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Marco Legal da Primeira Infância

Para Todos

UNIDADE I
UNIDADE I - Avanços e desafios na aplicação da
regra da prioridade absoluta no contexto da primeira
infância
Introdução
Nesta unidade, apresentaremos um panorama das infâncias e adolescências em
nosso país, com foco na primeira infância, um histórico das conquistas de direitos em nossa
legislação, culminando com o significado da construção de uma lei específica para a
primeira infância, seus fundamentos, áreas prioritárias, políticas públicas a ela
relacionadas, importância da parentalidade, do investimento e das estratégias de
financiamento e de intersetorialidade, entre outros.
Entre a lei e sua aplicação, há um caminho que depende de muitas pessoas, grupos
e instituições, incluindo cada um dos profissionais que atuam cotidianamente com as
crianças e suas famílias. Esperamos que os conhecimentos a serem apresentados
contribuam para a compreensão do cenário atual e das perspectivas para a efetiva
promoção da cidadania desde o começo da vida, como propõe o Marco Legal da Primeira
Infância.
A regra da prioridade absoluta é o primeiro ponto de convergência para unirmos
esforços na promoção do desenvolvimento humano na primeira infância, em uma
perspectiva de responsabilidade compartilhada. De fato, a Constituição Federal de 1988
utiliza a expressão prioridade absoluta apenas quando se refere às crianças, aos
adolescentes e aos jovens.
Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, Constituição
Federal, 1988).

É possível imaginar que se a regra da prioridade absoluta tivesse sido cumprida


amplamente desde 1988, teríamos outro cenário de desenvolvimento em nosso país.

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Segundo pesquisa nacional realizada pelo Datafolha e o Instituto Alana, em 2013, apenas
24% da população brasileira conhecia o termo prioridade absoluta. Nem a sociedade nem a
família conhecem amplamente os direitos de seus filhos (DATAFOLHA, INSTITUTO ALANA,
2013).

Diante dessa constatação, podemos concluir que a implementação legal se faz


necessária, com ampliação do acesso ao conhecimento e aos direitos mais que com a
criação de novas leis.
Como será visto no decorrer do curso, o Marco Legal da Primeira Infância pode ser
considerado um meio estratégico para compreensão da importância da absoluta
prioridade, pois “se mudarmos o começo da história, mudamos a história toda” (REFFI-
CAVOUKIEN, 2016).
De acordo com o Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016, art. 2º),
“considera-se primeira infância o período que abrange os primeiros 6 (seis) anos completos
ou 72 (setenta e dois) meses de vida da criança” (BRASIL, 2016). E neste período a
prioridade absoluta implica o dever do Estado de estabelecer políticas, programas e
serviços que atendam às especificidades e relevância dessa faixa etária, visando a garantir
seu desenvolvimento integral, em consonância com o Estatuto da Criança e do
Adolescente e outras leis (idem, arts. 1º e 3º).

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Aula 1: Panorama das infâncias e adolescências no
Brasil: dados socioeconômico-culturais
Atualmente, o Brasil conta com quase 20 milhões de crianças na primeira infância
(PNAD, 2010). Elas representam cerca de 10% da população do País e vivem em contextos
muito diversificados, pois vivemos em um país continental. Algumas se encontram em
melhores condições de desenvolvimento, pois, em várias regiões do Brasil, temos índices
de desenvolvimento humano (IDH) muito elevados. Outras vivem em contextos de
vulnerabilidade e risco social, com difícil acesso a serviços e políticas públicas. Contudo,
mesmo crianças que encontram-se em situação economicamente favorecidas podem
vivenciar contextos de risco, por outros fatores. Por isso, este curso visa ampliar a
implementação de ações e políticas inovadoras, assim como integrar muitas já existentes,
mas ainda não suficientemente articuladas, com vistas a garantir o acesso a direitos para o
desenvolvimento humano integral na primeira infância.
Conhecer a realidade do público com o qual trabalhamos é muito importante para
tomarmos decisões mais eficazes em relação às intervenções que realizamos. Em relação
à primeira infância, nem sempre temos dados específicos, mas iniciativas estão em
andamento, como o Diagnóstico Nacional da Situação de Atenção à Primeira Infância, que
está sendo realizado no âmbito do Pacto Nacional pela Primeira Infância (CNJ, 2019),
entre outras.

Contexto familiar vinculado à situação de exclusão social

Para melhor compreensão dos contextos de vida das crianças brasileiras, é


importante começarmos do contexto familiar, pois toda criança vive em família ou
excepcionalmente em serviço de acolhimento, de modo que as condições de vida das
famílias afetam diretamente seu desenvolvimento. Segundo dados do Cadastro Único para
Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), aproximadamente 76 milhões de pessoas
em famílias brasileiras estavam em situação de risco e vulnerabilidade social antes da
pandemia da COVID-19, sendo que a população total estimada pela última PNAD é de
aproximadamente 209 milhões de habitantes. Com os efeitos da crise provocada pela
situação de emergência em saúde, esse número aumentou (CECAD 2.0, 2020).

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A maior parcela de brasileiros e brasileiras em situação de pobreza ou extrema
pobreza está na faixa da infância e da adolescência, correspondendo a um total de
27.549.850 (CECAD 2.0).

Gráfico 1 – Situação de pobreza, por faixa etária, no Brasil

Fonte: CECAD 2.20, Site do Ministério da Cidadania. Referência do dado: 08/2020


https://aplicacoes.mds.gov.br/sagi/cecad20/painel03.php

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Dos brasileiros em situação de pobreza ou extrema pobreza, aproximadamente 10
milhões são crianças de até seis anos de idade. Desse modo, 50% das crianças na primeira
infância, no Brasil, estão em potencial risco para o seu pleno desenvolvimento.
Além disso, em 2018, tivemos 2.329.426 de gestantes no Brasil (SINASC/MS,
2020), das quais 851.666 eram beneficiárias do Programa Bolsa Família (PBF), identificadas
no acompanhamento da condicionalidade da saúde. Dessa forma, 36,5% das crianças em
gestação estavam em potencial risco pelo contexto de pobreza de suas mães. Porém,
graças à condicionalidade de saúde do PBF, 99% das gestantes beneficiárias identificadas
nesse programa estavam com o pré-natal em dia, conforme registros do Sistema Bolsa
Família na Saúde (2018).

Mortalidade infantil

De acordo com a pesquisa “Nascer no Brasil” (BRASIL; FIOCRUZ; 2014), nos anos
2011 e 2012, a taxa de mortalidade foi de 11,1 por mil nascidos vivos, com maior incidência
nas classes sociais mais desfavorecidas, nas regiões Norte e Nordeste, assim como
relacionada à precariedade dos serviços de saúde. Essa mesma pesquisa identificou que
aproximadamente metade das mulheres declarou que a gravidez não tinha sido desejada.
No entanto, o Brasil se destacou internacionalmente na redução da mortalidade
infantil, alcançando a meta prevista nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio antes do
prazo, reduzindo em 2/3 a mortalidade infantil entre 1990 e 2015 (RASELLA e col.,
2013). Essa redução, segundo os mesmos autores, está relacionada às condicionalidades
do Programa Bolsa Família, que elevou o número de acompanhamentos no pré-natal e na
vacinação das crianças, possibilitando também outros benefícios como Benefício Nutriz.

Excesso de cesarianas

Em relação ao nascimento, um índice que se mostra preocupante e mais frequente


nas classes economicamente favorecidas é o excesso de cesarianas. Victora (2016)
realizou um estudo científico há cerca de 30 anos, chamando atenção para a “pandemia de
cesarianas no Brasil, quando o índice era de 28%”, enquanto o recomendado pela
Organização Mundial da Saúde é de no máximo 15%. Contudo, esse índice continua
aumentando; em 2012, passou para 55,8%, segundo o Sistema de Informações sobre
Nascidos Vivos (SISNASC/Ministério da Saúde), chegando a mais de 90% em alguns
municípios brasileiros, tornando o Brasil o líder mundial em cesarianas.

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Dentre os vários fatores contrários a essa prática excessiva de cesarianas está a
prematuridade. Victora (2016) observa que “nós temos muitas crianças nascendo antes do
tempo”.

“E o que as pesquisas identificam como consequência da prematuridade e do baixo


peso ao nascer, em função de a criança sair antes do tempo do útero?
• Aumento da morbidade e da mortalidade infantil;
• Maior uso de serviços de saúde;
• Maiores gastos hospitalares;
• Retardo no desenvolvimento infantil;
• Redução do capital humano na próxima geração.” (VICTORA, 2016, p. 116)

Então, desde o nascimento, a prioridade não tem sido o ritmo da própria criança, de
nascer a termo, principalmente nas classes que não estão em vulnerabilidade econômica.

Gravidez na adolescência

Mais de 430 mil bebês nascem de mães adolescentes anualmente, no Brasil,


segundo o último relatório do Fundo de População da ONU (ONU/UNFPA). A taxa de
fecundidade brasileira entre meninas de 15 a 19 anos se encontra em 62 a cada mil bebês
nascidos vivos, acima da média mundial, que é de 44 a cada mil. Em relação à gravidez na
adolescência, “as pesquisas indicam um discreto decréscimo no número de mães entre 15
e 19 anos, pois entre 2004 e 2014 o registro de nascidos vivos passou de 78,8 para 60,5
filhos por mil mulheres nesse grupo etário” (INDICA, 2017).

Sub-registro de nascimento

Segundo o Censo do IBGE de 2010, cerca de 600.000 crianças de zero a dez anos
de idade, no Brasil, encontravam-se sem Registro Civil de Nascimento (RCN),
praticamente sem condição de exercer uma relação formal com o Estado Brasileiro.
Pessoas que, embora tenham nome, sobrenome, filiação, naturalidade, nacionalidade, do
ponto de vista formal não existem, tampouco conseguem comprovar quem são e acessar
os serviços a que têm direito.

