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AS

INQUISIÇÕES
PROTESTANTE E CATÓLICA, UMA
PERSPECTIVA VERDADEIRA

DANIEL ALMEIDA
@ALMEIDAFILOSOFIA
ÍNDICE
Introdução................................................................................................ 03

O que motivou a Inquisição Católica.................................................... 06

Como se procedeu a Inquisição Católica............................................. 14

As bruxas de Salém e a Inquisição Protestante.................................. 21

O que motivou a Inquisição Protestante.............................................. 25

Como se procedeu a Inquisição Protestante....................................... 29

Apelo aos cristãos.................................................................................... 35

2
INTRODUÇÃO
Não pretendo convencer algum lado a acreditar que
alguma das inquisições foi a pior. Também não pretendo
expor qual delas é motivada por Deus ou pelo homem
sanguinário, embora esteja explícito para alguns. Meu
intuito é mostrar as suas principais diferenças, isto é,
porque matou, como o fez e até que ponto chegou. Não
considere esse texto como um documento formal.

Tenho certeza de que muitos ainda pensam: "Mas por


que não deixá-los (os “hereges”) em paz, ao invés de
persegui-los e assassiná-los? Esse não é um ato contra a
liberdade?"

Ora, vejamos. Quando se tem uma ideia social em vigor


cujo perigo é iminente, não se deseja extirpá-la da
sociedade antes que engendre ainda mais o corpo social?
Deixe-me explicá-lo.

Se bem que não tenho certeza dessa analogia — e, cá


entre nós, também nunca fui tão bom nisso —, mas se
hoje surgisse um movimento pro-nazista, não seria
sensato reprimi-lo antes que se torne novamente um
perigo iminente?

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Foi isso que fizeram os ingleses quando os cátaros, a
exemplo, desembarcaram em seu porto, expulsaram-nos
de seu território, por considerar os seus ideais como
algo perigoso, uma vez que sua crença determinava a
procriação como algo demoníaco.

Embora tenhamos (a sociedade moderna) adotado essas


perspectivas, não significa que não são perigosas.
Significa, contudo, que as práticas sociais ou religiosas
se deterioraram ao longo dos últimos decênios. Alguns
poucos instruídos sabem o quanto esses ideais são
perigosos.

É notório que ao longo dos séculos houve-se um avanço


sociopolítico nas leis civis, não à toa que hoje em alguns
países, como aqui no Brasil, só é lícita a pena de morte
em tempos de guerra. Diante disso é muitas vezes
ridículo quando um determinado grupo ou pessoa se
refere à morte como punição, como quando alguém diz:
“bandido bom é bandido morto”. Tal pessoa, se o
dissesse no período medieval talvez não seria exposta ao
ridículo como o é hoje.

Não somente em questões de época, como também de


cultura. É claro que não podemos julgar os palestinos ou
os israelenses com as nossas leis, porque a nossa cultura
e, portanto, nossas leis diferem das suas. Do mesmo
modo seria ainda mais ridículo o julgarmos estando no
século quinze.

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Por essa razão, é de bom tom que julguemos
determinada época de acordo com suas leis e cultura e
não com as nossas.

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O QUE MOTIVOU A
INQUISIÇÃO CATÓLICA
Na antiguidade, era muito comum o “fazer justiça com
as próprias mãos”, que foi herdado do “olho por olho,
dente por dente”, não à toa a Lei de Talião e outras
similares, que dava autoridade aos agredidos pagar com
a mesma moeda a agressão dos agressores. Esse
princípio foi oralmente passado de geração em geração
até que em meados da era medieval o Estado diz: basta!

Em voga era comum pessoas julgarem umas as outras


por heresia e, em situações que as pessoas se sentiam
ameaçadas, resultava no fazer justiça com as próprias
mãos ou ao ato de levar a pessoa a um tribunal civil para
ser condenada.

Em síntese, os que eram condenados, aos moldes do


direito romano, o eram sem prévias investigações das
causas que levaram a cometer tal ato.

Somente com a instituição da Inquisição é que se foi


instaurado uma nova forma de fazer justiça. Inclusive, do
processo inquisitorial é que herdamos o direito que
temos hoje, de investigar e consequentemente julgar.

