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PERIGOSAS NACIONAIS

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SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS
DEDICATÓRIA
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTUO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
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CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27 – BÔNUS SAM
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
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CAPÍTULO 40
CAPÍTULO 40’’
BÔNUS - EDDY
EPÍLOGO
BÔNUS
DEMAIS OBRAS
REDES SOCIAIS DA AUTORA

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Nunca sei a melhor forma de começar os


agradecimentos de um livro! Para não ter erro,
começo agradecendo a cada leitor que sempre dá
uma chance ao meu trabalho, sou muito grata por
cada mensagem que recebo, cada crítica que me
ajuda muito a crescer dentro desta carreira deliciosa
e desafiadora que é ser escritora.
Em especial quero agradecer às duas Fadas
Madrinhas de Speed Sex, Júlia e Myrthes.
Meninas, muito obrigada mesmo por aguentar meus
surtos de insegurança, por ter me mostrado os
pontos que poderiam ser melhorados, por ter lido e
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ansiado por cada capítulo durante o


desenvolvimento da história. Sério, não sei se a
história teria ficado tão incrível sem o trabalho
maravilhoso de vocês duas ♥
Meu muito obrigada também vai para as
minhas queridas parceiras que sempre me apoiam
em massa quando tenho um lançamento. Valeu
mesmo por todo apoio, meninas!

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A todos o leitores incríveis que sempre leem os


meus livros.
Tenham uma deliciosa leitura ♥

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— Não, eu quero a porcaria do contrato


assinado hoje, Patrick. Vocês estão nos enrolando
há dois meses. Dois. Meses! — bufo impaciente.
Ouço o homem do outro lado da linha soltar um
gemido de descrença.
— Ayla...
— Sem Ayla. Ou vocês querem a
tecnologia ou vocês não querem. Se até as oito da
noite uma cópia do contrato assinado não chegar

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em meu e-mail, procurarei novos interessados.


Tenha uma boa tarde, senhor Hale.
Encerro a chamada e massageio minhas
têmporas. Comandar a empresa de soluções
tecnológicas da família é uma conquista que
carrego com orgulho, mas lidar com empresas que
acham que podem nos enrolar só porque a pessoa
no comando é uma mulher, me deixa tão puta da
vida que a minha vontade é descer o nível e mandá-
los se foder.
— Você está muito estressada. — Júlia
cantarola, tirando-me da sessão de tortura mental
que eu praticava com o maldito Patrick. Sorrio para
a minha prima sentada do outro lado da mesa. Nem
mesmo na hora do almoço eu tenho paz.
— Claro que estou, quando esses machistas
ridículos vão começar a aceitar que uma mulher
pode e faz o mesmo trabalho que eles? Muitas

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vezes ainda até melhor! — Ela sorri, me apoia em


todas as decisões profissionais que eu tome, mas
nunca trabalhou na vida. A não ser que considere as
vezes em que me convence a investir em projetos
malucos para ajudar seus amigos, já que seus pais
não são tão liberais assim, lhe dão tudo o que quer,
menos dinheiro em mãos.
— Você precisa de sexo — constata,
apontando seu garfo para mim. — Daquele tipo
bem quente e suado, que te tira de órbita e no outro
dia, mal consegue se manter sobre as pernas.
— Obviamente essa é a minha prioridade no
momento. Os duzentos e cinquenta softwares
prontos no laboratório vão se vender sozinhos. —
Ela revira os olhos enquanto pousa o talher no prato
e sorve um gole do seu vinho, tudo isso mantendo
os olhos presos em mim.
— Você tem trabalhado demais, Ayla. Não

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faz bem para a mente e nem para o corpo. — Seu


tom agora é preocupado, o que me desarma. Nossos
pais são irmãos e fomos criadas juntas desde bebês
e quando mamãe morreu, eu tinha só cinco anos, tia
Rosalyn quem foi o meu suporte materno. E apesar
de sermos da mesma idade, Júlia sempre foi
protetora em relação a mim.
— Eu sei, mas eu preciso. Papai não pode
se estressar mais com essas coisas. — Sua mão
acaricia a minha sobre a mesa, seus olhos
transbordando amor.
— Eu também sei. Mas me preocupo com
você e é por isso que vou te ajudar.
Estremeço, é automático quando algo deste
tipo é proferido pela voz melosa de Júlia Stewart.
Ela não é exatamente uma patricinha desmiolada,
só aproveita, e bem, todo o luxo que seus pais
podem lhe proporcionar. Claro que eu poderia

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seguir o mesmo caminho, mas existe algo dentro de


mim que não me permite ficar quieta, há uma
inquietação gostosa em meu interior que me
impulsiona a buscar sempre mais.
— Não me olhe com essa cara, Lally. — O
pior é que ela parece mesmo ofendida com o meu
olhar, o que me faz rir. — Lembra alguns meses
atrás quando investimos na startup de um amigo
meu?
— Você investiu, eu só assinei o cheque.
— É, mas você também tem recebido uma
parte dos lucros. O que importa é: você nem se
preocupou em perguntar do que se tratava a
empresa.
— Parei de me preocupar com isso quando
me fez investir em uma demanda de bonecos
sexuais realísticos. — A lembrança nos faz
gargalhar. Claro que a ideia foi uma tremenda

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furada, a amiga que estava por trás do projeto não


tinha suporte nenhum, além de seus desejos ocultos
de possuir um robô sexual que tivesse a aparência
de um homem de verdade.
— Aprecio a forma que confia em mim. —
Voltamos a comer, eu com pressa por ver que
preciso estar de volta ao escritório em meia hora,
ela percebe e revira os olhos. — O investimento
dessa vez foi em um aplicativo de encontros.
Arqueio as sobrancelhas em sua direção.
Sério isso?
— Ultimamente tenho usado shampoo dois
em um, pois não tenho tempo nem para duas
lavagens de cabelo, quem dirá para encontros!
— Dá para parar de me interromper e me
ouvir até o final? — Ergo as mãos, rendendo-me
diante sua expressão nervosa. — Não é um desses
aplicativos de encontros comuns, são para

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encontros sexuais. — Minhas sobrancelhas sobem


um pouco mais. — E não são só meros encontros...
são encontros profissionais...
— Pelo amor de Cristo, Júlia, estamos
investindo em uma empresa de prostituição? —
Controlo meu tom de voz, a incredulidade
dominando cada célula do meu corpo. — Onde
diabos você estava com a cabeça?
— Menos, Ayla, bem menos. — Apoiando
os cotovelos sobre a mesa, ela inclina o corpo para
frente, ficando mais próxima de mim. — Não é
bem assim, o Charles só gerencia o aplicativo,
ninguém obriga ninguém a fazer programa, não é
uma empresa de prostituição ele organiza
encontros, é a ponte entre cliente e acompanhantes
— frisa bem a palavra acompanhante encarando-
me profundamente. — Ele criou o aplicativo
pensando em pessoas como você, que quase não

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tem tempo para coisas prazerosas como o sexo. O


que na minha opinião é um absurdo. Charles é um
anjo em forma de gênio.
Ainda estou em choque por saber que nos
últimos seis meses andei, mesmo que
indiretamente, promovendo encontros sexuais.
Sinto-me uma cafetina.
— Não seja tão careta, Lally. Qual é o
problema em pagar por um encontro? Se você está
sem tempo e precisa de sexo, por que não pagar
alguém que é garantido que vai te satisfazer? Não é
crime viver um pouco, sabia? — Continuo
encarando-a perplexa.
— Eu não estou precisando de sexo. E não,
não é crime, mas...
— Careta. — Cantarola me apontando o
dedo em provocação. — Eu te amo e vou sim
marcar um encontro para você. Me agradeça

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depois. — A vadia fica de pé, dando por encerrada


a nossa conversa. Isso porque quem estava com
pressa era eu. — E só para você saber, será por
minha conta, um presentinho da melhor prima do
mundo.
Então me deixa sozinha. A conversa
repassando em minha cabeça como o letreiro de
filme, mas em câmera lenta. Meu cérebro tentando
ver se não deixou passar nada daquelas palavras
absurdas, não sou uma pessoa careta, vivo até que
de forma bem livre a minha vida, o problema
mesmo é que realmente não ando tendo tempo para
coisas triviais como encontros. Ou sexo. Desde que
meu pai teve um princípio de infarto, há mais ou
menos dois anos, eu tomei à frente da empresa da
família. No começo foi só provisório, porém
quando foi constatado que ele precisava mesmo de
descanso e se afastaria do cargo, acabei ficando em
definitivo, ainda que alguns investidores, machistas
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escrotos, achassem que eu não daria conta. Portanto


agora sou a CEO da Stewart Technologic Solutions
e toda a minha vida se resume à empresa.
E por mais incrível que pareça, sinto-me
mais incomodada por Júlia ter me chamado de
careta do que pela ideia em si de que aquela maluca
vai realmente me enfiar em um encontro com um
acompanhante. Meu corpo traidor se arrepia inteiro
com a mera ideia.
Acho que no final das contas eu preciso sim
de sexo...

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Engulo o resto de vinho da minha segunda


taça e massageio as têmporas sentindo que em
breve uma dor de cabeça se fará presente. São onze
horas da noite de um sábado e tudo o que eu mais
queria era estar dormindo, mas aqui estou eu:
sentada na mesa da cozinha rodeada de papéis:
contratos para revisar, contratos para assinar,
pedidos de peças para fazer, fichas de serviços
terceirizados que preciso analisar e por aí vai.

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A empresa tem um departamento próprio


para cada setor que citei anteriormente, mas assim
como aprendi com meu pai, checo todas as áreas
antes que cada decisão seja tomada.
Ouço barulho na maçaneta da porta de
entrada e resmungo baixo pois sei quem é e o que
virá a seguir. Ela tinha ficado de vir para cá hoje
depois da noitada. Na verdade, passa mais tempo
aqui do que na própria casa, não sei por que ainda
não se mudou de vez.
— Para. Eu não acredito que você está
trabalhando! — Júlia grita assim que adentra a
cozinha. Seus cabelos estão soltos, os saltos que
colocou ao sair de casa preso entre os dedos. Pela
forma que seus olhos se esforçam a ficarem fixos
no meu rosto, sei que bebeu um pouco além da
conta. — Eu te odeio, Ayla, odeio mesmo.
Levanto-me e a guio até um dos bancos da

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ilha, sentando-a ali e servindo-lhe um copo de água


gelada.
— Também amo você, priminha — brinco,
estendendo o copo que ela vira de uma só vez.
— Hoje é sábado, Lally. S-Á-B-A-D-O —
soletra, levantando um dedo a cada letra, ainda que
a palavra tenha seis letras, oito dedos seus estão
para cima. Abafo uma risada com a mão. — Você
deveria estar sei lá, transando por aí, daqui uns dias
voltará a ser virgem de tanto tempo faz que a sua
bonitinha não vê um pau...
— Pelo amor de Deus, Jú, bonitinha? —
Dessa vez não resisto e gargalho.
— Não seja uma prima chata e nos sirva
vinho, sua sem-transa. — Balanço a cabeça em
negativa à sua provocação e pego a garrafa pela
metade e duas taças, nos conduzindo em seguida
para a sala.

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Sentamos no tapete e eu ligo a TV, sirvo o


vinho e Júlia se recosta no sofá enquanto inspira o
cheiro delicioso do vinho antes de degustar um
gole.
— Eu estive pensando... — De repente ela
parece sóbria, até sua postura fica mais ereta. —
Quero te ajudar na empresa. — Arqueio a
sobrancelha em sua direção, mas permaneço em
silêncio esperando que desenvolva mais a
maluquice da vez. — Vou fazer faculdade, cursar
administração e ajudar você na Stewart.
Agradeço que ela não volte ao assunto sobre
a minha falta de vida sexual. Depois daquele nosso
almoço onde fiquei sabendo que tenho investido em
um aplicativo que promove encontros sexuais, Júlia
não falou mais nada em relação a me arrumar um
encontro por lá, o que tenho achado ótimo. Isso já
faz quase dois meses e secretamente tenho medo do

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que a sua cabecinha tem tramado desde então.


Balanço a cabeça espantando aqueles
pensamentos e mantenho o foco no momento. Suas
palavras enfim fazem sentido e eu a encaro
genuinamente espantada.
— Você está falando sério?
— Claro, eu amo a minha vida, mas amo
mais você e não quero te ver acabando com a sua
vida assim, Ayla. — Suas palavras me aquecem e
me fazem sentir culpada tudo na mesma proporção.
— E acho também que já está na hora de mostrar
aos meus pais que eu não sou uma cabeça de vento.
Acabo rindo de suas palavras, essa é a exata
forma que tio Clarence a chama.
— Não se sinta pressionada a fazer isso
apenas por minha causa, Jú. Eu prometo que vou
diminuir minhas horas de trabalho. — Ela revira os
olhos diante a minha falsa afirmação. — ‘Tá, eu sei
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que já falei isso centenas de vezes, mas dessa vez é


sério. Vou mesmo dar uma pisada no freio.
— Sei. Mesmo assim eu quero fazer isso.
Acho que preciso de um rumo na vida, ando me
sentindo meio perdida... — Júlia termina sua taça e
a inclina em minha direção para que eu sirva mais.
— Tem o meu total apoio. E eu vou adorar
ter você na empresa comigo. — Sou sincera, será
mesmo legal trabalharmos juntas.
— Eu sei e é por isso que começo na
segunda como sua assistente pessoal até que eu
esteja apta para estagiar como administradora, vou
ir te dando uma mão no que precisar que não seja
tão complicado.
Neste momento me sento ao seu lado e a
abraço forte.
— Eu te amo, viu?
— Também te amo, mas agora coloca um
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filme aí, minha noite foi uma bosta.


Concordo e coloco Como se fosse a
primeira vez para rodar. É o nosso filme preferido.
— O que aconteceu para classificar a sua
noite como uma bosta? — questiono ao me sentar
novamente ao seu lado.
— Não encontrei nem um cara decente que
valesse a pena trazer para casa. — Faz beicinho me
arrancando uma risada.
Céus, essa garota não existe!
Deixando de lado seu drama, nos
concentramos no filme.

Droga.
Toda vez que Júlia vem para cá juro para
mim mesma que aquela será a última vez que
dormirei no tapete, mas como sempre é nele que

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acordo. Minhas costas doem quando respiro fundo.


Ouço seu resmungo ao meu lado e, vagarosamente,
me sento.
— Inferno, dormimos no chão de novo? —
Não resisto e gargalho.
— Vou preparar o café da manhã.
Depois que comemos e conseguimos nos
recuperar por ter dormido no chão, vamos para a
casa dos pais dela para o almoço de domingo. O dia
passa tranquilo, minha mente mal conseguindo se
desligar das inúmeras coisas que preciso fazer no
escritório.
— Amanhã eu começo a colocar ordem na
sua vida, então pelo amor de Deus só relaxa hoje,
Ayla — alfineta, tomando o celular da minha mão.
Estamos todos na área da piscina enquanto o
almoço não sai.
— Só estava checando a agenda da semana,
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tem algumas reuniões para as quais preciso me


preparar antes...
— Ahan, mas hoje é domingo e você está
tendo um maravilhoso encontro em família. Nada
de celular até as sete da noite, aí eu monitorarei a
sua agenda e te passarei o que precisa rever para as
tais reuniões. — Por Cristo, se isso for um indício
de como será trabalhar com ela já estou começando
a repensar se será mesmo uma boa ideia!
— Você está exagerando, Jú.
— Não está não, filha. — Meu pai
intervém, apoiando aquela sandice. — Você tem
passado tempo demais mergulhada em coisas da
empresa, me pergunto se serei avó enquanto ainda
tenho saúde para brincar com uma criança.
Reviro os olhos perante seu drama.
— Vocês estão exagerando. — Para evitar
que continuem pegando no meu pé, me levanto e
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sigo para dentro da casa com a desculpa de que


preciso usar o banheiro.
Quando chego no corredor que leva aos
quartos, solto um longo suspiro. Essa coisa de
todos ficarem me falando que preciso relaxar tem
começado a me deixar irritada e ansiosa. Entro no
banheiro e jogo um pouco de água no rosto. Que
mal há em eu querer preencher os meus dias com
trabalho? Com algo que me realiza? Se eu estivesse
fazendo algo que não gosto, se estivesse sendo
obrigada a trabalhar, aí tudo bem, mas estou
saudável, tenho uma vida boa e trabalho com o que
amo, por que a minha família não pode aceitar as
minhas escolhas?
— Filha? — A voz do meu pai atravessa a
porta de madeira e só então me dou conta de que
grossas lágrimas descem pelo meu rosto. —
Desculpa se o pai falou algo que te chateou,

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princesa, eu só quero que você viva mais a sua vida


conforme a sua idade, sei que tem feito de tudo
para não me sobrecarregar e sou muito grato por
isso, mas eu não quero que se anule por minha
causa. — Abro a porta e o encontro recostado no
batente, os braços cruzados sobre o peito e um
olhar transbordando amor em minha direção.
— É isso que vocês não entendem, trabalhar
na empresa é o que me realiza, pai. Não estou me
anulando, a cada contrato que fecho sinto-me tão
realizada que nem sei explicar. E pode ter certeza
que quando eu sentir que está pesado, eu vou pedir
ajuda, o senhor sabe que eu não sou orgulhosa. —
Ele me abraça e inalo seu cheiro tão reconfortante.
O fato de ter crescido sem mãe nos tornou
ainda mais próximos. Meu pai sempre foi o meu
melhor amigo, o meu confidente.
— Só quero te ver feliz, prometo que vou

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me controlar mais em relação ao trabalho, mas você


é a menina dos meus olhos, princesa. Nunca vou
deixar cem por cento de me preocupar com você ou
de querer sempre o melhor para a sua vida. —
Beijando a minha cabeça ele nos guia novamente
para fora de casa.
— Eu sei, pai. Eu te amo demais por se
preocupar tanto, mas realmente não precisa, ‘tá? Eu
juro que quando precisar de ajuda o senhor será o
primeiro a saber.
— Tenho tanto orgulho de você, filhota. —
Nos separamos ao chegar na varanda, ele segue
para perto da piscina e eu desvio meu caminho indo
até a Júlia.
O restante do dia até que transcorre de
forma amena. Graças aos céus nada mais foi dito
sobre minhas horas semanais de trabalho e minha
prima realmente não me devolveu o celular, checou

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a minha agenda e me passou as reuniões para as


quais eu teria que revisar contrato, mas também não
me deixou fazê-lo ainda hoje. Me acompanhou até
em casa e me seguiu o tempo todo até que eu me
deitasse para dormir. Isso tudo ainda mantendo
meu celular cativo.
Dormi espumando de raiva. Mas lá no
fundo do meu coração eu me sentia tão amada e
cuidada, ainda que em exagero, que isso não me
permitiu brigar demais com ela.
Essa minha família é uma piada.

Júlia está vestida impecavelmente em um


terninho rosa chá e saia lápis branca, o cabelo preso
em um rabo de cavalo alto e um ar profissional que
nunca imaginei ver nela. Sorrio orgulhosa para a
minha prima.
No caminho até a empresa ela dirige e me
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entrega uma pasta com os contratos da primeira


reunião.
— Eu não pude trabalhar ontem, mas a que
horas você organizou tudo isso aqui? — Há post-its
marcando os pontos a serem revisados que acredito,
ela pegou das anotações na minha agenda.
— Falou certo, você não pôde trabalhar. E
se acostume, agora você tem uma assistente
pessoal, acho até que vou deixar o lance da
faculdade de lado e ser apenas a sua assistente para
sempre. Estou gostando dessa coisa de mandar em
você.
Acabo rindo de suas palavras. Perco-me na
leitura e sem que eu perceba, ela já está
estacionando na vaga destinada a mim na garagem
da empresa.
— Vou buscar o seu café, vê se não se
perde até que eu volte.

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— Você está abusando da sorte, Jú. — Seu


sorriso se amplia, entro no elevador e ela segue
direto para a cafeteria que tem em frente ao prédio.
Quando me sento em minha cadeira solto
um longo suspiro. Júlia ter adiantado os pontos a
serem revisados e ter vindo dirigindo realmente me
poupou tempo. Ligo meu notebook e enquanto
espero que ele ganhe vida, checo mais uma vez a
agenda do dia. Só pela manhã tenho três reuniões, à
tarde preciso analisar os candidatos para as duas
vagas de estágio que abrimos todo ano para
Desenvolvedores de Softwares.
Júlia chega alguns minutos depois, quando
estou quase me levantando para seguir para a sala
de reuniões, um sorriso matreiro de quem andou
aprontando das suas, logo nas primeiras horas da
manhã, estampado em seu rosto. Entregando-me o
copo de isopor fumegante, pega a minha agenda

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sobre a mesa e me segue.


— Você deveria ter me falado antes que o
barista é um tremendo de um gostoso. Eu teria
vindo te auxiliar na empresa há eras, Ayla.
— Não acredito que logo no primeiro dia,
quer dizer, logo nas primeiras horas, você já estava
dando o bote!
— Deixa de drama, diferente de você eu sei
aproveitar as coisas boas da vida e isso inclui os
homens. — Entramos na sala e eu logo me sento na
cabeceira da mesa, Júlia puxa uma cadeira para
bem perto de mim e se senta também. — Diga o
que preciso fazer aqui.
Nunca tive um assistente por saber que era
perfeitamente capaz de dar conta de tudo sozinha,
então não tenho muita ideia do que pedir que faça.
— Só anote o que achar mais relevante.
Teremos três reuniões seguidas, depois do almoço
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eu preciso me reunir com o financeiro e com os


responsáveis pelos fornecimentos. — Vejo-a
rabiscar algumas coisas e assentir com a cabeça.
— Certo.
Bebo um gole do meu café e no mesmo
instante Hillary, a secretária da presidência, bate na
porta indicando que o pessoal do MedClin havia
chegado. Dou início a reunião e consigo que
assinem o contrato de compra do novo software
que vai modernizar a forma de marcação de
consultas e interação entre hospital/paciente.
Estávamos trabalhando nele há quase seis meses, é
um sistema onde os próprios pacientes podem
consultar seus atendimentos, bem como exames
médicos e prontuários, além de receber notificações
quando suas consultas/retornos forem marcados.
— Estamos muito satisfeitos com o trabalho
de vocês, Ayla. Trabalho com a Stewart há mais de

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trinta anos e nunca me decepcionei. Você tem feito


um trabalho incrível no lugar do seu pai. — Sinto-
me emocionada com o elogio do Sr. Barnes.
— Obrigada, Barnes, tento sempre o meu
melhor. — Ele sorri e fica de pé, sendo
acompanhado por seu advogado que, desde o
início, não tirou os olhos da minha prima.
— Ficaria feliz se aceitasse jantar lá em
casa qualquer dia desses, gostaria muito que
conhecesse meu filho mais velho... — A frase fica
no ar e eu respiro fundo sem saber como recusar
sem parecer grossa.
Não é o primeiro e tenho certeza que não
será o último dos nossos clientes mais antigos a
quererem me apresentar aos seus filhos.
— Sinto-me honrada com o convite, vou
dar uma analisada na minha agenda e te ligo. —
Tento sorrir, mas sei que é um sorriso engessado e

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muito falso. Se ele percebe não deixa transparecer.


— Esperarei ansioso. — Nos guio até a
porta e o velho Barnes aperta a minha mão em
despedida.
— Na verdade, você tem a noite de quinta
livre, Ayla. — Lanço para a minha querida prima
um olhar assassino. A filha da mãe sorri mostrando
todos os dentes. Fecho os olhos e conto até dez para
me acalmar.
Não funciona.
— Que maravilha! Vou falar com a
Francine e depois te envio um e-mail. — Meu
Deus, como vou me livrar dessa situação agora? A
alegria estampada no rosto do velho me aperta o
peito.
Não consigo verbalizar um pensamento
sequer, até porque a maioria dos que estão
rondando a minha mente no momento são
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assassinos e contém um dicionário inteiro com os


piores palavrões existentes destinados a cara de pau
ao meu lado. Ainda sorrindo como se tivesse
acabado de ganhar na loteria e não assinar um
contrato onde me pagará centenas de milhões,
Barnes se vai acompanhado de seu advogado.
Quando retorno para a sala de reuniões,
Júlia tem a audácia de falar:
— De nada, priminha. — Explodo.
— Você não tinha o direito de se meter na
minha vida desta forma, Júlia. Tomar conta da
minha agenda de trabalho é uma coisa e o seu
trabalho, me jogar para um encontro assim, foi
totalmente desrespeitoso! — Ela desvia os olhos do
meu rosto, ao menos tem a decência de parecer
arrependida. Mas isso não alivia em nada o que fez.
— Eu te amo, Jú, estou adorando mesmo a ideia de
tê-la trabalhando comigo, mas por favor, nunca

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mais faça isso. Da minha vida pessoal cuido eu.


Vejo-a abrir e fechar a boca algumas vezes,
mas antes que consiga falar algo, Hillary bate
novamente à porta anunciando a próxima reunião.
Respiro fundo e só consigo pensar que em
meio período de serviço, Júlia já me deixou com
vontade de estrangulá-la.

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Na quinta-feira eu estou uma pilha de


nervos. Tivemos problemas com dois fornecedores
o que desencadeou no cancelamento de nove
contratos, já que não recebemos os computadores
que precisávamos para que os nossos técnicos
pudessem trabalhar. Minha cabeça parece prestes a
explodir e eu ainda tenho um jantar com a família
Barnes.
Eu odeio a Júlia neste momento.

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Ao menos ela tem feito um trabalho incrível


administrando a minha agenda. Não se meteu mais
nos meus assuntos particulares, além é claro de
uma indireta aqui e outra ali que preciso de sexo e
essa é a causa do meu esresse, mas nada além, o
que tem sido um alívio, não sei se suportaria
alguma situação como a de segunda, ainda mais
hoje.
— Eu separei as fichas dos candidatos ao
estágio para que você possa analisar, Lally, as
entrevistas estão marcadas para segunda. —
Massageio a testa, minha cabeça latejando
insistentemente. — Quer que eu ligue para o senhor
Barnes e cancele o jantar? Estou me sentindo um
lixo por ter armado isso para você.
Suspiro. A encaro e vejo que seu semblante
realmente demonstra arrependimento.
Droga.

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— Não, tudo bem eu mesma cuido disso. —


Ela se aproxima e deixa a minha agenda sobre a
mesa antes de caminhar até o frigobar e pegar de lá
duas garrafinhas de iogurte de morango.
— Sério, deixa que eu faço, assumo que te
devo essa. — Abre uma das garrafinhas e me
estende, sentando-se na beirada da mesa. — Você
não está nada bem hoje, sei que foi um grande dia
de merda e não quero me sentir ainda pior sabendo
que eu podia muito aliviar essa encrenca na qual eu
mesma te meti. — Sorrio para ela e bebo um gole
do iogurte, percebendo só neste momento que não
como nada desde uma barrinha de cereal na hora do
almoço.
Já são quase sete da noite.
— Estou com uma crise de enxaqueca a
caminho, não foi mesmo um dia fácil. — Encosto a
garrafa gelada na testa e suspiro com o contato

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bem-vindo. Fecho os olhos sentindo a pressão na


cabeça aumentar.
— Vá para casa e descanse, deixa que eu
cuido do velho. E pode ficar tranquila que vou dar
um jeito de ele desistir de um retorno. — Júlia fica
de pé e ajeita a minha mesa, desliga meu notebook
e me incentiva a partir o quanto antes, estendendo a
minha bolsa.
— Obrigada, Jú.
— Não me agradeça, apenas fique bem. —
Lhe dou um beijo na testa e saio.
No percurso até em casa dirijo no
automático, quase nem prestando atenção
corretamente ao trânsito. Meus olhos se negam a
ficarem abertos e uma pressão na nuca tem me
deixado aflita. Odeio crises de enxaqueca.
Tomo um relaxante e escaldante banho de
banheira e preparo um chá, que bebo com gosto,
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junto com dois comprimidos para dor antes de me


deitar. Graças aos céus os remédios não tardam a
fazer efeito e logo apago.

Acordo sentindo a cabeça mais leve e isso


me faz soltar um longo suspiro de alívio. Sento-me
na cama e vejo em meu celular que são três da
madrugada. Há duas mensagens da Jú, uma diz que
o jantar foi cancelado com sucesso e a outra é de
apenas alguns minutos atrás, perguntando se eu
tinha melhorado. Respondo a essa última dizendo
que estou melhor e sigo para a cozinha, morta de
fome.
Preparo um lanche com presunto, queijo e
mostarda e me sirvo um copo de suco de maracujá.
Na primeira mordida fecho os olhos apreciando o
picante da mostarda. Céus, eu estava mesmo
precisando de comida!
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Enquanto saboreio o meu lanche, dou uma


rolada pelo feed do Instagram. Júlia depois do
trabalho ontem ainda teve pique para uma
baladinha, há várias fotos suas com alguns de seus
amigos e uma com um cara que pela forma que a
está abraçando pela cintura e encarando seu rosto
com puro desejo nos olhos, aposto, está em sua
cama neste momento.
Admiro a sua disposição.
Após ficar entediada com as vidas perfeitas
das redes sociais, preparo um segundo lanche e me
sinto um pouco perdida. Uma leve sensação de: o
que tenho feito da minha vida? bate como um tapa
na cara. Acho que a foto da Júlia somada a todas as
vezes que tem pegado no meu pé ultimamente para
que eu saia mais, está começando a afetar meu
subconsciente e agora mesmo que eu não queira ele
está me recriminando.

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Enquanto mastigo meu terceiro lanche, meu


subconsciente agora me recriminando por estar
comendo tanto em plena madrugada, as palavras de
Júlia de algumas semanas atrás voltam como se o
destino as estivesse surrando ao pé do meu ouvido.
Chego a estremecer com o tanto que a situação me
parece fora do comum. E quando dou por mim, já
estou no playstore digitando: Speed Sex.
Desligo a parte racional do meu cérebro que
grita que estou sendo louca e precipitada e me
apego a sensação gostosa que borbulha sob a minha
pele por estar fazendo algo que eu, normalmente,
não faria. Me cadastro, obviamente oferecendo
informações falsas, apenas meu e-mail é
verdadeiro. Caramba, o negócio pede até os
documentos pessoais! Ao constatar tal fato, repenso
se me cadastro ou não, afinal, terei que fornecer
minhas informações verdadeiras. Que meleca.

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Meu dedo desliza pela tela e meus


pensamentos vagueiam. Que mal pode haver?
Consigo ouvir a voz de Júlia bradando:
Vamos lá, Lally, é só sexo, Deus bem sabe o quanto
você anda precisando de um pouco disso!
Revirando os olhos para os meus
pensamentos dou de ombros e volto ao início do
cadastro, agora oferecendo todos os meus dados
reais. Quando finalizo, vejo que são quase cinco
horas e decido deixar para explorar o app depois.
Logo é hora de levantar para mais um dia de
trabalho.
Me deito rezando para que a sexta não siga
o exemplo do dia anterior, senão vou ficar maluca.

A sexta não foi muito diferente da quinta.


As três da tarde já estou com a cabeça prestes a
explodir e a paciência inexistente. Samuel, gerente
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da contabilidade, entra na minha sala e pela sua


expressão sei que a tendência é piorar meu bom
humor. Ele tinha pedido há algumas horas uma
reunião urgente comigo.
— Ayla, as notícias não são nada boas e
sinto muito em despejar tudo assim, ainda mais
depois do dia que teve ontem. — Encaro-o
inexpressiva, sem forças até para demonstrar o
quanto estou puta da vida com essa semana
infernal. Percebendo minha animosidade ele logo
retoma a fala: — Há alguns meses percebi uma
discrepância nos valores de notas e valores que
realmente nos eram cobrados no setor de compras,
eram coisas poucas, não chegava a quinhentos
dólares por fatura. — Massageio as têmporas, isso
tem se tornado um maldito hábito, vejo os ombros
de Samuel encolher antes de prosseguir. — Só que
com a minha desconfiança, cavei mais a fundo e
somando tudo, descobri um rombo de quase três
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milhões. Essas pequenas diferenças de valores vêm


acontecendo há mais de quatro anos e como as
nossas compras sempre são em grandes
quantidades e feitas toda semana, ajudou para que
os roubos nunca fossem notados porque, como eu
disse, eram valores baixos. — Ele se cala,
esperando que eu reaja. O problema é que no
momento não tenho palavras para responder.
Não tenho ânimo para nada. Tudo o que eu
mais queria depois de ontem e o belo dia de merda
que tive hoje, era deitar em posição fetal e chorar
até segunda-feira. Como meu pai conseguiu lidar
com a presidência por mais de trinta anos? Desde
que assumi, essa é a primeira vez que enfrento
situações deste tipo e me sinto exausta.
— Já descobriu a origem desses desvios? —
questiono, tentando retomar a postura sem deixar a
peteca cair. Se for para desistir, desisto em casa,

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longe dos olhos dos outros e só pelo tempo


suficiente de colocar a cabeça no lugar.
— Estou quase. A pessoa é boa, consegui
rastrear duas contas, mas são contas laranjas e
ainda não tive um retorno de um amigo que faz uns
serviços por fora e está me ajudando. — Ele quis
dizer um hacker, mas obviamente isso é ilegal e
seria descartado caso conseguíssemos pegar o filho
da puta que tem nos roubado.
— Certo, obrigada por me manter
informada, Samuel. Qualquer novidade que surgir
não tarde em me procurar, seja o dia ou hora que
for, ok?
— Claro, Ayla, pode ficar tranquila que vou
descobrir quem é. Aqui, esses são os comparativos
que fiz com as faturas fraudadas e as corretas. —
Estende-me uma pasta grossa que me faz ter
vontade de chorar, pois me conheço o suficiente

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para saber que meu subconsciente não me deixará


dormir em paz enquanto não analisar cada
documento contido ali.
— Obrigada mais uma vez.
O homem se levanta e sai. Eu respiro fundo
e uma lágrima rola, a enxugo rápido e encaro o teto
pedindo a Deus que me dê paciência.
— Lally? — A voz de Júlia perfura minha
névoa de autopiedade. Levanto a cabeça e seus
olhos transmitem a mesma expressão de Samuel,
mas na sua frente me deixo desabar e grossas
lágrimas descem. Ela corre ao meu encontro depois
de trancar a porta. — Meu Deus, prima, o que foi?
Abraço sua cintura e deito a cabeça em sua
barriga, sentindo-me como quando era criança e ela
sempre me acolhia desta forma quando eu tinha
pesadelos. Júlia será uma mãe tão incrível...
— Eu acho que eu só não estava preparada
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para as turbulências da vida de uma CEO, tinha


sido tudo tão maravilhoso até aqui, mas essa
semana as coisas começaram a desandar e me sinto
tão sem esperança de que voltem aos eixos.
— Nah, você é incrível e sabe disso.
Segunda-feira você já estará recuperada desse
baque e vai dar a volta por cima de salto quinze. —
Acabo rindo de suas palavras, as lágrimas indo
embora com a energia boa que só essa maluquinha
consegue emanar. — Só que as surpresas
desagradáveis de hoje ainda não acabaram...
O tom de pesar em sua voz é nítido. Respiro
fundo.
— Cospe logo.
— Hoje você tem aquele jantar beneficente
para arrecadações de fundos para o orfanato...
Droga. Tinha me esquecido completamente
que era hoje! Kate é uma amiga dos tempos da
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faculdade que abriu um orfanato e faz um lindo


trabalho naquele lugar, prometi a ela que ia
aparecer neste evento para dar uma força e não
posso faltar. Um gemido misturado a uma lamúria
escapa dos meus lábios e fecho os olhos.
— Sabe o que ia ajudar muito a fechar este
dia de cão de forma incrível? — Tenho medo de
perguntar o que. Mas acho que nada pode ser tão
ruim que seja pior do que tudo que passei nas
últimas quase quarenta e oito horas. — Um
acompanhante bem gostoso para te alegrar durante
o jantar e depois dele...
Suas sobrancelhas sobem e descem em uma
sugestão descarada de que tipo de alegria está se
referindo. E por um momento penso que ela pode
estar certa.
— Eu te ajudo a selecionar um cara bem
bacana, culto, de preferência, já que você é toda

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cheia de mimimi, mas que também seja bem


gostoso, que aí se você decidir enfiar de vez o pé na
jaca, pode estender a noite e pagar por uma noite
com final feliz.
Não acredito que cheguei ao ponto cogitar a
ideia de pagar por algo como sexo. Acho que perdi
mesmo o controle da minha vida...
— Vamos, você é a chefe e pode encerrar o
expediente mais cedo, ainda mais depois de tudo
que passou. Vou te ajudar a escolher uma roupa
maravilhosa e enquanto se arruma, te ajudo a achar
o homem perfeito para tirar a sua pose de CEO. —
Reviro os olhos, mas fico de pé, pego a minha
bolsa e a sigo para fora da sala. — Mas você
precisa me prometer, Ayla, que se decidir transar
com o cara, vai trepar até não sentir mais as pernas.
Vai ver como isso vai te ajudar a extravasar toda
essa merda de ontem e hoje.

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Penso em ignorar suas palavras, mas elas


impregnam em meu cérebro e uma vozinha irritante
dentro da minha cabeça sussurra que ela pode estar
certa. Liberar endorfina certamente mal não irá
fazer.
— Eu prometo. — Até eu me surpreendo
com o quanto soo sincera.

— Loiro, olhos verdes, 1,80m de altura,


amante de artes e adora surfar. — Reviro os olhos
para a descrição que Júlia lê como também para a
foto do Johnny Bravo que ela me mostra. Sério,
falta muito pouco para que o topete do dito cujo
seja maior que o do personagem dos desenhos
animados.
Já estou quase pronta e sem esperança de
que iremos encontrar alguém para me acompanhar
a este evento. Toda essa ansiedade é totalmente
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nova para mim e não gosto muito de como ela me


faz sentir.
Perdi a conta de quantos caras ela já
descartou o perfil, são todos como este último,
genérico demais e não deixa nenhuma dúvida de
que é furada. Essa coisa de escolher o “cara certo”
por um aplicativo é mais difícil do que pensei.
Cara certo, acabo rindo da minha escolha de
palavras. Certo para uma noite, pronto, assim é bem
melhor.
Termino de aplicar a segunda camada de
rímel e me dou uma boa olhada no espelho. Meus
olhos cor de mel foram destacados por uma sombra
esfumada dourado com preto, o batom rosa bebê
faz meus lábios parecerem mais cheios, as duas
camadas de rímel conferiram volume aos meus
cílios e, modéstia à parte, estou parecendo uma
boneca. Meu vestido é longo e vermelho, tem uma

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alça só e uma abertura na perna esquerda que


começa bem na altura do meio da coxa.
— Senhoooor. — A louca se abana e me
encara com os olhos arregalados, me sento ao seu
lado na cama. — Pega só esse: Moreno, 1,89m de
altura, olhos verdes, estudante universitário, seus
hobbies são ler nas horas vagas e correr. — Quando
ela vira o aparelho para mim, perco o ar.
Ele não é forte, tipo aqueles ratos de
academia, mas o abdome é todo repartido em
gominhos e já consigo me imaginar raspando as
unhas por cada um deles... ele também usa um
topete, mas o seu é bem menor que o do Johnny e é
castanho aloirado. O sorriso que ele exibe na foto
possui mil e uma promessas e me arranca um
suspiro. Ele é alto, exatamente da forma que eu
gosto.
— Parece perfeito demais para ser verdade

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— comento o que realmente penso. Não é possível


que este cara seja um acompanhante. Lindo de
morrer deste jeito poderia ter o emprego que
quisesse, ainda mais sendo um estudante.
— Pode ser que seja um pouco menos
perfeito do que nas fotos, mas ainda é o melhor de
todos que vimos até agora. — Ela rola a tela para o
lado e outra foto aparece, nessa ele está de sunga
branca e minha Nossa Senhora, o volume que
brinca dentro daquele pedaço de pano é de deixar
qualquer um quente de tesão. — Se você não o
quiser, eu mesma vou marcar um encontro com ele.
— Júlia sussurra, a voz quase não saindo de tão
fascinada que ela está no belo volume do cara.
— Vê se ele está disponível para hoje então.
— Tento parecer casual, mas por dentro estou com
todos os dedos cruzados para que esteja. A
ansiedade me fazendo suar um pouquinho.

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Toda essa situação só deixa ainda mais


claro que eu realmente tenho negligenciado a
minha parte social, em especial minhas partes
femininas. Espero conseguir mudar este hábito a
partir de agora porque apesar de essa ansiedade ser
chata, me causa um friozinho na barriga de
expectativa que eu não sentia há eras.
— Ai. Meu. Deus! Você nasceu mesmo
com essa sua bunda maravilhosa virada para a lua,
ele acabou de ter um encontro cancelado e pode te
encontrar na porta do Orfanato em meia hora!
Sinto meu coração bater acelerado. Fico de
pé e calço as sandálias Christian Louboutin preta
com um lindo laço pendendo no calcanhar, ela tem
apenas uma tira fina para segurar os dedos na frente
e combina perfeitamente com o meu vestido.
— Que tipo de pacote você fechou, Jú? —
Por que diabos a minha voz está trêmula? Pego a

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clutch que faz par com as sandálias e me preparo


para sair do quarto.
— Hey, relaxa. Vai dar tudo certo, é só um
encontro. Eu fechei o pacote para acompanhante de
evento, com possível final feliz. — Sério que é esse
o nome que dão hoje em dia? Mais cedo quando ela
citou essas palavras pensei que fosse só uma forma
sua de desenhar a coisa toda, mas agora parece que
é real. — Ele vai estar de terno branco e com uma
rosa vermelha no bolso do paletó. Já passei o
endereço do orfanato e o nome dele é Damien.
Caramba, até o nome dele soa sexy para
caramba!
— Deseje-me sorte — brinco beijando sua
bochecha antes de caminhar até a porta.
— Sorte uma ova, te desejo orgasmos
múltiplos, é disso que você ‘tá precisando, sorte
você já tem de sobra — zomba, batendo na minha

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bunda quando passo por ela.


— Vê se tranca a minha casa direito antes
de sair. — Destravo o alarme do carro e coloco a
pequena bolsa no banco do passageiro. — Volta
para cá depois da sua noitada? — questiono já que
ela também tem seus compromissos para hoje.
— Obviamente, acha que vou te deixar
escapar de um extenso interrogatório depois dessa
noite?
— Idiota.
— Ah, antes que eu me esqueça, reservei a
suíte presidencial do Royal Palace, só por
precaução. — Meus olhos arregalam
automaticamente. — E coloquei algumas
camisinhas nessa sua bolsa. Eu sou incrível, eu sei,
me agradeça depois.
— Eu te amo, Jú. — Sopro um beijo para
ela, que me envia outro. O desejo de convidá-la
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para vir morar comigo de uma vez, crescendo no


meu peito. Resolvo deixar para fazer o convite
quando voltar e estivermos jogadas no tapete da
sala comendo besteiras, enquanto derramo todos os
detalhes do encontro para ela.
Entro no carro e dou partida, o coração
seguindo o ritmo do motor e acelerando mais a
cada quilômetro percorrido.
Só espero não ter um infarto antes mesmo
de chegar ao local!

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O manobrista de sorriso gentil pega a chave


da minha mão antes que ela caia, de tão suadas que
elas estão, e sorri para mim.
— Tenha um excelente jantar, senhora. —
Sorrio de volta em agradecimento ao pegar o ticket
que ele me estende e caminho até a entrada do
orfanato.
Minhas pernas ficam bambas quando o
vejo. Ele está de costas, o terno branco abraçando

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de forma perfeita seu tronco, a bunda mostrando-se


deliciosa dentro daquela bendita calça social.
Nunca tinha visto um homem vestir tão bem, e
deliciosamente, um terno desta forma. E olha que
convivo com homens de terno desde que nasci.
Acho que o barulho dos meus saltos na
calçada chama a sua atenção e ele se vira. Acabo
prendendo a respiração quando nossos olhares se
encontram, suas íris cristalinas são intensas e me
arrepia inteira. Ele me mede de cima a baixo, não
fico para trás e retribuo a conferida.
— Você deve ser a Ayla. — Sua voz grossa
e rouca faz uma onda de desejo se alastrar pelo meu
corpo, concentrando-se principalmente no meu
baixo ventre.
— Si-sim — pigarreio para limpar a
garganta, sentindo-me patética por gaguejar logo
nos primeiros minutos de contato. — E você, o

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Damien.
O sorriso que ele abre... quase perco o
equilíbrio.
— É um imenso prazer conhecê-la, Ayla. —
Se aproximando lentamente uma das suas mãos se
apossa da minha cintura enquanto a outra segura
meu queixo e levanta meu rosto para que fiquemos
olhos nos olhos, sua boca então desce e salpica um
selinho nos meus lábios.
Permaneço estática, desejando que sua
língua entre na brincadeira e que ele aproxime
ainda mais nossos corpos, mas Damien se afasta.
Solto um gemido meio bufado e ele sorri
percebendo meu descontento.
— A noite é uma criança, meu anjo. — A
forma que sua voz acaricia as palavras faz com que
um bando de borboletas excitadas se agite no meu
estômago.

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Acomodando meu braço na curva do seu,


ele nos guia para a entrada.
— Qual o protocolo para a noite? — Do que
ele está falando? Nunca paguei por um encontro e
não tenho a menor ideia de como essas coisas
funcionam. Eu deveria ter pesquisado mais sobre
isso! Notando a minha confusão, ele emenda: —
Somos namorados, amigos, parceiros de trabalho?
Qual é o papel que preciso desempenhar para você?
As palavras desempenhar para você fazem
a minha mente viajar para cenários que em nada
tem a ver com o jantar.
— Gosto de como a sua mente pensa, mas
aposto que ficaria decepcionada se pulássemos esse
jantar. Tem cara de ser importante — sussurra, a
boca bem próxima ao meu ouvido. — E eu
prometo, Ayla, que farei cada minuto de espera
valer totalmente a pena quando sairmos daqui.

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Não me incomoda em nada o fato de ele


achar que o tal “final feliz” já está garantido, pelo
contrário, faz meu interior se revirar ainda mais de
ansiedade. Esboço meu melhor sorriso, tentando
transparecer que nem estou pensando tanto assim
no final da noite e entramos no salão de festas do
orfanato.
Sorrio, desta vez de verdade, ao encontrar
Kate na recepção com a filha, Zoe, ao seu lado. A
pequena vem correndo em nossa direção e abraça
as minhas pernas.
— Tia Ayla! — Me abaixo sobre os saltos
para ficar da sua altura e beijo sua bochecha.
— Oi, lindinha, eu estava com saudades. —
Seu sorriso amplia e ela abraça o meu pescoço.
— Eu também tava, você não foi mais lá
em casa para a gente brincar — reclama, colocando
as duas mãozinhas na cintura. Fico de pé e beijo a

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sua testa.
— Prometo que vou em breve, ‘tá? — Zoe
agora encara o homem ao meu lado e só neste
momento me lembro que fiquei tão mergulhada na
luxúria que não respondi de qual forma nós o
apresentaríamos.
— Que bom que veio, Ayla. — Kate se
aproxima e me abraça, em seguida cochicha no
meu ouvido: — Por que não me falou que estava
namorando?
Enrijeço, será que seria melhor mesmo
apresentá-lo como namorado? De qualquer forma
que o apresentar sei que amanhã seremos notícia
em vários jornais e revistas de fofoca, já que o povo
adora esse tipo de matéria.
Quando o encaro, ele pisca e abre um
enorme sorriso que mina qualquer pensamento
coerente.

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— Então, com a correria do dia-a-dia


acabou que não surgiu a oportunidade. — Já que
entrei nessa, então que seja por completo e de uma
forma que não vá me fazer parecer uma completa
vadia. O sorriso dele se amplia ainda mais e meu
coração erra algumas batidas. — Esse é o Damien
meu namorado, Damien essa é a Kate, minha amiga
e diretora do orfanato.
Eu os apresento quando ela se afasta,
galante ele beija o dorso da mão dela e depois
abraça a minha cintura, colando meu corpo ao seu.
— É um prazer conhecê-la, Kate. Ayla fala
muito sobre você, estava curioso para conhecer a
mulher de coração enorme a quem tanto a minha
namorada admira. — Esse cara é bom! Tento não
parecer tão surpresa pela sua habilidade em
inventar histórias.
As bochechas dela ficam rosadas, Kate

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realmente tem um coração enorme e eu a admiro


mesmo, mas sempre que recebe um elogio pelo seu
trabalho no orfanato, fica envergonhada.
— Entrem e fiquem à vontade, e mais uma
vez obrigada por terem vindo.
Entramos e sigo direto para a mesa que
havia sido reservado para mim. Fico surpresa
quando Damien puxa a cadeira para que eu me
sente.
— Estou muito ansioso para saber mais
sobre você — sussurra antes de beijar o canto da
minha boca e se sentar na cadeira ao meu lado.
Coloco minha bolsa sobre a mesa e me recosto.
Sou salva de dar início a conversa quando
um garçom se aproxima e nos serve bebidas. Como
estou dirigindo peço apenas uma água com gás.
— O mesmo que o dela, por favor — pede.
— Pode beber se quiser.
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— De forma alguma, meu anjo, quero estar


completamente sóbrio para curtir cada momento
desta noite ao seu lado. — Sem que eu possa me
controlar, um suspiro me escapa. Céus, esse
homem tem que ter algum defeito não é possível!
— Me fale sobre você, Ayla. Trabalha com o que?
— Gerencio a empresa da família.
— Isso é maravilhoso. — Seu tom é sincero
e isso é tocante, já que nem sequer nos conhecemos
de verdade. Há um certo brilho de admiração nos
seus olhos que me derrete. — E no tempo livre, o
que gosta de fazer?
Rio sem humor algum.
— Não sei o que é tempo livre há pelo
menos dois anos. Esta noite está sendo a primeira
com algumas horas ociosas desde que consigo me
lembrar. — Um de seus braços procuram apoio nas
costas da minha cadeira e espalma a mão no meu

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ombro nu, o dedão acariciando delicadamente a


pele exposta. — E você, estuda o que? — Viro a
conversa para ele, tentando não ronronar como uma
gatinha manhosa com o contato quente da sua pele
contra a minha.
— Sou formado em Ciências da
Computação, agora estou fazendo pós. — Não digo
que a minha empresa é deste ramo, acho que seria
informações demais, mas a coincidência não me
passa despercebida... — Pergunte, princesa, posso
ver a curiosidade brilhando nos seus olhos e a
pergunta gritando nos seus pensamentos.
A vergonha me domina e seguro o impulso
de esconder o rosto com as mãos. Sua mão no meu
ombro o aperta, deixando claro que a minha
curiosidade não o incomoda. Damien abaixa o rosto
e salpica um beijo no outro ombro.
— Pergunte, Ayla — sussurra, sua voz

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ganhando mais um pouco de rouquidão que envia


uma fisgada direta ao meu ventre. O fato de ele
prender o lóbulo da minha orelha entre os dentes
não ajuda em manter a minha mente sã. Pigarreio.
— Não é da minha conta. Acredito que seja
bem comum suas... clientes sentirem essa
curiosidade, mas porque acompanhante? — Forço
as palavras a saírem. E ainda que eu realmente
esteja me corroendo por dentro, ele não precisa de
fato, me contar sua escolha de trabalho.
— Eu preciso do dinheiro. — A
determinação em seu tom me espanta. — Ser
acompanhante me ajuda a pagar as despesas
médicas do meu pai. E não, eu não vou para a cama
com todas as minhas clientes. — Não deixo de
notar que ele frisa a palavra cliente, com certeza
por causa do meu desconforto em proferi-la. — A
maioria só quer um acompanhante para eventos,

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jantares, leilões. Ou até mesmo só para ouvi-las o


que acredite em mim, acontece muito mais do que
procura por sexo em si.
Suas palavras me deixam surpresa. Pela
forma que Júlia tinha descrito o aplicativo, eu
jurava que ali só vendia sexo, depois que baixei e
fiz o meu cadastro não tive tempo de saber
exatamente como tudo funciona, mas agora
percebo, mais uma vez que a exagerada tinha
focado somente na parte do aplicativo que mais a
interessa. Isso é bem a cara dela!
— Vejo que você é recente na plataforma.
— Não nego, sei que é mais do que evidente minha
total falta de conhecimento. — Lá nós temos várias
categorias, há quem quer ser contratado apenas
para sexo, mas há também pessoas como eu, mais
focadas em eventos e eventualmente topa uma noite
com final feliz. — Uma risada acaba me escapando,

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suas sobrancelhas se erguem.


— Esse negócio de final feliz é muito bobo.
A forma como soa não parece em nada com algo
relacionado a sexo. — Confesso a verdade. Assisto
suas íris ganharem um brilho de excitação que faz
com que eu me remexa na cadeira. Sua boca se
aproxima mais uma vez do meu ouvido.
— Vou te fazer mudar de ideia esta noite,
princesa. Verá que final feliz faz todo o sentido
quando eu te fizer gozar na minha língua. — Seus
dentes resvalam no meu pescoço e eu prendo o ar.
— Depois, te colocar de quatro sobre a cama e
entrar em você tão vagarosamente que vai pedir por
favor, para eu te deixar gozar de novo. — Me
remexo mais uma vez, buscando algum tipo de
alívio que não vem. — Aposto que a sua calcinha
está ensopada neste instante.
Com uma ousadia que nunca tive antes, me

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inclino para ele e sopro as palavras no seu ouvido:


— Estaria se eu estivesse usando uma. —
Um rosnado animalesco brota do fundo do seu
peito e suas mãos me puxam para mais perto. A
mão livre procurando abrigo na minha coxa,
subindo um pouco mais, fazendo-me prender o
fôlego.
— O que acha de eu começar agora mesmo
a te mostrar o caminho para o final feliz, lá no
banheiro?
— Proposta tentadora, mas não dá. O jantar
já vai ser servido. — Damien morde meu ombro,
um muxoxo descontente saindo da sua boca.
— Até o final desta noite vou ficar maluco
só pensando em você sem calcinha, Ayla. Você é
má.
Rio de sua desolação. A forma tão
espontânea que estamos interagindo tem me
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surpreendido, afinal, só sabemos os nomes um do


outro, mas também tem me deixado completamente
excitada. E, novamente preciso dar créditos a Júlia,
uma noite sem preocupação e, se Deus quiser, sexo
era realmente do que eu estava precisando.

Minha barriga está doendo de tanto rir.


Damien é um cara extremamente divertido e tem
um ótimo papo.
O jantar estava maravilhoso, teve algumas
apresentações artísticas como em todos estes tipos
de eventos e a maioria das pessoas já fizeram as
suas doações e aos poucos estão indo embora. A
sobremesa está para ser servida e a expectativa do
que virá a seguir começa a me deixar quente de
novo.
— É sério, eu era uma criança muito
atentada. — Continua, alheio aos meus
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pensamentos pecaminosos sobre ele. — Não tinha


uma única vez que íamos ao shopping e meu nome
não tinha que ser anunciado nos alto-falantes
porque eu fugia dos meus pais e ficava escondido
nos provadores de lojas femininas, espiando as
mulheres.
Meu Deus!
— Você era terrível! — Sua habilidade em
manter a conversa sempre leve me impressiona.
Acho que é algo que o ajuda no trabalho.
— Era sim. — Terminando sua taça de
champanhe, acabei convencendo-o a tomar uma,
mas ele só aceitou se nós a dividíssemos, Damien
se inclina para mim.
— Vai querer esperar a sobremesa ou já
vamos embora e pedimos algo no quarto? — Meu
corpo inteiro arrepia com a promessa velada em sua
voz.

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— Acho que já podemos ir. — Ele sussurra


um: graças a Deus baixinho que me arranca mais
uma risada. Ficando de pé, Damien pega a minha
bolsa sobre a mesa e depois espera que eu também
me levante, sua mão espalmada em minhas costas
me conduz para fora do salão.
— Só vou me despedir da Kate, se quiser já
ir pedindo o meu carro... — Tiro o ticket do
estacionamento da bolsa e entrego para ele.
— Não demora, princesa, por favor. —
Puxando-me para dentro dos seus braços, sua boca
pressiona a minha, quando penso que desta vez vai
aprofundar o contato, ele se afasta. Um sorriso
safado esticando seus lábios.
Maldito filho da mãe.
Quase mudo de ideia e sigo atrás dele para a
rua, mas me obrigo a ir de encontro a Kate, que está
toda sorridente ao lado de um homem que não

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conheço, mas que me parece familiar.


— Amiga, já estou indo. O jantar estava
maravilhoso. — A abraço e desta vez, eu quem
sussurro: — Não me disse que estava namorando,
sua safada!
Abafando uma risada, ela me encara.
— Não estou, é... complicado... mas
obrigada por ter vindo, aparece lá em casa qualquer
dia desses para a gente colocar o papo em dia.
Temos muitas coisas para conversar!
— Prometo que vou me organizar e ir o
quanto antes. — Beijo seu rosto e me afasto. — Por
falar nisso, aquele programa que a gente tinha
comentado, para auxiliar nos estudos das crianças,
precisamos dar andamento à ideia. Vou ver como
está a minha agenda e marcar um café para que
possamos discutir melhor.
Seu sorriso aumenta ainda mais à menção
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do projeto que estávamos estudando.


— Ainda nem sei como agradecer, Ayla.
Significa muito para mim essa ajuda que está dando
às crianças. — Seus olhos se enchem de lágrimas.
— Imagina, não há pelo que agradecer.
Sabe que o quanto eu puder fazer, farei. E vê se não
hesita em me pedir ajuda, eim?
— Pode deixar. Mais uma vez, muito
obrigada e até breve.
— Até!
Ao chegar na porta do salão e ver Damien
sentado do banco do motorista do meu carro, uma
explosão de sensações se espalham pelo meu corpo
e acabo pensando que não vou conseguir esperar
até chegarmos ao hotel.

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Quando me sento no banco do passageiro


Damien me encara surpreso.
— Não vou dirigir o seu carro, Ayla, só o
trouxe até aqui para que não precisasse andar tanto
com esses saltos.
— Qual o problema em você dirigir? —
questiono ao perceber que ele parece mesmo
contrariado com este pequeno fato. Encolhendo os
ombros, esclarece:

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— Você é a cliente, o poder desta noite está


todo em suas mãos. Você quem conduz. Você
quem está pagando para que eu atenda aos seus
desejos. — As palavras finais saem baixas e elas
me incomodam. Pela primeira vez desde que aceitei
este encontro não me parece certo pagar por ele,
tendo em vista o quanto me diverti até agora.
— Podemos trocar se quiser, mas quero
deixar claro que não me incomoda você dirigir, não
te vejo como alguém que estou apenas pagando
para sair comigo. — Quando suas palavras se
repetem na minha mente, uma pontada de dor me
faz encolher ao perceber o que ele realmente quis
dizer com elas: eu sou só mais uma.
No que diabos eu estava pensando quando
me deixei levar por todo aquele papo bacana dele?
Aquele sempre foi o seu papel: me divertir, se
passar por meu namorado e fazer por merecer o

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dinheiro que receberá no final da noite. Passei tanto


tempo negligenciando minha parte mulher que
acabei ficando encantada por um garoto de
programa, esquecendo totalmente que cada gesto de
carinho nada mais era que ele fazendo a porcaria do
seu trabalho.
Irritada, mais comigo mesma do que com
qualquer outra coisa, decido fazer valer a pena cada
centavo que lhe entregarei quando esta noite
terminar.
— O meu desejo é que dirija o meu carro e
nos leve para o Royal.
— Ayla...
— Estou te pagando para isso, Damien, não
me faça arrepender por tê-lo escolhido dentre tantas
outras opções que eu tinha no aplicativo. —
Balançando a cabeça em negação, ele arranca com
o carro.

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Babaca filho da puta.


Nenhum de nós fala mais nada enquanto ele
nos leva para o hotel. Pego meu celular dentro da
bolsa e por nervosismo começo a checar o meu e-
mail. Não consigo conter uma risada quando vejo
um de Júlia, enviado há uma hora:
Saia do celular, sua vaca. Tem um
homem delicioso ao seu lado, que aposto, está
doido para entrar na sua calcinha. Então largue
essa porcaria e vai transar!
Não respondo e quando levanto a cabeça,
vejo que Damien está me encarando. O ignoro e
continuo olhando os e-mails até que ele estacione
na garagem subterrânea do hotel. Quando seguimos
para o elevador, ele se recosta contra a parede
metálica e me puxa para o seu peito, não me afasto,
pelo contrário, me apoio contra ele. Sua cabeça
procura abrigo no meu pescoço e a boca não tarda

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em se abrir ali, beijando e provocando. Acabo


gemendo ao toque da sua língua.
Minha raiva esmorecendo. Sendo
totalmente substituída pelo tesão.
O elevador para na recepção e descemos,
ele ainda mantendo-me entre seus braços. Com
pressa, ofereço a minha identificação e recebo o
cartão chave do quarto, ouço a risadinha de Damien
quando praticamente corro de volta para o
elevador.
Ainda sem dizer uma palavra sequer, seus
olhos encontram os meus, um brilho predador
dominando as suas íris esverdeadas e aumentando
meu desejo. Com dois passos largos seu corpo me
prensa contra o elevador e a boca amassa a minha
com fúria. Sua língua entra bruta em contato com a
minha, as mãos seguram a minha bunda, deixando-
me bem colada na maciça ereção que se esfrega em

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meu ventre. Chegando no nosso andar, Damien


impulsiona meu corpo para cima e enrolo as pernas
em seu quadril.
— Você está me enlouquecendo, Ayla. —
Algo em seu tom me diz que ele não está falando
apenas sobre sexo. Mas calo meus pensamentos e
rebolo contra seu membro.
Com uma rápida olhada para os dois lados
do corredor, ele confirma qual a direção que nos
levará ao nosso quarto e segue para ela a passos
apressados. Assim que a porta fecha atrás de nós,
desço dos seus braços e tateio as minhas costas em
busca do zíper do vestido.
— Vamos logo, Damien, tire a sua roupa,
não tenho a noite toda para ficar perdendo tempo
aqui. — Tiro a peça e a dobro com cuidado antes
de depositá-la no encosto do sofá. Como não estou
nem de calcinha e nem de sutiã, viro-me para ele

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apenas com os saltos. Suas pupilas estão dilatadas e


os olhos percorrem cada centímetro do meu corpo.
— Não é para ficar parado me encarando
que estou pagando você, se não vai fazer o serviço,
fala logo que procuro outro que o faça — provoco,
tentando ignorar todos os seus gestos cuidadosos,
pego o celular dentro da bolsa e em uma passada
ele o toma da minha mão, jogando-o no sofá antes
de me debruçar sobre o móvel e beijar a minha
boca.
Uma de suas mãos se infiltra em nosso meio
e desce certeira até o meu clitóris, dedilhando-o
com tamanha maestria que gozo tão logo ele
começa. A vergonha por não ter aguentado nem
cinco minutos me assola e continuo de olhos
fechados mesmo quando Damien para de me beijar.
Quando ele não fala nada e sinto o vento frio no
meu corpo pela ausência do seu sobre mim, eu os

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abro e o encontro tirando as próprias roupas.


No momento em que a última peça sai de
jogo, Damien toma o pau entre os dedos e me
encara profundamente ao se masturbar. Minha
vagina se contrai em expectativa, seus olhos
brilham e com uma piscadela indecente, ele se
ajoelha aos pés do sofá e puxa meu quadril,
escancara as minhas pernas e dois de seus dedos
voltam para dentro de mim, torcendo e
pressionando aquele pontinho delicioso lá no
fundo, fazendo-me perder os sentidos, sua boca
devora a minha com fome. Quando estou quase
gozando novamente, ele para, mas antes que eu
proteste, se estica até a calça jogada no chão e tira
da carteira uma camisinha.
Assisto, com água na boca, ele desenrolar o
preservativo, a cabeça redonda e rosada pedindo
pela minha língua. Contenho o ímpeto de chupá-lo,

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depois de ter sido um babaca mais cedo perdeu o


direito de ganhar um delicioso boquete. Sei que
isso não tem lógica, ele só estava sendo
profissional, mas meu lado vingativo revira os
olhos para a lógica.
Ainda sem que uma palavra sequer seja dita
entre nós, Damien se aproxima e me levanta, vira-
me de costas e apoia a minha barriga contra o
encosto do sofá, usa as mãos para afastar minhas
pernas e me penetra de uma só vez. Grito alto com
a invasão abrupta, me agarro ao tecido macio e me
deixo levar pela sensação de ser fodida por este
cara.
Céus, nem tinha me dado conta do quanto
eu realmente sentia falta disso!
Sincronizo algumas reboladas com as suas
investidas e logo suas mãos tomam meus seios, os
dedos beliscando os mamilos e aumentando o meu

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tesão. Acelerando ainda mais o ritmo, sua boca


morde meu ombro e eu gozo longa e
deliciosamente, abafando a intensa vontade de
gritar o seu nome, cravando os dentes no encosto
do sofá. Nunca lhe daria essa satisfação.
Ainda estou tentando adaptar a visão pós-
orgasmo quando seu dedo molhado encontra meu
clitóris e eu me perco mais uma vez, desfalecendo-
me debaixo de suas estocadas, uma de suas mãos
espalmam na minha lombar, fazendo-me inclinar
ainda mais a bunda para cima. Aumentando o ritmo
e profundidade das estocadas, sinto-o pulsar
anunciando seu gozo, com um rosnado, ele sai de
dentro de mim e vejo-o acariciar-se até que goze
dentro da camisinha.
— Caralho, princesa — sussurra ao beijar
as minhas costas.
Por que esse infeliz tinha que abrir a boca?

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Minhas defesas se enfraquecem, mas antes que eu


ceda, levanto e pego meu vestido a caminho do
banheiro. Bato a porta com força e me encaro no
espelho, meus olhos estão brilhando, os cabelos
revoltos e um largo sorriso se espalha pelo meu
rosto mesmo sem o meu consentimento.
Sinto-me leve.
E ainda que eu queira e esteja no direito de
exigir mais uma rodada, não o farei. Recoloco o
vestido e jogo um pouco de água no rosto, ajeito os
cabelos e saio do imenso banheiro. Damien está
jogado no sofá, o pau semiduro caído
pecaminosamente em sua barriga, a cabeça jogada
para trás e um ar satisfeito, ao ouvir o clique dos
meus saltos no chão, abre os olhos e um sorriso que
quase me faz mudar de ideia.
Não hoje.
Enfio a mão dentro da bolsa e saco o talão

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de cheques, com a caneta dourada que ganhei do


meu pai quando assumi a presidência, preencho
com um valor duas vezes maior do que o
combinado.
— Obrigada pela noite, Damien. Foi um
imenso prazer.
Deixo o cheque sobre a mesinha de centro e
saio do quarto rebolando. Ao chegar na porta dou
uma última olhada para trás e encontro um olhar
fulminante em minha direção. Pisco para ele antes
que a pesada madeira se feche.

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Quando abro meus olhos a primeira coisa


que me vem à mente é a imagem de imensos olhos
âmbar e uma boca perigosamente deliciosa e dura.
Inferno.
Meu pau já duro pela ereção matinal pulsa
dentro da cueca como se zombasse da minha cara.
Maldito membro traidor.
Me arrasto para fora do conforto da cama e
me guio para o banheiro. É sábado e tenho mil
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coisas para colocar em ordem antes de pegar algum


compromisso para a noite. Se bem que, com a
quantidade absurda que Ayla me deixou ontem, não
preciso estar em um encontro por um par de
semanas.
Maldita mulher irritante.
E gostosa pra caralho.
Como diabos fui deixar que ela entrasse na
minha mente? Não era como se eu pudesse ter
evitado a partir do momento que meus olhos
encontraram os dela, de qualquer forma. Foi algo
forte e que eu nunca imaginei que fosse
verdadeiramente possível, era como se eu já tivesse
visto aqueles olhos um milhão de vezes antes, só
não sei onde. Houve algum tipo de reconhecimento
que não sei explicar, ainda que nós nunca
tivéssemos nos encontrado uma vez sequer antes.
Foi por isso que quando nos sentamos tudo pareceu

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tão... normal, certo. Nunca tinha falado nem metade


das verdades que disse a ela, a alguma cliente.
Normalmente também não transo com todos
os meus encontros, como disse a Ayla, atuo na área
de acompanhante para eventos, estou na plataforma
há cinco meses e ela foi a primeira mulher com
quem fechei um pacote completo. Mesmo que eu
precise do dinheiro extra que entraria aceitando
mais ofertas como aquela, não é algo com o qual eu
possa fazer e viver bem comigo mesmo.
Na verdade, aquele estranho
reconhecimento se deu no momento em que eu vi a
foto do perfil da pessoa solicitando um encontro
comigo ontem. Havia algo nos seus olhos naquela
foto... realmente não sei dizer o que é, mas senti,
pela primeira vez desde que decidi seguir aquele
caminho para complementar a minha renda, que eu
queria aquela garota. Eu precisava daquela garota.

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— Oli, o papai não quer me deixar ajudá-lo


com o café da manhã. — A voz de Charlote
atravessa a porta do banheiro.
Respiro fundo.
— Saio em um minuto, Charlie.
Me alivio rápido e visto um short antes de
escovar os dentes e ir até a cozinha. Richard está
completamente concentrado em sua tigela de
cereais enquanto meu pai tenta, inutilmente, levar a
colher de mingau até a boca, todo o conteúdo
caindo em seu colo diante a tremedeira de suas
mãos. Parte o meu coração ver a dor em seus olhos
por não ser mais capaz de executar tarefas tão
simples como alimentar a si mesmo. Antes que eu
chegue até ele, a colher é lançada para longe e uma
série de palavrões voam de sua boca, ódio sendo
destilado em cada uma de suas palavras.
Meu irmãozinho se encolhe, encarando-me

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assustado. Charlie tem lágrimas caindo de seus


olhos e não preciso pedir, logo ela pega nosso
irmão e sai com ele da cozinha. Sorrio para ela em
agradecimento.
— Bom dia, pai. — Me abaixo e pego a
colher, enxaguo-a antes de me sentar ao seu lado.
Beijo a sua cabeça e ganho apenas um rosnar como
resposta.
Desde que foi diagnosticado com a Doença
de Huntington, há quase dois anos, consigo contar
em uma única mão a quantidade de palavras que
saíram da sua boca. Os remédios têm ajudado, mas
como os médicos disseram, eles apenas diminuem
os sintomas. A maldita doença causa a degeneração
progressiva das células nervosas do cérebro e essa
porcaria tem progredido mais e mais a cada dia. O
fato de ele não falar não ajuda em nada a saber de
quais formas mais posso ajudar.

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Pego um pano sobre a pia e limpo a sujeira


em seu colo.
— Deixe-me ajudá-lo com isso, seu Otávio.
— Ignoro sua usual carranca e mexo o mingau em
sua tigela, levando a primeira colherada até a sua
boca. Ele a abre com um pouco mais de dificuldade
do que ontem, há também uma demora maior no
ato de engolir.
Talvez se ele não fosse tão cabeça dura e
aceitasse as sessões de terapia da fala, ou se
simplesmente conversasse, seus músculos da
garganta estariam mais fortes. Recrimino meus
pensamentos. Ele é o único que pode decidir a
forma que quer prosseguir, ainda que isso acabe
afetando seus filhos no processo.
Tento disfarçar a preocupação e o medo que
rasgam o meu peito. Não é hora de demonstrar
fraqueza, Oliver.

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— Então, hoje é dia de fisioterapia. Renee


chega em alguns minutos. — Mais um rosnado.
Enquanto continuo alimentando-o conto um pouco
sobre como tinha sido a minha semana e a dos
meninos na escola.
Charlie está com dezesseis anos e é uma
adolescente incrível, tem sido a melhor tendo em
vista a nossa atual situação de merda. Richard, com
apenas oito anos é o que mais tem sofrido com toda
a mudança brusca que temos passado, mas ainda
assim é uma criança maravilhosa, o que me mata
mesmo são as suas perguntas frequentes sobre
quando a mamãe vai voltar. Sandra foi embora no
dia seguinte após a consulta que revelou o
diagnóstico e até hoje não sabemos onde está.
Sou puxado dos meus pensamentos quando
a voz rouca e fraca fala ao meu lado:
— Eu não quero mais isso, Oli. —

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Abandono a tigela de mingau sobe a mesa, mesmo


sabendo lá no fundo que não é sobre ele que meu
pai se refere. Algumas lágrimas fazem seu caminho
pelo meu rosto. É tão reconfortante, e doloroso,
ouvi-lo falar neste momento. — Estou muito
esgotado meu filho. E cansado de atrasar a sua
vida, a vida da sua irmã e causar medo no meu
garotinho.
Fecho os olhos e respiro fundo.
— Não tem atrasado nada. Eu trabalho e
estudo, Charlie também tem ido bem na escola e o
Richard ama o senhor. — Abandono a colher
dentro da tigela e viro sua cadeira de rodas de
frente para mim. — Nós te amamos, pai.
Enxugo a lágrima que escorre de seus olhos.
Sempre tive meu pai como o meu herói, um
bombeiro aposentado que sempre teve seus dias
cheios de atividades físicas e que nunca deixou um

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segundo sequer de aproveitar a infância dos seus


filhos. Sempre um homem ativo, não havia um dia
que não o víssemos agitado por aí o tempo inteiro,
vê-lo nesta situação hoje, acaba completamente
comigo.
— Sei que tem trabalhado muito mais do
que o necessário para pagar os remédios e o
enfermeiro. Mas tudo isso é inútil, não vê que vou
morrer, e logo, de qualquer forma? — Suas
palavras me acertam como um soco na boca do
estômago e sinto a bile subir. Engulo a grande bola
de angústia que de repente obstrui minha garganta e
toco seu rosto com ambas as mãos, fazendo-o olhar
firmemente para mim.
— O senhor cuidou de nós a vida toda,
agora é a nossa vez de retribuir. Pare de falar como
se estivesse com os dias contados e apenas me
deixe continuar cuidando do senhor, tudo bem? —

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Meu pai desvia os olhos, sua respiração


entrecortada e os lábios presos em uma linha reta
de pura contrariedade.
— Você não entende...
— Então fale comigo, pai.
— Eu não suporto mais viver desta forma,
meu filho. Não consigo comer sozinho ou limpar a
minha própria bunda, muitas vezes engasgo com a
saliva. Estou vendo meu filho se matar de trabalhar,
a minha garotinha trocando minhas fraldas quando
você ou o enfermeiro não estão, ao invés de se
divertindo com as amigas, o meu garotinho...
Oliver, me mata ver o medo nos olhos do seu irmão
quando não consigo me controlar e tenho meus
rompantes de raiva. — Enxugo mais algumas
lágrimas que ele deixa cair e aperto suas mãos
dentro da minha. — Meus dias estão sim contados,
filho.

