Você está na página 1de 8

ORIGINAL HEPATOTOXICIDADE DE PLANTAS

MEDICINAIS. XXI. AÇÃO DA INFUSÃO DE


MIKANIA HIRSUTISSIMA D.C. NO RATO

HEPATOTOXICITY OF MEDICINAL
PLANTS. XXI. ACTION OF MIKANIA
HIRSUTISSIMA D.C. INFUSION IN RATS.
Karina da Paz1
Ruberval Armando Lopes2
Miguel Angel Sala3
Christiane Friedrichi4
Marisa Semprini5
Simone Cecílio Hallak Regalo6
1
Graduanda de Biomedicina da
UNIFRAN – Universidade de Franca. RESUMO: os autores estudaram a hepatotoxicidade de Mikania hirsutissima D.C. (cipó-
Professor Titular da FORP-USP e
cabeludo). Foram usados ratos albinos Wistar machos pesando 100 g em média, que
2

Assessor de Patologia da UNIFRAN –


Universidade de Franca. receberam no bebedouro infusão de partes aéreas da planta (5,10 g/130 ml ou 250 mg/130 ml
3
Professor Titular da FORP-USP.
4
Doutoranda da FORP-USP. de água), durante 7 dias. Estudos histológico, cariométrico e estereológico foram realizados
5
Professor Titular da FORP-USP. em cortes de 6 mm de espessura de fígados fixados em formol e corados com hematoxilina
6
Professor Doutor da FORP-USP.
e eosina. Ao exame histopatológico, foram observadas áreas de hepatócitos volumosos,
granulosos, com núcleos claros. Em outras áreas houve intensa vacuolização citoplasmática
com regiões de necrose coagulativa. A veia centrolobular estava dilatada e congesta. O
espaço-porta estava desorganizado e os ductos biliares continham colangiócitos baixos com
núcleos de cromatina condensada na periferia. O grupo tratado com a dosagem menor não
mostrou alterações hepáticas de nota. O exame cariométrico detectou núcleos menores,
mais arredondados nos hepatócitos e sem alteração de forma nos colangiócitos.
Estereologicamente, os hepatócitos não mostraram diferença significante no que se refere
aos volumes celular e citoplasmático, assim como à densidade numérica. Os resultados
sugerem que a infusão de partes aéreas de M. hirsutissima causou lesões nos hepatócitos
(alteração hidrópica) perfeitamente reversíveis, e áreas de necrose coagulativa.
Palavras-chave: Cipó-cabeludo; fígado; rato; fitoterápico; morfometria.

ABSTRACT: the authors studied the hepatotoxicity of Mikania hirsutissima D.C. (cipó-
cabeludo) in rat liver. An infusion from aerial parts of the plant was administered in drinking
water for 7 days, in doses larger than the usually employed human dosage (5.10 g/130 ml
water) and in small doses (250 mg/130 ml water). Histological, karyometric and stereological
techniques were performed on 6-mm thick sections of formalin-fixed liver, stained with
hematoxylin and eosin. Histopathological analysis revealed hepatocytes with varying degrees
of vacuolization and areas of coagulative necrosis. The pericentrilobular area was dilated
and congested. The portal area was disorganized and colangiocytes were smaller. Rats treated
with smaller doses showed liver structure similar to that of control. A histometric study
showed smaller nuclei and cells with cytoplasm volume and cell number density which were
similar to those of control. The results suggest that M. hirsutissima aerial parts infusion
produced perfectly reversible damaged hepatic cells (hydropic alteration) and areas of
coagulative necrosis.
Key words: Cipó-cabeludo; liver; rat; phytotherapics; morphometry.

