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21/09/2016 Reconsiderando o Aniquilacionismo Evangélico ­ James I.

Packer

Reconsiderando o Aniquilacionismo Evangélico


Uma Análise do Pensamento de John Stott sobre a Não­Existência do Inferno

por

James I. Packer

O evangelicalismo é definido de várias maneiras por diversos tipos de


pessoas. Eu o defino como a religião dos crentes da Bíblia Trinitariana que
se gloriam na cruz de Cristo como a única fonte de paz com Deus e buscam
compartilhar a sua fé com os outros; e eu noto que o evangelicalismo
ocidental (para não irmos mais adiante), como o liberalismo protestante, o
catolicismo romano de toda espécie, e o ortodoxismo oriental, tem um
padrão propriamente seu. Dentre os fatores que formaram esse padrão
durante os últimos cinqüenta anos incluem‐se o ensinamento dogmático,
devocional, apologético e ativista ministrado nas igrejas evangélicas e em
movimentos paraeclesiásticos; a literatura (livros, jornais, revistas)
produzida pelos evangélicos; a sensação de uma fidelidade superior à
Bíblia, seu Deus e seu Cristo, que as instituições evangélicas cultivam; uma
sensação de estar sendo ameaçado pelos enormes batalhões do
protestantismo liberal, catolicismo romano e instituições seculares, que os
leva a vociferar quando esses fundamentos ideológicos são discutidos; a
obstinação por um evangelismo atuante; e o costume de transformar
estudiosos e líderes em gurus, de onde surge um sentimento de ultraje e
traição se percebem que eles estão andando fora da linha. Dentro da
distintiva identidade corporativa do evangelicalismo introduziram‐se uma
consciência de privilégio e vocação, uma mentalidade envolvente e
persistente, a discussão de temas irrelevantes, uma certa violência verbal
e uma tendência de atingir nossos próprios feridos.

Ainda não está claro se o recente restabelecimento da confiança e o


crescimento de uma vida intelectual [1] do movimento estão ou não
amadurecendo esse padrão ainda verde; entretanto, sem dúvida alguma,
os fatores citados acima se tornaram evidentes enquanto os evangélicos
discutiam o aniquilacionismo entre si nos últimos dez anos.

Idéias aniquilacionistas têm sido debatidas entre os evangélicos por mais


de um século [2], mas nunca se tornaram parte da corrente principal da fé
evangélica [3], nem sequer foram largamente discutidas no meio
evangélico até recentemente. Em 1987, Clark Pinnock escreveu um artigo
bombástico de duas páginas entitulado “O Fogo, e Nada Mais” [4], mas
que, apesar de amplamente lido, não provocou maiores discussões do que
uma exposição de quinhentas páginas sobre o assunto: “O Fogo que
Consome” (1982), publicada por Edward William Fudge [5], talentoso leigo
das Igrejas de Cristo. Entretanto, em 1988, surgiram dois curtos trabalhos
de defesa, ambos de veteranos evangélicos anglicanos: oito páginas de
John Stott em “Essentials” [6], e dez do falecido Philip Edgecumb Hughes
em “A Verdadeira Imagem” [7], que puseram o gato no meio dos pombos.

Em uma conferência de 350 líderes em Deerfiield, Illinois, no ano de 1989,


eu li um documento pomposamente entitulado “Evangélicos e o Caminho
da Salvação: Novos Desafios ao Evangelho: Universalismo e a Justificação

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pela Fé” [8]. No documento eu ofereci uma linha de pensamento contrária


à posição desses dois respeitáveis amigos [9]. A reação foi tal que a
conferência se dividiu ao meio sobre a questão da aniquilação. O relatório
da Christianity Today (periódico evangélico) dizia:

“Surgiram fortes desentendimentos sobre a posição do aniquilacionismo,


doutrina que afirma que as almas não salvas deixarão de existir após a
morte... a conferência foi quase que dividida ao meio ao tratar do assunto
em suas declarações, e nenhuma renúncia a essa posição foi incluída na
resenha final da conferência”. [10]

