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SANDRO BAGGIO

Música cristã
contemporânea

Um avivamento musical
em nossos dias

Uma cortesia da
Editora Vida
Vida
©2005, de Sandro Baggio

Vida Todos os direitos em língua portuguesa reservados por

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Edição: Billy Viveiros e Lilian Jenkino
Revisão: Nilda Nunes
Capa: Cláudio Souto
Diagramação: Sônia Peticov

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)


(Câmara Brasileira do Uvro, SP, Brasil)

Baggio, Sandro
Música cristã contemporânea / Sandro Baggio. — São Paulo : Editora
Vida, 2005.

Bibliografia
[sbn 85-7367-807-0

1. Música cristã contemporânea I. Título.

05-1850 cdd 246.75

índice para catálogo sistemático:

1. Música cristã contemporânea: Religião 246.75


Agradeço a meus pais por terem feito sempre o
melhor para minha educação e bem-estar; aos
pastores, mestres e amigos que aprenderam a me
amar a despeito de minhas idiossincrasias; a
homens como Dostoiévski, Vítor Hugo, Dietrich
Bonhoeffer, A. W. Tozer, Francis Schaeffer, C. S.
Lewis, ]ohn Stott, George Verwer, John Smith,
Tony Campolo, Glenn Kaiser, Keith Green, Caio
Fábio de Araújo Filho, Phillip Yancey Leonard
Sweet e Erwin Raphael McManus que têm
ajudado na formação de meu pensamento; a
minha mulher, Mara, e a minha filha, Michelle,
que dão cor à minha vida; e a meu salvador e
senhor, Jesus Cristo, razão e esperança para eu
viver num mundo capaz de me despertar
sentimentos tão ambíguos.
Dedico este trabalho a todos os artistas
que, através de suas obras, refletem
partículas da glória de Deus em um
mundo caído.
Prefácio

A música em geral é um poderoso instrumento. Como um dos


maiores tesouros da civilização, está presente na história da hu
manidade, ocupando sempre papel de destaque. Na sociedade
contemporânea ainda mais, visto que, valorizada pelos meios de
comunicação, se tornou presença obrigatória em praticamente
todas as atividades sociais. Ouvimos música nos consultórios, nos
elevadores, nos ginásios e estádios, em festas e funerais, em todos
os tipos de eventos, políticos, esportivos e religiosos.
A música também faz parte do dia-a-dia da maioria da popu-
lação, das donas-de-casa nas favelas ou em mansões, dos traba
lhadores em seus locais de trabalho ou a caminho deles, entre as
multidões ou no aconchego dos lares. Na verdade, a música tor
nou-se uma ótima companhia. O que seria de um mundo mergu
lhado apenas no barulho dos sons desarranjados?
Sob a perspectiva do cristianismo, a música não é menos im
portante. Como um dos principais veículos para a adoração, ela
tem percorrido os séculos e ajudado os fiéis a expressar sua devo
ção. Como veículo de evangelizacão, tem sido de uma utilidade
imensurável.
A exemplo de milhares de pessoas ao redor do mundo, tive
meu primeiro contato com a mensagem do evangelho através de
uma canção. Quando garoto, aos doze anos, fui convidado por
uma colega a participar da reunião de jovens de sua igreja. Ha-
via um pastor que falou por quase uma hora. Sobre ele e sobre o
assunto, só consigo lembrar-me é que talvez tenham sido cansati
vos... Mas, ao final da reunião, os jovens se levantaram, deram-
se as mãos e cantaram: Há momentos em que as palavras não
resolvem, mas o gesto de Jesus demonstra amor por nós... Os acor
des singelos da canção aliados ao calor das mãos entrelaçadas e
ao frescor do vento do Espírito que soprava naquele lugar foram
suficientes para derreter meu coração. Era música divina, com
seu poder de derrubar reinos, destronar reis e refazer vidas.
Desde a segunda metade do século 20 em particular, a música
no meio cristão tem sido alvo de muita polêmica quanto a sua
definição e propósito. É justamente essa discussão que Música
cristã contemporânea traz à tona. Sandro Baggio, na minha opi
nião, foi muito feliz na escolha dos tópicos a serem abordados,
desde a definição do que seria música cristã até as sugestões de
como usá-la de modo apropriado, como poderosa ferramenta a
serviço da evangelização dos povos.
Tenho certeza de que este livro chega em boa hora, no mo
mento em que a música evangélica parece viver sua plena disse
minação, e oramos para que seja de grande valia ao Reino de
Deus.
Jorge Camargo
Sumário

Introdução 11

Primeira parte: o que é música cristã contemporânea . 15

As origens 16
Avivamento musical 26
Música popular contemporânea 35

Música cristã contemporânea 43


A música cristã contemporânea no Brasil 56

Segunda parte: a diferença 65

As letras 68

O estilo de vida dos músicos 74

Terceira parte: as críticas 81

Conexão africana: o ritmo dos tambores 82

O rock é do Diabo 87

O ritmo incita à violência, à sensualidade e à rebelião 93

Mensagens invertidas afetam o subconsciente 103

Essa música é mundana demais 108


A música cristã deve ser apenas para louvor

e adoração 112
Quarta parte: aprendendo a usar a música cristã
contemporânea 117

Um desafio aos músicos 118

Em busca da excelência 124


Trazendo a música cristã contemporânea para casa 129

A música cristã contemporânea na igreja 134

Conclusão 141

Referências bibliográficas 143

Notas 145
Introdução

Adoração é a grande revolução na igreja moderna.


E também fonte de muita controvérsia.

Elmer Towns

Nas últimas décadas tem havido um número incontável de


inovadores no cerne do cristianismo evangélico. Muitos têm tra
zido benefícios para a igreja, com suas idéias ousadas. Outros não
têm conseguido tanto êxito, tropeçando nas barreiras do tradi-
cionalismo inflexível. Alguns, infelizmente, têm sido portadores
de idéias que certamente não procedem de Deus.
Dentre as grandes mudanças que ocorreram na igreja evan
gélica nas últimas três décadas do século 20 está o uso da música
popular. A contemporary christian music, ou música cristã con
temporânea, como tem sido chamada, é hoje uma realidade
em todo o mundo. Até mesmo o cenário musical secular já reco
nhece a sua importância, dedicando-lhe espaço para nomeação
na maior celebração da música popular, a entrega do prêmio
Grammy.
No entanto, existe ainda muita resistência por parte dos evan
gélicos para com a música cristã contemporânea. Uma certa pru
dência em aceitar algo novo é sempre saudável, mas é preciso
tomar cuidado para não exagerarmos na precaução, deixando de
ver o que Deus está fazendo de novo em nossos dias.
Séculos já se passaram desde a Reforma, época em que Lutero
introduziu na igreja uma melodia popular para sua composição
famosa, Castelo forte. Depois dele vieram outros, como os irmãos
Charles e John Wesley ou William Booth, do Exército de Salva
ção. Eles também ousaram usar meios nada convencionais para
sua época com o intuito de tornar a mensagem do Evangelho
mais acessível a seus ouvintes. A história tem se repetido através
dos séculos e a controvérsia também.
Creio que na situação atual encontramos, de um lado, jovens
cristãos rebeldes, que não possuem nenhum respeito pelas estru
turas eclesiásticas tradicionais, e, do outro, líderes tradicionais,
que têm riscado de seu rol de membros os músicos cristãos, sim
plesmente por não gostarem de seu estilo de música. Como disse
o pastor e músico Glenn Kaiser: "Gosto musical não é fundamen
to bíblico para comunhão ou excomunhão"1.
Precisamos analisar com cuidado tais questões, evitando to-
mar posições baseadas em gosto pessoal ou pressuposições sem
fundamento bíblico, para não ferirmos o trabalho de muitos ser
vos de Deus que se dedicam ao ministério da música, e para não
incorrermos no risco de espantar os jovens de nossas igrejas por
um radicalismo sem sentido. Nossa análise deve ser precisa, sa
bendo separar o estilo musical do estilo de vida dos músicos. Além
disso, precisamos aprender a enxergar além da fantasia e da ilu
são criadas por muitos envolvidos nesse mercado lucrativo da
música popular. Tudo isso é de suma importância, como veremos
nas próximas páginas.
Este livro é fruto de mais de uma década de pesquisas e en
volvimento com a música cristã contemporânea. No início, trata
va-se apenas de um interesse pessoal, uma tentativa de responder
aos meus próprios questionamentos sobre o assunto. Mas, à medi
da que fui encontrando aquilo que procurava, percebi que eu
não era o único interessado no tema. Ao meu redor, muitos jo

12
vens, líderes de jovens, pais e até pastores também tinham os
mesmos questionamentos e preocupações. E justamente para es
sas pessoas que dirijo meu trabalho.
A obra está dividida em quatro partes. Na primeira parte, apre
sentarei um pouco da história da música gospel norte-americana
e sua influência na música popular contemporânea; na segunda,
veremos duas diferenças básicas entre a música cristã contempo
rânea e a música secular; teremos então, na terceira parte, uma
visão de vários falsos conceitos sustentados por alguns cristãos
em torno da música popular (principalmente do rock); e, final
mente, encerrarei com algumas sugestões práticas para músicos,
pais e líderes cristãos quanto ao relacionamento entre a música
cristã contemporênea e a igreja.
Minha oração é para que os conceitos abordados neste traba
lho possam servir de auxílio tanto àqueles que estão lidando com
os questionamentos e a controvérsia em torno da música cristã
contemporânea quanto aos que estão buscando produzir música
relevante à sua geração, sem que, para isso, tenham que se des
viar da vontade de Deus.

13
Primeira parte

O que é música
cristã contemporânea

O termo gospel abrange vários tipos de canções que


compartilham uma identificação pessoal e emocional
com textos bíblicos e um rico vocabulário musical Dos
vários tipos, a música gospel cantada nas igrejas
batistas negras é provavelmente a mais importante,
pois tem influenciado não só as formas brancas de
gospel, mas também certos estilos de música popular.
Diferentemente do spirituals, que está arraigado nos
hinos formais protestantes, a música gospel negra é
improvisada, altamente emocional e alegre.

Grolier Multimedia Encyclopedia


As origens

A música gospel negra representa o poder do


indivíduo louvando a Deus e expressando sua fé.
Ray Funk

A música cristã contemporânea ficou conhecida como músi


ca gospel no Brasil a partir da década de 1990, quando o termo
passou a ser relacionado a qualquer estilo musical cujas letras e
compositores fossem cristãos. Alguns até diziam existir o jazi
gospel, o reggae gospel, o country gospel, o pop gospel, o rock gospel
e assim por diante. A verdade, no entanto, é que a música gospel
é um estilo próprio, desenvolvido a partir dos spirituals cantados
por cristãos negros norte-americanos no início do século 21, e tem
sido usada em muitas igrejas de maioria negra nos Estados Unidos.
O desenvolvimento do gospel deu-se principalmente em fun
ção da segregação racial na América do Norte. Os escravos ne
gros convertidos ao cristianismo que freqüentavam as igrejas
brancas eram inferiorizados por causa de sua cor. Muitos deles
começaram a formar congregações negras. Uma dessas igrejas foi
a Igreja Metodista Episcopal Africana, inicialmente denominada
Sociedade Africana Livre, fundada em 1787, na cidade de Fila
délfia, por Richard Allen.
A igreja e o lar eram os únicos lugares onde os negros possuíam
alguma forma de liberdade para praticar costumes próprios e de
senvolver opiniões diferentes das defendidas por seus senho
res. Eram os lugares onde eles podiam preservar parte de sua
cultura. Assim como no Brasil os escravos negros preservaram
seus costumes pagãos através dos cultos afro-brasileiros, do mes
mo modo, nos Estados Unidos, os negros preservaram parte de
sua cultura através da música.
No início, os cristãos negros continuaram entoando hinos tra
dicionais em seus cultos. Mais tarde, porém, as canções de traba
lho (work songs) começaram a servir de base para as composições
dos primeiros hinos negros. As canções de trabalho consistiam
em chamados e respostas, nos quais uma linha solo era alternada
com uma resposta coral, uma frase curta ou uma palavra. Tais
cantos, oriundos da África, ainda hoje são usados em muitas igre
jas naquele continente. Foram eles que deram origem à música
gospel, cuja maior característica é a de ser espontânea e profun
damente emocional. Outra característica é que seu ritmo é
sincopado, ou seja, há uma ligação entre a última nota de um
compasso com a primeira do seguinte. Além disso, há bastante
alteração no timbre de voz dos cantores.
Por volta de 1870, os cantores negros Jubilee, da Universida
de Fisk, em Indiana, realizaram várias apresentações nos Estados
Unidos e na Europa levando o gospel para fora da comunidade
negra. A partir de então, a música gospel começou a tornar-se
popular, dando origem a outros estilos, como o blues e o jazz-

AS PRIMEIRAS GRAVAÇÕES
O pesquisador musical americano Ray Funk diz que "se fôsse
mos considerar as gravações de artistas negros realizadas antes
da Segunda Guerra Mundial, quase todas elas eram jazz ou blues"1.
E, ainda segundo Funk, a música negra religiosa constitui uma
parte significativa de todas essas gravações.

17
Artistas negros cristãos, como o Standard Quintette e o
Dinwiddie Colored Quartette, estão entre os primeiros a realizar
gravações musicais, entre 1890 a 1902. Grande parte da influên
cia na música gospel que varreu a América do Norte após a Pri
meira Guerra Mundial veio desses artistas.
Veremos, a seguir, um pouco da história desses artistas a que
Ray Funk se refere.

Joshua White

Nascido em Greenville, em 19082, na Carolina do Sul, filho


de um pastor que lhe deu o nome de dois personagens importan-
tes da Bíblia, Josué e Daniel, Joshua White é um dos mais co
nhecidos cantores gospel do início do século 20. Quando criança,
Joshua trabalhava como guia de cantores e guitarristas cegos nas
ruas do sudeste de Chicago. Tal fato contribuiu muito para seu
aprendizado musical. Após ter se mudado para Nova York, em
1932, Joshua começou a gravar. Em 1939, ele formou seu próprio
grupo, que se tornou um dos favoritos do presidente Franklin
Roosevelt, chegando a tocar na Casa Branca. Como estava inte
ressado tanto pelo blues como pelo gospel, Joshua assumiu dife
rentes nomes para suas gravações (algo muito comum numa época
em que o blues era fortemente combatido por pregadores negros).
Nas gravações gospel usava o nome de Joshua White, the Christian
Singer [o Cantor Cristão]; para trabalhos seculares aparecia com
os nomes de Pinewood Tom, Tall Tom e Tippy Barton. Ele foi
popular nas duas carreiras e teve grande reconhecimento públi
co como cantor folclórico. Joshua apareceu em shows, em filmes,
nas rádios, realizou várias apresentações e gravações até a sua
morte, em 1969.

Gary Davis

Outro cantor gospel muito conhecido do início do século 20 foi o


reverendo Gary Davis, que também desenvolveu sua carreira tanto

18
dentro da igreja como fora dela. Ele nasceu cego, em 1896, em
Lawrense County, na Carolina do Sul, e começou a tocar ainda
criança, mas passaram-se trinta anos até ser descoberto por James
B. Long, um caçador de talentos da época. Foi ordenado ministro
em 1933 pela Convenção Batista Livre em Washington, Carolina
do Norte. Por volta de 1935, Gary Davis gravou seu primeiro dis
co pela American Record Company.
Blind Gary Davis, como ficou conhecido, fazia suas apresen
tações principalmente em reuniões de avivamento. Sua canção
Lord l wish 1 could see [Senhor> eu gostaria de poder ver} ], testemu
nho pessoal da dificuldade de não enxergar, foi gravada pela pri
meira vez em 26 de julho de 1935, mas rejeitada pela gravadora.
Por volta de 1945, o reverendo Gary Davis mudou-se para Nova
York, onde continuou cantando e pregando em reuniões evange-
lísticas ao ar livre e realizando gravações para diversos selos
fonográficos até a sua morte, em 1972.
Algumas das canções também foram gravadas por artistas como
Bob Dylan, Jackson Browne e The Grateful Dead. O legado
musical de Gary Davis pode ser conhecido não somente por suas
gravações, mas também pelo número de guitarristas que apren
deram suas técnicas musicais durante a década de 1960. Bob
Weir, do The Grateful Dead, disse: "O reverendo Davis me ensi
nou, pelo exemplo, a abrir mão dos preconceitos do que pode ou
não pode ser feito com uma guitarra"4.

Blind Willie Johnson

Um dos mais influentes artistas de música gospel e também um


dos maiores guitarristas de todos os tempos a usar a técnica slide**,
Willie Johnson nasceu por volta de 19006, perto da cidade de Temple,
no Texas. Ficou cego aos sete anos, quando sua madrasta lhe jogou
querosene nos olhos para se vingar da surra que tomou do marido
numa briga doméstica. Como bastista devoto e comprometido com
sua fé, Blind Willie Johnson foi um dos mais atuantes cantores

19
religiosos de rua do Texas durante os anos 1920-30; porém, gra
vou apenas trinta canções, entre 1927 e 1930. Ele tocava guitarra
e cantava suas canções com uma voz insistente e rasgada.
De todos os cantores e guitarristas religiosos anteriores à Se
gunda Guerra Mundial, Blind Willie Johnson é aquele cujas gra
vações têm despertado maior interesse dos historiadores musicais
nos últimos anos. Versões de sua canção Nobody's fault but mine
[Não é culpa de ninguém, apenas minha7 ] foram gravadas por The
Grateful Dead, Led Zeppelin, Nina Simone, Black Crowes, den
tre outros. Blind Willie Johnson morreu de pneumonia em
Beaumount, Texas, em 1949.

Washington Phillips

Washington Phillips gravou apenas dezoito canções, entre 1927


e 1929. Ele tinha uma voz suave e tocava um instrumento estra
nho, chamado dolceola, inventado por David R Boyd, de Ohio,
em 1890. Historiadores acreditam que menos de cem desses ins
trumentos foram fabricados e não sabem como um deles chegou
às mãos de Phillips. Aliás, não existem detalhes sobre a sua vida.
O que se sabe, através de suas canções, é que Phillips usou a
música como uma voz profética contra o pecado, a hipocrisia e as
divisões tão comuns entre as igrejas pentecostais de sua época.

Thomas A. Dorsey

Uma das figuras-chave no desenvolvimento da música gospel


moderna, o compositor Thomas Andrew Dorsey ajudou a mes
clar o blues à música gospel contemporânea, pelo que ficou co
nhecido com o pai do gospel Foi ele quem criou a expressão canções
gospel na década de 1920. Antes disso, elas eram chamadas de
canções evangelísticas. Um compositor bastante versátil, Thomas
Dorsey ficou conhecido por Precious Lord [Senhor precioso8 ], de
sua autoria, que foi gravada por artistas como Heavenly Gospel
Singers, Red Foley e Elvis Presley, dentre outros.

20
Nascido em 1899, em Atlanta, na Geórgia, Thomas Dorsey
era filho de um pregador batista. Apesar de ter sido tremenda
mente influenciado pelos hinos do dr. Isaac Watts, Dorsey tam
bém ouvia jazz e blues. Garoto prodígio, aprendeu sozinho a tocar
vários instrumentos, sendo o primeiro deles o piano. Dorsey assu-
miu o apelido de Geórgia Tom ainda jovem; começou a escrever
blues e passou a acompanhar uma de suas lendas, Ma Rainey's
Jazz Band, num dos bares de Al Capone em Chicago. Apesar de
estar envolvido com a música secular, Dorsey mantinha interesse
pelas canções religiosas, particularmente pelas canções com in
fluências de blues do compositor C. A. Tindley, outro pai do gospel
moderno.
Em 1926, enquanto Dorsey se recuperava de uma enfermida
de, seu filho morreu de apendicite aguda. O fato de continuar
vivo, apesar de estar doente havia seis meses, enquanto seu filho
morrera em poucas horas deixou-o muito abalado. Em meio à dor,
Dorsey disse ter recebido a visita de um mensageiro celestial que
o direcionou a escrever Ifyou see my Saviour, tell him that you saw
me [Se você vir meu Salvador, diga-lhe que me viu]. Ele enviou qui
nhentas cópias dessa canção para várias igrejas, mas foi somente
durante a Sessão Jubileu da Convenção Batista Nacional em
Chicago, em 1930, que ela se tornou um verdadeiro sucesso. Im
pressionados, os diretores da convenção sugeriram que Dorsey
vendesse os direitos da canção.
Dorsey compôs copiosamente durante os anos da depressão
americana. Suas canções tinham como objetivo levantar o ânimo
dos abatidos e deram origem ao blues gospel. Além de compor,
deu início e dirigiu vários corais gospel. Entre 1939 e 1944, acom
panhou Mahalia Jackson em apresentações pelos Estados Uni
dos. Dorsey continuou viajando e compondo até meados da
década de 1960, e durante muitos anos foi dirigente da Conven
ção de Cantores Gospel, fundada por ele e Sallie Martin. Morreu
em Chicago, em 1993, com 94 anos.

21
Mahalia Jackson

Mahalia Jackson nasceu, em 26 de outubro de 1911, e cres


ceu na primeira cidade da música negra americana, Nova Orleans.
Foi lá que teve sua introdução à música gospel. Quando a família
se mudou para Chicago, em 1928, suas convicções religiosas se
fortaleceram; ao mesmo tempo, ela passou a conhecer mais da
música negra, tanto cristã como secular. Em 1937, Mahalia co
meçou a gravar para o mercado independente dos selos Race
Records, nos quais permaneceu por quase dez anos. Durante esse
período, ela viajou com o pianista Thomas A. Dorsey, fazendo
sucesso na comunidade negra. Por volta de 1947, Mahalia tor
nou-se a primeira — e ainda hoje a maior — estrela da música a
ser conhecida como gospel. Em 1954, começou a gravar pela
Columbia Records e seus discos fizeram sucesso ao redor do mun
do. Mahalia passou, então, a compartilhar o palco com nomes
famosos como Nat King Cole, Louis Armstrong e Duke Ellington.
O historiador musical Will Friedwald diz acerca de Mahalia
Jackson: "Na década de [19] 60 ela havia definido tanto o seu
campo [musical] que quem usasse as palavras Mahalia Jackson e
música gospel em uma mesma frase corria o risco de tornar-se
redundante"9.
Além da música, Mahalia passou a interessar-se pela educa
ção das comunidades negras e tornou-se uma senhora de negócios,
com sua própria rede de restaurantes. Também passou a usar sua
música em favor do movimento dos direitos civis. Quando Martin
Luther King Jr. foi assassinado em 1968, Mahalia cantou Take my
hand precious Lord [Pegue minha mãot Senhor precioso10} em seu
funeral. Quatro anos depois, esse mesmo hino foi cantado por
uma das muitas artistas influenciadas por ela, Aretha Franklin,
no funeral da própria Mahalia, em janeiro de 1972.

OUTROS ARTISTAS PRECURSORES DO GOSPEL ATUAL

Arizona Juanita Dranes foi talvez a mais influente pianista e


cantora da música gospel. Nascida em Dallas, Texas, em 1906, foi

22
para Chicago em 1926, onde gravou várias sessões até 1928, acom
panhada pelo reverendo F. W. McGee e por Jessie May Hill. Infe
lizmente não existem maior informações sobre ela; sabe-se apenas
que não voltou a gravar após 1928.
Quartetos de capela constituíam uma das mais populares for
mas de música gospel durante a primeira metade do século 20.
The Blue Chips foi um desses quartetos, um grupo misterioso que
gravou três sessões em Nova York, em 1936, com um repertório
de canções cristãs e seculares, acompanhadas por uma pequena
banda de jazz-
Tal combinação de jazz e gospel é algo raro nas gravações reli
giosas da época. Os jornais religiosos das comunidades negras
freqüentemente traziam exortações quanto ao perigo de dimi
nuir a pureza da música gospel ao misturá-la ao jazz e levá-la para
fora da igreja, aos clubes noturnos. Essa mistura de estilos tem
sido mais aceita na música cristã contemporânea, em que todos
os estilos são aproveitados pelo esforço criativo de artistas como
Take 6 e Comissioned.

A INFLUÊNCIA DAS IGREJAS PENTECOSTAIS


NEGRAS NO GOSPEL

Uma das maiores forças na música gospel certamente tem sido


a influência das igrejas de santidade ou pentecostais, especial
mente da Igreja de Deus em Cristo.
A Igreja de Deus em Cristo (Church of God in Christ) foi
fundada em 1885, em Memphis, Tenessee, e é uma das maiores
denominações pentecostais negras dos Estados Unidos. Seu fun
dador, o bispo Charles Harrison Manson (1866-1961), encoraj ava
a música ritmada na igreja como parte da busca pela experiência
imediata e pessoal com Espírito Santo. Ainda que a Igreja de Deus
em Cristo seja a mais conhecida e influente de todas as igrejas de
santidade, há centenas de pequenas igrejas independentes, pois
o movimento pentecostal negro nos Estados Unidos é grande e
complexo. E foram tais igrejas pentecostais que primeiro encora-
jaram o uso de instrumentos musicais no culto, numa época em
que muitas denominações proibiam seu uso.
O presbítero Charles Beck foi um importante ministro
itinerante da Igreja de Deus em Cristo. Ele realizou várias grava
ções antes e depois da Segunda Guerra Mundial, desde sua pri
meira gravação solo em Jackson, Mississippi, até gravações com
seu trompete na congregação. Gravou o último álbum em 1956.
Beck tinha igrejas em várias cidades, incluindo Buffalo e
Jacksonville, na Flórida, e Pittsburgh, na Pensilvânia, mas tam
bém realizou reuniões regulares em tendas e teatros através de
seu país, geralmente levando outros cantores gospel consigo. Ele
morreu em 1966. Seus filhos, que formaram o The Beck Family,
tiveram um disco nas paradas rhythm & blues em 1979. Tony Beck,
o filho que cresceu viajando com o pai e mais tarde foi
contrabaixista para os Dixie Hummingbirds, é um ativo produtor
no cenário gospel atual.
O compromisso de Charles Beck em usar a música para Deus
levou-o a escrever num jornal de Cleveland, em 1956: "Quando
falamos de música na igreja, acredito que tenha de haver ritmo.
E isso eu tenho em minha igreja em Buffalo, onde eu toco trompete,
saxofone, percussão, órgão, piano e muitos outros instrumentos"11.
A herança musical da Igreja de Deus em Cristo é grande e
abrangente, alcançando a influente pianista Arizona Dranes, gran
des solistas femininas, como Rosetta Tharpe e Ernestine Washing
ton, e algumas das estrelas da música gospel contemporânea, como
o cantor Andrae Crouch, a irmã Mattie Moss Clark e suas
talentosas filhas, The Clark Sisters.

Como vimos, a música gospel é um estilo musical próprio. O


termo gospel — cujo significado é evangelho —, usado no Brasil
para determinar a música cristã contemporânea, foi apenas uma
estratégia mercadológica desenvolvida no final da década de

24
1980. No entanto, muito antes disso já havia em nosso país diver-
sas formas de música cristã contemporânea sendo usadas nas igre
jas, tanto nas pentecostais como nas tradicionais.
Extraindo-se a mensagem do Evangelho, uma pequena parte
do que é chamado de gospel no Brasil se enquadra no estilo de
senvolvido pelos cristãos negros norte-americanos. A música gospel
verdadeira é encontrada nas canções de Mahalia Jackson e dos
grupos The Clark Sisters e The Hawkins Family, dentre outros
poucos.

Surge então a pergunta: se não é uma expressão da música


gospel negra norte-americana, então o que é o gospel brasileiro?
O chamado gospel brasileiro é uma renovação musical dentro
da igreja com o objetivo de tornar a música evangélica mais rele
vante para a geração atual. Como veremos a seguir, algo seme
lhante já ocorreu no âmago do cristianismo diversas vezes, estando
freqüentemente associado a um período de reforma espiritual ou
de avivamento da igreja.

25
Avivamento musical

Toda nota, todo tom e toda harmonia são de


origem divina e pertencem anos... Tragam suas
cometas, harpas, órgãos, flautas, violinos, pianos e
tambores ou qualquer outra coisa que produza
melodia. Ofereçam-nas a Deus e as utilizem para
tornar seus corações alegres perante o Senhor.

WlLLIAM BOOTH

Uma revolução musical tomou conta das igrejas brasileiras no


início da década de 1990. A princípio, muitos líderes não davam
atenção a ela, pensando tratar-se apenas de uma moda passagei
ra ou de um movimento regional insignificante. Até que suas
igrejas começaram a ser afetadas. Os jovens que não encontra
ram apoio local para promover suas reuniões gospel debandaram
para outros espaços, onde foram acolhidos de braços abertos, sem
restrições.

Tal fato deu origem a muitas críticas e julgamentos cheios de


mágoa por parte daqueles que perderam um pedaço de sua con
gregação. Pessoas foram feridas, famílias foram divididas, com os
pais numa igreja e os filhos noutra; em meio a tudo isso, alguns
chegaram até mesmo a abandonar a fé cristã. Tudo poderia ter
sido evitado com um pouco de conhecimento histórico.
A revolução musical já acorreu várias vezes na história da
Igreja. Homens como Lutero, que escreveu o hino Castelo forte
para uma melodia popular de seus dias, foram responsáveis por
mudanças e reformas que envolveram a música. Avivalistas, como
os irmãos Wesley, estão na galeria dos que inovaram a música
cristã de seus dias.
Assim, tanto a fé dos reformadores quanto o zelo dos avivalistas
nos legaram uma herança de renovação musical que não pode
ser negada por nenhuma ala da igreja evangélica, seja ela pente -
costal ou tradicional. No entanto, antes de olharmos para a he
rança histórica, devemos penetrar na verdade eterna da palavra
de Deus.

