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ANGELA RAMA .

WALDOMIRO VERGUEIRO
ALEXANDRE BARBOSA . PAULO RAMOS . TULIO VILELA

AS HISTORIAS EM QUADRINHOS
como usar Como usar
COLECÃO

na sala de aula
as historias em quadrinhos
.t:§bss§& §ss§*§r ARTES vlsuAls m*:t *;xllm ç§*x ;xxll§xx
Katia Helena Pereira na sala de aula
§$m& &§sô:§r A INTERNET rxxx sta§m e§** x*a§m
Juvenal Zanchetta Jr.

§elm& tt§§&v A LITERATURA INFANTIL *§§§ sa§m de auc&a


Angela Rama
[t/aria Alice Faria
Waldomiro Vergueiro
de (Organizadores)
§§m& &§§ê§r A MÚSlcA mm s**§m max§a
Martins Ferreira
Alexandre Barbosa
&{,}m& a,§§â*§ ATELEVISÁo §§e Sm§a de xas§§m Paulo Ramos
Ívlarcos NaPolitano Túlio Vilela

&§sm& essasr o CINEMA §?§ §&§§e e§e axaa§m


Marcos NaPolitano
I
§&rme &r§&§' o JoRNAL §?e §e§a de exx§m
Ii/aria Alice Faria

&&§m§ &§§&§" o úoto nxm sa*a d** *xcx§a


Marciel Consani

ed itonacontexto
§ôm§$ es§&§ o TEATRo §1*§ §{*§§ dç* *ax§cx
Vic Vieira Granero

§&§?§$ §r§§*§r ouTRAS LINGUAGENS X;X SX§m út' *l+!lu!


Beatriz [t/arcondes, Gilda lvlenezes e Thaís Toshimitsu
Copyrighlg 2004 Dos :rutores
Todos os direitos desta edição reservados à SUMÁRIO
Editora Contexto (Editora Pinsky Ltda.)

Diagramação
Gustavo S. Vilas Boas
Reuisão
Luciana Salgado
Projeto e montagem de caPa
Antonio Kehl

Uso das Hes no ensino


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (crr')
(Câmara Brasileira do Livro, sr', Brasil) Waldomiro Vergueiro .................7
Barbosa, Alexmdre
Como usat as histórias em quadrinhos na sala de aula / A linguagem dos quadrinhos: uma "alfabetização" necessária
Alexmdre Barbosa, Paulo Ramos, Túlio Vilela ; Argela Rama, \Taldomiro
\/êrgueiro, (orgs.). 4. ed., 2" reimpressão. - São Paulo : Contexto,2014
(Co1eção Como usdr nr sala de aula)
- Wqldomiro Vergueiro ...............31

Bibliografia Os quadrinhos em aulas de Língua Portuguesa


N
rsB 978-85-72 44-27 0 -1
Paulo Ram0s.................. ........... 65
1. Ensino Meios auiliares 2. Histórix em quadrinhos na educaçáo
-
I. Rmos, Paulo. Ii. Vilela, Túlio. IIi. Rama, Angela. IV. Vergueiro,
'üaldomiro. V Título. \{I. Série. Os quadrinhos no ensino de Geografia
01 4695 cDD-371.3352 Angela Rama. 87
Índice para catálogo sistemático:
1. Histórias em quadrinhos na sala de aula : Educaçáo 371'3352
Os quadrinhos na aula de História
Túlio Vilelq .........105

Os quadrinhos no ensino de Artes


Eorrona CoNrBxro Alexandre Barbosa...... ............ 131
Diretor editorial: Jaime Pinshl
Rua Dr. José Elias, 520 - Alto da LaPa
05083-030 - Sáo Paulo - sP liibliografia 151
parx: (11) 38325838
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w.editoracontexto.com.br
Os autores.. ......... 155

2014

Proibicla a reproduçáo total ou parcial.


Os infratores serão processados na lorrna da lei.
USO DAS HQS NO ENSINO

Sem dúvida, os quadrinhos representam hoje, no mundo inteiro,


um meio de comunicação de massa de grande penetração popular. Nos
quatro cantos do planetar, as publicaçÕes do gênero circuiam com Lrma
enorme variedade de títulos e tiragens de milhares ou, às vezes, até mesmo
milhÕes de exemplares, avidamente adquiridos e consumidos por um
público fiel, sempre ansioso por novidades. Mesmo o aparecimento e a
concorrência de outros meios de comunicação e entretenimento, cada
vez mais abundantes, diversiÍicados e sofisticados, não impediram que
os quadrinhos continuassem, neste início de século, a atrair um grande
número de fas.
Tamanha popularidade das histórias em quadrinhos, as Hes, não se
cleupor acaso. Aprodução, divulgação e cornercialização, organizada em
r-Lma escala industrial, permitiu a proÍissionalizaçã.o das várias etapas de

sua elaboração, possibilitando-lhes atingir tiragens astronômicas. Hoje


em dia, em quase todos os países, a indústria dos quadrinhos move-se
por meio dos esforços de um grande número de proÍissionais que, muitas
vezes,sequertêmcontato direto entresi, podendo inclusive estardistantes
um do outro milhares de quilôn-retros, vivendo em países com línguas e
culturas diferentes. Assim, ats histórias em quadrinhos, além de serem um
rlos primeiros veículos a caminhar para a padronização de conteítdos,
também incorporaram a globalização econômica em seus processos de
produção, garantindo, dessa forma, a sobrevivência em Llm mercado cada
vez mais competitivo.

7
Essa inegável popularidade dos quadrinhos, no entanto, talvez tenha na realidade, vangloriando-se por uma caçada vitoriosa, mas também
sido tambérn responsável por uma espécie de "desconfiança" quanto aos registrando a primeira história contada por uma sucessão de in-ragens.
efeitos que elas poderiam provocar eln sells leitores. Por representarem Bastaria, então, enquadrá-las pelra se obter algo rruito semelhtrnte ao
um rneio de cornunicação cle vasto consumo e com conteúrdo, até os dias que modernamente se conhece como históriar em quadrinhos. Ainda
de hoje, majoritariamente direcionado às crianças e jovens, as IIes cedo se hoje, as crianças começam muito cedo a transmitir suas impressÕes do
tornaram objeto de restrição, condenadas por muitos pais e professores muirdo por meio de desenhos, representando seus pais, seus irmàos
no mundo inteiro. De uma maneira geral, os adultos tinham diÍiculdade e sells amigos com rabiscos que nem sempre lembram as pessoas ou
para;rcreditar que, por possuírem objetivos essencialmente comerciais, os
objetos retratados, rnas qlre, mesmo assirn, cllmprem o objetivo de
qr.radrinhos pudessem também contribuir para o aprimoramento cultural
comunicar urna rnensagem.
e moral de seus jovens leitores.
Aindir que de maneira intuitiva, tanto o homem das cavernas como
Pais e mestres desconÍiavam dirs aventuras fantasiosas das páginas
a criança de hoje parecem ter compreendiclo que, como diz a sabedo-
multicoloridas das uqs, supondo que elas poderiam afastar crianças e
ria popnlar, "uma imagem fala mais do que mil palavras". No entanto,
jovens de leituras "mais profundals", desviando-os assim de um ama-
embora as Íigulas das cavernas atendessem satisfatoriamente às neces-
durecimento "sadio e responsável". Daí, a entrada dos quadrinhos em
sidardes de comunicação do homern primitivo, elas logo se mostrariam
sala de aula encontrou severas restriçÕes, acabando por serem banidos,
muitas vezes de forma até violenta, do ambiente escolar. Aos poucos, tais insuficientes para acompanhar o desenvolvimento humano. A medida
restrições foram atenuadas e extinguidas, mas não de forma tranquila, em que as comunidades se tornavam nômades, a escrita simbólica,
sendo naverdade resultado de umalonga e árdua jornada. Para entender grafada em materiais mais leves, como o couro ou o pergaminho, pas-
melhor esse processo, é preciso recuar no tempo e conhecer um pouco sou a ftrncionar como elemento básico de comunicação. Ainda assim,
mais a evolução das histórias em quadrinhos e, por consequência, as raízes a formulação dos primeiros alfabetos guardou estreita relação com a
da resistência a elas por parte de pais e eclucadores. imagem dtrquilo que se pretendia representar, constituindo o que se
conhece como escrita ideográÍrca. É o caso dos hieróglifos e da escrita
japonesa, por exemplo.
A EVoLUÇÃO DAS I{ISTORIAS EM QUADRINHOS
O advento do alfabeto fonético fez com que a imageln passasse a
ter menor importância como elemento de comunicação entre os ho-
De certa forma, pode-se dizer que as histórias em quadrinhos mens, deixando de existir uma ligação direta entre a maneira como se
vão ao encontro das necessidades do ser humano, na medida em que representa graficamente um objeto ou um animal e a sua forma física
utilizam fartamente um elemento de comunicação que esteve presente real. Esse níve1 de abstração entre o objeto e seu símbolo representou
na história da humanidade desde os primórdios: a imagem gráÍrca. O Lrm avanço extraordinário para a humanidade, pois o novo sistema
homem primitivo, por exemplo, transformou a parede das cavernas em permitiu ampliar quase que ao infinito as possibilidades de composição
um grande mural, em qlle registrava elementos de comunicação para e transrnissão de mensagens e atingir um gralr de comunicação que o
seus contemporâneos: o relato de uma caçacla bem sucedida, a infor- desenho, isoladamente, não conseguia atingir. Por outro lado, vale lem-
mação da existêr-rcia de auimais selvagens em uma região específica, a brar que o acesso à palavra escrita ocorreu de forma paulatina, atingindo
indicação de seu paracleiro etc. inicialmente apenas as parcelas mais privilegiadas da população, o que
Assim, cluanclo o horr-rem das cavernas gravava duas imagens, uma garantiu a permanência da imagem gráfica como elemento essencial de
dele mesmo, sozinho, e ontra incluindo um animal abatido, poderia estar, comunicação na história da humanidade.

B 9
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Mesmo o aparecimento da imprensa não impediu que a imagem Com histórias de aventuras, no final da década de 1920, veio
as

gráfica continuasse a desempenhar pilpel preponderante na comu- também a tendência naturalista nos quadrinhos, que aproximou os cle-
senhos de uma representação mais Ítel de pessoas e objetos, ampliando
nicação humana: os séculos i rnediatarmente posteriores ao aparecimento
o seu impacto juntoao púrblicoleitor. Aomesmotempo, o aparecimento
da indústria tipograiÍica Íbram palco de uma infinidade de obras que
de um novo veículo de disseminação dos quadrinhos, as publicaçÕes pe-
aliavam, com bastante eficiência, a palavra impressa a elementos pic-
riódicas conhecidas como comicbooks-no Brasil, gibis-,nos quais logo
tóricos que atendiar-n aos rnais diversos objetivos, desde a doutrinaçào
despontaram os super-heróis, de extrema penetração junto aos leitores
religiosa à disseminação de ideias políticas, passando aincla pelo simples
mais jovens, ampliou consideravelmente o consumo dos quadrinhos,
entretenimento. Exernplos disso são a Bíbliallustrada por Gustave Doré tornando-os cadavez mais populares. A Segunda Guerra Mundial ajudou
e os milhares cle folhetins publicados entre os séculos xvII e xlx, a yasta
a multiplicar essa popularidade, com o engajamento Íictício dos heróis
imprensa humorística inglesa do século xvtu e a abundante produção de no conflito bélico e seu consunro massivo por grande parte dos adoles-
histórias infrrntis na França, Alemanha e Itália, entre outros. centes norte-americanos. As revistas de histórias em quadrinhos tiveram
A evolução cla indúrstr:ia tipográficar e o surgimento de grandes suas tiragens continuamente ampliadas, atingindo cifras astronômicas
cadeias jornalísticas, fundamentados em uma sólida tradição icono- naqueles anos.
gráfica, criaram as condições necessárias para o aparecimento das O final da Segunda Guerra Mundial viu o aparecimento de novos
históriars em quardrinhos como meio de comunicação de massa. Ainda gêneros nas revistas de quadrinhos, destacat-rdo-se as histórias de terror e
que histórias ou narrativas gráficas contenclo os principais elementos suspense, que enfocavam temáticas de gostos duvidosos e traziam repre-
dtr linguagem dos quadrinhos possam ser encontradas, paralelamente, sentações extremamente realistas. Apesar disso - ou talvez exatamente
em várias regiões do mundo, é possível aÍirmar que o arnbiente mais por isso -, sua popularidade entre os leitores adolescentes continuou a
propício para seu florescimento localizou-se nos Estaclos Unidos do crescer e as tiragens das revistas tornaram-se cada vez mais altas, levando
final do século xrx, quanclo todos os elementos tecnológicos e sociais parte da sociedade norte-americana a ficar preocupada com slla enorme
encontravam-se devidamente consolidados para que as histórias em influência sobre os leitores infantis.
quadrinhos se transformâssem em um produto de consumo massivo, O período de pós-guerra e início da chamada Guerra Fria foi es-
cornt, de [ato ocorreu. pecialmente propício para a criação do ambiente de desconfiança em
relação aos quadrinhos. Fredric Wertham, psiquiatra alemão radicado
Despontando inicialmente nas páginas dominicais dos jornais norte-
nos Estados Unidos, encontrou espaço privilegiado para unla cam-
americanos e voltados para as populaçÕes de migrantes, os quadrinhos
panha de alerta contra os pretensos malefícios que a leitura de histórias
eram predominantemente cômicos, com desenhos satíricos e persona-
em quadrinhos poderia trazer aos adolescentes norte-americanos.
gens carricarturais. Alguns anos depois, passaram a ter publicação diária
Baseado nos atendimentos que fazia de jovens problemáticos, o dr.
nos jornais - as célebres "tiras" *, e a diversificar suas temáticas, abrindo
Wertham passou a publicar artigos em jornais e revistas especializadas,
espaço para histórias que enfocavam núcleos familiares, anitnais antro-
ministrar palestras em escolas, participar de programas cle rádio e tevê,
pomorfizados e protagonistas Íêmininas, ernbora ainda conseruando os nos quais sempre salientava os aspectos negativos dos quadrinhos e
traços estilizados e o enfbque predominantemente cômico. Levados a sua leitura. Generalizando suas conclusÕes a partir de um segmento
todo o mundo pelos syndicares, grandes organizaçÕes distribuidoras de da indústria de revistas de histórias em quadrinhos - principalmente
notícias e material de cntretenimento para jornais detodo o planeta, essas as histórias de suspense e terror -, e dos casos patológicos de jovens e
histórias disseminartrm a visão de mundo norte-americana, colaboran- adolescentes que tratou em seu consultório, ele investiu violentamente
do, juntamente corn o cinema, par.l a globalização dos valores e cultura contra o meio, denunciando-o como uma grande ameaça à juventude
daquele país. norte-americana.