Depois disso, a pedido de John White, então presidente da Associação


Nacional de Evangélicos, o falecido John Gerstner escreveu uma resposta a
Stott, Hughes e Fudge sob o título “Arrependei‐vos ou Perecereis” (1990)
[11]; e em 1992 os documentos apresentados na quarta Conferência sobre
Dogmas Cristãos de Edinburgo foram publicados com o título
“Universalismo e a Doutrina do Inferno” [12], juntamente com “O
Argumento a Favor da Imortalidade Condicional”, de John W. Wenham e
“O Argumento Contra o Condicionalismo: Uma Resposta a Edward William
Fudge”, de Kendall S. Harmon.

E isso não foi tudo. Livros reafirmando a realidade e eternidade do inferno


começaram a aparecer: “Questões Cruciais Sobre o inferno” (1991) [13],
de Ajith Fernando; “Um Deus Irado?” (1991) [14], de Eryl Davies; “O Outro
Lado das Boas Novas” (1992) [15], por Larry Dixon; “Quatro Opiniões sobre
o Inferno” (1992) [16], por William Crocket, John Walvoord, Zachary Hayes
e Clark Pinnock; “A Estrada Para o Inferno” (1992) [17], de David Pawson;
“O Que Aconteceu Com o Inferno?” (1993) [18], de John Blanchard; “A
Batalha Pelo Inferno: Uma Visão Geral e Avaliação do Crescimento do
Interesse Evangélico pela Doutrina da Aniquilação” (1995) [19], por David
George Moore; “O Inferno Em Julgamento: O Argumento a Favor do Castigo
Eterno” (1995) [20], de Robert A. Peterson. Todos estes contestando mais
ou menos elaboradamente o aniquilacionismo. Continuava assim a
discussão.

O que está em questão aqui? A questão é essencialmente exegética,


embora com implicações pastorais e teológicas. E se resume a se, quando
Jesus disse que aqueles banidos no julgamento final “irão para o castigo
eterno” (Mt 25:46), Ele tinha em vista um estado de tormento que não
terá fim, ou um irrevogável fim da existência consciente; em outras
palavras (pois assim é colocada a questão), um castigo que é eterno em
sua extensão ou no seu efeito. A corrente principal da cristandade sempre
afirmou o primeiro, e continua a fazê‐lo; evangélicos aniquilacionistas,
juntos com muitos Testemunhas de Jeová, Adventistas do Sétimo Dia e
liberais — na realidade quase todos os que não são universalistas —
defendem o último. Entretanto desse ponto em diante os evangélicos
aniquilacionistas se dispersam e não há unanimidade [21].

Alguns têm asseverado que o aniquilamento ocorrerá imediatamente após


a sentença de Jesus no Juízo Final, após um período de tormento no
estado intermediário; outros têm pensado que cada pessoa banida da
presença de Jesus passará por algum tormento, proporcional em
intensidade e extensão ao que cada um merece, até que venha o momento
da aniquilação. Alguns baseiam o seu aniquilacionismo em uma
antropologia adaptada. Eles argumentam que uma existência eterna não é

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natural; e que, pelo contrário, desde que nós somos seres pessoais (almas)
que vivem por meio de corpos, a separação entre a alma e o corpo
extinguirá a consciência. Então, depois da nossa separação inicial (a
primeira morte) não há um estado intermediário, apenas uma
inconsciência que continuará até a ressurreição, e depois dos descrentes
ressuscitados serem banidos da presença de Cristo, as suas consciências
finalmente cessarão (segunda morte) quando, e porque, os seus corpos
ressurretos deixarão de existir. Entretanto, alguns que raciocinam desta
forma, na verdade, afirmam que há um estado intermediário consciente,
com alegria para os santos e sofrimento para os ímpios, como sempre foi o
consenso geral da Igreja. Todos que adotam essa antropologia denominam
a sua posição de imortalidade condicional, expressão cunhada para
mostrar que a existência após a morte que as religiões imaginam e que a
maioria, se não todas, deseja, é uma dádiva que Deus concede somente
aos crentes, enquanto que Ele, cedo ou tarde, simplesmente extingue o
resto de nossa raça. A existência eterna está, portanto, condicionada à fé
em Jesus Cristo, e a aniquilação é a alternativa para os demais [22].