ESTILOS MUSICAIS NA BÍBLIA

Nossa fé está baseada apenas na Sagrada Escritura, sola


Scriptura. Cremos que dela procede a regra de fé e prática. En
tão, precisamos partir dela em busca de instruções sobre quais
estilos musicais devemos usar na casa de Deus.
A Bíblia não nos fornece instruções específicas sobre estilos
musicais. Sabemos apenas que instrumentos de diversos tipos eram
usados pelos judeus, e que os instrumentos eram divididos em
três categorias: cordas, sopro e percussão. Foi Davi quem promo
veu o uso de tais instrumentos, além de instituir os cantores vo
cais e regentes de música (lCr 15.16). Parece, no entanto, não
ter havido nenhuma ordem divina para isso, senão a iniciativa
pessoal e a criatividade de Davi.
Já no Novo Testamento, os cristãos primitivos aparentemente
sequer usavam instrumentos na sua adoração a Deus. Isso por
que o uso de instrumentos no Antigo Testamento estava associa
do com as ofertas e cerimônias do templo, que não aconteciam
nas sinagogas após a Diáspora1. Assim, nos dias de Jesus e dos
apóstolos o canto vocal de capela era o modo usado para louvar a
Deus. Alguns dos chamados pais da igreja chegaram até mesmo
a considerar os instrumentos usados no AT como símbolos da gra
ça cristã (Eusébio, c. 260-340). Somente após a Reforma do sécu
lo 16 é que a adoração com instrumentos musicais voltou a ser
aceita pela igreja.

27
Sendo assim, não podemos recorrer à Bíblia para buscarmos
alguma base sobre que estilo de música devemos usar para a ado
ração a Deus. Apesar de a Bíblia estar repleta de recomendações
e incentivos para que o homem adore ao Criador, a única instru
ção bíblica específica que temos de como deve ser essa adoração
é a de Jesus à mulher samaritana: "Deus é espírito, e é necessário
que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade"
(Jo4.24).
A adoração a Deus, seja ela vocal ou instrumental, em ritmo
de rocky samba, valsa ou qualquer outro, deve brotar do mais
íntimo do ser humano como uma expressão de reconhecimento e
reverência ao Criador. Devemos também notar que a música na
Bíblia não estava restrita somente ao louvor e à adoração, como
veremos mais adiante.
Que outra fonte de informação então podemos usar para ob
ter uma visão cristã sobre o assunto? Resta-nos somente o exem
plo histórico de homens que andaram com Deus, muitas vezes
em tempos de densas trevas espirituais, e ousaram cantar um
cântico novo ao Senhor.

EXEMPLO HISTÓRICO

O historiador musical cristão Donald E Hustad aponta para o


fato de que buscar melodias seculares para tornar a música cristã
mais acessível ao povo é um acontecimento familiar na história
da igreja, estando intimamente ligado a épocas de avivamento
espiritual. Hustad cita, por exemplo, o caso de Ambrósio de Mi
lão (340-397) que desenvolveu um cantochão simples, rítmico e
silábico, que fazia apelo às massas de adoradores incultos e que
provavelmente tinha antecedentes seculares2. Ellsworth diz que
durante os primeiros séculos, a igreja continuamente emprestou
práticas e fontes musicais seculares3.
No entanto, dos séculos 6 ao 16, a música cristã se restringiu
quase que unicamente ao canto gregoriano, um estilo desenvol-

28
vido pelo papa Gregório, o Grande (590-604), composto apenas
de vozes masculinas, cantando em uníssono e sem o uso de ins-
trumentos musicais. A divisão de vozes era proibida, para evitar a
tentação do orgulho e da vaidade.
Francisco de Assis (1182-1226), responsável por um movimento
de reforma na igreja de seus dias, ficou conhecido como o cantor
de Deus por ter considerado a música como parte integrante em
sua missão. Em vez de seguir a tradição da igreja, que permitia
apenas o canto gregoriano, são Francisco buscou as melodias se
culares francesas para compor seus hinos de louvor.
No período da Reforma, Martinho Lutero (1483-1546) fez uso
de melodias seculares para seus hinos e cânticos. Certas fontes
indicam que Lutero usou até mesmo a melodia de um cântico a
Maria em um de seus hinos. Ele considerava a música como o
mais nobre dom de Deus aos homens, ao lado da Teologia. Lutero
devolveu ao povo a Bíblia e a adoração na linguagem vernacular.
is trinta e seis hinos, entre eles Castelo forte (Eirífeste Burg ist
un. Gott), foram escritos em linguagem simples e comum, com
o objetivo de apelar para as massas e ganhar popularidade. Até
mesmo seus inimigos tiveram que reconhecer o impacto dessa
estratégia. O padre jesuíta Adam Conzenius lamentou: "Os
hinos de Lutero destruíram mais almas que seus ensinos e men
sagens"4 .
O reformador suíço João Calvino (1509-64) opunha-se seve
ramente ao uso de instrumentos musicais, cânticos e hinos com
divisões e cujas letras não tivessem sido extraídas diretamente
das Escrituras. Em 1542, a pedido de Calvino, Louis Bourgeois
(1510-61) editou o Saltério de Genebra (Genevan psalter), uma
coleção de versões métricas dos Salmos. E interessante — e até
mesmo irônico — notar que essas versões métricas dos Salmos
foram preparadas por Clemente Marot, um poeta francês que usou
para isso canções populares de seu país. Marot escreveu tais ver
sões não com o objetivo de adoração, mas para o entretenimento
da corte do rei da França, Francisco I. Os salmos tornaram-se tão

29
populares e efetivos na propagação da Reforma, que Marot teve
que fugir da França, buscando refúgio em Genebra.
G. A. Crawford, biógrafo de Bourgeois, disse o seguinte sobre
os compositores da época: "Um compositor daquela época em
pregou seus talentos na harmonia e não na melodia... Dificil
mente existia diferença de estilo entre as músicas sacra e secular,
e a composição muitas vezes significava literalmente mistura"5.
Os salmos métricos tornaram-se a forma exclusiva de adora
ção aceita nas igrejas protestantes da Suíça, Escócia e Inglater
ra. Algumas dessas igrejas chegaram até mesmo a destruir seus
órgãos, num ato de protesto contra o uso de instrumentos musi
cais mundanos, proibindo-o nas igrejas e nas cidades governadas
por elas. A Igreja Escocesa, por exemplo, referia-se ao órgão como
a flauta do diabo. A Igreja Luterana, no entanto, seguia a tradi
ção de Lutero, considerando os instrumentos musicais e a música
como dons de Deus.
Foi somente no século 17 que os hinos voltaram a ser introdu
zidos na igreja, através de Isaac Watts (1674-1748), um jovem
brilhante. Watts, que aos vinte anos já era conhecedor de várias
línguas e acostumado com a poesia e literatura de sua época,
reclamou a seu pai sobre a falta de estética nos salmos métricos.
Como resposta, o pai o desafiou a compor algo melhor. Watts le
vou o desafio a sério e escreveu Behold the glories of the Lamb
[Contemple a glória do Cordeiro], o primeiro de seus mais de sete-
centos e cinqüenta hinos. Ele ficou conhecido como o pai da
hinologia inglesa, apesar das inúmeras críticas que recebeu por
desafiar os padrões estabelecidos para sua época.
Entre outros que ousaram mudar a música da igreja se encon
tram João Wesley (1703-91) e Carlos Wesley (1707-88), em parte
responsáveis pelo avivamento de seus dias, criadores dos hinos
evangelísticos; William Booth (1829-1912), fundador do Exérci
to de Salvação, que foi criticado por usar melodias populares e
instrumentos musicais em suas campanhas evangelísticas; D. L.
Moody (1837-99), um dos maiores evangelistas do século 19, e

30
seu compositor Ira D. Sankey (1840-1908), criadores dos cantos
de testemunho (gospel songs) em linguagem simples e contempo
rânea.

O que levou todos esses homens a desafiar os padrões da épo


ca e introduzir melodias novas na igreja? Moody responde:

Se você tiver canções que alcancem o coração, as igrejas estarão


sempre cheias... Música e cânticos não somente têm acom
panhado todo avivamento bíblico, mas são essenciais para
uma vida espiritual mais profunda. Os cânticos são, pelo
menos, tão importantes quanto a pregação para imprimir a Pa
lavra de Deus na mente das pessoas. Desde que Deus me cha
mou, a importância do louvor através das canções tem crescido
dentro em mim.6

O desejo de tornar a adoração mais relevante ao povo, facili


tando a assimilação da mensagem do Evangelho foi que moveu
os avivalistas a quebrar as barreiras e inovar a música cristã de
seus dias. Ao que parece, todos eles entendiam a música como
um dom da graça de Deus aos homens. Para eles, se uma melodia
fosse boa, mesmo tendo sido escrita por um incrédulo, era um
dom de Deus aos homens. Por esse motivo, eles não tinham a
menor dificuldade em tomar emprestada a melodia secular e
transformá-la em sacra. Essa renovação se repetiu por vezes na
história da igreja. Hustad comenta:

Visto que cremos que o Espírito Santo tem estado presente e


criativamente ativo no mundo desde o Pentecostes, precisamos
reconhecer que o ministério extra-eclesiástico dos reavivamen-
talistas, centralizado em sua personalidade, tem contribuído para
o crescimento e para a renovação da igreja, de Francisco de Assis
até João Huss, os Wesley, D. L. Moody, Billy Sunday e Billy
Graham. Sejam quais forem as suas fraquezas pessoais, de cará
ter, teologia ou método, esses homens foram usados por Deus
para realizar alguns dos seus propósitos. [...] Seria difícil separar

31
a expressão musical da pregação no avivamento; esses dois ele
mentos parecem pertencer-se mutuamente, embora ambos te
nham manifestado a tendência de ser anti-sociais. [...] Cada
período de renovação foi caracterizado por um florescimento de
uma nova hinologia.7

É interessante notar que muitos dos hinos escritos por


avivalistas do passado, cujas melodias foram emprestadas de
cânticos populares, são cantados hoje em dia nas igrejas evangé
licas e considerados como hinos inspirados por Deus. Os irmãos
João e Carlos Wesley, por exemplo, criadores do hino da experi
ência cristã e do hino gospel — evangelístico —, usaram como
fonte de inspiração as melodias de óperas e canções folclóricas
de origem germânica. Um exemplo disso é Mendenbras, cantada
em nossas igrejas com a letra O dia de descanso e júbilo, mas que
ainda hoje pode ser ouvida com suas palavras históricas e secula
res nos jardins de cerveja8 da Alemanha9.
Música nenhuma é intrinsecamente sacra nem secular. O que
hoje é sacro já foi considerado secular ou profano no passado.
Um exemplo dessa verdade é o uso do órgão e do piano nas igre
jas cristãs. O primeiro só aconteceu na Igreja Católica no século
12 e na Igreja Luterana no século 16; o segundo, somente no fim
do século 19. A autorização para se usar o órgão na Igreja Presbi
teriana só aconteceu em 1866. Na época em que esses instru
mentos foram introduzidos nas igrejas, muitos olhavam-nos com
suspeita, como se a igreja estivesse comprometendo-se com o
mundo. Com o passar do tempo, essas mesmas pessoas acabaram
por torná-los sacros.
Tal renovação é necessária, pois os tempos e os costumes mu

dam, e a arte assume novas formas de expressão a cada nova


geração. As verdades da Palavra de Deus são eternas, mas a apli
cação das verdades deve ser feita dentro de contextos históricos
que estão sempre em mutação.

32
DE VOLTA À BÍBLIA

Na verdade, o processo de renovação parece estar acontecen


do desde os tempos bíblicos, como indica Dana Key, músico cris
tão da extinta banda DeGarmo & Key e produtor musical, em
seu livro Dorit stop the music [Não pare a músicai0 ]. Segundo ele,
na própria Bíblia parece haver uma indicação de que algo seme
lhante ocorreu nos dias de Davi:

Aparentemente, o escritor de muitos dos salmos fez o mesmo.


Veja as instruções antes dos salmos 56 (De acordo com a melo
dia Uma Pomba em Carvalhos Distantes), 57, 58 e 59 (De acor
do com a melodia Não Destruas). Essas instruções ao dirigente
de canto dizem qual melodia daquela época servia como bom
acompanhamento para tais salmos.11

Vários textos bíblicos falam de ocasiões em que o povo cantou


algo novo a Deus. Exemplos podem ser vistos no cântico de Moi
sés (Ex 15) e no Magnificat de Maria (Lc 1.46-56). Alguém de
outra época apenas entenderá completamente as letras desses
cânticos se conhecer o contexto histórico em que eles foram es
critos. Assim é também com muitos dos salmos. Por isso, somos
exortados diversas vezes a apresentar a Deus canções novas que
mostrem ao povo de nossa época o que ele tem feito por nós:
"Cantem-lhe uma nova canção..." (SI 33.3); "Pôs um novo
cântico na minha boca..." (SI 40.3); "Cantem ao Senhor um
novo cântico..." (SI 96.1; 98.1); "Aleluia! Cantem ao Senhor
uma nova canção..." (SI 149.1); "e eles cantavam um cântico novo..."
(Ap5.9).
O cântico novo surge dentro de um contexto histórico e fala
ao povo da época sobre algo que Deus tenha feito. Esse tipo de
hinologia tem o poder de revelar que Deus está vivo e presente,
atuando na história humana. Talvez seja esse o motivo pelo qual
a renovação musical parece estar sempre ligada a períodos de
reavivamentos espirituais. Em tais períodos, o povo se volta para
Deus, experimentando novamente os atributos eternos e imutá-

33
veis de seu amor, sua graça, sua misericórdia e sua justiça. Dessas
experiências com Deus, surgem as canções que ajudam na pro-
clamação da mensagem cristã. Como expôs Margaret Clarkson,
em seu ensaio Christian hymnody [Uinologia cristã12], "cada reavi-
vamento e novo movimento cristão tem usado alguma forma de
hinologia para reforçar sua mensagem"13.

As renovações musicais em nossa época são apenas maneiras


de adaptar o louvor e a adoração a formas e estilos musicais con
temporâneos. No caso da música cristã contemporânea, que, como
vimos, foi apelidada de gospel no Brasil, a renovação foi, na ver
dade, fruto de uma revolução espiritual que aconteceu na Amé
rica do Norte no início da década de 1970. No meio da revolução,
houve o processo de renovação da música cristã para torná-la
mais relevante à nova geração. A diferença entre essa renovação
musical e as anteriores é que, com a evolução do mundo moder
no, as mudanças ocorreram mais rapidamente.

34
Música popular
contemporânea

No fim do século 20, a música popular tem-se tornado


uma característica estética de grande parte do mundo
ocidental... um grande empreendimento, em que todos
os anos se gastam bilhões de dólares em música
impressa, gravações e concertos públicos.

DONALD HUSTAD

Antes de analisarmos mais especificamente a revolução que


deu origem à música cristã contemporânea, vejamos o que é e
quais as origens da música popular contemporânea, ou simples
mente música pop, pois foi esta linguagem musical que passou a
ser associada ao Evangelho.
A música popular contemporânea é a música que está ao
alcance de todos, principalmente nos países industrializados.
E a música que toca nas rádios e emissoras de TV, nas boates e
discotecas, nas salas de espera e nos consultórios e que no
mundo todo atrai milhares de pessoas aos shows. É chamada
de música popular porque não exige nenhuma educação mu
sical para ser apreciada por completo, ao contrário da música
erudita.
Os vários estilos musicais que começaram a aparecer nos Es
tados Unidos no século 19 e no início do século 20, e que formam
o que hoje conhecemos como música popy são:
• gospel e spirituals: adaptações mais ritmadas de hinos tradi
cionais;

• blues: música triste e lenta;

• ragtime: música fortemente sincopada;


• jazz- música cheia de improvisações;
• rhythm & blues: blues mais ritmado;
• country & westem: música rural ou interiorana; e

• soul music: música carregada de emoções.

A música gospel desempenhou um papel importante na forma


ção do pop. Na década de 1940, Mahalia Jackson, Clara Ward e
Sister Rosetta Tharpe tornaram o gospel popular com suas grava
ções. Nas décadas seguintes, de 1950 e 1960, dois estilos que
hoje dominam 90% da música popular foram formados: o roclinroll
e o soul.

AS ORIGENS DO ROCK

O rock é hoje o estilo de música mais ouvido ao redor do


mundo. Mais do que isso, como disse Malcom Doney, "o rock
deixou de ser simplesmente um ramo da cultura popular para ser
tornar, possivelmente, a forma artística mais significativa surgida
no século 20"1. Seus acordes podem ser ouvidos em todos os la
dos, desde comerciais de tv e trilhas sonoras de filmes, novelas,
documentários e noticiários até dentro de muitas igrejas evangé
licas, Com isso, a indústria do rock é hoje um negócio milionário,
apesar de o estilo ter nascido num contexto de pobreza e rejeição.
As raízes do rock têm sido remetidas ao século 19, às canções
de trabalho (work songs) e aos gritos campais (field hollers) dos
negros americanos que trabalhavam nas plantações de algodão.
Estes deram desenvolvimento ao blues — cujo significado é tris
teza — como música secular e ao gospel — evangelho — como
música sacra. Na época, os instrumentos usados eram de fabrica
ção caseira, como o violão, o banjo e a gaita-de-boca.

36
No início do século 20, com a migração dos negros para os
centros urbanos do norte dos Estados Unidos, como Chicago,
Detroit e Nova York, o bines tomou uma nova forma instrumen
tal, aliando-se ao jazz- Em seguida, surgiu a comercialização dos
primeiros discos e a expansão da indústria fonográfica.
Mais tarde, já na década de 1930, com a guitarra elétrica
surgiu o rhythm & blues, música feita para ser tocada, como diz
Roberto Muggiati, "nos bares e guetos negros das grandes cida
des, pois era feita sob medida para locais ruidosos, onde se bebia
e conversava em voz alta, obrigando o cantor e a banda a briga
rem com todo aquele barulho"2.
Era essa a música negra secular das décadas de 1930 e 1940
nos Estados Unidos. Uma música cheia de sentimento, tristeza e
lamento; uma música composta por gente simples, para gente sim
ples. Por isso, os temas das canções variavam de problemas sociais
a ilusões amorosas, para esquecer tais problemas.
No entanto, os brancos possuíam sua própria música, pois a
discriminação racial já era forte, principalmente nos estados do
sul. A classe branca dominante, chamada de wasp — tvhite anglo-
saxon protestam, ou seja, protestantes brancos anglo-saxônicos
—, era constituída de pessoas puritanas, que ouviam apenas
música erudita e religiosa, tipicamente tocada ao som do órgão e
do piano.
As pessoas mais pobres, das áreas rurais, preferiam o country &
western, música considerada tão profana e perigosa pela elite pro
testante quanto a melodia dos negros.
O rock nasceu na década de 1950 da fusão desses dois estilos,
o rhythm & blues dos negros com o country & westem dos caipiras
brancos. Bill Halley e seus Cometas foram os autores da façanha.

O ROCKWROLL

Bill Halley não era negro, mas soube usar a energia e o balan
ço da música negra para desenvolver um estilo que apelasse tan-

37
to aos negros quanto aos brancos. Nascido em Detroit, em 1927,
Halley não era um revolucionário tentando seduzir a juventude
americana, ao contrário do que muitos pensam, mas um rapaz
pobre e caipira que tentava ganhar algum dinheiro com sua gui
tarra. E, se misturar a música dos brancos com a dos negros lhe
renderia esse dinheiro, então era isso que ele iria fazer.
Rock around the clock [Rock ao redor do relógio3 ] ficou conhe
cida como a primeira canção de rocknroll. Gravada em 1954 por
Bill Halley e sua banda, Cometas, a música só estourou no ano
seguinte, como trilha para o filme Sementes da violência. Esse fil
me, que expunha "toda a carga de hostilidade no relacionamen
to da juventude marginalizada com o Sistema"4, foi o carro-chefe
da revolução musical criada pelo rock na década de 1950.
Mas foi outro branco, Elvis Aron Presley, nascido em 1935 na
pequena cidade de Tupelo, no Mississippi, que herdou o título
de rei do rock. Os pais de Elvis eram membros da Assembléia de
Deus, onde ele teve sua instrução musical e aprendeu a cantar
canções gospel e spirituals. Em 1954, já morando em Memphis,
Elvis decidiu gravar um compacto para o aniversário de sua mãe.
Ele foi à Sun Records, uma modesta companhia de discos, e gra
vou duas canções populares da época. O dono do estúdio, Sam
Philips, um caçador de talentos, não ficou muito impressionado.
Um ano depois, quando Elvis gravou That's allright mama [Isso
está certo, mamãe5 ], Sam Philips soube que tinha um tesouro nas
mãos. Sam vivia dizendo: "No dia em que eu achar um branco
que cante com a força de um negro, estarei rico"6. Elvis foi o
branco que tornou a música negra acessível a todos numa época
de grande discriminação racial.
Nos anos seguintes o rock'ríroll tornou-se a música da Améri
ca — ou pelo menos da juventude americana. Os jovens não só
passaram a escutar rock, como também começaram a assumir uma
identidade semelhante à de seus ídolos. Aqueles foram os anos
dos rebeldes sem causa. Se escutar rock tornava alguém rebelde,
então era isso que muitos jovens fariam.

38
Acusado de ajudar a propagar a delinqüência juvenil, Elvis
Presley disse:

Se você gosta do rock'ríroll, não pode evitá-lo e, sim, dançar com


ele. Isto é o que acontece comigo... Não vejo como qualquer tipo
de música possa causar má influência nas pessoas. É somente
música. Não posso conceber essa idéia. Muitos jornais dizem
que o rock'ríroll é uma grande influência para a delinqüência
juvenil. Não penso assim. Delinqüência juvenil é algo que não
sei como explicar, mas não vejo como a música possa ter algo a
ver com isto.7

Tanto Bill Haley como Elvis Presley vieram de famílias pobres


e estavam buscando a fama e o dinheiro. Na onda deles, vieram
muitos outros. Os brancos, como Elvis, apelavam para a música
negra; os negros, como Chuck Berry, usavam-se de elementos do
country & western. Tudo o que importava era vender o maior nú
mero possível de discos.
A tragédia decorrente foi que a maioria se afundou nos vícios
e na promiscuidade, tendo uma carreira curta. Muggiati diz:

A maioria desses pioneiros do rock vinha de origens humildes e


infâncias marginalizadas; eles eram mais os veículos de uma
rebelião que estava no ar do que rebeldes assumidos; e, em suas
vidas particulares, se dilaceravam num conflito terrível entre o
Bem e o Mal, fruto de sua formação religiosa e de uma visão
fatalista do mundo, ainda dominante nos Estados sulinos, de
onde veio a maioria deles.8

Edward Plowman fez um comentário interessante sobre como


a igreja enfrentou a explosão do rock na década de 1950:

Mais para a direita, alguns pregadores e evangelistas alertavam


que o rock era parte de uma trama comunista para subverter a
nação. (Ironicamente, se não hilariantemente, pais russos per
plexos estavam, ao mesmo tempo, culpando a decadência oci
dental por despejar o rock entre seus jovens.)9

39
Meio século depois de seu início na década de 1950, o rock
domina a maior parte do cenário musical ao redor do mundo. E,
de certa forma, quase toda música popular atual é denominada
rock pelos críticos. Isso se dá, possivelmente, porque o rock não é
um estilo próprio como o gospel ou o blues, mas uma fusão de
vários estilos em um só.
John Blanchard diz que

em nossos dias, rock é um rótulo que, de forma genérica, abrange


toda a gama de música popular contemporânea [...]. O fato é que
o rocie deriva de muitas correntes e isso o torna complexo. Ele é
o rio Amazonas da música, com muitos afluentes desaguando
no imenso rio de som que estamos ouvindo, e é virtualmente
impossível traçar todos esses afluentes até as suas nascentes.10

E bom lembrar que o termo rock'nroll se refere à música ante


rior a 1964. Depois desse ano, com a ascensão dos Beatles, a música
popular ficou conhecida simplesmente como rock. O escritor Bob
Larson explica o fato da seguinte forma:

O termo generalizado rock introduziu-se como moda desde os


anos [19]60 e faz referência à música posterior aos Beatles [...].
Como produto de músicos conscientizados, o rock é mais de
classe média que seu antecessor, mas os termos rock e rock'nroll
são usados sem distinção por músicos e pelo público comprador
de discos.11

A MÚSICA SOUL

Outro estilo musical que nasceu do gospel e que representa


grande parcela dos ritmos populares de hoje é o soul, um estilo
que reproduz as características vocais do gospel. O soul nasceu no
início dos anos 1960 com Ray Charles, Aretha Franklin e James
Brown.
Ray Charles, cantor e pianista negro nascido em 1930, mistu
rou o estilo vocal do gospel com elementos de rhythm & blues e

40
rocliríroll para ajudar na criação da música soul. Ele foi responsá
vel pela divulgação do novo estilo em 1959, com a canção WJxat
should I say? [O que eu deveria dizer?12].
Aretha Franklin, filha de um pregador de Detroit, ficou
conhecida como Lady Soul, a dama do soul. Treinada como uma
cantora gospel, ela expandiu o estilo nas décadas de 1960 e
1970, durante as quais seus discos se tornaram sucessos interna
cionais.
No entanto, foi o padrinho do soul, James Brown, quem mais
influenciou a música popular com uma carreira que ultrapassou
cinco décadas. Ele é considerado por muitos como o maior artista
negro que já existiu. Sua influência pode ser vista em quase toda
a música negra atual.
Dois estilos musicais que mais vendem discos em todo o mun
do são o rap e o hip hop, uma evolução do /un/c, que por sua vez
veio do soul. A característica principal do rap — termo originado
das primeiras letras de rhythm and poetry, ou seja, ritmo e poesia
— são as letras faladas, em vez de cantadas, e uma forte ênfase
do ritmo sobre a melodia.
Na base de todos esses estilos está o gospel que Aretha Fanklin
e James Brown aprenderam em suas igrejas durante a infância.

A música popular é uma tremenda forma de comunicação de


massa. Mensagens de todos os tipos são transmitidas diariamente
a crianças, jovens e adultos através de artistas, como Elton John,
Lenny Kravitz, Madonna e Britney Spears, ou de bandas, como
Aerosmith, Green Day, The Offspring, Metallica e Linkin Park,
dentre outras.
A comunidade cristã parece estar descobrindo esse poder de
comunicação da música popular para comunicar o Evangelho de
Cristo. Apesar do protesto de muitos, a música cristã contempo
rânea abrange todos os estilos, conquistando cada vez mais espa-

41
ço nas igrejas e nos templos evangélicos ao redor do mundo. Des
ta forma, parece que estamos resgatando para Deus um veículo
de comunicação que há muito estava nas mãos do Diabo.
Como disse o professor de música, dr. Richard Stanislaw:

O rocie invoca especialmente a atenção do cristão por causa de


sua história. A música rock foi primeiramente cristã antes de ter
se tornado propriedade exclusiva da cultura pop secular. Déca
das antes de as estações de rádio descobrirem o rhythm & blues, o
estilo era exclusivamente usado pelo gospel.13

42
Música cristã
contemporânea

Quando eu estava no colégio nos anos [ J9J60, a


música contemporânea com mensagem cristã

simplesmente não existia. Ao contrário de hoje,


naquela época não havia conexão entre a nossa fé em
Cristo e a cultura daqueles dias.

John Styll

A música cristã contemporânea nasceu em meio a uma revo


lução espiritual que varreu os Estados Unidos no final da década
de 1960 e início da década de 1970, levando milhares de jovens
a Cristo. Tal revolução ficou conhecida como Movimento de Je
sus [Jesus Movement] por sua ênfase na pessoa de Jesus e em
seus ensinamentos, no lugar do cristianismo institucionalizado
das igrejas norte-americanas.
Cansados do estilo de vida libertino do movimento hippie e
desiludidos com a idéia de mudar o mundo com sua contracultura,
muitos jovens começaram a buscar no cristianismo a solução para
seus problemas e para a sociedade. Milhares foram batizados nas
praias do sul da Califórnia e em outras partes do país.
Muitos dos jovens que se converteram eram músicos para os
quais sua arte não era apenas mais uma forma de arte, mas um
veículo de expressão de idéias e conceitos. Eles tinham aprendi
do isso com Bob Dylan, Joan Baez e Beatles. O rock foi o maior
veículo de comunicação de idéias da contracultura hippie. Por
esse motivo, aqueles novos convertidos começaram a usar o rock
para transmitir seus novos conceitos e valores cristãos.
John Styll, diretor executivo da revista CCM, diz o seguinte
acerca do surgimento da música cristã contemporânea:

A música cristã contemporânea nasceu do movimento de


contracultura dos anos [19] 60. Hippies desiludidos que encon
traram a resposta em Cristo usaram o seu veículo de comunica
ção mais natural — a música — para proclamar a alegria de sua
salvação e compartilhar Cristo com os outros. Não era música
feita ao som de órgão, no entanto. Era a música que eles conhe
ciam e entendiam.1

Neste sentido, tinha razão o crítico musical Rolando de Nassáu


quando, ao escrever o prefácio de um livro cujo objetivo princi
pal era criticar o rock, acusou algumas igrejas brasileiras de esta
rem trazendo a contracultura para dentro da comunidade:

Lamentavelmente, o rock penetrou no ambiente sagrado das


igrejas. Em visita recente a uma igreja evangélica observamos o
seguinte: não havia órgão, nem piano, mas um conjunto de rock
(guitarra elétrica, violão elétrico, teclados eletrônicos, bateria e
instrumentos de percussão) que acompanhava o canto de um
rapaz e uma moça, cada qual empunhando o seu microfone,
ampliado por um potente equipamento de som; ninguém pos
suía hinário, porque as letras dos corinhos eram projetadas na
parede atrás do púlpito. Era a Contracultura trazida pelos jo
vens e aceita pela igreja...2

O que Nassáu parecia ignorar ou não dar muita atenção, é


que a contracultura hippie da década de 1960 foi um movimento
muito maior que o simples uso de instrumentos elétricos e eletrô
nicos. Além disso, o sentimento que estava por trás daquele mo
vimento não era intrinsecamente mau. É por este motivo que
precisamos analisar a contracultura, a fim entendermos o con-
texto histórico e cultural no qual a música cristã contemporânea
nasceu.