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Assim, utilizando-se de exemplos escolhidos a dedo e com rigor na Association of Comics Magazine já havian-r elaborado uma primeira
cientíÍico questionável, o psiquiatra tentava provar como as crianças proposta para depuração das publicaçÕes da indústria dos quadrinhos,
que recebiam influência dos quadrinhos apresentavam as mais variadas um Comics Code, quevisava garantir apais e educadores que o conteúdo
anomalias de comportamento, tornando-se cidadãos desajustados na das revistas não iria prejuclicar o desenvolvimento moral e intelectual de
sociedade. Posteriormente, Wertham reuniu suas observaçÕes em um seus filhos e alunos.
livro denominado A sedução dos inocente.s, publicado em 1954, que foi Bastante breve e genérica, essar primeira proposta não foi suficiente
um grande sucesso de pírblico e rrarcoll, durante as décadas seguintes, a para diminuir a sarnha moralista que guiava os detratores dos qua-
visão dominante sobre os quadrinhos nos Estados Unidos e, por exten- drinhos. Assim, após a publicação do livro do dr. Werthan-r, a Comics
são, em grande parte do mundo. Entre outras teses, o livro defendia, por Magazine Association of América sentiu necessidacle de elaborar um
exemplo, que a leitura das histórias do Batman poderia levar os leitores código mais detalhado, que passou a vigorar para todas as revistas de
ao homossexualismo, na medida em que esse herói e seu companheiro
histórias en-r quadrinhos. A partir dessa data, cada comic üook publicado
Robin representavam o sonho de dois homossexuais vivendo juntos. nos Estados Unidos passoll a receber um selo, fixado de forma bem visí-
Ou que o contato prolongado corrr as histórias do Superman poderia vel na capa, como forma de garantir à sociedade a "qualidade" interna.
levar uma criança a se atirar pela janela de seu apartâmento, buscando
Assim, as editorars norte-americilnas tentavam apaziguar os ânimos
imitar o herói.
da vasta classe média branca de seu país, que dizia estar zelando ptrra
Ínanter valores morais e religiosos.
Infelizmente, esse movimento formal de classificação dos quadrinhos,
\ em vez de colaborar para o tlprimoramento do meio como pretendiam
I seus idealiza<lores, teve dois efeitos bastante negativos sobre ele. Por um
lado, sotr o ponto de vista do mercado, gerou o desaparecimento de grande
nírmero de editoras, algumas com propostas bastante avançadLls em ternlos
de elaboração de conteúdos temáticos e reconhecimento da produção in-
telectual de roteiristas e desenhistas, tendo como consequência principal a
pasteurização do conteúdo das revistas.
De fato, de uma maneira geral, trs revistas de histórias em qua-
O livro Á sedução dos inocentes, de Fredric drinhos posteriores ao Comics Code caminhartrm decididamente paril
.t Wertham, que acusava os quadrinhos de a mediocridade, passando a veicular, enl sua grande maioria, histórias
'" 'k&YrY'""
*ilr$rt provocar anomalias de comportamento em
§r*
pífias e sem grandes pretensÕes criativas, qlle realmente poltco contribu-
crianças e adolescentes
íam para o aprimoramento intelectual de seus leitores. Por outro lado,
Devido ao impacto clas denúncias do dr. Wertharn e de outros seg- isto fez com que qualquer discussão sobre o valor estético e pedagógico
mentos da socied:rde norte-anrericarla - corno associaçÕes de professo- das ues fbsse descartada nos meios intelectuais, e as raras tentativas
res, mães e bibliotecairios, alén-r de grupos religiosos das mais diferentes acirdêmicas cle dar algum estatuto de arte aos quadrinhos logo seriam
tendências -, não tardou para que todos os produtos da indúrstria de encartrdas como absurdas e disparatadas.
quardrinhos passalssem a ser vistos con-ro deletérios, exigindo uma "vi- Em diversos lugares do mundo - França, Itália, Grã-Bretanha, Ale-
gilância" rigorosa por parte da sociedtrde .Parafazer frente a essa visão, manha e Brasil, por exemplo -, também explodiram ers críticas aos quadri-
ao final da década de 1940 alguns editores norte-americanos reunidos nhos, com motivação bastante semelhante (ainda que não tão agressiva)

12 13
...qr

.r \ ( r l r(,r(lir r)()s llstrrclos Unidos. Em praticamente todos os países nos 9. São proibidas pragas, obscenidades, pornograÍias, vulgaridades
,;rr,rr:,,s tJrrrltlr.in h«rs eram editados, manifestações contrárias partiram de
ou palavras e símbolos que adquiram sentido dúbio e inconfessável.
r ( ) r ('\('n l l n t cs clo rnundo cultural, educativo e científico. Alguns países
l 10. A gíria e as frases de uso popular devem ser usadas com mode-
('r r r( )
|
ram a estabelecer legislações restritivas aos quadrinhos,
)('r rs c lr cga
ração, preferirrdo-se sempre que possível a boir linguagem.
irrtk r a pLrblicação de material estrangeiro ou determinando crité-
l,r ,, il, 11. São inaceitáveis as ilustraçÕes provocantes, entendendo-se
r ios r'ísitlos para sua produção no país. No Brasil, os editores elaboraram
como tais as que apresentam a nudez, as que exibem indecente
rrrrr trirligo próprio e aplicaram às revistas um selo semelhante àquele
ou desnecessariamente as partes íntimas ou as que retratam poses
t lt'scnvolvi<lo nos Estados Unidos:
provocantes.
I2. A menção dos clefeitos físicos e das deformiclades deverá ser
evitada.
Código de Ética dos Quadrinhos* 13.Em hipótese algurna, na capa ou no texto, devem ser exploradas
histórias de terror, pavor, horror, aventuras sinistras, com as suas
l. As histórias em quadrinhos devem ser um instrumento de
cenas horripilantes, clepravação, sofrimentos físicos, excessiva
cclncação, formação moral, propaganda dos bons sentimentos e
exirltação das virtudes sociais e individuais.
violência, sadismo e masoquismo.
14. As forças da lei e da justiça devem sempre triunfar sobre as do
2. Não devendo sobrecarregar a mente das crianças como se fossem
r"rrn prolongamento do currículo escolar, elas devem, ao contrário,
crime e da perversidade. O crime só poderá ser tratado quando
contribuir para a higiene mental e o divertimento dos leitores for apresentado como irtividade sórdida e indigna e os criminosos,
juvenis e infantis. sempre punidos pelos seus erros. Os criminosos não podem ser
3. É necessário o maior cuidado para evitar que as histórias em qua- apresentados como tipos fascinantes olr sin-rpáticos e muito menos
rlrinhos, descumprindo sua missão, influenciem perniciosamente pode ser emprestado qualquer heroísmo às suas açÕes.
r juventude ou deem motivo a exageros da imaginação da infância 15. As revistas infantis e juvenis só poderão instituir concursos
c cla juventude. premiando os leitores por sells méritos. Tambérn não deverão as
4. As histórias em quadrinhos devem exaltar, sempre que possível, empresas signatárias deste Código editar, para efeito de venda nas
o papel dos pais e dos professores, jamais permitindo qualquer bancas, as chamadas figurinhas, objeto de um cornércio nocivo à
rrprcscntação ridícula ou desprimorosa de uns ou de outros. infância.
ir. Nlo ó permissível o ataque ou a falta de respeito a qualquer 16. Serão proibidos todos os elementos e técnicas não especiÍica-
rcligiiio ()tl raça. mente mencionados aqui, mas contrários ao espírito e à intenção
rr. ( )s p lincípios democráticos e as autoridades constituídas devem deste Código de Ética, e que são considerados violaçÕes do bom
st'r' prcstiuiaclas, jamais sendo apresentados de maneira simpática gosto e da decência.
orr lisorr jcirir os tiranos e inimigos do regime e da liberdade. 17. Todas as normas aqui fixadas se impõem não elpenas ao texto e
7. A Írrrrrília rriio prode ser exposta a qualquer tratamento desres- aos desenhos das histórias em quadrinhos, mas tantbém às capas
pcitoso, n('r)l () clivórcio apresentado como sendo uma solução das revistas.
l)itr.l .l\ tlilit rrltl,rtlt's ( ()niugaiS. 18. As revistas infantis e juvenis que forem feitas de acordo com
ll. l{claçocs scxrrrris, ccnas de amor excessivamente realistas, anor- este Código de Ética levarão na capa, em lugar bem visível, um
maliclaclcs scrtrrris, sccltrção e violência carnal não podem ser selo indicativo de sua adesão a estes princípios.
apresentirclas ucnr sc(l ucl sr-rgeridas.

