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O Pão

SAMARA FERNANDES
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• A História do Pão
• A Farinha
• O Fermento e a Fermentação

Objetivos de Aprendizagem
• Conhecer a história do pão e as populações de maior influência nesse
produto.
• Identificar as teorias de surgimento do pão fermentado.
• Entender os aspectos do grão de trigo.
• Conhecer os variados tipos de farinha.
• Compreender o processo de fermentação e os tipos de fermento.
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Introdução
Nesta unidade teremos, inicialmente, uma abordagem mais histórica, de modo que possamos
compreender a evolução do pão, afinal, ele nem sempre foi como o conhecemos atualmente. Os
primeiros pães não eram fermentados e por isso eram mais firmes e parecidos com uma bolacha.
A primeira ideia de pão sequer tinha o formato como o conhecemos e ele já foi, também, um
acirrado divisor de classes sociais.
Falar em pão e colocar o termo “fermentado” à frente pode parecer estranho, pois, atual-
mente, nossa concepção básica frequente é a de pães que são fermentados, ou seja, dificilmente
– ou mesmo nunca – ouve-se falar no contrário, um pão que não necessita de fermento ou de
esperar crescer. Ainda assim deve estar claro que a primeira noção de pão para os povos antigos
se baseava na utilização dos grãos em si e que apenas tempos depois ocorreu a descoberta de
que esperar um tempo faria o pão crescer. Você verá, em meio a isso, que há duas teorias a res-
peito do surgimento do pão fermentado e que até hoje não se sabe qual delas é a verídica – há
tendências de opinião, mas não há confirmação.
Depois de visto a parte histórica, partiremos para especificações a respeito do grão do trigo:
qual é sua composição e quais nutrientes são mais importantes em cada camada. Como é feita a
farinha de trigo branca que tanto utilizamos na panificação e quais outras farinhas podem ser uti-
lizadas. Nessa etapa ficará, claro que o endosperma é muito importante para você, futuro padeiro.
Agora, pergunto-lhe: “você sabia que o fermento é um ser vivo?” É sobre ele que falaremos
no último tópico desta unidade. Vou apresentar a você quais tipos de fermento biológico temos
disponíveis no mercado – o fresco, aquele pastoso, era o mais comum deles, mas você já deve
conhecer o de pacotinho, bem seco, que também é utilizado para fabricação de pães –, como
cada um deve ser utilizado e a diferença entre eles.
Assim concluiremos esta unidade entendendo como se dá o processo de fermentação, arre-
matando a importância das características da farinha utilizada – como o amido e as proteínas
do endosperma – com os ingredientes básicos para produção de um pão, ou seja, entenderemos
a influência de cada componente para o crescimento do pão.
Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 13

A História
do Pão

Caro(a) aluno(a), a história que vou contar não começa com esse
pão fofinho e branquinho que você gosta tanto de comer quen-
tinho com manteiga no café da manhã, pois, para chegarmos
a essa evolução, devemos partir do Período Neolítico, há cerca
de 10.000 anos, quando o homem já reconhecia as qualidades
nutritivas dos cereais.
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As sociedades, que eram inicialmente nômades Entre os anos 9.000 e 4.000 a.C., data-se uma
– cuja alimentação dependia de caça e de coleta evolução agrícola, pois nesse período o seden-
–, tornaram-se sedentárias – comunidade agrí- tarismo passou a ser mais frequente, gerando
cola. Sendo assim, no período de nomadismo, os primeiros cultivos de cereais. Em sequên-
parte da alimentação era baseada em caças (cervo, cia, aparecem as primeiras farinhas rústicas,
faisão ou peixes) e outra parte em nozes, frutas com os grãos triturados em pedras planas, que
silvestres e grãos (como centeio, espelta, painço e misturadas à água formavam uma massa e
trigo). Esses grãos já originavam a primeira ideia esta era deixada para secar ao sol ou mesmo
de pão primitivo, uma pasta que ficava de molho e sobre brasas – temos, então, um pão rústico,
depois era cozida em água. Mas perceba a utiliza- com textura semelhante à da bolacha (SEBESS,
ção dos grãos e da água (ingredientes básicos para 2014). Atenção: ainda não temos aqui um pão
se elaborar um pão) com a finalidade de melhorar fermentado.
a digestão se comparado ao cru, além de notarem
que dessa forma havia mais nutrientes – claro que
sem a utilização desses termos, mas perceber que
o alimento saciava mais já é um reconhecimento
no sentido nutricional (SUAS, 2012).

A espelta é um tipo de trigo mais rústico,


avermelhado; e o painço um cereal sem
glúten, também conhecido por “milho
alvo”, atualmente utilizado como comida
para pássaros.

Fonte: a autora.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 15

Figura 1: ilustração do
arado rudimentar

D
e modo geral, egípcios e gregos foram
os povos que mais fizeram avanços
na panificação, pois desde que os
grãos se tornaram fonte básica da
alimentação (advento do sedentarismo), eles
realizaram experimentos com esses ingredientes
e desenvolveram novas técnicas (SUAS, 2012).
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Figura 2: Antigo Egito: colheita do trigo

Egito

Cereais como o trigo, a espelta e a cevada já eram encontrados em plantações


no Egito há mais de 6.000 anos, como descrito:

[...] encontrou-se cevada em sítios pré-históricos do delta datados de cerca


de 4.000 a.C., à qual se devem acrescentar o trigo e a espelta. Às planícies
do Nilo, periodicamente inundadas, produziam cereais em quantidade
abundante e suficiente para o consumo nacional e para a exportação. O
trigo e a cevada constituíam a base da alimentação e eram usados para a
fabricação do pão e da cerveja [...] (BRESCIANI in FLANDRIN, 1999, p.71)

Segundo Suas (2012), na Antiguidade Clássica (5.500 a.C. – 300 d.C.), os grãos
podiam ser plantados ou trazidos de outras regiões. Bresciani (1999) explica
que o Egito exportava para os gregos, por exemplo, que então produziam
seus pães e massas doces.
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Os grãos eram, até então, consumidos de três formas: inteiros (mastigados),


cozidos como angu (cocção em água e sal que resulta numa pasta) ou como um
pão sem fermentação. Os primeiros pães eram feitos de farinha de trigo, cevada
ou espelta, mais água e sal. A massa era sovada tanto com as mãos quanto com
os pés, como mostram os hieróglifos, e assados em lajes, fornos de pedra e –
desconfia-se que – até mesmo nas paredes de fornos (SUAS, 2012).
Aqueles que consumiam o grão no formato de pão normalmente produ-
ziam sua farinha individualmente em casa. Os grãos eram dispostos ao sol
para secar e tostar; em seguida eram triturados em um pilão; depois moídos
entre duas pedras; e, por último, peneirados, resultando na farinha (ibidem).

“Um pouco de pó mineral sempre se misturava à farinha, o que, sem dúvida,


explica o desgaste dos dentes, verificado na maioria das múmias egípcias.”
(BRESCIANI, in FLANDRIN, 1999, p. 71)

Nesse período, o tipo de pasta ou de pão já era associado ao status na sociedade


da seguinte forma: pães mais brancos eram consumidos pelos mais ricos, pães
com poucos grãos integrais eram os da classe média e os pães completamente
integrais (ou de espelta) eram o alimento dos mais pobres (SUAS, 2012).
Por volta de 1.500 a.C., temos um marco: os pães fermentados começa-
ram a ser produzidos e, nesse entorno, existem duas teorias a respeito do
surgimento do processo de fermentação. A primeira afirma que os egípcios
aprimoraram o processo de fabricação de cerveja e utilizaram a bebida no lugar
da água, dessa forma houve a fermentação da massa e esta foi então assada.
A segunda teoria alega que parte da massa tenha sido esquecida em algum
lugar, fermentou naturalmente e foi assada após essa fermentação (ibidem).
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A primeira especulação é mais aceita por ser ainda mais. Os egípcios não apenas eram chama-
considerada mais realista, afinal, o método se dos de “comedores de pão”, como disse Hecateu
disseminou e se popularizou dentre os egípcios. de Mileto em 500 a.C., como também utilizavam
Mas fique à vontade para escolher a teoria de esse alimento como unidade cultural, desig-
sua preferência, querido(a) estudante. Entenda nando a riqueza pela quantidade de pães que
que esse pão fermentado não era muito leve, dispunha (JACOB, 2003). Temos, então, o pão
embora, se o compararmos a um sem fermen- como moeda, pois até mesmo pagamentos eram
tação, a leveza já era incrível. feitos com o pão e sua ausência era passível de
A partir daí, a importância do pão aumenta revoltas, como mostra o autor:

Um relato do tempo de Ramsés IX conta-nos um acontecimento quase novelístico,


no qual o não pagamento em dia de salários e uma ação de greve desempenham um
papel cômico. Um grupo de trabalhadores enviado para a província recebeu gordura
e cerveja, mas não lhes deram o pão. Em vista disso, os trabalhadores “deitaram-se
dentro de casa”, ou seja, recusaram-se a trabalhar. Um mês depois, novamente na
falta da ração de pão, “voltaram e deite-se” e enviaram delegados seus a Tebas. Os
grevistas tiveram sucesso com a queixa apresentada na capital provincial: o governo
mandou dar-lhes o pão que o empregador tinha recusado por duas vezes aos homens
(JACOB, 2003, p.71).

N
esse livro de pagamentos, pode- garante a ordem, evita revoltas e outros tipos
mos ter ideia de como foi uma das de reivindicações. Nas palavras do próprio Faraó
primeiras greves da história. Além Kheti (apud BRESCIANI in FLANDRIN, 1999,
disso, o fato de o governo dar o pão p.69) “um pobre pode se tornar um inimigo, um
aos empregados revoltados mostra também a homem que passa necessidades pode se tornar
consciência de controle social, acreditando na um rebelde. Acalma-se uma multidão que se
ideia de que alimento suficiente para o povo rebela pela comida”.
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• Pão primitivo: grãos de molho + cocção em água.


• Pão rústico (sem fermentação): farinha rústica + água + secagem ao sol ou em brasa.
• Pão fermentado: 1. farinha + sal + cerveja (levedura da cerveja leva à fermentação + assar);
2. farinha + sal + água (tempo e umidade levam à fermentação + assar)

Muitas fontes indicam que a criação do arado pode ter ocorrido no delta do Nilo, no Egito, porém não
há certeza a esse respeito. Conta a lenda:

“Um dia o homem regressou à casa, alegre, na companhia dos seus amigos. Com eles veio também
a manada. O deus do Sol havia coberto os prados de erva suculenta e as vacas estavam gordas.
Queriam oferecer uma festa ao deus e puseram-se a beber as bebidas fermentadas. Sentaram-se
debaixo das árvores, junto à plantação doméstica. Um dos homens, por brincadeira, pegou na
enxada e desferiu com ela um tal golpe no solo que ninguém conseguiu arrancá-la, mesmo quando
vários tentaram puxá-la ao mesmo tempo. No meio dos risos e de alguma gritaria, o dono da casa
foi buscar um boi e amarrou-o com uma corda forte à enxada enterrada no solo. O boi começou
a puxar. Mas não exercia força de baixo para cima, antes puxava a enxada na horizontal, e lançou
um mugido que fez tremer os confins do céu. Mas os homens ficaram estarrecidos ao ver como a
terra se deixava rasgar como se fosse uma peça de roupa. [...] Envergonharam-se, pensando que
haviam cometido um pecado, e foram desamarrar o boi da enxada.
No dia seguinte queriam tapar o rasgão [...] A mulher, contudo, impediu-os de o fazer e disse-lhes:
‘Antes de tapar o buraco, ponhamos as sementes de ervas no ventre da mãe terra’. E assim os
homens puseram-se a fazer aquilo que as mulheres faziam havia já muito tempo. [...] Pediam
perdão à terra por a terem rasgado e faziam-lhe diversas oferendas. Temiam que ela se abrisse e
os engolisse a todos. Porém, o que aconteceu foi uma coisa bem diferente. [...] As plantas cresceram
mais alto, mais verdes e mais carregadas de frutos do que nunca.”

Fonte: Jacob (2003, p. 39-40.)


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Outro fator relevante à história do pão e dos alimento como nossa manutenção enérgica
egípcios é a relação com a religião. Nos tú- diária, como na oração do Pai Nosso (“o pão
mulos antigos, foram encontradas dezenas nosso de cada dia”).
e até milhares de alimentos, pois eram tidos
como provimentos para a vida após a morte:
“[...] A crença em uma vida após a morte, que
existe desde as épocas mais remotas, insiste
na necessidade de prodigalizar alimentos aos
defuntos. As orações fúnebres requeriam pão
e cerveja, aves e bois [...]” (BRESCIANI, 1999, Consulte sempre a disciplina de História
e Cultura Gastronômica e confira quais
p.69). Podemos fazer, atualmente, várias as-
outras contribuições os egípcios deixa-
sociações , comparando a relação dos alimen- ram como legado para a Gastronomia!
tos expressa na citação anterior a inúmeros Atualize-se e aprofunde sempre seus
atos religiosos, seja o pão representando o conhecimentos!

corpo de Cristo, seja remetendo à multipli-


cação dos pães ou mesmo reconhecendo esse

Grécia

Os gregos da Antiguidade Clássica já eram gama de produções. Eles passaram a se preo-


conhecidos por uma grande variedade de cupar até mesmo com os formatos de acordo
pães, em média 72 tipos diferentes, o que nos com o sabor, para diferenciar um do outro,
leva a crer que já na época houve evolução de fazendo pães em formato de cones, redondos,
moagem e de fornos que permitissem tamanha ovais e triangulares, além dos básicos acha-
diversidade. Os fornos foram redesenhados e tados. Porém, diferentemente dos egípcios,
o processo de moagem melhorado, permitindo os gregos (e os italianos) utilizavam métodos
espessuras diferenciadas de farinhas. Além mais relacionados à produção de vinho e apro-
disso, a combinação de sabores (outros grãos, veitavam a fermentação das uvas, para obter a
ervas, óleos, frutas e sementes) ampliava a fermentação dos pães (SUAS, 2012).
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Império Romano

A panificação chegou à Roma (100 a.C. ao século I) custas do Estado. Além disso, aqueles que ali
por meio de mãos gregas. Os romanos ficaram aprendiam, deviam passar o conhecimento de
tão encantados com a arte e a ciência do pão, pai para filho (ibidem; SEBESS, 2014).
que todo o Império Romano passou a basear Com a queda do Império Romano, no século
sua alimentação no pão – população e exército V (marco inicial da Idade Média), a provisão
abastecidos com pão. Em 100 d.C., o imperador de trigo ficou escassa em quase toda a Europa,
Trajano, com intenção de controle social e desig- gerando a crise do pão. Como consequência,
nando a importância do pão para a população passou-se a produzir pães com outros cereais,
de modo que os mantivesse em ordem – como como centeio, cevada e aveia, ficando o trigo
faziam os egípcios –, criou uma guilda de padei- apenas para os ricos. Temos mais uma vez o pão
ros, chamada Colégio Oficial de Padeiros, cuja como fator de diferenciação de classes sociais
obrigação era fornecer esse alimento a todos às (ibidem).

Idade Média

Além da escassez de grãos, a Idade Média (séc. da igreja para plantar novamente, de forma que
V ao XV) foi marcada por crescimento urbano, aos poucos houve a ascensão do trigo e do pão
fome, doenças e muitas mudanças na fabricação (SUAS, 2012).
de pães – como citado anteriormente. Houve Um século depois e o ofício dos padeiros
a retomada de atividades pecuárias, de caça, foi regulamentado como profissão. E mais um
por conta da influência dos povos germâni- século adiante, definia-se a diferença entre as
cos nômades. Apenas por volta do século X é funções: fornarii assavam os pães e pistores pre-
que houve a retomada da agricultura, levando paravam e assavam a massa (ibidem).
também ao retorno da fabricação de pães como
Na medida em que o consumo de pão
na Antiguidade. Como o pão era importante cresceu na região do mediterrâneo, os
nos rituais da Igreja Católica, os sacerdotes se fornarii se deram conta de que poderiam
empenharam em fixar populações ao entorno se beneficiar da venda de pães também,
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e conquistaram esse direito com a ajuda


da Igreja. Já em Paris, por volta de 1.200 hospitais ganhavam tratamento médico (SUAS,
d.C., os pistores pressionaram e conse- 2012). Podemos, aqui, comparar o processo de
guiram o direito de exclusividade na pa- aprendizagem de um tamelier à ideia atual de
nificação. Em troca desse direito, ficavam
obrigados a fornecer pães à realeza e a
universidade ou de um curso profissionalizante.
se submeter às frequentes inspeções Durante o século XIII, os pães já haviam
para assegurar que os regulamentos sa- retornado à produção baseada na utilização do
nitários e de pesagem estivesse sendo
trigo, retomando os aspectos de status social
seguidos. (FLANDRIN & MONTANARI
apud SUAS, 2012). – mais brancos e macios, mais rica a família.
Vale ressaltar que, com o ofício regulamentado,
Surge na França a guilda de padeiros nomeada a corte dita direitos e deveres da guilda, que
Tamelier (referente ao ato de peneirar a farinha deveria obedecer às regras de comércio, aos pa-
de acordo com a receita). Para ser considerado drões de fabricação de pães definidos pelo rei, ao
um tamelier, era preciso passar por 4 anos de controle de preços e à garantia de qualidade: “Em
aprendizagem, realizar testes e passar pela apro- 1366, Carlos V da França definiu regras relativas
vação final do rei, para, então, poder exercer a a quando e onde os pães poderiam ser vendidos
profissão. O que lhes dava privilégios na socie- e determinou o preço de pães feitos com os di-
dade, por exemplo, os que forneciam pães aos versos tipos de farinhas” (SUAS, 2012, p.11).