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Permanecemos em silêncio absorvendo o


impacto das suas palavras.
— Não quero mais os medicamentos e nem
as terapias. Eu só quero... ir.
Incapaz de lidar com tudo isso, me levanto e
saio para fora de casa. As lágrimas vertem dos
meus olhos como duas cachoeiras, meu peito
parece ter sido aberto sem a porra de uma anestesia,
sinto como se o meu coração estivesse sendo
pressionado por um punho de aço. Encaro o céu e
me pergunto o que diabos eu devo fazer?
Ouço o zumbido da cadeira de rodas, mas
não me viro.
— Fique comigo, filho. Me dê os melhores
últimos dias que alguém poderia ter, ao seu lado e
dos seus irmãos, mas não me faça mais ficar aqui
sofrendo desta forma. — Um soluço rasga a minha
garganta e caio de joelhos no chão.

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Eu preferia que meu pai tivesse se mantido


em silêncio.

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Minha cabeça está em qualquer lugar menos


na loira sentada a minha frente tagarelando sobre
como seu ex-noivo vai ficar irado quando a vir na
revista ao lado de um homem sexy como eu. O
babaca vai se arrepender de ter enfiado o seu mini-
pau na boca da secretária, palavras dela.
É domingo à noite e não sei por que
infernos aceitei este maldito encontro. Não finja
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que realmente não sabe, Oliver. Minha consciência


grita, mas eu a ignoro. Eu só não podia continuar
dentro daquela casa claustrofóbica olhando para o
homem que eu amo querendo que eu o deixe
morrer.
— Você poderia ao menos fingir que está
me escutando, já que estou te pagando para isso. —
A loira reclama, nem sequer me lembro o seu
nome.
— Sinto muito, querida. Perdoe-me por ter
saído do ar por alguns minutos. Eu concordo
totalmente com você, seu ex-noivo está perdendo
muito a tendo traído. — Um enorme sorriso se abre
em seus lábios, deixando-me enojado de mim
mesmo.
Tudo o que eu queria, na verdade, era estar
em casa. Ainda que estar lá pareça me sufocar.
Finjo prestar atenção nela e quando um

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casal vem nos cumprimentar, lembro-me que seu


nome é Heather ao ouvir a mulher dizê-lo. É o
aniversário de trinta anos de casados de um casal de
amigos dos seus pais e ela quis mostrar ao ex que já
o tinha superado. Isso porque o suposto
rompimento havia sido ontem pela manhã.
Ontem pela manhã, quando meu pai
gentilmente pediu-me para que o assista morrer.
Consigo aguentar o restante da noite com
um sorriso mecânico e concordando com tudo o
que a Barbie Heather diz. Quando paramos em
frente ao seu carro, o sorriso que ela abre faz meu
estômago se retorcer.
— O que me diz de eu dobrar seu
pagamento e terminarmos essa noite na minha
casa? — Suas unhas compridas arranham meu peito
sobre a camisa, seguro a sua mão e a afasto.
— Sinto muito, é contra as regras mudar o

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pacote assim, de última hora. — Minto, um bico


ridículo inclina seus lábios para a frente e eu seguro
o ímpeto de revirar os olhos como uma garotinha
mimada.
— Isso é uma grande porcaria, adoraria ver
a cara do Louis quando eu lhe dissesse que transei
com um garoto de programa. — Conto até dez para
não mandá-la ir se foder. Apenas viro as costas e
saio, deixando-a para trás. Foda-se se ainda não
havia pego o cheque com o pagamento da noite.
Estou há quase duas horas de casa, mas opto
por não chamar um Uber, o clima está ameno e
andar me fará bem. Quando já andei por uns
quarenta minutos, meu celular recebe uma
notificação e vejo que recebi o pagamento do
encontro via cartão de crédito. Ao menos a Barbie
desmiolada é honesta... há também uma mensagem
dela no aplicativo:

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Verifiquei as regras dos encontros e não há


realmente uma que diga que não posso mudar o
meu pacote no último momento, mas agradeço por
ter dito isso, não estou com a cabeça no lugar hoje
e gostaria muito de me desculpar pela forma rude
que falei com você e pela forma como fui uma
verdadeira vaca durante toda a noite. Espero que
possamos nos ver novamente em uma outra
situação, Damien.
O pagamento é cinco vezes maior do que o
combinado. Sinto-me mal em não enviar ao menos
um agradecimento.
Está desculpada, desculpe-me também por
ter mentido para você, mas percebi que estava
apenas magoada e que se arrependeria
amargamente no dia seguinte se realmente
fôssemos para a cama. Obrigada pelo bônus,
Heather. Tenha uma boa vida.

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PS: Não perdoe o mini-pinto, ainda que ele


rasteje aos seus pés e lhe diga que nunca mais a
trairá. Homens traidores nunca mudam.
Envio a mensagem e desligo o meu celular.
Acabo rindo para mim mesmo com essa situação
inusitada. Tiro o paletó do terno, a caminhada
começando a me fazer suar e o dobro acomodando-
o no meu braço. Enquanto caminho, consigo limpar
os meus pensamentos sobre as últimas vinte e
quatro horas, mas então eles se voltam para um
certo par de pernas compridas e olhos caramelos.
Ayla, o que diabos você tem que mexe tanto
com a minha cabeça?
Um Rolls-Royce branco passa ao meu lado,
a porcaria de um carro idêntico ao dela e a imagem
de Ayla no banco do passageiro pedindo-me para
que eu nos levasse ao Royal passa como um filme
diante meus olhos. Aquela voz...

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Apenas por ser um maldito idiota pego o


celular no bolso e o ligo novamente, acessando em
seguida o Speed Sex, há uma segunda mensagem de
Heather que ignoro, sigo direto para o resumo da
minha noite de sexta. Há ali os contatos da
contratante, precisando de um pouco mais de
distração da minha própria vida, salvo o seu contato
na agenda. Estou prestes a lhe enviar uma
mensagem quando recebo outra notificação, mais
uma solicitação de encontro, penso em ignorar, mas
quando leio o nome da pessoa a solicitar, clico
imediatamente para ler.
Ayla quer um segundo encontro amanhã.
Com a porra do pacote final feliz.
Deslizo meu dedo sobre a tela, mas decido
não aceitar logo de cara. Deixo-a na espera de uma
confirmação. Juro que consigo vê-la impaciente
olhando para o celular, os dedos tamborilando

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sobre a coxa, o que percebi que é o que faz quando


fica nervosa. Divago tanto sobre Ayla e tudo o que
desejo fazer com ela amanhã, que nem noto que já
estou na porta de casa.
Destranco a porta da frente e me assusto
com Charlie sentada no sofá, a TV ligada, mas
olhos concentrados em suas próprias mãos. Minha
irmã está chorando. Sento-me ao seu lado e a puxo
para o meu colo, céus, como eu odeio vê-la sofrer!
— Ele não pode morrer, Oliver. Ele é o
nosso pai! — Minha irmã soluça, encolhendo-se
ainda mais sobre mim. — Por que ele quer morrer?
Eu não queria ter lhe contado a decisão do
papai, mas não podia simplesmente deixá-la de
fora, afinal, ela já entende o suficiente.
— Eu não sei, pingo de gente, o meu
coração também está partido.
— Ele não pode nos deixar, Oli. Não pode!
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— A raiva em sua voz me acerta em cheio. E é


vendo a sua revolta que eu entendo a escolha do
meu pai.
Para nós é simples querer que ele fique, pela
primeira vez eu me coloco no lugar dele, pergunto-
me de que forma estaria me sentindo se não
pudesse sequer comer sozinho, se não conseguisse
controlar minhas oscilações de humor e causasse
medo e chateasse as pessoas que amo. A doença em
si não causa dor física, mas me pego pensando no
tamanho da dor emocional que ele deve estar
sentindo por se sentir tão incapaz.
— Ele está sofrendo, Charlie. Sei que
também estamos, mas o mais prejudicado nisso
tudo é apenas o papai, eu não aceito, não mesmo a
sua decisão, mas eu o entendo. E nós temos que
respeitá-lo. — Abruptamente ela se levanta do meu
colo e me encara com raiva.

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— Você não pode estar falando sério,


Oliver. Não pode — grita, quando não respondo,
sua voz aumenta ainda mais assim como as suas
lágrimas. — Eu te odeio!
Sou deixado sozinho na sala. Desligo a TV
e me afundo no sofá, sei que Charlie está apenas
com medo, ainda assim as suas palavras me ferem
depois de tudo o que já tinha passado com meu pai
ontem.
Sandra, eu te odeio tanto por ter deixado
tudo no meu colo!

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Controle-se e pare de checar esse maldito


celular!
Repreendo-me quando encaro o aparelho
pela centésima vez. Eu não devia tê-lo procurado
novamente. Mas, minha nossa, a noite tinha sido
tão incrível que a única coisa na qual consegui
pensar desde o momento em que o deixei pasmo
naquele quarto de hotel, era em vê-lo de novo. Era
ter aquele bendito segundo round que eu mesma

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me neguei.
Foram dois dias de rememoração e juro que
ainda consigo sentir cada pequeno toque que ele
tinha me proporcionado. Quão louco isso é?
— Você tem reunião em alguns minutos
com os investidores e logo depois será a entrevista
para os estágios. — Júlia entra na sala já ditando os
meus primeiros compromissos.
— Droga, esqueci das entrevistas, tem
como reagendar para a tarde? — Seus olhos se
estreitam. — Eu esqueci que hoje é a consulta do
papai com o cardiologista. Será as dez.
— Certo, vou ver o que posso fazer. Você
nunca esquece um compromisso, Lally, ainda mais
um tão importante quanto uma consulta do tio.
— Eu não esqueci da consulta, só não tinha
me tocado de que as entrevistas eram na parte da
manhã. — Nem são oito horas ainda e já sinto que
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o dia será longo.


— Ayla. — Chama, já que eu estava mais
uma vez olhando o celular. — Estou ficando
verdadeiramente preocupada com você. Sua vida
tem sido só correria atrás de correria e você anda
tendo dores de cabeça constantes. Vou falar com o
papai e ver o que ele acha de assumir a empresa por
uns dias e você tirar férias.
— Não precisa, Jú, eu estou bem de
verdade. Pedi um segundo encontro com o Damien.
— Jogo para que ela se concentre em algo que não
seja me mandar trabalhar menos. Funciona.
— ‘Tá de brincadeira comigo! — Rio de
seu entusiasmo. — Para quando? Por favor, me diz
que fechou com o final feliz?
— Queria que fosse hoje, mas até agora não
tive retorno. E sim, pacote completo. — Seus olhos
dobram de tamanho.

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— Você é mesmo uma vaca sortuda. ‘Tô


mega feliz por te ver saindo e se preocupando mais
consigo mesma. Mas saiba que ainda vou ficar no
seu pé, mocinha. — Dispenso seu comentário com
um mostrar de língua, mas sua fala me lembra...
— Jú, por que você não se muda lá para
casa? Passamos muito tempo juntas de qualquer
forma e você mal tem ido para a casa dos seus pais
nos últimos dias. Topa ser a minha amiga de
quarto?
O grito que ela solta tenho certeza que até
as pessoas no saguão do prédio ouviram. Isso
porque estamos no décimo quinto andar. No minuto
seguinte Hillary abre a porta de olhos arregalados e
a mão sobre o colo.
— Está tudo bem, Ayla? — dirige-se a
mim, com uma expressão de puro choque.
— Está sim, querida. A Júlia aqui só teve

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um pequeno surto. — Ouço seu suspiro de alívio e


seguro uma gargalhada. Acho que estou começando
a ficar louca igual a minha prima.
— Certo, os investidores já estão te
esperando na sala oito. — Antes de realmente sair
pela porta ela olha para a Júlia desconfiada. — Se
precisar de qualquer coisa é só chamar.
No momento em que a porta se fecha não
me controlo mais e solto uma risada.
— Realmente não sei por que insisto em
mantê-la por perto. Mas o convite está de pé, se
quiser se mudar.
Pego os documentos que preciso e passo por
ela, que ainda está pasma, como se tivesse acabado
de ganhar o melhor presente do mundo e saio da
sala para a minha reunião.
— Bom dia, senhores e senhora —
cumprimento, sentando-me na cabeceira da grande
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mesa de vinte e quatro lugares. A sala está lotada,


todos retornam o meu bom dia e ainda acho
inacreditável que de todos os nossos investidores,
há somente uma mulher representado sua empresa.
— Como podem notar, tivemos um
aumento de 8,9% nos lucros do último bimestre.
Estamos também com mais de 764 pedidos de
novos softwares para os próximos doze meses. —
Distribuo as pastas com os números citados e
espero que todos tenham um momento para analisá-
los. — Com isso, criamos um plano de aumento
nos investimentos de 10%, com um retorno de 75%
nos lucros.
— Só uma dúvida, Ayla, tivemos
conhecimento neste final de semana de que
perdemos nove contratos, qual o impacto que isso
terá nos nossos bolsos? — Encaro o homem que
possui um pequeno sorriso brincando no canto de

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sua boca. É sempre ele a tentar fazer uma situação


pequena e de fácil resolução, virar um grande
problema apenas pelo simples prazer de me
cutucar. Claude lidera o topo dos investidores que
me subestimaram quando assumi a presidência,
mas é o único a ser inconveniente. Os outros já se
conformaram com o meu potencial.
— Temos a situação totalmente sob
controle, Claude, como falei minutos atrás, temos
centenas de contratos para os próximos doze meses.
E isso foi somente um balanço das propostas que
recebemos até a sexta-feira passada. — Tomo um
gole de água e dou uma rápida olhada em meu
celular para ver as horas. A luz de notificação do
celular pisca e prendo a respiração, mas só até ver
que, infelizmente, ainda não é uma resposta do
Damien. Pigarreio para espantar a ansiedade e
encaro os nossos investidores. — Como é de
conhecimento geral, — retomo o foco —
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recebemos inúmeras propostas diariamente e


filtramos as melhores. Os nove contratos que foram
desfeitos na semana passada nem eram tão
rentáveis quanto pensam, eram empresas pequenas
que só precisavam de softwares básicos, o que
também é de conhecimento geral, são os menos
lucrativos. Portanto gostaria de frisar: analisem os
números que receberam hoje, conversem entre si e
os seus diretores sobre o nosso novo plano. Nos
reuniremos novamente na quinta-feira para
falarmos sobre as suas respostas. Muito obrigada
por terem vindo.
Me levanto e saio da sala, mas não sem
antes dar uma última olhada para o imbecil do
Claude. Assim como ele sente prazer em levantar
questões irrelevantes para me irritar, eu o sinto em
colocá-lo em seu maldito lugar. Ofereço-lhe uma
piscadela antes de sair pela imensa porta de vidro e
o vejo cerrar a mandíbula.
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Otário.

— Os exames estão excelentes, Ayla, Eddy


está saudável e pronto para outra.
— Pelo amor de Deus, Dr. Stan, não fala
uma coisa dessas nem de brincadeira. — O senhor
de cabelos brancos ri apertando minha mão sobre a
mesa.
Depois do começo de infarto
semestralmente papai faz um check-up completo,
por insistência minha. Em todas as vezes o Dr. Stan
diz essas mesmas palavras, me fazendo rebatê-lo
também com o meu discurso pronto.
— Sua saúde está ótima, Edward, o que
quer que esteja fazendo, continue. — Ambos foram
amigos de faculdade e ainda hoje se veem ao
menos duas vezes por mês para uma partida de
golfe.
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— Obrigado por acalmar a minha fera,


Stanley, ainda que eu fale um milhão de vezes que
eu estou bem, ela só acredita quando essas palavras
saem da sua boca. — Meu pai acaricia minha
perna, sorrindo para mim de sua forma única e
reconfortante.
— Sei bem como é, minhas meninas
também agem desta forma. — O homem fica de pé,
seguimos seu exemplo. — Bom, nos vemos em seis
meses, Ayla. Já você, velho, te espero no clube no
próximo domingo, quero chutar essa sua bunda
sortuda ao menos uma vez.
— Somente em seus sonhos, Stan. Somente
em seus sonhos.
Saio da sala médica rindo. Esses dois são os
melhores para espantar as minhas preocupações
acerca da saúde do papai.
— Já que ouviu em primeira mão que estou

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bem, hoje passarei o resto do dia ao seu lado na


empresa. Sinto falta do trabalho, princesa. — Seu
tom é melancólico o que não me deixa contrariá-lo.
A Stewart Technologic Solutions foi
fundada pelo meu avô há quarenta e cinco anos e
papai a herdou junto com tio Clarence, mas como
meu tio já tem a sua própria empresa de
investimentos, papai é quem gerencia e tem
controle sobre a Stewart. Sei que ele trabalha na
empresa desde os seus catorze ou quinze anos e que
a sua vida toda é dedicada ao trabalho, portanto
imagino que realmente deve estar sendo horrível
para ele esses dois anos afastado.
— Vou amar tê-lo comigo o dia todo, papai.
— Deito a cabeça em seu ombro e juntos seguimos
até meu carro.
Decido tirar mais algum tempo antes de
voltar para a empresa e nos levo para almoçar.

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Enquanto comemos, falamos sobre o trabalho e


como temos crescido no ramo. Aqui, ao lado do
homem da minha vida sinto-me realizada por ter
comigo as duas coisas que mais amo neste mundo:
papai e o trabalho.
Sou uma tremenda garota de sorte!

O sorriso de orgulho do meu pai ao me


assistir trabalhando e colocando em seus devidos
lugares alguns funcionários que ainda se
incomodam com o fato de ter em seu comando uma
mulher e ainda por cima mais jovem do que eles,
faz o meu peito inflar.
Essa é a primeira vez que de fato papai e eu
trabalhamos juntos, ainda que ele já tenha feito
algumas breves supervisões sobre a minha forma de
gerenciar. E saber que ele aprova a minha forma de
gerir me deixa imensamente feliz.
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— Quer dar uma olhada nas fichas dos


candidatos ao estágio, pai? — Ele está sentado no
sofá do meu escritório, analisando alguns números
e com a sua inseparável caneca de café em mãos.
— Não filha, confio na sua escolha. — Eu
sorrio, mesmo que ele continue de cabeça baixa e
não veja.
Distraio-me olhando para as fichas que eu já
deveria ter analisado, mas não o fiz. Meu e-mail
apita chamando a minha atenção, é Samuel
informando que seu amigo está conseguindo algum
progresso, só então me lembro que não tive tempo,
devido ao jantar no orfanato e tudo o que veio
depois, de olhar mais a fundo os documentos que
ele tinha me dado na sexta e a última coisa que eu
quero neste momento, é estressar o meu pai com
essa bomba. Olho para cima e o vejo relaxado
enquanto trabalha, sinto um terrível aperto no peito

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apenas de imaginar em deixá-lo nervoso. Não,


definitivamente vou lidar com toda essa merda
sozinha. E o quanto antes, antes que ele descubra.
Respondo Samuel deixando claro que quero
estar por dentro de todos os pequenos passos que
der daqui em diante e peço que tudo permaneça só
entre nós dois, por enquanto. Sei da lealdade dele
para com o meu pai e fico grata quando concorda
em não informá-lo, ele conseguiu um estágio aqui
quando ainda estava na faculdade e foi efetivado
logo que se formou, já está conosco há quase seis
anos.
Quando volto para as fichas, Hillary bate na
porta.
— Já estão esperando por você na sala de
espera 5, Ayla. — Me pergunto onde diabos está a
Júlia, já que não a vi desde que voltei do almoço.
— Você viu a Júlia, Hill? — Vejo suas

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bochechas corarem e seus olhos desviam de mim.


Fecho os olhos esperando a sua resposta, já
antevendo que vem merda.
— Ela.. hum... eu... — A mulher quase
engasga tentando soltar as palavras.
— Deixa para lá, já imagino o que vai me
dizer.
Ouço a risada do meu pai e o encaro. Pelo
canto do olho vejo Hillary deixar a sala.
— Aquela garota não tem jeito. — Ele fica
de pé. — Temos reunião agora, princesa?
— Não, agora tenho as entrevistas para o
estágio. — Me levanto também, pego as pastas
sobre a mesa e saímos para o corredor interno, que
nos leva até a sala 5 e eu me acomodo na cadeira.
— Não se preocupe comigo aqui, filha.
Finja que sou o cara do café. — Balanço a cabeça
diante seu tom brincalhão e rio alto quando ele
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realmente anda até o fundo da sala de reuniões e


serve uma xícara de café, coloca na minha frente e
depois se retira, sentando-se no canto mais
afastado.
Passo rapidamente os olhos sobre as fichas
antes de pedir, pelo interfone sobre a mesa, que
Hillary mande o primeiro candidato a entrar.
— Boa tarde, Cara. — A moça sorri um
pouco sem jeito e se senta na cadeira próxima a
mim. — Me fale mais sobre você e os motivos que
a classificam para a vaga.
Vejo-a tomar uma respiração profunda e em
seguida começa a falar sobre suas habilidades e
projetos. Sorrio internamente quando dou uma
olhada na ficha e percebo que, diferente do que
fazem muitos candidatos até mesmo para vagas
efetivas, ela não está me dando um resumo do seu
curriculum, está sendo sincera em cada uma das

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suas palavras. Aprecio este fato. E gosto ainda mais


por saber que ela é a única mulher entre os dez
estudantes que estão lá fora ansiando por esta vaga.
— Trabalhar na Stewart sempre foi o meu
plano desde que entrei para a faculdade, me formar
e trabalhar para a melhor empresa do ramo foi o
que sempre almejei, mas depois que você assumiu
meu desejo apenas cresceu. Eu a admiro muito,
Ayla, quer dizer, Srta. Stewart.
— Ayla está ótimo, Cara. Eu gostei muito
do seu curriculum e dos seus projetos, sua
especialização e determinação é exatamente o que
estamos procurando. Entraremos em contato assim
que todos os candidatos forem analisados. —
Mesmo que ela tente esconder, vejo a decepção em
seus olhos e no pequeno encolher de ombros por
não conseguir a vaga logo de cara. — É apenas
como fazemos este processo, querida, não quer

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dizer que não vai conseguir a vaga. Além de


analisarmos fichas gostamos deste primeiro contato
com todos os inscritos, a paixão que cada um
mostra quando fala do próprio trabalho é um dos
fatores principais que levamos em conta.
Ela sorri e se levanta, acabo acompanhando-
a até a porta. Antes que saia, seguro seu braço.
— Dispensando toda essa formalidade,
posso lhe dizer com toda certeza: aguarde o meu
telefonema até o final de semana. — Pisco para ela
que sorrindo de orelha a orelha, saltita para fora do
corredor. — O próximo pode entrar, por favor.
Júlia tinha organizado as fichas em ordem
alfabética e passo os minutos seguintes ouvindo
estudantes de programação falando em suas línguas
nerds. Vários deles tem um curriculum admirável,
mas não possuem entusiasmo algum com o estágio.
Pela forma que falam, o que querem é um emprego

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fixo, mas sem passar pela etapa do treinamento.


Infelizmente não é assim que trabalhamos e acabo
dispensando essas fichas, ficando com apenas três
candidatos com potencial para agregar ao nosso
time. Quando o último estudante sai, a louca da
minha prima invade a sala.
— Tio Eddy, que bom vê-lo! — Nossa, nem
me lembrava que meu pai está aqui.
— Júlinha, é bom ver você também. — Ele
fica de pé e serve outra xícara de café, desta vez
para a intrusa.
— Onde diabos você estava?
Seus olhos se arregalam um pouco e ela
indica meu pai com a cabeça.
— Fazendo algumas cópias. — Seu batom
borrado me diz exatamente que tipo de cópia ela
andou fazendo nos últimos minutos. Céus, Júlia
realmente não tem conserto!
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— Tanto faz. Preciso terminar de analisar


essas fichas estou doida para acabar com isso logo,
tenho muito trabalho a fazer e nem sei quando darei
meu dia de trabalho por encerrado. — Vejo meu
pai me encarar preocupado e me bato mentalmente
por ter despertado sua curiosidade e preocupação.
Tudo o que ele menos precisa agora é descobrir
sobre os desvios.
— Algo que eu deva saber, princesa?
Porque pelo que vi, está tudo no caminho certo,
sem precisão de que estenda seu horário. —
Respiro fundo.
— Claro que não, papai. Sabe, só estou
querendo ter certeza de que tudo está mesmo no
caminho certo. — Como sou perfeccionista, ele não
retruca, porém seu olhar se mantém desconfiado
em minha direção.
— Na sexta-feira acabei esquecendo de

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entregar uma das fichas, temos mais um candidato


para entrevista antes que encerre tudo, Ayla. —
Bufo.
— Esqueceu? Isso não é do seu feitio. —
Dando de ombros, responde:
— Odeio não conseguir esconder nada de
você. Samuel pediu que lhe entregasse essa ficha
para análise, o cara é excelente e precisa de um
emprego, nem que seja somente um estágio.
Ótimo, tudo o que queria agora era
entrevistar mais um estudante mimado.
— Ele acabou de chegar, está subindo. —
Apenas pelo apoio que Samuel está me dando e
pelo ótimo trabalho dele em desbancar quem está
prejudicando a empresa, darei essa chance ao seu
amigo. Lançando-me um olhar esquisito e
ignorando o café que meu pai tinha lhe servido,
Júlia agarra o braço dele e o leva rumo a porta de

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saída dos fundos, por onde nós dois tínhamos


entrado. — Vamos tomar um café comigo, tio.
Temos muito papo para pôr em dia. — Estreito
meus olhos para ela, o que essa maluca está
tramando agora? Antes que a porta se feche atrás
deles, vejo seus lábios se moverem formando a
frase: Me agradeça depois.
Confusa, pego a ficha e começo a analisá-la
esperando que o estudante entre. Oliver D. James é
o nome dele, que já começa perdendo pontos por
me fazer esperar. Formado em ciências da
computação, pós-graduando em Engenharia de
Software, 26 anos.... ouço a porta se fechando e
resmungo, ainda com os olhos nos papéis:
— Está atrasado, James. Não tenho o dia
todo para ficar esperando a sua vontade.
— Me desculpa, srta. Stewart, tive uma
emergência familiar. — Droga, eu conheço essa

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voz.
— Damien? — Um sorriso preguiçoso e
malditamente excitante estica seus lábios.
— Olá, Ayla.
Porra.

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Quando Sam me ligou ontem à noite, depois


da minha tensa conversa com a Charlie e disse que
havia me conseguido uma entrevista para estágio na
empresa na qual eu o tenho ajudado em suas horas
extras, não pensei duas vezes antes de aceitar.
Obviamente era um dos planos conseguir um bom
estágio desde que comecei a pós-graduação, mas
estive tão focado em meu pai e todas as
responsabilidades da casa que não tinha chegado a
ter conhecimento destas vagas que a Stewart estava
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oferecendo. Na verdade, quando me pediu ajuda


para desbancar um roubo, nem imaginei que era na
Stewart, já que por fora ele presta serviços de
contabilidade para várias empresas. E fiquei
eufórico pra caralho ao receber a oportunidade de
trabalhar na melhor empresa de softwares da
atualidade.
Como hoje meu pai tinha consulta, faltei a
aula para acompanhá-lo. Saí do consultório o mais
rápido que pude e deixei que Doug, o enfermeiro, o
levasse para casa. Solicitei um Uber e pedi para que
o motorista dirigisse o mais rápido que
conseguisse, tentando deixar de lado todas as
preocupações que essa última consulta havia
desencadeado, até o prédio da empresa. Eu estava
esperançoso que o médico fosse colocar um pouco
de juízo para dentro daquela cabeça dura do seu
Otávio, mas tinha sido em vão.

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Os próximos dias não serão fáceis, eu tenho


plena ciência disso, só que pelo amor que tenho
pelo meu pai estou aceitando a sua decisão. Ainda
não concordo com ela e tenho certeza que nunca
concordarei, mas eu o respeito ao ponto de aceitar o
que ele quer. Aperto a ponte do nariz querendo
manter as lágrimas para dentro, agora não é hora de
desmoronar.
Chego ao andar ainda um pouco suado,
visto que o elevador tinha acabado de subir assim
que pisei no saguão e eu já tinha dez minutos de
atraso na minha conta, então subi os quinze lances
de escada. Graças a todos os anos de basquete na
escola e na faculdade, ainda tenho um bom
condicionamento físico o que me ajudou um pouco
nesta questão.
Porém toda a porcaria do meu fôlego é
completamente sugado para fora de mim quando eu

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a vejo.
Linda como um anjo, a cabeça baixa
encarando os papéis em sua frente, os dedos
tamborilando sobre o tampo de vidro.
— Está atrasado, James. Não tenho o dia
todo para ficar esperando a sua vontade. — A nota
de nervoso em sua voz envia impulsos elétricos por
todo o meu corpo.
O quão patético isso é?
— Me desculpa, Srta. Stewart, tive uma
emergência familiar. — Forço as palavras a saírem.
Não era assim que eu tinha imaginado reencontrá-
la, mas merda, estou adorando.
Como diabos eu não associei o nome à
pessoa? Sempre acompanhei o trabalho da Stewart
de perto por almejar um trabalho em uma empresa
tão grande e forte no mercado quanto ela, então
sabia que nos últimos anos a primogênita de
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Edward Stewart estava no comando, tinha lido um


ou dois artigos com o nome dela, mas não tinha
sido capaz de fazer a conexão. Porém não é como
se depois que meus olhos pousaram em Ayla eu
pudesse pensar em algo diferente do que terminar a
noite com ela em meus braços.
Puxo na memória o nome dela no Speed
Sex, Ayla Madison. Nada de Stewart. É, não tinha
realmente como eu saber.
Com o choque da minha voz seus olhos
lentamente levantam dos papéis e fazem uma
intensa varredura em todo meu corpo antes dos
olhos encontrem os meus.
— Damien? — Há um leve tremor em suas
palavras, o que faz com que um pequeno sorriso
estique meus lábios.
— Olá, Ayla. — Vejo-a engolir com certa
dificuldade e sinto-me triunfante por saber que ela

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se sente tão desconcertada em minha presença


quanto me sinto diante dela.
— O que diabos você está fazendo aqui?
Como me encontrou? — Minhas sobrancelhas se
unem diante seu questionário. Seu corpo esguio
fica de pé e assisto hipnotizado seus quadris se
moverem até os fundos da sala, onde ela se serve de
água e entorna um longo gole antes de voltar para a
mesa.
Eu me sento na cadeira mais próxima a
dela.
— Eu vim para a entrevista de estágio. —
Seus passos cessam a poucos centímetros da
cadeira à minha frente, bem ao meu lado. Seu
perfume inebria meus sentidos e acabo fechando os
olhos tentando evitar uma maldita ereção. Merda.
Viro meu rosto para olhá-la e vejo o leve tremor em
seus dedos segurando com força o copo.

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— Mas seu nome...


— Oliver Damien James? — A frase soa
mais como uma pergunta, ainda estou cheio de
dúvidas do porquê da sua reação. Samuel não havia
colocado a porcaria do meu nome na minha ficha
de apresentação?
— Certo. — Parecendo retomar o controle
de suas emoções, Ayla senta-se na cadeira e toma
mais um gole de sua água antes de abrir novamente
a pasta que estava lendo antes da minha chegada.
Quando a primeira folha se faz visível vejo o
motivo da sua confusão, Sam abreviou meu nome
do meio. Oliver D. James. — Me fale por que acha
que merece o estágio, Oliver.
Não contenho o sorriso quando ela dá
ênfase no meu nome.
— Acredito que as minhas qualificações
falem por mim, me formei com honras em ciências

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da computação e agora continuo sendo o primeiro


da turma de engenharia de software. — Seus olhos
continuam presos nos papéis, evitando qualquer
contato que seja comigo. Por dentro eu sorrio, isso
só mostra o quanto eu a afeto, não muito diferente
de tudo o que ela provoca em mim. — Já criei
alguns softwares modelos e aposto que todos os
detalhes estão incluídos nessas folhas que estão
prendendo tanto a sua atenção.
Um rosnado sexy para caramba sai de seus
lábios.
— Obrigada pela inscrição, ops, quer dizer,
você nem sequer se inscreveu para o estágio,
conseguiu a entrevista por pura sorte. — Agora ela
me encara e vejo que ainda está irritada comigo,
por qual motivo eu não faço ideia. Muito irritada
para dizer o mínimo. Suas palavras batem fundo em
mim. — Há sequer um interesse real de sua parte

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em trabalhar aqui, James, ou tudo não passa de uma


brincadeira idiota comigo?
Respiro fundo e encaro seus olhos raivosos.
— Posso não ter estado por dentro do edital
quando saiu as inscrições, Ayla, mas tenho total
qualificação para ser selecionado. Se a forma que
consegui a entrevista te incomoda, retiro minha
intenção de trabalhar com vocês já que pensei que
aqui o que mais importava era a capacidade de seus
funcionários e não a forma que eles chegam até
vocês. — Fico de pé, sentindo-me realmente
humilhado pela forma que suas palavras soaram. —
Sim, até alguns minutos atrás tudo o que eu mais
queria era conseguir um estágio e talvez
futuramente um emprego em uma empresa tão
prestigiada quanto a Stewart, mas vejo que
depositei minha fé em um lugar errado. Agradeço a
oportunidade, passar bem.

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Caminho para fora da sala sem nem olhar


para trás. Porém, suas palavras me param antes que
eu alcance a porta.
— Seu trabalho como acompanhante não
paga o suficiente? Talvez se fechar mais alguns
pacotes “final feliz” não precise se sujeitar a
entrevistas para estágios em empresas que não
merecem a sua fé. — Céus, ela é tão irritante, age
totalmente como uma garotinha mimada que não
suporta não ser a pessoa a ter a palavra final em
uma discussão. Decido entrar no seu jogo.
— Tem razão, fui um tolo ao pensar que
poderia conseguir essa vaga, afinal, meu lugar é
satisfazendo os caprichos de princesinhas esnobes,
mimadas e egoístas que não conseguem sequer
arrumar um cara bacana para acompanhá-las em
eventos, de tão insuportáveis que são. Adeus, Ayla.
Antes de sair da sala vejo seu rosto ficar

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completamente vermelho. Metade de mim sente-se


satisfeito por tê-la atingido, mas uma maior está
decepcionada pois aquela definição se encaixa a
ela: é só mais uma riquinha mimada.
Como diabos me deixei enganar por aquele
rostinho angelical no nosso primeiro encontro,
pensando que ela seria diferente?
Determinado a provar para ela que ser
acompanhante é o que eu faço, mas não o que eu
sou, pego meu celular assim que entro no Uber para
casa, a proposta para um pacote completo para hoje
à noite que ela havia me enviado ainda está
pendente e eu a aceito. Nem sei por que caralhos
solicitou um novo encontro se é claro que me
odeia.
Mas acho que ela também tem algum ponto
para provar, já que responde na mesma hora que
me encontra as nove no Royal.

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Maldita.

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Aquele... pelo amor dos deuses, eu nem


sequer encontro um xingamento que faça jus a toda
aquela arrogância e estupidez que é Oliver James.
Damien. O próprio demônio, isso sim! Como ele
teve a cara de pau de me falar todas aquelas merdas
e depois ainda aceitar minha proposta para hoje à
noite?
Eu nem sequer me lembrava mais daquele
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convite, ainda que eu tivesse surtado a metade do


dia pela espera de uma resposta, a sua visita
inesperada minou qualquer tipo de desejo que eu
estive alimentando em revê-lo. Descobrir a verdade
sobre ele totalmente me brochou.
Inferno de homem idiota. Mas
estupidamente delicioso!
Foco, Ayla. Mantenha a porcaria do foco,
mulher.
Irritada, pego a maior caneca que temos na
copa e a encho de café antes de seguir para a minha
sala e trancar a porta. Já é quase fim do expediente
e só quero analisar com calma todos os papéis que
Samuel me passou na sexta. Envio uma mensagem
para a Jú avisando que ficarei até mais tarde e
pedindo que leve o meu pai embora. Friso bem a
parte que não quero ser incomodada. São quase seis
da tarde, tenho apenas algumas horas até ir para

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casa e me arrumar para o tal encontro.


Para ser bem sincera não sei por que ainda
estou seguindo com esta merda, mas sinto-me
impelida a ir. Algo definitivamente ficou inacabado
entre Oliver e eu e foi por isso que tinha pedido um
novo encontro. É isso que eu irei fazer essa noite:
colocar os pingos no is. Várias coisas não ditas
ficaram no ar durante a entrevista e sinto que
preciso saber de todas elas para enfim, seguir em
frente e tirar da minha cabeça todos os resquícios
dos nossos encontros inusitados. E é somente por
isso que ligo para o Royal e faço uma reserva,
enviando em seguida o horário e o número da suíte
para aquele maldito filho da mãe.
Continue repetindo isso, bobinha, talvez
consiga convencer a si mesma que é só por isso
que vai a um encontro com um pedaço de mal
caminho daqueles em um hotel...

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Saio da empresa quando o relógio marca


oito e quarenta. Penso em enviar uma mensagem
para o Oliver e dizer que me atrasarei, mas mudo
de ideia no instante que entro debaixo dos jatos
relaxantes do chuveiro.
Eu estou pagando por este encontro, ele que
me espere.
Esfolio todo o meu corpo, me hidrato, seco
os cabelos deixando-os bem volumosos, capricho
na maquiagem destacando meus olhos cor de mel e
quando saio de casa, já são quinze para as dez. Há
cinco mensagens no meu celular, mas eu as ignoro
sem nem ver quem as enviou. Quando entrego as
chaves para o manobrista na porta do hotel são dez
em ponto.
Com toda a minha recém descoberta
confiança, depois de me identificar na recepção e
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receber a cópia da chave, sigo a passos


determinados até o elevador e depois até a suíte 69.
A escolha do número foi proposital.
Por debaixo da enorme porta de madeira
escapa uma melodia suave e sensual, respiro fundo
algumas vezes antes de deslizar o cartão chave pelo
leitor.
A primeira coisa que meus olhos captam
quando a porta se abre completamente sãos pés
esparramados pelo tapete felpudo. Subo o olhar
pelas longas pernas cobertas por uma calça social, o
volume de seu pênis mesmo sob as camadas de
roupa é bem visível pela forma tão desleixada que
seu corpo está. Continuo a inspeção e encontro um
vislumbre de seu peitoral escapando dos três
primeiros botões abertos da camisa, as mangas
enroladas até os cotovelos. Até a porcaria dos seus
braços, repletos de veias sobressalentes, é sexy.

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Será que existe alguma parte deste maldito


homem que não seja incrível?
Quando subo mais os olhos encontro um
sorriso safado dançando em seus lábios, deixando
claro que aprova a minha descarada avaliação de
seu corpo. Idiota. Em sua mão direita há um copo
com o que deduzo ser uísque pelo tom dourado do
líquido. No instante que nossos olhos se encontram,
percebo que aquela não é a sua primeira dose pela
forma que suas íris caminham preguiçosas pelo
meu corpo, devolvendo a inspeção.
— Por que você ainda está de roupa, James?
— Uso seu sobrenome e vejo-o trincar o maxilar
com o meu tom. — Vamos lá, estou pagando por
uma noite com final feliz e tenho certeza que não o
terei com você vestido.
Um lampejo de raiva cintila em seus olhos
antes que ele se levante. Mantendo os olhos colados

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aos meus, Oliver coloca o copo sobre a mesinha de


centro e caminha até parar a dois passos de mim.
Seu hálito de uísque misturado ao seu cheiro
natural me arrepia inteira.
— Ayla — geme o meu nome de uma
forma que me desmonta, mas permaneço firme.
Não irei cair em sua fala mansa novamente. —
Posso fazê-la gozar sem nem tocá-la, princesa.
Bufo diante sua presunção e do tom de
escárnio ao falar o apelido.
— Paguei por sexo e é isso o que eu quero.
— Desvio de seu corpo enorme parado no meio da
sala, ando até o sofá e jogo a minha bolsa sobre ele
antes de começar a me desfazer do vestido. — E
não promessas impossíveis de serem cumpridas. —
No momento em que a peça se amontoa aos meus
pés sinto sua presença às minhas costas, a
respiração quente arrepiando meu pescoço.

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— Aprenda uma coisa, princesa. — Sua


boca sopra um beijo delicado bem atrás da minha
orelha, nenhuma parte do seu corpo encostando, de
fato, ao meu. E juro que se ele continuar me
provocando desta forma serei mesmo capaz de
gozar sem que ele me toque. — Eu nunca fujo de
um desafio.
Fogo emana de seus olhos e conforme eles
percorrem meu corpo, sinto-me queimar. Faço a
minha melhor cara de paisagem para não deixá-lo
saber o quanto está me afetando. Pela forma que
seu olhar incendeia ainda mais, percebo que falhei,
um pequeno sorriso estica o canto direto dos seus
lábios antes de sua língua resvalar sobre eles. O
movimento me hipnotiza, seu dedo indicador sobe
em linha reta do meu pulso até meu ombro, o toque
tão delicado que mal o sinto.
Pegando-me totalmente de surpresa suas

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duas mãos agarram meus ombros e em dois passos


largos, Oliver nos leva para a parede mais próxima
ao sofá, minhas costas arqueiam ao contato com o
frio, pressionando meus seios cobertos apenas pelo
sutiã em seu peitoral rígido. Seus olhos não
abandonam os meus nem por um segundo, várias
promessas e luxúria gritando através de suas íris.
— Aquela noite eu estava disposto a chupar
você até que te fizesse gozar na minha língua,
lembra? — sussurra, as mãos espalmadas na parede
ao meu lado, nossos corpos a milímetros de
distância, sua boca tão perto que conforme ele solta
as palavras, sinto seu hálito de uísque dominar os
meus sentidos. — Lembra? — Insiste, chegando
um pouco mais perto. Perto demais para a minha
sanidade.
Engulo em seco, tentando manter o restinho
de controle que ainda possuo sobre o meu corpo. O

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que é quase nada perante sua voz sussurrada e a


presença tão imponente de seu corpo pairando
sobre mim com a promessa de uma segunda rodada
do que fizemos na nossa primeira noite juntos.
Assisto suas sobrancelhas arquearem e só então me
dou conta de que ele ainda espera uma resposta.
— Sim. — A sílaba me escapa com
dificuldade e seu sorriso amplia um pouco mais.
— Estou desde aquele dia me perguntando
o quão delicioso seria o seu gosto. — Minha vagina
contrai, sinto minha excitação fluindo e ensopando
a calcinha e fecho as pernas em busca de algum
contato. O movimento não lhe passa despercebido e
sua língua atrevida se projeta em uma deliciosa
carícia em meu colo. Não consigo desgrudar os
olhos da sua boca. A angústia pela liberação
crescendo e se avolumando em meu ventre.
O filho da puta é realmente bom.

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— Mas hoje, Ayla. — Seu tom se torna


mais firme, mais rouco e arrepia todos os poros do
meu corpo, amolece as minhas pernas e quebra
ainda mais a minha determinação em mostrar-me
inabalável, ainda que por dentro eu esteja em
chamas. — Hoje por mais que eu ainda anseie com
loucura saborear a sua boceta, só o farei se você
pedir. — Suas palavras fazem as chamas do meu
tesão crepitarem ainda mais alto, as labaredas
beijando e incendiando cada pequeno pedacinho do
meu corpo. — Só tocarei você quando me pedir
que eu o faça.
Eu deveria afastá-lo de mim. Deveria
mandá-lo se foder diante essa arrogância toda
presente em seu tom, deveria...
Desço minha mão esquerda entre nossos
corpos que ainda estão próximos, mas não se
tocando e deslizo-a lentamente pela minha barriga,

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enfiando-a por dentro da minha calcinha. Seu olhar


feroz acompanha meus movimentos e um rosnado
brota de seu peito quando meus dedos se escondem
dentro do tecido.
Dois podem jogar esse seu joguinho idiota
por poder.
Solto um gemido alto, quase dentro da sua
boca, já que Oliver se aproximou ainda mais,
quando meu tesão intensifica conforme manipulo
meu clitóris. Com um suspiro sua testa recai sobre
a minha e ambos mantemos nossos olhos em meus
movimentos dentro da calcinha. O volume na frente
de sua calça social me deixa com água na boca.
— Estou quase gozando — emito em meio
a mais gemidos e sobressalto-me quando sua mão
em punho, soca a parede. As veias em seus braços
saltadas diante a força que impõe no aperto de seus
punhos. Seu autocontrole é admirável, por mais que

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eu o odeie neste momento. — Tão perto, Oli. —


Provoco um pouco mais, sussurrando o apelido em
seu ouvido e passeando com a língua pela concha
de sua orelha.
No momento que os nós no meu ventre
começam a desatar, quebrando em ondas deliciosas
pelo meu corpo, vejo-o cair de joelhos e rasgar a
minha calcinha com força antes de abocanhar com
fome a minha boceta. Perco o equilíbrio e me
agarro em seus cabelos. Suas lambidas e sugadas
são vigorosas e leva todo o resto da minha sanidade
embora, fazendo-me desfazer em um orgasmo que
me deixa tonta. Grito alto o seu nome, suas mãos
agarram firme a minha bunda, mantendo-me parada
e dando-me forças para continuar em pé. Sua língua
não para, descendo de cima a baixo, pincelando
primorosamente o meu clitóris.
Quando sente que extraiu tudo o que podia

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do meu prazer, sinto um beijo suave no meu púbis,


só então abro os olhos e o encontro encarando-me,
um sorriso preguiçoso espalhado pelo seu rosto.
Sem emitir uma única palavra, toma minha mão na
sua e nos leva para o quarto. Oliver para no meio
do quarto e se despe, mantendo sempre os olhos
colados em mim, consigo ler neles toda a sua
contrariedade em ter cedido, seu cenho franzido e a
energia que seu corpo emana, raiva misturada a
tesão, deixa tudo ainda mais interessante. Deixa-o
ainda mais irresistível.
Seus movimentos são precisos quando ele
para atrás de mim e desabotoa meu sutiã, jogando-o
em um canto qualquer do cômodo. Suas mãos
pinçam meus mamilos com força, puxando-os entre
o limiar da dor e do prazer. Arqueio as costas de
encontro ao seu peitoral e levo minhas mãos para
trás tomando seu pau entre meus dedos,
punhetando-o vagarosamente. Seu gemido rouco
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reverbera direto no meu clitóris.


— Maldita seja, Ayla — rosna antes de me
empurrar para que eu fique de quatro sobre a cama,
vejo-o cobrir o pau com a camisinha e logo se
posiciona atrás de mim. Empino-me o quanto
posso, encostando meus seios no colchão macio.
Em um único empurrão ele me penetra,
fazendo-me esquecer qualquer joguinho idiota e
imploro sem nenhum pudor para que me foda mais
forte. Sua risada rouca me irrita, mas as suas
investidas é tudo o que importa no momento.
Foda-se a sua arrogância desde que
continue o que está fazendo.
Com uma estocada profunda Oliver para
por um instante e seu corpo pesa sobre o meu,
prendendo-me ainda mais entre ele e o colchão.
Suas mãos agarram firme a minha bunda e a boca
beija de língua meu pescoço. Antes de voltar ao

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ritmo constante, enrola meus cabelos em um punho


e puxa minha cabeça para trás, nossas bocas
colidem no momento que seu pau retoma a
cadência delirante dentro de mim.
Oliver é bom, mas não o bastante para me
fazer ter um segundo orgasmo essa noite a nossa
primeira vez foi insana pelo fato de eu estar há
tempos sem sexo, mas hoje é diferente e inda que
eu anseie por outro e meu corpo o esteja
construindo gradativamente, o orgasmo não
explode. Contudo suas investidas não cessam, o
beijo não abranda e sua mão livre não para as
carícias pelo meu corpo.
Quem precisa gozar quando o caminho até
lá é tão delicioso desta forma?
Não que eu fosse deixá-lo saber, de
qualquer forma, que ele fode gostoso assim...
Estou tão mergulhada nas sensações que me

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assusto quando meu corpo é abandonado sobre a


cama e o vejo curvar-se sobre mim, tirar a
camisinha e punhetar o próprio pau até esporrar nas
minhas costas.
Filho da mãe.

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Sua expressão encarando-me de lado é


impagável.
Minha porra pintando as suas costas
maravilhosas e um olhar mortal direcionado a mim.
Sou um bastardo filho da puta, um
verdadeiro babaca querendo marcar território desta
forma, mas foi mais forte que eu o impulso de tirar
do seu rosto aquele olhar soberbo por eu ter cedido
primeiro.
Roçando a bunda no meu pau semiereto,
Ayla fica de pé e anda a passos determinados até o
banheiro, ao chegar na porta se vira e me encara, já
livre da fúria, apenas zombaria molda seu
semblante antes que suas palavras ácidas soem:

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— Obrigada pela noite, Damien. Pode ir,


farei o seu pagamento assim que terminar o meu
banho. — Então a porta se fecha.
Enquanto pego minhas roupas espalhadas
pelo chão, eu rio. Mas é um riso incrédulo porque
caralho, essa mulher me enlouquece e menospreza,
mas tudo o que eu mais quero é fodê-la mais e
mais.
Qual diabos é o meu problema?

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Na terça de manhã quando meu despertador


toca a minha maior vontade é virar para o lado e
esquecer que existe toda uma vida do lado de fora
do meu quarto. Uma vida onde serei obrigado a
assistir meu pai em seus últimos dias de vida.
Uma dor lancinante me acerta em cheio
drenando o ar dos meus pulmões. Sento-me na
cama e encaro o teto tentando dispersar os
pensamentos negativos e depressivos. Prometi ao

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meu pai que estarei ao seu lado e é isso que eu


farei. Ainda que leve tudo de mim fingir que está
tudo bem.
Desisto de protelar, sabendo bem que só há
dois assuntos predominando meus pensamentos nos
últimos dias e nenhum deles me agrada muito, e
levanto logo. De qualquer forma prometi ao Sam
que o ajudaria um pouco mais com o lance do
desvio de verbas da Stewart. Ao pensar nisso um
riso amargo me escapa, o que será que a
princesinha vai pensar quando descobrir que eu
quem estou ajudando seu contador a desvendar a
fraude que anda rolando na sua empresa? Não vou
mentir, desfrutarei de cada momento do prazer de
ver a sua arrogância cair por terra.
Na cozinha, encontro Rick ajudando nosso
pai com seu mingau de aveia e sorrio para a cena.
Há um brilho novo nos olhos do meu velho que

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acalma um pouco o meu coração.


— Onde está a Charlie? — pergunto
enquanto coloco a máquina de café para funcionar
e me aproximo deles, assumindo a tarefa de ajudar
meu pai. Beijo a sua cabeça antes de sentar na
cadeira vaga, meu irmão fica de pé e me beija antes
de correr para a sala, deixando para trás a voz
animada dizendo que a Charlote está no quintal
colocando as roupas para secar. — Como o senhor
está hoje, pai?
Sua mão trêmula dispensa a minha
preocupação antes de pousar em meu braço.
— Estou bem, vocês precisam parar de me
perguntar isso a cada cinco minutos. — O esboço
de um sorriso brinca em seus lábios e me faz sorrir
também. Nem consigo me lembrar quando foi a
última vez que o vi com o semblante tão sereno
como hoje. — Prometi ao seu irmão que mais tarde

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vamos dar uma volta. Nós quatro, como nos velhos


tempos...
Sei o que ele está fazendo e me esmurro por
não ter pensado nisso antes. Se bem que com o
baque da sua decisão eu ainda não tinha conseguido
colocar a cabeça no lugar. Mas aprovo a sua ideia,
vamos ter ótimos momentos em família nos
próximos dias para que essas lembranças
sobreponham a dor da sua perda quando ela vier.
— Ótima ideia, mas tenho trabalho até lá
pelas três. Podemos ver o pôr do sol no píer, o que
acha?
— Ótima ideia. — Responde ecoando
minhas palavras, me arrancando mais um sorriso.
— Eu te amo, viu seu Otávio? — Vejo a dor
em seus olhos ao ouvir a declaração e internamente
me pergunto quantas oportunidades perdi de deixá-
lo saber disso.

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Quantas vezes engoli as palavras por


orgulho? Por achar que eu já estava homem demais
para dizer ao meu pai o quanto eu o amo? Quantas
vezes deixei de dizer-lhe o quanto me orgulho da
educação que ele me deu, do homem que ele me fez
hoje? O orgulho nos domina de tal forma que
pensamos apenas em nós mesmos, mergulhamos
tão profundamente em nossa própria arrogância que
deixamos de ressaltar nossa verdadeira gratidão por
aqueles que nos fizeram quem somos.
A iminência da morte nos acorda para a
vida.
— Eu sei, filho. Eu sei.
Em silêncio com o peso de todas as palavras
que não dissemos um ao outro ao longo de nossas
vidas, termino de ajudá-lo com seu café e tomo o
meu já que preciso ir para o apartamento do Sam.
— Doug chegará em alguns minutos,

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quando eu voltar nós iremos para o píer. Se


possível organize algumas comidas para levarmos,
dê banho no Rick e não esqueça de tirar as roupas
do varal e de preparar verduras para ele no almoço.
— Charlie revira os olhos.
— ‘Tá bom, papai. Mais alguma
recomendação? — Belisco sua bochecha diante a
provocação. Antes de sair de vez de casa todo
aquele pensamento de horas atrás sobre gratidão
retorna como uma musiquinha irritante que
impregna no cérebro, me fazendo voltar um passo e
tomar a minha irmã em um abraço apertado.
— Amo você, pingo de gente. Obrigado por
estar do meu lado. — Vejo-a piscar para espantar
as lágrimas e beijo sua testa antes de soltá-la.
— Também te amo, Oli. E eu quem
agradeço por tudo o que tem feito por nós. —
Ficando na ponta dos pés, Charlie me beija

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demoradamente na bochecha e se afasta rápido para


que eu não a veja chorando.
Respiro fundo e saio de casa.

— Mano, você é foda. Eu sabia que se


alguém chegaria ao fundo desta história, seria você!
— Sam praticamente grita as palavras quando
enfim a caixa de mensagem pula na tela do seu
notebook com o nome da pessoa por trás dos
desvios na Stewart. Como estávamos quase no final
do processo de busca, ele conseguiu a tarde de
folga na empresa para que pudéssemos finalizar
tudo e Ayla poder tomar as providências
necessárias.
Quase explodindo de excitação, Sam
caminha até a geladeira e tira dela duas garrafas de
cerveja. Sorvo um longo gole quando me entrega
uma, minhas vistas estão embaçadas e a cabeça
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começando a doer de tanto código que tive que


enfrentar desde o momento em que cheguei aqui,
há cinco horas. Foram cinco horas seguidas de
busca, edição e criação de códigos e desvendando
bugs. Mas valeu totalmente a pena.
— Essa história ainda vai dar tanta merda,
Eddy tem esse cara aí como um braço direito dentro
da empresa. — Sam bebe da própria garrafa antes
de apontá-la em minha direção. — Mas e aí, como
foi a entrevista?
Antes que eu possa controlar meus impulsos
balanço a cabeça em negativa com a pergunta. Ayla
provoca em mim os melhores e piores sentimentos
e minha reação a tudo que diz respeito a ela é
automática.
— A entrevista em si foi boa. Mereço a
vaga, sei que sim.
— Então porque esse tom de enterro,

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caralho? Ayla é uma pessoa justa, se a entrevista


foi boa a vaga é sua. — Quem o conhece em seu
local de trabalho não imagina que a cada dez
palavras que esse babaca fala, ao menos duas são
palavrões. Acho que exatamente por ser todo
correto no trabalho, fora dele fala tanta besteira
para poder extravasar o que guarda em suas horas
dentro da empresa.
Risos nervosos estão se tornando a minha
marca registrada e mais um abandona meus lábios.
Sam me encara como se um terceiro olho tivesse
brotado na minha testa. Conheço esse cara desde
que éramos moleques, crescemos juntos, só nos
afastamos um pouco nos dois últimos anos com
tudo o que vem acontecendo na minha casa.
— Ayla pode até ser uma pessoa justa, mas
as coisas entre nós são um pouco... difíceis. Se é
que essa é a palavra certa para definir a nossa

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relação.
— De que porra você ‘tá falando? — Além
de um ótimo amigo tinha me esquecido o quanto
esse maricas adora uma fofoca. Juro que seus olhos
brilham diante o prato cheio que acabo de lhe
oferecer.
— Ela é uma cliente. — Seus olhos
arregalam e em um único gole arremata sua
cerveja.
— Vou pegar uísque, cerveja não é páreo
para essa história do caralho. — Descrente finalizo
a minha garrafa também, pensando em como
diabos eu sou um cara de sorte com todas essas
merdas acontecendo de uma só vez.
Quando volta, serve duas doses e me
entrega uma. Prometendo a mim mesmo que ficarei
só na primeira pois ainda tenho um passeio em
família em algumas horas, aceito e a bebo devagar

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enquanto descrevo para o meu melhor amigo todos


os detalhes dos meus encontros com Ayla Stewart.
Ao final da história não duvidaria nada se esse filho
da puta gozasse nas próprias calças frente a
animação que está com a minha desgraça.
— James, sou seu amigo cara... mas porra,
nunca que eu queria ter a sua vida. — O desgraçado
gargalha até perder o fôlego. Mas de repente fica
sério. — Não vou perguntar como ela é na cama
porque seria muita falta de respeito e você sabe que
se tem uma coisa que não sou, é desrespeitoso com
as mulheres, mas... vale a pena?
— Vou fingir que não ouvi essa pergunta,
Samuel. — Ele rosna diante seu nome, é todo cheio
de boiolagens para que só o chamem de Sam. Só é
Samuel no local de trabalho.
Abandono o copo com metade do uísque
sobre a mesinha de centro e pego de volta o

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notebook para finalizar o meu trabalho. Sabia que


esse software que vinha trabalhado desde o começo
da faculdade ia ser útil em algum momento. Ele é o
carro-chefe perfeito para garantir a vaga no estágio,
mas parando bem para pensar e mesmo sabendo
que mereço a vaga, não acredito com cem por cento
de certeza de que seria uma boa ideia trabalhar com
a Ayla, para a Ayla mais especificamente.
— E eu vou fazer o que um melhor amigo
sempre faz e vou falar com a patroa, fazer a sua
fama para ela. — Balança as sobrancelhas em
provocação. Sei que não fará nada que me
prejudique, mas a ideia de ele falando bem do meu
potencial como criador para ela também não me
agrada em nada.
— Melhor não. — Salvo as informações
que ele precisa para entregar a Ayla e encerro o
programa, desligando o note em seguida.

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— Qual é? Não quer o emprego, caralho?


Ela nem vai desconfiar que eu sei o segredinho
safado de vocês. Vou só falar que o cara que ela
entrevistou é o mesmo que desbancou a fraude da
empresa. Não duvido nada que ela até te peça em
casamento depois disso.
— Tchau, Samuel. — Fico de pé para ir
para casa, uma cerveja e uma dose de uísque são o
bastante para deixar Sam mais do que alegrinho. E
eu honestamente detesto ele assim, fala ainda mais
do que o de costume, o que por si só já me faz
querer socá-lo.
— Samuel é o meu pau. Se até sexta-feira
você não for um estagiário na Stewart Technologic
Solutions eu não me chamo Sam Adams. — Ele
também fica de pé e me acompanha até a porta. —
Até mais, mano. Dá um abraço no tio Otávio por
mim.

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Enquanto caminho de volta para casa me


odeio por não ter insistido que ele não falasse com
a Ayla. No fundo mesmo eu sabendo que somos
completamente opostos um do outro, tudo o que eu
mais anseio é mais tempo com ela. Seja onde e
como for. Eu só quero ela.

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Ernest Sanchez.
Já amaldiçoei todas as gerações passadas e
futuras desse grande pedaço de merda.
Passei a noite de ontem toda em claro
depois que Samuel me enviou os documentos com
o resultado de suas buscas pelo responsável dos
desvios.
O homem me viu crescer, esteve ao lado do
meu pai em várias etapas da empresa até chegar

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onde estamos, ajudou meu pai em momentos de


crise, caramba, aquele desgraçado emprestou
dinheiro ao meu pai quando tivemos prejuízos com
alguns softwares que deram problemas e o
desenvolvedor era um vigarista e nos roubou!
Há uma batida leve na porta e antes que eu
responda a cabeça de Jú aparece no vão.
— Bom dia, nem te vi saindo de casa hoje.
— Ela entra deixando uma caneca extragrande de
café na minha mão.
— Obrigada — agradeço tomando um gole
do líquido calmante. Essa já é a minha terceira dose
do dia. — Saí bem cedinho mesmo quero resolver
essa merda logo, mas nem sei como ou por onde
começar.
Com um semblante preocupado Júlia se
senta na beirada da minha mesa.
— Fiquei sabendo que já chegou ao fundo
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da trama, aliás, Sam está esperando para falar com


você, pedi que me desse alguns minutos para eu
checar se está tudo ok. — Seu tom muda ao falar de
Samuel e isso me deixa em alerta. E o que é isso de
Sam?
— Você...
— Nos concentremos em você e o seu
recente problema, srta. Stewart. Em outro momento
divido com você a minha vida sexual. — A filha da
mãe levanta e rebola até a porta. — Vou pedir para
ele entrar.
Não deixo de notar a dubiedade de sua frase
e acabo sorrindo. Só essa maluca para me animar
em um dia que promete ser um grande desastre.
— Bom dia, Ayla. — Sorrio para Sam,
notando-o pela primeira vez. É bonito, até. Carinha
de nerd com os cabelos meio ruivos bagunçados,
mas não o deixando com cara de desleixo, óculos

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de aro grosso e lindos olhos azuis. Entendo os


motivos de Júlia estar se engraçando para cima
dele.
Céus, engraçando? Estou mesmo
precisando de vida social, já estou falando igual ao
meu pai! O pensamento me faz rir baixinho,
Samuel me encara confuso.
— Bom dia. Agradeço mais uma vez todo o
trabalho que teve aqui, — aponto os papéis sobre a
mesa — sei que foge do seu cargo, mas gostaria
muito da sua opinião sobre como proceder.
— A primeira coisa que eu faria no seu
lugar é falar com o seu pai. Em seguida, peça uma
apreensão dos computadores de todo o setor de
compra, venda e expedição e deixe o pessoal do TI
fazer o trabalho deles, porque você sabe que
consegui esses documentos não exatamente de um
modo legal. Precisamos conseguir provas que

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possam serem usadas. — Concordo, massageando


as têmporas. — Vai dar tudo certo, Ayla. Sei que o
Ernest sempre foi um homem que seu pai confiou
muito e que vai ser um choque inicialmente, mas o
quanto antes lidar com tudo, melhor será.
— Eu sei. Só... não acho que seja um
momento bom para levar mais estresse ao meu pai.
— Eu entendo e admiro muito o que está
tentando fazer poupando-o, porém acredito que isso
seja algo que ele fosse querer saber. Essa empresa é
importante demais para ele. Mas... — Esse “mas”
chama a minha atenção e o encaro, há um certo
constrangimento em seu tom que me deixa ainda
mais curiosa.
— Vamos, fale logo, Samuel.
— Sabe o cara que pedi que entrevistasse
para o estágio? — Quando afirmo um largo sorriso
se espalha pelo seu rosto. Um sorriso de orgulho.

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— Foi ele quem me ajudou a chegar no cerne do


problema. O cara é, me desculpa o uso da palavra,
mas ele é foda, os softwares usados na busca foram
criados por ele. — Meu queixo praticamente
resvala o chão. — Se ele for aceito para o estágio,
poderá fazer tudo corretamente dentro da empresa
para que possamos usar os dados compilados.
Porque mesmo se contratar ele só como freelancer
não poderemos usar, tendo em conta que os
softwares são só experimentais. No seu lugar, já
que quer manter segredo do seu pai por enquanto,
eu o contrataria e estaria com todos os documentos
corretos na mão primeiro, para depois falar com seu
pai e deixar que ele decida como proceder. Assim
vai estressá-lo uma vez só com este assunto.
Caramba.
— Em resumo, contratarei um estagiário e
terei que comprar a patente dele? Percebe como

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isso soa meio irreal? — Meu sistema de autodefesa


entra em ação, como sempre quando o assunto é o
Oliver.
— Seria irreal se não soubéssemos onde
estaria investindo o seu dinheiro, Ayla. O que não é
o caso, precisa de mais o quê para ter certeza que o
Oliver é um cara bom naquilo que faz? — OK,
nada em seu tom denuncia que ele saiba de tudo o
que aconteceu entre o seu amigo e eu, mas essa sua
última afirmação soou um tanto quanto imprópria.
— Ontem ficou cinco horas seguidas mergulhado
no computador e só parou quando conseguiu tudo o
que você precisava e não é só sobre o empenho
dele que estou falando, é sobre a sua inteligência e
capacidade. Conheço o estilo de trabalho da
Stewart e quando digo que ele se encaixa aqui, é
porque é a verdade, o conheço desde sempre e
garanto que não irá se arrepender em dar uma
chance ao cara.
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Por que tudo o que ele fala me soa muito


com insinuações? Será que ele não sabe mesmo de
toda a história sórdida que envolve Oliver e eu?
— Ainda não tive tempo de analisar mais a
fundo as fichas dos candidatos, verei o que consigo
fazer nos próximos dias. Obrigada pelas dicas,
Samuel. — Ainda que ele tente disfarçar, vejo a
decepção em seu encolher de ombros diante a
minha resposta.
— Estou aqui para o que precisar — diz,
dirigindo-se para a porta, antes de fechá-la, porém,
se vira para mim novamente e completa: — Oliver
é formado em Ciências da Computação e você já
tem provas de sua eficiência, não ter analisado as
fichas dos candidatos a estágio não é uma desculpa
aceitável, mas a decisão aqui é apenas sua.
Sim, o maldito sabe tudo. Antes que eu
tenha a chance de mandá-lo se foder junto com seu

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amigo filho da mãe, a porta se fecha.


Merda, que tipo de universo paralelo foi
esse em que caí depois que aceitei me cadastrar
naquela porcaria de aplicativo?

Por mais que eu quisesse evitar ter essa


conversa com o meu pai, achei que era melhor tê-la
logo. Isso é um pouco melhor do que a segunda
opção, que era considerar contratar Oliver. Sei que
ainda essa semana terei que de fato analisar as
fichas e que não serei mesquinha o suficiente em
descartar a excelência presente na dele apenas
porque fomos para a cama. É quase certo para mim
que uma das vagas será dele, caberá a mim, e a ele,
saber lidar com as nossas diferenças. Ou
compatibilidades em excesso, nesse caso.
Meu pai está em silêncio já tem alguns
minutos, vim direto para cá depois do expediente.
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Seus olhos passeiam por todas as folhas do arquivo


que Samuel tinha me dado. Juntei tudo em uma
única pasta que meu pai agora analisa.
— Estou muito decepcionado, filha. —
Suas palavras caem como uma bigorna em meu
estômago, esse era o meu outro medo em contar-lhe
a verdade: que ele se decepcionasse com a minha
gerência. Tudo o que eu sempre temi era isso:
decepcioná-lo.
Uma lágrima desce e eu a deixo escorrer
livre. Abaixo a cabeça e espero que ele termine de
falar, mas o silêncio perdura, alguns minutos depois
sinto seu toque no meu queixo levantando meu
rosto.
— Por que está chorando, princesa? Nós
vamos dar um jeito nisso. — Há uma consternação
em seu semblante que parte meu coração ao meio.
Arrastando a cadeira até mais perto de mim, meu

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pai me puxa para perto, aconchegando-me em seus


braços.
— Nunca quis decepcionar o senhor, pai.
Eu...
— Minha nossa, princesa, de onde tirou
essa ideia de que está me decepcionando? — Seu
tom é firme e ele nos afasta para olhar nos meus
olhos. — Você tem superado e muito tudo o que eu
sempre desejei para você, filha. É uma mulher
incrível, um ser humano com um coração de ouro e
uma CEO que está levando a nossa empresa ainda
mais para o topo. Como eu poderia me decepcionar
com você, meu amor?
Encaro-o confusa.
— Mas você disse que estava decepcionado
— sussurro, fazendo-o rir.
— Sim, mas não com você. Nunca com
você, princesa. Ernest sempre foi como um amigo,
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foi uma apunhalada e tanto isso que ele fez. Essa é


a minha decepção, ter confiado nele. — Sou
puxada novamente para seus braços e deito a
cabeça em seu ombro. O beijo que ele disfere na
minha testa me faz sentir novamente uma garotinha
com medo dos trovões. Em noites de tempestade eu
sempre corria para o seu quarto onde era mimada e
afagada até que pegasse outra vez no sono com a
sua voz doce cantando canções de ninar. Mais
algumas lágrimas descem, essas de nostalgia e
gratidão. — Você nunca me decepcionará,
filhotinha. Nunca.
Não o contradigo, sei que algum dia eu o
farei, afinal, não sou perfeita. Apenas aprecio o
carinho que me é fornecido e deixo de lado todas as
outras preocupações, isso até que meu pai joga a
bomba no meu colo:
— Mas eu concordo com o Samuel, o

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garoto que o ajudou é muito bom e merece uma


chance, aliás, quero que marque uma reunião com o
tal Oliver, eu mesmo quero oferecer a ele uma vaga
na nossa empresa.
Bem, que grande porcaria. Maldita hora que
decidi lhe contar exatamente tudo que Samuel tinha
me passado.

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Durante a aula meu celular tocou diversas


vezes, chequei somente a primeira ligação para ter
certeza de que não era algo relacionado ao meu pai
e como não era, deixei no silencioso para ver quem
estava ligando só quando estivesse indo para casa.
Nos últimos dias minha concentração nos
estudos tem sido nula diante a grande avalanche de
problemas que surgiu.
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— De todas as turmas que eu tenho, seja


graduando ou pós, você é o meu melhor aluno,
Oliver. Mas tenho te notado bem ausente esses
dias, algo que queira falar? — O professor Frederik
chama a minha atenção quando estou quase saindo
da sala. Pauso meus passos e o encaro.
— Peço desculpas, vou me concentrar mais.
— Não estou te repreendendo, Oliver só
estou preocupado. Não deixe que os problemas
tomem proporções maiores do que de fato
merecem. — Não o odeio por diminuir a situação
com meu pai, afinal, ele não sabe de tudo. Portanto
sorrio para ele.
— Obrigado, logo as coisas voltam ao
normal. — Frederik aperta meu ombro em sinal de
solidariedade e eu saio da sala antes que ele comece
a falar mais.
Não quero pessoas me dizendo que vai ficar

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tudo bem. Eu sei que não vai, ao menos não em


futuro próximo. É falta de fé, as pessoas gostam de
dizer, tenha paciência, nada dura para sempre.
Odeio frases prontas porque somente quem está
passando pela provação é que sabe o quanto dói, o
quanto custa levantar todos os dias da cama e
seguir com o dia normalmente mesmo quando tudo
por dentro de você está morrendo.
Não estou deixando que meus problemas
tomem proporções maiores do que eles merecem,
desde que começaram a surgir, me engoliram de
uma forma que nunca possuí o controle.
Disperso os pensamentos quando o celular
toca mais uma vez é o mesmo número
desconhecido que me ligou a manhã toda.
— Alô.
— Humm... Oliver? — pergunta uma voz
feminina que eu não reconheço.

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— Sou eu.
— Aqui é a Hillary da Stewart Technologic
Solutions. — Fico em silêncio esperando que diga o
que quer. — Você poderia estar comparecendo a
uma reunião aqui na empresa hoje, às quinze horas?
— Reunião referente a que? — Não
imaginei que me procurariam, ainda que Sam
realmente falasse com a Ayla sobre a minha ajuda
no lance do roubo, depois do nosso último encontro
tanto o da entrevista quanto o que tivemos pelo
Speed Sex, não achei que ela fosse querer saber de
mim tão cedo.
— Eddy Stewart quer falar com você a
respeito de uma vaga de emprego. — Minhas
pernas travam e meu coração dispara. Não tenho
vergonha nenhuma em admitir que estou
emocionado.
Porra.

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PORRA!
Só percebo que gritei a palavra quando ouço
uma risadinha do outro lado da linha.
— Desculpa a indiscrição. As três, né?
Estarei aí.
— Confirmado então, Oliver. E seja bem-
vindo a Stewart. — Diz e desliga. Soco o ar
animado depois de colocar o celular de volta no
bolso.
Caralho.
Merda, estou parecendo o Sam com essa
enxurrada de palavrões! O pensamento me faz rir e
sei que estou parecendo um louco rindo sozinho no
corredor da faculdade. Bem, foda-se!
Com a adrenalina correndo em minhas
veias, paraliso em frente ao grande portão que me
leva para a rua quando a primeira pessoa que sinto
vontade de conversar sobre essa novidade é uma
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maldita morena de boca dura que bagunçou toda a


minha vida. Será que ela sabe que seu pai quer me
oferecer um emprego? O que será que ela pensa
disso?
Cara, estou tão fodido...

