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QUESTIONÁRIO DE COMPORTAMENTOS AGRESSIVOS (QCA)1

Raquel Raimundo e Alexandra Marques Pinto

1. Indicações

1.1 Dimensões avaliadas

O Questionário de Comportamentos Agressivos (QCA) tem como objectivo principal

avaliar os comportamentos agressivos de crianças e adolescentes. A prova consiste em 6 itens

que avaliam a percepção dos colegas e professores relativamente à frequência de

agressividade destes indivíduos, em contexto escolar.

1.2 Populações-Alvo

O QCA é uma escala de hetero-relato destinada a avaliar as percepções dos alunos e

professores do 4º ao 9º ano de escolaridade, relativamente aos comportamentos agressivos

dos alunos, em cada turma escolar.

2. História

A avaliação da agressividade em crianças e adolescentes pode ser feita com recurso a

fontes diversas: através do professor (questionário), de um observador externo (mediante a

observação directa ou indirecta), com recurso aos colegas (nomeação de pares em

questionário ou entrevista aberta), ou ainda através de questionário aplicado ao próprio aluno

(Atlas & Pepler, 1998; Bierman, Smoot & Aumiller, 1993; Crick, 1996; Crick, Casas &

Mosher, 1997; Lochman, White & Wayland, 1991; Pereira, 2002). Cada um destes tipos de

fonte tem os seus pontos fortes e fracos em termos metodológicos (Ladd & Profilet, 1996),

1
Um agradecimento especial à Professora Doutora Maria Luísa Lima pela sua colaboração na revisão de
versões anteriores deste artigo.

1
sendo que a maioria das investigações tem-se baseado numa única fonte de medição

(Bierman, et al, 1993).

A maneira mais fácil e mais utilizada para obter dados relativamente à agressividade das

crianças e adolescentes é através de questionários de auto-relato (Borg, 1999; Fonseca,

Simões, Rebelo, Ferreira & Cardoso, 1994; Guerin & Hennessy, 2002; Lochman, et al, 1991;

Olweus, 1997; Pellegrini & Bartini, 2000; Whitney & Smith, 1993). Contudo, uma das

desvantagens da utilização de medidas de auto-relato para estudar a agressividade é o facto

dos indivíduos se sentirem relutantes em se auto-identificarem como agressivos, devido a

factores relacionados com a desejabilidade social (Fonseca, et al, 1994; Pellegrini & Bartini,

2000). A forma mais adequada de recolher dados para avaliar a variável agressividade entre

pares parece ser, até à data, o recurso a metodologias de hetero-relato. Por outro lado, a

conjunção da avaliação feita pelos pares com a dos professores tem permitido a obtenção de

melhores resultados (Bierman, et al., 1993; Coie & Dodge, 1998).

A opção pela elaboração e desenvolvimento de uma nova escala de hetero-relato deveu-se

à ausência de escalas disponíveis para a população portuguesa que avaliassem,

exclusivamente, comportamentos agressivos em contexto escolar, para alunos destes anos de

escolaridade. As escalas existentes ou avaliam comportamentos mais generalizados como

sendo os comportamentos anti-sociais, em vários contextos além do escolar (Fonseca, et al,

1994; 1995; 1999), ou avaliam apenas um tipo específico de agressividade proactiva mais

conhecida por bullying (Carvalhosa, Lima & Matos, 2001; Pereira, 2002).

Dodge e Coie (1987) avaliaram a agressividade de tipo reactiva, proactiva, física e verbal,

a partir dos relatos dos professores, através da escala “The Teacher Rating Instrument”. Com

base na revisão de literatura efectuada, acrescentámos a estes tipos de agressividade mais

dois, um que avaliasse a agressividade relacional, uma forma de agressividade mais indirecta

e que alguns autores consideram estar mais associada às raparigas (e. g. Crick, 1996; French,

2
Jansen & Pidada, 2002; Genta, Menesino, Fonzi, Costabile & Smith, 1996; Gumpel &

Meadan, 2000; Hudley, 1993; Marsh, et al, 2001) e outro que medisse a agressão dirigida

contra objectos, outra forma de agressividade mais directamente observável (Skinner, Altman

& Sherwood, 1991).

