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PREFÁCIO ••
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, . Autor d~ vasta obra, Rohert Dahl é um dos mais im~ortan:es cientista~er
políticos do pos-guerra. Destaca-se, sobretudo, por suas reflexões teoncas sobre a
democracia contemporânea, Sem risco de exagero, é possível afirmar que Dahl.
contribuiu decisivamente para definir os contornos do que hoje se entende pOl9
democracia, Isso porque, en~re outras razões, sua refle~ãü teórica não perde de vist,,~
o que se passa no mundo político habitado pelos cidadãos modernos, Eor considerar
,as democracias efetivamente existentes pobres aproximações do ideal democrático,g
pahl sugeriu que estas fossem ~hamadas de esiiuuuias. O simples fato de que ,fi
sugestão tenha sido seguida, que o termo poliarquia se tenha incorporado ao jargã~
da ciência política, atesta a importância do trabalho de Dahl',
Dahl distingue-se por sua capacidade de apresentar de forma clara, conciso.,8'
direto. e simples os problemas teóricos fundamentais que enfrenta. Um exemplc~
dessa qualidade pode ser :ncontrado na maneiro. concisa com que :Qahl trata ~
problema da democratlZacao, defmmdo-o. como um processo de progressiva arn-
pliacão da competição e da participação política. Esta identificaçiio da democrati"
zação com avanços nestes dois eixos - competição e participação - tornou-se$'
clássica porque, entre outr,as r:zões, ofereceu cri:érios claros e razoavelment~
objetivos para uma classificação dos regimes pO!JtICOS observados, permitindo ••

f!I
1. Para analises históricas dn reflexão teórica sobre n dernocracia c o papel de Dnhl nessa cvolucâo. "'"
consultar C. B. Mncphcrson, A Democracia Liberal': Origens c Evolução, Rio ~cJaneiro, Zahar, I <Í7S~
David Held, Modelos de Democracia, Belo Horizonte, Pnidcia, s. d.
ti
11 ;J.~
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I'OLlARQUIA PREFAciO

definir sua maior ou menor proximidade do ideal democrático. Diante de um país Poliarquia é uma obra de ruptura, uma obra em que novos pnradigmas
ualquer, em um determinado ponto no tempo, é possível avaliá-lo de acordo com • ' ,--J-- çK.- explicativos são invocados pela primeira vez. Variáveis ligadas ao mundo político
~~~ __ ~,-.J'
q - c 1assiificá
os dois eixos analíticos propostos e, com base nessa ava I·iaçao, ica- Io como
I.•.
ganham autonomia e poder explicativo, uma condição necessária para que transições
\--+c;~~ '"'
demoCrático ou não. Há limitações à competição política? Há parcelas expressivas \ .--(1)
de regimes possam vir a se constituir em um objeto legítimo de análise. Esta
~
~. •.

da população
para qualquer
às quais seja negado o direito de VOll/? Em caso de resposta afirmativa
das questões, o regime observado não é democrático.
v-"'" o=
introdução procura inserir Poliarquia nesse contexto, retomando
que procuraram identificar os determinantes da variaçª()_cl9~J~gimes
às principais obras
políticos, isto

» Essa forma de definir


fundamental
a democracia acabou por se constituir
quePoliarquia contribuiu para criar, qual seja,
de uma vasta literatura
na referência é, busca identificar- a;-~~spost;S-~~~;;sn;
alg-;:;?~poUCOs-países conseguem m;~terregimes
iit~~;t~~·~-pnra explic;gr-p~~-g~~._~Ql~tente
.gemoqáticos por longos.períodos.
t a Iíteratura dedicada a discutir a transição entre regimes políticos. É evidente que O ponto de partida óbvio dessa reconstituição da literatura é o trabalho de
ou bem se sabe distinguir urna democracia de um regime autoritário, ou não há íSeymour M. Lipsct", tido como uma das mais acabadas aplicações da teoria da
~
como se falar da transição de um a outro. Por isso mesmo, todo e qualquer trabalho ( modernização ao problema em tela, qual seja, o de explicar a variação do sucesso
sobre transição de regimes começa justamente pelas definições de autoritarismo e \ da democracia. A teoria da modernização é bastante conhecida e dispensa apresen-
~ .~;ações detalhadas. L1-. modernização é norm~llmente definida como o processo de
democracia empregadas. Em 99% dos casos, as definições baseiam-se em Poliar-
~ quia. transformações sociais pelo gual as sociedades pass<1m ao transitar do tradicional

~ A presença desta referência inicial quase obrigutória a Poliarquia pode ser ao moderno, processo em meio ao gual ocorre a diferenciação e a autonomização

~
,, i-lida, simbolicamente,
para a definição
como um reconhecimento
dos contornos da literatura
'--De fato, até o início dos anos 70, por paradoxal
à contribuição
a tratar das transições
decisiva deste livro
entre regimes.
que isso possa parecer, a agenda
das diferentes
ponto culminante
9a urbanização,
esferas da vida social. A obtenção
desse processo,
educação,
marcado pelo aparecimento
cOl11unicaçüo de massa, burocratização
de umn democracia
e incremento
etc. ~
estável é o
prévio

,, de pesquisas
processo
da democracia
dos cientistas
de democratização.
e do autoritarismo
políticos não incluía indagar sobre as chances
A literatura tendia a derivar as chances de ocorrência
de certas características sociais e históricas
de um

fora
sociedade
Para Lipset,

resumida na seguinte
e a democracia.
existiria

passagem:
uma relação
A formulação
'
direta entre o grau de modernização
de Lipset (1967: 49, 50) encontra-se
ela

do alcance da ação humana. A possibilidade da passagem de um a outro estado era


desconsidcrada. Mais do que isso, a literatura tornara-se rnarcadamente pessimista Talvez a generahzação mais comum, associando os sistemas políticos a outros aspectos
~
quanto às chances da democracia nos países subdesenvolvidos, ao tempo que da sociedade, seja a de que a democracia está relacionada com a situação de desenvolvimento
~ econômico. Quanto mais próspera for a nação, tanto maiores são as probabilidades de que ela
afirmava a exccpcionalidade dos países desenvolvidos. Democracia seria possível
sustenha a democracia. Desde Aristóieles até a atualidade, oshomens têm argumentado que só
~ apenas em países que se desenvolveram no século XIX. Países pobres estariam numa sociedade abastada, em que relativamente poucos cidadãos vivam no nível de pobreza
~ condenados ao autoritarismo e não escapariam a esse destino mesmo que se real, poderá existir urna situação em que a massa da população inteligentemente participe na

,
~
desenvolvessem.
A .constituição
concomitante
! políticas
à afirmação
desse

..Dito de outra maneira,


objeto
da autonomia
de pesquisa

essa literatura
- a transição
explicativa
de regimes
de vmÜíveis propriamente
foi um dos veículos por meio dos
- foi
política

tavorecida
tirania
e desenvolva
irresponsáveis. Urna
resultará
(ditadura
a autodisciplina
sociedade
numa
dividida
oligarquia
de base popular).
necessária
entre
(domínio
para evitar sucumbir
uma grande
ditatorial
massa
do pequeno
aos apelos de demagogos
pobre e uma pequena
estrato superior)
elite
ou em

~
guais a ciência política liberou-se ela teoria da modernização e ele suas explicações .1··
~ . calcadas no processo histórico de transformacão das estruturas sociais., Em expli-
Dito de maneira direta: a probabilidade de que países venham a ser democrá-

!t . cações desse tipo, regimes políticos inclependem da intervenção dos ntores políticos
e das escolhas institucionnis que fazem. Não há lugar para a política. pefinir as
~ 2. Sua contribuição original no tema encontra-se no artigo "Some Social Rcqucsites of Dcmocncy:
trnnsições como objeto de estudo implicn admitir que elas resultam, ou ao menos
!9 podem resultar. da ação de atores políticos. Se não fosse assim, não haveria por
Econornic Dcvcloprncnt and Pol itical Legilimncy", Amcrican Pol üical Sciencc Revicw, 53: 69-105,
1959. O artigo i"oi posteriormente rcpublicado como um capítulo de seu influente livro Tlic Polilical
Man, New York, Doubicday, 1960. As citações são retiradas da tradução brasileira, O Homem Político,
~ que estudá-Ias.
Rio de Janeiro, Zahnr, 1967.