14 t5
* Eli.rboraclo por um grupo de editores br:rsileiros
- de revistas de histórias que os meios de comunicação passassem a ser encaraclos de maneira
em quadrir-rhos, que incluía a Editora Gráfica O Cruzeiro, Editora Br:rsil- menos irpocalíptica, procurando-se anarlisá-los em sua especificidade
América Ltda, Rio GriiÍica e Eclitora e Editora Abril. Fonte: SILVA, Diaman- e compreender rnelhor o seu impacto na sociedade. Isto ocorreu com
tino da. Quadrinhos para tluadrados. Porto Alegre: Bels, 1976. p. 102- 104 todos os meios de comunicarção, como o cinema, o rádio, a televisão,
os jornais etc. Inevitavelmente, também as históritrs em quadrinhos
passaram a ter Lrm novo s/dÍus, recebendo uln poltco mais de atençào
Apesar desua imensa popularidade junto ao púrblicoleitor-composto das elites intelectuais e passando a ser aceitas conlo Llm elemento de
principalmente por jovens e adolescentes - e das altíssirlas tiragens ders destaque do sistema global de comunicação e conlo Llma forma de
revistas, a leitura de histórias em quadrinhos passou a ser estigmatizada manifestação artística com características próprias.
pelas camadas ditas "pensantes" da sociedade. Tinha-se corno certo que
O despertar para os cluadrinhos surgiu inicialmente no ambiente cul-
sua leitura afastava as crianças de "objetivos mais nobres" - como o co-
turtrl europeu, sendo depois arnprliado paral outras regiÕes do mundo. Aos
nhecimento do "rnundo dos livros" e o estudo de "assuntos sérios" -, que
pollcos, o "redescobrimento" das nes fez com que muitas das barreiras on
causava prejuízos ao rendimento escolar e poderia, inclusive, gerar con-
acusações contrâ elas fossem derrubadas e anuladas. De certa maneira,
sequências aincla mais aterradoras, como o embotamento do raciocínio
entendeu-se que grande parte da resistência que existia em relação a elas,
lógico, a diÍiculdade para apreensão de ideias abstratas e o mergulho em
principalmente por pa.rte de pais e educadores, era desprovida de funda-
um ambiente imaginativo prejudicial ao relacionanlerlto social e afetivo
mento, sllstentadarnuito mais em afirmaçÕes preconceituostrs em relaçào
de seus leitores.
a ummeio sobre o quirl, na realidade, setinhamuitopouco conhecimento.
De uma maneira geral, durante os anos qlle se seguiram à nralfa-
clada ctrmpanha de difamação contra elas, as histórias em quadrinhos A partir daí, ficou mais fiicil para as histórias en"r quadrinhos, tal como
quase tornaram-se as responsáveis por todos os males do mundo, ini- acontecelr com a literatura policial e a ficção científica, serem encaradas
migas do ensino e do aprendizado, corruptoras dtrs inocentes mentes eln slra especiÍicidade narrativa, analisadas sob uma ótica própria e mais
de seus indefêsos Ieitores. Portanto, qualquer ideia de aproveitamento positiva. Isto também, é claro, favoreceu a aproximação das histórias em
da linguagem dos quadrinhos em ambiente escolar seria, à época, con- quadrinhos das práticas pedagógicas.
siderada uma insanidade. A barreira pedagógica contra as histórias em Por outro lado, a percepção de que as histórias em quadrinhos
quadrinhos predominou durante muito tempo e, ainda hoje, não se podiam ser r,rtilizadas de forma eficiente para a transmissão de conhe-
pode afirmar que ela tenha realmente deixado de existir. Mesmo atual- cimentos específicos, ou seja, desempenhirndo uma função utilitária e
mente há notícias de pais que proíbem seus Íilhos de leren-r quadrinhos não arpenas de entretenimento, jai era corrente no meio "quadrinhístico"
sempre que as crianças não se saem bem nos estudos ou apresentarn desde n-ruito antes de seu "descobrimento" pelos estr-rdiosos da comu-
problemas de comportamento, ligando o distúrbio comportanental à nicação. As primeiras revistas de quadrinhos de caráter educacional
leitr-rra de gibis. publicadas nos Estados Unidos, tais como True Cornics, Real LiJ-e Conúcs
e Real Fact Comics, editadas durante a décac1a de 1940, traziam antolo-
gias de histórias em quadrinhos sobre personagens famosos da história,
O or,sconRrMENTO Dos euÂDRrNHos
figuras literárias e eventos históricos.
COMO PRODUÇÃO ARTÍSTICA E EDUCATIVA
Na segunda metade daquela mesma década, a editora Educational
Comics dedicava-se à publicação de histórias en-r quadrinhos religiosas e
O desenvolvimento dtrs ciências da comunicação e dos estudos de fundo moral, como Picture Stories from the Bible, Picture Stories from
culturais, principaln-rente nas úrltimas décadas do século xx, fez com Arn erican History, P ictur e Storiesfrom W orld History e Pictur e Stories from

1,6 11
Science. Títulos corno Classlcs lllustrated, reproduzidos praticamente no Entidades governarnentais de outros países preferiram aplicar a
mundo inteiro, inclusive no Brasil, buscavam aproximar as histórias em linguagem dos quadrinhos mais diretamente como apoio técnico à
qr-radrinhos das grandes obras literárias, vertendo para a linguagem das utilização de equipamentos e treinamento de pessoal em atividades
Hes os livros dos rnaiores autores da literatura mundial, como Charles especializadas. lá durante a Segunda Guerra Mundial, o Departamento
Dickens,William Shakespeare, DanielDefoe, VictorHugo, Jonathan Swift, de Defesa dos Estados Unidos, com a colaboração do célebre desenhista
Edgar Allan Poe etc. Will Eisner, utilizou fartamente os quadrinhos na elaboração de manuais
Outras publicações faziam da catequese seu maior objetivo, de- para treinamento de suas tropas.
dicando-se à transmissão de valores defendidos pela religião católica, Na Europa, a utilização dos quadrinhos como apoio ao tratamen-
sobressaindo-se aqueles, como Topix Comics e Treasure Chest, que se to de temas escolares de forma lúdica, possibilitando um processo de
dedicavam às biografias de santos e personagens bíblicos. Mais ou menos aprendizado mais agradável aos leitores, acentuou-se durante a década
na mesma época, na Itália, editoras ligadas à Igreja Católica também de 1970. Na França, por exemplo, a editora Larousse obteve um grancle
utilizaram fartamente a linguagem dos quaclrinhos para incutir nas êxito comercial com a publicação de t' Histoire de France em BD, em oito
crianças o sentimento religioso, em revistas que foram depois traduzidas volumes, que em sete anos teye mais de 600 mil coleçÕes vendidas, abrin-
e publicadas em muitos países do mundo.
do caminho para que a mesma editora lançasse, em 1983, também em
Mas a percepção dos benefícios pedagógicos dos qr-radrinhos nào oito volumes, outra obra em quadrinhos com Íins educativos, Découvrir
Íicon restrita apenas a autores e editores. Nos anos 50, na China comu-
la Bible. A obra foi depois editada em vários oLrtros países, como fapào,
nista, o governo de Mao Tse-Tung utilizou fartamente a linguagem das
Itália, Espanha e Estados Unidos.
histórias em cluadrinhos em campanhas "educativas", utilizando-se do
Outros editores, constatando o sucesso comercial desse tipo de
mesmo modelo de retratar "vidas exemplares" explorado pelas revistas
publicação, também se aventllrâram na nlesma linha, com maior ou
religiosas, mas enfocando representantes da nova sociedade que se pre-
menor sucesso, ajudando a Íirmar, perante o público, o entendimento
tendia estabelecer no país. As histórias podiam enfocar, por exemplo, a
de que as histórias em quadrinhos podiam ser utilizadas para a trans-
vida de um soldado que, a caminho de seu quartel, ao encontrar uma
pobre velhinha sem forças para caminhar, desviava-se de seu caminho e missão de conteírdos escolares, com resultados bastante satisfatórios.
a levava às costas até sua casa, passando a imagem de "solidariedade" que
Uma relação desse tipo de obras seria extensa e tediosa, mas, só para
o governo chinês pretendia vender à populaçào. qlre se tenha uma ideia de sua abrangência, é importante citar algumas,
como Ia Philosophie em bande dessinée, de Huisman y Berthomier,
i publicado em 1977; Psycholo§e em hande dessinée, de Huisman y Gilet,
de 1978; La vie de J. S. Bach e L'Ayenture de l'équipe de Cousteau, de
1985; e a série de títulos que buscam apresentar diversos personâ-
gens e temas para "principiantes", entre os quais sc encontram obras
dedicadas a Freud, Lenin, Einstein, Darwin, Trotsky, Marx, tr energia
nuclear, o Capital, os Estudos Cuhurais etc. Essa tendência se ampliou
pelo mundo inteiro, muitas vezes conr a tradução de obras publicadas
lmagem extraída de uma nos Estados Unidos e Europa, além da elaboração de personagens ou
das Hos editadas pelo ter-nas especíÍicos do local.
governo de [\4ao Tse-Tung:
Essas obras eram publicadas visando atingir o grande público,
os quadrinhos a serviço da
propaganda ideológica demonstrando a possibilidade de utilizar a linguagern dos quadrinhos

1B L9
__

com objetivos mais amplos que o simples entretenimento; mas a grande tornar suas aulas mais agradáveis, mas, também, conteúdos que pll-
maioria delas, com certeza, não buscava, especihcamente, o seu apro- dessem utilizar para transmissão e discussão de temas específicos nas
veitamento no ambiente escolarr - ou seja, não podiarn ser incluídas salas cle aula.
naquela categoria de pr-rblicaçÕes conhecida como "didáticas". Ainda qlte esta atividade tenha sido inicialmente vista com estra-
A inclusão efetiva das histórias en-r quadrinhos em lnateriais didá- nheza pela sociedade - at começar por aqueles professores que haviam
ticos começou de forma tírlicla. Inicialmente, elas eram utilizadas para crescido na época ern que os n-ralefícios cla leiturn de quadrinhos fazi.irn
ilustrar aspectos específicos das matérias que antes eram explicados parte do senso comulrr -, a evoh-rção dos tempos funcionou favorirvel-
por Lrm texto escrito. Nesse momento, as HQS apareciam nos livros rnente à linguagem das nqs, evidenciando seus beneÍícios para o ensino e
didáticos em quanticlade bastante restrita, pois aindar temia-se qlle sua garantindo sua presença no ambiente escolar formal. Mais recentemente,
inclusão pudesse ser objeto de resistência âo Llso do material por parte ern muitos países, os próprios órgãos oficiais de edr.rcação passaram a
das escolars. No entanto, constatando os resultados fàvoráveis de sr-ra reconhecer a importância de se inserir as histórias em quadrinhos no
utilização, alguns alltores cle livros didáticos - muitas vezes, inclusive, currículo escolar, desenvolvendo orientações específicas para isso. É o
por solicitação das próprias editoras -, começaram a incluir os quadri- que aconteceu no Brasil, por exemplo, onde o emprego das histórias em
nhos com n'rais frequência em suas obras, ampliando sua penetraçào quadrinhos já é reconhecido pela ros (Lei de Diretrizes e Bases) e pelos
no ambiente escolarr. ecN (Parâmetros Curriculares Nacionais):
Ainda qlle nem sernpre essa apropriação da linguagem tenha
ocorrido da maneira mais adequada - na verdade, houve erros e
exageros inevitáveis devido à inexperiênciir na utilização dela em Por que as histórias em quadrinhos auxiliam o ensino?
ambiente didático - a proliferação de iniciativas certamente contri- Existem vários motivos que levam as histórias em cluadrinhos a
buiu para refinar o processo, resultando, muitas vezes, erll produtos terem um bom desempenho nas escolas, possibilitando resultados
bem satisfatórios. Atuahrlente, é muito comllilt a publicação de livros muito melhores do que aqueles que se obteria sern elas. Veiamos
didáticos, em praticamente todas as áteas, que fàzem farta utilizaçào alguns deles:
das histórias em quadrinhos para transmissão c1e seu conteútc1o. No
Brasil, principalmente após ir avaliação realizirda pelo Ministério da Os estudantes querem ler os quadrinhos - há várias décadas, as
Educação a partir de meados dos anos de 1990, muitos autores de li- histórias em quadrinhos fazem parte do cotidiar-ro de crianças e
vros didáticos passaram a diversificar a linguagem no que diz respeito jovens, sualeiturasenclo muitopopuiar entre eles. Assim, ainclusão
aos textos informativos e às atividtrdes apresentadas como comple- dashistórias em quadrinhos na sala de aulanão é objeto de qualquer
mentares para os alunos, incorporando a linguagem dos quadrinhos tipo de rejeição por parte dos estuclantes, qlle, em geral, as recebem
em suas produções. de forma entusiasmerda, sentindo-se, com suir utilização, propensos
A partir daí, estava talvez indicado o caminho para qlle as Írltimas : a urna participação rlais ativa nas atividades de aula. As histórias en-r

btrrreiras contra a utilização das histórias en-r quadrinhos em ambiente quadrinhos altmentam a motivação dos estudantes para o couteítdo
didático pudessem ser derrubadas e as HQS pr-rclessem ser utilizadas livre- das arulas, aguçanclo sua curiosidarde e desaÍiar-rdo seu senso crítico. A
mente por professores e alunos no processo de ensino e aprendizagen-r. forte iclentificação dos estudantes com os ícones da cultura de massa-
Felizmente, as Írltimas clécadas do século passado presenciaram, cada entre os quais se dest;rcerm vários personagens dos quadrinhos -,
vez mais, a utilização de histórias em quaclrinhos pelos professores das é também um elemento que reforça a utilização das históriars em
diversas disciplinas, que nelas buscaram não apenas elementos para quadrinhos no processo didático.

