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Realização

Sem Deixar
Ninguém
para Trás
GRAVIDEZ, MATERNIDADE
E VIOLÊNCIA SEXUAL NA
ADOLESCÊNCIA
Realização Comunicação
Centro de Integração de Dados Raíza Tourinho
e Conhecimentos para Saúde - (CIDACS/Fiocruz Bahia)
Instituto Gonçalo Muniz - Fundação Adalton dos Anjos
Osvaldo Cruz (CIDACS/Fiocruz (CIDACS/Fiocruz Bahia)
Bahia)
Pedro Jose Sibahi
Instituto de Saúde Coletiva da (UNFPA Brasil)
Universidade Federal da Bahia ­
(ISC-UFBA)
Revisão de conteúdo
Fundo de População das Nações
Unidas (UNFPA Brasil) Júnia Quiroga
(UNFPA Brasil)

Equipe técnica Anna Cunha


(UNFPA Brasil)
Centro de Integração de Dados
Luana Natielle Basílio e Silva (UNFPA
e Conhecimentos para Saúde -
Brasil)
Instituto Gonçalo Muniz - Fundação
Osvaldo Cruz (CIDACS/Fiocruz Julia Alencastro
Bahia) (UNFPA Brasil)

Instituto de Saúde Coletiva da


Universidade Federal da Bahia Redação, edição, revisão e
(ISC-UFBA) projeto gráfico:

ALTER Conteúdo Relevante


Pesquisa e conteúdo
Autoras:
Emanuelle Góes
(CIDACS/­Fiocruz Bahia) Emanuelle Goes, Dandara Ramos e
Dandara Ramos Andrêa Ferreira
(CIDACS/Fiocruz Bahia, ISC-UFBA)
Fotografias: 
Andrêa Ferreira
(CIDACS/Fiocruz Bahia) Bancos de imagens e acervo
próprio das organizações parceiras
(CIDACS/Fiocruz Bahia, ISC/UFBA e
UNFPA Brasil)
Sumário

Apresentação.....................................................................4

Introdução............................................................................6

Gravidez e Maternidade na Adolescência.10


3.1. Contexto.....................................................................11
3.2. Uniões precoces............................................... 20
3.3. Observações.........................................................21

Violência Sexual contra Meninas e


Adolescentes................................................................... 25
4.1. Contexto.................................................................. 26
4.2. Observações........................................................31
1 | Apresentação

4
A Fundação Oswaldo Cruz a incidência de gravidez e
(Fiocruz) tem desenvolvido maternidade em adolescentes
nos últimos anos uma série brasileiras a partir da análise de
de ações em parceria com bancos de dados nacionais. Estes
o Fundo de População das dados foram desagregados,
Nações Unidas (UNFPA). Em ou seja, separados em
julho de 2019, em Nova York, a unidades menores que
então presidente da Fiocruz, permitem uma investigação
Nísia Trindade Lima, e a que leva em consideração
diretora-executiva do UNFPA, os diversos contextos de
Natalia Kanem, assinaram um desigualdades sociais e raciais,
Memorando de Entendimento de condições de vida e outros
(MdE) por ocasião do Fórum persistentes desafios para
Político de Alto Nível para o a efetivação de direitos.
Desenvolvimento Sustentável.
A análise adequada de dados,
A parceria tem englobado aliada aos direitos humanos,
ações voltadas para a ajuda a garantir que o uso
redução da mortalidade de métodos quantitativos
materna, Cooperação seja consistente com a
Sul-Sul, fortalecimento da identificação de causas
Enfermagem Obstétrica profundas de d­ esigualdades.
e Obstetrícia, promoção
da saúde de gestantes A presente cartilha Sem Deixar
indígenas e quilombolas Ninguém para Trás: Gravidez,
no contexto de Covid-19 – Maternidade e Violência
entre outras temáticas.  Sexual na Adolescência,
primeira publicação do Projeto,
É no âmbito dessa parceria foi produzida com o intuito
mais ampla que essas de apontar as situações de
organizações desenvolvem vulnerabilidade presentes nas
o Projeto Desigualdades e vidas de parte das meninas que
Gravidez na Adolescência, vivenciam a maternidade nessa
reunindo a Fiocruz, mais etapa do ciclo de vida. Nosso
especificamente o Centro objetivo é que esse material sirva
de Integração de Dados e como alerta sobre as condições
Conhecimentos para Saúde que podem levar à gravidez de
­(CIDACS - Fiocruz Bahia), o meninas, especialmente aquelas
Instituto de Saúde Coletiva da
relacionadas a desigualdades
Universidade Federal da Bahia ­
estruturais de raça e gênero.
(ISC/UFBA) e o UNFPA Brasil.
Nosso intuito também é que este
O Projeto Desigualdades e material possa ser utilizado por
Gravidez na Adolescência diversos segmentos sociais para
tem o objetivo de identificar apoiar tomadas de decisão.

5
6
As mulheres têm o direito próprias escolhas informadas
de tomar as suas próprias sobre contracepção e sobre sua
decisões sobre suas trajetórias trajetória reprodutiva.
reprodutivas. Isso se refere, por
Em 2018, o UNFPA iniciou um
exemplo, a se, quando e com que
esforço estratégico, com base
frequência desejam engravidar.
em dados de qualidade, ações
Esse direito foi reafirmado
programáticas e parcerias
em 1994, no Cairo (Egito), na amplas, para acelerar o alcance
Conferência Internacional sobre de resultados transformadores,
População e Desenvolvimento “os três zeros”, até 2030:
(CIPD), quando 179
governos concordaram • zero necessidade não-
que a saúde sexual e atendida de planejamento
reprodutiva é fundamental ­reprodutivo;
para o desenvolvimento • zero mortes maternas
econômico e social. evitáveis;
O Programa de Ação da CIPD • e zero violência de gênero
promoveu uma visão de e outras práticas nocivas,
desenvolvimento integrado que como o casamento infantil
está na base dos Objetivos de e a mutilação genital
Desenvolvimento Sustentável feminina.
(ODS), que são: Nos países em que está
presente, o UNFPA apoia os
• a não discriminação e a
esforços para ampliar o acesso
universalidade;
ao planejamento reprodutivo e o
• a centralidade da saúde, fornecimento de contraceptivos.
educação e empoderamento
das mulheres no ensejo do Além de previsto em tratados
desenvolvimento sustentável; e acordos internacionais, no
Brasil, o direito ao planejamento
• e a necessidade coletiva familiar é uma garantia
para assegurar a constitucional prevista no §
sustentabilidade ambiental. 7º do art. 226 da Constituição
De acordo com o UNFPA, ainda Federal, que dispõe: “(...) O
hoje, globalmente, mais de planejamento familiar é livre
800 mulheres morrem todos decisão do casal, competindo
os dias em consequência ao Estado propiciar recursos
da gravidez ou do parto. São educacionais e científicos para
214 milhões de mulheres em o exercício desse direito, vedada
todo mundo que querem qualquer forma coercitiva por
evitar a gravidez e ter acesso parte de instituições oficiais
à contracepção moderna. As ou privadas.” Esse direito
mulheres, adolescentes e jovens foi regulamentado pela lei
têm o direito de fazer as suas 9263/1996 e, em 2007, foi