Depois de ter tido seu pedido aceito por nós,


meu pai tem falado mais. Bom, de acordo com a
sua limitação, claro, mas tem se expressado bem
em vista da sua dificuldade em ter o controle dos
músculos faciais e da língua. Ainda não sou capaz
de olhá-lo sem sentir meu coração sendo
massacrado por um punho de pura angústia e
espero que este dia chegue logo, antes que ele se vá
e tudo o que fique dentro de mim seja
arrependimento.
Termino de servir o almoço e Rick me
encara animado ao ver a montanha de batatas fritas.
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Vejo os olhos do meu pai iluminar-se perante a


animação do filho e isso me aquece.
— Cadê a Charlie? — Meu pai pergunta,
noto que sua voz está mais arrastada do que mais
cedo e presumo que deva estar cansado, mesmo que
ainda estejamos na metade do dia.
— Foi para a casa de uma amiga fazer um
trabalho da escola. Doug foi ao banco e chega em
uma hora. — Sirvo homus em uma tigela e depois
de montar meu prato me sento ao lado dele para
ajudá-lo. — Hoje tenho uma reunião naquela
empresa que sempre quis um emprego, pai.
O maior sorriso dos últimos tempos se abre
em seu rosto.
— Essa é uma notícia maravilhosa, garoto.
Eu sempre soube que você seria capaz de
conquistar todos os seus sonhos. Você merece isso
e muito, muito mais, filho. Nunca aceite menos do

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que o topo do mundo porque é lá que é o seu lugar.


Um bolo de emoções se forma em minha
garganta e uso um longo gole de água para
desmanchá-lo. Meu pai ainda tem um enorme
sorriso nos lábios quando eu começo a servi-lo. Há
tempos não tínhamos uma refeição tão calma e em
um clima familiar como este, logo Richard começa
a contar como tinha sido sua manhã na escola e
estamos rindo de suas aventuras e de seu
constrangimento ao deixar escapar que gosta de
uma de suas amiguinhas de sala.
— Você será um grande homem também,
Rick. Sorte terá a mulher que conseguir conquistar
o seu amor. — Vejo a emoção fluindo em seus
olhos ao dizer tais palavras e as não ditas: ele não
estará aqui para assistir ao filho se tornar um
homem. — Respeite sempre o seu irmão e o ouça,
tudo bem, Richard? Oliver é o mais velho e merece

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todo o respeito vindo de você e da sua irmã.


Um silêncio pesado recai sobre nós. As
palavras do meu pai soando muito como uma
despedida.
— Eu sei, papai. E quando eu crescer quero
ser um homem igual o Oli. — Sorrio para o meu
irmão, falhando em transmitir alegria no leve
esticar de lábios pela forma inconstante que meu
coração está batendo com um medo iminente do
tom do meu pai.
— Sempre vou amar vocês. E sei que serão
muito felizes.
Quando abro a boca para contestar, Doug
chega com seu jeito eufórico de sempre, tomando
meu lugar em ajudar meu pai com a refeição. Ainda
em choque, dou-lhe uma segunda olhada antes de
me retirar para o quarto, tentando fazer com que
suas palavras e tom não me deixem paranoico.

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Desço do elevador no décimo quinto andar,


mas a minha cabeça ainda está lá em casa. Deixei
Doug, meus irmãos e meu pai na sala, mergulhados
em alguma atividade fonoaudióloga, ao menos ele
tem aceitado ajuda dos filhos para conseguir
manter-se ativo na fala. Suas palavras durante o
almoço ficam se repetindo em um fluxo
interminável.
Será que está acontecendo algo que eu não
saiba? Ele tem falado com o médico sem a minha
presença? Não é possível, a última consulta na
segunda eu estive presente do começo ao fim.
Droga, preciso mesmo me acalmar e deixar essa
paranoia de lado...
A mesma moça que me recebeu no dia da
entrevista surge no extenso corredor, um sorriso
gigante no rosto. Chega a ser estranho a forma
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constante que ela sorri.


— Boa tarde, Oliver! Estou muito feliz em
revê-lo aqui, eu sabia que a Ayla não seria burra o
bastante para deixá-lo escapar. — Pego-me
desejando perguntar se a morena tinha falado algo
sobre mim. Estou mesmo parecendo uma
garotinha! — Venha comigo, tio Eddy já está
esperando você.
Sigo-a pelo corredor até a mesma sala da
minha primeira visita ao prédio. Ali dentro estão
Ayla, Edward Stewart e Sam.
Normalmente sou um cara confiante, mas
agora me sinto tão nervoso que um frio se aloja em
meu estômago. Sam sorri quando entro, Edward
Stewart me olha com o que acredito ser admiração,
o que me deixa ainda mais nervoso, já Ayla desvia
os olhos para a parede aos fundos da sala.
— Boa tarde. — O corpo dela está rígido e

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sua postura mostra claramente que se esforça para


não se render e virar para mim. Por dentro eu
sorrio.
— Boa tarde, filho. — O senhor fica de pé e
se aproxima, apertando a minha mão com as suas
duas. O ato mostra que eu estava certo, era mesmo
admiração o que vi em seus olhos e isso me deixa
eufórico, tento não deixar isso tão evidente. Sinto-
me como uma criança na manhã de natal. — Estava
ansioso para conhecê-lo, Oliver. Estou muito
admirado com o trabalho que fez para nós bem
como pelo seu curriculum. — Com uma de suas
mãos em meu ombro ele me indica a cadeira ao
lado da de sua filha, que mantém os olhos
passeando por todos os lados menos em mim.
Sam apenas me oferece um meneio de
cabeça, está no modo profissional. Assim que me
sento Eddy pergunta:

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— Então, Oliver, o que você faz para viver?


— Engulo em seco no instante que Ayla me encara
e um sorriso de puro escárnio brilha em seus lábios.
Porém, só há uma forma de conseguir este
emprego, seja ele qual for, e é falando a verdade.
Respiro fundo e me concentro somente nele, pois
ainda sinto o olhar aguçado da princesinha sobre
mim.
— Eu poderia mentir para o senhor e dizer
que tenho um trabalho excelente na minha área,
mas depois que o meu pai ficou doente eu comecei
a procurar todos os meios disponíveis para
conseguir uma quantia boa que me ajudasse a
prover o tratamento dele e a cuidar dos meus
irmãos. Não tenho vergonha do que vinha fazendo,
senhor Stewart, porque foi o que andou sustentando
a minha família. — Em um único fôlego, solto a
bomba: — Nos últimos meses trabalhei como
acompanhante. — Ouço Ayla resfolegar e imagino
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que tenha pensado que eu faria exatamente o que


disse no começo: mentir. Eddy continua me
encarando, sua expressão agora indecifrável. —
Diferente do que muitas pessoas imaginam quando
ouvem a palavra acompanhante, não é uma
profissão que exija sexo. — Agora fixo meus olhos
em sua filha e a vejo enrubescer. — Eu apenas
acompanhava mulheres em eventos onde era
preciso companhia.
— Não precisa se explicar para mim, filho.
Só o fato de ter procurado um trabalho lícito para
cuidar da sua família já é algo que desperta ainda
mais a minha admiração. — Respiro aliviado diante
suas palavras. — Você estuda, né? Samuel
comentou algo assim...
— Sim, senhor.
— Por favor, me chame de Eddy a
superproteção da minha filha já me faz sentir velho

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o suficiente. — É impossível não rir de sua


verdadeira indignação com a afirmação. E pela
primeira vez desde que entrei aqui, vejo um sorriso
bonito se abrir na carranca da princesinha. — Mas
então, faz faculdade de que? — Sei que obviamente
ele leu a minha ficha, então me pergunto por que
me crivar de perguntas desta forma.
— Engenharia de software. Ainda quando
estava fazendo ciências da computação comecei a
nutrir uma certa paixão por criar softwares, assim
que finalizei o primeiro curso não tardei em
começar o segundo. — Seu sorriso, aquele
orgulhoso que exibia quando cheguei, retorna.
— Como já falei antes estou admirado e
satisfeito com o trabalho que fez junto ao Samuel e
tenho uma proposta para lhe fazer. — Estendendo a
mão ele pega da filha um calhamaço e me oferece.
— Todo ano contratamos dois estagiários e você

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estava na fila para uma das vagas, mas o seu


potencial é aquém de um estágio, quero te oferecer
um emprego fixo das oito as dezesseis com todos
os benefícios que a empresa tem a oferecer,
inclusive plano médico para o tratamento do seu
pai. A vaga é para atuar como criador, programador
e analista de softwares. Além do emprego,
queremos patentear o seu software que desvendou o
roubo da empresa.
Minha boca seca. Meu coração martela
insistentemente contra a caixa torácica. Só percebo
que estou tremendo quando alguns dos papéis
escorregam dos meus dedos e se espalham pelo
chão. Abaixo-me para pegá-los e meus dedos
resvalam nos de Ayla que teve o mesmo intuito que
eu, abaixando-se ao meu lado.
— Desculpa — peço baixinho, ainda em
choque pela proposta.

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— É uma grande oportunidade, Oliver. E


você a merece. — Suas palavras acalmam-me de
uma forma estranha. Ainda mais se considerar toda
a animosidade que tem nos cercado. Mas é como
um sopro suave sobre uma ferida em carne viva.
Quando fico ereto novamente organizando o
calhamaço, Eddy fica de pé.
— Leve as propostas para casa, converse
com o seu pai e pense direitinho. Na segunda nos
encontramos aqui às nove para que me dê a sua
resposta. — Dando-me um aperto no ombro ele se
retira da sala, mas para na porta e me encara uma
última vez. — Agora eu sei de onde eu o conheço,
Ayla, ele é aquele moço que te acompanhou no
jantar da Kate, eu vi vocês na revista. É aquele que
você falou que era seu namorado.
O clique da porta se fechando chega a fazer
eco na sala, diante o ensurdecedor silêncio que

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paira sobre nós.

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Puta merda.
No que o meu pai estava pensando ao soltar
aquela bomba antes de deixar a sala? E que merda
de revista é essa em que ele nos viu? Não cheguei a
ser informada de revista nenhuma que tenha
publicado sobre nós. Sabia que este era um risco
iminente, mas com todo o estresse que apenas
pensar no nome do Oliver tem trazido para a minha
vida, nem sequer pensei em checar se havia fotos

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daquela noite. E isso já faz algumas semanas!


Antes que qualquer um de nós possa dizer
algo Samuel solta uma estrondosa gargalhada,
fazendo-me encará-lo assustada. Nunca o tinha
visto sequer sorrir dentro da empresa.
— Mano, eu tinha que ter gravado a sua
cara! — diz ao amigo que o fuzila com um olhar
feroz. Sem demonstrar um pingo sequer de
constrangimento ou de arrependimento pela
brincadeira idiota, ele se levanta e segue até a porta.
— Até o final da reunião eu não tinha ideia do
porquê o Eddy quis a minha presença aqui, mas
agora preciso agradecê-lo pelo convite.
Aquela foi uma pergunta que eu tinha feito
a mim mesma quando o vi na sala e não soube a
resposta até este momento após a frase de efeito do
meu velho. De alguma forma Edward Stewart sabia
sobre a minha história conturbada com o Oliver e

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está querendo dar uma de cúpido e por Samuel ser


amigo do Oliver, acha que tem nele um aliado.
Bom, que azar o deles...
— Te vejo depois, Oli. — Samuel vai
embora e no instante que a porta se fecha, o clima
na sala muda totalmente.
É impossível negar a atração intensa que
sentimos pelo outro.
Estamos muito perto para o bem da minha
sanidade então me levanto e começo a ajeitar
minhas coisas para sair da sala. O que não demora
nem dois segundos, pois só trouxe a agenda e o
celular.
— Você. — Oliver começa, mas pigarreia
para clarear a voz. Uma vulnerabilidade que nuca
imaginei ver nele brilhando em seus olhos. — Você
está bem com a proposta que o seu pai me fez,
Ayla? — Por que a forma que ele fala o meu nome
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tem que mexer tanto comigo? Seus olhos fixam-se


nos meus lábios conforme eu passo a língua sobre
eles para aplacar a secura que de repente os
acomete.
Minha respiração se torna rasa e um nó se
forma no meu baixo ventre diante o fogo que
emana de suas íris verdes.
— Si-sim — gaguejo assistindo-o dar mais
um passo em minha direção. Prendo a respiração
sentindo a tensão sexual crepitar à nossa volta. Meu
corpo ansiando pela aproximação. Estou quase
fechando os olhos esperando pelo beijo quando seu
polegar resvala no canto da minha boca.
— Estava sujo de chocolate. — Mas que
merda? Com um sorriso cínico e parecendo ter
retomado o foco profissional, que por alguns
instantes tinha sido esquecido, Oliver se afasta
caminhando até a porta.

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Maldita seja a Júlia que me convenceu a


comer aqueles donuts com calda de chocolate antes
da reunião! E maldito seja esse filho da mãe
arrogante dos infernos que me deixou nervosa o
suficiente para me deixar com vontade de comer
chocolate!
— Tenha uma boa tarde, Madison. — Sua
voz rouca abandona a frase quando ele sai da sala,
permaneço estática e de boca aberta.
Definitivamente eu odeio esse cara.
Nem tenho tempo de me recuperar da
avalanche de emoções e a porta se abre novamente
revelando uma Júlia eufórica.
— Me conta tudo! Ele aceitou o emprego?
Vocês vão sair de novo? Vai, não seja careta e abre
logo essa boca, vaca sortuda! — Massageio as
têmporas.
Oliver precisa mesmo deste emprego, que é
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muito mais do que merecido considerando todo seu


potencial. Meu pai sempre foi uma pessoa justa e
me orgulho muito de, neste sentido, seguir os seus
passos, mas honestamente... Oliver e eu
trabalhando juntos? Da mesma forma que é
impossível negar que nos desejamos com loucura,
também há uma faísca de raiva que crepita quando
estamos no mesmo ambiente e não sei se
trabalharmos juntos será saudável.
— Meu Deus... — Jú passa a mão na frente
do meu rosto para chamar a minha atenção, seus
olhos estão brilhando em divertimento. — Não
acredito!
De que merda ela está falando? Arqueio a
sobrancelha esperando que me elucide, mas a idiota
apenas cai na gargalhada. Com a raiva pelos
momentos com Oliver fresca no meu sangue e a
provocação clara da minha prima, saio da sala e a

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deixo para trás antes que faça uma loucura. Assim


que entro no meu escritório ela aparece atrás de
mim, ignoro a sua presença e começo a checar a
minha agenda.
Tenho projetos para aprovar, dois
estagiários para escolher e algumas centenas de
pedidos de novos softwares para analisar. Caso
Oliver aceite a proposta, já até sei quais projetos o
colocarei à frente. Sua capacidade irá acrescentar
muito na nossa empresa...
— Desculpa, Lally. — A inconveniente se
senta na beirada da minha mesa e me encara com
um sorriso arrependido.
— Que seja.
Pego na gaveta os arquivos dos candidatos e
começo analisá-los. Cara será uma das
selecionadas, agora que Oliver não é mais uma
opção preciso escolher outro para ficar com a vaga

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que era dele, quando começo a ler a primeira ficha


Júlia coloca a mão sobre ela.
— Fala comigo, prima.
— Não tenho nada para falar, Júlia. Preciso
é trabalhar, alguém nessa família precisa fazer isso,
sabe? — Me arrependo das palavras ditas no
momento que vejo seu olhar ferido. Ficando de pé
ela assume uma postura defensiva e me encara
enquanto caminha rumo a porta.
— Você sempre foi cabeça dura e um tanto
fria quando se trata de sentimentos, se entregar ao
trabalho é o seu ponto forte, mas relações pessoais
não. Insisti para que saísse mais, que encontrasse
alguém porque tudo o que eu mais quero é te ver
feliz, Ayla. Você se blinda de arrogância quando
começa a se interessar por alguém e tudo o que
vejo é você sendo estúpida com o Oliver. Espero
que não seja tarde demais quando realmente aceitar

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que está apaixonada.


Fico parada encarando a porta depois que
ela a bate com força.
Evito pensar em suas palavras, tenho
trabalho demais para fazer e ainda que eu me
arrependa de ter dito aquilo para ela, não tenho
tempo para os seus chiliques.
Eu fria? De onde ela tirou isso? O problema
dela é que sua vida gira em torno de festas e
homens enquanto eu tenho a cabeça no lugar e
quero construir um futuro estável para mim e para a
família, que no futuro, pretendo constituir. Que mal
há nisso?

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Meu pai está eufórico com a proposta que


recebi. Tudo o que ele sempre quis foi me ver
trabalhando na minha área. Eu ainda estou nervoso,
sei do meu potencial, mas é uma proposta que
demanda uma responsabilidade enorme que não sei
se sou capaz de ter no momento tendo em conta
minha situação com o meu pai. Sem contar que
terei que trancar a faculdade.
Mas caralho, ser patenteado e ainda
contratado por uma empresa como a Stewart é o
sonho de cada programador que ame realmente o
seu trabalho!

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— Você precisa aceitar, filho, uma proposta


dessas não acontece mais de uma vez na vida. Sei
muito bem o que está passando nessa sua cabeça
dura e te garanto, seus irmãos e eu vamos ficar
bem. — Usando uma mão para dar apoio a outra,
ele abre os dedos sobre o meu braço, chamando a
minha atenção. — Você tem que aceitar, Oliver,
aceite isso como uma ordem.
Respiro fundo e deito a cabeça em seu
ombro.
— Vou aceitar, pai. — Minto, não em um
todo já que a parte da patente não tenho muito que
pensar antes de dizer sim, o problema é o emprego
que ainda não sei se é a escolha certa no momento.
Quando meus irmãos chegam da escola
aproveito o clima sociável que meu pai tem estado
e nos levo para jantar fora. Meus últimos encontros
foram rentáveis e com o corte nos gastos com o

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tratamento tem sobrado um pouco para que eu


possa fazer das próximas semanas, dias incríveis e
memoráveis para todos nós.
Me lembrar dos encontros me leva a pensar
que essa também é outra coisa que tenho que levar
em conta se aceitar o emprego. Não que seja um
sacrifício abrir mão de atuar como acompanhante, é
só que... sair do aplicativo minará de vez as minhas
chances de ter qualquer outro encontro com a Ayla
sem ser no ambiente profissional.
Merda, olha só para onde meus
pensamentos estão seguindo!
Tê-la deixado confusa na sala hoje levou
tudo de mim, porque Deus sabe o quanto eu queria
beijá-la, prensá-la contra a parede e fodê-la até que
ambos estivéssemos suados e sem fôlego. Como já
constatei anteriormente aquela mulher desperta o
meu pior e o meu melhor e para ser honesto não sei

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qual dos dois lados eu prefiro.

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Passei todo o sábado completamente área.


Ontem não vi mais a Júlia depois que ela saiu da
minha sala e estou começando a ficar preocupada.
Ainda não parei para pesar as suas palavras mesmo
que de tempos em tempos elas ressoem como um
eco em minha cabeça.
Levantei cedo e não parei um segundo
sequer de trabalhar, conseguindo deixar boa parte
do trabalho de segunda-feira pronto. Talvez essa

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não seja a melhor forma de viver, mas é a que me


faz feliz.
Engolindo todo o meu orgulho pego o
telefone e disco seu número, nunca ficamos vinte e
quatro horas sem nos falar nem mesmo quando eu
estava na faculdade e ela viajando pelas praias do
mundo a fora. A primeira ligação chama até cair na
caixa de mensagem, assim como a segunda e a
terceira. Não desisto, conheço a birra daquela lá e
sei que por mais que esteja chateada comigo, assim
como eu não consegue ficar muito tempo longe.
Somente na sexta ligação que obtenho resposta,
quer dizer, ela atende, mas fica muda esperando
que eu fale. Acabo rindo dessa sua tática.
— Júlia eu te amo. Me desculpa pelas
coisas que falei ontem eu estava nervosa, estar no
mesmo ambiente que o Oliver me irrita de uma
forma que nunca aconteceu antes e a perspectiva de

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trabalhar com ele tem me deixando ainda mais de


cabelo em pé. Sinto-me atraída por ele e culpo você
por todo esse descontrole que tem me dominado, já
que só o conheci por causa da sua insistência. — O
silêncio continua e eu suspiro. — Eu te amo, Jú me
perdoa vai? Nem para casa você veio ontem e eu
senti a sua falta para a nossa noite de sexta...
— Eu odeio tanto quando você se fecha
assim, Ayla. Na vida nem tudo se resume a
praticidade e trabalho. Você trabalha demais para
ter uma vida estável no futuro, mas enquanto esse
maldito futuro não chega você perde o presente. Eu
não tenho juízo, não tenho uma formação, sou
mimada, eu sei que sou, mas sabe? Eu estou
tremendamente feliz assim porque eu sei que se
morrer hoje terei aproveitado tudo o que quis e
você, prima? Se morrer hoje o que terá feito além
de elevar o status da Stewart?

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O silêncio agora é do meu lado da linha. E


quando me dou conta lágrimas banham meu rosto.
— Não chora, eu não falei nada disso por
mal. — Essa vaca conhece até a minha respiração!
— Só me mata ver você desperdiçando a vida
assim. Dá para ser uma CEO fodona e uma mulher
que curte uma noitada, uma empresária de sucesso
que vive uma paixão tórrida. Você pode ser tudo o
que quiser basta apenas acreditar, abrir os olhos e o
coração para a vida e viver. Eu te amo, viu? — Sei
que sorriso não se ouve, mas juro que posso ouvir
um em sua declaração. — ‘Tô indo para casa, toma
um superbanho e se arruma que nós vamos sair
hoje.
Quando penso em reclamar todo o seu
discurso sobre o que estou fazendo da minha vida
aparece em letras garrafais e neon diante meus
olhos, então me calo e apenas balbucio um “ok”.

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Com um “te vejo em breve” desconfiado ela


desliga e eu bufo antes de caminhar para o
banheiro.

Quando saio do banho recebo uma


mensagem com a localização de um barzinho
chique no centro e um texto bem delicado que diz:
“Se não aparecer esquece que tem uma prima que
te ama e uma assessora que faz a sua vida mais
tranquila” dramática? Imagina. Me troquei
escolhendo um dos meus melhores vestidos
casuais, caprichei na maquiagem para não dar
margem para que ela fale mais sobre a minha
inadequação social e calcei os saltos mais
elegantes, mas não muito exagerados e saí de casa
rumo ao endereço.
Deixo meu carro no estacionamento ao lado
do prédio e paro na calçada admirando a fachada da
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casa, de cara o local parece ser bacana, tem um ar


meio rústico e música ao vivo, ainda do lado de
fora posso ouvir uma banda tocando Beatles. Já
gostei do ambiente.
Entro e vasculho todos os cantos em busca
da doida, mas sou surpreendida quando vejo
Samuel. E Júlia dentro dos seus braços.
Não acredito que fui convidada para servir
de vela! Quando me aproximo seus olhos brilham e
ela se afasta dos braços de polvo que a mantinha
cativa, correndo ao meu encontro.
— Eu te odeio, mas eu te amo — sussurra
quase esmagando-me.
— Não consigo respirar — resmungo
abafado, sentindo o ar sumir dos meus pulmões.
Rindo, Júlia se afasta e me encara séria.
— Eu te amo e te perdoo por ser uma grossa
sem coração, mas nem por isso vou deixar de pegar
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no seu pé. E se não mudar e começar a viver,


realmente vou cair fora da sua vida. — Apesar do
sorriso gigantesco seu tom de voz não deixa
dúvidas de que está falando sério. — Vamos,
estávamos só esperando você chegar para irmos
para a nossa mesa.
— E aí, chefinha? — Acabo sorrindo diante
seu jeito extrovertido. Com o Samuel sisudo e
profissional eu já estava acostumada, mas este que
estou começando a conhecer desde a nossa reunião
com Oliver é totalmente novo para mim. E gosto
mais deste, já que ele faz a minha prima feliz, ao
que parece.
— É sábado, nada de chefinha, Samuel. —
Pisco divertida. Júlia entrelaça seus dedos aos dele
e nos guia para a parte dos fundos do bar.
— Estamos fora da empresa, nada de
Samuel, é Sam, chefinha — retruca me fazendo rir.

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Há uma pequena pista de dança perto do


palco e eu realmente amei este lugar! Me pergunto
como nunca o tinha visto já que fica a apenas cinco
quadras da minha casa. Parecendo ler meus
pensamentos, Jú revira os olhos.
— Não é como se você saísse de casa em
busca de lugares para se divertir, né? — zomba
deitando a cabeça no ombro do Sam. Sua atitude
muito pouco parecida com algo que ela faria, me
deixa surpresa.
Júlia Stewart está apaixonada. ‘Tá aí uma
coisa que eu nunca pensei que veria enquanto
vivesse, mas a ideia me causa um quentinho no
peito pois da mesma forma que ela diz querer a
minha felicidade, vê-la feliz é tudo o que eu quero.
Pedimos uma rodada de drinques e a banda
cover muda para músicas dançantes dos anos 80, o
clima fica ainda mais agitado, várias pessoas vão

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para a pista de dança. Engatamos uma conversa


sobre viagens e quando a primeira palavra sobre
trabalho sai da minha boca recebo dois pares de
raio lasers que se fossem reais, perfurariam meu
rosto.
— Estamos aqui para nos divertir. Beber,
dançar, dar uns pegas. — Com o último item seus
olhos se esticam para o cara sentado ao seu lado e
eu reviro os meus. — Assunto de trabalho da porta
para fora, senhorita workaholic.
— Ok. — Daí em diante só ouvi o que
tinham para compartilhar, já que minha última
viagem foi férias em família quando eu tinha
dezesseis anos.
Na terceira rodada de bebidas opto por
vinho branco sendo fuzilada novamente pelo casal,
porque que segundo eles estamos em um barzinho e
o certo é beber cerveja. Ignoro os protestos e peço

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uma deliciosa taça de Prosecco. Estou quase no


final dela quando Júlia olha para trás de mim, abre
um sorrisinho diabólico e depois volta os olhos
para o Sam. Como a noite toda até o momento foi
de troca insanas de olhares e beijos que eu
preferiria não ter presenciado, não dou atenção.
Mas deveria ter dado, porque quando a voz rouca
fala perto demais do meu ouvido me engasgo com
o vinho que tinha na boca.
— Desculpem o atraso, estava resolvendo
umas coisas com a Charlie.
Júlia me estende um guardanapo, o sorriso
em seu rosto me irrita, porém é ofuscado pelas
palavras de Oliver, estava resolvendo umas coisas
com a Charlie, quem diabos é Charlie?
Limpo minha boca e o pouco de vinho que
respingou no meu busto e encaro a taça quase
enxuta, evitando de propósito olhar para a minha

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esquerda que é onde a maior distração da minha


vida se sentou. Ele tem feito um ótimo trabalho
fingindo que não estou ao seu lado. Queria saber
como fazer isso.
— Não esquenta, não pretendemos ir
embora tão cedo. — Sam responde. — Mas e aí,
como ela está?
— Bem, só me deixando cada dia mais
louco. — Não gosto da sensação que embrulha a
boca do meu estômago com seu tom amoroso ao
falar dessa tal Charlie.
O filho da mãe tem uma namorada e
trabalha trepando por aí? Como essa mulher aceita
uma coisa dessas? Uma vozinha irritante no fundo
da minha mente sussurra: “Para ter um cara como
Oliver até você aceitaria, não finja que não,
vadia.”
Desligo meus ouvidos da conversa presente

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na mesa e presto atenção somente nas músicas


ainda dançantes, agora deste século. Como um
ruído de fundo escuto Oliver pedir cerveja e uma
rodada de petiscos, mas continuo ignorando tudo à
minha volta que não seja a minha taça quase vazia,
a música e as pessoas se movendo no ritmo dela.
Funciona até a voz de Júlia se infiltrar na
minha bolha:
— Por que você não vai dançar com o Oli,
Lally? — Essa vaca sabe que eu não sei dançar. E
que raios de ideia é essa. E que história é essa de
Oli?
É tanta sensação torcendo a minha barriga
essa noite que acho que vou vomitar.
— Se me dão licença, preciso ir ao
banheiro. — Saio da mesa em disparada, ignorando
o olhar torto da minha prima por fugir da sua
insinuação.

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Quando entro no confinamento do banheiro


feminino, paro em frente a pia e me encaro no
espelho. Meus olhos estão um pouco maiores que o
normal, efeito das doses que ingeri, meu cabelo
está um pouco mais volumoso o que me deixa
ainda mais bonita. Retoco meu batom e molho a
mão antes de passá-las nas bochechas para tentar
aplacar o fogo que as tem queimado. Molho
também a nuca.
Tudo o que aconteceu entre Oliver e eu foi
apenas um jogo de poder ridículo. O sexo foi
incrível, claro que foi, mas já passou. Meu lado
mesquinho falou alto quando soube que poderia tê-
lo abaixo de mim, literalmente. Eu ganhei aquele
maldito jogo, isso já está mais do que claro, agora
chega! Não sou mais uma adolescente de quinze
anos com hormônios a flor da pele. Sou uma adulta
e sei muito bem controlar o meu corpo.

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Claro que consigo.


E consegui, mas só até estar de volta ao
salão e vê-lo na pista de dança, seu corpo
completamente moldado ao da loira dentro dos seus
braços. Secreto, de Anuel AA e Karol G está
tocando e o casal obsceno se mexe junto ao
reggaeton. Sinto uma pontada no peito e um calor
quase insuportável afoguear meu rosto e colo.
Sigo a passos firmes até a mesa e não deixo
de notar que os olhos do maldito estão colados em
mim enquanto seu quadril se esfrega sem pudor
algum na mulher fundida a ele, e sua boca se move
quando a voz rouca e sensual do cantor executa o
trecho:
Eu sou viciado no seu corpo
Gata, você é só minha, eu não divido.
A forma como ele prende o canto do lábio
superior somado ao calor que seus olhos emanam

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me deixa completamente hipnotizada. Ainda que


por dentro eu esteja morrendo de vontade de
mandá-lo se foder, na mesma medida meu corpo
está em brasa ansiando por aquilo tudo que eu já sei
que ele é capaz de me causar. A música chega ao
fim e no momento que Oliver começa a caminhar
de volta para a nossa mesa eu me levanto.
— Vou para casa. — Não espero resposta
apenas saio.
Do lado de fora fecho os olhos assim que o
vento fresco da noite beija a minha pele. É uma
sensação muito bem-vinda que contrasta
perfeitamente com a temperatura elevada em que
Oliver deixou o meu corpo. Em passadas tranquilas
caminho até meu carro e quase infarto quando um
corpo quente me prensa contra a lataria antes que
eu abra a porta.
— Você tem me deixado louco, princesa.

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Passo metade dos meus dias completamente duro


pensando em você, em tudo o que já fizemos e tudo
o que eu ainda quero fazer com você. E a outra
metade, puto, me forçando a não pensar em você e
falhando miseravelmente. — Suas palavras são
ditas contra o meu pescoço onde a língua traceja
paralelos que me fazem perder qualquer linha de
raciocínio.
Sobre o que mesmo ele esteve falando nos
últimos segundos?
— Quero foder você, mas sei o quanto isso
é errado. Você já deixou claro de diversas formas o
quanto me detesta e sou um maldito sem orgulho
nenhum por ainda desejar você. Mas quer saber?
Foda-se a lógica, preciso sentir seu gosto e sentir o
seu corpo no meu de novo, nem que seja por uma
última vez. — Ao final de seu discurso inflamado
sua mão sobe o meu vestido e os dedos ágeis

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desbravam o caminho até a minha boceta que já


pulsa ansiando o contato.
Sua boca pressiona contra a minha, nossas
línguas se tocando calmamente, um total oposto de
seus dedos que circulam meu clitóris levando-me a
loucura. Agarro-me em seus ombros e mordo seus
lábios quando a primeira onda amolece meu corpo.
Oliver, implacável como é, usa sua maldita boca
para sussurrar tudo o que ainda pretende fazer
comigo naquela sua voz rouca que me deixa mole.
Ele não para. As mãos me procuram e acariciam
onde alcançam, não sei como ele consegue, ou se a
inércia pós-coito que não me deixou prestar
atenção, mas quando dou por mim estou sendo
empalada pelo seu pau, que me preenche de uma só
vez arrancando meu fôlego.
Com estocadas precisas e a boca
pecaminosa intercalando beijos, mordidas, chupões

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e palavras obscenas, Oliver consegue me levar a


um segundo orgasmo que me deixa tonta. Antes
que eu possa voltar a mim, ele goza e me coloca
sobre meus pés. Quando seus olhos encontram os
meus não consigo decifrar o que vejo.
— Obrigado pelo sexo, Ayla. Foi incrível
como sempre.
Então ele me dá as costas e sai ainda
abotoando a calça.
Ajeito meu vestido e fico encarando as suas
costas tentando entender que merda é essa que
acabou de acontecer. Sinto-me suja de uma forma
vergonhosa.
Neste instante uma vozinha lá no fundo da
minha mente grita: foi exatamente desta forma que
você o fez se sentir nas outras vezes em que
estiveram juntos.
Engolindo qualquer resto de dignidade que
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me sobrou, entro no carro e dirijo para casa.

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Se o meu pai soubesse o que eu fiz com a


Ayla eu levaria uma surra, mesmo que já não tenha
mais idade para apanhar.
Na verdade, nem eu mesmo sei o que deu
em mim para tratá-la daquela forma. Provocá-la foi
legal, ver a forma como tentava a todo custo não
deixar transparecer o quanto se sente atraída por
mim atiçou um lado meu que nem eu conhecia. Vê-
la com ciúmes por me ver dançando com aquela
loira que eu nem sequer conhecia, inflou meu ego e
despertou um fogo em meu interior que me fez ir
atrás dela. Não menti em uma só palavra de tudo o
que disse a ela e realmente a queria uma última vez
pois sei que a partir de segunda nunca mais terei a

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oportunidade.
Ayla me ignora, me faz sentir diminuído e
mesmo assim não consigo controlar meu corpo a
parar de desejá-la. Sou um idiota.
No momento que a prensei contra o carro e
senti a sua entrega eu só agi seguindo os comandos
do meu corpo. Aquela maldita frase no final foi um
rompante do meu eu que queria um pouco de
vingança. Da pequena parte minha que queria que
ela se sentisse um pouco da forma que me fez sentir
quando agiu como uma princesinha mimada e
egoísta.
Agora, deitado em minha cama fitando o
teto me sinto o pior ser humano do mundo.
Procurando uma forma de não me odiar pelo que
fiz, levo meus pensamentos para o meu outro
dilema além dos meus sentimentos por Ayla
Stewart: como conciliar o trabalho, a faculdade e a

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minha família.
As milhões de hipóteses fervem em minha
mente até que adormeço.

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No domingo à noite depois de muito bater


cabeça e discutir com meu pai os prós e contras de
cada hipótese que cogitei no sábado antes de
dormir, achei que a melhor opção será trancar a
faculdade, me entregar ao trabalho e quando já
estiver estabilizado, volto aos estudos. Não terei
psicológico para lidar com as três coisas ao mesmo
tempo.
Às nove da manhã em ponto estou na porta

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da sala de reuniões e Júlia aparece sorridente.


— Bom dia, Oliver. Tio Eddy já está te
esperando, pode entrar. — Ela abre a porta e dá um
tapinha no meu ombro e sussurra antes de virar as
costas e sair: — Boa sorte!
Abro a boca para responder, mas as
palavras somem quando vejo Ayla dobrando o
corredor. O vestido azul escuro abraça com
perfeição cada uma das curvas que eu conheço
bem. Os saltos dão a ela um ar profissional que a
deixa ainda mais irresistível.
Céus, por que essa mulher não cruzou o
meu caminho em outras circunstâncias? Por que
não somos pessoas diferentes?
Ao me ver parado na porta seus olhos
desviam de mim e ela muda de direção. Por um
mísero segundo antes de perdê-la de vista, juro que
vejo um lampejo de pesar em seu rosto. Com um

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suspiro resignado entro na sala. Edward está


sentado na cabeceira da mesa, uma xícara de café
entre os dedos e os olhos atentos em mim, disfarço
o incômodo de ter sido pego no flagra e caminho
até ele.
— Bom dia, Edward.
— Bom dia, filho. Sente-se aqui do meu
lado. — Seu tom amistoso alivia um pouco da
culpa pela forma que encarei a sua filha há alguns
segundos. — Como passou o final de semana?
Encaro-o surpreso, nunca imaginei que o
dono da empresa receberia um possível funcionário
para saber se ele aceita a proposta e ainda lhe
perguntaria sobre o seu final de semana. Mas há
algo no modo de Edward falar e na sua postura
corporal que diz que ele é exatamente desta forma.
— Foi bom, apesar de eu ter passado boa
parte dos dois dias batalhando para encontrar a

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melhor saída de poder aceitar o emprego. — Claro


que omito a parte que me aproveitei de sua filha.
— Como assim, melhor saída? — Sua testa
vinca e o olhar torna-se preocupado.
— Como falei na sexta sou eu quem ando
arcando com os gastos da minha família e do
tratamento do meu pai. E tem também a faculdade,
sou bolsista, mas se aceitar o emprego não acredito
que darei conta de lidar com essas três questões
sem deixar qualquer uma delas de lado em algum
momento. Sei que parece um dilema bobo, mas não
quero falhar em nenhuma das áreas da minha vida.
— Não é um dilema bobo, Oliver pelo
contrário, só deixa ainda mais claro o quanto é um
cara responsável. Em duas ocasiões você poderia
ter mentido para mim para passar uma imagem
perfeita, mas optou pela verdade o que me faz
admirá-lo ainda mais. — Edward anda até a

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mesinha no canto da sala e me serve uma xícara de


café, senta-se novamente e me encara sério. — Me
fale sobre o seu pai.
Engulo o nó que repentinamente se formou.
Falar sobre meu pai sempre me deixa para baixo,
mas respiro fundo e começo:
— Ele foi bombeiro por mais de trinta anos.
Meu pai sempre foi uma pessoa muito ativa, não o
via parado um segundo sequer durante todo o dia
mesmo quando não estava trabalhando. Dois anos
depois que se aposentou começou a ter espasmos
musculares e outras vezes, rigidez muscular, no
começo pensou não ser nada demais, só “coisas da
idade” ele dizia. Quando as crises se tornaram mais
constantes eu o forcei a buscar um médico, algumas
semanas depois tivemos o diagnóstico de Doença
de Huntington, descobrindo em seguida que na
verdade vários sintomas vinham se apresentado há

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anos, mas meu pai nunca deu atenção a eles


pensando sempre ser coisas corriqueiras devido ao
seu trabalho e esforços constantes. — A emoção
trava a minha garganta e bebo um gole do café para
recuperar a compostura. Não o encaro, continuo de
cabeça baixa: — Minha mãe foi embora no dia
seguinte ao diagnóstico, meu pai ficou dois anos
sem pronunciar uma única palavra e quando o fez,
dias atrás, me pediu para deixá-lo morrer.
Não sei por que confessei a última parte, só
saiu. Sua mão toca meu ombro e o aperta,
transmitindo conforto. Sinto lágrimas descendo e
percebo que essa é a primeira vez que digo aquela
verdade em voz alta. Edward é a primeira pessoa
com a qual compartilho a minha dor.
— É uma situação bem complicada, filho.
Não consigo imaginar o quanto deve estar sendo
difícil lidar com tudo o que foi jogado em seus

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ombros de uma hora para outra. Estou parecendo


uma vitrola quebrada, mas a cada conversa nossa
mais eu sinto admiração pela sua pessoa, Oliver.
Não é qualquer filho que abriria mão de tantas
coisas como você fez para cuidar do pai e dos
irmãos e se não for muita intromissão, gostaria de
lhe dar um conselho. — Pela primeira vez desde
que comecei a falar, levanto os olhos e o encaro.
Há compaixão em seus olhos e um sorriso
encorajador.
— Gostaria muito de ouvir seu conselho,
senhor.
— Edward ou Eddy, já falamos sobre isso,
filho. — Acabo rindo de sua reprovação.
— Tudo bem, Edward, quero muito receber
um conselho seu.
— Se estivesse no seu lugar aceitaria vender
o software e o emprego, o dinheiro da patente pode

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ser investido para o seu futuro e de seus irmãos, o


plano de saúde do trabalho cobrirá o tratamento do
seu pai e o salário vai ser o suficiente para arcar
com os gastos com a casa e o que mais precisar.
Sobre a faculdade, tenho certeza que dará conta
você é esforçado, mas para o começo e para que
você não ache que está sobrecarregado, sugiro que
a tranque por seis meses. — É um ótimo conselho e
exatamente o que eu tinha decidido fazer, tirando a
parte dos seis meses, já que no meu plano nem
cheguei a pensar em quando retomar os estudos. —
Apesar de já estar com um ótimo emprego
garantido, estudar nunca é demais. E eu não quero
que largue a faculdade por causa do emprego e não
vou aceitar isso, caso aceite a minha proposta.
Concordo com um aceno.
— Bom, dito isso qual a sua resposta,
Oliver? Estamos ansiosos para integrá-lo à nossa

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família. — Cara, essa não foi uma boa frase para se


usar, pois só me fez pensar em Ayla e a grande
atração que, ainda que eu não queira, sinto por ela.
Pigarreio para espantar as imagens pecaminosas
que começam querer dominar a minha mente e
respondo:
— Vim determinado a aceitar o emprego,
mas confesso que o plano era só trancar a faculdade
sem perspectiva de quando retomar. — Eddy faz
uma careta e eu sorrio. — Mas o seu conselho é
muito mais abrangente e eu vou segui-lo.
— Que ótimo, odiaria ter que retirar a
proposta caso não tivesse intenção de voltar a
estudar.
Dessa vez, gargalho. Sinto-me um pouco
mais leve depois da nossa conversa.
— Vou dar um jeito de acelerar seu
contrato, pode começar amanhã? — Edward fica de

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pé e abotoa o terno, organiza o jornal que lia antes


e pega as nossas xícaras. Pego-as de sua mão e eu
mesmo as levo para a bandeja.
— Seria ótimo, hoje só tenho que ir até a
faculdade e resolver as coisas por lá.
— Muito bom, então que tal um tour pela
empresa para amanhã já estar familiarizado? —
Aceito na mesma hora, afinal, este lugar é como um
parque de diversões para mim.
Porra, meu primeiro software será
reconhecido em breve e agora sou um funcionário
da Stewart Technology Solutions!

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Depois de cruzar com Oliver no corredor a


primeira coisa que fiz quando entrei na minha sala
foi digitar meu nome no Google. Cliquei na opção
de imagens e se abriu ali uma gama de fotos
minhas ao lado de Oliver na noite do jantar. Fotos
tiradas de vários ângulos, algumas até mesmo
enquanto jantávamos e nos conhecíamos. No
contexto de uma delas parecemos um casal
apaixonadíssimo e isso me faz revirar os olhos.

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Por que fotógrafos de revistas e jornais


amam distorcer o contexto de uma foto?
Porém sou obrigada a confessar: saímos
bem em todas elas. Fico por um longo tempo
clicando nas diversas fotos e me perguntando como
diabos não pensei em fazer essa pesquisa antes.
Mas parando para pensar bem, não era como se
meus pensamentos estivessem voltados para
qualquer outra coisa depois que nos conhecemos,
que não fosse Oliver e tudo o que ele tinha me feito
sentir e que eu queria de novo.
Volto para a página inicial de pesquisas e
procuro o site da revista que meu pai tinha
mencionado, já que não tenho ideia de como ele
soube sobre a minha pequena mentira sobre meu
status amoroso. Na primeira matéria que encontro,
de uma revista de negócios e mundo atual, usaram
uma foto de nós durante o jantar, estou rindo de

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algo que Oliver falou e nossos olhos estão


conectados e brilhando. Quem não nos conhece,
por esta foto diria que nos amamos loucamente, no
texto apenas nos apresenta e desejam toda a
felicidade ao novo casal.
Desço um pouco mais a página e encontro
uma foto de quando estávamos saindo do salão, a
mão dele na minha cintura e seus olhos encarando-
me com devoção. Ao menos é o que parece. Leio a
matéria:
CEO da Stewart Technologic Solutions, a
solteira mais cobiçada de Los Angeles, foi flagrada
na última noite de sexta com um possível novo
affair. Não conseguimos falar diretamente com a
senhorita Stewart, mas uma amiga próxima à
empresária confirmou que são namorados. O
homem da foto trata-se de Oliver D. James e o que
soubemos por outra fonte segura é que o jovem é

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um acompanhante do aplicativo sensação do


momento, o Speed Sex. Será que é amor verdadeiro
ou Oliver encontrou a sua “mina de ouro”?
O texto me deixa irritada de uma forma que
nem consigo explicar. Que tipo de gente infernal é
essa que redigiu essa porcaria?
Já disse o quanto odeio revista de fofocas?
Ainda sentindo a raiva correr quente em
minhas veias, disco o ramal da Hillary e peço que
localize a Júlia. Quando ela entra na minha sala,
logo demando:
— Quero que procure o advogado da
empresa e peça que dê um jeito de tirar aquela
matéria ridícula de circulação. Você viu o absurdo
que falaram do Oliver? E a forma nojenta que o
expuseram? — Volto meus olhos para o
computador e só então presto atenção no nome da
revista: Fatos & Fofocas.

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Nauseante.
— Não eu não vi nada, nem sabia que
tinham saído em alguma revista. — Viro a tela para
que ela leia e vejo seus olhos se arregalarem
conforme lê aquela merda. — Céus, que cruel,
prima. Pode deixar que vou falar com o advogado,
vou agora mesmo procurar ele. Fique calma que vai
dar tudo certo. — Antes de sair ela me olha curiosa.
— Acho que o Oliver também não viu isso, senão
teria comentado, né?
— Não sei, Jú as coisas desde o começo
foram tensas e intensas entre nós e não sei se ele
teria falado alguma coisa comigo caso tivesse visto
— confesso, a verdade sobre como me senti no
sábado espreitando na ponta da minha língua, mas
eu a engulo. — Sábado nós pioramos um
pouquinho mais a nossa situação, então...
— Eu sugiro que fale com ele, independente

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se ele já viu ou não acho que vocês precisam sentar


e conversar. Seja pela “tensão” que está presente
desde o começo ou pela matéria. Caso ele ainda
não tenha visto, quando ver, porque cedo ou tarde
vai acabar vendo, vai achar que você está
compactuando com o que ‘tá escrito aí. — Aponta
para o computador.
Engulo uma respiração atravessada porque
como em muitas outras vezes, ela está certa. Como
pode? Ela é mais desmiolada de nós duas, mas a
que tem razão em quase setenta por cento das
vezes.
— Vou procurá-lo. — Solto em um
resmungo.
— Ele está fazendo um tour com o tio Eddy
pela empresa. Ouvi boatos que ele começa amanhã.
— Suas sobrancelhas sobem e descem
sugestivamente e a informação causa um nó no

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meu ventre. Isso não é um bom sinal...


— Ouviu boatos? — Minha voz sai
estrangulada.
— É, o tio pediu que eu fosse até o RH e
pedisse que redigissem o contrato dele. Se quiser
posso encontrá-los e pedir que o Oliver venha aqui
antes de ir embora.
Acho que é melhor arrancar o Band-Aid de
uma vez. Depois desta nossa conversa o clima
estará mais suave entre nós e nos garantirá um
ambiente de trabalho saudável.
— Quero sim, por favor.
— Ótimo. Depois já vou atrás do advogado.
Vai dar tudo certo, prima.
O duplo sentido no seu voto final não me
passa despercebido.

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No momento em que batem na porta eu já


tinha organizado toda a minha mesa, organizado a
prateleira de livros atrás da minha cadeira e alisado
meu vestido uma centena de vezes. Nervosa eu?
Nunca.
Ao invés de esperar, como de costume que
Hillary abra a porta e anuncie o visitante, eu
mesmo vou recebê-lo. Minha mão trêmula paira
sobre a maçaneta e um suspiro de expectativa se
esvai.
Acho que nunca vou estar totalmente
preparada para me deparar com o quanto Oliver é
bonito. Há algo em seu jeito que excede os padrões
de beleza, talvez tenha essa impressão por ter
conhecido um pouco do seu interior, mesmo que o
ignore na maior parte do tempo e o trate apenas
como um meio para um fim.
— Bom dia — cumprimento, um sorriso

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educado aparece e seus olhos fixam-se nos meus.


— Bom dia, Júlia disse que queria falar
comigo? — Seu corpo não se move, nem os olhos
que ficam apenas no meu rosto. Não sei por que,
mas isso me incomoda.
— Quero sim, entre por favor. — Indico o
caminho até o sofá, quando ele segue para lá penso
não ser uma boa ideia nos manter tão próximos,
mas já é tarde para pedir que se sente na cadeira.
Fecho os olhos e chupo uma respiração com uma
pitada de coragem antes de me sentar ao seu lado.
— Aceita algo para beber?
— Não obrigado, se puder ser rápida ficarei
ainda mais grato, preciso resolver algumas coisas
ainda hoje. — Seu tom é um tanto frio,
completamente diferente do que já tinha usado
comigo desde que nos conhecemos.
— Tudo bem direto ao ponto, então. Não

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sei se chegou a ver a matéria que publicaram sobre


nós na Fatos & Fofocas. — Estudo seu semblante e
ele continua ilegível.
— Não. — Sucinto. Tão sucinto que chega
a me deixar irritada. Bufo.
— Beleza, não está mesmo a fim de
conversar comigo então vou só falar de uma vez. A
matéria te denigre e expõe de uma forma nojenta,
quero deixar claro que não compactuo com aquilo,
só vi hoje e já pedi que a Júlia entrasse em contato
com o advogado para que tirem a matéria do ar.
Silêncio. Um silêncio irritante. Não sei qual
o seu objetivo hoje, mas parece que é me tirar do
sério.
— Oliver?
— Agradeço por isso, mas saiba que não me
importo com o que falem de mim. Sei quem eu sou
e isso para mim basta. Sinto muito que a sua
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imagem tenha sido atrelada a minha em grande


proporção desta forma. — Ele fica de pé e me
estende a mão. — Obrigado mesmo por ter me
chamado aqui para me alertar sobre a matéria, até
mais, Ayla.
Não seguro a sua mão. Fico de pé também e
o encaro de igual para igual.
— Ainda não terminei tudo o que queria
falar. — Vejo-o apertar o maxilar antes de voltar a
se acomodar no sofá. — Acho que agora é o
momento ideal para realmente nos acertarmos e
colocarmos uma pedra sobre tudo isso. — Aponto
de mim para ele, deixando claro a que “isso” estou
me referindo.
Com ar curioso Oliver fica me encarando
esperando que eu continue. Eu o faço, tentando não
me deixar afetar pela sua inércia.
— Me sinto atraída por você. — Jogo de

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uma vez, antes que essa verdade me engasgue, ele


nem sequer pisca. Prossigo: — Depois daquela
nossa conversa no carro onde se negou a dirigi-lo
eu tenho agido como uma vaca. Chame de orgulho,
mesquinharia, do que quiser, nem eu mesma sei por
que agi daquela forma, mas eu quero me desculpar
por aquilo. No sábado depois que você foi embora
eu me senti usada, tão suja que a minha vontade era
correr atrás de você e te dar uns bons socos na cara,
só que aí eu tive um estalo: aquela foi a exata forma
que eu te larguei depois de transarmos nos nossos
dois encontros. Eu mereci. Engoli o que tinha
sobrado da minha dignidade, fui para casa e não
consegui parar um segundo sequer de pensar em
você e em como eu agi errado, no quanto eu queria
te encontrar e pedir desculpas. — Respiro fundo
para acalmar meus batimentos ensandecidos por ter
despejado tudo de uma só vez, Oliver ainda está
calado apenas me encarando. — Nós vamos
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trabalhar juntos agora, acho que seria ótimo se a


gente realmente conversasse, para que o clima não
fique estranho aqui na empresa.
— Nós não vamos trabalhar juntos, eu vou
trabalhar para você. Assim como naquela noite
com o lance do carro, você é quem detém o poder
sobre mim, Ayla. — Não gosto da forma que meu
corpo reage a essas palavras. A temperatura
aumenta e um punhado de borboletas se agitam no
meu ventre. Vejo-o fechar os olhos e pressionar
dois dedos contra a testa, como se para evitar uma
dor de cabeça, só então noto o quanto ele parece
abatido e preocupado. É a minha vez de
permanecer em silêncio e quando sente-se
novamente no controle, retoma: — Não serei
hipócrita e dizer que não te desejo, acho que já fui
claro sobre isso, mas acabou. Ainda que meu corpo
queira mais do seu sou homem o suficiente para me
controlar a respeito disto e quanto a clima estranho,
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pode ficar tranquila, não direi para sermos amigos


pois seria impraticável, mas posso te dar a minha
palavra que eu serei extremamente profissional
com você a partir de hoje. Eu preciso muito deste
emprego e o seu pai está me dando chances que eu
seria louco de não abraçar. — Abro um sorriso à
menção do meu pai, sei que no fundo sou uma
pessoa com o coração tão bom quanto o dele, mas
os meus sentimentos por Oliver me cegaram desde
o começo e não consegui agir com ele de outra
forma senão como uma princesinha mimada e
egoísta, como ele mesmo já apontou que me vê.
— Fico feliz que tenha aceitado a proposta
é realmente muito boa. — Sou sincera, fico mesmo
feliz por ele. Porque apesar de todas as nossas
diferenças, e por diferenças quero dizer
compatibilidade sexual e tudo que vem com ela, ele
é um profissional excelente e merece a vaga. Seu
sorriso é cauteloso e de novo ele fica de pé.
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— Obrigado, se era só isso agora eu preciso


mesmo ir. — Dessa vez, não me estende a mão só
caminha até a porta. — Até mais, Ayla.
Engulo em seco e o observo partir. Minha
língua parece presa no céu da boca, uma sensação
sufocante de perda apertando o meu peito ao vê-lo
ir.
— Até mais, Oliver.
A intenção era colocar uma pedra sobre
tudo o que já tinha acontecido entre nós até então,
mas porque sinto que ao invés disso deixamos
apenas as coisas ainda inacabadas?

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Não vou mentir, estou muito nervoso para o


meu primeiro dia de trabalho. No fundo estou
ciente de que não é pelo trabalho em si, já que sou
realmente bom no que faço, mas por tudo que
engloba trabalhar na Stewart.
Quando saio de casa meu pai sustenta um
sorriso orgulhoso que me faz acreditar que estou no
caminho certo. Na empresa, sigo direto para o setor
de criação, ontem Eddy me apresentou a todos no

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setor e ao meu superior, Mark, ele é um cara que


não aparenta ter mais que trinta anos e se parece
muito com o Sam.
Já no meu setor sigo para a minha sala.
Caramba, eu tenho a minha própria sala. É um
cômodo pequeno que suporta apenas a mesa,
cadeira e uma pequena estante, mas ainda assim me
fornece certa privacidade que muito me agrada.
Como cheguei mais cedo há poucas pessoas
em suas baias e eu as cumprimento a caminho da
minha sala. Ao fechar a porta, um sorriso enorme
aparece sem que eu possa controlá-lo.
Porra. É real, estou mesmo trabalhando na
Stewart Technologic Solutions!
Sento-me na confortável cadeira e ligo o
computador, tenho três telas na minha mesa e as
ligo também. Assim que finalizo a inicialização,
batem na porta.

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— Bom dia, cara. — Mark enfia a cabeça


pela fresta que abriu e sorri. — Reunião de
planejamento em vinte minutos, sala nove.
Pelo que Eddy me disse ontem essa reunião
acontece uma vez por mês, sempre na primeira
semana. Ainda segundo o que ele disse era para ter
sido ontem, mas ele pediu que adiassem para hoje
para que eu pudesse participar e já entrar no ritmo
de trabalho deles.
Sigo para a sala indicada e enfrento meu
primeiro desafio do dia quando dou de cara com
Ayla na cabeceira da mesa. Os cabelos estão presos
no alto da cabeça em um coque deixando a mostra
seu colo e pescoço, a visão envia impulsos direto
para a minha virilha. Lembranças de quando eu
beijei aqueles seios, de quando mordi aquele
pescoço macio enquanto gozava...
Fiquei por tempo demais divagando e

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quando sou puxado de volta para a realidade, o


único lugar vazio na mesa é justamente ao lado
dela. Tentando manter meus pensamentos sãos,
caminho até lá e me sento evitando contato direto
com a parte exposta de seu corpo pela blusa social
cor de rosa que tem os primeiros botões abertos.
Não é nada vulgar, mas diga isso aos meus
pensamentos que desejam despi-la!
Mark dá início a reunião falando sobre os
projetos em que estavam trabalhando até sexta-
feira, os finalizados e os que estão caminhando para
o fim. A equipe conta com quinze criadores e
produz uma média de oito softwares por mês. É
uma média até que boa tendo em conta todas as
etapas para o desenvolvimento de um software
até deixá-lo pronto para rodar sem riscos.
Ao final da apresentação do balanço do mês e o que
ele espera da equipe para este novo que está

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começando, Ayla toma a frente. No momento que


ela fica de pé é impossível não dar uma olhada em
sua bunda. Eu disse a ela que sou homem o
suficiente para me controlar e estou tentando sê-lo,
uma olhadinha de nada não se configura como
descontrole. Não no meu vocabulário pelo menos.
— Acho que ontem meu pai apresentou
para vocês o novo programador — diz apontando
para mim depois de cumprimentar a todos, é a
primeira vez desde que entrei na sala que me
encara. — Oliver, seja bem-vindo à família
Stewart, espero que se sinta em casa aqui conosco.
— Obrigado. — Paro por ali por não saber
como me referir a ela. Senhorita Stewart me parece
formal demais e todos por aqui parecem ser mais
informais.
— Gostei bastante do aumento do
desempenho da equipe, Mark. Continuemos assim.

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— Ayla folheia a pasta sobre a mesa e depois olha


em volta, para todos nós. — O pessoal da
Bartolomeu & Sons Contabilidade pediu uma
diminuição no prazo de entrega, acha que
conseguimos finalizar tudo em duas semanas? —
Algumas pessoas protestam, mas sob o olhar
austero de Mark se calam e abaixam a cabeça.
— Vamos fazer o possível, Ayla. De
qualquer forma este pedido já estava no topo de
prioridades para o mês. Por via das dúvidas peça
três semanas, só para não corrermos o risco de
quebrar o prazo.
— Certo. Outra coisa, a clínica Perfect
Body quer uma atualização do software que
vendemos para eles no ano passado, mas quanto a
isso não precisam de pressa, podem continuar
seguindo o cronograma de vocês. Na próxima
segunda os dois novos estagiários começam, Mark,

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meu pai e eu discutimos e decidimos que um deles


deverá ser colocado para trabalhar com o Oliver. —
Isso me pega totalmente de surpresa. É um passo
gigante para a mim ser responsável por um
estagiário, mas saber que tenho a confiança deles é
muito gratificante. Ayla anota mais algumas coisas
em seus papéis e depois de uma olhada fugaz em
minha direção, finaliza a reunião: — Então é isso,
que seja mais um mês bem produtivo, pessoal.
Qualquer coisa já sabem, estou sempre à disposição
na minha sala.
Quando todos começam a sair, Ayla pede
que Mark e eu fiquemos.
— Meu pai pediu que eu falasse com você,
Mark, ainda que Oliver seja recém-contratado ele
deve trabalhar com contas grandes. A experiência
dele dispensa testes.
— Claro, pode deixar, sem moleza para o

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novato aqui. — Ele me dá um tapa nas costas de


brincadeira, mas tudo no que consigo me
concentrar é nos olhos caramelos que estão fixos
nos meus.
Percebendo a tensão que começa a crepitar
em nossa volta, Ayla pigarreia e começa a recolher
suas coisas.
— Ótimo é isso aí. Espero que se adapte
rápido, Oliver e qualquer dúvida que surgir, pode
me procurar ou a Júlia, que é a forma de contato
imediato comigo quando eu estiver ocupada.
Estaremos sempre à disposição.
Não é uma boa escolha de palavras,
princesa... Não depois de todos os pensamentos
lascivos que dominou minha mente quando entrei
na sala.
— Obrigado. — Lembro de agradecer
quando a vejo andar até a porta.

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— Nos vemos por aí. — Assim que a porta


se fecha Mark me olha intrigado.
— É impressão minha ou rolou uma
química entre você e a chefe?
Sigo o caminho para fora da sala, querendo
ficar o mais longe possível dele e de sua pergunta,
porque se tem uma coisa na qual eu sou péssimo é
em mentir.
— É impressão sua, cara. — Ouço-o tossir
uma risada, mas continuo seguindo em frente,
evitando-o. — Que seja, se prepare que já te envio
trabalho, você vai entrar na equipe 6, nela estão o
Adam, o Carl e o Simon, primeiro entre em contato
com o cliente e colete os requisitos, depois
discutam quem fica com qual etapa do
desenvolvimento.
— Certo.
— E ouviu a chefe né, nada de moleza para
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você, novato! — Agora sou obrigado a olhá-lo e rir.


— Não esperaria nada menos.
De volta a minha sala solto uma longa
respiração pensando por quanto tempo mais
conseguirei manter apenas para mim o quão intensa
é a química que rola entre a chefe e eu. Tiro o
computador do modo standby e enquanto espero
que Mark me envie por ondo devo começar, dou
uma pesquisada na minha ferramenta de trabalho,
de cara já encontro algumas mudanças que seriam
bem-vindas na interface das máquinas que
agregariam muito para um melhor desempenho.
Faço uma nota mental para abordar com Sam se
Ayla ou Eddy são abertos a esse tipo de sugestão. A
janela de bate-papo da intranet pula na tela e baixo
o arquivo com as especificações do projeto que
preciso dar andamento. Mergulho com tudo na
coleta de requisitos, deixando de lado toda e

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qualquer coisa que não seja o meu trabalho.

— Sabe, não precisa pular o almoço para


mostrar desempenho, Oliver. — Me assusto ao som
da voz doce invadindo a minha sala, só então vejo
no canto da tela que já são quase três da tarde.
Sorrio antes de virar meu rosto para ela.
— Não é isso que estou fazendo. — Seu
sorriso se amplia.
— Só estou brincando, Sam comentou que
quando se entrega a um projeto esquece até mesmo
de comer. — Então levanta a mão com um saco de
papel, como se estendesse uma bandeira branca. —
Crunchwrap Supreme, do Taco Bell?
Céus, eu poderia pedi-la em casamento
agora mesmo.
— Só se comer comigo — proponho,

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aceitando sua oferta de paz. Mesmo que não ache


que seja uma boa ideia ficarmos sozinhos na minha
sala.
Ayla entra e encosta a porta deixando uma
fresta aberta, o que acho muito inteligente da sua
parte. Afasto os papéis espalhados sobre a minha
mesa e puxo a cadeira sobressalente para mim,
deixando a minha para ela, que é mais confortável.
— Obrigada por isso. — Sorri ao se sentar e
se recostar.
Durante os primeiros minutos de almoço
tudo é tenso, Ayla me estende um dos pacotes de
dentro do saco, eu retiro as latas de refrigerante, as
abro e lhe entrego a sua. Tudo parece sincronizado
e os nossos sorrisos são forçados. Não que não
estejamos à vontade um com o outro, o problema é
não sabermos como lidar com todas as verdades
não ditas e as vontades que carregamos dentro de

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nós quando estamos tão próximos desta forma.


— Sei que falou que seria impossível
sermos amigos. — Ela começa quando estamos na
metade dos nossos lanches. Eu a encaro curioso. —
Mas eu quero tentar, já pedi desculpas pela forma
como agi com você e quero te mostrar que aquela
não é realmente quem eu sou.
— Passou por um longo exame de
consciência, princesa? — Provoco, mas dessa vez
sem carregar a palavra princesa de sarcasmo. Com
uma careta, Ayla responde:
— Algo assim. Só acho que não
começamos da forma certa e todos merecem uma
segunda chance, até mesmo uma princesinha
esnobe, mimada e egoísta. — Não resisto e
gargalho de seu tom ao reproduzir as palavras que
usei para defini-la no dia da minha entrevista. — E
então?

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A expectativa que brilha em seus olhos a


deixa linda.
— Qualquer garota que me traga tacos de
almoço, de fato merece uma segunda chance. —
Sua gargalhada preenche o ambiente e
automaticamente meus olhos se fecham para
apreciar o som.
A ideia ainda me parece muito o início de
uma caminhada por uma estrada tortuosa onde os
obstáculos serão ereções permanentes e desejos
borbulhando sob a minha pele, como disse antes,
quando se trata de Ayla não possuo orgulho
nenhum, então...
E no fundo, acho que tem algo que Ayla
carrega consigo desde que nasceu: a arte de fazer
com que ninguém consiga lhe dizer não.
Nesse caso, estou bem ciente que sou
literalmente um ninguém.

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Meu exame de consciência tem nome,


sobrenome e na maioria das vezes age como um
ditador na minha vida: Júlia Stewart. Sua série de
argumentos de porque eu deveria propor bandeira
branca ao Oliver e sugerir recomeçarmos foi tão
extensa e convincente que não tive como negar que
tinha razão.
Não que eu tenha aceitado somente pela sua
insistência, foi só que mais uma vez as suas

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palavras me fizeram ver a minha vida sob uma


nova óptica. E preciso confessar, me senti muito
mais leve quando saí da sala do Oliver, o clima que
se estabeleceu entre nós me ajudou a me sentir
melhor comigo mesma.
Nos dias que se seguiram acompanhei de
perto o seu desempenho, não por duvidar da sua
capacidade, mas pelo simples fato de que não
conseguia me manter muito tempo longe. Ele é
espontâneo e emana tanta alegria que faz com que
desejemos estar sempre por perto.
Depois de um tempo conversando com meu
pai, entendi um pouco mais sobre Oliver James,
claro que papai não quis me contar tudo o que sabia
e conhecendo-o como conheço ele já teve o seu
tempo com Oliver e o fez, ainda que não quisesse,
contar toda a história da sua vida. Pelo pouco que
meu pai compartilhou comigo me fez admirar ainda

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mais a positividade dele.


Na quinta, estou finalizando a revisão de
alguns relatórios de venda quando Jú bate na minha
porta.
— Almoço em quinze minutos?
— Claro, onde? — Seu sorriso é enorme e
há dias a observo emanar essa intensa felicidade
que só consigo pensar sendo resultado de Sam em
sua vida.
— Rossi’s, eu você, Sam e Oli. — A babaca
balança as sobrancelhas em provocação. Reviro os
olhos.
— Saio em dez.
— Olha só, o nome mágico a fez dispensar
cinco minutos de trabalho. Quem diria?
— Sai da minha sala, Júlia. — Rindo, ela
vai. Quando fico sozinha sorrio também, porque,
droga ela tem razão!
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Organizo as planilhas que estava vendo e


leio o e-mail que tinha recebido há alguns minutos,
mas estava adiando a leitura, é sobre o andamento
do que pedi que fosse feito no começo da semana
em relação a matéria da maldita revista.
E por falar em advogado, meu pai se juntou
com os advogados da empresa e vão se reunir com
Ernest Sanchez esta tarde, eu queria estar presente,
porém meu pai foi categórico ao dizer que era
pessoal. Há algo mais nessa história que eu não sei
e decidi que é melhor dar este espaço ao meu pai,
quando achar que preciso saber ele me contará.
Satisfeita com o texto do e-mail, respondo
rapidamente e saio da sala feliz com a novidade que
terei para compartilhar com Oliver. Quando chego
no corredor Júlia já está à minha espera
esparramada no sofá da recepção.
— E ela levou só oito minutos para sair da

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toca! — zomba ficando de pé. Entrelaço meu braço


no seu e nos guio para o elevador. — Estou
gostando de ver você essa semana, Lally. Está
aprendendo que dá para ter uma vida fora da
empresa e isso tem me deixado feliz.
Deito a cabeça no seu ombro enquanto
descemos até o setor de criação. Assim que as
portas se abrem somos brindadas com a imagem de
Oliver e Sam recostados no balcão da recepção,
Sam está todo vestido de social, mas Oliver veste
uma calça sarja vinho e uma camiseta branca com a
estampa em 3D de um cubo mágico e algumas
fórmulas matemáticas em volta dele, acredito eu
que simulando como resolvê-lo. Tão nerd. E
delicioso.
Assim que nos veem, ambos sorriem e meu
coração dá um pequeno salto no peito quando os
olhos de Oliver se fixam nos meus. Tenho

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entendido um pouco a cada dia o porquê de ele ter


dito que seria impossível sermos amigos, mesmo
assim gosto muito do tempo que passamos juntos, a
atração é só uma coceira chata que tento evitar na
maioria das vezes. Em outras eu a uso como
munição nas minhas noites sozinha.
Sam abraça a cintura da minha prima
quando entramos no elevador. Mantendo o ar
profissional de sempre, apenas a beija na testa,
admiro esse seu autocontrole.
— Como estão as coisas na batcaverna? —
pergunto, me referindo ao seu escritório. Aquele foi
o apelido que dei a sua sala quando apareci por lá
ontem e vi os objetos de decoração que ele tinha
trazido. Muita coisa geek para o meu pouco
conhecimento do universo.
— A chefe anda bem exigente e temos
trabalhado como loucos para cumprir os prazos,

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mas vou te falar, eu amo o meu trabalho e estou


muito feliz aqui. — Seu tom é genuíno e me faz
sentir bem e feliz por ele.
— É muito bom saber disso, Oli. — É a
primeira vez que o chamo pelo apelido e isso
chama a sua atenção, seus olhos encontram os meus
e o brilho que eles emanam eu já vi ali antes.
Enquanto ele estava dentro de mim e sussurrava
sacanagens no meu ouvido.
Meu corpo inteiro arrepia e sinto um nó se
formar no meu ventre. Graças aos céus o elevador
chega à garagem e eu sou a primeira a sair da
claustrofóbica caixa metálica. Chego a respirar com
força ao me ver liberta daquele olhar cheio de
promessas lascivas.
— No seu carro, Ayla? — Sam questiona.
— Não ‘tô nada a fim de dirigir.
Concordo na mesma hora, aceitando de bom

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grado a distração.
— Vou precisar ir no banco depois do
almoço, nós vamos no seu, querido. Eu levo o carro
e depois você me deixa no banco antes de voltar ao
trabalho.
Arregalo os olhos diante suas palavras. O
que essa maluca está tramando?
— Tudo bem, gatinha. — Assisto-os
seguirem até o Prius estacionado há algumas vagas
da minha e só me mexo quando eles já estão
acomodados e Júlia dá a partida.
Destravo o carro e entramos, há um
pequeno sorriso se insinuando nos lábios de Oliver
e eu o ignoro para não cometer nenhuma loucura.
Ligo o ar condicionado para aplacar o calor insano
do meu corpo, coloco o cinto de segurança e espero
que ele faça o mesmo. Só então dou partida. O
silêncio chega a ser como uma terceira pessoa

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dentro do carro, assim como o constrangimento.


Quando estamos saindo da garagem dou
uma rápida olhada para o carro ao lado e vejo Júlia
piscar para mim antes de arrancar com tudo para a
rua. E só então eu entendo a sua escolha de
restaurante. Foi tudo um plano de sua mente
maquiavélica, o Rossi’s fica a quarenta minutos da
empresa, desde o início era a sua intenção me
deixar presa com Oliver por algum tempo no carro.
Não sei se a amo ou odeio por isso.

Quando levo minha mão para ligar o som a


sua paira sobre a minha e o contato traz à tona toda
a atração camuflada sob camadas e camadas de
amizade que temos construído. É a primeira vez
que nos tocamos desde o meu pedido de trégua.
— Vamos conversar, o intuito de amizade é
esse, não é? Nos conhecermos? — A voz está rouca
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deixando claro que não sou a única afetada.


— Claro.
Mas ficamos os dois em silêncio, até que ele
gargalha. Acabo acompanhando.
— Tudo bem eu começo. Como é ser a
CEO da Stewart?
— Isso não é você começando, só está me
forçando a começar com essa pergunta. — Ouço
sua risada baixa e me viro por alguns segundos para
admirá-lo quando paro em um sinal vermelho. É
tão bonita a ruguinha que se forma no canto dos
seus olhos quando ele sorri.
— Eu disse que ia começar, só não falei de
que forma. — O descarado pisca antes de emendar:
— Vamos lá, princesa, é a sua vez.
— No começo foi apavorante, eu não fazia
ideia do que fazer mesmo que tenha crescido vendo
meu pai gerenciar com maestria a empresa. —
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Orgulho emana das minhas palavras ao falar do


meu pai. — Mas ele ficou do meu lado por alguns
meses me auxiliando, depois fui pegando o jeito e
hoje eu amo o meu trabalho.
— Mesmo ele tomando quase todo o seu
tempo? — Não deixo de notar a nota de reprimenda
na sua voz. Respiro fundo.
— Sim, essa parte é culpa minha, eu sou
excelente administrando a empresa, mas não a
minha vida. Eu amo trabalhar, sabe? E sempre acho
que posso fazer mais, é aí que acabo administrando
mal o meu tempo.
— Eu entendo você, também me perco no
trabalho muitas vezes. No começo pensei que o seu
gosto era por poder. — Há uma pausa em que suas
palavras batem direto no meu rosto como um tapa,
porque ele não está totalmente errado. Aos poucos
tenho conseguido mudar esse meu lado, mas no

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começo era sim por este motivo. — Mas te


conhecendo melhor essa semana tenho visto que
não é. Você é mesmo muito mais do que uma
princesinha esnobe, mimada e egoísta.
Como estamos em uma conversa franca,
despejo tudo:
— No começo era exatamente por isso que
eu me matava, bem não em um todo, eu queria me
impor mais por ser mulher, foi difícil conquistar o
respeito, ser vista como uma superior ainda mais
por ser tão nova e inexperiente. Mas quando
começou a acontecer, não vou mentir, eu me senti
bem, me senti realizada e sempre queria mais
daquela sensação. — Consigo sentir seus olhos em
mim e isso me faz corar de vergonha, nunca tinha
exibido meus piores defeitos para ninguém desta
forma, acho que Oliver é a única pessoa próxima a
mim que conhece todos os meus lados, além do

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meu pai. — A Júlia tem sido de suma importância


na minha vida em relação a isso, sabe. Eu não tive
mãe, acredito que fui mimada um pouco demais
para compensar este fato, então às vezes eu sou
mesmo esnobe e egoísta.
— Nossa. — Uma risada sem humor sai da
minha boca.
— É, nossa. — Enfim chegamos ao
restaurante e desço assim que estaciono não
esperando que ele fale mais alguma coisa, porém
assim que ouço a porta do carona bater, Oliver está
ao meu lado e segura a minha mão.
— A forma que você age às vezes não dita
quem você é, Ayla. Só o fato de reconhecer que é
injusta em algumas situações, diz muito sobre
quem você realmente é. — Com o dedão e o
indicador ele levanta meu rosto. — E preciso ser
honesto, essa mistura de CEO megera e princesa

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doce é o que mais me deixa louco em você.