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

78
INTRODUÇÃO anti-inflamatória da Mikania laevigata (guaco-
cheiroso ou guaco-do-mato) e da M. involucrata
O cipó-cabeludo Mikania hirsutissima D.C.
(cipó-sem-nome). A Mikania hirsutissima (cipó-ca-
(também conhecido como cipó-almecega, cipó-
beludo), entretanto, não apresentou atividade anti-
almecega-cabeludo, cipó-caatinga, cipó-de-cerca,
inflamatória.
erva-dutra-guaco, guaco-cabeludo, guaco-de-cabe-
los) é uma herbácea escandente, vigorosa, com Determinando a atividade antiprotozóario de
folhas e ramagem densamente revestida por pelos 79 extratos de plantas da América Central e do Sul,
rígidos, nativa em quase todo o território brasilei- Muelas-Serrano et al. (2000) observaram ativida-
ro. Inflorescências em pequenas panículas axilares de contra o Trypanosoma cruzi de Mikania cordifolia
e terminais, com muitas flores de coloração (guaco-liso). Utilizando ainda esta espécie de plan-
esbranquiçada e suavemente perfumadas, reuni- ta, Paul et al. (2000) e Mosaddik e Alam (2000)
das em capítulos cônicos. Os frutos são aquênios observaram atividade antiúlcera da planta.
providos de um tufo de pêlos que favorecem a sua Mikania cordata apresenta numerosas ações
disseminação pelo vento (OLIVEIRA, 1972). farmacológicas, incluindo propriedades
Foram isolados do cipó-cabeludo os seguintes antimicrobiana, anti-inflamatória, analgésica e
constituintes: substâncias resinosas (2%), taninos psicofarmacológica (Bhattacharya et al., 1988).
catéquicos (5%), óleo essencial, saponinas (traços), Também foi demonstrado seu papel
flavonas, ácidos terpênicos, sais de Al, Ca, Fe, K, hepatoprotetor em danos agudos do fígado de ca-
Na, entre outros, e cumarinas (TESKE; mundongo, provocados pelo CCl4. A potência anti-
TRENTINI, 2001). hepatotóxica do extrato de raiz da planta é devida
principalmente a um aumento do reparo do
A Mikania hirsutissima tem sido utilizada como parênquima através da modulação da capacidade
diurética e antialbuminúrica, anti-reumática, ribossômica e da transferência de proteínas
antinevrálgica e antidiarréica (CARIBÉ; CAMPOS, (MANDAL et al., 1992). Os extratos da raiz da
1991; TESKE; TRENTINI, 2001). Também é uti- planta também mostraram uma atividade potente
lizada como anti-ulcerogênica (ARAÚJO et al., adaptogênica ou anti-estresse no rato albino, uma
1994) e moluscicida (SOUZA et al., 1984). Tem vez que os extratos inibiram sucessivamente a ul-
atividade antimicrobiana (ESQUICI et al., 1989), ceração gástrica frente à contenção do animal e ao
além de ser estimulante. estresse pelo frio. Bishayeè e Chatterjee (1994) obser-
Como propriedades farmacológicas, o cipó- varam que a atividade anti-úlcera da M. cordata po-
cabeludo provoca diurese abundante, devido às deria ser devida à modulação de fatores de defesa por
substâncias resinosas e óleo essencial que entram meio do aumento da citoproteção gástrica.
na sua composição. Auxilia a remoção do ácido Trabalhando com sete Asteraceae paraguaias,
úrico do sangue e da urina. É empregada também Arias et al. (1995) observaram que Mikania
no tratamento da cistite, uretrite, infecções de trato cordifolia (guaco), sob a forma de extrato etanólico,
urinário, distúrbios renais em geral, diarréia e inibia a muda do Triatoma infestans e apresentava
blenorragia. É altamente eficaz no tratamento da um potencial anti-tripanocida, fato este observado
nefrite, sendo uma das plantas mais usadas contra posteriormente por Muelas-Serrano et al. (2000).
este mal (ALMEIDA, 1993). Utilizando Mikania obtusata, Alves et al. (1995)
Utilizando Mikania malacolepsis (cipó- verificaram que o componente tripanocida da plan-
almecega), Nogueira et al. (1996) observaram a ta era o ácido ent-kaur-16-en-19-óico.
atividade antiedematogênica da planta. Usando Estudando 13 plantas medicinais brasileiras
esta mesma espécie de planta, Nogueira et al. (1997) com a finalidade de avaliar a atividade
revelaram atividade depressora do sistema nervo- antimicrobiana contra bactérias e fungos, Holetz
so central, com diminuição da atividade geral, da et al. (2002) verificaram que Mikania glomerata
resposta ao toque, ao aperto de cauda e reflexos. (guaco) apresentava algum grau de atividade
Suyenaga et al. (2002) observaram atividade antibacteriana e anticândida.