Revolução Industrial

Durante a primeira Revolução Industrial, no número exacerbado, além de máquinas que


século XVIII, criaram a máquina a vapor, o que dividem a massa, a pesam, a modelam, a fer-
melhorou ainda mais as técnicas de moagem mentam sob controle de temperatura e a leva
do trigo. A farinha passou a ter qualidade às assadeiras, automaticamente, de acordo
melhor, além de ser produzida em larga escala com a necessidade de cada padaria. Enfim, a
com redução de custos. Com as novas tec- revolução possibilitou que o pão fosse ainda
nologias, os componentes do trigo podiam mais acessível a toda a sociedade a baixo custo
inclusive ser separados (farelo, gérmen), as (SEBESS, 2014).
masseiras possibilitaram produção de pão em
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Brasil

No Brasil, antes da colonização, a tapioca (fécula de farinhas de melhor qualidade (SUAS, 2012).
extraída da mandioca), ou beiju de tapioca, era um Deve-se lembrar que, por conta das ricas farinhas
dos principais alimentos dos indígenas, servindo de milho e de mandioca no nosso país, a panificação
de base alimentar. Quando portugueses e europeus logo associou a utilização delas à farinha de trigo.
vierem para cá, trouxeram então o pão fermentado No Brasil, o consumo de pão de trigo sofre
e influenciam o consumo desse alimento. Em 1530, variações regionais. No Sul e no Sudeste,
por exemplo, o consumo é de cerca de
Martin Afonso tenta plantar pela primeira vez o
35kg pessoa/ano contra apenas 10kg
trigo no Brasil, porém, escassa até o século XIX, no Nordeste, o que pode ser facilmente
o pão feito a partir da farinha de trigo era desti- explicado pelas características da cultura
nado aos mais abastados. Nesse mesmo período regional, no qual o pão de trigo sofre a
concorrência direta de substitutos como o
surgem padarias com fornos ao estilo francês e as beiju, o cuscuz e o polvilho doce. (BOSISIO
técnicas são melhoradas, o que inclui a importação JUNIOR apud SUAS, 2012, p.15).

“No Brasil, o pão mais consumido é o chamado ‘pão francês’. De fato, este pão não é tradicional-
mente francês, mas, sim, brasileiro.
Dependendo da região do Brasil, recebe nomes diferenciados como filãozinho, cacetinho, pão de
sal, pão jacó, média, entre outros. [...]
A origem do ‘pão francês’ do Brasil não é muito certa, acredita-se que a receita foi elaborada no
início do século XX. As famílias mais abastadas, que retornavam da França, descreviam as caracte-
rísticas do pão francês com intuito de que fossem reproduzidos nas padarias do Brasil. [...] Assim
teria surgido o ‘pão tipo francês’, uma adaptação que os padeiros brasileiros fizeram com base
nas descrições solicitadas pelos seus fregueses, que mais tarde ganhou o nome de ‘pão francês’.
O maior diferencial do pão francês das famosas baquetes francesas é que o primeiro tem a adição
de açúcar e gordura na massa, enquanto o segundo é composto apenas de ingredientes básicos,
como farinha, água, sal e fermento. Os dois ingredientes adicionais são responsáveis pelo dife-
rencial na qualidade da casca e do miolo dos pães”.
Fonte: Suas (2012, p.199)
Panificação Clássica e Brasileira

S
e pensarmos em pães brasileiros, logo
associamos o pão de queijo ao consu-
mo nacional, pãozinho esse feito de
polvilho. Além dele, podemos citar a
utilização de ingredientes como a mandioca, o
pinhão, o cará e a banana na produção de pães
que agradam ao nosso paladar com a mesma
facilidade que o pão de trigo branco tradicional
agrada aos europeus. Atualmente, inúmeros
ingredientes são incorporados aos pães carac-
terizando-os à nossa nação, como o cupuaçu e
as castanhas brasileiras.
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Panificação Clássica e Brasileira
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A Farinha

Agora, prezado(a) estudante, entraremos realmente nas especifi-


cidades necessárias para se produzir um pão. E já que começamos,
existe uma informação importantíssima que você deve sempre ter
em mente: para preparar um pão, quatro ingredientes são funda-
mentais: farinha, fermento, sal e água. Qualquer outro item agrega
sabor, textura, aroma etc. à massa, mas não é essencial, e sim um
complemento. Claro que isso vai depender do aspecto final desejado
para o seu pão, mas lembre-se dos quatro grandes ingredientes.
Quando tratamos da farinha, associamos rapidamente essa
ideia à farinha de trigo branca, pois é a mais utilizada para fabrica-
ção de pães e é, inclusive, da qual trataremos mais a fundo. Porém,
antes de falarmos da farinha em si, vamos nos ater à origem dela,
o grão de trigo.
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O grão de trigo

O grão de trigo, de forma oval e cor que pode ir Como você pode conferir, cada camada é rica em
do avermelhado ao branco, é composto de três uma propriedade e cada uma delas exerce função
partes principais: o farelo, o gérmen e o endos- diferente na massa do pão. 12% a 15% do grão é
perma. Quais são as propriedades de cada uma constituído por casca, 3% é de gérmen e de 82% a
delas? Na ilustração você consegue verificar cada 84% é constituído de endosperma. Você já conse-
camada do grão e identificar suas respectivas gue ter ideia de qual dessas partes sai a nossa tão
funções (SEBESS, 2014). adorada farinha branca, não é mesmo?! (Ibidem)

Estrutura do grão de trigo.


Ilustrador: Bruno Pardinho

A casca (ou farelo) é a película protetora de todo O gérmen é responsável por gerar o nascimen-
o grão. Além de vitamina B, é rica em fibras in- to de uma nova planta e é rico em sais minerais,
solúveis. Sendo assim, pães com farelo de trigo óleos e vitaminas A, D e E. Além disso, devido
melhoram a digestão, saciam por mais tempo, re- ao seu alto teor de gordura (12,5%) pode se
duzem colesterol e ainda auxiliam na quantidade tornar rançoso e por isso é retirado da farinha,
de vitaminas ingeridas. A sensação do farelo é de mas não desperdiçado. O gérmen é utiliza-
uma poeira áspera e crua, por isso o padeiro deve do para fabricação de óleos e dele também é
tomar cuidado ao utilizá-lo, de modo que a quan- feito um pó que pode ser agregado à farinha
tidade ideal em combinação com a farinha branca para caracterizar algum tipo de pão integral
amenize essas sensações (KALANTY, 2012). (SEBESS, 2014).
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O endosperma constitui a maior parte do grão o fermento, fazendo o pão crescer, e a proteína
e é também a mais importante. O que deno- se desenvolve em cadeia de glúten, conferindo
minamos de farinha é o endosperma moído, elasticidade ao pão – não se preocupe, nós de-
composto de amido e proteínas (mais amido talharemos esses aspectos na próxima unidade
que proteínas). O amido se torna alimento para (KALANTY, 2012).

Figura 3: Plantação de trigo e grãos de trigo nas mãos do agricultor

A composição da farinha

A farinha – que pode ter grânulos de tamanhos num tipo de gel, porém, em água fria ou em
entre 11 e 41 milésimos de milímetros de diâ- álcool é insolúvel. De toda forma, os grãos de
metro – proveniente do endosperma é composta amido absorvem metade de seu peso em água
por amido e glúten, como anteriormente dito. O e os grãos danificados (grande parte da farinha
amido se torna solúvel quando adicionado à água é de amido danificado), absorvem o dobro de
aquecida entre 55°C e 70°C, transformando-se seu peso em água (SEBESS, 2012).
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O glúten não é realmente encontrado


na farinha, mas assim designamos por ser
proveniente de proteínas que constituem o en-
dosperma do trigo. O endosperma é composto
por gliadina e glutenina, duas proteínas que, em
A farinha integral
contato com água e com ação de amassamento é proveniente de
todo o grão
(sova), unem-se, formando o glúten.
Kalanty (2012) explica que o farelo e o
gérmen são removidos do grão de trigo e então Figura 4: Camadas do endosperma que originam as diferentes
farinhas
o endosperma é moído, resultando na farinha. Fonte: Kalanty (2012, p.38).
Depois dessa moagem, temos três resultados
da farinha do endosperma: a farinha comum,
a especial e a integral. A farinha de trigo comum é a encontrada com
mais facilidade nos mercados, proveniente da
parte externa do endosperma (como apresen-
tado na ilustração). Ela é um pouco mais escura
que a especial e apresenta mais sais minerais.
Confere sabor diferenciado a pães de estilo mais
artesanal (ibidem).
A farinha de trigo especial é oriunda da
Quer saber se a farinha contém glúten? região central do endosperma. Resulta numa fari-
Faça o experimento:
nha bem clara, mais branca, e com mais proteínas
Junte 100g de farinha com 50g de água e
amasse até formar uma bola.
– ótimo para a estruturação do glúten. Aqueles
Coloque essa massa embaixo de um fio de pães que se prezam por coloração bem branca no
água (da torneira mesmo); vá amassando miolo são feitos com farinha especial (ibidem).
bem, lavando a massa com a água que es-
E a farinha de trigo integral provém das três
corre; depois de 10 minutos, em média,
você terá em suas mãos uma massa gos- partes do grão, ou seja, do grão completo – soma-se
menta cinza-esverdeada, muito elástica. gérmen, farelo e endosperma. O resultado é uma
Essa massinha gosmenta é o glúten!
farinha rica em fibras e vitaminas, porém pobre
Fonte: Sebess (2014, p.28). em glúten, que necessita da combinação com a
farinha branca para obter-se um bom resultado
de elasticidade e crescimento (CAMARGO, 2013).
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Faça de conta que você está comendo


Já falamos a respeito de amidos, vitaminas, sais uma bomba. Ela oferece alguma resis-
minerais, proteínas etc. Entenda, com auxílio tência quando é mordida, mas é fácil
da tabela abaixo, a composição nutricional da de mastigar. Agora, finja estar comendo
uma fatia de pão branco para sanduíche.
farinha de trigo. Ela é igualmente fácil de morder, mas
leva um pouco mais de tempo para mas-
Composição de 100g de farinha:
tigar até que se rompa na boca.
Glicídios 56 g
Água 35 g No exemplo, temos a comparação de sensações
Proteínas 7,5 g entre uma farinha fraca, utilizada para doces, e
Lipídios 1g uma farinha forte, utilizada para pães. A tabela a
Sódio 370 mg
seguir apresenta o tipo de farinha usado para cada
Cálcio 100 mg
Potássio 109 mg
alimento, qual é o termo utilizado para denomi-
Enxofre 50 mg ná-la e a média de proteína contida na mesma.
Fósforo 100 mg
Vitamina B1 0,07 mg
Vitamina B2 0,03 mg
Vitamina E 0,023 mg
Tabela 1: Composição da farinha
Fonte: SEBESS (2014, p.26).

Já que ressaltamos a importância da proteína


na farinha para a formação do glúten, ou da Conforme resolução RDC nº 344, de 13
rede de glúten como chamamos, é importante de dezembro de 2002:
“4.1. É obrigatória a adição de ferro e ácido
atentar-se aos termos de padeiro que você pode
fólico nas farinhas de trigo e nas farinhas
ouvir no que diz respeito à farinha: farinha forte de milho pré-embaladas na ausência do
e farinha fraca. Mas e aí, qual será a diferença? cliente e prontas para oferta ao consumidor,
as destinadas ao uso industrial, incluindo
Quando se trata de uma farinha mais forte,
as de panificação e as farinhas adicionadas
quer-se dizer que nela há mais proteína, ou que nas pré-misturas, devendo cada 100 g de
ela é mais “dura” (você pode ouvir com esse farinha de trigo ou de farinha de milho for-
termo também). Isso quer dizer que o desen- necerem no mínimo 4,2 mg (quatro vírgula
dois miligramas) de ferro e 150 mcg (cento
volvimento de glúten será melhor, logo, para a
e cinquenta microgramas) de ácido fólico.”
panificação indica-se uma farinha forte. Pães Fonte: Brasil – Agência Nacional de Vigilância
feitos com farinha forte são mais consistentes Sanitária (online).

e necessitam de mastigação prolongada. Para


explicar, Kalanty (2012, p.38) exemplifica:
Panificação Clássica e Brasileira

Tipo de farinha branca Termo do padeiro Média de proteína

Bolo Muito fraca 8%

Doce Fraca 8,5%

Para todos os usos Moderada 10%

Pão Forte 12%

Tabela 2: Farinhas e seu conteúdo médio de proteínas


Fonte: Kalanty (2012, p.39).

Quando você se deparar com as farinhas bra-


sileiras e prestar atenção à quantidade de pro-
teínas, pode ser que haja um espanto, pois elas
não contém os 12% de proteínas como eu acabei
Que tal na sua próxima ida ao supermercado,
de informar que é indicado para a fabricação de
antes de escolher a farinha que levará para
pães. Não se assuste! Nem todo trigo tem um casa, conferir a quantidade de proteínas
endosperma rico em proteína mesmo. Mas você contida nela e escolher aquela que melhor
couber ao seu propósito?
pode utilizar a matéria-prima que encontrar com
o maior percentual possível, sem problema algum. Fonte: a autora.

Com 9%, por exemplo, é facilmente encontrada


e você terá ótimos resultados.

Outras farinhas

Encontra-se no mercado inúmeras farinhas im- vasta variedade de resultados de acordo com as
portantes para a panificação, sejam combinadas associações feitas pelo padeiro.
com a farinha de trigo ou mesmo puras, cada Para contextualizar as características de
uma em um caso. Imprescindível é saber que cada uma dessas farinhas, dois autores foram
essas farinhas agregam valores nutricionais, mais utilizados como embasamento teórico, são
aroma, textura, sabor e cor aos pães, permitindo eles: Camargo (2013) e Sebess (2012).
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 33

A farinha de centeio é integral, da mesma


família que o trigo e também muito utilizada
na panificação. Rica em vitamina A e fósforo,
o centeio contém glúten, porém em proporção
menor que o trigo. O resultado da utilização do
centeio (junto da farinha de trigo branca) é um
pão mais escuro e denso, porém muito aromático.
A farinha grano duro (ou grão duro) é do trigo
triticum durum L., matéria-prima muito utilizada
para fabricação das massas italianas. No Brasil
se produz pouco, encontra-se em quantidades
maiores em países próximos. O teor de glúten é
muito elevado (percentual excede 12%, podendo
chegar a 14% facilmente). A semolina de grão duro
é farinha de moagem mais grossa, amarelinha e de
sabor surpreendente quando agregada à farinha
branca para conferir textura, cor e sabor ao pão.

Por que a farinha de trigo?


• Rica em amido:
-- Liga.
-- Substrato para fermento.

• Rica em proteína:
-- Estrutura física.
-- Sabor suave.
-- Massa leve.
-- Fácil digestão.
-- Textura apreciada.
Panificação Clássica e Brasileira

A farinha de mandioca (ou fécula de mandioca) A farinha de cevada é pobre em glúten e, apesar
é proveniente da raiz mais famosa do país, que de mais utilizada em preparos de sopas e enso-
também pode ser chamada de amido de man- pados, a moagem da cevada perolada resulta
dioca ou farinha de tapioca fina (com 86% de em uma farinha que, misturada à farinha de
amido e ausente de glúten). Com essa farinha trigo, confere ao pão sabor adocicado e textura
se produz pães de queijo, chipas e inúmeros levemente terrosa.
biscoitos. Por fim, a farinha de soja, riquíssima em
A farinha de milho (ou fubá) é ausente de proteína, cálcio e vitamina B. A soja pode ser
glúten, por isso, ao ser utilizada, precisa ser encontrada como grão inteiro (com e sem casca),
acompanhada de farinha de trigo. Apesar disso, em forma de farinha, de lecitina, de óleo, de leite
é uma farinha de sabor ousado e, mesmo em etc. A farinha de soja parcialmente desengordu-
pouca quantidade, agrega facilmente suas ca- rada é utilizada no preparo de pães integrais. Ela
racterísticas à massa. O miolo resultante dessa é pobre em amido e rica em proteína e deve ser
mistura é mais fino e compacto. utilizada com cuidado, pois a grande quantidade
A farinha de aveia, seja em flocos finos ou afeta o volume e o sabor do resultado final.
grossos, é facilmente agregada às massas à base
de trigo – carece de glúten. É uma farinha ex-
tremamente nutritiva – rica em vitaminas, em
carboidratos, em minerais, em oligoelementos,
em proteínas e em lipídios – que auxiliam na
redução do mau colesterol.
A quinoa – rica em proteínas, em fibras e
Aproveite este conteúdo para relacioná-lo
em ômega 3 – não é um cereal, mas é tratada com os estudos e preparações apresen-
na panificação como se fosse. Desta planta se tadas na disciplina de Cozinha Clássica
faz uma farinha que é utilizada para compor sobre os tipos de farinha para a confec-
ção de massas frescas e industrializadas,
pães (combinada à farinha de trigo devido à
e qual o papel da semolina de grano duro
ausência de glúten). Mas, ainda, mais utiliza- nesses preparos. Aprofunde sempre seus
dos na panificação são seus grãos, que con- conhecimentos!

ferem textura principalmente se associados


a outros grãos.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 35
Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 37

O Fermento
e a Fermentação

Você sabia que o fermento é um fungo? Isso significa que ele é um


organismo vivo (por isso chamado de fermento biológico), unicelu-
lar e bem pequenino. Kalanty (2012) nos conta que em uma colher
de sopa de fermento comercial podem ser encontrados mais de
100 bilhões desses fungos, cujo nome científico é Saccharomyces
cerevisiae (fungos comedores de açúcar).
Nós encontramos fermento biológico de três tipos no comércio:
fresco, ativo seco e instantâneo.
Panificação Clássica e Brasileira

