Você está na página 1de 7

0

DIETA PRÉ-CONTEST NO FISICULTURISMO

INTRODUÇÃO

Pré-contest ou pré-competição é a fase de treinamento/preparação de


um fisiculturista em que o atleta busca maximizar a perda de gordura,
mantendo sua massa muscular. Claro que o condicionamento (percentual de
gordura) a ser atingido vai depender muito do seu objetivo e em algumas
categorias do fisiculturismo o percentual de gordura não chega aos níveis
extremos mais baixos (4-5% de BF).

Durante essa fase os atletas costumam restringir calorias


(principalmente de carboidratos e gorduras) e aumentar o volume de
treinamento, principalmente pela adição de exercícios aeróbicos. O treino de
musculação costuma ter um maior volume e menor intensidade devido à
restrição de calorias e desejo de maximizar o gasto energético. Além disso, boa
parte dos fisiculturistas e atletas fitness utilizam hormônios anabólicos
(esteroides anabolizantes, GH) e drogas termogênicas (hormônios da tireoide,
clembuterol, efedrina, ioimbina etc) nesse período da preparação. O uso
dessas substâncias maximiza a perda de gordura e favorece a manutenção ou
até mesmo o ganho de massa muscular.

Para indivíduos que não usam esteroides anabolizantes ou


termogênicos é muito mais difícil atingir um condicionamento de competição
com um bom volume muscular. Assim podemos entender porque no passado,
na era pré-esteroides (até meados dos anos 50), os fisiculturistas optavam por
competir com um percentual de gordura maior. Atingir um percentual de
gordura muito baixo sem uso de esteroides anabolizantes é muito catabólico
para massa muscular.

CONDIÇÕES INICIAIS PARA COMEÇAR O PRÉ-CONTEST

Muitas pessoas têm dúvidas de quanto tempo deve levar um pré-


contest. Qual o número de semanas, meses, ideal? Como saber se o atleta
está realmente pronto para subir no palco? Qual o percentual de gordura a ser
atingido ao final de uma preparação? Como deve ficar o físico do atleta ao final
da preparação nos quesitos volume, proporção, simetria, condicionamento?

1
São muitas perguntas a serem respondidas e não pretendo dar uma
resposta satisfatória para todas elas, uma vez que o fisiculturismo é um esporte
muito amplo e existem muitas características particulares dependendo da
categoria pretendida e objetivo do atleta. Vou focar aqui nos aspectos que
envolvem mais o condicionamento do atleta e seu volume muscular, uma vez
que a proporção e simetria são condições que podem variar com o objetivo e
categoria pretendida. Embora existam diferenças nos critérios, padrões e
categorias nas diversas federações, existem também muitas semelhanças. No
entanto, o foco aqui é o condicionamento do atleta.

O tempo de preparação de um fisiculturista pode ser muito variável, com


atletas se preparando em 8 semanas e outros em 20 semanas. Muitas vezes
são justamente os atletas mais experientes que optam por se preparar por mais
tempo (Eduardo Correa é um bom exemplo), enquanto novatos acabam
fazendo períodos mais curtos, justamente por falta de conhecimento e
experiência. Pelo meu conhecimento e experiência acredito que 16 semanas é
um bom tempo para uma preparação pré-contest, principalmente se o
percentual de gordura do atleta se situa na faixa de 10 a 15% (15-20% para
mulheres).

Mas como saber qual o tempo de preparação ideal?

Não é muito fácil responder essa pergunta, pois além do atleta estar com
uma boa condição física no off season (baixo BF), seria também importante
saber como seu corpo responde com a dieta e o treinamento durante o pré-
contest. Isso porque já sabemos que as pessoas têm metabolismos distintos e
a resposta de cada indivíduo depende de seu potencial genético. Não só isso,
alguns indivíduos sofrem mais os efeitos das adaptações fisiológicas,
principalmente aqueles que vivem em ciclos frequentes de ganho e perda de
peso, dietas restritivas e abuso de termogênicos. As adaptações fisiológicas
são respostas do nosso organismo às restrições energéticas impostas,
podendo reduzir o metabolismo, aumentar fome e tornar o processo de perda
de peso/gordura muito mais difícil. Alguns indivíduos sofrem tantos efeitos
dessas adaptações fisiológicas, que dificilmente conseguem voltar a condição
física e peso de anos anteriores. Alguns podem nunca mais chegar em um
condicionamento de competição (principalmente mulheres).
2
Para conhecer bem como uma pessoa responde a uma dieta, treino ou
hormônios, é preciso analisar sua evolução passada, seu histórico, seu físico e
também observar por um certo tempo como ela responde aos estímulos de
treino e dieta. Por isso é muito difícil para um treinador/nutricionista começar a
preparar um atleta com poucas semanas para a competição. Uma boa
anamnese e avaliação física podem dar um bom parâmetro para um
treinador/nutricionista experiente, mas para novatos o ideal é ter pelo menos
16-20 semanas para preparar o atleta, considerando que esse esse
fisiculturista apresente um bom condicionamento no off season.

PERCENTUAL DE GORDURA E TEMPO DE PREPARAÇÃO

Como dito anteriormente, o tempo de preparação de um atleta pode


depender de vários fatores, como genética, metabolismo, estratégia de
treinamento, dieta, hormônios etc. Aqui vou considerar um tempo médio, que
pode servir para maior parte dos indivíduos, principalmente aqueles que não
sofreram muito os efeitos das adaptações metabólicas.

Tabela 1. Tempo estimado de pré-contest para um fisiculturista de acordo com


seu condicionamento (BF = body fat, percentual de gordura) no off season.
Para atletas naturais o ideal é um tempo maior, podendo passar de 20
semanas (HALUCH, 2018).