A CONTRACULTURA HIPPIE

O verão de 1967 ficará para sempre na História como o "verão do


amor". Os Beatles haviam lançado o disco Sgt. Pepper's lonely hearts
club band [A banda dos corações solteiros do Sargento Pepper3].
Músicas desse disco, como Getting better [Melhorando] e Shes
leaving home [Ela está saindo de casa], revelavam todo o espírito
hippie da época e tornaram-se hinos da contracultura. Eram os
dias de esperança e utopia, dias em que os filhos floridos — assim
chamados por vestirem roupas coloridas e floridas — invadiam as
ruas Sunset Boulevard e Sunset Strip, em Los Angeles, ou o dis
trito de Haight-Ashbury, em San Francisco, para celebrar o sexo
e as drogas à vontade, em meio a muito rock.
Muito já foi escrito sobre a contracultura, e certamente não
temos espaço aqui para uma análise mais profunda do movimen
to, mas o que muitos cristãos não percebem é que, de fato, aque
les jovens estavam procurando paz, amor, realidade e vida. Eles
rejeitavam o consumismo capitalista, a hipocrisia religiosa e a
superficialidade da cultura americana.
Não havia nada de errado nisso. Obviamente, os meios que
eles usaram para expressar sua busca — palavra muito usada na
época — e as respostas que encontraram não foram necessaria
mente corretos. Mas, como disse John Stott, se os hippies estavam
à procura de paz, amor e realidade, o primeiro lugar que deveri
am ter procurado era a igreja. No entanto, eles ignoravam a igre
ja. Por quê? Stott responde: "Pois, com demasiada freqüência, o
que vêem nas igrejas não é a contracultura, mas o conformismo; não
uma nova sociedade que concretiza seus ideais, mas uma versão da
velha sociedade a que renunciaram; não a vida, mas a morte"4.
O escritor cristão Ronald M. Enroth parece concordar com
Stott em sua análise da contracultura:

45
Para a contracultura, a igreja instituída parecia um gueto con
fortável da classe média, formado por pessoas que se admiravam
mutuamente, enquanto condenavam o resto do mundo, apro
vavam satisfeitos o status quo e sentiam não haver necessidade
de uma crítica radical ao materialismo e à decadência da socie
dade americana.5

Outro que concorda com Stott em sua analise da contracultura


é John Smith, ministro metodista australiano. Smith era pastor
quando os efeitos da contracultura norte-americana começaram
a atrair os jovens de sua terra natal. Após uma transformação em
sua visão cristã do mundo e das pessoas, Smith fundou uma co
munidade na cidade de Melbourne constituída, em sua maioria,
de cx-hippies e motoqueiros ex-foras-da-lei, tornando-se um lí
der conhecido em muitos países de língua inglesa. A história de
como isso aconteceu é relatada com uma tremenda paixão e de
talhes em seu livro On the side of the angeh [Ao lado dos anjos].
Analisando a contracultura hippie, Smith diz:

A igreja, ao lado do Estado, tecnologia e indústria, fazia parte do


pacote que foi descartado pela contracultura. Não significa
va que a juventude da época tinha rejeitado a experiência
religiosa. Ela estava desesperadamente buscando algum sig
nificado autêntico por trás do Universo... Essa busca levaria
muitos a explorar as religiões do Oriente e a mágica do mundo
antigo. A igreja não era uma opção, pois havia vendido seu di
reito de ser para o sistema estabelecido e havia perdido o direito
de falar.6

Don Williams também passou por algumas transformações em


sua vida e em seu ministério ao aventurar-se a um contato com
os jovens da contracultura. Williams pastoreava uma igreja
presbiteriana no sul da Califórnia, no auge do movimento hippie.
Sua experiência com uma jovem chamada Cheryl nos serve como
lição sobre a contracultura:

46
Cheryl levou-me para as ruas. O verão de 1967 encontrou o
mundo hippie em pleno fôlego. Descobri o Hollywood Boulevard
e a Sunset Strip a apenas algumas quadras do prédio da igreja que
me havia servido como um refúgio eficaz da comunidade ao
redor. Era um mundo turbulento, de vestes e condutas bizarras.
Paz e Amor, ideais que freqüentemente significavam apenas sexo
e drogas, ainda expressavam anseios genuínos. Com suas roupas
espalhafatosas e cabelos desarrumados, esses filhos floridos não
estavam apenas descartando a sociedade tecnológica [...], mas
também clamando para serem reconhecidos como pessoas reais,
indivíduos singulares. Eles chamavam uns aos outros de belo,
procurando por aquela beleza interior da qual a Bíblia tão fre
qüentemente fala, em vez dos símbolos de status de uma socieda
de manipuladora de massas.
Fiquei imediatamente impressionado com as conversações
honestas que eram possíveis entre eles. Já não tinha que me
preocupar com minha vestimenta nem escolher minhas pala
vras, buscando cuidadosamente pela oportunidade de falar so
bre Jesus, como fizera nas fraternidades da faculdade. Aqui o
campo estava completamente aberto.
Deus usou Cheryl para ensinar-me muitas coisas no grande
processo de me libertar. Uma semana depois de nos conhecer
mos, ela veio novamente à igreja, correu pelo salão, lançou seus
braços ao meu redor e deu-me um beijo. Sendo um pastor jovem
e solteiro que tentava evitar qualquer tipo de escândalo, fiquei
assustado. Eu me senti como se minha cabeça tivesse girado 360
graus, à procura dos presbíteros da igreja, enquanto todo o meu
corpo congelava. Mais tarde, refletindo sobre o incidente, per
cebi que Cheryl estava apenas sendo ela mesma. Percebi que,
enquanto eu falava de liberdade cristã, Cheryl era muito mais
livre do que eu. Era um mundo novo aquele em que estava en
trando.
Comecei a ouvi-lo. Li seus jornais undergrounds, senti seu
espírito anárquico e escapista, ouvi suas falsas promessas nas

47
drogas alucinógenas e vi o fluxo de religiões orientais oferecer
uma nova espiritualidade a mentes ocidentais cansadas de
pragmatismo e materialismo. Oscilei sob suas críticas amargas
contra a guerra e o racismo. Fiquei envergonhado diante do
silêncio da igreja e lutei contra a tentação de tornar-me defensi
vo. Meu ouvir mais profundo veio com relação a sua música. Ali
comecei a sentir todo o peso de uma revolução cultural e ali
encontrei um segredo: a música é a chave para esta geração por
que a música é o lugar da mídia de massas em que os jovens se
comunicam entre si.7

John Stott, Ronald Enroth, John Smith e Don Williams pare


cem concordar que a contracultura hippie não seria feita de sexo
e drogas se a igreja não estivesse tão distante de seus ideais como
estava na época. Foi necessária outra revolução — desta vez den
tro da igreja — para que aqueles jovens tomassem conhecimento
da possibilidade de encontrar o amor verdadeiro, a paz real e a
verdade absoluta através de Jesus. Essa revolução ficou conheci
da como Movimento de Jesus. John Smith comenta:

Na imagem do Jesus cabeludo [...] eles encontraram um herói


perfeito e apropriado. Pregar Jesus, em vez da igreja, levou ao
surgimento de todo tipo de estruturas eclesiásticas alternativas,
muitas delas baseadas em comunidades. A música rock de Jesus
foi desenvolvida para expressar seus sentimentos.8

O MOVIMENTO DE JESUS

Até a ocorrência do fenômeno Povo de Jesus, a


igreja como um todo tinha ignorado quase por
completo os jovens da contracultura, exceto por
denúncias ocasionais contra eles como exemplos
típicos da decadência de nossos dias.

Ronald M. Enroth

48
Em fevereiro de 1971, a revista americana Look trazia na capa
a foto de um jovem hippie sendo batizado nas águas do Pacífico.
O Movimento de Jesus começava a chamar a atenção da impren
sa ao redor do mundo. O título da reportagem dizia: "O Movi
mento de Jesus está aí". Segundo o evangelista Billy Graham, em
seu livro Jesus e a geração jovem9, dois dos três repórteres da equi
pe da Look que fizeram a reportagem se converteram, de tão im
pressionados que ficaram com o movimento. Outras revistas, como
Newsweek e Life, também publicaram artigos sobre o Movimento
de Jesus. Em junho de 1971, a revista Time publicou uma reporta
gem de doze páginas sob o título "A Revolução de Jesus".
Billy Graham expressou sua opinião sobre o Movimento de
Jesus da seguinte forma:

Há armadilhas. Há temores. Há críticas. Alguns acham ser mui


to superficial, e, em alguns casos, é. Alguns consideram muito
emocional, e, em alguns casos, é. Alguns dizem estar fora dos
limites da igreja estabelecida, e, em alguns casos, está. Mas, mes
mo na igreja primitiva, tais problemas são encontradiços. Pro
curei estudar este movimento e sinto que há vários aspectos
recomendáveis de valor. Uma das coisas interessantes é que é
espontâneo.10

A CAPELA DO CALVÁRIO

Dentre as igrejas que abriram suas portas para os hippies re


cém-convertidos durante o Movimento de Jesus, estava a Capela
do Calvário (Calvary Chapei), do pastor Chuck Smith. Essa igre
ja, que em 1965 tinha vinte e cinco pessoas em sua primeira reu
nião, ultrapassou a marca dos dez mil membros na década de
1970. No período de apenas dois anos, em meados da década de
1970, um número estimado de vinte mil pessoas se converteram
na Capela do Calvário e oito mil foram batizadas. Tal crescimen
to chamou a atenção de vários pesquisadores do Centro para o
Crescimento da Igreja do Seminário Teológico Fuller, em
Pasadena, Califórnia.

49
A revolução começou na Capela do Calvário quando Chuck
Smith, cansado de anos de um ministério infrutífero, decidiu
mudar radicalmente o estilo de reuniões em sua igreja. A nova
fórmula adotada por Smith foi simples:

• ele passou a pregar sermões expositivos;

• mudou os hinos antigos por canções com melodias con


temporâneas; e

• começou a receber as pessoas do modo como elas estavam,


sem pré-requisitos para salvação.

Em seu livro Harvest [Colheita], Chuck Smith diz como teve


que confrontar a congregação para realizar tais mudanças:

Não quero que jamais digam que pregamos um tipo de experiên


cia cristã fácil [...]. Mas também não quero cometer o mesmo
erro que as igrejas de Santidade cometeram vinte anos atrás.
Sem que soubessem, elas assustaram e perderam uma geração de
jovens com um evangelho do tipo não faça isso e não faça aqui
lo. Que nós não sejamos culpados do mesmo erro. Ao contrário,
vamos confiar em Deus e enfatizar o trabalho do Espírito Santo
dentro de cada vida. É animador, muito mais real e natural,
deixar que o Espírito dite as mudanças. Que não sejamos culpa
dos de forçar às pessoas a nossa subcultura cristã ocidental de
rosto barbeado, cabelo curto, terno e gravata. Queremos que a
mudança venha de dentro para fora.11

Quando os diáconos da igreja quiseram impedir os hippies de


entrar descalços na congregação, Chuck Smith disse:

Se por causa de nosso carpete macio vamos ter de fechar as


portas para os jovens descalços, então eu pessoalmente sou a
favor de arrancar todo o carpete e deixar o piso só no concreto.
Se, por causa dos jeans sujos, temos que dizer a um jovem "La
mento, você não pode entrar... seu jeans está muito sujo", então
sou a favor de nos livrarmos dos assentos estofados. Vamos com-
prar bancos ou cadeiras de metal, ou algo que possa ser lavado.
Mas que nunca, nunca, possamos fechar as portas para alguém
por causa de suas vestes ou de sua aparência.12

Depois de Chuck Smith ter rompido a última barreira, cente


nas de hippies descalços e cabeludos começaram a encher as filei
ras do templo, que teve que ser aumentado muitas vezes para
comportar as massas que se seguiram.

JESUS MUSIC

Os jovens de Jesus [Jesus kids] querem os ensinamentos


bíblicos, não os preceitos de uma instituição que é mais
influenciada pelos desejos culturais e sociais de seus
membros do que pelo discipulado e estilo de vida
cristão ensinado na Bíblia.

Roger C. Palms13

Milhares de jovens se converteram durante o Movimento de


Jesus. Muitos deles deixaram a imagem hippie e se tornaram yuppies
— jovens urbanos profissionais. Muitos se uniram a igrejas tradi
cionais e muitos outros se desviaram e caíram. Alguns formaram
comunidades e continuam vivendo como hippies cristãos, servin
do a Deus e ao próximo. Dentre estes, podemos destacar a comu
nidade Jesus People USA (jpusa) de Chicago e os Sojourners de
Washington d.C. Embora diferentes no aspecto prático e teológi
co, tais comunidades sobreviveram e mantêm suas característi
cas principais desde os dias do Movimento de Jesus.
No entanto, a maior herança deixada pelo Movimento de Je
sus foi a nova linguagem musical que brotou no âmago daquela
revolução: a Jesus music, música de Jesus.
O que era a música de Jesus? Era simplesmente a música con
temporânea com mensagens do Evangelho. Com o passar do tem
po, a expressão Jesus music foi substituída por CCM, de contemporary
christian music, a música cristã contemporânea.

51
Foi a partir de 1965, quando um musical de Ralph Carmichael
foi usado por Billy Graham no filme The restless one [O incansá
vel1* ], que o Evangelho começou a ser comunicado em sons con
temporâneos. Dois anos depois, em 1967, os estudantes John
Coates e Bill Hartman se rebelaram contra a música sacra tradi
cional da Universidade John Brown, no Arkansas, e formaram o
primeiro grupo de ]e$us music da história. Eles organizaram um
coro de vinte pessoas, chamado The Sound Generation, e, usan
do melodias pop, baterias e guitarras, começaram a desfilar no
cenário musical com o Evangelho, alcançando milhares de pessoas
com seu testemunho.
Em 1969 surgiu o grupo Love Song, um dos maiores represen
tantes da Jesus music. Liderado por Chuck Girald, o Love Song
foi formado a partir da amizade de Chuck com os outros membros
da banda: Tommy Coomes (guitarra solo), Fred Fields (violino e
guitarra), John Mehler (bateria) e Jay Truax (baixo).
Chuck Girald cresceu em ambiente católico, mas abandonou
o lar e a igreja aos quinze anos em busca de aventuras com um
grupo musical itinerante. Após ter-se envolvido com drogas e
tentado encontrar respostas no budismo, Chuck e seus amigos
converteram^se a Cristo na Capela do Calvário, em 1970. A par
tir de então o Love Song tornou-se uma banda cristã.
O Movimento de Jesus estava ganhando força e muitos artis
tas famosos, como Barry McGuire, Eric Clapton e Johny Cash,
voltaram-se para Cristo. Vieram então os festivais de Jesus music,
sendo o primeiro grande festival provavelmente o Faith Festival
de Indiana, em março de 1970, que reuniu cerca de seis mil pessoas
para ver Pat Boone como atração principal. Dois meses depois, a
Universidade de Stanford, na Califórnia, abrigou o Sweet Jesus
Roll away the Stone (or Rock) Concert, mais um encontro mar
cante na história da Jesus music.
Edward Plowman afirma que a "revolução começou em várias
frentes durante os anos 1960 [...] mas não atingiu um desempe
nho significante antes de 1969"15.

52
POR QUE DEVERIA O DIABO TER TODA A BOA MÚSICA?
Em 1969, Larry Norman gravou Upon this rock [Sobre esta ro
cha] pela Capitol Records, trabalho que ficaria conhecido como
o primeiro disco de rock cristão da história da música. Norman
converteu-se na adolescência e, embora tenha vivido em Haight-
Ashbury, sede do movimento hippie na Califórnia, não se envol
veu com seu estilo de vida promíscuo. Nessa época, Larry era o
vocalista do grupo People, que teve uma canção nas paradas de
sucesso americanas (Top 40) em meados da década de 1960.
Quando o grupo se dividiu, Larry decidiu que iria cantar somen
te para Jesus. Emprestando as palavras de Lutero para sua canção
Why should the devil have ali the good music? [Por que deveria o
diabo ter toda boa música!], ele deu início oficial ao que passou a
ser conhecido como rock cristão.
Para Larry, o rock era o veículo adequado para expressar o
que Deus estava fazendo em seus dias. Ele disse: "Um renascimento
espiritual está acontecendo hoje e o Espírito Santo está na raiz
disso... e os jovens estão expressando sua felicidade profunda atra
vés do rock"lt.
John Reid Kennedy, líder estudantil de uma igreja fundamen-
talista, impressionado com o trabalho de Larry Norman, fez a se
guinte declaração acerca de seu disco Upon this rock:

Larry Norman transformou a vaidade dos Beatles, a blasfêmia


dos Rolling Stones, os suspiros existencialistas de The Doors e
a euforia das viagens das drogas de Simon e Garfunkel em um
cântico alegre ao Senhor. E não são necessárias explicações ou
interpretações da capa do disco para se entender a mensagem. O
álbum prova que o ritmo do rock pode e deve ser redimido.17

MYLON LEFEVRE

Um ano mais tarde, em 1970, Mylon LeFevre, um cantor cujas


raízes gospel na família The LeFevres vinham desde 1921, gravou
um disco com canções que combinavam a mensagem do Evange-

53
lho com melodias de rock. O talento artístico de Mylon já tinha
sido reconhecido por Elvis Presley, que gravou uma de suas com'
posições, Without him [Sem ele18].
Sendo assim, o disco foi bem recebido e Mylon logo subiu nas
paradas, conseguindo um contrato com a Columbia Records. Mas
Mylon não estava tão firme em sua fé cristã e, apesar de ainda
aparecerem referências ao Evangelho em seus discos posteriores,
elas foram diminuindo cada vez mais.
Em 1972 Mylon gravou seu terceiro disco, Over the influence
[Sobre a influência19], que o levou definitivamente para as para
das de sucesso, abrindo shows para The Who, Pink Floyd, Bob
Seger, Jethro Tull, Traffic, Grand Funk e outros. Nessa época
Mylon começou a flertar com as drogas também — da maconha à
cocaína e heroína. Em meio a tudo isso, Mylon ainda se lembrava
de Deus e continuava a falar sobre Jesus em seus concertos. Dana
Key foi um dos que ouviu seu testemunho e se converteu, vindo a
formar anos mais tarde o famoso grupo cristão da década de 1980,
DeGarmo & Key, em parceria com Eddie DeGarmo. Mylon co
menta sobre essa época: "Nós nunca subíamos ao palco sem orar.
Na maior parte do tempo estávamos drogados, mas eu me lembro
de ter orado 'Senhor, por favor não me deixe morrer em meu
pecado. Eu preciso de ajuda. Me ajude, em nome de Jesus'"20.
Em 1979, Mylon finalmente entregou sua vida a Jesus, aban
donando as drogas. Após a conversão, ele passou quatro anos
estudando a Bíblia e esperando por uma direção de Deus sobre o
que fazer de sua vida. Durante esse tempo, Deus mostrou-lhe o
novo rumo que sua música deveria tomar. Mylon diz:

O TocWnroü poderia ter me matado. Quando entreguei minha


vida ao Senhor, eu abandonei a música. Era algo importante
demais para mim. Era um ídolo. Era o meu modo de chamar a
atenção das pessoas, e eu estava viciado nisso. Mas Deus mos
trou-me: "Eu não me importo com sua música. Eu posso fazer as
rochas me louvarem. Todo joelho um dia se dobrará, quer queira

54
ou não. Você é que tem problema com o rocWnrolL Eu realmente
não preciso disso, tudo o que eu quero é teu coração. Mas agora
que teu coração está correto, continue tocando rock".21

Na música M;y heart belongs to him [Meu coração pertence a


ele], gravada após a sua conversão, no disco More [Mais22 ], Mylon
relata a experiência de conversão:

Minha mente tem sido um campo de batalha,


onde muitas guerras foram travadas.
Minha alma tem sido um mercado,
onde outros vendiam e compravam.
Mas através dos anos solitários e desperdiçados
havia Alguém que conhecia meus temores ocultos
e notava as lágrimas escondidas.
Agora meu coração pertence a ele.
Eu dei meu coração a Jesus.

Mylon LeFevre e sua banda The Broken Heart tornaram-se


um dos mais famosos grupos cristãos de pop rock da década de
1980 nos Estados Unidos.

Seguindo o exemplo Larry Norman e Mylon LeFevre, muitos


cantores cristãos e outros músicos que se converteram ao cristia
nismo durante aqueles anos do Movimento de Jesus começaram
a usar a música popular cada vez mais como veículo de divulga
ção do Evangelho, dando origem ao que hoje é conhecido como
música cristã contemporânea.

55
A música cristã
contemporânea no Brasil

No Brasil, a música evangélica era quase


exclusivamente importada, traduzida do inglês, mas
por volta de 1950 houve uma explosão de corinhos em
ritmo de marcha, usados nas campanhas de
evangelização. Mais tarde, as igrejas pentecostais
tornaram-se responsáveis pela utilização de ritmos
nordestinos, toadas sertanejas e guarânias na música
evangélica, e mais recentemente a onda do rock
evangélico também alcançou o Brasil

DONALD HUSTAD

Apesar de não ser um resultado direto do Movimento de Je


sus, os primeiros acordes contemporâneos a serem ouvidos no
Brasil, transportando uma mensagem do Evangelho, também sur
giram na década de 1970. Nesse período, grupos musicais cris
tãos estavam desafiando as regras do tradicionalismo rígido,
trazendo estilos e melodias contemporâneas para dentro das igrejas
brasileiras. Isso tudo muito antes da expressão música gospel ter
sido adotada pelos evangélicos brasileiros na década de 1990. Na
verdade, o termo gospel, pelo qual a música cristã contemporâ
nea brasileira foi denominada, fazia parte de uma estratégia
mercadológica elaborada no início daquela década.
O fato de não haver revistas especializadas em música cristã
durante esses anos no Brasil torna as informações sobre os grupos

56
e artistas brasileiros pouco documentadas e raramente divulgadas.
Isso contribuiu para que muitos dos que entraram na onda do
gospel desconhecessem quase que totalmente alguns dos precur
sores dessa revolução musical no país.

LUIZ DE CARVALHO

Muito antes de os grupos evangélicos das décadas de 1970 e


1980 desafiarem a música cristã com ritmos populares, Luiz de
Carvalho já se estabelecia como um dos pioneiros do disco evan
gélico no país. Cantor, mesmo antes de conhecer a Cristo, ele
ousou inovar quando introduziu o violão na igreja, numa época
em que somente o órgão tinha acesso livre. Com seu estilo popu
lar e inspirador, foi quebrando as barreiras do tradicionalismo e
conquistando os corações dos ouvintes em apresentações em que,
cada vez mais, pessoas se entregavam a Cristo.
Logo as apresentações de Luiz de Carvalho se tornaram ver
dadeiras cruzadas evangelísticas, com louvor e pregação da Pala
vra de Deus, levando-o a mais de vinte e dois países e a uma
marca de setenta discos gravados, dos quais cinqüenta e cinco
sendo LPs. O disco Meu tributo rendeu-lhe o prêmio de Disco de
Ouro e Obra santa tornou-se um dos mais vendidos no mercado
evangélico durante muitos anos.
Apesar do gosto pelas inovações, Luiz de Carvalho prefere
canções que falem ao coração e que aproximem as pessoas de
Deus. Talvez seja essa a razão pela qual se podia encontrar um
disco seu em quase todo lar evangélico do Brasil na década de
1970.

OS GRUPOS MUSICAIS

Um dos primeiros discos de música cristã contemporânea a


ser gravado no Brasil foi Viajem (sic), dos Jovens da Verdade, em
1973. Liderados por Jasiel Botelho, os Jovens da Verdade esta
vam dispostos a fazer "músicas para a nova geração de Jesus", nas

57
palavras deles, impressas na contracapa do lp. Eles eram os ecos
do Movimento de Jesus no Brasil, convidando os jovens a embar
car na "viagem de Jesus".
Na mesma época, outro grupo de jovens que estava usando a
música como veículo para transmitir a mensagem do Evangelho
era o Vencedores Por Cristo. Um ministério fundado pela Sepal1
no Brasil em 1968, o VPC percorreu o país com equipes de jovens
realizando trabalhos evangelísticos e desbravando fronteiras mu
sicais. Seu primeiro lp, Fale do amor, foi gravado em 1970 e usava
o sistema monofônico, ou seja, apenas um canal de áudio. Em
1973, as equipes do VPC já tinham percorrido trinta e três mil
quilômetros de estradas pelo Brasil. Havia muita história para
contar das experiências vividas.
Nesse clima, saiu o lp Se eu fosse contar, apontando um novo
rumo na música evangélica brasileira. Algumas canções eram tra
duções e versões de músicas do cantor americano Ralph
Carmichael. As canções desse disco foram cantadas em todo o
Brasil nos seis meses de viagem missionária da equipe. Mas so
mente em 1978, com o lp De vento em popa, o vpc ampliou os
horizontes e abriu espaços para uma musicalidade brasileira que
seria seguida por muitos artistas no país. Liderado pelo pastor
Jayme Kemp e usando a musicalidade de Guilherme Kerr, Aristeu
Pires Jr., Gerson Ortega, Nelson Bomilcar, Sérgio Pimenta, den
tre outros, os Vencedores Por Cristo ajudaram grandemente a
formar as bases para a revolução que viria quase duas décadas
mais tarde na música cristã em nosso país.
Além deles, outros grupos, como ELO e S-8, ajudaram a trazer
a música contemporânea para dentro das igrejas evangélicas bra
sileiras ainda na década de 1970.
O Grupo elo foi formado em 1976 pelos amigos de seminário
Jayro Trench Gonçalves — conhecido como Jayrinho — e Paulo
César da Silva, juntamente com suas mulheres. Juntos, eles pro
duziram músicas do mais alto nível no cenário evangélico de sua
época, lps como Calmo, sereno e tranqüilo, Ouvi dizer..., Novaje-

58
rusalém e Nova canção tornaram-se clássicos da música cristã bra
sileira. Quando a carreira do elo foi interrompida, com a morte
trágica de Jayrinho e sua família em 1981, Paulo César seguiu
adiante com o Grupo Logos, que gravou diversos discos na déca
da de 1980.
Embora não tão conhecido quanto o Grupo elo, o S-8, forma
do por membros da Comunidade S-8 em Niterói (rj), também
desafiou padrões em seus trabalhos musicais desde o início da
década de 1970. A Comunidade S-8 começou em 1971, quando
as portas da casa do ex-governador do Rio de Janeiro, Geremias
de Mattos Fontes, foram abertas para receber jovens que estavam
lutando contra o mal das drogas. Discos como Quem deseja ser
criança (1978), O que virá? (1979) e Apelo à Terra (1983) traziam
um estilo totalmente próprio e, ao mesmo tempo, recheado de
letras poéticas e revolucionárias, sem perder a singeleza de uma
fé quase infantil. Exemplos disso podem ser vistos nos trechos das
seguintes canções:

Deus nega o poeta


Que proclama a falsa libertação,
Que enfeita o lixo do seu peito
E rejeita o renascer.

(Você precisa renascer■, do LP O que virá?)

E você, que pensou que o que os dias prometem


É o paraíso!...
Que traçou as rugas do seu rosto, com infames paixões!...
E agora em meio a tanta gente, como uma ilha distante,
Você está sói
(Jesus é o amigo, do lp Apelo à Terra)

Foi Ele quem me fez entender


Quando eu brigava com os porquês,
Quando eu achava tudo um caos!

59
Foi Ele quem me compreendeu
Quando ninguém me entendia mais!
Eu era um louco na multidão!
Foi Ele quem me tomou pela mão
Quando eu andava sem direção,
Sem um amigo pra me apoiar!
Foi Ele quem me fez tão feliz
E tão criança em suas mãos
E tão guardado em seu coração.
Foi Ele quem me trouxe p'ros seus filhos
E nós choramos juntos e sorrimos juntos!
Meu pouso! Meu tesouro! Meu Jesus querido!
(Jesus querido, do lp Apelo à Terra)

Todos esses discos, tanto os dos Jovens da Verdade como os


do ELO e S-8, eram produções independentes, lançados pelas
próprias bandas. Alguns foram remasterizados e lançados em CD,
preservando, assim, uma página importante da música cristã con
temporânea brasileira.