O QCA foi constuído e validado no âmbito dos trabalhos que conduziram à dissertação de

mestrado de uma das autoras (Raimundo, 2005).

3. Fundamentação Teórica

A agressividade no espaço escolar entre pares é um problema significativo nas escolas de

todo o mundo (Marsh, Parada, Yeung & Healey, 2001), sendo que os resultados de diversas

investigações longitudinais têm salientado a agressividade na infância e adolescência como o

melhor preditor comportamental de dificuldades de ajustamento futuras (e.g. Bierman, et al.,

1993; Crick, 1996; Ladd & Profilet, 1996; Parker & Asher, 1987) e como o factor isolado que

mais contribui para a rejeição entre pares (e.g. Dodge & Coie, 1987; Zakriski, Jacobs & Coie,

1997).

A agressividade é definida por Parke e Slaby (1983, cit. por Coie & Dodge, 1998) como

um "comportamento que tem como objectivo fazer mal ou causar dano a outra pessoa ou

pessoas" (p. 781). Um comportamento agressivo tem de ter potencial para fazer mal ou

causar dano, ser intencional, envolver estímulo e ser aversivo para a vítima (Brain, 1994, cit.

por Coie & Dodge, 1998).

As teorias do comportamento agressivo juntamente com as observações realizadas em

animais, crianças e adolescentes sugerem a existência de duas formas distintas de

agressividade: a reactiva e a proactiva (Coie & Dodge, 1998; Dodge & Coie, 1987; Hubbard,

Smithmyer, Ramsden, Parker, Flanagan, Dearing, Relyea & Simons, 2002). A agressividade

hostil ou reactiva tem origem no modelo de agressão-frustração de Dollard e colaboradores

3
(1939, cit. por Coie & Dodge, 1998; Martín, 1993) e é definida como uma explosão de raiva

e furor pouco controlado e que aparenta ser uma reacção defensiva ao bloqueio de objectivos,

provocação ou frustração. É uma forma de agressividade tendencialmente mais violenta

(Dodge & Coie, 1987). A agressividade instrumental ou proactiva tem origem no modelo da

aprendizagem social de Bandura (1973, cit. por Coie & Dodge, 1998; Martín, 1993) e define-

se como um comportamento controlado, quase ritualístico, deliberado, centrado em

objectivos externos e caracterizado pela falta de emoção (Dodge & Coie, 1987).

Apesar dos avanços substanciais realizados nesta área de investigação, uma das limitações

tem sido o foco, em exclusivo, em formas de agressividade que são típicas nos rapazes, mas

relativamente raras em raparigas, isto é, em tipos de agressividade mais directa (física) em

detrimento de formas mais indirectas de agressividade voltadas para a relação (Crick, 1996;

Crick, Casas & Ku, 1999; Crick & Werner, 1998; French, et al., 2002). Crick (1996) dedicou-

se ao estudo destes tipos de agressividade. Definiu a agressividade física como um

comportamento que prejudica os outros através de danos físicos ou ameaças deste género de

danos e a agressividade relacional como um comportamento que prejudica os outros através

da influência que tem nos seus relacionamentos e que poderá tomar a forma de exclusão

social.

Skinner e colaboradores (1991) recorreram a entrevistas semi-estruturadas a crianças,

após as quais consideraram a existência de mais dois tipos de agressividade: a agressividade

verbal que abrange os ataques verbais aos outros (ex.: gritar, chamar nomes, gozar, arreliar,

fazer caretas ou gestos) e a agressividade dirigida contra objectos que visa expressar

agressividade ou afecto agressivo relativamente a objectos.

