Você está na página 1de 285

PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE MESTRADO EM HISTÓRIA

ANDRÉ LUIZ REIS MATTOS

FOTOGRAFIA, HISTÓRIA E MEMÓRIA:


REFLEXÕES E NARRATIVAS IMAGÉTICAS DA
VILA DE ENTRE-RIOS (1861 - 1939)

Dissertação de Mestrado em História Social


Linha de pesquisa em História Cultural

VASSOURAS/RJ
JUNHO/2012
ANDRÉ LUIZ REIS MATTOS

FOTOGRAFIA, HISTÓRIA E MEMÓRIA: REFLEXÕES


E NARRATIVAS IMAGÉTICAS DA VILA DE ENTRE-
RIOS (1861 - 1939)

Dissertação apresentada ao Curso Pós-


Graduação Stricto Sensu de Mestrado em
História Social – linha de pesquisa em História
Cultural, da Universidade Severino Sombra,
como parte dos requisitos necessários à
obtenção do grau de Mestre.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Ana Maria Dietrich (UFABC)

VASSOURAS/RJ
JUNHO/2012
UNIVERSIDADE SEVERINO SOMBRA
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE MESTRADO EM HISTÓRIA

ANDRÉ LUIZ REIS MATTOS

FOTOGRAFIA, HISTÓRIA E MEMÓRIA: REFLEXÕES E NARRATIVAS


IMAGÉTICAS DA VILA DE ENTRE-RIOS (1861 - 1939)

Banca examinadora:

___________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Ana Maria Dietrich (UFABC/SP)


(ORIENTADORA)

___________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Nancy Cardoso Pereira (SECRETARIA DE EDUCAÇÃO/RS)

___________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Kátia Peixoto dos Santos (PUC/SP)

___________________________________________________

Prof.º Dr.º Carlos Eduardo M. Araújo (USS/RJ)


A Deus, ao meu pai (in memorian)

e a minha mãe, aos meus filhos,

neto e companheira...

A minha orientadora... a todos

vocês, amor, carinho e respeito

para sempre...
AGRADECIMENTOS

A minha orientadora Prof.ª Dr.ª Ana Maria Dietrich, pela dedicação e paciência sem
igual.
Ao coordenador do Mestrado Prof.º Eduardo Scheidt, pela excelente condução do
curso, bem como, aos demais professores.
A secretária do mestrado Sandra Feijó, pela sua generosidade e competência.
Aos grandes amigos da turma do mestrado, que contribuíram com suas experiências
durante o curso.
Aos amigos e companheiros da 2ª Vara da Comarca de Três Rios, pelos incentivos e
compreensão em minhas ausências.
A minha filha Natália, ao meu filho João Vitor e ao meu neto Guilherme, pela
concessão das horas de pesquisa e trabalho.
Ao meu pai Mauro da Silva Mattos (in memorian) e a minha mãe Marlene Reis
Mattos, por tudo que recebi deles nesta existência.
A todos que, com boa intenção, colaboraram para a realização e finalização deste
trabalho.
“Ein Bild sagt mehr als 1000 Worte.”

[Uma imagem vale mais do que mil palavras]

Kurt Tucholsky

1
RESUMO

Esta dissertação apresenta a proposta de fomentar uma discussão historiográfica que


considere a fotografia em sua dupla dimensão, como fonte e testemunho de memória,
privilegiando-a como um lugar de lembrança relacionada a todas as representações a ela
associadas, sejam história de vidas, sejam monumentos arquitetônicos; entendendo memória
como o conjunto de lembranças preservadas e esquecidas de um indivíduo ou de uma
coletividade, em um processo contínuo de construção e reconstrução. Fatos e paisagens,
espaços urbanos de relação, desaparecem no esquecimento quando não existe interesse em
rememorá-los, porque houve perda de valor para determinado grupo ou coletividade ou
porque não existe nenhum meio de restituir sua imagem.
Neste diálogo, aproprio-me das fotografias, objetivando demonstrar, através da
narrativa imagética, as transformações urbanas ocorridas na cidade de Três Rios/RJ, desde o
momento inicial como Vila de Entre-Rios, em 1861, espaço de relação formado nas terras da
Fazenda de Cantagalo, no entorno das estações da Estrada União e Indústria e sete anos após,
da Estrada de Ferro D. Pedro II, até o final do movimento de emancipação do município de
Paraíba do Sul/RJ, nos anos de 1938 e 1939.
Os indivíduos que interagiam neste espaço urbano, por meio de atividades
relacionadas às artes, ao civismo, às manifestações políticas, ao lazer, aos esportes, ao
trabalho e à cultura, são retratados no decorrer dos capítulos, quando procuro entender o lugar
não só dos escravos libertos pela vontade manifestada em testamento da Condessa do Rio
Novo, mas de seus descendentes, na nascente sociedade da Vila de Entre-Rios. Todos sujeitos
históricos que vivenciaram enquanto grupo (ou grupos) as transformações ocorridas não
apenas nos seus espaços de relação, mas também nas expressões da vida em sociedade.

Palavras-chave: fotografia, história, memória, espaços urbanos, Três Rios.

2
RESUMEM

Esta tesis se presenta la propuesta de fomentar un debate que considera la imagen


historiográfica en su doble dimensión, como fuente de la memoria y el testimonio, haciendo
hincapié en ello como un lugar de recuerdo relacionados con todas las representaciones
asociadas con ella, son vidas de historia, son monumentos arquitectónico, entendido como el
conjunto de memoria preservada y olvidados recuerdos de un individuo o de una comunidad
en un proceso continuo de construcción y reconstrucción. Hechos y paisajes, espacios urbanos
de relación, desaparecen en el olvido cuando recuerdo ningún interés en ellos porque había
una pérdida de valor para un grupo o colectividad o porque no hay manera de restaurar su
imagen.
En este diálogo, me aproprio de fotografías, con el objetivo de demostrar, a través de
imágenes narrativas, las transformaciones urbanas que se han producido en la ciudad de Tres
Rios / RJ, de la aldea inicial incluso como Entre-Rios, en 1861, la relación de espacio
formado sobre tierra Granja de Cantagalo en torno a las estaciones y Sindicato de la Industria
de la carretera y el ferrocarril D. Pedro II hasta el final de la emancipación del municipio de
Paraíba do Sul / RJ en los años 1938 y 1939.
Los individuos que interactúan en este espacio urbano, a través de actividades
relacionadas con las artes, a la civilidad, a las manifestaciones políticas, el ocio, los deportes,
el trabajo y la cultura, son retratados a lo largo de los capítulos, cuando trato de entender no
sólo el lugar de por esclavos liberados en testimonio de la voluntad de la nueva condesa río,
pero sus descendientes en la naciente sociedad de la localidad de Entre-Rios. Todos los
sujetos históricos que tuvieron como grupo (o grupos) de los cambios ocurridos no sólo en sus
ámbitos de relación, sino también en términos de la sociedad.

Palabras clave: fotografía, historia, la memoria, los espacios urbanos, Tres Ríos.

3
SUMÁRIO

Introdução ............................................................................................................................... 12

Capítulo I - Fotografia, História e Memória........................................................................18


1.1 - A fotografia, a memória e a diversidade das fontes históricas.........................................18
1.2 - O “Angelus Novus”..........................................................................................................37
1.3 - A fotografia, o tempo e os esquecidos nos embates de memória.....................................45
1.3.1 – Os esquecidos...............................................................................................................45
1.3.2 – O tempo........................................................................................................................56
1.4 - A fotografia, as memórias compartilhadas e a nostalgia..................................................68

Capítulo II - Fotografia, História e Memória: pesquisa e narrativa imagética ........... ... 86


2.1 - A proposta temática e metodológica.................................................................................86
2.2 - Critério metodológico de seleção das imagens.................................................................92

2.3 - Vila de Entre-Rios, uma narrativa imagética....................................................................95


2.3.1 - 1º Momento: Da formação urbana da Vila de Entre-Rios até a formalização da
condição de 2º Distrito de Paraíba do Sul (1861 a 1890).........................................................95
2.3.1.1 - A Ponte das Garças....................................................................................................95
2.3.1.2 - Estação Rodoviária de Entre-Rios (Estação das Mudas) e as estações
ferroviárias..............................................................................................................................119
2.3.1.2.1 – Estação Rodoviária de Entre Rios.......................................................................120
2.3.1.2.2 – Estações Ferroviárias da Estrada de Ferro D. Pedro II e da Estrada de Ferro
Leopoldina Railway Company Limited..................................................................................136

Capítulo III - A Condessa, os espaços urbanos, a sociedade e os negros


libertos....................................................................................................................................148
3.1 - 2º Momento: Entre-Rios, de 2º Distrito de Paraíba do Sul até o findar do movimento de
emancipação política e econômica (1890 a 1938)..................................................................148
3.1.1 – A Condessa do Rio Novo e o crescimento urbano da Vila de Entre-Rios..................148
3.1.2 – O movimento de emancipação político-administrativa e a continuidade do crescimento
urbano de Entre-Rios na década de 1930................................................................................164

4
3.2 – Igrejas do distrito de Entre Rios.....................................................................................199
3.3 – A nascente sociedade urbana da Vila de Entre-Rios e o lugar dos escravos libertos e seus
descendentes............................................................................................................................215

Conclusão...............................................................................................................................244

Anexo 1: Narrativas imagéticas: panoramas e paisagens.................................................247


Biografias...............................................................................................................................264

Fontes.....................................................................................................................................271

Bibliografia............................................................................................................................272

5
RELAÇÃO DAS IMAGENS

Fotografia 1: Vista externa da Fazenda Capoeirinha em Chiador/MG ................................... 13


Fotografia 2: Entrada da sede principal da Fazenda Capoeirinha em Chiador/MG .............. 14
Fotografia 3: Tomada interna do público presente ao Clube Atlético Entre-Rios......... ......... 21
Fotografia 4: Segundo registro do salão do Clube Atlético Entre-Rios – CAER ................... 22
Fotografia 5: Imagem das dimensões do salão do CAER....................................................... 23
Fotografia 6: Vista externa do Café Rio Branco na Av. Condessa do Rio Novo ................... 25
Fotografia 7: Passagem da imagem de N. Senhora Aparecida pela cidade de Três Rios/RJ.. 27
Fotografia 8: Passagem da imagem de N. Senhora Aparecida pela cidade de Três Rios/RJ.. 27
Fotografia 9: Vista externa da Igreja Matriz de São Sebastião ............................................... 28
Fotografia 10: Concentração popular em homenagem a Nossa Senhora Aparecida ............. 29
Fotografia 11: Procissão em homenagem a Nossa Senhora Aparecida.... .............................. 30
Fotografia 12: Inauguração da capela em homenagem a Nossa Senhora Aparecida ............. 31
Fotografia 13: Vista externa da capela em homenagem a Nossa Senhora Aparecida ............ 32
Fotografia 14: Representantes das cidades de Bom Jesus de Itabapuana e Entre-Rios ......... 33
Fotografia 15: Angelus Novus de Paul Klee .......................................................................... 37
Fotografia 16: Descendentes dos escravos libertos pela Condessa do Rio Novo ................... 41
Fotografia 17: Ex-presidente Nilo Peçanha em Entre-Rios.. .................................................. 45
Fotografia 18: Ex-presidente Nilo Peçanha junto às autoridades ........................................... 46
Fotografia 19: Praça São Sebastião em Três Rios/RJ ............................................................. 51
Fotografia 20: Tomada externa da Praça São Sebastião ......................................................... 52
Fotografia 21: Piso atual da Praça São Sebastião ................................................................... 53
Fotografia 22: Estátua em homenagem ao ex-presidente Tancredo Neves ........................... 54
Fotografia 23: Fotografia aérea do centro da cidade de Três Rios ......................................... 57
Fotografia 24: “Ele está morto e vai morrer” – A. Gardner: Retrato de Lewis Payne, 1865 .. 60
Fotografia 25: Imagem interna da antiga loja Casa Lopes ...................................................... 66
Fotografia 26: Tomada externa noturna do coreto da Praça São Sebastião ............................ 70
Fotografia 27: Manifestação cívica política no antigo coreto da Praça São Sebastião .......... 71
Fotografia 28: Tomada externa do coreto da Praça São Sebastião ......................................... 73
Fotografia 29: Jovens se confraternizando no interior do coreto da Praça São Sebastião ...... 74
Fotografia 30: Vista panorâmica da Praça São Sebastião ....................................................... 75
Fotografia 31: Vista panorâmica da Praça São Sebastião ....................................................... 76

6
Fotografia 32: Vista panorâmica noturna da Praça São Sebastião.......................................... 77
Fotografia 33: Tomada externa de um parquinho na Praça São Sebastião ............................. 79
Fotografia 34: Registro do concurso garota simpatia de 1968 ............................................... 79
Fotografia 35: Tomada externa do desfile cívico de Sete de Setembro .................................. 79
Fotografia 36: Tomada externa do desfile cívico de Sete de Setembro .................................. 79
Fotografia 37: Locomotiva da E. F. C. do Brasil na Estação Ferroviária de Entre-Rios ........ 80
Fotografia 38: Estação Ferroviária da E. F. C. do Brasil em Entre-Rios no final de 1935 ..... 82
Fotografia 39: Vista externa da Ponte de Entre-Rios .............................................................. 95
Fotografia 40: Recorte da fotografia 39 .................................................................................. 96
Fotografia 41: Pilar original da Ponte das Garças.................................................................97
Fotografia 42: Imagem aérea gerada pelo Google Pro ........................................................... 99
Fotografia 43: Visão lateral da Ponte do Paraíba .................................................................. 101
Fotografia 44: Vila da Paraíba do Sul/RJ em 1861 ............................................................... 102
Fotografia 45: Recorte do Mapa da Estrada Real ................................................................. 107
Fotografia 46: Planta da Estrada União e Indústria .............................................................. 108
Fotografia 47: Desenho realizado da fotografia 39 .............................................................. 110
Fotografia 48: Registro externo da Ponte das Garças .......................................................... 111
Fotografia 49: Imagem externa da Casa do Pedágio ............................................................ 113
Fotografia 50: Registro externo da Casa do Pedágio e da Ponte das Garças ....................... 114
Fotografia 51: Recorte da fotografia 50 ................................................................................ 115
Fotografia 52: Sr. Antonio Villela Junior ............................................................................. 115
Fotografia 53: Ponte das Garças ........................................................................................... 116
Fotografia 54: Ponte das Garças em seu interior .................................................................. 117
Fotografia 55: Ponte das Garças em um registro de posição similar à da fotografia 39 ....... 117
Fotografia 56: Vista externa da Fazenda Boa União ............................................................ 120
Fotografia 57: Vista externa da Estação de Entre-Rios ........................................................ 121
Fotografia 58: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 124
Fotografia 59: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 125
Fotografia 60: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 126
Fotografia 61: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 126
Fotografia 62: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 127
Fotografia 63: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 128
Fotografia 64: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 128
Fotografia 65: Recorte da fotografia 57 ................................................................................ 129

7
Fotografia 66: Recorte da fotografia 57. ............................................................................... 129
Fotografia 67: Imagem aérea gerada pelo Google Pro em 2010........................................... 130
Fotografia 68: Primeira maquete da sede da Fazenda de Cantagalo..................................... 131
Fotografia 69: Segunda maquete da sede da Fazenda de Cantagalo..................................... 132
Fotografia 70: Terceira maquete da sede da Fazenda de Cantagalo ..................................... 132
Fotografia 71: Quarta e última maquete da sede da Fazenda de Cantagalo ......................... 133
Fotografia 72: Desenho representando a Fazenda de Cantagalo .................................. 133
Fotografia 73: Pedras pertencentes à Fazenda de Cantagalo ................................................ 134
Fotografia 74: Possíveis casas construídas pela Condessa do Rio Novo ............................. 138
Fotografia 75: Vista externa da Estação Ferroviária de Entre-Rios...................................... 140
Fotografia 76: Recorte da fotografia 75 ................................................................................ 140
Fotografia 77: Desenho realizado da fotografia 75 ............................................................... 141
Fotografia 78: Recorte da fotografia 75 ................................................................................ 141
Fotografia 79: Neste mapa em vermelho tem-se o trecho inicial da E. F. Dom Pedro II ..... 142
Fotografia 80: Vista externa da Estação de Pedras da Estrada de Ferro Leopoldina............ 143
Fotografia 81: Panorâmica onde se observa a Estação de Três Rios da Leopoldina ............ 144
Fotografia 82: Cabine construída pela E.F.D. Pedro II......................................................... 145
Fotografia 83: Cabine pela E.F.D. Pedro II .......................................................................... 145
Fotografia 84: Estado atual da cabine ................................................................................... 146
Fotografia 85: Estado atual da cabine ................................................................................... 146
Fotografia 86: Estado atual da cabine ................................................................................... 146
Fotografia 87: Estado atual da cabine ................................................................................... 146
Fotografia 88: Panorâmica do ainda distrito de Paraíba do Sul/RJ, Entre Rios.................... 149
Fotografia 89: Planta topográfica da Fazenda de Cantagalo................................................. 151
Fotografia 90: Planta topográfica da Fazenda de Cantagalo, ampliada ................................ 152
Fotografia 91: Panorâmica do distrito de Entre-Rios na década de 10 ................................. 154
Fotografia 92: Vista externa da Rua Visconde de Entre-Rios .............................................. 156
Fotografia 93: Fotografia do centro do distrito de Entre-Rios .............................................. 156
Fotografia 94: Vista externa da Estação Ferroviária de Entre-Rios...................................... 157
Fotografia 95: Fotografia do centro do distrito de Entre-Rios .............................................. 158
Fotografia 96: Fotografia externa da Rua Campos Elíseos................................................... 159
Fotografia 97: Fotografia do distrito de Entre-Rios .............................................................. 160
Fotografia 98: Vista externa do Parque Oscar Weinchenk ................................................... 161
Fotografia 99: Segundo registro externo do Parque Oscar Weinchenk ................................ 161

8
Fotografia 100: Fotografia externa da Rua Maria Pereira .................................................... 164
Fotografia 101 e verso: Fotografia panorâmica do distrito de Entre-Rios ........................... 166
Fotografia 102: Destruição causada pela explosão de vagão de carga com munição........... 167
Fotografia 103: Enchentes do Rio Paraíba do Sul ................................................................ 168
Fotografia 104: Panorâmica do distrito de Entre-Rios..........................................................169
Fotografia 105: Panorâmica do distrito de Entre-Rios.......................................................... 171
Fotografia 106: Senhor que vendia latões de água pelas ruas do distrito de Entre-Rios ...... 173
Fotografia 107: Fotografia externa da Fábrica de Balas Ezilma ........................................... 175
Fotografia 108: Imagem externa da Fábrica de Fósforo “Pharol” ........................................ 176
Fotografia 109: Panorâmica de Entre Rios............................................................................177
Fotografia 110: Fotografia externa do Armazém dos Irmãos Ferreira Álvares .................... 178
Fotografia 111: Panorâmica da Rua da Maçonaria ............................................................... 179
Fotografia 112: Viaduto sobre a linha férrea ........................................................................179
Fotografia 113: Viaduto sobre a linha férrea ........................................................................179
Fotografia 114: Viaduto sobre a linha férrea ........................................................................179
Fotografia 115: Viaduto sobre a linha férrea ........................................................................179
Fotografia 116: Fotografia externa da Rua da Condessa ...................................................... 180
Fotografia 117: Panorâmica da Rua da Condessa ................................................................. 181
Fotografia 118: Panorâmica da Rua da Condessa ................................................................. 181
Fotografia 119: Panorâmica da Rua da Condessa ................................................................. 182
Fotografia 120: Fotografia externa do Banco de Entre-Rios ................................................ 183
Fotografia 121: Drº Walter Gomes Francklin ....................................................................... 184
Fotografia 122: Grupo Escolar Condessa do Rio Novo........................................................ 185
Fotografia 123: Igreja Matriz de São Sebastião .................................................................... 186
Fotografia 124: Vista externa do Grupo Espírita Fé e Esperança ......................................... 187
Fotografia 125: Possível representação do auto Vitória ....................................................... 188
Fotografia 126: Representação do ônibus da empresa Autobus Ltda ................................... 189
Fotografia 127: Panorâmica do distrito de Entre-Rios.......................................................... 190
Fotografia 128: Fotografia do time de futebol do Entrerriense Futebol Clube ..................... 191
Fotografia 129: Inauguração do Estádio do Entrerriense F. C .............................................. 192
Fotografia 130: Registro do aniversário da Banda 1º de Maio ............................................. 193
Fotografia 131: Panorâmica do distrito de Entre-Rios.......................................................... 194
Fotografia 132: Chegada dos emancipacionistas em Três Rios ............................................ 196
Fotografia 133: Vista externa da Capela Nossa Senhora da Piedade ................................... 199

9
Fotografia 134: Capela Nossa Senhora da Piedade, ao lado do trevo do Cantagalo ............ 201
Fotografia 135: Vista externa da Capela Nossa Senhora da Piedade no Bairro Cantagalo .. 202
Fotografia 136: Vista do cemitério nos fundos da Capela Nossa Senhora da Piedade.......202
Fotografia 137: Monumento à Condessa do Rio Novo e ao Barão Ribeiro de Sá, ............... 203
Fotografia 138: Bustos da Condessa do Rio Novo e do Barão Ribeiro de Sá ...................... 204
Fotografia 139: Vista externa da Capela de São Sebastião ................................................... 205
Fotografia 140: Vista externa da Capela de São Sebastião ................................................... 206
Fotografia 141: Imagem externa do Largo da Capelinha ..................................................... 207
Fotografia 142: Vista externa da Praça Visconde do Rio Novo ........................................... 207
Fotografia 143: Vista externa da Igreja de Nossa Senhora da Conceição ............................ 208
Fotografia 144: Vista externa da Igreja de Nossa Senhora da Conceição ............................ 209
Fotografia 145: Vista externa da Igreja de São Sebastião, no início de sua construção ....... 210
Fotografia 146: Vista externa da Igreja Matriz de São Sebastião.........................................210
Fotografia 147: Vista externa da Igreja de São Sebastião .................................................... 211
Fotografia 148: Vista externa da Igreja de São Sebastião .................................................... 212
Fotografia 149: Vista externa da Igreja de São Sebastião .................................................... 212
Fotografia 150: Vista externa da Igreja de São Sebastião .................................................... 213
Fotografia 151: Vista externa da Igreja de São Sebastião .................................................... 214
Fotografia 152: Imagem da parte superior da capa do periódico “Correio Trirriense” ........ 222
Fotografia 153: Grupo Dramático Beneficente Dias Braga .................................................. 224
Fotografia 154: Diretoria do Grupo Dramático Beneficente Dias Braga ............................. 225
Fotografia 155: Registro do corpo cênico do G.D.B. Dias Braga ........................................ 225
Fotografia 156: Grupo de Amadores Teatrais Viriato Correia ............................................. 226
Fotografia 157: Músicos e membros da diretoria da Banda 1º de Maio .......................... 227
Fotografia 158: Registro dos músicos da Banda “Jazz União” ............................................ 228
Fotografia 159: Músicos da primeira Jazz Band da cidade a “Jazz Band Columbia” .......... 228
Fotografia 160: Imagem externa dos músicos da Banda de Música Henrique Mesquita ..... 229
Fotografia 161: Registro externo dos jogadores do América Futebol Clube ........................ 230
Fotografia 162: Equipe de futebol do Entrerriense Futebol Clube da década de 1930 ........ 231
Fotografia 163: Inauguração do campo de futebol do Entrerriense Futebol Clube .............. 232
Fotografia 164: Estádio de futebol do Entrerriense F. C. ....................................................233
Fotografia 165: Comemoração pela instalação do novo município de Entre-Rios .............. 234
Fotografia 166: Comemoração pela instalação do novo município de Entre-Rios .............. 235
Fotografia 167: Inauguração do prédio da Prefeitura Municipal de Três Rios em 1943 ...... 236

10
Fotografia 168: Homenagem ao dia da árvore, realizada na Praça da Autonomia ............... 236
Fotografia 169: Vista externa do local em frente a Matriz de São Sebastião ....................... 237
Fotografia 170: Vista externa do Gynásio Pinto Ferreira ..................................................... 238
Fotografia 171: Vista externa do Grupo Escolar Condessa do Rio Novo ............................ 239
Fotografia 172: Vista interna da Oficina da Escola Profissional de Entre-Rios ................... 239
Fotografia 173: Vista externa do Armazém de Café ............................................................ 240
Fotografia 174: Vista externa onde se observa os trabalhadores do Armazém de Café ....... 241
Fotografia 175: Trabalhadores negros junto aos tratores ...................................................... 241
Fotografia 176: Panorâmica do Viaduto Antônio Teixeira Pinto..........................................246

11
INTRODUÇÃO

XIV Encontro Regional da ANPUH-RIO – Associação Nacional de História, 19 de


julho de 2010, a primeira ANPUH que estive presente. Numa mesa com mediação da Profª
Ana Maria Mauad, apresentei o projeto de pesquisa que em abril daquele ano foi selecionado
no Programa de Pós–Graduação em História Cultural da Universidade Severino Sombra –
USS de Vassouras/RJ. Não conhecia a UNIRIO, e por isso, além de pegar o ônibus em Três
Rios bem cedo, resolvi usar um táxi no percurso entre a rodoviária e a sede do evento. Se
tivesse por algum motivo que buscar na memória as lembranças do trajeto realizado pelo
motorista naquela manhã, não encontraria, simplesmente porque minha atenção fora
direcionada a uma imagem singular para quem na fotografia e na memória tem os objetos de
sua paixão e estudos.
No pára-brisa do carro, refletido estava em posição favorável à observação do
motorista, este um senhor aparentando seus 50 anos, a imagem de dois jovens abraçados e no
segundo plano, uma praia. Não observava a fotografia, mas a imagem que no pára-brisa
refletia dois meninos que “acompanhavam” o motorista em seus caminhos diários, por todo o
tempo, como uma lembrança daqueles e de algum lugar e momento que não se desejava
esquecidos.
Fiquei me perguntando quem seriam. Filhos, netos? Que sensações, que sentimentos
se reafirmam com a presença da lembrança, que da memória retorna sempre viva e presente
por meio daquela imagem fotográfica? Não formulei nenhuma pergunta, pois absorvido em
reflexões várias não percebi que tão rapidamente chegara ao meu destino. Foi um momento
especial por tudo que envolveu de significados, pois estava nos passos primeiros de um
caminho iniciado ainda na graduação - pesquisa sobre fotografia e história -, motivado na
época pelo registro da Fazenda Capoeirinha em Chiador/MG, onde a presença das pessoas
“vivas” na imagem, mas não mais existentes na atualidade, até hoje povoa meus pensamentos
de múltiplas indagações.
A fazenda pertencia a Marcelino José da Costa e Maria Cherobina de Castro Mattos,
bisavós do meu pai, Mauro da Silva Mattos, e esta fotografia despertou, naquele momento da
escolha do tema para o trabalho final da graduação em Licenciatura em História pela
Universidade de Uberaba/MG, todo o encanto e a paixão que sempre senti ao observar
qualquer fotografia antiga. Percebo algo de “mágico” em cada uma daquelas que me
conduzem a um ambiente diferente, a um tempo anterior e a uma realidade que eu não

12
experimentei e que não me será possível vivenciar, mas que a imagem consegue imputar uma
“sensação de realidade”.
As pessoas, os objetos, as paisagens e os espaços de relação não se encontram no
tempo presente, mas que de alguma forma, vencendo a distância que separa o ato fotográfico,
a “imagem-ato” se presentifica ao observador, com toda a sua possibilidade de narrar uma
parcela da história e das lembranças dos que permanecem representados no seu referente.

Fotografia 1: Vista externa da Fazenda Capoeirinha em Chiador/MG, com a presença de seus


proprietários, e trabalhadores. Fotografia sem registro da data e autor, acervo André Mattos.

A Fazenda Capoeirinha ainda permanece na atualidade com sua sede bem conservada,
mas as pessoas que foram “preservadas” em imagem nesta fotografia, sem o registro da data
de sua reprodução, não existem mais. Observa-se interessante distribuição dos indivíduos,
deixando claro uma divisão social, com os trabalhadores, suas crianças e mulheres postadas
num segundo plano, e os possíveis proprietários e seus familiares (também homens, mulheres
e crianças) no primeiro plano bem à frente à esquerda, e dois homens a cavalo logo atrás
destes.
Esta imagem possibilita interessantes análises sobre as questões das hierarquias sociais
naquele tempo, não só porque a arrumação espacial concebida para o registro fotográfico
permite a identificação de grupos sociais distintos, por meio de limites “territoriais” evidentes,
mas também e ainda, pelas roupas (chapéus, ternos, gravatas, vestidos de melhor qualidade no

13
acabamento percebidos entre as pessoas que se destacam) e pela formação étnica, com negros
apenas entre os trabalhadores.
Roland Barthes (2008, p. 68) define punctum como “o “detalhe” que me atrai. Sinto
que basta sua presença para mudar minha leitura, que se trata de uma nova foto que eu olho,
marcada a meus olhos por um valor superior. Esse “detalhe” é o punctum (o que me punge)”,
elemento cultural e social, flecha que fere alguns, mas com certeza, nem todos.

Fotografia 2: Vista externa da entrada da sede principal da Fazenda Capoeirinha em Chiador/MG,


aparentando bom estado de conservação, neste registro fotográfico datado do ano de 2008, autor Eduardo
Mattos, acervo André Mattos.

Apesar desta fotografia em sua totalidade entusiasmar, o punctum se apresenta na


mulher que está no centro dos dois grupos, vestida e posicionada de forma a demonstrar sua
condição de serviçal. Uma personagem que transita por dois mundos, aparece no centro da
imagem, num plano à frente dos prováveis trabalhadores da fazenda e seus familiares, estando
ao lado do que parece ser um carrinho de bebê.
No processo de formação de memórias, as imagens depoimentos de eventos e instantes
de um passado não vivido pelos que observam no presente são testemunhos de memórias
individuais e coletivas, como no caso destas fotografias, e todas as lembranças reavivadas e
recordadas, possíveis de serem percebidas através dos fragmentos das ruínas dos fatos

14
históricos, podendo ajustar e rearmar a nossa própria lembrança e ao mesmo tempo se
incorporarem à memória; é a imagem testemunho ou documentos testemunho, transformando-
se em lembranças, compartilhando memórias.
O presente trabalho apresenta a proposta de fomentar uma discussão que considere a
fotografia em sua dupla dimensão de fonte historiográfica e testemunho de memória,
privilegiando-a como um lugar de lembrança relacionada a todas as representações a ela
associadas, sejam história de vidas, sejam monumentos arquitetônicos, entendendo memória
como o conjunto de lembranças preservadas e esquecidas de um indivíduo ou de uma
coletividade, estando em processo contínuo de construção e reconstrução.
Fatos e paisagens, espaços urbanos de relação, desaparecem no esquecimento quando
não existe interesse em rememorá-los, porque houve perda de valor para determinado grupo
ou coletividade, ou porque não existe meio algum de restituir sua imagem.
A escolha do tema está fundamentada na relevância contemporânea dos estudos da
História Cultural. Roger Chartier (1990, p. 16 e 17) explica que a “história cultural, tal como a
entendemos, tem por principal objeto identificar o modo como em diferentes lugares e
momentos uma determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler”. A História
Cultural, no trato com a diversidade das fontes historiográficas, é a que mais avança em
direção ao campo da memória (principalmente com relação ao que Ecléa Bosi (2004, p. 16)
define como “substância social da memória”), por entender que não se pode mais identificar a
memória como um método parcial e limitado de recordar fatos passados, servindo como
simples auxiliar para as ciências humanas.
O aporte da História Cultural é fundamental nos estudos e interpretações da memória
construída nas representações e nas relações de poder, alistadas às batalhas de memória
realizadas nos espaços de afinidade e que se sedimentam nas práticas sociais.
É possível apropriar-me da fotografia como lugar de lembranças e ponto de referência
à memória substanciada nas relações sociais que ocorrem nos espaços urbanos, porque
vivemos um momento onde as teorias e ideologias diversas da historiografia, e das demais
ciências humanas, convivem e dialogam apesar dos reconhecidos e naturais conflitos. Assim
promovendo nesta pesquisa interfaces com a Psicologia Social e a Sociologia, através de
autores como: Dubois, Joly, Barthes, Burke, Kossoy (estudos conceituais e metodológicos da
fotografia) e Bosi, Benjamin, Bérgson (pela leitura de Bosi), e Halbwachs e Ricceur (na lida
com a Memória e sua relação com a História). 1

1 BARTHES, Roland. A Câmara Clara. Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 2008; BENJAMIN, Walter. Walter
Benjamin – Obras Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo. Brasiliense. 11ª

15
O caminho teórico escolhido é aplicado na análise das fotografias da Vila de Entre-
Rios, hoje município de Três Rios, no Vale do Paraíba do Sul/RJ. Fotografias dos espaços
urbanos construídos e transformados, que se interrelacionam com memórias individuais e
coletivas, memórias silenciadas, memórias impostas pelos detentores de poder, memórias de
grupos e de trabalhadores; permitindo que a construção historiográfica se desenrole através de
uma narrativa imagética.
Cidade-polo da região centro-sul do Estado do Rio de Janeiro, Três Rios possuiu uma
população urbana em torno de 78.000 habitantes, e um número considerável de visitantes e
moradores de outras cidades vizinhas, atraídos pelas oportunidades de emprego, educação e
saúde. Desde o início do século XX vem experimentando um crescimento econômico,
político, educacional e cultural, refletido na existência de Universidades com diversos cursos
de graduação e pós-graduação; Centros Tecnológicos e de Qualificação Profissional,
indústrias e comércio com empresas e lojas reconhecidas no âmbito nacional; diversos
festivais e atividades ligados às artes cênicas, gastronomia, música e dança. Este processo
teve início no governo municipal do Prefeito Celso Jacob, sofrendo continuidade e impulso
durante a administração do Prefeito Vinicius Farah.
O primeiro capítulo propõe-se a uma reflexão sobre a presença da fotografia nas
pesquisas interdisciplinares, tendo em vista sua gradual aceitação na atualidade, em
consonância com outras diversas fontes historiográficas, analisando os conceitos teóricos que
identificam a fotografia como fonte para a construção da narrativa histórica e testemunho de
memória.
Por meio das reflexões de Walter Benjamin, relaciono qual História é capaz e de que
maneira de se alistar com a memória e com a fotografia. História que vislumbra um tempo
apto a interrupções, a particularização: o tempo da memória; assim, não formulada por uma
narrativa tradicional, mas em migalhas, privilegiando os sujeitos esquecidos e silenciados pela
história oficial, os vencidos em todos os confrontos de memórias.
Nos itens seguintes, aspectos importantes para entender o entrecruzamento entre
fotografia, história e memória são analisados: o tempo, os esquecidos nos embates de
memória, a fotografia como lugar de lembrança, o conceito de memórias compartilhadas e

Reimpressão, 2008; BOSI, Ecléa. O Tempo Vivo da Memória. Ensaios de Psicologia Social. Ateliê Editorial.
São Paulo/SP, 2ª Edição, 2004; BURKE, Peter. Testemunha Ocular: História e Imagem. 2ª ed. SP: EDUSC.
2004; DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico. Papirus. Campinas/SP. 12ª Edição, 2009; HALBWACHS,
Maurice. A Memória Coletiva. Nova tradução de Beatriz Sidou. Centauro, São Paulo/SP. 2009; JOLY, Martine.
Introdução à análise da Imagem. SP, ed. Papirus. 13ª Edição, 2009; KOSSOY, Borys. Fotografia e História.
São Paulo/SP: Ateliê Editorial. 2ª ed. 2003. RICCER, Paul. A memória, a história e o esquecimento. Editora
Unicamp. 2ª reimpressão, 2010. Campinas/SP.

16
nostalgia, o princípio da distância de Benjamin que “nasceu” com a sua definição de aura. De
Barthes e Dubois, retira-se a apreciação de separação e corte temporal e espacial, que ocorre
no momento de elaboração da imagem-ato, qualidade que permite por meio da presença da
fotografia na atualidade, a interpretação de um instante interrompido no tempo passado, –
apreciação que também confere a cada registro a condição de objeto único -, fragmento e
testemunho de lembranças.
No segundo capítulo, relaciono a proposta temática e metodológica, e os critérios de
seleção das imagens escolhidas, apresentando após uma narrativa construída na análise
imagética das fotografias da Vila de Entre Rios, iniciada com a formação do primeiro núcleo
urbano, a partir do que defino como marco inicial, a Ponte das Garças (1961) e a construção
da Estação Rodoviária da Estrada União e Indústria e das Estações Ferroviárias da Estrada de
Ferro D. Pedro II, depois Central do Brasil e da Leopoldina Railway Company Limited.
No capítulo terceiro, alisto a formação do espaço urbano do então segundo distrito de
Paraíba do Sul/RJ, Entre Rios, percorrendo por todo o período de tempo que perpassa pelos
primeiros movimentos visando à emancipação política e administrativa, até a sua constituição
como município do Estado do Rio de Janeiro, entre o final de 1938 e início de 1939,
privilegiando os principais espaços que foram afetados, transformados ou totalmente
eliminados pelos movimentos que atravessam a sociedade.
Os indivíduos que interagiam através de atividades relacionadas às artes, ao civismo,
as manifestações políticas, ao lazer, aos esportes, ao trabalho e à cultura, são retratados
durante todo o trabalho, mas principalmente neste capítulo, quando procuro entender o lugar
não só dos escravos libertos pela vontade manifestada em testamento da Condessa do Rio
Novo, mas também de seus descendentes, na nascente sociedade urbana da Vila de Entre-
Rios; sujeitos históricos que vivenciaram como grupo (ou grupos) as transformações
ocorridas não apenas nos seus espaços de relação, mas também nas expressões da vida em
sociedade.
Encerro demonstrando o quanto é fundamental desenvolver estudos e reflexões sobre
o material imagético relacionado ao patrimônio material e imaterial urbano e à memória do
tempo inicial dos espaços urbanos de Três Rios, em vias de quase total desaparecimento.
Ressalta-se que as imagens digitalizadas e utilizadas nos capítulos sofreram análises
em inferências que remetem ao assunto tratado no texto em que foram assinaladas –
exemplificando as propostas teóricas apresentadas -, e que abarcam imagens vinculadas ao
objeto Vila de Entre Rios e cidade de Três Rios, fugindo da condição de meras ilustrações,
como infelizmente ainda é comum a muitos na lida com as fotografias.

17
CAPITULO I

Fotografia, História e Memória.

1.1 A fotografia, a memória e a diversidade das fontes históricas.

“Louca ou sensata? A Fotografia pode ser uma ou outra coisa: sensata se


seu realismo permanece relativo, temperado por hábitos estéticos ou empíricos
(folhear uma revista no cabeleireiro, no dentista); louca, se esse realismo é
absoluto e, se assim podemos dizer, original, fazendo voltar à consciência
amorosa e assustada a própria letra do Tempo: movimento propriamente
revulsivo, que inverte o curso da coisa e que eu chamarei, para encerrar, de êxtase
[grifo do autor] fotográfico. Essas são as duas vias da Fotografia. Cabe a mim
escolher, submeter seu espetáculo ao código civilizado das ilusões perfeitas ou
afrontar nela o despertar da intratável realidade.” Roland Barthes 2

O campo de aplicação da fotografia como objeto e fonte historiográfica é


relativamente novo, mas não inexplorado. Ainda apresentam-se em construção caminhos
(distintas linhas de investigação) que pretendem configurar a real dimensão teórica para sua
aplicação. Ana Maria Mauad, Boris Kossoy, Martine Jolly, Peter Burke, Roland Barthes e
Philippe Dubois, são alguns dos autores que, por suas pesquisas e trabalhos, permitem avaliar
que os princípios e metodologias atuais aplicados ao estudo e interpretação dos registros
fotográficos, como fragmentos estáticos de um determinado objeto(s), paisagem(ns),
espaço(s) ou sujeito(s) em seu tempo histórico, tenham presença de importância na formação
de uma narrativa, na qual a memória individual e coletiva se manifestam através da linguagem
imagética.
“Em relação a muitas dessas fotos, era a História que me separava delas. A
história não é simplesmente esse tempo em que não éramos nascidos? Eu lia minha
inexistência nas roupas que minha mãe tinha usado antes que eu pudesse me
lembrar dela. Há uma espécie de estupefação em ver um ser familiar vestido de
outro modo. [destaque do autor] Eis, em torno de 1913, minha mãe em traje de
passeio, gorro, pluma, luvas, tecido delicado que surge nos punhos e na gola, de
um “chique” desmentido pela doçura e simplicidade de seu olhar. É a única vez
que a vejo assim, apanhada em uma História (dos gostos, das modas, dos tecidos):
minha atenção desvia-se então dela para o acessório que pereceu; pois a roupa é
perecível, ela forja para o ser amado um segundo túmulo. Para “reencontrar”

2 BARTHES, Roland. A Câmara Clara. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008, p. 175.

18
minha mãe, fugidiamente, é pena, e sem jamais poder manter por muito tempo essa
ressurreição, é preciso que, bem mais tarde, eu reencontre em algumas fotos os
objetos que ela tinha sobre sua cômoda, uma caixa de pó-de-arroz de marfim (eu
gostava do ruído da tampa), um frasco de cristal bisotado, ou ainda uma cadeira
baixa que hoje tenho perto de minha cama, ou ainda os tecidos de ráfia que ela
dispunha sobre o sofá, as grandes sacolas de que ela gostava (cujas formas
confortáveis desmentiam a idéia burguesa da “bolsa”).
Assim, a vida de alguém cuja existência precedeu um pouco a nossa
mantém encerrada em sua particularidade a própria tensão da História, seu
quinhão. A História é histérica: ela só se constitui se a olharmos – e para olhá-la
é preciso estar excluído dela... [grifo do autor] Para mim, a História é isso, o tempo
em que minha mãe viveu antes de mim [grifo do autor] (aliás, é essa época que
mais me interessa, historicamente).” 3

Neste trecho da sua última obra, Barthes resume, envolvido nas lembranças despertadas
pelas fotografias de sua mãe falecida, a relação do historiador com a sua ciência, com
possíveis fontes e também a condição basilar do nosso ofício.
Diante dos registros imagéticos, ele experimenta a realidade, para a historiografia, da
aplicação na atualidade, das análises e interpretações dos referentes presentes nas imagens
fotográficas. Observa a figura materna apanhada em uma História, por estar vestida com
roupas de outro tempo, um tempo anterior ao da sua relação com a mãe, período que mais o
interessa historicamente, e que também se define na data do registro fotográfico.
Mas para reencontrá-la, a lembrança foi intensificada quando induzido a desviar sua
atenção para os acessórios que a acompanharam na fotografia, ainda vivos e presentes em sua
memória, objetos que definem as particularidades da história de vida de sua mãe. Os objetos
biográficos, entre estes a fotografia, possuem a condição de potencializar memórias,
permitindo o recordar das experiências de vidas.
Os objetos biográficos são construções do mundo material que incorporam
experiências de vida do seu possuidor. Como fonte de descobertas, o objeto
biográfico ancora memórias que estimulam performances narrativas do
colaborador. O significado biográfico dado ao objeto é efetivado na presença
constante deste elemento material na vida de seus proprietários. 4

3 Ibidem, p. 96 a 98.
4 ALMEIDA, Juniele Rabelo. Objeto Biográfico e Performance Narrativa: Questões para História Oral de
Vida. Disponível no site: http://neho.vitis.uspnet.usp.br/images/stories/PDFs/juniele.pdf. Acesso em: 09 de jan.
2012.

19
As imagens no referente fotográfico conduzem Roland Barthes a percebe-se nítida e
conscientemente distante no tempo e no espaço, era a História que o apartava no minuto
recente e real, do momento efetivado em cada fotografia.
O tempo funciona como um dos elementos que definem a condição de pertencimento de
um fato ou objeto à história, é o que se apresentou para este autor no axioma “antes de mim”
[grifo nosso], sendo necessário que o olhar do historiador esteja excluído do tempo histórico
estudado, anterior à sua existência. Na atualidade, mesmo a História do tempo presente
percorre um campo de pesquisa onde o evento ou objeto pesquisado encontra-se pelo menos a
alguns passos no passado.
“Somente a História e a consciência histórica podem introduzir a necessária
descontinuidade entre passado e presente: História, com efeito, é a ciência da diferença.”
(MENEZES, 1992, p. 4)
Os estudos com relação ao passado são determinados pelas marcas da temporalidade, o
historiador encontra um tempo diverso em vários aspectos daquele em que está inserido,
podendo ocorrer inversões às representações originais de objetos históricos analisados, o que
também remete aos limites da abordagem historiográfica que relaciona apenas fatos e eventos
no decorrer de um tempo homogêneo, definidor de uma improvável e fechada verdade
histórica.
A impressão que permanece é a de que o historiador estará sempre a percorrer caminhos
anteriores a sua própria experiência, porque como “as flores [que] dirigem sua corola para o
sol, o passado, graças a um misterioso heliotropismo, tenta dirigir-se para o sol que se levanta
no céu da história.” (BENJAMIN, 2008, p. 224)
Nos registros que se seguem, o exemplo das fotografias como representação das
particularidades da história de uma vida, transpassa para a inserção de individualidades em
manifestações sociais representativas de uma determinada comunidade.
De meados dos anos quarenta até o final dos anos cinqüenta, o rádio no Brasil
alcançaria seu auge com os programas de auditório, sendo a Rádio Nacional a principal
empresa radiofônica desse período. A “Hora do Pato” foi um dos seus programas mais
populares, ocorrendo apresentação nos municípios do interior do Estado do Rio, como
naquele ano 1956 em Três Rios. Além do programa de calouros com os cantores da cidade,
havia a apresentação de artistas famosos contratados da Rádio Nacional.
Na edição nº 32 do Jornal “A Tribuna de Três Rios”, do acervo da Casa de Cultura da
cidade, encontra-se escrito:

20
Fotografia 3: Tomada interna, registrando o publico presente no Clube Atlético Entre-Rios - CAER
durante a apresentação do programa “A Hora do Pato”, realizado em 14 de dezembro de 1956, em
comemoração ao aniversário de emancipação do Município de Três Rios. Fotografia do acervo Rádio Três Rios
5, com fotógrafo desconhecido.

“No ano passado o Governo Municipal realizou grande festividade em


comemoração a data [emancipação da cidade], com a colaboração da Rádio Três
Rios, para qual foi convidada e aqui compareceu o maior programa popular da
radiofonia brasileira, A HORA DO PATO, em apresentação gratuita na sede do
Clube Atlético Entre-Rios. Era desejo do chefe Executivo Municipal [Prefeito
Joaquim Ferreira], realizar, também este ano, festa idêntica que seria oferecida ao
povo, de preferência em uma das praças de esporte da cidade, entretanto, razões
de ordem econômica, tão conhecida de todo o povo através dos balancetes

5 RÁDIO TRÊS RIOS, empresa de radiocomunicação fundada em 27.11.1947, pelo Sr. Elias Jorge, precursor da
radiofonia em Três Rios. Atualmente, ainda sob a administração da família Jorge, a Rádio Três Rios,
transmitindo na sintonia AM 1150 KHZ, ampliou o ramo de comunicação do grupo com as emissoras FM 89,7 -
Antena 1 e Canal 5 de TV por cabo. Empresa sempre presente nas manifestações políticas, culturais e sociais do
município, tem grande importância na história da radiofonia da região.

21
municipais periodicamente publicados, impede-nos de levar avante o seu intento”.
6

Barthes sentiu uma “espécie de estupefação” diante da imagem de sua mãe, em


registros fotográficos de um tempo em que ele mesmo não existira, e eu, uma grande surpresa,
após reconhecer inicialmente nas imagens o meu avô Mario de Castro Reis (emancipacionista
e Presidente da Câmara de Vereadores de Três Rios no período de 1955/1959) – ao seu lado o
amigo e companheiro político, Drº Otávio Freitas (Presidente da Câmara de Vereadores no
período de 1947/1949), e a minha avó, Zeni Reis e depois, ao seu lado, a jovem que anos mais
tarde seria a minha mãe, Marlene Reis Mattos. (Nas fotografias 3 a 5, da direita para
esquerda, circundados de amarelo).

Fotografia 4: Segundo registro do espaço interno do principal salão do Clube Atlético Entre-Rios –
CAER, permitindo observar o grande público presente. Fotografia do acervo Rádio Três Rios, de 14 de
dezembro de 1956, sem autor conhecido.

Estas fotografias eram desconhecidas de todos nós familiares de Marlene, encontrei-as


em minhas pesquisas no acervo da Rádio Três Rios. Inicialmente, ela não conseguiu localizar,

6 19 ANOS de vida autônoma. Tribuna de Três Rios, Três Rios/RJ, Ano I, nº 22, de 13 de dezembro de 1957,
capa.

22
em sua memória, informações quanto à data e o que estava fazendo no Clube Atlético Entre-
Rios, reconhecido pelo seu salão principal. Lembrava-se apenas que era comum a
apresentação de cantores e artistas contratados pela rádio para eventos, como se observa,
sempre bastante populares. Segundo os arquivos da empresa, as fotografias foram realizadas
em 14 de dezembro de 1956, durante a apresentação do Programa “A Hora do Pato” da Rádio
Nacional; minha mãe estaria então com 16 anos.

Fotografia 5: Terceira e última imagem do espaço interno, registro realizado de um outro ângulo,
permitindo perceber parte das dimensões do salão do CAER e a presença de um público composto de homens,
mulheres, jovens e crianças. Nesta fotografia, a jovem Marlene Reis parece voltar sua atenção para o seu pai,
ao olhar para trás. Do acervo Rádio Três Rios, sem fotógrafo conhecido, registro de 14 de dezembro de 1956.

As feições de meus avós encontram semelhança com as imagens anotadas na


memória, mas esta jovem, na verdade, apesar de reconhecê-la na figura materna, não a havia
percebido, porque não vivenciei na minha existência uma relação direta com ela. Nas
lembranças que trago na memória não havia uma moça como esta, eu a desconhecia. A
fotografia guardou em seu referente uma imagem que agora permite, não só pela semelhança
na aparência, mas também por tudo que está sedimentado como conhecimento ligado aos

23
signos e índices relativos à juventude e especificadamente, a maternidade e a relação de amor
e admiração, ser incorporada a todas as memórias que possuo sobre minha mãe.
As memórias e as lembranças são constituídas nas experiências de relações sociais e
por diversas formas de percepção destas experiências, bem como de fatos e situações do
cotidiano, podendo ocorrer entre sujeitos no mesmo tempo ou em tempos e espaços distintos.
As fotografias também são lugares de lembrança das experiências de outros, que
permanecem “vivas” no referente fotográfico, possibilitando não só uma leitura rememorativa
de fatos e ações dos sujeitos históricos em seu tempo, mas também, através do olhar
investigativo e interpretativo no presente, delinear as lembranças que se fazem comuns.
Enquanto lugar de lembranças, a fotografia permite percorrer não só os espaços da
memória das pessoas que se relacionam diretamente com indivíduos, objetos e paisagens
referenciadas na imagem, pelas semelhanças com as “imagens mentais arquivadas” na
memória (Barthes reencontra a mãe ao reconhecer nas fotografias objetos de seu uso diário);
mas também observar e descobrir muito além do que o fotógrafo no ato fotográfico, em seu
instante de elaboração, captou em seu olhar, consentindo o encontrar e o compartilhar de
memórias, lembranças e mesmo do que permanecia esquecido, oculto, dependendo da
particularidade em que se forjou o olhar do Spectator 7; proporcionando “à mente condições
de formar uma idéia relativa a algo já vivenciado ou, caso se trate de uma informação nova,
fazer com que o interlocutor consiga imaginar, ou seja, formar imagem mental”.
(HAGEMEYER, 2011, p. 43)
“O objetivo último do historiador será sempre o de produzir com maior
êxito essas imagens mentais, em fazer imaginar experiências históricas não
vivenciadas, ou vivenciadas no nível micro de nossa vida individual: como foi,
como é, o que mudou; qual foi a dimensão dessa mudança; por que somos assim
ou temos essas atitudes, valores, crenças; e em que momento elas se tornaram
relevantes em comparação com as daqueles que viveram no passado. Imaginamos
estar inseridos em relações sociais que são representadas por meio de imagens e
difundidas no imaginário. (BACZO,1985). O historiador intervém na imaginação
histórica quando vasculha momentos de ruptura e constata recorrências e
continuidades. Ao fazê-lo, entra em um mundo perdido e o imagina: como terá

7 “Observei que uma foto pode ser objeto de três práticas (ou de três emoções, ou de três intenções): fazer,
suportar, olhar. O Operador é o Fotógrafo. O Spectator somos todos nós, que compulsamos, nos jornais, nos
livros, nos álbuns, nos arquivos, coleções de fotos. E aquele ou aquela, que é fotografado, é o alvo, o referente,
emitido pelo objeto, que de bom grado eu chamaria de Spectrun da Fotografia, porque essa palavra mantém,
através da sua raiz, uma relação com o “espetáculo” e a ele acrescenta essa coisa um pouco terrível que há em
toda fotografia: o retorno do morto.” BARTHES, Roland, op. cit. p. 20.

24
acontecido? Como aqueles homens viviam, trabalhavam, sentiam, estavam
informados do que ocorria em outros lugares? 8

Fotografia 6: Vista externa do Café Rio Branco na Av. Condessa do Rio Novo, centro de Três Rios/RJ.
Fotografia da década de 20 do acervo Sr. Altair 9, sem autor conhecido.

O olhar que o historiador institui movido pelo objeto e tema a ser estudado, pelo evento
a ser pesquisado, com a finalidade de elaborar a escrita da História, inicia-se em sua própria
imaginação, formulando questões e hipóteses, situações e histórias, ampliando o campo de
suas indagações. Desta forma, motivado, sentindo mesmo uma paixão pelo trabalho a ser
desenvolvido, gera conflitos que o movimentam e estimulam a superar os obstáculos
encontrados no processo de despertar os mortos e os esquecidos da história, juntando e
analisando os seus fragmentos. Nesta tarefa, o pesquisador deve se posicionar sempre
excluído da História, pois é o agente do presente; o tempo do historiador é “saturado de
“agoras””. (BENJAMIN, 2008, p. 229)

8 HAGEMEYER, Rafael Rosa. Representar a história através de imagens: entre a reconstituição e a analogia.
In Imagem em Debate, GAWRYSZEWSKI, Alberto, organizador. Londrina/PR: Eduel – Editora da
Universidade Estadual de Londrina; Londrina, 2011, p. 43 - 44.
9 Ver: anexo “biografia”, p 219.

25
“Nos últimos tempos, os historiadores têm ampliado consideravelmente
seus interesses para incluir não apenas eventos políticos, tendências econômicas e
estruturas sociais, mas também a história das mentalidades, a história da vida
cotidiana, a história da cultura material, a história do corpo, etc. Não teria sido
possível desenvolver pesquisa nesses campos relativamente novos se eles tivessem
se limitado a fontes tradicionais, tais como documentos oficiais produzidos pelas
administrações e preservados em seus arquivos.” 10

É esta História - que acolhe uma variedade de vestígios e testemunhos proporcionais


às ações humanas no tempo histórico; objetos, textos, imagens, sons (relatos da história oral e
mídias fonográficas, por exemplo) - que permite ao historiador da atualidade conhecer o
passado ou entender a contemporaneidade de nossas relações sociais.
Assim percebe-se na fotografia da página anterior. Esta conduz o historiador a
imaginar uma série de indagações e possíveis análises, principalmente no trato das
manifestações populares, observando-se na imagem algumas presenças e ausências. Homens e
crianças junto à representação de uma bebida, que segundo o Srº Altair Tavares, seria de uma
cerveja fabricada na própria cidade. Tem-se aqui o registro da inauguração deste objeto?
A atenção volta-se naturalmente para o plano central da fotografia, com o homem
abaixado em frente à “grande garrafa”, e para a criança colocada no alto, segurando um copo
de cerveja (?), o que por si só representa diferenças com relação ao comportamento social na
atualidade. Por suas roupas e aparência, percebe-se a representatividade econômica e étnica
de todos os registrados. Não existe nenhuma mulher entre os presentes.
Contemplados no início da História como disciplina acadêmica, com uma pesquisa
historiográfica onde se admitia apenas os “papeis velhos oficiais” como documento, e em
decorrência, encurtando-se o campo de atuação desta ciência, experimenta-se, atualmente,
uma História (ou Nova História, e neste campo, a História Cultural) em que o domínio deste
conhecimento permite utilizar, “cada vez mais, de uma gama mais abrangente de evidências,
na qual as imagens têm o seu lugar ao lado de textos literários e testemunhos orais.”
(BURKE, 2004, p. 11)
Discutir o que é fonte histórica significa, na atualidade, estabelecer o que deve e o que
não deve ser analisado pela historiografia, porque qualquer vestígio se “transforma” em fonte
de pesquisa histórica, pela vontade do historiador. É o “olhar” para as ruínas e os fragmentos,
e privilegiar o que realmente poderá testemunhar o que aconteceu. Assim o passado e a

10 BURKE, Peter. Testemunha Ocular: História e Imagem. 2. ed. São Paulo/SP: EDUSC. 2004, p. 16.

26
história que relata este passado serão sempre o que foi escolhido, não omitido, o interpretado
de acordo com o pensamento e os critérios metodológicos desta ou daquela ciência, a leitura
imposta ao evento ou fato histórico, podendo haver sempre testemunhos transversais ao
observado e aceito anteriormente.
As fontes encontradas por si mesmas não são a história ou o fazer e conhecer a
história, mas os elementos que permitem a construção do conhecimento. Estes fragmentos
permanecem como pontes de referência às memórias principalmente dos vencedores, estando
mais próxima ao olhar do investigador do que os lugares de lembrança dos vencidos, que são
submetidos à sombra, aos lugares de esquecimento.
O historiador – no campo da História Cultural – que se propõe a uma construção
histórica por meio da análise dos significados e representações contidas nas diversas fontes,
deve cuidar para identificar as articulações entre o que sobrevive como memória voluntária e
consciente, como ação dos homens, e os fatores inconscientes desta, quase sempre incógnitos,
que a circunscrevem e a restringem; a memória involuntária.

Fotografias 7 e 8: Vista externa da passagem da imagem de Nosso Senhora Aparecida pela cidade de
Três Rios/RJ, em fevereiro de 1959, do acervo Rádio Três Rios, com fotógrafo desconhecido.

Proust, segundo Odete Dourado, tenta na sua obra “Em busca do tempo perdido”,
salvar a vida e as sensações do transcurso do tempo, apoiando-se na memória, dividindo esta
em voluntária e involuntária: a primeira oferece aspectos falsos do passado, fragmentados e

27
esparsos, por pertencer à inteligência, à consciência; a segunda, por se fazer no inconsciente,
pela atração que um momento exerce sobre o outro, permanece submersa no esquecimento até
que um pequeno elo de similaridade entre o passado e o presente desencadeie movimentos na
memória, que trazem para o presente todo um segmento de eventos contíguos. A memória
involuntária “não nos faz reviver o passado enquanto tal, mas oferece-nos a realidade em toda
a sua inteireza: o passado em toda a sua forma e solidez restaurado no presente.”
(DOURADO, 2005)
Entendo assim que no fazer historiográfico é possível recorrer-se à memória, sendo
esta descortinada para o futuro com o conhecimento histórico. A fotografia de qualquer tempo
funciona como um dos elementos que retoma no presente, as relações vividas pelos seres que
participaram de uma mesma época, experiências-depoimentos às vezes conflitantes entre
indivíduos, mas possíveis de serem compartilhadas em qualquer tempo, apresentando, no
instante do presente vivido, o que está sedimentado na memória inconsciente, que, para
Marcel Proust, apresenta-se com a marca da autenticidade. É possível colher uma quantidade
de informações sobre fatos e experiências passadas dos depoimentos de indivíduos,
importando ao historiador fazer emergir destes testemunhos uma visão de mundo.

