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DIÁLOGOS
INTERDISCIPLINARES
EM EDUCAÇÃO
Múltiplos Saberes, Novos Olhares – Volume 1
DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES
EM EDUCAÇÃO
Múltiplos Saberes, Novos Olhares – Volume 1
AVALIAÇÃO, PARECER E REVISÃO POR PARES
Os textos que compõem esta obra foram avaliados por pares e indicados para publicação.
Bibliografia.
ISBN: 978-65-5368-090-6
https://doi.org/10.37008/978-65-5368-090-6.15.07.22
R
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização prévia da Editora BAGAI por qualquer processo, meio
ou forma, especialmente por sistemas gráficos (impressão), fonográficos, microfílmicos, fotográficos, videográficos, repro-
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Lei dos Direitos Autorais).
www.editorabagai.com.br /editorabagai
/editorabagai contato@editorabagai.com.br
Cleber Bianchessi
Organizador
DIÁLOGOS INTERDISCIPLINARES
EM EDUCAÇÃO
Múltiplos Saberes, Novos Olhares – Volume 1
1.ª Edição - Copyright© 2021 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Bagai.
O conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade do(s) seu(s) respectivo(s) autor(es). As normas ortográficas, questões
gramaticais, sistema de citações e referencial bibliográfico são prerrogativas de cada autor(es).
Revisão Os autores
o processo metodológico de construção do conhecimento pelo sujeito com base em sua relação com
o contexto, com a realidade, com sua cultura. Busca-se a expressão dessa interdisciplinaridade
pela caracterização de dois movimentos dialéticos: a problematização da situação pela qual se
desvela a realidade e a sistematização dos conhecimentos de forma integrada.
(COSTA; LOUREIRO, 2017, p. 116-117)
INTRODUÇÃO
1
Doutora em Educação (UNISINOS). Professora adjunta (UNIOESTE).CV: http://lattes.cnpq.br/3093574479627521
11
(2004), Del Priore (2006), dentre outros, possibilitam a compreensão de que a
infância é construção histórica e os modos de ser criança e viver a infância são
variáveis de acordo com as práticas sociais estabelecidas, em diferentes tempos
históricos e em contextos diferentes.
Como acentua Arroyo (2000, p. 39):
A infância não é um simples conceito, é um preceito, um projeto de ser,
vinculado a ideais de felicidade e emancipação, nos lembra Ariès. Ou
vinculada a um ideal-projeto de harmoniosa maturação, nos adverte
J. J. Rousseau. Um projeto vinculado muito antes à Paideia, que nasce
preocupada com a educação justa da infância. Maturação, felicidade,
emancipação, harmonia ou educação justa... tudo valores, ideais e
projetos onde a infância e seu artífice, o pedagogo, se configuram.
Não é que as crianças tenham permanecido ausentes das pesquisas, mas sim
seus modos de vida têm escapado às pesquisas. Ainda conhecemos pouco sobre a
infância como construção cultural (QUINTEIRO, 2002). O campo dos estudos
da infância e estudos da criança tem procurado realizar esse processo de desocul-
tação, dando lugar à alteridade da infância, que perpassa por ouvir e compreender
as crianças a partir do modo como elas veem e existem no mundo (OLIVEIRA,
2001; FARIA 1999). Oliveira (2001), para isso, propõe o entendimento da criança
enquanto outro, ou seja, o reconhecimento desta enquanto sujeito pertencente à
categoria humana, com a mesma identidade genérica do adulto, no entanto, sujeito
singular, completo em si mesmo, pertencente a um tempo/espaço geográfico,
histórico, social, cultural, em que os sujeitos de pouca idade são simultaneamente
detentores e criadores de história e cultura, com singularidades em relação ao
adulto, que possuem um modo de se expressar e estar no mundo diferente do adulto.
Nesse processo de conformação histórica da infância Narodowski (1994)
acentua que a pedagogia por um lado se proclama tributária do conceito moderno
de infância, por outro lado abstrai as características históricas da infância. Entre-
tanto, como afirma Barbosa (2007), a infância é uma experiência heterogênea,
há uma pluralidade de infâncias que precisam ser compreendidas em relação à
pluralidade de modos de socializações humanas. A infância, nessa perspectiva,
é uma “experiência social e pessoal, ativamente construída e permanentemente
ressignificada” (BARBOSA, 2007, p. 1065).
A temática infância passa à condição de maior relevância na sociedade
contemporânea ocidental. O século XX é considerado o “século da criança”,
impulsionando iniciativas de proteção e educação para a criança (CAMARA,
13
2011). Tais iniciativas geraram inegáveis avanços no campo teórico sobre a infân-
cia, possibilitando as bases teóricas e científicas para uma concepção da criança
como sujeito de direitos. Assim, “os direitos da criança e a preocupação social
com a população infantil foram as principais preocupações no início do século
XX, cujo marco emblemático foi a promulgação, em 1959, da Declaração Uni-
versal dos Direitos da Criança, pela Organização das Nações Unidas” (DIAS,
2008, p. 219, grifo da autora).
Os atuais estudos possibilitam a compreensão de que, diferente da idéia
preconizada pela modernidade, ela não é única, ao contrário convivemos com
diversas infâncias, pois há uma multiplicidade de elementos culturais e sociais
que vão interferir no modo de ser criança na sociedade. Coexistem, muitas vezes,
numa mesma sociedade, diferentes infâncias, com possibilidades e realidades
bastante distintas conforme têm afirmado diversos autores (DORNELLES,
2005; BUJES, 2002; OLIVEIRA, 2001). Por conseguinte, a infância é construção
social, cultural e produção histórica, resulta de um longo percurso na história da
humanidade. Em realidade, trata-se de infâncias e não, tão somente, infância.
São diversas, não uma infância única, abstrata, genérica. Conforme Faria (1999)
cada época histórica, cada sociedade, cada lugar, irá apresentar sua definição que
expressa determinadas culturas, conhecimentos, costumes. E mesmo numa mesma
sociedade nos deparamos com diferentes infâncias, convivemos com diferentes
imagens de infância (DORNELLES, 2005)
A sociologia da infância coloca em questão as ideias modernas que com-
puseram um conjunto de saberes sobre a sociedade e a infância, sinalizando
a inadequação de tais ideias para compreender a vida social contemporânea e
explica que ela surge com uma dupla tarefa: “criar um espaço para a infância no
discurso sociológico e encarar a complexidade e ambiguidade da infância como
um fenômeno contemporâneo e instável” (PROUT, 2010, p. 733).
16
Educação Infantil, constituindo-se num campo específico a ser melhor acolhido
no âmbito da prática e das pesquisas educacionais.
A partir desse período nota-se consistente ampliação em diversas áreas
das ciências sociais que configuram novos campos temáticos, tais como a socio-
logia da infância, a antropologia da infância, a filosofia da infância, dentre outros,
e contribuem para ampliar o olhar sobre a criança. Essas pesquisas possibilitam a
percepção de uma diversidade de processos históricos, os quais evidenciam uma
diversidade de infâncias, definidas pelas múltiplas vivências dos sujeitos a partir
do pertencimento social, étnico-racial, religioso, de gênero, dentre outros (RO-
CHA E GOUVÊA, 2010). Nesse sentido:
2
Dados apontados pelo “Levantamento bibliográfico: história da infância no Brasil”, elaborado pelo GEHPAI - Grupo
de Estudos de História da Psicologia Aplicada à Infância, IP-USP.
17
pensado possuírem uma história” a infância é um desses novos temas que passam
a interessar aos historiadores.
As produções no Brasil sobre história da infância, quer no âmbito da His-
tória, quer no da História da Educação “têm possibilitado conferir visibilidade e
legibilidade aos processos sociais de formação das diferentes infâncias brasileiras,
nos diversos espaços educativos e momentos históricos” (GOUVÊA; JINZENJI,
2006, p. 114). Nesse movimento investigativo as crianças começam a ser percebidas
como “pequenas artesãs na construção da própria história, a partir de características,
atitudes e interesses que lhes são peculiares”, a história volta-se a elas percebendo-as
como “sujeitos na história” (MOURA, 2007, p. 14).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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20
IMPACTOS AMBIENTAIS E DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL: UMA ABORDAGEM INVESTIGATIVA
INTRODUÇÃO
3
Especialista em Ensino de Ciências (IFSC). Docente (SEDSC). CV: http://lattes.cnpq.br/2997547611519251
4
Doutorado em Engenharia e Ciência de Alimentos (FURG). Docente (UNIASSLEVI).
CV: http://lattes.cnpq.br/4448748119317117
5
Doutor em Saúde Coletiva (UFSC). Pós-doutorando no Programa de Pós-Graduação em Saúde e Meio Ambiente
(UNIVILLE). CV: http://lattes.cnpq.br/7360141353267899
6
Doutorado em Ecologia e Conservação (UFPR). Pós-doutor em Botânica Tropical. Professor do Departamento de
Ciências Biológicas (UNIVILLE). CV: http://lattes.cnpq.br/9349272647053308
21
damentais para o exercício da capacidade de aprender, de questionar e refletir sobre
fatos e temas do cotidiano. Induzindo assim o processo de ensino aprendizagem
a ser transformador e emancipatório, tornando os alunos capazes de pensar e agir
de forma crítica na sociedade, transformando-a (FREIRE, 1987).
A disciplina de ciências torna-se uma forte aliada nesse processo de cons-
trução, uma vez que aborda, não apenas, os conteúdos relacionados à compreen-
são do ambiente natural, mas também suscita meios para que os estudantes se
reconheçam como partes integrantes do mundo, compreendendo os fatos que os
cercam e atuando de forma ativa, sustentável e reflexiva na sociedade.
Neste sentido, possibilitar uma aprendizagem significativa, em especial nas
questões que tangem à educação ambiental e o desenvolvimento sustentável, tor-
na-se importante no cotidiano escolar, evidenciando a relevância desta pesquisa.
Uma vez que esta apresenta as atividades de cunho investigativo como método para
promover a formação integral do aluno, tornando-o crítico, questionador, reflexivo
e sujeito de sua aprendizagem, fugindo assim da passividade e mecanicidade das
abordagens tradicionais de ensino.
Sendo assim, o presente trabalho tem por objetivo refletir sobre a impor-
tância da utilização de atividades investigativas, no processo de ensino aprendi-
zagem na disciplina de ciências e compreender a relevância de tal abordagem no
desenvolvimento do senso crítico e da autonomia dos estudantes no que concerne
o estudo sobre os impactos ambientais causados pelo homem e a busca por ações
sustentáveis na mitigação destes.
METODOLOGIA
RESULTADOS
Nuvem de palavras
Pegada Ecológica
DISCUSSÃO
26
autores enfatizam ainda que o debate sobre as questões ambientais é importante
para reduzir os impactos das mudanças climáticas.
Na atividade experimental ficou evidente a participação ativa e o protago-
nismo dos alunos, quando estes levantaram hipóteses ao longo do procedimento
e elaboraram explicações frente aos resultados, relacionando o experimento com
o efeito estufa e aquecimento global, sendo o professor um mediador no processo,
possibilitando que os estudantes se tornassem sujeitos da própria de aprendiza-
gem, construindo conceitos e desenvolvendo o pensamento científico. Os autores
Wilsek e Tossin (2009) trazem essa perspectiva quando destacam a relevância
de uma escola que possibilita ao aluno participar ativamente do seu processo de
aprendizagem, permitindo que os conteúdos sejam associados aos fatos do coti-
diano, evidenciando assim o papel de mediador do professor nessa construção.
Durante a experimentação o diálogo sempre se fez presente, permitindo um
direcionamento aos alunos. As autoras Zanon e Freitas (2007) mencionam que
uma relação dialógica oportuniza múltiplas formas de pensar e promove melhorias
nas argumentações dos estudantes frente a diferentes situações, enriquecendo
assim os conceitos trabalhados.
Na atividade investigativa: “Como reduzir a contaminação atmosférica?”, a
retomada de conteúdos permitiu a interiorização dos mesmos, uma vez que alguns
estudantes não haviam se apropriado efetivamente dos conceitos relacionados ao
tema de estudo, evidenciando o caráter processual da Sequência de Ensino por
Investigação. Segundo Zômpero e Laburú (2010), o ensino por investigação objetiva
o desenvolvimento cognitivo, em seus estudos; os autores relacionam a metodologia
com os aspectos abordados na teoria da Aprendizagem Significativa, uma vez que:
“[...] engajamento dos estudantes; a resolução do problema, para os
quais os alunos deverão mobilizar conhecimentos da experiência
adquirida; a emissão de hipóteses nas quais é possível a identificação
dos conhecimentos prévios dos alunos, bem como a possibilidade
que as atividades investigativas proporcionam aos estudantes de reor-
ganizarem seus conhecimentos na estrutura cognitiva, ao tomarem
contato com novas fontes de informações” (ZOMPERO; LABURU,
2010, p. 18).
CONCLUSÃO
28
interesse, estimularam a curiosidade e a busca por explicações frente aos problemas
apresentados e posteriores análises e reflexões acerca dos resultados encontrados.
A educação ambiental e o desenvolvimento sustentável são temas, muitas
vezes recorrentes em sala de aula, dessa forma, o uso de diferentes estratégias
metodológicas permite maior interesse do aluno e possibilita que este pense e
haja de forma transformadora na sociedade.
Fomentar o protagonismo do aluno na construção do conhecimento é
também possibilitar que este investigue, analise e tire suas próprias conclusões,
é atuar como mediador no processo de ensino-aprendizagem e, assim, permitir
que o aluno identifique a relevância dos conteúdos trabalhados em sala de aula,
uma vez que pode relacioná-los com os fatos que ocorrem no mundo que o cerca.
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30
ERRO ENCONTRADO NOS RECURSOS
TECNOLÓGICOS USADOS PARA O ENSINO DA
MATEMÁTICA
INTRODUÇÃO
7
Mestre em Ciências Naturais e Matemática (FURB). CV: http://lattes.cnpq.br/1469248630990193
8
Pós-doutorado em Educação (Faculdades EST). Doutorado em Ciências Pedagógicas (UH Cuba).
CV: http://lattes.cnpq.br/2458576908626767
31
estes componentes. E, se isto não for o suficiente — e não o é —, importa também
saber como neste complexo se reflete a arte, a literatura, a filosofia e a história,
assim com a análise política, econômica e sociológica.
Uma abordagem na tentativa de desmistificar a relação linear de desenvol-
vimento tecnológico com evolução humana não significa transformar as escolas
em templos para tornar seus alunos aprendizes de filósofos ou sociólogos. Não é
necessária e nem desejável tal atitude. Fazer isso requer apenas Interdisciplinaridade
que pode ser conseguida não através de disciplinas estanques, como se procura con-
figurar nas soluções atuais, mas sim através de grupos de conhecimento formados
pelos mais diversos professores com a adoção de novas e diversificadas técnicas.
A comunicação é a essência de uma boa relação e bom conviver. Por-
tanto, exercitamos a comunicação que a priori deveria ser em nossa
casa, com nossos familiares. Um dos melhores lugares para exercitar os
processos comunicativos é nossa casa. O próximo lugar é o ambiente
escolar, onde as interações professor-aluno, aluno-aluno, aluno-meio
são estabelecidas de maneira prazerosa. (RODRIGUES, 2015, p. 8)
32
DESENVOLVIMENTO
Por que será que alguns professores e cientistas não se conformam com
estas mudanças e não acrescentam a esta realidade outras ferramentas que tanto
contribuíram na sua própria atuação junto aos seus alunos e à sociedade? Será
que é a sua posição dogmática do infalível que estará caindo por terra? Querem
continuar como ‘mágicos’ na busca de ‘repassar’ conhecimentos que fatalmente
levarão ao maior conforto humano independentemente de a quem estão servindo?
A existência desta nova concepção e desta atuação crescente em direção
aos problemas gerados pelo ressentimento compreensível de que foi permitida
à comunidade científica uma autonomia de voo exacerbada, em que os cidadãos
tiveram pouca ou nenhuma influência, está proporcionando discussões mais abertas,
mais críticas e mais conscientes.
Este procedimento poderá realmente contribuir para um desenvolvimento
científico-tecnológico imbricado ao desenvolvimento de toda a sociedade. como
um importante começo nesta mudança de cultura, ainda fortemente presente
em nossa civilização, precisamos, de certa maneira, no ensino tecnológico,
além da adoção de uma nova abordagem epistemológica, levar em considera-
ção outros aspectos fundamentais.
Para isso, a educação nas escolas não pode ser apenas em ‘equipar’ os estu-
dantes com conhecimento e habilidades para que eles ‘consigam’ empregos na
sua vida de adulto. Ela precisa muito mais: precisa tornar os jovens criativos e
críticos em relação às realizações da ciência e da tecnologia que, em inúmeras
situações, eles próprios ajudaram a criar; precisa ajudá-los a pensar com respeito
às aspirações de seus colegas e de todos os cidadãos; precisa torná-los cuidadosos
com a sua saúde — hoje fortemente dependente de muitos resultados tecnológicos — e,
acima de tudo, precisa levá-los a pensar, num processo coletivo, nos resultados e
consequências dos artefatos científico-tecnológicos.
A educação aponta na direção do pensamento crítico da riqueza dos valores
culturais e das dimensões morais e espirituais da vida. Ela precisa ser levada a todos
os jovens, com estes pressupostos, independentemente de sua bagagem de conheci-
mento, sexo, credo, raça ou cor. Temos que entender que a educação como um pro-
cesso que envolve conhecimento, e, portanto, é necessário conhecer o conhecimento.
Importante destacar o enfoque social da educação e do conhecimento, isto é,
a educação é um processo de construção social do conhecimento, forma atitudes,
vincula valores e atitudes. O desenvolvimento social é um processo que afirma a
33
independência nacional, assegura um crescimento econômico sustentado preserva
o meio ambiente e assegura a participação democrática do povo como principal
ator e benefício desse processo.
Observando o contexto educacional, percebemos que o processo de ensino
e aprendizagem deve acompanhar as transformações sociais. Nesse sentido, os
educadores necessitam também aprender e ensinar com esses novos recursos e
metodologias. Salientamos o uso da informática no ambiente escolar, uma vez que
muitas rotinas sociais já estão sendo contempladas com essa tecnologia.
Dessa forma, reiteramos a importância dos conteúdos matemáticos para a
utilização de planilhas, principalmente o conceito de função. Utilizando planilha
de cálculos, os estudantes podem construir e explorar diversos conceitos mate-
máticos através de suas macros instruções, tendo o resultado em tempo real. Esse
processo leva-o a pensar matematicamente, experimentando, testando hipóteses,
criando estratégias para resolver os problemas propostos. (BRASIL, 2006, p. 88)
Com uma sociedade da informação e da comunicação, o estudante sente a
necessidade de estar incluso nesse ambiente. Portanto, trabalhar com as tecnologias
digitais no ambiente escolar possibilita o acesso a esse mundo de maneira eficiente
e eficaz, pois, nessa interação os sujeitos desenvolvem novas habilidades e compe-
tências e participam do processo de ensino e aprendizagem. (GONÇALVES, 2014)
Ao se abordar a tecnologia da informação, é comum que acadêmicos
e mesmo profissionais de mercado, tenham o costume de se referir
a sistemas como dotados de inteligência, sejam eles informatizados
(como é o caso de alguns softwares) ou não. Este é um equívoco
comum, visto que sistemas computacionais se baseiam em lógica, ou
seja, cálculos matemáticos que conferem testes baseados em proba-
bilidades que advém de equações, algoritmos e expressões aritméticas
que, por mais complexas que possam parecer apenas simulam aquilo
que se conhece por inteligência. (MEDEIROS e GONÇALVES,
2018, p. 51)
Para este estudo em particular, os autores focam este recorte de seus estu-
dos em operações matemáticas envolvendo frações com parêntese, para tanto,
inicialmente é preciso rememorar que de acordo com as propriedades resolutivas,
a adoção dos parênteses como elementos ordenadores da sequência de prioridade
na execução matemática de quaisquer operações.
Na aritmética quando dividimos um número por zero, não existe um resul-
tado. Por exemplo quando dividimos 4 por zero (4/0) não existe um valor para
34
esta operação. Se fizermos 7/ (3 – 2 – 1), pelas propriedades resolvemos os valores
que estão entre parênteses e depois dividimos, o que também resulta 7/0, não
existindo valor. Se fizermos com valores decimais 6/ (0,9 – 0,8 – 0,1), a regra
de resolução é a mesma, primeiro resolvemos os parênteses depois a divisão, o
resultado também não existirão.
Porém, quando aplicamos na planilha eletrônica a resolução aritmética 4/
(0,9 – 0,8 – 0,1), a planilha consegue apresentar resultados para aquilo que as
regras aritméticas não permitem.
Na figura abaixo buscamos alterar os valores, para verificar se havia um
padrão na planilha, no entanto, o que nos chamou atenção é que a própria planilha
traz resultados contraditórios.
Fonte: Os autores
CONSIDERAÇÕES
REFERÊNCIAS
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cumprimento do estágio pós doutoral)
36
A IMPORTÂNCIA DA QUÍMICA DE COORDENAÇÃO
E SEU CONHECIMENTO NA FORMAÇÃO
UNIVERSITÁRIA DE PROFISSIONAIS DA QUÍMICA
INTRODUÇÃO
Nunca será tão simples falar sobre ensino e exemplificá-lo. Se for feita uma
pesquisa, um simples significado até uma concepção complexa e destrinchada de
diversos pensadores, haverá inúmeras respostas. E isso não é diferente dentro dos
Cursos Superiores de Química. As Concepções do processo ensino-aprendizagem
remetem para os significados pessoais e gerais em torno do processo ensino-
-aprendizagem, ou seja, interpretações do ensino e do ensinar, da competência e
desempenho dos professores, da sua eficácia, da satisfação nas atividades docentes,
do melhor método, da aprendizagem, das funções do professor e do aluno e das
dificuldades percepcionadas nas atividades docentes (FIGUEIRA, 2008).
Na teoria da construção do pensamento e da linguagem contido na obra
“A formação social da mente” (COLE et al., 1991) explicita que o aluno tem
uma maior evolução quando ocorre um desafio sobre o conhecimento atual
do aluno. Contudo há necessidades da utilização de contextos que venham a
ajudar e mediar o ensino. Algo a se ter bastante cuidado, atenção e prática é o
modo de transmitir o conhecimento.
[...] Mas transmitir deliberadamente novos conceitos e novas formas
ao aluno é, estou convencido, tão impossível e inútil quanto ensinar
uma criança a andar segundo as leis do equilíbrio. Qualquer tentativa
dessa espécie apenas desvia o aluno do objetivo proposto (TOLSTÓI,
1903, p. 146).
9
Doutorando em Biotecnologia (UECE). CV: http://lattes.cnpq.br/3502481342419035
10
Doutoranda em Biotecnologia (UECE). CV: http://lattes.cnpq.br/4441669217228037
11
Graduanda em Química (UECE). CV: http://lattes.cnpq.br/5368892491757183
12
Pós-doutorando em Química (UECE). CV: http://lattes.cnpq.br/0983778965244237
13
Doutora em Química (UECE). CV: http://lattes.cnpq.br/9351322395472113
37
E nada do que foi mencionado seria diferente no Ensino da Química, seja
na educação básica ou na educação superior, onde é comum encontrar diver-
sas metodologias que venham a auxiliar o processo de ensino e aprendizagem.
Quando se trata de ensino superior, a Química pode trazer algumas adversidades
e problemáticas, tais como a dificuldade dos alunos recém ingressados se adap-
tarem ao novo mundo de uma universidade, a sua rotina de estudos e exigências
cientificas, atrapalhando assim, o rendimento do estudante e levando até a desis-
tência do curso superior e uma grande evasão (MATTA; LEBRÃO; HELENO,
2017; MONTEIRO; SOARES, 2017).
As aulas práticas experimentais vêm se mostrando de grande importância
para o desenvolvimento e no processo de ensino/aprendizado de grande relevân-
cia. Silva e Egas (2022) demonstraram que 66% dos alunos demonstraram uma
melhora significativa do aprendizado em Química após realização de aulas práticas
“Uma vez que, tais atividades estimulam suas curiosidades e interesse, permitindo
a criação de conexões entre teoria, prática e fatos da vida cotidiana”. Contudo,
não basta apenas colocar o conteúdo prático e esperar que os alunos executem de
forma robotizada e mecânica, sem entender o fundamento ou o porquê daquilo.
O estudo da Química de Coordenação abordada nas universidades dentro
das disciplinas de Química Inorgânica, objetiva contemplar ao profissional da
Química uma formação aprofundada desta classe, compostos de coordenação,
bastante abrangente, sólida e interdisciplinar, relatando sua importância em diversas
áreas, tais como biológica, bioinorgânica, farmacológica, na medicina, na fabricação
de materiais e de tantas outras áreas exploradas nos últimos anos (SILVA et al.,
2018; SILVA FILHO et al., 2019; NASCIMENTO et al., 2019).
Os conteúdos da área da Química Inorgânica possuem a inclusão nos
currículos institucionais, de temas que propiciem reflexão sobre Ciência e Tec-
nologia. Assim, vem transformando sua concepção de práticas laboratoriais em
uma perspectiva construtiva sobre os aspectos que envolvem a formação e a pro-
fissão docente e profissional, promovendo a articulação entre a teoria e prática. A
Química Inorgânica é conhecida como o ramo da Química que estuda todos os
compostos que não possui o elemento carbono, no entanto, a Química Inorgânica
é um estudo bem mais amplo e complexo (SANTOS et al., 2014).
Os compostos de coordenação (ou complexos inorgânicos) estão presentes
na maioria dos processos químicos que envolvem espécies inorgânicas em tempe-
raturas não muito elevadas. Assim é que em fenômenos vitais como a respiração e a
38
fotossíntese (entre outros), em processos industriais importantes no cotidiano e em
um número incalculável de experimentos de laboratórios, sempre estão envolvidos
processos ou produtos relacionados à Química de Coordenação (FARIAS, 2005).
A Química de Coordenação vem trazendo grandes estudos e benefícios para
a sociedade, principalmente dentro da busca de novos fármacos. Pinheiro et al.
(2021) relata complexos inorgânicos como promissores fármacos para a Doença
de Alzheimer, uma doença neurodegenerativa crônica. Machado el al. (2021)
aborda metalofármacos a base de cobre como uma promissora terapia antitumoral
e Silva et al. (2021) apresenta complexos de rutênio, potencialidade como fárma-
cos. Muitos se tem pesquisado sobre os compostos de coordenação, pois tem-se
observado que tais complexos formam organometálicos termodinamicamente e
cineticamente estáveis, que demonstram uma alta eficiência.
Experimentos realizados pelos próprios alunos dentro das aulas de Quí-
mica Inorgânica trazem uma motivação e resgata seu conhecimento adquirido
nas aulas teóricas, proporcionando-os a buscar suas interpretações de conceitos
para aplicá-los a fim de que haja um elo entre conhecimento do cotidiano com
o científico. Nesse sentido, no ensino por investigação, os alunos são colocados
em situação de realizar pequenas pesquisas, combinando simultaneamente con-
teúdos conceituais, procedimentais e atitudinais (BALDAQUIM et al., 2018).
Dessa forma, a proposta de realizar reações que envolvam complexos inorgânicos
se mostra promissora, pois envolve mudanças de cores e reações de precipitação.
Neste capítulo será apresentado uma reação muito comum dentro da Química
Inorgânica, a formação do sulfato de tetraminocobre (II) monoidratado, e que
vem demonstrando muito interesse nos alunos, por ser colorido, formação de
precipitado e mudança de cores.
A reação do sulfato de tetraminocobre (II) monoidratado, de fórmula
[Cu(NH3)4]SO4, é um sal formado pelo íon complexo [Cu(NH3)4]2+ e pelo ânion
SO42-. Este composto é usado em estamparia têxtil e como fungicida. Os sais com-
plexos são caracterizados pelas suas cores fortes, essas mesmas cores, dependem
de alguns fatores, tais como: do número de elétrons presentes nos orbitais d do
íon metálico central, do arranjo dos ligantes em volta do íon central (geometria
do complexo), pois isso afeta a separação dos orbitais, da natureza do ligante, uma
vez que diferentes ligantes têm diferentes efeitos nas energias relativas dos orbitais
e, das transições entre orbitais (LEE, 1999).
39
DESENVOLVIMENTO
40
excesso de NaOH (reação 02), Figura 01(A). Aqueceu-se cuidadosamente o tubo
de ensaio até perceber o escurecimento do precipitado (reação 03), Figura 01(B).
Figura 01 – Ilustração das reações 02 (A) e 03 (B), com seus respectivos precipitados.
41
Ao adicionar 2 mL de uma solução de NH4OH à uma solução de CuSO4.5H2O
ocorreu uma reação com formação de precipitado de cor azul. Pela reação, perce-
be-se a reatividade do ligante NH3 frente ao íon Cu2+. Com isso, foi explorado os
efeitos tais como geometria da molécula, estados de oxidação, absorção no espec-
tro eletromagnético relacionando a cor observada com comprimentos de ondas,
consequentemente relacionando à energia da absorção. Por fim, a adição de álcool
etílico pode-se perceber a cristalização do precipitado, onde nesta etapa pode-se
explorar questões tais como cristalização e reações envolvendo precipitados, assim
como, cinética e equilíbrio na reação de complexação. A Figura 02(C) ilustra as
soluções iniciais de CuSO4.5H2O e a Figura 02(D) ilustram após as reações 01 e 03.
CONSIDERAÇÕES
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TOLSTÓI, L. N. Artigos sobre pedagogia (Pedagoguítcheskiestât"i), Ed. Kuchnereva i K°, 1903.
44
METODOLOGIAS ATIVAS: POTENCIALIDADES
NO CONTEXTO DA PRÁTICA EDUCATIVA NA
EDUCAÇÃO BÁSICA
INTRODUÇÃO
14
Mestra em Educação (UFAL). CV: http://lattes.cnpq.br/2788334074013242
15
Mestra em Ensino de Ciências e Matemática (UFAL). CV: http://lattes.cnpq.br/8395264805003654
45
A noção de Aprendizagem Ativa refere-se a um conjunto de práticas pedagó-
gicas que consideram o estudante como protagonista do próprio processo de cons-
trução do conhecimento, que se desenvolve de modo mais autônomo, participativo,
colaborativo e ativo. Essa abordagem, podem seguir diferentes linhas de pensamento
e de prática. Para Guaraldo e Brito (2017, p. 25), as “metodologias ativas podem
proporcionar autonomia, formação crítica, capacidade de fazer projetos, solucionar
problemas, organizar, planejar, repensar a próxima etapa a ser pesquisada e resolvida”.
Este capítulo tem como objetivo descrever algumas metodologias ativas e como estas
podem ser trabalhadas em sala de aula integrada as Tecnologias Digitais da Informação
e Comunicação (TDIC). Apresentaremos também uma sequência de quatro atividades
avaliativas utilizando as metodologias ativas: gamificação, seminários/discursões, Estudos
e atividades em grupo, com uso de Aplicativo e plataforma da web nas aulas de História.
REFERENCIAL TEÓRICO
METODOLOGIA
RESULTADOS E DISCUSSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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54
ESTRANHANDO CONCEPÇÕES SOBRE CORPO E
PRÁTICAS SEXUAIS NA EDUCAÇÃO BÁSICA
INTRODUÇÃO
Para Louro (2001), o termo queer significa estranho, excêntrico, raro, extraor-
dinário, sendo também utilizada como uma expressão pejorativa para se referir às
pessoas homossexuais. Como forma de ressignificar o sentido histórico atribuído
a esse léxico, a pesquisadora destaca que o termo é assumido por grupos LGBT-
QIA+ como forma de caracterizar sua perspectiva de oposição e de contestação,
com a ideia de que ser queer é se colocar contra a normalização, ou seja, aquilo
que é tido como naturalizado e legitimado socialmente.