4. Estudos realizados em Portugal

4.1 Data e objectivos

4
O QCA foi construído durante os meses de Janeiro e Fevereiro de 2004 e aplicado

colectivamente, numa primeira fase, em 5 turmas provenientes de cada ano de escolaridade,

do 2º e 3º ciclos do Ensino Básico. Esta aplicação visou a recolha de dados para validação do

questionário, nomeadamente no que diz respeito à selecção do seu formato e análise e

selecção dos itens. Estes foram construídos com base no questionário “The Teacher Rating

Instrument”, de Dodge e Coie (1987), em entrevistas semi-estruturadas realizadas por

Skinner e colaboradores (1991) e na revisão de literatura efectuada sobre tipos e formas de

agressividade. Os itens foram estruturados, modificados e, alguns deles, aglutinados num

número menor de itens, com base na semelhança do tipo de agressividade.

Após a primeira aplicação efectuaram-se alterações no formato de resposta e num dos

itens da escala, de modo a facilitar a sua compreensão. A versão final do QCA foi aplicada

entre Março e Junho de 2004 com vista a avaliar as suas qualidades (Raimundo, 2005).

O QCA foi também aplicado entre Janeiro e Junho de 2007, em 8 turmas do 4º ano de

escolaridade provenientes de 6 escolas de 1º ciclo, para avaliar a eficácia de um programa de

desenvolvimento de competências sociais e emocionais e o seu impacto a nível do

ajustamento comportamental e emocional dos alunos. A avaliação da agressividade foi feita

pelos professores, antes e após a implementação do programa, num grupo de intervenção e

num grupo de controlo.

Estão ainda a decorrer estudos com o QCA de avaliação do impacto de uma nova

metodologia, o PBL (Problem Based Learning) que está a ser implementada na disciplina de

Área de Projecto, em turmas do 5º e 7º anos de escolaridade de um agrupamento de escolas

de Lisboa, frequentada sobretudo por alunos com um estatuto sócio-económico médio-baixo.

Apenas está a ser aplicada a versão para professores, sendo que cada um deles avalia todos os

alunos da turma.

5
A escala QCA encontra-se em fase de tradução e adaptação ao contexto Eslovaco no

Research Institute of Child Psychology and Psychopathology, em Bratislava, por intermédio

de PhDr. Eva Smiková.

4.2 Amostra e metodologia

Foram realizados dois estudos. A amostra do primeiro estudo empírico com o QCA é

constituída por 443 crianças e adolescentes (218 rapazes e 225 raparigas) e 22 directores de

turma, provenientes de cinco escolas públicas dos concelhos de Lisboa, Torres Vedras e

Sousel. As crianças e adolescentes da amostra apresentavam idades compreendidas entre os

nove e os 17 anos, situando-se a média em 12.86 (desvio-padrão de 1.63) e eram

provenientes, de forma equilibrada, do 5º, 6º, 7º, 8º e 9º anos de escolaridade.

Aproximadamente 70% dos alunos da amostra nunca reprovaram e a maioria dos que

reprovaram apenas o fez uma vez (19.5%). Relativamente ao estatuto socio-económico

(ESE), calculado a partir de dados como a profissão dos pais, o seu local de trabalho e o seu

grau de instrução presentes na escala de Graffar (1956) e dividido em cinco níveis em que um

corresponde ao ESE elevado e cinco ao ESE baixo, verificou-se que a média foi de 3.13

(desvio-padrão de 1.31).

A metodologia de recolha de dados utilizada baseou-se na nomeação, por parte dos pares

e dos professores, dos três alunos mais agressivos e dos três alunos menos agressivos de cada

turma. Das 22 turmas foram nomeados, ao todo, 87 alunos como mais agressivos e 97 alunos

como menos agressivos. Após a nomeação, os sujeitos (pares e professores) avaliaram a

agressividade desses alunos através do QCA.

