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INTRODUÇÃO
1. O profeta Ezequiel
"Ao fazer de Victor Hugo o maior contista da humanidade, William Shakespeare não se
esquece de Ezequiel: destina-lhe um pequeno poema que, se não completamente
discreto, é, pelo menos, cheio de louvor. Na pena de Victor Hugo, são realmente incisivos
os elogios ao adivinho montês, gênio da caverna – assim o chama –, que ruge para
anunciar o progresso e que 'declara a paz como outros declaram a guerra'. Não apenas
Victor Hugo: Schiller desejara aprender o hebraico só para ler Ezequiel" (Tirado do
prólogo do livro de P. AUVRAY. Ezequiel, Cartagena, 1960. p. 9). Não há por que ocultá-lo:
Ezequiel foi o que hoje chamamos "um tipo original". Sua mímica, seus gestos, suas
estranhas posturas, suas atribuladas atitudes, seus longos períodos de mutismo e
imobilidade, inclusive seus êxtases e suas experiências sobrenaturais, surpreendem e
desconcertam o leitor.
Embora tenhamos poucos dados biográficos sobre o profeta, conhece-se, pelo menos, o
tempo e o lugar de sua ação, na leitura de seu livro. Era filho do sacerdote Buzi, portanto,
de família sacerdotal. É bem provável, pelo que se lê em seu livro, que exercesse o
ministério sacerdotal em Jerusalém, antes da tomada da cidade pelos Babilônios. Não
sabemos a data de seu nascimento nem de sua mor- te, mas supõe-se que, a partir dos
acontecimentos relatados em seu livro, tenha nascido na segunda metade do século VII
a.C. No entanto, só aparece em cena desde o momento em que recebe a vocação
profética. Como sacerdote e profeta, poeta e teólogo, organizador religioso e pregador,
viveu e interpretou a época mais trágica e mais dura da história de Israel: o exílio.
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Foi deportado para a Babilônia juntamente com outros muitos judeus, em 597 a.C. e ali
residiu, na comunidade de Tel-Abid, às margens do rio Quebar, provavelmente um canal
que vai da Babilônia a Uruk (cf. Ez 1,3: 3,15). Exerceu o ministério profético por, mais ou
menos, vinte anos, de 593 a 571 a.C., e sua mensagem é dirigida especialmente aos
exilados, embora também o preocupem a situação e o destino de sua pátria e de
Jerusalém, que visitou várias vezes, mediante visões em êxtase (cf. Ez 8-11; 40ss).
2. Contexto histórico
De início, devemos remontar a 722 a.C., ano em que a Samaria, capital do reinado de
Israel, é sitiada pelo exército assírio. Com sua queda, desaparece o reino do Norte. Na
Assíria, reina Sargon II (722-705 a.C.) e em Judá (também chamada reino do Sul), Ezequias
(727-698 a.C.). A Assíria transforma-se numa potência que dominará todo o Oriente
próximo, enquanto a Babilônia, com Merodac Baladan, procura ficar independente da
Assíria. No entanto, Judá submeter-se-á ao império assírio, durante vinte anos, em que
vive relativamente tranquila, pagando, sem que nenhuma classe reclamasse, tributo à
Assíria, apesar de ter tenta- do emancipar-se, por diversas vezes, mas sem resultado.
Quando Ezequias atinge a maioridade e sobe ao trono em 714 a.C., a situação se complica.
Levado pelo desejo de reforma religiosa e de independência política, o novo rei tentará
provar que não concorda com a Assíria e envolve-se em diversas revoltas. A Babilônia e o
Egito também se uniram na rebelião contra a Assíria. Porém, de fato, somente a pequena
cidade de Asdod se rebela, esperando contar com o apoio dos egípcios que nunca
entraram na batalha. A reação de Sargon II foi contundente. Realizou rápida campanha
contra Asdod, Gaza e Asdudimmu, com o filho Senaquerib, como general do exército.
Judá se entrega, e Ezequias apressa-se em pagar tributo para evitar o castigo (cf. 2Rs
18,13).
Seguiram-se alguns anos de paz até a morte de Sargon II, em 705 a.C. Os judeus uniram-se
novamente aos egípcios, a fim de se rebelarem contra a Assíria. Entretanto, o auxílio dos
egípcios para nada lhes serviu, pois Senaquerib, sucessor de Sargon II (704-681 a.C.),
invadiu novamente Judá e atacou Jerusalém. Porém, antes que a cidade fosse tomada,
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Senaquerib e seu exército, dizimado pela epidemia, tiveram de retirar-se (cf. 2Rs 18-19).
Corre o ano 701 a.C. A partir dessa época, a Assíria começa a perder prestigio e domínio.