Em suas pesquisas sobre os estudos queer, Miskolci (2012, p. 26) ressalta que essas
teorias buscam dar visibilidade às injustiças e violências implicadas na disseminação e
na demanda do cumprimento das normas e das conversões culturais, tanto na criação
dos “normais” quanto dos “anormais””. O autor (2012) afirma que essas práticas opres-
soras contra LGBTQIA+ são baseadas em convenções de gênero e sexualidade que
permitem e, em muitos casos, exigem que indivíduos sejam insultados cotidianamente
como esquisitos/as, “bichas”, “sapatões”, “boiolas”, entre outros termos pejorativos.
Ao contrário de Louro (1997; 2000; 2004; 2008) e Miskolci (2012), alguns/mas
pesquisadores/as brasileiros/as optam pela tradução do termo queer no sentido de “transvia-
do(s)”, como a professora Berenice Bento (2008; 2009). A autora justifica essa opção pela
inexistência em língua portuguesa de uma tradução clara para queer. Desta forma, o termo
“transviado” é considerado uma tradução cultural idiossincrática, trazendo a ideia do ser
queer ao vocabulário da língua portuguesa no Brasil. O uso da palavra “viado” justifica-se
por ser um dos xingamentos mais utilizados em nosso país para se referir a homossexuais
masculinos. Para abarcar os/as transgêneros, o “trans” também compõe o termo.
Nesta pesquisa, especificamente, o termo utilizado será queer, pois, assim
como ressalta Daniela Andrade (2015), pesquisadora trans, observa-se que a palavra
“transviado” não contém toda a carga semântica de problematização que traz o termo
queer, nem abrange toda a comunidade LGBTQIA+. Ativista que desenvolve há
anos um importante trabalho militante dos direitos da população trans por meio do
seu perfil no Facebook e do seu blog, Daniela Andrade (2015) destaca que o termo
“transviado” não contempla as pessoas trans, pois supõe uma mistura conceitual de
identidade de gênero e orientação sexual. A pesquisadora pontua que a distinção dessa
junção de características identitárias é uma luta histórica de travestis e pessoas trans.
56
Historicamente, os ideais dos estudos queer surgiram a partir das reflexões
e as críticas surgidas no movimento do feminismo lésbico e da liberação gay.
Nessa conjuntura, a política da identidade passou a ser criticada por pesquisa-
dores/as porque ela não contemplava os sujeitos que não se enquadravam no
pretenso modelo identitário hegemônico de homossexualidade, como as drag
queens, sadomasoquistas e travestis (FURLANI, 2009). Desta forma, os estudos
queer surgem questionando uma suposta “identidade homossexual”, visto que as
pessoas LGBTQIA+ que não a possuíam eram vítimas de preconceito e exclusão
dentro do próprio movimento. Um dos acontecimentos que contribuíram para
mostrar a fragilidade dessa excludente política de identidade construída até então
foi a epidemia do HIV, no início da década de 80. Furlani (2009) destaca que,
se por um lado, a discriminação e a violência aos gays aumentavam, por outro
eram criadas redes de solidariedade a partir de uma nova identidade baseada no
compartilhamento dos efeitos decorrentes da Aids.
Nessa perspectiva, com os discursos se dirigindo menos às identidades e se con-
centrando nas práticas sexuais (LOURO, 2001), o queer rejeita o essencialismo sobre a
identidade sexual e busca “provocar outro modo de conhecer e de pensar”, objetivando
se tornar “uma política de conhecimento cultural” (LOURO, 2004, p. 60). Assim, a
premissa básica queer — rejeitar qualquer forma de normatividade — pode englobar
não apenas gênero e sexualidade, mas também as questões raciais, étnicas, coloniais,
etc. Como pontuado por Furlani (2009), o queer é uma atitude intelectual, investigativa
e crítica, o qual recursa um sistema normativo que pode gerar dor e discriminação.
A partir desses pressupostos, observa-se que a escola é um dos principais
ambientes para ocorrer as ações queer de estranhar, desconfiar e desconstruir aquilo
que é tido como norma, visto que o ambiente escolar contribui de forma fulcral para
o processo de construção de nossas identidades. Em relação a isso, Louro (2001)
enfatiza que o ideal queer no processo educativo nasce do movimento de colocar em
situação embaraçosa o que há de estável no corpo de conhecimentos repassados aos/
às alunos/as, enfrentando as condições em que se dá o conhecimento. Entretanto, o
pensar queer não dará respostas prontas ao embate de questionar o que é ensinado,
mas apontará caminhos para que o/a estudante comece a repensar o modo como
ele/a recebe/assimila as informações. Deste modo, busca-se superar a ideia de que
na educação ocorre a transmissão do conhecimento, tirando assim a compreensão
de que o/a docente é o/a único/a detentor/a do conhecimento (FURLANI, 2009).
É importante frisar que, segundo Furlani (2009), uma postura pedagógica
queer é rigorosamente contra qualquer forma de normatização da sexualidade.
57
Isso ocorre desde as séries iniciais — em que brincadeiras que exigem mais do
corpo são tidas como masculinas e as mais delicadas como femininas — até em
turmas mais avançadas, em que discursos misóginos e LGBTQIA+fóbicos são
legitimados e contribuem para ações de violência e opressão. Além disso, o processo
de tornar queer o ensino é constante, visto que o pensamento normativo permeia
as práticas sociais escolares. A cada novo planejamento de aula, é preciso ocorrer
o questionamento “das redes de poder e os interesses que definem as representa-
ções negativas, inferiores e propositadamente excluídas dos currículos acerca dos
gêneros, das sexualidades, das relações étnico-raciais” (FURLANI, 2011, p. 37).
A pesquisadora Britzman (1995) elenca uma série de reflexos que as peda-
gogias queer podem provocar, como: a redefinição do conceito de família, descons-
truindo a concepção tradicional de família nuclear formada por pai, mãe e filhos/
as; um novo pensar sobre as representações de afeto, estranhando o pensamento
social de que apenas casais heterossexuais podem demonstrar carinho publicamente;
a problematização dos crimes contra a mulher e LGBTQIA+, em que culpam a
vítima pela violência cometida, entre outros. Para que isso ocorra, Louro (1997)
sugere que seja realizado um processo de estranhar o currículo. Como forma de
exemplificar essa prática pedagógica, na próxima seção, serão apresentadas suges-
tões de como trabalhar questões relacionadas às práticas sexuais em sala de aula.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Nota: este capítulo é um recorte revisado e atualizado da tese de doutorado “Políticas educacionais para
gênero e sexualidade em Mato Grosso: um estudo crítico do discurso”, de Márcio Evaristo Beltrão (2019).
62
A UNIVERSALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO DIGITAL
COMO INSTRUMENTO FUNDAMENTAL À REDUÇÃO
DAS DESIGUALDADES SOCIAIS: A NECESSIDADE
ESTATAL DE INVESTIMENTO EM INOVAÇÃO E
TECNOLOGIA NO CONTEXTO PÓS-PANDÊMICO
Melissa Trento20
Rodrigo Carvalho Polli21
INTRODUÇÃO
20
Mestranda em Direito Econômico e Desenvolvimento (PUC-PR). Auditora de controle externo (TCE-PR).
CV: http://lattes.cnpq.br/9706923655134442
21
Mestrando em Direito Econômico e Desenvolvimento (PUC-PR). Advogado. CV: http://lattes.cnpq.br/6839777019402571
63
Assim, o objetivo do presente capítulo é analisar o contexto educacional
digital pós-pandêmico e avaliar a capacidade do Estado de implementação
de uma estrutura logística digital por meio de inovação tecnológica para
a efetiva promoção da igualdade material, mediante o fornecimento de
serviços educacionais no país.
Para tanto, estabelecer-se-á o paralelo entre a compreensão da constru-
ção teórica da igualdade de posições, concepção de justiça social que preconiza
a redução das distâncias sociais com o intuito de embasar políticas públicas
universalizantes, integrais e otimizadas no sentido de promover investimentos
efetivos em tecnologia e conectividade para a educação de todos no Brasil.
DESENVOLVIMENTO
22
Art. 205 CF - “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho”.
23
CASTANHA, Daniel. Direito fundamental à educação no brasil e o acesso gratuito à educação básica obrigatória incluindo
o ensino médio: a consagração da igualdade de posições à luz do desenvolvimento. In: Direitos Fundamentais, Tecnologia
e Educação. Organização Ana Cláudia Santana, Emerson Gabardo, Annappa Nagarathna, Curitiba: Íthala, 2019, p. 32.
24
MALISKA, Marcos Augusto. O direito à educação e a Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2001. p. 157.
64
rico. Da mesma forma, o seu não oferecimento, ou sua oferta irregular, importa
na responsabilização da autoridade competente25.
Assim, devido à suspensão das atividades escolares presenciais por conta da
pandemia, o uso de ferramentas de tecnologia tornou-se essencial, indispensável
e emergencial para o prosseguimento da educação obrigatória, sob pena de grave
e talvez irreparáveis danos e prejuízos na aprendizagem de milhares de crianças
e adolescentes decorrentes da crise sanitária instalada no país.
Segundo Daniel Castanha, a missão precípua do direito à educação é fomen-
tar uma construção coletiva, consciente e livre, com poder de influência e decisão,
capaz de reafirmar continuamente o Estado democrático de direito.26
Aplicável ao contexto pandêmico em que vivenciamos, o art. 206, inciso I,
da Constituição da República estabelece como princípio a “igualdade de condições
para o acesso e permanência na escola”, o que reclama a garantia de meios concretos
para a acessibilidade dos alunos, inclusive a oferta dos instrumentos tecnológicos
necessários para o acompanhamento das aulas remotas por aqueles que não dis-
ponham de recursos para adquiri-los.
Nas lições de Emerson Gabardo, o modelo do Estado Social e Democrá-
tico de Direito, presente no sistema constitucional pátrio, impinge aos Poderes
Públicos “o dever de garantir aos cidadãos não somente condições mínimas de
existência digna, mas também condições suficientes para que cada pessoa possa
desenvolver livremente a sua personalidade Esse objetivo pressupõe uma série de
condutas estatais positivas ou negativas para a satisfação dos direitos fundamentais
sociais prescritos na Carta Magna”27.
A satisfação do conteúdo integral dos direitos sociais pressupõe mais do que
o atendimento ao mínimo existencial. E à Administração compete adotar todas as
medidas possíveis para que a dignidade do cidadão não seja promovida apenas em
um grau mínimo, mas sim em um grau máximo. Importante observação seguindo
a mesma linha de raciocínio de Ana Paula de Barcellos, cuja reflexão conclui que
o mínimo existencial não se resume ao mínimo para se viver, mas visa também
assegurar um mínimo de inserção social.28
25
HACHEM, Daniel Wunder; KALIL, Gilberto Alexandre de Abreu. O direito fundamental social à educação e sua
maximização por meio da função extrafiscal dos tributos: o exemplo do Programa Universidade para Todos (Prouni).
A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, a. 16, n. 66, p. 153-177, out./dez. 2016.
26
CASTANHA, Daniel. Direito fundamental à educação..., p. 35.
27
GABARDO, Emerson. Interesse público e subsidiariedade: o Estado e a sociedade civil para além do bem e do mal. Belo
Horizonte: Fórum, 2009. p. 331.
28
BARCELLOS, Ana Paula de. A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais. Rio de Janeiro, Renovar, 2008, p. 396.
65
No mesmo sentido é o entendimento dos autores Alexandre Godoy Dotta e
Rodrigo Maciel Cabral, ao lecionarem que a provisão de um direito fundamental não
pode significar qualquer provisão, mas sim uma provisão de natureza satisfativa, a
fim de alcançar as finalidades propostas pela Lei de Diretrizes e Bases. Veja-se, por
exemplo, as políticas públicas voltadas à avaliação da qualidade no ensino superior29.
Nesse sentido, impõe-se à Administração Pública uma atuação maximizada,
universalizada e inclusiva que possibilite aos seus titulares a fruição de seus direitos
de maneira real e efetiva, ainda que sob adversidades decorrentes de crises sanitárias
pandêmicas, como exemplo a imposta pelo vírus COVID-19.
Levando em conta a interpretação sistêmica e relevando-se a atuação otimi-
zada e progressista da Administração Pública é que se pode afirmar que a garantia
do mínimo existencial representa apenas o ponto inicial do agir estatal. Ademais,
o dever do Estado de “atendimento ao educando, em todas as etapas da educação
básica, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, trans-
porte, alimentação e assistência à saúde” (art. 208, VII, da Constituição da Repú-
blica), representa mandamento não exaustivo, o que implica no dever de abranger
e considerar todas as medidas de assistência que sejam necessárias à garantia da
manutenção dos estudantes na escola e de viabilizar formatos contemporâneos
e adequados à realidade que se apresenta, exigindo interpretação atualizada, em
razão das circunstâncias excepcionais.
A universalização da educação no Brasil vem sendo construída lentamente e
ainda sem resultados práticos evidenciados. A igualdade material não foi concre-
tizada. A pandemia agravou ainda mais o cenário de desigualdade social, criando
a dicotomia entre os estudantes com recursos financeiros capazes de permanecer
conectados e dar continuidade às aulas em formato digital em contraposição com
os alunos completamente vulneráveis e à mercê da iniciativa pública para ter-lhes
assegurado o simples acesso à educação durante o período de isolamento social.
A proteção do direito fundamental à educação possui dimensões multifacetárias,
o que compreende o objetivo de desenvolvimento da sociedade, razão pela qual
se reputa pertinente analisar tal direito sob o enfoque de importantes concepções
de justiça social que se fundam na igualdade, a fim de ressaltar qual delas possui
melhores características capazes de, factualmente, minimizar as realidades desiguais
existentes na estrutura social brasileira.
29
CABRAL, Rodrigo Maciel; DOTTA, Alexandre Godoy. Mínimo existencial na hermenêutica da jurisprudência brasileira
referente às políticas públicas relativas ao direito à educação. RECHTD. Revista de estudos constitucionais, hermenêutica e
teoria do direito, v. 10, p. 147, 2018. http://dx.doi.org/10.4013/rechtd.2018.102.05
66
Consistentemente no dever de dispensar tratamento equânime às pessoas,
a igualdade material30 pode ser concretizada por meio de diversas políticas públi-
cas, dentre elas, a garantia de acesso à educação em sua maior amplitude, tal qual
prevista no artigo 208, l e ll, da Constituição Federal. Todavia, a densificação dos
preceitos fundamentais que embasam a educação exige diretrizes públicas lastrea-
das em diferentes concepções de justiça social. Os modelos a seguir delineiam as
noções sobre a igualdade de posições e a igualdade de oportunidades propostas pelo
sociólogo francês François Dubet.
As duas concepções têm por finalidade precípua atenuar as disparidades
que sobrepujam entre a abstração da previsão constitucional de igualdade entre os
indivíduos e a realidade que, lamentavelmente, denota o cenário de desigualdade
social no Brasil. Em qualquer das hipóteses, a ideia é “reduzir certas desigualdades
a fim de torná-las, se não justas, ao menos aceitáveis”.31
Embora as duas formulações possuam propósito legítimo e não sejam exclu-
dentes entre si, elas contribuem para a mobilização das classes sociais de formas diver-
sas, pois atingem grupos de interesse situados em posições diversas no tecido social.32
Diante disso, convém destacar as suas peculiaridades para estabelecer apli-
cação prioritária de uma das concepções que apresenta o melhor potencial de
direcionar a implementação da política pública adequada a garantir a igualdade
efetiva no fornecimento da educação digital.
A igualdade de posições considera que a sociedade está distribuída em variadas
e distintas posições sociais. Uma espécie de “rede”, em que cada indivíduo ocupa
um ponto específico e, juntos, formam toda a estrutura social. As medidas políticas
que possuem respaldo na igualdade de posições focam nas condições de vida de
cada pessoa (v.g alimentação, moradia, vestuário, transporte), ao acesso a todos
os tipos de serviços públicos - neste ensaio particularmente se limitará à educa-
ção – dentre outras questões sociais com o intuito de, reduzindo as disparidades
entre as pessoas, promover a justiça social.33 Pode-se afirmar, portanto, que com
políticas públicas embasadas na igualdade de posições mostra-se a possibilidade
de estreitamento das diferenças entre o plano abstrato da igualdade positivada e
30
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 9.
31
DUBET, François. Status e oportunidades: como repensar a justiça social. Vargem Grande Paulista: Cidade Nova, 2015.
p. 11. 30 Ibidem, p. 14-15.
32
Ibidem, p. 14-15.
33
CASTANHA, Daniel. Direito fundamental à educação..., p. 37.
67
as situações fáticas do plano concreto, tal qual preceitua um verdadeiro Estado
de bem-estar social e quiçá a promoção da felicidade, para além da liberdade.34
Assim, pode-se concluir que a implementação da igualdade de posições
possui um efeito universalizante, pois, é possível deduzir que serviços públicos
de grande relevância como saúde, transporte público e, notadamente, a educação,
estariam ao alcance de uma gama de cidadãos em maior escala, visto que amplia-
ria os benefícios a um número mais elevado de pessoas, proporcionando o gozo
e usufruto de determinados serviços públicos aos quais tais pessoas não estavam
contempladas. Logo, na visão de François Dubet, é dever dos entes federativos
responsabilizarem-se pela construção e funcionamento adequado e gratuito dos
espaços públicos – escolas, bibliotecas, centros culturais, hospitais, terminais
rodoviários etc., para que todos possam deles se beneficiar.35
O segundo modelo a ser compreendido é o da igualdade de oportunidades.
Tal concepção parte da premissa de que os poderes constituídos têm o dever de
disponibilizar a todos a possibilidade de preencher as melhores posições disponí-
veis, com base em um princípio meritocrático.36 Com base nesse modelo, não há
preocupação em relação à redução das desigualdades que precedem as diferentes
posições sociais ocupadas pelos indivíduos em determinado contexto ou situação,
mas sim com o combate a discriminações injustas. A igualdade de oportunidades
apregoa que todas as posições dispostas na estrutura social devem estar abertas
indistintamente. As desigualdades sociais seriam aceitas, já que a concepção de
justiça em questão desconsidera as origens dos indivíduos, ao passo que valoriza a
competição decorrente do mérito de cada um. Segundo Daniel Castanha, o desen-
volvimento dessa formulação de justiça social é fictício, porquanto desconsidera
o fato de que as pessoas de diferentes estratos sociais ocupam posições desiguais
em razão de suas heranças econômicas e culturais37.
A promoção da igualdade de oportunidades visa garantir acesso indis-
criminado a bens e serviços em que os menos favorecidos estariam normal-
mente excluídos. Assim, por meio de políticas públicas, os mais vulneráveis
são integrados às possibilidades de escolha, assegurando-lhes o acesso
equânime aos serviços públicos da mesma maneira que outros cidadãos. 38
34
GABARDO, Emerson. A felicidade como fundamento teórico do desenvolvimento em um Estado Social. Revista
Digital de Direito Administrativo, v. 5, n. 1, p. 99-141, jan./jun. 2018.
35
DUBET, François. Op. cit., p. 24-25.
36
Ibidem, p.27.
37
CASTANHA, Daniel. Direito fundamental à educação..., p. 40.
38
HACHEM, Daniel Wunder. Tutela..., p. 108.
68
Portanto, a concepção de justiça social baseada na igualdade de oportu-
nidades pode ser sintetizada a partir da eliminação das desigualdades no
começo da disputa, de forma que indivíduos permaneçam em equilíbrio
inicial, porém, aceita eventuais desigualdades resultantes do desempenho
dos indivíduos, já que derivados da meritocracia.
Após rápida síntese dos modelos de justiça social propostos por
François Dubet, revela-se oportuno correlacioná-los para com o presente
capítulo, denotando que, em verdade, a política educacional brasileira e, em
especial, a educação digital possui correspondência axiológica imediata
para com a igualdade de posições. Muito embora, conforme relata a com-
pilação, ambos os modelos contenham medidas interessantes e louváveis,
ensejam ações estatais distintas.
A educação digital que se impõe hodiernamente requer a premissa iguali-
tária contida na igualdade de posições, pois é a que melhor reflete o ideal a que
se busca. Isso porque, as políticas educacionais que englobam a necessidade de
conectividade universalizada devem empenhar-se na efetivação da igualdade
material, transcendendo a impessoalidade de diplomas normativos insensíveis
para nivelar, de forma imediata, as realidades desiguais existentes na estrutura
social.39 Assim, o modelo de justiça social lastreado no primado da igualdade
material que melhor se coaduna com o propósito constitucional da educação é
o da igualdade de posições, devendo, pois, servir de alicerce às políticas públicas
educacionais digitais no Brasil ao propósito final de garantir, no maior espectro
possível, o desenvolvimento social, cultural e econômico.
Sabe-se que o cumprimento da dimensão objetiva dos direitos fundamen-
tais impõe à Administração Pública, agindo sponte propria, que estabeleça os
meios necessários a conferir aos cidadãos ampla acessibilidade aos bens jurídicos
de natureza jusfundamental40, em especial e ao que atina ao presente ensaio, o
direito à educação. Nas lições de Fabrício Motta, uma política pública não pode
desconsiderar a multiplicidade de fatores que permeiam a matéria. Não levar em
consideração a existência de desigualdades sociais e estruturais pode consistir em
um fator determinante no insucesso da política pública educacional”.41
39
CASTANHA, Daniel. Direito fundamental à educação..., p. 44.
40
HACHEM, Daniel Wunder. Tutela..., p. 519.
41
MOTTA, Fabrício; BUÍSSA, Leonardo; BARBOSA, Maísa. O financiamento da educação no Brasil como instrumento
de aprofundamento da desigualdade social. A&C – Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte,
ano 18, n. 73, p. 97-114, jul./set. 2018.p. 110.
69
A acessibilidade ao serviço público da educação em tempos atuais requer
do Estado a reinvenção e remodelagem do formato tradicional praticado na rede
pública de ensino. Se as desigualdades já eram evidentes e abissais antes do período
de pandemia, durante o seu transcurso e após tal colapso sanitário, as disparidades
serão ainda mais explícitas. As políticas públicas de cunho social devem ter, por
premissa, a busca pela equidade. É inconcebível a adoção de medidas de ordem
geral sem que se considere a vulnerabilidade de uma significativa parcela da popu-
lação. “Em uma sociedade estruturalmente desigual como a brasileira, o amplo
acesso ao ensino de qualidade é um dos pilares para se minimizar distorções”
(MOTTA, Fabrício, 2018, p. 110)42
O Brasil ocupa a lamentável posição de 156ª (entre 164 países avaliados) na
mensuração de distribuição de rendas entre a população, o que o coloca entre os
dez países mais desiguais do mundo, segundo o coeficiente de Gini43, figurando
na posição 84º do ranking do Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, sendo
a educação uma de suas principais variáveis.44
A tutela administrativa dos direitos fundamentais reclama que a Admi-
nistração formule e execute políticas públicas, orientadas a corrigir os problemas
sociais que impeçam indivíduos e setores específicos da sociedade de lograr acesso
igualitário aos bens jurídicos por eles protegidos. “Não basta que sejam prestados
os serviços públicos, impõe-se também a tomada de decisões políticas que corrijam
aquelas distorções sociais remanescentes”. (HACHEM, 2014, p. 520)45
É preciso reconhecer a indispensabilidade do fornecimento de tecnologia
em conectividade (v.g. computadores, notebooks e acesso à internet) enquanto
premissa básica para o desenvolvimento de personalidades para que, em última
análise, possam estas aprimorar a democracia por meio das decisões políticas,
além de promover o desenvolvimento econômico social tão almejado e pres-
crito no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4 (educação de qualidade
para todos) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas e no Plano
Nacional de Educação do Brasil.
Reconhecendo a importância do investimento na área educacional, com vistas
a garantir o atingimento de um patamar desejável de acesso ao ensino de qualidade,
42
Ibidem, op. cit. p. 110.
43
Disponível em https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101760.pdf acesso em 15/07/2021 e DISTRIBU-
TION of income or consumption. In: WORLD BANK. World development indicators. Washington, DC, [2020]. tab.
1.3. Disponível em: http://wdi.worldbank.org/table. Acesso em: jun. 2020.
44
Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade de 2020 disponível em http://hdr.undp.org/sites/default/
files/2020_statistical_annex_table_3.pdf acesso em: 15 jul. 21.
45
HACHEM, Daniel Wunder. Tutela administrativa efetiva..., p. 520.
70
o novo Fundeb – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica
tornou-se fonte de financiamento permanente com a Emenda Constitucional nº
108/20 e Lei nº 14.113/20, consignando que os aportes da União chegarão a 23%
do total dos Fundos até 2026. Assim, com mais recursos, surgem novas possibili-
dades aos gestores públicos para repensar o fornecimento da educação nos moldes
tradicionais. O modelo contemporâneo deve ser compatível com as necessidades
atuais e anseios prementes de uma sociedade justa, igualitária e globalizada.
Resta evidente que a tecnologia relacionada à educação digital se revela
como condição sine qua non para a fruição de certas prerrogativas garantidas
pelo Estado Democrático e Social do Direito – o adequado desenvolvimento das
capacidades dos estudantes, pleno exercício futuro da cidadania, livre escolha da
profissão, dentre tantos outros direitos fundamentais e objetivos da República.
Por isso, o direito à educação em sentido amplo deve deixar de ser considerado
mera promessa constitucional para alcançar lugar de destaque no sistema jurídico
e proporcionar efeitos práticos na sociedade.
Para delinear o cenário de imprescindibilidade da educação digital para a
emancipação da sociedade, convém destacar a recente publicação da Lei nº 14.172
de 10 de junho de 2021, que dispõe sobre a garantia de acesso à internet, com fins
educacionais, a professores e alunos da educação básica pública.
O importante avanço legislativo consignado na referida Lei estabelece o
repasse de 3,5 bilhões aos Estados para atender alunos da rede estadual e municipal.
Prescreve a lei que os recursos poderão ser investidos na contratação de internet
móvel, na aquisição de terminais portáteis (máximo de 50%), na contratação de
soluções de conexão na modalidade fixa para conexão de domicílios ou de comu-
nidades quando for comprovado custo-efetividade ou quando não houver oferta
de dados móveis na localidade de moradia dos estudantes.46
Tal marco legal tem o potencial de reduzir o amplo espectro das classes
sociais e por fim, minimizar os efeitos deletérios das desigualdades sociais exis-
tentes, convergindo, inclusive, com o que prevê a Política Nacional de Educação
e com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável preconizados pela ONU.
Segundo dados do IBGE e do Censo Escolar 2020 (INEP/MEC), a internet
banda larga não chegava a 17,2 mil escolas urbanas (20,5%) em 2020 (Censo Escolar
da Educação Básica). Ao fim de 2020, somente 2 a cada 10 cidades (22,5% das
redes municipais) terminaram o ano com plataformas educacionais em operação
46
Lei nº 14.172 de 10 de junho de 2021. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.172-de-10-de-
-junho-de-2021-325242900. Acesso em 18 jun. 2021.
71
(dados da Undime), o que denota indicativo de insuficiência de investimentos
para a garantia do acesso dos estudantes à educação básica obrigatória. Nas lições
de Élida Graziane Pinto “gastar formalmente o montante mínimo de recursos
vinculados, mas não assegurar o padrão de qualidade, é gastar mal (lesão aos prin-
cípios da finalidade e eficiência), além de configurar oferta irregular de ensino nos
moldes do art. 208, §2º combinado com o art. 206, VII, ambos da CR/1988”.47
A oferta de conectividade e inclusão digital nas escolas públicas é pauta
emergencial que não apenas viabilizará o ensino híbrido já praticado na rede
privada quanto auxiliará nas estratégias de enfrentamento ao abandono escolar
evidenciado durante a pandemia. Ademais, possibilitará o cumprimento do dever
expresso no art. 227, caput, da Constituição da República, pois confere absoluta
prioridade à educação para crianças, jovens e adolescentes (faixa etária que cor-
responde à educação básica obrigatória no país). A universalização do acesso à
rede mundial de computadores nas escolas possui previsão normativa na Lei
13.005/2014 (Plano Nacional de Educação) e na Lei 14.109/2020 (que alterou a
Lei do Fust), consignando metas específicas de conexão de escolas à internet de
alta velocidade até 2024. De acordo com a estratégia 7.15 do Plano Nacional de
Educação, tal transformação digital nas escolas deveria ter ocorrido até o ano de
2019, o que obviamente não se concretizou.
Ademais, o princípio da juridicidade que direciona todo o agir estatal impul-
siona a Administração Pública para redimensionar suas estratégias, inovar em tec-
nologia da informação e implantar medidas, bem como estruturar o serviço público
de educação de modo a visar “ao pleno desenvolvimento da personalidade humana”
e “capacitar todas as pessoas a participar efetivamente de uma sociedade livre”, con-
forme estatui o art. 13.1 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais, introduzido na ordem jurídica brasileira pelo Decreto nº 591/1992.
Assim, pode-se concluir que a inclusão digital se revela vital e de extrema
urgência na atualidade para a garantia mínima da igualdade de posições entre
os indivíduos que se encontram no sistema escolar, ao fito de ostentar condi-
ções efetivas de desenvolver-se singularmente, bem como o de impulsionar
o desenvolvimento da sociedade.
À título de ilustração, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domi-
cílios (Pnad) Covid-19, conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-
tística (IBGE), em outubro de 2020 um contingente de 5,5 milhões crianças e
47
PINTO, Élida Graziane. Financiamento dos Direitos à Saúde e à Educação. Belo Horizonte: Fórum, 2015. p. 26/27.
72
adolescentes com idades entre 6 e 17 anos não conseguiram ter acesso às atividades
escolares ao longo do ano letivo de 2019.
Tal cenário impõe à Administração Pública que assuma um perfil inclusivo
para efetivamente atenuar as assimetrias sociais, ainda mais escancaradas após a
pandemia do Covid-19. Por meio de ações planejadas, racionais e estruturadas
o Estado figura como o principal propulsor do desenvolvimento, por intermé-
dio da premente inclusão digital.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
BITENCOURT NETO, Eurico. O direito ao mínimo para uma existência digna. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
48
2010. p. 105.
73
desenvolvimento pessoal e interpessoal por meio das ações de educação. Portanto,
depreende-se que para conferir dignidade humana e tratamento igualitário a todos
os estudantes, por meio do desenvolvimento das capacidades intelectuais e morais,
é imprescindível a atuação universalizada, inclusiva e otimizada da Administração
Pública na aplicação de receitas e políticas públicas educacionais direcionadas ao
acesso à educação digital na rede pública de ensino no país.
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76
NEOLIBERALISMO E TEORIA DO CAPITAL
HUMANO: REFLEXÕES SOBRE AS POLÍTICAS
EDUCACIONAIS BRASILEIRAS NA DÉCADA DE 1990
INTRODUÇÃO
49
Doutora em Educação (UEM). CV: http://lattes.cnpq.br/9821201632314062
50
Doutorado em Educação (UEM). CV: http://lattes.cnpq.br/3057696425156430
77
Uma corrente de pensamento e uma ideologia, isto é, uma forma de
ver e julgar o mundo social; 2. um movimento intelectual organizado,
que realiza reuniões conferências e congressos, edita publicações,
cria think-tanks, isto é, centros de geração de ideias e programas, de
difusão e promoção de eventos; 3. um conjunto de políticas adotadas
pelos governos neoconservadores, sobretudo a partir da segunda
metade dos anos 70 e propagados pelo mundo a partir das orga-
nizações multilaterais criadas pelo acordo de Bretton Woods (1945),
isto é, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI)
(MORAES, 2001, p. 10)
80
[...] a reforma do Estado deve ser entendida dentro do contexto da
redefinição do papel do Estado, que deixa de ser o responsável direto
pelo desenvolvimento econômico e social pela via da produção de
bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador
desse desenvolvimento (BRASIL, 1995, p. 12).
CONCLUSÃO
84
o mercado de trabalho é quem determina o destino. Assim ela se torna elitista,
serve aos interesses do capital.
Podemos afirmar que a educação é necessária para romper e superar a lógica
das contradições do sistema capitalista, para isso, ela precisa estar para além do
capital e andar de mãos dadas com a luta para a transformação do atual modelo
econômico/político hegemônico.