Fotografia 9: Vista externa da Igreja Matriz de São Sebastião na saída da procissão em homenagem a
Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil para os católicos. Fotografia do acervo Rádio Três Rios, de
fevereiro de 1959, sem autor conhecido.

28
Nas imagens sequenciadas a partir das fotografias da página 27 até a 32, tem-se uma
narrativa que demonstra as complexidades de um acontecimento popular religioso, na
sociedade trirriense, realizado em fevereiro de 1959: a procissão organizada pelo Srº José
Pinto teve seu início na Igreja Matriz de São Sebastião, percorrendo as ruas da cidade,
chegando ao 3º Depósito da Estrada de Ferro Central do Brasil, onde foi sagrada a capela em
homenagem a Nossa Senhora Aparecida.
A capela fica a alguns metros da entrada do 3º Depósito, local onde atualmente
funciona a empresa T´Trans, possuindo uma espécie de concha, pintada internamente de azul
e um altar. Fiéis, representantes de todas as camadas da população, crianças, homens de terno
e gravata, jovens e mulheres vestidas adequadamente para esta importante celebração, espaços
de relação social e as manifestações e símbolos de fé: eis o que se vislumbra nas imagens.

Fotografia 10: Vista externa da concentração popular quando da sagração da capela em homenagem
a Nossa Senhora Aparecida, no antigo 3º Depósito da E. de F. Central do Brasil, em Três Rios/RJ. Fotografia
do acervo Rádio Três Rios, de fevereiro de 1959, sem autor conhecido.

No ato fotográfico, o fotógrafo expressa suas experiências vividas como sujeito em


seu tempo histórico, sua cultura, seus conhecimentos, seus interesses e, também, suas técnicas
no lidar com a construção imagética. Mas como estas, todas as fotografias são testemunhos
que avançam os limites da memória de seu autor; são depositárias das memórias involuntárias
e coletivas de todos os indivíduos que permanecem perpetuados neste objeto bidimensional,

29
privilegiando a articulação da História como conhecimento da vida social, cotidiana, dos
sujeitos e da sociedade em que estão inseridos.
É muito provável, na profusão de imagens que se encontram na atualidade, terem-se
dois ou mais olhares criadores do ato fotográfico, sobre um mesmo evento, pessoas,
paisagens, objetos, espaços, que, como ação dos sujeitos históricos, demonstrem interesses e
ângulos diferenciados, revelando parcelas diversas da realidade, colhendo-se pontos de
percepção múltiplos, às vezes contrapostos, uma recomposição constante de dados e imagens.
O campo teórico e metodológico da História Cultural e seu trato com a diversidade das
fontes historiográficas se alistam ao campo (ainda em construção) da Memória,
principalmente com relação ao que Ecléa Bosi define como “substância social da memória”
(BOSI, 2004, p. 16), por entender que não se pode mais identificar a memória como um
método parcial e limitado de recordar fatos passados, servindo como simples auxiliar para as
ciências humanas. A memória se baseia na construção de referenciais de distintos grupos
sociais, sobre as experiências vividas anteriormente e no presente, respaldados nas tradições e
atrelado a mudanças culturais. (CHIOZZINI, 2000)

Fotografia 11: Vista externa da chegada da procissão em homenagem a Nossa Senhora Aparecida, no
antigo 3º Depósito da E. de F. Central do Brasil, em Três Rios/RJ. Fotografia do acervo Rádio Três Rios, de
fevereiro de 1959, sem autor conhecido.

30
“... a memória enquanto processo subordinado à dinâmica social
desautoriza, seja a idéia de construção no passado, seja a de uma função de
almoxarifado desse passado. A elaboração da memória se dá no presente e para
responder a solicitações do presente. É do presente, sim, que a rememoração
recebe incentivo, tanto quanto as condições para se efetivar [...]” 11

A fotografia como fonte historiográfica e testemunho de memória, privilegiada como


um lugar de lembrança relacionada a todas as representações a ela associadas, sejam história
de vidas, sejam monumentos arquitetônicos – ajuda a libertar o historiador da velha obsessão
pela linguagem realista como simulacro da verdade, por ser um objeto portador de sentidos,
recebendo do presente a sua interpretação e análise.
Fatos e paisagens, espaços urbanos de relação, desaparecem quando não existe
interesse em rememorá-los, porque houve perda de valor para determinado grupo ou
coletividade, ou porque não existe nenhum meio de restituir sua imagem.

Fotografia 12: Vista externa da missa de inauguração da capela em homenagem a Nossa Senhora
Aparecida, realizada no antigo 3º Depósito da E. de F. Central do Brasil, em Três Rios/RJ. Fotografia do
acervo Rádio Três Rios, fevereiro de 1959, sem autor conhecido.

11 MENEZES, Ulpiano T. Bezerra de. A História, cativa da memória? Para um mapeamento da memória no
campo das Ciências Sociais. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), São Paulo, 1992, n. 34, p. 4.

31
Inegavelmente, apresenta-se como uma mudança pertinaz à ciência histórica o
abandonar definitivo do tempo teórico onde o documento oficial detinha o valor de verdade,
cabendo ao historiador extrair deste “corpo” todo conhecimento possível, não acrescentando
informação alguma que neste não se encontre. Com base neste pensamento, o historiador
positivista era ou é aquele que se posicionava ou posiciona o mais chegado possível aos textos
oficiais, construindo uma história metódica e factual, que se concentra no estudo de "grandes
eventos históricos" e "grandes personalidades". Por este motivo, que “a comunidade de
praticantes da historiografia metódica entendia que a imagem fotográfica não preenchia os
requisitos necessários para ser considerada fonte de pesquisa histórica. Percebida como uma
anomalia, foi deixada de lado.” (BORGES, 2008, p. 17)

Fotografia 13: Vista externa da capela em homenagem a Nossa Senhora Aparecida, atualmente no
pátio da empresa T´Trans, em Três Rios/RJ. Fotografia do acervo André Mattos, de 13 de janeiro de 2012.

O fato de se estar utilizando na atualidade as representações fotográficas como objeto


e fonte em pesquisas diversas, é fruto da mudança dos conceitos historiográficos que
ocorreram com a presença da corrente francesa dos Annales, na década de 1920, que
inegavelmente proporcionaram os passos mais consistentes para a diversificação do uso das

32
fontes, não deixando totalmente de lado os documentos escritos, mas ampliando os seus
domínios. Os Annales, no entanto, privilegiaram uma história serial, enquanto os estudos de
memória valorizam a narrativa e o testemunho dos indivíduos, sendo este o ponto de
divergência entre esta e a corrente da História Cultural.
A análise teórica neste trabalho privilegia a concepção da fotografia como lugar de
lembranças, testemunho e ponto de referência à memória individual ou coletiva, possível de
realizar-se, porque vivemos um momento onde as teorias e ideologias diversas da
historiografia, em especial a Nova História Cultural, e das demais ciências sociais, convivem
e dialogam, apesar dos reconhecidos e naturais conflitos.
A fotografia projeta-se como instrumento de pesquisa multidisciplinar, contribuindo
para elaboração de conhecimentos diversos em todas as áreas do pensamento humano. Sua
capacidade de, por meio de seus referentes, assemelhar-se ao real, de vencer o tempo
preservando o instante do ato fotográfico e de proporcionar um redimensionamento de
memórias, referendado no presente quanto à sua consolidação, apresenta-se como indicador
empírico para a constituição do conhecimento de fenômenos relevantes e credores de análise.

Fotografia 14: Vista externa do grupo de políticos, na sua maioria, representantes das cidades de Bom
Jesus de Itabapuana e Entre-Rios, após reunião na Assembléia do Rio de Janeiro, em Niterói, que concedeu a

33
emancipação a estes dois municípios. Não encontrada a fotografia original, de 14 de dezembro de 1938,
reproduzo a imagem impressa no jornal O Cartaz, de 11 a 17 de dezembro de 1971, Ano I nº 15, p. 2, sem autor
conhecido, acervo André Mattos.

Registros fotográficos existem que integram de maneira efetiva determinados fatos e


eventos, que pela dimensão de atuação das ciências humanas por meio de projetos e
pesquisas, encontram-se entre os de maior importância para a história de um povo ou de uma
nação, ou de um determinado grupo social. É o caso da imagem anterior, representativa do
momento final dos processos de emancipação política e econômica das cidades de Entre-Rios
e Bom Jesus de Itabapuana.
Utilizada pelos jornais da cidade em diversos momentos comemorativos da data da
emancipação, a reprodução da imagem vem sendo caracterizada nestes anos por valorizar o
movimento e alguns dos seus representantes. Destacado na imagem (1) o Dr. Walter Gomes
Francklin, um dos principais emancipacionistas e o primeiro prefeito da cidade, e ao seu lado
esquerdo, o interventor do Estado do Rio de Janeiro, Ernani do Amaral Peixoto; junto a este,
o representante de Bom Jesus de Itabapuana, o tenente-coronel Fernando Lopes da Costa. Do
lado direito do Dr. Walter Francklin, o emancipacionista José da Silva Vaz, comerciante em
Entre-Rios, seguido do Padre Melo (vigário de B. J. de Iabapoana) e Avelino Ribeiro,
proprietário da Alfaiataria e Camisaria Rio, em Entre-Rios.
É possível interpretá-la de maneiras diversas, por exemplo: questionando o porquê de
não haver entre os indivíduos nenhum que pertença à etnia negra; e qual a relação dos
representantes militares e religiosos que aparecem na imagem, nos referidos processos. O
embasamento a estas questões está relacionado às escolhas conduzidas por estímulos
aplicados na configuração do que deve ser esquecido, e o que e como deve ser lembrado,
remetendo ao poder relacionado à memória, ao esquecimento, e principalmente a sua função
definidora de uma identidade social e coletiva, elaborada pelas ideologias várias, formadoras
de uma história oficial.
Pela aceitação da diversificação das fontes enquanto fragmentos/documentos,
vestígios e testemunhos no fazer/conhecer histórico pelas escolas historiográficas modernas,
observa-se que “documentos oficiais, como testamentos e inventários ou os registros
paroquiais e civis, bem como materiais produzidos pelo Poder Judiciário e pelos órgãos de
repressão” (PINSKY e DE LUCA, 2009, p. 7), as fontes imagéticas (estáticas ou
cinematográficas) e sonoras, são contempladas com estudos e artigos que visam à formulação
de metodologias para análise e aplicação destas na construção dos fatos históricos.

34
No posfácio “História Cultural no século XXI” do livro “O que é História Cultural?”
Burke afirma:
“Hoje, parece que quase tudo tem sua história cultural escrita. Para citar apenas
os títulos ou subtítulos de alguns livros publicados desde 2000, há histórias culturais de:
calendários, causalidade, clima, cafés, espartilhos, exames, pelos faciais, medo, impotência,
insônia, cogumelo mágico, masturbação, nacionalismo, gravidez, objetos e tabaco. O
conceito de “revolução cultural” foi estendido, da China dos anos 1960 para outros lugares
e tempos, inclusive Rússia e México nos anos 1920 e até Roma e Atenas na Antiguidade.” 12

Que se critiquem alguns temas e objetos pesquisados em sua relevância, mas esta
amplitude temática somente se configurou na atualidade pela aceitação e utilização de
diversas e novas fontes historiográficas, e entre estas, a fotografia, permitindo aos
historiadores percorrerem por novos caminhos.
“Já foi dito que as imagens são históricas, que dependem das variáveis técnicas e
estéticas do contexto histórico que as produziram e das diferentes visões de mundo que
concorrem no jogo das relações sociais. Nesse sentido, guardam as fotografias, na sua
superfície sensível, a marca indefectível do passado que as produziu e consumiu. Um dia já
foram memória presente, próxima àqueles que as possuíam, as guardavam e colecionavam
como relíquias, lembranças ou testemunhos. No processo de constante vir a ser recuperam o
seu caráter de presença, em um novo lugar, em um outro contexto e com uma função
diferente. Da mesma forma que seus antigos donos, o historiador entra em contato com este
presente/passado e o investe de sentido, um sentido diverso daquele dado pelos
contemporâneos da imagem, mas próprio à problemática ser estudada. Aí reside a
competência daquele que analisa imagens do passado: no problema proposto e na
construção do objeto de estudo. A imagem não fala por si só é necessário que as perguntas
sejam feitas.” 13

É por este caminho teórico da relação da fotografia com a história, em que o registro
fotográfico supera a condição de fonte historiográfica, adentrando, pela análise interpretativa
de seus referentes, à qualidade de testemunho de memória, que construo este trabalho. De
memória concernente a um momento no passado, interpretada no hoje pelas diferentes visões
de mundo que concorrem no jogo das relações sociais, ao lugar de lembranças, e ainda mais
atual, na organização de um “lugar de lembrança virtual” de uma memória individual e

12 BURKE, Peter. O que é História Cultural? Rio de Janeiro/RJ: Jorge Zahar Editor Ltda, 2. ed. (revista e
ampliada), 2008, p. 165.
13 MAUAD, Ana Maria. Através da Imagem: Fotografia e História Interfaces. Disponível no site:
http://www.historia.uff.br/tempo/artigos_dossie/artg2-4.pdf. Acesso em: 21 de abr. 2010.

35
coletiva, as aplicações teóricas dos estudos da fotografia nos conduzem a aceitação e
utilização da mesma como fonte historiográfica.
A imagem fotográfica de qualquer Spectrun não se distingue do seu referente, pois
ambos são estáticos, concedendo à fotografia, por suas próprias características enquanto
objeto ou fonte historiográfica, a condição de um testemunho/documento; tornando-a assim
capaz de sofrer análise e interpretação não só das identidades, ações e representações sociais e
culturais de distintos grupos em diferentes períodos históricos, mas, também, do patrimônio
cultural material dos espaços urbanos e de suas transformações, aproximando-nos mais do
real que foi um dia.
Fotografias apresentarão sempre seu referente em sua imagem. As motivações e
condições sociais, culturais e econômicas que conduziram o Operator à produção do registro
fotográfico se perdem em algumas, como ocorre com inúmeros objetos fotográficos em poder
de particulares, em sebos, em arquivos públicos ou digitalizados e expostos em diversos sites
na Internet.
As pessoas, objetos, paisagens e espaços físicos retratados, em sua maioria não mais
existem em nosso mundo real, mas os referentes em suas imagens permanecem apenas
esquecidos, aguardando que o olhar do historiador no presente lhes conceda a condição de
renascidos, enquanto memórias retornando à “vida”, graças a essa “teimosia do referente em
estar sempre presente... em suma, o referente adere.” (BARTHES, 2008, p. 15-16)
Qualquer contextualização aplicada por um historiador ou pesquisador das outras
ciências humanas, estará íntima e irreversivelmente correlacionada a uma opinião
manipuladora com a temática pesquisada, será sempre um olhar do homem da ciência na
atualidade, sob os fatos do passado em busca de uma interpretação e da construção do
conhecimento.
Barthes (2008, p. 19) escreveu: “Aceitei então tomar-me por mediador de toda a
Fotografia: eu tentaria formular, a partir de alguns movimentos pessoais, o traço fundamental,
o universo sem o qual não haveria Fotografia.” É possível considerar que este autor não
conseguiu seu intento, mas é intensamente discutível não avaliar, na atualidade, a importância
de suas observações e análises que, somadas a outros estudos, permitem descortinar novos
caminhos para a construção historiográfica e sua relação com a memória, utilizando-se das
fontes visuais.

36
1.2 - O “Angelus Novus”

“Minhas asas estão prontas para o vôo,


Se pudesse, eu retrocederia
Pois eu seria menos feliz
Se permanecesse imerso no tempo vivo.”
Gerhard Scholem, Saudação do Anjo. 14

Ao analisar semioticamente o quadro de Paul Klee, Angelus Novus, Benjamin afirma


que este...
“Representa um anjo que parece querer afastar-se de algo que
ele encara fixamente. Seus olhos estão escancarados, sua boca
dilatada, suas asas abertas. O anjo da história deve ter esse aspecto.
Seu rosto está dirigido para o passado. Onde nós vemos uma cadeia
de acontecimentos, ele vê uma catástrofe única, que acumula
incansavelmente ruína sobre ruína e as dispersa a nossos pés. Ele
gostaria de deter-se para acordar os mortos e juntar os fragmentos.
Mas uma tempestade sopra do paraíso e prende-se em suas asas com
tanta força que ele não pode mais fechá-las. Essa tempestade o impele
irresistivelmente para o futuro, ao qual ele vira as costas, enquanto o
Fotografia 15: Angelus
Novus de Paul Klee – amontoado de ruínas cresce até o céu. Essa tempestade é o que
imagem disponível em
diversos site na internet. chamamos progresso.” 15

O passado é estudado com atenção pelos historiadores, temos nossos olhos, quando em
investigação, voltados para ele, mas a História não é apenas uma ciência que indaga o
FotografiaGiovanni
passado. 1: Levi afirma que: “Ela é uma contínua reconstituição da realidade, mas nós
Fazenda
Capoeirinha em Chiador/MG,
pertencia aos
sabemos quebisavós do meu sempre nos escapará, sempre será mais rica do que podemos
a realidade
pai, Marcelino José da Costa e
Maria Cherobina
imaginar... de Castro
a História é uma ciência da busca infinita. Este é o grande fascínio da profissão de
Mattos, não tendo hoje o
historiador.”
registro da data(LEVI,
em que ela foi p. 35) E, se me é permitido acrescentar, a beleza e a arte da nossa
2009,
reproduzida. Observa-se
interessante distribuição das
ciência.
pessoas deixando claro uma
divisão Existem
hierárquicaincontáveis
social, com “ruína sobre ruína” que clamam serem reviradas e reerguidas, ou
os trabalhadores postados
atrás, emosparte, possíveis
revistas para que o historiador atente apropriar no presente às reminiscências das
proprietários e seus familiares
(com crianças
ações e mulheres)
dos sujeitos à
históricos de outros tempos. Estas desaparecem ou são esquecidas por
frente e dois homens a cavalo
logo atrás destes. Destaque
14para a mulher aoGerhard.
SCHOLEM, centro daSaudação
foto do Anjo, apud BENJAMIN, Walter. Sobre o Conceito da História, in Walter
e em posição intermediária
Benjamin – Obras Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP: Brasiliense. 11.
entre os dois grupos, vestida de
Reimpressão, 2008, p. 226.
forma a demonstrar uma
15posição
Ibidem.de serviçal, estando ao
lado de um possível carrinho
de bebe. Esta imagem 37
possibilita interessante análise
sobre as questões das divisões
sociais a época.
perda de valor, são vestígios daquilo ou daqueles que não mais existem, do que não está
presente; deseja-se como o Anjo de Benjamin, “acordar” os mortos e conhecer suas vidas.
Mas o que o Anjo encara fixamente, parecendo querer se apartar (por ser talvez
impossível um encontro?) com seus “olhos escancarados, sua boca dilatada e suas asas
abertas”? (BENJAMIN, 2008, p. 226) O que estaria relacionado com o passado, com as
ruínas, os fragmentos, o tempo e com os mortos, mas que permanece sempre presente?
Ele afronta a Memória. Seja individual ou coletiva, preservada no esquecimento (par
dialético da lembrança) e na lembrança, “momento objetal da memória” (RICCEUR, 2010, p.
23), e de alguma maneira sempre presente em espaços e ações do homem, enquanto ser social
e histórico. Citado por Ecléa Bosi, P. Nora afirma: “A memória se enraíza no concreto, no
espaço, gesto, imagem e objeto”. (BOSI, 2004, p. 16)
Michael Löwy 16 escreve que esta é a tese mais conhecida de Benjamin, que se oferece
como comentário de um quadro de Paul Klee 17; o que foi escrito tem pouca afinidade com o
quadro, “trata-se fundamentalmente da projeção de seus próprios sentimentos e ideias sobre a
imagem sutil e despojada do artista alemão.” (LÖWY, 2007, p. 88) Aplicada após a sua
publicação em variados contextos e estudos, esta tese é uma alegoria, considerando que seus
elementos não possuem além do texto, o sentido que de propósito lhes é atribuído pelo autor.
“Walter Benjamin não é um escritor como outros: sua obra fragmentada, inacabada, às
vezes hermética, freqüentemente anacrônica e, no entanto, sempre atual, ocupa um lugar
singular, realmente único, no panorama intelectual e político do século XX”. (LÖWY, 2007,
p. 13) Ao utilizar este autor nas minhas reflexões, desejo apropriar-me de alguns dos seus
pensamentos, considerando-os fundamentais na análise da temática objeto deste trabalho, a
saber: o conceito de tempo como o “tempo-de-agora” [Jetztzeit], esse real instante que
interrompe o contínuo linear da história, a própria concepção da descontinuidade da história e
o “princípio da distância”, apreciação que surge na definição de aura, construído numa trama
entre o espaço e o tempo.
“A recepção de Benjamin, principalmente na França, estava voltada
prioritariamente para a vertente estética de sua obra, com certa tendência a
considerá-lo sobretudo um historiador da cultura. Ora, sem negligenciar esse
aspecto de sua obra, é preciso reconhecer o alcance muito mais amplo de seu
pensamento, que visa nada menos do que uma nova compreensão da história

16 Ver: anexo “biografias”, p. 267.


17 Ver: anexo “biografias”, p. 268 e 269.

38
humana... Sua reflexão constitui um todo no qual arte, história, cultura, política,
literatura e teologia são inseparáveis.” 18

Mas qual é a História capaz de dialogar com a Memória e que entendo se apresenta na
conceituação de Benjamin quando afirma que esta transforma a imagem do passado em coisa
sua? Deste...
“... passado que traz consigo um índice misterioso, que o impele à
redenção. Pois não somos tocados por um sopro do ar que foi respirado antes? Não
existem, nas vozes que escutamos, ecos de vozes que emudeceram? Não têm as
mulheres que cortejamos irmãs que elas não chegaram a conhecer? Se assim é,
existe um encontro secreto, marcado entre as gerações precedentes e a nossa.
Alguém na terra está à nossa espera. Nesse caso, como a cada geração, foi-nos
concedida uma frágil força messiânica para a qual o passado dirige um apelo. Esse
apelo não pode ser rejeitado impunemente.” 19

É a História que não se esquiva, no fazer historiográfico, de percorrer os campos do


conhecimento e da impressionabilidade, desenvolvendo diálogos com as outras ciências
sociais e a memória, recordando as ações dos sujeitos históricos, atendendo ao apelo das
gerações anteriores ao reparar o abandono e o esquecimento social, cultural e político a
muitos imputado, articulando no presente a sua ação redentora.
“Pensar, portanto, as relações entre memória e história é colocar-se no
interior desses diálogos – postura à qual a história [entendo que apenas algumas
escolas historiográficas], ingênua ou arrogantemente, tem-se furtado ao
reconhecer na memória apenas aquilo que reflete sua própria imagem e
semelhança.” 20

No entrecruzamento teórico objeto desta dissertação, entendo que a fotografia,


enquanto testemunho de memória, é uma das fontes capazes de exercitar ou executar este
“encontro secreto”, aproximando os tempos históricos do passado da contemporaneidade.
Para Benjamim, a rememoração encontra-se na essência da relação teológica com o
passado e com a própria significação de Erlösung (melhor traduzido por redenção do que

18 LÖWY, Michel. Walter Benjamin: aviso de incêndio. Uma leitura das teses “Sobre o conceito de história”.
São Paulo/SP: BOITEMPO. 1ª reimpressão, 2007, p. 14.
19 BENJAMIN, Walter, op. cit. p. 223.
20 SEIXAS, Jacy Alves de. Percursos de Memórias em terras de História: problemáticas atuais. In Memória e
(Res)sentimento. Indagações sobre uma questão sensível. Organização de Bresciani e Naxara, Stella e Marcia.
Campinas/SP: Unicamp, 2004, p. 52.

39
libertação) conforme afirma Löwy, (2007, p. 13) sem estabelecer distinção entre as ações dos
sujeitos históricos “grandes” e “pequenos”, considerando-se assim os diversos personagens
que precisam ser analisados na construção historiográfica, agindo em similaridade com os
conceitos da Nova História Cultural, caracterizada entre outros pensamentos teóricos, por não
recusar as expressões culturais de nenhuma classe social, mas considerando com apreço as
manifestações populares. “O cronista que narra os acontecimentos, sem distinguir entre os
grandes e os pequenos, leva em conta a verdade de que nada do que um dia aconteceu pode
ser considerado perdido para a história.” (BENJAMIN, 2008, p. 233)
História que também não se constrói através da narração tradicional, mas de uma
narrativa que compartilha a permanência das histórias e memórias da vida e a possibilidade de
rememoração. Desta forma, o substrato comum à fotografia, à memória e à narrativa histórica
encontra-se nas experiências que permanecem apesar do transpor do tempo e do espaço.
História que não tem preocupação somente com os grandes feitos e fatos, mas que é
capaz de não permitir que a parcela do passado, silenciada nos embates de memória, encontre
pousada nos lugares de esquecimento, apropriando-se do que foi relegado, do que não se
permitiu significar na história, transparecendo o sujeito histórico, sua memória, suas
subjetividades e seus espaços de relação social, que estavam na sombra.
Organizo o entrecruzamento teórico entre a fotografia, a história e a memória por meio
dos elementos comuns aos seus estudos, construindo uma narrativa imagética da formação do
espaço urbano da Vila de Entre-Rios, atual cidade de Três Rios/RJ, no período temporal
demarcado entre 1861 e os anos finais da década de 1930, quando se encerra o movimento de
emancipação política e econômica. Nasci neste município, percorro estes espaços, e ainda
testemunho as transformações ocorridas nos lugares de relação social com perdas para a sua
memória e história.
Assim, indaga-se o que revelam os indivíduos formadores de um grupo de famílias
assistidas pelo Grupo Espírita Fé e Esperança em Entre Rios, anteriormente, Vila de Entre-
Rios, perpetuados na fotografia que segue.
Três Rios tem sua formação urbana vinculada aos espaços físicos relacionados às
fazendas de café pertencentes a Mariana Claudina Pereira de Carvalho, a Condessa do Rio
Novo 21 e seus pais, os Barões de Entre Rios, Antônio Barroso Pereira e Claudina Venância
de Jesus. Escravos, personagens com pouca acuidade para a história vista de cima, mas
importantes no contexto historiográfico da Nova História Cultural, foram libertos por desejo

21 Ver: “anexo biografias”, p. 267.

40
expresso no testamento da Condessa, que deliberou a utilização das terras da Fazenda de
Cantagalo para seu assentamento.

Fotografia 16: Descendentes dos escravos libertos pela Condessa do Rio Novo, poucos anos após o
finalizar das atividades da Colônia Agrícola de Nossa Senhora da Piedade, assistidos pelo Grupo Espírita Fé e
Esperança, na cidade Três Rios/RJ, nesta tomada externa da sede da instituição, realizada na segunda metade
da década de 30 do século XX. Fotografia do acervo Sr. Altair, sem autor conhecido.

Isabela Torres de Castro, em sua dissertação de mestrado pela Universidade Severino


Sombra de Vassouras/RJ, pesquisou e analisou a constituição da Colônia Agrícola de Nossa
Senhora da Piedade composta no ano de 1882 pelos escravos libertos da Fazenda de
Cantagalo, extinta em 1932 devido...
“a uma combinação de fatores. Dentre eles estavam: o desgaste do solo, o
fato de a colônia encontrar-se em região de fronteira fechada, a falta de
investimento e de interesse público no desenvolvimento social, e, finalmente, a
ausência de uma política de reforma agrária no Brasil.” 22

O que está apontado nesta fotografia, capturado no ato fotográfico, não se repetirá
jamais em todo o seu contexto social, econômico e cultural, permanecendo o testemunho da
memória fragmentada destes indivíduos e desta comunidade, neste registro imagético que

22 INNOCÊNCIO, Isabela Torres de Castro. Liberdade e Acesso a terra. Fazenda de Cantagalo, Paraíba do Sul
(1882-1932). Disponível no site: http://www.uss.br/hotsites/revistaeletronica/arquivos/liberdade.swf. Acesso em:
5 de set. 2011.

41
venceu o tempo e a distância espacial, apresentando-se como objeto capaz de responder
algumas indagações das pesquisas históricas. (BARTHES, 2008, p. 13)
Em quantos estudos essa fotografia poderia ser utilizada como fonte historiográfica?
Interessante observar as vestimentas (roupas brancas, lenços na cabeça das mulheres e das
meninas), as sacolas e cestas com os mantimentos doados, os brinquedos de algumas crianças,
a falta de calçados, que demonstram a condição social e econômica deste grupo de pessoas.
Não existe um rosto sorrindo, por quê?
O que essas pessoas poderiam reafirmar quanto aos saberes históricos do presente? O
que seria repensado na escrita da História, considerando as memórias que a fotografia
“carrega”, em consonância ou não com outras imagens e outras fontes históricas? O que essa
fotografia “fala”, “grita” no presente, para o futuro, com relação ao passado, por meio de
todos os referentes que permaneceram, apesar da distância temporal e espacial existente entre
o instante congelado na imagem e o olhar do pesquisador na atualidade?
Entre os negros existe apenas uma face que parece diferir, ao fundo, perto do muro,
logo ao lado e embaixo da sombrinha carregada por uma mulher. Em sua maioria são
mulheres e crianças. Possíveis de serem percebidos têm-se apenas sete homens. Esse registro
apresenta para análise informações históricas referentes a questões de etnia, econômicas,
culturais e sociais.
Com tantas questões “impregnadas” nessa imagem, ela não deveria continuar relegada
à sombra do esquecimento sem nenhuma importância para a historiografia, como também, os
personagens nela registrados. São estes os vencidos que se distinguem dos usuais vencedores
nos embates de memórias: é sobre tais grupos, suas paisagens, seu cotidiano que pretendo me
aprofundar na continuidade deste trabalho.
Compreende-se da leitura da tese “Sobre o conceito de história” de Benjamin, que as
reminiscências do passado, daquilo que não está mais presente entre nós, apresentam-se na
atualidade por meio de discursos narrativos que se manifestam fragmentados nas fontes
históricas – entre estas a fotografia -, colocando-se o historiador como aquele que atribui
sentidos com o olhar do presente no desejo de reconstituir a realidade.
Ciência Humana, a História não se apresenta na sua escrita apenas através do tempo
unidimensional de uma narrativa sucessiva, onde os fatos se configuram como “uma
catástrofe única”, [até porque] “a verdadeira imagem do passado perpassa, veloz. O passado
só se deixa fixar como imagem que relampeja irreversivelmente no momento em que é
reconhecido”. (BENJAMIN, 2008, p. 224) A atenção não é dirigida ao olhar universalizante

42
de um tempo entendido como homogêneo e vazio, mas estabilizando-se na conceituação do
passado como tempo em descontinuidade.
O historiador que escolhe caminhar por este campo historiográfico, entende a pouca
probabilidade do passado apresentar-se no presente como ele realmente objetivou-se,
compreendendo que a pertinência de sentidos que esta ciência imputa ao passado realiza-se à
luz do presente. “Articular historicamente o passado não significa conhecê-lo “como ele de
fato foi. Significa apropriar-se de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de
um perigo” (BENJAMIN, 2008, p. 224). Em seu ofício...
“(...) aproveita essa oportunidade para extrair uma época determinada do
curso homogêneo da história; do mesmo modo, ele extrai da época uma vida
determinada e, da obra composta durante essa vida, uma obra determinada. Seu
método resulta em que na obra o conjunto da obra, no conjunto da obra a época e
na época a totalidade do processo histórico são preservados e transcendidos. O
fruto nutritivo do que é compreendido historicamente contém em seu interior o
tempo, como sementes preciosas, mas insípidas.” 23

Desta forma, o processo histórico revela-se nos indivíduos e suas obras – ações sociais e
culturais em suas relações nos grupos e espaços sociais no seu tempo histórico -, pertencentes
a uma determinada época e espaço de convivência, e suas memórias possíveis de
compreensão histórica. Concebe-se desta forma uma análise primária dos referentes impressos
na fotografia da página 41.
Este registro é um “fruto nutritivo do que é compreendido historicamente, [contendo]
em seu interior o tempo...” não mais a imagem móvel da eternidade, cronológico e linear, em
que se desenrolam todos os grandes fatos históricos como fenômenos continuados, mas o
tempo possível de interrupções, de particularização, o tempo da memória e da fotografia.
Benjamin constituiu então “um outro conceito de tempo, ‘tempo de agora’ (Jetztzeit),
caracterizado por sua intensidade e sua brevidade, cujo modelo foi explicitamente calcado na
tradição messiânica e mística judaica.” (GAGNEBIN, 2008, p. 8) Preceito teórico que permite
então à História perceber que a memória também “é filha do presente. Mas, como seu objeto é
a mudança, se lhe falta o referencial do passado, o presente permanece incompreensível e o
futuro escapa a qualquer projeto.” (MENEZES, 1992, p. 4) Desta maneira, história e memória
encontram-se no mesmo caminho que procura...

23 BENJAMIN, Walter. op. cit. p. 231.

43
“(...) salvar o passado no presente graças à percepção de uma semelhança
que os transforma os dois: transforma o passado porque este assume uma forma
nova, que poderia ter desaparecido no esquecimento; transforma o presente
porque este se revela como sendo a realização possível dessa promessa anterior,
que poderia ter-se perdido para sempre, que ainda pode se perder se não a
descobrirmos, inscrita nas linhas do atual.” 24

Percorrendo por este campo teórico, o historiador entende que é preciso sempre
objetivar acordar os mortos, retirar os indivíduos e sujeitos dos lugares de esquecimento e
juntar os fragmentos de suas vidas. Fragmentos que são os rastros deixados ou apagados, em
alguns momentos também por eles próprios, ocorrendo este ato quando “o esquecimento
publico era [é] constitutivo de um discurso de memória politicamente desejável” (HUYSSEN)
ou, quando a sociedade experimenta um “estado de exceção”, que para Benjamin, a tradição
dos oprimidos ensina ser esta conjuntura na verdade a regra geral. 25
Benjamin defende que o historiador abandone a “identificação afetiva” que se realiza
pela “submissão total à ordem das coisas existentes.” (LÖWY, 2007, p. 71) Cabe a este
“escovar a história a contrapelo” (BENJAMIN, 2008, p. 225), apresentando novos
questionamentos, olhares, e indagações a fontes diversas, construindo novas leituras sobre
objetos e ações passadas, estudadas [ou não] e revisadas.
Existem diversas e divergentes maneiras de se relacionar com o passado, mas todas
envolvem interesses, poder e exclusão. Proponho-me analisar também as “batalhas de
memórias” pelas quais as ações de indivíduos e grupos estabelecem o que deve permanecer
esquecido (vencidos) ou cultuado nas práticas de lembrança (vencedores). A memória opera a
partir de um processo seletivo em que o esquecimento determina a hegemonia do que deve ser
lembrado. No caso de Entre-Rios, tal análise se faz essencial. O grupo dos “negros”, por
exemplo, sempre foi deixado de lado nas narrativas hegemônicas da cidade, conforme abordo
no próximo sub-capítulo (e, principalmente, no final do capítulo III), quando irei aprofundar-
me em tais embates de memória.

24 MENEZES, Ulpiano T. Bezerra de. op. cit. p. 16.


25 O texto de Walter Benjamin, publicado após sua morte em 1940, foi escrito sob o impacto do acordo de
agosto de 1939 entre Stalin e Hitler e de todo o período do pós I Guerra Mundial e início da II; o que torna
compreensível a sua preocupação em definir que o “investigador historicista” não constitua uma relação de
empatia com o vencedor.

44
1.3 - A fotografia, o tempo e os esquecidos nos embates de memória.
1.3.1 – Os esquecidos.
“Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nome de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedra?
E a Babilônia várias vezes destruída –
Quem a reconstruiu tantas vezes? (...)
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo.
Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os césares? (...)
Cada página uma vitória.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande homem.
Quem pagava a conta?
Tantas histórias.
Tantas questões.”
– “Perguntas de um operário que lê” – Bertold Brecth 26

Fotografia 17 – Tomada externa registrando a presença do ex-presidente Nilo Peçanha (marcado com
uma seta) na Estação Ferroviária da Estrada de Ferro Central do Brasil em Entre-Rios, quando da campanha
para a eleição do presidente do Estado do Rio de Janeiro, de 1914. Os apoios da cobertura da plataforma em
frente à estação ficavam fora de sua área, fixadas na calçada. Esta fotografia do primeiro quarto da década de
10 do século XX, pertence ao acervo Srº Altair, sem fotógrafo conhecido.

26 Perguntas de um operário que lê. BRECHT, Bertold. apud por LÖWY, Michel. op. cit. p. 77.

45
Fotografia 18: Ex-presidente Nilo Peçanha (marcado com uma seta) junto às autoridades quando da
sua passagem pela Estação Ferroviária da Estrada de Ferro Central do Brasil no distrito de Entre-Rios,
registro externo do primeiro quarto da década de 10 do século XX. Sem autor conhecido, do acervo Sr. Altair.

Nos dois registros fotográficos que apresento sobre a passagem do então ex-presidente
da república Nilo Procópio Peçanha, 27 pelo distrito de Entre-Rios (hoje Três Rios),
exemplifica-se o reconhecer, na fotografia, a sua capacidade de ativar e compartilhar
memórias enquanto fragmento do passado, que permite revivê-lo redimensionado no presente,
mesmo que o instante, os objetos, espaços sociais e as sensações experimentadas não
pertençam ao indivíduo que a observa e estuda.
Uma diferença marcante entre as duas está que na primeira, além dos políticos,
comerciantes e outros representantes das elites do município de Paraíba do Sul e do distrito de
Entre-Rios, reconhecidos principalmente pelas suas vestimentas e por se encontrarem em
arredor do presidente, e membros de sua comitiva, temos a presença de populares e de
crianças em número significativo, agrupadas e principalmente localizadas abaixo da posição

27 Ver: anexo “biografias”, p. 267 e 268.

46
do ex-presidente, mas em condições de serem “captadas” com destaque pela objetiva. A
imagem valoriza a presença dessas pessoas junto a Nilo Peçanha.
Em confronto com o vetor escravidão, um dos constituintes sociais da base de
formação da sociedade trirriense, tem-se à vista nesta imagem um bom número de adultos e
crianças negras, bem como, percebe-se a ausência, nas duas imagens, da representação
feminina, tendo em vista que a mulher brasileira adquiriu o direito de votar nas eleições
nacionais somente no Código Eleitoral Provisório, de 24 de fevereiro de 1932, mas, à época,
apenas as mulheres casadas devidamente autorizadas pelos seus maridos, às viúvas e solteiras
com renda própria, costumavam aparecer em público.
Na segunda imagem, observa-se claramente o desejo de registrar a presença de Nilo
Peçanha, junto a ele apenas as autoridades e os indivíduos expoentes das classes econômicas
e políticas de Paraíba do Sul e do distrito de Entre-Rios. Os dois registros atendem a vontade
de se comprovar a receptividade positiva e o apoio a sua campanha para presidente do Estado
do Rio de Janeiro junto aos diferentes grupos sociais. Percebe-se também, à direita, presença
de uma criança segurando o seu chapéu numa posição de reverência, trajando camisa e calça
compridas e calçado com botas, demonstrando uma condição social superior às destacadas na
fotografia anterior, enquanto os adultos portam chapéus.
Outro aspecto observado é o espaço físico onde as imagens foram construídas: ambas
na Estação Ferroviária da Rede Central do Brasil, mas a primeira em local mais amplo, junto
aos trilhos, propício a maior aglomeração popular, tendo no segundo plano os prédios do
trecho urbano da Estrada União e Indústria (atual Avenida Condessa do Rio Novo); e a
segunda, ao lado da sede da estação, onde o espaço reduzido serviu para limitar a presença
apenas para representações políticas e econômicas da região.
O que nos informam esses personagens, suas roupas e adereços [também a falta destes
como os sapatos nos pés de algumas crianças do primeiro registro], seus olhares, posição
corporal e distribuição espacial na fotografia, seus espaços de relação, entre outros aspectos
do registro imagético? Corroboram principalmente na identificação das divisões econômicas
existentes nesta sociedade, na percepção da presença do poder político e econômico ainda nas
mãos da etnia branca quase 30 anos após a libertação dos escravos, e na utilização do povo
apenas para “confirmar” o apoio político à candidatura de Nilo Peçanha, entre outros fatores.
Para a formulação das respostas é imprescindível que o historiador supere a condição
de “pretenso historiador neutro, que acede diretamente aos fatos ‘reais’, na verdade apenas
[confirmando] a visão dos vencedores, dos reis, dos papas, dos imperadores... de todas as

47
épocas”, (LÖWY, 2007, p. 65) dando visibilidade a aqueles com os quais se solidariza
Benjamin, ao defini-los como os oprimidos pela história.
A fotografia na sua relação com a memória e a história, quando não consideradas na
construção historiográfica, é rastro esquecido pelo tempo em silêncio, pela necessidade de
sobrevivência de alguns indivíduos em suas “lutas” com o que precisa ser esquecido, pelos
sentimentos de culpa, pelo não desejo de rememoração, pelo desvalor imputado por alguns
pesquisadores das ciências sociais.
São também fragmentos de disputas de memória, por permitirem o configurar das
ações dos indivíduos e dos grupos sociais quando estes estabelecem o que deve constar como
lugares de lembranças ou esquecimentos, o que interfere diretamente nos processos de
rememoração das transformações dos espaços urbanos de relação social, ambiente manifesto
das memórias individuais e coletivas, e consequentemente na formação da identidade dos
sujeitos históricos e na construção historiográfica.
Pollak, citando Halbwachs, afirma que este autor...
“(...) longe de ver nessa memória coletiva uma imposição, uma forma
específica de dominação ou violência simbólica, acentua as funções positivas
desempenhadas pela memória comum, a saber, de reforçar a coesão social, não
pela coerção, mas pela adesão afetiva ao grupo, donde o termo que utiliza, de
“comunidade afetiva.” 28

Relacionados ambos os processos neste trabalho (processos entendidos como o da


“comunidade afetiva” definida pelo ajuntamento por afinidade e vontade livre a determinado
grupo, Halbwachs, e da “tradição dos oprimidos”, Benjamin), apresento-os como formas de
“negociação” nos embates de memória, visando à conciliação entre memórias individuais e
coletivas, coexistindo ambos na sociedade em permanente estado de disputas de memórias – o
que e como deve ser lembrado, em confronto com o que e como deve ser esquecido -, por
meio dos diversos grupos que convivem nos espaços físicos de afinidade social, ocorrendo em
determinados momentos históricos, maior tendência a uma ou a outra, mas ambas
funcionando como elementos capitais na formação cultural e social de um povo.
O tempo, o progresso, as relações políticas e econômicas, as transformações culturais,
a diminuição ou ampliação virtual e temporal dos espaços geográficos, a possibilidade de
movimentação de pessoas entre as fronteiras políticas e os grandes êxodos populacionais; são

28 POLLAK, Michael. Memória, Esquecimento, Silêncio. Disponível no site:


http://www2.uel.br/cch/cdph/arqtxt/Memoria_esquecimento_silencio.pdf. Acesso em: 14 de out. 2008.

48
elementos que ampliam a existência de múltiplos grupos em disputa de memórias, com muitas
forças interferindo no processo de adesão a um ou outro desenho de “negociação”.
Assim, nem sempre ocorre a formação de uma memória coletiva pelo processo de
“comunidade afetiva” que se expressa pela semelhança das memórias individuais. É preciso
considerar também as oriundas dos embates que acontecem nas altercações de poder, nestes
momentos de “estado de exceção” ou da utilização do esquecimento “para afirmar
reivindicações culturais, legais e simbólicas em prol de uma memória política nacional”
(HUYSSEN), quando ideologias políticas, econômicas e mesmo sociais, buscam sobressair
umas sobre outras. Mas todas estas “constroem” (...)
“(...) pontos de referência como indicadores empíricos da memória coletiva
de um determinado grupo, uma memória estruturada com suas hierarquias e
classificações, uma memória também que, ao definir o que é comum a um grupo e o
que diferencia dos outros, fundamenta e reforça os sentimentos de pertencimento e
as fronteiras sócio-culturais...” 29

Nessa dimensão teórica, analiso as memórias do processo de formação dos espaços


urbanos e das suas relações sociais, pertinentes à Vila de Entre Rios, pela perspectiva do
registro fotográfico, testemunho de memória e fonte historiográfica capaz de assumir, na sua
relação com a memória e a lembrança, e com a História, a característica de pontos de
referência ou, ainda melhor, a condição de lugar de lembrança e de esquecimento.
Pode-se auferir a importância dos espaços urbanos de relação para os processos
mnemônicos nesta afirmativa do Charles Figley 30, apresentada na reportagem “Dez anos
depois, traumas do 11 de setembro ainda atormentam os norte-americanos” do The New York
Times:
“Tais pontos de referência são os locais que o indivíduo vê todos os dias,
lugares como aquele onde ele pediu a mão da esposa, recebeu a notícia de que
havia sido promovido ou onde os filhos pequenos brincavam”, explica Figley. “O
soldado é enviado para uma zona de combate, mas depois sai de lá. Ele não deixa
o lar, mas, na verdade, retorna a todo o momento”. 31

29 Ibidem.
30 Ver: anexo “biografias”, p. 266.
31 DEZ ANOS depois, traumas do 11 de setembro ainda atormentam os norte-americanos. Reportagem de
Anemona Hartocollis com contribuição do jornalista Alain Delaqueriere. Disponível no site:
http://m.noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2011/08/28/dez-anos-depois-traumas-do-11-de-setembro-
ainda-atormentam-os-norte-americanos.htm. Acesso em 28 de agos. 2011.

49
Prefiro utilizar nesta pesquisa os termos “lugar de lembrança e de esquecimento” por
entender que a memória tem seu lugar nos registros mentais do sujeito histórico, registros que
elaboram ações, testemunhos e fatos que podem ser parcialmente recuperados, rememorados e
reinterpretados por meio da análise de determinados objetos, lugares e monumentos; em vez
de “lugar de memória”, conceito desenvolvido por Pierre Nora.
“A expressão lugares de memória foi criada pelo historiador francês Pierre Nora.
Convencido de que no tempo em que vivemos os países e os grupos sociais sofreram uma
profunda mudança na relação que mantinham tradicionalmente com o passado, Pierre
Nora acredita que uma das questões significativas da cultura contemporânea situa-se no
entrecruzamento entre o respeito ao passado – seja ele real ou imaginário – e o
sentimento de pertencimento a um dado grupo; entre a consciência coletiva e a
preocupação com a individualidade; entre a memória e a identidade (...) Para Pierre
Nora, os lugares de memória são em primeiro lugar lugares em uma tríplice acepção:
são lugares materiais onde a memória social se ancora e pode ser apreendida pelos
sentidos; são lugares funcionais porque tem ou adquiriram a função de alicerçar
memórias coletivas e são lugares simbólicos onde essa memória coletiva (...) se expressa
e se revela. São, portanto, lugares carregados de uma vontade de memória. Longe de ser
um produto espontâneo e natural, os lugares de memória são uma construção histórica e
o interesse em seu estudo vem, exatamente, de seu valor como documentos e monumentos
reveladores dos processos sociais, dos conflitos, das paixões e dos interesses que,
conscientemente ou não, os revestem de uma função icônica.” 32

As praças das cidades brasileiras, por serem um espaço importante de relações e


manifestações sociais, são impregnadas pelas memórias das ações dos sujeitos históricos que,
participando da vida em sociedade, em determinados “papeis” de expressão de poder
(político/cultural/religioso/econômico), procuram “eternizar” suas marcas/registros, sofrendo
esses espaços urbanos, alterações importantes que “movimentam” suas memórias no passar
do tempo histórico de sua existência.
Na edição de 13 de dezembro de 2008, o Jornal “Entre-Rios” apresentava notícia de
autoria de Angélica Garcia, da entrega à população trirriense da reforma da Praça São
Sebastião:
“Fazendo parte das comemorações do aniversário de Três Rios, o prefeito
Celso Jacob entrega amanhã (14), às 11h, a reforma da Praça São Sebastião, no
Centro da cidade. A entrega havia sido anunciada em outubro, pelo secretário de

32 NEVES, Margarida de Souza. Lugares de Memória da Medicina no Brasil. Disponível no site:


http://www.historiaecultura.pro.br/cienciaepreconceito/lugaresdememoria.htm. Acesso em: 24 de abr. 2011.

50
Obras da cidade, Robson Garcia. Segundo informações do Governo Municipal, a
obra constará de anfiteatro, playground, centro de internet comunitária, nova
arborização, novo piso e uma homenagem à cidade, com uma fonte representando
os três rios. A reforma da praça está sendo realizada com a parceria entre
Governo Municipal e Banco Itaú e foi iniciada em junho deste ano. Desde então, o
trânsito no local ficou interrompido”. 33

Fotografia 19: Vista frontal dos ladrinhos que foram inseridos no piso da Praça São Sebastião, após
processo de revitalização promovido pelo então Prefeito João Pedro da Silveira, extraídos quando da
remodelação deste espaço urbano em 2008. Acervo Rádio Três Rios, sem fotógrafo conhecido.

Em 1954, o então Prefeito de Três Rios, João Pedro da Silveira 34, deixou
“perpetuado” no piso da Praça São Sebastião uma possível “homenagem” do povo da cidade,
em agradecimento às obras de revitalização realizadas nesse importante espaço de relação
social do município; ladrinhos foram colocados no calçamento próximo ao chafariz, conforme
se pode observar na fotografia acima.

33 Disponível junto com a fotografia 20 no site: http://www.entreriosjornal.com.br/noticia/14006-praca-sao-


sebastiao-sera-entregue-a-populacao-neste-domingo. Acesso em 25 de jun. 2011.
34 Ver: anexo “biografia”, p. 267.

51
No periódico “Entre-Rios
Jornal” de 25 de setembro de 1954, 35 é
noticiada a inauguração de vários
melhoramentos na cidade, entre estes o
ladrilhamento da Praça São Sebastião,
obra que eliminou a poeira do seu
traçado urbanístico.
Em uma nota embaixo e no
centro da primeira página, encontra-se
Fotografia 20: Tomada externa da Praça São informação de que mais de 30
Sebastião durante as obras de sua remodelação em 2008,
habitantes da cidade organizaram uma
realizada Condomínio Edifício José Vaz.
lista de adesão, oferecendo os ladrilhos
com a inscrição em homenagem ao prefeito pela obra do calçamento e piso. Relata ainda que
os mesmos seriam colocados na parte central da praça, conforme desejo dos seus doadores,
que assim, demonstravam “seu apoio àquela esplêndida realização pública de incontestável
utilidade para o aspecto urbano da cidade e conforto dos habitantes de Três Rios.” 36

Interessante observar que consta como diretor presidente do jornal o Sr.º João Pedro da
Silveira, prefeito do município de Três Rios à época dessa edição.
Quando da reforma realizada pelo Prefeito Celso Jacob 37 em 2008, esse marco foi
retirado, apesar da manifestação de algumas pessoas, desaparecendo assim um lugar de
lembrança das memórias atreladas ao espaço urbano, conservado agora apenas nas notícias
vinculadas nos jornais da época.
Nesse caso, a fotografia do acervo da Rádio Três Rios, onde nitidamente vemos os
ladrilhos, assume a sua condição de testemunho de memória, “testemunho [que] constitui a
estrutura fundamental de transição entre a memória e a história”; (RICCEUR, 2010, p. 41)
lugar de lembrança que permite à memória assumir a sua “função específica de acesso [no
presente] ao passado.” (RICCEUR, 2010, p. 25) Histórias e memórias também são atreladas
aos monumentos que comumente são colocados e recolocados em espaços públicos como as
praças.

35 INAUGURADO vários melhoramentos com a presença do Exmo. Governador Alte. Ernani do Amaral
Peixoto e do candidato Dr. Miguel Couto Filho. Entre-Rios Jornal, Três Rios/RJ, ano XX, edição nº 1025, de
25 de setembro de 1954, capa.
36 HOMENAGEM ao Prefeito. Entre-Rios Jornal, Três Rios/RJ, ano XX, edição nº 1025, de 25 de setembro
de 1954, capa.
37. Ver: anexo “biografias”, p. 265.

52
No exemplo da homenagem prestada ao ex-presidente Tancredo Neves 38 com uma
estátua inserida na Praça São Sebastião, em 14 de dezembro de 1985, no segundo governo do
Prefeito Samir Nasser, movimenta-se a memória de uma forma inusitada. Um detalhe na sua
concepção logo mobilizou a imaginação popular: na sua posição inicial, tal estátua tinha em
uma das suas mãos o dedo indicador apontando para a sede da Prefeitura Municipal de Três
Rios, o que levou rapidamente ao pensamento popular irônico de que o presidente indicava
onde ficavam os “ladrões” da cidade.

Fotografia 21: Piso atual da Praça São Sebastião após as obras realizadas no governo do Prefeito
Celso Jacob. Atualmente a praça vem sendo muito utilizada pelo atual executivo municipal – Prefeito Vinicius
Farah -, para atividades culturais, de lazer, religiosas e de cidadania. Ao centro, a estátua em homenagem ao
ex-presidente Tancredo Neves, registro de 2009, acervo André Mattos.

Quando da citada obra de remodelação, tomou-se o cuidado de mudar a posição do


monumento, colocado agora de costas para a prefeitura, o que acabou conduzindo a uma nova
manifestação: Tancredo, por vergonha, não queria nem ver o que ocorre entre as paredes do
prédio da administração pública. Observa-se também que não existe nenhuma placa indicativa
de quando a estátua foi artisticamente confeccionada, seu autor, a data e governo de quem a

38 Ver: anexo “biografias”, p. 269 e 270.

53
posicionou na praça, nem quem é o homenageado, o que causa dúvidas, principalmente aos
mais jovens, dificultando qualquer vinculo com a memória da cidade.
Escreveu-me por e-mail a historiadora Ezilma Teixeira 39, informando sobre alguns
outros fatos relacionados a este monumento, que apresento a seguir na forma de uma “crônica
urbana” sobre a estátua do Tancredo Neves.

Fotografia 22: Praça São Sebastião, tendo no centro da imagem a estátua em homenagem ao ex-
presidente Tancredo Neves, observando-se o dedo indicador ainda danificado e a ausência de qualquer placa
informativa. Registro de 2012, acervo André Mattos.

39 Ver: anexo “biografias”, p. 266.

54
Sendo este um recorrente costume dos nossos políticos, afirma-se “que a estátua só foi
erguida para agradar ao "eterno" senador Francisco Dornelles”, sobrinho de Tancredo e
político com imensa influência no interior do Estado do Rio de Janeiro. O ex-presidente
nunca esteve na cidade de Três Rios, “não tem nenhuma ligação com a nossa história. Foi
adulação política mesmo...”, possível de se realizar por sua importância para a recente história
política do Brasil.
“O maior interessado e defensor foi o falecido ‘Zé Moacyr’, Secretário de
Administração do segundo governo do Prefeito Samir Nasser. Algumas manifestações
contrárias ocorreram, mas a obra acabou sendo encomendada ao artista trirriense Osorinho.
Mas a história não termina ainda, afirma a professora que “na época a prefeitura não tinha
caixa para fazer uma estátua de bronze,” a solução “foi fazê-la de fibra de vidro, material
altamente inflamável.” Não poderia acontecer outra coisa... “numa madrugada colocaram
fogo na estátua, que teve parte de uma perna queimada.” Outro fato insólito foi quando um
dia ela amanheceu de baby-doll e touquinha. “As más línguas disseram que a irreverência
havia sido obra do recém-falecido Drº Warderley Garcez Rodrigues”.
Em jornais da época, tem-se na notícia da inauguração, revelado o atraso e as
mudanças no cerimonial motivadas pelas fortes chuvas que caíram no horário marcado, e a
presença, entre outros, do prefeito de Niterói, Moreira Franco, que se retirou antes do
encerramento do evento, e da sobrinha de Tancredo Neves, Lucilia Neves Salgado, que
descerrou a fita inaugural, num gesto simples e rápido.
“Entre as críticas dirigidas à iniciativa de se homenagear o presidente
eleito..., estão as dúvidas quanto à importância da personalidade para a cidade; o
que Tancredo fez além de se deixar fotografar a lado do prefeito Samir Nasser
[existem duas fotos em edições anteriores deste jornal em que os dois estão juntos];
porque não um busto ao invés de uma estátua que não corresponde ao tamanho
normal de uma pessoa e ainda a qualidade da obra – estátua de massa (poderia
pelo menos ser de bronze ou de pedra), e o esquecimento dos autonomistas da
cidade que mal recebem homenagens verbais e são as personalidades merecedoras
de homenagens desse porte.” 40

Apesar das mudanças ocorridas na Praça São Sebastião, a estátua permanece, e


infelizmente segue representativa apenas da dependência que existe entre os poderes políticos
no Brasil. O monumento, na condição de patrimônio histórico, precisa ter

40 INAUGURAÇÃO da estátua atrasa em 2 horas e meia. O Diário. Três Rios/RJ, de 17 de dezembro de 1985,
ed. nº 253, capa.

55
receptividade/ressonância na comunidade onde está inserido. O valor outorgado a qualquer
monumento não está apenas na obra em si, mas na sua capacidade de preservar, na
consciência das gerações futuras, a lembrança de ações e movimentos empreendidos por
aqueles representativos de um grupo ou comunidade social.
Nesse sentido, o monumento relaciona-se com a manutenção da memória coletiva de
um povo, sociedade ou grupo. No próprio artigo do jornal, seu autor lembra a figura dos
emancipacionistas esquecidos ou pouco lembrados nas iniciativas de valorização da memória
histórica da cidade. Ezilma Teixeira registra ainda que foi com surpresa que ela observou,
após as obras de remodelação empreendidas em 2008, que a estátua retornou à praça,
cometendo-se “uma grande gafe histórica: colocou-a [o prefeito Celso Jacob] ao lado do busto
de Walter Francklin, [emancipacionista e primeiro prefeito de Três Rios] dando aos dois a
mesma importância para Três Rios.”
A especificidade do monumento deve-se precisamente ao seu modo de atuação sobre a
memória. A estátua de Tancredo Neves não trabalha e movimenta a memória da sociedade
trirriense pela mediação da afetividade, contribuindo para manter e preservar a identidade
histórica da cidade, mas apenas e infelizmente presentifica-se e permance no anedotário
popular.
Vale lembrar que o referido dedo indicador encontra-se atualmente quebrado.

1.3.2 – O tempo.

O tempo é o elemento primordial ao estudo da fotografia, da memória e da história. As


apreciações quanto ao passado estão sempre condicionadas pela temporalidade. Os
significados históricos do tempo encontram, na memória, o substrato capaz de aproximar as
ações humanas do passado da realidade múltipla das sociedades contemporâneas, definidas
quanto aos valores, culturas, modos de relações, vivências, experiências e representações.
Estes significados estão presentes nas diversas formas de registros e marcas, os fragmentos e
as ruínas, as fontes e testemunhos, que o historiador utiliza para a construção do
conhecimento historiográfico.
“Toda a fotografia é um resíduo do passado... Toda fotografia representa o testemunho
de uma criação. Por outro lado, ela representará sempre a criação de um testemunho”.
(KOSSOY, 2003, p. 50) A condição de testemunho de memória vincula-se à fotografia
quando do ato-fotográfico, momento do “nascimento” da imagem fotográfica, sendo este
também o finalizar de um procedimento que surge com a aspiração de um sujeito, processo

56
depoimento da condição cultural e social do fotógrafo em seu tempo histórico, tornando-se a
imagem revelada o testemunho de lembranças que admitem a rememoração.