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De suspeito para réu era um processo gradual, como o é
hoje nas justiças mais justas graças à Inquisição. Não é à
toa que muitos se referem à Inquisição como um
“tribunal de misericórdia”.

O Estado criou um tribunal específico para investigar o


que era de fato heresia cabendo à Igreja determinar o
herege.

A Inquisição[1] católica era constituída pelo tribunal do


Santo Ofício junto ao tribunal civil. Diferente do que
muitos pensam, não era Igreja Católica, somente, era
Estado-Igreja. Não era a Igreja Católica a responsável
por punir ou vingar. Na verdade, isso cabia às leis civis.

À Igreja cabia o ato de determinar o que era considerado


como heresia, tratá-lo e, se conviesse, emendá-lo e
reintegrá-lo.

Suponhamos que uma determinada pessoa seja


condenada à prisão nos dias de hoje. A justiça não busca
saber se essa pessoa se arrepende, mas se ela tem provas
que evidenciem que ela é inocente.

[1] Inquisição. Etim. inquisitio, de inquirire, “procurar”, in (em) mais


quaerere (perguntar, procurar). O que pode ser traduzido como
inquérito, em procura ou em investigação. Em suma, investigação
ou procuração.

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Do mesmo modo, no período medieval, qualquer
tribunal civil não absolvia um criminoso ou um agressor
da ordem social apenas por se mostrar arrependido.

Contudo, para o tribunal do Santo Ofício, se o herege se


arrependesse, ele estaria absolvido.

Não cabia à Igreja matar um herege. Contudo, era a ela


destinada a incumbência de fazer, se necessário fosse, o
uso da força para o arrependimento do herege:

É verdade que não se deve ‘forçar’ ninguém a


aceitar a fé. Neste particular os medievais
procediam corretamente. Não obrigaram os
judeus, nem os pagãos ou muçulmanos a abraçar a
fé cristã. Mas quem era cristão tinha feito no
batismo o compromisso de conservar a fé, de ser
membro da Igreja e da Cristandade até a morte,
assumira supremas obrigações diante das
autoridades, às quais davam o direito de ungir o
fiel cumprimento. Apostando, o cristão tornava-se
perjuro, réu de um crime considerado como o
maior de todos. (Pe. José Bernard S. J., A
Inquisição: História de uma Instituição
Controvertida. Calvariae Editorial: Sertanópolis
— PR, 2021, p. 19).

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A HERESIA MANIQUEÍSTA

Um pouco antes da idade média surgiu uma corrente


doutrinária herdada da Pérsia por meio de um falso
profeta chamado Mani (que, por sua vez, herdou do
gnosticismo e este, do marcionismo). Essa doutrina
ganhou tanta fama que começou a mexer com a cabeça
dos clérigos da época.

A doutrina se baseava na ideia de que existe, além da


força do Sumo-Bem, uma força do Mal. Para os
maniqueus, tudo o que há de bom, belo e verdadeiro no
mundo é criação do Deus bom e perfeito (Reino da Luz),
enquanto o mal é criação de Satanás (Reino das
Sombras). Ou seja, tudo o que provém do espírito é do
Deus bom e deve ser glorificado; tudo o que provém da
carne, do corpo, é mau e deve ser sacrificado.

Talvez pareça que não há muita divergência ao


cristianismo, como você deve estar pensando. Por esse
motivo, os clérigos da Igreja submeteram a doutrina a
um concílio para validá-la como verdadeira ou falsa.

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REFUTANDO A HERESIA MANIQUEÍSTA

Com um olhar mais atento, você poderá notar que (1) a


doutrina diz que há duas forças superiores, dois deuses,
mas sabemos que há somente um; além disso, afirma
que (2) Deus não é soberano sobre o bem e o mal, mas
sabemos que ele é soberano sobre todas as coisas; (3)
considera o mal como um ente, contudo sabemos que o
mal é a ausência do bem.

Se Deus é um só; se é soberano e único Criador sobre


todas as coisas; se o mal é a ausência completa de Deus...
ora, a doutrina é falsa e deve tão logo ser considerada
heresia.

Agostinho, enquanto maniqueísta, percebeu isso e logo


converteu-se ao catolicismo, refutando posteriormente a
falsa doutrina e o falso profeta. Após isso essa corrente
doutrinária morreu.