Nesse momento eu odeio a Júlia por ter
forçado esse tempo juntos.

Durante o almoço o casal apaixonado


consegue fazer com o que clima volte a ficar
tranquilo e aproveito o momento, evitando pensar
na volta para a empresa que enfrentaremos em
breve. Sam conta algumas traquinagens de Oli
quando eram pequenos e Júlia retribui o favor
quanto a mim, deixando ambos pasmos com o
quanto eu era terrível quando criança. Acho que até
os meus dez anos eu era mesmo um pesadelo para o
meu pai.
Já na sobremesa Júlia libera mais uma
bomba antes de se levantar e sair com Sam:
— Amanhã à noite esperamos você no
Don’t Tell. — Começo a protestar, mas ela me cala:
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— É aniversário do Sam. Às nove, Ayla. Não irei


para casa depois do trabalho, mas se não aparecer
te busco pelos cabelos.
Detenho o ímpeto de revirar os olhos.
— Que diabos de lugar tem Don’t Tell
como nome? — indago ao pedir a conta.
— É o bar preferido do Sam, fica perto de
casa. Acho que você vai gostar de lá, sabe jogar
sinuca?
— Claro que sei! — Me animo um pouco.
Júlia tem mesmo me contaminado com a sua vibe
baladeira.
— Temos um campeonato marcado para
amanhã então, princesa. — Quando Oliver sugere
dividirmos a conta, não me oponho. Eu podia muito
bem pagar sozinha, mas não quero que ele ache que
estou querendo me impor.
E droga, a forma como ele tem me chamado
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de princesa tem feito coisas comigo que nem sei o


que são. Só sei que não quero que pare.

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É quase fim do expediente quando batem na


minha porta.
— Pode entrar. — Continuo digitando a
sequência de códigos para não perder a linha de
raciocínio, quando levanto os olhos para o visitante
perco o fôlego quando vejo Ayla encostada no
batente. Não a tinha visto hoje.
O vestido branco colado ao seu corpo como
uma segunda pele não deixa margem para a

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imaginação e levo rapidamente meus olhos para os


seus para evitar maiores constrangimentos. Não que
a roupa seja vulgar ou inapropriada para o trabalho,
é só que meus pensamentos não sabem ser puros
quando se trata desta mulher.
— Oi! — cumprimenta abrindo um largo
sorriso.
— Oi, dia cheio no andar de cima? — Fico
de pé e puxo a cadeira de frente a minha mesa para
que se sente. Agradecendo, ela o faz e sinto o
cheiro do seu shampoo invadir meus sentidos.
Pêssego. Já tinha notado antes, mas não tinha
conseguido definir qual era. Freio o instinto de me
abaixar e cheirá-los. Isso pegaria muito mal.
— Seria se eu tivesse passado o dia aqui,
andei de um lado ao outro da cidade hoje. Todo
tipo de reunião que possa imaginar. — Seu ar
cansado me faz ter vontade de andar até ela e

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massagear seus ombros.


— E o que te traz a minha humilde
batcaverna no final deste dia cansativo? — Rindo
do meu tom ela se inclina um pouco para frente e
fala baixo, com um ar conspiratório.
— Vim abusar um pouco da boa-vontade do
meu novo funcionário. — A frase me faz respirar
fundo e pensar em códigos de programação para
não ficar excitado. Percebendo o duplo sentido em
suas palavras, Ayla limpa a garganta antes de
continuar: — Tenho um projeto em mente, na
verdade ainda nem sei o que quero, mas queria algo
que ajudasse no desenvolvimento das crianças do
orfanato da Kate e queria pedir a sua ajuda.
— Um aplicativo? — Chuto, é a primeira
coisa na qual consigo pensar ao relacionar crianças
e tecnologia.
— Não sei, você cria aplicativos? Pensei

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que só trabalhasse com softwares.


— Não tenho prática, mas brinco um pouco.
— Seus olhos se iluminam de animação.
— Então, eu já consegui patrocínio com a
A&L, eles vão doar alguns tablets, acha que
conseguiria criar algo no segmento de educação,
mas de forma divertida? — O lado criativo do meu
cérebro começa a trabalhar e centenas de ideias se
formam.
— Claro. Estamos falando de quanto tempo
para o planejamento e desenvolvimento? — Seus
ombros caem um pouco e os olhos desviam dos
meus.
— Prometi algo assim para a Kate há meses
já. — Silêncio. Vejo a vergonha em sua postura
corporal. Pela forma que disse que se aproveitaria
da minha boa-vontade, presumo que isso será um
serviço à parte do meu cargo na empresa.

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— Eu topo, vamos sentar com a Kate e ver


qual sua visão para o aplicativo, chegaremos em
um consenso e farei o possível para terminar o
quanto antes, tudo bem?
— Sério?
— Sério, mas...
— Sempre tem um “mas”! — Sorrio, seus
olhos se acendem de felicidade e quase me faz
mudar de ideia sobre a minha proposta. Quase. —
Mas — provoca — eu aceito qualquer coisa, sua
ajuda será muito importante para mim neste
projeto.
— Quero que saia comigo. — Despejo logo,
antes que sua animação me contagie e me faça
desistir. Sei que estou sendo bem babaca aqui, só
que ela não sabe que mesmo se me disser não, eu
irei ajudá-la.
— Acho que já entramos em um acordo que
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não seria uma boa ideia, Oli. — Sua expressão


agora é cautelosa.
— Temos saído para almoçar direto, será a
mesma coisa só que a noite. — Não soo
convincente nem para mim mesmo.
— Tudo bem, se é pelo bem das crianças,
por que não? — Merda, sua resposta traz um peso
enorme para a minha consciência. Toco sua mão
sobre a mesa.
— Sabe que vou trabalhar no projeto
mesmo que não aceite, né? — O brilho que toma
conta das suas íris me deixa duro, nem tento pensar
em outras coisas para evitar, não quando ela parece
querer me devorar apenas com os olhos.
— Claro que sei. — A provocadora fica de
pé e sorri abertamente enquanto caminha até a
porta. — Essa noite se ganhar de mim na sinuca a
resposta continua sendo sim, senão, me ajudará sem

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ganhar nada em troca. — E pisca antes de bater a


porta.
Gemendo de frustração me recosto na
cadeira. Preciso transar antes que as minhas bolas
explodam.

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Estou bem ciente que esse jogo de gato e


rato que Oliver e eu estamos jogando uma hora ou
outra vai acabar mal. Ou de uma forma incrível,
dependendo do ponto de vista. O problema é que é
mais forte do que eu. Provocá-lo faz uma dose de
adrenalina deliciosa correr pelas minhas veias, é
como se fosse uma droga que eu sempre volto para
um pouco mais.
E é por isso que capricho no visual para a
noite.
O vestido é azul escuro e tem uma fenda
que começa no topo da coxa direita, é longo e tem
um decote generoso, o que dispensa o uso de sutiã.
Nos pés, opto por uma sandália de saltos médios,

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na cor preta. Não capricho muito na maquiagem, já


que é um barzinho, mas deixo meus cílios
compridos e volumosos assim como meus cabelos,
que sequei e fiz alguns cachos. Batom nude e estou
pronta.
Quando termino de me arrumar são nove e
três e já tem cinco mensagens de Júlia no meu
celular.
— Senhor, essa garota não conhece a
palavra limites — resmungo sozinha enquanto
confiro minha bolsa antes de trancar a porta de
casa. Assim que entro no carro e abro o portão da
garagem, ela liga. Decidida a provocá-la forço uma
voz de sono: — Alô?
— Puta merda, Ayla Madison Stewart, você
está dormindo, porra? — Seguro a vontade de
gargalhar diante seu grito.
— Cheguei do trabalho com dor de cabeça,

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acabei me deitando um pouco. Sinto muito, Jú, mas


não vai dar pra sair, dê os parabéns para o Sam em
meu nome. — Ouço-a suspirar e quando volta a
falar seu tom é preocupado.
— Tudo bem, volte a dormir. Vou tentar ir
para casa mais cedo. — Consigo ouvir uma voz
perguntando “ela não vem?”, mas não posso
identificá-la. O som fica abafado quando ela tampa
o bocal do celular para falar com quem quer que
seja e logo retoma: — Fique bem, até mais tarde.
Jogo o celular no banco do carona e deixo a
risada escapar. Essa foi fácil. Agora tendo tempo
para fazer as coisas com calma, ligo o som do
carro, digito o endereço no GPS e saio de casa.

Ao parar o carro no estacionamento do bar é


inevitável meus pensamentos repassarem a cena da
última vez que Oliver e eu estivemos juntos em um
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estacionamento de bar. A lembrança espalha


arrepios por todo meu corpo e pulo logo para fora
antes que comece a ficar excitada demais.
Aqui é bem diferente do bar da outra noite,
mas o clima também é bastante receptivo. Há duas
mesas de sinuca no salão ladeado por três bares, as
mesas redondas estão espalhadas. É bem grande o
lugar e já está cheio, mas o ambiente é leve, nada
de bagunça. Procuro por Jú ou Sam, mas não vejo
nenhum dos dois, ando até o fundo do salão onde
mais algumas mesas, essas quadradas, ocupam todo
o espaço que parece muito com uma lanchonete. E
lá no fundo, na última mesa vejo o casal se
engolindo, aproveito que estão entretidos em um
beijo que parece mais uma competição de quem
engole mais a língua de quem e chego sorrateira.
— Por que não procuram um quarto? — A
louca empurra o coitado do Sam com tudo antes de

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pular de pé e soltar um grito, chamando a atenção


de todo o bar para nós.
— Sua puta, você veio! — Então sou
sugada para dentro dos seus braços. Nunca vou me
acostumar com seus abraços de urso e ainda que eu
tenha mais corpo, ela tem mais força, que não sei
de onde vem considerando seu tamanho.
— ‘Tá, eu acho que ainda preciso respirar
se quiser continuar vivendo. — Júlia me empurra
ao se afastar.
— Foda-se, você mentiu pra mim. — Antes
de respondê-la, cumprimento Sam.
— Parabéns, acabei não tendo tempo de
comprar um presente, mas na semana que vem te
entrego. — Dispensando meu comentário, Sam fica
de pé e aceita meu abraço.
— Cara, é tão estranho receber os parabéns
da chefe, ainda mais com um abraço. — Minha vez
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de dispensar sua baboseira. — E não precisa de


presente, Ayla. Você já me deu o melhor que eu
poderia pedir.
Seus olhos se voltam para a minha prima e
ao mesmo tempo que explodo de felicidade por vê-
los juntos e assistir a reciprocidade dos sentimentos
deles, sinto um aperto no coração, um desejo
pungente de viver o mesmo.
Tive alguns namoros ao longo da vida, nada
que tenha durado tempo demais para ser mais do
que paixão, então nunca cheguei de fato a amar
alguém que não fosse da minha família. E
honestamente nem sei se isso um dia irá acontecer
se considerar a minha inaptidão para vida social.
— Senta aí, vou pedir cervejas. — Acho
que ele deve ter percebido a minha repentina
mudança de humor, pois se afasta e me deixa
sozinha com a Jú. Como não há segredos e não

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tenho vergonha de me abrir com ela, desabafo o


que estou sentindo.
— Não seja boba, prima. Tudo tem a sua
hora certa para acontecer. Tenho certeza que
quando menos estiver esperando, seu príncipe
encantado irá aparecer. — Balança as sobrancelhas
deixando clara a sua provocação, relacionando a
nossa conversa com as piadas de Oliver chamando-
me de princesa. Coço o nariz com o dedo do meio,
fazendo-a rir alto. — Mas me fala, por que disse
que não viria?
— Você gruda igual meleca, Júlia. Eu te
amo, mas tem hora que as pessoas precisam de um
tempo, sabe? Disse que eu tinha que estar aqui as
nove, as nove e três já tinha uma porrada de
mensagens suas no meu celular. — A bonita revira
os olhos. — Só não queria que ficasse me
apressando, já estava saindo de casa quando ligou,

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mas sabia que começaria um monólogo de uma


hora se eu falasse que estava atrasada. — Outra
revirada de olhos. Sei que também faço muito isso,
só que nunca tinha reparado o quanto é chato e
irrita.
— Vou ignorar toda a parte insultante do
seu discurso e me focar só no fato que você veio —
resmunga e em seguida começa a contar como tem
sido seus dias de “compromissada”. Sorrio quando
ela afirma que nunca se imaginou namorando, mas
que agora não se imagina mais é sem o Sam em sua
vida.
— Não acha que está cedo demais para já
estar assim? — Dispensando meu comentário com
um abanar de mãos, Júlia pega o resto de sua
cerveja sobre a mesa e bebe um gole antes de
responder:
— Quando é a pessoa certa você apenas

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sabe. Não ‘tô falando que o amo loucamente ou que


morreria por ele nem nada do tipo. Mas a gente se
diverte, ainda que sejamos opostos em muitas
coisas, nos completamos em outras. Percebi que
sorrio mais quando estamos juntos e que quando
estamos longe, é nele que penso na maior parte do
tempo, então por que não aproveitar cada segundo
dessa paixão? Pode ser que amanhã a gente acorde
e esses sentimentos todos tenham passado, mas
também pode ser que o sentimento evolua e a gente
se descubra amando um ao outro e se case no final.
Seja como for eu só quero que continue.
Nos próximos segundos eu até tento
continuar prestando atenção no que ela fala e ser
ativa na conversa quando Sam volta. Sei que
agradeço a cerveja, porém se me perguntarem qual
o assunto eu nunca saberei responder, porque meus
pensamentos estão completamente voltados para
cada descrição que ela fez de seus sentimentos
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acerca de Sam.
E droga, a forma como ele tem me chamado
de princesa tem feito coisas comigo que nem sei o
que são. Só sei que não quero que pare. Minha
consciência grita o pensamento que tive dia desses
e depois zomba da minha cara: Você está
completamente ferrada, querida.

Bebi duas cervejas. Nunca tinha bebido


tanta cerveja de uma única vez e não sei, essa deve
ser alguma especial com o teor alcoólico nas
alturas, porque começo a me sentir meio solta. Não
bêbada, só alegre.
Ainda estou mastigando as palavras da Júlia
e tentando com fervor não deixar que elas me
deixem paranóica. Só consigo de fato sair de dentro
da minha própria cabeça quando vejo um casal
entrando na área do bar em que estamos. Estive tão
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imersa nos pensamentos que nem tinha me dado


conta que Oliver ainda não tinha chegado.
Bom, ele acabou de chegar. E com uma
loira pendurada no braço, pelo visto ele tem um
tipo e não são morenas...
Arremato a terceira cerveja que ainda estava
pela metade.
Ouço os cumprimentos sendo trocados, mas
continuo na minha, encarando a bonita decoração
do bar, há pequenos quadros com frases de músicas
de rock espalhados pelas paredes, tem também
fotos de roqueiros que fizeram história. Estou
admirando a as rugas na testa do Johnny Cash
quando escuto um nome que eriça os pelos do meu
corpo e não é de uma forma boa. Charlie.
— Desculpem o atraso, estava resolvendo
umas coisas com a Charlie.
Pelo bem da minha sanidade mental meu
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subconsciente tinha me feito o favor de arquivar


aquela frase do Oliver nos confins do meu cérebro,
só que agora... levanto meus olhos e reparo bem na
loira. É bonita e parece ser bem mais nova do que
Oliver e eu, chuto uns vinte anos seus olhos são
verdes e o rosto parece de porcelana, os lábios bem
desenhados e brilhantes do que presumo ser gloss.
E ela não para de sorrir! Argh.
— Boa noite, Ayla. — Estreito meus olhos
para o sorriso matreiro de Oliver. Meu
cumprimento é um levantar de queixo que deixa
claro que não estou no clima para gracinhas. A
Barbie se solta do braço do Oli e se agarra no
pescoço do Sam, Júlia apenas sorri e eu a encaro
alarmada. O que estou perdendo aqui?
Eles estão cochichando e os dois cornos
estão sorrindo como se uma piada estivesse
chegando ao fim e logo estarão se acabando em

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gargalhadas. A cena desperta o pior em mim e me


levanto.
— Com licença. — Saio rumo ao banheiro
me perguntando o que diabos eu vim fazer aqui.
Me parece muito que vim parar em algum
tipo de troca obscena de casal, só não entendo por
que fizeram questão da minha companhia. Por que
a Júlia está sendo tão cruel comigo a este ponto?
Ela sabe da minha história bagunçada com Oliver e
o quanto me sinto atraída por ele e ainda que não
tenhamos nada...
Bom, aí está a informação chave: Oliver e
eu não temos nada e eu não tenho direito nenhum
de ficar irritada com o que quer ele faça com
mulher alguma. O que eu propus a ele foi amizade,
a atração que sentimos é só isso, atração. E nós
nunca mais faremos nada a respeito dela.
Bufo ao chegar no corredor que leva aos

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banheiros e ver a fila gigante ali. Desvio meu


caminho e vou para a área dos fumantes, não é o
melhor lugar para quem quer respirar, mas é o
único mais perto que encontro. Por sorte só há um
casal fumando e no canto mais afastado, caminho
até a balaustrada que dá para o estacionamento e
sugo uma longa lufada de ar.
Sinto sua presença antes mesmo que ele
esteja próximo o suficiente para tal. É como uma
energia que crepita e instiga as partes certas do meu
corpo a se acenderem. Reviro os olhos para o meu
corpo traidor e continuo olhando para as dezenas de
carros no escuro.
— Está tudo bem com você? — Não sei
qual a necessidade de chegar tão perto e sussurrar a
pergunta no meu ouvido. Ainda sem me virar,
aceno um sim com a cabeça. — Não parece.
— Tanto faz.

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— Tanto faz? — A dúvida misturada ao


sarcasmo nas suas palavras me irrita um pouco
mais.
— O que você quer, Oliver? Tem gente te
esperando lá dentro. — Desde que ele chegou, o
encaro pela primeira vez e perco o ar. Merda. O
filho da mãe está lindo com uma camisa branca
estampada com vários bonecos de videogame, a
calça jeans preta abraça tão bem as suas coxas que
sinto vontade de substituí-la pelas minhas mãos.
— Quer que eu responda o que eu
realmente quero, ou quer a resposta mais
apropriada?
— Acho que a sua namorada não vai ficar
nada feliz se ouvir essa conversa — rosno, indo de
irritada a puta da vida. O descaramento desse cara
não tem limites, porque ainda me sinto atraída por
ele mesmo sabendo que é um canalha?

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— Minha o que? — Seu tom é horrorizado,


mas nos olhos o brilho é de puro divertimento e não
demora para que o idiota comece a gargalhar. Na
dúvida se soco seu estômago ou vou embora, opto
pelo mais seguro e lhe dou as costas. Dou só um
passo antes de sentir seus dedos fecharem no meu
pulso. O olhar agora é sério, retomando a malicia
de segundos atrás. — Pelo amor de Deus, Ayla,
Charlotte é minha irmã! Mas confesso que é uma
delícia de ver assim, toda cheia de ciúmes.
Ainda estou tentando processar o que foi
dito quando sua boca esmaga a minha. A palavra
“irmã” é a única que importa no meio de tudo o
que ele disse. Para o resto, ligo um grande foda-se e
o puxo para mais perto.

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Eu sabia desde o início que sermos amigos


não era um plano que ia funcionar. Mas até que
chegamos mais longe que imaginei.
Empurro nossos corpos mais para os fundos
da varanda, para a parte mais escura, colando-a
contra a mureta. Uma das minhas mãos se mantem
em sua cintura enquanto a outra desce para a fenda
do vestido, subindo calmamente até a tira fininha
da lateral de sua calcinha, que puxo com o

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indicador. O estalo do tecido contra a pele faz


minhas bolas pulsarem. Ayla entremeia os dedos
em meus cabelos e aumenta a pressão do beijo.
Continuo o tour com as mãos pelo seu corpo, louco
de vontade de tê-la nua mais uma vez sob mim.
— Ayla — sibilo seu nome ainda dentro do
beijo, um alerta que se não pararmos agora, não sei
se conseguirei depois.
— Oli. — Devolve no mesmo tom, o que
não me ajuda em nada. Encosto a testa na sua e
puxo uma longa respiração, minhas mãos paradas
em sua cintura, as suas espalmadas em meu peito.
Volto a mim e tomo a decisão mais sensata.
Torturante, contudo a mais apropriada.
— Vamos voltar lá para dentro. — Como eu
disse a ela, preciso do emprego. É a chance da
minha vida e não posso estragar tudo por causa da
minha intensa atração pela chefe. A dor da rejeição

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brilha em seus olhos por alguns segundos, mas ela


disfarça com um sorriso, entendendo meus
motivos.
— Tudo bem. — Então do nada, começa a
gargalhar e esconde o rosto no meu ombro.
Confuso, me afasto o suficiente para parear nossos
olhos. — Não acredito que fiquei com ciúmes da
sua irmã!
Agora eu rio também. E sinto-me leve por
tê-la admitindo tão abertamente que estava com
ciúmes, normalmente bateria o pé e jogaria algum
tipo de insulto em cima de mim. Essa sua faceta,
leve e verdadeira, é tão irresistível que praguejando
pela minha fraqueza, eu a puxo de volta para um
novo beijo. Tentando manter um mínimo de
controle, deixo as mãos paradas somente em sua
cintura, já as suas tem outros planos e seguem para
o sul do meu corpo, uma delas procurando uma

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brecha no cós do meu jeans. Segundos antes de


seus dedos macios se enrolarem no meu pau eu nos
afasto de novo.
— Nós não podemos. — As palavras saem
como fel e provoca dor nas minhas bolas.
— Poder, podemos, a questão não é essa.
Mas eu entendo o que quer dizer. — Diz se
colocando ao meu lado e passando o indicador
pelos lábios para ajeitar o batom. — Bom, então
vamos lá para dentro, tenho uma partida de sinuca
para vencer.
Me dá as costas e volta rebolando para
dentro do bar. Fechos os olhos e encaro o céu
escuro.
Doce inferno.

Demoro um pouco mais para voltar, já que

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não pretendia dar uma amostra grátis da minha


ereção para todo o bar. Assim que chego na nossa
mesa agora ocupada por mais pessoas do que
quando saí, Ayla está em um bate-papo animado
com Júlia e minha irmã. Alguns dos colegas de
Sam do tempo da faculdade chegaram e não gosto
da forma como um deles encara a Ayla. Conheço o
olhar pois é a exata forma que eu a encaro.
Depois de um cumprimento rápido, me
sento ao lado da Charlie e passo um braço sobre o
encosto de sua cadeira. Seus olhos brilham de
animação e ela deita a cabeça no meu ombro. Ela
estava mesmo precisando de um pouco de diversão,
tem andado com problemas demais, assim como eu,
consumindo os seus dias e fazendo-a esquecer que
ainda é só uma adolescente.
— Charlie essa é a Ayla, minha chefe, Ayla,
essa é a Charlotte, minha irmã de dezesseis anos.

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— Charlie me encara confusa diante a


apresentação, mas Ayla sorri e aceita a provocação,
me mostrando a língua.
— A Jú já nos apresentou, estava aqui
falando para a minha nova amiga Charlie que vou
detonar o irmão dela na sinuca. — Minha irmã
abafa uma risada na borda de seu copo de
refrigerante. Ela sabe o quanto sou competitivo e
bom em qualquer jogo que seja.
— Só se for agora, princesa. — Ao som da
palavra, Charlie me olha curiosa. Júlia, que
descobri, já a conhecia por intermédio de Sam, a
puxa de lado em uma conversa que não faço
questão de saber, não quando os olhos verdes de
Ayla estão pregados em mim demonstrando intenso
desejo. Pigarreio e indico com uma mão o caminho
até o salão de cima. — E então?
Sua língua passeia pelos lábios antes de

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ficar de pé. Infelizmente não vamos sozinhos. Sam,


Júlia e alguns de seus amigos nos acompanham.
Faço dupla com ele e jogamos contra as primas.
E nós perdemos. Três malditas vezes.
Mas não é como se tivéssemos chance com
as duas se inclinando provocativamente sobre a
mesa de bilhar e vez ou outra acariciando o taco
como se fosse um pau e o estivesse dando a melhor
punheta do universo. Claro que com a maior
sutiliza do mundo, outras pessoas vendo de fora
nem notavam a provocação. Ao final da terceira
partida, Charlie quis ir para casa estava me
despedindo de todos quando Ayla insistiu em levá-
la, alegando que voltaria para ganhar mais de mim
na sinuca. Aceito a oferta e vejo-as partirem com
Júlia.
— Cara, quando foi que a Júlia conheceu a
Charlie? — pergunto quando voltamos para a mesa

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e Sam pede outra rodada de cerveja. Alguns de seus


amigos partiram no meio da segundada partida, não
eram amigos de verdade, apenas caras que
marcavam presença por alguns minutos nos
aniversários de todos da turma.
— Dia desses. Tinha ido com a Jú no
cinema e trombei a Charlie pelo shopping.
— Mas elas parecem amigas de longa data.
— Não que eu esteja reclamando, é bom ver a
minha irmã interagindo. Mas que é estranho, é.
— Não é, caralho? Mulher é um bicho
estranho, quando gostam mesmo uma da outra logo
de cara viram amigas de infância, mas quando não
gostam, não há Deus no mundo que as façam se
falar uma segunda vez. — Ele bebe um gole de sua
cerveja e depois emenda: — No dia do shopping a
gente tomou um sorvete e no fim fiquei de lado só
vendo as duas batendo papo por quase uma porra

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de hora inteira.
Virando o assunto para o tema proibido para
mim, meu amigo pergunta como estou resistindo à
Ayla e acabamos imersos numa conversa cheia de
palavras profundas da parte dele que não faço ideia
de onde surgiram. Não é que sejamos dois putos,
sempre fomos desapegados e tal e nunca chegamos
a falar sobre relacionamento, por isso é tão estranho
para mim vê-lo caidinho como está. Mas fico feliz
por ele. Os dois parecem realmente darem certo e
isso é o que importa.
Não demora e as duas estão de volta, ambas
com sorrisos comprometedores que me deixa
apreensivo. Pelo pouco de convivência com a Júlia
já aprendi que aquele sorriso não significa boa
coisa. No rosto de Ayla ele é novidade e a sensação
que causa nas partes certas do meu corpo me faz
querer ter ido embora também, pelo bem da minha

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sanidade mental e do meu emprego. Só que elas


apenas se sentam e pedem uma porção de petiscos.
Júlia começa a contar das suas aventuras
pelo mundo, de todas as viagens malucas que já fez
e todos prestamos atenção, fascinados demais com
os detalhes de diferentes países e culturas que ela
nos apresenta. Até que o golpe de misericórdia que
o sorriso anunciava, veio:
— Vamos animar essa noite, nem ‘tá
parecendo uma comemoração. — Então chama o
garçom e pede uma garrafa de tequila e quatro
shots. Ela se cala diante meu olhar curioso e o de
Sam, Ayla apenas sorri miúdo, me encarando de
lado. As duas de armação, só quando o garçom
volta e coloca o pedido sobre a mesa que Júlia
torna a falar. — A brincadeira da vez é: Eu nunca.
Minha experiência com essa brincadeira me
diz que nunca acaba bem. Ou melhor, acaba bem

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demais e isso não é o que preciso no momento.


Não, é exatamente o que eu preciso, mas não com
Ayla, ainda que ela seja a única que eu tenho
desejado. Abro a boca para protestar, mas ela já
estava servindo as doses e me olha lascivamente
antes de soltar:
— Eu nunca paguei por sexo. — Filha da
puta. Ainda soltando seu doce ácido sobre mim.
Nós quatro viramos a primeira dose.
Júlia encara o namorado desconfiada, assim
como ele o faz. Ayla apenas me encara curiosa.
— Que foi, só você pode contratar um
acompanhante? — Ele provoca.
Eu tinha dezessete anos e tinha muita
curiosidade, Sam e eu juntamos a nossa mesada e
contratamos uma garota de programa, como ainda
éramos virgens, só pedimos um strip-tease e
batemos punheta. Não sei se ele virou a dose
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pensando nessa mesma ocasião. Não rolou sexo,


mas depois da clara provocação da morena, eu não
ia deixá-la saber que nunca paguei por sexo.
— Minha vez, — Júlia com seus olhos
colados no namorado, pronúncia lentamente: — Eu
nunca fiz um ménage.
Apenas Sam e eu bebemos.
— Faculdade! — Ele se defende quando
recebe um intensa fuzilada. Ayla me encara ansiosa
e a curiosidade brilhando na sua expressão me
deixa duro.
— Eu nunca nadei pelado. — Sam desvia
da raiva da namorada e joga mais uma rodada. Três
de nós bebemos e é a minha vez de encarar Ayla
com curiosidade.
— Sério, nunca? — Ela dá de ombros. Sou
o único que ainda não jogou, então solto a primeira
coisa que surge na minha mente:
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— Eu nunca transei no ambiente de


trabalho. — Apenas Júlia vira a dose e Sam ergue
as duas sobrancelhas para ela.
— ‘Tá de sacanagem comigo, né amor? —
A sua cara desolada com o sorriso que ela abre me
faz gargalhar. — Caralho, Júlia...
A brincadeira segue com as mais variadas
questões. Eu nunca beijei um cara, obviamente
Sam e eu não bebemos. E conforme elas eram
jogadas na mesa, eu sabia que eram testes, essa era
a trama das duas: estavam nos testando.
Eu nunca transei com alguém mais velho,
eu nunca transei com alguém do mesmo sexo, eu
nunca transei em local público, eu nunca enviei um
nude, eu nunca tomei um porre e precisei de ajuda,
eu nunca gravei um vídeo de sexo, eu nunca fumei
maconha. Sim, a maioria das questões eram de teor
sexual e na, sei lá, décima quinta rodada, já

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tínhamos pedido outra garrafa e estávamos quase


todos meio bêbados, menos a Ayla. Cara, ela é
mais velha que eu, ‘tá, são só dois anos, mas ainda
assim não viveu um quarto do que eu já vivi. E olha
que ela tem grana, o que é meio caminho andado
para qualquer tipo de diversão.
— Eu nunca trepei com a chefe. — Sam
solta a pérola e cai na gargalhada. Júlia e eu
viramos a dose e meu amigo arregala os olhos. —
Ah, porra, você trepou com a Ayla?
Agora eu quem rio. Ele está tão bêbado que
nem notou que Ayla não bebeu na questão de trepar
com alguém do mesmo sexo.
— Não, amor, ela é minha prima. Mas já
trepei com um chefe...
— Eu pensei que trabalhar na Stewart era o
seu primeiro emprego. — Ela revira os olhos e dá
dois tapinhas em sua bochecha, um sorriso muito

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doce estampado, como uma mãe faz com o filho


para não chamá-lo de burro.
— Investi aqui e ali, então tive alguns
chefes...
— Ah, porra... — Repete a maldição e a
puxa para um beijo meloso, esquecendo a
brincadeira.
Não sou um voyeur, mas toda a tequila, as
perguntas sobre sexo, a energia sexual que esses
dois exalam e as mais de três semanas sem sexo
fazem direitinho o seu trabalho e estou
completamente excitado. Roubando uma olhada
fugaz de Ayla, a encontro me olhando como se
desejasse estar fazendo comigo o mesmo que o
casalzinho. Pigarreio e fico de pé.
— Com licença.
Ando o mais rápido que a minha semi-
embriaguez permite até o corredor que leva aos
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banheiros. Ali dentro é um inferno conseguir mijar


de pau duro, faço o meu melhor para não molhar
todo o banheiro e quando termino, depois de lavar
as mãos jogo uma água gelada no rosto para esfriar
os hormônios.
Penso em ir para casa, seria o melhor
porque está na cara que esta noite a Ayla traçou
uma meta e está disposta a tudo para alcançá-la:
testar a minha resistência de toda forma que
conseguir. E ela está cedendo aos poucos, a minha
resistência, quero dizer. E sei que mais um pouco
de esforço da parte dela, da Ayla, eu vou ceder.
Tudo isso passa pela minha cabeça antes de eu
chegar de volta à mesa e acabo rindo do
emaranhado dos meus pensamentos em relação a
Ayla e a minha resistência. Eu estou mais bêbado
do que pensei.
— ‘Tá rindo do que? — Sam pergunta

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quando desabo na cadeira. Nego com a cabeça


antes que Júlia solte o próximo eu nunca. Pelo
visto, tinham voltado ao clima da brincadeira e
aceitei ficar por mais algumas rodadas.

“Eu nunca fiz um body shot”


Dois de nós vira a dose e essa é a última
coisa da qual me lembro.

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Dizem que a primeira coisa que se faz


quando acorda é abrir os olhos, mas hoje eu não
consigo abrir os meus. A primeira coisa que
realmente faço é gemer quando uma pontada de dor
massacra meu crânio, minhas mãos tateiam o
travesseiro macio debaixo da minha cabeça e esse é
o primeiro indício de que algo não está certo.
O travesseiro é macio demais.
Ainda sem conseguir forçar as pálpebras a

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abrirem, aguço os outros sentidos e o cheiro que


domina meu olfato me faz apertar os olhos com
mais força, querendo mantê-los fechados.
Para sempre se possível.
Não.
“— Eu nunca fiz um body shot — Sam joga
a questão. Eu e ele viramos a dose no mesmo
instante em que Júlia fica de pé.
— Nunca é tarde para mudar de lado nessa
brincadeira. — Expressa segura de si e caminha
até o balcão.
Para fritar ainda mais os meus miolos, Ayla
também se levanta.
— Concordo plenamente.”
Com os dedos trêmulos e o receio
galopando em minhas veias, massageio a testa e
abro uma fresta do olho esquerdo. Encontro um
guarda-roupa branco enorme, borboletas pregadas
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sobre as portas. No chão vejo minhas roupas e isso


traz outra pontada na cabeça. Abro os dois olhos
lutando com a ânsia de voltar a fechá-los e observo
melhor o quarto. É gigante, as paredes em um tom
violeta bem clarinho que mais parece branco, a
cortina que cobre a janela é cor-de-rosa com
pequenas flores e borboletas. Alguém aqui gosta
muito deste inseto. Acho tão estranho chamar uma
coisinha tão bonitinha como a borboleta de inseto.
Pare de protelar, cara. Qual é, seja homem!
Não é falta de coragem o problema é que...
nem sei mais qual é a porra do problema. Bufo
impaciente comigo mesmo e todo esse drama
infernal que tenho me autoimposto e viro logo para
o lado direito.
E encontro a cama vazia.
Frustrado, jogo o lençol que cobre meu
corpo para longe e me sento na cama. Há uma bola

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roxa de um chupão bem no meu quadril e outra na


minha coxa, próximo demais da minha virilha...
“— Vai ficar aí olhando ou o quê? — Ayla
grita quando fico somente de olhos arregalados
para ela que se senta no balcão.
Engulo em seco e me aproximo.
— Que diabos pensa que vai fazer? — As
palavras escapam arrastadas pela quantidade de
álcool que circula no meu organismo.
— Penso não, meu amor, vou fazer. Ou
melhor, nós vamos. — Então a safada deita de
costas no balcão e puxa o maldito decote do
vestido mais para baixo. A porcaria cobre
praticamente apenas os seus mamilos desta forma.
Seguro suas mãos e tento voltar a peça
para o lugar, mas é em vão. Seu sorriso aumenta e
ficando sobre os cotovelos, o rosto se aproxima
demais do meu.
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— Vamos lá, Oli, beba do meu corpo.


Ah, caralho!”
Vejo meu pau semiereto dilatar e endurecer
cada vez mais diante as lembranças. Forço um
pouco mais meu cérebro enevoado, mas nada vem.
Irritado, com dor de cabeça e sem saber como
diabos vim parar nessa casa, que deduzo ser da
Ayla, mas não tenho certeza, ando até as roupas no
chão em busca da minha cueca.
Não a encontro em lugar nenhum. Entro no
meu jeans e o deixo desabotoado e o zíper aberto
para não machucar meu pau ainda duro e caminho
até a segunda porta dentro do quarto que presumo
ser o banheiro. Jogo uma água fria no rosto
enquanto me encaro no espelho.
— Que diabos cê aprontou ontem, cara? —
pergunto ao meu reflexo. Há dois chupões no meu
pescoço, também.

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Ouço uma risadinha e me assusto. Ao olhar


para trás, encontro Ayla toda esparramada dentro
da banheira. Os malditos seios expostos. Com uma
falsa inocência que convenceria quem a visse pela
primeira vez, ela arregala os olhos e me oferece um
sorriso capaz de fazer com que acreditemos em
algo como a paz mundial.
— Bom dia, Oli. — Mel derrama de cada
letra e me deixa ainda mais desconfiado.
— Quem é você? Preciso que traga a
megera da minha chefe de volta agora. — Sua
gargalhada alta ecoa no banheiro gigante e o traidor
do meu pau meio para fora da calça, pulsa.
“Ao nosso lado no balcão, Júlia e Sam
seguem o passo-a-passo do body shot e Ayla os
encara atenta, quando ele cospe o limão que pegou
da boca dela para o lado e a arrebata em um beijo
que faz o bar inteiro explodir, a minha chefe me

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encara com um sorriso diabólico e pega o potinho


de sal.
— Lambe aqui — pede, indicando o topo do
seio direito.
Olhando no fundo dos seus olhos, como um
cachorro faminto coloco a língua para fora e a
deslizo lentamente pela sua pele cremosa. O
gemido rouco que chega aos meus ouvidos faz
minha cueca parecer dois números menores. Cada
passo seu é mais provocativo que o anterior e ela
os realiza encarando-me atenta: salpica sal onde
lambi, prende a fatia de limão entre os dentes e
depois despeja a bebida do shot dentro do próprio
umbigo.
— Me beba.”
— Estava dormindo tão gostoso que não
quis te acordar. Vem para a banheira comigo —
pede manhosa, afastando o corpo para frente. Fico

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parado no mesmo lugar.


— Ayla...
— ‘Tá, já sei. Precisamos conversar, mas
antes de sentarmos e você falar o quanto foi errado
a gente transar de novo e toda essa história
blábláblá que já conheço, por que não transamos
mais uma vez? Uma vez a mais, uma vez a menos,
não vai fazer diferença, vai? — Os dedos finos
passeiam pelo colo e beliscam os mamilos ao final
da frase.
Por que mesmo é errado a gente transar?
Chuto a calça para longe e a encaro, misto
raiva e desejo.
Eu sou um fraco.
— Camisinha? — Ela aponta para a gaveta
da pia e eu rapidamente pego uma e desenrolo no
meu pau antes de sentar atrás dela na banheira.
Assim que minha bunda encontra o azulejo
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frio, Ayla se vira de frente e encaixa todas as partes


certas dos nossos corpos. Gemo alto e a aperto
contra mim.
Seus olhos fixam-se nos meus quando ela
inicia sua cavalgada.
“Volto a lamber a pele macia para
absorver o sal e depois desço para a barriga, a
cada passo mantenho nossos olhos conectados e
transmito no meu olhar o quanto eu a desejo.
Rodeio seu umbigo com a ponta da língua antes de
sugar a tequila. Tomo o limão de seus lábios e o
mordo, engolindo o suco da fruta.
Assim como Sam, cuspo o bagaço para o
lado, mas não a beijo sobre o balcão. Pego-a pela
cintura e a puxo para mim, suas pernas se enrolam
na minha cintura e a cabeça se esconde no meu
pescoço.
— Onde está a porra do seu carro? —

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indago quando já estamos na porta do bar.


— Estacionamento dos fundos. — É para
onde sigo. Só paro quando a coloco deitada no
banco de trás e arranco seu vestido e calcinha.
Beijo o caminho dos seus seios até a sua boceta e
paro alguns segundos antes de abocanhar o seu
clitóris:
— Agora sim vou beber você princesa.”
Ayla arranha minha nuca e mantem um
ritmo delicioso de sobe-e-desce misturado com
reboladas que me deixa maluco. A boca não para,
me morde, lambe, chupa e beija.
Não lembro com clareza de tudo o que
fizemos ontem, mas pelas marcas em meu corpo sei
que foi tão intenso quanto está sendo agora e eu
nunca a tinha visto tão ousada.
— Você fode tão gostoso, Oli. — Ali eu me
perco. Agarro sua cintura com ambas as mãos e
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invisto contra suas descidas.


Gozo poucos minutos depois com ela me
apertando em seu orgasmo. A cabeça tomba no
meu peito e seu suspiro raso é doce de se ouvir.
— Certo, preciso ser sincero e dizer que não
foi um erro, e se foi, nunca cometi um erro tão
delicioso. — Ela ri baixinho, ainda estou dentro
dela e sua mão esquerda faz um carinho gostoso no
meu peito.
— Aquela brincadeira ontem me fez ver que
eu tenho vinte e oito anos, mas de fato, nunca vivi.
— Seu tom é tímido e puxo seu queixo para cima
para olhar nos seus olhos. — A cada revelação sua,
mais eu queria que você me mostrasse como era,
sabe? Queria conhecer a mim mesma, sexualmente,
com você.
Permaneço quieto. Pena que meu pau não
segue meu exemplo e começa a ficar pronto para

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outra.
— Não é segredo para ninguém que nos
sentimos atraídos, a nossa situação não é a mais
ideal, mas eu gosto de estar com você. Não parece
errado. — Continuo em silêncio. Ayla se afasta e
segura meu rosto em suas mãos. Salpica um selinho
na minha boca e finaliza: — Acho que somos
adultos o suficiente para lidar com a nossa atração e
não deixar que isso interfira no ambiente de
trabalho.
Entendo o que ela quer dizer, engulo o bolo
de ansiedade que apareceu do nada na minha
garganta e respiro fundo.
— Onde quer chegar? — pergunto, não
querendo ficar com dúvidas se a entendi certo ou
não.
— Exatamente onde estamos. — E rebola
para provar bem onde estamos.

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Ok, não entendi errado.


— Na empresa ainda seremos amigáveis
como tem sido nas últimas semanas. Entretanto,
fora de lá quando surgir a vontade, a gente sai,
transa, aproveita a vida. E, mesmo que tenha
perdido para mim na sinuca, eu aceito sua
chantagem de sairmos enquanto me ajuda no
projeto da Kate. — Ela negocia pesado. E ainda
que a minha chantagem fosse sairmos uma vez para
que eu a ajude, gosto mais do seu termo, dá até para
fingir algum contratempo e estender o prazo de
entrega... — E aí, o que acha?
— Por que a minha vida é tão complicada?
— soo como uma garotinha mimada, mas sério, por
que a mulher que fode com a minha mente tinha
que ser a minha chefe?
— Só tem que ser complicado se você
quiser. Transar é a coisa mais simples que existe

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desde que haja atração. — Eu a tiro de cima de


mim, porque está ficando impraticável pensar ainda
dentro dela.
O sim está na ponta da minha língua para
essa sua proposta indecente. Porém... meu lado
sensato ainda tem um pouco de controle sobre mim.
— E atração. — Ela continua, levantando
da banheira e se enrolando em um roupão. — Nós
temos de sobra, compatibilidade sexual, também.
— Ayla, princesa. — Saio da banheira e a
puxo pela cintura. — Cala a boquinha um pouco,
meu amor. Me deixa raciocinar. — Beijo seus
lábios e saio do banheiro, sendo acompanhado pela
sua risada.
— Já percebeu que os papéis estão
invertidos aqui? Eu estou sendo o cara insistente
que quer sexo sem compromisso e você a mocinha
com medo de ter o coração partido. — Volto para o

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banheiro e pego minha calça, assim que apareço no


quarto minha cueca é jogada no meu rosto.
Visto minhas roupas enquanto ela assiste
cada passo meu.
E eu não consigo pensar em nada com seus
olhos me comendo desta forma. Realmente parece
que invertemos os papéis.
— Vou fazer o café da manhã, talvez depois
de uma xícara de café você possa pensar melhor. —
Já está virando rotina, mas quando ela me dá as
costas, encaro o teto e bufo frustrado.

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Eu não estou bêbada, um pouco alegre, mas


sóbria o suficiente para dirigir.
— Preciso estar dentro de você, princesa.
— Sua voz arrastada é soprada contra a pele do
meu pescoço. Acabei de ter um orgasmo incrível
proporcionado pela sua língua e suas palavras me
faz desejar mais.
Sinto-me ousada. Só é mais que isso, o jogo
do “eu nunca” apenas deixou mais claro o quanto
sou careta, segundo as palavras da Júlia. “Até seu
pai, com quase sessenta anos, vive mais do que
você, Lally” e é verdade, não tem um final de

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semana sequer que Seu Eddy fique em casa. Aquilo


me comeu o cérebro e tudo o que eu queria era
aproveitar.
E quando o pensamento de aproveitar
vinha, somente a imagem de Oliver o
acompanhava. Por que não?
— Calma, aí, garanhão. Vamos lá para
casa, hoje quero aproveitar tudo que ainda não
aproveitamos. — Sua resposta é uma mordida no
meu pescoço e um apertão nos meus seios.
— Então acelera essa coisa, Ayla, antes que
eu goze no banco de trás do seu carro.
Pulo para o banco da frente e dirijo o mais
rápido que posso até a minha casa. Apenas uma
certeza gritando na minha mente: estou fazendo a
coisa certa seguindo meu corpo e mente.
Somente quando coloco as panquecas sobre
os pratos é que Oliver aparece. Não pensei que teria
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que persuadi-lo a ter um relacionamento sexual


comigo. No entanto deveria ter sabido depois da
reunião com meu pai onde ele foi completamente
sincero.
Oliver é um cara íntegro e isso me deixa
ainda mais atraída por ele.
Em silêncio nos sentamos e tomamos café.
Seus olhos vez ou outra passeiam pela cozinha e
param em mim, parecendo desconfortável. Acho
que outro ponto para a sua incerteza sobre o sexo
sem compromisso é a diferença social. Besteira.
Mas pela forma que se porta dentro da minha casa,
indica isso, ele parece deslocado. Quando termina
de comer fica de pé e para bem perto de mim,
enrolo os braços na sua cintura e deito a cabeça em
seu peito. Seu coração está acelerado.
— Preciso ir para casa resolver umas coisas,
conversamos melhor depois pode ser? — Estico-me

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no banquinho e beijo seus lábios.


— Claro. Sem pressão, ‘tá? Eu só quero
continuar sua amiga, porém com o benefício do
sexo, não pensa demais no que pode dar errado. —
E olha só a mulher de negócios falando sobre
enfrentar riscos!
Mentalmente me reprovo, vida social e
trabalho não são a mesma coisa e os riscos que essa
amizade colorida pode gerar são bem altos, sei
bem, mas foda-se, já fui prudente demais, acho que
é hora de cometer umas burradas na vida.
— Certo. Obrigado pela noite, foi incrível
ainda que eu não lembre claramente de muita coisa.
— Oliver beija a minha testa e se afasta.
— Me ofende agradecer assim. — Sei que
não foi sua intenção, quando entendi que todo o
veneno que destilava era falta de saber como lidar
com a atração que sentia por ele, percebi que

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agradecer por sexo é horrível.


— Não quis ofender, só...
— Eu sei. Mas para registro futuro,
transamos porque gostamos um do outro, nada de
agradecimentos. Aliás, me agradeça com mais
orgasmos.
— Céus, você está impossível. Tchau, Ayla.
Quando ele me dá as costas, uma cena de
Criminal Minds surge na minha mente e dou uma
de Penélope Garcia:
— Detesto te ver partindo, mas adoro te ver
de costas.
Adoro ainda mais que ele entende a minha
referência e olha para trás, me mandando beijo
como Derek Morgan faz naquela cena.
Bonito, culto, gostoso, inteligente, transa
bem, íntegro e ainda assiste Criminal Minds, se eu
estivesse procurando por amor, diria até que
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encontrei o meu cara certo.

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Meu pai tem estado melhor depois que de


certa forma Charlie e eu “aceitamos” a sua decisão.
Sorri mais, conversa mais e se esforça mais. É
perceptível que cada novo dia é um pouco mais
difícil que o outro para ele, mas tenho respeitado a
sua escolha, engulo o choro, a raiva e a dor e sorrio
para o homem que me deu a vida e quer que a sua
termine.
Temos tido bons momentos em família.

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Rick está amando ter o pai mais ativo, ele é o único


que conviveu menos com nosso pai em sua fase boa
e é o único que não sabe o que vem por aí.
No domingo à noite saio com meus irmãos
para jantar no shopping. Segundo meu velho, era
dia das crianças se divertirem um pouco. Depois de
uma sessão no cinema, comemos porcarias e tentei
ao máximo não me sentir culpado por estar me
divertindo enquanto meu pai está em casa, não
sozinho, já que Doug aceitou as horas extras.
Tem sido assim também quando estou com
Ayla. Eu ainda não tinha admitido para mim
mesmo, mas boa parte do meu receio em me jogar
no lance que ela me propôs ontem é esse: estar
vivendo enquanto meu pai morre. Não parece justo,
não parece certo.
— A Ayla é legal, Oli. — Minha irmã joga
a frase assim, do nada. Estamos na praça de

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alimentação, Rick se acabando em batatas com


ketchup, meu hamburger está pela metade a fome
se foi no momento que comecei a pensar no meu
pai.
— Quem é Ayla? — Rick pergunta de boca
cheia.
— Minha chefe.
— E namorada. — Charlie completa e vejo
meu irmão arregalar os olhos.
— Cê tem namorada, Oli? — Mergulha
mais uma batata no ketchup e enfia na boca, lambe
os dedos e volta os olhos atentos para mim. — Ela
é bonita, Char?
Fico na minha, querendo ver até onde vai o
papo desses dois.
— Ela é linda, Ri. — Char e Ri, ainda que
todos os chamemos de Charlie e Rick, aquela é a
forma única deles de se tratarem, eu acho lindo. —
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E muito legal também. E gosta muito do Oli.


Eu sou apenas Oli para todo mundo. Isso
não me incomoda, não verdadeiramente, mas me
pergunto por quê.
— Ela é só a minha chefe. É bonita e muito
legal, sim só que não é minha namorada. —
Interfiro quando Richard começa a fazer planos.
Como por exemplo: convidar a Ayla para almoçar
lá em casa, ou para um dos nossos passeios de final
de semana com o papai.
Vejo Charlie revirar os olhos e sugar o
canudo de sua Coca-Cola.
— Não entendo por que os adultos
complicam tudo. ‘Tá na cara que você também
gosta dela, então por que não ficam juntos? —
Puxo sua cadeira para mais perto e beijo a sua testa.
— Quisera eu que tudo fosse simples assim,
pingo de gente. Nem sempre somos nós que
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complicamos e sim a vida que já vem complicada.


Ayla e eu somos de mundos totalmente diferentes e
nossas vidas se cruzaram num momento nada
propício e isso é tudo.
Infelizmente.

Na segunda-feira de manhã chego na


empresa quinze minutos mais cedo como de
costume, só para encontrar a minha sala vazia.
— Ganhou upgrade, Oliver. Como vai ficar
responsável por um dos estagiários, ganhou uma
sala maior. — Mark me leva para a nova sala, no
mesmo corredor, mas um pouco maior que a de
antes.
Bem maior. Nela já há duas mesas grandes,
uma com quatro e a outra com três enormes telas, é
separada por uma divisória que proporciona uma
falsa ideia de privacidade. É como se houvesse uma
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baia dentro da minha nova sala.


— Você ficará com a Cara, ela deve chegar
em alguns minutos. Sei que é novo no trabalho, se
quiser algumas dicas de como lidar com estagiário
é só me chamar, beleza?
— Beleza. É só deixá-la executar trabalhos
como os meus? — Acredito que seja isso, ao menos
era o que eu gostaria de fazer se fosse aceito para
uma das vagas.
— Quase isso, Eddy gosta de dar
responsabilidades menores para os estagiários, só
que dentro de contas grandes. Então pode colocá-la
para te ajudar no que estiver fazendo, só fique de
olhos.
— Entendido.
— E qualquer coisa, chama.
Ele sai e eu me acomodo. Meus poucos
pertences que tinha trazido para a outra sala estão
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em uma caixa sobre a mesa e aproveito os minutos


antes do começo do expediente para oganizá-los.
Coloco o porta retratos com a foto do papai e os
meninos de frente para mim na mesa e acabo
sorrindo encarando-os.
— Toc-toc. — Uma voz feminina chama a
minha atenção da porta e me viro, encontrando
parada ali uma morena baixinha. Os olhos estão
bem marcados de preto e um pouco arregalados do
que presumo ser empolgação. As pontas dos
cabelos são cor-de-rosa, ela usa botas e um vestido
estampado. Bem eclética. — Você deve ser o
Oliver, meu novo chefe.
Abafo uma risada pelo ridículo de sua
afirmação.
— Colega de trabalho soa melhor. E você é
a Cara?
— Eu mesma. — Ela parece indecisa ainda

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parada na porta e me encarando.


— Entra e fica à vontade. Vou iniciar as
coisas por aqui e a gente vê por onde pode
começar.
Cara entra e começa a iniciar sua própria
máquina. Enquanto elas ligam, ela me conta um
pouco sobre seu currículo e o que manja mais em
criação. Até me conta sobre um aplicativo que está
trabalhando para conclusão do curso. Como estou
quase finalizando a primeira etapa do software da
firma de contabilidade que Mark tinha dado como
prioridade, uma segunda mão nessa fase apenas
atrapalharia, então peço que comece a coleta de
requisitos para o próximo projeto da pilha.
— Sei que não é muita coisa começar com
coletagem de requisitos, mas é que já ‘tô quase no
final aqui. Na fase seguinte te coloco a par e então
você me ajuda com a finalização, ok?

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— Imagina, eu sei como funciona essas


coisas em empresas grandes. Para ser honesta,
cheguei aqui pensando que serviria café. — Sua
frase me faz rir. Não é algo que a gente imagina
depois de uma conversa aberta como a que eu tive
com Eddy. Não mesmo.
— Pode ficar tranquila que ninguém vai te
pedir café aqui, Cara. A não ser que queira trazer,
aí eu não rejeitarei. — Ela ri aceitando a pasta que
estendo, começa a folhear e já ataca o teclado.
Também me entrego ao trabalho, hora ou
outra conversamos, trocamos algumas experiências
e dicas. Gostei bastante da minha nova colega de
trabalho.

A caixa de mensagens internas pula em uma


das minhas telas quase na hora do almoço. É da
Ayla.
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A fim de comer algumas porcarias de


almoço hoje, topa?
Consegui fazer um bom trabalho em ignorar
o final de semana e tudo o que aconteceu nele. Meu
foco no momento é o trabalho, meu pai e irmãos.
Só. A chegada da Cara pela manhã contribuiu para
manter a minha mente ocupada até agora.
E puta merda, Ayla me convida para
almoçar como se nada tivesse acontecido na sexta.
Como se no sábado não tivesse me proposto termos
sexo sem compromisso. Então me dou conta de que
é isso que ela está tentando provar: que dá sim para
ter sexo e o trabalho.
Levanto os olhos para a mesa de frente a
minha para conferir se não estou sendo observado.
Como disse anteriormente, falsa sensação de
privacidade. Tudo o que eu menos quero é alguém
pensando que há coisas além de uma relação

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profissional entre Ayla e eu.


Claro. Me encontra no estacionamento em
quinze?
Um OK aparece na tela e desativo o bate-
papo. Pedi-la para me encontrar no estacionamento
me traz uma nova preocupação: preciso comprar
um carro. O do meu pai Sandra levou embora. Ter
vendido a patente do meu software “espião” que é
como batizei a tecnologia que nos permitiu pegar o
cara que estava roubado a Stewart, somado ao meu
novo salário e todos os benefícios que vem com ele
me permiti comprar um, não almejo um carro zero,
quero um simples que dê para oferecer conforto aos
meus irmãos. Defino como meta para o final de
semana sair a procura de um.
Termino uma linha de códigos e anoto
alguns planos para dar continuidade depois do
almoço e me preparo para sair.

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— Temos duas horas de almoço, acho que


você já sabe, né? — Cara levanta a cabeça do
teclado e me olha sorrindo.
— Sei sim, só não ficou muito claro quando
posso sair.
— Entre as onze e as duas, pode escolher.
Você quem faz seu horário.
— Ótimo. Trabalho dos sonhos. —
Concordo com um aceno.
— O melhor.
Não espero respostas e saio. Assim que
chego no estacionamento, Ayla já está lá,
maravilhosa encostada em seu carro. O vestido de
hoje é vermelho, seja lá qual for a cor do dia, Ayla
consegue ficar incrível em todas elas.
— E aí, como está sendo o seu dia? —
Afastando-se do carro fica na ponta dos pés,
mesmo de salto ainda sou alguns centímetros mais
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alto, e beija a minha bochecha. As mãos seguram


meus ombros.
— Tranquilo. E o seu? — Devolvo o beijo e
só então ela se afasta.
O som do alarme sendo desativado soa e
ando até o lado do passageiro. A sensação de andar
de carona com ela sempre é estranha. Não
desconfortável, só... estranha.
— Corrido, mas que bom que está tranquilo
para você. — Saímos da garagem e seguimos rumo
ao centro, não pergunto para onde, só aceito a
companhia. — Pensei em irmos hoje falar com a
Kate, mas só vou poder à noite, tenho várias
reuniões durante a tarde.
— Por mim tudo bem.
Ayla se remexe no banco, parece ansiosa
por algo. Eu até faço ideia do que é, mas prefiro
ficar quieto, ainda não acredito que amizade
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colorida com a chefe seja uma boa ideia.


— Ah, esqueci de falar, o advogado
conseguiu tirar a matéria do ar.
— Ótimoe de novo, sinto muito por tê-la
exposto como a namorada do prostituto. — Sua
gargalhada preenche o carro e chego a pensar que
vamos bater de tanto que ela ri e se contorce.
— Idiota. — Quando percebo onde
estamos, eu quem rio alto.
— Sério, McDonald’s? — Dando de
ombros, responde:
— Eu disse que queria comer porcarias.
E faz um imenso pedido que duvido
conseguirá comer tudo. Dividimos a conta e
comemos no carro mesmo, num canto mais
afastado do estacionamento do restaurante.
— Você pensou no que eu falei no sábado,
Oli? — A doçura no seu tom quase faz o sim saltar
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da minha boca.
— Não.
— Não, não pensou ou não, não quer sexo
sem compromisso.
— Não pensei. Mas não é como se eu
precisasse pensar demais, Ayla, não acho que seja
uma boa ideia e pensar com certeza não me fará
mudar de opinião. — Seus ombros encolhem.
— Tudo bem. — É a última palavra que
trocamos até que chegamos de volta a empresa. —
Posso te pegar na sua casa as sete? — A voz
profissional que usa deixa ainda mais claro que
aquele “tudo bem” foi uma puta duma mentira.
Respiro fundo. Não há nada que eu possa
fazer para acabar com o clima pesado.
Bom, até há, mas não quero misturar as
coisas. Ainda que me misturar com Ayla, sem
roupas, seja tudo o que mais quero.
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— Pode sim, mas se preferir, posso te


encontrar lá.
— Não, tenho um compromisso perto da
sua casa. Passo lá as sete. Tchau, James.
Retrocedemos mesmo.

A reunião com a Kate até que foi produtiva.


Consegui ter uma base legal do que ela quer para as
crianças e realmente é um aplicativo, algo que
misture brincadeiras, números e letras. Achei a
premissa interessante e tenho certeza que vai ficar
divertido e didático na mesma medida.
Tirando a produtividade da reunião o resto
foi um fiasco. Ayla não trocou mais do que meia
dúzias de palavras comigo. Por um lado, eu até a
entendo ser rejeitado não é uma coisa que dê para
levar cem por cento numa boa. Só que depois de
seu pedido de trégua e da forma bacana que
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estávamos interagindo, achei que ela levaria de


uma forma melhor a minha negativa. Kate percebeu
o clima tenso e o sorriso insinuativo que ofereceu
para a minha chefe deixou até a mim sem graça.
Agora estamos no carro novamente, quase
chegando na minha casa. Tentei fugir da carona
constrangedora e me ofereci para ir para casa de
táxi, a pé ou qualquer meio que não nos colocasse
em um carro com esse clima de merda. “Esteve
aqui a trabalho, é minha obrigação levá-lo para
casa” essa foi a sua resposta que me fez querer
revirar os olhos feito uma garotinha birrenta.
Discordei dizendo que era um favor e não trabalho,
isso a fez bufar e resmungar algo a respeito de me
pagar horas extras. Para não puxar mais briga no
seu atual estado de espírito, me calei.
Mas já deu.
— Podemos conversar? — Tiro o cinto e

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me viro de lado no banco assim que o carro para


em frente a minha casa.
— Está tarde, Oliver amanhã tenho reunião
logo as sete, preciso rever alguns números ainda
hoje para estar preparada. — Seu rosto continua
fixo à frente, a postura rígida.
— Eu pensei que fossemos amigos. — Ayla
exala um suspiro cansado. — Pensei que tentaria ao
menos entender o meu lado nessa situação.
Encostando a cabeça no volante, lentamente
vira o rosto para mim. A lua está alta no céu o que
nos fornece claridade o suficiente. E caramba, pela
luz da lua seu perfil é ainda mais encantador.
— Somos amigos, sim.
— A forma que agiu desde o momento que
falei não para sexo sem compromisso me diz o
contrário. Você não é só a minha chefe, Ayla, é a
dona da empresa onde eu trabalho, eu sou um ex-
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acompanhante, você já pagou para fazer sexo


comigo, saímos em uma revista que questionou a
minha integridade e me acusou, mesmo que
indiretamente de querer te dar um golpe. Sou
pobre, se vamos dar os nomes certos aos bois, e
você podre de rica.
— Nenhuma merda do que acabou de falar
me interessa, Oliver. E nem servem de motivos
reais para você dizer não. E caso não se lembre,
compramos a patente do seu software, pobre é um
termo que pode riscar dessa sua lista idiota. — Seu
corpo fica ereto e ela tira o cinto, imitando a minha
posição. Estamos de frente um para o outro agora.
Rio sem humor pela forma que colocou meu
novo status social inexistente. Estou bem ciente que
me pagaram uma boa quantia pelo software, mas
isso para mim não significa nada, não muda as
minhas origens ou a forma como cheguei aqui. Não

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muda que sou apenas seu funcionário.


— Se coloca no meu lugar. O que você
faria?
— Sendo bem honesta? — Concordo. — Eu
toparia. É só sexo e a minha vida só diz respeito a
mim. Pouco me importaria com o que falassem, se
falassem.
— Falou a pessoa que foi atrás de um
advogado logo na primeira fofoca que apareceu na
mídia. — Vejo a raiva cintilar em suas íris.
— Porra, Oliver eu só procurei um
advogado em respeito a você, ao que eles estavam
insinuando sobre você, por causa da forma sem
escrúpulos que eles o expuseram. Mas ‘tá bom, eu
já entendi, você não quer sexo sem compromisso,
agora pode por favor, descer do meu carro?
— Claro. — Abro a porta, assim que coloco
uma perna para fora sinto sua mão no meu braço.
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— Desculpa. Eu só... você me deixa


confusa e os seus motivos para rejeitar as coisas
entre nós, são idiotas. Preciso de mais do que o que
já disse para conseguir aceitar numa boa.
— É tudo o que eu tenho, sinto muito.
E antes que eu possa tentar sair de novo,
Ayla joga seu corpo para cima do meu e sua boca
pressiona a minha. Uma coisa que aprendi é ser
cavalheiro e isso no meu manual significa não
rechaçar uma dama, então correspondo ao beijo.
Suas mãos agarram a minha nuca, pegando
impulso para subir no meu colo. O mesmo vestido
vermelho da hora do almoço, que evitei olhar por
mais que dois segundos para não ter pensamentos
pecaminosos, agora se enrola em suas coxas, que
me prendem contra o banco. Ayla puxa a porta,
fechando-a novamente e começa a rebolar no meu
pau.

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— Você me quer tanto quanto eu te quero


— sussurra, intercalando beijos e lambidas no meu
ouvido.
— O problema não é o querer, princesa. Só
Deus sabe o quanto eu te quero. — Uma de suas
mãos mergulham em nosso meio e descasa o botão
da minha calça, não demora para os dedos espertos
puxem meu pau para fora.
— Seus motivos são fracos, Oli. — Seus
olhos encontram os meus, os joelhos procuram
apoio no banco e há um pedido silencioso
estampado no seu rosto conforme ela afasta a
calcinha e segura meu pau. Deito a cabeça no apoio
e fecho os olhos. Conto até cem. Ao meu silêncio,
sua boca vai para o meu queixo, mordidinhas
suaves e lambidas provocantes. — É só uma
palavrinha, meu amor. Três letrinhas, vamos lá, eu
sei que você quer.

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— Puta que pariu, Ayla, me fode logo.

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Disposta a descobrir os motivos reais da


recusa de Oliver, na sexta-feira marco um jantar em
família. Sei que eles conversaram e pelo que
conheço do meu pai, ele conhece o Oli melhor do
que eu.
Eu pensei que depois do episódio no carro,
na segunda à noite, ele mudaria de ideia. No final
só me fez sentir um pouco mais babaca, porque deu
a impressão que eu o forcei a fazer sexo comigo.

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Asim que gozamos, Oliver beijou meus cabelos,


minha testa e depois a minha boca antes de cravar
um pouco mais fundo a faca:
— Eu amo transar com você, Ayla. Desejo
você mais do que já desejei qualquer mulher na
minha vida, mas a resposta ainda é não. Pelo bem
da minha sanidade mental.
O final da sua frase que ficou martelando na
minha cabeça durante toda a semana. Admiti para
mim mesma que tinha agido como uma vaca com
ele depois da negativa e voltei a ser a mesma de
antes. Almoçamos juntos, trocamos ideias sobre o
trabalho e discutimos um pouco sobre seus planos
para o aplicativo da Kate. A semana passou rápido
seguindo esse nosso cronograma, a tensão sexual
sempre presente, sempre nos mordendo pelas
beiradas nos fazendo soltar comentários
insinuativos e alguns toques maliciosos.

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E eu ganhei uma nova inimiga: Cara


Davenport.
Na entrevista eu a achei o máximo, era a
única mulher inscrita para o estágio e desde aquele
primeiro momento eu soube que queria dar uma das
vagas a ela. Em termos de trabalho ela é incrível, é
muito criativa e disposta. O problema é que essas
palavras vieram de Oliver, Mark também só tem
elogios a tecer para a nova funcionária. Não tenho
nada contra ela, a não ser o fato de que Oliver
parece encantado e que eles passam a maior parte
do dia juntos. E que muitas vezes quando apareço
no andar de criação, eu os encontro rindo e
conversando como velhos amigos. Ou novos
namorados.
Mordo o canto da bochecha com um pouco
mais de força quando penso nisso.
Ela é uma igual.

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Se for levar em consideração os motivos de


Oli para não termos sexo sem compromisso, Cara é
ideal para ele. Possuem o mesmo cargo, ambos são
estudantes e tem mais uma porrada de coisas em
comum.
— A panela está queimando. — Júlia
aparece do nada dentro da cozinha e pula na minha
frente. Nem se quer me lembrava mais que estava
cozinhando.
Levanto e apago o fogo. O arroz já era.
— Vou pedir chinesa, ia pedir pizza, mas
ainda acho cedo para meu pai abusar tanto. Então
vamos de chinesa. — Abandono a panela sobre a
pia e encho um copo d’água.
— Vem, senta aqui e fala comigo. — Sou
guiada como uma criança até a bancada mais
próxima. — Que que ‘tá pegando?
— Oliver disse não para a amizade colorida.
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— Despejo de uma vez, sem nenhuma dignidade.


Bem quando decido jogar para o ralo a prudência
total e me divertir um pouco, a única pessoa com a
qual desejo fazê-lo, não me quer.
A vida é mesmo uma tremenda de uma
piada de mal gosto, né?
— Ele deve ter um motivo, Lally.
— Ah, porra. Vai ficar do lado dele agora?
— Ela ri.
— Não ‘tô ficando do lado de ninguém é só
que as vezes tem alguma coisa acontecendo na vida
pessoal dele que o tem deixado inseguro. Falta de
interesse nós sabemos que não é, então o motivo
deve ser bem sério.
Júlia fala como se soubesse de alguma
coisa. Quando a questiono sobre isso, ela
desconversa:
— Vou procurar o telefone daquele chinês
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que a gente ama. — Fico sozinha na cozinha, a


curiosidade comendo meu estômago.
Não demora para que meu pai chegue e
assim como a minha prima, ele sempre esquiva
quando tento puxar a conversa para o assunto
Oliver James. O que me deixa frustrada ao
extremo. O único momento que seu nome surge na
conversa é quando meu pai está indo embora. Ele
beija a minha testa e me abraça apertado.
— Eu gosto dele, filha. É um bom rapaz. —
Reviro os olhos e tento fingir:
— Eu sei que é, mas não estou interessada,
pai. Só estava curiosa para saber um pouco mais
sobre ele exatamente pelo fato de o senhor estar tão
impressionado.
— Sei, minta para mim, princesa, mas
nunca para si mesma. — Outro beijo na testa. —
De qualquer forma, tenha paciência com ele, viu?

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As coisas que ele tem passado eu não desejaria a


ninguém. Oliver é um homem forte e honrado, um
homem que eu ia amar ver fazendo a minha
garotinha feliz.
Sou deixada na porta de casa de boca aberta
e o coração batendo como um louco no peito.
Ao invés de respostas, o jantar só me trouxe
mais dúvidas.
A maior delas: acho que parei de seguir
apenas o meu corpo e minha mente e estou
começando a ouvir o meu coração.

Uma coisa que aprendi na empresa é: tenha


o máximo de aliados que puder.
É pensando nisso que domingo de manhã
peço ao Sam que me passe o telefone da Charlie.
Ela não coube em si quando liguei convidando-a

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para um dia de garotas. Eu não tinha nada em


mente, na verdade só fui no mercado com a Júlia e
enchi um carrinho de porcarias gordurosas.
— Estou gostando de ver você arregaçando
as mangas e indo à luta atrás algo que não seja a
empresa, Lally. — Declara quando estamos perto
da casa do Oli. — E eu sei que vai dar tudo certo,
tio Edyy tem razão, você só precisa ter um pouco
de paciência.
— Vou ignorar o fato que ficou ouvindo
minha conversa com meu pai por detrás da porta e
que, provavelmente sabe de algo que não quer me
contar, ‘tá? — A safada dá de ombros. — Manda
uma mensagem pra Charlie e diz que já estamos
chegando. Não quero correr o risco de topar com o
Oli.
Pedi que não contasse para onde estava indo
e ela inventou uma desculpa que ia para a casa de

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uma amiga estudar. Garota esperta! Quando o


portão da casa se abre, Charlie aparece com uma
mochila nas costas, ao nos ver um enorme sorriso
aparece.
— Quase não acreditei que era você mesma
me ligando! — Sua empolgação contagia. — Só
fiquei curiosa do porquê mentir para o meu irmão,
nunca fiz isso e não gostei de fazê-lo ainda que
fosse a pedido seu, Ayla.
Já gostei dela. Se parece com o irmão até
mesmo na personalidade.
— Peço desculpas por isso, mas garanto que
foi por uma boa causa.
Ela não responde só concorda com um
aceno mínimo. Dirijo para casa e enquanto isso
vamos falando do meu assunto preferido nos
últimos tempos: Oliver Damien.
Minha conversa com meu pai ontem me fez
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entender que mentir para si mesmo é a pior forma


de enganação que existe. Parar de lutar contra
aquilo que desejamos é a melhor forma de alcançar
paz de espírito.
E tudo o que eu mais quero, depois de
Oliver, é paz.
No final do dia descobri coisas sobre Oli
que nunca imaginei, me vi caindo ainda mais por
tudo o que ele é, tudo o que ele representa para a
família, pela forma que tem cuidado do pai doente,
pelo homem que desperta admiração por onde
passa, mesmo sem nem abrir a boca. E ainda que eu
acredite que haja um milhão de coisas para
descobrir, fiquei satisfeita no final das contas.
À noite, deixei Charlie em casa e quando
deitei a cabeça no travesseiro, enfim encontrei as
respostas que estava procurando desde ontem com
meu pai. Foi pesando tudo o que eu já conhecia de

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Oliver e tudo o que sua irmã me contou que eu


consegui entende-lo. Foi naquele momento,
olhando para o teto na penumbra que eu consegui
me entender.
Eu estou apaixonada.

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Soube que seria uma semana infernal no


momento que descobri que Charlote estava
mentindo para mim. Disse que ia estudar na casa de
uma amiga, porém vi muito bem quando entrou em
um carro preto na porta de casa. Tentei ligar várias
vezes em seu celular, mas sempre dava desligado.
Quando chegou, quase as nove da noite, nós
brigamos. Foi a primeira vez que levantamos a voz
um para o outro, até acordamos meu pai e o Rick.

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Não quero impedi-la de viver como uma


adolescente por causa dos nossos problemas, mas
não vou tolerar mentiras. Já tive dezesseis anos e
aprontei bastante e é por saber disso que exijo
diálogo e transparência. Charlie foi para cama de
cara virada comigo, me chamando de idiota
controlador e ainda sem me dizer de fato onde e
com quem estava. E de castigo sem celular por um
mês.
A tristeza que vi nos olhos do meu pai ao
assistir a briga, mas não ter forças para intervir, só
serviu para piorar a situação.
Quando a segunda-feira chegou, fria e
nublada, acordei com meu pai engasgando em seu
quarto. Estava deitado e não conseguiu engolir a
própria saliva, achei que ia perdê-lo naquele
momento. Mandei Charlie e Richard para a escola e
fiquei com ele até ter certeza que estava bem,

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mesmo estando aos cuidados do enfermeiro, não


me senti confiante o suficiente para sair do seu
lado. Cheguei ao trabalho atrasado e não rendi um
décimo do meu potencial. Ao perceber minha
dispersão, Mark me deu o dia de folga. Velei o
sono do meu pai a tarde inteira, percebendo que ele
dormia mais do que o normal.
— Infelizmente daqui para frente a
tendência é piorar, Oliver. — Doug explica no final
da tarde, antes que meus irmãos cheguem da
escola. — Seus músculos estão enfraquecendo mais
a cada dia, mesmo com as poucas sessões de
fisioterapia que ele tem aceitado. De agora em
diante tudo o que ele precisa é estar confortável até
que... — pausa, sem saber como falar a palavra.
— Ele morra. — Duas palavras que tem o
poder de esmagar as minhas esperanças e trazer a
bile até a garganta.

