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Música cristã
contemporânea
Um avivamento musical
em nossos dias
Uma cortesia da
Editora Vida
Vida
©2005, de Sandro Baggio
Associação Nacional de
©2001, publicada por Editora Vida,
Livrarias Evangélicas salvo indicação em contrário.
Baggio, Sandro
Música cristã contemporânea / Sandro Baggio. — São Paulo : Editora
Vida, 2005.
Bibliografia
[sbn 85-7367-807-0
Introdução 11
As origens 16
Avivamento musical 26
Música popular contemporânea 35
As letras 68
O rock é do Diabo 87
e adoração 112
Quarta parte: aprendendo a usar a música cristã
contemporânea 117
Conclusão 141
Notas 145
Introdução
Elmer Towns
12
vens, líderes de jovens, pais e até pastores também tinham os
mesmos questionamentos e preocupações. E justamente para es
sas pessoas que dirijo meu trabalho.
A obra está dividida em quatro partes. Na primeira parte, apre
sentarei um pouco da história da música gospel norte-americana
e sua influência na música popular contemporânea; na segunda,
veremos duas diferenças básicas entre a música cristã contempo
rânea e a música secular; teremos então, na terceira parte, uma
visão de vários falsos conceitos sustentados por alguns cristãos
em torno da música popular (principalmente do rock); e, final
mente, encerrarei com algumas sugestões práticas para músicos,
pais e líderes cristãos quanto ao relacionamento entre a música
cristã contemporênea e a igreja.
Minha oração é para que os conceitos abordados neste traba
lho possam servir de auxílio tanto àqueles que estão lidando com
os questionamentos e a controvérsia em torno da música cristã
contemporânea quanto aos que estão buscando produzir música
relevante à sua geração, sem que, para isso, tenham que se des
viar da vontade de Deus.
13
Primeira parte
O que é música
cristã contemporânea
AS PRIMEIRAS GRAVAÇÕES
O pesquisador musical americano Ray Funk diz que "se fôsse
mos considerar as gravações de artistas negros realizadas antes
da Segunda Guerra Mundial, quase todas elas eram jazz ou blues"1.
E, ainda segundo Funk, a música negra religiosa constitui uma
parte significativa de todas essas gravações.
17
Artistas negros cristãos, como o Standard Quintette e o
Dinwiddie Colored Quartette, estão entre os primeiros a realizar
gravações musicais, entre 1890 a 1902. Grande parte da influên
cia na música gospel que varreu a América do Norte após a Pri
meira Guerra Mundial veio desses artistas.
Veremos, a seguir, um pouco da história desses artistas a que
Ray Funk se refere.
Joshua White
Gary Davis
18
dentro da igreja como fora dela. Ele nasceu cego, em 1896, em
Lawrense County, na Carolina do Sul, e começou a tocar ainda
criança, mas passaram-se trinta anos até ser descoberto por James
B. Long, um caçador de talentos da época. Foi ordenado ministro
em 1933 pela Convenção Batista Livre em Washington, Carolina
do Norte. Por volta de 1935, Gary Davis gravou seu primeiro dis
co pela American Record Company.
Blind Gary Davis, como ficou conhecido, fazia suas apresen
tações principalmente em reuniões de avivamento. Sua canção
Lord l wish 1 could see [Senhor> eu gostaria de poder ver} ], testemu
nho pessoal da dificuldade de não enxergar, foi gravada pela pri
meira vez em 26 de julho de 1935, mas rejeitada pela gravadora.
Por volta de 1945, o reverendo Gary Davis mudou-se para Nova
York, onde continuou cantando e pregando em reuniões evange-
lísticas ao ar livre e realizando gravações para diversos selos
fonográficos até a sua morte, em 1972.
Algumas das canções também foram gravadas por artistas como
Bob Dylan, Jackson Browne e The Grateful Dead. O legado
musical de Gary Davis pode ser conhecido não somente por suas
gravações, mas também pelo número de guitarristas que apren
deram suas técnicas musicais durante a década de 1960. Bob
Weir, do The Grateful Dead, disse: "O reverendo Davis me ensi
nou, pelo exemplo, a abrir mão dos preconceitos do que pode ou
não pode ser feito com uma guitarra"4.
19
religiosos de rua do Texas durante os anos 1920-30; porém, gra
vou apenas trinta canções, entre 1927 e 1930. Ele tocava guitarra
e cantava suas canções com uma voz insistente e rasgada.
De todos os cantores e guitarristas religiosos anteriores à Se
gunda Guerra Mundial, Blind Willie Johnson é aquele cujas gra
vações têm despertado maior interesse dos historiadores musicais
nos últimos anos. Versões de sua canção Nobody's fault but mine
[Não é culpa de ninguém, apenas minha7 ] foram gravadas por The
Grateful Dead, Led Zeppelin, Nina Simone, Black Crowes, den
tre outros. Blind Willie Johnson morreu de pneumonia em
Beaumount, Texas, em 1949.
Washington Phillips
Thomas A. Dorsey
20
Nascido em 1899, em Atlanta, na Geórgia, Thomas Dorsey
era filho de um pregador batista. Apesar de ter sido tremenda
mente influenciado pelos hinos do dr. Isaac Watts, Dorsey tam
bém ouvia jazz e blues. Garoto prodígio, aprendeu sozinho a tocar
vários instrumentos, sendo o primeiro deles o piano. Dorsey assu-
miu o apelido de Geórgia Tom ainda jovem; começou a escrever
blues e passou a acompanhar uma de suas lendas, Ma Rainey's
Jazz Band, num dos bares de Al Capone em Chicago. Apesar de
estar envolvido com a música secular, Dorsey mantinha interesse
pelas canções religiosas, particularmente pelas canções com in
fluências de blues do compositor C. A. Tindley, outro pai do gospel
moderno.
Em 1926, enquanto Dorsey se recuperava de uma enfermida
de, seu filho morreu de apendicite aguda. O fato de continuar
vivo, apesar de estar doente havia seis meses, enquanto seu filho
morrera em poucas horas deixou-o muito abalado. Em meio à dor,
Dorsey disse ter recebido a visita de um mensageiro celestial que
o direcionou a escrever Ifyou see my Saviour, tell him that you saw
me [Se você vir meu Salvador, diga-lhe que me viu]. Ele enviou qui
nhentas cópias dessa canção para várias igrejas, mas foi somente
durante a Sessão Jubileu da Convenção Batista Nacional em
Chicago, em 1930, que ela se tornou um verdadeiro sucesso. Im
pressionados, os diretores da convenção sugeriram que Dorsey
vendesse os direitos da canção.
Dorsey compôs copiosamente durante os anos da depressão
americana. Suas canções tinham como objetivo levantar o ânimo
dos abatidos e deram origem ao blues gospel. Além de compor,
deu início e dirigiu vários corais gospel. Entre 1939 e 1944, acom
panhou Mahalia Jackson em apresentações pelos Estados Uni
dos. Dorsey continuou viajando e compondo até meados da
década de 1960, e durante muitos anos foi dirigente da Conven
ção de Cantores Gospel, fundada por ele e Sallie Martin. Morreu
em Chicago, em 1993, com 94 anos.
21
Mahalia Jackson
22
para Chicago em 1926, onde gravou várias sessões até 1928, acom
panhada pelo reverendo F. W. McGee e por Jessie May Hill. Infe
lizmente não existem maior informações sobre ela; sabe-se apenas
que não voltou a gravar após 1928.
Quartetos de capela constituíam uma das mais populares for
mas de música gospel durante a primeira metade do século 20.
The Blue Chips foi um desses quartetos, um grupo misterioso que
gravou três sessões em Nova York, em 1936, com um repertório
de canções cristãs e seculares, acompanhadas por uma pequena
banda de jazz-
Tal combinação de jazz e gospel é algo raro nas gravações reli
giosas da época. Os jornais religiosos das comunidades negras
freqüentemente traziam exortações quanto ao perigo de dimi
nuir a pureza da música gospel ao misturá-la ao jazz e levá-la para
fora da igreja, aos clubes noturnos. Essa mistura de estilos tem
sido mais aceita na música cristã contemporânea, em que todos
os estilos são aproveitados pelo esforço criativo de artistas como
Take 6 e Comissioned.
24
1980. No entanto, muito antes disso já havia em nosso país diver-
sas formas de música cristã contemporânea sendo usadas nas igre
jas, tanto nas pentecostais como nas tradicionais.
Extraindo-se a mensagem do Evangelho, uma pequena parte
do que é chamado de gospel no Brasil se enquadra no estilo de
senvolvido pelos cristãos negros norte-americanos. A música gospel
verdadeira é encontrada nas canções de Mahalia Jackson e dos
grupos The Clark Sisters e The Hawkins Family, dentre outros
poucos.
25
Avivamento musical
WlLLIAM BOOTH
27
Sendo assim, não podemos recorrer à Bíblia para buscarmos
alguma base sobre que estilo de música devemos usar para a ado
ração a Deus. Apesar de a Bíblia estar repleta de recomendações
e incentivos para que o homem adore ao Criador, a única instru
ção bíblica específica que temos de como deve ser essa adoração
é a de Jesus à mulher samaritana: "Deus é espírito, e é necessário
que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade"
(Jo4.24).
A adoração a Deus, seja ela vocal ou instrumental, em ritmo
de rocky samba, valsa ou qualquer outro, deve brotar do mais
íntimo do ser humano como uma expressão de reconhecimento e
reverência ao Criador. Devemos também notar que a música na
Bíblia não estava restrita somente ao louvor e à adoração, como
veremos mais adiante.
Que outra fonte de informação então podemos usar para ob
ter uma visão cristã sobre o assunto? Resta-nos somente o exem
plo histórico de homens que andaram com Deus, muitas vezes
em tempos de densas trevas espirituais, e ousaram cantar um
cântico novo ao Senhor.
EXEMPLO HISTÓRICO
28
vido pelo papa Gregório, o Grande (590-604), composto apenas
de vozes masculinas, cantando em uníssono e sem o uso de ins-
trumentos musicais. A divisão de vozes era proibida, para evitar a
tentação do orgulho e da vaidade.
Francisco de Assis (1182-1226), responsável por um movimento
de reforma na igreja de seus dias, ficou conhecido como o cantor
de Deus por ter considerado a música como parte integrante em
sua missão. Em vez de seguir a tradição da igreja, que permitia
apenas o canto gregoriano, são Francisco buscou as melodias se
culares francesas para compor seus hinos de louvor.