7
lançada a Política Nacional Mais especificamente, as
de Planejamento Familiar, desigualdades podem
que incorporou a oferta de se manifestar antes do
oito métodos contraceptivos nascimento do bebê,
gratuitos nas Unidades no acompanhamento
Básicas de Saúde, incluindo a da gestação, ou após o
contracepção de emergência, nascimento, quando a
e a venda de anticoncepcionais trajetória de vida de uma
a preços reduzidos na rede mulher que foi mãe na
Farmácia Popular. adolescência é condicionada
pelo seu contexto social.
Cerca de 99% de todas as
mortes maternas ocorrem em Para Organização Mundial
países em desenvolvimento – de Saúde, a gravidez na
mais de metade em contextos adolescência pode ser
de emergência humanitária. entendida como aquela
O planejamento familiar é que acontece até os 19 anos
central para o empoderamento de idade. Ocorre entre
das mulheres e para o adolescentes com perfis
desenvolvimento ­sustentável. sociodemográficos bastante
heterogêneos, mas tende a ser
A violência contra as mulheres
mais frequente nos contextos
e meninas continua a ser um
de maior vulnerabilidade social
fenômeno alarmante em nível
e de barreiras de acesso a
global. O Secretário Geral das
serviços e direitos.
Nações Unidas, António Guterres,
classificou a violência contra Na presente pesquisa com
mulheres e meninas como a enfoque no Brasil, para fins
“pandemia mais longa e mortal de análise e para apreender
do mundo”. Estima-se que uma diferenças importantes de
em cada três mulheres irá sofrer experiências na gravidez e
violência física ou sexual durante maternidade na adolescência,
a sua vida. consideram-se, no geral, a faixa
etária dos 10 a 14 anos e dos 15 a
Nesse contexto, a maternidade
19 anos. Na faixa de 10 a 14 anos,
na adolescência é um
há fortes evidências de gravidez
aspecto a ser tratado no
relacionada a situações de
contexto de saúde coletiva
violências sexuais que preveem
e por uma perspectiva
a possibilidade de acesso
de direitos humanos,
ao aborto legal, conforme a
considerando desigualdades
legislação brasileira.
socioeconômicas, contextos
de violência e seu impacto Por meio do Sistema de
na saúde e na trajetória Informações sobre Nascidos
de vida das adolescentes. Vivos (SINASC) é possível

8
acessar, entre diversas outras de âmbito municipal.
informações, o número de Posteriormente os dados são
nascidos vivos de mulheres enviados para o sistema de
adolescentes no Brasil. Os âmbito estadual, onde são
dados do SINASC têm como agregados e enviados para a
objetivo registrar informações esfera federal.
de nascimentos informados em
Para o projeto, os dados
todo território nacional e fornecer
do SINASC foram filtrados,
dados de natalidade para todos
selecionando-se os nascidos
os níveis do Sistema de Saúde.
vivos de mães com idades
A coleta dos dados do SINASC
entre 10 e 19 anos. Os dados
se faz através do documento
do SINASC contam com
de Declaração de Nascidos
informações colhidas ao
Vivos (DN), que é preenchido
nascimento, englobando uma
por profissionais de saúde
série de referências, como
ou por parteiras tradicionais
região e unidade da federação,
responsáveis pela assistência ao
tipo de parto (vaginal ou
parto ou ao recém-nascido.
cesáreo), duração da gestação,
As DNs são recolhidas pelas número de consultas de pré-
Secretarias Municipais de natal e peso ao nascer, assim
Saúde, onde são digitalizadas, como o perfil da parturiente/
processadas e consolidadas mãe, os anos de estudo, raça/
no sistema local do SINASC, cor, estado civil e idade.
Foto: Tuane Fernandes / UNFPA

9
10
3.1. Contexto A gravidez ou maternidade não-
intencional na adolescência
O fortalecimento das trajetórias está frequentemente associada
de vida de adolescentes e a esses desafios. Especialmente
jovens no Brasil relaciona-se à quando não é fruto de
possibilidade de que encontrem planejamento e desejo, consiste
um ambiente favorável para em uma nítida manifestação
fazerem escolhas, desfrutar de vulnerabilidade dos direitos
de seus direitos e contar com sexuais e reprodutivos de
as condições para o seu pleno adolescentes e, portanto,
desenvolvimento. Contudo, de seus direitos humanos.
são ainda frequentes os Melhorar condições sociais,
contextos de iniquidades sociais, incorporar na implementação
desigualdades de gênero e das políticas públicas as
étnico-raciais, acesso limitado dimensões estruturantes
à educação de qualidade, das desigualdades raciais e
dificuldades de acesso a étnicas, informar e empoderar
serviços de qualidade e insumos adolescentes e jovens para
de saúde, incluindo saúde sexual o exercício de seus direitos
e reprodutiva, e a exposição à e cidadania, incluindo a
violência, entre outros. Esses autonomia e condições de
fatores encontram-se muitas escolha no que tange às suas
vezes inter-relacionados e, trajetórias reprodutivas, é
quando não endereçados a fundamental para que elas e
políticas públicas efetivas e eles tenham autonomia sobre
inclusivas, contribuem também suas vidas, saúde e dignidade.
para a persistência de ciclos
intergeracionais de pobreza e
desigualdade.

EMPODERAR ADOLESCENTES E JOVENS


PARA O EXERCÍCIO DE SEUS DIREITOS E
CIDADANIA É FUNDAMENTAL PARA QUE
ELAS E ELES TENHAM AUTONOMIA SOBRE
SUAS VIDAS, SAÚDE E DIGNIDADE.

