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3.

1 O calor como energia


A teoria do calórico
Quando analisamos o conceito de equilíbrio térmico, observamos que, se dois ob-
jetos a temperaturas diferentes são colocados em contato, eles atingem, após um Sugestão de leitura
BrAGA, M.;
certo tempo, a mesma temperatura. Até o início do século XIX os cientistas explica-
GUErrA, A.; rEIS,
vam esse fato supondo que todos os objetos continham, em seu interior, uma subs- J. C. Breve história da
tância fluida, invisível, de peso desprezível, denominada calórico. Quanto maior fosse física moderna –
a temperatura de um objeto, maior seria a quantidade de calórico em seu interior. A belle-époque da
ciência, vol. 4. rio
De acordo com esse modelo, quando dois objetos, a temperaturas diferentes, eram
de Janeiro:
colocados em contato, haveria passagem de calórico do objeto mais quente para o mais Jorge Zahar Editor
frio, acarretando diminuição na temperatura do primeiro e aumento na temperatura do ltda., 2008.
segundo. Quando os objetos atingiam a mesma temperatura, o fluxo de calórico era in-
terrompido e eles permaneciam, a partir daquele instante, em equilíbrio térmico.
Apesar de esta teoria explicar satisfatoriamente muitos fenômenos, alguns físicos

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mostravam-se insatisfeitos com certos aspectos fundamentais da ideia do calórico, o
que levou à sua substituição por outra, mais adequada, na qual o calor é considerado
uma forma de energia.

Calor é ener
energia
A ideia de que o calor é energia foi introduzida por rumford, um engenheiro militar
que, em 1798, trabalhava na perfuração de canos de canhão. Observando o aqueci-
mento das peças ao serem perfuradas, rumford percebeu que era possível atribuir
esse aquecimento ao trabalho que era realizado contra o atrito, na perfuração. Em BENJAMIN
outras palavras, a energia empregada na realização daquele trabalho era transferida THOMPSON –
para as peças, provocando a elevação de suas temperaturas. Portanto, a antiga ideia CONDE DE
RUMFORD
de que objetos mais aquecidos possuíam maior quantidade de calórico (substância
(1753-1814)
fluida, invisível, de peso desprezível) começava a ser substituída pela concepção de
Engenheiro
que esses objetos possuem, realmente, maior quantidade de energia. estadunidense que,
A divulgação dessa hipótese provocou muitas discussões entre os cientistas do sé- durante a revolução
culo XIX. Alguns deles realizaram experiências que vieram a confirmar as suposições da Independência
Americana, viu-se
de rumford. Entre eles, devemos destacar James P. Joule (1818-1889), pois foram ex- obrigado a se exilar
periências realizadas por ele que acabaram estabelecendo, definitivamente, que o ca- na Inglaterra, onde
lor é uma forma de energia. trabalhou como alto
Atualmente, considera-se que, quando a temperatura de um objeto é aumentada, funcionário do
governo. Após ser
a energia que ele possui em seu interior, denominada energia interna, também au- sagrado cavalheiro
menta. Se esse objeto é colocado próximo ou em contato com outro, de temperatura pelo rei George III,
mais baixa, haverá transferência de energia do primeiro para o segundo. Essa energia recebeu permissão
é denominada calor. Portanto, o conceito de calor passou a ser o seguinte: para trabalhar em
uma fábrica de
Calor é a energia transferida de um objeto para outro em virtude, armas em Munique.
Nessa ocasião, ele
unicamente, de uma diferença de temperatura entre eles.
iniciou estudos que o
Comentários levaram a questionar
a teoria do calórico,
1) O termo calor só deve ser usado para designar a energia em trânsito, isto é, enquanto está sendo
lançando as bases da
transferida de um objeto para outro, em virtude de uma diferença de temperatura. A transferên- moderna teoria do
cia de calor para um objeto acarreta aumento na energia de agitação de seus átomos e molécu- calor como uma
las, ou seja, acarreta aumento da energia interna do objeto, o que, em geral, provoca elevação forma de energia.
em sua temperatura.