No segundo estudo, realizado com alunos do 4º ano de escolaridade, foram avaliados 154

alunos (80 rapazes e 74 raparigas) pelos seus professores antes do programa de

desenvolvimento de competências sociais e emocionais ser implementado e 134 alunos (72

6
rapazes e 62 raparigas) após a implementação do programa. No pré-teste 102 alunos

pertenciam a grupos onde o programa foi efectivamente aplicado e 52 ao grupo de controlo.

No pós-teste 82 alunos integravam o grupo de intervenção e 52 o grupo de controlo. 98,2%

da amostra tinha idades compreendidas entre os 9 e os 12 anos no pré-teste. 75,2% dos alunos

nunca reprovaram e 16,6% apenas reprovou uma vez. Em relação ao ESE, avaliado através

da escala de Graffar, verificou-se que a média se situou em 3,17 (desvio-padrão de 1,38).

Neste segundo estudo a metodologia de recolha de dados baseou-se na avaliação feita

pelos professores intervenientes a todos os alunos das suas turmas, sem recurso à nomeação.

4.3 Dados qualitativos e quantitativos dos itens

Os itens do QCA incluem, de acordo com os dados recolhidos na revisão de literatura,

quer formas directas de agressividade, como sejam a física, contra objectos e a reactiva, quer

ainda formas mais indirectas de agressividade, tais como a verbal, a relacional e a proactiva,

que inclui as práticas de bullying. Alguns exemplos de itens são: "Bate, esmurra, dá pontapés,

morde ou empurra os colegas" e "Deixa de parte colegas de grupo, ignora-os, espalha boatos

ou mentiras ou estraga amizades".

Durante a fase de validação do questionário, a análise dos itens teve como objectivo

perceber qual o grau de compreensão dos sujeitos da amostra relativamente aos termos

empregues nas instruções e nos itens da escala. As respostas aos itens avaliam a frequência de

agressividade percebida e são dadas no formato Likert de cinco pontos, desde nunca=1 a

quase sempre=5.

4.4 Resultados no âmbito da sensibilidade

No quadro 1 descrevemos os resultados obtidos em cada item da escala QCA, tendo em

conta os respondentes da primeira amostra.

7
Inserir Quadro 1

No quadro 2 estão descritos os resultados obtidos no segundo estudo.

Inserir Quadro 2

Como é de esperar de uma escala que avalia a agressividade numa amostra não clínica, a

distribuição das respostas aos itens é claramente assimétrica. Assim, foram registados níveis

moderados de frequência de agressividade percebida, abaixo do ponto médio, em ambos os

estudos.

4.5 Resultados relativos à precisão

O cálculo da consistência interna foi realizado a partir da determinação do índice Alpha

de Cronbach. No primeiro estudo obtiveram-se valores de .96 para a escala total quando os

respondentes são os pares e de .90 quando são os professores. Analisámos ainda a correlação

(Pearson) entre cada item e a escala total e obtivémos valores que oscilam entre .86 e .97 para

os pares e entre .67 e .93 para os professores, todos eles claramente acima de .50.

Analisámos também a precisão mediante a comparação dos resultados obtidos no QCA

através do relato dos pares com os resultados obtidos a partir do relato feito pelos professores.

Todas as correlações entre os relatos, para cada um dos itens da escala, foram altamente

significativas (p<.01) variando entre .480 e .867, sendo que a correlação foi de .868 (p<.01)

para o índice de agressividade geral.

No segundo estudo obtiveram-se valores de Alpha de Cronbach de .95, quer no pré-teste,

quer no pós-teste, a partir da hetero-avaliação feita pelos professores. No pré-teste os itens

8
apresentam uma correlação com a escala que oscila entre .826 e .957 (p<.001) e no pós-teste

entre .810 e .946 (p<.001). As correlações inter-item vão de .611 (itens 3 e 5) a .893 (itens 2 e

6) no pré-teste (p<.001) e de .629 (itens 3 e 5) a .886 (itens 2 e 6) no pós-teste (p<.001). Os

valores elevados e a estabilidade dos valores de alpha nos dois estudos e das correlações

item-escala são reveladores de uma boa consistência interna da escala.