No período da Reforma, Martinho Lutero (1483-1546) fez uso
de melodias seculares para seus hinos e cânticos. Certas fontes
indicam que Lutero usou até mesmo a melodia de um cântico a
Maria em um de seus hinos. Ele considerava a música como o
mais nobre dom de Deus aos homens, ao lado da Teologia. Lutero
devolveu ao povo a Bíblia e a adoração na linguagem vernacular.
is trinta e seis hinos, entre eles Castelo forte (Eirífeste Burg ist
un. Gott), foram escritos em linguagem simples e comum, com
o objetivo de apelar para as massas e ganhar popularidade. Até
mesmo seus inimigos tiveram que reconhecer o impacto dessa
estratégia. O padre jesuíta Adam Conzenius lamentou: "Os
hinos de Lutero destruíram mais almas que seus ensinos e men
sagens"4 .
O reformador suíço João Calvino (1509-64) opunha-se seve
ramente ao uso de instrumentos musicais, cânticos e hinos com
divisões e cujas letras não tivessem sido extraídas diretamente
das Escrituras. Em 1542, a pedido de Calvino, Louis Bourgeois
(1510-61) editou o Saltério de Genebra (Genevan psalter), uma
coleção de versões métricas dos Salmos. E interessante — e até
mesmo irônico — notar que essas versões métricas dos Salmos
foram preparadas por Clemente Marot, um poeta francês que usou
para isso canções populares de seu país. Marot escreveu tais ver
sões não com o objetivo de adoração, mas para o entretenimento
da corte do rei da França, Francisco I. Os salmos tornaram-se tão
29
populares e efetivos na propagação da Reforma, que Marot teve
que fugir da França, buscando refúgio em Genebra.
G. A. Crawford, biógrafo de Bourgeois, disse o seguinte sobre
os compositores da época: "Um compositor daquela época em
pregou seus talentos na harmonia e não na melodia... Dificil
mente existia diferença de estilo entre as músicas sacra e secular,
e a composição muitas vezes significava literalmente mistura"5.
Os salmos métricos tornaram-se a forma exclusiva de adora
ção aceita nas igrejas protestantes da Suíça, Escócia e Inglater
ra. Algumas dessas igrejas chegaram até mesmo a destruir seus
órgãos, num ato de protesto contra o uso de instrumentos musi
cais mundanos, proibindo-o nas igrejas e nas cidades governadas
por elas. A Igreja Escocesa, por exemplo, referia-se ao órgão como
a flauta do diabo. A Igreja Luterana, no entanto, seguia a tradi
ção de Lutero, considerando os instrumentos musicais e a música
como dons de Deus.
Foi somente no século 17 que os hinos voltaram a ser introdu
zidos na igreja, através de Isaac Watts (1674-1748), um jovem
brilhante. Watts, que aos vinte anos já era conhecedor de várias
línguas e acostumado com a poesia e literatura de sua época,
reclamou a seu pai sobre a falta de estética nos salmos métricos.
Como resposta, o pai o desafiou a compor algo melhor. Watts le
vou o desafio a sério e escreveu Behold the glories of the Lamb
[Contemple a glória do Cordeiro], o primeiro de seus mais de sete-
centos e cinqüenta hinos. Ele ficou conhecido como o pai da
hinologia inglesa, apesar das inúmeras críticas que recebeu por
desafiar os padrões estabelecidos para sua época.
Entre outros que ousaram mudar a música da igreja se encon
tram João Wesley (1703-91) e Carlos Wesley (1707-88), em parte
responsáveis pelo avivamento de seus dias, criadores dos hinos
evangelísticos; William Booth (1829-1912), fundador do Exérci
to de Salvação, que foi criticado por usar melodias populares e
instrumentos musicais em suas campanhas evangelísticas; D. L.
Moody (1837-99), um dos maiores evangelistas do século 19, e
30
seu compositor Ira D. Sankey (1840-1908), criadores dos cantos
de testemunho (gospel songs) em linguagem simples e contempo
rânea.
31
a expressão musical da pregação no avivamento; esses dois ele
mentos parecem pertencer-se mutuamente, embora ambos te
nham manifestado a tendência de ser anti-sociais. [...] Cada
período de renovação foi caracterizado por um florescimento de
uma nova hinologia.7
32
DE VOLTA À BÍBLIA
33
veis de seu amor, sua graça, sua misericórdia e sua justiça. Dessas
experiências com Deus, surgem as canções que ajudam na pro-
clamação da mensagem cristã. Como expôs Margaret Clarkson,
em seu ensaio Christian hymnody [Uinologia cristã12], "cada reavi-
vamento e novo movimento cristão tem usado alguma forma de
hinologia para reforçar sua mensagem"13.
34
Música popular
contemporânea
DONALD HUSTAD
AS ORIGENS DO ROCK
36
No início do século 20, com a migração dos negros para os
centros urbanos do norte dos Estados Unidos, como Chicago,
Detroit e Nova York, o bines tomou uma nova forma instrumen
tal, aliando-se ao jazz- Em seguida, surgiu a comercialização dos
primeiros discos e a expansão da indústria fonográfica.
Mais tarde, já na década de 1930, com a guitarra elétrica
surgiu o rhythm & blues, música feita para ser tocada, como diz
Roberto Muggiati, "nos bares e guetos negros das grandes cida
des, pois era feita sob medida para locais ruidosos, onde se bebia
e conversava em voz alta, obrigando o cantor e a banda a briga
rem com todo aquele barulho"2.
Era essa a música negra secular das décadas de 1930 e 1940
nos Estados Unidos. Uma música cheia de sentimento, tristeza e
lamento; uma música composta por gente simples, para gente sim
ples. Por isso, os temas das canções variavam de problemas sociais
a ilusões amorosas, para esquecer tais problemas.
No entanto, os brancos possuíam sua própria música, pois a
discriminação racial já era forte, principalmente nos estados do
sul. A classe branca dominante, chamada de wasp — tvhite anglo-
saxon protestam, ou seja, protestantes brancos anglo-saxônicos
—, era constituída de pessoas puritanas, que ouviam apenas
música erudita e religiosa, tipicamente tocada ao som do órgão e
do piano.
As pessoas mais pobres, das áreas rurais, preferiam o country &
western, música considerada tão profana e perigosa pela elite pro
testante quanto a melodia dos negros.
O rock nasceu na década de 1950 da fusão desses dois estilos,
o rhythm & blues dos negros com o country & westem dos caipiras
brancos. Bill Halley e seus Cometas foram os autores da façanha.
O ROCKWROLL
Bill Halley não era negro, mas soube usar a energia e o balan
ço da música negra para desenvolver um estilo que apelasse tan-
37
to aos negros quanto aos brancos. Nascido em Detroit, em 1927,
Halley não era um revolucionário tentando seduzir a juventude
americana, ao contrário do que muitos pensam, mas um rapaz
pobre e caipira que tentava ganhar algum dinheiro com sua gui
tarra. E, se misturar a música dos brancos com a dos negros lhe
renderia esse dinheiro, então era isso que ele iria fazer.
Rock around the clock [Rock ao redor do relógio3 ] ficou conhe
cida como a primeira canção de rocknroll. Gravada em 1954 por
Bill Halley e sua banda, Cometas, a música só estourou no ano
seguinte, como trilha para o filme Sementes da violência. Esse fil
me, que expunha "toda a carga de hostilidade no relacionamen
to da juventude marginalizada com o Sistema"4, foi o carro-chefe
da revolução musical criada pelo rock na década de 1950.
Mas foi outro branco, Elvis Aron Presley, nascido em 1935 na
pequena cidade de Tupelo, no Mississippi, que herdou o título
de rei do rock. Os pais de Elvis eram membros da Assembléia de
Deus, onde ele teve sua instrução musical e aprendeu a cantar
canções gospel e spirituals. Em 1954, já morando em Memphis,
Elvis decidiu gravar um compacto para o aniversário de sua mãe.
Ele foi à Sun Records, uma modesta companhia de discos, e gra
vou duas canções populares da época. O dono do estúdio, Sam
Philips, um caçador de talentos, não ficou muito impressionado.
Um ano depois, quando Elvis gravou That's allright mama [Isso
está certo, mamãe5 ], Sam Philips soube que tinha um tesouro nas
mãos. Sam vivia dizendo: "No dia em que eu achar um branco
que cante com a força de um negro, estarei rico"6. Elvis foi o
branco que tornou a música negra acessível a todos numa época
de grande discriminação racial.
Nos anos seguintes o rock'ríroll tornou-se a música da Améri
ca — ou pelo menos da juventude americana. Os jovens não só
passaram a escutar rock, como também começaram a assumir uma
identidade semelhante à de seus ídolos. Aqueles foram os anos
dos rebeldes sem causa. Se escutar rock tornava alguém rebelde,
então era isso que muitos jovens fariam.
38
Acusado de ajudar a propagar a delinqüência juvenil, Elvis
Presley disse:
39
Meio século depois de seu início na década de 1950, o rock
domina a maior parte do cenário musical ao redor do mundo. E,
de certa forma, quase toda música popular atual é denominada
rock pelos críticos. Isso se dá, possivelmente, porque o rock não é
um estilo próprio como o gospel ou o blues, mas uma fusão de
vários estilos em um só.
John Blanchard diz que
A MÚSICA SOUL
40
rocliríroll para ajudar na criação da música soul. Ele foi responsá
vel pela divulgação do novo estilo em 1959, com a canção WJxat
should I say? [O que eu deveria dizer?12].
Aretha Franklin, filha de um pregador de Detroit, ficou
conhecida como Lady Soul, a dama do soul. Treinada como uma
cantora gospel, ela expandiu o estilo nas décadas de 1960 e
1970, durante as quais seus discos se tornaram sucessos interna
cionais.
No entanto, foi o padrinho do soul, James Brown, quem mais
influenciou a música popular com uma carreira que ultrapassou
cinco décadas. Ele é considerado por muitos como o maior artista
negro que já existiu. Sua influência pode ser vista em quase toda
a música negra atual.
Dois estilos musicais que mais vendem discos em todo o mun
do são o rap e o hip hop, uma evolução do /un/c, que por sua vez
veio do soul. A característica principal do rap — termo originado
das primeiras letras de rhythm and poetry, ou seja, ritmo e poesia
— são as letras faladas, em vez de cantadas, e uma forte ênfase
do ritmo sobre a melodia.
Na base de todos esses estilos está o gospel que Aretha Fanklin
e James Brown aprenderam em suas igrejas durante a infância.
41
ço nas igrejas e nos templos evangélicos ao redor do mundo. Des
ta forma, parece que estamos resgatando para Deus um veículo
de comunicação que há muito estava nas mãos do Diabo.
Como disse o professor de música, dr. Richard Stanislaw:
42
Música cristã
contemporânea
John Styll
A CONTRACULTURA HIPPIE
45
Para a contracultura, a igreja instituída parecia um gueto con
fortável da classe média, formado por pessoas que se admiravam
mutuamente, enquanto condenavam o resto do mundo, apro
vavam satisfeitos o status quo e sentiam não haver necessidade
de uma crítica radical ao materialismo e à decadência da socie
dade americana.5
46
Cheryl levou-me para as ruas. O verão de 1967 encontrou o
mundo hippie em pleno fôlego. Descobri o Hollywood Boulevard
e a Sunset Strip a apenas algumas quadras do prédio da igreja que
me havia servido como um refúgio eficaz da comunidade ao
redor. Era um mundo turbulento, de vestes e condutas bizarras.