11
O QUE SÃO DIREITOS REPRODUTIVOS?

Os direitos reprodutivos discriminação. Desta forma,


baseiam-se no reconhecimento todos os indivíduos devem
dos direitos humanos de todos ser tratados com igualdade
os casais e indivíduos de decidir e conseguir exercer sua
de forma livre e responsável sexualidade livremente, com
sobre o número, o espaçamento saúde e segurança. Afinal, sem
e quando ter ou não ter filhos/ igualdade, não há liberdade.
as, assim como o direito de ter Vale lembrar que são direitos:
as informações e os meios para o acesso ao planejamento
fazê-lo e a possibilidade de reprodutivo voluntário e aos
atingir o mais alto padrão de métodos de contracepção, bem
saúde reprodutiva. Os direitos como a plena proteção com
sexuais e reprodutivos são relação às diversas violências,
direitos humanos relacionados a exemplo da exploração, do
à sexualidade e à reprodução, abuso e do assédio sexual.
devendo ser exercidos livres de

brazil.unfpa.org

Os Direitos Reprodutivos também incluem:

O direito de tomar
O direito a relações O direito ao
decisões relativas
mutuamente atendimento em saúde
à reprodução, livre
respeitosas e com privacidade e
de discriminação,
equitativas. confidencialidade.
coerção e violência.

12
A justiça reprodutiva aborda
a realidade social e suas
desigualdades, além de
combater a exploração dos
corpos e defender a liberdade
sexual e reprodutiva das
mulheres. Baseia-se ainda na
ideia de que as possibilidades
reprodutivas estão
relacionadas ao contexto social
e comunitário e não refletem
escolhas e acessos individuais.
Vista como uma teoria
interseccional, a justiça
reprodutiva emerge das
experiências de mulheres
negras que vivenciam
um conjunto complexo de
opressões e hierarquias OS IMPACTOS DAS
reprodutivas. O conceito OPRESSÕES DE RAÇA,
baseia-se no entendimento de
que os impactos das opressões CLASSE, GÊNERO E DE
de raça, classe, gênero e de ORIENTAÇÃO SEXUAL
orientação sexual não são
aditivos, mas integrativos, NÃO SÃO ADITIVOS,
produzindo esse paradigma de MAS INTEGRATIVOS,
interseccionalidade, gerando a
discriminação interseccional. PRODUZINDO UM
PARADIGMA DE
INTERSECCIONALIDADE.

13
O Ministério da Saúde utiliza No Brasil, 6.118.205 bebês
dados com o recorte etário nasceram de mães
de adolescência adotado adolescentes no período de 2008
pela Organização Mundial de a 2019, sendo 296.959 (4,86%)
Saúde (OMS), que a caracteriza nascidos de mães com idade
como o período da vida entre entre 10 a 14 anos e 5.821.246
10 e 19 anos de idade. De todo (95,14%) nascidos de mães
modo, vale mencionar que a com idade entre 15 e 19 anos. As
legislação nacional do Estatuto maiores proporções de nascidos
da Criança e do Adolescente vivos de mães adolescentes
(ECA) considera adolescente são encontradas nas regiões
a faixa dos doze e aos dezoito Norte e Nordeste do país,
anos incompletos de idade. como identificado no mapa.

Porcentagem de nascidos vivos por idade da mãe, segundo


macro-regiões do país (Brasil, 2008-2019)
No Brasil, entre os nascidos vivos de mães adolescentes, 4,86%
foram de mães entre 10 e 14 anos e 95,14% de mães com idades
entre 15 e 19 anos.
10 a 14 anos

1,17%
10 a 14 anos 15 a 19 anos

1,54% 20,11%
15 a 19 anos

23,90%

10 a 14 anos

0,86%
15 a 19 anos

16,91% 10 a 14 anos

0,59%
15 a 19 anos

10 a 14 anos 14,40%
0,63%
Fonte: SINASC/DATASUS/Ministério da Saúde 15 a 19 anos

14,99%
14
Além das disparidades entre as mulheres que tiveram
regionais, os dados também filhos é encontrada entre
apontam para vulnerabilidades indígenas e negras (pardas
relacionadas à opressão e pretas), com os menores
interseccional de gênero, raça, percentuais entre brancas e
geração e classe, marcadores asiáticas. Observa-se também
sociais que historicamente que essas disparidades raciais
têm envolvido o fenômeno da permanecem durante toda
gravidez na adolescência. série histórica (2008-2019).
No período analisado, a maior
participação das adolescentes
Foto: Adobe Stock

15
Porcentagem de nascidos vivos de mães adolescentes (10 a 14
anos) - de 2008 a 2019

10 a 14 anos (%)

3,8
3,69 3,66 3,69 3,63 3,67
3,57 3,55
3,46 3,4 3,45
3,27

1,25 1,22 1,21 1,22 1,21 1,21 1,16


0,99 1,01 1,06 1,12 1,07
1,01 0,97 0,96 0,95 0,96 0,91
0,98 0,97 0,95 0,95 0,9 0,88 0,84 0,76 0,85
0,9 0,85 0,8 0,72 0,68
0,68 0,66 0,63 0,61 0,61 0,59 0,75 0,65
0,57 0,49 0,64 0,58
0,45 0,4 0,36 0,34

2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019

Branca Preta Parda Indígena Total

Porcentagem de nascidos vivos de mães adolescentes (15 - 19


anos), de 2008 a 2019
15 a 19 anos (%)

26,02 25,98 26 26,28


25,57 25,68 25,36 25,26 25,69
24,94 24,84 25
22,76 22,2 21,63 21,5 21,37 21,43 21,09
20,45 19,89
19,44 18,98
18,81 18,6 18,37 18,37 18,31 18,32 18,78
18,24 18,3 17,94 17,64
17,9 17,93 17,29 17,26
16,26 16,42 16,7 16,77
15,64 15,58 15,69
14,96 14,64 14,65 14,77
14,19 13,93 13,93 14,04
13,37 13,19
12,53
11,88
10,91
10,09
9,48

2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019

Branca Preta Parda Indígena Total

Fonte: Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos - DATASUS

16
Entre as adolescentes na indígenas encontra o desafio
faixa de 10 a 14 anos, o maior da discussão étnico-cultural,
percentual de nascidos vivos foi sobre o próprio conceito
identificado entre as meninas de meninas, adolescentes
indígenas em comparação e mulheres, bem como o
às demais adolescentes em processo de transição entre
toda série histórica, chegando estas fases. Isto posto, faz-se
a quase 4 vezes mais quando necessário buscar o maior
comparada às brancas, que detalhamento de informações
apresentaram menos de 1% de no processo de construção de
nascidos vivos de adolescentes evidências e elaboração de
neste grupo etário e com políticas públicas focados em
redução ao longo do tempo povos indígenas. O respeito à
(0,69% em 2008 e 0,34% em autonomia, não-violência e o
2019). Para as adolescentes direito de decisão das meninas
pretas, a redução começou a é princípio fundamental no
partir de 2012 (0,90%) chegando acesso e fruição dos direitos
a uma frequência de NV de reprodutivos.
0,59% em 2019. Já para as No que se refere à escolaridade,
pardas a queda iniciou apenas quase 60% (57,5%) das mães
em 2014 (1,16%), atingindo 0,85% adolescentes do período
em 2019. Para a faixa etária de analisado tinham de 8 a 11
15 a 19 anos, foram observados anos de escolaridade; 34,3%
padrões semelhantes entre os delas informaram ter de 4 a 7
grupos raciais. anos de estudo; 3,8% relataram
ter nenhum ou 1 a 3 anos de
Sem adentrar no mérito das
estudo; e apenas 2,4% tinham 12
discussões sobre relativismo
anos ou mais de escolaridade.
cultural, faz-se necessário
observar que a perspectiva da Apesar dos avanços no
gravidez na adolescência de acesso educacional no país,

