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Fundamentos de contabilidade

José L. Azzolin

Fundamentos de
contabilidade
José L. Azzolin

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6234-8

58355 9 788538 762348


Fundamentos de
contabilidade

José L. Azzolin

IESDE BRASIL S/A


2019
© 2019 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos
direitos autorais.
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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
A998f Azzolin, José L.
Fundamentos de contabilidade / José L. Azzolin. - 1. ed. - Curitiba
[PR] : IESDE Brasil, 2019.
156 p.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6234-8

1. Contabilidade. I. Título.
CDD: 657
18-54428
CDU: 657

Todos os direitos reservados.

IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
José L. Azzolin
Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Especialista em Administração Tributária e em Metodologia em Ensino Superior pela Escola de
Administração Fazendária (ESAF) e em Gestão da Aprendizagem e Formação Pedagógica do
Professor Universitário pela Universidade Positivo (UP). Bacharel em Ciências Econômicas pela
Fundação de Estudos Sociais do Paraná (FESP). Atuou como auditor fiscal da Secretaria da Fazenda
(PR) durante trinta e dois anos. Professor nas disciplinas de Contabilidade Geral, Análise e Gestão
de Custos, Contabilidade Empresarial, Gestão Financeira, Gestão Orçamentária e Controladoria.
É autor de livros nas áreas de contabilidade, planejamento e controle, análise de crédito e cobrança,
análise de demonstrações contábeis, rotinas contábeis e trabalhistas, e análise de custos.
Sumário

Apresentação 7

1 A contabilidade 9
1.1 A origem da contabilidade 10
1.2 Evolução da contabilidade 12
1.3 A contabilidade no cenário atual 17

2 O patrimônio 25
2.1 O que é patrimônio? 25
2.2 Bens econômicos 26
2.3 Direitos: o que é seu, mas encontra-se em poder de terceiros 30
2.4 Obrigações: elas financiam os investimentos 32

3 Estudo das contas 39


3.1 Contas patrimoniais e contas de resultado 39
3.2 O método das partidas dobradas 43
3.3 Plano de contas: necessário para o planejamento e para a gestão 49

4 Balanço Patrimonial 55
4.1 O Balanço Patrimonial 55
4.2 Ativo: conjunto de bens e direitos 56
4.3 Passivo: obrigações da empresa com terceiros 68
4.4 Patrimônio Líquido: capital investido pelos sócios e retenção de lucros 74

5 Demonstrações financeiras 83
5.1 Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) 83
5.2 Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL) 93
5.3 Demonstração do Fluxo de Caixa (DFC) 98
6 Fundamentos de custos 107
6.1 Custeio por absorção e custeio variável 107
6.2 Análise do custo/volume/lucro 115
6.3 Margem de contribuição unitária e determinação do ponto de equilíbrio 119

7 Análise das demonstrações financeiras 127


7.1 Análises horizontal, vertical e de valores absolutos 127
7.2 Indicadores financeiros: solvência e estrutura patrimonial 133
7.3 Indicadores de rotatividade dos estoques, dos valores a receber e dos valores a
pagar 138
7.4 Indicadores econômicos: rentabilidade e retorno 143

Gabarito 153
Apresentação

A contabilidade é a linguagem dos negócios. Por isso, destina-se não apenas aos contado-
res, mas também aos empresários, administradores, gestores e todos os indivíduos que precisam
conhecer adequadamente as técnicas contábeis para tomar decisões em uma organização. Assim,
esta obra destina-se aos profissionais que desejam ou precisam, em decorrência de suas escolhas
profissionais, compreender a contabilidade.

Há tempos, a contabilidade passou a ser estudada por diversos profissionais, desmistificando


a ideia equivocada de que ela é extremamente difícil ou “coisa de contador”. Atualmente, a
contabilidade não tem como única finalidade o atendimento às formalidades legais e do fisco, hoje
ela está voltada para o mundo. Em 2007, o Brasil aderiu aos padrões internacionais de contabilidade
e auditoria, por isso a contabilidade deve se revestir das características quantitativas e qualitativas
da informação contábil-financeira, adquirindo um caráter universal.

Nesta obra veremos que a riqueza – tanto da pessoa física quanto da pessoa jurídica –
é demonstrada pelo conjunto de seus bens, direitos e obrigações, itens que representam seu
patrimônio. Ainda, veremos que para elaborar e entender um plano de negócios, é necessário
conhecer a essência da equação contábil e os pressupostos do processo de contabilidade de um
plano de contas.

Além desses aspectos, conheceremos o Balanço Patrimonial (BP) – constituído por Ativos,
Passivos e pelo Patrimônio Líquido – e aprenderemos a elaborar e interpretar as demais demons-
trações financeiras: Demonstração do Resultado do Exercício (DRE), Demonstração das Mutações
do Patrimônio Líquido (DMPL) e Demonstração do Fluxo de Caixa (DFC).

Compreenderemos que é impossível gerir uma empresa sem a compreensão básica dos
custos e que a avaliação eficaz de uma entidade depende principalmente da possibilidade de
compará-la a outras.

A análise das demonstrações financeiras, por sua vez (assunto que também estudaremos
nesta obra), tem o objetivo de dotar o administrador e o empreendedor de informações qualitativas
e quantitativas capazes de levá-los a tomar decisões e monitorar o desempenho de suas empresas.

Dada a riqueza deste livro, você tem em mãos uma obra essencial para a compreensão
dos aspectos básicos da contabilidade, indo além das noções preliminares e dominando aspectos
contábeis e financeiros que garantem a gestão eficiente de um negócio.
1
A contabilidade

A contabilidade teve origem em tempos remotos e evoluiu quase que simultaneamente ao


crescimento das atividades rurais, mercantis e industriais. Entretanto, a área começou a consolidar-
-se apenas no século XV, com a publicação da obra Summa de arithmetica, geometria, proportioni
et proportionalita (1494), do Frei Luca Pacioli, a qual trazia uma seção inteira sobre os registros
contábeis segundo o método das partidas dobradas.
Após Pacioli, outros autores publicaram novos trabalhos, e os métodos preconizados por
eles se desenvolviam e cresciam à medida que o comércio, as sociedades e o crédito evoluíam.
O crescimento dos créditos, inclusive, foi um dos principais motivos para o início do controle sobre
volumes e valores, que se deu por meio de documentos que garantiam os direitos provenientes de
transações a prazo, pois até então, as vendas e/ou trocas eram realizadas à vista.
No Brasil, a importância da contabilidade só foi evidenciada a partir da década de 1970, com
a divulgação da Circular n. 179/1972 (BC, 1972). De acordo com Iudícibus, Marion e Faria (2018), a
Circular em questão adotou a filosofia contábil norte-americana, a qual pressupunha o uso da
contabilidade para a tomada de decisões, dando ênfase à contabilidade aplicada.
Ainda de acordo com Iudícibus, Marion e Faria (2018, p. 15), na contabilidade america-
na, “ao contrário dos europeus, não havia uma preocupação com a teoria das contas, ou querer
provar que a Contabilidade é uma ciência”. A ascensão da escola americana decorreu também da
importância dada à auditoria e dos expressivos valores concedidos a pesquisas desenvolvidas pelas
universidades americanas nas áreas de contabilidade, finanças e auditoria. Na sequência, a mesma
filosofia veio a ser reafirmada pela Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), que ficou conhecida como a
“Lei das Sociedades por Ações”.
De acordo com Iudícibus et al. (2018), as Leis n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007) e n. 11.941/2009
(BRASIL, 2009) contribuíram posteriormente para a elevação de todos os profissionais da contabi-
lidade a um patamar ímpar de qualidade, uma vez que com a globalização dos negócios, a prática
contábil tornou-se mais importante e regulamentada, não podendo ser praticada conforme os
desejos de cada um.
Todo esse percurso histórico capaz de trazer a contabilidade à realidade atual é o que estu-
damos neste capítulo.
10 Fundamentos de contabilidade

1.1 A origem da contabilidade


Vídeo
De acordo com Eddington, citado por Sá (2002, p. 21), “para que a exposição
de um sistema de pensamento seja clara, é preciso que se comece pelas origens”,
portanto, é importante que estudemos a procedência dos pensamentos, a fim de
compreendermos as concepções atuais.
Comecemos, então, pela escrita. Estudiosos como Hendriksen e Van Breda
(2009) afirmam que a escrita está atrelada ao incremento de atividades comerciais baseadas no
desenvolvimento da agricultura e nas trocas de mercadorias, considerando a necessidade de con-
trolar trocas de itens, pagamentos de tributos e afins.
De acordo com Sá (2006), antes mesmo da invenção dos ideogramas, já se adotava a escrita
contábil. Para o autor, “foram os contadores que se transformaram em escribas e não os escribas
em contadores” (SÁ, 2006, p. 17).
inventário: levanta- Tanto para controle de bens quanto para trocas é necessária a utilização de um inventário.
mento minucioso de
todos os bens. Já que não havia moeda, um cálculo de equivalência dos diversos bens era necessário, mas só foi
possível quando do surgimento da contabilidade, mesmo em sua forma rudimentar.
Como demonstra Iudícibus, Marion e Faria (2018), até os anos 4.000 a.C. não existia escrita,
tampouco existiam os números do modo como conhecemos hoje. Dessa maneira, um pastor, cujo
bem era representado pelo rebanho, executava a contabilidade de uma forma bem elementar, ado-
seixo: pedra ou cas- tando uma contagem com base na quantidade de seixos. Ao conduzir seu rebanho para abrigar-se
calho de pequenas
dimensões.
em uma caverna, o pastor deveria, portanto, separar um seixo para cada cabeça de gado que lá
entrava, de modo que cada um representasse um animal de seu rebanho. Na condução do rebanho
para fora da caverna, era possível constatar se o número de cabeças de gado era maior ou menor
que a quantidade de seixos separados no momento da entrada.
Iudícibus, Marion e Faria (2018) exemplificam esse fato: quando do início do inverno, um
pastor internou seu rebanho, e para controle, separou um seixo para cada cabeça do rebanho que
entrava na caverna. Ao final do inverno, ele retirou o rebanho da caverna e, para cada cabeça
que saía, separava um seixo. Ao comparar os dois conjuntos de seixos (o da entrada com o da
saída), constatou que o conjunto da saída era superior ao conjunto das entradas e concluiu alegre-
mente que o rebanho havia crescido.
Essa diferença constatada por meio dos seixos representaria, portanto, o nascimento ou morte
de um animal. Nesse exemplo, verificamos além da contagem a mensuração da riqueza do pastor.
Isso significa que em decorrência desse procedimento, houve o uso efetivo de um processo contábil.
Rudimentarmente, o pastor realizou um inventário, como pode ser demonstrado na Figura 1.
Figura 1 – Exemplo de inventário rudimentar de um rebanho

1º inventário 2º inventário Acréscimo de cabeças de gado


••••• ■■■■■■■ •••••■■
••••• ■■■■■■■ •••••■■
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Fonte: Adaptado de Iudícibus, Marion e Faria, 2018, p. 5.


A contabilidade 11

Você pode perceber que a contagem e a análise são tão antigas quanto o próprio ser humano.
Relatos bíblicos, inclusive, já traziam informações sobre a contagem. O Livro de Jó, por exemplo,
descreve a riqueza deste personagem: “possuía sete mil ovelhas, três mil camelos, quinhentas juntas
de bois, quinhentas jumentas e uma grande quantidade de escravos” (BÍBLIA, Jó, 2018, 1: 3).
Embora estejamos tratando do pastoreio, muitos cidadãos exerciam outras atividades, como
a caça, a pesca, a agricultura e a prestação de serviços. Quem possuía um rebanho, certamente ne-
cessitava de grãos que pertenciam ao agricultor, e este, por sua vez, necessitava tanto da carne para
se alimentar quanto das peles dos animais para se vestir. Pela inexistência da moeda, era necessário
atribuir valores aos bens para se realizar a troca de um por outro.
Uma questão que se levanta é: como atribuir valores? Smith (2017), ao discorrer sobre o
assunto, busca determinar o valor pela quantidade de trabalho necessária para conquistar o bem.
Por exemplo, imagine que um caçador, para abater um veado, tenha despendido o dobro de tempo
que outro caçador despendeu para abater um castor. Seguindo esse raciocínio, um veado deve
custar o equivalente a dois castores.
Além disso, o valor dos bens estava sujeito à lei natural da oferta e da demanda. Não existia,
por exemplo, processo de conservação da carne, por isso, havia a necessidade de trocá-la mais
rapidamente que os grãos. Se houvesse pouca demanda por carne e nem sua troca, ela se deterioraria
em dias. Esse fato ensejava que o valor da carne dependesse também do mercado, e não apenas do
tempo de trabalho aplicado em sua obtenção.
Os diversos polos começaram a preocupar-se com o controle da produção e dos estoques
e com seus potenciais rendimentos. Assim, havia a necessidade da criação de um sistema que
pudesse representar a produção e o consumo, sem o qual seria impossível realizar um registro,
ainda que incipiente. Veja na Figura 2 registros da antiga Mesopotâmia, em que a escrita, criada
pelos sumérios por volta de 4.000 a.C., era efetuada em placas de barro.
Figura 2 – Texto de escrita cuneiforme em sumério
Jastrow/Wikimedia Commons

Fonte: Contrat archaïque sumérien concernant la vente d’un champ et d’une maison1. 2.600 a.C. 8,5 x 8,5 x 2 cm. Museu do Louvre, Paris.

Todos esses relatos confirmam a asserção de Marion (1988, p. 23), de que “a contabilidade é
tão antiga quanto a origem do homem”.

1 Contrato sumério de Shuruppak diz respeito ao contrato desenvolvido por uma antiga civilização da Suméria – atual-
mente localizada no Iraque –, que registra a venda de um campo e de uma casa (cerca de 2.600 a.C.).
12 Fundamentos de contabilidade

1.2 Evolução da contabilidade


Vídeo
Dando um salto na História, encontramos Aristóteles, que em aproximada-
mente 300 a.C. escreveu sobre premissas falsas e falácias. À época, constatava-se a
predominância dos sofistas, produzindo discursos falaciosos, com argumentações
descritivas de uma suposta verdade que tinha como objetivo real a indução do ou-
vinte ao erro, ao ludíbrio e ao engano.
Aristóteles defendeu a ideia de que a falácia é um pensamento ilógico, já o argumento é um
raciocínio lógico que depende da correta relação entre as premissas e suas conclusões.
Uma premissa é uma ideia ou fato inicial do qual se parte para formar um raciocínio ou um estu-
do. Para Aristóteles (2015, p. 21), “ao contrário da retórica dos sofistas, a verdadeira arte retórica funda-
-se em provas, entendendo-se por prova uma espécie de demonstração a partir de um raciocínio lógico”.
Hoog (2014, p. 2), por sua vez, afirma que “um argumento contábil pode ser chamado de
premissa, e as conclusões destes argumentos são deduzidas a partir das investigações das premis-
sas”. Logo, se a premissa for falsa, a conclusão também será falsa. Se a premissa for verdadeira,
a conclusão será verdadeira.
Constata-se, com base em Aristóteles, que existe uma filosofia contabilística que ensina aos
usuários da contabilidade a pensar e refletir sobre as situações reais, a partir de uma base real,
já que a contabilidade se assenta em postulados e princípios que determinam que apenas os fatos
contábeis sustentados por materialidade e objetividade – ou seja, apenas os argumentos contábeis
entendidos como premissas verdadeiras – sejam aceitos para registro contábil.
De Aristóteles, vamos para o século VII. Os árabes, influenciados pelos indianos, produzi-
ram uma lógica e um sistema numérico, inclusive com o conceito de zero, que é hoje denominado
de arábico. Esse sistema numérico é fundamental para a evolução da contabilidade, já que esta é
uma linguagem matemática.
Sem a matemática, a contabilidade não teria evoluído. Os europeus utilizavam, até então,
somente o sistema romano. Imagine que você precise realizar uma soma utilizando-se apenas dos
algarismos romanos. Vamos tentar?

DCCXXIV + DCCXXIV = ?

Você conseguiu? Agora divida o resultado por três. Consegue? Como seria difícil realizar
operações matemáticas básicas fazendo uso do sistema romano!
Constata-se, em decorrência de tamanha dificuldade, que os algarismos romanos foram de-
senvolvidos para demonstrar quantidades e não para o desenvolvimento de cálculos.
Vamos, agora, para a Idade Média. Em meados do século XI, na Europa Ocidental, o pontapé
inicial para o desenvolvimento da ciência matemática – e o consequente desenvolvimento da contabili-
dade – foi realizado por Leonardo Fibonacci, conhecido também como Leonardo de Pisa.
A contabilidade 13

O matemático publicou, em 1202, o Liber abaci2, que continha capítulos sobre adição, subtra-
ção, preços de produtos, sociedades, entre outros. As fontes de apoio utilizadas por Leonardo Pisa
para escrever seu livro provinham do mundo islâmico, por ele visitado durante suas muitas viagens.
Segundo Cuomo (2002), nessa obra, o autor aprofundou-se encadeando todo o material
recolhido que, além de conter as regras para o cálculo dos numerais indo-arábicos, é um verdadeiro
baú do tesouro não só para cientistas e estudiosos da matemática, mas também para os historiadores
da sociedade e economia medievais, já que trata de numerosos problemas de natureza prática,
principalmente ligados ao cálculo dos lucros, conversões e mensuração de moedas.
Os algarismos arábicos, também chamados de indo-arábicos, são um sistema de numeração
que consiste nos símbolos: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 0. Há autores que atribuem a origem dos símbolos
à relação destes com a quantidade de ângulos que possuíam em sua forma original. Você pode
observar essa curiosa relação na Figura 3. Figura 3 – Uma versão da evolução dos
números arábicos
De acordo com Hendriksen e Van Breda (2009,
p. 39), “não sabemos quem inventou a contabilidade.
Sabemos, porém, que sistemas de escrituração por
partidas dobradas começaram a surgir gradativamen-
te nos séculos XIII e XIV em diversos centros de co-
mércio da Itália”.
Pode-se afirmar que até a edição da obra de
Leonardo de Pisa, a contabilidade era embasada apenas
em conhecimentos adquiridos no cotidiano, não fun-
damentados na ciência, fato que só se tornou possível
com a evolução da matemática, relacionando de vez as
duas áreas. Sem ângulos

A sistematização, ou seja, a padronização por Fonte: Adaptada de Lemos apud Darela, Cardoso e
Rosa, 2011, p. 69.
meio de normas, só foi possível graças ao Liber abaci
(no qual houve a utilização dos algarismos arábicos) e progrediu em 1494, quando a contabilidade
começou a tomar corpo com a obra de Luca Pacioli (Figura 4).
A obra Summa de arithmetica, geometria, proportioni et proportionalita, como o próprio título
sugere, é um tratado matemático, mas além disso, ela contempla os registros contábeis segundo o
método das partidas dobradas3, metodologia aceita e utilizada até hoje pela contabilidade (e que
será estudado adiante).
Denominado Tratado Particular de Conta e Escrituração, o método desenvolvido por Luca
Pacioli, de acordo com Marion (2009, p. 160) é “universalmente aceito, dá início a uma nova fase
para a Contabilidade como disciplina adulta, além de desabrochar a escola contábil italiana, que
iria dominar o cenário contábil até o início do século XX”.

2 Trata-se do Livro do Ábaco ou Livro do Cálculo.


3 A característica deste método universalmente aceito, é que o registro é realizado de maneira dígrafa, isto é, qualquer
operação implica em um lançamento em, no mínimo, duas contas; um valor lançado em uma conta enseja que o mesmo
valor seja lançado em outra ou outras contas.
14 Fundamentos de contabilidade

Figura 4 – Retrato de Luca Pacioli com um estudante

Mattes/ Wikimedia Commons


Fonte: BARBARI, Jacopo de. Portrait of Luca Pacioli (1445-1517) with a student (Guidobaldo da Montefeltro?). 1495. Óleo sobre tela: color.;
98 x 108 cm. Museu de Capodimonte, Nápoles.

De acordo com estudiosos da área, ao longo dos anos foram criadas várias escolas,
compreendidas como correntes doutrinárias da contabilidade, sempre atendendo às mudanças
exigidas pela sociedade, limitadas a determinado período histórico. É possível dividir essas escolas
de acordo com os períodos, os personagens principais, os ideais e doutrinas defendidas, e a
aceitação dessas correntes pela sociedade. É o que vemos no Quadro 1.
Quadro 1 – Períodos da contabilidade

Período Nome do período Duração Personagem e obra principal

História Antiga ou da Leonardo Fibonacci, com


1º 6.000 a.C. até 1202 d. C.
contabilidade empírica Liber Abacci.

História Média ou da
Frei Luca Pacioli, com o método das
2º sistematização da conta- De 1202 até 1494
partidas dobradas.
bilidade

Francesco Villa, com La contabilitá


História Moderna ou da
3º De 1494 até 1840 Applicatta alle Administrazioni
literatura da contabilidade
Privada e Pubbliche.

Fábio Besta, seguidor de Francesco


História Contemporânea
Villa, definiu o patrimônio como ob-
4º ou científica da contabi- De 1840 até a atualidade
jeto da contabilidade em sua obra
lidade
La Ragioneria.
Fonte: Elaborado pelo autor.

Já conhecemos os dois primeiros períodos de evolução da contabilidade demonstrados no


Quadro 1, com as contribuições matemáticas de Leonardo Fibonacci e com o método das partidas
dobradas do Frei Luca Pacioli. Vejamos, agora, o terceiro e quarto períodos dessa evolução.
A contabilidade 15

O terceiro período teve início com a obra de Francesco Villa, La Contabilita Applicata alle
Ammistrazioni Private e Publiche (1840), complementada no quarto período por Fábio Besta, que
produziu diversas obras, tendo La Ragioneria (1880) como a principal, cujos princípios permane-
cem até os dias de hoje.
No terceiro período ocorreu a disseminação da escola italiana por toda a Europa, liderada
por doutrinadores italianos como Leonardo de Pisa, Luca Pacioli, Benedetto Cotrugli, Francesco
Villa, Fábio Besta, Gino Zappa e Vicenzo Masi. Entretanto, essa escola se fundamentava em
excessiva teoria e não permitia a flexibilidade necessária para o surgimento, por exemplo, de uma
contabilidade gerencial4, já que os autores europeus entendiam que a contabilidade era uma ciência.
Assim, ela se voltava apenas ao público acadêmico, não sendo compreendida como uma disciplina
que pudesse ser discutida nas empresas.
De acordo com Iudícibus, Marion e Faria (2018, p. 17), nesse período os estudos da contabi-
lidade avançaram, “porém, os trabalhos [eram] repetitivos e excessivamente teóricos, apenas pelo
gosto de serem teóricos”.
A Revolução Industrial, a intensificação do comércio internacional e as guerras – ocasiões
que acarretaram inúmeras falências – tornaram necessários os levantamentos de perdas e lucros.
Além disso, o crescimento dos negócios no século XX foi um dos fatores que contribuíram para o
aperfeiçoamento da contabilidade.
Com o término da Primeira Guerra Mundial em 1919, aflorou uma demanda de bens de con-
sumo e de uso que alimentou uma explosão de investimentos, principalmente voltados para rádios,
telefones e automóveis. De acordo com Hendriksen e Van Breda (1999, p. 57), “somente a produção de
automóveis elevou-se de 485.000, em 1913, para 1.934.000 em 1919 e 5.622.000 em 1929”.
Em 1929, porém, ocorreu uma crise no mercado norte-americano que foi chamada de
Grande Depressão, cujas causas e efeitos permanecem em discussão até a atualidade. Os contado-
res não passaram incólumes às críticas levantadas nas discussões. Pesquisadores atribuíram como incólumes: ilesos,
intactos.
causa da crise a concentração do poder e da riqueza nas mãos de poucas pessoas.
Autores das áreas de direito e de economia, como Adolph Berle e Gardiner Means, escreve-
ram sobre a temática e afirmaram que “enquanto padrões de contabilidade não se tornarem mais
rígidos, e não houver lei que imponha cânones específicos, os diretores de empresas e seus contado-
res serão capazes, dentro de certos limites, de apresentar as cifras que quiserem” (HENDRIKSEN;
VAN BREDA, 2009, p. 58).
A contabilidade, à época, não impunha padrões de controle no intuito de evitar fraudes.
Por isso, por meio do New Deal, plano que vigorou entre 1933 e 1937, implementado pelo então New Deal: novo
acordo.
presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, o governo criou leis que permitiram controlar
o sistema financeiro, de modo a reduzir a possibilidade de fraudes.

4 Em vez de ater-se exclusivamente à teoria, a contabilidade gerencial adota um conjunto de técnicas contábeis, como
a controladoria, a gestão de custos e a análise das demonstrações financeiras, que fornecem informações para o proces-
so de tomada de decisões.
16 Fundamentos de contabilidade

Embora um pouco injustas, essas críticas à contabilidade ensejaram respostas que vieram
por meio da adoção de inúmeros procedimentos de suas associações: o American Institute of
Accountants (AIA) e o American Association of Accountants (AAA).
De acordo com Hendriksen e Van Breda (2009), a AIA, por exemplo, criou uma comissão
com o objetivo de cooperar com a Bolsa de Valores de Nova Iorque e, como resultado dessa coope-
ração, editou uma norma exigindo que todas as empresas se inscrevessem na Bolsa e fornecessem
a esta última suas demonstrações financeiras auditadas.
Os líderes empresariais, porém, não reagiram suficientemente para tentar solucionar os
problemas, pois cada um deles ou cada grupo de pessoas atribuía a outra ou a outros a respon-
sabilidade pela Grande Depressão. Segundo Hendriksen e Van Breda (2009), o então candidato
a presidente Franklin Roosevelt, em um comício realizado em 1928, culpou os empresários pela
depressão, mesmo sabendo que o poder público também tinha sua responsabilidade.
Com a posse do presidente Roosevelt, iniciaram-se os famosos 100 primeiros dias5, em que
foram editadas inúmeras leis, destacando-se a Lei de Emergência Bancária e a Lei da Veracidade na
Emissão de Títulos6, ambas com o objetivo de evitar ou diminuir fraudes.
Assim, entra em ação no ano de 1936 o Comitê de Procedimentos Contábeis (Committee
on Accounting Procedure – CAP), ao qual foi atribuída autoridade para fazer pronunciamentos a
respeito de princípios e procedimentos contábeis.
Surge, então, no início do século XX, a escola norte-americana, conhecida como pragmática,
que apresentou muitas características especiais e importantes para a contabilidade, sobretudo
porque se ateve ao aspecto prático das questões econômico-administrativas e se preocupou pouco
com as construções teóricas gerais, praticando mais a arte do que a ciência. Importante frisar que
por arte, entende-se a capacidade de gerar informações por meio das demonstrações, e assim,
garantir a possibilidade de auditar o passado, controlar o presente e planejar o futuro.
As grandes corporações que foram criadas naquele século exigiam que a contabilidade
ampliasse seus horizontes para além dos ideais da escola europeia, que se restringia apenas
ao campo acadêmico e concebia a contabilidade como ciência pura, estudando seus aspectos
lógicos e sistemáticos.
Essas corporações exigiam uma contabilidade prática, que resolvesse as questões ligadas ao
custo, à controladoria, à gestão financeira e, principalmente, à possibilidade de prever o futuro por
meio da aplicação de práticas orçamentárias. No Brasil, seguem esse pensamento os professores
José Carlos Marion, Milton Augusto Walter, Sérgio de Iudícibus, Eliseu Martins, Alexandre Assaf
Neto, Stephen Kanitz, entre outros grandes nomes da área.

5 Roosevelt conseguiu construir todo o programa de recuperação e reforma econômica-social, a New Deal, em dias,
com a participação dos grandes sindicatos, das autoridades municipais, industriais, dos fazendeiros e de todas as
lideranças americanas.
6 Essas leis de 1933 exigiam que os títulos emitidos fossem registrados quando oferecidos à venda ao público,
coibindo, assim, a emissão de títulos enganosos.
A contabilidade 17

Marion (1988) esquematiza os modelos que vigoram no Brasil desde a década de 1940 até a
atualidade, como é possível observar pela análise da Figura 5:
Figura 5 – Modelos de contabilidade adotados no Brasil nos últimos anos
Modelo europeu Modelo americano Contabilidade para o mundo
Decreto-Lei n. 2.627/1940 Lei n. 6.404/1976 Leis n.11.638/2007 e n.11.941/2009
• Visava os donos das empresas. • Adequa-se aos acionistas. • Propõe a contabilidade
• Não considerava os acionistas. • Brasileiros, padrão nacional. para o mundo.

Fonte: Adaptado de Marion, 1988, p. 44.

O Decreto-Lei n. 2.627/1940 (BRASIL, 1940) normatizou as características e a natureza das


sociedades anônimas que começavam a florescer no país, voltando-se exclusivamente aos aspectos
jurídicos das empresas.
A Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976) organiza as sociedades e impõe a distribuição de
poderes, criando o Conselho de Administração e determinando que as decisões sejam tomadas
ou corroboradas pelas Assembleias Gerais dos Acionistas, voltando-se, portanto, aos acionistas
das companhias.
As Leis n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007) e 11.941/2009 (BRASIL, 2009) introduziram e deram
ênfase às normas contábeis expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pelos demais
órgãos reguladores, obrigando os responsáveis pelas normas contábeis a falarem a mesma língua,
assunto que estudamos na próxima seção.

1.3 A contabilidade no cenário atual


Vídeo
A contabilidade de hoje deve ser vista como um sistema de informação cujo
método de trabalho consiste em coletar, processar e transmitir dados sobre a situa-
ção econômico-financeira de uma entidade em determinado momento, avaliar a
evolução do patrimônio em determinado período e, com base nos dados, fornecer
meios para a tomada de decisões.
De acordo com o American Institute of Accountants (AIA)7, a contabilidade tem por finalidade
“a classificação, registro, resumo e exposição das transações de entidades em termos de custos,
transferências e rendimentos, incluindo a conversão de custos em dinheiro e outros valores, e o seu
dispêndio como gasto ou prejuízo” (PARMA, 1991, p. 24).
Você pode observar que começamos a adotar um caráter simplista no trato das questões
contábeis, como descreveu o professor José Carlos Boucinhas no prefácio do livro Contabilidade
Introdutória, coordenado pelo professor Sérgio de Iudícibus:
A velha tendência da escola europeia, de uma prolixidade teórica monótona e
cansativa, cedeu vez a uma atitude mais pragmática, representada pela escola
norte-americana, mais preocupada em apresentar essa disciplina como poderoso
instrumento de administração. Simultaneamente, sem pôr em risco a genial

7 O AIA é uma organização profissional que define a contabilidade como profissão que deve ser exercida com padrões
profissionais éticos e alinhados com o interesse público. Conheça mais em: https://www.aiaworldwide.com/. Acesso em:
18 dez. 2018.
18 Fundamentos de contabilidade

concepção do método das partidas dobradas, que permitiu construir uma imagem
perfeita de equilíbrio entre os valores que integram o patrimônio de qualquer
ente, são feitas pesquisas com o uso de sofisticados métodos matemáticos,
procurando explicação e justificação racional das ações que sucedem no âmbito
das empresas e outras entidades. (BOUCINHAS, 1998, p. 22)

Em 1971, o Brasil começou a viver um grande crescimento econômico que refletiu no


mercado de ações, principalmente com a participação de pequenos investidores. Havia, portanto,
a necessidade de regulamentar a estrutura das demonstrações financeiras, principalmente a do
Balanço Patrimonial e a da Demonstração do Resultado do Exercício. Além disso, houve também
a necessidade de regulamentar os órgãos de auditoria, no intuito de avaliar as condições de risco
das empresas.
Em 1972 foi editada pelo Banco Central do Brasil a Circular n. 179/1972 (BC, 1972),
introduzindo normas pertinentes às sociedades por ações referentes ao controle, à auditoria e à
estruturação das demonstrações contábeis.
Em 1976 foi editada a Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), que estabeleceu regras para o fun-
cionamento das sociedades anônimas e regulamentou a relação entre os acionistas e a estruturação
e divulgação dos resultados, com o objetivo de essas ações transparentes e objetivas.
Desde 2005, quando as entidades ligadas às normas de contabilidade resolveram que o Brasil
deveria se submeter às normas internacionais de contabilidade, muito se discutiu a esse respeito
e, a partir dessas discussões, editou-se a Lei n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007). Desde então, a conta-
bilidade brasileira está utilizando os padrões internacionais definidos pelo International Financial
Reporting Standards (IFRS) e emitidos pelo International Accounting Standards Board (IASB).
O IASB é uma entidade que executa um papel de fundamental importância nas áreas contábil
e financeira. Ele é o órgão internacional responsável por emitir normas de acolhimento obrigatório
pelas entidades correlatas existentes em todos os países. Essas normas são denominadas IFRS.
No Brasil, a entidade que reproduz e exige das empresas e profissionais ligados à contabili-
dade a convergência às normas internacionais é o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC).
De acordo com Iudícibus et al. (2018, p. 14), “um importante passo, no Brasil, foi dado pela
criação do CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis”. Para o autor, o país está caminhando
para uma única norma mundial, o que só se realiza pela convergência às normas internacionais de
contabilidade, emitidas pelo IASB.
Vivemos em um mundo globalizado e as empresas hoje são globais. Em decorrência dessa
realidade, é necessário que os postulados, as estruturas patrimoniais e as de resultado sejam capa-
zes de serem avaliadas e interpretadas em todo o mundo.
Diferentemente da abordagem dos princípios de contabilidade vigentes até 2011, em que
diversas entidades expediam normas e definiam postulados e princípios de maneira totalmente dife-
rente, toda a normatização contábil no Brasil passou a ser firmada pelo Comitê de Pronunciamentos
Contábeis (CPC) a partir daquele ano.
A contabilidade 19

A primeira norma surge com a publicação do CPC 00 (CPC, 2011), que aborda a estrutu-
ra conceitual atual e interpreta as características qualitativas da informação contábil-financeira,
ou seja, os atributos que tornam as demonstrações contábeis úteis aos seus usuários. O pronun-
ciamento em questão também comenta acerca das características qualitativas da informação
contábil-financeira útil e prescreve que ela precisa ser relevante e representar com fidedignidade o
que se propõe representar, além de dever apresentar materialidade, como é demonstrado na Figura 6.
Figura 6 – Características da informação contábil

Relevância

Características qualitativas fundamentais Materialidade

Revelação fidedigna

Fonte: Elaborada pelo autor com base em CPC, 2011.

Vejamos, então, o que significam essas características:


• relevância: para ser relevante, uma informação deve ser capaz de avaliar decisões
econômicas passadas de modo que a experiência possa influenciar as decisões presentes
(caráter confirmatório) e futuras (caráter preditivo) dos usuários, ou seja, ser capaz de
fazer a diferença nas tomadas de decisões;
• materialidade: a informação deve propiciar a confirmação ou a necessidade de mudança
de decisões;
• representação fidedigna: só é fidedigna a informação que representar a verdade, a
autenticidade e a precisão do fenômeno que está sendo representado. A representação
fidedigna indica que a informação é neutra e livre de erros, isto é, ela não apresenta
sem dados confiáveis informações favoráveis ou desfavoráveis. Finalmente, a infor-
mação é completa.
Por outro lado, o pronunciamento elenca outras características que, embora não essenciais,
melhoram a qualidade da informação contábil. Essas características são demonstradas na Figura 7
a seguir.
Figura 7 – Outras características da informação contábil

Comparabilidade

Verificabilidade
Características qualitativas de melhoria
Tempestividade

Compreensibilidade

Fonte: Elaborada pelo autor com base em CPC, 2011.

Vejamos os sentidos de cada uma das características qualitativas de melhoria:


• comparabilidade: as informações contábeis-financeiras devem proporcionar ao usuário a pos-
sibilidade de conhecer e calcular a evolução de determinada informação ao longo do tempo;
20 Fundamentos de contabilidade

• verificabilidade: deve-se admitir a possibilidade de que diferentes observadores cheguem


a um consenso, mesmo que não se obtenha um completo acordo quanto ao retrato de
uma realidade econômica;
• tempestividade: a informação contábil deve chegar ao conhecimento do usuário em tempo
hábil para que ele possa utilizá-la no momento correto;
• compreensibilidade: pressupõe-se que o usuário da informação contábil disponha de
conhecimentos suficientes de contabilidade e da atividade da empresa para que seja
capaz de analisar, com a profundidade necessária, as demonstrações divulgadas como
informações contábeis. Essa característica também deve levar em consideração a
organização espacial, a redação e as técnicas de exposição, além de dever ser expressa em
idioma nacional, permitindo-se o uso de palavras em língua estrangeira quando inexistir
palavra com significado idêntico na língua nacional.
Em relação à apresentação, as Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC) são editadas pelo
Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e compreendem regras e procedimentos de conduta
que devem ser observados como requisitos para o exercício da profissão contábil e também devem
seguir os mesmos padrões de elaboração e estilo das normas internacionais.
A Resolução n. 1.121/2008 (BRASIL, 2008) acrescenta pressupostos básicos que devem
ser observados na elaboração das demonstrações financeiras. Alguns deles são descritos no
quadro a seguir:
Quadro 2 – Pressupostos para a elaboração das demonstrações financeiras

É possível que um evento, para fins de registro contábil, tenha forma legal,
porém a forma tenha sido artificialmente produzida. No caso da constituição
Primazia da essência
de um fundo de reserva, por exemplo, para enfrentar futuros problemas com
sobre a forma indenizações trabalhistas, não há data definida para ocorrer o evento indeni-
zatório, mas esses recursos devem ser contabilizados.

As receitas e despesas devem ser registradas no período de sua ocorrência,


independentemente do seu recebimento ou pagamento. Os salários de
Regime de um determinado mês, por exemplo, são pagos no mês seguinte, porém o
competência fato gerador do salário ocorreu no mês da realização do trabalho e, assim,
a despesa de salário deve ser apropriada no período de sua ocorrência,
independentemente de seus reflexos em caixa.

As demonstrações financeiras são elaboradas e apresentadas partindo do


Continuidade pressuposto de que a empresa está em atividade e irá manter-se por um
tempo previsível e não entrará em processo de liquidação.

Um exemplo da aplicação desse pressuposto é a atribuição do valor para um


ativo biológico. Qual é o valor verdadeiro e justo de um quilo de mel que
foi coletado no apiário? Qual é o valor da lã da ovelha que foi tosquiada?
A resposta é, referentemente ao valor justo e verdadeiro, que esses dois
Visão verdadeira
ativos sejam avaliados ao preço de mercado. Se você tem um valor a receber
e apropriada sobre o qual incide ganhos financeiros a serem calculados com base, por
exemplo, nos índices de preços ao consumidor, o seu valor verdadeiro não é o
que está no documento que representa este direito: o valor justo e verdadeiro
de contas a receber é o valor original acrescido dos encargos financeiros.
Fonte: Elaborado pelo autor com base em Brasil, 2008.
A contabilidade 21

Além das características preconizadas, é forçoso lembrar que as entidades se obrigam a obe-
decer a um conjunto de normas e regras oriundas das boas práticas da governança corporativa, as
quais estão expostas na Figura 8.
Figura 8 – Normas básicas de governança corporativa

Transparência

Equidade
Princípios básicos de governança corporativa
Prestação de contas

Responsabilidade corporativa

Fonte: Elaborada pelo autor.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) define cada um desses princípios:


Transparência – consiste no desejo de disponibilizar para as partes interessadas
as informações que sejam de seu interesse e não apenas aquelas impostas por
disposições de leis ou regulamentos.
Equidade – caracteriza-se pelo tratamento justo e isonômico de todos os sócios
e demais partes interessadas (stakeholders), levando em consideração seus direi-
tos, deveres, necessidades, interesses e expectativas.
Prestação de Contas (accountability) – os agentes de governança devem pres-
tar contas de sua atuação de modo claro, conciso, compreensível e tempestivo,
assumindo integralmente as consequências de seus atos e omissões e atuando
com diligência e responsabilidade no âmbito dos seus papéis.
Responsabilidade corporativa – os agentes de governança devem zelar pela
viabilidade econômico-financeira das organizações, reduzir as externalidades
negativas de seus negócios e suas operações e aumentar as positivas, levando
em consideração, no seu modelo de negócios, os diversos capitais (financeiro,
manufaturado, intelectual, humano, social, ambiental etc.) no curto, médio e
longo prazos. (IBGC, 2015, p. 72)

É oportuno considerar que mesmo as empresas que não estejam obrigadas a se inserir nos
princípios da governança corporativa devem atender a esses princípios, pois sua observância gera
valor e credibilidade e os clientes passam a enxergá-la como responsável e transparente.
A ciência contábil encontrou um campo fértil quando a economia de mercado exigiu
ferramentas de controle e projeções, de modo que, ao longo dos tempos, houve (e ainda há) uma
interação entre os dois fenômenos: a economia e a contabilidade.

Considerações finais
Como vimos no decorrer deste capítulo, as modificações sofridas pela contabilidade
sempre foram ensejadas pelo mercado. Sem informações contábeis, o investidor que desejasse
se tornar acionista não teria como analisar a situação econômico-financeira das empresas
nas quais desejava investir, os administradores não poderiam obter informações precisas
22 Fundamentos de contabilidade

e indispensáveis às tomadas de decisões, e os indivíduos não teriam instrumentos para


mensurar e controlar os patrimônios individuais. Todos esses fatores fazem da contabilidade
uma ferramenta que fornece condições para o equilíbrio dos orçamentos domésticos e para a
tomada de decisões sobre investimentos pessoais.

Ampliando seus conhecimentos


• Aprofunde seus conhecimentos sobre a história da contabilidade e o impacto de eventos
econômicos, políticos e sociais relacionados a essa história com a leitura do artigo a seguir.
PELEIAS, I. R. et al. Evolução do ensino da contabilidade no Brasil: uma análise histórica.
Revista Contabilidade & Finanças. São Paulo, p. 19-32, jun. 2007. Disponível em: http://
www.scielo.br/pdf/rcf/v18nspe/a03v18sp.pdf. Acesso em: 18 dez. 2018.

Atividades
1. Leia a seguinte afirmação, constante na Resolução n. 1.121/2008: “As transações devem ser
contabilizadas e apresentadas de modo a demonstrar a substância econômica, mesmo que
em detrimento dos aspectos formais”. Com base no que estudamos sobre essa resolução,
qual pressuposto básico está relacionado a essa afirmativa?

2. Qual foi a importância da obra Liber abaci (1202), de Leonardo Fibonacci, para a matemática
e para a contabilidade? Justifique.

3. Sabe-se que, por muito tempo, o ensino da contabilidade seguia orientações da escola euro-
peia. Entretanto, no início do século XX, a escola norte-americana ganhou força e cresceu.
Explique qual é a principal diferença entre essas duas escolas.