JANIRES E O REBANHÃO

Por volta de 1977, Janires Magalhães Manso montou uma banda


de rock e começou a fazer shows em São Paulo em cima da
carroceria de um caminhão. Um dia alguém comentou que ele
estava fazendo um rebanhão de Jesus. Nascia, então, um dos gru
pos musicais que causou mais polênia na música cristã brasileira
na década de 1980: o Rebanhão.
Liderado por Janires, o Rebanhão nasceu em São Paulo, mu-
dando-se depois para o Rio de Janeiro. A partir da mudança de
cidade e com a formação que incluía Pedro Braconnot no tecla
do, Kandel Rocha na bateria, André Marien na guitarra, Paulinho
Marotta no baixo, Carlinhos Félix na guitarra e vocais, o Rebanhão
gravou seu primeiro disco, Mais doce que o mel, em 1981, lançado
pela gravadora Doce Harmonia. Esse disco foi tão revolucionário

60
que recebeu acusações de conter mensagens invertidas (backward
messages1). Sem se importar com as críticas, Janires e seus com
panheiros seguiram adiante, desafiando os conceitos e precon
ceitos de como deveria ser a música cristã. O grupo trazia uma
mistura de ritmos que iam do baião ao roácnroll.
O segundo lp foi Luz do mundo (1983, Arca Musical), com um
som mais amadurecido. O disco foi muito bem recebido e chegou
a ter algumas de suas canções tocadas em rádios FM seculares do
Rio de Janeiro.
O músico cristão Martinho Lutero expressa assim a influência
que o Rebanhão teve na vida de muitos músicos e jovens brasi
leiros: "O Rebanhão foi o motivo para muitos jovens despertarem
a cantar, compor com mais ousadia, tocar bateria, serem
irreverentes e corajosos e sem medo de represálias por serem au
tênticos e falar o que estavam sentindo"3.
Em 1984, Janires reuniu alguns amigos e gravou um disco ao
vivo, celebrando os dez anos da sua conversão. O lp Janires e
amigos foi gravado no auditório da rádio Boas Novas, do Rio de
Janeiro. As letras de músicas como Casinha, Alex e Baltazar não
encontram nada semelhante na música cristã brasileira até hoje.
Nessa mesma época, Janires deixou o Rebanhão e foi traba^
lhar com a mpc (Mocidade Para Cristo) em Belo Horizonte, onde
formou a Banda Azul e gravou Espelho nos olhos, em 1986. Janires
começou a viajar para diversas partes do Brasil, compartilhando
o Evangelho de Cristo com milhares de jovens, usando suas ex
pressões irreverentes e sua música inteligente. Foi voltando de
uma dessas viagens, durante a noite, que o ônibus no qual viaja
va colidiu com outro veículo, ceifando-lhe a vida, em janeiro de
1988.
De pertences pessoais Janires deixou apenas uma velha bolsa
de couro e um violão Ovation. Mas, através de seu testemunho
de vida, ele deixou um desafio às próximas gerações de músicos
evangélicos brasileiros quanto ao uso da música contemporânea
na igreja. Suas letras estão entre as mais criativas e inteligentes

61
de todo o repertório nacional. Como ele, poucos são aqueles que
têm manifestado tamanha genialidade na arte de compor.
Em 1991, o jornal evangélico do Rio de Janeiro Graça ePaz fez
a seguinte menção a Janires: "Um dos maiores talentos de todos
os tempos... Um dos compositores que mais polemizaram a músi
"4
ca sacra

NOS ANOS RECENTES

Seguindo o exemplo do Rebanhão, muitos grupos começaram


a despontar em todo o país ainda na década de 1980, formando o
que mais tarde seria conhecido como música gospel. Dentre os
mais conhecidos estão: Sinal de Alerta, Banda e Voz, Complexo
J e Fruto Sagrado, do Rio de Janeiro; e Kadoshi (ex-Atos-2), Ofi
cina G-3, Banda Gerd, Banda Rara, Katsbarnéa e Resgate, de
São Paulo.
Apoiados por um forte esquema de publicidade, por emissoras
de rádio e programas de TV, esses grupos alcançaram uma plata
forma de exposição pública muito mais elevada que seus
antecessores. Bandas, como Resgate e Oficina G-3, e artistas,
como Carlinhos Felix e Brother Simion, passaram a viajar por
todo o Brasil e até para outros países e continentes, tocando em
centenas de lugares anualmente.
Na pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em novembro
de 1993, a rádio Imprensa FM, que na época transmitia a progra
mação gospel, figurava em décimo quinto lugar entre as mais ou
vidas de São Paulo.
No Rio de Janeiro, os artistas cristãos começaram a ocupar
espaços como o Canecão — o mesmo lugar onde se apresentam
astros da música popular brasileira, como Caetano Veloso e
Roberto Carlos.

AS GRAVADORAS

A distribuição de discos no Brasil era precária até o final da


década de 1980, contribuindo ainda mais para que muitos grupos

62
fossem conhecidos apenas em seus estados ou regiões. Era muito
difícil, por exemplo, comprar um disco do grupo Banda e Voz em
São Paulo, ou do Atos-2 no Rio de Janeiro. Isso para não dizer da
dificuldade encontrada em outros estados.
As duas gravadoras que trouxeram os primeiros discos de
música cristã contemporânea internacional para o mercado bra
sileiro foram a Arca Musical, do Rio de Janeiro, e Music Maker,
de Belo Horizonte. O primeiro disco de rock cristão pesado a ser
lançado no Brasil foi Not of this world [Não deste mundo5], do
Petra, em 1986, pela Music Maker.
A Bom Pastor, formada em 1971 por Elias de Carvalho, filho
do cantor Luiz de Carvalho, tornou-se a maior gravadora e distri
buidora de música cristã contemporânea do Brasil. A Bom Pastor
é composta de várias lojas, uma editora literária, uma editora
musical e a gravadora Bom Pastor, considerada a maior gravado
ra da América Latina, com mais de quatrocentas matrizes. Ou
tras gravadoras, como a Line Records e a Gospel Records, também
têm sua parcela na distribuição do gospel nacional.
A mais popular dentre as duas, a Gospel Records, foi criada
em 1990, visando ao mercado emergente e promissor da música
cristã contemporânea. Os shows de música gospel, lotando espa
ços como o Canecão no Rio de Janeiro e Dama Xoc em São Pau
lo, indicavam o sucesso garantido. Entre 1990 e 1991 a Gospel
Records lançou dez discos de música gospel nacional e inter
nacional, começando pelo lp Princípio, do Rebanhão. No final de
1995, os lançamentos já chegavam a sessenta títulos.

OS EVENTOS

Além das emissoras de rádio e das gravadoras especializadas


em divulgar a música cristã contemporânea, os artistas e as ban
das começaram a contar com todo um sistema de shows e festi
vais de grande porte. Infelizmente, alguns desses festivais são
planejados segundo interesses próprios de gravadoras e igrejas e,

63
por isso, falham ao apresentar o amplo panorama da música cristã
contemporânea no Brasil.
O maior de todos os eventos de música cristã no Brasil na
década de 1990 foi o S.O.S. da Vida. Realizado durante vários
anos em São Paulo, o evento chegou a reunir aproximadamente
cem mil pessoas em sua quarta edição, em setembro de 1994. No
Rio de Janeiro, o Gospel Power Festival de 1993 foi o maior even
to de música cristã realizado naquela cidade até então.

A música cristã contemporânea encontrou definitivamente


seu espaço no Brasil. Cada vez mais, igrejas e líderes cristãos
apoiam a iniciativa de conjuntos com ritmos contemporâneos e
promovem reuniões com música contemporânea para atrair os
jovens. Com isso, cresce também o número de bandas e artistas.
Um festival de música gospel promovido pela Gospel FM de São
Paulo, em 1993, chegou a receber mais de trezentas fitas de dife
rentes grupos. Mas, ainda assim, há muitas críticas com relação
aos estilos usados pela música cristã contemporânea, principal
mente o rock. Muitos acham que certos estilos não servem para o
uso na igreja. Infelizmente, como veremos adiante, grande parte
dessas críticas é fundamentada em preconceitos, opiniões pesso
ais e falsas premissas.

ívl
Segunda parte

A diferença

Música é uma força muito poderosa. Possui um modo


de quebrar barreiras. Algumas vezes, quando um
pregador ou um livro não consegue, a música
consegue. Mas muitos artistas estão usando essa
ferramenta poderosa com letras horríveis e negativas, e
estas letras estão penetrando nos corações dos ouvintes
e moldando seus valores... Por que não podemos
tomar esta mesma força — música —, colocar letras
positivas e começar a moldar valores com ela!

Sandy Patti, cantora

Em janeiro de 1989, quando eu trabalhava como missionário


na Operação Mobilização, tive uma experiência que me ensinou
a diferença entre o uso da música para fins benéficos ou maléfi
cos. Na época, encontrava-me em Amsterdã, trabalhando nas
reformas do navio Logos II, que havia sido adquirido para substi
tuir o Logos que naufragara um ano antes, no canal de Beagle.
Éramos um grupo de quarenta e cinco pessoas trabalhando doze
horas por dia, tentando acabar logo as reformas para navegar ao
redor do mundo anunciando o Evangelho.
Um dia, após o expediente de trabalho, um jovem sueco cha
mado Max convidou-me para ir a um show de rock no centro da
cidade. Como estava interessado no assunto, decidi não perder a
oportunidade. Mesmo não estando acostumado ao frio do inver
no europeu, achei que valia a pena sair naquela noite para ver o
show. Além do mais, estava curioso para dar uma volta pela cida
de, uma vez que havia chegado recentemente. Uni-me ao grupo,
que encheu um furgão em direção ao centro.
Amsterdã é uma cidade linda, cortada por mais de cem ca
nais e cheia de construções antigas, museus e igrejas que exibem
sua arquitetura encantadora. Mas é também uma cidade de
inigualável promiscuidade sexual.
Quando chegamos ao local, fiquei conhecendo um pouco mais
da vida noturna do centro da cidade. O show seria realizado
num barco atracado no canal atrás da estação central de trens.
As águas tranqüilas do canal, refletindo o brilho das luzes da
cidade, podiam enganar um novato como eu quanto à tranqüili
dade daquela área. O lugar onde estacionamos estava cheio de
travestis, prostitutas e viciados em drogas. Ao entrar no barco
tive a impressão de estar entrando em um clube punk londrino. O
local era pequeno, estreito e estava infestado de fumaça de ci
garro. Jovens cheios de tatuagens e com cabelos exóticos conver
savam em meio à música de fundo de uma banda cristã de punk
rock. Eu me senti meio fora de lugar, com o cabelo curto e a roupa
bem arrumada.
Mais alguns minutos de espera e alguém anunciou a banda da
noite: No Longer Music. Mesmo sem querer, fui levado pela onda
de corpos que se espremiam em direção ao palco. Nos trinta mi
nutos seguintes, fui assaltado por uma avalanche sonora, enquanto
tentava ler as letras das canções que eram projetadas na parede:
Punks vieram nos matar, mas Teu poder os paralisou... Terroristas
pediram pra nós tocarmos, mas Teu amor dissipou todo terror...
Quando a música parou, todos se sentaram no chão, e então
David Pierce, o vocalista do grupo, pregou uma mensagem ousa
da do Evangelho. Para minha surpresa, ninguém fez sinal de ir
embora. Pelo contrário, vários se dirigiram à frente quando ouvi
ram o convite para conhecer Jesus. Mais uma vez o milagre da
salvação acontecia e a graça de Deus superabundava aos peca
dores. O sho<w, na verdade, era um trabalho evangelístico de um
grupo de cristãos punks da Jocum* em Amsterdã. Por trás das
tatuagens e dos cabelos exóticos, encontravam-se jovens com um
tremendo desejo de compartilhar o amor de Deus para a juven
tude perdida daquela cidade do pecado.
Ao me deitar naquela noite, gastei um tempo refletindo sobre
aquilo que havia presenciado. Várias perguntas se formavam em
minha mente. Qual a diferença entre aquele show que eu havia
presenciado e as dezenas de shows que aconteciam em outras
partes da cidade? Certamente não era a música. De fato, não
havia nenhuma diferença musical entre bandas como o Suicidai
Tendencies, The Clash, Bad Religion e aquela que eu havia es
cutado. O estilo era o mesmo, a energia era a mesma e o público
tinha a mesma aparência. Mas havia diferenças. Quais?
Foi refletindo sobre isso que cheguei à conclusão de que exis
tem nítidas diferenças entre a música cristã contemporânea,
música gospel ou rock cristão, e a música pop ou secular. Essas
diferenças não estão no estilo nem no ritmo, mas principalmente
nas letras das canções e no estilo de vida dos músicos cristãos.

*Jovens com uma Missão, (n. do E.)

67
As letras

Se tirássemos a letra... não creio que seríamos


capazes de distinguir entre a música rock
evangélica e a música rock secular.

Chuck Girald

Uma das maiores diferenças entre uma canção secular e uma


canção cristã está na letra. A própria Bíblia declara que a boca
fala daquilo que está cheio o coração (Lc 6.45) e que os lábios do
justo sabem o que é bom, mas a boca dos ímpios somente o que é
perverso (Pv 10.32). As canções populares de nossos dias
exemplificam cada vez mais tal verdade.
Em 1990, pela primeira vez na história norte-americana, um
disco foi julgado por uma corte federal. O disco em questão, As
nasty as they wanna be [Tão perverso quanto eles desejam ser], do
grupo de rap 2 Live Crew, tinha vendido até então quase dois
milhões de cópias. Segundo Robert DeMoss, especialista em cul
tura juvenil do ministério A Família em Foco (Focus on the
Family), um dos responsáveis pelo processo que culminou na con
denação do disco como obsceno, nunca houve um disco na histó
ria americana com um conteúdo tão elevado de degradação sexual
DeMoss e sua equipe tiveram o árduo trabalho de transcrever
o álbum duplo e encontraram o seguinte:

• 87 descrições de sexo oral;

• 117 referências explícitas à genitália masculina e femini


na; e

• 412 usos de termos vulgares com conotações sexuais.

Segundo os seus cálculos, DeMoss afirma que, quando uma


criança que está entrando na adolescência — o consumidor pri
mário desse tipo de disco — escuta um desses discos somente dez
vezes, é assaltado "com 1 170 referências explícitas de genitália
masculina e feminina, enquanto ouve 870 descrições de sexo
oral"2.
Nem todas as canções seculares chegam a esse extremo de
vulgaridades, mas o que se observa é um aumento explosivo de
artistas que, em nome da liberdade de expressão, escrevem letras
explícitas sobre sexo, violência e ocultismo. Isso ocorre com to
dos os estilos: rap, rock, mpb, sertanejo, pagode, axé-music etc.
Quando as referências não são explícitas, muitas vezes há insinu
ações e letras com sentido ambíguo.
Falando sobre esse assunto, DeMoss diz o seguinte:

Baseado em mais de uma década de estudos sérios, eu não acre


dito que toda música secular contém mensagens anti-sociais,
ilícitas e perversas. Há muitos artistas que exibem idéias positi
vas em suas canções. [...] Não sou defensor de nenhum estilo em
particular [...]. Minha preocupação principal é em relação ao
conteúdo das letras dos artistas populares e à moda crescente de
degradação e abuso que tem surgido em tempos recentes. Todos
os estilos de música [...] podem ser, e geralmente são, manipula
dos pelos propósitos ilícitos dos artistas que os produzem.
Semelhantemente, essas mesmas formas de música podem ser
usadas para criar canções que elevam o espírito humano.3

69
Em contrapartida, as letras de músicas cristãs, embora nem
sempre criativas, possuem um padrão moral e espiritual elevado.
Das canções de louvor e adoração de Ademar Campos, Asaph
Borba e Ana Paula Valadão ao rock do Brother Simion, Resgate
ou Oficina G-3, dois temas comuns são vistos: a exaltação de
Jesus Cristo como Senhor e a pregação dos valores eternos do
Evangelho. Esta é uma verdade que não pode ser negada por
nenhum crítico da música cristã contemporânea. Como disse Tim
Stafford: "Estilisticamente, a música cristã contemporânea é de
rivativa: quer seja rap ou heavy metal ou popt a música é
indistinguível de seu correlativo secular, exceto pelas letras
edificantes"4.
No entanto, existem dois argumentos que envolvem a ques
tão das letras das canções cristãs. Embora tais argumentos fre
qüentemente são gerados por pessoas de fora do cenário musical
cristão, eles possuem um fundo de verdade que deve ser levado a
sério por todos que exercem um ministério musical dentro dos
limites da igreja.
Em primeiro lugar, dizem os críticos, as letras são difíceis de
escutar. Existem várias possibilidades para que isso aconteça. Um
mau equipamento de som, ou um técnico que não saiba operar
bem os controles, pode tornar a letra ininteligível aos ouvintes.
Mas isso ocorre, quando é o caso, somente nas apresentações ao
vivo. Nas gravações, uma boa mixagem é feita de forma a equili
brar o nível dos instrumentos com o vocal, pois os músicos cris
tãos geralmente desejam que o ouvinte entenda a mensagem.
Muitos chegam a mencionar, na letra de suas canções, passagens
bíblicas que lhes serviram de inspiração durante a composição.
Em última análise, mesmo que alguém não entenda o que está
sendo cantado num determinado instante, é melhor ouvir uma
música que seguramente manifesta um alto padrão moral e espi
ritual do que encher a mente com águas de fontes duvidosas.
A segunda crítica é de que os músicos cristãos são muito su
perficiais. Infelizmente há muito que se concordar com tal argu-

70
mento. Grande parte dos compositores cristãos da atualidade,
como diz Franky Schaeffer, parece ter "um q.i. trinta pontos me
nor do que o de uma água-viva retardada"5. Basta olhar para a
maioria das letras de músicas cristãs da atualidade para consta
tar sua afirmação. A maioria delas se resume em repetir chavões
do tipo "Eu vivia perdido, mas Jesus me encontrou", ou "Jesus te
ama, ele quer te salvar". Não há nada de errado com esssas men
sagem, mas há algo mais. Existem muitos outros aspectos da vida
que devem ser vistos dentro de uma perspectiva cristã: proble
mas como a infidelidade, os desabrigados, suicídio, brigas de qua
drilhas de rua, salvação, pureza sexual e tantos outros desafios
modernos.
Os profetas do passado eram homens que clamavam por justi
ça moral e social, do mesmo modo que clamavam pela justiça
legal, entre Deus e o homem. Jesus disse: "Bem-aventurados os
que têm fome e sede de justiça, pois serão satisfeitos" (Mt 5.6).
Se a música cristã pretende ser relevante para a sociedade mo
derna, ela precisará manifestar em suas letras mais fome e sede
de justiça. Os músicos cristãos precisam romper com a mediocri
dade e desenvolver uma criatividade madura e contextualizada
em suas letras.
Carman, um cantor cristão contemporâneo norte-americano,
é um exemplo de alguém que, nas décadas de 1980 e 1990, usou de
vários estilos musicais com bastante criatividade para ministrar ao
povo com música. Suas letras variavam desde simples canções de
louvor e adoração a histórias bíblicas cantadas com um pouco de
humor e irreverência, mas que acabavam causando um tremen
do impacto espiritual no ouvinte. Carman também produziu vários
vídeos cristãos. Seu clamor era dirigido tanto à igreja, para que
ela despertasse e levantasse um padrão moral e espiritual, quan
to ao mundo, denunciando o pecado e as injustiças sociais.
Existem muitos outros artistas cristãos que procuram
equacionar em sua fé os problemas atuais. O músico cristão sue
co Ulf Christiansson e sua banda Jerusalém viram o efeito da

71
criatividade musical em maio de 1994. Durante uma cerimônia
na Holanda, houve um período de três minutos de silêncio nacio
nal, para recordar o Holocausto. Após os minutos de silêncio, a
música que a banda havia gravado no disco Prophet [Profeta],
chamada Berlim 38 (next year in Jerusalém) [Berlim 38 (próximo
ano em Jerusalém)6 ], foi tocada em rede nacional de tv com ima
gens do filme A lista de Schindler. Pense no impacto que essa can
ção teve sobre as pessoas que a ouviram.
O importante, no entanto, não é apenas denunciar os proble
mas, mas também apontar respostas. Obviamente, no contexto
de um CD, pode haver canções que denunciem e canções que
apresentem as respostas. Devemos evitar legalismos nesta área.
Mas é importante que a resposta seja apresentada ao ouvinte.
Ulf Christiansson fala o seguinte a esse respeito: "Você en
contra muitas perguntas, mas também precisa ter as respostas. A
maioria dos cristãos sabe que muitas coisas estão erradas, mas
nós precisamos saber a resposta; e a resposta é espiritual, uma
resposta de nossos corações"7.
Grahan Kendrick, o líder de louvor e adoração inglês que
levou o louvor para as ruas com a criação da Marcha para Jesus no
final da década de 1980, é outro que foi além do simpíismo em
suas letras. Mesmo compondo para louvor e adoração, ele conse-
guia escrever letras que clamavam por justiça social, como, por
exemplo, O Lord, the clouds are gathering [O Senhor, as nuvens
estão se ajuntando]:

O Senhor, as nuvens estão se ajuntando,


o fogo do juízo queima.
Como temos caído! [...]
O Senhor, sobre as nações agora
onde está a pomba da paz?
Suas asas foram quebradas.
O Senhor, enquanto crianças preciosas morrem de fome,
as armas de guerra crescem.

72
O pão delas está sendo roubado [...]
O Senhor, poderes das trevas estão prontos para inundar
nossas ruas com ódio e medo.
Temos que despertar!

Tenha misericórdia, Senhor.


Perdoa-nos, Senhor.
Restaura-nos, Senhor.
Aviva tua igreja novamente!
Que a justiça possa correr como rios
e a retidão como uma fonte que nunca se acabe.

Esta era uma canção de louvor e adoração! Vozes proféticas


como a do exemplo devem levantar-se em cada geração e
conclamar o povo de Deus a buscar a justiça divina para a nossa
terra.

No Brasil, João Alexandre tem sido uma espécie de voz cla


mando no deserto com suas canções que misturam poesia singela
e reflexão sobre os problemas da atualidade. Sua canção Brasil
expressa um clamor do povo brasileiro por justiça social e denun
cia muitos dos problemas nacionais.

As letras da música cristã contemporânea não somente esta


belecem uma nítida linha divisória entre ela e a música secular,
como também oferecem uma oportunidade única para que a igreja
seja luz e sal na música popular de nossos dias. Entretanto, a
qualidade das composições cristãs deve melhorar, tanto na
criatividade de suas letras como no nível de produção musical.

73
O estilo de vida
dos músicos

Precisamos tomar muito cuidado antes de condenar


qualquer espécie de expressão artística por causa do
estilo de vida daqueles que a produzem ou
interpretam. Se levássemos tal filosofia a extremos
estaríamos vivendo em um deserto cultural.

John Blanchard

Sexo, drogas e roclcnroll... Este é o retrato há muito passado


pelos artistas do cenário pop para seus fãs ao redor do mundo.
Declarações dadas por esses artistas à imprensa estão cheias de
insinuações imorais e revelam seus vícios:

Minha mulher me trai, mas só com outras mulheres, e deixa que eu


fique com ela e com suas amantes — Robin Gibb, dos Bee Gees.1

Devo ter cheirado [cocaína equivalente a] todo o Peru. Sobrevi


ver aos anos [19] 70 foi um milagre — Steven Tyler, vocalista do
Aerosmith.2

Drogas à vontade, corpos à vontade, música à vontade, a festa é


nossa — Paul Kantor, do Jefferson Airplane.3

Madonna vive nossas fantasias. Ela é capaz de fazer aquilo que


nossos pais não nos deixam fazer — jovem fã de Madonna.4

De Elvis Presley a Madonna, a imagem de rocie star, ou estrela


do roc/c, continua sendo a de uma vida em que tudo se compra
com um simples toque de mágica. Até mesmo as canções de al
guns artistas apresentam essa idéia. Money for nothing [Dinheiro
sem fazer nada], do grupo inglês Dire Straits, é uma delas:

[..,] É assim que se faz,


você toca guitarra na MTV

[...] É assim que se faz,


dinheiro sem fazer nada
e garotas de graça.

Mas como disse Steve Lawhead, "o estilo de vida dorocliríroll


[...] não é tudo aquilo que parece"5. No fundo de toda essa ima
gem fictícia de prazer, glória e riqueza fácil, jazem um vazio inte
rior e uma vida de infelicidade que têm levado muitos artistas ao
suicídio.
Kurt Cobain foi um triste exemplo. Guitarrista e vocalista do
Nirvana, e viciado em heroína, Kurt deu um tiro na cabeça, aos
vinte e sete anos, por não suportar a pressão dos fãs, que viam
nele um super-homem. Ele sabia a verdade acerca de si mesmo e
escolheu o suicídio como fuga das ilusões que o cercavam. Infe
lizmente, sua atitude motivou outras pessoas a fazerem o mesmo,
inclusive alguns de seus fãs.
A história de Kurt Cobain mostra-nos o poder de influência
que um artista possui — tanto para o bem como para o mal. Steve
Lawhead diz que "enquanto está na crista da popularidade, a
influência de uma estrela do rock parece espantosa. Quer a ima
gem seja ilusão quer não, o poder parece bem real"6.
Ainda assim, há muitos artistas que tentam negar o poder de
influência e esquivar-se da responsabilidade, quando acontece
de um adolescente dar um tiro na cabeça após ter ouvido numa
canção que o suicídio é boa saída. É uma irresponsabilidade tre
menda os artistas escreverem algo negativo em suas canções e
dizerem que tudo não passou de uma piada. Na verdade, geral
mente eles estão refletindo nas músicas suas próprias crenças e
estilo de vida.

75
A Bíblia, porém, é clara a esse respeito. EmMt 12.35-37, Jesus
disse: "O homem bom do seu bom tesouro tira coisas boas, e o
homem mau do seu mau tesouro tira coisas más. Mas eu lhes digo
que, no dia do juízo, os homens haverão de dar conta de toda
palavra inútil que tiverem falado. Pois por suas palavras vocês
serão absolvidos, e por suas palavras serão condenados".
E exatamente por isso que os artistas cristãos são diferentes.
Eles entendem que estão diante dos olhos do público e que tudo
que fizerem ou disserem terá um impacto na vida de seus fãs. Eles
também sabem que, por essa razão, serão julgados por Deus com
maior rigor (Tg 3.1). Além disso, como cristãos, eles sabem que
terão de prestar contas a Deus de como viveram suas vidas.
Melody Green fez o seguinte comentário a respeito da respon
sabilidade cristã diante do público: "Qualquer um que faz uso de
uma plataforma pública é um modelo, quer queira ou não, e quer
reconheça isso ou não. E aí que vem a responsabilidade"7.
Melody sabe muito bem disso, pois seu marido, Keith Green,
influenciou milhões de pessoas através de sua vida e ministério.
Keith lutou para estabelecer um padrão de santidade no cenário
da música cristã. Para ele, a música era um ministério ao Senhor.
Um homem de convicções fortes, ele foi muitas vezes criticado e
incompreendido por suas declarações. Antes de sua morte, Keith
disse:

A única coisa que eu quero representar é a voz do Senhor cha


mando pessoas para viver em santidade. O mundo está cansado
de dizeres religiosos... Eles querem ver o Evangelho sendo vivi
do e nós, cristãos, temos de nos conscientizar de nossa respon
sabilidade de mostrar-lhes esta vida.8

No folheto Can God use rock music? [Deus pode usar o rock?],
Keith revelou a preocupação quanto aos que usam os meios de
comunicação para apresentar o Evangelho:

Estou convencido de que o potencial de alcançar pessoas para


Jesus através da mídia — através de discos, rádio, filmes ou tele-

76
visão — é monumental, simplesmente porque essas são coisas
que têm prendido, e continuam prendendo, a atenção das
pessoas. Eu realmente creio que cristãos que estão completa
mente entregues a Deus, usando essas ferramentas, podem levar
pessoas a curvar-se em arrependimento e conduzi-las aos braços
abertos do Salvador. Mas se suas vidas não estão completamen
te entregues a Deus, se seus motivos estiverem confusos e seus
corações divididos, então eu vejo apenas vergonha e ridiculari
zação sendo lançada sobre o Evangelho.9

O apóstolo Paulo escreveu aos fílipenses chamando-os à res


ponsabilidade de uma vida santa diante do mundo: "Façam tudo
sem queixas nem discussões, para que venham a tornar-se puros
e irrepreensíveis, filhos de Deus inculpáveis no meio de uma ge
ração corrompida e depravada, na qual vocês brilham como es
trelas no universo" (Fp 2.14-15).
As palavras de Paulo são fortes: puros, irrepreensíveis e
inculpáveis. Mas é somente assim, diz Paulo, que os cristãos pode
rão brilhar como estrelas no mundo. E nossa conduta santa que
revelará ao mundo quem somos. Na verdade, Paulo está apenas
ecoando as palavras que Jesus disse a seus discípulos no Sermão
do Monte: "Assim brilhe a luz de vocês diante dos homens, para
que vejam as suas boas obras e glorifiquem ao Pai de vocês, que
está nos céus" (Mt 5.16).
Peters Carlsson, ex-integrante da banda sueca de rock cristão
Jerusalém, parece entender isso quando diz: "Eu não dou uma
mensagem. Eu sou uma mensagem... Nós podemos cantar sobre
Jesus e pode soar vazio... muitas palavras bonitas, mas sem vida.
Por quê? Porque não está na pessoa que está cantando; sua vida
não sustenta suas palavras"10.
É importante que os músicos cristãos tenham a atitude de
levar seus fãs a olhar para Jesus acima de todas as coisas. Isso não
quer dizer que eles devam viver uma vida imoral, com a desculpa
de serem fracos. Como Paulo, qualquer um que tome posição

77
diante do público deve estar pronto a dizer: "Tornem-se meus
imitadores, como eu o sou de Cristo" (ICo 11.1).
Steve Taylor, filho de um pregador que gravou vários discos
de música cristã contemporânea entre 1982 e 1995 e que produ
ziu muitos artistas famosos, como Guardian, Newsboys e Six Pence
None the Richer na década de 1990, manifestou sua opinião,
dizendo:

Após ter sido um pastor de jovens por cinco anos, reconheço


que os jovens passam por uma certa etapa em suas vidas em que
eles precisam ter heróis, e é melhor que esses heróis sejam da
música cristã do que Twisted Sister, Ozzy Osbourne ou qualquer
outro...11

No entanto, quando falta no artista um padrão de conduta


moral e espiritual exemplar, seus fãs são tremendamente afeta
dos. O efeito que poderia ser positivo torna-se negativo e perigo
so. Já citamos o caso de Kurt Cobain, que levou alguns jovens a
se suicidarem seguindo seu exemplo. O mesmo pode acontecer
com artistas cristãos. Dan Peters escreveu o seguinte:

Milhares de jovens fãs são [...] influenciados quando um artista


cristão bem conhecido dá testemunho de como o Senhor está
trabalhando em sua vida. Este é um dos aspectos mais poderosos
da música cristã contemporânea — seu poder de mudar vidas
para melhor. O oposto, claro, é também verdade. Adolescentes
são adversamente afetados quando imitam o artista cristão po
pular que, apesar de dizer-se comprometido com Cristo, apre
senta um mau exemplo, fumando ou bebendo publicamente,
usando linguagem imprópria ou indiscreta, ou exibindo com
portamento imoral.12

Mas não devemos ser tão duros no julgamento quando acon


tecer de um de nossos irmãos ou irmãs que ocupam um ministério
público cair em pecado. Devemos entender que eles são tão hu
manos e propensos ao erro como qualquer um de nós. O cantor

78
Dallas Holm confirma: "É triste o fato de que elevamos persona
lidades artísticas a um nível que elas não merecem"13. George
Verwer, fundador da Operação Mobilização, um movimento mis
sionário que atua em vários países ao redor do mundo com os
navios Doulos e Logos II, disse:

Por que tantas pessoas famosas que se convertem acabam vol


tando atrás/ Porque estão bem em frente de nossos olhos até
cometerem seu primeiro grande erro, quando então elas rece
bem cerca de quinze dardos fundamentalistas em suas costas!...
Julgando as pessoas categoricamente, irrevogavelmente, sem
chance para explicações — isso é o que é triste.14

Que estas palavras sirvam de alerta para nós. Não devemos,


em hipótese alguma, apoiar nem encobrir o pecado de alguém
somente porque tal pessoa é uma personalidade de destaque no
cenário cristão. Mas, ao mesmo tempo, devemos usar de sabedo
ria ao tratar com aqueles que escorregam numa plataforma pú
blica e trazem vergonha ao Corpo de Cristo. Alguém já disse que
a igreja é o único exército que mata os seus feridos. Não devemos
fazer desta declaração uma verdade. Ao contrário disso, deve
mos estar prontos a perdoar uns aos outros, assim como somos
constantemente perdoados pelo nosso Senhor. Devemos deixar
todo juízo final nas mãos de Deus, que julgará cada um segundo
as suas obras (Ap 20.13).