A RELAÇÃO ENTRE EDUCAÇÃO E MATERNIDADE ADOLESCENTE


É COMPLEXA. HÁ EVIDÊNCIAS DE QUE A BAIXA ESCOLARIDADE
E A EVASÃO ESCOLAR SÃO FATORES QUE CONTRIBUEM
PARA A OCORRÊNCIA ANTECIPADA DA MATERNIDADE,
MAS, AO MESMO TEMPO, VIVENCIAR A MATERNIDADE E
PERMANECER NA ESCOLA SE MOSTRA UM GRANDE DESAFIO.

17
as desigualdades estruturais habilidades socioemocionais
de raça e gênero e o status e empoderamento, quanto
socioeconômico impactam também para a permanência
na escolaridade de meninas e reinserção das adolescentes
e mulheres no país. A relação em caso de gravidez e
entre educação e maternidade maternidade, de modo que
adolescente é complexa. Há a escola possa facilitar para
evidências de que a baixa que essa adolescente retome
escolaridade e a evasão escolar os estudos e conte com redes
são fatores que contribuem institucionais de apoio.
para a ocorrência antecipada
Entre as meninas e adolescentes
da maternidade, mas, ao
de 10 a 14 anos, 43,6% relataram
mesmo tempo, vivenciar a
ter feito 7 ou mais consultas
maternidade e permanecer
de pré-natal; 38,2%, entre 4 a 6
na escola se mostra um
consultas; e 14% relataram ter
grande desafio, tornando
feito de 1 a 3 consultas. Destaca-
a maternidade um fator
se que 3,3% das meninas e
relacionado ao interrompimento
adolescentes de 10 a 14 anos
da educação formal, de forma
informaram não ter realizado
parcial ou permanente, e à
nenhuma consulta de pré-natal.
escolarização tardia. Nesse
Entre as adolescentes e jovens
contexto, é nítida também a
de 15 a 19 anos, mais da metade
necessidade de fortalecimento
(52,2%) realizou 7 ou mais
do sistema educacional
consultas de pré-natal. Neste
tanto para a promoção
grupo etário, 2,5% das mães
de educação integral em
relataram não ter realizado
sexualidade, capaz de ofertar
informações e desenvolver nenhuma consulta de pré-natal.

Você sabia?
A Lei Federal n. 6.202/75 dá à gestante a
possibilidade de continuar seus estudos em regime
domiciliar após o oitavo mês e no período da
licença maternidade. A medida é essencial para
que gestantes adolescentes possam seguir sua
trajetória escolar.

Saiba mais aqui

18
Número de Consultas de Pré-Natal 10 a 14 anos 15 a 19 anos

Nenhuma 3,3% 2,5%


De 1 a 3 consultas 13,9% 10,2%
De 4 a 6 consultas 38,2% 34,2%
7 ou mais consultas 43,6% 52,2%
Ignorado 1,0% 0,8%
Total 100% 100%
Fonte: Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos - Sinasc. Dados extraídos via Tabnet-DATASUS para o
período 2008-2019

No acesso ao pré-natal, ao O acesso ao pré-natal é


observar os grupos raciais, as um importante indicador
meninas indígenas de 10 a 14 da garantia de direitos
anos e 15 a 19 respectivamente reprodutivos e de saúde,
(20,8%; 26,6%), seguidas das sendo as consultas feitas
pardas (40,4%; 47,4%) e pretas nesse período fundamentais
(41,9%; 50,2%) são as que menos para a realização de exames
referem a realização de 7 ou e identificação de gravidezes
mais consultas de pré-natal de risco ou com probabilidade
em relação às brancas (56,6%; de desenvolvimento de
64,3%), sendo as adolescentes alguma doença na gestante
de 10 a 14 anos que apresentam ou no feto durante a gravidez
as menores frequências a 7 ou ou na hora do parto, e de
mais consultas de pré-natal. Já situações que possam
no indicador ‘Nenhuma consulta demandar tratamentos,
de pré-natal realizada’, a maior acesso a medicamentos ou
frequência é de adolescentes outras medidas relevantes,
de 10 a 14 anos, principalmente que eventualmente poderão
indígenas (10,9%), seguidas das também necessitar de atenção
pretas e pardas (3,3%). Assim obstétrica especializada para
como para as de 15 a 19 anos o parto. O acesso ao pré-natal
(indígenas: 7,9%; pretas: 3,0%; adequado é fundamental para
pardas: 2,7%). a prevenção da mortalidade
materna por causas evitáveis.

19
Número de consultas de pré-natal por grupo de raça-cor materna entre
adolescentes.
10 a 14 anos (%) 15 a 19 anos (%)
2,4 1 0,9 0,7 1 1,6 1 0,8 0,6 0,8

20,8 26,6
41,9 40,4 43,6
50,2 47,4 52,2
56,6
64,3
39,3
39,5

38,1 40,5 38,2


34 37,5
31,8 34,2
26,5
24,4 27,1
15,4 14,9 13,9 11,8
9 11,6 6,4 1,5 10,2 2,5
10,9 3,6 3,3 1,9 3,3 7,9 3 2,7
Indígenas Pretas Pardas Brancas Total Indígenas Pretas Pardas Brancas Total

Nenhuma De 1 a 3 De 4 a 6 7 ou mais Ignorado

Fonte: Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos - Sinasc. Dados extraídos via Tabnet-DATASUS para o
período 2008-2019