Referências
ARISTÓTELES. Retórica. Trad. de Manuel Alexandre Júnior, Paulo Farmhouse Alberto e Abel do Nascimento
Pena. São Paulo: Publifolha, 2015.

BC – Banco Central do Brasil. Circular n. 179, de 10 de maio de 1972. Diário Oficial da União, Brasília,
DF, 11 maio 1972. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/downloadNormativo.asp?
arquivo=/Lists/Normativos/Attachments/40314/Circ_0179_v2_L.pdf. Acesso em: 26 nov. 2018.

BÍBLIA. (Antigo Testamento). Jó. Português. Bíblia Sagrada. Trad. Bíblia Ave Maria, cap. 1, vers. 3. Disponível
em: https://www.bibliacatolica.com.br/biblia-ave-maria/jo/1/. Acesso em: 26 nov. 2018.

BRASIL. Decreto-Lei n. 2.627, de 26 de setembro de 1940. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília,
DF, 1 out. 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2627compilado.htm.
Acesso em: 27 nov. 2018.

BRASIL. Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 17
dez. 1976. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm. Acesso em: 24 out. 2018.
A contabilidade 23

BRASIL. Lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 28
dez. 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm. Acesso
em: 30 out. 2018.

BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Resolução n. 1.121, de 28 de março de 2008. Diário Oficial
da União, Brasília, DF, 1 abr. 2008. Disponível em: http://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/Res_1121.pdf.
Acesso em: 28 nov. 2018.

BRASIL. Lei n. 11.941, de 27 de maio de 2009. Diário Oficial da União, Brasília, Poder Legislativo, DF,
28 maio 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11941.htm.
Acesso em: 16 nov. 2018.

BOUCINHAS, J. C. Prefácio. In: IUDÍCIBUS, S. Contabilidade introdutória. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1998.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 00 (R1): estrutura conceitual para elaboração e di-
vulgação de relatório contábil-financeiro. Brasília, 2011. Disponível em: http://static.cpc.aatb.com.br/
Documentos/147_CPC00_R1.pdf. Acesso em: 18 dez. 2018.

CUOMO, S. Fibonacci’s Liber Abaci: A Translation into Modern English of Leonardo Pisano’s Book of
Calculation by Laurence E. Singler. Institute for Research in Classical Philosophy and Science, 2004. Revisão.
Disponível em: http://www.ircps.org/sites/ircps.org/files/aestimatio/1/2004-02-01_Cuomo.pdf. Acesso em:
28 nov. 2018.

DARELA, E.; CARDOSO, M.; ROSA, R. C. História da matemática. Palhoça: UnisulVirtual, 2011. Disponível
em: http://pergamum.unisul.br/pergamum/pdf/restrito/000003/00000369.pdf. Acesso em: 18 dez. 2018.

HENDRIKSEN, E. S.; VAN BREDA, M. F. Teoria da contabilidade. São Paulo: Atlas, 2009.

HOOG, W. A. Z. A importância da filosofia para os contadores. Contábeis. 17 fev. 2014. Disponível em:
https://www.contabeis.com.br/artigos/1606/a-importancia-da-filosofia-para-os-contadores/. Acesso em: 28
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IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Código das melhores práticas de governança
corporativa. 5. ed. São Paulo: IBGC, 2015. Disponível em: http://www.ibgc.org.br/userfiles/files/Publicacoes/
Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf. Acesso em: 14 dez. 2018.

IUDÍCIBUS, S. et al. Contabilidade introdutória. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1998.

IUDÍCIBUS, S.; MARION, J. C.; FARIA, A. C. Introdução à teoria da contabilidade. 6. ed. São Paulo:
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IUDÍCIBUS, S. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de acordo com as
normas internacionais e do CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

MARION, J. C. Contabilidade empresarial. São Paulo: Atlas, 1988.

MARION, J. C. Teoria da contabilidade. São Paulo: Alínea, 2009.

MARION, J. C. Contabilidade básica. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

PARMA, H. Delineamentos histórico-contábeis. Contabilidade Vista & Revista, Belo Horizonte, v. 3, n. 1,


p. 20-26, ago. 1991. Disponível em: http://www.spell.org.br/documentos/ver/24918/delineamentos-historicos
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SÁ, A. L. Teoria da Contabilidade. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

SMITH, A. A riqueza das nações: uma investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações. 3. ed.
Rio de Janeiro, 2017.
2
O patrimônio

A contabilidade relativa às entidades1 tem como objeto o estudo do patrimônio. Seu objetivo
é controlá-lo permanentemente que esse controle possa contribuir nas tomadas de decisões.
No desenvolvimento de suas atividades, as entidades utilizam bens econômicos para
produzir outros bens, realizando a intermediação entre o produtor e o usuário ou na prestação
de serviços.
No intuito de atender aos seus objetivos, a entidade jurídica – que é independente das
pessoas físicas que a compõem – tem a necessidade, por um lado, de realizar investimentos em
bens e direitos e, por outro, de buscar financiamentos para seus investimentos. Nesse sentido, o
presente capítulo tratará dos investimentos e financiamentos que representam o patrimônio.

2.1 O que é patrimônio?


Vídeo
Como já dito, o foco da contabilidade é o patrimônio. Em toda a literatura
nacional, o patrimônio é definido como o conjunto de bens, direitos e obrigações
de uma entidade, seja ela física ou jurídica.
Para Sá (2002, p. 60), o “patrimônio é um fundo de valores, em um dado mo-
mento existente, visando à satisfação das necessidades da atividade de uma célula
social”. Os valores representativos de bens e de direitos constituídos pretendem satisfazer as neces-
sidades de cada setor da instituição, que Sá (2002) denominou como célula social. Assim, móveis,
computadores e demais bens do escritório de um gerente, por exemplo, representam um fundo de
valores não destinado à venda, mas sim destinado às exigências da atividade do profissional.
Para entender o que é patrimônio, é preciso compreender o que são bens, direitos e obrigações
tanto sob o aspecto qualitativo quanto sob o aspecto quantitativo. Qualitativamente, o patrimônio
busca identificar seus componentes nomeando-os; quantitativamente, busca-se atribuir-lhes um
valor monetário. Veja como essa diferença se dá no Quadro 1 a seguir:
Quadro 1 – Exemplos de componentes do patrimônio

Aspectos qualitativos Aspectos quantitativos

Bens Disponibilidades, estoques etc. Disponibilidades: R$ 10.000,00

Direitos Duplicatas a receber, tributos a recuperar etc. Duplicatas a receber: R$ 100.000,00

Obrigações Duplicatas a pagar, tributos a pagar etc. Tributos a pagar: R$ 18.000,00

Fonte: Elaborado pelo autor.

1 Contabilmente, uma entidade pode ser uma pessoa física ou um conjunto de pessoas que se unem e constituem uma
empresa por quotas de responsabilidade limitada ou uma sociedade anônima.
26 Fundamentos de contabilidade

A seguir, estudamos cada um dos componentes do patrimônio: os bens econômicos, os di-


reitos e as obrigações.

2.2 Bens econômicos


Vídeo
De acordo com Fulgencio (2007, p. 86), os bens
são coisas capazes de satisfazer as necessidades materiais humanas e suscetíveis
de avaliação econômica. Tudo aquilo que tem utilidade, com ou sem valor eco-
nômico. O ar, por exemplo, é um bem livre, mas o minério de ferro é um bem
econômico, porque é escasso e depende do trabalho humano para ser obtido.

Ainda, segundo o autor, para que um bem seja reconhecido pela contabilidade é necessário
que ele:
• tenha valor econômico;
• possa ser convertido em dinheiro;
• seja útil e capaz de satisfazer as necessidades da entidade.
Assim, o interesse da contabilidade são os bens econômicos, ou seja, os bens que têm preços,
diferentemente dos bens livres (como o ar e o sol) aos quais não se pode atribuir preço.
Os bens econômicos de existência própria – independentemente do meio em que se situam –
são denominados tangíveis ou materiais. São exemplos de bens tangíveis: terrenos, prédios,
máquinas, veículos, ferramentas, entre outros. Entretanto, se os bens econômicos não puderem ser
reconhecidos visualmente, de maneira distinta dos outros (ainda que possuam valor monetário),
eles são conceituados como intangíveis ou imateriais. São exemplos de bens intangíveis: marcas e
patentes, fundos de comércio2, entre outros.
Considerando a relevância dos bens econômicos para a contabilidade, é importante
apresentar algumas definições e classificações embasadas no Código Civil (BRASIL, 2002), no
CPC 27 (CPC, 2009) e em diversos autores da área3. Essas definições são utilizadas pela con-
tabilidade empresarial e, por meio delas, podemos enumerar e classificar os principais bens
como imóveis ou móveis.
Os bens imóveis não podem ser deslocados, a não ser que haja danos em sua estrutura.
Para a contabilidade, há necessidade de separar esses bens em diversos itens, por exemplo: solo
(superfície), elementos incorporados ao solo (como construções e plantações) e bens determinados
legalmente (como penhor agrícola e apólices da dívida pública).

2 Para uma empresa comercial, por exemplo, é de suma importância a localização do estabelecimento de vendas.
O fundo de comércio é conhecido também por goodwill of trade ou como ponto da empresa.
3 Como Franco (1988), Calderelli (1967), Iudícibus et. al (2018) e Marion (2015).
O patrimônio 27

Os bens móveis são aqueles que podem ser deslocados sem prejuízos ou com pouco prejuízo
em sua estrutura, podendo ser classificados em: móveis que podem ser transportados (animais,
materiais e mercadorias) ou móveis por determinação legal (direitos autorais sobre um objeto
móvel, ou seja, produção intelectual, marcas, patentes ou obras artísticas).
As características sobre a fungibilidade ou não fungibilidade dos bens se assentam na
possibilidade de substituição desses bens. Assim, os bens fungíveis são aqueles que podem ser
substituídos por outros de mesmo gênero, espécie, quantidade e qualidade (como móveis, imóveis,
dinheiro etc.). Já os infungíveis são os bens de natureza insubstituível (por exemplo: pinturas,
obras de arte, partituras etc.).
Os bens econômicos podem ser classificados como bens de troca, por serem valores rotati-
vos destinados à venda ou transformação. Esses bens, por sua vez, são classificados como:
• numerários: denominação atribuída a moedas que foram cunhadas ou impressas,
ou seja, diz respeito a valores monetários;
• produtos: são objetos que tenham sido alvo de fabricação, isto é, que foram extraídos de
algo e que modificaram os insumos empregados;
• mercadorias: são artigos adquiridos por intermediários (empresas comerciais) entre os
produtores primários ou industriais e os consumidores ou usuários. Essa intermediação é
denominada revenda, e pode ser realizada a varejo ou por atacado.

Os bens econômicos também podem ser classificados como bens de consumo ou de aplica-
ção, sendo classificados como:
• matéria-prima;
• materiais secundários;
• embalagens; e
• material de escritório.

A matéria-prima é o insumo principal para a fabricação de qualquer produto. Ela pode ser insumo: elemento
necessário para
natural, como a soja ou o trigo utilizados na produção do óleo e da farinha, ou pode ser transfor- a produção de
mercadoria.
mada, como chapas de aço e tábuas para produzir automóveis e mobiliários.
Os materiais secundários são itens agregados à produção, em caráter complementar. Para pro-
duzir uma compota de figo, por exemplo, o fruto é a matéria-prima e o açúcar é o material secundário.
Já a embalagem é o recipiente destinado a armazenar os produtos tanto individualmente
quanto em grupos, com o objetivo de protegê-los. A embalagem é um insumo que, muitas vezes,
tem custo superior ao do próprio produto.
28 Fundamentos de contabilidade

Ao material de escritório devem ser adicionados os custos pertinentes aos produtos utiliza-
dos na higiene e limpeza da instituição, além de gastos com produtos consumidos na copa, como
água, pó de café, entre outros. Vemos na Figura 1 a classificação apresentada até aqui.
Figura 1 – Mapa da classificação dos bens

Imóveis

Uso Móveis

Fungíveis e Infungíveis

Materiais ou corpóreos

Matéria
Imateriais ou
intangíveis
Bens econômicos
Numerários

Troca Produtos

Mercadorias

Matéria-prima

Materiais secundários

Aplicação

Embalagens

Materiais de escritório

Fonte: Elaborada pelo autor.

Agora que conhecemos essas definições, é possível trabalharmos em um memorial descritivo


de bens de uso que uma entidade deve adquirir antes de abrir um negócio, pois, para a abertura de
uma empresa são obrigatórias diversas ações que antecedem o ato de “abrir as portas”.
Inicialmente, é forçoso levantar quais bens serão utilizados pelo empreendimento para que
se possa produzir determinado produto, revender determinada mercadoria ou prestar um serviço.
Imagine uma indústria sem um parque fabril, um mercado sem local de vendas, um mecânico sem
ferramentas ou um cozinheiro sem condimentos. Para que isso não ocorra, é preciso realizar um
levantamento dos bens de uso.
Vamos, ainda, imaginar a abertura de uma pequena confecção. Será necessário adquirir
máquinas para produzir as peças de vestuário, por isso, deve-se elaborar um memorial
O patrimônio 29

descritivo de todos os bens tangíveis necessários à execução desses objetivos. A Tabela 1 é um


exemplo de memorial.
Tabela 1 – Exemplo de memorial descritivo dos bens tangíveis

Descritor Quantidade Valor unitário Valor total


Máquina de costura Janome 2 R$ 1.120,05 R$ 2.240,10

Máquina de costura reta Singer 2 R$ 959,90 R$ 1.919,80

Máquina de cortar tecidos Faca 1 R$ 1.780,00 R$ 1.780,00

Computador Gamer Intel 1% 7400 2 R$ 2.828,00 R$ 5.656,00

Total dos bens tangíveis R$ 11.595,90


Fonte: Elaborada pelo autor.

Além das máquinas, a empresa deve registrar sua marca e seus produtos no Instituto Nacional
de Propriedade Industrial (INPI). Para realizar o registro, ela despende valores para a contratação
de empresas especializadas em desenvolver sites, logomarca e afins. Para esse tipo de bens, exige-se
também um memorial descritivo, de acordo com o modelo expresso na Tabela 2.
Tabela 2 – Exemplo de memorial descritivo dos bens intangíveis

Marcas e patentes R$ 1.500,00

Esforço mercadológico com empresas especializadas R$ 5.000,00

Total dos bens intangíveis R$ 6.500,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Para começar a produzir, a empresa necessita de insumos; então, ela deve adquiri-los,
fazendo-se necessária a elaboração de um memorial descritivo dos insumos que inicialmente
comporão os estoques e, posteriormente, os custos de produção.
Vamos imaginar que a previsão de produção durante o mês seja de 100 calças, sendo necessário
adquirir para cada unidade e para o total de calças a serem produzidas os insumos descritos na Tabela 3.
Tabela 3 – Exemplo de memorial descritivo dos insumos para a produção de calças

Descrição Quantidade Valor unitário Valor total

Fazenda 1,12 m2 R$ 18,66 R$ 20,90

Forro 0,32 m2 R$ 7,32 R$ 2,34

Zíper 1 R$ 3,00 R$ 3,00

Botão 3 R$ 0,45 R$ 1,35

Linha de costura 45,00 m R$ 0,01 R$ 0,45

Linha algodão 160,00 m R$ 0,011 R$ 1,76

Etiqueta de confecção 1 R$ 0,50 R$ 0,50

Etiqueta de logo 1 R$ 2,00 R$ 2,00

Lavanderia Stone 0,380 kg R$ 26,00 R$ 9,88


(Continua)
30 Fundamentos de contabilidade

Descrição Quantidade Valor unitário Valor total


Embalagem plástica 1 R$ 0,12 R$ 0,12

Bordado 1 R$ 7,00 R$ 7,00

Entretela 1 R$ 1,20 R$ 1,20

Total dos custos variáveis R$ 50,50

Produção prevista de calças R$ 100,00

Estoque de insumos R$ 5.050,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Imaginemos que na metade do mês tenham sido produzidas 50 calças. Em decorrência da


sua fabricação, foram transferidos 50% dos insumos adquiridos, ou seja, o valor de R$ 2.525,00.
A este valor foram adicionados, a título de exemplo, os custos da mão de obra (R$ 2.500,00) e os
custos indiretos, no valor de R$ 450,00. Assim, o total do custo de produção a ser transferido para
os estoques de produtos prontos é de R$ 5.475,00, somados os valores dos insumos, da mão de obra
e dos custos indiretos. Convém observar que 50% dos insumos que não foram utilizados também
compõem os estoques de materiais.
A empresa de confecções, nesse momento, possui uma riqueza patrimonial expressa em
moeda, nos valores e nos bens descritos na Tabela 4.
Tabela 4 – Memorial da riqueza patrimonial (bens) da indústria de confecções

Bens de troca

Produtos acabados R$ 5.475,00

Bens de aplicação

Insumos R$ 2.525,00

Bens tangíveis R$ 11.595,90

Bens intangíveis R$ 6.500,00

Total dos bens R$ 26.095,90


Fonte: Elaborada pelo autor.

Para confeccionar seus produtos, a pequena indústria de confecções necessita manter recur-
sos alocados como bens sem os quais não consegue produzir. Por outro lado, constituirá direitos
quando começar a vender os produtos acabados. Este é o tema da próxima seção.

2.3 Direitos: o que é seu, mas encontra-se em poder de terceiros


Vídeo
Vamos discorrer sobre os direitos que, para fins contábeis, só podem ser con-
siderados como tal se puderem ser convertidos em dinheiro. Podemos entender os
direitos como algo pertencente à companhia, mas que está em poder de terceiros.
Dessa maneira, a diferença entre os bens e os direitos é a posse.
Por exemplo, o dinheiro que você tem depositado em um banco não está em
seu poder, logo, os recursos financeiros que você mantém em bancos – mesmo aqueles em conta
corrente – são seus direitos.
O patrimônio 31

Outro bom exemplo de direito é o da instituição que vende produtos a consumidores,


intermediários ou usuários; porém, em decorrência da política de recebimento das vendas, ela
concede um prazo para o comprador efetuar o pagamento. Como se trata de um contrato, a
entidade normalmente emite uma fatura, e dela são extraídas duplicatas relacionadas a cada uma
das prestações mensais. Utiliza-se a expressão normalmente porque no Brasil é usual a emissão de
cheques pós-datados4 para documentar a realização de uma venda a prazo, assim como é habitual
aceitar vale-refeição, vale-alimentação e afins.
A empresa que emite um título de crédito, aceita cheques pós-datados ou vales institui um
direito a receber. Além da venda a prazo de suas mercadorias, a empresa também pode vender
bens de uso (máquinas, veículos etc.) e pode aceitar que o adquirente emita uma nota promissória,
gerando um direito para a empresa vendedora.
Pela sistemática tributária vigente, alguns tributos são recuperáveis e geram direitos para
empresa, como é o caso do Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS); para algu-
mas empresas, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); o Programa de Integração Social
(PIS); e a Contribuição para Financiamento das Atividades Sociais (COFINS).
Partindo do exemplo da indústria de confecções, que possuía 50 calças em estoque, vamos
imaginar que tenha sido realizada uma venda de 50% dos itens, isto é, 25 calças. Essas calças estão
evidenciadas nos estoques, e futuramente, no custo do produto vendido (CPV) pelo custo de pro-
dução (matéria-prima, mão de obra e custos indiretos). Ou seja, as 50 calças que estão em estoque
custam, cada uma, R$ 109,50; portanto, o custo total dos itens é de R$ 5.475,00.
Suponhamos que a confecção almeje um lucro de 80%. O valor de venda será, em decor-
rência dessa escolha, de R$ 197,10 por unidade (R$ 109,50 × 1,80) e o preço total da venda das 25
unidades será de R$ 4.927,50 (25 × R$ 197,10).
As empresas normalmente concedem prazos de pagamento aos seus clientes. Por isso, é nor-
mal a adoção do cartão de crédito como forma de pagamento, o que caracteriza uma venda a prazo.
Assim, vamos imaginar que a política de recebimento de vendas adotada pela indústria de
confecções seja de 10% do pagamento à vista e o restante parcelado em cinco vezes iguais. Isso
significa que a indústria receberá R$ 492,75 (10% de R$ 4.927,50) em dinheiro e os R$ 4.434,75
restantes em períodos futuros.
Temos, nessa situação, um bem e um direito. O bem é o dinheiro que a companhia recebe –
e que está em seu poder – e o direito é o montante de recursos que está em poder dos clientes e que
a companhia somente receberá nos prazos acordados. Com base nesses dados, vamos atualizar a
riqueza patrimonial dessa pequena indústria de confecções na Tabela 5.
Tabela 5 – Exemplo de memorial da riqueza patrimonial da indústria de confecções

Bens de troca

Numerário R$ 492,75

Produtos acabados R$ 2.737,50


(Continua)

4 Cheque com uma data futura indicando quando deve ser depositado.
32 Fundamentos de contabilidade

Bens de aplicação

Insumos R$ 1.262,50

Direitos

Duplicatas a receber R$ 4.434,75

Bens tangíveis R$ 11.595,90

Bens intangíveis R$ 6.500,00

Total dos bens e direitos R$ 27.023,40


Fonte: Elaborada pelo autor.

Concluída a explanação dos bens e direitos pertencentes à empresa, o passo seguinte é deter-
minar de que forma a instituição provê os recursos para financiá-los.

2.4 Obrigações: elas financiam os investimentos


Vídeo
Para financiar os bens e direitos que compõem a riqueza de uma empresa,
ela necessita permanentemente de recursos financeiros que possam ser aplicados
na atividade, visando alcançar seus objetivos. Os recursos financeiros têm duas ori-
gens: as internas e as externas.
As origens internas correspondem ao capital dos proprietários, sendo deno-
minadas capital próprio, e correspondem ao conceito de riqueza ou de Patrimônio Líquido, abran-
gendo o investimento inicial realizado pelos sócios ou acionistas, acrescido dos lucros gerados.
As origens externas são denominadas capital de terceiros e dizem respeito aos recursos pro-
venientes de terceiros (por exemplo, de instituições financeiras, fornecedores de materiais e servi-
ços, e entidades públicas credoras de impostos, taxas e contribuições).
O capital total à disposição da empresa ou as origens de recursos representam o conjunto de
valores disponibilizados para a empresa, abrangendo capital próprio e capital de terceiros.
O provimento de recursos – tanto de capital próprio quanto de capital de terceiros – gera
obrigações. Inclusive, no mundo acadêmico, muito se discute sobre a caracterização do capital
investido pelos sócios como obrigação. Marion (2015, p. 385) ensina que “pela Lei das Sociedades
Anônimas, entende-se como Passivo todo o lado direito do Balanço Patrimonial [...] Assim, o
Patrimônio Líquido pode ser visto como uma obrigação da empresa com seus proprietários”.
No entanto, as obrigações com os sócios não são por eles exigidas de imediato, pois elas
denotam que os sócios são os proprietários da empresa, mesmo que ela seja uma entidade diferente
da deles. De acordo com Iudícibus (2010, p. 33), deve-se compreender a “entidade contábil como
um ente, juridicamente delimitado ou não [...] para o qual devemos realizar relatórios” que são, por
sua vez, destinados aos proprietários da própria entidade.
Frisa-se que em decorrência desse aporte de recursos, os sócios esperam receber retorno por
meio de dividendos. Se a empresa não apresentar lucros que se transformam em dividendos, os
sócios se retirarão da sociedade e exigirão a devolução dos investimentos realizados.
O patrimônio 33

Na sequência, Iudícibus (2010, p. 34) esclarece sobre o postulado da continuidade, afirmando


que “a contabilidade é mantida para entidades, como pessoas distintas dos sócios que as integram
e que, se supõe, continuarão operando por período indefinido de tempo”.
Argumentando esses dois enunciados, o autor pontifica que “de acordo com a teoria da en-
tidade [...] é preciso, antes de mais nada, esclarecer que a entidade tem vida distinta das atividades
e interesses pessoais dos proprietários de parcelas de seu capital. A entidade tem personalidade
própria” (IUDÍCIBUS, 2010, p. 168).
No mesmo sentido, Marion (2015) ensina que a contabilidade, por se basear nos pilares da
entidade e da continuidade, exige que caso não houver uma entidade contábil, inexistirá a aplica-
ção da contabilidade, o que leva à dedução lógica de que a contabilidade é mantida para a entidade
e não para os sócios. Assim, se uma pessoa ou empresa fizer uma lista de seus bens econômicos e
de todas as importâncias que tem a receber – bem como de todas as suas dívidas – pode-se dar a
essa lista o nome de patrimônio.
Retomando o exemplo da pequena indústria de confecções, verificamos por meio do
memorial descritivo dos bens tangíveis, que a empresa adquiriu bens destinados ao seu uso nas
atividades de confecção que totalizaram R$ 11.595,90, enquanto pelo memorial descritivo do
intangível constatou-se que a empresa investiu R$ 6.500,00, totalizando R$ 18.095,90 em aplicações
de recursos. Essas aplicações precisam obrigatoriamente ter origem, que pode ser própria ou de
terceiros. Como exemplo, vamos considerar que 45% desses recursos foram captados por meio
de empréstimos em instituições financeiras, enquanto os 55% restantes foram captados por meio da
participação dos sócios.
Para representar o patrimônio dessa entidade, devemos traçar um risco vertical em uma
folha de papel e colocar ao lado esquerdo os bens e direitos que representam as aplicações de
recursos e ao lado direito as obrigações que representam as origens dos recursos, como se evidencia
na Tabela 6.
Tabela 6 – Demonstração das origens e aplicações de recursos

Capital de terceiros
Bens tangíveis R$ 11.595,90 R$ 8.143,16
(R$ 18.095,00 × 45%)

Capital próprio
Bens intangíveis R$ 6.500,00 R$ 9.952,75
(R$ 18.095,00 × 55%)

Total das aplicações R$ 18.095,90 Total das origens R$ 18.095,90


Fonte: Elaborada pelo autor.

Na sequência, a empresa adquiriu R$ 5.050,00 de insumos necessários para a confecção


das calças. Suponha que o fornecedor desses insumos tenha concedido um prazo para pagamen-
to de 60 dias. Isso significa que a empresa, ao mesmo tempo em que agregou uma aplicação de
R$ 5.050,00, assumiu uma obrigação no mesmo valor, como demonstra a Tabela 7 a seguir.
34 Fundamentos de contabilidade

Tabela 7 – Alteração do patrimônio por aquisição de insumos

Descritor Valor Descritor Valor


Capital de terceiros
Bens de aplicação R$ 5.050,00 R$ 8.143,16
(R$ 18.095 × 45%)

Bens tangíveis R$ 11.595,90 Fornecedores R$ 5.050,00

Bens intangíveis R$ 6.500,00 (=) Capital de terceiros R$ 13.193,16

Capital próprio
R$ 9.952,75
(R$ 18.095,90 × 55%)

Total das aplicações R$ 23.145,90 Total das origens R$ 23.145,90


Fonte: Elaborada pelo autor.

Em seguida, a empresa consumiu 50% do estoque de insumos para produzir 50 calças.


Para fabricá-las, foi necessário apontar os salários devidos aos seus trabalhadores, um montante de
R$ 2.500,00. Além disso, a empresa despendeu de R$ 450,00 de custos indiretos de fabricação.
Sabemos que o salário e os custos indiretos (como energia elétrica e água) podem ser pagos
nos primeiros dias do mês seguinte – é o que a empresa pretende fazer. Nesse caso, ocorre a criação
de uma nova obrigação com terceiros, como demonstra a Tabela 8.
Tabela 8 – Inclusão de novos bens e obrigações

Descritor Valor Descritor Valor


Capital de terceiros
R$ 8.143,16
(R$ 18.095,90 × 45%)

Bens de troca R$ 5.475,00 Fornecedores R$ 5.050,00

Bens de aplicação R$ 2.525,00 Salários a pagar R$ 2.500,00

Bens tangíveis R$ 11.595,90 Contas a pagar R$ 450,00

Bens intangíveis R$ 6.500,00 (=) Capital de terceiros R$ 16.143,16

Capital próprio
R$ 9,952,75
(R$ 18.095,90 × 55%)

Total das aplicações R$ 26.095,90 Total das origens R$ 26.095,90


Fonte: Elaborada pelo autor.

Por meio desses dados, constatamos que a pequena indústria realizou a venda de 50% das
calças existentes em estoque, ou seja, 25 calças. Essas calças foram vendidas por R$ 4.927,50. Do
valor de vendas foi recebido R$ 492,50 e foi constituído um direito de R$ 4.434,75. Para completar a
operação, falta calcular qual foi o lucro obtido na venda realizada. Para isso, basta efetuar a seguinte
operação:

Receita das vendas de 25 unidades × 197,10 R$ 4.927,50


(-) Custo das vendas de 25 unidades × 109,50 R$ 2.737,50
(=) Lucro/recurso dos proprietários (capital próprio) R$ 2.190,00
O patrimônio 35

O lucro apurado será distribuído aos sócios da empresa ou aumentará sua riqueza líquida
como um aumento de capital. Como ensinam Iudícibus et al. (2018, p. 345), o Capital Social é:
uma figura mais jurídica do que econômica, já que, do ponto de vista econômico,
também os lucros não distribuídos, mesmo que ainda na forma de Reservas,
representam uma espécie de investimento dos acionistas. Sua incorporação ao
Capital Social é uma formalização em que os proprietários renunciam a sua
distribuição. É como se os acionistas recebessem essas Reservas e a reinvestissem
na sociedade.

Os eventos realizados pela pequena indústria de confecções – tanto na fase pré-operacional


(quando investiu na aquisição de máquinas e em intangíveis) quanto na fase operacional de
faturamento – permitiram concluir que o seu patrimônio, descrito qualitativamente e mensurado
quantitativamente, resultou em um valor de R$ 28.285,90, como se vê na Tabela 9.
Tabela 9 – Inclusão de novos bens, direitos e obrigações.

Descritor Valor Descritor Valor


Financiamento inicial R$ 8.143,16

Bens de troca (Numerários) R$ 492,75 Fornecedores R$ 5.050,00

Direito (Duplicatas a receber) R$ 4.434,75 Salários a pagar R$ 2.500,00

Bens de troca (Produtos) R$ 2.737,50 Contas a pagar R$ 450,00

Bens de aplicação (Insumos) R$ 2.525,00 (=) Capital de terceiros R$ 16.143,16

Bens tangíveis R$ 11.595,90 Capital próprio R$ 12.142,75

Bens intangíveis R$ 6.500,00 Capital Social R$ 9.952,75

Lucro R$ 2.190,00

Total das aplicações R$ 28.285,90 Total das origens R$ 28.285,90


Fonte: Elaborada pelo autor.

O lado esquerdo da tabela apresenta, em dado momento, o conjunto de bens e direitos


(as aplicações de recursos), tanto qualitativa quanto quantitativamente. Em decorrência da impos-
sibilidade de existir um investimento sem o devido financiamento, a tabela também apresenta, no
lado direito, as obrigações da empresa, ou seja, os financiamentos.
Assim, verificamos que a montagem da Tabela 9 caracteriza todo o percurso realizado sobre
o conceito de patrimônio. Constatamos, ainda, que os valores dos bens e direitos são exatamente
iguais aos das obrigações – sejam elas de Passivo ou de Patrimônio Líquido – e que o conjunto de
bens, direitos e obrigações vinculados a uma pessoa física ou jurídica denomina-se patrimônio.

Considerações finais
Ao iniciar um planejamento para criação de uma empresa é necessário prover recursos
financeiros para realizar os investimentos necessários. Por isso, os sócios integralizam o Capital
Social, ou seja, realizam um investimento inicial por quotas de capital ou ações.
À medida que a empresa opera, suas obrigações deixam de se restringir apenas aos sócios, pois,
em virtude da aquisição de mercadorias para pagamento a prazo e da protelação de pagamento de
despesas, as obrigações se estendem também a fornecedores de mercadorias ou de insumos.
36 Fundamentos de contabilidade

Ao final, a soma dessas obrigações próprias e para com terceiros se iguala ao montante
investido em bens e em direitos, e o capital total compreende o somatório dos recursos postos à
disposição da entidade, ou seja, a soma do capital de terceiros com o capital próprio.
O Balanço Patrimonial, por ser uma demonstração contábil que apresenta um retrato da
empresa em dado momento, é considerado estático, porém, é necessário muito dinamismo para se
chegar a ele.
Você pode não conhecer fisicamente uma empresa, porém, ela se apresenta a você por meio
deste retrato. Com ele, você poderá conhecer o conjunto de bens, direitos e obrigações dessa enti-
dade; em outras palavras, você conhecerá o patrimônio dessa entidade.

Ampliando seus conhecimentos


• Ao estudar o patrimônio, verificamos que parte dele é composta pelo Ativo, que congrega
o conjunto de bens e de direitos. Sugerimos a leitura do artigo a seguir para melhor com-
preender esse componente patrimonial.
GOULART, A. M. C. O conceito de Ativos na contabilidade: um fundamento a ser
explorado. Revista Contabilidade & Finanças, São Paulo, n. 28, p. 56-65, jan./abr. 2002.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rcf/v13n28/v13n28a04.pdf. Acesso em: 26 dez. 2018.
• Grande parte do conteúdo deste capítulo foi destinado ao estudo dos bens. Você poderá
aprofundar seus conhecimentos nesse assunto por meio da leitura do artigo a seguir.
RIBEIRO, G. W. C. Bens jurídicos no Código Civil de 2002. Boletim Jurídico, Uberaba,
v. 13, n. 954. Disponível em: https://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/artigo/2478/
bens-juridicos-codigo-civil-2002. Acesso em: 26 dez. 2018.

Atividades
1. José, um dos sócios da empresa Alfa, solicita que o contador realize a escrituração de uma
escrivaninha que pertencia ao seu falecido avô. Ele justifica a solicitação em decorrência do
alto valor sentimental desse móvel, reconhecido por todos os sócios e familiares. O conta-
dor, na dúvida, solicita sua opinião a respeito dessa escrituração. O que você diria a ele?

2. Identifique e justifique se os itens a seguir devem ser caracterizados como bens, direitos
ou obrigações:

a) Dinheiro em caixa e em conta corrente.


b) Automóvel alugado pela empresa para locomoção.
O patrimônio 37

3. Toda a torcida de um clube de futebol, inclusive os adversários, acham que o jogador Júnior
vale muito dinheiro. Alguns torcedores e principalmente a diretoria do clube até imaginam
o valor monetário desse jogador em cifras de milhões de dólares. O presidente do clube,
visando aumentar o valor da riqueza da empresa, entende que o valor que a torcida atribui
ao jogador (que é um bem fungível, porque pode ser transferido) deve ser registrado pela
contabilidade. Você concorda com ele? Justifique sua resposta.

Referências
BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Poder
Legislativo, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/
L10406.htm. Acesso em: 14 dez. 2018.

CALDERELLI, A. Enciclopédia contábil brasileira. São Paulo: Formar, 1967.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 27: Ativo Imobilizado. Brasília, DF, 2009. Disponível
em: http://www.cpc.org.br/CPC/Documentos-Emitidos/Pronunciamentos/Pronunciamento?Id=58. Acesso
em: 26 dez. 2018.

FRANCO, H. Contabilidade geral. 21. ed. São Paulo: Atlas, 1988.

FULGENCIO, P. C. Glossário Vade Mecum: administração pública, ciências contábeis, direito, economia,
meio ambiente. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.

IUDÍCIBUS, S. Teoria da contabilidade. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

IUDÍCIBUS, S. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de acordo com as
normas internacionais e do CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

MARION, José Carlos. Contabilidade empresarial. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

SÁ, A. L. Teoria da contabilidade. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2002.


3
Estudo das contas

Imagine-se responsável pelos apontamentos das transações realizadas por uma pessoa ou
empresa. Certamente você se preocuparia em organizar os documentos separando os recebimentos
dos pagamentos. Após essa separação, provavelmente você organizaria as despesas, por exemplo,
em diversas categorias: alimentação, transporte, vestuário etc.
Um raciocínio lógico induziria você a pensar que como há necessidade desses apontamentos,
eles devem ser usados futuramente para eventuais conferências, controle, entre outras utilidades.
Por isso, você naturalmente usaria fichas ou folhas para registrar as transações de acordo com a
separação feita inicialmente.
A realização desse trabalho nada mais é que a utilização de um recurso contábil que se
caracteriza por reunir em um item todos os eventos da mesma natureza, no intuito de estruturar
os apontamentos de maneira homogênea e compatível, e proporcionar aos usuários dessas
informações a possibilidade de analisá-las, compará-las e exercer controle sobre elas.
Note que você planejou, executou e possibilitou o controle das transações. Em contabilidade,
o documento utilizado para essa finalidade é um plano, o qual tem como objetivo o planejamento e
a execução ordenada dos lançamentos, almejando a viabilidade do controle. Neste capítulo, vamos
entender como se organizam e se contabilizam as contas.

3.1 Contas patrimoniais e contas de resultado


Vídeo
No linguajar popular, a palavra conta é utilizada para representar compro-
missos a pagar ou a receber. Dizemos que vamos pagar a conta de energia elétrica,
que a conta de água será debitada na conta bancária etc.
Na contabilidade, porém, a expressão conta assume outros significados emba-
sados em diversas teorias, destacando-se, com base em Iudícibus e Marion (2002), as
seguintes: teoria personalista, teoria materialista e teoria patrimonialista.
Na teoria personalista existem três tipos de pessoas (os proprietários, os correspondentes
e os agentes consignatários) e cada conta representa um tipo de pessoa. Dessa maneira, as contas
Capital Social, Empréstimos e Fornecedores representam pessoas credoras da entidade, enquanto
as Duplicatas a receber e os Estoques representam pessoas devedoras dessa corporação.
Para essa teoria, as contas dos proprietários – sócios e acionistas – são as contas do Patrimônio
Líquido e suas variações (Despesas e Receitas). As contas dos agentes correspondentes são aquelas
que representam os direitos (Duplicatas a receber) e as obrigações (Duplicatas a pagar). Por fim, as
contas dos agentes consignatários são aquelas que representam os bens da sociedade.
40 Fundamentos de contabilidade

Na teoria materialista (que apresenta uma visão mais econômica da conta) não são as pes-
soas que contam: o que conta são as entradas e saídas de valores. As contas são classificadas como
integrais e diferenciais, sendo as integrais aquelas que representam os bens, direitos e obrigações da
empresa; enquanto as diferenciais representam o Patrimônio Líquido e suas modificações (Receitas
e Despesas).
Nos ateremos à terceira teoria, pois na contabilidade atual utiliza-se a teoria patrimonialista
e as contas são divididas em dois grupos:
• contas patrimoniais: referentes aos bens, direitos e obrigações, ou seja, aquelas relacionadas
ao patrimônio da entidade;
• contas de resultado: representam as receitas auferidas e as despesas incorridas em uma
entidade.
Assim, pode-se dizer que conta patrimonial é a denominação dada a cada um dos elementos
patrimoniais. São exemplos: Caixa, Estoques, Veículos, Duplicatas a pagar e Capital Social.
As contas patrimoniais são classificadas como Ativo, Passivo e Patrimônio Líquido. Os bens
e os direitos são contas ativas; as obrigações com terceiros são contas passivas e o capital perten-
cente aos sócios e acionistas são contas do Patrimônio Líquido. Essa classificação pode ser melhor
visualizada na Figura 1 a seguir.
Figura 1 – Classificação das contas patrimoniais

Bens e
Ativo
direitos

Contas patrimoniais Capital de


Passivo
terceiros

Capital
Patrimônio Líquido
próprio

Fonte: Elaborada pelo autor.

Além de possuir bens, direitos e obrigações, uma empresa – seja ela produtora rural, indus-
trial, comercial ou de prestação de serviços – é constituída para realizar operações que resultem
em lucro. Para isso, a empresa obtém receitas que decorrem da venda de bens ou da prestação de
serviços e incorre em despesas por consumo de bens e serviços. Denominamos de contas de resul-
tado as contas de Receitas e Despesas. Cada um dos elementos do resultado também será chamado
de conta, por exemplo: Receita de vendas, Receita de serviços, Despesas de tributos, Despesas de
salários, Despesas de aluguel, entre outros.
Estudo das contas 41

Essa classificação pode ser melhor visualizada na Figura 2.


Figura 2 – Classificação das contas de resultado

Salários
Custos e Aluguel
Despesas Juros
etc.

Contas de resultado

Vendas
Serviços
Receitas
Juros
etc.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Todos os acontecimentos que se passam em uma entidade – como integralização de capital,


aquisição de insumos, venda de produtos, pagamentos de salários e outros – são registrados por
meio de contas que reúnem transações da mesma natureza.
Dessa maneira, podem-se reunir todas as operações que envolvem dinheiro em uma só conta;
os eventos que envolvem pagamentos e recebimentos de dinheiro, por exemplo, são contabilizados
em uma conta denominada de caixa1.
Se, em vez de comprar à vista, a empresa realizar a operação combinando um prazo para
pagamento a determinado fornecedor, abre-se uma conta denominada de fornecedor. Nessa conta
ficarão acumuladas todas as transações com esse fornecedor.
Graficamente, uma conta é representada na forma da letra “T”, como se vê na Figura 3.
Figura 3 – Representação gráfica de uma conta

Nome da conta

Fonte: Elaborada pelo autor.

Essa expressão gráfica denomina-se razonete e consiste em uma ficha para a escrituração
contábil feita sinteticamente. O razonete tem apenas o número, o nome da conta e as colunas da
direita e da esquerda.

1 A expressão caixa provém do nome do recipiente em que era guardado o dinheiro quando não existiam cofres,
bancos etc. O comerciante colocava o dinheiro em uma caixa e o levava para casa ao final do dia.
42 Fundamentos de contabilidade

Já o razão é um livro no qual cada conta ocupa uma página e reúne um conjunto de contas.
De acordo com Sá (2002), o livro-razão tem a finalidade de registrar o que se passa em cada conta,
apresentando sua posição. A conta, em decorrência disso, é uma unidade no livro-razão2.
Com o emprego de sistemas mecanográficos, o livro-razão foi substituído por fichas soltas
que hoje estão na memória de um computador ou embutidas em sistemas operacionais avançados.
No entanto, segundo Iudícibus (1998, p. 45, grifo no original), embora as contas estejam
em seu conjunto “mantidas em um livro, ou arquivo, ou numa memória, continuam com a mesma
denominação, Razão”3. Observe no Quadro 1 como é uma folha do livro-razão.
Quadro 1 – Folha do livro-razão

Conta:

Código da conta:

Aplicações Origens
Data Histórico Saldo
Débito Crédito

Fonte: Elaborado pelo autor.

