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PORTUGUÊS

Farsa de Inês Pereira de Gil Vicente


Estrutura externa e interna
Farsa – peça breve e sem divisão formal em atos/cenas
. ESTRUTURA EXTERNA

A farsa não contém estrutura externa; ao longo da peça, há personagens que entram e saem, que permite
considerar a existência de “cenas”.
. ESTRUTURA INTERNA

Podem ser considerados 3 grandes momentos:

. exposição – Inês deseja libertar-se pelo casamento, da vida de solteira

. conflito – Inês rejeita um pretendente rico e aceita um pretendente galante, com quem é infeliz

. desenlace – Inês casa com Pero Marques, que tinha rejeitado, e concretiza o seu desejo

As personagens – principais características


. Inês Pereira: a casadoira

É uma das personagens mais complexas. Aprende com a experiência de vida e evolui, transforma-se ao decorrer da
peça.

. inicio da peça/ solteira

. indolente/ não cumpre as tarefas

. sonhadora e romântica

. pretende casar-se para

. se libertar da sua vida

. se unir ao homem ideal

. mostra ser rebelde e determinada

. não ouve os conselhos da Mãe

. desposa o pretendente

. casamento com o Escudeiro

. submetida a um tratamento cruel

. desencantada e desiludida

. casamento com Pero Marques

. sente-se livre; comete adultério (traição)

. Mãe: a matriarca

. voz da experiência

. pragmática (afirma que um casamento implica sustento material) e prudente

. mostra o seu afeto maternal por Inês (pede ao Escudeiro que seja afetuoso com a filha)
. Lianor Vaz: a alcoviteira

. propõe a Inês o casamento com Pero Marques

. assusta e determinada

. pragmática (sugere que Inês case com Pero Marques pois ele pode sustentá-la)

. Pero Marques: o “asno”

. lavrador abastado

. ingénuo, ignorante e um pouco grosseiro

. determinado (não desiste do seu desejo de casar com Inês)

. Escudeiro: o “cavalo”

. fidalgo e mentiroso

. interesseiro

. autoritário, despótico (humilha e oprime Inês após o casamento)

. cruel para com o Moço

. cobarde (é morto por um pastor quando fugia da batalha)

. Moço: personagem tipo

. funciona como contraponto do Escudeiro (através dos comentários do Moço, sabe-se a condição miserável em que
vive o Escudeiro)

. irónico

. Os judeus, Latão e Vital: os casamenteiros

. astuciosos e eloquentes

. têm uma função semelhante à de Lianor Vaz (persuadir InêS)

. Moças e Mancebos, Luzia e Fernando: os amigos da família (povo)

. convidados para a festa do primeiro casamento de Inês, cantam e bailam, animando a boda e contribuindo para a
festa do teatro

. Ermitão

. sedutor

. tem um comportamento imoral, semelhante ao do clérigo referido no início da farsa

A ação – dramatização da vida quotidiana


. a mulher

. vida doméstica

. liberdade restringida pela Mãe e pelo marido

. casamento com meio de emancipação

. adultério

. costumes

. casamentos arranjados -> casamenteiros


. cerimónia de casamento com festa -> canto e dança

. prática religiosa -> missa

. classe social

. decadência da nobreza -> Brás da Mata

. desconsideração da vida -> Pero Marques

. devassidão do clero -> clérigo e Ermitão

O espaço
. Inês solteira

Espaço interior -> casa de Inês

. Inês casada com o Escudeiro confinamento de Inês à área doméstica

Espaços interiores -> casa de Inês e residência do Escudeiro

. Inês casada com Pero Marques

Espaço interior -> residência liberdade de movimentos

Espaço exterior -> peregrinação até à ermita

O tempo
Apenas uma referência concreta: o Moço refere que o Escudeiro partira há três meses para o norte de África quando
Inês recebe a carta

A sátira e o cómico no teatro de Gil Vicente


. objetivos da sátira

. refletir sobre a realidade social portuguesa da época de Gil Vicente

. analisar criticamente os grupos e as instituições de uma sociedade

. denunciar os vícios e os erros em tom humorístico

. corrigir os comportamentos condenáveis (função edificante)

. temas da Farsa

. a decadência de costumes

. a duplicidade e falsidade

. o casamento

. a condição da mulher

. alvos da crítica

. as jovens casadoiras

. os alcoviteiros

. os religiosos

. os rústicos

. os escudeiros
. estratégias de sátira

. personagens-tipo

. caricatura

. comicidade

. ironia e sarcasmo

. diálogo

. cómico de situação

. Pero Marques senta-se na cadeira ao contrário e de costas para Inês e sua Mãe

. as interrupções e repetições constantes de Vidal e Latão com a pressa de persuadirem Inês

. Pero Marques, descalço, transporta Inês às costas para o encontro amoroso desta com o Ermitão e canta enquanto

. cómico de carácter

. Pero Marques, descolado no contexto em que é colocado

. O escudeiro, dissimulado, com o seu discurso elaborado e o seu talento para cantar e tocar

. cómico de linguagem

. linguem de Pero Marques

. discurso repetitivo de Vidal e Latão

. ironia do Moço que serve o Escudeiro

Principais recursos estilísticos presentes na obra


. Ironia – dar a entender o contrário do que se diz, por exemplo, parece que se está a elogiar quando, na
verdade, se está a ridicularizar;

. “I-vos vós embora à guerra, / que eu vos guardarei oitavas.” (Moço) – as “oitavas” eram as prestações que os lavradores
pagavam ao proprietário das terras; com isto o Moço está a ser irónico, pois o Escudeiro não tem terras, logo não pode
receber nada.