20 21
- Palavras e imagens, juntos, ensinam de forma mais eficiente - a acesso a outras possibilidacles de comunicação que colaboram para
interligação do texto com a imagem, existente nas histórias em seu relacionamento familiar e coletivo.
quadrinhos, amplia a compreensão de conceitos de uma forma
que qualquer um dos códigos, isoladamente, teria dificuldades para Os quadrinhos auxiliam no desenyolvimento do hábito de lei-
atingir. Na rnedida em que essa interligação texto/imagem ocorre tura - a ideia preconcebida de que as histórias em quadrinhos
nos quadrinhos com uma dinâmica própria e complementar, re- colaboravam para afastar as crianças e jovens da leitura de outros
presenta muito mais do que o simples acréscimo de uma linguagem materiais foi refutada por diversos estudos científicos. Hoje em dia
a outra - como acontece, por exemplo, nos livros ilustrados -, sabe-se que, em geral, os leitores de histórias em quadrinhos são
mas a criação de um novo nível de comunicação, que amplia a também leitores de outros tipos de revistas, de jornais e de livros.
possibilidade de compreensão do conteúdo programático por Assim, a ampliação da fan-riliaridade com a leitura de históriars er-n
parte dos alunos. quadrinhos, propiciadtr por sua aplicação em sala de aula, possibi-
lita que muitos estudantes se abram para os benefícios da leitura,
Existe um alto nível de informação nos quadrinhos - as revistas encontrando menor dificuldade para concentrar-se nas leituras
de histórias em quadrinhos versam sobre os mais clifêrentes temas, com Íinalidade de estudo.
,t
sendo facilmente aplicáveis em qualquer áretr. Cada gênero, ntesmo
o mais comLrm (como o de super-heróis, por exemplo) ou cada Os quadrinhos enriquecem o vocabulário dos estudantes - as
história em quadrinhos oferece um variado leque de inforrnações histórias em quadrinhos são escritas em linguagem de tácil enten-
passíveis de serem discutidas em sala de aula, dependendo apenas do dimento, com muittrs expressÕes que fazem parte do cotidiano dos
interesse do professor e dos alunos. EIas podem ser utilizadas tanto leitores; ao mesmo tempo, na rnedida em que tratam de assuntos
como reforço a pontos especílicos do programa conlo parapropiciar variados, introduzem sempre palavras novas aos estudantes, cujo
exemplos de aplicação dos conceitos teóricos desenvolvidos em aula. vocabulário vai se ampliando cluase qr-re de forma despercebida
Histórias de ficção científica, por exemplo, possibilitam as mais ptrra eles. Essa característica dos quadrinhos atende à necessidade
variadas informaçÕes no campo c1a física, tecnologia, engenharia, dos estudantes de utilizar um repertório próprio de expressÕes e
arquitetura, química etc., que são muito mais faciln-rentc irssirniláveis valores de comunicação, corluns ao grtlpo em que se encontram
quando na linguagem das histórias en"r quadrinhos. Mais ainda, essas inseridos, não agredindo o seu vocabulário normal da forma
informarções são absorvidas na própria linguagem dos estudantes, como o fazem algumas produções literárias (como os livros clás-
muitas vezes dispensando demoradas e tediosas explicações por sicos de literatura, por exemplo). Dessa forma, pelos <padrinhos,
parte dos professores. histórias passadas no Velho Oeste norte-americano possibilitam,
por sua aplicação naquele contexto específico, a incorporação ao
As possibilidades de comunicação são enriquecidas pelafamiliari- vocabulário dos estudantes de termos referentes àquele ambiente,
dade com as histórias em quadrinhos - a inclusão dos quadrinhos tanto no que diz respeito a elementos geográficos como sociais
na saltr de auln possibilita ao estudante ampliar seu leque de meios ou tecnológicos.
de comunicação, incorporirndo a linguagem gráfica às lingr.ragens
oral eescrita, que nonrralnrente utiliza. Devido aosvariados recursos O caráter elíptico da linguagem quadrinhística obriga o leitor a
da linguagem qunclrinhísticir - como o balão, a onomatopeia, os pensar e imaginar - sendo uma narrativa com linguagem fixa, a
diversos planos utilizados pelos desenhistas -, os estudantes têm constituição de uma história em quadrinhos implica na seleção de

22 /_.7
- momentos-chave da história para utilização expressa na narrativa tamento das histórias em quadrinhos uos anos escolares iniciais
gráfica, deixando-se outros momentos a cargo da imaginação do e tampouco para sua utilização em séries mais avançadas, mesmo

leitor. Dessa forma, os estudantes, pela leitura de quadrinhos, são em nível universitário. A grande variedade de títulos, temas e
constantemente instados a exercitar o seu pensalnento, comple- histórias existentes permite que qualquer professor possa iden-
mentando em sua mente os momentos que não foram expressos tiÍicar materiais apropriados para sua classe de alunos, sejam de
graficamente, dessa forma desenvolvendo o pensamento lógico.
qualquer nível ou faixa etária, seja qual for o assunto que deseje
desenvolver com eles.
Além disso, as histórias em quadrinhos são especialmente úrteis para
exercícios de compreensão de leitura e como fontes para estimular
Todos os pontos mencionados no quadro anterior constituem
os métodos de análise e síntese das mensagens. É o que acontece,
apenas algumas razões para se deÍênder o aproveitamento das histórias
por exemplo, quando o professor solicita aos estudantes que passem
ern quadrinhos no ensino. Outros poderiam ser acrescentados, é claro.
para a linguagem dos quadrinhos uma história fornecida somente
Porém, mais do que listar vantagens, talvez seja interessante fechar
essas
r-ralinguagem escrita, o que iráexigirdeles que realizem uma análise
essa discussão lembrando duas características bastarnte pragn-ráticas do
detalhada dos fatos narrados e que definam os acontecimentos mais
aproveitamento dos quadrinhos em ambiente escolar: acessibilidade e
importantes para o desenvolvimento da trafila, antes cle representá-
baixo custo.
los grarficamente.
Mesmo neste mon-Iento, início do século ut, quando a indústria
dos quadrinhos está muito longe das tiragens verdadeiramente astro-
Os quadrinhos têm um caráter globalizador - por serem veiculadas nômicas que atingiu no seu período de maior popularidade - quando
no mundo inteiro, as revistas de histórias em quadrinhos trazem muitos títulos facilmente atingiam tiragens de n-rilhÕes de exemplares
normalmente temáticas que têm condiçÕes de ser compreendidas vendidos , pode-se dizer que sua disponibilidade é un-r fator ainda
por qualquer estudante, sem necessidade de um conhecimento incontestável. Elas podem ser encontradas em praticamente todas as
anterior especíÍico ou familiari<lade com o tema, seja ela devida a esquinas, em qualquer bancir de jornal do país, a um custo relativamente
trntecedentes culturais, étnicos, linguísticos ou sociais. Un-ra his- baixo quando comparado com olrtros produtos da indústria cultural.
tória qr-re se passe na sociedade japonesa pode, de uma maneira Além disso, também estão disponíveis em supermercados, farmácias,
geral, ter slra mensagem principal cornpreendida por leitores de armazéns, papelarias e outros estabelecimentos comerciais.
outros países, ainda que características especíÍicas dessa sociedade Fora itens raros oLI exemplares pertencentes a colecionadores, as
sejam desconhecidas para eles (estando aí, provavelmente, um revistas de histórias em quadril"rhos são facilmente obticlas, podendo ser
dos motivos do sucesso dos quadrinhos japoneses, os mangás, no adquiridas diretamente ou emprestadas de terceiros. De uma maneira
Ocidente). Além disso, exatarmente por seu caráter globalizador, irs geral, é possível afirmar que todas as pessoas têm o costume de partilhar
histórias ern quadrinhos possibilitam, com selr Lrso, a integração suas revistas de quadrinhos, emprestando-as para amigos e familiares,
entre as clifêrentes áreas do conhecirnento, possibilitando na escola e não oferecem muita resistência quânto a cedê-las para utilização por
um trabalho interclisciplinar e o com diferentes habilidades inter- professores e alunos. Assim, com relativa facilidade, podem os próprios
pretativas (visuais c vcrbais). estudantes se encarregar de obter as reüstas junto a amigos ou familiares,
auxiliando os professores na manutenção de um acervo útil para suas
Os quadrinhos podem ser utilizados em qualquer nível escolar e atividades de ensino.
com qualquer tema- não existe qualquer barreira para o aprovei-

24 25
=_...-rr_

Para utilização em ambiente didático, não é essencial que as his- Se imagem passada aos estlldantes pelo uso dos quadrinhos,
for esta a
tórias em quadrinhos sejam obtidas em primeira mão. Elas podem ser seus benefícios serão muito limitados. Além de ficar evidente para os
adquiridas em sebos ou lojas que comercializam materiais usados, oll alunos que eles estão sendo sutilmente enganados pelo professor, pode
mesmo recortadas de jornais antigos, a um custo praticamente insignifi-
gerar desconÍiança e mesmo aberta resistência à leitura e uso de histórias
cante. Ainda que a possibilidade de exibição de quadrinhos por meio de
em quadrinhos no ambiente escolar (ou mesmo fora dele), comprome-
projetores de slides ot datashows ajude a atingir os estudantes de forma
tendo trabalhos futuros com esse meio, tanto por parte desse professor
mais intensa, direta e coletiva, contribuindo parâ um resultado mais
especíÍico como de seus colegas de outras disciplinas.
eficiente, isto não é absolutamente essencial para sua utilização. Com
Da mesma forma, ulrla valorização excessiva das histórias em quadri-
os quadrinhos, tanto o professor quanto a instituição escolar estão, em
nhos pelo professor, principalmente no momento de sua utilização - como
princípio, isentos da necessidade de dispor de caros aparatos eletrônicos
se elas dessem a resposta desejadapara todas as dúvidas e necessidades do
para uso em sala de aula.
processo de ensino -, também acaba sendo pottco produtiva, pois coloca o
meio em uma posição desconÍ-ortável frente às outras formas de comunica-
ção. Os quadrinhos não podem ser vistos pela escola como uma espécie de
Couo urrlrzAR os euADRrNHos No ENSTNo panaceia que atende a toclo e qualquer objetivo educacional, como se eles
possuíssem alguma característica mágica capaz de transformar pedra em
Não existem regras. No caso dos quadrinhos, pode-se dizer que o ouro. Pelo contrário, deve-se buscar a integração dos quadrinhos a outras
único limite para seu bom aproveitamento em qualquer sala de aula produções das indírstrias editorial, televisiva, radiofônica, cinematográfica
é a criatividade do professor e sua capacidade de bem utilizá-los para
etc., tratanclo todos como formas complementares e nào corno ininrigas ott
atingir seus objetivos de ensino. Eles tanto poden-r ser r-rtilizados para
adversárias na atenção dos estudantes.
introduzir um tema que será depois clesenvolvido por outros meios,
Outra questão importante diz respeito à seleção do material a ser
para aprofundar um conceito já apresentado, para gerar uma discussào
utilizado em aula. Considerando o nútnero e variedade de publicaçoes
a respeito de um assunto, para ilustrar uma ideia, collto rlma forma
de histórias em quadrinhos existentes no mercado, essa seleção deve
lúdica para tratamento de um tema árido ou como contraposição ao
levar em conta os objetivos educacionais que se deseja alcançar. Nesse
enfoque dado por outro meio de comr-rnicação. Em cada um desses
casos, caberá ao professor, quando do planejamento e desenvolvimento
sentido, talvez o ponto fundamental dessa seleção esteja ligado à iden-
de atividades na escola, em qualquer disciplina, estabelecer a estratégia tiÍicação de materiais adequados - tanto em termos de temática como
mais adequada às suas necessidades e às características de faixa etária, de linguagem utilizada -, à idade e ao desenvolvimento intelectual dos
nível de conhecimento e capacidade de compreensão de seus alunos. alunos com os quais se deseja trabalhar, atentando-se a que a primeira
Consideradas essas questÕes, a aplicação das histórias em quadrinhos não é necessariamente um condicionante da segunda. De uma maneira
cleverá se adaptar ao cronograma do curso, sendo utilizadas na sequên- geral, considerando-se as características relacionadas aos diversos ciclos
cia norrnal das atividades e sem quarlquer destaque em relação al outras escolares, é possível fazer algumas considerações em relação aos materiais
linguagens ou alternativas diciáticas. A utilização da leitura cle gibis como a serem utilizados em cada um deles, como mostra o quadro a seguir:
um lxomento de relaxamento para os alunos, uma espécie de descanso no
uso de materiais mais nobres, pode atingir resultados exatamente opostos Pré-Escolar: os alunos se encontram nas primeiras iniciativas de
aos pretendidos. Ou seja: a aula não deve parar quando da introdução da representação (etapa pré-esquemática), atendendo a necessicla-
ieitura de qutrdrinhos, como se também o professor estivesse necessitando des motoras e emocionais. Em seu trabalho com a linguagem,
de um descanso l]a sua árdua tarefa de ensino. os resultados obtidos são menos importantes que o processo. A