Filiação paterna

Os dados do Sistema Nacional de Informações de Registro Civil (SIRC, 2020)


revelam que das quase 2,8 milhões de crianças nascidas em 2019, que tiveram seus
registros enviados pelos cartórios, 6,3% não tiveram filiação paterna informada. Desse

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modo, aproximadamente 173 mil crianças não tiveram o nome do pai inscrito no registro
de nascimento, no ano de 2019. E o que isso repercute em suas vidas?

Gráfico 2 – Número de crianças sem reconhecimento paterno no registro de nascimento,


por Estado, em 2019

Fonte: SIRC, 2020. Acesso em: 25 set. 2020.

Famílias monoparentais

Dados do IBGE também apontaram para o aumento de cerca de um milhão de mães


responsáveis sozinhas por suas famílias, entre 2005 e 2015 (dados do Instituto Data
Popular, divulgados pela Agência Brasil, em 2015). Ao final do período do levantamento
dos dados, o Brasil somava 67 milhões de mães, 31% delas estavam na condição de mulher
responsável familiar, um número que chegava a aproximadamente 20 milhões.

Crianças com deficiências

Segundo dados do IBGE (2010), 6,7% da população brasileira tem algum tipo de
deficiência grave, das quais aproximadamente 3,5 milhões são crianças de até 14 anos e
quase 30% dessa população está fora da escola . No caso dos beneficiários do Benefício de
Prestação Continuada (BPC), esse acompanhamento tem sido melhor estruturado a partir

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do Programa BPC Escola. O BPC tem 4.655.375 milhões de beneficiários, dos quais 82.769
são crianças na primeira infância (SNAS/SEDS/MC, 2020). O público de crianças
beneficiárias do BPC também é um público prioritário do Programa Criança Feliz,
encontrando-se um total de 8.407 crianças na primeira infância com deficiência que
passaram com suas famílias a contar com acompanhamento intersetorial com visita
domiciliar semanal, visando à promoção de seu desenvolvimento (Prontuário SUAS, 2020).
A partir do Programa Criança Feliz, 8.407 crianças na primeira infância, com
deficiência, e sua família passaram a contar com acompanhamento intersetorial com visita
domiciliar semanal, visando à promoção de seu desenvolvimento (Prontuário SUAS, 2020).

Deficit de crescimento

Outro dado basilar como parâmetro das condições para o desenvolvimento infantil
diz respeito à nutrição e pode ser aferido pelo crescimento adequado à faixa etária.
Segundo dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN/MS, 2020), o déficit
de altura em crianças de até 5 anos, acompanhadas pelo Programa Bolsa Família, no Brasil,
apresenta variações regionais significativas:

Figura 1 – Porcentagem de deficit de altura entre as crianças acompanhadas


pelo Programa Bolsa Família

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Fonte: SISVAN/MS, 2020.

Desnutrição x obesidade infantil

O Brasil vivencia um processo de transição nutricional, caracterizado pelo


aumento do excesso de peso e obesidade e por prevalências ainda preocupantes de
desnutrição, especialmente em populações de maior vulnerabilidade. Dados do ano de
2019 sobre o estado nutricional de crianças menores de cinco anos acompanhadas na
Atenção Primária à Saúde (APS) evidenciaram uma prevalência de déficit de estatura e
déficit de peso iguais a 13,3% e 4,1%, respectivamente. Dados também de 2019 indicam
uma prevalência de obesidade igual a 6,95% entre crianças nessa mesma faixa etária. Em
relação aos marcadores de consumo alimentar de crianças acompanhadas na APS, os
dados mostram uma prevalência de aleitamento materno exclusivo entre crianças
menores de 6 meses igual a 53%, segundo os Relatórios Públicos do Sistema de Vigilância
Alimentar e Nutricional - Sisvan. E, quanto à proporção de nascidos vivos com baixo peso ao
nascer (peso abaixo de 2.500g), o resultado foi de 8,7%, considerando os registros no
Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos – Sinasc/Ministério da Saúde, 2020.

Vacinação

Segundo dados do Sistema Bolsa Família na Saúde, 99,44% das crianças menores de
7 anos, acompanhadas em função das condicionalidades do Programa Bolsa Família, 10
apresentavam vacinação em dia, o que indica que a queda de vacinação na população
brasileira esteja associada a outros fatores vivenciados no contexto das famílias com
crianças de classe economicamente favorecidas.

Acesso à creche

Conforme o Relatório do 3º Ciclo de Monitoramento das Metas do Plano Nacional


de Educação (PNE), em 2018, o Brasil alcançou a cobertura de 35,7% das crianças, o que
representa cerca de 3,8 milhões de crianças atendidas (MEC, 2018). Em relação à Pré-
Escola, em 2018, a taxa de cobertura medida pelo Indicador 1A alcançou 93,8%,
mostrando que ainda não se atingiu a universalização do atendimento para a população de
4 a 5 anos, meta estabelecida para o ano de 2016 no PNE. Permanece o desafio de acesso
à creche para muitas crianças brasileiras e suas famílias.

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Crianças afastadas da família por medida de proteção

Os dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), administrado pelo


Conselho Nacional de Justiça, revelam, em maio/2020, a existência de 32.791 crianças e
adolescentes vivendo em serviços de acolhimento, número que constata que a
porcentagem de crianças acolhidas diminuiu em 25,47% em relação ao ano de 2013 (CNJ,
2020).
Apesar de mais de 10.000 crianças e adolescentes terem sido adotados nos últimos
cinco anos no Brasil e existirem mais de 34.000 pretendentes à adoção cadastrados nas
Varas da Infância e Juventude e habitados para adotar, aproximadamente 5.000 crianças e
adolescentes se encontram aptos para adoção, sem encontrarem uma família disponível
para acolhê-los, em função de apresentarem problemas de saúde, idade superior a 7 anos
ou pertencerem a grupos de irmãos (CNJ, 2020).
Outra importante fonte de informações sobre serviços de acolhimento no Brasil é
o Censo SUAS, ferramenta de monitoramento do Sistema Único de Assistência Social,
gerenciada pela Secretaria Nacional de Assistência Social e alimentada anualmente pelos
estados e os municípios. O Censo SUAS 2018 identificou 33.146 crianças e adolescentes
acolhidos no Brasil, sendo 26% na Primeira Infância. Portanto, atualmente, os dados do
CNJ e do SUAS mostram os mesmos resultados, sendo as diferenças apenas uma questão
da temporalidade da coleta dos dados. Essas crianças estão em um total de 2.834 Unidades 11

de Acolhimento Institucional, onde estavam acolhidos 95,8% das crianças e dos


adolescentes, e 332 em Serviços de Família Acolhedora, onde estavam 4,2% delas.

Acesso a tecnologias de informação

De acordo com o estudo do Cetic.br (2019), embora venha crescendo a cada ano o
número de usuários da rede de internet no Brasil, há fortes contrastes entre diversas
classes socioeconômicas. Nas classes A e B, 95% dos habitantes já fazem uso regular da
rede mundial de internet, enquanto, nas classes D e E, esse índice não passa de 57%. Entre
outros impactos, o acesso precário reduz a oportunidade de acessar informações e
alcançar benefícios tangíveis e, assim, reproduz a desigualdade social, com implicações
para os filhos dos adultos privados das tecnologias de informação.

Exposição precoce ao meio digital

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Ao mesmo tempo que as famílias devem contar com acesso de qualidade à rede de
internet e à comunicação cidadã, as crianças entre 0 e 6 anos necessitam de proteção
contra a excessiva exposição a conteúdos de mídia, pois esta limita a interação da criança
com outras pessoas e atividades, como as brincadeiras, a alimentação e o sono. De fato, a
OMS (2019) enfatiza que bebês e crianças até dois anos de idade não deveriam ser
entretidos por meio de telas digitais ou eletrônicas. Além disso, as crianças com mais de
dois anos não deveriam passar mais de uma hora por dia em frente às telas, segundo
pesquisa realizada em 2017 pelo conglomerado Viacom (2017), com foco em crianças de
idades entre 2 e 5 anos de 12 países, que apontou que, no Brasil, elas passavam cerca de
42 horas por semana diante das diversas telas – 50% a mais do que a média global, que é
de 28 horas.

Denúncias de violações contra crianças e adolescentes

Em 2003, o Governo Brasileiro criou o Disque 100, proporcionando um sistema de


recebimento de denúncias de violações de direitos humanos. Em 2019, o número de
denúncias em relação a violências contra crianças e adolescentes aumentou 14% em
relação a 2018, atingindo aproximadamente 55% do total de denúncias recebidas, com
86.837 denúncias. Estas se referiam a mais de 118 mil crianças e adolescentes, entre os
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quais 20,2% tinha até 3 anos de idade, e 24,4%, entre 4 e 7 anos de idade (MMFDH, 2019).

Trabalho infantil

De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD),


em 2016, existiam 2,4 milhões de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil,
das quais 104 mil tinham entre 5 e 9 anos. Segundo o Fórum Nacional de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI, s/d), o trabalho de crianças é mais prevalente
nas áreas rurais em detrimento do trabalho dos adolescentes, que é mais urbano. O Censo
Agropecuário IBGE de 2017 mostra que houve queda de quase 50% no número de crianças
e adolescentes até 14 anos trabalhando na área rural. Ainda segundo o estudo do FNPETI,
essa redução se deu em decorrência dos avanços de políticas públicas de educação,
assistência social e geração de renda, entre outras.
O número de crianças e adolescentes negros em situação de trabalho é maior do
que o de não negros. As regiões Nordeste (39,5%) e Sudeste (25,1%) apresentam os
maiores percentuais de crianças em situação de trabalho infantil. Também é mais visível o

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trabalho dos meninos do que o das meninas, uma vez que formas como o trabalho
doméstico são mais difíceis de serem identificadas. É importante lembrar que essa
pesquisa não mensura algumas das piores formas de trabalho infantil, como a exploração
sexual, o tráfico de crianças e o aliciamento para o tráfico de drogas.

