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Nesse período, o país passou por grandes mudanças. Mao implementou políticas marxistas, mas,
diferentemente do comunismo soviético, centrado na classe trabalhadora industrial, a revolução
maoísta se baseou nos camponeses.
O objetivo do líder chinês era industrializar o país e transformar a tradicional economia agrária. Para
isso, criou grupos de trabalho e fazendas coletivas, proibindo a agricultura particular e a propriedade
privada.
Mas o Grande Salto para Frente — como Mao chamou seu processo de industrialização — também
causou uma insuficiência alimentar muito séria e a fome matou de 20 a 45 milhões de pessoas entre
1958 e 1962, segundo diferentes fontes.
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Mao aprofundou suas políticas comunistas e lançou, em meados dos anos 60, outro projeto
controverso: a Revolução Cultural, uma campanha contra partidários do capitalismo na China sob o
pretexto — apontam os historiadores — de eliminar seus inimigos políticos dentro do Partido
Comunista Chinês.
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Milhões de pessoas foram aterrorizadas pela Guarda Vermelha, os jovens mobilizados por Mao para
eliminar a "cultura burguesa".
Apesar disso, um forte culto à personalidade transformou Mao em uma espécie de divindade
nacional.
A imagem dele ainda está muito presente no cotidiano do país asiático. No entanto, a República
Popular da China é muito diferente daquela concebida pelo autointitulado "Grande Timoneiro".
Direito de imagemGETTY IMAGESImage captionA imagem atual de Xangai, a capital econômica
da China
A China hoje
Sete décadas após sua fundação como o maior país comunista do mundo, a nação asiática caminha,
segundo alguns analistas, para se tornar a principal potência econômica do planeta.
O PIB chinês é superado apenas pelo dos Estados Unidos. No entanto, em termos de paridade do
poder de compra (PPP), já é o país mais rico do mundo.
A China também possui o setor bancário mais rico e a instituição com o maior total de ativos: o
Banco Industrial e Comercial da China (ICBC).
E é o principal gigante comercial: produz e exporta mais que qualquer outro país, com 119 empresas
na lista das 500 maiores do mundo, segundo a lista de 2019 da revista Fortune.
Tudo isso foi possível devido a mudanças introduzidas desde 1978, dois anos após a morte de Mao,
por Deng Xiaoping, que promoveu um programa econômico que ficou conhecido como "reforma e
abertura".
Deng fez o oposto da proposta de Mao: liberalizou a economia, permitindo o ressurgimento do setor
privado e o poder descentralizado, deixando a tomada de decisão nas mãos das autoridades locais.
Ele também passou a dar aos agricultores maiores liberdades para que pudessem administrar as
terras que cultivavam e vender os produtos que colhiam.
Também promoveu uma abertura ao exterior: ele viajou para os EUA e selou laços com Washington,
após o histórico primeiro passo que Richard Nixon deu ao visitar a China nos últimos anos de Mao,
em plena Guerra Fria.
Assim começaram os contatos comerciais entre a República Popular da China e o Ocidente, abrindo
espaço para a entrada no mercado chinês de investimentos estrangeiros e multinacionais icônicas do
capitalismo, como Coca-Cola, Boeing e McDonald's.
A fórmula foi bem-sucedida e permitiu à China começar a crescer, de forma sustentável, em níveis
recordes, por três décadas.
O Banco Mundial estima que mais de 850 milhões de chineses saíram da pobreza graças às
reformas, como parte de um desenvolvimento sem precedentes.
A China se modernizou e hoje não apenas domina a fabricação de roupas, têxteis e eletrodomésticos.
É também um gigante tecnológico.
Outra empresa privada, a Lenovo, vende mais computadores pessoais que qualquer outra empresa no
mundo.
Os fundadores dessas empresas estão entre as centenas de chineses que agora fazem parte da lista de
bilionários da revista Forbes.
Com tudo isso, vale a pena perguntar: podemos continuar chamando a China de país comunista?
70 anos depois de Mao chegar ao poder, o país ainda é governado por uma única força, o Partido
Comunista da China, que opera de forma centralizada e tem líderes em cada cidade e região do país.
O presidente é eleito pela Assembleia Popular Nacional (o Parlamento), que é controlada pelo
Partido Comunista.
Não há liberdade de imprensa e, com exceção de alguns meios de comunicação privados, o setor de
mídia está sob controle estatal.
Segundo a organização de direitos humanos Human Rights Watch, o governo chinês "mantém
controle rígido sobre a internet, os meios de comunicação e a academia". Também "persegue
comunidades religiosas" e "detém arbitrariamente defensores dos direitos humanos".
No entanto, quando o país é analisado por uma perspectiva econômica, é outra história.
Direito de imagemGETTY IMAGESImage captionPoliticamente comunista. Economicamente, nem
tanto.
"Economicamente, a China está hoje mais próxima do capitalismo do que do comunismo", disse à
BBC Kelsey Broderick, analista especializada em China da consultoria Eurasia Group.
No entanto, Broderick alerta que, embora à primeira vista a economia chinesa pareça completamente
capitalista, "se você remover a camada mais superficial, poderá ver a mão pesada do Partido".
Ele também é oficialmente o proprietário de toda a terra, embora, na prática, as pessoas possam ter
propriedades privadas.
