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Estudo de caso 2º bimestre - Etiópia

Letícia Mosquéra, Rodrigo Abreu, Samara Rabelo, Thaynara Castro

1 MULTILATERALISMO
1.1 UNIÃO AFRICANA (PAN-AFRICANISMO)

A União Africana é um produto do pan-africanismo, um conjunto de ideias de


emancipação dos povos negros, que surge vagarosamente ao fim do século XIX e se
desenvolve após a segunda guerra mundial, como consequência da independência dos
Estados africanos. Inicialmente, os militantes radicais – e com isso quero dizer, os
chefes de Estado mais radicais - dessa corrente almejavam a criação de um Estado
unitário que englobasse todos os países africanos, enquanto os moderados (Grupo de
Monróvia) preferiam submeter sua soberania a uma Organização Internacional (OI)
especializada nas questões africanas. Assim, pela maioria, em maio 1963, Haile Selassié
recebe em Addis Abeba a comissão que inaugura a Organização da Unidade Africana
(OUA). Os objetivos da OI eram de emancipação regional e continental, dentro de uma
perspectiva universal. Também almejavam combater colonialismo, o apartheid e
defender o pan-africanismo (DIALLO, 2005). Contudo, ainda seguindo Diallo, a OI
falha em entregar o que fora prometido quando na realidade se mostra como um “clube
de presidentes” dos Estados membro, pois se omitia constantemente, quando não
declarava neutralidade. Ainda, a OI deixou de receber as cotas dos membros por
diversas vezes, impossibilitando sua atuação. Como solução, em maio 2002 a União
Africana (UA) substitui jurídica e politicamente a OUA.

A UA é fundada com uma proposta diferente de sua antecessora, e mais ou menos nos
moldes da União Europeia, sob o intuito de contrariar a marginalização do continente
africano, mas também trazer novidades, como possíveis intervenções no setor privado,
novas regras para programas de empréstimos e financiamentos bi ou multilaterais,
resolução das dívidas africanas e devolução de capitais “exilados” (DIALLO, 2005). O
5º artigo do ato constitutivo da UA dispõe os órgãos que constituem a UA, e destacamos
o Conselho Executivo, o Parlamento Pan-africano, a Corte de Justiça, o Comitê dos
Representantes Permanentes e o Conselho Econômico, Social e Cultural e Instituições
Financeiras. Além disso, a UA poderá criar outros órgãos por iniciativa própria, como o
fez com o Conselho da Paz e da Segurança, que entrou em vigor junto do ato
constitutivo.

1.2 AGENDA 2063

Um dos planos de ação para o desenvolvimento sustentável africano, elaborado pela


UA, é justamente a Agenda 2063: um aglomerado de aspirações, objetivos e prioridades
para os Estados africanos trabalharem durante as próximas décadas a fim de transformar
o continente numa verdadeira potência pan-africana. O plano nasce no evento do 50º
Aniversário da Declaração de Solemn, em 2013, com metas para serem atingidas em até
50 anos, ou até 2063.

A Agenda é dividida em 7 aspirações, com 20 objetivos no total. Dentre eles, temos, por
exemplo, altos níveis de IDH, economias aceleradas e modernas, relação sustentável
com o meio ambiente, uma África unida (em uma federação ou confederação) e a
preservação da paz no continente, sem nenhum tipo de guerra.

A UA engloba os 55 países da África, sem distinções, e todos tem direito a voto nas
assembleias da Organização. É certo afirmar que os objetivos postos na Agenda 2063
são objetos de perseguição de todos os Estados-membros, pois tratam-se de objetos
positivos para qualquer Estado, independente de regime político ou governo.

A Etiópia tem buscado seguir o proposto, assinando um tratado de paz com a Eritreia
em 2018 e cooperando na pacificação da Somália na mesma década. No entanto, alguns
problemas domésticos são ainda sobressalentes, como as próprias questões étnicas e
religiosas que há muito vêm causando intrigas no interior do país. O povo etíope tem
ainda sofrido, desde 2021, despejos financiados pelo próprio Banco Mundial, com
recursos que foram destinados à saúde e educação (PUBLICA, 2015).

