Aspectos históricos e culturais da construção do conceito de campo elétrico
são elementos fundamentais na compreensão da sua origem e do seu processo de desenvolvimento. Os fenômenos associados à eletricidade e ao magnetismo foram observados, ainda sem distinção, na Grécia Antiga, quando os filósofos pré-socráticos preocupavam-se com questões acerca da origem do mundo e das transformações na Natureza, no período que vai do final do século VII ao final do século V a.C. O filósofo, matemático e astrônomo grego, Tales de Mileto, no século VI a.C., parece ter sido o primeiro a observar fenômenos desta natureza, ao atritar uma ‘pedra’ denominada elektron com um pedaço de lã, e, ao fazê-lo, observou que esta ‘pedra’, também conhecida por âmbar, atraía pequenos corpos.
Em 1600, surge o trabalho de William GILBERT (1540-1603), médico da rainha
inglesa Elisabeth I, que publicou um tratado sistemático e crítico, De Magnete, sobre o que se sabia, até então, sobre magnetismo e eletricidade. Incluindo seus experimentos em eletricidade relatou que outras substâncias gozavam da propriedade do âmbar depois de friccionadas por peles ou tecidos, denominando-as de elétricas, ou seja, que podiam ser eletrizadas como o âmbar. Exemplos: o lacre, o enxofre, vidro, seda, etc.. Observou que metais não podiam ser eletrizados por fricção, chamando-os de não- eletrizáveis. Além disso, diferenciou os fenômenos elétricos dos magnéticos, criando a expressão vis electrica (força elétrica). A situação não se alterou muito com os estudos de Otto von GUERICKE (1602- 1686), físico alemão, que notou a repulsão de partículas de mesma carga, e construiu a primeira máquina eletrostática para eletrizar um corpo, o gerador eletrostático. Observou o poder das pontas nos corpos eletrizados e também que a chama de uma vela podia deseletrizar um corpo metálico carregado. Descobriu a indução elétrica, uma maneira de eletrizar um corpo sem qualquer contato com ele. Uma de suas mais importantes descobertas foi a de que substâncias eletrizadas, além da atração, podiam sofrer repulsão. Mas foi incapaz de explicar como uma bola carregada podia eletrizar outra por contato, ou seja, a condução ou transmissão da eletricidade. Os investigadores do século XVII e início do século XVIII encontraram-se com uma confusa coleção de observações sobre eletrização por atrito, formação de centelhas e efeitos da umidade atmosférica, que foram incapazes de explicar por causa da falta de conceitos eletrostáticos fundamentais. Apesar disto, um considerável número de importantes observações qualitativas surgiu neste período. Em 1731, o inglês Stephen GRAY (1679-1736) demonstrou claramente a condução elétrica nos corpos, que foram então por ele classificados de condutores e não-condutores (isolantes). Lançou a ideia de associar a eletricidade a um fluído elétrico, universal e imponderável, capaz de depositar-se entre os poros e interstícios dos corpos materiais. Em 1759 Franz Ulrich Theodor ÄPINUS (1724- 1802) mostrou a existência de todos os graus de transição entre os condutores e os não-condutores. Eles fizeram as primeiras observações da influência exercida por corpos carregados em condutores isolados. Charles DU FAY (1698-1739), sábio francês, tornou-se correspondente de Gray. Realizou suas próprias observações de caráter científico, deixando de lado as interpretações metafísicas e o sensacionalismo das exibições nas cortes. Chegou à conclusão de que todos os corpos são eletrizáveis, ou seja, de que toda a matéria possui a propriedade que por séculos havia sido peculiar ao âmbar ou a um pequeno grupo de substâncias ditas elétricas. Suspendendo a si mesmo por fios de seda, constatou que, quando era eletrizado e outra pessoa se aproximasse bastante, ocorriam pequenas descargas elétricas e estalidos e no escuro viam-se centelhas. Notou também que todos os objetos eletrizados por meio de um mesmo bastão de vidro, repeliam-se mutuamente, mas atraiam objetos que haviam sido eletrizados por meio de âmbar. Concluiu, então, que deveriam haver dois tipos de eletricidade, que