26 21
- relação desses estudantes com os quadrinhos é basicamente lúdica, Nível Médio: os estudarntes dessa fase se caracterizam pela mudança
sem que interfira uma consciência crítica sobre as imagens que de personalidade, devida à passagem da adolescência para a idade
aparecem nas histórias em quadrinhos, tanto nas que recebem do adtrlta. Passam a ser tniris críticos e questionadores em relação ao
professor como naquelas que eles próprios produzem. Nessa fase, que recebem cm aula, não submetendo-se passivamente a qual-
é muito importante cultivar o contato com a linguagem das ues, qlrer material que thes é ofêrecido. Tendem tan-rbém a ter uma des-
incentiyando a produção cle narrativas breves em quadrinhos, confiança natural (e saudável) em relação aos meios, den-rarndando
sem pressioná-los quanto a elaboração de textos de qualidacle ou um tipo de material que clesafie sua inteligência. Por outro lac1o,
são também, muito pressionados pelo coletivo, perdenclo às vezes
a cópia de outros modelos.
um pouco c1e sua espontaneidade ao terem que conÍiontar suas
opir-riÕes pessoais com as do seu grupo. Nas produçÕes próprias,
Nível Fundamental (ln a 4u séries): nos primeiros ílnos, não se
buscarm reprocluzir personagens mais próxin-ros da realidade, com
pode identificar clualquer salto na capacidade expressiva dos
articulações, movimentos e detalhes de roupas clue acompanhtrm
alunos, que evoluem de forma sistemática e gradutrl para maior o que veeln ao sell redor.
reconhecimento e apropriação da realidade que os circunda. Aos
poucos, a criança vai deixando de ver a si mesma como o centro do A seleção dos materiais em quadrinhos a seren utilizados em aula
mundo e passa a incorporar os demais a seu rneio arnbiente, ou seja, deve levar em consideração essas características, de forma a atingir re-
evoluinclo em termos socialização. Da mesma forma, começa aos sultadgs mais satisfatórios. Fatores adicionais na escolha são, também:
poLlcos a identiflcar características específicas de grupos e pessoas, dispor de um texto qlre não tragar erros gramaticais; um tetna capaz de
podendo ser apresentada a diferentes títulos ou revistas de quadri- despertar e manter o ir-rteresse do grupo, que corresponda às necessidades
nhos, bem como ser instada a realizar trabalhos progressivamente da disciplina a ser ensinada; um material de qualidade gráÍrca adequadir
ao uso pretendido; outros aspectos que o professor considere relevantes
mais elaborados, qr-re incorporern os elementos da lingutrgem dos
para sua disciplina.
quadrinhos de uma Í'orma mais intensa.
Por Íim, na utiliztrção de quadrinhos no ensino, é n-ruito importante
que o professor tenha suliciente familiaridade com o meio, conhecendo os
Nível Fundamental (5o a 6u séries): os alunos se integram mais principais elelnentos da slla lingr-ragem e os recLrrsos que ela dispõe para re-
à sociedade que os rodeia, sendo capazes de distinguir os níveis presentação do imaginário; domine razoavelmente o processo de evoluçào
local, regional, nacional e internacional, relacioná-los entre si e histórica dos quadrinhos, seus principais representantes e características
adqr-ririr a consciência de estar eÍr um mundo muito mais am- como meio cle comunicação de massa; esteja a par das especiíiciclades do
plo do que as fronteiras entre sua casa e a escola. O processo de processo de produção e distribuição de quadrinhos; e, enÍim, conheça os
socialização se amplia, cort a inserção em grupos de interesse e diversos produtos em qlle eles estão disponíveis.
a diferenciação entre os sexos. Têm a capacidade de identificar Ao dominar adequadamente todos esses elementos, qualquer pro-
detalhes das obras de cluadrinhos e conseguem fazer correlações fessor estará apto a incorporar os quadrinhos de forma positiva em seu
processo didático, dinamizar"rdo suas aulas, ampliando a rnotivação de
entre eles e sua realidade social. As produções próprias incor-
seus alunos e conseguindo melhores resultados no processo de ensino
poram a sensação de profundiclade, a superposição de elementos
e aprendizagem. Os textos reunidos neste livro, envolveldo o uso das
e a linha clo horizonte, fruto de sua maior familiaridade com a
ues nas mais diferentes disciplinas, demonstram qlre, nesse campo, as
linguirgern dos quadrinhos. possibilidades são infinitas.

28 29
A LINGUAGEM DOS QUADRINHOS
uMA "ALFABET IZAç LO"
NECES SÁRIA

A "alfabetização" na linguagem especíÍica dos quadrinhos é indis-


I pensável para qlle o aluno decodiÍrque as múltiplas mensagens neles
presentes e, também, para que o professor obtenha melhores resultados
em sua utilização.
Em primeiro lugar, nota-se que as histórias em quadrinhos consti-
tuem um sistema narrativo composto por dois códigos que atlram em
constante interação: o visual e o verbal. Cada um desses ocuPa, dentro
clos quadrinhos, um papel especial, reforçando um ao outro e garantindo
que a mensagem seja entendida em plenitude. Alguns elementos da men-
sagem são passados exc.lusivamente pelo texto, outros têrn na linguagem
pictórica a sua fonte de transmissão. A grande mirioria das mensagens
dos quadrinhos, no entanto, é percebida pelos leitores por intermédio
da interação entre os dois códigos. Assim, a análise separada de cada um
deles obedece a uma necessidade puramente didática, pois, dentro do
ambiente das ues, eles não podem ser pensados separadamente.
Ligados a cada um dos códigos, os autores de sQs, ao longo dos anos,
forarn desenvolvendo e aplicando elementos que passaram a fàzer parte
integrante da linguagem específica do gênero, permitindo-lhes atingir
a rapidez de comunicação exigida por um meio de comunicação de
massa por excelência. AJguns desses elementos específrcos foram criados
dentro do ambiente próprio dos quadrinhos. Outros vão buscar sua
inspiração em diferentes meios e formas de expressão, tomando em-
prestado e apropriando-se de novas linguagens, adaptando-as confopne
a criatividade dos autores de uQs.

31
- leitura do texto escrito, ou seja, do alto par tr baixo e da esquerda para a
direita (nos países asiáticos, essa representação ocorrerá da direita para
( a esquerda, acompanhando a leitura das escritas japonesa e chinesa, por
exemplo), o que permitirá o entendimento da mensagem.
Essa mesrna ordem de leitura tambén-r ocorrerá dentro de cada
quadrinho, em relação à disposição dos personagens e suas respectivas
falas. Ou seja, acontecimentos que ocorrem antes na sequência temporal
- aincla que o intervalo entre os atos representados seja apenas de alguns
s No clássico Fábula em
segundos - são apresentados sempre à esquerda do quadrinho.

I h Veneza, aventura de Corso


Ítíaltese desenhada por Hugo *-l
l, .lr,
ir t?
Pratt, um exemplo didático de
utilização dos códigos visual e ,il \-l
in\ -,', :l
verbal. Nos três primeiros
quadrinhos os dois códigos
ir
iiiill
:ii. :{,
,!!1tF(
a

I I
interagem, nos demais,
prevalece o código visual.

Nesse sentido da apropriação da linguagem, cabe lembrar que o


meio que mais emprestolr recursos de linguagem aos quaclrinhos foi,
sem dírvidtr, o cinema, do qual as histórias em quadrinhos aliás sempre
estiveram muito próximas, tanto em termos históricos (ambos surgem
como indústria na mesma época, Íinal do século xx) como de prefe-
rência do pírblico. Na tira de Garfield, percebe-se como a "leitura" dos quadrinhos, mesmo
quando sem a utilização de palavras, segue o mesmo sentido do texto
escrito: da esquerda para a direita e de cima para baixo.

A r-rNcuacEM vISUAL (icoNrca)


A técnica de desenho utilizada nas histórias em quadrinhos vai
depender do objetivo de cada criador. Inicialmente, predominavarr nas
A imagem desenhada é o elemento básico das histórias em quadri- Hes os desenhos caricaturais. A partir do Írnal da década de 1920, no en-
nhos. Ela se apresenta colno uma sequência de quadros que trazem uma tanto, com a popularização das histórias de aventuras e de super-heróis,
mensagem ao leitor, normalmente uma narrativat, seja ela ficcional (um os quadrinhos de desenho naturalista tornaram-se muito comuns. A
conto de fadas, urla história infantil, a aventura de um super-herói etc.) esse respeito, éimportante assinalar que a adequação entre o estilo de
ou real (o relato/reportagem sobre fatos ou acontecimentos, a biograÍia desenho e a temática abordada na história ern quadrinhos é um aspecto
de um personagem ilustre etc.). muito sugestivo na utilização desse meio na sala de aula: é importante
Sua menor r-rnidade narrattiva será o quadrinho ou vinheta. A su- que o professor tenha bem clara a diferenciação de estilos, de modo a
cessão de vinhetas será, no mundo ociclental, organizada no sentido da tirar vantagens da variedade no processo de ensino.

)Z 33
=Er

O quannrNuo ou vTNHETA

O quadrinho ou vinheta constitui a representação, por meio de uma


imagem fixa, de um instante especíÍico ou de uma sequência interligada
de instantes, que são essenciais para a compreensão de uma determinada
ação ou acontecimento. Isso quer dizer, poftanto, que um quadrinho se
diferencia de uma fotografia, que capta apenas um instante, um átimo
de segundo em que o diaÍiagma da máquina fotográfica ficou aberto.
Assim, dentro de um mesmo quadrinho podem estar expressos
). { vários momentos, que, vistos em conjunto, dão a ideia de uma açào
í
específica. Nos quadrinhos que refletem luta, comuns nas histórias de
ô
It o ) aventura, pode-se retratar, em Llm mesmo quadro, tanto o momento do
impacto do soco qlle um personagem dá em outro como os rnomentos

w que antecedem essa açào ou acontecem em decorrência desse ato: as


,i.,

palavras de ameaça do agressor, o grito da vítima e o início de sua queda,


depois da agressão sofrida.
l*;xlrr§l
ólrslfl/

Vários
momentos
Nick Holmes'
Três estilos distintos de uo: o traço realista em de uma
de zezé Jm, r"presentação caricatural
o desenho estilizado mesma ação
personagens em Touro
"
Sentado podem ser
dos
mostrados
em um único
quadrinho:
no exemplo
A linguagem icônica estão ligadas questÕes de enquadramento' retirado
montagem de tiras
planos, arigtú;t de visão, formato àos quadrinhos' de Zagor,
i de personagens' bem como a utilizaçào
f agilrur, iesticulação e criação o soco,
visuais' A compreensão
àá rigrrtut".inéticas, ideogramas e,metáforas o início da
a melhor utilizaçào
.1. .ídu um desses .I.-Ãto, também permitirá
queda e o
possibilitará até mesmo a ela- grito da
àas histórias em quadrinhos no ensino e
vítima estão
todo o potencial
boração de HQs que utilizem com mais dese"'olt"ta na mesma
áu tirlg.tug.* típica do meio' A seguir, cada
um desses elementos será vinheta.
brevemente aPresentado'

35
34
__

começaram a neira às vezes estonteante. Embora isso atenda a uma característica do


Inicialmente, quando as histórias em quadrinhos leitor moderno, qlre exige uma narrativa gráÍica com maior dinan-rismo
as vinhetas costumavam
,.r.gi, .,ol; lornais dÀinicais e nas tiras diárias'
grande p*" d':1it-1*i:': visual e figuras marcantes, pode representar uma barreira para a leitura,
ter sempre o mesmo formato' Até hoje'
p:"Tt varraçoes' principalmente para leitores que não estão acosturnados a esse ritmo
.;J"-; utilizar-se desse estilo de apresentaçào'noscom jornais' Com o desen- narrativo, dificultando a compreensão da mensagem. A utilização de
p.ir-,.ipuf-.nte devido àslimitações de espaço
nas narrativas' diferentes formatos de quadrinhos é também uma característica dos
volvimento do gênero, visando obter mais-dinamicidade
quadrinhos japoneses, muito populares hoje em dia.
asvinhetaspassaramugu,.nu,osmaisdiferentesformatos.Aspáginas os
dominicais, po, rapidamente começaram a diversificar A decisão sobre o formarto mais adequado de vinheta a se utilizar
"r,"-ilo, mosaicos em q,adrinhos) que em Lrma determinada história dependerá também da ação que o artis-
formatos r"rtilizados, crànc1o verdadeiros
como Winsor McCay e Alex ta proclrra retratar. AçÕes que indicam movimento são normalmente
até hoje deslumbram os leitores' Artistas
;i;y-;ã, pr, conhecidos exatamente pela plasticidade melhor expressas em vinhetas retangulares. Por outro lado, a utilizaçào
"".*prt,lt"ram de vinhettrs de tamanhos difêrentes na mesma página colabora para a
que caracterizava seus trabalhos'
leitura da história, afastar-rdo bastante a monotonia visual.