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86
LITERATURA NO ENSINO MÉDIO E SUAS
IMPLICAÇÕES NO VESTIBULAR
Mariana Ferraz51
Rosilene Frederico Rocha Bombini52
Ketilin Mayra Pedro53
INTRODUÇÃO
51
Mestranda em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem (UNESP). CV: http://lattes.cnpq.br/8193481873280631
52
Doutora em Estudos Literários (UNESP). Docente (UNISAGRADO). CV: http://lattes.cnpq.br/5816114359890064
53
Doutora em Educação (UNESP). Pós-doutorado (UNESP). Docente (UNISAGRADO). Professora Colaboradora do
Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem (UNESP).
CV: http://lattes.cnpq.br/0991868156805558
87
vêm atrelados aos textos literários ao colocarem o aluno em posição secundária quando
ele deveria ser sujeito primário, isto é, ao lado do texto, na leitura dos textos literários.
As obras literárias possuem linguagem polissêmica, com vocabulário que
retrata o período e o estilo em que foram produzidas e, muitas vezes, não são com-
preendidas pelo estudante do ensino médio. Normalmente, isso causa desinteresse
pela dificuldade encontrada no contato com a linguagem ao dificultar a compreensão.
As Orientações Curriculares para o Ensino Médio (BRASIL, 2006) apontam
impasses que ocorrem na literatura, como substituição da literatura “difícil” por uma
literatura considerada mais digerível; simplificação da aprendizagem literária a um
conjunto de informações externas às obras e aos textos, além de substituição dos textos
originais por resumos. Isso ocorre principalmente pela carga horária da disciplina de
literatura e as “metas” que deverão ser cumpridas em três anos referentes ao ensino
médio, pelo professor e escola, que requerem uma seleção de obras que permita uma
formação mais significativa possível para os alunos com o objetivo e foco nos vestibulares.
Por outro lado, os grandes vestibulares do país divulgam, a cada novo processo
seletivo, as listas de leituras obrigatórias para os candidatos. As obras solicitadas para esses
exames influenciam indiretamente a seleção de leituras integrais. O professor não pode
manter seu planejamento focado totalmente ao programa do vestibular, mas os alunos
precisam estudar todo o conteúdo demandado nesses exames em um período de três anos.
Como prática consolidada, a cada ano, são selecionadas obras importantes das
literaturas brasileira e portuguesa como leituras obrigatórias para os vestibulandos. Toda
essa demanda de livros a serem lidos faz com que o aluno do ensino médio não explore
profundamente as obras, mas sim se preocupe apenas com o que é solicitado e, muitas
vezes, o conhecimento de uma obra literária não passa da leitura de um breve resumo.
Atualmente está sendo implantada nas escolas a Base Nacional Comum
Curricular (BRASIL, 2018), um documento de caráter normativo que define o
conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos
devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica.
Para a BNCC é importante recolocar o texto literário como ponto de partida
para o trabalho com a literatura, intensificando seu convívio com os estudantes,
diferente do que acontece atualmente, já que as biografias de autores, as carac-
terísticas de épocas, os resumos e outros gêneros artísticos substitutivos, como o
cinema e as HQs, têm tornado o texto literário como plano secundário.
Ainda dando destaque à BNCC, há os campos de atuação social propostos para
contextualizar as práticas de linguagem no ensino médio em Língua Portuguesa. A
88
literatura encontra-se no campo artístico-literário em que se busca a ampliação do
contato e a análise mais fundamentada de manifestações culturais e artísticas em geral,
visa à continuidade da formação do leitor literário e do desenvolvimento da fruição.
Nesse campo, a principal ideia é levar os estudantes a ampliarem seu repertório
de leituras e selecionar obras significativas para si, conseguindo aprender os níveis
de leitura presentes nos textos e os discursos subjacentes de seus autores. A prática
dessa leitura literária deve ser capaz de resgatar a historicidade dos textos: produção,
circulação e recepção das obras literárias, em um entrecruzamento de diálogos (entre
obras, leitores, tempos históricos) e em seus movimentos de manutenção da tradição e
de ruptura, suas tensões entre códigos estéticos e seus modos de apreensão da realidade.
A tradição literária deve ser constituída por textos clássicos, considerados
canônicos – obras legitimadas como elemento expressivo de suas épocas. Essa tradi-
ção possibilita a apreensão do imaginário e das formas de sensibilidade de uma deter-
minada época, de suas formas poéticas e das formas de organização social e cultural
do Brasil, sendo ainda hoje capazes de tocar os leitores nas emoções e nos valores.
No vestibular mais concorrido do país exige-se uma análise crítica da obra e
até que o aluno seja capaz de estabelecer uma relação entre obras. Para isso, é neces-
sário que o ensino da literatura no ensino médio ultrapasse o mero conhecimento
do enredo de uma narrativa. A escolha dos textos literários deve considerar, dentre
outros fatores, o universo do educando, a atualidade dos textos e os diálogos que
eles estabelecem com as especificidades do sujeito e do mundo em que ele vive.
Em face de todas as questões apresentadas até o momento, esta pesquisa justi-
fica-se pela discussão do nível de conhecimento literário imposto pelo vestibular e o
ensino da literatura que vem sendo orientado e desenvolvido especialmente nos anos
finais da educação básica. Assim, a pesquisa teve por objetivo analisar as questões
de literatura do vestibular organizado pela Fundação Universitária para o Vestibular
(FUVEST), e a forma como esse conhecimento está sendo avaliado neste concorrido
exame. Na sequência, os resultados são comparados com as orientações das Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Médio em relação ao ensino da literatura.
DESENVOLVIMENTO
A fim de discutir a temática proposta, este trabalho foi executado por meio de
pesquisa bibliográfica. O referido estudo foi dividido em duas partes: apresentação
das questões selecionadas das provas de literatura da Fuvest (anos de 2017 a 2019)
89
com as respectivas análises quanto ao conteúdo e forma como a literatura foi cobrada;
levantamento das orientações encontradas em documentos oficiais nacionais.
As análises estão fundamentadas na Teoria Literária e no método da análise
comparativa. Também serão consideradas discussões de estudiosos sobre o ensino
da literatura para embasar o estudo e análise dos resultados.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
90
Quadro 1 – Levantamento das questões de Literatura - Fuvest 2017 a 2019 – por tipo de
questionamento
Ano da Nº da Tipologia Tipo de
Título da Obra
Prova Questão do Texto Questionamento
Caracterização do
4 Iracema Narrativa
período literário
Caracterização do
5 Iracema Narrativa
período literário
6 Iracema Narrativa Interpretação
Caracterização do
17 Claro Enigma Poema
período literário
18 Claro Enigma Poema Interpretação
Memórias Póstumas de
Característica dos
72 Brás Cubas/ Minha Vida de Narrativa
personagens
Menina
Memórias Póstumas de
73 Brás Cubas/ Minha Vida de Narrativa Recursos estilísticos
Menina
74 Minha Vida de Menina Narrativa Interpretação
2018 75 Minha Vida de Menina Narrativa Interpretação
Caracterização do
76 O Cortiço Narrativa
período literário
77 O Cortiço Narrativa Recursos linguísticos
Característica dos
78 Vidas Secas Narrativa
personagens
79 Vidas Secas Narrativa Interpretação
91
Caracterização da
80 Sagarana Narrativa
obra
81 Sagarana Narrativa Recursos estilísticos
2018 82 Sagarana Narrativa Interpretação
Caracterização da
83 Claro Enigma Poema
obra
84 Claro Enigma Poema Recursos linguísticos
Memórias Póstumas de Brás Caracterização da
64 Narrativa
Cubas/ Vidas Secas obra
Caracterização da
65 A Relíquia Narrativa
obra
66 Iracema Narrativa Interpretação
67 Iracema Narrativa Recursos linguísticos
Comparação entre
68 Claro Enigma Poema
2019 obras
69 Claro Enigma Poema Interpretação
Caracterização da
70 Sagarana Narrativa
obra
Memórias Póstumas de Brás
71 Narrativa Interpretação
Cubas
Memórias Póstumas de Brás
72 Narrativa Interpretação
Cubas
Fonte: elaborada pela autora.
92
Quadro 2 – Levantamento por tipo de questionamento
Tipo de questionamento e
Ano / nº da questão / Obra
Quantidade de questões
2017
questão 4 - Iracema
Caracterização da obra 2019
(4 questões) questão 66 - Iracema
questão 70 – Sagarana
questão 72 – Memórias Póstumas de Brás Cubas
Caracterização temática do
2017
período
questão 5 - Iracema
(1 questão)
2017
questão 6 – Iracema
93
2019
questão 64 - Memórias Póstumas de Brás Cubas/Vidas Secas
(interpretação da obra)
questão 65 - A Relíquia
Interpretação da Obra
questão 66 – Iracema
(19 questões)
questão 67 – Iracema
questão 69 - Claro Enigma
questão 70 – Sagarana
questão 71 - Memórias Póstumas de Brás Cubas
2017
questão 12 - Memórias Póstumas de Brás Cubas
Recursos estilísticos 2018
(3 questões) questão 73 - Memórias Póstumas de Brás Cubas/Minha Vida
de Menina
questão 81 - Sagarana
Contexto histórico 2017
(1 questão) questão 13 - Vidas Secas
2017
questão 15 – Mayombe
Comparação entre obras 2018
(3 questões) questão 80 – Sagarana
2019
questão 68 - Claro Enigma
Interdisciplinaridade 2017
(1 questão) questão 16 - Mayombe (geografia)
2017
Caracterização do período questão 17 _ Claro Enigma
literário questão 18 - Claro Enigma
(3 questões) 2018
questão 76 - O Cortiço
2018
Caracterização dos
personagens questão 72 - Memórias Póstumas de Brás Cubas/Minha Vida
de Menina
(2 questões)
questão 78 - Vidas Secas
Fonte: elaborada pela autora
94
tiva nos últimos dois anos esse tipo de questionamento. Os outros tipos de cobrança
aparecem em menor quantidade, sem destaque para nenhum aspecto significativo.
Nota-se que a exigência de conhecer as obras literárias vai além da simples
compreensão ou mero conhecimento do enredo, o que exige uma reflexão bem
mais aprimorada das relações que se estabelecem entre os elementos da narrativa
e as temáticas e/ou valores subjacentes às obras.
Como consequência da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação Nacional: 9.394/96 - LDB (1996) e da mudança estrutural da educação
básica, houve a intenção do governo federal em se criar documentos oficiais que
orientassem o ensino nessa etapa de escolaridade.
No que diz respeito a esses documentos em nível federal, foram criados três
principais: os Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio PCNEM (1999),
os Parâmetros Curriculares Nacionais+: Ensino Médio – Orientações Educacio-
nais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (2002): PCN+ e
as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006): OCN. Os dois primeiros
abordam o ensino da literatura como matéria subordinada ao ensino de língua
portuguesa ou sendo utilizada como pretexto para ensinar e exemplificar conteúdos
distintos. Somente o último documento designa um papel mais direcionado para a
importância da literatura e da formação do leitor literário. Fortes e Oliveira (2015)
afirmam que é a partir das considerações presentes nas OCNs que se apresenta
uma “proposta de encaminhamento metodológico para leitura literária de Rildo
Cosson, como reflexão sobre certa possibilidade de abordagem da literatura no
contexto do ensino médio brasileiro” (FORTES; OLIVEIRA, 2015, p. 283).
A literatura no ensino médio limita-se à literatura cobrada no vestibular,
quase como apenas uma cronologia literária. Para Cosson (2016, p. 21), a literatura
vista nesse período da educação básica é “uma sucessão dicotômica entre estilos de
época, cânone e dados bibliográficos dos autores acompanhada de rasgos teóricos
sobre gêneros, formas fixas e alguma coisa de retórica em uma perspectiva pra lá
de tradicional”. Os textos literários são vistos em sua maior parte através de frag-
mentos, sendo aulas informativas e, muitas vezes, incompreendidas pelos alunos.
Todorov (2009), em A Literatura em perigo, afirma que a leitura de fragmentos
de obras contribui ainda mais para o desinteresse do corpo discente pela leitura lite-
rária. Assim, poucas são as oportunidades da leitura de um texto integral e, quando
acontecem, os alunos são submetidos a resumir ou discutir a obra assistematicamente.
95
É possível constatar que os especialistas responsáveis pelo tema da literatura nas
Orientações Curriculares para o Ensino Médio publicadas pelo MEC, em 2006, ressaltam as
especificidades do texto literário. Essas orientações partem do conceito de letramento da
pesquisadora Magda Soares, ao afirmar que o letramento é o “estado ou condição de quem
não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais da escrita” (SOARES,
2004, p. 47). Essas mesmas Orientações reforçam que o letramento literário pressupõe
que o aluno não só seja capaz de ler o poema ou a narrativa literária, mas também possa
apropriar-se efetivamente desses textos por meio da experiência estética, isto é, a fruição.
Antônio Cândido (1995), em O direito à literatura, defende que a literatura é capaz
de desenvolver em nós a sensibilidade, tornando-nos mais compreensivos, reflexivos, críticos
e abertos para novos olhares e possibilidades diante da nossa condição humana. Dessa
forma, corrobora com o que as OCN orientam, para que esse trabalho com a literatura
possa “formar o leitor literário, melhor ainda, de letrar - literariamente o aluno, fazendo-o
apropriar-se daquilo a que tem direito” (BRASIL, 2006, p. 54). Assim, seguindo a reflexão
de Cândido, a leitura literária favorece a reflexão sobre o mundo a nossa volta, revelando
nossos horizontes, ampliando os conhecimentos, possibilitando novos pontos de vista.
A interação com os textos literários favorece o desenvolvimento da curiosidade
e da imaginação dos leitores, a elevação e a educação da sensibilidade estética. Por
meio da literatura é possível acessar diferentes saberes sobre as culturas de povos e
lugares desconhecidos não importando se fictício ou real. A leitura literária deixa
em cada pessoa uma bagagem de experiências que nos constrói como leitores e
que se refletem em nossa formação e posturas diante das questões reais.
Sendo assim, o letramento literário deve ser trabalhado como algo que
requer mais tempo, pois diante de um texto literário é preciso saber refletir sobre
questões estéticas, políticas, sociais ou pessoais que possam estar contidas impli-
citamente ou explicitamente no texto.
Cosson (2016, p. 40) cita três etapas para compreender a leitura, a primeira
conhecida como antecipação, para aguçar a curiosidade do aluno, “consiste nas várias
operações que o leitor realiza antes de penetrar no texto propriamente dito, são rele-
vantes tanto os objetivos da leitura, que levam o leitor a adotar posturas diferenciadas
ante o texto, quantos os elementos que compõem a materialidade do texto, como
a capa, o título, o número de páginas, entre outros”. A segunda é a decifração, se
aprofundar no texto através das letras e das palavras. Para o autor, “quanto maior é
a nossa familiaridade e o domínio delas, mais fácil é a decifração”. A última etapa é
da interpretação, “são as relações estabelecidas pelo leitor quando processa o texto,
96
por meio da interpretação, o leitor negocia o sentido do texto, em um diálogo que
envolve autor, leitor e comunidade”. Por isso, por mais pessoal e íntimo que esse
momento interno possa parecer a cada leitor, ele continua sendo um ato social.
Constata-se, por meio da análise dos documentos oficiais e das questões
de literatura na Fuvest, ser evidente que as orientações se contrapõem ao que é
cobrado no vestibular. Com o intuito de apenas ser aprovado no exame, o leitor
torna-se um leitor seletivo, com o foco apenas em responder corretamente as
questões e não se apropria dos textos com fruição.
Todorov (2009), em A literatura em Perigo, sustenta a ideia de que a literatura
tem um papel particular a cumprir, diferentemente dos discursos religiosos, morais
ou políticos, ela não formula um sistema de preceitos; por essa razão, escapa às
censuras que se exercem sobre as formuladas de forma literal.
É necessário priorizar o real aprendizado do aluno, oferecer a ele diversos textos
que estejam próximos ou distantes de sua realidade histórica e social para que possa
construir sua própria identidade como leitor e não apenas para realização de exames.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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FORTES, Rafael Adelino e OLIVEIRA, Vanderléia da Silva. O ensino de literatura no Ensino Médio e os
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PASSONI, Célia A. N., Literatura Fuvest 2018: estudo das obras, resumos, análise dos textos, exercícios,
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SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte, Autêntica, 2004.
TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.
98
ARGUMENTAÇÃO E RACIOCÍNIO:
UMA REVISÃO TEÓRICA
Antonio Sales54
INTRODUÇÃO
O CONCEITO DE ARGUMENTAÇÃO
Doutor em Educação (UFMS). Docente do Programa de Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática (UNIVERSI-
54
EXPLICAÇÃO OU ESCLARECIMENTO
JUSTIFICATIVA OU JUSTIFICATÓRIA
101
Arsac e seus colaboradores ao discutir o tema elaborou um
esquema é mais simples (fig.2).
102
A argumentação explicativa ocupa pouco espaço em nossa discussão, embora,
por ser uma técnica didática, devesse merecer muito mais. A argumentação justi-
ficatória, por sua vez, pode ser classificada, quanto ao nível de racionalidade, em
três níveis, a saber:Folclórica, Natural e Racional. Analisemos cada uma delas.
NÍVEL FOLCLÓRICO
103
Podemos ainda citar o exemplo de uma prática que se faz por tradição. Em
algumas regiões para resolver a equação , as duas frações são reduzidas ao mesmo
denominador e depois “cortam-se” os denominadores. Isso é admitido como uma
regra que dispensa explicação (SALES, 2010).
ARGUMENTAÇÃO NATURAL
104
Figura 4-Esquema Síntese da Argumentação
106
procedeu uma análise detalhada sobre isso e uma adaptação do seu estudo
fugiria ao objetivo deste esboço.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por se tratar de um esboço teórico talvez não seja oportuno apresentar con-
clusão ou considerações finais. Supomos ser mais pertinente esboçar uma síntese
geral. Nesse caso salientamos que embora não tenhamos discutido a perspectiva
de Pedemonte somos do parecer de que é possível evoluir da argumentação para a
demonstração e evidenciamos isso outros trabalhos por nós produzidos (SALES;
PAIS, 2010; SALES; PAIS, 2011).
Neste espaço nossa preocupação consistiu em apresentar os níveis de argu-
mentação, sua relação com a prova e a demonstração e esboçar a sua função no
âmbito do estudo da Matemática tendo em vista que estudos mais detalhados estão
disponíveis nos textos citados no parágrafo anterior. Visamos também contribuir
para que o professor de matemática da educação básica possa ter elementos para
analisar o nível do argumento apresentado pelo seu aluno.
Como forma de articular a abdução, indução e dedução retomamos o exem-
plo citado em que um suposto aluno abduziu, a partir de dois exemplos, que a
soma de dois números ímpares pode produzir sempre um resultado par. Através
de alguns exemplos mais ele “induziu”, isto é, verificou por indução, que até certo
ponto a sua perspectiva se confirmava, logo, ele “induziu-se” (concluiu para si
mesmo) que o princípio se estendia para além do que lhe era possível experi-
mentar. Imaginemos agora o professor percebendo toda essa articulação entre o
particular e o geral e propondo o seguinte desafio à classe: “procurem dois núme-
ros ímpares cuja soma seja 55”.
É de se esperar que o aluno que fez todo esse percurso racional responda:
“não dá, professor! Tem que dar sempre par”. Temos aí um caso de dedução, pois,
se dois números ímpares quaisquer, quando somados, resulta em um número par,
esse “par” de ímpares cuja soma é ímpar não existe.
Esse aluno usou uma argumentação natural que permite entrever um racio-
cínio lógico bem elaborado. Faltam elementos formais na fala, mas não há inge-
nuidade e nem “tradição” em seus argumentos. Fizeram-se presentes, nessa suposta
experiência didática, a abdução, a indução e a dedução.
107
REFERÊNCIAS
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L´Argumentation. 2 ed. Paris: PUF, 1987.
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Não paginado.
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tration dans l´aprentissagem des mathetmatiques. 2002. 424 f. Tese (Doutorado em Didática da Matemática).
Grenoble, Fr: Université Joseph Fourier-Grenoble I; Gênova, It: Université de Genova, 2002.
PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. 3.ed. São Paulo: Perspectiva, 2003.
PLANTIN, Christian. A Argumentação. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.
SALES, Antonio. Práticas argumentativas no estudo da Geometria por acadêmicos de Licenciatura em
Matemática. 2010. Tese (Doutorado em Educação). Campo Grande, PPGEDU/UFMS, 2010.
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Acadêmicos de um Curso de Licenciatura em Matemática. Revista da Faculdade de Educação (Universidade
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SALES, Antonio; PAIS, Luiz Carlos. A Argumentação no Estudo da Geometria Euclidiana por Acadê-
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2011, Recife/PE. XIII Conferência Interamericana de Educação Matemática-XIII CIAEM. Recife/PE:
Brascolar Gráfica e Editora Ltda, 2011.
TOULMIN, Stephen Edelston. Os usos do argumento. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
108
DIDÁTICA ZORÓ – DA DOCÊNCIA INICIANTE À
DOCÊNCIA EXPERIENTE, TRAJETÓRIA DE UM
PROFESSOR PANGYJẼJ
INTRODUÇÃO
111
Foi neste contexto que elaboramos o referido estudo que foi pensado a
partir dos problemas evidenciados no início da carreira docente na perspectiva
da Didática Intercultural. Trata de uma compreensão pedagógica em construção
situada no âmbito da Licenciatura em Educação Básica Intercultural da Univer-
sidade Federal de Rondônia. Sua principal inspiração decorre das relações entre
o aprender e o ensinar comunitário porque inferimos que muitos aspectos destas
formas de educar estão presentes no espaço escolar como estratégica de sentidos
ao saber formal. Algumas especificidades deste modo de pensar esta concepção
formativa vem se delineando no espaço da educação escolar indígena.
Nesta perspectiva, o educar não se limita a atuação docente, pois os sabe-
dores e sabedoras indígenas também contribuem para as aprendizagens culturais-
-formais desde o surgimento das primeiras escolas indígenas. Assim, a Didática
Intercultural, inspirada nos processos próprios dos saberes ancestrais ameríndios
é um componente curricular que discute temas referentes às infâncias, teorias da
aprendizagem, função social da escola, às relações docência/discencia, o planeja-
mento pedagógico, os processos avaliativos e as especificidades da carreira docente
indígena - ingresso, formação, remuneração, saúde e relações com a comunidade.
Neste contexto, por meio dos memoriais de profissionalidade docente a
Didática Intercultural se interessa em estudar as trajetórias iniciais na profissão,
a construção da identidade docente e a experiencia profissional. A esse respeito,
há estudos interessantes como o de Huberman (2000) que apresenta uma siste-
matização sobre o ciclo de vida profissional docente. De acordo com este autor a
carreira docente pode ser caracterizada por diferentes fases de atuação: entrada,
estabilização, diversificação, serenidade e desinvestimento.
Mas, será que este estudo ajuda a entender a trajetória de um educador ou
educadora indígena? Avaliamos que a definição da entrada na profissão é inter-
pretada como a fase do professor iniciante que vai de 1 (um) a 3 (três) anos, é
caracterizada pela sobrevivência e descoberta. Estes sentimentos são compartilhados
frequentemente por docentes nos processos de formação. Em determinadas situa-
ções informam que em função do desconhecimento de determinados conteúdos
aquele assunto não é discutido em sala de aula.
Assim, é possível inferir que a área de atuação docente intercultural é carac-
terizada por um conjunto de exigências que envolvem o domínio de saberes e a
reflexão permanente sobre a prática pedagógica, pois é: “[...]. É na leitura crítica
da profissão diante das realidades sociais que se buscam os referenciais para modi-
112
ficá-la” (PIMENTA, 2012, p. 19). Mas, até chegar aí há um grande caminho que
precisa ser percorrido, que resulta de elaborados processos em que se articulam o
trabalho docente e a formação em contínuos processos de ação, reflexão e ação:
Espera-se, pois, que mobilize os conhecimentos da teoria da educação
e da didática, necessários à compreensão do ensino como realidade
social e, que desenvolva neles, a capacidade de investigar a própria
atividade para, a partir dela, constituírem e transformarem os seus
saberes-fazeres docentes, num processo contínuo de construção de
suas identidades como professores. (PIMENTA, 1997, p. 6).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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métodos. Portugal: Porto Editora, 1994.
BRASIL. MEC. Referencial Curricular Nacional para as Escolas Indígenas. Brasília, MEC: 1998.
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pesquisa em educação. Pedagogia Foco, Iturama (MG), v. 12, n. 7, p. 117-132, jan./jun. 2017.
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MINDLIN, Betty. O aprendiz de origens e novidades. Estudos Avançados, v. 8, n. 20, 1994.
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interdisciplinar nas escolas Pangyjẽj. Orientadora: Josélia Gomes Neves. 36f. Trabalho de Conclusão de
Curso (TCC). Especialização Lato Sensu em Educação Escolar Indígena do Departamento de Educação
Intercultural (DEINTER), UNIR, Campus de Ji-Paraná, 2021.
120
O POVO INDÍGENA ARARA KARO E O SEU
PRINCIPAL RITUAL CULTURAL - WAYO AKANÃ,
A FESTA DO JACARÉ
INTRODUÇÃO
O estudo ora apresentado foi elaborado junto ao Povo Indígena Arara Karo,
habitante da Terra Indígena Igarapé Lourdes, no município de Ji-Paraná, em
Rondônia no período de junho de 2015 a setembro de 2016. O recorte para este
escrito envolve dois aspectos: a historiografia do referido povo e os antecedentes
históricos da festa do Jacaré. (ARARA, 2016).
Os Arara constituem uma sociedade indígena da Amazônia que se autode-
nomina Karo, composta por aproximadamente 400 pessoas, organizadas nas aldeias
Pajgap e Iterap, localizadas na Terra Indígena Igarapé Lourdes em Ji-Paraná, estado
de Rondônia. Sua língua materna pertence ao tronco linguístico Tupi Ramarama,
a 2ª língua falada pela maioria das pessoas é o português.
O Wayo Akana ou a Festa do Jacaré é realizada periodicamente na época do
verão, ocasião em que há uma mobilização coletiva que organiza esta atividade
cultural. Considerando a importância deste ritual é que foi proposto o seguinte
estudo pela primeira autora, uma pesquisadora indígena e a segunda autora que
acompanha esta sociedade étnica há cerca de 15 (quinze) anos, elementos que
serão levados em conta neste escrito.
Constitui uma parte do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) desenvol-
vido na Universidade Federal de Rondônia (UNIR) na Licenciatura em Educação
Básica Intercultural sob orientação da segunda autora. Foi elaborado na perspectiva
da educação crítica ou problematizadora (FREIRE, 1987) no âmbito da área da
Educação Escolar Intercultural no Ensino Fundamental e Gestão Escolar, habi-
litação do curso que forma a docência dos anos iniciais da escolarização.
Embora o tema Festa do Jacaré já tenha sido discutido por outros pesqui-
sadores e pesquisadoras em diferentes visões (MINDLIN, 2001; ISIDORO,
57
Graduada (UNIR). Professora indígena (SEDUC). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6001-0708
58
Doutora em Educação Escolar (UNESP). Professora (UNIR). CV: http://lattes.cnpq.br/1098108142638272
121
2006; PAULA, 2008; NEVES, 2009; SANTOS, 2015), compreendemos que
é importante a análise por uma intelectual indígena Arara, enquanto impor-
tante recurso de protagonismo e visibilidade étnica, com potencialidade para
ser trabalhado em sala de aula.
Em relação à metodologia o estudo se caracterizou em uma perspectiva
qualitativa, um recurso que: “Compreende um conjunto de diferentes técnicas
interpretativas que visam a descrever e a decodificar os componentes de um sistema
complexo de significados. Tem por objetivo traduzir e expressar o sentido dos
fenômenos do mundo social [...]”. (NEVES, 1996, p. 1). Nesta direção, realiza-
mos um levantamento bibliográfico no intuito de localizar fontes que de alguma
forma disponibilizassem elementos sobre a comunidade Arara em interface com
a pesquisa autobiográfica porque ela envolve: “[...] Histórias de Vida, Biografias,
Autobiografias, Memoriais - não obstante se utilize de diversas fontes, tais como
narrativas, história oral, fotos, vídeos, filmes, diários, documentos em geral, reco-
nhece-se dependente da memória”. (ABRAHÃO, 2003, p. 2).
Esta concepção metodológica não se limita à coleta de dados, mas assume
um papel formativo para todos os participantes do estudo, uma vez que: “As pes-
soas vivem histórias e no contar dessas histórias se reafirmam. Modificam-se e
criam novas histórias. As histórias vividas e contadas educam a nós mesmos e aos
outros [...]”. (CLANDININ; CONNELLY, 2011, p. 27). Este sentimento esteve
presente no decorrer do estudo pois concebemos as narrativas indígenas como
relevantes fontes de conhecimento principalmente, porque os sujeitos participaram
ativamente do ritual em discussão: Pajé Cícero Xia Mot Arara, Luisa Arara, José
Dutra Yohwãy Arara, Maria Ora Yõ Arara, Pedro Arara e Carlão Arara.
122
discute as invasões, desaldeamentos e o trabalho escravo nos seringais, por último
os esforços do retorno à vivência comunitária por volta de 1976.
Para os Arara o Povo da atualidade resultou de um evento sobrenatural
oriundo de um processo de renascimento. De acordo com a narrativa do Pajé
Cícero Xia Mot Arara, em tempos outros, o céu caiu sobre os ancestrais Arara
e tudo escureceu. Nisso apareceram vários bichos como onça, tatu, porco, cutia,
paca, pássaros, todos eles adivinharam que o céu ia cair. De repente, chegou o tal
de Xa’wãt, conhecido pelos brancos6 com o nome de Mapinguari e começou a
devorar as pessoas. Depois o pajé ouviu uma voz que dizia, “Sai, sai, pega sua filha”.
Assim o céu caiu e já não existia mais ninguém pois o Xa’wãt já tinha comido
todos, restaram apenas o pajé e sua filha para recriar o Povo Arara. Ele ficou com
ela em cima de um pé de açaí. Os velhos contam que a sorte é que o pajé casou
com sua própria filha e a partir daí, foi possível o reaparecimento do povo Arara
em seu território tradicional onde é atualmente o município de Ji-Paraná.
Os relatos dos participantes59 do estudo de forma geral informam que
antigamente os indígenas da etnia Arara Karo não tinham um lugar determi-
nado para morar considerando o modo de vida nômade. Mas, se encontravam
em épocas específicas em antigas aldeias, como: Iyá Perot ká/Pedra Cascalhenta,
Kanã Opi/Terra Vermelha, Xapîya Korokôtkã/Escrotos Leves. Neste contexto,
um dos aspectos de fundamental importância na cultura era a presença do líder
espiritual, o Pajé. Um diferencial Arara dentre outras etnias indígenas cujos pajés
foram associados ao diabo, uma ação direta das seitas evangélicas fundamentalistas
que provocaram a sua destruição no interior aldeias.
Nesta direção, Cícero de forma muito corajosa aceitou a decisão dos espíritos,
a de ser a autoridade religiosa dos Arara, ser o Pajé60. Este trabalho exige muitos
sacrifícios, dentre outros desafios, o de enfrentar o sobrenatural através dos animais
na floresta. Para os Arara ser Pajé é responder a um perfil específico: ser alguém
considerado boa pessoa, honesta, justa, generosa que possa perceber e dialogar com
outros seres para poder cuidar adequadamente de seu povo. Cicero se saiu tão bem
em sua atuação que com o tempo ensinava o ofício de Pajé a outros escolhidos:
[...]. Manuel teve como guia seu cunhado Cícero Tiamot [...]. Tiamot
ensinou Manuel a enfrentar e dialogar com as araras, macacos, papa-
59
Vitória Naxap Wêt Arara, Maria Ora yô Arara, Firmino Xit Xabat, Cida Yari Arara, Procópio Na ´Xot Wêt Arara, Pedro
Arara, Paulo Orok mãn Arara, Maria Arõx Arara, Benedito Yõn Péw Arara e Fermino Ot Xãra Arara.