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— Sim. — Uma de suas mãos apertam meu


ombro em sinal de conforto. — Eu sinto muito
mesmo por ele. Sugiro que deixe seus irmãos se
despedirem enquanto ele ainda está estável, depois
de hoje, quanto menos contato ele tiver, melhor.
Seu sistema imunológico está muito vulnerável e
minha indicação seria interná-lo. É o melhor nessa
situação tanto para ele, quanto para vocês.
Meus irmãos e eu passamos a noite inteira
no quarto com nosso pai. Ele ria um pouco, falava
umas poucas palavras e eu via aos poucos sua força
se esvair. Quando o dia amanheceu, pedi mais uma
folga no trabalho e fiz uso do meu novo plano de
saúde.
Internei meu pai.
Com a promessa que voltaria para passar a
noite e tendo garantias que cuidariam bem dele e o
deixariam o mais confortável possível, fui para o

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turno da tarde no trabalho e dessa vez, consegui dar


o meu melhor. Ainda não era o meu cem por cento,
mas fui capaz de finalizar mais uma parte do
projeto que tínhamos que entregar na sexta.
Batidas na porta soam, mas não faço
questão de conferir quem é. Cara o faz, sei que
tenho sido um péssimo colega de trabalho, mas
foda-se. Continuo concentrado na tela à minha
frente, estou fazendo a primeira rodada de testes do
software.
— Oli? — Automaticamente meus olhos se
fecham ao som da sua voz. É como um bálsamo
sobre uma ferida recém-aberta. — Almoça comigo
hoje?
Nem sequer notei que já é hora do almoço.
Cara já tinha feito seu horário? Não sei responder,
mal a notei na sala desde que cheguei.
— Preciso terminar os testes iniciais,

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estamos em cima do prazo, já. — Sei que de uma


forma ou de outra, farei meu horário de almoço em
breve, visto que são quase duas da tarde. O fato é
que não quero ficar a sós com ela. Ayla me
conforta e me faz sentir melhor, seja qual for a
situação, tira meus pensamentos dos problemas e
tudo o que eu menos preciso agora é de distração.
— Você está me evitando. Mark disse que
foi para casa ontem e não veio de manhã, está tudo
bem?
— Está. Só tinha umas coisas para resolver
e não, não estou te evitando, só quero fazer o meu
trabalho, no prazo. — Não desvio meus olhos da
tela. Sei que se o fizer, se olhar em seus olhos, vou
acabar cedendo. Ainda contra a minha vontade, ela
sempre consegue me persuadir aos seus desejos e
isso só deixa ainda mais claro o quanto devo
manter distância neste momento.

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— Tudo bem, então. Nos vemos por aí.


— É.
Ouço-a falando com a Cara, mas continuo
concentrado no trabalho. Encarando o relógio de
minuto em minuto, ansiando a noite, que é quando
vou ter certeza que meu pai está bem. Algum
tempo depois uma sacola de papel é colocada sobre
a minha mesa.
— Você precisa comer. Não vai poder
trabalhar e nem resolver coisas se estiver
desmaiado. — Seu tom é de pura repreensão.
— Não precisava se preocupar, Ayla. — Ela
bufa e segue até a porta.
— Sei que não. De nada, Oliver. — Antes
de a porta se fechar, levanto meus olhos para
encontrar seu olhar magoado em minha direção. —
Pensei que fossemos amigos.
E eu pensei que teria meu pai para sempre
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comigo.

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Estou preocupada com o Oliver. Ninguém


sabe o que tem de fato acontecido com ele, ou
sabem e não querem me falar. Na quinta, recebo
uma mensagem sua pedindo desculpas pela
grosseria de ontem e por estar me evitando. Ao
menos admitiu que está me evitando, já é alguma
coisa.
Tento arrancar informações do Sam, da Jú e
até do meu pai, mas sempre em vão. Sei que meu
pai se encontrou com Oli ontem à noite, mas agora
até meu próprio pai está me evitando.
Não consigo falar com a Charlote, o que só

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me deixa ainda mais preocupada.


É uma merda ficar assim.
Para evitar pensar demais no que está ou
não acontecendo, mergulho no trabalho. Analiso
propostas o dia todo e quando vou para casa, levo
contratos para revisar. Por sorte, Júlia parece tão
mergulhada no seu conto de fadas que nem tem
tentado me controlar.
Começo a pensar que ter procurado Charlie
foi um erro, que ficar insistindo com Oliver, é um
erro. Ele foi taxativo em dizer que não quer nada
mais que amizade, o certo agora é deixá-lo em paz?
Como saber a resposta certa para essa pergunta se o
meu coração parece diminuir de tamanho só de
pensar em não mais beijá-lo?
É por isso que eu prefiro o trabalho a vida
social. Minha vida profissional não é um terreno
incerto, há riscos como em qualquer negócio, mas

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são riscos que posso contornar, riscos que não vão


quebrar o meu coração. As vozes do meu pai e da
Júlia dizendo-me para ter paciência sussurram ao
meu ouvido, como se eles estivessem ao meu lado.
Tomo isso como um sinal do destino e resolvo me
dar mais uma chance. Não foi exatamente isso que
pedi ao Oliver? Acho que este é o momento de me
dar uma segunda chance a mim mesma.
E ao invés de pensar que posso estar dando
volta em círculos e que no final, vou me ferrar,
prefiro respirar fundo e ser paciente.
Continuo analisando propostas até que uma
inquietação borbulha sob a minha pele e não
consigo mais me manter sentada, lendo. Caminho
até a cafeteria em frente ao prédio da empresa e
peço dois lattes com caramelo, sigo com eles direto
para o andar de criação. Preciso ao menos saber
como ele está antes de lhe dar espaço.

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Com as duas mãos ocupadas, aproveito que


a porta está entreaberta e a empurro com o pé. Um
dos copos escapa da minha mão quando meus olhos
decifram a cena à minha frente: Oliver e Cara
abraçados, ele sentado na beirada da mesa e ela
entre as suas pernas. O som do copo caindo e o
líquido se esparramando pelo chão chama atenção
do casal, mas apenas Cara me olha, assustada.
— Ah, oi, Ayla! — A animação no seu tom
me causa náuseas. Oliver não move um músculo
sequer do corpo.
Não respondo.
Não me movo.
Sinto meu coração batendo nos ouvidos.
Meus dedos trêmulos não conseguem
suportar o peso do segundo copo e ele também
encontra o chão. Quando Cara tenta se aproximar
perguntando se estou bem, saio do transe e corro
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para fora dali.


Cara é ideal para ele. Enquanto a atração
sexual é tudo o que temos em comum, eles têm o
emprego, o gosto por coisas geeks e um milhão de
coisas mais. E estavam abraçados. Abraçados
durante a porcaria do expediente.
A raiva corre quente em minhas veias
trazendo-me de volta a mim. E antes de chegar ao
meu escritório dou meia volta até o andar de
criação. A equipe de limpeza já enviou duas
auxiliares para limpar a bagunça e anoto
mentalmente o nome delas para enviar um bônus
como pedido de desculpas. Sei que é o trabalho
delas lidar com a limpeza, mas não uma que eu
poderia ter evitado se não estivesse com a cabeça
voltada para coisas banais ao invés do trabalho.
Desvio das duas no corredor e entro na sala,
não encontro Oliver, que pena. O dele guardo para

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depois.
— Cara, não sei como tem sido as coisas
por aqui, mas quero deixar claro que não toleramos
nossos funcionários perdendo tempo com relações
afetivas durante o expediente. Aliás,
confraternização é proibida entre colegas do
mesmo setor. Profissionalismo é o que te leva
adiante, conquistar o respeito é primordial no nosso
ramo, ainda mais por sermos mulheres, espero que
essa seja a última vez que algo do tipo aconteça no
escritório. — Seus olhos se arregalam e juro que
mesmo da porta consigo ver lágrimas se
acumulando nos cantos.
— Eu... nós...eu não... O Oliver acabou de
perder...
— Não me interessa a vida pessoal de
vocês, só quero que no local de trabalho se limitem
a ser profissionais, gosto do seu potencial e

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detestaria ter que te demitir por causa de homem.


E é a verdade acredito que ela vai chegar
longe e quero que vá, que cresça aqui dentro da
empresa. Não digo que corre o risco de demissão
por causa da minha história com Oliver, mas pelo
fato de ela acabar deixando que aquele cara domine
sua cabeça e com isso perca o foco no trabalho,
como ele havia feito comigo, quase me fazendo
perder o controle da minha vida.
— Você tem potencial para ir longe, para
chegar onde poucas de nós estão. Não deixe que
um homem desvie seu foco do que realmente é
importante, porque, quando você realmente precisa
só tem a você mesma a quem recorrer. — Deixo-a
saber que é benquista para a equipe, mas no final
quando ouço minhas palavras percebo que discursei
para mim mesma.
Ignoro a minha própria lição de moral e lhe

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forneço um sorriso amigável antes de sair da sua


sala.
Quando as portas do elevador se abrem me
deixando no andar da presidência, deixo meu
coração dentro dele e aperto o andar do térreo.
Mandando-o para bem longe de mim. Volto a vestir
a minha roupa de CEO e mergulho com mais vigor
ainda no trabalho.
Ao menos uma coisa Oliver me ensinou: a
pagar por sexo.
Não preciso mais ficar anos sem gozar com
um cara por causa do meu trabalho.
Olá, Speed Sex!

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“Nós estaremos caminhando para o nosso


último descanso; (...) A vida vai se acabar como
uma lamparina de ouro cai e quebra, quando a sua
corrente de prata se arrebenta, ou como um pote
de barro se despedaça quando a corda do poço se
parte. Então o nosso corpo voltará para o pó da
terra, de onde veio, e o nosso espírito voltará para
Deus, que o deu...”
Eu vejo os lábios do padre se moverem,

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pego somente alguns trechos de suas palavras, mas


sei que está fazendo um discurso bonito. Se é que
um discurso fúnebre possa ser considerado bonito.
Os ex-parceiros do corpo de bombeiro estão todos
aqui. Eles foram a única família que nos restou,
além de nós mesmos.
Eu vejo e escuto tudo isso, mas de fato, não
enxergo nem ouço nada.
Richard chora dentro dos meus braços e não
entende por que é o que seu pai não estará mais
conosco quando sairmos daqui. Ele é só uma
criança. Assim como um pai não deveria nunca
enterrar um filho, uma criança não deveria
despedir-se de seu pai em tão tenra idade.
Charlotte está ao meu lado, a cabeça deitada
no meu ombro e os seus soluços misturados aos do
meu irmãozinho são como uma coroa de espinhos
sendo enrolada cada vez mais apertado em torno do

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meu coração.
Otávio James, sessenta e dois anos, faleceu
na tarde de sexta-feira, seus rins e coração
resolveram que era hora de parar de trabalhar às
duas e quarenta e cinco da tarde.
Todos que passam por mim perguntam se
estou bem. Nada nunca mais voltará a ficar bem.
Não sem meu pai aqui. Por mais que a morte seja
uma certeza indubitável e esteja se anunciando há
meses, nunca estaremos realmente preparados para
o momento que ela nos tira alguém.
Os olhares de pena me irritam. É por não
querer lidar com eles que não contei a ninguém
sobre o falecimento do meu pai. Apenas Cara
soube, pois estava na sala comigo quando recebi a
ligação do hospital e desabei ali mesmo. Ela
estranhou quando pedi que não contasse a ninguém,
mas respeitou a minha decisão, inventei para Mark

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que precisava de mais uma tarde de folga para


acompanhar meu pai ao médico e fui liberado. As
últimas vinte e quatro horas passaram totalmente no
automático, não me lembro se comi ou se tomei
banho.
Quando começam a descer o caixão, o ar
abandona meus pulmões e minhas vistas ficam
turvas. Só não desmorono novamente porque o
grito do meu irmão me chama de volta à realidade
suas perninhas perdem a força, mas consigo segurá-
lo antes que caia de joelhos no chão. O grito que
ele solta parece saído direto do fundo de sua alma
repleto de dor.
Meu Deus, eu não vou suportar isso.
Meus soluços se misturam ao dele.
— Porque, Oli? É o meu papai, como que
eu vou crescer e ser um homem igual você, sem
ele? — O abraço mais apertado e Charlie se junta a

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nós. Como eu queria ter respostas ao menos para


uma de suas perguntas. Eu mesmo tenho as minhas
próprias consumindo a minha sanidade.
Richard continua chorando e externando
seus questionamentos, tentando entender através de
suas perguntas, porque o papai se foi. Me desligo
de sua voz e tento apenas confortá-lo da única
forma que sou capaz no momento: com um abraço.
Nem minto dizendo que vai ficar tudo bem, como
todos tem feito. Vejo as pessoas indo embora
quando a cerimônia termina, mas nós três
continuamos parados encarando a terra revolvida.
Meu pai se foi. Aquela ali é a sua nova
casa, não mais ao nosso lado. Estamos por conta
própria. Mais do que nunca, esses dois agora são
responsabilidade minha. Como lidar com isso, se
às vezes não sei como cuidar de mim mesmo?
— Cara, você deveria ter me ligado. — A

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voz de Sam soa no meio dos meus pensamentos


turbulentos.
— Eu mandei uma mensagem para ele, Oli.
Você foi claro que não queria que o pessoal do
trabalho soubesse, mas o Sam? Ele é como da
família e neste momento você precisa dele.
A minha irmãzinha está cuidando de mim
quando o certo deveria ser o contrário. Pela
primeira vez desde que saí da empresa na sexta, eu
olho para ela. Seus olhos estão vermelhos, assim
como o nariz, a dor é visível em seus olhos, mas
Charlie aparenta estar lidando com tudo melhor do
que eu.
Não consigo fazer com que qualquer
palavra saia e aceito de bom grado quando os
braços de Sam envolvem a mim e meu irmão.
— Foda cara, ainda parece que é mentira
que tio Otávio se foi. — Sinto Charlie puxar

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Richard dos meus braços alguns minutos depois e


só então percebo que ele adormeceu.
— Vou levá-lo para o carro. — Assisto-os
partirem, mas continuo no mesmo lugar.
Sam não me solta e por mais que seja
estranho todo esse contato entre nós, me acalma um
pouco.
— Pode soar muito babaca falar assim,
irmão, mas acho que foi melhor para ele. — É, soa
muito babaca, só que aquela é uma verdade que eu
tenho evitado admitir para mim mesmo. — Ele
estava sofrendo muito, Oli.
— Eu sei.
— Então nós vamos para casa. Para a minha
casa. Você e os meninos vão passar uns dias lá, vão
sentir a perda e vão juntos, aprender a lidar com
ela. Depois você vai dar a volta por cima,
entendeu?
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— Não fala como se essa merda fosse fácil,


Samuel. Não foi você que acabou de enterrar o pai,
aliás, nunca nem teve um, então não faz ideia do
que estou sentindo. — Me arrependo das palavras
ditas no momento que seus olhos encontram os
meus.
O pai do Sam o abandonou quando ele tinha
nove anos. Simplesmente decidiu que não queria
mais ser pai e foi embora. Eram só os dois, já que a
mãe morreu no parto, o velho apenas arrumou as
malas e foi embora deixando um bilhete de sinto
muito
— Foi mal, eu só...
— Não sabe como lidar com a própria dor e
por isso machuca os outros. Eu estou do seu lado,
Oliver sempre estive e sempre vou estar, mas não
enquanto você estiver sendo cuzão. Você tem dois
irmãos que precisam de você e tenho certeza que

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tudo o que o seu pai mais queria, era ver você feliz,
realizado e vivendo, perpetuando tudo aquilo que
ele deixou como herança para você.
Lágrimas descem por seu rosto fazendo-me
sentir ainda mais miserável. Entendo o que ele quer
dizer com o lance da herança. Seu pai depois que o
deixou, prosperou e quando morreu, há dois anos,
deixou para ele uma quantidade obscena de
dinheiro como herança, que Sam nunca usou um
centavo. Meu pai não me deixou nada além de
contas médicas e dois irmãos, isso em termos
materiais. Mas em contrapartida, me ensinou a ser
um homem de verdade, me deu amor e foi presente.
Na balança da vida isso conta muito mais do que
qualquer dinheiro, por mais alta que seja a quantia.
— Vou levar os meninos comigo. Tome seu
tempo, tire a noite para sentir a perda do jeito que
achar melhor e pensar no que resultará dela. Você

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precisa desse tempo sozinho. — Eu o puxo para um


novo abraço quando começa a se afastar.
— Obrigado, Sam. E me desculpa ter dito
aquilo.
— Só quero que fique bem e pode ficar
tranquilo que ninguém além do Eddy vai ficar
sabendo. — Abro a boca para contestar, mas ele me
para: — Ainda vai querer o emprego depois que a
poeira abaixar então temos que ter um aliado lá
dentro.
— Pode ser. — Corto-o, não querendo me
estender no assunto, com medo de que falando da
empresa ele trará Ayla para a conversa.
Infelizmente não tenho tanta sorte.
— Já que a que tinha você conseguiu
afastar. Ayla está puta da vida com você e sai até
de perto quando alguém fala o seu nome. — Lhe
dou as costas e sigo para mais perto da lápide. Só

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que ele não pega a deixa e continua: — E depois de


tudo o que já conversaram, é mais do que óbvio que
o Eddy vai entender sua necessidade de
afastamento. Vou falar com ele.
Não respondo. Ouço seus passos se
afastando e respiro aliviado.
— Seu luto não é motivo para magoar as
pessoas, eu te perdoo, mas nem todas as pessoas o
farão. Inclusive a Ayla.
— Tchau, Sam.
— O que é uma pena, levando em
consideração o quanto ela realmente gosta de você.
Otávio ficaria muito decepcionado se soubesse a
forma como a tem tratado.
Sam continua falando até alcançar os
portões do cemitério, mas eu o ignoro. Sento-me ao
lado da lápide do meu pai e sentindo o coração
ficar apertado no peito, choro e peço conselhos que
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nunca mais irei ouvir.

Minha cabeça lateja. Não me lembro de


muita coisa depois de sair do cemitério, só de
passar no supermercado e comprar uma quantidade
exuberante de vodca. O resto é um borrão. Até
agora e algum inconveniente resolver que é o
momento perfeito para vir apertar o interfone de
casa. Cubro a cabeça com o travesseiro para abafar
o som, mas então meu celular começa a tocar.
— Caralho. — Tateio a cama em busca do
aparelho encontrando-o segundos antes de a ligação
ir para a caixa de mensagens. — Alô.
— Abra a porta, Oliver. Sei que está em
casa. — Afasto o celular para ter certeza de que
isso está mesmo acontecendo. O número é
desconhecido então não posso afirmar se é um
sonho, mas reconheço a voz. — Anda, rapaz. Abra
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a porta.
A ligação é finalizada e me vejo sem saída a
não ser fazer o que me foi dito. Caminho até o
portão como um zumbi, sendo guiado pelo escuro
apenas pela memória muscular que não me deixa
esbarrar em nenhum móvel. Nem faço ideia de que
horas são.
— Pensei que teria que procurar um
chaveiro vinte e quatro horas e mentir que perdi a
chave de casa. — Eddy sorri e me puxa para um
abraço desajeitado, já que suas mãos estão
abarrotadas de sacolas.
Fico calado por não saber o que falar.
— Não vai me convidar para entrar, filho?
— Filho...
— Claro, entra.
Nos levo até a sala, desta vez acendendo as
luzes, como se estivesse mesmo em casa, ele me
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deixa no sofá e anda até a cozinha, onde sobre a


mesa começa a desfazer as compras. Apoio a
cabeça no sofá e acho que volto a dormir, pois sinto
um cutucão no ombro algum tempo depois e antes
de abrir os olhos, sinto um forte cheiro de café.
— Aqui, beba para nós podermos
conversar. — Uma caneca é colocada na minha
mão e Eddy se senta ao meu lado, seus olhos
atentos não se desgrudam de mim. Ele degusta da
própria caneca e ergue as sobrancelhas quando
demoro muito para começar a beber da minha.
— Estou um pouco confuso — falo pela
primeira vez. Sua risada baixa me faz perguntar
como ele pode estar aqui, me oferecendo café e
rindo quando eu acabei de enterrar o meu pai.
— Sei que sim, mas beba seu café primeiro.
— Sua mão livre aperta meu joelho antes que ele se
levante e volte para a cozinha.

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Ainda sem saber como interpretar a visita


inesperada, bebo o tal café. Forte e amargo. Eddy
volta e agora traz consigo um prato com ovos
mexidos.
— Coma. Imagino que nem se lembre
quando foi a última vez que comeu. — De fato não
me lembro. Na sexta quando Ayla mais uma vez
mandou meu almoço? Deve ter sido. Hoje já é
domingo. Não, já é segunda, constato ao olhar no
relógio e ver que são duas da madrugada.
— Por que está aqui a essa hora, Eddy? —
Finalizo meu café e dou algumas garfadas nos
ovos. E só então me dou conta de que estou
faminto. Detono tudo em menos de cinco minutos.
— Samuel me ligou ontem à tarde. Não vim
antes porque estava com a minha filha no hospital.
— Quê? O que aconteceu com a Ayla? Ela
está bem? — Meu coração dispara com a mera

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ideia de algo acontecer a ela. Quando vou colocar o


prato sobre a mesinha de centro, percebo que estou
tremendo. Sinto a mão de Eddy amparar a minha e
um sorriso tranquilizador se abre em seu rosto:
— Ela está bem. Por um acaso, assim como
você minha menininha pensou que acabar com o
estoque de bebida alcoólica do mundo é a solução
para qualquer problema. — Apesar das palavras
deixarem subentendido a brincadeira, seu tom é
sério, assim como seu olhar pregado no meu rosto.
— Ouça, filho. — O adjetivo sendo usado pela
segunda vez me faz fechar os olhos e respirar
fundo. — Eu quero que saiba que não está sozinho.
Entendo a necessidade de se isolar no começo, mas
quero, e preciso, que coloque na sua cabeça que
você não está sozinho. — Repete com mais ênfase.
Continuo calado.
— Meus pais morreram quando eu tinha

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trinta e três anos, minha esposa havia me deixado


há apenas dois meses e eu precisava ser o suporte
da minha filha, que na época estava com cinco
aninhos. Eu me senti perdido, garoto. A Ayla me
olhava e perguntava por que a mãe dela estava
demorando a voltar do trabalho e eu só sabia chorar
encarando a minha menininha. Não tinha nem
começado a me recuperar do baque, quando meus
pais foram vítimas de latrocínio. — Engulo a bile
que tenta escapar. — Você está com pena de mim
agora, Oli?
Desvio meus olhos dos seus.
— Eu não... — Não é pena, mas também
não sei explicar o que é.
— Não precisa sentir vergonha. É inerente
ao ser humano se compadecer da dor do outro, isso
não é ter pena, Oliver, é compaixão, é amor ao
próximo. E é isso que eu sinto por você, eu te

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admiro e tenho orgulho de você da mesma forma


que tenho certeza, seu pai sentia.
Eddy se levanta e volta com a garrafa de
café, nos serve mais e bebe um longo gole antes de
continuar:
— Você é mais forte do que imagina. Sabe
o que me deu forças para levantar a cabeça e seguir
em frente? — Desta vez ele espera que eu
responda, seus olhos continuam colados em mim
como se estudando meu comportamento e não sei
como me sinto em relação a isso.
— O que?
— Ayla. — Seu sorriso ao pronunciar o
nome, provoca o meu. — Eu tinha uma família que
poderia cuidar dela? Claro que tinha e nos
primeiros dias era a eles a quem eu recorria, mas
quando a noite chegava e ela voltava para casa,
corria para dentro dos meus braços e me enchia o

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rosto de beijos. Eu senti muito a sua falta, papai,


fica bem logo para eu não ter que ficar mais longe
de você. Era isso o que ela dizia toda noite e ficava
grudada em mim até dormir nos meus braços. —
Seus olhos mal seguram as lágrimas e vejo algumas
rolarem. Eddy pigarreia antes de continuar: —
Então um dia eu acordei para a realidade e vi que
estava condenando a minha filha a me perder
também, ainda que eu estivesse vivo. Percebi que
não só eu tinha perdido a esposa e os pais, ela
também tinha perdido a mãe e os avós. Foi fácil
recomeçar sem as pessoas que sempre estiveram ao
meu lado? Não foi, mas dia após dia eu via o
sorriso da Ayla de volta e ele me dava forças para
continuar. — Seu tom se torna mais sério quando
inicia a próxima frase. — Seus irmãos precisam de
você, a minha empresa precisa de você. E se
formos ser sinceros um com o outro aqui, a minha
filha precisa de você.
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— Nós não...
— Eu sou velho, mas não sou burro, filho.
Dei este conselho à Ayla e agora o estenderei a
você: minta para mim, mas não minta para si
mesmo. Mas hoje eu não vim aqui falar sobre o
relacionamento de vocês, vim para fazê-lo enxergar
que não está sozinho. Quer manter a privacidade,
tudo bem. Pode trabalhar de casa por algumas
semanas, é até bom que vai estar mais tempo com
seus irmãos. Só não se esqueça que temos um
acordo, em seis meses volta para a faculdade. —
Eddy fica de pé e recolhe o prato e as canecas. —
Não tive o privilégio de conhecer seu pai e sinto
muito por isso. Continue orgulhando-o Oliver. —
Enquanto caminha até a cozinha, sua voz ainda soa:
— Agora durma um pouco, está de folga até
quarta-feira, porém na quinta já irá receber
trabalho. Vou ficar por aqui por mais algum tempo,
se não se importar.
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— Não, tudo bem. — Ainda estou


assimilando tudo, a sua visita, suas palavras, meus
sentimentos. Está tudo confuso, mas
estranhamente, mais calmo dentro de mim. — Só...
a Ayla está mesmo bem?
— Sim, foi só uma desidratação comum
depois de uma noite de bebedeira. Só que no caso
dela foi um dia inteiro de bebedeira e como foi o
primeiro porre da vida dela...
Acabo sorrindo. Minha princesinha está
mesmo ficando rebelde.
Minha.
Um desejo absurdo de falar com ela surge
repentinamente, como uma onda que chega com
tudo na faixa de areia. Contudo, no momento o
melhor ainda é manter distância. Já tenho coisas
demais para lidar. Uma pena que isso não impede
meu desejo por ela que só cresce, o pior de tudo é

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perceber que não é mais apenas físico.


— Vá para a cama filho. E pode ficar
tranquilo, ninguém além de mim vai saber o que
está acontecendo até que esteja pronto para contar.
Só não demora, ‘tá? Júlia agora está com mania de
postar no Instagram, frases de livros que já leu,
esses dias postou uma que eu até salvei pois nunca
tinha lido nada tão verdadeiro, veja: “A vida não
para e espera que nossas cicatrizes se curem, você
quem deve forçá-las a se curar enquanto vive.”
Existem centenas de pessoa à sua volta dispostas a
te ajudar no processo de cura, mantenha isso em
mente.
Quando Eddy some dentro da cozinha,
caminho para o quarto. Jogo-me na cama e desligo
meus pensamentos pois sei que se começar a pensar
em tudo o que foi dito nas últimas horas, vou pirar.
Adormeço em alguns minutos, nem vejo quando

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ele vai embora. Mas acordo quase na hora do


almoço e encontro comida pronta na minha
geladeira.

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— Oi amor. Ainda estou aqui no hospital


com a Lally. — A voz cansada da minha garota soa
logo ao segundo toque.
E me faz ter vontade de pegar a Ayla e o
Oliver e trancá-los em um cômodo e só deixá-los
sair de lá, quando tiverem virado adultos e
conversado. Porra de gente cu doce.
— Tudo bem, só liguei para saber como
você está.
— Preocupada. Ai, amor... eu quem

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incentivei ela a continuar investindo no Oli e


agora...ela quase entrou em coma alcóolico! —
Ouço-a fungar e praguejo baixo, detestando estar
longe.
— Não se culpe assim, linda. Ela é adulta e
sabe o que faz. Mas se serve de consolo, Oliver
também ‘tá bem mal. — Não conto o real motivo
de ele estar assim. Não devia manter a minha
palavra depois de ele ter sido filho da puta comigo,
mas o faço mesmo assim.
— Eu acho é pouco. — Sinto um aperto no
peito diante suas palavras, ainda que ela não saiba a
verdade, me faz sentir mal por ter aberto a boca. —
Mas e aí, o que está fazendo?
— Nada, trouxe a Charlie e o Rick para cá,
Oli ‘tá um cuzão e resolvi distrair os meninos. —
Ah merda, essa coisa de mentir não vai funcionar.
A cada vez que falo a respeito, mais sinto o gosto

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amargo na ponta da língua.


Quem está sendo o cuzão agora?
— Tem alguma coisa que quer me contar,
Samuel? — E ela me conhece melhor do que
ninguém.
— Porra de Samuel, amor. — Ela ri e faz o
aperto no meu peito diminuir. — Depois a gente
conversa. Vai passar a noite aí, né?
Ela confirma e conversamos por mais
alguns minutos, ter encontrado a Júlia foi a melhor
coisa que aconteceu na minha vida. Eu
praticamente cresci sozinho depois que meu pai foi
embora, fui tutelado por um primo que só pensava
em sexo e bebidas. Diante o baque do abandono,
todos acharam melhor que eu ficasse na mesma
casa, na mesma escola e com os mesmos amigos,
então o único degenerado que não ia fazer falta
para ninguém, veio morar comigo. Fred tinha vinte

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e seis anos na época e nem um emprego tinha.


Todo o meu progresso na vida foi graças a mim
mesmo e o meu desejo de ser um homem melhor
do que o que doou esperma para me conceber
— Sam? — Levanto a cabeça do celular e
encontro a Charlie na porta da sala. Os olhos
inchados de tanto chorar.
— Vem cá, pingo de gente. — Ela se deita
com a cabeça no meu colo e a deixo chorar mais.
A família James foi o meu alicerce, perdi o
homem que me deu a vida, mas ganhei um exemplo
melhor de pai e três irmãos. E na verdade devo um
pouco do que sou à Otávio James. Desde que Oli e
eu começamos a andar juntos ele me acolheu como
um filho. Só me afastei nos últimos meses pois ele
mesmo havia pedido, acho que não queria que as
pessoas que o amavam o vissem definhando; queria
que guardássemos apenas as boas lembranças dele.

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E entendo a sua vontade, mas agora sinto uma dor


angustiante por não ter conseguido me despedir
direito.
— Será que o Oli vai ficar bem? — sussurra
se encolhendo um pouco mais. Não tive irmãos e
nunca consegui amar meus primos como família,
mas acredito que se fôssemos mais próximos, eu os
amaria como eu amo a Charlie e seus irmãos.
— Vai sim, Charlie. Pode demorar uns dias,
mas vai. — Me agarro a essa afirmação com todas
as minhas forças. Eddy havia dito que ia procurá-
lo, espero que isso surta algum efeito sobre aquele
cabeça dura.
Caralho, o que o Oliver tem de correto e
gente boa, ele tem de cabeça dura e isso vai acabar
fazendo-o perder a melhor garota que já cruzou o
seu caminho. Sem contar a confiança e respeito dos
irmãos.

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— Posso fazer uma pergunta bem chata?


— Claro. — Afirmo, mas com o medo
espreitando. Nunca se sabe o que esperar de um
adolescente.
— Como foi depois... — Puta que pariu,
começo a suar frio. Porque caralhos ela quer falar
sobre sexo logo comigo? Engulo em seco. —
Depois que o seu pai foi embora?
Aaaaahhh! Nossa.
Suspiro tão alto que Charlie se levanta do
meu colo em um pulo e segura meu braço.
— Desculpa, não devia ter tocado nesse
assunto. Não precisa responder, Sam. — Bato com
o indicador no seu nariz e ela sorri.
— Se perguntou é porque quer saber. —
Brinco, aliviado pra caralho. — E para ser sincero,
não me lembro de muita coisa. Acho que meu
subconsciente bloqueou essa parte da minha vida,
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sabe? Mas no seu caso, você só tem que continuar


vivendo. Alguns dias vai doer mais, em outros, vai
se sentir culpada até por estar respirando e ele não,
vai chegar um momento da sua vida que você vai
sentar e chorar por tudo aquilo que está vivendo e
que gostaria de dividir com ele, a dor de não poder
fazê-lo vai ser tão intensa que vai pensar que queria
se juntar a ele, mas daí você vai se lembrar do
sorriso dele, do quanto ele te amava e o quanto
queria te ver feliz. Então vai fazer uma oração e
agradecê-lo por ter sido um pai tão incrível e
desejar que ele esteja bem, aonde estiver.
É isso o que eu faço quase todas as noites.
Mas para a minha mãe. A mulher mais incrível do
mundo que eu não tive o prazer de conhecer, mas
que amo com tudo que há em mim. Há fotos dela
espalhada por toda a minha casa e meu passatempo
preferido nas férias é viajar para a casa dos meus
tios para ouvir histórias sobre ela, ainda que todos
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tenham me ignorado pela maior parte da minha


vida quando precisei deles.
Só percebo que estou chorando quando
Charlie me abraça pelo ombro.
— Ninguém perguntou como você está e
todos sabemos que ele também era como um pai
para você. — Não a corrijo a respeito das minhas
lágrimas.
— Eu ‘tô bem, pingo de gente. E logo vocês
também vão ficar, ‘tá? — Com um aceno ela volta
para perto e deita a cabeça no meu ombro.
Ligo a TV e ficamos vendo filmes. Não sei
em que momento adormeço, mas acordo no meio
da madrugada com um cobertor jogado sobre mim.
A nossa pingo de gente tá crescendo. Me orgulho
muito dela nesse momento sendo forte desta forma,
só que ao mesmo tempo fico com medo de estar
interiorizando a dor, por que aí quando não

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conseguir suportar mais, o resultado será trágico.


Oliver precisa urgentemente colocar a
cabeça no lugar. Isso não significa que não pode
viver o luto, mas precisa saber que existem pessoas
que precisam dele além dele mesmo.

Richard ainda está dormindo quando Júlia


chega trazendo café da manhã. Aliás, está
dormindo já faz doze horas e isso está começando a
me deixar preocupado.
Enquanto Charlie toma banho, conto para a
minha namorada tudo o que realmente está
acontecendo. Primeiro ela me xinga e fica puta por
eu a ter deixado falar daquela forma sobre Oliver
ontem, mas depois me abraça e promete que não
vai contar para a prima. Honestamente não entendo
os motivos dele para querer manter a morte do pai
em segredo, mas como não é a minha vida, não
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posso fazer nada.


— E como você está? — Pergunta ao se
enfiar no meio das minhas pernas. Estamos na
cozinha, eu sentado em um dos banquinhos da ilha.
Beijo sua testa e a trago para mais perto.
— Bem.
— Bem mesmo, amor? — Insiste, ela sabe
sobre meu passado com meus pais e ver a
preocupação em seus olhos só me faz ter mais
certeza de que eu a amo. Beijo a ponta no seu nariz.
— Sim. Bem mesmo. Juro.
Eu nunca pensei que um dia fosse encontrar
a mulher perfeita. Na verdade, nunca pensei que de
fato existia uma. Mas no dia que fiquei preso no
elevador com essa maluca, passei a acreditar em
destino e perfeição.
— Só estou preocupado com o Rick. O
garoto estava muito mal ontem e está dormindo há
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doze horas. — Já é quase hora de ir para a empresa


e não faço ideia do que fazer com os meninos. Não
cheguei a pensar nisso quando os trouxe para casa.
— Vamos fazer assim: você vai para o
trabalho e eu fico aqui com os dois. Tento
conversar com o Rick e depois se eles quiserem ir
para casa, eu os levo. Ayla vai ficar uns dias
afastada, então também estou de folga. — Ela se
dar bem com as pessoas que considero a minha
única família, significa demais para mim.
— Certo. Obrigado. — Ela se afasta e
começa a servir café para nós. — E como a Ayla
está?
Júlia bufa, me fazendo rir.
— Bem, ainda não querendo ouvir falar o
nome que começa com “O”, mas é nítido o quanto
gosta dele. O segredo agora é dar tempo ao tempo,
ainda mais com a situação toda com o Oli.

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Ela pode ser meio desmiolada,


completamente sem noção em alguns momentos e
amar aprontar uma loucura, mas eu a amo demais e
ela me completa de uma forma que nem há palavras
que possam explicar. E tem um coração do
tamanho do mundo. Seu amor pela prima é algo
que acho lindo e admiro pra caralho, é o mesmo
amor que sinto pelo ingrato do meu melhor amigo.
Despeço-me de Charlie algum tempo
depois, seus olhos ainda estão vermelhos de tanto
chorar.
— Quero ir para casa ver como o Oli está
— pede quando a abraço.
— A Jú vai levar vocês quando quiserem.
Cuida do seu irmão, o Rick precisa de muito
cuidado e atenção. — Beijo sua testa e me afasto.
— Promete que vai me ligar se precisar de alguma
coisa? O Oli vai tentar ser forte e fingir que não

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precisa de nada e nem de ninguém, então se


perceber algo me liga ou manda mensagem.
— Pode deixar. E obrigada por tudo, Sam.
— Passo os polegares pelas novas lágrimas que
descem.
— Somos uma família, pingo de gente. E
seu pai me ensinou que dentro da família, a gente
cuida um do outro.
Sigo para a empresa dividido. Mesmo
sabendo que estou fazendo tudo o que está ao meu
alcance, lá no fundo fica o desejo de poder fazer
mais.

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Lavo o rosto e evito levantar a cabeça


enquanto não saio do banheiro. Tenho tido
vergonha de me encarar no espelho.
Como fui deixar que Oliver me afetasse
tanto ao ponto de beber até passar mal? Sinto que a
minha dignidade foi dizimada. Sempre tive orgulho
da minha racionalidade, mas agora...
O pior de tudo é ainda sentir o coração bater
mais forte ao pensar nele. “O amor é irracional,

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princesa, não tente entendê-lo senão vai


enlouquecer. Ele foi feito para ser sentido e não
compreendido.” As palavras do meu pai ficam se
repetindo na minha cabeça. Eu não amo o Oliver,
estou apaixonada por ele. E entre amor e paixão há
um abismo gigante que não estou disposta a
atravessar. Não quando apenas a paixão já causou
tanto estrago.
O negócio agora é arregaçar as mangas e
seguir o fluxo da vida: esquecer o Oliver, trabalhar,
sair, conhecer pessoas, encontrar outro cara. Afinal,
não dizem que dor de amor só outro amor cura?
Acredito que paixão também se encaixa nesse
contexto.
Ouço barulho de chaves na porta da frente,
mas não me importo em ir ver quem é.
— Filha? — O que ele está fazendo aqui? E
se está aqui, quem está na empresa?

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— No quarto. — Logo meu pai está na


porta, os olhos preocupados colados em mim. Está
com a mesma roupa de ontem, o que me faz pensar
onde é que passou a noite.
— Trouxe o almoço. — Ainda mantendo os
olhos em mim, anda até a cama e se senta. Me
abraço mais apertado diante seu olhar
inspecionador. — Acredito que já tomou banho?
— Sim. E obrigada pela comida, mas não
estou com fome.
— Eu sei, contudo, não quero saber se está
ou não com fome, você tem que comer. — O fato
de usar o tom paternal rígido que eu não ouvia há
anos, me deixa em alerta. Não houve uma palavra
sequer de reprimenda quando Júlia ligou para ele
depois de me levar ao hospital, mas acho que agora
isso está prestes a mudar. — Vai ficar em casa até
sexta-feira, descansar e se recuperar, física e

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emocionalmente para voltar com tudo na segunda.


— Ignoro a ordem, talvez se não der tanta
importância, ele nem se lembre de tais palavras
quando for embora.
— Se o senhor está aqui, quem está na
presidência hoje? — Pergunto ao segui-lo para a
cozinha.
Sua risada é sem humor algum. Sem manter
contato visual, meu pai me serve um generoso prato
de comida.
— Você trabalha tanto, Ayla que a
presidência pode andar sozinha por um mês. —
Diante meu silêncio, completa: — Hillary está
anotando os recados, não se preocupe com isso. —
Bufo sem entender como ele pode estar tão
tranquilo em relação a empresa estar sem um
presidente. Ainda sem me olhar, se senta em um
dos bancos, faço o mesmo. — Sabe que não sou de

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intrometer na sua vida.


— Mas isso está prestes a mudar —
resmungo ao enfiar a primeira garfada de salmão na
boca. Sua risada agora é bem-humorada.
— Só quero o seu bem. — Continuo
comendo. — Você se lembra de tudo o que me
falou no sábado de madrugada, no hospital?
Engulo em seco. Não lembro de tudo, mas
tenho certeza que falei muito mais do que deveria.
Tenho alguns flashes de coisas que falei e de coisas
que ele falou, como aquela frase sobre amor que
fica martelando na minha cabeça como o tique-
taque insistente de um relógio. Nego com a cabeça.
— Imaginei. Já está grandinha e sabe bem o
que faz, no entanto sinto que está na hora de te dar
uns conselhos. — Meu pai se levanta e nos serve
Coca-Cola. — Toda decisão que tomamos nessa
vida traz consequências. Essa dor de cabeça que

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está sentindo hoje é consequência da sua decisão de


beber achando que isso faria os problemas
desaparecerem. As decisões tomadas de cabeça
quente são as que sempre trazem as piores e mais
dolorosas consequências.
— Não foi muito inteligente mesmo beber
como se o álcool fosse ser escasso do planeta —
sibilo, ainda sentindo a cabeça pulsar de tempos em
tempos. Meu pai ri e aperta minha mão sobre a
mesa.
— Sei que já falei isso tantas vezes que já
está cansada de escutar, mas eu me orgulho muito
de você, princesa. — O apelido carinhoso que usa
comigo desde que eu era pequena, agora só me faz
pensar no Oliver. O que estranhamente não me
incomoda. — E quero que me prometa que não vai
tomar nenhuma decisão precipitada a respeito de
Oliver e tudo o que tem acontecido entre vocês.

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Sinto meu rosto queimar, pois agora


lembro-me vagamente de dizer ao meu pai que
paguei ao Oli para transar comigo. Sou mesmo uma
vaca.
— Eu...
— Sei há tempos que não é mais criança,
filha. E a sua vida sexual não é do meu interesse,
desde que se cuide. Isso é tudo o que eu preciso
saber, isso e que você está feliz. Use essa semana
para relaxar. — Engulo a comida da boca e me
preparo para contestar, porém meu pai levanta a
mão direita, impedindo-me. — Vai ficar em casa e
sem trabalho por sete dias, Ayla. Não quero
desculpas, não quero chantagem, considere uma
ordem.
Reviro os olhos. Mas seu tom é carinhoso e
isso me impede de ficar nervosa.
— Como eu estava dizendo, tire esses dias

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para pensar. Organize sua agenda pessoal, esqueça


que existe uma vida além de você. E tenha sempre
em mente que todo mundo tem uma vida além
daquela que deixa as pessoas conhecerem.
O encaro confusa com essa frase final, não
tenho tempo de perguntar a respeito já que ele fica
de pé deixando claro que a conversa acabou.
— Vou indo, estou velho demais para todo
esse drama jovem no qual vocês me enfiam.
— Vocês? — Minha confusão aumenta.
Abraço-o pela cintura e juntos seguimos até a porta.
— Você, a Júlia. Vocês. Enfim fique bem,
princesa. — Sei que tem mais gente envolvida
nesse “vocês” dele e que Oliver é um deles.
Empurro esse pensamento para o fundo da minha
mente. Ficou claro desde a primeira interação do
meu pai com ele que os laços não ficariam apenas
no campo profissional. Isso não me incomoda, não

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totalmente pelo menos não em relação ao meu pai.


— Se cuida, Sr. Stewart, notei que está com
a mesma roupa de ontem, será que vou querer saber
onde passou a noite? — Até onde eu sei, meu pai
nunca mais namorou depois da minha mãe. Às
vezes acho que seria bom se ele encontrasse outra
pessoa. Ele ri e beija a minha cabeça, me abraçando
mais apertado.
— Tenho certeza que não. E pode ficar
tranquila que sei me cuidar. — Pisca e me beija de
novo antes de sair pela porta da frente. — Ah, antes
que eu me esqueça, está convocada para jantar
comigo três vezes nesta semana. Quero conferir se
está mesmo seguindo as minhas ordens, mocinha.
Reviro os olhos, enquanto ele segue até o
elevador, fico olhando-o sentindo meu peito
quentinho de tanto amor.
— Eu te amo! — grito antes de as portas

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metálicas se fecharem.
— Eu também, princesa.

Nem me lembrava mais qual era a sensação


de estar em casa de pernas para cima em um dia de
semana. É quarta-feira depois do almoço e meu
corpo dói de estar dormindo tanto nos últimos dois
dias. O que tem sido estranho é o sumiço da Júlia,
mandou algumas mensagens para saber como estou
e informando que iria passar alguns dias com os
pais. Ela parece estar me evitando, nem ao jantar de
ontem na casa do meu pai ela apareceu. A desculpa
de ontem era que tinha planos com Sam.
Hoje descubro o que está acontecendo.
São duas da tarde e perdi a conta de quantas
vezes levantei, comi algo e voltei para o sofá, a TV
está ligada transmitindo um filme qualquer que não
sinto vontade alguma de assistir, quando relanceio
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a tela e vejo Isla Fisher na pele de Becky girando


em círculos dentro de uma loja como se estivesse
no paraíso, decido que vou às compras. Outra coisa
que também não me lembro qual a sensação.
Troco de roupa e ligo para a Jú, não é
possível que irá negar uma tarde de compras.
— Oi, Lally! — O barulho de fundo é de
pessoas falando ao mesmo tempo e telefones
tocando. Assim como as lojas são o paraíso para
Becky, esse som é o meu próprio paraíso.
— Você ‘tá na empresa? — Pergunta idiota,
eu sei, mas o som dos anjos cantando que é o
barulho da empresa em funcionamento me faz
perder o rumo da vida.
— Sim, vim dar uma mãozinha para a Hill
em relação a sua agenda. Precisa de algo, prima?
— Estou indo fazer compras, queria que
fosse comigo? — Uso meu melhor tom manhoso.
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Sempre funciona com meu pai e com ela e jogo o


pedido em tom de pergunta, é sempre bom deixar a
pessoa pensar que tem escolha.
— Você indo fazer compras? Geralmente
suas roupas são compradas online, isso quando não
contrata uma personal shopper. — A surpresa no
seu tom misturada a leve reprimenda pelo meu
estilo de compras me faz revirar os olhos e
funciona como um ponto a meu favor
— Então, sou inexperiente nessa coisa de
“tarde de compras” você tem que ir comigo. —
Ouço-a falando com alguém do outro lado antes de
voltar a falar comigo:
— Te vejo na praça de alimentação em
quarenta minutos. Você paga o almoço. — Dando
um soco no ar em comemoração e saio de casa.

Quando Júlia se aproxima já fiz nossos


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pedidos em seu restaurante favorito que serve


comida típica brasileira. Sua nova obsessão é um
tal de “arroz no arado”. E sim, estou tentando
comprá-la com comida.
— Já estava com saudades. — Fico de pé e
a abraço. Soltando um muxoxo de desdém diante
meu drama ela abre um imenso sorriso e beija a
minha bochecha.
— Estava te dando um tempo para
descansar, sei que às vezes sou bem insuportável.
— Nos sentamos e o garçom nos serve vinho.
Em outra época Júlia não perderia tempo
em pedir o telefone do cara, hoje ela só o
cumprimenta com um sorriso amigável e agradece.
As coisas, e as pessoas, realmente mudam. Espero
conseguir essa mudança, também.
— Não seja dura consigo mesma. — Seus
olhos se estreitam para mim. — ‘Tá, às vezes você

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precisa de um pouco de limites, ainda assim eu te


amo e preciso te ter por perto. — Isso a faz sorrir,
mas noto que sua postura é tensa e a forma como
pensa antes de falar, deixa claro que está
escondendo alguma coisa de mim. — O que está
acontecendo, Jú?
— Como assim? Não está acontecendo
nada. — Então ela começa a girar o anel que usa no
anelar. Esse é o seu tique nervoso.
— Você está mexendo no anel. — Com os
olhos arregalados, ela esconde as duas mãos
debaixo da mesa. — Se é sobre o Oliver e a Cara,
eu já os vi juntos não precisa ficar sem graça por ter
que me contar.
Vejo-a engolir em seco e um sorriso sem
graça delineia seus lábios.
— Ele não quis sexo sem compromisso
comigo e alguns dias depois já estava se pegando

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com a estagiária bem no meio do escritório. —


Júlia fica de boca aberta com a informação. — Me
apaixonei por ele e me arrependo por ter permitido
isso, graças a Deus essa droga passa rápido.
Soo cética até para mim mesma.
— Talvez você devesse falar essa frase com
um pouquinho mais de convicção, assim quem sabe
eu acredite em você? — provoca e aí está a minha
Júlia.
— Idiota. Está do meu lado ou não? —
Nossos pratos chegam e não deixo passar o olhar
desconfiado que ela me lança. Acho que pegou
minha chantagem, como já descobri o motivo do
seu afastamento não faz diferença ser pega no
flagra.
— Do seu, sempre. — Enquanto comemos,
falamos desses dias que ela ficou longe. Me conta
como anda a empresa e de como ficou feliz por eu

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ter ligado chamando-a para fazer compras. — Até


apostei com seu pai que não iria sair de casa até
segunda, quando voltasse para a empresa. Seu pai
tem mais fé em você do que eu, já que bateu o pé e
me garantiu que você seguiria sim as
recomendações dele.
É, meu pai tem enviado mensagens
diariamente com itinerários para que, segundo ele,
eu me desestresse. Me pergunto onde é que ele tem
tirado essas listas que incluem: spa, manicure,
cabelereiro, compras e barzinhos.
— Não sei nem dizer como me sinto ao
saber que virei alvo de apostas entre vocês. E olha
que são a minha família, eim? — Dessa vez ela
gargalha. — Para o seu azar, resolvi mesmo sair da
toca. Estava pensando em ir para alguma boate hoje
à noite...
Júlia engasga com a bebida que estava na

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boca e agora eu quem gargalho.


— Sério? Você em uma boate?
— É. Não é isso que pessoas da minha
idade fazem? Se divertem em boates?
— Claro. — Continuamos a comer, seus
olhos desconfiados vez ou outra fixam-se em mim,
parece ainda haver algo escondido atrás de suas
ações e tento ignorar essa impressão. Algumas
vezes ouvi meu pai dizer que trabalhava demais
porque “mente vazia é oficina do diabo”, esses dias
sem fazer nada com certeza está me fazendo ver
coisas onde não tem.
Assim que terminamos o almoço passamos
pelas dezenas de lojas que a Júlia tem certeza que
me agradará e ela não estava errada. Depois de
umas três horas e duas idas ao carro para guardar as
sacolas, estamos em uma loja de lingerie. A nossa
última parada.

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— Preciso de calcinhas novas. Sam tem


uma terrível mania de rasgá-las — reclama, porém,
seu sorriso deixa claro o quanto aquilo realmente a
incomoda.
— Safada. — Encolhendo os ombros ela
começa a jogar diversos modelos de fio-dental
dentro de sua sacola.
— Você deveria escolher umas também.
Escolher a própria roupa íntima para variar um
pouco, sabe? — Ignoro a provocação, mas aceito a
dica e escolho algumas peças.
Não compro lingerie há tempos, as que
tenho foram todas escolhidas pela Penélope, a
personal shopper que contrato quando preciso
renovar o guarda-roupa.
Gosto de conforto, já que passo a maioria
dos meus dias no trabalho, então as minhas
calcinhas não são tão sensuais assim. Algumas são

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mais ousadas, nem de longe parecidas com um fio-


dental e ao ver os modelos mais variados minha
mente começa a divagar. Uma imagem do sorriso
safado de Oliver pisca diante meus olhos, detenho
meus pensamentos de vagarem mais e envio aquela
maldita imagem direto para o fundo mais escondido
do meu cérebro. Volto meus pensamentos para as
calcinhas e pego uma dezena delas.
Quanto mais ando pelos corredores e
encontro um modelo mais sexy que o outro, mais
uma ideia maluca toma forma.
Então quando Júlia pega algumas fantasias
e caminha para os provadores, me sento para
esperá-la e saco meu celular. Acesso o aplicativo e
procuro o cara ideal para conhecer algumas das
minhas novas calcinhas.

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Quando chego em casa a primeira coisa que


faço é colocar as novas lingeries para lavar.
Júlia voltou comigo e nos entretemos por
horas desfazendo as sacolas e experimentando
roupas. Ri como há tempos não ria. Às oito e meia,
vou tomar banho afinal, tenho planos para esta
noite.
— Onde pensa que vai? — Pergunta quando
saio do banheiro enrolada no roupão, a roupa que

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vou usar está estirada sobre a cama e seus olhos


estão fixos nela.
Não havia comentado nada a respeito, não
que quisesse esconder nem nada do tipo. Nem eu
sei por que não falei que tenho um encontro.
— Tenho um encontro. — A expressão
surpresa que toma conta do seu rosto é hilária.
— Sério? Com quem? Como? — Pula sobre
a cama e me segue com o olhar enquanto começo a
me vestir.
— Ele se chama Jake. — Visto a calcinha
escolhida para a minha estréia no mundo dos
encontros casuais, ela é rosa com detalhes de
oncinha e um lacinho arrematando a parte de trás. E
é fio-dental.
— Que mais? — Júlia deita de barriga para
baixo e apoia ambos os cotovelos sobre a cama,
amparando o rosto com as mãos. — Onde o
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conheceu? Quantos anos ele tem? Trabalha com


que?
Passo o vestido vinho pela cabeça e sorrio
para ela.
— Ainda não o conheci, marquei o encontro
pelo Speed Sex, conversamos pouco por lá, mas deu
para perceber que é um fofo. Tem trinta anos e é
advogado, mamãe. — Ela revira os olhos com a
minha provocação. De repente se senta ereta na
cama, os olhos atentos em mim enquanto começo a
me maquiar.
— Não acha que é um pouco cedo para sair
marcando encontros assim? — A encaro pelo
espelho da penteadeira.
— Falou a pessoa que me apresentou o
aplicativo. E cedo por quê?
— Por nada, é só que... o que sabe desse
cara? E se o perfil dele for falso e ele for um
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psicopata? — Gargalho, sua expressão séria me


deixa preocupada com essa sua mudança drástica
de opinião.
— Júlia, é só um encontro em um
restaurante. — Omito a parte que reservei um
quarto no Royal Palace. — Além do mais ele pode
ser um chato, então fica atenta ao seu celular, que
qualquer coisa te mando uma mensagem pedindo
resgate.
— Não acho que seja uma boa ideia, Ayla.
— Não entendendo essa sua paranóia, abandono as
maquiagens e me sento ao seu lado na cama.
— Você sempre teve encontros através de
aplicativos ou aqueles às escuras, sempre foi para
boates e ia para casa com um cara que nunca tinha
visto antes, qual o problema de eu fazer o mesmo?
— Não é que não pode, é só que você não
tem experiência nessa coisa. Não vai saber se o

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cara for encrenca, não quero que se machuque, só


isso. E acho que está sendo precipitada marcando
encontros assim.
Penso um pouco sobre o que disse e chego a
conclusão que não, eu não estou sendo nem um
pouco precipitada. Na verdade, acho que é o que eu
deveria ter feito desde o começo, não deveria ter
deixado que as cosias entre Oliver e eu tivesse
acontecido mais do que uma vez. A premissa do
Speed Sex é essa, não é?
— Pelo contrário, é uma decisão que eu já
deveria ter tomado há tempos, Jú. — Volto para a
penteadeira e continuo a me arrumar. Seus olhos
permanecem fixos em mim, noto pelo espelho.
— Tudo bem então, a vida é sua. Só fique
esperta, ‘tá?
— Namorar com o Sam te deixou mole,
prima. — Aceitando que não vou mudar de ideia,

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ela se coloca atrás de mim e me ajuda com o


cabelo.
— Não me deixou mole, só mudou meus
pensamentos sobre algumas coisas.
— Quanto mistério.
— Besta. — Cutuca minha cabeça com o
modelador de cachos. — Só estava pensando que
sei lá... o Oliver...
— Oliver e eu não temos nada a ver. Ele
está com outra e eu preciso fazer o mesmo.
Transamos algumas vezes, foi incrível, mas como
tudo nessa vida, acabou. — Ignoro a pontada de dor
que se insinua em meu peito ao soltar as palavras.
— Então a questão é você mostrar que não
está por baixo? Isso não é você, Ayla. — Dando
um retoque final nas pontas, ela finaliza meu
penteado e vejo reprovação em seu rosto.
— Não, a questão é eu viver, aproveitar a
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vida enquanto tenho tempo.


Vou até o guarda-roupa para pegar minha
bolsa e também para fugir dessa conversa que fica
dando voltas, e que tenho certeza, não vai nos levar
a lugar nenhum.
— Vai ficar em casa essa noite? — Indago
pegando o essencial e organizando na clutch.
— Vou para o Sam daqui a pouco, vamos
levar o Rick e a Charlie para sair. — Mordo a
língua para conter o ímpeto de perguntar sobre
Oliver. Chego a sentir gosto de sangue tamanha a
força que demanda não abrir a boca. Lhe ofereço
um último sorriso enquanto caminho até a porta.
— Boa noite então, diga a Charlie que
mandei um oi.
E ao Oliver que sinto sua falta.
Engulo o nó da minha garganta junto com
tais palavras e saio logo de casa antes que eu perca
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a coragem e faça uma burrice.

Toda a preocupação de Júlia me fez ficar


paranóica, então chego mais cedo ao restaurante e
peço que troquem a nossa mesa por uma no meio
do salão, de frente para a porta. Deixo também um
alarme no meu celular programado para daqui
quarenta e cinco minutos, para ter uma desculpa
para me levantar e sair de fininho, caso descubra
que é uma roubada.
Mas no momento que o cara entra no
restaurante, eu prendo a respiração até encontrar o
cravo vermelho no bolso do seu paletó e ter certeza
de que é ele.
A foto do perfil no aplicativo não faz jus a
tamanha beleza que Jake é pessoalmente. Seus
cabelos são cortados no estilo militar e os olhos
azuis brilham, mesmo de longe e o terno azul
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escuro lhe cai bem. Enquanto caminha até a nossa


mesa, o sorriso que estica seus lábios provoca o
meu.
— Não precisa se levantar, baby — diz
quando faço menção em ficar de pé para
cumprimentá-lo. Seu perfume inebria meus
sentidos quando se abaixa e beija meu rosto. —
Prazer em conhecê-la, Ayla.
— O prazer é todo meu. — Jake se senta e o
garçom aparece para anotar os nossos pedidos.
Peço uma garrafa de vinho e seu sorriso se
amplia.
— Me fale sobre você, linda. — Pede,
segurando minha mão sobre a mesa, o toque é
quente e bem-vindo.
— Sou uma mulher comum, nada demais
que valha a pena saber. — Desconverso, o cara
parece ser legal, a presença é agradável, mas não
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me sinto à vontade para falar sobre mim.


— Ah, que isso, vamos lá me conte algo
sobre você. — Insiste, chegando sua cadeira para
mais perto da minha.
— Trabalho na empresa da família e minha
vida se resume basicamente a isso: meu trabalho.
— Seu ar surpreso me deixa confuso.
— Nossa, uma trabalhadora, eim? — Seu
tom me irrita. É como se presumisse que eu fosse
só uma madame e isso sem nem saber mais do que
meu nome e idade. — E a empresa da família é de
que ramo?
— Não estou pagando um encontro para
falar sobre a minha família, Jake. Aliás, para o que
eu estou pagando, dispensa até mesmo o jantar. —
Explodo, não suportando seu tom zombeteiro.
Assim como a foto não faz jus a sua beleza, o
pouco que conversamos não mostrou o quanto é

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chato e irritante.
— Podemos pular essa parte então, gatinha.
Reviro os olhos, já é o terceiro apelido em
menos de vinte minutos de conversa. Neste
momento desejo ter programado o alarme para
meia hora e não quarenta e cinco minutos. O
garçom volta com o vinho e fico grata por ter com
o que ocuparmos a boca. Só que o cara vira a taça
de uma vez só, como se não bebesse nada há dias.
— E então, Ayla, vamos pular o jantar ou o
quê? — Quase choro de emoção quando meu
celular toca.
— Com licença.
Levanto rápido e vou para o banheiro, no
caminho pego o celular de dentro da bolsa e atendo,
feliz, a ligação do meu pai.
— Eu te amo. — Digo antes mesmo que ele
fale algo, sua gargalhada soa fazendo um quentinho
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gostoso se espalhar pelo meu peito.


— Gostei do novo método de atender ao
telefone. Espero que não seja usado com todos que
te ligam.
— Esse é reservado somente para o senhor,
Eddy.
— Sei. Como você está? — Ouço barulho
de talheres e panelas e presumo que esteja fazendo
o jantar. — Júlia disse que saíram hoje para fazer
compras...
— Estou ótima, no momento em uma
enrascada, mas estou bem.
— Enrascada? O que está acontecendo,
filha? — A preocupação é nítida em sua voz. —
Júlia disse que tinha um encontro hoje, é algo
relacionado a isso?
Nesse momento eu amo a intromissão
daquela enxerida.
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— Nada demais. E sim, o encontro tem a


ver. Me dá só dois minutinhos que te ligo, ‘tá? —
Sob protestos preocupados, desligo e volto para o
salão do restaurante. Jake está recostado na cadeira
como se estivesse no sofá de casa. Digita
incansável no celular que mal nota quando paro ao
seu lado. Aproveito sua distração e caminho até o
caixa. Geralmente os garçons recebem a conta na
mesa, porém, lá é o último lugar que quero ir.
— Boa noite, poderia por favor incluir a
dica do chefe ao pedido da mesa cinquenta e fechar
a conta para mim? — A atendente me olha confusa,
abro meu melhor sorriso esperando que ela me
entenda. — Primeiro encontro, o cara é um idiota.
Em dez minutos de conversa me deu três apelidos
diferentes.
— Está fazendo muito pagando o jantar
dele, se fosse eu sairia de fininho. — Rindo, ela me

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entrega a conta, passo o cartão e saio pela porta dos


fundos sem que Jake note minha fuga.
Aliviada, ligo para o meu pai assim que
entro no carro.
— Já estava discando seu número para ligar
de novo, mocinha.
— Espero que o que quer que esteja
cozinhando, dê para dois. Estou morta de fome e
indo para a sua casa.
— Só traga a sobremesa.
— Cheesecake de framboesa?
— Essa é a minha garota! — Coloco no
GPS o endereço da Kiss Sugary, a confeitaria onde
sempre compramos. Eles vendem os melhores
confeitos da cidade!
Meu pai encerra a chamada, não sem antes
me mandar prestar atenção ao trânsito. Saio do
estacionamento do restaurante e acabo rindo
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sozinha. Meu encontro foi um fiasco, mas


estranhamente uma parte minha está feliz por isso.
E convenhamos, passar a noite com meu pai
vai ser muito melhor do que qualquer outro
programa com qualquer outro homem.
Exceto pelo Oliver. Uma noite com ele, nem
que fosse para apenas falar besteira, seria
perfeito...
Ligo o som do carro no último volume,
tentando calar meu subconsciente traidor.

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Os dias tem passado rápido e isso é bom,


entre cuidar dos meus irmãos e dar andamento no
projeto da Kate, mal tem sobrado tempo para que
eu pense na minha perda. Ou na Ayla.
Decidi que mergulhar no trabalho era a
melhor coisa a se fazer e já que estava dispensado
por alguns dias da empresa, o projeto foi a minha
escolha. Em apenas dois dias consegui deixar as
primeiras etapas prontas. Não durmo direito há três

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dias, simplesmente não rola deitar a cabeça no


travesseiro e ficar de olhos fechados esperando o
sono aparecer, meus pensamentos vagueiam e nem
sempre para caminhos bons. Só tenho cochilado e
em cima da mesa do computador.
Hoje Richard e Charlie voltam para a
escola, este foi o nosso combinado, no dia que eu
voltasse a trabalhar para a Stewart, eles voltariam
para as suas rotinas.
Com a minha nova inseparável
companheira: a caneca cheia de café, sigo até o
quarto do meu irmão. Ao passar em frente a porta
fechada do quarto do meu pai, sinto uma pontada
de pânico se insinuar no meu peito. Apresso os
passos e chego ao meu destino com o coração
acelerado. A coberta está jogada no chão, assim
como o travesseiro e quase todas as roupas do seu
guarda-roupa, Rick parece ter tido um surto de

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raiva no meio da madrugada e revirado todo o


quarto, o antigo porta-retratos com uma foto da
família toda está todo quebrado em meio as roupas.
Respiro fundo antes de cavar um espaço com os pés
entre o amontoado de tecidos para chegar até a
cama.
— Rick, hora de levantar. — Ele rosna
antes de abrir os olhos e me encarar. — Vamos lá,
maninho. — Sem dizer uma única palavra, se
levanta e pega a coberta do chão, volta para a cama
e cobre o corpo inteiro, inclusive a cabeça.
— Me deixa em paz. — Respiro fundo e me
sento ao seu lado.
Richard tem aderido ao voto de silêncio que
nosso pai havia executado por dois anos e aos
rompantes de raiva também. Puxo uma ponta da
coberta e acaricio seus cabelos.
— Eu sei que não é fácil, Rick, mas temos

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que seguir em frente. Acha que o papai ia ficar feliz


se te visse dessa forma? Tudo o que ele sempre
quis foi que estudasse e fosse alguém na vida, acha
que agindo desta forma vai conseguir deixá-lo
orgulhoso de você?
— Ele está morto, Oliver. Gente morta não
sente merda nenhuma. — Grita, sentando-se na
cama, grossas lágrimas vertem, deixo a caneca
sobre o criado-mudo e tento abraçá-lo, ele se
esquiva e corre para fora do quarto. — Você age
como se nada tivesse acontecido, como se nada
tivesse mudado. Por que você não morreu no lugar
dele?
Suas palavras me atingem direto no coração
e a dor se espalha pelo meu corpo como uma dose
letal de veneno. Matando vagarosamente metade de
mim.
— Deixe-o em casa mais alguns dias, Oli.

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— Charlie aparece na porta, quando levanto a


cabeça vejo-a enxugando algumas lágrimas. Nem
ligo para as minhas e as deixo correrem livre pelo
meu rosto. Ela se aproxima e me abraça.
— Não sei o que fazer, Charlote. Não sei
como ajudá-lo.
— Ele só precisa saber que estamos aqui.
No momento certo ele vai se abrir e entender que a
morte só nos separou fisicamente do papai. —
Levanto e beijo a sua bochecha.
— Obrigado, pingo de gente.
Algum tempo depois, Charlie sai para a
escola e Richard ainda está trancado no banheiro.
Vou para a cozinha e faço waffles, seu café da
manhã preferido e que não fazíamos há meses.
Preparo chocolate quente e com tudo pronto,
coloco sobre uma bandeja e sigo para o quarto
novamente. Começo a arrumar as roupas do chão,

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estou quase terminando e nem sinal de Rick. Isso


me deixa preocupado e corro para o corredor.
— Rick? — Bato na porta insistentemente.
Nada. Nem um único ruído vindo de lá de dentro.
— Richard?
Nada.
Giro a maçaneta, está trancada. Esmurro a
porta mais algumas vezes e continuo chamando seu
nome. O desespero me consome e tirando forças
nem sei de onde, chuto o tambor da porta uma,
duas, três, na quarta ela cede. Entro correndo e meu
coração cessa algumas batidas quando encontro o
corpo de Rick na banheira. O medo me paralisa.
Ele está imóvel.
— Richard? — Tento mais uma vez, a voz
saindo trêmula. Lágrimas turvam minhas vistas e
cedo ao peso do corpo desabando sobre os joelhos.
Um grito de pavor, medo, angústia e vários
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sentimentos que tem massacrado meu peito explode


para fora de mim.
— Oli? — Puta merda, me arrasto até ele e
o tomo em meus braços. — O que aconteceu? —
Pergunta tentando sair do meu agarre. Não o solto,
pelo contrário, o aperto mais.
— Caralho, Rick, eu pensei... você estava...
não faz mais isso comigo! — Sua expressão é
confusa e ele para de lutar para se soltar, deita a
cabeça no meu peito e retribui o abraço. Não fiz
muito sentido, mas acho que ele entendeu o que
quis dizer, pois suspira antes de falar:
— Me desculpa, eu só queria ficar sozinho.
Acabei dormindo na banheira depois de... chorar.
Eu não entendo, Oli. O papai era um herói, um
homem bom, um pai carinhoso, por que ele teve
que ficar doente e morrer? Tem tantas pessoas ruins
no mundo, por que Deus não mata elas ao invés das

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pessoas boas?
Não respondo, ainda estou em choque pelo
medo de que ele teria... não consigo nem pensar
nisso sem que meu coração acelere e meu corpo
trema.
— Cada pessoa tem uma missão aqui na
Terra, maninho. E quando termina de cumpri-la,
chega o momento da partida. Muitas vezes a gente
não compreende a forma a que elas são designadas
a nos deixar, mas Deus só dá às pessoas lutas que
ele sabe que elas são capazes de vencer. — Tento
explicar quando já me sinto eu novamente. Ainda
estamos abraçados no chão do banheiro. — Tudo o
que fazemos nesta vida, sofremos as consequências
em uma vida futura, nossa família, nossos amigos,
até mesmo os nossos animais de estimação, já nos
são designados antes mesmo de nascermos. São
dívidas de vidas passadas que continuamos

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pagando até conseguir evoluir. — Não sei se estou


fazendo muito sentido, na época da faculdade tinha
uma turma que era ligada nesse lance de
espiritualidade e cheguei a participar de algumas de
suas reuniões, Bella, uma das meninas do grupo
uma vez me explicou sobre essa coisa de vidas
passadas e futuras, só não sei se consegui passar a
mensagem correta ao meu irmão. No momento não
acredito que seja capaz de muita coisa coerente,
para ser sincero.
— Está querendo dizer que assistirmos o
papai morrer é algum tipo de dívida que nós
tínhamos que pagar por algo que fizemos em outra
vida? — Questiona, incrédulo, porém maduro
demais para a sua pouca idade. Nos guio para fora
do banheiro, rumo ao seu quarto.
— Não, sim... não sei. Talvez a nossa
missão com o papai tenha sido outra, a vida inteira

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que vivemos com ele, tudo o que aprendemos com


ele. E essa forma que ele se foi, seja algo que
aconteceu para que evoluíssemos a nossa forma de
enxergar a vida. Sou tão leigo em tudo isso quanto
você, maninho, mas prefiro acreditar que existe um
céu onde o papai esteja neste momento e que, em
uma vida futura, nós vamos nos reencontrar. Em
uma vida futura eu vou poder retribuir tudo o que
ele fez por mim.
O silêncio prevalece entre nós depois das
minhas palavras. Foi a primeira vez que eu pensei
naquilo tudo. Rick come seu café da manhã e eu
termino de arrumar o quarto. Quando me sento em
frente ao meu notebook e acesso a intranet da
Stewart, já está disponível o que devo fazer. Baixo
as informações e começo a trabalhar.
— Oli? — A voz baixa do meu irmão
funciona como um acalento depois de ter pensado

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tê-lo perdido.
— Sim?
— Me desculpa por mais cedo. Não vou
mais me trancar no banheiro. — Sem graça, ele se
aproxima e procura abrigo no meu colo. Quase não
cabe mais, mas o acomodo sobre as minhas pernas
e o aninho a mim como um bebê. — Nem vou mais
gritar com você. Eu só sinto falta do papai e queria
que ele estivesse aqui, e por isso estou ignorando
tudo o que tem feito por mim, o quanto também
está sofrendo. Eu te amo, Oli. Desculpa ter falando
que deveria ter morrido.
— Também te amo, Rick. Nunca vou
substituir o papai e nem é isso que eu quero, só
quero que saiba que pode contar comigo sempre.
Para qualquer coisa.
Ele confirma com a cabeça e continua
quietinho no meu colo. Ficamos assim por um

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longo tempo. Acho que acabamos de dar, juntos, o


primeiro passo para o nosso recomeço.

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Mentira e omissão tem significados


diferentes, mas a dor que ambas causam são iguais.
Dolorosas e excruciantes.
Duas semanas do pior dia da minha vida
acabei de mandar meus irmãos para a escola e meu
telefone toca. Ainda preciso comprar meu carro
para conseguir oferecer mais comodidade aos meus
irmãos, isso é algo que mais uma vez acaba ficando
em segundo plano.