O fermento biológico fresco tem aparência de


Usando fermento fresco
uma pasta cremosa e é encontrado facilmente
em supermercados, mercearias e lojas especia- 1. Coloque água ou leite em uma tigela. Na
maioria dos casos, o intervalo de temperatura
lizadas em alimentos. Apresenta uma textura do líquido é entre 21,11°C e 32,22°C. No
maleável, de fácil manipulação e deve ser arma- entanto, o fermento fresco pode tolerar
temperaturas tão baixas quanto 4,44°C e tão
zenado coberto e refrigerado. Em temperatura altas quanto 35°C.
controla de 2,22°C a 4,44°C ele permanece vivo 2. Mexa para dissolver.
por pelo menos 21 dias (KALANTY, 2012). 3. Proceda com os ingredientes restantes
conforme a receita.
E como devemos utilizá-lo? A melhor indi-
cação é esfarelar o fermento em água primeiro Tabela 3: Como utilizar fermento fresco
Fonte: Kalanty (2012, p.46).
(ou em líquido) e misturar bem, para que ele
seja bem dissolvido antes de se adicionar qual-
quer ingrediente à massa, dessa forma, teremos O fermento seco ativo tem aparência granula-
pães mais resistentes. Evite esfarelar o fermento da grossa e de cor bege e é também facilmente
diretamente na massa, pois será mais difícil encontrado em mercearias, supermercados e
homogeneizá-lo, prejudicando a fermentação lojas especialidades em produtos alimentícios.
posterior (ibidem). Se a embalagem não for aberta, o fermento
pode durar mais de um ano em prateleira,
porém, depois de aberto, deve ser armaze-
Figura 5: Fermento nado em recipiente fechado sob refrigeração,
biológico fresco.
permanecendo vivo por 3 a 4 meses. Se con-
gelado, sua atividade pode durar 6 ou mais
meses (ibidem).
Esse tipo de fermento deve necessariamen-
te ser reidratado em água morna antes de ser
utilizado, por 10 minutos. O resultado da massa
com esse tipo de fermento é menos elástica, não
encolhendo tanto quando se faz a modelagem,
por isso é muito utilizado para fabricação de
pizzas (ibidem).
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 39

em embalagens maiores, tanto em supermerca-


dos, como em mercearias e outros estabeleci-
mentos alimentícios. Vem se tornando dos mais
populares por conta da facilidade de utilização e
armazenagem, além de ser extremamente con-
fiável. Fechado se mantém por mais de um ano
se armazenado em recipiente hermético sob
refrigeração (10°C a 21,22°C). Aberto, deve-se
guardar da mesma forma, tendo duração de 3 a
4 meses e congelado pode durar por seis meses
ou mais (ibidem).
Apesar de nas embalagens desse fermen-
Figura 6: Fermento biológico seco ativo.
to vir a informação de que ele não precisa de
reidratação e deve ser acrescentado diretamente
Usando o fermento seco ativo à massa, não é uma recomendação que eu faça.
Para pães mais resistentes, dissolva o fermento
Aqueça a tigela deixando-a sob água corrente
quente. Elimine a água. seco instantâneo em água antes de utilizá-lo
1. Coloque água a 43,33°C na tigela. também.
2. Salpique o fermento seco ativo sobre a água.
Não misture. Deixe descansar por 5 minutos.
3. Mexa uma vez. Deixe descansar por mais 5 Usando o fermento instantâneo
minutos.
4. Proceda com os ingredientes restantes
1. Aqueça a tigela deixando-a sob água corrente
conforme a receita.
quente.

Tabela 4: Utilizando o fermento biológico seco ativo


2. Coloque na tigela água a 40,56°C.
Fonte: Kalanty (2012, p.47). 3. Salpique o fermento instantâneo sobre a água.
4. Mexa para dissolver.
O fermento seco instantâneo apresenta aspecto 5. Continue com os ingredientes restantes,
conforme a receita.
de grânulos finos, menores que do fermento
seco ativo, mais liso e de coloração bege-claro.
Tabela 5: Utilizando o fermento biológico seco instantâneo
É encontrado em embalagens de 10g e também Fonte: Kalanty (2012, p.48).
Panificação Clássica e Brasileira

A Fermentação

O processo de panificação é um equilíbrio harmonioso entre o domí-


nio técnico do padeiro e a transformação natural que ocorre durante a
fermentação. Esta inicia-se quando são combinados dois dos principais
ingredientes do pão: farinha e água. Com a adição de sal, fermento,
tempo e temperatura, o profissional equilibra todos os elementos da
fermentação (SUAS, 2012, p.81).

Como coloca o autor, a fermentação é um processo que demanda ingredientes


básicos e que são determinantes para o resultado final. É a fermentação que
influenciará no sabor e no aroma do pão. Sendo assim, entenderemos agora
como se dá todo o processo interno de fermentação na massa, em que o amido
e a proteína que abordamos no tópico sobre a farinha são itens determinantes.
Primeiramente, deve estar claro que toda fermentação é relacionada à
alteração de moléculas sob efeito de fungos (levedura e mofos) e bactérias.
Utilizamos produtos fermentados todos os dias, sem, muitas vezes, ter consci-
ência disso. A exemplo, podemos citar o queijo, que é resultado da fermentação
do leite, bem como a manteiga e os iogurtes.
Na panificação ocorre o que chamamos de fermentação alcóolica, pois
os açúcares presentes na farinha (ou glicídios, que são carboidratos que
incluem açúcares, amidos etc.) são transformados em álcool e dióxido de
carbono (CO2). Além de a farinha ser constituída em 70% por amido (dis-
tribuído em amilose e amilopectina), também se encontram nela enzimas
beta-amilases adormecidas. Em contato com a água ocorre o processo de
hidrólise, ou seja, as enzimas são acionadas e transformam os açúcares
complexos em açúcares simples (amilose → maltose → glicose; amilopec-
tina → dextrina → maltose → glicose). Esses açúcares simples servem de
alimento para o fermento, que absorve a glicose e gera dióxido de carbono
e álcool (SUAS, 2012).
A ilustração a seguir simplifica a compreensão da fermentação alcóolica:
Enquanto a fermentação ocorre e há liberação de CO2, conduz-se o processo
de crescimento da massa.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 41

Figura 7: Processo de fermentação utilizando fermento comercial


Fonte: Suas (2012, p. 82).

Em paralelo ao processo de fermentação, ocorre o desenvolvimento do glúten,


resultante da combinação das proteínas existentes na farinha com água e ação
mecânica de sova ou do gancho da masseira/ batedeira.
As duas principais proteínas do trigo – glutenina (proteína que tem
algum efeito na elasticidade da massa) e gliadina (proteína que afeta a
extensibilidade da massa) – são responsáveis pela formação da massa.
[...] Na medida que inflam, elas se atraem mutuamente e formam cadeias
de proteínas chamada glúten. Depois do glúten se formar, a operação
mecânica do gancho vai produzir uma estrutura organizada por meio
de dois movimentos distintos. O primeiro estende as cadeias de glúten,
enquanto o segundo atrai as cadeias de volta. Depois de um período de
mistura, essas cadeias se alongam cada vez mais, e se tornam cada vez
mais finas, e mais sobrepostas (SUAS, 2012, p.63).
Panificação Clássica e Brasileira

O tempo de sova é fator determinante para o desenvolvimento do glúten.


Um processo mais longo resulta num glúten bem desenvolvido, um período
mais curto resulta em uma estrutura menos desenvolvida. Apesar disso,
deve-se tomar cuidado para não exagerar no tempo de sova, pois o glúten
superdesenvolvido torna a estrutura quebradiça, rompendo-se facilmente
(KALANTY, 2012).

Figura 8: Este ponto de desenvolvi-


mento do glúten da massa é chama-
do de ponto de véu

Fonte: Verdadeiro... (2014, online).

“Os padeiros profissionais algumas vezes usam os termos glúten elástico


e glúten plástico. A massa que é fácil de abrir e de transformar em filões é
chamada de plástica. Por outro lado, aquela que volta apenas o suficiente
e tem uma superfície lisa, com poucos rasgos ou pretas, é chamada de
elástica. Diz-se que uma massa que exibe equilíbrio entre as propriedades
plástica e elástica tem glúten de alta qualidade.”

Fonte: Kalanty (2012, p.106).


GASTRONOMIA • UNICESUMAR 43

A elasticidade e a extensibilidade resultantes do desenvolvimento do glúten


são responsáveis por conter o CO2 liberado pela fermentação alcóolica dentro
da massa. Ou seja, enquanto o amido alimenta o fermento e este libera dióxido
de carbono e álcool, o glúten desenvolvido deixa a massa resistente para que
não haja um “estouro”, e os gases e álcoois se mantenham presos à massa,
resultando em um pão volumoso e leve.

Quanto de fermento devo utilizar?


A quantidade de fermento utilizada controla a fermentação, ou seja, para
que a massa tenha tempo suficiente para obter os benefícios da fermen-
tação, deve-se usar em torno de 0,5% a 2% de fermento (fresco), tendo
como base a quantidade de farinha. Se for uma massa doce, a quantidade
será maior. Caso utilize o fermento seco ativo ou o seco instantâneo, o
ideal é fazer a proporção de acordo com as indicações do distribuidor
(SUAS, 2012).
Além do efeito de crescimento da massa, a fermentação produz ácidos
orgânicos que diminuem o pH da massa. Essa acidificação prolonga o processo
de envelhecimento e aumenta a durabilidade do pão. Além disso, a fermenta-
ção produz o aroma característico que conhecemos, tanto por conta do álcool
liberado quanto dos ácidos produzidos (ibidem).

O crescimento da massa
Ainda relacionado à fermentação, o crescimento da massa exige alguns
cuidados especiais. Depois de misturadas as matérias-primas e obtida
uma massa consistente, com bom desenvolvimento de glúten, é hora de
deixar que a massa descanse para crescer – quando começa realmente o
processo de fermentação alcóolica. Isso é necessário para que a estrutura
de glúten relaxe e volte a se tornar elástica – você verá que assim que ter-
mina o processo de sova, a massa fica bem unida e não é manipulável com
facilidade, o que chamamos de “glúten estressado” – para que as células
de ar e bolhas de CO2 se espalhem de forma uniforme por toda a massa
(KALANTY, 2012).
Panificação Clássica e Brasileira

Três são os fatores cruciais para o bom crescimento de uma massa: tempe-
ratura, tempo e umidade. Em tempo normal, sem aceleração do processo,
uma massa deve crescer entre 21,11°C a 28,89°C, com umidade de 50% a
80% (quando há equipamentos específicos de panificação, tanto temperatura
quanto umidade podem ser controladas com precisão). O tempo pode ser
de 45 minutos a 1 hora e 30 minutos. Claro que são indicações de forma
generalizada e o ideal é seguir o receituário e as indicações do padeiro para
cada pão. Valendo-se de um lembrete importante: cuidado com a tempera-
tura, pois o fermento é um ser vivo, a 45°C ele está em risco e a 60°C ele é
aniquilado! Em caso de colocar a massa para crescer em estufa, o controle de
temperatura deve ser ainda maior, não deixando extrapolar 35°C (ibidem).
Na próxima unidade, nós abordaremos ainda mais especificamente a
fermentação, pois você verá que não existe apenas um método de ação da
levedura na fermentação, e sim, formas variadas de ativarmos a levedu-
ra antes de adicioná-la à massa, resultando em pães com características
diferenciadas, tanto em crescimento, quanto em aroma, sabor e textura.
Espero-te por lá.

Amido → açúcares → alimenta fermento → expele dióxido de carbônico


(CO2) + álcool → crescimento da massa.

Proteínas (glúten) → + água → + sova → formação de rede → estrutura e


elasticidade do pão.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 45

considerações finais
o final desta etapa, você consegue entender de onde surgiu o nosso pãozinho
de cada dia. Sabe que ele já foi mais pesado, sem fermentação, em formato
diferente e rústico. Ao falar em Egito, consegue entender como a percepção
desse povo com relação à agricultura influenciou positivamente os avanços
na panificação. Avanços que também fizeram os romanos, com a moagem dos grãos e a
criatividade de misturar ingredientes.
Nesse patamar, também é possível optar por qual das teorias acerca da descoberta
da fermentação você mais se adapta: foi a substituição da água pela cerveja ou o esque-
cimento que fez a massa fermentar? Não se sabe, mas há adeptos das duas ideias.
Reflita, no término desta unidade, como os fatores geográficos, sociais e religiosos
interferem no percurso da história do pão. Na Idade Média isso ficou bem claro, pois
com o aumento da população urbana acompanhado da escassez de grãos, muitas doen-
ças tomaram conta das pessoas e, se não havia grãos, também não havia pães – ou, ao
menos, não em mesma quantidade e qualidade. Temos então forte retorno às atividades
pecuárias como foco na alimentação. Porém, note a influência religiosa: sabemos que
atualmente o pão é comumente utilizado em Igrejas diversas, o que não era diferente
na Idade Média, pois esse alimento já era tido como sagrado e a Igreja Católica teve
forte empenho para incentivar novamente as plantações de grãos, o que possibilitou o
retorno do grande consumo de pães.
Além de todo esse contexto histórico, você começará a próxima unidade com uma boa
base para entender a panificação de forma geral, pois sua trajetória também percorreu o
grão de trigo, conhecendo cada um de seus componentes, sabendo que o endosperma é
bem importante para a panificação, pois é daí que extraímos a farinha de trigo branca,
e que não é apenas do trigo que podemos fazer a farinha.
Conhecemos os três tipos de fermento comerciais – biológico fresco, seco instantâ-
neo e seco ativo – e como é que esses seres vivos atuam para que o pão cresça, ou seja,
como é que se dá o processo de fermentação.
Porém, apesar da riqueza de conteúdo que já abordamos nesta unidade, não é
suficiente para que você compreenda todo o processo de fermentação e o que são
os pré-fermentos. Sendo assim, convido-te a me acompanhar a mais uma unida-
de, cheia de informações a respeito desse alimento que faz parte da nossa base
alimentar: o pão.
Panificação Clássica e Brasileira

atividades de estudo

1. Existem duas teorias que fundamentam o surgimento do pão fer-


mentado, quais são elas?

2. O grão de trigo é constituído por casca (farelo), gérmen e endosperma.


De qual dessas partes provém a farinha mais utilizada na panificação?
Explique as razões dessa escolha.

3. Com base na resposta anterior, explique o processo de fermentação


alcóolica, como se dá o desenvolvimento da rede de glúten e sua
importância para o crescimento da massa.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 47

material complementar
Pão - Arte e Ciência
Sandra Canella-Rawls

Editora: Senac São Paulo


Sinopse: Todos supõem conhecer bem o pão, esse alimento uni-
versal e ao alcance diário do paladar de ricos e pobres, mas serão
surpreendidos nesse trabalho pela variedade de informações
que o tema fornece. Sua antiguidade, que faz desse alimento um
produto tipicamente artesão, contrasta, por exemplo, com sua
modernidade, no sentido do que já se criou em panificação e da
interminável condição de continuar criando. (Gourmand World
Cookbook Awards 2005 - Melhor Livro sobre Pão).

Julice Vaz, formada em Confeitaria e Panificação, explica sobre as produções de pães artesanais
em sua boulangerie, em São Paulo.

Confira o conteúdo disponível em: <https://vimeo.com/29125309>. Acesso em: 09 jul. 2015.


Panificação Clássica e Brasileira

leitura complementar

Pão egípcio da Antiguidade


Autor: Desconhecido. Em: Parede da tumba de Senet, em Luxor, Egito.

Triture os grãos em um pilão e peneire-os para retirar as cascas. Moa bem até
obter uma farinha branca. Misture a farinha com água suficiente até formar
uma massa bem uniforme. Sove-a em uma tigela grande ou amasse-a com
delicadeza. Separe porções dessa massa e forme bolas. Asse diretamente sobre
cinzas quentes ou coloque em fôrmas sobre uma chapa de cobre, no fogo.
Fique atento durante o cozimento: assim que a parte inferior do pão começar
a dourar, vire e asse do outro lado.
Nas encostas quentes da colina de Sheikh Abd el-Qurna, com vista para
o vale do Nilo, perto da antiga cidade de Tebas – atual Luxos –, fica a entrada
discreta e humilde da tumba egípcia Senet. Esculpida na montanha de calcá-
rio, é uma das centenas de câmaras funerárias da região. Nas tumbas jaziam
após a morte os nobres, funcionários que exerciam o poder no reinado dos
faraós do Egito Antigo.
Nas paredes das tumbas estão pintadas cenas do cotidiano que eles
gostariam que permanecessem na vida após a morte. Então, tudo o que era
agradável – lembranças felizes, experiências e rituais – está registrado em
detalhes, propiciando uma imagem clara do cotidiano de 4 mil anos atrás.
Há cenas de caça e pesca, de colheitas diversas, cachos de uva, festas e da
vida rural em geral.
Quase todas as tumbas eram para homens, mas a tumba de número
TT60 em Tebas é a de Senet. É a única de uma mulher, datada do período
egípcio do Médio Império, entre 2055 e 1650 a.C., e a câmara mortuária mais
antiga, cujas paredes decoradas se mantiveram bem. Além das imagens de
caça, aragem e semeadura, há representações indicando a produção de pão.
São tão detalhadas e coloridas que os que viram os murais atestam seu poder
avassalador: “Estamos diante de representações excepcionais da verdadeira
culinária do Médio Império”, escreveu o egiptólogo Thierry Benderitter ao
vê-las na década de 1970.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 49

leitura complementar
Mas quem era Senet? Esposa ou talvez mãe de Antefoqer, um vizir –
ancião que ficava entre o faraó e os súditos – que serviu ao rei Amenemhat I
e depois ao seu filho, Sesóstris I, no início da 12ª dinastia, entre 1958 e 1913
a.C. O fato de ela ter recebido seu próprio hipogeu, ou tumba subterrânea
privada, atesta a importância de Antefoqer, mas atualmente a entrada não
é majestosa. Menor que outras na mesma colina, apresenta uma entrada de
tijolos com uma porta simples de madeira, adicionada em 1914 pelo egiptó-
logo inglês Norman Davies.
Pouquíssimos túmulos estão abertos ao público, e este quase não é visita-
do; a entrada é restrita, e fotografar, proibido, para evitar que o flash danifique
os murais. Os poucos que têm acesso permitido devem se esgueirar pelos
escombros intermináveis que circundam a entrada e até retirar uma pilha de
pedras que muitas vezes bloqueia a porta verdadeira – simples, mas eficaz e
segura. Assim que é aberta, essa porta revela um corredor longo, estreito e
sombrio que se estende até a tumba, e o teto, descendente em altura, desperta
uma sensação de compreensão. A passagem leva a uma câmara quadrada
empoeirada, onde há uma estátua da própria Senet sentada, uma restauração,
pois a escultura foi encontrada em fragmentos.
Além da câmara, há outro corredor comprido, mas esse é claro, com
pinturas nas cores ocre, amarela, vermelha e azul. Lá, o olho foi desenhado
pela primeira vez, em uma imagem de Antefoqer, durante a caça, posando
majestosamente com uma tanga, de acordo em punho. Em torno do pescoço,
um colar elaborado azul, verde e branco, e os pulsos estão adornados com
pulseiras que combinam.
Há belos desenhos de galgos, hipopótamos e aves: gansos, patos e fla-
mingos em um fundo azul-celeste vivo. Gazelas e lebres são perseguidas por
cães; aves correm atrás das redes de peixes – são tão detalhados que é possí-
vel determinar a espécie. E, então, no meio da passagem de vinte metros, à
direita, estão as cenas culinárias.
Nelas, ilustra-se o preparo da carne, por exemplo. Sob a proteção refres-
cante de um toldo, homens esquartejam um boi e penduram as peças em
Panificação Clássica e Brasileira

leitura complementar

cordas, enquanto deixam outras ao sol para amaciar, batendo-as com pedras.
À direita, um homem adiciona um osso a um caldeirão de sopa com uma
das mãos, enquanto, com a outra, mexe o líquido usando uma vara. Outro
personagem assa aves no espeto sobre uma grade levantada, estimulando as
brasas com um leque em forma de meia-lua. É uma atividade intensa.
Assim como a receita para o preparo de pão resumida no início desse
capítulo, ela parece estar desenhada à perfeição. É claro que essas imagens
não serviam para instruir o cozinheiro da casa, mas ajudavam os mortos a
ter pão fresco decente na vida após a morte. Acima de tudo, é um registro
histórico que nos informa sobre a panificação há milhares de anos.
As imagens não só revelam como a farinha é preparada a partir de grãos,
mas também a conversa (decifrada dos hieróglifos) entre os personagens,
pintada perto da cabeça como balões de diálogo.
A princípio, dois homens esmagam os grãos em um recipiente de ma-
deira. “Embaixo!”, um ordena ao outro, que responde: “Faço conforme sua
vontade”. Depois, a mulher peneira os grãos para retirar as cascas, enquanto
a companheira deixa os grãos ainda mais finos usando uma mó.
Em outra imagem, uma moça prepara pequenos rolos de massa, enquan-
to a outra adiciona tiras finas em fôrmas cônicas altas. Atrás dela, vê-se um
homem colocando os recipientes cônicos em um forno, cutucando as brasas
com uma das mãos e protegendo o rosto do calor com a outra. Mas não parece
satisfeito com o estado da lenha: “Esta lenha está verde”.