Por maiores que sejam as falhas encontradas na vida de al


guns artistas cristãos, de um modo geral a maioria apresenta um
desejo sincero de ser modelo de conduta moral e espiritual para a
juventude. Neste sentido, a música cristã contemporânea colo
ca-se numa posição totalmente inversa ao cenário secular, onde
as Madonnas e os Kurt Cobains fazem o show da promiscuidade e
das drogas.

79
Terceira parte

As críticas

Para discutirmos sobre a música rock seriamente,


precisamos estar conscientes das ilusões e não sermos
pegos pelas armadilhas superficiais, como cabelo,
roupas, linguagem e estilo de vida.

Steve Lawhead, escritor.

Falar sobre música cristã contemporânea ou rock cristão em cer


tos círculos evangélicos é colocar-se diante de uma avalanche de
críticas, pois diversos mitos têm sido associados à música em geral e,
mais precisamente, ao rock. Com base nos mitos é que algumas des
sas críticas são feitas. Sei disso por experiência própria, pois eu tam
bém já questionei a música cristã contemporânea e o rock cristão.
Em função da grande influência do rock sobre praticamente a
maior parte da música popular contemporânea e, por conseqüên
cia, da música cristã contemporânea, é importante identificar e
analisar esses mitos, para ver se eles são verdadeiros ou não. So-
mente assim poderemos saber se as críticas contrárias a esses es
tilos de música têm razão de existir.
As questões que serão analisadas nesta parte são controversas e,
em alguns casos, difíceis de chegar a um entendimento comum.
Mas nem por isso podemos deixar de tratar delas, pois é justamente
por ter de lidar com tais questões que a música cristã contemporâ
nea encontra um equilíbrio e torna-se uma expressão verdadeira do
que Deus está fazendo na música de suas igrejas nos dias de hoje.
Conexão africana:
o ritmo dos tambores

A influência da música negra gospel sobre o


rockfn'roll, rhythm & blues e soul music tem
sido grandemente reconhecida.

Ray Funk

Um dos maiores argumentos contra o rock é que o ritmo em si


é diabólico, originado nas selvas africanas, onde era usado em
rituais pagãos. Sendo assim, mesmo que a letra seja boa, o ritmo
é mau, pois é de inspiração satânica. Existe até mesmo uma len
da cristã acerca do missionário que foi repreendido pelos nativos
de uma tribo africana ao tocar para eles um cassete de rock cris
tão' . Don D. Johnson é um dos críticos que cita essa história em
seu livro, Os riscos traiçoeiros do rock. Segundo ele, os nativos
teriam dito ao missionário: "Você nos ensinou a abandonar a fei-
tiçaria e a invocação de espíritos. Por que os está invocando com
esta música? Com este mesmo ritmo invocamos os espíritos maus
na África!"2.
Seguindo tal linha de pensamento, críticos como Johnson afir
mam que o rock tem suas raízes na África:

O ritmo do rocie... depois de uma longa viagem da África... [onde


fora usado] muitas vezes nas cerimônias, ritos religiosos e ou-
trás celebrações com tambores, chocalhos, varetas, cabaças e
outros instrumentos de percussão. [...] O estilo do ritmo do rock
existia na África séculos antes de a música clássica ter aparecido
na Europa.3

Já o escritor Steve Lawhead, em Rock on trial [Rock na tri


lha*], parece discordar desse argumento, dizendo que "a cone
xão entre a música de várias tribos africanas, escravos americanos
e o rock de hoje é tênue, na melhor das hipóteses"5.
Lawhead e alguns outros escritores apontam para o fato de
que a idéia de o rock ter vindo das selvas africanas é fruto de um
preconceito racial muito forte que dominava a América, princi
palmente o sul dos Estados Unidos, nas décadas de 1950 e 1960.
Era justamente por não querer que seus filhos ouvissem música
negra, nem que se misturassem com os negros nos bailes de rock,
que muitos pais supostamente preocupados tentavam dar ao rock
uma má fama.
O cardeal Samuel Stricht, de Chicago, resume a idéia que
muitos tinham acerca do rocie naqueles dias: "Uma volta ao
tribalismo não pode ser tolerada pela nossa juventude católica"6.
A questão básica é: se o ritmo do rock estava presente nos
tambores dos nativos africanos, então por que o rock nasceu na
América do Norte e não no Caribe, ou mesmo no Brasil? Difícil
de explicar? Mais difícil ainda fica quando pensamos no fato de
que os escravos africanos levados para a América não podiam
tocar seus tambores, pois seus senhores pensavam que mensagens
de revolta podiam ser transmitidas entre grupos de escravos atra
vés do barulho deles.
Como disse Tony Palmer: "Tambores quase nunca foram ouvi
dos na música americana negra até meados do século 2O"7.
Isso coloca o uso dos tambores e de bateria na música bem
depois do início do jazz, do blues e do spiritualy estilos que se fun
diram para formar o rock. O único instrumento usado pelos pri
meiros escravos era o banjo, que não se originou na África negra,
mas foi levado para lá por mercadores egípcios.

83
É difícil entender também por que os africanos acharam es
tranha a música de Louis Armstrong quando ele tocou na África.
Se a origem da música negra americana veio das selvas africanas,
por que eles estranhariam ojazz de Armstrong?
Kurt Pahlen, buscando as origens do jazz, comentou esse fato
da seguinte forma:

Recuando ainda mais para o passado encontram-se, nas últimas


décadas do século 19, precursores do jazz, como o ragtimey cujo
berço seria a Sedalia, no estado do Missouri. E mais além, no
passado/ Estariam o blues e spiritual, os work-songs dos negros nas
plantações de algodão? Talvez. Seria então ojazz música popular,
folclore? De qual povo? Dos negros, seria a resposta. Da África,
portanto? Só com fortes ressalvas. Aliás, quando Louis
Armstrong, influente figura no jazz [...] visitou em meados do
século [20] a África, a pátria de seus antepassados, foi aí recebi
do com grande júbilo, mas de modo não diferente do que o seria
na Europa, na Ásia ou na Polinésia. Sua música era inteiramen
te estranha aos africanos, nela não havia nada que lhes fosse
aparentado; por isso ela lhes inspirava confiança, pois conquis
tara justamente o mundo, sem levar em conta raça e condição
social.8

Johnson disse que a característica mais marcante e nociva do


rock está em seu ritmo sincopado, o que o torna perigoso. Pahlen,
no entanto, parece discordar dele.
Segundo Pahlen, "a música africana não pode usar síncopes,
porque não possui divisão de compasso e, portanto, não possui
também partes do compasso que possam ser regularmente acen-
tuadas"9.
Pahlen diz também que o ritmo síncope não se originou nas
Américas, pois os compositores europeus medievais já o conhe
ciam. De fato, como disse Steve Miller, o ritmo síncope é encon
trado em muitos estilos de música, inclusive na música erudita
— no coro Aleluia, de Handel, por exemplo10.
Em meio à polêmica, a questão básica permanece: o rock é ou
não um produto das selvas africanas? E, se for, será que isso o
desqualifica como veículo de evangelização? Será que a música
africana não pode ser usada para louvar o Criador de todas as
coisas e transportar sua mensagem à juventude moderna?
Como já vimos, o rock é uma fusão de estilos e é simplesmente
impossível apontar apenas um determinado estilo ou ritmo como
sua fonte. No entanto, mesmo que o ritmo tenha vindo da Áfri
ca, mesmo que tenha sido usado em rituais pagãos, afirmar que
esse ritmo é intrinsecamente mal seria desconsiderar a cultura
africana.
Já estive em vários países da África ocidental e central, de
onde veio a maioria dos escravos para o continente americano, e
pude conduzir a adoração a Deus em diversas igrejas e aldeias.
Em todas as ocasiões, não foi surpresa descobrir que não havia
órgãos nem pianos naquelas igrejas humildes e pobres. Para lou
var a Deus, o povo usava seus tambores e literalmente tudo que
produzisse som. Jamais ouvi um irmão africano dizer que o ritmo
dos tambores fosse demoníaco. Ao contrário, para eles, sua músi
ca é um dom de Deus para o povo. E estão certos!
Hustad cita uma carta recebida do reverendo Alton J. Shea,
enquanto este trabalhava como missionário em Serra Leoa, na
África ocidental. Na carta, o missionário não reclamava das su-
postas influências malignas dos tambores africanos: "Estamos tendo
uma experiência tremenda aqui na África. De fato, tivemos que
sublimar os nossos gostos musicais para promover a música indí
gena nas igrejas e pelo rádio. O toque de bumbos é que toca o
coração dos nativos aqui..."11.
Assim, mesmo que o rock contenha elementos de estilos musi
cais africanos pagãos, não é certo dizer que seja demoníaco. Se
ria insultar a diversidade cultural da criação de Deus. A música
africana, assim como todos os estilos musicais, é fruto da capaci
dade criativa que Deus deu ao homem. Em cada cultura, essa
capacidade se expressa de uma forma diferente. Certamente, ai-

85
gumas culturas, não conhecendo o Deus desconhecido, ofere
cem suas capacidades criativas e artísticas aos demônios. Nesses
casos, a missão da igreja é resgatar tais expressões de criatividade
para o Criador de todas as coisas, Jesus Cristo. Pois, como escre
veu Paulo aos colossenses, "nele foram criadas todas as coisas nos
céus e na terra, as visíveis e as invisíveis... todas as coisas foram
criadas por ele e para ele" (Cl 1.16).
O rock é do Diabo

Não se trata [...] de um mero estilo musical, mas de


uma liturgia usada por Satanás, para roubar a alma
dos jovens deste tão sofrido século.

Claudionor de Andrade

Outro mito que assombra os cristãos quando pensam em rock


é a idéia de que seja música do Diabo, de que seja tão corrupta
que não possa ser usada para nenhum propósito divino. Vários
livros já foram escritos combatendo o rock e suas influências so-
bre a juventude. Um exemplo é o livro A mensagem oculta do
rock, publicado pela primeira vez em 1986, em meio à febre de
caça às bruxas escondidas em faixas de discos seculares através
do processo chamado backward masking*. No referido livro, os
autores afirmam várias vezes, em declarações como as abaixo,
que a música rock é do Diabo:

O rock faz parte da liturgia do culto ao Demônio... mesmo que


você não seja adorador de Satanãs, ao ouvir o rock, inconscien
temente, estará rendendo homenagens ao inimigo número um
da raça humana. Portanto, não há apreciadores de rock, há
adoradores do Diabo.1

*Veremos mais sobre essa técnica no capítulo 11.


Jamais poderíamos ficar calados diante da propagação desse gê
nero de música criado sob a inspiração de Satanás.2

Ironicamente foi de um roqueiro brasileiro que veio a frase: o


diabo é o pai do rock. Raul Seixas foi um homem profundamente
envolvido com a magia negra e os ensinamentos de Alister
Crowley, conhecido como a Besta 666 e considerado o maior fei
ticeiro dos últimos séculos. Sendo assim, os cristãos não deveriam
confiar na frase de Raul Seixas, pois, como Jesus disse, o Diabo é
o pai da mentira (Jo 8-44).
Um dos parceiros de Raul Seixas foi o escritor Paulo Coelho.
No livro As valkíriaSy Paulo Coelho conta que pelo menos uma
das canções que compôs com Raul era, na verdade, um cântico
de invocação às forças do mal. Ele diz:

Sociedade alternativa... não era uma música... era um mantra de


ritual mágico, com as palavras da Besta do Apocalipse [referên
cia a Alister Crowley] sendo lidas atrás, em tom baixo. Quem
cantasse aquela música estaria invocando as forças das trevas. E
todos cantavam.3

Existe, então, a possibilidade de que a música seja usada como


um instrumento para a adoração do Diabo. Não somente o rock,
mas qualquer estilo musical. Hitler freqüentemente usava a
música erudita de Richard Wagner nos campos de concentração
onde milhões de judeus foram exterminados. Mas dizer que este
ou aquele estilo é intrinsecamente maligno é reduzir o dom cria
tivo de Deus aos homens e exaltar as capacidades de Satanás.
Steve Lawhead fala muito bem a esse respeito: "Aqueles que
tratam o rock como sendo do domínio do Diabo se esquecem de
que Satanás é o pai da mentira e do caos. Ele não pode criar
nada, apenas perverter as coisas boas que Deus criou, inclinan-
do-as para seus fins"4.
Mesmo assim, muitos cristãos, como o televangelista norte-
americano Jimmy Swaggart, ainda consideram o rock como músi-

83
ca do Diabo. No auge da popularidade de seu ministério, na dé-
cada de 1980, antes de sua queda moral, Swaggart atacou o rock:

Qualquer cristão que permita qualquer disco de rock ou country


em sua casa está convidando os poderes das trevas. Envolven
do-se com essa influência satânica, o controle da mente e do
espírito é possível. Qualquer um que escute essa sujeira está
abertamente entrando em comunhão com espíritos malignos.
Toda a música rock (e provavelmente toda, ou pelos menos a
maioria da música country) que está sendo tocada nas rádios
hoje em dia é de inspiração demoníaca.5

A ironia em tal afirmação é que os ritmos de muitas das can


ções de Swaggart eram country ou o próprio pseudodemoníaco
rock'nroll Sendo assim, acredito que Swaggart não se referia aos
estilos musicais, mas ao mau uso que muitos cantores fazem deles.
De qualquer maneira, assim como Swaggart, aqueles que acre
ditam que o rock é do Diabo encontram nas bandas de rock fortes
argumentos para sustentarem tal mito. O fato é que muitas ban
das e cantores de rock propositadamente o associam ao Diabo
com fins comerciais. A maioria nem sequer acredita na existên
cia dele.
Em 1989, o escritor e apresentador Bob Larson, autor de mui
tos livros que combatem o rock — e que curiosamente mudou
sua posição, passando a apoiar as bandas de rock cristão —, foi
convidado pela revista secular norte-americana Spin a viajar du
rante algum tempo com a banda de heavy metal secular Slayer,
para fazer uma reportagem sobre seu suposto envolvimento satã'
nico. Ao final da viagem, Larson chegou à conclusão de que os
membros da banda não eram satanistas, mas apenas usavam o
satanismo como uma fachada comercial6. E importante notar que
o objetivo de Larson não era defender nenhuma banda de roc/c,
mas simplesmente de apresentar os fatos.
Por não entenderem a estratégia satânica de publicidade,
muitos cristãos e críticos do rock chamam esse estilo musical de

89
religião e culto ao Diabo e falham em ter uma visão objetiva do
problema. Quando alguém chama, por exemplo, Ozzy Osbourne
de "própria encarnação do Demônio"7, tal afirmação soa tão ridí
cula que os jovens não levam a sério o alerta que o escritor está
tentando fazer em relação à mensagem transmitida por Osbourne
em suas músicas.
Obviamente o fato de muitas bandas de rock usarem o
satanismo, ou a violência, ou o sexo, apenas com fins comerciais
não justifica seus atos. Ao contrário, como nos mostra Larson em
Satanismo: a sedução da juventude norte-americana, muitos jovens
estão seguindo o exemplo dessas bandas e se envolvendo com o
satanismo de uma maneira real e perigosa. Steve Taylor faz um
comentário importante a respeito:

Muitos artistas estão assumindo uma postura satânica — ou


algo semelhante — quando eles nem sequer acreditam no diabo
ou no inferno... ou eles fazem vídeos com bastante sexo e vio
lência. Eles dizem que é apenas uma piada, mas nós sabemos que
os jovens levam isso a sério... Muitos desses caras estão fazendo
tais coisas motivados pelo dinheiro, eles estão agindo como se
fossem alguém que na verdade não são... Eles realmente não
acreditam no que estão dizendo. Isso tudo é muito perigoso,
porque a motivação é o dinheiro.8

Assim como Steve Taylor, os músicos cristãos parecem estar


preocupados em denunciar essa atitude irresponsável. A banda
No Longer Music, que conheci em Amsterdã, escreveu uma can
ção de alerta tanto para as bandas que usam temas satânicos em
suas músicas como para os que escutam tais bandas:

666, pentagrama e caveira.


O significado destas coisas não importa p'ra você.
Moda de música macabra.
Mas Satanás é real, não importa se você acredita ou não.
Você pode brincar com fogo e não se queimar?

90
A dor que você sente foi você mesmo que buscou.
Será sua vida apenas um jogo?
Por que você se entrega às chamas?
Hei, você não sabe...
(da música You dorít know [Você não sabe9])

Sou totalmente contrário aos músicos que usam suas canções


para transmitir mensagens que incentivam a destruição, a cobi
ça, o sexo, o suicídio, a morte e o ocultismo. No entanto, não
posso julgar todo um amplo estilo musical por causa de tais músi
cos. Já fiz isso no passado, em palestras que censuravam o rock,
acusando até mesmo grupos cristãos como o Rebanhão. Na épo
ca, eu passava várias horas por dia ouvindo discos ao contrário,
examinando capas, lendo revistas e fazendo todo um trabalho de
pesquisa com o único objetivo de desmascarar os demônios do
rock. Mas, depois de observar os frutos que grupos de rock cristão
estão produzindo na vida de muitos jovens, aprendi a separar o
estilo musical daqueles que o usam.
A verdade é que o rock não é do Diabo simplesmente porque
ele não é criador de nada. Ele apenas corrompeu as coisas
boas criadas por Deus (Gn 1.31). Não só o rock foi corrompido,
mas todas as formas de música. Até mesmo o homem foi corrom
pido. E por isso que Jesus veio, para redimir não somente o ho
mem, mas todas as coisas que foram corrompidas pelo pecado
(Rm 8.20-23). Além disso, quando dizemos que isso ou aquilo é
do Diabo, estamos anulando a soberania divina. A Bíblia é expli
cita em dizer: "Do Senhor é a terra e tudo o que nela existe, o
mundo e os que nele vivem" (SI 24.1). Deus está no controle do
Universo, restaurando e trazendo ordem às coisas que foram cor
rompidas através do pecado de Adão.
Mas Deus poderia usar um meio tão corrupto como o rocie
para trazer glória ao seu nome e atrair pessoas a si?
Basta olhar para nossas próprias vidas, pois Deus também nos
usa, apesar de toda nossa corrupção e pecado. A resposta para
isso é a redenção através do poder do sangue de Jesus.

91
Steve Lawhead diz: "Um erro é cometido, também, ao pensar
que o que o Diabo usa não possa ser redimido. A música é um
dom do Deus todo-poderoso e de amor eterno que continuamen
te redime sua criação"10.
Assim como toda a criação de Deus, as artes e a música tam
bém devem ser redimidas dos efeitos destrutivos do pecado.

92
O ritmo incita à violência,
à sensualidade e à rebelião

"Mas essa música não é apenas emocional", queixam-


se os críticos; "ela é física, apelando mais aos pés do
que à mente e ao coração". Rítmica ela é, e a música
rítmica há muito tem servido a igrejal

DONALD E HUSTAD

Outro argumento muito usado contra o rock é que o ritmo


conduz os jovens à violência, à sensualidade e à rebelião. Mais
uma vez, o problema está no ritmo, por isso o rock não pode ser
usado pelos cristãos. Os que defendem essa teoria dizem que o
ritmo conduz as pessoas a um estado de hipnose, por ser repetiti
vo e sincopado. Para sustentar sua teoria, muitos usam exemplos
de experiências realizadas com plantas e animais que, suposta
mente sob o efeito do rock, apresentaram anomalias no desenvol
vimento. Apesar de parecer, este não é um argumento científico.
Mais uma vez, estamos diante de um conceito falso, criado pelos
próprios artistas e pessoas envolvidas no cenário do rock, com o
objetivo de atrair a atenção da mídia e vender mais discos.
Steve Lawhead aponta para o fato de que roqueiros são artis
tas que estão mais preocupados com a venda de seus discos do
que com o efeito moral que suas palavras ou atitudes irão causar
no público. Ele diz: "Uma vez que os músicos de rock são
manipuladores de imagem, freqüentemente o que eles dizem e
fazem possui um propósito. Normalmente o propósito é simples
mente chamar atenção. Eles querem ou precisam destacar-se da
multidão"1.
Já citamos o caso dos membros da banda Slayer, constatado
por Bob Larson como sendo manipuladores de uma imagem satâ
nica com o objetivo de iludir e vender discos. Larson coloca bem
isso ao dizer: "Se os membros do grupo Slayer venderam sua alma
a Satanás, eles o fizeram no banco e não numa missa negra. A
bebida fermentada, proibida, que os Slayer sorveram, não é a
bebida da morte lírica e do desespero. É o elixir da fama"2.
É justamente por não percebermos isso que muitas vezes aca
bamos pronunciando julgamentos errados sobre um determinado
grupo ou cantor. Um exemplo clássico é o que aconteceu há al
guns anos com o grupo Kiss. Por muito tempo, eles usaram
maquiagens e se envolveram com uma aura de mistério ao redor
de si. Não tardou para que surgissem inúmeras especulações so
bre o grupo: eles teriam sido formados pela igreja satânica com o
objetivo de corromper os jovens da América; o nome Kiss signifi
caria knights in satarís service, cavaleiros em serviço satânico; a
língua do vocalista Gene Simmons havia sido operada para que
ele se parecesse com uma serpente; e muitos outros boatos.
Hoje qualquer pessoa que conhece rock sabe que, embora o
Kiss possa ser usado pelo Diabo — isso não está em questão —,
eles não são satanistas como se pensava. Mas as especulações
que foram feitas sobre o grupo com o objetivo de assustar os jo
vens só serviram para divulgá-los ainda mais entre aqueles que
estavam buscando algo fora do comum. O pior é que muitos des
ses jovens se envolveram com práticas satânicas por acreditarem
em tais especulações.
Ninguém acredita quando um lutador de luta livre diz que
vai despedaçar seu adversário, cortar sua cabeça e urinar sobre
ela. Tais declarações fazem parte do apelo para chamar a atenção
do público. Da mesma forma, acontece no mundo do rock.

94
Lawhead confirma a questão quando diz que roqueiros são
atores. Sendo assim, nem tudo o que eles dizem ou fazem deve
ser levado a sérioí. Isso é de fundamental importância no que diz
respeito às letras das músicas e à imagem criada pelos artistas de
rock.
Sid Berstein, um veterano musical responsável pela primeira
viagem dos Beatles aos Estados Unidos declarou que a importân
cia do sensacionalismo e a falta de originalidade deram origem à
violência e ao sexo, porque é aí que o dinheiro está.
Mas o que dizer dos constantes estouros de violência, de sen
sualidade e dos atos de rebelião presentes nos shows de rock1. Não
seria a música responsável por isso?
Vamos analisar cada uma dessas coisas.

O RITMO GERA VIOLÊNCIA

Isto não quer dizer que toda a música rock é


violenta... uma das ênfases do rock é a violência.

Dan D. Johnson4

A violência parece estar presente em concertos de rock. Dos


tumultos da década de 1950 às mortes em shows dos Ramones e
do Sepultura no Brasil na década de 1990, parece que onde há
rock, há uma arma carregada e pronta para disparar.
Infelizmente os cantores de rock parecem não estar muito
preocupados com isso. Os Rolling Stones continuaram pedin
do compaixão para o Diabo (Sympathy for the Devil), enquanto
elementos da gangue de motoqueiros Hell's Angels, os Anjos do
Inferno, matavam um rapaz negro de dezoito anos em frente ao
palco, no festival de Altamont, em 1970. Pete Townshend, do
The Who, não demonstrou nenhuma compaixão pelos onze fãs
que morreram asfixiados do lado de fora de um de seus concer
tos. Ele simplesmente disse: "Nós não vamos deixar que algo pe
queno como isso nos detenha... Somos uma banda de rock'nroll.

95
Você sabe que nós não nos preocupamos com a morte de onze
pessoas"5.
Mas será que o problema da violência está no ritmo? Será que
o rock tem mesmo o poder de transformar jovens de boa conduta
em pessoas violentas, máquinas mortíferas sem controle algum? E
possível ser hipnotizado através do rocki
Tais perguntas têm sido feitas por muitas pessoas preocupadas
com a violência que acompanha os shows de rock. As respostas
para elas não são fáceis, mas são possíveis. Tenho acompanhado
concertos de rock há alguns anos e observado como os jovens
reagem em tais situações. De minhas observações cheguei a al
gumas conclusões.
Primeiramente, no que diz respeito ao ritmo, descobri que,
embora o rock seja propício para manifestações violentas, tais
manifestações são totalmente conscientes e auto-induzidas. Isto
é, quando um jovem reage de uma forma violenta num show de
rock, ele o faz porque quer e não porque a música o levou a agir
de tal maneira. Seus atos são conscientes e ele pode parar a qual
quer instante. Como disse Lawhead:

Fãs de rock, assim como torcedores de futebol ou vendedores de


produtos em liquidação, são auto-induzidos, não induzidos pelo
ritmo, e cada participante pode escolher como reagir. A música
tem poder para mover, mas não para anular sensibilidades nor
mais.6

O delegado de polícia Jair Cesário da Silva parece ter chega


do a essa mesma conclusão. Ao apurar o caso de duas mortes em
shows de rock em São Paulo, no mês de maio de 1991, ele disse:
"Essas mortes provam que algumas pessoas estão usando o rock
como fachada para exercitar a agressividade gratuita"7.
Em segundo lugar, qualquer pessoa que entenda de hipnotis-
mo sabe que é impossível conseguir, num show de rock, os estados
necessários para hipnotizar alguém. Para chegar à hipnose é fun
damental que haja uma postura de concentração e relaxamento,

96
do rock contemporâneo e cativante, esse problema torna-se mais
acentuado porque o consumo do rock é maior que o de outros
estilos — principalmente entre os adolescentes. Mas, como disse
Larson, "nem todas as canções ou cantores têm o propósito de
destruir a moral da América"12.
O problema de insinuações sexuais na música popular não se
limita ao rock. O caso do grupo 2 Live Crew, citado no capítulo
6, é um exemplo. De fato, o hip hop e o rap têm sido muito usados
para passar mensagens de violência e perversão sexual. Em junho
de 1993 uma senhora de setenta e oito anos foi assassinada a
golpes de walkman por um garoto de dezesseis anos, após recla
mar da letra obscena que ele cantava, um rap do cantor Dr. Dre13.
Os ritmos brasileiros como samba, pagode, lambada e axé-music
são carregados de insinuações sexuais e letras que descrevem a
mulher como objeto sexual. Alguns bailes funks no Rio de Janeiro
são cenários de violência gratuita e até mesmo orgias sexuais.
Na verdade, o problema vai além da música popular. Veja, por
exemplo, Wagner, reconhecido mundialmente como um dos gran
des compositores de música erudita. Ele era um homem megalo
maníaco, chegando aos limites da loucura. Era imoral, egoísta,
adúltero, arrogante, hedonista e violentamente racista. No en
tanto, sua música é aplaudida por muitos que consideram o rock
perigoso.