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PI1EF,íCIO
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I'OUM/QUIA
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ticos aumenta com o grau de modernização da sociedade. Lipset testa a correlação houve e continuam havendo democracias estáveis com sistemas multipartidários, representação
r
entre diversos
A análise cmpírica
rrrandes
'"
índices de modernização

CTrupos de países:
'"
comprova sua hipótese,
os subdesenvolvidos
e sua classificação
permitindo,

-Embora
dos regimes políticos.
sobretudo,
com regimes
distinguir
autoritários
dois
e os
proporcional
s50 muito
e um Estado unitário.
menos importantes

Após revisar os argumentos


De fato, eu diria que tais variações
do que as derivadas das diferenças
nos sistemas de Governo
básicas da estrutura

a favor de cada uma das variáveis institucionais


socia!'.
••r
rêíesenvolvidos

com regimes democráticos.
..
Lipset afirme que o desenvol-
citadas, Lipset conclui: r
i vimento
lique o desenvolvimento
favorece a manutenção
leva à obtenção
da democracia,
da democracia,
o que não é o mesmo que afirmar
na vasta literatura direta-
r
; mente influenciada por esse trabalho, essa proposiç~o foi interpretada como
Eu poderia
essenciais <lOS
salientar
sistemas
de novo
democráticos.
que n50 considero
Se as condições
esses aspectos
sociais subjacentes
da estrutura
facilitam
política
a democra-
r
significando que a modernização causa a democracia" cia, como parecem fazê-to na Suécia, por exemplo, então a combinação de muitos p~rtidos, ~

na estrutura
a sociedade
A estabilidade da democracia
social pelo avanço da modernização.
moderna geraria uma estrutura
decorreria das transformações levadas a cabo
I?e acordo com Lipset (1967: 66),
social condizente com a democracia
representação
minorias
proporcional
irresponsáveis
e Estado unitário
consigam um reduto
n50 a debi lita seriamente.
no parlamento.
No máximo, permite que

••
~
.ao alterar a "estrutura de cstrat;ficação, de lima pirâmide alongada com uma vasta Está claro que, nessa explicação, há muito pouco espaço para estudar a

base composta
~a".
Dela classe inferior,
Essas transformações
para um 10s<1ngo com uma crescente
afetam o conflito social e, conseqüentemente,
classe
a sua
transição
favorecer
possa contribuir
de regimes. A modernização
a democratização
tudo decide e para aqueles interessados
só resta apoiar esse processo. Não há ação política gue
de maneif:1 direta para a democracia. A ação possível é indireta,
em
".,,-r
tradução política, tornando-o moderado, isto porque "uma numerosa classe média
tempera o conflito, ao premiar os partidos moderados e democráticos, e ao punir via apoio à modernização. Mas isso só será verdade se a modernização acarretar a
~
democracia em toda e qualquer situação histórica. Essa invariãncia histórica foi
os grupos extremistas". Ao mesmo tempo, as classes inferiores teriam sua renda e
v
••
questionada por uma série de autores.
nível educacional elevados, com o que se ubriria a possibilidade de que "desenvol- ,~-r·
vam perspectivas a mais longo prazo e concepções mais complexas e grudualistas Em sua análise ernpírica, Lipset não recorreu a uma série temporal. Foram

da política" (1967:60). Em uma palavra: desuparecerinm QSrazões para conflitos comparados


infcrência
os países desenvolvidos
segundo a qual o desenvolvimento
e subdesenvolvidos nos anos 50. Logo, a
dos países subdesenvolvidos trará
r
sociais violentos
neira pacífica,
e extremados,
istoé, por meio da competição
abrindo-se a possibilidade
eleitoral'.
de resolvê-I os de ma-
consigo a democracia encontra fundamento em uma teoria linear da história. Mais r
Processos propriamente políticos, nesse tipo de explicacão, nfto afetariQm as do que isso, supõe que a história seja única, que todo e qualquer país, em qualquer ev-
momento da história, passa pelos mesmos estágios. Assim, os países subdesenvol-
chances da democracia: a política não possui autonomia; o que se passa nesta esfera
vidos representariam o passado dos países desenvolvidos e estes o futuro daqueles.
fi'
seria o reflexo do amplo processo
políticas, admite-se, poderiam
de transform<lção da estrutura social. Instituições
ter alguma importância, mas esta seria sempre secun- A inferência, portanto, passa pela suposição da existência de um caminho único, a r
dária e subordinada à estrutura social. Lipset (1967: 92) afirma, por exemplo, que, ser trilhado por lodos os países que caminham em direção Q mcdernidade. r
sendo constantes os demais fatores, os sistemas bipartidários são melhores do que os multipar-
Barrington Moore Jr." rompe com essa visão, observando
uma únicQ rota através da gual os países transitariam do tradicional
que não existiria
para o moderno.
r-
ti dá rios, que a eleição de indivíduos para os altos cargos numa base territorial é preferível fi Trabalhando dentro de uma perspectiva macroistórica, Moore (1975: 13) identifica Ir
representação proporcional, e que o federalismo é superior ao Estado unitário. Evidentemente, três diferen tes rotas para a modernização: r
r
.). Para uma rcvisâo
ment and Dcrnocrncy
da litcraturn empírica
Rcconsidcrcd",
sobre o tema, consultar
/vnicricun Bchoviorul
Larry Diamond,
Scicmist , 35: 450-499,
"Economic Dcvclop-
1992, c Adarn 5. O leitor mais alento não dcixani de notar que o formato instituciona! citado coincide com o dos Estados r
Przcworski e Fcrnando Lirnongi, Modcrniznt ion: Thcorics and Facts, \Vorking Papcr n. S, Univcrsiiy Unidos.
of Chicago Ccntcr 011 Dcrnocmcy, 1995. 6. Social Origins of Dictatorship nntl Dcmocracv: Lord and Pcasant in lhe Moking o] Modcrn World,
4. Vale observar 'lu\';nesta explicação a modcrniz.rcâo é invocadn corno urna vnri.ivc l intcrvcnic nte, pOSIO Bosron, Bcacon Prcss, 1966. Citações foram retiradas da versão portuguesa: As Origens Sociais da
r
quc G a igualdade que Favorece i! dcrnocrncin. Logo, sociedades
.1(~mOcr;ílicas. Como veremos adiante,
não-modernas mas igunlinirias tenderão
esta é ;\ posição

J.I
defendida pelo próprio Dnhl.
Ditaduru e da Democracia:
Edições Cosmos,
Senhores e Camponeses
1975.
na Construção do Mundo Moderno, Lisboa,

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~ POLlARQUiI\ .I PREP,{CIO

~
~
No leque dos faros aqui examinados,
o mundo pré-industri~1 ao contemporfmeo.
poder-se-ão distinguirtrês
O primeiro desses caminhos leva-nos através daquilo
caminhos

que acho merece ser chamado as revoluções burguesas. [ ... ] Acho que [revoluções burguesas] é
principais, desde
I,
.< A
I .+.
: consumadas
I tou e destruiu
ao longo do processo de modernização.

, ticos: nazi-fascismo,
a nobreza, a modernização
quando foram preservadas
desembocou
Onde a burguesia não enfren-
em regimes não-democrá-
as formas repressivas de trqbüllw
uma designação necessária para determinadas alteraçôes violentas que se verificaram nas socie- no campo via a aliança entre nobreza e burguesia; comunismo, quando a burguesia

.~
dades inglesa, francesa e americana
cracias industriais. [ ... ] O segundo
durante o século XX. A Alemanha
no seu caminho para a transformação em modernas
caminho também foi capitalista mas culminou em fascismo
e o Japão são os exemplos evidentes. [ ... ] Chamar-lhe-e! a
demo-
Ii"1' ~ra demasiadamente fraca e o problema do campo foi deixado intocado.
Moore procura explicar os acontecimentos do século XX lançando mão de

~
forma capitalista
caminho
e reacionária.
é, evidentemente,
Equivale
o comunismo,
a uma forma de revolução vinda de cima. [... ] O terceiro
como foi exempli ficado na Rússia e na China.
ii
:1
variações
---
classe são
----
ocorridas no deslanchar do processo de modernização.
as variáveis explicativas fundamentais, mas sua ação se daria com um
As alianças de

atraso de séculos. Não existiriam, propriamente, opções a fazer. Moore, em uma


~ +:;.
A associação encontrada por Lipset aplicar-se-ia a um grupo restrito de única passsagem, admite que o destino do Japão, da Itália e da Alemanha poderia
~

-
países. Existiriam outras faces políticas possíveis para o processo de moderni- ter sido al terudo no século Xx. Mas as chances de reverter o destino tecido ao longo
,. zação: o fascismo e o comunismo. A ocorrência da democracia dependeria do dos séculos eram muito pequenas:
"desenvolvimento de um grupo na sociedade com uma base econômica inde-
~
pendente, o qual ataca os obstáculos a uma versão democrática do capitalismo 1. Eventualmente, a porta para os regimes fascistas foi aberta pela incapacidade de estas
~ herdados do passado" (1975: 14).