Historicamente, essas são opiniões do século passado. O século dezenove


foi uma era de audaciosos desafios a suposições antigas, sonhos audaciosos
de fazer as coisas melhores, e empreendimentos audaciosos, tanto
intelectuais como tecnológicos, para realizá‐los. O ensinamento cristão
histórico sobre o inferno era posto em questão à luz da convicção
utilitariana e progressista de que a retribuição em si, sem qualquer
perspectiva de alguma coisa ou alguém ser melhorado por ela, não é
justificativa suficiente para a punição, desconsiderando o castigo eterno.
Partindo desse ponto de vista a idéia de que o ato de Deus manter alguém
em permanente tormento após a morte era indigno dEle e, portanto, a
posição tradicional sobre o castigo eterno deve ser abandonada, devendo‐
se encontrar outra maneira de explicar os textos que parecem ensiná‐la.
Revisionistas da Bíblia desenvolveram duas maneiras de fazer isso, ambas
essencialmente especulativas, à maneira de Orígenes, que usava a filosofia
da época para estabelecer uma estrutura da forma de interpretação dos
textos e para preencher as lacunas nos seus ensinamentos. O primeiro
método era o universalismo, que diz que todos os seres humanos estarão
por fim no céu, e especula em como, através de dolorosas experiências, os
que morrem na incredulidade conseguirão isso. A segunda maneira é o
aniquilacionismo, o qual afirma que os que estarão no céu serão por fim
todos os humanos, e especula sobre quando os incrédulos serão
aniquilados. Os argumentos utilizados pelos aniquilacionistas de hoje são
essencialmente os mesmos dos seus predecessores do século passado.

Duas advertências pastorais e teológicas devem preceder nossas


considerações a esses argumentos.

1) Opiniões sobre o inferno não devem ser discutidas fora das linhas do
Evangelho. Por quê? Porque é somente em conexão com o Evangelho que
Jesus e os autores do Novo Testamento falam do inferno, e a maneira
bíblica de lidar com temas bíblicos é levar‐se em consideração tanto as
suas conexões bíblicas, quanto a sua substância bíblica. Como diz Peter
Toon:

“... a pregação e o ensino de Jesus com relação ao Geena, trevas e


condenação estavam relacionados com a Sua proclamação e exposição do
reino de Deus, salvação e vida eterna; eles nunca são expostos como

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assuntos independentes para reflexão e estudo. Renomados teólogos [23]


têm muito enfatizado este último ponto. ... o inferno é parte integrante
do Evangelho e portanto não pode ser deixado de fora ... . Advertir as
pessoas para que evitem o inferno significa que ele é uma realidade, ou
pode vir a ser uma realidade. Portanto, é inevitável que tentemos oferecer
uma descrição do inferno pelo menos em termos de poena damni (dor pela
perda da alegria) e possivelmente de poena sensus (dor dos sentidos, ou
seja, através dos sentidos) mas ... sempre reconhecemos que falamos
figuradamente”. [24]

A idéia cristã do inferno não é um conceito isolado de sofrimento apenas


por sofrimento (a divina “selvageria”, “sadismo”, “crueldade” e
“vingança” do qual os aniquilacionistas acusam os crentes que declaram o
inferno eterno) [25]; mas uma noção biblicamente formada por três
misérias equivalentes, que são: a exclusão da presença e comunhão
graciosa de Deus, em castigo e com destruição sobre aqueles que, ao
negarem as misericórdias de Deus, já rejeitaram o Pai e o Filho nos seus
corações. A justiça do juízo final de Deus, o qual Jesus administrará, de
acordo com o Evangelho, está em duas coisas: primeiro, o fato de que o
que as pessoas recebem não é apenas o que elas merecem, mas o que elas
na verdade escolheram — isto é, existir para sempre sem Deus e
conseqüentemente sem nenhum dos bens que Ele concede; segundo, o
fato de que a sentença é proporcional ao conhecimento da Palavra, obra e
vontade de Deus, que foram desconsideradas (Cf. Lc. 12:42‐48; Rm1:18‐
20, 32, 2:4,12‐15). De acordo com o Evangelho, o inferno não é uma
selvageria imoral, mas uma retribuição moral, e discussões sobre a sua
extensão para os seus habitantes devem ocorrer dentro desse quadro.