Um pré-natal de qualidade, com e dificuldade de acessar o


a quantidade adequada de serviço (além de estigma e
consultas, é um fator, portanto, falta de acolhimento). Como
também de promoção de apontado nos dados anteriores,
partos seguros e saudáveis, as desigualdades no acesso
e de redução dos casos de ao pré-natal estão ligadas a
morbimortalidade materna. intersecções entre idade, raça/
Embora as recomendações do cor e outros marcadores sociais.
Ministério da Saúde sejam de
que o pré-natal tenha início o
quanto antes, preferencialmente 3.2. Uniões precoces
no primeiro trimestre da
gestação, adolescentes tendem Os dados do SINASC também
a iniciar o pré-natal em fases apontam que, do total de
mais avançadas da gravidez, em mães adolescentes, 29,2%
relação a outras faixas etárias. estavam entre aquelas que
Adolescentes muitas vezes vivenciavam algum tipo de
demoram mais a ter a primeira relação conjugal (casadas ou
consulta de pré-natal e podem em união consensual) e foi
ter menos consultas ao longo observado o maior percentual
da gestação - podendo indicar entre as mulheres indígenas.
um processo mais difícil de Mesmo entre aquelas de 10 a 14
identificar, processar emocional anos, chegando a ser superior
e socialmente a gravidez em ambos os grupos etários

20
quando comparado com as desigualdades de gênero,
adolescentes nos demais raça/cor e etnia. Embora tanto
grupos raciais. As evidências meninos quanto meninas
mostram que casamentos vivenciem uniões precoces,
precoces na América Latina meninas são significativamente
são, em sua maioria, informais mais afetadas por essa prática.
e consensuais, frequentemente
De acordo com pesquisa da
envolvendo homens adultos e
organização Promundo, o
meninas na fase da infância e
Brasil ocupa o quarto lugar no
adolescência. Na região, o Brasil
mundo em números absolutos
se destaca pelo ranking elevado
de mulheres casadas até a
em números absolutos.
idade de 15 anos, com 877 mil
O casamento infantil1 é mulheres com idades entre 20 e
uma violação dos direitos 24 anos que se casaram até os
humanos, cujo enfrentamento 15 anos (11%). O Brasil é também
está previsto inclusive no o quarto país em números
Objetivo de Desenvolvimento absolutos de meninas casadas
Sustentável (ODS) 5. Embora com idade inferior a 18 anos:
a Lei 13.811/2019 (que alterou cerca de 3 milhões de mulheres
o Código Civil Brasileiro) com idades entre 20 e 24 anos
proíba expressamente o casaram antes de 18 anos (36%
casamento de adolescentes do total de mulheres casadas
menores de 16 anos, a prática nessa mesma faixa etária). De
permanece ainda relativamente acordo com dados coletados
frequente, por diversas razões no Censo de 2010, pouco mais
estruturantes, dentre elas de 88 mil meninas e meninos
a pobreza persistente e as (idades entre 10 e 14 anos) estão
Nascidos vivos de mães adolescentes (10-19 anos),
segundo raça/cor e estado civil da mãe (Brasil, 2008-2019)
Brancas Pretas Pardas Indígenas Total*

10 a 14 15 a 19 10 a 14 15 a 19 10 a 14 15 a 19 10 a 14 15 a 19
Estado civil 6.375.514
72.762 1.788,102 12.092 246.453 202.905 3.720,802 9.200 65.889
% % % % % % % % N %
Solteira 86,08 71,06 83,92 73,44 79,83 67,81 64,91 55,05 4 417 766 69,3
Casada/ União
12,64 27,85 14,84 25,59 18,78 31,11 31,25 42,67 1.860,627 29,2
consensual
Fonte: Sistema de informações sobre Nascidos Vivos - Dados extraídos via Tabnet-DATASUS para o período
2008-2019
* O número total de meninas inclui os grupos de asiáticas e raça/cor ignorada, que foram excluídos
desta análise. O estudo completo pode ser acessado em https://rsdjournal.org/index.php/rsd/article/
view/39404/32415

1
O casamento infantil é definido pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CRC)
como uma união envolvendo, pelo menos, um cônjuge abaixo dos 18 anos.

21
em uniões consensuais, civis
e/ou religiosas, no Brasil.
As uniões precoces ameaçam
a vida e a saúde das
meninas, e limitam suas
perspectivas de futuro. As
meninas pressionadas ao
casamento costumam
engravidar enquanto ainda
são adolescentes, aumentando
O Objetivo de
o risco de complicações
Desenvolvimento
na gravidez ou no parto.
Sustentável 5 - ODS
Essas complicações são
5, que é um dos 17
uma das principais causas
objetivos da Agenda
de mortalidade entre
2030 de Desenvolvimento
adolescentes em países em
Sustentável, visa alcançar
­desenvolvimento.
a igualdade de gênero
O UNFPA globalmente promove e empoderar todas as
programas e apoia legislações mulheres e meninas,
destinadas a acabar com prevendo a eliminação de
o casamento infantil. Além todas as práticas nocivas,
disso, estimula investimentos como os casamentos
baseados em evidências e uniões precoces,
e centrados nas meninas, forçados e de crianças e
que as capacitam com as adolescentes, observando
informações, habilidades e as intersecções de raça,
serviços de que precisam etnia, idade, deficiência,
para serem saudáveis, com orientação sexual,
educação e segurança, identidade de gênero,
ajudando-as a fazer uma territorialidade, cultura,
transição bem-sucedida religião e nacionalidade,
para a idade adulta. O UNFPA em especial para as
também trabalha para mulheres do campo, da
apoiar as necessidades de floresta, das águas e
meninas que tenham passado das periferias urbanas.
por uniões precoces, em
especial no planejamento
da vida reprodutiva e
na saúde materna, mas
também no apoio a seus
projetos de vida e inserção
educacional e profissional.

22
Além do 3.3. Observações
enfrentamento às
uniões precoces ou Ser adolescente e tornar-se
forçadas, o ODS 5 mãe é um desafio para as
objetiva o alcance meninas brasileiras que muitas
real da igualdade vezes têm uma interrupção
de gênero também dos projetos e sonhos da
por metas de adolescência em decorrência
eliminar a violência da maternidade. Neste contexto,
contra mulheres para as mães adolescentes, é
e meninas, de fundamental garantir o acesso
garantir igualdade aos direitos fundamentais e
de participação básicos, como à educação
e oportunidades formal e proteção social, pois
de liderança, e de elas precisam estudar, trabalhar
garantir o acesso e planejar o futuro.
universal aos Os serviços de saúde devem
direitos sexuais considerar as particularidades
e reprodutivos. da gestação e maternidade na
Também são metas adolescência, com garantia do
dos ODS: igualdade cuidado integral e equânime
de gênero (ao considerando as dinâmicas dos
empoderar todas as marcadores sociais de raça,
mulheres e meninas, gênero, geração e classe.
acabando com
a violência a que
são submetidas);
a erradicação da
Foto: Marcello Casal jr/Agência Brasil

pobreza, da fome;
segurança alimentar;
saúde e bem-
estar; educação
de qualidade;
trabalho decente
e crescimento
econômico,
entre outros.