E o Estado também controla o sistema bancário, decidindo quem pode tomar empréstimos.
Até as empresas privadas chinesas devem passar por inspeções estatais e ter "comitês partidários que
possam influenciar a tomada de decisões", diz Broderick.
Isso também ocorre com algumas empresas estrangeiras, no caso de terem entre seus empregados
três ou mais funcionários do Partido (situação comum, considerando que o grupo tem quase 90
milhões de membros).
Direito de imagemGETTY IMAGESImage captionO governo Trump acusa a China de usar sua
principal empresa privada para espionar outros países; a Huawei nega a acusação
Essa fronteira confusa entre o privado e o estatal está por trás da controvérsia que afeta a Huawei
hoje, depois de os Estados Unidos acusarem a maior empresa privada da China de ser uma frente de
espionagem estatal — o que a companhia nega.
'Capitalismo estatal'
Esses traços socialistas que persistem no modelo econômico chinês e que levaram muitos analistas a
usar o termo "capitalismo de Estado" também exacerbaram a guerra comercial entre a China e os
Estados Unidos.
Embora o conflito esteja centrado na balança comercial, que é muito favorável a Pequim,
Washington e outros parceiros comerciais da China reclamam do enorme auxílio estatal que as
empresas privadas chinesas recebem e que, portanto, as coloca em vantagem na comparação com
seus rivais internacionais.
"As empresas privadas chinesas têm uma dupla vantagem: tomam empréstimos de bancos públicos e
recebem subsídios de energia de empresas estatais que controlam toda a produção de energia do
país", diz o jornalista e analista internacional Diego Laje.
Laje, que foi apresentador da TV Central da China em Pequim e correspondente da rede americana
CNN na Ásia, acredita que a China "não pode ser chamada de capitalista porque não atende aos
requisitos e compromissos da Organização Mundial do Comércio (OMC)", à qual aderiu em 2001 e
que ainda não a reconhece como uma "economia de mercado".
No entanto, o jornalista ressalta que "no dia-a-dia, a intervenção estatal não é sentida, o que dá uma
sensação de liberdade" que faz com que, de muitas maneiras, a economia chinesa opere como um
sistema capitalista.
"Sinto que a China é cada vez mais capitalista", disse às BBC Xiao Lin, uma mulher de 30 anos do
sudeste da China que mudou para Pequim para estudar e trabalhar como intérprete.
Ela diz que vê isso principalmente no mercado imobiliário. "As casas estão ficando cada vez mais
caras e apenas os ricos podem comprá-las. Jovens profissionais como eu não conseguem ter a
própria casa e dependem dos pais ou avós."
Isso também é perceptível nos serviços de saúde: a maioria dos chineses depende do sistema público,
geralmente lotado, mas os mais ricos vão para hospitais particulares.
A educação chinesa também passou por mudanças. Ainda é oferecida pelo Estado, mas já não é mais
totalmente gratuita. "São 9 anos obrigatórios e não pagos. Mas, para ir ao ensino médio e à
universidade, é preciso pagar", diz a jovem.
Onde ela mais sente a presença do Estado em sua vida é em termos de segurança e liberdade de
expressão.
A primeira questão ela elogia: "A China é o país mais seguro que existe, o governo garante nossa
segurança".
Por outro lado, lamenta as restrições que enfrenta quando quer navegar na internet ou usar as redes
sociais.
"Xi quer que um estado forte esteja no comando. Ele simplesmente não acredita nas forças do
mercado como solução para os problemas, nem vê espaço em que o Partido Comunista não possa ou
não deva intervir", disse ao jornal South China Morning Post, o principal jornal em inglês de Hong
Kong.
"Os níveis de repressão e controle estão aumentando e a tecnologia foi aperfeiçoada para que a
China seja hoje um estado policial perfeito", diz ele.
Broderick, da Eurasia Group, argumenta que Xi "está convencido de que o colapso da União
Soviética ocorreu porque eles deixaram de lado suas raízes comunistas e não quer que isso aconteça
em seu país".
Há quem compare algumas de suas políticas com as de Mao: por exemplo, a campanha de combate à
corrupção que ele promoveu quando chegou ao poder, segundo os críticos, era uma ferramenta
contra seus oponentes políticos.
O colunista do South China Morning Post Cary Huang afirma que Xi se mostra como um "defensor
do livre mercado e da globalização econômica" no exterior, mas "em seu país de origem ele lidera
uma campanha para doutrinar a nação com ideologias do marxismo, leninismo e de Mao."
Segundo Huang, o presidente chinês conseguiu se tornar um "sábio do comunismo, ao lado de Mao e
superior a Deng" e seu "entusiasmo pela ortodoxia comunista" pode ter a ver com seu desejo de
"justificar o que provavelmente acabará sendo um governo vitalício, de estilo monárquico".
À medida que a economia chinesa desacelera — levando alguns a duvidarem de que ela possa se
tornar a economia número um do planeta, ou mesmo cogitando uma grande crise financeira —
aumentam as dúvidas sobre como Xi enfrentará a situação. Em 2018, a China modificou a
Constituição para garantir sua continuidade no poder.
O que é certo, diz Laje, é que "hoje a classe média chinesa está acostumada a viver de uma certa
maneira e para eles não há como voltar atrás".