Você está na página 1de 2

ARAÚJO FARIA, B.; KAMIZAKI, R.

Discriminação de velocidades de veículos por


observadores parados. Revista Psicologia em Pesquisa, v. 14, n. 4, p. 170–185, 24 out. 2020.

Os processos perceptivos são fundamentais para adaptação dos organismos ao


ambiente que os rodeia, permitindo a organização, codificação e análise dos estímulos
sensoriais que foram transformados em impulsos neurais. Dentre esses processos, a percepção
visual é um dos processos mais complexos e permite ao organismo formar imagens
representacionais dos objetos e do ambiente, representações essas que são sintetizadas com
dados de outros sentidos e podem se associar a representações já armazenadas na memória
para processamento e análise de situações.
Nesse sentido, Faria e Kamizaki (2020), autores do artigo, apontam que um dos
aspectos da percepção visual, a percepção de movimento, é de suma importância para
interação dos indivíduos com objetos e pessoas e para seu deslocamento no espaço, tendo
inclusive uma importância filogenética para poder fugir de predadores e para caça de animais
que sirvam de alimento.
Muitos estudos já mostram a grande capacidade de perceber diferentes padrões de
movimento, mas a percepção e discriminação de velocidade têm sido menos estudadas. No
entanto, nos tempos hodiernos, grande é a importância da percepção de velocidade dada a
enorme frota de veículos automotores e as necessidades de deslocamentos nos centros
urbanos. Nesse sentido, um motorista precisa ter uma boa percepção da própria velocidade do
veículo que está dirigindo, como também dos outros veículos para que possa saber quando
poderá acelerar ou desacelerar sem se colocar em risco de colisão com outros veículos. Do
mesmo modo deve está atento a pedestres atravessando a rua e outras coisas que possam
aparecer na rodovia para assim evitar qualquer acidente.
Por sua vez, os pedestres ao atravessarem a rua devem estar atentos à velocidade dos
carros, para poder prever quando é possível ou não atravessar. Desse modo, discriminando a
velocidade dos carros, através de sua percepção visual, e estimando o tempo necessário para
atravessar com segurança, eles adaptam a velocidade de seu movimento de um lado para outro
da rodovia. No entanto, muitas são as vezes que a velocidade dos carros são subestimadas,
segundo dados da Seguradora Líder (2019 apud FARIA; KAMIZAKI, 2020), só em 2019
11.919 pessoas morreram em atropelamentos. Neste sentido, dada a importância da percepção
de velocidade no trânsito e a falta de estudos na perspectiva dos pedestres, o estudo de Faria e
Kamizaki (2020) propõe-se a investigar a percepção de velocidade de automóveis de
observadores parados em situação natural.
Além da discussão dos resultados apontados, relacionados a capacidade de que o
indivíduo possui para discriminar velocidades de movimentação do veículo em relação ao
valor real aplicado no experimento realizado, modelos matemáticos podem contribuir para
ampliar as discussões teóricas, como o da função-potência criada por Stanley Smith Stevens.
O cálculo do expoente da função-potência da percepção de velocidade, expresso
matematicamente pela Lei da Potência por Stevens (2008), onde a resposta individual ao
estímulo apresentado é diretamente proporcional a uma constante arbitrária multiplicada pela
magnitude real do estímulo, elevado a uma grandeza física relacionada à sensibilidade
perceptiva dos indivíduos para um determinado tipo de estímulo, foi apresentado como um
instrumento importante para demonstrar teoricamente tal percepção no escopo de pesquisas da
Psicologia experimental bem como da Psicofísica.
O experimento analisado resultou na equação:
1, 31
R=0 , 94. E
O referido expoente indica a sensibilidade perceptiva dos indivíduos ao estímulo da
velocidade observada e demonstrou que quanto maior a velocidade real, maior será o valor
estimado pelos indivíduos para esse estímulo e vice-versa. Ou seja, a percepção da velocidade
está diretamente relacionada ao estímulo submetido e, de acordo com a pesquisa, os
indivíduos são capazes de estimar com um bom grau de exatidão as velocidades de veículos
quando são postos na condição de observadores inerciais do movimento.
Os pesquisadores afirmaram que essa capacidade de estimar velocidade é inerente à
espécie humana, especificamente, uma característica adquirida da visão humana,
independente de sexo e de ser condutor de veículos habilitado. No entanto, outras variáveis
precisam ser estudadas para confirmar o valor encontrado do expoente de percepção, tais
como, luminosidade do ambiente, distância do referencial de observação e tempo de
exposição do estímulo.
Eles sugerem ainda experimentos com velocidades diferentes das realizadas na
referida pesquisa, ressaltaram a importância da percepção de estímulo de velocidade para as
relações humanas contemporâneas e a ausência de pesquisas científicas contemplando o
referido tema.

Você também pode gostar