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

79
Trabalhando com brônquio humano e tra- microscópio óptico Nikon, com objetiva de imersão
quéia de cobaia isolados, MOURA et al. (2002) (100 x), munido de uma câmara clara Nikon. Os
verificaram ação inibidora de Mikania glomerata núcleos foram projetados sobre papel, com aumen-
por efeito bronquiodilatador, naquelas doenças to final de 1000 x. As imagens nucleares obtidas
bronquioconstritivas. Tendo-se em vista não ha- foram então contornadas com lápis, tomando-se o
ver na literatura referência sobre contra-indicações, cuidado de considerar apenas as imagens elípticas.
efeitos colaterais, interações, superdosagem e uso Para obtenção dos diâmetros, os eixos maior e
durante a gestação e lactação, são objetivos do pre- menor dessas imagens foram medidos com uma
sente trabalho estudar a hepatotoxicidade de escala milimetrada.
Mikania hirsutissima, administrada em dose exces- Uma vez determinados os eixos maior (D) e
siva e dose pequena, sob a forma de chá por infu- menor (d), foram estimados os seguintes
são, oferecidas a ratos no bebedouro. parâmetros cariométricos (SALA et al., 1994): diâ-
metro médio, relação D/d, perímetro, área, volu-
MATERIAL E MÉTODOS me, relação V/A, coeficiente de forma, índice de
Foram utilizados 15 ratos albinos machos, va- contorno e excentricidade.
riedade Wistar, pesando em média 100 g, dividi- Mediante métodos estereológicos foram de-
dos em 3 grupos: terminados os volumes do núcleo e citoplasma de
Grupo 1: cinco animais que receberam sob a hepatócitos e células dos ductos biliares
forma de chá por infusão 5,10 g da planta/130 ml de (colangiócitos), a relação N/C e a densidade nu-
água, no bebedouro, ad libitum, durante sete dias. mérica dos hepatócitos (SALA et al., 1992), utili-
zando-se uma grade de 100 pontos.
Grupo 2: cinco ratos que receberam a infusão
de 250 mg de partes aéreas da planta/130 ml de O confronto estatístico foi realizado com o em-
água, nas mesmas condições do grupo anterior. prego do teste não-paramêtrico de Mann-Whitney.
Grupo 3: cinco ratos que receberam somente
água no bebedouro, e serviram como controles. RESULTADOS
Os animais foram colocados em caixas apro- Nos animais do grupo 1, foi possível observar
priadas e alimentados com ração comercial e chá sonolência, tremura, sangramento nasal, edema,
ou água ad libitum. patas cianóticas, estômago repleto de gazes. Hou-
No sétimo dia de tratamento, os ratos foram ve duas mortes dias após o início do experimento.
sacrificados por inalação de éter anestésico e, atra- Histopatologia - No fígado dos animais do gru-
vés de uma incisão ampla no abdômen, colheram- po controle foi possível observar os seguintes tipos
se fragmentos do fígado, os quais foram imediata- celulares: hepatócitos, células hematopoiéticas,
mente imersos em formol a 10%, onde foram dei- colangiócitos, células que formam os sinusóides,
xados a fixar durante 24 h. células de Kupffer, células armazenadoras de gor-
Após a fixação, as peças foram desidratadas, dura (células de Ito) e as células pit (em fossa).
diafanizadas e incluídas em parafina. O material Os hepatócitos estão arranjados em lâminas
foi seccionado com 6 mm de espessura. De um ou cordões verticais à veia centrolobular com
total de 500 cortes, foram separados 10 cortes por canalículos biliares entre os hepatócitos adjacentes
bloco, sendo que cada um destes 10 cortes no cordão. Os cordões têm a espessura de uma
correspondia a um intervalo de 50 secções. Os cor- célula e formam anastomoses. Os sinusóides são
tes foram corados pela hematoxilina e eosina. formados por uma camada contínua de células
As técnicas histométricas foram aplicadas so- endoteliais fenestradas e estão presentes entre os
mente nos animais do grupo 2. cordões de hepatócitos, enquanto que o espaço
Para obter os diâmetros maior e menor dos perisinusoidal (espaço de Disse) localiza-se entre
núcleos das células, os cortes foram focalizados ao o hepatócito e a parede dos sinusóides.