23
OBSERVAM-SE DESVANTAGENS PARA AS
ADOLESCENTES INDÍGENAS, PRETAS E PARDAS,
EVIDENCIANDO COMO O RACISMO INSTITUCIONAL
INTERAGE COM OUTROS MARCADORES, COMO, POR
EXEMPLO, O ETARISMO, E AMPLIA AS BARREIRAS AO
ACESSO À CONSULTA DE PRÉ-NATAL OU OUTROS
SERVIÇOS DE SAÚDE REPRODUTIVA.

Os achados desta pesquisa se carrega muitos julgamentos,


assemelham às desigualdades estigmas e preconceitos,
raciais identificadas em outros daqueles que estão em torno da
estudos sobre o acesso de adolescente gestante, incluindo
mulheres indígenas, pretas e os serviços e profissionais da
pardas aos serviços de saúde saúde, que deveriam garantir
reprodutiva. São elas que o cuidado integral. Ao mesmo
sofrem inúmeras barreiras tempo, a tomada de decisão
desde o momento de procurar de meninas e adolescentes
o atendimento até a entrada diante de uma gravidez é muito
no serviço de saúde. limitada, dependendo de uma
rede de apoio – sobretudo
Mesmo quando compartilham
entre as mais jovens –, dos
similaridades (mães
arranjos familiares, das relações
adolescentes realizando
afetivas e sexuais e do contexto
pré-natal) observam-
da ocorrência da gravidez,
se desvantagens para as
aspectos que podem retardar
indígenas, pretas e pardas,
a procura pelos serviços de
evidenciando como o racismo
saúde. Ademais, são as meninas
institucional interage com
e adolescentes indígenas,
outros marcadores, como, por
pretas e pardas que vivem em
exemplo, o etarismo, e amplia
locais mais segregados, com
as barreiras ao acesso à
vazios assistenciais, sendo
consulta de pré-natal ou outros
uma das barreiras geográficas
serviços de saúde reprodutiva.
e institucionais de acesso
Geralmente, a maternidade na aos serviços de saúde.
adolescência é um evento que

24
25
4.1 Contexto tantas outras, limitando sua
autonomia e suas escolhas.
Viver com integridade corporal,
sem coerção e violência No Brasil, no período de 2015 a
é um direito fundamental. 2019, foram registrados 69.418
Contudo, a violência de gênero atendimentos decorrentes
é ainda uma das violações de violência sexual contra
de direitos humanos mais meninas e adolescentes em
prevalentes no mundo e pode serviços de saúde, de acordo
começar cedo na vida de uma com os dados do Sistema de
mulher. A Meta 5.2 do ODS 5 Informação de Agravos de
estabelece o compromisso Notificação (­ SINAN-Datasus).
rumo à eliminação de todas Dentre estes casos, as meninas
as formas de violência contra de 10 a 14 anos foram as
as mulheres e meninas, principais vítimas (66,92%), e as
inclusive violência sexual, nas de 15 a 19 anos representaram
esferas públicas e privadas. 33,08% do total dos casos.
A violência contra mulheres e Na questão de raça, as
meninas é uma violação dos adolescentes negras (pretas
direitos humanos e também e pardas) foram as que mais
é reconhecida como um sofreram violência sexual, com
problema de saúde pública. 64,18% do total.
Pode trazer sérios efeitos São meninas e adolescentes
às vítimas, no curto e no as principais vítimas de
longo-prazo, impactando violência sexual sendo
a sua saúde física, mental, que o próprio domicílio é
sexual e reprodutiva. Além onde costuma acontecer a
da integridade corporal, violação. Os homens e as
com consequencias físicas pessoas conhecidas são os
imediatas que podem incluir
principais abusadores.
lesões, gravidez indesejada,
infecções sexualmente Ressalta-se a imperiosa
transmissíveis (IST) e disturbios necessidade de programas
ginecológicos, a violência especializados no atendimento
sexual pode trazer ansiedade, às e aos adolescentes
depressão, pânico, transtorno sexualmente vitimizados,
de estresse pós-traumático seja por violência intra ou
e até automutilação e extrafamiliar, bem como
dependência de substâncias o fortalecimento da rede
psicoativas. Isso pode impactar intersetorial de proteção,
nas demais esferas da vida da com continuidade das ações,
vítima, como relacionamentos que evite a revitimização e
e frequência escolar, entre restitua-lhes os seus direitos,

26
além do comprometimento do precisam estar atentas para
setor público e demais atores a questão da vitimização
sociais no enfrentamento à ocorrida na residência - local
violência sexual e de gênero. de ocorrência da violência
Evidencia-se que adolescentes sexual para 63,16% dos casos
nem sempre encontram na registrados contra meninas e
família um lugar de proteção, adolescentes no período de
de modo que políticas públicas 2015 a 2019 (SINAN-Datasus).

Porcentagem dos casos de Porcentagem dos casos de


violência sexual contra meninas violência sexual contra meninas
e adolescentes, segundo raça/cor e adolescentes, segundo grupo
(2015-2019) etário (2015-2019)

Indígena 1,2% 10 a 14 anos 66,92%


Parda 54,75%
Preta
15 a 19 anos 33,08%
9,43%
Branca 34,3% 64,18% do total

Fonte: Sistema de Informação de Agravos de Notificação - Sinan. Dados extraídos via Tabnet-DATASUS

Porcentagem dos casos de violência sexual contra meninas e


adolescentes, segundo local de ocorrência e perfil do agressor (2015-2019)

10,64%
20,38%

24,8%

LOCAL AGRESSOR
17,22%

1,39% 63,16% 62,41%

Residência/Habitação Coletiva Conhecido


Escola
Desconhecido
Local Público/Comércio/ Serviços e outros
Ignorada
Ignorado
Fonte: Sistema de Informação de Agravos de Notificação - Sinan. Dados extraídos via Tabnet-DATASUS.

27
VOCÊ SABIA?
A Lei Federal n. 13.431/2017 Saiba mais aqui
estabelece o sistema de
garantia de direitos da
criança e adolescente vítima
de violência. A lei garante o
direito à escuta especializada
junto aos órgãos de saúde,
assistência social, educação
(e outros), com procedimentos
adequados e encaminhamento
das denúncias à autoridade
policial do local dos fatos,
ao Conselho Tutelar e/
ou Ministério Público.