, democracias enfrentarem os problemas graves da época e a sua relutância ou incapacidade de
I. introduzir alterações estruturais fundamentais (1975: 502).
~ As revoluções burguesas assim como as diferentes formas de persistência do i·~i
passado apontariam para diferentes correlações de força entre a burguesia e a nobreza.
~ A democracia estabelecer-s'e-ia somente onde a burguesia fora forte o suficiente para
i-i Nem mesmo alterações estruturais fundamentais garantiriam, com um grau
mínimo de certeza, a alteração do rumo traçado no passado distante. Em Moore,
D levar a cabo uma transformação violenta da ordem social. Onde ela não teve essa forÇll, . :""1-;'
Ij
os homens são presas das decisões tomadas no passado. O destino político da
onde a reação à agricultura comercial levou ao recrudescimento das relações servis no
fj Alemanha no século XX foi decidido ao longo dos séculos XVIII e XIX, se não
campo, os obstáculos à democracia não foram removidos e, como resultado, emergi- '-r:, 1antes. Regimes
I·,
~ políticos não são matéria de escolha. Tanto mais porque as rotas
ram formas políticas repressivas. Assim, se comparados aos países onde o "problema
'I: ') disponíveis para a modernização são condicionadas pelas escolhas já feitas, isto é,
camponês" foi resolvido por meios revolucionários, na Alemanha e no Japão o impulso
il: l_as rotas não são escolhidas pelas elites de maneira livre, pois estas
burguês era muito mais fraco. Se chegou a tomar forma revolucionária, a revolução
foi derrotada. Mais tarde, algumas secções de uma classe comercial e industrial
li
~ relativamente fraca apoiaram-se em elementos dissidentes das classes mais antigas e
~\
H
constituem, muito mais claramente, sucessivas fases históricas, Deste modo, apresentam entre
a·· si uma relação determinada e limitada. Os métodos de modernização escolhidos por um país
e ainda dominantes, principalmente recrutados no campo, para levarem a cabo as
alterações políticas e econômicas necessárias para uma sociedade industrial moderna,
~l
1':: alteram
(1975: 478).
as dimensões do problema para os países seguintes que escolham o mesmo método

~ sob os auspícios de um regime semiparlamentar. O desenvolvimento industrial pode


~ avançar rapidamente sob tais auspícios. Mas o resultado, após um breve e instável 2~regimes políticos dependem do momento em que os países iniciaram seu

••••
período de democracia, tem sido o fascismo (1975: 14) . processo de rnodernizacão. A experiência dos "países líderes" foi excepcional,
A terceira via, a do comunismo, teria ocorrido onde a debilidade da burguesia única. A via democrática estava barrada aos países capitalistas "retardatarios"
fosse ainda mais pronunciada. Nesses casos, as grandes burocracias agrárias teriam enquanto a via fascista não mais se ofereceu à .Rússia e à China. Ora, se isso for
~ inibido os impulsos comerciais e mais tarde industriais, fazendo com que as classes verdade, a inferência feita por Lipset não seria válida, isto é, não seria possível
urbanas viessem a se tornar "demasiado fracas para constituírem mesmo uma parte
~ inferir o futuro dos países subdesenvolvidos pelo que se passou com os países
~

••
~
menor na modernização
havido tentativas nesse sentido"
Em resumo, a democracia
efectuada pela Alemanha
(1975: 15).
dependeria, basicamente,
e pelo Japão, embora tivesse

das aliancas de classe!


desenvolvidos. Um dos objetivos de Moere, justamente,
ser trilhada pelos países do Terceiro Mundo, representados
Índia. Moore não oferece respostas claras, até porque na Índia ocorreu tão-somente
é o de saber qual a rota a
em seu estudo pela

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17
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POLlARQU/A
:11
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I! PREFÁCIO
r.
11·
i.
"um fraco impulso modernizador" (1975: 15). No entanto, para Moore, parece !i ( ,. H . d . - ~
agranas. untmgton acrescenta que a mo erruzaçao desestabiliza a democracia ao
r
!
~
certo que as chances de que essa rota contemple a democracia são remotas. Métodos a, i intensificar o conflito social. Para os países do Terceiro Mundo, o destino estaria
políticos repressivos seriam constitutivos da industrialização retardatarià". ·'k.
\' \._selado. Tanto a manutenção da ordem tradicional quanto a sua dissolucão resulta- r
Os acontecimentos políticos dos anos 70 contribuíram para dar alento a : riam em soluções necessariamente autoritárias. A crer nesses diagnósticos, nada fIP
explicações desse tipo. Ao contrário das previsões de Lipset, a modernização nos 1 "que os cidadãos do Terceiro Mundo viessem a fazer poderia alterar a sua sorte.
i
países do Terceiro Mundo parecia estar associada à emergência de regimes auto- ~.
Ii
Desses argumentos decorre a mais completa impotência política. r
N- ritários. Tome-se, a título de exemplo, o que se passou na América do Sul onde i\M,~,4v ir'l\.~"-\",:"Nesses termos, a própria pergunta com que Dahl define o objetivo de seu r
apenas dois países - Colômbia e Venezuela - resistiram à maré ascendente do i livro rompe com a literatura precedente. Ao fazê-Ia, Dahl libera a política da
autoritarismo ao longo de toda a década. O esquema explicativo proposto por determinação férrea do processo histórico de modernização. Não que explicações r
Moere, ainda que um tanto simplificado, foi invocado, seguidamente, para dar derivadas da estrutura social sejam descartadas. Os capítulos 4, 5 e 6 àe Poliarquia r
conta do fracasso da democracia no Terceiro Mundo: a fraqueza do próprio discutem os temas caros à teoria da modernização. No entanto, em lugar de invocar r
processo de modernização, e sua incapacidade de eliminar formas arcaicas de a história, Dahl procura isolar as características da estrutura social a afetar de
dominação no campo estariam na raiz desse malogro. maneira direta, o mundo político. Mais especificamente, Dahl procura estudar oi\r
. Samuel P. Huntington propõe uma explicação alternativa para esse insucesso. ~efeitos do acesso e do controle dos recursos de poder socioeco~ôm~cos e de c,%rção ir
Segundo a interpretação
processo de dissolução
desse autor, o autoritarisrno
da ordem tradicional e da mobilização
seria a resultante política do
social daí decorren-
__~?_brea democraci~. Com ~~sc_nes~_~_ ~rité2io_:::a.~.~s~oe.~o!:t~?!e _~~~r~_os_~~c~rsos ;'r
de po~istingue as sociedades de acordo com.sC':u ~rau de plurpljSOlQ.
te". A democracia seria ameaçada pela entrada das massas na arena política. Recém r. r
liberadas dos Iaços de dependência pessoal que estruturavam sua experiência social
e política no campo, essas massas seriam incapazes de apresentar o comportamento
I
,!
Na visão de Dahl, o pluralisn~o·;ocietai ser;~-l;l~;·d~s principais determinante~-
da sorte da democracia.
exclusivo a qualquer
Em sociedades plurais, nenhum grupo social teria acesso
dos recursos de poder, isto é, nenhum grupo social poderia
,;-
Ki
"
moderado louvado por Lipset". Sob a democracia, líderes atenderiam a essas garantir sua preponderância sobre os demais. Pelo contrário. O resultado seria a
demandas, comprometendo
uma vez que a rcdistribuiçâo
a própria continuidade do processo de modernização,
de renda se faria à custa do investimento'''. Em uma
i neutralizado recíproca dos grupos em conflito. Em outras palavras, Dahl e a escola
p,luralista a que ele se filia creditam a preservação da liberdade política à sobrcvi-
r

r-
palavra, a modernização
nuidade, a eliminação da democracia.
causaria instabilidade

Como se vê, explicações calcadas na teoria da modernização


progressivamente, pessimistas".
política e pediria, para sua conti-

Segundo Lipset, a intensidade


tornaram-se,
do conflito social
l vência e à contraposicão
1_~~_~hances~~.~~~.:_~a~~~:J)or~.::~,
de inúmeros poderes sociais independente:;)".
dependeria~_d_~ f?~~ ?~_p~~~~~S!l:r?_~.':.
{ sociedade. Este, por seu turno, independer:-rã-dõ-jirocésso histórico de desenvolvi-
~ mento. Em outras palavras, Dahl está a sugerir que a ocorrência da estrutura social
"r
qs

diminuiria com o avanço do processo de modernização. Moere corrige-o afirmando que Lipset identifica como favorável à democracia não estaria restrita às sociedades r
que isso seria verdade apenas quando fossem eliminados os privilégios das classes modernas. Por exemplo, a maioria dos países hoje desenvolvidos seriam socieda- r
des pluralistas no século XIX c, por isso mesmo, teriam-se tornado democráticos
antes de se modernizar. Alemanha, Itália e Japão no século XIX, por seu turno, r
7. Ver as conclusões de Moore sobre a Índia;1 pilgina 474 e fi nota 4 na página 504, onde a situação social estariam longe de ser plurais. O mesmo critério - o grau de pluralismo societal - r
S.
na América Latina é cornpnradn com fi tia Alemanha, da luilin e do Japão do entre-guerras.