60
Infelizmente o Pajé Cícero Arara nos deixou no dia 20 de junho de 2020. Como tantos outros povos indígenas fomos
surpreendidos com a pandemia da covid-19 que cobriu de luto nossa comunidade. Uma perda irreparável.
123
gaios, lontras, onças, todos os animais que não são apenas bichos, mas
seres do além, de quem não se pode ter medo, sob pena de adoecer.
Manuel, como os outros pajés, trilha o Caminho das Almas, o Narawá
Nekam [...]. Conta-nos que veste a roupa das onças, o couro dos
espíritos, metamorfoseia-se em onça, anda no meio delas. Quando
em sua forma humana, o pajé encontra uma onça que é também
pajé. Se tem medo, atira, e noutro dia descobre que não se tratava de
uma onça, mas de um colega pajé, que surge na aldeia, ferido. [...].
(MINDLIN, 2016, p. 333).
Até meados do ano passado o Povo Arara contava com o trabalho de Cícero
Xia Mot Arara, que nasceu na região de Ji-Paraná por volta de 1936, como já
mencionado, o território tradicional de perambulação dos Karo. Era um dos histo-
riadores desta etnia. Sabia das lutas e dos tempos difíceis vividos pelos Arara com
outros povos e principalmente dos embates com os “brancos”, os não indígenas.
Cícero viveu nas aldeias e sofreu a dispersão provocada pelo contato com grupos
não indígenas. Neste sentido, com outros mais velhos afirmou que o primeiro
branco que o Povo conheceu foi um homem chamado Barros do Seringal Santa
Maria. Isso aconteceu durante uma travessia do Rio Machado em que os indí-
genas formavam seus grupos para andar na mata. Contam que foi a equipe do
Benedito Arara que encontrou o não indígena e voltou para a maloca para avisar
os parentes daquele diferente “outro”.
Assim, a memória Arara aponta que em um determinado momento pessoas
desconhecidas tomaram conta de seus territórios e organizavam estes espaços em
seringais com diferentes “patrões”. Era o chamado 2º Ciclo da Borracha que para
o Povo significou um dos principais marcos de reedição do sofrimento Karo, o
que nos leva a interpretá-lo como uma “situação-limite”. De acordo com Paulo
Freire em Pedagogia do Oprimido, trata de um conjunto de ocorrências que: “[...]
se apresentam aos homens [e mulheres] como se fossem determinantes históricas,
esmagadoras, em face das quais não lhes cabe outra alternativa, senão adaptar-se.
[...]”. (FREIRE, 1987, p. 60). Foi nesta época que doenças desconhecidas provo-
caram muitas mortes nos aldeamentos. Além das enfermidades, foi neste difícil
tempo com o seringalista Barros que o Povo Arara ouviu e teve que aprender pela
primeira vez o duro significado da palavra “patrão”. De início não sabiam bem o
que queria dizer, mas com o passar do tempo e por meio de duras experiências
entenderam que significava algo muito ruim, alguém que provocava medo e terror:
124
Primeiro branco que teve contato com os Arara foi o velho Barros.
Apareceu na aldeia [...]. Depois foram (os Arara) trabalhar no serin-
gal, com o patrão. O patrão não mandava mercadoria para eles, não
tinha feriado, tinha que trabalhar todo o tempo para poder pagar a
mercadoria que foi comida. Mesmo assim, o patrão ficava reclamando,
que se não trabalhasse mandava matar. [...]. Então, meu pai desistiu,
não tinha como agüentar o patrão. (ISIDORO, 2006, p. 26).
126
Lourdes, parte do território tradicional da etnia que aconteceu em 1976 e homo-
logada através do Decreto nº 88.609/1983.
No entanto, conforme as narrativas, as observações empíricas e outros estudos
apontam, as cicatrizes da colonização permaneceram na vida do povo Arara, seja
nos nomes das pessoas, os mesmos dos antigos proprietários de seringais. Podem ser
notadas na forma de falar a língua portuguesa, que se aproxima bastante do modo
de comunicação dos não indígenas da região ou mesmo nas marcações territoriais:
A ocupação das terras pelos colonizadores e a invasão de divisas são
percebidas, inclusive no acesso à aldeia I’terap que é por meio da
fazenda 3 Rios.[...]. Este artigo possibilita conhecer a história do
povo Arara (Karo Tap) contada por quem vivenciou/sentiu na própria
pele, mesmo que pela memória dos pais e avós, a violência pela qual
foram tomados. Essa abordagem foi uma maneira de reconhecer e
valorizar a narrativa dos esquecidos e/ou silenciados pela colonialidade.
(ALVES; ARARA; MEDEIROS, 2021, p. 14).
127
universo completo de conhecimento integrado, com fortes ligações
com o meio em que se desenvolveu. (TEIXEIRA, 1995, p. 293).
129
Figura 1 - Cícero, Marli, Manichula e Miru (2008)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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Luís Donizete Benzi. (orgs.). A temática indígena na escola: novos subsídios para professores de 1º e 2º
graus. Brasília/MEC, 1995.
Nota: dedicamos este texto à memória dos Arara que não sobreviveram às explorações e maus tratos nos
seringais da Amazônia.
132
REFLEXÕES DE UM PROFESSOR FORMADO EM
LÍNGUA PORTUGUESA A PARTIR DA DISCIPLINA DE
ESTÁGIO SUPERVISIONADO: O ENSINO DE LÍNGUA
MATERNA EM PAUTA
INTRODUÇÃO
61
Doutor em Linguística (UFC). Professor (SEDUC–CE). CV: http://lattes.cnpq.br/6002586478534594
133
METODOLOGIA
134
AS AULAS MINISTRADAS NO ESTÁGIO
Esta seção é muito importante, uma vez que representa o “coração” deste
relato, pois é aqui que, a partir das aulas observadas, teço reflexões pertinentes sobre:
ensino de língua portuguesa e formação de professor de língua materna, eviden-
ciando ainda a relevância da disciplina de estágio na formação de futuros docentes.
É válido ressaltar que, para a BNCC, não basta o professor ministrar a aula (de
gramática, neste caso); é preciso que tal conteúdo faça sentido para a vida cotidiana
dos alunos. Nesse caso, estudar os tipos de conjunções coordenativas ou subordinati-
vas (considerando somente a abordagem estruturalista da língua) não é o suficiente,
nem produtivo; é preciso evidenciar para o aluno a importância dos conectivos para
a construção da ideia global do texto. Logo, uma conjunção “portanto”, por exemplo,
não é apenas um conectivo classificado como conjunção coordenativa conclusiva; no
texto, ao usar os conectivos, construímos sentidos e argumentamos sobre determinado
tema ou assunto; e isso precisa ficar claro para os estudantes; saber usar adequada e
criticamente esses elos coesivos é decisivo para a construção da nossa argumentação.
A BNCC sugere, como competências específicas relacionadas a este conteúdo
ministrado nestas aulas do estágio, as seguintes competências:
135
Competências específicas:
Competência específica 3 - Utilizar diferentes linguagens (artísticas, corporais e verbais) para exercer,
com autonomia e colaboração, protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva, de forma crítica,
criativa, ética e solidária, defendendo pontos de vista que respeitem o outro e promovam os Direitos
Humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável, em âmbito local, regional e global.
Competência específica 4 - Compreender as línguas como fenômeno (geo)político, histórico, social,
variável, heterogêneo e sensível aos contextos de uso, reconhecendo-as e vivenciando-as como formas
de expressões identitárias, pessoais e coletivas, bem como respeitando as variedades linguísticas e agindo
no enfrentamento de preconceitos de qualquer natureza.
Fonte: Quadro retirado da BNCC (2018).
62
Os campos de atuação da BNCC são: da vida cotidiana, da vida pública, das práticas de estudo e pesquisa do artístico/
literário e do jornalístico-midiático.
136
Centralidade da norma-padrão. Centralidade dos efeitos de sentido.
Ausência de relação com as especificidades dos gêneros, Fusão com o trabalho com os gêneros,
uma vez que a análise é mais de cunho estrutural e, quando na medida em que contempla justa-
normativa, desconsidera o funcionamento desses gêneros nos mente a intersecção das condições
contextos de interação verbal. de produção dos textos e as escolhas
linguísticas.
- Unidades privilegiadas: a palavra, a frase e o período. Unidade privilegiada: o texto.
- Preferência pelos exercícios estruturais, de identificação e Preferência por questões abertas e ativi-
classificação de unidades/funções morfológicas e correção. dades de pesquisa, que exigem compa-
ração e reflexão sobre adequação e efeito
de sentidos.
Fonte: Quadro retirado de Mendonça (2006).
A REGÊNCIA
139
Conjunção coordenativa Conclusiva (sentido de conclusão) Eu estudei muito; portanto estou
preparado para a prova do Enem.
Fonte: Quadro elaborado pelo estudante estagiário (2021).
Entendo que o aluno, sim, precisa conhecer tais nomenclaturas, porém esta
abordagem estrutural é limitada, não explora as diferentes formas de construir a
argumentação. Por exemplo, no quadro, o “mas” é dado como exemplo de conjunção
coordenativa adversativa; o “e” como conjunção coordenativa aditiva. Porém, nem
sempre estes conectivos irão estabelecer sentido de oposição e soma respectivamente. A
140
depender do contexto de uso, “e” também pode estabelecer sentido de oposição ou de
conclusão; e o “mas” pode estabelecer sentido de adição, como nos exemplos a seguir:
Texto 1: Exemplo de uso com o conectivo “Mas” Texto 2: Exemplo de uso com o conectivo “e”
Rosa de Hiroshima O mundo é grande
(Vinicius de Moraes) (Carlos Drummond de Andrade)
Pensem nas crianças, mudas, telepáticas O mundo é grande e cabe
Pensem nas meninas, cegas, inexatas Nesta janela sobre o mar.
Pensem nas mulheres, rotas alteradas O mar é grande e cabe
Pensem nas feridas, como rosas cálidas Na cama e no colchão de amar.
O amor é grande e cabe
No breve espaço de beijar.
Mas, oh, não se esqueçam da rosa, da rosa
Da rosa de Hiroshima, a rosa hereditária
A rosa radioativa, estúpida e inválida
Note que, no primeiro texto, o poeta elenca uma lista de coisas que devem
ser pensadas, não podem ser esquecidas; portanto, quando ele enumera tais ele-
mentos, ao chegar no quinto verso (“Mas, oh, não se esqueçam da rosa (...)”, o
contexto faz com que este conectivo estabeleça sentido de soma e não de oposição.
Por outro lado, no segundo texto, o “e”, comumente classificado como
conectivo com sentido de soma, assume, neste contexto de uso, sentido de
oposição, porque, mesmo o mundo e o mar serem grandes, não impede que
eles caibam na mão do eu lírico.
Essas discussões, geralmente, não são contempladas no ensino tradicional
de gramática; são outros tipos de estudos que analisam o uso dos conectivos em
uso, como a gramática funcionalista. Além da gramática funcionalista, há muitos
outros estudos sobre os conectivos que consideramos mais produtivos e signifi-
cativos para a construção da argumentação.
À guisa de exemplo, pode-se citar (ADAM, 2011). Em seus estu-
dos, o foco recai no uso ou na função deste uso dos conectivos para a cons-
trução da argumentação no texto.
Uma outra perspectiva de abordagem dos conectivos é pelo quadro teó-
rico-metodológico do Interacionismo Sociodiscursivo (ISD), que estuda
a influência do contexto de produção/contexto comunicativo na escolha dos
conectivos para escrever o texto.
Tendo citado outros estudos sobre os conectivos, além da gramática normativa, é
pertinente citarmos também as contribuições da Linguística Textual (KOCH, 2006).
141
Todos esses teóricos vistos até aqui vêm contribuindo com estudos que
suscitam a necessidade de um ensino de gramática renovado; a própria BNCC
adota a terminologia “análise linguística/semiótica” em detrimento da termologia
“gramática”, uma vez que esta deixa de considerar determinados fenômenos lin-
guísticos, como os contextos reais de comunicação-interação, por exemplo.
Podemos concluir, dessa maneira, que é preciso ampliar as possibilidades
de abordagem dos conectivos nas aulas de língua materna.
Em se tratando da finalização do conteúdo, o estagiário realizou uma ati-
vidade com questões de marcar, para trabalhar o assunto. A atividade foi retirada
de provas do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM. A seguir, apresento
uma questão da atividade como exemplo:
(Enem-2014)
Miss Universo: “As pessoas racistas devem procurar ajuda”
SÃO PAULO - Leila Lopes, de 25 anos, não é a primeira negra a receber a faixa de Miss Universo. A primazia coube a
Janelle “Penny” Commissiong, de Trinidad e Tobago, vencedora do concurso em 1977. Depois dela vieram Chelsi Smith, dos
Estados Unidos, em 1995; Wendy Fitzwilliam, também de Trindad e Tobago, em 1998, e Mpule Kwelagobe, de Botswana,
em 1999. Em 1986, a gaúcha Deise Nunes, que foi a primeira negra a se eleger Miss Brasil, ficou em sexto lugar na classifi-
cação geral. Ainda assim a estupidez humana faz com que, vez ou outra, surjam manifestações preconceituosas como a de um
site brasileiro que, às vésperas da competição, e se valendo do anonimato de quem o criou, emitiu opiniões do tipo “Como
alguém consegue achar uma preta bonita?” Após receber o título, a mulher mais linda do mundo - que tem o português como
língua materna e também fala fluentemente o inglês - disse o que pensa de atitudes como essa e também sobre como sua
conquista pode ajudar os necessitados de Angola e de outros países.
COSTA, D. Disponível em: http://oglobo.globo.com. Acesso em: 10 set 2011 (adaptado)
O uso da expressão “ainda assim” presente nesse texto tem como finalidade
a) criticar o teor das informações fatuais até ali veiculadas.
b) questionar a validade das ideias apresentadas anteriormente.
c) comprovar a veracidade das informações expressas anteriormente.
d) introduzir argumentos que reforçam o que foi dito anteriormente.
e) enfatizar o contrassenso entre o que é dito antes e o que vem em seguida.
SÍNTESE DA EXPERIÊNCIA
Uma vez que não poderia registrar tudo que aconteceu no estágio, (por questão
de espaço), limito-me, nesta seção, a apresentar, pelo menos, os dois pontos que
mais me chamaram atenção: 1) o professor de língua portuguesa (em formação,
ou já formado) precisa considerar-se também um pesquisador; 2) o conceito de
análise linguística precisa ser “plantado” e “cultivado” nos professores de língua
portuguesa já atuantes e nos futuros professores de língua materna.
Quando defendo que o professor de língua materna precisa considerar-se tam-
bém um pesquisador é no sentido de que, ao trabalhar a linguagem em sala de aula,
essa discussão precisa fazer sentido e precisa ser produtiva para o aluno; dessa maneira,
a prática da pesquisa embasará o professor em suas escolhas teórico-metodológicas.
No artigo de (DODÓ; FERNADES, 2019), os autores tecem uma discus-
são sobre a importância da formação do professor como questão decisiva para o
trabalho com o ensino de língua materna. Segundo eles:
os rumos que as nossas aulas de língua materna terão, poderão ser
positivos ou negativos; isso vai depender de como o professor abor-
dará o conceito de língua e das escolhas dos métodos de ensino para
conduzir a prática e o exercício da linguagem na sala de aula (DODÓ;
FERNANDES, 2019, p. 20).
143
De modo geral, ora o estagiário trabalhava numa perspectiva tradicional,
ora trabalhava numa perspectiva da linguística aplicada.
Considerando isso, entendo que, muitas vezes, ainda não está claro para
os docentes os objetivos de se ensinar língua portuguesa a nativos desta língua.
Logo, se não está claro para o docente, isso poderá influenciar em suas aulas de
língua materna, podendo representar um impasse para o desenvolvimento das
competências e habilidades linguísticas dos estudantes.
Isso foi observado em algumas aulas. Os alunos se questionavam sobre o
porquê de estudar “isso”. O estagiário respondeu que este conteúdo poderia ser
cobrado nos vestibulares e/ou no Enem. Esse fato consegue, pois, confirmar essa
necessidade de uma reflexão, de fato, mais profunda sobre o uso que fazemos da
língua nas diversas esferas de comunicação.
Paralelo a essa discussão, é necessário traçar alguns pontos relacionados ao
conceito de análise linguística e sua repercussão para o ensino de língua materna.
Vimos, em seções anteriores, que a diferença-mor entre estudar gramática e estudar
análise linguística é que aquela limita-se a estudar a estrutura pela estrutura; esta,
além de estudar a estrutura, oportuniza uma reflexão de como usar os elementos
linguísticos para produzir textos, construir argumentação, construir sentidos.
Trazendo essa reflexão às aulas que estão sendo analisadas por mim, pude notar
que, em alguns momentos, trabalhava-se só o ensino de gramática por ela mesma;
em outros, trabalhava-se o ensino de análise linguística (mesmo que de forma bem
superficial); sobre isso, tais reflexões revelaram: I) uma dificuldade em estabelecer ou
definir que referencial teórico usar para embasar o fazer docente; II) certa incompreen-
são da terminologia “análise linguística”; III) por fim, considerando as explicações do
conteúdo feitas nas aulas, percebi que o estagiário usou apenas uma corrente teórica
para trabalhar os conteúdos: a corrente estruturalista, demonstrando não conhecer
outras formas de abordagem da língua, como a gramática funcionalista, por exemplo.
Assim, entendo que é primordial que o professor esteja sempre em formação,
pesquisando, refletindo, analisando e revendo seu fazer docente, a fim de embasar
consistente e conscientemente sua prática.
É exatamente, nesse ponto, que entram como grande importância a dis-
ciplina de estágio e os estudos: da Sociolinguística, da Análise do Discurso, da
Linguística Textual, da Semiótica, da Estilística, enfim, da Linguística Aplicada.
Esses conhecimentos são importantes, pois são eles que justificarão as escolhas
144
teórico-metodológicas do professor de língua materna, tornando as aulas de língua
portuguesa cada vez mais produtivas e significativas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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decisivo para as escolhas teórico-metodológicas que nortearão o fazer docente nas aulas de língua materna.
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NEVES, M. H. M. Gramática na escola. 2. ed. São Paulo: Contexto, 1991.
146
A AULA E SUAS PARTES: PENSANDO AS MUDANÇAS
E AS PERMANÊNCIAS NO ENSINO DE HISTÓRIA
ATRAVÉS DE FOTOGRAFIAS
INTRODUÇÃO
63
Doutoranda em História (UFPel). CV: http://lattes.cnpq.br/1116806849100317
64
Doutorado em História (PUCRS). Professora e coordenadora Mestrado Profissional em História (UFPel).
CV: http://lattes.cnpq.br/9702327766711105
65
Graduanda em História (UFPel). CV: http://lattes.cnpq.br/3108933244813773
147
voltada especificamente a profissionalização na vida adulta e as meninas aos cui-
dados da casa, como por exemplo, costurar, bordar e pintar.
Além disso, segundo o historiador Kossoy a interpretação da fotografia propor-
ciona um exame interpretativo, algo presente nas análises realizadas durante a pesquisa
A partir do conteúdo documental que encerram, as fotografias que
retratam diferentes aspectos da vida passada de um país são importantes
para os estudos históricos concernentes às mais diferentes áreas do
conhecimento. Essas fontes iconográficas, submetidas a um prévio
exame técnico-iconográfico e interpretativo, prestam-se definitiva-
mente para a recuperação de informações. (KOSSOY, 2012, p. 57)
DESENVOLVIMENTO
148
Aula de leitura do EEPG Orozimbo Maia, de Campinas, em 1939.
149
Sala de aula com suporte do quadro-negro nos anos de 1930
Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Figura-2-Sala-de-aula-com-suporte-do-quadro-ne-
gro-nos-anos-de-1930_fig1_345212538
151
Continuamos observando a separação dos gêneros e uma diferenciação no
aprendizado para ambos. Contudo, devemos salientar que é justamente nesse
período, especificamente entre 1945 a 1964, que segundo Carli (2010) surgem os
movimentos para o ensino popular no Brasil: Campanha Nacional de Educação de
Adultos em 1950; Campanha Nacional de Educação Rural em 1952; Campanha
do Livro Didático e Manuais de Ensino em 1953 e a criação do Centro Brasileiro
de Pesquisas Educacionais em 1955.
Além disso, o começo da tramitação no Congresso Parlamentar da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a primeira LDBEN no Brasil,
“foram 13 anos de discussão parlamentar, de que amplos setores da sociedade
civil tomaram parte” (CARLI, 2010, p. 75). Em decorrência das mudanças na
legislação e no cenário político nacional observaremos uma mudança signifi-
cativa nos períodos posteriores.
A terceira foto retrata um ambiente escolar diferente em relação aos anterio-
res, uma vez que, observamos a presença de meninos e meninas juntos na classe e
sem a presença da professora. A fotografia se apresenta em cores, em decorrência
do avanço do registro fotográfico e consegue de maneira superior detalhar até
mesmo os elementos presentes nas paredes da sala de aula.
Fonte: https://www.fundacaotorino.com.br/ei/sobre/
A fotografia aqui selecionada retrata uma sala de aula numa escola particular
no estado de Minas Gerais e possui como intencionalidade demonstrar o espaço
de aprendizado que essa instituição proporciona aos seus alunos. Justamente por
152
se tratar de uma instituição privada a foto foi produzido por um profissional e
está presente no site de propaganda da escola. Novamente observamos a ordem
e disciplina presentes no local, a mistura dos gêneros no mesmo ambiente e uti-
lização de mapas e gráficos nas paredes da sala. Além disso, os jovens não estão
vestidos de maneira semelhante, ou seja, uniformizados, outro ponto de altera-
ção em relação a outras imagens.
Além disso, vale mencionar que o contexto histórico de produção dessa
fotografia é o período da ditadura-civil militar no Brasil e em decorrência disso,
segundo Carli (2010) as reformas do ensino primário e secundário ocorreram
em 1971 e foram consolidas pela Lei nº 5.692/1971 e a nova LDBEN. Nesse
momento, buscava-se a modernização da educação e do espaço escolar, algo que
é visualizado de maneira indireta na própria fotografia.
As últimas imagens são referentes ao final do século, especificamente
década de 90, na escola EMEF Sebastiana Cobra no munícipio de São José dos
Campos no estado de São Paulo.
Fonte: https://sites.google.com/site/historia1958/35o-anos-da-emef-sebbastiana-cobra
Fonte: https://sites.google.com/site/historia1958/35o-anos-da-emef-sebbastiana-cobra
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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Nota: esse texto é resultado da produção de pesquisa, debates e discussão realizadas dentro do grupo de
estudos em Ensino de História, que recebe financiamento de bolsa EPEC-Ensino/FURG e do projeto de
pesquisa em Livros didáticos, financiado por bolsa CNPQ-PIBIC
156
A FORMAÇÃO DO CARÁTER NOS ESCRITOS DA
EDUCADORA ELLEN G. WHITE
INTRODUÇÃO
Pós-Doutorado (FAJE). Doutorado em Ciências da Religião (Atlantic International Universit – EUA). Professor de
66
158
A INFLUÊNCIA DOS PAIS NA FORMAÇÃO DO CARÁTER
159
Um dos fatores que mais exercem grande influência na formação do caráter
é o tipo de disciplina aplicada pelos pais. Dependendo da sua forma e atuação,
teremos indivíduos fortes, estruturados ou pessoas frágeis e desequilibradas.
As capacidades físicas, mentais e espirituais devem ser desenvolvidas de
maneira equilibrada, sob o preço da disciplina. O exemplo perfeito é Jesus, que “cres-
cia em sabedoria, em estatura e em graça diante de Deus e dos homens” (Lc 2:52).
“Pais bem informados exercem uma disciplina do tipo democrático, onde há abertura
para o diálogo, e onde as punições são aplicadas com amor” (WHITE, 1989a, p. 79).
O DESENVOLVIMENTO DO CARÁTER
162
f ) Contato com a natureza
“O contato constante com a natureza, a observação das belas coisas da criação
de Deus, propendem a despertar o espírito, purificar e elevar o caráter. Desperta o
interesse e respeito pelas coisas que Deus criou” (WHITE, 1973, p. 143).
g) Esforço Diligente
Deve haver sincero e perseverante esforço para romper com os costumes,
regras e más associações (WHITE, 1989b, p. 547). Os elementos que tornam o
desenvolvimento do caráter bem sucedido são: desejo irreprimível; vontade indo-
mável; esforço tenaz; incansável perseverança (WHITE, 1978b, p. 669).
h) Como desenvolver o Caráter
“Cada ato da vida tem sua influência neste processo. As pequenas coi-
sas têm sua influência e a negligência nestas coisas pode deixar grandes defi-
ciências no caráter das pessoas” (WHITE, 1989b, p. 546). As faculdades men-
tais e morais devem ser educadas para a formação de um caráter de valor, com
pleno desenvolvimento do intelecto.
i) A meditação e a atividade
A meditação e a atividade são essenciais à formação do caráter cristão.
j) O trabalho duro
Trabalho duro é essencial ao êxito de cada jovem. Devemos vencer a incli-
nação de procurar uma ocupação fácil e em qualquer posição que servirmos
estarmos desenvolvendo o caráter.
l) O tempo
Todo momento deve ser sabiamente aproveitado, cuidando de se proteger
o coração (a mente) de determinadas coisas que possam denegrir o caráter. Um
coração bem protegido significa sobrevivência.
m) A resistência
No que concerne às tentações; a fortuna, a fama, o poder e o prazer são os
maiorais. “Resistindo contra cada uma delas de peito aberto, cultivaremos o caráter
dentro de nós” (SWINDOLL, 1985, p. 22).
n) Sinceridade e integridade
Deve-se buscar a sinceridade com todo coração, pois ela faz parte de um
caráter sólido, sem hipocrisia e máscaras. Deve-se buscar ser verdadeiros e honestos,
apresentando profundidade de pensamentos e firme integridade.
163
o) Os talentos
Os talentos devem ser aproveitados ao máximo. Deus nos deu estes talentos
para honrar e glorificar o Seu nome e para o bem de nossos semelhantes.
A TRANSFORMAÇÃO DO CARÁTER
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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168
ARQUEOLOGIA E EDUCAÇÃO: UM DIÁLOGO
INTERDISCIPLINAR ATRAVÉS DO PATRIMÔNIO
67
Doutorando em Arqueologia (MAE/USP). CV: http://lattes.cnpq.br/1058669383267451
169
III. Valorizar o território como espaço educativo, passível de lei-
turas e interpretações por meio de múltiplas estratégias educacionais;
Para uma discussão a partir das relações institucionais, ver Oliveira (2019).
69
Direito difuso é aquele cujo principal receptor são coletivos sociais e não indivíduos. Por exemplo, o meio ambiente é
70
um direito difuso.
173
por grupos sociais, participando da memória e da identidade destes grupos. Assim,
o patrimônio não existe por si próprio, ou melhor dizendo, ele só existe de maneira
coletiva. É dessa forma que ele aparece no Art. 216 da Constituição Brasileira;
Krenak, que participou ativamente da Constituinte de 1988 e, portanto, fez parte
da construção do atual entendimento jurídico a respeito do patrimônio, relata que
O que eu achei muito interessante no processo que me envolveu na
Constituinte é que eu tinha patrimônio muito mais como recursos do
que como direito. Antes de isso aparecer para mim como um acervo,
um patrimônio, ele aparecia para mim como um recurso, e eu nem
tinha pensado criticamente na diferença que pode haver entre um
acervo e um recurso. Agora, pensando criticamente, imagino que a
diferença seja a seguinte: o recurso é aquilo que você frui na vida
[...]. Vai fruir um recurso. É diferente da ideia de você ter um acervo.
Nesse conceito de acervo, você está aqui deste lado da montanha, mas
sabe que do outro lado da montanha tem disponível um conjunto de
bens, de coisas que você pode ter contato.
174
Uma vez que os objetos são compreendidos como vetores de processos sociais,
é possível discutir o que leva certos objetos a se tornarem patrimônio e outros não.
Isto é, a investigação crítica71 de um acervo patrimonial constitui um laboratório
de História, onde é possível analisar memórias a partir de uma dimensão crítica
(MENESES, 1994). Sendo o patrimônio fruto do trabalho humano, a hierarqui-
zação de certos produtos que se tornam tombados ou musealizados muitas vezes
passa pela divisão de classes dentro da própria sociedade, onde é o patrimônio
relacionado à elite e seu modo de vida aquele mais valorizado, ou então patrimônios
sobre os quais são erigidos discursos que glorificam um passado inexistente a fim
de criar discursos ufanistas. Outra capacidade do acervo é discutir criticamente o
presente através dele, seja através da problematização de como aquele objeto che-
gou a ser produzido, seja através da problematização de como ele foi consumido.
Por fim, patrimônio-gerador pode servir no combate aos preconceitos e
racismos que fazem parte da superestrutura do modo de produção capitalista.
Milanez et al (2019), por exemplo, descrevem como o racismo contra povos indí-
genas aparece enquanto segregação, negação da existência, fossilização da cultura,
além de preconceito religioso desde a chegada dos europeus à América. Vemos
diversas mentiras sendo contadas sobre estes povos, como eles serem aculturados,
terem muito privilégios, muitas terras, serem atrasados e não gostarem de trabalhar
(PORTAL GELEDÉS, 2014). Nos últimos anos, vimos o presidente Bolsonaro e
seu vice dizendo que indígenas são como animais em zoológico (G1, 2018), ou se
lamentarem que os indígenas não tenham sido dizimados no passado (G1, 2022).
Diante disso, vale notar a perspectiva de Souza (2022), que traz como
objetivos do ensino de história e cultura indígenas (dentro do âmbito do currí-
culo de Física): i. Consciência da existência do preconceito nos indivíduos e na
sociedade; ii. Combate ao problema; iii. Auto-sócio-crítica do mundo moderno
atual; iv. Invenção, valorização, reinvenção e reativação de práticas e conhecimen-
tos. Dentro de cada um deles, é necessário desaprender e aprender conceitos, e
podemos facilmente ver como o patrimônio-gerador pode ser importante tanto
para a desaprendizagem quanto para a aprendizagem.
71
Esta investigação crítica abre espaço inclusive para se desenvolver interfaces com disciplinas das ciências naturais, como
a Física, uma vez que é possível discutir quais técnicas são utilizadas na análise dos objetos, quais os limites desta técnica,
e como elas modificaram o próprio fazer arqueológico, levando à formação de uma auto-consciência crítica de como são
realizadas as pesquisas (CLARKE, 1973).
175
Tabela 1. Quadro de tópicos a serem desaprendidos e aprendidos em sala de aula (SOUZA,
2022, p. 17)
176
EM VIAS DE CONCLUSÃO: O PRINCÍPIO MOBILIZADOR DA
ESPERANÇA
177
favelas e em terras indígenas a ponto de falar que a história brasileira é marcada
por uma constante guerra civil?
A partir da investigação destas questões, reconhecemos que estes povos e
grupos sociais que sofreram e sofrem a violência também resistem ao capitalismo
por séculos, e que a nossa sociedade é apenas uma possibilidade entre tantas
outras. Vemos outras maneiras de estar no mundo e modificá-lo. Temos a chance
de elencar novas formas de agir e modificar o mundo que nos rodeia através do
patrimônio-gerador. Assim, a Arqueologia, em interface com a Educação, pode
servir ao que Freire chamou de uma postura “criticamente esperançosa”, em que o
futuro não está escrito e a desumanização não é inevitável (FREIRE, 2018). Em
outras palavras, existem sim alternativas à sociedade liberal e capitalista.
Esperança se relaciona com a nossa capacidade de projetar o futuro e sonhar,
sonhar com realidades que ultrapassam o curso dos acontecimentos e que, ao estar
em desacordo com a realidade, nos permite trabalhar para a realização destas utopias
(LENIN, 2017). Este é o “princípio de esperança” que podemos tirar da Arqueo-
logia e Educação em diálogo, uma esperança que “não é um otimismo irrestrito e
irresponsável, senão um realismo baseado no que a História nos mostra. As coisas
podem mudar se atuamos em coletivo. A desesperança imobiliza. A esperança
abre horizontes” (VÁZQUEZ, 2018, p. 672, tradução minha).