Figura 2 – Panorama da situação da infância e da adolescência no Brasil,


segundo o relatório do UNICEF (2018)

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Fonte: UNICEF (2018).

Outros dados que corroboram o desafio de cumprimento da regra da prioridade


absoluta de assegurar os direitos das crianças e dos adolescentes são trazidos pelo
Relatório de Atenção dos Municípios com a Primeira Infância (INSTITUTO ALANA;
FMCSV, 2020): 42% das crianças e dos adolescentes entre 0 e 14 anos vivem abaixo da
linha da pobreza, duas crianças morrem por dia no Brasil em razão de diarreia provocada
pela falta de saneamento básico, 2,8 milhões de crianças se encontram fora da escola e
79.000 crianças de 5 a 9 anos são submetidas ao trabalho infantil.

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Figura 3 – Panorama sobre pobreza na infância e na adolescência no Brasil

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Fonte: UNICEF, 2018.

Figura 4 – Panorama sobre pobreza na infância e na adolescência no Brasil

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Fonte: UNICEF (2018).

Um estudo de linha de base de Avaliação de Impacto do Programa Criança Feliz


analisou aproximadamente 3 mil crianças de até três anos idade e suas famílias, vinculadas
ao Programa Bolsa Família. Observaram que mais de 90% das casas em que viviam eram
construídas de tijolos, cerca de 87% das famílias dispunham de água encanada dentro de
casa, e quase 80% dispunham de sanitário com descarga. As famílias eram compostas, em
média, por cinco pessoas. A escolaridade média dos pais era de cerca de 8,5 anos, sendo
que apenas metade trabalhava diariamente e mais de um quarto não trabalhavam. A
maioria das crianças teve parto hospitalar, sendo metade aproximadamente partos de
cesariana (VICTORA, BOTELHO, SAGI, 2019). Entre os achados nessa pesquisa, observou-
se alta prevalência de sintomas depressivos maternos e que menos de 10% das crianças
possuíam algum livro ou revistinha em casa, o que teria um papel importante para a
estimulação intelectual (ibdem).

Você sabia?

O Brasil acabou de ganhar duas ferramentas importantes para conhecimento dos


dados específicos da atenção à primeira infância.
Trata-se do Índice Município Amigo da Primeira Infância – IMAPI, que traz
inicadores de saúde, assistência social, educação e cuidados responsivos às crianças de até
6 anos de idade, em cada município brasileiro. Foi desenvolvido pela Universidade de 15
Brasília, em parceria com a Universidade Federal da Bahia, com apoio da Fundação Bill e
Melinda Gates. Você pode pesquisar os indicadores sobre a situação de atenção à primeira
infância em seu município em: https://imapi.org/.
Outra importante ferramenta é a Plataforma OBSERVA, desenvolvida pela Rede
Nacional Primeira Infância, que contém dados detalhados sobre crianças de até seis anos
de idade em saúde, educação e assistência social, por município. Você pode monitorar a
implementação do Marco Legal da Primeira Infância com a ajuda dessa plataforma, em:
mpiobserva@org.br.
Consulte também: FUNDAÇÃO ABRINQ. A Criança e o Adolescente nos ODS: Marco zero
dos principais indicadores brasileiros. São Paulo, 2019. Disponível em:
<https://www.fadc.org.br/sites/default/files/2019-11/ODS-10.pdf>.

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VÍDEO 1
Para finalizar este tema, assista à pílula do documentário O Começo da Vida sobre
os DIREITOS DAS CRIANÇAS: https://ocomecodavida.com.br/direitos-das-criancas/. E
reflita sobre as condições de desenvolvimento em que se encontram as crianças de seu
território de atuação. Você pode registrar em um portifólio quais situações problemas lhe
chamaram mais atenção a partir da leitura realizada.

Referências bibliográficas:

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 16 set. 2020.
BRASIL. Marco Legal da Primeira Infância, de 8 de março de 2016. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2016/Lei/L13257.htm#:~:text=1%C2%BA%20Esta%20Lei%20estabelece%20princ%C3%
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https://aplicacoes.mds.gov.br/sagi/cecad20/painel03.php. Acesso em: 24 set. 2020.

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<https://cetic.br/pt/tics/domicilios/2019/domicilios/A5/>.

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https://www.unicef.org/brazil/media/156/file/Pobreza_na_Infancia_e_na_Adolescencia.pdf .
Acesso em: 24 set. 2020.

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em: <https://insights.viacomcbs.com/pt-br/post/no-brasil-os-pais-se-preocupam-com-a-
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1000 dias. Em: BRASIL. Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. CÂMARA DOS
DEPUTADOS: Centro de Estudos e Debates Estratégicos, 2018, pp. 103-117. Disponível em:

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https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-do-marco-
legal-da-primeira-infancia

VICTORA, C.; BOTELHO, V. SAGI. Avaliação de Impacto do Desenvolvimento Infantil. Cadernos de


Estudos n. 35. Brasília-DF: Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI), Ministério da
Cidadania.

19

18

19
1.1.2. Panorama dos direitos da criança e do adolescente: a condição
peculiar de desenvolvimento, do menorismo à proteção integral, o melhor
interesse da criança, a prioridade absoluta dos direitos da criança e do
adolescente e a responsabilidade compartilhada

“Crianças e adolescentes: que experiência de vida estamos lhes ofertando


hoje, neste presente que virá a ser um dia
o seu passado moldador?”
Edson Seda

A citação de Edson Seda (2018 [1993]), um dos redatores do Estatuto da Criança e


do Adolescente, instiga a reflexão sobre como nossas tradições contemporâneas se
portam na direção da efetivação da regra da prioridade absoluta e dos princípios
estatutários e que passado estamos construindo. Um passado organizado em tradições
que garantem, promovem e defendem direitos humanos de crianças ou um passado que se
organiza em práticas que ignoram, menosprezam e violam direitos humanos de crianças,
reproduzindo tradições anteriores?
Durante a década de 90, o Brasil, assim como muitos países, experienciaram o
surgimento de profundas mudanças no entendimento do significado da infância, dando
origem ao chamado reconhecimento da criança e do adolescente como pessoas plenas de
direitos - sujeitos de direitos - reconhecidos como pessoas em uma condição peculiar de
desenvolvimento, própria das suas idades. Nesse sentido, surge a Doutrina da Proteção
Integral, que representa um grande marco regulatório porque a criança passa a ser
compreendida como sujeito de direitos. Isso se dá com a Convenção Internacional dos
Direitos da Criança (1989), a Constituição Federal (1988) e o Estatuto da Criança e do
Adolescente (1990). A partir desses três elementos normativos, pode-se falar de uma
doutrina jurídica da proteção integral (VERONESE, 2020).

A CONDIÇÃO PECULIAR DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE COMO PESSOAS EM

DESENVOLVIMENTO

Condição peculiar, segundo outro redator do Estatuto da Criança e do


Adolescente, Antônio Gomes da Costa (2016), “significa que a criança e o adolescente têm
todos os direitos, de que são detentores os adultos, desde que sejam aplicáveis à sua idade,
ao grau de desenvolvimento físico ou mental e à sua capacidade de autonomia e

19

20
discernimento”. Essa compreensão tem respaldo nas ciências humanas e biológicas a
respeito da condição de pessoas em desenvolvimento físico, emocional, cognitivo e
sociocultural, que merecem proteção especial por se encontrarem em um estágio
importante e peculiar da vida. Segundo Gomes (2016), ao interpretar todos os demais
artigos da legislação, esse princípio deve servir como critério:

"Art. 6º - Na interpretação desta lei levar-se-ão em conta os fins sociais a


que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres
individuais e coletivos e a condição peculiar da criança e do adolescente
como pessoas em desenvolvimento" (BRASIL, Estatuto da Criança e do
Adolescente, 1990).

Ainda sobre esse aspecto, Seda (2018 [1993]) afirma que “(...) qualquer medida
adotada em relação a esta ou àquela criança, qualquer programa coletivo de trabalho,
qualquer política pública formulada, deve sempre, defendendo a criança, defender
também a sociedade”. De acordo com o autor, essa exigência é própria da cidadania, na
qual fazer valer os interesses de cada um envolve também promover a exigência de
preservação do bem comum, da coletividade.

● DO MENORISMO à PROTEÇÃO INTEGRAL

Os caminhos históricos da infância no Brasil são permeados por privações,


omissões e estigmatizações, destacando-se as situações marcadas por maus-tratos,
violações sexuais, mortalidade, miséria, fome, abandono, escravidão, discriminação etc.
As primeiras ações dirigidas a corrigir essa situação estiveram a cargo dos jesuítas,
em um modelo europeu que muito se diferenciava da realidade das crianças que viviam no
Brasil Colônia, trazendo sérias dificuldades para a adaptação delas à proposta pedagógica
jesuítica (DEL PRIORI, 1995, citado em PASSETI s/a, p. 4).
Segundo Neto, no século XVIII: “(...), um estrondoso número de bebês
abandonados eram deixados pelas mães à noite, nas ruas sujas. Muitas vezes eram
devorados por cães e outros animais que viviam nas proximidades ou vitimados pelas
intempéries ou pela fome” (NETO, 2000, p. 107).
Como solução a essa situação considerada caótica, foi instalada, na Colônia, a
chamada Roda dos Expostos. De acordo com Passeti, “(...) a primeira foi aberta na Santa
Casa de Misericórdia em Salvador, no ano de 1726. Ainda no período colonial, uma
segunda e última roda é estabelecida em Recife. Mesmo, após a independência do Brasil,
21
20

21
essas rodas continuaram a funcionar. Em 1825, uma outra roda é instalada na Santa Casa
de Misericórdia de São Paulo” (PASSETI, s/a, p. 10).