Fotografia 23: Fotografia aérea do centro da cidade de Três Rios, denominada na sua formação
inicial de Vila de Entre-Rios, tomada no início de 1970. Em primeiro plano, a Praça São Sebastião e no centro,
o antigo coreto. Registro realizado pelo fotógrafo Abdisio 41, que afirmou ter feito a imagem nos últimos dias
do primeiro governo do prefeito Alberto Lavinas; pertencente ao acervo Rádio Três Rios.

Na fotografia acima se tem o registro da formação arquitetônica da Praça São


Sebastião e o seu entorno, no início dos anos 70. Além de testemunho das possíveis intenções
vinculadas ao ato-fotográfico, vislumbram-se as alterações ocorridas no transcorrer do tempo:
sinalizado abaixo e à direita, (2) a obra inacabada do Edifício Vale do Paraíba, primeiro
prédio na cidade com 10 andares; no lado esquerdo, (3) terreno onde foi erguido o restaurante
Choupana, destruído em um incêndio, e que atualmente abriga a Galeria Solar Martha Dutra.
Pode-se observar ainda, entre outros, (1) o antigo prédio da Companhia Usinas Nacionais -

41 Ver: anexo “biografia”, p. 264.

57
Açúcar e Café Pérola com sua chaminé, onde atualmente temos as “Torres Gêmeas” da
cidade, o Edifício e Shopping Olga Sola.
Uma das características da Praça São Sebastião é o de representar o principal espaço
de relação social e cultural do município. A praça é, até o presente momento, o centro do que
defino como um Circuito de Memórias, por existir no seu redor, construído no decorrer de sua
história, espaços físicos de representação político-administrativa (a sede da Prefeitura
Municipal de Três Rios), religiosa (a Igreja de São Sebastião, santo padroeiro do município),
da justiça (o chamado Fórum velho, onde funciona atualmente apenas o Juizado Especial
Cível e que foi sede primeira do Colégio Estadual Condessa do Rio Novo), cultural o Teatro
Celso Peçanha que abriga o Grupo de Amadores Teatrais Viriato Correa, e a Casa da Cultura
de Três Rios, no mesmo prédio do fórum antigo, no seu segundo andar), comercial (com
restaurantes, padaria e o Shopping Olga Sola), além de edifícios, casas residenciais e a sede
do SEBRAE.
É possível perceber que após a realização deste registro fotográfico, até o presente,
mais de sete prédios substituíram construções mais antigas, além de várias transformações
que modificaram a organização espacial da praça, o que explica, em parte, o descaso com o
patrimônio cultural da cidade.
Anoto anteriormente que para Ricceur, a fenomenologia da lembrança é o objeto da
memória. Entendo que a fotografia, enquanto testemunho e lugar de lembrança, possibilita a
análise de memórias de indivíduos e espaços em que estão inseridos, lembranças possíveis de
serem estudadas pelo historiador ou representantes de outras ciências sociais, em pesquisas
nesta e em outras fontes diversas – “lembrar é ter uma lembrança ou ir em busca de uma
lembrança”. (RICCEUR, 2010, p. 24) A construção historiográfica oriunda das análises e
interpretações dos lugares de lembrança é o finalizar do processo de confrontação entre o
tempo, a memória e a história.
Desta tomada aérea pode-se perceber ainda, no centro da praça, o antigo coreto – local
de manifestações cívicas e espaço de confraternização da juventude, durante a década de 50 e
60, que foi substituído por uma fonte luminosa no penúltimo dia do governo Michelli Feliz
(janeiro de 1971), vice-prefeito no primeiro mandato do prefeito Alberto da Silva Lavinas. 42
Na edição nº 373 do Correio Trirriense, que circulou no dia 29 de maio de 1969, temos
na capa, em destaque, o seguinte título: “Praça São Sebastião terá fonte luminosa”, e no corpo
da matéria sem autor definido a informação que “o aprazível logradouro situado no coração

42 Ver: anexo “biografias”, p. 265.

58
da cidade de Três Rios ficará mais bela (sic), isto porque o governo do município vem de
adquirir moderna fonte luminosa para ornamentá-la (sic).” O objetivo desta e de outras obras
era, naquele tempo, construir uma “nova concepção urbanística nos moldes das modernas
cidades”, transformando a praça num local mais adequado a recreação, “com reais vantagens
para a população infantil”. 43
Passível de interpretação e análise dos referentes presentes nas imagens repletas de
representações culturais e sociais, a fotografia consente entrecruzamentos com a história e a
memória. Sendo historiador, propus-me à análise deste entrecruzamento, por entender que é
preciso percorrer também novos caminhos na pesquisa historiográfica, aceitando o desafio de
abandonar conceitos mais usuais e seguros. É a “pretensão do exercício interdisciplinar que
indaga, duvida e se aventura em tarefas de desconstrução de moradas do saber, nem sempre
recompensado por uma nova edificação.” (BRESCIANI e NAXARA, 2004, p. 9-10)
O processo de formação dos espaços urbanos de relação deste município tem seu
início na organização da Vila de Entre-Rios, distrito de Paraíba do Sul/RJ. Na década de 20
surge um movimento de emancipação política, impulsionado pelo desenvolvimento
econômico, decorrência do privilegiado espaço geográfico e da presença, inicialmente da
Estrada União Indústria e logo após, das Estradas de Ferro D. Pedro II e Leopoldina Railway
Company Limited. Em dezembro de 1938, finalmente é decretada a emancipação, nascendo o
município de Entre-Rios. Em razão de haver outros dois municípios brasileiros com o mesmo
nome, em 1943 o município toma o nome de Três Rios.
Durante seu tempo de existência, passa o município por alguns períodos de estagnação
e de maior impulso econômico e cultural, responsáveis pelas alterações nos espaços urbanos,
verdadeiros movimentos que atravessam a sociedade, “tempestades que sopram do paraíso”,
afetando o que se encontra sedimentado, desfazendo, reinventando, aparentemente
modificando, criando novos corpos exteriores nos antigos hábitos e ações do homem no seu
grupo social, provocando a remodelação dos ambientes sociais, espaços de lutas de poder,
onde na maioria das vezes a memória de grupos minoritários perde a batalha para os poderes
econômicos e políticos.
O tempo e o espaço são efetivos à demarcação da especificidade do “olhar” da
História sobre as realizações humanas, encontrando na fotografia e na memória os elementos
que permitem conceber significados a estas ações.
Escreve Barthes sobre a próxima fotografia:

43 PRAÇA São Sebastião terá fonte luminosa. Correio Trirriense. Três Rios/RJ. Ano IX, quinta-feira, 29 de
maio de 1969, nº 373, capa.

59
“Em 1865, o jovem Lewis Payne tentou assassinar o secretário de Estado
americano, W. H. Seward. Alexander Gardner fotografou-o em sua cela; ele espera
seu enforcamento. A foto é bela, o jovem também: trata-se do studium. Mas o
punctum é: ele vai morrer. Leio ao mesmo tempo: isso será e isso foi; observo com
horror um futuro anterior cuja aposta é a morte. Ao me dar o passado absoluto da
pose (aoristo), a fotografia me diz a morte no futuro. O que me punge é a
descoberta dessa equivalência. Diante da foto de minha mãe criança, eu me digo:
ela vai morrer: estremeço, tal como o psicótico de Winnicott, por uma catástrofe
que já ocorreu. Que o sujeito já esteja
morto ou não, qualquer fotografia é essa
catástrofe.
Esse punctum, mais ou menos
apagado sob a abundância e a disparidade
das fotos de atualidade, pode ser lido
abertamente na fotografia histórica: nela
há sempre um esmagamento do Tempo:
isso está morto e isso vai morrer... Em
1850, August Salzmann fotografou, perto
de Jerusalém, o caminho de Beith-Lehem
(ortografia da época): nada além de um
solo pedregoso, de oliveiras; mas três
tempos conturbam minha consciência: meu
presente, o tempo de Jesus e o do fotógrafo,
tudo isso sob a instância da “realidade” –
e não mais através das elaborações do
texto, ficcional ou poético, que jamais é
Fotografia 24: “Ele está morto e vai morrer” – crível até a raiz.” 44
Alexander Gardner: Retrato de Lewis Payne, 1865.
Disponível no site: http://www.old-picture.com/civil-
A fotografia lida então com o
war/pictures/manacled-sweater-001.jpg. Acesso em mar.
de 2011. tempo possível de interrupções, de
particularização, o “tempo-de-agora” de
Benjamin, o tempo da memória. Esta análise desenvolvida por Barthes está amparada na
relação da fotografia com o tempo e a realidade.
Este tempo não é linear, mas interrompido por um momento, “tempo esmagado” (a
fotografia é o instante congelado tecnicamente), permitindo perceber no mesmo exercício de

44 BARTHES, Roland. op. cit. p. 141 - 144.

60
olhar, a “vida” (antes e no minuto do ato fotográfico – entendida como existência, presença) e
a morte (realidade presente em todas as imagens fotográficas relacionadas a indivíduos que
viveram suas existências em tempos passados). “Vida”, “morte” e as representações de uma
série de valores negativos agregados à idéia de dor, isolamento, destruição, separação de entes
queridos, solidão, exclusão e angústia perante um futuro incerto. E não só isso, também os
espaços físicos de relação social “morrem” ao serem eliminados ou transformados.
A fotografia de pessoas não mais presentes provoca sentimentos que preferíamos
fossem esquecidos, mas que na imagem fotográfica retomam; parte de nossa memória é
preservada em imagens. Este registro ocorre por meio de uma “técnica muito mais bem
adaptada do que a pintura [por exemplo] para a reprodução mimética do mundo, a fotografia
vê-se rapidamente designada como aquilo que deverá (...) se encarregar de todas as funções
sociais e utilitárias (...) exercidas [antes] pela arte pictural.” (DUBOIS, 2009, p. 30)
O conceito de tempo que abraço nesta pesquisa não se ancora na linearidade,
encontrando no registro fotográfico sua aplicação, pois tanto um quanto o outro e também a
memória, permitem serem interrompidos, fragmentados (a fotografia é um fragmento do
tempo e do espaço), vencendo a distância do espaço e das próprias demarcações temporais
humanas, possibilitando o redimensionar do passado no presente.
Esta questão remonta ainda ao ato fotográfico e à própria criação e existência da
fotografia (imagem-ato) e a sua essência temporal e espacial. Dubois encara este ponto da
separação, do corte, do “cut”, considerando que “qualquer fotografia é um golpe [uma
jogada], qualquer ato [de tomada ou de olhar para a imagem] é uma tentativa de “fazer uma
jogada” [dar um golpe]” (DUBOIS, 2009, p. 162) e que o impulso de sucessividade do ato
fotográfico – primeiro repetir o ato com várias tomadas de um mesmo assunto, para depois
selecionar -, está correlacionado à compulsão da repetição corriqueira em jogos como o
xadrez, exemplo utilizado por desse autor.
A realidade tão comum na contemporaneidade - onde é possível obterem-se com
câmeras fotográficas digitais um número quase infinito (e não se afirma que seja infinito em
sua totalidade porque conscientemente nem no mundo virtual é possível vislumbrar a
condição de um espaço infinito a ser preenchido) de imagens que podem ser construídas e
“descarregadas” virtualmente - não elimina a qualidade de objeto único admitido para toda e
qualquer imagem fotográfica.
Mesmo numa série - “metralhemos em primeiro lugar”, (DUBOIS, 2009, p. 82) - uma
imagem terá como diferencial da outra, pelo menos, o instante – o corte temporal, que por
mais breve que seja, mesmo não perceptível ao olhar, o é para a consciência. Por isso, aceita-

61
se que a análise da fotografia pela questão do corte temporal e espacial pode também
permanecer atrelada a uma única imagem referenciada no registro fotográfico.
“Como tal [a noção de corte], indissociável do ato que a faz ser, a imagem
fotográfica não é apenas uma impressão luminosa, é igualmente uma impressão
trabalhada por um gesto radical que a faz por inteiro de uma só vez, o gesto do
corte, do cut, que faz seus golpes recaírem ao mesmo tempo sobre o fio da duração
e sobre o contínuo da extensão. Temporalmente de fato – repetiram-nos o
suficiente – a imagem-ato fotográfica interrompe, detém, fixa, imobiliza, destaca,
separa a duração, captando dela um único instante. Espacialmente, da mesma
maneira, fraciona, levanta, isola, capta, recorta uma porção de extensão. A foto
aparece dessa maneira, no sentido forte, como uma fatia única e singular, de
espaço-tempo, literalmente cortada ao vivo. [grifo do autor] Marca tomada de
empréstimo, subtraída de uma continuidade dupla. Pequeno bloco de estando-lá,
[grifo do autor] pequena comoção de aqui-agora, furtada de um duplo infinito.
Pode-se dizer que o fotógrafo, no extremo oposto o pintor, trabalha sempre com o
cinzel, [grifos o autor] passando, em cada enfocamento, em cada tomada, em cada
disparo, passando o mundo que o cerca pelo fio de sua navalha. 45

Cada fotografia deve ser analisada como objeto único, mesmo pertencendo a um
conjunto de um fotógrafo ou abordando um mesmo tema. Todas as questões ligadas a este
objeto (o índice, o corte, a relação com o real, a sensação de verdade, o espaço, o tempo, a
distância, o ato, a autoria, a técnica, a linguagem), no exercício de suas interpretações, devem
ser embasadas por uma determinada metodologia, consideradas em suas manifestações de
presença no registro “impresso” sobre a superfície plana ou no mundo virtual.
Dubois afirma que o “tempo não tem validade aos olhos da fotografia” (DUBOIS,
2009, p. 163), sendo ele, o tempo, que marca cronologicamente a existência humana, pois
após o corte do ato fotográfico, o tempo continua sua trajetória, mas o registro interrompe
(conforme Benjamin), provoca o esmagamento (conceito de Barthes), instalando um fora-do-
tempo (considerado por Dubois), um instante vazio, separado, um extra-instante que
permanece como pequenos quadros, baldes separados das águas deste rio que incessantemente
corre para o futuro.
O tempo fragmenta-se na fotografia e na memória, retomando seu ritmo, quando a
percepção repousa sobre a imagem e esta desperta lembranças – saudades pousadas em
retratos -, movimenta a memória num instante que vence a distância temporal entre o corte

45 DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico. Campinas/SP: Papirus, 12. ed. 2009, p. 161.

62
fotográfico e a observação, analise e interpretação do referente imagético. A imagem
fotográfica e a imagem da memória são capazes de lidar com tempo, interrompendo e
retomando o seu fluxo por meio da lembrança.
“Se o ato fotográfico reduz o fio do tempo a um ponto, se faz da duração
que escoa infinitamente um simples instante detido, não é menos claro que esse
simples ponto, esse lapso curto, esse momento único, levantado do contínuo do
tempo referencial, torna-se, uma vez pego, um instante perpétuo: uma fração de
segundo, decerto, mas “eternizada”, captada de uma vez por todas, destinada
(também) a durar, mas no próprio estado em que ela foi captada e cortada.” 46

A condição de permanecer a imagem eternizada é que permite o ato de olhar e


interpretar uma fotografia – presença de uma coisa ausente – sendo este o momento de
“lançar-se sobre a imagem revelada, no tempo da contemplação real (que é o tempo
contemporâneo), qualquer real desvanecido” (DUBOIS, 2009, p. 312), desaparecido,
esquecido, mas impregnado na imagem bidimensional desse lugar de lembranças.
Os registros fotográficos serão sempre pontos de referência como indicadores
empíricos da memória coletiva e individual, que aproxima a memória da realidade atual, por
meio das lembranças ou mesmo do que foi esquecido, de tempo e lugar distantes.
“De todas as artes da imagem, de fato, a fotografia é provavelmente aquela
em que a representação está ao mesmo tempo, ontologicamente, o mais perto
possível de seu objeto, pois é sua emanação física direta (a impressão luminosa) e
porque lhe cola literalmente na pele (estão intimamente ligados), mas é igualmente,
e também ontologicamente, aquela em que a representação mantém uma distância
absoluta do objeto, em que ela o coloca, com obstinação, como um objeto separado.
Tanto mais separado quanto perdido.” 47

O que confere essa característica relacionada por Phillippe Dubois, de estar perto e ao
mesmo tempo distante do seu objeto, é a condição imputada culturalmente à fotografia de ser
uma representação da realidade, capturada pela imagem e bidimensionalmente preservada, e a
de sujeitar-se ao olhar interpretativo do receptor em qualquer momento presente.
A fotografia é definida, então, na relação com a História e a Memória pela sua
condição de lugar de lembrança, e testemunho de memórias, e por seu status enquanto objeto

46 Ibidem, p. 168.
47 Ibidem, p. 311 - 312.

63
que dialoga com o tempo possível de interrupção e fragmentação, e pelo “princípio de
distância”, que Benjamin apresenta na sua significação de aura.
No seu escrito “Pequena História da Fotografia”, de 1931, Walter Benjamin antecipa o
que Dubois nomeia como “princípio da distância”, conceito que surge na definição de aura
construído numa trama entre o espaço e o tempo; “a aura seria assim o próprio efeito dialético
saído dessa tensão entre o longínquo e o próximo, ou melhor, do longínquo mais essencial
agarrado, mantido, no próximo mais conjuntural.” (DUBOIS, 2009, p. 311) Nesse estudo,
Benjamin, entre outros tópicos, escreve sobre a aura que envolvia as pessoas retratadas nos
primeiros registros fotográficos: “O rosto humano era rodeado por um silêncio em que o olhar
repousava”, (BENJAMIN, 2008, p. 95) afirmando que...
“Havia uma aura em torno deles [das pessoas fotografadas], um meio que
atravessado por seu olhar lhes dava uma sensação de plenitude e segurança. Em
particular, em muitas imagens de grupo os personagens conservam ainda uma
forma alada de “estarem juntos”, tal como ela aparece transitoriamente na chapa,
antes de desaparecer no “clichê original”. É esse círculo de vapor que às vezes
circunscreve, de modo belo e significativo, o oval hoje antiquado da foto... Pois
aquela aura não é o simples produto de uma câmara primitiva.” 48 [grifo nosso]

O que poderia ser apenas uma característica das possibilidades técnicas, no fazer e
revelar da fotografia, para este autor representava muito mais do que um elemento que o
avanço nesta “arte” de obtenção da fotografia “expulsou” da imagem, e que se tentou retomar
através de um tom crepuscular (em moda à época), uma penumbra.
Mas “apesar desta penumbra, distinguia-se com clareza uma pose cuja rigidez traía a
impotência daquela geração [de fotógrafos] em face do progresso técnico.” (BENJAMIN,
2008, p. 99) A aura de Benjamin retorna à fotografia com o trabalho de Atget, “um ator que
retirou a máscara, descontente com sua profissão, e tentou, igualmente, desmascarar a
realidade.” (BENJAMIN, 2008, p. 100) Ao analisar as fotos parisienses de Atget, Benjamin
apresenta pela primeira vez a sua definição de aura, antes, porém, afirmando que as imagens
daquele fotógrafo “sugam a aura da realidade como uma bomba suga a água de um navio que
afunda” (BENJAMIN, 2008, p. 92); aura que se transfere então para a imagem indiciária que
permanece, vencendo o tempo e distância. O tema receberá a devida complementação no seu
artigo “A obra de arte na era de sua reprodutividade técnica” de 1935/1936, quando afirma:

48 BENJAMIN, Walter. Pequena história da fotografia, in Walter Benjamin – Obras Escolhidas Vol. I – Magia
e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP. Editora Brasiliense. 11. reimpressão, 2008, p. 98 e 99.

64
“Em suma, o que é a aura? É uma figura singular, composta de elementos
espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que
ela esteja. Observar, em repouso, numa tarde de verão, uma cadeia de montanhas
no horizonte, ou um galho, que projeta sua sombra sobre nós, significa respirar a
aura dessas montanhas, desse galho. Graças a essa definição, é fácil identificar os
fatores sociais específicos que condicionam o declínio atual da aura. Ele deriva de
duas circunstâncias, estreitamente ligadas à crescente difusão e intensidade dos
movimentos de massas. Fazer as coisas “ficarem mais próximas” é uma
preocupação tão apaixonada das massas modernas como sua tendência a superar
o caráter único de todos os fatos através da sua reprodutibilidade. Cada dia fica
mais irresistível a necessidade de possuir o objeto, de tão perto quanto possível, na
imagem, ou antes, na sua cópia, na sua reprodução. Cada dia fica mais nítido a
diferença entre a reprodução, como ela nos é oferecida pelas revistas ilustradas e
pelas atualidades cinematográficas, e a imagem. Nesta, a unidade e a durabilidade
se associam tão intimamente como, na reprodução, a transitoriedade e a
repetibilidade. Retirar o objeto do seu invólucro, destruir sua aura, é a
característica de uma forma de percepção cuja capacidade de captar “o
semelhante no mundo” é tão aguda, que graças a reprodução ela consegue capta-
la até no fenômeno único.” 49

Esta característica das massas de buscar achegar as coisas, os objetos, as paisagens, os


momentos, as pessoas, está relacionada a uma necessidade não só de possuir, de reter, mas de
tornar permanente o que na memória garantem as lembranças, evitando-se o esquecimento
indesejável, apesar da distância temporal transcorrida.
Na impossibilidade física de tornar os instantes permanentes e acessíveis à repetição, a
fotografia, detentora do poder de vencer a distância no tempo e no espaço, aparece como o
objeto capaz de atender em grande parte o imperativo tão humano de vencer a “morte” e
tornar as coisas eternas.
Tudo o que está referenciado na fotografia que segue, está impregnado pelo tempo. Os
móveis, as roupas, os eletrodomésticos, as prateleiras, as pessoas, o disco de vinil, a imagem
em preto e branco. A sensação do passado ocorre porque experimentamos na atualidade uma
realidade diferente quanto a esses elementos, e porque são objetos catalisadores de memória e
condensadores de lembranças. Sobre este registro, informa por e-mail Cínara Jorge: 50

49 BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutividade técnica, in Walter Benjamin – Obras
Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP. Brasiliense. 11 reimpressão. 2008, p. 170.
50 Ver: anexo “biografia” p. 266.

65
Fotografia 25: Imagem interna da antiga loja Casa Lopes de propriedade de Rufino Lopes e que foi em
sua época a maior loja de Três Rios/RJ. Fotografia do acervo da família de Leonor Bastos Jorge. Registro do
final da década de 40, sem fotógrafo conhecido.

“A Casa Lopes ficava na esquina da Rua Presidente Vargas com Dr.


Oswaldo Cruz. No andar superior era o Hotel Palace e hoje este prédio é ocupado
pelos escritórios do Supermercado Bramil. Mamãe (Leonor Bastos Jorge, Dona
Lola) trabalhava lá, no setor de louças por volta de 1946. Era muito estimada pelo
Sr. Rufino e família. Na foto ela está atendendo a uma cliente e me parece que tem
um ferro de passar roupas na mão.”

As reflexões teóricas e a construção de uma narrativa imagética da história da Vila de


Entre-Rios, hoje município de Três Rios, no vale do Paraíba do Sul, Rio de Janeiro, com
apoio nos registros fotográficos, permitem o conhecer e rememorar das lembranças dos
sujeitos inseridos nos espaços urbanos construídos e transformados, das memórias individuais
e coletivas elaboradas nos processos de negociação e nos embates de memórias, das memórias
silenciadas, das memórias impostas, das memórias de grupos e de trabalhadores; enfim,
memórias dos sujeitos históricos nas suas relações sociais e culturais na sociedade trirriense.

66
Paul Ricceur escreve, em sua obra, que a frase-chave que acompanha sua pesquisa é a
afirmativa de Aristóteles: “A memória é do passado”, (RICCEUR, 2010, p. 35) mas esta se
faz no presente. A fotografia também é do passado, e um dos pontos de convergência com a
memória, é que ambas vencem a distância espaço-temporal permitindo a rememoração, a
ressignificação e o compartilhamento de lembranças.
Toda lembrança é acompanhada da noção de tempo. Ricceur (2010, p. 37) afirma que
o “papel desempenhado pela distância temporal: o ato de se lembrar (mnêmoneuein) produz-
se quando transcorreu um tempo (pri khronisthênai). E é esse intervalo de tempo, entre a
impressão original e seu retorno, que a recordação percorre.” Tempo, memória, história,
recordação e esquecimento, entrecruzando-se teoricamente com a fotografia, visando à
construção de uma narrativa imagética.

67
1.4 - A fotografia, as memórias compartilhadas e a nostalgia.

“O movimento de recuperação da memória nas ciências humanas será moda


acadêmica ou tem origem mais profunda como a necessidade de enraizamento? Do vínculo
com o passado se extrai a força para a formação de identidade”. (BOSI, 2004, p. 16) O
homem sempre sentiu necessidade de olhar para o passado, mesmo quando suas articulações
em sociedade convergiam estudos e pesquisas, para as ações no presente e a construção de um
futuro próximo. Mas existem momentos de maior fragilidade do vínculo apresentado por
Ecléa Bosi, quando ocorre a perda da relação do homem com suas memórias.
Para Benjamin, o principal período da história humana de distanciamento das tradições
culturais e históricas é o da modernidade capitalista...
“Tanto uns como os outros [operários e passantes na multidão], vítimas da
civilização urbana e industrial, não conhecem mais a experiência autêntica
(Erfahrung), baseada na memória de uma tradição cultural e histórica, mas
somente a vivência imediata (Erlebnis) e, particularmente, o Chockerlebnis
[experiência de choque] que neles provoca um comportamento reativo de
autômatos “que liquidaram completamente sua memória.” 51

Esta condição de uma “vivência imediata” provoca um distanciamento das expressões


sociais e culturais formadas no passado, impregnando a sociedade de um desvalor dos espaços
físicos, das construções e das práticas de relação, dos sentimentos de nostalgia, das tradições,
que representam o “velho”, devendo estes ser substituídos e esquecidos em nome da
modernidade. O futuro também é um momento bem próximo, é o que se forma e procede na
brevidade, sujeito a pouco tempo de existência, logo superado, transformado no presente ou
desaparecido no passado.
O estudo do patrimônio cultural material dos lugares urbanos e das manifestações
sociais neles ocorridas permite entender a própria identidade social e cultural da cidade e dos
indivíduos que convivem em seus espaços, cabendo ao historiador a análise dos
vestígios/fragmentos, trazendo “uma espécie de semente da rememoração a este conjunto de
testemunhos exteriores a nós para que ele vire uma consistente massa de lembrança.”
(HALBWACHS, 2009, p. 32-33)
Constata-se então o quanto é fundamental nesta pesquisa trazer para as gerações
futuras as lembranças dos referenciais urbanos, culturais e sociais importantes para a

51 BENJAMIN, Walter. apud, LÖWY, Michel op. cit. p. 28.

68
compreensão e perpetuação do patrimônio cultural material arquitetônico da Vila de Entre-
Rios, servindo como uma aproximação entre passado e presente, superando o distanciamento
vivido na atualidade quanto às tradições e memórias.
Como realizar tal empreendimento se o processo de urbanização, essencialmente
definido pelas muitas transformações e poucas permanências na organização dos espaços
sociais, privilegia a substituição do antigo pelo moderno, fazendo desaparecer o primeiro
literalmente transformado em pó? Como não permitir que “o esquecimento, que atravessou o
rio Letes...” seja funesto, acarretando “... também à letargia da cognição do presente?” (BOSI,
2004, p. 44) A fonte historiográfica que melhor atende a essas indagações é a fotografia,
capaz de registrar e perpetuar pessoas, suas atividades, seus trajes, suas relações e os
ambientes urbanos transformados.
As imagens a seguir permitem vislumbrar a relação dos indivíduos com um dos
espaços urbanos da cidade de Três Rios, que vem servindo às análises deste capítulo, e as
mudanças provocadas no processo de urbanização, quando das transformações ou eliminação
de determinadas parcelas do lugar. A Praça São Sebastião e nela o seu antigo coreto, enquanto
ambiente de manifestações sociais, sejam elas cívicas, culturais, políticas ou
comportamentais, apresenta-se com suas memórias atreladas aos testemunhos das imagens
fotográficas.
No lugar do coreto, inicialmente foi construído, no início da década de 70, um
chafariz, eliminando de imediato todos os referenciais e lembranças das manifestações cívicas
e políticas que ocorriam em seu espaço e no entorno, desde a sua construção, permanecendo,
nos bancos a sua volta, a propriedade de permitir as relações sociais como namoros, encontros
com amigos e etc.
Em 2008, com as reformas empreendidas no governo Celso Jacob, o antigo chafariz,
que já não funcionava mais, foi substituído por um monumento em homenagem ao encontro
dos três rios – Paraíba do Sul, Piabanha e Paraibuna – que ocorre nas terras do município e
que responde pelo nome da cidade. Atualmente, na gestão do Prefeito Vinicius Farah, retorna-
se, com outros contornos, o chafariz.
Não somente este local específico, mas todo o espaço da praça foi remodelado,
criando novos significados ao ambiente público, e retomando outros perdidos anteriormente
(foi construído novamente um parquinho para as crianças), reafirmando e valorizando sua
condição de espaço de manifestações e representações artísticas, culturais, religiosas e sociais.
Todos os processos de revitalização que ocorreram na história deste lugar de relação
social do Município de Três Rios foram precedidos por uma divulgação midiática de

69
valorização de um conceito que definia as ações como uma necessidade de modernização,
atrelado à imagem administrativa de um poder executivo progressista, atuante e inovador.

Fotografia 26: Tomada externa noturna do coreto da Praça São Sebastião enfeitado para as
festividades natalinas, existindo clara representação de uma árvore de natal, com uma “Estrela de Belém” no
seu topo. Em seu interior várias crianças. Fotografia provavelmente da década de 60 do acervo Rádio Três
Rios, com autor desconhecido.

A praça é o principal espaço urbano comunitário para a convivência física e afetiva


dos moradores de uma cidade ou bairro.
“Quais seriam as características básicas que podemos captar na imagem
fotográfica de uma praça? Sim, qualquer praça: tanto as do início da segunda
metade do século XX [a Praça São Sebastião tem sua construção no primeiro

70
quartel desse período] quanto algumas das mais modernas de nossas cidades
atuais. Certamente, poderíamos mencionar suas dezenas de características mais
gerais tais como o coreto, os brinquedos infantis, o cenário dos encontros de
namorados, entre outros... Mas, sem dúvida, nada é tão marcante em seu espaço
quanto o binômio, caro ao campo da História [e da Memória],
mudança/permanência.” 52

Assim, a imagem fotográfica enquanto testemunho de memórias e lugar de


lembranças, concede ao historiador a oportunidade de não apenas perceber as
mudanças/permanências ocorridas com o avançar do tempo em determinados espaços de
relações coletivas, mas o compreender de outros aspectos da vida social que foram capturados
no ato-fotográfico. O enfeitar e iluminar o coreto durante o período natalino informa a
importância deste espaço para a sociedade, ele é visto e festejado.

Fotografia 27: Manifestação cívica política durante as comemorações da independência em 7 de


setembro, no antigo coreto da Praça São Sebastião. Na posição de destaque tem-se o prefeito César Pereira
Louro, discursando junto ao microfone e ao seu lado, de terno branco, o Profº Aquilas Rodrigues Coutinho.
Fotografia do acervo Rádio Três Rios, tomada entre os anos de 1959 a 1963, sem fotógrafo conhecido.

52 ARAUJO, Marcelo da Silva. Na imagem do passado a nostalgia do presente; memória, lazer e sociabilidade
na Praça da Lira. Disponível no site:
http://www.ffp.uerj.br/tamoios/2008.1/praca%20da%20lira%20Marcelo%20da%20Silva%20Ara%FAjo.pdf.
Acesso em: 31 de mar. 2011.

71
Na fotografia acima destaca-se a presença do prefeito César Pereira Louro lendo um
discurso, ato comum dos políticos em datas representativas da história do país, quando
ocorrem aglomerações populares, e do Professor Aquilas Rodrigues Coutinho, 53 ao seu lado,
um pouco atrás, de terno branco. A fotografia apresenta também, num segundo plano, jovens
estudantes uniformizadas, segurando bandeiras do Brasil.
Manifestação de momento cívico importante, repleto de símbolos construídos no
decorrer do tempo, nos “7 de setembro” todos cumprem determinados papeis representativos
dos poderes instituídos, exaltando e exteriorizando valores, tais como o amor a pátria e o
respeito a seus símbolos, disciplina militar, reconhecimento dos heróis da nação e etc. Com o
passar dos anos, ocorreram mudanças que refletiram a transformação política no país:
passamos pelo tempo do fervor cívico e exaltação ao Estado e seus representantes e heróis, às
manifestações populares por liberdades políticas e melhores condições sociais.
Na edição de 11 de setembro de 1954 do periódico “Entre-Rios Jornal” lê-se:
“A data de 7 de setembro, a exemplo do que ocorreu nos anos anteriores,
mereceu do povo de nossa terra o carinho devido a maior data da nacionalidade.
(...) As escolas locais, as entidades desportivas e o Grêmio Musical 1º de Maio,
com organização exemplar, deslumbraram a cidade, com o desfile magnífico e o
garbo das desfilantes. As 8 horas da manhã já a Praça São Sebastião, local do
desfile, apresentava o aspecto festivo que só a mocidade pode dar a um ambiente.
(...) De regresso [o desfile] a Praça São Sebastião, foram as bandeiras conduzidas
ao coreto, formando ai um conjunto deslumbrante. Com todos formados ao redor
do coreto, usou da palavra o Prefeito João Pedro da Silveira (...)”54

O artigo do jornal parece descrever as imagens presentes na fotografia da página


anterior, demonstrando o quanto o coreto da praça, por um bom período de tempo, serviu às
manifestações cívicas e políticas, permanecendo nas fotografias suas representações e
memórias.
Além de permitir constatar os usos sociais ocorridas no coreto da Praça São Sebastião,
tem-se temáticas diversas nas fotografias relacionadas. A necessidade de problematizar uma
série de novos temas pela história condicionou a historiografia moderna à utilização de outras
fontes diversas aos textos escritos, bem como a aproximação com as ciências sociais e a
memória.

53 Ver: anexo “biografia”, p. 265.


54 BRILHANTES as homenagens ao “Dia da Pátria”. Entre-Rios Jornal. Três Rios/RJ, ano XX, de 11 de
setembro de 1954, capa.

72
Nesta linha de avaliação, observam-se na próxima fotografia a presença, em primeiro
plano, de jovens alunas uniformizadas; e em segundo plano, adultos e crianças no interior do
coreto e ao alto, faixa onde se encontram escritas as seguintes palavras: “Salve os heróis da
Grande Guerra”.

Fotografia 28: Tomada externa do coreto da Praça São Sebastião em mais uma manifestação cívica,
nesta fotografia da década de 50 do acervo Rádio Três Rios, sem autor conhecido.

É possível relacioná-la aos estudos das manifestações cívicas/políticas do Estado


brasileiro, por ser registro de uma homenagem aos pracinhas do Exército que estiveram
presentes em combate na Itália durante a 2ª Guerra Mundial. Na imagem - onde se observa
também ao centro a tosca escada de madeira que foi utilizada para afixar a faixa de um lado e
uma vara de bambu do outro -, percebe-se certo desinteresse dos presentes, principalmente
das jovens e das crianças, pela atividade ou o aguardar do início das comemorações.
Os uniformes são semelhantes aos usados pelas alunas da fotografia da página 71,
ocorrendo mudança visível apenas nas boinas [boinas claras x boinas escuras] e nesta, apesar
da maioria se encontrar de costas, não temos o uso de gravatas como observado no referido
registro.
Durante a década de 50, tem início a padronização dos uniformes escolares definidos
pela saia de pregas, blusa de fustão (tecido com algodão riscado), meias ¾, sapatos pretos, e

73
gravatas para as meninas, e o uso de luvas em eventos cívicos. Um detalhe interessante é
constatar que, no coreto, os indivíduos que podem ser visualizados, tanto adultos quanto
crianças e jovens – alguns segurando bandeiras -, são todos do sexo masculino. O evento é
uma manifestação em homenagem a membros de exército nacional e à época não era
permitida a presença feminina entre seus contingentes. Sendo um reduto masculino, as
mulheres eram aceitas apenas em atividades de apoio humanístico, como a da enfermagem.

Fotografia 29: Jovens confraternizando no interior do coreto da Praça São Sebastião nesta tomada
externa realizada entre o final dos 50 e o início dos 60. Fotografia do acervo Rádio Três Rios, sem autor
conhecido.

A praça pode ser entendida como um espaço urbano de encontros entre variados
atores sociais, em constantes fruições cotidianas, arquitetando seus sentidos e hábitos a partir
das práticas do lugar, em suas atitudes e posturas coletivas. O antigo coreto era espaço para
diversas manifestações sociais, e as mudanças ocorridas nos últimos tempos serviram para a

74
eliminação de alguns símbolos que se formaram no decorrer de sua história, e para a
reafirmação de outras tantas representações que permanecem.

Fotografia 30: Vista panorâmica da Praça São Sebastião, tirada do Condomínio Edifício José Vaz, na
década de 80. Em destaque, abaixo, à direita, em primeiro plano, o chafariz que substituiu o coreto, e em
segundo plano, ao fundo à esquerda, a Igreja Matriz de São Sebastião, padroeiro da cidade. Disponível no site:
http://tresrioscriativa.com.br/pracasjardins/136. Acesso em 25 de agos. de 2010.

Atualmente os usos imputados à Praça São Sebastião, principalmente pelas duas


últimas administrações municipais, reforçam a participação popular representativa de todas as
camadas sociais da cidade, o que havia se perdido em momentos anteriores. Várias foram as
transformações nesse espaço durante o período histórico de sua existência. Assim, cabe ao
historiador entender e escrever sobre as ações humanas, que nas relações micro e macro
permitem que o ocorrido não se perca e que memórias não repousem no esquecimento.

75
1
3 4 5
2
6 7

Fotografia 31: Vista panorâmica da Praça São Sebastião, tirada do Condomínio Edifício José Vaz em
2010, mesma tomada da fotografia anterior observando-se ao centro a obra em homenagem ao encontro dos
Três Rios, e no primeiro plano, (8) o Centro de Inclusão Digital. A praça recebeu ainda, na sua remodelação
em 2008, (6) um anfiteatro, (7) e um pequeno parque de diversão. Na imagem pode-se ver ainda: (2) a sede da
Prefeitura Municipal de Três Rios, (1) a Igreja Matriz de São Sebastião, (3) o Teatro Celso Peçanha, (4) a Casa
de Cultura e (5) a sede dos Correios. Disponível no site: http://drpedropaulo.com.br/contatos.html. Acesso em
11 de set. de 2011.

A imagem fotográfica apresenta-se como fragmento da realidade mais afiançado para


se manter a lembrança, testemunho da memória de indivíduos ou de uma coletividade, mesmo
que não se tenha percebido ou vivenciado o momento e o espaço de afinidade congelado em
seu referente. Barthes apresenta no texto que segue, uma relação dúbia entre seu próprio
conceito do “isso foi” – a imagem referenciada na fotografia -, e a imprecisão nebulosa da
memória.
“Diante de uma foto, a consciência não toma necessariamente a via
nostálgica da lembrança (quantas fotografias estão fora do tempo individual),
mas, sem relação a qualquer foto existente no mundo, a via da certeza: a essência
da Fotografia consiste em ratificar o que ela representa. Certo dia, recebi de um
fotógrafo uma foto minha, sendo-me impossível, apesar de meus esforços, lembrar-
me de onde ela fora tirada; eu examinava a gravata, o pulôver, para descobrir em
que circunstância eu os tinha usado; trabalho inútil. Todavia, porque era uma

76
fotografia [destaque do autor], eu não podia negar que eu tinha estado lá (mesmo
que eu não soubesse onde). Essa distorção entre a certeza e o esquecimento me
deu uma espécie de vertigem, e como que uma angústia policial ( o tema de Blow-
up não estava distante); fui ao vernissage como a um inquérito, para enfim tomar
conhecimento daquilo que eu não sabia mais a meu respeito.
Nenhum escrito pode me dar essa certeza.” [nosso destaque] 55

Fotografia 32: Vista panorâmica noturna da Praça São Sebastião de 6 de dezembro de 2011, também
tirada do Condomínio Edifício José Vaz, mesma tomada das anteriores, com a decoração de Natal organizada
pela Prefeitura Municipal de Três Rios. Fotógrafo Yassuo Imai, disponível na sua página social do Facebook.
Acesso em 01 de janeiro de 2012.

Na experiência de Barthes, o ato fotográfico foi realizado de forma não consciente,


mas este não pode ser desconsiderado, porque a imagem referendava um determinado instante
de sua vida que ele “não podia negar que... tinha estado lá (mesmo que eu não soubesse
onde)”. Ocorre nesta experiência um desacordo com a memória, mas a impossibilidade de
recusar o que está representado na fotografia provoca-lhe uma “distorção entre a certeza
(impressão de que o momento que sobressai na imagem realmente aconteceu) e o
esquecimento” (a lembrança não encontra na memória o registro daquela experiência, o

55 BARTHES, Roland. op. cit. p. 127 - 128.

77
instante então supera a condição de algo esquecido e adentra ao campo da irrealidade, do não
ocorrido, confrontando diretamente a qualidade primeira da fotografia de se apresentar como
semelhante à realidade).
Nenhum registro por mais descritivo que se apresente “pode... dar essa certeza”, sejam
estes testemunhos de memórias individuais, ou das memórias dos tempos de relação de outras
pessoas ou grupos sociais. Porém, a fotografia em sua construção histórica como registro,
adquiriu “socialmente” tal status (representação do real) e esta condição permite que, sobre
certos aspectos, seja possível a uma imagem fotográfica remeter-nos quase automaticamente à
dimensão nostálgica por meio do seu referente, mesmo que este represente um tempo
individual diferente do sujeito que interpreta, analisa ou apenas observa a fotografia. “Para
confirmar ou recordar uma lembrança, não são necessários testemunhos no sentido literal da
palavra, ou seja, indivíduos presentes sob uma forma material e sensível.” (HALBWACHS,
2009, p. 31)
Na edição de domingo, 3 de abril de 2011 do jornal “O Globo”, em um trecho da
reportagem “Exposição de fotos revela o passado do Rio - Memórias da Cidade reúne
imagens das décadas de 50 e 60, que fazem parte do acervo da Agência O Globo”, vemos
algumas imagens deste acervo, em exposição que reuniu 65 fotografias separadas por temas
como mobiliário urbano, transporte e arquitetura.
No final do artigo encontra-se destacada a opinião do designer visual da exposição Jair
de Souza que, analisando as fotografias, afirma que estas “mostram a atmosfera diferente, que
existia no Rio: __ Tem a foto do Parque Shanghai, que hoje voltou a ser visitado, de um
homem ouvindo jogo do Brasil num rádio de pilha enquanto fazia a barba. É uma época que
você não conheceu, mas [da qual] sente saudade”.
O sentimento nostálgico se define numa leitura positiva que floresceu nos últimos
tempos, contrária às interpretações da atitude nostálgica que a relaciona às expressões de
melancolia, sofrimento, depressão e tristeza. A fotografia então conduz a uma lembrança não
representativa de uma realidade vivida, experimentada, não apenas por sua construção
ocorrida num tempo distante, histórico, mas por uma aspiração da natureza do sentimento de
atração pelo passado, por um período ou um lugar que estabelece associações agradáveis,
surgindo “voluntária ou involuntariamente, como instrumento gerador da utopia, ancorado
(...) nos sonhos de um outro lugar e de um outro tempo”. (BEBIANO, 2000)
As memórias e as lembranças podem ser constituídas nas experiências de relação, como
também nas diversas formas de percepção do nosso mundo de existência e do mundo do
outro.

78
Fotografias 33, 34, 35 e 36: Da esquerda para direita, de cima para baixo: (1) tomada de um parquinho
na Praça São Sebastião em frente à antiga sede da Escola Estadual Condessa do Rio Novo (atualmente Fórum e
Casa de Cultura); (2) registro do concurso Garota Simpatia de 1968, promovido pela Rádio Três Rios em
comemoração pelos seus 21 anos, nas dependências do Clube Atlético Entre-Rios – CAER; (3) e (4) tomadas do
desfile cívico de sete de setembro com apresentação da bateria do Colégio Cenecista Walter Franklin e de uma
das quermesses realizada na Igreja São Sebastião. Fotos da década de 1960, sem fotógrafo conhecido, do
acervo Rádio Três Rios.

As atividades referenciadas nos registros fotográficos anteriores são práticas ainda


presentes em nossa sociedade. Apesar de tantas mudanças sociais ocorridas no passar do
tempo, são percebidas e experimentadas por muitos, sendo possível observarem –
nostalgicamente também -, semelhanças e diferenças com relação aos momentos presente e
passado.
Quantas lembranças são movimentadas nas memórias das pessoas quando nos
deparamos com as crianças brincando em um parquinho na praça? As atividades religiosas

79
com procissão, barraquinhas de salgados e doces, fogos de artifício, ruas enfeitadas, pessoas
com “roupa de ir à missa”, nostalgicamente removem do esquecimento as lembranças de
tempos experimentados ou apenas percebidos nos discursos de outros, referendados na
imagem fotográfica. Desfiles cívicos, bailes populares, programas de rádio, concursos de
beleza, passeios na praia, jogo de futebol nos estádios ou nos pequenos campinhos de terra
batida... ao observar tais eventos, tem-se a memória no comparecimento vivo de uma imagem
das coisas passadas, que retornam ao presente pela lembrança reencontrada, movimentada e
compartilhada pelos referentes presentes nas fotografias.

Fotografia 37: Registro externo de uma Locomotiva da Estrada de Ferro Central do Brasil na Estação
Ferroviária de Entre-Rios, na década de 1930. Fotografia do acervo Sr. Altair, sem fotógrafo conhecido.

Assim ocorre, por exemplo, com as representações atreladas às estradas de ferro que
permeiam a memória dos espaços urbanos de muitas cidades no Brasil, que têm suas
formações vinculadas à presença das estações, dos trilhos, dos trens e dos funcionários das
companhias ferroviárias. No caso de Três Rios, das Estradas de Ferro D. Pedro II – depois
Central do Brasil e Leopoldina Railway Company Limited.

80
“As Estações Ferroviárias fundaram cidades, centralizaram a vida das
povoações, serviram como agência de correios, trouxeram o progresso e foram em
geral construídas com arquiteturas diferentes, desde as mais suntuosas até as mais
simples. Porém, até os anos 50 eram em geral construções bonitas. Hoje em sua
grande maioria abandonadas, somente permanecem ativas aquelas que se
transformaram em estações de trens metropolitanos, as que se estão no caminho
dos poucos trens turísticos e as poucas que são utilizadas como central de
recebimento de cargas pelas atuais concessionárias das ferrovias.” 56

A importância das atividades desenvolvidas pelas estradas de ferro e em seu entorno,


concedeu a formação de símbolos e representações que criaram uma composição de
mensagens socialmente significativas, possíveis de retomar na atualidade por meio de
lembranças nostálgicas. O estudo das memórias vinculadas historicamente a estes símbolos e
representações pode obter, não só de outras fontes como a oralidade e os documentos escritos,
também na fotografia elementos para a sua compreensão.
O Sr. Altair Tavares afirma que, ao receber a fotografia anterior dos ferroviários, esses
confirmaram ser esta a primeira locomotiva que saiu das oficinas da cidade. Na edição nº 43
de 14 de dezembro de 1935, do periódico “Entre-Rios Jornal”, foi publicado o seguinte artigo
– também sem autor relacionado -, acompanhado da fotografia que segue após:

“Com ótimo resultado realizou-se domingo último, a experiência da


composição confeccionada nas oficinas da 7ª Inspetoria da Locomoção, nesta
cidade, chefiada pelo distinto e esforçado engenheiro Dr.º Maurício Mont´Mor.
Trata-se de sete carros de passageiros, para o serviço de transporte de veranistas
da Linha Auxiliar. Esses veículos que são 4 de 1ª classe, 2 de 2ª e um de chefe de
trem, bagagem e correio, - foram cuidadosamente condicionados e seu
acabamento já vem demonstra algum esforço da direção e dedicados operários da
7ª I. L.
Os referidos carros apresentam em geral boa disposição, conforto,
segurança e aspecto agradáveis em seu acabamento, quase luxuosos. Os de 1ª
classe são dotados de mobiliário moderno e todo em couro, com iluminação
elétrica, “toilette” e aparelho sanitário com o máximo de higiene. Os de 2ª classe,
que pouco diferem dos de 1ª, têm bancos de madeira confortáveis e aparelho

56 GIESBRECHT, Ralph Mennucci. Texto de apresentação do blog. Disponível:


http://www.estacoesferroviarias.com.br/index.html. Acesso em: 09 de set. 2011.

81
sanitário e “toilette” equivalentes aos de 1ª, do ponto de vista higiênico. O tempo
de construção foi de 8 meses e o custo aproximado de cada carro é de 40:000$000.
ENTRE-RIOS JORNAL sente-se jubiloso em poder oferecer ao público uma
demonstração dos esforços e competência dos laboriosos operários da I.L. 7, aos
quais apresenta felicitações, que são extensivas ao Ilustre engenheiro Dr.º
Maurício Mont´Mor, Sr. Hoddo Dottori, respectivamente chefe e mestre daquele
importante departamento federal.”Na verdade a locomotiva conduzia os vagões
que foram confeccionados em Três Rios.” 57

Fotografia 38: Tomada da Estação Ferroviária da Estrada de Ferro Central do Brasil em Entre-Rios, no
final de 1935. Fotografia do acervo André Mattos, sem autor conhecido.

Neste texto vê-se que, nas oficinas da 7ª Inspetoria da Locomoção, foi construída uma
composição de sete carros de passageiros e não uma locomotiva. Desta forma, numa
confrontação entre o testemunho oral e o artigo publicado no jornal, o primeiro não se
confirma. Chama à atenção a similaridade entre a locomotiva captada pela fotografia da
página 80 e a que aparece acima, com grande possibilidade de que os dois registros
fotográficos tenham sido realizados no mesmo dia, pela presença de duas crianças, de suas

57. OS PRIMEIROS carros de passageiros confeccionados nas oficinas da Estrada de Ferro Central do Brasil.
Entre-Rios Jornal. Três Rios/RJ, ano I, nº 43 de 14 de dezembro de 1954, p. 2.

82
roupas (são parecidas), e em ambas as imagens, elas estão com a atenção direcionada ao
fotógrafo.
Desta forma, a análise das fotografias e a notícia do jornal da época começariam a
corrigir a informação prestada pelos ferroviários, e obviamente, uma pesquisa em arquivos da
empresa – se existirem – ou a entrevista com algum dos trabalhadores remanescentes das
oficinas, reafirmariam ou não o vinculado.
A fotografia é uma fonte histórica que, como outros documentos que receberam
importância na atualidade, imputa ao historiador a necessidade de uma abordagem
diferenciada das fontes escritas, utilizadas mais comumente, o que não invalida a sua
condição de documento testemunho de memórias.
As fotografias então se qualificam como lugares de lembrança dos testemunhos de
outros, que permanecem “vivos” no referente fotográfico, incitando não só uma leitura
rememorativa de fatos e ações dos sujeitos históricos em seu tempo, mas também, através do
olhar no presente, delinear as lembranças em comum; sem perder a condição de fonte e objeto
de estudos e pesquisas multidisciplinares, permitindo abarcar temáticas diversas, passando do
campo nostálgico para o das ciências humanas e destes para o campo dos estudos de
memórias.
“Todavia, quando dizemos que o depoimento de alguém que esteve presente
ou participou de certo evento não nos fará recordar nada se não restou em nosso
espírito nenhum vestígio do evento passado que tentamos evocar, não pretendemos
dizer que a lembrança ou parte dela devesse subsistir em nós da mesma forma,
mas somente que, como nós e as testemunhas fazíamos parte de um mesmo grupo e
pensávamos em comum com relação a certos aspectos, permanecemos em contato
com esse grupo e ainda somos capazes de nos identificar com ele e de confundir o
nosso passado com o dele.” 58

Fazemos parte de uma coletividade social e o nosso testemunho reflete muito do que
absorvemos das relações nesta sociedade. Os referenciais de memória que formamos também
espelham esta realidade, independente do tempo e dos espaços de relação de existência do ser.
Incluo-me no grupo de pessoas onde os referenciais, e não apenas estes, ligados à presença
das estradas de ferro, estão presentes na memória; assim ocorre com outras pessoas e outras
realidades.

58 HALBWACHS, Maurice. A Memória Coletiva. Nova tradução de Beatriz Sidou. São Paulo/SP: Centauro,
2009, p. 33.

83
“Nesse sentido, a busca ávida por traços distintivos de uma época, idílica, sempre se
nos apresenta pulsante ao encararmos uma imagem já recuada no tempo.” (ARAUJO)
Ademais, num outro “canto” deste conceito, é possível que o olhar de um fotógrafo do tempo
presente observe no mundo ao seu redor, lugares, pessoas, hábitos, que encontrem
similaridades ao experimentado e percebido por outras pessoas no passado, como também o
será no tempo futuro; serão sempre como memórias compartilhadas.
A confrontação de uma série de fotografias, mesmo que de autores diferentes, de um
mesmo tempo histórico ou não, mas referindo-se a um mesmo grupo e espaço social, permite,
além do reencontro nostálgico de lembranças, uma leitura/conhecimento das transformações e
permanências dos lugares sociais e das memórias dos indivíduos e da coletividade inserida
nestes espaços. Ao mesmo tempo, concede também uma construção historiográfica através de
uma narrativa imagética dos aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais, encontrando-
se ou não paralelo com outras fontes históricas. Nos registros fotográficos...
“(...) podemos acompanhar as transformações do espaço urbano: a relva
que cresce livre, a ponte lançada sobre o córrego, a divisão dos terrenos, a
primeira venda, o primeiro bazar. As casas crescem do chão e vão mudando:
canteiros, cercas, muros, escadas, cores novas, a terra vermelha e depois o verde
umbroso. Arbustos e depois árvores, calçadas, esquinas... uma casa pintada de
azul que irradia a luz da manhã, os terrenos baldios, as ruas sem saída que
terminaram em praças ermas inacabadas por dezenas de anos.” 59

Cada espaço vivido surge com funções originalmente particulares e distintas, e no seu
processo de formação as suas respectivas histórias e memórias se entrelaçam. Os registros
fotográficos revelam-se de suma importância por permitirem a observação cuidadosa dos
processos de rupturas, continuidades e sobreposições arrastados no âmbito das alterações
urbanas. A compreensão faz-se possível pelo papel de registro dos fatos em tempos históricos
que, principalmente o material fotográfico disponível de diversos acervos concede. “Esquecer
um período da vida é perder o contato com os que então nos rodeavam.” (HALBWACHS,
2009, p. 37)
Jean Duvignaud afirma que Maurice Halbwachs demonstra ser impossível “conceber o
problema da recordação e da localização das lembranças quando não se toma como ponto de
referência os contextos sociais reais que servem de baliza a essa reconstrução que chamamos
de memória”, (DUVIGNAUD, 2009, prefácio p. 7-8) estabelecendo que a pesquisa

59 BOSI, Ecléa. op. cit. p. 73-74.

84
historiográfica não deva se desvincular de uma apreciação das memórias coletivas. A
experiência compartilhada da memória através das interações sociais é fator formador da
identidade dos sujeitos, e suas lembranças são resultados deste processo, preservando uma
experiência histórica repleta de valores e tradições culturais.
Mais do que a expressão do olhar do fotógrafo, para a construção de uma narrativa
imagética do processo de urbanização da Vila de Entre-Rios, os registros analisados nesta
pesquisa são testemunhos de memórias coletivas de grupos diversos que se relacionam neste
especifico espaço social.
“Não esqueçamos que a memória parte do presente, de um presente ávido pelo
passado, cuja percepção “é a apropriação veemente do que nós sabemos que não nos pertence
mais,”” e a imagem fotográfica é “uma coisa viva... que sobe do passado com todo o seu
frescor. Chamada de novo, trabalhada pela percepção do agora, arrisca-se a fugir da captura
de um presente que não se reconhece nela.” (BOSI, 2004, p. 20)

85
CAPITULO I I

Fotografia, História e Memória: pesquisa e narrativa imagética.

2.1 – A proposta temática e metodológica

“Diante de uma imagem – por mais antiga que seja -, o presente jamais
cessa de se reconfigurar (...). Diante de uma imagem – por mais recente, por mais
contemporânea que seja -, o passado, ao mesmo tempo, jamais cessa de se
reconfigurar, porque essa imagem só se torna pensável em uma construção da
memória.” 60

Uma narrativa imagética da Vila de Entre-Rios, atualmente a minha cidade de Três


Rios, analisando as inter-relações entre fotografia, história e memória: assim apresenta-se a
proposta temática deste trabalho. Já me havia relacionado com os dois primeiros elementos,
na construção da monografia final do curso de Licenciatura em História e, desejando
continuar por este fascinante caminho do campo historiográfico, outro “ingrediente” aportou
nesta pesquisa: a memória.
A memória, a narrativa e a história, são analisadas por alguns autores como
representações de coletividades sociais, em determinados tempos e espaços históricos,
instituídos pelas ações dos sujeitos inseridos nestes grupos. A fotografia é construída no ato-
fotográfico por um ator, que teceu suas memórias a partir das diversas interações que
alimentou com outros indivíduos, apresentando-se no presente não só como lugar de
lembrança deste sujeito, mas também, numa perspectiva que se amplia para a condição de
testemunho das representações sociais de diversos grupos, nos seus espaços de relação.
Para alinhavar esta narrativa, entendo a fotografia, então, como testemunho de
memória e fonte da história. Tal proposta de investigação fomenta uma discussão
historiográfica, que considera o registro fotográfico nesta sua dupla dimensão, privilegiando-o
como um lugar de lembranças relacionadas a todas as representações a elas associadas, sejam
histórias de vidas, sejam as histórias da formação e transformação dos espaços urbanos de
relação, além de fonte de um período histórico específico.
Assim, a narrativa imagética formulada neste trabalho não é apenas o rememorar das
lembranças ou do que foi esquecido de um ou poucos indivíduos – o(s) sujeito(s)

60 DIDI-HUBERMAN, Georges apud NASCIMENTO, Roberta Andrade do. Charles Baudelaire e a arte da
memória. Disponível no site: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-
106X2005000100004. Acesso em: 01 de dez. 2011.