Agradecimentos
REFERÊNCIAS
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180
PROJETOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL NA
PERSPECTIVA HISTÓRICO CULTURAL POR MEIO
DA MEDIAÇÃO DIALÉTICA
INTRODUÇÃO
182
parceiros mais experientes que as levem a novos horizontes e que possibilitam
ampliar seu processo de humanização.
O objetivo do presente capítulo é apresentar um projeto dentro da
perspectiva histórico cultural que tem a mediação dialética como método de
investigação. Nos utilizamos da pesquisa qualitativa de cunho descrito com
aproximações de estudo de caso.
184
O PROJETO DO JARDIM
Atenciosamente,
Professoras Fernanda e Nádia.
188
A narrativa sobre o local de produção do chocolate gerou grande curiosidade
sobre o Estado do Espírito Santo, o que levou às professoras a mostrarem o mapa
político do Brasil, mas antes, este foi explicado junto ao mapa mundi, onde foi
dito que aquele era apenas um pequeno pedaço do mundo, as crianças ficaram
tão encantadas com a representação gráfica do território, que resolvemos colar em
cada uma de nossas cinco mesas um mapa múndi.
Dando continuidade ao projeto, nos organizamos para a realização da aula
de culinária. Necessário destacar as intervenções de letramento que permearam
o desenvolvimento do projeto. As crianças manifestaram a vontade de fazer a
receita do mousse e em seguida problematizamos como poderíamos fazê-la, o
que seria necessário para sua produção. Nesse momento a professora anotou os
ingredientes necessários para a receita e prontamente sugere que cada criança
contribua com algo para fazermos.
Então discutimos como faríamos para saber o que trazer e como comu-
nicamos às famílias. Uma criança disse que deveríamos escrever em um
pedaço de papel os ingredientes e assim procedemos, mas não de forma
convencional. Primeiramente, a professora escreveu no quadro em forma
de lista o nome de todos os ingredientes, com suas respectivas pistas. Após
visualizarem, as crianças foram combinando entre elas o que cada um poderia
trazer, quando decidiram, elas escreveram, cada um com sua forma particular
de escrita, um bilhete, o qual deveria ser levado para casa e lido para os pais,
para tanto, as crianças desenharam e algumas fizeram tentativa de escrita a
partir da lista feita pela professora.
No dia seguinte, as crianças trouxeram os ingredientes, e percebemos que se
fizeram entender com os seus bilhetes, pois utilizaram suas ferramentas e técni-
cas de escrita para a realização da receita. O resultado foi tremendo, porque cada
criança tinha em suas mãozinhas o ingrediente anotado. A atividade, que a olho
nú nos pareceu pequena, envolveu muito compromisso da parte das crianças, que
foi escolher o ingrediente, elaborar sua forma de anotação, cuidar para que aquela
anotação não se extraviasse, a leitura que fizeram em casa, a credibilidade que a
anotação produziu, pois ali eles não tinham apenas a fala, mas o bilhete, que era
uma “prova” do planejamento futuro.
A execução da culinária foi um momento ímpar, na medida em que acredita-
mos que este seja gerador de cumplicidade e prestígio e são, sem dúvida, absorvidos
pela criança, pois o compromisso que os pais assumem ao estarem alinhados aos
189
acontecimentos da sala é gerador de infinitas potências para o desenvolvimento
emocional e intelectual de cada um deles.
É necessário destacar que nos preocupamos em desenvolver uma abordagem
includente em relação às crianças e suas diferentes possibilidades de contribuição
do ingrediente, assim, na roda, tratamos o assunto de forma muito tranquila, sem
pressioná-los a trazerem algo que não seria possível para aquele momento.
A roda de conversa é o local onde todas as crianças têm a oportunidade de
falar e também de se sentirem parte do todo, esses momentos sempre nos foram
muito caros, pois era ali onde podíamos fazer a retomada de cada etapa que já tinha
sido concluída e lembrar as que ainda precisavam ser alcançadas. A conversa, o
diálogo, a roda nos davam alicerce para que a todo o momento os pares estivessem
se sentindo parte do processo.
No momento da execução da aula de culinária, ainda destacamos a orga-
nização no momento de preparar, a retomada da lista de ingredientes e modo de
preparo, esperar a vez de participar, o momento de escolha de cobertura, contribuir
da execução da receita e a autonomia ao se servir.
Em todo o processo, a cada detalhe é possível perceber o aprendizado de
questões relacionadas a matemática, quantidades, contagem um-a-um e divisão.
Na aula de culinária as crianças comeram e puderam levar uma porção para casa,
com o objetivo de compartilhar a produção com as famílias, um bilhetinho foi
enviado junto, para agradecer o envolvimento de todos. Algumas famílias deram
devolutiva nos parabenizando e elogiando o sabor do mousse.
Em um outro momento trouxemos para as crianças o filme “ A fantás-
tica fábrica de chocolate”. Após assistirmos ao filme, realizamos uma roda de
conversa e fizemos alguns apontamentos relacionados aos comportamentos e
atitudes das crianças da história. Compreendemos que o filme é uma forma de
arte que deve ser proporcionada às crianças. O momento do cinema não poderia
faltar para os nossos pequenos.
A leitura de diferentes histórias com o tema chocolate também fizeram
parte das tardes do grupo. Uma em especial “O coelhinho que não era de
Páscoa” da autora Ruth Rocha. A história tem como protagonista um coe-
lhinho que não queria ser de páscoa, e aprende com seus amigos a profissão
de confeiteiro e acaba salvando a páscoa no final da história. Muitas crian-
ças sentiram vontade de também serem confeiteiros, então, aproveitamos a
190
oportunidade para conhecer um pouco mais dessa profissão, convidando um
profissional para ampliar nosso olhar.
Em virtude da pandemia, tivemos que pensar em estratégias para essa ati-
vidade, pois a escola tinha um protocolo de segurança onde não poderia entrar
nenhum adulto além dos que já estavam no quadro, assim, a professora entrou em
contato com o confeiteiro que se colocou à disposição para fazer um vídeo para
as crianças. Foi aí que surgiu a ideia de fazermos um bolo e a professora entregar
na casa dele para ele confeitar.
Nossa primeira necessidade era obter uma receita do bolo, assim fomos até
a internet buscá-la. Após a professora selecioná-la, essa foi lida para as crianças,
com o combinado de ser realizada no outro dia. Porém, a professora explicou que
não teríamos o computador e que seria preciso anotá-la para não esquecer. A
professora sugeriu que escrevessem em uma cartolina, de uma forma que ficasse
visível para o grupo todo e todos pudessem ler e realizar a receita sem ajuda,
sozinhos, apenas sob seu olhar atento.
Enquanto a professora fazia a leitura, eles organizavam a escrita na carto-
lina, ali valia tudo, desenhos, a primeira letra, uma única sílaba da palavra, enfim,
puderam utilizar diferentes recursos para o registro.
Posteriormente fizemos a organização e a divisão de ingredientes e todos
contribuíram da melhor forma. Após o bolo ficar pronto, as crianças enviaram
para o confeiteiro, que gravou um vídeo falando sobre a sua profissão e história
de vida, ele também mostrou algumas técnicas de confeitaria.
No dia seguinte, as crianças ficaram maravilhadas com a surpresa do bolo
confeitado e ainda puderam fazer o corte e se servirem com autonomia. Uma
criança manifestou a vontade de levar a receita para a mãe dele e assim todas
as crianças fizeram o registro da receita e levaram para as suas casas. Também
propomos que fizessem com suas famílias e se pudessem compartilhassem esse
momento com a turma. Tivemos uma surpresa com a vontade do Miguel em fazer
e trazer de presente para as professoras.
Propostas e desafios envolvendo conceitos matemáticos fizeram parte do
projeto a todo o momento. Aqui temos uma proposta de retomada e elaboração
de conceitos de fração, jogos de alfabetização relacionados ao tema também esti-
veram presentes e na foto (anexo 1) especificamente estamos utilizando o celular
para vermos juntos de onde vem o açúcar. Estávamos diante de questionamentos
191
e demandas que exigem outras ferramentas e as mídias precisam estar presentes
para contribuir de forma positiva na aquisição de conhecimento.
Como percebemos uma polêmica a respeito do “açúcar” solicitamos a
visita de nossa nutricionista, que ofereceu uma palestra para as nossas crianças.
Nessa visita, ela trouxe propostas de trocas inteligentes, para que as crianças
entendessem que o açúcar em excesso faz mal para a saúde e assim nos ensi-
nou a diminuí-lo usando o cacau no lugar de achocolatados. Aqui podemos
abordar a ideia de porcentagem com os termos, cacau 50% ou cacau 70%, onde
foi explicado utilizando a caneca que eles utilizam, riscamos com canetão para
representar a metade, e explicamos que metade poderia ser representada por
50%, e os 70% teria dois risquinhos a mais.
No dia seguinte, fizemos a bebida de chocolate sugerida pela nutricionista,
sem açúcar, apenas o cacau. Esta atividade foi realizada com o grupo, sem a inter-
venção da professora, desde o check list dos utensílios necessários como jarra,
colher grande para mexer, os copinhos em correspondência biunívoca e todos os
ingredientes necessários para a produção da bebida. Quando a experimentamos,
tivemos opiniões variadas, foi aí que surgiu a ideia de fazermos uma votação para
verificar quantos porcento a bebida tinha sido aprovada. A votação ocorreu em
assembleia e a bebida obteve 80% de aprovação.
A professora trouxe para a sala um livro muito diferente, onde as ilustra-
ções eram feitas de tecidos, botões e lãs, cujo nome era “Meu amor” de Beatrice
Alemagna. As crianças ficaram muto interessadas não apenas nas histórias, como
também na possibilidade de ampliarem suas produções artísticas, seus dese-
nhos, suas pinturas e esculturas.
Compreendendo que a arte também deve fazer parte do ambiente da edu-
cação infantil, oportunizamos um momento de produção coletiva: Combinamos
de produzirmos uma tela com materiais dos tons do chocolate, do projeto da
turma, para presentear a supervisora e a orientadora do núcleo que estiveram
presente em todo o processo do desenvolvimento do “Projeto Chocolate”. Nesta
atividade cada criança contribuiu de uma forma, uns pintaram, outros colaram
e outros escreveram. A participação não só das crianças como das professo-
ras no projeto foi determinante para que este, acontecesse, nosso processo de
aprendizagem foi sendo um deleite para o grupo, fomos aprendendo coisas que
superaram os primeiros objetivos, fomos nos envolvendo todos os dias, reali-
192
zando descobertas inusitadas e potentes na construção de sujeitos experientes,
criativos, autônomos e mais sensíveis.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
193
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, José Luís Vieira de; OLIVEIRA, Edilson Moreira de; ARNONI, Maria Eliza Brefere. Mediação
dialética na educação escolar: teoria e prática. São Paulo: Loyola, 2007.
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ler e a escrever: uma proposta construtivista. Porto Alegre. Artmed, 2008.
VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
194
O BIG DATA COMO PRECURSOR NA FORMA
DE PLANEJAR, AVALIAR E RESSIGNIFICAR A
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO
INTRODUÇÃO
CV: http://lattes.cnpq.br/8980539982139253
195
educação contemporânea. Essa tecnologia é tratada e discutida de maneira
a incentivar sua utilização em busca de melhores resultados na formação
integral dos discentes atuais.
BIG DATA
DESENVOLVIMENTO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
Babosa, A. A. S., Andrade, F. S., & de Carvalho, R. N. (2017). Mineração de Dados em Ambientes Virtuais
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201
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Taurion, C. (2013). Big data. Rio de Janeiro: Brasport.
202
O GOOGLE WORKSPACE FOR EDUCATION E SUAS
FERRAMENTAS DE COLABORAÇÃO EM REDE PARA
A APRENDIZAGEM
CONHECENDO A ÁGUA E SEUS PROCESSOS
EM UMA ATIVIDADE COLABORATIVA,
INTERDISCIPLINAR E CONTEXTUAL
INTRODUÇÃO
CV: http://lattes.cnpq.br/8980539982139253
203
uma fundamentação teórica aplicada ao processo de reconhecimento, estudo e
utilização de ferramentas colaborativas como precursoras de um aprimoramento
na forma de fazer a educação do século XXI.
COLABORAÇÃO EM REDE
205
Para Moura e Carvalho (2006), as TIC’s são essenciais no desenvolvimento de
boas práticas em sala de aula, principalmente quando geridas em rede, proporcionando
atividade colaborativa com intenção pedagógica. Segundo as autoras, a utilização
de ferramentas em rede, proporcionam um ambiente de protagonismo para seus
utilizadores, onde estes passam a interagir e produzir conteúdo que auxilia no
desenvolvimento cognitivo, seu e de seus colegas, promovendo significado ao que
é estudado. Para Grotto (2004), a formalização do conhecimento é uma associação
de correlação entre o sujeito e o meio, ganhando propósito a partir de vivências
construtivas que promovam experiências.
Para Grotto (2004), a interatividade proporcionada pelas ferramentas digi-
tais em rede, promove em seus utilizadores, determinado grau de envolvimento,
transferência de práticas e domínio sobre os eventos. A autora evidencia que é
inexequível adivinhar com confiança o procedimento humano, por isso, ferra-
mentas adaptativas e em rede são propícias à utilização pedagógica para desen-
volver conhecimento, pois buscam potencializar interatividade e colaboração
para fortalecer a aprendizagem.
DESENVOLVIMENTO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
Barbosa, J. R. A. (2008). A avaliação da aprendizagem como processo interativo: um desafio para o educador.
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de aula. Momento-Diálogos em Educação, 27(1), 266-281.
210
QUAIS FRUTAS VOU ESCOLHER? CONVERSANDO
SOBRE HISTÓRIAS EM QUADRINHOS E O
TRABALHO COM A COMBINATÓRIA NA INFÂNCIA
INTRODUÇÃO
Durante nossa jornada em sala de aula, seja como professores, como licen-
ciandos ou alunos da educação básica, percebemos que a combinatória se apresenta
como um dos conteúdos matemáticos mais complexos, tendo em vista a existência de
algumas dificuldades relatadas por estudantes (ZANON, 2019). Essas dificuldades
se concentram na compreensão dos enunciados, na identificação dos agrupamentos
(permutação, arranjo ou combinação), no número de cálculos envolvidos, dentre
outros aspectos que acabam por caracterizar os problemas como difíceis e, em
algumas ocasiões, incompreensíveis aos olhos de quem está lendo (ZANON, 2019).
Entretanto, apesar de ser formalizada com seus conceitos elucidados apenas
no ensino médio (BRASIL, 2018; ZANON, 2019), temos que seus princípios
podem ser abordados em etapas iniciais do processo educacional, como, por
exemplo, na educação infantil (BORBA; PESSOA; BARRETO; LIMA, 2013;
ZANON, 2019), quando se explora e se trabalha com atividades relacionadas ao
raciocínio combinatório. Por isso, no decorrer dos anos, o debate acerca do ensino
de matemática na educação infantil tem se intensificado e se tornado elemento
de constante análise entre pesquisadores. Desse modo, há um movimento de
reflexão acerca de práticas pedagógicas que podem ser implementadas para o
trabalho com a matemática na infância.
Assim sendo, nossos estudos buscam propor aos docentes que atuam na
educação infantil uma discussão sobre a utilização de um recurso pedagógico que
pode auxiliar no desenvolvimento do raciocínio combinatório de crianças. Esse
recurso são as histórias em quadrinhos (HQs), um gênero literário que ainda circula
entre crianças e adolescentes. Dentre suas caraterísticas, as HQ trazem uma dada
CV: http://lattes.cnpq.br/4458768372376772
211
visão da realidade. Portanto, nossa intenção é apresentar a história em quadrinhos
“Hoje é dia de salada de frutas!”, discorrer sobre como professores da educação
infantil podem trabalhar essa narrativa com crianças de 5 anos, através de uma
intervenção pedagógica, e descrever possíveis maneiras de como ela, a HQ, pode
auxiliar no desenvolvimento do raciocínio combinatório.
O enredo da HQ aqui mostrada tem a finalidade de apresentar a seguinte
situação: uma criança é convidada por uma adulta (nós pensamos e planejamos
que fosse sua mãe, mas as crianças que a lerem podem ter outras interpretações) a
escolher três dentre quatro frutas disponíveis para a preparação de uma salada de
frutas. As ações de escolha e as formas de organizar as frutas para a preparação da
salada tendem a mobilizar o raciocínio combinatório das crianças envolvidas no
processo. Desse modo, acreditamos que a proposta amplia padrões convencionais de
aulas expositivas e dialogadas e expande o uso de materiais didáticos manipuláveis
em atividades de matemática. Além disso, busca, de uma maneira mais dinâmica,
aproximar as crianças da matemática presente em seu cotidiano. Ademais, a inser-
ção dessa temática na educação infantil pode vir a contribuir para aprendizagens
futuras, nessa, e, em outras áreas do conhecimento, no decorrer da vida das crianças.
DESENVOLVIMENTO
215
O USO DA HQ COMO RECURSO DIDÁTICO
217
Figura 1 – Hoje é dia de salada de frutas!
Quadrinho 4 Quadrinho 5
1- 9- 17 -
2- 10 - 18 -
3- 11 - 19 -
4- 12 - 20 -
5- 13 - 21 -
6- 14 - 22 -
7- 15 - 23 -
8- 16 - 24 -
CONSIDERAÇÕES
REFERÊNCIAS
BORBA, Rute Elizabete de Souza Rosa; PESSOA, Cristiane; BARRETO, Fernanda; LIMA, Rita. Crianças,
adolescentes, jovens e adultos e a resolução de situações combinatórias. Horizontes, Itatiba, v. 31, n. 1, 2013.
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BORBA, Rute; ROCHA, Cristiane de Arimatéa; AZEVEDO, Juliana. Estudos em Raciocínio Combina-
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ZANON, Thiarla Xavier Dal-Cin. Reflexões sobre enunciados de problemas de análise combinatória em
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em: https://periodicos.ufes.br/prodiscente/article/view/18618. Acesso em: 02 maio 2021.
ZANON, Thiarla Xavier Dal-Cin. Imagens conceituais de combinatória no ensino superior de matemática.
2019. 332f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal
do Espírito Santo, Vitória, 2019. Disponível em: https://sappg.ufes.br/tese_drupal//tese_13491_TESE%20
Thiarla%20-%20%20FINAL%2001-05%20para%20IMPRESS%C3O.pdf. Acesso em: 17 jun. 2022.
NOTA: este capítulo é uma adaptação de um TCC, o qual pode ser acessado em: https://repositorio.ifes.
edu.br/handle/123456789/1722?locale-attribute=en
222
GESTÃO ESCOLAR DEMOCRÁTICA REDE
MUNICIPAL DE ENSINO EM MAUÉS/AM NA
VISÃO DOS GESTORES
INTRODUÇÃO
81
Doutorando em Ciências da Educação (UNIDA-PRY). Professor (SME-Maués/AM).
CV: http://lattes.cnpq.br/0501017164481747
82
Doutor em Letras Neolatinas (UFRJ). Professor adjunto (UNILA) e professor pesquisador (UFAM).
CV: http://lattes.cnpq.br/6227315631560289
223
DESAFIOS PARA A IMPLEMENTAÇÃO DA GESTÃO
DEMOCRÁTICA NAS ESCOLAS
224
No cenário histórico, a luta por uma gestão escolar democrática é travada
em diferentes instâncias, e cada conquista deve ser comemorada. Nesse cenário, os
embates têm se intensificado com a finalidade de regulamentar legislação norteadora
e de definir instrumentos que operacionalizem essa perspectiva de gestão escolar.
Paro (2015, p. 85), por sua vez, afirma que
[...] isto pode funcionar como um importante suporte legal para
cada vez mais se incrementarem medidas a chamar a comunidade
para a escola para participar de decisões a respeito de seus rumos e
da realização de seus propósitos educativos.
225
A GESTÃO ESCOLAR NA PERSPECTIVA DE GESTORES
AMAZONENSES
226
QUADRO 02 – Respostas à Pergunta 02
Como você desenvolve a Gestão Democrática em sua escola?
Nº Nome Respostas
1 Informante 1 Faço de maneira coletiva e participativa, todos interagem.
Sempre busco envolver os profissionais de modo que possamos
2 Informante 2
desenvolver uma gestão participativa.
Fazer uma gestão precisa de uma coletividade que busque, incentive,
3 Informante 3
conheça e desenvolva mecanismos de processos educativos.
Trabalhamos em coletividade, cada um desenvolve sua função, pro-
4 Informante 4
curando fazer seu melhor para obtermos resultados positivos.
É importante a participação dos envolvidos na escola: professores,
funcionários, alunos, pais e toda comunidade escolar precisam
estar envolvidos por meio da democracia nas tomadas de decisões
5 Informante 5
na escola; assim é possível alcançar objetivos traçados com a
colaboração de todos, para maiores possibilidades de ter êxito
naquilo que é almejado dentro da instituição de ensino.
Fonte: adaptado de Caldas (2021)
227
No intuito de analisar o que pensam esses gestores de forma ampliada, indo além
do contexto escolar de sua própria instituição de ensino, a pergunta seguinte focou
em suas perspectivas sobre a gestão escolar na rede municipal de ensino em Maués.
A partir dos dados obtidos, percebemos que a gestão democrática está pre-
sente na rede municipal de ensino na visão de todos os informantes, sendo que
para três deles ela acontece de forma presente e ativa.
Buscando entender melhor as respostas obtidas pela pergunta anterior, a
seguir, apresentamos quadro com justificativas dos gestores.
228
Observa-se que os gestores escolares acreditam nos resultados a partir da
implantação de uma gestão democrática nas escolas de forma presente e ativa em
Maués/AM. Apenas um deles acredita que esse trabalho acontece de maneira
parcialmente democrática na rede municipal de ensino por seguir um planeja-
mento maior, do sistema educacional, extrapolando o planejamento local. Apesar
disso, todos entendem que o melhor caminho é fazer as escolas funcionarem
dentro da perspectiva democrática.
Segundo a Lei 13.005/2014 (BRASIL, 2014), prevê-se
Assegurar condições, no prazo de dois anos, para a efetivação da
gestão democrática da educação, associada a critérios técnicos de
mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade escolar, no
âmbito das escolas públicas, prevendo recursos e apoio técnico da
União para tanto.
229
4 Informante 4 Partilhamos conhecimento em prol da melhoria da educação.
Vantagens: envolvimento dos profissionais nas ações praticadas pela
escola. Desafios: buscar possíveis caminhos para participação efetiva
da comunidade escolar (família dos alunos).
5 Informante 5 Vantagens: o gestor não trabalha de forma isolada, ele sempre busca
envolver todos nas decisões que irão ajudar no ambiente escolar.
Desafios: as políticas públicas, gestores mal preparados, dificuldade
de participação dos pais na escola e professores desmotivados por
falta de um salário digno.
Fonte: adaptado de Caldas (2021)
230
ALGUNS POSSÍVEIS ENCAMINHAMENTOS...
REFERÊNCIAS
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Professor Darcy Ribeiro, 24 a 27 set. 2014.
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-2014-778970-publicacaooriginal-144468-pl.html>. Acesso em: abr. 2021.
BRASIL. Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 1 abr. 2021.
CALDAS, Ronan Miranda. Gestão democrática do ensino na rede municipal de Maués/AM – Brasil na
visão dos gestores, da BNCC e do RCA. Dissertação de mestrado defendida no âmbito do Programa de
Mestrado em Ciencias de la Educación da Universidad de la Integración de las Américas. Ciudad del Este,
Paraguay, 2021.
231
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LÜCK, Heloísa. Gestão educacional: uma questão paradigmática. 12ª ed. Petrópolis: Vozes, 2015. (Série:
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MOURA, E. S. Relações e contradições entre a gestão escolar democrática e a qualidade total: um estudo a
partir das observações realizadas em escolas públicas da rede Municipal de Manaus. 2011. 131 f. Dissertação
(Mestrado em educação) – UFAM/FUA, Manaus, 2011.
OLIVEIRA, J. L. C. de; MAGALHÃES, A. M. M. de; MASUEMATSUDA, L. Métodos mistos na
pesquisa em enfermagem: Possibilidades de aplicação à luz de Creswell. Texto & Contexto – Enfermagem,
Cascavel, v. 27 n. 2, jun. 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
d=S0104-07072018000200323&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 11 abr. 2021.
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(Educação, Tecnologias e Transdisciplinaridade; Políticas Públicas de Educação).
232
A EDUCAÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL
DO IDOSO
INTRODUÇÃO
83
Doutora em Direito e Justiça (UFMG). Professora do curso de Direito (UNAERP). Advogada.
CV: http://lattes.cnpq.br/3102197230766801
84
Pós-graduação em Planejamento Tributário (LEGALE). Pós-graduando em Direito Tributário (PUCRS). Professor
e advogado. CV: http://lattes.cnpq.br/2440698559494685
233
do idoso ao envelhecimento ativo, saudável e de qualidade (OMS, 2005, p. 9). Dito
de outra forma, o aumento da expectativa média de vida da população precisa ser
acompanhado de qualidade de vida, assegurando-se a saúde do idoso em todas
as suas dimensões (física, moral e social), exigindo-se que o Estado – e também a
sociedade – atue constantemente em benefício dessa parcela da população.
Dentre os direitos fundamentais do idoso, o direito à educação se revela como
essencial para que seja possível um envelhecimento saudável e com qualidade de
vida, pois é por meio da educação que ocorre a transformação e evolução moral,
social e política do ser humano, sendo ela instrumento necessário para a reinserção
social do idoso na vida da comunidade.
Atualmente, a legislação brasileira reconhece e garante diversos direitos fun-
damentais aos idosos, se mostrando bastante diversificada e organizada. Contudo,
no que se refere ao direito do idoso à educação e à implantação de políticas públicas
voltadas para a educação das pessoas idosas, percebe-se que, no Brasil, esse direito
ainda não se encontra devidamente consolidado. Isso porque, além da ausência
de um maior investimento na área de educação e de uma melhor preparação e
formação dos profissionais que atendem os idosos, muitas leis e políticas públicas
não observam as variadas peculiaridades, condições e necessidades inerentes a
pessoa idosa, desconsiderando a posição no processo educacional, havendo um
desrespeito às particularidades inerentes a sua idade.
237
A educação, enquanto direito de todos e dever do Estado e da sociedade,
além de fundamental para a formação pessoal e profissional do indivíduo, é direito
essencial para a construção de uma sociedade justa, harmônica e solidária, eis que
possibilita que o ser humano exerça conscientemente e plenamente a sua liberdade,
além de possibilitar a sua inserção e participação na vida social.
238
a saúde do idoso ainda permaneceu como atribuição preponderante das famílias
e da sociedade, e não primordialmente do Estado.
Posteriormente, em 1994, por meio da Lei n. 8.842, foi criada a Política
Nacional do Idoso (PNI) com o objetivo de “assegurar os direitos sociais do idoso,
criando condições para promover sua autonomia, integração e participação efetiva
na sociedade.” (art. 1º da Lei n. 8.842/94). O PNI de 1994 ainda assegura o direito
à saúde do idoso e o seu amplo acesso por meio do SUS, de modo que essa parcela
da população possa alcançar a longevidade com qualidade de vida.
Anos depois, em resposta às proposições contidas no Plano de Ação Interna-
cional para o Envelhecimento, formulado na II Assembleia Mundial sobre o Envelhe-
cimento, realizada em 2002, foi instituído o Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003),
que assegura aos idosos a fruição e gozo de todos os direitos fundamentais ine-
rentes à pessoa humana, e também, o acesso irrestrito a todas as oportunidades e
facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento
moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade (art. 2º
da Lei n. 10.741/2003). O documento normativo ainda determina como dever da
família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público “assegurar ao idoso, com
absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,
à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao
respeito e à convivência familiar e comunitária” (art. 3º da Lei n. 10.741/2003).
Em 2006, por meio do SUS, é instituído o Pacto Pela Saúde, cujo objetivo
é promover inovações nos processos e instrumentos de gestão, visando alcançar
maior eficiência e qualidade dos serviços prestados pelo SUS, redefinindo as
responsabilidades de cada um de seus gestores em função das necessidades de
saúde da população e na busca da equidade social. Em relação aos idosos, o pacto
assume o compromisso de garantir a saúde do idoso de forma integral, visando
o envelhecimento saudável e ativo dessa população por meio da implantação da
Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI - Portaria n. 2.528).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
241
qualquer outro membro da sociedade, é sujeito de direitos e deveres, participando
e exercendo o seu papel social dentro da comunidade.
Contudo, ainda nos dias de hoje, o idoso é tratado como cidadão de segunda
classe, sofrendo diversas formas de discriminação e violência. Além disso, os direitos
fundamentais dos idosos são frequentemente violados, de modo que essa parcela
da população é, por vezes, colocada à margem da sociedade.
Garantir a proteção e a efetivação dos direitos fundamentais dos idosos é
dever e responsabilidade social do Estado, que deve assumir o compromisso de
promover a igualdade e a justiça social, minimizando os danos decorrentes de
discriminações de faixa etária, como também as relacionadas com as diferentes
condições econômicas e sociais da população. Do mesmo modo, a legislação e as
políticas públicas devem assegurar que o processo de envelhecimento seja enca-
rado como uma problemática social, cuja solução exige a adoção de medidas que
preparem os indivíduos para o envelhecimento saudável.
Além disso, é inegável que a sociedade civil assume um papel de grande
importância para a estruturação e implantação de políticas para o público idoso,
sobretudo, no que diz respeito aos diversos programas, atividades e trabalhos que
buscam garantir a educação permanente e o aprendizado ao longo da vida.
No âmbito da educação, o Poder Público e a sociedade civil devem atentar-se
para o fato de que a população idosa possui suas peculiaridades e necessidades
específicas, devendo-se desenvolver novas práticas e ações educacionais que lhes
sejam adequadas. É preciso compreender que o ser humano é um ser inacabado
e em constante transformação, e o processo de aprendizado é permanente e deve
ser acessível para todos os membros da sociedade.
Importa ressaltar, também, que a educação do idoso não pode ser compreen-
dida como uma política de caráter assistencialista, e sim, como instrumento capaz
de promover a saúde e a qualidade de vida, permitindo-lhe um envelhecimento
saudável e com condições suficientes para que possa exercer a sua cidadania e ter a sua
dignidade respeitada (OLIVEIRA; SCORTEGAGNA; OLIVEIRA, 2015, p. 354).
Por fim, verifica-se que no Brasil, embora a legislação e as políticas públicas
específicas para a educação contemplem os direitos da pessoa idosa em diversos
aspectos, há momentos em que o idoso é equiparado e/ou caracterizado como
adulto, e o seu direito à educação é integrado à educação de adultos, e até mesmo,
à educação para todas as idades. Por isso, é possível concluir que a sociedade
brasileira ainda carece de ações e políticas públicas específicas e eficazes para a
242
educação da pessoa idosa, prejudicando e/ou impedindo a concretização de um
direito essencial para um envelhecimento ativo e saudável: o direito à educação.
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244
ÉTICA, LITERATURA E DIREITOS HUMANOS:
EXPERIÊNCIA EM CONTEXTO DE
ENSINO JURÍDICO
INTRODUÇÃO
248
consiste em código de conduta, costumes morais e hábitos e de um determinado
local, ao passo que a outra, pretende ser a racionalização dessa moral, eticamente.
A moral é criada de acordo com a evolução de cada sociedade, por meio
de suas tradições e costumes, ditando o que pode e o que não pode, o que é
aceito e o que não é aceito. Porém, a ética, se dedica a reflexão sobre as ações
morais, aprovando ou reprovando o certo e o errado, bem como o que deve ser
mantido e o que deve ser reprovado, buscando assim um melhor equilíbrio entre
todos de uma sociedade em comum.