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A HERESIA DOS CÁTAROS

Mas ressurgiu em meados da idade média novamente.


Agora, como um novo rótulo, catarismo.

Os cátaros consideram a matéria como algo impuro, não


à toa se consideravam como “os puros”, aqueles que
sempre buscavam a espiritualidade. E a impureza do
mundo era uma mera criação do Deus mau, Deus do
Antigo Testamento, que aprisionou os espíritos em
corpos impuros e desprezíveis. Não à toa que para eles a
procriação era um mal, o pior pecado que se poderia
cometer, porque de algum modo faria com que os
espíritos que habitam o céu fossem presos pelo Deus
mau aos corpos dos que nascem na terra.

Como a matéria para eles era um pecado mortal, ser


humano os levaria ao inferno se não punissem
constantemente a carne.

(Há uma diferença que vale ser ressaltada aqui: à


perspectiva tanto católica quanto protestante, o martírio
da carne serve para o enaltecimento do espírito, ao
passo que para os cátaros bastava-se a mera punição
dessa prisão na qual o Deus mau os colocou, o corpo.
Devido a isso, procriar era um pecado mortal.)

E, para os cátaros, o “jejum” não cabia somente a eles,


como também à comunidade. Dado que para eles “uma
mulher grávida é uma mulher que tem o demônio no
corpo”, era muito comum os cátaros levarem gestantes à
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fogueira para serem queimadas a fim de não dar
oportunidade ao Deus mau de aprisionar num corpo
mais um espírito.

Para eles, a humanidade deveria se decompor até que


não se restasse qualquer resquício de matéria.

Para a concepção dos povos medievais, inclusive para os


reis, essa era uma doutrina que poderia levar o país ao
colapso. Foi por essa e outras razões que o povo
começou a revidar contra os cátaros.

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A REVOLTA POPULAR

Diante do crescimento do catarismo, das perseguições e


dos linchamentos, à parte da Igreja e do Estado, as
pessoas começaram a se mobilizar para deter o seu
avanço, bem como promover a sua extinção matando os
seus líderes mesmo sem o consentimento dos bispos,
como aconteceu em Milão ou Liège.

O maniqueísmo chegou a tal ponto “que os príncipes, os


reis, os imperadores e o povo em massa procederam à
execução dos hereges que consideravam como o maior
perigo” diz Bernadino Llorca.

Literalmente, os povos temiam a piedade da Igreja


diante das heresias, razão pela qual faziam justiça com
as próprias mãos. Até aqui a Igreja não era atuante como
inquisidora.

Contudo chegou a um ponto que a Igreja enfim


determinou que algo fosse feito, uma vez que pessoas
constantemente iam para a fogueira e eram mortas em
praça pública por assuntos de sua incumbência: heresia.

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COMO SE PROCEDEU A
INQUISIÇÃO CATÓLICA
Quero relembrar que a Inquisição foi um processo que
abrangia católicos. Qualquer outra religião que não fosse
esta não se poderia submeter-se ao ato inquisitorial,
uma vez que heresia à perspectiva cristã diz respeito à
fuga dos princípios cristãos.

Dito isso, em 1231, através do Papa Gregório IX, a


Inquisição é criada e dá a responsabilidade aos
Dominicanos para agir contra os hereges. Nasce o
primeiro tribunal. “Cabe ao Papa reprimir os hereges”
(pronúncia do séc. XII no Concílio de Verona).

Haveria alguns procedimentos a que o sujeito herético


deveria se submeter. O Dictionnaire de Théologie
Catholique — o qual disponibilizei junto a este escrito —
traz sete procedimentos. Mas para fins de clareza,
praticidade e simplificação sem fuga, vou limitá-los a
três procedimentos. O primeiro era arrependimento. O
segundo, penitência. O terceiro, julgamento final.

Segundo o Dictionnaire, o tribunal do Santo Ofício, no


período inquisitorial, concedia aos acusados uma
oportunidade de ouvir um sermão sobre o
arrependimento e dava a possibilidade aos hereges de se

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confessarem por livre e espontânea vontade durante os
próximos quinze a trinta dias (Tempo de Graça) após o
sermão sem nenhuma investigação ao sujeito durante
esse tempo.

