org.br/_files/ugd/033518_757ee7a8ede146c9af3b35b222e2a557.pdf
. Acesso em: 24 ago. 2021.
ESPÍRITO SANTO EM AÇÃO. Relatório de atividades 2021. Disponível em: https://es-
acao.org.br/wp-content/uploads/2021/12/relatorio-atividades-esacao-2021.pdf. Acesso em: 23
ago. 2021.
ESPÍRITO SANTO EM AÇÃO. Seme de Cariacica, AEC e ES em Ação alinham ações.
Disponível em: https://es-acao.org.br/2022/08/14/seme-de-cariacica-aec-e-es-em-acao-
alinham-acoes/. Acesso em: 24 ago. 2021.
LAVAL, Christian. A escola não é uma empresa: o liberalismo em ataque ao ensino
público. 1ª ed. São Paulo: Boitempo, 2004.
TRIVINOS, Augusto Nibaldo Silva. Introdução à pesquisa em Ciências Sociais: a pesquisa
qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.
268

O ENSINO DE FILOSOFIA POLÍTICA A PARTIR DO PENSAMENTO DE


ERNESTO LACLAU E CHANTAL MOUFFE

Ricardo Miranda
Mestre em Filosofia (UFES).
Professor de Filosofia – SEDU/ES.
ricardomirandacd@yahoo.com.br

INTRODUÇÃO

Com o chamado Novo Ensino Médio decorrente de uma série de alterações curriculares,
mudanças nas diretrizes e organizações educacionais além da introdução da BNCC, tivemos
explicitamente, a partir de 2017, sucessivas implementações de uma formação de cunho
neoliberal na proposta educacional em nosso País. Enquanto a ênfase agora volta-se para
algumas disciplinas como Português e Matemática e novidades como Projeto de Vida e Estudo
Orientado, outras disciplinas tiveram significativa redução da carga horária e restrição de
conteúdo, como é o caso de Filosofia e Sociologia.

Todavia, ainda que limitada e extremamente condensada a Filosofia não pode perder sua função
de despertar e promover o conhecimento crítico-reflexivo. Entre os temas relevantes da
disciplina Filosofia temos a Filosofia Política responsável pela conscientização e reflexão
crítica da vida política e sua ligação com o ser e o convívio em sociedade. Em que pese a
existência de uma notória aversão aos assuntos relacionados a política por grande parte das
pessoas, entendemos que é justamente esse distanciamento e apatia que proporcionam em nosso
País uma política nefasta e de interesses e privilégios de poucos, isto é, temos um
desconhecimento e despreparo da população para o debate e crítica aos acontecimentos e ações
políticas que acabam favorecendo aqueles que fazem da política um meio de vida para
interesses particulares e não coletivos. O Ensino de Filosofia Política tem grande
responsabilidade na formação do cidadão e nos rumos políticos que se pretende para uma
sociedade melhor. Para tanto, entendemos que um ótimo ponto de partida deve ser uma
compreensão de política a partir do pensamento de Ernesto Laclau e de Chantal Mouffe. O que
se pretende com essa discussão é o expurgo da indiferença e aversão a política, estando em jogo
exatamente o futuro de nossa democracia, uma vez devemos primar pelo fortalecimento da
consciência crítica, do pensamento reflexivo e buscar a consolidação e manutenção do nosso
regime democrático com ampla e irrestrita participação política dos cidadãos, cujos passos
iniciais também ficam a cargo do Ensino de Filosofia Política aos educandos.
269

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo exploratório onde o método de abordagem adotado, em maior parte, é o


dedutivo devido a forma de explicitação dos fundamentos e objetivos a serem alcançados. O
método de procedimento é monográfico, por investigar determinado assunto, não só em
profundidade, mas em vários ângulos e aspectos, conforme os fins a que se destina. O estudo
configura-se em caráter descritivo, estruturado como pesquisa que tem uma abordagem
qualitativa. Apresenta como técnica de pesquisa a documentação indireta através de pesquisa
bibliográfica, com técnica de coleta de dados secundários, devido às informações obtidas em
livros.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Aos educandos do Ensino Médio é muito comum no Ensino de Filosofia Política a limitação a
uma brevíssima introdução ao pensamento político de Platão, Aristóteles, Maquiavel e uma
curta explanação sobre os Contratualistas clássicos – Hobbes, Rousseau e Locke. Contudo,
entendemos relevante expandir a reflexão política fazendo uso das contribuições filosóficas dos
pensadores contemporâneos Ernesto Laclau e Chantal Mouffe. As reflexões de ambos estão
voltadas para o campo da teoria política, apresentando-se como teóricos pós-marxistas44 uma
vez que buscam “superar os limites de uma visão determinista do processo histórico, de acordo
com a qual as possibilidades de transformação política estariam determinadas pela evolução da
realidade econômica” (NEVES, 2019, p. 11). Podemos afirmar que eles se afastam do
marxismo clássico no seu aspecto finalístico de superação da burguesia pelo proletariado
através da revolução, além do excessivo adensamento da economia na política. Todavia,
aproximam-se das ideias de Marx ao entender a necessidade de uma ruptura com a ordem
capitalista maciçamente dominante.

A formulação de uma teoria do discurso em Ernesto Laclau e Chantal Mouffe ganha força com
a publicação, em 1985, de Hegemonia e Estratégia Socialista, tendo como suporte o
pensamento, no campo da linguística, de Saussure e Wittgenstein. Para os nossos autores um
discurso ao produzir sentido o faz de forma precária, contingente e limitada uma vez que esse
mesmo sentido tende a ser alterado numa disputa de discursos hegemônicos. O foco de Laclau
e Mouffe está voltado para a existência social dos seres e objetos (e não na mera existência
material-física), uma vez que essa existência social é dotada de sentido por estar imersa num

44
Cf. Posmarxismo sin pedido de desculpas (LACLAU; MOUFFE, 2000).
270

discurso. Nesse contexto, afirmam que não há sentidos sociais que possam ser previamente
constituídos dada a impossibilidade de se garantir que certos sentidos possam ser
necessariamente universalizados. Isso se deve, em parte, ao elevado grau de complexidade do
social que impede a totalização de conteúdos particulares onde toda tentativa de fechamento de
um único sentido social será sempre uma busca precária e incompleta.

A noção de discurso não está desacoplada das práticas, ficando, pois, afastada a recorrente
dicotomia “discurso-prática” (mental-material), “uma estrutura discursiva não é uma entidade
meramente ‘cognitiva’ ou ‘contemplativa’; é uma prática articulatória que constitui e organiza
as relações sociais” (LACLAU & MOUFFE, 2015, p. 167). Com efeito, um discurso apresenta-
se como prática articulatória que se desdobra em relações sociais fixando sentidos parciais.

Ao mesmo tempo que o discurso é sempre precário e contingente, também será limitado pela
sua própria negação, no chamado corte antagônico. O antagonismo é apresentado pelos nossos
autores em seu ponto fundamental como o limite de toda a objetividade numa forma precisa de
presença discursiva: “Isso deve ser entendido em seu sentido mais literal: como afirmação de
que o antagonismo não tem um sentido objetivo, de modo que é aquilo que impede a
constituição da objetividade como tal”. (LACLAU, 2000, p. 34). No antagonismo temos a
seguinte situação: “a presença do ‘Outro’ me impede de ser plenamente eu mesmo. A relação
advém não de totalidades plenas, mas da impossibilidade de sua constituição. A presença do
Outro não é uma impossibilidade lógica: ela existe; logo, não é uma contradição” (LACLAU
& MOUFFE, 2015, p. 202). Diante dessa relação antagônica temos a impossibilidade de
constituição de um discurso pleno, fechado, acabado. As próprias identidades apresentam-se
incompletas face ao antagonismo. Assim, existindo um “nós” teremos a sua incompletude de
identidade pela relação antagônica com um “eles” o que impossibilita a incorporação de um
discurso único, integral. O antagonismo encontra-se no discurso, na política, na sociedade,
sempre como impossibilidade da objetividade. Para Laclau, a política é um antagonismo que se
constitui.

Se por um lado nossos autores afirmam a impossibilidade de fixação última de sentido, por
outro, admitem a existência de fixação de sentidos parciais, o que também vale para a noção de
sociedade: “Se o social não consegue se fixar a si mesmo nas formas inteligíveis e instituídas
de uma sociedade, o social só existe, no entanto, como um esforço para construir esse objeto
impossível” (LACLAU & MOUFFE, 2015, p. 187). Esse esforço é justamente a política,
marcada pela presença do antagonismo no social. Os antagonismos, por seu turno, constituem
271

os limites da sociedade, impossibilitando-a de constituir-se plenamente. Dessa forma, é


“impossível pensar e conceitualizar o social sem uma noção de radical negatividade, ou seja,
sem uma concepção de antagonismo, servindo, ao mesmo tempo, como condição de
possibilidade e condição de impossibilidade da sociedade” (MENDONÇA & RODRIGUES,
2014, p. 12). Entendemos, pois, o antagonismo, como constitutivo do âmbito político e
condição necessária para as relações sociais, de modo que, no Ensino de Filosofia Política, a
categoria antagonismo não pode ser negligenciada, mas, pelo contrário, deve ser o ponto de
partida para formulações teórico-críticas.

A hegemonia, por seu turno, surge, de acordo com Laclau e Mouffe (2015), como movimento
estratégico de articulação do social e político a partir das impossibilidades decorrentes do
antagonismo. Se por um lado temos uma identidade que vive numa constante busca pela sua
completude estando, contudo, fadada a impossibilidade de conseguir tal êxito45, por outro lado,
temos a hegemonia, numa tentativa de preencher a ausência de plenitude, o que também ocorre
de forma parcial, precária e contingente.

Mouffe direcionou suas pesquisas à distinção entre o político e a política com a consequente
teorização do chamado modelo agonístico de democracia. Em linhas gerais e muito breves,
nossa filósofa parte da distinção entre “a política” e “o político”46 , estando este no nível
ontológico e aquele no nível ôntico de modo que “o político” relaciona-se aos espaços de poder
e conflito, enquanto “a política” seria o campo das instituições e das ações práticas do político.