Este é o ponto central de seu livro: Po/itical Ordcrín Chonging Socicties, New Havcn, Yalc Univcrsity
é aplicado aos países subdesenvolvidos,
iCosta Rica. Isto é, não haveria uma incompatibilidade
explicando assim casos raros como o da
intrínseca entre democracia
r
9.
Press, 1968. O livro foi publicado
Em real idade, Lipsct (1967:69)
no Brasil em 1975 pelo Edusp - Forense Universitária.
observara que urna nipida transição do tradicional 00 moderno poderia ; e subdesenvolvimento. Da mesma forma, nada impediria que estes países se e-
ser prejudicial ~ democracia.
Lgesenvolvesse·~ e/ou adotassem governos democráticos com sucesso. ~

••r
10. O argumento sobre .1 incornpatibilidndc entre democracia e desenvolvimento encontra-se em Sarnucl
Huntington c Joan Nelson, No Easy Choicc: Polítical Ponicipation in Dcveioping Countrics, Carn- Se é verdade que o pluralismo proposto por Dahl permite escapar do deter-
bridge, Harvard University Press, 1976.
1 L Esses diagnósticos, vale notar, foram direta rnente influenciados pela guerra fr-ia e tiveram implicações
diretas sobre a potítica externa norte-americana. 1 12. A influência de Montesquicu, Mndison e Tocqucvillc sobre o pluralisrno são evidentes.

18

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minismo pessimista presente


POLlARQUIA

nas formulações caudatárias da teoria da moderni-


PREFÁCIO

ênfase, ao contrário de em autores como Huntington e o próprio Lipset, deixa de


zação, não é menos verdade que o leitor de Poliarquia se ressente da falta de uma ser a dificuldade de incorporar as massas ao sistema político, tese tão cara aos
/~discussão aprofundada do próprio pluralismo, Sobretudo, falta ao livro uma dis- estudos orientados pela teoria da modernização. A seqüência a que se refere o título
f
r
I
cussão sobre
nia"pluralismo
econômico
13
como

contribui
Tudo
as sociedades podem
que Dahl nos diz em Poliarquia
para aumentar
mover-se

o grau de pluralismo
ao longo do contínuo
é que o desenvolvimento
societaL Dessa
hegemo-

forma, o
do capítulo
refere-se
diz respeito,
à ordem dos avanços
tão-somente,
em direção
a variáveis
11 democracia
políticas. A variação
ao longo
possível
dos dois eixos
que a definem: competição e participação política. A estrutura social não é sequer
pluralismo acaba por perder muito da sua força, confundindo-se com a teorja d~

.,
mencionada. Apenas variáveis políticas são consideradas".
\, modernização'·.
.Com base em considerações dessa ordem, Dahl oferece uma explicação
No entanto, essa "diluição" do plur alismo na teoria da modernização é alternativa para a excepcional idade dos países desenvolvidos: nestes. a competi\fÜQ \
compensada pela incorporação de variáveis institucionais à análise: precedeu a inclusão política, isto é, nesses países teve lugar a seqüência identificada
como mais propícia à democracia. Essa alternativa não estaria mais disponível aos
apesar de as instituições terem sido interpretadas, cada vez mais amplamente, por cerca de uma
\9 países subdesenvolvidos, posto que não haveria mais como justificar limitações à

••
geração, como um mero epifenômeno, este período de reducionismo em ciência política pode
extensão do sufrágio. Isto é, as dificuldades para a estabilidade democrática nos
estar agora chegando ao fim. Seja como for, para analisar a eficácia governamental em regimes
países subdesenvolvidos decorreriam de razões políticas.
competitivos, creio que se deve dar alguma ênfase às instituições políticas. [ ... ] Nas poliarquias,
dois tipos de arranjos institucionais parecem trazer importantes conscquências para a "eficácia" A própria forma como Dahl aborda o problema básico da democracia colo-
do governo. Um desses tem a ver com o relncionarnenio entre o Executivo e as outras forças ca-o a anos-luz da literatura que o precede. O leitor educado por Lipset, Moore e
políticas importantes do país, inclusive o relacionamento que tem sido freglientemente a fonte Huntington é verdadeiramente sacudido pelos axiomas enunciados no capítulo
de sérios problemas em regimes competitivos - entre o Executivo e o Legislativo. [... ] A outra
inicial de PoliaNjlLÍ:!< A democrac~~L afirma D~hl,.~!~~~.?"d:~lm cálculode custos

• instituição

perspectiva
significativa

Não há como
adotada
é o sistema

exagerar
por Lipset
partidário.

a importância
e Moere
dessa
é flagrante.
passagem.
Dahl rompe
A diferença
com o esquema
com a
I
~
l,
\
l
e benefícios
formulacãe
feito

tolerar - iéus ~dv~rSá;(os:"A


vãn:tãfóSo'f;zê'~io:
por
é a premissaoe
atores

Ã""oposicão
polílicos
que toaQe
guesÚo
em conflito.
qLiãlguer-grupo
está'~;;';;b~~"~~-
será tolerada pela situação
O ponto
políiíco
t~m-fõ~cas"i;;ra
guando
de partida
prefei--e-rep;in~ir
tanto,
para esta última
dessa

~~- é
a

\explicativo imposto pela teoria da modernização. Variacões institucionais são !


for menos custoso fazê-Io do que aceitar o risco de perder o poder para a primeira
i invocadaU2ill-a explicar o s_uce~s? ..~.a, democracia. Ainda que desenvolva pouco I
• I em eleicões livres. Da mesma forma, a oposição aceita participar da competição
esse tema, é impossível não notar que os pontos levantados por Dahl - relações i
eleitoral quando esta opcão lhe for menos custosa do que a conquista do poder por
Executivo-Legislativo e sistema partidário - acabaram por se constituir nos pólos I r-fueios revolucionários. Nesses termos, como já comentado, a democracia susten-
"estruturadores do movimento neo-institucionalista dos anos 80. !

~
dedicado
A ruptura
aos efeitos
de Poliarquia
da entrada
com a literatura
das massas
anterior
no sistema
é claríssima
político. Nesse
no capítulo
capítulo, a
j
: .ta-se a partir
\ em condicões
,12olíticos inseridos
Uma
de um equilíbrio
de eliminar

vez mais,
em uma relacão
será
de forças,
os demais.

difícil
isto é, guando
Sobretudo,
estratégica.
exagerar
é fruto

a importância
nenhum
de um cálculo

dessa
grupo socbl

formulação.
de atores
está

Em
~ 13. o leitor também se ressente de urna discussão dos métodos que permitem rnensurar o grau de plural ismo
societal. Vale notar as dificuldades com que Dnhl se defronta ao discutir a neutralizaçâo do poder
I!
'-primeiro lugar, cabe notar que a formulação de Dahl representa um forte golpe em
; explicações culturalistas. A manutenção da democracia não depende da adesão
~ coercitivo dos exércitos modernos. j
]4. Em SUi'lS origens, seguindo de perto Tccquevil!e, o pruralisrnc enaltece íl sobrevivência dos grupos !. prévia dos atores sociais a determinados valores. A adesão às regras democráticas \,
~ sociais intermediários, vistos como os obstáculos sociais capazes de barrnr e lirnitnr o ameaçador poder I . é circunstancial, contingente. Depende, sobretudo, de considerações estratégicas ..
político concentrado nas mãos do soberano. Onde esses grupos são destruidos, o soberano não
encontraria limites fi SlI;tS pretensões e n liberdade estaria nmeaçada. Logo, a modernização terá efeitos i LCom isso, Dahl abre espaço para que os atores políticos e suas escolhas passem a i

diversos para n democracia ccnlormeesta acarrete ou não a destruição dos grupos socinis
~ radicalmente
intermediários. Nesses lermos, sociedades plurnis são contrnpostns a sociedades de massa, o destino
t
I 1
~ dos Estados Unidos contraposto ao da Alemanha. É i~leressanle que. em Poíiarquía, essa dlst inção não I 15. Par» urna confrontação entre argumentos inspirados por Dahl e por Huntington acerca da abertura
"'.::" foi explorada, isto é, que urna das proposições centrais do pluralisrno não tenha sido sequer invocada.
!' brasileira, consultar Skidmorc, 1991, pp. 324 c ss.