No segundo estudo foi ainda possível avaliar a estabilidade temporal através do teste-

reteste com três meses e meio a quatro meses de intervalo, entre as duas aplicações.

Considerou-se apenas as turmas que integravam o grupo de controlo e que não participaram

no programa (N=52). A análise das correlações teste-resteste para cada um dos itens

evidencia que todas elas são significativas (p<.001), oscilando entre .814 (item 3) e .877

(item 6), sendo a correlação da escala total nos dois momentos de .916 (p<.001).

4.6 Resultados relativos à validade

Para além dos procedimentos de validade de conteúdo (facial) utilizados na fase inicial de

construção do QCA, foram feitos três tipos de análises tendo em vista o estudo da validade do

instrumento. Relativamente à validade de constructo (validade factorial), optámos pela

análise do QCA em componentes principais, com rotação varimax. Os resultados do

primeiro estudo apontam para a existência de uma solução inicial com um factor único,

explicativa de 75.25% da variância total. Os itens da escala evidenciaram uma boa correlação

com o factor único da escala, com valores que oscilam entre .96 e .69. No segundo estudo a

estrutura factorial da escala foi replicada, nos dois momentos de avaliação. O factor único no

pré-teste explica 81.33% da variância total, enquanto que no pós-teste é explicativo de

80.43% da mesma. Os itens saturam no factor único da escala entre .825 e .956 no pré-teste e

entre .822 e .946 no pós-teste. Ambos os índices são reveladores de uma boa estrutura

factorial do QCA.

9
Em termos de validade empírica, as diferenças em função do sexo no primeiro estudo

revelaram que os rapazes (colegas – M=2.37, dp=.71; professores – M=2.25, dp=.90) são

mais frequentemente nomeados como mais agressivos pelos colegas (t=8.339; gl=121.931;

p<.000) e pelos professores (t=5.892; gl=124.826; p<.000) do que as raparigas (M=1.41,

dp=.61 e M=1.40, dp=.72, respectivamente).

A metodologia utilizada neste estudo permitiu-nos ainda isolar, dentro da amostra global,

os alunos considerados mais agressivos dos alunos considerados menos agressivos, dentro de

cada turma. A comparação das respostas ao QCA revelou que os alunos nomeados como

mais agressivos (colegas – M=2.73, dp=.41; professores – M=2.64, dp=.70) apresentam

valores de frequência de agressividade geral significativamente mais elevados, quer no relato

dos colegas (t=25.093; gl=106.664; p<.000), quer no relato dos professores (t=16.591;

gl=16.591; p<.000) do que os alunos nomeados como menos agressivos (M=1.24, dp=.25 e

M=1.11, dp=.22, respectivamente).

No segundo estudo foi ainda analisada a validade discriminante do instrumento, mediante

a comparação dos resultados obtidos pelo grupo de intervenção e pelo grupo de controlo, nos

dois momentos de avaliação (pré-teste e pós-teste). Não foram encontradas diferenças

significativas entre o grupo de intervenção (M=1.85, dp=.92) e o grupo de controlo (M=2.06,

dp=1.00) no pré-teste (t=-1.286; gl=135; p=.201). No entanto foram encontradas diferenças

significativas no pós-teste (t=-1.981; gl=133; p=.050), no sentido do grupo de controlo ter

sido percepcionado como tendo mais comportamentos agressivos (M=2.06, dp=1.05) do que

o grupo de intervenção (M=1.74, dp=.84), após a implementação do programa de

desenvolvimento de competências sociais e emocionais, provando assim o poder

discriminante da escala.