Frente ao antagonismo político, Mouffe, traz à tona a noção de agonismo apresentando a


seguinte distinção: “O antagonismo é uma luta entre inimigos, já agonismo é uma luta entre
adversários” (MOUFFE, 2012, p. 115). Isso significa que a adoção da percepção agonística não
se pretende mais a eliminação do “outro” visto como inimigo, compreendido como
impossibilidade de assunção de identidade, que passa a ser, então, percebido como adversário
merecedor de respeito. O conflito, o antagonismo continuam existindo, porém os adversários
se consideram mutuamente. Com isso, mantem-se o campo das paixões na esfera política, não
significando que numa disputa, uma eventual “derrota” corresponda, para o “derrotado” a

45
Isso corresponde ao que Laclau denomina de “falta constitutiva” ou “incompletude identitária”.
46
Nas palavras de Mouffe: “Mais precisamente, é assim que diferencio ‘o político’ da ‘política’: entendo por ‘o
político’ a dimensão de antagonismo que considero constitutiva das sociedades humanas, enquanto entendo por
‘política’ o conjunto de práticas e instituições por meio das quais uma ordem é criada, organizando a coexistência
humana no contexto conflituoso produzido pelo político” (MOUFFE, 2015, p. 8).
272

concordância ou adoção da ideia aguerrida vencedora, mas implica no reconhecimento da não


vitória pretendida, sem que com isso, o outro seja erradicado.

CONCLUSÃO

Com as mais recentes mudanças no Ensino Médio verificamos uma redução significativa nos
temas de Filosofia em especial no que diz respeito a Política. O Ensino de Filosofia Política
pode se tornar mais palatável e atrativo partindo das concepções teóricas de Ernesto Laclau e
Chantal Mouffe, que nos oferecem uma visão crítica e radical. Categorias como antagonismo,
hegemonia mostram-se basilares para o ensino de Filosofia Política, assim como a distinção
entre a política e o político. Uma compreensão nítida, a partir de Laclau e Mouffe, sobre as
categorias ligadas à Política proporcionará ao educando uma reflexão mais crítica e concreta da
nossa realidade social, bem como, possibilitará o seu enaltecimento como cidadão da práxis
política.

REFERÊNCIAS

LACLAU, Ernesto. Nuevas reflexiones sobre la revolución de nuestro tiempo. 2. ed.


Buenos Aires: Nueva Visión, 2000.
LACLAU, Ernesto; MOUFFE, Chantal. Posmarxismo sin pedido de desculpas. In:
LACLAU, Ernesto. Nuevas reflexiones sobre la revolución de nuestro tiempo. 2. ed.
Buenos Aires: Nueva Visión, 2000, p. 111-145.
LACLAU, Ernesto; MOUFFE. Hegemonia e estratégia socialista: por uma política
democrática radical. São Paulo: Intermeios, 2015.
MENDONÇA, Daniel de; RODRIGUES, Léo Peixoto (orgs.). Pós-estruturalismo e teoria
do discurso: em torno de Ernesto Laclau. 2. ed. Porto Alegre: EDIPUC-RS, 2014.
MOUFFE, Chantal. La paradoja democrática: el peligro del consenso em la política
contemporánea. Barcelona: Gedisa, 2012a.
______. Sobre o político. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2015.
NEVES, José. Prefácio. In: MOUFFE, Chantal. Por um populismo de esquerda. Lisboa:
Gradiva, 2019, p. 11-13.
273

COOPERAÇÃO E COLABORAÇÃO FEDERATIVAS EM TERRITÓRIOS DA


BAHIA: O CONSÓRCIO PÚBLICO INTERMUNICIPAL COMO ARRANJO DE
GESTÃO DA EDUCAÇÃO

Maura da Silva Miranda1


Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia
Professora da Rede Estadual de Ensino.
maura.miranda@enova.educacao.ba.gov.br.

Maria Couto Cunha


Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia
Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (FACED/UFBA).
mariacoutocunha@gmail.com

INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta um recorte dos resultados de uma tese de doutorado que investigou os
processos de institucionalização das relações intergovernamentais para assegurar a cooperação
e a colaboração federativas na gestão da educação na Bahia, tendo como foco os consórcios
públicos intermunicipais, a partir da Lei nº 11.107/2005. Devido às fortes desigualdades
regionais no Brasil, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu o Pacto Federativo, a ser
efetivado por meio das formas cooperação (art. 23) e do regime de colaboração (art. 211).
Todavia, como o Pacto Federativo ainda não apresenta definição clara de operacionalização
entre os entes federados e não existe um Sistema Nacional de Educação devidamente
regulamentado, assiste-se no país a aprovação de diversos formatos de arranjos no federalismo
brasileiro para assegurar a gestão interfederativa de políticas públicas educacionais.

Ao longo dos anos, várias leis regulamentaram a descentralização da gestão pública no país
para viabilizar a cooperação federativa, dentre elas a Lei nº 11.107/2005, que dispõe sobre
normas gerais de contratação de consórcios públicos pela União, os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios para a realização de objetivos de interesse comum. Após a regulamentação da
referida lei pelo Decreto nº 6.017/2007, os entes da federação passaram a ter maior segurança
institucional, contribuindo para o aprimoramento da gestão consorciada no Brasil. Desde então,
o número de consórcios públicos vem se ampliando em todo o país, apresentando resultados
efetivos em experiências de gestão consorciada de políticas públicas entre os entes federados.
Na Bahia, a maioria dos municípios apresenta baixa capacidade de arrecadação de receitas
próprias, em função de sua base econômica ser eminentemente agrária e rural e os impostos
incidirem, em grande parte, sobre serviços e atividades urbanas. Há uma dependência desses
274

entes de complementações financeiras da União para assegurarem o financiamento de suas


políticas.

Nesse contexto, a criação de consórcios públicos intermunicipais capazes de viabilizar a


cooperação horizontal e vertical, por meio da captação conjunta de recursos, torna-se uma
agenda necessária. Desde 2011, o governo da Bahia passou a fomentar arranjos territoriais em
formato de consórcio público como parte integrante de sua Política de Desenvolvimento
Territorial3. Por meio da institucionalização dessa política, a Bahia foi dividida em 27
Territórios de Identidade, compostos por agrupamentos de municípios com características
geográficas, econômicas e culturais comuns. Os territórios passaram a participar da elaboração
do Plano Plurianual Participativo do Governo da Bahia (2007- 2010; 2011-2014) propondo
políticas contextualizadas com as demandas locais, a partir de diagnósticos territoriais, com
metas projetadas em Planos de Desenvolvimento Territorial Sustentável.

Para coordenar os rumos da nova política da gestão territorial foi criada, na estrutura
administrativa da Secretaria de Planejamento do governo - SEPLAN, a Diretoria de
Planejamento Territorial (DPT), que, em articulação direta com as secretarias de governo e a
sociedade civil dos territórios, mobilizou a implantação de 35 consórcios públicos (SEPLAN,
2020). Assim, a pesquisa em torno da qual se faz esse recorte teve como objetivo geral: Analisar
as experiências de consórcios públicos intermunicipais que atuam na área da educação em
Territórios de Identidade da Bahia, com vistas a conhecer sob que condições institucionais e
estruturais ocorrem a cooperação e a colaboração interfederativas no espaço territorial.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, do tipo exploratória, assentada no paradigma crítico


(GAMBOA, 2012), tendo como procedimentos: pesquisa documental, questionários e
entrevistas. Participaram das entrevistas representantes dos seguintes órgãos: Secretaria de
Planejamento (SEPLAN); Conselho Estadual de Desenvolvimento Territorial (CEDETER);
Federação dos Consórcios (FEC); Secretaria Estadual da Educação; Consórcios Públicos. A
delimitação dos consórcios no campo empírico se deu a partir dos seguintes critérios: a)
consórcios com previsão de atuação na educação em seus estatutos; b) com Câmara Técnica de
Educação ativa; e c) com gestão consolidada, na avaliação da SEPLAN. A partir desses critérios
foram identificados 05 consórcios para estudo.
275

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Decreto nº 12.354 de 25 de agosto de 2010. Dispõe sobre os princípios, diretrizes e objetivos


da política de desenvolvimento territorial do estado da Bahia,

Para análise dos casos foram selecionadas quatro categorias: 1) aspectos normativos e políticos
que embasam a política de consórcios públicos; 2) gestão consorciada, estrutura administrativa
e planejamento territorial; 3) relações interfederativas na gestão consorciada; 4)
governabilidade e participação social do poder local na gestão consorciada.

No que se refere à primeira categoria, a pesquisa evidenciou que o arranjo de gestão territorial,
por meio dos consórcios públicos intermunicipais na Bahia, traz uma regulamentação normativa
significativa, com condições de promover a descentralização de serviços públicos entre Estado
e municípios, com segurança institucional. Quanto à segunda categoria os achados
evidenciaram a relevância dos consórcios no planejamento e desenvolvimento da política
territorial, pois, assegura a celeridade, a economia, a eficiência e maior capilaridade do Estado
na gestão dos serviços públicos, visto que a Bahia é um estado com vasta extensão territorial,
com 417 municípios, o que limita a atuação direta das secretarias de governo em cada ente. Por
meio do consórcio, os municípios dos territórios investigados têm conseguido formular e
implementar políticas públicas conjuntas, a partir de suas demandas locais.

Com a terceira categoria foi possível perceber que o consórcio tem conseguido promover a
cooperação, tanto horizontal, por meio dos contratos de rateios, quanto vertical, através do
financiamento de ações via convênios e contratos com o Governo do Estado e com a União. A
cooperação vertical com o Estado tem sido a principal fonte de financiamento das políticas.
Entre os anos de 2013 a 2015 os consórcios conseguiram captar consideráveis valores de
recursos para o desenvolvimento de políticas de desenvolvimento territorial em várias áreas.
Com isso, a gestão consorciada aparenta ser um modelo de arranjo capaz de atender a
cooperação federativa, prevista no artigo 23 da CF de 1988.

No entanto, apesar dessas condições favoráveis, os consórcios investigados apresentaram


limitações institucionais na gestão colaborativa das políticas educacionais na estrutura
federativa. Pelas entrevistas, verificou-se que a gestão consorciada na área da educação pública
não tem conseguido estruturar um arranjo educacional sistêmico entre os órgãos gestores da
educação, em âmbito estadual e territorial. Durante o desenvolvimento da pesquisa observou-
se que a falta normatização do regime de colaboração, com definição de instâncias
276

institucionalizadas na estrutura administrativa da Secretaria Estadual de Educação, dificulta o


desenvolvimento de políticas educacionais articuladas com os municípios, os Núcleos
Territoriais de Educação, os colegiados territoriais, os consórcios públicos, universidades e
institutos federais, atuantes nos territórios.