86
constituidor(es) das imagens fotográficas -, mas sim, as memórias de uma coletividade,
resultado das diversas interações sociais ocorridas durante o recorte temporal escolhido, sem
desconsiderar que as narrativas históricas refletem sempre um procedimento contínuo de
escolha e reconstrução dos vestígios do passado, realizado no presente pelo historiador.
O ato de narrar, de contar experiências, para Walter Benjamin “está em vias de
extinção. São cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente” (BENJAMIN,
2008, p. 197), ocorrendo com dificuldade no mundo atual. No pensamento do autor,
assinalado em sua tese O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov, de 1936, a
narrativa faz referência à memória tornando-se fonte de histórias. São discursos carregados de
ensinamentos, experiências, que se perdem na contemporaneidade, porque o homem está cada
vez mais privado da faculdade da comunicação interpessoal. Pouco do que possuímos está a
serviço da narrativa histórica.
A imagem fotográfica e a memória encontram uma interlocução com a narrativa, arte
em desaparecimento, ou, para algumas leituras modernas, em transformação ou adaptação aos
novos canais de comunicação, espelho da aceleração do tempo e das vivências próprias da
contemporaneidade.
A compreensão da verdadeira extensão da narrativa em seu abarcamento histórico
encontra-se, segundo aquele autor, no entrecruzamento de dois tipos arcaicos: o marinheiro
(aquele que viaja e tem inúmeras experiências a serem compartilhadas), sendo analisado como
o que vem de longe; e o camponês (aquele que conhece as histórias e tradições do lugar de
relação de suas vivências), que traduzia em relatos a sabedoria prática – definida como a
sugestão organizada na substância viva da existência -, que havia acumulado. Dois modos de
vida que produziram seus respectivos grupos de narradores.
Estes dois personagens representam o tempo (camponês) e o espaço (marinheiro),
elementos de intersecção que permitem diálogos entre fotografia e narrativa, e destas com a
memória e a história.
A narrativa procede da tradição oral compartilhando memórias. É a expressão de um
trabalho artesanal que se realiza sobre a matéria-prima da experiência, tendo como modelos
originais o conto de fadas, as lendas. “O narrador retira da experiência o que ele conta: sua
própria experiência ou a relatada pelos outros. E incorpora as coisas narradas à experiência
dos seus ouvintes.” (BENJAMIN, 2008, p. 201) Por isso é aquele que sabe dar conselhos, e
aconselhar é conceder uma sugestão sobre a extensão de uma história que está sendo narrada.
Depois vieram os artesãos, que aperfeiçoaram esta arte. Com eles, o poder de narrar
movimentava o contador de histórias por inteiro. "Na verdadeira narração, a mão intervém

87
decisivamente, com seus gestos, aprendidos na experiência do trabalho, que sustentam de cem
maneiras o fluxo do que é dito." (BENJAMIN, 2008, p. 220-221) E os gestos colaboram para
a formação mental das imagens extraídas e compartilhadas do que está sendo narrado.
Assim como a análise de imagens fotográficas e a memória, diferentemente do
romance a narrativa não tende para o finalizar, justificando sempre novas histórias,
imaginadas, reconstruídas e rememoradas em alguns momentos, daquilo que foi narrado no
passado, no seu início, do que se tornou tradição. “Ela não se entrega. Ela conserva suas
forças e depois de muito tempo ainda é capaz de desenvolver.” (BENJAMIN, 2008, p. 204) E
também como a fotografia e a memória, a narrativa vence o tempo preservando-se, como
escreveu Benjamin, à maneira das sementes de trigo que por milhares de anos, inseridas nas
câmaras das pirâmides no Egito, conservaram suas condições germinativas. (BENJAMIN,
2008, p. 204)
A imagem, enquanto componente inerente à natureza humana (a memória é
constituída de imagens, rememorar é formar imagens mentais), é um dos mecanismos
desencadeadores da memória, apresentando-se a fotografia como o equivalente visual da
lembrança, permitindo recordar o tempo passado, criando sentidos que ensejam narrativas
históricas. Como uma narrativa, o registro fotográfico prossegue “contando” e retendo as
lembranças, as experiências, conservando-se na memória do novo “ouvinte visual”, (como
lembranças compartilhadas) quando da retransmissão da história no presente, sendo esta
condição primordial para a sobrevivência da memória.
O que podemos apreender de Benjamin é a exemplaridade da narrativa, ou seja, ela se
faz a partir de uma determinada perspectiva e um determinado olhar.
“A narrativa ganha faces, plasticidades, feições e cenários capturados pela
câmara fotográfica. Registrar imagens, guardá-las e contar o que foi fotografado é
um processo dinâmico em que os significados contidos nas fotografias, capturados
por quem apertou o botão, são recriados por quem as guarda e recontados por
quem as mostra.” 61

A ligação da narrativa com a memória, a fotografia e a história, é evidente, e no caso


em particular desta dissertação, irei traçar a narrativa imagética a partir de dois momentos
cronológicos que se enfocam no recorte temporal entre 1861 e o final da década de 1930:

61 JUSTO, Joana Sanches. Narrar histórias, fotografar momentos: tecendo intersecções entre narrativa oral e
álbuns de fotografias. Disponível no site:
http://www.unioeste.br/prppg/mestrados/letras/revistas/travessias/ed_005/artecomunicacao.htm. Acesso em: 01
de dez. 2011.

88
1º Momento: Da formação urbana da Vila de Entre-Rios até a formalização da
condição de 2º Distrito de Paraíba do Sul (1861 a 1890) e;
2º Momento: Entre-Rios, de 2º Distrito de Paraíba do Sul até o termino do movimento
de emancipação política e econômica (1890 a 1939).
A partir de tais recortes, observei as seguintes categorias imagéticas: as paisagens
urbanas pré-definidas – ponte, estações, ruas, praças, igrejas, prédios e as relações sociais
experimentadas nestes espaços: manifestações populares, grupos organizados em torno de
propostas culturais, religiosas, esportivas e políticas, permitindo perceber as condições de
formação de uma sociedade que, ao mesmo tempo em que constrói este espaço urbano,
estabelece fronteiras sócio-culturais. Mas por recorrer a uma concepção de tempo não linear,
as narrativas ensejadas pelas imagens fotográficas, em algumas oportunidades, conduzem a
momentos que transpassam o recorte temporal estabelecido.
As fotografias mostram os lugares que, mesmo transformados ou inexistentes na
atualidade, ainda são “pisados” como outros o fizeram no passado, permitindo o recontar,
reavivar, rememorar, compartilhar e preservar as memórias do tempo de formação sócio-
espacial da cidade de Três Rios, por meio de uma narrativa imagética.
Os campos de estudos teóricos se definiram então na relação entre a fotografia, a
história e a memória. Mas qual(is) a(s) dimensão(ões) e pensamento(s) poderia(am) servir
para “unir” os ângulos do triângulo? Que discurso(s) serviria(am) para uma descontinuidade
ou discordância entre as partes? E a fotografia, enquanto testemunho de memórias, lugar de
lembranças, também fonte de estudos e análises pela História, de que maneira interfere nesta
relação, contribuindo para a construção historiográfica?

FOTOGRAFIA

HISTÓRIA MEMÓRIA

Na sua relação com a história, a fotografia se apresenta como fonte capaz de conceber
o encontro entre passado e presente, aproximando os tempos históricos ao responder as
indagações formuladas nas pesquisas historiográficas. Reminiscências individuais e coletivas

89
fragmentadas do passado, os registros imagéticos permitem a formulação de discursos
narrativos pelo historiador, reconhecendo o fato histórico e atribuindo-lhe sentido no presente,
propiciando, assim, novas leituras no campo contínuo das construções e reconstruções
históricas.
Fonte que conserva na imagem bidimensional os referentes culturais e sociais da época
do ato-fotográfico, a fotografia relaciona-se com um elemento primordial à história: o tempo.
Cria, então, um diálogo entre este instante inicial (pela perpetuação das presenças e ausências)
e a lembrança e o esquecimento, expondo a inseparável trama existente entre a memória, a
narrativa imagética e a história.
Pelo lado deste triângulo que converge até a memória, a fotografia assume sua
condição de testemunho capaz de ativar e compartilhar lembranças, fundamental para a
transição entre a memória e a história. Lugar de lembrança ou esquecimento, apresenta-se
também, como testemunho das batalhas de memória, permitindo perceber as manipulações
políticas, culturais, sociais ou religiosas que definiram ao longo da história, o que pode ser
lembrado e o que deve ser esquecido nos processos de rememoração, interferindo diretamente
na formação da identidade de indivíduos e grupos e, consequentemente, na constituição
historiográfica. Inegável a capacidade da fotografia de provocar recordações, apresentando-se
como um dos principais mecanismos da linguagem desencadeadora da memória.
É também ponto de referência como indicadores empíricos da memória coletiva,
constituindo coleções e acervos que, arquivados, organizados e divulgados, são patrimônios
culturais que celebram as atividades da memória, cumprindo papel social fundamental numa
sociedade que prima pela idéia de que o progresso e a modernidade podem abrir mão do
passado.
Na relação da história com a memória observa-se, como aponta Jacy Alves de Seixas
(2004, p. 38), um momento crescente de revalorização da memória (falas, direito e dever de
memória), convivendo com um movimento inverso que indica descaso ou fragilidade teórica
por parte dos historiadores. A memória torna-se com isso uma prisioneira da história, uma
verdadeira memória historicizada, restando a esta (a memória) os lugares de memória,
vivendo apenas sob o olhar de uma história reconstituída. Entendo que, na atualidade, a
aceitação e análise, pela historiografia, da subjetividade das experiências humanas no
processo de relação social e formação das identidades, aproximam esses campos do
conhecimento humano.
A história, tal qual a memória, relaciona-se com a descontinuidade do tempo,
apresentando-se ambas, neste estudo teórico, como a base do triângulo, a sustentação da

90
pesquisa. Benjamin apontou, em suas teses sobre a história, os limites para a enumeração de
fatos e eventos ao longo de um tempo homogêneo e linear, homogeneidade que afasta a
historiografia da memória.
Na atualidade, os historiadores ligados aos campos da História Cultural, Social, da
História do tempo presente e da História Oral, distanciam-se tanto do conceito de uma história
como apontamento fidedigno do passado, como do abatimento da memória a apenas um
elemento de reconstrução seletiva do passado. Ao valorizar a subjetividade dos sentimentos e
vivências dos indivíduos nos seus processos de interação social, constroi-se um espaço no
interior da narrativa histórica, que dá visibilidade àqueles que não aparecem no registro
documental, elaborando as narrativas dos grupos esquecidos por outros campos da
historiografia.
Trazer para a história uma dimensão da existência humana fundada na subjetividade
estabelece uma conexão possível da história com a memória, porque esta não obedece apenas
à razão, mas a tudo o que participa do conjunto constituído das identidades. Encontrar e
entender valores, culturas, modos de vida, representações das diversas sociedades e de seus
indivíduos formadores, em seu tempo e espaços históricos, aproxima a memória com a
história pesquisada, a estudada e a narrada. Assim, entendo que fotografia, memória, narrativa
e história podem dialogar, apesar de suas diferenças e especificidades.
Tempo, espaços urbanos e a representação das relações e identidades sociais: são estas
as três linhas principais que unem os pontos do triângulo teórico formado, que se distribuem e
se inter-relacionam, permitindo a construção de uma narrativa histórica. Dessas, acredito que
o tempo é o objeto presente com a capacidade ímpar de unir os elementos da pesquisa, tempo
fragmentado, descontínuo, instituído de substrato móvel, fluído e sensível, o tempo
qualificado da lembrança. Em consonância com os estudos teóricos de Paul Ricceur, entendo
que memória, lembranças e esquecimentos são níveis intermediários entre o tempo e a
narrativa histórica.
A Memória e a História são “um trabalho sobre o tempo, mas sobre o tempo vivido,
conotado pela cultura e pelo indivíduo.” (BOSI, 2004, p. 53) A problemática comum a ambas
é a representação/reconstrução do passado e a relação com o tempo e as fontes para a prática
historiográfica. A fotografia insere-se no contexto por perpetuar o momento de um tempo
existido, experimentado com objetivos, propostas, desejos, ideologias; testemunho das
memórias das ações e dos empreendimentos dos homens no seu momento histórico.

91
A fotografia é antes de tudo imagem-presença de uma coisa ausente, referenciada na
memória preservada, que vence o tempo e o espaço da sua formação no ato fotográfico, até a
análise dos pesquisadores das ciências humanas. Considero, para as reflexões deste trabalho,
o entendimento de que imaginar é evocar ou rememorar lembranças através de imagens –
porque toda memória reivindica imagens -, distanciando-me da relação comum da imaginação
com o fantástico, com a ficção.

Mesmo uma lembrança evocada por um odor familiar, um sabor, uma sensação ou por
uma melodia, surge na memória através das imagens de objetos, momentos e pessoas que
afetaram a alma em algum momento de sua experiência histórica. “Parece, mesmo, que a
volta da lembrança pode fazer-se somente no modo de tornar-se-imagem [imagem-
lembrança].” (RICCEUR, 2010, p. 26) Imagens-representação, que permitem a apreensão e o
conhecer das ações e práticas do sujeito histórico em seu espaço de relação social, “sensíveis
ao mesmo tempo à pluralidade das clivagens que atravessam uma sociedade e à diversidade
dos empregos materiais ou de códigos compartilhados”. (CHARTIER, 1991, p. 177)

A percepção, por meio de uma experiência viva e direta com a imagem fotográfica,
permite que aqueles que não conviveram com o espaço de relação registrada na fotografia
construam em sua memória uma imagem-lembrança, compartilhada e ressignificada pelas
informações históricas que análise e estudos possibilitam. E as lembranças descortinadas,
rememoradas podem e devem acompanhar os registros fotográficos em qualquer meio de
preservação e divulgação (museus áudios-visuais, livros, sites na internet, circuitos culturais,
entre outros).

A valorização da fotografia e consequentemente a sua preservação, enquanto


patrimônio cultural e social de uma comunidade, consente não somente o entendimento de
que “nada temos de melhor que a memória para garantir que algo ocorreu antes de formamos
sua lembrança” (RICCEUR, 2010, p. 26), mas também tornar presente uma grande parcela do
que foi esquecido, enquanto rastros apagados ou ruínas abandonadas, retornando ao seu lugar
na história, pelo olhar daqueles que superaram as condições impostas, por uma historiografia
voltada apenas para os vencedores dos embates de memória.

92
2.3 - Vila de Entre-Rios, uma narrativa imagética.

Neste trabalho, centro meus estudos no período de formação do Município de Três


Rios, onde ocorreu a primeira configuração dos espaços urbanos de relações sociais, que
foram registrados por meio das imagens fotográficas: desde o momento em que se chamava
Vila de Entre-Rios, até o findar do movimento de emancipação de Entre-Rios, então distrito
da cidade de Paraíba do Sul/RJ, sucedido nos últimos anos da década de 1930.

2.3.1 - 1º Momento: Da formação urbana da Vila de Entre-Rios até a


formalização da condição de 2º Distrito de Paraíba do Sul (1861 a 1890).

2.3.1.1 - A Ponte das Garças

Fotografia 39: Vista externa da Ponte de Entre-Rios atualmente Ponte das Garças. Observam-se ao
fundo no segundo plano os morros na maior parte ainda com sua floresta original – Mata Atlântica, e a
esquerda no primeiro plano, dois indivíduos nas cabeceiras da ponte. Fotografia de Revert Henry Klumb de
1861/1866. 62 As fotografias de Klumb fazem parte de diversos acervos.

62 Ver: anexo “biografias”, p. 269.

93
Considero a Ponte das Garças como o marco determinante do processo de urbanização
da cidade de Três Rios, pois a sua construção originou, a alguns poucos quilômetros adiante,
o local da Estação Rodoviária de Entre-Rios, núcleo inicial da Vila de Entre-Rios; ambas são
obras da Companhia União Indústria. A ponte por sua importância e sendo também a primeira
fotografia a ser analisada, apresento a sua história, compreendendo os motivos da edificação
sobre o rio Paraíba do Sul, próxima à região denominada a época de Três Barras. 63

Fotografia 40: Recorte da fotografia 39 destacando dois homens nas laterais da cabeceira da Ponte
das Garças, na margem esquerda do rio Paraíba do Sul, próximos aos imponentes pilares originais. A presença
destes indivíduos permite perceber o tamanho dos pilares, servindo de escala. Acredito que Klumb posicionou
esta pessoas com o objetivo de demonstrar a “grandiosidade” da obra.

63 “A designação Três Barras é devido ao encontro em um mesmo ponto dos rios Paraibuna (água escura), que
vem de Minas Gerais e Piabanha (água manchada), que vem de Petrópolis, com o rio Paraíba do Sul (rio ruim
para navegação), que vem de São Paulo. Os rios Paraibuna e Piabanha são, portanto, importantes afluentes do rio
Paraíba do Sul e o raro acidente geográfico das barras dos dois rios em um mesmo ponto, um encontro de três
rios...” DAVID, Eduardo Gonçalves. Projeto Cultural Comemorativo do 150º aniversário da Rodovia União e
Indústria – 1861 – 2011. Enviado a mim por correio eletrônico, pelo próprio autor, que atualmente reside na
Espanha.

94
No início de 1848, o Imperador D. Pedro II, percorre as fazendas de café do interior da
província do Rio de Janeiro, em um roteiro com saída de Petrópolis, passando por Sumidouro,
pela Vila da Paraíba do Sul e por Vassouras. Nesta viagem recebe uma reivindicação dos
fazendeiros, “sustentáculo político e financeiro da monarquia” (DAVID, 2009, p. 107), para a
realização de melhorias nas estradas, sobretudo no Caminho Novo. A economia brasileira no
século XVIII era essencialmente agrícola, voltada para a exportação, tendo como principal
produto, o café, exigindo estradas em condições de servir como vias de escoamento da
produção.

Fotografia 41: Pilar original da Ponte das Garças aproveitado pela ponte ferroviária da Estrada de
Ferro Leopoldina. Imagem presente no Projeto Cultural Comemorativo dos 150º Aniversário da Rodovia União
e Indústria – 1861 – 2011 de Eduardo Gonçalves David, sem informação da data e autor do registro.

Pelo Decreto Imperial nº. 1.301 de 7 de agosto de 1852, aprovado pela Assembléia
Geral Legislativa em 11 de setembro daquele ano, o Imperador D. Pedro II, autorizou a
construção e exploração, por 50 anos, pela Companhia União e Indústria, de duas linhas de
estrada (...)
“(...) começando nos pontos mais apropriados à margem do Rio Paraíba,
desde a Vila deste nome até o Porto Novo do Cunha, se dirijam uma até a barra do
Rio das Velhas, passando por Barbacena, e com ramal desta cidade para a de São
95
João Del Rei e outra pelo município de Mar de Espanha, com direção à cidade de
Ouro Preto; e desejando promover, quanto possível o benefício da agricultura e do
comércio das indicadas localidades, facilitando as comunicações entre aqueles
pontos e as relações entre as duas Províncias do Rio de Janeiro e de Minas
Gerais...” 64

Como iniciativa privada do Comendador Mariano Procópio Ferreira Lage, apoiado


inteiramente pelo Imperador, com participação de fazendeiros da Zona da Mata mineira
preocupados com as melhorias dos meios de transporte de suas produções, a estrada União e
Indústria acabou se configurando na primeira rodovia pavimentada do Brasil.
O contrato para a realização da obra foi aprovado pelo Decreto de S. M. Imperial D.
Pedro II nº. 1755 de 19 de março de 1856, iniciando a 1ª seção de Petrópolis a Pedro do Rio,
em 12 de abril do mesmo ano, com uma cerimônia de inauguração, onde se fizeram presentes
o Imperador e a Imperatriz Tereza Cristina.
O acordo definia, nos dois primeiros parágrafos, quanto ao traçado da estrada, o
seguinte:
1.ª A companhia União e Indústria obriga-se a construir e conservar á sua
própria custa uma linha de estrada que, começando em Petrópolis, se dirija á
margem direita do rio Paraíba junto a ponte em construção, defronte da vila do
mesmo nome. Esta estrada deverá tocar no lugar denominado Três Barras (ou seja,
passando por ai a linha principal, ou por via de um ramal dela derivado no ponto
que mais convier), e oferecerá em qualquer estação do ano, cômodo e seguro
trânsito para carros de quatro rodas, carruagens e diligências (...)
2ª A estrada considerar-se-á dividida em duas seções: a 1ª começa em
Petrópolis e termina no lugar ou fazenda denominada do Pedro do Rio; a 2ª será
desse lugar até á ponte em construção defronte da vila da Paraíba do Sul,
compreendendo o ramal para o lugar denominado Três Barras, se houver de ser
construído por não convir que toque nesse ponto a linha principal, seguindo-se
quando for possível o alinhamento feito para a estrada de ferro projetada pela
imperial companhia de navegação e estrada de ferro de Mauá.” 65

64 DAVID, Eduardo Gonçalves. A mula do ouro: paixões e dramas por trás da construção de rodovias e
ferrovias na única monarquia das Américas. Niterói/RJ: Editora Portifolium, 2009, p. 113.
65 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1856 – Decretos – digitalizado na página da Center for Research
Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ.
Disponível nos sites: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u833/000081.html e
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u833/000082.html. Acesso em: 9 de set. de 2011.

96
rio Paraíba do Sul
• Fazenda Três Barras
1
Três Rios
Região conhecida no final do séc. XIX
2 3 como Três Barras, atualmente,
Moura Brasil, distrito de Três Rios.
Ponte das Garças

Fotografia 42: Imagem aérea gerada pelo Google Pro em 2009, extraída do “Inventário das Fazendas
do Vale do Paraíba Fluminense.” 66 Toda a região próxima à Fazenda Três Barras e ao (1) encontro dos três
rios (Paraíba do Sul, Paraibuna e Piabanha), era conhecida à época como Três Barras. À esquerda observa-se
(2) a Ponte das Garças; cortando o mapa de baixo para cima, a (3) atual estrada BR 040, que liga a cidade do
Rio de Janeiro/RJ com Juiz de Fora/MG; e da esquerda para a direita, com maior volume de água, o rio
Paraíba do Sul.

Observa-se que o acordo mencionava a possibilidade de a estrada passar por Três


Barras como linha principal ou como ramal (parágrafo 1º), conforme estudos anteriormente
elaborados pelo major Júlio Frederico Koeler (1840). Este arquiteto alemão foi encarregado
pelo Imperador de produzir novos mapas, a partir da ponte de Paraibuna até Petrópolis,
estabelecendo um caminho que efetivamente viesse cortar estas terras.
Instituir que o percurso atravessasse a ponte defronte à Vila da Paraíba do Sul
(parágrafo 2º), atendia, naquele momento, aos interesses dos fazendeiros de café da região do
vale do Paraíba. O prazo para a construção das duas seções foi determinado em quatro anos,
após a assinatura do acordo.

66 Inventário das Fazendas do Vale do Paraíba Fluminense. - Fazenda Três Barras/RJ – Disponível no site:
http://www.institutocidadeviva.org.br/inventarios/sistema/wp-content/uploads/2009/11/21_faz_tres_barras.pdf.
Acesso em: 24 de set. 2011.

97
A obra demandava diligências notáveis para os engenheiros e operários, pois o
percurso era entrecortado por cursos d’água e pelas escarpas graníticas da serra do Taquaril. O
Comendador Lage contratou para a empreitada os engenheiros: Antônio Maria de Oliveira
Bulhões, brasileiro, que foi o responsável pelo trecho entre Petrópolis e Três Barras (Aquém
Paraíba), nos territórios da atual cidade de Três Rios/RJ, e o alemão José Keller, que assumiu
a responsabilidade do trecho Três Barras a Santo Antônio do Paraibuna (Além Paraíba), atual
Juiz de Fora/MG.
A definição do percurso da 2ª seção da estrada foi fundamental para a escolha do local
da construção da Ponte das Garças e da edificação, adiante, da Estação Rodoviária de Entre-
Rios. No relatório apresentado por Mariano Procópio a Assembléia Geral dos Acionistas da
Companhia União e Indústria, em 7 de maio de 1863, a ponte aparece com a denominação de
Ponte de Entre-Rios, limite entre as duas seções da estrada.
Atendendo a uma determinação do acordo, a empresa apresentou, à presidência da
Província do Rio de Janeiro, plantas organizadas pelo engenheiro Antonio Bulhões, no dia 20
de junho de 1857, indicando que pretendia seguir o seguinte trajeto para a 2ª seção da estrada:
“(...) descer o rio Piabanha, desde o Pedro do Rio, pela Barra-Mansa,
Posse, confluência do Rio-Preto e fazenda de Francisco Gomes, até o lugar
chamado João Gomes, na margem direita do rio da Paraíba; lançar um ramal por
este rio abaixo até as Três-Barras, e com outro subir até a ponte de pedra em
construção defronte da vila da Paraíba do Sul.” 67

A Companhia União e Indústria sinaliza, então, que a estrada, na sua 2ª seção, teria um
trecho de Petrópolis até Três Barras, com outro ramal indo até a ponte na Vila da Paraíba do
Sul, não garantindo que desta seguiria pelo Caminho Novo até a ponte de Paraibuna, na divisa
entre as províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Tal iniciativa ensejou a indicação do engenheiro Cristóvão Bagott Lane, pelo vice-
presidente João Manuel Pereira da Silva, conforme consta do seu relatório, apresentado a
Assembléia Legislativa da Província do Rio de Janeiro, na 2ª Seção da 12ª legislatura, no ano
de 1857, para proceder aos exames necessários sobre a linha que deveria seguir a estrada, na
sua 2ª seção, segundo o determinado no contrato.

67 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na página da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível nos sites:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000119.html e http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000120.html. Acesso em: 10 de
set. 2011.

98
Antes de assinalar as instruções ao engenheiro, João M. P. da Silva relaciona o que
definiu como “histórico da questão”, descrevendo o trajeto do antigo Caminho Novo:
“A antiga estrada de Minas Gerais à cidade do Rio de Janeiro chegava ao
Porto da Estrela, situado à margem direita do rio Inhomerim; dai por mar era a
comunicação com a capital do império. Essa estrada foi construída às expensas dos
cofres gerais e provinciais de Minas e Rio de Janeiro.
Entrava na província deste último nome pela ponte coberta sobre o rio
Paraibuna, que separa os limites de ambas as províncias. Do Paraibuna seguia
para a vila da Paraíba do Sul, assentada sobre a margem esquerda do rio do
mesmo nome; e dai, atravessando-o até agora em barcas, mas logo que findar a
ponte de pedra, que se está a muitos anos construindo, e que brevemente ficará
concluída, vinha pelos lugares denominados Governo, Lage, Cebolas, Patupulba,
Secretario, Pegado, Pedro do Rio, Sumidouro, Manga Larga, Olaria, Córrego Seco
hoje Petrópolis e fabrica da pólvora. Havendo a presidência da província do Rio de
Janeiro conseguido realizar uma navegação regular por vapor ao porto de Mauá,
construir uma via férrea dai à fabrica da pólvora, e subir a serra até Petrópolis por
uma estrada normal de rodagem; pensou desde logo em fazer seguir pelo mesmo
sistema e com o mesmo desenvolvimento a mencionada estrada, continuando-a de
Petrópolis para diante.” [grifo nosso] 68

Fotografia 43: Visão lateral da Ponte do Paraíba, construída na Vila da Paraíba do Sul. Sem
informação do fotógrafo e da data do registro, acervo de André Mattos.

68 Ibidem, disponível no site: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000117.html. Acesso em: 10 de set. 2011.

99
João Manoel P. da Silva deixa claro que o pensamento do governo da Província do
Rio de Janeiro, era o de se utilizar de parte do Caminho Novo, que ligava a ponte de
Paraibuna a Petrópolis, passando pela Vila da Paraíba do Sul. A ponte, indicada neste trecho,
sobre o rio Paraíba do Sul, foi...
“Idealizada por Júlio Frederico Koeler, e demorou muitos anos para ficar
pronta devido a diversos problemas. Quem conseguiu terminá-la foi Irineu
Evangelista de Souza – o Barão de Mauá, que trouxe da fundição da Ponta da
Areia, que hoje leva o seu nome, as peças de metal que não podiam ultrapassar 3
metros, porque vinham em lombo de burro subindo a serra da Estrela.” 69

Fotografia 44: Vila da Paraíba do Sul/RJ em 1861, ano de inauguração da estrada União e Indústria,
observando-se na foto a Ponte do Paraíba inaugurada em 1857, e uma vista da cidade com construções em
ambas as margens do rio Paraíba do Sul. Estampa litográfica em cartão (a partir de original fotográfico) do
álbum Brazil Pitoresco. Fotografia de Victor Frond, do acervo da Biblioteca Nacional. 70

69 Informação enviada a mim por Cínara Jorge, através de correio eletrônico.


70 RIBEYROLES, Charles. Álbum “Brasil Pitoresco”. Paris. 1861. Disponível na biblioteca digitalizada:
http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_iconografia/th_christina/icon1113654/icon1113654_22.jpg. Acesso em
23 de set. 2010.

100
Iniciada em 1836, em atenção ao pedido encaminhado pelo Barão do Piabanha,
Hilário Joaquim de Andrade, para substituição da passagem pelo rio por barcas, a ponte do
Paraíba, por onde deveria passar a 2ª seção da estrada, foi entregue ao trânsito somente em 13
de dezembro de 1857, antes de terminada a União e Indústria. Esta ponte foi pavimentada de
cimento, em substituição aos antigos pranchões de madeira em 1921, pelo governo do Estado
do Rio de Janeiro, sendo engenheiro o Drº Margarino Torres, com reinauguração em 22 de
janeiro de 1922.
Ao evitar este percurso por questões econômicas e políticas, Mariano Procópio
favorece a formação urbana daquela que seria no futuro, a cidade de Três Rios.
Ainda quanto ao escrito do vice-presidente da província do Rio de Janeiro, antes de
encerrar retoma os dois artigos iniciais do contrato, para informar que a 1ª seção encontrava-
se praticamente finalizada - o que ocorreu em 18 de março de 1958, com marco do alto da
Vila Thereza, em Petrópolis, indo até Pedro do Rio (em 01 de abril deste mesmo ano,
começou o serviço de transporte em duas diligências) e depois, para afirmar, mais uma vez,
que a 2ª seção deveria findar na ponte defronte a Vila da Paraíba do Sul, compreendendo o
ramal para Três Barras, “se houver de ser construído por não convir que toque nesse
ponto a linha principal”. [grifo nosso] 71
A missão do engenheiro Lane era definir, então, o melhor percurso que corresponderia
às condições contratuais, em relação à 2ª seção da estrada, sendo-lhe lembrado que os pontos
obrigados pelo convênio são apenas dois: Paraíba do Sul e Três Barras, “o primeiro sempre
como fim; o segundo como ramal ou intermediário.” [grifo nosso] 72
A solicitação de José Manuel ao engenheiro afirmava-se na pretensão da direção da
companhia (contrária à vontade do governo fluminense), aventado em ofícios dirigidos a ele,
de levar a estrada, que construía na província de Minas, pelo registro do Paraibuna até Três
Barras, e não à Vila de Paraíba do Sul. Segundo esta, seria mais dispendiosa e inconveniente a
linha direta a aquela vila, sendo impossível atender as normas de construção determinadas no
contrato, pois era necessário desviar-se do segmento acidentado da estrada de Paraibuna até
Paraíba do Sul e do caminho de Cebolas, embora tendo que vencer a serra do Caniço em
Correias, próximo de Petrópolis.
Assim, para a companhia de Mariano Procópio, os dois trechos da 2ª seção se
“encontrariam” na Ponte de Entre-Rios, a ser construída na região de Três Barras.

71 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na página da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000118.html. Acesso em: 10 de set 2011.
72 Ibidem, disponível no site: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000119.html. Acesso em: 10 de set. 2011.

101
Outro motivo para a mudança do itinerário, segundo Eduardo David (2009, p. 110-
111), foi porque Mariano Procópio não conseguiu apoio de Hilário Joaquim de Andrade, o
Barão do Piabanha - presidente da Câmara de Vereadores da Vila de Paraíba do Sul -, e de
João Gomes Ribeiro de Avelar, o Barão de Paraíba, que exigiram a divisão dos pedágios
cobrados para a utilização da Ponte do Paraíba.
A opção era a utilização do ramal por Três Barras, possível de ser concretizado porque
o Major Antonio Barroso Pereira 73 concedeu a extensão de terras necessária para a estrada,
cortando as Fazendas de Cantagalo e Boa União, de sua propriedade, sem cobrança de valor
algum.
Esta alternativa também atendia aos interesses econômicos dos fazendeiros de café da
Zona da Mata mineira, pois a mudança no percurso economizaria 21 km de extensão da
estrada, mesmo que para tanto fosse preciso gastar 400 contos de réis somente na construção
da Ponte de Entre-Rios. O pedágio cobrado seria revertido integralmente aos cofres da
Companhia União e Indústria.
É preciso assinalar que houve manifestação contrária da Câmara Municipal da Vila da
Paraíba do Sul, apresentada por ofício ao governo da Província do Rio de Janeiro, quanto a
esse interesse da empresa, conforme consta do relatório de 1857 74, sustentada nas seguintes
considerações:
1º - que a direção da estrada do Paraibuna até a Vila da Paraíba do Sul, e desta para
Petrópolis, seria mais regular e direta mesmo para a província de Minas-Gerais;
2º - que a finalidade e a intenção do contrato seriam de levar a estrada de Petrópolis á
Vila da Paraíba do Sul, tirando-se o ramal no lugar mais conveniente para a comunicação com
Três Barras, considerando-se a hipótese de seguir a estrada em direção a Três Barras, e deste
ponto à Vila da Paraíba do Sul, apenas no caso da primeira via não atender as condições do
contrato;

73 “O território trirriense nada mais era do que uma grande fazenda chamada Cantagalo. Esta fazenda pertencia
ao Barão de Entre Rios – Antônio Barroso Pereira (Júnior como se vê em alguns documentos). O Barão teve
apenas um casal de filhos, o 2º Barão e Visconde de Entre Rios - Antônio Barroso Pereira (este foi o 3º com o
mesmo nome na família), e a Viscondessa, mais tarde Condessa do Rio Novo - Mariana Claudina Barroso
Pereira.” NASCIMENTO, Cínara Maria Basto Jorge Andrade do. Paraíba do Sul e região. Disponível no site:
http://www.cbg.org.br/cartamensal/CM93.pdf. Acesso em 05 de jan. 2012.
74 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na página da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível nos sites:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000117.html e http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000118.html. Acesso em: 11 de
set. 2011.

102
3º - que a província do Rio de Janeiro preparava-se para construir esta estrada à sua
custa, e a teria executado se a Companhia União e Indústria não se apresentasse para a
realização do projeto;
4º - que sendo a estrada feita com auxílio da presidência do Rio de Janeiro, mediante a
garantia de juros por esta efetuada, e em seu território, a obra deveria ser antes um beneficio
para os habitantes da província, e não para os de Minas Gerais;
5º - que o beneficio da província do Rio de Janeiro somente se conseguiria pela linha
direta de Pedro do Rio à Vila da Paraíba do Sul, porque era grande, à época, a produção das
fazendas de café no entorno do rio Paraíba. Além de sustentar aquela localidade, lugar de
comércio e trânsito de tropas, também não se perderia a grande ponte de pedra defronte a vila,
cujo investimento da província do Rio do Janeiro foi de cerca de 600:000 (seiscentos contos
de réis), ficando abandonada do trânsito;
6º - que os fazendeiros mais importantes da região, incluídos nas terras que se
estendem do rio Paraíba ao rio Paraibuna, e os da margem direita do Paraíba, além de parte
dos fazendeiros de Paty do Alferes e Valença, ficariam privados da estrada, porque a viagem
para eles seria mais longa e mais dispendiosa, com os seus produtos mais sobrecarregados no
preço pelas despesas de transporte;
7º - que a Companhia União e Indústria nunca explorou e nem fez explorar a linha
direta do Pedro do Rio à Vila da Paraíba do Sul o que possibilitaria comprovar ou não, se a
mesma serviria a uma estrada de rodagem.
Encerra o vice-presidente as suas orientações ao engenheiro Cristóvão Bagott Lane,
afirmando que:
“Todas estas considerações de uma parte e de outra, devem ser apreciadas
por Vm para orientá-lo na sua comissão, e fazê-lo compreender melhor a
necessidade que sente a presidência do Rio de Janeiro, de ficar bem esclarecida
para se poder resolver a direção da estrada” 75.

O parecer do engenheiro C. B. Lane foi entregue em 21 de agosto de 1857, constando


da exposição realizada por Thomaz Gomes dos Santos, vice-presidente da Província do Rio
de Janeiro, em 29 de julho de 1858, quando da entrega da administração ao presidente
conselheiro Antonio N. Tolentino. Lane afirmou ser preferível o traçado apresentado pela
companhia.

75 Ibidem, disponível nos sites: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000121.html. Acesso em: 11 de set. 2011.

103
Apesar deste resultado e por entender ser mais prudente, em vistas das manifestações
da Vila de Paraíba do Sul, Tomaz G. dos Santos resolveu (...)
“(...) nomear em 23 do dito setembro uma comissão composta do
mencionado coronel Galdino Justiniano da Silva Pimentel, do tenente-coronel
Jacintho Vieira do Couto Soares e do major Sergio Marcondes de Andrade, para,
em vista das referidas plantas, parecer do engenheiro Lane, e demais papéis
relativos a este assunto, estudar de novo o terreno, examinar o antigo traço, e os
trabalhos sobre eles feitos, verificando se seria possível melhorá-lo, e comparar o
resultado de tais investigações com a linha proposta pela companhia; devendo
ainda ter em consideração, indagar, e ponderar o provável volume dos produtos
da província que teria de ser transportado por uma ou por outra das duas
projetadas direções da estrada, averiguando para isso qual delas atravessaria
terrenos mais habitados e produtivos presentemente, qual a que comunicaria tais
outros de maior uberdade, posto que menos cultivados ou produtivos na
atualidade, qual de semelhantes direções a que proporcionaria comunicações a
esta parte da província que mais delas estivesse carecendo; tendo para tal fim em
vista as irradiações das estradas ora existentes nessas localidades; levantando as
necessárias plantas, e fazendo os devidos orçamentos, etc., (...) resolução esta que
comuniquei ao diretor dos trabalhos da estrada o dr. Manoel de Mello Franco
(...)”. 76

Estas determinações demonstram que as ponderações apresentadas pela Câmara


Municipal da Vila da Paraíba do Sul, e a influência política de seus representantes, por algum
tempo ainda mantiveram o embate.
Mesmo tomando esta providência, Tomaz G. dos Santos deferiu, em 28 de outubro de
1857, a solicitação do presidente da Companhia União e Indústria que, considerando o
prejuízo que poderia ocasionar a suspensão dos trabalhos da estrada, enquanto se examinava e
resolvia a pendência da 2ª seção, requereu permissão para construir um ramal até Três Barras,
na direção indicada pelas plantas.
Em 29 de dezembro de 1857 a comissão, por meio de ofício, apresenta o parecer final
informando que o traçado...

76 Exposição realizada pelo Sr. Thomaz Gomes dos Santos, vice-presidente da Província do Rio de Janeiro em
29 de julho de 1858 ao entregar a administração ao presidente conselheiro Antonio N. Tolentino, digitalizado na
pagina da Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/789/000084.html. Acesso em: 12
de set. 2011.

104
“... que começa na margem esquerda do Piabanha e do córrego do Rosário,
segue ao açude da Cachoeira no vale de Jó Grande, subindo pelo morro deste
nome à chácara do doutor Cunha, na estrada velha, de onde continua até o alto do
mesmo morro, e dai segue ao vale do córrego das Marrecas, indo deste ponto á
ponte terminal do Paraíba; (...) é mais vantajosa do que a apresentada pela
companhia União e Indústria, tanto para os fazendeiros do lado ocidental do
município de Paraíba, e parte dos de Valença e Vassouras, (...) como para própria
companhia”. 77

Fotografia 45: Recorte do Mapa da Estrada Real, destacando o trecho em laranja do Caminho Novo,
percurso que, segundo o governo da Província do Rio de Janeiro, deveria seguir a Estrada União e Indústria.
Em cinza claro o percurso da atual BR 040, que liga o Rio de Janeiro/RJ a Juiz de Fora/MG, e que utiliza em
seu itinerário alguns trechos da antiga União e Indústria. 78

77 Ibidem, disponível nos sites: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/788/000096.html e


http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/788/000097.html. Acesso em: 11 de set. 2011.
78 MAPA da Estrada Real, disponível no site: http://www.mitxplorer.com.br/2012/01/31/programa-roteiros-
planilhados-da-estrada-real/. Acesso em 22 de jan. de 2012.

105
1
2

Fotografia 46: Planta da Estrada União e Indústria, destacando-se (1) a Estação de Entre-Rios, (3) a
Vila da Paraíba do Sul e (2) a Ponte de Entre-Rios, atual, Ponte das Garças. “Planta e Perfil Longitudinal da
Estrada da Companhia União e Indústria.” (KLUMB, 1995, p. 189)

106
Encerra Thomaz a sua exposição, afirmando que apresentou à Companhia União e
Indústria a conclusão da comissão, não tendo recebido, até a data da apresentação do relatório
junto a Assembléia Legislativa da Província do Rio de Janeiro, resposta alguma. Entendeu
ser...
“Incontestável é que a companhia (...) não convém um traço que a desvie da
sua grande linha de Minas, de que a estrada que atravessa a província do Rio de
Janeiro não é mais do que a continuação e o necessário prolongamento para
chegar ao litoral, em que se acha o grande mercado, que aquela primeira
província demanda”. 79

Estas últimas palavras definem bem o que desejava a companhia naquele momento,
quanto ao traçado da 2ª seção da Estrada União Indústria. Na seqüência dos relatórios, o
embate político/econômico perde sua força.
Mariano Procópio Ferreira Lage conseguiu finalizar seu empreendimento graças às
suas boas relações com o Imperador, e à percepção do Major Antonio Barroso Pereira,
diplomado por D. Pedro II, em 1852, com o título de Barão de Entre-Rios, que vislumbrou
possibilidades de negócios e comercialização da produção de suas fazendas, com a passagem
da estrada em suas terras.

A União Indústria foi inaugurada cinco anos após a assinatura do contrato, em 23 de


julho de 1861, com uma viagem do Imperador D. Pedro II e comitiva, de Petrópolis a Juiz de
Fora, descrita na obra “Doze horas em diligência”, de Revert Henry Klumb, publicada em
1872, um guia do viajante de Petrópolis a Juiz de Fora, trabalho que o autor definiu como:
“(...) uma ligeira descrição dos lugares notáveis, atravessados por uma
estrada magnífica. Esta obra não tem merecimento senão o de ser: o primeiro guia
ilustrado de desenhos copiados da fotografia (...) A idéia primeira é de 1861, em
1863 trabalhei nela, em 1864, 1865 e 1866 acabei as vistas, em 1870 tratei da
publicação com um editor e enfim em 1872 vejo-a realizada!” 80

A Ponte das Garças é um patrimônio tombado pelo Conselho Municipal de Cultura de


Três Rios, através da Lei Municipal nº 1919 de 23/02/1994, DC n. 2.113 de 26/06/1997.

79 Exposição realizada pelo Sr. Thomaz Gomes dos Santos, vice-presidente da Província do Rio de Janeiro em
29 de julho de 1858 ao entregar a administração ao presidente conselheiro Antonio N. Tolentino, digitalizado na
pagina da Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/788/000097.html. Acesso em: 11
de set. de 2011.
80 KLUMB, Revert Henry. Doze horas em diligência – Guia do Viajante de Petrópolis a Juiz de Fora. In:
Anuário do Museu Imperial – Edição Comemorativa. Petrópolis/RJ: Editora Gráfica Serrana, 1995 p. 123.

107
Considerada a maior obra de engenharia da estrada União e Indústria, foi edificada
sobre o rio Paraíba do Sul, com 153 metros de extensão, três vãos de 51 metros e pilares de
1,80 metros de espessura. As vigas da cabeceira mediam 5,30 metros de altura e largura de
5,50 metros, “formando uma caixa em treliça metálica montada no local. O engenheiro José
Keller, responsável pelas obras Aquém Paraíba, acompanhou de perto o serviço de montagem
das peças importadas da Inglaterra.” (DAVID, 2009, p. 107) Foram utilizadas 300 toneladas
de ferro, 12.000 tijolos e 78 metros cúbicos de madeira empregada no soalho.

Fotografia 47: Desenho realizado da fotografia 39, presente no livro de Klumber, que na introdução
afirmou: “Esta obra não tem o merecimento se não o de ser: o primeiro guia ilustrado de desenhos copiados da
fotografia.” (KLUMB, 1995, p. 123, desenho na p. 154) Vê-se à direita a Fazenda das Garças, ausente no
citado registro.

Com a chegada dos trilhos da Estrada de Ferro D. Pedro II a Entre-Rios, a Companhia


União & Indústria “fica totalmente sem cargas, pois não fazia sentido pagar mais caro e levar
mais tempo transportando o café da zona da mata mineira para o Rio de Janeiro, apenas para
utilizá-la.” (DAVID, 2009, p. 189) Pelo decreto 4.320 de 13 de janeiro de 1869, D. Pedro II
transfere os bens desta empresa para a Estrada de Ferro D. Pedro II, assumindo o comando da
maior ferrovia do Brasil, no dia seguinte, o Comendador Mariano Procópio F. Lage; o que
comprova a sua boa relação com o Imperador.

No decorrer dos anos, a Ponte das Garças sofre modificações, tanto para receber os
trilhos da Estrada de Ferro Leopoldina Railway, quanto pela construção, ao seu lado, de uma

108
ponte para a estrada rodoviária, tendo em vista o crescimento urbano de Três Rios para além
da margem direita do rio Paraíba do Sul, em uma das “saídas” para a BR 040, que atualmente
tem seu trajeto passando por fora do centro da cidade, ligando o Rio de Janeiro/RJ a Juiz de
Fora/MG.
A construção da ponte de concreto não tem sua data conhecida pelos pesquisadores da
cidade. No jornal “Arealense”, de sábado, 09 de janeiro de 1926, 81 um acanhado texto, sem
autor, ajuda a esclarecer esta dúvida: “O pontilhão sobre o macadam, próximo à Ponte das
Garças, foi substituído por uma boa e bonita ponte de cimento armado”; sendo possível que a
fotografia 50 seja o registro desta obra.

Fotografia 48: Neste registro realizado entre a década de 1930 e início de 1940, observa-se um ônibus
da Viação Rio-Minas da linha Rio/Juiz de Fora e o seu motorista, que posa ao lado do veículo, na ponte
rodoviária construída ao lado da Ponte das Garças. Ao fundo, destaca-se à direita, a Fazenda das Garças. Sem
informação do fotógrafo, pertence ao acervo Sr. Altair.

Pode-se considerar que a nota seja pequena para uma notícia importante, mas este
informativo apresentava-se com artigos maiores na capa e parte da página 2, e pequenas notas
nas 2 e 3, e a publicidade tomando o espaço total da página 4. Não existe, também, próximo
ao local nenhuma outra ponte, mesmo menor, que pudesse ter noticiada sua construção.

81 PONTE de cimento armado. Arealense. Três Rios/RJ. Ano XXV, sábado, 9 de janeiro de 1926, nº 1.254, p. 3.

109
Na fotografia 48, visualizam-se as alterações realizadas na ponte, no seu lado
esquerdo, para que pudesse receber os trilhos da Estrada de Ferro Leopoldina, permanecendo
ainda os seus pilares originais. O morro à esquerda e ao fundo difere da fotografia 39 por não
possuir mais a sua mata original, consumida a sua madeira com a derrubada das árvores no
decorrer dos anos.
Ao fundo, à direita, aparece a Fazenda das Garças, casarão de estilo neoclássico
construído em 1860, pertencendo, juntamente com os 80 hectares do seu entorno, a três
gerações da família Werneck Santos – na época desta fotografia eram proprietários o Sr.º
Álvaro Werneck e sua esposa Eliza Werneck. Foi vendida em 1997, pela viúva de Antonio
Luiz Werneck Santos, ao empresário Isaias da Silva, que no mesmo ano iniciou a demolição
do prédio com intenção de construir uma moradia moderna. Abandonado o projeto, o casarão
e demais construções foram “esquecidos”, sem preocupação com sua integridade, o que
determinou a ação de vândalos e a sua destruição no início deste século.
Analisando a fotografia, o engenheiro e historiador Eduardo G. David afirmou que
“pelos meus cálculos [esta ponte] deve ter uns 6,20 metros de largura, inferior à atual 82, que
tem uma passagem de pedestre na lateral.” Comparando com a imagem no recorte da
fotografia 50, tem-se que a estrutura metálica não foi modificada desde a realização deste
registro.
Em destaque, também, o ônibus da linha Rio/Juiz de Fora e ao lado, seu motorista.
Este modelo tinha carroceria nacional e mecânica americana. Da marca “International”,
provavelmente foi fabricado no ano de 1934, sendo do tipo C-1, construído pela Empresa
Grassi, fundada em 1904 por iniciativa dos irmãos Luiz e Fortunato Grassi, que possuía
oficinas no nº. 37 da Rua Barão de Itapetininga, em São Paulo/SP. Modelo semelhante
realizava o percurso entre Juiz de Fora/MG e Entre-Rios/RJ, no ano de 1935.
Logo no início do trecho da estrada União e Indústria, na direção que levaria à Estação
Rodoviária, havia a Casa do Pedágio, chalé de madeira no estilo de todas as construções da
empresa, que era utilizada também, como residência do guarda cobrador e sua família.
Nas fotografias 49 e 50, a construção destaca-se bem próxima a Ponte das Garças e a
linha da estrada de ferro. Alguns memorialistas afirmam que, nos dois registros, temos a
figura do importante cronista do jornal “Arealense”, o Antonio Villela de Carvalho Junior -
“Totonho Villela”, que assinava seus artigos com o pseudônimo de “Vê Jota”, na figura do

82 Ver fotografias da página 116 e 117.

110
sujeito mais velho. Na primeira imagem, este indivíduo encontra-se no segundo degrau da
escada.

Fotografia 49: Nesta imagem vê-se a Casa do Pedágio, parecendo não estar mais em condições para
servir de moradia, nada indicando que estaria sendo utilizada à época. Na borda inferior à direita, os trilhos da
Estrada de Ferro Leopoldina, que passavam bem à frente. Registro com aproximação temporal entre a década
de 1900 e o final da década de 1930, com fotógrafo desconhecido, acervo Sr.º Altair.

No recorte da fotografia 50, percebe-se que a estrutura metálica não se assemelha à


original, provavelmente ocorrendo esta mudança para a sua utilização como ponte ferroviária.
A composição é bastante diferente da observada na fotografia da página 111, que se
assemelha, em muito, às condições atuais, conforme se vê nos registros 53 a 55. Além disso,
aparece, também, no recorte, o que seria a construção ou revitalização da ponte rodoviária: as
imagens confirmam que as fotografias 49 e 50, no seu ato-fotográfico, são anteriores ao
registro 47.
No relatório do presidente da Província do Estado do Rio de Janeiro, Drº Alberto
Seixas Martins Torres, de 15 de setembro de 1899, declarou ele:

111
“Reconhecida a Leopoldina Railway Company Limited como continuadora
da Companhia Leopoldina (...) foi-lhe concedido (...) privilegio para a construção
[grifo nosso], uso e gozo das estradas de ferro do Areal a Entre-Rios (...)” 83

Desta forma, podem-se estabelecer dois marcos temporais limites para as fotografias
49 e 50: 1900, ano de chegada dos trilhos da Leopoldina em Entre-Rios, e o final da década
de 30, corroborado, também, pela informação do jornal Arealense, analisado anteriormente.

Fotografia 50: Neste registro tem-se evidenciado ao fundo, a Ponte das Garças, alterada na sua
configuração inicial, para receber os trilhos da Estrada de Ferro Leopoldina Railway, e o que parece um trecho
em obras da atual ponte rodoviária, sem as proteções nas suas laterais. Fotografia tomada entre a década de
1900 e o final da década de 1930. Sem informação do fotógrafo, acervo do Srº. Altair.

Em pesquisa realizada no acervo dos exemplares do jornal Arealense, na Casa de


Cultura de Três Rios, encontram-se artigos assinados por “Vê Jota”, em publicações das
décadas de 1910 e 1920, do século passado. Na edição de nº. 600 do referido jornal,
comemorativa dos 12 anos de sua fundação, que circulou em 13 de abril de 1912, seu editor,
Luiz Bravo, em um artigo agradece a alguns dos colaboradores, relacionando entre esses o Sr.
Villela Junior.

83 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1899, digitalizado na pagina da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u869/000033.html. Acesso em: 14 de set. 2011.

112
Fotografia 51: Recorte da fotografia 50, onde se observa, com mais clareza, a Ponte das Garças,
“dividida” numa ponte metálica, que recebeu os trilhos da Estrada Leopoldina Railway, com uma estrutura
diferente da atual, e que pouco lembra a original; e à sua direita, a ponte rodoviária em construção ou
manutenção, tendo no centro o que parece uma pequena cabine.

Recorrendo ao historiador Hugo Kling, este afirma que


Antonio Villela Júnior era seu “colega na idade”. O primeiro
nasceu em 1899, falecendo em 1979, e o segundo era onze
anos mais velho, nascido em 1888, vindo a falecer em 28 de
abril de 1974, visto na fotografia ao lado, que foi extraída do
jornal O Cartaz, na sua edição de nº. 138, de 4 a 10 de maio
de 1974, que noticiou a sua morte.
Fotografia 52: Sr.º Antonio Escreveria então para o jornal com idade entre 22 a 32
Villela Junior.
anos; assim, um dos sujeitos mais jovens presentes na
fotografia da página 114, é o Sr. Antonio Villela Junior, e não o de mais idade, presente nos
dois registros.

113
Esta análise confirma a opinião do Sr. Altair Tavares, de que seria o nosso cronista o
indivíduo de terno cinza à esquerda do homem mais velho. Como Villela Junior possuía um
irmão mais novo, é provável que tenhamos o seu pai, Antonio Villela de Carvalho, à direita, e
seu irmão à esquerda de terno branco. Não foi possível identificar o senhor a direita, um
pouco afastado do grupo.
Antonio Villela de Carvalho veio a falecer nesta cidade no dia 8 de julho de 1940,
conforme noticiado no periódico Entre-Rios Jornal 84, que informa, ainda, que nasceu na
localidade Ponte das Garças, em Entre-Rios, no ano de 1864, sendo seus filhos, Antonio
Villela Junior, Julia Villela Pereira, Alice Villela de Freitas, Adalgiza Villela Medeiros, Inaya
Villela de Medeiros e José Villela de Carvalho. A data de sua morte delimita o recorte
temporal da realização das fotografias 49 e 50.

Fotografia 53: Ponte das Garças, imagem da sua parte utilizada como passagem para a estrada de
ferro e que atualmente é apenas uma passarela de pedestres. Tendo em vista a sua importância para a definição
do local onde seria construída a Estação de Entre-Rios, núcleo urbano inicial da Vila de Entre-Rios, este
monumento arquitetônico merecia maiores esforços para a sua preservação. Registro fotográfico de outubro de
2011, acervo André Mattos.

84 ANTONIO Villela de Carvalho. Entre-Rios Jornal. Três Rios/RJ. Ano VI, de 11 de julho de 1940, nº. 287,
capa.

114
Fotografia 54: Ponte das Garças e sua passarela de pedestres. Com mais detalhe, a presença de
ferrugens nas partes de metal. Fotografia de outubro de 2011, acervo André Mattos.

Fotografia 55: Ponte das Garças em um registro de posição similar à da fotografia 39, permitindo
perceber as mudanças ocorridas em 140 anos, desde a sua inauguração, com evidentes sinais de falta de
manutenção nas estruturas de metal; e o grande desmatamento ocorrido nos morros. A ponte tem atualmente de
pista 7,50 metros de largura, e um metro de cada lado de passarela, totalizando cerca de 9,50 metros. Acervo
André Mattos, outubro de 2011.

115
Uma das principais perdas na Ponte das Garças no decorrer dos anos está na
eliminação de seus pilares, como se pode constatar na confrontação das fotografias.
O que fica evidenciado, então, é que Três Rios deve, definitivamente, a sua
localização ao mineiro Comendador Procópio Ferreira Lage, a Antonio Barroso Pereira, o
Barão de Entre-Rios e à Ponte das Garças.
Alguns personagens históricos são celebrados como potenciais fundadores da cidade,
entre eles, a Condessa do Rio Novo e o Barão Ribeiro de Sá, que como veremos na sequência
deste trabalho, realizaram ações que contribuíram para a organização e crescimento dos
espaços de relação social da antiga vila.
Mas apresenta-se de real importância, como marco histórico e elemento definidor do
local onde surgiu o primeiro núcleo urbano da Vila de Entre-Rios, a Ponte das Garças, sem a
qual, muito provavelmente, a história e as memórias deste município, do interior do Estado do
Rio de Janeiro, seriam bem diferentes.

116
2.3.1.2 - Estação Rodoviária de Entre-Rios (Estação das Mudas) e as estações

ferroviárias.

2.3.1.2.1 – Estação Rodoviária de Entre-Rios.

“Entre-Rios nasceu e se criou pela influência de artistas do trabalho.” (SILVA, 1939,


capa)
Esta afirmativa é encontrada no periódico Entre-Rios Jornal, de fevereiro de 1939,
sendo seu autor Pedro Moraes da Silva. Este historiador trirriense estabelece, no seu artigo,
uma relação entre o início da formação urbana da cidade de Três Rios, e a presença dos
funcionários da Companhia União e Indústria, e, principalmente, dos trabalhadores da estação
ferroviária e oficinas da Estrada de Ferro D. Pedro II.
João Pedro da Silveira, ex-prefeito, ao escrever neste mesmo periódico, mas em 1966,
quando do 28º aniversário da emancipação do município, assegurou que “sobravam razões de
entusiasmo e até mesmo de justo orgulho pelo vertiginoso crescimento desta jovem cidade”
(SILVEIRA, 1966, capa).
Três Rios experimentava, naquela época, um período econômico favorável, definido
por este articulista, no cômputo geral das rendas públicas, na seqüência de construções
(realizações públicas e particulares), delineando a imagem de um futuro promissor para seus
habitantes.
Esta confiança ocorria, segundo ele, pelo montante de todo o capital empregado no
comércio, nas indústrias e mesmo nos setores das profissões liberais, que ofereciam “garantias
de sucesso, desde que administradas com carinho e dedicação”. (SILVEIRA, 1966)
Visões separadas por quase 30 anos de história, mas que se aproximam, ao
estabelecerem como condicionantes para o “nascimento” e para a “vida” de Três Rios, dois
elementos: o trabalhador e o capital.
Esta “... influência de artistas do trabalho” compreende na sua origem, pela presença
dos funcionários de três obras importantes para a formação do núcleo urbano da cidade,
objetos de pesquisa neste capítulo, que possibilitaram, em um curto período de tempo, o seu
crescimento econômico, político e social: a Estação Rodoviária de Entre-Rios, uma das doze
estações de mudas da estrada União e Indústria, e as Estações Ferroviárias das Estradas de
Ferro D. Pedro II e Leopoldina Railway Company Limited.
“Transposto o Paraíba na ponte que se chama das Garças, o traçado
passou a cortar as terras das Fazendas do Cantagalo e da Boa União... Dentro das

117
terras do Cantagalo, a Companhia fez erguer uma grande estação rodoviária, onde
seus carros de transporte, depois da inauguração, passaram a apanhar e a deixar
cargas, o mesmo fazendo as Diligências em relação aos passageiros.” 85

A construção da estação rodoviária foi acompanhada de 29 casas para os funcionários


que tinham famílias, havendo alojamento para os solteiros, em dependências próximas aos
armazéns.

