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Resumo
Esse artigo tem como objetivo analisar a percepção de professores, bem como, os
significados dos termos violência e indisciplina no contexto escolar. O presente estudo
originou-se, de pesquisa realizada pelo projeto de pesquisa “Indisciplina e Violência nas
escolas: embate entre as subjetividades presentes no espaço escolar”. Projeto este ligado à
Faculdade de Educação e Ciências Sociais da Universidade Federal do Pará, Campus
Universitário de Abaetetuba. Além da pesquisa bibliográfica, foram realizadas entrevista com
dois professores de uma Escola de Estadual de Ensino Fundamental e Médio do Município de
Abaetetuba, no Estado do Pará. Os resultados demonstraram que nem sempre os alunos
indisciplinados são violentos e o papel do professor é muito importante para minimizar esse
cenário. Analisando os relatos, conclui-se que os professores precisam distinguir o conceito
de indisciplina do conceito de violência, para assim saber atuar de maneira adequada perante
situações de indisciplina escolar e de violência, posto que, a indisciplina escolar pode ser
reflexo até da própria maneira de abordar o conteúdo. Sendo que a violência tem outro
enfoque e envolve outros fatores, inclusive sociais e externos à escola, que devem ser
solucionados com apoio de assistentes sociais, psicólogos, entrando algumas vezes na esfera
judicial.
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Doutora em Educação: Psicologia da Educação pela PUC-SP. Professora Adjunta da Universidade Federal do
Pará. Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Indisciplina e Violência nas Escolas – UFPA. E-mail:
vivianlobato@ufpa.br.
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Introdução
Cada vez mais se verifica o aumento da violência nas escolas, seja entre os alunos,
seja entre alunos e professores. A incidência da violência também está ligada à indisciplina
dos alunos e tal comportamento é gerado por uma série de fatores. O objetivo desse artigo é
analisar a percepção de professores, bem como, os significados dos termos violência e
indisciplina no contexto escolar.
Os diferentes significados atribuídos à violência fazem com que o seu estudo seja
muito complexo. De acordo com Abramovay e Rua (2002, p.21), a falta de um significado
consensual, sobre violência escolar, tem dificultado a sua compreensão e conceituação. Sobre
isso as autoras postulam que, “O que é caracterizado como violência varia em função do
estabelecimento escolar, do status de quem fala (professores, diretores, alunos, etc.), da idade
e provavelmente, do sexo”.
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Abramovay (2003) define a violência como um ato físico de indivíduos contra outros e
como uma quebra da capacidade de resolver os conflitos através do diálogo, além de
considerar sua forma verbal e institucional.
O conceito de indisciplina também sofre alterações, haja vista que, está sujeito ao
contexto histórico, social e cultural. Todavia, parece haver um consenso que rótula de
indisciplinado o (a) aluno (a) que apresenta comportamento fora dos padrões esperados.
Dessa maneira, de acordo com Rego (1996), a inquietação, a discordância e o questionamento
acabam sendo considerados como indisciplina. Segundo a autora, o conceito de indisciplina
como ato de rebeldia contra a autoridade e incapacidade de se ajustar as normas estabelecidas,
ainda é bastante aceito pelos profissionais da educação.
Sposito (1998) adverte não ser uma regra a relação entre a pobreza e o aumento da
violência. Abramovay (2003) também tece conjecturas sobre esta relação e ressalta que
existem excelentes escolas em comunidades consideradas violentas, o que desmistifica o
discurso fatalista que aponta as desigualdades como principal fonte do problema.
De acordo com Guimarães (1996, p. 73), a violência “seria caracterizada por qualquer
ato [...] que, no sentido jurídico, provocaria, pelo uso da força, um constrangimento físico ou
moral”. Dessa forma muitos comportamentos apresentados pelos alunos durante as aulas –
agressões físicas e verbais, vandalismo, entre outros –, não seriam indisciplina escolar, mas
violência devendo, portanto, ser abordados com formas diferentes.
Hoje em dia tem-se discutido bastante sobre o bullying que é uma das facetas de
violência entre alunos. O fenômeno do bullying foi percebido preliminarmente por Olweus
(1978) na Noruega. Segundo autor, tais fatos desencadearam o suicídio de três crianças na
faixa etária de 10 a 14 anos, devido a sofrimentos físicos e psíquicos causados por colegas de
escola. Assim, foi estabelecida uma Campanha Anti-Bullying nas escolas em 1993.
Fante (2005) realça a importância de Olweus ter desenvolvido certos critérios para um
correto diagnóstico do bullying. Através desses critérios foi possível detectar o problema de
forma específica, propiciando uma diferenciação entre o bullying e outros incidentes.
Voors (2000, p.5) escreve sobre o contraste de sentimentos entre o agressor e a vítima
do bullying:
Mauro (2010, p.5) destaca os danos que essa violência institucional pode causar:
Percebe-se que o bullying é sério e deve ser tratado como tal. O bullying está presente
em todas as classes sociais, culturas e escolas, em maior ou menor grau. É necessário
diferenciar o bullying de uma agressão ocasional, atuando na especificidade de cada caso.