Esta roda era uma espécie de dispositivo onde eram colocados os bebês
abandonados por quem desejasse fazê-lo. Apresentava uma forma
cilíndrica, dividida ao meio, sendo fixada no muro ou na janela da
instituição. O bebê era colocado numa das partes desse mecanismo que
tinha uma abertura externa. Depois, a roda era girada para o outro lado
do muro ou da janela, possibilitando a entrada da criança para dentro da
instituição. Prosseguindo o ritual, era puxada uma cordinha com uma
sineta, pela pessoa que havia trazido a criança, a fim de avisar o vigilante
ou a rodeira dessa chegada, e imediatamente a mesma se retirava do
local (PASSETI, s/a, p. 9).

Segundo os registros oficiais, a criança pequena foi, pela primeira vez, objeto de
normatização legal da parte de seus interesses com o advento da Lei do Ventre Livre,
instituída em 1871 – Lei nº 2.040. Em seus artigos 1º e 2º, essa lei assegurou que os filhos
nascidos de escravos seriam pessoas livres, bem como proibiu a venda de crianças com
idade inferior a 12 anos.
Durante os séculos XVIII e XIX, a titularidade das ações de “amparo” às crianças
esteve a cargo das Santas Casas de Misericórdia e das ações de algumas paróquias, em
especial nas metrópoles do Rio de Janeiro e São Paulo. Em 1911, o Governo da República
criou o Instituto Sete de Setembro, na Capital da República, com a finalidade de recolher e
atender as crianças abandonadas nas ruas da cidade, bem como aquelas envolvidas em
delitos, sendo aquele o precursor das ações oficiais do Estado Brasileiro, transformando-
se, posteriormente, no Serviço de Assistência ao Menor (SAM), de 1941, que, por sua vez,
deu origem à Fundação Nacional de Bem-Estar do Menor (FUNABEM), em 1964.
Vale destacar que, na virada do século XIX para o XX, grupos de imigrantes
chegavam ao país, inúmeros negros escravizados foram libertados e as principais cidades
contavam com uma população em crescimento. Como ressaltado por Alvarez (2003, p.
693), “o antigo medo das elites diante dos escravos será [foi] substituído pela grande
inquietação em face da presença da pobreza urbana nas principais metrópoles do país”.
Assim, para dar conta do novo “problema”, as atenções estatais se voltavam para hábitos,
costumes, modos de pensar e relações interpessoais da população. Diante das mudanças
no contexto político e social mencionadas, um grande número de pessoas não integradas
ao novo mundo do trabalho assalariado dos centros urbanos passou a ser percebido pelas
elites enquanto uma “classe perigosa”, tornando-se uma preocupação constante das
22

21

22
autoridades públicas e policiais (ALVAREZ, 2003). A juventude em situação de
vulnerabilidade torna-se, então, um problema no Brasil:
Vemos pelas ruas mais centrais da cidade inúmeras crianças vagando à
toa, mendigando aos transeuntes, crianças, aliás, dotadas de robustez
física, indicada por sinais que revelam uma boa constituição psicológica,
mas que, entretanto, colocadas em um meio deletério, habituadas à vida
minguada da terra donde partiram, acreditando que neste país a vida
absolutamente nada custa, vivem à toa, à procura de seu destino, como
se neste como em todos os países fosse possível a conquista da vida por
outra lei que não a lei do trabalho (SÃO PAULO, 1893, citado
em:ALVAREZ, 2003, p. 64).

De acordo com Rizzini (2007), o Estado descobre a possibilidade de moldar novos


cidadãos. No lugar de investir em uma política nacional de educação de qualidade para
todos, optou-se por investir em uma política tutelar predominantemente jurídico-
assistencialista para a juventude em situação de vulnerabilidade econômica e social
(RIZZINI, 2007).
Surge, nesse sentido, uma nova forma de pensar o papel do Estado em relação a
um determinado grupo de jovens. Juntamente com esse modelo, passaram a emergir, de
forma mais robusta, debates a respeito de jovens “delinquentes, pequenos mendigos,
vadios, viciosos, abandonados”, levantando-se a necessidade de mudanças legislativas e
institucionais para dar conta da questão da chamada “menoridade” (ALVAREZ, 1989, p.
50). Tais preocupações e discussões irão culminar, entre outras disposições, no Decreto n.
16.272 de 1923, em que são criadas normas de assistência social visando “proteger os
menores abandonados e delinquentes”, base para a criação do Código de Menores de
1927.
No âmbito da Justiça, somente em 1923 foi criado o primeiro Juizado de Menores
no país, que, entre outras tarefas, teve a missão de trazer para a legislação brasileira a
Doutrina da Situação Irregular, consumada no primeiro Código de Menores, em 1927,
conhecido como Melo Mattos.
O Código de Menores de 1927 reconhecia como objetivos principais a proteção
e a assistência. Por um lado, foram criados dispositivos inovadores, estabelecendo a
proibição do trabalho dos menores de 12 anos, bem como a proibição do trabalho infantil
noturno. Por outro lado, foram criados artefatos legais voltados para aqueles que viviam
em situação de vulnerabilidade econômica, estabelecendo, assim, um tratamento jurídico-

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22

23
penal especial para essa parcela da população jovem, a chamada Doutrina da Situação
Irregular (CIFALI, 2019).
O Código previa que a autoridade competente deveria se informar a respeito do
estado psíquico, mental e moral do jovem, além da situação social, moral e econômica de
pais, tutores ou pessoas incumbidas de sua guarda. Não havia uma diferenciação entre
jovens que eram acusados de haver cometido atos contrários à lei e aqueles em situação
de abandono. Além disso, nos casos envolvendo infrações penais, ainda que o jovem fosse
absolvido, poderia ser encaminhado a uma instituição ou ser submetido à liberdade
vigiada. O delito não era tão preponderante como a situação econômica e social do jovem
e de sua família. Os pais, assim como os jovens, eram repreendidos por viverem em
condições miseráveis, isolando-se o jovem em instituições estatais precárias sob o
argumento de que era para o seu próprio bem (CIFALI, 2019).
Já o Código Penal de 1940, em sua exposição de motivos, declarava que: “não
cuida o projeto dos imaturos (menores de 18 anos) senão para declará-los inteira e
irrestritamente fora do direito penal, sujeitos apenas à pedagogia corretiva da legislação
especial”, o Código de Menores (BRASIL, 1940). Ou seja, optou-se por manter a
intervenção estatal sobre os menores de 18 anos em um âmbito especializado. Em seguida,
em 1942, foi criado o SAM (Serviço de Assistência aos Menores), órgão que atuaria como
um equivalente ao sistema penitenciário para a população adolescente, tendo surgido
diante do aumento da população juvenil institucionalizada (SARAIVA, 2005; RIZZINI,
2007).
Em 1964, foi estabelecida a Política Nacional de Bem-Estar do Menor (PNBEM),
executada pela Fundação Nacional de Bem-Estar do Menor (FUNABEM). A PNBEM tinha
um caráter nacional. O Instituto Sete de Setembro, o SAM e a FUNABEM surgiram como
integrantes do Ministério da Justiça, sendo a última transferida para o Ministério da
Previdência Social, de 1972 até 1986.
Com as constituições aprovadas por Vargas, o Código de Menores sofreu pequenas
alterações, porém, prevaleceu na sua essência até 1979, quando o Brasil teve aprovado o
Código Cavaliere, seu segundo Código de Menores Brasileiro. Este foi inspirado na mesma
doutrina do anterior, inaugurada em 1927, embora nesse período outros países já
tivessem iniciado uma outra concepção, representada pela Declaração dos Direitos da
Criança de 1924, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e a Declaração
Universal dos Direitos da Criança de 1959.
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23

24
Curiosamente, nesse ano de 1979, a Organização das Nações Unidas (ONU)
instituía, por provocação da Polônia, um grupo ad hoc para percorrer todos os territórios
do planeta, durante 10 anos, visando à construção do texto-base para a Convenção
Internacional dos Direitos da Criança, na perspectiva de avançar a legislação internacional
na direção da Doutrina da Proteção Integral, que veio a ser aprovada na Assembleia Geral
da ONU de 1989.

Mas o que pretendia a Doutrina da Situação Irregular?

A Doutrina da Situação Irregular estabelecia a atuação da Justiça em situações de


abandono, prática de infração penal, desvio de conduta, falta de assistência ou
representação legal, carência material, entre outros. A lei não pretendia a atuação na
prevenção, mas se ocupava do conflito instalado. Calcada em uma concepção
segregacionista em relação à criança e ao adolescente, considerava como conflito com a lei
estar irregular perante a sociedade e o poder público:
Art. 2º Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular
o menor:
I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução
obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de:
a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável;
b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las;
Il - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou
responsável;
III - em perigo moral, devido a:
a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons
costumes;
b) exploração em atividade contrária aos bons costumes;
IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos
pais ou responsável;
V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou
comunitária;
VI - autor de infração penal (BRASIL, Código de Menores, 1979).