~
20 2/
~
IA

.
1
~
.I,,!S
"
•••
~
~ !

li,
f'OLlARQUIA

ft
ífazer arte do uadro ex licativo. Atores olíticos tomam decisõe fie
. conseqüências de seus atos, escolhem instituições políticas; em uma palavra, agem
IJloliticamente. E a maneira como atuam desempenha um papel decisivo na obten-
fi !

"q
LçãO e ria manutenção da democracia.

~
FERNANDO LIMONGI

AGRADECIMENTOS
~
,)-
e).
I,
fjfA
j!.

ff
•• i~

Gostaria de expressar meu reconhecimento à Fundação Rockefeller pelo

"••

apoio financeiro que ajudou a tornar possível este livro e outros que realizei sobre
o tema de governos e oposições. Sou grato também ao Conselho da Universidade
de Yale pela ajuda financeira do Fundo de Pesquisa para Assuntos Mundiais Henry
L. Stimson e à Universidade de Yale por uma bolsa para pesquisadores seniores ~ i'
que me permitiu concluir o manuscrito.
Os comentários de alguns colegas que leram vários rascunhos em parte ou
no todo foram particularmente proveitosos. Entre estes estão Frederick Barghoorn,
Robert Dix, William Foltz, Michael Leiserson, Rajni Kothari, Juan Linz e Gordon
•••• !

Skilling, todos eles co-autores de um volume correlato, Regimes and Oppositions,


e também Hans Daalder, Joseph Lal'alornbara, Vai Lorwin, Nelson Polsby e Stein
Rokkan, Gostaria de agradecer aos alunos de meus cursos de graduação. e pós-gra-
••• I
,

duação por se submeterem a um contato com o rascunho do manuscrito e manifes-


tarem reações que me foram, muitas vezes, extremamente úteis.
Pela paciência, competência e presteza com que transformaram meus esboços
•• I

••••.,
em texto datilografado legível, quero expressar tanto meus agradecimentos quanto
minha admiração às senhoras Betty Mauceri, Miriam Swanson e Nancy Hoskins.
E uma vez mais aumentei meus débitos para com a senhora Marian Ash por seu
trabalho de supervisão editorial na Yale University Press,
~!

R.A.D. ;

22 23
•••
(-; .~

:'
{.

"
~" f~~::!i-


.-

• DEMOCRATIZAÇÃO
1

E OPOSIÇÃO PÚBLICA

••
••
• Dado um regime em que os opositores do governo não possam se organizar
aberta e legalmente em partidos políticos para fazer-lhe oposição em eleições livres
i!
I
• e idôneas, que condições favorecem ou impedem sua transformação
no qual isto seja possível? Este é o assunto do presente trabalho.
num regime
~
I
~
r
CONCEITOS I
li
11\

Cçomo o desenvolvimento de um sisten~~[t.k.9_qlle_.peIlnite_Qp-osição, ~


!~
ri~~!.~~.~~~.~_c:~r::E~~~ção eJ}.trU.DL.gQy.eJ.!!9_!<..Ji~1&.QP..9J).~nt.eLL.u!U.._aspect.o ~
imE~~?J~_(:La_<!~l1.~c.ratiza.<?o,
este livro trata, necessariamente, de um aspecto da t
"
democratização. Mas os dois processos ~ democratização e desenvolvimento da. :~.
!:
oposição pública - não são, a meu ver, idênticos. Uma descrição completa das ir:
,':

diferenças poderia ryos levar à abordagem tediosa de um atoleiro semântico. Para !~:
li.
evitar este desvio, tomo a liberdade de indicar, muito sumariamente, sem muita
explicação ou elaboração, alguns de meus pressupost.2i]
li
I.'

•• .,.
~~:.'.,.,\
. ç: Parto do. pressuposto de que uma caracJeIÍstica-chave..da-democracia-é
I
-)~contínuaresponsi\!jdade do gov..ernoàspreferência.s. de se1,lScidadãos.considerados
( cQmo-politicarnente.iguais. Não pretendo levar em consideração aqui outras carac-
. terÍsticas que poderiam ser necessárias para um sistema ser estritamente democrá-
.a_.
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~
iii
•.- tico. Neste livro, gostaria de reservar o termo "democracia" para um sistema

25
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FAFICH/UFMG
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~
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" POLlIIRQUIA

político que tenha, como uma de suas características, a qualidade de ser inteira-
DEMOCRATIZAÇÃO E OPOSIÇÃO PUBLICA

Tabela J.1. Alguns requisitos de uma democracia para um


grande número de pessoas
•ti
"
mente, ou quase inteiramente, responsivo a todos os seus cidadãos. A esta altura,
não devemos nos preocupar em saber se este sistema realmente existe, existiu ou Para a oportunidade de: São necessárias as seguintes garantias
pode existir. Pode-se, seguramente, conceber um sistema hipotético desse gênero;
tal concepção serviu como um ideal, ou parte de um ideal, para muita gente. Como I. Formular preferências
institucionais:
1. Liberdade de formar e aderir a organiza- ""
?í:C
sistema hipotético, ponto extremo de uma escala, ou estado de coisas delimitador,
ele pode (como um vácuo perfeito) servir de base para se avaliar o grau com que
vários sistemas se aproximam deste limite teórico.
ções
2. Liberdade de expressão
3. Direito de voto
••
1/1
'.~ .
;:' Parto do pressuposto também de que, para um governo continuar sendo 4. Direito de líderes políticos disputarem apoio
f'
,
<I.'
responsivo durante certo tempo, às preferências de seus cidadãos, considerados, 5. Fontes alternativas de informação

politicamente iguais, todos os cidadãos plenos devem ter oportunidades plenas: 11. Exprimir prcferéucins
~
1. Liberdade de formar e aderir a organiza-
ções fi
1. De formular suas preferências.
2. De expressar suas preferências a seus concidadãos e ao governo através da ação
2. Liberdade de expressão
li
3. Direito de voto
individual e da coletiva. '!:.- Elegibilidade para cargos políticos fi
3. De ter suas preferências igualmente consideradas na conduta do governo, ou 5. Direito de líderes políticos disputarem apoio
~
seja, consideradas sem discriminação decorrente do conteúdo ou da fonte da 6. Fontes alternativas de informação
preferência. L Eleições livres e idôneas
(I
111. Ter preferências igualmente 1. Liberdade de formar e aderir a organiza- 'I
Essas me parecem ser então as três condições necessárias à democracia, ainda que,
••g
considcndns IHI conduta do governo
ções

,
provavelmente, não sejam suficientes. Em seguida, suponho que para essas três oportu-
2. Liberdade de expressão
nidades existirem para um grande número de pessoas, tal como o número de pessoas
3. Direito de voto
abarcado pela maioria dos Estados-nações existentes, as instituicões da sociedade devem -!!.... Elegibilidade para cargos públicos
fornecer pelo menos oito garantias. Elas estão indicadas na tabela 1.1. .
5. Direito de líderes políticos disputarem
I Parto ainda do pressuposto adicional de que as conexões entre as garantias e

,
apoio
I as três oportunidades fundamentais süo suficientemente evidentes para dispensar 5a. Direito de líderes políticos disputarem e
i qualquer elaboração adicional I . votos
~ Q=:xaminando a lista de oito garantias institucionais, tudo indica que elas 6. Fontes alternativas de informação
deveriam nos proporcionar uma escala teórica em cujo âmbito seria possível .Z:.. Eleições livres e idôneas f)
~diferentes sistemas pol!!iE9.s. Uma avaliação mais de perto, porém, indica 8. Instituições para fazer com que as políticas
que as oito garantias po~ ser melhor interpretadas como constituindo.~u~s governamentais dependam de eleições e de
f
.~~m~r:~~e~_.te0ic~~)i!;;eiramente diferentes da~5
<,
outras manifestações de preferência . e
. 1. Tanto historicamente como no presente, os regimes variam enormemente
e
na amplitude com que as oito condições institucionais estão a~~amente di~p~r:.~. IJ
~, são publicamente utilizadas e .~mente giu.í!.mislas,ao menos para alguns
tl
1. Algumas dessas rclnções são discutidns em meu trabalho A Prcfocc to Dcmocratic Thcory, Chicago. membros do sistem;polí'tico que queiram contestar a conduta do governo. Assim,
University af Chicago Press, lk.JS6, pp. 63-81, e em Robcrt A. Dnhl e Charles E. Lindblom, Politics, uma escala refletindo essas oito condições nos permitiriuomparar regimes dife- ~
Economícs aliei WeI!arc, New York, Harper, 1953, Caps. 10 e 11.
~
27
26
~
... _ ... __ ._-_ __
.. ._--- _._--------.-..,.---.-....,.-.._----- ---

, .