denominou vítrea e resinosa. Isto constituiu a teoria dos dois fluidos elétricos. De acordo com Du Fay, os corpos neutros continham a mesma quantidade dos dois fluidos. A etapa seguinte mostra a tentativa de armazenar, de alguma forma, o fluido elétrico. Em 1745, Ewald Georg VON KLEIST (1700-1748), bispo da Pomerânia, teve a ideia usar uma garrafa de vidro tapada com uma tampa de cortiça com um prego atravessado. Pôs o prego em contato com um gerador eletrostático e, segurando a garrafa com uma mão e tocando no prego com a outra, levou um choque considerável, bem mais intenso do que aqueles que se sentia em contato com corpos comuns eletrizados. Repetindo a experiência com a garrafa cheia de água, o choque foi ainda maior. Ressaltou, então, o termo condensador para a garrafa, o primeiro capacitor construído. Quase na mesma época, na cidade holandesa de Leyden, Pieter VAN MUSSCHENBROEK (1692-1761), físico e matemático, repetiu as experiências de Kleist, cujo relato fora lido na Academia Francesa de Ciências, enquanto as observações de Kleist foram apenas enviadas a um amigo em Berlin. Assim, o mérito da descoberta acabou ficando com o holandês, e o condensador ficou conhecido como garrafa de Leyden. A elucidação do fenômeno da garrafa de Leyden ocupou não só Apinus, como também a Benjamin FRANKLIN (1707-1790). Norte-americano, interessou-se pela eletricidade após uma demonstração pública em Boston, em 1746. Entre 1747 e 1754, Franklin realizou uma série de experimentos, num dos quais descobriu que na garrafa de Leyden, o arame que sai da garrafa possui eletricidade contrária à do vidro da garrafa. Elaborou sua própria teoria para a eletricidade, contrária à então aceita teoria dos dois fluidos elétricos de Du Fay. Para ele, havia apenas um fluido elétrico, o qual todo o corpo não-eletrizado conteria em certa quantidade, e que era um elemento comum a todos eles. Se um corpo o possuísse em excesso, era chamado de positivo. Se o possuísse de menos, era negativo. Esta foi a teoria do fluido único, e não foi bem recebida pela comunidade científica da época. Em 1759 foi definitivamente rejeitada, com base experimental, pelo inglês Robert SYMMER. Entretanto, a teoria do fluido único teve o mérito de introduzir o conceito da conservação do fluido elétrico. Outro mérito de Franklin foi o de estabelecer a natureza elétrica dos relâmpagos (1752), com a invenção do para-raios, ao empinar uma pandorga durante uma tempestade. A força entre partículas carregadas começou a ser estabelecida em meados do século XVIII. Começou com a suspeita de uma relação com a lei da gravitação de Newton. Entretanto, em 1767 Joseph PRIESTLEY (1733-1804) encontrou forte evidência disto na descoberta sua e de seus amigos, entre eles Henry CAVENDISH (1731-1810), de que a carga de um condutor reside inteiramente em sua superfície, ficando seu interior completamente livre de influências elétricas, fato este que não mereceu muita atenção na época.
Idade Contemporânea
Em 1785, Charles Augustin de COULOMB (1736-1806), um engenheiro civil
militar aposentado, realizou experiências com uma balança de torsão e enunciou a famosa lei que hoje leva seu nome “a força entre duas cargas é diretamente proporcional a carga em cada uma delas e inversamente ao quadrado da distância que as separa”. Em 1786, Coulomb relatou que um condutor também blinda seu interior (ele desconhecia os relatos de Cavendish), e viu nisto também uma indicação para a lei de força enunciada. Entretanto, esta parte do relato foi tão completamente esquecida, que o efeito de blindagem hoje está ligado ao nome da Faraday. Em 1811, Siméon Denis POISSON (1781-1849) fez progressos com a lei de Coulomb, trabalhando na teoria do potencial, que tinha sido inicialmente desenvolvida para a gravitação. Ele mostrou que toda a eletrostática, não considerando a presença dos dielétricos, pode ser explicada pela lei de Coulomb ou, equivalentemente, pela equação diferencial de Laplace-Poisson. Referências https://www.ufrgs.br/eletromagnetismo/material-suplementar/historia-do-eletromagnetismo/