2) Opiniões sobre o inferno não deveriam ser determinadas por


considerações do bem‐estar. Diz John Wenham: “Acautelai‐vos da imensa
atração natural por qualquer saída que os livre da idéia de pecado e
sofrimento sem fim. A tentação de torcer o que deveriam ser declarações
completamente rígidas das Escrituras é intensa. É a situação ideal para
uma racionalização inconsciente” [26].

Diz John Stott:

“Eu acho o conceito de tormento consciente eterno emocionalmente


intolerável e não compreendo como as pessoas conseguem conviver com
isso sem cauterizar seus sentimentos ou esfacelá‐los com a tensão. Mas as
nossas emoções são um guia instável, não confiável para nos conduzir à
verdade e não devem ser exaltadas ao lugar de suprema autoridade em
determiná‐la ... minha pergunta deve ser — e é — não o que me diz o
meu coração, mas, o que diz a Palavra de Deus?” [27].

Ambos adotaram o aniquilacionismo, no que estão errados, mas eles o


admitem por uma justa razão — não porque é uma idéia que se ajustou
confortavelmente às suas convicções, apesar de tê‐lo feito, mas porque
eles pensaram tê‐lo encontrado na Bíblia. Qualquer que seja nossa posição
sobre a questão, nós também devemos ser guiados pelas Escrituras e nada
mais.

1) O primeiro argumento é a necessidade de explicar “castigo eterno” de


Mateus 25:46, que está diretamente relacionado com “vida eterna”, sem
que traga necessariamente a implicação de eternidade. Admitindo‐se que,

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como é corretamente defendido, “eterno” (aionios) no Novo Testamento


significa “que pertence à era porvir” em vez de expressar qualquer noção
diretamente cronológica, os escritores do Novo Testamento são unânimes
em concluir que o tempo porvir será eterno. Então o problema dos
aniquilacionistas permanece no mesmo lugar que estava. A afirmação de
que, na era por vir, a vida é alguma coisa contínua, enquanto que o castigo
é algo com um final, torna a questão evasiva. Basil Atkinson, “um
excêntrico bacharel acadêmico”, de acordo com Wenham [28], mas um
filologista profissional, e mentor de Wenham e Stott nessa matéria,
escreveu:

“Quando o adjetivo aionios significando “eterno” é usado no grego


juntamente com substantivos de ação, ele se refere ao resultado da ação,
não ao processo. Assim a expressão “castigo eterno” é comparável a
“redenção eterna” e a “salvação eterna”, todas expressões bíblicas ... os
que se perdem não passarão eternamente por um processo de castigo mas
serão punidos uma vez por todas com resultados eternos”. [29]

Embora essa declaração seja constantemente feita por aniquilacionistas,


que de outra maneira não poderiam erigir sua posição, ela carece de apoio
gramatical e em qualquer caso torna a questão evasiva quando assume que
o castigo é um evento momentâneo ao invés de contínuo. Embora,
porventura, não seja absolutamente impossível, o raciocínio parece
artificial, evasivo, e, em uma avaliação final, desamparado.

2) O segundo argumento é que, uma vez que a idéia de imortalidade


intrínseca da alma (isto é, do indivíduo consciente) deixa de ser
considerada como uma intromissão platônica na exegese do segundo
século, parecerá que o único significado natural de morte, destruição,
fogo e trevas no Novo Testamento como indicadores do destino dos ímpios
é de que tais pessoas deixam de existir. Mas tal afirmação quando
submetida à prova mostra estar errada. Para os evangélicos, a analogia das
Escrituras, isto é, o axioma da sua coerência e consistência intrínsecas e
sua capacidade de elucidar ela mesma os seus ensinos, é uma regra para
toda interpretação, e, embora haja textos que, tomando‐os isoladamente,
podem conter implicações aniquilacionistas, há outros que de forma
alguma podem se encaixar nesse esquema. Mas nenhuma teoria que se
propõe a explicar o significado da Bíblia e não abrange todas as Suas
principais declarações pode ser verdadeira.