DEMOCRATIZAÇÃO E OPOSlç,íO PUBLICA


POLlARQUIA

rentes segundo a amplitude da oposição, da contestação pública ou da com~ Ipaís com um sufrágio limitado mas com um governo fortemente tolerante. Conse-
política permissíveis". Entretanto, como um regime poderia permitir o exercício da qüentemente, quando os países são classificados exclusivamente de acordo Com
~ oposição a uma parte muito pequena ou muito grande da população, certamente sua capacidade de inclusão sem levar em conta as circunstâncias ambientes, 2s
#- resultados são anômalos. No entanto, desde que tenhamos em mente o fato de que
precisaremos de uma 'segunda dimensão. '
a abrangência do "sufrágio" ou, mais genericamente, de que o direito de participar
~ .- 2. 'Tanto histórica corno contemporaneamente, os regimes variam também indica apenas uma característica dos sistemas, característica essa que só pode ser
,na proporção da população habilitada a participar, num plano mais ou menos igual interpretada no contexto de outras, ela é útil para distinguir regimes por sua
do controle e da contestação à conduta do governo. Uma escala refletindo a_ capacidade de inclusão.
;mpÚt~d~ do direito de participação na contestação pública nos permitiria compa- \- Consideremos, então, a democratização como formada por pelo menos duas
rar diferentes regimes segundo sua inclusividade .. ~mensões: contestação pública e direito de participação (figura 1.1). A maioria
.O direito de voto em eleições livres e idôneas, por exemplo, participa das dos leitores certamente acredita que a democratização implica mais do que essas
~ duas dimensões. Quando um regime garante este direito a alguns de seus cidadãos, duas dimensões; mais adiante discutirei uma terceira dimensão. Mas proponho que
•*-- ele caminha para uma maior contestação pública. Mas, quanto maior a proporção se limite a discussão aqui a essas duas. Pois a questão, creio eu, já estácolocada:
de cidadãos que desfruta do direito, mais inclusivo é o regime." desenvolver um sistema de contestação- pública não é necessariamente equivalente
~
e A contestação pública e a inclusão variam um tanto independentemente. A à. democratização plen.~.
~ Grã-Bretanha possuía um sistema altamente desenvolvido de contestação pública J'ara demonstrar mais claramente a relação entre contestação pública e
no final do século XVIII, mas apenas uma minúscula parcela da população estava democratização, coloquemos as duas dimensões como na figura 1.23• Como um
plenamente incluída nele até a ampliação do sufrágio, em 1867 e 1884. A Suíça regime pode ser teoricamente localizado em qualquer lugar no espaço limitado
possui um dos sistemas mais plenamente desenvolvidos de contestação pública. pelas duas dimensões, fica imediatamente evidente que nossa terminologia para
~ Poucas pessoas provavelmente contestariam a visão de que o regime suíço é regimes é quase inapelavelmente inadequada, pois se trata de uma terminologia
\ \ "altamente democrático". No entanto, a metade feminina da população suíça ainda invariavelmente fundada mais na classificação do que no posicionarnento relativo .
~
\! está excluída das eleiçêes nacionais. Por contraste, a União Soviética ainda não ~
.

possui quase nenhum sistema de contestação pública, apesar de possuir o sufrágio


Figura 1.1 Duns dimensões teóricas de democratização
universal. Na verdade, uma das mU~~l'!~Lmpression'!.nte~Q~Je séÇ]J19_te.m
sido o virtüãTdes~.!laRcimen.to.J:le..uma.J:otaLnegaçãQ.daJegitimiQi1g~,ç\ª.RaJJicjpa~ Plena

ção popular no governo. Somente um punhado de países não tem conseguido


!farãntirumã'-vot;çã~pelo menos ritualístíca de seus cidadãos, e de manter ao
" menos eleições nominais; mesmo os ditadores m~is repressivos geralmente se
~ dizem favoráveis, hoje em dia, ao legítimo direito do povo de participar no governo,

.i
Coutestaçâo
~•.•.. isto é, de participar na "administração", ainda que não na contestação públic;Q Pública

~ dispens;íyeldizer que. na falta do direito de exercer oposicão o direLto.Qe._ «


"participar" é desl2.ido de boa Earte do si !!~ifféado que telnnum -õãís onde ~xiste a
contestacãó pública. Um país cQl~ufui:;;~-n}~e.fSãÇe:cqm::Ü~l}fri9-fi}fa.Jm·fHite
represslvo'certamente pJop.orciouariamenosl.opoIlunidades a oposições.dogue um-
~ Nenhum(a) I )
Direito de participar em eleições Pleno
,,,o e cargos públicos

~
2. Neste livro, os lermos libcrnlização, cornpcução política, política competitiva.iconrcsração públ icn e \.
oposição pública são usados indifercruemcrue p"rn aludir a esta dimensão, e regimes com lima
3. Urna lista de 114 países ordenados segundo essas duas dimensões será encontrada no apêndice A,
classificação rclní ivnmente alta nessa dirnensáo são Ircqüenternchte referidos como regimes compeli-
Tab, A·l.
tivos.

29
28

~
~~,~:.,?~~:~:;;-#!??Jif"i.f~;-'-"-

••
DEMOCRATIZAÇ/io E OPOSiÇÃO PÚBLICA
••
••
POLlARQUIA

o,(

espaço encerrado por nossas duas dimensões poderia certamente ser subdividido A- d~mocracia poderia ser concebida como um regime localizado no canto
superior direito. Mas como ela pode env.olver mais dimensões do que as duas da
em qualquer número de células, cada uma delas recebendoum nome. Entretanto,
os propósitos deste livro tornam redundante uma tipologia elaborada. Em vez disso,
permitam-me fornecer um pequeno vocabulário - razoável, espero - que me
permitirá falar com suficiente precisão sobre os tipos de mudanças em regimes que
f\~\ '.figura 1.2, e como (no meu entender) nenhum grande sistema no mundo real é
plenamente democratizado, prefiro chamar os sistemas mundiais reais que estão
mais perto do canto superior direito de poliarquias. Qualquer mudança num regilP:e
que o desloque para cima e para a direita, ao longo do caminho III, por exemplo,
rK fi•
pretendo discutir. ~ fJ
. Chamarei um regime próximo do canto inferior esquerdo da figura 1.2 de pode-se dizer que representa algum grau de democratização. As poliarquias podeIDl
ser pensadas então como".I!<gimes relativamente (mas incompletamente) democra-, I fJ
••
hegemonia fechada. Se um regime hegemônico se desloca para cima, como no
caminho I, ele estará se deslocando para uma maior contestação pública. Sem,
tizados, ou, em outros termos, as poliarquias silo regjmes que forom substoncjnJ- ik
esticar demais c assunto, poderíamos dizer que uma mudança nessa direção mente popularizados e liberalizados. isto é, fortemente inclusivos e amplamente

•.,
envolve a liberalizaçâo do regime; alternativamente, poderíamos dizer que o abertos à contestação públic~"] ~
i-
,"Vocês vão observar que, apesar de ter nomeado regimes próximos dos 'qua'
regime se torna mais competitivo. Se um regime muda no sentido de proporcionar
uma maior participação, como no caminho II, poderíamos dizer que ele está cantos, o grande espaço no meio da figura não foi nomeado, nem está subdividido.
mudando para uma maior popularização, ou que está-se tornando inclusivo. Um A ausência de nomes reflete, parcialmente, a tendência histórica de classificar
regime poderia mudar ao longo de uma dimensão e não da outra. Se chamarmos regimes segundo tipos extremos; reflete também meu próprio desejo de evitar uma fJ
um regime próximo do canto superior esquerdo de oligarquia competitiva, então o terminologia redundante. A falta de nomenclatura não significa uma falta de fi
regimes; na verdade, um número preponderante de regimes nacionais, atualmente,
fJ
•,
Figura 1.2 Liberalização, inclusividade e democratização no mundo, possivelmente cairia na área média. Muitas mudanças significativas em'
regimes envolvem pois deslocamentos dentro de, para dentro ou para fora, dessa
importante área central, na medida em que esses' regimes se tornam mais (ou
Oligarquias Poliarquias

••.,
cornpctitivus menos) inclusivos e aumentam (ou reduzem) as oportunidades de contestação
,~~
;; U *ct/ll'J.l pública. Para me referir a regimes dentro dessa grande área interna, apelarei
( Iltl~fc eventualmente para os termos aproximadamente ou quase: um regime aproxima-
111

••
,~~~
,,-,#,,,,flJ,.-ov:~ -' tvf",ffY I, damente hegemônico oferece um pouco mais de oportunidades de contestação
: .-",,,,"--,,,"'.~

Libcralizaçâo pública do que um regime hegemônico; uma quase-poliarquia poderia ser bastante
[contestação
públicn)
inclusiva mas ofereceria restrições mais sérias à contestação pública do que uma
poliarquia plena, ou poderia proporcionar oportunidades de contestação pública
ti
••
comparáveis às de uma poliarquia plena e ser, rio entanto, um pouco menos
inclusiva' .