Paz e Amor, ideais que freqüentemente significavam apenas sexo
e drogas, ainda expressavam anseios genuínos. Com suas roupas
espalhafatosas e cabelos desarrumados, esses filhos floridos não
estavam apenas descartando a sociedade tecnológica [...], mas
também clamando para serem reconhecidos como pessoas reais,
indivíduos singulares. Eles chamavam uns aos outros de belo,
procurando por aquela beleza interior da qual a Bíblia tão fre
qüentemente fala, em vez dos símbolos de status de uma socieda
de manipuladora de massas.
Fiquei imediatamente impressionado com as conversações
honestas que eram possíveis entre eles. Já não tinha que me
preocupar com minha vestimenta nem escolher minhas pala
vras, buscando cuidadosamente pela oportunidade de falar so
bre Jesus, como fizera nas fraternidades da faculdade. Aqui o
campo estava completamente aberto.
Deus usou Cheryl para ensinar-me muitas coisas no grande
processo de me libertar. Uma semana depois de nos conhecer
mos, ela veio novamente à igreja, correu pelo salão, lançou seus
braços ao meu redor e deu-me um beijo. Sendo um pastor jovem
e solteiro que tentava evitar qualquer tipo de escândalo, fiquei
assustado. Eu me senti como se minha cabeça tivesse girado 360
graus, à procura dos presbíteros da igreja, enquanto todo o meu
corpo congelava. Mais tarde, refletindo sobre o incidente, per
cebi que Cheryl estava apenas sendo ela mesma. Percebi que,
enquanto eu falava de liberdade cristã, Cheryl era muito mais
livre do que eu. Era um mundo novo aquele em que estava en
trando.
Comecei a ouvi-lo. Li seus jornais undergrounds, senti seu
espírito anárquico e escapista, ouvi suas falsas promessas nas
47
drogas alucinógenas e vi o fluxo de religiões orientais oferecer
uma nova espiritualidade a mentes ocidentais cansadas de
pragmatismo e materialismo. Oscilei sob suas críticas amargas
contra a guerra e o racismo. Fiquei envergonhado diante do
silêncio da igreja e lutei contra a tentação de tornar-me defensi
vo. Meu ouvir mais profundo veio com relação a sua música. Ali
comecei a sentir todo o peso de uma revolução cultural e ali
encontrei um segredo: a música é a chave para esta geração por
que a música é o lugar da mídia de massas em que os jovens se
comunicam entre si.7
O MOVIMENTO DE JESUS
Ronald M. Enroth
48
Em fevereiro de 1971, a revista americana Look trazia na capa
a foto de um jovem hippie sendo batizado nas águas do Pacífico.
O Movimento de Jesus começava a chamar a atenção da impren
sa ao redor do mundo. O título da reportagem dizia: "O Movi
mento de Jesus está aí". Segundo o evangelista Billy Graham, em
seu livro Jesus e a geração jovem9, dois dos três repórteres da equi
pe da Look que fizeram a reportagem se converteram, de tão im
pressionados que ficaram com o movimento. Outras revistas, como
Newsweek e Life, também publicaram artigos sobre o Movimento
de Jesus. Em junho de 1971, a revista Time publicou uma reporta
gem de doze páginas sob o título "A Revolução de Jesus".
Billy Graham expressou sua opinião sobre o Movimento de
Jesus da seguinte forma:
A CAPELA DO CALVÁRIO
49
A revolução começou na Capela do Calvário quando Chuck
Smith, cansado de anos de um ministério infrutífero, decidiu
mudar radicalmente o estilo de reuniões em sua igreja. A nova
fórmula adotada por Smith foi simples:
JESUS MUSIC
Roger C. Palms13
51
Foi a partir de 1965, quando um musical de Ralph Carmichael
foi usado por Billy Graham no filme The restless one [O incansá
vel1* ], que o Evangelho começou a ser comunicado em sons con
temporâneos. Dois anos depois, em 1967, os estudantes John
Coates e Bill Hartman se rebelaram contra a música sacra tradi
cional da Universidade John Brown, no Arkansas, e formaram o
primeiro grupo de ]e$us music da história. Eles organizaram um
coro de vinte pessoas, chamado The Sound Generation, e, usan
do melodias pop, baterias e guitarras, começaram a desfilar no
cenário musical com o Evangelho, alcançando milhares de pessoas
com seu testemunho.
Em 1969 surgiu o grupo Love Song, um dos maiores represen
tantes da Jesus music. Liderado por Chuck Girald, o Love Song
foi formado a partir da amizade de Chuck com os outros membros
da banda: Tommy Coomes (guitarra solo), Fred Fields (violino e
guitarra), John Mehler (bateria) e Jay Truax (baixo).
Chuck Girald cresceu em ambiente católico, mas abandonou
o lar e a igreja aos quinze anos em busca de aventuras com um
grupo musical itinerante. Após ter-se envolvido com drogas e
tentado encontrar respostas no budismo, Chuck e seus amigos
converteram^se a Cristo na Capela do Calvário, em 1970. A par
tir de então o Love Song tornou-se uma banda cristã.
O Movimento de Jesus estava ganhando força e muitos artis
tas famosos, como Barry McGuire, Eric Clapton e Johny Cash,
voltaram-se para Cristo. Vieram então os festivais de Jesus music,
sendo o primeiro grande festival provavelmente o Faith Festival
de Indiana, em março de 1970, que reuniu cerca de seis mil pessoas
para ver Pat Boone como atração principal. Dois meses depois, a
Universidade de Stanford, na Califórnia, abrigou o Sweet Jesus
Roll away the Stone (or Rock) Concert, mais um encontro mar
cante na história da Jesus music.
Edward Plowman afirma que a "revolução começou em várias
frentes durante os anos 1960 [...] mas não atingiu um desempe
nho significante antes de 1969"15.
52
POR QUE DEVERIA O DIABO TER TODA A BOA MÚSICA?
Em 1969, Larry Norman gravou Upon this rock [Sobre esta ro
cha] pela Capitol Records, trabalho que ficaria conhecido como
o primeiro disco de rock cristão da história da música. Norman
converteu-se na adolescência e, embora tenha vivido em Haight-
Ashbury, sede do movimento hippie na Califórnia, não se envol
veu com seu estilo de vida promíscuo. Nessa época, Larry era o
vocalista do grupo People, que teve uma canção nas paradas de
sucesso americanas (Top 40) em meados da década de 1960.
Quando o grupo se dividiu, Larry decidiu que iria cantar somen
te para Jesus. Emprestando as palavras de Lutero para sua canção
Why should the devil have ali the good music? [Por que deveria o
diabo ter toda boa música!], ele deu início oficial ao que passou a
ser conhecido como rock cristão.
Para Larry, o rock era o veículo adequado para expressar o
que Deus estava fazendo em seus dias. Ele disse: "Um renascimento
espiritual está acontecendo hoje e o Espírito Santo está na raiz
disso... e os jovens estão expressando sua felicidade profunda atra
vés do rock"lt.
John Reid Kennedy, líder estudantil de uma igreja fundamen-
talista, impressionado com o trabalho de Larry Norman, fez a se
guinte declaração acerca de seu disco Upon this rock:
MYLON LEFEVRE
53
lho com melodias de rock. O talento artístico de Mylon já tinha
sido reconhecido por Elvis Presley, que gravou uma de suas com'
posições, Without him [Sem ele18].
Sendo assim, o disco foi bem recebido e Mylon logo subiu nas
paradas, conseguindo um contrato com a Columbia Records. Mas
Mylon não estava tão firme em sua fé cristã e, apesar de ainda
aparecerem referências ao Evangelho em seus discos posteriores,
elas foram diminuindo cada vez mais.
Em 1972 Mylon gravou seu terceiro disco, Over the influence
[Sobre a influência19], que o levou definitivamente para as para
das de sucesso, abrindo shows para The Who, Pink Floyd, Bob
Seger, Jethro Tull, Traffic, Grand Funk e outros. Nessa época
Mylon começou a flertar com as drogas também — da maconha à
cocaína e heroína. Em meio a tudo isso, Mylon ainda se lembrava
de Deus e continuava a falar sobre Jesus em seus concertos. Dana
Key foi um dos que ouviu seu testemunho e se converteu, vindo a
formar anos mais tarde o famoso grupo cristão da década de 1980,
DeGarmo & Key, em parceria com Eddie DeGarmo. Mylon co
menta sobre essa época: "Nós nunca subíamos ao palco sem orar.
Na maior parte do tempo estávamos drogados, mas eu me lembro
de ter orado 'Senhor, por favor não me deixe morrer em meu
pecado. Eu preciso de ajuda. Me ajude, em nome de Jesus'"20.
Em 1979, Mylon finalmente entregou sua vida a Jesus, aban
donando as drogas. Após a conversão, ele passou quatro anos
estudando a Bíblia e esperando por uma direção de Deus sobre o
que fazer de sua vida. Durante esse tempo, Deus mostrou-lhe o
novo rumo que sua música deveria tomar. Mylon diz:
54
ou não. Você é que tem problema com o rocWnrolL Eu realmente
não preciso disso, tudo o que eu quero é teu coração. Mas agora
que teu coração está correto, continue tocando rock".21
55
A música cristã
contemporânea no Brasil
DONALD HUSTAD
56
e artistas brasileiros pouco documentadas e raramente divulgadas.
Isso contribuiu para que muitos dos que entraram na onda do
gospel desconhecessem quase que totalmente alguns dos precur
sores dessa revolução musical no país.
LUIZ DE CARVALHO
OS GRUPOS MUSICAIS
57
palavras deles, impressas na contracapa do lp. Eles eram os ecos
do Movimento de Jesus no Brasil, convidando os jovens a embar
car na "viagem de Jesus".
Na mesma época, outro grupo de jovens que estava usando a
música como veículo para transmitir a mensagem do Evangelho
era o Vencedores Por Cristo. Um ministério fundado pela Sepal1
no Brasil em 1968, o VPC percorreu o país com equipes de jovens
realizando trabalhos evangelísticos e desbravando fronteiras mu
sicais. Seu primeiro lp, Fale do amor, foi gravado em 1970 e usava
o sistema monofônico, ou seja, apenas um canal de áudio. Em
1973, as equipes do VPC já tinham percorrido trinta e três mil
quilômetros de estradas pelo Brasil. Havia muita história para
contar das experiências vividas.