Cada folha do livro-razão deve conter: nome do elemento patrimonial ou de resultado;


código da conta; data da operação; histórico da operação; coluna destinada ao registro (em reais)
das aplicações de recursos – lançamento a débito; coluna destinada ao registro (em reais) das
origens de recursos – lançamento a crédito; e coluna destinada a representar (em reais) a diferença
entre os valores lançados a débito e a crédito. As expressões que merecem uma explicação bem
detalhada são justamente estas: débito e crédito.
Como as transações realizadas por uma entidade são efetuadas por meio de lançamen-
tos digráficos, ou seja, debitando-se determinada conta e simultaneamente creditando-se outra
(ou outras) pelo mesmo valor, temos que definir inicialmente o conteúdo das colunas. A coluna da es-
querda é utilizada para débitos e a da direita para créditos, como pode ser visto na figura a seguir.
Figura 4 – Representação gráfica e informações de uma conta

Número e nome da conta

Débito Crédito

Fonte: Elaborada pelo autor.

2 A expressão razão é de origem italiana e provém de ragione. Na Itália, as escolas de Contabilidade são denominadas
de ragioneria, cuja tradução livre é “escola das razões”.
3 Cada uma das páginas do livro-razão refere-se a uma conta que “deve contar à outra o que aconteceu”.
Estudo das contas 43

Assim, em um mesmo lançamento, a soma dos débitos é sempre igual a dos créditos efetua-
dos. O registro, dessa maneira, obedece ao método das partidas dobradas. Segundo Hendriksen e
Van Breda (2009, p. 45), “as contas em forma de T foram desenvolvidas para indicar aumentos de
um lado e reduções do outro”.
Conclui-se que, em um mesmo lançamento, a soma dos débitos é sempre igual à dos créditos
efetuados4. A figura a seguir identifica somente uma operação: a de compra de um automóvel. Mesmo
sendo somente uma operação, os registros contábeis são realizados em duas contas.
Figura 5 – Contabilização da compra de um automóvel

Automóvel
o
bit 50.000

Compra de
um automóvel

Cr
éd
ito Contas a pagar

50.000

Fonte: Elaborada pelo autor.

O princípio ou axioma contábil das partidas dobradas pode ser enunciado de diversas formas:
• não há débito sem que haja o respectivo crédito;
• se um valor é debitado de uma conta, credita-se o mesmo valor em outra conta;
• não há registro no débito de uma ou mais contas sem que haja registro simultâneo, de
igual valor, a crédito de uma ou mais contas.
Os critérios para que uma conta receba lançamento a débito (lado esquerdo) ou a crédito
(lado direito) são estudados na seção seguinte.

3.2 O método das partidas dobradas


Vídeo
As contas, em relação ao funcionamento do método das partidas dobradas,
ou seja, em relação aos lançamentos a débito e a crédito, podem ser divididas em:
• Unilaterais: porque sofrem variação em um só sentido. Por exemplo, nas contas
de resultado em geral as Despesas são debitadas e as Receitas são creditadas.
• Bilaterais: porque sofrem variações nos dois sentidos, ou seja, fazem-se registros
tanto a débito quanto a crédito. Um exemplo é a conta Caixa, que normalmente é a conta
que mais recebe lançamentos, sendo estes efetuados tanto a débito quanto a crédito.

4 A expressões débito e crédito são meramente contábeis. Assim, débito não significa algo ruim ou depreciativo e crédito
não significa algo de bom ou vantajoso. As palavras débito e crédito referem-se, exclusivamente, aos dois lados da conta.
44 Fundamentos de contabilidade

É importante ressaltar que à época de Pacioli (1494), de acordo com Iudícibus, Martins e
Carvalho (2005, p. 13),
possivelmente não se conhecia, ainda, o conceito de número negativo. Daí, por
incrível que possa parecer, haver surgido uma das maiores forças do método,
representado pela figura da dualidade débito/crédito, ou seja, os escrituradores
da época desenvolveram, a seu modo, uma espécie de nova teoria matemática
com a figura do saldo devedor e credor para suprir o que faltava. Em outras
palavras: se for debitada uma conta representativa de um Ativo, por exemplo,
quando esse, por outra operação, diminui, não se registra como número
negativo ou dedução do lançamento anterior no lado do débito, mas sim como
crédito, no lado direito, permanecendo ambos os registros, bem como valendo
seu resultado algébrico (o saldo).

Para realizar os lançamentos de acordo com o método das partidas dobradas, em conse-
quência, são considerados os aumentos ou as diminuições dos valores de cada conta.

• Todas as contas do Ativo são debitadas (lado esquerdo) quando


aumentam e são creditadas (lado direito) quando diminuem.
• Todas as contas do Passivo e do Patrimônio Líquido são debitadas
(lado esquerdo) quando diminuem e são creditadas (lado direito)
quando aumentam.

O diagrama que representa os mecanismos dos lançamentos – tanto a débito quanto a


crédito – das contas patrimoniais é o apresentado na Figura 6.
Figura 6 – Lançamentos no Ativo, Passivo e Patrimônio Líquido

Ativo

Pelos aumentos Pelas diminuições

Débito Crédito

Pelas diminuições Pelos aumentos


Passivo +
Patrimônio
Líquido

Fonte: Elaborada pelo autor.

As contas de Resultado, por sua vez (em razão de serem unilaterais e porque ao final, se
for uma Receita, aumentará o Patrimônio Líquido e se for uma Despesa diminuirá o Patrimônio
Líquido), obedecem ao seguinte procedimento:
Estudo das contas 45

As contas de Despesa As contas de Receita


recebem lançamento a recebem lançamento a
débito (lado esquerdo). crédito (lado direito).

Com base nessas explicações, é oportuno resumir o mecanismo dos lançamentos a débito e
crédito das contas, como pode se observar no Quadro 2.
Quadro 2 – Resumo do mecanismo de débito e crédito

Natureza Determinação do lançamento

Das contas Do saldo Aumentos Diminuições

Ativo devedor a débito a crédito

Passivo credor a crédito a débito

Patrimônio Líquido credor a crédito a débito

Receitas credor a crédito –

Despesas devedor a débito –


Fonte: Elaborado pelo autor.

Agora, vejamos como são desenvolvidos os lançamentos nas contas por meio do método das
partidas dobradas. Para isso, é necessário seguir os seguintes passos:
• 1º passo: identificar as contas envolvidas;
• 2º passo: verificar a que grupos as contas pertencem (Ativo, Passivo, Patrimônio Líquido,
Despesa ou Receita);
• 3º passo: identificar o que o fato provoca sobre o saldo das contas, se ele os aumenta ou
se os diminui;
• 4º passo: efetuar o lançamento segundo o método das partidas dobradas.
Imagine que dois cidadãos tenham resolvido constituir uma sociedade, a qual denominaram
de JJ SC, e, pelo contrato, subscreveram um capital. Entendendo que havia uma necessidade de subscrição: ato
jurídico em que
aporte de recursos inicial, cada um dos sócios integralizou sua parcela no valor de R$ 50.000,00 em sócios assumem a

dinheiro. Assim, o Capital Social integralizado5 foi de R$ 100.000,00. obrigação de trans-


ferir bens ou direitos

O primeiro passo, como se viu, é identificar quais contas estão envolvidas no lançamento. para o patrimônio da
entidade.
Uma delas já está identificada pelo nome: Capital Social. Para determinar o nome da outra, note
que estamos falando que a integralização foi em dinheiro, logo, a conta é denominada Caixa.

5 Após a subscrição, os sócios integralizam (entregam à sociedade) o valor subscrito, em dinheiro ou em bens
suscetíveis de avaliação monetária.
46 Fundamentos de contabilidade

O segundo passo é identificar a que grupos as contas pertencem: o Caixa pertence ao Ativo
e o Capital Social ao Patrimônio Líquido. O terceiro passo é identificar o que o fato provoca sobre
o saldo das contas. Como esses são os lançamentos iniciais, as contas identificadas não possuem
saldo, isso significa que mesmo assim o fato irá provocar um lançamento.
O quarto passo é efetuar o lançamento de acordo com o método das partidas dobradas: a con-
ta Caixa é uma conta ativa e está aumentando, por isso recebe lançamento a débito. A conta Capital
Social é uma conta de Patrimônio Líquido que está aumentando e, por isso, recebe lançamento
a crédito.
Desconsiderando os centavos para fins didáticos e considerando que as contas – em virtude
de não terem sido ainda codificadas – serão enumeradas na ordem em que aparecerem a partir
daqui, os lançamentos serão realizados da seguinte maneira:
Figura 7 – Aporte inicial de recursos

1. Caixa 2. Capital Social

(1) 100.000 100.000 (1)

Fonte: Elaborada pelo autor.

O segundo evento para efetuar a constituição da empresa foi o pagamento de despesas


organizacionais e de abertura, quando se desembolsou R$ 2.000,00 para esse fim. Um pagamento
significa dinheiro saindo de caixa, logo, a conta Caixa está diminuindo. Toda vez que uma conta
ativa diminui, ela recebe um lançamento a crédito.
A conta da despesa, agora denominada de Despesas de organização, recebe um lançamento
a débito como todas as despesas, de modo que os lançamentos desse evento são realizados da
seguinte maneira:
Figura 8 – Despesas organizacionais e de abertura

1. Caixa 2. Capital Social

(1) 100.000 2.000 (2) 100.000 (1)

3. Despesas de organização

(2) 2.000

Fonte: Elaborada pelo autor.

Note que a conta Capital Social permaneceu inalterada, pois o evento relatado não tem
relação com essa conta.
Estudo das contas 47

O terceiro evento da empresa foi a aquisição de um computador no valor de R$ 2.000,00 nas


seguintes condições de pagamento: 50% do valor à vista e 50% a prazo.
Constatamos nesse evento que existe o envolvimento de três contas: um computador (bem);
um valor da conta Caixa (pelo pagamento de parte da compra) e a constituição de uma obrigação,
pela promessa de pagamento futuro com o título de Duplicatas a pagar.
A conta Computador, por ser um bem, é uma conta ativa que está aumentando, por isso
recebe lançamento a débito. A conta Caixa é uma conta ativa que está diminuindo, por isso recebe
lançamento a crédito; já a conta Duplicatas a pagar é uma conta passiva que está aumentando e, por
isso, recebe lançamento a crédito. Os lançamentos são realizados da seguinte maneira:
Figura 9 – Aquisição de computador

1. Caixa 2. Capital Social

(1) 100.000 2.000 (2) 100.000 (1)


1.000 (3)

3. Despesas de organização 4. Computador

(2) 2.000 (3) 2.000

5. Duplicatas a pagar

1.000 (3)

Fonte: Elaborada pelo autor.

Nota-se aqui que as contas Capital Social e Despesas de organização não receberam lança-
mentos em decorrência de o evento não se referir a elas.
O quarto evento da empresa se deu logo nos primeiros dias, quando a empresa conseguiu
realizar um serviço que gerou uma receita de R$ 5.000,00. Desse valor, 30% foi recebido em
dinheiro. Para o restante, a empresa emitiu uma fatura de R$ 3.500,00 para recebimento em 30 dias.
Aqui também devem ser utilizadas três contas: Caixa, Receita de serviços e Duplicatas a
receber. A conta Caixa é ativa e está aumentando, assim, recebe lançamento a débito. Duplicatas
a receber é uma conta ativa que está aumentando, dessa forma, recebe lançamentos a débito.
Já a conta Receita de serviços, em razão de ser uma receita, recebe lançamento a crédito. Veja os
lançamentos na Figura 9 a seguir.
48 Fundamentos de contabilidade

Figura 10 – Prestação de serviços

1. Caixa 2. Capital Social

(1) 100.000 2.000 (2) 100.000 (1)


(4) 1.500 900 (3)
101.500 2.900

3. Despesas de Organização 4. Computador

(2) 2.000 (3) 1.800

5. Duplicatas a pagar 6. Receitas de serviços

900 (3) 5.000 (4)

7. Duplicatas a receber

(4) 3.500

Fonte: Elaborada pelo autor.

Da mesma maneira que nos casos anteriores, constata-se que algumas contas permanecem
inalteradas porque não têm relação com o evento, então não recebem lançamentos.
Repare que na conta Caixa, tanto na coluna do débito quanto na de crédito, aparecem a
totalização de dois valores. Significa, até o momento, que entraram no Caixa (débito) R$ 101.500,00
e saíram do Caixa (crédito) R$ 2.900,00. Será que os lançamentos pelo método das partidas dobra-
das estão corretos?
No exemplo que exploramos, utilizamos poucos eventos. Imagine, porém, os milhares de
eventos que são realizados por uma empresa real. Essa quantidade poderia gerar lançamentos
incorretos, por isso há necessidade da montagem de um Balancete de Verificação, que é um
relatório contábil gerado periodicamente com o objetivo de verificar eventuais distorções nos
saldos das diversas contas. Esse relatório é elaborado com base nos valores lançados a débito de
cada conta para confirmar se o método das partidas dobradas foi realizado adequadamente, isto é,
se os valores lançados a débito são iguais aos lançados a crédito. A seguir, é apresentado o Balancete
de Verificação.
Estudo das contas 49

Tabela 1 – Balancete de Verificação

Lançamentos Lançamentos Saldo


Código Contas Saldo credor
a débito a crédito devedor
1 Caixa R$ 101.500,00 R$ 2.900,00 R$ 98.600,00 –

2 Capital – R$ 100.000,00 – R$ 100.000,00

3 Despesas de organização R$ 2.000,00 – R$ 2.000,00 –

4 Computador R$ 1.800,00 – R$ 1.800,00 –

5 Duplicatas a pagar – R$ 900,00 – R$ 900,00

6 Receitas de serviços – R$ 5.000,00 – R$ 5.000,00

7 Duplicatas a receber R$ 3.500,00 – R$ 3.500,00 –

Totais R$ 108.800,00 R$ 108.800,00 R$ 105.900,00 R$ 105.900,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Como elucidado anteriormente – e verificado pela ordem sequencial das contas que com-
põem o Balancete de Verificação –, em decorrência de as contas ainda não terem sido codificadas,
elas foram enumeradas na ordem em que surgiram os lançamentos. A codificação das contas é
realizada a partir da elaboração de um plano de contas, assunto que estudamos na seção seguinte.

3.3 Plano de contas: necessário para o planejamento e para a gestão


Vídeo
A descrição de contas classificadas adequadamente e que possibilitam o controle
do patrimônio é denominada plano de contas. Na definição de Padoveze (2018, p. 49),
o plano de contas é um conjunto de contas que serve “para atender às necessidades de
registro das transações dos eventos econômicos, de modo a possibilitar a construção
dos principais relatórios contábeis e atender a todos os usuários da informação contábil”.
O autor afirma que o plano deve liminarmente atender às necessidades específicas de todos
os usuários da informação, tanto os internos (como gestores e colaboradores) quanto os externos
(como clientes, fornecedores, entre outros).
O plano de contas deve codificar as contas e os códigos devem permitir que sejam extraídos
relatórios (tanto de prestações de contas quanto de planejamentos de ações futuras). A denomi-
nação das contas deve identificar os elementos que representam. Assim, por exemplo, o elemento
Duplicatas a receber identifica de imediato as vendas a prazo.
Pressupõe-se que a empresa opere continuamente, por isso, o plano de contas deve ter flexibili-
dade, de modo a permitir sua ampliação. Sua elaboração obedece a uma sequência que é denominada
de graduação. No primeiro grau são numerados os quatro conjuntos de conta:

1. Ativo
2. Passivo
3. Custos e Despesas
4. Receitas
50 Fundamentos de contabilidade

Por meio dessa graduação, as contas são inseridas hierarquicamente, relacionando-se entre
si como se fossem uma família. De acordo com Padoveze (2018), o elemento denominado Bancos
conta corrente, por exemplo, é a mãe da conta Banco do Brasil; é possível dizer ainda que o Banco
do Estado e o Banco do Brasil são filhas de Bancos conta corrente.
Se utilizarmos, por exemplo, a conta Fornecedores – que sintetiza quem fornece insumos ou
produtos e concede ao adquirente prazo para pagamento –, podemos estabelecer a hierarquia das
contas de acordo com a Figura 11.
Figura 11 – Hierarquia das contas

1º grau 2. Passivo

2º grau 2.1 Passivo Circulante

3º grau 2.1.1 Fornecedores

4º grau 2.1.1.1 Fornecedores nacionais

2.1.1.1.1 – JotaJota

5º grau

2.1.1.1.2 – JotaKa

Fonte: Elaborada pelo autor.

O detalhamento das contas dependerá das necessidades de cada empresa. Um fornecedor


que proporcione dois importantes e representativos insumos à empresa pode ensejar, por exemplo,
a inserção de uma conta de grau 6. Se o fornecedor JotaJota (2.1.1.1.1), por exemplo, fornece carne
bovina e suína a um restaurante, é possível que sejam abertas duas contas filiais: 2.1.1.1.1.1 para
carne bovina e 2.1.1.1.1.2 para carne suína.
Com base nessa fundamentação, é possível elaborar um plano de contas simplificado, hierar-
quizando as contas até o terceiro grau, como demonstrado no Quadro 4 a seguir. Nos capítulos
seguintes, que tratam do Balanço Patrimonial e das demais demonstrações financeiras, faremos o
detalhamento de cada uma das contas que aparecem nesse quadro.
Estudo das contas 51

Quadro 4 – Plano de contas simplificado

1. Ativo
1.1 Ativo Circulante
1.1.1 Disponibilidades
1.1.2 Duplicatas a receber
1.1.3 Estoques
1.2 Ativo não Circulante
1.2.1 Realizável a longo prazo
1.2.2 Investimentos
1.2.3 Imobilizado
1.2.4 Intangível

2. Passivo
2.1 Passivo Circulante
2.1.1 Duplicatas a pagar
2.1.2 Salários a pagar
2.2 Passivo não Circulante
2.2.1 Financiamentos
2.2.2 Tributos refinanciados
2.3 Patrimônio Líquido
2.3.1 Capital Social
2.3.2 Reservas de Lucros

3. Despesas e Custos
3.1 Custo das mercadorias vendidas
3.2 Despesas com vendas
3.3 Despesas financeiras
3.4 Despesas gerais e administrativas

4. Receitas
4.1 Receita de vendas
4.2 Receita de serviços
4.3 Tributos incidentes sobre vendas
4.4 Abatimentos e diferenças de preços

Fonte: Elaborado pelo autor.


52 Fundamentos de contabilidade

Um plano de contas – mesmo apresentado de maneira simplificada – deve ser estruturado


com o objetivo de atender a padronização definida pela Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), com
as modificações introduzidas pela Lei n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007) e pela Lei n. 11.941/2009
(BRASIL, 2009).
O plano de contas, além de obedecer à estrutura definida por lei, denominado de plano de
contas simplificado, pode ser elaborado visando aos interesses e objetivos internos da empresa.
Nessas condições ele é denominado de plano de contas gerencial.
Um bom exemplo é a elaboração de um plano detalhado visando a um sistema analítico
dos custos de mão de obra incorridos na produção de um produto contendo todas as contas
referentes a esses custos, como salários, prêmios de produção, gratificações, férias, INSS, FGTS e
afins. Da mesma forma, um plano de contas gerencial leva em consideração todos os elementos
envolvidos em cada uma das demais contas a serem utilizadas.

Considerações finais
Pelo explicitado neste capítulo, foi possível entender que o plano de contas pode ser consi-
derado um elo de comunicação entre os diversos setores de uma empresa e o mundo exterior a ela,
incluindo clientes, bancos, fornecedores e outros.
Se não existir um plano de contas ou se ele não possibilitar a escrituração adequada dos
eventos contábeis que ocorrem em uma empresa, as improvisações para esses registros podem
produzir dissabores a todos os que dependem da informação contábil.

Ampliando seus conhecimentos


• Aprofunde seus conhecimentos sobre contas, planos de contas e estruturas das
demonstrações financeiras com noções que serão imprescindíveis para o conhecimento
da fundamentação da contabilidade nos capítulos 1 e 12 da seguinte obra:
IUDÍCIBUS, S. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de
acordo com as normas internacionais e do CPC. São Paulo: Atlas, 2010.
• Para compreender melhor o método das partidas dobradas, leia o artigo de Waggnoor
Macieira Kettle e Lucas Barros Kettle:
KETTLE, W. M.; KETTLE, L. B. Epistemologia do método das partidas dobradas:
considerações sobre aspectos históricos e métodos de ensino. Acta Negócios, Engenheiro
Coelho, SP, v. 1, n. 2, p. 13-31, 2017. Disponível em: https://cdn1.unasp.br/ec/sites/
revistas/wp-content/uploads/2018/05/21074747/neg%C3%B3cios-01.pdf. Acesso em:
9 jan. 2019.
Estudo das contas 53

Atividades
1. As leis brasileiras que regem a estrutura das contas patrimoniais dividem-nas em cinco
grandes grupos. Identifique-os em contas do Ativo e do Passivo e indique suas funções em
termos de registros contábeis.

2. Um plano de contas pode ser elaborado com o intuito de adequar-se apenas ao cumprimento
da lei ou pode ser produzido para, além dessa obrigatoriedade, auxiliar os gestores nas
tomadas de decisões. Indique os dois planos de contas e explique a diferença entre eles.

3. Por que as contas podem ser hierarquicamente chamadas de “mãe” e “filha”? Dê exemplos
dessa classificação.

Referências
BRASIL. Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF,
17 dez. 1976. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm. Acesso em: 24 out. 2018.

BRASIL. Lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 28
dez. 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm. Acesso
em: 30 out. 2018.

BRASIL. Lei n. 11.941, de 27 de maio de 2009. Diário Oficial da União, Brasília, Poder Legislativo, DF, 28
maio 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11941.htm.
Acesso em: 16 nov. 2018.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 16 (R1): Estoques. Brasília, DF, 2009. Disponível em:
http://static.cpc.aatb.com.br/Documentos/243_CPC_16_R1_rev%2013.pdf. Acesso em: 27 dez. 2018.

HENDRIKSEN, E. S.; VAN BREDA, M. F. Teoria da contabilidade. São Paulo: Atlas, 2009.

IUDÍCIBUS, S. et. al. Contabilidade introdutória. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1998.

IUDÍCIBUS, S.; MARION, J. C. Introdução à teoria da contabilidade: para o nível de graduação. 3. ed.
São Paulo: Atlas, 2002.

IUDÍCIBUS, S.; MARTINS, E.; CARVALHO, L. N. Contabilidade: aspectos relevantes da epopeia de


sua evolução. Revista Contabilidade & Finanças, São Paulo, n. 38, p. 7-19, maio/ago. 2005. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/rcf/v16n38/v16n38a02.pdf. Acesso em: 25 dez. 2018.

PADOVEZE, C. L. Manual de contabilidade básica: uma introdução à prática contábil. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

SÁ, A. L. Teoria da contabilidade. São Paulo: Atlas, 2002.


4
Balanço Patrimonial

Em todo exercício social – que corresponde a um período de 12 meses, determinados pelos


estatutos ou contratos sociais – as empresas são obrigadas a elaborar e a apresentar, com base na
contabilidade, diversas demonstrações que buscam exprimir com clareza os atos de gestão revela-
dores das condições financeiras, econômicas e patrimoniais da entidade.
A gestão financeira deve expressar os eventos relacionados às operações monetárias e de
crédito, como fluxo de caixa, gestão do capital de giro, indicadores de liquidez, indicadores de
endividamento, prazos médios e ciclos operacionais e financeiros. A gestão econômica aponta as
operações relativas à formação, à distribuição e ao consumo, e envolve os indicadores de lucra-
tividade, rentabilidade e retorno para a empresa e para os proprietários. Já a gestão patrimonial
está vinculada ao conjunto de bens, direitos e obrigações retratados em dado momento, que é
denominado de período administrativo ou exercício social. Este representa um espaço de tempo no
qual se dividem os resultados dos diversos atos de gestão. O enfoque deste capítulo será na gestão
patrimonial da entidade.

4.1 O Balanço Patrimonial


Vídeo
Para as pequenas e médias empresas, a unidade de tempo que é objeto da
apuração contábil é de um ano. Para as grandes empresas esse tempo é trimestral:
encerram-se em 31 de março, 30 de junho, 30 de setembro e 31 de dezembro, em
decorrência das determinações contidas no Decreto n. 9.580/2018 (BRASIL, 2018),
da legislação do Imposto de Renda.
As entidades em geral – com exceção das micro e pequenas empresas enquadradas no
regime de tributação do Simples Nacional1 – deverão publicar o Balanço Patrimonial anualmente.
Para fins societários, o exercício social pode encerrar-se em qualquer dia do ano, à escolha da
gestão. Entretanto, para fins de Imposto de Renda, o exercício social se encerra no último dia do ano, em
31 de dezembro, fato que normalmente leva as empresas a encerrar seu Balanço nessa data.
Feitas essas considerações, é possível definir o Balanço Patrimonial como uma demonstração
estática que representa um retrato do patrimônio em dado momento, sintetizando os bens, direitos
e obrigações de uma empresa.
É denominado de Balanço porque, como vimos anteriormente, os dois lados – esquerdo
e direito – são compostos por valores iguais e, por isso, assemelha-se a uma balança. Conheça a
composição do Balanço Patrimonial na Figura 1 a seguir.

1 O Simples Nacional é um regime tributário diferenciado que abrange as empresas com receita bruta anual de até
R$ 4,8 milhões. Os objetivos do regime são: 1. abranger todos os tributos devidos pela empresa em uma só rubrica,
minimizando, em muito, a carga tributária; e 2. dispensar a escrituração de livros e da elaboração das demonstrações
financeiras (BRASIL, 2017).
56 Fundamentos de contabilidade

Figura 1 – Elementos básicos do Balanço Patrimonial

Balanço Patrimonial

Ativo Passivo
Patrimônio Líquido

Fonte: Elaborada pelo autor.

Neste capítulo vamos discorrer sobre esses três elementos que compõem o Balanço Patrimonial
(Ativo, Passivo e Patrimônio Líquido), apresentando suas funções e a importância de cada um para o
retrato do patrimônio de uma entidade.

4.2 Ativo: conjunto de bens e direitos


Vídeo
O padrão de estrutura do Balanço Patrimonial teve origem a partir da
Circular n. 179/1972 (BC, 1972) emitida pelo Banco Central do Brasil para tratar
das normas gerais de auditoria. A princípio, essa regulamentação era dirigida so-
mente às empresas constituídas sob a forma de sociedade por ações; porém, aos
poucos, foi adotada por uma grande quantidade de empresas. Isso ocorreu em vir-
tude de não existir um padrão específico para estruturar as demonstrações financeiras.
Os órgãos representativos das empresas, dos contadores e dos auditores começaram a
exigir o estabelecimento de um padrão na apresentação das demonstrações financeiras. Por isso,
foi editada na sequência a Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), que regulamentou a existência das
sociedades por ações e definiu uma nova estrutura para as demonstrações financeiras.
Em 1977, a Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (FIPECAFI),
da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo
(FEA/USP), editou o Manual de Contabilidade das Sociedades por Ações, que trouxe ao público
tudo o que se discutia no âmbito acadêmico da Universidade de São Paulo.
Em 1986, o Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (IBRACON) emitiu um
pronunciamento que foi aprovado e referendado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM)
por meio da Deliberação n. 29, de 05 de fevereiro de 1986, a qual discorre sobre os postulados,
princípios e convenções contábeis.
O Conselho Federal de Contabilidade (CFC), órgão representativo da classe dos contabi-
listas, emitiu, por sua vez, a Resolução n. 750/1993 (BRASIL, 1993), descrevendo os princípios
fundamentais da contabilidade.
Em 2005, o Brasil decidiu aderir às normas internacionais de auditoria e contabilidade, e com
base nos atos e doutrina citados, foram editadas as Leis n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007) e n. 11.941/2009
(BRASIL, 2009), de modo a adaptar a estrutura contábil brasileira às normas internacionais da
Balanço Patrimonial 57

International Financial Reporting Standards2 (IFRS). Dadas as modificações introduzidas por essas leis
na Lei das Sociedades por Ações, pode-se afirmar com base no art. 178 desta última, que
no balanço, as contas serão classificadas segundo os elementos do patrimônio
que registrem, e agrupadas de modo a facilitar o conhecimento e a análise da
situação financeira da companhia. [...] No ativo, as contas serão dispostas em
ordem decrescente de grau de liquidez dos elementos nelas registrados, nos
seguintes grupos:
I – ativo circulante; e
II – ativo não circulante, composto por ativo realizável a longo prazo, investi-
mentos, imobilizado e intangível.” (BRASIL, 1976)

É oportuno observar que o Balanço, além de apresentar a situação patrimonial da entidade,


deve servir de instrumento para analisar essa situação. Na sequência, o art. 179 da Lei n. 6.404/1976
(BRASIL, 1976) determina que o Ativo Circulante seja estruturado da seguinte maneira:
As contas serão classificadas do seguinte modo:
I – no ativo circulante: as disponibilidades, os direitos realizáveis no curso
do exercício social subsequente e as aplicações de recursos em despesas do
exercício seguinte;
II – no ativo realizável a longo prazo: os direitos realizáveis após o término
do exercício seguinte, assim como os derivados de vendas, adiantamentos ou
empréstimos a sociedades coligadas ou controladas (artigo 243), diretores, acio-
nistas ou participantes no lucro da companhia, que não constituírem negócios
usuais na exploração do objeto da companhia;
III – em investimentos: as participações permanentes em outras sociedades e os
direitos de qualquer natureza, não classificáveis no ativo circulante, e que não se
destinem à manutenção da atividade da companhia ou da empresa;
IV – no ativo imobilizado: os direitos que tenham por objeto bens corpóreos
destinados à manutenção das atividades da companhia ou da empresa ou exer-
cidos com essa finalidade, inclusive os decorrentes de operações que transfiram
à companhia os benefícios, riscos e controle desses bens;
V – (Revogado pela Lei nº 11.941, de 2009)
VI – no intangível: os direitos que tenham por objeto bens incorpóreos destina-
dos à manutenção da companhia ou exercidos com essa finalidade, inclusive o
fundo de comércio adquirido. (BRASIL, 1976)

As disposições detalhadas nesse artigo (já alterado pela Lei n. 11.941/2009) têm o propósito
de enumerar detalhadamente todos os bens e direitos da companhia que já vinham sendo imple-
mentados pelos comitês.
O Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) foi criado em 2005 e tem como objetivo
estudar, preparar e emitir pronunciamentos técnicos sobre procedimentos contábeis. O CPC é o
órgão regulador brasileiro do processo de produção de normas, e tem como intuito de adequar a
contabilidade brasileira aos padrões internacionais.

2 As Normas Internacionais de Informação Financeira são emitidas pelo International Accounting Standards Board –
IASB (Conselho de Normas Internacionais de Contabilidade), o qual tem como objetivo uniformizar os procedimentos
contábeis a nível mundial.
58 Fundamentos de contabilidade

De acordo com o CPC 00 (CPC, 2011), que define a estrutura conceitual para a elaboração
e apresentação das demonstrações contábeis, “ativo é um recurso controlado pela entidade como
resultado de eventos passados e do qual se espera que fluam futuros benefícios econômicos para
a entidade” (CPC, 2011). Da mesma maneira, esse pronunciamento define que para se enquadrar
na definição de Ativo, deve-se atentar não só para a forma legal, mas também para sua essência
subjacente, o que caracteriza a primazia da essência sobre a forma.
Por exemplo, imagine que uma empresa adquiriu via pagamento à vista mercadorias para
revenda e depois constatou que não havia caixa suficiente para pagar o valor da compra. O con-
tador resolveu, então, lançar o valor do Estoque (Ativo), porém, pela inexistência de numerário,
resolveu lançar a contrapartida na conta de Duplicatas a pagar.
Sabemos que a duplicata é um documento que comprova operações de compra a prazo,
não correspondendo, portanto, a uma operação à vista. Nesse caso, existe um documento formal:
a nota fiscal. Contudo, a essência dessa operação consiste no fato de não ter sido realizada a prazo;
em decorrência disso, há necessidade de se alterar o conteúdo da nota fiscal para atender à forma e
à essência. Outro exemplo de primazia da essência é trazido pelo CPC de 2011, ao discorrer sobre
uma operação de arrendamento mercantil.
Assim, por exemplo, no caso do arrendamento mercantil financeiro, a essência
subjacente e a realidade econômica são a de que o arrendatário adquire os
benefícios econômicos do uso do ativo arrendado pela maior parte da sua
vida útil, em contraprestação de aceitar a obrigação de pagar por esse direito
valor próximo do valor justo do ativo e o respectivo encargo financeiro. Dessa
forma, o arrendamento mercantil financeiro dá origem a itens que satisfazem à
definição de ativo e de passivo e, portanto, devem ser reconhecidos como tais no
balanço patrimonial do arrendatário. (CPC, 2011)

Dessa maneira, o contrato de arrendamento deve compor o ativo da empresa arrendatária.


Contabilmente, no Balanço Patrimonial somente são registrados aqueles ativos que contenham, de
acordo com o CPC 00, as seguintes características: ser controlado pela entidade; ser resultante de
um evento que ocorreu no passado; e, por fim, gerar benefício econômico futuro. Dessas carac-
terísticas se depreende, por exemplo, um episódio que envolva o estoque um lote de mercadorias
deterioradas e sem perspectiva de ser comercializado; este não será apresentado no Balanço da
empresa, pois não representa benefícios presentes ou possíveis benefícios econômicos futuros.
O mesmo se pode dizer de um título a receber, quando a empresa já esgotou todos os recursos
possíveis e imagináveis para recebê-lo. Por não representar benefícios futuros, não deverá constar
no Balanço, embora seja um direito da empresa.
Se a entidade não conseguir a documentação comprobatória dessas perdas3, que pode ser
emitida por autoridades competentes nos casos de não recebimento de títulos, ela deverá apropriar
uma conta redutora desses bens ou direitos sob o título de Provisões para perdas, obtendo-se,
assim, o Ativo Líquido, de modo que o Ativo represente, realmente, a existência de um benefício
econômico futuro.

3 São exemplos de documentação comprobatória de perdas: laudos do corpo de bombeiros, saúde pública, polícia,
autoridades sanitárias ou Poder Judiciário.
Balanço Patrimonial 59

Por outro lado, há certos itens que embora apresentem potencial para a obtenção de
benefícios futuros, não são evidenciados no Balanço. Isso ocorre porque esses itens não podem ser
avaliados em dinheiro, ou, ainda que possam ser avaliados monetariamente, não é possível ativá-
-los. Um exemplo disso é o goodwill, expressão que pode ser traduzida como “clientela” e representa
o valor do ponto comercial.
Outro exemplo dessa situação seria a propriedade de uma banca de revistas localizada em
um ponto de grande movimentação de público e outra, com as mesmas características físicas,
mas que se encontra em um local com pouca movimentação de transeuntes: certamente o valor do
ponto comercial da primeira banca é maior que o valor da segunda.
O “nome” e a “marca” também podem representar algo valioso para a entidade, mas quase
nunca aparecem no Balanço em decorrência da dificuldade de atribuir-lhes um valor objetivo.
Tanto o goodwill quanto o nome e a marca podem ser contabilizados se houver um valor
objetivo obtido por documento probante de negociação ou pelo pagamento da criação da marca.
Como exemplo, podemos citar a contabilização de um craque do futebol “formado” por um clube:
esse profissional não pode ter seu valor contabilizado no Ativo por ter se tornado um grande craque
durante seu crescimento no clube, diferentemente de outros jogadores adquiridos, que possuem
valores objetivos expressos nos contratos de negociação e que, portanto, constarão no Intangível.
O Ativo, que é uma conta de 1º grau, é subdivido em Ativo Circulante e Ativo não Circulante
que, por sua vez, são contas de 2º grau. As contas constantes no Ativo Circulante, que são de
3º grau, envolvem transações mais numerosas que, no dizer de Marion (2015, p. 74), “são contas que
estão constantemente em movimento, isto é, seus saldos são frequentemente alterados”. Essas contas
são caracterizadas pelo giro e seus elementos patrimoniais são:
• as disponibilidades;
• os direitos realizáveis no curso do exercício social subsequente;
• os estoques; e
• as aplicações de recursos em despesas do exercício seguinte.
Cada um desses grupos contém outras contas, as quais são classificadas como Contas de
4º grau, como se demonstra no quadro a seguir:
Quadro 1 – Contas de 4º grau do Ativo Circulante

1. Ativo
1.1 Ativo Circulante
1.1.1 Disponibilidades
1.1.1.1 Caixa e equivalentes de caixa
1.1.1.2 Bancos
1.1.1.3 Aplicações financeiras de liquidez imediata
1.1.2 Direitos realizáveis
1.1.2.1 Duplicatas a receber (clientes)
(Continua)
60 Fundamentos de contabilidade

1.1.2.2 (-) Provisão para créditos de liquidação duvidosa


1.1.2.3 Tributos a recuperar
1.1.2.4 Aplicações financeiras de liquidez de curto prazo
1.1.2.5 Outros valores a receber
1.1.3 Estoques
1.1.3.1 Estoque de produtos prontos
1.1.3.2 Estoque de produtos em elaboração
1.1.3.3 Estoque de matéria-prima
1.1.3.4 Estoque de materiais secundários
1.1.3.5 Estoque de embalagens
1.1.3.6 (-) Provisão para ajuste de estoques
1.1.4 Despesas do exercício seguinte
1.1.4.1 Seguros antecipados
1.1.4.2 Assinatura de jornais, periódicos etc.
1.1.4.3 Juros a apropriar
Fonte: Elaborado pelo autor.

A primeira conta que aparece no Ativo é a conta Disponibilidades. Nesse grupo, o destaque é
para a conta Caixa, que de acordo com normas internacionais também engloba os recursos equiva-
lentes, ou seja, cheques em mãos e em trânsito, que representam recursos com livre movimentação
para aplicação nas operações da empresa.
É importante observar que as contas relacionadas sejam de utilização da entidade. O conjunto
de estoques, por exemplo, indica que o plano pertence a uma empresa industrial, tendo em vista
a necessidade de estocar produtos em elaboração e matéria-prima. Em uma empresa mercantil, o
estoque seria apenas de mercadorias.
O último grupo de contas do Ativo Circulante é o de Despesas do exercício seguinte, o qual
representa valores pagos cujos benefícios ocorrerão em período futuro. Quando da contratação
de um seguro, por exemplo, para aproveitar descontos, a empresa paga o valor da despesa à vista,
embora o período de cobertura seja de doze ou mais meses. Dessa maneira, o valor pago não se
refere ao mês do pagamento, mas aos diversos meses de vigência do seguro, período no qual a
organização tem o direito de ser ressarcida na ocorrência de um fato fortuito. Decorre desse direito
futuro o lançamento de uma despesa em uma conta do Ativo.
As contas do Ativo não Circulante, também de 3º grau, envolvem transações referentes a
bens e direitos de vida mais longa, ou seja, seus valores não são alterados frequentemente, já que
não há uma conotação de giro. Seus elementos patrimoniais são:
• Realizável a longo prazo
• Investimentos
Balanço Patrimonial 61

• Imobilizado
• Intangível
Aqui, também, cada um dos grupos de contas possui outras contas a eles vinculadas, que são
classificadas como sendo de 4º grau, como se demonstra a seguir:
Quadro 2 – Contas de 4º grau do Ativo não Circulante

1. Ativo
1.2 Ativo não Circulante
1.2.1 Realizável a longo prazo
1.2.1.1 Duplicatas a receber (clientes)
1.2.1.2 Tributos a recuperar
1.2.1.3 Aplicações financeiras de liquidez de longo prazo
1.2.1.4 Outros valores a receber
1.2.2 Investimentos
1.2.2.1 Participações permanentes em outras sociedades
1.2.2.2 (-) Perdas estimadas
1.2.2.3 Investimentos em incentivos fiscais
1.2.2.4 Obras de arte
1.2.3 Imobilizado
1.2.3.1 Terrenos
1.2.3.2 Obras civis
1.2.3.3 Instalações
1.2.3.4 Máquinas e equipamentos
1.2.3.5 Móveis e utensílios
1.2.3.6 Veículos
1.2.3.7 Obras em andamento
1.2.3.8 (-) Depreciação acumulada
1.2.4 Intangível
1.2.4.1 Direitos federativos
1.2.4.2 Marcas e patentes
1.2.4.3 Direitos sobre recursos naturais
1.2.4.4 Pesquisa e desenvolvimento
1.2.4.5 (-) Amortização acumulada
Fonte: Elaborado pelo autor.
62 Fundamentos de contabilidade

Algumas contas ativas merecem uma breve explicação, pois, como verifica-se, são pre-
cedidas por sinal negativo. Vamos tratar deste assunto a seguir, fundamentando os ajustes nas
contas ativas.

4.2.1 Ajustes nas contas ativas


Os ajustes em algumas contas são necessários em decorrência das práticas e normas
internacionais. De acordo com Iudícibus et al. (2018, p. 57), “o conceito é inerente à estimativa
do valor recuperável do ativo, onde é valorizada a informação ao usuário da contabilidade sobre
o real valor que se espera no ativo, ou seja, os benefícios econômicos futuros devem ser ajustados
àquilo que realmente se tem a expectativa de ser recebido”.
No grupo de Direitos realizáveis destaca-se uma conta redutora que foi denominada de
Créditos de liquidação duvidosa. Ela representa uma estimativa de incerteza no recebimento das
vendas. Por exemplo, se as vendas no valor de R$ 100.000,00 forem realizadas a prazo, a contrapar-
tida delas será realizada na conta de Duplicatas a receber, como se observa pelos lançamentos nos
razonetes 1 e 2 da Figura 1.
Apesar do posicionamento da Receita Federal, que não considera dedutível a despesa do
crédito de liquidação duvidosa, a legislação societária mantém posição favorável. De acordo com
Iudícibus et al. (2018, p. 57), “a estimativa de perda vai ao encontro do que é previsto nas normas
internacionais e no processo de harmonização internacional da contabilidade”.
A apuração do valor da perda varia de empresa para empresa e de setor a setor. Por isso,
vamos imaginar uma expectativa de não recebimento de, por exemplo, 3% do valor das vendas
por inadimplência dos compradores. Nesse caso, é prudente diminuir tanto os valores a receber
como os valores das receitas de vendas. A conta que representa essa perda é a Provisão para
devedores duvidosos.
Tecnicamente, os valores referentes às diminuições não podem ser lançados diretamente nas
contas originais das operações, por isso, são lançados em contas distintas, como se vê nos razonetes
3 e 4 da Figura 2.
Figura 2 – Apropriação da Provisão para Devedores Duvidosos

1. Duplicatas a receber 2. Receita de vendas

100.000 Transfere para o Transfere para o 100.000


Balanço Resultado

3. Despesas de provisão
para devedores duvidosos 4. Provisão para devedores duvidosos

3.000 Transfere para o Transfere para o 3.000


Resultado Balanço

* Para fins didáticos foram excluídos os centavos e o R$.