Fonte: Sitwell (2013, p.11-12).


GASTRONOMIA • UNICESUMAR 51

leitura complementar

Panificação por Etapas


SAMARA FERNANDES
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• A levedura e a fermentação
• Outras matérias-primas
• A porcentagem do padeiro

Objetivos de Aprendizagem
• Entender a ação da levedura no processo de fermentação.
• Conhecer os diferentes tipos de fermentação prévia.
• Recordar outras matérias-primas com as quais se produz pães.
• Praticar a porcentagem do padeiro.
53

Introdução
Nesta unidade, estudaremos pontos muito importantes na panificação, antes de realmente
colocarmos a mão na massa. O primeiro item são os tipos de fermentação primária e como as
leveduras agem no processo de fermentação – você já deve ter em mente que, para um bom
resultado, não deixamos a massa crescer apenas uma vez. Em seguida, veremos as matérias-pri-
mas que podem ser utilizadas para se fabricar um pão, ingredientes que vão além da farinha, do
fermento, do sal e da água. Por fim, você aprenderá o que é a porcentagem do padeiro e como
utilizar na vida profissional.
Para contemplar todo esse conteúdo, no primeiro tópico, falaremos apenas dos processos
de pré-fermento, compreendendo que, para esta primeira fermentação, temos uma base seme-
lhante, independentemente do processo, sendo que o que se modifica são as quantidades e as
proporções. Além disso, você verá que podemos utilizar não apenas aqueles três tipos de fer-
mentos industriais, mas também o fermento natural, obtendo resultados diferentes de acordo
com a sua escolha. Depois deste tópico introdutório, você saberá diferenciar biga de esponja,
de poolish, de massa pré-fermentada e de sourdough – além de suas funções, quantidades e de
quando utilizar cada um deles.
O segundo tópico contemplará as matérias-primas que são utilizadas na panificação e que
vão além dos quatro ingredientes básicos. Se você já fez um pão, já leu uma receita de um ou viu
alguém fazendo, possivelmente notou que se pode utilizar ovo, leite, manteiga, margarina, mel
etc. Isso é muito comum e cada um desses ingredientes afetam o resultado da massa final de uma
forma diferente. Para você ter uma primeira ideia, os adoçantes, se utilizados em quantidades
moderadas, amaciam o glúten, ou seja, permitem que a massa estique com mais facilidade.
No terceiro tópico teremos um pouquinho de matemática, mas não se assuste, são algumas
regras de três bem simples! Isso é necessário para que você seja capaz de interpretar a linguagem
de um padeiro, afinal, ele fala tudo em porcentagem: “x% de hidratação”, “y% de farinha” etc.
Você vai ver que depois de bem explicadinho, não é nenhum “bicho de sete cabeças”.
E então, vamos começar?
Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 55

A Levedura
e a Fermentação

Sabemos que para assar um pão devemos esperar que a massa


cresça, ou seja, aguardamos o processo de fermentação ocorrer até
que, com a liberação de gases e de álcool, ela infle, resultando em
um pão macio. O que você deve tomar nota agora é que existem
pré-fermentos – ou fermentação primária – que possibilitam dife-
rentes ações da levedura na fermentação. Suas (2012) mostra que
a base para um pré-fermento é sempre semelhante (farinha, água,
fermento, natural ou industrial, e, em alguns casos, sal), porém,
altera-se a textura e o período controlado de tempo de fermentação
antes de se adicionar à massa final, obtendo diferentes resultados.
Os pré-fermentos podem ser a esponja, a biga, a massa pré-
-fermentada, o poolish, e ainda, o método de fermentação natural
sourdough. Para entendermos cada um desses métodos, serão
utilizados, para embasamento teórico, os autores Cauvain e Young
(2009), Sebess (2014) e Suas (2012).
Panificação Clássica e Brasileira

Esponja

A esponja é uma mistura cremosa feita com Sendo assim, a quantidade de fermento vai
fermento e a mesma quantidade de farinha variar de acordo com o tempo que se pode
e água (ou outro líquido, como o leite). Essa esperar antes de utilizá-lo. A tabela abaixo
massa deve ser feita de 2 a 8 horas antes de mostra a quantidade ideal de fermento por
se produzir realmente o pão, para que ocorra quilo de farinha de acordo com o tempo de
a fermentação completa no pré-fermento. fermentação.

Duração do tempo de fermentação da esponja Dosagem de fermento x quilo de farinha

2 horas 20 gramas

3 horas 15 gramas

5 horas 08 gramas

8 horas 05 gramas

Tabela 6: Dosagem de fermento para realização de esponja


Fonte: SEBESS (2014, p.57).

A essa mistura normalmente não se acrescenta ácida cuja característica afetará o pão. A acidez
sal e a utilização de uma esponja resulta num ideal de uma esponja também prolonga a vida do
pão com sabor levemente adocicado. O ideal é pão depois de assado, ou seja, além de melhorar
que se espere essa massa atingir maturidade, ou o sabor também aumenta sua durabilidade.
seja, quando bolhas estiverem bem formadas à Vale ressaltar que não há contra indicação
superfície e começarem a se romper é sinal de em seu uso, pelo contrário, as massas doces,
que ela está pronta para ser misturada à massa principalmente, são muito beneficiadas, pois,
final. Se ela não chegar a esse ponto, sua utili- por conta da grande quantidade de açúcar, a
zação não terá o mesmo resultado, pois não terá rede de glúten não se desenvolve como deveria
desenvolvido a acidez suficiente – bem como o e a esponja ajuda a firmar essa massa, compen-
excesso de fermentação deixará a esponja muito sando o outro enfraquecimento.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 57

Vantagens do uso da esponja


Proporciona benefícios significativos para
a qualidade do pão:
• Aumenta o sabor e a conservação do
pão, deixando na boca um leve sabor
de avelãs.
• Ajuda a manter a massa do pão no for-
mato inicial.
• Os cortes feitos na casca abrem bem.
• Os pães obtêm boa coloração.
• Melhora a cocção dos pães.

Fonte: Sebess (2014, p.58).

Utilize a esponja quando seu volume, no


mínimo, triplicar com relação ao início e já
houver uma leve depressão em seu topo.
Antes disso ela não está no ponto ideal de
uso, perdendo suas vantagens.

Figura 9: Esponja madura.


Panificação Clássica e Brasileira

Biga

A biga é uma fermentação primária de origem pães produzidos com fermentação muito curta.
italiana. Para os italianos, a biga pode ser líquida, Uma massa bem básica é feita e reservada
firme, mais azeda, fermentadas em temperatura para fermentar por um período antes de ser mis-
ambiente ou ainda em ambientes frios. Já ao turada à massa final. A mais simples é feita com
nosso modo, a biga se caracteriza por um pré- farinha, água, fermento e sal, sendo indicado
-fermento mais firme, com menos água e mais deixar no mínimo três horas fermentando –
farinha que uma esponja (65% de água para sem ultrapassar seis em temperatura ambiente.
100% de farinha, utilizando de 0,8% a 1% de É possível deixar a massa velha fermentar
fermento biológico fresco). Em temperatura por mais tempo – até 48 horas –, porém, nessa
controlada a 16°C, a biga pode ser mantida em situação é necessário mantê-la entre 2°C a
fermentação por até 18 horas. 7°C e retirá-la duas horas antes de utilizar,
para que a temperatura fique mais próxima
Fórmula Percentual ao ambiente.
em kg do padeiro
A massa pré-fermentada pode ser feita
Farinha 1 kg 100%
também reservando parte de alguma massa
Fermento final. Por exemplo, reserva-se parte de uma
0,008 kg 0,8%
fresco
massa de farinha integral para que ela fermente
Água 0,650 kg 65%
e seja usada dias depois como pré-fermento. Ou
Tabela 7: Receita básica para fabricação de biga
Fonte: SEBESS (2014, p.66). então a massa da baguete, que leva apenas os in-
gredientes básicos e pode servir de fermentação
As funções dessa massa fermentada são seme- primária para qualquer tipo de mistura final. Da
lhantes à da esponja, enfatizando o sabor e a du- quantidade total de farinha utilizada para um
rabilidade. Por ser um pré-fermento mais firme, pão, a média de massa velha que se acrescenta
é importante utilizar farinha forte de modo que varia entre 40% e 50%, mas, de acordo com a
não prejudique a extensibilidade da massa. receita, pode-se pedir de 10% a 180%.
As proporções de cada ingrediente variam
Massa pré-fermentada de receita para receita, tendo como base a fari-
Também conhecida como massa velha, a massa nha destinada à fermentação da esponja – que
pré-fermentada é uma invenção recente e fácil, pode ser de 20% a 30% da farinha total da
criada para compensar a qualidade baixa dos mistura final. Segue tabela com proporções:
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 59

Fórmula Percentual
em kg do padeiro
fermentação esperado, deve-se controlar a quanti-
Farinha 1 kg 100% dade de fermento acrescido à massa de acordo com
Fermento o tempo disponível para a fermentação. O indicado
0,015 kg 1,5%
fresco
é deixar que o poolish fermente em temperatura
0,640 kg a
Água 64% a 66%
0,660 kg ambiente (considerada de 27°C a 29°C).
Sal 0,002 kg 2%
Tabela 8: Proporções para fabricação de massa pré-fermentada
Fonte: adaptado de SUAS (2012).

Lembrete: os 20% a 30% da farinha total da


mistura (em destaque) representam os 100%
para a mistura da massa velha.
A massa pré-fermentada pode ser utilizada
para qualquer tipo de pão, desde os mais tradi-
cionais – como baguetes e pães de forma – até
pães mais elaborados – como croissant e brioche.
Figura 10: Poolish sendo acrescentado à massa final

Poolish
Um dos primeiros pré-fermentos feito com Tempo de
3 horas 7 a 8 horas 12 a 15 horas
fermentação
fermento industrial, o poolish, foi criado na
Polônia – final do século XX –, adaptado na Quantidade de
1,5% 0,7% 0,1%
fermento fresco
Áustria e depois chegou à França. O pão re-
Tabela 9: Cálculo para a quantidade de fermento para o poolish
sultante da utilização dessa massa era menos Fonte: SUAS (2012, p.90).

ácido que o comum na época (com sourdough,


que você conhecerá a seguir) e mais leve em Apesar de poder ser usado em pães e doces, costu-
textura também, de modo a ter rápida aceitação. ma ser o pré-fermento preferido para a fabricação
Para se preparar o poolish, utiliza-se de base o de baguetes. O ponto ideal para utilização do
volume de água que vai na receita, na fórmula do poolish é quando atinge a maturidade, que pode
padeiro. Essa medida pode variar de 20% a 80% do ser reconhecida quando algumas formas mais
total de água (em temperatura de 16°C), usando côncavas se formam na superfície. A acidez que
a mesma quantidade de farinha e a consistência leva à durabilidade está ideal nesse ponto, menos
será mais líquida. Não é comum acrescentar sal a desenvolvida ou desenvolvida em demasia faz
esse pré-fermento, então, para manter o efeito de com que o pré-fermento não tenha esse benefício.
Panificação Clássica e Brasileira

Sourdough
Para alguns, sourdough, para outros, levain. volume e que, depois de reencontrada, foi
Trata-se do mesmo pré-fermento, porém, este levada para assar marca também o surgimento
não é desenvolvido a partir de um fermento do método sourdough.
industrial, como os outros, e sim, cultiva-se Até conseguirmos a levedura em si, precisa-
uma cultura de micro-organismos (levedura mos criar a cultura e esperar que ela se desenvol-
e bactérias) que aumentam em quantidade e va, seguindo algumas etapas. Primeiro cria-se e
depois são utilizados para fermentar a massa. elabora-se a cultura; depois que se alimenta uma
Sempre que uma parte do sourdough é utiliza- ou duas vezes, essa cultura passa a ser chama-
do, reserva-se uma porção dessa cultura para da de fermento; depois da alimentação final, é
perpetuar o fermento criado, sendo necessário chamada levedura. Para manter a cultura viva,
acrescentar mais farinha e água a cada vez para sempre separa-se parte para a massa final, parte
manter a atividade da levedura. para realimentar – quando o fermento chega
Quando estudamos a história do pão e nesse estágio ele passa a ser chamado de starter;
o surgimento da fermentação na primeira a parte retirada para a utilização na massa final
unidade do livro, vimos que uma das teo- resulta em um pão sourdough.
rias a respeito do primeiro pão fermentado Para elaborar sua própria cultura de levain,
se deu no Egito por volta de 4.000 a 3.000 ou seja, começar a cultura do seu fermento na-
a.C. Aquela massa esquecida que dobrou de tural, siga a programação a seguir:

Tempo antes da
Programação Farinha Água Starter
próxima alimentação
500 g de farinha integral e
1º dia - manhã1 1 kg - 24 horas
500 g de farinha branca
2º dia - manhã 500 g de farinha branca 500 g 500 g 6 - 8 horas
2º dia - tarde 500 g de farinha branca 500 g 500 g 16 horas
3º dia - manhã 500 g de farinha branca 500 g 500 g 6 - 8 horas
3º dia - tarde 500 g de farinha branca 500 g 500 g 16 horas
4º dia - manhã 500 g de farinha branca 500 g 500 g 6 - 8 horas
4º dia - tarde 500 g de farinha branca 500 g 500 g 16 horas
5º dia - manhã 500 g de farinha branca 500 g 500 g 6 - 8 horas
5º dia - tarde 500 g de farinha branca 500 g 500 g 16 horas
Tabela 10: Começar o starter (iniciador de fermento natural para produção de sourdough). Fonte: Suas (2012, p. 97).
1
Acrescentar 15 g de malte na primeira alimentação para ajudar a iniciar a fermentação. Essa programação é um guia para iniciar um
starter desde o início. Durante esse processo, o starter deve ser mantido em temperatura de 27°C para estimular a fermentação. Uma
cultura madura será capaz de multiplicar três vezes em volume em um espaço de 8 a 10 horas.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 61

A fim de garantir que o fermento natural con- alimentação – também chamada de levedura –,
tinue vivo para ser utilizado em massas finais que depois de mais 12 horas será enfim acres-
para fabricação de diversos pães, é necessário centada à massa final.
garantir a ele alimento, ou seja, o açúcar da fa- Para a fabricação de um pão sourdough, o
rinha, água e oxigênio. Esse é o processo cha- receituário indicará a quantidade necessária de
mado de alimentar a cultura e devem-se seguir levedura. O resultado será um pão com carac-
as seguintes proporções: terísticas mais rústicas, mais escuros, de casca
crocante e, graças à acidez, um pão de maior
Farinha 100%
durabilidade e sabor mais expressivo.
Água 50%
Agora, que tal conhecer outras matérias-pri-
Starter 50%
mas que podemos utilizar para a fabricação de
Total do primeiro alimento 200%
um pão? Este será o tópico do nosso próximo
Tabela 11: Proporções para alimentar a cultura.
Fonte: Suas (2012, p. 99). tópico!

O starter é retirado depois do 5º dia, então,


guarda-se 50% e a outra metade será alimentada
para utilizar na massa final de um pão. Esta
primeira alimentação deve fermentar por 12
horas em temperatura ambiente e em seguida
será alimentado novamente:

Farinha 100%
Água 50%
Primeiro alimento 50%
Total do primeiro alimento 200%
Tabela 12: Primeiro alimento
Fonte: Suas (2012, p. 99).

