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1983
RESUMO
A paisagem tem amplas relações com o meio ambiente. Seu estudo é composto
de temas que são de grande importância para o planejamento ambiental. Alguns
desses temas, tais como, conceito de paisagem, sua tipologia, são abordados neste
trabalho que apresenta ainda uma tentativa de regionalização da paisagem no Estado
de São Paulo. Esta regionalização baseia-se na relação existente entre embasamento
geológico/geomorfológico e fatores culturais que se expressam no espaço criando uni-
dades.
ABSTRACT
The landscape has broad relationships with environment. Its studying is based
on themes which are important for the environniental planning. Some of these themes
are presented in this work, with an attempt of the regionalization in São Paulo State.
This regionalization is based in the relationship between geological/ geomorphological
basis and the cultural factor which are expressed in the space creating units.
* Instituto Geológico - Caixa Postal 8772 - 01000 - São Paulo, SP, Brasil
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ponentes que se expressam visualmente. Ela reação ambiental à alteração de uma área,
tem um funcionamento que decorre de um causada pelo homem onde havia primitiva-
dinamismo (aspecto interno) que é o estado mente uma floresta. Pode constituir-se em
de relação entre componentes que reagem um ecossistema estável em resposta às no-
entre si. São mutáveis mas dentro de um vas condições de biotopo.
equilíbrio dinâmico (OLIVEIRA, 1982). Em Em relação à paisagem cultural foram se-
decorrência a estes fatos a paisagem apa- lecionados alguns conceitos que para efeito
rece como uma estrutura quase estática, pois de planejamento apresentam aspectos bas-
sua mutação é praticamente invisível e a tante ricos de interesse. Aparece no primei-
longo prazo. Somente o homem quando en- ro caso a paisagem cultural quanto ao as-
tra como componente cultural transforma a pecto predominante da ocupação humana.
paisagem com grande rapidez podendo pro- É vista através de elementos visuais que
vocar a perda do equilíbrio natural dinâmi- foram criados através de novos arranjos dos
co (OLIVEIRA, 1982). componentes abióticos-bióticos acrescidos
dos componentes culturais. Tem-se por exem-
3 TIPOLOGIA DA PAISAGEM plo a paisagem urbana, no caso das cidades;
a paisagem rural, nas áreas onde predomi-
Os tipos de paisagem apresentados a se- nam as atividades agropecuárias e as paisa-
guir baseiam-se em úma classificação que gens ruro-urbanas, quando a agricultura e
decorre da predominância de alguns fato- cidades se mesclam. Área rural versus urba-
res no arranjo dos componentes da paisa· na criam uma relação dialética, onde uma
gemo São de interesse para o planejamento, área procura anular a outra. Na atualidade
pois mostram o grau de interferência do ho- o crescimento desenfreado das cidades nos
mem na natureza. países subdesenvolvidos anulam muitas ve-
O primeiro tipo que surge é o da paisa- zes zonas de solos bastante ricos. São em
gem natural, onde predominam o arranjo geral países carentes de alimentos e neces'si-
dos componentes bióticos, abióticos e o solo, tam explorar cuidadosamente seus recursos
muito pouco alterados, sendo que o fator agrícolas para garantir a sobrevivência de
cultural é inexpressivo. Hoje em dia é difí- uma população que cresce de forma desen-
cil encontrar uma paisagem eminentemente freada. No Estado de São Paulo aparece
natural, não tocada pelo homem. A ação des- exemplos gritantes deste fato. São as áreas
te é planetária, provocando alterações da de terra roxa, o solo mais rico do estado,
mesma proporção. A. poluição atinge a at- que vem sendo invadidas por cidades como
mosfera em sua totalidade com diversos Campinas, Jaú, em decorrência de sua ex-
graus de concentração de poluentes que pansão territorial.
atuam por toda parte. Quanto à organização das atividades sur-
gem as paisagens planejadas, e/ou de inter-
Pode·se dividir a paisagem natural em venção aleatória. Quanto às primeiras, algu-
original e alterada. No primeiro caso os ní- mas são realizadas utilizando-se técnicas pri-
veis de ação humana são mínimos. O ho- mitivas, onde se criam ambientes muito es-
mem pode conviver com as paisagens origi- táveis em funcão do uso da terra. Isto ocor-
nais sem causar nenhuma modificação. ~ o re nas regiõe~ de agricultura em terracea-
caso dos índios brasileiros que vivem em mentos, na Asia de Sudeste.