4.7 Procedimentos de aplicação e correcção

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A administração da prova pode ser de natureza individual, ou colectiva, em contexto de

sala de aula e deverá seguir os princípios gerais de administração de provas de “papel e

lápis”, sendo que não apresenta tempo limite. Cada item é cotado de 1 a 5 e, já que todos

estão formulados no mesmo sentido, a pontuação total da escala é obtida pelo somatório

directo das respostas a cada um dos itens.

5. Interpretação dos resultados

5.1 Dimensões e sua interpretação

Em primeiro lugar, convém reforçar que, no primeiro estudo, nem todos os alunos de

cada turma foram avaliados através do QCA, porque esta escala foi aplicada para avaliar

apenas, através de hetero-relato, os alunos mais e menos agressivos em cada turma. É à luz

deste facto que os resultados obtidos deverão ser interpretados.

Os resultados das análises factoriais permitem-nos concluir que estamos perante uma

escala que avalia um constructo unidimensional, sendo que o factor único encontrado explica,

pelo menos, 75% da variância dos resultados. Este facto justifica que a interpretação da

pontuação seja feita por referência à agressividade geral, sendo desaconselhadas

interpretações que tenham em linha de conta sub-tipos de agressividade, como seja a

agressividade física e relacional ou outras formas.

5.2 Normas, critérios ou parâmetros

A escala não possui normas, servindo as estatísticas descritivas obtidas com as nossas

amostras, de parâmetros de referência para a interpretação dos valores obtidos e para futuros

estudos sendo possível, para tal, recorrer à ponderação directa dos valores obtidos através da

compararação dos mesmos com as médias e desvios-padrão aqui apresentados.

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6. Avaliação crítica

6.1 Vantagens e potencialidades

O QCA é um instrumento desenvolvido e validado para ser aplicado a alunos e

professores, no sentido de avaliar as suas percepões de agressividade, relativamente aos

alunos. O QCA pode constituir-se como uma ferramenta útil para aferir a frequência do

comportamento agressivo, dado que investigações anteriores apontam para a obtenção de

melhores resultados quando a metodologia de recolha de dados relativos à agressividade se

baseia no relato de colegas e professores.

O número reduzido de itens do instrumento torna simples e rápida a sua aplicação em

regime de hetero-avaliação em contexto colectivo, dadas as dificuldades óbvias de obtenção

do acordo e motivação de alunos e professores para avaliarem todos os alunos da turma,

relativamente a este parâmetro, com questionários mais extensos.

A escala foi construída com base numa visão abrangente da agressividade que inclui, quer

formas mais directas como a agressividade física, contra objectos e reactiva, quer formas

mais indirectas como a agressividade verbal, relacional e proactiva, na qual se incluem as

práticas de bullying.

Os estudos conduzidos que levaram à construção e validação do QCA legitimam a sua

utilização na investigação e na intervenção psicológica. A precisão do instrumento e a sua

validade de constructo, discriminante e empírica por referência a critério foram asseguradas.

Neste sentido, o QCA poderá tornar-se uma poderosa ferramenta para a avaliação

psicológica e intervenção educativa, no sentido de poder ajudar a construir programas de

intervenção para a promoção de comportamentos saudáveis e prevenção de comportamentos

desajustados, como é frequentemente o caso da agressividade e da violência em geral.

6.2 Limitações

12
Não podemos esquecer que os itens desta escala avaliam, essencialmente, a frequência da

agressividade generalizada, embora estejam subjacentes formas distintas de agressividade,

quer directa, quer indirecta. Os utilizadores mais interessados em avaliar tipos de

agressividade específicos nestas idades, como é o caso do bullying, devem recorrer a outras

escalas, tais como “A agressividade entre crianças no espaço escolar” de Olweus (1989),

adaptado à população portuguesa por Pereira e Almeida (1994, cit. por Pereira, 2002), ou

ainda o “Scan-Bullying Quest 2005”, de Almeida, Caurcel e Machado (2006).