Nesse clima, saiu o lp Se eu fosse contar, apontando um novo
rumo na música evangélica brasileira. Algumas canções eram tra
duções e versões de músicas do cantor americano Ralph
Carmichael. As canções desse disco foram cantadas em todo o
Brasil nos seis meses de viagem missionária da equipe. Mas so
mente em 1978, com o lp De vento em popa, o vpc ampliou os
horizontes e abriu espaços para uma musicalidade brasileira que
seria seguida por muitos artistas no país. Liderado pelo pastor
Jayme Kemp e usando a musicalidade de Guilherme Kerr, Aristeu
Pires Jr., Gerson Ortega, Nelson Bomilcar, Sérgio Pimenta, den
tre outros, os Vencedores Por Cristo ajudaram grandemente a
formar as bases para a revolução que viria quase duas décadas
mais tarde na música cristã em nosso país.
Além deles, outros grupos, como ELO e S-8, ajudaram a trazer
a música contemporânea para dentro das igrejas evangélicas bra
sileiras ainda na década de 1970.
O Grupo elo foi formado em 1976 pelos amigos de seminário
Jayro Trench Gonçalves — conhecido como Jayrinho — e Paulo
César da Silva, juntamente com suas mulheres. Juntos, eles pro
duziram músicas do mais alto nível no cenário evangélico de sua
época, lps como Calmo, sereno e tranqüilo, Ouvi dizer..., Novaje-
58
rusalém e Nova canção tornaram-se clássicos da música cristã bra
sileira. Quando a carreira do elo foi interrompida, com a morte
trágica de Jayrinho e sua família em 1981, Paulo César seguiu
adiante com o Grupo Logos, que gravou diversos discos na déca
da de 1980.
Embora não tão conhecido quanto o Grupo elo, o S-8, forma
do por membros da Comunidade S-8 em Niterói (rj), também
desafiou padrões em seus trabalhos musicais desde o início da
década de 1970. A Comunidade S-8 começou em 1971, quando
as portas da casa do ex-governador do Rio de Janeiro, Geremias
de Mattos Fontes, foram abertas para receber jovens que estavam
lutando contra o mal das drogas. Discos como Quem deseja ser
criança (1978), O que virá? (1979) e Apelo à Terra (1983) traziam
um estilo totalmente próprio e, ao mesmo tempo, recheado de
letras poéticas e revolucionárias, sem perder a singeleza de uma
fé quase infantil. Exemplos disso podem ser vistos nos trechos das
seguintes canções:
59
Foi Ele quem me compreendeu
Quando ninguém me entendia mais!
Eu era um louco na multidão!
Foi Ele quem me tomou pela mão
Quando eu andava sem direção,
Sem um amigo pra me apoiar!
Foi Ele quem me fez tão feliz
E tão criança em suas mãos
E tão guardado em seu coração.
Foi Ele quem me trouxe p'ros seus filhos
E nós choramos juntos e sorrimos juntos!
Meu pouso! Meu tesouro! Meu Jesus querido!
(Jesus querido, do lp Apelo à Terra)
JANIRES E O REBANHÃO
60
que recebeu acusações de conter mensagens invertidas (backward
messages1). Sem se importar com as críticas, Janires e seus com
panheiros seguiram adiante, desafiando os conceitos e precon
ceitos de como deveria ser a música cristã. O grupo trazia uma
mistura de ritmos que iam do baião ao roácnroll.
O segundo lp foi Luz do mundo (1983, Arca Musical), com um
som mais amadurecido. O disco foi muito bem recebido e chegou
a ter algumas de suas canções tocadas em rádios FM seculares do
Rio de Janeiro.
O músico cristão Martinho Lutero expressa assim a influência
que o Rebanhão teve na vida de muitos músicos e jovens brasi
leiros: "O Rebanhão foi o motivo para muitos jovens despertarem
a cantar, compor com mais ousadia, tocar bateria, serem
irreverentes e corajosos e sem medo de represálias por serem au
tênticos e falar o que estavam sentindo"3.
Em 1984, Janires reuniu alguns amigos e gravou um disco ao
vivo, celebrando os dez anos da sua conversão. O lp Janires e
amigos foi gravado no auditório da rádio Boas Novas, do Rio de
Janeiro. As letras de músicas como Casinha, Alex e Baltazar não
encontram nada semelhante na música cristã brasileira até hoje.
Nessa mesma época, Janires deixou o Rebanhão e foi traba^
lhar com a mpc (Mocidade Para Cristo) em Belo Horizonte, onde
formou a Banda Azul e gravou Espelho nos olhos, em 1986. Janires
começou a viajar para diversas partes do Brasil, compartilhando
o Evangelho de Cristo com milhares de jovens, usando suas ex
pressões irreverentes e sua música inteligente. Foi voltando de
uma dessas viagens, durante a noite, que o ônibus no qual viaja
va colidiu com outro veículo, ceifando-lhe a vida, em janeiro de
1988.
De pertences pessoais Janires deixou apenas uma velha bolsa
de couro e um violão Ovation. Mas, através de seu testemunho
de vida, ele deixou um desafio às próximas gerações de músicos
evangélicos brasileiros quanto ao uso da música contemporânea
na igreja. Suas letras estão entre as mais criativas e inteligentes
61
de todo o repertório nacional. Como ele, poucos são aqueles que
têm manifestado tamanha genialidade na arte de compor.
Em 1991, o jornal evangélico do Rio de Janeiro Graça ePaz fez
a seguinte menção a Janires: "Um dos maiores talentos de todos
os tempos... Um dos compositores que mais polemizaram a músi
"4
ca sacra
AS GRAVADORAS
62
fossem conhecidos apenas em seus estados ou regiões. Era muito
difícil, por exemplo, comprar um disco do grupo Banda e Voz em
São Paulo, ou do Atos-2 no Rio de Janeiro. Isso para não dizer da
dificuldade encontrada em outros estados.
As duas gravadoras que trouxeram os primeiros discos de
música cristã contemporânea internacional para o mercado bra
sileiro foram a Arca Musical, do Rio de Janeiro, e Music Maker,
de Belo Horizonte. O primeiro disco de rock cristão pesado a ser
lançado no Brasil foi Not of this world [Não deste mundo5], do
Petra, em 1986, pela Music Maker.
A Bom Pastor, formada em 1971 por Elias de Carvalho, filho
do cantor Luiz de Carvalho, tornou-se a maior gravadora e distri
buidora de música cristã contemporânea do Brasil. A Bom Pastor
é composta de várias lojas, uma editora literária, uma editora
musical e a gravadora Bom Pastor, considerada a maior gravado
ra da América Latina, com mais de quatrocentas matrizes. Ou
tras gravadoras, como a Line Records e a Gospel Records, também
têm sua parcela na distribuição do gospel nacional.
A mais popular dentre as duas, a Gospel Records, foi criada
em 1990, visando ao mercado emergente e promissor da música
cristã contemporânea. Os shows de música gospel, lotando espa
ços como o Canecão no Rio de Janeiro e Dama Xoc em São Pau
lo, indicavam o sucesso garantido. Entre 1990 e 1991 a Gospel
Records lançou dez discos de música gospel nacional e inter
nacional, começando pelo lp Princípio, do Rebanhão. No final de
1995, os lançamentos já chegavam a sessenta títulos.
OS EVENTOS
63
por isso, falham ao apresentar o amplo panorama da música cristã
contemporânea no Brasil.
O maior de todos os eventos de música cristã no Brasil na
década de 1990 foi o S.O.S. da Vida. Realizado durante vários
anos em São Paulo, o evento chegou a reunir aproximadamente
cem mil pessoas em sua quarta edição, em setembro de 1994. No
Rio de Janeiro, o Gospel Power Festival de 1993 foi o maior even
to de música cristã realizado naquela cidade até então.
ívl
Segunda parte
A diferença
67
As letras
Chuck Girald
69
Em contrapartida, as letras de músicas cristãs, embora nem
sempre criativas, possuem um padrão moral e espiritual elevado.
Das canções de louvor e adoração de Ademar Campos, Asaph
Borba e Ana Paula Valadão ao rock do Brother Simion, Resgate
ou Oficina G-3, dois temas comuns são vistos: a exaltação de
Jesus Cristo como Senhor e a pregação dos valores eternos do
Evangelho. Esta é uma verdade que não pode ser negada por
nenhum crítico da música cristã contemporânea. Como disse Tim
Stafford: "Estilisticamente, a música cristã contemporânea é de
rivativa: quer seja rap ou heavy metal ou popt a música é
indistinguível de seu correlativo secular, exceto pelas letras
edificantes"4.
No entanto, existem dois argumentos que envolvem a ques
tão das letras das canções cristãs. Embora tais argumentos fre
qüentemente são gerados por pessoas de fora do cenário musical
cristão, eles possuem um fundo de verdade que deve ser levado a
sério por todos que exercem um ministério musical dentro dos
limites da igreja.
Em primeiro lugar, dizem os críticos, as letras são difíceis de
escutar. Existem várias possibilidades para que isso aconteça. Um
mau equipamento de som, ou um técnico que não saiba operar
bem os controles, pode tornar a letra ininteligível aos ouvintes.
Mas isso ocorre, quando é o caso, somente nas apresentações ao
vivo. Nas gravações, uma boa mixagem é feita de forma a equili
brar o nível dos instrumentos com o vocal, pois os músicos cris
tãos geralmente desejam que o ouvinte entenda a mensagem.
Muitos chegam a mencionar, na letra de suas canções, passagens
bíblicas que lhes serviram de inspiração durante a composição.
Em última análise, mesmo que alguém não entenda o que está
sendo cantado num determinado instante, é melhor ouvir uma
música que seguramente manifesta um alto padrão moral e espi
ritual do que encher a mente com águas de fontes duvidosas.
A segunda crítica é de que os músicos cristãos são muito su
perficiais. Infelizmente há muito que se concordar com tal argu-
70
mento. Grande parte dos compositores cristãos da atualidade,
como diz Franky Schaeffer, parece ter "um q.i. trinta pontos me
nor do que o de uma água-viva retardada"5. Basta olhar para a
maioria das letras de músicas cristãs da atualidade para consta
tar sua afirmação. A maioria delas se resume em repetir chavões
do tipo "Eu vivia perdido, mas Jesus me encontrou", ou "Jesus te
ama, ele quer te salvar". Não há nada de errado com esssas men
sagem, mas há algo mais. Existem muitos outros aspectos da vida
que devem ser vistos dentro de uma perspectiva cristã: proble
mas como a infidelidade, os desabrigados, suicídio, brigas de qua
drilhas de rua, salvação, pureza sexual e tantos outros desafios
modernos.
Os profetas do passado eram homens que clamavam por justi
ça moral e social, do mesmo modo que clamavam pela justiça
legal, entre Deus e o homem. Jesus disse: "Bem-aventurados os
que têm fome e sede de justiça, pois serão satisfeitos" (Mt 5.6).