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— Oliver? — De imediato não reconheço a


voz.
— É ele. — Ouço um suspiro de pesar.
— É o Dr. Howard, como você e os
meninos estão indo? — Além de ser o médico que
acompanhou meu pai desde o diagnóstico, Leonard
Howard era amigo do meu pai. Trabalharam juntos
em alguns casos quando meu pai era bombeiro.
— Estamos bem, Leo.
— Ouça, — ele pigarreia e a forma que
aquela única palavra soa, provoca uma sensação
ruim na boca do meu estômago. — Sei que depois
do diagnóstico a maior preocupações de vocês era
com o tratamento e com a partida da Sandra as
coisas ficaram ainda mais complicadas,
especialmente para você que ficou com a maior
parte das responsabilidades. — Ele está protelando,
percebo pela forma que estica cada palavra e pelas

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pausas que faz entre elas. — Ainda está tudo muito


recente, mas seu pai me fez prometer que te
procuraria alguns dias depois de sua partida para
falar sobre os exames.
Os exames.
Os malditos exames. Como o médico disse,
nos concentramos apenas no seu tratamento e os
turbilhões que veio com ele, as sequelas cada vez
mais presentes que a doença estava deixando em
seu corpo. As consequências que a doença poderia
trazer para nós, seus filhos, acabou ficando
esquecida. Até agora.
— Ele deixou tudo preparado já, os papéis
estão todos preenchidos, é só vir com os meninos
e...
Aquela pausa. Eu deveria ter me atentado
mais a ela, assim como eu deveria ter sido mais
atento quando meu pai disse “Acompanhe seus

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irmãos ao médico para fazer os testes” ao invés de:


“Marque uma consulta para você e seus irmãos
fazerem os testes”. Talvez se eu o tivesse sido, o
baque posterior teria sido menor.
— Só venha, ‘tá legal? Estarei esperando
vocês hoje as quatro. — Desliga sem esperar
respostas.
No meu peito fica uma sensação estranha e
quando encaro o celular, meu primeiro impulso é
ligar para o Eddy. Ele tem vindo quase todos os
dias para checar como estamos e já conquistou a
Charlie, Rick ainda está reticente, depois da nossa
conversa na quinta passada, tem sido mais aberto
quanto a aproximações e o esforço que meu chefe
tem feito para me ajudar com os meninos tem
significado muito para mim, o cara tem um coração
gigante e o amor que vejo em seus olhos quando
está perto dos meus irmãos me faz admirá-lo ainda

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mais. Eddy promete pegar os meninos na escola e


passar aqui para irmos juntos para a clínica e
desliga deixando claro sua preocupação.
Depois do telefonema a minha tarde foi
completamente improdutiva, não consegui parar de
pensar nas centenas de hipóteses do que pode vir a
acontecer depois que tivermos os resultados. Temos
50% de chance de ter herdado os genes alterados
que desenvolvem a doença.
Quando me dou conta, estou tremendo e
lágrimas grossas descem por meu rosto. Desisto do
trabalho e saio de casa para clarear um pouco a
mente e tentar controlar o medo.

As três e meia uma buzina soa do lado de


fora de casa e ainda tremendo saio para encontrar
meus irmãos sorridentes no banco de trás. Eddy
tem o olhar preocupado colado em mim.
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— Está tudo bem, filho? — A forma como


tem me chamado de filho tem me oferecido um
pouco de conforto. Às vezes chego a me odiar por
gostar, parece que de certa forma estou traindo a
memória do meu pai.
— Não, mas vai ficar depois que pegarmos
os exames e os resultados forem negativos. — Ele
sorri. Caminho até o lado do passageiro e entro no
carro.
— Tio Eddy não disse para onde vamos. —
Rick resmunga e me sinto feliz por ele se dirigir a
Eddy como tio. Estamos mesmo progredindo e isso
é tudo o que eu quero.
— Precisamos fazer uns exames, nada
muito importante. — Minimizo, não querendo
preocupá-los antes da hora e desnecessariamente.
Porque se Deus quiser os exames darão negativo.
Tenho me apegado a essa esperança com todas as

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minhas forças.
Em silêncio seguimos para a clínica. O
clima pesado, ou apenas eu o esteja sentindo desta
forma por estar guardando para mim a real
importância dos exames. Chego a suspirar quando
o carro para no estacionamento.
— Ouça, vai dar tudo certo. E
independentemente dos resultados, saiba que vou
estar aqui para você e seus irmãos. — Eddy fala
depois que os meninos descem, me segurando por
alguns segundos ainda dentro do carro.
Seguimos para dentro da clínica e
encontramos o Dr. Howard já nos esperando na
recepção. Após os cumprimentos, apresentações e
cordialidade em excesso por parte do médico, o que
me deixa ainda mais apreensivo, ele pega uma
prancheta de trás do balcão e nos guia pelo longo
corredor.

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— Fiquei o tempo todo com seu pai desde o


instante que ele deu entrada na internação, Oliver.
— Começa a protelação novamente. — E ele me
pediu para digitar isso para te entregar. — Um
envelope branco me é estendido junto com os
formulários dos meus irmãos para que eu assine. —
Vamos tirar um pouquinho de sangue, meninos?
Não entendo por que meu pai preencheu os
papéis deles e os meus não.
— Espere eu preencher meu formulário,
então vamos juntos. — Há uma troca de
informações silenciosas entre Eddy e o médico que
não consigo compreender. Encaro-os confuso.
— Eu os acompanho, fique aqui e leia o que
seu pai lhe deixou. — Eddy anuncia, apertando
meu ombro e indicando a fileira de cadeiras no
corredor. — Depois você resolve as outras
questões.

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Ainda sem entender nada, me sento e rompo


o lacre do envelope. É tão mecânico e sem
sentimentos ver as letras impressas. Respiro fundo
e começo a ler.
Filho,
Espero sinceramente que um dia possa me
perdoar depois de ler esta carta. Quero começar
dizendo que sinto muito por todo o sofrimento que
te fiz passar nesses últimos anos, por ter deixado
para você a responsabilidade de criar seus irmãos,
por ter mentido para você durante vinte e seis
anos.
Pauso a leitura sentindo um gosto ruim na
boca. Engulo a bile e o papel treme entre meus
dedos.
Eu te amo, Oliver. Você foi o melhor
presente que a sua mãe poderia ter me dado
quando nos conhecemos. Eu aprendi muito com

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você, foi você quem me ensinou a ser o homem que


eu fui ao longo da vida. Me sinto miserável por
morrer e não ter coragem de falar a verdade
olhando nos seus olhos, mas eu não queria morrer
vendo a dor estampada neles. No momento deve
estar se perguntando por que seus irmãos foram
fazer os exames e você está sentado lendo as
minhas últimas palavras, vou começar a explicação
te falando como me senti quando descobri que a
minha doença era hereditária.
Eu me odiei, filho. Me odiei por ser o
motivo pelo qual um dos meus filhos poderia vir a
ter essa doença maldita. Me senti culpado, quis
morrer no mesmo instante que ouvi a palavra
hereditária da boca do médico, mas ao mesmo
tempo que senti o ódio me dominar, um sopro de
alívio me acometeu porque eu sabia que
acontecesse o que acontecesse, meus filhos teriam
você.
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Meu coração acelera e começo a suar frio,


com medo de estar começando a interpretar mal as
suas palavras. Dobro as duas folhas e encaro o teto
pálido. O ar se torna rarefeito e sinto dificuldades
para respirar. Decido acabar com a angústia e volto
meus olhos para as letras.
Não imagina o quanto me senti mal por ter
pensado isso. Não imagina o quanto me odiei
ainda mais por ter sentido aquela tranquilidade.
Todos os dias depois daquela consulta meu ódio
aumentava assim como a doença evoluía.
Progressiva e devastadoramente. Minando
qualquer sentimento bom que existia dentro de
mim. Eu não suportava olhar para o Rick e pensar
que no futuro, por minha causa, ele poderia não ter
forças suficientes para segurar seu filho no colo.
Não conseguia olhar para a minha Charlie e
imaginá-la em uma cadeira de rodas e tendo que
ser cuidada da mesma forma que eu necessitava de
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cuidados e foi por isso que não insisti para que


fizessem os exames antes de partir. Preferi morrer
com a dúvida do que tendo a certeza, caso desse
positivo, de que arruinei a vida dos meus filhos. A
culpa me corroía e deteriorava o meu corpo quase
tanto quanto a doença. E então eu olhava para
você e toda a minha esperança era renovada. Se eu
suportei dois anos de progressão do huntington, foi
por você, Oli.
Imagino que deva estar com medo das
palavras seguintes desta carta, que deva estar
tremendo e desejando não estar entendendo certo
as discriminações que estou fazendo entre você e
seus irmãos. Mas você está entendendo
perfeitamente, filho. Sim, filho. Você sempre foi e
sempre será o meu primeiro filho, ainda que não o
seja biologicamente.
Meus dedos amassam as folhas, isso não

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pode estar acontecendo.


Isso não é real. Fecho os olhos e sinto as
lágrimas quentes deslizando pelas minhas
bochechas. Meu peito parece ter sido aberto sem
anestesia, sinto meu coração exposto e sendo
esmagado pela dor.
Eu amei a sua mãe desde o primeiro olhar e
ela só descobriu que estava gravida dois meses
depois que começamos a sair. Ela estava gravida
de quase quatro meses. Não precisei pensar nem
uma vez sequer antes de dizer que você era meu. Te
amei no momento que o teste deu positivo. Não
cabe a mim falar sobre o seu pai biológico e
espero, do fundo do meu coração, que um dia a
Sandra volte e vocês possam falar a respeito. Eu
realmente sinto muito mesmo por estar te contando
desta forma e quero que saiba que eu sempre te
amei como meu, nunca houve um segundo sequer

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que eu tenha pensado ou sentido o contrário. Como


falei no começo, espero que um dia possa me
perdoar pelos anos de mentira.
— Não foi mentira, foi omissão — sussurro
para ninguém, um soluço rasga o caminho pela
minha garganta e sai em forma de um grito de dor e
desespero. Uma sensação de vazio se espalha
vagarosamente por mim. — Meu pai era Otávio
James, ele morreu há uma semana — declaro,
minha voz saindo engasgada.
Ouço passos no corredor e vejo que eles
estão voltando. Me recomponho o melhor que
consigo. Enxugo as lágrimas e dobro a carta,
enfiando-a no bolso detrás da calça.
— Tudo bem por aqui? — Eddy pergunta
sentando-se ao meu lado.
— Claro, vamos embora? — Agradeço
quando meus irmãos parecem entretidos demais em

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uma conversa para perguntar sobre o meu exame.


— Pedi que acelerassem o processo, os
resultados saem na segunda. — É uma notícia
maravilhosa, mas estou tão entorpecido que nem
consigo agradecer. — Que tal a gente comer um
lanche antes de eu deixá-los em casa? — Eddy
sugere, novamente os olhos atentos em mim,
buscando informações. Dou de ombros, Rick se
empolga, já Charlie assim que começamos a
caminhar para fora percebe que há algo
acontecendo e se aproxima, me abraçando.
— Está tudo bem, Oli? — A abraço pelo
ombro.
— Está sim — minto.
Não consigo prestar atenção em nada do
que conversam durante o caminho ou enquanto
estamos na lanchonete, não sinto fome então
dispenso o lanche. Sinto o olhar atento de Eddy

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sobre mim o tempo inteiro e fico aliviado por meus


irmãos não perceberem o meu estado catatônico.
Ao chegarmos em casa eles entram primeiro
falando algo sobre dever de casa, quando faço
menção de sair do carro, sinto meu braço ser
segurado.
— Quer conversar?
— Ele não era meu pai. Não deixou meus
formulários preenchidos porque sempre soube que
eu não ia precisar fazer os exames. Ele mentiu para
mim por toda a minha vida. — As palavras me
escapam, parece ser um dom desse homem, me
fazer falar tudo o que estou sentido. Não estou com
raiva, só não sei explicar o que estou sentindo. —
Me deixou uma maldita carta contando a verdade.
— Sinto muito que tenha descoberto desta
forma. — Silêncio. — Posso te perguntar uma
coisa? — Não respondo, só faço um gesto

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afirmativo de cabeça. — Saber que Otávio não é


biologicamente seu pai, muda o que sente por ele
ou por seus irmãos?
Pela primeira vez penso a respeito. A
resposta salta da minha boca em menos de um
segundo depois:
— Não.
Eddy sorri e aperta meu joelho.
— Pois é, ter o mesmo DNA nem sempre
quer dizer alguma coisa, tudo o que importa é o que
ele te ensinou, tudo o que sente por ele. Em algum
momento da sua vida sentiu que Otávio era
indiferente a você?
— Não.
— Se ele não tivesse deixado essa carta,
algum dia desconfiaria desta verdade escrita aí?
— Não.

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— Acredito que já tenha todas as respostas


que precisa para lidar com essa descoberta, Oli. —
Me lembro que não tinha terminado de ler
completamente a carta e a tiro do bolso.
Se não puder me perdoar e sentir que é
demais cuidar dos seus irmãos, saiba que não
pensarei menos de você, só por favor, tenha certeza
que eles terão alguém que os ame tanto quanto eu
te amei.
Sempre seu pai.
Chego a me sentir ofendido com essa
suposição.
— Por que ele pensaria tão pouco de mim
desta forma? — Pergunto a ninguém
especificamente, ainda oprimido pela mistura de
sentimentos borbulhando dentro do meu peito.
Eddy toma a folha da minha mão e a lê.
— Ele só quis que soubesse que confia e
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acredita em você. Que não importa qual a sua


decisão, sempre irá te amar.
— Eu nunca seria capaz de deixar meus
irmãos. Ainda que nesta carta estivesse escrito que
nem a Sandra é minha mãe, eu nunca os deixaria.
— Meu coração comprimi apenas com o mero
pensamento.
— No fundo ele sabia disso, mas queria ter
certeza que você soubesse das suas opções.
Deixar meus irmãos nunca seria uma opção,
no fundo eu entendo o lado do meu pai ao supor tal
coisa. Meu pai. Lembro-me de Sam e tudo o que
passou com o homem que lhe deu a vida e
inconscientemente meus pensamentos traçam os
paralelos que há entre os dois homens.
— Otávio sempre foi meu pai, não importa
o que um papel ou um pouco de sangue diga o
contrário. Ele me amou tanto quanto o senhor ama

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a Ayla. — Pronunciar seu nome faz um gelado se


espalhar pelo meu estômago, como uma ansiedade
por estar há tanto tempo sem vê-la.
— Claro que sim e tenho certeza que onde
quer que ele esteja, está radiante de tanto orgulho
de você neste momento.
Quando desço do carro todos os meus
sentimentos entram em harmonia e tudo o que eu
sinto é uma extrema sensação de paz. Meu pai disse
que fui o melhor presente que Sandra lhe deu, mas
creio que é exatamente o contrário, pensando em
tudo o que poderia ter dado errado em minha vida
se Otávio não tivesse sido meu pai, eu quem ganhei
o presente mais precioso de Deus.
Ao deitar depois de ajudar Rick e Charlie
com a lição de casa, faço uma prece agradecendo a
Deus por cada benção que tem me concedido desde
que nasci. Também prometo ao meu pai que não

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importa o resultado dos exames, sempre vou estar


aqui para os meus irmãos.
Pela primeira vez desde aquela sexta-feira,
tenho uma noite de sono tranquila.

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Minha volta para a empresa foi revigorante.


Não sei qual a sensação de ter um filho
distante e reencontrá-lo depois de anos, mas
acredito que seja a mesma que senti quando sentei
na minha cadeira: realizada, aliviada, em paz.
Meu pai tinha razão quando disse que não
tinha nada em atraso, portanto tenho uma manhã
até que calma analisando contratos e selecionando
pedidos. Nada é tão maravilhoso do que voltar a

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fazer aquilo que se ama.


Depois do almoço é que as coisas começam
a ficar corridas. Reuniões com alguns fornecedores,
com investidores e com alguns representantes. Uma
reunião emendou na outra e os afazeres, também.
Assim a minha semana voou e me senti viva como
não consegui durante a semana que fiquei em casa,
ainda que as compras e todo o tempo que passei
com meu pai tenha sido proveitoso, havia um vazio
no meu peito que só foi preenchido quando vi que o
final da sexta-feira tinha chegado e minha mesa
estava abarrotada de papéis com os compromissos
realizados.
Minha segunda e terceira tentativa de
encontros também foram horríveis e isso contribuiu
para que a semana de descanso fosse considerada
improdutiva, além da óbvia falta de trabalho.
Parece que o mundo está conspirando para que eu

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volte aos anos de celibato. Só que aprendi uma


coisa nesses anos administrando a empresa: a nunca
desistir, por isso, no sábado vasculho o aplicativo
de uma ponta a outra em busca do cara da vez. E
fico puta da vida quando vejo que o perfil do Oliver
ainda está ativo.
Marquei encontro com o primeiro que vi
depois de me deparar com o perfil dele. Ele havia
mudado a foto, agora a foto do seu perfil é uma que
foi tirada na noite do nosso primeiro encontro.
Aquele terno...
Para extravasar o estresse que a busca, e o
que encontrei no aplicativo causou, no sábado saio
para correr, coisa que nunca tinha feito antes. Tinha
planos de passar o dia com meu pai, o que foi por
água baixo quando ele me informou que já tinha
compromisso para o dia todo. Me disse apenas isso,
“tenho compromisso o dia todo” bem misterioso.

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Depois de quarenta minutos correndo no


parque perto de casa, decido visitar a Kate. Ainda
não tinha parado para pensar em como vai ficar o
projeto para o orfanato considerando a forma que
as coisas se complicaram entre Oliver e eu.
E de novo, tudo na minha vida parece trazê-
lo à tona.
Durante a semana procurei me ocupar com
qualquer coisa que aparecesse, mesmo que não
fosse da minha alçada, para não cair na tentação
que me assombrava de tempos em tempos de ir
procurá-lo no setor de criação. Acompanhei os
horários que seu crachá era passado na entrada e
saída, mas me contive e não desci até o seu andar.
Grande progresso.
Como o orfanato fica a poucas quadras do
parque, tomo uma água e descanso um pouco antes
de andar até lá. Decido entrar pela porta dos fundos

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que dá direto para a casa da Kate e me surpreendo


com a voz que ouço vindo do refeitório. O que ele
está fazendo aqui?
— Então a princesa beijou o príncipe e ele
acordou do sono profundo ao qual tinha sido
condenado. — Tapo a boca com a mão direita para
controlar a gargalhada que quer vazão com a sua
versão do conto de fadas. Fico na ponta dos pés e
olho pela janela para dentro do imenso salão. Ele
está de costas para onde estou, dezenas de crianças
formando um círculo em sua volta. Alguns meninos
protestam pela sua inversão de papéis na história, já
as meninas sorriem orgulhosas do feito da princesa.
— Sabe qual a mensagem que essa versão da
história quer passar? — Todos respondem que
não. — Que não há nada no mundo que uma
princesa não possa fazer. As garotas são tão fortes,
capazes e inteligentes quanto os garotos. E muitas
vezes, elas quem salvam os príncipes na vida real.
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— Espionando, Ayla? Que coisa feia! —


Me assusto com a voz da Kate e quase caio ao me
virar rápido para o rumo de onde ela veio.
— Minha nossa, quer me matar de susto? —
A idiota ri.
— Te vi de lá de dentro, não podia perder a
oportunidade do flagra. — Kate me abraça em
cumprimento e logo Zoe aparece atrás da mãe.
Acho linda a forma que estão sempre
unidas.
— Tia Ayla, por que não veio mais cedo
para a hora da historinha? — Se joga nos meus
braços e eu a pego com algum esforço, ela já está
bem grandinha para a minha baixa estatura.
— Peguei o final, o que achou do fato de a
princesa salvar o príncipe? — Seu sorriso se alarga
antes de seus olhos se voltarem para a mãe.
— Eu amei! É igual a história da mamãe,
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ela vai salvar o príncipe dela! — Encaro minha


amiga esperando que me elucide, suas bochechas
coram.
— Depois a gente fala sobre isso. — Diz
sem emitir som. — Volte lá para dentro filha, vou
levar a tia Ayla para tomar café comigo agora. —
Obedientemente, Zoe me dá um beijo antes de
pular do meu colo e seguir para dentro. — Vamos,
temos muito o que conversar.
Kate é uma mulher admirável. Depois de
tudo o que passou com o pai da Zoe, merece mais
do que qualquer pessoa ser feliz.
— Ele parece bem à vontade. — Indico o
salão com o polegar conforme seguimos para sua
casa. Vim com intenção de falar que não sabia
como ia ficar o nosso projeto, mas encontro Oliver
aqui. Nem sei o que pensar de tudo isso.
— Oli é incrível com crianças!

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— Oli? — Mas já está nesse nível de


intimidade?
— Não precisa ficar com ciúmes, estou bem
como estou, obrigada. — Provoca me cutucando na
cintura. Bufo.
— Não estou com ciúmes. — Mas não eim?
Agradeço quando ela apenas revira os olhos diante
minha resposta e muda de assunto.
— Ele chegou aqui logo depois do almoço,
disse que queria interagir um pouco com as
crianças, captar suas essências para que o aplicativo
fique realmente a cara delas. Não é um fofo? —
Entramos na casa e sou levada para a sala enquanto
ela vai para a cozinha nos servir o tal café.
— Muito — resmungo. Sua risada chega até
mim e me faz revirar os olhos.
— Seja o que for que aconteceu entre vocês,
ele está sofrendo, Ayla. — Dá início ao adentrar a
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sala carregando uma bandeja. — Mas tem algo


mais acontecendo.
— Tem, ele está de caso com uma colega de
trabalho. — Sua expressão confusa me deixa sem
graça.
— Certeza? Posso jurar que o que senti
enquanto conversávamos não foi felicidade por um
relacionamento novo, mas sim dor de perda. —
Bebo o café e penso nas suas palavras. — Esse tipo
de dor a gente reconhece quando vê, por que já
sofreu demais por ela. — Kate suspira. — Mas
enfim, ele só veio passar um tempo com as crianças
e dizer que independente de qualquer coisa, está
com tudo no projeto e até no final do mês, já estará
pronto.
O silêncio que domina o ambiente me
impele a falar e quando dou por mim estou
contando a ela todo o meu relacionamento

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conturbado com Oliver Damien.


— Uau — sibila depois de quase uma hora,
várias gargalhadas e algumas lágrimas.
Acho que falei tudo sobre Oliver e eu ao
meu pai quando estava bêbada e a Júlia sempre
soube de tudo desde o começo, mas esta foi de fato
a primeira vez que me abri a respeito com alguém.
E isso me tirou um peso gigantesco do coração.
— E eu achando que a minha vida estava
movimentada com o novo voluntário e tudo o mais.
— Acabo sorrindo de sua falsa indignação. — Mas
vamos lá, tenho certeza que não me contou tudo
isso procurando conselhos, a forma que tudo
escapou acho que precisava era só de desabafar,
né? — Não respondo, por que não sei o real motivo
de ter lhe contado tudo, mas estou disposta a aceitar
seus conselhos, afinal, Kate é uma mulher sábia e
com toda a sua bagagem, com certeza tem uma

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coisa ou duas que possa me passar. — Que está


apaixonada, já se deu conta. — Com isso concordo
com um aceno, ela sorri e pega uma das minhas
mãos entre as suas. — Então, já falou para o Oliver
como se sente?
— Não, quando decidi procurá-lo para
conversarmos a respeito o peguei agarrado com a
Cara.
— Daí presumiu que estavam se pegando,
virou as costas e depois soltou os cachorros para
cima da moça. — Kate falando desta forma me faz
parecer tão megera... — Como eu falei, não acho
que o Oli esteja de fato com essa tal Cara. Quando
o recebi ele parecia perdido, não sei explicar, mas
alguma coisa aconteceu e meu conselho é que
conversem.
A simples menção de uma conversa entre
nós faz meus batimentos acelerarem.

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— Espere aqui mais um pouco, vou tirar as


crianças do salão, em cinco minutos Oliver estará
sozinho, tome a sua decisão, amiga. O meu maior
conselho é: escute apenas o seu coração. — Ela se
levanta e me dá um abraço apertado antes de me
deixar sozinha.
Pego o celular para olhar a hora e começar a
contar os minutos e noto que estou tremendo. Ativo
o cronometro e enquanto assisto os segundos
passarem, toda a conversa que tive com a Kate se
repete em minha mente. Até que...
“... Posso jurar que o que senti enquanto
conversávamos não foi felicidade por um
relacionamento novo, mas sim dor de perda.”
Ao me lembrar dessas palavras sinto o ar
fugir e uma pontada me acerta em cheio no peito.
Volto alguns dias atrás e repasso tudo o que
aconteceu desde o dia do flagra, então uma frase da

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Cara salta entre todas as lembranças:


— Eu... nós...eu não... O Oliver acabou de
perder...
O pai dele estava doente. Caralho, ele
perdeu o pai!
Puta que pariu, eu sou mesmo uma esnobe e
egoísta.

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Meus olhos ainda estavam fixos nos


números correndo na tela do meu celular, ora ou
outra ficando incompreensíveis pelas lágrimas que
desciam num fluxo interminável.
Eu sou um ser humano horrível.
Só percebo que passou tempo demais
quando Kate aparece na porta.
— Ei, por que está chorando assim? —
Sentando-se ao meu lado, me puxa para um abraço.

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— Foi algo que eu disse?


— Sou um ser humano horrível, Kate.
Egoísta, mimada, egocêntrica.
— Ei, ei, ei. Pode parar. Seja lá o que
aconteceu nesses quinze minutos desde que te
deixei que te fez chegar a essa conclusão, está
errado. Você não é nada disso, amiga. — Balanço a
cabeça em discordância.
— Sou sim. As pessoas me convêm quando
tem algo a oferecer, só enxergo esse lado delas,
quando elas precisam de mim, me revisto de
ignorância e as afasto. Sou um monstro. — Essa
verdade dói.
— E o que eu estou te oferecendo para que
nos presenteie com o aplicativo? Ou quando doa
semestralmente, roupas para as crianças? O que eu
te dei em troca da viagem que você bancou para
que levássemos os meninos para a praia?

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— É diferente...
— Não, não é. Você é uma pessoa
maravilhosa, às vezes centrada demais no trabalho
e com pouco tato para lidar com pessoas e questões
pessoais, mas é dona de um coração bom, Ayla. —
Fico calada, não vai adiantar retrucar, vamos ficar
aqui o dia inteiro enumerando as nossas
divergências de opinião. — Agora vai lá fora,
Oliver está esperando você.
Respiro fundo e seco as lágrimas.
— Siga o seu coração, Ayla. Cale a sua
mente e siga apenas o que pede o seu coração. —
No momento, meu coração pede que eu procure
Oliver e peça desculpas.
— Obrigada, Kate.
Saio de sua casa e ando para o salão. Ele
ainda está de costas para mim, mas agora noto sua
postura curvada, como se estivesse com um peso
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enorme sobre os ombros. Em silêncio, me


aproximo e toco seu braço. Oliver se vira
lentamente, surpresa cintilando em seus olhos
quando eles encontram os meus.
— Ayla?
— Oi. — Minha voz é só um sussurro.
Antes que algum de nós fale novamente, eu
o abraço. As lágrimas voltam a cair, assim como a
dor no meu peito.
— O que foi? — pergunta, uma de suas
mãos acariciando minhas costas, a outra amparando
meu rosto. As palavras ficam presas na minha
garganta, apenas soluços saem da minha boca.
Oliver continua me confortando e percebo que mais
uma vez estou sendo egoísta.
Ele quem perdeu o pai e está me consolando
por ter sido uma idiota.
Nos afasto e encaro seu rosto.
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— Me desculpa por ter sido uma pessoa tão


horrível com você. Desde o começo estive
pensando somente em mim, não levei em
consideração nada do que interessava para você. E
agora...
— E agora?
— Seu pai... — Seus olhos se fecham,
assim como a sua expressão.
— Quem te contou? — Ele se afasta,
sentando em um dos bancos do refeitório.
— Ninguém me contou, eu deduzi. Na
sexta... eu estava indo até sua sala para
conversarmos, te encontrei abraçando a Cara... —
Sinto vergonha de mim mesma, mas opto por ser
sincera. — Eu pensei que estavam...
— Por Deus, Ayla, não aceitei seu convite
para sexo sem compromisso e nem nunca falamos
nada sobre o que rolava entre nós, mas eu não
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costumo sair com mais de uma mulher ao mesmo


tempo. — Seu olhar magoado só intensifica a
sensação de que sou um monstro.
— No domingo a Charlie passou o dia
comigo e com a Júlia, falamos sobre você, tinha
aceitado o seu não, mas não tinha desistido de você.
— Agora é surpresa que define sua expressão.
Continuo: — A cada coisa que eu descobria a seu
respeito, mais eu sentia vontade de contornar a sua
recusa. Naquela noite cheguei à conclusão que
estava apaixonada. Na sexta-feira estava indo te
procurar para abrir o jogo, para te chamar para
conversar e chegarmos a um consenso. Te
encontrei abraçado a ela, o rosto enfiado em seu
pescoço, você nem sequer se virou quando a ouviu
falar meu nome. As piores coisas se passaram pela
minha cabeça, Oli. O que eu sentia, o que eu sinto
por você, me cegou.

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Silêncio.
— Fui uma grossa com a Cara — prossigo
quando fica claro que ele não vai se pronunciar. —
Falei tanta coisa horrível, — enxugo uma lágrima
que escorre, seus olhos fixam-se nos meus e Oliver
fica de pé, dá dois passos e para bem na minha
frente — depois passei a ignorar completamente
tudo o que dizia respeito a você, aceitei a sua
recusa e o fato de que ela é a pessoa ideal para
você.
— Pessoa ideal? — pergunta com a voz
rouca, sua mão direita sobe de encontro ao meu
rosto e lentamente o polegar enxuga as lágrimas
que ainda teimam em rolar. — E isso existe?
— Levei em consideração seus motivos
para não ficar comigo, vocês são pessoas tão
parecidas, tem os mesmos gostos, mesmo
trabalho... pessoa ideal. — Encaro o chão, sentindo

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uma ansiedade ferver meu sangue por estarmos tão


perto.
— Meu pai faleceu, Ayla. Era por isso que
eu estava abraçado à Cara na sexta, tinha acabado
de receber a ligação do hospital e desmoronei. Ela
estava lá e me ajudou, não me virei para olhar para
você porque não queria que me visse naquele
momento. — Mais um passo para perto e estou
novamente em seus braços. Passo os meus pela sua
cintura e deito a cabeça no seu peito. — Eu estava
me sentindo perdido, com raiva do mundo, com
raiva de mim por me preocupar com o que você
pensaria de mim se me visse chorando, quando meu
pai tinha acabado de morrer. Eu estava disposto a
esquecer você, Ayla, porque achava injusto eu estar
apaixonado, estar feliz, quando meu pai estava
doente e definhando cada dia mais.
Suas lágrimas pingam no meu ombro, seu

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aperto em meu corpo intensifica.


— Você era como um sopro de paz no
turbilhão que eu estava vivendo em casa, só que eu
não achava justo ter momentos bons, quando meu
pai não os podia ter. Depois que a gente transava,
sempre ficava um peso no meu peito, sabe? Como
se eu o estivesse traindo. — Um soluço lhe escapa
e isso corta meu coração. — Ele foi um homem tão
incrível, Ayla. Era um herói, sabia?
— Imagino que sim. — Sussurro, querendo
de alguma forma, confortá-lo. Nos guio até a mesa
mais próxima e empurro seu corpo para que se
sente sobre ela, me coloco entre as suas pernas e
volto a abraçá-lo.
Este não é o melhor lugar para
conversarmos, mas tenho medo de sugerir que
saíamos daqui e o momento se perca.
— Não, ele era um herói de verdade. Foi

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bombeiro por mais de vinte e cinco anos. Nunca


houve uma coisa sequer que ele fosse incapaz de
fazer. — Volta a falar e consigo sentir a dor da
perda em cada palavra. — Eu fiquei completamente
sem chão com aquele telefonema e com tudo o que
veio depois. Tenho vinte e seis anos, não sei como
criar duas crianças. Nunca nem parei para pensar se
um dia queria filhos e agora...
— Por que não me procurou, Oli?
Ele solta uma risada sombria.
— Sam descobriu por que a Charlie contou,
achou que eu precisaria dele. Ele foi e contou ao
seu pai, depois para a Júlia, eu não queria que
ninguém soubesse, não queria a pena de ninguém,
não queria que ninguém tentasse me fazer sentir
melhor, porque eu não queria me sentir melhor.
Ainda não quero. — A amargura em seu tom é
assustadora.

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— Em resumo, todo mundo sabia, menos


eu.
— Não por escolha minha, como eu disse,
não era para ninguém saber. — Não consigo
entender essa sua escolha. Não mesmo. Não me
lembro como foi perder a minha mãe e nem fico
pensando em como seria perder o meu pai, mas
imagino que se algo assim acontecesse, eu iria
querer as pessoas que amo, próximas. Exponho
esse pensamento e ele ri novamente, não estou
gostando nada deste lado seu. — É fácil falar
quando a dor é alheia, não dá para você imaginar
como será lidar com uma perda dessas, Ayla.
Enfim, agora você sabe.
Todos sabiam, confessei meus sentimentos
por Oliver para Deus e o mundo, mas ninguém se
preocupou em me dizer o que de fato estava
acontecendo com ele. Júlia me ouviu xingá-lo de

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tudo que era palavrão, sabendo que na verdade ele


estava sofrendo o luto pelo pai. Meu pai me ouviu
narrar tudo o que eu sentia, me acompanhou ao
hospital por eu beber demais por estar apaixonada
por um homem que eu achava que estava me
trocando por outra, mas que na verdade, só estava
perdido na dor.
Nossa, para quê inimigos com uma família
dessa?
— É inacreditável — sussurro para o nada.
A dor de ninguém se preocupar com os meus
sentimentos tem um gosto ruim.
— O que?
— Se não prestou atenção antes, eu disse
que estou apaixonada por você. Meu pai sabe disso,
a Júlia sabe e nenhum deles se preocuparam com
isso quando omitiram de mim o que estava
acontecendo com você. — Suas sobrancelhas

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franzem.
— É inacreditável mesmo. — Oliver repete
minha frase ao se afastar e ficar de pé. — Está
fazendo tudo ser sobre você. Foda-se se tenho uma
criança de oito anos em casa que corre o sério risco
de entrar em depressão pela perda do pai, tudo o
que importa é que a princesinha não ficou sabendo!
— Grita, encolho os ombros automaticamente. —
Sério, Ayla? — Além da raiva, a dor em seus olhos
funciona como um torno esmagando meu coração.
Fecho os meus olhos e respiro fundo.
— Não vamos chegar a lugar nenhum se
ficarmos comparando dores e suas importâncias.
Estou magoada por não ter sabido antes por que
gostaria de ter feito mais por você. Estou me
sentindo traída pela minha família. — Ando até ele
e toco seu braço, Oliver se esquiva do meu toque e
isso me fere. — Eu só queria que soubesse que

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estou aqui para você, Oli. — Digo quando me dou


conta de que não importa o que eu fale, nada vai
mudar essa situação horrível que estamos no
momento. — Sempre estarei.
Ambos estamos magoados, ferido e ele não
sabe como lidar com seu luto, eu forçar a minha
presença não ajudará em nada.
Ignorando a dor causada pela recente
rejeição, me aproximo e beijo sua bochecha.
— Vou para casa. Tem o número do meu
telefone, me liga quando precisar. — Dou apenas
um passo antes que ele me puxe para seus braços.
Não dizemos nada um para o outro, Oliver
deita a cabeça no meu pescoço e sinto a quentura
das suas lágrimas ali.
— Eu não quis que soubesse por que não sei
como lidar com tudo o que sinto, então mergulho
no trabalho para não sentir. Ver você hoje...
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despertou tudo o que eu tinha conseguido deixar de


lado quando me afastei — sussurra quando penso
que não mais tentaria conversar. — Não sei como
lidar com nada, para ser sincero, trabalhar é a única
coisa que sei no momento, é algo que lógico, nada
das variáveis que envolve os sentimentos. É algo
que não vai me causar mais dor, é a única coisa
sólida que tenho.
— Você tem a mim. Me deixa te ajudar. —
O pedido escapa em forma de súplica antes mesmo
que eu consiga controlar a minha boca.
— Gosto demais de você para machucá-la.
E no momento essa é a única coisa que farei se a
gente se envolver — confessa baixo, a boca colada
no meu pescoço onde o rosto ainda está escondido.
— Estou falando de amizade, Oliver. Me
deixa ser sua amiga, me deixa segurar a sua mão
nessa jornada, me deixa te ajudar a lidar com tudo

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isso. — Acaricio suas costas e sinto aos poucos seu


corpo relaxar. — Concordo com você que não dá
para imaginar como iremos lidar com uma perda,
mas tenho certeza que ter pessoas que te amam por
perto, ajuda. E se em algum momento eu estiver
atrapalhando, é só falar que me afasto. Também
gosto demais de você para deixá-lo sozinho quando
mais precisa de apoio.
— Gosto demais de você para garantir que
seremos apenas amigos. — Ah, droga. Quanto a
isso não tenho como contrapor, por que também
não posso lhe dar essa garantia.
— Um dia de cada vez, Oli. Vamos seguir
um dia de cada vez.
— Um dia de cada vez. Acho que posso
aceitar isso. — Seu rosto enfim se afasta do meu
pescoço e um pequeno sorriso se insinua em seus
lábios. Estamos perto demais. — Obrigado,

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princesa. E me desculpa.
— Desculpar pelo que? —
Inapropriadamente meu corpo inteiro se arrepia e
faço uso de todo o meu autocontrole para não beijá-
lo.
— Por ter falado coisas horríveis para você
e ter te chamado de novo, de egoísta mimada. —
Suas duas mãos seguram meu rosto e fecho meus
olhos.
— Mas eu sou uma princesinha egoísta e
mimada. — Desta vez ele abre um sorriso de
verdade.
— Sim, é a minha princesinha egoísta e
mimada. — Sua boca pressiona um beijo na minha
testa antes de começar a se afastar.
— Me desculpa. — Pede de novo.
— Pelo que?
— Por não conseguir manter distância —
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diz andando de ré até a saída. — Por não ser o cara


ideal para você. — Mais alguns passos, quando
chega na porta seus olhos adquirem um brilho de
angústia que me deixa temerosa. — E por ser
loucamente apaixonado por você.
Com isso ele vai embora.
Não consigo evitar que um sorriso imenso
se abra. Falamos tudo o que sentimos, ou quase
tudo, inventamos culpas desnecessárias, brigamos,
fizemos as pazes e selamos um acordo de amizade.
Tudo isso em um único dia. O que era para ter sido
uma conversa esclarecedora entre nós, apenas
gerou mais dúvidas.
O amor é irracional, princesa, não tente
entendê-lo senão vai enlouquecer. Ele foi feito para
ser sentido e não compreendido.”
Me lembro das palavras do meu pai, aquele
com quem ainda terei uma conversa séria, e me

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sinto em paz.
Não precisamos nos compreender, apenas
sentir.

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Uma ansiedade que nunca senti antes me


dominou completamente depois da minha conversa
com o Oli. Estava tão agitada que nem consegui
dormir direito. Faxinei a casa inteira e fiz algo que
nunca tinha feito: programei um grande almoço de
domingo e convidei toda a minha família, o que na
verdade consiste em Júlia, seus pais e o meu.
Assisti vídeos de culinária e eu mesma cozinhei,
ninguém foi parar no hospital com intoxicação
alimentar e isso para mim foi um grande feito.
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No final do dia quando meus tios já se


despediam e meu pai seguia atrás, pedi que ficasse.
Sentei com ele e com a minha prima e os coloquei
contra a parede.
— Entenda, princesa, não era a minha
história para que eu contasse. As pessoas possuem
segredos e toda uma vida além daquela que
conhecemos. — Meu pai fala de uma forma que
parece que já havia ensaiado sua defesa há tempos.
O encaro desconfiada. — Eu te amo, filhota. Peço
desculpas por ter omitido, mas espero que me
entenda e que o entenda também, lidar com o luto é
difícil e doloroso, nesses momentos nem sempre
agimos racionalmente. Eu mesmo quando perdi a
sua mãe quase perdi você também. Tenha
paciência.
Eu tinha todo um discurso pronto para
deixá-lo saber o quanto fiquei magoada, mas como

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dizer algo depois disso? Quando era mais nova,


lembro de ele me contar como tinha sido as nossas
vidas depois da perda da mamãe, já que eu não
lembrava de muita coisa, então sei o quanto sofreu
e o quanto foi difícil superar.
Meu pai se aproxima mais e beija meu rosto
enquanto me puxa para um abraço.
— Está brava comigo, filha?
— Estou, estava, não... nem sei mais. — Ele
ri e me aperta um pouco em seus braços.
— Tem todo o direito de ficar chateada
comigo, mas tente entender o lado do Oliver, ‘tá? E
já passou, vocês conversaram, se acertaram, então
coloque uma pedra sobre o que ficou para trás,
concentre-se apenas no que será de hoje em diante.
— Ganho mais um beijo na testa e ele se afasta. —
Agora vou indo, tenho compromisso ainda hoje.
— Anda muito misterioso com todos esses
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compromissos, senhor Edward, algo que eu precise


saber? — Meu pai deixa escapar uma risada
deliciosa que eu não ouvia há tempos, chego a
fechar os olhos para apreciar o som. Toda essa
história de dor e perda tem me deixado sentimental
em relação ao meu velhinho. Me jogo em seus
braços de novo e o acompanho quando começa a
sair da minha casa.
— Está com ciúmes desse velho aqui,
princesa? — Pergunta em meio a risadas.
— Claro. Você é meu pai! — Chegamos ao
portão e ele me segura pelos ombros.
— Na hora certa saberá, pode ficar
tranquila. Eu te amo, filha.
— Também amo você, mesmo quando me
esconde coisas.
Sua risada fica para trás enquanto ele
caminha para o carro. Só quando volto para dentro
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de casa é que percebo que no meio da minha


conversa profunda com meu pai, a safada da Júlia
saiu de fininho.
Filha da mãe!
Não pense que vai sair impune, docinho. Me
acerto com vc depois.
Envio para ela. Sua resposta é um emoji de
coração e um eu te amo. Reviro os olhos para a tela
do celular e com ele ainda em mãos, me jogo na
cama. E antes que eu possa controlar meus
movimentos, estou clicando no ícone do Speed Sex
e digitando Damien na barra de busca. Seu perfil
abre na tela para o meu deleite e passo pelas suas
fotos, admirando cada uma delas por um tempo
longo demais para ser considerado normal.
Clico na opção de marcar encontro e digito
que preciso de um acompanhante para sexta-feira.
Meu coração dispara com a ansiedade do que pode

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vir a acontecer se ele aceitar, nem sei se ele ainda


checa o aplicativo ou seus e-mails que são
relacionados ao app, se só deixou o perfil lá por
comodismo porque se esqueceu de deletá-lo ou se
ainda o está usando. São tantas dúvidas... respiro
fundo, as ignoro e só faço a oferta.
Para brecar o instinto de atualizar minha
página de dois em dois minutos, desativo a internet
do celular e procuro um livro para ler. Outra coisa
que não fazia há tempos.
Sinto que enfim estou entrando em sintonia
comigo mesma, conseguindo equilibrar vida
pessoal e profissional. A sensação que isso me
causa é deliciosa, realização misturada a euforia.

Ao entrar no elevador na segunda cedo com


três copos de latte com caramelo em mãos, ao invés
de apertar o botão do andar da presidência, paro no
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andar de criação. Não, não estou indo em busca do


Oli, apesar de querer muito falar com ele, estou
atrás da Cara, lhe devo um pedido de desculpas. O
fato de eles dividirem uma sala só vem bem a
calhar no momento.
Bato na porta e espero que alguém a abra.
— Ah, oi. Bom dia, Ayla. — Cara me
cumprimenta, seu sorriso é engessado e me sinto
mal por isso.
— Bom dia, Oli ainda não chegou? —
Mordo a ponta da língua quando essa é a primeira
pergunta que escapa quando vejo que está sozinha.
— Aqui, te trouxe café.
Desconfiada, ela pega o copo que lhe
estendo.
— Posso entrar?
— Sim, claro. — Cara senta em sua cadeira
e eu me aproximo depois de colocar o terceiro copo
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sobre a mesa do Oliver.


— Vim aqui falar com você. — Vejo
apreensão em seus olhos e isso me faz sentir ainda
pior. Eu fui muito horrível com ela, senhor!
— Posso falar primeiro, Ayla? Sinto que
não tive oportunidade de me defender aquele dia.
— Sorrio e confirmo com a cabeça. — Oliver e eu
nunca tivemos nada além de amizade, eu sou
casada e amo demais a minha esposa. Perdi meu
pai para o câncer não tem um ano e quando ele
balbuciou em meio ao choro que o pai tinha
falecido, meu primeiro instinto foi confortá-lo
porque conheço bem a dor que ele estava sentindo.
Apoio o cotovelo no joelho e o queixo
contra a palma da mão, por medo que a minha boca
se abra tanto e eu acabe babando. Sério, não sei
aonde enfiar a minha cara.
— Eu...

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— Depois que juntei dois mais dois entendi


o porquê agiu daquela forma. Mas confesso que me
senti muito ofendida, estou amando trabalhar aqui e
estaria mentindo se dissesse que não pensei em
pedir demissão depois daquela sexta. — Engulo em
seco.
— Me desculpa, foi exatamente para isso
que vim, para me desculpar. Fui ignorante e uma
estúpida, independente se você e Oliver estivessem
juntos ou não, eu não tinha o direito de agir daquela
forma. Sinto muito mesmo que tenha se sentido
assim em relação ao trabalho e quero deixar claro
que presamos muito ter você na equipe. — Nos
encaramos por alguns segundos até que ela sorri.
Desta vez um sorriso sincero. — Estou me sentindo
horrível depois de tudo o que me falou, a última
coisa que eu queria era que se sentisse acuada na
empresa.

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— Está tudo bem, falei com a Júlia e


entendi o que estava acontecendo. Ela deixou claro
que aquele não era um comportamento típico seu.
— Cara bebe um pouco do seu latte e me encara
parecendo ter se lembrado de algo. — E sobre o
Oli, ele não tem vindo para a empresa, pensei que
soubesse.
— Como assim, ele não tem vindo? Tenho
acompanhado seu cartão de entrada ser passado na
catraca todo dia. — Fico de pé, nervosa. Ouço a
risada dela e viro para olhá-la.
— Não sei dizer, mas respira antes que saia
por aí ofendendo as pessoas de novo. — A bonita já
está começando a ficar afrontosa! — Eu consegui
entender o seu lado, mas se fosse uma pessoa mais
ignorante teria saído daqui sem pedir demissão e
ainda te tacaria um processo.
Merda, ela tem razão.

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— Não estou falando isso para te provocar,


Ayla, só estou te ajudando a ser racional no
momento. — Há verdade em suas palavras e tudo o
que eu pensava a seu respeito, se torna obsoleto.
Sinto que só agora estou conhecendo-a de fato e
estou gostando muito dela.
— Devo agradecer, então? — provoco
imitando seu sorriso. — Estou feliz que possamos
recomeçar. Seja bem-vinda a família Stewart, Cara,
espero que todos aqui estejam sendo legais com
você.
Ela estala a língua como se dispensando
minhas palavras.
— A chefe foi meio babaca dia desses, mas
de resto é o emprego dos sonhos. — Dessa vez eu
rio alto. — Muito obrigada, aliás, ainda não tinha
tido oportunidade de agradecer a oportunidade de
trabalhar aqui.

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Aproveito que estou de pé e caminho até a


porta.
— A vaga era sua desde o momento que
entrou na sala de entrevista aquele dia, Cara. —
Seu sorriso aumenta. — Até qualquer hora.
— Até. — Antes que eu saia de vez de seu
campo de visão, ela grita: — Posso ficar com
aquele latte ali? — Aponta para a mesa do Oli, dou
de ombros. — Estou começando a entender o que
fez o Oliver cair por você, garota.
Saio do andar com um enorme sorriso que
ameaça partir meu rosto ao meio. Então me lembro
da ausência do Oli na empresa e volto a ficar
preocupada, subo direto para a minha sala e
encontro Júlia na mesa da Hillary. Acho que não
vai demorar para que a minha prima me avise que
está indo morar com o Sam, já passa a maioria das
noites por lá, de qualquer forma.

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— Por que Oliver James não está vindo


para a empresa, se o seu ponto está sendo marcado
diariamente? — Júlia sorri sem graça. É agora que
a pego de jeito. — Vamos entrar, temos coisas a
tratar antes que eu dê início ao meu dia.
Engolindo em seco ela me acompanha.
— Hillary, segure as ligações até que uma
de nós saia da sala, ok? — Seus olhos arregalam em
surpresa e balbucia um ok. — Pode começar a
falar, Jú — peço assim que fecho a porta atrás de
mim e me sento em minha cadeira, Júlia se senta na
cadeira do outro lado da mesa. Vejo vergonha em
seus olhos e no fundo isso me dá uma sensação de
triunfo.
— Sam só me contou por que os irmãos do
Oli estavam com ele, me pediu para guardar
segredo porque era o que o Oli queria. Não me
sinto mal por ter escondido, não era coisa minha

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para eu me meter. — Eu rio, logo ela falando sobre


não se meter?
— Jú, você nunca se importou com essa
coisa de não é a minha vida. Quero mais do que
isso.
— Estou aprendendo a ser menos invasiva,
não me arrependo de todas as vezes que fui com
você, pois isso te ajudou a sair do casulo, contudo,
tenho me controlado quanto a isso. E desta vez
estamos falando de falecimento, prima, é coisa
séria. — Fazia tempo que eu não a via falar com
tanta seriedade. E mais uma vez cai por terra a
minha intenção de ser dura com alguém que andou
omitindo coisas de mim.
— Tudo bem, você tem razão, mas saiba
que fiquei muito chateada. Você sabe o quanto eu
gosto dele, estava ciente que ele precisava de
alguém e não me deu nenhuma pista, me deixou

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xingá-lo como se ele fosse um crápula. Estou me


sentindo traída para ser bem sincera.
Júlia sorri e se levanta vindo em minha
direção, puxa minha cadeira para trás e me abraça
apertado.
— Desculpa não ter contado — pede me
apertando forte.
— ‘Tá, mas me promete que não vai mais
fazer isso. — Ela sussurra um prometo não muito
confiável e se afasta indo para a porta. — Obrigada
viu, Júlia.
— Pelo que?
— Por existir. — Vejo-a enxugar os olhos.
— Estou de TPM, Lally, não faz isso
comigo. — Segurando a porta antes de sair, volta a
me encarar — Já volto para falarmos da sua agenda
de hoje.
Quando fico sozinha, ligo meu computador
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e começo a me preparar para o trabalho, então me


lembro que não falamos a respeito de Oliver não
estar vindo para a empresa. Ligo para o meu pai, a
chamada cai direto na caixa postal.
— Eddy, Eddy, o senhor está aprontando
alguma e vou descobrir o que é logo, logo. — Rio
ao perceber que estou falando sozinha. O telefone
da mesa toca em seguida dando início ao turbilhão
que é meus dias na diretoria.
Alongo os dedos e mergulho de cabeça.

No final do dia estou cansada e doida para


chegar em casa, tomar um longo banho de banheira
e relaxar quando a notificação de um e-mail
aparece na tela do computador. Não conheço o
remetente, é de uma clínica, a princípio imagino
que seja algum pedido que foi encaminhado para o
e-mail errado, porém, quando leio o assunto
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começo a tremer ao me dar conta de que o e-mail


logado é o do meu pai.
Re: RESULTADO DOS EXAMES –
DOENÇA DE HUNTINGTON.

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Júlia aparece na minha sala dois segundos


depois que ligo para ela. Acho que o desespero na
minha voz deve ser o motivo sua pressa.
— O que aconteceu?
As lágrimas rolam livres e não consigo
parar de tremer, muito menos falar. Não sei
exatamente o que é a doença de Huntington, mas
nada com doença no nome é uma coisa boa. Júlia se
aproxima e me abraça, não abri o e-mail, primeiro

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porque não tive coragem e segundo porque respeito


a privacidade do meu pai, como a janela inicial do
e-mail ainda está aberta e o assunto gritando em
negrito na tela, aponto para ela veja.
— Ah puta merda. — Ouço-a murmurar e
isso me desestabiliza ainda mais. — Não acredito,
meu Deus não pode ser... seria uma piada de muito
mau gosto do destino...
Seus balbucios chamam a minha atenção.
Do que ela está falando?
— Não estou te entendendo. — Soluço as
palavras, vendo medo e dor cintilando em suas íris.
— O pai do Oli... o Otávio faleceu devido a
deterioração da doença de Huntington... se o tio
Eddy tiver a mesma doença... meu Deus... — Só
nesse momento me dou conta de que ninguém
havia me dito o que realmente o pai dele tinha. Só
falavam que estava doente.

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Ao me lembrar da dor que Oli tem vivido,


desabo de vez. Meu pai...
— Vamos, eu dirijo. — Minha prima me
abraça e nos leva para o estacionamento. Encosto a
cabeça na janela e sigo até a casa do meu pai,
rezando a Deus que tudo tenha sido apenas um
engano. — Não deve ser nada, Lally, se o tio
estivesse doente ele teria falado alguma coisa.
— Ele tem andado estranho, Jú. Cheio de
compromissos que duram o dia inteiro, às vezes sai
e não atende o celular, tem o lance do roubo da
empresa, ele não processou o Sanchez, o que tenho
achado um absurdo. E se isso tudo for sinal de que
está morrendo e não quer que eu saiba? — Tudo
escapa em um único fôlego e em meio a soluços.
— Respira, prima, vamos primeiro falar
com ele. Você não abriu o e-mail, talvez a clínica
tenha enviado para a pessoa errada.

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— Está calma assim porque não é com


você! Queria ver se fosse com o seu pai se estaria
me mandando respirar. — Grito, a dor me deixando
sem fôlego.
— Tio Eddy é como um pai para mim, não
menospreze a minha preocupação. — Seu tom é
magoado e me arrependo de ter explodido.
Sussurro um pedido de desculpas e
seguimos o resto do trajeto em silêncio. Meus
pensamentos não param de viajar por milhares de
cenários. Nenhum deles me agrada.

Minhas pernas não querem obedecer aos


comandos do meu cérebro e me mantem parada
dentro do carro na garagem da casa do meu pai. As
luzes do andar debaixo estão todas acesas e vejo
movimentos lá dentro.
— Vamos, Lally. — Júlia me tira do carro e
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me guia para a porta da frente.


Não está trancada então seguimos direto
para a cozinha, minhas pernas voltam a travar
quando vejo que meu pai não está sozinho.
— Pai? — Minha voz sai baixa. Todas as
quatro cabeças se viram para nós e acredito que
minha expressão não seja a melhor já que dois dos
homens à mesa se levantam e correm na minha
direção.
— O que aconteceu princesa? — perguntam
ao mesmo tempo.
Não sei se rio ou se choro. Opto por apenas
me jogar nos braços do homem da minha vida,
como se fosse a última vez. O que pode vir a ser
uma das últimas se...
— O senhor está doente? — Afrouxando
um pouco meu aperto, meu pai me segura pelos
ombros e me encara sério.
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— Não. Se estivesse você seria a primeira


pessoa a saber. — Ainda me amparando ele me
leva para a mesa e puxa uma das cadeiras para
mim. — Sente-se e me fale de onde tirou essa ideia
de que estou doente, seja lá o que tenha acontecido
mexeu muito com você, está pálida.
Quando me sento sinto um aperto
reconfortante em minha mão e sorrio para os olhos
preocupados de Oliver. Nunca imaginei que um dia
chegaria aqui e o encontraria com os irmãos,
fazendo companhia para o meu pai no jantar.
— Você esqueceu seu e-mail logado no
computador da presidência, esta tarde chegou um e-
mail cujo tema era resultado de exames, doenças de
Huntington. — O silêncio que recai sobre nós é
pesado. — O senhor tem andado diferente, cheio de
compromissos que nunca me diz quais são, perdoou
o roubo do Ernest, se está doente, pai, por favor me

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fala logo. — Novas lágrimas descem e o medo


volta a massacrar meu peito.
Meu pai se aproxima e Oliver se afasta.
Richard e Charlotte estão concentrados em seus
pratos e percebo que fazem um grande esforço para
não chorar.
— Vem comigo, princesa. — Sou levada
para a sala de jantar e meu choro se intensifica, ele
disse que não está doente, então por que quer falar
comigo a sós? Minhas mãos não param de tremer.
— Os exames não sãos meus.
Suspiro de alívio, a expressão do meu pai
continua tensa e volto a ficar apreensiva.
Segurando minhas mãos, ele as beija antes de me
puxar para um abraço.
— Huntington é hereditário, Ayla. — Arfo
entendendo o que isso implica para Oliver e seus
irmãos. O peso que senti saindo do meu peito volta

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com força.
— Oh meu Deus. — Sou levada para a
cadeira mais próxima.
É tão injusto!
— Posso falar com ela a sós, Eddy? — A
voz do Oli soa e nós dois nos viramos para a porta.
Ele se aproxima enquanto meu pai volta para a
cozinha. — Sinto muito que tenha passado por esse
susto, princesa. — Oliver se ajoelha no chão em
frente a mim, suas mãos seguram as minhas,
entrelaçando nossos dedos. — Os exames são dos
meus irmãos, seu pai foi comigo levá-los no
laboratório e pediu que os resultados fossem
apressados.
Fico confusa, por que ele está falando só
sobre os irmãos? Será que ele já sabe o resultado do
próprio exame? A dor e o medo que vejo em seus
olhos dispara meus batimentos. Não me contenho

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mais e me jogo em seus braços, minhas lágrimas


molhando a sua camiseta. O medo de perdê-lo
paralisando todo meu corpo.
— Não quero perder você, mas quero que
saiba que vou estar do seu lado sempre. Para o que
precisar. — Paro de falar quando as próximas
palavras que espreitam na ponta da minha língua é
uma declaração que nenhum de nós está pronto
para fazer ou ouvir.
— Não vai me perder, princesa. — Oliver
enxuga minhas lágrimas e beija a minha testa. —
Estou morrendo de medo de descobrir os resultados
e ter você do meu lado significa muito para mim.
Engulo em seco, agoniada por ele continuar
falando apenas sobre os irmãos.
— E o seu exame? — Forço as palavras e
sinto seu corpo ficar tenso.
— Não precisei fazer. — Mal ouço sua voz,
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de tão baixo que ele está falando. — Eu... — Fecho


os olhos e respiro fundo tentando me controlar
emocionalmente. — Não precisei fazer, meu pai
não... ele não era meu pai biológico.
— Ah, Oli, sinto muito! — O sorriso que
aparece em seu rosto me deixa confusa. Frente a
minha incredulidade com seu reação, ele explica a
forma como descobriu e como tem se sentido
depois de ter lido a carta, e quanto mais ele fala,
mais sinto-me impelida a ele. Tudo nesse homem
me fascina.
Ficamos abraçados por um longo tempo na
sala de jantar, enquanto ele me conta mais sobre o
seu pai e me faz desejar ter tido a honra de
conhecê-lo.
Quando voltamos para a sala de jantar,
Richard está sentado no colo do meu pai e Charlie
ao lado deles, Júlia não está em lugar nenhum às

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vistas. A cena do meu pai com as crianças é linda e


me faz imaginar como seria se nossa família fosse
maior.
— Não li os resultados, Oli, apenas os
imprimi. — Meu pai indica os papéis sobre a mesa.
Aperto sua mão que ainda entrelaçada a minha
relembrando-o da minha promessa de estar ao seu
lado.
Vejo seus dedos tremerem ao pegar as
folhas e virá-las para si. Seguro-o antes que caia de
joelhos. Seus braços me abraçam pelo ombro e em
meio a um choro alto misturado a risos
incontroláveis, Oli murmura centenas de
“obrigado”.
— Negativo, porra! — Grita olhando nos
meus olhos. — Eles estão livres, Ayla, meus
irmãos... — Choro com ele. Seu alívio aquece meu
coração, sua felicidade provoca a minha.

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Richard e Charlie continuam colados ao


meu, só se afastam quando Oli se afasta de mim e
corre ao encontro deles. Tomo o lugar que Charlote
ocupava e meu pai sorri para mim.
— Ficaram assustados quando mencionou
os resultados. Eles não sabiam que viriam para o
meu e-mail e achou que eu estava doente. Tiveram
medo de me perder para a mesma doença que levou
o pai. — Que coisa mais linda e triste ao mesmo
tempo! E sendo sincera não entendo essa ligação
entre eles. — Meus compromissos misteriosos nos
últimos dias era dar suporte a Oliver e aos irmãos,
me apeguei a esses meninos de uma forma que os
amo como amo você.
Bom, agora tudo faz sentido. E me faz amar
meu pai infinitamente mais, deito a cabeça em seu
ombro e faço uma prece silenciosa agradecendo a
Deus por ter um pai tão incrível. E pedindo que no

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futuro eu consiga ser um ser humano tão iluminado


quanto ele.
Levanto a cabeça e me deparo com os
irmãos abraçados e comemorando entre si. Os
olhos de Oliver encontram os meus e um enorme
sorriso delineia seus lábios antes de eles moverem
em um agradecimento silencioso.
E posso jurar que a palavra que move seus
lábios em seguida tem alguma coisa a ver com
amor.

Depois de conseguirmos controlar todo o


turbilhão de emoções que eu trouxe no meio do
jantar deles, nos sentamos e tivemos uma refeição
maravilhosa. Me ofereci para servir a sobremesa e
Oliver me acompanhou enquanto os outros três
foram para a sala escolher um filme. Júlia
aproveitou quando saí da cozinha com meu pai e
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foi para casa, alegando que era um momento só


nosso e não queria se meter, descobri isso quando
chequei meu celular e via a sua mensagem.
— Obrigado mesmo por tudo, Ayla.
Honestamente eu não sei como estaríamos no
momento se não fosse você e seu pai.
Sirvo os pedaços de torta e Oli uma bola de
sorvete em cada prato.
— Não precisa agradecer. Tudo o que
queremos é vê-los bem. — Lhe ofereço um sorriso
e mais uma vez preciso controlar minha língua que
quer falar mais do que deve.
Pequenos passos.
Vamos para a sala e nos divertimos pelas
próximas horas com uma comédia que Richard
escolheu. Perto das onze da noite, Oliver informa
que está indo, já que os meninos tem aula no dia
seguinte.
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— Também acordo cedo amanhã, eu deixo


vocês em casa. — Meu pai sorri em aprovação
diante minha atitude.
— Não precisa se incomodar, eu chamo um
Uber. — Charlie belisca o irmão quando ele recusa.
— Ai, Charlotte, que foi?
Seguro o riso e vejo que Richard está
adormecido no colo do meu pai.
— Rick está dormindo, tenho certeza que
todos vocês estão cansados, vamos logo, deixa de
ser teimoso. — Levo os pratos da sobremesa para a
cozinha e quando volto para a sala, Oli já está com
o irmão nos braços e Charlie se despede do meu
pai.
— Obrigada por tudo, tio Eddy. — Ela o
beija no rosto e vejo a emoção fluindo nos olhos do
meu velho, que pisca e olha para o teto tentando
disfarçar as lágrimas.

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— Faço tudo de coração, querida. E volte


sempre que quiser, minhas portas estão sempre
abertas para vocês. — Ele a beija na testa e
seguimos para fora depois que também me
despeço.
No carro um silêncio gostoso nos faz
companhia, Oli está no banco do passageiro e vez
ou outra, roubo um olhar fugaz e o encontro me
encarando, sorrio e de canto de olho vejo-o sorrir
também. Ao estacionar em frente a sua casa,
Charlie desce rápido já com Rick nos braços e
segue para o portão.
— Valeu pela carona, Ayla. Até mais. —
Oliver corre para ajudar a irmã, que dispensa a
ajuda e só pede que ele destranque o portão,
percebo-os falando mais algumas coisas que não
entendo pela distância. Alguns segundos depois ele
volta e se debruça sobre a minha janela.

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— Obrigado pela carona. — Seu sorriso me


faz suspirar. Céus, como ele é lindo! — Mark tem
passado meu cartão desde que seu pai autorizou
que eu trabalhasse de casa, mas acho que já estou
pronto para voltar.
Então era isso que estava acontecendo.
Como não pensei em algo assim?
— Tem certeza? Tire mais um tempo para
ficar mais com os meninos. — Com os olhos fixos
nos meus, Oliver traz a mão para perto do meu
rosto e afasta uma mecha do meu cabelo que havia
escapado.
— Eles já voltaram para a escola, passam a
maior parte do tempo lá, de qualquer forma só
ficaremos juntos à noite. Posso muito bem voltar
para a empresa agora. — Ele está perto demais para
a minha sanidade. Só consigo me concentrar no
mover dos seus lábios e me lembrar do quanto eles

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beijam bem...
— Você quem sabe — respondo ao
perceber que suas sobrancelhas estão arqueadas.
Devo estar encarando sua boca como uma maníaca.
— Volto amanhã. Eu levo o café. — Pisca e
se inclina deixando um beijo na minha testa. —
Tenha uma boa noite, princesa.
Engulo a decepção de não ter sido beijada
na boca e abro um sorriso.
— Tenha uma boa noite você também, Oli.
— Dou partida no carro, mas meus olhos
continuam fixos nele, que começa andar de costas
até o portão.
— Ayla?
— O que? — Minhas esperanças por um
beijo se renovam, um sorriso matreiro estica seus
lábios e envia arrepios por toda a minha pele.
— Cheque seu perfil no Speed Sex, por
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favor. — Mais uma piscada e meu coração começa


a bater como um louco. Oliver entra e fecha o
portão, deixando-me parada ali, correndo um sério
risco de bater o carro no caminho até em casa de
tão ansiosa que suas palavras me deixaram.
Com um sorriso que não consigo desfazer,
dirijo com cautela redobrada.
Eu estou mesmo apaixonada por este
homem. Senhor!

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A paz que tomou conta da minha alma após


ler os resultados dos exames nunca poderá ser
colocada em palavras.
Passei a noite inteira em claro, estava tão
feliz que nem consegui dormir então aproveitei
meu tempo da melhor forma: trabalhando. Não
tenho como retribuir tudo o que Eddy e Ayla tem
feito por mim de outro jeito senão com o meu
trabalho. Finalizei mais uma etapa do aplicativo da

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Kate e realizei os testes finais no projeto que Mark


tinha me enviado na quarta, Cara havia mandado
bem em adiantar uma grande parte dele.
Quando o sol nasce, ainda estou energizado
e tomo um banho gelado para ver se isso acalma
um pouco meus nervos. Preparo o café da manhã e
só então vou acordar os meninos.
— Tem alguém que parece ter visto um
passarinho verde. — Charlie cantarola ao se sentar
para tomar café.
— Coma antes que se atrase, mocinha. —
Seu sorriso aumenta.
Em alguns momentos a dor da perda ainda é
excruciante, normalmente quando me esqueço que
meu pai não está mais aqui e fico ansioso para lhe
contar algo. Nesses momentos meu peito é
comprimido e o ar se torna escasso. Evoco as
memórias boas que temos juntos e isso ajuda um

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pouco a aliviar o peso, sei que nunca vai ficar fácil


aceitar sua partida, mas com o tempo a dor ficará
mais amena.
E depois de ontem e a constatação que
aquela maldita doença não paira mais sobre nós,
tudo parece mais leve. Assim que os meninos saem
para a escola ligo para o Sam pedindo que me dê
carona, ele fica surpreso com a minha ligação e
confirma que passa aqui em meia hora.
Estou nervoso com a minha volta, de certa
forma no meu íntimo ainda há uma persistente
sensação estranha de estar agindo errado me
permitindo coisas novas, inclusive essas ondas de
felicidade que Ayla me proporciona.
— O que te fez querer voltar rápido assim?
— Essa é a primeira coisa que ele pergunta quando
afivelo o cinto. — Esquece, não é como se eu não
soubesse. Mas me fala, já tirou a cabeça da bunda?

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— Estou bem Samuel, obrigado por


perguntar. — Com um som de desdém, ele arranca
com o carro.
— Júlia me contou dos exames, fiquei feliz
pra caralho. — Expressa e sinto a honestidade em
seu tom. — Só que também muito puto por ter
sabido por ela. Caralho, Oliver quando vai voltar a
se lembrar que ‘tô aqui pra você, porra? Na
verdade, eu devia ter mandado se foder quando me
ligou pedindo carona.
— Eu estava perdido, Sam, não conseguia
pensar direito em nada, o Rick estava muito mal,
tive medo que desenvolvesse depressão e...
— Já sei de tudo isso, cara, porque eu estive
com ele por vários dias enquanto sua cabeça estava
enfiada no rabo. Quer saber, esquece. — O silêncio
impera até que cheguemos a empresa.
— Me desculpa, Sam. Você é como um

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irmão para mim, eu devia ter considerado mais tudo


o que já passamos juntos e procurado mais apoio
em você. Sei que nunca viraria as costas para mim.
— Deixa essa porra pra lá, já passou. Só
esteja ciente que se voltar a agir dessa forma, pode
esquecer que um dia fomos amigos. Amizade não é
feita apenas de momentos felizes, amizade é você
saber que o outro estará ali para te estender a mão
por mais filho da puta você esteja agindo. — Sam
desce do carro e eu faço o mesmo. — E você andou
sendo muito filho da puta, Oli.
Ao travar o carro ele segue até o elevador
me ignorando totalmente, conhecendo-o como
conheço, deixo que vá. Não está bravo comigo de
verdade, mas sei que precisa de um tempo até
conseguir ficar numa boa comigo de novo. Espero
o elevador descer de novamente e sigo para o andar
de criação.

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— Bom dia! — Cara me cumprimenta


assim que entro na nossa sala. — É bom te ter de
volta.
— É bom estar de volta, como estão as
coisas por aqui?
Enquanto ligo minhas máquinas e me situo,
ela me conta como tem andado os projetos e sobre
a conversa que teve com a Ayla o que me deixa
surpreso.
— Aquela garota está de quatro por você.
— Essa não é uma boa imagem para se plantar de
Ayla na minha cabeça, não quando tudo o que eu
mais desejo é tê-la para mim novamente naquela
posição... — Eca, Oliver você está pensando nela
literalmente de quatro, né? Pelo amor de Deus, para
de pensar em sexo e vai trabalhar.
Gargalhando Cara se afasta para a sua mesa,
já eu tento me concentrar no trabalho e não em

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Ayla e no quanto anseio por um tempo a sós com


ela.

Quase não acreditei quando recebi um e-


mail notificando o pedido de encontro, eu mal me
lembrava que ainda estava ativo no app. Quando o
perfil não é usado frequentemente, só aparece caso
o contratante faça uma busca pelo nome, o que
explica eu não ter recebido nenhum pedido antes do
da Ayla. É um algoritmo inteligente esse que usam,
para que apenas usuários assíduos fiquem no topo
de sugestões. Eu ainda não estava raciocinando
direito e meu peito estava apertado pelo medo,
aceitei o pedido por instinto. Um instinto que tentei
refrear, mas que foi mais forte que eu: o de tê-la
por perto.
Não nos falamos depois de ontem à noite e
Ayla apenas confirmou o encontro, não houve
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explicação sobre que tipo de encontro será e de


certa forma isso me deixa ansioso. Assim que o
expediente acaba desço para o estacionamento,
acabo parado dentro do elevador quando ele para,
Sam não quis almoçar comigo e nem disse se me
daria carona para casa, então não sei por que vim
parar aqui.
— Quer carona? — A voz de Ayla soa, saio
do elevador e olho direto para onde sei que seu
carro fica estacionado e ela está parada ali,
encostada na porta do carona. — Vamos lá, Sam já
foi.
É, acho que ele está mais chateado comigo
do que eu supus.
— Não fique bravo com ele, mais do que
ninguém eu o entendo e pode levar um tempo até
que ele o entenda e volte a ficar de boa. Logo tudo
volta ao normal entre vocês. — Sigo até o carro e

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paro ao seu lado.


— Não estou bravo só me sentindo um
merda de amigo. — Sua mão procura a minha e
entrelaça nossos dedos.
— Isso você foi mesmo, mas a gente
supera.
— Nossa, valeu. — Ayla gargalhada alto e
empurra meu ombro com o seu, seu polegar
acariciando as costas da minha mão me acalma e
faz meus pensamentos voarem para cenários não
muito apropriados.
— Só estou sendo sincera. Sam só está puto
porque gosta muito de você, se ele não gostasse, se
não valorizasse a amizade de vocês, aí ele não
estaria dando a mínima.
— Devo presumir que você não gosta de
mim, dado que estamos numa boa neste momento?
— Ouço-a bufar e seguro uma risada.
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— Muito pelo contrário, deve presumir que


gosto demais de você, só que de uma forma não
muito amigável e é por isso que estamos aqui. —
Ayla beija o canto da minha boca, da mesma forma
que fiz com ela em nosso primeiro encontro e se
afasta, indo para o lado do motorista. — Agora
entra logo que ainda preciso ir para casa me
arrumar, tenho um encontro esta noite.
A safada ainda pisca antes de entrar no
carro. Gemo em frustração.
Primeiro ela pede que sejamos amigos,
agora diz que gosta de mim de uma forma nada
amigável. É ou não é de foder qualquer homem por
mais que este seja detentor de um bom juízo?