A pandemia do coronavírus também atrasou o desenvolvimento dos objetivos, forçando


o Estado da Etiópia a realocar e despender recursos de outras áreas para a manutenção
da saúde no país.

1.3 OMS, COVID-19 E DIPLOMACIA DA VACINA

A pandemia do covid-19 (doravante denominada apenas “COVID”) impactou de várias


formas todos os Estados do mundo, doméstica e internacionalmente, possivelmente
transformando para sempre as relações internacionais tradicionais. O coronavírus, como
outras doenças respiratórias, é transmitido pelo ar, de uma pessoa infectada com o vírus
para outra. A principal e talvez mais eficiente estratégia para mitigar os avanços do
vírus é o isolamento social. No entanto, o isolamento e seus derivados (como a
quarentena) resultam na diminuição da interação das pessoas e povos, causando
esfriamento econômico generalizado e problemas sociais, como desemprego,
insegurança alimentar, falência de empresas e negócios locais, etc. Como forma de
resolver a pandemia, foi inaugurada uma verdadeira “diplomacia da vacina”, com uma
valorização nunca antes vista da Organização Mundial da Saúde (OMS), bem como pela
cooperação internacional em prol de imunizantes do novo vírus, que foram
disponibilizados em tempo recorde.

A OMS foi estabelecida em 1946, tornando se operacional em 1948, sob a


responsabilidade de cuidar dos temais relativos à saúde no âmbito global. Atualmente,
informações oficiais da OMS indicam que a OI atua com sistemas de saúde,
acompanhamento da saúde e curso da vida, prevenção, vigilância e resolução, e também
serviços corporativos. A OMS é considerada a autoridade máxima global para tratar de
temas da saúde por ter grande parte do seu efetivo formado por profissionais
habilitados, e também ter à disposição um imenso repertório de estudos condicionados a
ela.

Atualmente o Diretor-Geral da OMS é o etíope Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus, o


primeiro africano eleito para dirigir a OI, o que também tem muito significado para a
Etiópia. Tedros foi ministro da saúde e das relações exteriores da Etiópia durante as
primeiras duas décadas do século XXI, e trabalhou com excelência para melhorar a
saúde do seu país e da região do Chifre da África. Ao assumir o cargo de Diretor da
OMS, lançou o 13ª Programa Geral de Trabalho, um projeto de 5 anos que visava
auxiliar os países a implementar as melhorias de saúde estabelecidas nos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. O etíope também liderou evoluções
organizacionais na estrutura da OMS, criando uma nova cultura funcional, mais
moderna e descentralizada, que facilitaria o suporte dado aos membros-colaboradores
da OI, além de ter influenciado na contratação e desenvolvimento dos funcionários do
quadro-geral, investindo em estudos e novos talentos.

Durante a pandemia, a OMS tem sido responsável por articular as melhores reações à
covid-19, desde as prevenções, os investimentos em pesquisas, instruções, até desmentir
fake news sobre o tratamento da doença. É também a OI que está organizando o
consórcio de apoio internacional de combate à pandemia, o COVAX.

1.4 COVAX FACILITY

A iniciativa da Covax Facility é, de acordo com a própria OMS, um programa em


parceria com a Gavi Alliance, a Coalition for Epidemic Preparedness Innovations
(CEPI), e a UNICEF, que visa doar vacinas para todos os países que não tiverem
condições de adquiri-las regularmente.

O sucesso dos testes das vacinas contra o coronavírus, ainda em meados de 2020,
motivou os países mais ricos a comprarem antecipadamente lotes maiores do que a
própria população, como uma medida de segurança e, com o advento desses
imunizantes ao final de 2020, e os demais Estados comprando os excedentes de
produção ou reservando novos lotes, a oferta diminuiu bastante e o preço seguiu o
caminho inverso, não permitindo o acesso aos países menos favorecidos. A covax
propõe sanar esse problema.