Winsor McCaY, e outra de Flash


Uma página de Little Nemo, desenhada Por e
na arte de Propor novas ProPorçÕes
Gordon, Por Alex RaYmond dois pioneiros
maior dinamicidade à leitura
formatos aos quadrinhos, conferindo

publicadas em revistas' Página de Spawn e de Dragon Ball: formatos arrojados são característicos
Atualmente, as histórias em quadrinhos dos quadrinhos modernos; mas devem ser utilizados
pri".;;i;"nte aquelas do gênero de super-heróis' fazem utilizaçào
de ma-
com parcimônia com alunos não familiarizados com a linguagem
i"riur," arrojada àe for*ntãs de quadrinhos' intercalando-os

31
36
_--

for- Alguns autores preferem até não utilizar a linha demarcatória


Por sua vez, aslinhas que demarcam o contorno das imagens'
informativa' Linhas separando os quadrinhos. Simplesrnente a omitem. Na maioria dos
mando os quadrinhos, também possLrem função
casos, no entanto, essa linha é facilmente imaginada pelo leitor de forma
contínuas, sólidas, envolvendo u' i-ug""'
indicam que a ação retratada
Imagens quase automática, sua ausência não implicando em qualquer dificuldade
ocorre num momento real, presente - verossímil, Portanto'
de um acon- adicional para a leitura.
ã"á""a."a"s por linhas po"iilhudut.são representativas
podem mesmo representar
tecimento ocorrido em tempo pretérito ou
(nesse caso' com os mesmos
sonho ou devaneio de algum personagem Vwtibular
com contornos
objetivos, podem ser também utilizados quadrinhos
uma abundância cle
ondulados, em forma de nuvem) ' Além disso' existe
dos quadrinhos
exemplos de histórias em que as linhas.demarcatórias
história' ampliando as possibi-
p"r,i.ipuru." metalinguisticulr-rente da
lidades narrativas do meio'

t
Uma historia em quadrinhos
sem quadrinhos:
It"w LJ
\t r) ü
&c
o autor, Glauco, omitiu
propositalmente as linhas
demarcatórias de cada
vinheta, sem qualquer
preluízo do entendimento
*
üo
para o leitor

Na historinha
de Chico Bento, É importante tarmbém ter em mente que os contornos dos quadri-
o brasileiro uhos não representam uma gaiola da qual nada pode escapar. Autores
I\tlaurício de
Souza brinca que dominam a linguagem costumam, em determinados momentos-
com as linhas chave, extrapolar os limites dos quadrinhos, fazendo corn que parte da
I demarcatórias ação se desenrole fora deles. Em outros momentos, os quadrinhos, por
dos quadrinhos, necessidade narrativa, podem apârecer inter-relacionados, com uma
estabelecendo
mesma ação sendo contada de forma a virtualmente transpassar os
uma esPécie de
metalinguagem cluadrinhos (como a trajetória de uma flecha ou de urna bala, um corpo
do gênero que se movimenta após urn soco etc.)

39
38
Plano Total ou de Conjunto - representa âpenas a pessoâ humana
e pouco mais, não permitindo ver muitos detalhes do espaço em volta
do(s) personagem(ns). A representação do cenário é a menor possível:
$
,".{}
*ü .i§

,.)

criativa utilização dos


Na tirinha do Cebolinha, de lVlaurício de Souza' uma
humorÍstico e obtido pelo rompimento dos contornos
quaàrlnhos: o efeito
rígidos das ProPrias vinhetas

PraNos P ÂNculos DE VISÃo

a for-
Nos quadrinhos, os enquadramentos ou planos representam
ma como uma determinada imagem foi representada'
limitada na altura Flash Gordon. '

na pintura' na fotografia e no
. iu.grr.u, da mesma forma como ocorre
se referirem à
cinema. Os diversos planos serão nomeados conforme
do corpo humano' Nesse sentido' os quadrinhos
utilizam Plano Médio ou Aproximado - Representa os seres humanos da
representação
a denominação utilizada no cinema: cintura para cima. Permite que se tenha mais clareza dos traços fisio-
nômicos e expressões dos personagens e é muito utilizado para cenas
de forma a abranger
Plano Geral- enquadramento bastante amplo' de diálogos:
tanto a fi.guruhr-urru.omo, também, todo o cenário que a envolve' É o
equivalente às descrições do meio ambiente nos romances:
;úy *U§!*ç aae*S Tu9Âoua!6É eÀ1&elí9,
ÍuÁq.' ff ÀE yaa êü! Áclte r §çorãÁbtÉç..,

I
cÜr,|a
ri
1

H'€
Las Aventuras
A
de Glenn DYstra Jim das Se/yas

40
4l
__

Plano Americano - retrata os personagens a partir da altura dos


ui\ÀÂ ...
joelhos, baseando-se na ideia de que, em uma conversação normal'
nossa
CÀVrIXA J

pe..epçao c1a pessoa com quem se está falando se dilui a partir


desse

ponto da anatomia humana:

Fantasma e Los inoxidables

lá os ângulos de visão representam a forma como o autor deseja


Tex
qlre a cena seja observada. Basicamente, eles se dividem em três tipos:
Ângulo de visão médio - a cena é observada como se ocorresse à
PrimeiroPlano-Limitaoenquadramentoàalturaclosombros altura dos olhos do Ieitor. É a mais comum, normalmente utilizada em
e seu
da figura representada, salientando a expressão do personagem cenas de ação mais lenta:
estado emocional: r§r;r".s ,-(rxôfi pr& §'§'}tlb§í{r,
pl§§& &l,l§ §ufr§r &{}sͧ§
1rq§1 - 5$lf, &§T0 p6l vl§§{..
»&NrÊ Dg t,l,$
:§ \\ 3Êr!::},{1À1§â â
41Âr§ &§.:Êqlr-

)
Tarzan

Plano de Detalhe, Pormenor ot close-up - limita o espaço


em
ou de um objeto em particular'
torno de parte de uma figura humana
passaria
Serve para realçar um elemento da figura que normalmente
Homem Aranha
despercebido ao leitor:

43
42
__

também chamado de plongé ou picado' Logicamente, nenhuma história em quadrinhos irá utilizar planos
Ângulo de visão superior -
ângulos de visão de uma maneira uniforme. Para tornar a leitura mais
nele a uçao e enfocada de cima para baixo. Esse ângulo de visão nor-
e
dinâmica e atrativa, costluna-se alternar os diversos planos e ângulos,
malmente permite que os personagens sejam diminuídos' quase que
fazendo conl que um plano geral preceda um plano médio, utilize-se
encurral,ldos pelo meio amtiente ou pelas adversidades. São utilizados
um plano de detalhe para inserir um clima de suspense na narrativa,
em momentos de grande tensão, quando se deseja causar suspense:
retrate-se os personagens de cima para baixo nos momentos em que vi-
venciam grandes perigos ou ameaças e por aí afora. Mais recentemente,
as páginas de abertura das histórias costumam trazer um grande cluadro
que ocupa toda a página, com um plano geral:

Los inoxidables

Ângulo de visão inferior - Também conhecido como contre-plongé


LAti Avlit\t't'lrnÀli nr GlElrll\l DY$TllA
ou cont;aPicado, nelese vê a ação de baixo para cima' Em geral' é utili- Las Aventuras de Glenn Dystra SERIH B
,udo paru erraltecer, engrandecer ou tornar a Íigura retratada mais forte
do q.r" ela realmente é. Muito comlrm em histórias de super-heróis' MoNrec;El,r
principalmente para salientar a figura do protagonista'
A montagem de uma história em quadrinhos vai depender do tipo
de narrativa e do veículo em que ela serápublicada. As tiras de jornal, por
sua própria característica, precisam trabalhar temas especíÍrcos em dois ou
três quadrinhos, algumas yezes de forma isolada, em outras, interligadas
com tiras anteriores e posteriores. O primeiro modelo é característico de
tiras de humor, no qual toda a narrativa se inicia e termina em uma única
tira, seguin do a já consagrada fórmula conhecida co mo a- gag- a - day (uma
piada por dia). O segundo modelo está ligado às histórias de aventuras,
cujas tiras diárias partem de um gancho ou momento de tensão ante-
riormente dado, um desenvolvimento desse momento e a geração de um
Batman. segundo momento que criará elo com a tira do dia seguinte, garantindo
o cavaleiro das ÚreYas o retorno do leitor.

45
44
___

a publicação em jornais, muitas tiras de quadrinhos, devido a sua


popularidade junto aos leitores, são reunidas em álbuns, publicados
regularmente. Esse novo formato de publicação pode muitas vezes
implicar em readaptações de algumas tiras, a Íim de evitar redundân-
cias na narrativa.
Além disso, os editores ou até mesmo o próprio autor podem en-
tender necessário refazer as tiras iniciais - principalmente quando estas
forarn publicadas muitos anos antes -, atualizando a representação grá-
fica dtrs primeiras tiras do personagem às linhas atualmente adotadas;
outras vezes, podem reagrupar essas tiras segundo os temas tratados,
iü f:: i.
possibilitando uma nova forma de aproximação do leitor à obra. Todas
!f essas questÕes influenciarão na apreensão do sentido dos quadrir-rhos e
..\: t
I podem ser elementos a merecer consicleração por parte do profêssor na
sua abordagem em sala de aula.
Dois modelos de tiras diárias publicadas em
jornal: na primeira , em l\4afalda,
anarrativaseresumeaostrêsquadrinhosdaqueledia;nosegt undo,
em
a inicia com a continuação de uma tirinha do dlia anterior e,
Cisco Kid, açáo
ao final, estabelece um gancho para a do dia seguinte' <r)

A diferença entre os dois modelos é substarrcial, pois' no primeiro'


en-

qua,to a leituia de uma tira isolacla permitirá um entendimento completo


da mensagem (mesmo quando as aneclotas sobre urn
rresmo tel'lla sào cles-
dobradas em vários dias seguidos), no segundo, na mtrior palte das vezes' a
leitura isoladada tira po.r.á esclarece o leitor, darndo a ele impressão de ter crrr*e6itr*
interrompido um diálogo de alguém, sem saber sobre qlle assunto
estava-se

YlK
tratando antes e qual será o eventual <lesfecho cla conversa'
A partir de finais da década de 70, a diminuição cle espaço para os
tiras
quaclrinhos nos jornais obrigou muitos editores a limitarem as
u doi, quadrinhos, o que levou à diminuição do número de
tiras de
encon-
aventuras presentes na imprensa periódica, pois muitos autores
traram dificuldade para atingir o mesmo clímax narrativo com apenas

dois Írnicos quadrinhos.