São essas as medidas tomadas pelos dominicanos no


combate aos cátaros: convidam-nos a participarem do
sermão e os convida ao arrependimento. A partir do
instante em que o herege se arrepende e se apresenta
aos dominicanos como um penitente, se ver livre das
condenações da Igreja ou do Estado. Caso contrário, o
herege é submetido ao inquérito católico para convencê-
lo ao arrependimento e, se persistir, sê-lo-ia dado ao
Estado.

Quanto aos atos de inquérito para o convencimento do


herege, penso que seja válido ressaltar um documento
desgraçadamente protestante.

Em 1567, foi publicado um documento de autoria


protestante que denunciava as práticas da inquisição
católica. Um ano mais tarde às línguas francês, inglês,
holandês e alemão já haviam sido traduzidas. Esse
documento englobava as práticas subscricionais da
Inquisição na Ibéria.

15
A partir de Montanus[2], pseudônimo do autor, o mundo
conheceu a Inquisição Espanhola.

[2] Esse camarada poderia ser considerado um dos primeiros


pentecostais, senão o primeiro protestante a se voltar contra a
autoridade da Igreja Católica. Acusações de Montanus, em
meados do segundo século depois de Cristo, são bem similares às
acusações que os protestantes fazem tanto uns contra os outros
ou quanto contra ao catolicismo, como a não aceitação da
sucessão apostólica ou a “frieza espiritual” apelando para as
revelações do Espírito Santo. Contudo há também grandes
diferenças, como a castidade, uma certa semelhança à doutrina
maniqueísta de martírio da maligna carne. Montanus se separou
da Igreja e fundou a sua própria comunidade, pregando a volta de
Cristo.

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A INQUISIÇÃO ESPANHOLA

“Esses torturadores apresentavam-se totalmente vestidos,


do alto da cabeça à sola dos pés em trajes de lona, como as
vestimentas usadas pelos demônios nos palcos dos teatros e
exatamente com esta finalidade: provocar medo físico e
mental numa pobre alma de ver-se torturado por uma
figura demoníaca.” — diz um trecho do documento de
Montanus. “Assassinados pelos tormentos, seus longos dias
eram comparativamente muito mais cruéis do que se
estivessem nas mãos de um carrasco para serem executados
sumariamente.”

Veja o que ele diz quanto aos instrumentos utilizados


pelos inquisidores: “Seu exterior era como a de uma
grande boneca com a aparência de uma bela mulher. Um
semicírculo era desenhado em torno dela. E a pessoa que
ultrapassasse essa marca fatal acionava uma mola que
fazia o instrumento diabólico se abrir. Imediatamente ele
era aprisionado e milhares de lâminas o cortava em
pedaços.”

Cruel? Bom. Seria, se fosse verdade.

Somente agora no século XX se descobriu que tudo o que


se sabia sobre a Inquisição era falso. A Igreja Católica
abriu o Vaticano para historiadores e pesquisadores e
descobriu-se o mito por trás do discurso desse
camarada protestante.

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Na verdade, a Inquisição não possuía máquinas ou
instrumentos de tortura para os hereges. Após a
publicação do documento de Montanus é que se criou
vários instrumentos para se formar mitos em torno
deles.

Vale lembrar o que diz o historiador Rino Camilleri em


seu livro A verdadeira história da Inquisição:

As fontes [históricas] demonstram muito


claramente que a Inquisição recorria à tortura
muito raramente. O especialista Bartolomé
Benassa, que se ocupou da Inquisição mais dura, a
espanhola, fala de um uso da tortura
"relativamente pouco frequente e geralmente
moderado, era o recurso à pena capital,
excepcional depois do ano 1500". O fato é que os
inquisidores não acreditavam na eficácia da
tortura. Os manuais para inquisidores
convidavam a que se desconfiasse dela, porque os
fracos, sob tortura, confessariam qualquer coisa, e
nela os "duros" teriam persistido facilmente. Ora,
porque quem resistia à tortura sem confessar era
automaticamente solto, vai de si que como meio de
prova a tortura era pouco útil. Não só. A confissão
obtida sob tortura devia ser confirmada por escrito
pelo imputado posteriormente, sem tortura
(somente assim as eventuais admissões de culpa
podiam ser levadas a juízo).” (Rino Camilleri - La
Vera Storia dell ´Inquisizione, pg. 46-47).