Nesse contexto, a gestão da educação entre os municípios fica desarticulada em âmbito


territorial, possibilitando a existência de um campo aberto para a iniciativa privada. Frente a
este cenário de desarticulação cooperativa e colaborativa no campo da gestão da educação,
assiste-se nos últimos anos, ao avanço em territórios baianos de um regime de colaboração “de
outro tipo” disseminado por institutos e fundações privadas vinculados ao movimento
empresarial nacional Todos Pela Educação, tendo o consórcio público como parceiro, sem
coordenação, apoio ou interferência do Estado.

Quanto a quarta categoria desta pesquisa observou-se que a gestão consorciada apresenta
fragilidades na governabilidade e no controle social pelo poder local. A gestão consorciada da
educação territorial ocorre entre os gestores públicos municipais e seus parceiros privados, sem
a participação de colegiados territoriais, câmaras municipais, conselhos, sindicatos de
professores, universidades públicas e movimentos sociais do território. Conforme afirma,
Moura (2001), o êxito de qualquer processo de desenvolvimento local depende sempre da
mobilização e participação da comunidade local, o estabelecimento de parcerias, visão
abrangente e integrada de desenvolvimento, considerando sempre os aspectos econômicos,
sociais, políticos, culturais e ambientais que compõem o território.

Os arranjos consorciados de educação instituídos no espaço territorial com a integração dos


órgãos públicos, participação dos colegiados territoriais, em parcerias com entidades
endógenas, dentre outros atores sociais locais, podem vir a ser uma alternativa para a
colaboração entre os entes, capazes de promover o empoderamento do poder local. Para Santos
(2015), o arcabouço-teórico discursivo de Estado que serve de base para este tipo de política e
desenvolvimento territorial, seria a de um ‘Estado-Providência’ que assegure a democracia e a
participação social, por meio de novas sociabilidades alternativas dos territórios, capazes de
promover a inclusão da comunidade na gestão pública.

CONCLUSÃO

Os resultados da pesquisa sinalizam que a gestão consorciada na Bahia, apesar de apresentar


277

condições de institucionalização de um arranjo territorial robusto, demonstra dificuldades de


articulação interfederativa para a colaboração e a cooperação na área da educação. A ausência
da coordenação do Estado na gestão da educação, tendo os consórcios como parceiros
potenciais, tem motivado a ampliação da atuação de atores do movimento empresarial nacional,
os quais vêm ocupando espaços no controle do conteúdo curricular e no planejamento
educacional. A pesquisa revela que a proposição de arranjos educacionais em formato de
consórcio público, desvinculada de uma estrutura na administração direta do Estado que defina
o arranjo de gestão e a coordenação da política educacional a partir das estruturas federativas,
apresenta limitações para viabilizar a operacionalização do regime de colaboração e efetivar a
cooperação entre os entes, possibilitando o avanço das parcerias público privadas em territórios
da Bahia.

Para tanto, importa que a Secretaria da Educação do Estado, as universidades, os consórcios


públicos, os movimentos e organizações sociais endógenas de cada território encontrem
caminhos e condições para a criação de uma ambiência capaz de institucionalizar uma rede
colaborativa nas estruturas públicas territoriais e fortalecer modelos de descentralização da
gestão da educação com inclusão do poder local. Nesse sentido, se faz necessário repensar um
arranjo de gestão da educação territorial pública, laica, gratuita e de qualidade social, integrada
aos territórios, sem a qual não se constrói as bases sociais e políticas necessárias para a
consolidação de uma política de desenvolvimento territorial democratizante.

REFERÊNCIAS

BAHIA. Decreto nº 12.354 de 25 de agosto de 2010.Institui o Programa Territórios


de Identidade e dá outras providências. Disponível em:
https://governoba.jusbrasil.com.br/legislacao/1024959/decreto-12354-10. Acesso em
dez de 2018.
BAHIA, SEPLAN. Consórcio Público um novo instrumento de cooperação
federativa. Disponível em: http://www.seplan.ba.gov.br/arquivos/file/politica-
territorial/consorcios
publicos/Consorcios_Publicos_um_novo_instrumento_de_cooperacao_federativa_Seplan.
pdf. Acesso em out. de 2017.
BAHIA, SEPLAN. Política Territorial do Estado da Bahia. Disponível em:
http://www.seplan.ba.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=30. (2012). Acesso
em: 17 nov. 2017.
BRASIL, PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Decreto no 6.017, de 17 de janeiro de
2007. Regulamenta a Lei no 11.107, de 6 de abril de 2005, que dispõe sobre normas
gerais de contratação de consórcios públicos. Brasília-DF, 2007.
278

BRASIL. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Lei 11.107 de 06 de abril de 2005. Dispõe


sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências.
Disponível em www.senado.gov.br.
GAMBOA, Silvio Sánchez. Pesquisa em educação: métodos e epistemologias. Argos
Editora Unochapecó, Chapecó, 2012.
MOURA, Maria Suzana et al. Desenvolvimento local sustentável: O que sinalizam as
Práticas. In: Congresso da Associação Latino-americana de Sociologia (ALAS), XXIII,
2001, Ciudad de Guatemala. Anais... Guatemala: ALAS (no prelo)
SANTOS, Boaventura de Sousa A Gramática do tempo: por uma nova cultura política. 3ª
edição. São Paulo: Editora Cortez, 2015.
279

EIXO 7 – Federalismo, formação, valorização e


trabalho dos profissionais da educação
280

OS IMPACTOS DA ORGANIZAÇÃO DOS ESTAGIÁRIOS DA PREFEITURA DE


VITÓRIA NO ÂMBITO DAS POLÌTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
INSTITUÍDAS PELA SEME

Aline de Sousa Rosa


Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Espírito Santo
alinedesousa2000@gmail.com

Nicoly de Souza de Moura


Graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal do Espírito Santo
nysouza062@gmail.com

INTRODUÇÃO

O presente estudo tem como objeto de pesquisa a Organização de Estagiários da Prefeitura


Municipal de Vitória/ES e suas ações no âmbito das lutas e articulações por melhores condições
de trabalho para este segmento de profissionais no município. Como objetivo geral buscamos
conceber quais são os discursos sobre o tema que pairam sobre esse movimento, quais
mudanças aconteceram a partir das solicitações realizadas pela organização junto a secretária
de educação do município, juntamente com as propostas de leis que foram formuladas após o
período da criação da Organização dos Estagiários que tange às reivindicações realizadas por
este grupo.

Dessa forma, partindo das legislações nacionais, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional - LDBN em seu título VI - dos Profissionais da Educação, aponta que a formação
destes, terá como fundamentos: I – a presença de sólida formação básica, que propicie o
conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas competências de trabalho; II – a
associação entre teorias e práticas, mediante estágios supervisionados e capacitação em
serviço. (BRASIL, 1996)

Bem como, define que a União, o Distrito Federal, os estados e os Municípios devem atuar em
regime de colaboração a fim de promover formação inicial e continuada do magistério e adotar
mecanismos facilitadores de acesso e permanência nos cursos de formação de professores em
nível superior para atuação na educação básica pública.

Nessa perspectiva, o Plano Nacional de Educação - PNE (2014) coaduna e reforça com os
preceitos estabelecidos pela LDB, estabelecendo como uma das metas a serem cumpridas:
15.8) valorizar as práticas de ensino e os estágios nos cursos de formação de nível médio e
superior dos profissionais da educação, visando ao trabalho sistemático de articulação entre a
281

formação acadêmica e as demandas da educação básica;

Adiante, a Política Nacional de Formação de Professores que tem como seus princípios a
articulação teoria e prática, articulação instituição formadora e escolas de educação básica,
apresentou como umas das várias problemáticas do seu diagnóstico “Estágios curriculares sem
planejamento e sem vinculação clara com as escolas” (BRASIL, 2017).

Na produção acadêmica destacam-se autores como (CARVALHO, 2020); (SILVA e GASPAR,


2018) e (ADAMS, MELO E NUNES, 2021) que dialogam com a importância do trabalho
realizado através dos estágios supervisionados para a formação de futuros professores, numa
perspectiva de os estudantes participarem do processo de ensino-aprendizagem sob a visão do
educador, assim como a possibilidade de se pensar a atuação dos futuros docentes de acordo
com a realidade das salas de aulas que eles estarão inseridos. Ainda mais, destacamos a
importância das produções dos alunos que realizam a disciplina de estágio supervisionado,
através dos memoriais descritivos, numa ampliação do entender o que é ser professor e também
de uma escrita-formação que se constitui na atividade de pesquisa, narrar, ouvir, sentir e
escrever (NUNES E VENTORIM, 2017) Porém, pouco se discute sobre a atuação dos
estagiários remunerados que compõem o quadro de colaboradores das instituições de ensino.

A Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008 traz as definições e regulamentações para a oferta


de estágio das empresas e instituições concedentes, para os alunos que serão estagiários e para
as instituições de ensino a qual estes possuem vínculo. Mesmo após a revogação do art. 82 da
Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que define que os sistemas de ensino definirão de
acordo com sua jurisdição as regras para concessão de estágios, ainda são observadas diversas
incoerências e divergências da atuação dos estagiários em consonância com a lei nos
municípios da Grande Vitória.

Em contraponto a esta situação, surge no final do ano 2021 a Organização dos Estagiários da
Prefeitura de Vitória que emerge de um contexto de irregularidades e más condições de
trabalho, dentre elas, o descumprimento do Termo de Compromisso - TCE firmado entre a
PMV, o aluno - estagiário, a instituição de ensino, desvio de funções, ausência de professor de
Educação Especial impossibilitando orientações com o trabalho executado com os Alunos -
Público da Educação Especial, falta de atividades e de materiais adaptados, sobrecarga de
trabalho (acompanhamento de mais de um aluno PAEE, em salas diferentes, implicando em
descontinuidade e fragmentação do trabalho realizado), entre outros fatores que culminaram
282

num processo de desvalorização dos docentes em formação posicionados enquanto


profissionais de apoio para alunos PAEE (Organização dos Estagiários da PMV, 2021). Nesse
cenário, cerca de 200 estudantes - estagiários da rede que unindo-se por uma educação pública
e de qualidade cada vez mais abrangente, somam-se a indignação às condições insalubres de
trabalho, desvio de função, abusos de autoridade por parte de supervisores e baixos salários se
mobilizam através de pautas coletivas para a reivindicação de melhores condições de trabalho,
visando uma ampliação do reconhecimento do papel do estagiário dentro das escolas
municipais de ensino, formação continuada para estes que fazem parte do quadro de educadores
da escola, aumento dos salários e outras demandas que vão surgindo ao longo do tempo
(Organização dos estagiários da PMV, 2021) .