Fonte: Elaborada pelo autor.
Balanço Patrimonial 63

Verificamos que os valores referentes às Duplicatas a receber e à Receita de vendas perma-


necem inalterados. Esses valores, ao final do período contábil (em razão da elaboração do Balanço
Patrimonial e da Demonstração de Resultado) serão transferidos para essas duas demonstrações,
como se vê nas Tabelas 1 e 2. Inicialmente, vejamos a apresentação qualitativa e quantitativa nas
contas ativas.
Tabela 1 – Composição das contas de Direitos realizáveis líquidos

1. Ativo

1.1 Ativo Circulante

1.1.2 Direitos realizáveis líquidos R$ 97.000,00

1.1.2.1 Duplicatas a receber (conta 1) R$ 100.000,00

1.1.2.2 (-) Provisão para devedores duvidosos (conta 4) (R$ 3.000,00)

Fonte: Elaborada pelo autor.

Na sequência, verifiquemos a Demonstração do Resultado na Tabela 2.


Tabela 2 – Composição do resultado do período

Demonstração do Resultado

Receita de vendas (transferida da conta 2) R$ 100.000,00

(-) Despesas Provisão devedores duvidosos (transferida da conta 3) -R$ 3.000,00

(=) Resultado R$ 97.000,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Como se nota na Tabela 1, há um valor que reduz os Direitos a receber, pela expectativa de
perda. Na Tabela 2, podemos observar o impacto dessa perda no Resultado do período. Na sequên-
cia, constatamos que no grupo de Estoques também há uma conta redutora, que foi denominada
Provisão para ajuste de estoques. Essa conta registra as perdas decorrentes de avarias, estragos,
danos verificados e obsolescência dos itens constantes nos estoques, de modo que eles sejam regis-
trados pelo valor realizável líquido.
Suponhamos que determinada empresa, em decorrência de uma tempestade, tenha sofrido
avarias nos componentes dos estoques. A primeira medida é buscar na autoridade competente –
neste caso, no Corpo de Bombeiros – um laudo pericial que documente essa perda.
O problema é que há necessidade de se promover diversos atos que demandam tempo para
realização e a empresa não pode realizar de imediato a baixa dos itens afetados. Por isso, realiza-se
uma provisão para ajustes. Vejamos como será esse lançamento, supondo que o estoque apontado
pela contabilidade seja de R$ 50.000,00, e as perdas, de R$ 6.000,00.
Tecnicamente, os valores referentes às diminuições não podem ser lançados diretamente na
conta de Estoques, por isso são lançados em contas distintas, como se vê nos razonetes 2 e 3 da
Figura 3.
64 Fundamentos de contabilidade

Figura 3 – Provisão para ajuste dos estoques

1. Estoques 2. Despesas de provisão


para ajuste de estoques
50.000 Transfere para o
Balanço 6.000 Transfere para o
Resultado

3. Provisão para ajuste dos estoques

Transfere para o 6.000


Balanço

* Para fins didáticos foram excluídos os centavos e o R$.


Fonte: Elaborada pelo autor.

Verificamos que o valor referente aos estoques permanece inalterado. Esse valor e o da
Provisão para ajuste de estoques serão ao final do período contábil transferidos para o Balanço,
como se vê Tabela 3.
Tabela 3 – Composição das contas dos estoques líquidos

1. Ativo

1.1 Ativo Circulante

1.1.3 Estoques (líquido) R$ 44.000,00

1.1.3.1 Duplicatas a receber (conta 1) R$ 50.000,00

1.1.3.2 (-) Provisão para ajuste de estoques (conta 3) (R$ 6.000,00)


Fonte: Elaborada pelo autor.

O valor do estoque líquido é de R$ 44.000,00, e não de R$ 50.000,00, pois como se explicou,


R$ 6.000,00 representa as perdas. O valor da conta 2 será transferido para o resultado, por isso não
é objeto de análise neste momento.
Na sequência, vamos analisar as contas do Ativo não Circulante. Se no Ativo Circulante
são lançados os direitos realizáveis no curso do exercício social subsequente, os valores a rece-
ber depois do ano social subsequente serão classificados como Realizável a longo prazo por isso,
é possível afirmar que este grupo de contas é da mesma natureza do Ativo Circulante, excetuado o
prazo de realização.
Trata-se, portanto, de valores a serem recebidos em um longo prazo e, em decorrência da
corrosão da moeda, não valerão o que valem hoje. Por exemplo, um par de sapatos adquirido hoje
por R$ 200,00 custará um valor maior daqui a um ano, em razão da inflação. Supondo que o índice
de inflação tenha sido de 5% a.a., o par de sapatos custará R$ 210,00.
Balanço Patrimonial 65

Por isso, de acordo com a Lei n. 11.638/2007, “os elementos do ativo decorrentes de
operações de longo prazo serão ajustados a valor presente, sendo os demais ajustados quando
houver efeito relevante” (BRASIL, 2007). Complementando esse entendimento, o Pronunciamento
Técnico CPC 12 (CPC, 2008) determina que os recebíveis devem ser ajustados a valor presente com
base em taxas de retorno que reflitam as avaliações do mercado.
Vamos imaginar que uma empresa possua uma Duplicata a receber proveniente de vendas
a prazo para daqui a 367 dias, ou seja, para depois do ano seguinte. O valor da duplicata é de
R$ 90.000,00 e a taxa de retorno, denominada pela matemática financeira como taxa de desconto,
é de 10% ao ano. A questão que se apresenta é: quanto será esse valor depois de um ano, já que
a duplicata valerá 10% a menos? A resposta pode ser obtida trazendo esse valor a valor presente
líquido (VPL), que é calculado por meio da fórmula de juros compostos:

1
(1 + i)n

Aplicando a fórmula de VPL descrita, se a taxa de retorno ou de desconto é de 10% a.a.,

o fator que determinará o VPL será 1 , ou seja, 0,909. Isso significa que daqui a um ano a
(1,10)n
duplicata corresponderá somente a 90,9% de seu valor atual, representando uma perda de 10%.
Assim, ao multiplicar o fator 0,909 por R$ 90.000,00, concluímos que o valor do realizável
trazido a valor presente é de R$ 81.818,18. A diferença entre R$ 90.000,00 e R$ 81.818,18, ou seja,
R$ 9.818,82, será debitada da Receita bruta de vendas e creditada em Ajuste a valor presente, que
é uma conta redutora das Duplicatas a receber a longo prazo. Os lançamentos em razonete podem
ser vistos na figura a seguir.
Figura 4 – Lançamento dos ajustes nos recebíveis de longo prazo

1. Duplicatas a receber de longo prazo 2. Receita de vendas

R$ 90.000,00 Transfere para o R$ 9.818,82 R$ 90.000,00


Balanço

3. Ajuste a valor presente

Transfere para o R$ 9.818,82


Balanço

Fonte: Elaborada pelo autor.


66 Fundamentos de contabilidade

No Balanço Patrimonial, esses valores estarão evidenciados de acordo com a Tabela 4


a seguir:
Tabela 4 – Composição das contas de Direitos realizáveis líquidos de longo prazo

1. Ativo

1.2 Ativo não Circulante

1.2.1 Direitos realizáveis líquidos 81.818,18

1.2.1.1 Duplicatas a receber 90.000,00

1.2.1.2 (-) Ajuste a valor presente 9.818,82

Fonte: Elaborada pelo autor.

O ajuste a valor presente sugere que as demonstrações contábeis precisam apresentar o


maior valor preditivo do Ativo, de modo a contribuir para melhorar o grau de sua relevância.
O segundo conjunto de contas do Ativo não Circulante são os valores dos investimentos
contabilizados e que serão avaliados pelo valor justo ou pela equivalência patrimonial.
De acordo com o CPC 46 (2012), valor justo é: “o preço que seria recebido pela venda de um
ativo ou que seria pago pela transferência de um passivo em uma transação não forçada entre par-
ticipantes do mercado na data da mensuração”. Valor justo, em consequência, é o valor de mercado,
isto é, o valor que será obtido na venda do bem, na realização de um direito e, seguindo a mesma
fundamentação, o valor que será pago quando do vencimento de uma obrigação.
Já a avaliação pela equivalência patrimonial é realizada por meio do percentual referente
à participação da sociedade investidora na sociedade investida: suponha que o investimento da
empresa Alfa (investidora) corresponda a 20% do Capital Social da empresa Beta (investida) e
que o lucro desta tenha sido de R$ 100.000,00 em determinado ano. A empresa Alfa, em decor-
rência de sua participação societária na Cia. Beta, irá atualizar o valor de seus investimentos em
20%, ou seja, serão acrescidos R$ 20.000,00 no valor de seus investimentos.
Na sequência encontramos o Ativo Imobilizado e o Ativo Intangível, que, de acordo com o
art. 183, incs. V e VII da Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), são registrados pelo custo de aquisição.
Os elementos que fazem parte desses dois grupos de contas sujeitam-se à perda de valor em decor-
rência do desgaste ou da obsolescência.
O seu automóvel, por exemplo. Se você tentar vendê-lo após um ano de uso, não receberá
por ele o mesmo valor pelo qual foi adquirido, pois ele sofreu não só com o desgaste físico, mas
também sofreu a obsolescência, isto é, o surgimento de modelos mais modernos e o emprego de
novas tecnologias.
Isso significa que ocorreu uma perda de valor e, por isso, serão deduzidos do Imobilizado os
valores de depreciação, amortização e exaustão; já do Intangível será deduzido o saldo das contas
que registrem a sua amortização. São essas denominações que contabilmente acompanham as
perdas de valor. Vamos examinar a Figura 5 para melhor compreender esses conceitos:
Balanço Patrimonial 67

Figura 5 – Representação das perdas de valor dos ativos

Depreciação Bens físicos sujeitos a desgaste ou perda de utilidade


por uso, ação da natureza ou obsolescência.

Amortização Direitos da propriedade industrial ou comercial e


Perda de valor
quaisquer outros com duração limitada.

Exaustão Exploração de direitos cujos objetos


sejam recursos minerais ou florestais.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Note que os bens registrados no imobilizado são depreciados, os bens e direitos contabilizados
no intangível são amortizados e os bens de recursos naturais são exauridos.
A depreciação, a amortização e a exaustão devem ser entendidas como medidas de perda de
utilidade do bem de uso, representadas por quotas periódicas – mês, trimestre ou ano – computadas
como custo ou despesa de cada exercício.
Existem diversos métodos para efetuar os cálculos de depreciação e amortização. De acordo
com Iudícibus et al. (2018), o método mais utilizado é o de quotas uniformes, também chamado
de quotas constantes. Por meio desse método, a depreciação é calculada dividindo-se o valor do
Imobilizado ou do Intangível pelo tempo de vida útil do objeto em questão.
Imagine uma máquina adquirida e registrada por R$ 200.000,00 e que, de acordo com as
especificações técnicas definidas pelo fabricante, tenha uma vida útil de dez anos. Para se calcular
sua depreciação anual, basta dividir R$ 200.000,00 por 10 anos: o resultado é R$ 20.000,00 ao ano.
Para determinar a depreciação mensal, divide-se os R$ 20.000,00 por 12 meses. Assim, a de-
preciação mensal será de R$ 1.666,67. A depreciação diária é o valor resultante da divisão do valor
mensal por 30 dias. Se um produto demanda segundos para ser produzido, o cálculo deve ser feito
em cima da hora trabalhada: divide-se as horas em minutos e estes em segundos para chegar ao
custo da depreciação por segundo. O mesmo método é utilizado para a amortização do Intangível.
O último agrupamento refere-se aos registrados como recursos naturais. Uma floresta,
por exemplo, é comprada com a finalidade de extrair árvores que resultem em madeira; uma
jazida de calcário é utilizada para que a extração resulte em produção de cimento, entre outros
empreendimentos.
A exaustão é a denominação que acompanha a extração desse calcário ou o corte das árvores.
Para se determinar o valor da exaustão, toma-se o valor que foi pago pela reserva mineral ou florestal
e divide-se pela possança4 conhecida. Assim, será possível saber o valor de cada m3, m2, tonelada ou

4 Possança é a denominação que se dá ao volume de minério previsto em uma jazida ou à quantidade de árvores exis-
tentes em uma floresta
68 Fundamentos de contabilidade

outras unidades de medida. Cada vez que os recursos minerais ou florestais vão se exaurindo, regis-
tra-se na contabilidade o valor de cada unidade de medida.
Vamos imaginar que uma área florestal foi adquirida por R$ 1.000.000,00 e possuía 2.000
árvores. Cada árvore custa, em consequência, R$ 500,00 (R$ 1.000.000,00 / 2.000). Assim, cada
árvore abatida gera um lançamento contábil referente à exaustão no valor de R$ 500,00.
Tendo conhecido as características dos Ativos, agora vamos conhecer as origens ou financia-
mentos de recursos que representam as obrigações registradas no Passivo.

4.3 Passivo: obrigações da empresa com terceiros


Vídeo
Vimos anteriormente que todas as aplicações de recursos alocadas no Ativo ne-
cessitam obrigatoriamente de um financiamento, que pode ser provido por capital pró-
prio ou de terceiros. O capital próprio é o provimento inicial, realizado pelos sócios ou
acionistas, acrescido dos lucros obtidos nos diversos períodos e o capital de terceiros é o
que denominamos de Passivo, que representa as exigibilidades da empresa.
De acordo com o CPC 00, o Passivo “é uma obrigação presente da entidade, derivada de
eventos passados, cuja liquidação se espera que resulte na saída de recursos da entidade capazes de
gerar benefícios econômicos” (CPC, 2011).
Dessa definição, infere-se que a característica fundamental de um Passivo é que, com ele,
a empresa passa a ter uma obrigação presente. Uma obrigação é uma exigibilidade assumida em
decorrência de contratos e de práticas usuais de negócios, ou, conforme a opinião de Hendriksen
e Van Breda (1999, p. 410), consiste em “sacrifícios futuros prováveis de benefícios econômicos
resultantes de obrigações presentes de uma entidade”. Essas obrigações podem ser assumidas em
decorrência de o fornecedor ter concedido um prazo para pagamento de uma compra realizada ou
de um empréstimo tomado junto a uma instituição financeira.
O financiador concede um prazo, que pode ser curto ou longo, para liquidação das obri-
gações, fator que definirá sua classificação. De acordo com o art. 178 da Lei n. 6.404/1976,
“no passivo, as contas serão classificadas nos seguintes grupos: (I) passivo circulante; (II) passivo
não circulante” (BRASIL, 1976).
De acordo com o art. 180 da Lei n. 6.404/1976, “as obrigações da companhia, inclusive
financiamentos para a aquisição de direitos do ativo não circulante, serão classificadas no passivo
circulante, quando se vencerem no exercício seguinte, e no passivo não circulante, se tiverem
vencimento em prazo maior”.
Nesse sentido, o CPC 26 (R1) determina que:
O passivo deve ser classificado como circulante quando satisfizer qualquer dos
seguintes critérios:
a) espera-se que seja liquidado durante o ciclo operacional normal da entidade;
b) está mantido essencialmente para a finalidade de ser negociado;
c) deve ser liquidado no período de até doze meses após a data do balanço; ou
d) a entidade não tem direito incondicional de diferir a liquidação do passivo
durante pelo menos doze meses após a data do balanço. (CPC, 2011)
Balanço Patrimonial 69

O CPC 26 (R1) ainda anuncia que as obrigações decorrentes do financiamento do capital de


giro – entendidas como os gastos incorridos no ciclo operacional (como as provisões para riscos
fiscais, trabalhistas e cíveis) – serão classificadas como Passivo Circulante, embora estejam progra-
madas para liquidação em mais de 12 meses.
Um exemplo para essa hipótese é o caso de um fornecedor de matéria-prima que estipula que
o valor da compra seja pago em dezoito meses. Inicialmente, concluiríamos que o valor referente a
12 meses seria lançado no Passivo Circulante e o dos seis meses (para totalizar os 18 meses) seriam
contabilizados no Passivo não Circulante. Entretanto, a matéria-prima é um gasto pertencente
ao ciclo operacional, por isso, o valor da exigibilidade, mesmo considerando o prazo de dezoito
meses, é registrado no Passivo Circulante.
Outras obrigações não vinculadas ao ciclo operacional, porém com vencimento em até 12
meses (como os saldos bancários a descoberto5 e demais obrigações decorrentes de empréstimos),
também são classificadas como Passivo Circulante.
Por outro lado, os passivos financeiros que proporcionam financiamento a longo prazo e,
por isso, não fazem parte do capital circulante usado no ciclo operacional normal da entidade –
cuja exigibilidade se dê após o período de 12 meses após a data do Balanço –, são classificados
como Passivo não Circulante, a exemplo do financiamento de Ativos Imobilizados.
O Passivo é uma conta de 1º grau e é subdividido em Passivo Circulante e Passivo não
Circulante, que são contas de 2º grau. As contas do Passivo Circulante (de 3º e 4º graus) envolvem
transações mais conhecidas como transações de funcionamento, como as apresentadas no quadro
a seguir.
Quadro 3 – Contas de 3º e 4º graus do Passivo Circulante

2. Passivo
2.1 Passivo Circulante
2.1.1 Fornecedores (duplicatas a pagar)
2.1.2 Encargos trabalhistas
2.1.2.1 Salários a pagar
2.1.2.2 Provisão para férias
2.1.2.3 Provisão para terço de férias
2.1.2.4 FGTS a recolher
2.1.2.5 Participação nos resultados a pagar
2.1.2.6 Provisão para demandas trabalhistas
2.1.3 Tributos e contribuições a pagar
2.1.3.1 INSS a recolher
2.1.3.2 Outros encargos sobre a folha a pagar
(Continua)

5 Os saldos bancários a descoberto ocorrem quando a empresa emite um cheque especial ou possui uma conta cor-
rente garantida, que é uma modalidade em que o banco liquida o cheque mesmo que ele não tenha fundos, pois existem
garantias contratuais.
70 Fundamentos de contabilidade

2.1.3.3 Imposto de Renda a recolher


2.1.3.4 Contribuição Social sobre o Lucro Líquido a recolher
2.1.3.5 ICMS a recolher
2.1.3.6 PIS a recolher
2.1.3.7 COFINS a recolher
2.1.3.8 REFIS a pagar
2.1.4 Instituições financeiras nacionais
2.1.4.1 Empréstimos
2.1.4.2 Saldos bancários a descoberto
2.1.5 Instituições financeiras internacionais
2.1.6 Outras obrigações
2.1.6.1 Dividendos a pagar
Fonte: Elaborado pelo autor.

É importante destacar que em condições normais, as obrigações do Passivo Circulante são


assumidas para financiamento dos bens e direitos do Ativo Circulante.
Não é normal, tampouco conveniente, que se assuma uma obrigação que vence em curto
prazo para financiar investimentos de longo prazo. O ideal, em termos de gestão, é raciocinar de
acordo com o apresentado na Figura 6.
Figura 6 – Representação gráfica do capital de giro ideal

Ativo Circulante Passivo Circulante


Duplicatas a receber Fornecedores
Estoques Salários a pagar
Tributos a pagar

Fonte: Elaborada pelo autor.

A Figura 6 representa uma situação ideal de capital de giro, isto é, uma situação na qual todo
o Passivo Circulante financia os valores investidos em Duplicatas a receber e em Estoques, pois os
valores aplicados nessas contas serão convertidos em dinheiro em um pequeno intervalo de tempo.
Não é adequado que uma obrigação de curto prazo (Passivo Circulante) financie uma aplicação em
Imobilizado (Ativo não Circulante), pois este não será vendido pela empresa.
Em finanças, adota-se também um modelo que desmembra tanto as contas do Ativo Circulante
quanto as do Passivo Circulante em dois grupos. Esse modelo, proposto por Fleuriet (1978), leva em
consideração a sua ligação com a atividade operacional da empresa. Em consequência disso, as contas
cíclicas e não cíclicas são divididas em grupos, de modo a poder calcular adequadamente a necessi-
dade de capital de giro.
As contas não cíclicas, embora classificadas no Ativo Circulante, não estão estritamente
relacionadas ao ciclo operacional. No Ativo, podemos citar a conta Caixa, pois nela são registradas
algumas entradas não provenientes do ciclo operacional, por exemplo, a entrada de recursos
Balanço Patrimonial 71

provenientes de empréstimos bancários e a saída de valores para liquidar os empréstimos tomados.


No Passivo, contas de Empréstimos podem ter sido criadas para financiamento de Imobilizado e,
em decorrência disso, denominam-se contas não cíclicas.
Cíclicas, portanto, são as contas pertinentes tão somente ao ciclo operacional. No Ativo, são
as Duplicatas a receber e os Estoques; no Passivo, são os Fornecedores e as Obrigações a pagar.
São contas geradas principalmente pela adoção do regime de competência. Por esse regime, os
efeitos das transações são reconhecidos nos períodos a que se referem, independentemente do
recebimento ou pagamento.
A receita é apropriada quando o fato gerador se efetiva independentemente da concretização
da operação financeira. O fato gerador da Receita de vendas, por exemplo, é a venda, e registra-se
seu valor independentemente de ela ter sido recebida ou não. O mesmo raciocínio é aplicado pela
incidência de tributos sobre vendas: o fato gerador ocorre no momento da venda, porém o paga-
mento ocorrerá em data futura.
A despesa é incorrida quando a empresa consome bens e serviços para geração de receitas.
Por exemplo, o salário tem como fato gerador o trabalho realizado, portanto, registra-se seu valor
mesmo que este seja pago apenas no mês seguinte.
Vejamos um exemplo referente a vendas. Sobre o valor de R$ 250.000,00 de uma venda reali-
zada a prazo, incidem diversos tributos. No Brasil, as alíquotas dos tributos denominados indiretos
(ICMS, PIS, COFINS) são seletivas, ou seja, são fixadas pelas autoridades fazendárias e dependem
de fatores como região, produto, destino, origem, entre outros. Para exemplificar, vamos escolher
o ICMS dentre os diversos tributos possíveis e fixar uma alíquota hipotética de 12%: o lançamento
do valor das vendas será realizado na conta de Receita de vendas e esse valor será transferido para
a Demonstração do Resultado. A contrapartida (porque a venda foi realizada a prazo) será na conta
de Duplicatas a Receber, uma conta do Ativo.
O ICMS incidente sobre as vendas reduz o valor da venda, pois oportunamente deverá ser
pago ao erário. Como a autoridade fazendária concede prazo para pagamento pela adoção do
regime de competência, constitui-se uma obrigação de ICMS a pagar. Veja esses lançamentos na
Figura 7:
Figura 7 – Lançamentos nas contas de ICMS sobre vendas e ICMS a pagar

1. Duplicatas a receber 2. Receita de vendas

250.000 Transfere para o Transfere para 250.000


Ativo Circulante a DRE

3. ICMS sobre vendas 4. ICMS a pagar

30.000 Transfere para Transfere para o 30.000


a DRE Passivo Circulante

* Para fins didáticos foram excluídos os centavos e o R$.


Fonte: Elaborada pelo autor.
72 Fundamentos de contabilidade

No preço cobrado por uma entidade pela venda de um produto, está inserido o ICMS.
O valor desse imposto deverá ser pago ao Estado oportunamente, assim, é um recurso que perma-
nece temporariamente na empresa, devendo ser excluído da Receita de vendas. Como é necessário
identificar seu valor, ele é lançado em uma conta à parte, no caso, na conta 3 (ICMS sobre vendas).
Dessa maneira, a Receita Líquida de Vendas será de R$ 220.000,00 (R$ 250.000,00 – R$ 30.000,00).
Como a empresa deverá pagar ao Estado o valor do ICMS, a contrapartida da conta de ICMS
sobre vendas será na conta de ICMS a pagar, que constará no Passivo Circulante, na conta ICMS a
recolher ou a pagar.
Outro exemplo refere-se ao pagamento de salários. Como a empresa, em decorrência do
permissivo da legislação trabalhista, poderá pagar o salário no mês seguinte ao do fato gerador6,
o apontamento da despesa de salário ocorrerá no mês em que ele se realizou e, como não foi
pago, constitui-se uma obrigação de Salários a pagar. Supondo que o valor do salário seja de
R$ 30.000,00, a despesa será lançada em Despesas de salários e a contrapartida em Salários a pagar,
como pode ser visualizado na Figura 8.
Figura 8 – Lançamento nas contas de Despesas de salários a Salários a pagar

1. Despesas de salários 2. Salários a pagar

30.000 Transfere para Transfere para o 30.000


a DRE Passivo Circulante

* Para fins didáticos foram excluídos os centavos e o R$.


Fonte: Elaborada pelo autor.

A conta 1 reflete a conta de Despesas de salários, que deve ser lançada no mês da ocorrência
do fato, ou seja, no mês em que se realizou o trabalho. Como ele não foi pago no mês (pois será pago
no mês seguinte), a empresa assume uma obrigação que é registrada na conta 2, em seu encerra-
mento, que constará no Passivo Circulante, na conta Salários a pagar.
As contas do Passivo não Circulante, também de 3º grau, envolvem transações referentes a
obrigações exigíveis em longo prazo e têm características de financiamento.
Enquanto no Ativo as contas de Realizável a longo prazo são classificadas como um subgrupo
do Ativo não Circulante, do qual fazem parte os grupos de Investimentos, Imobilizado e Intangível.
No Passivo, as contas com vencimento de longo prazo são classificadas em um grupo de contas
separado, denominado Passivo não Circulante.
Do mesmo modo, cada um desses grupos de contas possui outras contas classificadas em
3º e 4º graus, como demonstrado no quadro a seguir:

6 O mês do fato gerador dos salários é o mês em que o trabalho se realizou. Assim, os salários de janeiro referem-se
ao trabalho realizado pelos funcionários no mês de janeiro e são despesas do mês de janeiro.
Balanço Patrimonial 73

Quadro 4 – Contas de 3º e 4º graus do Passivo não Circulante

2. Passivo
2.2 Passivo não Circulante
2.1.1 Fornecedores (duplicatas a pagar)
2.1.2 Provisão para demandas trabalhistas
2.1.3 Tributos e contribuições a pagar
2.1.3.1 Imposto de Renda a recolher
2.1.3.2 Contribuição Social sobre o Lucro Líquido a recolher
2.1.3.3 ICMS a recolher
2.1.4 Instituições financeiras nacionais
2.1.4.1 Empréstimos
2.1.4.2 Saldos bancários a descoberto
2.1.5 Instituições financeiras internacionais
2.1.6 Outras obrigações
Fonte: Elaborado pelo autor.

Da mesma maneira que vimos no Ativo, de acordo com Lei n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007),
os elementos integrantes do Passivo não Circulante decorrem de operações de longo prazo (supe-
rior a um ano).
Para a avaliação das exigibilidades de longo prazo, utiliza-se o mesmo critério utilizado
para avaliar o Realizável a longo prazo do Ativo, ou seja, são ajustadas a valor presente líquido
(VPL). Se as obrigações forem em moeda estrangeira, é exigida a conversão para a moeda nacional,
consoante o disposto no art. 184 da Lei n. 6.404/1976:
no balanço, os elementos do passivo serão avaliados de acordo com os seguintes
critérios:
I – as obrigações, encargos e riscos, conhecidos ou calculáveis, inclusive Imposto
sobre a Renda a pagar com base no resultado do exercício, serão computados
pelo valor atualizado até a data do balanço;
II – as obrigações em moeda estrangeira, com cláusula de paridade cam-
bial, serão convertidas em moeda nacional à taxa de câmbio em vigor na
data do balanço.
III – as obrigações, os encargos e os riscos classificados no passivo não circulante
serão ajustados ao seu valor presente, sendo os demais ajustados quando houver
efeito relevante. (BRASIL, 1976)

Cabem ainda considerações sobre as provisões que, de acordo com Iudícibus et al. (2018),
para serem constituídas precisam atender aos seguintes itens:
• existência de obrigação legal presente como consequência de um evento passado;
• probabilidade de que os recursos sejam exigidos para liquidar a obrigação;
• possibilidade de o valor da obrigação ser estimado com segurança suficiente.
74 Fundamentos de contabilidade

Vamos supor que a Receita Federal tenha lavrado um auto de infração contra uma empresa.
Analisado esse fato, a assessoria jurídica entende que existe a possibilidade de ele ser anulado,
porém, para isso há necessidade de a empesa impetrar recursos.
Entretanto, o debate jurídico pode não ser bem-sucedido e, após dois anos ou mais, o auto
de infração pode ser julgado procedente, obrigando a entidade a efetuar o pagamento. Assim, esse
será um evento passado, com probabilidade liquidação e o valor está expresso com suficiente segu-
rança, por isso ele é considerado uma provisão.
O último grupo de contas que será objeto de nossa análise neste capítulo é o Patrimônio
Líquido, que veremos a seguir.

4.4 Patrimônio Líquido: capital investido pelos sócios e retenção


de lucros
Vídeo Como visto, as origens de recursos necessários à operação da empresa vêm de
duas fontes:
• Passivo: que representa o capital de terceiros;
• Patrimônio Líquido: o capital próprio.

De acordo com Marion (2015, p. 48), “a verdadeira riqueza de uma empresa são os bens e direitos
(Ativo) menos as obrigações (Passivo) da empresa para com terceiros”. Essa definição justifica a equação
básica do Patrimônio Líquido, utilizada para identificar a riqueza de uma pessoa física ou jurídica:

PL = A – P

Além da doutrina exposta por Marion (2015), no mesmo sentido, para o CPC 00, o
Patrimônio Líquido “é o interesse residual nos ativos da entidade depois de deduzidos todos os
seus passivos” (CPC, 2011).
É fácil entender o conceito de riqueza líquida (conhecido como Patrimônio Líquido) ao rela-
cionarmos uma empresa com uma pessoa física. Imagine que uma pessoa possua R$ 1.200,00 em sua
conta no banco e tenha direito a receber de R$ 5.000,00 ao final do mês. Essa pessoa também possui
um automóvel inteiramente pago no valor de R$ 25.000,00 e um apartamento de R$ 180.000,00,
comprado junto ao Sistema Financeiro de Habitação (SFH), devendo ainda 80 prestações de
R$ 1.000,00. Seu patrimônio pode ser demonstrado da seguinte maneira:
Tabela 5 – Patrimônio de uma pessoa física

Ativo Passivo
Depósito no banco R$ 1.200,00 Dívidas com o SFH R$ 80.000,00
Direito ao salário R$ 5.000,00
Automóvel R$ 25.000,00 Patrimônio Líquido (A – P) R$ 131.200,00
Apartamento R$ 180.000,00

Ativo total (bens e direitos) R$ 211,200,00 Passivo + PL R$ 211.200,00


Fonte: Elaborada pelo autor.
Balanço Patrimonial 75

De acordo com o art. 178 da Lei n. 6.404/1976, no Passivo as contas também podem ser
classificadas no seguinte grupo: “III – patrimônio líquido, dividido em capital social, reservas de capital,
ajustes de avaliação patrimonial, reservas de lucros, ações em tesouraria e prejuízos acumulados”
(BRASIL, 1976). Note que a Lei considera o Patrimônio Líquido como Passivo, representando como
obrigações da empresa os valores pertencentes aos sócios ou acionistas.
O Passivo é uma conta de 1º grau. Como se viu no texto transcrito da Lei n. 6.404/1976
(BRASIL, 1976), ele é subdivido em Passivo Circulante, Passivo não Circulante e Patrimônio
Líquido, que são contas de 2º grau. Com relação ao Patrimônio Líquido, vamos apresentar cada
um dos grupos de contas que são classificadas como de 3º e 4º graus no Quadro 5 a seguir.
Quadro 5 – Contas de 3º e 4º graus do Patrimônio Líquido

2. Passivo
2.3 Patrimônio Líquido
2.3.1 Capital Social
2.3.1.1 Capital subscrito
2.3.1.2 Capital a integralizar
2.3.2 Reservas de capital
2.3.3 Ajustes de avaliação patrimonial
2.3.4 Reservas de lucros
2.3.5 (-) Ações em tesouraria
2.3.6 (-) Prejuízos acumulados

Fonte: Elaborado pelo autor.

A conta Capital Social representa os investimentos realizados pelos proprietários, ou seja,


pelos acionistas em uma sociedade anônima ou pelos sócios em uma companhia de responsabili-
dade limitada. Essa conta deve discriminar o valor do capital subscrito e do capital a integralizar.
Para Iudícibus et al. (2018), o Capital Social, na verdade, é mais uma figura jurídica, já que do pon-
to de vista econômico, os valores dos lucros de cada período também representam investimentos
dos acionistas.
A subscrição é a assinatura de um documento pelo qual os sócios (em companhias por
quotas) e acionistas (em sociedades por ações) se comprometem a contribuir com determinada
quantia para uma empresa. À medida que as pessoas vão entregando os valores à firma, elas estão
realizando o capital e o saldo que resta após cada aporte, denominado Capital a integralizar.
Conheça o Patrimônio Líquido da Porto Maravilha7 referente aos anos de 2016 (primeira
coluna com dados quantitativos) e 2015 (segunda coluna com dados quantitativos).

7 Porto Maravilha é a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro S.A.
76 Fundamentos de contabilidade

Figura 9 – Demonstração do Patrimônio Líquido da empresa Porto Maravilha

Patrimônio Líquido Nota 14

Capital Social 5.053.490 4.785.383

Capital a integralizar (177.375) (117.477)

Prejuízos acumulados (4.660.789) (4.173.052)

Total do Patrimônio Líquido 215.326 494.854

TOTAL DO PASSIVO E PATRIMÔNIO LÍQUIDO 5.147.978 5.550.232

Fonte: Porto Maravilha, 2017.

Como se vê, os acionistas não realizaram totalmente o capital subscrito e têm “uma dívida”
para com a sociedade no sentido de que falta integralizar o valor registrado nesse título (no exem-
plo, R$ 117.477,00) no ano de 2015.
Após o grupo de contas referentes ao Capital Social, aparece o grupo das Reservas de Capital.
As contas que compõem esse grupo não provêm do resultado do período, por isso, não transitam
pela Demonstração do Resultado. São aportes de recursos vinculados ao capital, porém não podem
ser computados de imediato como capital. A justificativa é que o Capital Social possui um valor
nominal declarado nos estatutos e esse valor só pode ser alterado por meio de decisão societária
tomada em Assembleia Geral Extraordinária (AGE).
Um bom exemplo desse grupo de contas é o ágio ou deságio na venda das ações. Quando uma
empresa emite novas ações e as coloca à venda, pode acontecer de o investidor comprá-las por
maior valor que o valor nominal (valor de face) da ação ao considerar que será um bom investi-
mento e que poderá vendê-la com lucro.
O valor que exceder o valor nominal da ação deverá ser contabilizado como ágio na emissão
de ações. Esse valor fica nessa conta até que ocorra a Assembleia Geral Extraordinária, que aprova
sua transformação em capital. Por outro lado, se o investidor pagar um valor menor do que o valor
nominal da ação, verifica-se um deságio na emissão das ações. O ágio e o deságio constituem reser-
vas de capital, o primeiro aumentando e o segundo diminuindo o Patrimônio Líquido.
Os valores de Ativo e de Passivo sofrem variações em decorrência de sua avaliação a preço
de mercado (valor justo). As contrapartidas dos ajustes das contas ativas e passivas, enquanto não
computadas no Resultado do exercício, constituirão a conta de Ajuste de Variação Patrimonial.
As contas de Reservas de lucros, diferentemente das contas de Capital, provêm do resultado
do exercício. Destacam-se as discriminadas na Lei n. 6.404/1976.
Do lucro líquido do exercício, 5% (cinco por cento) serão aplicados, antes de
qualquer outra destinação, na constituição da reserva legal, que não excederá
de 20% (vinte por cento) do capital social. [...] O estatuto poderá criar reservas
desde que, para cada uma: I - indique, de modo preciso e completo, a sua fina-
lidade; II - fixe os critérios para determinar a parcela anual dos lucros líquidos
que serão destinados à sua constituição; e III - estabeleça o limite máximo da
reserva. [...] A assembleia-geral poderá, por proposta dos órgãos da adminis-
tração, destinar parte do lucro líquido à formação de reserva com a finalidade
Balanço Patrimonial 77

de compensar, em exercício futuro, a diminuição do lucro decorrente de perda


julgada provável, cujo valor possa ser estimado. [...] A assembleia-geral poderá,
por proposta dos órgãos de administração, destinar para a reserva de incentivos
fiscais a parcela do lucro líquido decorrente de doações ou subvenções gover-
namentais para investimentos, que poderá ser excluída da base de cálculo do
dividendo obrigatório (inciso I do caput do art. 202 desta Lei) [...] No exercício
em que o montante do dividendo obrigatório, calculado nos termos do estatuto
ou do art. 202, ultrapassar a parcela realizada do lucro líquido do exercício,
a assembleia-geral poderá, por proposta dos órgãos de administração, destinar
o excesso à constituição de reserva de lucros a realizar. (BRASIL, 1976)

De acordo com Azevedo (2016), diversas empresas deixaram de ter ações negociadas na bol-
sa de valores em 2017. O fechamento de capital ocorre principalmente quando o valor de mercado
das companhias começa a cair drasticamente por razões diversas ou quando seu produto sofre
restrições no mercado. Um bom exemplo de perda de valor seria o das indústrias tabagistas em
virtude das campanhas publicitárias voltadas aos prejuízos causados pelo tabaco.
No mesmo sentido, as indústrias que utilizam a fibra de amianto para fabricar caixas e
condutores de água tiveram quedas bruscas e irrecuperáveis no valor de suas ações, motivadas
pelos prejuízos que o amianto causa à saúde (como o câncer), por isso fecham o capital. Quando as
entidades resolvem fazer isso, elas devem adquirir suas próprias ações e registrá-las como redução
de Patrimônio Líquido, sob o título Ações em tesouraria. Neste grupo também se incluem as ações
que ainda não foram vendidas.
Explicitada a estrutura do Patrimônio Líquido a ser observada por todas as empresas brasi-
leiras, vamos visualizar qualitativamente e quantitativamente o Patrimônio Líquido apresentado
pela Gerdau S.A. Nas colunas 1 e 2 são apresentados os dados da controladora em 31 de dezembro
de 2017 e de 2016; já nas colunas 3 e 4 são apresentados dados consolidados de 31 de dezembro de
2017 e de 2016.
Figura 10 – Demonstração do Patrimônio Líquido da empresa GERDAU.

Patrimônio Líquido 22
Capital Social 19.249.181 19.249.181 19.249.181 19.249.181
Ações em tesouraria (76.085) (98.746) (76.085) (98.746)
Reserva de Capital 11.597 11.597 11.597 11.597

Reserva de Lucros 3.315.374 3.763.207 3.315.374 3.763.207

Ajustes de Avaliação Patrimonial 1.145.134 1.102.897 1.145.134 1.102.897


ATRIBUÍDO A PARTICIPAÇÃO DOS
ACIONISTAS CONTROLADORES 23.645.201 24.028.136 23.645.201 24.028.136

PARTICIPAÇÕES DOS ACIONIS-


TAS NÃO-CONTROLADORES – – 248.740 246.517

PATRIMÔNIO LÍQUIDO 23.645.201 24.028.136 23.893.941 24.274.653

TOTAL DO PASSIVO E DO
PATRIMÔNIO LÍQUIDO 32.423.852 32.888.695 50.301.761 54.635.141

Fonte: Gerdau, 2018.


78 Fundamentos de contabilidade

Analisando o grupo de contas apresentado, verifica-se que excetuada a conta de Prejuízos


acumulados, o Patrimônio Líquido da empresa citada ratifica toda a explicitação que se fez acerca
da riqueza das entidades brasileiras. O Patrimônio Líquido representa a participação dos acionis-
tas nas empresas, sendo para eles o grupo mais interessante. Por outro lado, é também o grupo de
interesse dos rentistas, isto é, aqueles que aplicam seus recursos no mercado acionário e decidirão
adquirir ações de empresas que possuam um Patrimônio Líquido sólido e robusto.
Com o objetivo de oferecer um resumo dos grupos de contas e uma breve explicação de cada
um deles, veja o quadro a seguir.
Quadro 6 – Itens do Balanço Patrimonial

Ativo Passivo e Patrimônio Líquido


Circulante: contas que estão constantemente em giro, em Circulante: obrigações que serão liquidadas no próximo
circulação, em movimento e cuja conversão em dinheiro será, exercício social, ou seja, 365 dias após o levantamento do
no máximo, no próximo exercício social. Balanço Patrimonial.

Não Circulante: aplicações de recursos em bens e direitos Não Circulante: obrigações exigíveis em longo prazo, que
que se realizarão em longo prazo ou serão mantidos para uso serão liquidadas com prazo superior a um ano.
das empresas.
Patrimônio Líquido: recursos dos proprietários aplicados
Realizável em longo prazo: aplicações de recursos em bens e na entidade, compreendendo os seguintes itens:
direitos que se realizarão em longo prazo ou serão mantidos
para uso das empresas. • Capital: participação inicial dos sócios ou acionistas.

Investimentos: inversões financeiras de caráter permanente • Reservas de Capital: compreende o ágio, as doações
(como ações de outras companhias) que geram rendimentos e as subvenções para investimentos.
e não são necessários à atividade operacional da companhia.
• Reservas de lucros: contas constituídas pela apro-
Imobilizado: itens de natureza permanente, denominados
priação de lucros da companhia.
de bens de uso, que serão utilizados para a manutenção das
atividades da companhia. • Prejuízos acumulados: saldo remanescente da DRE
Intangível: gastos referentes a bens e direitos incorpóreos, quando da ocorrência de prejuízos.
que beneficiarão resultados de exercícios futuros.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Conhecendo o conteúdo de cada uma das contas, veja na Tabela 6 um modelo de Balanço
Patrimonial.
Tabela 6 – Modelo de Balanço Patrimonial

Balanço Patrimonial em 31/12/20XX

Ativo Circulante 40.000 Passivo Circulante 30.000


Caixa 2.000 Fornecedores 20.000
Duplicatas a receber 23.000 Salários a pagar 7.000
Estoques 15.000 Impostos a pagar 3.000

Ativo não Circulante 72.000 Passivo não Circulante 12.000

Imóveis 55.000 Patrimônio Líquido 70.000


Máquinas e equipamentos 10.000 Capital 65.000
Móveis e utensílios 7.000 Reservas de Lucros 5.000

Ativo total 112.000 Passivo + PL totais 112.000


* Para fins didáticos foram excluídos o R$ e os centavos.
Fonte: Elaborada pelo autor.
Balanço Patrimonial 79

O quadro apresentado é uma síntese de todos os grupos de contas que compõem o Balanço
Patrimonial de uma empresa. A Tabela 6 exemplifica como essa demonstração poderia ser elabo-
rada. Todas as contas e a ordem em que foram apresentadas correspondem às determinações das
leis societárias citadas e a descrição das contas e de cada grupo de contas sintetiza todo o conteúdo
contextualizado neste capítulo.