Na tabela anterior, o que era representado por


“total do primeiro alimento” como 200%, agora
será considerado 50%, ou seja, a quantidade
total será realimentada com o mesmo volume de
água e dobro de farinha, resultando na segunda Figura 11: Sourdough
Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 63

Outras
Matérias-Primas

Utilizamos, na panificação, no mínimo quatro ingredientes básicos


para a fabricação de um pão: farinha, fermento, água e sal – como
já dito previamente. Além desses, outros ingredientes secundá-
rios podem ser acrescentados à massa, de modo que tenhamos
resultados diferentes.
Já tratamos, na unidade anterior, a respeito da farinha de trigo
(e de outras farinhas que podemos utilizar) e do fermento (bem
como da ação da levedura). Por isso, vamos entender algumas
peculiaridades e ações do sal e da água na panificação e depois
discutiremos a respeito de algumas das outras matérias-primas
que são utilizadas.
Panificação Clássica e Brasileira

Água

A água é um dos ingredientes mais importantes por isso, filtrar ainda é a sugestão mais viável.
para o pão, nas palavras de Kalanty (2012, p.54) Atente-se mesmo à temperatura, afinal, a água
“é o segundo maior ingrediente na panificação” – muito fria retarda a ação do fermento e acima
pois só não é maior que a farinha. Ela é a respon- de 51,67°C – muito quente – o fermento pode
sável por determinar o resultado final do pão, morrer e parar. O ideal é que a água esteja entre
se este ficará mais leve, o tamanho dos alvéolos, 32,22°C e 37,78°C, de modo que a água aqueça
quão crocante será a casca (CAMARGO, 2013). a farinha e mantenha a massa em temperatura
Se a água da torneira for clorada demais, é média de 26,67°C. Se você mora em uma região
indicado que se filtre antes de utilizá-la para pre- muito quente, utilize a água mais fria, em torno
parar pães para reduzir os minerais e aditivos em de 15,56°C, para que a temperatura da farinha
excesso. É possível utilizar água envazada, mas misturada aos outros ingredientes não se eleve
para fabricação em larga escala não é rentável, demais (KALANTY, 2012).

Sal

Sabe aquela casquinha dourada que nós adora- o pão cresceria muito rápido e, como resulta-
mos no pão? Se não fosse o sal, ela ficaria opaca do, sentiríamos sabor alcóolico, podre. O autor
e clara, bem sem graça. O sal é responsável por ainda explica que a massa sem sal tende a ser
agregar sabor, cor e aroma, resultando em um mais pegajosa, sem uma boa estrutura proteica.
pão mais bonito e saboroso. Ainda sobre o sal, Camargo (2013, p.19)
Segundo Kalanty (2012), uma de suas fun- indica:
ções é frear a fermentação, deixando que esta
Vá além do tipo ordinário, de cozinha. Use
ocorra mais lentamente até a hora de assar o pão o marinho fino, por exemplo, ou compre
– e quando essa hora chegar, ainda haverá açú- sal marinho grosso e coloque para moer.
cares dentro dela, o que leva à cor mais escura e [...] Fique à vontade para tentar outros
tipos. Mas lembre-se de que grãos muito
charmosa da qual tanto gostamos. Caso contrá-
grossos dificultam uma distribuição mais
rio, o que ocorreria então? Sem o sal, os açúcares equânime pela massa. E, principalmente,
seriam rapidamente devorados pelo fermento, dificultam a dissolução.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 65

Com relação à quantidade, o indicado para que Quando há necessidade de se utilizar mais
haja harmonia na massa é utilizar em torno de açúcar, como no caso das massas doces, por
2% do peso da farinha (ibidem). O sal é respon- exemplo, haverá a indicação ideal dos outros
sável por agregar sabor, cor e aroma, resultando componentes da receita para que haja harmonia
em um pão mais bonito e saboroso. entre todos os ingredientes.

Açúcar

O açúcar não precisa ser, necessariamente, o


convencional branco. Pode-se utilizar líquidos
ou sólidos, seja o granulado branco, mascavo,
demerara etc., ou ainda os xaropes de milho,
de bordo e o mel. Kalanty (2012) explica que o
fato de os açúcares reterem umidade influencia
na durabilidade dos pães assados, prolongando
a vida do produto.

Quantidade de
açúcar com relação Açúcares e a colônia de fermento Açúcares e a rede proteica
à % de farinha
Pequena quantidade: afeta Pequeno efeito.
Menos de 5% pouco o fermento.
Poucos efeitos detectados.

Quantidade moderada: acelera Amacia o glúten: estica


a velocidade metabólica do com mais facilidade.
De 5% a 10% fermento de maneira notável.
Crescimento ligeiramente mais rápido
mantém a massa com sabor suave.

Grande quantidade: o açúcar rouba o Roubam proteínas da água


suprimento de água do fermento. de que o fermento precisa:
Entre 11% e 20% Pode interromper o seu metabolismo. massa muito macia (caso
das massas doces).

Tabela 13: ação do fermento e da rede proteica de acordo com a quantidade de açúcar utilizado na massa.
Fonte: adaptado de Kalanty (2012, p. 57).
Panificação Clássica e Brasileira

Gorduras

Devemos entender como gorduras – para a pani- A manteiga é resultado da agitação do creme de
ficação – tanto laticínios quanto óleos vegetais leite e tem de 16 a 18 g de água em cada 100 g. Ao
e animais. utilizar muita manteiga em uma massa, apesar
Os laticínios podem ser manteiga, margari- da riqueza conferida ao sabor, ela fica mais mole
na, iogurte, creme de leite azedo etc. São itens e também mais pesada. Nesse tipo de situação,
que conferem sabor, aroma e textura ao pão – é indicada uma quantidade maior de fermento
principalmente a manteiga (ibidem). para contrabalancear o efeito (SEBESS, 2014).
A margarina é uma emulsão de óleo e água
ou óleo, água e leite. Mas não apenas isso,
muitos aditivos são acrescentados à margari-
na, como lecitina de soja (estabilizante de óleo
com líquidos), sal, glicose-lactose (açúcares),
fécula, vitaminas, ácido sórbico (antifúngico)
etc. Assim como a manteiga, aumenta o peso da
massa e por isso haverá indicação na receita da
quantidade ideal de fermento para compensar
a textura (ibidem).

Revisite com frequência os ensinamentos


da disciplina de Higiene e Segurança e
coloque-os em prática todas as vezes que
for realizar um preparo na cozinha!
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 67

A banha bovina refinada é uma gordura de tende a ficar rança (KALANTY, 2012).
origem animal obtida a partir da separação No caso da grande quantidade de gordura,
por cristalização dos sebos. Se for utilizá-la, ocorrerá da mesma forma que para o açúcar,
lembre-se de conferir se ela tem odor neutro e haverá a indicação ideal dos outros componen-
aparência de massa untuosa e plástica (ibidem). tes da receita para que haja harmonia entre
Em algumas receitas brasileiras, utiliza-se todos os ingredientes.
também a banha do porco.
Os óleos vegetais podem ser de milho, de
canola, de gergelim, de amêndoa, de noz, de
azeite de oliva, dentre outros. Líquidos estes que
podem ser acrescentados à massa em tempera-
tura ambiente. Com exceção do azeite, os óleos • Laticínios são perecíveis e devem ser
vegetais costumam não agregar tanto sabor à armazenados sob refrigeração.

massa, deixando-as mais aguadas. Ainda assim, • Qualquer gordura utilizada em uma
são valiosos para pequenos pães que se estraga- massa pode ser substituída por
riam com mais facilidade se utilizada outra gor- manteiga!

dura. Mas cuidado, vale lembrar que esse tipo de


gordura, quando exposta ao ar por muito tempo,

Quantidade de gordura com


Gorduras e a rede de proteínas
relação à % de farinha

Pequena quantidade: efeito irrelevante na estrutura da massa.


Menos de 5%
Exemplos de utilização: pretzels e grissinis.

Quantidade moderada: amaciam a estrutura proteica.


Entre 5% e 10%
Exemplos: pão de forma integral de mel e ballons.

Grande quantidade: interfere no desenvolvimento da rede de glúten.


Se acrescentado muito cedo: rede de suporte muito fraca.
Acima de 15% Indicado: desenvolver o glúten primeiro, depois acrescentar a gordura.
Técnica de emulsão.
Exemplos: brioche e pão de manteiga.

Tabela 14: ação da rede proteica de acordo com a quantidade de gordura utilizada na massa.
Fonte: adaptado de Kalanty (2012, p. 59).
Panificação Clássica e Brasileira

Ovos

O ovo tem ação tanto de gordura quanto de pro-


teína para a estrutura do pão. Segundo Kalanty
(2012), a gema é rica em gordura, agregando cor Aprofunde seu conhecimento sobre ovos
e intensidade à massa, realçando sua textura; na disciplina de Café da Manhã e Lanches.
Além de um estudo sobre toda a estrutura
e a clara é rica em proteína, que se liga à rede
do ovo e temperaturas de coagulação, você
proteica da farinha e sustenta a estrutura – prin- irá aprender na prática diversos preparos
cipalmente de massas doces, que apresentam clássicos!

estrutura mais fraca graças à quantidade de


gordura e de açúcar.

Melhoradores de massa

Os melhoradores, como o próprio nome sugere,


são utilizados com função de melhorar o
produto final, ou seja, o pão. Segundo Suas
(2012), podem ser aditivos naturais ou
químicos, lembrando que os pães podem,
sim, ser produzidos sem nenhum deles. Em
muitos casos, recorre-se aos melhoradores
para corrigir as fraquezas de nossa farinha
ou a falta de tolerância do glúten (farinha
mais fraca), como explica Sebess (2014). A
tabela a seguir explica os aditivos encontrados
em melhoradores e a dosagem a ser utilizada:
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 69

Melhorador Tipo de ação Dosagem Local de Incorporação


Reforça o glúten, deixa a massa mais flexível,
500 mg a 2
serve também para proteger a massa da ação
Ácido ascórbico g por cada Nos moinhos ou
dos fermentos proteolíticos. Na atualidade,
E300 ou vitamina C 100 kg de nas padarias.
é o mais importante agente oxidante usado
farinha.
mundialmente no setor alimentício.
Deixa a massa macia, melhora a textura e 0,3% do
Lecitina de
deixa o miolo do pão mais fino e suave. Facilita peso de
soja E322 Na própria padaria.
a formação de cadeias de proteínas com o farinha
(emulsificante)
amido, dando maior estabilidade às massas. utilizada.
Extrato de malte
4 a 10 g
(proveniente de Nos moinhos ou
Alimenta as leveduras, ativando a fermentação. por quilo
grãos de trigo ou nas padarias.
de farinha.
cevada germinados)
A amilase fúngica é mais segura para emprego
na panificação em virtude de seu baixo pH (5).
O malte ou a farinha de malte (que é portadora
de enzimas amilásicas) produzem grandes
quantidades de açúcares fermentáveis,
Amilases alimento vital para as leveduras. Além disso, - -
ajuda a produzir um pão com casca de cor
muito apetitosa, dourada uniformemente, e
com tempo de conservação maior. A farinha de
soja, por exemplo, tem ação direta no miolo,
deixando-o mais branquinho.*
0,7% a 1%
Descora os pigmentos da farinha de trigo,
Farinha de favas do peso da Nos moinhos.
deixando assim o miolo do pão mais branco.
farinha.
Serve para suprir a carência de glúten em Nos moinhos e
Glúten 1% a 3%.
farinhas com insuficiência de proteínas. nas padarias.
Assim como o ácido propiônico, o propionato 0,3% do
Propionato de
de cálcio é utilizado como conservante, peso da Nas padarias.
cálcio E282
principalmente como antimofo. farinha.
*As enzimas mais importantes da farinha são as amilases e as proteases.
Tabela 15: Melhoradores e suas funções. Fonte: SEBESS, 2014, p.33.

Como você pôde notar, na tabela anterior, a com pequenas quantidades de melhoradores já
adição de aditivos ou correção da farinha pode misturados em proporções ideais à venda nos
ser feita nos moinhos produtores ou na própria supermercados. Normalmente na embalagem
padaria. Se você não tem uma padaria e nem pre- está escrito: melhorador para pães. Escolha um
tende abrir, mas vai precisar de melhoradores de de sua marca de confiança e lembre-se de pesar
massa em casa, não se preocupe. Existem pacotes adequadamente de acordo com cada receituário.
Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 71

A Porcentagem
do Padeiro

Caro(a) aluno(a), nesta unidade você entenderá como se interpreta


um receituário de padeiro. Se você já teve algum contato com livros
profissionais, com receitas de pães ou até mesmo conversou com
um padeiro, deve ter notado que elas dificilmente são apresenta-
das com medidas em kg ou g, mas em porcentagem (%). Kalanty
(2012) explica a utilização da porcentagem do padeiro (PP%) de
uma forma bem divertida:

Dois padeiros entram no bar...

Um deles pergunta ao outro: “Quanta água você põe nas suas


baguetes?”. Ele não quer saber um peso exato. Se a resposta
for 2,27 quilos, ela não será muito esclarecedora. Quantas
baguetes essa quantidade de água faz? Cinco? Quinze?

O padeiro espera ouvir uma resposta que indique uma por-


centagem. Se alguém lhe perguntar sobre suas baguetes, o
padeiro diz: “Perto de 65%”, esperando satisfazer a pergunta
do amigo. A isso o primeiro padeiro pode retrucar: “Bom, eu
usava 65%, mas ultimamente ando usando 67%, porque a
farinha parece mais seca” (KALANTY, 2012, p. 71).
Panificação Clássica e Brasileira

P
ara um leigo no assunto ou um inician- a conversa acima para exemplificar: quando o
te talvez a terminologia soe estranha. padeiro fala em 65% de água, ele quer dizer que
Porém, o mais importante a se verifi- baseado no total de farinha (100%) que vai
car no exemplo que o autor coloca é a na massa, 65% desse peso deve ser referente à
compreensão que os padeiros fazem a partir desse água. Se estivéssemos falando em 1kg de fari-
percentual, ou seja, ele notou que houve mudan- nha, estes mesmos 65% seriam 650 g.
ça na última leva de farinha que utilizou para a Devo atentá-lo ao fato de que se há mais
produção de suas baguetes, sendo que necessitou de um tipo de farinha na mesma receita, então
de mais água para que chegasse à textura ideal. a soma das duas é que será considerada 100%.
Todo ingrediente de um pão tem como refe- Este caso é muito recorrente em pães integrais,
rência a quantidade de farinha. Então toda que para a produção dos quais utiliza-se, por exem-
vez que falarmos sobre a porcentagem de um plo, 600 g de farinha branca e 300 g de farinha
ingrediente, estamos dizendo que é comparado de centeio que somam 900 g de farinha, então
ao peso da farinha total da receita. Vou utilizar esse é o total – 100% (SEBESS, 2014).
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 73

Veja a tabela com a receita básica de um pão


de forma tradicional, com a fórmula em quilo
– método comumente utilizado em cozinhas e
em confeitaria.
Mas se a farinha é 100% e a água pode
ser 65%, então só aí, antes de acrescentar
Receita básica
outros ingredientes, eu já tenho 165%?
Fórmula em kg Estaria isso correto? Sim! Não se assuste ao
Farinha 0000 1 kg ler receituários de padeiro, pois aqui nada
Sal 0,020 kg resultará em 100%. Como todos os ingre-
Fermento fresco 0,025 kg dientes são comparados ao peso da fari-
Água 0,600 kg nha, como explica Kalanty (2012), então o
Manteiga ou margarina 0,100 kg total de todos os ingredientes sempre será
um valor acima e quanto mais ingredien-
Tabela 16: Receita básica de pão de forma
Fonte: adaptado de SEBESS (2014, p.170). tes, maior a porcentagem total da receita.

Fonte: adaptado de Kalanty (2012).


Agora vamos entender como encontrar a PP%.
Nesta receita, o total de farinha da massa é
1 kg, que corresponde a 100%. Os 0,020 kg
(ou 20 g) de sal correspondem a 2% de 1 kg.
Seguindo a mesma lógica, conseguimos encon-
trar o percentual dos outros ingredientes? Qual
é a porcentagem de água utilizada nessa receita?
Se você respondeu 60% acertou.
De modo mais detalhado, devemos fazer
o seguinte raciocínio utilizando regra de três:
1 kg  100%
0,020 kg  PP% de sal

Pergunte-se: se 1 kg (1000 g) de farinha re-


presenta 100%, então 0,020 kg corresponde a
quanto? E então resolva a regra de três:
1 kg x PP% = 0,020 kg × 100%
PP% = 0,020 × 100 = 2%
1 Figura 12: Pão de forma
Panificação Clássica e Brasileira

Aplicando a mesma equação à quantidade de


qualquer ingrediente, teremos como resultado o
percentual do padeiro daquele item. Sendo assim,
segundo Kalanty (2012, p.72), podemos dizer:

Peso do ingrediente X × 100% = PP% do ingrediente X


Peso da farinha

Vamos aplicar a fórmula a outros ingredientes:


• Peso da manteiga × 100% = PP% manteiga
Peso da farinha
• 0,100 kg × 100% = PP% manteiga
1 kg
• 0,100 kg × 100% = PP% manteiga
1 kg
• 0,100 × 100% = PP% manteiga
• 10% = PP% manteiga

Vamos ver então como fica a tabela comple-


ta com o percentual do padeiro de todos os
ingredientes:

Receita básica
Fórmula Percentual do
em kg Padeiro (PP%)
Farinha 0000 1 kg 100%
Sal 0,020 kg 2%
Fermento fresco 0,025 kg 2,5%
Água 0,600 kg 60%
Manteiga ou
0,100 kg 10%
margarina
174,5%
Tabela 17: Receita básica de pão de forma
Fonte: adaptado de SEBESS (2014, p.170).
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 75

Na receita do pão de forma temos uma PTF A absorção de água varia de acordo com a
(porcentagem total da fórmula) – termo uti- qualidade da farinha. Se considerarmos a fari-
lizado por Sebess (2014) – de 174,5%, cor- nha para panificação, provavelmente utilizar-
respondente à soma dos percentuais de cada -se-á em torno de 60% de água. De modo geral,
ingrediente. Como visto anteriormente, é Sebess (2014) define uma taxa de hidratação das
comum que esse valor ultrapasse 100% quando farinhas que podem variar entre 58% e 66%. O
o assunto é pão. autor, ainda, lista as taxas de hidratação, classi-
Mas e então, o que notamos com a utiliza- ficando o tipo de massa resultante de cada uma.
ção dessas porcentagens? Acompanhe na tabela:

Taxa de hidratação Massa a ser preparada Exemplos

Menos de 57% Massas duras Pães italianos

De 57% a 60% Massas firmes Para trabalhos com divisora automática

De 60% a 63% Massa bastarda Trabalho para todos os dias

De 63% a 66% Massa suave Trabalhos manuais

Mais de 66% Massas moles Massas que necessitam de correções

Tabela 18: Taxa de hidratação da massa


Fonte: SEBESS (2014, p.53).