Os destinatários das disposições contidas na legislação “menorista” eram apenas


algumas crianças e adolescentes, tão somente aquelas enquadradas em uma hipótese de
situação irregular, então tratadas como objeto de intervenção da Justiça.

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25
A Lei 6.697/79 surgiu em um momento em que a sociedade brasileira e, em especial,
a maioria das pessoas que atuavam na atenção à infância entendiam que o modelo adotado
no país para o atendimento às crianças só havia colecionado sucessivos fracassos, quer
seja no que diz respeito às ações empreendidas pelo poder público, em que as FEBEMs se
constituíam em “carros-chefe”, ou nas ações desenvolvidas pelas Organizações da
Sociedade Civil, impregnadas pelo filantropismo assistencialista. Essa lei foi aprovada em
um contexto de fortes críticas, inclusive internacionais, ao tratamento da questão no Brasil,
sendo uma resposta ainda dentro do contexto do regime militar, que ignorou as discussões
e as propostas que já estavam sendo realizadas, alinhadas às novas concepções de
proteção integral. Dessa forma, em sua vigência, o Código de Menores foi mais objeto de
críticas e contestações do que de apoio e alinhamento pelo conjunto das instituições e das
iniciativas da sociedade.
Por outro lado, o menorismo no Brasil foi invadido por inúmeras iniciativas que
buscavam estabelecer outros parâmetros de atendimento e proteção à infância e à
adolescência, destacando-se projetos como “Alternativas para Atendimento a Meninos e
Meninas de Rua” - cujo processo de mobilização deu origem a uma Organização, o
Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua; as Casas Lares, com o intuito de
reformular o modelo de institucionalização de crianças em pequenas unidades e as
Repúblicas Juvenis, como estratégia para a retirada de meninos e meninas das ruas das
grandes cidades (RIZZINI; PILOTTI, 2009).
Todas as iniciativas nesse período tinham iluminação nos 10 pontos trazidos pela
Declaração Universal dos Direitos da Criança, de 1959, sendo essas as bases para a
discussão do que viria a ser, em 1989, a Convenção Internacional dos Direitos da Criança.
Pode-se inferir que o período de vigência do último Código de Menores (10 anos) foi o
período de efervescência da sua negação, com o amadurecimento da Doutrina da Proteção
Integral.
Até esse período, as ações privadas e públicas de atendimento às crianças
pequenas no Brasil se sustentavam no viés assistencialista e de caráter meramente
compensatório. Inexistia uma política nacional e integrada. Porém, nesse período, ocorreu
uma marcante transformação na concepção sobre a finalidade social da Educação Infantil
enquanto um direito das crianças, ainda que sobre forte influência da vertente do direito
da família cujas mães eram trabalhadoras e que, portanto, deviam portar um direito de 26

assistência aos filhos.

25

26
As questões sociais, políticas e econômicas, amplamente constatadas por diversos
segmentos envolvidos na atenção à criança pequena, fizeram com que ganhasse corpo a
organização de um processo de mobilização das instituições públicas e sociais com vista a
se ter garantida na nova Constituição Federal, em construção, a proteção integral aos
direitos humanos de todas as crianças e os adolescentes, liderados pelo Movimento
Nacional Criança e Constituinte.
Figura 5 – As crianças na Constituinte (Fonte: Plenarinho, Câmara dos Deputados)

No texto constitucional de 1988, ficou estabelecido o atendimento institucional


educacional às crianças, conforme dispõe o artigo 208, inciso IV: “O dever do Estado com
a educação será efetivado mediante a garantia de [...] atendimento em creche e pré-escola
às crianças de zero a seis anos de idade” (BRASIL, Constituição Federal, 1988).
A concepção da criança e do adolescente como sujeitos portadores de direitos
fundamentais foi ampliada no caput do artigo 227 de nossa CF, que convém ser
compreendida em seu valor histórico pela leitura de seu preâmbulo:

Constituição Federal do Brasil

PREÂMBULO
27
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia
Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado
a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a

26

27
segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como
valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem
interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias,
promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
(...)

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,


ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação
dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

Essa conquista histórica foi seguida de diversas iniciativas visando à


regulamentação do artigo 227, reunindo agentes/servidores públicos, profissionais
liberais, educadores, juízes, promotores, defensores, lideranças religiosas e organizações
internacionais em uma grande cruzada nacional para a construção do Marco Legal dos
Direitos da Criança e do Adolescente, inspirados pelo resultado das discussões que viriam
a dar origem ao texto da Convenção Internacional de 1989.
Assim, em 13 de julho de 1990, esse marco legal foi aprovado por unanimidade no
Congresso Nacional, constituindo a Lei n° 8.069 – o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA).

VÍDEO 2

Assista, a seguir, ao vídeo construído em homenagem aos 30 anos do ECA, retratando a


importante conquista representada por sua promulgação. Disponível em:
https://www.cnj.jus.br/agendas/congresso-digital-dos-30-anos-do-estatuto-da-crianca-
e-do-adolescente/.
28
Na sua operacionalidade, nesses 30 anos de vigência, o ECA requereu algumas
alterações na direção de um adequado detalhamento das normas, com vistas a ampliar sua
capacidade de induzir a alteração da realidade vivida por crianças e adolescentes. Dentre
essas alterações destacam-se a lei do direito à convivência familiar e comunitária, também
conhecida como lei da adoção (Lei 12.010/2009), a lei contra maus-tratos (Lei
13.046/2014), o sistema nacional de socioeducação (Lei 12.594/2012) e o marco legal da
primeira infância (Lei 13.257/2016).
2

27

28
A Lei 12.010/2009 foi de suma importância para uma maior efetividade dos
direitos da criança e do adolescente na realidade concreta. Isso porque, no passado, a
adoção de crianças tinha o único objetivo de suprir as vontades e as necessidades do
adotante. Contudo, com o passar do tempo e o desenvolvimento das ideias democráticas,
o interesse do infante foi sendo priorizado no ordenamento jurídico, de modo que,
atualmente, o papel da adoção não é mais o de conceder uma criança a uma família, mas
uma família para uma criança (GHESTI, 2010; RIBEIRO, 2019).
No que tange ao sistema nacional de socioeducação, este representa um grande
avanço também para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes, tendo em
vista que se constitui em uma importante conquista na atenção e na intervenção de
adolescentes autores de atos infracionais. Com o SINASE (Lei 12.594/2012), por meio de
ações articuladas e ações pedagógicas, estabelece-se um potencial para proporcionar a
ressignificação das trajetórias infratoras, visando à não reincidência infracional e à
construção de novos projetos de vida para esses jovens.
A Lei 13.046/2014 contra maus-tratos determina a presença de especialistas em
lugares públicos ou privados que saibam reconhecer suspeitas de maus-tratos.
De acordo com pesquisa “Ocultos à plena luz”, divulgada em 2014 pelo Fundo das
Nações Unidas para a Infância (Unicef), “6 em cada 10 crianças, de 2 a 14 anos de idade, no
mundo, sofrem punições físicas dos cuidadores. Geralmente, o castigo físico vem
acompanhado da agressão psicológica”. Portanto, a implementação dessa lei corroborou e
corrobora para o avanço da efetivação da democracia na realidade, possuindo suma
importância para garantir os direitos das crianças e dos adolescentes no Brasil.
Com essas iniciativas por parte de instituições, segmentos sociais e profissionais,
vem sendo gradativamente pavimentado o caminho para a construção de um passado
marcado por valor, respeito, igualdade de direito e importância pessoal, social e econômica
29
da criança cidadã. A construção dessa via bem estruturada é um enorme desafio e sua
realização tem sido gradativa.
Nessa trajetória, destaca-se o Marco Legal da Primeira Infância, que, para se
estabelecer/detalhar como um conjunto de direitos específicos de um segmento etário da
população de crianças, necessitou de um período de maturação da sociedade e das
instituições sobre as normas gerais da cidadania infantojuvenil.
Levando em conta a regra constitucional da prioridade absoluta, quanto mais tenra
a idade da criança, maior deve ser o nível de prioridade dirigida à atenção das suas

28

29
necessidades e interesses – direitos fundamentais, pois é justamente nos primeiros anos
de vida de uma criança, em função de suas naturais condições de maturações físicas,
psíquicas, biológicas e sociais que elas mais necessitam da atuação dos adultos para fazer
valer o direito de ter direitos. Essa concepção se encaixa perfeitamente na reflexão que
Costa nos trouxe em seu texto sobre a Política de Atendimento, publicado no site Pro-
Menino em dezembro de 2012:

O atendimento aos direitos da criança e do adolescente deve ser


encarado como prioridade absoluta, devido ao fato de esses:
1. não conhecerem suficientemente seus direitos;
2. não terem condições de suprir por si mesmos suas necessidades
básicas,
3. serem pessoas em condição peculiar de desenvolvimento, e,
finalmente,
4. possuírem um valor intrínseco (são seres humanos integrais em
qualquer fase de seu desenvolvimento) e um valor projetivo (são
portadores do futuro de suas famílias, de seus povos e da espécie
humana) (COSTA, 2012).

Uma expressão importantíssima sempre ouvida desse mestre em diversos


momentos é que a implementação da Doutrina da Proteção Integral exige de todos –
gestores, trabalhadores sociais, educadores, autoridades da justiça, defensores dos
direitos da criança e da sociedade como um todo – uma mudança definitiva na maneira de
“ver, pensar e agir” frente a uma criança e ao que ela demanda das providências dos
adultos.

● A PRIORIDADE ABSOLUTA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Por muitos anos, a prioridade absoluta estabelecida nos Art. 227 da CF e Art. 4º do 30
ECA foi considerada como um princípio para efetivação dos direitos da criança e do
adolescente e, mesmo depois de três décadas, ainda são amplamente desconhecidos por
grande parte da população e, por outros, incompreendidos ou mesmo contestados.