Fotografia 56: Vista aérea da Fazenda Boa União, inicialmente propriedade do Barão de Entre-Rios,
mas transferida a seu sobrinho José Antonio Barroso de Carvalho - Visconde do Rio Novo, conhecido como
Major Carvalhinho, quando do casamento com sua filha Mariana. Pelas terras desta fazenda passaram as
estradas rodoviária e ferroviária. Fotografia do Arquivo Central do IPHAN.

Sexta e maior das doze estações das mudas da estrada União e Indústria, esta
edificação estabeleceu-se historicamente, como o núcleo inicial na formação da Vila de Entre-
Rios.
O espaço urbano surge como um ativo arraial ao redor da movimentada estação
rodoviária, onde eram embarcadas dezenas de arrobas de café e outras mercadorias, oriundas
das fazendas da Zona da Mata mineira e do Vale do Paraíba (mais próximas), e passageiros,
(existia uma estrada interligando a estação à Vila da Paraíba do Sul) com destino a Petrópolis,

85 KLING, Hugo José. Cinzas que Falam. 1ª Edição, 1971, p. 83

118
e principalmente para a capital do Império, o Rio de Janeiro; transformando-se depois, numa
Vila com um comércio atraente, e possibilidades de conquistas econômicas, para aqueles que
chegavam às suas terras.

Fotografia 57: Vista externa da Estação de Entre-Rios, núcleo inicial da Vila de Entre-Rios – chamada
Estação Barão de Entre-Rios, em homenagem ao fazendeiro Antonio Barroso Pereira, falecido em 8 de maio de
1862, que colaborou com a Companhia União e Indústria, permitindo a passagem da estrada pelas terras da
Fazenda de Cantagalo e da Fazenda Boa União. Fotografia de Revert Henry Klumb, de 1861/1866. As
fotografias de Klumb fazem parte de diversos acervos.

“Na área cedida pelos Fazendeiros do Cantagalo à Companhia União e


Indústria, outras casas foram erguidas, de sorte que aos poucos o arraial foi
contando com algum comércio, como vendas, lojas e botequins. Nas proximidades
da rodoviária foram construídas mais algumas casas, para morada e comércio,
estas pelos proprietários da Fazenda de Cantagalo, que as iam arrendando aos

119
interessados em explorar as possibilidades da movimentação resultante do arraial
que a União e Indústria ensejou.” 86

Revert Henry Klumb (1995, p. 150) escreveu que, na Estação de Entre-Rios, durante a
viagem de inauguração da Estrada União e Indústria, realizada em diligências, no dia 23 de
julho de 1861, a comitiva imperial fez parada para descanso e almoço, servido na casa
principal, sendo recebida em festa por políticos, fazendeiros e comerciantes, representantes
militares e eclesiásticos da região.
A obra literária de Klumb foi elaborada, não apenas por meio de suas impressões
realizadas durante aquele dia, mas entre os anos de 1861 e 1872. Por isso, ao relatar este
momento de repouso, descreve também a estação da Estrada de Ferro D. Pedro II – erguida
seis anos após a inauguração da rodovia, tecendo comentários sobre a realização das duas
obras (as estradas rodoviária e de ferro), considerando-as importantes para o progresso do
país, mas asseverando que uma estaria fadada a inutilizar a outra, o que realmente ocorreu.
Antonio Ribeiro de Sá, neto do Barão Ribeiro de Sá, anota em seu livro, baseado na
notícia da viagem de D. Pedro II de Petrópolis/RJ a Juiz de Fora/MG, pela União e Indústria,
publicada no Jornal do Comércio daquele ano, que:
“Um quarto de hora depois de atravessar a ponte [Ponte das Garças],
chegaram à Estação de Entre-Rios. O edifício principal dessa bela estação é de
madeira, com almofadas de reboco de barro rústico, conservando a cor natural,
produzindo lindo efeito.” 87

Os poucos relatos encontrados, que descrevem a Estação de Entre-Rios, assemelham-


se com a imagem presente na fotografia 57. Outro historiador da cidade, Hugo J. Kling,
apresenta esta construção, da seguinte maneira:
“Tinha sessenta metros de extensão. No centro era a parte destinada aos
passageiros e dum lado e do outro, no mesmo correr, estavam os armazéns de
carga, bar e restaurante. Nos fundos, onde se situa hoje a Praça da Autonomia,
erguiam-se as cocheiras e os depósitos de carros, oficinas e ferrador de animais.”
88

86 KLING, Hugo José. op. cit. p. 83.


87 DE SÁ, Antonio Ribeiro. A Cidade de Entre-Rios – sua origem e fundação. Composto e impresso na
Tipografia Brasil, Juiz de Fora/MG, 1942, p. 15.
88 KLING, Hugo José. op. cit. 83.

120
No livro “Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho”, Richard Burton, explorador e
orientalista britânico, narra uma excursão realizada pelos campos e montanhas do Brasil em
1867, da capital Rio de Janeiro às minas de ouro do centro de Minas Gerais, via Petrópolis e
Barbacena, utilizando-se, em grande parte, da Estrada União e Indústria.
Sobre a Estação de Entre-Rios e seu entorno escreveu:
“Às 11h30min da manhã, depois de quatro horas de viagem efetiva,
chegamos a Entre Rios, o meio do caminho. Ali, um almoço – e um mau almoço,
por sinal – esperava os viajantes (...) Em Entre Rios, descêramos para uns 200
metros acima do nível do mar; a atmosfera é desagradável, quente e úmida,
alimentando febres; a água ainda pior. No hotel, portanto, só tratamos de matar o
tempo. Nas imediações, o vale, coberto, outrora, de luxuriantes florestas, foi
limpado para a plantação de café e deverá ser lavrado para o plantio de algodão.
As chuvas torrenciais, seguindo-se às queimadas de todos os anos, arrastaram o
humo carbonífero dos morros para as depressões estreitas, e pantanosas, que são
frias demais para o cultivo; cada córrego é um escoadouro de adubo líquido que
se dirige para o Atlântico, e o solo superficial é de pura argila. Também aqui as
terras sofrem dois flagelos especiais: os grandes proprietários e o sistema de
agricultura herdado dos aborígines, ou vindo da África Central e perpetuado pelos
desleixados métodos de cultura, necessários em toda a parte onde é empregada a
mão-de-obra servil. No Brasil, como na Rússia e no Sul dos Estados Unidos, onde
vastas plantações têm de ser meramente roçadas, o solo virgem constitui um
importante fator, no que diz respeito ao valor real da propriedade territorial; a
falta de adubo e a necessidade de pousios só permitem que seja aproveitada
metade do total das terras – às vezes, mesmo, uma décima parte – para o cultivo
anual. Esse mal deve ser mitigado, antes que o país possa ser colonizado ou
grandemente melhorado, mas não é fácil sugerir uma adequada medida, sem os
males da “desapropriação””. 89

Este texto configura-se como um resumo das condições geoclimáticas de Entre-Rios,


bem como, uma análise da relação dos grandes fazendeiros de café com as suas terras.
Pesquisas nos jornais da cidade, do início do século XX, permitem constatar a incidência de
doenças relacionadas a essas condições do local, “alimentando febres”, e as constantes cheias
do rio Paraíba do Sul.

89 BURTON, Richard. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho – Coleção “O Brasil visto por estrangeiros”,
tradução de David Jardim Júnior. Senado Federal, Brasília, 2001. Disponível no site:
http://www.senado.gov.br/publicacoes/conselho/asp/pdfS.asp?COD_PUBLICACAO=78. Acesso em: 10 de out.
2011.

121
Entendo ser importante para a narrativa a análise de recortes empreendidos na
fotografia da página 123, que apresento a seguir, por esta ser a única conhecida imagem a
perpetuar as memórias relacionadas à estação rodoviária.

Fotografia 58: Recorte da fotografia 57, onde se vê a parte central – com hotel e restaurante – da
Estação Rodoviária de Entre-Rios.

No recorte, tem-se a presença de indivíduos à frente da construção principal


assobradada, que se destaca por ser uma obra destinada aos passageiros e onde, na parte
superior, funcionavam os escritórios: são homens vestindo conjuntos de calça, paletó e colete,
que na época eram em tons escuros, acompanhados de camisas brancas; e mulheres com
roupas que demonstravam ostentação e riqueza. Diferenciando-se destes, à esquerda, e a
direita junto a uma carroça, homens vestidos de forma mais simples.
As novidades européias eram consumidas na capital e também no interior fluminense
pelas mulheres e filhas dos ricos fazendeiros do café do Vale do Paraíba, e em seguida, com a
“transferência” da produção do café para as terras do interior paulista, pelas famílias das
grandes fazendas de São Paulo.
“Sedas francesas, cambraias de linho ou algodão e incontáveis casimiras de
lã inglesa seguiam em direção às ricas fazendas de açúcar ou café. Rendas e
bordados de Flandres ou da Irlanda, chapéus de feltro ou seda, fitas e pentes para
cabelos, cintos, crinolinas (armações circulares de metal colocadas no forro de
saias e vestidos para aumentar o volume das saias rodadas) e os imprescindíveis

122
sapatos, botas e botinas, símbolos da condição livre ou senhorial no Brasil
escravista, eram consumidos com avidez.” 90

É preciso considerar, que o Império utilizou das representações da modernização


européia, incluindo-se, neste contexto, a moda das roupas e acessórios, para adaptar costumes
e práticas de uma sociedade moderna, visando ditar os modelos de civilização para a
sociedade brasileira.
A Estação recebia também, durante seus anos iniciais, passageiros da Vila de Paraíba
do Sul e das fazendas de café das cercanias que, utilizando-se das diligências Mazeppa,
sempre puxadas por duas parelhas de mulas, dirigiam-se a Petrópolis (fazendeiros da região
possuíam casas nesta cidade) ou à capital Rio de Janeiro. Hugo J. Kling informa, que “no
prédio principal funcionava um bar e havia também um Hotel com alguns quartos que se
alugava a quem precisasse aqui pernoitar. O conforto era relativo ao local e ao tempo.”
(KLING, 1969, p. 61)

Fotografia 59: Recorte da fotografia 57, onde se tem a extremidade direita da sede principal da
estação.

90 MARINS, Paulo César Garcez. Resumo do texto: A vida cotidiana dos paulistas: moradias, alimentação,
indumentária. Disponível no site: http://www.terrapaulista.org.br/costumes/vestuario/saibamais.asp. Acesso em:
25 de out. 2011.

123
Fotografia 60: Recorte da fotografia 57, onde se observa a extremidade esquerda da sede principal da
estação.

Nestes dois recortes, das extremidades da Estação, vê-se melhor acabamento nas
portas e janelas, e na cerca: entendo ser possível localizar-se os alojamentos dos empregados e
funcionários solteiros, e escritórios da administração. Na fotografia acima, parece haver, no
segundo plano à esquerda, atrás do edifício principal, outra construção semelhante a um
alojamento ou refeitório, pois mais ao centro tem-se uma pequena chaminé, e ao fundo
destaca-se um dos galpões.

Fotografia 61: Recorte da fotografia 57, ainda do prédio principal no seu lado mais a esquerda, vê-se
uma carroça ao centro.

124
Neste, nitidamente vê-se uma carroça estacionada no lado esquerdo da casa central, no
espaço destinado aos armazéns de carga, parecendo conter três sacos em seu interior. A
estação recebia e guardava para futuro transporte a produção de café e outros produtos das
fazendas da região. Percebe-se que a construção tem suas paredes em madeira, e a base com
pedras cortadas.

Fotografia 62: Recorte da fotografia 57, onde se observa a extremidade direita, da sede principal da
estação.

Homens, três ou quatro, – possíveis funcionários da estação ou de uma das fazendas -,


à direita da casa central, próximos a uma charrete, percebendo-se também duas carroças com
lonas colocadas de maneira diversa, à frente e ao lado da cerca que separa o pasto da estrada.
A presença destes meios de transporte na fotografia permite compreender o espaço como local
de movimento de pessoas e mercadorias.

125
Fotografia 63: Recorte da fotografia 57, onde se observa o pátio ao fundo e, no segundo plano, um dos
galpões.

O pátio no fundo da estação era o local onde se encontravam as cocheiras, os depósitos


de carros, oficinas e ferrador de animais, observando-se na imagem pelo menos dois carros de
carga ao centro.

A Estação de Entre-Rios era constituída de três vastos galpões, incluindo o prédio


principal e outro pequeno, ao centro.

Fotografia 64: Recorte da fotografia 57, onde se vê parte dos currais.

Na parte inferior do registro fotográfico da página 121 destacam-se os currais, com as


mulas e cavalos utilizados no trato com as diligências de passageiros e os carros de carga,
vistos dois destes à esquerda, cobertos de lona.

“Para as doze estações de muda da Companhia União e Indústria seriam necessárias


um milhar de muares (600 para os carroções do transporte de carga e 400 para tracionar
diligências de passageiros)”. (DAVID, 2009, p. 136) Na fotografia o número de animais
enquadrados é bem menor do que o apontado por esse autor.

126
Fotografia 65: Recorte da fotografia 57, com a imagem do rio Paraíba do Sul na sua margem
esquerda.

Observa-se pela margem esquerda, vista do rio Paraíba do Sul que corta a cidade de
Três Rios, e que por muito tempo, inundava nos períodos de chuvas intensas. Também
próximo ao local, tem-se região descrita por Richard Burton como “pantanosas, que são frias
demais para o cultivo”, terras com poucas árvores. Ao fundo, os morros com sua vegetação
primitiva, característica da Mata Atlântica, possuindo a região madeiras nobres.

Fotografia 66: Recorte da fotografia 57, com a imagem da sede da Fazenda de Cantagalo, no segundo
plano, ao alto à direita.

127
Neste recorte, observa-se no segundo plano ao fundo, mais à direita e ao alto, a sede
da Fazenda de Cantagalo, de propriedade do Barão de Entre-Rios. Compreendo que a escolha
do ângulo por parte de Klumb deva ao seu desejo de colocar, no mesmo registro fotográfico, a
estação rodoviária e a sede da fazenda que pertencia ao homem que contribuiu para a
realização da obra da estrada União e Indústria, por permitir a passagem da mesma, por suas
terras: “(...) as casas brancas que a um km perdemos de vista, são da Fazenda de Cantagalo,
propriedade da Baronesa de Entre-Rios, mais longe se acha à cidade de Paraíba do Sul,
inteiramente decaída de sua antiga importância (...)” (KLUMB, 1995, p. 150)
Ao fazer esta descrição Klumb, não relaciona como proprietário da Fazenda de
Cantagalo o Barão de Entre-Rios, e sim sua esposa, a Baronesa, provavelmente porque a
fotografia 57 tenha sido realizada após sua morte em maio de 1862.

Localização da Estação de Entre-Rios considerando


a posição da fotografia de Klumb e a afirmativa do historiador Hugo Kling.

Fotografia 67: Imagem aérea gerada pelo Google Pro em 2010, presente no Projeto Cultural
Comemorativo dos 150º Aniversário da Rodovia União e Indústria – 1861 – 2011 de Eduardo Gonçalves David.

Na imagem anterior, é possível definir o ângulo da mirada do fotografo Revert Klumb,


que desta maneira, conseguiu incluir no registro, mesmo distante, a sede da Fazenda
Cantagalo e a estação rodoviária de Entre-Rios.
Determina-se também a localização da Estação de Entre-Rios (circulada em amarelo),
bem ao lado da atual Avenida Condessa do Rio Novo (antiga Rua da Condessa e trecho da
União e Indústria, que passava pelo centro da cidade), e em frente à Estação da Estrada de
Ferro D. Pedro II e a estrada de ferro.

128
O historiador Hugo Kling (1971, p. 83) escreveu que a parte aos fundos da casa
destinada à recepção dos passageiros, onde existiam dois grandes galpões, localizava-se no
espaço que atualmente abriga a Praça da Autonomia.

Utilizando-se de seus conhecimentos como engenheiro, de um desenho da década de


50 (fotografia 72) e de uma descrição feita por Kling, relatada em carta que lhe foi entregue
pessoalmente (ambos reportando aos traços arquitetônicos do casarão da fazenda demolida na
década de 30), Eduardo G. David desenvolveu importante trabalho: maquetes em 3D da
Fazenda de Cantagalo.

Fotografia 68: Primeira maquete da sede da Fazenda de Cantagalo, uma vista de um ângulo acima,
destacando a frente da sede e sua construção em forma de “U”, por Eduardo David de 24/11/2010.

“As obras da casa do major Antonio Barroso estavam seguindo num bom
ritmo. Depois que os quatro lados da casa foram demarcados, formando um
quadrado com 30 metros de lado, com faces orientadas para os pontos cardeais,
foi só subir paredes grossas, de um metro de largura. A base de pedra, (...) tinha a
forma de U, com a parte aberta para o lado do rio, que passava nos fundos. Na
frente seria construída uma grande escada, que se elevaria mais de 3 metros, para
abrigar em baixo, como um porão, cômodos para as atividades de apoio:
armazenagem de alimentos, guarda de arreios, de ferramentas e um pequeno

129
escritório onde pessoas que não gozavam da intimidade necessária para serem
convidadas a subir até a varanda, ali em baixo seriam atendidas.” 91

Fotografia 69: Segunda maquete da sede da Fazenda de Cantagalo, vista lateral da entrada, que tinha
janelas voltadas para a margem esquerda do rio Paraíba do Sul, sendo possível ainda, perceber a sua
construção em forma de “U”, por Eduardo David de 24/11/2010.

Fotografia 70: Terceira maquete da sede da Fazenda de Cantagalo, em uma das vista laterais, por
Eduardo David de 24/11/2010.

91 DAVID, Eduardo Gonçalves. op. cit. p. 136.

130
Fotografia 71: Quarta e última maquete da sede da Fazenda de Cantagalo, por Eduardo David de
24/11/2010, por Eduardo David de 24/11/2010.

A imagem a seguir é do desenho utilizado por Eduardo G. David, para configurar as


maquetes. Esta representação foi publicada no jornal O Cartaz de Três Rios/RJ, na sua edição
de nº. 20 de 15 a 21 de janeiro de 1972, sem informação do autor.

Fotografia 72: Desenho publicado no jornal O Cartaz, representando a Fazenda de Cantagalo, sem
autor conhecido.

Este mesmo periódico noticiou, na sua edição de nº. 19, de 08 a 14 de janeiro desse
mesmo ano, que havia sido encontrado por Jobal Soares de Azevedo e Pedro Paulo de
Oliveira França, dois pilares de pedras da sede da Fazenda de Cantagalo (circulado de
amarelo no desenho).
Relíquias históricas, únicas conhecidas da sede da fazenda, pertenciam, conforme
testamento da Condessa do Rio Novo, à Casa de Caridade de Paraíba do Sul. As pedras, com

131
mais de um século, estavam num terreno no bairro de Vila Izabel, de propriedade da
Prefeitura Municipal de Três Rios. Noticiado em edições posteriores, os pilares seriam
confiados pela Mesa Administrativa da Casa de Caridade de Paraíba do Sul ao Museu
Rodoviário do distrito de Paraibuna, em Comendador Levy Gasparian.

Fotografia 73: Jobal Soares de Azevedo e Pedro Paulo de Oliveira França, ao lado das pedras
pertencentes à Fazenda de Cantagalo. Tomada externa do terreno em que foram encontradas. Imagem
fotográfica reproduzida de registro publicado no periódico O Cartaz, de Três Rios/RJ, sem autor definido,
acervo André Mattos.

A fotografia de Revert Klumb é a única reprodução fotográfica conhecida destes


importantes marcos para a memória da cidade: a Estação Rodoviária de Entre-Rios, núcleo
inicial da Vila de Entre-Rios, lugar onde realmente “nasceu” a cidade de Três Rios. Além de
registrar a distância a sede da Fazenda de Cantagalo, de propriedade do Barão de Entre-Rios.
Patrimônios históricos que se perderam completamente com o tempo, restando a imagem e as
poucas descrições, como lugares de lembranças que permitem a escrita da história.
A construção da estação, com a fixação, no seu entorno, de seus funcionários, de
alguns dos trabalhadores da estrada e a movimentação de carga e passageiros, influenciou
diretamente na edificação de outras obras, e na formação de um pequeno comércio,
ampliando-se, consideravelmente, o espaço urbano, com a presença dos trabalhadores da

132
Estrada de Ferro D. Pedro II e da Leopoldina Railway Company Limited, como veremos a
seguir.

133
2.3.1.2.2 – Estações Ferroviárias da Estrada de Ferro D. Pedro II e da Estrada de
Ferro Leopoldina Railway Company Limited.

As estações ferroviárias foram responsáveis pela dinamização sócio-espacial das


cidades, ou mesmo pela fundação de núcleos urbanos, não somente na região do Vale do
Paraíba, mas em todo o Estado do Rio de Janeiro, durante o final do segundo Império, e os
anos iniciais da República, tornando-se referências locais importantes.
Com Três Rios, esta realidade apresenta-se na passagem da Estrada de Ferro D. Pedro
II, e a edificação, também nas terras da Fazenda de Cantagalo, de uma Estação Ferroviária,
somando-se a anterior instalação da Estação Rodoviária, ocorrendo entre a construção de
ambas um pequeno espaço de tempo. Sobre este fato escreve H. Kling:
“Seis anos decorreram depois da inauguração da rodovia e eis que Entre-
Rios é também alcançada pela Estrada de Ferro D. Pedro II, que constrói a sua
estação terminal, exatamente defronte da estação rodoviária. A inauguração desse
prolongamento ferroviário ocorreu em 13 de outubro de 1867.” [Com a presença
do Imperador D. Pedro II e comitiva] 92

O mesmo tratamento outorgado à estrada União e Indústria pelo Barão de Entre-Rios


foi prestado pelo Major Carvalhinho, seu sobrinho-genro, que permitiu a travessia da ferrovia
pelas terras das fazendas de Cantagalo e Boa União, além da concessão de área para a
construção da Estação Ferroviária de Entre-Rios e do Depósito de Locomotivas e oficinas, “o
que repercutiu muito bem na corte. Em 27 de março de 1867, D. Pedro II agraciou-o com o
título de Visconde do Rio Novo.” 93
A Estrada de Ferro D. Pedro II passou a ser denominada, em 22 de novembro de
1889, após a proclamação da República, Estrada de Ferro Central do Brasil. Em 13 de agosto
de 1890, a Vila de Entre-Rios é elevada à condição de segundo distrito de Paraíba do Sul,
pelo decreto estadual nº. 114, recebendo em 1900 a Estrada de Ferro Leopoldina Railway
Company Limited.
No relatório de 15 de setembro de 1900, escreveu Alberto de Seixas Martins Torres,
então Presidente da Província do Estado do Rio de Janeiro:
“The Leopoldina Railway Company Limited - estando concluída a
construção do prolongamento do Areal a Entre Rios, [grifo nosso] que tão

92 KLING, Hugo José. op. cit. p. 83 - 84.


93 Ibidem.

134
importante é para a viação do Estado e principalmente para esta capital, foi
autorizado o trafego provisório em 18 de Maio de 1900.
Acha-se em estudos definitivos o trecho entre Entre-Rios e Serraria, tendo
16 km, 950 ms em território fluminense e 2 kms, 747 ms em território mineiro. Esse
prolongamento da Leopoldina parte do km 91 + 27 ms da linha Grão Pará,
ficando o ponto de partida distante 2.177 ms da nova estação de Entre-Rios.” 94

As duas ferrovias, em conjunto com a União e Indústria, foram vetores para a gênese
de representações socio-economico-geográficas, que acompanham a cidade por toda a sua
história, elementos responsáveis diretamente pelo seu crescimento urbano e populacional. O
município é considerado o maior entroncamento rodoferroviário do país, realidade que
margeia as palavras atribuídas ao presidente Juscelino Kubitschek, de que “Três Rios é a
esquina do Brasil”.
A chegada da Estrada de Ferro D. Pedro II determinou uma drástica diminuição na
utilização comercial da estrada União e Indústria, e também do caminho que interligava a Vila
de Entre-Rios ao município sede de Paraíba do Sul, conforme escreveu Esperidião Eloy de
Barros Pimentel, então Presidente da Província do Estado do Rio de Janeiro, no relatório de
21 de maio de 1867:
“Atendendo as informações que prestou-me a diretoria de obras acerca da
estrada de Entre—Rios, ordenei—lhe que se despendesse administrativamente a
quantia de 980$1OO com os concertos de que mais ela carecia, constando-me que
tais obras vão em andamento. Devo observar a V. Ex. que não convêm empregar-
se maiores capitais nessa estrada, porque logo que a via férrea de D. Pedro II
chegue á estação da Paraíba do Sul será inevitável o seu abandono. [grifo nosso]
Percorre ela o espaço que separa aquela vila da estação de Entre-Rios na
estrada companhia União & Indústria, margeando continuamente o Paraíba.
Conduz para aquele ponto parte dos produtos da lavoura do município da Paraíba
do Sul e os do lado oriental da freguesia de Santa Thereza de Valença.” 95

Pelo Decreto 3325 de 29 de outubro de 1864, as propriedades da companhia de


Mariano Procópio foram transferidas para o governo Imperial, e posteriormente incorporadas

94 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1900, digitalizado na pagina da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u870/000010.html. Acesso em: 14 de set. 2011.
95 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1867, digitalizado na pagina da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u846/000001.html. Acesso em: 14 de set. de 2011.

135
à Companhia da Estrada de Ferro D. Pedro II, por meio do Decreto Imperial 3.503 de 1º de
julho de 1865.
Assim, durante anos, as estradas de ferro sobrepujaram as rodovias em importância,
tanto para o transporte de passageiros, quanto, e principalmente, para o transporte de cargas.
Os elementos urbanos sociais que surgiram com as estradas e estações ferroviárias, e
com os trabalhadores envolvidos em sua construção, são marcos de identidade que se
tornaram fundamentais na formação da memória dos espaços de relação de diversos
municípios, ao longo de um período demarcado pelos dois últimos quartos finais do século
XIX, até pelo menos, a década de 50 do século XX.
A Companhia Estrada de Ferro D. Pedro II, além da Estação
Ferroviária, construiu em sua proximidade, “um depósito de máquinas e
uma oficina mecânica para reparo do material rodante e, como é lógico,
empregando-se aí mais de cinqüenta operários que precisavam ter onde
morar”.

Fotografia 74: Vista externa de algumas das possíveis casas construídas pela Condessa do Rio Novo.
Acervo André Mattos, 11 de janeiro de 2012.

136
Esta movimentação de pessoal demandou a construção, pela Condessa do Rio Novo
(seu marido, o Visconde do Rio Novo, faleceu em 1869), de mais residências na Vila de
Entre-Rios, casas geminadas, que conforme informação do historiador Hugo Kling, “ficaram
conhecidas como as casinhas da Vila” (KLING, 1971, p. 84) localizadas, segundo este autor,
no quadrilátero formado hoje pela Rua Antônio Carlos, Rua 15 de Novembro, Martins Paixão
e a via férrea.

Dois autores da época descrevem a Estação Ferroviária de Entre-Rios de forma


conflitante: Revert Henry Klumb afirma que (...)
“Defronte [a Estação Rodoviária de Entre-Rios] está à estação da estrada de
ferro, maciça, pesada e a nosso ver pouco segura. Estamos certos que os
construtores deste edifício hão de desculpar nossa franqueza, sobretudo quando
souberem que podemos afiançar-lhes, ter visto esta estação, tão bem construída
aparentemente, não poder resistir a uma chuva um pouco forte, nem mesmo a uma
ventania, sem que no dia seguinte haja necessidade de alguns consertos.” 96

Richard Burton, menos descritivo, escreveu:


“(...) Enquanto era servido o feijão, fui examinar os alicerces de uma
estação ferroviária, que envergonhará os galpões que têm esse nome na maioria
das estradas de ferro anglo-brasileiras; isso me faz lembrar dos venerandos
remanescentes da linha de Stephenson, a “Liverpool a Manchester”, que ainda
existem, por exemplo, na Ponte Newton.” 97

Enquanto o viajante inglês elogiava a estação ferroviária, comparando-a às melhores


da Inglaterra, Revert tece crítica a falta de segurança e fragilidade da edificação. É preciso
considerar que Klumb, mantinha grata admiração pela obra da Companhia União e Indústria,
e boas relações com Mariano Procópio, reconhecendo em seu livro que a chegada da estrada
de ferro provocaria danos financeiros a esta empresa. A fotografia 75 demonstra, observando
a edificação da Estação Ferroviária de Entre-Rios, que as palavras de Richard Burton são mais
adequadas.
A Estação de Entre-Rios foi uma das mais importantes da Estrada de Ferro Central do
Brasil, da chamada Linha do Centro, por contar com grandes oficinas de manutenção de
locomotivas e construção de vagões, como descrito no capítulo I, tendo os trilhos servidos

96 KLUMB, Revert Henry, op. cit. p. 150.


97 BURTON, Richard. op. cit.

137
também à Linha Auxiliar, e do ponto de junção com a Estrada de Ferro Leopoldina, irradiava
para toda a rede mineira

Fotografia 75: Vista da Estação Ferroviária de Entre-Rios, fotografia de autoria de Revert Henry
Klumb, de 1867/1972. Foi realizado no mesmo local do registro nº 56, o Morro Áureo.

Fotografia 76: Recorte da fotografia 75, onde se vem algumas (1) casas e a (2) estrada para a Fazenda
de Cantagalo.

A imagem da fotografia 76 permite visualizar algumas casas, construídas próximo ao


caminho que seguia até a sede da Fazenda de Cantagalo, construções não presentes na

138
fotografia nº 57 representativa da Estação de Entre-Rios, bem como, constata-se a eliminação
de algumas árvores no local.

Fotografia 77: Desenho realizado da fotografia 75, presente no livro de Klumb. (KLUMB, 1971, p.
150)

Fotografia 78: Recorte da fotografia 75, destacando-se o estado de abandono da Estação Rodoviária,
e um prédio com construção mais moderna, à esquerda no primeiro plano, que também aparece na imagem 77.

Este recorte comprova as informações dos historiadores de que, em pouco tempo, a


estrada União e Indústria perde sua importância como via de escoamento da produção,
ficando abandonados seus galpões, mesmo que incorporados ao patrimônio da Estrada de
Ferro D. Pedro II, espinha dorsal de todo o sistema ferroviário da província do Rio de Janeiro.

139
O primeiro segmento foi concluído em 1858, da estação Dom Pedro II até Belém
(Japeri), depois subindo a serra das Araras, chegando a Barra do Piraí em 1864. Seguindo
adiante em direção a Paraíba do Sul e depois Entre-Rios, e desta localidade, utilizando-se de
trechos da União e Indústria por Paraibuna, chega a Juiz de Fora em 1875; trajeto que atendia
as necessidades dos Fazendeiros do Vale do Paraíba e da Zona da Mata Mineira, facilitando e
diminuindo os custos no transporte de seus produtos.

Fotografia 79: Neste mapa em vermelho tem-se o trecho inicial da E. F. Dom Pedro II e circulado em
amarelo temos o ramal da Estrada de Ferro Leopoldina na linha-tronco de Saracuruna até Entre-Rios, que
seguiu depois para Caratinga/MG. 98

Quanto à Companhia Leopoldina, constituiu-se por meio da incorporação de várias


linhas estaduais e particulares, que passavam por dificuldades financeiras, incorporadas ao seu
patrimônio em 1889. Em 1897, por problemas econômicos, a empresa entrou em liquidação,
organizando-se uma nova companhia em Londres, a “The Leopoldina Railway Company

98 MAPA, disponível no site: http://www.estacoesferroviarias.com.br/efcb_rj_linha_centro/fotos/mapa-


linhacentro.jpg. Acesso em 12 de set. de 2011.

140
Ltda”, que assumiu a direção do empreendimento, sendo reconhecida como continuadora,
pelo Decreto nº 496 de 12 de novembro de 1898.

“Quem vinha pelo trem de passageiros do Rio pela Leopoldina, sairia da


estação de Barão de Mauá, passaria por Caxias, subiria a RJ/MG, onde o trem era
partido em dois. Um pedaço ia para a linha de Manhuaçu, à direita, e o outro para
a linha de Caratinga, à esquerda. A Central autorizou a Leopoldina a se utilizar
da linha métrica desde onde desembocava o ramal de Petrópolis até a estação de
Entre-Rios em 10 de janeiro de 1901. Hoje [2012] está sem pátio e sem trilhos, não
faz mais parte do circuito ferroviário da cidade.” 99

Fotografia 80: Vista externa da Estação de Pedras da Estrada de Ferro Leopoldina, entendida como
um posto auxiliar da estação maior da Linha do Centro da Central do Brasil, localizada a dois quarteirões da
estação da Central do Brasil, na área urbana central da cidade de Três Rios. Fotografia da década de 70,
acervo André Mattos.

Esta malha ferroviária permitiu um maior fluxo de pessoas entre a capital, Rio de
Janeiro, o interior do estado e Minas Gerais. Assim, o trânsito de passageiros cresceu, e entre

99 Texto sem autor definido, disponível no site:


http://www.estacoesferroviarias.com.br/efl_mg_tresrios_caratinga/tresrios-efl.htm. Acesso em: 10 de out. 2011.

141
estes, estrangeiros que migraram para o Brasil, em busca de oportunidades de trabalho e
renda, levando muitos a se fixarem nos novos centros urbanos, que se formaram no entorno
das estações ferroviárias.

Em várias cidades, os prédios das estações ferroviárias, desativados, são utilizados


como espaços de cultura e memória. A estação da Leopoldina Railway Company em Três
Rios, atualmente, é utilizado como “Espaço da Ciência”, num convênio entre a Prefeitura
Municipal de Três Rios, por meio da Secretaria de Educação, e a Fundação CECIERJ -
Centro de Ciências e Educação Superior à Distância do Estado do Rio de Janeiro.

Fotografia 81: Vista panorâmica, onde se observa a Estação de Três Rios da Leopoldina (no centro é o
quarto telhado) ainda em atividade nesta fotografia de 1968 de autor desconhecido, 100 com o pátio, à direita
repleto de composições. Vê-se também a Rua Barão do Rio Branco – no momento do ato-fotográfico sem a
presença de pessoas e automóveis -, e, à sua esquerda ao centro, a sede do antigo Colégio Entre-Rios. A fundo,
num segundo plano à direita, ainda em construção o edifício Saint Etienne, localizado no entorno da Praça da
Autonomia.

Estes empreendimentos configuram-se em importância para a história Três Rios, pois


foram determinantes na formação inicial do espaço urbano de relações da cidade. A

100 Disponível no site: http://www.estacoesferroviarias.com.br/efl_mg_tresrios_caratinga/tresrios-efl.htm.


Acesso em: 10 de out. 2011.

142
construção de estradas de ferro ou rodovias sempre foi utilizada pelos poderes federal,
estadual e municipal como demonstração inequívoca de progresso.
A existência do município está, então, intimamente unida a estes dois fatores: a
denominação do arraial de Entre-Rios é uma conseqüência da Estação Rodoviária (que
recebeu este nome em homenagem ao Barão de Entre-Rios) e ao fluxo de pessoas e de valores
econômicos, que esteve por muito tempo atrelado aos três principais empreendimentos: a
estação rodoviária e as estações ferroviárias.
A importância geográfica da antiga vila por oferecer “caminhos” para a continuidade
do projeto ferroviário do II Império brasileiro proporcionou a construção, em 1871, de uma
cabine em comemoração à investida da ferrovia ao rio São Francisco que, infelizmente,
desvalorizada enquanto marco da história da cidade, encontra-se completamente abandonada.

Fotografias 82 e 83: Cabine construída durante a presidência de Mariano Procópio junto a E.F.D.
Pedro II em frente a chave que mudava a linha em direção à Serra da Mantiqueira no Estado de Minas Gerais.
Observa-se nas duas fotografias a presença de placas comemorativas fundidas nas oficinas que a ferrovia
possuía na Vila de Entre-Rios. Fotografias com marco temporal e autores desconhecidos, do acervo digitalizado
de André Mattos.

Nesta obra foram anexadas, nas laterais sem portas, três placas de bronze, com os
seguintes textos: 1ª placa: “Pelo Ministério de 16 de julho de 1968 sendo Ministro da
Agricultura Comercio e Obras Públicas o Exmo. Sr. Cons. Diogo D`Albuquerque foi

143
apresentada a proposta para o prolongamento até o Rio das Velhas”; 2ª placa: “Por ordem do
Exmo. Sr. Cons. Theodoro Prado, Ministro da Agricultura Comercio e Obras Públicas exara
em ofício de 17 de julho de 1871 foram começados os trabalhos da Linha Central ao Rio das
Velhas” e 3ª e última placa: “Sob o reinado do S. M. O. Imperador senhor D. Pedro Segundo
foram inaugurados os trabalhos da Linha do Centro em seis de agosto de 1871”.

Fotografias 84, 85, 86, 87: Estado atual deste importante marco da memória do processo inicial de
formação da cidade de Três Rios, completamente abandonado, sem as placas comemorativas há muito
roubadas. Fotografia de dezembro de 2011 da coleção digitalizada de André Mattos.

A formação do espaço urbano da Vila de Entre-Rios relaciona-se, diretamente, ao


período de implantação, pelo governo imperial de D. Pedro II, de alternativas para o
escoamento da produção cafeeira, do Vale do Paraíba e da Zona da Mata mineira.

144
Neste primeiro momento do recorte temporal da pesquisa, definido entre os anos de
1861 e 1890, as terras das Fazendas de Cantagalo e Boa União recebem a edificação da Ponte
de Entre-Rios – obra que possibilita a passagem da estrada União e Indústria -, e das Estações
Rodoviária e Ferroviária de Entre-Rios, configurando-se no núcleo populacional que, no
decorrer dos anos, se transformaria na cidade de Três Rios.
A partir da chegada das ferrovias, começam a ser redesenhados novos campos de
trabalho e circulação de capital, não só nas estações e oficinas, mas no comércio, na indústria,
e nas profissões liberais; ensejando a construção dos espaços de relação: edifícios para lojas
comerciais, bancos e indústrias, casas residenciais, ruas, igrejas e praças; reafirmando assim, a
condição das Companhias Ferroviárias de servirem como agentes de desenvolvimento
regionais. São estas novas edificações, construídas no processo de crescimento do espaço
urbano, que aparecem retratadas nas fotografias inseridas no próximo capitulo.

145
CAPITULO I I I

A Condessa, os espaços urbanos, a sociedade e os negros libertos.

3.1 - 2º Momento: Entre-Rios, de 2º Distrito de Paraíba do Sul até o findar do


movimento de emancipação política e econômica (1890 a 1939).

3.1.1 – A Condessa do Rio Novo e o crescimento urbano da Vila de Entre-Rios.

Miguel Padilha, em um artigo publicado no periódico O Jornal de Três Rios, de abril


de 1960, escreveu que, desde 1954, não se instalava uma grande organização industrial em
Três Rios, situação que considerou estranha, absurda e inverossímil. Sua indignação estava
pautada na incapacidade dos políticos de perceberem a posição geográfica privilegiada de
Três Rios, quanto ao sistema rodo-ferroviário do país.

“Situamo-nos, praticamente, nos limites dos três maiores centros de


consumo do país: Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. É de fácil alcance
pelo nosso município, através das rodovias e dos caminhos de ferro estão o
Espírito Santo, a Bahia e mais alguns Estados do Sul e do Nordeste. Aqui temos a
maior estrada de ferro do país, a Central do Brasil que nos serve pelas suas linhas
troncos as quais demandam os Estados de Minas e de São Paulo; e pelos seus
ramais de bitola estreita: o da linha auxiliar (zona de Miguel Pereira) e o da
Ponte Nova. Também nos serve a Estrada de Ferro Leopoldina, que liga o litoral a
Zona da Mata, em Minas. Rodovias antigas e novas, modernizadas, cruzam o
Município de Três Rios, em todas as direções, caldeando em tráfego de veículos,
borbulhante e intenso, que dia e noite, incessantemente, dá vazão a economia
brasileira, num vai e vem de formiga: das fontes de produção aos mercados e vice
e versa. E Três Rios se situa como um centro radiador magnífico (...)” 101

Mauro Kleiman afirma que o “transporte por modal ferroviário foi aquele que primeiro
propiciou a tentativa de integração no território brasileiro na escala regional e urbana” (2006).
Segundo esse autor, as ferrovias foram substituídas como principal meio de transporte
regional e urbano de passageiros e de mercadorias, a partir de 1930 e, de maneira mais

101 INDÚSTRIA, Padilha, Miguel. O Jornal de Três Rios. Três Rios/RJ, nº. 2, 28 de abril de 1960, capa.

146
intensa, durante a segunda metade da década de 1950, ocorrendo deslocamento desta função
para “o modal alternativo automotivo, como elemento articulador do território” (KLEIMAN,
2006), em função da instalação da indústria automobilística no Brasil.

No processo de urbanização de Três Rios, como relatado, os dois elementos são


marcos importantes para sua formação geo-econômica, possibilitando a cidade ligar-se por
ferrovias e rodovias aos principais centros industriais e comerciais do país.

Entendo que o crescimento de um município não está relacionado apenas a um fator.


Condições favoráveis quanto às questões econômicas e políticas, a localização geográfica, a
formação de grupos sociais e o aumento populacional, são aspectos, entre outros, que se
tornam mais ou menos relevantes, na formação da rede urbana.

A conformação constituída com a passagem da estrada União e Indústria e das


ferrovias pelas terras das Fazendas de Cantagalo e Boa União, e a construção das suas
respectivas estações, foram os aspectos mais importantes para que, nos primeiros anos de sua
formação, a vila e depois o distrito de Entre-Rios, recebesse considerável fluxo de capital e
pessoas em busca de oportunidades de negócios e empregos, no comércio, na indústria e na
prestação de serviços.

O núcleo urbano da Vila de Entre-Rios tem o seu termo inicial, como visto no capítulo
II, na construção da Ponte de Entre-Rios e da Estação Rodoviária, desenvolvendo-se
geograficamente, com o passar dos anos, em direção à margem do rio Paraíba do Sul, no
entorno da estrada União e Indústria, e nos trechos das estradas de ferro, conforme demonstra
a imagem abaixo.

1 2 3 4 5 6
9
7 8

Fotografia 88: Fotografia que permite uma visão panorâmica do ainda distrito de Paraíba do Sul/RJ,
Entre Rios. Registro realizado entre 1937 e 1938, com autor desconhecido, acervo André Mattos.

147
Neste registro fotográfico, sinalizo pontos de referência ao crescimento espacial da
cidade, no que atualmente, é definido como o centro de Três Rios. É possível considera-lo
entre os anos de 1937 e 1938, tendo em vista observar-se na imagem (7) o Hospital Nossa
Senhora da Conceição, que teve a cerimônia do lançamento e benção da pedra fundamental
realizada em 14 de março de 1937, sendo inaugurado em 24 de abril de 1938, ao lado da
igreja do mesmo nome, e não constar o Cinema Glória 102, construído no final de 1938.

No segundo plano (3) o antigo trecho da União e Indústria, vindo da Ponte das Garças,
passando pela Estação Ferroviária da Central do Brasil, atravessando a linha férrea no Largo
do Barulho (seta amarela), passando pela (9) Praça Salim Chimelli (destruída no final de 2012
para a construção de um viaduto), seguindo em direção às terras da antiga Fazenda Boa União
(seta branca).

No lado direito da imagem (6) a Igreja Matriz de São Sebastião, (5) o espaço onde foi
construída a Praça Vicente Dias, atual São Sebastião, ao centro no segundo plano (4) o rio
Paraíba do Sul, que tem seu percurso ocorrendo da direita para esquerda neste registro, e (8) o
trecho da Estrada de Ferro Central do Brasil. À esquerda, vê-se (1) o Cemitério São José, e (2)
um campo de futebol no Morro Áureo, utilizado pelo Central S. C. e depois pelo Entrerriense
F. Clube – estes morros separam o centro da cidade do bairro Vila Izabel.

Contribuiu favoravelmente para a formação espacial da cidade, a vontade firmada em


testamento, de 11 de agosto de 1882, de Mariana Claudina Pereira de Carvalho, a Condessa
do Rio Novo, que determinou a venda dos lotes ou prazos, aforados ou arrendados aos
interessados nas terras fronteiras a Estação de Entre-Rios, na Fazenda de Cantagalo.

Essas terras hoje formam o núcleo principal da cidade e alguns dos seus bairros. A
renda gerada foi revertida para a Casa de Caridade de Paraíba do Sul/RJ, fundada em 11 de
agosto de 1881. A Condessa veio a falecer em Londres, onde se encontrava em tratamento de
saúde, no dia 5 de junho de 1883.

“Nessa ocasião, quando a Casa de Caridade de Paraíba do Sul recebeu o


precioso legado da veneranda titular, e até princípios de 1886, as habitações
existentes na Fazenda de Cantagalo eram em número de cinqüenta, e o valor
locativo mensal de cada uma delas, correspondia a 23$000, em média geral.” 103

102 Ver fotografia 104.


103 DE SÁ, Antonio Ribeiro, op. cit. p. 23.

148
Fotografia 89: Planta topográfica da Fazenda de Cantagalo, primeira carta cadastral da Vila de
Entre-Rios. Fonte: DE SÁ, Antonio Ribeiro.

Atender ao determinado pela Condessa do Rio Novo poderia levar à formação de um


núcleo urbano no entorno da Estação de Entre-Rios, o que favoreceria financeiramente a
própria Casa de Caridade. Consciente da possibilidade, para tanto, Miguel Ribeiro de Sá, o
Barão Ribeiro de Sá, segundo provedor da Irmandade Nossa Senhora da Piedade, regedora da
instituição, determinou a composição de uma carta cadastral, realizada pelo engenheiro
Nicomedes Dié e apresentada à mesa administrativa em 26 de maio de 1886.
A planta organizou as terras em 368 lotes com frentes para ruas e praças, no terreno
entre as estações rodoviária e ferroviária e o rio Paraíba do Sul, e nos trechos da Estrada
União e Indústria e das linhas de ferro da Estrada de Ferro Central do Brasil, o que se
conformou com o passar do tempo, e que as imagens fotográficas de panorâmicas da cidade
demonstram.
Antonio Ribeiro de Sá (1942, p. 31-32) informa que, ao apresentar seu relatório do ano
de 1886 à mesa administrativa da Irmandade, o Barão considerou que os terrenos situados em
local tão favorável atrairiam muitos pretendentes, o que realmente ocorreu, tendo em vista que
em menos de um mês 71 pedidos para aforamento de lotes foram apresentados.

149
Fotografia 90: Detalhe ampliado da planta topográfica da Fazenda de Cantagalo. Fonte: DE SÁ,
Antonio Ribeiro.

Mas um detalhe não passou despercebido por aquele administrador: em 13 de


setembro daquele ano, João Pedro Guimarães requereu o aforamento de 53 lotes, o que foi
recusado em parte, por não favorecer o processo de formação da zona urbana, impedindo-se a
concessão de um número maior de lotes a apenas um indivíduo.
“O arraial tomou logo outro impulso progressista e a animada Vila foi
dispondo de mais comércio, hotéis e colégios, e o seu desenvolvimento foi num
crescendo ininterrupto e, em 13 de agosto de 1890, foi a Vila elevada oficialmente
o segundo Distrito de Paraíba do Sul”. 104

Entre-Rios transformou-se em um lugar de convergência de todas as outras localidades


e cidades que foram servidas pela estrada União e Indústria, e pelas linhas das estradas de
ferro, ligando a Zona da Mata Mineira – e desta para o Norte e Nordeste do Brasil -, o Vale do
Paraíba, a cidade de Petrópolis e a capital do Império, Rio de Janeiro, o que ampliou
consideravelmente a relação.

104 DE SÁ, Antonio Ribeiro, op. cit. p. 85.

150
A construção das estações, o loteamento das terras próximas a elas e a presença de
funcionários das companhias e suas famílias, possibilitaram o surgimento de pequeno centro
urbano, que cresceu consideravelmente, num período relativamente curto de 80 anos (1861 a
1940).
A população da Vila de Entre-Rios foi se formando, também, com a vinda de
portugueses, sírios, espanhóis, alemães e ingleses (estes para a construção das estradas
rodoviária e ferroviária, respectivamente), e brasileiros natos, contando ainda, com a presença
dos negros escravos libertos das fazendas de café e seus descendentes.
“Nos primórdios de cidade em formação, os emigrantes estrangeiros são os
pioneiros no comércio local. Esta cidade não fez exceção, à regra. Para cá, então
afluíram os Srs José Nasser, Alexandre Kalil, os irmãos Salim e Pedro Chimelli,
Simão Kalife e Rezhala Kalife, Jorge Moor, Abrahão José Mansur e Michel José
Farah, estes no ramo de fazenda e armarinho. Os primeiros lojistas de Três Rios.
No ramo de cereais tivemos os Srs Benardino Osório, Alberto Domingos Ferreira,
João Nery Gama, Miguel Hagge, os irmãos Antonio, Joaquim, Acácio, Manoel
Ferreira Álvares, os quais foram precedidos pelo tio, Quintino Pinto Álvares.
Foram sírios libanezes e portugueses, que iniciaram o comércio trirriense (...)” 105

Também vamos encontrá-los entre os industriais e os profissionais liberais.


Até o início do século XX, as redes de municípios no Brasil existiam, sobretudo, em
função das relações econômicas com o exterior, com o café tornando-se por muito tempo o
principal produto de exportação, refletindo este sistema colonial de exploração da economia,
na concepção das cidades, construídas com o propósito de ocupar, dominar e extrair.
A Vila de Entre-Rios sentiu menos que a cidade de Paraíba do Sul a abolição da
escravatura e a nova realidade urbana do Brasil, com o advento da República, pois suas
características geo-urbanas beneficiaram a organização de um comércio e de uma indústria,
que favoreceram o acelerado progresso econômico e populacional. Alguns historiadores
afirmam que em 1924 o distrito possuía população aproximada de 4.000 pessoas, chegando a
mais de 10.000 habitantes e renda superior a 150 contos de réis em 1937 106, com um número
considerável de construções (ruas, praças, igrejas, residências, comércio, escolas e indústrias);

105 BRAVO, Aparecida. Gente que aqui viveu, gente que aqui vive. Revista do 4º Seminário dos Clubes de
Diretores Lojistas do Estado do Rio de Janeiro. Três Rios/RJ, 21, 22 e 23 de abril de 1967. Composta e Impressa
na Gráfica Três Rios, p. 32.
106 SUB-PREFEITURA. Arealense. Entre-Rios, atualmente, Três Rios/RJ. Ano XXVI, de 20 de março de 1937,
ed. nº. 1.632, p. 4.

151
mas Entre-Rios carecia de intervenções político-administrativas da prefeitura de Paraíba do
Sul.
Não havia ruas calçadas (inicialmente eram de terra batida) e com iluminação pública,
a água era obtida em poços ou entregues pelas carroças d´água, e a energia produzida pela
Companhia de Eletricidade em Paraibuna era insuficiente para atender a crescente demanda.
No jornal Arealense de sábado, 13 de março de 1926, 107 tem-se a informação que o
distrito de Entre-Rios foi responsável, no ano anterior, por uma arrecadação (renda de
impostos) de 91:985$527, possibilitando a criação na localidade de uma Agência da
Prefeitura, em conformidade com a Lei Estadual nº. 1986, de 10 de novembro de 1925. Após
a implantação da sub-prefeitura, quase sistematicamente o jornal Arealense passou a publicar
em suas edições, relações divulgando o número de novas residências, lojas, veículos,
impostos arrecadados, procurando evidenciar o crescimento do distrito.

2
1 3
8 6

4 5
7

Fotografia 91: Panorâmica do distrito de Entre-Rios na década de 10, sem fotógrafo conhecido,
acervo André Mattos.

A partir da fotografia 91, observa-se, na seqüência de imagens, o progresso urbano do


distrito de Entre-Rios. Nesta imagem as principais construções encontram-se margeando o

107 SESSÃO da Câmara: Entre-Rios será grandemente beneficiado pela deliberação nº. 322 da câmara.
Arealense. Entre-Rios, atualmente, Três Rios/RJ. Ano XXV, de sábado, 13 de março de 1926, ed. nº. 1263, p. 2.

152
trecho (3) da Estrada União e Indústria – Rua da Condessa, (atualmente Avenida Condessa do
Rio Novo), e da (5) linha férrea da Estrada de Ferro Central do Brasil, na direção oposta à sua
estação e pátio de manobra. Esta fotografia foi publicada na edição nº. 54 do O Jornal de Três
Rios, que circulou em 3 de maio de 1961, com informação que o registro seria de julho de
1914, e pertencia ao Srº Guilherme Bravo, editor proprietário do jornal Arealense.

Deste núcleo, as outras edificações acompanharam a estrada de ferro e o (4) trecho da


União e Indústria, que segue para Juiz de Fora/MG e ainda, mesmo que bem espaçado, em
direção (6) ao rio Paraíba do Sul. Vê-se também a (7) antiga Rua Visconde de Entre-Rios (na
fotografia 92 apresentando um número maior de casas), atualmente Rua da Maçonaria, com
poucas residências, mas já com o prédio da Loja Maçônica 25 de Março.

O (8) espaço onde, em 24 de fevereiro de 1911, foi inaugurada a Praça Oscar


Weisnchenck, aparece sem o coreto, o que pode indicar que a imagem é anterior a 1914, e no
alto mais a esquerda tem-se (2) o Morro Áureo, ainda sem o campo de futebol que foi
formado na década de 20.

No alto à esquerda, observa-se o (1) Cemitério São José, onde conforme a


pesquisadora Cínara Jorge 108, em 19 de maio de 1896, o vereador João Pedro Guimarães,
(esposo de Marianna, filha de Josina, que era sobrinha da Condessa do Rio Novo), realizou
uma indicação na reunião da Câmara de Vereadores de Paraíba do Sul, para que se
providenciasse a construção de um cemitério no distrito de Entre Rios, sendo aprovado o
pedido em 20 de fevereiro de 1897, com o orçamento para a obra realizado por Lino José da
Cruz.

Na imagem, é possível observar ainda a Igreja dos Republicanos – denominação


utilizada pelo jornalista e diretor do jornal Arealense, Guilherme Bravo 109, para designar a
Igreja de Nossa Senhora da Conceição (indicada pela seta amarela), que tem sua construção
em data desconhecida pelos historiadores e memorialistas da cidade, ocorrendo
provavelmente entre o final do século XIX e primeiros anos do século XX. Em inferência
neste registro, que pode ser encontrada no periódico relacionado na página anterior 110, lê-se a
informação da não existência de postes de luz, apenas de telegrafia.

108 Informação encaminhada por correio eletrônico.


109 “Tal assertiva tem por base antigo registro escrito de Guilherme Pereira Bravo, que dava como origem da
sua construção as divergências políticas entre republicanos e imperialistas, que trouxeram a incompatibilidade
das suas convivências sob o mesmo teto religioso”. TEIXEIRA, Ezilma. Era uma vez... Juiz de Fora/MG. Editar
Editora Associada. 2006, p. 30.
110 Inferência a fotografia publicada na edição n°. 54 do O Jornal de Três Rios, Três Rios/RJ, que circulou em 3
de maio de 1961, capa.

153
Fotografia 92: Vista da Rua Visconde de Entre-Rios, atualmente Rua da Maçonaria, onde se percebe o
calçamento feito com moinha de carvão por cima da terra batida. No primeiro plano, à esquerda a sede da Loja
Maçônica 25 de março, inaugurada em 1899. Ao centro, dois indivíduos adultos e uma criança, com outras
pessoas no segundo plano. Os postes não possuíam lâmpadas. Fotografia da década de 20, sem autor
conhecido, acervo Profª. Ezilma Teixeira.

Fotografia 93: Fotografia do centro do distrito de Entre-Rios, entre a primeira metade da década de
1910 e o inicio da década de 1920. Sem informação do seu autor, acervo André Mattos.

154
A fotografia nº 93 também permite observar aspectos da formação urbana do distrito
de Entre-Rios. Do mesmo período temporal da anterior, destaca-se à direita a estação
ferroviária da Estrada de Ferro Central do Brasil (em detalhe na fotografia 94), com seu
depósito e pátio de manobra repleto de vagões. Ao centro à esquerda, a Estação de Pedra da
Estrada de Ferro Leopoldina com seu pátio, onde é possível ver uma locomotiva em partida
(expelindo fumaça). Os trens entravam no pátio de ré, após manobra no atual bairro do
Triângulo, depois de atravessar a Ponte das Garças.

Fotografia 94: Vista externa da Estação Ferroviária de Entre-Rios, do mesmo período das anteriores,
possibilitando perceber a movimentação de passageiros e trabalhadores da ferrovia, com destaque para o
homem realizando manutenção no telhado da estação. À direita, a plataforma onde está escrito Entre-Rios.
Fotografia sem autor conhecido, acervo Sr.º Altair.

É possível apreender que não havia postes de luz. No segundo plano, à direita no alto,
a Igreja Nossa Senhora da Conceição. Em primeiro plano, destacando-se, isolado em um
amplo terreno, o prédio do Clube Recreativo e Musical Henrique Mesquita, fundado por volta
de 1890, tendo sua sede construída no ano de 1904, local de saraus e apresentações teatrais,
conforme informa Hugo Kling:

155
“(...) e não tardou muito a ser, no mesmo salão, improvisado um palco no qual os
irmãos Cornélio e Felinto Guerra, coadjuvados por familiares e pelo jovem João
Amâncio, como eles ferroviário, passaram a levar à cena peças muito boas como
“A Escrava Isaura” e “A Cabana do Pai Tomás.” 111

Na fotografia 95, observa-se toda a (1) área da Estação Ferroviária de Entre-Rios, no


centro (à esquerda), e todo o trecho (2) da Rua da Condessa (bem ao centro da imagem). No
segundo plano ao centro, (3) a Oficina dos Irmãos Torno, de propriedade de Pedro e Alfredo
Torno, construída no local, no início da década de 1910; e a (4) Praça Oscar Weinchenk (atual
Praça da Autonomia), não sendo possível perceber ainda o seu coreto.

No primeiro plano à direita, o (5) prédio da Subestação da CIE – Companhia


Internacional de Eletricidade, hoje pertencente à Ligth, edificado no início do século XX, e a
(6) atual Rua XV de Novembro, que não existia quando da tomada da imagem 91, e que se
destaca no registro 96. Além da falta de iluminação pública, as ruas da cidade ainda eram de
terra batida, ou com carvão de pedra queimado.

1 2
4

5 6

Fotografia 95: Fotografia do centro do distrito de Entre-Rios, como as anteriores, realizada entre
década de 1910 e 1920, sem informação do seu autor, acervo André Mattos.

111 KLING, Hugo. op. cit. p. 79.

156
Fotografia 96: Fotografia da Rua Campos Elíseos, atualmente, Rua XV de Novembro, com destaque
para o prédio da Subestação Elétrica da CIE – Companhia Internacional de Eletricidade, e para o calçamento,
também realizado com moinha de carvão, sobre chão de terra batida. Observa-se ao centro um homem e uma
carroça puxada por cavalo, uma criança atravessando a ponte e dois homens na entrada da subestação, à
direita. Registro da década de 1920, sem autor conhecido, acervo Sr. Altair.

Encerrando esta seqüência de fotografias panorâmicas e de paisagens urbanas de


Entre-Rios, entre o início da década de 1910 e o final da década de 1920, o registro 97
permite observar a Estação Ferroviária no primeiro plano à direita, destacando-se ao centro, o
pontilhão de ferro, e ao fundo o rio Paraíba do Sul.
No espaço da Praça Oscar Weinchenk, onde inicialmente encontravam-se os galpões
da Estação Rodoviária de Entre-Rios, da estrada União e Indústria, nota-se (1) o Coreto –
arquitetado pelo oficial serralheiro Alfredo José de Souza -, que foi inaugurado nos anos
primeiros da década de 1910. No segundo plano à direita, algumas construções em áreas
próximas à margem esquerda do Rio Paraíba do Sul.
As fotografias permitem perceber que o crescimento urbano do distrito de Entre-Rios,
ocorreu seguindo as direções “indicadas” pelas estradas rodoviária e ferroviária, além dos
terrenos à margem do rio Paraíba do Sul.