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

80
Os hepatócitos são células poliédricas, com se muito semelhante ao do controle, entretanto, o
núcleo arredondado de tamanho variável. O núcleo citoplasma era mais granuloso. Em algumas áreas
apresenta um ou mais nucléolos proeminentes. O os sinusóides eram mais dilatados (Figura 2).
citoplasma é eosinofílico e granular; dependendo do
estado funcional, gordura ou glicogênio pode dar-lhe
um aspecto vacuolar. Embora 80% dos hepatócitos
sejam morfologicamente homogêneos, aqueles
que cercam a veia centrolobular são menores.
As células de Kupffer são macrófagos fixos e
constituem cerca de 10% das células do fígado do
rato. Estas células estão situadas nas células
endoteliais sinusoidais, cerca de 40% das células
de Kupffer estão nas áreas periportais. As células
de Ito ou células armazenadoras de gordura, célu-
las perisinusoidais, lipócitos ou células estreladas, Figura 2 - Aspecto histopatológico do fígado de rato tratado com cipó-
apresentam número variável de gotas de lipídios cabeludo. Notar sinusóides amplos e congestos. HE (900 x)
citoplasmáticos. O espaço porta contém vasos e
ductos biliares em estroma de tecido conjuntivo Cariometria – Os núcleos dos hepatócitos do
limitando os lóbulos hepáticos. rato tratado com doses menores da planta (grupo
2) apresentaram diminuição significativa dos diâ-
O fígado dos animais do grupo 1 mostrou áreas metros, perímetro, área, volume e relação V/A. Os
de hepatócitos granulosos e núcleos claros. Em parâmetros que avaliam a forma nuclear demons-
outras áreas foi possível observar vacuolização traram que os hepatócitos dos ratos do grupo 2
citoplasmática intensa e com núcleos em degene- apresentam núcleos mais arredondados que os ra-
ração; alguns hepatócitos estavam balonizados tos controle (Tabela 1).
(Figura 1). Foi possível observar áreas de necrose
coagulativa (núcleos em cariólise). Da mesma maneira, os núcleos dos
colangiócitos mostraram valores significativamen-
A veia centrolobular estava dilatada e congesta. te menores nos animais do grupo 2 em compara-
O espaço-porta estava desorganizado, com vasos ção aos controles para diâmetro maior, diâmetro
congestos e ductos biliares diminuídos, com célu- médio, perímetro, área, volume e relação V/A
las pequenas e núcleos com cromatina condensada (Tabela 1). A forma dos núcleos, por sua vez, não
na periferia. mostrou alterações significativas (Tabela 1).
O hepatócito do animal do grupo 2 mostrou- Estereologia – Não foram observadas dife-
renças significativas entre os hepatócitos do rato tra-
tado com baixas doses da planta (grupo 2) e o gru-
po controle com relação aos volumes nuclear e
citoplasmático, e à densidade numérica (Tabela 2).
Entretanto, quando se analisou a relação núcleo-
citoplasmática, verificou-se diferença altamente
significante entre ambos grupos (Tabela 2).

DISCUSSÃO
Pouco se sabe sobre a toxicidade do cipó-ca-
beludo Mikania hirsutissima. A literatura consulta-
Figura 1 - Aspecto histopatológico do fígado de rato tratado com cipó-
da trata tão somente das propriedades medicinais
cabeludo (grupo 1). Notar a vacuolização do citoplasma. HE (900 x) da planta.

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

81
Tabela 1 - Valores médios dos parâmetros cariométricos dos hepatócitos e colangiócitos de ratos contro-
les (C) e tratados com cipó-cabeludo (T). Teste de Mann-Whitney.
PARÂMETROS Hepatócitos Colangiócitos
C T C T
Diâmetro maior (mm) 7,25 5,27* 4,14 3,42
Diâmetro menor (mm) 5,90 4,55* 2,65 1,96*
Diâmetro médio (mm) 6,52 4,88* 3,23 2,55**
Relação entre diâmetros 1,24 1,17* 1,86 1,81
Perímetro (mm) 20,72 15,46* 10,93 8,66*
Área (mm ) 2
34,14 19,32* 8,94 5,45*
Volume (mm ) 3
154,88 66,86* 22,42 10,52*
Relação Volume/área 4,35 3,26* 2,16 1,70**
Coeficiente de forma 0,98 0,99 0,88 0,88
Índice de contorno 3,58 3,57 3,86 3,82
Excentricidade 0,53 0,36* 0,59 0,66
- p < 0,01
- p < 0,05