A pandemia se trata de um fenômeno global, e a covid é transmitida muito rapidamente,


assim como evolui na mesma velocidade. Nesse sentido, a OMS entende que o
problema do coronavírus e seus derivados só serão de fato resolvidos quando toda a
população mundial estiver vacinada. E como a demanda é superior à capacidade
produtiva dos principais produtores, os mais pobres perderam o acesso. Para isso, o
COVAX promete, entre outros, trazer vacina para pelos menos 20% da população dos
países beneficiados. Para tanto, a covax conta com o financiamento de 165 países (BBC,
2020), e recentemente conseguiu financiamento do setor privado também.

Em 2021, dados oficiais da Gavi (junho de 2021) informam que o programa já


distribuiu mais de 81 milhões de imunizantes em todos os continentes do globo. A
Etiópia foi um dos favorecidos da iniciativa, e em março recebeu cerca de 2.2 milhões
de doses da vacina AstraZeneca.

No entanto, dados do WorldMeters estimam que a população total da Etiópia é de 117


milhões de habitantes, e, portanto, a quantidade recebida só seria suficiente para
imunizar 2,56% da população. O imunizante da covax foi recebido em março, e desde
então o país não recebeu novos lotes da vacina.
Dados do OurWorldInData calculam que em junho de 2021, a média de novos casos de
covid por dia é de 241.14. A média de mortos por dia é 7.71. Apesar de números
relativamente baixos (pelo menos se comparados com demais países do ocidente), essas
estatísticas configuram uma emergência sanitária imediata, que necessita ser sanada o
quanto antes e reforça o termo “diplomacia” ou mesmo “corrida das vacinas”.

2 RELAÇÃO BILATERAL BRASIL – ETIÓPIA

Hoje o Brasil tem mais missões diplomáticas na África do que tem o Reino Unido.
Apenas entre 2003 e 2010, o Brasil abriu 17 novas embaixadas na África e visitou 23
países africanos. Especificamente, sua relação com a Etiópia vem crescendo, o Brasil
enxerga e reconhece que o país tem o maior crescimento econômico do continente e a
segunda maior população, atrás apenas da Nigéria, e por abrigar a sede da União
Africana (UA), da Comissão Econômica das Nações Unidas para a África (UNECA),
entre outras reuniões multilaterais e comícios, Adis Abeba projeta-se como importante
polo diplomático, e desempenha relevante papel nos processos de paz no continente.

O Brasil e Etiópia começaram suas relações diplomáticas em 1951 e a Embaixada do


Brasil em Adis Abeba foi aberta nos anos 60, mas desativada poucos anos depois, sendo
reaberta em 2005. Já a da Etiópia, se estabeleceu no Brasil apenas em 2011, por conta
de mudanças de governos e crises que postergaram o investimento e atenção à sua
política externa. Porém por mais que seja recente, seu estabelecimento foi a primeira
embaixada do país na América do Sul, desde então as visitas têm sido frequentes,
contribuindo para a intensificação do diálogo e da cooperação bilateral nas áreas como
agricultura, energias renováveis, ciência e tecnologia, educação e desenvolvimento
social.

2.1 ACORDOS E COOPERAÇÕES

Com a frequência das visitas é natural que cooperações e acordos venham a surgir,
facilitados pelo corpo diplomático das embaixadas, os primeiros assinados já em 2012
com premissas de cooperação técnica, comissão mista permanente e isenção de vistos;
sendo estes pontos chaves para entender como poderá ser o futuro desta relação. No ano
seguinte foi assinado pela então presidente Dilma Rousseff em visita à Etiópia acordos
de serviços aéreos, cooperação educacional e cooperação em ciência, tecnologia e
inovação. E com isso a Ethiopian Airlines iniciou sua operação de rota aérea entre a
capital e São Paulo.

Agora na história mais recente os dois países se mantêm com uma boa relação, foram
nove acordos assinados nos últimos três anos, especialmente na área de ciência e
tecnologia e na análise de educação e desenvolvimento, agricultura e pesquisa. Existem
muitas semelhanças entre o solo e a agricultura da Etiópia e do Brasil, então qualquer
tipo de tecnologia ou sementes que sejam utilizadas no Brasil, podem ser também
utilizadas na Etiópia. Há um diálogo com empresas agrícolas brasileiras para que elas
invistam na Etiópia, pois está presente no centro do globo, ocupando uma posição
estratégica na Costa Oriental da África e as empresas brasileiras que já exportam para o
Oriente Médio também podem aproveitar a oportunidade de fazer negócios na Etiópia,
na medida em que o país se situa ao lado do mar vermelho, os produtos estão livres de
impostos e podem chegar facilmente nos mercados da China e Índia.