METODOLOGIA

Metodologicamente, optamos pela técnica de análise documental pautada em Menga e Ludke


(1986), no qual correspondeu ao levantamento de legislações educacionais cuja temática
abordada refere-se a formação inicial de trabalhadores do magistério, dentre elas a LDB, PNE,
a Política Nacional de Formação de Professores, o Plano Nacional de Formação de Professores
e a Política de Educação Especial do Município de Vitória na Perspectiva da Educação
Inclusiva, os projetos de Lei acerca o aumento da bolsa salarial e da indicação de ticket -
alimentação ocorridas no âmbito do município de Vitória - ES, combinada com a análise de
fontes produzidas pela Organização dos Estagiários da PMV, como sua primeira Carta enviada
à SEME no final de 2021, o Manifesto disponibilizado em sua página do Instagram
(https://instagram.com/org.estagiarios?igshid=YmMyMTA2M2Y=). Buscando maior
aprofundamento na pesquisa, foi realizado revisão de literatura nos bancos de dados do Google
Acadêmico e do Scielo, utilizando como descritores a importância do estágio remunerado para
licenciatura; Relevância do Estágio não obrigatório na formação de professores e Prática do
estágio não obrigatório no curso de Pedagogia. Todos os resultados encontrados referem-se
exclusivamente ao estágio curricular obrigatório, não correspondendo, portanto, a busca
efetuada.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O estágio não obrigatório remunerado não encontra posição de destaque nas produções
acadêmico científicas quando se trata acerca de uma unidade formativa de futuros professores.
O foco dos trabalhos até então, incide portanto, sobre a relevância do estágio curricular
283

obrigatório. Esse dado nos mostra que pouco se tem discutido sobre as potencialidades do
estágio remunerado não obrigatório enquanto uma política voltada a juventude do município
de Vitória - ES, bem como, uma política de formação de futuros professores que valoriza a
intrínseca articulação entre a teoria e prática e a ocupação privilegiada simultaneamente em
dois locais distintos de produção de saber e de conhecimento: a escola e universidade.

O estágio nas escolas públicas do município de Vitória - ES refere-se majoritariamente ao


acompanhamento de alunos PAEE, o que implica no assessoramento pedagógico, auxílio para
conclusão de atividades, retirada de dúvidas, entre outras demandas correspondentes a
especificidade de cada aluno. O TCE firmado entre ambas as partes envolvidas aponta como
principais atividades a serem executadas pelos estagiários aponta para as seguintes atribuições:

Auxiliar o professor regente nas atividades com os alunos em sala de aula e em


atividades extraclasse, auxiliar nos projetos desenvolvidos pelo professor regente;
auxiliar no atendimento; acompanhamento de alunos da modalidade da
Educação Especial; auxiliar na participação das atividades pedagógicas
desenvolvidas na unidade escolar; auxiliar na confecção de material didático que
viabilize potencializar o processo de aprendizagem do aluno e auxiliar e estimular aos
alunos ao protagonismo estudantil infanto juvenil por meio de ações educativas.
(CIEE, 2022, Grifos nossos).

Nesta perspectiva, através de revisão de literatura, percebe-se que o estágio remunerado não
obrigatório é subalternizado pelas pesquisas científicas, mas também pelas diretrizes do
município. Tomamos como referência a Política Municipal de Educação Especial, visto que,
em grande parte os estagiários configuram-se em profissionais de apoio do atendimento
ofertado pela Educação Especial, conforme previsto no TCE. De acordo com o referido
documento, cabe ao professor especializado: Orientar, quanto à aplicação de recursos de
tecnologia assistiva, os estagiários e demais profissionais envolvidos no processo de ensino
aprendizagem, em colaboração com a equipe pedagógica. (SEME, 2018). Salienta-se que esta
é a única menção aos estagiários ao longo de todo o documento legal.

È nesta conjuntura de desvalorização do estágio, que no final do ano de 2021, um grupo de


estagiários da rede municipal de ensino de Vitória começam a unir-se e a criar articulação, bem
como discutir, debater e refletir no âmbito das legislações vigentes, as obrigações, deveres e
direitos da categoria.

Dessa forma, em busca de melhores condições de trabalho foi impulsionada uma luta
organizada e unificada no qual envolveu diversas ações, sendo estas, o estabelecimento de
284

diálogo e de reuniões com vereadores da Câmara Municipal de Vitória no qual reverberou em


falas repercutidas na Casa de Leis e nas Indicações N. 0150\2021 e 7928\2021 cuja temática
aponta para propostas indicativas de aumento salarial. Também foi marcado uma reunião com
a Secretaria de Educação no ano de 2021 através de intermédio do Sindicato dos Profissionais
da Educação Pública (SINDIUPES) no qual foi abordado anseios e possibilidades de melhoria
para o estágio, dentre eles, a necessidade de formação voltada para o segmento de atuação e
melhor direcionamento por parte dos gestores das escolas.

CONCLUSÃO

Portanto, a partir da análise das ações realizadas pela Organização de Estagiários da Prefeitura
de Vitória, concebem mudanças significativas quanto à postura da organização diante do
trabalho com os estagiários.

Destacam-se as formações CI GFDE 0170/2022 e a CI GFDE 0198/2022 ambas possuindo


como público-alvo os estagiários, que foram planejadas e concedidas a partir da solicitação
realizada por estes e como tema a formação continuada para o trabalho com as crianças alvo
da política da educação especial.

Bem como o decreto de nº 20.433, que regulamenta a contratação de estagiários a nível


superior com carga horária de 5h/diárias e realiza o reajuste das ofertas das bolsas em mais de
40% para os futuros contratados e atuais bolsistas.

E ademais a indicação de lei número 6911/2022, designado pela vereadora Camila Valadão
- PSOL que a partir de uma reunião com a organização dos estagiários, requereu a oferta de
ticket de alimentação para estes.

REFERÊNCIAS

Adams, F. W., Melo, R. J. de, & Nunes, S. M. T. (2021). A importância do estágio para
a formação inicial docente sob a ótica de licenciandos em educação do campo. Pesquisa
E Debate Em Educação, 11(2), 1–19, e31985.
CARVALHO, Scarlett O.’hara Costa. Reflexões acerca da experiência do Estágio
Supervisionado em Educação Infantil. Práticas Educativas, Memórias e Oralidades-Rev.
Pemo, v. 2, n. 1, p. 1-12, 2020.
Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação (PNE) e dá
outras providências. Brasília: Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 26
jun.
285

Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação


Nacional. Brasília: MEC, 1996. BRASIL.
BRASIL. Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008. Dispõe sobre o estágio de estudantes;
altera a redação do art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 26 set.
BRASIL. Política Nacional de Formação de Professores. Maria Helena Guimarães de
Castro. Brasília: MEC, 2017. BRASIL.
BRASIL. Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica.
Secretária Municipal de Educação de Vitória. Política Municipal de Educação Especial.
Org. Ana Lúcia Sodré Oliveira. Secretária Municipal de Educação de Vitória (SEME),
2018. 53p.
KINGDON, John W. (1995). Agendas, Alternatives, and Public Policies. 2nd.
LUDKE, Menga; ANDRÉ, Marli. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. Em
Aberto, v. 5, n. 31, 1986.
ORGANIZAÇÃO DOS ESTAGIÁRIOS DA PREFEITURA DE VITÓRIA. Carta a Seme.
- ES, 2022.
SILVA, Haíla Ivanilda; GASPAR, Mônica. Estágio supervisionado: a relação teoria e
prática reflexiva na formação de professores do curso de Licenciatura em Pedagogia.
Revista brasileira de estudos pedagógicos, v. 99, p. 205-221, 2018.
286

VALORIZAÇÃO OU (DES)VALORIZAÇÃO? O PROCESSO DE INFLEXÃO DA


POLÍTICA DE VALORIZAÇÃO DOCENTE

Samára Assunção Valles Jorge


SEDUC/Cáceres
samaravalles@hotmail.com

Lucinalda Carneiro Lima


SME/ Cáceres- MT
lunyna.dara@gmail.com

Robert Kennedy
SME/ Cáceres- MT
Ronertkennedysm@gmail.com

INTRODUÇÃO

A valorização dos profissionais da educação se configura como parte estratégica das políticas
educacionais para se alcançar a qualidade da educação. Estratégia que envolva a garantia de
salário digno, carreira atraente, jornada compatível com as atividades escolares, condições de
trabalho, boa infraestrutura e ações que envolvam a gestão democrática dentro dos ambientes
escolares. Estas exigências se fazem presente na Constituição Federal - CF/88, Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional - LDBN n° 9.394/96, meta 18 do Plano Nacional de Educação -
PNE (2014-2014), Parecer da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de
Educação CEB/CNE nº 18/2012, Lei do Piso n° 11.738 de 2008 entre outros documentos que
visam a defesa da valorização dos profissionais da educação. Assim como na meta 16 do Plano
Municipal de Educação de Cáceres/MT (2015-2025); META 16: Valorizar os profissionais da
educação da rede municipal da Educação Básica, a fim de equiparar o rendimento médio dos
demais profissionais com escolaridade equivalente, até o final do 4º ano da vigência deste PME.
(PME, 2020).

A meta do referido plano faz parte da luta dos profissionais da Educação Básica, atravessada
pela falta de recursos financeiros que impede o cumprimento do financiamento da educação.
Luta marcada pela necessidade de mudanças econômicas e políticas, “mudanças estruturais de
ordem econômica que prescinde imediatamente de posições políticas, tanto de âmbito macro
quanto micro” (RIBEIRO, p. 12. 2020).