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Estou fazendo uso de todo meu autocontrole


para não sucumbir aos desejos que me dominam
quando o assunto é o Oliver. Como eu falei a ele,
quero mesmo que sejamos apenas amigos, quero
que comecemos do zero.
— Lally, seu pai está na sala. — Júlia enfia
a cabeça pela porta do meu quarto e seu anúncio
me faz parar com o batom a meio caminho dos
lábios.
— Meu pai?
— Isso, seu pai, por que a surpresa?
— Porque não faço ideia do que ele possa
querer, nunca aparece do nada. — Só percebo que
estou tremendo quando Júlia tira o batom da minha
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mão.
— Relaxa, você anda meio paranóica,
respira fundo e vai lá ver o que ele quer. — Minha
prima beija a minha testa depois de aplicar o batom
nos meus lábios. — Aliás, ‘tá muito gata, Oliver
vai ficar, ainda mais, caidinho.
Reviro os olhos pela sua provocação e saio
do quarto, meus passos são incertos e ao ver meu
pai parado em frente a lareira analisando as dezenas
de fotos nossas, corro para abraçá-lo.
— Nossa, se soubesse que seria tão bem
recebido, teria vindo antes. — Ganho um beijo na
cabeça e seus braços me apertam contra seu corpo.
— Já disse que estou bem, princesa, confia em mim
não precisa ficar preocupada desse jeito.
Mantendo-nos perto, ele nos guia para o
sofá.
— Me pedir para não me preocupar é o
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mesmo que eu pedir que o senhor não se preocupe


comigo. — Ouço sua risada abafada em meus
cabelos já que estou deitada em seu peito.
— Você tem um bom ponto, mas em
relação a minha saúde eu estou bem mesmo, filha.
Hoje eu vim para falarmos a respeito do desvio de
dinheiro na empresa. — Suspiro, a paz que senti
por ele estar bem durou meros segundos. Fico
calada esperando que prossiga, o que faz logo após
suspirar também, noto que o seu suspiro é cansado
e triste. — Você conheceu o filho do Ernest?
— Randy Sanchez?
— Ele mesmo, há alguns anos Randy se
envolveu em um acidente com a mãe. — Consigo
sentir sua tensão apenas pela forma que me abraça.
— Anastácia teve ferimentos leves e só um braço
quebrado, já o garoto... teve uma lesão cerebral
muito grave e está internado em uma clínica desde

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então. — Vejo-o apertar a ponte do nariz, o que só


faz quando está chateado com algo. — Nada
justifica ele ter me roubado por anos, mas os
desvios era para que conseguisse pagar o
tratamento do filho.
— Ah, pai. — Uma lágrima rola por
imaginar a tristeza de Ernest.
— O pior nessa história filha, é que somos
amigos há décadas e se ele tivesse vindo falar
comigo, eu o ajudaria com o maior prazer.
— E por que ele não te procurou?
— Vergonha, na época eles estavam
passando por problemas no casamento, a Ana
estava bebendo demais e o Randy, envolvido com
drogas, no dia do acidente ela estava bêbada e ele
drogado. — Os ombros do meu pai encolhem. —
Ernest disse que a culpa de tudo isso, das bebidas,
das drogas, do acidente é dele, que ele tinha traído

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a esposa e causado tudo aquilo, teve vergonha de


admitir e de pedir ajuda, de deixar as pessoas
saberem que, palavras dele, ele destruiu a própria
família. Fiquei tão chateado com essa história toda,
porque digo que somos amigos só que eu nem
sequer fazia ideia de que ele estava passando por
esse mundo de coisas ruins. Me sinto uma pessoa
horrível por não ter sequer percebido que algo
estava errado com ele.
— Não se sinta mal, como o senhor disse,
todas as pessoas possuem uma vida além daquela
que mostra para a gente. Se ele não queria que
soubesse, não teria como o senhor saber.
— Ernest disse que sempre sentiu inveja de
nós, do seu sucesso, da nossa cumplicidade e de
como juntos alavancamos mais e mais a Stewart,
Randy mal falava com ele desde que acabou a
faculdade, foi uma sucessão de problemas que o fez

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agir daquela forma. Me sinto muito mal por tudo


isso. — Meu pai se afasta um pouco apoia os
cotovelos sobre os joelhos — Enfim, só achei que
estava na hora de você saber por que não dei
andamento no processo.
— E o que foi decidido? — questiono já
prevendo que com certeza ele o ajudou de alguma
forma. Depois de tudo o que aconteceu com o
Oliver estou aprendendo que nem sempre as
pessoas agem com racionalidade em momentos de
alto estresse ou profunda dor.
— Ernest pediu demissão e vai fazer
terapia. Ele e a Ana vão se divorciar. — Meu pai
suspira. — Paguei dois anos de clínica para o
Randy, tempo suficiente para que Ernest se reerga.
— Viu só, o senhor tem um coração
gigante, não precisa se sentir mal por não ter
percebido nada antes. Se fosse qualquer outra

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pessoa, pouco ligaria se o cara está passando por


problemas ou se eram amigos, iria demiti-lo sem
direito algum e ainda levaria o processo a diante.
— Beijo sua bochecha. — Estarei torcendo para
que as coisas se ajeitem logo para eles.
— Eu também, princesa. Eu também. —
Quando ele se levanta, também fico de pé. E pela
primeira vez na noite ele parece notar que estou
produzida. — Está bonita, vai sair hoje?
— Vou sim. — Ando até a cozinha para
fugir da pergunta que sei que virá em seguida, ouço
sua risada me seguindo.
— Tenha uma boa noite e um bom
encontro. — Sou puxada para um abraço rápido e
ganho um beijo na testa antes que ele caminhe para
a porta de entrada. — E diga ao Oli que mandei um
oi.
Gargalho sozinha quando meu pai vai

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embora.
Então me dou conta de que estou prestes a ir
a um encontro com o homem por quem estou
completamente apaixonada. Não estava nervosa,
até este momento, não é como se esse fosse o nosso
primeiro encontro, mas de certa forma é. É o nosso
primeiro encontro depois que deixamos claro tudo
o que sentimos um pelo outro.
Amizade, Ayla, vocês precisam se conhecer
melhor antes de qualquer coisa.
Parabenizo meu subconsciente pelo alerta e
peço que ele seja capaz de controlar o meu corpo.

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O endereço que a Ayla me enviou por


mensagem me leva direto para um restaurante à
beira-mar. O lugar é incrível e eu nunca tinha vindo
para este lado da cidade, as mesas são organizadas
em um deque com vista para o mar e a luz é
proveniente da lua e de pequenas lâmpadas
espalhadas por um tipo de varal por toda a área. E
está lotado, consigo ver mesmo do lado de fora.
— Boa noite, mesa para quantos? — A

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simpática recepcionista me aborda assim que passo


pelo umbral feito de bambus. O flerte é explicito
em seu tom.
— É reserva, no nome de Ayla.
— Pode me acompanhar, por favor. —
Indica o caminho, perdendo um pouco da alegria
que tinha ao me cumprimentar. Acabo sorrindo. —
Sua acompanhante já está te esperando.
Tudo ao redor fica em segundo plano
quando meus olhos a encontram. Ayla está em pé
próxima ao balcão de pedidos conversando com um
homem que presumo ser o cozinheiro tendo em
vista a touca e o avental, usa um short jeans que
deixa suas belas pernas de fora e a blusa é um tom
bem claro de rosa, suas costas estão quase
completamente nuas. Me aproximo e toco sua pele
macia, sentindo o calor que emana se espalhar por
todo meu corpo.

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— Boa noite, princesa. — Sussurro em seu


ouvido, sua cabeça tomba contra meu ombro.
— Boa noite. — Meu maior desejo no
momento é tirar o sorriso dos seus lábios com um
beijo. — Vem, vamos sentar um pouco, nosso
pedido já está quase pronto. — Ayla entrelaça
nossos dedos e nos leva para os banquinhos no bar
ao lado do balcão. — Não vamos comer aqui, tenho
uma ideia melhor.
— Ah, é? Me conta mais. — Seu sorriso se
amplia e com um olhar que me faz desejá-la ainda
mais, ela se aproxima até ficar bem perto do meu
ouvido.
— É surpresa, agora mesmo irá descobrir.
Mas me fala, como estão os meninos? — Uma de
suas mãos encontra apoio na minha coxa e ela
inicia um assunto trivial como se a poucos
centímetros de sua mão não existisse um pênis

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semiereto por causa dela mesma.


Pigarreio e tiro sua mão da minha perna,
colocando-a sobre o balcão. Sua risadinha travessa
não ajuda muito em manter meus desejos sob
controle.
— Eles ficaram com o Sam, ao que parece
vão no cinema com ele e a Júlia. — O cozinheiro
reaparece com uma sacola de compras e nos
interrompe.
— Aqui, Ayla, espero que esteja do seu
agrado. — Ela fica de pé e abre um enorme sorriso
para ele.
— Obrigada, Ron. Diga a Sara que mandei
um beijo. — Pego a sacola antes que ela o faça.
— Pode deixar e vê se não some mais,
quase nem me lembrei que já te conhecia quando
apareceu chamando por mim. — Ayla revira os
olhos, o sorriso ainda colado no rosto ao encarar o
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homem.
— Sempre exagerado.
— Volta mais vezes e traz seu amigo. — O
tal Ron grita quando começamos a nos afastar, vejo
as bochechas da Ayla corarem e viro para trás,
dando ao cara um aceno de cabeça.
— Tchau, Ron.
Descemos pelo deque e saímos direto na
praia, Ayla se apoia em meus ombros e tira sua
sandália, quando começamos a andar pela orla é
que entendo o porquê ela pediu que eu viesse de
bermuda e chinelo. Tiro meus chinelos e ela os
toma da minha mão, colocando nossos calçados em
uma sacola que tira do bolso traseiro do short.
— Celular? — Pergunta, deixando-me
confuso.
— No meu bolso...
Uma de suas mãos se espalma em minha
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barriga e a outra invade meu bolso, tirando dele o


aparelho, vejo-a desligar e fazer o mesmo com o
próprio telefone.
— Hoje seremos só nós dois. Acho que
merecemos um tempo de tudo. — Passo um braço
pelo seu pescoço e a puxo para perto, controlando
meus impulsos de beijá-la.
Sou muito mais forte do que imaginei que
fosse.
Andamos por alguns metros até uma parte
mais afastada do restaurante e de qualquer outro
ponto, paramos ao lado de uma imensa pedra
ladeada por coqueiros. A luz da lua sendo o ponto
principal de iluminação para nós, as luzes dos
postes na alameda estão distantes, proporcionando
quase nenhum brilho.
Ayla pega a sacola do meu ombro e tira dela
uma toalha de mesa enorme.

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— Não sabia que restaurantes oferecem


todo o arsenal de piquenique. — Jogo, a
curiosidade sobre o cozinheiro me deixando meio
irritado.
— E não oferecem, bom ao menos esse não,
mas o Ron é um amigo da época da faculdade então
me deu uma mãozinha. — Ayla para a tarefa de
esticar todas as pontas da toalha e me encara com
um sorriso brincando em seus lábios. — É
impressão minha ou tem alguém com ciúme? —
Bufo diante a incredulidade das suas palavras.
— Não é ciúmes, só curiosidade mesmo,
vocês pareceram bem íntimos lá atrás, tem toda
essa sacola cheia de coisas...
— De coisas para eu aproveitar com você. E
na verdade, a esposa dele que é minha amiga. —
Com o sorriso se abrindo ainda mais, ela se
aproxima, deixando a sacola sobre a toalha.

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— Tanto faz. — Dou um passo para trás


para continuar agindo com bom senso.
— É, tanto faz, mas você fica todo
vermelhinho com ciúmes e isso é fofo. — Agora
suas palavras mexem com meu ego.
— Fofo? — Puxo-a pela cintura e colo
minha testa na sua, seus olhos se arregalam e a
boca entreabre. — Acho que já teve provas o
suficiente que não sou fofo, princesa. — Meus
olhos se fixam na ponta da sua língua que umedece
lentamente os lábios, quando um gemido baixo lhe
escapa, volto a mim e nos afasto. — Não sei se essa
coisa “de só nós dois” é uma boa ideia.
A encarnação de todos meus sonhos e
pecados gargalha alto enquanto se senta na toalha e
me convida a fazer o mesmo.
— Temos quiche de palmito, queijos e wrap
de fajitas de carne — recita enquanto tira da sacola

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um pote com cada comida que lista, por fim, tira


duas taças e uma garrafa de vinho. — Vamos lá,
está esperando convite dourado pra sentar, Oli?
Nesse caso meu convite dourado seria um
beijo. Ou ela totalmente nua deitada nessa maldita
toalha. Balanço a cabeça para tirar a imagem da
mente e me sento ao seu lado, Ayla me estende a
garrafa, eu a abro e nos sirvo enquanto ela abre os
potes de comida. Pelos próximos minutos
comemos, bebemos e conversamos amenidades.
Fico sabendo como foi a sua infância tendo
somente o pai e entendo um pouco porque é tão
princesinha de vez em quando. Rimos muito
trocando histórias vergonhosas de nossa
adolescência e não consigo me lembrar quando foi
a última vez que me senti tão leve e feliz como
neste momento, só sei que foi ao lado dela em
algum momento do último mês.

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— Nossa, acho que comi demais —


resmunga esticando as pernas e alisando a barriga.
— Amo o tempero do Ron, na época da faculdade
inventava grupos de estudos só para que a gente se
reunisse no apartamento deles para que ele
cozinhasse.
— Quem diria que a princesa na verdade é
uma quase morta de fome — zombo e ganho um
tapa no ombro.
— Só me alimento bem e com comida de
qualidade. — Ayla deita de costas e eu miro o mar
para não encarar a faixa de pele de sua barriga que
fica exposta. O vento sibilando e as ondas
quebrando são os únicos sons presentes por um
longo tempo, o clima continua leve. — Posso te
fazer uma pergunta?
— Sempre. — A rapidez que a palavra me
escapa me surpreende. Ela volta a sentar e entrelaça

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seu braço no meu.


— Como tem se sentido? — Meus olhos
voltam para o mar e eu respiro fundo. O clima leve
sendo substituído com a mesma rapidez que a
palavra escapou.
— Bem.
— Oli, pode ser sincero comigo, se não
estiver pronto para falar mais a respeito, vou
entender, só não esconda as coisas de mim por
querer se proteger. — Ayla deita a cabeça no meu
ombro e sua mão livre pousa em meu peito. —
Nada do que disser vai me fazer pensar menos de
você, nunca, entendeu? Então pode compartilhar
suas dores, seus medos e receios comigo, sempre.
Você é um homem incrível e tem lidado superbem
com tudo, e dada a situação que tem vivido você
tem todo o direito de não se sentir bem. Então vou
refazer a minha pergunta, querido, como tem sido

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esses dias para você?


Engulo o nó que apareceu na minha
garganta e enfio meus dedos entre seus cabelos
macios.
— Estou aqui para você, Oli. E não somente
para os momentos bons.
Com a minha cabeça encostada na sua,
meus dedos enrolados em seus cabelos e a sua mão
sobre o meu coração, conto sobre o medo constante
que tem me rondado de falhar com os meus irmãos,
falo novamente sobre meu pai e a carta que ele me
deixou, dos medos dele, da culpa que ele carregou
até seu último segundo de vida. Uma culpa que não
era dele, afinal, ele não escolheu ter aquela doença.
Falo da minha culpa pelos momentos felizes que
passamos juntos, do sentimento de estar agindo
errado ao seguir com a minha vida quando a do
melhor homem que já conheci, foi ceifada cedo

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demais.
Falo tanto que minha garganta seca e
preciso tomar mais uma taça de vinho. Choro tanto
que preciso usar um dos guardanapos que ela
trouxe, para enxugar as lágrimas. Mas acima de
tudo recebo de volta a sua compreensão, a sua força
e palavras que me confortam.
— Sabe quando disse que a culpa não seria
do seu pai caso um dos meninos tivesse herdado os
genes? — Ayla pergunta, agora estou deitado em
seu colo e os seus dedos massageiam
deliciosamente meu couro cabeludo. Confirmo com
a cabeça. — Por que acha que a culpa não seria
dele?
É uma pergunta estranha e me deixa um
pouco irritado.
— Ele não escolheu ter a doença e se um
dos meninos herdasse, também não seria porque ele

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quis.
— Pois é, tem coisas na vida que estão além
do nosso controle, saber se no futuro vamos
desenvolver uma doença e passá-la aos nossos
filhos é uma delas, mas tem coisas, como a culpa,
que dá para evitarmos. Ainda mais quando é uma
culpa imaginária, criada pelo luto. — Seus olhos
fixam-se nos meus e suas palavras falam direto
com o meu coração, é estranho falar desta forma,
contudo é como me sinto. Sinto-as infiltrando em
meu peito e dando a ele um alento que era tão
necessário. — Você acha que o seu pai ia querer
que você deixasse toda a sua vida de lado e ficasse
só sentado chorando por ele?
— Ele odiaria.
— Então. Se você for feliz, seguir com a
vida e correr atrás dos seus sonhos, seu pai com
certeza estará feliz e orgulhoso de ver que te criou

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bem, de ver que conseguiu passar para o filho dele,


a sua essência. — Suavemente seus dedos limpam
as lágrimas que escorrem e depois, Ayla beija a
minha testa. — Eu te a...adoro muito e sei que vai
conseguir se livrar dessa culpa e ser tão feliz quanto
nunca pensou ser possível.
Deus, como eu quero beijá-la. Puxo sua
cabeça para baixo e encosto as nossas testas, fecho
meus olhos e inspiro a paz que ela emana.
— Obrigado, princesa. Acho que nunca
agradecerei o suficiente por tudo o que tem feito
por mim. — Beijo seu queixo. — Também adoro
você.
Ficamos assim por um tempo, conversando
pelo olhar, transmitindo o quanto um significa para
o outro.
— A noite está maravilhosa, mas temos que
voltar. Amanhã levanto cedo. — Ela tem razão,

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ainda que tudo o que eu mais quero neste momento


é continuar aqui.
Recolho a nossa bagunça e enfio tudo de
volta na sacola, Ayla me abraça pela cintura e
caminhamos de volta até o restaurante, passando
direto pela lateral e indo para o seu carro. No
caminho até a minha casa uma paz imensa toma
conta de mim, fecho os olhos e inspiro
profundamente desejando que seja ininterrupta.
— Obrigada pela noite, Oli. Eu me diverti
bastante. — Se despede ao estacionar em frente ao
meu portão.
— Sou eu quem tenho que agradecer,
princesa. — Me inclino e beijo seu rosto. — Adorei
cada segundo. — Vejo-a fechar os olhos e uma de
suas mãos sobe de encontro ao meu rosto,
mantendo-me no lugar: ainda com a boca na sua
bochecha. — Até amanhã — sussurro e seguro sua

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mão, tirando-a de mim, antes que eu não consiga


mais me controlar. Suspirando, ela se afasta.
— Até.
Desço do carro e procuro as chaves do meu
bolso, assim que enfio a certa na fechadura, ouço-a
chamando meu nome, me viro e a vejo correndo até
mim.
— Foda-se, Oliver.
Ayla se joga nos meus braços e sua boca
devora a minha. Minhas mãos vão direto para a sua
cintura e a colo em mim, nossas línguas se
desbravam matando toda a saudade acumulada,
suas mãos entram por debaixo da minha camisa e
as unhas arranham todo o caminho do meu peitoral.
Gemo dentro da sua boca e a colo no portão,
acredito que nunca tenha beijado alguém com tanto
sentimento desta forma.
Carinho, saudade, paixão, cuidado.
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Paro de analisar quando algo mais forte do


que todos os anteriores surge na minha cabeça e me
concentro apenas na sua língua dominando a
minha. Com uma mordida no meu lábio inferior
Ayla separa nossas bocas, os olhos dilatados e
brilhantes de desejo.
— Boa noite, Oli.
Um selinho e ela se afasta até o carro,
permaneço parado no mesmo lugar mesmo quando
seu carro já sumiu de vista, sentindo aquele
sentimento criar ainda mais força dentro de mim.

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— Você está atrasada! — Júlia grita do


andar de baixo e eu corro para calçar as sapatilhas.
Droga.
— Eu disse que era para deixar esses
contratos para segunda-feira que eu organizaria
todos antes que começasse a analisar, mas é
teimosa, né? — Marcha para dentro do quarto e
começa a pentear meus cabelos. — Ficou quase um
mês programando esse dia para chegar atrasada.

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— Nossa, ainda bem que sempre posso


contar com você e sua habilidade em me fazer
sentir pior quando já estou estressada. — A idiota ri
quando termina o coque e me faz sentar para a
maquiagem.
— De nada. — Aplicando a base nas
minhas bochechas, me encara parecendo tão
ansiosa quanto eu. — E aí, ‘tá nervosa com o que
vai rolar depois do evento no orfanato?
Sua pergunta faz um frio gostoso se
espalhar pela minha barriga. Hoje iremos entregar
os tabletes com o aplicativo que o Oli desenvolveu
para as crianças e depois vamos sair em mais um
encontro. Já faz um mês daquela noite na praia e
até que estamos conseguindo lidar bem com o lance
da amizade, almoçamos juntos com o Sam e a Jú
quase todos os dias, nos falamos a noite e jantamos
na casa do meu pai uma vez por semana, parece

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que foi algum tipo de acordo do meu pai com os


irmãos James. Não nos beijamos de novo, não por
falta de vontade, isso é mais do que óbvio que tem
de sobra dos dois lados, estamos realmente indo
devagar, nos conhecendo melhor.
Descobri nessa coisa de sermos amigos que
estou muito mais do que apaixonada por ele.
— Ansiosa, nervosa.
— Sabe que não precisa, né? — Confirmo
com um aceno e recebo em troca um olhar irritado
por me mexer.
— Posso te fazer uma pergunta?
— Se ficar quieta enquanto termino aqui,
com certeza — responde ranzinza, sopro um beijo
que a faz revirar os olhos.
— Você ama o Sam?
— Claro que eu o amo! — Seu tom é um
pouco ofendido.
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— Como soube que o amava? E como pode


ter certeza que é amor, se se conhecem a tão pouco
tempo? — Seus olhos atentos me estudam e ela
larga a palheta de sombras sobre a cama e me
encara séria.
— Estou vendo que essa pergunta não é,
realmente, sobre mim e meu relacionamento, mas
ouça: quando algo bom acontece quem é a primeira
pessoa que você pensa em procurar? Não me
responda, só tenha em mente a resposta. Quando
você está chateada, quem você procura porque sabe
que vai te ajudar a se sentir melhor? À noite,
quando deita para dormir quem é a última pessoa
na qual você pensa? E quando acorda, quem é o
primeiro a receber uma mensagem sua de bom dia?
Agora quero que me responda, para quantas das
minhas perguntas o nome do Oli foi a resposta?
— Todas.

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— É assim que você descobre que ama,


prima. E quanto ao tempo, cada pessoa tem uma
alma gêmea vagando no mundo em busca da sua
metade, quando o reconhecimento acontece,
naquele momento, na primeira troca de olhar, o
amor nasce. E ainda que a gente não saiba que é
amor, ele só cresce mais e mais a cada dia, até o
momento que você finalmente se dá conta, com as
respostas das perguntas que te fiz, que está amando.
— Eu o amo — sussurro para mim mesma.
— Aleluia! Pensei que ia ter que abrir a sua
cabeça e desenhar dentro do seu cérebro alguma
coisa que te fizesse perceber isso logo! — Júlia me
abraça apertado. — Agora anda, vai logo para o
evento para poder aproveitar a noite com o seu
amor.
Sorrio também, mas paro quando penso em
algo...

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— E se ele não sentir o mesmo? — Mal


ouço minha própria voz de tão baixa ela sai pelo
medo.
— Não que você seja burra, mas Oli é um
pouco mais esperto que você e tenho certeza que
ele já se deu conta que te ama, só ainda não sabe
como falar, já que a pedido seu, selaram um acordo
de amizade. Você o conhece melhor do que eu e
sabe muito bem que ele não tentaria nada que
ferisse o que combinaram.
Nisso minha prima tem razão. Só que,
quando conversamos e nos entendemos, ele tinha
dito que não estava preparado para se envolver com
nada que não fosse amizade, então será que a Júlia
está certa?
— Você só saberá se é recíproco se for
honesta e o meu conselho é que o faça esta noite.
Aproveite o encontro e abra o jogo. — Colocando a

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bolsa na minha mão, completa: — Agora vai logo


que está mais do que atrasada.
Antes de me levantar eu a abraço.
— Te amo, doidinha.
— Também amo você, agora me mata de
orgulho indo lá e agarrando seu homem.
Ganho um tapa na bunda quando lhe dou as
costas para sair do quarto.
Com um pouco mais de coragem após a
nossa conversa, sigo para o orfanato com um
sorriso nos lábios e o coração leve.

— Estou nervoso. — É a primeira coisa que


Oli fala quando entra no carro. — Você chegar
atrasada não ajuda. — Vejo-o fechar os olhos e
respirar fundo. — Desculpa, está sendo gentil me
dando carona e eu aqui reclamando, mas estou

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nervoso pra caralho.


Me estico no banco e beijo sua bochecha.
— E porque está tão nervoso assim,
querido? — Dou partida no carro e sigo para o
orfanato.
— É a primeira vez que algo que crio
sozinho vai ser usado em massa, e se der errado? E
se ficou uma porcaria e as crianças odiarem? —
Comprimo os lábios para suprimir um sorriso. Sua
insegurança o deixa uma graça.
E na verdade, já era para termos entregado
os tabletes há algum tempo, por causa dessa sua
insegurança adiamos duas vezes. Sempre por ele
dizer que precisava verificar mais alguma coisa que
não entendo ou consertar algum bug, que depois
descobri pela Cara, nem existiam, ele só estava
mesmo analisando incontáveis vezes as linhas de
código.

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— Até eu me diverti com os jogos do


aplicativo, as crianças vão adorar. Relaxa. —
Aperto sua coxa e logo sua mão procura a minha
entrelaçando nossos dedos. — Os meninos estão
com meu pai?
— Sim, foram no cinema antes, mas já
devem estar lá nos esperando e a presença do seu
pai no evento, me deixa ainda mais nervoso. —
Tem sido uma rotina para eles irem ao cinema,
assim como o jantar semanal. Eles fazem bem ao
meu pai e vice-versa, essa aproximação deles é
linda, meu pai os ama como se fossem seus filhos.
E eu entendo o porquê da presença dele
deixá-lo nervoso, Oli o tem como um mentor e se
for bem honesta, como um segundo pai.
— Só respira fundo, vai dar tudo certo. —
Um sorriso tenso se abre e com carinho Oliver beija
o dorso da minha mão. O restante do percurso

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seguimos conversando sobre planos, tenho


aprendido que ele é um homem que adora um
plano, não sei se é algo de agora ou se já era assim,
mas adoro esse seu lado e apesar de ainda fazer
planos com uma voz temerosa, isso deixa claro a
esperança que ele tem em dias melhores. Deixa
evidente que está se esforçando para seguir em
frente.
Quando paro no estacionamento do
orfanato, percebo pelo seu sorriso que está mais
calmo.
— Seja o que Deus quiser — sussurra ao
sair do carro. Balanço a cabeça, rindo e o
acompanho, pegamos os quarenta e oito tabletes no
meu porta-malas e seguimos para dentro.
Todos estão no esperando no mesmo salão
onde conversamos um tempo atrás, ao passarmos
pelas portas há uma troca de olhar significativa,

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ambos estamos lembrando daquele dia e tudo o que


dissemos um para o outro.
— Não sei se quero saber o motivo de
chegarem atrasado para o próprio evento, mas que
demora eim? — Meu pai se aproxima e seu sorriso
é enorme ao encarar a nós dois. Oliver empalidece.
— Senhor, Ayla só me pegou em casa tem
uns quinze minutos. — Vejo meu pai segurar uma
risada, já eu bufo empurrando Oli pelo ombro.
— Obrigada por me entregar. Estava
conversando com a Júlia, acabei me atrasando, o
que importa é que já estamos aqui. — Kate nos
interrompe com Zoe ao seu lado.
— Tia Ayla, a gente ‘tá doidinho pra ver os
jogos! — Todos nós rimos da sua ansiedade.
— Então vamos lá, lindinha.
Para uma melhor comunicação ente Oli e as
crianças, as mesas foram todas afastadas e vamos
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nos sentar em uma roda com ele no meio, todas já


estão sentadas formando o círculo, os adultos ficam
de lado e Oliver e eu nos inserimos ali no meio e
começamos entregar os dezoito tabletes. Os
reservas meu pai leva para o escritório da Kate.
Instruímos eles a ligarem e como só tem o
aplicativo instalado, logo tudo é bem fácil. Os
olhinhos brilham quando o app começa a iniciar.
— Digitem o nome de vocês e a idade,
desta forma serão direcionados para os melhores
jogos e atividades para a sua faixa etária. — Oli
segue pelo grupo ajudando algumas crianças que
não sabem escrever os nomes.
— Minha faixa o que? — Uma delas
pergunta.
— Faixa etária, para a sua idade — explico
observando a interação entre eles.
Ao ver os sorrisos em seus rostinhos, me
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pego tentando entender como podem abandoná-las


a própria sorte, sei que existem situações extremas
onde os pais não tem mesmo condição de criar os
filhos, mas já ouvi de Kate tantas histórias sobre
abandono que me aquece o coração poder estar
proporcionando este momento de felicidade a eles.
Logo os sons que preenchem o ambiente
são as musiquinhas dos jogos e risadas deliciosas e
espontâneas, os voluntários que estão sempre por
aqui ajudando a Kate também estão se divertindo,
todos espalhados pelo salão. Vejo a Charlie em
cima de uma das mesas no canto fotografando tudo.
— Nem sei realmente como agradecer por
isso, amiga. — Kate mal consegue conter as
lágrimas e eu a puxo para um abraço.
— Esses sorrisos são o melhor
agradecimento. — Aponto para o salão e todas as
crianças felizes. — Você é uma pessoa tão incrível

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em dar um lar e amor a eles, tenho muito orgulho


da minha amiga. — Beijo seu rosto e enxugo as
lágrimas que descem.
— Não, você e o Oliver que são demais,
sério, ficou tudo tão perfeito muito melhor do que
eu tinha imaginado. — Oliver chega e pega bem o
final da frase.
— Só ficou tão bacana assim por causa das
ideias que me passou, Kate, estou muito honrado
por ter participado do projeto. — Seu rosto cora,
evidenciando que ainda está um pouco nervoso.
Quando Kate se afasta alegando que precisa
servir o lanche para as crianças, puxo Oli para fora
do salão.
— Viu só como deu tudo certo? Todos
amaram o aplicativo, meu pai está muito orgulhoso.
— Seguro sua mão e um pequeno sorriso se abre.
Por um momento vejo um lampejo de dor
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em seus olhos e isso me aperta o coração, pois sem


bem o que ele significa. É a primeira vez que algo
que criou sozinho está decolando para o sucesso e
seu pai não está aqui de corpo presente para
assistir. Solto sua mão e o abraço, sua cabeça
encontra abrigo no meu pescoço e sinto um suspiro
contra a minha pele.
— Obrigado — sussurra, nos afasto um
pouco e seguro seu rosto entre as minhas mãos.
— Não há pelo que agradecer, meu amor.
— Minha testa encosta na sua e nossos olhos
fixam-se um no outro, o ar a nossa volta muda
completamente e tudo no que consigo pensar é no
quanto eu quero beijá-lo. — Eu vou beijar você.
— Por favor — sorri de uma forma que
aquece meu peito, aproximo mais as nossas bocas e
seus pupilas dilatam, delicadamente passo a língua
pelo contorno dos seus lábios e acabo gemendo

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com a sensação. Que falta eu senti de beijar essa


boca! Oliver devolve o movimento e suas mãos
apertam minha cintura, mantendo-me bem colada a
ele. — Te quero tanto, princesa.
— Não tanto quanto eu quero você. —
Devolvo e prendo seu lábio inferior entre os dentes,
quando um rosnado brota do fundo do seu peito,
jogo de lado o receio e o beijo com toda fome dele
que abrigo em mim.
Minhas mãos acariciam seu rosto e o
contato com a sua pele quente me arrepia inteira,
sua língua dança junto a minha de uma forma tão
deliciosa que tudo o mais deixa de existir. Tudo o
que importa agora somos nós dois e este beijo. Suas
mãos sobem pelas minhas costas, puxando-me para
ainda mais perto e sinto o seu desespero em cada
toque, em cada pequeno suspiro que exala. É o
mesmo desespero que sinto para tocá-lo inteiro,

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para senti-lo mais uma vez completamente em


mim.
— Acha que podemos adiar o encontro de
hoje e irmos daqui direto para a minha casa? —
Pergunto com nossas bocas ainda se devorando, Oli
geme e seus dedos cravam com um pouco mais de
força em minha pele.
— Acho que podemos fazer tudo o que
você quiser, Ayla. — Sua resposta envia espasmos
de desejo por todo meu corpo e um frio delicioso se
espalha pelo meu baixo ventre.
— Tudo o que eu quero é você, não como
amigo, não como colega de trabalho. Quero você.
— Reforço com um selinho demorado. — Não
quero mais esperar para te ter de novo, Oli. Vamos
levar tudo no seu ritmo, não quero pressionar nada,
mas quero deixar claro que eu te amo, que vou estar
sempre aqui para o que precisar inclusive para te

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dar espaço caso precise dele.


Seus olhos se fecham apertados e ele
suspira antes de me beijar longa e demoradamente,
com mais desespero do que o último beijo e com
mais carinho, também, as mãos grandes amparam
meu rosto e os dedos acariciam minhas bochechas.
Não era no pátio do orfanato que eu queria dizer
que o amo, só saiu. Mas acho que fiz a coisa certa
considerando a forma que estou sendo beijada.
— Tudo o que eu preciso neste momento é
de você, princesa. De você inteira só para mim. —
Deixando uma mordidinha no meu lábio inferior,
Oliver se afasta, suas mãos continuam segurando
meu rosto e há uma intensidade tão visceral em
seus olhos que me tira o fôlego. — Eu te amo,
Ayla.
Não espero mais nada, nem me preocupo
em ir nos despedir do pessoal, apenas nos levo para

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o meu carro. Envio somente uma mensagem para o


meu pai:
Por favor, peça desculpas a Kate por mim e diga
que Oliver e eu tivemos um imprevisto e
precisamos sair as pressas. Ah, outro favor, leve
os meninos para passar a noite com o senhor ;)
Te amo!

Hoje a noite é toda nossa.

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Meu peito está expandido, sinto o amor e a


felicidade correr quentes pelas minhas veias.
Enquanto Ayla dirige para sua casa, encosto a
cabeça no banco e fecho os olhos, faço uma prece
silenciosa agradecendo a Deus e ao meu pai por
tudo o que sou hoje.
Ainda parece meio surreal que meu
primeiro aplicativo criado do zero e sozinho tenha
dado tão certo, cada novo dia tem sido melhor,
mais preenchido por esperança. Estar aqui agora,
depois do sucesso que foi a recepção no orfanato é
como um sonho. Depois daquele nosso encontro na

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praia percebi que por mais que tivéssemos firmado


um acordo de amizade, o que eu sinto por ela vai
muito além. Cada almoço juntos, cada ligação no
final do dia ou mensagem durante ele apenas para
checar se o outro estava bem, fazia meu coração
acelerar e uma vontade de estar sempre ao seu lado
crescer loucamente dentro de mim. Aprendi amá-la
com cada pequena coisa que desvendava de sua
personalidade, do seu coração.
— Do que está rindo? — Sua voz me tira
dos pensamentos e eu nem sequer tinha percebido
que estava rindo.
— Estou feliz e grato, ver aquelas crianças
hoje renovou as minhas esperanças e me fez
enxergar que perdi meu pai, mas que fui um
homem de sorte por ter sido criado por ele, por ter
guardadas no meu coração as lembranças mais
lindas que uma criança poderia querer. Eles não

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têm nada além de um teto e amor que recebem de


uma pessoa que nem da família é e ainda assim
estão sempre com um sorriso no rosto e são gratos
por cada coisinha que ganham, isso é lindo e
inspirador de uma forma que não há palavras para
descrever. — A emoção trava a minha garganta, a
minha vontade enquanto ensinava a todos como
iniciar o app, era ter condições de levá-los todos
para a minha casa e dar-lhes tanto amor quanto
recebi enquanto crescia.
— É verdade, a gente recebe e tem tanto e
muitas vezes só reclamamos, mal nos lembramos
de agradecer. — Há um instante de silêncio e isso
me faz acreditar que Ayla está falando de si
mesma, porém agora não é hora para remoer
problemas. Seguro sua mão e a coloco rente aos
meus lábios.
— Estou muito feliz por estarmos aqui

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agora, por ter você na minha vida. — Seu sorriso


reaparece. — E muito ansioso para chegarmos na
sua casa, só Deus sabe quanta falta tenho sentido de
estar com você, princesa.
Vejo-a fechar mais as pernas e meu pau
pulsa, por sorte falta apenas um quarteirão para o
nosso destino, o que não significa que não posso
provocá-la. Sento-me de lado no banco e aproximo
minha boca do seu ouvido.
— Já estou ficando duro só de imaginar
você toda nua na cama. — Pressiono sua mão no
meu pênis semiereto e seu gemido o faz inchar
ainda mais. — Estou salivando de vontade de sentir
o seu gosto, princesa. Uma noite só vai ser pouco
para que eu mate todo o desejo que estou
guardando há tempos.
— Oli...
— Fala, princesa. — Mordisco o lóbulo da

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sua orelha e vejo sua pele arrepiar, no momento


que Ayla entra com o carro na garagem, enfio
minha mão por dentro da sua camisa e a encho com
seu seio. Céus, como senti falta de tocá-la! —
Quero você e vai ser agora, depois a gente entra e
faz tudo com calma. — Rio quando ela solta o cinto
e me empurra de volta para o meu banco.
Aciono a alavanca e empurro o banco para
trás, antes de vir para cima de mim Ayla tira a
própria calça e calcinha, uma série de palavrões
escapam da minha boca com a visão da sua boceta.
Tiro minha camiseta e a vejo fazer o mesmo,
passando uma das pernas sobre o banco, senta
sobre mim fazendo-me gemer com o contato. Levo
minhas mãos para seu pescoço e as desço ao longo
do seu colo, seios, barriga até escorregar uma mais
para baixo e enfiar dois dedos dentro dela. Eles
entram com tanta facilidade que preciso me
concentrar para não gozar.
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— Porra, princesa. — Sua boca devora a


minha com ansiedade e com gemidos suaves, Ayla
cavalga na minha mão. Me perco nos sons e
sensações e no momento que sinto seu orgasmo
chegando, ela para e agilmente desabotoa a minha
calça.
— Tem camisinha no porta-luvas. — Me
estico e pego o pacote, abro-o e ela toma o
preservativo da minha mão, seus dedos delicados
massageiam meu pau. Beijo sua testa e fecho os
olhos apreciando seu toque, logo sinto a camisinha
sendo colocada, permaneço de olhos fechados e
quando Ayla me leva para dentro perco todas as
minhas forças. Meus braços ficam trêmulos e meus
batimentos aceleram assustadoramente.
É avassalador, quente e suado. Mas ainda
assim estamos fazendo amor.
Seus braços enrolam em meu pescoço e

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nossas bocas se procuram, o beijo é lento assim


como suas investidas contra mim. Minhas mãos
acariciam cada pedaço de pele que conseguem
alcançar e seus gemidos se intensificam conforme o
orgasmo volta a se formar, seguro seu rosto com as
duas mãos e a encaro.
— Olha para mim, princesa. — Seus olhos
abrem e eles estão brilhando. — Eu te amo tanto,
Ayla. A primeira vez que vi você o sentimento
tomou forma e fiz de tudo para ignorá-lo, tive tanto
medo de deixá-lo me dominar, mas a cada vez que
via seu sorriso, cada vez que conversávamos e eu
conhecia um pouco mais de você, mais o
sentimento crescia sem eu sequer me dar conta,
sem que eu pudesse fazer nada para impedir. —
Estamos suados, nossas respirações rasas pelo
esforço, mas sinto que não existe momento melhor
do que agora para deixá-la saber de tudo. — Não
consigo mais ver sentido em uma vida que não
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tenha você nela, pode ser cedo demais para me


sentir assim, mas é tudo o que sinto. Você é tudo o
que quero.
Lágrimas descem pelas suas bochechas e
seus movimentos se tornam mais acelerados.
— Você é a inspiração que me move,
princesa. — Nossas bocas voltam a se devorar e em
instantes tenho uma Ayla mole em meus braços,
suspirando e gemendo baixinho.
— Você também é tudo o que eu quero,
meu amor. Se for cedo, vamos ficar juntos até que
não seja mais. — Me dando um selinho ela sorri de
uma forma que meu coração volta a acelerar. — E é
você quem me inspira, me completa e me
transborda.
Quando sua cabeça deita no meu peito,
acaricio suas costas e novamente me pego fazendo
uma prece. Desta vez agradecendo por tê-la na

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minha vida e pedindo que tudo isso seja mesmo


real, pois se não for, não acredito que eu seja capaz
de suportar a dor perdê-la.

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Meu corpo inteiro protesta quando me viro


na cama e antes que eu me mova mais, braços me
puxam de encontro a um corpo quente que me faz
suspirar.
— Bom dia, princesa — sussurra no meu
ouvido e eu suspiro de novo. Até senti-lo me
puxando para si não tinha tanta certeza se a noite de
ontem havia sido só um sonho.
Foi tudo tão perfeito que não duvidaria se

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tivesse sido.
— Bom dia. — Me aconchego melhor em
seu peito e seus dedos se entremeiam em meus
cabelos. — Planos para hoje?
— Sim, mas só vou poder concretizá-los
caso você não tenha nenhum. — O tom rouco em
sua voz não deixa dúvidas de que tipo de plano ele
tem em mente.
— Meu plano hoje é só você.
Sibilando um “perfeito”, Oliver inverte
nossas posições na cama e antes que eu possa
responder, desliza suavemente para dentro de mim.
De madrugada acabamos entrando em um consenso
de transar sem camisinha algumas vezes, faço uso
de anticoncepcional e como nenhum método é cem
por cento confiável, não vamos dar margem à sorte
transando sempre sem. Nenhum de nós quer filhos
agora, mas nos sentirmos sem nada entre a gente

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era algo que ansiávamos pra caramba, essa é a


segunda vez e sinto todo meu corpo entrar em
êxtase com a sensação.
Envolvo seu corpo com braços e pernas,
desta forma sinto cada estocada mais
profundamente e isso me leva ao orgasmo em
poucos minutos. Sua respiração ofegante em meu
ouvido enquanto ele goza começa a me esquentar
novamente e quando Oli começa a sair de dentro de
mim, o puxo de volta, rindo do meu desespero suas
estocadas retornam e tenho um segundo orgasmo,
me esparramando sem forças nenhuma sobre o
colchão.
— Você faz o café desta vez, preciso de
pelo menos mais meia hora de cochilo depois
dessa. — Sua gargalhada preenche o ambiente, não
tenho energia nem para abrir os olhos, sinto um
beijo nos meus lábios.

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— Durma, princesa.
Ouço seus passos se afastando e em seguida
o barulho do chuveiro, perco a consciência em
algum momento entre ele saindo do banho e me
beijando de novo. Porém ainda escuto quando
sussurra:
— Eu te amo, Ayla.

Há um toque gostoso no meu pé esquerdo


que me faz gemer. Nunca fui acordada com
massagem nos pés, no entanto poderia me
acostumar com extrema facilidade.
— Se a cada vez que eu acordar ao seu lado
for ter uma recepção com as de hoje, quero que
venha morar comigo ainda hoje. — Oli ri e seu
corpo escala a cama pairando sobre o meu.
— Renovou as energias? Porque me

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perguntou dos meus planos, mas desmaiou logo na


primeira rodada... — Provoca enquanto beija meu
rosto e colo. — Seu café está no criado.
— Para que café se tenho você? E
respondendo a sua pergunta, estou totalmente
energizada. — Forço seu corpo para cima e sento
sobre seu quadril. — Só que antes de tudo preciso
de um banho. — Estalo um beijo na sua boca e
corro para o banheiro, assim que ligo o chuveiro ele
entra tirando a roupa.
— Preciso checar os meninos mais tarde,
seu pai ligou e disse para não me preocupar, só que
me sentirei horrível se não passarmos nenhum
tempo juntos esse final de semana. — Fala
enquanto ensaboa meu corpo, adoro a forma
carinhosa que passa a espuma por cada pedaço de
pele. É excitante mesmo ele não querendo que seja.
— Ainda está cedo e você acabou de me dar

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uma ideia muito boa. Tem um hotel fazenda aqui


pertinho, o que acha de irmos todos para um final
de semana? Voltamos amanhã à noite. — Beijo sua
boca. — O que acha?
— Bom, a ideia é boa.
— Sinto que tem um “mas” a caminho —
cantarolo ao procurar uma toalha.
— Tive as despesas com o sepultamento do
meu pai e agora preciso comprar um carro, estou
evitando gastos. — Explica desviando os olhos, me
aproximo com a toalha sobressalente e a enrolo em
sua cintura, abraçando-o em seguida.
Sei que o dinheiro que recebeu da patente
do seu software está rendendo em uma conta no
banco, não foi exatamente uma quantia pequena e
não entendo por que ele finge que nunca aconteceu
essa transação, com a loucura que tudo ficou depois
que começou a trabalhar na empresa o software

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ainda não foi finalizado corretamente para ser


comercializado e quando o for, Oli ainda receberá
royalties por um longo tempo. Poupar dinheiro é
sempre bom, mas um pouquinho de diversão de vez
em quando não faz mal a ninguém...
— E se aceitasse essa pequena viagem
como um presente? Você merece depois do sucesso
de ontem. — Seu corpo enrijece sob meu toque. —
Fez um trabalho incrível no app e não cobrou nada,
sei que o que queria era só ajudar a Kate, mas eu
ficaria muito feliz se aceitasse, é uma gratificação
mínima em vista do bem enorme que fez para
aquelas crianças.
— Você está falando de bancar a mim e
meus irmãos em um hotel fazenda, com certeza de
luxo, não posso aceitar isso, princesa. — Oli vira
de frente para mim e me abraça, os olhos colados
aos meus.

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— Sabia que é falta de educação recusar um


presente assim? — Um sorriso se insinua e roubo
um selinho. — O hotel não é de luxo não vai ficar
tão caro, vamos lá, Oli, pensa no quanto vai ser
gostoso passar vinte e quatro horas ao ar livre,
curtir seus irmãos, comidinhas caseiras e muita paz.
— Faço a minha melhor cara pidona e ele bufa. —
Pensa no quanto seus irmãos vão amar a viagem.
— É por isso que a Stewart está no topo,
você negocia pesado. — Ganho um beijo estalado
nos lábios antes que Oli se afaste para o quarto. —
Vamos logo antes que eu mude de ideia.
Corro atrás dele e me agarro em suas costas
como uma macaquinha, sua gargalhada me aquece.
— Eu te amo, querido. — Beijo seu
pescoço, suas mãos seguram minhas coxas e a
visão de seus grandes dedos morenos espalmados
na minha pele alba acende meu corpo.

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— É, ‘tô sabendo, princesa. Me ama tanto


que usa meus irmãos para que eu aceite seus
presentes absurdos. — Belisco sua cintura e mordo
sua orelha.
— Presente absurdo seria se eu te desse um
carro. É só uma viagem!
— Ayla, falando sério agora você nem
brinca com uma coisas dessas de vir me dar um
carro. Isso seria um insulto gigantesco e nós
brigaríamos feio. — Agora seu tom é sério, desço
de suas costas e paro na sua frente.
— Só estava brincando, não precisa ficar
chateado. Mas fique sabendo, senhor eu posso
cuidar de tudo sozinho, que tem muitas pessoas
com quem pode contar se precisar de ajuda
financeira, não precisa ficar remoendo problemas
por aí não, ‘tá?
Um tapa estala na minha bunda quando lhe

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dou as costas e sigo para o guarda roupa.


— ‘Tá. Pode ter certeza que quando eu
achar que preciso de ajuda, pedirei um bônus para a
minha chefe, já que segundo ela o departamento de
criação tem rendido melhor depois que entrei para a
empresa. — Sinto seu corpo colado ao meu e um
beijo é depositado no meu ombro. Não resisto, me
viro para ele e e acabo soltando a pergunta:
— Por que nem toca no assunto do dinheiro
da patente? Não estou reclamando de pagar essa
viagem e se estou sendo intrometida, me desculpa.
Só estou curiosa porque não te ouço falando nada a
respeito. — Oli suspira.
— Depois do funeral doei para tudo para
uma instituição que realiza pesquisas para a cura
daquela maldita doença. Só deixei no banco o
suficiente para garantir a faculdade dos meus
irmãos. — Suas palavras saem baixas e eu o aperto

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mais em meus braços. O orgulho que sinto dele


tomando proporções gigantescas.
— Você é uma pessoa tão incrível, meu
amor. Eu te amo. — Beijo-o com calma e carinho,
tentando fazê-lo sentir a veracidade da minha
declaração.
— Eu que te amo, princesa. Tanto que não
cabe em mim.
— É, ‘tô sabendo. — Devolvo sua resposta
de minutos atrás, rindo Oliver se afasta e começa a
se vestir, também me ocupo em colocar uma roupa
e separar outras para a nossa pequena viagem.
Uma comichão deliciosa de felicidade
percorre cada célula do meu corpo.
Sempre pensei que sendo a melhor no
trabalho, que levando mais e mais prestígio para a
empresa e conquistando espaços onde só os homens
mandam, eu seria feliz e completa. Nunca pensei
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que a minha felicidade estivesse interligada a uma


pessoa, mas estou amando descobrir tudo isso ao
lado do Oliver.

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Ver meus irmãos correndo e se divertindo


com Eddy faz com que eu me sinta menos mal por
ter aceitado que Ayla gastasse uma pequena fortuna
nos trazendo para este pedaço de paraíso. E
definitivamente temos significados diferentes para
a palavra luxo, o lugar é imenso, cheio de árvores,
lagos artificiais e naturais, cachoeira e mais um
monte de coisas que ainda não tive tempo de
desvendar.
Tudo o que eu mais quero é continuar como
estou agora: com Ayla nos meus braços na
espreguiçadeira e meus irmãos à vista dentro da

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piscina. Tive medo que me achasse um tolo por ter


doado o dinheiro que recebi da Stewart, a
admiração que vi em seus olhos me fez acreditar
que fiz a coisa certa.
— Eles têm feito muito bem para o meu pai.
— Ela sussurra, uma das mãos acariciando meu
peito. — Eu não o via tão feliz assim há tempos, na
verdade, nem sei se já o vi resplandecer tanta
felicidade desta forma. — Consigo sentir a emoção
em cada uma de suas palavras, beijo seus cabelos e
a aperto contra mim.
— Então é mútuo, nesse momento de
transição seu pai tem sido de extrema importância
para eles. Richard está mais ativo, se abre mais
comigo e sorri mais. Nem tenho palavras para
expressar o quanto sou grato.
Remexendo-se em meus braços, Ayla
alcança a minha boca e me beija. Sus lábios macios

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tocam os meus com tanta delicadeza que me


esqueço até de onde estamos, tudo o que importa é
o seu toque, o seu beijo, ela. Envolvo seus cabelos
em minha mão e a mantenho perto, nossas línguas
se desbravam com carinho e nossas respirações se
tornam uma só, meu corpo inteiro reage a ela, meu
coração acelera e bombeia amor para cada pedaço
de mim.
— Você é o anjo que Deus enviou para me
salvar de mim mesma, Oli. — Sibila com nossos
lábios ainda colados. — Não tinha percebido o
quanto eu me autossabotava até que você me falou
algumas verdades.
Se afastando ela volta a se deitar em meu
peito, acaricio suas costas com uma mão e sua nuca
com a outra.
— Ayla, não eram verdades eram palavras
ditas em momentos de estresse. Estávamos

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discutindo e tudo o que queríamos era ferir o outro.


— Contorno, sentindo uma dor pungente ao saber
que minhas palavras de fato a tinham ferido tanto.
E é por isso que a melhor solução em
momentos de raiva é se calar, ouvir apenas a voz do
coração e deixar para tomar decisões e conversar
quando tudo já estiver mais calmo. Só assim
evitamos magoar o próximo.
— Não, meu amor, foram verdades que eu
mesma camuflava. Eu sempre tive medo de
decepcionar o meu pai, não sei por que alimentei
esse medo absurdo sendo que tudo o que ele me
dava era apoio e amor. Lá no fundo eu sempre
achei que tinha que ser a melhor para que ele me
considerasse boa, para que ele tivesse orgulho de
mim. — Enxugo uma lágrima que escapa dos seus
olhos e beijo sua bochecha. — Esse medo cresceu
junto comigo e me dominou de tal forma que tudo

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o que me importava era trabalhar, levar a empresa


para o topo, conquistar clientes, mostrar que eu era
capaz. Me tornei uma pessoa calculista, egoísta e
autocentrada, conhecer você foi o que me tirou do
buraco em que eu mesma me enfiei, você me fez
conhecer a Ayla que eu queria ser. E o que eu
quero ser é alguém como você, alguém que ama
sem medida, que cuida mesmo quando precisa ser
cuidado, que perdoa com facilidade, mas não por
ser fraco e sim por que é uma pessoa boa e incrível
que só quer o bem acima de tudo. Obrigada por me
apresentar a mim mesma, Oli, obrigada por me
amar e por ser você.
— Ah, princesa. — Caralho até eu estou
quase chorando agora. Puxo-a para mais perto e a
abraço apertado. — Nem sei o que dizer depois
dessa declaração toda — brinco, sua risada
deliciosa soa e eu a beijo.

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— Um eu te amo seria um bom começo.


— Te amo demais, princesa. Na verdade,
demais ainda é pouco, não sei se um dia criarão
uma palavra ou uma fórmula que seja capaz de
quantificar o quanto eu te amo. E quer saber? Isso
não importa, o que importa é que estarei ao seu
lado todos os dias da minha vida, enquanto você
permitir, te mostrando o quanto te amo.
— Nada mal — zomba, mordo sua
bochecha. — Para sempre, Oli.
— Que?
— Para sempre, você disse que vai estar ao
meu lado enquanto eu permitir e será para sempre.
Abaixo minha cabeça e tomo seus lábios
nos meus, tento passar neste contato o quanto
significa para mim. Dizemos que iríamos devagar,
que nos conheceríamos primeiro, mas quem é que
consegue controlar a intensidade dos sentimentos?
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Eu não e nem quero tentar. Só quero


continuar vivendo essa vida que mais parece um
sonho, ao lado desta mulher tão incrivelmente
maravilhosa que o destino me deu de presente.

— Você bem que podia se casar com a Ayla


né, aí a gente ia morar tudo junto. — Richard
declara enquanto nos trocamos. Charlie e Ayla
saíram para comprar coisas de garotas enquanto nós
homens nos arrumamos para o jantar, Eddy está em
seu próprio quarto descansando um pouco antes de
nos juntarmos de novo.
Bagunço seus cabelos e recebo um olhar
irritado enquanto ele coloca os fios de volta no
lugar.
— A vida não é tão fácil assim, carinha.
Estamos namorando e nos conhecendo, quem sabe
daqui alguns anos? — Ajeito a gola de sua camisa e
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seus braços se enrolam em meu pescoço, retribuo o


abraço.
— Eu estou feliz — cochicha tão baixo que
quase não ouço e a forma como a frase escapa
carregada de culpa, me parte o coração. E só neste
momento entendo todas as vezes que Ayla diz que
não devo me sentir culpado em levar a vida adiante.
— Parece errado depois que o papai se foi...
— Mas não é, Rick.
— Não, você não ‘tá me entendendo, eu ‘tô
feliz em ter o tio Eddy por perto e esses dias
chamei ele de pai. Saiu sem querer, sabe? Eu ‘tô
começando a gostar muito dele e acho que o papai
ficaria triste comigo por isso.
Afasto seu corpinho do meu e encaro seus
olhos, a tristeza presente em seu rosto me faz
engolir em seco.
— Ninguém nunca vai substituir o papai,
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nem eu nem o Eddy, nem ninguém. E não é errado


você amar o Eddy, ele tem sido mesmo como um
pai para todos nós e merece o nosso carinho, não
acha?
— Sim, mas...
— Não tem “mas” quando o assunto é
amor, Rick, e pode ter certeza de que o papai está
muito feliz por saber que tem alguém cuidando de
você com tanto amor como o Eddy tem feito.
Acredite em mim, baixinho. — Um sorriso mínimo
desponta e aperto suas costelas, fazendo cócegas, e
só quando ele ri de verdade é que o solto. — Não
tem que se sentir culpado nunca por estar feliz, viu?
Tudo o que o papai queria era que fôssemos felizes,
foi isso o que ele ensinou para a gente a vida toda,
não foi? — Concorda com um aceno. — Pois
então, só seja feliz, Richard.
Beijo sua bochecha e bem nesse momento a

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porta se abre revelando uma Charlie eufórica cheia


de sacolas. Fuzilo quem entra depois com o que
espero que seja meu melhor olhar reprovador.
— Sério, Ayla?
— Foram só algumas comprinhas! — Seu
ar inocente me faz bufar e quando não consigo
manter a carranca, seu sorriso fica imenso. — Você
está lindo, Rick. — Pisca para ele fazendo-o corar.
— Obrigado, você também ‘tá linda. —
Richard se afasta quando Ayla se aproxima.
— Pare de gastar tanto assim, princesa,
tenho certeza que a Charlie não precisa de metade
das coisas que compraram. — Ela estala um beijo
na minha boca.
— Tem uma coisa que você nunca vai
entender, amor, a figura feminina faz muita falta na
vida de uma adolescente, eu tive a Júlia e a mãe
dela nessa fase, mas a sua irmã não tem nenhuma.
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Prometo que vou gastar menos, porém, se acostume


com as nossas tardes de meninas, porque vamos tê-
las direto, é para o bem dela.
— Passarem algum tempo juntas concordo
que pode ser para o bem dela, já gastar tanto e
desnecessariamente? — Ayla revira os olhos.
— Deixa de ser chato, Oli. — Respiro
fundo e puxo sua mão para que sente no meu colo.
— Desculpa, está sendo maravilhosa com
ela e estou só reclamando, obrigado, princesa. —
Beijo-a e seu sorriso ofusca minha indignação. —
Vamos jantar logo, não vejo a hora de ficarmos
sozinhos de novo, acho que ainda não matei todo o
desejo acumulado.
Suas bochechas coram e ela esconde o rosto
no meu pescoço. Vejo Charlie sair com Rick do
quarto falando algo sobre ir chamar o tio Eddy e
aproveito quando a porta se fecha para deitar o

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corpo de Ayla sobre a cama.


— Ficar tão perto e não poder te tocar como
anseio a cada segundo é uma tortura, princesa. —
Me deito sobre ela, a saia do seu vestido sobe
conforme me acomodo e esfrego meu pau por cima
de sua boceta, seu gemido baixo me faz pulsar e
intensifico a pressão em seu clitóris.
— Amor...
— Fico louco como me chama assim, me
faz querer rasgar suas roupas e me perder para
sempre no calor do seu corpo. — Ayla envolve
meus quadris com as pernas, me trazendo para mais
perto, escorrego a mão entre nós e deslizo um dedo
para dentro da sua calcinha. — Caralho, princesa.
Ela está tão molhada que minha boca saliva
de vontade de prová-la. Pulo da cama e tranco a
porta, volto para a cama sendo acompanhado pela
sua risadinha safada, desço a calcinha pelas suas

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pernas e a puxo para a beirada da cama enquanto


me ajoelho.
— Amo sentir o seu sabor, Ayla. —
Lambo-a de cima a baixo, quando subo de novo,
prendo seu clitóris entre os lábios, sugo-o para
dentro da minha boca e insiro dois dedos dentro
dela. Eles me sugam com fome da mesma forma
que meus lábios trabalham em seu pontinho
sensível. — Amo a forma que geme o meu nome.
— E ela o faz, baixinho e rouco, puxa meus cabelos
e se esfrega sem vergonha alguma no meu rosto,
intensifico os movimentos da língua e dos dedos e
logo o sabor do seu orgasmo preenche a minha
boca.
— Eu amo você. — Sussurra languida, toda
esparramada na cama, me levanto e sigo para o
banheiro, enxaguo a boca e lavo o rosto. Estou
quase saindo quando ela para atrás de mim. —

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Minha vez, Oli.


— Por mais que ter você chupando o meu
pau é tudo o que quero neste momento, estamos
atrasados e não quero que o seu pai pense no que
gerou nosso atraso. — Beijo sua testa e saio do
banheiro antes que a tentação de olhá-la seja
demais e eu mude de ideia.
Assim que saímos do quarto encontramos
os três no corredor. Merda!
— Já estava achando que pediriam serviço
de quarto. — A voz do Eddy está séria e nem
consigo encará-lo tamanho meu embaraço. — Ou
seriam a janta um do outro.
— Pai! — Ayla grita e ele gargalha alto, o
que não diminui a minha vergonha.
— Vamos logo, não sei vocês, mas eu estou
morto de fome. De comida. — Reclamando da
forma do pai agir em frente aos meninos, Ayla me
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puxa para que nós os sigamos. — Só estou


brincando, princesa, nem parece que esse cara aqui
tem feito o trabalho direito, considerando seu
estresse.
— Pelo amor de Deus. — Ela bufa e
começa a andar mais rápido, indo na frente. Eddy
gargalha de novo.
— Sabe que estou só me divertindo, né
filho? — Sua mão aperta meu ombro, eu sorrio,
bem ciente que é um sorriso forçado.
— Você tem que trabalhar melhor, Oli,
você precisa do emprego. — Rick me repreende e
desta vez não resisto e também rio junto com o
Eddy.
— Precisa mesmo, Oli. E eu, preciso de
netinhos. — Suspiro como uma garotinha, dando
graças a Deus quando chegamos ao restaurante pois
não tenho ideia de como responder a essa. A

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hostess nos recebe e nos acompanha até a mesa


onde Ayla já está acomodada com uma expressão
nada amistosa.
— Está tudo bem, princesa? — Entrelaço
nossos dedos e trago sua mão para beijar.
— Sim.
— Que bom, porque a nossa noite ainda
nem começou.
Isso lhe arranca um sorriso e logo estamos
todos acomodados e é servida as entradas, Ayla se
envolve em uma conversa sobre filmes e séries com
a Charlie, já Eddy está contando para o Rick como
é o Japão, ouço-o até prometendo que um dia o
levará para ver tudo por si só. Não sei se é uma
promessa apropriada para o momento, tendo em
vista a fragilidade do emocional do meu irmão, mas
a alegria que vejo nos olhos de ambos com a
conversa, me faz ficar calado.

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E me pego sorrindo ao ver todas as pessoas


que amo juntas e felizes.
— Para sempre, princesa. — Confirmo o
que ela tinha me dito mais cedo e a abraço,
sentindo meu coração bater acelerado para dar
conta de bombear tanto amor. Seu sorriso amplia e
olhando para ele tenho a mais absoluta certeza de
que para sempre será mesmo o nosso tempo.

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— Não, não quero ter uma porcentagem


maior nos lucros, quero comprar a patente. —
Charles, o amigo da Júlia me olha como se uma
segunda cabeça tivesse surgido sobre meu pescoço.
— ‘Tá brincando com a minha cara, né?
Você tem checado seu extrato de lucros? O que
você recebe é 0,08% do que o app rende por mês,
acha que serei burro de vender? Você gerencia a
empresa e sabe dar ordens, mas ao menos entende

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algo sobre programação para ir dando um UP no


app?
— Querido. — Carrego a palavra com todo
o sarcasmo que há em mim e vejo-o fazer uma
careta, internamente eu sorrio, por fora mantenho
meu olhar profissional. — Só te chamei aqui e fiz a
oferta por cortesia, Speed Sex já é um nome
conhecido no mercado e seria mais fácil fazê-lo
alçar voos maiores tendo a logo da Stewart, no
entanto, caso sua mente pequena recuse a oferta,
tenho um dos melhores programadores do mercado
na minha equipe e posso lançar um app mil vezes
melhor, só quis jogar limpo já que investia na sua
empreitada. — Charles engole em seco e no canto
da sala Júlia morde os lábios para segurar um
sorriso.
— Preciso pensar. Eu criei esse app do zero,
Ayla, não acho que eu esteja pronto para abrir mão

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dele assim.
— Cinquenta mil e mais 15% dos lucros por
cinco anos. É a minha última oferta, se não aceitar
agora ela voltará para doze mil e sem lucros. —
Ouço-o sussurrar um “porra” e agora eu quem
seguro o riso.
— Onde eu assino? — Quero gritar e socar
o ar em comemoração, respiro fundo e me
contenho.
— Nas linhas pontilhadas em todas as vias,
por favor. — Júlia indica, vindo com o contrato
contendo a minha última proposta. Pisco para ela
em admiração por ter sido tão rápida em fazer as
alterações.
Ela tem ficado cada dia mais esperta e
pegado o meu ritmo no trabalho. Juntas estamos
trazendo pequenas startups para a Stewart e
começando um novo departamento na empresa. Oli

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decidiu voltar para a faculdade antes dos seis meses


que tinha acordado com meu pai e agora tem feito
algumas aulas online para conciliar com seus
horários, tem trabalhado incansavelmente em mais
apps no estilo do que fez para a Kate e arriscando
novas criações. Estamos lançando uma média de
um por mês e tem sido um sucesso. Ah, o seu
software espião também já está no mercado e
vendendo como água no deserto.
— Nos envie um curriculum, Charles, você
é um ótimo programador, talvez tenhamos uma
vaga para você no nosso novo departamento. —
Um enorme sorriso aparece, ele fica de pé e aperta
a minha mão.
— Você negocia pesado, Ayla. E pode
deixar que vou enviar sim, seria uma honra
trabalhar aqui.
A cada vez que alguém me diz que negocio

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pesado meus pensamentos se voltam para Oli e as


vezes em que ele me disse a mesma coisa,
geralmente quando tento convencê-lo de algo,
gosto ainda mais quando isso envolve sexo. Meus
batimentos aceleram, já estou com saudades do
meu namorado.
— Iiihhh, conheço esse olhar. — Júlia
provoca, batendo o quadril no meu. — Quando ele
volta?
Oli tem participado de vários seminários,
alguns duram até uma semana e ficar longe é
sempre uma tortura.
— Amanhã. Sinto tanto orgulho dele, no
entanto essas viagens tem me deixado maluca. —
Minha prima me abraça pelo ombro e nos leva para
fora da sala.
— E é por isso que hoje vamos ter uma
noite das garotas. Cara e a esposa, Charlie, você e

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eu. Algumas margueritas, muitos petiscos e filmes


românticos.
— Sabe que a Charlie só tem dezesseis
anos, né? — Revira os olhos e chama o elevador, já
são sete da noite e estávamos na última reunião do
dia. Agora é só descanso por dois longos e
deliciosos dias.
— Margueritas virgens, meu amor. Se bem
que acho que já está na hora de ela começar a
conhecer o lado bom da vida... — Minha vez de
revirar os olhos. — Vamos buscá-la agora, deixar o
Richard com o Sam e seguirmos para a melhor
noite do mês!
Seu grito na frase final chama a atenção das
pessoas que estão saindo do segundo elevador na
garagem e me encolho tentando passar
despercebida. Aceito quando pede para levar o
carro e me acomodo no banco do passageiro, a

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primeira coisa que faço quando vejo que está


concentrada no trânsito, é enviar uma mensagem
para o Oli.

Eu: Consegui! O SS é nosso!!!


Amor: Essa é a minha garota! Estou orgulhoso de
vc princesa.

Meu peito aperta um pouco mais e suspiro


recostando a cabeça na janela do carro.

Amor: Princesa? Ainda está aí?


Eu: Tô, e sentindo muito a sua falta.
Amor: Também estou louco para te ver e saciar
todo o desejo que venho acumulando ao longo
desses quatro dias...
Eu: Vamos ter uma noite das garotas, mas vou

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amar uma chamada de vídeo depois?


Amor: Sinto muito, princesa, tenho que adiantar
algumas coisas para poder ir embora amanhã,
senão só vou conseguir sair daqui na segunda.

Um dor se espalha por mim e enche meus


olhos de lágrimas.

Eu: Tudo bem, se cuida. Eu te amo.


Amor: Tbm amo vc.
Algumas lágrimas descem e eu as enxugo
com raiva, detestando esse meu lado sensível, uma
mão envolve a minha e agradeço por Júlia ignorar
meu choro e só me confortar. Sorrio para ela, que
retribui e continua dirigindo.

A noite das garotas foi um fiasco. Ao menos


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para mim, Júlia realmente apresentou o lado bom


da vida para a Charlie lhe dando duas margueritas,
minha cunhada dormiu rindo para as paredes e
contando todos os seus segredos. Cara e a esposa
são tão lindas juntas que chega a me embrulhar o
estômago. Isso, obviamente é a saudade do Oliver
falando.
São duas da madrugada e não consigo
dormir, meus pensamentos ficam repassando todas
as lembranças que tenho com o Oli desde que nos
conhecemos, intensificando a dor no meu peito.
Ouço barulho na porta da frente e me encolho na
cama, Júlia com certeza está indo se encontrar com
o Sam e eu vou continuar aqui, sozinha.
Puxo o travesseiro que tem o cheiro dele e o
abraço, isso me acalma e acho que adormeço,
porque acordo assustada algum tempo depois com
um corpo a mais na minha cama.

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— Durma, princesa — sussurra e eu sorrio.


Sei que é só um sonho, mas aproveito a
sensação vívida e me aconchego ao corpo do Oli,
beijo seu peito nu e passo uma perna por cima das
suas.
— Eu te amo.
— Não mais do que eu, princesa.

O cheiro de café me desperta e me


espreguiço antes de sair da cama, Charlie deve estar
com uma ressaca insuportável, por isso está
preparando café tão cedo, ainda são seis da manhã
de um sábado.
— Então quer dizer que agora você bebe?
— Meu coração dispara com a voz. Não foi um
sonho! Corro para a cozinha e pulo em seus braços,
surpreso, Oliver perde o equilíbrio por alguns

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segundos antes de firmar o corpo e me abraçar


apertado. — Princesa.
Não suporto esperar mais e o beijo, ele ri do
meu desespero, mas corresponde. Céus, eu senti
tanta falta dessa boca, desses braços!
— Vão para o quarto, pelo amor de Deus.
— Charlie resmunga e ouço o barulho do seu
banquinho sendo arrastado.
Não nos movemos, minhas mãos
entremeiam em seus cabelos e as suas me apoiam
pela bunda. Andando alguns passos, Oli me coloca
sobre a mesa e se acomoda entre as minhas pernas
sem separar nossas bocas um segundo sequer.
— Você veio mais cedo — acuso quando o
ar se torna necessário e nos afastamos.
— Na verdade, meu voo atrasou era para eu
ter chegado antes de você dormir. — Ganho um
beijo estalado e Oli se afasta para nos servir café.
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— Então, Charlie de ressaca, eim?


Não há reprimendas em seu tom e isso me
deixa aliviada, não tinha parado para pensar o que
ele acharia de sua irmã bebendo.
— Júlia. Se tiver que brigar com alguém,
brigue com ela. — Sua cabeça balança em
discordância e me entrega uma caneca fumegante.
— Não vou brigar, fico feliz que tenha sido
com vocês que ela bebeu, poderia ter sido pior. Só
estou me sentindo um irmão e um namorado
relapso, minha rotina está uma loucura e mal ando
tendo tempo para ela, Rick ou você. — Há pesar
em seu tom e eu pulo da mesa e trato logo de fazê-
lo parar.
— Logo as coisas se acalmam, não se culpe
assim, amor. — Guio seu corpo para a cadeira e
faço-o sentar, paro atrás dele e massageio seus
ombros. — Pensa que está fazendo isso para

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garantir os nossos futuros.


Sua cabeça tomba e se acomoda em minha
barriga, tomamos café em silêncio e sinto que não
consegui aliviar nenhum pouco seu sentimento de
culpa, o que me deixa chateada. Não era assim que
eu tinha imaginado sua volta para mim depois de
tantos dias separados.

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Minha cabeça está doendo de tanto pensar.


Ter recebido uma mensagem de Eddy nos
convocando para um almoço em sua casa e dizendo
que precisa falar comigo não está ajudando. Tenho
dado o meu melhor em tudo o que me proponho a
fazer, ter voltado mais cedo para a faculdade foi
ótimo e com meu trabalho na Stewart consegui
adiantar várias matérias, o que vai me permitir
formar mais cedo, já no próximo mês.
E por mais que eu pense que as coisas
ficarão mais calmas depois da formatura, sei lá no
fundo que só estou enganando a mim mesmo. As

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horas de estudos serão substituídas por horas de


trabalho e tudo vai continuar da mesma forma,
senão mais louco.
— Oli? — Charlote entra no escritório que
compartilho com a Ayla aqui na casa dela e fecha a
porta atrás de si. — Está tudo bem?
— Está sim, algumas coisinhas para
resolver aqui e ali, nada com que deva se
preocupar. — Minha irmã senta na beirada da mesa
e começa a brincar com o peso de papel.
— Pensei que tivesse ficado chateado por
eu ter bebido ontem, quero que saiba que foi a
primeira vez e que não pretendo repetir. É
relaxante, mas não vale a dor de cabeça no dia
seguinte. — Rio alto e belisco a ponta do seu nariz.
— Fala isso agora, pingo de gente, daqui
alguns anos pega gosto. Só mantenha sempre o
controle, ‘tá? Pode curtir a vida à vontade, desde

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que seja com prudência e moderação.


Ainda não estou preparado para falar sobre
sexo com a minha irmã e sei que isso terá que
mudar logo, afinal, ela não é mais uma criança.
Será que a Ayla toparia pegar meu lugar nessa
conversa?
— Ayla parece chateada, por isso que vim
ver se está tudo certo. — Exalo com força.
Me recosto na cadeira e encaro o teto,
quanto mais penso mais os problemas parecem
crescer.
— Pode pedir que ela venha aqui, por
favor? Ah, se troque que vamos almoçar no Eddy.
Charlie saltita da mesa e corre para fora da
sala, ainda estou me acostumando que meu chefe é
o mesmo cara que me cobra netos, as vezes me
parece tão estranho chamá-lo de Eddy e no
momento seguinte estarmos em uma conversa
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envolvendo milhões de dólares. Parece irreal.


— Me chamou?
— Sim, pode vir aqui? — Não gosto do
jeito que seus olhos desviam de mim. Ayla se
aproxima e para ao lado da cadeira, os olhos
continuam me evitando, fico de pé e a envolvo em
meus braços. — Precisa me dizer quando eu fizer
algo que a deixe chateada, minha cabeça está cheia.
Me desculpa.
— Não estou chateada é só que você ficou
dias longe, chega de surpresa, não me acorda e
quando o dia amanhece e podemos passar um
tempo juntos, se tranca no escritório. — Acaricio
seu rosto e beijo a sua testa. — Não liga para mim,
estou de TPM.
— Pedir para eu não ligar para você é o
mesmo que pedir para eu não respirar, princesa. —
Me afasto um pouco e pego na gaveta a caixinha

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que trouxe comigo de Nova York, a minha ideia era


entregar o presente amanhã a noite quando
saíssemos para jantar, mas como sempre tudo o que
planejamos sai de controle, não há melhor
momento do que agora. Seus olhos se arregalam ao
ver a caixinha de veludo. — Relaxa, ainda não é
um anel de noivado. — Beijo sua boca e volto a
abraçá-la. — Ainda não tenho estrutura para ser o
marido que você merece, só quero te dar esse anel
como uma forma de concretizar o nosso para
sempre.
Lágrimas descem quando ela vê o anel de
platina, a jóia tem um pingente com o símbolo do
infinito. A coloco em seu dedo e o beijo em
seguida.
— Sabe que já tem todo um futuro
garantido agora terminando a faculdade, não sabe?
— Pergunta envolvendo meu pescoço e colando

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nossos corpos. — Não está pensando que depois


vai trocar as horas de estudo por horas de trabalho,
está? Porque eu não vou permitir isso, Oli. Você
tem agido como eu agia antes de nos conhecermos,
está querendo impressionar quem?
— A questão não é impressionar, princesa.
É saber o meu lugar e conquistar coisas por mim
mesmo, não quero ser o cara que só tem um cargo
bom porque é o namorado da chefe.
— Que história é essa? Já estamos juntos há
um tempo, por que isso agora? — Vejo-a ficar
vermelha tentando conter o nervosismo e me
afasto, não quero mais um problema para a minha
extensa lista.
— Não quero brigar, Ayla, minha cabeça
está doendo e temos um almoço com o seu pai em
uma hora.
— Certo, nos encontramos lá então, preciso

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sair. — Com passadas firmes ela sai da sala e eu


caio de volta na cadeira.
Essa está sendo uma bela volta adiantada
para casa.