Foi estabelecida também uma comissão conjunta, de um fórum de consultoria política e


existem outros acordos com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa)
e a Agência Brasileira de Cooperação, envolvendo o Instituto de Agricultura Etíope de
manejo de solo, irrigação e florestal. Há também uma intenção em prol de estabelecer
normas de segurança alimentar até 2025. Tanto o Brasil quanto a Etiópia têm interesse
em ver acontecer reformas nas instituições financeiras internacionais e no Conselho de
Segurança das Nações Unidas e a Etiópia acredita que pode encontrar no Brasil
parceiros para o desenvolvimento. Como o governo brasileiro, o governo etíope é
progressista e busca o desenvolvimento. No centro de suas políticas estão a redução da
pobreza, os investimentos em saúde e educação, incentivar o setor privado a liderar a
economia, a ampliação de infraestrutura como ferrovias e usinas elétricas, a
transformação do setor agrícola e o apoio à exportação; E todos os setores acima são
áreas em que as empresas brasileiras têm excelência.

2.2 INTERCÂMBIO COMERCIAL BILATERAL

De 2008 a 2012, o intercâmbio comercial entre os dois países cresceu em 68,1% em


função do aumento das exportações e 435% das importações. Em 2012, as exportações
para a Etiópia foram majoritariamente por produtos da manufatura, 90,4%, e os básicos
9,6%. Também no mesmo ano a maior parte das importações brasileiras originárias da
Etiópia foram compostas por produtos semimanufaturados, 69,9% do total, e os
manufaturados a 28,3%.

Mas mesmo com estes excelentes números a escala de envolvimento de empresas de


outros países emergentes como China e Índia comparado às empresas brasileiras na
Etiópia ainda não chegam a ser significativa. E os investimentos brasileiros são muito
mais proeminentes em países subsaarianos, a parceria Etiópia x Brasil fica em 20º lugar.

Atualmente no cenário de possibilidades oportunas de exportação para o brasil é


extenso, podemos facilmente enumerar uma lista de 25 categorias que tem oportunidade
de prospecção, como exemplo os mercados de Óleos combustíveis, trigo, açúcar, ferro,
automóveis, medicamentos e assim segue. Por mais que o número de empresas
brasileiras que já fazem esse intercambio (mais de 60), essa relação tem capacidade para
mais e o mercado etíope possui demanda para tal.

3. RELAÇÃO BILATERAL: ETIÓPIA – CHINA

Apesar da história entre a China e a Etiópia ser de longa data, foi em 24 de novembro de
1970, quando a China reconheceu a Eritreia como parte do domínio etíope em troca do
reconhecimento de Taiwan como chinesa, que a relação diplomática foi oficializada
entre os países. No entanto, somente em 1991, com o poder político etíope sendo
assumido pelo grupo rebelde chamado Frente Democrática Revolucionária Popular da
Etiópia (FDRPE), que essa relação começou a ser explorada de fato.

O interesse da China na Etiópia decorreu por fatores econômicos, de segurança e


diplomacia, mas ao longo prazo concentrou-se em grande parte na procura de recursos e
por razões políticas. A Etiópia possui um território com grandes reservas de recursos e
sua importância política no continente africano é inegável. Desse modo a China viu um
meio de facilitar seu acesso a importantes organizações africanas, como a União
Africana e a Comissão Econômica das Nações Unidas pela África, fornecendo à China
o acesso às elites africanas, que possuem influência em todo continente.
Quanto para a Etiópia, a agricultura é a principal atividade econômica do país, o
governo identificou que um crescimento rápido desse setor seria necessário para
erradicar a pobreza e melhorar a economia do país. Foi identificado que o período de
maiores taxas de crescimento agrícola foi também marcado pela intensificação da
relação econômica com a China, que se tornou o principal parceiro da Etiópia. Além de
ser exportador de produtos agrícolas para a China, a Etiópia também recebeu
significantes quantias de investimento financeiro chinês e Investimento Direto
Estrangeiro (IDE) que auxiliaram na melhoria da infraestrutura do país.