perfeita comunhão com a natureza. Suas ati-
vidades não causam alterações no ambiente, Hoje em dia, as paisagens organizadas
pois são concentradas e itinerantes e não com técnicas modernas podem ser estáveis,
apresentam grande magnitude de ações. decorrentes do equilíbrio cultural dinâmi-
co (OLIVEIRA, 1982), ou não. O uso que
No Estado de São Paulo somente algu- se vem fazendo dessas áreas é intenso e
mas regiões da Serra do Mar, mais inaces-
síveis podem ser consideradas como paisa- muitas vezes sem promover a necessária
gens originais. O Vale do Rio Ribeira de pausa para recuperar suas condições poten-
Iguape tinha regiões com estas característi- ciais. Onde se aplica a tecnologia branda,
cas. Na atualidade a pressão sócio-econômi- aquelas que alteram o mínimo as condições
ca e a posse da terra .de forma desordenada naturais, pode-se criar relações ambientais
estão contribuindo para alterar de modo ne- bastante estáveis. Nessas áreas pratica-se o
gativo a paisagem, nessa região. controle biológico das pragas e evita-se as
O segundo tipo de paisagem é a natural ~ubstâncias poluentes que envenenam o
·alterada. A mata secundária é um tipo de meio ambiente. É o caso das fazendas bio-
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ar, - da
erosão
água
paisagem
qualidade de -de
Diminuição
do
aodaas ---Fontes
-térmico
homem
doenças Terraplanagem
Responsável
-maisdedade---- Impactu
Caçadas
Aumento
Indústria
Crescimento
de
do
Resíduos
Desaparecimento
essencial
pelas do
--Aumento
dediversidade
de pragas
Umidade
incidência
Desconforto
vida
-Assoreamento
climático
urbano
Erosão
Modificação
Aumento
solo
ecossistemas
Perda
tóxicos
Impacto
alimentos
qualidade
Diminuição
Poluição
Subnutrição
populaç,ões
Favelizaçãobiológica
excessiva
Empobrecimento
Compactação
Perda
Aumento
quantidade
Destruição
espécies
espécies
Impacto
Impermeabilização
para da
de
componente
Incidência
plantas
recuperação
doenças
dedo ritmo
qualidade
doDerivado
de
custo 02
solosdas
mananciais
fonte
de
daninhas
dede dade de incidência
solo
Perda
baixas SEQOENCIA DE IMPACTOS AMBIENTAIS
de vida -
doenças Rebaixamento
- lençol
Doenças do
agrícolasfreático
mento Ar Interferência Direta
Interferência Indireta
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SEQUÊNCIA DO IMPACTO AMBIENTAL
INTERFERÊNCIA INTERFERENCIA
DI RETA INDIRETA
AR
C L f MA
ÁGUA
HOMEM
VEGETA~ÃO
FAUNA
SOLO
FIGURA 1
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PERCEPÇÃO AMBIENTAL
ES T íMU LO PERSONALIDADE
AMBIENTAL
COMPORTAMEN
SENSArÃO PERCEPrÃO AMBIENTAL
FIGURA 2
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noção de perigo que é um dós mecanismos ta-se da região metropolitana de São Paulo.
básicos do instinto de sobrevivência. Acon- Os impactos ambientais na grande cidade
teceu um fato dramático em março de 1984, são intensos e extensos. Surgem no centro
foi o incêndio da Vila Socó em Cubatão. com o adensamento urbana indo à perife-
Um grupo de migrantes construíram suas ria com o povoamento desordenado.
moradias em cima de um oleoduto da Pe- IC - Trata-se da Bacia do Rio Paraí-
trobrás, e com o incêndio deste ocorrem ba. O fato marcante nesta região é a linea-
centenas de mortes e perdas materiais de ridade da urbanização São Paulo-Rio com
grande monta. seus problemas peculiares. Nas áreas mais
h necessário que se tente estabilizar os acidentadas a erosão é intensa acarretando
agrupamentos humanos para haver uma um grande assoreamento na rede hidrográ-
convivência equilibrada com a natureza. So- fica.
mente assim será possível perceber e com- ID - São as áreas mais acidentadas do
preender seus mecanismos. Estado de São Paulo. Na direção NNE sur-
ge a Serra da Mantiqueira e a SSE a Serra
6 TENTATIVA DE REGIONALIZAÇÃI) do Mar. Devido ao fato de serem áreas mui-
PAISAGÍSTICA DO to acidentadas não há povoamento pleno,
ESTADO DE SÃO PAULO mas esparso. Conservam assim, grande par-
te das paisagens naturais, intocadas e de
A tentativa de regionalização da paisa- grandes belezas naturais.
gem baseia-se em OLIVEIRA apud GEI- Na Serra do Mar próximo à Baixada
SER et alii (1978) quando foram descritas Santista existe o problema da poluição in-
as macrounidades paisagísticas do Estado tensa que está destruindo os ecossistemas
de São Paulo com algumas áreas de impac- naturais. Em Cubatão as favelas sobem as
to ambiental intenso. encostas da serra e estão em situação de
O presente trabalho retoma os conceitos grande perigo em face da instabilidade des-
do anterior e os amplia, mostrando mais ses sítios.