Se a música cristã pretende ser relevante para a sociedade mo
derna, ela precisará manifestar em suas letras mais fome e sede
de justiça. Os músicos cristãos precisam romper com a mediocri
dade e desenvolver uma criatividade madura e contextualizada
em suas letras.
Carman, um cantor cristão contemporâneo norte-americano,
é um exemplo de alguém que, nas décadas de 1980 e 1990, usou de
vários estilos musicais com bastante criatividade para ministrar ao
povo com música. Suas letras variavam desde simples canções de
louvor e adoração a histórias bíblicas cantadas com um pouco de
humor e irreverência, mas que acabavam causando um tremen
do impacto espiritual no ouvinte. Carman também produziu vários
vídeos cristãos. Seu clamor era dirigido tanto à igreja, para que
ela despertasse e levantasse um padrão moral e espiritual, quan
to ao mundo, denunciando o pecado e as injustiças sociais.
Existem muitos outros artistas cristãos que procuram
equacionar em sua fé os problemas atuais. O músico cristão sue
co Ulf Christiansson e sua banda Jerusalém viram o efeito da
71
criatividade musical em maio de 1994. Durante uma cerimônia
na Holanda, houve um período de três minutos de silêncio nacio
nal, para recordar o Holocausto. Após os minutos de silêncio, a
música que a banda havia gravado no disco Prophet [Profeta],
chamada Berlim 38 (next year in Jerusalém) [Berlim 38 (próximo
ano em Jerusalém)6 ], foi tocada em rede nacional de tv com ima
gens do filme A lista de Schindler. Pense no impacto que essa can
ção teve sobre as pessoas que a ouviram.
O importante, no entanto, não é apenas denunciar os proble
mas, mas também apontar respostas. Obviamente, no contexto
de um CD, pode haver canções que denunciem e canções que
apresentem as respostas. Devemos evitar legalismos nesta área.
Mas é importante que a resposta seja apresentada ao ouvinte.
Ulf Christiansson fala o seguinte a esse respeito: "Você en
contra muitas perguntas, mas também precisa ter as respostas. A
maioria dos cristãos sabe que muitas coisas estão erradas, mas
nós precisamos saber a resposta; e a resposta é espiritual, uma
resposta de nossos corações"7.
Grahan Kendrick, o líder de louvor e adoração inglês que
levou o louvor para as ruas com a criação da Marcha para Jesus no
final da década de 1980, é outro que foi além do simpíismo em
suas letras. Mesmo compondo para louvor e adoração, ele conse-
guia escrever letras que clamavam por justiça social, como, por
exemplo, O Lord, the clouds are gathering [O Senhor, as nuvens
estão se ajuntando]:
72
O pão delas está sendo roubado [...]
O Senhor, poderes das trevas estão prontos para inundar
nossas ruas com ódio e medo.
Temos que despertar!
73
O estilo de vida
dos músicos
John Blanchard
75
A Bíblia, porém, é clara a esse respeito. EmMt 12.35-37, Jesus
disse: "O homem bom do seu bom tesouro tira coisas boas, e o
homem mau do seu mau tesouro tira coisas más. Mas eu lhes digo
que, no dia do juízo, os homens haverão de dar conta de toda
palavra inútil que tiverem falado. Pois por suas palavras vocês
serão absolvidos, e por suas palavras serão condenados".
E exatamente por isso que os artistas cristãos são diferentes.
Eles entendem que estão diante dos olhos do público e que tudo
que fizerem ou disserem terá um impacto na vida de seus fãs. Eles
também sabem que, por essa razão, serão julgados por Deus com
maior rigor (Tg 3.1). Além disso, como cristãos, eles sabem que
terão de prestar contas a Deus de como viveram suas vidas.
Melody Green fez o seguinte comentário a respeito da respon
sabilidade cristã diante do público: "Qualquer um que faz uso de
uma plataforma pública é um modelo, quer queira ou não, e quer
reconheça isso ou não. E aí que vem a responsabilidade"7.
Melody sabe muito bem disso, pois seu marido, Keith Green,
influenciou milhões de pessoas através de sua vida e ministério.
Keith lutou para estabelecer um padrão de santidade no cenário
da música cristã. Para ele, a música era um ministério ao Senhor.
Um homem de convicções fortes, ele foi muitas vezes criticado e
incompreendido por suas declarações. Antes de sua morte, Keith
disse:
No folheto Can God use rock music? [Deus pode usar o rock?],
Keith revelou a preocupação quanto aos que usam os meios de
comunicação para apresentar o Evangelho:
76
visão — é monumental, simplesmente porque essas são coisas
que têm prendido, e continuam prendendo, a atenção das
pessoas. Eu realmente creio que cristãos que estão completa
mente entregues a Deus, usando essas ferramentas, podem levar
pessoas a curvar-se em arrependimento e conduzi-las aos braços
abertos do Salvador. Mas se suas vidas não estão completamen
te entregues a Deus, se seus motivos estiverem confusos e seus
corações divididos, então eu vejo apenas vergonha e ridiculari
zação sendo lançada sobre o Evangelho.9
77
diante do público deve estar pronto a dizer: "Tornem-se meus
imitadores, como eu o sou de Cristo" (ICo 11.1).
Steve Taylor, filho de um pregador que gravou vários discos
de música cristã contemporânea entre 1982 e 1995 e que produ
ziu muitos artistas famosos, como Guardian, Newsboys e Six Pence
None the Richer na década de 1990, manifestou sua opinião,
dizendo:
78
Dallas Holm confirma: "É triste o fato de que elevamos persona
lidades artísticas a um nível que elas não merecem"13. George
Verwer, fundador da Operação Mobilização, um movimento mis
sionário que atua em vários países ao redor do mundo com os
navios Doulos e Logos II, disse:
79
Terceira parte
As críticas
Ray Funk
83
É difícil entender também por que os africanos acharam es
tranha a música de Louis Armstrong quando ele tocou na África.
Se a origem da música negra americana veio das selvas africanas,
por que eles estranhariam ojazz de Armstrong?
Kurt Pahlen, buscando as origens do jazz, comentou esse fato
da seguinte forma:
85
gumas culturas, não conhecendo o Deus desconhecido, ofere
cem suas capacidades criativas e artísticas aos demônios. Nesses
casos, a missão da igreja é resgatar tais expressões de criatividade
para o Criador de todas as coisas, Jesus Cristo. Pois, como escre
veu Paulo aos colossenses, "nele foram criadas todas as coisas nos
céus e na terra, as visíveis e as invisíveis... todas as coisas foram
criadas por ele e para ele" (Cl 1.16).
O rock é do Diabo
Claudionor de Andrade
83
ca do Diabo. No auge da popularidade de seu ministério, na dé-
cada de 1980, antes de sua queda moral, Swaggart atacou o rock:
89
religião e culto ao Diabo e falham em ter uma visão objetiva do
problema. Quando alguém chama, por exemplo, Ozzy Osbourne
de "própria encarnação do Demônio"7, tal afirmação soa tão ridí
cula que os jovens não levam a sério o alerta que o escritor está
tentando fazer em relação à mensagem transmitida por Osbourne
em suas músicas.
Obviamente o fato de muitas bandas de rock usarem o
satanismo, ou a violência, ou o sexo, apenas com fins comerciais
não justifica seus atos. Ao contrário, como nos mostra Larson em
Satanismo: a sedução da juventude norte-americana, muitos jovens
estão seguindo o exemplo dessas bandas e se envolvendo com o
satanismo de uma maneira real e perigosa. Steve Taylor faz um
comentário importante a respeito:
90
A dor que você sente foi você mesmo que buscou.
Será sua vida apenas um jogo?
Por que você se entrega às chamas?
Hei, você não sabe...
(da música You dorít know [Você não sabe9])
91
Steve Lawhead diz: "Um erro é cometido, também, ao pensar
que o que o Diabo usa não possa ser redimido. A música é um
dom do Deus todo-poderoso e de amor eterno que continuamen
te redime sua criação"10.
Assim como toda a criação de Deus, as artes e a música tam
bém devem ser redimidas dos efeitos destrutivos do pecado.
92
O ritmo incita à violência,
à sensualidade e à rebelião
DONALD E HUSTAD
94
Lawhead confirma a questão quando diz que roqueiros são
atores. Sendo assim, nem tudo o que eles dizem ou fazem deve
ser levado a sérioí. Isso é de fundamental importância no que diz
respeito às letras das músicas e à imagem criada pelos artistas de
rock.
Sid Berstein, um veterano musical responsável pela primeira
viagem dos Beatles aos Estados Unidos declarou que a importân
cia do sensacionalismo e a falta de originalidade deram origem à
violência e ao sexo, porque é aí que o dinheiro está.
Mas o que dizer dos constantes estouros de violência, de sen
sualidade e dos atos de rebelião presentes nos shows de rock1. Não
seria a música responsável por isso?
Vamos analisar cada uma dessas coisas.
Dan D. Johnson4
■
95
Você sabe que nós não nos preocupamos com a morte de onze
pessoas"5.
Mas será que o problema da violência está no ritmo? Será que
o rock tem mesmo o poder de transformar jovens de boa conduta
em pessoas violentas, máquinas mortíferas sem controle algum? E
possível ser hipnotizado através do rocki
Tais perguntas têm sido feitas por muitas pessoas preocupadas
com a violência que acompanha os shows de rock. As respostas
para elas não são fáceis, mas são possíveis. Tenho acompanhado
concertos de rock há alguns anos e observado como os jovens
reagem em tais situações. De minhas observações cheguei a al
gumas conclusões.
Primeiramente, no que diz respeito ao ritmo, descobri que,
embora o rock seja propício para manifestações violentas, tais
manifestações são totalmente conscientes e auto-induzidas. Isto
é, quando um jovem reage de uma forma violenta num show de
rock, ele o faz porque quer e não porque a música o levou a agir
de tal maneira. Seus atos são conscientes e ele pode parar a qual
quer instante. Como disse Lawhead:
96
do rock contemporâneo e cativante, esse problema torna-se mais
acentuado porque o consumo do rock é maior que o de outros
estilos — principalmente entre os adolescentes. Mas, como disse
Larson, "nem todas as canções ou cantores têm o propósito de
destruir a moral da América"12.
O problema de insinuações sexuais na música popular não se
limita ao rock. O caso do grupo 2 Live Crew, citado no capítulo
6, é um exemplo. De fato, o hip hop e o rap têm sido muito usados
para passar mensagens de violência e perversão sexual. Em junho
de 1993 uma senhora de setenta e oito anos foi assassinada a
golpes de walkman por um garoto de dezesseis anos, após recla
mar da letra obscena que ele cantava, um rap do cantor Dr. Dre13.