Normalmente, as tiras recebem por título o nome de seu persona- Flash Gordon e Charlie Brown: exemplos de quadrinhos que, publicados
gemougrupodepersonagensmaisdestacado.Estetítulonormalmente originalmente em tirinhas de jornal, foram posteriormente rediagramados e
ãpur"..-ro olto da tira, à escluerda, sendo a primeira coisa a chamar a reagrupados para publicação em álbuns ou revistas
aierrçao do leitor, acompanhando o sentido normal de
leitura' Após

46 47
=_r

por
Histórias elaboradas para publicação em revistas ou álbuns'
sua vez, possuem un] ritmo narrativo diferente do
das tiras de jornal'
deperldendo de seus objetivos. Inicialmente, as histórias
púlicadas nos
,t*i, book, ou gibis eram bastante curtas, com uma média entre seis
e sete páginas. Assim, cada revista trazia várias
histórias' muitas vezes
.o* proiugonistas diferentes, cada história podendo ser lida de forma
direta
independente, sem qualquer relação com a outra e sem relação {
com histórias anteriores do mesmo personagem'
Esse moclelo prevaleceu na indústria das sQs' principalmente
a

quebrado a partir da )
norte-americana, durante muitos anos, sendo
de seu ,;
clécada de 60, quando a Marvel Comics, sob a coordenação
à

editor-chefê Stan Lee, introduziu um modelo em que a continuidade


as histórias Logotipos do Superman, Batman e Spawn:
narrativa exercia papel preponderante, o que transformou marcas registradas colocadas sempre no início de cada história, conferindo
aquelas que'
em quadrinhos puUil.aaas por essa empresa - e Por todas identidade aos personagens
voluntária ou involuntariamente, seguiram os Seus passos -, em episó-
dios de uma grande e, às vezes, interminável saga'
mo splash page' Também em destaque na primeira página vem o título da história,
A primeira página da história, também conhecida co
E uma espécie
escolhido de forma a funcionar como um atrativo ao leitor. Ele é mais
funciona como uma introdução à narrativa que se seguirá' um elemento que poderá ou não levar o leitor a optar pela leitura da-
c1e indicativo sobre o que será tratado
nas páginas seguintes, introduz.indo
quela história ou pela compra da revista, pesando bastante nessa decisão.
o leitor diretamente nos eventos e atmosfera
da história, fazendo com que
Por outro lado, pode também representar uma artimanha visando dar
elecompreendaosprincipaiselementosnelaenvolvidoseretomando' ao leitor uma falsa expectativa; nesse caso, o resultado é normalmente
eventualmente, elementos de histórias anteriores' contraproducente, deixando o leitor insatisfeito com os resultados, o qlre
Essa página inicial pode ter apenas um grande
quadro que ocupe
pode ser suicida partr produtos da grande indírstria.
de maiores
toda sua extensão, ou, mais tradicionalmente' Llm quadro Nas histórias em quardrinhos, a página pode ser considerada como
mas isso poderá variar de
dimensões seguido por dois outros menores) urn grande bloco narrativo, representando um segmento de uma açào
fixos'
acordo .o* À, objetivos do autor' Em histórias de personagens contada em várias páginas sequenciais. Em boas produções, ela é re-
sua identificação, em forma de logotipo' aparece
no alto sultado de um planejamento deliberado, de forma a se encadear com
normalmente
da página. Esse logotipo constitui o grande elemento
identiÍicador' a aquilo que a precede e o que lhe é imediatan-rente posterior. Nesse
que é zelosamente cuidada por planejamento, os alltores e editores de quadrinhos estão especialmente
-ur.u d. furrtasia do "produto" específico, imediata
parte das grandes ediioras. o logotipo garante a identiÍicação atentos ao fato de que cada virar de página representa a perda de um
produtos pouco da atenção do leitor, que deve ser imediatamente recuperada
ào p"rrorugem junto a seu público, podendo ser utilizado
em
desenhos animados' brinquedos' livros' nos primeiros quadrinhos que ele 1ê na página seguinte ou <1ue pode
derirados dàs quadrinhos, como
projeto gráfico ser desviada para outro ponto da narrativa, conforme os interesses
filmes etc. O logotipo deve interagir graficamente com o
imediatos do autor.
da primeira página, valorizando-o'

49
48
=".-r

ern que conclui alguns desenvolvimentos temáticos, propor outros que


Assim, além de considerar as unidades de informação menores - os
terão continuidade em uma história posterior do personagem, criando
diversos quadrinhos - é preciso ter em vista sua relação com os demais,
ou seja, com o conjunto da página, levando-se em conta que o leitor a o necessário suspense que compelirá o leitor a retornar ao título futu-
enxerga colno uma unidacle e, ao focalizar sua atenção em um quadrinho
ramente. Em termos gráfi.cos, as histórias em quadrinhos geralmente se
continua tendo arinda presente à sua frente, por meio da visão encerraflr com Lrm quadro maior, normalmente um grande plano, ao pé
"rp".ifi.o,
p"tiféti.u, os olrtros componentes c1a mesma página. Poucas pessoas têm c1o qual se coloca a palavra "Íim" ou, no caso de Írnal provisório, alguns

Ltma compreensão exata da complexidade desse sistema de recepçào


indicativos do que poderá ocorrer no próximo episódio.
cluanclo se está lendo urna história em qnaclrinhos e nem, tampouco,
que nele talvez repouse a maior responsabilidade pelo fascínio que o
r Ítôa
meio consegue despertar em seus leitores.

§t PAT§ÍÀ'
&t
§r( §râ§xtÔ§t &,§
* §!*§ § li! â6§
, tm§&r!
!§ mlx§,r{, }§§mü,
m§ §§§§l§§!xÍ{r p§§§ §Í§,§§l§§§ tUlrertir*§sl]si4,'{x

Página dupla de X-tVen e uma de Elektra: Aleitura de uma página


de Ho envolve um complexo e instigante exercício de percepção,
§ R§llt§ ôsa
em que os detalhes interagem para compor uma unidade carregada
D⧠TR§\§! §§§§
t§mrll
de significados e sugestões
Zagor e Pernalonga: dois modelos de final de história típicos dos
quadrinhos: no canto direito da última vinheta, o convite para uma
Desse r.nodo, a constituição cle uma página de quadrinhos é feita de continuação ou o caracterÍstico "Fim"
modo a considerar todos os eletnentos que influen"r na leitura, buscan-
do criar uma dinâmica interna que facilite o entendimento. Portanto,
Pno'ra.coNtsrAS E pERSoNAcF,NS SECUNDÁRIos
questÕes como perspectiva, cores, claro/escuro, tonalidacles de sombra
e massa etc. influenciam tanto no aspecto gráfico da página quanto na
compreensão da mensagem.
A maioria das histórias em quadrinhos produzidas pela grande
Na elaboração de uma história em quadrinhos, o final deve repre- indústria costuma ter um protagonista fixo, constituindo o que se
costuma chamar de "série". O protagonista é graÍicamente distinto dos
sentar o coroamento lógico da narrativa, Íêchando todos os pontos que
demais, tanto por atributos físicos colno por suas caractcrísticas sociais
foram abertos (no caso de uma história isolada) ou, ao mesmo tempo

51
50
=_r

e intelectuais. Fisicamente, principalmente no caso das histórias de utilizar-se de uma representação realista dos personagens. Mas isso nào
super-heróis ou de aventllras, Costlrmam Ser Sempre retratados Com o é uma regra, pois muitas histórias de aventuras utilizam um desenho
identificação imediata estilizado, com personagens caricaturais ou antropomórficos, como,
-ãrroo tipo de roupa, a Íim de possibilitar sua
por parte dos leitores. Além disso, tanto as cores corrlo os instrumentos por exemplo, as históriirs dos persorragens da Disney.
utilizados pelos heróis dos quadrinhos podem ter uma função simbólica, Elementos também importantes para a caracterização dos persona-
reforçando uma determinada visão de mundo- gens e compreensão da mensagem das histórias em quadrinhos são suas
expressões corporais e faciais, que muito influenciam a compreensão de
seu estado de espírito. As expressÕes faciais seguem um código univer-
salmente aceito para eviclenciar cada estado de ânimo, possibilitar-rdo
expressar os mais variados sentimentos, de acordo com a criatividade
de cada autor. Por sua yez, os gestos do personagem acompanham as
características deÍinidas para ele.
Por último, é importante lembrar que, sendo um meio de comuni-
cação de massa, muitas histórias em quadrinhos tendem a Íirmar-se em
estereótipos para melhor fixar as características de um persontrgem junto
ao público. Este tipo de representação traz em si uma forte carga ideoló-
gica, reproduzindo os preconceitos dominantes na sociedade. E não se
O Capitão América e seu uniforme que faz trata apenas de representar o herói com Llma figura agradável ao olhar
referência explícita às cores da bandeira
e o malfeitor com traços simiescos, mas, às vezes até sub-repticiamente,
norte-americana: a imagem idealizada do
"paladino da democracia" salientar traços ou situaçÕes que fortalecem a visão estereotipada de
raças, classes, grupos étnicos, profissÕes etc. Ainda que hoje em dia esses
Por sua vez, em alguns gêneros de quadrinhos, principalmente os estereótipos já não tenham a mesma agressividade que tinham no início
de aventuras e de super-heróis, os personagens secundários são este- dos quadrinhos, representações cle determinados grupos podem surgir
reotipados, podendo ser classiÍicados eln algumas poucas categorias: nas histórias em quadrinhos de forma ostensivamente preconceituosa.
a namorada ou o objeto de interesse amoroso do protagonista; o(s)
companheiro(s) do herói; o vilão ou oponente; os personagens de apoio'
E11 geral, todos esses personagens concorrem para destacar a atuação do lst sb lxeslorwt e*p;ffíklfl:
protagonista, criando uma situação que, devido àsua complexidade, exige
sua interferência pessoal. Os exemplos se multiplicam: o vilão ameaça
destruir uma propriedade ou se apropria de bens que não the pertencem,
o companheiro ou a namorada do herói encontram uma dificuldade
que não podem resolver sozinhos, alguma pessoa da comunidade traz ao
"). "
protagonista uma solicitação de ajuda etc. ",}
A representação gráÍrca dos personagens - da figura humana, Tintin e l\rlorgan: seja numa história de desenho estilizado ou numa de traço
enfim -, vai obedecer ao estilo dos quadrinhos. Histórias cômicas mais naturalista, os antagonistas são desenhados de modo a distinguir-se
tendem a ter personagens caricatos, histórias de aventuras costumam negativamente dos herois

52 53
--r

*§\,?t
FrcuR,rs ctNETtcAS E METÁFORAS vlsuAIS
xr-ã*k"

Nas histórias em quadrinhos, como já comentado, as imagens sào


sempre fixas. Para dar a ideia ou ilusão de mobilidade, de deslocamento
físicà, o meio desenvolveu uma série de artifícios que permitem ao
leitor apreender a velocidade relativa de distintos objetos ou corpos,
generiàmente conhecidos como Íiguras cinéticas. Ainda que seja
Impossível esgotar aqui todos os tipos possíveis de figuras, pois elas
variam de acordo conr a ct'iatividade dos autol'es, as mais cotttuns sào
as que expressam trajetóriir linear (linhas ou pontos que assinalam
o
pãrcorrido), oscilação (traços cllrtos que rodeiam Llm perso- âttü- .,.§EM?Râ

"rpuço indicanclo tremor ou vibrarção), impacto (estrela irregular em âu'Ru! o§ Rê1Rd-


GRAOo§1..,
nagem,
ç
cuio centro se situa o objeto que produz o impacto ou o lugar ontle
Ç
?
((
ele ocorre), entre olrtras. a
( {((
&
*qt\à'.
{ãã '&
Em l\rlafalda, Tintin, Bidu e Spirou, exemplos das inúmeras possibilidades de
utilização das metáforas visuais nos quadrinhos:
os alunos podem ser incentivados a interpretá-las

A LmcuacnM VERBAL

Sendo um sistema de significação que utiliza dois códigos en-r intera-


Para dar a sensação de movimento, os desenhistas de no lançam mão ção, parte da mensagem das histórias em quirdrinhos é passada ao leitor
das figuras cinéticas, em que traços, linhas e repetições de imagens por meio da linguagem verbal. Esta vai aparecer principalmente para
servem para representar deslocamentos, oscilações e impactos' expressar a fala ou pensamento dos personagens) a voz do narrador e os
lmagens de Gen e Senninha. sons envolvidos nas narrativas apresentadas, mas também estará presente

metáforas visuais atuam no sentido de expressar ideias e senti- em elenentos gráficos, como cartazes, cartas, vitrines etc. A Íim de integrar
Já as
mentos, reÍbrçando, muitas vezes, o conteúdo verbal. Elas se constituem a linguagem verbal à flguração narrativa, os quadrinhos desenvolveram
diversas convençÕes especíÍrcas àsualinguagem, que comnnicam instan-
em signos ou conyenções gráficas qlle têm relação direta ou indireta
aor, &p.arrões do senso comum, como, por exemplo, "ver estrelas"' taneamente ao leitor o" status" do enunciado verbal.
"falar cãbras e lagartos", "dormir como um tronco" etc' As metáforas Assim, os textos verbais que representam formas de comunicação dos
personagens, internas ou externas, aparecem nos quadrinhos envoltos por
visuais possibilitam um rápido entendimento da ideia. Elirs podem
estar loializadas dentro ou fora dos balões. Como no caso das Írguras uma linha circular, próxima à cabeça do(s) que as expressam. Da mesma
cinéticas, sua variedade é infinita. forma, os textos que contêm a expressão do narradorvêm acondicionados