A relação sino-etíope evoluiu demasiadamente em um pequeno período de tempo.


Passaram de uma relação bilateral modesta para uma firme cooperação econômica, com
crescentes trocas culturais e políticas. Nenhum outro país investiu mais na Etiópia do
que a China, e a China se tornou um dos maiores exportadores de bens para a Etiópia.

3.1 COOPERAÇÃO NO ÂMBITO COMERCIAL

As trocas comerciais entre os países tiveram início em 1956, porém, não eram tão
significantes como nos anos recentes. Em 2006 a China se tornou o principal parceiro
econômico da Etiópia correspondendo a cerca de quinze por cento da taxa de
comercialização. As trocas bilaterais entre os dois países se expandiram rapidamente e a
se tornou uma importante fonte de produtos manufaturados e maquinários para a
Etiópia.

Na perspectiva etíope, a parceria com a China serve, em grande parte, propósitos


políticos e econômicos do regime implantado desde 1991, sob a liderança do primeiro-
ministro, Meles Zenawi, há 20 anos. A participação ativa da China em desenvolvimento
econômico é um dos interesses principais da Etiópia, assim como os empréstimos e
projetos de infraestrutura financiados pela China. A acessibilidade chinesa e suas
afinidades com o modelo de desenvolvimento “colbertista” do Primeiro Ministro Meles
também são fatores que alimentam a parceria.

Quanto as razões chinesas, pode-se citar a importância regional e continental da Etiópia,


o fato de sua capital ser a sede da União Africana (UA), bem como da Comissão
Econômica das Nações Unidas para a África (ECA), por conter a segunda maior
população do continente, uma localização estratégica e por seu controle sobre a fonte do
Nilo Azul, maior lago da Etiópia.

Durante o período entre 2002 e 2008, sementes oleaginosas, couros e produtos minerais
relataram ser as três principais commodities de exportação para a China, respondendo
por cerca de noventa e oito por cento da exportação total.

A China tem um grande impacto positivo na economia etíope e, de muitas maneiras,


pode ser considerada uma relação em que ambos ganham. No entanto, a dependência
que a Etiópia tem sobre as importações chinesas pode vim a ser um fator negativo a
longo prazo.

3.2 TRATADOS OFICIAIS DE DESTAQUE

As relações bilaterais entre a Etiópia e a China com o tempo se tornaram bastante


complexas e já abrangem instrumentos na área de salvaguardas tecnológicas,
previdência social, tributação, defesa, aduana, entre outras. Os tratados internacionais
são instrumentos necessários para o estabelecimento do equilíbrio entre as nações,

Durante a parceria Sino-Etíope, foram estabelecidos diversos acordos ide importância,


podendo-se destacar os seguintes:

· Acordo de Cooperação Econômica e Tecnológica, assinado em 1971. O


presidente etíope da época era Abiy Ahmed Ali e na China o representante era
Chiang Kai-Shek. Acordos sobre essa mesma temática também foram assinados
nos anos de 1988 e 2002.
· Acordo de Comércio, também assinado em 1971, tinha o objetivo de
impulsionar e facilitar a relação comercial entre a China e a Etiópia por meio da
definição de regras para maior segurança de ambos.
· Protocolo de Comércio, assinado nos anos 1984, 1986 e 1988, com o intuito de
regulamentar e registrar o acordo sobre comércio.
· Acordo para Cooperação Comercial, Econômica e Tecnológica, firmado em
1996, época em que o presidente da Etiópia era Negasso Gidada e o da China era
Jiang Zemin. O primeiro-ministro da época fez uma visita oficial à China e, em
sequência, o presidente chinês foi à capital da Etiópia. Essas visitas resultaram
na assinatura desse acordo. Nele a China concedeu à Etiópia o status de nação
mais favorecida.
· Acordo para Promoção Mútua e Proteção de Investimentos, firmado em 1988,
quando o representante chinês era Li Xiannian e o etíope era Mengstu Haile
Mariam. O acordo tinha o objetivo de reconhecer a promoção e proteção
reciproca dos investimentos entre os países.