Utilizando esses dados, pode-se calcular quanto A massa bastarda tem hidratação de 60% e a fari-
de farinha e de água são necessários para a pro- nha totaliza sempre 100%. Partindo desse prin-
dução de determinada quantidade de pão. Como cípio, podemos dizer que se tivéssemos 100 kg
isso é feito? Vamos entender, aplicando a linha de farinha, utilizaríamos 60 kg de água, resul-
de raciocínio de Sebess (2014). tando num total de 160 kg de massa. Sendo
Primeiro devemos determinar quantos pães assim, para encontrar a quantidade de farinha
faremos e o peso de cada um, para tal explicação. e de água necessárias para a produção dos 20
Seguiremos com o seguinte exemplo: pãezinhos, faremos uma regra de três simples:
• 20 pãezinhos (de massa bastarda) de 50 g
cada. Massa em quilos – 160 kg  1 kg
• 20 × 50 = 1000 g ou 1 kg de massa total. Farinha em quilos – 100 kg  x
Panificação Clássica e Brasileira

160x = 100 × 1 → x = 100 ÷ 160 → x =


0,625 kg ou 625 g de farinha.

Conclui-se que serão necessários 625 g de fa-


rinha para produzir 1 kg de massa, ou seja, os
20 pãezinhos.
Para encontrar a quantidade necessária de
água segue-se o mesmo raciocínio:

Massa em quilos – 160 kg  1 kg


Água em quilos – 60 kg  x
160x = 60 × 1 → x = 60 ÷ 160 → x =
0,375 kg ou 375 g de água.

Precisaremos de 375 g de água para produzir


os 20 pãezinhos, ou seja, peso que completa
a diferença entre farinha e quantidade total
de massa necessária (1000 g de massa – 625
g de farinha = 375 g de água).
Conhecendo a hidratação da massa, con-
seguimos prever o resultado final. A massa
menos hidratada é mais firme e por isso é
mais fácil de manipular; já na mais hidratada,
a dificuldade de modelar é um pouco maior.
Mesmo que você se depare com receituários
prontos, com a PP% já calculada, é importan-
te que entenda qual é a linguagem utilizada
por padeiros profissionais, de modo que em
qualquer necessidade você saberá interpretar
qualquer receita de pães.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 77

considerações finais
T
enho certeza de que você finalizou esta que, se tiver mais de 11% de açúcar em um re-
unidade se programando para fazer ceituário de pão, é sinal de que a massa é doce
sua própria cultura de sourdough, já e o glúten está comprometido, você é capaz de
separou todos os ingredientes nas pro- identificar a solução, pois conhece as funções
porções corretas, já pegou uma caderneta de do ovo e entende que ele, como possui função
anotações para saber em que passo está e já está emulsificante, ajuda a reestruturar ou auxilia na
calculando quanto de fermento será necessário estruturação do glúten mais frágil.
para o próximo pão que você fará. Que ótimo, E quanto aos pré-fermentos? São essenciais
pois na próxima unidade você vai aprender como para resultados aprimorados de um pão de qua-
moldar alguns pães bem clássicos e outros não lidade e com maior durabilidade. Sabendo as
tão conhecidos, mas ainda tradicionais. características de cada fermentação prévia, você
Caro(a) aluno(a), você pode notar como a é capaz de identificar qual é a melhor opção para
escolha dos ingredientes é extremamente im- um pão italiano ou para um pão doce.
portante para a panificação? Você imaginaria Nós também verificamos como é que os
que a água seria um dos fatores mais decisivos padeiros se entendem entre si e resolvem, pro-
para o seu resultado final? Pois é, chega a ser porcionalmente, as quantidades necessárias de
considerado o segundo maior ingrediente, per- cada ingrediente para a fabricação de um pão,
dendo apenas para a farinha de trigo e isso se pois a farinha é sempre 100% e a nossa mate-
dá porque é a água que determina a leveza do mática aqui vai além desse número, sendo que
pão. Não por acaso algumas indicações exigem a receita de um pão pode totalizar até mais de
que a água seja filtrada, para evitar o excesso de 300% por conta disso. Mas você, jovem padeiro,
cloro na produção de pães. já nem se assusta mais com isso.
Nesta unidade que finalizamos, foi possível Agora que você está “antenado” em tudo
averiguar a quantidade de sal suficiente para acerca de pães, vamos para a última unidade
conferir sabor, aroma e cor aos pães sem que contemplar o passo a passo para você pôr as
se mate o fermento. Como agora você já sabe mãos na massa?
Panificação Clássica e Brasileira

atividades de estudo

1. Estudamos nesta unidade a ação da levedura na fermentação.


Conhecendo pré-fermentos, explique a diferença entre esponja e biga.

2. Qual é a ação do sal e do açúcar na massa final do pão? Devo me


preocupar com as quantidades?

3. Você trabalha em uma padaria e acaba de receber uma encomenda:


produzir 250 pães italianos de 500 g cada. Qual é o peso total de
massa necessário para preparar esses pães? Quanto você precisará
de farinha e de água?
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 79

material complementar
Pão da Paz – 195 receitas de pão de países membros da ONU
Paulo Braga

Editora: Gaia Editora


Sinopse: Esta obra traz uma apresentação dos 192 países in-
tegrantes da Organização das Nações Unidas por meio de suas
receitas tradicionais de pão. Idealizado por Paulo Braga, padeiro
amador, fotógrafo profissional e pacifista apaixonado, o livro é
totalmente ilustrado e cada receita vem acompanhada de uma
mensagem de paz.

Veja a bela produção do The Food Club (clube da comida, livre tradução) para preparar um
pão de espelta rústico.

Disponível em: <https://vimeo.com/40112127>. Acesso em:10 jul.2015.


Panificação Clássica e Brasileira

leitura complementar

A baguette

Em nenhum outro país aconteceu que um simples pedaço de pão se tenha


tornado no símbolo de uma nação. A baguette com cerca de 70 cm de com-
primento, e uma côdea estaladiça, com uma história de quase 100 anos é
considerada pelo resto do mundo como tipicamente francesa, ao passo que os
franceses a identificam com Paris. As cidades francesas estavam habituadas
a confiar no abastecimento de alimentos provenientes, sobretudo, dos seus
arredores rurais. A própria cidade de Paris raramente sofreu falta de pão. Já
que desde o tempo dos romanos a vasta planície de Beauce lhe servia como
celeiro. Graças a esta riqueza de cereais, a Catedral de Notre-Dame pôde ser
construída. Os seus espetaculares vitrais foram financiados pelos comerciantes
locais. Os padeiros doaram quatro janelas, mais que qualquer outra corporação,
o que demonstra a sua importância nessa época. Os padeiros faziam bolas
com sua massa, boules de onde deriva a designação boulanger, que remonta
ao século XV. Os Pães eram redondos e grandes com uma côdea grossa e um
miolo denso, e sem sal, porque o sal era muito caro. Para a população o pão era
alimento básico. O pão integral escuro e rústico era feito com uma mistura de
vários tipos de farinha, pois na maior parte das vezes nos campos ceifavam-se
simultaneamente diversos tipos de cereais, para reduzir o risco de eventuais
prejuízos nas colheitas devido a doenças das espigas. O mais pobre, que nem
este pão rústico podia pagar, comprava o biscuit (bis-cuit significa cozido
duas vezes), o pão do dia anterior que era novamente levado ao forno, para
se manter seco e poder ser conservado. Mas foi apenas no reinado do Rei-Sol
que se descobriu a forma de separar o farelo, para fazer pão branco, pois Luís
XIV preferia pão de trigo branco e delicado. Para o conseguir, enriquecia-se
a massa azeda com levedura de cerveja. No entanto, o pão branco feito de
farinha refinada existia apenas nas cidades, onde ia ganhando a sua posição
como símbolo de prestígio, pois os nobres rapidamente descobriram que era
o mínimo que os seus delicados estômagos podiam suportar. Tal como todas
as cidades, também Paris foi vítima de más colheitas. A decisão do governo,
de 1787, de aumentar o preço dos cereais, além de uma má colheita no ano
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 81

leitura complementar
seguinte, e, ainda, um Inverno extremamente rigoroso, foram factores que
acabaram por fazer eclodir a Revolução.
No decorrer do século XVIII surgiram as primeiras formas de pão compridas e
estreitas, que alteravam a relação entre a côdea e o miolo, em prol da côdea, o
que desde logo fez os deleites dos parisienses. Graças à adição de fermento, a
baguette adquiriu a sua côdea fina e dourada e a estrutura macia. Felizmente
para os padeiros, o sucesso da baguette coincidiu com a expansão dos amas-
sadores mecânicos, que muito lhes facilitaram o trabalho. Enquanto Paris
se deliciava com o pão comprido, a população rural continuava a consumir o
tradicional pão grande redondo e, de facto, só no século XX é que a baguette
conseguiu introduzir-se na província.
As melhores baguettes são douradas e tostadas por fora, e os cortes
feitos na massa formam saliências estaladiças. Por dentro o miolo
deve ter cor creme, não demasiado branca, uma consistência macia
e flexível, com pequenos orifícios e um delicado sabor a leite e
amêndoas. Se a côdea se esfarelar e o interior parecer algodão,
é porque a baguette foi feita provavelmente com massa con-
gelada. Os métodos industriais de cozer pão reduzem o
tempo de amassar e levedar, o que dá origem a um miolo
insípido, branco e muito poroso, que seca rapidamente.
Esta perda de humidade produz-se na superfície devido
à evaporação, sendo o resultado uma côdea rija e um
miolo ainda mais duro. Isto pode acontecer com o pão
dos supermercados, que são embalados em celofane
com gás neutro e inofensivo, como o azoto, que
prolonga a conservação, evitando o processo de
oxidação, mas que nunca apresenta a frescura de
um pão acabado de cozer. Infelizmente, desde
os anos 60, as panificadoras industriais têm
vindo a impor-se, e a qualidade das baguettes
ressentiu-se de tal forma que os consumidores
franceses ou reduziram drasticamente o consumo
Panificação Clássica e Brasileira

leitura complementar

de pão, ou voltaram-se para outros tipos de pão, como o pain complet (pão
integral) ou o pain de campagne (pão rural), que hoje são considerados mais
nutritivos.
Foi só graças a uma nova geração de excelentes artífices que os parisienses
voltaram a descobrir, a pouco e pouco, como é que uma verdadeira baguette
deve ser. Um deles é Jean-Luc Poujauran, que trabalha uma farinha rica,
lentamente moída entre duas mós, deixando a massa levedar num processo
lento mas contínuo para ganhar sabor. Para iniciar a fermentação, utiliza
uma massa mais velha, o que lhe confere um sabor mais amendoado do que
o fermento fresco. Os jovens padeiros oferecem aos seus clientes uma grande
variedade de pães e pãezinhos especiais, enriquecidos com ervas, especiarias,
nozes, ou frutos secos.
Em França, existem actualmente 35000 padarias, que produzem 3,2 milhões
de toneladas de pão por dia. Mas os franceses só consomem 150 g de pão
por ano, enquanto no século passado consumiam 500 g. Um em cada três
pães vendidos é uma baguette. Estima-se um consumo de 10 milhões de
unidades por dia.
Os papéis inverteram-se actuamente. Considera-se saudável o pão integral,
que tem, hoje em dia, grande aceitação entre as pessoas abastadas, ao passo
que o povo recorre aos produtos industriais à base de farinha branca.

Fonte: Dominé, André (2001, p.17).


Processos da Panificação
SAMARA FERNANDES
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:

• Passo-a-passo da panificação
• Moldagens tradicionais
• Outras moldagens

Objetivos de Aprendizagem
• Entender o passo-a-passo da panificação.
• Compreender o processo de mistura da massa.
• Conhecer as modelagens.
• Identificar como assar os pães.
• Reconhecer as características de pães clássicos.
85

Introdução
Bem-vindo(a) à última unidade do nosso livro de panificação.
Nesta unidade, trataremos a respeito das abordagens mais práticas da panificação. O passo-
-a-passo necessário para fabricar um pão, do começo ao fim. Como você já deve ter imaginado,
existem, sim, etapas corretas a se seguir para obter um melhor resultado e agora vamos identificar
cada um desses passos para termos um pão com a maciez, a cor, o aroma e a textura ideias. Nós
consideraremos, basicamente, seis etapas: a mistura e sova de todos os ingredientes; a primeira
fermentação; a divisão da massa; o boleamento – também chamado de moldagem da massa –;
a fermentação final; e a cocção, momento em que os pães são levados para assar.
Você verá que tem ordem para misturar os ingredientes, depois, tempo para descansar a
massa antes de moldá-la, pois, caso contrário, ela fica estressada e não corresponde às nossas
expectativas. A extensibilidade e a elasticidade da massa são dependentes desse processo,
principalmente da qualidade da proteína da farinha juntamente da sova e do descanso mínimo
necessário. Pois é, caro(a) aluno(a), para ser um bom padeiro é preciso paciência e respeito pela
gastronomia, pois se você pular as etapas cruciais, seu resultado final mostrará que isso aconteceu.
Com relação a isso, teremos contato com a sequência de mistura direta, que dispõe da
ordem de se misturar inicialmente fermento com a água, depois a farinha e, por último, o sal.
Reconhecendo esse processo mais básico, você terá as indicações do momento ideal para se
acrescentar qualquer elemento secundário, seja ele um ovo ou uma gordura. Mas os detalhes
desse processo eu deixo para daqui a pouco, logo no nosso primeiro tópico.
Além de colocarmos as mãos na massa, vamos também moldar essas massas. Você já deve
ter visto a vitrine daquelas padarias cheias de pãezinhos de tudo quanto é forma, com recheio,
sem recheio, redondo, achatado, em formato de cone, como filão, baguete, enfim, poderíamos
citar muitos. O importante é que ao menos os básicos você aprenderá, aqueles que são cruciais
para sua formação. Temos outras moldagens além das apresentadas aqui, é claro, mas, as clás-
sicas não poderíamos deixar de apresentar. Afora isso, você também pode criar sua própria
moldagem de pão, o que acha?
Vamos então começar a nossa última etapa de trabalho.
Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 87

Passo-a-Passo
da Panificação

Agora que você já conhece os ingredientes que podem ser utilizados


para se fazer um pão, vamos entender as etapas, o passo-a-passo
da panificação, desde o processo de mistura dos ingredientes até
termos um pão assado. Seguindo esses passos, com certeza você
terá um ótimo resultado (SEBESS, 2014).
Panificação Clássica e Brasileira

1 3

4 6

1. Mistura dos ingredientes e sova; 2. Primeira fermentação; 3. Divisão da massa; 4. Boleamento ou moldagem final; 5. Fermentação final; 6. Cocção.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 89

Mistura dos
ingredientes e sova

Para o padeiro, é crucial que as medidas sejam pode incorporá-la à farinha e à água logo no
exatas, sendo assim, é necessário fazer primei- início da mistura; de 5% a 15% é ideal colocar
ro a mise en place de todos os ingredientes. O no meio do processo, enquanto estiver desen-
ideal, segundo Kalanty (2012), é que cada um volvendo a massa; e acima de 15% – grande
deles seja pesado, pois não dá para se confiar em quantidade – o melhor é incorporar ao final,
medidas de volume, como a xícara. Uma xícara depois da mistura completamente desenvol-
de manteiga não tem o mesmo peso que uma vida, pois a quantidade maior poderia que-
xícara de farinha, sendo assim, usar a balança brar a rede de glúten, mas, acrescentando no
ainda é a maneira mais confiável de seguir à momento final, o glúten já se desenvolveu e é
risca sua receita. capaz de suportar o tanto de gordura. Isso se
Vamos, então, à mistura dos ingredientes. tratamos de gorduras sólidas, como manteiga
Este é o primeiro passo e um dos mais impor- ou margarina. Em caso de gorduras líquidas,
tantes também, pois resulta na preparação da estas podem ser consideradas parte da hidra-
massa. A primeira preocupação é com a água. tação da farinha e dispostas à mistura logo no
Devemos mantê-la em uma média de 23ºC a começo (SUAS, 2012).
25ºC. Acima dessa temperatura, o fermento
cresce rápido demais, não chegando ao ponto
ideal de textura e sabor; e abaixo o tempo será
longo demais até atingir a fermentação ideal
(SUAS, 2012).
Kalanty (2012) explica que existe a sequên-
cia de mistura direta, que nada mais é que mis-
turar primeiro o fermento com a água; depois
a farinha; e por fim o sal. Isso se tratando dos
quatro ingredientes básicos.
Quando há adição de gordura, é impor-
tante ficar atento ao momento ideal de acres-
centá-la à massa. Se a receita indicar de 2% a
4% - considerada pequena quantidade – você Figura 13: Mise en place dos ingredientes
Panificação Clássica e Brasileira

Se a mistura for mecânica, significa que utilizare- Depois disso, passa-se à segunda velocida-
mos uma masseira, um equipamento profissio- de, nesta etapa é que desenvolve-se o glúten.
nal, para preparar toda a massa. Sebess (2014) Confira na tabela a seguir os tempos e as tem-
compara a primeira velocidade da masseira à peraturas médias mais utilizadas:
mistura manual. Depois, a sova para atingir o
ponto de véu necessita da segunda velocidade. Temperaturas de base* para a mistura e sova
O autor explica que as fases de misturar e sovar
Mistura e (54ºC) 20 min em
os ingredientes duram em média de 3 a 5 minu- sova intensiva segunda velocidade.
tos na masseira – de modo que água e farinha
(58ºC a 59ºC) 5 min em
estejam bem incorporadas. Mistura e
primeira e 10 min em
sova melhorada
segunda velocidade.