Na busca de compreender o processo de valorização dos profissionais de Educação do


Município de Cáceres – MT, nos últimos anos, este resumo tem como objetivo apresentar um
287

breve histórico sobre o tema: valorização profissional dos trabalhadores na Educação do


Munícipio de Cáceres-MT assim como o movimento grevista ocorrido no ano de 2022, que teve
como pauta prioritária: cumprimento do Piso Salarial, hora atividade para professores
temporários e a regulamentação do PROFUNCIONARIO. Na busca de compreender este
processo elencamos como problema de estudo, entender como ocorreu o processo de
implementação dos direitos sobre valorização do magistério.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa documental por favorecer a observação do processo de maturação ou


de evolução de indivíduos, grupos, conceitos, conhecimentos, comportamentos, mentalidades,
práticas, entre outros. (CELLARD, 2008). De modo a analisar as mudanças na legislação que
visa garantir os direitos e valorização dos profissionais da Educação do Município de Cáceres-
MT. Sustentada pelo aporte teórico dos autores (RIBEIRO, 2020 e SAVIANI, (2009).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os profissionais do Sistema Municipal de Educação de Cáceres estiveram em greve por 48


(quarenta e oito) dias reivindicando as seguintes pautas: I – Pagamento do Piso Nacional do
Magistério, II - Hora atividade para professores em contrato temporário e III - regulamentação
do PROFUNCIOÁRIO. As três pautas são de suma importância para a educação, porém, vamos
nos deter sobre a pauta do magistério em relação ao piso salarial nacional.

É sabido que uma das formas de valorização do magistério consiste em políticas públicas a fim
de assegurar uma carreira e remuneração compatível com a complexidade que a profissão exige.

Em 16 de julho de 2008 foi sancionada a Lei n° 11.738, que instituiu o piso salarial profissional
nacional para os profissionais do magistério público da educação básica. Posteriormente, em
27/02/2013, o Supremo Tribunal Federal – STF decidiu pela constitucionalidade da Lei que
regula o piso salarial nacional dos profissionais do magistério público da educação básica. A
decisão tem efeito erga omnes, ou seja, obriga a todos os entes federativos ao cumprimento da
Lei, inclusive o município de Cáceres -MT.

Em fevereiro de 2022 o piso nacional do magistério de 2022 foi regulamentado pela Portaria
67/2022 homologado o Parecer 2/2022/CHEFIA/GAB/SEB/SEB de 31 de janeiro de 2022, com
fulcro na Lei n° 11.738/2008. Com efeito, resultou no reajuste de 33,24% percentuais. Em
janeiro de 2022 o Reajuste Geral Anual foi de 14,35% para todos os servidores do município,
288

logo, os profissionais do magistério não obtiveram o reajuste estipulado pelo Parecer


Ministerial.

No mesmo mês, o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais – SSPM convocou a categoria
da educação municipal para tratar de diversas pautas, conforme convocação do dia 07/02/2022,
dentre as pautas, constava o Piso Salarial Nacional em 18/02/2022, outra convocação, e a
assembleia reuniu novamente para discutir as mesmas pautas. Em 29/03/2022 os profissionais
da educação municipal foram convocados para paralisação em defesa da educação municipal
que ocorreu em 30 de março de 2022. E conforme consta na ata nº 25/2022 do SSPM a
paralisação foi necessária uma vez que as tentativas de negociação com a administração teriam
sido frustradas. Após a paralização o Executivo Municipal pediu aos profissionais da educação
um prazo, que corresponderia até o final do primeiro quadrimestre. Prazo este, prontamente
atendido pela categoria. Porém, encerrado o período de estudo e análise das contas a categoria
foi até ao executivo exigir uma resposta, que foi negativa para todas as pautas.

Diante da negativa, os profissionais da educação não viram outra saída que não fosse a deflagrar
a greve até que houvesse uma negociação. Na data de 03/06/2022 o SSPM comunica o
Executivo Municipal a partir do ofício nº 046/2022/SSPM a decisão unanime da assembleia
pela greve a partir do dia 07/06/202 afim de lutar por um direito já constituído e tutelado,
inclusive endossado pelo STF, bem como instituído pelo PME como uma estratégia da Meta
14 que consiste em “assegurar conforme Lei nº 11.738 de 16 de julho de 2008, que na
elaboração do Plano de Carreiras, Cargos e Salários seja utilizado o Piso Salarial profissional
nacional como o patamar mínimo de referência”. O município demorou mais de 30 dias para
iniciar diálogo e negociações, preferiu judicializar pedindo a ilegalidade da greve dos
profissionais da educação. A Desembargadora, do caso, em 22/06/2022 prolatou decisão da
tutela de urgência para retorno dos profissionais no prazo de 48 horas às atividades, sob pena
de multa diária fixada em R$1.000,00 (hum mil reais). Em assembleia a categoria decidiu por
pagar a multa e permanecer em greve, bem como contestar judicialmente.

Início de julho de 2022 o executivo pela primeira vez se dispõe ao diálogo e faz uma proposta
de acordo, esta, foi rejeitada e a categoria produziu uma contraproposta, que não foi atendida.
Logo, em 08 de julho, o sindicato, vereador, e o secretário de assuntos estratégicos do executivo
municipal conversaram e decidiram minutar coletivamente através de representantes uma
proposta máxima em relação ao piso nacional do magistério de 4% porcento as negociações
perduraram mais alguns dias, até que a proposta foi aceita pela categoria, uma vez que outras
289

pautas também foram atendidas parcialmente. Portanto, o acordo foi homologado em 15 de


julho de 2022. Porém, fica evidente não só descumprimento legal, mas também o processo
inverso da valorização do profissional docente diante de situações como essa vivenciada pelos
profissionais da educação do município de Cáceres-MT que apenas mediante medidas estremas
como a greve, conseguem se sentar à mesa para “diálogo” ou até mesmo garantir o mínimo de
seus direitos já tutelados.

CONCLUSÃO

Podemos considerar que a CF de 1988 e a LDBN nº 9.394/96 representaram alguns avanços


para a constituição da carreira docente ao definir em seus textos garantias que trouxeram
mudanças significativas para a prática e carreira docente, como a LDBN que em seu art. 67
deixa claro que o profissional docente tem assegurado o direito ao aperfeiçoamento continuado,
inclusive com licenciamento periódico remunerado; um piso salarial profissional; a progressão
funcional baseada na titulação ou habilitação, e na avaliação do desempenho; um período
reservado a estudos, planejamento e avaliação incluído na carga horária; e condições adequadas
de trabalho.

Essas conquistas são os frutos de muitos embates e lutas da classe trabalhadora da educação,
que constitui processo de extrema complexidade dada a nossa história educacional, na qual ora
se revela o caráter centralizador dessas políticas, ora o seu caráter descentralizador, num
percurso de descontinuidade (SAVIANI, 2009). Todavia os debates sobre a construção dessas
políticas, assim como a das políticas de fundos, têm suas matérias vinculadas e votadas em
plena reforma do Estado, justificadas na necessidade de contenção de gastos sociais pela
máquina pública. Isso aconteceu com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e Valorização do Magistério - FUNDEF e o Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB
que são pilares de sustentação do financiamento da educação brasileira, inclusive garantindo
um percentual para o pagamento remuneratório dos professores. Assim, como as Resoluções nº
03/1997 e nº 02/2009 – CNE que fixam diretrizes para os Planos de Carreira de professores.

Portanto, afim de compreender o processo de valorização dos profissionais de Educação do


Município de Cáceres – MT, nos últimos anos, é preciso observarmos as diversas legislações
que subsidiam esta pauta, como a CF de 1988, a LDBN nº 9.394/96, o PNE e o PME
290

representam avanços significativos na valorização da carreira docente ao definir em seus textos


garantias que trouxeram mudanças significativas para a prática e carreira docente.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Constituição Federal de 1988


BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Lei nº 9.394/96
CÁCERES, Lei n° 2.863 de 11 de maio de 2020. Disponível em: http://leismunicipa.is/pyker,
acesso em 30 de ago. 2022.
CÁCERES, Processo Judicial Eletrônico, PJE, N° 1011258-41.2022.8.11.0000
CELLARD, A. A análise documental. In: POUPART, J. et al. A pesquisa qualitativa:
enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis, Vozes, 2008.
RIBEIRO, J.M.C. Valorização dos Profissionais da Educação Básica no Brasil. In:
Valorização dos profissionais da Educação no contexto do FUNDEB e do PSPN. RIBEIRO;
FIGUEIREDO (org). Tangará da Serra-MT. Editora: Unemat. 2020.
SAVIANI, Dermeval. Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do problema no
contexto brasileiro. In_: Revista Brasileira de Educação: Abril, 2009, vol.14, no.40, p.143-
155. ISSN 1413-2478.
291

LEI DE BONIFICAÇÃO POR DESEMPENHO DA SECRETARIA MUNICIPAL DE


VITÓRIA: POSICIONAMENTO DO CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

Zoraide Barboza de Souza


Mestra do Programa Educação: História, Política, Sociedade da PUC-SP
Professora Especialista de Educação Infantil da Rede Municipal de Vitória - ES

Keila Bárbara Ribeiro da Silva


Especialista em: História e Política Social pela UFES
Professora de Ciências Sociais da Rede Municipal de Vitória - ES

INTRODUÇÃO

No dia treze de abril de 2022 foi aprovado em plenária do Conselho Municipal de Educação
(COMEV) o Parecer/COMEV 02/2022 - Técnico da Comissão de Legislação e Normas - CLN,
acerca da Lei Municipal no 9777/21, que institui a Bonificação por Desempenho no âmbito da
Secretaria Municipal de Educação (SEME), cria a Comissão de Bonificação por Desempenho
e dá outras providências.

Vitória tomou como referência os preceitos que orientam a administração pública na


contemporaneidade, seguindo as concepções e os fundamentos do sistema capitalista, numa
perspectiva de que apenas o lucro importa. Idealizando o alcance da eficiência e eficácia do
mercado, quando o município toma a iniciativa de enviar para a Câmara de Vereadores o projeto
lei de bonificação por desempenho.

Com essa ação da gestão, de enviar o referido projeto de lei, o COMEV é instigado a se
posicionar por meio de Parecer conforme legislação municipal, Lei 4746/1998 em seu artigo
terceiro quando fala das suas competências “[...]emitir parecer sobre questões e assunto de
natureza pedagógica e educacional que lhe sejam submetidas pelo Governo do Município, pelo
Secretário Municipal de Educação, bem como por outras autoridades, entidades e pessoas
interessadas.” (VITÓRIA, 1998, p. 02).