18
Tudo o que se disse sobre esses instrumentos de
tortura, como a tal dama de ferro, a guilhotina, a pera da
angústia, a cadeira espanhola, a serra, o berço de Judas...
tudo isso foi um mito criado.

Além do mito que diz respeito às torturas, também se


criou um mito acerca das prisões a que os hereges eram
submetidos. Na verdade, as cadeias da cidade eram
muito mais temidas pelos infratores da época, não à toa
que prisioneiros eram mortos toda semana. Outrossim
descobriu-se também que esses prisioneiros
blasfemavam nas celas apenas para irem para as prisões
católicas e escapar das torturas recebidas em prisões
civis.

Um documento que hoje se comprova falso circulou na


época alegando que a Inquisição dizimaria populações
inteiras por heresia, uma das razões pelas quais a
Inquisição espanhola é uma das mais conhecidas, e uma
das maiores mentiras espalhadas sobre a Igreja Católica.

Fala-se também sobre a bruxaria. Na verdade, pelo


tribunal do Santo Ofício a bruxaria foi considerada
ilusória, embora tenham criado um mito em torno do
livro d’O martelo das bruxas — o livro também foi
considerado falso.

19
Em pouco menos de três séculos, de 3.000 a 5.000
pessoas sofreram pelas mãos da Inquisição. Ao passo que
durante o mesmo período mais de 150.000 pessoas
consideradas como bruxas foram queimadas na famosa
fogueira ao redor da Europa sem a atuação da Igreja.

Diz-se que piedade quanto às bruxas não ocorreu com a


Inquisição Protestante.

20
AS BRUXAS DE SALÉM E A
INQUISIÇÃO PROTESTANTE

(Nunca houve Inquisição no meio protestante enquanto


instituição. Contudo, houve medidas relativas à
inquisição, embora nada formalizado pela Igreja como o
foi no catolicismo, o que se torna bastante difícil
pesquisar e encontrar fontes verídicas. Contudo, alguns
escritos valiosos da época foram preservados.)

Você naturalmente já ouviu falar sobre as Bruxas de


Salém.

Alguns puritanos estão a fugir da perseguição na


Inglaterra do século XVII, e um reverendo chega em
Salém com duas filhas e uma escrava chamada Tituba.
Essa escrava é uma das primeiras vítimas daquilo que
ficaria conhecido como a caça às bruxas.

Nos cultos puritanos um ministro chamado Samuel


Parris costumava pregar sobre fogo e enxofre, com
proposições não somente bíblicas, mas retiradas
também de um livro da época, de Thomas Vincent, por
título Fire and Brimstone.

Não sei se foi daí que se originou a ideia de que os


protestantes só pregam sobre o inferno ao invés de pre-

21
gar sobre moralidade, mas essa era realmente a
realidade dessa comunidade de Salém e por essa razão
as pessoas temiam os poderes do diabo.

22
A INQUISIÇÃO PROTESTANTE ÀS BRUXAS DE SALÉM

Fato é que algumas moças, sobrinha e filha do ministro


Samuel Parris, começaram a brincar com adivinhações,
não por incentivo da escrava Tituba, mas por pura
curiosidade, ato que era considerado heresia tanto para
o catolicismo quanto para o protestantismo. As moças
logo começaram a demonstrar comportamentos
estranhos. Consequentemente acusaram Tituba. Os
juízes da época acusaram-na de bruxaria e ela
confessou, acusando em seguida duas outras mulheres
da aldeia.

Após isso mais e mais acusações iam surgindo e na


comunidade local houve uma grande histeria. Em mais
ou menos um ano cerca de 200 pessoas foram acusadas
de bruxaria, até que o governador William Phips
determinou que nada mais fizessem contra as bruxas.

Fato é que essa tal inquisição não teve como principais


inquisidores ministros protestantes, mas juízes civis. Até
nesse período era comum o “olho por olho, dente por
dente”, ou o “fazer justiça com as próprias mãos”. A
comunidade, e não os clérigos do protestantismo,
promoveram a caça às bruxas, embora tivessem
motivações puritanas.