Judas 6 e Mateus 8:12; 22:13, 25:30 mostram que as trevas significam um


estado de privação e aflição, mas não de destruição no sentido de deixar
de existir. Somente aqueles que existem podem chorar e ranger seus
dentes, como é dito dos que serão lançados nas trevas.

Em nenhuma parte a morte significa extinção; morte física é a partida


para outra forma de existência chamada sheol ou hades, e morte
metafórica é uma existência sem Deus e Sua graça; nada na terminologia
bíblica garante a idéia, encontrada em Guillebaud [30] e outros, de que “a
segunda morte” de Apocalipse 21:11, 20:14, 21:8 significa ou refere‐se à
extinção da existência.

Lucas 16:22‐24 nos mostra, como também uma grande quantidade de


linguagem apocalíptica extra‐bíblica, que fogo significa uma existência

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continuamente em tormento, e as arrepiantes palavras de Apocalipse


14:10, 19:20, 20:10 e de Mateus 13:42,50 confirmam isso.

Em 2 Tessalonicenses 1:9 Paulo explica, ou amplia, o significado de


“sofrerão penalidade de eterna (aionios) destruição” adicionando “banidos
da face do Senhor” — expressão que, por denotar exclusão, joga por terra
a idéia de que “destruição” significa extinção. Somente aqueles que
existem podem ser excluídos. Tem sido freqüentemente demonstrado que
no grego o significado natural das palavras relacionadas a destruição
(substantivo, olethros; verbo, apollumi) é arruinar, de forma que o foi
destruído fica, a partir de então, inutilizado, ao invés de propriamente
aniquilado, de maneira que passa a não mais existir de forma alguma.

Os aniquilacionistas se defendem com especial argumentação. Às vezes,


eles argumentam que tais textos que falam de um tormento contínuo
fazem referência somente a uma experiência temporária para os que se
perdem antes de deixarem de existir, mas isso é tornar a questão evasiva
através de uma exegese especulativa e renunciar a sua declaração original
de que o Novo Testamento, quando fala de perdição eterna, sugere
naturalmente a extinção. Peterson cita John Stott, no que ele chama de
“o melhor argumento aniquilacionista” [31]. O trecho a seguir faz
comentários às palavras “A fumaça do seu tormento sobe pelos séculos dos
séculos” de Apocalipse 14:11.

O próprio fogo é chamado “eterno” e “inextinguível”, mas seria muito


estranho se o que fosse ali atirado provasse ser indestrutível. A nossa
expectativa deveria ser o oposto: o que for ali atirado deve ser consumido
eternamente, não atormentado eternamente. Por isso existe a fumaça
(evidência de que o fogo fez o seu trabalho) que “sobe pelos séculos dos
séculos”.

“Pelo contrário”, contra‐argumenta Peterson, “nossa expectativa seria de


que a fumaça se extinguiria uma vez que o fogo já tivesse terminado o seu
serviço ...”. O restante do verso confirma nossa interpretação: “e não têm
descanso algum, nem de dia nem de noite, os adoradores da besta e da
sua imagem” [32]. Para isso parece não haver resposta.

Portanto, o argumento lingüístico fracassa em todos os seus pontos. Dizer


que alguns textos, tomados isoladamente, poderiam significar a
aniquilação, não prova absolutamente nada quando outros evidentemente
não o fazem.

