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Resumo
Este artigo analisa os códigos de poder na área de Tecnologia da Informação (TI) no
Brasil, revelando como os marcadores de gênero e sexualidade estão atrelados à
potência performativa do exercício da profissão de TI. Para tanto, empregamos uma
abordagem metodológica que integra pesquisa quantitativa (com 467 respostas) e
entrevistas qualitativas (envolvendo 19 profissionais), destacando os códigos
subalternizados decorrentes da discriminação de gênero e as complexidades
enfrentadas por mulheres e por homens não heterossexuais na sua integração no
setor. Em suma, nosso estudo expõe nuances de poder relacionadas ao gênero e
sexualidade, desafiando a concepção da hegemonia universal masculina nesse setor,
uma vez que reconhece a existência de diversas expressões de masculinidades.
1. Introdução
Neste artigo, adentramos no território da Tecnologia da Informação (TI)
no Brasil, com o propósito de analisar as operações hegemônicas do setor. A
hegemonia é nesta pesquisa interpretada como uma construção relacional que opera
a homogeneização de determinada particularidade para a representação de um todo.
No setor de Tecnologia da Informação, a utilização do termo é referente aos atos
fundacionais generificados e heteronormativos que produzem a construção da
potência performativa do profissional de TI. Neste caso, a particularidade (gênero e
1
Estudante do curso de graduação em Ciências Sociais e do Consumo da ESPM-SP. E-mail:
lucas.kelly@acad.espm.br.
2
Professora do curso de graduação em Ciência Sociais e do Consumo da ESPM-SP. E-mail:
clarissa.sanfelice@espm.br.
2
2. Metodologia
A metodologia empregada na pesquisa que resultou neste artigo consistiu
em uma abordagem que combina métodos quantitativos e qualitativos. Inicialmente,
foi feita uma exploração bibliográfica em livros e artigos de base teórica feminista a
fim de estabelecer os fundamentos teóricos que orientaram o desenvolvimento do
estudo. De acordo com Lima (2008), a pesquisa no campo bibliográfico consiste em
buscar na esfera dos artigos científicos, livros e outros documentos escritos,
conteúdos necessários para avançar nas investigações de uma temática de real
interesse do pesquisador.
Posteriormente, realizamos uma pesquisa quantitativa utilizando um
questionário misto, que combinou perguntas de roteiro fechado e perguntas abertas,
através da plataforma Google Forms. Os questionários foram distribuídos ao longo
3. Gênero e tecnologia
A primeira programadora de códigos foi uma mulher Matemática e escritora
inglesa, Ada Lovelace. A pioneira foi responsável, ainda na era vitoriana, por produzir
o primeiro algoritmo a ser processado por uma máquina (MARTINS, 2016). Segundo
relatório da Statista (2022):
Algo que acontece muito é quando uma tech leader mulher precisa
comprovar muito mais suas soluções do que os homens com o mesmo nível
de conhecimento. Ela precisa se esforçar para que suas opiniões sejam
aceitas e respeitadas, enquanto os homens têm suas ideias mais facilmente
acolhidas. (Participante sete, 5 de junho de 2023).
Isso pode ser um entrave, pois as conversas desse grupo giram em torno de
temas que não me interessam, como carros, futebol, entre outros. Minhas
afinidades são diferentes, gosto de Ru Paul Drag Race, e os caras não sabem
nem o que é uma Drag. Essas vivências diferentes criam barreiras na
interação, tornando mais fácil conversar e me sentir melhor com mulheres.
Assuntos como moda, cabelo e maquiagem nos conectam. (Participante
nove, 30 de maio de 2023).
E foi bem tenso, assim, bem solitário. Ainda assim, tive a sorte de fazer
amizade com alguns gays que se tornaram meus melhores amigos até hoje.
Isso me isolou do restante da turma, que apresentava preconceitos que eu
não aceitava, e acabei não fazendo amizades com todos. Percebi que, nesse
ambiente, tinham grupinhos fechados que compartilham interesses comuns.
(Participante três, 05 de junho de 2023).
A análise dos relatos, tanto das mulheres quanto dos homens não
heterossexuais, evidencia uma variedade de níveis em que o poder opera. Embora se
possam perceber vantagens amplas para os homens nesse setor, é essencial notar
que existem nuances de subalternização internas às próprias masculinidades. Esta
reflexão assume significância, pois frequentemente, ao abordar a hegemonia no
setor, a tendência é focalizar nos homens como uma categoria universal. No entanto,
é crucial questionar a universalização das categorias identitárias, compreendendo
que o poder desempenha diferentes papéis nos diversos fragmentos da sociedade.
5 Considerações finais
Considerando os elementos discutidos ao longo deste artigo, podemos
compreender a complexidade das dinâmicas de gênero e sexualidade que permeiam
o cenário do setor da Tecnologia da Informação no Brasil. Ao explorar as nuances do
setor, este estudo mergulhou nas operações de poder, revelando uma compreensão
mais profunda das dinâmicas de gênero e sexualidade que se manifestam nessa
conjuntura. Nessa investigação, ficou evidente a interseção entre o poder dominante
masculino e heteronormativo, com os códigos subalternizados das mulheres e
homens gays nesse cenário.
As lentes de gênero e sexualidade nos possibilitaram delinear os atos
performativos no exercício identitário da profissão de TI, indicando que altos níveis
de potência performativa estão relacionados à produção generificada e
heteronormativa desse exercício identitário.
Por conseguinte, esta pesquisa contribui para a compreensão de que as
masculinidades hegemônicas, ancoradas na heterossexualidade, marginalizam e
subalternizam em diferentes proporções mulheres e homens não heterossexuais. A
reflexão sobre essas questões possibilita o direcionamento de ações e políticas que
visem a desconstrução dos códigos hegemônicos, fomentando um ambiente
tecnológico mais inclusivo, igualitário e diversificado. Ao desafiar e reformular esses
códigos, conseguiremos superar algumas barreiras que mantêm as desigualdades de
gênero e sexualidade no setor de TI, transformando-o em um ambiente propício para
os agenciamentos de diversas identidades.
A figura abaixo (1), representa a construção de uma nuvem de palavras
realizada após os relatos voluntários de 192 participantes que descreveram um perfil
homogêneo de homens no setor de Tecnologia da Informação. As palavras mais
frequentemente citadas foram: classe média, homens, heterossexuais, branco e cis.
Referências
DE SOUZA, Tatiele Pereira; TOSTA, Tania Ludmila Dias. Imagens de gênero e raça
na tecnologia da informação: invisibilidades negras, territórios brancos; mulheres
ocultas, espaços masculinos. Cadernos de Gênero e Tecnologia, v. 13, n. 42,
p.341-364, 2020.
HAYES, Caroline Clarke. Gender Codes. Gender codes: Why women are
leaving computing, p. 265-273, 2010.