157
1

Fotografia 97: Fotografia do distrito de Entre-Rios, também tomada entre década de 1910 e 1920, sem
informação do seu autor, acervo André Mattos.

Nas duas próximas imagens, tem-se a primeira praça arquitetada no distrito de Entre-
Rios, um espaço arborizado próximo ao Largo da Capelinha e a Estação Ferroviária da
Central do Brasil, onde durante as décadas primeiras do século XX, ocorriam as
manifestações políticas, culturais e cívicas, como as apresentações da Banda 1º de Maio e as
manifestações em favor da emancipação.

A atual Praça da Autonomia apresenta-se ainda com as mesmas configurações, com


seu Coreto construído em estilo colonial preservado, diferenciando-se no piso e na presença
de bancos e mesas, utilizadas durante o dia principalmente por aposentados para jogos de
cartas, damas, e para encontros com os amigos. Nos jornais anteriores a década de 20, este
local é chamado de Parque Oscar Weinchenk.

Um dos espaços urbanos mais arborizados do município, sua denominação atual é uma
homenagem aos autonomistas que se reuniam sob as sombras de suas árvores e junto ao
coreto – destacado na fotografia 99. Com o tempo, foi perdendo em importância e valor para a
Praça São Sebastião, apesar de existirem ao seu redor diversas lojas e prédios comerciais, o
maior supermercado da cidade e a rodoviária municipal, conhecida popularmente como
“rodoviária velha”, recebendo um grande fluxo de pessoas diariamente.

158
Fotografia 98: Vista do Parque Oscar Weinchenk, onde, no primeiro plano, aparecem três crianças e
ao fundo o Coreto, com mais três crianças à sua frente. Registro sem autor conhecido da década de 1920,
acervo André Mattos.

Fotografia 99: Segundo registro do Parque Oscar Weinchenk, destacando ao fundo o Coreto que existe
no local até os dias de hoje, com um grupo de crianças à frente, e ao centro, no primeiro plano, à esquerda, um
possível guarda. A imagem permite perceber também as plantas e árvores dos jardins. Fotografia sem autor
conhecido, realizada na década de 1920, acervo André Mattos.

159
Seu tempo de “glória” está intimamente ligado ao movimento de pessoas junto à
Capela de São Sebastião, no Largo da Capelinha e a Estação Ferroviária da Central do Brasil.

Na edição de 15 de setembro de 1910, do jornal Arealense, encontra-se publicada a


seguinte nota:

“Há muito que carecia de uma limpeza a Rua Nelson Vianna, nas valas que
a margeiam, por se acharem imensamente sujas, em completo lodaçal que exalava
constantemente um fétido insuportável, que vinha por certo em prejuízo da higiene.
Não se via uma providência siquer, dada por quem de direito, e assim o tempo
passava sem uma medida preventiva. Nas ocasiões de chuvas, não dando
escoamento, as águas alagavam as ruas, tornando-as intransitáveis. Agora,
porém, por um espírito de verdadeiro altruísmo o Sr. Major João da Costa Ribas,
não fazendo como todo fazendeiro ou capitalista que necessita de trânsito, mas que
se não move em uma iniciativa porque o seu rico dinheirinho não se gasta para o
bem público, prontificou-se a fazer, com uma grande turma de trabalhadores,
concerto na estrada União e Indústria, e então vendo que estas valas
prejudicavam, assim na imundice a que se viam, a saúde pública, estabeleceu-lhes
a respectiva limpeza. Fica devendo o povo de Entre-Rios uma gratidão ao Major
Ribas. E a oportunidade aproveitamos para chamar a atenção dos poderes
competentes para outras valas em outras ruas que requisitam limpezas” 112

Nessa notícia, em um primeiro momento, o seu autor imputa aos fazendeiros e


capitalistas certa responsabilidade na manutenção das vias públicas. Observa-se que a
despeito do seu crescimento urbano, com a construção de novas edificações, organização de
novas ruas e praças, e o recrudescimento das atividades no comércio e na indústria, durante,
principalmente, todo o período entre 1870 e os primeiros anos da década de 1920, o distrito de
Entre-Rios, careceu da presença mais constante do poder executivo da cidade de Paraíba do
Sul, e do próprio governo do Rio de Janeiro, na sua manutenção.

A situação, entre outros fatores, corroborou para o surgimento e continuidade das


manifestações políticas e sociais em favor da emancipação e criação de um novo município.
Informes quanto à necessidade de intervenções do poder público nos espaços urbanos, bem
como os exemplos de iniciativas privadas neste campo, estão presentes nas edições do jornal

112 Coluna de notícias do jornal Arealense. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ. Ano X, quinta-feira, 15 de setembro
de 1910, p. 2.

160
Arealense dos anos das décadas de 1910 e 1920, quase sempre relacionadas à capacidade de
arrecadação de rendas pelo distrito.

Como exemplo, tem-se a campanha para arrecadação de 11:000$000 junto aos


habitantes de Entre-Rios, para completar o valor repassado pelo governo estadual –
7:000$000 e pelo executivo municipal – 7:000$000, visando os serviços de urbanização da
Praça Vicente Dias, atual São Sebastião, iniciada em abril de 1926.

Percebe-se, nas fotografias anotadas neste capítulo, que a partir das primeiras décadas
do século XX, seguindo não só a organização “imposta” pelo desejo da Condessa do Rio
Novo em seu testamento, mas também as deliberações quanto à formação da primeira planta
cadastral do município, pelo Barão Ribeiro de Sá, Entre-Rios teve seu centro urbano
formatado, principalmente, no entorno das estações e estradas rodoviárias e ferroviárias, bem
como, num momento seguinte, em direção às margem esquerda do rio Paraíba do Sul.

Este “movimento de ampliação dos espaços de relação”, bastante intenso para o


período temporal de poucos anos, deu-se pela presença daqueles que elegeram a cidade como
lugar para trabalho e investimentos, no comércio e na indústria. E foram essas mesmas
pessoas que, com a continuidade deste processo e a necessidade de maior aplicação dos
valores arrecadados com os impostos, na infra-estrutura urbana, que se apresentaram à frente
do movimento de emancipação de Entre-Rios, como veremos a seguir.

161
3.1.2 – O movimento de emancipação político-administrativa e a continuidade do
crescimento urbano de Entre-Rios, na década de 1930.

“Embora a administração sulparaibana realizasse alguns


melhoramentos no 2º distrito [durante os dois últimos quartos da década de
20], esses não foram bastante para fazer cessar um clamor de emancipação
política e administrativa, já presente nos primeiros anos da década de 20.”
113

Fotografia 100: Fotografia externa da Rua Maria Pereira, atualmente Rua Drº Walmir Peçanha.
Fotografia sem autor definido, da década de 1920, acervo Profª Ezilma Teixeira.

No registro acima é possível perceber as condições de calçamento da rua, que apesar


do uso da moinha de carvão, encontrava-se bastante enlameada, além de demonstrar com
maior nitidez a falta de iluminação pública. Ao centro, em primeiro plano, algumas crianças.
As precárias condições da cidade, incluindo-se um sério problema de abastecimento de água e
de tratamento para o esgoto (inexistente), foram fatores que também contribuíram para o
movimento de emancipação.

A ausência dos poderes públicos e o crescimento urbano do distrito provocam a partir


de 1921, debates entre a população sobre a separação de Entre-Rios do município de Paraíba
do Sul, conforme publicado no jornal Arealense, de 26 de novembro de 1927:

113 TEIXEIRA, Ezilma. op. cit. p. 139.

162
“Data de longos anos o justo desejo dos entrerrienses de conquistarem sua
independência. Para comprová-lo, vamos recordar que, em 1921, por ocasião do
abastecimento d’água local, e do lançamento da pedra fundamental do grupo
escolar, uma comissão dirigiu-se ao exmo. Sr. Dr. Raul Veiga [presidente do
Estado do Rio de Janeiro entre 1918 e 1922], para pedir a sua ex. que assentisse na
elevação de Entre-Rios a vila.” 114

As questões relacionadas ao progresso urbano e econômico, com a não aplicação


devida dos impostos na manutenção e melhorias da infra-estrutura, aparecem no final da
década de 1920, em artigos publicados no Arealense: “Entre-Rios, que tem direito ao
emprego em seu benefício de 70% do que contribui aos cofres municipais, jamais conseguiu
que em seu proveito fosse despendida uma soma que ao menos atingisse a 50%.” 115
Em 9 de novembro de 1927, foi fundado a Liga Progresso de Entre-Rios, em reunião
realizada no antigo Cinema 1º de Maio, sendo esta a primeira organização política/social a
lutar pela emancipação. A finalidade da Liga aparece assim em seu programa:
“É uma congregação de todos os amigos do progresso de Entre-Rios, sem
distinção de classes, de posições, de fortuna, de credos políticos ou política
partidária, para lutar por todos os meios lícitos, em prol da grandeza desta terra.
(...) [esclarece o articulista] Não se poderá negar uma feição política a LPER, pois
sem uma atuação propriamente política, não lograremos ver reconhecidos os
nossos direitos.” 116

Neste mesmo dia, uma comissão foi eleita para representar a LPER na posse do
presidente do Estado do Rio de Janeiro, Deputado Manuel de Mattos Duarte Silva, em
dezembro de 1927.
O distrito continuava em processo crescente de urbanização, conforme se constata no
registro 101, do início da década de 1930. Na imagem é possível visualizar o prédio (1) do
Grupo Escolar Condessa do Rio Novo, inaugurado em 3 de maio de 1928, e que serviu
durante alguns anos como sede da Comarca de Três Rios, e que atualmente, abriga no seu
andar térreo, o Juizado Especial Civil, e no andar superior, a Casa de Cultura e Secretaria de
Cultura do Município de Três Rios.

114 TUDO por Entre-Rios. Arealense. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ. Ano XXVII, sábado, 26 de novembro de
1927, nº. 1351, capa.
115 NOBILÍSSIMAS aspirações III. Arealense. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ. Ano XXVII, sábado, 15 de
outubro de 1927, nº. 1345, p. 2.
116 OS FINS da Liga Progresso de Entre-Rios – seu programa. Arealense. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ. Ano
XXVII, sábado, 24 de dezembro de 1927, nº. 1355, capa.

163
1 2

Fotografia 101 e verso: Fotografia panorâmica do distrito de Entre-Rios, tomada em 16 de outubro de


1932, conforme referência no verso, sem informação do seu autor, do acervo André Mattos.

164
No segundo plano à direita, temos (2) o Armazém Regulador de Café do Estado de
Minas Gerais, construído no governo do presidente, Drº Antonio Carlos Ribeiro de Andrada,
inaugurado em 24 de novembro de 1928.

No primeiro plano à esquerda, (3) vê-se o Posto dos Consertadores, observado também
no registro abaixo, destruído após a explosão de um vagão carregado com munição,
conduzido pelo trem do 12º Regimento de Infantaria de Belo Horizonte/MG, que se dirigia à
cidade de São João Del Rey/MG, procedente de São Paulo, após o término da Revolução
Constitucionalista de 1932. A imagem possui em seu verso a informação da data, da cidade e
do evento principal, além de um carimbo da Óptica R. Haack, com endereço na Av. 15 de
novembro, em Petrópolis/RJ. Em 29 de novembro de 1973, Frederico Haack, escreveu no site
da Fotolog:

“A loja foi fundada pelo meu bisavô Rudolf Haack, em 29/julho/1921,


ficava ao lado do cinema Capitólio, no número 958, foi a primeira Óptica de
Petrópolis, veio a fechar em 2006, devido à idade do proprietário Reinhald Haack
e também devido ao crescimento do comércio que foi sufocando as lojas mais
antigas.” 117

Fotografia 102: Registro da destruição causada pela explosão de vagão de carga com munição, vindo de
São Paulo. Sem informação do seu autor, acervo André Mattos.

117 Disponível no site: http://fotolog.terra.com.br/petropolis1:147. Acesso em 10 de jan. de 2012.

165
As imagens panorâmicas demonstram que os espaços entre a Estação Ferroviária e as
margens do rio Paraíba do Sul foram sendo preenchidos no transcorrer dos anos. Para realizar
as obras de construção de residências e organização de ruas, foi necessário proceder a
aterramentos, pois os mesmos recebiam as águas deste rio durante os períodos de cheias.

As enchentes, em algumas ocasiões, conforme noticiado em jornais da época, chegavam


às proximidades da Igreja de São Sebastião e da Rua Barão do Rio Branco, no centro da
cidade.

Fotografia 103: Fotografia publicada no periódico Entre-Rios Jornal, edição de nº. 63, que circulou
em 2 de abril de 1936, ilustrando matéria sobre as enchentes do Rio Paraíba do Sul. Nesta imagem, apesar da
pouca qualidade, é possível perceber no primeiro plano, abaixo, as águas transbordadas e os indivíduos –
adultos, jovens e crianças do sexo masculino, um deles a esquerda sentado em uma bicicleta -, na Rua Barão do
Rio Branco, que fica no centro da cidade. Registro do acervo André Mattos.

166
A fotografia 104 confirma o crescimento urbano ocorrido no distrito de Entre-Rios, no
período entre 1910 e os anos iniciais da década de 40, em comparação com os registros
panorâmicos anteriores.

Bem ao centro, tem-se na imagem o (1) prédio do Cinema Glória, que foi inaugurado
em novembro de 1938, além de um número maior de residências, edificações e ruas. No
segundo plano à esquerda, o (4) campo de futebol do Entrerriense F. C., onde hoje existe o
prédio da FAETC (no antigo CIEP do Morro Áureo), e no centro, (2) a Rua Walmir Peçanha;
mais embaixo (7) a Rua Barão do Rio Branco e a direita no centro, (3) a Rua Barão Ribeiro de
Sá, atual Rua Presidente Vargas.

4 5 6

1 2 3

Fotografia 104: Panorâmica do distrito de Entre-Rios, entre o final do ano de 1938 e início de 1940,
sem informação do seu autor, do acervo Srº Altair.

Novas edificações aparecem no fundo, a esquerda do pátio da E.F. Central do Brasil e


das linhas da estrada de ferro Leopoldina, (5) começando a “subir” o morro que dava acesso
aos terrenos da colônia agrícola dos escravos libertos que, anos depois, se transformaria no
bairro de Vila Izabel. No segundo plano à direita, tem-se a (6) curva do Paraíba do Sul
(atualmente menor pelo aterramento ocorrido), e seguindo o rio, construções onde hoje existe
a Rua Direita.

167
As fotografias testemunham o revelado no artigo sem autor definido, publicado no
jornal Arealense, de 7 de agosto de 1926:

“É evidente o surto de progresso que se manifesta de modos vários,


dominando nessa hora o nosso grande centro [espaço retratado nas imagens deste
capítulo], onde a atividade humana febricitantemente se multiplica.

Bem que não seja de direito uma cidade, Entre-Rios o é de facto pela
densidade de sua população, pelo crescente movimento de seu comércio, pelo
desenvolvimento grandioso de suas indústrias (...)

Convem que nos detenhamos particularmente a nossa terra, outrora tão


cruelmente desprezada e hoje em plena florescência de um progresso animador.
Há poucos anos só se sabia da existência de muitas de nossas ruas através da
carta topográfica reveladora. Demarcadas algumas, com várias edificações
dificilmente se as transpunha, tantos eram os buracos, tal era a matagal que as
ocultava. (...)

Se ha três anos passado Entre-Rios atraia a atenção dos que o visitavam,


pela sua topografia admirável, hoje quase deslumbra com os inúmeros edifícios
construídos em ruas que surgiram com o nosso progresso incontestável. Estão
sendo edificados aproximadamente 15 novos prédios; fazem-se remodelações,
constroem-se muros, etc, tudo indicando o valor desta terra, onde se trabalha
intensamente e se desfruta relativo conforto.

Faltam-nos ainda muitas coisas de ordem material e que os recursos


ordinários da Prefeitura não comportam. Resentimo-nos, por exemplo, de boa
água potável e de uma rede de esgotos. Temo-las, a primeira de má qualidade, e a
segunda deficientíssima e limitada à algumas ruas somente (...)

Qualquer espírito menos observador, que tenha deixado de vir a esta


localidade há anos, terá forçosamente que curvar-se as evidências dos fatos.
Notará sem grande custo a metamorfose por que passou Entre-Rios, hoje um lugar
em franca prosperidade. Prova-o exuberantemente, entre outras coisas, essa
aluvião de automóveis de passageiros e de cargas, que se cruzam noite e dia, nas
nossas ruas perfeitamente transitáveis.

(...) Se alguém duvidar e quiser certifica-se de tudo quanto ficou exposto,


faça como nós. De sê ao agradável trabalho de galgar o morro “Áureo”, onde
esta confortavelmente instalado o campo do valoroso Entrerriense Foot Ball Club.
De lá deixe que o olhar prescrutador apreenda toda a imensidade do nosso vale,

168
banhado pelo majestoso e poético Paraíba. E verá como o nosso solo está
pontilhado de habitações e como as nossas ruas se movimentam num frenesi que
encanta e que entusiasma aos que desejam e vão conseguindo o desenvolvimento
de Entre-Rios.” 118

A representação de uma cidade em processo de crescimento, relacionado ora à


presença das estações rodoviária e, principalmente, ferroviária; ora à sua privilegiada
localização geo-econômica; ora aos esforços dos seus habitantes, colaboradores financeiros
habituais nas obras de construção e manutenção dos espaços urbanos de relação; bem como,
na junção destes elementos, sempre estiveram presentes nas palavras e artigos dos jornais da
cidade, desde antes, no decorrer e após o finalizar do processo de emancipação, diminuindo a
sua incidência apenas após a década de 1970.

3 5 6
2 4

1
7 8

Fotografia 105: Panorâmica do distrito de Entre-Rios, realizada no final dos anos de 1930, sem
informação de autor, acervo Srº Altair.

Na sequência da imagem anterior, a fotografia 105, tirada do Morro do CTB, permite


vislumbrar outro trecho do centro de Entre-Rios, no ambiente urbano formado seguindo em
direção à (1) estrada de ferro Central do Brasil e à (5) margem esquerda do rio Paraíba do Sul.

118 ENTRE-RIOS e seu progresso. “Arealense”. Três Rios/RJ. Ano XXVI, sábado, 7 de agosto de 1926, edição
nº 1283, capa, (transcrito conforme publicado a época).

169
No primeiro plano (7), o Hospital e a Igreja Nossa Senhora da Conceição; no segundo
plano ao centro, (2) a Praça São Sebastião, revitalizada, mas não com a sua configuração
atual, e próximo a este logradouro a (3) Igreja de São Sebastião (4) e o prédio do Grupo
Escolar Condessa do Rio Novo. A rua que aparece em destaque ao centro do registro é a (8)
atual Gomes Porto, e à direita vê-se (6) a Ilha da Floresta, na atualidade, conhecida como a
Ilha do Independência Clube.

Entre-Rios chegara, assim, a uma situação econômica, social e cultural, que motivava
cada vez mais os seus moradores, a buscarem a autonomia. A permanência da condição de
distrito era entendida como um entrave ao crescimento e debatia-se, segundo assinalado, a
necessidade de aplicação das rendas auferidas na conservação e melhoria da infra-estrutura
urbana.

O Entre-Rios Jornal na edição comemorativa do seu primeiro aniversário, em janeiro


de 1936, apresentou um levantamento das condições econômicas e sociais do distrito até
aquele momento, expondo a opinião corrente de que Entre-Rios possuía as condições
propícias para se tornar um município independente.

Utilizo fotografias da época para compor uma narrativa do cotidiano do distrito,


realizando, na seqüência, um diálogo entre a linguagem escrita e o testemunho da linguagem
imagética.

“(...) Entre-Rios, favorecida pela sua excepcional posição topográfica,


constituindo um centro de gravitação ferroviária e rodoviária e auxiliada pelo
esforço dinâmico de sua laboriosa população, desenvolveu-se agigantadamente.”
(...) “No terreno industrial se ainda não galgou posto de relevo entre as maiores
cidades industriais, deve-se única e exclusivamente ao descaso dos
administradores, que se sucedem, mas ainda nenhum procurou resolver o
problema de importância vital para uma população: que é a sua AGUA.” (...) 119

Identificado em alguns jornais com o nome de Carlos (há referências também ao


Lucas da Lata D`água), o individuo destacado no registro 100 vendia latões de água pelas ruas
do distrito de Entre-Rios. No segundo plano vêem-se lojas comerciais, além da presença de
três crianças, sendo que apenas uma está com os pés calçados.

119 “ENTRE-RIOS jornal”, comemorando seu primeiro aniversário, presta justa homenagem a futurosa cidade
de Entre-Rios, e seus dignos leitores do rincão fluminense. Entre-Rios Jornal. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ.
Ano II, sexta-feira, 17 de janeiro de 1936, ed. 52, capa e p. 16.

170
Fotografia 106: Registro da década de 1920, sem informação do fotógrafo, acervo Srº Altair.

O problema do abastecimento é relatado em diversas edições dos jornais da cidade,


desde a década de 1910. Durante o período de maior recrudescimento do movimento de
separação, a sua continuidade foi interpretada com o intento de atrofiar o desenvolvimento do
distrito. “Uma localidade sem água boa e em abundância assemelha-se a um corpo em cujas
veias corre sangue impuro e insuficiente a vitalidade dos respectivos órgãos, tornando-o
naturalmente inútil.” 120 A água é apresentada como sinônimo de saúde e vida, e sua falta
provoca doença, morte, impede o corpo (a cidade) de evoluir, progredir.

Já a documentação oficial mostra que a administração do governo do Rio de Janeiro


conhecia e admitia este problema, conforme se pode constatar pelo relatório do seu
presidente, Srº Manuel de Mattos Duarte Silva, de 1 de agosto de 1928:
“O desenvolvimento notável que vem tendo a povoação de Entre-Rios, com
o aumento constante de sua população e grande numero de novas edificações faz
com que vá se tornando de certa forma premente a situação do abastecimento
d’agua desta localidade, que é um dos distritos do Município de Paraíba do Sul.

120 O MAIOR entrave ao progresso de Entre-Rios é o problema da água. Entre-Rios Jornal. Entre-Rios, atual
Três Rios/RJ. Ano I, 31 de outubro de 1935, ed. 42, capa.

171
O atual suprimento é feito por meio de seis poços artesianos, de um poço de
1 metro de diâmetro e 13 metros de profundidade e de uma fonte auxiliar.
A sua remodelação segundo parecer da Diretoria de Obras deverá ser feito
com a captação de um novo manancial, que embora distante, possa vir ao
reservatório superior, abandonando-se os mananciais do subsolo e a sua onerosa
elevação mecânica, aproveitando-se para o novo serviço a rede de distribuição e o
mesmo reservatório e tornando-se apenas necessário o assentamento da linha
adutora e a construção da tomada d’agua. Esse assunto a ser cuidado dependerá
de um entendimento com os Poderes Municipais, de forma a ser devidamente
regulado, sem excessivos ônus para o Estado. Além dos serviços de sua
manutenção, que constavam do funcionamento normal da estação elevatória,
conserva da rede de captação, terrenos marginais, reservatórios e jardim, foi feita
a ligação de 35 penas d’agua (...)”.121

Os aspectos relacionados, tanto nas narrativas dos jornais quando no testemunho da


narrativa imagética, estão em consonância com as informações presentes neste relatório: o
crescimento urbano, populacional e econômico e a falta de investimento e entendimento
financeiro, dos executivos estadual e municipal.

A narrativa do Entre-Rios Jornal divide-se em tópicos, que abrangem áreas


importantes para a formação e existência de um município:

“(...) As indústrias existentes em Entre-Rios são as seguintes: Usinas de Laticínios,


Fabricas de balas, diversas Cerâmicas, Refinação de açúcar e outras de pequeno vulto.” 122

Nas fotografias tem-se alguns exemplos dessas empresas, como a Fábrica de Balas Ezilma,
perpetuada na imagem do registro 107. Informou-me por e-mail a Profª Ezilma Teixeira, que
o registro é do dia da inauguração da indústria do seu pai João Batista Teixeira, que
estabeleceu este nome em homenagem às suas três filhas mais velhas – Erlia, Zélia e Ilma.
A fabrica foi uma das primeiras construções da Rua Marechal Deodoro, espaço não
bem visto a época, por sua proximidade com os bordeis existentes as margens do Rio Paraíba
do Sul. É possível observar em pé, ao centro, as operárias da fabrica, e no segundo plano, nas

121 Relatório da Província do Rio de Janeiro de 1928, digitalizado na pagina da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u896/000203.html. Acesso em: 14 de fev. 2012.
122 “ENTRE-RIOS jornal”, comemorando seu primeiro aniversário, presta justa homenagem a futurosa cidade
de Entre-Rios, e seus dignos leitores do rincão fluminense. Entre-Rios Jornal. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ.
Ano II, sexta-feira, 17 de janeiro de 1936, ed. 52, capa.

172
laterais, os “viajantes” – representantes da empresa, tendo ao centro de terno branco o Srº
João Teixeira, além de crianças e outros indivíduos.
Esta empresa encerrou suas atividades nos anos de 1960, e no local atualmente
encontra-se o Edifício Zanata. Afirmou ainda a historiadora trirriense:

Fotografia 107: Fotografia externa da Fábrica de Balas Ezilma. Registro do ano de 1935 do acervo
pessoal da Profª Ezilma Teixeira, sem identificação do fotógrafo.

“É uma história muito bonita, com meu pai - químico industrial -


inventando uma bala sem recheio, mais barata, hoje chamada tutti frutti, mas que
ele deu o nome de bala Combate, pelo racionamento provocado durante a Segunda
Guerra. Chegou a enviar fardos e mais fardos da bala Combate, para os nossos
pracinhas na Itália”. 123

Outro exemplo é o da Fábrica de Fósforo Pharol, de propriedade do emancipacionista


José da Silva Vaz, que funcionava na Rua Mariano Procópio, no centro da cidade, em um
edifício com três pavilhões. Na reportagem no Entre-Rios Jornal de 18 de janeiro de 1935,
existe uma descrição completa dos maquinários e do processo de produção. A empresa tinha

123 Enviado por correio eletrônico.

173
capacidade máxima de fabricação de até 60 mil caixas por dia, empregando 100 funcionários,
80 homens e 20 mulheres, em 8 horas de trabalho. Era sócio no empreendimento o Sr. Djalma
Matheus Ferreira.

Fotografia 108: Imagem externa da Fábrica de Fósforo “Pharol”. Observa-se a rua ainda não
calçada, com dois adultos em movimento e duas crianças, sem iluminação pública, e ao fundo, à esquerda, a
torre do sino da Igreja de São Sebastião. Registro da década de 1930, sem fotógrafo definido, acervo André
Mattos.

“O maior núcleo operário que possui Entre-Rios é o das oficinas da E. F.


C. B., sob o nome de 7ª Inspetoria de Locomoção. Neste departamento onde
mourejam centenas de operários, a Central do Brasil está construindo grandes
galpões para aumento de produção, e assim terminados, será a maior oficina do
interior, mantida por esta via férrea.” 124

Entre-Rios tem sua história e memórias intensamente atreladas à estação e às oficinas


da Estrada de Ferro Central do Brasil, não somente por ser um dos elementos propiciadores

124 “ENTRE-RIOS jornal”, comemorando seu primeiro aniversário, presta justa homenagem a futurosa cidade
de Entre-Rios, e seus dignos leitores do rincão fluminense. Entre-Rios Jornal. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ.
Ano II, sexta-feira, 17 de janeiro de 1936, ed. 52, capa.

174
do crescimento urbano e econômico do distrito, mas também, e principalmente, pela presença
política, cultural e social de seus funcionários na sociedade trirriense.

Fotografia 109: Imagem panorâmica observando-se à esquerda, no primeiro plano, as oficinas 7ª


Inspetoria de Locomoção da E. de F. Central do Brasil; ao fundo, o rio Paraíba do Sul e à direita, no primeiro
plano, os Armazéns de Café do Estado de Minas Gerais. Entre as oficinas e o armazém passava a linha férrea.
Fotografia publicada Entre-Rios Jornal de 17 de janeiro de 1936, sem fotógrafo conhecido.

“Fazendo jus ao progresso local o comércio, artes e outros ofícios, tem


acentuado o seu campo de ação, não só ampliando o número de casas, como
também, modernizando e aumentando a apresentação de seus produtos. Entre-Rios
possue bons e confortáveis hotéis, açougues diversos, grande numero de armazéns
de secos e molhados, garages, casas de armarinho e fazendas, ótimas e bem
instaladas, salientando-se o Prédio Salin Chimelli, em bem adiantada construção,
em estilo moderno confeitarias, bares e cafés, bilhares, restaurantes, depósitos de
pães, padarias, tipografias, cinemas com aparelhos modernos, agencia lotérica,
agencias de transportes, marcenarias, casas funerárias, alfaiatarias, tinturarias,
fotografias, sapatarias, construtores, serrarias, oficinas mecânicas e
serralheiros.” 125

125 Ibidem.

175
Algumas das fotografias das paisagens urbanas de Entre-Rios permitem observar as
representações do comércio, como a do Armazém dos Irmãos Ferreira Álvares, registro 110,
localizado na esquina da Praça Salin Chimelli com a Travessa Bezerra de Menezes, no trecho
da estrada União e Indústria denominado durante alguns anos de Rua Nelson Viana. No
primeiro plano, e mais ao centro, adultos e crianças, e à esquerda, três homens abrindo ou
fechando o estabelecimento. Atualmente funciona neste local um supermercado.

Fotografia 110: Registro da década de 1920, sem informação de autor, acervo Srº Altair.

O registro 111 é uma panorâmica (5) da Rua da Maçonaria, (6) esquina com a Praça
Salin Chimelli. Observa-se, no plano central, (1) a Loja Auto Entrerriense, a seu lado, (2) o
prédio construído em 1936 pelos irmãos Chimelli, bem como o (3) trecho da estrada de ferro
Central do Brasil e a (4) rua que levava ao cemitério da cidade.

Este espaço urbano sofreu na atualidade uma grande intervenção do governo


municipal, com a construção de um viaduto sobre a ferrovia no antigo Largo do Barulho,
tendo seu início na Avenida Condessa do Rio Novo, finalizando na esquina com a Rua da
Maçonaria, conforme seqüência de imagens da esquerda para a direita e de cima para baixo,
nas fotografias 112 a 115.

176
4
3

1 2

Fotografia 111: Panorâmica da Rua da Maçonaria na sua esquina com a Praça Salim Chimelli. Registro
do final da década de 1930, sem informação de autor, acervo Srº Altair.

Fotografias 112 113, 114 e 115: Registro da obra do viaduto sobre a linha férrea que eliminou a Praça
Salin Chimelli, de maio de 2012, acervo de André Mattos.

177
A Rua da Condessa, trecho urbano da estrada União e Indústria, por muitos anos
concentrou o maior número de estabelecimentos comerciais, por sua localização junto à
Estação Ferroviária e proximidade com o Largo da Capelinha e o Parque Oscar Weinchenk.

Observa-se na fotografia 116, no primeiro plano à direita, os prédios da Confeitaria


Guarany, de propriedade do Sr. Vicente Dias, que nos fundos organizou o Cine Teatro
Guarany. À esquerda é possível ver parte da plataforma da estação ferroviária. Em segundo
plano, na esquina, o prédio das Casas Nasser. Mulheres, principalmente, caminham pela
calçada, no poste em frente ao estabelecimento veem-se lâmpada para iluminação pública.

Fotografia 116: Fotografia da Rua da Condessa. Registro realizado entre a década de 1920 e 1930,
sem informação de autor, acervo Sr. Altair.

Outra imagem da Rua da Condessa, a fotografia 117 permite observar no primeiro


plano, à esquerda, uma casa de armarinho e fazendas – veem-se alguns produtos expostos, o
que para a narrativa do Entre-Rios Jornal era sinal de modernidade. Ao fundo a Farmácia
Central, e próxima a esta uma carroça para transporte de mercadorias, com tração humana. Na
calçada em frente aos estabelecimentos comerciais, um deles com o símbolo da companhia
telefônica, a presença de crianças e adultos, homens e mulheres.

178
Fotografia 117: Fotografia da Rua da Condessa, neste registro da década de 1920, sem informação de
autor, acervo Profª Ezilma Teixeira.

Fotografia 118: Registro da década de 1930, da Rua da Condessa. Sem informação de autor, acervo
Profª Ezilma Teixeira.

179
As duas imagens, fotografias 118 e 119, reafirmam a condição da Rua da Condessa de
ser, em seu tempo, um dos principais espaços urbanos de relação social do distrito, pela
presença de indivíduos em movimentação.

No registro anterior observa-se à direita, a Estação Ferroviária de Entre Rios, alguns


vagões e possíveis passageiros do lado interno junto ao muro, com a cobertura da plataforma,
que ficava fora de sua área, apoiada na calçada. No primeiro plano, à esquerda, os prédios do
Hotel Entre-Rios e da Casa Bancária e no centro, automóveis, uma carroça sendo conduzida
por um homem e outras pessoas.

Fotografia 119: Rua da Condessa, próximo ao Largo da Capelinha, neste registro da década de 1930,
sem informação de autor, acervo Profª Ezilma Teixeira.

Na fotografia 119, a imagem é mais aproximada do que a anterior, do espaço


denominado à época Largo da Capelinha. À direita, vê-se a Estação Ferroviária de Entre Rios,
destacando-se o nome na plataforma e, embaixo, carros de um ponto de táxi. No segundo
plano, no centro, o prédio do Hotel Rio Branco, e à frente da plataforma, na esquina, a Casa
Nasser, fundada em 1915. Ao fundo, percebe-se a Igreja Nossa Senhora da Conceição.

180
Interessante observar um grupo de pessoas no primeiro plano ao centro e à direita, na
entrada da plataforma, com o que parece ser uma mesa e objetos no chão da via pública. Um
homem “espera” recostado na entrada de uma loja, à esquerda no primeiro plano; não é
possível identificar nenhuma mulher. Um aspecto que se apresenta nas imagens da Rua da
Condessa, é que a iluminação não existe em todos os postes.

“Em número de dois, são os bancos que existem, além de duas agências de
conceituadas casas de créditos” (1936). Na fotografia 120, o Banco de Entre-Rios, que
conforme informação da historiadora Ezilma Teixeira (2005, p. 71) foi fundado por Ângelo
da Silva Mattos, em 17 de setembro de 1928, autorizado pela Carta Patente nº 24.709. Na
década de 1940, foi vendido ao Banco Fluminense da Produção.

Fotografia 120: Fotografia externa do


Banco de Entre-Rios, Registro da década de 1930,
sem autor definido, acervo Profª Ezilma Teixeira.

“No momento atual temos nove representantes da classe médica, três gabinetes de
Odontologia e seis farmácias.” (1936) Entre estes profissionais destacou-se na vida pública da
cidade o Drº Walter Gomes Francklin, médico-parteiro, que atendia num consultório montado
nas dependências da Farmácia Central, situada na Rua da Condessa. Walter Francklin é
considerado a principal figura do movimento emancipacionista, tendo sido conduzido pelo
interventor do Estado do Rio de Janeiro, Ernani do Amaral Peixoto, à condição de primeiro
prefeito de Entre-Rios.

181
Fotografia 121: Drº Walter Gomes Francklin, médico, primeiro prefeito do município de Entre Rios.
Retrato publicado no Entre-Rios Jornal de 17 de janeiro de 1939. Fotógrafo Gray Silveira, do acervo André
Mattos.

“Na parte concernente ao ensino, é o que Entre-Rios tem, no momento


atual, de mais disseminado. Tratando-se da base primordial da evolução social,
com prazer registramos os colégios existentes: Ginásio Pinto Ferreira, recém
inaugurado, dirigido pelo prof. Pinto Ferreira e professora D. Hilda Caldas de
Souza. Mantêm os cursos primário, de Datilografia, Comercial e de Admissão,
iniciando em breve o Ginasial. O Ginásio de Entre-Rios, fundado em 6 de agosto
de 1930. Tem como diretor o professor José Théos Joaquim da Silva, com aulas
diurnas e noturna. Cursos: primário, secundário, comercial e jardim de infância.
Escola Ideal, dirigida pelo prof. Vital R. Cabral, mantêm cursos de jardim de
infância, primário e de admissão. Escola Mista Francisco Cerqueira, mantida pelo
Grupo Espírita Fé e Esperança e dirigida pela professora Arbella Bezerra. Escola
Mista Condessa do Rio Novo, mantida pela Casa de Caridade de Paraíba do
Sul/RJ e dirigida pela professora Aura Saldanha. Colégio Henrique Dias, dirigido
pelo prof. Pedro Penchel, aulas diurnas e noturnas com diversos cursos. Grupo
Escolar Condessa do Rio Novo, sob as expensas, e mantido este estabelecimento
de ensino primário e secundário, sendo sua diretora a distinta educadora, D.
Cândida Silveira. Mantêm anexo uma escola de ensino profissional, a cargo da
prof. Senhorinha Argentina Cunha. (...) Externato N. S. Aparecida, mantêm o

182
ensino primário e secundário, dirigido pela prof. D. Hilda Caldas de Souza. Além
dessas escolas existem três mantidas pela Prefeitura Municipal, sendo uma sita a
Ponte das Garças; outra a Rua Nelson Vianna, em prédio próprio e outra em
Cantagalo. O Sindicato Unitivo Ferroviário da Central do Brasil mantêm em sua
sede uma escola primária para o ensino aos filhos de seus associados. Existem
outras aulas particulares para a difusão do ensino primário na localidade.” 126

Segundo a pesquisadora Maria Lúcia de A. Aranha, “a partir da década de 30 a


educação alcança [no Brasil] níveis de atenção nunca antes atingidos, quer pelos movimentos
dos educadores, quer pelas iniciativas governamentais, ou pelos resultados concretos.” (1993,
p. 244) Tal quantidade de estabelecimento de ensino, particulares e públicos, além do mantido
por uma instituição religiosa, demonstra o afirmado no texto quanto à importância concedida
a educação pelos grupos sociais de Entre-Rios.

A próxima imagem é uma vista externa da sede primeira do Grupo Escolar Condessa
do Rio Novo. Ezilma Teixeira (2005, p. 63) escreve que este edifício “foi construído em
terreno doado ao Estado do Rio de Janeiro por José da Silva Vaz, na então nada urbanizada
Praça Vicente Dias, atualmente a Praça São Sebastião.”.

Fotografia 122: Grupo Escolar Condessa do Rio Novo, registro provável da década de 1930, sem
autor definido, acervo André Mattos.

126 Ibidem, p. 16.

183
“A religião que predomina na sociedade entrerriense, é a católica, que
possui dois antigos templos: de S. Sebastião e de N. S. da Conceição. Logo após a
chegada do estimado pároco Rev. Vigário Padre José Custódio Pereira Barroso, o
sacerdote talhado para dirigir os fiéis de Entre-Rios, tivemos a satisfação de
presenciar a rapidez vertiginosa da construção da Nova Matriz, onde já assistimos
os santos ofícios da missa do galo no ano próximo findo. A construção desse
templo é bem uma demonstração de dinamismo construtor dos entrerrienses.

Existem ainda outros cultos religiosos, também com regular disseminação,


sendo o dos metodistas, que possuem templo na Rua Cônego Salles, que tem como
pastor o Rev. Isnard Rocha; e o dos Batistas que mantêm o seu templo à Rua
Barão do Rio Branco, dirigido pelo Ver. Vital Cabral”. 127

Fotografia 123: Igreja Matriz de São Sebastião, neste registro do final da década de 1930, sem autor
definido, acervo Rádio Três Rios.

Dedico um item neste capítulo às igrejas católicas, presentes desde a segunda metade
do século XIX nas terras de Entre-Rios. Na imagem tem-se uma vista externa da Igreja Matriz
de São Sebastião, próxima à Praça Vicente Dias, atualmente Praça São Sebastião, quando do
período em que se suspendeu a sua obra, para a construção do Hospital N. S. da Conceição.

127 Ibidem.

184
É interessante observar que, na narrativa do jornal, a Doutrina Espírita é relacionada
em um item após as considerações sobre as doutrinas religiosas, afirmando “que esta doutrina
mantém um amplo número de adeptos, e aqui existe o Grupo Espírita Fé e Esperança, cuja
instituição tem prestado relevantes serviços a Entre-Rios.” (1936) O texto enfoca
principalmente as suas atividades assistenciais e caritativas. “Uma das suas grandes obras é a
maternidade, sob a direção clínica do humanitário Dr. Walter Gomes Francklin” (1936) Na
fotografia 124, vêem-se as crianças atendidas pelo Asilo Manoel Pessoa de Campos e os
alunos da Escola Francisco Cerqueira, na frente da antiga sede da instituição.

Fotografia 124: Vista externa do Grupo Espírita Fé e Esperança, neste registro do final da década de
1930, sem autor definido, acervo André Mattos.

“Excelentes e rápidos são os meios de transportes de passageiros em Entre-


Rios: Na linha do centro da Central do Brasil, transitam diariamente 19 trens de
passageiros; na Linha Auxiliar, seis (...) Da Leopoldina Railway, trafegam
diariamente, 8 trens de passageiros. Além desses temos serviços de auto-ônibus.
Viação Rio-Minas que possue dois ônibus do Rio a Juiz de Fora e dois vice e
versa. [fotografia 47] A um auto Victória que faz o trajeto Entre-Rios a Juiz de
Fora. O veterano no transporte de passageiros entre a Princesa de Minas e a
nossa localidade, é o auto Vencedor do Srº Samuel Costa, que transita a (sic)
muitos anos neste percurso. De Petrópolis, a linda cidade das Hortências, temos o
ônibus da “Autobus”, do Srº Octavio Costa. Entre Paraíba e esta localidade faz o

185
serviço a “Viação Sul Paraibana”, correndo cinco autos para aquela cidade e vice
e versa. Esta empresa também faz correr três autos para a localidade de Werneck.
” 128

Novamente as possibilidades de comunicação com outras localidades, por meio das


vias de transporte rodoviário e ferroviário são relacionadas pela imprensa trirriense, como um
aspecto importante para afirmar a condição do distrito de se emancipar da cidade de Paraíba
do Sul. Nas fotografias 125 e 126, tem-se a imagem dos ônibus citados na narrativa.
No registro 125, a representação do auto Vitória, ônibus que atendia à linha Juiz de
Fora/Entre-Rios, da marca “International”, modelo 1934. Observa-se na sua lateral escrito
“Entre-Rios Juiz de Fora”. No lado esquerdo provavelmente seu motorista e à direita do
veículo a figura de uma criança. Uma imagem interessante é da árvore atrás do ônibus, parece
que se encontra na rua onde o veículo está estacionado, pois antes se visualiza o que se
desenha sendo uma calçada, o que pode demonstrar que a fotografia foi alterada.

Fotografia 125: Representação do auto Vitória. Sem informação da data e o autor do registro. 129

128 Ibidem.
129 Fotografia do Museu Virtual do Transporte da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos,
na Sala dos Estados. Disponível no site: http://www.museudantu.org.br/EMinasGerais3.htm. Acesso em: 13 de
out. de 2011.

186
Fotografia 126: Representação do ônibus da empresa Autobus Ltda, publicada no Entre-Rios Jornal
de 21 de dezembro de 1939. Sem informação do autor, acervo André Mattos.

“Existem em Entre-Rios dois prédios destinados ao café. Um de grandes


dimensões, o do Armazém Regulador do Estado de Minas Gerais 130, com
comunicação com as duas bitolas da Estrada de Ferro. Está situado próximo das
oficinas da I L 7. Outro das Usinas do Departamento Nacional de Café, que vem
prestando relevantes serviços aos fazendeiros deste município. Possue também
esta localidade uma torrefação de café – São Sebastião, dos Srs Luiz Cristóvão &
Cia.” 131

130 Ver fotografia 109.


131 “ENTRE-RIOS jornal”, comemorando seu primeiro aniversário, presta justa homenagem a futurosa cidade
de Entre-Rios, e seus dignos leitores do rincão fluminense. Entre-Rios Jornal. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ.
Ano II, sexta-feira, 17 de janeiro de 1936, ed. 52, p. 16.

187
Os dois armazéns existentes em Entre-Rios pertenciam ao Estado de Minas Gerais e
ao governo federal, construídos para atender a necessidade de armazenamento e distribuição
da produção mineira e dos fazendeiros da região, principalmente pelo transporte ferroviário
até o porto na cidade do Rio de Janeiro. O Armazém Regulador do Estado de Minas Gerais
foi construído ao lado das linhas férreas da Central do Brasil, o que facilitava a carga e
descarga das sacas de café.

Fotografia 127: Panorâmica do distrito de Entre-Rios, do final da década de 30, sem autor conhecido,
do acervo André Mattos.

O prédio (1) das Usinas do Departamento Nacional do Café, órgão criado


primeiramente como Conselho Nacional do Café, em 1931, pelo presidente Getúlio Vargas e
em 1933 transformado em departamento, encontrava-se próximo à Igreja São Sebastião.
Neste edifício atualmente funciona o G. E. Condessa do Rio Novo.

“Possue Entre-Rios atualmente quatro clubes de futebol e um de voleibol.


Os de futebol são: Entrerriense Futebol Clube, cujo campo tem arquibancadas,
vestiários e banheiros, o América Futebol Clube, que tem seu “graund” também
cercado; o Avenidense Futebol Clube, enquanto não constrói o seu campo, disputa
no do Entrerriense F. C; e o Central S. C. que se utiliza do campo no Morro

188
Áureo. De Voleibol, o Violeta A. C., que tem sua aprazível praça de esportes, no
populoso e progressista bairro do Portão Vermelho.” 132

Fotografia 128: Fotografia do time de futebol do Entrerriense Futebol Clube. Sem informação do
autor da fotografia, acervo André Mattos.

Na fotografia 128 que consta do livro sobre os 25 anos deste clube, tem-se o elenco
considerado como o “esquadrão de ouro” do carijó. Tomada em 5 de setembro de 1933,
quando realizou-se no distrito, a segunda partida da “melhor de três”, entre o Entrerriense F.
C e o Riachuelo F. Clube, de Paraíba do Sul, pela “Taça Concórdia”, vencida pelo time de
Entre-Rios pelo placar de 3x1. Da esquerda para a direita, sentados: Zico, Alceu e Jaú.
Ajoelhados: Zé Coruja, Mane Cezário e Bira, Em pé: Tamanduá, Bajara, Gradim, Landico e
Bertolino, ladeados por João B. Manhães e Virgílio Torno, diretores da agremiação.

No registro seguinte, observa-se a presença do público – homens, mulheres e crianças


-, durante a inauguração do estádio de futebol do Entrerriense Futebol Clube, em 1930.
Destaque à direita para arquibancada, que possuía, embaixo, os vestiários para os jogadores, e
na esquerda, no primeiro plano, instrumentos musicais da Banda 1° de Maio.

132 Ibidem.

189
Fotografia 129: Registro da inauguração do estádio de futebol do Entrerriense Futebol Clube. Sem
informação do autor da fotografia, acervo André Mattos.

“Tem Entre-Rios a tradicional banda “1º de Maio”, regida pelo competente


professor sr. Generoso da Costa Barros, e um Jazz-Band, organizado com os
elementos da Banda que lhe empresta o nome e dirigido pelo mesmo professor; o
Jazz Band Guarani, sob a direção do sr. Ramiro Lopes e a Jazz Band União, sob a
direção do conhecido musicista Sebastião de Castro, e tem como diretor o sr. João
P. Silveira.” 133

Na fotografia 109 tem-se o registro do 30º aniversário da Banda 1º de Maio,


observando-se na imagem os músicos com seus instrumentos, e diretores ao centro. No
primeiro plano, vê-se uma criança que está com seu rosto encoberto; encontram-se todos em
frente a sede da agremiação musical, que aparece em segundo plano ao fundo a esquerda.

As “Jazz Band” eram conjuntos dançantes que durante as décadas de 1920 e 1930,
animavam as festas e bailes na cidade, oferecendo-se também para apresentações, aniversários
e casamentos. A narrativa omite as manifestações de artes cênicas, presentes principalmente
com o Grupo Dramático Dias Braga, e a existência de cinemas em Entre-Rios, que recebia
também, conforme informado pelos jornais da época, circos e artistas de outras localidades.

133 Ibidem.

190
Fotografia 130: Registro do 30º aniversário da Banda 1º de Maio. Fotografia de 1940, sem
informação do autor. Acervo André Mattos.

“A imprensa local é constituída de dois semanários: Entre-Rios Jornal, que hoje


completa seu primeiro ano de existência, e Arealense, fundado em Areal, em 1901 e editado
em Entre-Rios, desde 1924. (...)” (1936). Muito da história e da memória da cidade encontra-
se nas páginas destes dois informativos, que “acompanharam” e registraram o crescimento e
as mudanças ocorridas nos espaços urbanos e na vida dos grupos sociais de Entre-Rios. O
Arealense encerrou suas atividades no início da década de 1940, e o Entre-Rios Jornal
continua sendo publicado diariamente na cidade.

Encerra o autor a matéria afirmando:

“Eis em síntese o que é esta laboriosa localidade, de Entre-Rios, fadada a


ser, no porvir, uma das mais importantes cidades do Estado do Rio de Janeiro. Se
alguma omissão houver, que nos desculpem os prejudicados, pois o foi
involuntariamente.” 134

134 Ibidem.

191
No primeiro ano de sua existência, o Entre-Rios Jornal une-se ao Arealense na
divulgação do movimento de emancipação de Entre-Rios, assim a narrativa termina
“prevendo” para o futuro, não só a configuração como município independente, mas, também,
a condição de uma das cidades mais importantes do Estado do Rio de Janeiro.

Percebem-se na seqüência das panorâmicas e paisagens urbanas a realidade do


crescimento da Vila de Entre-Rios, durante os seus quase 40 primeiros anos do século XX.

Fotografia 131: Panorâmica da cidade de Três Rios. Esta fotografia foi feita após a emancipação do
município de Paraíba do Sul/RJ. Registro do início da década de 1940, sem autor definido. Acervo André
Mattos.

O não atendimento às reinvidicações iniciais, feitas diretamente junto ao governo do


Estado, fez com que o movimento de emancipação, por meio de seus representantes, buscasse
novos caminhos, com a Liga transformando-se em União Autonomista Entrerriense em 1932,
recrudescendo a campanha com comícios, passeatas e manifestações populares.

As ações organizadas determinaram a eleição, em 1934, do Drº Bernado Bello, para a


Câmara Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e em 1936, de vários representantes do
distrito, na câmara de vereadores de Paraíba do Sul, tendo como seu prefeito eleito, no mesmo
ano, o líder emancipacionista, Drº Walter Gomes Francklin.

192
Na Assembléia, o Drº Bernado Bello consegue a aprovação do projeto de
emancipação, mas o governador interino Heitor Collet, cedendo a pressões políticas, vetou-o
parcialmente.
Somente em 1937, quando sobreveio o Estado Novo, com a permanência do prefeito
Drº. Walter Francklin à frente da administração de Paraíba do Sul, este consegue a aprovação
do projeto ao interventor estadual, o Cte. Ernani do Amaral Peixoto. Pelo Decreto Estadual nº.
634 de 14 de dezembro de 1938 é criado o Município de Entre Rios, e com o Decreto
Estadual nº. 641 de 15 de dezembro de 1938 ficou estabelecido, para o quinquênio 1939-
1943, o quadro territorial, configurando-se o Município de Entre-Rios, formado por quatro
distritos: Entre-Rios, Bemposta, Areal e Monte Serrat.
Para alguns, a emancipação foi creditada também à instalação do Estado Novo no
Brasil, conforme consta do edital publicado no jornal Arealense de 17 de dezembro de 1938:
“(...) E que o Estado Novo concedesse a Entre-Rios, por intermédio do
distinto prefeito de Paraíba do Sul [Drº. Walter Gomes Francklin,] a autonomia que
os entrerrienses não obtiveram em longos anos de esforços quase sobre-humano
junto aos governos. Sentíamo-nos confiantes nos homens que dirigem a Nação e o
Estado e estávamos absolutamente certos que a politicalha não poderia opor
embargos agora à realização de tão altruístico ideal. Sabíamos que entre as
inumeráveis vantagens usufruídas pelo povo através do Estatuto de 10 de novembro,
estava esta que mais avoluma o valor do regime a que estamos submetidos. O
Estado Novo não permite intermediários entre o povo e o governo. Esse por seus
delegados ausculta o sentir das massas e procura realizar-lhes os anseios dentro
mesmo dos moldes traçados para a estrutura de um Brasil Novo. Foi um dos
delegados desse governo, o Prefeito de Paraíba, quem promoveu todos os meios
para alcançarmos a liberdade de nos governarmos livremente conforme nosso
desejo (...)” 135

Durante os anos seguintes, o Estado Novo, seus interventores e o presidente Getúlio


Vargas foram alvo de palavras elogiosas nos jornais da cidade.
A fotografia 131 é uma imagem recorrente nos jornais de Três Rios. Observa-se a
chegada (1) do Drº Walter Gomes Francklin, (2) do Deputado Estadual Drº Bernado Bello e
do industrial (3) José da Silva Vaz à cidade, após a aprovação da emancipação de Entre-Rios,

135 ENTRE-RIOS conseguiu sua autonomia. Arealense. Entre-Rios, atual Três Rios/RJ. Ano 38, 17 de
dezembro de 1938, ed. nº. 1.742, capa.

193
recebidos em festa pelo povo, próximo à redação do Entre-Rios Jornal, na Rua da Condessa;
entre estes, somente homens adultos, jovens e crianças.

1 2 3

Fotografia 132: Chegada dos emancipacionistas à recém criada cidade de Entre-Rios. Registro
fotográfico de dezembro de 1938, sem fotógrafo reconhecido, do acervo André Mattos.

Pelo decreto-lei estadual nº. 1.056, de 31 de dezembro de 1943, Entre-Rios tem sua
denominação alterada para Três Rios, e ainda no mesmo decreto, o distrito de Monte Serrat
foi extinto, com seu território constituindo o novo distrito de Afonso Arinos.
Pela lei nº. 2.382, de 18 de janeiro de 1.955, é criado o distrito de Serraria, anexado ao
município de Três Rios, passando a compor-se seu território de 5 distritos: Três Rios, Afonso
Arinos, Areal, Bemposta e Serraria. Pelo decreto estadual nº. 99, de 30 de janeiro de 1963, o
distrito de Serraria passou a denominar-se Comendador Levy Gasparian. Em divisão
territorial, datada de 31 de dezembro de 1968, o município é constituído de 5 distritos: Três
Rios, Afonso Arinos, Areal, Bemposta e Comendador Levy Gasparian.
Pela lei estadual nº. 1.923, de 23 de dezembro de 1991, desmembraram-se do
município de Três Rios os distritos de Comendador Levy Gasparian e Afonso Arinos, para
formar o novo município de Comendador Levy Gasparian. E pela lei estadual nº. 1986, de 10
de abril de 1992, separa de Três Rios o distrito de Areal, elevado à categoria de município.

194
Três Rios permanece até os dias atuais constituído apenas por 2 distritos: Três Rios e
Bemposta.
No trabalho de pesquisa, deparei-me com este artigo, de Wanderlei Rodrigues,
publicado no jornal Tribuna de Três Rios, reproduzindo-o em sua totalidade, por entender
que, resume bem o que é abordado neste capítulo.

“__ Menino, vá lavar os pé para dormir!


Era aquele o pior momento das vinte e quatro horas do dia: a hora do lava-
pés. A mulecada passara boa parte da noite em correrias de soldado-e-ladrão, em
meio à nuvem de moinha de carvão, que, na época se constituía o calçamento das
ruas da cidade.
Olhos tontos de sono, corpo esgotado de cansaço... e no final, o trágico
lava-pés! Sacrifício demais!
Tínhamos um campo de futebol, ali na Rua Condessa do Rio Novo, mais ou
menos fronteiro à atual Casa Funerária Schmitz. E digo mais, muito raramente o
jogo se interrompia a meio para dar passagem aos veículos.
O Lucas da Lata D`água, se se candidatasse (éramos ditadura) seria com
certeza eleito até deputado. Quem não conhecia? Duzentos reis uma lata d`água
de vinte quilos.
Poucos problemas a resolver, pois problema só existe realmente quando há
possibilidade de resolução. Que possibilidade tínhamos nós? Não existia,
portanto, problemas, havia, isto sim, determinismo.
Pescava-se na Rua Barbosa de Andrade. Praticava se esporte na Rua
Condessa. Apanhava-se rã na Praça São Sebastião e era-se mordido de cobra na
Rua do Quincão.
Isto foi ontem.
Os paralepípedos vieram e cobriram o pó das ruas. O asfalto penetrou
cidade a dentro, trazendo consigo o progresso nas rodas das viaturas.
O ranário se transformou numa das mais belas praças do Estado, e nem
vestígio mais se encontra da grande vala da Rua Barbosa de Andrade, onde se
pescava nas enchentes. Os ofídios buscaram plagas mais desertas e ninguém se
atreve a uma simples “pelada” na Rua Condessa, disputada palmo a palmo pelos
veículos modernos.
O povo tem sua representação nas altas esferas políticas. Tem água, tem
esgotos, tem poder organizado, tem cooperativas, tem sindicatos, cinemas, teatro,
sociedades, estádios e hospital.

195
Isto é hoje.
Não é profecia.
Cassandra a muito cedeu seu lugar para a ciência pura que analisa,
compara e estabelece os ciclos.
Como será Três Rios de amanhã?
Obedecendo ao mesmo ritmo de crescimento, não há porque negar, será a
maior cidade do Estado.
Porque é irradiante por suas vias rodo-ferroviárias. Porque é eqüidistante
dos extremos, na configuração geográfica da Carta Estadual.
Porque é terra palmilhada obrigatoriamente, por todos quantos queiram
visitar os centros populosos mais desenvolvidos, e, sobretudo, porque abriga vinte
mil filhos [atualmente a cidade possui mais de 70 mil habitantes], que são outras
tantas vozes tonitruantes na intransigente defesa de sua trajetória gloriosa.” 136

136 TRÊS RIOS: Ontem, hoje e amanhã. RODRIGUES, Wanderlei. Tribuna de Três Rios. Três Rios/RJ. Ano I,
17 de janeiro de 1958, ed. 27, capa e p. 4.

196
3.1.3 – Igrejas Católicas do distrito de Entre Rios.

A presença da representação católica em sociedades regionalizadas, no interior do


Brasil, pode ser medida por meio da construção de igrejas e capelas em um número
representativo de cidades, e pela participação de seus representantes, principalmente na
atuação dos padres, junto aos membros do seu apostolado.
Durante o período da escravidão no Vale do Paraíba, as capelas eram erguidas
próximas às sedes das fazendas de café, e as igrejas, normalmente a matriz, em local de
destaque, nos centros urbanos. A construção da primeira capela na Vila de Entre-Rios ocorre
quase que concomitantemente com a edificação e inauguração da estação da estrada União e
Indústria.

Fotografia 133: Vista externa da Capela Nossa Senhora da Piedade, fotografia publicada no jornal O
Cartaz, na sua edição de nº. 52, do Ano II, que circulou em Três Rios nos dias 21 a 27 de outubro de 1972. Sem
autor conhecido e período temporal determinado com exatidão, do acervo André Mattos.

