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23/03/2020 Correntes da Escatologia Protestante

Correntes da Escatologia Protestante


por

Elias Medeiros

Nós, evangélicos protestantes, cremos que a Bíblia responde às questões básicas levantadas em
todas as épocas e em todos os lugares. Entretanto, a questão que está sempre presente na mente e
no coração de todos os seres humanos é a questão relacionada com o futuro. "O passado a gente
conta, o presente a gente curte, e o futuro a gente tenta adivinhar". Esta parece ser a filosofia da
maioria das pessoas e de várias religiões.

Historicamente falando, a igreja protestante tem passado por épocas nas quais pode-se detectar a
falta de um balanço escatológico. Algumas vezes, a igreja se mostrava tão apegada ao presente,
que dava pouca atenção ao futuro. Outras, a igreja se apegava tanto ao passado, que chegava a
esquecer de sua relevância para o presente e de seu destino futuro.

A história da escatologia cristã em geral reflete essa batalha entre o passado, o presente e o futuro.
Vários teólogos evangélicos protestantes têm escrito sobre o assunto. A história da igreja tem
revelado que, durante os primeiros cinco séculos, os cristãos não se preocupavam muito em
desenvolver uma doutrina escatológica. É bom ressaltar, entretanto, que a ausência de um dogma
sistematicamente formulado nunca significou a ausência de crenças e esperanças escatológicas.
Pelo contrário, durante os primeiros cinco séculos os cristãos criam na vida após a morte, na
segunda vinda do Senhor Jesus, na ressurreição dos mortos, no julgamento final, em tribulações e
na criação de um novo céu e de uma nova terra. Mas a escatologia, como doutrina sistematizada,
tal qual nós a temos hoje, não foi desenvolvida durante aquele período. Basta lermos o credo
apostólico para percebermos essas crenças, porém sem um desenvolvimento cronológico ou
sistemático da doutrina.

Mesmo durante a Idade Média, até o início da Reforma Protestante, os cristãos daquela época
também criam nesses ensinos, mas havia "pouca reflexão sobre a maneira pela qual" os fatos se
desenvolveriam, especialmente sobre o aspecto cronológico da escatologia bíblica.
Já os reformadores protestantes sem dúvida refletiram mais sobre a questão escatológica. Em
parte, foram motivados pela disputa teológica com a Igreja Católica, que ensinava o purgatório,
por exemplo. Os teólogos reformados, portanto, fizeram muita ligação entre a escatologia, a
soteriologia (a glorificação dos salvos) e a eclesiologia (a igreja triufante etc).

Na atualidade, o racionalismo, o evolucionismo, o existencialismo, juntamente com o liberalismo


teológico, provocaram uma reflexão mais profunda por parte dos protestantes ortodoxos, já que
todos aqueles ismos atacavam todo tipo de ensino sobre a certeza de alguma realidade futura.
Berkhof e outros protestantes reformados reconheciam que o liberalismo teológico ignorava
totalmente os ensinos escatológicos do próprio Jesus Cristo, colocando toda a ênfase simplesmente
nos preceitos éticos do Senhor. O racionalismo, o evolucionismo e o existencialismo filosófico, por
sua vez, desconsideram qualquer ensino escatológico: na melhor das hipóteses, a escatologia
bíblica não passa de uma utopia mitológica.

Os protestantes evangélicos, entretanto, baseados no ensino da Palavra de Deus, crêem na vida


após a morte, na segunda vinda do Senhor Jesus, na ressurreição dos mortos, no julgamento final,
na criação de um novo céu e de uma nova terra. Em outras palavras, os protestantes conservam as
mesmas crenças que os demais cristãos que aceitam as Escrituras Sagradas como única e última
regra infalível de fé e prática. Mas o fato de crerem nessas doutrinas não significa que todos os
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protestantes as aceitem do mesmo modo, em relação à forma como elas se cumprirão. Assim, há
uma variada divergência hermenêutica no meio protestante, com pelo menos três escolas de
interpretação: aminelista, posmilenista e premilenista.