3) O terceiro argumento é o de que o fato de Deus aplicar eternamente


um castigo aos perdidos seria algo injusto e desproporcional. Stott
escreve: “eu questiono se o 'tormento eterno e consciente' é compatível
com a revelação bíblica de justiça divina, a menos que talvez (como tem
sido argumentado) a impenitência dos ímpios também perdure ao longo da
eternidade” [33]. A incerteza expressa pelo “talvez” de Stott é estranha,
por isso não há nenhuma razão para se pensar que a ressurreição dos
ímpios mudará o seu caráter, e sim toda a razão para se supor que a sua
rebeldia e impenitência continuarão enquanto eles existirem, tornando o
eterno exílio da comunhão de Deus plenamente apropriado; mas, deixando
isso a parte, é evidente que o argumento, se fosse válido, provaria coisas
demais e terminaria solapando a própria causa aniquilacionista.

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Mas se, como sugere o argumento, é desnecessariamente cruel para Deus


manter os que se perdem existindo para serem atormentados, porque a
Sua justiça no caso não requer isso, como os aniquilacionistas podem
justificar, em termos da justiça de Deus, o fato dEle os fazer passar por
qualquer tipo de tormento após a morte. Por que a justiça, que desse
ponto de vista requer a aniquilação de qualquer forma, não se satisfaz
com uma aniquilação no momento da morte? Os aniquilacionistas bíblicos,
que não podem escapar da expectativa bíblica da ressurreição final de
crentes e incrédulos para o julgamento, também admitem que haverá
alguma dor imposta após o julgamento e antes da extinção; mas se a
justiça de Deus não requer nada além da aniquilação, e portanto não
requer essa dor, ela se torna uma crueldade desnecessária, sendo Deus
assim, conseqüentemente, acusado de cometer a mesma falta da qual os
aniquilacionistas ansiosamente querem provar que Ele é inocente e
também condenam a corrente principal do pensamento cristão por sua
inferência. Enquanto que, se a justiça de Deus realmente não requer
nenhuma punição em adição à aniquilação, e a contínua hostilidade,
rebeldia e impenitência dos ímpios para com Deus permanece uma
realidade após suas mortes, não haverá momento algum em que seja
possível tanto para Deus como para o homem dizer que castigo suficiente
já foi aplicado, que já não merecem mais do que já receberam, e qualquer
punição a mais além disso seria injusta. Dessa forma o argumento retorna
aos seus proponentes como um bumerangue, impelindo‐os de volta e
deixando‐os sem poder escapar das garras do seu dilema. Basil Atkinson foi
mais sábio e declarou: “eu tenho evitado ... qualquer argumento sobre o
estado final dos ímpios baseado no caráter de Deus, o que eu consideraria
uma irreverência tentar avaliá‐lo” [34]. Sem dúvida ele anteviu as
dificuldades a que tal argumento conduz.

4) O quarto argumento é o de que a alegria dos santos no céu seria


arruinada pelo fato de saberem que alguns continuam debaixo de
merecida punição. Mas não se pode dizer isso de Deus, como se a
manifestação da Sua santidade na punição doesse mais a Ele do que aos
ofensores; e desde que no céu os cristãos serão semelhantes a Deus,
amando o que Ele ama e se regozijando em toda manifestação Sua,
incluindo a manifestação da Sua justiça (na qual os santos, pelas
Escrituras, na verdade já se alegram neste mundo), não há razão para
imaginar que a sua alegria eterna será prejudicada dessa forma [35].

É desagradável contestar honrados colegas evangélicos através de uma


matéria impressa, alguns dos quais são bons amigos e outros (eu falo
particularmente de Atkinson, Wenham e Hughes) agora já se encontram
com Cristo. Portanto, paro por aqui. Meu propósito era apenas
reconsiderar o debate e avaliar a força dos argumentos utilizados, e isso
eu fiz. Eu não estou certo se concordo com Peter Toon quando diz que
“discussão sobre se o inferno significa castigo eterno ou aniquilação após o
juízo ... é tanto perda de tempo como uma tentativa de saber daquilo que
não podemos saber” [36], mas eu estou convencido de que ele está certo
em dizer que o inferno “faz parte do Evangelho” e que “advertir as
pessoas para que evitem o inferno significa que ele é uma realidade” [37].
Todo aquele que se decide por advertir as pessoas para que evitem o
inferno pode andar em comunhão no seu ministério e legitimamente
reivindicar ser um evangélico. Quando John Stott argumenta que “a
aniquilação final do ímpio deveria ser aceita como uma alternativa
legítima e biblicamente fundamentada para o eterno e consciente
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tormento” [38], ele pede demais, pois os fundamentos bíblicos dessa


posição, quando examinados, provam, como vimos, que são inadequados.
Seria errado porém, se essas diferenças de opinião quanto ao assunto
levassem ao rompimento da comunhão. Entretanto seria uma boa coisa se
elas fossem resolvidas.