55
54
-r em um retângulo colocado no canto superior esquerdo do quadrinho. A
A presença do balao ligado por um prolongamento chamado ra-
bicho, trpontando um personagem, é um alerta ao leitor, dando-lhe a
representação verbal de sons é feita nos quadrinhos por meio das ono-
seguinte mensagem: "Eu estou falandol" Como mais de um personagem
matopeias, normalmente em caracteres grandes e dispostas na vinheta
pode "falar" em um mesmo quadrinho, o balão também funcior-ra, pela
de maneira a valorizá-la graficamente. A seguir veremos cada um desses
sua disposição, como un-r indicador da ordem dos falantes, acompa-
elementos em detalhes.
nhando a direção linear pela qual se lê. Ou seja: balões colocados na
parte superior esquerda do quadrinho devern ser lidos antes daqueles
colocados r\ direita e abaixo. Os balÕes clevem tan-rbém acompanhar as
O n,crÀo convenções dos diálogos: o balão que é lido primeiro no quadrinho
deve também ser aquele que representa a fala inicial em uma conversa.
Frequentemente, quando personagens de histórias em quadrinhos
são transplantados para o meio cinematográfico, muitos leitores recla-
marn de que a voz na tela não corresponde à do persontrgem' Como §alll,,. §çc ,. , tt!r§, §rt§rss
rôr drrrrssr tta v§§{:ox§À de {s §{trrit
6§ §e ,'§.trr*!
üata§ {ar{
ôrr§a nc x'|rr
pode ser isso? Afinal, os personagens dos quadrinhos não falam'
§

Eles realmente não falam; no entanto, os leitores leem suas palavras §§, ôt{t, tt| &e àr|Êar§a"
6tl sLtú §rrâ§&.
e têm a impressão de ouvi-las em sllas mentes. Essa impressão é criada t
§s§.! &.§arlr§§
ttl frtl
nos quadrinhos pelo uso de balões de fala, que formam um ódigo
trh,

bastante complexo. Isso acontece porque, principalmente pelo balão, i\

as histórias em quadrinhos se transformam em um verdadeiro híbrido


de imagem e texto, que não podem mais ser separados. O balao é a §
intersecção entre ilnagem e palavra.
Ele apareceu timidamente nos quadrinhos no final do século
xrx, em uma história do personagem Yellow Kid. Descoberto seu po- Numa sequência de Pernalonga vê-se que a disposição gráfica
tencial, passou a ser utilizado de maneira regular nas histórias dos dos balões no interior dos quadrinhos determina a ordem de leitura e,
Katzenjammer Kids (Os Sobrinhos do Capitão) e Little Nemo in assim, serve para orientar o leitor quanto à sequência exata da narrativa
Slumbiiland, tornando-se depois uma marca característica dos quadri-
nhos. Sendo uma convenção, o código auditivo transmitido pelo balao
Por outro lado, também como resultado de uma convenção de-
passa geralmente despercebido ao leitor, a menos qlle um comentário
senvolvida no seio cla lir-rguagenr das ues, o continente do balão - ou
iextual chame a atenção ou que participe ativamente da narrativa,
seja, a linha que o delin-rita - também informa várias coisas ao leitor.
transformando-se em rnetalinguagem.
Vejamos alguns exemplos:
Para a decodificação da mensagem contida no balão, o leitor deve
considerartanto imagem e texto como outros elementos do código que sào
.linhas tracejadas transmitem
mais ou menos icônicos por natureza. Cotno característictr única dos qua- - a Êô0!â I

drinhos, obalão representa uma densa fonte de informaçÕes, que começam ideia de que o personagem está fa-
a ser transmitidas ao leitor antes mesmo clue este leia o texto, ou seja, pela
lando em voz muito baixa, de forma
a não ser ouvido pelos demais;
própria existência do balao e sua posição no quadrinho. Ele informa que
um personagem está falando na primeira pessoa. Chico Bento

56 51
. em formato de nuvetn, com o ra-
p\
w^A ÍônÀ vÊz §uE
TEM urÂA rE§TÂ §0 bicho elaborado como bolhas que
çl BEBO M{JIÍA
dela se desprendem - o chamado
r

bolão pensantento, indicando que


- as palavras que nele estão contidas
são pensadas pelo personagem e
§
i{ não pronunciadas por ele;

Snoopy

...cAçcÃ()!l §lJ§ l{ô


,,ê L)^Âê§lÊô
^^§Í?Â
ffim
r)
á,1./4
Liga da Justiça

' ligado a um balão inferior *


representa as pausas que Lrm perso-
; nagem faz em uma conversação, nelas se intercalando os balões de
seu interlocutor;
Cascão
. com traçad o em zig-zag, semelhante a uma descarga elétrica * in- . com múltiplos ra-
dica umavoz que procede de um aparelho mecânico como telefone, bichos - representa
robô, alto-falante etc. Também pode representar o grito de um
personagem;
que vários persona-
gens estão falando ao
§K§d{..
mesmo tempo.

'levando para fora do quadrinho -


indica que a voz está sendo emitida
por alguém que não aParece na
ilustração;

Revisfa da Xuxa lt4afalda

58 59
flrq*pxwm"-
-r Por sua vez, o texto contido no balão, irlém de slra ntensagem
. tremidas - signiÍrcam Áee§r§ssee§l
principal, ou seja, o signiÍicado das palavras, também transmite uma
mensagem específica de acordo com o tipo de letra que é utilizado para medo; se o tamanho da
sua composição. Normalmente, as mensagens contidas nos balões sào letra for maior que o
graftrdas em letras de imprensa maiúsculas, fecl-rando-se a mensagem normal, deve ser inter-
com Llm ponto de exclamação. Quando se referem a uma conversa efil pretado eomtl urn grito
tom normal, as letras nào surgem com qualquer elemento distintivo; de pavor ou de susto;
em 11utras ocasiÕes, elas poclem receber tamanho e forma diferenciados,
que acrescentam significado ao enunciado principal, como podemos
Yer nos exemplos:
Flash Gordon

r*§g g*ye»n* §<l*ç,


§*ar§o**i&§ §,{$ Âa§§ §{Jri §}§ dyx'
,,fie,,J§'í§"',1 §§ § L' É &
, §*r,lng gd*. ,

A grande patrulha

'tamanho normal que o maior, em uegrito - significar que as palavras sào


pronunciadas em tom mais alto que o normal, etr geral ligadas a situaçÕes
de dominação, a expressão de um comando etc.;

Asterix
. tamanho menor que o normal - re-
l presenta Llm tom de voz mais baixo, ' em alfàbetos ou tipologias diferentes - representarn que o emissor

t-
.1r.\1,";,i,
expresstrndo atitude de submissão,
timidez ou a busca de um ambiente
da mensagem está se comunicando em Llm outro idioma, em geral não
familiar a outros personagens da história (e, imagina-se, tampouco
ao leitor).
confider-rcial;

Evidentemente, além desses exemplos, tanto no que se refere à for-


ma dos balÕes como ao conteúdo, há inúmeras outras possibilidades à
disposição da criatividade de cada autor. Um dos grandes atrativos da
linguagem dos quadrinhos é exatamente slra dinâmica, sempre possi-
Asterix bilitando a incorporação de novas representaçÕes gráficas.

60 61
-r A rscnNoa
As onomatopeias são fartamente utilizadas na literatura, não cons-
tituindo uma convenção específica das histórias em quadrinhos. No
('utanto, é especíÍica dos quadrinhos a plasticidade e sugestão gráfica
A legenda representa a 11oz onisciente do narrador da história, sendo
(lLle as onomatopeias neles asstttriratn, ocupando papel importante nir
utilizada para situar o leitor no tempo e no espaço, indicando mudança
inguagem, papel esse que aumentou consideraveltlente nas últimas dé-
de localização dos fatos, avanço ou retorno no fluxo temporal, expressoes
I

cadas, impondo um ritmo fremente às narrativas de ação e participando


de sentimento ou percepçÕes dos personagens, etc. A legenda é colocada
sraÍicamente na diagramação das páginas. Nos mangás, por exemplo,
na parte superior do quadrinho, devendo ser lida em primeiro lugar, pre -
irs onomatopeias são integradas aos desenhos de uma tal forma que sua
ced".rdo alala dos personagens. Em geral ela não tem qualquer funçào
trardução e substituição pode quebrar a harmonia do conjunto visual.
gráfica, carecendo de sigr-riÍrcado maior. Atualmente, com os recursos
Em geral, as onomatopeias são grafadas independentemente dos
áa informática, pocle ter elementos tipográficos oLl cores diferenciadas,
balões, em caracteres grandes, perto do local em que ocorre o sont que
para evidenciar uma característica especíÍica do narrador. Por exemplo,
representam. A maioria das onomatopeias provém do idioma inglês, mas
en-r histórias narradas pelos próprios personagens, cores diferentes
nas
a difusão dos quadrinhos consagroll representações sonoras próprias a
legendas podem indicar a sucessão de narradores.
cada idioma. Vejamos alguns exemplos:

h tts s§a. r§ S.§§a§{. §e§ aâliFt B},!M §1 pltr3id !§ telln!§ l§§"' l§ bi§ olliei}l §*l}} à'{M§' Explosão: Brzml
§§r§8§§,1 a lr§riltir llrdtt rs§ Quebra: Crack!
§r§§§§§. ôôly*e§t,&
st§l? Choque: Crash!
§w§ bd§{it.§\e.
0 C§{x§${ttt
11 !iôfrd§rt,.
Queda na água: Splash!
Pingos de chuva: Plic! Plic!Plic!
&wtu§Ky Sono: ZZZZZZZZZZZZZZZZZ!
Golpe ou Soco: Powl

weM&ffie Campainha: Rring! Rring!


Metralhado r a: Rá - tá - t á - tá-tá-tá!
Beijo: Smack!
Exemplo de legenda em lznogoud, the infamous'.
disposta no alto do q uadrinho, representa a voz do narrador Tiro: Bang!Pow!

Logicamente, as onomatopeias também irão variar de autor para


A oNoNlatopp,t.c
autor, segundo sua procedência e preferências pessoais. Nesse sentido,
é importante salientar que alguns autores e editores brasileiros muitas
As onomatopeias são signos convencionais que representam ou vezes optaram pela adaptação das onomartopeias em inglês à língua por-
imitam um som por meio de caracteres alfabéticos. Elas variam de tuglresa, entendendo que, sendo a lingr"ragem uma maneira c1e apreender
país a país, na medicla em que diferentes culturas representam os sons
o mundo, a utilização <las onomatopeias originais implicaria na apreen-
àe acordo com o idioma utilizado para sua comunicação. Assim, a re- são de uma cultura e psicologia alienígenas, com diversas consequências
presentação do canto de um galo, por exemplo, será feita pelo francês para os leitores. Esse entendimento perdeu um pouco a sua força em
como ki-ki-ri-ki-ki!, enquanto o brasileiro representará o mesmo som anos recentes, tanto por motivos econômicos como culturais, mas uào
por co-co-có-ri-có!

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podemos perder de vista que as onomatopeias em inglês representam
I apenas uma forma de compreensão dos sons, que pode ser, por sua vez, OS QUADRINHOS EM AULAS
confrontada com outras possíveis representaçoes. É inrportante que os
DE IÍNGUA PORTUGUESA
professores salientem essa questão.

r$
§CIN§A/
-ul
g§NííO,I
wNtÍól
- Em que você trabalha?
- Sou professor de português.
- Nossa, sempre fui mal na sua matéria. Nunca entendi direito
l,
,, aquelas coisas de análise sintática, oração subordinada. Era
tudo muito chato.
t,
Que atire a primeira pedra o professor de português qlre nlrnca
Spirou teve na vida uma conversa parecida com essa. O pioi de tuclo é que
nem podemos culpar a grande maioria das pessoas por achar clue a
língua se resume a oraçÕes subordir-radas substantivas àbjetivas diretas
ou outro tipo qualquer de classificação. por muito tempo, o ensino de
Língua Portuguesa se resumiu ou se limito, a gramáticas normati-
- -
vas, que ditavam aos alunos as regras do que seriaa "boa língua"
ou a
"língua correta".
, Não é o caso de condenar as gramáticas normativas ou de desqua-
) , lificá-las, mas é fato que o conceito de Lí,gua portuguesa, hoje, é bem
rnais amplo' Ensina-se a lí,gua em uso, como procesró d..o-ur-,icaçào,
em sells mais diversos contextos. o texto tornoLr-se o principal suporte
pedagógico - e não apenas textos literários. os alunos purioram'a
t",
contato com outras formas de produção escrita: reportagens jornalís_
ticas, cartas opinativas, publicidades. A gramática nôrmat]r.a deixou
de
ser o elemento-chave do ensino.
As histórias em quadrinhos tambérn passaram a ser utilizadas
em sala de aula e ganharam espaço em muitos livros didáticos. Até os
l\/lorgan exames vestibulares (. unicarnp constantemente usa quadrinhos
em

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