Certamente qualquer artista, seja qual for o estilo musical


representado, que use mensagens pervertidas de sexo e violência
para vender mais sua música está assumindo uma postura conde
nável. Mas um estilo musical não pode ser jogado no lixo pela
atitude isolada de algumas pessoas que fazem mau uso dele por
motivos egoístas.

E importante notar também que a vulgaridade tem sido ex


plorada pela música popular como parte de estratégia
mercadológica criada para atrair novos consumidores — princi
palmente jovens e adolescentes. O maior exemplo dessa estraté
gia pode ser visto na figura da cantora Madonna. Após ter criado

98
o que não combinaria, em hipótese alguma, com o cenário do
espetáculo.
Por último, um dos maiores motivos de violência nos shows de
rock é o uso de álcool e drogas antes mesmo de começar a apre
sentação dos grupos e cantores. Sendo assim, não é a música que
produz a violência, mas o fato de que muitas pessoas estão
alcoolizadas e drogadas durante o concerto.
O problema da violência não está no ritmo do rock. Se esti
vesse, todos aqueles que escutam rock seriam, pelo menos em
pequena escala, violentos. Mas os roqueiros que eu conheço, na
maioria, não são pessoas violentas.

O RITMO CONDUZ À SENSUALIDADE

Eles disseram que a música em si, não a letra,


mas a música era um convite para o sexo,
ou melhor, para relações sexuais.

Dan D. Johnson8

John Blanchard disse que uma das alegações mais persisten


tes acerca do rock é que ele contém fortes conotações sexuais9.
Dan Johnson concorda com Blanchard e aponta a sincopia do
rock como a causa do ritmo ser mais sensual10.
Ao que parece, o rock tem um poder estimulante para práti
cas sexuais. Quem escuta rock está, de alguma forma, recebendo
estímulos sexuais. Pelo menos é isso o que alguns críticos como
Blanchard e Johnson disseram em seus livros.
Outros críticos do rock, como Bob Larson, usam a expressão
rock masturbatório para se referir ao rock carregado de insinua
ções sexuais. Segundo Larson, o problema não está no ritmo, mas
nas letras das canções11. De fato, grupos de rock, como Scorpions
e Van Halen, gostam de fazer insinuações sexuais em suas músi
cas. Até mesmo as capas de CDs de alguns artistas de rock pode
riam ser consideradas picantes ou pornográficas. Sendo o ritmo

97
uma imagem de símbolo sexual, ela vendeu milhões de discos ao
redor do mundo. Em 1992, seguindo o eixo da fortuna, lançou o
livro erótico Sex, com vinte e oito páginas de fotos e textos exal
tando a perversão sexual de várias formas. Dois anos antes, seu
vídeo ]ustify my love {Justifique meu amor1*], vetado pela mtv
americana e exibido sem cortes pela Rede Globo no Brasil, mos
trava a cantora tendo relações com um homem e uma mulher ao
mesmo tempo, além de cenas de homossexualismo, lesbianismo e
sadomasoquismo.
Sendo assim, constatamos que o problema da imoralidade se-
xual na música popular não está ligado a nenhum ritmo ou estilo
musical em particular, mas é um reflexo da vida desregrada de
certos artistas e da estratégia mercadológica de outros.
Como vimos no início, a sincopia é apresentada por Johnson e
Blanchard como responsável pela sensualidade do rock. O escri
tor Steve Lawhead discorda, dizendo que a sincopia é um ele
mento musical comum, usada numa variedade de estilos musicais,
com nenhum efeito anormal sobre as pessoas. Será que não esta
mos diante de um problema fictício, baseado em preconceitos
musicais? Será a imoralidade demonstrada nosshows de rock mais
um reflexo da imagem criada pelos artistas, que um efeito hipnó
tico ou estimulante do ritmo? Ao que tudo indica, é exatamente
isso que acontece. Se for assim, por que afirmar que não há lugar
na igreja para o rockl
Talvez porque, mesmo não tendo o poder de induzir as
pessoas a práticas sexuais, o ritmo do rock é, de fato, um ritmo
dançante. Elvis já dizia que com o rock é possível dançar15.
Esse fato em particular perturba muitos críticos cristãos quan
do se fala de rock cristão. Ao que parece, ritmos que apelam
para as emoções e expressões corporais não encontram muito es
paço no cristianismo.

Tal idéia, no entanto, é fruto de uma doutrina antiga, susten


tada pelos movimentos ascéticos que enxergavam o corpo como
uma parte inferior na relação espírito—matéria. Mas o que en-

99
contramos na Bíblia é algo diferente. A música hebraica é tre
mendamente emocional e, em diversas ocasiões, era acompanha
da de expressões físicas (v. Ex 15.20; ISm 21.11; 2Sm 6.14,16;
2Cr 5.12; SI 30.11; 98.4; 149.3; 150.4). Não há nada de errado
numa música que desperte nossos sentidos físicos. Deus criou
e está interessado em todos os aspectos do homem, físicos,
emocionais, mentais e espirituais. Steve Miller coloca muito
bem a questão:

A adoração dos antigos hebreus era freqüentemente caracteri


zada pela exuberância saudável. Eles dançavam, batiam palmas,
soavam as trombetas em alto som e tocavam címbalos ao se
alegrarem diante do Senhor... Vamos tomar cuidado para não
equacionarmos espiritualidade com serenidade.16

O RITMO PROMOVE REBELIÃO

Os prediletos do rock confirmam que ele é o porta-


voz para a revolução social, moral e política, ou em
outras palavras, que o tema principal do rock é a
rebelião. Rock é a linguagem de rebelião,
manifestando-se contra a autoridade dos pais (ou
qualquer outra autoridade, seja qual for), contra
decência, moralidade, dignidade.

Dan D. Johnson17

Quando o rock começou a tomar conta da América na déca


da de 1950, a juventude ficou totalmente louca pela nova músi
ca. Mas, como vimos na história do rock, os roqueiros não eram
rebeldes assumidos, e sim partes de uma rebelião que estava no
ar. Os jovens rebeldes ouviam rock porque isso era um desafio
que faziam a seus pais. Embalados por filmes como Juventude trans-
viada e Sementes da violência^ esses jovens tinham diante de si a
imagem de rebeldia no ator James Dean. Lawhead confirma isso,

100
dizendo: "Não importava se o rocicríroll era de conteúdo rebelde
ou não, uma rebelião se formou ao seu redor... Até mesmo o sim
ples fato de ouvir rock já era uma declaração de rebeldia"18.
No entanto, uma vez mais, a rebelião do rock é apenas uma
imagem. Na verdade, uma falsa imagem. Se o rock tem o poder
de conduzir os jovens a se rebelarem contra seus pais, esse poder
não está no ritmo, mas na imagem produzida pelos cantores de
rock. A imagem esteve presente no rocWríroll de Elvis, no rock
politizado dos Beatles, na música e na atitude punk dos Sex Pistols,
nos grupos de heavy metal da década de 1980, na onda grunge das
bandas de Seattle, como Nirvana, Pearl Jam e Soundgarden na
década de 1990, ou ainda nos recentes festivais de new metal.
Mas esse tipo de rebelião é tão falso e superficial que até mesmo
alguns artistas de rock o desprezam. Os membros da banda nova-
iorquina Anthrax escreveram uma canção condenando o que
chamavam de revolução sob as mangas das camisas — referindo-
se à moda grunge de usar camisas de flanela como sinal de atitu
de rebelde.
No entanto, o maior exemplo de que a rebelião do rock não
está no ritmo, e sim na imagem, são as manifestações de histeria
coletiva das décadas de 1950 e 1960. Steve Lawhead comenta:

Assista [por exemplo] a um filme dos Beatles no Estádio Shea,


as arquibancadas lotadas com milhares de fãs chorando e gri
tando, e você imagina o porquê de toda aquela histeria. Seria a
música? Não, se a música fosse a responsável, aquelas canções
ainda levariam as pessoas à loucura. Coloque alguns discos dos
Beatles para tocar hoje e você não verá ninguém gritando e
arrancando os cabelos. As pessoas não querem mais agir dessa
maneira. Está fora de moda.19

A imagem rebelde pôde ser vista no Brasil em dezembro de


1992, quando o cantor Axl Rose, vocalista da banda Guns'n'Roses,
arremessou uma cadeira sobre os jornalistas que estavam no sa
guão do hotel Maksoud Plaza em São Paulo. Ao contrário do que

101
muitos pensaram, Axl estava apenas fazendo seu papel de rebel
de sem causa. Ele já havia dito antes: "Uma imagem rebelde
pode funcionar bem. Somos considerados a banda mais perigosa
do mundo. E uma boa reputação para uma banda de rock"20.
Por outro lado, a imagem rebelde do rock serviu de base para
grupos cristãos comporem suas canções. O grupo sueco Jerusalém
escreveu Rebels of ]esus Christ [Rebeldes de Jesus Cristo] falando
sobre a rebelião contra o pecado, contra a idolatria, contra o
sistema mundano que rege as ações humanas.

O ritmo do rock não tem o poder que lhe é atribuído por mui
tos de seus críticos. O rock não pode induzir ninguém a fazer algo
que não queira fazer. Todas as manifestações de histeria, violên
cia e rebeldia vistas em certos concertos de rock são auto-induzidas
e, algumas vezes, pelo fato de haver na platéia pessoas drogadas e
alcoolizadas. Além disso, o grande empreendimento da música
popular tem levado muitos artistas sem escrúpulos a usar imagens
de violência, erotismo e rebeldia para se destacar no cenário ar
tístico e vender mais discos.

102
Mensagens invertidas
afetam o subconsciente

A mais nova arma de que o Demônio está se


utilizando contra a humanidade é conhecida em todo o
mundo pelo nome de backward masking (máscara
ao contrário ou retrocesso oculto). E isso que todos os
grandes grupos de rock e cantores (inclusive
brasileiros) que rendem culto aberto (ou não
publicamente declarado) a Satanás estão fazendo com
quase todas as suas músicas: usando-as como veículos
de backward masking para mensagens satânicas.

Jefferson Magno Costa

Em fevereiro de 1985 ouvi pela primeira vez falar sobre


backward message, mensagem invertida. Na época eu fazia parte
da liderança nacional de jovens de minha denominação. A rea
ção imediata foi a de unir-me ao irmão que fez a descoberta e
pesquisar o assunto. Gastamos tempo e dinheiro comprando dis
cos e revistas para realizarmos nossas pesquisas. Ouvimos deze
nas de discos tocados na direção contrária. Dentre os artistas em
cujo trabalho encontramos mensagens invertidas estavam Rita
Lee, Balão Mágico, Roberto Carlos, Alceu Valença, Raul Seixas,
Electric Light Orquestra, Led Zeppelin, Beatles e até mesmo o
grupo cristão Rebanhão. Logo começamos a fazer palestras em
várias igrejas sobre mensagens invertidas e ocultismo através da
música. Nossa descoberta causava espanto e até medo. Muitos
chegaram a quebrar seus discos e algumas pessoas se converte
ram durante aquelas palestras.
Hoje, anos depois, ainda sou questionado acerca de backward
message. Não nego que, de fato, alguns daqueles discos tinham
mensagens invertidas. Mas eram poucos. A maioria dos casos era
apenas o que chamo de ilusão auditiva. Tínhamos que forçar
para ouvir algo. E, como já determináramos em nossas mentes
que a mensagem estava lá, não era muito difícil encontrá-la ou
acreditar que estávamos realmente ouvindo Diabo em vez de quia
bo ou fiapo.
Atualmente backward message não é mais novidade para nin
guém envolvido com o rock. Quando o grupo de heavy metal bra
sileiro Sepultura lançou o disco Schizophrenia em 1987, uma loja
de discos de São Paulo fez um concurso oferecendo prêmios para
aqueles que decifrassem a mensagem invertida que a banda ha
via gravado. Bandas cristãs, como Petra e Whitecross, incluíram
mensagens invertidas com versículos bíblicos em suas canções.
O fato é que backward message existe. Resta-nos saber qual a
sua origem — satânica ou truque de estúdio — e se é possível
alterar a mente das pessoas com tais mensagens.

BACKWARD MASKING

Existem duas fontes prováveis das mensagens invertidas na


música: técnica de estúdio e ilusão auditiva.
O backward masking como técnica de estúdio é bastante co
nhecido e foi usado por alguns artistas da década de 1960 —
pelos Beatles, dentre eles — com o objetivo de vender mais dis
cos. Mas é algo muito raro atualmente, segundo Bruce Helmink,
engenheiro de som dos Estúdios Amerisound. A razão para isso,
como diz Helmink, é o alto custo com estúdios, devido aos pro
blemas técnicos envolvidos para fazê-lo de uma maneira que não
seja perceptível quando o disco é tocado na posição normal1.

104
Outro perito no assunto de relações interpessoais e da mente,
que foi grandemente consultado por músicos, empresários e téc
nicos de gravações durante a década de 1960, é o dr. John Kappas.
As pessoas que o procuravam queriam saber como encontrar for
mas de vender mais discos. Queriam que o dr. Kappas lhes falasse
se era possível influenciar pessoas por palavras e mensagens ocul
tas, gravadas invertidas em suas canções. Segundo o próprio dr.
Kappas:

O desejo desses grupos, tanto pública como privadamente, não


era corromper a juventude dos Estados Unidos. Eles não esta
vam tentando colocar um feitiço sobre alguém, nem fazer algo
duvidoso. Em vez disso, eles estavam simplesmente interessa
dos em criar uma atração para as massas. Se suas mensagens
subliminares lhes ajudariam a vender, então eles se utilizariam
delas.2

Kerry Livgren tocava com o grupo Kansas quando sua canção


Dust in the wind [Poeira no vento0 ] foi acusada de conter mensa
gens invertidas que supostamente diziam "cometa suicídio"! Após
converter-se ao Evangelho e ter sido questionado sobre o caso,
Livgren disse nunca ter gravado nada ao contrário, pelo menos
intencionalmente. Poderia ter sido uma ilusão auditiva?
O fato é que a maior parte das mensagens invertidas encon
tradas nas músicas durante a febre do backward message — tanto
no Brasil quanto nos Estados Unidos — era apenas ilusão auditi
va. Para ilustrar o fato, uma estação de rádio de Las Vegas (kila-
FM) tocou duas canções ao contrário, onde as palavras pecado,
teu senhor e satanás todo-poderoso podiam ser ouvidas. Seria uma
canção de Ozzy Osbourne, Kiss ou Black Sabbath? Não. Era o
tradicional cantor cristão americano George Beverly Shea
interpretando Quão grande és tu e O amor de Deus. Quando se
trata de uma ilusão, nem mesmo os artistas cristãos estão imunes
a ela4.

105
Kappas e outros investigadores mais recentes chegaram à con
clusão de que as mensagens ocultas nas gravações, ainda que
sejam realidades, não alteram o pensamento das pessoas. A maioria
dos estudos realizados sobre mensagens subliminares mostra que
apenas pessoas com predisposição mental têm seu comportamen
to de alguma forma afetado por tais mensagens. Por exemplo:
apesar de todas as tentativas, ninguém conseguiu usar mensa
gens subliminares para fazer com que alguém que odiasse pipoca
saísse do cinema, após ter sido exposto a tais mensagens, com um
desejo imenso de comprar pipocas.
Segundo Kappas, se alguém estiver querendo manipular as
pessoas através da música, backward masking não seria a melhor
forma, pois, além de ser extremamente dispendiosa, não foram
encontrados resultados satisfatórios que comprovassem a eficá
cia da técnica. Para ele,

A única forma de intensificar a reação à letra é gravá-la para a


mente consciente. Sem dúvida, a letra deve ser gravada um pou
co mais baixo que a música, para que a pessoa tenha que se
esforçar para escutá-la. É por isso que a música gravada correta
mente [sem backward masking] e escutada através de fones de
ouvido tem tanta influência sobre as pessoas.5

Ross Pavlac parece ter chegado à mesma conclusão. Ele


pesquisou vários livros de psicologia e propaganda, escritos du
rante o período de maior interesse e discussão sobre o assunto de
backward masking nos Estados Unidos e não encontrou sequer
um artigo que discutisse a possibilidade de manipulação subliminar
através de mensagens invertidas na música. Ao contrário, ele
descobriu que na psicologia não havia nenhum termo para des
crever tal processo. Quando os psicólogos usavam a expressão
backward maskingy se referiam ao fato de tornar a mensagem difí
cil de detectar, colocando ruídos por trás (backward) ou na frente
dela (forward masking). Era somente dessa maneira que as pessoas
poderiam ser, de alguma forma, sugestionadas pelas mensagens6.

106
Apesar de sabermos que não existe nada de satânico ou so
brenatural em backwarâ masking e que se trata de técnicas de
estúdio raramente usadas ou, na maioria dos casos, de coinci
dências e ilusões auditivas, devemos estar alertas para o seguinte
fato: a repetição constante de uma letra com mensagens negati
vas pode afetar as pessoas.
Por esse motivo, devemos selecionar bem o que estamos ou
vindo para que não sejamos enredados por filosofias vãs e enga
nosas, que se fundamentam nas tradições humanas e nos princípios
elementares deste mundo, e não em Cristo (Cl 2.8). Além disso,
devemos evitar consumir músicas que apresentam valores con
trários à Bíblia, pela simples razão de estarmos colocando dinhei
ro nas mãos de pessoas que se opõem aos valores cristãos, ao
Evangelho de Cristo, e que muitas vezes blasfemam o nome de
Deus.

107
Essa música é
mundana demais

Eu penso que a música, por si só, é neutra. Música


não é certa ou errada. E apenas um veículo que pode
ser usado bem ou mal... E o uso que fazemos dela e
as personalidades envolvidas que fazem a diferença.

Luís Palau

Tendo crescido em um lar cristão, desde a infância ouvi inú


meros alertas sobre o perigo de o crente envolver-se com o mun
do. Aliás, uma das primeiras passagens bíblicas que memorizei
quando criança foi o Salmo 1. Naquela época eu entendia que
ter contato com os ímpios tornava o cristão impuro. Infelizmente,
aquele não era apenas o pensamento infantil de uma criança que
não sabia interpretar a Bíblia, mas é a mentalidade predominan
te em muitos círculos evangélicos até hoje. Muitos pregadores
usam o texto Como é feliz o homem que teme o Senhor, que não
segue o conselho dos ímpios, não imita a conduta dos pecadores, nem
se assenta na roda dos zombadores para sustentar a crença de que
o cristão não pode ter relacionamentos com os ímpios. Seguindo
essa mentalidade, a comunidade cristã tem se isolado do mundo
e assumido uma postura de superioridade em relação aos incré
dulos. Foi por esse mesmo motivo que os fariseus rejeitaram Jesus;
eles haviam se tornado mais espirituais que o próprio Deus.
Mas qual o relacionamento dessa mentalidade com a música?
É que, com uma interpretação errada acerca de como deve ser a
relação entre o crente e o mundo, todas as áreas de nossa exis
tência sofrem, inclusive a música. Passamos a categorizar as coi
sas entre cristãs e seculares, sagradas e profanas. Dizemos Isto
pode porque é sagrado!, ou Isto não pode, é profano. O maior perigo
dessa dicotomia é que muitos passam a viver uma esquizofrenia
espiritual, como disse George Verwer1. Tais pessoas desenvolvem
duas personalidades, uma vivida no ambiente sagrado, a igreja, e
outra levada a cabo no ambiente secular, o mundo.
Talvez seja por isso que existem mais santos dentro da igreja,
das quatro paredes do templo, do que nas ruas, nos comércios, no
trânsito das grandes cidades. Até mesmo um mafioso pode pare
cer santo dentro de uma igreja. O desafio é ser luz no mundo.
Jesus disse: "Não rogo que os tires do mundo, mas que os protejas
do Maligno" (Jo 17.15).
Como cristãos, somos chamados para brilhar em meio a uma
geração corrupta e perversa (Fp 2.15), a estar no mundo sem ser
do mundo, a transformar nosso padrão de pensamento, renovan
do nossa mente (Rm 12.2). É preciso sabedoria para diferenciar o
ser do estar. Tal sabedoria não será alcançada através de uma
mentalidade medíocre e separatista.
Precisamos nos livrar dessa dicotomia que faz separação entre
o sagrado e o secular, a fim de sermos mais efetivos para Deus e
desfrutarmos mais a vida abundante que Jesus veio nos dar. Como
disse Lawhead:

Um temor doentio de tornar-se mundano ou uma preocupação


obsessiva em descobrir o que é e o que não é mundano, é um
sinal marcante de uma mentalidade de isolamento. [...] Quando
a Bíblia fala de mundanismo, está falando sobre cair no modo de
pensar pecaminoso do mundo, permitindo que alguma outra
coisa tome o lugar de Deus em nossas vidas. Mundanismo não é
o mero contato com as pessoas, lugares ou coisas do mundo.2

109
É essa mentalidade de isolamento que nos impede de sermos
mais efetivos na expansão do Reino de Deus. Foi contra tal men
talidade que lutaram os reformadores do século 16. Para eles, o
senhorio de Cristo devia estender-se sobre todas as áreas de nos
sa vida, inclusive a música e as artes.
Quando tratamos de isolamento musical, surgem algumas per
guntas. Existe música mundana? Se existe, o que diferencia a
música mundana da música sacra? Uma escala musical diferen
cia um dó secular de um dó cristão? Podemos encontrar num
piano tanto um dó diabólico quanto um dó divino? Existe algo
como uma guitarra secular e uma guitarra cristã?
O escritor John Blanchard discorre sobre essas questões:

Não há tal coisa que se possa intitular música cristã. Há cristãos


e há música; há boa música e há música de má qualidade (tal
afirmação nada tem a ver com gosto, estilo, cultura, ou idade
daquele que a executa ou ouve); há música que reflete a glória de
Deus e há música que não o faz. Podemos levar isto ainda mais
longe: há cristãos que escrevem e tocam música má, e há incré
dulos que escrevem música boa. A música não é boa por estar
sendo tocada num contexto religioso, nem a música é má por
ser executada num contexto secular. Todas estas distinções ten
dem a distorcer a verdade. A música não deve ser julgada pelo
seu contexto, mas pelo seu conteúdo. Flores maravilhosas po
dem ser encontradas num deserto poeirento, assim como plan
tas venenosas podem ser encontradas num encantador jardim.3

O fato de Blanchard estar criticando o rock em seu livro não


o impediu de enxergar a realidade de que a música em si é neu
tra. Mas ele não foi o único a chegar a essa conclusão. Outros
escritores que falam sobre a influência da música popular na cul
tura contemporânea também concordam com o fato de que sim
plesmente não existe tal coisa que possa ser chamada de música
mundana. Vejamos alguns exemplos:

110
Música é feita de notas individuais, acordes e padrões rítmicos
que podem ser tocados por alguns ou muitos instrumentos. As
notas não têm escolha de como serão usadas. E o músico quem
determina como uma criação musical será usada — se para o
bem ou para o mal. Mesmo se a maioria das [...] canções fossem
utilizadas pelo homem para o mal, isso não alteraria o fato de
que elas também possam ser utilizadas com bons propósitos.4

Precisamos perceber que a música ganha valor quando é ho


nesta, em significado e propósito. Devemos agradecer a Deus pela
canção de amor honesta que reflete a bênção de escolher al
guém para amar para sempre. Devemos nos alegrar quando um
artista — secular ou cristão — é imparcial com os jovens sobre os
problemas da vida e oferece soluções. Devemos abraçar letras de
qualquer um disposto a dizer aos jovens que alguém se importa,
dando-lhes esperança no meio das provações. Como disse Francis
SchaefTer, "devemos perceber que arte não precisa ser um folheto
do Evangelho para ser boa"5. Não precisamos nos limitar à músi'
ca cristã. Como reconhece Larson, há muitos artistas de rock cujos
estilos de vida e canções estão acima de censura6.

O que todos os autores citados estão dizendo é que a frase


Esta música é mundana e não pode ser usada na igreja é um mito,
uma ilusão e, portanto, não pode ser levada a sério para determi
nar se um estilo musical pode ou não ser usado pela igreja.
Espero que, ao refletir sobre essas declarações, possamos des
cobrir que o que torna uma música maligna não é seu rótulo, não
é se ela é chamada de secular ou cristã, mas seu conteúdo, sua
mensagem, sua motivação e seu propósito.

111
A música cristã deve
ser apenas para louvor
e adoração

Devemos tomar cuidado até mesmo com algumas


músicas evangélicas que, na realidade, não contêm
uma mensagem muito definida de louvor a Deus.

Glen Hughes

Muitos criticam a música cristã contemporânea alegando que


o louvor e a adoração devem ser os únicos objetivos da música
cristã. Eles se esquecem de que para o judeu nos tempos bíblicos
a adoração era um estilo de vida, não uma atividade confinada
aos cultos realizados no templo aos sábados. Sendo assim, a músi
ca usada por eles estava relacionada a uma grande variedade de
atividades diárias e era usada com diversos fins e propósitos, tais
como:

• para promover alegria (Gn31.27; Ec 2.1,8-11);

• na guerra Qs 6; 2Cr 20.21,22);

• como expressão de arte e poesia (Cantares de Salomão);

• como forma de protesto (SI 73);


• para confissão (SI 32; 51);

• para oração (SI 7; 42; 64 etc);


• para testemunho (SI 23; 46 etc);
• para terapia (ISm 16.14-17,23);

• como dever religioso (SI 81.1; 95.1; Is 30.29); e

• como expressão de lamento e tristeza (Lamentações de


Jeremias).

A música foi criada por Deus e já existia mesmo antes de haver


o homem. No livro de Jó, o mais antigo das Escrituras, lemos que,
quando Deus lançava os fundamentos da terra, as estrelas matu
tinas cantavam e todos os anjos se regozijavam (Jó 38.1-7). Se
compararmos esta passagem com Isaías 14.12, onde Lúcifer é cha
mado de estrela da manhã e filho da alvorada, podemos enten
der que, mesmo antes da criação do Universo, havia no céu uma
hoste angelical separada para cantar louvores ao Eterno Deus,
da qual Lúcifer parece ter sido o regente (Ez 28.12-15)*.
O homem, criatura de Deus, recebeu a música como um dom
divino. É interessante notar que mesmo os povos mais primitivos
são dotados de musicalidade. Não existe nem um povo que não
tenha sua própria música, assim como não existe ninguém que
não aprecie algum tipo de música. Vivemos num universo musi
cal onde, desde que nascemos, somos envolvidos pela música e
aprendemos a apreciá-la.
Na Bíblia, a primeira passagem referente à música e instru
mentos musicais está em Gênesis 4.21. O texto se refere às bases
da cidade edificada por Caim e seus descendentes. Entre os pila-

*Muitos comentaristas das escrituras concordam com o fato de que ambas as


passagens (Is 14.12 e Ez 28.12-14) estão relacionadas tanto a reis terrenos como à
queda de Lúcifer, e apesar do termo Lúcifer não aparecer nas traduções em português
de Isaías 14.12, em que foi traduzido por estrela da manhã, a versão inglesa King
James usa a palavra latina Luct/er, que quer dizer cheio de luz. Se este for o caso,
Ezequiel 28.13 relaciona Lúcifer a instrumentos musicais — "seus engastes e guami-
ções". De acordo com Ci-iamplin, a palavra hebraica traduzida por engastes significa
instrumentos musicais de sopro. A tradução de Almeida, revista e corrigida, fala de
tambores e pífaros. A Bíblia de Jerusalém, em nota de rodapé, aponta para tamborins
e flautas.

113
res daquela sociedade primitiva encontramos a agricultura (v. 20),
a indústria (v. 22) e a música (v. 21). Vemos nessa passagem a
importância da música na vida do homem.
E de interesse também notarmos que, na Bíblia, a música era
dividida em instrumental (SI 33.2,3; 150) e vocal (SI 98.5; 2Sm
19.35; At 16.25).
Steve Miller diz que, possivelmente, os fatores mais interes
santes quando observamos a música na Bíblia são a sua rica varie
dade e as poucas restrições quanto a seu uso. Miller aponta para
a variedade de instrumentos, de sons e volumes, de adoradores,
de posturas e modos, de lugares, de ocasiões e de motivos1.
Vejamos algumas dessas variedades:

• Variedade de instrumentos musicais na Bíblia. Diversos


instrumentos musicais são encontrados nas Escrituras, di
vididos em três categorias:

• instrumentos de sopro: cornetas/trombetas (Nm 10.9,10;


2Cr 5.12; Is 27.13), flauta dupla (Dn 3.5,15) e pífaro/
flauta (Jó 21.12; Dn 3.5);
• instrumentos de cordas: harpa/lira (ISm 16.23; Is 16.11),
saltério (Dn 3.5,7,10,15) e citara (Dn 3.5);
• instrumentos de percussão: tamborim (Ex 15.20; SI 81.2),
címbalo (2Sm 6.5; SI 150.5) e chocalho (2Sm 6.5).

• Variedade de sons e volumes:

• alto como o som de muitas águas, como o trovão, como


o som dos harpistas (Ap 14.2,3);
• vozes acompanhadas por instrumentos (2Cr 5.12,13);
• sons de alegria (Ne 12.43);
• instrumentos ressonantes (2Cr 30.21);
• um barulho alegre (SI 95.1).