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Algumas pessoas afirmam que os protestantes teriam
influenciado a caça às bruxas baseados num escrito de
Benedict Carpzov, o famoso livro da Inquisição na
Saxônia, alegando que através disso o protestantismo
matou mais de 20.000 bruxas.

Na verdade, a obra de Carpzov é sobre direito penal, de


cunho majoritariamente jurídico e sem o apoio da Igreja
puritana, embora citando passagens bíblicas para validar
seus argumentos (Ex. 22:18; Lv. 19:31; 20:6,27; Dt. 12:1-5),
especialmente o “Não deixarás viver a feiticeira”.

Embora Carpzov tenha sido protestante, isso não


demonstra que a dita inquisição foi protestante. Além
disso, depois de pesquisas mais modernas, não se pode
comprovar que houve participação direta dele nos
processos de bruxaria que acabaram em morte.

Contudo, não digo que os protestantes são isentos dos


assassínios, não somente de católicos como também dos
próprios irmãos.

24
O QUE MOTIVOU A
INQUISIÇÃO PROTESTANTE

Sou protestante da Igreja Batista. Já não sei se os


personagens dessa história devem ser considerados
mártires ou aquilo que os outros protestantes
consideravam na época, como subversivos e hereges.
Mas esse não é o objetivo. O fim desta redação consiste
saber qual o papel de tal corrente denominacional na
Inquisição.

O nascimento da Igreja Batista é um tanto quanto


incerto para alguns protestantes. Às vezes, nossos
líderes dizem que nascemos de João Batista, cuja
doutrina ascendeu na Igreja primitiva e foi passando de
geração em geração até a sua legalização na Holanda do
século XVII. Outra hipótese é que viemos dos
anabatistas, os rebatizadores da Reforma.

Acredito que a primeira hipótese pode ser considerada


falsa, uma vez que (1) não temos sucessão apostólica ou
uma liderança específica; (2) não aceitamos a tradição
como um dogma, o que não nos possibilitaria uma base
para determinar a tradição da sucessão apostólica uma
vez que a tradição está contaminada por erros e
superstições segundo a nossa concepção.

255
A segunda hipótese é a que pode ser considerada a mais
verídica porque os mesmos dogmas defendidos por eles
nós recebemos. Não à toa que hoje nós consideramos a
Bíblia como a “nossa única regra de fé e prática”,
princípio cujas raízes se encontram no anabatismo. A
partir da reforma protestante, houve várias outras
reformas dentro do próprio meio protestante, e uma
dessas foi a revolta anabatista.

26
A REVOLTA ANABATISTA

Quando Zwínglio, ao lado de Lutero, promovia a


reforma em Zurique, alguns de seus alunos o
questionaram acerca do batismo infantil se baseando nas
argumentações já apresentadas. Félix Manz e Conrad
Grebel foram os precursores de toda essa reivindicação
anabatista.

Alguns historiadores dizem que Zwínglio não aceitou as


reivindicações anabatistas por medo das autoridades
civis, uma vez que os anabatistas foram ultrarradicais,
arruaceiros, perturbadores da ordem pública e
subversivos. Contudo, essa é uma falsa premissa.

Zwínglio não adotou os questionamentos e argumentos


dos anabatistas por entendimento de que, à sua
perspectiva, as suas proposições teológicas eram falsas.

Enquanto os reformadores buscavam a separação


apenas da Igreja Católica, os anabatistas buscavam a
separação do catolicismo, da Reforma e do Estado, não à
toa foi o grupo mais perseguido nesse período.

Uma das principais pautas era considerada heresia para


os reformadores, o rebatismo, isto é, batizar-se
novamente. À perspectiva dos anabatistas, era
necessário um novo batismo por duas principais razões:

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(1) o batismo deve ser na fase adulta porque o batismo
de criança era inválido, uma vez que batismo consiste
em arrependimento e criança não tem conhecimento de
pecado para arrepender-se; e (2) porque, como outrora
estiveram em religião considerada também herege,
fazia-se necessário um novo batismo, um verdadeiro,
puro e consciente. Mas havia um problema nisso, que
não estava somente no campo religioso, mas social.