A Capela de Nossa Senhora da Piedade, mandada construir em 1864 por Claudina


Venância de Jesus, esposa de Antonio Barroso Pereira, Barão de Entre-Rios e mãe da
Condessa do Rio Novo, é o principal monumento histórico, artístico e arquitetônico da cidade
de Três Rios.
Projetado por arquitetos portugueses, deve-se a sua edificação ao trabalho de operários
e artistas de São João Del Rei/MG, responsáveis também pelo altar; “a capela é a última

197
relíquia que restou da opulência da Fazenda de Cantagalo, onde na casa-grande residiram
importantes membros da nossa aristocracia rural (...)”. (TEIXEIRA. 1997, p. 15)
Edificar capelas católicas nas suas propriedades era uma garantia, para a aristocracia
rural brasileira, de que seriam velada e enterrada em solo sagrado, na “Casa de Deus”,
próximos aos seus santos de devoção, criando, também, um espaço de “perpetuação” de suas
memórias, existindo, habitualmente, cemitérios junto a essas edificações.
A Condessa do Rio Novo em seu testamento determinou:
“O meu funeral deixo a vontade de meus testamenteiros e parentes,
desejando que, se for possível, os meus restos mortais descansem juntos aos dos
meus pais e de meu marido, no jazigo da capela de Nossa Senhora da Piedade, sita
na Fazenda de Cantagalo (...) A Casa de Caridade terá a seu cargo a conservação
da Capela de Nossa Senhora, fundada por minha finada mãe nas terras da mesma
fazenda, e manterá um capelão para celebrar missa ao menos duas vezes por mês,
e nos aniversários do falecimento dos meus pais, de meu marido, e do meu; zelará
o jazigo das pessoas de minha família e fará mais celebrar todos os anos, uma
missa pelo eterno descanso de meus parentes, e outra pela de meus escravos
falecidos (...) 137

Isabela Innocencio analisa o conteúdo religioso do testamento da Condessa do Rio


Novo, percebendo a riqueza de informações quanto ao seu significado sócio-político. Neste
trecho; evidencia-se a importância dos laços familiares, preceito caro à religião católica, pelo
desejo que seus restos mortais fossem colocados próximos ao dos seus pais e marido, bem
como pela determinação da realização de missas em favor dos seus parentes mais próximos.
“Outra forma de salvar ou pelo menos abreviar a presença da alma no Purgatório eram
as orações e missas, que serviam também para que elas não ficassem vagando na Terra de
maneira errante.” (INOCENCIO, 2002, p. 27) A solicitação para realização de missas aos
escravos falecidos relaciona-se a estas questões da salvação da alma, pelas ações de caridade
em favor do próximo.
“As pessoas no passado esforçavam-se para que estivessem preparadas, quando
chegasse o momento da morte. Fazia parte dessa preparação a prestação de contas, as
instruções quanto ao seu cadáver, à sua alma e aos seus bens terrenos.” (INOCENCIO, 2002,
p. 23) O instrumento para este fim, principalmente entre os da elite rural brasileira, era o
testamento.

137 Testamento da Condessa do Rio Novo de 18 de novembro de 1882, transladado do original em 1993, pela
historiadora trirriense Irene Lopes Guimarães.

198
Em 1886, foi nomeado pelo Barão Ribeiro de Sá, o primeiro Capelão desta igreja, o
Padre José Nunes Cardoso de Rezende. Na capela encontram-se os restos mortais do primeiro
Barão de Entre-Rios, de sua esposa, de Mariana Claudina, a Condessa do Rio Novo, e do seu
primo-esposo, José Antonio B. de Carvalho – Visconde do Rio Novo, e do Barão Ribeiro de
Sá, além de outros familiares e parentes.

Fotografia 134: Vista externa da Capela Nossa Senhora da Piedade, nesta fotografia sem autor
conhecido, do final da década de 1950, acervo Rádio Três Rios.

A capela destaca-se nesta fotografia ao lado do trevo do Cantagalo em Três Rios, no


espaço em seu entorno, atualmente encontram-se várias construções residenciais e industriais.
No segundo plano o rio Paraíba do Sul, e mais ao centro, o trecho da BR 393, e nesta estrada
vê-se um caminhão, e finalizando o trevo, um ônibus e um carro da marca wolksvagem.
A Capela não se encontra atualmente aberta à visitação. Através do processo nº.
18/300-189/86 foi tombada provisoriamente, em 01 de outubro de 1987 pelo INEPAC-
(Instituto Estadual de patrimônio Cultural), com seu tombamento definitivo ocorrendo em 18
de março de 1992; também tombada pelo Patrimônio Histórico Municipal pelo Decreto nº.
2.113 de 26 de junho de 1997.
199
Fotografia 135: Vista da Capela Nossa Senhora da Piedade no Bairro Cantagalo, não estando aberta
a visitações. Fotografia de 23 de fevereiro de 2012, acervo André Mattos.

Fotografia 136: Vista do cemitério que existe nos fundos da Capela Nossa Senhora da Piedade, onde
estão enterrados parentes e descendentes, da Condessa do Rio Novo. Fotografia de 23 de fevereiro de 2012,
acervo André Mattos.

200
Fotografia 137: Registro da construção do monumento em homenagem a Condessa do Rio Novo e ao
Barão Ribeiro de Sá, no Largo do Barulho. Fotografia do início da década de 1970, sem fotógrafo conhecido,
acervo André Mattos.

No início da década de 1970 foi construído no espaço conhecido como “Largo do


Barulho”, a Praça Barão Ribeiro de Sá, junto à travessia da linha férrea, e nesta, um
monumento em homenagem a Condessa do Rio Novo e ao Barão Ribeiro de Sá. Projeto do
vereador, professor e historiador Aquilas Rodrigues Coutinho, na época, tal iniciativa foi
considerada um restabelecimento da verdade histórica sobre a participação do Barão Ribeiro
de Sá na fundação da cidade de Três Rios.
Em artigo publicado no jornal O Cartaz, Aquilas Coutinho escreve:
“Quem conhece a História da Cidade de Três Rios, efetivamente sabe que
foi efetiva a ação do Barão Ribeiro de Sá quando provedor da Casa de Caridade
de Paraíba do Sul, executando a clausula 5ª do testamento da Condessa, que
determinava o aforamento das terras fronteiras à estação de Entre-Rios, o que
possibilitou quatro anos após, o surgimento do 2º distrito de Paraiba do Sul. (...)
Justa assim a homenagem que se irá prestar aos fundadores de Três Rios.” 138

138 A CIDADE ganha um monumento duplo. O Cartaz. Três Rios/RJ. Ano I, de 4 a 11 de setembro de 1971,
ed. nº 1.

201
O monumento foi inaugurado em 14 de dezembro de 1971, na gestão do prefeito José
Araujo Damasceno. Em 1980, manifestações contrárias à manutenção dos bustos naquele
local tiveram começo, tendo em vista estarem atrapalhando a visibilidade dos motoristas que
trafegavam da Av. Condessa do Rio Novo em direção à Rua 15 de Novembro.
Os bustos foram transferidos, então, para um pequeno logradouro próximo à Capela
Nossa Senhora da Piedade, como se observa na fotografia 139, não havendo nenhuma placa
indicativa com o nome dos homenageados, o autor da obra e etc. Assim, como o monumento
em homenagem a Tancredo Neves, analisado no capítulo I, esta obra também não recebe
valor social e cultural por parte dos entrerrienses. A Praça Barão Ribeiro de Sá não mais
existe no local, sendo substituída pelo viaduto que está sendo construído sobre a linha férrea.

Fotografia 138: Registro dos bustos em homenagem à Condessa do Rio Novo e ao Barão Ribeiro de
Sá, próximos à Capela Nossa Senhora da Piedade, no Bairro Cantagalo (sem placas indicativas). Fotografia de
23 de fevereiro de 2012, acervo André Mattos.

Em 1890, foi construída, próxima a Estação Ferroviária de Entre-Rios, uma capela em


louvor a São Sebastião, que permaneceu neste local até 1936, quando foi demolida, e parte
dos materiais empregados na edificação da Matriz de São Sebastião, um templo maior e que

202
atendia os interesses dos católicos, pois a capela tornara-se pequena para a população do
distrito de Entre-Rios. Sobre a Capela de São Sebastião escreve Hugo Kling:
“Como a antiga Vila era uma constante vítima dos surtos epidêmicos e o
Drº Carvalho Lima, [primeiro médico residente em Entre-Rios] um fervoroso
devoto de São Sebastião, dizia sempre que se o povo quisesse se livrar de tanta
doença, que construísse uma igreja que tivesse por padroeiro este Santo. A sua
idéia foi criando corpo e o seu conselho afinal aceito. Acabou à frente da comissão
que ergueu a citada capela e foi assim que São Sebastião se tornou o padroeiro da
Vila, hoje cidade de Três Rios” 139

É interessante, neste relato, a relação que se construiu entre a “eleição” de São


Sebastião como padroeiro da cidade, as crendices e ações de fé dos indivíduos católicos da
Vila de Entre-Rios, e a sugestão, apesar de ser um fervoroso devoto, para terminar com os
surtos epidêmicos, vinda de um homem de ciência, um médico. Os sentidos e significados das
expressões de fé são marcantes na cultura social do povo brasileiro, e esta é mais uma das
tantas narrativas histórias, atreladas a memórias da religiosidade daquele tempo.

Fotografia 139: Vista externa da Capela de São Sebastião, nesta fotografia da década de 1920, sem
autor definido, acervo do Srº Altair.

139 KLING, Hugo José. op. cit. p. 103.

203
Fotografia 140: Vista externa da Capela de São Sebastião, nos primeiros anos da década de 1910. Sem
fotografo definido, acervo André Mattos.

Na fotografia 140, a Capela de São Sebastião destaca-se ao centro, sendo possível


observar que, quando da realização desta imagem, não existia ainda a Praça Oscar
Weinchenk. Vê-se no primeiro plano o pontilhão sobre a estrada de ferro, e o espaço ao centro
denominado de “Largo da Capelinha”. No segundo plano, poucas casas podem ser observadas
à direita, nos terrenos em direção à margem do Rio Paraíba do Sul; pessoas encontram-se no
lado direito junto à capela, além de uma carroça e um cavalo.
O espaço existente entre a capela e a estação ferroviária foi conhecido durante muitos
anos, como o Largo da Capelinha, recebendo, como visto anteriormente, o principal fluxo de
pessoas no distrito, pelo embarque e desembarque de passageiros e mercadorias na Estação
Ferroviária da Central do Brasil. Entre estas “corria” a Rua da Condessa, trecho urbano da
estrada União e Indústria, ocorrendo no local maior concentração de lojas comerciais, hotéis e
casa bancária.
É o que se observa na fotografia 141, onde uma aglomeração de pessoas, na sua
maioria bem vestidas, aguarda o embarque ou desembarque em mais um dos trens de
passageiros, visto no segundo plano à direita junto à plataforma da E. F. Central do Brasil. Ao

204
fundo à esquerda, uma carroça que lembra as de pipoca ou frutas existentes ainda nos dias
atuais.

Fotografia 141: Imagem do Largo da Capelinha, Fotografia entre a década de 1920 e 1930, sem autor
conhecido, acervo André Mattos.

Fotografia 142: Vista da Praça Visconde do Rio Novo, fotografia do início da década de 1940, sem
fotógrafo conhecido. Acervo André Mattos.

205
No registro 142, tem-se a Praça Visconde do Rio Novo, construída no local da Capela
de São Sebastião, depois que esta foi demolida em 1936, bem ao lado a atual Praça da
Autonomia. Observam-se pessoas e um cavalo atravessando as ruas, no segundo plano à
esquerda, indivíduos junto às árvores, com uma criança correndo.
A praça desaparece no final da década de 1950, para a construção da Rodoviária
Roberto Silveira, conhecida atualmente como a “rodoviária velha”. As lojas existentes no
local ainda possuem seus endereços atrelados ao nome da Praça Visconde do Rio Novo,
logradouro que não mais existe.
No mesmo período de edificação da Capela de São Sebastião, surge no local onde
hoje existe o Morro do CTB, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição. Segundo o jornalista
Guilherme Pereira Bravo – relatado em publicações de jornais da cidade na década de 1930, e
também, relacionado pela historiadora e professora Ezilma Teixeira, em sua obra “Era uma
vez...” -, a origem dessa igreja estaria no desacordo político entre imperialistas (Capela de São
Sebastião), e republicanos (Igreja N.S. da Conceição), criando-se o rótulo para esta última, de
“Igreja dos Republicanos”.

Fotografia 143: Vista externa da Igreja de Nossa Senhora da Conceição – também denominada Igreja
dos Republicanos. Fotografia do período entre a década de 1910 e a de 1930, pois ainda não fora levantado, ao
lado, o hospital. Sem autor definido, do acervo Profª Ezilma Teixeira.

206
Fotografia 144: Vista externa da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, ao lado do hospital que
recebe o mesmo nome. Fotografia de 23 de fevereiro de 2012, acervo André Mattos.

Em 1930, a Diocese de Marquês de Valença, hoje Valença/RJ, concedeu à Capela de


São Sebastião a condição de Matriz, sendo seu primeiro Vigário o Padre Rossi, que,
impossibilitado de atender plenamente aos católicos da cidade em uma igreja pequena,
providenciou entendimentos com a Casa de Caridade de Paraíba do Sul para a doação de um
terreno onde seria construída uma igreja maior. “As duras penas Padre Rossi, um pugilo de
abnegados fiéis e alguns humildes trabalhadores conseguiram lançar as fundações, erguer as
colunas, fundir o vigamento e a laje da grande nave e também a abóbada do altar mor.”
(KLING. 1969, p. 16) Esta parte da obra foi realizada em quatro anos. (Ver fotografia 145)
O lugar onde foi edificada a igreja era denominado de Campo de Maricá ou Lagoinha,
“e havia também os que chamavam o local de Palha, ou Palha de Arroz, por ser ali o monturo
desse resíduo, proveniente do moinho de pilagem desse cereal e que pertenceu aos irmãos
[portugueses] Campos, Manoel, Antonio e José de Campos.” (KLING. 1969, p. 16).
A Igreja Matriz de São Sebastião tem a torre sineira em posição diferente das outras
igrejas católicas do país: esta foi construída na parte de trás. O motivo permanece sem
esclarecimento, aventando-se ainda hoje, como principal hipótese, o desejo inicial de se
construir a entrada de frente para as margens do rio Paraíba do Sul. As duas fotografias que
seguem ajudam-nos a configurar outra explicação.

207
Fotografia 145: Vista externa da Igreja de São Sebastião, no início de sua construção, fotografia dos
anos primeiros de 1930. Registro publicado no jornal Arealense, na sua edição nº. 1399, que circulou em 13 de
abril de 1932. Fotografia sem autor conhecido, acervo André Mattos.

Fotografia 146: Vista externa da Igreja Matriz de São Sebastião, durante o período de sua construção,
com o registro de populares presentes em uma das procissões das telhas. Destacando-se o homem ao centro, no
primeiro plano, vestido de terno branco, mas com um pequeno rasgo em sua calça. Fotografia do último quarto
da década de 1930, sem fotógrafo definido, do acervo Sr. Altair.

208
No registro 145, existem dois pilares indicados pela seta preta, que parecem
recomendar a edificação da torre sineira, na frente, claramente tem-se a abertura da entrada
principal, que traz ao fundo os morros da margem direita do Rio Paraíba do Sul.
Na fotografia 146, percebe-se a entrada construída primeiramente, estando
praticamente pronta, sendo possível observar, pelo vão ainda sem o portal, que a parte central
e os fundos da obra não haviam sido iniciados, assim tem-se que a torre foi erguida ao final.

Fotografia 147: Vista externa da Igreja de


São Sebastião, quando foi suspensa a obra para a
construção do Hospital de Clínicas Nossa Senhora
da Conceição. Fotografia realizada entre 1934 e
1941, sem fotógrafo definido, acervo André Mattos.

As fotografias mostram que a formação urbana da cidade de Três Rios ocorreu do


espaço onde foram construídas as estações, em direção às margens do rio Paraíba do Sul, não
havendo lógica em se construir a entrada da principal igreja da cidade, de costas para onde se
concentrava a maior parte da população.
Assim, a causa para esta inusitada posição da torre adveio por esquecimento no
começo da obra, ou porque, naquele momento, as condições financeiras não permitiam a sua
edificação. De qualquer forma, esta é uma característica da Igreja de São Sebastião, que tem
na torre sineira a contribuição dos operários das oficinas da Central do Brasil, que com a
aprovação da diretoria desta empresa federal, fundiram, ofereceram e colocaram no local, o
sino maior da matriz.

209
Fotografia 148: Vista externa da
Igreja de São Sebastião, também de quando
a obra ficou aguardando a construção do
Hospital de Clínicas Nossa Senhora da
Conceição. É possível perceber, à
esquerda, o salão paroquial e o trecho da
Praça São Sebastião, em obra, recebendo
calçamento com paralepípedos. Fotografia
realizada entre 1934 e 1941, sem fotografo
definido, acervo André Mattos.

Fotografia 149: Vista externa da Igreja de São Sebastião do mesmo período da anterior - 1934 e 1941.
Observa-se no primeiro plano a Praça São Sebastião, com seu antigo coreto à direita, e os bancos, que por seu
formato peculiar, levaram a população a chamá-la durante um tempo de “praça da bigorna”. Ao fundo em
segundo plano, encoberto pelas árvores, o Grupo Escolar Condessa do Rio Novo. A igreja mesmo inacabada e
ainda sem sua sagração oficial realizava missas, por isso é possível perceber algumas pessoas dirigindo-se e
entrando na paróquia. Sem fotógrafo definido, acervo André Mattos.

210
Fotografia 150: Vista externa da Igreja de São Sebastião, quando da solenidade de sua sagração, em
29 de maio de 1942. Imagem sem identificação de autor, do acervo Profª Ezilma Teixeira.

Pode-se inferir que o início da construção da Matriz de São Sebastião, num terreno
onde próximo havia o prédio do Grupo Escolar Condessa do Rio Novo, data do início da
década de 1930. Em 7 de março de 1934, assume o Padre José Custódio Pereira Barroso, que
no contínuo da obra, em 1936, com as paredes em parte levantadas e a nova igreja coberta, em
condições de realizar as missas, sugere uma parada para providenciar a edificação do Hospital
Nossa Senhora da Conceição, ao lado da igreja do mesmo nome.
Em 1941, encerrada a construção do hospital, as obras da matriz foram reiniciadas,
ocorrendo a sua sagração, pelo S. Revma. D. Rodolfo das Mercês de Oliveira Pena, Bispo
Diocesano de Valença, no domingo, 29 de maio de 1942.
A Igreja foi tombada como Patrimônio Histórico Cultural da cidade pelo CMCTR –
Conselho Municipal de Cultura de Três Rios, por meio da Lei nº 1919 de 23/02/1994 DC n.
2.113 de 26/06/1997.

211
Fotografia 151: Vista externa da Igreja de São Sebastião, observando-se no primeiro plano, o obelisco
feito em memória da Condessa do Rio Novo, pela Casa de Caridade de Paraíba do Sul/RJ, e transferido da
Capela N. S. da Piedade, para este local, por proposta do vereador Drº Milton Coelho de Vasconcellos, em
1948, durante o governo do prefeito Guilherme Pereira Bravo. Fotografia de 23 de fevereiro de 2012, acervo
André Mattos.

212
3.2 – A nascente sociedade urbana da Vila de Entre-Rios e o lugar dos escravos libertos
e seus descendentes.

Os registros imagéticos são indícios que o período entre o final do século XIX e o início
do século XX constituiu-se de significativas transformações na Vila de Entre-Rios,
perpetuadas pelo trabalho e empenho de fotógrafos profissionais ou amadores, na sua maioria
desconhecidos, em documentar, conscientemente ou não, as múltiplas e sucessivas alterações
nas configurações da arquitetura das cidades.
“Nesses espaços os homens modernos ergueram seus novos templos,
redefiniram suas relações sociais, formularam as suas utopias, apostaram no
futuro e se deixaram seduzir pelas invenções modernas. Os cenários urbanos onde
foram encenadas as práticas modernas e suas variantes tornaram-se também um
capítulo vastamente desenvolvido pelos pesquisadores da temática modernidade,
buscando compreender a atuação dos seus atores sociais diante da inserção dos
hábitos modernos em seu cotidiano e como as contradições da modernidade
proporcionaram a conflagração das posturas tradicionais.” 140

As cidades são espaços de manifestação de diversos grupos sociais em constante disputa


de memória. No processo de formação de memórias, as imagens são depoimentos de eventos
e instantes do passado, são testemunhos de memórias individuais e coletivas, de todas as
lembranças reavivadas e recordadas, possíveis de serem percebidas através destes fragmentos
das ruínas dos fatos históricos, podendo ajustar e rearmar a nossa própria lembrança e ao
mesmo tempo se incorporarem à memória; é a imagem testemunho ou documentos
testemunhos, se transformando em lembranças, ensejando narrativas, compartilhando
memórias.
“Aqueles que viveram em Entre-Rios por volta dos anos de 1885 a 90, não
podiam prever o que seria decorridos 40 e poucos anos, este pedaço da antiga
Fazenda de Cantagalo, que já é hoje um centro de grandes possibilidades, onde se
vive sofrivelmente, por entre o febricitante trabalho de seus habitantes.
Quem conheceu Entre-Rios do tempo do professor Antonio Pulga, do
Manoel da Travessia e da tia Senhoria; quem mais tarde assistiu ao período dos –
Zés Portugueses e dos Pires, no Portão Vermelho; Virginio Emerenciano Pereira,

140 PIRES, Maria da Conceição Francisca. Vitória no começo do século XX: Modernidade e modernização na
construção da capital capixaba. Disponível no site:
http://www.cchla.ufpb.br/saeculum/saeculum14_dos06_pires.pdf. Acesso em: 12 de jan. 2012.

213
Pereira Gomes, Alfredo e Pedro Torno e outros; quem ainda – e isso a poucos
anos – assistiu o surto de progressos que deram a esta terra as iniciativas de
Antonio Pereira Lopes e Vicente Dias, e hoje assiste ao esforço hercúleo para
elevar sempre e cada vez mais Entre-Rios a culminância que o destino lhe reserva,
certamente há de sentir prazer por morar em terra tão promissora.
Entre-Rios hoje difere muito daquele que conhecemos a 40 anos passados:
difere nos hábitos e nos aspectos.
Antigamente vivia-se como se fosse uma só família, tão reduzido era o
número de habitantes e tinha-se apenas a estrada “União e Indústria”, a estrada
de Cantagalo e o largo de S. Sebastião, para se transitar. Tudo o mais eram
apertados trilhos, por entre lagoas, pastos e moitas de marica.
O tempo foi correndo, a população aumentando e com ela os fogões; novas
ruas foram abertas, começam a surgir as sociedades de toda a ordem, o estado
sanitário foi melhorando e hoje, embora lhe falte água boa e um sistema perfeito
de esgoto pode-se dizer que – moramos em uma verdadeira cidade onde há de
tudo.
Quiséramos que o leitor que paciente nos lê, pudesse retroceder conosco
aquela época distante, quando nos acercávamos do guarda da travessia da estrada
dos Campos Elysios, hoje Rua 15 de novembro – o velho Dario – a ouvir-lhe as
histórias, admirar-lhe os pássaros engaiolados que cantavam alegremente e gosar
a sombra amiga do caramanchão existente ao lado, cuja folhagem exuberante,
merecia todo o carinho do vigia atento, para então poder compreender o motivo
da nossa obstinação em relembrar “coisas que passaram”, destruindo ilusões e
derramando saudades, que ainda vivem n´alguns corações amadurecidos pelos
anos (...)
Entre-Rios foi nada, passou a ser muito, e no futuro será tão grande, que,
prever se torna impossível.” 141

José D`Assunção Barros (2007, p. 9) escreve que pensar e sentir a cidade, antes do
século XIX, muitas vezes fora função dos poetas, dos cronistas e romancistas, bem como dos
arquitetos e dos filósofos. Antonio Villela de Carvalho Junior – Vê Jota - apresenta-se entre
os cronistas da imprensa trirriense, como aquele que mais escreveu sobre a sociedade
nascente da vila e depois distrito de Entre-Rios. Nesta narrativa, pessoas e espaços, se

141 “ENTRE-RIOS, o que foi e o que será”. Vê Jota, pseudônimo de Antonio Villela Junior. “Entre-Rios
Jornal.” Entre-Rios, atual Três Rios. Ano II, sexta-feira, 17 de janeiro de 1936, ed. 52, p. 2.

214
interpenetram demarcando ações, tempo, criando e revelando imagens e significados na vida
de relação social.
Seus trabalhos atravessaram todo o período da formação urbana, indo além do
movimento de emancipação. Publicados nos anos iniciais da década de 1910 no jornal
“Arealense”, também são encontrados no informativo “Entre-Rios Jornal” (onde escreveu a
coluna “Coisas que passaram”) entre outros, sendo de importância considerável para o estudo
e a escrita da história de Três Rios.
Esteve presente na formação dos principais grupos de artes cênicas, musicais,
esportivos, culturais, políticos e sociais da cidade, foi vice-prefeito do Município de Paraíba
do Sul, ocupou a cadeira nº 6 da Academia Trirriense de Letras e Artes. Sua crônica,
publicada três anos antes da emancipação, é um registro do quanto Entre-Rios no final dos
anos de 1930, difere em muito do último quarto do século XIX: em hábitos e em diversos
outros aspectos.
Dentre as diversas maneiras de se pensar a cidade como espaço de relação social, José
D`Assunção Barros, relaciona os estudos que consideram a “cidade como texto”, perspectiva
apoiada sobre a contribuição da semiótica para o entendimento do acontecimento urbano, “a
cidade pode também ser encarada como um “texto”, e o seu leitor privilegiado, seria o
habitante (ou o visitante) que se desloca através da cidade,” (2007, p. 40) sendo possível fazer
uma leitura deste ambiente, através das diferentes escritas e linguagens, que surgem nos
processos de relação entre os grupos sociais, e destes, com os ambientes urbanos,
compreendendo seus critérios de aceitação e segregação, sua tecnologia, sua produção
material e cultural, a distribuição de riquezas e etc.
Esta “escrita” da cidade é dinâmica, esta sempre sendo revisada e alterada pelos
próprios habitantes: “a cidade é um discurso”, (BARTHES. 2001, p. 224) que pode ser lido e
compreendido, mesmo com a diversidade de sentidos existentes, através dos próprios espaços
de relação (ruas, praças, monumentos, edificações) e das manifestações sociais e culturais
(festas, expressões artísticas, manifestações cívicas e esportivas, etc.).
A fotografia apresenta-se como a fonte imagética capaz de registrar tanto os lugares,
quanto as manifestações nestes. “De múltiplas maneiras o próprio espaço e a materialidade de
uma cidade se convertem em narradores da sua história (...). É extremamente difícil e
desafiador para o historiador que estuda as realidades urbanas do passado, recuperar o registro
(...) destes atos de fala.” (BARROS. 2007, p. 42-44) As narrativas imagéticas “contam” as
memórias da cidade.

215
Na Vila de Entre-Rios do último quarto do século XIX, o pequeno contingente
populacional permitia uma relação descrita pelo cronista como familiar, próxima ao que ainda
ocorre nas pequenas cidades do interior, ou em alguns bairros dos médios municípios
brasileiros. Através das imagens fotográficas apresentadas nesta pesquisa, percebe-se o
quanto o distrito expandiu seus limites urbanos durante o recorte temporal estudado, com
novas edificações para o comércio, a indústria e residências, ruas, praças, escolas e igrejas, o
hospital, e cinemas.
O número de habitantes amplia-se (e com estes “os fogões”), recebendo também
estrangeiros que se juntaram aos que aqui já residiam, entre estes, os funcionários das estradas
rodoviária e de ferro, os descendentes dos proprietários rurais e os negros libertos das
fazendas da região. Vê Jota apreende que este crescimento populacional determina a formação
de “sociedades de toda a ordem,” grupos sociais constituídos, e são estes que de distintos
modos, escreveram o “discurso urbano” do período de formação da cidade de Três Rios.
É possível admitir que a coletividade entrerriense nos anos finais da década de 1930,
mesmo sendo de uma cidade em formação no interior do Estado do Rio de Janeiro, refletia a
configuração da sociedade brasileira a época: nova organização social burguesa republicana
(comercial, industrial e financeira), capitalista e urbana; e são os representantes desta elite,
que produziram as imagens analisadas: o olhar fotográfico reflete em sua maior parte “as
cenas” do cotidiano deste grupo, devendo ser analisado criticamente.
Considerando a compleição primeira das fazendas de café nesta terra, e da aristocracia
rural que se formaram, também graças à relação com o negro através do trabalho escravo, por
meio das fotografias, registram-se “presenças e ausências” destes indivíduos na sociedade de
Entre-Rios, em determinados espaços e grupos de relação; um (...)
“Decifrar de outro modo as sociedades, penetrando na meadas das relações
e das tensões que as constituem a partir de um ponto de entrada (um
acontecimento, importante ou obscuro, um relato de vida, uma rede de práticas
específicas) e considerando não haver prática ou estrutura que não seja produzida
pelas representações, contraditórias e em confronto, pelas quais os indivíduos e os
grupos dão sentido ao mundo que é o deles.” 142

Procuro desta forma, perceber de que maneira, e em que espaços sociais, os negros
libertos e seus descendentes estiveram presentes na formação da sociedade nascente da Vila

142 CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Disponível no site:


http://www.scielo.br/pdf/ea/v5n11/v5n11a10.pdf. Acesso em: 16 de agos. 2011.

216
de Entre-Rios, no pós-abolição até o final dos 40. Herdeira das propriedades de seus pais a
Condessa do Rio Novo, sem descendentes diretos do seu casamento com seu primo José
Antônio Barroso de Carvalho (Major Carvalhinho – o Visconde do Rio Novo), concedeu por
desejo expresso no seu testamento, liberdade aos seus escravos, deliberando também, a
utilização das terras da Fazenda de Cantagalo para o assentamento destes.
“Deixo livres todos os escravos que eu possuir ao tempo da minha morte, e
desobrigados da prestação de serviços até aos vinte e um anos, os ingênuos filhos
de minhas escravas nascidas depois da Lei de vinte e oito de dezembro de mil
oitocentos e setenta e um. Esses libertos e ingênuos, e seus descendentes formarão
em minha fazenda denominada de Cantagalo – uma colônia agrícola – com a
denominação de “Nossa Senhora da Piedade”, que será a protetora do
estabelecimento. Na mesma fazenda e a expensas do rendimento dela serão
estabelecidas duas escolas para educação dos menores da colônia, de ambos os
sexos, que serão franqueadas também aos menores da circunvizinhança, se não
houver inconveniente. Aos adultos serão distribuídos lotes de terras afim de
cultivarem cereais para a sua subsistência e lotes de cafezais para beneficia-los e
colher os frutos: destes, depois de convenientemente preparados e vendidos, lhes
pertencerá a metade do produto liquido, e a outra metade à casa de caridade, que
se fundar na cidade da Paraíba do Sul...” 143

Isabela Innocencio afirma que Mariana Claudina Pereira de Carvalho, falecida em


Londres em 5 de junho de 1883 aos 87 anos, ao conceber seu testamento, estava “fortemente
influenciada pelas idéias de sua época” (2005, p. 135). Quanto à mão-de-obra escrava, buscou
mantê-la enquanto viva, a exemplo de outros cafeicultores de seu tempo, concedendo a
liberdade condicionada a sua morte.
“Ao mesmo tempo, ao entrar em contato com a “elite letrada” dos finais do século
XX, foi influenciada por suas idéias positivistas e abolicionistas, que a levaram a tentar inserir
os ex-escravos na sociedade, dando-lhes condições de sobrevivência.” (INNOCENCIO, 2005,
p. 136)
O período que se seguiu à libertação dos escravos, encontra uma vila em processo de
formação urbana social, com a presença importante de trabalhadores funcionários da Estrada
União e Indústria e da Estrada de Ferro D. Pedro II.

143 Testamento da Condessa do Rio Novo de 18 de novembro de 1882, transladado do original em 1993, pela
historiadora trirriense Irene Lopes Guimarães.

217
A principal expectativa por parte dos emancipados tornados libertos, estava na
possibilidade de possuir terras em lotes delimitados, plantar e viver das rendas de seu
trabalho. O término da escravidão apresentou-se como uma das etapas de um processo que
visava obter o tratamento e direitos igualitários de cidadão. Segundo Isabela Innocêncio
(2005, p. 55) um total de 244 escravos conquistaram a liberdade, sendo 86 mulheres, 116
homens e 42 ingênuos.
Deste tempo até meados de 1935, quando do encerramento das atividades da Colônia
Nossa Senhora da Piedade, Entre-Rios experimentavou um crescente movimento político
visando à emancipação da cidade de Paraíba do Sul, principalmente por superá-la
economicamente.
Nesta região do Vale do Paraíba, a minoria de negros (é possível considerar a chegada
neste percurso de tempo de negros oriundos de outras fazendas e regiões) se confronta então,
com os interesses daqueles que aportaram nestas terras e seus descendentes, atraídos pelas
possibilidades de trabalho e renda junto às estações, ao comércio e a indústria, oriundos do
interior de Minas Gerais, bem como, imigrantes portugueses, espanhóis, italianos, sírios e
libaneses, e uma pequena parcela de alemães que vieram para a construção da cidade de
Petrópolis e Juiz de Fora, e ingleses, que nesta terra chegaram junto com os trilhos, os vagões
e as locomotivas.
Através das crônicas de Vê Jota, se conhecem alguns dos personagens que transitavam
por caminhos marginais nesta nova sociedade, “tipos populares” ou popularescos, presentes
nas antigas ruas de terra batida.
“Tia Senhorinha”, velha crioula ex-escrava, curvada pela ação dos anos
vividos e tida como dada a bruxarias, o que lhe valeu ser surrada algumas vezes
pelos supersticiosos. “Panqueca”, português que trocara o hábito de trabalhar
pelo de beber e tinha uma boca depravada. “Zé Periquito”, preto, moço, com os
pés inchados pela quantidade de bichos que lhe atacavam os dedos; tinha a mania
de se supor namorado das moças e vivia dizendo: “Zé Periquito qué casá, sim
sinhô!” “Maria Jagunça”, uma preta descuidada dos requisitos de higiene e que
por 40 réis de aguardente, portava bilhete de namorados: uma alcoviteira barata!
“Cegonha”, outra preta, esta assediada e cozinheira que nas horas de folga,
postava-se nos logradouros públicos e quando as crianças e mesmo marmanjos a
espicaçavam, dizia: “Paga imposto!” e mudava de lugar. “Luiz”, mulato velhote
trabalhador e fiel, que se esborrachava as vezes e passava a elogiar as pessoas de
destaque na localidade, terminando os elogios com frases como estas: “canalha”!,
cachorro”! Antonio Simão, mulato que falava macio e vivia da caridade pública:

218
foi o maior filante de cachaça de que viveu em Entre-Rios. Morreu abraçado a um
garrafão vazio. Muitos outros tipos, alguns até perigosos, animaram as ruas de
Entre Rios.” 144

Apesar de experimentarem inicialmente uma proposta inédita de assentamento agrário,


diferentemente da maioria dos ex-escravos, que ao serem libertos não tinham muitas opções
de trabalho e nem terra para produzir e morar, os negros da Fazenda Cantagalo não
conseguiram se livrar dos estigmas da cor e da escravidão, bem como dos interesses diversos
– principalmente econômicos e fundiários -, daqueles que deveriam prover a realização dos
desejos testamentários da Condessa do Rio Novo (os dirigentes da Casa de Caridade de
Paraíba do Sul), incluindo-se estes, entre os fatores para a derrocada do empreendimento.
Dentre os listados por Vilela Junior, tem apenas um português, os outros são negros ou
mulatos, o que indica as condições de inserção dos indivíduos desta etnia naquela sociedade.
O texto é um discurso que desqualifica estes personagens, representações que demarcam
territórios sociais (de classe e etnia), elaborados pelo senso comum e aplicados para descrever
as relações interpessoais e intergrupais, que ocorriam à época.
Os termos utilizados, também demonstram a maneira como os negros são percebidos:
“ex-escrava”, “dada a bruxarias”, “preta descuidada”, “alcoviteira barata”, “velhote”,
“trabalhador e fiel” (um ser servil, preparado para o trabalho pesado), “preta” e “filante de
cachaça”. Os atributos físicos e morais aparecem logo depois de seus nomes ou apelidos,
identificando-os enquanto indivíduos marginais.
Desta maneira o negro é relatado como um ser amoral, tendencioso ao vício da bebida,
aos desvios da sexualidade e a violência. Cria-se com esta perspectiva um antagonismo de
raças, “eliminava-se o escravo, mas inventava-se o negro/preto como uma marca social
negativa. Libertava-se o trabalhador e instituía-se legalmente a idéia de “vadiagem” para
controlá-lo.” (GOMES E ARAÚJO, 2001)
A utilização da mão-de-obra escrava durante um longo e fundamental período de
formação da sociedade brasileira determinou na pós-escravidão (o escravo e suas atividades
no trabalho eram entendidos como coisas menores, inferiores), às delimitações de classes e
papéis entre grupos étnicos distintos e o lugar que passaram a ocupar na cidade.
Mesmo divergente na sua origem, do período de tempo demarcado nesta escrita, tem-
se na imagem 152, digitalizada de um jornal, a configuração de uma representação que se

144 EM COMEMORAÇÃO ao nosso aniversário – prêmio Melnhaque: A melhor “História de Três Rios”.
JUNIOR, Antonio Villela. O Jornal de Três Rios. Três Rios/RJ. Ano II, 26 de abril de 1961, nº. 53, p. 2.

219
construiu como conseqüência dos embates de memória, entre os grupos detentores dos
poderes políticos e econômicos, e as minorias sociais étnicas, presente ainda nos dias atuais –
que perdura desde o século XIX, e que entendo define muito bem os papéis imputados aos
negros, que abandonados à própria sorte nos espaços urbanos pós-abolição, desconheceram
“políticas públicas (...) para incorporar milhares de pessoas a uma sociedade até então de
cidadania restrita por meio de acesso à terra, ao trabalho à educação.” (GOMES E ARAUJO,
2001)

Fotografia 152: Imagem da parte superior da capa do periódico “Correio Trirriense” na sua edição
de nº 413 de 30 de abril de 1970. Do acervo André Mattos.

A imagem do negro neste exemplo está diretamente relacionada às representações do


trabalho, de um proletariado amigo e subserviente, do homem humilde e religioso, simboliza
o popular que se expressa enquanto grupo social apenas nas manifestações de cultura, música
e esporte, aquele que se faz feliz com os benefícios providenciados pelos grandes líderes
políticos. A posição do homem negro nesta imagem – ele esta num plano menor, numa
posição de reverência -, indica a supremacia de um (o branco benevolente) para com o outro.
O texto de inferência a imagem reforça estes estereótipos.

“Alberto Lavinas, o líder popular [o homem branco como líder, o chefe, o


que segue na dianteira e tem suas vontades e determinações definidas como as
melhores para o povo], o amigo dos trabalhadores, comemora o 1º de maio
inaugurando obras que farão mais feliz o proletariado trirriense. No flagrante de
Abdisio, o Prefeito Lavinas abraçando a um dos muito trabalhadores trirrienses,

220
homenageia de maneira simbólica, aquele que constrói a grandeza nacional: o
Trabalhador Brasileiro.” 145

Em 22 de janeiro do mesmo ano, ou seja, 5 meses antes, na edição nº 401 do “Correio


Trirriense” na sua capa, esta mesma fotografia é utilizada pela primeira vez, para enaltecer a
relação entre o povo da cidade de Três Rios, mas especificamente, do bairro Monte Castelo,
que através deste gesto de um dos seus moradores “agradecia” as melhorias realizadas
naquele logradouro pelo governo municipal. O abraço representava a devoção e a
manifestação de carinho de todos os residentes:
“O governador trirriense recebe “AQUELE ABRAÇO” de tão querido José
Grilo, trirriense autentico, homem do povo, velho motorista do DNER, morador
antigo do bairro do Monte Castelo e irrestrito admirador do Chefe do Executivo
trirriense”. 146

Arte, cultura, economia, política, trabalho, manifestações populares, as fotografias


revelam quais os espaços conquistados ou concedidos aos negros libertos e seus descendentes
na nascente sociedade de Entre-Rios. O que as presenças ou ausências nas imagens
fotográficas nos revelam? É o que proponho perceber.
“Três Rios, ou melhor, Entre-Rios, desde a 70 anos passados [anos finais do
século XIX], quando sua população era diminuta, e consequentemente, possuindo
pequeno número de habitações – quase todas cobertas de zinco – começou a receber
a visita de companhias dramáticas, que realizavam seus espetáculos em palcos
montados no interior dos “Grandes Armazéns da Companhia da Estrada União e
Indústria”, existente na área fronteira à Estação da Central do Brasil e hoje
ocupada por construções modernas.” 147

Formaram-se no início do século XX alguns grupos de teatro amadores que tiveram


curta duração. Idealizado em 1913 por Vicente Dias, Alberto Silva, José da Silva Vaz e
Antonio Vilela Junior, surge no ano seguinte o Grupo Dramático e Beneficente Dias Braga,
encenando em 21 de agosto de 1914 no “Teatro Sul-América” o drama em 3 atos – “Condessa
Diana de Rione” – e a comédia em um ato: “O Diabo atrás da porta”.

145 PREFEITO homenageia data do trabalhador inaugurando melhoramentos. Correio Trirriense. Três Rios/RJ.
Ano IX, quinta-feira, 30 de abril de 1970, nº. 413, capa.
146 O HOMEM do povo simboliza abraço popular no governo do município. “Correio Trirriense. Três Rios/RJ.
Ano IX, quinta-feira, 22 de janeiro de 1970, nº. 401, capa.
147 TEATRO amador vem dos primórdios da cidade: 85 anos de cena. Vê Jota.O Cartaz. Três Rios/RJ. Ano III,
24 de julho de 1974, nº. 149 (A).

221
Fotografia 153: Fotografia externa dos membros do corpo cênico do Grupo Dramático Beneficente
Dias Braga, realizada em 21 de agosto de 1914, Vicente Dias é o primeiro à direita, sentado. Sem autor
conhecido, acervo Sr. Altair.

Na fotografia 153, os indivíduos que participaram da primeira encenação do Grupo D.


B. Dias Braga: José Vaz, João Amâncio, Francisco Neves, Alfeu Braga, Virgilho Bilheri e
Antonio Villela Junior, Hermínia Torres e Hercília Pereira. As duas meninas ao centro no
primeiro plano são, à esquerda, Araci Vidal, e a direita, Adalgisa Villela.
“Nas áreas culturais e artísticas da Vila, o movimento tomou corpo malgrado à
corrente ainda aferrada aos “preconceitos sociais” que entravava a participação de damas nas
representações planejadas.” (KLING. 1969, p. 81) Hugo Kling relata a dificuldade da mulher
no início do século XX, de fazer-se presente nas atividades cênicas, mas não relaciona este
mesmo comportamento com relação aos negros: este grupo de teatro era formado
principalmente, por comerciantes e seus filhos, não possuía negros entre seus pares. Em 1937
surge em Entre-Rios, o Grupo de Amadores Teatrais Viriato Correia, existente até os dias
presente.

222
Fotografia 154: Registro dos membros da diretoria do Grupo Dramático Beneficente Dias Braga em
clichê publicado originalmente no jornal “O Theatro”, comemorativo da passagem do 1º aniversário do grupo,
ocorrido em 21 de agosto de 1914: no primeiro plano sentado a direita o Srº Antonio Pereira Lopes, ao centro o
Srº Francisco Regis de Oliveira, e a esquerda o Srº Quintino Pinto Álvares, no fundo de pé, da esquerda para
direita: Srº Juvenal de Moraes, Srº Joaquim Gomes da Silva (o Quincão), e o Srº José Nasser. Todos
comerciantes na cidade. Sem autor conhecido, acervo André Mattos.

Fotografia 155: Registro do corpo cênico do G.D.B. Dias Braga, quando da realização da peça
“Silvio, o Cigano”. Registro publicado no jornal “O Cartaz” de Três Rios/RJ, ano III, 24 de julho de 1974, nº
149 (A). Original de 1915, acervo André Mattos, sem autor conhecido.

223
As imagens que apresentam o corpo de diretores e os artistas, mesmo quando da
comemoração do primeiro aniversário de apresentações em agosto de 1915, revelam que os
negros não participavam destas atividades, muito provavelmente, por não se representarem
entre os comerciantes, em sua grande maioria imigrante estrangeiros. Na fotografia acima em
primeiro plano da esquerda para a direita: Araci Vidal e Adalgisa Vilela. Em segundo: Vilela
Junior, José Vaz, Alberto Silva, Estefânia Carlinda Álvares, Iracema Almeida, e Vicente Dias.
Ao fundo em pé na mesma ordem: Virgilio Bilheri, Edgar Vidal, Francisco Neves de
Carvalho, Trupim P. da Silva, João Amâncio, Fernando Castilho e Pedro Fernandes.

Fotografia 156: Tomada externa dos componentes do Grupo de Amadores Teatrais Viriato Correia
que em 1937 apresentaram a primeira peça “Zuzu”. Fotografia deste ano sem autor definido, do acervo André
Mattos.

Esta realidade parece não ter se alterado com o passar do tempo, pois 23 anos após o
Grupo Dias Braga, organiza-se nas dependências do informativo “Entre-Rios Jornal” o Grupo
de Amadores Teatrais Viriato Correia que entre os seus componentes quando da apresentação
da primeira peça, não possuía nenhum artista cênico negro.
Reportando aos aspectos das artes – música -, no inicio da formação social na Vila de
Entre Rios, Vê Jota escreve:
“A música começou a ser cultuada em Três Rios, não só pelas damas que se
dedicavam ao estudo da música em piano, como também pelas bandas formadas

224
pelos escravos [presentes nas cerimônias de inauguração das Estações de Entre-Rios
tocando em homenagem ao imperador D. Pedro II], como a que ainda chegamos a
conhecer na Fazenda de São Lourenço de propriedade do venerado Visconde de
Entre-Rios, já nos primeiros anos da República e em franca decadência. O seu
mestre chamava-se João Prata e desfrutava da confiança e da amizade do
Visconde.” 148

Relaciona este cronista ainda: a Banda Henrique Mesquita que possuía como mestre o
musicista Francisco Duarte descrito como uma criatura de longos cabelos alourados, olhar
doce e atitudes paternais; a charanga do Pedro Belmonte, o Grupo Musical Carlos Gomes,
regido pelo professor Guerra da Costa, o Grupo da Lira fundado por volta de 1900 pelos
irmãos Agnelo, Galvino e Marcolino e o Grupo Musical 1º de Maio do qual foram fundadores
os ferroviários Carlos Vidal, Severino José Ferreira e Ernesto Mattos entre outros. – esta
agremiação musical centenária ainda permanece em plena atividade.

Fotografia 157: Registro externo dos músicos e membros da diretoria da Banda 1º de Maio,
destacados estes últimos em posição ao fundo e no alto, que foi fundada em 1910 em sua maioria pelos
funcionários da EFC do Brasil, entre os seus componentes percebe-se alguns negros, mas nenhum entre os
diretores. Fotografia da década de 1920, sem autor conhecido, do acervo Sr. Altair.

148 EM COMEMORAÇÃO ao nosso aniversário – prêmio Melnhaque: A melhor “História de Três Rios”.
JUNIOR, Antonio Villela. “O Jornal de Três Rios”. Três Rios/RJ. Ano II, 26 de abril de 1961, nº 53, p. 2.

225
Fotografia 158: Registro dos músicos da Banda “Jazz União”, da esquerda para a direita: Aquilas
Coutinho (tornou-se professor e historiador), Sebastião de Castro (Tunga, pistonista chamado de “Louis
Armstrong” trirriense, destacado pela seta), João Pedro da Silveira (foi prefeito da cidade), Israel Fonseca,
Manoel José Rodrigues, Geraldo Barbosa (“Macumba”, ferroviário e desportista) e Manoel Lima. Registro
publicado no jornal “O Cartaz” de Três Rios/RJ, ano I, 18 a 25 de setembro de 1971, nº 3. Original da década
de 1930. Do acervo André Mattos, sem autor conhecido.

Fotografia 159: Registro dos músicos do primeiro Jazz Band da cidade a “Jazz Band Columbia” nesta
fotografia publicada no jornal “O Cartaz” de 16 a 29 de fevereiro de 1980, original provavelmente da década
de 1930. De terno branco tem-se o músico conhecido como “Periquito” natural da cidade de Porto Novo/BA, os
demais que aparecem na imagem da esquerda para a direita: Manoel Rodrigues, Iracy Pena, Israel da Silva
Fonseca, Waldemar Pinhel, João Silveira e Ramiro Lopes. A fundo residência na Rua Oswaldo Cruz, nº 297, no
centro da cidade de Três Rios. Sem autor conhecido, do acervo André Mattos.

226
A Banda Musical 1º de Maio teve participação importante na aglutinação da
população para os comícios do movimento emancipacionista. Ao domingo percorria as ruas
da cidade realizando apresentações musicais e convidando o povo para esta atividade. Jornais
da época informam a participação de seus músicos em bailes, quermesses da igreja, carnavais
e também, acompanhando o féretro de pessoas mais afortunadas da cidade.
A população negra, liberta da condição de propriedade, utilizou-se de variadas
estratégias de mobilidade social na pós-abolição para a inserção nas sociedades urbanas. O
ambiente da arte musical recebeu intensa participação e influência dos negros na formação, no
caso de Entre-Rios, mas também de outros centros urbanos brasileiros, de diversos grupos
instrumentais, bem mais do que nos das artes cênicas. Destacando-se no distrito também a
Banda “Jazz União” e a “Jazz Band Columbia”.
Regina Xavier (2008, p 25) afirma que, “se a cidade era um lugar de conflitos e de
resistência para os escravos era, ao mesmo tempo, um lugar que propiciava espaços de
convivência para a comunidade negra, importante na construção de estratégias variadas na
busca de melhores condições de vida”.

Fotografia 160: Imagem externa dos músicos da Banda de Música Henrique Mesquita, onde se
observa a presença de negros entre os seus componentes. No primeiro plano, terceiro da esquerda para a
direita, o mestre o musicista Francisco Duarte. Fotografia da década de 1920, sem autor definido, do acervo
Srº Altair.

227
Se os atributos morais da etnia negra apresentados por Vê Jota em seu artigo indicam
uma visão negativa da sociedade republicana brasileira eminentemente branca – representada
na sua “porção” regionalizada pela sociedade entrerriense, alguns estereótipos “positivos”
valorizavam os talentos destes para “a música, para a dança ou qualquer outra atividade que a
emoção sobrepujasse a razão. Observa-se que as “características da raça”, dependendo do
espaço social, podem ser qualificadas negativa ou positivamente.” (ABRAHÃO E SOARES,
2003)
Outro espaço de participação social dos negros na coletividade entrerriense ocorreu
pelas atividades esportivas, especificamente, o futebol, que possuía a época representantes
deste grupo em todas as equipes da cidade, o que possibilitou certa ascensão social e
financeira.
O futebol se fez presente no Brasil pelas mãos dos ingleses que vieram para a
implantação da malha ferroviária como alternativa de lazer para a elite branca brasileira e não
para os negros recém libertos, mas quando foi acomodado pelas classes populares este esporte
passou a ser mestiço, negro e “brasileiro”. Existem trabalhos que estabelecem a presença dos
negros em equipes de futebol amador já no início do século XX.

Fotografia 161: Registro externo dos jogadores do América Futebol Clube nesta fotografia publicada
no jornal O Cartaz no seu ano II, de 28 de abril a 4 de maio de 1973, nº 86. Original de 1929, sem autor
conhecido, do acervo André Mattos.

A primeira representação imagética conhecida de jogadores negros em uma equipe de


futebol da cidade é datada de 17 de novembro de 1929, quando da realização do jogo entre o

228
América Futebol Clube e o Riachuelo Esporte Clube, tradicional equipe auriverde da cidade
de Paraíba do Sul/RJ, que terminou com o placar de 2 x 1 para os rubros de Entre-Rios.
Relacionam-se na fotografia anterior os jogadores em primeiro plano sentados:
Santinho, Hélio – goleiro -, e Pinhal com o mascote da equipe Sebastião Guilherme Dias, o
“Cici” à frente. Ajoelhados: Nico Couto, Teófilo e Silvio “Malandragem”. Em pé ao fundo da
esquerda para a direita: o Srºs Aparício de Freitas, Darci César Guimarães (de terno branco) e
Antonio Martins, os jogadores Manoel Duarte e Coutinho Junior, a madrinha Maria Cantuária
de Araújo, o presidente do clube, Mariano Aguiar, os atletas Batoque, Chaves e José Manoel
e por último, segurando uma bandeira, o Srº Josino de Carvalho.

Fotografia 162: Registro externo da equipe de futebol do Entrerriense Futebol Clube da década de
1930, onde se percebe a presença de alguns jogadores negros; da esquerda para a direita tem-se: Bertolino,
Tamanduá, Fortunato, Licirio, Zé Coruja, Sapo, Gradim, Ayres, Bira, Jobal e Manoel. Em primeiro plano
Habib Obeica e a madrinha do clube a Srta. Balbina Santos Gomes. Fotografia publicada no jornal “O Cartaz”
no seu ano I, de 8 a 14 de janeiro de 1971, nº 19. Sem autor conhecido, do acervo André Mattos.

Constatada a presença de negros entre os jogadores de futebol das equipes de Entre-


Rios, o mesmo não se observa entre os diretores dos clubes. Qualquer posição onde se
determina algum tipo de poder, principalmente os econômicos e políticos, a presença dos
indivíduos negros ocorria raramente. Entendo que esta condição reflete nas redes de relação
social, o lugar dos negros, alijados das condições necessárias para figurar junto às elites
comerciais, industriais e financeiras, classes onde a presença dos brancos é mais evidente.
Pesquisar a participação de determinados grupos em variadas atividades permite
mensurar a ocorrência de desigualdades nas ocupações sociais definindo-se assim as zonas de

229
segregação que ocorrem nos espaços urbanos. E esta condição aparece em diversas formas de
diálogo, como por exemplo, nos escritos dos jornais e nos livros dos historiadores mais
antigos da cidade de Três Rios, utilizados nesta pesquisa. Pouco da participação dos negros é
referendado.

Fotografia 163: Registro realizado em 2 de junho de 1930, durante a inauguração do atual campo de
futebol do Entrerriense Futebol Clube, com a solenidade de benção e o corte da fita inaugural. Na imagem da
esquerda para direita: Quintino Pinto Álvares, Jacinto Sobrinho (atrás deste), Pedro Chimelli (ao fundo),
Manoel Ferreira de Souza Neto (Manoelito, de terno branco), Vitorino Martins (ao fundo), o Padre Antonio
Rossi, Horácio da Silva Braga (segurando o que parece ser uma vela), José da Silva Leal (também ao fundo),
Balbina Santos Gomes (madrinha), Guilherme Bravo, Clodoaldo de Carvalho, Salim Chimelli (ao fundo), Ciro
Marini, Mariano de Aguiar e Pedro Caldas. Destaca-se em primeiro plano o pequeno coroinha ao lado do
padre. Sem autor conhecido, esta fotografia foi publicada, na revista do Jubileu de Ouro do Entrerriense
Futebol Clube, de 1975, do acervo André Mattos.

Hugo José Kling é um dos historiadores da cidade, suas obras publicadas em 1969 e
1971, além de aspectos relacionados à formação de Três Rios e seus monumentos, apresentam
biografias dos seus “principais” moradores, um apanhado de artigos publicados nos jornais da
cidade com características da historiografia positivista: são nomes e sobrenomes que
representam uma elite branca de comerciantes, industriais, profissionais liberais, religiosos e
professores.

230
Fotografia 164: Registro da diretoria, realizado diante da primeira arquibancada do estádio de futebol
do Clube Entrerriense na Rua Marechal Deodoro no centro de Entre-Rios, com os degraus de madeira, em 18
de dezembro de 1933. Presentes nesta fotografia publicada no jornal “O Cartaz” de 5 de abril de 1974, na sua
edição de nº 133, em pé ao fundo da esquerda para a direita: Julio Assumpção, Virgílio Torno, Pedro Caldas,
Manoel da Rocha Pinto, Custódio José Martins, Namitala Hagge, Henrique José Marinho; e no primeiro plano
sentados, também neste mesmo sentido: Theobaldo Rocha, Jacinto Sobrinho, Balbina dos Santos Gomes
(madrinha do clube), Pedro Paulo Rodrigues Caldas e Mariano Aguiar. Sem fotografo determinado, do acervo
André Mattos.

Uma única figura fugiu a esta condição: Camila, escrava de Mariana Claudina, que
recebeu por desejo testamentário da Condessa do Rio Novo, uma casa em Entre-Rios em
usufruto e em dinheiro a quantia de um conto de réis. “Camila foi uma escrava, mas foi
também um ser humano e cristão.” (KLING. 1973, p. 46) Filha de um português – Augusto, e
de uma escrava – Tônia, “a criança era clarinha e crescia robusta e linda”. (KLING. 1973, p.
57)
“Afinal, em agosto de 1835 é que Tônia e Camila entraram para o serviço
do novo Sinhô na Fazenda da Boa União, onde à época se movimentavam mais de
oitenta escravos de ambos os sexos, sem contar as crianças.
Tônia foi para a senzala e dali por diante, com outras escravas, participaria
de todos os trabalhos, quer na capina da lavoura, que na apanha do café.
A futura Condessa do Rio Novo, de pronto simpatizou com a mulata Camila,
que regulava a sua idade e mais encantada ficou quando soube que sua nova

231
escrava sabia ler e escrever, pois ela destinava-a a ser sua companheira na
Fazenda, já que, havia decorrido mais de três anos, depois do seu casamento, sem
que tivesse filhos.” 149

A figura de Camila permanece até nossos dias apenas pela presença de seu nome no
testamento da Condessa e, conforme afirma Hugo Kling (1971, p. 77) na tradição oral das
histórias do “preto Bentão” falecido em idade avançada, mas que não recebeu também,
maiores identificações, apesar deste autor afirmar que recolheu deste informações preciosas
para os seus escritos.
“Refletir o trauma social (...) significa pensar tal memória dentro das redes
de poder que as definem, recortam, delimitam elegendo critérios do que lembrar e
por sua vez narrar e do que esquecer e silenciar, definindo assim linhas de
interpretações da História que se deseja elaborar.” 150

Fotografia 165: Registro externo relacionado às comemorações pela instalação do novo município de
Entre-Rios. Artigos em jornais da época informam sobre uma festa popular – um grande churrasco -, realizado
no campo do Entrerriense F. C.. Observa-se na fotografia a presença de homens e mulheres, adultos, jovens e
crianças, brancos, negros e mulatos. Sem autor determinado, do acervo do Srº Altair.

149 KLING, Hugo José. op. cit., p. 67.


150 DIETRICH, Ana Maria. Percurso de memória(s) traumática(s) da II Guerra Mundial. Disponível no site:
http://pt.scribd.com/ana_diet/d/63676819-PERCURSOS-DE-MEMORIA . Acesso em 11 de out. de 2011.