Considerações finais
Constata-se que o Balanço Patrimonial, por apresentar a situação financeira da empresa em
determinado período, é uma demonstração estática em que se evidencia o Patrimônio Líquido de
uma entidade, que é a diferença entre o Ativo e o Passivo.
Sob a ótica financeira, o Balanço é a principal demonstração contábil e ganha maior evidência
a partir da convergência das normas nacionais para as normas internacionais de contabilidade e
auditoria, em virtude dessas normas exigirem que sejam obedecidas as características de relevância,
materialidade e revelação fidedigna. O Balanço Patrimonial é a demonstração que deve atender aos
princípios básicos da governança corporativa da transparência e da prestação de contas.

Ampliando seus conhecimentos


• Existem diversos métodos para se calcular a depreciação dos bens tangíveis. Este artigo
poderá auxiliar no conhecimento dos diferentes métodos de cálculos de depreciação:
FREITAS, L. C.; SILVA, M. L.; MACHADO, C. C. Influência do cálculo de depreciação
no imposto de renda e no fluxo de caixa de uma atividade de transporte florestal. Revista
Árvore, v. 10, n. 2, p. 257-264, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rarv/v31n2/
a08v31n2.pdf. Acesso em: 03 jan. 2019.
• A obra a seguir é uma grande referência da área contábil. Leia o capítulo 19 deste manual
para conhecer a diferença entre provisões, Passivos contingentes e Ativos contingentes.
IUDÍCIBUS, S. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de
acordo com as normas internacionais e do CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

Atividades
1. No Balanço Patrimonial das empresas, verifica-se que, em ordem de classificação, primeiro
são colocadas as contas de Duplicatas a receber e depois as contas de Estoques. Essa dispo-
sição está correta? Por quê?

2. No grupo do Patrimônio Líquido existe uma conta denominada Reservas de capital. Explique
por que o ágio na emissão de ações deve ser contabilizado nesse grupo e não diretamente na
conta capital.
80 Fundamentos de contabilidade

3. As contas cujas exigibilidades vencem depois do exercício seguinte devem ser registradas
no Passivo não Circulante. Cite e explique por que algumas delas, mesmo vencendo a longo
prazo, são classificadas no Passivo Circulante.

Referências
BC – Banco Central do Brasil. Circular n. 179, de 10 de maio de 1972. Diário Oficial da União, Brasília,
DF, 11 maio 1972. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/downloadNormativo.asp?
arquivo=/Lists/Normativos/Attachments/40314/Circ_0179_v2_L.pdf. Acesso em: 2 jan. 2019.

BRASIL. Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF,
17 dez. 1976. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm. Acesso em: 3 jan. 2019.

BRASIL. Comissão de Valores Mobiliários. Deliberação n. 29, de 05 de fevereiro de 1986. Diário Oficial
da União, Brasília, DF, 13 fev. 1986. Disponível em: http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/legislacao/
deliberacoes/anexos/0001/deli029.pdf. Acesso em: 2 jan. 2019.

BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Resolução n. 750, de 29 de dezembro de 1993. Diário Oficial
da União, Brasília, DF, 31 dez. 1993. Disponível em: http://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/RES_750.pdf.
Acesso em: 2 jan. 2019.

BRASIL. Lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 28
dez. 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm. Acesso
em: 3 jan. 2019.

BRASIL. Lei n. 11.941, de 27 de maio de 2009. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília DF, 28
maio 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11941.htm.
Acesso em: 3 jan. 2019.

BRASIL. Lei complementar n. 155, de 27 de outubro de 2016. Diário Oficial da União, Poder Legislativo,
Brasília, DF, 28 out. 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCP/Lcp155.htm.
Acesso em: 10 jan. 2019.

BRASIL. Decreto n. 9.580, de 22 de novembro de 2018. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília,
DF, 23 nov. 2018. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9580.
htm. Acesso em: 10 jan. 2019.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 12: ajuste a valor presente. Brasília, DF, 2008. Disponível
em: http://static.cpc.aatb.com.br/Documentos/219_CPC_12.pdf. Acesso em: 2 jan. 2019.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 00 (R1): estrutura conceitual para elaboração e
divulgação de relatório contábil-financeiro. Brasília, DF, 2011. Disponível em: http://static.cpc.aatb.com.br/
Documentos/147_CPC00_R1.pdf. Acesso em: 3 jan. 2019.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 26 (R1): apresentação das Demonstrações Contábeis.
Brasília, DF, 2011. Disponível em: http://static.cpc.aatb.com.br/Documentos/312_CPC_26_R1_rev%2013.
pdf. Acesso em: 3 jan. 2019.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 46: mensuração do valor justo. Brasília, DF, 2012.
Disponível em: http://static.cpc.aatb.com.br/Documentos/395_CPC_46_rev%2012.pdf. Acesso em: 3 jan. 2019.

FLEURIET, M. A dinâmica financeira das empresas brasileiras: um novo método de análise, orçamento e
planejamento financeiro. Belo Horizonte: FDC, 1978.
Balanço Patrimonial 81

GERDAU. Demonstrações financeiras individuais da controladora e consolidadas em 31 de dezembro de 2017.


2018. Disponível em: http://gerdau.infoinvest.com.br/ptb/8185/2359%2080625_GERDAU_Dfs2017_Valor.
pdf. Acesso em: 3 jan. 2019.

HENDRIKSEN, E. S.; VAN BREDA, M. F. Teoria da contabilidade. São Paulo: Atlas, 1999.

IUDÍCIBUS, S. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de acordo com as
normas internacionais e do CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

MARION, José Carlos. Contabilidade empresarial. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

PORTO MARAVILHA – Companhia de Desenvolvimento Urbano da região do porto do Rio de Janeiro


S.A. Relatório final n. 19/16 sobre as demonstrações contábeis encerradas em 31 de dezembro de 2016. 2017.
Disponível em: https://portomaravilha.com.br/uploads/8b4f1add6e1e09d7735c3f38fcb9be97.pdf. Acesso
em: 28 dez. 2018.
5
Demonstrações financeiras

Como vimos no capítulo anterior, cabe ao Balanço Patrimonial uma demonstração estática,
isto é, cabe a ele evidenciar o estágio patrimonial da empresa, seus bens, direitos e obrigações.
O Patrimônio Líquido – parte do Balanço Patrimonial – pode sofrer modificações por
aumentos ou diminuições de capital realizadas pelos sócios. Entretanto, as maiores modificações
provêm de operações realizadas pela empresa.
Uma indústria, por exemplo, promove uma redução do Patrimônio Líquido ao adquirir insumos,
ao realizar gastos com mão de obra e com custos indiretos necessários à fabricação de um produto. Por
outro lado, ao vender esse produto, obtém-se também uma receita de vendas, que o faz aumentar.
As receitas e os gastos anunciados são compilados na Demonstração do Resultado do
Exercício (DRE), cuja elaboração tem como objetivo avaliar a situação econômica com base nas
variações do Patrimônio Líquido da empresa e resultam em lucros ou prejuízos. A DRE retrata a
situação dinâmica do Patrimônio Líquido, apresentando, ao final, o Lucro Líquido do Exercício
(LLE) ou o prejuízo do período, se esse for o caso.
Esses lucros ou prejuízos são transportados para outra demonstração, denominada
Demonstração de Lucros ou Prejuízos Acumulados (DLPA). De acordo com a Lei n. 6.404/1976
(BRASIL, 1976), a DLPA pode ser substituída pela Demonstração das Mutações do Patrimônio
Líquido (DMPL), em virtude desta ser mais completa.
O Balanço Patrimonial (BP), a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) e a
Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL) são demonstrações que interagem
entre si, uma vez que no encerramento do exercício contábil, uma partida realizada em uma delas
tem contrapartida em outra.
Além dessas demonstrações, que espelham o resultado econômico da empresa, é necessário
determinar sua situação financeira. Sob essa óptica, a questão agora é: a receita foi total ou parcial-
mente recebida? Os gastos foram total ou parcialmente pagos? As respostas a essas duas questões
serão respondidas por meio da Demonstração do Fluxo de Caixa (DFC). Essas são, portanto, as
demonstrações que estudaremos neste capítulo.

5.1 Demonstração do Resultado do Exercício (DRE)


Vídeo
A cada exercício social ou período contábil1, as empresas apuram o resultado
de suas operações. É recomendável, entretanto, que sejam apurados o superavit (lu-
cro) ou deficit (prejuízo) em períodos mais curtos: mensais ou trimestrais. Para as
sociedades por ações, é obrigatório que esses dados sejam apurados trimestralmente.

1 Período contábil é aquele que, de acordo com o art. 175 da Lei n. 6.404/1976, “terá duração de 1 (um) ano e a data
do término será fixada no estatuto” (BRASIL, 1976).
84 Fundamentos de contabilidade

O Resultado, que pode ser um lucro ou um prejuízo, representa a diferença entre as Receitas
e as Despesas geradas no período. O Resultado será um lucro se as Receitas forem maiores que as
Despesas ou será um prejuízo se as Receitas forem menores que as Despesas.

Receitas (-) Despesas = Resultado

Geralmente, a Receita tem origem nas vendas de mercadorias ou prestações de serviços.


Esporadicamente, pode ocorrer recebimento de juros provenientes de aplicações financeiras ou
ainda a obtenção de uma Receita não operacional originada pela venda de um Ativo Imobilizado.
As Receitas aumentam o Patrimônio Líquido da empresa e a contrapartida desse aumento
reflete no Balanço Patrimonial por meio da entrada de dinheiro no Caixa (Receita à vista) ou em
forma de Direitos a receber (Receita a prazo).
Assim, a Receita sempre aumenta o Ativo, embora nem todo aumento de Ativo signifique
uma Receita. Por exemplo, empréstimos bancários e financiamentos aumentam o Caixa, mas não
são Receitas.
Por outro lado, os Custos e as Despesas diminuem o Patrimônio Líquido, pois, de acordo
com Martins (2010), representam um sacrifício da empresa para obter Receita. A perda reflete no
Balanço Patrimonial em duas contas, por meio de uma redução do Caixa – quando é paga à vista –
ou como a constituição de uma obrigação – quando não for paga, ocasionando aumento de uma
dívida no Passivo que será paga no futuro. A Despesa pode, ainda, representar uma redução do
Ativo sem que ocorra desembolso, como é o caso da apropriação da depreciação dos bens perten-
centes ao Ativo Imobilizado.
O confronto entre Receitas e Despesas para apurar o Resultado do período (lucro ou
prejuízo) ocorre ao final do período mensal, trimestral e anual, de acordo com o período
adotado pela entidade. Se o Resultado for positivo, ele aumentará o Patrimônio Líquido e se
negativo, o Patrimônio Líquido diminuirá.
A dinâmica explicitada em relação aos aumentos e diminuições do Patrimônio Líquido pode
ser resumida em duas categorias:
• alterações provenientes das operações com os sócios: aumento ou retirada de capital e
retenção ou distribuição de lucro que não interferem na elaboração da Demonstração do
Resultado do Exercício;
• alterações provenientes das operações da empresa: provocam modificações no patrimônio
e derivam de uma série de transações, como as Receitas operacionais, Despesas
operacionais, Receitas não operacionais e Despesas não operacionais.

Nos ensinamentos de Hendriksen e Van Breda (1999, p. 223), “receitas podem ser definidas,
em termos gerais, como o produto gerado por uma empresa e despesas são os custos assumidos
para gerar essas receitas”.
Demonstrações financeiras 85

As variações provenientes das operações ocorrem por meio do relacionamento comercial


entre a empresa e as pessoas com as quais ela se corresponde – clientes, fornecedores, prestadores
de serviços etc. – independentemente do pagamento ou recebimento de numerário no momento
da operação. Se uma venda for realizada a prazo, constitui-se um direito sob o título de Duplicatas
a receber, se uma compra for realizada a prazo, assume-se uma obrigação para pagamento futuro.
Dessa maneira, pode-se afirmar que a movimentação do Patrimônio da empresa ocorre em
função de quatro acontecimentos principais: compras, vendas, pagamentos ou recebimentos.
As Receitas, os gastos e, consequentemente, o Resultado são evidenciados na Demonstração
do Resultado do Exercício, prevista pelo art. 176 da Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), já com a
redação dada pela Lei n. 11.941/2009 (BRASIL, 2009). O conteúdo da DRE deve ser elaborado de
maneira descritiva e dedutiva, de acordo com o seguinte exemplo:
Quadro 1 – Conteúdo da DRE

Faturamento Bruto
(-) IPI faturado
(=) Receita Bruta de Vendas e Serviços
(-) Deduções (∑ das vendas canceladas, dos abatimentos e dos tributos)
Vendas canceladas
Abatimentos concedidos
Tributos sobre vendas e serviços (∑ do ICMS ou ISS, PIS, COFINS e SIMPLES)
ICMS ou ISS
PIS
COFINS
SIMPLES NACIONAL (se for o caso)
(=) Receita Líquida de Vendas e Serviços
(-) Custo das mercadorias e serviços vendidos
(=) Lucro Bruto Operacional
(-) Despesas operacionais (∑ das Despesas com vendas, financeiras e gerais)
Despesas com vendas
Resultado Financeiro Líquido (Receitas – Despesas financeiras)
Despesas gerais e administrativas
Outras despesas operacionais
(=) Lucro ou prejuízo operacional
(+) Outras receitas

(Continua)
86 Fundamentos de contabilidade

(-) Outras despesas


(=) Resultado do exercício antes dos tributos sobre resultado
(-) Provisão para os tributos (∑ do IRPJ e da CSLL)
Provisão para o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ)
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)
(=) Resultado do exercício após os tributos sobre resultado
(-) Participações (∑ das seguintes participações)
Debenturistas
Empregados
Administradores
Partes beneficiárias
Fundos de assistência e previdência
(=) Lucro ou prejuízo líquido do exercício
(÷) Número de ações
(=) Lucro Líquido por Ação
Fonte: Elaborado pelo autor com base em Brasil, 1976.

Determinada a estrutura, vamos agora aprender o conteúdo das contas que compõem
a DRE. Liminarmente, é necessário relembrar que na determinação do Resultado, de acordo com
a Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), as receitas e os rendimentos do período são computados
independentemente de sua realização em moeda e os gastos incorridos são reconhecidos indepen-
dentemente de seu pagamento. Essa é a adoção formal expressa pelo regime de competência, ou
seja, o registro de receitas e de gastos são realizados pela data de sua ocorrência, independentemente
dos reflexos no caixa.
O art. 187 da Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976) estabelece que as empresas devem descrimi-
nar a Receita Bruta das Vendas e Serviços, as Deduções das vendas, os Abatimentos e os Impostos.
Dessa forma, a contabilização das vendas deverá ser feita por seu valor bruto, incluindo tributos.
De acordo com a Instrução Normativa n. 51/1978 (BRASIL, 1978), nas Receitas de Vendas
incluem-se somente os impostos não cumulativos. Por isso, o IPI (imposto incidente nas operações
de industrialização) não deve ser incluído, pois as indústrias são meras arrecadadoras desse impos-
to, cobrando de seus clientes sem alterar sua Receita Bruta.
Constata-se, em decorrência disso, discrepâncias entre as diversas normas citadas. De acor-
do com Iudícibus et al. (2018, p. 569) “uma forma utilizada na prática para conciliar o problema
é dar o nome de Faturamento Bruto ao que seria a Receita Bruta, e utilizar esta para designar a
diferença entre o Faturamento Bruto e o IPI”.
Demonstrações financeiras 87

É importante analisar o valor do Faturamento Bruto, considerando todos os tributos também


sob o viés financeiro e não somente pelo contábil. Quando a nota fiscal e a fatura são emitidas, o
valor que se constitui como Duplicatas a receber é o valor total da nota, inclusive o IPI.
Se a empresa conceder, por exemplo, dez meses de prazo para o cliente pagar o que adquiriu,
essa decisão tem reflexo na administração do capital de giro. O valor do IPI será recebido em dez
parcelas, porém, será recolhido no mês seguinte ao da venda. Isso significa que haverá um impacto
na gestão do caixa por dois motivos: pela saída imediata de caixa para recolhimento de todo o valor
do IPI e pela necessidade de provimento oneroso de recursos para manutenção do capital de giro. oneroso: sujeito a
encargos, custoso.
De acordo com Hendriksen e Van Breda (1999, p. 135), a geração de informação para tomada
de decisão e definição da política de recebimento de Receitas de uma companhia “desempenha
papel importante na teoria da contabilidade [...] pois, a função da contabilidade é fornecer infor-
mação quantitativa, principalmente de natureza financeira, para tomada de decisões econômicas”.
Assim, para fins de apresentação, ensinam Iudícibus et al. (2018, p. 570): “deve ser demons-
trado o valor bruto faturado, deduz-se daí o IPI incidente sobre as vendas, chegando-se ao valor da
receita bruta sem o imposto”, como consta do modelo apresentado no Quadro 1.
Além dessa discussão, o cálculo do PIS e da COFINS também gera controvérsias. Até 2018,
o ICMS era calculado sobre os valores da COFINS e do PIS. Muitas empresas entraram com ações
judiciais requerendo que os valores decorrentes dos dois tributos não servissem mais de base de
cálculo para o ICMS.
Recursos julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram pela exclusão dos
valores pagos a título de ICMS da base de cálculo da COFINS e do PIS. Tal fato teve repercussão
e generalizou-se, mas não foi vinculante, ou seja, geraram-se efeitos somente para empresas que
entraram com ações judiciais. Dessa maneira, as demais empresas deverão interpô-las e aguardar
novos julgamentos.
Por esse motivo, vamos conhecer as duas possibilidades de cálculo de PIS e COFINS:
incidindo sobre o ICMS e o excluindo da base de cálculo. Os três tributos, de acordo com a
Constituição Federal (BRASIL, 1988), podem ser não cumulativos, isto é, em cada operação, ao se
calcular seus valores, abate-se o valor calculado na operação anterior. Por isso, esses tributos são
denominados recuperáveis.
Para se determinar o valor do faturamento, ou seja, o valor da Receita Bruta considerando
a incidência dos tributos uns sobre os outros e sobre si próprios sucessivas vezes (PIS e COFINS
incidindo sobre o ICMS), utiliza-se a seguinte fórmula:

Custos × (1 - % de tributos recuperáveis)


Faturamento = + %IPI
1 - (%ICMS + %PIS + %COFINS + %MK)
88 Fundamentos de contabilidade

Constata-se pela fórmula que os tributos e o Markup2 (MK) incidem sobre si próprios e
uns sobre os outros sucessivamente, como no exemplo aplicado com os dados a seguir (Tabela 1).
É importante salientar que os tributos possuem alíquotas seletivas e podem variar de acordo com a
região, com o produto, com a pessoa etc. Os percentuais do exemplo a seguir são meramente didáticos.

Tabela 1 – Dados para cálculo de tributos e de Markup

Custos (já excluídos os tributos recuperáveis) R$ 10.000,00

ICMS 12%

PIS 0,065%

COFINS 3,0%

Markup 25%

IPI 10%
Fonte: Elaborada pelo autor.

Inicialmente, monta-se a fórmula com os dados apresentados, informando que o IPI,


por ser calculado por fora, não entra no dividendo e no divisor. Enquanto o ICMS, o PIS, a
COFINS e o Markup são calculados por dentro (determinando que um incida sobre os outros),
o IPI será calculado por fora e incidirá sobre todos eles.

10.000,00
Faturamento = + 10%
1 - (12% + 0,065% + 3% + 25%)

Em seguida, efetuam-se os cálculos dos percentuais que se encontram entre parênteses no


divisor, constatando que eles somam 40,65% ou 0,4065, como se vê a seguir.

10.000,00
Faturamento = + 10%
1 - 0,4065

Na sequência, realiza-se a operação dos dados do divisor:

10.000,00
Faturamento = + 10%
0,5935

Matematicamente, o que se busca é saber o valor atribuído ao preço de venda. No caso,


acrescentar aos R$ 10.000,00 (representado por 1) os 40,65% necessários para se obter o preço.

2 O Markup indica o quanto o preço de venda está acima do preço de custo do produto que será vendido. É um per-
centual que define a precificação do produto.
Demonstrações financeiras 89

Ou seja, o custo corresponde a 59,35% do preço. Com a inclusão desses tributos e do Markup,
a precificação será de R$ 16.849,20. Há necessidade de acrescentar o IPI sobre ela, calculado por
fora sobre tudo o que se incluiu até o momento.

Faturamento = 16.849,20 + 1.684,92 = 18.534,12

Constata-se que o preço pelo qual o produto deve ser vendido é de R$ 18.534,12, é a partir
dele que serão realizados os cálculos dos tributos. Note que o PIS, a COFINS e o IPI são calculados
sobre as vendas, não sobre os custos. Assim, para determinar o preço de venda, foi necessário in-
cluir os tributos e o Markup, realizando a precificação.
Após a realização dos cálculos, é possível elaborar a Demonstração do Resultado do Exercício
até o item Lucro Bruto Operacional, que também representa o Markup estimado pelos gestores ou
proprietários, de acordo com a Tabela 2.
Tabela 2 – Demonstração do Resultado considerando o ICMS na base de cálculo do PIS e COFINS.

Faturamento bruto R$ 18.534,12

(-) IPI faturado 10% -R$ 1.684,92

(=) Receita Bruta de Vendas R$ 16.842,20

(-) Deduções -R$ 2.636,90

ICMS (12% × R$ 16.863,41) -R$ 2.021,90

PIS (0,065%) -R$ 109,52

COFINS -R$ 505,48

(=) Receita Líquida de Vendas R$ 14.212,30

(-) Custo dos produtos vendidos R$ 10.000,00

(=) Lucro Bruto Operacional (Markup) R$ 4.212,30

(=) ou (Markup) = 25% × R$ 16.842,20 R$ 4.212,30

Fonte: Elaborada pelo autor.

Como podemos verificar na Tabela 2, o valor do faturamento bruto, que será cobrado do
comprador, inclui todos os tributos e o Markup. Para calcular os tributos, aplica-se a respectiva
alíquota sobre a Receita Bruta de Vendas e a Receita Bruta subtraída dos tributos resultará na
Receita Líquida de Vendas.
Da Receita Líquida diminui-se o Custo dos produtos vendidos e obtém-se o Lucro Bruto
Operacional, que é o Markup. No exemplo em questão, em virtude de termos determinado que ele
seria de 25%, “sobraram” R$ 4.212,30 para a empresa pagar suas despesas; essa “sobra” representa
o lucro.
Para se determinar o valor do faturamento excluindo o ICMS da base de cálculo do PIS e
da COFINS, há necessidade de realizar cálculos diferentes. No exemplo adotado anteriormente,
procedeu-se com o cálculo por dentro do ICMS, do PIS e da COFINS. Na modalidade a seguir,
que exclui esses tributos, vamos utilizar valores meramente didáticos (Tabela 3).
90 Fundamentos de contabilidade

Tabela 3 – Valor de custos, alíquotas de tributos e Markup para calcular o Resultado de uma operação de venda.

Custos (já excluídos os tributos recuperáveis) R$ 50.000,00

ICMS a ser calculado sobre a Receita Bruta 12%

PIS a ser calculado sobre a Receita Bruta (sem ICMS) 0,065%

COFINS a ser calculado sobre a Receita Bruta (sem ICMS) 3,0%

Markup a ser acrescentado aos custos 75%

IPI 10%
Fonte: Elaborada pelo autor.

Definidos as alíquotas e os valores estabelecidos didaticamente, é possível, agora, determi-


nar os valores dos tributos e calcular o Lucro Bruto Operacional, como se vê na Tabela 4.
Tabela 4 – Demonstração do Resultado excluindo o ICMS na base de cálculo do PIS e COFINS.

Descritor Percentuais Memória Valores


Custos de produção R$ 50.000,00

Margem 75% R$ 50.000,00 × 75% R$ 37.500,00

Faturamento Custos + Margem R$ 87.500,00

IPI 15% R$ 87.500,00 × 15% R$ 13.125,00

Receita Bruta Faturamento – IPI R$ 74.375,00

(-) ICMS 12% 12% × R$ 74.375,00 -R$ 8.925,00

(-) PIS 0,065% 0,065% × (R$ 74.375,00 - R$ 8.925,00) -R$ 425,43

(-) COFINS 3% 3% × (R$ 74.375,00 - R$ 8.925,00) -R$ 1.963,50

Receita Líquida R$ 63.061,08

(-) Custos -R$ 50.000,00

(=) Lucro Bruto Operacional R$ 13.061,08


Fonte: Elaborada pelo autor.

Além da dedução dos tributos, a Receita Bruta é diminuída pelas vendas canceladas –
que correspondem ao montante devolvido pelos clientes, considerando defeitos ou não atendi-
mento das especificações do pedido – ou pelos abatimentos sobre vendas, que são descontos con-
cedidos a clientes na ocasião da venda, normalmente de caráter promocional.
O custo das vendas tem duas denominações: Custo dos produtos vendidos, no caso de
empresa industrial, e Custo das mercadorias vendidas, nos casos de empresas comerciais. O Custo
dos produtos vendidos é obtido pela fórmula:

CPV = EI + CPP - EF
Em que:
CPV= Custo da produção vendida
CPP= Custo de produção do período
EI = Estoque inicial
EF = Estoque final
Demonstrações financeiras 91

As empresas comerciais caracterizam-se pela atividade de intermediação entre o produtor e o


consumidor, o custo das mercadorias vendidas, nesse caso, apresentam os seguintes componentes:

CMV = EI + CL - EF
Em que:
CMV = Custo das mercadorias vendidas
EI = Estoque inicial
CL = Compras líquidas
EF = Estoque final

Vimos nos exemplos que do faturamento são excluídos os tributos e os custos, obtendo-se o
Lucro Bruto Operacional. Deste deverão ser eliminadas as Despesas operacionais.
Despesas operacionais são sacrifícios financeiros necessários ao funcionamento da empresa,
isto é, são atividades necessárias para que a entidade possa vender, administrar e financiar suas
atividades. São elas:
• Despesas com vendas: correspondem às despesas de promoção e distribuição dos pro-
dutos da empresa no mercado, e ainda os riscos assumidos pela venda, como garantias e
provisão para devedores duvidosos;
• Despesas administrativas: compreendem as despesas incorridas para a direção e execução
das tarefas administrativas, bem como as despesas gerais que beneficiam os negócios da
empresa, como o aluguel do escritório e gastos com pessoal administrativo;
• Despesas financeiras: representam a remuneração paga a instituições financeiras pelos
financiamentos por elas concedidos.
As Receitas financeiras representam os ganhos de capitais aplicados em investimentos
temporários. É oportuno esclarecer que a diferença entre as Despesas e Receitas financeiras
representa o Resultado Financeiro Líquido. Por exemplo, uma empresa pode ter investido
temporariamente seus recursos em uma instituição financeira, por outro lado, ela também
pode ter captado recursos para financiar seu capital de giro. Os investimentos geram receita, os
financiamentos geram despesas. O Resultado Financeiro Líquido a ser levado para a DRE é a
diferença entre essas Receitas e Despesas financeiras.
Outras receitas e despesas são contas que compreendem valores provenientes de transa-
ções eventuais ou secundárias. Retomando os dados do Quadro 1, nota-se que a partir do valor
do Resultado do exercício antes dos tributos sobre resultado, há a necessidade de calcular esses
tributos, que são Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido (CSLL). Obtém-se, então, o Resultado do exercício após os tributos sobre Resultado, valor
utilizado para cálculo das participações dos debenturistas, empregados, administradores, partes
beneficiárias, fundos de assistência e previdência.
92 Fundamentos de contabilidade

A Demonstração do Resultado é concluída com o Lucro Líquido do Exercício (LLE),


valor que será transportado para a Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL) –
assunto que estudamos a seguir – e com o Lucro por ação, que é um indicador ao acionista,
representativo do valor a que faz jus pela ação que possui.
Para consolidar seus conhecimentos sobre a Demonstração do Resultado do Exercício,
conheça a demonstração publicada pelo Grupo Boticário:
Figura 1 – Demonstrações de Resultados da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza

Fundação Grupo boticário de proteção à Natureza


Demonstrações de resultados
Exercícios findos em 31 de dezembro de 2017 e 2016
(Em milhares de reais)

2017 2016

Receita (Nota 15) 19.309 13.588


Despesas vinculadas aos programas e administração (Nota 16)
Desenvolvimento institucional (2.921) (2.134)
Ciência e Informação (5.644) (5.610)
Áreas protegidas (5.208) (4.264)
Estratégias de convervação (2.585) (2.299)

Gestão Estratégica (486) (245)

Projetos estratégicos de conservação (3.111) (2.209)

(19.955) (16.761)

Outras receitas operacionais (Nota 17)

Outras receitas operacionais 988 898

Superávit (déficit) antes do resultado financeiro 342 (2.275)

Resultado financeiro (Nota 19)

Despesas financeiras (108) (131)

Despesas financeiras – fundo patrimonial (313) (482)

Despesas financeiras 285 335

Despesas financeiras – fundo patrimonial 1.997 2.467

1.861 2.189

Superávit (déficit) do exercício 2.203 (86)

As notas explicativas são parte integrante das demonstrações financeiras.

Fonte: Fundação Grupo Boticário, 2017.

Liminarmente, é oportuno destacar que as notas demonstradas entre parênteses referem-se


às notas explicativas, pois como vimos, as demonstrações financeiras devem ser apresentadas de
maneira qualitativa (nomes das contas) e quantitativa (valores). Algumas dessas contas merecem
Demonstrações financeiras 93

uma explicação por sua existência, por isso, as notas integram essas demonstrações. Além disso,
note que é necessário que as demonstrações apresentem dados de dois períodos sucessivos, como
vimos na Figura 1.

5.2 Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL)


Vídeo
De início, é importante assinalar que a Demonstração das Mutações do
Patrimônio Líquido (DMPL), como ensina Marion (2015), integra o Balanço
Patrimonial (BP) e a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE). Essa inte-
gração pode ser visualizada na Figura 2.
Figura 2 – Integração entre BP, DMPL e DRE.

Balanço Patrimonial DMPL DRE

Pasivo + PL
LLE

Dividendos a pagar
Ativo Constituição de
reservas
Patrimônio Líquido

Cálculos dos divi-


Reservas LLE
dendos a pagar

Fonte: Elaborada pelo autor com base em Marion, 2015.

A DMPL inicia-se com os saldos do Patrimônio Líquido do ano anterior e, na sequência, recebe
a contrapartida do Lucro Líquido do Exercício que estamos encerrando e que consta na DRE.
Para esclarecer como ocorre esse processo, imagine que estamos no ano 2. Os saldos do
Balanço Patrimonial, que serão transportados para a DMPL, são os do ano 1 e o Lucro Líquido
do Exercício a ser transportado para a DMPL é o da DRE do ano 2.
Desse somatório, isto é, da soma dos valores trazidos do BP (ano 1) acrescido do lucro do
ano 2, deduz-se a constituição de reservas e calcula-se o valor dos dividendos a pagar aos acionistas.
A contrapartida das contas de Reservas é realizada no grupo do Patrimônio Líquido e os dividendos
no grupo do Passivo, ambos no Balanço Patrimonial.
A estrutura da Demonstração de Lucros ou Prejuízos Acumulados está definida pelo art. 186
da Lei n. 6.404/1976, que determina que ela discriminará:
I - o saldo do início do período, os ajustes de exercícios anteriores e a correção
monetária do saldo inicial;
II - as reversões de reservas e o lucro líquido do exercício;
III - as transferências para reservas, os dividendos, a parcela dos lucros incorpo-
rada ao capital e o saldo ao fim do período.
§ 1º Como ajustes de exercícios anteriores serão considerados apenas os
decorrentes de efeitos da mudança de critério contábil, ou da retificação de erro
imputável a determinado exercício anterior, e que não possam ser atribuídos a
fatos subsequentes. (BRASIL, 1976)
94 Fundamentos de contabilidade

Percebe-se que a DLPA é uma simplificação da DMPL, pois apresenta somente dados
relacionados ao lucro do exercício. Além das empresas que são obrigadas a apresentar a DMPL,
muitas outras estão também optando pela DLPA.
Ademais, o CPC 26 (CPC, 2011) cita a existência somente da DMPL. Convém assinalar,
porém, que existe uma contradição entre os termos da Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976) e os
termos do Pronunciamento, prevalecendo, no entanto, a determinação legal.
O parágrafo 2 da Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976) determina que a DLPA “poderá ser
incluída na demonstração das mutações do patrimônio líquido, se elaborada e publicada pela
companhia”. Nota-se que a DMPL é uma demonstração mais completa, sendo uma de suas colunas
a representação dos lucros ou prejuízos acumulados.
O CPC 26 (BRASIL, 2011), por sua vez, determina que seja apresentada a Demonstração
das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL), não restando, em consequência disso, motivos para
não elaborá-la. A elaboração da DMPL abrange todas as empresas, em decorrência do disposto na
Resolução CFC n. 1.185/2009 (BRASIL, 2009).
Para Iudícibus et al. (2018, p. 639), essa demonstração é de grande importância, pois indica
“claramente a formação e a utilização de todas as reservas, e não apenas das originadas por lucros.
Servirá também para melhor compreensão, inclusive quanto ao cálculo dos dividendos obrigató-
rios”, estes necessariamente calculados pelas empresas constituídas como sociedades por ações.
Como o próprio nome indica, a DMPL registra as variações das contas que formam o
Patrimônio Líquido. Essas variações, por sua vez, constituem-se por fatos contábeis divididos em
duas categorias: fatos permutativos e fatos modificativos.
Os fatos contábeis permutativos são aqueles que não alteram o valor do Patrimônio Líquido.
Um exemplo é quando há aumento de capital utilizando valores de Reserva Legal: a conta de Capital
aumenta e a conta de Reserva Legal diminui, porém, o valor do Patrimônio Líquido continua o mes-
mo porque é realizada apenas uma transferência entre contas de dentro do próprio grupo do PL.
Já os fatos contábeis modificativos alteram o valor do Patrimônio Líquido. Eles acontecem
em decorrência dos seguintes eventos:
• acréscimo pelo lucro ou redução pelo prejuízo líquido do exercício;
• redução por pagamento de dividendos;
• acréscimo pelo recebimento de valor que exceda o valor nominal das ações integralizadas
ou o preço de emissão das ações sem valor nominal;
• acréscimo por prêmio recebido na emissão de debêntures;
• redução por ações próprias adquiridas ou acréscimo por sua venda;
• acréscimo ou redução por ajustes de exercícios anteriores;
• ajustes de avaliação patrimonial.
Demonstrações financeiras 95

Os fatos contábeis modificativos são aumentativos quando aumentam o Patrimônio Líquido


e diminutivos quando o diminuem. O Lucro do Exercício faz com que o PL seja aumentado, já o
pagamento de dividendos resulta em sua diminuição.
Vamos desenvolver um exemplo para melhor explicar o que foi contextualizado. Vimos que
a DMPL se integra ao BP e à DRE. Na Tabela 5, apresentaremos o Patrimônio Líquido da Cia. Beta
referente a ano 1, que totaliza o montante de R$ 15.200,00.
Na mesma tabela, será apresentada, de modo simplificado, a DRE do ano 2, que apresenta,
após todas as deduções, um Lucro Líquido de R$ 2.000,00. Esse é o valor a que vamos nos ater em
relação à DRE, pois é o que irá compor a DMPL.
Tabela 5 – BP e DRE simplificados da Cia. Beta

Balanço Patrimonial ano 1 ano 2 Demonstração do Resultado ano 2


Patrimônio Líquido

Capital R$ 10.000,00

Reservas de Capital

Ágio na venda de ações R$ 3.800,00

Reservas de Lucros

Reserva legal R$ 300,00

Reserva estatutária R$ 500,00

Reserva orçamentária R$ 400,00

Reserva de Lucros a realizar R$ 200,00

Lucros e/ou Prejuízos Acumulados –

Total do PL R$ 15.200,00 Lucro Líquido R$ 2.000,00

Fonte: Elaborada pelo autor.

No ano 2, o Patrimônio Líquido da Cia. Beta sofreu mutações, ou seja, ocorreram fatos
como lucros e aumento de capital.Vejamos algumas dessas mutações:
• Lucro Líquido de R$ 2.000,00;
• aumento de capital no início do período no valor de R$ 3.800,00, com transferência da
conta de Ágio;
• captação de recursos dos acionistas da empresa durante o ano 2, no montante de R$ 3.000,00;
• constituição de Reserva legal de 5% sobre o Lucro Líquido;
• constituição de Reserva estatutária de 10% sobre o Lucro Líquido;
• reversão de 50% da Reserva de Lucros a realizar;
• constituição de R$ 200,00 de Reserva orçamentária;
• distribuição do restante do lucro líquido.
Como vimos, existe uma integração entre as três demonstrações. Vejamos agora a aplicação
de diversos procedimentos para a elaboração da DMPL na Tabela 6:
96

Tabela 6 – Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido do ano 2

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Reserva Reserva de
A/Z Fatos Capital Ágio Reserva Legal Reserva Estatutária DLPA Total
Orçamentária lucros a realizar
Fundamentos de contabilidade

A Saldo inicial R$ 10.000,00 R$ 3.800,00 R$ 300,00 R$ 500,00 R$ 400,00 R$ 200,00 – R$ 15.200,00

B Lucro Líquido – – – – – – R$ 2.000,00 R$ 2.000,00

C Aumento de capital 1 R$ 3.800 -R$ 3.800,00 – – – – – –

D Aumento de capital 2 R$ 3.000 – – – – – – R$ 3.000,00

E Reserva Legal – – R$ 100,00 – – – -R$100,00 –

G Reserva Estatutária – – – R$ 200,00 – – -R$ 200,00 –

H Reversão – – – – – -R$ 100,00 R$ 100,00 –

I Reserva Orçamentária – – – – R$ 200,00 – -R$ 200,00 –

J Dividendos – – – – – – -R$ 1.600,00 -R$ 1.600,00

K Saldo final R$ 16.800,00 – R$ 400,00 R$ 700,00 R$ 600,00 R$ 100,00 – R$ 18.600,00

Fonte: Elaborada pelo autor.


Demonstrações financeiras 97

O primeiro ponto a notar é que todas as contas e saldos referentes ao Patrimônio Líquido
constantes no Balanço Patrimonial do ano 1 foram transferidos para a Demonstração das Mutações
do Patrimônio Líquido do ano 2, como se verifica nas colunas 3 a 10 da linha A.
O Lucro Líquido do Exercício, calculado na Demonstração do Resultado do ano 2, também
foi transferido para a DMPL do ano 2, como se verifica na coluna 9 da linha B. O valor transportado,
proveniente de um fato contábil modificativo aumentativo, é adicionado ao saldo inicial, como se
vê no totalizador da linha B.
Uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE) pode aprovar um aumento do capital
mediante a incorporação de reservas existentes. Na empresa, o saldo da conta de Ágio na venda de
ações ensejou um aumento de capital. Esse é um fato contábil permutativo, pois apenas realizou-se
a transferência de valores entre as contas existentes do Patrimônio Líquido, como pode ser obser-
vado nas colunas 3 e 4 da linha C.
Além de aumentar o capital com a transferência de valores entre as contas do PL, os acionistas
da Cia. Beta aportaram novos recursos na empresa, aumentando o capital em mais R$ 3.000,00.
Esse é um fato contábil modificativo aumentativo, pois ocorre um aumento do PL, situação
demonstrada nas colunas 3 e 10 da linha D.
De acordo como o art. 193 da Lei n. 6.404/1976, “do lucro líquido do exercício, 5% (cinco
por cento) serão aplicados, antes de qualquer outra destinação, na constituição da reserva legal”
(BRASIL, 1976). Este fato não altera o valor do PL, pois ao mesmo tempo em que se aumenta a conta
de Reserva Legal, diminui-se a conta de Lucros (DPLA), como se vê nas colunas 5 e 9 da linha E.
O art. 194 da mesma lei afirma que “o estatuto poderá criar reservas desde que, para cada
uma: I – indique, de modo preciso e completo, a sua finalidade; II – fixe os critérios para determi-
nar a parcela anual dos lucros líquidos que serão destinados à sua constituição; e III – estabeleça
o limite máximo da reserva” (BRASIL, 1976). Essa é a Reserva estatutária que, para a Cia. Beta foi
fixada em 10% do Lucro Líquido do Exercício. O fato não altera o valor do PL, porque ao mesmo
tempo em se aumenta a conta de Reserva estatutária, diminui-se a conta de Lucros (DPLA), como
exposto nas colunas 6 e 9 da linha E.
A legislação prevê que no exercício em que o montante do dividendo obrigatório ultrapassar
a parcela realizada do Lucro Líquido do Exercício, a Assembleia Geral poderá destinar o excesso
à constituição de Reserva de Lucros a realizar (BRASIL, 1976). No ano 1, a Cia. Beta realizou essa
reserva e, em consequência, deixou de distribuir dividendos. No ano 2, em decorrência do lucro
apresentado, há a possibilidade de reverter parte dela.
Esse é um fato contábil permutativo, pois ocorrem somente alterações dos valores entre
contas. Entretanto, cabe uma observação: diminui-se a conta de Reserva de Lucros a realizar e a
contrapartida ocasionará um aumento na coluna 9 (correspondente à DLPA), por isso, realizada a
reversão, deverá ser realizada a distribuição de dividendos que havia sido diferida no ano 1.
As sociedades anônimas não podem mais reter lucros sob a denominação de Lucros
Acumulados, isso significa que todo lucro que remanescer após a realização de reservas deve ser
distribuído. Por isso, de acordo com o art. 195 da Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976), é de suma
98 Fundamentos de contabilidade

importância que o Conselho de Administração proponha aos acionistas destinação de parte dos
lucros para constituição de reservas – como para Contingências – com a finalidade de compensar
em exercício futuro a diminuição do lucro decorrente de perda julgada provável.
Para o presente exemplo, foi escolhida a constituição de uma Reserva orçamentária
com objetivo de reter parte do lucro para, de acordo com Iudícibus et al. (2018, p. 425), “atender a
projeto de investimento [...] que deverá estar justificada com o orçamento de capital da companhia.”
quantum: quantidade O quantum pode ser definido em percentual sobre o lucro ou em valor determinado, como é
de um elemento.
possível verificar nas colunas 7 e 9 da linha I.
Todo o saldo remanescente do lucro, como se vê nas colunas 9 e 10 da linha J, será distribuído,
fato que caracteriza um fato contábil modificativo diminutivo. Os saldos finais da Demonstração
das Mutações do Patrimônio Líquido são transferidos para o Balanço Patrimonial do ano 2 que
conterá, agora, os valores dos anos 1 e 2, como se observa na Tabela 7, pois o Balanço deverá ser
divulgado de maneira sucessiva.
Tabela 7 – Balanços Patrimoniais da Cia. Beta

Balanço Patrimonial ano 1 ano 2


Patrimônio Líquido

Capital R$ 10.000,00 R$ 16.800,00

Reservas de Capital

Ágio na venda de ações R$ 3.800,00 –

Reservas de Lucros

Reserva Legal R$ 300,00 R$ 400,00

Reserva Estatutária R$ 500,00 R$ 700,00

Reserva orçamentária R$ 400,00 R$ 600,00

Reserva de lucros a realizar R$ 200,00 R$ 100,00

Lucros ou Prejuízos acumulados – –

Total R$ 15.200,00 R$ 18.600,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Pode-se constatar a confirmação da assertiva inicial de que existe uma integração entre as três
demonstrações (BP, DMPL e DRE), as quais servirão de base para a elaboração da Demonstração
do Fluxo de Caixa (DFC), assunto da seção seguinte.