Tabela 2 - Valores médios dos parâmetros estereológicos dos hepatócitos de ratos controles e tratados
com cipó-cabeludo. Teste de Mann-Whitney.
PARÂMETROS Controle Tratado
Volume citoplasmático (mm3) 1880,01 1373,90
Volume celular (mm3) 2034,89 1830,26
Relação Núcleo/Citoplasma 0,077 0,035*
Densidade numérica (n/mm3) 494535,4 556308,0
- p < 0,01

Em um trabalho em camundongos sob ação malacolepsis, administrado parenteralmente, pro-


do extrato hidroalcóolico de M. hirsutissima, Araú- vocou depressão do sistema nervoso central, com
jo et al. (1994) determinaram que a DL50 era 8,13 diminuição da atividade geral, da resposta ao to-
g/kg para a via oral e 3,0 g/kg para a intraperitoneal. que, ao aperto de cauda e reflexos, nos modelos
Nogueira et al. (1996) determinaram a DL50 agudo e crônico (NOGUEIRA et al., 1997). O tra-
de animais sob ação do extrato bruto fluido (etanol tamento sub-crônico revelou alterações nos
70%) e posteriormente com o fracionado com parâmetros fisiológicos de modo dose-dependente.
hexano do cipó-almecega Mikania malacolepsis. Os Trabalhando com Mikania glomerata (guaco),
valores foram 2,48 g/kg intraperitonealmente e 10,0 Moura et al. (2002) observaram que a planta oca-
g/kg via oral para o extrato bruto fluido, e 4,35 g/ sionava uma redução na contração do músculo liso
kg via oral e 0,68 g/kg intraperitonealmente para o respiratório da cobaia, independente de qualquer
fracionado com hexano. Observaram, ainda, ataxia ação nos b-adrenoceptores, muscarínicos ou
e hipnose quando do emprego de doses mais al- histaminérgicos, da ativação dos canais de potás-
tas. Concluíram que a toxicidade da planta aumen- sio, da liberação de prostanóides ou óxido nítrico.
tou quando se utilizou a fração hexânica. Provavelmente, esta ação seja devida à presença
Em outro trabalho, o cipó-almecega M. de compostos cumarínicos e não-cumarínicos.