Mas há um clamor dos excluídos/oprimidos, aqueles que quase não são
ouvidos, e quando são, praticamente não são atendidos. Como está a comunidade
estudantil? Como são tratados educandos e educadores? A formação dos cidadãos
e profissionais do futuro, depende diretamente dos educadores, por isso devem
ser valorizados, reconhecidos, fornecendo condições necessária para fortalecerem
seus conhecimentos. “Pois não há docência sem discência”.
(...) A ética de que falo é a que sabe afrontada na manifestação dis-
criminatória de raça, de gênero, de classe. É por esta ética inseparável
da prática educativa, não importa se trabalhamos com crianças, jovens
ou com adultos que devemos lutar (...) (FREIRE, 2020, p. 17 e 18)
249
inerentes à sua realização: o problema dos fins não pode ser dissociado
do problema dos meios (BOBBIO, 2004, p. 44).
E para tais fins praticar a tolerância e viver em paz, uns com os outros,
como bons vizinhos, e unir as nossas forças para manter a paz e a
segurança internacionais, e a garantir, pela aceitação de princípios e
a instituição dos métodos, que a força armada não será usada a não
ser no interesse comum, a empregar um mecanismo internacional
para promover o progresso econômico e social de todos os povos.
Assim sendo de suma importância destacar, que há boas leis, o que falta
são líderes, pessoas comprometidas verdadeiramente em colocá-las em práticas,
precisando de novas leis e/ou adequação das já existente, que seja verdadeira e
efetivas, leis usuais. Observado o preâmbulo da Declaração Universal Dos Direitos
Humanos, é possível destacar o reconhecimento da dignidade de todos os seres
250
humanos, ao pondo de destacar como sendo uma só família, ou seja, desde 1948
foi adotada e proclamada pela resolução de 217 A(III) da Assembleia Geral das
Nações Unidas, e apresentada ao mundo:
Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade ine-
rente a todos os membros da família humana e dos seus direitos
iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça
e da paz no mundo;
252
sível transformar e não só ser transformado pelo mundo. Assim sendo, todos tem
direitos e obrigações, exigindo uma e cumprindo a outra.
Sendo assim, o presente trabalho é proposto com o objetivo de apresentar uma
proposta de atualização hermenêutica necessária dos valores dos direitos humanos,
e um trabalho interdisciplinar, que dão origem à cultura do saber, através de uma
visão investigativa apresentada pelas janelas da literatura. No entanto é necessária
uma constante reflexão. Até que ponto a teoria do politicamente correto contri-
buiu para os direitos humanos? Haja vista, todos os direitos e garantias prevista
na Declaração Universal dos Direitos Humanos, seria suficiente para qualquer e
todo ser humano ser respeitado, as divisões de raça, classe, opção sexual, religião
etc. fez enfraquecer todos, pois a divisão nunca fortalece.
CONSIDERAÇÕES
REFERÊNCIAS
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https://www.pensador.com/frase/Mjcy/#:~:text=Aprendemos%20a%20voar%20como%20os%20p%C3%A1s-
saros%20e%20a%20nadar%20como,aprendemos%20a%20conviver%20como%20irm%C3%A3os. Acesso
em: 06 dez. 2021.
254
“O LUGAR DOS DIREITOS HUMANOS NO ENSINO
DE LITERATURA: APROXIMAÇÕES ENTRE
CONCEIÇÃO EVARISTO E TEREZA CARDENAS”
INTRODUÇÃO
87
Especialização em Língua Espanhola e Literatura em Língua Espanhola (UFMT).
CV: http://lattes.cnpq.br/5262766582822364
88
Doutor em Teoria Literária e Literatura (UnB). Docente (UNIC). CV: http://lattes.cnpq.br 6784437572638138
255
de direito e de saber de todos aqueles que dela necessitam é que nos impulsio-
nam enquanto pesquisadora e professora da sala de aula, a apoiar e lutar por um
ensino de qualidade, onde, o aluno encontre significado para sua trajetória de vida,
enquanto indivíduo, reconhecendo a importância do saber na sua formação escolar.
Dessa maneira, a escola deve ser uma referência para todos aqueles que ali vão
em busca do conhecimento possam se sentir acolhidos e enxergar o espaço escolar
como um lugar de pertencimento e se veja como parte do processo para a construção
de uma sociedade mais igualitária, mais justa para todos. Acreditamos que a leitura
literária contribui para o pensamento reflexivo uma vez que discute questões da socie-
dade contemporânea, trazendo átona problemas vivenciados no cotidiano das pessoas.
O contato com o texto literário, desperta o criticidade do leitor, para que ele
se posicione diante dos conflitos, diante das injustiças e das desigualdades sociais,
desperta o desejo por uma sociedade melhor e o faz perceber que as mudanças
precisam acontecer, primeiramente nele próprio, enquanto leitor/estudante e depois
em todos os demais que carecem de oportunidades.
Nessa perspectiva, a escritora brasileira, Conceição Evaristo e a cubana, Teresa
Cárdenas, contribuem para uma tomada de consciência, de descoberta e de conquista
por direitos humanos e por igualdades sociais, levando o leitor a uma profunda
reflexão diante da vida e do respeito ao outro. A escola é, portanto, um espaço, onde
se aprende sobre o mundo, onde cada um se identifica, se reconhece e também se
diferencia. Sendo a escola um lugar de ensino/aprendizagem, é também um lugar de
construção de boas histórias, de superação, de oportunidades e de reconhecimento.
DESENVOLVIMENTO
Entretanto, não queremos dizer com isso, que atividades como essas não sejam
importantes para o desenvolvimento do discente, o que queremos ressaltar aqui é a
omissão da leitura da obra literária como ferramenta de ensino/aprendizagem, em
que propicia ao leitor/aluno o desenvolvimento do imaginário, como a aventura
257
de conhecer muitos lugares, culturas diferentes e ainda promove a criticidade.
Por fim, a literatura, além de expandir os conhecimentos do leitor, proporciona a
este viver experiências jamais experienciada de outra maneira, em outras palavras,
podemos dizer que essa omissão da leitura da obra literária na sala de aula nos
documentos oficiais, é por certo, o apagamento da literatura na Educação Básica.
Partindo do pressuposto que em uma comunidade escolar, alunos e professores cons-
tituem sujeitos imprescindíveis no processo de ensino aprendizagem em uma comunidade
escolar em que ambos exerçam a prática cotidiana como objeto de reflexão, fica evidenciado
que é possível o avanço rumo a uma educação mais justa e igualitária. A inserção de textos
literários na educação básica amplia o entendimento do aluno e promove a contemplação
cultural e revela ainda, valores diferentes aos seus. Isso acontece porque, a partir do contato
com texto literário, o aluno é capaz de se familiarizar com padrões de interação social,
diversificada e distinta, sabendo valorizar e apreciar diferentes formas culturais.
Wolfgang Iser (1996), importante representante da Teoria do Efeito da
Recepção, diz que diante dos vazios dos textos, isto é, dos interditos, o leitor deverá
preenchê-los com plurissignificações. Isto posto, cabe ao leitor interagir com a
estrutura do texto literário, pois, mesmo sofrendo seus efeitos, ainda age sobre ele.
Se o sentido do texto tem um caráter de imagem, então o sujeito nunca desaparecerá
dessa relação. Ao contrário do que é um princípio válido para o modo do conheci-
mento discursivos, os seguintes pontos de vista são características desse processo:
O leitor não consegue mais se distanciar dessa interação. Ao contrário,
ele relaciona o texto a uma situação pela atividade nele despertada; assim
estabelece as condições necessárias para que o texto seja eficaz. Se o leitor
realiza os atos de apreciação exigidos, produz uma situação para o texto e
sua relação com ele não pode ser mais realizada por meio da divisão discur-
siva entre sujeito e objeto. Por conseguinte, o sentido não é mais algo a ser
explicado, mas sim um efeito a ser experimentado. (ISER, 1996. p. 33-34).
258
Nesse sentido, experimentar a leitura com o espírito da época, as condições
sociais e as disposições dos seus autores, certamente, é uma posição privilegiada,
uma vez que os textos literários têm como característica não perder a sua capaci-
dade de comunicação. Por essa razão, mesmo depois de muito tempo, eles ainda
conseguem se comunicar com o leitor e ainda são passíveis de significação.
Cosson (2021, p. 16), ao referir-se à prática da literatura, seja ela leitura ou
escrita, diz que “consiste exatamente em uma exploração das potencialidades da lin-
guagem, da palavra escrita, que não tem paralelo em outra atividade humana”, através
da qual nos é revelado, muitas vezes, um discurso arbitrário carregado de um discurso
próprio, maneira de se tornar dono da linguagem que, sendo minha, é também do
outro. De outro modo, a literatura tem o poder de nos transportar de um universo
a outro, de nos fazer agregar valores e nos chamar para uma reflexão crítica sobre a
realidade, além de nos libertar de nós mesmos, ampliando a nossa visão de mundo:
[...] a literatura tem o poder de se metamorfosear em todas as formas
discursivas. Ela também tem muitos artifícios e guarda em si o presente,
o passado e o futuro da palavra. Como acontecia com o deus grego, não
se pode conhecer a verdade da palavra e da linguagem sem interrogar
constantemente esse discurso proteiforme, percorrendo seus artifícios e
as diferentes temporalidades que ele encerra. (COSSON, 2021, p. 17).
Nesse sentido, Cosson (2021, p. 17), deixa claro que não sabemos da vida por
meio da literatura ou da experiência do outro e nem por vivenciar experiência de outras
pessoas, mas que a “ficção feita palavra na narrativa e a palavra feita matéria na poesia são
processos formativos tanto da linguagem quanto do leitor e do escritor.” A literatura nos
proporciona, portanto, viver outras vidas, sair de nós mesmos e, assim, vivenciar aconteci-
mentos e discutir as questões da sociedade como forma de garantir os direitos humanos.
Antonio Candido (2011, p. 172), no bojo das discussões sobre o movimento pelos
direitos humanos, afirma que somos a primeira era que busca encontrar solução para as
questões dos direitos humanos, para resolver os conflitos que tem gerado desarmonias e
injustiça. Essa busca pelos direitos humanos, conforme diz: não mais do estado ideal sonhado
pelos utopistas racionais que nos antecederam, mas do máximo viável de igualdade e justiça [...].
Segundo Candido (2011, p. 172), na atualidade já não se vê estampado em
colunas de jornais ou em revistas, caricaturas do esfarrapado ou do negro como
motivo de piadas, como era de costume, pois a sociedade compreendeu que essa
conduta não agrada mais, pois em vez de provocar o riso, como antes, hoje, o
sentimento é de revolta, que ele chama de rompimento do estado de coisas, ou seja, é
a possibilidade de mudança para a compreensão do estado das coisas.
259
A sociedade pós-moderna tem visto essas transformações acontecerem na
atualidade, é isso tem sido positivo, pois revela o melhoramento do ser humano
pela busca de igualdade e justiça, ainda assim, se faz necessário o melhoramento
do indivíduo em outros aspectos, como romper o preconceito e a discriminação
racial, para que em um futuro próximo, os descendentes afro-brasileiros, não
passem mais por situações constrangedoras apenas por serem negros.
Nesse sentido, a luta pelos direitos humanos pressupõe, segundo Candido (2011,
p. 176) leis que do ponto de vista social, garantam os direitos básicos de um indivíduo.
Vale pontuar, que segundo Candido, os bens importantes são não apenas os que assegu-
ram a sobrevivência física em níveis decentes, mas os que garantem a integridade espiritual.
Desse modo, acreditamos que o texto literário, garantem a integridade espiritual do
indivíduo, uma vez que o faz com que se posicione diante dos conflitos, diante das injustiças e
das desigualdades sociais. Desperta ainda, o desejo por uma sociedade melhor e o faz perceber
que as mudanças precisam acontecer, para que possamos evoluir enquanto seres humanos.
Nessa perspectiva, (Candido,2011, p. 182) diz: a literatura desenvolve em nós a quota de
humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade
e o semelhante. Cabe, portanto, enquanto garantia dos direitos humanos, oportunizar a todos o
acesso a arte, a música, a obra literária como bens imprescindíveis no tocante a alma humana.
METODOLOGIA
As nossas reflexões para este trabalho estão alicerçadas no lugar dos direitos
humanos na literatura, a partir do diálogo, nas aproximações entre Conceição Evaristo
e Teresa Cárdenas, que aponta a necessidade de debate sobre questões sociais (iden-
tidade, desigualdade, raça e sexismo) e o texto literário, bem como, o letramento de
re/existência do protagonismo de mulheres negras na Disciplina de Eletivas de língua
Portuguesa. A proposta interventiva tem como objeto de estudo o letramento literário
como foco nas questões citadas acima e que são percebidas no ambiente escolar.
Para tanto, traçaremos um estudo comparativo entre os livros “Cartas para minha
mãe”, de Teresa Cárdenas (2020), e “Olhos d’água”, de Conceição Evaristo (2020), com
os alunos matriculados na primeira série do Ensino Médio com o objetivo de averiguar
os motivos que os levam à prática de comportamentos preconceituosos, relacionados a
questões de cunho racial e de sexismo no ambiente escolar. Nessa perspectiva, os estu-
dantes deverão refletir sobre a leitura das obras trabalhadas em sala de aula, atentando
para situações relacionadas à pobreza ou mesmo à condição da mulher negra diante de
eventos ou circunstâncias de racismo e sexismo vivenciadas nas grandes cidades brasileiras.
260
A obra literária Olhos d’água, da escritora Conceição Evaristo (2020), reúne uma
coletânea de 15 contos, os quais apresentam questões sociais e existenciais vivenciadas
pelos afrodescendentes, no caso, as mulheres, inseridas nos subúrbios das grandes
metrópoles do Brasil, em especial, do Rio de Janeiro. Desse modo, essa narrativa de
ficção traz uma abordagem da violência urbana e da pobreza a que as comunidades
afrodescendentes se encontram expostas nas favelas brasileiras. No entanto, fica evidente
que o conflito maior são as lutas pessoais de cada personagem na busca de si mesma,
seu desejo de realizar sonhos, de se sentir amada e acolhida na sua dor, nas suas aflições.
A problemática narrada ficcionalmente pela escritora Conceição Evaristo (2020)
revela a vivência e experiência de mulher de pele negra que, através das suas percepções,
permite contar as vivências e as mazelas humanas, principalmente, de mulheres negras
afrodescendentes no subúrbio brasileiro que, ainda na atualidade, vivem tanto a desigual-
dade da cor da pele e quanto do sexismo. Vistas a partir desta perspectiva, pode-se dizer
que, às vezes, realidade e ficção se mesclam através de suas narrativas. Percebemos ainda
que ficam evidenciados na obra Olhos d’água momentos contraditórios entre o nasci-
mento, tido como refrigério para a alma feminina, como alegria e esperança, e a morte,
que representada pela dor, pelas lágrimas pela saudade dos entes queridos que partiram.
Desse modo, podemos compreender de maneira clara a frase contida no prefácio
do livro em análise: “Minha mãe sempre costurou a vida com fios de ferro.” (EVA-
RISTO, 2020, p. 9). Assim, as narrativas em Olhos d’água levam o leitor a entender que
a vida de suas personagens é construída, costurada e umedecida pelo choro, as quais,
mesmo em silêncio, suplicam, do lugar de submissão que lhes foi designado ao longo
da história, por um espaço que é seu por direito, onde possam sonhar, conquistar e
construir sua própria história a partir do sentimento de pertencimento de uma socie-
dade acolhedora, onde a discriminação e o preconceito sejam apenas coisa do passado.
Quanto à Cartas para a minha mãe, de Tereza Cárdenas (2020), a obra nos é apre-
sentada em Diários Cartas ou ainda Cartas diários, modo que a narradora criança utiliza
para se comunicar com o mundo dos vivos e relatar o seu cotidiano de abandono, discri-
minação, até mesmo entre os seus, devido a seus traços nítidos, em que são evidenciadas
características próprias da negritude. A escritora nos chama a atenção para a vulnerabilidade
das personagens e para o fato de que o medo, a violência, a discriminação, a desigualdade
social e o abandono fazem parte do cenário das comunidades afrodescendentes cubanas.
Outro fator que nos chama a atenção na obra de Teresa Cárdenas é o suicídio,
devido à depressão, causada pelas mazelas humanas, como a falta de oportunidades,
de perspectivas de vida, fato cada vez mais comum na atualidade, independente-
261
mente de classe social e da cor da pele. Já o sexismo em Cartas para a minha mãe
é pontuado como assédio infantil e, em outros momentos, como uma alternativa
para apurar a cor; no caso, trata-se de uma referência ao clareamento da cor da
pele, situação em que não se dá muita importância ao caráter do sexo oposto.
Já em Olhos d’água, a sexualidade das personagens é revelada conforme as his-
tórias pessoais de cada uma delas, ora pelas próprias condições vivenciada, ora pelas
mazelas humanas, como a falta de perspectiva de vida e o despreparo, pelos quais
acabam fazendo escolhas erradas, ora pela busca de amar e se sentir amada. Neste
sentido, percebemos que os significados são construídos, mediante a linguagem, na
interação comunicativa, nas vivências de cada sujeito nesta perspectiva, a escritora,
Conceição Evaristo, sem meias palavras, discute o relacionamento homoafetivo,
mostrando assim, que a humanidade é complexa e carece discutir as vivencias humana
por completo, como forma de diluir tabus e preconceitos na sociedade atual.
Assim como Cuba, o Brasil vive as mesmas problemáticas em relação à pobreza,
à discriminação racial e ao preconceito. Ambas as escritoras usam a escrita como forma
de denunciar a violência e a discriminação racial decorrentes da cor da pele. Compreen-
demos que a denúncia utilizada pelas escritoras, Conceição Evaristo e Teresa Cárdenas,
aponta para as desigualdades sociais vivenciadas pelos afros descentes, principalmente,
pelas mulheres negras que vivem nos subúrbios das grandes cidades. Por fim, ambas
escritoras, desperta a todos nós enquanto sociedade a engarmos na luta a favor dos menos
favorecidos, para que estes tenham seus direitos resguardados enquanto seres humanos.
Finalmente, esperamos que os alunos possam se posicionar de modo respeitoso
no trato com o outro, percebendo, através da leitura e sob a ótica das escritoras
latino-americanas, o quanto se faz necessário discutir essas questões como forma
de combater ideias preconceituosas e o quanto é importante saber respeitar as
diferenças raciais, bem como, lutarmos por políticas públicas que garantam os
direitos humanos a todos cidadãos e cidadãs da nação brasileira.
RESULTADOS ESPERADOS
Esperamos com este trabalho, que o conhecimento adquirido seja uma luz na insti-
tuição de ensino, favorecendo, assim, ministrar aulas com base nos teóricos em estudo e com
estratégias e mecanismos que despertem no educando o interesse por questões relacionadas
à pobreza, bem como por aquelas relacionadas à mulher de pele negra, diante de circuns-
tâncias de racismo e sexismo. Além disso, também é esperado que o texto literário amplie
o universo dos estudantes, que o texto literário, desperte a usar a imaginação, a criatividade
262
e a percepção, contribuindo com atitudes respeitosas no trato com as mulheres, princi-
palmente com a mulher de pele negra, devido sempre ter estado exposta à discriminação.
Diante da temática em discussão, como, “O lugar dos direitos humanos no
ensino de literatura: aproximações entre Conceição Evaristo e Teresa Cárdenas”,
percebemos o quanto vale apena trabalhar com a literatura na sala de aula. As
discussões na sala aula, os depoimentos dos alunos relacionado as vivências de pre-
conceitos e de violações de seus direitos, além de nos comover, nos levam a outros
desafios, como a lutar por um espaço, no ambiente escolar, em que seja oportuno
a leitura, e ao pensamento reflexivo, assim como, a desafiar os alunos a desenvol-
verem a prática da leitura literária como forma de apreciação, depois como forma
de apropriarem do conhecimento e desse jeito despertar o leitor crítico que há em
todos aqueles que descobrem na leitura o caminho para se posicionar diante da vida.
Nesse sentido, desejamos a transformação do estudante/leitor após o ato da leitura e
que, desse modo, saiba lidar com as diferenças a sua volta e tratar todos com respeito. Espe-
ramos também que todo aprendizado possa alcançar lugares muito além do espaço escolar
e que proporcione o melhoramento da pessoa humana, como forma de ressignificar a vida.
Portanto, esperamos que este trabalho seja significativo na vida dos nossos alunos
e que o ensino literário, avance em qualidade para a efetiva aprendizagem dos nossos
jovens aprendizes uma vez que o avanço tecnológico tem possibilitado ressignificar as
aulas por meio da leitura digital e de muitas outras atividades. Esperamos ainda, cola-
borar com a pesquisa para que metas e diretrizes das políticas públicas sejam (re)vistas
e melhoradas, contribuindo, dessa forma, para o ingresso dos nossos jovens estudantes
nas instituições de ensino superior com as habilidades e competências que lhes são
exigidas e que lhes sejam assegurados dos seus direitos enquanto estudantes e cidadãos.
CONSIDERAÇÕES
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Base nacional comum curricular- BNCC. Brasília: MEC/SEB, 2017.
Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 4 fev. 2022.
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de Referencia Curricular de Mato Grosso (DRC-MT-EM), 2021. https://pt.scribd.com/document/536138586/
DRC-MT-EM-ITINERARIOS-Completo-Vers-uo-Leitura-Critica-1-docx
CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 5. ed. Rio de Janeiro: Ouro Sobre Azul, 2011. Disponível em: https://
filosoficabiblioteca.files.wordpress.com/2017/10/antonio-candido-o-direito-c3a0-literatura.pdf. Acesso em:
05 fev. 2022.
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COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. São Paulo: Contexto, 2021.
EVARISTO, Conceição. Olhos d’água. 14. reimp. Rio de Janeiro: Ed. Pallas, 2020.
ISER, Wofgang. O ato da leitura: uma teoria do efeito estético. Rio de Janeiro: Editora 34, 1996. v.1
264
A SUBJETIVAÇÃO NEOLIBERAL POR MEIO
DO CURRÍCULO ESCOLAR E A EDUCAÇÃO EM
DIREITOS HUMANOS COMO UMA FERRAMENTA DE
TRANSFORMAÇÃO
INTRODUÇÃO
89
Mestrando em Direitos Humanos e Políticas Públicas (PUCPR). CV: http://lattes.cnpq.br/8909027746952781
265
mas também não se ignora que ele pode atuar de maneira a modificar, em certo
grau, a base material da qual emerge.
A RACIONALIDADE NEOLIBERAL
270
dez competências gerais” (BRASIL, 2017). Ainda na introdução do documento,
há a conceituação de competência e habilidades:
Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conheci-
mentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e
socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas
da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do
trabalho (BRASIL, 2017).
Com a previsão cada vez mais intensa dos direitos humanos em instrumentos
normativos nacionais e internacionais, a invocação de sua gramática para as mais
diversas finalidades tem se intensificado nos cenários político e social. Em que
pese a difusão do ideário dos direitos humanos, há de se ressaltar a inexistência de
consenso a respeito de seu conteúdo, isto é, distintas correntes teóricas disputam
a definição de qual seria a acepção mais adequada para a expressão.
Sánchez Rubio (2017) afirma que o paradigma dominante, na contempo-
raneidade, no que concerne aos direitos humanos é o que os vislumbra a partir de
272
sua dimensão institucional. Sob a influência da perspectiva institucional, ideias
ou conceitos como a liberdade e a dignidade humana são alçadas ao plano da
ontologia, ou seja, tratadas como se detivessem uma existência independente dos
seres humanos (SÁNCHEZ RUBIO, 2017).
E os direitos humanos, dominados por esse viés institucional, são hipos-
tasiados em documentos normativos, assumindo relevância tão somente
numa perspectiva pós-violatória e dependendo da atuação institucional (por
meio de juízes, tribunais e políticas públicas, por exemplo) para obterem
proteção (SÁNCHEZ RUBIO, 2017).
Ocorre que, como bem informa Sánchez Rubio (2017), essa perspectiva de
proteção dá conta, com certa generosidade, de tão somente 99,9% das violações
de direitos humanos. Por esse motivo, o autor propõe que, para a retomada do
potencial libertador dos direitos humanos, eles devem ser entendidos dentro de
uma nova lente que priorize as práticas humanas, em vez de superdimensionar a
institucionalidade (SÁNCHEZ RUBIO, 2017).
De acordo com Sánchez Rubio (2017), os direitos humanos são construções
sociais e históricas oriundas das relações materiais e culturais estabelecidas entre os
sujeitos, de forma que, no cotidiano, os indivíduos criam e destroem esses direitos.
O autor sustenta, ainda, que a sociedade civil dispõe de um sistema de garantias
próprio para os direitos humanos (sem ter de apelar, necessariamente, ao Poder
Judiciário). Para corroborar a tese, traz o exemplo dos grupos sociais que se juntam
para evitar um despejo ilegal, o que corresponderia, claramente, a um mecanismo
de garantia do direito humano à moradia (SÁNCHEZ RUBIO, 2017).
Essa ótica de análise conforma-se à dimensão instituinte dos direitos huma-
nos, que, a seu turno, é consagrada tão somente pela ação coletiva e por meio
de lutas individuais travadas no cotidiano. Os movimentos sociais organizados
segundo a lógica do poder compartilhado e os poderes instituintes cotidianos
(lutas individuais no âmbito da família, do trabalho e da escola, por exemplo) são
imprescindíveis para a reação contra os abusos advindos dos poderes constituintes
oligárquicos e para a construção de uma dimensão multigarantista e pré-violatória
de direitos humanos (SÁNCHEZ RUBIO, 2017).
Tal visão insere-se na tradição da teoria crítica dos direitos huma-
nos, que busca, incessantemente, consolidar a percepção de que, para além
de simples previsão normativa, abstrata e genérica, esses direitos possuem
273
um valor de combate, organizando a luta social pela liberdade (ESCRI-
VÃO FILHO; SOUSA JÚNIOR, 2016).
Portanto, a educação em direitos humanos, caso deseje ser uma ferra-
menta de transformação e de oposição à racionalidade neoliberal, deve levar
em conta a dimensão instituinte desses direitos. A usurpação do currículo
escolar pelos parâmetros e modelos apregoados pelo neoliberalismo tem o
fim de construir subjetividades individualistas e orientadas pela concorrên-
cia e pelo paradigma empresarial.
A dimensão instituinte dos direitos humanos é algo incompatível com essa
lógica, haja vista valorizar a cooperação e a atuação coletiva com o objetivo de
alcançar resultados que tragam benefícios à totalidade dos que estão envolvidos
no processo de resistência e de luta contra alguma situação opressiva.
Nesse sentido, a inclusão, no currículo escolar, da perspectiva instituinte
dos direitos humanos, pode ser benéfica ao plano dos que almejam superar a
racionalidade neoliberal e fomentar o desenvolvimento de sujeitos capazes de
compreender, de maneira crítica, a realidade desigual na qual estão inseridos e de
detectar os possíveis meios de alterá-la.
A inserção da dimensão instituinte dos direitos humanos, no currículo das
escolas, pode ocorrer por meio do ensino das linhas teóricas que identificam o
real sentido dos processos de resistência popular concretizados ao longo da his-
tória do Brasil. Há de ser consubstanciado, no ambiente escolar, um tratamento
teórico adequado, abrangendo todas as implicações sociológicas e políticas, das
lutas abolicionistas travadas contra a escravidão e o racismo no século XIX; das
greves e revoltas da classe trabalhadora, durante o século XX, para a conquista de
melhores condições de trabalho; e das lutas feministas para o alcance da igualdade
formal e material neste país, por exemplo.
Por meio desses mecanismos de ensino, pode-se fomentar a criação de cons-
ciências que sejam capazes de perceber e que tenham o desejo de transformar a
exploração do modo de produção capitalista, buscando, portanto, uma maior justiça
social; bem como é possível estimular a formação de subjetividades que contestem
opressões como as de raça e de gênero, solidarizando-se com os movimentos que
se opõem a essas estruturas de dominação.
274
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ALVARENGA, Darlan. Taxa de desemprego do Brasil deve ficar entre as maiores do mundo em 2022;
veja ranking. G1, 28 abr. 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2022/04/28/taxa-
-de-desemprego-do-brasil-deve-ficar-entre-as-maiores-do-mundo-em-2022-veja-ranking.ghtml. Acesso
em: 01 jun. 2022.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2017. Disponível em: http://
basenacionalcomum.mec.gov.br/a-base. Acesso em: 01 jun. 2022.
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2021. E-pub.
DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. 1. ed.
São Paulo: Boitempo, 2016. E-pub.
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político sobre os direitos humanos. 1. ed. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016.
FRASER, Nancy; JAEGGI, Rahel. Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. Tradução de
Nathalie Bressiani. São Paulo: Boitempo, 2020. E-pub.
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FREIRE, Paulo. A educação na cidade. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2005.
275
FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 15. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2015.
LIBÂNEO, José Carlos. Finalidades educativas escolares em disputa, currículo e didática, 2019. Disponível
em: https://tinyurl.com/3e4sfc7c. Acesso em: 01 jun. 2022.
SÁNCHEZ RUBIO, David. Crítica a una cultura estática y anestesiada de derechos humanos. Por una
recuperación de las dimensiones constituyentes de la lucha por los derechos. Revista Culturas Jurídicas,
Niterói, v. 4, n. 7, p. 26-63, 2017. Disponível em: https://periodicos.uff.br/culturasjuridicas/article/view/44855.
Acesso em: 02 jun. 2022.
SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 7.ed. Campinas: Autores
Associados, 2000.
276
O QUE A SOCIEDADE ESPERA DE NÓS
PROFESSORES BRASILEIROS
Escrevo estas mal traçadas linhas do meu leito de recuperação. Sofri um acidente
andando. Sim, caminhando por uma calçada, próximo a minha residência. A calçada
é totalmente irregular, torta e qualquer mínimo deslize, pisar em falso causa grandes
acidentes. Acabei fraturando o tornozelo. O diagnóstico foi de fraturas múltiplas
na perna. Resultado, três dias de internação, uma cirurgia, uma placa de metal de
10 cm do lado esquerdo e dois pinos do lado direito para apoiar e reforçar e 65 dias
de afastamento do trabalho. Devo salientar que trabalho em gestão escolar, de mim
dependem diretamente 1050 alunos, professores, funcionários, e a diretora a qual,
sem meu suporte, se vê obrigada a gerir sozinha todo esse complexo educacional.
Algum desavisado irá perguntar, o que esse episódio isolado tem a ver com
a educação? Pois bem, leitor, lhe respondo prontamente. Tem tudo a ver. A edu-
cação relevante e significativa tem absolutamente tudo a ver com a organização
de qualquer sociedade. Diz a norma brasileira ”PASSEIOS PÚBLICOS DE
CONCRETO EXIGEM PROJETO QUE CONSIDERE A ACESSIBILI-
DADE DOS USUÁRIOS E BOAS PRÁTICAS DE EXECUÇÃO” Matéria
original do site AECwebTexto: Juliana Nakamura
O concreto é bastante aproveitado na construção de calçadas em função
de características como durabilidade, resistência e custo competitivo.
Mas embora envolva práticas de amplo domínio da engenharia, essa
solução não pode prescindir de cuidados de execução, sob o risco de
surgirem manifestações patológicas que comprometem a vida útil e
a funcionalidade dos passeios públicos.”As recomendações começam
com a realização de um projeto, que contemple aspectos dimensionais
e especificações técnicas — como traço do concreto, tamanho de juntas
e a inserção de tela soldada — definidas em função da carga à qual
o piso será exposto. O projeto é fundamental, também, para garantir
atendimento aos requisitos de acessibilidade. Para tanto, devem ser
observadas a legislação municipal e a ABNT NBR 9050:2020 —
90
Mestrado em Master in TESOL (University of Brighton, U.B., Inglaterra). CV: http://lattes.cnpq.br/2745880231295075
277
Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos
urbanos, recentemente atualizada.