O foco deste estudo é discutir sobre o Parecer/COMEV 02/2022 que se posiciona a respeito da
lei 9.777/2021 do município de Vitória, que institui a bonificação por desempenho no âmbito
da SEME. Tendo como referência a retirada de direitos conquistados pelo magistério ao longo
do seu processo de lutas, quando regulamenta que para ter “direito” à bonificação, o docente
deve abdicar do direito de licença médica, licença para acompanhar familiares em atendimento
médico, licença nojo, licença gala. Nessa perspectiva, pode-se construir reflexões que para
292

alcançar a recompensa disponibilizada pela administração, o/a professor/a não poderá adoecer,
enlutar-se ou mesmo comemorar casamento.

Outro aspecto também que abordaremos é a relação da bonificação com a implantação do


modelo produtivo e competitivo por parte da administração, na busca de que professores/as
alcancem a suposta qualidade produtiva, fazendo com que recaia sobre professores/as e
estudantes a responsabilidade de fracasso/sucesso. Em um artigo, EVANGELISTA e
VALENTIM (2013, p. 1009) sinalizam que “[...]A ansiedade gerada na longa espera pela
divulgação do resultado das metas, bem como as consequências que isso traz, pode engendrar
sentimentos como culpa orgulho, competição, vergonha e inveja”.

PROBLEMA

Ao ponderar a respeito dos elementos que orientam a bonificação na educação do município,


pode-se questionar: quais as considerações que o Parecer/COMEV 02/2022 apresenta em
relação à perda de direitos, ou seja, desistência de licença médica, licença para acompanhar
familiares em atendimento médico, licença nojo, licença gala? Ainda, qual a relação da
bonificação com o modelo produtivo e competitivo do mercado e as implicações para
professores/as e estudantes?

O objetivo deste trabalho é analisar as perdas de direitos que os/as professores/as tiveram ao
serem submetidos à lei 9.777/2021 de bonificação por desempenho da SEME, do município de
Vitória, relacionando a responsabilização do fracasso/sucesso para professores/as e estudantes.

METODOLOGIA

Este trabalho tem como abordagem o relato de experiência. Fizemos essa escolha pelo nosso
envolvimento com o processo de elaboração do Parecer/COMEV 02/2022, sendo que uma
compõe a relatoria e a outra atuava como presidenta do COMEV. Nossa vivência com a feitura
do documento, coloca-nos em condições de relatar o percurso de reflexões produzidas nos
encontros e lives promovidas pelo COMEV. O roteiro a ser usado poderá auxiliar na
compreensão do referido parecer, fazendo com que amplie o entendimento da temática.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Aos falarmos sobre a perda de direitos do magistério, o parecer explicita críticas à SEME por
falta de políticas públicas e faz inferência a respeito das licenças médicas e licença para
293

acompanhar familiares, afirmando que a referida lei de bonificação “[...]deixou descobertos/as


os/as servidores/as atacados/as por doenças profissionais produzidas pelo próprio sistema, a
maior parte dos/das licenciados/as do magistério que se enquadram neste critério são de doenças
psiquiátricas e ortopédicas”. (VITÓRIA, 2022, p. 02). Sinaliza também a falta de sensibilidade
por parte da administração em trazer uma lei que não leva em conta que a humanidade está
voltando de uma pandemia em decorrência da Covid19.

Outro aspecto que o parecer faz referência é a destituição do direito de celebrar o amor, ou seja,
os/as professores/as tinham direito à licença gala de 07 dias para celebração de seu matrimônio.
A partir da lei 9.777/2021 o profissional que fizer a escolha de usufruir seu direito “[…]ao
tirarem licença gala, perdem a ‘valorização’ e caem na classificação dos/das sem mérito, pois
apenas os/as ‘preguiçosos/as’ celebram o amor e a vida.” (VITÓRIA, 2022, p. 03).

Outro aspecto dessa lei de bonificação é a busca de culpabilização do fracasso de professores/as


e estudantes, bem como premiação aos mesmos pelo “sucesso” alcançado, implantando o
modelo produtivo e competitivo do mercado. “Os modelos administrativos podem ser
considerados, portanto, roupagens bonitas, ou seja, instrumentos que visam à construção e
naturalização de valores, comportamentos, modos de sentir e viver: políticas de subjetivação.”
(EVANGELISTA e VALENTIM, 2013, p. 1006).

O parecer sinaliza com base em Esteban(2008) que o discurso oficial indica os dados das
avaliações padronizadas como mecanismo de melhoria da educação. No entanto, a referida
autora aponta que “[...]as avaliações externas pouco contribuíram, ao longo dos anos, para a
educação e para a melhoria da aprendizagem. (VITÓRIA, 2022, p. 08).

Dessa forma, a lei de bonificação tem como referência as metas determinadas para as Unidades
de Ensino e no índice do PAEBES. Nesse contexto, a organização pedagógica pode caminhar
na perspectiva de resultados e é assombrada pela vigilância severa dos organismos externos.
"[...]o que está em jogo não é a possível certeza de ser sempre vigiado, tal como no clássico
panóptico, e sim a incerteza e a instabilidade de ser avaliado de diferentes maneiras, por
diferentes meios e por distintos agentes” (BALL, 2001, p. 110).

O parecer questiona o fato do município ter adotado o Programa de Avaliação da Educação


Básica do Espírito Santo (PAEBES) para balizar os indicadores do desempenho institucional
das escolas e dos/das profissionais da educação, pois o município possui um sistema de
avaliação próprio, Lei 8.051/2010 do SAEMV (Sistema de Avaliação Municipal de Vitória),
294

que foi desenvolvida e amplamente discutida junto à comunidade escolar e dialoga com as
realidades educacionais do município.

Paro (2012) elabora uma crítica sobre a remuneração por mérito aos professores dizendo que é
uma medida descabida que revela o desconhecimento das condições da atividade pedagógica,
e, nela, revelam-se dois supostos: “[...]suposição da incúria do professor no desenvolvimento
de suas atribuições”, precisando ser estimulado para tal como acontece na produção capitalista;
e, o segundo, “[...]o reconhecimento (não explícito) de que o salário do professor não é
suficiente para propiciar-lhe condições mínimas de trabalho” (PARO, 2012, p. 601).

CONCLUSÃO

A sobrecarga de trabalho e as condições de estresse, com a nova matriz curricular e as inúmeras


cobranças por índices a serem alcançados, tem causado danos a saúde do Magistério de Vitória,
que com os salários achatados, e na busca por maiores recursos financeiros, passam a ser
pressionados pelas circunstâncias a não faltar ao trabalho, mesmo quando estão doentes.

Destacamos que a valorização salarial é algo que se reflete ao longo da carreira das/dos
professoras/es e impacta positivamente na sua qualidade laboral e de vida e que, de acordo com
a Constituição Federal, os vencimentos de um/uma trabalhador/a precisam suprir as suas
necessidades vitais básicas, bem como as de sua família, com moradia, alimentação, educação,
saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social.

A precarização do investimento em educação do município se transveste em fracasso individual


dos professores eximindo assim o poder executivo e legislativo da responsabilidade por
assegurar infraestrutura, segurança e valorização salarial.

A construção de uma política efetiva de valorização dos/das profissionais do magistério, deve


garantir os direitos já conquistados, proporcionar melhorias e o aprimoramento permanente da
qualidade da Educação Pública socialmente referenciada, e estimular a busca pela melhoria
contínua do aprendizado dos/das estudantes e da gestão das unidades escolares e
administrativas.

REFERÊNCIAS

BALL, S. Diretrizes. Políticas Globais e Relações Políticas Locais em Educação. Currículo


sem Fronteiras s, v.1, n.2, pp.99-116, Jul/Dez 2001.
295

EVANGELISTA Simone Torres e VALENTIM Igor Vinicius Lima. Remuneração Variável


de Professores: controle, culpa e subjetivação. Porto Alegre: Educação & Realidade, v. 38,
n. 3, p. 999-1018, jul./set. 2013.

PARO, Vitor Henrique. Trabalho docente na escola fundamental: questões candentes.


https://www.scielo.br/j/cp/a/9Dh3nRBRrYmmBBddSGtbHkN/?format=pdf&lang=pt Acesso
em 22.08/2022

VITÓRIA. Parecer Técnico da Comissão de Legislação e Normas - CLN, acerca da Lei


Municipal no 9777/21, que institui a política de bonificação por desempenho no
município de Vitória-ES e cria a Comissão de Avaliação remunerada. Vitória: COMEV,
2022.

VITÓRIA. Lei nº 4746 - Dispõe sobre a organização e funcionamento do Conselho


Municipal de Educação de Vitória. Vitória: Prefeitura Municipal de Vitória, 1998.

VITÓRIA. Lei nº9.777/2021- Institui a Bonificação por Desempenho no âmbito da


Secretaria Municipal de Educação (SEME), cria a Comissão da Bonificação por
Desempenho e dá outras providências. Vitória: Prefeitura Municipal de Vitória, 2021.
296

“CINECONVERSAS” SOBRE A SÉRIE “FAMÍLIA DINOSSAURO”:


IGUALDADE E DIFERENÇA A ESCOLA COMO CONSTRUÇÃO DE
IDENTIDADE

Gabriel Lecoque Francisco


Universidade Federal do Espírito Santo
PPGMPE Espírito Santo/ ES/ Brasil.
gabrielecoque@gmail.com

Letícia Lopes Bortolotti Batista


Universidade Federal do Espírito Santo
PPGMPE Espírito Santo/ES/Brasil.
leticia.bortolotti@edu.ufes.br

Simara Santos Silva


Universidade Federal do Espírito Santo
PPGMPE Espírito Santo/ ES/ Brasil.
simaraufes88@gmail.com

INTRODUÇÃO

O presente resumo apresenta o trabalho docente com audiovisuais discutindo temas como
ecologia, discriminação e preconceito dialogados na disciplina de Diversidade e Diferença na
Educação, ministrada pela professora doutora Patrícia Gomes Rufino Andrade47, no mestrado
profissional em educação da UFES.

O trabalho docente envolve uma diversificação de metodologias e práticas, que façam sentido
aos estudantes e promovam conhecimento e cidadania. Uma dessas oportunidades são as
práticas escolares com audiovisuais nos quais um assunto pode ser introduzido, ou ainda uma
oficina pode ser criada. O artigo aqui apresentado abordou os assuntos já citados através do
episódio “O casamento de Roy” da série “Família Dinossauro” em que ocorreram conversas a
partir do episódio culminando com algumas atividades.