(68ºC) em velocidade
Mistura e
lenta, a massa
sova lenta
esquenta menos.
Tabela 19: Temperaturas para mistura e sova
Fonte: Sebess (2014, p.41).
* Temperatura de base é o valor obtido pelo somatório das tem-
peraturas da bacia, das pás da masseira, da farinha e da água.

A
mistura e a sova lentas resultam
em massa menos trabalhada, de
fermentação mais longa, o pão é
saboroso, mas o volume final do
pão não é grande; mistura e sova melhora-
das resultam em um pão volumoso e de bom
sabor, um tipo de mistura bem recomendado;
a mistura e sova intensiva pode chegar ao
limite do glúten, arriscando perder o ponto e
quebrar toda a rede, se feito de maneira ideal,
o pão fica bem volumoso e com miolo bem
branco (SEBESS, 2014).
Figura 14: Masseira de braço
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 91

Primeira
fermentação

A primeira fermentação se dá depois da massa


sovada, é o primeiro momento de descan-
so da mistura. O ideal é fazer um primeiro
boleamento e deixar descansando dentro do
bowl utilizado, da bacia da batedeira ou da
superfície de trabalho, sempre cobrindo a su-
perfície para que não resseque. Esse momento
Figura 15: Relaxamento da massa
é chamado de relaxamento da massa – ou,
de maneira informal, “desestressar” o glúten
–, o que ocorre nos primeiros 10 minutos. Divisão da massa
Quando a massa precisar de um tempo de
fermentação primária maior, virá designado A divisão da massa pode ser feita de maneira manual, utili-
no receituário específico e esse tempo deverá zando-se uma balança, de modo que se pese cada pedaço de
ser respeitado para que ela tenha a melhor massa para obtermos um resultado final padronizado. Porém,
consistência final possível. também existem as divisoras, que são máquinas próprias para
porcionar. Esse tipo de equipamento é mais utilizado em pada-
rias, onde se fabrica um grande número de pães de uma só vez.

Não se esqueça de um princípio funda-


mental destacado em todas as nossas dis-
ciplinas: utilize sempre ingredientes de
qualidade, independentemente da receita
que estiver executando! Com os pães, siga
o mesmo princípio!

Figura 16: Massa dividida manualmente


Panificação Clássica e Brasileira

Boleamento ou temperatura e umidade controladas – de modo


modelagem final que o volume aumente graças à ação da fermen-
tação (que vimos logo na primeira unidade).
Depois de definido o tamanho dos pães que Para identificar se o pão está pronto para ser
você fará e dividida a massa, é hora de modelar. levado ao forno tem um pequeno segredinho:
O boleamento ou modelagem podem ser feitos
O pão que estiver pronto para ir ao forno,
de maneira manual ou mecânica. O boleamento ao ser pressionado, deve retornar à posi-
manual consiste em definir o formato que você ção anterior deixando uma leve marca.
deseja para seu pão e então fazer a modelagem. A massa que ainda não fermentou o su-
ficiente retorna rapidamente e tem uma
Pães como coroas e espigas precisam ser mode- textura firme, ao passo que massa exces-
las manualmente. Já a máquina modeladora sivamente fermentada mantém a marca
“serve para enrolar pães como baguete, francês, do dedo e fica achatada (ou começa a
murchar) no ponto onde foi pressionada.
careca” (SEBESS, 2014, p.44).
(SUAS, 2012, p.118)

Veja só, caro(a) aluno(a), antes de seguir para


o próximo passo, lembre-se sempre de pres-
sionar a massa de seu pão já modelado para
verificar se está pronto para a cocção. É nessa
etapa, também, que você deve fazer os cortes
nos pães – quando necessário ou característico.

Figura 17: Máquina modeladora

Fermentação final

Nessa etapa, temos a última fermentação antes


que o pão seja assado. Sendo assim, depois de
modelado, os pães serão deixados para fermen-
tar – seja na bancada de trabalho, já nas formas
que irão ao forno, seja na fermentadora com Figura 18: Pães já fermentados
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 93

Cocção

No momento de levar os pães para a cocção,


é importante deixar espaço entre eles, pois é
necessário que o calor circule para que todos
sejam assados de forma uniformizada (SUAS,
2012). Essa é a etapa em que o pão se torna
mesmo pão, com textura, aroma e sabor como
conhecemos.
Ao colocar o tabuleiro no forno, em 5 mi- Figura 19: Pão depois da cocção finalizada

nutos em média, as leveduras são destruídas,


pois a massa atinge 50ºC, o que faz parar a
fermentação. Após este momento, o miolo
do pão começa a se formar e a casca vai fican-
do dourada. Essa cor da casca é resultado da
reação de Maillard, que ocorre graças à carame-
lização dos açúcares provenientes na superfície Confira, a seguir, o resultado de pães com
falta de vapor e com excesso de vapor, para
da massa – a dextrina que fica na casca do pão
entender melhor sua função na panificação.
(SEBESS, 2014).
Falta de vapor:
Parte da água contida no pão evapora, • Casca grossa
o que resulta na casca firme e miolo macio. • Fata de crescimento
• Aspecto fosco
Alguns tipos de pães exigem jatos de vapor,
• Rachaduras na casca.
ou seja, que seja injetado vapor dentro do
Excesso de vapor:
forno, isso para que a casca fique mais bri- • Pães não crescem direito
lhante e fina, também mais crocante e cara- • Pães com casca muito fina
• Pães ficam murchos depois de assados.
melizada (ibidem). Aqueles pães com casca
quebradiça, como o pão francês, são exem- Fonte: Sebess (2014, p.47)

plos de pães que levam jatos de vapor durante


a cocção.
Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 95

Moldagens
Tradicionais

Agora que você já conhece os passos que deve seguir para ter um
bom resultado na panificação, falta aprender algumas técnicas de
modelagens. Começaremos com as mais clássicas. E lembre-se:
nesta etapa, a sua massa já passou pela primeira fermentação,
depois de modelada ela irá para a fermentação final!
Panificação Clássica e Brasileira

Moldagem de baguete

Neste ponto, o glúten já descansou o suficiente para ficar maleável à moldagem.

Primeiro você deve fazer um retângulo com a massa, tirando o excesso de ar


contido nela. Na sequência, dobre a massa ao meio até unir as duas partes.
Na terceira etapa, você deve ter já o formato inicial da baguete.

Agora basta enrolá-la com as duas mãos de modo que ela fique maior ho-
rizontalmente. Ainda neste movimento, afine as duas pontas laterais para
caracterizar a baguete. Pronto, sua moldagem está completa, agora é só deixar
que ela fermente novamente para então assar (SUAS, 2012).
A dica mais importante agora é como efetuar o corte que deixa a bague-
te tão característica. Sim, aluno(a), existe uma técnica também para isso.
Acompanhe comigo as ilustrações a seguir.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 97

Na primeira ilustração, segue um corte feito corretamente, note que estão


padronizados, seguindo a mesma orientação e de tamanhos semelhantes.
Na ilustração 2 e 3 temos cortes desiguais, resultando em um acabamento
amador e malfeito. A 4 apresenta o corte quadriculado. Já na 5 e 6, visualize
a massa na vertical, sendo a ilustração 5 a maneira incorreta de posicionar
a lâmina de corte, pois está reto demais; e a 6 a maneira correta, o corte é
mais superficial e inclinado, protegendo esse corte do calor, o resultado é uma
abertura bonita e dourada (SEBESS, 2014).

Figura 20:
Fazendo os
cortes
Panificação Clássica e Brasileira

Se você fizer o corte corretamente, suas baguetes ficarão harmoniosas, cara-


melizadas e com padrão de excelência.

Para fazer o pão bengala, é só reduzir o tamanho da baguete e fazer menos


cortes. Bem como para o francês, utiliza-se a porção média de 60g de massa
crua para resultar em um pãozinho de 50g – padrão brasileiro.

Fonte: a autora.

Moldagem do filão

Para moldar o filão, a massa descansada pode ficar mais ovalada – contrário
da baguete, que era necessário começar por um retângulo.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 99

Sendo assim, você deve fazer uma primeira dobra, puxando a parte superior da
massa para o centro; em seguida, faça uma segunda dobra, seguindo a mesma
orientação; depois você fará uma terceira dobra, resultando em apenas uma marca-
ção fina e simples ao centro da massa, como se fosse uma “costura” (SUAS, 2012).
Por último, conforme a figura 4, coloque a “costura” para baixo e reforce
o formato do filão. Pronto, seu pão está moldado.

Moldagem da broa

Para começar a moldagem da broa, você deve ter a massa já descansada no


mesmo formato que o início do filão, ovalada ou em formato de bola.

Como na ilustração 2, você deve puxar uma ponta da bola até o outro lado, reali-
zando uma dobra completa, sove-a para dentro de modo que a superfície comece a
ficar lisa. Em seguida, você deve levar toda a superfície da massa para um mesmo
centro em movimento circular, formando embaixo um “umbigo” (SUAS, 2012).
Por fim, é só bolear a massa na bancada, unificando a parte inferior e
mantendo a superfície bem lisa.
Panificação Clássica e Brasileira

Moldagem do brioche

Para modelar o brioche parisiense, você deve ter em mãos uma forma própria
e grande.

Unte a forma grande e própria com manteiga derretida. Forme cinco bolas
de 100 g cada e boleie a última em formato de gota.

Assim que tiver as cinco partes em mãos, reserve a que está em formato de gota
e coloque as outras na forma, como mostra a ilustração do meio. Em seguida,
enfarinhe o dedo mínimo, ele te auxiliará a introduzir a gota ao centro da forma.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 101

Utilize o dedo mínimo enfarinhado para pressionar a ponta da gota ao centro


das outras bolas de massa. Faça isso com cuidado, para que não percam o
formato. Ao final, você terá o brioche parisiense como na última ilustração
(SEBESS, 2014).
Para modelar o brioche parisiense individual você deve ter em mãos
uma forma própria de tamanho pequeno.

Comece untando a forma própria individual com manteiga derretida. Separe


100 g de massa e boleie. Com a lateral da mão, divida a massa em duas partes,
deixando 2/3 de um lado e 1/3 de outro, sem que os lados se separem. Na
terceira ilustração você vê como deve parecer depois de marcar a divisão.

Coloque a massa na forma com a bola maior para baixo. Torça em 360ºC
a bolinha menor, enfarinhe o dedo mínimo e pressione-a para o fundo da
forma. O resultado é o brioche individual que você vê na última ilustração.
Também para preparar um brioche individual, temos outro método que
resulta no mesmo aspecto.
Panificação Clássica e Brasileira

Comece como o primeiro método, porém, aqui você pegará os 100 g de massa
e formará uma espécie de anel com 2/3 da massa. Com 1/3 dela, você fará
a gota, como no modelo do brioche grande. Coloque a rosquinha na forma
untada, enfarinhe o dedo mínimo para que ele o ajude a introduzir a gotinha
ao fundo da forma, como você na ilustração. Ao final, você terá também um
brioche parisiense individual (ibidem).

Figura 21: Brioche parisiense individual

Para ficar douradinho, como o da Foto, é só esperar crescer e pincelar gema


de ovo delicadamente para que não escorra (isso dificultaria desenformar) e
levar para assar.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 103

Moldando Cinnamon Rolls

A moldagem de cinnamon rolls é uma das mais simples.

A massa deve ser aberta em formato retangular com espessura de 5mm.


Pincele a borda inferior com gema de ovo e deixe secar. Pincele manteiga
derretida no restante da massa. Polvilhe açúcar (mascavo ou cristal) e canela
por cima de toda a manteiga. Enrole a massa da parte superior, onde não foi
pincelado com ovo, na direção da borda que foi pincelada com a gema. Enrole
sempre de maneira firme, para que o rolo final fique de tamanho uniforme.

Agora, é só cortar rolinhos de 3,5 cm de espessura com uma faca do chef bem
afiada e dispor em um tabuleiro enfarinhado. A moldagem dos cinnamon rolls
está completa (ibidem).
Panificação Clássica e Brasileira

Se você quiser seu cinnamon roll como o da foto, é


só cobrir ainda quente com glacê real ou fondant
e estará pronto para servir.

“O enroladinho de canela (cinnamon roll) é


um pão doce derivado do brioche. Ele é fa-
cilmente encontrado na América do Norte
e em alguns países do norte da Europa.
Segundo alguns estudiosos, foi criado na
Suécia, onde é chamado de kanelbulle.”

Fonte: Sebess (2014, p.91).


GASTRONOMIA • UNICESUMAR 105

Figura 22: Cinnamon roll


Panificação Clássica e Brasileira
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 107

Outras
Moldagens

No tópico anterior, apresentei a você as moldagens de pães mais


tradicionais. Neste, vamos conhecer como modelar alguns outros
pães, uns mais rústicos, outros mais modernos.
Panificação Clássica e Brasileira

Moldagem margarida

Para a moldagem margarida, depois da primeira fermentação, você deve manter


o formato boleado da massa, como a broa vista anteriormente.

Com um rolo pequeno, afunde o centro da massa. Em seguida, gire o rolo


em 90º e repita essa ação.
Faça isso mais duas vezes e você terá o formato finalizado. Coloque uma
pequena bola no centro e está pronto (SUAS, 2012).

Moldagem espiga

Para a moldagem em formato de espiga, comece com o processo igual ao da


baguete, porém, não é necessário afinar as pontas. Enfarinhe a superfície de
todos os pães e deixe fermentar.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 109

Depois que dobrar de volume, use uma tesoura afiada para fazer cortes a 45º
em um lado e no outro da baguete, até que ela esteja toda modelada. Cuidado
para não chegar à base do pão, deixe sempre um pedacinho de massa ao final
para que a espiga permaneça inteira (SEBESS, 2014).

Moldagem torcido

Comece moldando um filão.


Enfarinhe o centro do filão para que o rolo não grude. Em seguida, abra
apenas o centro da massa, de modo que fique bem marcado.
Enrole a massa de dentro para fora, até que ela fique inteiramente torcida
(SUAS, 2012).
Panificação Clássica e Brasileira

Moldagem vivarais

Para moldar no formato vivarais, você deve começar formando um filão.

Para continuar, será necessário uma raspadeira ou cortador de massa. Corte um


“X” em um lado e outro “X” próximo ao outro. Junte com as mãos e transfira a
massa para uma superfície enfarinhada com o corte para baixo (SUAS, 2012).

Moldagem Charleston

A moldagem Charleston é semelhante à vivarais, porém não é feito o corte


em si. Ainda assim, você deve começar modelando um filão.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 111

Em seguida, enfarinhe a superfície do filão para que o rolo não se prenda à


massa. Utilizando o rolo fino, aprofunde-o em forma de “X” em um lado da
massa.
Faça outro “X” no outro lado da massa. Na última ilustração você pode
ver o resultado final da moldagem. Agora é só deixar crescer em superfície
enfarinhada (ibidem).

Moldagem Coroa Bordalesa

Essa moldagem fica realmente em formato de coroa e para isso precisaremos


de um cesto próprio para pães em formato de coroa.
Abra uma pequena quantidade de massa em formato redondo e fino,
utilizando o rolo. Em seguida, coloque a massa aberta no centro do cesto em
formato de coroa. Faça seis bolas de massa e disponha cada uma delas no
cesto, uma ao lado da outra.

Entre uma bola e outra, corte a porção do meio formando tiras. Coloque cada
uma dessas abas sobre uma das bolas, para que você tenha uma moldagem
de coroa (ibidem).
Panificação Clássica e Brasileira

Moldagem Ferradura

Essa modelagem termina realmente semelhante a uma ferradura e para chegar


a esse resultado, você precisará de uma cesta em formato de coroa, como a
utilizada anteriormente.

Aqui, também começaremos modelando um filão. Em seguida, vamos en-


farinhar levemente todo o centro dele para que o rolo não se prenda. Abra
o centro da massa com o rolo pequeno e depois comece enrolar, deixando a
marca de fenda ao final.

A fenda está para baixo. Mantenha-a assim e curve-a, deixando no formato


de ferradura. Deixe fermentar na cesta para manter o formato (ibidem).
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 113

Moldagem de Croissant

Para moldar o croissant, primeiro temos que abrir a massa em formato


retangular.

Feito isso, corte uma longa tira, com média de 20,5 cm de altura. Nela, faça
triângulos de 10 em 10 cm. Cada triângulo será utilizado para moldar um
croissant, então, comece esticando levemente um deles. Faça um pequeno
corte ao meio da base de cada triângulo e estique as duas pontas, uma para
cada lado, em lados opostos, para deixar a base mais larga.

Enrole a massa a partir da base do triângulo até chegar à ponta. Por fim, é só
colocar na forma e pincelar com gema de ovo misturada com um pouquinho
de água (ibidem).
Panificação Clássica e Brasileira

É
claro que existem inúmeras formas
de se moldar um pão e, além das
que eu apresentei aqui, você pode
também criar a sua própria molda- Não deixe de conferir nossas aulas con-
gem. Esses moldes servem para pães com ceituais em que algumas modelagens
estudadas aqui serão demonstradas deta-
ou sem recheio. Claro que uns se adaptam
lhadamente. Depois, a prática será funda-
melhor que outros, mas com bom senso, você mental para obter os melhores resultados!!
pode criar pães maravilhosos!