A sua aplicação é essencialmente aconselhada em contexto colectivo, mais do que em

intervenção psicológica individual, na qual outros questionários mais extensos poderão

facultar informação mais pormenorizada sobre os indivíduos em estudo.

Considera-se necessária a realização de mais estudos para avaliar características

psicométricas adicionais do instrumento, nomeadamente no que se refere à avaliação da

validade convergente e preditiva, assim como estudos com amostras numérica e

geograficamente mais alargadas, abrangendo ainda instituições educativas do ensino privado.

6.3 Desenvolvimentos e estudos futuros

Os resultados alcançados com o QCA apontam para a prossecução das investigações para

dar resposta às limitações anteriormente apontadas. Em estudos futuros seria também

interessante avaliar, através do QCA, não só a frequência de comportamentos agressivos, mas

também a sua intensidade, uma vez que um acto agressivo pode ocorrer muito

esporadicamente, mas ter um forte impacto na vítima.

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intervention (pp. 423-451). New York: Plenum Press.

8. Material

O instrumento é apresentado em duas folhas nas quais se encontram as instruções, os

itens e o respectivo local para o registo das respostas.

9. Edição e distribuição

O QCA pode ser obtido para fins de investigação e de intervenção, contactando para o

efeito as autoras.

10. Contacto com as autoras

Raquel Raimundo

Escola Básica 2/3 Professor Delfim Santos

Rua Maestro Frederico de Freitas

1500-400 LISBOA

raquelraimundo@portugalmail.pt

Alexandra Marques Pinto

Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação

16
Universidade de Lisboa

Alameda da Universidade

1649-013 LISBOA

mapmp@fpce.ul.pt

17
Quadro 1

Distribuição dos Resultados do QCA no primeiro estudo

Itens Respondentes Min.-Máx. Média Desv.-Pad.

1 Pares 1-5 2.50 1.14

Professores 1-4 1.57 .91

2 Pares 1-5 3.47 1.10

Professores 1-5 2.22 1.33

3 Pares 1-5 2.02 1.11

Professores 1-5 1.69 1.07

4 Pares 1-5 2.21 1.11

Professores 1-4 1.61 .87

5 Pares 1-5 3.62 1.28

Professores 1-5 2.25 1.32

6 Pares 1-5 2.92 1.38

Professores 1-5 1.96 1.18

18
Quadro 2

Distribuição dos Resultados do QCA no segundo estudo

Momento da
Itens Grupos Min.-Máx. Média Desv.-Pad.
Avaliação

Intervenção 1-5 1.80 .998


Pré-Teste
Controlo 1-5 1.94 1.074
1
Intervenção 1-4 1.72 .946
Pós-Teste
Controlo 1-5 2.02 1.244

Intervenção 1-5 1.98 1.012


Pré-Teste
Controlo 1-5 2.23 1.113
2
Intervenção 1-4 1.89 .969
Pós-Teste
Controlo 1-5 2.33 1.115

Intervenção 1-5 1.59 .917


Pré-Teste
Controlo 1-5 2.06 1.092
3
Intervenção 1-4 1.5 .820
Pós-Teste
Controlo 1-5 2.02 1.213

Intervenção 1-3 1.48 .781


Pré-Teste
Controlo 1-5 1.58 .997
4
Intervenção 1-4 1.34 .757
Pós-Teste
Controlo 1-5 1.38 .844

Intervenção 1-5 2.30 1.315


Pré-Teste
Controlo 1-5 2.37 1.121
5
Intervenção 1-5 2.23 1.240
Pós-Teste
Controlo 1-5 2.46 1.179

19
Intervenção 1-5 1.93 1.142
Pré-Teste
Controlo 1-5 2.19 1.138
6
Intervenção 1-4 1.74 1.052
Pós-Teste
Controlo 1-5 2.17 1.184

20

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