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

82
A administração de infusão de cipó-cabeludo elevada do fitoterápico administrada no rato pro-
(M. hirsutissima) em doses excessivas (grupo 1) nos vocou no fígado, o aparecimento de lesão celular,
ratos, constantes deste trabalho, provocou sinais de em algumas áreas, traduzida em alteração
toxicidade, traduzidos por morte de dois animais, hidrópica, perfeitamente reversível. O mecanismo
sonolência, tremura, sangramento nasal, edema, desta alteração não está esclarecido.
cianose, etc.
O fitoterápico causou o aparecimento de áre- AGRADECIMENTOS
as de hepatócitos granulosos e núcleos claros, áre-
as de hepatócitos vacuolizados com núcleos em Os autores agradecem à Universidade de Fran-
degeneração, áreas de balonização celular e de ca pelo apoio financeiro.
necrose coagulativa no fígado dos ratos do grupo
1. A veia centrolobular estava dilatada e congesta e REFERÊNCIAS
o espaço-porta desorganizado, com vasos congestos
e com ductos biliares constituídos de células pe- ALMEIDA, E. R. Plantas medicinais brasileiras, conheci-
quenas e núcleos vesicosos. mentos populares e científicas. São Paulo: Hemus, 1993.
Nos animais do grupo 2, o fígado mostrou-se ALVES, T. M. A.; CHAVES, P. P. G.; SANTOS,
histologicamente semelhante ao do controle; en- L. M. S. T.; NAGEM, T. J.; MURTA, S. M. F.;
tretanto, com citoplasma granuloso e sinusóides CERAVOLO, I. P.; ROMANHA, A. J.; ZANI, C.
mais amplos. L. A diterpene from Mikania obtusata active on
Embora se tenha observado alterações estru- Trypanosoma cruzi. Planta Med., v. 61, n.1, p. 85-
turais hepáticas ao microscópio, quando se aplica- 87, 1995.
ram técnicas estereológicas os valores para volume ARAÚJO, L. C. L.; GUIRRO, R.; ANTONIO,
celular e volume citoplasmático não mostraram M.A.; BRITO, A. R. M. S. Avaliação preliminar
diferença significante, o mesmo acontecendo com dos feitos antiulcerogênicos de quatro espécies
o número de hepatócitos por mm3. Somente a indicadas popularmente como medicinais. Resu-
relação N/C mostrou-se significantemente menor mos da IX Reunião Anual da FESBE, 1994.
no rato tratado.
BATTACHARYA, S.; PAL, S.; NAG
Por outro lado, quando se aplicaram técnicas
CHAUDHURI, A. K. Neuropharmacological
cariométricas, foi possível observar que os núcleos
studies on Mikania cordata root stract. Planta Med.,
dos hepatócitos mostraram valores
v. 54, n. 3, p. 483-487, 1988
significantemente menores nos ratos tratados para
diâmetros maior, menor e médio, perímetro, área, BISHAYEÈ, A.; CHATTERJEE, M. Protective
volume e relação V/A. Os parâmetros para esti- effects of Mikania cordata root extract against
mar a forma dos núcleos mostraram que houve physical and chemical factors-induced gastric
alteração da forma nos animais do grupo tratado. erosions in experimental animal. Planta Med., v.
Quando os colangiócitos foram avaliados, ob- 60, n. 2, p. 110-113, 1994.
servaram-se valores significantemente menores CARIBÉ, J.; CAMPOS, J. M. Plantas que agridem
para diâmetros menor e médio, perímetro, área, o homem: guia prático para a época atual. São Pau-
volume e relação V/A. A forma desses núcleos não lo: Cultrix Pensamento, 1991. 319 p.
se alterou, já que valores para excentricidade, coe-
ficiente de forma e índice de contorno não foram ESQUICI, R. N.; ALICE, C. B.; SCHAPOVAL, E.
diferentes nos dois grupos de animais estudados. E. S.; ZUANASSI, T. A.; HENRIQUES, A. T. In-
vestigação comparativa da atividade antimicrobiana
de Mikania hirsutissima D.C. (Compositae) e
CONCLUSÃO Micrograma vaccinifolia (Langsd. et Fisch) Copel
Do que foi exposto, podemos concluir, nas (Polipodiaceae). Rev.Bras. Farm., v. 70, n. 1, p. 74-76,
condições experimentais deste trabalho, que a dose 1989.