METODOLOGIA

Buscando uma aproximação de discussão com a igualdade e diferença trouxemos para


discussão o episódio “O casamento de Roy”. Onde percebemos que os dispositivos
democráticos de igualdade formulados dentro das sociedades ocidentais são marcados por

47
A professora faz parte do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros. É professora Adjunta do Centro de Educação,
UFES.
297

diferenças de status e de hierarquias, de modo que a mera introdução de dispositivos legais não
é suficiente para garantir a compreensão do debate que perpassa as definições de igualdade e
diferença. A diferença não é uma característica natural, esse processo acontece na relação social
e é produzido em conexão com as relações de poder e em meio a essa estrutura a diferença é
avaliada de forma negativa em detrimento ao não diferente, contudo “[...] “essa outra coisa”, o
“não diferente”, também só faz sentido, só existe na “relação de diferença” que a opõe ao
“diferente” (SILVA, 2007, p. 87). Alguns episódios da série televisiva “Família Dinossauro”,
contribuem neste artigo para dialogar sobre igualdade e diferença ao trazer o audiovisual como
ferramenta acessível, que aproxima e transmite o texto científico por meio de imagens e sons.
No episódio “O casamento de Roy”, retornando a fala onde o personagem Dino dialoga com
seu filho Baby:

Baby: Porque os quadrúpedes são maus?


Dino: Deixa eu explicar filho, sabe nós andamos com as duas patas e eles
andam com as quatro, então eles são diferentes e portanto maus.
Baby: Eu tenho quatro patas!
Dino: Não, não! Esses são braços!
Baby: Mas eu ando com eles!
Dino: Não! Talvez você seja jovem demais para entender a sutileza da
discriminação racial.

A narrativa acima, revela um “tipo ideal” de dinossauro construído ideologicamente pela classe
dominante, onde os seres que andam apenas com duas patas são considerados bons, aceitáveis
dentro da sociedade dos dinossauros, por sua vez os dinossauros que andam com as quatro patas
são considerados maus, pois dentro de uma visão estereotipada da sociedade em que vivem,
correspondem a seres biologicamente inferiores. A ideia que relaciona os dinossauros
quadrúpedes a seres maus, pode ser considerada preconceito racial, pois ao se espalhar nas
relações sociais carregando tais estereótipos, impede o “ser diferente” de ampliar seus espaços
sociais, se configurando na discriminação.

Processos sistemáticos de exclusão social dificultam a percepção do valor


pessoal dos indivíduos pela sociedade; os processos de estigmatização não
apenas dificultam a construção de um sentimento de solidariedade entre os
membros da comunidade política, mas também criam obstáculos para a forma
de uma concepção integrada do psiquismo individual (MOREIRA, 2020,
p.131,132).

A discriminação e o preconceito são fenômenos culturais e sociológicos, que se constituem


como verdadeiros obstáculos impedindo os dinossauros quadrúpedes de se beneficiar de
oportunidades nos diversos âmbitos da sociedade. Na narrativa citada abaixo demonstra os
efeitos da discriminação e do preconceito em mais uma cena:
298

Mônica: Fran, não acredito!!! Fui despedida do meu emprego hoje, só porque
sou quadrúpede!
Fran: O que? Mônica que loucura!!! Tem certeza?
Mônica: Tenho, a ordem saiu da diretoria, se você tem quatro patas está fora,
dispensaram a mim, duas mesas e uma mesinha de café.
Charlene: Mãe, corre liga a tv! Oi Mônica, você precisa ver isso!
Voz do apresentador na tv: Hoje uma reunião especial do conselho de sábios,
mudou radicalmente a legislação tornando ilegal qualquer um que tenha
quatro patas. Todos os dinossauros quadrúpedes têm vinte e quatro horas para
abandonarem suas propriedades e voltarem para o outro lado do pântano a não
ser que sejam casados com um bípede ou se disponham a passar pelas
alterações cirúrgicas necessárias.

As discussões desenvolvidas até aqui nos possibilitam constituir outras reflexões e práticas,
entendendo que as disparidades que atravessam as diferenças e igualdades têm profundas raízes
que estão ligadas à raça, gênero e cultura.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Após tecer um plano de aula com as ideias principais a serem discutidas, o episódio foi levado
para a sala de aula, buscando compreender as percepções dos estudantes do 6º e 8º ano do ensino
fundamental, na disciplina de Geografia. Tendo como embasamento teórico o pensamento de
Paulo Freire: “A teoria sem a prática vira ―verbalismo, assim como a prática sem teoria, vira
ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se a práxis, a ação criadora e
modificadora da realidade.” (2021, p.25)

Antes da exibição do episódio, foi explicado um pouco sobre a série, sendo que alguns
estudantes disseram que conheciam a “Família Dinossauros”, outros reconheceram durante o
episódio. Nas aulas anteriores a exibição do episódio haviam sido discutidos os temas principais
contido no mesmo, como os problemas ambientais com o 6º; e discriminação e preconceito ao
abordar as migrações na América Latina com o 8º ano. Lembremos que estes são temas
transversais da BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e podem ser discutidos em várias
disciplinas e séries do ensino fundamental e médio.

Ao discutir o episódio foram feitas algumas problematizações: Qual o tema central do episódio?
Quais assuntos foram abordados? O que mais chamou atenção? O objetivo era ouvi-los falar,
deixando livres.

Algumas dificuldades inerentes há muitos cotidianos escolares aconteceram, como o áudio não
ser tão bom em uma aula devido há outro evento na escola, a imagem não ser tão visível, pois
a sala de vídeo tinha muita claridade. Apesar dos problemas, o diálogo com os educandos foi
muito interessante, destacando a seguinte fala: “Este episódio possui muita crítica social”.
299

Outros temas levantados pelos estudantes foram: casamento, casamento forçado, machismo,
preconceito, desmatamento, desemprego, discriminação. Determinados temas foram mais
abordados em algumas turmas que em outras, mas sabemos enquanto professores, que
diversidade de pessoas promovem também aulas diferentes. Na aula seguinte foi retomado o
diálogo e uma nova conversa sobre o tema foi iniciada. Após esse momento foi solicitado uma
atividade, sendo que, como registro no caderno, poderia ser um breve resumo sobre o episódio,
uma comparação entre o que foi visto com a realidade, ou ainda um desenho.

Dentre os estudantes, o que chama a atenção é a lembrança da indagação da criança dinossauro,


o Baby, sendo destacado por muitos educandos, apesar de aparecer pouco no episódio. Assim
um estudante fala: “O Baby perguntou ao pai, mas ele não ligou. Não deu atenção e continuou
preconceituoso”. Aqui refletiremos, será que esta criança não tem atenção em casa quando quer
falar sobre temas polêmicos, ou já viu isso em alguma situação nos ambientes em que
frequenta? No texto que poderia fazer um paralelo entre o episódio e a realidade uma estudante
escreveu: “Sou negra e de família negra, já vi isso (discriminação) acontecer como os
quadrúpedes”. Uma referência a situação vivida no episódio e discutida na sala, em que
preconceito contra os latinos (referência as aulas anteriores) aos negros e deficientes foram
abordadas. Sendo livre o desenho, tivemos como foco dos estudantes o casamento devido a
situação de permanecer na comunidade, o problema ecológico do desmatamento, os discursos
preconceituosos pelo governo, entre outros temas.

CONCLUSÃO

As práticas pedagógicas podem produzir reflexões nos docentes e discentes transformando as


relações sociais e as leituras de mundo, um olhar crítico e compreendendo as contradições
econômicas, sociais, raciais e históricas. Este entendimento vem com certo tempo, como Freire
escreve “a libertação, por isto, é um parto. E um parto doloroso. O homem (e mulher) que nasce
deste parto é um homem (e mulher) novo que só é viável na e pela superação da contradição
opressores-oprimidos, que é a libertação de todos. (p. 23, 1987, grifo nosso). Os contrastes da
sociedade são carregados de discursos que mais dificultam o diálogo e a cidadania, do que
buscam cooperar para resolver as problematizações como no episódio debatido neste artigo.
Cabe ao cotidiano escolar oportunizar redes de diálogos, sendo as “cineconversas” uma
metodologia de alcance para temas transdisciplinares, diversos e atuais.

REFERÊNCIAS
300

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 68 ª ed.


Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2021.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. 23ª impressão. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1987.

MOREIRA, Adilson José. Tratado de Direito Antidiscriminatório. São Paulo: Editora


Contracorrente, 2020.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Diferença e identidade: o currículo multiculturalista. In: ______.
Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2. ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2007. p. 85-90.

SILVA, Tomaz Tadeu da, et al. A produção social da identidade e da diferença: A


perspectiva dos Estudos Culturais. Ed. 15ª. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2014.

SUCESSO NOS ANOS 90, 'FAMÍLIA DINOSSAURO' COMPLETA 25 ANOS. Correio 24


horas. Salvador, 27 de abr. de 2016. Obtido em
https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/sucesso-nos-anos-90-familia-dinossauro-
completa-25-anos/. Acesso em: 02 jul. 2022.
301

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM ESPAÇOS FORMATIVOS,


REFLEXIVOS E COLABORATIVOS: RELATOS DE EXPERIÊNCIA DE UMA
PRÁTICA NO SISTEMA DE ENSINO DE VITÓRIA

Rodrigo Ferreira Rodrigues


Professor Permanente do PPGEH, Ifes
rodrigo.rodrigues@ifes.edu.br

Clarisse Oliveira da Rocha Fontan


Mestranda PPGEH – Ifes / Secretaria Municipal de Vitória
clarissefontan2015@gmail.com

INTRODUÇÃO

Partindo da Constituição Federal Brasileira de 1988, que cita em seu artigo 205 que a
educação é um direito de todos e dever do Estado contando com a colaboração e incentivo da
sociedade, seguindo pelo artigo 206 que cita um dos princípios sendo o da garantia do padrão
de qualidade para a educação e perpassando pela realidade encontrada no sistema educacional
brasileiro, em nossas experiências cotidianas como profissionais da educação, percebemos a
urgência em dialogar a respeito da qualidade da educação brasileira através de uma efetiva
cooperação.