Os ritmos brasileiros como samba, pagode, lambada e axé-music
são carregados de insinuações sexuais e letras que descrevem a
mulher como objeto sexual. Alguns bailes funks no Rio de Janeiro
são cenários de violência gratuita e até mesmo orgias sexuais.
Na verdade, o problema vai além da música popular. Veja, por
exemplo, Wagner, reconhecido mundialmente como um dos gran
des compositores de música erudita. Ele era um homem megalo
maníaco, chegando aos limites da loucura. Era imoral, egoísta,
adúltero, arrogante, hedonista e violentamente racista. No en
tanto, sua música é aplaudida por muitos que consideram o rock
perigoso.
98
o que não combinaria, em hipótese alguma, com o cenário do
espetáculo.
Por último, um dos maiores motivos de violência nos shows de
rock é o uso de álcool e drogas antes mesmo de começar a apre
sentação dos grupos e cantores. Sendo assim, não é a música que
produz a violência, mas o fato de que muitas pessoas estão
alcoolizadas e drogadas durante o concerto.
O problema da violência não está no ritmo do rock. Se esti
vesse, todos aqueles que escutam rock seriam, pelo menos em
pequena escala, violentos. Mas os roqueiros que eu conheço, na
maioria, não são pessoas violentas.
Dan D. Johnson8
97
uma imagem de símbolo sexual, ela vendeu milhões de discos ao
redor do mundo. Em 1992, seguindo o eixo da fortuna, lançou o
livro erótico Sex, com vinte e oito páginas de fotos e textos exal
tando a perversão sexual de várias formas. Dois anos antes, seu
vídeo ]ustify my love {Justifique meu amor1*], vetado pela mtv
americana e exibido sem cortes pela Rede Globo no Brasil, mos
trava a cantora tendo relações com um homem e uma mulher ao
mesmo tempo, além de cenas de homossexualismo, lesbianismo e
sadomasoquismo.
Sendo assim, constatamos que o problema da imoralidade se-
xual na música popular não está ligado a nenhum ritmo ou estilo
musical em particular, mas é um reflexo da vida desregrada de
certos artistas e da estratégia mercadológica de outros.
Como vimos no início, a sincopia é apresentada por Johnson e
Blanchard como responsável pela sensualidade do rock. O escri
tor Steve Lawhead discorda, dizendo que a sincopia é um ele
mento musical comum, usada numa variedade de estilos musicais,
com nenhum efeito anormal sobre as pessoas. Será que não esta
mos diante de um problema fictício, baseado em preconceitos
musicais? Será a imoralidade demonstrada nosshows de rock mais
um reflexo da imagem criada pelos artistas, que um efeito hipnó
tico ou estimulante do ritmo? Ao que tudo indica, é exatamente
isso que acontece. Se for assim, por que afirmar que não há lugar
na igreja para o rockl
Talvez porque, mesmo não tendo o poder de induzir as
pessoas a práticas sexuais, o ritmo do rock é, de fato, um ritmo
dançante. Elvis já dizia que com o rock é possível dançar15.
Esse fato em particular perturba muitos críticos cristãos quan
do se fala de rock cristão. Ao que parece, ritmos que apelam
para as emoções e expressões corporais não encontram muito es
paço no cristianismo.
99
contramos na Bíblia é algo diferente. A música hebraica é tre
mendamente emocional e, em diversas ocasiões, era acompanha
da de expressões físicas (v. Ex 15.20; ISm 21.11; 2Sm 6.14,16;
2Cr 5.12; SI 30.11; 98.4; 149.3; 150.4). Não há nada de errado
numa música que desperte nossos sentidos físicos. Deus criou
e está interessado em todos os aspectos do homem, físicos,
emocionais, mentais e espirituais. Steve Miller coloca muito
bem a questão:
Dan D. Johnson17
100
dizendo: "Não importava se o rocicríroll era de conteúdo rebelde
ou não, uma rebelião se formou ao seu redor... Até mesmo o sim
ples fato de ouvir rock já era uma declaração de rebeldia"18.
No entanto, uma vez mais, a rebelião do rock é apenas uma
imagem. Na verdade, uma falsa imagem. Se o rock tem o poder
de conduzir os jovens a se rebelarem contra seus pais, esse poder
não está no ritmo, mas na imagem produzida pelos cantores de
rock. A imagem esteve presente no rocWríroll de Elvis, no rock
politizado dos Beatles, na música e na atitude punk dos Sex Pistols,
nos grupos de heavy metal da década de 1980, na onda grunge das
bandas de Seattle, como Nirvana, Pearl Jam e Soundgarden na
década de 1990, ou ainda nos recentes festivais de new metal.
Mas esse tipo de rebelião é tão falso e superficial que até mesmo
alguns artistas de rock o desprezam. Os membros da banda nova-
iorquina Anthrax escreveram uma canção condenando o que
chamavam de revolução sob as mangas das camisas — referindo-
se à moda grunge de usar camisas de flanela como sinal de atitu
de rebelde.
No entanto, o maior exemplo de que a rebelião do rock não
está no ritmo, e sim na imagem, são as manifestações de histeria
coletiva das décadas de 1950 e 1960. Steve Lawhead comenta:
101
muitos pensaram, Axl estava apenas fazendo seu papel de rebel
de sem causa. Ele já havia dito antes: "Uma imagem rebelde
pode funcionar bem. Somos considerados a banda mais perigosa
do mundo. E uma boa reputação para uma banda de rock"20.
Por outro lado, a imagem rebelde do rock serviu de base para
grupos cristãos comporem suas canções. O grupo sueco Jerusalém
escreveu Rebels of ]esus Christ [Rebeldes de Jesus Cristo] falando
sobre a rebelião contra o pecado, contra a idolatria, contra o
sistema mundano que rege as ações humanas.
O ritmo do rock não tem o poder que lhe é atribuído por mui
tos de seus críticos. O rock não pode induzir ninguém a fazer algo
que não queira fazer. Todas as manifestações de histeria, violên
cia e rebeldia vistas em certos concertos de rock são auto-induzidas
e, algumas vezes, pelo fato de haver na platéia pessoas drogadas e
alcoolizadas. Além disso, o grande empreendimento da música
popular tem levado muitos artistas sem escrúpulos a usar imagens
de violência, erotismo e rebeldia para se destacar no cenário ar
tístico e vender mais discos.
102
Mensagens invertidas
afetam o subconsciente
BACKWARD MASKING
104
Outro perito no assunto de relações interpessoais e da mente,
que foi grandemente consultado por músicos, empresários e téc
nicos de gravações durante a década de 1960, é o dr. John Kappas.
As pessoas que o procuravam queriam saber como encontrar for
mas de vender mais discos. Queriam que o dr. Kappas lhes falasse
se era possível influenciar pessoas por palavras e mensagens ocul
tas, gravadas invertidas em suas canções. Segundo o próprio dr.
Kappas:
105
Kappas e outros investigadores mais recentes chegaram à con
clusão de que as mensagens ocultas nas gravações, ainda que
sejam realidades, não alteram o pensamento das pessoas. A maioria
dos estudos realizados sobre mensagens subliminares mostra que
apenas pessoas com predisposição mental têm seu comportamen
to de alguma forma afetado por tais mensagens. Por exemplo:
apesar de todas as tentativas, ninguém conseguiu usar mensa
gens subliminares para fazer com que alguém que odiasse pipoca
saísse do cinema, após ter sido exposto a tais mensagens, com um
desejo imenso de comprar pipocas.
Segundo Kappas, se alguém estiver querendo manipular as
pessoas através da música, backward masking não seria a melhor
forma, pois, além de ser extremamente dispendiosa, não foram
encontrados resultados satisfatórios que comprovassem a eficá
cia da técnica. Para ele,
106
Apesar de sabermos que não existe nada de satânico ou so
brenatural em backwarâ masking e que se trata de técnicas de
estúdio raramente usadas ou, na maioria dos casos, de coinci
dências e ilusões auditivas, devemos estar alertas para o seguinte
fato: a repetição constante de uma letra com mensagens negati
vas pode afetar as pessoas.
Por esse motivo, devemos selecionar bem o que estamos ou
vindo para que não sejamos enredados por filosofias vãs e enga
nosas, que se fundamentam nas tradições humanas e nos princípios
elementares deste mundo, e não em Cristo (Cl 2.8). Além disso,
devemos evitar consumir músicas que apresentam valores con
trários à Bíblia, pela simples razão de estarmos colocando dinhei
ro nas mãos de pessoas que se opõem aos valores cristãos, ao
Evangelho de Cristo, e que muitas vezes blasfemam o nome de
Deus.
107
Essa música é
mundana demais
Luís Palau
109
É essa mentalidade de isolamento que nos impede de sermos
mais efetivos na expansão do Reino de Deus. Foi contra tal men
talidade que lutaram os reformadores do século 16. Para eles, o
senhorio de Cristo devia estender-se sobre todas as áreas de nos
sa vida, inclusive a música e as artes.
Quando tratamos de isolamento musical, surgem algumas per
guntas. Existe música mundana? Se existe, o que diferencia a
música mundana da música sacra? Uma escala musical diferen
cia um dó secular de um dó cristão? Podemos encontrar num
piano tanto um dó diabólico quanto um dó divino? Existe algo
como uma guitarra secular e uma guitarra cristã?
O escritor John Blanchard discorre sobre essas questões:
110
Música é feita de notas individuais, acordes e padrões rítmicos
que podem ser tocados por alguns ou muitos instrumentos. As
notas não têm escolha de como serão usadas. E o músico quem
determina como uma criação musical será usada — se para o
bem ou para o mal. Mesmo se a maioria das [...] canções fossem
utilizadas pelo homem para o mal, isso não alteraria o fato de
que elas também possam ser utilizadas com bons propósitos.4
111
A música cristã deve
ser apenas para louvor
e adoração
Glen Hughes
113
res daquela sociedade primitiva encontramos a agricultura (v. 20),
a indústria (v. 22) e a música (v. 21). Vemos nessa passagem a
importância da música na vida do homem.
E de interesse também notarmos que, na Bíblia, a música era
dividida em instrumental (SI 33.2,3; 150) e vocal (SI 98.5; 2Sm
19.35; At 16.25).
Steve Miller diz que, possivelmente, os fatores mais interes
santes quando observamos a música na Bíblia são a sua rica varie
dade e as poucas restrições quanto a seu uso. Miller aponta para
a variedade de instrumentos, de sons e volumes, de adoradores,
de posturas e modos, de lugares, de ocasiões e de motivos1.
Vejamos algumas dessas variedades:
• Variedade de adoradores:
114
• todo o povo (2Cr 23.13);
• tudo o que tem vida (SI 150.6).