Notas:
[1] ‐ No Place for Truth (Nenhum Lugar para Verdade ‐ Grand Rapids:
Eerdmans, 1993) de David Wells e Mark Noll, The Scandal of the
Evangelical Mind (O Escândalo da Mente Evangélica ‐ Grand Rapids:
Eerdmans, 1994), contam só parte da história. Admitindo‐se que a teologia
evangélica em algumas partes e sobre alguns aspectos tem sido deformada
e fragmentada, a energia que atualmente vem sendo dedicada para
recuperá‐la aqui, é notável.

[2] ‐ Detalhes podem ser recolhidos de LeRoy Edwin Froom, The


Conditionalist Faith of Our Fathers (A Fé Condicional de Nossos Pais ‐
Washington, D. C.: Review and Herald, 2 vols., 1965‐66), e de David J.
Powys, “The Nineteenth and Twentieth Century Debates about Hell and
Universalism”, (O Debate sobre Inferno e Universalismo no Século 19 e 20 ‐
Uníversalism, Paternoster Press, e Grand Rapids: Baker, 1992), 93138.

[3] ‐ Eu declarei isto em “The Problem of Eternal Punishment” (O


Problema do Castigo Eterno ‐ Crux XXVI.3 ‐ 23/09/90. John Wenham
desafiou fundamentado em que os evangélicos falaram muito sobre o
assunto na segunda metade do século 19, que ele chamou “o auge do
condicionalismo entre evangélicos” (Universalism. ., 181 e nota 27). Mas
conversação e convicção não são a mesma coisa. A evidência para minha
afirmação encontra‐se no fato de que três dos “quatro melhores livros que
defendem o aniquilacionismo” segundo Robert A. Peterson, (Hell on Trial ‐
Inferno em Julgamento ‐ Phillipsburg: Presbyterian & Reformed Publishing,
1995, 161‐62); The Righteous Judge, de Harold E. Guillebaud (O Justo Juiz
‐ publicação independente, 1964); Basil F. C. Atkinson, Life and
lmmortality (Vida e Imortalidade ‐ publicação independente, n.d.c. 1968;
e Edward William Fudge, The Fire That Consumes (O Fogo Que Consome),
não foram publicados por nenhuma publicadora evangélica influente.

[4] ‐ Christianity Today (Cristianismo Hoje), 20 de março de 1987, 40‐41.


Pinnock ampliou sua linha de pensamento em “The Destruction of the
Finally Impenitent” (A Destruição do Impenitente a Final ‐ Criswell
Theological Review 4 (Primavera 1990), 243‐59.

[5] ‐ Houston: Providential Press, (Imprensa providencial), 1982. O livro de


Fudge foi notado e respondido de forma breve por Robert UM. Morey,
Death and the Afterlife (Morte e a Vida após a morte ‐ Minneapolis:
Bethany House, 1984), 124ff., 205. Uma edição revisada e reduzida, com
as respostas de Fudge aos críticos, apareceu em 1994 (Carlisle, Reino
Unido,: Paternoster Press).

[6] ‐ David L. Edwards e John Stott, Essenhals (Londres: Hodder &


Stoughton, 1988), 313‐20.

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[7] ‐ Grand Rapids: Eerdmans, e Leicester, Reino Unido,: Inter‐Varsity


Press, 1989, 398‐407.

[8] ‐ Kenneth Kantzer e Carl F. H. o Henry, eds., Evangelical Essentials


(Grand Rapids: Zondervan, 1990), 107‐36.