Para o contexto da época — estamos falando do início do


séc. XVI, (segunda década de 1500) — o batismo era
símbolo tanto para a Igreja quanto para o Estado, que
legalizava a partir batismo o nascimento da pessoa.
Por essas e outras razões, não somente Zwínglio, como
também Lutero, outros reformadores, católicos e a
sociedade civil viram o movimento como perigo
iminente.

28
COMO SE PROCEDEU A
INQUISIÇÃO PROTESTANTE

Sou protestante da Igreja Batista. Já não sei se os


personagens dessa história devem ser considerados
mártires ou aquilo que os outros protestantes
consideravam na época, como subversivos e hereges.
Mas esse não é o objetivo. O fim desta redação consiste
saber qual o papel de tal corrente denominacional na
Inquisição.

O nascimento da Igreja Batista é um tanto quanto


incerto para alguns protestantes. Às vezes, nossos
líderes dizem que nascemos de João Batista, cuja
doutrina ascendeu na Igreja primitiva e foi passando de
geração em geração até a sua legalização na Holanda do
século XVII. Outra hipótese é que viemos dos
anabatistas, os rebatizadores da Reforma.

Acredito que a primeira hipótese pode ser considerada


falsa, uma vez que (1) não temos sucessão apostólica ou
uma liderança específica; (2) não aceitamos a tradição
como um dogma, o que não nos possibilitaria uma base
para determinar a tradição da sucessão apostólica uma
vez que a tradição está contaminada por erros e
superstições segundo a nossa concepção.

29
A INQUISIÇÃO CONTRA OS ANABATISTAS

Os reformadores, os anglicanos e os reis perseguiram


os anabatistas. Dado que estes se batizavam pela
segunda vez, já que primeira era inválida, o rei Fernando
I decretou contra eles afogamento declarando ser esse “o
terceiro [e último] batismo [...] o melhor antídoto para os
anabatistas”.

O livro Cenário Sangrento, também conhecido como O


espelho dos mártires, de Thieleman J. van Braght, narra
milhares de execuções de anabatistas ao longo dos
séculos XVI e XVII na Europa das quais Zwínglio foi o
principal inquisidor. Pena de morte foi decretada no
Conselho de Zurique em 1526 para qualquer um que
ousasse ser batizado novamente. Na Suíça e na
Alemanha, medidas semelhantes foram adotadas.

Carlos V, em 1528, se baseou numa antiga lei de combate


ao donatismo para decretar contra os anabatistas pena
de morte.

Em várias regiões os anabatistas eram mortos, e de


diferentes formas. Enquanto alguns eram ironicamente
afogados, outros eram queimados nas fogueiras;
enquanto uns eram esquartejados, outros eram
enterrados vivos, como o caso de várias mulheres
anabatistas que pereceram com tal pena de morte.

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Na Igreja da Irmandade, como gostariam de ser
chamados, os anabatistas tiveram um irmão chamado
Dirk Willems, cuja morte é lembrada como um dos
grandes martírios da irmandade. Quando Dirk estava a
fugir dos inquisidores protestantes e civis, um de seus
perseguidores cai num buraco na água congelada. Dirk
volta e resgata seu perseguidor que se afoga na água fria
do inverno europeu. Depois de salvá-lo, o anabatista é
capturado, torturado e queimado na fogueira condenado
por heresia.

Um dos líderes da revolta anabatista, Michael Sattler, foi


queimado por ordem do magistério católico junto com
outros três anabatistas. Em seu julgamento, ele
proclamou: “Se nos invadirem os turcos, não deveríamos
resistir pela força; porque está escrito: ‘Não matarás’. Não
devemos nos defender nem contra os turcos nem contra
nossos perseguidores. [...] Vocês querendo ser cristãos e
jactanciosos de Cristo, perseguem as testemunhas piedosas
de Cristo e sois turcos segundo o espírito.”

Martin Bucer, ex-dominicano convertido ao calvinismo,


diz em carta: "não duvidamos que Michael Sattler,
queimado em Rotenburgo, foi um amigo querido de Deus;
foi certamente um dos líderes anabatistas, mas tinha mais
prendas e era mais honrado que muitos de nós".

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A perseguição continuou durante todo o século, o que
fez com que os anabatistas migrassem tanto para o
Oriente quanto para o Ocidente e crescessem
exponencialmente.