BF no off season BF no off season Tempo de pré-contest


(homens) (mulheres)
7 - 8% 12 - 13% 8 semanas
9 - 12% 13 - 15% 10 - 12 semanas
13 - 15% 16 - 18% 12 - 16 semanas
16 - 18% 19 - 22% 16 - 20 semanas

A tabela 1 dá estimativas do tempo de preparação para um atleta


considerando seu percentual de gordura no off season. Lembrando que para os
homens o objetivo é atingir um percentual de gordura de aproximadamente 4 a
6% ao final do pré-contest, enquanto para as mulheres o objetivo é
normalmente atingir um percentual de gordura de aproximadamente 8 a 10%
(categorias biquíni e wellness). Algumas categorias femininas, como

3
bodyfitness e women’s physique, exigem mais definição muscular,
principalmente essa última, onde o BF fica próximo ao dos homens.

DIETA NO PRÉ-CONTEST

Durante a fase de pré-contest fisiculturistas costumam adotar uma dieta


hipocalórica pobre em carboidratos e gorduras e rica em proteínas (low
carb/low fat/high protein) com uma quantidade normal de gorduras, na faixa de
10-20% das calorias. A redução das calorias é geralmente feita de forma
gradativa, assim como aumento do volume de treino na forma de exercícios
aeróbicos.

As recomendações de uma dieta para perda de gordura são de um


déficit calórico na faixa de 500-1000 kcal por dia, o que equivale a 3500-7000
kcal por semana. Esse déficit calórico costuma provocar uma perda de peso na
faixa de 0,5-1,0 kg por semana nas primeiras semanas. No entanto, com o
decorrer das semanas a perda de peso/gordura é cada vez menor. Isso
acontece porque nosso metabolismo não é estático e sim dinâmico, ou seja, a
restrição calórica induz adaptações fisiológicas (termogênese adaptativa,
aumento da eficiência mitocondrial, redução da leptina), que são uma resposta
do organismo que visa atenuar e reestabelecer o peso corporal. Essas
adaptações fisiológicass são inevitáveis e tornam o processo de perda de
gordura cada vez mais difícil conforme se reduz o percentual de gordura. Além

4
disso, para tentar forçar a perda de peso fisiculturistas aumentam a restrição de
calorias e o volume de treinamento aeróbico. Esse déficit energético agressivo,
assim como o baixo percentual de gordura, aumentam o risco de perda de
massa muscular. Esse catabolismo muscular é atenuado ou evitado quando o
indivíduo faz uso de esteroides anabolizantes.

A dieta rica em proteínas durante a preparação para a competição tem a


finalidade de reduzir a degradação de proteínas (catabolismo proteico) e
aumentar a saciedade e a termogênese. A redução de carboidratos é gradativa
e tem como objetivo propiciar uma “vantagem metabólica” para perda de peso.
No entanto, as melhores evidências não mostram uma vantagem metabólica na
redução dos carboidratos em comparação às gorduras. Na verdade, uma
redução drástica dos carboidratos pode prejudicar a performance e favorecer o
aumento do catabolismo muscular, principalmente em fisiculturistas naturais,
que não fazem uso de hormônios anabólicos.

Dessa forma, uma dieta padrão pré-competição tem uma proporção


aproximada de calorias de 30-50% de carboidratos, 25-40% de proteínas e 20-
30% de lipídios. As proteínas devem ficar na faixa de 2,0-3,5 g/kg
(considerando todas as fontes de proteínas, vegetais e animais), sendo as
quantidades maiores necessárias quando o déficit energético é elevado (mais
de 1000 kcal) e quando o percentual de gordura está muito baixo (abaixo de
~8-10% de BF). Para fisiculturistas naturais o déficit energético deve ficar
limitado a ~400-600 kcal, pois uma perda rápida de peso favorece o
catabolismo muscular.

Alguns atletas chegam a perder 1-2 kg de peso por semana nas


primeiras semanas de preparação, principalmente quando combinam a
restrição de calorias com o exercício aeróbico. Essa perda de peso pode ser
aceitável para atletas muito pesados, muito retidos e com um percentual de
gordura alto (~20% de BF). Porém, para atletas mais leves uma perda
agressiva de peso tende a levar à perda de massa muscular, principalmente
naqueles que não utilizam esteroides anabolizantes. Em indivíduos que utilizam
hormônios é aceitável um déficit maior de calorias, como 800-1500 kcal/dia.
Nesse caso, os esteroides tendem a prevenir um possível catabolismo
muscular.
5
REFERÊNCIAS

HALUCH, D. Nutrição no fisiculturismo – dieta, metabolismo e fisiologia.


Florianópolis, Letras Comtemporâneas, 2018.

HALUCH, D. Hormônios no fisiculturismo – história, fisiologia e farmacologia.


Florianópolis, Letras Comtemporâneas, 2017.

HALUCH, D. Emagrecimento e Metabolismo – bioquímica, fisiologia e nutrição.


Florianópolis, Letras Comtemporâneas, 2021.

HALUCH, D.; CONRADO, M. Nutrição Esportiva e Hipertrofia Muscular. 2023.

HELMS, E.; ARAGON, A.; FITSCHEN, P. Evidence-based recommendations for


natural bodybuilding contest preparation: nutrition and supplementation. J Int
Soc Sports Nutr. May 12;11:20, 2014.

SPENDLOVE, J. et al. Dietary Intake of Competitive Bodybuilders. Sports Med.


Jul;45(7):1041-63, 2015.

LAMBERT, C.; FRANK, L.; EVANS, W. Macronutrient considerations for the


sport of bodybuilding. Sports Med. 34(5):317-27, 2004.

Você também pode gostar