4 A GRANDE REPRESA DO RENASCIMENTO ETÍOPE E SUAS


IMPLICAÇÕES NA POLÍTICA EXTERNA

Ao decorrer do século XX, a Etiópia lidou com uma sucessão de turbulências políticas
internas e externas, decorrentes principalmente do caráter multiétnico do Estado. Porém,
no último par de décadas, a situação política se tornou estável o suficiente para que uma
série de condições favoráveis ao desenvolvimento do país se desenvolvessem. Enquanto
recursos e energia eram convertidos para impedir a falência do Estado, o investimento
em questões desenvolvimentistas era postergado. Após o ingresso em um regime
estável, sem oposição interna ou externa que ameace o governo, pode-se buscar atender
a outras demandas domésticas, como as de infraestrutura, o que se observa hoje no
governo etíope. Em decorrência disso, observou-se também o crescimento do PIB, que
atingiu a marca de crescimento de mais de 10% anuais por 5 anos seguidos, de 2004 até
2008 (BANCO MUNDIAL, 2021).

Dentre as diversas obras planejadas visando o desenvolvimento etíope e a superação do


legado de pobreza e fome que é por vezes associado ao país, a mais ambiciosa é a
Grande Represa do Renascimento Etíope (GERD, na sigla em inglês). Elaborado para
ser a maior planta hidrelétrica da África, o projeto prevê a produção de
aproximadamente 15.130GWh/ano, o suficiente para suprir a demanda de energia etíope
e ainda exportar de forma abundante para todo o leste africano.

Já em 2011 foram iniciadas as obras da GERD, sem acordo com Sudão e Egito, os dois
principais afetados pela construção. O preenchimento da represa, que ocorre em etapas,
teve seu primeiro estágio completo em julho de 2020 e o segundo previsto para a
temporada chuvosa de 2021 (de julho a agosto). Quando completo, o reservatório da
represa armazenará 74 BMC (bilhões de metros cúbicos) durante o período de cheia do
Nilo e 49.3BMC durante o período de seca (ZANE, 2020). A expectativa é que a
represa esteja com o reservatório completo dentro de cinco a sete anos.

Desde o início do projeto, a comunidade internacional acompanha de perto o desenrolar


da situação, algo que se intensifica à medida em que a obra caminha para seu fim e
nenhum acordo com os países jusantes do Nilo podem ser vislumbrado no horizonte. A
necessidade de desenvolvimento elétrico da Etiópia, que enfrenta o aumento da
atividade industrial e da população, esbarra em questões patrióticas e ambientais,
dificultando o diálogo e acirrando os ânimos. Sendo assim, é necessário trabalhar para
que nenhuma das partes envolvidas seja prejudicada, já que o funcionamento da GERD
não é mais uma questão de “se”, mas sim “quando”.

4.1 POTENCIAIS BENEFÍCIOS E MALEFÍCIOS

Por mais que o objetivo principal da GERD seja a produção de energia, diversos efeitos
colaterais podem ser esperados após a construção da hidrelétrica. Em primeiro lugar
temos o controle de fluxo, que funciona como uma faca de dois gumes. Se administrada
da forma correta, a represa terá capacidade para conter as enchentes do Nilo, que
causam prejuízos à agricultura e à infraestrutura dos países jusantes. Além disso, ao
longo da parte egípcia e sudanesa do Nilo, existem diversas outras represas construídas
que visam controlar as enchentes do rio, mas estas estão localizadas em regiões áridas o
que além de aumentar a evaporação da água, faz com que ela se perca no deserto ao
invés de voltar em forma de chuva. Esse cenário se modifica no local de construção da
GERD, o planalto etíope, com clima mais ameno e florestas ao redor. A retirada das
represas de contenção no Saara e a substituição delas pela etíope pode representar uma
diminuição significativa no desperdício de água. Por outro lado, fica explícita a
necessidade de um acordo que regule o fluxo da barragem, principalmente em anos de
secas, de forma a assegurar que a segurança hídrica dos países não será comprometida
pela Etiópia.

