A farsa de Inês Pereira, escrita pelo português Gil Vicente, é uma obra
onde se retrata a vida amoral e os costumes degradantes da sociedade
portuguesa da época. Na narrativa conhecemos Inês Pereira, uma linda jovem que se vê as voltas com o serviço doméstico e atividades que ela considera degradantes e que vê no matrimonio sua chance de escapar daquela realidade tão ingrata, como se revela logo no primeiro trecho:
INÊS: Renego deste lavrar
E do primeiro que o usou; Ó diabo que o eu dou, Que tão mau é d'aturar. Oh Jesu! que enfadamento, E que raiva, e que tormento, Que cegueira, e que canseira! Eu hei-de buscar maneira D'algum outro aviamento.
Esse descontentamento da jovem Inês é que era movimentar toda
trama. Uma casamenteira chamada Lianor Vaz aparece e, sobre um falso pretexto, leva-lhe a pedido de casamento de Pero Marques, um camponês simples e rústico (como deixar transparecer em sua carta) e que desagrada Inês, que decide recebe-lo somente para pilhéria, apesar dos protestos de sua mãe. Mesmo assim, como fica nítido no trecho abaixo, ela prossegue em suas intenções:
INÊS: Essa é boa demanda!
Cerimónias há mister Homem que tal carta manda? Eu o estou cá pintando: Sabeis, mãe, que eu adivinho? Deve ser um vilãozinho Ei-lo, se vem penteando: Será com algum ancinho?
Quando o moço chega para visita-la, Inês se comporta de forma ridícula
e sem demonstrar nenhum traquejo social, desencorajando pero a cortejá-la, faz com que ele vá embora. Nesse momento entram em cena Latão e Vidal, dois judeus casamenteiros, contratados por Inês para que lhe arranjem um partido à sua altura, alguém que lhe possa trazer benefícios futuros e imediatos.
INÊS: Eu falei ontem ali
Que passaram por aqui Os judeos casamenteiros E hão-de vir agora aqui.
São duas figuras claramente trapaceiras, que levam como possível
pretende Brás da Mata, um escudeiro, que pretende casar-se com Inês e tirar vantagens materiais deste casamento. ESCUDEIRO: E se me vires mentir Gabando-me de privado, Está tu dissimulado, Ou sai-te pera fora a rir Isto te aviso daqui, Faze-o por amor de mi.
Brás consegue alcançar o seu objetivo, e já em casa com Inês começa a
colocar suas garras de fora, enchendo-a de regras a serem seguidas e restringindo a sua liberdade. Brás morre num combate (tentando evitá-lo) e Inês, livre das amarras deste casamento, chama Lianor e diz que procure Pero e por fim acertem seu casamento.