284
É importante frisar que não é tarefa exclusiva dos professores modernizar
o sistema de ensino. Porém esses, sem dúvida, serão os mais prejudicados com
a privatização do Ensino Público e a implementação de meios alternativos de
escolarização como o Ensino domiciliar. Nas palavras de Moran: “Todas as orga-
nizações estão revendo seus métodos tradicionais de ensinar e aprender. Algumas
estão ainda muito ancoradas em métodos tradicionais, centrados na transmissão de
informações pelo professor.” (MORAN, 2018, p. 19). Mas esse será exatamente o
que levará boa parte dos atuais profissionais da educação ao caminho do desem-
prego e da extinção de seu trabalho público estável. Não podemos esperar apenas
dos governantes que um total reforma na educação pública brasileira aconteça. É
obrigação deles, sem dúvida, pagamos impostos. Mas estes só se moverão em dire-
ção a implantação de políticas de modernização e organização do ensino público
à medida que forem empurrados, pressionados e exigidos pela própria população.
É exatamente a mobilização do povo que os fará trabalhar de forma eficaz. Não
podemos esquecer do que nos ensina as sábias palavras de Freire:
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses que-faze-
res se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo
buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei,
porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando,
intervenho, intervindo, educo e me educo. Pesquiso para conhecer
e o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade.
(FREIRE, 1996, p. 16)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
AECwebTexto: Juliana Nakamura “PASSEIOS PÚBLICOS DE CONCRETO EXIGEM PROJETO
QUE CONSIDERE A ACESSIBILIDADE DOS USUÁRIOS E BOAS PRÁTICAS DE EXECUÇÃO”,
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cucao/#:~:text=Al%C3%A9m%20da%20ABNT%20NBR%209050,2015%20%E2%80%94%20Lei%20
Brasileira%20de%20Inclus%C3%A3o.> Acesso em: 06 jul. 2022.
BACICH L.; MORAN J. Metodologias Ativas Para Uma Educação Inovadora: Uma Abordagem Teórico
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| Seção: 1 | Página: 103 Órgão: Ministério da Educação/Conselho Nacional de Educação RESOLUÇÃO
CNE/CP Nº 1, DE 27 DE OUTUBRO DE 2020. Disponível em: <https://www.in.gov.br/web/dou/-/
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FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia, Saberes necessários à Prática Educativa, São Paulo, Paz e Terra 1996.
Escolas brasileiras ainda formam analfabetos funcionais, Jornal da Usp, Tainá Lourenço, 13/11/2020. Dis-
ponível em <https://jornal.usp.br/atualidades/escolas-brasileiras-ainda-formam-analfabetos-funcionais/>.
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12/03/2018. Disponível em <https://porvir.org/falta-mais-dinheiro-na-educacao/>. Acesso em: 22 jun. 2022.
Em vitória do governo Bolsonaro, ensino domiciliar é aprovado na Câmara, UOL notícias, Gabriela Vinhal
e Ana Bimbati 18/05/2022. Disponível em <https://educacao.uol.com.br/noticias/2022/05/18/em-vitoria-
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LARROSA J. ET AL Desenhar a Escola: Um Exercício Coletivo De Pensamento IN LARROSA J Elogio
da Escola, Belo Horizonte, Autêntica, 2021 p. 249 a 270.
ROCHA J. Design Thinking na formação de professores: Novos Olhares Para Os Desafios Na Educação, in
BACICH L.; MORAN J. Metodologias Ativas Para Uma Educação Inovadora: Uma Abordagem Teórico
Prática, Porto Alegre, Penso, 2018 p.153 a 174.
288
VEMOS UM MUSEU DE NOVIDADES: BREVES
REFLEXÕES SOBRE REFORMA DO ENSINO MÉDIO
INTRODUÇÃO
O título deste texto alude à visão crítica dos seus autores a respeito da lei
nº 13.415/17, que normatiza a reforma do Ensino Médio brasileiro. As premissas
dessa reforma são as de incentivar e desenvolver o protagonismo juvenil por meio,
basicamente, da possibilidade de os alunos escolherem as disciplinas às quais
gostariam de estudar de acordo com a sua vocação e interesse, ao se decidirem
pelo que se denominou de itinerários formativos. Se supõe que, por essa via, os
estudantes poderiam se interessar mais pela escola e por sua formação.
Como um ensaio, as palavras aqui expressas se mostram como um convite à reflexão
coletiva, bem como objetivam contribuir com a agenda de pesquisas sobre a educação,
a fim de que essas reformas cumpram o objetivo a que se propõem, a saber: fazer com
que os alunos aprendam. É inquestionável a necessidade de se modificar aspectos rela-
cionados ao sistema educacional brasileiro, tais como: a estrutura física das escolas, suas
metodologias e currículos,haja vista a obsolência de algumas práticas e a ineficácia de
muitas ações. No entanto, compete avaliar as mudanças propostas e as estratégias adota-
das para suaimplementação. Portanto, foi com esse propósito que o texto foi produzido.
Para tal empreendimento, ele estará estruturado em três pontos fundamen-
tais. A primeira parte apresenta ao leitor, os elementos conceituais e discursivos
que justificam a reforma do Ensino Médio. Nesse âmbito não se pode deixar de
falar sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que é o documento que
estabelece as competências e habilidades essenciais que os estudantes de todo o país
devem desenvolver ao longo de toda a Educação Básica. No segundo momento,
discutimos os aspectos epistemológicos das novas unidades curriculares indicadas
na reforma, sobretudo o Projeto de Vida. E, por fim, focalizamos os desafios à
atuação docente, por meio de relatos e idiossincrasias de nós professores, postos
91
Doutora em Sociologia Política (UENF). Professora de Sociologia (SEEDUC-RJ).
CV: http://lattes.cnpq.br/0475924210728731
92
Especialização em História Política: Poder e Cultura (UFES). Professor de Sociologia (SEDU-ES).
CV: http://lattes.cnpq.br/8699400722216149
289
por essa reforma. Assim, pensando suas possibilidades, desafios e dificuldades
problematizamos o horizonte pragmático desse novo Ensino Médio.
94
Vide o resumo executivo do documento “Estratégia 2020 para a educação do Grupo Banco Mundial”. Disponível em:
https://documents1.worldbank.org/curated/en/461751468336853263/pdf/644870WP00PORT00Box0361538B0PU-
BLIC0.pdf. Acesso em: 14 jun. 2022.
291
Afirmamos isso porque não são recentes os movimentos de lutas e reivindicações
dos profissionais da educação, no sentido de propor melhorias ao sistema de ensino,
demandando mais políticas, recursos e investimentos para o setor. Ações que, politicamente,
sempre foram vistas como gastos, e não como uma perspectiva estratégica de investimento
de longo prazo como devem ser, e para as quais a gestão pública faz ouvidos moucos.
Para os críticos, essa reforma do ensino médio traz poucas novidades além
de negligenciar questões já pontuadas em estudos anteriores. Assim, como aponta
Silva (2018) “sob a aparência de novo, a atual reforma do Ensino Médio acoberta
velhos discursos e velhos propósitos” (p. 1). A reforma curricular proposta prevê que,
considerando as competências gerais da BNCC e da LDBEN, as redes deverão defi-
nir estratégias para trabalhar o desenvolvimento do projeto de vida dos estudantes,
como orientação vocacional e profissional e preparação para o mundo do trabalho.
Nesse sentido, Silva verifica o retorno de perspectivas já debatidas e criticadas, pois:
A definição de competências como eixo de prescrições curriculares foi favo-
recida, no contexto da reforma curricular da década de 1990, em virtude de
sua proximidade com a ideia de competição e de competitividade (…) Esse
discurso, agora revigorado, é retomado em meio às mesmas justificativas, de
que é necessário adequar a escola a supostas e generalizáveis mudanças do
“mundo do trabalho”, associadas de modo mecânico e imediato a inovações
de caráter tecnológico e organizacional (SILVA, 2018, p. 11)
95
Falas obtidas dos alunos nas escolas em que trabalhamos.
96
Neste escopo, cumpre registrar o enfraquecimento da rede profissional e tecnológica fortalecida muito no período de
2005 a 2010 com a política de expansão e interiorização dos Institutos Federais. Além disso, os convênios propostos pela
reforma com o sistema S receberam as mesmas críticas já citadas.
97
Como, por exemplo, a Gratificação por Lotação Prioritária (GLP) no Rio de Janeiro; Carga Horária Especial (CHE)
no Espírito Santo.
294
como decidirem se elas serão pré-definidas em seus currículos ou decididas no
âmbito das próprias escolas. Então, com algumas redes implementando mais
cedo e outras mais tarde, a conjuntura atual é de que todas as unidades escolares
brasileiras estão no momento de implementação dessas novas reformas.
Assim, de modo preliminar, e cujo diálogo com outros trabalhos e reflexões
fazemos questão de estabelecer, exporemos alguns dos desafios que já se interpuseram
às escolas, aos professores, e, lamentavelmente, também aos estudantes nesse processo.
98
Esse é mais um ponto em que “vemos um museu de novidades”, pois reconhecemos no projeto de vida as mesmas bases
da disciplina que na ditadura chamavam de OSPB, cujos conteúdos estavam de acordo com o regime da época. Hoje,
chama-se projeto de vida e está de acordo com o mercado. Nos dois casos os percebemos alienantes.
295
garantir a coesão psicológica aos estudantes nessa fase de intensa cons-
trução da identidade, gerar bem-estar e sensação de prosperidade,
contribuir para a transição entre a juventude e a fase adulta, contribuir
para a inserção social e laboral, favorecer a construção de projetos de vida
voltados para o compromisso social e o bem comum, além de desem-
penhar um importante papel na formação da identidade moral, ou seja,
de como os jovens se reconhecem a partir dos valores morais que regem
suas condutas (DANZA; MORGADO DA SILVA, 2020, p. 214).
Nesse aspecto, uma crítica fundamental a ser feita se respalda no fato de que a função
da escola é socializar os conhecimentos científicos. E no trecho acima verificamos a falta
de cientificidade na abordagem já que não há uma diretriz específica que defina os con-
teúdos epistemológicos e tampouco o profissional da área a trabalhar com a componente.
Ainda é pelos autores supracitados que verificamos que,
Assim como a Psicologia, outros campos do conhecimento contribuem
para que o tema dos projetos de vida seja discutido, compreendido e
desenvolvido nas escolas. Um suporte importante vem da Sociologia.
Essa ciência entende o projeto de vida como uma conduta emancipatória
que visa à adaptação ou à superação do campo de possibilidades dos
jovens, que é conferido pelo lugar social, histórico e econômico que
ocupam na sociedade. Essa concepção nos ajuda a compreender que o
projeto de vida tem um papel importante na superação das desigualda-
des, pois possibilita a mobilidade social mediante o entendimento dos
privilégios, das desigualdades e das dificuldades que contornam a vida
dos jovens e que podem ser superadas na medida em que oportunidade
e ações para o seu enfretamento forem planejadas e efetuadas [...]Outro
campo do conhecimento que contribui para a discussão em torno do
projeto de vida é a filosofia, em especial a perspectiva existencialista
[...] donde se quer chamar a atenção para o fato de que precisamos
fazer escolhas e nos responsabilizar por elas. São essas escolhas que
nos constituirão e que determinarão os rumos da nossa vida (DANZA;
MORGADO DA SILVA, 2020, p. 214, grifo nosso).
Na rede privada assim como na rede federal se pode observar que os profissionais
que trabalhavam essa componente vinham, via de regra, da área de conhecimento da
pedagogia, ressaltando sua especialização em psicopedagogia, um campo mais alinhado
ao desenho institucional da proposta. Em contrapartida, nas redes públicas analisadas
se observou que o modelo ensaístico desse componente curricular não trouxe balizas
de como poder realizá-la a contento. A diversidade de profissionais que poderão
ministrá-la reflete, ao fim e ao cabo, numa proposta inorgânica e pouco eficiente.
298
Segundo Benevente (1991, p. 178) não se muda uma instituição sem mudar
as práticas que a produzem no dia a dia além do fato de que “mudança de práticas
é de ordem diferente e de uma lógica diferentes da mudança legislativa: é um pro-
cesso complexo que envolve os professores e não resulta nem da simples vontade
destes e nem decorre mecanicamente de qualquer intervenção exterior” (p. 140).
E nesse mesmo diapasão não há como desconsiderar que “é mais fácil mudar
os discursos dos que as práticas” (LEITE, 2000). Por isso, uma relação mais dialó-
gica com os operadores da ponta, ou burocratas de “nível de rua” (LOTTA, 2012),
seria a estratégia mais acertada no sentido de produzir os resultados esperados. Isso
implica uma escuta ativa desses operadores por parte dos gestores da coisa pública.
De acordo com Silva (2018) verifica-se um profundo desrespeito pela condição
do professor, que é tomado como incapaz de exercitar a análise e a crítica. Dada a essa
suposta incapacidade, outros pensarão e proporão por ele (p. 13). Por essa razão, quando
não se considera a necessidade de se partir da escola, o alcance limitado das reformas
já está dado no momento mesmo de suas proposições, visto que os educadores reinter-
pretam os dispositivos normativos e atribuem a eles novos significados (SILVA, 2018).
Desse modo, observamos a desconsideração dos profissionais da educação
um dos pontos problemáticos da reforma, posto que não mexeram em elementos
efetivamente problemáticos do processo educativo. Alguns exemplos desses são: o
quantitativo de alunos em relação à quantidade de recursos fornecidos pela escola,
sendo sempre necessário fazer um rodízio para a proposição de atividades fora da sala
de aula e; o confinamento dos alunos por mais tempo na escola, sem a diversificação
das atividades, torna o espaço escolar enfadonho e propenso à desordem pela ocio-
sidade de alunos que estão sem atividades em determinados momentos. Acrescido
a isso, vemos que a necessidade de professores trabalharem em mais de uma escola,
e com muitas turmas, limita sua capacidade criativa e os extenua fisicamente, com-
prometendo sua saúde e qualidade de vida, e, consequentemente seu fazer docente.
Porém, a despeito desse quadro, o que se nota atualmente são iniciativas em
prol da adequação das práticas docentes à essa nova conjuntura. As redes privadas,
por meio de seus sistemas, anteciparam alguns passos nesse processo. Por exemplo,
um dos autores desse texto teve uma capacitação sobre a BNCC e o Novo Ensino
Médio já no ano de 2019, ao passo que na rede estadual, o discurso era de que não
seria implementado. Mas, conforme já pontuado, por meio das pressões de agências
internacionais e da condicionalidade de repasse de verbas à implementação dessa
reforma, o gestor se rendeu. Fazendo isso num processo travestido de democrático,
299
o realizou de modo absolutamente vertical e a toque de caixa. Assim, coube aos
professores se adaptarem e seguir “trocando o pneu com o carro em movimento”.
Tudo isso sem falarmos da questão dos desafios à prática docente impostos pelo
retorno após o isolamento social produzido pela pandemia da COVID-19.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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SILVA, Mônica Ribeiro da. A BNCC da reforma do Ensino Médio: o resgate de um empoeirado discurso.
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300
MULHERES, FUTEBOL E UNIVERSIDADE: UM
ESTUDO COM ALUNAS DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO AMAPÁ - UNIFAP
INTRODUÇÃO
100
Doutorado em Estudos do Lazer (UFMG). Docente do Curso de Educação Física e do Programa de Pós Graduação
em Educação (UNIFAP). CV: http://lattes.cnpq.br/9623409607452966
101
Acadêmico do Curso de Educação Física. Bolsista de Iniciação Científica (PROBIC/UNIFAP).
CV: http://lattes.cnpq.br/0137574326298814
102
Esta pesquisa recebeu financiamento do Programa de Auxílio ao Pesquisador, promovido pela Universidade Federal
do Amapá – PAPESQ/UNIFAP
301
Com relação às mulheres, alvo deste estudo, não foi diferente, vez que
sofreram/sofrem restrições e proibições para praticar futebol. Como indica Goel-
lner (2021), desde que o futebol foi criado, as mulheres, em diferentes tempos
e contextos sociais, precisaram disputar poderes para nele adentrar e, ao fazê-lo,
desconstruíram representações que, assentadas na biologia do corpo e do sexo,
justificavam o caráter exótico, espetacular e impróprio atribuído à sua prática.
Entre os anos de 1930 e 1940, vários discursos de viés biologicista vieram
à tona com o intuito de proibir a prática futebolística das mulheres. Baseando-
-se em pensamentos de que o futebol era contra a “natureza” feminina e de que
poderia “comprometer funções reprodutivas”, sendo, portanto, uma ameaça à
condução de uma maternidade sadia, essa modalidade foi oficialmente impedida
às mulheres em 1941. Entretanto, por trás desses argumentos, estava o caráter
fortemente machista e patriarcal da sociedade, que se incomodava com a ocu-
pação dos espaços públicos e a decisão do uso do próprio corpo pelas mulheres
(GOELLNER, 2021; FRANZINI, 2005).
Nessa perspectiva, é fundamental compreender a presença das mulheres no
futebol, passando pela discussão das motivações, barreiras e espaços/locais que
garantiram sua presença na modalidade, pois se trata de uma vivência que ainda
imprime uma série de dificuldades, como as desigualdades de gênero, falta de
oportunidades e limitação de espaços para prática esportiva.
O presente texto apresenta o resultado de uma pesquisa realizada com estu-
dantes universitárias que participam do time de futsal feminino da Universidade
Federal do Amapá – UNIFAP. Fazem parte desse coletivo 17 mulheres. Esse grupo
também é responsável pela participação da UNIFAP em competições esportivas
universitárias, seja no âmbito estadual ou nacional. Assim, as questões centrais
que orientaram a investigação foram: quais as motivações para praticar futebol?
Que barreiras são apontadas para a permanência no futebol?
Além dessas, procuramos também responder: quais espaços/locais tiveram
importância para inserir as meninas na prática futebolística? Qual pessoa/agente
social teve mais importância para iniciação das alunas no futebol? Houve resistência
familiar para que elas praticassem futebol? Os dados que serão apresentados a seguir
foram coletados por meio de um questionário virtual, na plataforma Google Forms.
302
DESENVOLVIMENTO
Como se pode observar, a escola foi indicada como o local de maior relevância
para a inserção das alunas no futebol, mencionada por 35,3% das partícipes. Em
seguida, vieram as opções amigos da rua (29,4%), família (23,5%) e universidade,
com 11,8%. Para esse grupo de participantes, as informações revelam o papel de
instituições de ensino que possibilitaram a inserção das mulheres no futebol, o
que traduz como esses espaços podem se constituir em locais de questionamentos
e tensionamentos das diversas maneiras de desigualdades.
Para Souza et al. (2020), a escola é um espaço propício para se debaterem
diversos assuntos, um dos quais seria a prática do futsal feminino escolar, que
se encontra repleto de preconceitos e sexismo. Historicamente, ao que se refere
à mulher no esporte, sempre foram visíveis as dificuldades encontradas para se
estabelecerem, embora já seja significativo o espaço adquirido pelo sexo feminino
em diversas práticas esportivas.
Apesar de a escola ser apontada como um importante local para inserção das
meninas no futebol, isso não significa que esse processo esteja ausente de tensões,
como retratam Maffei, Verardi e Carvalho (2019). Os autores realizaram uma
investigação na qual discutiram o interesse na prática do futebol feminino nas
303
aulas de Educação Física, nas escolas públicas estaduais do município de Santa
Cruz do Rio Pardo-SP. De modo geral, foi indicado que 70% das participantes
da pesquisa passaram por experiências com o esporte na escola, embora os senti-
mentos das alunas, em relação ao futebol, sejam polarizados.
Um grupo de alunas demonstrou aderência e interesse pela modalidade,
construindo sentimentos positivos em relação ao futebol. Já outro grupo demons-
trou não adesão ao esporte, sendo que os motivos alegados pelo desinteresse se
relacionam com os atritos e os impedimentos por parte dos meninos, bem como
a falta de colegas praticantes para jogarem juntas.
A despeito de termos observado outros espaços/ambientes de importância
para a inserção das mulheres no futebol, tais como a família, os amigos e a univer-
sidade, para esse grupo que investigamos, a escola foi o principal local de acesso à
prática do futebol. Ainda que exista um paradigma presente na prática do futebol
feminino, que historicamente traz uma bagagem preconceituosa, entendemos que
a escola, como um local com potencial anticolonial, possibilita transgressões dos
sistemas de dominação, como o sexismo (hoocks, 2017).
Na sequência, indagamos as participantes sobre qual pessoa/agente social elas
consideraram que mais as tinha incentivado para praticar futsal.Como é possível
observar no gráfico 2, a opção “professor” e “amigas” foram as mais mencionadas,
ambas com 23,5% das respostas. Em seguida, vieram as opções “pai” e “amigos”,
igualando também o quantitativo de respondentes (11,8%).
304
A ação docente tem a finalidade de contribuir para a formação global do
cidadão, incluindo-se, assim, os aspectos biológico, cultural, social e afetivo. Dentro
dessa perspectiva, cabe ressaltar que a intervenção do/da professor/professora se
constitui para além de transmitir conhecimento, mas a concebemos como uma
prática engajada, que deve ser questionadora dos determinantes de classe, de gênero
e raciais (hoocks, 2017). Diante disso, ao identificarmos que o “professor” foi um
dos principais artífices para a inserção no futebol das mulheres que pesquisamos,
compreendemos, com mais evidência, o papel que essa/a profissional pode ter para
reconceitualizar o ensino, questionar parcialidades e formas de opressão.
Não estamos aqui romantizando o/a professor/professora. Há de se destacar
os limites do seu trabalho, como as condições materiais precárias às quais muitos/
as são submetidos/as., No entanto, esse trabalho docente precisa ser pautado sob
a perspectiva da mudança, entendendo o ato pedagógico como essencialmente
político. Assim, o alicerce dessa mudança perpassa pela importância de proporcionar
a todos, todas e todes, indistintamente, as mesmas oportunidades de aprendizado,
transgredindo os modelos de dominação da sociedade capitalista colonial, a qual
se baseia, sobretudo, em modelos classistas, sexistas e raciais.
Como discute Freire (1996), ensinar é uma especificidade humana, que, além
de exigir competência profissional, requer comprometimento e compreensão de que a
educação é uma forma de intervenção no mundo, e que, portanto, deve ser dialógica e
tem uma natureza ideológica, sempre articulada com algum tipo de intencionalidade.
Como ensina o autor, ensinar exige a convicção de que a mudança é possível, mesmo
diante todas as dificuldades e as desigualdades que vivenciamos cotidianamente.
Ainda sobre essa questão, outro aspecto de destaque, indicado pelas inte-
grantes da pesquisa, foi a importância das “amigas” para a inserção na prática
futebolística. Isso revela como esse espaço pode se constituir em um locus de
sociabilidade, formação de laços, edificação de identidades e de fortalecimento das
mulheres. Além disso, destacamos que essa contribuição para iniciação ao futebol
foi realizada por outras mulheres, revelando o quanto que a presença feminina no
futebol tem se expandido nos dias atuais.
Quando observamos que mulheres têm um papel de destaque para inserir outras
mulheres em um espaço que historicamente não foi tido como seu, isso revela o pro-
tagonismo que o sexo feminino tem em alçar espaços/locais quaisquer que sejam. Isso
também não significa que as mulheres não têm maiores dificuldades para se inserir, caso
desejem, no futebol, mas indica que, mesmo lentamente, têm ocorrido mudanças de
305
um paradigma essencialmente masculino no futebol e, com resistência, as mulheres têm
se feito presentes nesse contexto. Embora também tenhamos observado a presença da
figura masculina – pai, amigos, professor - como destaque para inserção das mulheres
no futebol, é de se destacar o elevado número de jogadoras que indicaram a figura de
uma mulher como a principal para a iniciação na prática futebolística.
Na sequência da pesquisa, questionamos às partícipes se houvera resistência
de sua família em relação à prática do futebol. Os resultados das respostas podem
ser observados por meio do Gráfico 3.
308
Gráfico 5: Motivações para praticar futebol
CONSIDERAÇÕES FINAIS
309
o futebol. Por mais que atualmente se questione, a presença do sexismo ainda é
encontrada no futebol, gerando o rebaixamento e a desqualificação do feminino.
Mesmo diante de tantas dificuldades, as mulheres têm desenhado sua tra-
jetória no futebol, percurso este calcado em resistências para se fazerem presentes
nessa esfera social. Portanto, os dados aqui apresentados nos indicam algumas
características da trajetória das mulheres no futebol, o que, sob o nosso ponto de
vista, vem a sugerir mudanças da relação das mulheres nesse esporte, mesmo que
tais mudanças ainda sejam lentas.
Registramos que esta pesquisa apresenta resultados parciais e circunstanciais,
os quais “falam” da realidade de um grupo de 17 mulheres que compõem uma
equipe de futsal feminino universitário. Percebemos avanços em relação à inserção
das mulheres nessa seara, as quais têm ocupado espaços e enfrentado barreiras. No
entanto, são necessárias investigações sobre outras mulheres, em outras realidades,
a fim de obter uma interpretação mais abrangente do objeto debatido.
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TIBURI, M. Feminismo em comum: para todas, todes e todos. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2019.
310
“REMOVED”: UM OLHAR DA PSICOLOGIA SOBRE
OS EFEITOS PSICOLÓGICOS DA ADOÇÃO E
DEVOLUÇÃO DE CRIANÇAS
INTRODUÇÃO
103
Doutor em Educação (PUC-Minas). Professor (FAMINAS BH). CV: http://lattes.cnpq.br/6436140896087143
104
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
105
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
106
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
107
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
108
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
109
Graduando em Psicologia (FAMINAS BH).
110
Baseado no filme: ReMoved, lançado primeiramente nos EUA, em agosto de 2013, duração de 13 minutos, dirigido e
produzido por: Nathanael Matanick para 168 Film Festival. Personagens principais: Zoe Lock.
311
Diante do roteiro de Removed percebe-se imediatamente a importância do
psicólogo em um trabalho ativo no processo de adoção, e do papel de relevân-
cia no que se diz respeito à garantia da qualidade de vida das crianças em lares
disfuncionais. É função desse profissional orientar a família candidata à adoção
sobre os impactos do procedimento para a criança, além de garantir que aquela
família esteja apta para receber a criança disponível. O psicólogo é responsável
por trabalhar principalmente a realidade emocional dos pais adotivos, acompa-
nhando-os na convivência com as crianças para avaliar a adaptação de ambas as
partes. Em outro sentido, ao mesmo tempo que é fundamental dar garantias em
relação à família, também é essencial saber se a criança está apta para a adoção,
para serem inseridas em uma nova família.
DESENVOLVIMENTO
312
Entretanto, no Artigo 23 do mesmo Estatuto fica esclarecido que a falta de
recursos materiais não pode ser um fator determinante para a perda ou suspensão
do poder que a família exerce.
Assim, entende-se que para destituir a guarda de uma criança ou adoles-
cente é necessário cautela, por ser uma decisão geradora de sequelas psicosso-
ciais negativas à criança e à família. Essa deliberação só deve ocorrer se ficarem
comprovados benefícios para a criança ou adolescente, não causando danos a seu
desenvolvimento, ou seja, “quando apresentar reais vantagens para o adotando e
fundar-se em motivos legítimos” (ECA, 199, Art. .43).
Para revelar esses motivos legítimos, a intervenção do Estado na família
natural deve ser primariamente baseada em orientação, apoio e estímulo. Essa
interferência também se estende a grávidas, puérperas e a qualquer pessoa que
apresente desejo de conceder seu filho à adoção. A destituição do poder de guarda
familiar e o arranjo em uma família substituta é um recurso legal destinado a garantir
o cuidado de crianças e adolescentes que não podem permanecer em sua família
de origem por motivos diversos. É uma medida que só deve ser tomada quando
os direitos da criança ou adolescente forem violados ou esgotados os recursos para
permanência na família natural ou extensa (ALBORNOZ, 2018). A efetividade
do processo de adoção necessita da execução de trâmites judiciais lentos, visto que
se trata de um processo complexo, devido à exigência de provas razoáveis que o
tutor não pode assumir essa responsabilidade. Então, antes do início do processo
adotivo, vários trâmites legais precisam ser cumpridos. Isso é necessário para que
todas as perspectivas sejam analisadas e para que não haja prejuízo ao menor.
Em alguns casos ocorre o abrigamento em Instituições acolhedoras, ligadas
ou não ao governo, atuantes pontualmente na área de proteção a menores. O abri-
gamento deve ser feito preferencialmente em pequenos grupos, a fim de reduzir
os impactos e rótulos consequentes da institucionalização. Os abrigos residenciais
(ARs), são instituições que possibilitam conexões afetivas, semelhantes à estrutura
familiar, e tem como objetivo atender as demandas materiais e afetivas da criança
e do adolescente (ALBORNOZ, 2018).
No que diz respeito à família adotante, elas atravessam um longo período
de coleta de documentos, testes de proficiência, saúde financeira e mental para
serem elegíveis para tal, além de fazer parte de uma lista de espera.
A lentidão de todo o processo adotivo é uma das causas das dificuldades em
adotar. Gera ainda uma longa permanência nas instituições, dificultando a adoção
313
de crianças e adolescentes, já que o principal interesse das famílias substitutas é
por meninos e meninas bem pequenos (ALBORNOZ, 2018).
Após a adoção ainda há outras questões a serem consideradas referentes à
saúde emocional dos envolvidos, como no caso das distinções entre o filho biológico
e o filho adotado. Apesar de se tratar de um processo jurídico o Estatuto da Criança
e Adolescente estabelece que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento,
ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à filiação” (ECA, 199, Art.20). Em outro
ponto, no artigo 48, há um reforço desses direitos, a partir da irrevogabilidade da
adoção, o que garante que nos documentos de identificação do adotado constem
como filiação os dados dos adotantes e nenhuma informação sobre sua família
natural. Dessa forma, “a adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os
mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo
com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais” (ECA, 199, Art. 41).
Atualmente os motivos mais comuns para o abrigamento, em todas as
regiões do Brasil, são a negligência e o abandono, revelando uma deficiência de
vínculos afetivos. Além disso, muitas chegam aos abrigos porque são oriundas de
famílias precárias em que é comum a violência doméstica, concomitante com o
uso de drogas e álcool por pais ou responsáveis. Muitas são crianças de rua, órfãos,
ou estão vulneráveis, pois pais ou responsáveis foram encarcerados, passaram por
abuso sexual por familiares, entre tantas outras tristes razões. (ASSIS; FARIAS;
2013 APUD PARRA; OLIVEIRA; MATURANA, 2019).
Nessa perspectiva, há inclusive, a defesa de que em certos lares, o meio ambiente
físico e social é tão empobrecido e caótico que a colocação de uma criança em uma
instituição de abrigamento pode proporcionar a recuperação e um crescimento psico-
lógico (BRONFENBRENNER, 1996 APUD, SIQUEIRA; DELL’AGLIO, 2006).
Assim, conforme Hueb (2016) o acolhimento institucional tanto pode ser
uma forma de espera pela reestruturação familiar e de preparo para o retorno à
família biológica daquela criança ou adolescente que se encontra em situação de
risco social ou pessoal, como pode ser visto como período de transição para o
processo de adoção quando não há mais possibilidades de reinserção na família
de origem ou substituta. Entretanto, se por um lado, a institucionalização acolhe,
por outro pode provocar ansiedade devido a mudanças no ambiente, na rotina,
nas pessoas com quem a criança passa a conviver.
314
A ausência de uma rede de apoio social pode produzir um senso de soli-
dão e falta de significado de vida (SAMUELSSON; ET AL., 1996, APUD
SIQUEIRA; DELL’AGLIO, 2006), pois a rede de apoio social e afetivo define
como o indivíduo percebe seu mundo social, como se orienta nele, suas estraté-
gias e competências para estabelecer relações, como também os recursos que este
lhe oportuniza frente às situações adversas apresentadas. O abrigo precisa fazer
parte da rede de apoio social e afetivo, fornecendo recursos para o enfrentamento
de eventos negativos advindos tanto de suas famílias quanto do mundo externo,
modelos positivos, segurança e proteção. Somente assim oferecerá um ambiente
propício para o pleno desenvolvimento cognitivo, social e afetivo das crianças e
adolescentes inseridos nesse contexto.