. “Bem sabedes vós, marido, quanto vos amo” (Inês Pereira) – Inês sente exatamente o contrário do que diz e a prova disso
é que se vai encontrar com o Ermitão;

. Comparação – relação de semelhança entre duas entidades, estabelecida por uma expressão comparativa

- “Coitada, assi hei de estar/ encerrada nesta casa /como panela sem asa, / que sempre está num lugar?” (Inês Pereira) –
Inês lamenta a sua sorte, comparando-se a um objeto inútil;

- “Estareis aqui encerrada / nesta casa tão fechada, / como freira d’Odivelas.” (Escudeiro) – Brás da Mata compara a
situação de Inês com a clausura de uma freira;

. Interrogação retórica – pergunta à qual não se pretende resposta;

- “E assi hão de ser logrados / dous dias amargurados, / que eu possa durar viva?” (Inês Pereira) – descontento pela vida que
leva

- “E nasceu-te algum unheiro / ou cuidas que é dia santo?” (Mãe) – a Mãe espera que Inês faça o que lhe pediu; serve para
criticar o comportamento da filha;
. Metáfora – comparação sem a presença explícita do elemento comparativo;

- “porque a moça sisuda / é uma perla pera amar” (Mãe) – aconselha Inês a mostrar-se séria para impressionar o Escudeiro;

- “Marido cuco me levades” (Inês) – compara Pêro Marques a um cuco porque ele repete sempre a mesma frase;

- “Sempre fostes percebido / pera cervo” (Inês)

. Metonímia – emprego de um termo que pode significar outro;

- “Renego deste lavrar” (Inês) – o termo lavrar é sinónimo, neste contexto, de costurar;

- “que não m’hei de contentar / de casar com parvoíces” (Inês) – revela que não quer casar com um homem parvo, ou seja,
provinciano, como era Pêro Marques.

Resumo da peça
Inês Pereira é uma jovem solteira que sofre a pressão constante do casamento, e reclama da sorte por estar presa em casa, aos
serviços domésticos, cansando-se deles. Imagina Inês casar-se com um homem que ao mesmo tempo seja alegre, bem-
humorado, galante e que goste de dançar e cantar, o que já se percebe na primeira conversa que estabelece com sua mãe e
Leonor Vaz. Essas duas têm uma visão mais prática do matrimônio: o que importa é que o marido cumpra suas obrigações
financeiras, enquanto que Inês está apenas preocupada com o lado prazeroso, cortesão.

O primeiro candidato, apresentado por Leonor Vaz, é Pero Marques, camponês de posses, o que satisfazia a ideia de marido na
visão de sua mãe, mas era extremamente simplório, grosseirão, desajeitado, fatos que desagradam Inês. Por isso Pero Marques
é descartado pela moça.

Aceita então a proposta de dois judeus casamenteiros divertidíssimos, Latão e Vidal, que somente se interessam no dinheiro que
o casamento arranjado pode lhes render, não dando importância ao bem-estar da moça. Então lhe apresentam Brás da Mata,
um escudeiro, que se mostra exatamente do jeito que Inês esperava, apesar das desconfianças de sua mãe.

Eles se casam. No entanto, consumado o casamento, Brás, seu marido, mostra ser tirano, proibindo-a de tudo, até de ir à janela.
Chegava a pregar as janelas para que Inês não olhasse para a rua. Proibia Inês de cantar dentro de casa, pois queria uma mulher
obediente e discreta.

Encarcerada em sua própria casa, Inês encontra sua desgraça. Mas a desventura dura pouco pois Brás torna-se cavaleiro e é
chamado para a guerra, onde morre nas mãos de um mouro quando fugia de forma covarde.

Viúva e mais experiente, fingindo tristeza pela morte do marido tirano, Inês aceita casar-se com Pero Marques, seu antigo
pretendente. Aproveitando-se da ingenuidade de Pero, o trai descaradamente quando é procurada por um ermitão que tinha
sido um antigo apaixonado seu. Marcam um encontro na ermida e Inês exige que Pero, seu marido, a leve ao encontro do
ermitão. Ele obedece colocando-a montada em suas costas e levando Inês ao encontro do amante.

Consuma-se assim o tema, que era um ditado popular de que "é melhor um asno que nos carregue do que um cavalo que nos
derrube".

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