;mf)I.JJ" A necessidade de usar termos como esses subseqüentemente, neste livro,

Inclllsividnde (parucípação)
~~
atesta a utilidade da classificação;
"próximo" atesta a impropriedade
a arbitrariedade das fronteiras entre "pleno" e
de qualquer classificação. Enquanto tivermos
••
••
.•..
percurso I representa uma mudança de uma hegemonia fechada para uma oligar-
4." o problema tcrrninológico é formidável pois parece impossível encontrar termos já em LISO que não
quia competitiva, M~s uma hegernonia fechada poderia tO,rnar-se também mais tragam consigo lima grande carga de ambigüidade e de significado adicional, O leitor deve lembrar


inclusiva sem liberalizar, isto é, sem aumentar as oportunidades de contestação que os termos aqui utilizados são empregados ao longo de todo o livro, até onde me foi possível, apenns
f;i com os significados indicados nos partigrnfos precedentes. Alguns leitores certamente rcsisrirão no
pública, como no percurso lI. Neste caso, o regime muda de uma hegernonia :;'1 termo poliarquia como alternativa pi1Til a palavra democracia, mas é importante manter a distinção ernre
fechada para uma inclusiva"
;,~'.
'{~';I democracia corno um sistema ideal e os arranjos institucionais que devem ser considerados como lima
41
30 "\ ..
.11 (I
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::_~..:.~~,.:
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••••
.• '

POLIA RQ UIA
V\
i;\~

'1;'\;\ DEMOCRATIZAÇÃO E ot-osiçso PUBLICA

claro que os termos são meios úteis mas extremamente arbitrários de subdividir o
1
il\ l!tconveniente pensar a democratização como consistindo de diversas trans-
espaço na figura 1.2, os conceitos servirão a.nossos propósit~ !'j \ formações históricas amplas. Uma delas é a transformação de hegemonias e
lá \ oligarquias competitivas em quase-poliarquias. Este foi, essencialmente, o proces-
!
'I
so que se operou no mundo ocidental ao longo do século XIX. Uma segunda é a
A Questão Recolocada transformação de quase-poliarquias em poliarquias plenas. Foi o que ocorreu na

[!.. questão que abriu este capítulo pode agora ser recolocada da seguinte
I Europa nas quase três décadas que se estenderam do final do século passado até a
Primeira Guerra Mundial. Uma terceira é a democratização ainda maior de polia r-
maneira: quias plenas. Este processo histórico coincide, talvez, com o rápido desenvolvi-
r mento do Estado de bem-estar democrático que se seguiu à instauração da Grande
( 1. Que condições aumentam ou diminuem as chances de democratização de um
Depressão; interrompido pela Segunda Guerra Mundial, ci processo parece ter-se
I regime hegernônico ou aproximadamente hegemônico?
) Mais especificamente, que fatores aumentam ou diminuem as chances de renovado no final dos anos 60 na forma de rápido crescimento das reivindicações
\2. pela democratização de uma grande diversidade de instituiçôes sociais, especial-
contestação pública?

/3. Ainda mais especificamente, que fatores aumentam ou diminuem as chances de It' mente entre os jovens.]

•• l_
contestação pública num regime fortemente inclusivo, isto é, numa poliarquia?
@ste livro trata da primeira e da segunda dessas transformações, mas não da
terceiras. Quer prospere, quer fracasse, a terceira onda de democratização certa-
mente se mostrará tão importante quanto as outras. Na medida em que acontecerá
({8 apenas nos países mais "avançados" e ajudará a configurar o caráter da vida nos
Qualificações ·1

••
países "avançados" no século XXI, para muitas pessoas desses países, a terceira

rEste livro trata, pois, das condições sob as quais os sistemas de contestação f onda poderá perfeitamente parecer mais importante do que as outras. Entretanto,
a maior parte do mundo continua aquém da possibilidade dessa particular transfor-
( pública são passíveis de se desenvolver e existir. Como a contestação pública é um ~ \.
aspecto dll5!.e.n:\Ocratização, este livro trata necessariamente, em certa nledíct..a.~:~a I
(i mação. Dos i40 países nominalmente independentes existentes em 1969, cerca de
duas dúzias eram fortemente inclusivos e possuíam sistemas de contestação pública
t democratização, como observei no início deste capítulo. Mas é importante lembrar !
altamente desenvolvidos: eram poliarquias inclusivas, em suma. Uma outra dúzia
que o enfoque aqui adotado exclui alguns assuntos importantes que seriam consi-
ou menos, talvez, eram quase-poliarquias a um alcance razoável da poliarquia
'I:! derados numa análise da democratizaçã~
plena. É nessas três dúzias de países que a terceira onda deve ocorrer. A possibili-
dade de algumas nâo-poliarquias saltarem por cima das instituiçôes da poliarquia
r espécie de aproximação imperfeita de um ideal, e n experiência mostra, acredito, que, quando o mesmo e chegarem, de alguma forma, a uma democratização mais plena do que a hoje
- lermo é USíH.lO p41Ta ambos, intrometem-se, na análise, uma confusão desnecessária e discussões existente nas poliarquias, como os ideólogos às vezes prometem, parece remota à
semânticas essencialmente irrclcvantes. No extremo oposto, o lermo hcgcmonia não é inteiramente
luz da análise que se segue. Para a maioria dos países, então, o primeiro e o segundo

••
satisfatório; no entanto, considerando-se o significado que lhe atribuí, Q termo hegcmônico pflTcce-me
mais apropriado elo que hierárquico, rnonocrãrico, absolutista, autocrático, despótico, autoritário, estágios de democratização - e não o terceiro - serão os mais relevantes,]'
totalitário ete. O uso que faço do termo "contestação", em "contestação pública", está bem dentro do
0a verdade, o enfoque deste livro é mais restrito do que uma análise dos dois
uso normal (ainda que inusual) dn língua inglesa; em inglês, contestação significa contestar, O que
significa fazer de algo o objeto de disputa, discussão ou litígio, e seus sinônimos mais próximos são primeiros estágios da democratização. Aludi a "regimes" e "sistemas de contesta-
disputar, desafiar ou competir. A utilidade do termo foi-me sugerida inicialmente, porém, por "The
t
•,.
, ção pública". Mas até agora não especifiquei o nível de estrutura política em que
Mcans of Contcstation", Govcrnrnent and Oppositíon 1, jan. 1966, pp. 155-174, de Bertra nd de
Jouvenel. O uso que Jouvenel faz é semelhante ao meu e idêntico ao do termo francês que ele usou no r *- regimes e contestação pública podem ser efetivos. Permitam então que enfatize
original, significando dâbat, objectíon, conflit, opposition, No mesmo número desta revista, porém. imediatamente que a análise lida aqui com regimes nacionais, isto é, regimes
Ghita lonescu C"Canlrol and Contcstation in Some One-Party Staies", pp. 240-250) usa o lermo em seu

••
sentido mais estreito mas atualmente muito comum, como "o anti-sisternn, postulados básicos e
permanentes de qualquer oposição com base nas diferenças fundamentais} dicotôrn icas, de opinião e
de ideolog ias" (p. 241). Esta é uma definição certamente mais restrita do conceito do que fi que emprego 5. Tratei de alguns aspectos da terceira em After tln: Rcvohuion? Autboríty in a Good Socicty, Ncw Haveri,
aqui, e que Jouvenel emprega em seu ensaio, penso eu. Vale Univcrsity Press, 1970.

'.~ 32 33

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••
~...~

POL/MIQUIA
li DEMOC/lATIZ,\ÇÃO E OPOSIÇ/IO PUBLICA ~

-
• ur:i!
tomados ao nível do país, ou, se quiserem, de Estado legalmente independente, ou,
para usar termos menos apropriados, da nação ou Estado-nação. Parte da análise
seguramente poderia ser aplicada a níveis subordinados de organização social e
u.
'I"
I.

~it
traria problemas de dados tão catastróficos que tornariam a empreitada altamente
insatisfatória.Em princípio, as organizações subnacioriais certamente poderiam ser "
.r
política como municípios, províncias, sindicatos, empresas, igrejas e coisas assim; Figura 1.3 Uma ordenação hipotética de países segundo
parte dela, talvez, poderia até ser relevante para as estruturas políticas que estão
emergindo com níveis mais inclusivos - vários tipos de organizações internacio-
nais. Mas a argumentação
nacionaii]
é desenvolvida tratando especificamente de regimes
~i
i,
as oportunidades disponíveis de contestação

Baixo
o regime nacional

Alto
""
íNovamente, isto seria uma grave omissão num livro sobre democratização.