O TAMANHO DO DESAFIO
Do total de casos de violência (quase 80%) sofreu estupro;
sexual (estupro, assédio, e desse montante, 24,31% das
pornografia infantil, exploração adolescentes chegaram ao
sexual, atentado violento ao serviço gestante, sendo que
pudor) registrados contra 26,48% tiveram acesso ao
meninas e adolescentes, entre serviço de aborto legal.
2008 e 2019, a grande maioria

RESSALTA-SE A IMPERIOSA NECESSIDADE


DE PROGRAMAS ESPECIALIZADOS NO
ATENDIMENTO ÀS E AOS ADOLESCENTES
SEXUALMENTE VITIMIZADOS, BEM COMO O
FORTALECIMENTO DA REDE INTERSETORIAL
DE PROTEÇÃO.

28
Se ocorreu violência sexual,
qual tipo?
Grupo Etário
Total
10-14 15-19 (dos grupos)

Estupro 78,64% 80,81% 79,36%

Outras formas
de violência 21,36% 19,19% 20,64%
sexual*
*estupro, assédio, pornografia infantil, exploração sexual,
atentado violento ao pudor

A violência sexual teve uma


gestação como consequência?

Grupo Etário
10-14 15-19 (dosTotal
grupos)

Não 72,47% 81,4% 75,69%

Sim 27,53% 18,6% 24,31%

Fonte: Sistema de Informação de Agravos de Notificação -


Sinan. Dados extraídos via Tabnet-DATASUS (2008 a 2019).

29
A violência sexual e o acesso enfermagem, de assistência
restrito aos serviços de aborto social, de psicologia etc.
legal também são questões E um outro componente,
que precisam ser levadas em não menos importante,
consideração nos desfechos em razão da característica
de gravidez e maternidade na deste procedimento,
adolescência, principalmente que é a legislação,
para as meninas de 10 a 14 anos. componente ético-legal.
No Brasil, apesar de o aborto
O Código Penal Brasileiro, de
ser permitido para gravidez
1940, estabelece os permissivos
em decorrência de estupro,
legais para a interrupção da
o acesso a este direito e ao
gravidez nos casos previstos em
serviço de aborto legal pode
lei, que incluem a interrupção
ser desafiador. Mulheres e
para salvar a vida da mulher e
meninas que necessitam desse
para o caso de uma gestação
serviço precisam ultrapassar
decorrente de estupro, por
barreiras pessoais, relacionais,
solicitação e consentimento da
geográficas e institucionais.
mulher. Se a mulher for menor
Muitas gravidezes que
de idade, com deficiência ou
resultaram de relações sexuais
incapaz, por autorização de seu
violentas e não consentidas
representante legal.
chegam a termo.
Mais recentemente, em 2012,
Segundo o Cadastro Nacional
ampliou-se também para os
de Estabelecimentos de
casos de anencefalia fetal, por
Saúde (CNES)/SUS, o país tem
meio da ADPF (Arguição de
90 prestadores do serviço
Descumprimento de Preceito
especializado de atenção à
Fundamental) nº 147 do Superior
vítima de violência sexual com
Tribunal Federal.
a classificação de atenção à
interrupção da gravidez para os A violência sexual e de gênero é
casos previstos em lei. resultado de uma discriminação
estrutural e arraigada, que
O Aborto legal é um tema
requer medidas e reformas
complexo e se refere
legislativas, administrativas
especificamente ao processo
e institucionais, incluindo a
de interrupção da gravidez
erradicação dos estereótipos
nos casos previstos em
e iniquidades de gênero e
lei. O aborto legal tem um
raça/cor. Esforços para o
componente técnico, baseado
enfrentamento à violência de
em protocolos médicos,
gênero precisam, portanto,
protocolos assistenciais, de

Fonte: Mapa do Aborto Legal*

30
investir nas mudanças de perpetradores e o medo gerado
normas sociais e de gênero por suas ações afetam todas as
prejudiciais que perpetuam mulheres e meninas.
a desigualdade. Isso inclui
programas de prevenção, como
a oferta de educação integral 4.2. Observações
em gênero e sexualidade, e
redes de proteção e de justiça Os Objetivos para o
atuantes. Ademais, no centro Desenvolvimento Sustentável
da abordagem de acolhimento (ODS) são um apelo global
às sobreviventes dessas à ação para acabar com
violências deve estar o direito à a pobreza, proteger o meio
segurança, à confidencialidade, ambiente e o clima e garantir
à não discriminação e que todas as pessoas, em
à autodeterminação, todos os lugares, possam
envolvendo serviços de saúde, desfrutar de paz, prosperidade e
seviços sociais e de justiça condições dignas e respeitosas.
de qualidade. A violência Estes são objetivos globais
de gênero não é apenas assumidos pelos países e
uma violação dos direitos apoiados pelas Nações Unidas
individuais e a impunidade dos para alcance até 2030.

31
É importante ressaltar que o
horizonte efetivo da Agenda 2030
de Desenvolvimento Sustentável
depende de esforços intensificados
com vistas a “eliminar todas as
formas de discriminação de gênero,
nas suas intersecções com raça, etnia,
idade, deficiência, orientação sexual,
identidade de gênero, territorialidade,
cultura, religião e nacionalidade, em
especial para as meninas e mulheres
do campo, da floresta, das águas
e das periferias urbanas”. (Fonte:
https://brasil.un.org/pt-br/sdgs/5).
Nem toda gravidez na adolescência
é consequência de um estupro.
No entanto, muitas adolescentes
engravidam e se tornam mães não
intencionalmente e a violência sexual
tem sido um determinante que
requer prevenção, atenção e cuidado,
especialmente nos casos de gestação
e maternidade na faixa dos 10 a 14
anos. Muitos desses casos não são
sequer denunciados ou considerados
eventos de violência sexual. É comum
a prática de culpabilização das
vítimas e a crença que, de alguma
forma, as meninas e adolescentes
poderiam ter evitado a violência
sexual e o estupro. A opressão e a
culpa, a dificuldade de diálogo com
responsáveis e com profissionais
da saúde, da educação e outras
instâncias relevantes, bem como as
barreiras de acesso às instituições
e redes de proteção, fazem com
que muitas meninas e adolescentes
e familiares, mesmo identificando
a violência, sejam silenciadas.