232
Esta afirmativa pode ser aplicada também aos aspectos sociais da história dos negros
na pós-escravidão, pois o esquecimento e as escolhas quanto ao que deve ser lembrado
demarcam a memória coletiva e a construção da identidade deste grupo, que mesmo assim,
tem a sua “escrita” na formação cidade de Três Rios.
Rompendo o silêncio imposto ou os impedimentos a leitura deste discurso, as
fotografias narram experiências sensíveis, aspectos das relações sociais, colaborando para a
compreensão da vida desta comunidade étnica, sugerindo espaços de rupturas e
continuidades, mesmo representando o olhar de outro grupo social.
Quando os referentes fotográficos abarcam as atividades sociais nos espaços públicos
da cidade, os indivíduos negros e mulatos aparecem em manifestações diversas, conforme os
registros 165 e 166.

Fotografia 166: Registro externo também referente à festividade descrita na fotografia anterior. Sem
fotógrafo definido, do acervo do Srº Altair.

Porém, quando as imagens fotográficas destacam algum grupo do restante da


população, seja por representação econômica, política ou religiosa, não se encontram nos
registros a presença de indivíduos negros, conforme as fotografias a seguir analisadas.

233
Fotografia 167: Registro externo realizado na Praça São Sebastião, possivelmente quando da
inauguração do prédio da Prefeitura Municipal de Três Rios em 1943, identificando-se entre o grupo que se
destaca no primeiro plano ao centro: João Pedro da Silveira (primeiro a esquerda) e ao seu lado o Prefeito
Walter Gomes Francklin, e entre as mulheres, encontra-se ao centro destas, e a professora Alva Coutinho
Carvalhido, única mulher até o presente momento eleita vereadora em Três Rios. Sem fotógrafo conhecido, do
acervo Srº Altair.

Fotografia 168: Registro externo de uma atividade cívica em homenagem ao dia da árvore, realizada
na Praça da Autonomia, onde se tem a presença de alunas de escolas do município (no primeiro plano a
esquerdas jovens terminando o plantio de uma muda, acompanhada possivelmente por uma professora).

234
Identifica-se na fotografia: terceiro da esquerda para direita o Prefeito Walter Gomes Francklin, adiante a
segunda mulher com vestido branco, Alva Coutinho Carvalhido e os dois últimos, João Pedro da Silveira e
Aquilas Coutinho. Fotografia do início da década de 1940, sem autor definido, do acervo André Mattos.

Quando das obras para a construção da Igreja Matriz de São Sebastião, o Padre José
Custódio Pereira Barroso, vigário que assumiu a Freguesia de São Sebastião de Entre-Rios em
7 de março de 1934, organizou a Liga Católica Jesus, Maria, José com a participação
principalmente de operários da Central do Brasil, conseguiu através de doações e das
procissões das telhas, onde ocorria intensa participação de populares, findar a cobertura da
igreja.

Fotografia 169: Vista externa do local enfrente a Matriz de São Sebastião, à esquerda ao fundo, onde
as pessoas depositavam em pilhas (no centro da fotografia) a sua doação de telhas. Registro do último quarto
da década de 1930, sem fotografo definido, do acervo Srº Altair.

“Era uma curiosa inovação para conseguir recursos. Um cidadão de confiança ficava
junto de uma ruma de telhas e os fiéis passavam por ali em fila e compravam uma telha, duas
ou três ou quantas quisessem e ia colocá-las em outra pilha adiante [vista na fotografia 125].
(KLING. 1971, p. 17) Imagens como esta, quando da presença de diversos indivíduos em
atividades e manifestações populares, sem a preocupação de se destacar este ou aquele grupo
social, incluem em seus referentes à presença de adultos, jovens e crianças negras. Nas

235
manifestações de cunho religioso é possível perceber que as roupas apresentavam-se de
melhor qualidade, mesmo que simples.
No campo da educação, fundamental para inserção do individuo na sociedade e para a
conquista de melhores condições de trabalho e renda, as fotografias que seguem indicam as
oportunidades experimentadas pelos descendentes dos negros libertos. Em uma escola
particular não estão presentes, em um colégio do estado são percebidos em número menor e
em uma escola técnica profissional, meninos negros aparecem sendo preparados para funções
no mercado de trabalho, onde se exigia capacitação técnica e não o ensino superior.

Fotografia 170: Vista externa do Gynásio Pinto Ferreira, instituição educacional tradicional com
matriz na cidade de Petrópolis/RJ. Nesta imagem alunos e professores estão perfilados; os meninos na frente e
as meninas na sacada do edifício, não sendo possível identificar a representação negra entre estes. Fotografia
do ano de 1935, sem fotógrafo conhecido, do acervo André Mattos.

236
Fotografia 171: Vista externa do Grupo Escolar Condessa do Rio Novo, na Praça São Sebastião, com
seus alunos perfilados em frente à escola, observando-se no primeiro plano à direita, crianças plantando uma
muda de árvore, e junto a elas, a professora Alva Coutinho Carvalhido. Nesta fotografia do início da década de
1940, é possível observar à presença em número maior de crianças brancas e em maioria meninas, mesmo
sendo este um colégio mantido pelo Estado. Do acervo André Mattos sem autor conhecido.

Fotografia 172: Vista interna da Oficina da Escola Profissional de Entre-Rios, onde a presença de
jovens meninos negros aparece com maior destaque. No segundo plano ao fundo a direita, membros da
diretoria desta instituição de ensino e atrás dois possíveis instrutores, que em sendo seriam os únicos
professores negros observados nas fotografias. Registro da década de 1940, do acervo André Mattos.

237
“Dentre os libertos retiraram-se logo após a recepção de sua liberdade 8
indivíduos, todos do sexo masculino, e estes foram somente dos que tinham ofícios
e que preferiram exerce-los fora da colônia, como mais rendosos. Foi interesse e
não outro motivo que os fez emigrar.
Eles eram carapinas, ferreiros, pedreiros e cozinheiros. Estes retirantes
deixaram de obter lotes na colônia (...).” 151

Alguns negros desenvolviam nas fazendas outros ofícios além da atividade na


agricultura, trabalhos que exigiam maior esforço físico, e que, imputaram a estes, a
representação de indivíduos aptos ao trabalho na carpintaria, nas serralherias, nas obras
urbanas, como pedreiros, pintores, entre outros.

Fotografia 173: Vista externa do Armazém de Café construído em Entre-Rios pelo presidente de Minas
Gerais, observando-se os trilhos da E. F. Central do Brasil, bem em frente de um dos galpões. Nota-se que os
que estão descarregando as sacas de café do vagão são todos negros, “assistidos” em sua maioria, por
senhores brancos bem trajados. Fotografia do início da década de 1930, sem fotógrafo conhecido, do acervo Srº
Altair.

Esta condição de serem trabalhadores acostumados com a lida braçal, acrescido da


necessidade de sobrevivência além das fronteiras das fazendas, conduziu a população negra a

151 Boletim nº 3 da Sociedade Central de Imigração do Rio de Janeiro, de 1884. Relatório do Srº Drº Ennes de
Souza, apud, INNOCENCIO, Isabela Torres de Castro. op. cit. p. 89.

238
atividades outras nas cidades, mas sempre em posições onde havia o imperativo de uma mão-
de-obra menos qualificada, nos setores residuais, limitados às práticas ou ocupações
inadequadamente retribuídas e degradadas, posições onde havia o imperativo de uma mão-de-
obra menos qualificada.

Fotografia 174: Vista externa onde se observa os trabalhadores do Armazém de Café que estão
amontoando o café para a queima durante o governo do presidente Getúlio Vargas, todos os indivíduos, mesmo
os que orientam a tarefa, são negros. Fotografias do início da década de 30 do acervo André Mattos, sem
definição do seu autor.

Fotografia 175: Vista externa onde se observa os trabalhadores negros junto aos tratores na
reconstrução do Cemitério São José, em Entre-Rios, após um desabamento. Equipe dirigida por Domício

239
Ribeiro que aparece no primeiro plano à esquerda. Fotografia da década de 1940, sem fotógrafo conhecido, do
acervo Profª Ezilma Teixeira.

Desta maneira, quando da implantação das propostas de educação para o trabalho,


como as Escolas Profissionais, estas receberam no seu início, um número maior de alunos
negros. A educação formal, que permitia com mais possibilidades a ascensão social,
formando os doutores e bacharéis, comerciantes e industriais, atendia majoritariamente, as
crianças e os jovens da elite branca.
Um aspecto importante percebido é que apenas na fotografia 15, utilizada nas análises
teóricas do capítulo I, de maneira a demonstrar sua condição de provedora familiar através da
ajuda assistencial, tem-se a presença da mulher negra e em mais nenhuma outra imagem,
indicando que mesmo entre grupos silenciados e esquecidos, subsistem...
“(...) zonas mudas e, no que se refere ao passado, um oceano de silêncio,
ligado à partilha desigual dos traços, da memória e, ainda mais, da História, este
relato que, por muito tempo, “esqueceu” as mulheres, como se, por serem
destinadas à obscuridade da reprodução, elas estivessem fora do tempo, ou ao
menos fora do acontecimento.” 152

Pesquisando sobre as transformações urbanas na Vila e depois, distrito de Entre-Rios,


através dos testemunhos das fontes fotográficas, os estudos apontaram para um crescimento
urbano direcionado para os espaços “indicados” pelas estradas rodoviária e ferroviária, além
dos terrenos à margem esquerda do rio Paraíba do Sul, constituindo-se o que atualmente é
identificado como o centro da cidade de Três Rios.
Neste período entre a Vila de Entre-Rios e a emancipação e criação do município de
Entre-Rios, grupos sociais escreveram a suas histórias e memórias, refletindo na própria
concepção dos espaços sociais de relação, seus embates de memória, concebendo zonas
segregadoras e de inter-relação, nos territórios da cidade, não somente considerando sua
ocupação física, mas e principalmente, a formação econômica e cultural da sociedade.
Uma análise da população da cidade de Três Rios na atualidade através dos espaços
urbanos organizados em bairros residências populares e o centro dividindo-se principalmente
entre os prédios mais luxuosos e casas residenciais e lojas comerciais – incluindo-se clubes,
escolas particulares e universidades; permite constatar que os indivíduos negros e mulatos em

152 PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Bauru/SP. Editora Edusc, 2005, p. 9.

240
sua grande maioria estão vivendo nos bairros em casas mais simples e trabalhando em
atividades profissionais que exigem mais esforço físico e um nível escolar menor.
Os discursos da cidade são construídos e reconstruídos nas ações dos diversos grupos
sociais que a compõem. Mas todos de uma forma ou de outra, lembrados ou deixados no
esquecimento, “escrevem” seus traços identificadores culturais; assim também os negros
libertos e seus descendentes construíram sua fala, sua narrativa; memória visitada pelas fontes
e testemunhos fotográficos.

241
CONCLUSÃO

Sempre admirei as fotografias antigas. Julgo, hoje, que há algo de “mágico”, em cada
uma daquelas que me levaram a um ambiente diferente, há uma realidade que eu não
experimentei. Com este pensamento, iniciei a justificativa do projeto apresentado em 2010 no
programa de mestrado da Universidade Severino Sombra em Vassouras/RJ. Lembro-me que
numa oportunidade exteriorizei aos amigos mestrando a paixão que sinto no encontro com as
imagens de outros tempos, houve opiniões divergentes quanto a esta condição: pode o
historiador movimentar-se em suas pesquisas pela paixão? Não chegamos a um consenso,
apenas percebo que após o término deste trabalho, a paixão permanece em um crescendo;
talvez por isso minha afinidade com os escritos de Roland Barthes em sua obra A Câmara
Clara.
A trajetória desta pesquisa possibilitou-me caminhar bem mais adiante do que
imaginava. Inicialmente preocupava-me com o patrimônio material e cultural dos espaços
urbanos da antiga Vila de Entre-Rios, que pouco preservado, começara a desaparecer, já em
meados da década de 60, principalmente durante o governo do então prefeito Alberto da Silva
Lavinas, desejoso de construir outra paisagem urbana em substituição àquela – formatada nas
décadas iniciais do século XX - que representava à imagem do atraso e de uma sociedade
então considerada inadequada para os padrões modernos.
Entendia que o conjunto documental fotográfico relativo à Vila de Entre-Rios, e após,
distrito de Entre-Rios, através do seu potencial comunicacional e informativo, e a sua
condição de testemunho de memória, permitia não apenas uma análise da história
socioeconômico desta localidade, mas também, a construção de uma narrativa imagética que
reavivasse, pelo menos, uma parcela das identidades e das memórias dos indivíduos e dos
ambientes urbanos de relação, em seu tempo histórico.
De todos os trabalhos escritos sobre a história da Vila de Entre-Rios, nenhum o fora
considerando a fotografia enquanto fonte e testemunho de memória. Alguns dos registros
fotográficos utilizados na pesquisa encontram-se publicados em outras obras, mas sem a
preocupação com uma análise mais específica quanto às representações das histórias e
memórias atreladas aos seus referentes fotográficos.
Um dos desafios desta pesquisa foi alinhavar os estudos teóricos, definido na relação
entre a fotografia, à história e a memória, estabelecendo os conceitos que poderiam servir para

242
“unir” os ângulos do triângulo constituído por estes elementos, bem como, identificando e
analisando que discursos representam uma descontinuidade ou discordância entre as partes.
Assim, o diálogo com os autores permitiu-me percorrer por um caminho teórico que,
entendo, abaliza a narrativa imagética, através de um elemento principal, capaz de alistar a
história com a memória e com a fotografia: o tempo, mas um tempo apto a interrupções, a
particularização, a fragmentação, o tempo da memória. Ao tempo estão “conectadas” as
discussões quanto à lembrança, o esquecimento, a memória compartilhada e a nostalgia, a
distância temporal e espacial, a aura, a separação e o corte, a imagem-ato, o congelamento e a
permanência, a ausência e a presença. Conceitualmente é um caminho com muito a ser
percorrido.
Tinha como objetivo então, traçado nas linhas do projeto, aplicar os conceitos teóricos
na identificação dos patrimônios materiais não preservados no processo de urbanização de
Três Rios, desde o primeiro marco da formação do núcleo populacional até o final do
movimento de emancipação, apenas com vistas à divulgação e perpetuação da memória
urbana da cidade.
Às vezes enxergamos tão pouco dos horizontes que os caminhos podem nos conduzir e
descortinar, esquecemos que é possível caminhar para bem mais além, e principalmente, não
apreendemos que cada passo apresenta nuanças que nossos olhos teimam em não enxergar;
mesmo sabendo que pelos caminhos da história o olhar do presente sempre interpreta a sua
maneira as ações do passado.
Acredito realmente que a pesquisa levou-me a bem mais adiante. Não só reconhecendo
uma parcela dos espaços urbanos, ou a maneira como se desenvolveu fisicamente o processo
de urbanização da Vila de Entre-Rios, mas percebendo alguns dos motivos possíveis para a
sua formação. Não somente identificando o patrimônio material não mais existente, mas
alcançando algumas das motivações, dos interesses, e das relações de poder que interferiram
tanto na sua edificação, quanto na sua transformação ou substituição por outros elementos.
Neste processo os personagens históricos se apresentaram, alguns com seus nomes e
memórias bastante conhecidos, outros nem tanto, e a outros ainda foi concedido alguma
visualidade, não mais estão totalmente esquecidos, mas todos, sujeitos históricos presentes na
sociedade trirriense do início do século XX, reconhecidos ou não nas imagens.
Outras fontes, analisadas após o início da pesquisa, serviram de contraponto aos
testemunhos imagéticos, referendando os testemunhos dos referentes presentes nos registros
fotográficos. Entre estas entendo que as narrativas literárias foram as mais ricas, trazendo-nos

243
através das palavras de um Vê Jota, por exemplo, o olhar de outros indivíduos, próximos ao
período temporal estudado, sobre as manifestações e ações daquela sociedade.

Fotografia 176: Panorâmica do Viaduto Antônio Teixeira Pinto – “Antônio da Farmácia”, inaugurado
em 05/07/2012 sobre a linha férrea, ligando a Av. Condessa do Rio Novo a Rua Nelson Viana, que suprimiu a
Praça Salim Chimelli. Esta é a maior obra de intervenção no espaço urbano da cidade de Três Rios, nos últimos
anos. Fotografia sem autor definido, publicada no site: http://www.entreriosjornal.com.br/noticia/26160-obra-
mais-importante-da-historia-de-tres-rios-e-inaugurada-nessa-quinta-feira.

A cidade de Três Rios experimentou no seu período inicial de constituição enquanto


município do Vale do Paraíba do Sul no Estado do Rio de Janeiro, na última metade do século
XIX, as intervenções oriundas: das elites rurais ligadas à produção cafeeira, dos projetos de
interiorização da malha rodo-ferroviária do Segundo Império, da chegada e permanência de
imigrantes procedentes de outras localidades e países, e da presença dos negros libertos pelo
desejo testamentário da Condessa do Rio Novo.
No início do século XX, temos as intercessões dos projetos da República e do intenso
crescimento urbano, da continuidade da presença da malha ferroviária e do processo de
imigração; das questões atreladas à formação de uma burguesia comercial, industrial e
financeira, da formação do sentimento de pertencimento motivando, entre outros fatores, o
surgimento do movimento de emancipação, e das delimitações sociais nos espaços de relação
e na formação da sociedade. As fotografias têm sua presença de importância na delimitação e
identificação destes contextos e na construção da narrativa histórica.
A concretização do projeto de pesquisa, através desta dissertação, apresenta-se como
mais um trabalho historiográfico, que permite a compreensão da história local e regional, bem
como, o reaviar das memórias individuais e coletivas, da minha cidade de Três Rios.

244
Anexo 1: Narrativas imagéticas: panorâmicas e paisagens.

1861/1866

Vista externa da Estação de Entre-Rios. Fotografia de Revert Henry Klumb, de 1861/1866. As


fotografias de Klumb fazem parte de diversos acervos.

1867/1872

Vista externa da Estação Ferroviária de Entre-Rios, nesta fotografia, de autoria de Revert Henry
Klumb, 1867/1972, foi realizado no mesmo local do registro anterior, o Morro Áureo.

245
Década de 10

Panorâmica do distrito de Entre-Rios na década de 10, sem fotografo conhecido, acervo André Mattos.

Vista externa da Capela de São Sebastião, nos primeiros anos da década de 1910. Sem fotografo
definido, acervo André Mattos.

246
Década de 20

Vista externa da Rua Visconde de Entre-Rios, atualmente Rua da Maçonaria. Fotografia da década de
20, sem autor conhecido, acervo Profª. Ezilma Teixeira.

Fotografia do centro do distrito de Entre-Rios, num período entre a primeira metade da década de
1910 e o inicio da década de 1920. Sem informação do seu autor, acervo André Mattos.

247
Vista externa da Estação Ferroviária de Entre-Rios. Fotografia sem autor conhecido, acervo Sr.º
Altair.

Fotografia do centro do distrito de Entre-Rios, como as anteriores, realizada entre década de 1910 e
1920, sem informação do seu autor, acervo André Mattos.

248
Fotografia externa da Rua da Condessa. Registro realizado entre a década de 1920 e 1930, sem
informação do seu autor, acervo Srº Altair.

Fotografia externa da Rua Campos Elíseos. Registro da década de 1920, sem autor conhecido, acervo
Sr. Altair.

249
Fotografia do distrito de Entre-Rios, também realizada entre década de 1910 e 1920, sem informação
do seu autor, acervo André Mattos.

Vista externa do Parque Oscar Weinchenk. Registro sem autor conhecido, realizado na década de
1920, acervo André Mattos.

250
Segundo registro externo do Parque Oscar Weinchenk. Fotografia sem autor conhecido, realizado na
década de 1920, acervo André Mattos.

Fotografia externa da Rua Maria Pereira, atualmente Rua Drº Walmir Peçanha. Fotografia sem autor
definido, da década de 1920, acervo Profª Ezilma Teixeira.

251
Fotografia externa da Rua da Condessa, neste registro da década de 1920, sem informação do seu
autor, acervo Profª Ezilma Teixeira.

Vista externa da Capela de São Sebastião, nesta fotografia da década de 1920, sem autor definido,
acervo do Srº Altair.

252
Registro da década de 1920, sem informação do seu autor, acervo Srº Altair.

Década de 30

Registro da década de 1930, da Rua da Condessa. Sem informação do seu autor, acervo Profª Ezilma
Teixeira.

253
Rua da Condessa, próximo ao Largo da Capelinha, neste registro da década de 1930, sem informação
do seu autor, acervo Profª Ezilma Teixeira.

Fotografia panorâmica do distrito de Entre-Rios, realizada em 16 de outubro de 1932, sem autor


conhecido, acervo André Mattos.

254
Fotografia que permite uma visão panorâmica do ainda distrito de Paraíba do Sul/RJ, Entre Rios. Autor
desconhecido, do final da década de 30, acervo André Mattos.

Panorâmica do distrito de Entre-Rios, entre o final do ano de 1938 e início de 1940, sem informação do
seu autor, do acervo Srº Altair.

Panorâmica do distrito de Entre-Rios, do final da década de 30, sem autor conhecido, do acervo André
Mattos.

255
Panorâmica do distrito de Entre-Rios, realizada no final dos anos de 1930, sem informação do seu autor,
acervo Srº Altair.

Imagem externa da Fábrica de Fósforo “Pharol”. Registro da década de 1930, sem fotografo definido,
acervo André Mattos.

256
Panorâmica da Rua da Maçonaria na sua esquina com a Praça Salim Chimelli. Registro do final da
década de 1930, sem informação do seu autor, acervo Srº Altair.

Década de 40

Panorâmica da cidade de Três Rios, esta fotografia foi realizada após a emancipação do município de
Paraíba do Sul/RJ. Registro do início da década de 1940, sem autor definido. Acervo André Mattos.

257
Imagem externa das oficinas 7ª Inspetoria de Locomoção da E. de F. Central do Brasil, e dos Armazéns
de Café do Estado de Minas Gerais. Fotografia publicada Entre-Rios Jornal de 17 de janeiro de 1936, sem
fotógrafo conhecido.

Vista externa da Praça Visconde do Rio Novo, nesta fotografia do início da década de 1940, sem
fotógrafo conhecido, acervo André Mattos.

258
Década de 50

Vista externa da Capela Nossa Senhora da Piedade, nesta fotografia sem autor conhecido, do final da
década de 1950, acervo Rádio Três Rios.

Década de 60

Vista panorâmica onde se observa a Estação de Três Rios da Leopoldina, ainda em atividade nesta
fotografia de 1968 de autor desconhecido.

259
Década de 70

Vista externa da Estação de Pedras da Estrada de Ferro Leopoldina. Fotografia da década de 70,
acervo André Mattos.

Registro da construção do monumento em homenagem a Condessa do Rio Novo e ao Barão Ribeiro de


Sá, no Largo do Barulho, nesta fotografia do início da década de 1970, sem fotógrafo conhecido, acervo André
Mattos.

260
2012

Registros da obra do viaduto sobre a linha férrea que eliminou a Praça Salin Chimelli, de maio de
2012, acervo de André Mattos.

Panorâmica do Viaduto Antônio Teixeira Pinto – “Antônio da Farmácia”, inaugurado em 05/07/2012.

261
Biografias:

Abdisio Bernardo da Silva, natural de Arcoverde, Pernambuco, é reconhecido “por


duas gerações de trirrienses, o fotógrafo Abdisio Bernardo da Silva, se tornou uma
unanimidade de simpatia junto ao povo da cidade. Na verdade, ele já fotografou crianças, hoje
homens e mulheres, e continua sendo admirado pelas famílias. Falar sobre o pernambucano
Abdisio é tarefa para quem o acompanha desde que ele surgiu em Três Rios, no ano de 1965.
A primeira iniciativa foi abrir um estúdio fotográfico na Galeria da Automeca, que fica
logo no início da Rua Nelson Viana. Muito experimentado, já que havia sido fotógrafo de
alguns jornais do Rio e depois da Companhia Hidroelétrica do São Francisco, (CHESF),
começaria ali seu trabalho com aquelas fotos de casamentos, batizados, etc. Naquela época, o
prefeito da cidade era o saudoso Alberto Lavinas, que logo o convidou para realizar trabalhos
para a PMTR. Seus serviços na prefeitura acabaram fazendo com que a então esposa, Dona
Dilma passasse a auxiliá-lo no estúdio. (...) Logo seria chamado para participar das mais
diversas atividades sociais, inclusive se tornando filiado de partido político como o PDT, para
o qual foi levado pelo próprio Leonel Brizola. (...)
Abdisio afirmou: “Através da minha fotografia eu consigo expressar momentos
únicos, especiais e também do lado pessoal. Vejo o mundo por um ângulo diferente, mais
colorido em alguns momentos, e noutros nem tanto. Através das minhas lentes, consigo captar
a verdade, a tristeza, a alegria, retratando situações inusitadas, e às vezes até divertidas. Tenho
imensa preocupação com problemas sociais e a minha arte está sempre à disposição. A
fotografia tem uma expressão íntima sobre o que vejo. Num clique eternizo um flagra, uma
situação, ou um tema que poderá virar discussão pelo mundo todo. O que mais me da prazer é
aplicar os meus conhecimentos, para retratar momentos harmoniosos e torná-los símbolos de
amor e paz.” 153

Altair Tavares da Silva, nascido na cidade de Três Rios em 1927, filho de Augusto
Tavares da Silva e Alvina N. Tavares, o pai era proprietário de uma fábrica de colchão de
capim e a mãe costureira na colchoaria trabalhando na confecção das capas. Trabalhou no
Banco Fluminense da Produção, no INPS, nas Casas Pernambucanas, no Banco Predial, no
Banco da Lavoura de Minas Gerais, vindo a administrar a fábrica do pai por volta de
1957/1958. Casado com a Srª Leniset Peyroton Tavares da Silva, funcionária do antigo

153 ABDÍSIO: “Três Rios é o amor da minha vida.” Texto de José Barros de 27/06/2011. Disponível no site:
http://folhapopular.net.br/noticias/860. Acesso em 23 de mar. de 2012.

262
Banerj, primeira mulher filiada no Sindicato dos Bancários de Três Rios, tem 3 filhos e 4
netas. Atualmente aposentado, sua paixão pela fotografia surge com a primeira que recebeu
dos ferroviários (fotografia 22). Indagado afirmou: “__ Essas fotografias são a história de
Três Rios, meu filho, a memória da nossa cidade.” Srº Altair é também um registro vivo das
memórias do município, sempre pronto a dividir suas informações. Devo a ele muito do que
escrevo nas análises fotográficas.

Alberto da Silva Lavinas, nasceu em Três Rios em 10 de maio de 1930, falescendo


em 2 de fevereiro de 1991. Filho de Aníbal Peixoto Lavinas e de Nadir da Silva Lavinas, foi
Cirurgião Dentista formado pela Faculdade de Odontologia de Juiz de Fora, MG, em 1951.
Iniciou a carreira política como vereador de 1958 (aos 28 anos) a 1963, vice-prefeito de Três
Rios de 1963 a 1966 e prefeito de 1967 a 1970, deixando o cargo para concorrer a Câmara de
Deputados Federal se elegendo em 1971, cumprindo o mandato até 1975 e novamente de
1975 a 1979. Feito o primeiro suplente de Amaral Peixoto quando este foi reeleito senador
por via indireta em 1978 foi convocado para o exercício do mandato por força de licença do
titular em 1980 quando também ingressou no PDS deixando o MDB, nele permanecendo até
ingressar no PDT em 1986; foi eleito novamente prefeito de Três Rios em 1988. Reconhecido
como um dos prefeitos que mais intervensão realizou nos espaços urbanos da cidade de Três
Rios, com a remodelação da Avenida Condessa do Rio Novo, a destruição do Armazem de
Café e o início das obras da Avenida Alberto Lavinas.

Aquilas Rodrigues Coutinho, professor, Inspetor do Ensino Municipal, o que hoje


equivale a Secretário de Educação, poeta, músico, teatrólogo, escritor e historiador. Lecionou
também em vários cursos, inclusive no curso normal do Colégio Entres Rios. É o autor da
letra e da música do Hino de Três Rios, que foi criado por Lei em 05 de setembro de 1972.
Um dos fundadores do Colégio Cenecista Walter Francklin, onde lecionava Português e
Música.

Celso Alencar Ramos Jacob, nasceu em Três Rios no dia 19 de janeiro de 1957.
Filho de Alencar Jacob e Carmem Ramos Jacob. Estudou o antigo curso primário no Grupo
Escolar Condessa do Rio Novo, e completou o segundo grau no Colégio Ruy Barbosa.
Formou-se em economia na Faculdade André Arcoverde em Valença/RJ e fez mestrado em
Educação. Foi prefeito de Três Rios com dois mandatos de 2001/2004 e 2005/2008 e
Deputado Federal.

263
Charles Figley, professor de saúde mental de vítimas de desastres na Escola de
Serviço Social da Universidade Tulane e ex-fuzileiro naval, apresentou o conceito de
transtorno do estresse pós-traumático em um livro de 1978 sobre ex-combatentes da Guerra
do Vietnã. Ele disse que um dos motivos pelos quais é tão difícil se livrar do trauma é o fato
de o problema danificar os aspectos mais triviais da vida cotidiana. Reportagem de Anemona
Hartocollis com contribuição do jornalista Alain Delaqueriere. 154

Cínara Maria Bastos Jorge Andrade do Nacimento, trirriense, funcionária pública


aposentada, sócia colaboradora do Colégio Brasileiro de Genealogia (CBG), moderadora do
grupo de discussões em genealogia na internet, GenealBr; atualmente escrevendo um livro
sobre as memórias dos pioneiros desta região do Vale do Paraíba do Sul.

Ezilma Teixeira, é filha de João Batista Teixeira e de Cecília Garcia Teixeira, nasceu
em Três Rios (RJ), onde ainda reside. Graduada em História pela Universidade Severino
Sombra, apresenta em sua formação acadêmica alguns cursos de pós-graduação, como
Docência do Ensino Superior, Psicopedagogia, e outros de extensão universitária voltados ao
aperfeiçoamento da sua graduação de origem. Professora de História faz parte do Conselho
Municipal de Educação de Três Rios.
É membro efetivo do Instituto de Estudos Valeparaibanos, de São Paulo e da
Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra (ADESG), Delegacia de Minas
Gerais. É sócia representativa do Rotary Clube Três Rios Beira Rio, onde atualmente chefia a
Comissão de Relações Públicas, cumulativamente com a Comissão de Meio Ambiente.
Envolvida com a política cultural da região, fez parte do grupo que em 1997 fundou a
Casa de Cultura de Três Rios. Escritora, jornalista – colunista do periódico “Entre-Rios
Jornal”, pesquisadora e historiadora, têm diversos trabalhos publicados e editados sobre a
história da região, sendo os mais recentes: Aprendendo nossa Terra - livro didático editado
em 2004 e adotado pelas escolas municipais e particulares de Três Rios.Editora Editar – Juiz
de Fora (MG); e Era uma vez... – História – editado em 2005 – Editora Editar – Juiz de Fora
(MG).

154 Biografia disponível no site: matériahttp://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2011/08/28/dez-anos-


depois-traumas-do-11-de-setembro-ainda-atormentam-os-norte-americanos.jhtm. Acesso em 28 de agost. de
2011.

264
João Pedro da Silveira, Interventor do município de Três Rios no período de
13/02/1946 até 05/08/1946 e 05/02/1947 até 10/08/1947. Foi prefeito eleito da cidade no
período de 03/02/1951 até 31/01/1955.

Mariana Claudina Pereira de Carvalho, a Condessa do Rio Novo. Nasceu em 1816


em local não conhecido, provavelmente na Fazenda Cantagalo nas terras da atual cidade de
Três Rios, sendo filha de Antonio Barroso Pereira, o Barão de Entre-Rios e Claudina
Venância de Jesus. Alguns pesquisadores afirmam que aos oito anos foi internada em um
colégio no Rio de Janeiro, onde permaneceu por 4 anos, retornando a fazenda com 12 anos,
mas não foram encontrados ainda documentos quanto a este período de sua vida.
Casou-se possivelmente em 1832, com seu primo o Major José Antônio Barroso de
Carvalho, passando a residir na Fazenda Boa União, não nascendo filhos deste matrimonio.
Em sua vida conquistou os seguintes títulos nobiliárquicos: em 1856, Baronesa; em 1867,
Viscondessa e em 1880 – título concedidos ao seu esposo, viúva, foi elevada a Condessa do
Rio Novo um raro acontecimento na história da nobreza brasileira.
Considerada pelos historiadores trirrienses como uma mulher a frente de seu tempo,
realizou importantes atividades nas áreas política, administrativa e principalmente
assistenciais. Por vontade expressa em seu testamento libertou os escravos de suas fazendas,
estabelecendo critérios para a criação da Colônia Nossa Senhora da Piedade, onde atualmente
esta situado o bairro de Vila Isabel e também da Casa de Caridade de Paraíba do Sul. Falesceu
em Londres em 1882, aos 66 anos, estando os seus restos mortais no mausoléu da Capela
Nossa Senhora da Piedade. É considerada por muitos a fundadora de Três Rios.

Michael Löwy, pensador marxista é diretor de pesquisa do CNRS – Centre National


de la Recherche Scientifique e leciona na École dês Hautes Études em Sciences Sociales de
Paris. Nascido em São Paulo em 6 de maio de 1938, numa família de judeus emigrados para o
Brasil nos anos 30. Estudou o ginásio e o científico em escola pública, entrando para o curso
de ciências sociais da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP em 1956. Mudou-se
para Paris, França em 1961 onde encontra-se até os dias presentes. Seus trabalhos estão
publicados em 24 línguas.

Nilo Peçanha. “Presidente da república brasileira (1909-1910) nascido em Campos


dos Goitacases, RJ, que como presidente da república, procurou manter-se neutro durante a

265
disputada campanha eleitoral entre Hermes da Fonseca e Rui Barbosa, pela sua sucessão.
Filho de camponeses humildes formou-se pela Faculdade de Direito de Recife, PE (1887),
onde depois criou um escritório de advocacia. Atraído pela política, fundou, com Francisco
Portela, o Clube Republicano de Campos e foi membro do Congresso Constituinte (1890-
1891) e da primeira legislatura do Congresso Nacional. Reeleito sucessivamente, foi eleito
presidente do estado do Rio de Janeiro (1903), onde se mostrou um administrador dinâmico e
eficiente.
Compondo como vice a chapa vitoriosa de Afonso Pena, assumiu a presidência com a
morte do titular. Após passar o governo para o eleito Hermes Rodrigues da Fonseca, foi para
Europa (1910-1912), só voltando para assumir a cadeira de senador pelo Rio de Janeiro.
Eleito presidente do estado do Rio de Janeiro (1914), antes do término do mandato foi
nomeado para o Ministério das Relações Exteriores (1917). Formou uma chapa oposicionista
com José Joaquim Seabra, presidente da Bahia, com o apoio dos maçônicos da Grande
Oriente do Brasil, na chamada Reação Republicana (1921), contra o candidato das correntes
oficiais, Artur Bernardes, presidente de Minas Gerais, apoiado pela Igreja Católica, e foi
derrotado (1922). Publicou os livros Impressões da Europa (1913), com suas observações
sobre a primeira viagem ao exterior, e Política, economia e finanças (1922), com os discursos
de campanha da Reação Republicana, e morreu no Rio de Janeiro, RJ, em 31 de março.” 155

“Paul Klee nasceu em 18 de dezembro de 1879 em Münchenbuchsee, perto de Berna,


na Suíça. Em setembro de 1898, beirando os 19 anos, ele partiu para Munique para estudar
arte. Apresentou-se na Academia, mas foi aconselhado a freqüentar primeiro um escola de
arte particular. Klee juntou-se à escola Knirr e produziu vários nus e retratos. Conheceu Lily
Stumpf, uma pianista, no outono de 1899, e suas afeições tornaram-se arraigadas. No entanto,
só se casariam alguns anos depois (...) Os primeiros passos em direção ao movimento que
mais tarde ficaria conhecido como Expressionismo foram dados nesta época. É notável que as
paisagens de Klee mudaram, perdendo sua objetividade e tornando-se mais monumentais e
românticas. Em 1934, aconteceu sua primeira exposição inglesa, e uma ampla retrospectiva
foi apresentada em Berna em 1935. No mesmo ano, ele desenvolveu os primeiros sintomas de
câncer de pele. Por algum tempo sofreu de depressão, resultante de sua doença, mas, em
1937, retornou o trabalho com ímpeto e energia fenomenais. Enquanto isso, na Alemanha,

155 Biografia disponível no site: http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/governo-nilo-pecanha/governo-nilo-


pecanha.php.Acesso em 24 de jun. de 2011.

266
alguns de seus trabalhos foram expostos em uma "exibição de arte degenerada", e mais
adiante 102 deles seriam confiscados de coleções públicas (...)
Em 10 de maio de 1940, Klee foi acolhido por um sanatório perto de Locarno e,
menos de um mês depois, transferido para a clínica Sant'Agnese. Morreu em 28 de junho do
mesmo ano. Klee experimentou a mistura de meios artísticos, usando aquarela e pintura a óleo
ou tinta, cola e verniz, por exemplo. No entanto, nem sempre é possível especificar o meio
utilizado em alguns trabalhos.” 156

Revert Henry Klumb foi natural de Berlin na Alemanha, teria aportado no Brasil em
1852, que além de utilizar o sistema daguerreotypo, também tirava retratos sobre papel, vidro
e marfim, executando vistas de chácaras, monumentos, reproduções de pinturas e plantas
arquitetônicas. Agraciado em 24 de agosto de 1861 com o título de “Photographo da Caza
Imperial”, foi professor de fotografia da princesa Izabel. Documentando aspectos da Estrada
União e Indústria publica em 1872 o livro “Doze Horas em Diligências, um guia do viajante
de Petrópolis a Juiz de Fora”, obra que dedica à imperatriz, sua protetora. Neste livro, um guia
ilustrado de desenhos copiados da fotografia, conforme escreveu no prefácio, constata-se a
sua preocupação em demonstrar a grandiosidade deste empreendimento realizado pela
vontade do Imperador D. Pedro II. 157

Tancredo Neves, “(1910-1985) foi um advogado, empresário e político brasileiro.


Nascido na cidade de São João Del Rey, Tancredo de Almeida Neves Neves ingressou para a
carreira política muito jovem como vereador em sua cidade natal em 1934. A partir daí
participou de diversos momentos decisivos da história do Brasil.
Durante o Estado Novo conheceu de perto as pressões da ditadura, sendo preso em
1937 e em 1939. Em 1954, quando era ministro da Justiça do mesmo Getúlio Vargas, ficou ao
seu lado no momento da crise que culminou no seu suicídio.
Com a morte de Vargas articulou a candidatura de Juscelino Kubitschec à presidência.
Em 1961, convenceu João Goulart a aceitar o parlamentarismo e assim, evitar o golpe.
Nomeado primeiro presidente de Conselho dos Ministros, o regime parlamentarista não deu
certo e, três anos depois, Tancredo era um dos mais ativos adversários ao golpe militar que

156 Biografia disponível no site: http://www.pintoresfamosos.com.br/?pg=klee. Acesso em 24 de jun. de 2011.


157 KOSSOY, Boris. Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro – Fotógrafos e Oficio da Fotografia no
Brasil (1833-1910). IMS – Instituto Moreira Salles. São Paulo/SP, 1ª Edição, 2002, p. 189/193.

267
acabou por acontecer e depor Jango. Em 1985 concorreu à presidência da república recebendo
480 votos contra 180 de seu adversário Paulo Maluf.
Neves representava a esperança do cidadão brasileiro após o fracasso da campanha
pelas diretas. No entanto, não chegou a tomar posse. Um processo inflamatório no aparelho
intestinal fez com que se submetesse a sete cirurgias e José Sarney, seu vice, teve que assumir
o governo em seu lugar. Tancredo Neves faleceu no dia 21 de abril de 1985 depois de trinta e
oito dias de internamento.” 158

158 Biografia disponível no site: http://www.e-biografias.net/biografias/tancredo_neves.php. Acesso em 22 de


mar. de 2012.

268
Fontes:

a) Documentos oficiais:
* Relatório da Província do Rio de Janeiro de diversos anos, digitalizado na pagina da
Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930).

* Testamento da Condessa do Rio Novo.

b) Publicações Oficiais:
* Jornais: “Arealense”, “Entre-Rios Jornal”, “O Cartaz”, “O Jornal de Três Rios”, “A
Tribuna” e o “Correio Trirriense” – acervos Casa de Cultura de Três Rios e Entre-Rios Jornal.

c) Fotografias de diversos acervos.

269
Bibliografia:

19 ANOS de vida autônoma. Tribuna de Três Rios, Três Rios/RJ, Ano I, nº 22 de 13


de dezembro de 1957, capa.

20 DE JUNHO: Povo receberá a nova Avenida Condessa do Rio Novo. Sem autor da
notícia. “Correio Trirriense”. Três Rios/RJ. Ano IX, quinta-feira, 11 de junho de 1970,
edição nº 419, capa.

ABRAHÃO e SOARES, Bruno Otávio de Lacerda e Antonio Jorge Gonçalves. O


elogio ao negro no espaço do futebol: entre a integração pós-escravidão e a manutenção das
hierarquias sociais. Disponível no site:
http://comunicacaoeesporte.files.wordpress.com/2010/10/elogio-ao-negro-no-espaco-o-
futebol-pos-escravidao-e-hierarquias-sociais.pdf . Acesso em: 12 de fev. 2012.

ALMEIDA, Juniele Rabelo. Objeto Biográfico e Performance Narrativa: Questões


para História Oral de Vida. Disponível no site:
http://neho.vitis.uspnet.usp.br/images/stories/PDFs/juniele.pdf. Acesso em: 09 de jan. 2012.

ANDRÉ, Richard Gonçalves. Entre o contexto e a linguagem: o discurso fotográfico e


a pesquisa histórica. Domínio da Imagem – Revista do LEDI, Londrina/PR, ano II, nº 5,
novembro de 2009.

ARAUJO, Marcelo da Silva. Na imagem do passado a nostalgia do presente;


memória, lazer e sociabilidade na Praça da Lira. Disponível no site:
http://www.ffp.uerj.br/tamoios/2008.1/praca%20da%20lira%20Marcelo%20da%20Silva%20
Ara%FAjo.pdf. Acesso em: 31 de mar. 2011.

BARRETO, Ana Claudia de Jesus. O lugar dos negros pobres na cidade: estudo na
área de risco do bairro Dom Bosco. Disponível no site:
http://www.ufjf.br/revistalibertas/files/2011/02/artigo10_13.pdf. Acesso em: 25 de jan. 2012.

270
BARROS, José. “Três Rios: Como Pilatos, Cultura "lava mãos", possibilitando
derrubada do palacete da família Nasser”. Disponível no site:
http://www.agenciaserra.com.br/ler_noticia.php?acao=noticia&id=7382. Acesso em: 23 de
mar. 2010.

BARROS, José D`Assunpção. Cidade e História. Petrópolis/RJ. Editora Vozes. 2007.

BARTHES, Roland. A Câmara Clara. Rio de Janeiro. Editora Nova Fronteira, 2008.

BEBIANO, Rui. Nostalgia e imaginação: dois fatores dinâmicos num mundo global.
Disponível no site:
http://www.apfilosofia.org/documentos/pdf/RuiBebiano_Memoria_Globalizacao.pdf. Acesso
em: 18 de abr. 2011.

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutividade técnica, in Walter


Benjamin – Obras Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP.
Editora Brasiliense. 11ª reimpressão, 2008.

BENJAMIN, Walter. O narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In


Walter Benjamin – Obras Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP:
Editora Brasiliense. 11ª Reimpressão. 2008.

BENJAMIN, Walter. Pequena história da fotografia, in Walter Benjamin – Obras


Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP. Editora Brasiliense. 11ª
reimpressão, 2008

BENJAMIN, Walter. Sobre o Conceito da História. In Walter Benjamin – Obras


Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP: Editora Brasiliense. 11ª
Reimpressão, 2008.

BRILHANTES as homenagens ao “Dia da Pátria”. Entre-Rios Jornal. Três Rios/RJ,


ano XX, de 11 de setembro de 1954, capa.

271
BORGES, Maria Eliza Linhares. História e Fotografia. Belo Horizonte/MG:
Autêntica Editora. 2008.

BOSI, Ecléa. O Tempo Vivo da Memória. Ensaios de Psicologia Social. Ateliê


Editorial. São Paulo/SP, 2ª Edição, 2004.

BRESCIANI e NAXARA, Stella e Márcia. Memória e (Res)sentimento: Indagações


sobre uma questão sensível. Capmpinas/SP: Editora Unicamp, 2004.

BRAVO, Maria Aparecida. Gente que aqui viveu, gente que aqui vive. Revista do 4º
Seminário dos Clubes de Diretores Lojistas do Estado do Rio de Janeiro. Três Rios/RJ, 21, 22
e 23 de abril de 1967. Composta e Impressa na Gráfica Três Rios,

BURKE, Peter. O que é História Cultural? Rio de Janeiro/RJ: Jorge Zahar Editor
Ltda, 2. ed. (revista e ampliada), 2008.

BURKE, Peter. Testemunha Ocular: História e Imagem. 2. ed. São Paulo/SP:


EDUSC. 2004.

BURTON, Richard. Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho – Coleção O Brasil


visto por estrangeiros, tradução de David Jardim Júnior. Senado Federal, Brasília, 2001.
Disponível no site:
http://www.senado.gov.br/publicacoes/conselho/asp/pdfS.asp?COD_PUBLICACAO=78.
Acesso em: 10 de out. 2011.

CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Revista Estudos Avançados. v. 5


n.11 São Paulo/SP, jan./abr. 1991.

CHARTIER, Roger. Por uma sociologia histórica das práticas culturais. In: A
História Cultural: Entre práticas e representações. Difel. Rio de Janeiro/RJ, 1990.

CHIOZZINI, Daniel: Memória é matéria prima do trabalho do historiador.


Disponível no site: http://www.pactoaudiovisual.com.br/mestres_final/lygia/texto1.htm.
Acesso em 25 de fev. 2009.

272
DAVID, Eduardo Gonçalves. A mula do ouro: paixões e dramas por trás da
construção de rodovias e ferrovias na única monarquia das Américas. Niterói/RJ: Editora
Portifolium, 2009.

DE SÁ, Antonio Ribeiro. A Cidade de Entre-Rios – sua origem e fundação, composto


e impresso na Tipografia Brasil, Juiz de Fora/MG, 1942.

DESAPARECE um dos últimos obstáculos ao progresso: Hotel Central começou a ser


demolido. Sem autor da notícia. “Correio Trirriense”. Três Rios/RJ. Ano V, quinta-feira, 6
de fevereiro de 1969, edição nº 359, capa.

DEZ ANOS depois, traumas do 11 de setembro ainda atormentam os norte-


americanos. Reportagem de Anemona Hartocollis com contribuição do jornalista Alain
Delaqueriere. Disponível no site:
http://m.noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2011/08/28/dez-anos-depois-traumas-do-11-
de-setembro-ainda-atormentam-os-norte-americanos.htm. Acesso em: 28 de agos. 2011.

DIDI-HUBERMAN, Georges apud Nascimento, Roberta Andrade do. Charles


Baudelaire e a arte da memória. Disponível no site:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-106X2005000100004. Acesso
em: 01 de dez. 2011.

DIETRICH, Ana Maria. Percurso de memória(s) traumática(s) da II Guerra Mundial.


Disponível no site: http://pt.scribd.com/doc/63676819/PERCURSOS-DE-MEMORIA.
Acesso em 11 de out. de 2011.

DOURADO, Odete. Para sempre, memória. Disponível no site:


http://www.portalseer.ufba.br/index.php/rua/article/viewArticle/3093. Acesso em 11 de abr.
2011.

DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico. Campinas/SP: Papirus Editora, 12ª ed., 2009.

273
EM COMEMORAÇÃO ao nosso aniversário – prêmio Melnhaque: A melhor
“História de Três Rios”. JUNIOR, Antonio Villela. “O Jornal de Três Rios”. Três Rios/RJ.
Ano II, 26 de abril de 1961, nº 53, p. 2.

“ENTRE-RIOS jornal”, comemorando seu primeiro aniversário, presta justa


homenagem a futurosa cidade de Entre-Rios, e seus dignos leitores do rincão fluminense.
“Entre-Rios Jornal.” Entre-Rios, atual Três Rios. Ano II, sexta-feira, 17 de janeiro de 1936,
ed 52, capa e página 16.

“ENTRE-RIOS, o que foi e o que será”. Vê Jota, pseudônimo de Antonio Villela


Junior. “Entre-Rios Jornal.” Entre-Rios, atual Três Rios. Ano II, sexta-feira, 17 de janeiro de
1936, ed 52, p. 2.

EXPOSIÇÃO realizada pelo Sr. Thomaz Gomes dos Santos, vice-presidente da


Província do Rio de Janeiro em 29 de julho de 1858 ao entregar a administração ao presidente
conselheiro Antonio N. Tolentino, digitalizado no site da Center for Research Libraries –
Global Resources Network: Provincial Presidential Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ.
Disponível no site: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/789/000084.html. Acesso em: 12 de set. 2011.

GAGNEBIN, Jeanne Marie. Walter Benjamin ou a história aberta. Prefácio do livro:


Obras Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo/SP: Editora
Brasiliense, 11ª reimpressão, 2008.

GIESBRECHT, Ralph Mennucci. Texto de apresentação do blog. Disponível:


http://www.estacoesferroviarias.com.br/index.html. Acesso em: 09 de set. 2011.

GOMES e ARAÚJO. Flávio e Carlos Eduardo Moreira. Abolição da escravidão: a


igualdade que não veio. Disponível no site:
http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/abolicao_a_igualdade_que_nao_veio_6.html
. Acesso em: 23 de jan. 2012.

HAGEMEYER, Rafael Rosa. Representar a história através de imagens: entre a


reconstituição e a analogia. In Imagem em Debate, Gawryszewski, Alberto, organizador.
Londrina/PR: Eduel – Editora da Universidade Estadual de Londrina; Londrina, 2011.

274
HALBWACHS, Maurice. A Memória Coletiva. Nova tradução de Beatriz Sidou. São
Paulo/SP: Centauro Editora, 2009.

HOMENAGEM ao Prefeito. Entre-Rios Jornal, Três Rios/RJ, ano XX, edição nº


1025, de 25 de setembro de 1954, capa.

HUYSSEN, Andreas. Resistencia a la Memoria: los usos y abusos del olvido público.
Conferência de abertura da INTERCOM - Porto Alegre, 31 de Agosto de 2004. Disponível no
site: http://www.intercom.org.br/memoria/congresso2004/conferencia_andreas_huyssen.pdf.
Acesso em: 24 de agos. 2010.

INAUGURADO vários melhoramentos com a presença do Exmo. Governador Alte.


Ernani do Amaral Peixoto e do candidato Dr. Miguel Couto Filho. Entre-Rios Jornal, Três
Rios/RJ, ano XX, edição nº 1025, de 25 de setembro de 1954, capa.

INAUGURAÇÃO da estátua atrasa em 2 horas e meia. O Diário. Três Rios/RJ, edição


de nº 253 de 17 de dezembro de 1985, capa.

INDÚSTRIA. Padilha, Miguel. O Jornal de Três Rios. Três Rios/RJ, Ano I, nº 2, 28


de abril de 1960, capa.

INNOCÊNCIO, Isabela Torres de Castro. Liberdade e Acesso a terra. Fazenda de


Cantagalo, Paraíba do Sul (1882-1932). Disponível no site:
http://www.uss.br/hotsites/revistaeletronica/arquivos/liberdade.swf. Acesso em: 5 de set.
2011.

INNOCENCIO, Isabela Torres de Castro. Liberdade e acesso à terra. Rio de


Janeiro/RJ. Folha Carioca Editora Ltda. 2005.

INVENTÁRIO das Fazendas do Vale do Paraíba Fluminense. - Fazenda Três


Barras/RJ – Disponível no site: http://www.institutocidadeviva.org.br/inventarios/sistema/wp-
content/uploads/2009/11/21_faz_tres_barras.pdf. Acesso em: 24 de set. 2011.

275
JUSTO, Joana Sanches. Narrar histórias, fotografar momentos: tecendo intersecções
entre narrativa oral e álbuns de fotografias. Disponível no site:
http://www.unioeste.br/prppg/mestrados/letras/revistas/travessias/ed_005/artecomunicacao.ht
m. Acesso em: 01 de dez. 2011.

KLING, Hugo José. Cinzas que Falam. Juiz de Fora/MG, 1ª Edição, Sociedade
Propagadora Esdeva – Lar Católico - 1971.

KLING, Hugo José. A Matriz de São Sebastião de Entre Rios e outras anotações
históricas. Juiz de Fora/MG: Sociedade Propagadora Esdeva, 1969.

KLUMB, Revert Henry. Doze horas em diligência – Guia do Viajante de Petrópolis a


Juiz de Fora. In: Anuário do Museu Imperial – Edição Comemorativa. Petrópolis/RJ: Editora
Gráfica Serrana, 1995.

KOSSOY, Borys. Fotografia e História. São Paulo/SP: Ateliê Editorial. 2ª ed. 2003.

LEVI, Giovanni. O microscópio infinito. Entrevista a Revista de História da Biblioteca


Nacional. In: Revista de História da Biblioteca Nacional. Ano 4, n° 41. Rio de Janeiro/RJ:
SABIN. 2009.

LÖWY, Michel. Walter Benjamin: aviso de incêndio. Uma leitura das teses “Sobre o
conceito de história”. São Paulo/SP: BOITEMPO Editorial. 1ª reimpressão, 2007.

MARINS, Paulo César Garcez. Resumo do texto: A vida cotidiana dos paulistas:
moradias, alimentação, indumentária. Disponível no site:
http://www.terrapaulista.org.br/costumes/vestuario/saibamais.asp. Acesso em: 25 de out.
2011.

MAUAD, Ana Maria. Através da Imagem: Fotografia e História Interfaces.


Disponível no site: http://www.historia.uff.br/tempo/artigos_dossie/artg2-4.pdf. Acesso em:
21 de abr. 2010.

276
MENEZES, Ulpiano T. Bezerra de. A História, cativa da memória? Para um
mapeamento da memória, no campo das Ciências Sociais. Revista do Instituto de Estudos
Brasileiros (IEB), São Paulo, n. 34, 1992.

NEVES, Margarida de Souza. Lugares de Memória da Medicina no Brasil. Disponível


no site: http://www.historiaecultura.pro.br/cienciaepreconceito/lugaresdememoria.htm.
Acesso em: 24 de abr. 2011.

O HOMEM do povo simboliza abraço popular no governo do município. “Correio


Trirriense”. Três Rios/RJ. Ano IX, quinta-feira, 22 de janeiro de 1970, nº 401, capa.

O MAIOR entrave ao progresso de Entre-Rios é o problema da água. “Entre-Rios


Jornal.” Entre-Rios, atual Três Rios. Ano I, 31 de outubro de 1935, ed 42, capa.

OS PRIMEIROS carros de passageiros confeccionados nas officinas da Estrada de


Ferro Central do Brasil. Entre-Rios Jornal. Três Rios/RJ, ano I, nº 43 de 14 de dezembro de
1954, p 2.

PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. Bauru/SP. Editora Edusc,


2005.

PINSKY e DE LUCA, Carla Bassanezi e Tânia Regina. O Historiador e suas fontes.


São Paulo/SP: Editora Contexto, 2009.

PIRES, Maria da Conceição Francisca. Vitória no começo do século XX: Modernidade


e modernização na construção da capital capixaba. Disponível no site:
http://www.cchla.ufpb.br/saeculum/saeculum14_dos06_pires.pdf. Acesso em: 12 de jan.
2012.

POLLAK, Michael. Memória, Esquecimento, Silêncio. Disponível no site:


http://www2.uel.br/cch/cdph/arqtxt/Memoria_esquecimento_silencio.pdf. Acesso em: 14 de
out. 2008.

277
PRAÇA São Sebastião terá fonte luminosa. Correio Trirriense. Três Rios. Ano IX,
quinta-feira, 29 de maio de 1969, nº 373, capa.

PREFEITO homenageia data do trabalhador inaugurando melhoramentos. “Correio


Trirriense”. Três Rios/RJ. Ano IX, quinta-feira, 30 de abril de 1970, nº 413, capa.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1928, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u896/000203.html.
Acesso em: 14 de fev. 2012.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1856 – Decretos – digitalizado na


pagina da Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential
Reports (1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u833/000081.html e
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u833/000082.html. Acesso em: 9 de set. de 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000117.html . Acesso em: 10 de set. 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000118.html. Acesso em: 10 de set 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000119.html. Acesso em: 10 de set. 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports

278
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000119.html e
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000120.html. Acesso em: 10 de set. 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000120.html e http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/787/000121.html.
Acesso em: 11 de set. 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/788/000096.html e http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/788/000097.html.
Acesso em: 11 de set. 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1857, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/788/000097.html. Acesso em: 11 de set. de 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1899, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u869/000033.html.
Acesso em: 14 de set. 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1867, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u846/000001.html. Acesso em: 14 de set. de 2011.

RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1899, digitalizado na pagina da


Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível: http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u869/000033.html.
Acesso em: 14 de set. 2011.

279
RELATÓRIO da Província do Rio de Janeiro de 1900, digitalizado na pagina da
Center for Research Libraries – Global Resources Network: Provincial Presidential Reports
(1830:1930) Rio de Janeiro/RJ. Disponível no site:
http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u870/000010.html. Acesso em: 9 de set. 2011.

RICCEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas/SP: Editora


UNICAMP, 2ª reimpressão, 2010.

SEIXAS, Jacy Alves de. Percursos de Memórias em terras de História: problemáticas


atuais. In Memória e (Res)sentimento. Indagações sobre uma questão sensível. Organização
de Bresciani e Naxara, Stella e Marcia. Campinas/SP: Editora Unicamp, 2004.

SILVA, Pedro Moraes da. O Município de Entre Rios. Artigo publicado numa edição
especial do “Entre-Rios Jornal”, ano V de 17 de janeiro de 1939, nº 209, p. 6. Arquivo da
Casa de Cultura de Três Rios.

SILVEIRA, João Pedro da. Fundação da cidade de Três Rios: 1938 – 1966. Artigo
publicado no “Entre-Rios Jornal” no final de 1966. Arquivo da Casa de Cultura de Três Rios.

SCHOLEM, Gerhard. Saudação do Anjo, apud BENJAMIN, Walter. Sobre o Conceito


da História, in Walter Benjamin – Obras Escolhidas Vol. I – Magia e Técnica, Arte e
Política. São Paulo/SP: Editora Brasiliense. 11ª Reimpressão, 2008.

TEATRO amador vem dos primórdios da cidade: 85 anos de cena. Vê Jota.“O


Cartaz”. Três Rios/RJ. Ano III, 24 de julho de 1974, nº 149 (A).

TEIXEIRA, Ezilma. Era uma vez... Juiz de Fora/MG. Editar Editora Associada. 2006.

TRÊS RIOS: Ontem, hoje e amanhã. RODRIGUES, Wanderlei. “Tribuna de Três


Rios.” Três Rios. Ano I, 17 de janeiro de 1958, ed 27, capa e página 4.

XAVIER, Regina Célia Lima. A escravidão no Brasil Meridional e os desafios


historiográficos. In: RS negro: cartografias sobre a produção do conhecimento. Porto
Alegre/RS. EDIPUCRS, 2008.

280

Você também pode gostar