5.3 Demonstração do Fluxo de Caixa (DFC)


Vídeo
Diferentemente das demonstrações já apresentadas – Balanço Patrimonial,
Demonstração do Resultado do Exercício e Demonstração das Mutações do
Patrimônio Líquido – que são interdependentes, a Demonstração do Fluxo de Caixa
(DFC) é independente e tem o objetivo de demonstrar de que modo ocorreram as
movimentações de entrada e saída de dinheiro em um dado período de tempo.
Demonstrações financeiras 99

Por isso, os dados necessários à sua elaboração são colhidos no Balanço Patrimonial e na
Demonstração do Resultado do Exercício, sem que ocorra um lançamento contábil. Isso significa
que a DFC colhe dados de outras demonstrações sem as características das partidas dobradas.
As empresas constituídas sob a forma de sociedades anônimas já eram obrigadas a
elaborar e apresentar a DFC desde 1999, em decorrência de exigências previstas pelo Instituto dos
Auditores Independentes do Brasil (IBRACON). A demonstração deveria refletir as transações
de caixa de três grupos específicos: atividades operacionais, atividades de investimentos e
atividades de financiamentos.
Entretanto, a partir de 2005, com a criação do Comitê de Pronunciamentos Contábeis
(CPC), essas exigências foram revogadas e produziu-se grande número de normas tendentes a fazer
a contabilidade brasileira ser convertida para as normas internacionais de contabilidade e de auditoria.
Em virtude da criação do CPC, a atividade contábil passou a ter uma norma única e as entidades, a
partir de então, revogaram todas as resoluções, pronunciamentos e normas que existiam.
Em 2007, com a edição da Lei n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007) – que alterou a Lei n. 6.404/1976
(BRASIL, 1976) – a elaboração da DFC tornou-se obrigatória para todas as empresas, repetindo
basicamente a divisão de grupos de eventos antes ditados pelo IBRACON: das operações, dos
financiamentos e dos investimentos. Atualmente, toda a matéria está regulamentada pelo Comitê
de Pronunciamentos Contábeis, que define as contas que serão classificadas em cada um dos fluxos.
O fluxo de caixa das operações deriva das atividades operacionais, como dos recebimentos de
caixa pela venda de mercadorias ou pela prestação de serviços; dos recebimentos de caixa decorren-
tes de royalties3 e de outras receitas; pagamentos de caixa a fornecedores de mercadorias e serviços;
pagamentos de caixa a empregados e pagamentos de caixa de impostos sobre a renda.
Além dessas atividades operacionais, o fluxo de caixa também pode ser gerado pelas
atividades de financiamento de fornecedores de capital à entidade, por exemplo, nos casos de
caixa recebido pela emissão de ações, pela emissão de debêntures, e empréstimos, amortização de
empréstimos e financiamentos.
O fluxo advindo das atividades de investimento representa os dispêndios de recursos feitos
pela entidade com a finalidade de gerar lucros, por exemplo, pagamentos em caixa (numerário)
para aquisição de Ativo Imobilizado, Intangíveis e outros Ativos de longo prazo, recebimentos de
caixa resultantes da venda de Ativo Imobilizado, Intangíveis e outros Ativos de longo prazo, adian-
tamentos em caixa e empréstimos feitos a terceiros (exceto instituição financeira).
De acordo com Iudícibus et al. (2018, p. 575) “para divulgar o fluxo de caixa oriundo das
atividades operacionais, pode ser utilizado o método direto ou o indireto.”
Pelo método direto, no fluxo referente às atividades operacionais são relacionadas as principais
classes de recebimentos e pagamentos. Já pelo método indireto, também no fluxo das atividades
operacionais, a DFC parte do lucro e ajustam-se os valores de transações que não envolvem o caixa, pois
apontam-se os aumentos e diminuições das diversas contas.

3 Royalties, plural de royalty. Trata-se do pagamento que alguém faz por ter obtido o direito de explorar um bem de outra pessoa.
100 Fundamentos de contabilidade

Repare que a diferença dos dois métodos circunscreve-se somente às atividades operacio-
nais. Para as atividades de investimento e de financiamento os fluxos são iguais.
O Quadro 2 apresenta-se um modelo de Demonstração do Fluxo de Caixa pelo método direto.
Quadro 2 – Demonstração qualitativa do Fluxo de Caixa pelo método direto

Atividades operacionais

Recebimento de clientes

Recebimento de juros

Duplicatas descontadas

Outros recebimentos

(-) Pagamentos

a fornecedores de mercadorias

de impostos

de salários

de juros

de despesas pagas antecipadamente

outros pagamentos

(=) Caixa líquido consumido nas atividades operacionais

Atividades de Investimentos

Recebimento pela venda de Imobilizado

Pagamento pela compra de Imobilizado

(=) Caixa líquido consumido nas atividades de investimentos

Atividades de financiamentos

Aumento de capital

Empréstimos de curto prazo

Pagamento de dividendos

(=) Caixa líquido consumido nas atividades de financiamentos

Aumento líquido no Caixa e Equivalente de caixa

Saldo de Caixa + Equivalente de caixa em X0

Saldo de Caixa + Equivalente de caixa em X1

Composição do Caixa e Equivalentes de Caixa


(Conciliação entre DFC e BP)

Descritores 31/12/X0 31/12/X1


Caixa

Bancos

Aplicações financeiras

Total
Fonte: Adaptado de Iudícibus et al., 2018, p. 580.
Demonstrações financeiras 101

No método direto, ao se apresentar as contas referentes às atividades operacionais, os valores de


recebimentos e de pagamentos são apresentados de modo detalhado por meio de contas de clientes,
juros etc. Diferentemente do que ocorre no método indireto, apresentado a seguir.
Quadro 3 – Demonstração qualitativa do Fluxo de Caixa pelo método indireto

Descritores

Atividades operacionais

Lucro Líquido

(+) depreciação

(-) Lucro na venda de Imobilizado

Lucro ajustado

Aumento em Duplicatas a receber

Aumento de Provisões para perdas de duplicatas

Aumento de duplicatas descontadas

Aumento em Estoques

Aumento em Despesas pagas antecipadamente

Aumento em Fornecedores

Redução em Provisão para Imposto de Renda a pagar

Redução em Salários a pagar

(=) Caixa líquido consumido nas atividades operacionais

Atividades de investimentos

Recebimento pela venda de Imobilizado

Pagamento pela compra de Imobilizado

(=) Caixa líquido consumido nas atividades de investimento

Atividades de financiamentos

Aumento de capital

Empréstimo de curto prazo

Distribuição de dividendos

(=) Caixa líquido consumido nas atividades de financiamento

Aumento líquido nas Disponibilidades

Saldo de Caixa + Equivalentes de caixa em X0

Saldo de Caixa + Equivalentes de caixa em X1


Fonte: Adaptado de Iudícibus et al., 2018, p. 580.

Como pode ser observado, quando se faz uso do método indireto, as entradas e saídas de
caixa das atividades operacionais são informadas por seus volumes brutos. Vejamos um exemplo
de DFC neste método, em que determinada empresa apresenta os Balanços Patrimoniais conforme
a Tabela 8.
102 Fundamentos de contabilidade

Tabela 8 – Balanços Patrimoniais dos anos 1 e 2

Contas ano 1 ano 2

ATIVO CIRCULANTE R$ 400,00 R$ 750,00

Disponibilidades R$ 32,00 R$ 38,00

Duplicatas a receber R$ 248,00 R$ 496,00

Estoques R$ 120,00 R$ 216,00

ATIVO NÃO CIRCULANTE R$ 700,00 R$ 965,00

Investimentos R$ 104,00 R$ 253,00

Participação em coligadas R$ 104,00 R$ 253,00

Imobilizado R$ 596,00 R$ 712,00

Imóveis de uso R$ 440,00 R$ 600,00

(-) Depreciação acumulada de imóveis -R$ 24,00 -R$ 48,00

Máquinas e acessórios R$ 200,00 R$ 150,00

(-) Depreciação acumulada de máquinas e acessórios -R$ 20,00 -R$ 40,00

ATIVO TOTAL R$ 1.100,00 R$ 1.715,00

PASSIVO CIRCULANTE R$ 250,00 R$ 375,00

Fornecedores R$ 150,00 R$ 220,00

Empréstimos R$ 100,00 R$ 155,00

PASSIVO NÃO CIRCULANTE R$ 280,00 R$ 370,00

Financiamentos internos de longo prazo R$ 110,00 R$ 170,00

Financiamentos externos de longo prazo R$ 170,00 R$ 200,00

PATRIMÔNIO LÍQUIDO R$ 570,00 R$ 970,00

Capital R$ 475,00 R$ 500,00

Reservas de lucros R$ 95,00 R$ 470,00

PASSIVO + PL TOTAL R$ 1.100,00 R$ 1.715,00

Fonte: Elaborada pelo autor.

Além dos Balanços Patrimoniais, a empresa informa os seguintes dados:


• o Lucro apurado na DRE foi de R$ 570,00;
• consta na DMPL a distribuição de dividendos no valor de R$ 100,00.
Para elaborar a DFC pelo método indireto, o primeiro passo é apurar as variações ocorridas
em cada conta dos Balanços Patrimoniais, como se observa na coluna 4 da tabela a seguir.
Demonstrações financeiras 103

Tabela 9 – Balanços patrimoniais e variações dos valores

Balanços patrimoniais e variações

Coluna 1 Coluna 2 Coluna 3 Coluna 4

CONTAS ano 1 ano 2 variações


ATIVO CIRCULANTE R$ 400,00 R$ 750,00 R$ 350,00

Disponibilidades R$ 32,00 R$ 38,00 R$ 6,00

Duplicatas a Receber R$ 248,00 R$ 496,00 R$ 248,00

Estoques R$ 120,00 R$ 216,00 R$ 96,00

ATIVO NÃO CIRCULANTE R$ 700,00 R$ 1.060,00 R$ 360,00

Investimentos R$ 104,00 R$ 253,00 R$ 149,00

Participação em Coligadas R$ 104,00 R$ 253,00 R$ 149,00

Imobilizado R$ 596,00 R$ 807,00 R$ 211,00

Imóveis de uso R$ 440,00 R$ 540,00 R$ 100,00

(-) Depreciação acumulada de imóveis R$ -24,00 -R$ 48,00 R$ 24,00

Máquinas e acessórios R$ 200,00 R$ 355,00 R$ 155,00

(-) Depreciação acumulada de máquinas e aces-


R$ -20,00 -R$ 40,00 R$ 20,00
sórios

ATIVO TOTAL R$ 1100,00 R$ 1.810,00 R$ 710,00

PASSIVO CIRCULANTE R$ 250,00 R$ 375,00 R$ 125,00

Fornecedores R$ 150,00 R$ 220,00 R$ 70,00

Empréstimos R$ 100,00 R$ 155,00 R$ 55,00

PASSIVO NÃO CIRCULANTE R$ 280,00 R$ 370,00 R$ 90,00

Financiamentos internos de longo prazo R$ 110,00 R$ 170,00 R$ 60,00

Financiamentos externos de longo prazo R$ 170,00 R$ 200,00 R$ 30,00

PATRIMÔNIO LÍQUIDO R$ 570,00 R$ 1065,00 R$ 495,00

Capital R$ 475,00 R$ 500,00 R$ 25,00

Reservas de lucros R$ 95,00 R$ 565,00 R$ 470,00

PASSIVO + PL TOTAL R$ 1.100,00 R$ 1.810,00 R$ 710,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Pelo método indireto, são calculadas as variações que ocorreram no período em todas as
contas que compõem o Balanço Patrimonial. É o valor dessas variações que são levados à DFC,
agrupados nos três fluxos: de atividades operacionais, de atividades de investimento e de atividades
de financiamento.
104 Fundamentos de contabilidade

Com base nas variações calculadas na Tabela 9, no lucro de R$ 570,00 informado e no valor
dos dividendos de R$ 100,00 também informados, elabora-se a Demonstração do Fluxo de Caixa
(DFC), como se vê na Tabela 10.
Tabela 10 – Demonstração do Fluxo de Caixa

Demonstração do Fluxo de Caixa – Método indireto

Atividades operacionais

Lucro Líquido R$ 570,00

Mais: depreciação R$ 44,00

Lucro ajustado R$ 614,00

Aumento em Duplicatas a receber -R$ 248,00

Aumento em Estoques -R$ 96,00

Aumento em fornecedores e Empréstimos R$ 125,00

Redução em Provisão para Imposto de Renda pagar –

Redução em Salários a pagar –

Caixa Líquido consumido – Atividades operacionais R$ 395,00

Atividades de investimentos

Recebimento pela venda de Imobilizado R$ 149,00

Pagamento pela compra de Imobilizado R$ 211,00

Caixa Líquido consumido – Atividades de investimento R$ 360,00

Atividades de financiamentos

Aumento de Capital R$ 25,00

Empréstimo de longo prazo R$ 90,00

Distribuição de dividendos R$ 100,00

Caixa Líquido consumido – Atividades de financiamento R$ 15,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

A DFC, como podemos perceber, é uma demonstração financeira elaborada com base em
informações e dados de outras. Sua maior utilidade é a de representar um instrumento financeiro
para a tomada de decisões.
O Lucro Líquido (R$ 570,00) e o valor dos dividendos (R$ 100,00) foram informados logo
após os Balanços Patrimoniais. As demais contas e valores provêm das variações calculadas na
Tabela 9.
Ao final de cada um dos fluxos da DFC, encontra-se o somatório dos valores de cada qua-
dro. Assim, o somatório do fluxo 1 (caixa líquido consumido em atividades operacionais) é de R$
395,00; o somatório do fluxo 2 (atividades de investimentos) é de R$ 360,00 e o do fluxo 3 (ativida-
des de financiamento) é de R$ 15,00.
Constata-se, pela explicitação do tema e pela apresentação dos exemplos, que o objetivo da
DFC é prover informações sobre as entradas e saídas de dinheiro de uma empresa durante determi-
nado período, de modo a propiciar aos usuários a informação sobre a capacidade que a companhia
tem de gerar caixa.
Demonstrações financeiras 105

Considerações finais
Pode-se dizer que a Demonstração do Resultado é comparável a um filme. O enredo é o
registro das receitas e das despesas e o final é aquilo que se espera: é feliz quando há lucro ou infeliz
quando há prejuízo. A DRE aponta, em consequência disso, a capacidade de geração de riqueza do
negócio empreendido.
O Patrimônio Líquido representa de fato a riqueza de uma entidade, por isso é indispensável
a elaboração da Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido, por meio da qual se torna
possível identificar o valor patrimonial das ações ou das quotas de capital de uma empresa. Por esse
motivo, a DMPL é um instrumento indispensável para os investidores quando se interessam por
investir na compra de ações.
A Demonstração do Fluxo de Caixa, por sua vez, propicia aos gestores a realização de um
planejamento financeiro da empresa, pois os dados históricos por ela apresentados embasam as
decisões futuras sobre a necessidade de captações de empréstimos ou de aplicações de recursos
excedentes.
Essas três demonstrações, acrescidas do Balanço Patrimonial, atuam como registros histó-
ricos do sucesso ou insucesso de uma empresa e norteiam as ações dos seus acionistas e gestores.

Ampliando seus conhecimentos


• Indicamos a leitura de um estudo aprofundado sobre a Demonstração do Fluxo de Caixa,
incluindo pesquisa sobre o estágio do ciclo de vida das organizações nas instituições de
ensino superior.
GONÇALVES. A. A. Estudo da relação da Demonstração do Fluxo de Caixa (DFC) com
o estágio de vida das organizações nas instituições de ensino com capital aberto listadas
na BM&F/ Bovespa. 2013. Dissertação (Mestrado em Ciências Contábeis e Atuariais) –
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2013. Disponível em: https://
tede2.pucsp.br/handle/handle/1568#preview-link0. Acesso em: 28 jan. 2019.
• A leitura desta dissertação irá consolidar seus conhecimentos acerca das demonstrações
financeiras. Há, inclusive, um capítulo inteiro que apresenta uma proposta conceitual
para alteração de alguns procedimentos e estruturação das demonstrações contábeis das
sociedades cooperativas.
GONÇALVES, C. S. Uma contribuição à estruturação dos procedimentos e demonstrações
contábeis das cooperativas: aplicação em uma cooperativa de trabalho. 2003. Dissertação
(Mestrado em Ciências Contábeis) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.
Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/12/12136/tde-12122003-
112731/publico/DISSERTACAOCESARSCHMIDT.pdf. Acesso em: 28 jan. 2019.
106 Fundamentos de contabilidade

Atividades
1. Explique a diferença entre os fatos contábeis modificativos e fatos contábeis permutativos.

2. É correto afirmar que a adoção do método indireto de elaboração da Demonstração do


Fluxo de Caixa altera todos os campos previstos no método direto? Explique.

3. É possível afirmar que a DRE e a DMPL são demonstrações interdependentes e que a DFC
é independente? Justifique.

Referências
BRASIL. Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 17
dez. 1976. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6404consol.htm. Acesso em: 17 jan. 2019.

BRASIL. Receita Federal – RFB. Instrução normativa n. 51, de 3 de novembro de 1978. Diário Oficial da
União, Brasília, DF, 8 nov. 1978. Disponível em: http://sijut2.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.
action?&visao=original&idAto=13879. Acesso em: 17 jan. 2019.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, Poder Legislativo,
Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm.
Acesso em: 28 jan. 2019.

BRASIL. Lei n. 11.941, de 27 de maio de 2009. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 28
maio 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11941.htm.
Acesso em: 17 jan. 2019.

BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. Resolução n. 1.185, de 28 de agosto de 2009. Diário Oficial
da União, Brasília, DF, 15 set. 2009. Disponível em: http://www1.cfc.org.br/sisweb/SRE/docs/Res_1185.pdf.
Acesso em: 18 jan. 2019.

CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 26 (R1): apresentação das demonstrações contábeis.
Brasília, DF, 2011. Disponível em: http://static.cpc.aatb.com.br/Documentos/312_CPC_26_R1_rev%2013.
pdf. Acesso em: 03 jan. 2019.

FUNDAÇÃO GRUPO BOTICÁRIO. Demonstrações financeiras em 31 de dezembro de 2017 e 2016. 2017.


Disponível em: http://www.fundacaogrupoboticario.org.br/pt/quem-somos/pages/relatorio-anual.aspx.
Acesso em: 23 jan. 2019.

HENDRIKSEN, E. S.; VAN BREDA, M. F. Teoria da contabilidade. São Paulo: Atlas, 1999.

IUDÍCIBUS, S. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de acordo com as
normas internacionais e do CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

MARION, J. C. Contabilidade empresarial. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

MARTINS, E. Contabilidade de custos. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2010.


6
Fundamentos de custos

Para iniciar o tema custos, faz-se necessário inicialmente definir gastos. O gasto é uma
quantia monetária empregada pela empresa com a finalidade de desenvolver o negócio, sendo
classificado em quatro espécies: investimentos, despesas, perdas e custos.
Os investimentos compreendem os recursos despendidos em imobilizações técnicas e finan-
ceiras, os quais são caracterizados como bens de uso ou de rendimentos não destinados à venda.
Com o passar do tempo eles perdem valor em decorrência de uso ou obsolescência e, aos poucos,
transformam-se em custos ou despesas.
Despesas são gastos que representam uma inversão de capital com o objetivo de cooperar na
produção ou distribuição de riquezas. São lançadas diretamente no Resultado do período, ou seja,
não integram o valor do produto que se produz ou se revende. Pode-se dizer que as atividades de
vendas, distribuição e administração realizadas pela empresa geram despesas.
As perdas são gastos que ocorrem no processo de fabricação, no transporte ou no manuseio
da matéria-prima ou do produto. Já os custos são valores que fazem parte do produto final.
São os gastos empregados para produzi-lo, como matéria-prima, mão de obra direta, custos
indiretos de fabricação ou ainda valores dispendidos para adquiri-lo para revenda, nos casos de
empresas comerciais.
Em decorrência de os custos integrarem o valor da produção ou da aquisição de um bem ou
serviço, há necessidade do desenvolvimento de métodos para determinar de que maneira eles se
integram ao produto. Esses métodos podem ser o custeio por absorção e o custeio variável, um dos
assuntos que serão estudados neste capítulo.

6.1 Custeio por absorção e custeio variável


Vídeo
As empresas – tanto aquelas que desenvolvem atividades comerciais quanto
as voltadas para prestação de serviços ou industrialização – buscam para o exercí-
cio de suas atividades operacionais a revenda de produtos, a produção de bens ou
serviços e, como consequência, procuram gerar lucros que satisfaçam as expectati-
vas de retorno de suas fontes de financiamento.
A expressão lucro é utilizada de muitas maneiras pela contabilidade. Para compreender esse
tema, é importante destacar o lucro bruto, obtido pelas seguintes equações:
• Para as empresas comerciais: suponhamos que uma mercadoria tenha sido adquirida por
R$ 100,00 e revendida por R$ 150,00. Logo, o lucro bruto será de R$ 50,00.

Preço de venda (-) custo de aquisição da mercadoria vendida


108 Fundamentos de contabilidade

• Para as prestadoras de serviços: suponhamos que o preço cobrado pelo conserto de um


automóvel seja de R$ 80,00 e o valor dos serviços a ser pago ao mecânico seja de R$ 50,00.
O lucro bruto será de R$ 30,00.

Preço do serviço (-) custo do serviço prestado

Nesses dois tipos de atividade, é fácil determinar o custo porque existem dados
disponibilizados pelos documentos das operações. No caso da empresa mercantil, o custo é o
valor que consta na nota de compra; na prestação de serviços, é o apontamento da mão de obra
executada. Assim, vamos nos aprofundar na determinação de custos de uma empresa industrial,
pois não é tão simples chegar nesse valor quanto seria para as demais empresas.
De acordo com Martins (2003), custo se faz no chão da fábrica. Uma fábrica é, normalmente,
dividida em departamentos ou centros de custos, pois ao imaginá-la, pressupõe-se a existência de
uma planta industrial. Centro de custo ou Departamento, de acordo com Martins (2003, p. 70),
“é a unidade mínima administrativa para a Contabilidade de Custos, representada por pessoas e
máquinas (na maioria dos casos), em que se desenvolvem atividades homogêneas.”
Os centros de custos compostos por pessoas e máquinas são os encontrados com mais
frequência. Uma caldeiraria, por exemplo, é um centro de custo constituído por máquinas, pois
não existem funcionários que trabalhem próximos e permanentemente nesse centro.
Agora imagine uma empresa de consultoria que, para o exercício de suas atividades,
os consultores se deslocam para diversas empresas no mesmo dia e utilizam os equipamentos
dessas empresas. Nesse caso, teríamos um centro de custos formado apenas por pessoas.
Qualquer que seja o centro, é ali que ocorrem os custos e eles acompanham o movimento
físico dos insumos1. Imagine que os materiais (espécies de insumos) de uma fábrica artesanal de
cerveja sejam o malte, o lúpulo e o fermento. Para fabricar a cerveja, a matéria-prima transita por
três centros de custos, nos quais são realizados os processos produtivos.
Para exemplificar, nominaremos esses centros: mostura, fervura e fermentação. Esses são
os centros por onde os insumos transitam de maneira usual e repetitiva. O fluxo dos custos de
materiais acompanha seu movimento físico pelos centros, de acordo com Figura 1 a seguir.

1 Os insumos estão relacionados aos gastos gerados com os materiais, com a mão de obra e com o Imobili-
zado empregado.
Fundamentos de custos 109

Figura 1 – Centros de custos e processos produtivos da cervejaria artesanal

Fervura: o mosto é
fervido e recebe a adi-
ção de lúpulo. Ao final
Mostura: processo ini- da fervura, é separado
ciado com a moagem do do lúpulo e resfriado,
malte, que depois é mistu- Fermentação: o fermen-
preparando-se para a
rado à água quente. to é adicionado ao mosto
fermentação.
Com essa água rica em para iniciar a fermenta-
açúcares (chamada de ção e transformá-lo em
mosto) tem início o cerveja. A fermentação
processo de fabricação. dura de 5 a 10 dias.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Os custos dos materiais (malte, lúpulo e fermento) utilizados no processo de fabricação são
variáveis, de acordo com a intensidade ou natureza da produção. De acordo com Martins (2003), se
o custo aumenta à medida em que cresce o volume, trata-se de um custo variável, pois ele mantém
relação direta com o volume de produção ou serviço.
Além dos custos variáveis, na fábrica existem também os custos fixos, que ocorrem inde-
pendentemente da quantidade de produtos que está sendo produzida. São custos da capacidade
instalada que compreendem, por exemplo, a depreciação de máquinas, aluguel e seguro da fábrica.
São custos fixos também os referentes à remuneração e encargos da folha de salários dos empregados.
Como atribuir os custos variáveis e fixos ao produto? No Brasil é obrigatória a adoção do
custeio por absorção, em decorrência do disposto no CPC 16:
Os custos de transformação de estoques incluem os custos diretamente
relacionados com as unidades produzidas ou com as linhas de produção, como
pode ser o caso da mão de obra direta. Também incluem a alocação sistemática
de custos indiretos de produção, fixos e variáveis, que sejam incorridos
para transformar os materiais em produtos acabados. Os custos indiretos
de produção fixos são aqueles que permanecem relativamente constantes
independentemente do volume de produção, tais como a depreciação e a
manutenção de edifícios e instalações fabris, máquinas, equipamentos e ativos
de direito de uso utilizados no processo de produção e o custo de gestão e de
administração da fábrica. (CPC, 2009)

Nesse sentido, Iudícibus et al. (2018, p. 84) afirmam que a inclusão de materiais, mão de obra
e custos indiretos “representa o custeio por absorção, ou seja, o estoque em processo ou acabado
‘absorve’ todos os custos incorridos, diretos e indiretos”. A Figura 2 detalha a formação dos custos.
110 Fundamentos de contabilidade

Figura 2 – Detalhamento da formação de custos do produto

Custos indiretos de
Matéria-prima Mão de obra direta
fabricação

Produtos em
elaboração

Produtos acabados

Fonte: Elaborada pelo autor.

Por meio dessa contextualização, vamos supor que o custo dos materiais empregados na
produção de uma garrafa de cerveja seja de R$ 2,00. Admitamos, também, que os custos fixos
mensais da cervejaria artesanal sejam os dispostos conforme a Tabela 1.
Tabela 1 – Custos fixos de uma fábrica de cerveja

Aluguel do imóvel R$ 1.000,00


Salário do empregado da fábrica R$ 1.200,00
Encargos sociais e trabalhistas R$ 850,00
Energia elétrica R$ 128,00
Comunicação R$ 116,00
Seguro do imóvel e de equipamentos R$ 24,00

Total R$ 3.318,00
Fonte: Elaborada pelo autor.

Por outro lado, vamos imaginar que a produção do mês tenha sido de 1.500 garrafas de
cerveja. Uma maneira bastante simples é a distribuição proporcional dos custos indiretos às
garrafas produzidas. Assim, cada garrafa produzida irá absorver R$ 2,21 de custos fixos. O custo
de cada garrafa, utilizando-se o custeio por absorção será o demonstrado na Tabela 2.
Tabela 2 – Custo unitário por absorção de uma garrafa de cerveja

Custo variável unitário R$ 2,00


Rateio do custo fixo R$ 2,21

Total R$ 4,21
Fonte: Elaborada pelo autor.

O custo de uma garrafa de cerveja pelo custeio por absorção é de R$ 4,21. Vamos ampliar
nosso entendimento projetando custos para uma empresa dividida em centros e que fabrica diver-
sos produtos que transitam pelos diversos centros.
Fundamentos de custos 111

Os centros podem ser divididos em centros de produção ou produtivos e centros de serviços.


Os primeiros são aqueles pelos quais transitam os produtos e, em consequência, é possível apro-
priar seu custo aos produtos. Os segundos não atuam diretamente na produção e sua finalidade é
prestar serviços aos centros produtivos.
Para o exemplo que vamos desenvolver, os centros produtivos são a estamparia, a usinagem
e a montagem. Já os centros de serviços são a supervisão e o almoxarifado. A Tabela 3 apresenta a
estrutura desses centros e os custos de produção incorridos em cada um deles.
Tabela 3 – Centros de custos e valores atribuídos

Centros produtivos Centros de serviços


Custos
Estamparia Usinagem Montagem Supervisão Almoxarifado
Mão de obra R$ 25.000,00 R$ 15.000,00 R$ 10.000,00 R$ 2.500,00 R$ 2.000,00
Encargos de
R$ 17.500,00 R$ 10.500,00 R$ 7.000,00 R$ 1.750,00 R$ 1.400,00
mão de obra
Aluguel R$ 1.000,00 R$ 800,00 R$ 700,00 R$ 100,00 R$ 400,00
Depreciação R$ 2.500,00 R$ 2.000,00 R$ 400,00 – –
Energia elétrica R$ 420,00 R$ 2.800,00 R$ 400,00 R$ 60,00 R$ 60,00
Manutenção R$ 1.200,00 R$ 1.200,00 R$ 600,00 – –

Total R$ 47.620,00 R$ 32.300,00 R$ 19.100,00 R$ 4.410,00 R$ 3.860,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Os produtos não transitam pelos centros de serviços (supervisão e almoxarifado). Assim, não
é possível atribuir os custos desses serviços a eles, portanto, há necessidade de transferi-los aos
centros produtivos.
Existem diversas bases para ratear custos, como o aluguel do espaço ocupado. A escolha
da base será feita pelo gestor, considerando a relevância do custo tanto qualitativamente
quanto quantitativamente.
Observa-se que a mão de obra (qualidade) e o valor dela (quantidade) são os custos fixos
mais relevantes na empresa objeto do estudo, por isso, vamos escolher a mão de obra como a base
de rateio, utilizando os valores despendidos nos centros produtivos. Para isso, há necessidade de
calcular a relação de valor de cada centro produtivo com o total dos três centros, como se vê na
Tabela 4.
Tabela 4 – Relação percentual de participação do custo da mão de obra sobre o total

Mão de obra Valor Relação


Estamparia R$ 25.000,00 50%

Usinagem R$ 15.000,00 30%

Montagem R$ 10.000,00 20%

Total R$ 50.000,00 100%


Fonte: Elaborada pelo autor.
112 Fundamentos de contabilidade

Estabelecida a relação do custo de cada centro com o total dos custos, vamos transferi-los
dos centros de serviços para os centros produtivos.
Assim, os custos da supervisão e do almoxarifado serão transferidos de acordo com o
percentual da relação. Realizada a transferência, os valores referentes aos dois centros de serviços
ficarão com saldo nulo, como se observa na Tabela 5.
Tabela 5 – Transferência dos custos dos centros de serviços

Centros produtivos Centros de serviços


Custos
Estamparia Usinagem Montagem Supervisão Almoxarifado

Mão de obra R$ 25.000,00 R$ 15.000,00 R$ 10.000,00 R$ 2.500,00 R$ 2.000,00

Encargos de mão de obra R$ 17.500,00 R$ 10.500,00 R$ 7.000,00 R$ 1.750,00 R$ 1.400,00

Aluguel R$ 1.000,00 R$ 800,00 R$ 700,00 R$ 100,00 R$ 400,00

Depreciação R$ 2.500,00 R$ 2.000,00 R$ 400,00 – –

Energia elétrica R$ 420,00 R$ 2.800,00 R$ 400,00 R$ 60,00 R$ 60,00

Manutenção R$ 1.200,00 R$ 1.200,00 R$ 600,00 – –

Total R$ 47.620,00 R$ 32.300,00 R$ 19.100,00 R$ 4.410,00 R$ 3.860,00

Transferido supervisão R$ 2.205,00 R$ 1.323,00 R$ 882,00 -R$ 4.410,00 –

Transferido almoxarifado R$ 1.930,00 R$ 1.158,00 R$ 772,00 – -R$ 3.860,00

Total R$ 51.755,00 R$ 34.781,00 R$ 20.754,00 – –

Fonte: Elaborada pelo autor.

Vamos aceitar que a empresa produza três produtos, denominados Alfa, Beta e Gama.
Esses produtos transitam pelos três centros produtivos durante determinado tempo. Para saber
quanto tempo foi destinado a cada um deles, há necessidade de saber qual é o tempo necessário de
produção de cada unidade e a quantidade produzida. Vamos admitir as dimensões de tempo e de
quantidade descritas na Tabela 6.
Tabela 6 – Dimensão de tempo e de quantidade da produção

Quantidade
Produto Estamparia Usinagem Acabamento
produzida
Alfa 20 15 20 750

Beta 15 18 15 600

Gama 20 10 20 300
Fonte: Elaborada pelo autor.

Dessa maneira, uma unidade do produto Alfa demanda 20 minutos de estamparia, 15 minu-
tos de usinagem e 20 minutos de acabamento.
Fundamentos de custos 113

Na sequência, precisamos determinar a quantidade de minutos trabalhados em cada um dos


centros. Para isso, é necessário multiplicar o tempo gasto no centro de custos para cada unidade,
multiplicando-o pela quantidade produzida de cada produto, como se constata na Tabela 7.
Tabela 7 – Tempo despendido para o total de cada produto

Estamparia
Alfa 20 min × 750 unidades 15.000

Beta 15 min × 600 unidades 9.000

Gama 20 min × 300 unidades 6.000

Total em minutos 30.000

Usinagem
Alfa 15 min × 750 unidades 11.250

Beta 18 min × 600 unidades 10.800

Gama 10 min × 300 unidades 3.000

Total em minutos 25.050

Acabamento
Alfa 20 min × 750 unidades 15.000

Beta 15 min × 600 unidades 9.000

Gama 20 min × 300 unidades 6.000

Total em minutos 30.000


Fonte: Elaborada pelo autor.

Constata-se, pela Tabela 7, que o tempo gasto em minutos em cada centro foi de:

Estamparia: 30.000 minutos


Usinagem: 25.050 minutos
Acabamento: 30.000 minutos

Para determinar o custo do minuto de cada centro, cujo valor podemos observar na Tabela
8, basta dividir o custo total (Tabela 5) pela quantidade de minutos trabalhados em cada centro
(Tabela 7).
114 Fundamentos de contabilidade

Tabela 8 – Custo do minuto trabalhado

Centros produtivos Centros de serviços


Custos
Estamparia Usinagem Montagem Supervisão Almoxarifado
Mão de obra R$ 25.000,00 R$ 15.000,00 R$ 10.000,00 R$ 2.500,00 R$ 2.000,00

Encargos de mão de obra R$ 17.500,00 R$ 10.500,00 R$ 7.000,00 R$ 1.750,00 R$ 1.400,00

Aluguel R$ 1.000,00 R$ 800,00 R$ 700,00 R$ 100,00 R$ 400,00

Depreciação R$ 2.500,00 R$ 2.000,00 R$ 400,00 – –

Energia elétrica R$ 420,00 R$ 2.800,00 R$ 400,00 R$ 60,00 R$ 60,00

Manutenção R$ 1.200,00 R$ 1.200,00 R$ 600,00 – –

Total R$ 47.620,00 R$ 32.300,00 R$ 19.100,00 R$ 4.410,00 R$ 3.860,00

Transferido da supervisão R$ 2.205,00 R$ 1.323,00 R$ 882,00 -R$ 4.410,00 –

Transferido do almoxarifado R$ 1.930,00 R$ 1.158,00 R$ 772,00 – -R$ 3.860,00

Total R$ 51.755,00 R$ 34.781,00 R$ 20.754,00 – –

Tempo em minutos 30.000 min. 25.050 min. 30.000 min.

Custo por minuto R$ 1,725 R$ 1,388 R$ 0,692


Fonte: Elaborada pelo autor.

Além desses custos com o tempo de produção, há necessidade de incluir o custo dos mate-
riais. Para esse cálculo, vamos admitir que os produtos consumissem a quantidade de material e o
custo da unidade de material constantes na Tabela 9.
Tabela 9 – Quantidade, custo unitário e valor do material de cada unidade produzida.

Consumo unitário
Produto Custo unitário por kg Custo unitário
de matéria-prima
Alfa 2 kg R$ 50,00 R$ 100,00
Beta 3 kg R$ 40,00 R$ 120,00
Gama 2 kg R$ 30,00 R$ 60,00
Fonte: Elaborada pelo autor.

De acordo com o explicitado na Tabela 8, obtivemos o custo de cada minuto consumido


em cada centro produtivo. Já na Tabela 9 vimos o custo unitário da matéria-prima agregada ao
produto. Finalmente, podemos estabelecer o custo por absorção de cada produto fabricado, o que
é observado na Tabela 10.
Tabela 10 – Custo atribuído a cada produto com base no custeio por absorção

Produto Alfa
Materiais R$ 100,00

Outros custos

Estamparia 1,725 × 20 min R$ 34,50

Usinagem 1,388 × 15 min R$ 20,82

Montagem 0,692 × 20 min R$ 13,84

Custo unitário R$ 169,16


(Continua)
Fundamentos de custos 115

Produto Beta
Materiais R$ 120,00

Outros custos

Estamparia 1,725 × 15 min R$ 25,88

Usinagem 1,388 × 18 min R$ 33,84

Montagem 0,692 × 15 min R$ 10,38

Custo unitário R$ 190,10

Produto Gama
Materiais R$ 60,00

Outros custos

Estamparia 1,725 × 20 min R$ 34,50

Usinagem 1,388 × 10 min R$ 13,88

Montagem 0,692 × 20 min R$ 13,84

Custo unitário R$ 122,22

Fonte: Elaborada pelo autor.

Na Tabela 10 foi possível observar os custos de cada produto pelo método do custeio por
absorção, que é obrigatório no Brasil. É relevante observar que existe outro método cuja adoção se
torna indispensável sob a ótica gerencial, que é o custeio variável ou direto.
Esse método considera como custo de produção somente os custos variáveis, por enten-
der que os custos fixos existem, mesmo que não haja produção no período. É utilizado somente
pela contabilidade gerencial, pois não é permitido pela contabilidade financeira. De acordo com
Iudícibus et al. (2018, p. 84), o “chamado custeio direto não é aceitável para fins contábeis e de de-
monstrações contábeis oficiais, nem para fins fiscais”.
Entretanto, para a tomada de decisões – principalmente no enfrentamento de conflitos –
há necessidade de isolar o custo variável, tanto o direto quanto o indireto identificável, para que
depois de deduzido da receita com vendas, seja apurada a margem de contribuição. Essa apuração
se faz adotando a análise do custo/volume/lucro, que é o tema da seção a seguir.

6.2 Análise do custo/volume/lucro


Vídeo
Enquanto no método de custeamento por absorção os custos fixos são lan-
çados na conta Estoques, no método de custeamento direto trabalha-se com os
conceitos de custos e despesas fixos e custos e despesas variáveis para obter e avaliar
a margem de contribuição unitária de cada um dos produtos. Essa margem é obtida
pela diferença entre o preço unitário de venda e os custos variáveis unitários incor-
ridos em sua produção. Os custos fixos, em razão de ocorrerem independentemente do volume de
produção, não são atribuídos ao produto, mas à empresa como um todo.
O custeamento direto traz as seguintes vantagens:
116 Fundamentos de contabilidade

• fornece informações sobre os produtos que devem merecer maior esforço de venda, os
que podem ser colocados em planos secundários, ou até mesmo aqueles que podem ser
eliminados da produção;
• apresenta a relação entre custo, volume e lucro, levando à decisão de estabelecer o preço
de venda;
• define volumes de produção e preços adequados.

Vejamos o caso de uma indústria automobilística que possui uma planta industrial com
capacidade para produzir 36.000 automóveis por mês. Em decorrência da crise econômica, o mer-
cado encontra-se em recessão e essa indústria está conseguindo produzir e vender somente 24.000
automóveis mensalmente, com preço de venda de cada automóvel de R$ 50.000,00.
Os custos variáveis por unidade produzida são:
• custos variáveis incorridos com materiais no valor de R$ 32.000,00;
• despesas variáveis incorridas com transporte do veículo da fábrica até os pontos de venda
no valor de R$ 500,00;
• custos fixos mensais totais no valor de R$ 270.000.000,00.