• Variedade de adoradores:

• cantores e músicos designados e treinados (lCr 15.22);


• duetos (Jz 5.1);

114
• todo o povo (2Cr 23.13);
• tudo o que tem vida (SI 150.6).

Variedade de posturas e modos:

• batendo palmas (SI 47.1);


• dançando (Êx 15.20);
• levantando as mãos para o santuário (SI 134.2);
• empe (2Cr 7.6);
• ajoelhado (SI 95.6);
• usando repetições (o Salmo 136 repete 26 vezes a mes
ma frase).

Variedade de lugares:
• na grande congregação (SI 68.26);
• nos muros de Jerusalém (Ne 12.31);
• na ampla sala no andar superior (Mc 14-15);
• descendo de um monte (ISm 10.5);
• no santuário (SI 150.1);
• nacama (SI 149.5);
• na prisão (At 16.25).

Variedades de ocasiões:
• na dedicação do muro da cidade (Ne 12.27);
• durante as ofertas (2Cr 23.18);
• acompanhando uma festa (2Cr 30.21);
• durante a unção do rei (lRs 1.34);
• durante a lua nova e durante a lua cheia (SI 81.3);
• no culto (ICo 14);
• na celebração da Páscoa/ceia (Mc 14.26);
• num tempo de crise pessoal (At 16.25).

Variedade de propósitos:

• para ensinar a verdade (SI 1; 119; 127);


• paraorar(S13;6;38;131;137);
• para confessar pecados (SI 51);

115
• paralouvar(Sl8;18;116;138);
• para exortar (SI 2; 131; 134; 136).

Como vemos, a música na Bíblia é rica e variada. Sendo um


dom de Deus ao homem, a melhor forma de agradecer a Deus por
essa dádiva é fazer música para seu louvor e sua glória. Em Hebreus
13.15, somos exortados a louvar a Deus de duas maneiras: "Por
meio de Jesus, portanto, ofereçamos continuamente a Deus um
sacrifício de louvor, que é o fruto de lábios que confessam o seu nome".
A música como dever religioso — que deve ser oferecida como
sacrifício de louvor — é o que nós chamamos de música sacra, ou
sagrada, música de louvor e adoração.
Existe, no entanto, uma música espontânea, que brota do co
ração cheio da vida de Deus, através do Espírito Santo — é o
fruto dos lábios que confessam o seu nome (Ef 5.18,19). Essa
música, que não deixa de ser louvor a Deus, não precisa ser feita
de palavras ou expressões religiosas. Ela reflete as experiências
da vida de alguém que conhece a Deus e não precisa afirmá-lo
com os lábios para que as pessoas tomem conhecimento. Sua vida
é uma expressão de sua intimidade com o Criador. É por esse
motivo que a música encontrada nas Escrituras é ampla e está
relacionada a todas as áreas da vida humana.
Atualmente, quando Deus parece estar restaurando a música
na igreja, é preciso que a música cristã não se limite a temas
sacros, mas que esteja também relacionada com a totalidade do
ser humano, com a realidade do seu dia-a-dia num mundo cada
vez mais complexo e carente da glória de Deus.

116
Quarta parte

Aprendendo a
usar a música cristã
contemporânea

A música cristã contemporânea prove um meio


cultural relevante de encorajamento espiritual e uma
alternativa de entretenimento para a geração atual.

John Styll
Um desafio aos músicos

Jesus não quer que sejamos tão bons quanto o


mundo, ele quer que sejamos melhores! E isso não
significa excedê-lo no som, no estilo, ou no
talento... significa ultrapassá-lo no valor...

Keith Green, músico cristão.

A música cristã contemporânea veio como uma bênção do


céu para os músicos cristãos. Antes mesmo de perguntarem se
era correto ou não, eles já a tocavam e traziam-na para dentro
das igrejas evangélicas. Enquanto os pastores debatiam o assun
to, eles formavam bandas e transformavam os cânticos tradicio
nais em melodias contemporâneas. Isso gerou contendas e, na
maioria dos casos, os músicos tiveram uma grande parcela de
culpa. O motivo está no fato de que os músicos cristãos, em gran
de parte, foram por muito tempo mais músicos do que cristãos.
Quando eu me converti e comecei a tocar na igreja, essa re
alidade era bastante evidente no círculo de amigos e músicos
cristãos. Freqüentemente íamos à igreja tão-somente para tocar
e não aproveitávamos nada da mensagem. Em outras ocasiões,
nosso interesse estava voltado para um outro grupo que vinha
tocar na igreja, e começávamos a comparar as habilidades para
ver quem tocava melhor. A igreja tornava-se, então, um palco de
vaidades, sem contar o esforço que fazíamos para impressionar as
moças com nossos dotes musicais.
Hoje sinto vergonha ao me lembrar de quanto tempo perdi
com tais atitudes. No entanto, na época, nenhum pastor se apro
ximou de mim e de meus amigos para falar-nos, de uma forma
clara e convincente, acerca de nossos erros. Parecia que, pelo fato
de a igreja precisar de nossas habilidades musicais, podíamos con
tinuar como estávamos — desde que continuássemos na igreja!
Graças a Deus muitos pastores estão enxergando esse proble
ma e estão tratando dele. Tendo isso em vista, ofereço, aqui, um
desafio aos músicos cristãos. Conheço bem a resistência das pessoas
quando se fala em seguir regras. Mas, acredite-me, se você con
siderar as diretrizes a seguir, seu ministério será mais eficaz e terá
maior impacto no mundo.

Não deixe a música substituir seu relacionamento com Deus

Um dos grandes desafios para qualquer músico cristão é man


ter o equilíbrio entre sua paixão pela música e seu amor por Deus.
Muitos não conseguem encontrar esse equilíbrio e chegam a fa
zer da música o seu pequeno deus. Quando deixamos a música
— ou qualquer outra coisa — tomar o lugar de Deus em nossa
vida, estamos edificando para nós mesmos um altar a outro deus,
algo que se tornou um ídolo para nós. A prova disso, no caso da
música, é que gastamos mais tempo com nosso instrumento musi
cal do que com a Bíblia. Sabemos mais sobre os últimos modelos
de guitarras e teclados do que sobre os ensinamentos de Jesus.
Temos mais ouvidos para a música do que para o que Deus está
querendo falar através do Espírito Santo. Em resumo, não temos
tempo para nos relacionarmos com Deus. Mas, como disse Melody
Green, "a música não é um substituto de nosso tempo com Deus,
nem mesmo a música de adoração"1.
Alguns músicos podem pensar Mas, então, eu não posso mais
ensaiar, estudar e aprimorar minhas técnicas? Não só pode, como
deve. No entanto, tudo deve ser feito dentro das prioridades cor
retas. Se a ordem das prioridades for invertida, causando um
desequilíbrio, corremos o risco de colocar em jogo nosso relacio-

119
namento com Deus ou com o próximo. A música cristã deve ser
uma expressão da vida do cristão com Deus. A Bíblia diz que
devemos fazer tudo para a glória de Deus (ICo 10.32). Isso certa
mente inclui a música que ouvimos e que tocamos.

Esteja vinculado a uma igreja local

Algo que não canso de falar aos jovens nem aos músicos com
quem tenho contato é que cada músico cristão deve estar vincu
lado a uma igreja local. E na igreja local que você irá crescer em
sua fé cristã. É lá onde você terá uma oportunidade de expressar
seu amor a Deus nos relacionamentos com outros irmãos. E atra-
vés da igreja local que você irá descobrir e aprender a exercer
sua função no Corpo de Cristo. Mais importante ainda: os líderes
da igreja local estarão mentoreando seu caminhar com Cristo,
ajudando-o a enxergar seus erros, aconselhando-o, orando por
você e por seu ministério. A exortação do escritor aos Hebreus
nunca foi tão atual quanto hoje: "Não deixemos de reunir-nos
como igreja, segundo o costume de alguns, mas procuremos en
corajar-nos uns aos outros, ainda mais quando vocês vêem que se
aproxima o Dia" (Hb 10.25).

Não comprometa seus valores cristãos

Uma das grandes tentações que o músico cristão enfrenta é a


de se vender para alcançar o sucesso, o que pode acontecer de
várias maneiras. Quando falamos sobre isso, logo vem a idéia de
alguém que abandonou a música cristã para mergulhar no cená
rio secular. Mas nem sempre o vender-se chega a tal ponto. Mui
tos correm o risco de se venderem mesmo dentro do cenário cristão.
Como? De várias maneiras. Vejamos algumas.
Copiando o estilo e a identidade de outros músicos. Se um músico
se considera chamado por Deus para exercer seu ministério, ele
deve buscar de Deus sua identidade e seu estilo musical. Quan
do esse músico passa a imitar o estilo de outros músicos — mesmo
que sejam cristãos —, pensando que poderá tornar sua música

120
mais agradável para as massas, ele corre o risco de estar se ven
dendo em busca do sucesso.
Produzindo música com fins comerciais. Música é uma forma de
arte, uma expressão da criatividade que Deus concedeu ao homem.
Como tal, é um dom de Deus. Por esse motivo, produzir música
apenas visando ao lucro pessoal é desonrar o dom de Deus.
Oferecendo respostas baratas para atrair mais ouvintes. Um
jornalista australiano disse que nós, cristãos, somos uma "mino
ria egoísta e vaga, que estamos continuamente dizendo aos ou
tros para tornar-se cristãos em vez de descobrirmos por que eles
não são"2.
Esta declaração é um tanto agressiva, mas reflete uma reali
dade entre nós — principalmente se tratando da música cristã.
Como já vimos antes, a maioria das canções cristãs são medíocres
no que diz respeito à letra. E quando alguém tenta mudar, com
pondo sobre temas do cotidiano, acaba sendo criticado por es-
crever uma letra muito superficial. Mas o que é mais superficial:
dizer simplesmente que Jesus salva ou falar das conseqüências do
pecado — racismo, violência, egoísmo, poluição, drogas etc. —
do qual Jesus está querendo salvar o homem?
Na década de 1990, muitos pensaram que artistas cristãos
populares da época, como Michael W Smith e Amy Grant, haviam
se vendido porque algumas de suas canções não mencionavam
mais o nome de Deus. Com essa mentalidade, teríamos de retirar
o livro de Ester da Bíblia, pois ele também não menciona o nome
de Deus. O fato é que os artistas estavam preocupados em ofere
cer respostas aos problemas que as pessoas enfrentavam. Seguin
do o caminho contrário, muitos estão cantando o que os cristãos
querem ouvir — não o que eles precisam ouvir — e vendendo
milhares de discos. Devemos lembrar que os profetas do Antigo
Testamento não faziam sucesso com sua mensagem. Jesus tam
bém não foi popular na agenda dos religiosos, mas nem por isso
mudou a sua mensagem. Do mesmo modo, os músicos cristãos
precisam tomar cuidado para não se deixar levar pelo sentimento
de aprovação da maioria, pensando, desse modo, estar agradan-

121
do a Deus. Ao contrário do dito popular, nem sempre a voz do
povo é a voz de Deus.

Aprenda a usar a música certa para a ocasião certa

O evangelista Luís Palau certa vez disse que música é como


uma peça de roupa. Deve-se usar a música certa para a ocasião
certa3. Uma verdade que muitos músicos precisam aprender.
Uma vez que a Bíblia não diz nada a respeito de qual estilo
musical específico deve ser usado pelo cristão, como podemos
determinar se um estilo serve ou não para o que estamos fa
zendo?
Tal escolha deve ser feita após considerarmos duas questões
básicas e essenciais.
Qual é o propósito da reunião! A regra fundamental diz respei
to ao propósito do que estamos fazendo. Qual o nosso objetivo?
Se queremos criar um ambiente de confissão e quebrantamento,
não usaremos rap ou rock. Se, por outro lado, desejamos conduzir
o povo no louvor alegre, é melhor que o estilo usado seja propício
para isso. De maneira semelhante, um estilo usado para o evan-
gelismo através da música pode não ser o melhor para o louvor e
a adoração.
Que público tentamos alcançar? Em segundo lugar, devemos le
var em consideração a audiência que tentamos alcançar. Se nos
sa música é dirigida a uma congregação de pessoas mais idosas e
conservadoras, não iremos conquistá-las ao som de rock. O uso
de cânticos tradicionais e suaves funcionará melhor. Quando,
todavia, objetivamos alcançar jovens e adolescentes, uma melo
dia popular e contemporânea irá atraí-los mais do que os velhos
hinos. Para alguns grupos específicos, o uso do rock pesado ou do
rap se tornará necessário.
Esse processo exige uma certa flexibilidade do músico cristão.
Como o apóstolo Paulo, para ser efetivo em seu ministério, ele
precisará fazer "tudo para com todos, para de alguma forma sal
var alguns" (ICo 9.22).

122
O músico cristão precisará aprender a fazer a escolha certa,
evitando prender-se a formas tradicionais que funcionaram no
passado, ao seu gosto pessoal, àquilo que ministra à sua vida e ao
que parece apropriado à sua cultura. Caso contrário, estará obri-
gando sua audiência a moldar-se ao seu gosto pessoal e cultural,
o que certamente não é uma boa maneira de alcançar as pessoas
ou ministrar a elas. Não foi assim que Jesus fez. Ele não ficou lá
no céu cantando O mortais! Se vós soubésseis como eu vos amo!...
Não! Em vez disso, Jesus deixou seu conforto, sua glória, sua se'
gurança ao lado do Pai e veio ao mundo na fragilidade de uma
criança, nascendo entre os homens e tornando-se semelhante a
eles. Qual era o objetivo de tanto esforço? Servir. Porque "nem
mesmo o Filho do homem veio para ser servido, mas para servir e
dar a sua vida em resgate por muitos" (Mc 10.45).
Paulo, em Filipenses 2.5-11, disse que esta deve ser a nossa
atitude:

Seja a atitude de vocês a mesma de Cristo Jesus, que, embora


sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que
devia apegar-se; mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo,
tornando-se semelhante aos homens. E, sendo encontrado em
forma humana, humilhou-se a si mesmo e foi obediente até a
morte, e morte de cruz! Por isso Deus o exaltou à mais alta
posição e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que
ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debai
xo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor,
para a glória de Deus Pai.

O músico cristão que segue esse exemplo não ficará preso aos
seus próprios gostos nem à tradição ou à cultura. Ao buscar servir
aos outros através de sua música, ele aprenderá a sacrificar-se
em função do próximo. Se fizer isso de todo o coração, com o
desejo sincero de servir, ele poderá não fazer muito sucesso no
meio dos homens, mas ouvirá do seu Senhor e Mestre: Muito bem,
servo bom e fiel!... Venha e participe da alegria do teu Senhor!

123
Em busca da excelência

Nenhum atleta é coroado como vencedor, se não


competir de acordo com as regras.

Apóstolo Paulo

O músico cristão, quer reconheça ou não, ocupa uma posição


de destaque no Corpo de Cristo, pois sua obra é vista e ouvida
pelas pessoas ao seu redor. Não existe como escondê-la. Ele não
pode, como faz o intercessor, trabalhar no porão. Seu lugar é no
palco, diante dos olhos do público. Tal posição exige certas qua
lidades de caráter, a fim de que o nome de Cristo não seja en
vergonhado. Algumas dessas características estão listadas a seguir.

FLEXIBILIDADE

O músico cristão exerce um ministério dirigido a pessoas de


idades, gostos e culturas distintos. Para ser capaz de comunicar-
se com cada uma delas, ele precisa ser flexível, não se limitando
a apenas um estilo musical, mas usando o estilo específico para o
público-alvo, fazendo de tudo para com todos (ICo 9.19-23).

MATURIDADE CRISTÃ
Uma das funções da música é ensinar ao povo as verdades da
Palavra de Deus. Em Colossenses 3.16, Paulo recomenda-nos o
seguinte: "ensinem e aconselhem-se uns aos outros com toda a
sabedoria, e cantem salmos, hinos e cânticos espirituais". Este
aspecto aproxima o músico do mestre. Se assim for, a advertência
de Tiago, de alguma forma, deve ser considerada pelos músicos
cristãos: "Meus irmãos, não sejam muitos de vocês mestres, pois
vocês sabem que nós, os que ensinamos, seremos julgados com
maior rigor" (3.1).
Aquilo que é ensinado através da música e das atitudes do mú
sico cristão será julgado por Deus de uma forma mais severa, por
causa da esfera de influência que aquele que faz uso de uma plata
forma possui. Por esse motivo, qualquer cristão considerando uma
carreira musical deve estar preparado a dizer, como o apóstolo,
"Tornem-se meus imitadores, como eu o sou de Cristo" (ICo 11.1).

DILIGÊNCIA
O dicionário define diligência como presteza em fazer alguma
coisa. A pessoa diligente é cuidadosa, zelosa, alguém que se em
penha naquilo que faz. O músico cristão deve ter zelo por sua
música e por seus instrumentos. Ele deve buscar apresentar sem
pre o melhor, dedicando, para isso, treino e preparo adequados.
Paulo expressou um padrão bíblico de diligência quando es
creveu aos Colossenses: "Tudo o que fizerem, façam de todo o
coração, como para o Senhor, e não para os homens" (Cl 3.23).
A advertência do profeta deve fazer-nos tremer diante do fato
de que é considerado maldito aquele que faz a obra do Senhor
negligentemente (Jr 48.10).

ESPÍRITO DE SERVO
A capacidade de servir aos outros sem esperar recompensa
dos homens é uma grande virtude que deve estar presente em
cada discípulo de Cristo. Jesus disse: "quem quiser tornar-se im
portante entre vocês deverá ser servo" (Mt 20.26).
O músico cristão não deve buscar fama ou riquezas. Seu mi
nistério não deve ser avaliado com base no número de pessoas

125
que assistem a suas apresentações ou em quantos CDs ele vende.
Ele fará sucesso aos olhos de Deus quando usar seus dons e talen
tos para servir ao próximo (Mt 25.21,34-40).

SENSIBILIDADE PARA COM OS MAIS FRACOS

Em Romanos 14, Paulo nos adverte a sermos sensíveis para


com os mais fracos. Naquela época, a questão polêmica era se o
cristão devia ou não comer certos tipos de comida. Hoje, em
muitos lugares, a questão é se o cristão deve ou não ouvir ou
tocar certos estilos musicais — uma vez que muitos deles estão
associados a imagens de violência, rebelião, sensualidade e ado
ração satânica.
Se mudarmos algumas palavras daquele capítulo por música
cristã contemporânea, teremos a seguinte advertência do após
tolo: aceitem ao que é fraco na fé, sem discutir assuntos contro
versos. Um crê que pode ouvir música cristã contemporânea; já
outro, cuja fé é fraca, ouve apenas música tradicional. Aquele
que ouve música cristã contemporânea não deve desprezar o que
não ouve, e aquele que não ouve música cristã contemporânea
não deve condenar aquele que ouve, pois Deus o aceitou... Cada
um de nós prestará contas de si mesmo a Deus. Portanto, deixe
mos de julgar uns aos outros. Em vez disso, façamos o propósito de
não colocar pedra de tropeço ou obstáculo no caminho do irmão.
O músico cristão que se sente chamado por Deus para minis
trar com estilos musicais contemporâneos não deve desprezar
aqueles que preferem as canções tradicionais, e vice-versa. O
importante é que cada um seja fiel ao seu chamado e sensível às
preferências alheias.

O DESEJO DE COMUNICAR A MENSAGEM COM CLAREZA

Como discípulo de Cristo, o músico cristão é enviado ao mun


do com uma mensagem. Tornar essa mensagem clara para seus
ouvintes deve constituir-se uma de suas maiores preocupações.
David Pierce, fundador do ministério Steiger Internacional e
da banda No Longer Music, relata a experiência que teve ao

126
assistir à apresentação da banda U2 para sessenta mil pessoas na
Holanda. Ele diz:

Durante o show, todos estavam em pé, com a atenção voltada


para Bono, o vocalista. Foi uma experiência incrível estar com
tantas pessoas e sentir-se tão unido a elas. Alguém que conhe
cia o Bono tinha me dito que ele era um cristão. Pensei comigo
mesmo Dê glória a Deus, Bono. Ao pensar nisso, notei um lindo
pôr-do-sol com seus raios avermelhados invadindo o estádio.
Dê glória a Deus, Bono. Eles irão ouvi-lo. Você não precisa dizer
muito. Diga apenas algo. Eu continuei esperando que ele fizesse
uma declaração sobre Deus. Mas ele não disse nada. E todos
deixaram o estádio cantando "Eu ainda não encontrei o que
estou procurando".1

Essa experiência marcou tanto a vida de David Pierce que ele


prometeu a Deus que, sempre que estivesse num palco, mesmo
que fosse ameaçado de morte, diria algo de sua fé em Cristo.
David e sua banda tiveram a oportunidade de tocar e comparti
lhar o amor de Deus em alguns dos lugares mais sombrios do
século 20: no distrito hippie de Cristiania em Copenhague, onde
a única igreja é um templo satânico; numa reunião de terroristas
do eta, em Bilbao, na Espanha; num clube de jovens satanistas
na Holanda; para uma multidão de muçulmanos no Casaquistão
e em dezenas de cidades na Sibéria e na Mongólia.
O desejo de comunicar uma mensagem positiva deve estar
em todos aqueles que usam a plataforma pública e que têm aces
so a pessoas perdidas e sem esperanças. O cristão deve ser o exem
plo, pregando a palavra a tempo e fora de tempo (2Tm 4.2).

EVITANDO AS ARMADILHAS NO CAMINHO

O músico e pastor britânico Steve Flashman diz que aqueles


que consideram a música como uma ferramenta para comunicar
o Evangelho às pessoas correm o risco de cair em três armadilhas:
• falta de profissionalismo;

127
• superficialidade, com letras cheias de chavões cristãos; e
• isolamento, com concertos somente em igrejas para o pú
blico cristão em sua maioria.

Por outro lado, Flashman aponta os perigos que esperam aque


les que se enxergam como músicos em primeiro lugar e que, por
acaso, são cristãos:
• o perigo de comprometer os padrões cristãos para conse
guir um contrato;

• o perigo de alienar-se da igreja, da família e de Deus por


medo de não ser compreendido; e
• o perigo de não pregar o evangelho.

Quanto a este último risco, Flashman faz o seguinte comentário:

Isso não significa que as canções produzidas têm de ter conteú


do cristão, mas sim que o músico é um embaixador de Cristo, e
que, sendo assim, suas entrevistas, apresentações e declarações
públicas devem refletir algo da natureza de Deus... Há tantas
bandas pregando suas mensagens [em som] alto e claro, é hora
de termos coragem de falar com clareza.2

Músicos cristãos precisam estar conscientes de que sua músi


ca pode ser de grande influência para a vida de muitas pessoas.
Para que essa influência seja duradoura e benéfica, eles devem
assumir um compromisso sério com Deus e sua Palavra, colocan
do-o em primeiro lugar em suas vidas. A comunhão com uma
igreja local e o cuidado para não se deixar levar por motivações
duvidosas devem estar presentes na vida de cada um. Além dis
so, os músicos cristãos precisam desenvolver certas qualidades
para que sua música alcance o público-alvo e produza resultados
positivos. Somente assim eles terão condições de produzir músi
cas que serão relevantes à sua geração.
Trazendo a música cristã
contemporânea para casa

A ignorância dos adultos contribui para a proliferação


de rock pornográfico distribuído a seus filhos.

Bob Larson

Quando se fala de música cristã contemporânea, gospel ou


rock cristão, muitos pais ficam preocupados com o que seus filhos
estão escutando ou onde eles estão indo assistir às apresentações
das bandas. Essa preocupação acentua-se ainda mais quando os
adolescentes ou jovens começam a mergulhar na subcultura
musical e passam a refleti-la em seu modo de vestir-se, arrumar
— ou desarrumar — os cabelos, falar etc.
Infelizmente, muitos cristãos têm tratado a questão da música
que seus filhos ouvem do mesmo modo que alguns pais de an
tigamente tratavam a questão da masturbação de seus filhos. Em
vez de aconselhá-los de forma correta, aqueles pais tentavam
assustá-los, dizendo que se continuassem a mastubar-se ficariam
cegos ou que cresceriam pêlos nas palmas das mãos. Da mesma
maneira, hoje, muitos pais tentam assustar seus filhos dizendo
que o rock é do Diabo ou que todos os roqueiros são satanistas.
Outros, nem sequer dizem nada, simplesmente entram no quarto
do filho arrancando os pôsteres das paredes e quebrando cds e
DVDs. O resultado de tais atitudes é que muitos vencem a bata
lha, mas perdem o filho. A Bíblia diz: "Pais, não irritem seus fi
lhos; antes criem-nos segundo a instrução e o conselho do Senhor"
(Ef6.4).
Os pais precisam aprender a lidar adequadamente com os pro
blemas que seus filhos possam estar enfrentando também na área
da música.
O escritor Bob Larson tornou-se um especialista em cultura
juvenil e rock. Seu programa de rádio Talk back to Bob Larson
[Converse com Bob Larson1] teve uma grande audiência nos Es
tados Unidos e ajudou muitos jovens e adolescentes em seus pro
blemas com drogas, sexo, envolvimento satânico e rock. No livro
Su hijo y ei rock [Seu filho e o rock1], Larson aponta quatro manei
ras através das quais os pais podem ajudar seus filhos com relação
à música. Vejamos.

ESTANDO INFORMADO

A falta de informação quanto ao que seus filhos estão escu


tando pode levar os pais a ignorar algo maléfico ou a tentar privá-
los de algo que poderia servir como alternativa saudável para
suas vidas. A maior parte dos desentendimentos entre pais e fi
lhos cristãos, quando o assunto é música, é fruto de preconceitos
e mitos como os que tratamos neste livro.
O sociólogo cristão norte-americano Tony Campolo olha para
a questão da música popular e do rock da seguinte forma: "Parte
da música popular entre os jovens hoje, dentro do cenário de
música cristã, é boa e parte é má. O assunto não está relacionado
particularmente ao tipo de música, mas ao que está sendo comu
nicado e expresso através da música"3.
Para saber o que está sendo comunicado através da músi
ca, os pais precisam interessar-se pelo assunto, pesquisar, ir com
seus filhos a certos concertos, demonstrar interesse genuíno por
aquilo que é tão importante para eles. Para muitos, isso é um

130
desafio que envolverá sacrifícios pessoais. Mas, quando se trata
do bem-estar de um filho ou uma filha, nenhum esforço é grande
demais.

DEMONSTRANDO AMOR

Vivemos num mundo cada vez mais agitado e corrido. As de


mandas da vida, do trabalho, da igreja e do ministério parecem
sugar todo o nosso tempo. Em meio ao ativismo, muitos pais não
dedicam tempo a seus filhos. Esta é uma verdade maior para aque
les que estão no ministério cristão e que esquecem que o minis
tério doméstico deve vir em primeiro lugar. De qualquer maneira,
as conseqüências de tal negligência são trágicas, uma vez que, se
não conseguem atrair a atenção dos pais, as crianças se voltarão
para a televisão ou para os amigos em busca de auxílio e, em
muitos casos, crescerão revoltadas com a igreja que lhes roubou
a presença deles.
Franky SchaefTer faz um comentário importante acerca da espiri
tualidade no relacionamento de amor entre pais e filhos. Ele diz:

Considere uma criança amargurada e amedrontada com o cris


tianismo, porque foi abandonada pelo pai ou pela mãe ocupada
na obra do Senhor. A criança senta-se diante da televisão, na
creche ou em casa, enquanto seus pais correm de um lado para o
outro em atividades espirituais. No entanto, o que pode ser mais
espiritual do que cumprir os mandamentos de Deus, amando e
cuidando de seus próprios filhos, desfrutando da presença deles,
apreciando-os, celebrando a vida com eles?4

Al Menconi nos lembra de que os cantores de rock estão co


municando seus valores a nossos filhos todos os dias. "Será que
estamos fazendo o mesmo?", pergunta ele5.
Precisamos desenvolver um relacionamento de amor e comu
nicação diária com nossos filhos, se não quisermos perdê-los para
o mundo.

131
SENDO UM BOM EXEMPLO

As crianças observam tudo o que os seus pais fazem para apren


der com eles e imitá-los; é fundamental, então, que os pais sejam
um bom exemplo para seus filhos. A Bíblia diz que não devemos
tentar retirar o cisco que está no olho de alguém, quando temos
uma viga em nosso próprio olho (Mt 7.3-5). O mesmo diz respeito
ao relacionamento no lar. Um pai que proíbe seu filho ou filha de
escutar tal música por achar que a letra é perniciosa e violenta,
enquanto assisti a programas de piadas vulgares na televisão, está
contradizendo suas próprias palavras e agindo como hipócrita.
Dessa forma, o modelo que ele apresentará aos filhos é o da hipo
crisia. Como resultado, seus filhos também começarão a agir com
hipocrisia, ocultando dos pais o que fazem ou pensam. As conse
qüências poderão ser trágicas no futuro.

PROVENDO ALTERNATIVAS

De acordo com pesquisas da Associação Médica Americana,


os adolescentes escutam, em média, cerca de 10 500 horas de
rock entre os treze e os dezessete anos — o dobro do tempo gasto
em sala de aula no mesmo período6.
Outra pesquisa, realizada entre os ouvintes de rock pesado
(heavy metal), mostrou que apenas 9% da audiência tinha vinte e
quatro anos ou mais7. A verdade é que os jovens e adolescentes
são naturalmente atraídos pela música pop e pelo rocie. Por isso,
os pais cristãos precisam aprender a prover uma alternativa para
o gosto musical de seus filhos. Felizmente a música cristã con
temporânea apresenta hoje um vasto quadro de artistas e estilos,
para todos os gostos.
Mas, parte da música cristã não soa diferente do rock profano,
dizem alguns. Então, qual é a vantagem de incentivar os filhos
para que ouçam música cristã contemporânea? Bob Larson res
ponde: "A letra das canções não está saturada de imoralidade.
Os músicos têm entregue seus talentos ao Senhor e, em sua maio
ria, estão realmente desejando honrar a Jesus"8.