Uma nova compreensão tem sido trazida a partir de ações desenvolvidas, por
exemplo, pelo Programa Prioridade Absoluta, promovido pelo Instituto Alana, que difunde
que não se trata de um princípio, mas de uma regra. Destaca-se, ainda, que em nenhum
outro trecho da CF se fala em prioridade absoluta. Essa visão convoca a necessária
mobilização para o cumprimento de nossa Constituição Cidadã, que, magistralmente,

29

30
reconhece que nada é mais importante para uma nação do que cuidar, com absoluta
prioridade, dos cidadãos crianças, adolescentes e jovens.
Além disso, a regra da prioridade absoluta, na CF (art. 227) e no ECA (art.4º), iguala
e nomina quem deve cumpri-lo: “...é dever da família, (comunidade) sociedade do poder
público garantir com absoluta prioridade a efetivação dos direitos...”. Para quem lê o caput
desses dois artigos, não resta dúvida de que todos, absolutamente todos, devem garantir
com absoluta prioridade a efetivação dos direitos. Trata-se de uma responsabilidade de
todos, uma responsabilidade compartilhada entre a família, a sociedade e o Estado.

Figura 2 – Cartaz do Programa Prioridade Absoluta (Fonte: Instituto Alana, 2018)

.
Diante, então, da realidade repleta de tradições que se organizam de forma avessa
(contrária do lado direito), prevalecendo o absolutismo das velhas prioridades, o que
fazer? A tentativa de resposta exige resgatar a tríade destacada por Antônio Carlos
Gomes: é preciso promover mudanças na forma de ver, pensar e agir em relação às
crianças. Não é impossível, porém pouco provável, que se possa atuar priorizando a
efetivação dos direitos de crianças, agindo sob a égide daquelas tradições que não
conseguem reconhecer o valor humano e a condição especial, peculiar, singular das 31
pessoas nessa faixa de idade.
Prosseguindo nos ditames legais, é preciso resgatar a amplitude estabelecida na
legislação sobre o que compreende a regra da prioridade absoluta. Isso fica expresso no
Art. 4º do ECA, parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância
pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas
com a proteção à infância e à juventude. (BRASIL, Estatuto da Criança e
do Adolescente, 1990, art. 4º)

30

31
Então, se levarmos em conta o que a ciência e as boas práticas de políticas públicas
produziram no Brasil e no mundo, tão logo surge uma vida: a uma criança deve ser
reservado o melhor que o poder público e a sociedade têm para garantir o seu pleno
desenvolvimento. Embora não exista hierarquia na destinação de recursos específicos na
efetivação da cidadania dessa ampla faixa que compreende crianças e adolescentes, é
certo que quão mais cedo se puder atender a plenitude de direitos, demandas e
necessidades, menos se terá o que compensar nos anos vindouros.

● O Melhor Interesse da Criança

Muitas vezes, não é fácil conciliar as necessidades e os interesses dos vários


titulares de direitos, encontrando-se a criança frequentemente em meio a disputas de
interesses dos adultos. Nesse contexto, em consequência da evolução normativa, é preciso
ter um critério para balizar a tomada de decisões. Esse critério é: “o melhor interesse da
criança” ou “interesse superior da criança”.
Esse critério balizador não está explícito na CF nem no ECA, mas respalda-se
claramente na Convenção Internacional dos Direitos da Criança e do Adolescente,
ratificada no Brasil com a promulgação do Decreto Legislativo nº 99.710/90. O Decreto
torna norma legal todos os princípios e artigos da Convenção e, assim sendo, lá essa
expressão é tácita:

Art. 3.1 - Todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por


instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais,
autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar,
primordialmente, o interesse maior da criança". (ONU/UNICEF, 1989)
32
Nesta trajetória de avanços legislativos, o Marco Legal da Primeira Infância, por sua vez,
inscreve este critério na lei:

Art. 4º As políticas públicas voltadas ao atendimento dos direitos da


criança na primeira infância serão elaboradas e executadas de forma a:
I - atender ao interesse superior da criança e à sua condição de sujeito
de direitos e de cidadã (...) (BRASIL, Lei 13.257/2016)

Para alguns autores, como Gonçalves (2020), resta a necessidade de definição do


sentido exato do melhor interesse, que não é de fácil apreensão e sujeito a interpretações
controversas. Na CF e no ECA, tem-se o direito de liberdade, o direito ao respeito e
dignidade às crianças e aos adolescentes, além do direito de participação, de ser ouvido

31

32
nas situações que lhes dizem respeito e que envolvem possíveis conflitos aos seus
interesses.
A menoridade criminal e civil e a ausência de condição de defender, administrativa
ou judicialmente, os seus interesses, não anula o direito de crianças e adolescentes se
manifestarem em qualquer situação, administrativa ou judicial, no que diga respeito aos
seus direitos.
(...) a participação da criança e do adolescente no processo de decisão
sobre seu melhor interesse afigura-se essencial e obrigatória, em
observância aos valores positivados pelo legislador e, em especial, para a
concretização da dignidade que se realiza pela concepção da criança
como sujeito de direito e não apenas como objeto de proteção
(GONÇALVES, 2020).

Esse direito, critério e condição de efetivação são ainda mais detalhados no Marco
Legal da Primeira Infância, quando, em seu artigo 4º, prevê que também se deve incluir a
participação da criança – mesmo na primeira infância – na definição das ações que lhe
digam respeito, em conformidade com suas características etárias e de desenvolvimento.
Essa é a forma de “promover sua inclusão social como cidadã”, reconhecendo-se que a
participação da criança e sua escuta requerem a atuação de profissionais qualificados em
processos de escuta adequados às diferentes formas de expressão infantil (Lei
13.257/2016).

● A RESPONSABILIDADE COMPARTILHADA
33
No caso dos direitos assegurados a todas as crianças brasileiras pelo Art. 227 da
CF, cabe ao Estado, à Sociedade e à Família o dever de cumpri-los. Trata-se, assim, de uma
responsabilidade compartilhada. Ao contrário da doutrina anterior, que responsabilizava
apenas as famílias pelas condições das crianças e dos adolescentes, as novas disposições
vêm trazer a responsabilidade de toda a sociedade, assim como do Estado, no cuidado e na
atenção à infância e à adolescência.
Assim, cada um possui seu papel para efetivar os direitos constitucionais,
estatutários e do Marco Legal da Primeira Infância. Este, mais ainda, prevê também a
responsabilidade do setor empresarial, por meio do “conceito de responsabilidade social e
investimento social privado” (BRASIL, Marco Legal da Primeira Infância, 2016, art. 12). No

32

33
entanto, para exercer a responsabilidade é necessário ter conhecimento dela e de como
exercê-la.

Você sabia?

Segundo pesquisa do Instituto Datafolha, “oitenta e um por cento (81%) dos brasileiros não
se consideram informados o suficiente sobre os direitos das crianças previstos na
Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)” (DATAFOLHA;
INSTITUTO ALANA, 2013).

Neste sentido, o Marco Legal da Primeira Infância buscou aprimorar no ECA o


dispositivo para promover a todos o conhecimento sobre os direitos das crianças e
adolescentes, inclusive para as crianças na primeira infância:

Art. 36. A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 , passa a vigorar acrescida


do seguinte art. 265-A:
“ Art. 265-A. O poder público fará periodicamente ampla divulgação dos
direitos da criança e do adolescente nos meios de comunicação social.
Parágrafo único. A divulgação a que se refere o caput será veiculada em
linguagem clara, compreensível e adequada a crianças e adolescentes,
especialmente às crianças com idade inferior a 6 (seis) anos.” (Lei
13.257/2016, art. 36)

Depois de percorrer todas essas informações consistentes do ponto de vista


normativo e doutrinário, pode-se fazer uma pausa para refletir sobre os efeitos dessas 34
conquistas na realidade brasileira e formular alguns questionamentos. Retome o texto, se
necessário, e se pergunte:

● Qual a minha percepção sobre esse sujeito denominado criança?


● Que condutas, atitudes e disposição revelam o meu comportamento perante esse
sujeito?
● Como tenho percebido minha responsabilidade sobre a realidade que lhes é
ofertada cotidianamente?
● Percebo-me responsável, de alguma forma, por todas as crianças, não apenas pelos
meus filhos?
Então, a que conclusões chegou?

33

34
É certo que leis, normas e regras, por si, não alteram a realidade, senão pelo seu uso
cotidiano. Isso exige uma mudança interna, que vai do particular/individual para o
geral/coletivo. Exige aceitação e reconhecimento da maneira como temos agido no
particular e no geral e, mais ainda, percepção do que fazemos sob a influência de velhas
tradições – aquelas que ignoram a condição de igualdade, respeito, dignidade que as
crianças portam naturalmente na sua existência.
Para que o novo se estabeleça como real, várias transformações são necessárias,
iniciando pela percepção de que o que se tinha precisa ser alterado e aquilo de que se
dispõe são instrumentos/ferramentas para a construção do novo. Então? Fazemos o novo
– a nova realidade da cidadania da criança, usando as velhas tradições ou introduzindo
novas tradições? Percebe-se, inclusive, que, com o advento do dever constitucional,
algumas tradições foram construídas na direção da negação da responsabilidade, dando
origem ao chamado “encaminhamento”, ou seja, a velha e conhecida transferência de
responsabilidade.