Figura 23: Croissant


GASTRONOMIA • UNICESUMAR 115

considerações finais
hegamos ao fim de mais uma unida- finalização do pão antes de seu crescimento
de, a última deste livro. Nela vimos o final. O pão mais básico para nós, brasileiros,
passo-a-passo da panificação. Agora é o pão francês. Com a base semelhante a ele,
sabemos que é necessário misturar os temos a baguete, um clássico tradicional fran-
ingredientes, normalmente pela sequência direta cês. Sendo assim, não poderia ter deixado de
de mistura, e, depois de sovar bem a massa, para demonstrar como é que podemos moldar esse
que o glúten tenha um bom desenvolvimen- pão, tão tradicional não apenas na França, como
to, depois, precisamos deixar que ela passe por no Brasil todo.
uma primeira fermentação, para desestressar o Além disso, agora podemos identificar cor-
glúten. Essa etapa é quando temos o relaxamento retamente quando um corte foi bem executado
da massa, ela ocorre nos primeiros dez minutos, ou não. Aquele corte bem aberto, padronizado,
sendo assim, pode-se ou não deixar mais tempo, douradinho, é sinal de que a lâmina foi usada
sendo importante ressaltar que, na ausência de da maneira esperada, tendo talhado na massa
tempo, pode-se esperar pouco tempo para dar um corte superficial inclinado, de modo que
continuidade ao processo. Apenas depois disso fique protegido do calor, resultando na bonita
é que podemos moldá-la ao nosso gosto, ou de abertura de cor dourada. Nem todos os padeiros
acordo com o pão que estamos fazendo, esperar se atentam à padronização. A falta de padroni-
mais uma vez para que a massa cresça e só então zação, aparentemente simples e sem problemas,
depois é que levamos o pão à cocção. é o mesmo que mostrar ao seu cliente que o
É válido sempre reforçar que as etapas são capricho e o cuidado com a fabricação não foi
importantes e devem ser respeitadas. Sem isso, tão grande assim, e que, na verdade, havia pressa
não teremos um pão com as características es- ou desconhecimento de técnicas. É isso que
peradas, seja em cor, em textura, em aroma, você gostaria que seu cliente pensasse de você?
em leveza. Acredito que não.
Os dois últimos tópicos desta unidade E mais, desmistificamos algumas dessas
foram cruciais para que você acompanhasse modelagens, como a do croissant, que muitos
o desenvolvimento de uma moldagem, etapa não sabem o segredinho do pequeno corte na
que só ocorre depois que a massa passou por base para que ele abra mais e fique mais bonito.
uma primeira fermentação. Note que algumas Porém, agora você sabe e é capaz de fazer sua
características se repetem, por exemplo, re- massa folhada e seu croissant, recheando-o e
tirar o ar antes de modelar é essencial para a aproveitando as técnicas para o seu melhor fim.
Panificação Clássica e Brasileira

atividades de estudo

1. Qual é a função da primeira fermentação da massa?

2. Explique a modelagem de um pão tradicional.

3. Explique a modelagem do croissant.


GASTRONOMIA • UNICESUMAR 117

material complementar
Grandes Chefs da Panificação
Fernando de Oliveira e André Schmid

Editora: Padaria 2000


Sinopse: Obra concebida por Fernando de Oliveira, Responsável
Técnico pelo DAT 2000 – Departamento de Assistência Técnica,
reúne 80 receitas dos principais consultores em panificação do
Brasil. Desfrute das receitas de pães sofisticados e de alto valor
agregado apresentados nas boulangeries dos países mais desen-
volvidos da alta panificação.

O Livro do Pão
Richard Bertinet

Editora: Marco Zero


Sinopse: O autor Richard Bertinet traz mais detalhes sobre o pre-
paro de massas e desmistifica os pães mais sofisticados, para
que qualquer pessoa possa prepará-los em casa, sem dificuldade.
Panificação Clássica e Brasileira

leitura complementar

A Boulangerie de Hoje

Bonjour, Madame, Merci, Madame, Au Revoir, Madame, Bonne Journée,


Madame....essa musiquinha, curiosamente mais aguda que em outras cir-
cunstâncias, você vai ouvir assim que colocar os pés no templo da panificação
francesa. Ao sair, também vai se perguntar quantas vezes por dia aquela
senhora bem penteada e elegante, frequentemente a mulher do boulanger
que fica lá nos fundos imantando ao forno, deve ter repetido essas fórmulas
inevitáveis!
Para você que chegou agora, é primordial fazer uma turnê pelas padarias do
bairro para achar aquela que faz a verdadeira baguete, crocante e dourada por
fora, com o miolo irregular, macio, com um vago gosto de amêndoas (dizem
as más línguas que ela só é boa em Paris) e que se comprada às 4 da tarde,
quando sai do forno para o goûter das crianças, resiste bravamente até o café
da manhã do dia seguinte. Depois de comer uma baguete ruim, você andará,
sem reclamar, mais uma quadra ou duas em busca da melhor!
Grande parte das padarias está aberta no domingo até meio dia, mas fecha
na segunda-feira. É bom prever então uma regra-de-três para sua baguete
quentinha da tarde se não quiser se afligir em busca de uma boulangerie de
plantão (como farmácias).
Aquela figura caricatural do francês com a baguete debaixo do braço não
é tão ultrapassada assim. Ainda se vê de vez em quando sendo elemento
indispensável à mesa, ela é complicada de carregar, por isso não é tão raro
vê-la atravessada sob um braço enquanto o outro se ocupa das compras co-
tidianas ou das chaves. Os mais metódicos pedem que seja cortada ao meio
(coupée, síl vous plaît) para reduzir o comprimento e não trancar nas portas.
Saiba, a propósito, que corte do pão em fatias é cobrado (algo em torno de
0,60 centimes).
Se as instalações visíveis de uma boulangerie (prateleiras, vitrines, balcão
etc.) são quase sempre impecáveis, geralmente bonitas, não se assuste ao
ver a Mão que serviu o pão se ocupar do troco e voltar aos Pães. Mesmo as
melhores boulangeries não se preocupam com essas “manias exageradas” de
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 119

leitura complementar
asseio! Espátulas, pinças e outros acessórios do gênero são raríssimos. Também
não espere por embrulhos, Dê-se por satisfeito se tiver a habitual folhinha
de papel no meio da baguete para segurá-la (as grandes padarias oferecem
generosamente meio saquinho de papel!). Console-se com o fato de que com
tantos séculos dessa prática, pouco asseada para nós obcecados da higiene,
nunca soube de doença por causa do manuseio do pão.
Nas horas do rush – de manhã, no almoço e em torno de 16 horas – é bom já
saber o que vai comprar, porque a fila é grande e o ritmo de atendimento...
de fórmula 1!
Olhe só tudo que você vai achar na boulangerie francesa:
• Sanduíches diversos (panninis incluídos) e saladinhas mistas.
• Minipizzas, quiches, tortilhas salgadas, que podem ser requentadas no
microondas local.
• Balas e bombons para a meninada: carambars (barrinha fina de caramelo
puxa-puxa, delicioso ganha pão dos dentistas), malanbars, (o nosso chi-
clete), réglisse (rolinho negro com gosto de remédio, feito de plantas) e
outras esquisitisses “fluorescentes”.

Fonte: Donel (1999, p.105-107).


Panificação Clássica e Brasileira

CONCLUSÃO GERAL
Querido(a) aluno(a),
É a contento que digo a você que chegamos ao final de mais uma etapa
que contribui para a sua formação. Neste tempo juntos, pudemos nos apro-
fundar em uma parcela da gastronomia que dificilmente desagrada alguém:
a panificação.
Para você, aluno(a) e futuro profissional, que entrará em um mercado de
trabalho que dispõe de um leque tão grande de opções, é importante já ter um
conhecimento prévio do que irá encontrar e como atuar em cada uma dessas
situações. Com este livro, você é capaz de entender como produzir pães do
começo ao fim, compreendendo todas as reações que ocorrem durante esse
processo, seja o processo de fermentação, seja o desenvolvimento do glúten
e até mesmo a hora ideal de assar o pão.
Agora você sabe que com apenas quatro ingredientes conseguimos fazer
um pão: farinha de trigo, água, fermento e sal. Conquanto, usamos outros
ingredientes para agregar sabor, cor ou melhorar a textura de nosso pão, além
disso, você é capaz de identificar as falhas de uma massa e como corrigi-la.
Quem diria que o sal, produto tão utilizado no nosso dia a dia na cozinha,
seria tão determinante para um pãozinho de qualidade? Sabemos que ele é
importante para frear a fermentação, de modo que essa ocorra mais lenta-
mente até que tenhamos a hora de assar o pão, sobrando ainda açúcares para
caramelizar a casquinha. Imagine que sem este ingrediente que parece tão
simples, os pães não teriam o mesmo sabor nem a mesma textura, teríamos
um pão crescido tão rapidamente que sentiríamos aquela nota de álcool no
produto final.
Apesar de muito importante, o sal é apenas um dos ingredientes e re-
conhecemos que temos proporções para se seguir justamente porque o sal
freia enquanto o fermento tenta consumir cada vez mais e mais rápido o
açúcar que acrescentamos para rebater a carência no glúten proveniente do
acréscimo desse açúcar. Vimos que podemos juntar um ovo, por exemplo, e
assim por diante, cada ingrediente tem uma função, então, reconhecendo cada
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 121

uma delas, podemos ler um receituário de pão, em linguagem de padeiro e


compreender que há uma lógica na quantidade de cada um dos ingredientes
escolhidos – não apenas se é manteiga, margarina ou ovo, mas também nas
quantidades envolvidas. O mais importante, caro(a) aluno(a), é reconhecer
essas características é mais um elemento diferencial para o seu futuro como
profissional.
Você chegou aqui inteirado à linguagem dos padeiros, podendo já ser
considerado um! E, profissionalmente falando, esse é um conhecimento
muito importante, pois, para padronizar seu negócio ou suas encomendas, é
preciso saber quanto de massa precisa preparar para que não haja desperdício
e, com os cálculos do padeiro, você sabe exatamente quanto utilizar de cada
ingrediente de modo inteligente.
A padronização agrega ainda mais valor ao seu trabalho, pois, como você
deve ter visto, panificação é um exercício meticuloso para quem está iniciando,
mas nada difícil se tiver as proporções respeitadas. Por fim, espero que tenha
aproveitado cada página e se deliciado com a mão na massa. Lembre-se: a
padaria pode estar à sua espera!
Até mais, prezado(a) padeiro(a).
Panificação Clássica e Brasileira

BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/


referências

wps/wcm/connect/f851a500474580668c83dc3fbc4c6735/RDC_344_2002.pdf?MOD=AJPERES>
Acesso em: 19 abr. 2015.

BRESCIANI, E. Alimentos e bebidas do Antigo Egito. In: FLANDRIN, Jean Louis; MONTANARI,
Massimo (Orgs.). História da Alimentação. Tradução por Luciano Vieira Machado, Guilherme J.
F. Teixeira. 4.ed. São Paulo: Estação Liberdade, 1998. p.68-79.

CAMARGO, L. A. Pão nosso: receitas caseiras com fermento natural. 1. ed. São Paulo: Editora
Panelinha, 2013.

CAUVAIN, S. P.; YOUNG, L. S. Tecnologia da Panificação. Tradução por Carlos David Szlak. 2. ed.
Barueri, São Paulo: Manole, 2009.

DONEL, E. O Passaporte do Gourmet: um mergulho na gastronomia francesa. Rio de Janeiro:


Ediouro, 1999.

DOMINÉ, A. Especialidades francesas. Tradução por Onoma, Gabinete de Produções, Lda.


Könemann Verlagsgesellschaft mbH, 2001.

JACOB, H. E. Seis mil anos de pão: a civilização humana através de seu principal alimento. Tradução
por José M. Justo. São Paulo: Editora Nova Alexandria, 2003.

KALANTY, M. Como assar pães: as cinco famílias de pães. Tradução por Renata Lucia Bottini. São
Paulo: Editora Senac São Paulo, 2012.

O VERDADEIRO panetone italiano. Pão Rústico. Disponível em: <http://paorustico.


com/2014/11/16/o-verdadeiro-panetone-italiano/>. Acesso em: 10 jul. 2015.

SEBESS, P. Técnicas de padaria profissional. Tradução por Renato Freire. 2. ed. Rio de Janeiro:
Senac Nacional, 2014.

SITWELL, W. A História da Culinária em 100 Receitas. Uma incrível viagem pelos hábitos alimen-
tares ao longo do tempo. Tradução por Áurea Akemi Arata. São Paulo: Publifolha, 2013.

SUAS, M. Panificação e viennoiserie: abordagem profissional. Tradução por Beatriz Karan Guimarães.
São Paulo: Cengage Learning, 2012.
GASTRONOMIA • UNICESUMAR 123

UNIDADE I UNIDADE II

gabarito
1. Existem duas teorias que fundamentam o sur- 1. Estudamos nesta unidade a ação da levedura
gimento do pão fermentado, quais são elas? na fermentação. Conhecendo pré-fermentos,
A primeira afirma que os egípcios aprimoraram explique a diferença entre esponja e biga.
o processo de fabricação de cerveja e utilizaram A esponja é uma mistura cremosa feita com fer-
a bebida no lugar da água, dessa forma houve a mento e a mesma quantidade de farinha e água
fermentação da massa e esta foi então assada. (ou outro líquido, como o leite). Essa massa deve
A segunda teoria alega que parte da massa ser feita de 2 a 8 horas antes de se produzir re-
tenha sido esquecida em algum lugar, fermen- almente o pão, para que ocorra a fermentação
tou naturalmente e foi então assada. A primeira completa no pré-fermento. A biga se caracteriza
especulação é mais aceita por ser vista como por um pré-fermento mais firme, com menos água
mais realista, afinal, o método se disseminou e e mais farinha que uma esponja (65% de água
popularizou dentre os egípcios. para 100% de farinha, utilizando de 0,8% a 1%
de fermento biológico fresco). Em temperatura
2. O grão de trigo é constituído por casca (farelo),
controlada a 16°C, a biga pode ser mantida em
gérmen e endosperma. De qual dessas partes
fermentação por até 18 horas.
provém a farinha mais utilizada na panificação?
Explique as razões dessa escolha. 2. Qual é a ação do sal e do açúcar na massa final do
O endosperma é a parte de maior constituição do pão? Devo me preocupar com as quantidades?
grão e também a mais importante. O que denomi- O sal é responsável por agregar sabor, cor e aroma,
namos de farinha é o endosperma moído, compos- resultando em um pão mais bonito e saboroso.
to de amido e proteínas (mais amido que proteínas). Com relação à quantidade, o indicado para que
O amido se torna alimento para o fermento, fazen- haja harmonia na massa é utilizar em torno de
do o pão crescer, e a proteína se desenvolve em 2% do peso da farinha.
cadeia de glúten, conferindo elasticidade ao pão. Os açúcares retêm umidade e influenciam para
3. Com base na resposta anterior, explique o pro- a durabilidade dos pães assados, sendo que os
cesso de fermentação alcóolica, como se dá o líquidos absorvem ainda mais e por isso prolonga
desenvolvimento da rede de glúten e sua impor- a vida do produto. Menos de 5% de açúcar a
tância para o crescimento da massa. massa praticamente não é afetada, detectando-se
poucos efeitos. De 5% a 10% o açúcar amacia o
Farinha, fermento e água misturados ativam as
glúten, resultando numa massa que estica com
enzimas beta-amilases que quebram os amidos
mais facilidade e cresce mais rápida. Acima de
(amilose e amilopectina) em açúcares simples
11% o açúcar rouba proteínas da água que o
(glicose). Esses açúcares servem de alimento para
fermento precisa, resultando em massa muito
o fermento que, durante esse processo, libera
macia, podendo até interromper o processo de
dióxido de carbono e álcool, resultando no cres-
fermentação.
cimento da massa. As proteínas da farinha em
contato com água e ação mecânica de sova (ou 3. Você trabalha em uma padaria e acaba de rece-
do gancho) formam uma rede glutinosa que, bem ber uma encomenda: produzir 250 pães italianos
desenvolvida, é capaz de segurar os gases libera- de 500 g cada. Qual é o peso total de massa
dos na fermentação dentro da massa, permitindo necessário para preparar esses pães? Quanto
que ela cresça com maestria. você precisará de farinha e de água?
Panificação Clássica e Brasileira

Peso total de massa → 250 pães × 500 g = 125.000 g A primeira fermentação se dá depois da massa
gabarito

ou 125 kg. sovada, é o primeiro momento de descanso da


A massa italiana tem hidratação de 57% e a fari- mistura. Esse momento é chamado de relaxamen-
nha totaliza sempre 100%. Partindo desse princí- to da massa – ou, de maneira informal, “deses-
pio, podemos dizer que se tivéssemos 100 kg de tressar” o glúten –, o que ocorre nos primeiros
farinha, utilizaríamos 57 kg de água, resultando 10 minutos.
num total de 157 kg de massa. Sendo assim, para 2. Explique a modelagem de um pão tradicional.
encontrar a quantidade de farinha e de água ne-
Filão: a massa descansada deve ficar em formato
cessárias para a produção dos 250 pães, faremos
redondo. Faz-se uma primeira dobra, puxando a
uma regra de três simples:
parte superior da massa para o centro. Depois
Massa em quilos – 157 kg -------- 125 kg faz-se uma segunda dobra, seguindo a mesma
Farinha em quilos – 100 kg ------- x orientação. Por fim, faz-se uma terceira dobra,
157x = 100 × 125 → x = 12500 ÷ 157 → x ≅ 79,62 resultando em uma fina marcação bem ao centro
kg de farinha. da massa.

E para a água: 3. Explique a modelagem do croissant.


Massa em quilos – 157 kg -------- 125 kg Primeiro abre-se a massa em formato retangular.
Água em quilos – 57 kg --------- x Depois corta-se uma longa tira, com média de

157x = 125 × 57 → x = 7125 ÷ 157 → x ≅ 45,38 20,5 cm de altura. Nesta, faz-se triângulos de

g de água. 10 em 10 cm. Cada triângulo deve ser esticado


levemente. Faz-se um pequeno corte ao meio
Conclui-se que serão necessários 79,62 kg de
da base de cada triângulo e estica-se as duas
farinha e 45,38 kg de água para produzir 125 kg
pontas, uma para cada lado, em lados opostos,
de massa, ou seja, os 250 pães italianos.
para deixar a base mais larga. Deve-se enrolar a
massa a partir da base do triângulo até chegar à
UNIDADE III ponta. Por fim, é só colocar na forma e pincelar
1. Qual é a função da primeira fermentação da com gema de ovo misturada com um pouquinho
massa? de água.

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