Em determinado dia, a empresa recebe uma proposta do mercado externo para venda de
12.000 automóveis, porém o preço de venda da proposta é de R$ 35.000,00 por unidade. O dilema
é: deve-se aceitar ou não a proposta?
Vamos iniciar a resolução do problema realizando os cálculos com base no custeio por
absorção, de uso obrigatório, de acordo com a Tabela 11.
Tabela 11 – Cálculo de custeio por absorção

Descritores de custos e despesas Valores


Custos variáveis do material empregado R$ 32.000,00

Despesas variáveis pelo transporte R$ 500,00

Rateio dos custos fixos (270.000.000 / 24.000 unidades) R$ 11.250,00

Custeio por absorção R$ 43.750,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

O valor de R$ 43.750,00 demonstrado na Tabela 11 diz respeito ao custo unitário do


automóvel que irá compor o valor do Estoque no Ativo Circulante. Por ocasião da venda,
efetua-se a baixa do Estoque com contrapartida na conta Custo dos produtos vendidos (CPV) na
Demonstração do Resultado, que será elaborada na forma demonstrada na Tabela 12.
Tabela 12 – Demonstração do Resultado na venda de um automóvel

Descritores Valores
Receita Bruta de Vendas R$ 50.000,00
(-) CPV -R$ 43.750,00

(=) Lucro Bruto R$ 6.250,00


Fonte: Elaborada pelo autor.
Fundamentos de custos 117

Agora, analisemos a proposta de venda a um preço unitário de R$ 35.000,00. Nota-se de


imediato que esse preço para venda no mercado externo é de valor inferior ao custo do automóvel,
que é de R$ 43.750,00 registrado na contabilidade. Esse custo, como vimos anteriormente, foi
mensurado pelo custeio por absorção.
Preliminarmente, em decorrência desse resultado, não seria possível aceitar a proposta, pois
o preço é menor que o custo. Vamos, entretanto, enfrentar o dilema fazendo uso do custeio variável.
No custeio variável, os custos fixos não são computados no custo unitário do produto, por isso,
calcula-se a margem de contribuição unitária (MCU) do produto, como se vê na Tabela 13.
Tabela 13 – Cálculo da margem de contribuição unitária

Descritores Mercado interno Mercado externo


Preço unitário R$ 50.000,00 R$ 35.000,00

(-) Custos variáveis -R$ 32.000,00 -R$ 32.000,00

(-) Despesas variáveis -R$ 500,00 -R$ 500,00

(=) Margem de contribuição unitária R$ 17.500,00 R$ 2.500,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Veja que a MCU do produto a ser vendido no mercado externo é bem menor do que a MCU
obtida na venda no mercado interno. Considere, porém, que ela é positiva e se não houver limita-
ção ou restrição na capacidade produtiva, a proposta é aceitável. Essa premissa deriva da teoria das
restrições, referente aos aspectos operacionais e mercadológicos da empresa.
Inicialmente, há necessidade de examinar se existe restrição na capacidade produtiva.
Sabemos que a planta industrial instalada tem capacidade para produzir 36.000 automóveis por mês,
porém está produzindo somente 24.000 unidades. Vender 12.000 automóveis sob a ótica da capaci-
dade instalada é viável porque seria utilizada a capacidade ociosa, não havendo, portanto, limitação:

Capacidade instalada 36.000 unidades


(-) Produção atual 24.000 unidades
(=) Capacidade ociosa 12.000 unidades

Conclusão: não há restrição.

E os custos fixos? Eles integrarão a Demonstração do Resultado com destaque exclusivo e


não como CPV. Dessa maneira, na Tabela 14 (que demonstra o custeio por absorção), os custos fixos
estão integrados no CPV de R$ 1.050.000,00; enquanto na Tabela 15, referente ao custeio variável,
os custos fixos são demonstrados separadamente. Vejamos as duas demonstrações, considerando
a venda de toda a produção do período: pelo custeio por absorção foram 24.000 unidades e pelo
custeio variável serão 36.000 unidades.
118 Fundamentos de contabilidade

Tabela 14 – Demonstração do Resultado pelo custeio por absorção

Receita Bruta de Vendas 24.000 × R$ 50.000,00 R$ 1.200.000.000,00


(-) CPV 24.000 × R$ 43.750,00 -R$ 1.050.000.000,00

(=) Lucro Bruto R$ 150.000.000,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Em decorrência de os custos fixos totais serem apresentados separadamente, no método de


custeio variável o CPV é igual para os dois métodos, como se vê na Tabela 15.
Tabela 15 – Demonstração do Resultado pelo custeio variável

Receita Bruta de Vendas R$ 1.620.000.000,00

Mercado interno 24.000 × R$ 50.000,00 R$ 1.200.000.000,00

Mercado externo 12.000 × R$ 35.000,00 R$ 420.000.000,00

(-) Custos variáveis R$ 1.152.000.000,00

Mercado interno 24.000 × R$ 32.000,00 R$ 768.000.000,00

Mercado externo 12.000 × R$ 32.000,00 R$ 384.000.000,00

(=) Margem de contribuição R$ 468.000.000,00

(-) Custos fixos totais R$ 270.000.000,00

(=) Lucro Bruto R$ 198.000.000,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Conclui-se facilmente que a contabilidade financeira legal ou fiscal deve ser realizada, obri-
gatoriamente, fazendo uso do custeio por absorção, porém, ela não permite enfrentar os dilemas
que se colocarem à frente do gestor. Portanto, é imprescindível a utilização do custeio variável para
fins gerenciais, sob risco de tomada de decisões inadequadas.
E se houver limitação na capacidade produtiva? A pergunta será respondida utilizando a
margem de contribuição unitária. Calculamos a MCU para venda nos dois mercados:

Mercado interno: R$ 17.500,00


Mercado externo: R$ 2.500,00

Vimos também que não é possível produzir mais do que 36.000 automóveis por mês. Então,
vamos imaginar que a proposta de compra do exterior seja de 13.000 automóveis. Para atender-
mos, em decorrência da restrição da capacidade produtiva, nós teríamos que reduzir a venda para
o mercado interno para 23.000 unidades. Seria viável? Primeiramente vejamos a situação atual:

Mercado interno: 24.000 unidades × R$ 17.500,00 = R$ 420.000.000,00


Mercado externo: 12.000 unidades × R$ 2.500,00 = R$ 30.000.000,00
(=) Margem de contribuição total: R$ 450.000.000,00
Fundamentos de custos 119

Comparemos com a nova situação proposta:

Mercado interno: 23.000 unidades × R$ 17.500,00 = R$ 402.500.000,00


Mercado externo: 13.000 unidades × R$ 2.500,00 = R$ 32.500.000,00
(=) Margem de contribuição total: R$ 435.000.000,00

Observa-se que a nova proposta é inviável. Foi possível verificar que é indiscutível que
os gestores devam fazer uso do que se denomina contabilidade gerencial e que a análise da
margem de contribuição unitária deve ser mais estudada. Até aqui, vimos o custo, o lucro e
o volume (parcialmente), restando aprofundar o conceito e utilização desse último, objeto de
destaque na próxima seção.

6.3 Margem de contribuição unitária e determinação do ponto


de equilíbrio
Vídeo
Como vimos, a contabilidade fiscal ou legal é realizada sem a separação dos
custos fixos e variáveis, em decorrência da obrigação do uso do custeamento por
absorção. Por isso, ela não oferece elementos necessários para calcular a margem de
contribuição unitária, que é a diferença entre o preço e os custos variáveis.
Preço e custo referem-se a uma unidade do produto ou do serviço. Para determinarmos
a relação do custo/volume/lucro, dependemos da cuidadosa separação dos custos segundo sua
variabilidade. De acordo com Padoveze (2004, p. 368),
os conceitos de custos fixos e variáveis permitem uma expansão das possibi-
lidades de análise dos gastos da empresa, em relação aos volumes produzidos ou
vendidos, determinando pontos importantes para fundamentar futuras decisões
de aumento ou diminuição de produção, corte ou manutenção de produtos
existentes, mudanças no mix de produção, incorporação de novos produtos ou
quantidades adicionais etc.

Analisemos, em primeiro lugar, a expressão lucro. O lucro é a diferença entre o preço e os


gastos despendidos na produção de um produto. O preço representa o valor pelo qual um bem é
vendido. Os custos ou gastos incumbidos podem ser fixos ou variáveis.
No custeio variável ou direto, os custos fixos de produção são tratados como inerentes ao
período, e não como custo dos produtos. Disso resulta que eles não são incluídos no valor da pro-
dução em andamento, tampouco nos estoques dos produtos acabados.
Os custos gerados pela planta fabril, pelas instalações, pelas máquinas e pelos equipamentos
tendem a ser inflexíveis com relação às mudanças no volume de produção, isto é, esses custos não
variam com o volume produzido. Pequenas oscilações ocorrem, mas não de modo proporcional,
como em um reajuste no valor dos salários, fato que aumenta o custo fixo, porém não gera aumen-
to de produção.
120 Fundamentos de contabilidade

Por isso, a linha que representa os custos fixos deverá ser elaborada não exatamente de modo
horizontal, e sim com pequenos degraus que representam os pequenos aumentos e, algumas vezes,
diminuições durante o período, como se vê na Figura 3.
Figura 3 – Representação da variação dos custos fixos
$

Custos
fixos

Fonte: Elaborada pelo autor.

Já em relação aos custos variáveis, o valor dos materiais oscila proporcionalmente ao grau da
produção, com pequenas variações, principalmente decorrentes das perdas verificadas no processo
produtivo. Dessa maneira, a representação gráfica dos custos variáveis, em vez de ser uma linha
reta, deve ser representada como na Figura 4.
Figura 4 – Representação dos custos variáveis
$

Custos
variáveis

Fonte: Elaborada pelo autor.

Como vimos na seção anterior, com a definição do preço e dos custos variáveis podemos
chegar à margem de contribuição unitária2, que junto dos custos fixos é indispensável para calcular
o volume, ou seja, a quantidade a ser (ou que já foi) produzida, principalmente o necessário para
cobrir os gastos da empresa, determinando o chamado ponto de equilíbrio.
Para Leone (2000, p. 427), “sua utilização e a análise tem como objetivo auxiliar as funções
de planejamento e a de tomada de decisões gerenciais de curto prazo da empresa”. Com os valores
a seguir discriminados (Figura 5), podemos determinar o ponto de equilíbrio, que ocorre quando
as Receitas e Despesas da empresa são iguais a zero.
Figura 5 – Ponto de equilíbrio

RECEITAS = DESPESAS

PONTO DE EQUILÍBRIO
Fonte: Elaborada pelo autor.

2 Preço de venda unitária subtraído dos custos variáveis unitários consumidos em uma unidade produzida.
Fundamentos de custos 121

Existem algumas formas de calcular o ponto de equilíbrio. São elas: Ponto de Equilíbrio
Operacional em unidades (PEO); Ponto de Equilíbrio Econômico (PEE); e Ponto de Equilíbrio com
múltiplos produtos (Mix).
O Ponto de Equilíbrio Operacional (PEO) define em unidades o número de produtos
(peças, metros, quilos etc.) que deve ser fabricado e vendido para que o resultado seja zero, de
acordo com a seguinte fórmula:

custos fixos totais (CFT)


PEO em unidades =
margem de contribuição unitária (MCU)

Vamos considerar os dados a seguir para exemplificar o cálculo:


Custos fixos totais: R$ 5.000,00
Preço unitário de venda: R$ 4,00
Custos variáveis unitários: R$ 2,50
Qual é o volume de produtos que a empresa deve produzir e vender para que seu resultado
seja igual a zero?

CFT
PEO em unidades =
MCU

5.000
PEO em unidades =
4,0 - 2,50

5.000
PEO em unidades = = 3.333,33 unidades
1,50

Pelos cálculos demonstrados, conclui-se que a empresa, ao produzir 3.333,33 unidades,


atinge o Ponto de Equilíbrio Operacional; nessa hipótese, não tem lucro, tampouco prejuízo.
A Tabela 16 demonstra o resultado zero quando se atinge o PEO.
Tabela 16 – Resultado com vendas no PEO

Receita 3.333,33 × 4,00 R$ 13.333,32

(-) Custos Variáveis 3.333,33 × 2,50 -R$ 8.333,33

(=) MC total R$ 5.000,00

(-) Custos fixos -R$ 5.000,00

(=) Resultado 0,0

Fonte: Elaborada pelo autor.


122 Fundamentos de contabilidade

Ao vender 3.333,33 unidades do produto, todos os custos incorridos na produção e todos


os custos fixos serão compensados, porém a empresa não terá lucro algum. Para obter lucro, a
empresa deverá produzir e vender mais unidades.
Para definir o aumento de volume de produção e de vendas, utiliza-se o Ponto de Equilíbrio
Econômico (PEE), que é aquele que ocorre quando às receitas totais são acrescidas do valor do
lucro desejado pela empres. Para calcular o PEE devemos utilizar a seguinte fórmula:

custos fixos totais + lucro desejado


PEE em unidades =
margem de contribuição unitária

Vamos considerar os mesmos valores do exemplo anterior para o cálculo do PEE:


Custos fixos totais: R$ 5.000,00
Preço unitário de venda: R$ 4,00
Custos variáveis unitários: R$ 2,50
Lucro desejado: R$ 3.000,00
Qual é o volume de produtos que a empresa deve produzir e vender para que seu resultado
seja igual a R$ 3.000,00?

CFT + lucro desejado


PEE em unidades =
MCU

5.000 + 3.000
PEE em unidades =
4,00 - 2,50

8.000
PEE em unidades = = 5.333,33 unidades
1,50

Nota-se que para cobrir todos os custos e ainda apresentar o lucro almejado, a empresa de-
verá vender 5.333,00 unidades. A Tabela 17 demonstra o resultado superavitário para quando se
atingir o PEE.
Tabela 17 – Resultado com vendas no PEE

Receita 5.333,33 × 4,00 R$ 21.333,32

(-) Custos variáveis 5.333,33 × 2,50 -R$ 13.333,33

(=) MC total R$ 8.000,00

(-) Custos fixos -R$ 5.000,00

(=) Resultado R$ 3.000,00

Fonte: Elaborada pelo autor.


Fundamentos de custos 123

Observa-se que ao aumentar o volume de produção, mesmo permanecendo os demais da-


dos inalterados, a empresa obtém lucro. Com um só produto, ficou demonstrado que é simples
conceituar e calcular pontos de equilíbrio.
Entretanto, as empresas geralmente comercializam diversos produtos, por isso é preciso
considerar todos eles e calcular distintas margens de contribuição para cada um.
Para se calcular o Ponto de Equilíbrio com múltiplos produtos (Mix) deve-se determinar
qual é o valor da receita de vendas de cada produto em relação às vendas totais e assim determinar a
margem de contribuição unitária ponderada.
O cálculo da margem de contribuição ponderada se faz necessário, pois como existe mais de
um produto, logo com diferentes preços, deve-se estabelecer a relação deles com a produção total.
Na Tabela 18 estão discriminados três produtos com seus respectivos preços e custos variá-
veis unitários. A tabela mostra quanto cada produto corresponde, em percentual, ou seja, qual é a
relação de cada um dos produtos com a receita total das vendas da empresa e os custos fixos totais
do período. Os percentuais e os custos fixos são ilustrativos, produzidos apenas para fins didáticos.
Tabela 18 – Dados referentes aos produtos vendidos pela empresa

Produto Alfa Beta Celta Período

Preço unitário de venda R$ 60,00 R$ 35,00 R$ 42,00

Custos e despesas variáveis R$ 40,00 R$ 20,00 R$ 22,00

Relação com vendas totais 35% 25% 40% 100%

Custos fixos totais R$90,000,00

Fonte: Elaborada pelo autor.

Para determinar a MCU Ponderada, em primeiro lugar deve-se calcular a MCU de cada um
dos produtos. Em seguida, multiplica-se a MCU pelo percentual de participação que cada produto
tem na receita total.
Por último, soma-se as margens ponderadas de cada produto, obtendo-se a MCU Ponderada
de todos eles. Todos esses cálculos estão demonstrados na Tabela 19.
Tabela 19 – Cálculo da Margem de Contribuição Ponderada de todos os produtos

Produto Alfa Beta Celta

Preço unitário de venda R$ 60,00 R$ 35,00 R$ 42,00

(-) Custos variáveis R$ 40,00 R$ 20,00 R$ 22,00

(=) Margem de contribuição unitária R$ 20,00 R$ 15,00 R$ 20,00

Relação com vendas totais 35% 25% 40%

(=) Margem de Contribuição Ponderada R$ 7,00 R$ 3,75 R$ 8,00 R$ 18,75


Fonte: Elaborada pelo autor.
124 Fundamentos de contabilidade

Qual é o volume de produtos que a empresa deve produzir e vender para que seu resultado
seja igual a zero?

CFT
PEO em unidades =
MCU ponderada

90.000
PEO em unidades =
18,75

90.000
PEO em unidades = = 4.800 unidades
18,75

Ao dividir R$ 90.000,00 de custos fixos totais pela margem de contribuição unitária pon-
derada de R$ 17,75, chegamos à conclusão de que devem ser produzidas 4.800 unidades para
obter o Ponto de Equilíbrio Operacional. Como estamos trabalhando com margem ponderada,
é necessário determinar qual é a quantidade mínima de cada produto a ser produzida.
Para se determinar o ponto de equilíbrio de cada produto, basta multiplicar o percentual de
relação de um pela quantidade prevista para o PEO, assim:

Alfa 35,00% × 4.800 1.680 unidades


Beta 25,00% × 4.800 1.200 unidades
Celta 40,00% × 4.800 1.920 unidades

A Tabela 20 demonstra a margem de contribuição total, apurando o valor de vendas e os


custos variáveis de cada produto.
Tabela 20 – Margem de contribuição total

Receita Bruta R$ 223.440,00

Produto Alfa 1.680 × R$ 60,00 R$ 100.800,00

Produto Beta 1.200 × R$ 35,00 R$ 42.000,00

Produto Celta 1.920 × R$ 42,00 R$ 80.640,00

(-) Custos variáveis -R$ 133.440,00

Produto Alfa 1.680 × R$ 40,00 R$ 67.200,00

Produto Beta 1.200 × R$ 20,00 R$ 24.000,00

Produto Celta 1.920 × R$ 22,00 R$ 42.240,00

(=) MCU total R$ 90.000,00

Fonte: Elaborada pelo autor.


Fundamentos de custos 125

Como se vê, na hipótese de se vender a quantidade de cada produto no ponto de equilíbrio,


se diminuirmos da margem de contribuição total os custos fixos totais, obtém-se um resultado
igual a zero (R$ 90.000,00 - R$ 90.000,00 = 0).
Como acabamos de ver, a empresa deve produzir ao todo 4.800 unidades para atingir o
Ponto de Equilíbrio Operacional (PEO). Como produz três produtos, a partir da relação percentual
de cada um deles na Receita Total, é possível determinar o volume de cada um dos produtos.
Esse cálculo é muito importante porque interfere diretamente nos aspectos de produção.
Imaginemos que apenas uma máquina seja necessária para produzir todos os produtos, porém
cada um deles exige uma ferramenta específica, isto é, toda a vez que for produzido o produto
Alfa usa-se uma ferramenta que terá que ser substituída para produzir o produto Beta e assim
por diante.
Com a indicação da quantidade de cada produto, já temos uma decisão: a produção
de Alfa será de, no mínimo, 1.680 unidades, pois esta quantidade é a definida pelo Ponto de
Equilíbrio Ponderado.

Considerações finais
A contabilidade financeira embasa-se totalmente nos preceitos legais e normativos regentes
da contabilidade. Porém, paralelamente, os gestores se obrigam a desenvolver o que se denomina
contabilidade gerencial, sem a qual não seria possível examinar e resolver os dilemas que se apre-
sentam no dia a dia das empresas.
É a contabilidade gerencial que promove a análise do resultado econômico por meio da
relação entre custo, volume e lucro, o que permite determinar o preço e a lucratividade de modo a
realizar o planejamento estratégico na área das finanças.

Ampliando seus conhecimentos


• Para aprofundar seu conhecimento sobre a gestão estratégica de custos, leia a tese de
Tiago Nascimento Borges Slavov.
SLAVOV, T. N. B. Gestão estratégica de custos: uma contribuição para a construção
de sua estrutura conceitual. 2013. 291 f. Tese (Doutorado). Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. Disponível
em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/12/12136/tde-02052013-135506/pt-br.php.
Acesso em: 15 jan. 2019.
• Para estudar a aplicação do custeio por absorção em pequenas empresas, leia o artigo de
Fúlvia Lima e Rudolfo Filho.
LIMA, F. F.; FILHO, R. A. M. Gestão estratégica de custos: custeio por absorção em
pequenas empresas. Interações, Campo Grande, v. 17, n. 3, p. 528-541, jul./set. 2016.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/inter/v17n3/1518-7012-inter-17-03-0528.pdf.
Acesso em: 15 jan. 2019.
Atividades
1. Como são divididos os centros de custos de uma empresa e qual é o motivo dessa divisão?

2. Em relação ao valor dos estoques, qual é a diferença entre custeio por absorção e custeio variável?

3. Quais bases são aceitas para determinar o rateio dos custos fixos?

Referências
CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis. CPC 16: Estoques. Brasília, DF, 2009. Disponível em:
http://static.cpc.aatb.com.br/Documentos/243_CPC_16_R1_rev%2013.pdf. Acesso em: 14 jan. 2019.

IUDÍCIBUS, S. et al. Manual de contabilidade societária: aplicável a todas as sociedades de acordo com as
normas internacionais e do CPC. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

LEONE, G. S. G. Custos: planejamento, implantação e controle. São Paulo: Atlas, 2000.

MARTINS, E. Contabilidade de custos. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

PADOVEZE, C. L. Contabilidade gerencial: um enfoque em sistema de informação contábil. 4. ed. São Paulo:
Atlas, 2004.
7
Análise das demonstrações financeiras

Após a Grande Depressão ocorrida no mercado financeiro dos Estados Unidos da América,
em 1929, as empresas ficaram obrigadas a apresentar o Balanço auditado. À época, as demons-
trações eram assim denominadas: Demonstração do Patrimônio – hoje denominado de Balanço
Patrimonial; Balanço Econômico – atual Demonstração do Resultado do Exercício; e Balanço
Financeiro – conhecido como Demonstração do Fluxo de Caixa. É por isso que encontramos na
literatura ou mesmo em conteúdos programáticos de algumas disciplinas a expressão análise de
balanços. Contudo, levando em conta que hoje são exigidas as análises de outras demonstrações,
a expressão mais adequada tornou-se análise das demonstrações financeiras.
Oportunamente, convém acrescentar que a análise da situação econômico-financeira de
uma empresa extrapola o conteúdo apresentado nas demonstrações contábeis e engloba dados e
informações que não estão presentes nessas demonstrações.
A análise das demonstrações financeiras pode ser direcionada à própria empresa ou ao
público em geral. Denomina-se análise interna quando sua execução é realizada por profissionais
da própria empresa e objetiva realizar o controle operacional da entidade e dos colaboradores.
De acordo com a escola norte-americana, análise das demonstrações financeiras interna é um
instrumento de correção e de tomadas de decisões. Já a análise externa é promovida por um analista
não vinculado à empresa e é realizada para atender demandas requeridas por agentes externos,
como instituições financeiras, estudos e projetos de ampliação da empresa, fiscalização tributária,
entre outros.
Este capítulo irá fornecer fundamentos teóricos e realizar aplicações práticas com o objetivo
de orientar um analista nas ações de decompor, comparar e interpretar as demonstrações financeiras.
Para isso, é importante que o analista tenha conhecimento de matemática básica e financeira e
que saiba classificar as contas de todas as demonstrações financeiras com a finalidade de aplicar as
fórmulas matemáticas adequadas para a construção de indicadores que irão propiciar a interpretação
dos dados apresentados pela contabilidade.

7.1 Análises horizontal, vertical e de valores absolutos


Vídeo
A análise das demonstrações financeiras tem como objetivo gerar relatórios
(embasados em dados contábeis) que diagnosticam a situação econômico-financei-
ra de uma entidade e divide-se em diversos segmentos.
Iniciaremos tratando da análise de valores absolutos, que são aqueles
constantes nas demonstrações. Ao subtrair-se os dados de um ano pelo do outro,
obtêm-se diferenças absolutas que determinam a variação ocorrida entre duas situações, ou seja,
de um ano para o outro.
128 Fundamentos de contabilidade

Sem os cálculos das diferenças absolutas, não é possível elaborar a Demonstração do


Fluxo de Caixa (DFC) pelo método indireto, que por força da Lei n. 11.638/2007 (BRASIL, 2007)
substituiu a Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos (DOAR), a qual utilizava as
variações para determinar o fluxo de fundos e usos. Embora não seja mais obrigatória a elaboração
da DOAR, muitas empresas ainda a adotam, pois, de acordo com Marion (2015), essa demonstração
tem uma função importante nas atividades gerenciais.
A Tabela 1 apresenta diversas contas do Ativo não Circulante de uma empresa fictícia,
com valores referentes ao ano 1 e ao ano 2 e as variações ocorridas entre os dois períodos.
Tabela 1 – Diferenças absolutas das contas do Ativo não Circulante

Contas ano 1 ano 2 Valores absolutos


Aquisição de subsidiárias R$ 12.950,00 R$ 16.900,00 -R$ 3.950,00

Compras de Imobilizado R$ 57.755,00 R$ 67.210,00 -R$ 9.455,00

Compras de Intangíveis R$ 11.550,00 R$ 14.000,00 -R$ 2.450,00

Compras de Ativos financeiros R$ 5.200,00 R$ 4.200,00 R$ 1.000,00

Empréstimos concedidos a coligadas R$ 12.000,00 R$ 9.000,00 R$ 3.000,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Os valores absolutos são os descritos nos anos 1 e 2 e a diferença dos valores absolutos é o
resultado obtido pela diminuição dos valores do ano 1 pelos valores do ano 2.
A Demonstração do Fluxo de Caixa pelo método indireto apresenta as variações nos Ativos
não Circulantes no fluxo denominado Investimentos. Com base na Tabela 1, podemos verificar que
houve saídas de caixa pelas aquisições de subsidiárias no valor de R$ 3.950,00 em razão de compras
de Imobilizado no valor de R$ 9.450,00; e pela compra de Intangível no valor de R$ 2.450,00.
Por outro lado, constatamos entrada de caixa pela venda (diminuição) de Ativos financeiros
e pela devolução de empréstimos concedidos às coligadas no valor de R$ 3.000,00. Por tratar de
aquisições ou vendas de contas do Ativo não Circulante, as variações entre essas contas são deno-
minadas atividades de investimento e estão demonstradas na Tabela 2.
Tabela 2 – Fluxo dos investimentos (DFC)

Contas R$
Aquisição de subsidiárias -R$ 3.950,00
Compras de Imobilizado -R$ 9.455,00
Compras de Intangíveis -R$ 2.450,00
Compras de Ativos financeiros R$ 1.000,00
Empréstimos concedidos a coligadas R$ 3.000,00

Caixa líquido dos investimentos -R$ 11.855,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

Como se vê, a variação total do caixa foi de R$ 11.855,00 negativos, o que significa que houve
esse desembolso em decorrência da aquisição de subsidiárias, de Imobilizado e de Intangíveis,
aquisições que resultam no valor de R$ 15.855,00 negativos.
Análise das demonstrações financeiras 129

Por outro lado, houve um recebimento referente à redução de Ativos financeiros no valor de
R$ 1.000,00 e uma devolução de empréstimos realizados pelas subsidiárias no valor de R$ 3.000,00.
Assim, se diminuirmos dos R$ 15.855,00 de saídas os R$ 4.000,00 de entrada, chegaremos ao resul-
tado apresentado na Tabela 2.
Realizada a análise dos valores absolutos, estudamos agora a análise horizontal, que é a
comparação entre resultados da evolução de uma mesma conta em sucessivos períodos contábeis.
De acordo com Azzolin (2012, p. 187)
A análise horizontal, também denominada de análise de evolução, ou de método
de percentagens horizontais, consiste em verificar a evolução, através do tempo,
dos diversos itens que compõem as demonstrações financeiras permitindo, em
consequência, avaliar o crescimento ou a diminuição dos componentes das
demonstrações financeiras através de uma série histórica (vários períodos).

As empresas são obrigadas a publicar suas demonstrações financeiras apresentando dados


de no mínimo dois anos sucessivos. Podemos, em decorrência disso, realizar a análise horizontal de
todas as empresas constituídas como sociedades por ações, pois elas são obrigadas a publicá-las.
Uma análise para verificar a evolução de diversos anos só será possível se pudermos acessar os dados
de uma sequência de períodos, por isso, a análise horizontal pode ser desenvolvida anualmente
ou encadeadamente.
Segundo Matarazzo (2010) e Fernandes (1997), existem dois tipos de análise horizontal:
a encadeada e a anual. Na análise horizontal encadeada, o cálculo das variações é realizado em
relação a um ano-base, ou seja, os valores referentes ao primeiro ano equivalem a 100% (cem por
cento) e os valores dos anos seguintes serão divididos pelos do primeiro ano, pois este é o valor
representativo dos valores monetários sobre os quais são confrontados os demais períodos. Já na
análise horizontal anual, o cálculo das variações relaciona-se com o ano anterior, ou seja, o ano an-
terior equivale a 100% e o valor do ano seguinte será dividido pelo valor do ano anterior. Vejamos
um exemplo dos dois critérios na Tabela 3.
Tabela 3 – Duplicatas a receber dos anos 1 ao 4

Conta ano 1 ano 2 ano 3 ano 4


Duplicatas a receber R$ 200,00 R$ 250,00 R$ 300,00 R$ 350,00

Análise encadeada 100% 25% 50% 75%

Análise anual 0% 25% 20% 17%


Fonte: Elaborada pelo autor.

Como se constata, na análise encadeada os valores dos anos 2, 3 e 4 foram divididos pelo
valor do ano 1 – já que este foi considerado como ano-base para os cálculos –, enquanto na análise
anual, o valor do ano 2 foi dividido pelo valor do ano 1. Os valores do ano 3 foram calculados sobre
o ano 2 e os valores do ano 4 foram divididos pelo ano 3.
O terceiro tipo de análise que reflete a tendência de crescimentos ou de diminuições dos
componentes patrimoniais é a análise vertical. Por essa análise, também conhecida por análise de
130 Fundamentos de contabilidade

estrutura ou método de percentagens verticais, calcula-se a participação percentual dos valores dos
diversos elementos que compõem as demonstrações financeiras com relação aos valores totais.
Por exemplo, os valores de Disponibilidades (que é um elemento do Ativo Circulante)
serão divididos pelo valor total do Ativo Circulante para verificarmos quantos por cento as
Disponibilidades representam no valor total do Ativo Circulante. O mesmo procedimento é
adotado para todas as contas e demonstrações: qual a porcentagem que o Capital representa do
Patrimônio Líquido? Quanto a conta Fornecedores representa do Passivo não Circulante?
Como exemplo, vamos considerar a Demonstração do Resultado simplificada desenvolvida
na Tabela 4, com suas partes em relação à conta totalizadora, isto é, a conta que representa 100%
do grupo.
Tabela 4 – Análise vertical da Demonstração do Resultado simplificada

Total Receita Líquida de Vendas R$ 120.000,00


Custo dos produtos vendidos R$ 73.200,00

Despesas com vendas R$ 10.000,00


Partes
Despesas administrativas R$ 12.000,00

(=) Lucro R$ 24.800,00


Fonte: Elaborada pelo autor.

No exemplo da Tabela 4, considera-se que o valor da Receita Líquida de Vendas corresponde


a 100% dos valores da conta, e a partir desse valor verificamos a relação de cada um dos elementos
que compõem essa receita, aplicando-se os cálculos de uma regra de três simples, pois conhecemos
três dos quatro valores que necessitamos, como se observa nos cálculos realizados a seguir.
• Proporção do Custo dos produtos vendidos em relação à Receita Líquida de Vendas: se
R$ 120.000,00 representa 100%, quanto representa R$ 73.200,00?

(73.200,00 × 100%)
X= = 61%
120.000,00

• Proporção das Despesas com vendas em relação à Receita Líquida de Vendas: se


R$ 120.000,00 representa 100%, quanto representa R$ 10.000,00?

(10.000,00 × 100%)
X= = 8,33%
120.000,00

• Proporção das Despesas administrativas em relação à Receita Líquida de Vendas: se


R$ 120.000,00 representa 100%, quanto representa R$ 12.000,00?

(12.000,00 × 100%)
X= = 10%
120.000,00
Análise das demonstrações financeiras 131

• Proporção do Lucro em relação à Receita Líquida de Vendas: se R$ 120.000,00 representa


100%, quanto representa R$ 24.800,00?

(24.800,00 × 100%)
X= = 20,67%
120.000,00

Realizando esses cálculos na Demonstração simplificada, ela ficará de acordo com o de-
monstrado na Tabela 5.
Tabela 5 – DRE com os cálculos da análise vertical

Descritores Valores AV

Total Receita Líquida de Vendas R$ 120.000,00 100%

Custo dos produtos vendidos R$ 73.200,00 61,00%

Despesas com vendas R$ 10.000,00 8,33%


Partes
Despesas administrativas R$ 12.000,00 10,00%

(=) Lucro R$ 24.800,00 20,67%


Fonte: Elaborada pelo autor.

Como podemos verificar, ao dividirmos cada uma das partes pelo total, identificamos quan-
to cada parte representa do total.
Agora, vejamos um relatório das análises horizontal (AH) e vertical (AV) das Demonstrações
do Resultado dos Exercícios dos anos 1 e 2 de uma empresa fictícia, com o intuito de interpretar os
percentuais dessas análises.
Tabela 6 – DRE com os cálculos da AH e AV

Evolução Estrutura
CONTAS ano 1 ano 2
AH a2/a1 AV 1 AV 2

(=) Receita Bruta Vendas R$ 108.000,00 R$ 127.200,00 17,78% 100,00% 100,00%

(-) ICMS + PIS + COFINS -R$ 20.520,00 -R$ 27.984,00 36,37% 19,00% 22,00%

(=) Receita Líquida Vendas R$ 87.480,00 R$ 99.216,00 13,42% 81,00% 78,00%

(-) Custo das mercadorias e


-R$ 43.200,00 -R$ 50.880,00 17,78% 40,00% 40,00%
serviços vendidos

(=) Lucro Bruto R$ 44.280,00 R$ 48.336,00 9,16% 41,00% 38,00%

(-) Despesas operacionais -R$ 22.788,00 -R$ 26.314,00 15,47% 21,10% 20,69%

Despesas com vendas R$ 13.122,00 R$ 13.253,00 1,00% 12,15% 10,42%

Resultado Financeiro Líquido R$ 6.124,00 R$ 7.961,00 30,00% 5,67% 6,26%

Despesas administrativas R$ 3.542,00 R$ 5.100,00 43,97% 3,28% 4,01%

(=) Lucro operacional R$ 21.492,00 R$ 22.022,00 2,47% 19,90% 17,31%


Fonte: Elaborada pelo autor.
132 Fundamentos de contabilidade

A quais conclusões ou diagnósticos podemos chegar em relação à análise horizontal?


Vejamos algumas delas:
• a evolução da análise horizontal só pode ser calculada do ano 2 sobre o ano 1, pois o ano
anterior a 1 não foi evidenciado na análise.
• a evolução das vendas do ano 1 para o ano 2 foi de 17,78%. Esse percentual é de suma
importância para a análise, pois se a receita cresce próximo de 18%, pode-se inferir que as
demais contas também evoluirão nesse percentual.
• vejamos o caso dos tributos. Eles evoluíram 36,37%. Se as vendas evoluíram 18%, era de
se esperar que os tributos, em virtude de serem calculados sobre as vendas, evoluiriam na
mesma proporção, podendo-se inferir que houve aumento da carga tributária.
• as Despesas operacionais estão abaixo da evolução das vendas (15,47%), em função do
crescimento quase nulo das Despesas com vendas, que praticamente não evoluíram (1%).
Como as Despesas operacionais representam o somatório das Despesas com vendas,
do Resultado Financeiro Líquido e das Despesas administrativas, há que se pesquisar
as demais contas que compõem este grupo, dado o aumento de 15,47% no total das
despesas, enquanto as de vendas evoluíram somente 1%. Essa pesquisa leva à conclusão
de que a empresa teve um crescimento desproporcional do Resultado Financeiro Líquido,
que aumentou em 30%; e das Despesas administrativas, que evoluíram em 43,97%.
Esses dados devem servir de parâmetro para os gestores verificarem os motivos do
crescimento desproporcional em comparação à evolução das receitas.
• os expressivos aumentos de tributos e de despesas foram os responsáveis pelo Lucro
operacional apresentar um crescimento de 2,47%, valor aquém ao da evolução das vendas.
E em relação à análise vertical? O que podemos inferir pelos dados da Tabela 6? Vejamos
alguns pontos interessantes:
• assim como observamos na análise horizontal, na análise vertical houve um crescimento
no valor dos tributos de 19% para 22%, fato que resultou na diminuição do percentual da
Receita Líquida sobre Vendas, que caiu de 81% para 78%.
• além dos tributos, o Resultado Financeiro Líquido, que antes representava 5,67% da
Receita Bruta, agora representa 6,26%.
• houve aumento das Despesas administrativas, que antes representavam 3,28% da Receita
Bruta e agora representam 4,01%.
Os cálculos matemáticos, como se percebe, são relativamente fáceis de realizar. É o resultado
desses cálculos que viabilizam a realização de um diagnóstico da situação apresentada no relatório
que denominamos anteriormente como conclusões.
envidar: empenhar, Esse diagnóstico permite ao gestor envidar seus esforços no sentido de melhorar aqueles
dedicar.
itens que se distanciam da normalidade e permitem exercer o controle sobre os atos e fatos que
ocorrem em uma empresa. Os gestores, utilizando os dados do exemplo em questão, com certeza
Análise das demonstrações financeiras 133

questionarão: não será possível realizar um planejamento tributário para minimizar a carga
tributária? Qual é motivo do crescimento desproporcional das Despesas financeiras e das Despesas
administrativas? A busca de respostas a essas questões é uma função importante, principalmente
para a correção de falhas e para a definição de metas saneadoras.
As análises dos valores absolutos e as análises horizontal e vertical oferecem evidências que
devem ser confrontadas com outros indicadores, dentre os quais estão os indicadores financeiros,
assunto que veremos a seguir.

7.2 Indicadores financeiros: solvência e estrutura patrimonial


Vídeo
Indicadores são métricas e mecanismos que coletam dados e geram informa-
ções. Tratam-se de dados financeiros que servem para inferir a situação financeira
de um empreendimento ou de uma entidade.
Inicialmente, é forçoso constatar que diversos autores usam expressões
diversificadas para se reportar aos indicadores financeiros. Para Franco (1989) e
Iudícibus (1995), a expressão é quociente. Matarazzo (2010, p. 154) usa a expressão índice e ensina
que “o importante não é o cálculo de grande número de índices, mas de um conjunto de índices
que permita conhecer a situação da empresa, segundo o grau de profundidade desejada na análise”.
Aqui usaremos a expressão indicadores, opção escolhida também por Assaf Neto (2012).
Iniciaremos pelos indicadores de solvência, que demonstram a capacidade de a empresa solver suas
dívidas. Nesse grupo destacam-se os indicadores de: liquidez corrente, liquidez seca e liquidez geral.
O indicador de liquidez corrente demonstra quanto a empresa possui de bens e direitos
que podem se transformar em dinheiro em um curto prazo (Ativo Circulante) para pagar suas
dívidas que também estão no curto prazo (Passivo Circulante), esse indicador é obtido por meio
da seguinte fórmula:

ILC = AC / PC
Em que:
ILC = indicador de liquidez corrente
AC = Ativo Circulante
PC = Passivo Circulante

O indicador de liquidez seca revela quanto a empresa possui em dinheiro e bens dispo-
níveis – desconsiderando o valor do estoque – para pagar suas dívidas no curto prazo (próximo
exercício). Ele é obtido por meio da seguinte fórmula:
134 Fundamentos de contabilidade

ILS = (AC – E) / PC
Em que:
ILS = indicador de liquidez seca
AC = Ativo Circulante
E = Estoques
PC = Passivo Circulante

O indicador de liquidez geral esboça quanto a empresa possui em dinheiro e bens realizá-
veis no curto e no longo prazo para pagar suas dívidas também no curto e no longo prazo. Ele é
obtido ao utilizar a seguinte fórmula:

ILG= (AC + RLP) / (PC + PNC)


Em que:
ILG = indicador de liquidez geral
AC = Ativo Circulante
RLP = Realizável a longo prazo
PC = Passivo Circulante
PNC = Passivo não Circulante

Para exemplificar os indicadores vistos, vamos calculá-los utilizando os dados constantes no


exemplo de Balanço Patrimonial apresentado a seguir.
Tabela 7 – Balanços Patrimoniais

Contas ano 1 ano 2 Contas ano 1 ano 2

Ativo Circulante R$ 1.600,00 R$ 2.248,00 Passivo Circulante R$ 1.800,00 R$ 2.120,00

Disponibilidades R$ 100,00 R$ 110,00 Fornecedores R$ 1.000,00 R$ 1.200,00

Duplicatas a receber R$ 850,00 R$ 1.293,00 Empréstimos R$ 800,00 R$ 920,00

Estoques R$ 650,00 R$ 845,00 Passivo não Circulante R$ 390,00 R$ 560,00

Ativo não Circulante R$ 3.500,00 R$ 3.300,00 Empréstimos R$ 300,00 R$ 400,00

Duplicatas a receber R$ 500,00 R$ 200,00 Impostos diferidos R$ 90,00 R$ 160,00

Imobilizado R$ 3.000,00 R$ 3.100,00 Patrimônio Líquido R$ 2.910,00 R$ 2.868,00

Ativo Total R$ 5.100,00 R$ 5.548,00 Passivo + PL R$ 5.100,00 R$ 5.548,00

Fonte: Elaborada pelo autor.


Análise das demonstrações financeiras 135

Observados os Balanços dos anos 1 e 2, e fazendo uso das fórmulas, vejamos o resultado do
cálculo dos indicadores de solvência na Tabela 8 a seguir.
Tabela 8 – Indicadores de solvência

Indicadores ano 1 ano 2

Liquidez corrente 0,89 1,06

Liquidez seca 0,53 0,66

Liquidez geral 0,96 0,91

Fonte: Elaborada pelo autor.

Ao observar os indicadores obtidos na Tabela 8, verifica-se que excetuado o indicador de


liquidez corrente do ano 2, a empresa não possui recursos suficientes para liquidar suas obrigações,
pois os indicadores deveriam ser maiores que 1,0. Isso significa que para cada real de obrigação
deve haver, ao menos, um real de disponibilidades ou de realizáveis. Entretanto, os indicadores de
liquidez não são suficientes para fazer qualquer inferência sobre a situação financeira da empresa,
sendo necessário calcular outros indicadores.
Se verificarmos as fórmulas descritas e sua aplicação prática, constatamos que estamos
analisando as contas dos investimentos (Ativo) e as contas de financiamentos (Passivo e Patrimônio
Líquido). Por isso, vamos avançar em nossos estudos e calcular de que forma as empresas compõem
a sua estrutura patrimonial. Os indicadores que retratam a estrutura de capitais são:
• participação de capital de terceiros nos investimentos totais;
• endividamento de curto prazo;
• imobilização do Patrimônio Líquido;
• participação do capital de terceiros sobre o dos sócios;
• composição do endividamento.