A colaboração entre municípios, estados e federação se mostra incipiente e frágil. Podemos


tomar como exemplo, de vivências pessoais como profissional direta na educação no Espírito
Santo, em específico no município de Vitória, que, por exemplo, o Ensino Infantil,
Fundamental I e II sob responsabilidade do município apresenta uma constituição de sistema
completamente distinto do que é apresentado para o Ensino Médio sob responsabilidade do
ente Estado.

Os sistemas públicos de educação se subdividem tornando-se diferentes entre si, municípios


e estado, mas garantindo também a autonomia de cada ente federado para constituição de seu
próprio sistema educacional. Ou seja, é urgente e necessária a articulação de um sistema
nacional de educação que potencialize a consolidação de uma educação de qualidade e ao
alcance de todos.

Neste relato de experiência exploraremos a prática implementada na formação continuada de


professores na educação infantil no munícipio de Vitória junto a uma unidade de ensino do
sistema, como oportunidade de articulação de diferentes níveis de ensino para potencializar
302

identidades e reconhecimentos locais para as necessidades educacionais respeitando-se a


região que se esteja inserida a unidade (ou unidades) de ensino, inclusive de diferentes
sistemas, num explícito espírito colaborativo.

DESENVOLVIMENTO

De 2015 a 2022, estive à frente da Direção no CMEI (Centro Municipal de Educação Infantil)
Georgina da Trindade Faria, localizado em São Pedro, no município de Vitória – ES, onde
implementamos “Formação Continuada na Escola”, através do uso de Plataforma Digital
VIXEDUCA e também a Aprende Vix, ambas administradas e disponibilizado acesso pela
secretaria municipal de educação de Vitória para formação dos profissionais, o que
possibilitou maior alcance, qualidade de conhecimento e a construção colaborativa de
documentos coletivos para essa Unidade de Ensino, além é claro de ser economicamente mais
viável para participação de todos os interessados e palestrantes convidados. Diferentes
profissionais, vindos de setores diferentes, municípios da Região Metropolitana com sistemas
educacionais diferentes, conseguiram unir esforços e produzir uma diretriz interna para que
essas diferenças trazidas não interferissem e causassem divisões internas.

Iniciamos em 2015 como um projeto piloto da Secretaria Municipal de Educação de Vitória


(SEMEV) pois não havia regularidade nas formações ofertadas pela própria secretaria para as
escolas. Identificamos que os profissionais precisavam de estudo constante, troca e
atualização de ideias, bem como oportunidades de formação certificada que possibilitassem
ascensão no plano de carreira da Prefeitura Municipal de Vitória (PMV) onde é necessário, a
cada 3 anos, apresentar certificados de cursos de atualização para progredir e que se
desdobram em vantagens financeiras.

Desde o primeiro ano de atuação apresentamos projeto de formação para Gerência de


Formação e Desenvolvimento em Educação (GFDE), para os servidores e colaboradores da
escola e naquele ano iniciamos as atividades de forma presencial e complementarmente com
atividades online nas plataformas supracitadas. A experiência logrou êxito e nos anos
seguintes continuamos com a proposta agregando também a comunidade escolar no geral
(conselho de escola e outros segmentos), onde servidores de outras UEs também participaram.

Novas concepções de formação trazem, como um dos eixos principais, os grupos de formação,
que não se constroem somente por meio da acumulação de saberes no processo de formação
inicial universitária e acadêmica, mas, sobretudo, por meio de um trabalho eminentemente
303

reflexivo, o qual amplia e favorece as discussões e as trocas tão importantes para a construção
do conhecimento.

Em lugar de um conteúdo predeterminado, fechado, transmitido em um curso


convencional, de forma passiva e memorizada, cria-se um espaço especial de
construção do conhecimento em que a reflexão é a mola propulsora do trabalho [...].
O grupo de formação reflexiva está voltado para que seus professores componentes
tornem-se sujeitos de sua própria prática pedagógica e de seu processo de
conhecimento. Nesse contexto, ser sujeito significa ser capaz de refletir sobre sua
prática e transformá-la - tornando-a mais significativa, mediante o diálogo - pela
tomada de consciência da teoria que a embasa. (ABRAMOWICZ, 2003, p. 138-139).

Segundo Freire (2001), faz parte da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa.
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino... No meu entender, o que há de
pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que
se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a
busca, a pesquisa. Esses que-fazeres se encontram um no corpo do outro. (FREIRE,
2002, p. 14).
É na troca que o saber se complementa, pois cada pensamento se conecta a outro e vão se
formando novas ideias que levarão a novas buscas e consequentemente a novos saberes tecendo
assim uma teia de conhecimento construída coletivamente.
Os temas eram selecionados logo nos primeiros dias de atividades letivas no início de cada
ano, onde os servidores, livremente e espontaneamente indicavam temáticas e assuntos a
serem abordados em um processo de construção colaborativa da ementa a ser implementada
ao longo do percurso letivo.

Em março ou abril, com os temas escolhidos, projeto escrito e cronograma de execução,


iniciavam as formações. Algumas vezes administradas/apresentadas pelos próprios servidores
que faziam estudos prévios embasados por suas experiências, outras vezes com participações
externas de colaboradores diversos (professores da Universidade Federal do Espírito Santo
(Ufes), colegas de outras UE, servidores da SEME e etc.).

O cronograma de implementação do processo formativo aproveitava-se das datas previstas


em calendário letivo. Algumas datas reservadas pela própria SEME, mas também por outras
definidas pela unidade escolar que possuía autonomia na gerência de datas e consensuadas
pelo grupo, sempre garantidos no calendário e em horário de trabalho.

De modo geral a dinâmica de formação considerava debates que ocorriam nas datas agendadas
em calendário realizadas, portanto, presencialmente, mas de forma complementar também
recorria a sistemas online, disponibilizados pela SEME mas gerenciados pela equipe gestora
da unidade, onde cada participante realizava atividades na plataforma como forma de registro
das temáticas abordadas e complementando a carga horária de formação.
304

O certificado ao final do ano, era emitido pela própria direção da escola validado pela GFDE
para fins de progressão funcional.

Sendo assim, como tal recurso e prática a estratégia efetivou a colaboração no processo de
formação continuada na educação infantil, articulando vários segmentos da unidade bem
como profissionais articulando diferentes experiências, vivências e formações.

Partindo das próprias vivências cotidianas na educação (como docente, pedagoga e diretora
escolar) e fazendo uma análise de vários estudos mais amplos realizados sobre os efeitos da
cooperação, colaboração, pactuação entre entes federados é urgente a necessidade de
implementar um modelo que favoreça a integração e articulação, nas diferentes redes e
sistemas de ensino, a participação dos diferentes atores sociais.

Atualmente, no estado do Espírito Santo, temos o Pacto pela Aprendizagem no Espírito Santo
(Paes), uma iniciativa do Governo do Estado com o objetivo de fortalecer a aprendizagem das
crianças desde a educação infantil até as séries finais do ensino fundamental, desenvolvida a
partir do estabelecimento de um regime de colaboração entre o estado e as redes/sistemas
municipais de ensino por meio de adesão voluntária instituída pela Lei Estadual nº 10.631 de
28 de março de 2017 criado e o Fundo Estadual de Apoio à Ampliação e Melhoria das
Condições de Oferta da Educação Infantil no Espírito Santo instituído pela Lei Estadual nº
10.787/2017, cujas normas e critérios para regulamentar os procedimentos administrativos
referentes ao repasse e execução de recursos financeiros provenientes do fundo foi ditado pelo
Decreto Estadual nº 4.217-R/2018.

Temos, como atores pactuados e participantes do PAES a UNDIME (União dos Dirigentes
Municipais de Educação) e em nível nacional o CONSED (Conselho dos Secretários de
Educação dos Estados), esses se destacam pela articulação de colegiados e organizações de
educação pública. O que vale refletir é que essas associações partem de princípios, iniciativas
e desejos que contemplam uma educação de qualidade e para todos, mas efetivamente
precisamos criar instâncias que alcancem a todos os profissionais envolvidos na equidade e
qualidade educacional. De fato, a colaboração é uma alternativa constitucional.

CONCLUSÃO

Importante destacarmos segundo RODRIGUES e NASCIMENTO (2018) a reflexão a


respeito da colaboração, contemplada nesse estudo.

É, portanto no campo das políticas sociais que se configura esta reflexão,


configuradas nos contextos e rupturas atuais que se configuram as políticas
educacionais e de direito à educação como obrigação do Estado constitucionalmente
305

definida a partir do princípio do Regime de Colaboração, como elemento basilar no


arranjo federativo cooperativo. (RODRIGUES e NASCIMENTO, 2018, p. 05)
Sendo assim e partindo da experiência por mim vivenciada ao longo desses 7 anos a frente da
Direção do CMEI Georgina da Trindade Faria, junto a equipe de pedagogas, o corpo docente
(oriundos de diferentes redes e experiências), demais profissionais ligados diretamente e
entidades e formadores externos e de diferentes setores, onde foi possível implementar
Formação Continuada através de Plataforma Digital, para qualificar e padronizar a qualidade
da educação ofertada em nossa Unidade de Ensino (UE), através do documento que
chamamos de “Diretrizes CMEI GTF” e que foi de extrema importância para potencializar o
trabalho pedagógico já desenvolvido nesta UE, além é claro da ótima aceitação e participação
dos profissionais e até mesmo outros que não compunham nosso quadro de funcionários mas
solicitaram participar pela relevância apresentada, veio o desejo de ampliar a pesquisa e
possibilidade dessa cooperação com outros atores no Município de Vitória e melhor
articulados em experiências, de fato colaborativas em todos os campos que compõe as
políticas públicas de educação inclusive a formação continuada de professores para educação
infantil sob os princípios da participação reflexiva, crítica e democrática por uma educação
de mais qualidade.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05.10.1988. Brasília, 1988.


Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso
em: 04 nov. 2021.
RODRIGUES, Rodrigo Ferreira; NASCIMENTO, R. P. . Federalismo e políticas
educacionais no Brasil: contextos e rupturas. Research, Society and Development , v. 07, p.
01, 2018. Acesso em: 04 nov. 2021.
ABRAMOWICZ, Mere. A importância dos Grupos de Formação Reflexiva Docente no
interior dos Cursos Universitários. In: CASTANHO, Maria Eugênia. (Org.). Temas e
Textos em Metodologia do Ensino Superior. 1a. ed. Campinas-SP: Papirus Editora, 2003, p.
137-142
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Cortez, 20
306

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