TErMODINÂMICA CAPÍTULO 3 57
Não se pode, portanto, dizer que “um objeto possui calor” ou que “a tem-
Ilustrações: Antonio Robson/Arquivo da editora

a b
calor peratura é a medida do calor no objeto”. Na realidade, o que os objetos
calor
possuem é energia interna, e quanto maior for sua temperatura, maior
será essa energia. Naturalmente, se um objeto está a uma temperatura
mais elevada do que outro, ele pode transferir parte de sua energia inter-
na para esse outro. Tal energia transferida é o calor, que passa de um
objeto para o outro (figura 3.1).
2) É importante observar que a energia interna de um objeto pode aumen-
Figura 3.1. Calor é a energia que se transfere de tar sem que ele receba calor, desde que receba alguma outra forma
um objeto para outro em virtude de uma diferença de energia.
de temperatura entre eles. Por exemplo, quando agitamos uma garrafa contendo água, sua tempe-
a 14 °C b 15 °C ratura se eleva, apesar de a água não ter recebido calor. O aumento de
energia interna, nesse caso, ocorreu em virtude da transferência
da energia mecânica à água, ao realizarmos o trabalho de agitar a garrafa.
calor
As ilustrações desta página
estão representadas sem
A água recebeu Unidades de calor escala e em cores fantasia.
uma caloria
de calor
Uma vez estabelecido que o calor é uma forma de energia, é
Figura 3.2. 1 caloria é a quantidade de calor necessário que uma certa quantidade de calor deva ser medida
necessária para elevar de 1 °C a temperatura de 1 g em unidades de energia. Então, no SI, mediremos o calor em
de água.
joule, em homenagem a Joule, que descobriu as relações entre
A “caloria” (Cal) utilizada em nutrição, aquela
calor e trabalho mecânico.
que aparece no rótulo das informações Entretanto, na prática, outra unidade de calor é até hoje
nutricionais dos alimentos, na realidade usada. Muito antiga (da época do calórico) e que não pertence
equivale a 1 kcal, ou seja, 1 cal nutricional 5
ao SI, denomina-se cal. Por definição, 1 cal é a quantidade de
5 1 000 cal 5 1 kcal. Um jovem do sexo
masculino, por exemplo, com 20 anos e 72 kg calor que deve ser transferida a 1 g de água para que sua tempe-
consome, em média, 2 900 kcal por dia ratura se eleve de 1 °C (figura 3.2).
quando está em repouso, enquanto uma Na década de 1940, a comunidade científica decidiu que a
jovem do sexo feminino, com mesma idade e
relação entre essas duas unidades é:
58 kg, consome 2 200 kcal por dia.
SABA, F. Mexa-se. Atividade f ísica, saúde e bem-
-estar. São Paulo: Takano, 2003.
1 cal 5 4,2 J


➔ verifique
o que 1. Dois blocos idênticos, A e B, ambos de ferro, que a temperatura do bloco se eleva aprecia-
aprendeu são colocados em contato e isolados de in- velmente. lembrando-se do comentário 2, fei-
fluências externas, como representado na fi- to nesta seção, responda:
gura ao lado. As temperaturas iniciais dos blo- a) A energia interna do bloco de chumbo
cos são TA 5 200 °C e TB 5 50 °C. aumentou? Sim.
a) Depois de certo tempo, o que ocorreu com
b) Houve alguma transferência de calor para
a temperatura TA? E com TB?
o chumbo? Não.
não escreva b) De acordo com os cientistas anteriores a
no livro! rumford e Joule, qual era a causa das va- c) Então, qual foi a causa do aumento da
riações das temperaturas TA e TB? energia interna do bloco de chumbo?
Banco de imagens/
Arquivo da editora

A B
Fe Fe 2. Considere, ainda, os blocos do exercício ante- 4. a) No exercício 1, suponha que 100 cal foram
rior. De acordo com o ponto de vista dos cien- transferidas de A para B. Qual é, em joules, o
tistas atuais: valor dessa quantidade de calor? 418 J
TA TB a) Depois de certo tempo, o que ocorreu com b) Suponha que o trabalho total realizado
a energia interna de A? E com a de B? pelo martelo sobre o bloco de chumbo,
1. a) TA diminuiu e TB
aumentou. b) Houve transferência de energia de um blo- no exercício anterior, tenha sido de 836 J.
b) Havia passagem de co para outro? Em que sentido? Sim; de A para B. Qual quantidade de calor, em calorias,
calórico de A para B. c) Como se denomina essa energia transferida? deveria ser fornecida ao bloco para pro-
2. a) A energia interna de A Calor.
diminuiu e a de B aumentou. 3. Uma pessoa, usando um martelo, golpeia re- vocar nele a mesma elevação de tempe-
3.c) Trabalho realizado petidas vezes um bloco de chumbo. Verifica-se ratura? 200 cal
pelos golpes do martelo.

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