Alto
," "

l1l fi'
Mesmo da perspectiva da contestação pública, a omissão é importante. Iss~porque Organ ízaçõcs
\. uma observação casual sugere que os paísesdiferem

~ój?g~v~rp':~
na amplitude com que
i!.:pfclP9YcIo~:ãJ~ ô-po_;t~;i'cÍãd~s-pã;ã';'Z~~t~st~~~~e a participação ~os'p'rõc'éSsc)snã'o
nacional, mas também de várias organizações so.ci~is.e ~ov~riiã.?1eii- ..
subnacionais

Baixo IV 11 "
ltais subordinadas. Agora, no tocante ao grau em que as diferenças brutas nas I: Regimes integralmente "liberalizados" ou "competitivos".
••
.,••
~cteríst;~;~-g~-;ais de unidades subnacionais parecem estar associadas a diferen- 11.
Competitivo em nível nacional, hcgernônico no interior de
ças na natureza do regime nacional (se ele é ou não uma poliarquia, por exemplo), organizações subnacionais.
111.
tentarei levar isso em consideração na análise] Competitivo dentro de organizações subnacionais, hcgernõnico em

:::..;.- , (Entretanto, seria razoável insistir em que a análise deveria ir bem mais longe. ~~
'
nível nacional. fi'
-: .r IV. Estruturas políticas integralmente hcgemônicas .
Uma descrição integral das oportunidades disponíveis para participação e con-
testação no interior de um país certamente exige que se diga algo sobre as
localizudasno longo das duas dimensões ilustradas nas figuras l.1 e 1.2. Entretanto,
oportunidades disponíveis no interior de unidades subnacionais, A extraordinária
tentativa de consentir uma grande dose de autogestão em unidades subnacionais, k o problema não é simplesmente localizar países no espaço hipotético sugerido pela

na Iugoslávia, significa que as oportunidades para participação e contestação são


maiores naquele país, apesar do regime de partido único, do que, digamos, na
i
figura 1.3. Primeiro porque aquele espaço diz respeito apenas a uma das duas
dimensões principais: a contestação. Obviamente, um procedimento similar seria
necessário para a outra dimensão principal: a participação. Mais ainda, mesmo t
•••
r
Argentina ou no Brasil. Uma visão abrangente sobre o assunto exigiria então que
se atentasse para todas as possibilidades sugeridos na figura 1.3 •. C_OIP.. c.feito,
alguns críticos recentes da democratização incompleta em poliarquias argumcn-
tãiTlqueaiiiél:nj'ü-e-ãs'poI i;~ciuias 'p;~sa~l; ~~r~on~ pet: tiv'~; e~; ~í;;~i mícfcin al, 1
dentro de um país, as unidades subnacionuis
nidades que proporcionam para a contestação
freqüentemente diferem nas oportu-
e a participação. Em muitos países
modernos, por exemplo, essas oportunidades são muito maiores nos governos
•••
:~;
muitus'âas'ofgaiiizaçõessubríãcíonai's~p'iiitiéúl~rin-eiifc'-ãs'-ãss'gc;;ç-Ô;;;;;;;-vadas,
sãó-li·ege.Ij1..9iirc:l~9U oligárquicas'"]
municipais do que nos sindicatos, e maiores nos sindicatos do que nas empresas
prr~ã~i;~.
Conseqüentemente, seria preciso dividir as unidades subnacionais em •••
••••
algumas categorias: empresas, sindicatos, governos municipais, igrejas, institui-
[!'or importante que seja a tarefa de se abordar, além da descrição do regime
ções educacionais etc.? A esse estágio, tais requisitos estão, infelizmente, à beira
nacional, as unidades subnacionais, creio que a tentativa de examinar um número
da utopia, razão por que - mais pragmático do que teórico - decidi concentrar a
muito alentado de países exigiria a esta altura uma análise tão complexa e cncon-

••••
;.!
minha atenção no nível nacion~

••••
6. cr., particular, Grant McConne!l, Prívatc Power anel American Democracy, Ncw York, Knopf,
em 7. o jií clássico estudo de Scymour Martin Lipsci, Martin A. Trow c Jamcs S. Cotcrn.m, Uníon Dcmocracy,
1966; Henry S, Knricl, Thc Decline of /vm erícnn Píuratism, Smnford, Stanford Univcrsiiy Prcss, 1061; Glcncoc, The Free Prcss, 1956, concentra-se no caso desvinntc de um sindicato onde a conrcsinção c.
c, em certa medida, la rnbé rn Robcn Paul Wolff', Thc Povcrty af Liberalism, BOSIOO, Beacon Prcss, a participação s50 ;lIt;15. Descrever c explicar aquele caso desviarue no contexto de um único país foi
1968.
um empreendimento considerável.

34

1
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35
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POLlARQUIA

• Hipóteses

. (9uanda regimes hegernõnicos e oligarquias competitivas se deslocam na


de uma poliarquia, eles aumentam as oportunidades
direção de efetiva participação
f,'. AXIOMA

o axioma
3 .. Quanto
l...,!anto maior a possibilidade
DEMOCRATIZAÇÃO

mais os custos
de um regime
E OPOSiÇÃO PÚBLICA

da supressão excederem
competitivo.

3 pode ser ilustrada graficamente


os custos

como na figura 1.4.


da tolerância,

~~ e contestação e, portanto, a número. de indivíduos, grupos e interesses cujas


"'" Figura 1.4
I preferências devem ser levadas em consideração nas decisões palíticas]
~ - \Da perspectiva das governantes, uma tal transformação traz consigo novas "1
possibilidades de conflito, em decorrência de que seus objetivos (e eles próprias)
'@
podem ser substituídas par representantes das indivíduos, grupos ou interesses
I@ recérn-incorporadosj] :<E- Custos de tolerância

[2. problema de seus opositores é a imagem invertida da problema das


governantes. Qualquer transformação que dê mais oportunidades de as opositores
i~ do governo traduzirem seus objetivos em políticas aplicadas pela Estada traz Custos

~~ consigo a possibilidade de conflito com representantes dos indivíduos, grupos ou


interesses que eles substituem na governo']
~ LL\~sim, quanta maiar o canflita entre governo e apasição, mais provável é o
'E- Custos de repressão
esfarço de cada parte para negar uma efetiva oportunidade de participacãa à autra
---.{;>
nas decisões palíticas. Em autras palavras, quanta maiOí a canflita entre lUD 1-
4- ~gaverna e seus opanentes, mais difícil se faz a talerância de cada um para com 0- i
·1·
~. Coma a oposição jHeci§.~ ganhar o controle do.Estado. para.suprimir.os.
J Probabilidade de um regime competitivo = .-:lif;
1«') governantes (na momento em que oposição e governa trocaram de papéis), pode-.
A
mos formular a proposição geral como um axioma sobre a tolerância de governos-
e par.a cam seus oponentes:
i,
(Quanto mais baixos os custos da tolerância, maior a segurança da governo.
Quanto maiores as custas da supressão, maior a segurança d~o:..s::0~clui-se
'-e ,-
I AXIOMA 1. A probabilidade de um governo tO,lerar uma oposição aumenta com a
t-- daí que as condições que proporcionam um alto grau dr-Segurança mútua para o

~iminuiç50 dos custos esperados da tolerância. --.. r :


I governa e as oposições tenderiam a gerar e preservar opmtun.iàadés· mais amplas
I.
para as oposições contestarem a conduta do gaverna.l
/
[A questão. colocada lago. acima pode agora se;-;ecolocada:
L!?-ntretanto, um governo deve considerar também o quanto lhe custaria supri-
mir uma oposição; pais ainda que a tolerância cobre um preço., a supressão. poderia
custar muito mais e ser, obviamente, estúpidãJPortanto:
r Que circunstâncias aumentam significativamente a segurança mútua de governo e oposi-
-J ; ções e aumentam assim as possibilidades de contestação pública e de poliarquia?

••
""

; AXIOMA 2. A probabilidade de um governo tolerar uma oposição aumenta na medida


Antes de tentar responder a esta pergunta, porém, devo considerar uma
Lem que crescem os custos de sua eliminação.

•• [!..ssim, as possibilidades de um sistema político mais competitiva surgir ou


durar podem ser pensadas coma dependentes de dois conjuntos de custas:
';l,'
j
i
i
anterior: qual a importância da poliarquia?

~;o
~ ,
,
~ J

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