Variedade de lugares:
• na grande congregação (SI 68.26);
• nos muros de Jerusalém (Ne 12.31);
• na ampla sala no andar superior (Mc 14-15);
• descendo de um monte (ISm 10.5);
• no santuário (SI 150.1);
• nacama (SI 149.5);
• na prisão (At 16.25).
Variedades de ocasiões:
• na dedicação do muro da cidade (Ne 12.27);
• durante as ofertas (2Cr 23.18);
• acompanhando uma festa (2Cr 30.21);
• durante a unção do rei (lRs 1.34);
• durante a lua nova e durante a lua cheia (SI 81.3);
• no culto (ICo 14);
• na celebração da Páscoa/ceia (Mc 14.26);
• num tempo de crise pessoal (At 16.25).
Variedade de propósitos:
115
• paralouvar(Sl8;18;116;138);
• para exortar (SI 2; 131; 134; 136).
116
Quarta parte
Aprendendo a
usar a música cristã
contemporânea
John Styll
Um desafio aos músicos
119
namento com Deus ou com o próximo. A música cristã deve ser
uma expressão da vida do cristão com Deus. A Bíblia diz que
devemos fazer tudo para a glória de Deus (ICo 10.32). Isso certa
mente inclui a música que ouvimos e que tocamos.
Algo que não canso de falar aos jovens nem aos músicos com
quem tenho contato é que cada músico cristão deve estar vincu
lado a uma igreja local. E na igreja local que você irá crescer em
sua fé cristã. É lá onde você terá uma oportunidade de expressar
seu amor a Deus nos relacionamentos com outros irmãos. E atra-
vés da igreja local que você irá descobrir e aprender a exercer
sua função no Corpo de Cristo. Mais importante ainda: os líderes
da igreja local estarão mentoreando seu caminhar com Cristo,
ajudando-o a enxergar seus erros, aconselhando-o, orando por
você e por seu ministério. A exortação do escritor aos Hebreus
nunca foi tão atual quanto hoje: "Não deixemos de reunir-nos
como igreja, segundo o costume de alguns, mas procuremos en
corajar-nos uns aos outros, ainda mais quando vocês vêem que se
aproxima o Dia" (Hb 10.25).
120
mais agradável para as massas, ele corre o risco de estar se ven
dendo em busca do sucesso.
Produzindo música com fins comerciais. Música é uma forma de
arte, uma expressão da criatividade que Deus concedeu ao homem.
Como tal, é um dom de Deus. Por esse motivo, produzir música
apenas visando ao lucro pessoal é desonrar o dom de Deus.
Oferecendo respostas baratas para atrair mais ouvintes. Um
jornalista australiano disse que nós, cristãos, somos uma "mino
ria egoísta e vaga, que estamos continuamente dizendo aos ou
tros para tornar-se cristãos em vez de descobrirmos por que eles
não são"2.
Esta declaração é um tanto agressiva, mas reflete uma reali
dade entre nós — principalmente se tratando da música cristã.
Como já vimos antes, a maioria das canções cristãs são medíocres
no que diz respeito à letra. E quando alguém tenta mudar, com
pondo sobre temas do cotidiano, acaba sendo criticado por es-
crever uma letra muito superficial. Mas o que é mais superficial:
dizer simplesmente que Jesus salva ou falar das conseqüências do
pecado — racismo, violência, egoísmo, poluição, drogas etc. —
do qual Jesus está querendo salvar o homem?
Na década de 1990, muitos pensaram que artistas cristãos
populares da época, como Michael W Smith e Amy Grant, haviam
se vendido porque algumas de suas canções não mencionavam
mais o nome de Deus. Com essa mentalidade, teríamos de retirar
o livro de Ester da Bíblia, pois ele também não menciona o nome
de Deus. O fato é que os artistas estavam preocupados em ofere
cer respostas aos problemas que as pessoas enfrentavam. Seguin
do o caminho contrário, muitos estão cantando o que os cristãos
querem ouvir — não o que eles precisam ouvir — e vendendo
milhares de discos. Devemos lembrar que os profetas do Antigo
Testamento não faziam sucesso com sua mensagem. Jesus tam
bém não foi popular na agenda dos religiosos, mas nem por isso
mudou a sua mensagem. Do mesmo modo, os músicos cristãos
precisam tomar cuidado para não se deixar levar pelo sentimento
de aprovação da maioria, pensando, desse modo, estar agradan-
121
do a Deus. Ao contrário do dito popular, nem sempre a voz do
povo é a voz de Deus.
122
O músico cristão precisará aprender a fazer a escolha certa,
evitando prender-se a formas tradicionais que funcionaram no
passado, ao seu gosto pessoal, àquilo que ministra à sua vida e ao
que parece apropriado à sua cultura. Caso contrário, estará obri-
gando sua audiência a moldar-se ao seu gosto pessoal e cultural,
o que certamente não é uma boa maneira de alcançar as pessoas
ou ministrar a elas. Não foi assim que Jesus fez. Ele não ficou lá
no céu cantando O mortais! Se vós soubésseis como eu vos amo!...
Não! Em vez disso, Jesus deixou seu conforto, sua glória, sua se'
gurança ao lado do Pai e veio ao mundo na fragilidade de uma
criança, nascendo entre os homens e tornando-se semelhante a
eles. Qual era o objetivo de tanto esforço? Servir. Porque "nem
mesmo o Filho do homem veio para ser servido, mas para servir e
dar a sua vida em resgate por muitos" (Mc 10.45).
Paulo, em Filipenses 2.5-11, disse que esta deve ser a nossa
atitude:
O músico cristão que segue esse exemplo não ficará preso aos
seus próprios gostos nem à tradição ou à cultura. Ao buscar servir
aos outros através de sua música, ele aprenderá a sacrificar-se
em função do próximo. Se fizer isso de todo o coração, com o
desejo sincero de servir, ele poderá não fazer muito sucesso no
meio dos homens, mas ouvirá do seu Senhor e Mestre: Muito bem,
servo bom e fiel!... Venha e participe da alegria do teu Senhor!
123
Em busca da excelência
Apóstolo Paulo
FLEXIBILIDADE
MATURIDADE CRISTÃ
Uma das funções da música é ensinar ao povo as verdades da
Palavra de Deus. Em Colossenses 3.16, Paulo recomenda-nos o
seguinte: "ensinem e aconselhem-se uns aos outros com toda a
sabedoria, e cantem salmos, hinos e cânticos espirituais". Este
aspecto aproxima o músico do mestre. Se assim for, a advertência
de Tiago, de alguma forma, deve ser considerada pelos músicos
cristãos: "Meus irmãos, não sejam muitos de vocês mestres, pois
vocês sabem que nós, os que ensinamos, seremos julgados com
maior rigor" (3.1).
Aquilo que é ensinado através da música e das atitudes do mú
sico cristão será julgado por Deus de uma forma mais severa, por
causa da esfera de influência que aquele que faz uso de uma plata
forma possui. Por esse motivo, qualquer cristão considerando uma
carreira musical deve estar preparado a dizer, como o apóstolo,
"Tornem-se meus imitadores, como eu o sou de Cristo" (ICo 11.1).
DILIGÊNCIA
O dicionário define diligência como presteza em fazer alguma
coisa. A pessoa diligente é cuidadosa, zelosa, alguém que se em
penha naquilo que faz. O músico cristão deve ter zelo por sua
música e por seus instrumentos. Ele deve buscar apresentar sem
pre o melhor, dedicando, para isso, treino e preparo adequados.
Paulo expressou um padrão bíblico de diligência quando es
creveu aos Colossenses: "Tudo o que fizerem, façam de todo o
coração, como para o Senhor, e não para os homens" (Cl 3.23).
A advertência do profeta deve fazer-nos tremer diante do fato
de que é considerado maldito aquele que faz a obra do Senhor
negligentemente (Jr 48.10).
ESPÍRITO DE SERVO
A capacidade de servir aos outros sem esperar recompensa
dos homens é uma grande virtude que deve estar presente em
cada discípulo de Cristo. Jesus disse: "quem quiser tornar-se im
portante entre vocês deverá ser servo" (Mt 20.26).
O músico cristão não deve buscar fama ou riquezas. Seu mi
nistério não deve ser avaliado com base no número de pessoas
125
que assistem a suas apresentações ou em quantos CDs ele vende.
Ele fará sucesso aos olhos de Deus quando usar seus dons e talen
tos para servir ao próximo (Mt 25.21,34-40).
126
assistir à apresentação da banda U2 para sessenta mil pessoas na
Holanda. Ele diz:
127
• superficialidade, com letras cheias de chavões cristãos; e
• isolamento, com concertos somente em igrejas para o pú
blico cristão em sua maioria.
Bob Larson
ESTANDO INFORMADO
130
desafio que envolverá sacrifícios pessoais. Mas, quando se trata
do bem-estar de um filho ou uma filha, nenhum esforço é grande
demais.
DEMONSTRANDO AMOR
131
SENDO UM BOM EXEMPLO
PROVENDO ALTERNATIVAS
132
Os pais devem interessar-se por aquilo que seus filhos estão
escutando. Eles devem procurar conhecer um pouco da vida dos
artistas e, sempre que possível, acompanhar os filhos a um con
certo. Quando identificarem algum cantor ou grupo que pode
ser de má influência na vida dos filhos, devem procurar uma al
ternativa cristã para eles. Fazendo isso, estarão demonstrando
interesse sincero pelos filhos e, ao mesmo tempo, terão mais con
dições de ajudá-los em seus problemas.
133
A música cristã
contemporânea na igreja
135
em nenhum tipo de igreja ou reunião religiosa participando de
nossos shows e sendo expostas à mensagem do Evangelho capaz
de fazer diferença em suas vidas, porque elas se identificaram
com a música que estava sendo tocada.
Quando Doug Murren pastoreava a Igreja do Evangelho Qua-
drangular em Kirkland, estado de Washington, viu sua congre
gação explodir de uns poucos membros para quase quatro mil,
em dez anos. Tal crescimento é algo extraordinário naquela re
gião dos Estados Unidos. A música desempenhou um papel im
portante na estratégia de Murren. Ele disse: "Pessoas incrédulas
[...] são atraídas a uma igreja que é compatível com seu estilo
musical e possui sons familiares. Em outras palavras, elas são atra
ídas pela música com um som contemporâneo"4.
A estratégia musical da igreja de Murren incluía pesquisar os
estilos mais populares na área e usá-los para alcançar os não al
cançados; e fazer avaliações constantes da eficácia do trabalho,
buscando a excelência, uma vez que tais pessoas procuram músi
ca com qualidade. O pastor Murren avaliava tanto o conteúdo
quanto a qualidade das canções. Ele diz: "Freqüentemente eu
me pergunto 'será que a música e a adoração em nossos cultos
realmente representam os gostos e estilos das pessoas que Deus
me chamou para alcançar?'"5.