Para saber mais:

● Cartilha Primeira Infância é Prioridade Absoluta, Instituto Alana. Disponível em:


https://prioridadeabsoluta.org.br/wp-content/uploads/2017/11/cartilha_primeira-
infancia.pdf.
35
● DIDONET, V. Trajetória dos direitos da criança no Brasil – de Menor e Desvalido a Criança
Cidadã, Sujeito de Direitos. Em: Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. Câmara
dos Deputados: Centro de Estudos e Debates Estratégicos (e-book), 2016, p. 60-75.
Disponível em: https://www2.camara.leg.br/a-
camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-do-marco-legal-da-primeira-
infancia.

Referências Bibliográficas

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institucional de assistência e proteção aos menores. 1989. Dissertação (Mestrado em Sociologia) –
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Departamento de Sociologia, USP, São Paulo.

ALVAREZ, M.C. Bacháreis, criminologistas e juristas. São Paulo: IBCCrim, 2003.


BRASIL. Constituição Federal, de 5 de outubro 1988. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 16 set. 2020.

34

35
BRASIL. Lei 6.697, de 10 de outubro de 1979. Código de Menores. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/L6697impressao.htm. Acesso em: 16 set.
2020.

BRASIL. Lei 8069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. 13 de julho 1990.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 16 set. 2020.

BRASIL. Lei 13.267, de 8 de março de 2016. Marco Legal da Primeira Infância. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2016/Lei/L13257.htm#:~:text=1%C2%BA%20Esta%20Lei%20estabelece%20princ%C3%
ADpios,e%20diretrizes%20da%20Lei%20n%C2%BA. Acesso em: 16 set. 2020.

CIFALI, A. C. As disputas pela definição da justiça juvenil no Brasil: atores, racionalidades e


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Rio Grande do Sul. Disponível em: http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/8884. Acesso em: 20
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COSTA, A. C. G. da. A condição peculiar da pessoa em desenvolvimento. Fundação Telefônica Vivo,


2016. Disponível em:
http://fundacaotelefonicavivo.org.br/promenino/trabalhoinfantil/colunistas/a-condicao-peculiar-
da-pessoa-em-desenvolvimento/. Acesso em: 15 set. 2020.

DATAFOLHA; INSTITUTO ALANA. Pesquisa Legislação sobre os Direitos das Crianças. 2013.
Disponível em: https://prioridadeabsoluta.org.br/wp-content/uploads/2014/07/pesquisa_data-
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DEL PRIORI, M. História da criança no Brasil. In: PASSETI, E. As crianças brasileiras: um pouco de
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GHESTI, I. Assim caminha a Adoção... o lento processo de reconhecimento de crianças e adolescentes


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interprofissional: Direito, Psicologia, Psiquiatria, Serviço Social e Ciências Sociais na prática jurisdicional.
Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2010, pp. 85-104.
36
GONÇALVES, C. de J. M. Breves Considerações sobre o Princípio do Melhor Interesse da Criança
e do Adolescente. 2020. Disponível em:
http://www.editoramagister.com/doutrina_23385195_BREVES_CONSIDERACOES_SOBRE_O_P
RINCIPIO_DO_MELHOR_INTERESSE_DA_CRIANCA_E_DO_ADOLESCENTE.aspx. Acesso em: 16
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NETO, J. C. de S. História da Criança e do Adolescente no Brasil. Revista Unifeo, revista semestral


do Centro Universitário FIEO – ano 2, n. 3 (2000).

RIBEIRO, G. B. da S. Evolução do Processo Adoção no Brasil, 2019. Disponível em:


https://ambitojuridico.com.br/cadernos/eca/evolucao-do-processo-adocao-no-brasil-
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RIZZINI, I. O século perdido: raízes históricas das políticas públicas para a infância no Brasil. São
Paulo: Editora Cortez, 2007.

RIZZINI, I.; PILOTTI, F. A Arte de Governar crianças: a história das políticas sociais, da legislação e
da assistência à infância no Brasil. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2009.

35

36
SARAIVA, J. B. C. Adolescente em conflito com a lei. Da indiferença à proteção integral. Uma
abordagem sobre a responsabilidade penal juvenil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.

SÊDA, E. Construir o passado ou como mudar hábitos, usos e costumes tendo como instrumento
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ONU/UNICEF. Convenção Internacional dos Direitos da Criança. 1989. Disponível:


https://www.unicef.org/brazil/convencao-sobre-os-direitos-da-crianca. Acesso em: 16 set. 2020.

VERONESE, J. R. P. Estatuto da Criança e do Adolescente – 30 anos – entre avanços e desafios.


Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2020.

37

36

37
Aula 2: A Era dos Direitos Positivos: esforço histórico
do Marco Legal da Primeira Infância
Na trajetória de desenvolvimento dos direitos da criança no Brasil, você está sendo
convidado a mobilizar diversos conhecimentos, buscar saberes especializados e integrar
redes intersetoriais para contribuir na implementação de uma lei inédita no mundo, que é
o Marco Legal da Primeira Infância. Esta nova legislação busca reforçar as conquistas
anteriores construídas especialmente no Artigo 227 da Constituição Federal e no Estatuto
da Criança e do Adolescente, ancorados na Convenção sobre os Direitos da Criança.
Parte-se da compreensão de que ao se promover atenção específica no começo da
vida se oportuniza com mais plenitude o desenvolvimento como um todo, possibilitando
de fato a cidadania na infância. De fato, todos passam pela primeira infância, esta fase
impacta a adolescência, a juventude, a vida adulta e a terceira idade.
O Marco Legal da Primeira Infância compõe-se de 17 artigos específicos e outros
que alteram outras leis, trazendo maior visibilidade às crianças na primeira infância:

1º Esta Lei estabelece princípios e diretrizes para a formulação e a


implementação de políticas públicas para a primeira infância em atenção
à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no
desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do ser humano, em
consonância com os princípios e diretrizes da Lei nº 8.069, de 13 de julho
de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) ; altera a Lei nº 8.069, de
13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente); altera os arts.
6º, 185, 304 e 318 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941
(Código de Processo Penal) ; acrescenta incisos ao art. 473
da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei
nº 5.452, de 1º de maio de 1943 ; altera os arts. 1º, 3º, 4º e 5º da Lei nº
11.770, de 9 de setembro de 2008 ; e acrescenta parágrafos ao art. 5º
da Lei nº 12.662, de 5 de junho de 2012 . (BRASIL, 2016, Marco Legal da
Primeira Infância, Lei 13.257).

Disto se observa que as crianças brasileiras contam agora com uma lei que
reconhece seu direito ao desenvolvimento integral, desde o início da vida. Com este
objetivo, o Marco Legal da Primeira Infância estabeleceu princípios e diretrizes para a

37

38
formulação e a implementação de políticas públicas voltadas às crianças de 0 a 6 anos no
País.

Art. 4º As políticas públicas voltadas ao atendimento dos direitos da


criança na primeira infância serão elaboradas e executadas de forma a:
I – Atender ao interesse superior da criança e à sua condição de sujeito
de direitos e de cidadão;
II – Incluir a participação da criança na definição das ações que lhe digam
respeito, em conformidade com suas características etárias e de
desenvolvimento;
III – respeitar a individualidade e os ritmos de desenvolvimento das
crianças e valorizar a diversidade da infância brasileira, assim como as
diferenças entre as crianças em seus contextos sociais e culturais;
IV – Reduzir as desigualdades no acesso aos bens e serviços que atendam
aos direitos da criança na primeira infância, priorizando o investimento
público na promoção da justiça social, da equidade e da inclusão sem
discriminação da criança;
V – Articular as dimensões ética, humanista e política da criança cidadã
com as evidências científicas e a prática profissional no atendimento da
primeira infância;
VI – Adotar abordagem participativa, envolvendo a sociedade, por meio
de suas organizações representativas, os profissionais, os pais e as
crianças, no aprimoramento da qualidade das ações e na garantia da
oferta dos serviços;
VII – articular as ações setoriais com vistas ao atendimento integral e
integrado;
VIII – descentralizar as ações entre os entes da Federação;
IX – Promover a formação da cultura de proteção e promoção da criança,
com apoio dos meios de comunicação social.
Parágrafo único. A participação da criança na formulação das políticas e
das ações que lhe dizem respeito tem o objetivo de promover sua
inclusão social como cidadã e dar-se-á de acordo com a especificidade de
sua idade, devendo ser realizada por profissionais qualificados em
processos de escuta adequados às diferentes formas de expressão
infantil (BRASIL, 2016)

Ao trazer o foco para um momento da vida em que ações podem ser promovidas
mais oportunamente e com mais intencionalidade antes que o agravo ou a violação já
tenham ocorrido, com vistas à promoção do desenvolvimento humano integral da pessoa,
podemos considerar que estamos diante da oportunidade de construção de uma Era de
Direitos Positivos.