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

83
HOLETZ, F. B.; PESSINI, G. L.; SANCHES, ROJAS DE ARIAS, A.; FERRO, E.; INCHAUSTI,
N. R.; CORTEZ, D. A. G.; NAKAMURA, C. V.; A.; ASCURA, M.; ACOSTA, N.; RODRIGUEZ,
DIAS FILHO, B. P. Screening of some plants used E.; FOURNET. A. Mutagenic, insecticidal and
in the Brazilian folk medicine for the treatment of tr ypanocidal activity of some Paraguayan
infectious diseases. Mem.Inst.Oswaldo Cruz, v. 97, Asteraceae. J. Ethnopharmacol., v. 45, n. 1, p. 35-
n. 7, p. 1027-1031, 2002 41, 1995.
MANDAL, P. K.; BISHAYEÈ, A., SALA, M. A.; KOMESU, M. C.; LOPES, R. A.;
CHATTERJEE, M. Stimulation of hepatic protein MAIA CAMPOS, G. Karyometric study of basal
synthesis in response to Mikania cordata root extract cell carcinoma. Braz.Dental J., v. 5, n. 1, p. 11-14,
in carbon tetrachloride-induced hepatotoxicity in 1994.
mice. Ital. J. Biochem., v. 41, n. 6, p. 345-351, 1992.
SALA, M. A.; LOPES, R. A.; MATHEUS, M.
MOSSADIK, M. A.; ALAM, K. M .F. The anti- Método morfométrico para análisis cuantitativo de
ulcerogenic effect of an alkaloidal fraction frm los tejidos. Determinación de los parámetros
Mikania cordata on diclofenac sodium-induced normales para los hepatocitos de rata. Rev.Fac.Med.
gastrointestinal lesions in rats. J.Pharm.Pharmacol., Zaragoza, v. 32, n. 1, p. 39-31, 1992.
v. 52, n. 9, p. 1157-1162, 2000.
SOARES DE MOURA, R.; COSTA, S. S.;
MUELAS-SERRANO, S.; NOGAL, J.; JANSEN, J. M.; SILVA, C. A.; LOPES, C. S.;
MARTÍNEZ-DÍAZ, R.; ESCARIO, J.; BERNARDO FILHO, M.; NASCIMENTO DA
MARTÍNEZ-FERNÁNDEZ, A.; GÓMEZ- SILVA, V.; CRIDDLE, D. N.; NUNES
BARRIN, A. In vitro screening of American plant PORTELA, B.; RUBENICH, L. M. S.;
extracts on Trypanosoma cruzi and Trichomonas GAGLIARDI ARAÚJO, R.; CARVALHO, L. C.
vaginalis. J.Ethnopharmacol., v. 71, n. 1, p. 101-107, R. M. Bronchodilator activity of Mikania glomerata
2000. Sprengel on human bronchi and guinea-pig
trachea. J.Pharm.Pharmacol., v. 54, n. 2, p. 249-256,
NOGUEIRA, L.; SIQUEIRA, J.; RIADO, S.; ARA- 2002.
UJO, C.; ARAUJO, L. Estudos preliminares das
propriedades farmacológicas e toxicológicas das SOUZA, C. P.; AZEVEDO, M. L. L.; LOPES, J.
frações extraídas do caule da espécie Mikania L. C.; SARTI, S. J.; SANTOS FILHO, E.;
malacolepsis Robinson. Anais da XI Reunião Anual LOPES, J. N. C.; VICHNEWSKI, W.; NASI, A.
da FESBE, Caxambu, 1996. p. 821. M. T. T.; LEITÃO FILHO, H.F. Quimioprofilaxia
da esquistossomose: Atividade moluscicida de pro-
NOGUEIRA, L.; ARAUJO, L., ARAUJO, C.; dutos naturais: Ensaios com caramujos adultos e
OLIVEIRA, F. Avaliação toxicológica aguda e desovas. An.Acad.Brasil.Ciênc., v. 56, n. 3, p. 333-
subcrônica e screening hipocrático do extrato bru- 338, 1984.
to fluido e frações da espécie Mikania malacolepsis
Robinson. Anais da 49a Reunião Anual da SBPC, SUYENAGA, E. S.; RECHE, E.; FARIAS, R. M.;
Belo Horizonte, 1997. p. 820. SCHAPOVAL, E. E. S.; CHAVES, C. G. M.;
HENRIQUES, A. T. Antiinflammator y
OLIVEIRA, I. Contribution to the botanical study investigation of some species of Mikania. Phytother.
of Mikania hirsutissima D.C. var. hirsutissima. II. Res., v. 16, n. 6, p. 519-523, 2002.
External morphology and anatomy of the leaf,
flower, fruit and seed. Rev. Farm. Bioq.USP, v. 10, TESKE, M.; TRENTINI, A. M. M. Herbarium
n. 1, p. 15-36, 1972. Compêndio de Fitoterapia. 4a ed. Curitiba:
Herbarium, 2001. 317 p.
PAUL, R. K.; JABBAR, A.; RASHID, M. A.
Antiulcer activity of Mikania cordata. Fitoterapia,
v. 71, n. 6, p. 701-703, 2000.

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

84
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA:
Prof. Dr. Ruberval Armando Lopes
Laboratório de Patologia – Departamento de
Morfologia, Estomatologia e Fisiologia
Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto - USP
Av. do Café, s/n
14040-904 Ribeirão Preto – SP
e-mail: ralopes@forp.usp.br

Investigação - Revista Científica da Universidade de Franca Franca (SP) v. 5 n. 1/6 p. 78-85 jan. 2003 / dez. 2005

85

Você também pode gostar