136
próprios cristãos]. Significa também levar a mensagem às pessoas
de uma forma que elas entendam e com a qual se relacionem.6
REDENÇÃO
Ao contrário do que muitos pensam, os Reformadores não eram
contra as artes. Lutero usava a música secular de seus dias para
transmitir a mensagem do Evangelho, porque acreditava na pos
sibilidade de remissão, não apenas do ser humano, mas também
das artes — especialmente da música. Na introdução do Wittenberg
137
Gesangbuch, Lutero escreveu: "Eu não sou da opinião de que to-
das as artes sejam esmagadas e se percam por causa do Evange
lho, como algumas pessoas preconceituosas pensam, mas desejaria
ver todas elas, e especialmente a música, servas daquele que as
criou e as deu a nós"8.
Além de servir como elo de comunicação com esta geração e
de ajudá-la a entender a mensagem do Evangelho, a música cris
tã contemporânea é também o meio de resgatarmos para Deus
um veículo que estava sendo usado exclusivamente pelo mundo
secular. J. G. Machen, no livro Christianity and culture [Cristando.-
de e cultura9], diz o seguinte:
138
através dos anos (He 3.2). Mas, como disse John White, no livro
Quando o Espírito vem com poder, no meio de todo avivamento há
um pouco de sujeira. Vemos isso no livro dos Atos do Apóstolos,
quando o Espírito Santo estava movendo o coração dos cristãos
para doarem parte de seus bens aos pobres. Em meio àquele mo
ver sobrenatural de Deus, Ananias e Safira foram condenados
por abrigarem motivos escusos em seus corações (At 5).
Há pelo menos dois aspectos que devem ser evitados no rela
cionamento entre a igreja e a música cristã contemporânea.
Em primeiro lugar, trata-se da idéia de movimento. Por exem
plo, no Brasil a música cristã contemporânea foi rotulada de gospel
e criou-se um movimento em torno dela. Isso pode parecer bom a
princípio, sobretudo porque começa a mobilizar multidões, mas
logo se torna negativo, porque gera uma tendência de se criarem
círculos fechados e rotular as pessoas ou coisas como fazendo ou
não parte dele. Dessa forma, corre-se o risco de reverter os aspectos
positivos da identificação e contextualização da mensagem.
Muitos confundiram a música cristã contemporânea com o
movimento gospel. Artistas cuja carreira musical estava em deca
dência abraçaram o movimento e começaram a gravar cds gospel
para tentar abocanhar um pedaço do mercado. Virou moda, em
certos círculos, ser conhecido como gospel. No entanto, o que
significava ser gospel7. Para muitos significava apreciar certo esti
lo de música — a música cristã contemporânea. Para outros era
vestir a indumentária gospel — camisetas, bonés, moletons, len
ços etc, com jargões cristãos. Para outros ainda, era freqüentar
certas igrejas — ou espaços — e falar a linguagem gospel.
Isso tudo demonstra que o gospel foi de fato um movimento,
uma tribo de jovens cristãos modernos. O risco dessa idéia de
movimento é que, com o passar do tempo, as pessoas tendem a
cansar-se e passam a rejeitar tudo aquilo que está associado a
ele, como ficou claro no caso do movimento gospel no Brasil.
O segundo aspecto negativo que deve ser evitado pela igreja
na utilização da música cristã contemporânea está relacionado
139
ao primeiro. Trata-se da tentativa de massificar uma marca, de
fendida como estratégia mercadológica. O movimento gospel fez
exatamente isso. Para um produto ser vendido em círculos evan
gélicos na década de 1990, precisava ser rotulado com o termo
gospel. Além da música gospel, vieram a moda gospel, a igreja
gospel e a linguagem gospel. Se não bastasse tudo isso, tivemos
também cosméticos gospel, prestação de serviços gospel e até tele-
900 gospel, no qual o ouvinte pagava para receber uma oração.
Tudo explorando um nome, uma imagem criada para o consumo
em massa. O resultado é que, em vez de ser parte de um aviva-
mento musical com o objetivo de revelar a glória de Deus ao
mundo moderno, o movimento gospel correu o risco de entrar
para a História como aqueles que vendem Jesus como se vendes
sem cerveja e cigarros.
Em algum momento chegou-se até mesmo ao ridículo de dis
cutir quem era o dono da marca gospel, evidenciando a impor
tância comercial que ela ganhara. Quando igrejas começam a
competir e a disputar direitos sobre rótulos criados em nome do
Evangelho, significa que suas motivações podem não ser tão pu
ras quanto parecem.
140
Conclusão
142
Referências bibliográficas
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144
Notas
Introdução
Capítulo 1 - As origens
1 Citado no encarte do cd Preaching the gospel da série Roots 'riblues lançada pela
Columbia Records em 1991.
1 Algumas fontes apontam o seu nascimento em 1914 ou 1915.
'Tradução livre do editor.
4 Disponível no site <http://www.revgarydavis.com/> i acessado em 4-3.2005.
5 Segundo Henrique Autran Dourado, slide (ing. íit.: escorregar) é o efeito de
deslizar não-cromaticamente de uma nota para a outra.
6 Datas de seu nascimento e morte também aparecem como sendo 1902 e 1950.
7 Tradução livre do editor.
8 Tradução livre do editor.
9 Citado no encarte do CD Mahalia Jackson, gospel, spirituals & hymns, Sony
Music Entertainment Inc, 1991.
10 Tradução livre do editor.
1' Citado por Ray Funk no encarte do CD Preaching the gospel da série Roots 'riblues
lançada pela Columbia Records em 1991.
1 John W Styll, "From the Editor", revista cem, publicada em Nashville, lennessee,
em julho de 1993, p. 42.
2 Apud J. M. Costa, C. Andrade, G. Moreira, G. Couto, A mensagem oculta
dorock,p. 23.
3 Tradução livre do editor.
4 John R. W. Stott, A mensagem do Sermão do Monte, p. 3.
5 Apud Charles J. Mellis, Committed communiües, p. 75.
6 John Smith, On the side ofthe angels, p. 142.
7 Apud Charles J. Mellis, op.cit., pp. 73-4.
M John Smith, op. cit., p. 142.
9E15.
10 Billy Graham, Jesus e a geração jovem, p. 17.
1' Chuck Smith, Tal Brooke, Harvest, p. 48.
12 Ibid.,PP. 49-50.
11 Apud Charles J. Mellis, op. cit., p. 76.
146
14 Tradução livre do editor.
15 Edward E. Plowman, The underground church, p. 99.
16 Apud Edward E. Plowman, op. cit., p. 112.
l7Ibid.,p. 109.
IM Tradução livre do editor.
19 Tradução livre do editor.
20 Apud Steve Rabey, The heart ofrock and roll, p. 17.
21 Ibid., p. 18.
22 Tradução livre do editor.
Capítulo 6 - As letras
147
Capítulo 8 - Conexão africana: o ritmo dos tambores
1 O disco era uma coletânea do início dos anos 1970, com músicas cristãs de
Ralph Carmichael, dentre outras. Como disse Al Menconi, "se [a canção em ques
tão] for demoníaca, quase todos os corais da América devem estar em perigo".
(Apud Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, p. 29.)
2 Dan D. Johnson, Os riscos traiçoeiros do rock, p. 56.
Mbid-.pp. 11-3.
4 Tradução livre do editor.
5 Steve Lawhead, Rock on trial, p. 49.
í! Apud Roberto Muggiati, A história do rock, p. 22.
7 Apud Steve Lawhead, op. cit., p. 50.
8 Kurt Pahlen, Nova história universal da música, p. 485.
l)Ibid.,p.486.
10 "O ritmo síncope é, de fato, encontrado em muitos estilos de música, incluindo
[música] clássica [O coro Aleluia] e hinos tradicionais [Quandojesus entrou no meu
coração]. Os críticos estão dispostos a descartar toda a música contendo síncope ? Nós
não encontramos nenhum estudo que estabeleça uma ligação entre a sincopia e reações
negativas." Cf. Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, p. 27.
11 Donald R Hustad, Jubilate! A música na igreja, p. 220.
148
7 "Comportamento: O Show dos Horrores", artigo publicado na revista Veja em
São Paulo, em 22.5.1991.
8Dan D. Johnson, op. cit., p. 36.
qJohn Blanchard, R Anderson, D. Cleave, Rock m igreja?!, p. 28.
10 Dan D. Johnson, op. cit., p. 11.
11 Bob Larson, Su hijo y ei rock, p. 6.
I2Ibid.
11 Segundo artigo "Rap celebra violência do gueto e chega às paradas", de Mareei
Plasse, publicado no caderno Ilustrada, p. 8, da Folha de S.Paulo, em 27.12.1993.
14 Tradução livre do editor.
15 Marcelo Eduardo Lemos Costa (org.), Elvis por ele mesmo, p. 63.
l6Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, p. 19.
l7Dan D. Johnson, op. cit., p.19.
18Steve Lawhead, op. cit., p. 24.
19Ibid.,p.57.
20 "Axl explica violência em show", artigo publicado na revista Bizz, em outubro
de 1991, p. 8.
1 "Backward masking: satanic plot or red herring", artigo de Ross Pavlac publi
cado na Cornerstone Magazine, v. 11, 62 ed., de Chicago, Illinois.
2 Apud Ted Schwarz, Duane Empey, Satanismo, p. 150.
1 Tradução livre do editor.
4 "Backward masking: satanic plot or red herring", artigo de Ross Pavlac publi
cado na Comerstone Magazine, v. 11,62 ed., de Chicago, Illinois.
5 Apud Ted Schwarz, Duane Empey, op. cit.,p. 159.
6 "Backward masking: satanic plot or red herring", artigo de Ross Pavlac publi
cado na Cornerstone Magazine, v. 11,62 ed., de Chicago, Illinois.
149
Capítulo 14 - Um desafio aos músicos
1 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 57.
2 John Smith, On the side ofthe angels, p. 130.
3 Entrevista com Luís Palau publicada na revista londrina New Christian Media
Quarterlytv. 3,n. 7.
Conclusão
150
a é um dos maiores tesouros da civilização. Como um
dos principais veículos para a adoração, tem percorrido os
séculos e ajudado os fiéis a expressar sua devoção. Como
veículo de evangelizaçao, tem sido de utilidade imensurável.
Consciente da relevância e influência da música, Sandro
Baggio apresenta aos leitores uma reflexão séria e
comprometida dessa arte que ainda suscita controvérsia e
paixão no meio evangélico. Origem, estilos musicais, ritmos e
outros temas relevantes são tratados com o conhecimento e
experiência adquiridos em quase duas décadas de pesquisa e
vivência musical.
Em meio a tantas opiniões diferentes e por vezes conflitantes,
sintonize o coração em uma nova maneira de olhar para a
Música cristã contemporânea. Confira!
ISBN 85-7367-807-0
788573 678079
Categoria: Louvor