A inquisição protestante, contudo, não foi somente


contra os anabatistas.

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A INQUISIÇÃO CONTRA OS CATÓLICOS

A Reforma ganhou força mesmo diante de grandes


martírios.

Na expansão da Reforma protestante, padres e


bispos foram presos e decapitados, igrejas e
mosteiros arrasados, católicos aos milhares foram
mortos. Qualquer aproveitador era alçado ao
posto de bispo ou pastor. Tribunais religiosos
(inquisições) foram montados em todo o país.”
(Macaulay – Leipzig, tomo I, pg. 54).

Camponeses tanto católicos quanto anabatistas


pegaram em armas para defender suas causas e suas
famílias. Mesmo assim, comunidades foram massacradas
pelos exércitos tanto de anglicanos quanto de puritanos
ou luteranos.

Estima-se que Lutero ao lado dos príncipes alemães


promoveram a execução de mais de 100 mil camponeses,
dentre eles os anabatistas.

Na Inglaterra, terras da comunidade irlandesa foram


cedidas aos puritanos.

Não somente católicos, anabatistas e outros


protestantes foram perseguidos pelos reformadores,
como também os judeus. Para Lutero, porcos e judeus
deveriam ter o mesmo destino.

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Essa crença luterana deu base teológica para um dos
maiores genocídios da história, o Holocausto. Não à toa,
Hitler considerou Lutero um grande reformador, um
herói nacional.

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APELO AOS CRISTÃOS
Quanto o Cristo fundou a sua Igreja no primeiro século,
naturalmente ele deixou claro a todos nós que ainda
veríamos não somente o crescimento como também a
apostasia que haveria em sua Santa Igreja, razão pela
qual fomos alertados “tenha cuidado de ti mesmo e da
doutrina”.

No primeiro século, os primeiros cristãos


“permaneceram na doutrina dos apóstolos”, embora
tendo ainda farisaísmo, marcionismo ou doutrinas
semelhantes circulando, mas a Igreja era imbatível até
mesmo contra o impiedoso coliseu. O grande Império
Romano caiu, e foi a grande Pedra da profecia de Daniel
que o esmagou. Por essa razão a Pedra (a Igreja)
continuou de pé.

Homens como Agostinho, Irineu, Inácio, Ambrósio,


Gregório, Atanásio começaram a surgir para servirem de
escudo contra todas as flechas que de todos os lados
tentavam atingir o Sagrado Corpo. E conseguiram.
Combateram contra os cátaros, os maniqueístas, o
montanismo e o marcionismo e venceram.

Mas a partir do século XVI os membros da Igreja


começaram a ser atingidos por ganância e negligência.
Essa foi uma parte fundamental atingida do Santo Corpo

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que não subsistiu ao ataque e pereceu perdendo mais
pessoas do que em toda a história da Igreja.

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APELO AOS PROTESTANTES

As Sagradas Escrituras definem a Igreja de Cristo como


o fundamento da verdade. Por que estamos divididos?

Sabemos que pessoas como Lutero, Calvino, Zwínglio ou


Muntzer não podem ser consideradas infalíveis, e essa
foi uma das suas reivindicações a respeito do Papa que
também não poderia sê-lo. Mas se eles não foram
infalíveis ao menos na Reforma da Igreja, por que
considerar a nossa Igreja como infalível?

E se você não considera a sua Igreja como infalível,


como ela pode ser o fundamento da verdade?

Sem querer escandalizá-lo, a Igreja veio antes da Bíblia,


e a Bíblia foi escrita por homens que você considera
como falíveis. Se você os considera como falíveis, como
podem ter escrito a Bíblia infalível?

Se você os considera como infalíveis ao menos quando


escreveram as Escrituras, uma vez que estavam debaixo
da iluminação do Santo Espírito de Deus, por que Deus
não os preservaria da mentira, da idolatria, da
negligência e de todo erro ao exortarem pessoalmente —
ou ao fazerem uma Reforma em sua Igreja?

Se a Igreja de Cristo é santa, por que o seu reformador


não deveria sê-lo?

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Certamente Deus não convidaria demônios para
erigirem um castelo nos céus.

Trate isso como uma carta do seu saudoso irmão em


Cristo,

Daniel Almeida.

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