Segundo 2Rs 19,37, Is 37,28 e os anais assírios, Senaquerib foi assassinado por dois de seus
filhos, em Nínive, tendo-lhe sucedido o filho mais novo, Assaradon (680- 669 a.C.) que, em
671, apodera-se do Egito. Em Judá, reina o ímpio Manassés (698- 643 a.C.) que continua
submisso à Assíria, com Assaradon, primeiro e, em seguida, com Assurbanipal III, também
rei assírio (669-630 aC.). A Manassés sucedeu-lhe no trono o filho Amon (643-640 a.C.)
que seguiu, em tudo, os passos do pai (cf. 2Rs 21,19-26; 2Cr 33,21-25).
Somente com Josias mudará a situação religiosa e política do país. Determinadas tensões
internas e externas foram produzindo, no império assírio, grande deterioração e enorme
vazio político. Foi então que, com decisão e habilidade políticas, Josias estendeu a
influência de seu poder aos territórios do antigo reino do Norte. Um dos sucessos mais
importantes de seu reinado (640-609 a.C.) foi a reforma religiosa levada a cabo, mais ou
menos, em 622, conforme a ideologia e as normas práticas encontradas no livro do
Deuteronômio. As indicações referentes às medidas do templo, assim como a ideia de ser
o lugar da presença de Deus na terra, serão retomadas por Ezequiel em seus oráculos e
visões sobre a restauração definitiva (cf. Ez 40-48) e sobre a glória de Deus que deixa o
Templo (Ez 11.23), para voltar logo, definitivamente (Ex 47,5-7a).
A queda de Nínive, em 622 a.C., significa a derrota definitiva do império assírio. Agora é a
Babilônia, sua vizinha, que vai adquirindo protagonismo e domínio sobre o noroeste de
Judá. Por outro lado, o Egito vai consolidando gradualmente sua força: sob o governo do
faraó Necao II (610-595 a.C.) faz-se presente em toda a Ásia ocidental e entra em
confronto com a Babilônia, graças a seu poder e influência sobre alguns pequenos
estados da Síria e da Palestina. O Egito não vê, com bons olhos, os progressos dos
babilônicos que desejam assolar a Assíria e, paradoxalmente, o Egito tenta salvar o que
resta do império assírio. É esta a luta que dificulta a tranquilidade do rei Josias e a que
acaba definitivamente com a paz de Judá. Com efeito, em 609 a.C., em Megido, território
do antigo Israel. Josias procura deter os egípcios que sobem até a Mesopotâmia, a fim de
ajudar o último rei assírio, mas é derrotado pelo exército de Necao II, e morre na batalha
(cf. 2Rs 24.28-30).
O rei que o sucede, Joacaz de Judá (609 a.C.), reina por pouco tempo. Deposto aos três
meses por Necao, é levado prisioneiro para o Egito e ali morre na prisão. Seu sucessor, o
irmão mais velho, Joaquim, é colocado no trono de Judá por ordem irrevogável de Necao.
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Seu reinado dura mais ou menos dez anos (609-598 a.C.) Ezequiel não fala dele, mas sim
Jeremias, um de seus mais temíveis adversários. Judá continua sob o poder egípcio até o
surgimento de Nabucodonosor (605-562 a.C.), rei da Babilônia, e derrota Necao em
Carquêmis, em 605 a.C. A partir desse momento, os babilônios transformam-se nos novos
senhores e dominadores de todo o Oriente Médio.
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Godolias. Estavam mais interessados, sem dúvida, na situação de sua terra longínqua, que
nas coisas que aconteciam na terra do exílio e em sua vida cotidiana. Do exílio, Ezequiel
dirige sua mensagem aos homens do seu povo que ficaram em Jerusalém e em toda a
terra santa: ao mesmo tempo, exerce o ministério entre os exilados, com os quais convive
(Ez 1,2.3; 11,24.25).
Embora a redação atual possa não ser do profeta, o essencial do livro é considerado, hoje,
de Ezequiel. Tudo porque, essencialmente, sua atuação profética é oral, estruturada
sobretudo para a recitação e aprendida de cor e na repetição oral, transmitida pelo
profeta e seus discípulos: portanto, cheia de acréscimos, frequentemente, pouco felizes.
É quase certo que Ezequiel deixou escrita grande parte de sua pregação: as experiências
de êxtase, suas ações simbólicas, os oráculos: porém, por primeiro, foi a trans- missão oral
de ensinamentos e mensagens que, de imediato, os discípulos ou redatores posteriores
agruparam e estruturaram por meio do critério, para isso, do mesmo cará ter do escrito
(ações simbólicas, experiências de êxtases, visões) das palavras ou temas de enlace
(espada, ídolo, abominações...) e do conteúdo dos oráculos.