132
Os pais devem interessar-se por aquilo que seus filhos estão
escutando. Eles devem procurar conhecer um pouco da vida dos
artistas e, sempre que possível, acompanhar os filhos a um con
certo. Quando identificarem algum cantor ou grupo que pode
ser de má influência na vida dos filhos, devem procurar uma al
ternativa cristã para eles. Fazendo isso, estarão demonstrando
interesse sincero pelos filhos e, ao mesmo tempo, terão mais con
dições de ajudá-los em seus problemas.

133
A música cristã
contemporânea na igreja

Se você quiser alcançar os jovens neste


país, escreva uma canção.

Serge Denisoff, sociólogo.

Hoje, certamente Deus está fazendo algo novo em sua igreja,


e a música tem sido grandemente usada neste mover divino.
Milhares de jovens e adultos estão voltando-se para o Evangelho
em concertos de música cristã contemporânea. George Verwer,
fundador da Operação Mobilização, diz que, onde quer que a
igreja esteja crescendo, esse crescimento é geralmente acompa
nhado de música contemporânea1.
Até a celebração do louvor e da adoração nas igrejas ganhou
mais vida através de ritmos populares. Movimentos como a Mar
cha para Jesus só se tornaram possíveis por causa da nova música
de louvor e adoração que foi levada para as ruas. E a música
cristã contemporânea tem sido uma boa alternativa para muitos
cristãos que gostam dos ritmos modermos, mas não querem cor
rer o risco de se contaminar com as mensagens geralmente nega
tivas dos artistas de música popular.
Quando o Movimento de Jesus estava em pleno fôlego nos
Estados Unidos, o evangelista Bilíy Graham disse o seguinte:
"Quem quer que consiga captar a imaginação da gente jovem de
nossa geração, transformará o mundo"2.
Muito tempo depois, ainda há líderes cristãos que não perce
beram essa verdade e que criticam a música cristã contemporâ
nea como se ela fosse do diabo. Por outro lado, existem aqueles
que a estão usando como uma forma de mercadologia, correndo
o risco de trasmitir mais uma marca de consumo do que o Evan
gelho de Jesus Cristo.

AJUDANDO A IGREJA A COMUNICAR-SE


COM ESTA GERAÇÃO

Vivemos num mundo cada vez mais complexo. A mistura das


raças e o crescimento rápido das grandes metrópoles têm trazido
para perto de nós grupos étnicos de várias partes do mundo e
produzido diversas subculturas. Apresentar o Evangelho para o
homem moderno tem se tornado cada vez mais difícil. Os pasto
res urbanos estão tendo de aprender técnicas de missões trans-
culturais para sobreviverem nas selvas cosmopolitanas em que se
transformaram suas próprias cidades.
E justamente nesse ponto que se encontra o primeiro aspecto
positivo da música cristã contemporânea: a possibilidade de iden
tificação que ela proporciona. Através de seus diversos estilos,
ela facilita a comunicação do Evangelho ao homem moderno.
Steve Lawhead expressa isso da seguinte forma: "O rock possui a
habilidade de alcançar muitas pessoas onde elas vivem. Unido à
mensagem cristã, ele se torna uma poderosa forma de comunica
ção, muito mais poderosa que diversos meios tradicionais, uma
vez que muitas pessoas se afastaram de tais meios"}.
Quando o jovem — ou mesmo a pessoa adulta — escuta um
rock cristão ou uma música cristã em um ritmo contemporâneo,
ele se identifica com a melodia e está pronto para ouvir a mensa
gem com muito mais naturalidade. Em muitos dos trabalhos evan-
gelísticos que realizei com o Refúgio do Rock e com bandas como
Mortification e No Longer Music, vi pessoas que não entrariam

135
em nenhum tipo de igreja ou reunião religiosa participando de
nossos shows e sendo expostas à mensagem do Evangelho capaz
de fazer diferença em suas vidas, porque elas se identificaram
com a música que estava sendo tocada.
Quando Doug Murren pastoreava a Igreja do Evangelho Qua-
drangular em Kirkland, estado de Washington, viu sua congre
gação explodir de uns poucos membros para quase quatro mil,
em dez anos. Tal crescimento é algo extraordinário naquela re
gião dos Estados Unidos. A música desempenhou um papel im
portante na estratégia de Murren. Ele disse: "Pessoas incrédulas
[...] são atraídas a uma igreja que é compatível com seu estilo
musical e possui sons familiares. Em outras palavras, elas são atra
ídas pela música com um som contemporâneo"4.
A estratégia musical da igreja de Murren incluía pesquisar os
estilos mais populares na área e usá-los para alcançar os não al
cançados; e fazer avaliações constantes da eficácia do trabalho,
buscando a excelência, uma vez que tais pessoas procuram músi
ca com qualidade. O pastor Murren avaliava tanto o conteúdo
quanto a qualidade das canções. Ele diz: "Freqüentemente eu
me pergunto 'será que a música e a adoração em nossos cultos
realmente representam os gostos e estilos das pessoas que Deus
me chamou para alcançar?'"5.

AJUDANDO ESTA GERAÇÃO A ENTENDER A


MENSAGEM DO EVANGELHO

Além de ajudar no processo de identificação com os jovens, a


música cristã contemporânea prove um meio para que a mensa
gem do Evangelho seja apresentada numa linguagem mais fácil
de ser entendida. Lawhead diz:

Alcançar as pessoas com a mensagem cristã através da música é


possível somente se a música for ao encontro delas. No entanto,
isso significa mais do que apenas prover que os discos cristãos
sejam colocados nas mãos das pessoas que desejam ouvi-los [os

136
próprios cristãos]. Significa também levar a mensagem às pessoas
de uma forma que elas entendam e com a qual se relacionem.6

Quando o jovem escuta uma canção de grupos como Petra,


POD, ou de artistas como Stacie Orrico, ele não se identifica ape
nas com a música, mas também é capaz de entender a mensa
gem. Um exemplo pode ser visto na canção Place in this world
[Lugar neste mundo1], de Michael W. Smith, cuja letra diz:

O vento está soprando, mas eu estou parado.


Uma vida cheia de páginas esperando para serem escritas.
Um coração esperançoso, uma cabeça cheia de sonhos.
Mas fazer deles realidade é mais difícil do que parece...
Se existem milhões de pessoas ajoelhadas,
Em meio a todas elas, você ainda pode me ouvir?
Ouvir-me perguntando: Qual é o meu lugar?
Existe uma visão para a minha vida?
Sinto-me como se estivesse vagando pela noite
Para encontrar meu lugar neste mundo.
Não tenho muito em que me apoiar.
Senhor, eu preciso de sua luz para encontrar
Meu lugar neste mundo.

Ao escutar essa canção, o jovem adolescente se identifica com


a música. Mas não é só isso, a letra fala com ele, fala de questões
que ele está enfrentando, de dúvidas que possui. Ele consegue
assimilar a mensagem e aprende que precisamos da direção de
Deus para encontrar o sentido de nossas vidas.

REDENÇÃO
Ao contrário do que muitos pensam, os Reformadores não eram
contra as artes. Lutero usava a música secular de seus dias para
transmitir a mensagem do Evangelho, porque acreditava na pos
sibilidade de remissão, não apenas do ser humano, mas também
das artes — especialmente da música. Na introdução do Wittenberg

137
Gesangbuch, Lutero escreveu: "Eu não sou da opinião de que to-
das as artes sejam esmagadas e se percam por causa do Evange
lho, como algumas pessoas preconceituosas pensam, mas desejaria
ver todas elas, e especialmente a música, servas daquele que as
criou e as deu a nós"8.
Além de servir como elo de comunicação com esta geração e
de ajudá-la a entender a mensagem do Evangelho, a música cris
tã contemporânea é também o meio de resgatarmos para Deus
um veículo que estava sendo usado exclusivamente pelo mundo
secular. J. G. Machen, no livro Christianity and culture [Cristando.-
de e cultura9], diz o seguinte:

O cristão não pode estar satisfeito enquanto qualquer atividade


humana se opuser ao cristianismo, ou enquanto estiver total
mente fora de contato com a fé cristã... Ele não pode ficar indi
ferente a quaisquer ramos do interesse humano, mas deve
procurar trazê-los a algum tipo de relacionamento com o Evan
gelho.10

Como já vimos, nenhuma música é intrinsecamente má ou


diabólica. Como toda criação que sofreu as conseqüências da
queda e do pecado, as artes em geral e a música em particular
também precisam ser redimidas para Deus. A glória do evange
lho cristão é que, por mais caído que esteja o homem, por mais
distorcido que esteja seu caráter, sua vida e dons, eles podem ser
redimidos pelo poder de Deus. Estamos imitando o exemplo dos
reformadores, ao nos esforçarmos em trazer todas as coisas para
debaixo do senhorio de Cristo. A igreja está começando a perce
ber isso; à medida que os ritmos musicais vão sendo resgatados e
incorporados na adoração a Deus, o Evangelho torna-se mais
acessível ao homem moderno.

ASPECTOS NEGATIVOS A SEREM EVITADOS

Acredito que a renovação musical de nossos dias é uma ex


pressão genuína do avivamento que Deus deseja trazer à sua igreja

138
através dos anos (He 3.2). Mas, como disse John White, no livro
Quando o Espírito vem com poder, no meio de todo avivamento há
um pouco de sujeira. Vemos isso no livro dos Atos do Apóstolos,
quando o Espírito Santo estava movendo o coração dos cristãos
para doarem parte de seus bens aos pobres. Em meio àquele mo
ver sobrenatural de Deus, Ananias e Safira foram condenados
por abrigarem motivos escusos em seus corações (At 5).
Há pelo menos dois aspectos que devem ser evitados no rela
cionamento entre a igreja e a música cristã contemporânea.
Em primeiro lugar, trata-se da idéia de movimento. Por exem
plo, no Brasil a música cristã contemporânea foi rotulada de gospel
e criou-se um movimento em torno dela. Isso pode parecer bom a
princípio, sobretudo porque começa a mobilizar multidões, mas
logo se torna negativo, porque gera uma tendência de se criarem
círculos fechados e rotular as pessoas ou coisas como fazendo ou
não parte dele. Dessa forma, corre-se o risco de reverter os aspectos
positivos da identificação e contextualização da mensagem.
Muitos confundiram a música cristã contemporânea com o
movimento gospel. Artistas cuja carreira musical estava em deca
dência abraçaram o movimento e começaram a gravar cds gospel
para tentar abocanhar um pedaço do mercado. Virou moda, em
certos círculos, ser conhecido como gospel. No entanto, o que
significava ser gospel7. Para muitos significava apreciar certo esti
lo de música — a música cristã contemporânea. Para outros era
vestir a indumentária gospel — camisetas, bonés, moletons, len
ços etc, com jargões cristãos. Para outros ainda, era freqüentar
certas igrejas — ou espaços — e falar a linguagem gospel.
Isso tudo demonstra que o gospel foi de fato um movimento,
uma tribo de jovens cristãos modernos. O risco dessa idéia de
movimento é que, com o passar do tempo, as pessoas tendem a
cansar-se e passam a rejeitar tudo aquilo que está associado a
ele, como ficou claro no caso do movimento gospel no Brasil.
O segundo aspecto negativo que deve ser evitado pela igreja
na utilização da música cristã contemporânea está relacionado

139
ao primeiro. Trata-se da tentativa de massificar uma marca, de
fendida como estratégia mercadológica. O movimento gospel fez
exatamente isso. Para um produto ser vendido em círculos evan
gélicos na década de 1990, precisava ser rotulado com o termo
gospel. Além da música gospel, vieram a moda gospel, a igreja
gospel e a linguagem gospel. Se não bastasse tudo isso, tivemos
também cosméticos gospel, prestação de serviços gospel e até tele-
900 gospel, no qual o ouvinte pagava para receber uma oração.
Tudo explorando um nome, uma imagem criada para o consumo
em massa. O resultado é que, em vez de ser parte de um aviva-
mento musical com o objetivo de revelar a glória de Deus ao
mundo moderno, o movimento gospel correu o risco de entrar
para a História como aqueles que vendem Jesus como se vendes
sem cerveja e cigarros.
Em algum momento chegou-se até mesmo ao ridículo de dis
cutir quem era o dono da marca gospel, evidenciando a impor
tância comercial que ela ganhara. Quando igrejas começam a
competir e a disputar direitos sobre rótulos criados em nome do
Evangelho, significa que suas motivações podem não ser tão pu
ras quanto parecem.

Mas, quem está convertendo quem? Será que estamos influ


enciando o mundo com nosso estilo de vida irrepreensível? Ou
será que estamos sendo influenciados por métodos de vendas
baseados na cobiça humana?
Ananias e Safira estavam no meio de um tremendo mover do
Espírito Santo. No entanto, ao se deixarem levar pela cobiça,
caíram no laço do diabo quando mentiram ao Espírito Santo e
foram removidos do cenário tragicamente. Que Deus nos livre
de cometer o mesmo erro ao usarmos a música cristã contempo
rânea e os métodos modernos para a promoção do Evangelho.

140
Conclusão

Quer os crentes gostem ou não, o rock irá


marcar definitivamente a última metade do
século 20 com coisas que permanecerão pelos
próximos quatro ou cinco séculos.

Calvin Miller, escritor cristão.

A Bíblia ensina que não nos devemos precipitar quanto ao


juízo das coisas que não entendemos. Foi em meio ao avivamento
da igreja primitiva, quando os apóstolos estavam sendo persegui
dos pelos religiosos da época, que o sábio Gamaliel disse: "Se o
propósito ou atividade deles for de origem humana, fracassará; se
proceder de Deus, vocês não serão capazes de impedi-los, pois se
acharão lutando contra Deus" (At 5.38,39).
Precisamos desse conselho quando aproximamos a música cristã
contemporânea de nossas igrejas. Ela já faz parte de nossas igre
jas e, portanto, não temos alternativa, a não ser lidar de forma
madura e equilibrada com o tema. Não podemos permitir que os
temores, preconceitos ou até mesmo mitos ligados à música po
pular nos impeçam de tirar proveito da ponte de comunicação da
mensagem do Evangelho proporcionada pela música cristã con
temporânea.
Dois dos maiores críticos do rock e da música cristã contem
porânea parecem ter algo a ensinar a todos nós. O primeiro deles,
David Wilkerson, famoso por suas críticas ao rock, disse o seguin
te, num panfleto intitulado Confissões de alguém que odeia o
rock'ríroll:

Com toda sinceridade, eu preguei contra o que pensei ser com


prometimento com o mundo. Condenei um estilo musical que
nasceu na rebelião e na idolatria. Olhando para trás, imagino
quantos novos convertidos inocentes eu feri... Hoje, confesso
ter sido culpado de julgar os outros segundo meus próprios pa
drões.1

Outro que duvidava da eficácia da música cristã contempo


rânea para comunicar o Evangelho é o escritor americano Bob
Larson. Mas ele também acabou mudando a sua postura: "A
música cristã contemporânea é jovem e está crescendo. Tem
muitos defeitos, e algumas inconsistências são notórias demais.
Mas mesmo as piores tentativas modernas de expressar a fé cristã
são melhores que os hinos profanos cheios de sexo e hedonismo"2.
Espero que, como Wilkerson, Larson e muitos outros, nós tam
bém possamos aprender a ver a música cristã contemporânea de
maneira equilibrada, sem preconceitos ou manifestações de juízo
precipitado. Como vimos, cada grande período de avivamento na
História foi precedido ou acompanhado por uma renovação mu
sical. Oro para que este livro possa ajudar a igreja a entender
esse fato e considerar mais seriamente o papel que a música cris
tã contemporânea pode desempenhar na divulgação do Evange
lho, na conversão de milhares de pessoas e na extensão do
senhorio de Cristo sobre todas as coisas.

142
Referências bibliográficas

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Stott, John R. W. A mensagem do Sermão do Monte. São Paulo: abu, 1986.
Verwer, George. Vida em profundidade. São Paulo: Mundo Cristão, s.d.

144
Notas

Introdução

'Glenn Kaiser, The responsability ofthe Christian musician, prefácio.

Capítulo 1 - As origens

1 Citado no encarte do cd Preaching the gospel da série Roots 'riblues lançada pela
Columbia Records em 1991.
1 Algumas fontes apontam o seu nascimento em 1914 ou 1915.
'Tradução livre do editor.
4 Disponível no site <http://www.revgarydavis.com/> i acessado em 4-3.2005.
5 Segundo Henrique Autran Dourado, slide (ing. íit.: escorregar) é o efeito de
deslizar não-cromaticamente de uma nota para a outra.
6 Datas de seu nascimento e morte também aparecem como sendo 1902 e 1950.
7 Tradução livre do editor.
8 Tradução livre do editor.
9 Citado no encarte do CD Mahalia Jackson, gospel, spirituals & hymns, Sony
Music Entertainment Inc, 1991.
10 Tradução livre do editor.
1' Citado por Ray Funk no encarte do CD Preaching the gospel da série Roots 'riblues
lançada pela Columbia Records em 1991.

Capítulo 2 - Avivamento musical

1 Dispersão dos judeus após o cativeiro por todo o mundo.


1 Donald E Hustad Jubilatel A música na igreja, p. 125.
} Apud Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, p. 110.
4 Ibid.,pp. 115,243.
5Ibid.,p. 126.
<%id.,p. 130.
7Ibid.,p. 141.
8 Jardins de cerveja (Biergartens) são locais à sombra de castanheiras plantadas
sobre os antigos porões onde a cerveja era armazenada e mantida refrigerada durante
os meses de verão na Alemanha. Mesas compridas são colocadas nesses locais e as
pessoas se reúnem para beber cerveja. Trata-se de uma antiga tradição iniciada no sul
da Alemanha e preservada até os dias atuais. Somente na cidade de Munique há mais
de quatrocentos jardins de cerveja.
9 Donald R Hustad, op. cit, p. 129.
10 Tradução livre do editor.
11 ApudRobertG. DeMossJr., Leam to discem, p. 128.
12 Tradução livre do editor.
1 * Apud Leland Ryken, The Christian imagination, p. 419.

Capítulo 3 - Música popular contemporânea

1 Apud John Blanchard, R Anderson, D. Cleave, Rock in igreja?!, p. 8.


2 Roberto Mugcsiati, A história do rock, revista Somtrês, p. 12.
3 Tradução livre do editor.
4Ibid.,p.7.
5 Tradução livre do editor.
6 Marcelo Eduardo Lemos Costa (org.), Elvis por ele mesmo, p. 28.
7Ibid.,p.63.
8 Roberto Muggiati, op. cit., p. 28.
9 Edward E. Plowman, The underground church, p. 98.
10 John Blanchard, R Anderson, D. Cleave, op. cit., pp. 8-9, 15.
11 Bob Larson, Su hijo y ei rock, p. 5.
12 Tradução livre do editor.
13 Apud Steve Lawhead, Rocie on trial, p. 90.

Capítulo 4 - Música cristã contemporânea

1 John W Styll, "From the Editor", revista cem, publicada em Nashville, lennessee,
em julho de 1993, p. 42.
2 Apud J. M. Costa, C. Andrade, G. Moreira, G. Couto, A mensagem oculta
dorock,p. 23.
3 Tradução livre do editor.
4 John R. W. Stott, A mensagem do Sermão do Monte, p. 3.
5 Apud Charles J. Mellis, Committed communiües, p. 75.
6 John Smith, On the side ofthe angels, p. 142.
7 Apud Charles J. Mellis, op.cit., pp. 73-4.
M John Smith, op. cit., p. 142.
9E15.
10 Billy Graham, Jesus e a geração jovem, p. 17.
1' Chuck Smith, Tal Brooke, Harvest, p. 48.
12 Ibid.,PP. 49-50.
11 Apud Charles J. Mellis, op. cit., p. 76.

146
14 Tradução livre do editor.
15 Edward E. Plowman, The underground church, p. 99.
16 Apud Edward E. Plowman, op. cit., p. 112.
l7Ibid.,p. 109.
IM Tradução livre do editor.
19 Tradução livre do editor.
20 Apud Steve Rabey, The heart ofrock and roll, p. 17.
21 Ibid., p. 18.
22 Tradução livre do editor.

Capítulo 5 - A música cristã contemporânea no Brasil

1 Serviço de Evangelização para a América Latina, (n. do E.)


2 O assunto de mensagens invertidas será detalhado mais adiante, no capítulo 11.
3 Entrevista concedida ao jornal Graça e Paz, Rio de Janeiro, 1991, p. 4.
4 Jornal Graça ePaz, Rio de Janeiro, 1991, p. 3.
5 Tradução livre do editor.

Capítulo 6 - As letras

1 Robert G. DeMoss Jr., Leam to discem, pp. 67-8.


2 Ibid., p. 69.
3 Ibid., p. 62.
4 Tim Stafford, "Has Christian Rock Lost its Soul?", revista Christianity Today,
publicada em Carol Stream, Illinois, em 22 de novembro de 1993, p. 17.
5 Franky Schaeffer, Addicted to mediocrity, p. 25.
6 Tradução livre do editor.
7 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 52.

Capítulo 7-0 estilo de vida dos músicos

1 Revista Bizz, ano 9, n. 12,edição 101 (caderno especial).


2 Ibid.
3 Apud John Blanchard, R Anderson, D. Cleave, Rocie in igreja?',, p.36.
4 Apud Bob Larson, Su hijo y ei rock, p. 67.
5 Steve Lawhead, Rock on trial, p. 39.
6 Ibid.
7 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 96.
aIbid.,p.98.
9Keith Green, Can God use rock music?
10 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, op. cit., p. 97.
llIbid.,p.99.
12 Ibid.
13 Ibid., p. 88.
l4Ibid.tP.89.

147
Capítulo 8 - Conexão africana: o ritmo dos tambores

1 O disco era uma coletânea do início dos anos 1970, com músicas cristãs de
Ralph Carmichael, dentre outras. Como disse Al Menconi, "se [a canção em ques
tão] for demoníaca, quase todos os corais da América devem estar em perigo".
(Apud Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, p. 29.)
2 Dan D. Johnson, Os riscos traiçoeiros do rock, p. 56.
Mbid-.pp. 11-3.
4 Tradução livre do editor.
5 Steve Lawhead, Rock on trial, p. 49.
í! Apud Roberto Muggiati, A história do rock, p. 22.
7 Apud Steve Lawhead, op. cit., p. 50.
8 Kurt Pahlen, Nova história universal da música, p. 485.
l)Ibid.,p.486.
10 "O ritmo síncope é, de fato, encontrado em muitos estilos de música, incluindo
[música] clássica [O coro Aleluia] e hinos tradicionais [Quandojesus entrou no meu
coração]. Os críticos estão dispostos a descartar toda a música contendo síncope ? Nós
não encontramos nenhum estudo que estabeleça uma ligação entre a sincopia e reações
negativas." Cf. Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, p. 27.
11 Donald R Hustad, Jubilate! A música na igreja, p. 220.

Capítulo 9 - O rock é do Diabo

'J. M. Costa, C. Andrade, G. Moreira, G. Couto, A mensagem oculta do


rock, p. 93.
2Ibid.,p.72.
;Pau!o Coelho, As valkírias, p. 123.
4Steve Lawhead, Rock on trial, p. 96.
3Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, pp. 29-30.
óBob Larson, Satanismo, pp. 13-4,19-20,93.
7J. M. Costa, C. Andrade, G. Moreira, G. Couto, op. cit., p. 95.
8Apud Dan Peters, S. Cher Merril, op. cit., pp. 31-2.
gTraduçào livre do editor.
l0Steve Lawhead, op. cit., p. 96.

Capítulo 10 - O ritmo incita à violência, à sensualidade e à


rebeldia

1 Steve Lawhead, Rocie on trial, p. 96.


2Bob Larson, Satanismo, p. 19.
3 Steve Lawhead, op. cit., pp. 24-5.
4 Dan D. Johnson, Os riscos traiçoeiros do rock, p. 119.
5 Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 34.
6Steve Lawhead, op. cit., p. 56.

148
7 "Comportamento: O Show dos Horrores", artigo publicado na revista Veja em
São Paulo, em 22.5.1991.
8Dan D. Johnson, op. cit., p. 36.
qJohn Blanchard, R Anderson, D. Cleave, Rock m igreja?!, p. 28.
10 Dan D. Johnson, op. cit., p. 11.
11 Bob Larson, Su hijo y ei rock, p. 6.
I2Ibid.
11 Segundo artigo "Rap celebra violência do gueto e chega às paradas", de Mareei
Plasse, publicado no caderno Ilustrada, p. 8, da Folha de S.Paulo, em 27.12.1993.
14 Tradução livre do editor.
15 Marcelo Eduardo Lemos Costa (org.), Elvis por ele mesmo, p. 63.
l6Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, p. 19.
l7Dan D. Johnson, op. cit., p.19.
18Steve Lawhead, op. cit., p. 24.
19Ibid.,p.57.
20 "Axl explica violência em show", artigo publicado na revista Bizz, em outubro
de 1991, p. 8.

Capítulo 11 - Mensagens invertidas afetam o subconsciente

1 "Backward masking: satanic plot or red herring", artigo de Ross Pavlac publi
cado na Cornerstone Magazine, v. 11, 62 ed., de Chicago, Illinois.
2 Apud Ted Schwarz, Duane Empey, Satanismo, p. 150.
1 Tradução livre do editor.
4 "Backward masking: satanic plot or red herring", artigo de Ross Pavlac publi
cado na Comerstone Magazine, v. 11,62 ed., de Chicago, Illinois.
5 Apud Ted Schwarz, Duane Empey, op. cit.,p. 159.
6 "Backward masking: satanic plot or red herring", artigo de Ross Pavlac publi
cado na Cornerstone Magazine, v. 11,62 ed., de Chicago, Illinois.

Capítulo 12 - Essa música é mundana demais

1 George Verwer, Vida em profundidade.


1 Steve Lawhead, Rock on trial, p. 84.
1 John Blanchard, P Anderson, D. Cleave, Rocie in igreja?!, p. 24.
4 Robert DeMoss Jr., Learn to discern, p. 129.
5 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 43.
b Bob Larson, Su hijo y ei rock, p. 105.

Capítulo 13 - A música cristã deve ser apenas para louvor e


adoração

'Steve MlLLER, The contemporary Christian music debate, 1993.

149
Capítulo 14 - Um desafio aos músicos

1 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 57.
2 John Smith, On the side ofthe angels, p. 130.
3 Entrevista com Luís Palau publicada na revista londrina New Christian Media
Quarterlytv. 3,n. 7.

Capítulo 15 - Em busca da excelência

1 David Pierce, Rock priest, p. 16.


2 Steve Flashman, Closing the gap, p. 140.

Capítulo 16 - Trazendo a música cristã contemporânea para


casa

1 Tradução livre do editor.


2 Tradução livre do editor.
1 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 47.
4 Franky Schaeffer, Addicted to mediocrity, p. 53.
''Apud Steve Miller, The contemporary Christianmusic debate, p. 163.
6 Dan Peters, S. Cher Merril, op. cit., p. 19.
7 Bob Larson, Su hijo y ei rock, p. 32.
8Ibid.,p. 106.

Capítulo 17 - A música cristã contemporânea na igreja

1 Steve Miller, The contemporary Christian music debate, p. 215.


2 Apud Dan Peters, S. Cher Merril, What about Christian rock?, p. 24.
5 Steve Lawhead, Rock on trial, p. 87.
4 Apud Steve Miller, op. cit., p. 207.
5Ibid.,p.221.
6 Steve Lawhead, op. cit., pp. 83-4.
7Tradução livre do editor.
8Francis Schaeffer, How should we then live?, p. 90.
9Tradução livre do editor.
10 Apud Steve Lawhead, op. cit., p. 81.

Conclusão

1 Apud Steve Flashman, Closing the gap, p. 138.


1 Bob Larson, Su hijo y ei rock, p. 106.

150
a é um dos maiores tesouros da civilização. Como um
dos principais veículos para a adoração, tem percorrido os
séculos e ajudado os fiéis a expressar sua devoção. Como
veículo de evangelizaçao, tem sido de utilidade imensurável.
Consciente da relevância e influência da música, Sandro
Baggio apresenta aos leitores uma reflexão séria e
comprometida dessa arte que ainda suscita controvérsia e
paixão no meio evangélico. Origem, estilos musicais, ritmos e
outros temas relevantes são tratados com o conhecimento e
experiência adquiridos em quase duas décadas de pesquisa e
vivência musical.
Em meio a tantas opiniões diferentes e por vezes conflitantes,
sintonize o coração em uma nova maneira de olhar para a
Música cristã contemporânea. Confira!

SandrO BaggiO é formado em Teologia com ênfase em


Missões pelo Seminário Missio-Teológico, do Rio de Janeiro.
De 1989 a 1991 foi missionário junto a Operação
Mobilização (OM} a bordo do navio Logos
II. Tem servido à Secretaria Geral de
Missões da Igreja do Evangelho
Quadrangular desde 1996 e é pastor
da IEQ de Vila Mariana, Projeto
Ágape, (SP) desde 1998.

ISBN 85-7367-807-0

788573 678079

Categoria: Louvor

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