Estou quase saindo da casa da Ayla para o


almoço quando Eddy entra.
— Júlia está te esperando lá fora, querida.
Oliver e eu vamos depois. — Ele beija a cabeça da
minha irmã e depois me encara sério. — Vem
comigo, filho e pegue a chave da sua casa.
Confuso, e confesso com medo, obedeço.
Por alguns minutos seguimos no seu carro em um
completo silêncio, o que só me deixa mais nervoso.
— Há quanto tempo não passa uma semana
inteira na sua casa, Oliver? — Não consigo decifrar
o seu tom, é um que nunca tinha usado comigo

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antes. E não sei também responder a sua pergunta.


— Não sei exatamente, está tudo corrido
desde que voltei para a faculdade, muitas vezes saio
de lá direto para a Ayla...
— Sei.
Silêncio.
Chegamos e ainda não faço ideia do porquê
ele quis vir até aqui, desço do carro e abro o portão,
entramos e não sei para onde ir.
— Vamos filho, vou fazer um café
enquanto você abre o quarto do seu pai. — Travo,
não entro lá desde o funeral.
— Não...
— Vamos logo, vou colocar a água para
ferver, abra a porta e as janelas para arejar. Depois
iremos organizá-lo. — Engulo alguns palavrões que
querem escapar e quando encaro o chaveiro, noto
que estou tremendo. Sua mão envolve a minha e
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agora seu tom é paternal. — Você tem preenchido


seus dias o máximo que pode e por um lado isso é
bom, pois seu progresso está assustadoramente
positivo, mas por outro está negando a si mesmo o
tempo do luto e isso é errado. Mas tem sido tão
bom não sentir nada, não é? Parece que nem
aconteceu, e como começou a se enganar que está
em uma fase boa, seu subconsciente vem
mantendo-o cada vez mais ocupado, criando cada
dia mais afazeres que acredita serem inadiáveis.
Mas a única coisa inadiável aqui agora é você,
filho.
Eddy me envolve em um abraço apertado e
pela primeira vez em meses parece que respiro de
verdade.
— Vai lá, abra o quarto e depois
conversamos mais, ok? — Concordo com um aceno
e sigo até a porta trancada.

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Erro três vezes antes de conseguir encaixar


a chave na fechadura. Quando a porta se abre, o
cheiro do meu pai invade meus sentidos e as
lágrimas descem sem controle, fecho os olhos e
juro que ainda posso vê-lo deitado em sua cama,
nos últimos dias seu sorriso era sempre presente e
me lembrar dele neste momento me traz um aperto
no peito. Ele parecia estar em paz com sua decisão
e disposto a passar cada segundo dos seus últimos
dias amando seus filhos e foi exatamente o que fez.
Forço meus pés a seguirem em frente, abro
as duas janelas e o vento entra, uma brisa suave
toca a minha pele como um carinho do universo.
Me apoio no parapeito da janela e encaro o céu,
inspiro profundamente e uma paz que não sentia há
meses se instala em meu peito. É como se entrar
aqui enfim tirasse todo o peso que estava
carregando e agora tudo o que sinto é paz.

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O cheiro de café me alcança e em segundos


Eddy aparece ao meu lado me estendendo uma
caneca.
— Guarde aquilo que foi bom e dispense o
que restar. — Não entendo o que suas palavras
querem dizer, portanto continuo calado. — Os
aprendizados, as memórias felizes, os sorrisos, os
conselhos, guarde tudo isso em seu coração, os dias
difíceis no ápice da doença, quando ele pediu que o
deixassem partir, todas essas roupas e objetos. —
Gesticula indicando o quarto. — Desfaça. Só
depois que se livrar de tudo aquilo que não vai
acrescentar nada no seu futuro é que vai conseguir
realmente se sentir bem, só aí a sensação de estar
feliz será verdadeira e não uma máscara criada para
evitar a vida.
Bebo meu café e digiro o que disse. Não
acredito que eu esteja me enganando, tenho mesmo

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vivido bons momentos e meus dias estão cheios


porque precisa ser assim para que eu dê conta de
tudo que tem que ser feito.
— Por que acha que não tem passado muito
tempo aqui? Por que não entrou neste quarto e
desfez das coisas do seu pai antes? — Vejo-o andar
em volta e começar a dobrar algumas roupas que
estão sobre a poltrona perto do guarda-roupa.
— Como falei, muitas vezes saio da
faculdade e vou para a Ayla, quando não estou com
ela estou com os meninos ou então trabalhando,
não tem sobrado muito tempo nem para descansar.
— Estou começando a ficar irritado com essa
conversa que não parece chegar a lugar nenhum.
— Se estivesse em aula e minha filha te
ligasse dizendo que precisa urgente de você, o que
faria?
— Iria até ela, claro.

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— Esse é o ponto, prioridades, filho. Temos


que saber definir as nossas e o nosso bem-estar
espiritual tem que vir sempre em primeiro lugar,
tem que enfrentar seus próprios fantasmas antes de
qualquer coisa para só então conseguir priorizar as
outras partes da vida. — Eddy sai do quarto e
permaneço parado no mesmo lugar, ele volta em
seguida com vassoura, panos e um balde com água.
— Responda com a primeira coisa que vier a sua
cabeça: se pudesse estar em qualquer lugar agora,
onde estaria?
— Com a Ayla.
— E se ela dissesse que só voltaria a vê-lo
depois que se resolvesse consigo mesmo?
— Eddy, por favor seja claro comigo.
Minha cabeça está doendo e tenho tantas coisas nas
quais preciso pensar...
— Você está sendo um babaca estúpido e

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no momento é a última pessoa que eu desejaria


namorando a minha filha, fui claro o suficiente? —
Seus olhos encontram os meus e vejo que está
falando sério, engulo em seco e desvio meu olhar
para a janela. — Está enganando a si mesmo
fingindo que está tudo bem e que já superou a
morte do seu pai, quando na verdade está tudo
trancafiado aí dentro, te corroendo de dentro para
fora, te fazendo agir impulsivamente. Abra as
portas do guarda-roupa, Oliver, se desfaça das
roupas do seu pai, se despeça dessa parte da sua
vida, tire de dentro do seu peito a dor que tem
escondido, grite, chore, destrua algumas coisas, só
não deixe que o luto continue consumindo a sua
essência como tem acontecido. Vou para casa, se
conseguir resolver essa sua parte da sua vida
estaremos te esperando de braços abertos. Mas se
decidir que é fraco demais para sentir o luto e
seguir em frente, esqueça a minha filha.
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Quando ouço a porta da frente bater,


desmorono e caio sobre os joelhos porque no fundo
eu sei que ele só disse as verdades que andei
escondendo de mim mesmo.

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Eu não queria ter corrido para o meu pai


como uma garotinha mimada, mas foi exatamente o
que fiz por saber que ele teria a palavra certa para
me acalmar.
Estive relevando as atitudes do Oliver por
saber que finalizar a faculdade significava muito
para ele, só que depois da nossa pequena interação
pela manhã percebi que sua agenda cheia e
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compromissos inadiáveis que aparecem muitas


vezes do nada, se tratava de algo muito mais
profundo. Assim como ele disse que não queria
brigar eu também não queria e foi por isso que
decidi sair e pedir ajuda.
— Vai ficar tudo bem, Lally. Tenho certeza
que sim. — Júlia tenta me consolar, já faz quase
quatro horas que meu pai chegou e até agora
nenhum sinal de Oli.
Não sei de que forma interpretar essa falta
de notícia, Richard que ainda é novo e não entende
muito de clima, não percebeu que tem alguma coisa
errada, mas Charlie não para de roer as unhas.
— Vou até lá, não suporto mais essa espera.
— Fico de pé e ainda que meu pai ache que o certo
é deixá-lo se resolver sozinho, prometi estar lá para
ele e é isso que vou fazer. — Diga ao meu pai
que... sei lá, inventa alguma desculpa.

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Não espero resposta e saio correndo, dirijo


o mais rápido e prudente possível chegando em sua
casa vinte minutos depois. Tento abrir o portão e
constato que está destrancado, assim como a porta
da frente. Entro com passadas suaves e aguço a
audição notando que está tudo no mais completo
silêncio. Preocupação inunda meu peito e ando
mais rápido para o interior da casa, só quando entro
no corredor que leva aos quartos é que ouço os
ruídos de choro.
Engulo o bolo de angústia que trava a
minha garganta e me aproximo mais da única porta
aberta. Oliver está sentado no chão rodeado de
caixas abertas e roupas espalhadas por todos os
lados.
— Será que ela vai me perdoar por ter sido
tão estúpido? Desde o começo não facilitei nada
para nós e agora, quando tudo estava indo tão bem,

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dei mais essa bola fora. — Vejo-o cheirar algumas


camisas antes de dobrá-las e colocar na caixa mais
perto. — Eu a amo demais, pai, você teria gostado
dela. É inteligente, esperta, linda e o mais
importante, ela ama a mim e aos meus irmãos.
Enxugo as lágrimas que descem e
permaneço apenas o observando, quando fica muito
estranho ficar bisbilhotando seu momento com o
pai, saio e vou para a sala, minha noite mal
dormida e todo o estresse que senti durante o dia
com a sua ausência cobra seu preço e acabo
adormecendo no sofá.

Sinto algo molhado pressionado contra a


minha barriga e uma mão acaricia
ininterruptamente minha perna direita. Abro os
olhos e vejo que são suas lágrimas que estão
molhando a minha blusa.
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— Não quero ter que te pedir perdão nunca


mais, princesa. Eu te amo tanto e tudo o que mais
quero é te fazer feliz, sei que falhei com isso nos
últimos meses e não imagina o quanto me dói ter
essa certeza. — Tento falar e seu indicador
pressiona meus lábios pedindo silêncio. — Minha
conversa com seu pai hoje me fez temer perdê-la e
eu nunca senti tanto medo antes, eu passei esses
dias todos mentindo para mim, me enganando que
estava tudo bem quando por dentro eu estava
estraçalhado. Perder o meu pai levou um pedaço de
mim, descobrir que ele não era realmente meu pai,
ainda que eu tenha pensado que não, me machucou.
Levei um tempo até enxergar a verdade, mas
agora...
— Eu sei, amor. E está tudo bem, você
mesmo me disse que o luto é imprevisível então
nem você poderia ter previsto que tudo isso
aconteceria. O que importa é que está aqui comigo
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agora.
— E é onde vou estar para sempre. — Seu
corpo paira sobre o meu no sofá e no momento que
ele me beija com gosto de café, meu estômago
embrulha. O empurro de cima de mim e quase não
consigo chegar a tempo no banheiro. — Princesa?
Oliver se aproxima e segura meus cabelos
enquanto coloco para fora todo o meu almoço, sinto
uma fraqueza assustadora e me apoio em seus
braços, minha cabeça gira. Quando paro de
regurgitar um pensamento fugaz domina a minha
mente antes que eu apague: com toda a correria dos
últimos meses não me lembro quando foi a última
vez que comprei absorvente.

Aos poucos volto a mim e sinto uma mão


acariciando meu rosto, ouço tudo o que acontece a
minha volta como se estivesse em segundo plano.
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Forço minha voz a sair, mas é inútil minha língua


parece travada e meus membros pesados.
— Fica comigo, princesa. Fica comigo. —
Quero dizer que está tudo bem, que estou aqui com
ele, que o ouço, dentro da minha cabeça eu formo
as palavras, contudo sinto meus lábios travados.
Escuto Oli ligando para o meu pai e para o Sam e
depois sinto sua boca em minha testa. — Pelo amor
de Deus, princesa, não me deixe, não sei o que vai
ser de mim sem você.
Meu corpo é transportado para outro lugar e
ficamos em movimento por algum tempo, acho que
estamos indo ao hospital. Ouço Sam e Oliver
conversando, tento abrir os olhos e não tenho forças
nem para isso. Sua mão se entrelaça a minha e
aperto seus dedos, acho que consigo imprimir
realmente um pouco de força já que Oli sussurra
um “graças a Deus” choroso.

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De tanto tentar me expressar em vão, sinto-


me fraca e tudo fica escuro mais uma vez.

Tem uma mão segurando a minha quando


acordo. Abro os olhos e vejo seus cabelos cor de
areia próximos a minha cintura, entremeio meus
dedos da mão livre neles e Oliver se remexe.
— Graças a Deus, princesa. — Seus olhos
estão vermelhos e inchados, a boca não tarda em
esmagar a minha em um beijo de alívio. — Fiquei
tão preocupado e com medo, Ayla, desculpa ter te
deixado estressada a ponto de passar mal assim.
Abraço-o pelo pescoço e o mantenho perto.
O quão loucas serão as mudanças que
enfrentaremos se aquilo que me ocorreu for
verdade? Estamos juntos a menos de um ano e já
passamos por tantas coisas, será que seremos fortes
o suficiente para lidar com mais essa bagagem?
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— Não foi culpa sua, amor. Na verdade,


acho que foi um pouco mais do que só estresse o
que me fez passar mal. — Seus olhos se tornam
ainda mais preocupados e desesperados. — Calma,
está tudo bem, pode chamar o médico primeiro,
antes que eu fale o que acho que aconteceu?
— Claro. — Sua relutância em se afastar é
nítida na forma que anda de costas até a porta
mantendo os olhos sempre colados em mim. Sorrio
para tranquilizá-lo e acho que consigo
considerando o pequeno sorriso que deixa escapar.
Junto com o médico, alguns minutos depois,
também entram meu pai, Rick e Charlie.
— Como se sente, Ayla? — O dr. Peterson,
leio em seu jaleco, se aproxima e me ausculta
enquanto checa meu pulso.
— Ainda um pouco fraca e com uma leve
dor de cabeça, mas estou bem.

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— Você teve um episódio de hipoglicemia,


já tinha acontecido antes? — Pergunta ao pegar
uma prancheta aos pés da maca e começar a fazer
anotações. Nego e ele rabisca na folha. — Vamos
ter que te monitorar quanto a isso, pode ter sido um
episódio isolado, como também pode ser que esteja
desenvolvendo uma diabetes gestacional.
E com a sua frase tenho a confirmação das
minhas suspeitas. Eu estou grávida!
— Diabetes o que? — A voz do Oli sai duas
oitavas mais alta que o normal e quando o encaro,
seus olhos estão enormes e ele está pálido. Meu pai
no canto da sala tem um sorriso dividindo seu rosto
ao meio, Charlie parece estar se contendo para
pular de alegria e Richard está alheio a tudo, mais
interessado no aparelho desfibrilador no canto do
quarto.
— Diabetes gestacional, é quando o corpo

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não produz insulina suficiente, ou a produz em


excesso. Durante a gestação o organismo da mulher
requer mais insulina porque a placenta produz
glicose extra, com todas as mudanças hormonais
que o corpo passa, é normal que o organismo tenha
dificuldade em regular a glicose.
— Gestação?
— Ah, sua dúvida não é quanto ao que
exatamente é a diabetes, mas sim a parte
gestacional da coisa. Presumo que seja o pai? —
Seu tom bem-humorado me faz rir, Oli continua
sério e cada vez mais branco.
— Pai? — balbucia.
— Ok, pessoal que tal darmos um pouco de
privacidade ao casal? — O médico encara meu pai
e cunhados e todos saem do quarto. — Terá alta em
algumas horas, Ayla, mas como eu disse sairá
daqui com instruções para o acompanhamento da

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glicose e sugiro que procure o quanto antes um


obstetra de sua confiança.
— Obstetra?
Estou começando a ficar preocupada com a
sua inércia.
— Vem cá, amor. — Seus olhos estão em
mim, mas parecem não me ver, seus passos são
incertos e quando chega perto o suficiente ele
desaba na cadeira ao lado da maca. — Você está
bem?
— Nós vamos ter um bebê? — Entrelaço
nossos dedos e pouso nossas mãos na minha
barriga.
— Isso incomoda você? — Minha voz sai
baixa, o medo começando a se infiltrar em meu
interior.
— Não, de forma alguma, só... nós vamos
mesmo ter um bebê? — Suas sobrancelhas estão
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arqueadas e a expressão confusa muda para algo


que deduzo ser felicidade, um brilho diferente
domina suas íris e meu coração acelera. — Será
que estamos preparados para isso? — Diante sua
pergunta, sinto que suas mãos começam a tremer.
— Se não estivermos, vamos aprender a
estar. — Puxo-o para mais perto e o beijo. O beijo
se torna salgado e não sei se as lágrimas são minhas
ou dele.
— Que loucura, meu Deus. — As palavram
saem de encontro aos meus lábios e sua mão que
estava entrelaçada a minha se solta e espalma
sozinha sobre meu ventre. — Eu te amo, mamãe.
— Abafo um soluço, rio e choro ao mesmo tempo
ao ser inundada pelo amor que cintila em seus
olhos, gestos e palavras. — Seja bem-vindo, ou
bem-vinda, meu amor. — Abaixando a cabeça, Oli
beija a minha barriga. Penteio seus cabelos com os

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dedos e ele permanece recostado ali, depositando


centenas de beijos.
— Também amo você, papai. — Devolvo a
declaração e a palavra soa tão doce na minha língua
que eu a repito várias e várias vezes mentalmente.
— Seu pai deve estar explodindo de
felicidade — comenta, sentando-se ereto
novamente, também me sento, deixando as pernas
para fora da maca e ficando bem perto dele — Fala
para mim de novo que é verdade, princesa? Ainda
parece surreal demais...
Deslizo o polegar pela lágrima que risca seu
rosto e encosto nossas testas. Trago nossas mãos de
volta para a minha barriga e sussurro:
— Nós vamos ser pais, Oliver. Nosso amor
é tão forte e lindo que gerou uma outra vida, nós
nos amamos tanto que foi preciso um terceiro
coração nesse relacionamento para poder suportar

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tanto amor.
Por um longo tempo nenhum de nós fala ou
faz nada, ficamos apenas nos sentindo e sentindo
também nossos corações se expandirem de amor
pelo novo pedacinho nosso que começa a crescer
dentro de mim. Quando nossa família entra
novamente, há mais uma rodada de lágrimas, todas
elas de felicidade. E espero que seja somente assim
daqui em diante.
Deito a cabeça no ombro do Oliver e ao
encarar as outras pessoas no quarto não posso
deixar de pensar que eu ganhei a irmã que eu nem
sabia que queria, um anjo da guarda em forma do
amor da minha vida e meu pai ganhou um
companheiro, já que Rick tem feito um bem danado
a ele, e tudo isso em um só pacote de amor.
Suspiro.
Alguns dias difíceis ainda virão, tenho

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certeza, mas no momento tudo o que mais quero é


continuar vivendo este sonho real.

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Foi para ver esse sorriso lindo no rosto da


minha princesa que eu batalhei a minha vida toda.
Vê-la transbordando tanta felicidade faz valer cada
noite de sono perdida, cada hora extra que tive que
fazer até que a empresa desabrochasse.
Um neto.
Eu não sabia que desejava tanto um neto até
Oliver aparecer em nossas vidas, a forma que seus
olhos se iluminavam quando encarava a minha

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menina deixou claro desde o começo que era o


homem destinado a amá-la. E depois de conhecê-lo
a fundo vi que não poderia ter pedido um genro
melhor, não é qualquer pessoa que enfrenta tudo o
que lhe aconteceu e consegue manter o caráter
intacto.
Fico de pé e toco minha taça com o garfo,
pedindo a atenção de todos. Os convidei para um
jantar para que comunicássemos ao restante da
nossa família a chegada do novo membro. E para
pedir algo ao Oli.
— Obrigado a todos por terem vindo. —
Todos respondem e fico alguns instantes encarando
a minha família, engolindo o bolo de emoções que
obstrui a minha garganta. Pigarreio e retomo: —
Hoje eu sou um homem feliz de verdade. Passei a
vida toda enxergando a felicidade nas pequenas
coisas da vida, mas só agora, com todos vocês aqui,

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com a minha filha feliz e vivendo uma história de


amor tão linda e sendo essa mulher incrível que ela
é, é que eu consigo sentir a felicidade plena. Sei
que se eu morrer hoje, morrerei feliz.
— Pelo amor de Deus, pai! — Sorrio para a
Ayla que me encara nervosa. — Pare de brincar
com essas coisas.
— Você ‘tá doente, tio Eddy? — Me
arrependo da brincadeira no momento que a voz
baixa e repleta de emoção do Rick soa, seus
olhinhos brilham de lágrimas que se acumulam. Me
aproximo e o abraço.
— Não, filho. Estou muito bem e pretendo
viver por mais uns trinta anos, no mínimo. — Seu
suspiro de alívio me aquece e me ajuda a ter certeza
sobre o pedido que tenho a fazer ao seu irmão. —
Ayla, Oliver. — Ambos ficam de pé todos os
encaram com expectativa.

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— É com uma imensa alegria que


comunicamos a vocês, nossos familiares, que temos
mais um Stewart a caminho! — Todos aplaudem ao
final de sua frase, minha princesa tem um sorriso
enorme e é possível sentir a felicidade irradiando
em ondas dela.
Fico de lado junto ao Richard enquanto o
casal recebe as felicitações, assim que Júlia, a
última a abraçá-los se afasta, peço que me
acompanhem até a biblioteca. Sou obrigado a
confessar que estou nervoso.
— Está tudo bem mesmo com o senhor,
pai? — Ayla pergunta assim que fecho a porta atrás
de nós, suas mãos avançam para as lapelas do meu
terno e acariciam meu peito depois de ajeitá-las.
Beijo sua testa e me afasto até a cadeira, me sento e
peço que façam o mesmo nas poltronas que ficam
de frente.

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— Está sim, princesa. Só tem algo que


quero falar com vocês e precisa ser particular. —
Oli franze a testa e segura a mão da minha filha.
Ambos parecem nervosos então decido falar de
uma vez: — Estão dando inicio a uma fase
deliciosa da vida de vocês e quero que aproveitem
cada segundo, já adianto que em momento algum
duvidei da sua capacidade como genitor, Oliver e
não quero que enxergue o meu pedido como uma
afronta ao seu caráter ou a sua forma de levar a
vida.
— Estou ficando nervoso. — Brinca e se
senta mais na beirada da poltrona.
— Eu amo os seus irmãos e a você também,
como se fossem meus filhos e tudo o que mais
quero é que sejam felizes. Você deu duro para
terminar a faculdade e tem sido um programador
invejável, trazendo ainda mais prestígio para a

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minha empresa, não há dúvidas de que seu futuro


profissional já está todo trilhado. Novamente quero
deixar claro que não duvido da sua capacidade de
ser o suporte dos meninos. — Sei que estou
enrolando pela forma que os olhos da Ayla se
estreitam, ela sabe que estou nervoso e um pequeno
sorriso se insinua. — Minha vida mudou muito
depois que conheci vocês, Oli, por mais que sempre
diga que minha filha e eu ajudamos muito vocês, o
contrário também aconteceu. — Pigarreio mais
uma vez. — Em vista de tudo o que falei, eu queria
que você me passasse a guarda dos dois.
Seus olhos arregalam e a boca abre em
choque.
— Eu me orgulho muito de tudo que tem
feito por eles, não é qualquer jovem que faria o que
você fez, mas eles tem revezado entre o Sam, aqui
e na Ayla, já que nem na casa de vocês nenhum

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tem ficado e isso não é bom para eles. Não estou


julgando e sei que a correria é precisa, só que aqui
comigo eles terão mais estabilidade. Ainda será
você o responsável por eles, só...
Não sei como explicar a eles que ter
Richard ao meu lado me mantém vivo. Depois que
me afastei da empresa e a Ayla começou a passar
mais tempo por lá, meus dias eram apáticos e não
havia muito sentido em nada, minha vida tinha sido
toda construída em volta da empresa e da minha
filha, eu sabia que o afastamento de ambos era para
o meu próprio bem, porém nem isso fazia com que
me afetasse menos. Foram dois anos com meias
felicidades até que me encontrei naquele garotinho
perdido e vice-versa. Acho que Oliver consegue ler
as minhas palavras não-ditas em meus olhos pois
um imenso sorriso se abre e ele fica de pé, caminha
até o meu lado da mesa e me toma em um abraço.

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— Eu ficaria imensamente feliz em lhe


passar a guarda deles, pai. — É a primeira vez que
ele se refere a mim desta forma, ainda que eu já
tenha pedido que o fizesse há algum tempo. Meu
peito acelera e fungo alto para evitar derrubar
algumas lágrimas. — Espero que saiba que nós
também te amamos, Eddy.
— Muito obrigado, filho. — Ayla se
aconchega do meu outro lado e acaricio sua
barriguinha.
— Me perdoa por não ter notado antes o
quanto eu assumir seu lugar na empresa o afetou.
— Dispenso sua tentativa de absorver culpa com
um estalar de língua. — Sempre soube que queria
um garotinho para te fazer companhia ao invés de
uma princesinha mimada como eu — brinca, me
acertando com o quadril — E agora terá três. —
Completa acariciando o ventre.

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— Três? — Oliver e eu perguntamos juntos.


Ela dá de ombros e abre outro de seus
sorrisos que iluminam a minha vida.
— Eu também tinha minhas surpresas para
esta noite.
— Mas como assim três? E como soube o
sexo? Não estamos só de nove semanas? — Oli
questiona confuso e acho bonita a forma que fala
estamos ao se referir a gestação. Até onde todos
sabemos, ontem Ayla teve a sua primeira consulta
com o obstetra e ainda não tínhamos tido notícias
de como foi.
— Você, Rick e o bebê. Descobri o sexo
através de uma sexagem fetal. E na verdade, pai,
além dos seus três garotos, terá mais uma
princesinha.
De início não entendo, mas quando a ficha
cai, gargalho alto, Oliver empalidece.
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Terei um casal de netinhos!


A emoção nos deixa tão sem palavras que
nem consigo responder a sua brincadeira dizendo
que ela sempre foi o meu sonho mais lindo.

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Hoje faz um ano do melhor dia da minha


vida. Um ano do dia que vi a minha princesa pela
primeira vez, que os meus dias se tornaram mais
bonitos e o meu coração aprendeu o que era amor.
Tantas coisas aconteceram nesses trezentos
e sessenta e cinco dias que se eu for parar para
pensar em todas elas, ficaria louco. Mas fiz um
esforço para me lembrar dos melhores momentos
para poder montar o presente da Ayla.
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Estamos entrando no quarto mês de


gestação e cada novo dia tem sido de descobertas
maravilhosas e uma miríade de novos sentimentos.
Sairmos bem e saudáveis do primeiro trimestre é
mais um dos motivos da comemoração de hoje.
Graças a Deus ela não teve mais nenhum episódio
de hipoglicemia ou chegou a desenvolver a tal
diabetes gestacional.
E porra, vou ser pai de gêmeos! Meu
coração ainda acelera a cada vez que penso nisso,
expande um pouquinho mais a cada vez que toco a
barriga da minha princesa e sinto seus chutinhos.
Nunca achei que fosse possível tamanha felicidade.
— Está tudo pronto, Oli? — Cara que tem
me ajudado no desenvolvimento do meu projeto
pergunta, enfiando a cabeça pela porta da minha
sala.
Agora que me formei divido com Mark a

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gerência da equipe de criação e tenho uma sala


exclusiva. Cara ficou com a que dividíamos e é ela
quem agora toma conta de um estagiário.
— Sim, acabei os toques finais agora. Só
falta upar para a nuvem.
— Ótimo, porque se ainda não viu, já são
sete e meia e você está atrasado para a própria festa
de noivado! — Merda. — Dá logo o fora daqui,
Oli, eu subo o arquivo.
Sigo direto para o estacionamento. Ayla não
me deu um carro, não exatamente, mas decidiu que
precisava de uma minivan agora que estamos à
espera dos gêmeos e me obrigou a ficar com o seu
Rolls Royce alegando que eu comprar outro carro
seria um gasto desnecessário. Como sempre, uma
excelente negociadora. Foi com a sua afiada
capacidade de me vencer nas negociações que me
convenceu a vender a casa que era dos meus pais,

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apliquei tudo numa poupança para o futuro dos


meninos, inclusive a minha parte e agora moramos
juntos.
Ela ainda não sabe de toda a surpresa que
preparei para nós hoje, pedi que me esperasse em
casa, fingi até mesmo que não sabia que dia era
hoje quando jogou algumas indiretas, como por
exemplo me perguntar se eu me lembrava do que
ela vestia no nosso primeiro encontro. Como hoje é
quinta-feira, o dia do nosso jantar semanal com
Eddy e meus irmãos não precisei inventar nenhuma
desculpa para levá-la até lá.
Assim que entro no quarto a encontro
sentada na cama encarando as dezenas de pares de
sapatos à sua frente.
— Estamos no quarto mês e meus sapatos já
não me servem mais — choraminga. Me aproximo
e beijo seus lábios, automaticamente minha mão

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procura sua barriga.


— Os chinelos com pérolas que a Júlia te
deu são lindos e ainda serve. — Pego o par e me
ajoelho diante dela, beijo o peito dos seus pés antes
de acomodá-los nos chinelos. — E combina com a
cor do vestido. — Este é branco e uma fita no
mesmo tom delineia sua cintura, deixando a
barriguinha ainda mais pontuda e linda. Beijo-a
antes de ficar de pé e me dirigir para o banheiro. —
Saio em dez minutos.
Pensei que ela ficaria na cama, mas se
levanta e vem atrás de mim, sentando-se na
banqueta que usa para suas velas aromáticas.
— Acho que poderíamos adiar esse jantar
no meu pai e sair só nós dois, o que você acha? —
Quase conto a verdade ao ver uma sombra de
tristeza encobrir seus olhos. Desvio os meus e
começo a me despir.

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— Prometi ao Rick que ia ajudá-lo com o


dever de casa hoje, princesa. — Seus ombros
encolhem.
— Tudo bem. — Ficamos em silêncio e dou
início ao meu banho, vejo-a morder a ponta do
polegar. — Ah, lembra daquele jantar beneficente
do orfanato que fomos ano passado? Kate está
pensando em promover outro, o que acha de irmos
de novo e desta vez levar um patrocínio maior?
Mordo os lábios para não rir de seu esforço
em tentar me fazer lembrar.
— Acho ótimo.
Mais rápido do que imaginei que seria,
finalizo meu banho e caminho para o quarto em
busca de uma roupa, Ayla vem atrás e pega o terno
branco. Mais uma jogada sua para me remeter
àquela noite.
— Boa escolha, princesa. — Beijo sua testa

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e me visto.
Saímos de casa alguns minutos depois,
quando paro no primeiro semáforo ela bufa.
— Já chega, Oli. Não acredito que não se
lembra que dia é hoje! Te dei dicas o dia todo e até
agora você não deu um pio a respeito. — As mãos
sobem de encontro aos olhos e odeio vê-la chorar,
mesmo que seja por um bom motivo.
— Desculpa, que dia é hoje, Ayla? Minha
cabeça está meio cheia com o trabalho, o que eu
deixei passar? Seu aniversário sei que não é, já que
foi mês retrasado...
— Não é dia nenhum, Oliver. Esquece.
O restante do percurso é feito em completo
silêncio e por todo ele sigo falando a mim mesmo
que estou mentindo por uma boa causa. Estaciono
na garagem da casa do meu sogro e seguro sua mão
antes que ela desça.

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— Está tudo bem, princesa? — Desprendo


nossos cintos e me inclino para o seu lado, deslizo a
mão pelo seu rosto e capturo seus lábios em um
beijo terno.
— Não, hoje faz um ano que nos
conhecemos, amor. E você não se lembrou, sou tão
insignificante assim para você? — Sei que são os
hormônios falando e que não é verdade, mas suas
palavras me fazem sentir mal.
— Eu te amo, Ayla. Não há nada no mundo
que signifique mais para mim do que você e nossos
filhos. — Engulo em seco e desço do carro, abro a
porta para ela que desce e me ignora, caminhando
direto para a entrada.
Corro atrás dela e a intercepto antes que
entre.
— Muito, princesa. Te amo muito. —
Sussurro antes de eu mesmo abrir a porta, assim

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que ela dá o primeiro passo para dentro, I Don’t


Want To Miss A Thing do Aerosmith começa a
tocar e na maior parede da sala, o projetor mostra
as imagens do anime que fiz sobre nós.
Seu avatar é uma princesa barrigudinha e o
meu, um cara comum num terno branco. Sua mão
procura a minha enquanto a outra cobre a boca,
surpresa. A abraço pela cintura, Ayla mal nota que
todos nossos amigos e familiares estão em volta, os
olhos concentrados apenas na parede onde nossos
bonequinhos estão no jantar beneficente do
orfanato.
— Ah, Oli! — Chora quando a animação
muda para o nosso piquenique na praia e segue
numa sequência engraçada e bonita dos nossos
melhores momentos juntos.
— Acredite em mim quando digo que é a
maior importância da minha vida, princesa. —

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Beijo sua bochecha e acaricio nossos filhos que se


agitam sob a minha palma.
Na projeção agora estamos no hospital, no
dia que descobrimos a gravidez. Em seguida, a
noite em que seu pai pediu a guarda dos meninos e
ela nos contou que teríamos gêmeos. A sala
explode em risos quando meu avatar desmaia
depois da descoberta. Quando a cena muda, imito o
vídeo e me ajoelho, tiro do bolso o anel de platina
estilo tiara de princesa, a música diminuiu e todos
os olhos se voltam para nós. Os seus olhos, que são
os únicos que importam para mim, estão marejados
e brilhantes.
— Há alguns meses falei que não estava
preparado para ser o marido que você precisa,
porém, a cada segundo ao seu lado eu descubro que
com você eu sou capaz de tudo. — Seguro sua mão
direita e tiro o anel que tinha te dado naquela

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ocasião. — E afinal, o que é a vida senão uma


sucessão de surpresas que nos mostram o quão
fortes podemos ser e o quão longe podemos
chegar? — Coloco o novo anel na pontinha do seu
dedo e encaro seus olhos. O azul das pedras de
safira que enfeitam a tiara ganhando destaque em
sua pele branca. — Hoje faz exatamente um ano
que nossos olhares se cruzaram pela primeira vez,
um ano que o amor fez morada em meu peito e não
poderia haver um dia melhor para que eu te
perguntasse: quer ser minha esposa, para sempre,
princesa?
Soluçando e chorando, Ayla sussurra “sim”
e termino de deslizar o anel no seu dedo. Fico de pé
e a beijo, seus braços envolvem meu pescoço e só
interrompo o beijo por causa do seu choro.
— Você não esqueceu.
— Nunca poderia me esquecer deste dia,

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princesa. — Encosto minha testa na sua, na tela a


animação continua, depois do pedido de casamento
montei cenas aleatórias que nos imagino vivendo
de hoje em diante.
— Eu amei a surpresa, os vídeos, o pedido.
Amei tudo, Oli. — Enxugo suas lágrimas e acaricio
seu rosto. — Você foi a melhor surpresa que a vida
poderia ter me dado, você e as nossas sementinhas.
— Nossas mãos se juntam sobre seu ventre e
começamos a dançar ao ritmo da música que
alguém coloca. — Eu te amo, Oliver Damien
James.
— Não mais do que eu amo você, Ayla
Madison Stewart.

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Ouço as risadinhas, mas continuo de olhos


fechados esforçando-me para não rir também.
— Você vai acoda o papai antes da hora,
Chloe! — Otávio sussurra e juro que ainda de olhos
fechados consigo ver a minha garotinha revirando
os olhos, hábito que herdou da tia Júlia, as
mãozinhas na cintura e os pezinhos batendo no
chão diante a reprovação do irmão.
— Você que vai se fica bigando comigo

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alto desse jeito — retruca e sou obrigado a morder


os lábios para conter a risada.
— Já estamos prontos, queridos? — Ayla
intervém falando baixinho, ouço-os concordarem
com um “anhan” e tenho certeza que estão
balançando efusivamente suas cabecinhas.
Tenho decoradas em minha mente e coração
cada pequena mania desses dois.
O barulho dos pezinhos caminhando até a
cama soam e continuo imóvel. Sinto o colchão
afundar ao meu lado e quatro mãozinhas começam
a acariciar meu rosto.
— Papai — chamam em uníssono. Pisco
algumas vezes e estico os braços, simulando um
perfeito despertar. Os olhinhos me encaram
ansiosos e o sorriso que abrem provocam o meu. —
Feliz aniversário! — gritam e pulam sobre meu
corpo, abraço-os junto a mim.

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Olho para o lado direito da cama e encontro


Ayla parada ali segurando um bolo em uma
bandeja recheada com o nosso café da manhã. Seu
sorriso aquece meu peito e desocupo uma das
mãos, chamando-a para se juntar a nós.
— Parabéns, amor. — Ganho um beijo
rápido e em seguida mais alguns, esses dos nossos
filhos.
— Muito obrigado, papai ama vocês
demais. — Beijo-os de volta e seguindo as ordens
da mamãe, nos sentamos e tomamos café da manhã
na cama.
Mesmo que Otávio e Chloe estejam com
três aninhos, em alguns dias ainda parece surreal
acreditar que hoje tenho a minha própria família.
Nunca imaginei que fosse possível se ver
totalmente rendido por dois seres humanos tão
pequenos.

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Quando as crianças pulam da cama e


correm para se arrumarem para o dia, beijo de
forma certa a minha esposa, que se derrete toda sob
mim. Suas mãos agarram meu cabelo com força e
intensifico um pouco mais o contato dos nossos
sexos.
— Quero você, Oli — pede, descendo as
mãos para a minha cueca e se livrando dela com
uma rapidez impressionante. Nos afasto e corro
para trancar a porta, ao voltar vejo-a tirando a
própria calcinha e se abrir toda para mim. Envolvo
meu pau com a mão esquerda e o bombeio algumas
vezes antes de me deitar novamente sobre ela.
— Melhor presente de aniversário, você
toda aberta e molhada assim, princesa. — Suas
unhas cravam nos meus braços quando empurro de
uma só vez para dentro. A boca encontra abrigo no
meu ombro para abafar os gemidos. — Grita,

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princesa, foi para que você pudesse gritar enquanto


eu te fodo que escolhemos paredes a prova de som,
lembra? — Seus olhos brilham ainda mais de
prazer com as minhas palavras, Ayla sobe de
encontro às minhas estocadas e aperta cada vez
mais forte meu braço. Afasto um pouco a parte de
cima dos nossos corpos e quando se vê livre, a boca
solta os gemidos que tanto amo, apoio os joelhos na
cama e beijo seu colo, os seios deliciosos saltam a
cada estocada. Amparo sua cintura com as mãos,
deixando-a imóvel para mim e acelero o ritmo.
— Mais rápido — geme, manhosa. Chupo
dois dedos e os levo até seu clitóris, desferindo
círculos lentos ao sentir seu orgasmo chegar mais e
mais perto. Seus olhos se fecham e ela grita alto
enquanto goza. Volto a deitar sobre seu corpo e
beijo calmamente seus lábios quando meu próprio
gozo começa a se formar, Ayla acaricia minhas
costas e corresponde ao beijo, me envolvendo com
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braços e pernas.
— Eu amo você, princesa — balbucio
languidamente perdendo-me na névoa do prazer.
Mantenho o ritmo lento e constante até que não
resisto mais e me liberto dentro dela. — Obrigado.
— Selo nossos lábios uma vez mais antes de
desfazer nosso contato.
— Achei que já tínhamos passado da fase
de agradecer por sexo, amor — zomba seguindo-
me para o banheiro. Entramos no box e logo
iniciamos o banho.
— Sabe muito bem ao que agradeci,
espertinha. — Despejo uma quantidade generosa de
shampoo na mão e massageio seu couro cabeludo.
Seus gemidos de contentamento começam a me
deixar pronto para outra.
— E sabe muito bem que tudo o que
fazemos é porque te amamos, bonitinho. — Sua

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vez de me ajudar, as mãos ensaboam todo meu


corpo demorando em lugares que não precisavam
tanto assim de atenção, mas que foi muito bem
recebida. — Ainda não mudou de ideia sobre a
festa?
— Não. Nada de festa. Vamos jantar com
seu pai e só.
— Mas...
— Já falei, nada de festa, princesa. O
dinheiro que seria usado para essa bobeira, doe para
alguma instituição, diga a Júlia para fazer o mesmo,
porque tenho certeza que é ela quem está te
infernizando com esse assunto. Recebi o
planejamento que ela fez a respeito e não é uma
festa o que está organizando e sim um evento. —
Pego uma toalha no suporte e começo a me
enxugar, revirando os olhos ela faz o mesmo.
— Você está fazendo trinta anos, só se faz

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trinta anos uma vez na vida! — Outra coisa que


tenho certeza que foi a Júlia quem disse.
— Toda idade a gente só faz uma vez na
vida, princesa. — Dou um beijo rápido na ponta do
seu nariz e fujo dessa conversa indo para o closet.
Mas ainda consigo ouvir seu rosnado antes de sair
de vez do banheiro.
Estou quase feliz que aceitou o assunto por
encerrado, já que nos trocamos em silêncio, quando
ela entra na cozinha me encarando com grandes
olhos pidões. Estou terminando de ajeitar a
lancheira das crianças, que estão terminando de se
trocar com a ajuda da babá.
— Por favor? Todo ano você planeja uma
festa linda para mim, me deixa fazer o mesmo! É
mais do que justo.
— Só quero curtir a noite com a minha
família, deixa para o ano que vem. E quem te ouve

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fazendo esse pedido até acredita que seria vocês


mesma a organizar essa tal festa. — Batendo os pés
como uma criança mimada, Ayla me deixa sozinho,
rindo. — Depois quer colocar a Chloe de castigo
quando ela faz o mesmo — grito, ainda de costas
para mim, seu dedo do meio fica em riste.
— Não estou te ouvindo, seu chato.
— Mamãe, não pode chama o papai de
chato! — Otávio a repreende, descendo as escadas
de mãos dada com a irmã.
— O papai não é chato. — Chloe completa,
olhando-a de soslaio antes de correr para me
abraçar.
Erguendo as mãos em sinal de rendição ela
desaparece dentro do escritório.
— Vamos para escola, meus amores? —
Comemorando por hoje ser eu a levá-los, eles
correm para a garagem. — Acredito que possa tirar
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o dia de folga, Lana. Eddy vai pegá-los na escola e


vão sair com meus irmãos depois disso, só
confirma com a Ayla, por favor.
No começo fui contra termos uma babá,
mas quando completaram dois anos e começou a
rotina de escola e tudo o mais, acabei cedendo aos
pedidos de Ayla. Lana é uma pessoa incrível e eles
a amam, com a sua ajuda conseguimos controlar
nossos horários, tendo assim mais tempo para ficar
com eles no final do dia.
— Vou falar com ela, obrigada, senhor
James. E feliz aniversário. — Agradeço e acabo
não falando mais nada a respeito do senhor James,
já cansei de pedir que me chame apenas de Oliver,
sempre em vão.
Quando chego no carro, os dois já estão
sentados em suas cadeirinhas, mas os cintos
invertidos. Rindo, ajeito-os e dou um beijo em cada

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antes de sentar no meu banco e dar partida.


— Vocês queriam que o papai aceitasse a
festa de tia Júlia? — questiono enquanto seguimos
pelo trânsito. Ambos balançam a cabeça em
concordância, mas vejo pela expressão em seus
rostos que essa não é a resposta que realmente
querem me dar. — Vamos lá, o que eu já falei?
Nada de mentir para mim, não importa o que a Júlia
tenha prometido a vocês.
Otávio que é o puxa-saco da Júlia, já que é a
sua madrinha, olha a irmã sério, emitindo em seu
olhar o pedido para que ela fique quieta. Minha
princesinha encolhe os ombros e vejo seus olhos
brilharem de lágrimas mal contidas por estar
escondendo algo de mim.
— Ela pometeu leva a gente no paique de
piscina. — Que vontade de esganar aquela maluca.
E nem sei por que diabos ela está fazendo

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tanta questão dessa maldita festa. Sua vida de


casada está tão monótona a este ponto?
— Não chora, princesa. Está tudo bem,
você não fez nada de errado. — Toco seu pé
tentando acalmá-la, ela funga e esfrega os olhinhos.
— Vou levar vocês ao parque de piscina no final de
semana, tudo bem? Mas só se parar de chorar. —
Mordendo o lábio inferior para que ele pare de
tremer, Chloe concorda com um aceno. Tão
manhosa quanto a mãe. Já o meu garoto cruza os
braços emburrado por ter tido seu segredo revelado
e segue em silêncio até chegarmos na escola. —
Vem cá, Otávio.
Meu tom o deixa em alerta, os bracinhos
caem ao lado do corpo e um olhar arrependido
domina suas íris.
— Nada de ficar bravo com a sua irmã, já
cansei de falar que não deve aceitar as propostas da

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Júlia. — Pego seu queixo e o faço me olhar. —


Otávio?
— Me desculpa, papai. Não vô fica bavo
com a imã. — Beijo sua testa e só então tiro Chloe
de sua cadeirinha.
— Boa aula, princesinha do pai. — Seus
bracinhos envolvem meu pescoço e centenas de
beijos são depositados nas minhas bochechas.
— Bom tabalio.
Com um enorme sorriso dividindo meu
rosto ao meio, assisto os dois darem as mãos e
seguirem para a fila de sua turma. Toda a paz que
estava dominando o carro com meus filhos dentro
dele é substituída quando dou partida e sigo rumo a
empresa. Júlia hoje vai escutar algumas verdades,
chega de tentar passar por cima da minha palavra e
da minha esposa perante nossos filhos.

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Não tive um segundo sequer ocioso para


conseguir falar com a Júlia. Cara e eu gerenciamos
o setor de criação agora, além do nosso pequeno
negócio paralelo de criação de vídeos-animes.
Depois do meu pedido de casamento, aquele vídeo
que fiz para a Ayla viralizou e hoje trabalhamos
produzindo vários naquele estilo, para qualquer tipo
de comemoração.
São quase quatro da tarde quando ela entra
na minha sala.
— Só me escuta — pede ao fechar a porta e
caminhar até a cadeira de frente para a minha mesa.
Por não querer esgotar a minha paciência já quase
inexistente, acato seu pedido. — Essa é uma cópia
do convite da sua festa. — Um papel grosso é
jogado sobre a mesa, não o pego, continuo
encarando-a. — Tá, que seja, não quer olhar eu
falo, os convidados serão instruídos a fazer uma

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contribuição para uma instituição da sua escolha, é


só montar a lista que vou colocar no site de
confirmação de presença. Este é o seu presente.
— Júlia, eu não quero festa. — Mas sou
obrigado a confessar que a sua ideia é boa.
— Por favor, é o primeiro evento que estou
organizando, estou querendo fazer carreira nessa
área, me ajuda a ver se sou mesmo capaz. — Ah,
droga, como dizer não a isso?
— Tudo bem, — antes que eu fale mais
alguma coisa, a maluca já deu a volta na mesa e
está me abraçando.
— Eu te amo, Oli! Você é o melhor primo
intruso do mundo. — Beija a minha bochecha e
caminha para a porta. — Não esquece de montar a
lista e me enviar ainda hoje.
Respiro fundo quando fico sozinho. A
bendita festa será no sábado e não sei, talvez esteja
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ficando velho, mas não tenho tido muito ânimo


para toda essa coisa de socializar. Uma noite
tranquila com Ayla e os meninos é tudo o que
anseio para o meu final de semana.
Dispenso os pensamentos a respeito do
sábado e me concentro nos testes finais do software
que temos que entregar amanhã. Algum tempo
depois alguém bate na minha porta e peço que
entre, o sorriso da Hillary é enorme quando me
entrega um terno na embalagem da lavanderia.
— Ayla pediu que lhe entregasse isso.
— Obrigado. — Agradeço ainda que esteja
confuso, hoje ela trabalhou de casa, está dividindo
a presidência com o pai, cada mês um trabalha
fisicamente aqui na empresa e este mês Ayla tem
ficado em casa e o nosso combinado para hoje era
que eu iria buscá-la para irmos jantar com Eddy e o
resto da família.

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— E isso. — Me estende um tablet. — Feliz


aniversário, Oliver.
Pensei em agradecer, mas as palavras
sumiram quando a tela do aparelho acendeu e vi a
logo do Speed Sex seguida da notificação:
Você tem um encontro marcado.

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Não é o mesmo de quatro anos atrás, mas


Oliver ainda veste um terno branco como nenhum
homem consegue. Engulo a saliva que preenche a
minha boca ao vê-lo tão delicioso caminhando em
minha direção.
— Ayla? — Sorrio amplamente ficando na
ponta dos pés e beijando o cantinho dos seus lábios.
— Boa noite, amor. — Seus olhos
percorrem todo meu corpo antes de enfim fixarem-
se nos meus.
— Não íamos jantar com seu pai? —
Entrelaço nossos dedos e nos levo para dentro do
restaurante.
— Sim, mas eles foram ao cinema e depois
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tiveram uma tarde cheia, os pequenos acabaram


dormindo cedo. Meu pai e seus irmãos não se
importaram de eu querer roubá-lo só para mim esta
noite. — Bato meu quadril no seu e Oli solta nossas
mãos para abraçar minha cintura. Os dedos
apertando forte a minha carne.
— Também não estou me importando
nenhum pouco com isso, princesa. — Sussurra no
meu ouvido. — A propósito, sua ideia de usar o
Speed Sex para marcar este encontro me deu
algumas ideias...
Um arrepio gostoso me percorre inteira,
mas disfarço quando o maître nos recepciona.
Somos guiados para dentro, o restaurante é
adequado para reuniões de negócio e possui baias
privadas para tal. Escolhi logo a última para que
não fôssemos incomodados.
— Em alguns minutos traremos as bebidas,

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fiquem à vontade.
Deixo que Oli entre primeiro e me sento em
seguida, subindo com a mão pela sua perna. Deito a
cabeça no seu ombro e ficamos conversando
enquanto esperamos as bebidas, a cada vez que
sentamos para conversar e ele compartilha comigo
as suas conquistas, mais orgulho eu sinto dele.
Estar prosperando em seu próprio negócio e ainda
conseguir ser gerente de criação, marido e um pai
incrível é algo que não consigo entender como ele
faz, mas o amo por conseguir com maestria.
— Quando decidirmos o pedido,
chamamos. — Aviso ao garçom assim que ele nos
serve o vinho preferido do Oli. Quando ele se
afasta, proponho um brinde. — A você, o homem
mais incrível que eu conheço, o pai mais dedicado,
amoroso e presente. O marido mais carinhoso e
perfeito, parabéns pelos seus trinta anos, Oliver. —

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Toco nossas taças e beijo sua boca em seguida, ao


invés de degustarmos o vinho.
Sua mão ampara meu rosto posicionando-
me em um melhor ângulo, o dedão resvala de leve
na minha bochecha em uma caricia deliciosa.
Aproveito que estamos de costas e desço a mão
esquerda até o zíper da sua calça social, assim que
começo a descê-lo, a sua cobre a minha.
— O que está fazendo, princesa? — Nossas
testas estão encostadas e seus olhos possuem um
brilho de pura malícia.
— Combinamos de riscar nossas metas na
brincadeira do “eu nunca”, lembra? Nunca transei
em um local público. — Vejo-o engolir em seco,
tínhamos brincado sobre aquilo, mas no momento
que fiz a reserva neste restaurante pedi essa mesa
reservada exatamente para conseguirmos riscar este
item.

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— Princesa. — A palavra sai em um


sussurro sôfrego diante a sua luta interna entre
ceder e ser sensato. Decidida a tornar a escolha
ainda mais fácil, tiro sua mão de cima da minha e
termino de descer seu zíper e mergulho-a dentro de
sua cueca.
Minha nossa, ele está tão duro! Não consigo
conter o gemido que escapa, Oli o captura com seus
lábios e sei que tomou sua decisão quando uma de
suas mãos descem a alça do meu vestido e os dedos
procuram meu mamilo. Puxo-o para fora da cueca e
o masturbo, o beijo ganha mais intensidade assim
como seus toques ficam mais brutos, ansiosa para
senti-lo logo dentro de mim empurro a mesa um
pouco para frente e me levanto do banco, antes de
me sentar em seu colo, subo meu vestido.
— Caralho, Ayla, saiu de casa sem calcinha
de novo? — Minha resposta é segurar seu pau e

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descer lentamente por ele. — Porra.


Suas mãos apertam minha cintura e me
ajudam na cavalgada. O medo de sermos pegos
deixa tudo mais intenso e não tardo em acelerar os
movimentos, gemendo baixinho no meu ouvido Oli
envolve meus cabelos em punho e puxa minha
cabeça para trás, nossas bocas colidem tão ansiosas
quanto meus movimentos sobre ele. Não demora e
nos desfazemos em um orgasmo alucinante. Antes
que eu tenha tempo de sair de cima dele, ouvimos
passos se aproximando, com uma agilidade ímpar,
desço meu vestido, dou uma ajeitada nos fios
rebeldes e me sento meio de lado, seu pênis
semiereto ainda dentro de mim.
— Já decidiram o que vão pedir? —
Olhando de fora parece apenas que estou sentada
no colo do meu marido, mas o filho da mãe se
remexe acertando um pontinho sensível dentro de

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mim que quase me faz fechar os olhos e gemer.


— Estamos quase prontos para decidir, né
amor? — Seu tom é suave e quando não consigo
responder, ele abafa uma risada no meu pescoço.
— Assim que decidirmos te chamamos.
Consigo ver as bochechas do pobre garçom
ficarem rosadas antes que ele saia, no fim das
contas acho que ele percebeu exatamente o que
estávamos fazendo.
— Você é terrível, princesa. Vamos,
precisamos limpar você antes do jantar. — Ganho
um tapa na coxa como incentivo para ficar de pé.
Respirando fundo me levanto e sigo para o
banheiro que por sorte fica bem perto da nossa
mesa. Oli me limpa com cuidado, sempre com um
sorriso matreiro brincando em seus lábios. —
Adorei este encontro, acho que precisamos marcar
mais vezes. Não tivemos muitos encontros antes de

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casarmos, afinal.
— Concordo. — Salpico um selinho rápido
e voltamos para a nossa mesa. — E para isso acho
que meu marido expert em programação deveria
criar um app só para nós, onde podemos marcar
nossos encontros e especificar detalhadamente qual
será o propósito deles...
— E é por esse tipo de ideia vinda da nossa
presidente que a Stewart continua no topo depois
de tantos anos — brinca, deixando que eu entre
primeiro desta vez. — Posso pensar em algo no
final de semana.
Falar sobre o final de semana me lembra...
— Ainda não te dei seu presente. —
Procuro minha bolsa e tiro dela o envelope que
recebi hoje mais cedo.
— Mais presentes? Já falei que meus
maiores presentes são vocês, princesa.
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— Eu sei. Apenas abra.


Desconfiado ele abre o envelope e vejo seus
olhos marejarem enquanto lê o que diz os papéis.
— Não acredito! É sério? — Não consigo
conter minhas próprias lágrimas quando seus
braços me envolvem.
— Sim, na segunda-feira já podemos levar
o nosso filho para casa.
Há algum tempo vínhamos falando em
adoção, ainda mais depois que começamos a ser
voluntários no orfanato da Kate, cada uma daquelas
crianças possuem um lugar especial em nossos
corações e agora que nossos filhos já estão
grandinhos, é o melhor momento para
aumentarmos a nossa família. Spencer, um lindo
garotinho de nove anos é o mais novo Stewart
James.
— Spencer é só o primeiro, Oli. Vamos
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realizar o seu sonho e dar um lar cheio de amor


para quantas crianças mais conseguirmos.
Seus lábios voltam a me beijar e tudo o
mais deixa de ter importância neste instante. Tudo
o que importa é a nossa família, o nosso amor que
nunca vai parar de crescer.

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Chloe entra no meu quarto com os braços


cruzados sobre o colo e os olhinhos marejados.
Quando me vê calçando os sapatos, descruza os
braços e corre para o meu colo abrindo o berreiro.
Seus soluços cortam meu coração.
— Ei, princesinha o que aconteceu? —
Escondendo o rosto no meu pescoço ela só chora,
confiro seu corpo para ver se não há nenhum
machucado e não encontro nada.
Em instantes Ayla aparece na porta e pela
sua expressão sei que Chloe quer algo ao que ela
disse não. Minha esposa sempre carrega um olhar

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de culpa quando diz não a um dos nossos filhos,


como se lhe doesse dizer a pequena palavra.
— Se não falar com o papai, não tem como
eu te ajudar, filha. — Seguro seu rostinho em
minhas mãos e ela funga alto, os olhinhos
amendoados e cor de mel iguais ao da mãe tocando
a minha alma com tanto amor.
Antes de voltar minha atenção para a
preciosidade nos meus braços, vejo Ayla negar com
a cabeça antes de sair do meu campo de visão.
— Quelo o vitido de pincesa, mas a mamãe
disse que não é festa de fantasia.
— Oras, mas a festa é minha e eu digo que
a minha princesa tem que ir vestida como uma
princesa! — Um enorme sorriso desenha seus
lábios e os braços agarram meu pescoço, juro que
já consigo ver a reprovação nos olhos da Ayla
quando eu levar a nossa pequena para se trocar.

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Mas caramba, que mal há em Chloe usar um


vestido de princesa? E qual o sentido de eu aceitar
essa maldita festa se a minha filha não pode ir
vestida como quer? — Vamos lá que ainda preciso
polir a sua coroa. — E me preparar para acalmar a
sua mãe, mas isso guardo só para mim.
Ainda com ela em meu colo nos levo até o
seu quartinho. Hoje moramos em uma casa que
compramos juntos quando os bebês fizeram um
aninho e eu já podia arcar com os gastos, até lá
moramos no apartamento que Ayla dividia com a
Júlia. Cada um tem seu próprio quarto e
encontramos minha linda e muito brava esposa com
um vestido de festa nos braços nos esperando.
— Venha se trocar, Chloe. — Seus olhos já
deixam claro que não devo me intrometer. Dou de
ombros deixando claro que já é tarde.
— Sabe, tudo o que eu queria hoje era ficar

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de bobeira em casa, tendo a minha princesinha


saltitando para lá e para cá alegrando a minha noite.
— Ando até a cama e as sobrancelhas de Ayla
eriçam quase juntando-se aos cabelos. — Mas
então fui coagido a aceitar uma festa de aniversário.
— Agora ela bufa. — Então se a minha princesa
não pode ficar em casa com o seu lindo vestido,
porque terá que acompanhar o papai a esta tal festa,
obviamente ela irá com o seu melhor vestido de
princesa, já que precisa deixar claro para todos
quem ela é. — A risadinha gostosa da minha filha
provoca a minha.
— Pelo amor de Deus, Oliver! — Mas
então a reprovação da minha esposa corta nosso
momento.
— É só uma festa, Ayla. Qual o problema
de ela escolher o próprio vestido e este ser uma
fantasia?

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— A questão não é o tipo de evento, é você


passar por cima da minha palavra e sempre deixar
que ela faça o que quer! — Chloe se encolhe no
meu colo diante o tom alto. Ayla e eu não brigamos
na frente deles, na verdade quase nunca brigamos.
Conversamos e expomos as nossas divergências até
entrarmos em um consenso, essa é a primeira vez
que o fazemos na frente dela e isso a está
assustando. — Vai ficar com seu irmão e a Lana,
Chloe. — Seus braços me apertam ainda mais
apertado.
— Vai lá amor meu. Papai já te busca para
colocar o vestido. — Beijo sua testa para
tranquilizá-la e sorrio, ainda com os olhinhos
atentos na mãe, ela fica de pé. Eu a acompanho até
a porta e a fecho depois que ela sai.
— Não é a primeira vez que você faz isso.
Passa pela sua cabeça que a cada vez que falo não e

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você o rebate com um sim, você tira a porcaria da


minha autoridade como mãe? — Me aproximo e a
abraço, mas Ayla repele meu toque se afastando até
o guarda-roupa da nossa filha, onde com raiva
guarda o vestido que tem nas mãos e joga toda a
coleção de fantasias de princesas sobre a cama. —
Tem horas que penso que eu poderia muito bem ir
embora, já que se viram tão bem sem mim e estou
perdendo todo o respeito dos meus filhos por eles
terem um pai tão legal que nunca sabe dizer não.
Agora percebo pelo seu tom que ela está
chorando. Tiro os cabides remanescentes de sua
mão e os coloco sobre a cama antes de puxá-la,
ainda sob protestos, para dentro dos meus braços.
— O que está acontecendo, princesa? —
sussurro em seu ouvido enquanto suas lágrimas
molham meu ombro.
— Ontem o Otávio não queria vir embora

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da casa da Júlia porque disse que a mamãe é brava


e só briga, hoje a Chloe corre para você assim que
que o “n” da palavra não soa, sou uma mãe tão
horrível assim? — Preciso fazer um esforço
tremendo para não rir. Em alguns meses a TPM da
Ayla é tão severa que não trocamos uma palavra
sequer durante uma semana, em outras a sua
carência é extrema e fazemos sexo até três vezes
por dia. Ao que tudo indica esse mês é uma mistura
das duas versões anteriores, mas para o bem do
meu casamento guardo para mim a minha
descoberta.
— Você é uma mãe incrível, Ayla, é a
melhor que um pai poderia querer para os seus
filhos. — Seus soluços não cessam, seguro seu
rosto como fiz há alguns minutos com a nossa filha
e a faço me olhar. — As crianças amam você, essa
é só uma semana ruim e me desculpa ter falado sim
para a Chloe, mas é só um vestido, ninguém vai se
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importar com que roupa ela estará usando na festa.


— Odeio quando me faz amá-lo ainda mais,
quando estou tentando te odiar — reclama
desviando os olhos de mim. Beijo seus lábios com
carinho.
— Agora vai lá pedir desculpas para a
Chloe, ela ficou assustada quando gritou comigo.
— Enxugo suas lágrimas e a abraço uma vez mais.
— Nunca pense que é menos do que a pessoa mais
incrível deste mundo, princesa. Nós a amamos
muito e se fosse embora, nenhum de nós existiria
mais da mesma forma, é você quem nos guia
diariamente. Você é a nossa inspiração.
Ainda ouço suas fungadas quando ela sai do
quarto. E me pego pensando que daqui a alguns
anos terei duas feras de TPM para lidar. Estremeço
com a perspectiva.
— Pronta para se transformar em uma linda

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princesa? — Com uma determinação que só


costumo ver nos olhos da minha esposa quando ela
está prestes a fechar um grande contrato, Chloe se
aproxima com as mãozinhas na cintura e me olha
séria.
— Acho que mudei de ideia, papai. Quelo o
vitido igal o da mamãe. — Sorrio amplamente para
ela e a deixo livre para fazer a sua escolha, na porta
os olhos da Ayla ainda vertem lágrimas, mas essas
são claramente de orgulho e felicidade.
E só então noto que o seu vestido é longo,
as mangas curtas e com bordados de borboletas em
brilhantes na frente da saia. A cor marsala acentua
a beleza da sua pele e dos seus olhos, é só um dos
vários modelos que comprou na versão “mãe e
filha”. Otávio e eu também temos lá as nossas
peças combinando e sorrio ainda mais ao ver que
ele está usando uma calça cargo bege com a camisa

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branca com estampa do justiceiro. Apenas nossos


sapatos são diferentes.
— Agora podemos ir para a festa? —
questiono quando Ayla termina de ajeitar os cachos
dourados da nossa princesa. Sair de casa nunca
tinha sido uma batalha tão árdua, o que apenas
acentua a minha recusa a esta noite.
Todos concordam e saímos em seguida.
Lana nos acompanha, mas esta noite é apenas uma
amiga. Acho bonito o laço de amizade dela com a
minha esposa. Quando viramos na esquina que dá
para o salão que Júlia alugou meu maior desejo é
fazer o retorno e ir para a casa, não consigo nem
mensurar por alto a quantidade de carros
estacionados ao longo da avenida o que significa
que o estacionamento já está lotado.
Engulo uma série de impropérios e diminuo
a velocidade procurando um lugar para estacionar.

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— Jú acabou de mandar mensagem, sua


vaga está garantida no estacionamento do lado de
lá. — Ayla instrui e sigo para onde informa.
Ao chegarmos na porta de entrada somos
parados por fotógrafos e jornalistas. Sim,
fotógrafos e jornalistas na minha suposta festa de
aniversário.
— Oliver James, você tem sido um nome de
peso no mercado atual de softwares e aplicativos,
como concilia a vida profissional de sucesso com a
pessoal? — Um deles enfia o gravador no meu
rosto ao fazer a pergunta.
— Minha esposa é a minha rocha, a minha
bússola. É por ela e com ela que consigo conciliar
tudo. E você falou errado, cara, concilio a minha
vida pessoal de sucesso com a profissional. —
Algumas risadinhas se fazem ouvir e pisco para o
jornalista que me encara curioso. Otávio no meu

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colo sorri abertamente para os fotógrafos que não


param com suas câmeras.
— E como é ser pai de gêmeos? Como você
e sua esposa dão conta de manter o império Stewart
e ainda ter tempo para os filhos? — Dessa vez é
uma moça que me aponta seu gravador. Abraço a
cintura da minha esposa e Chloe se inclina para que
eu também a pegue. Agora é Ayla quem me abraça
pela cintura enquanto eu amparo nossos dois
pequenos.
— A minha esposa também é a resposta
para essa pergunta. Desde que a conheci, Ayla
sempre foi e sempre vai ser a minha inspiração. E
quanto darmos conta de manter a empresa e a nossa
família, isso é amor. Se você o coloca em tudo o
que faz, com certeza terá grandes resultados. Agora
se me dão licença, preciso comemorar os meus
trinta anos com os amores da minha vida.

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— Affe, a mulher quase se tornou uma poça


de feromônios aos seus pés! Por que tem que ser
tão cativante assim? — implica enquanto seguimos
caminho para dentro do salão.
— Porque sei que a minha esposa gosta —
sussurro e ganho um selinho.
— Eca! — Nossos filhos gritam ao nosso
contato. Para atentá-los, Ayla os enche de beijos
também.
— Quem é que chega atrasado para a
própria festa de aniversário? — Júlia chega toda
atrapalhada com uma prancheta em mãos, os
cabelos revoltos de quem andou passando a mão
por eles uma centena de vezes.
Antes que nós a cumprimentemos, somos
arrastados para a nossa mesa onde Sam, Eddy e
meus irmãos (e cunhado!!!) já estão sentados.
Chloe e Otávio saltam do meu colo para o do vô e

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sou sugado para dentro do abraço apertado da


Charlie.
— Parabéns de novo, maninho! — Inalo o
seu perfume e a aperto ainda mais. Me orgulho
muito da mulher que ela tem se tornado.
— Obrigado, pingo de gente. — Isso a faz
revirar os olhos.
— Dá para parar com esse apelido? Parece
que você e o Sam fazem de propósito quando o
Kenny está por perto, nem o papai implica tanto
assim com o coitado! — Beijo sua testa quando se
afasta e o tal cara com nome de rapper fica de pé
para apertar a minha mão.
— Como estão as coisas, Kenny? Espero
que esteja mantendo as mãos em lugares
apropriados... — O moleque engasga antes de
responder:
— É claro, senhor. — Charlie revira os
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olhos antes de voltar a sentar e Eddy engole uma


risada ao me ver aterrorizando o pobrezinho. E na
verdade eu gosto dele, é um cara decente e parece
fazer a minha irmã feliz, para mim isso é o que
importa.
— Queria ter feito esse terror todo em cima
de você quando foi a sua vez com a minha princesa,
Oli. — Expressa quando me sento. — Pode voltar a
respirar rapaz, é a mim a quem você deve
explicações de onde anda essas suas mãos.
Agora eu quem gargalho. Sam dá um tapa
no ombro do Kenny e me zoa:
— E que porra é essa de senhor? Tá
aceitando que virou um velho babão agora? —
Todos nós o repreendemos pelo palavrão na frente
das crianças. Ainda que seja em vão, ele nunca
muda esse seu jeito de cinco palavras dois
palavrões. — Ah esqueci, caralho.

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Acabo rindo quando ele olha para Chloe e


finge passar um zíper nos lábios. Rick se senta ao
meu lado e enquanto todos iniciam um bate-papo
para se colocar a par da vida do outro, converso
com meu irmão.
— Na segunda o Spencer vai vir morar
conosco. — Seus olhos brilham, sei que ama muito
estar com Eddy, mas já deixou claro o quanto
queria uma, que ele não me ouça falando essa
palavra, criança da sua idade para brincar.
— Que maneiro! Ele vai estudar comigo? E
vai poder passar algum tempo na casa do pai? —
Ninguém nunca vai entender a paz que me dá ao
vê-lo consegui chamar meu sogro de pai sem
remorso brilhando em seus olhos.
— Sim para as duas coisas. Mas de primeiro
instante vamos passar mais tempo com ele lá em
casa até que se acostume com a casa nova, se quiser

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ir ficar uns dias com a gente também seria legal e ia


ajudá-lo na adaptação.
Ele nem me responde, corre logo para tentar
dividir a atenção do Eddy com meus filhos e lhe
fazer o pedido de ficar uns dias na minha casa.
— Está na hora do discurso, Oli. — Júlia se
aproxima da nossa mesa e me puxa consigo. — Em
alguns minutos será servido o jantar, também
organizei um leilão para arrecadarmos mais
doações...
— E vai leiloar o que? Até agora não vi
nada que possa ser leiloado aqui. — Um dia eu
aprendo a não me surpreender com as ideias
mirabolantes dessa maluca, mas não será hoje.
— Solteiros. Cara me ajudou semana
passada com um algoritmo não sei do que, onde
lançamos um site para procurarmos alguns solteiros
disponíveis para levar algumas belas senhoras para

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jantar. Acabou que ela conseguiu, usando um


pouco da persuasão do nome Stewart, que vários
usuários do Speed Sex se inscrevesse, os jantares
serão bancados com uma porcentagem dos lucros
do app.
— Acho que você leva mesmo jeito para
essa coisa de organizar eventos...
— Sou foda em tudo o que me disponho a
fazer, priminho. — Ela aperta as minhas bochechas
quando chegamos ao pequeno púlpito montado. —
Agora vai lá e diz isso para todas essas pessoas.
Rindo, toco no microfone para testá-lo.
— Boa noite, pessoal. — Ao som da minha
voz, Chloe escapa dos braços do avô e corre para
perto de mim. Pego-a no colo e um coro de “awnn”
se faz ouvir pelo salão. — Quero agradecer a todos
que compareceram a este evento, quer dizer a
minha festa de trinta anos! — Todos riem. — Mas

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em especial, quero agradecer a minha prima postiça


por ter organizado tudo isso sozinha. Júlia, sei que
muitas vezes nós a rotulamos como doida,
desmiolada e mais um monte de adjetivos
semelhantes, mas a verdade é que nenhum de nós
estaríamos aqui, literalmente, se não fosse você. —
Vejo-a enxugar os olhos e sorrir amplamente.
— Eu amo a tia Xú. — Chloe fala baixo,
mas o som é amplificado pelo microfone e mais
uma vez as pessoas emitem risadinhas e suspiros.
— É, nós te amamos, tia Júlia. Muito
obrigada por ter me dado o melhor presente da
minha vida e não estou falando desta festa. —
Pisco para ela, que sabe bem que estou falando
sobre ela ter convencido Ayla a se cadastrar no
Speed Sex. — Agora vamos a parte mais importante
da noite, os números, minha gratidão pelas doações
que fizeram é imensurável. Ao todo foram

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arrecadados oito milhões! — Aplausos soam e


encaro Júlia verdadeiramente admirado, uma ponta
de remorso se insinuando por eu ter sido tão avesso
a esta festa desde o começo. — E ainda temos o
leilão, então galera, bora abrir as carteiras e fazer o
bem! Mais uma coisa, anotem o contato da Júlia
Stewart e a procurem para assessorar seu próximo
evento.
Me afasto do púlpito sendo ovacionado e
parabenizando enquanto caminho de volta para a
minha família. Mas no caminho paro e puxo a
doidinha para um abraço.
— Obrigado mesmo, Jú. Significa demais
toda essa arrecadação. — Ela dá de ombros, como
se não fosse nada. — E você significa demais para
nós.
— Ah, Oli, para! Meus hormônios estão
todos descontrolados ultimamente... — Ao som das

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próprias palavras seus olhos se arregalam. —


Aimeudeusaimeudeusaimeudeus...
— Parabéns, mamãe. — Felicito enquanto
ela ainda parece em choque pela possibilidade.
Chloe me olha confusa por chamar a tia de mãe, já
a Júlia corre para os braços do marido.
Continuo seguindo para a nossa mesa com
um enorme sorriso estampado no rosto, assim como
a sensação de plenitude que se espalha
vagarosamente por mim ao ver minha família
reunida e feliz depois de tantos momentos difíceis.

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Jay – Estrelando o Amor, livro 1


Take 2 – Estrelando o Amor, livro 2
Jess – O passado por trás das cenas
Luke – Conto da Trilogia Estrelando o Amor
Remake – Conto da Trilogia Estrelando o Amor
Prazer em conhecê-los
Um louco prazer
Gostosuras e Travessuras
Apenas um
Negócio Fechado!
Novos Termos – Spin-Off Negócio Fechado!
Em nome do prazer

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