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A atitude de comer o livro, como gesto inicial de sua vocação (Ez 2,9-3.3). Trata-se do livro
que contém a palavra de Deus, que o profeta há de assimilar para poder transmiti-la
integralmente. É uma atuação mais real e profunda que a de Isaías, a quem um serafim
tocara os lábios com uma brasa ardente (Is 6,5-7) e que a de Jeremias, em cuja boca o
próprio Senhor pusera suas palavras (Jr 1,9).
Atuações com relação ao ataque a Jerusalém. Trata-se de várias atuações de que se serve
Ezequiel, a fim de levar à conversão: destacam o desenho de um ataque num ladrilho,
como exemplo do iminente ataque da cidade de Jerusalém, e os três diferentes modos de
cortar os cabelos da cabeça e da barba, deixando apenas alguns fios (o resto) (Ez 4.1-5.4).
A visão de uma desolação e profanação. Trata-se dos capítulos (Ez 8-11) que tratam do
desaparecimento da glória de Deus, após alguns atos graves de profanação realizados no
templo. Ezequiel vê as diferentes abominações que acontecem no templo de Deus, o
culto aos animais ali realizado, as lamentações pelo deus Tamuz, enfim, os ritos de
adoração ao sol e a extinção da vegetação. Tamanha é a profanação, que a sentença
torna-se radical e imediata: um grupo de seis anjos marca com um "tau" os eleitos,
enquanto outro grupo mata todos os que não foram marcados.
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Então, o profeta faz uma pausa para refletir e permanece mudo durante, mais ou menos,
seis meses. Silêncio pela morte da esposa e dor pela queda da cidade. Permanece imóvel e
sem falar, até que mensageiro, salvo do desastre de Jerusalém, chegue a Babilônia para
comunicar aos exilados que a cidade caíra nas mãos dos babilônios. Nesse ínterim (Ez
24,26-27). Ezequiel recupera o movimento e a fala (Ez 33,21-22) e começa nova função
profética. Muda o tom da pregação. Não mais se baseia nas ameaças de castigo, nem a
mensagem é de condenação: permanece, então, a mensagem de consolo, tão necessária
para um povo outrora desobediente, hoje, arrependido.
Sua mensagem, nesses momentos, é dirigida, de modo todo especial, aos exilados, aos
quais anuncia a salvação se se converterem ao Senhor seu Deus, e às nações, as quais
condena por sua atitude de colaboração na destruição de Jerusalém e por terem se
sentido satisfeitas por sua queda (Ez 25ss).
A majestosa visão dos ossos secos (Ez 37) anuncia a nova reunião do povo e a restauração
nacional, graças à intervenção de Deus (Ez 37,12-14). A força de Deus criará um povo novo
e vivo. Os ossos e os esqueletos simbolizam a História de uma humanidade morta,
pecadora e rebelde, que recupera o gosto pela vida, pelo amor e pela esperança. A
esperança Deus a Jerusalém (Ez 43), onde haverá torna-se realidade pela volta da glória
de um culto e uma vida social diferente e nova, centralizada no novo templo, cuja
construção (Ez 40), estrutura (Ez 41) e partes (Ez 42). Ezequiel descreve magistralmente.
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5. Teologia
A santidade de Deus é ofendida pelo pecado que pode ser de dois tipos: profanação das
criaturas, como acontece na idolatria e profanação do culto no santuário. É o culto um dos
principais interesses de Ezequiel que sonha com um novo Israel, como comunidade cultual
e teocrática, sob o cetro do sumo sacerdote e em torno do templo. Não há dúvida:
profeta recebe as ideias mais importantes da tradição sacerdotal.
A história do povo é vista como total infidelidade. Ela não começa em Canaã como
afirmam Oséias e Jeremias, mas no Egito, onde os israelitas prestaram culto a outros
deuses e no deserto, onde o sábado foi profanado e se desprezou a Lei do Senhor. A total
depravação expressa se em dois capítulos paralelos, o 16 e o 23, nos quais,
alegoricamente, mediante a imagem de duas moças, descreve-se a Infidelidade da
Samaria e a mais grave de Judá. O povo não só se prostituiu, mas também pagou suas
amantes.
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dos principais responsáveis por uma nação e que podemos traduzir por "príncipe" (Ez
21,17; 22,6; 26,16; 27,21; 45; 46; 48). Descenderá da linhagem de Davi, mas será muito
diferente de seus antecessores (Ez 17,1-24). Como um pastor, reconstruirá a unidade do
povo, até existir um só rebanho e um só pastor (Ez 34; cf. Jo 10).
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