Os amilenistas como L.Berkhof, O.T.Allis, G.C.Berkhouwer e outros crêem que as Escrituras


Sagradas não fazem nenhuma distinção cronológica entre a segunda vinda de Cristo, o
arrebatamento da igreja, e a participação do crente no novo céu e na nova terra. Para os amilenistas
haverá apenas uma ressurreição geral dos crentes e dos incrédulos, a qual ocorrerá durante a
segunda vinda de Cristo. O julgamento final será para todos os povos. A tribulação é algo que
experimentamos na presente era. O milênio referido nas Escrituras (Apocalipse 20) não significa
um milênio literal, pois o reino de Deus, inaugurado visivelmente com a primeira vinda do Senhor
Jesus, continua espiritualmente presente, embora invisível (invisibilidade não é sinônimo de
inexistência), e será consumado com a segunda vinda visível do Rei da Glória. Entramos neste
reino pela fé (João 3). Para os amilenistas as Escrituras não fazem distinção entre a igreja no Velho
Testamento (Israel)e a igreja do Novo Testamento ("o novo Israel", composta de circuncisos e
incircuncisos).

Os posmilenistas, como Charles Hodge, B.B.Warfield, W.G.T. Shedd, e A.H.Strong, crêem que a
segunda vinda de Cristo ocorrerá após o milênio (não literal). A era presente se misturará com o
milênio de acordo com o progresso do evangelho no mundo. Em geral, os posmilenistas assumem
a mesma postura amilenista com relação ao ensino da ressurreição, do julgamento final, da
tribulação e da posição sobre Israel e igreja.

Os premilenistas se dividem em dois grupos principais: os premilenistas históricos (como


G.E.Ladd, A.Reese e M.J.Erickson) e os premilenistas dispensacionalistas (como L.S.Chafer,
J.D.Pentecost, C.C.Ryrie, J.F.Walvoord e Scofield).

Os premilenistas históricos crêem que a segunda vinda de Cristo para reinar nesta terra e o
arrebatamento da igreja acontecerão simultaneamente; haverá a ressurreição dos salvos no início
do milênio (a primeira ressurreição) e a ressurreição dos incrédulos no final do milênio. O milênio,
entretanto, na posição premilenista histórica, é tanto presente como futuro. No presente, Cristo
reina nos céus. No futuro, Cristo reinará na terra, embora os premilenistas históricos em geral não
considerem o período da tribulação e façam uma certa distinção entre Israel e igreja (o Israel
espiritual).

Os premilenistas dispensacionalistas ensinam que a segunda vinda do Senhor Jesus acontecerá em


duas fases: na primeira, o Senhor Jesus se encontrará com a igreja nos ares, levará os salvos para
participar das bodas do Cordeiro nas regiões celestiais; e, após sete anos de tribulação na terra sem
a presença da igreja, regressará com ela para reinar neste mundo por mil anos. Eles fazem uma
distinção entre a ressurreição para a igreja, na ocasião do arrebatamento, a ressurreição para
aqueles que virão a crer durante a tribulação de sete anos (ressurreição esta que ocorrerá na
segunda vinda do Senhor, no final da tribulação) e a ressurreição dos incrédulos no final do
milênio.

Os premilenistas dispensacionalistas fazem, também, uma distinção entre o julgamento dos crentes
após o arrebatamento, o julgamento de judeus e gentios convertidos no final da tribulação de sete
anos e o julgamento dos incrédulos no final do milênio. Sem dúvida, para os membros desta escola
de interpretação, os sete anos de tribulação será literal, mas a igreja neo-testamentária será
arrebatada antes dessa tribulação. O milênio será inaugurado e estabelecido com a segunda vinda
do Senhor Jesus, após a tribulação e durará, literalmente, 1.000 anos. Sem dúvida, esta posição
distingue completamente Israel e igreja.

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De todas essas perspectivas protestantes, a meu ver, a que mais se coaduna com a exegese bíblica é
a posição amilenista. Pessoalmente creio que esta posição é a mais condizente com o ensino dos
profetas, do Senhor Jesus e dos apóstolos, tanto hermenêutica quanto exegeticamente falando
(Mateus 24-25).

Se o leitor estudar com mais afinco essas posições escatológicas, poderá perceber suas implicações
imediatas no que tange à evangelização mundial e ao envolvimento da igreja nas questões sociais e
políticas de nossa era. A posição escatológica mais fraca, em termos hermenêuticos e exegéticos, é
a posição premilenista, devido à sua grade cronológica pré-estabelecida. Os premilenistas, em
geral, começam com um quadro cronológico pré-estabelecido e passam a fazer uma "cirurgia
textual" nas Escrituras, de acordo com o quadro já pré-desenhado por eles.

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O paraibano Elias Medeiros é chefe do Departamento de Missões do Seminário Reformado de
Jackson, Mississippi (EUA) e professor do Centro Evangélico de Missões (CEM), em Viçosa, MG.

Publicado originalmente na Revista Ultimato.

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