[9] ‐ A linha de pensamento foi desenvolvida no artigo de Crux (Ponto


Crucial), nota 3.

[10] ‐ Christianity Today (Cristianismo Hoje), 16 de junho de 1989, 60,; 63.

[11] ‐ Ligonier, Pennsylvania,: Soli Deo Gloria Publications (Soli Deo Gloria
Publicações), 1990.

[12] ‐ Veja nota 2.

[13] ‐ Eastbourne, Reino Unido,: Kingsway, 1991.

[14] ‐ Bridgend, Reino Unido,: Evangelical Press of Wales (Imprensa


Evangélica de Gales), 1991.

[15] ‐ Wheaton: Bridgepoint Books (Victor Books), 1992.

[16] ‐ Grand Rapids: Zondervan, 1992.

[17] ‐ Londres: Hodder & Stoughton, 1992.

[18] ‐ Darlington, Reino Unido,: Evangelical Press (Imprensa Evangélica),


1993.

[19] ‐ Lanham, Maryland,: United Press of América, 1995.

[20] ‐ Veja nota 3.

[21] ‐ Para uma consideração geral, veja David J. Powys, ""The Nineteenth
& Twentieth Century Debates about Hell and Universalism," in
Universalism. . ., (Debate sobre Inferno do Século 19 e 20 e
Universalismo), em Universalism. . ., 93‐129.

[22] ‐ Além de seus expoentes evangélicos modernos, o condicionalismo


tem tido o apoio de uma grande parte do protestantismo mundial durante
os últimos 150 anos. Veja B. B. Warfield, " Annihilationism"
(Aniquilacionismo‐Grand Rapids: Baker, 1981), ix., 447‐57; Peter Toon,
Heaven and Hell (Céu e Inferno ‐ Nashville: o Thomas Nelson, 1986),
17S81;artigos "Annihilationism" (Aniquilacionismo) e Conditional
Immortality" (Imortalidade Condicional ‐ Dicionário Evangélico de Teologia
‐ Walter UM. Elwell, ed. Grand Rapids: Baker,1984).

[23] ‐ Ibid., 199.

[24] ‐ Ibid., 200‐201.

[25] ‐ “Selvageria” é de Michael Green, Evangelism through the Local


Church (Evangelismo pela Igreja Local ‐ Londres: Hodder & Stoughton,
1990); “sadismo” é de J. W. Wenham, Universalism. . . (Universalismo ...),
187; as outras duas palavras são de Clark Pinnock, Criswell Theological
Review 4 (1990), 246.

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21/09/2016 Reconsiderando o Aniquilacionismo Evangélico ­ James I. Packer

[26] ‐ Wenham, The Enigma of Evil (O Enigma do Mal ‐ Grand Rapids:


Zondervan, 1985), 37‐38.

[27] ‐ Stott, Essentials, 315‐16.

[28] ‐ Wenham, Universalism ... (Universalismo...), 162, note 3.

[29] ‐ Atkinson, Life and lmmortality (Vida e Imortalidade), 101.

[30] ‐ H. E. Guillebaud, The Righteous Judge (O Justo Juiz), 14.

[31] ‐ Peterson, Hell on Trial (Inferno em Julgamento), 162. Wenham


descreve as páginas de Stott como um “tratamento leve”, (Universalism. .
., 167). O julgamento de Peterson me parece mais perspicaz.

[32] ‐ Ibid., 168‐69; Stott citando, Essentials, 316.

[33] ‐ Ibid., 319.

[34] ‐ Ibid., iv.

[35] ‐ Estas sentenças são principalmente retiradas de Packer, art. cit, 23.
36 Ibid., 201.

[37] ‐ Ibid., 250.

[38] ‐ Ibid., 320.39 Fonte: Revista Fides Reformata

Dr. James Packer, antigamente Professor de Teologia no Regent College,


Vancouver; desde 1979, Editor Senior da Chrishanity Today e um professor
muito ocupado. Ele disserta amplamente, escreve extensivamente, e é o
distinto autor de numerosos best‐sellers. Ele contribuiu para Reformation
& Revival Journal.

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