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AGRUPAMENTO DE ESCOLAS CIDADE DO ENTRONCAMENTO

FARSA DE INÊS PEREIRA

Espaço e Tempo

A Farsa de Inês Pereira é uma das mais perfeitas de Gil Vicente. Muito embora tenha um
princípio, um meio e um fim, ainda não atinge a complexidade das peças de teatro clássicas.

A divisão em atos e cenas ainda não era conhecida pelo mestre Gil Vicente. As suas peças são
rudimentares, ignoram a unidade de espaço e de tempo. A intriga salta de um lado para outro
sem intervalos, na realização do espetáculo. A título de exemplo, lembremos a Personagem
Pero Marques que aparece monologando no início da rua de Inês, tateando, em busca da casa
da pretendente e, instantes depois, já se encontra dentro, sentado numa cadeira, falando com
elas.

Tal como no espaço, o tempo também surge em Gil Vicente sem unidade. A ação salta sobre
períodos de tempo, sem serem assinalados por intervalos entre os atos. Por exemplo, num
instante Inês fala com o marido e, momentos depois, recebe uma carta do irmão dizendo que
está viúva, o que já se passara há algum tempo.

Ação

Esta farsa é o desenvolvimento dramático do dito popular « Mais quero asno que me leve que
cavalo me derrube», feita com o intuito de demonstrar a alguns fidalgos que duvidavam da sua
honestidade literária, que poderia fazer uma peça, partindo de um provérbio.

Gil Vicente pôs em cena personagens que encarnavam os elementos ativos desta comparação.

Asno me cavalo

Pero Marques Inês Pereira Escudeiro

Acrescentou como personagens secundárias: Mãe ( voz do bom senso); Lianor Vaz e os Judeus
Casamenteiros ( Latão e Vidal).

A peça constrói-se assim no contraste assinalado logo no provérbio .

PERO ESCUDEIRO BRÁS DA MATA

 Lianor propõe Pero Marques para  Judeus casamenteiros propõem Brás


marido a Inês, que o repele. da Mata
 Mãe aconselha Inês sobre o modo  O escudeiro diz aos judeus como se
como se deve comportar perante devem comportar perante as
Pero mentiras

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 Troça de Inês  Troça do escudeiro
 Conversa de Pero e Inês  Conversa de Inês e o Escudeiro
 Casamento de Inês com Pero  Casamento de Inês com o Escudeiro
 Mãe aconselha Inês a casar com  Mãe aconselha Inês a não casar com
Pero o Escudeiro
 Escudeiro não consente que a
 Pero dá à Mulher toda a liberdade Mulher cante ou fale com alguém
 Escudeiro exige do Moço que
 Pero leva a mulher às costas ao mantenha a mulher enclausurada
encontro com um amante (ermitão)

 Leva o marido a cantar alegremente


que é enganado -cavalo
- elegante
-asno -nobre
-estúpido -orgulhoso
-serviçal -preguiçoso
-teimoso - desleal
-deselegante -poltrão
-modesto
-resistente

SÍMBOLOS
O cavalo é que seria ótimo se não a derrubasse. Foi esse cavalo seguro e leal que Inês
sinceramente amou em sonhos de donzela. Porém teve que optar pelo asno serviçal, a quem
nunca poderia amar. A felicidade que não poderia encontrar no amor, procurou-a na vingança
profunda pelo seu desencanto.

O Escudeiro representa um passado que não podia continuar. Pero substitui o escudeiro na
vida, mas não no coração dela. Simboliza a burguesia a substituir a classe nobre na vida, mas
não no coração dos portugueses, naquela época.

CARACTERIZAÇÃO DAS PERSONAGENS

 INÊS PEREIRA
É a personagem fundamental da peça. Podemos caracterizá-la em três fases: enquanto
solteira; após o primeiro casamento com o escudeiro e, finalmente, depois do
matrimónio contraído com Pero Marques.
Inicialmente era preguiçosa, alegre, vaidosa e um pouco maldizente. Por outro lado,
não exigia luxos nem riquezas. Queria um homem que lhe proporcionasse uma vida
alegre, ainda que pobre.
A segunda Inês, casada em primeiras núpcias, modificou-se em função da severidade
do escudeiro, que a mantinha fiel e obediente às suas imposições.
A terceira Inês é o resultado de uma transformação profunda, provocada pelo
comportamento cínico do escudeiro. Aceitou Pero Marques como marido pois desta
forma teria toda a liberdade desejada e poderia vingar nele as afrontas recebidas
anteriormente, transformando Pero num super- asno.

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 PERO MARQUES
É um ser ingénuo, estúpido, serviçal, modesto que vive feliz e espalha felicidade à sua
volta. Representa o antigo servo da gleba, que ao longo dos tempos, teria conseguido
amealhar algumas coroas enegrecidas pelo suor.
É a personagem cómica da peça. Não sabe sentar-se numa cadeira, e ao pretender
oferecer a Inês umas peras fresquinhas, que trazia no fundo do capuz, por debaixo dos
arreios dos animais, havia-se esquecido delas em casa. Ao ver-se sozinho com Inês, fica
enleado e vai-se embora, com medo do escuro. Pede que mande a resposta por Lianor
Vaz.
Como é persistente, espera por Inês, após esta ter enviuvado.
 ESCUDEIRO
É a atuação do Escudeiro que fabrica Pero Marques- o seu contrário. Ele transtorna e
transforma Inês, que cheia de ódio, explora a ingenuidade e o amor de Pero até às
últimas consequências.

 LIANOR VAZ
É a alcoviteira, a comadre casamenteira, que arranja casamentos e deles tira lucro.
Sabe muito da sua profissão. Possui bons e subtis conhecimentos da sua arte, daí que,
ao chegar junto de Inês e da sua mãe, não mostre logo as suas pretensões. Inventa
uma conversa para lhes despertar a atenção. Quando elas já estão com piedade de
Lianor, então não perde tempo e fala do assunto do seu interesse.

 MÃE

É a boa conselheira e confidente. Luta quanto pode, pela felicidade da filha iludida,
o que torna Inês mais responsável pela sua escolha. Como qualquer mãe, pretende que
a filha case com um homem rico, que lhe proporcione uma vida ociosa, pois conhece
melhor que ninguém o caráter de Inês. A certa altura, Inês não a quis ouvir e esta afasta-
se. Inês há de aprender às suas custas.
 JUDEUS CASAMENTEIROS
Eram fingidos, odiosos e agiam por dinheiro. Não ignoravam os defeitos de Inês, nem
do Escudeiro, embora nunca os revelassem a um ou a outro. Zombavam, sempre que
possível dos dois.

 ERMITÃO
Personagem secundária perfeitamente dispensável.
Os ermitães eram elementos do clero que se aproveitavam da fé e da ingenuidade dos
crentes, esmolando e vivendo parasitariamente.
O Ermitão que surge nesta peça fora um antigo enamorado de Inês e agora
aproveitava-se da ingenuidade de Pero para se encontrar novamente com ela.
Na época havia a mentalidade de que as relações com gente da igreja não eram
pecaminosas.

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