32
Para acessar informações caminhos para ruptura do
sobre os serviços locais para ciclo da violência doméstica,
atendimento à violência facilitando o acesso a serviços
baseada em gênero, o UNFPA especializados, processos
Brasil desenvolveu a Plataforma formativos e acolhedores.
Mulher Segura (htps://www.
mulhersegura.org/) cujo
LIGUE 180 - CENTRAL DE
objetivo é garantir o acesso
ATENDIMENTO À MULHER
remoto e presencial a uma
A Central de Atendimento à
comunidade de apoio e a
Mulher (Ligue 180) presta uma
informações confiáveis sobre
escuta e acolhida qualificada
os diferentes tipos de violência,
às mulheres em situação de
desde sua identificação até
violência. O serviço registra
os mecanismos de denúncia.
e encaminha denúncias
A Plataforma conecta
aos órgãos competentes,
mulheres em situação de
bem como reclamações,
violência aos canais de apoio
sugestões ou elogios sobre
disponíveis por todo o país.
o funcionamento dos
Para que as sobreviventes
serviços de atendimento.
possam dar os primeiros
passos para romper com o O serviço também fornece
ciclo da violência doméstica, informações sobre os
foram reunidos os principais direitos da mulher, como os
serviços de enfrentamento à locais de atendimento mais
violência contra as mulheres próximos e apropriados
desenvolvidos pelos estados para cada caso: Casa da
brasileiros e organizações locais. Mulher Brasileira, Centros de
Referências, Delegacias de
Muitas mulheres não
Atendimento à Mulher (Deam),
conseguem terminar um
Defensorias Públicas, Núcleos
relacionamento, ainda
Integrados de Atendimento
que abusivo, por diversas
às Mulheres, entre outros.
razões históricas, culturais e
socioeconômicas. Em contextos A ligação é gratuita e o serviço
de crise e isolamento social, funciona 24 horas por dia,
é ainda mais difícil deixar um todos os dias da semana. São
lar violento e observamos o atendidas todas as pessoas
aumento dos feminicídios. que ligam relatando eventos
Por isso, apresentamos de violência contra a mulher.

33
O Ligue 180 atende em MINISTÉRIO PÚBLICO
todo o território nacional e Os promotores de Justiça
também pode ser acessado têm sido fortes aliados do
em outros países. movimento social de defesa
dos direitos da criança e do
A Constituição Federal ainda
adolescente. Todo estado
estabelece que é dever da
conta com um Centro de Apoio
família, da sociedade e do
Operacional (CAO), que pode
Estado assegurar à criança
e deve ser acessado na defesa
e ao adolescente direitos
e garantia dos direitos das
fundamentais, além de colocá-
crianças e dos adolescentes.
los a salvo de toda forma de
exploração e violência. Veja
como denunciar casos de
POLÍCIA MILITAR
maus-tratos e negligência a
Número 190 é o número de
crianças e adolescentes:
telefone da Polícia Militar que
deve ser acionado em casos
de necessidade imediata ou
DISQUE 100 - DISQUE
socorro rápido. O 190 recebe
DIREITOS HUMANOS
ligações de forma gratuita
O número da Secretaria de
em todo o território nacional.
Direitos Humanos recebe
denúncias de forma rápida
e anônima e encaminha
POLÍCIA FEDERAL, POLÍCIA
o assunto aos órgãos
RODOVIÁRIA FEDERAL E
competentes no município
DELEGACIAS ESPECIALIZADAS
de origem da criança ou do
OU COMUNS
adolescente. Disque 100 de
As denúncias são anônimas e
qualquer parte do Brasil. A
não oferecem risco à imagem
ligação é gratuita, anônima
e segurança do denunciante.
e com atendimento 24 horas,
todos os dias da semana.

34
CONSELHO TUTELAR
DA SUA CIDADE
O Conselho Tutelar é um dos
órgãos de proteção e que
também recebe denúncias
de violações dos direitos das
crianças e adolescentes.

DISQUE-DENÚNCIA
O Disque Denúncia atua no
combate à violência contra
o idoso, a mulher, as pessoas
com deficiência e a criança
e ao adolescente, através do
núcleo de violência doméstica.
Este núcleo foi desenvolvido
para monitorar as denúncias
cadastradas com o objetivo
de priorizar e qualificar o
atendimento. O serviço possui
parceria com as delegacias
especializadas (Delegacia
Especializada no atendimento
de crianças e adolescentes
vítimas - DCAV e Delegacia
Especializada na Proteção
da Criança e do Adolescente
- DPCA) e com os conselhos
tutelares, enviando as
denúncias e solicitando maiores
e melhores providências.

35
PROJETO DESIGUALDADES E GRAVIDEZ
NA ADOLESCÊNCIA

O CIDACS/Fiocruz Bahia, o Endereços:


ISC-UFBA e o UNFPA Brasil
CIDACS-Fiocruz Bahia
agradecem a todos que
Parque Tecnológico da Edf.
contribuíram para a produção
Tecnocentro
deste projeto
Rua Mundo, 121 – sala 315 –
Colaboradores: Karina Cardoso ­Trobogy - Salvador – BA | Brasil
Meira1, Luana Junqueira Dias CEP 41745-715
Myrrha1, Ana Paula Reis2, Vitória cidacs.comunicacao@fiocruz.br
Nunes3, Jamile Mendes3, Núbia www.cidacs.bahia.fiocruz.br
Pinto4, Maria Eduarda Santo4,
Everly Teixeira2, Herick Oliveira5 ISC/UFBA
Rua Basílio da Gama, s/n
Campus Universitário Canela
1
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Salvador – BA | Brasil
Rio Grande do Norte, Brasil
CEP 40.110-040
2
Instituto de Saúde Coletiva, Universidade Federal
da Bahia, Salvador, Bahia, Brasil
+55 (71) 3283-7373
3
Escola de Enfermagem, Universidade Federal da isc@ufba.br
Bahia, Salvador, Bahia, Brasil
4
Instituto de Psicologia, Universidade Federal da
www.isc.ufba.br
Bahia, Salvador, Bahia, Brasil
5
Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, UNFPA Brasil
Paraíba, Brasil CASA DA ONU
Setor de Embaixadas Norte
SEN, Quadra 802 Conjunto C Lote
17 – Brasília – DF | Brasil
CEP 70800-400 -
+55 (61) 3038-9252
imprensa.brasil@unfpa.org.br
brazil.unfpa.org/pt-br

Janeiro, 2023

As opiniões expressas nesta publicação não refletem necessariamente as visões


do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). As informações e dados
apresentados são de responsabilidade do redator, não implicando afirmações
oficiais por parte do UNFPA ou de qualquer outra agência ou departamento das
Nações Unidas. A terminologia empregada e a apresentação de imagens não
implicam expressão de opinião por parte do UNFPA a respeito do status jurídico
de qualquer país, território, cidade ou área, ou de suas autoridades, ou a respeito
da delimitação de suas fronteiras ou limites.

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