Outro benefício seria a retenção de sedimentos na barragem etíope. Essas partículas se


acumulam em outras represas jusantes, causando danos à infraestrutura destas,
diminuindo a vida útil e acarretando altos valores de manutenção. Porém, a GERD irá
operar como um filtro. Calcula-se que o fluxo de sedimentos pode ser reduzido em até
86% quando a represa estiver trabalhando em sua capacidade máxima. Isso
economizaria mais de US $50 milhões por ano ao Sudão apenas em despesas para
desentupir canais, além de outras subsequentes (TESFA, 2013, p. 9).

Por fim, os impactos sociais e ambientais devem ser medidos de forma intensa e
colocados em discussão. No decorrer dos anos de formulação do projeto, pouco se
atentou a isso, o que deixa uma carência de dados sobre o impacto real da construção na
população e na biodiversidade local. Sem relatórios nesse sentido, não há possibilidade
de políticas públicas que mitiguem o efeito prejudicial de novas construções.

4.2 GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS COMO ELEMENTO DA PE

O acesso à água é um dos principais catalisadores de disputas políticas internacionais,


principalmente em lugares em que sua disponibilidade é escassa. De forma análoga, no
leste africano o aumento exponencial da população e o desenvolvimento industrial
tornam o gerenciamento de recursos hídricos um fator com importância crescente em
diálogos externos, principalmente frente a uma possível restrição destes em decorrência
do aquecimento global.

O potencial conflituoso da relação entre nações que dividem o mesmo rio pode ser
observado desde os primórdios dos Estados modernos. O Egito, por exemplo, por muito
tempo confiou não apenas em sua diplomacia para manter o controle do Nilo, mas
também em estratégias de desestabilização política, financiando grupos armados em
território etíope e nações em estado de beligerância com esse país (GEBRELUEL, 2014,
p. 28). Porém, o balanço de poder regional não demonstra mais uma clara sobreposição
de poderes de uma nação sobre a outra, em decorrência do impacto da Primavera Árabe
no Egito e da estabilização política da Etiópia, o que torna o potencial destrutivo desse
embate maior.

Ademais, indo além da natureza conflituosa dessas relações, compartilhar um rio cria
também a possibilidade de maior integração regional. Como dito anteriormente, a
GERD gerará energia o suficiente para ser exportada para todo o leste africano, o que
auxiliaria no desenvolvimento humano, industrial e comercial dos países da região, de
forma conjunta. Além disso, o aumento na interdependência energética dos países
diminui as chances de conflito, por aumentar as consequências destrutivas da quebra de
relações. Nesse sentido, a integração regional pode significar um aumento no nível de
segurança mundial, já que a região leste da África é uma das mais instáveis do mundo.
Em síntese, a GERD pode representar uma oportunidade de crescimento em diversos
aspectos na região. Porém, um último fator talvez cause o maior entrave nas discussões
da represa: a retórica nacionalista acerca do Nilo.

Para a Etiópia, as políticas referentes ao rio são descendentes diretas do colonialismo. Já


para o Egito, o Nilo corresponde a um dos principais fatores da construção nacional e
fazer quaisquer concessões nesse sentido causarão turbulências domésticas e a imagem
de perda de força internacional, um cenário que o país já fragilizado busca evitar.
Portanto, será difícil encontrar uma solução benéfica para todos as partes envolvidas
enquanto o orgulho não for deixado de fora da mesa de negociações, algo quase
impossível de se exigir de países que se utilizam dessa retórica manter a estabilidade
interna.

REFERÊNCIAS
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com o Brasil. Correio Nagô. Disponível em: <https://correionago.com.br/embaixador-
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https://data.worldbank.org/indicator/NY.GDP.MKTP.CD?locations=ET. Acesso em: 6
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Disponível em:
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TAWFIK, Rawia. The Grand Ethiopian Renaissance Dam: a benefit-sharing project in
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