Assim, destaca-se a necessidade de políticas públicas de intervenção dire-
cionadas às instituições de abrigo, considerando o grande número de crianças e
adolescentes abrigados, de forma que se favoreça uma melhoria das condições
de atendimento a essa população (SIQUEIRA; DELL’AGLIO, 2006), incenti-
vando o atendimento profissional.
Cada vez mais em evidência a adoção vem sendo transformada em um meio
mais simples e completo para extirpar o abandono infantil na sociedade atual (RIEDE;
SARTORI, 2003) tornando-se alvo de estudos psicológicos, sociais e jurídicos.
Todavia, outro viés começa a ganhar expressão, a devolução de adotados.
Quando não ocorre o estabelecimento de um vínculo afetivo familiar de fato entre
adotantes e adotado, poderá ocorrer um duplo abandono da criança, quando essa
passa a ser vista como ‘problema’ por ter nascido de ‘outra barriga’, de maneira que
os adotantes não a sentem como pertencente à família (RIEDE; SARTORI, 2003).
Os mesmos autores (2003) apontam que para evitar a frustração da adoção,
torna-se ainda mais necessário conhecer o perfil dos adotantes e reforçar a pre-
paração, visto que na adoção ocorre a busca de uma família para a criança e não
uma criança para resolver os problemas de uma família.
Sendo assim, a equipe interprofissional assume um lugar acentuado para o
sucesso nas adoções. É necessária transparência em todo o trâmite, pois a “devo-
lução” oficializada é uma experiência de duplo abandono, com consequência de
difícil reparação. Assim, a exigência do profissionalismo da equipe envolvida é
preconizada pelo ECA (1990) em seu artigo 151, que dispõe:
Compete à equipe interprofissional dentre outras atribuições que lhe
forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito,
315
mediante laudos, ou verbalmente, na audiência, e bem assim desen-
volver trabalhos de aconselhamento, orientação, encaminhamento,
prevenção e outros, tudo sob a imediata subordinação à autoridade
judiciária, assegurada a livre manifestação do ponto de vista técnico.
(ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ARTIGO
151 LEI 8.069 13 DE JULHO 1990, BRASIL, 1990).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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322
A VITIMOLOGIA NA PERSPECTIVA PSICOLÓGICA
SOB O OLHAR DO FILME: O QUARTO DE JACK
INTRODUÇÃO
111
Doutor em Educação (PUC-Minas). Professor (FAMINAS BH). CV: http://lattes.cnpq.br/6436140896087143
112
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
113
Graduando em Psicologia (FAMINAS BH).
114
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
115
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
116
Graduanda em Psicologia (FAMINAS BH).
323
Apesar de sua timidez, Jack é educado por sua mãe através das aulas minis-
tradas pelo idoso sequestrador. Eles têm lareira, comida, geladeira e pode assistir
televisão e, à noite, Jack deve dormir no pequeno armário quando ele visita Alegria.
“Em troca” do cárcere, o idoso Nick fornece mantimentos para os dois.
Quando uma oportunidade de escapar se apresenta, “meu filho e eu fazemos tudo
ao nosso alcance para aproveitá-la”. Mas como você encara o mundo depois de
tanto tempo preso? A maioria das duas horas do filme são gastas no quarto ato,
que dá ao filme seu título. A prisão não é apenas física, mas também emocional.
No blog psicoampliar é feita a seguinte leitura de que “a mãe sempre explicou ao
menino Jack que o mundo dentro da televisão é imaginário. A realidade é única
e exclusivamente aquilo que lhe é palpável” (OLIVEIRA, 2020).
Para dar ao filho uma infância mais feliz naquele ambiente desfavorável ela
criou um mundo paralelo em que o que acontecia na televisão não era real, e os
personagens e cenas ficavam presos nele. Como resultado, a imaginação de Jack
continuou até seus cinco anos quando sua mãe (tentou) explicar-lhe que tudo era
uma fantasia. A do pequeno Jack cita frases que parecem sem sentido, porém toda
a criação fantástica dele. Já para Joy, num conflito entre a claustrofobia de antes
e depois do cárcere com o medo de ser livre novamente.
A imaginação do pequeno Jack contém frases que parecem sem sentido, mas
refletem toda a sua fantástica criação. Joy, por outro lado, está presa entre dois medos:
de ficar presa ou ser livre novamente, porém não conseguir manter a criação do filho.
DESENVOLVIMENTO
324
A transformação de Joy e Jack é um labirinto de emoções que eventual-
mente colidem e convergem, tornando este título um grande filme sobre um dos
sentimentos mais poderosos do mundo: o amor materno e os sacrifícios que ela
faz pelo bem-estar de seu filho, pagando o preço com sua saúde mental, medo
constante e confinamento mental.
Contudo, o aparente “final feliz” nada mais é do que apenas o final de um
ciclo que aprofunda a temática da trama, ao revelar obstáculos difíceis de serem
superados durante o processo de integração deles com a realidade.
Ao longo deste filme encontramos alguns aspectos correlatos aos elementos
discursivos sobre o tema da Vitimologia. De faria e Da Silva Paiva entendem que
Vítima deriva do latim “victima” e “victus”, e significa vencido, dominado. Tendo
em vista que no âmbito do Direito Penal a vítima é vista como sendo o sujeito
passivo do crime, aquele contra quem se imputa o delito ou contravenção.
Destaca-se que em 1985 pela primeira vez o conceito de vítima foi
expresso pela Organização das Nações Unidas, na declaração que designou
sendo vítima todas as pessoas que,
individual ou coletivamente, sofreram dano, incluindo lesão física ou
mental, sofrimento emocional, perda econômica ou restrição subs-
tancial dos seus direitos fundamentais, através de atos ou omissões
que consistem em violação a normas penais, incluindo aquelas que
proscrevem abuso de poder (MAIA, 2012, p. 2).
Este conceito mostra que a vítima seria, então, o sujeito passivo do crime,
aquele que de alguma forma foi lesionado. Os danos não se restringem apenas aos
materiais, podem ser também, físicos, psicológicos ou morais.
Na busca da compreensão do tema e de acordo com Benjamin Mendelsohn,
2002, as vítimas podem ter cinco classificações da seguinte maneira:
1. vítima ideais (completamente inocente). 2. vítimas menos culpadas
que os criminosos (exignorantia). 3. vítimas tão culpadas quanto os
criminosos (dupla suicida, aborto consentido, eutanásia). 4. vítimas
mais culpadas que os criminosos (vítimas por provocação que dão
causa ao delito). 5. vítimas como únicas culpadas (vítimas agressoras,
simuladas e imaginárias). (FREDERICO, 2013, p. 3,4).
326
Em 2018 a revista Exame trouxe uma reportagem de Ruic apresentando
o ranking com os piores países do mundo para mulheres. Esta constatação é da
fundação filantrópica do conglomerado de mídia Thomson Reuters Foundation,
que divulgou na terça feira 26/06/2018 um estudo que buscou analisar alguns
fatores como saúde, discriminação, violência sexual e outros tipos de violência que
elegeram os piores países para as mulheres. E o ranking ficou assim: 1º Índia; 2º
Afeganistão; 3º Síria; 4º Somália; 5º Arábia Saudita; 6º Paquistão; 7º República
Democrática do Congo; 8º Iêmen; 9º Nigéria e 10º Estados Unidos.
Não vemos o Brasil nessa lista, mas isso não significa que não haja violência
contra a mulher, como apresentado pelo UNICEF (2021), ou dados importantes
do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (BSP). “Entre 2016 e 2020, 35 mil
crianças e adolescentes de 0 a 19 anos foram mortos violentamente no Brasil –
média de 7 mil por ano.” Além disso, de 2017 a 2020, 180 milhões de pessoas
sofreram violência sexual – uma média de 45 milhões por ano”.
O filme abordado neste capítulo é baseado em uma trágica história real
ocorrida em 2008, a qual alcançou grande repercussão mundial. Em 16 de janeiro
de 2018 o jornal Estado de Minas postou em suas páginas uma matéria relem-
brando os casos mais famosos de sequestro, entre os quais o de Elisabeth Fritzl
da Áustria que foi sequestrada e estuprada pelo seu pai Josef durante 24 anos no
porão da casa da família em Amstetten.
Diante das inúmeras possibilidades de classificações para às vítimas, Fre-
derico (2013) vai observar que:
É perceptível que cada autor tome parâmetros como: idade, sexo,
condição social, financeira e patológica para atribuir a vítima uma
classificação que julgue a mais coerente. Todavia cada autor classifica
a vítima de acordo com a linha de pesquisa que adotará, e sendo assim
deixa uma gama de ramificações para conclusões de estudos outros a
serem realizados. (TOMÉ; PEREIRA, 2014. p. 115).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
329
Que pelo fato de a subjetividade da mulher ser absolutamente negada
no ato do estupro, ocorre um processo de vitimização, o qual torna
acontecer novamente durante o processo, gerando sua revitimização,
pois a vítima é posta, meramente, como meio de prova... A violação
da intimidade da vítima é tão grave e desprezível que as condutas
descritas no tipo penal são reputadas de hediondos e as sequelas
oriundas do delito não são abrandadas pela privação de liberdade do
agressor. (GUIMARÃES. 2020. p. 13).
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332
REPRESENTAÇÃO DA ESCRAVIDÃO E DO NEGRO
NO BRASIL COLONIAL EM LIVROS DIDÁTICOS
DE HISTÓRIA DO ENSINO MÉDIO: UM ESTUDO
COMPARATIVO DA DÉCADA ANTERIOR E
POSTERIOR A OBRIGATORIEDADE DA
LEI Nº 10.639/2003
Doutor em Antropologia (UFPE). Professor Adjunto pesquisador em Ensino das Ciências Sociais (UFPE).
118
CV: http://lattes.cnpq.br/8170344621940111
333
processos culturais e herdeira dos Annales, que originou a “história problema”,
como um contra ponto ao materialismo histórico dialético, defensor de uma tese
mais totalizante da história, ancorado em um viés mais político e econômico,
corrente historiográfica até então reinante na academia. O presente capítulo é
uma miscelânea dessas duas correntes, visto a questão política ser importante
como garantia das liberdades, inclusive as individuais, assim como a cultural
que por assim dizer é a materialização dessas liberdades.
Neste contexto, a educação terá um papel fundamental na arti-
culação de novas maneiras de representar a cultura e a história da
África e dos negros no Brasil.
Circe Bittencourt em seu saber histórico (2013) relata que os anos de
1990 a 1995 nos estados brasileiros pululavam aproximadamente três deze-
nas de propostas educacionais que convergiam para a superação do modelo
tecnicista dos anos 1970, embora divergissem em outros pontos. Ressalta que
todas as propostas se apresentaram, assim como os saberes escolares contidos
nelas, como fruto de discussões dos três setores que seriam legítimos para
opinar em tal assunto: o poder educacional, das Secretarias de Educação, o
da academia, dos estudiosos com as discussões historiográficas, e dos profes-
sores. Concluindo que as propostas apresentadas basicamente propunham o
conteúdo do currículo estruturado sob duas formas: a dos eixos temáticos, cujo
lado crítico recai sobre a imprecisão em discernir eixos temáticos escolares das
histórias temáticas, mas se justificaria pela “impossibilidade de se estudar toda
a história da humanidade” e que a inovação trazida por esta forma de aborda-
gem seria a flexibilização para a montagem e organização dos conteúdos. E a
segunda abordagem pautada nos “modos de produção”, baseada, segundo ela, no
estruturalismo que imobilizaria as ações dos indivíduos na sociedade. Ambas
abordagens desfrutam de objetivos semelhantes, assim como são igualmente
críticas às noções de tempo histórico oriundos do positivismo. Mas ambas,
duplamente criticadas por Circe, quanto a concepção de uma História nacional
subordinada à europeia, em que o Brasil só “começaria a existir” a partir da
Europa. Ainda ressalta que seriam os objetivos ou as finalidades do ensino, se
inserindo e se integrando na constituição ou transformação paradigmática,
responsáveis pelas alterações nas relações sociais e culturais confirmando a
Educação como via importante para manutenção ou quebra de discriminações.
Ainda assevera que as propostas educacionais objetivavam suplantar um ensino
de história fundamentado na construção de um tempo histórico homogêneo,
334
eurocêntrico, com lógica de periodização baseada no sujeito-histórico do
Estado-Nação (BITTENCOURT, CIRCE, 2013, pp. 14-23).
A partir desse contexto, nota-se na historiografia brasileira uma abertura,
não sem resistências, para o debate que enfatizava o percurso histórico dos gru-
pos negros no Brasil. Dessa empreitada, surgiram novas maneiras de empoderar
os grupos afro-brasileiros. Então, através da legislação, o Estado brasileiro criou
uma política de reparação e valorização de ações afirmativas, que incentivaram
o ingresso, a permanência e a valorização das identidades da população negra
no âmbito das escolas, bem como nos manuais que as representavam com a
promulgação da Lei 10.639/2003.
De acordo com Silva e Fonseca (2007), as representações no ensino da
História devem ter como principal norteador a história do imaginário. Esta é um
importante instrumento para pensar como as populações discriminadas foram
sendo esquecidas no contexto do ensino brasileiro. Além disso, as ideologias de
representação para Durand (2002), enfatizam a reprodução imposta por estruturas
sociais dominantes no cenário político de uma determinada sociedade, neces-
sário se fazia um contra ponto.
Deste modo, o tema desse capítulo mostra uma relevância histórica signifi-
cativa quando se pensa a sua contribuição para entender o ensino brasileiro, mais
especificamente o ensino de história, a partir da produção de material didático que
destaca como os mecanismos ideológicos estão representando os afrodescendentes
no currículo e nos livros didáticos das escolas brasileiras.
Francisco de Assis Silva apresenta, em seu livro “História do Brasil” (1992),
uma crítica objetiva da escravidão, justificando essa visão na própria “Apresentação”
da obra quando afirma ser possível ter tal posicionamento, por ser “fruto de um
momento histórico em que as liberdades democráticas [no Brasil] nos permitem
enveredar pelo caminho da análise crítica mais objetiva”.
Ele divide o livro em seis unidades onde cada uma apresenta no mínimo
um capitulo e no máximo doze. Seu livro não traz consigo o apelo do trabalho
editorial, até pela data de publicação (1992). Apresenta o açúcar como atividade
lucrativa, “motor” que atraiu interesses e apresentou as justificativas necessárias à
colonização e consequentemente à escravidão, instituição necessária, na visão dos
colonos, para empreitada pretendida. Ele combate à ideia de passividade do índio
e do negro e refuta a ideia da “democracia racial” no Brasil afirmando que tanto
índio como negro foram escravizados e ambos reagiram, cada um a seu modo,
335
a essa instituição, no entanto, o poder econômico, político e militar do homem
branco se sobressaiu (SILVA, 1992, p. 55).
Ainda levanta uma questão que incomoda o historiador tradicionalista
do “como falar sobre as lutas negras e ao mesmo tempo defender a ideia sobre
a bondade do Senhor? O melhor seria sustentar a tesa da ‘passividade negra’”.
Contudo ele mesmo ressalva que:
não podemos confundir as lutas negras na colônia como movi-
mentos de consciência coletiva e politicamente organizado com
o propósito de colocar um ponto final no regime escravista. Nem
tampouco foram movimentos voltados ideologicamente para a
tomada do poder. Foram, invariavelmente, rebeldias individuais ou
coletivas, onde o negro buscava livrar-se da escravidão” (SILVA,
1992: p. 58).
Percebe-se que Assis (1992, p. 97) é um autor que se coloca nos livros,
reconhecendo a escravidão como processo malévolo para os escravos, embora
336
não tenha desenvolvido a contribuição do negro na questão cultural para for-
mação do Brasil. Além de não apresentar ações de fortalecimento das iden-
tidades e o combate ao racismo e a discriminação até esperado visto a obra
ser anterior a Lei 10.639/2003.
Já Vicentino e Gianpaolo nos convida, em sua “História do Brasil”
(1997), no Prefácio e na Apresentação, a mergulhar em uma história do Brasil
marcada por uma constante: a “mudança”, contudo esta seria efetuada para
não se sair do lugar afirmam parafraseando Giuseppe Tomasi di Lampedusa
quando afirma que “é preciso que tudo mude para que tudo permaneça como
está” revelando o tom de crítica aos problemas estruturais enfrentado pelo
país desde os 1500. Já se apresentam como portadores de uma visão crítica
da construção da sociedade e suas relações entre os indivíduos. Enfatizam,
em Nota, que trabalharam com periodização cronológica, para não fugirem à
prática comumente adotada pelos historiadores autores de livros didáticos, a
fim de facilitar o entendimento, contudo ressaltam que não se deve prender-
-se em exatidão absoluta a tais períodos, pois não são unânimes na academia,
podendo existir outros “marcos” mais significativos.
Apresentam a escravidão, como considerada pelos portugueses da época,
“uma instituição “justa”, já que no início, escravizavam-se os mouros, con-
siderados “infiéis” pelos cristãos” sem nenhuma crítica ou contra ponto. E
exemplificam dois fatores que explicaria a preferência do negro africano
para o emprego do trabalho escravo: o comércio de escravos no Atlântico e
o desaparecimento dos índios, através de extermínios. Apresentam os negros
escravos como vistos pela sociedade da época, como mercadorias, formadora
da base da sociedade e sem mobilidade social, também sem apresentar um
contraponto. Relatam a escravidão na África como promovida e estimulada
pelos portugueses a fim de comprar os negros vencidos dos chefes das tribos
vencedoras afirmando que, aos poucos, as tribos africanas teriam passado a
capturar seus conterrâneos e passado a vendê-los aos comerciantes portugue-
ses em troca de fumo, tecido, cachaça, joias. Não houve uma preocupação em
explicar os tipos de escravidão existentes em África anterior à chegada dos
europeus, em especial dos portugueses. Relatam os tipos de resistências pra-
ticadas pelos negros contra a escravização como atos de rebeldia, bem como
de violência contra os senhores, além de fugas, suicídios e até organização
em comunidades livres, referindo-se aos quilombos, descrito como ameaça,
337
aos Senhores de Engenhos, por estimular o desejo de liberdade nos escravos
(VICENTINO; GIANPAOLO, 1997, pp. 103-111).
Ponto positivo do livro é que já apresenta um trabalho gráfico mais elabo-
rado, mais atrativo, porém é bem resumido e não entrega a questão crítica que
se propuseram, no início da obra, permanecendo, na maioria das vezes, apenas
relatando como os personagens se enxergavam ou, melhor dizendo, como os
senhores enxergavam suas relações sociais com os demais. Não trabalha de fato
a luta dos negros para resistir e enfrentar suas adversidades, ficando mais com a
visão do senhor, representando o negro como objeto, mercadoria, e sem mobili-
dade social, negando-lhes assim sua importância para a formação da sociedade,
embora tenham relatado algumas formas de resistência. Também foram omissos
quanto ao legado cultural deixado pelos negros. Não há, dessa forma, o forta-
lecimento de identidades, valorização de ações educativas que combateriam o
racismo e a discriminação, porque os autores, apesar do discurso mais inflamado
na apresentação de sua obra, incorreram num erro de visão única da história, a
mais tradicionalíssima possível.
Cotrim em sua “História do Brasil” (2005), propõe um livro de visão global
da história do Ocidente e do Brasil, como o próprio autor nos conta na “Apre-
sentação”, procurando abranger processos históricos das sociedades analisando
aspectos econômicos, políticos, sociais e culturais utilizando-se, quando possível,
das contribuições mais recentes da historiografia e do ensino de história para tornar
mais significativo o aprendizado do aluno, onde o mesmo possa fazer uma relação
entre a história que se analisa com a que se vive, analisando o passado e o presente.
Cotrim abre o capítulo 23 sobre a economia açucareira fazendo uma
“ponte” entre o presente, com a concentração de terras no Brasil, e o passado
com as implantações dos engenhos. Diga-se de passagem, o único a realizar
essa “ponte” de ligação para um aprendizado significativo. Também apresenta
o açúcar como solução encontrada por Portugal para colonizar o Brasil. Traz
em “Textos Complementares” a vida cotidiana de um engenho, a vida privada,
relatando como um “feitor-mor” estava orientado pelo seu senhor a tratar os
escravos: desde o nascimento até à morte daquele. Elenca alguns motivos que
justificariam a escravidão africana à indígena como: a barreira cultural, onde o
índio não estaria “adaptado” ao trabalho na lavoura, pois na tribo seria incum-
bência das mulheres tal atividade; a dizimação sofrida pelos indígenas por causa
das epidemias (varíola, gripes) [além do posicionamento da própria Igreja]; por
outro lado os negros, em sua maioria, provinham de culturas familiarizadas com
338
metalurgia e criação de gado. Também contesta a passividade tanto de indíge-
nas quanto de negros frente à escravidão citando Stuart Schwartz que diz que
“os africanos sem dúvida não eram mais “predispostos” ao “cativeiro do que os
índios”; sem esquecer à Igreja que combateu a escravização do índio e permitiu
a dos negros” (COTRIM, 2005, pp. 209-213).
Na abertura do capítulo 24 sobre as Condições da Escravidão Africana
reflete, novamente fazendo uma “ponte” sobre o tráfico negro da África para o
Brasil com o Brasil contemporâneo e sua grande população de afro-descendentes,
questionando como se desenvolveu esse tráfico negro; quais as condições de vida
dos africanos ao chegarem no Brasil e quais estratégias de resistência à escravidão
desenvolveram (COTRIM, 2005, p. 217).
Descreve o negro como sujeito histórico que luta e, invocando a mais
recente historiografia afirma que
As “negociações” entre senhores e escravos também faziam parte
do cotidiano escravista. Segundo os historiadores João José Reis e
Eduardo Silva, muitos escravos cumpriam as exigências de obe-
diências e trabalho em troca de um melhor padrão de sobrevivência
(alimentos, vestuários, tratamento) e da conquista de espaço para
a expressão de sua cultura, organização de festas, etc. (COTRIM,
2005, p. 221).
339
Já Campos e Miranda em sua “História do Brasil” (2005) pensam um livro
didático, como nos informa na “Apresentação” de sua obra, que não se apresente
como um “pacote de viagem”, com paradas predeterminadas, objetivos fixos e
meios de transporte programados, mas algo próximo de um “mochilão” em direção
à História, de trajetos múltiplos, inúmeras possibilidades de reflexão e críticas e
entradas e saídas provisórias.
O livro também se propõe a ser um compêndio de história mundial e
do Brasil, por ser volume único, e apresenta a sociedade colonial assentada
na oposição entre senhores e escravos e outros grupos sociais, normalmente
homens livres que definiam-se de acordo com grau de proximidade ou distância
com os primeiros. Ponto positivo trazido pelos autores é que ressaltam que a
escravidão já existia na África, inclusive desde o século VIII com mercadores
mulçumanos que negociavam escravos na rota do mediterrâneo para a Europa,
e enfatizam que os Portugueses e outros Estados europeus marcaram a “África”
para sempre com a institucionalização do comércio de cativos para as Américas
e que a mesma esteve baseada na questão econômica. Nesse ponto, foi o único
dentre os livros utilizados como fonte a afirmar que a escravidão em África foi
institucionalizada pelos europeus, mais especificamente, pelos portugueses. Eles
procuraram realizar breve explanação sobre a diferença entre trabalho escravo, de
servo e de assalariado e apresentaram a escravidão negra como mais atrativa do
que a do indígena pela rede mercantil trazida consigo, com estrutura em escala
mundial, obedecendo aos interesses econômicos, além da questão religiosa da
defesa do índio pela Igreja em detrimento dos negros. Apresentaram o negro
como sujeito histórico que “apesar de todas as condições desfavoráveis e dos
discursos legitimadores da escravidão [...] não deixaram de apresentar formas
de resistência à situação: promoveram sabotagens no processo de produção do
açúcar; organizaram fugas coletivas ou individuais; assassinaram senhores e
feitores; suicidavam-se e geravam revoltas nas plantations e povoações” além
da “preservação das crenças e ritos africanos, apesar da condenação e vigilância
do clero colonial” e dos quilombos “marca mais característica da resistência”
(CAMPOS; MIRANDA, 2005, pp. 213-218).
Ponto negativo observado na obra é que não apresenta textos de visões
antagônicas ao tema, como se propõe, realiza mais uma síntese, embora uma
síntese bem elaborada falando sobre a escravidão ser anterior à sistematização
portuguesa, mesmo não aprofundando a questão. Relatam a existência da escra-
vidão de guerra na África, dos vencidos pelas tribos rivais, e citam o comércio
340
dos mercadores mulçumanos desde o século VIII (CAMPOS; MIRANDA,
2005, p. 2013). Outra questão negativa é a ausência da cultura negra na obra,
não falam dos conjuntos de crenças, da cosmogonia, músicas, danças etc., contri-
buições culturais importantes, embora apresente o negro como sujeito histórico,
defendendo seus interesses nas diversas formas de resistências praticadas. Apesar
dos autores proporem um debate no livro, devido à unicidade do volume, eles
perderam páginas preciosas para aprofundar o assunto e trazer as contribuições
culturais que ficou ausente na obra.
Apresentada a investigação a que o presente capítulo se propôs, foi possível
anuir à importância da escolha do livro didático, pois a discussão empreendida
permitiu instrumentalizar o pensar docente acerca dessa escolha por meio de uma
reflexão dos aspectos e dimensões da História e Cultura afro-brasileira contidas
neles e embasadas na legislação, sem, contudo, elegê-lo como único suporte edu-
cacional válido e adequado, visto serem portadores de “fatos” históricos.
Nessa linha de pensamento, Ferreira e Franco afirmam que “os fatos nunca
são coisas dadas, mas o resultado de um diálogo entre o documento e o seu
leitor”. (ideia compartilhada por Jaime Pinsk (2012) em seu “Ensino de His-
tória e a Criação do Fato”). Além disso, continua Ferreira e Franco o trabalho
empreendido na interpretação das fontes dependerá da condução que o histo-
riador dará aos seus questionamentos sobre o objeto de estudo que se conecta as
fontes dadas (FERREIRA; FRANCO, 2009, p. 64). A partir desse contexto, é
importante destacar que a fontes não são apenas documentos estáticos com letras
e palavras, mas um conjunto de símbolos e significados empreendidos por um
grupo específico, que determinam em certo sentido, a lógica social vivida num
determinado momento histórico.
Dessa maneira, Jaime e Carla Pinsky (2013, p. 23) complementam esse
diálogo nos alertando para não cairmos numa espécie de anacronismo pois que
o passado deve ser interrogado sim e a partir de questões que nos inquietam no
presente sim, contudo nos alerta para que não caiamos num “presentismo” vulgar,
procurando encontrar no passado justificativas para atitudes, valores e ideologias
praticadas no presente, mas sim tomarmos como referências questões sociais e
culturais, bem como todas as desigualdades: sociais, raciais, sexuais para interpretar
o mundo, [re]organizar a sociedade, mudar limites, realizar rupturas ou mesmo
consolidar instituições etc. Ou seja, necessário se embasar de múltiplas visões para
não incorrer no risco de uma história superficial e “única”.
341
Portanto, o conceito de representação é de fundamental importância. Para
Burke (2005), a representação das estruturas sócio-históricas deve levar em con-
sideração as diversidades culturais. Nesse sentido, a reprodução ou a ruptura com
sistemas de dominação ou exclusão são vistas pela teoria da representação como
um processo de agenciamento do sujeito. Assim, o livro didático não deixa de
ser visto como instrumento de reconstrução das práticas ideológicas, que poderá
contribuir para uma nova configuração do ensino da cultura brasileira, enfatizando
a produção cultural e histórica das etnias africanas no Brasil, visto que o fazer
histórico, não é neutro em seus posicionamentos.
Após as discussões empreendidas, a partir da representação que os autores
fizeram da escravidão e do negro no Brasil Colonial nas obras didáticas para
o ensino médio, ficou evidente a questão ideológica presente pelas omissões,
eufemismos, relatos, evitando assim promover uma discussão direta com
múltiplas fontes. As obras didáticas mencionadas não atenderam, em sua
integralidade, tanto os manuais de (1992) e (1997) anteriores à promulgação
da Lei 10.639/2003, já esperado, quanto os posteriores também, ambos de
(2005), o que não era esperado.
Apesar das conquistas e sugestões da contidas na referida Lei 10.639/2003
seu “translado” integral para vivência escolar ainda é um devir, e essa mudança,
estrutural, não é realizada por decreto, mas por interações sociais diárias eivadas de
lutas e, nesse contexto, o livro didático continua sendo um instrumento cobiçado
pelo poder que pode ocupar na manutenção do status quo ou como balizador de
políticas de ações afirmativas.
De maneira geral, o presente capítulo permitiu entender os contextos
e as forças envolvidas atuantes na “guarda”, elaboração e difusão do conhe-
cimento histórico, onde o livro didático é um instrumento valioso nesse
embate de permanências e rupturas.
Com isso, reconhecendo a dívida social que o Estado brasileiro e a Sociedade
ainda possuem junto aos descendentes de africanos negros foi por isso instituída “a
obrigatoriedade de inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos
currículos da Educação Básica tratando-se de decisão política, com fortes reper-
cussões pedagógicas, inclusive na formação de professores”. (BRASIL, 2004, p. 17)
342
FONTES
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Médio. Brasília-DF.
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344
SOBRE O ORGANIZADOR
CLEBER BIANCHESSI
345
ÍNDICE Ensino jurídico 245, 246, 253 Prática educativa 45, 120, 249, 254, 270,
288
REMISSIVO Estágio supervisionado 133
Práticas sexuais 55, 57-60
Ética 53, 74, 113, 122, 136, 186, 236, 245,
246, 248, 249, 253, 254 Q
F Quarto de jack 323, 326, 328
A Ferramentas de colaboração 203, 206, 207, Química de coordenação 37-39, 43, 44
209, 210
Abordagem investigativa 21 R
Festa do Jacaré 121, 127-132
Adoção e devolução de crianças 311 Recursos tecnológicos 31, 281, 284
Formação do caráter 157, 159-163, 166,
Arara Karo 121-123, 126, 127, 129, 130, 167 Rede municipal de ensino 223, 226, 228,
132 229, 231
Formação universitária 37
Argumentação e raciocínio 99, 100 Reforma do ensino médio 289, 290, 292,
Fotografias 147, 148, 150, 156 300
Arqueologia e educação 169, 174, 178
G Removed 311, 312
B
Gestão escolar democrática 223-225, 228, Representação da escravidão 333
Big Data 195-202 230-232
S
C Google Workspace for Education 195, 196,
201, 203, 206, 207 Subjetivação neoliberal 265, 269
Conceição Evaristo 255, 256, 260-263
H T
Construção do conhecimento 21, 29, 46,
195, 198, 204, 282 Histórias em Quadrinhos 211, 214-217, Teoria do capital humano 77, 78, 82
220, 222
Contexto pós-pandêmico 63 Tereza Cardenas 255
Currículo escolar 55, 265, 269-272, 274
I
Território interdisciplinar 11
Impactos ambientais 21, 22, 28
D V
Implicações no vestibular 87
Desenvolvimento sustentável 21, 22, 25, Visão dos gestores 223, 231
28, 29, 70, 71 Infância 11-20, 76, 157, 159, 160, 167, 181,
182, 211, 214-216, 220, 237, 307, 317, 318, Vitimologia 323, 325, 326, 328, 331, 332
Desigualdades sociais 63, 68, 69, 71, 78, 322, 324
256, 260, 262 W
Inovação e tecnologia 63
Didática Zoró 109, 110, 114, 115, 118, 120 Wayo Akanã 121, 129, 131
Direito fundamental do idoso 233
L
Literatura no ensino médio 87, 89, 95, 98
Direitos humanos 19, 62, 136, 236, 245-
251, 253-256, 259, 260, 262-265, 272-275, Livros didáticos de história 333
331
Diálogo interdisciplinar 169 M
Docência experiente 109 Mediação dialética 181, 183, 194
Ensino de literatura 87, 98, 246, 255, 263 Professor Pangyjẽj 109
Ensino de língua materna 133, 135, 137, Professores brasileiros 277, 286
140, 143, 144
Profissionais da química 37
346
ISBN 978-65-5368-090-6
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