detalhes quanto ao arranjo do conjunto de IE - A região litorânea apresenta pla-
fatores ambientais que determinam as uni- nícies costeiras em contato com as escarpas
dades paisagísticas. (fig. 3) da Serra do Mar. Possue grandes belezas
Macrounidade paisagística I - R~presen- naturais que atraem os turistas, motivando
ta basicamente uma relação entre embasa- a especulação imobiliária desenfreada que
mento geológico e seu reflexo geomorfoló- desestrutura o espaço.
gico. Caracteriza-se por conter uma grande Apresenta como nas outras macrouni-
diversidade de rochas duras e resistentes dades grande volume de impacto.
aliadas a uma topografia bastante acidenta- Macrounidade paisagística 11 - Repre-
da. h um ambiente de grande vulnerabili- senta quase 2/3 do Estado de São Paulo,
dade com baixa capacidade de carga. A sendo como na outra macrounidade uma
grande diversidade rochas, topografia, solos reação entre rocha e relevo. Caracteriza-se
aliada à ação contínua de massas de ar car- por conter rochas sedimentares e um relevo
regadas de umidade promoveu uma grande menos acentuado onde as formas tabulares
diversidade de ecossistemas e portanto são uma constante. A exceção é a região das
de formas de vida. cuestas basálticas onde surgem rochas mais
Esta região possue povoamento mais resistentes, fruto de derramamentos. basál-
antigo e a maior concentração demográfica ticos. O relevo aí, torna-se mais aéidentado
do país. Em decorrência disto o volume de com escarpas íngremes e topos planos.
atividades humanas provoca uma conside- A diversidade biológica na macrouni-
rável quantidade de impacto nesta área. dade paisagística 11 é menor se comparada
IA - h uma submacrounidade paisa- com a I, existem menos unidades de ecos-
gística. Pode ser considerada a área repre- sÍstemas naturais. A presença do homem é
sentativa da macrounidade I, embora apre- intensa e a fisionomia da paisagem é carac-
sente aspectos diversificados quantos fatos terizada pelos fatores culturais agrícolas e
paisagísticos. urbanos.
IB - Esta submacrounidade representa lIA - Submacrounidade paisagística -
um fator cultural marcante, o urbano. Tra- Trata-se do Planalto Ocidental; região ca-
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0'1 FIGURA :3 SITUACÃO DA PAISAGEM
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racterizada por uma topografia plana e tabu- havendo inclusive a formação de uma área
liforme fruto da decomposição de rochas metropolitana na região de Campinas e ar-
sedimentares do grupo Bauru, com algum redores. A vulnerabilidade ambiental é va-
afloramento do basalto onde a topografia se riável. Em algumas áreas demarcadas na
torna mais movimentada. Os solos são rela- figura 3 ocorre erosão intensa e voçoroca-
tivamente ricos e a ocupação da agricultura mento.
é intensa. Mais ao sul do Planalto Ociden-
tal, numa ampla faixa que vai de Presidente 7 CONSIDERAÇOES FINAIS
Prudente e Marília, surge uma área mais
vulnerável que em decorrência da ocupação Os temas que foram apresentados e dis-
humana, apresenta um amplo processo de cutidos nesse trabalho evidenciam mostrar
erosão e voçorocamento. O mesmo fato apa- o amplo espectro do estudo da paisagem
rece ao norte da região de Votuporanga. como subsídio do Planejamento Ambiental.
I1B - Na região das cuestas basálti- No momento p~esente, em face do descaso
caS encontra-se a terra rocha, o solo mais com que o assunto "ambiente" vem sendo
fértil do Estado de São Paulo. A urbaniza- tratado as medidas para a recuperação am-
ção nessa área tem avançado sobre esses biental são setorizadas e emergenciais. En-
solos anulando-os com a impermeabilização quanto isso os problemas se avolumam. Os
decorrente das construções. técnicos interessados em propor soluções
I1IC - A submacrounidade paisagísti- para os problemas do meio ambiente e da
ca a seguir é bastante complexa do ponto paisagem, terão uma área de atuação bas-
de vista do embasamento geológico pois aí tante espinhosa e complexa como cenário
aparecem inúmeras formações. No entanto de intervenção.
ele se caracteriza por ser uma área rebaixa- Urge que os profissionais em planejamen-
da em relação à macrounidade paisagísti- to ambiental apliquem medidas que deixem
ca I e se contrapõe ao front das cuestas de ser setorizadas e passem a ser globais.
basálticas. Essa região rebaixada recebeu o A natureza é um conceito global. Somente
nome de Depressão Periférica. Apresenta so- através das medidas preconizadas acima será
los bem mais pobres que as regiões lIA e possível conviver com a natureza em toda
I1B, o impacto ambiental é mais elevado sua magnitude.
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