Enquanto a criança ou adolescente que pratica o bullying pode ter um sentimento de poder, a
vítima pode se sentir muito ferido a ponto de gerar danos psicológicos graves na sua psique.
De acordo com Estrela (2002, p.133) vários estudos sobre indisciplina escolar
mostram que esta, quando ocorre, tem o objetivo de “assegurar as condições de
funcionamento do ensino-aprendizagem e garantir a socialização dos alunos, mas raras vezes
infringe as normas legais que asseguram a ordem na sociedade civil”, ao contrário da
violência onde ocorrem, por exemplo, agressões físicas e depredações da escola.
Resultados e Discussão
Uma das consequências dessa falha na educação familiar, segundo os discursos dos
professores, é o deslocamento da função da escola, que passa então a preocupar-se quase
exclusivamente com questões normativas.
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Há muitos atos e muitas coisas que os alunos praticam, que não chegam a ser
propriamente violência, às vezes são reflexos naturais do convívio deles que a gente
acaba caracterizando como violência.
Esse professor diferencia a indisciplina da violência. Ele tem clareza de que nem tudo
o que os alunos praticam chega a ser violência. Nem tudo pode ser chamado de violência.
Certa inquietação dos alunos, naquela faixa etária, é até natural e aceitável.
Para Brito (2007), a indisciplina está relacionada com as atitudes dos alunos, que
podem ser manifestadas por meio da displicência e da recusa (resistência) à atividade
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proposta. Em outras palavras, a indisciplina é representada por atitudes dos alunos que não
estejam de acordo com o proposto inicialmente pelo professor ou pelo grupo.
A mesma professora de Biologia entende que, para o aluno, assistir a uma aula de
física ou de química sem bons laboratórios, perde o verdadeiro sentido do conteúdo. Segundo
a docente, o aluno rejeita aquele ensino por meio da indisciplina na sala de aula.
E uma das coisas que eu observo que leva muitos alunos a praticar atos de
indisciplina e de violência, é a falta de estrutura das escolas públicas. Falta uma
estrutura que apóie um ensino mais próximo da realidade do aluno. Hoje, a maioria
das disciplinas estão completamente fora do cotidiano dos alunos e isso acaba
gerando uma antipatia nele. Eles acabam manifestando um comportamento que
dizemos ser indisciplina, mas na realidade, é um comportamento avesso aquilo que
ele não quer receber.
Além de concordar com essa afirmação, pode-se ampliar essa falta de estrutura da qual
se queixa o professor, pois, se a escola tem uma aparência suja, mal pintada, com pichações e
carteiras quebradas o aluno é contagiado por aquele ambiente. Assim, pode-se concluir que a
própria instituição também gera uma violência.
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Tudo isso, demonstra a falta de estrutura das escolas públicas para receberem os
alunos de hoje. Hoje em dia, ao mesmo tempo em que o professor está falando, o aluno pode
com seu tablet ou note-book, pode acessar os sites de pesquisa e em tempo real acessar aquela
mesma informação, questioná-la, rejeitá-la ou simplesmente copiá-la. Ou seja, o aluno é
assediado hoje por várias fontes de informações e a escola, por sua vez, ainda trabalha com
estruturas de quinze, vinte anos atrás e tentar formar jovens de hoje.
O que ficou claro é que nem sempre o aluno indisciplinado é também violento. São
atitudes distintas, que podem ocorrer individualmente ou não.
Conclusão
Por fim, vale ressaltar que é preciso, em parte, refrear a angustia de banir da escola a
indisciplina e a violência (como se isso fosse possível). Esses dois temas, sempre existiram e
sempre existirão no âmbito escolar. Cabe a escola e, especificamente, aos docentes
compreenderem tal diferença para saber lidar com as situações que venham a ocorrer. Para
isso, faz-se necessária formação inicial e continuada de qualidade, que subsidiem os docentes
teórica-metodológicamente para trabalhar com ambos os fenômenos.
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Referências
DUBET, François. A escola e a exclusão. Cadernos de pesquisa, São Paulo, n.119, p.29-45,
jul. 2003.
ESTRELA, M. T. Relação pedagógica, disciplina e indisciplina na aula. 4. ed. Porto: Porto,
2002.
FANTE, Cleo. Fenômeno Bullyng: como prevenir a violência nas escolas e educar para a
paz. 2. ed. São Paulo: Verus Editora, 2005.
GARCIA, J. A gestão da indisciplina na escola. In: COLÓQUIO DA SECÇÃO
PORTUGUESA DA AFIRSE/AIPELF. 11, Lisboa. Atas. Lisboa: Estrela e Ferreira. 2001.
p. 375-381.
LOPES, A. Disciplina: é mais fácil para os alunos seguir regras que eles ajudam a criar.
Nova Escola, São Paulo, n. 183, p.45-49, jun./jul. 2005.