A participação de capital de terceiros, que indica o quanto a empresa é dependente de


recursos de terceiros, é obtida com a aplicação da seguinte fórmula:

(PC + PNC) / AT
Em que:
PC = Passivo Circulante
PNC = Passivo não Circulante
AT = Ativo Total
136 Fundamentos de contabilidade

A imobilização do Patrimônio Líquido busca dimensionar quanto dos recursos perten-


centes aos sócios (PL) estão paralisados no Ativo não Circulante ou, na linguagem popular, estão
engessados. Esse valor é obtido com a aplicação da seguinte fórmula:

ANC / PL
Em que:
PL = Patrimônio Líquido
ANC = Ativo não Circulante

A participação do capital de terceiros sobre o dos sócios indica o percentual de capital de


terceiros em relação ao Patrimônio Líquido, expressando o grau de necessidade da empresa em
utilizar recursos de terceiros. Esse indicador é obtido pela seguinte fórmula:

PCT = PL / (PC + PNC)


Em que:
PCT = Participação de capitais de terceiros
PC = Passivo Circulante
PNC = Passivo não Circulante
PL = Patrimônio Líquido

A composição do endividamento, que indica quanto da dívida total da empresa deverá ser
paga em curto prazo, é obtida por meio da seguinte fórmula:

CE = PC / (PC + PNC)
Em que:
CE = Composição do endividamento
PC = Passivo Circulante
PNC = Passivo não Circulante

A fim de aplicar as fórmulas descritas e calcular os indicadores da estrutura patrimonial,


vamos utilizar o Balanço do ano 1, demonstrado na Tabela 9 a seguir.
Análise das demonstrações financeiras 137

Tabela 9 – Balanço Patrimonial do ano 1

Contas ano 1 Contas ano 1

Ativo Circulante R$ 1.600,00 Passivo Circulante R$ 1.800,00

Disponibilidades R$ 100,00 Fornecedores R$ 1.000,00

Duplicatas a receber R$ 850,00 Empréstimos R$ 800,00

Estoques R$ 650,00 Passivo não Circulante R$ 390,00

Ativo não Circulante R$ 3.500,00 Empréstimos R$ 300,00

Duplicatas a receber R$ 500,00 Impostos diferidos R$ 90,00

Imobilizado R$ 3.000,00 Patrimônio Líquido R$ 2.910,00

Ativo Total R$ 5.100,00 Passivo + PL R$ 5.100,00

Fonte: Elaborada pelo autor.

Os percentuais referentes aos indicadores da estrutura patrimonial, calculados com base nos
dados da Tabela 9, podem ser vistos na Tabela 10.
Tabela 10 – Indicadores da estrutura patrimonial

Participação capital de terceiros (PC + PNC) / AT 42,94%

Imobilização do PL ANC / PL 120,27%

Participação de capital de terceiros sobre o dos sócios PL / (PC+PNC) 132,88%

Composição do endividamento PC / (PC+PNC) 82,19%


Fonte: Elaborada pelo autor.

Em que:
PC = Passivo Circulante
PNC = Passivo não Circulante
AT = Ativo Total
PL = Patrimônio Líquido

Para analisar os indicadores da estrutura patrimonial, deve-se averiguar o cenário econô-


mico tanto do país quanto do ramo de atividade em que a empresa atua. Segundo Marion (2012,
p. 95), “não há dúvida de que, principalmente em época inflacionária, é apetitoso trabalhar mais
com capital de terceiros que com capital próprio. Essa tendência é acentuada quando a maior
parte do capital de terceiros é composta de exigíveis não onerosos”1.

1 O Passivo não oneroso é composto por obrigações sobre as quais não incidem juros nem atualização monetária.
As Duplicatas a pagar, por exemplo, são um passivo não oneroso, pois se o valor for pago no prazo de vencimento, não
sofrerá acréscimo algum.
138 Fundamentos de contabilidade

Em instituições financeiras de financiamento, como o Banco Nacional de Desenvolvimento


Econômico e Social (BNDES), existem diversas linhas de crédito a juros subsidiados. Isto enseja
que as empresas busquem esses recursos em vez de empregar o capital próprio, por serem mais
“apetitosos”, como afirma Marion (2012, p. 95).
Dessa forma, tanto os indicadores de solvência quanto os da estrutura de capitais devem ser
analisados juntamente aos indicadores de atividade, grupo que conheceremos no próximo item.

7.3 Indicadores de rotatividade dos estoques, dos valores a receber


e dos valores a pagar
Vídeo Na seção anterior aprendemos que o indicador de liquidez corrente é obtido
pela divisão do Ativo Circulante pelo Passivo Circulante. Assim, para obtermos
um exemplo, vamos calcular o ILC com base nos seguintes dados:

Ativo Circulante: R$ 120,00


Passivo Circulante: R$ 120,00
ILC = AC / PC
ILC = 120,00 / 120,00
ILC = 1,00

Interpretando isoladamente este indicador, conclui-se que a empresa tem condições de


liquidar suas obrigações, pois para cada R$ 1,00 de exigível (Passivo Circulante), ela tem possibili-
dade de realizar R$ 1,00 (Ativo Circulante).
O Ativo Circulante (AC) é composto, entre outras contas, pelas Duplicatas a receber.
Suponhamos que dos R$ 100,00 lançados no Ativo Circulante, R$ 50,00 sejam referentes às Duplicatas
a receber. Suponhamos, ainda, que a empresa tenha concedido 60 dias para o cliente lhe pagar.
O Passivo Circulante (PC) é composto, entre outras contas, pelas Duplicatas a pagar. Vamos
supor que dos R$ 100,00 lançados no Passivo Circulante, R$ 50,00 refiram-se às Duplicatas a pagar.
Suponhamos, ainda, que a empresa tenha obtido de seu fornecedor o prazo de 30 dias para pagamento.
Nota-se que embora o ILC tenha indicado que a empresa tem condições de solver seus
compromissos, esse fato não é uma verdade absoluta, pois no vencimento da duplicata a pagar
(que é de 30 dias), ela não terá disponibilidade para realizar esse pagamento, já que a duplicata a
receber se transformará em dinheiro somente dentro de 60 dias.
Dessa necessidade decorre que os indicadores de solvência devem relacionar-se
obrigatoriamente com os indicadores de rotatividade, também denominados indicadores de
velocidade ou indicadores de atividade. Para Gitman (2010, p. 53), essa nomenclatura relaciona-se
com a “velocidade com que diversas contas se convertem em vendas ou em caixa – entradas ou
saídas”. Essa velocidade dependerá do ciclo operacional da empresa que, a título de exemplo, consta
da Figura 1.
Análise das demonstrações financeiras 139

Figura 1 – Ciclo operacional resumido de uma empresa industrial

Compra de
fornecedores

Recebimento Estocagem de
das vendas matéria-prima

Venda Produção

Estocagem de
produtos prontos

Fonte: Elaborada pelo autor.

Cada ação do ciclo operacional representado na Figura 1 deve ser convertido em dias,
para isso, desenha-se uma linha do tempo. Vamos considerar a linha do tempo da Figura 2.
Figura 2 – Linha do tempo do ciclo operacional

Compra de Recebimento
Produção
fornecedores das vendas
Estocagem da Estocagem Ciclo operacio-
matéria-prima dos produtos nal (total)

Tempo em dias 0 20 5 35 60 120

Fonte: Elaborada pelo autor.

Observa-se que desde o momento da compra até o recebimento das vendas, é demandado
um período de 120 dias, isto é, a empresa obterá dinheiro somente 120 dias após a compra
do produto.
Identificado o prazo de realização de caixa, a questão que se levanta é: a empresa pode
liquidar a obrigação decorrente da compra? A resposta é dada por meio dos cálculos realizados no
ciclo financeiro, também chamado de ciclo de caixa, cuja fórmula é a seguinte:

Ciclo financeiro (CF) = Ciclo operacional (–) Prazo de pagamento das obrigações

Se o fornecedor conceder 60 dias de prazo, está nítido que a empresa não conseguirá liquidar
seu compromisso, fato que resulta em necessidade de capital de giro. Veja na Tabela 11.
140 Fundamentos de contabilidade

Tabela 11 – Demonstração da necessidade do capital de giro (em dias)

Ciclo operacional 120 dias

(-) Prazo do fornecedor 60 dias

(=) Necessidade de capital de giro em dias 60 dias


Fonte: Elaborada pelo autor.

É imprescindível que sejam estudadas adequadamente as políticas de compras, de estocagem


da matéria-prima, de produção, de estocagem de produtos prontos, de venda dos produtos e de
recebimento pela venda dos produtos. Esses estudos se assentam nos indicadores de rotatividade,
que permitem conhecer o ritmo ou a velocidade de transformação de contas do Ativo e do Passivo:
• Prazo médio de estocagem (PME)
• Prazo médio de recebimento das duplicatas a receber (PMR)
• Prazo médio de pagamento das duplicatas a pagar (PMP)
• Posicionamento relativo (PR)

• Posicionamento de atividade (PA)

Para exemplificar, vamos calcular o indicador referente aos estoques. Os estoques estão
registrados pelo custo de aquisição, por isso mantêm relação com o custo das mercadorias
vendidas (CMV). Imaginando que o valor do estoque seja de R$ 20.000,00 e o CMV seja de
R$ 160.000,00, dividindo-se um pelo outro (20.000,00 / 160.000,00), concluímos que a empresa
tem o correspondente a 12,5% de estoque para suas vendas.
Esse indicador será multiplicado por 360 dias2 e o resultado indicará quantos dias a em-
presa tem de estoque para vender. A seguir, apresentamos um pequeno comentário e as fórmulas
de cálculo. O prazo médio de estocagem mostra quantos dias o estoque demora para ser utilizado
na produção, ou vendido nos casos de empresas comerciais:

Estoques
Prazo médio de estocagem = × 360
CMV

O prazo médio de recebimento das duplicatas, calculado a partir da política de crédito deter-
minada pela empresa, expressa quantos dias a empresa espera, em média, para receber suas vendas
a prazo. A fórmula utilizada é a seguinte:

Duplicatas a receber
Prazo médio de recebimento = × 360
Receita de vendas

2 Para cálculo da rotatividade, considera-se que todos os meses do ano têm 30 dias. Logo, o ano tem 360 dias para
esse fim.
Análise das demonstrações financeiras 141

O prazo médio de pagamento das duplicatas, dependente da política de pagamentos


definida pelos fornecedores, demonstra quantos dias a empresa espera, em média, para pagar
suas compras. Ele é calculado por meio da seguinte fórmula:

Fornecedores
Prazo médio de pagamento = × 360
Compras

O posicionamento relativo “permite conhecer a relação existente entre os prazos de


recebimento e de pagamentos” (AZZOLIN, 2012, p. 218). O ideal seria que o mesmo prazo que os
fornecedores concedem para pagamento fosse concedido para recebimento dos clientes.
Assim, ao dividir o prazo médio das Duplicatas a receber pelo prazo médio das Duplicatas
a pagar, em uma situação ideal, esse resultado seria igual a 1. Se o indicador for maior que 1,
isso significa que foi concedido mais prazo que se recebeu; e se inferior, significa que se concedeu
menos prazo aos clientes que o concedido pelos fornecedores.

Prazo médio de recebimentos


Posicionamento relativo =
Prazo médio de pagamentos

O posicionamento de atividade indica se o prazo médio de recebimento das vendas somado


ao prazo de permanência em estoques estão compatíveis com o prazo necessário para pagamento
das compras:

PM de estocagem + PM de recebimentos
Posicionamento de atividade =
Prazo médio de pagamentos

Para exemplificar as fórmulas aprendidas, vamos calcular os prazos médios e os quocientes


de posicionamento relativo e de atividade com base nos dados da Tabela 12.
Tabela 12 – Dados para cálculo dos prazos médios

Descritores ano 1
Estoque de mercadorias R$ 600,00

Custo das mercadorias vendidas R$ 3.600,00

Duplicatas a receber R$ 600,00

Duplicatas a pagar R$ 900,00

Vendas a prazo R$ 8.000,00

Compras R$ 5.000,00
Fonte: Elaborada pelo autor.
142 Fundamentos de contabilidade

Com os dados fornecidos para desenvolvermos uma atividade prática, é possível fazermos
os cálculos.
• Prazo médio de estocagem

600,00
PME = = 0,17 × 360 = 60
3.600,00

O resultado significa que a empresa possui em estoques 17% do necessário para vender
no próximo período, pois possui R$ 600,00 em estoques e vende R$ 3.600,00. Ou seja, a
empresa possui em estoque o suficiente para vender nos próximos 60 dias.
• Prazo médio de recebimentos

600,00
PMR = = 0,075 × 360 = 27
8.000,00

Infere-se que a empresa ainda não recebeu 7,5% das vendas que realizou e que o prazo
médio de recebimento das vendas é de 27 dias.
• Prazo médio de pagamentos

900,00
PMP = = 0,18 × 360 = 64,8
5.000,00

Nota-se que a empresa ainda não pagou 18% das compras que realizou e que o prazo
médio de pagamento das compras é de 64,8 dias.
• Posicionamento relativo

27
Posicionamento relativo = = 0, 42
64,8

A busca será sempre equiparar os indicadores de recebimento e pagamento. Logo, a meta


é que o posicionamento seja igual a 1. Indicador menor que 1 indica fluxo de caixa favo-
rável, pois o prazo de recebimento é menor que o de pagamento. No sentido oposto, se for
maior que 1, o fluxo de caixa da empresa será considerado desfavorável.
• Posicionamento da atividade

60 = 24
Posicionamento de Atividade = = 1,38
60,8

Diferentemente do posicionamento relativo, aqui se constata que a empresa, em


decorrência do tempo elevado de estocagem, terá grandes problemas com seu fluxo de
caixa, pois o prazo de pagamento é menor que o somatório dos prazos de estocagem e
de recebimento. O resultado será o de capital de giro negativo, isto é, para saldar seus
compromissos, a empresa terá que tomar empréstimos.
Análise das demonstrações financeiras 143

Em conclusão, percebe-se que o gargalo da empresa está no prazo de estocagem, pois ao com-
parar o prazo médio de estocagem com o prazo médio dos recebimentos de vendas, constatamos que
o prazo de estocagem é mais de 100% maior que o de recebimento – e é ele que cria valor para a em-
presa porque uma das motivações para o cliente é a possibilidade de pagar no maior prazo possível.
A exemplo da adoção do sistema just in time, uma negociação para determinar o prazo de just in time: no
momento certo.
pagamento aos fornecedores e uma adequada concessão de crédito aos clientes são os objetivos de
uma gestão financeira eficiente e eficaz que deve ser realizada por meio dos indicadores apresentados.
Além dos indicadores de solvência e de atividades que acabamos de conhecer – que anali-
sam os aspectos financeiros –, a atenção agora volta-se para os indicadores econômicos, objeto da
próxima seção.

7.4 Indicadores econômicos: rentabilidade e retorno


Vídeo Inicialmente, é necessário tecer alguns comentários sobre as expressões uti-
lizadas para se calcular os indicadores econômicos. As contas que constituem uma
DRE são discriminadas no art. 187 da Lei n. 6.404/1976 (BRASIL, 1976):
I - a receita bruta das vendas e serviços, as deduções das vendas, os abatimentos
e os impostos;
II - a receita líquida das vendas e serviços, o custo das mercadorias e serviços
vendidos e o lucro bruto;
III - as despesas com as vendas, as despesas financeiras, deduzidas das receitas,
as despesas gerais e administrativas, e outras despesas operacionais;
IV - o lucro ou prejuízo operacional, as receitas e despesas não operacionais e o
saldo da conta de correção monetária (artigo 185, § 3º);
IV - o lucro ou prejuízo operacional, as receitas e despesas não operacionais;
(Redação dada pela Lei nº 9.249, de 1995)
IV - o lucro ou prejuízo operacional, as outras receitas e as outras despesas;

As deduções de vendas anulam o valor das vendas, pois representam devolução do que
foi vendido. Os abatimentos concedidos também reduzem o valor das vendas. Os tributos serão
recolhidos ao erário. Dessa maneira, “ao se proceder a análise econômica, quando for necessário
reportar-se à Receita, adotar-se-á a receita líquida de vendas e serviços sob a denominação de
‘vendas’” (AZZOLIN, 2012, p. 239).A expressão Lucro Bruto refere-se ao resultado da Receita
subtraída do Custo dos produtos vendidos (CPV).
O Lucro Líquido Operacional é o Lucro Bruto deduzido dos gastos com as atividades não
ligadas diretamente ao processo produtivo, como nos casos de despesas com vendas e despesas
gerais e administrativas. Esse Lucro Líquido Operacional é o que denominamos de EBITDA3,
capaz de identificar a geração de caixa antes dos juros, tributos, depreciação e amortização.
Atualmente, o EBITDA é utilizado no Brasil em decorrência da conversão às normas internacionais
de contabilidade.

3 EBITDA é uma sigla inglesa que significa Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization ou, traduzindo
livremente, “Lucro Antes dos Juros, dos Impostos, da Depreciação e da Amortização”.
144 Fundamentos de contabilidade

Após a dedução dos juros, da depreciação e da amortização, chega-se a um novo lucro,


denominado Resultado do Exercício antes dos impostos, ou EBT4. Desse resultado deduzem-se os
tributos sobre o resultado e obtém-se o Lucro Líquido, que é o valor à disposição dos acionistas.
A rentabilidade é uma medida obtida pela divisão do Lucro Líquido pelo que se deseja
medir. Por exemplo, se quisermos saber qual é a rentabilidade das vendas brutas, dividimos o
Lucro Líquido pela Receita Bruta. Se a intenção é determinar a rentabilidade das vendas líquidas,
divide-se o Lucro Líquido pela Receita Líquida, e assim sucessivamente.
Após definidas as expressões utilizadas, em uma revisão de literatura é possível constatar
alguns indicadores que avaliam economicamente uma empesa. São os definidos por Assaf Neto
(2012), Iudícibus (2017), Gitman (2010) e Marion (2012):
• giro do Ativo;
• rentabilidade do Ativo Total;
• rentabilidade do Patrimônio Líquido;
• margem das vendas;
• margem EBITDA;
• alavancagem financeira;
• taxa de crescimento do Lucro Líquido;
• lucro por ação;
• valor patrimonial da ação.

Ao adquirir uma ação ou uma quota do capital de uma empresa, o investidor almeja resultado
financeiro. A mensuração e a rentabilidade são medidas por meio dos indicadores que se embasam
no lucro. Vamos analisá-los na sequência.
O giro do Ativo mostra a proporção existente entre o volume de vendas e os investimentos
totais realizados pela empresa, ou seja, quanto a empresa vendeu para cada R$ 1,00 de investimen-
tos no Ativo. A fórmula utilizada para obter esse indicador é:

Vendas
Ativo Total

A rentabilidade do Ativo Total mede a eficiência global da administração, apurando o


retorno obtido em relação ao total de recursos aplicados. Se uma empresa investe em ativos um
valor de R$ 1.000.000,00 e o lucro do período foi de R$ 50.000,00, a rentabilidade do ativo foi de
5% (50.000,00 / 1.000.000,00). Vamos supor que em outra empresa tenha sido investido em Ativo
o mesmo valor, porém, o lucro tenha sido de R$ 80.000,00, logo, a rentabilidade do ativo terá sido

4 EBT significa Earning Before Taxes ou, traduzindo livremente, “Lucro Antes dos Impostos”.
Análise das demonstrações financeiras 145

de 8% (80.000,00 / 1.000.000,00). Os gestores de qual das duas empresas teria agido com mais
eficiência? Os cálculos devem ser feitos por meio da seguinte fórmula:

Lucro Líquido
Ativo Total

A rentabilidade do Patrimônio Líquido mede a capacidade de a empresa gerar retorno,


indicando quanto ela obtém de lucro para cada R$ 1,00 de capital próprio. Seu cálculo é feito
desta forma:

Lucro Líquido
Patrimônio Líquido

A margem das vendas revela a rentabilidade obtida pela empresa em função de seu fatura-
mento, ou seja, quanto a empresa obtém de lucro para cada R$ 1,00 vendido. Esse valor é obtido
aplicando-se a fórmula a seguir:

Lucro Líquido
vendas

O EBITDA “é um indicador financeiro que é calculado à margem da Demonstração do


Resultado, pois, ao se adotar o custeio por absorção, parte dos itens que o compõe foram incluídos
em itens anteriores” (AZZOLIN, 2012, p. 244). Em decorrência de o EBITDA identificar a geração
de caixa antes dos juros, dos impostos, da depreciação e da amortização, ele é um indicador finan-
ceiro que representa a geração operacional de caixa. Utiliza-se a seguinte fórmula para obtê-lo:

EBITDA
Receita Líquida

A alavancagem financeira5 ocorre quando os capitais de terceiros (Passivos) produzem efei-


tos positivos sobre o Patrimônio Líquido. Para exemplificar, imagine que o custo do Capital de
terceiros captado no BNDES corresponda a 5% a.a. e que os acionistas esperem um retorno de 10%
a.a. sobre os investimentos que fizerem.
Analisada essa hipótese, os gestores irão concluir que tomar recursos do banco gerará
menos gastos do que tomar recursos dos acionistas. Menor valor de juro impacta positivamente
o Patrimônio Líquido, daí a importância de se medir quanto isso representa correlacionando os
investimentos (Ativo) ao retorno do PL. Para calcular o grau de alavancagem financeira (GAF),
aplica-se a seguinte fórmula:

5 Do inglês Financial Leverage.


146 Fundamentos de contabilidade

retorno sobre Patrimônio Líquido


retorno sobre o Ativo

A taxa de crescimento do Lucro Líquido é o percentual de lucro distribuído aos acionistas


na forma de dividendos ou de juros sobre o capital próprio. De acordo com Assaf Neto (2012), é
pay-out: percentual denominada índice de pay-out e é calculada de acordo com a seguinte fórmula:
de lucro distribuído.

pay-out = dividendos
Lucro Líquido

O Lucro por Ação (LPA) representa a parcela do Lucro Líquido que compete a cada ação da
empresa. Esse indicador é obtido por meio da seguinte expressão:

LPA = Lucro Líquido


número de ações

Uma parte dos lucros auferidos nos diversos períodos da existência da empresa é distribuída
aos sócios ou acionistas, enquanto a outra parte permanece retida na empresa, com base na decisão
da Assembleia de acionistas. Por derivar dos lucros, os valores que permanecem na entidade
são agrupados em Reservas de Lucros, ensejando aumento do Patrimônio Líquido. Disso resulta
que o valor patrimonial6 é diferente do valor nominal7, sendo determinado da seguinte maneira:

VPA = Patrimônio Líquido


quantidade de ações

Imagine que uma empresa tenha acionistas dispersos pelo mundo inteiro em decorrência da
globalização da economia. Eles elegem gestores para administrar a empresa e esperam que estes a
dirijam com eficiência e eficácia para que os investimentos realizados lhes propiciem um retorno.
Em outras palavras, eles esperam que sejam remunerados pelo lucro e que essa remuneração seja
maior que as de outras empresas, pois, se assim não for, convém vender as ações e adquirir outras
ações de companhias de maior rendimento. Esse entendimento, por si só, já justifica a importância
dos indicadores que acabamos de explicitar.
Para exemplificar os cálculos dos indicadores econômicos aprendidos, vamos utilizar dados
fictícios da Demonstração do Resultado (Tabela 13) e do Balanço Patrimonial (Tabela 14),
apresentados a seguir.

6 O valor patrimonial das ações é o valor do Patrimônio Líquido dividido pela quantidade de ações.
7 O valor nominal das ações, denominado valor de face, é o constante nos estatutos sociais.
Análise das demonstrações financeiras 147

Tabela 13 – Demonstração do Resultado

Descritores ano 2

Receita Líquida de Vendas R$ 30.705,00

(-) Custo dos produtos vendidos -R$ 20.879,40

(=) Lucro Bruto Operacional R$ 9.825,60

(-) Despesas operacionais -R$ 5.760,00

(=) EBITDA R$ 4.065,60

(-) Despesas de depreciação -R$ 2.390,00

(-) Despesas financeiras -R$ 930,00

Lucro antes dos tributos sobre Resultado R$ 745,60

(-) Imposto de Renda e Contribuição Social (24%) -R$ 178,94

(=) Lucro Líquido do Exercício R$ 566,66

Quantidade de ações 1.000

Lucro por ação = LLE / Quantidade de ações 0,57

Fonte: Elaborada pelo autor.

Tabela 14 – Balanço Patrimonial

Descritores ano 2 Descritores ano 2

Ativo Circulante R$ 12.230,00 Passivo Circulante R$ 6.200,00

Caixa R$ 3.630,00 Fornecedores R$ 3.820,00

Clientes R$ 5.710,00 Impostos a pagar R$ 790,00

Estoques R$ 2.890,00 Financiamentos R$ 1.590,00

Ativo não Circulante R$ 23.740,00 Passivo não Circulante R$ 10.230,00

Realizável a longo prazo R$ 980,00 Total dos passivos R$ 16.430,00

Imobilizado R$ 45.710,00 Patrimônio Líquido R$ 19.540,00

(-) Depreciação -R$ 22.950,00 Capital Social R$ 8.190,00

Reservas de Lucros R$ 11.350,00

Total do Ativo R$ 35.970,00 Total do Passivo e Patrimônio Líquido R$ 35.970,00

Fonte: Elaborada pelo autor.

Com os dados dessas duas demonstrações, é possível calcular todos os indicadores referen-
tes à situação econômica da empresa. É o que faremos a seguir.
148 Fundamentos de contabilidade

Figura 3 – Cálculo de indicadores

Giro do Ativo Rentabilidade do Ativo Total

vendas
Lucro Líquido do Exercício
Ativo Total
Ativo Total
30.075,00
= 0,85 566,66
35.970,00 = 0,016
35.970,00
No ano 2, o Ativo girou 85%, ou seja, a Receita de
No ano 2, a rentabilidade do Ativo Total foi de 1,6%,
Vendas de um ano quase atingiu o valor de todos
o que quer dizer que todos os investimentos realiza-
os investimentos realizados no Ativo Total.
dos geraram um retorno (ganho) de 1,6% a.a.

Rentabilidade do Margem das vendas


Patrimônio Líquido

Lucro Líquido do Exercício Lucro Líquido do Exercício


Patrimônio Líquido vendas
566,66
566,66 = 0,018
= 0,029 30.705,00
19.540,00
Significa que, no ano 2, a margem do Lucro Líquido
No ano 2, a rentabilidade do Patrimônio Líquido foi
sobre as vendas foi de 1,8%. Esse dado nos diz que
de 2,9%. Isso significa que os acionistas tiveram um
sobrou 1,8% do valor das vendas líquidas realizadas.
retorno de seus investimentos de 2,9% a.a.

Margem EBITDA Alavancagem Financeira

EBITDA %RetPL
vendas %RetA
4.065,60 0,029
= 0,132 = 1,841
30.705,00 0,016
%RetPL = percentual de retorno do
Patrimônio Líquido
Significa que, no ano 2, a margem do EBITDA sobre %RetA = percentual de retorno do Ativo
as vendas foi de 13,2%. Podemos concluir, com isso,
Quando o grau de alavancagem financeira for maior
que as atividades operacionais da empresa geram um
que 1, isso indica que o endividamento tem um efeito
lucro de 13,2%.
de alavanca sobre o lucro, ou seja, o capital de terceiros
contribui para um retorno maior para os acionistas.
Quando o grau de alavancagem é igual a 1, a situação é
nula, ou seja, é indiferente tomar recursos de terceiros
ou dos acionistas. Entretanto, se o grau é menor que 1,
significa que o capital de terceiros está consumindo o
capital próprio em decorrência da incidência de juros.

(Continua)
Análise das demonstrações financeiras 149

Distribuição de dividendos Lucro por Ação

0,8 × 566,66 = 453,34 Lucro Líquido do Exercício


quantidade de ações
O valor dos dividendos a serem distribuídos aos acio-
566,66
nistas é calculado na Demonstração das Mutações do = 0,567
Patrimônio Líquido. Como essa demonstração não foi 1.000,00
apresentada anteriormente, para fins didáticos vamos
supor que a empresa reteve 20% na constituição de Cada ação gerou um lucro de R$ 0,567. Isso significa
reservas e distribuiu 80% do Lucro Líquido. O resultado que ao valor de cada ação vigente serão acrescidos
ao qual chegamos indica que no ano 2 a empresa R$ 0,567.
distribuiu 80% do lucro gerado no exercício, ou seja,
ela distribuiu R$ 453,34 a título de dividendos.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Os indicadores que acabamos de calcular e analisar devem ser comparados com aqueles
apresentados pelas empresas do mesmo setor e com os índices oficiais. Tomemos como exemplo
a rentabilidade do Patrimônio Líquido que calculamos anteriormente e vamos compará-la às
de diversos setores de atividades, com base nos dados e informações constantes no site do
Instituto Assaf8.
Tabela 15 – Retorno do Patrimônio Líquido de alguns setores no ano de 2017

Setores de atividades %
Serviços educacionais 13,10%

Softwares e serviços computacionais -1,4%

Varejo – linhas especiais -0,2%

Veículos terrestres e aéreos -0,2%

Vestuário 12,40%
Fonte: Adaptado de Instituto Assaf, 2019.

É importante notar que se a empresa objeto desta análise for dos setores de serviços
educacionais ou de vestuário, a rentabilidade do Patrimônio Líquido deixa muito a desejar, pois
o rendimento da empresa foi de 2,9%, muito aquém ao das outras empresas do mesmo ramo.
Por outro lado, se o setor for de serviços computacionais, de varejo de linhas especiais ou de
veículos terrestres e aéreos há que se festejar, pois esses três setores apresentaram índices negativos.
Assim, não basta calcular os índices, é necessário compará-los com o das empresas do mesmo ramo.

8 O Instituto Assaf traz informações sobre indicadores da economia, rendimento de aplicações financeiras, indicado-
res de valor, indicadores de mercado, entre outros.
150 Fundamentos de contabilidade

Considerações finais
Uma das funções da contabilidade é a de promover a análise das demonstrações finan-
ceiras por meio de diversos indicadores que interagem entre si. Os indicadores de rentabili-
dade e de atividades, ao longo dos anos, exercem um efeito muito grande sobre os índices de
liquidez e de endividamento.
A análise das demonstrações financeiras no Brasil, a partir de 2007 – ano em que nosso
país começou a adotar as normas internacionais de contabilidade e auditoria – passou a utilizar
obrigatoriamente expressões novas (destacando-se o EBITDA) e começou a se preocupar muito
mais com a avaliação de empresas, pois o valor de uma empresa é definido pelos resultados por
ela esperados.
Não basta que as entidades possuam prédios enormes e modernos, maquinaria sofisticada
etc. se esses recursos não forem capazes de gerar resultados, pois não haverá acionista que compre
suas ações.
Além de calcular os indicadores da própria entidade, é necessário compará-los aos de outras
empresas, pois é assim que um investidor procede: ele estuda a situação financeira e econômica
das empresas para decidir de qual (ou quais) irá comprar ações.
Internamente, a análise dos indicadores deve propiciar à empresa a possibilidade de tomar
decisões, no intuito de corrigir eventuais erros e, principalmente, de projetar o futuro. Por isso, as
demonstrações financeiras elaboradas com base em registros dos fatos contábeis e que têm a finali-
dade de demonstrar as situações econômicas, financeiras e patrimoniais são complementadas pela
análise, que tem o objetivo de avaliar os resultados obtidos, objetivando principalmente estimular
os investidores.

Ampliando seus conhecimentos


• Uma das características qualitativas da contabilidade é a comparabilidade. Nos negócios,
essa característica é mensurada por meio da comparação de períodos contábeis. É im-
prescindível, entretanto, que essa comparação também seja realizada por meio de dados
do setor em que cada instituição está inserida. Consulte o site do Instituto Assaf e conheça
dados de empresas de diversos segmentos.
INSTITUTO ASSAF. Finanças corporativas e valor no Brasil. 2019. Disponível em: http://
www.institutoassaf.com.br/2012/. Acesso em: 23 jan. 2019.
• Alguns anuários trazem demonstrações contábeis, indicadores econômicos e indicadores
financeiros das maiores empresas do Brasil. Compare os indicadores de algumas empresas,
disponibilizados no site do Valor Econômico.
VALOR ECONÔMICO. 1000 maiores empresas e as campeãs em 25 setores e 5 regiões.
2017. Disponível em: https://www.valor.com.br/valor1000/2017. Acesso em: 23 jan. 2019.
Análise das demonstrações financeiras 151

Atividades
1. Por que o valor nominal de uma ação é diferente de seu valor patrimonial?

2. É possível afirmar que os indicadores são independentes e a análise isolada de cada um deles
pode conduzir à determinação do desempenho da empresa? Justifique.

3. Qual é a razão da necessidade de se comparar o índice de liquidez corrente com os prazos


médios de recebimento e pagamentos?

Referências
ASSAF NETO, A. Estrutura e análise de balanços: um enfoque econômico financeiro. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2012.

AZZOLIN, J. L. Análise das demonstrações contábeis. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2012.

BRASIL. Lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 28
dez. 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11638.htm. Acesso
em: 30 out. 2018.

FERNANDES, P. O. Análise de balanços no setor público: em que consiste a análise de balanços e qual a sua
importância para o setor público? Revista Brasileira de Contabilidade, Brasília, DF, v. 26, n. 108, p. 60-68,
nov./dez. 1997.

FRANCO, H. Estrutura, análise e interpretação de balanços: de acordo com a nova Lei das S.A., Lei n. 6.404,
de 15-12-1976. 15. ed. São Paulo: Atlas, 1989.

GITMAN, L. J. Princípios de administração financeira. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

INSTITUTO ASSAF. Finanças corporativas e valor no Brasil. 2019. Disponível em: http://www.institutoassaf.
com.br/2012/. Acesso em: 23 jan. 2019.

IUDÍCIBUS, S. Contabilidade gerencial. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1995.

IUDÍCIBUS, S. Análise de balanços. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

MARION, J. C. Análise das demonstrações contábeis: contabilidade empresarial. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

MARION, J. C. Contabilidade empresarial. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

MATARAZZO, D. C. Análise financeira de balanços: uma abordagem gerencial. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

VALOR ECONÔMICO. 1000 maiores empresas e as campeãs em 25 setores e 5 regiões. 2017. Disponível em:
https://www.valor.com.br/valor1000/2017. Acesso em: 23 jan. 2019.
Gabarito

1 A contabilidade
1. A característica atrelada a essa afirmativa é a primazia da essência sobre a forma. Essa
característica determina que mesmo que um evento tenha forma legal e se sua forma
tiver sido artificialmente produzida, abandona-se o documento, pois foi produzido de
modo artificial e se faz o registro pela essência.

2. A obra Liber abaci (1202) tornou-se importante para as duas áreas porque contém regras
para cálculos com numerais indo-arábicos e capítulos sobre adição, subtração e preços
de produtos. Ela também trata de diversos problemas de natureza prática, como cálculo
de lucros, conversões e mensuração de moedas.

3. Pode-se dizer que a escola europeia era mais voltada para o mundo acadêmico e produziu
dezenas de obras somente para construções teóricas sobre a contabilidade. A escola norte-
-americana, por outro lado, pouco se preocupa com a teoria e volta-se pragmaticamente
aos aspectos práticos das questões econômico-administrativas, produzindo muito mais
arte que ciência.

2 O patrimônio
1. Não é possível atender à solicitação de José pois, juridicamente, para ser reconhecido pela
contabilidade, o bem deve reunir três condições mínimas: ter valor econômico, poder
ser convertido em dinheiro e ser útil e capaz de satisfazer as necessidades da entidade.
No caso apresentado, o móvel, como um bem de uso, possui um valor objetivo, entretanto
seu valor sentimental não pode ser convertido em valor econômico (vale somente a
quem possuir um sentimento com relação ao móvel, não sendo útil às necessidades
da entidade).

2.

a) O dinheiro existente em caixa é um bem de troca, pois está em poder da empresa.


Já o numerário que está depositado no banco é um direito, porque mesmo pertencente
à empresa, está em poder de terceiros.

b) O automóvel não se caracteriza como bem, direito ou obrigação. Ele pertence à


locadora, sendo um direito desta.

3. O valor do jogador de futebol é um bem infungível, pois cada atleta tem um preço
denominado de passe. Esse bem, porém, só pode ser escriturado por meio de uma
documentação probante, isto é, quando um clube adquire o passe de um jogador de
futebol, é lavrado um contrato de compra e venda. Esse contrato é um comprovante do
valor do jogador, sem ele, não é possível registrar contabilmente esse valor.
154 Fundamentos de contabilidade

3 Estudo das contas


1. No Balanço Patrimonial, os grandes grupos definidos no Ativo são o Ativo Circulante e
o Ativo não Circulante. No Passivo temos o Passivo Circulante, o Passivo não Circulante e o
Patrimônio Líquido. Nas contas do Ativo são registrados os bens e direitos da empresa;
nas contas do Passivo são registradas as obrigações e no Patrimônio Líquido estão o capital
pertencente aos sócios e acionistas.

2. Os dois tipos de planos de contas são o simplificado e o gerencial. O primeiro é realizado


de maneira padronizada, seguindo basicamente a estrutura definida em lei. O segundo é
elaborado visando aos interesses e objetivos internos da empresa, compondo um sistema
analítico dos custos de mão de obra (salários, prêmios de produção, gratificações, férias,
INSS, FGTS, entre outros).

3. A conta “mãe” é a conta principal de um conjunto de contas a ela vinculadas, já as contas


“filhas” são as subcontas. Por exemplo, a conta Estoques é a conta “mãe” e as contas filhas
são Estoque de produtos acabados, Estoque de produtos e elaboração, Estoque de matéria-
-prima, Estoque de embalagens, entre outras.

4 Balanço patrimonial
1. A disposição está correta porque a legislação vigente determina que no Ativo as contas sejam
dispostas em ordem decrescente de grau de liquidez. As duplicatas a receber têm vencimento
a partir do dia de hoje, enquanto os estoques têm de ser vendidos e, normalmente, vão
compor o grupo de Duplicatas a receber.

2. Quando uma empresa emite novas ações e as coloca à venda, pode acontecer de o investidor
comprá-las por maior valor que o valor nominal (valor de face) da ação em virtude de
considerar que será um bom investimento e poderá vendê-la com lucros. O valor que exceder
o valor nominal deverá ser contabilizado como ágio na emissão de ações até que os sócios,
em Assembleia Geral Extraordinária, resolvam convertê-lo em Capital Social.

3. As contas decorrentes de financiamento do capital de giro, assim entendidos como os gastos


incorridos no ciclo operacional (como provisões para riscos fiscais, trabalhistas e cíveis),
serão classificadas como Passivo Circulante mesmo que estejam para ser liquidadas em mais
de 12 meses. Isso ocorre porque a legislação determina que, por se tratar de gasto referente
ao ciclo operacional, este deve ser contabilizado como Passivo Circulante.

5 Demonstrações financeiras
1. Os fatos contábeis permutativos ocorrem quando se transfere um valor de uma conta à outra
dentro do Patrimônio Líquido, por isso eles não o modificam. Já os fatos contábeis modificativos,
como expresso na própria denominação, modificam o Patrimônio Líquido, modificação esta
que pode ser aumentativa (quando o valor do PL é aumentado) ou diminutiva (quando o valor
do PL é diminuído).
Gabarito 155

2. Esta afirmativa não é correta. Quando a opção de elaboração da DFC for o método indireto,
há um detalhamento das contas de atividades operacionais, porém, os dados dos campos de
financiamentos e de investimentos são os mesmos para os dois métodos.

3. Sim, é correto afirmar que a DRE e a DMPL são interdependentes e a DFC é independente,
pois na Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido, efetua-se a contrapartida do
encerramento da Demonstração do Resultado do Exercício. Já a Demonstração do Fluxo
de Caixa colhe e seleciona dados dessas duas demonstrações, sem realizar lançamentos
contábeis nelas.

6 Fundamentos de custos
1. Para a elaboração de um produto, é necessária a existência de uma matéria-prima que será
transformada. Porém, ela não pode realizar por si só essa transformação, sendo necessária,
portanto, a participação de outros dois componentes: mão de obra e custos de transformação.
Além disso, nem sempre é possível agregar estes três componentes em apenas um local,
por isso, divide-se a fábrica em centros. Os centros produtivos são os locais por onde o
produto transita; os demais são denominados centros de serviços ou auxiliares, tendo como
finalidade prestar serviços aos centros de produção.

2. No custeio por absorção, todos os custos – sejam variáveis ou fixos – são atribuídos ao produto.
Dessa maneira, ao ser levado aos estoques, ele carrega consigo todos os custos incorridos, ou
seja, ele absorve todos os custos. Já no custeio variável, por entender que somente os custos
variáveis podem ser atribuídos aos produtos, na transferência para os estoques somente esses
custos são agregados ao produto e os custos fixos são controlados separadamente.

3. Existem diversas bases para se efetuar o rateio dos custos fixos, sua escolha merece uma
análise técnica e profunda do gestor. O aluguel, por exemplo, tem relação com o porte do
imóvel, assim, o modo mais razoável de ratear o valor do aluguel é com base no espaço
ocupado pelos diversos centros ou pessoas. Outro exemplo seria o rateio da energia elétrica,
que deve embasar-se no consumo de cada unidade. Em decorrência disso, a maneira mais
técnica de realizar o rateio seria por meio de medidores de consumo a serem instalados em
cada uma das unidades.

7 Análise das demonstrações financeiras


1. O valor nominal é o valor original das ações que consta nos Estatutos Sociais. Porém, parte
dos lucros gerados nos diversos períodos fica retida na empresa sob a forma de Reservas,
fato que resulta em aumentos do Patrimônio Líquido. Esse valor é chamado de patrimonial.

2. Não, pois os indicadores interagem entre si. Não adianta, por exemplo, apresentar um alto
índice de liquidez comum se os valores a receber demoram para ser recebidos e os valores a
pagar devem ser quitados imediatamente. Um valor expressivo de Receita Bruta de Vendas
e uma pequena rentabilidade não estimulam a compra de ações.
156 Fundamentos de contabilidade

3. Quando se calcula o índice de liquidez corrente, divide-se o valor do Ativo Circulante pelo
valor do Passivo Circulante. Ocorre que o prazo de recebimento dos valores pode ser maior
que o do pagamento das exigibilidades e, por isso, o índice fica distorcido. É necessário que
se calculem os prazos médios de recebimentos e de pagamentos para, posteriormente, juntá-
-lo ao índice de liquidez corrente, concluindo, assim, se a empresa tem condições de pagar
adequadamente suas obrigações.
Fundamentos de contabilidade
José L. Azzolin

Fundamentos de
contabilidade
José L. Azzolin

Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional


ISBN 978-85-387-6234-8

58355 9 788538 762348

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