38

39
1.2.1 As infâncias, as crianças e a era do direito

Prestem atenção no que eu digo,


Pois eu não falo por mal:
Os muitos adultos que me perdoem,
Mas infância é sensacional!...
...Lá no seu tempo de infância,
Será que não foram felizes?
Mas se tudo o que fizeram
Já fugiu de sua lembrança,
Fiquem sabendo o que eu quero:
Mais respeito, eu sou criança!
Pedro Bandeira

Todos profissionais que estão participando deste curso devem ter acesso a
conhecimentos inerentes às infâncias e vivências junto a crianças, a começar da própria
criança que já fomos um dia.
Como podemos efetivamente garantir uma atuação que supere o senso comum,
que não se restrinja apenas ao atendimento das necessidades básicas imediatas das
crianças, mas que as levem a viverem experiências promotoras de desenvolvimento
humano integral, a conhecerem e a explorarem os espaços sociais em que vivem, de
maneira a apropriarem-se de referências cognitivas, afetivas e sociais para – em muitos
casos – superarem, com o apoio dos adultos, as condições de vulnerabilidade em que
muitas vezes se encontram? E a sentirem-se valorizadas em toda sua riqueza enquanto ser
humano único e protagonista de sua própria história, em seu contexto cultural igualmente
próprio e de valor intangível? Em uma Nação que se dispõe a ser “dos filhos deste solo, mãe
gentil”?
O ponto de partida pode ser ter a clareza das concepções de infâncias e de crianças
que permeiam os diversos contextos em que cada um atua e então fazer prevalecer
concepções que se sustentam no reconhecimento das crianças como sujeitos de direitos,
cidadãs.
A perspectiva que se apresenta é de superação da visão tradicional das crianças
como receptáculos vazios, vistas como tábulas rasas ou como devir (NASCIMENTO, 2008).
Essa perspectiva manteve-se presente nos processos formativos durante muitas décadas,
mas os contributos da Sociologia da Infância (CORSARO, 2002; DELGADO; MÜLLER,
2005; PINTO; SARMENTO, 2005) tem auxiliado na superação dessa visão reduzida sobre

39

40
as infâncias e as crianças. Apresenta novos conceitos, a partir de perspectivas teóricas que
reconhecem que:

A concepção de infância singular vai ganhando contornos diferentes


quando conseguimos compreendê-la como categoria social, categoria
humana, que é um período de vida de cada um – de 0 a mais ou menos 12
anos de idade – e que, portanto, assume uma perspectiva plural –
infâncias – que pode se constituir de diversas formas, a depender do
contexto social e cultural em que se concretiza (ALMEIDA, 2016. p. 135)

Esquematicamente, essa mudança de perspectiva pode ser assim esboçada:

Categoria Categoria da
INFÂNCIA social história
geracional humana

Período da
INFÂNCIAS vida (+- 0 a 12
anos)

Essa nova configuração e reconhecimento da pluralidade das infâncias são


substratos importantes para o desenvolvimento de ações de dimensão nacional,
envolvendo profissionais que exercem papéis relevantes no reconhecimento dos direitos
das crianças.
O reconhecimento social das crianças gera uma mudança de olhar para o papel que
desempenham na sociedade, na construção de seus saberes, suas culturas e nas relações
com seus pares e adultos. À medida em que as valorizamos, permitimos que as mesmas
participem ativamente do meio em que vivem, elas podem, inclusive, assumir papel ativo
na explicitação das contradições sociais, já que, muitas vezes, encontram-se expostas e
vulneráveis a essas contradições.
O olhar das crianças permite revelar fenômenos sociais que o olhar dos
adultos deixa na penumbra ou obscurece totalmente. Assim, interpretar
as representações sociais das crianças pode ser não apenas um meio de
acesso à infância como categoria social, mas às próprias estruturas e
dinâmicas sociais que são desocultadas no discurso das crianças. (PINTO
e SARMENTO,1997, p. 25)

40

41
O reconhecimento do protagonismo social das crianças dá-se exatamente quando
as incluímos em seus contextos de vida, valorizamos e respeitamos os seus discursos e suas
ações e nos dispomos a apoiá-las em seu desenvolvimento, considerando sua centralidade
e superior interesse. É importante reconhecê-las como cidadãs, sujeitos de direitos, seres
pensantes, ativos, criativos e capazes. Dessa maneira, poderemos reconhecer a
pluralidade das concepções de crianças que vivem as diversas infâncias, conforme
expresso neste esquema:

Sujeito de
CRIANÇA Cidadã
direitos

Produtora de
CRIANÇAS cultura e
conhecimento

A apropriação dessas concepções é fundamental para que possamos dimensionar


o espaço social de validação e implementação das políticas públicas para a primeira
infância. As estratégias devem ser estabelecidas em conjunto para se qualificar
instituições e profissionais das diversas áreas (educação, saúde, assistência social, direitos
humanos, cultura, justiça, entre outros) e setores, em âmbito nacional, a fim de se
promover a garantia dos direitos das crianças, especialmente das que se encontram na
primeira infância, período determinante para a formação e desenvolvimento humano. Não
se pode perder de vista que urge a necessidade de uma mobilização nacional para se
construir estratégias conjuntas de aprimoramento das atuais práticas e processos do
sistema de justiça e da rede de serviços.
Importa ressaltar que as crianças, na era dos direitos positivos, estão respaldadas
há 30 anos pela entrada em vigor da Doutrina de Proteção Integral e agora, com o Marco
Legal da Primeira Infância, com uma doutrina de promoção do desenvolvimento integral
desde o início da vida. Mais que proteção, elas tem direito a ações que impulsionem seu
desenvolvimento, não apenas que não o deixem desprotegido. E levem em consideração a
razão de ser de sua prioridade.

41

42
SEU NOME É HOJE

Somos culpados de muitos erros e faltas


porém nosso pior crime é o abandono das crianças
negando-lhes a fonte da vida
Muitas das coisas de que necessitamos podem esperar.
A criança não pode
Agora é o momento
em que seus ossos estão se formando
seu sangue também o está
e seus sentidos estão se desenvolvendo
A ela não podemos responder “amanhã”
Seu nome é hoje.

Gabriela Mistral, poetiza chilena

Esta poesia é muito profunda, pois além de nos remeter ao fato de que o tempo da
criança é hoje, também explicita que a criança é a protagonista do seu tempo e da sua
História, a quem nos cabe ser afetuosamente responsivos, encorajadores, apoiadores,
educadores, cuidadores, inspiradores. Por isso, o Marco Legal da Primeira infância nos traz
a importância da escuta e o princípio do respeito ao ritmo de desenvolvimento de cada
criança (Lei 13.257/2016, artigo 4º, III). Não nos cabe impor nosso ritmo de
desenvolvimento, mas responder diante de sua prontidão e redimensionar o papel do
adulto, da família e da comunidade na interação com a criança enquanto pessoa hoje, não
apenas no futuro.
§ 1º Os programas que se destinam ao fortalecimento da família no
exercício de sua função de cuidado e educação de seus filhos na primeira
infância promoverão atividades centradas na criança, focadas na família
e baseadas na comunidade. (BRASIL, 2016, Lei 13.257/2016, art. 14).
A abordagem positiva não pode prescindir da atuação dos diversos profissionais,
que se disponham a assumir papel ativo na implementação da regra da prioridade absoluta,

42

43
de maneira a promover processos sensíveis às necessidades e interesses das crianças na
primeira infância, sem nunca deixar de promover as oportunidades possíveis para seu
desenvolvimento integral.

Art. 3º A prioridade absoluta em assegurar os direitos da criança, do


adolescente e do jovem, nos termos do art. 227 da Constituição Federal e
do art. 4º da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 , implica o dever do
Estado de estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a
primeira infância que atendam às especificidades dessa faixa etária,
visando a garantir seu desenvolvimento integral. (BRASIL, 2016, Lei
13.257/2016)

A Frente Parlamentar para a Primeira Infância tem


atuado na perspectiva dos direitos positivos. Não apenas se ocupou de promover a
capacitação de parlamentares e gestores a partir de um Programa de Liderança Executiva
em Desenvolvimento da Primeira Infância, de propor e aprovar o Marco Legal da Primeira
Infância, permanece proativamente envolvida em sua implementação.

43

44
Todas essas iniciativas contribuem para dar visibilidade ao Marco Legal da
Primeira Infância e, especialmente, às ações que devem ser empreendidas para sua
implementação, de tal modo que cumpra seu papel, levando os diversos atores sociais a
deixarem o campo do discurso e a tomarem decisões efetivas para a garantia dos direitos
das crianças.

Saiba mais sobre o papel da Frente Parlamentar da Primeira Infância ouvindo o áudio
que se segue e consultando o site: https://frentedaprimeirainfancia.com.br/blog/

Objetivos da Frente Parlamentar da Primeira Infância

https://www.camara.leg.br/radio/programas/559554-leandre-pv-pr-frente-
parlamentar-em-defesa-da-primeira-infancia/

A Rede Nacional Primeira Infância (RNPI) constituiu um conjunto de


entidades civis e governamentais organizadas em rede e também trabalha como porta-voz
das crianças na primeira infância. Além do esforço em traduzir a atenção que elas
merecem, por meio da formulação do Plano Nacional pela Primeira Infância, em 2010, que
em 2020 foi revisto e atualizado, esteve ativa durante todo processo de construção do
Marco Legal da Primeira Infância.
Além de estar em processo de proposição da versão atualizada do Plano Nacional
pela Primeira Infância, agregando novos temas para as ações finalísticas e estendendo sua
vigência até 2030, a Rede Nacional Primeira Infância está lançou no dia 8 de outubro de de
2020 o Observatório de Implementação do Marco Legal da Primeira Infância (acessível na
Plataforma OBSERVA, em: mpiobserva.org.br).

44

45
De fato, não se pode falar em uma legislação de promoção de direitos sem um
processo de monitoramento de sua implementação (PAES DE BARROS, COUTINHO,
MENDONÇA, 2016). As crianças vivem no mundo real, de modo que a lei de fato existe
para elas quando se traduz em ações concretas.

Saiba mais sobre a atuação da Rede Nacional Primeira Infância e também sobre as
Redes Estaduais da Primeira Infância em: http://primeirainfancia.org.br/

O Sistema de Justiça ingressou de forma significativa no reconhecimento da importância


do Marco Legal da Primeira Infância, realizando com a sociedade civil e o apoio do
Ministério da Justiça o Seminário: “Justiça Começa na Infância: A Era dos Direitos Positivos”,
em 18.set.2020, reunindo a alta cúpula do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria
Pública em prol da implementação da regra da prioridade absoluta desde o começo da vida.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=gd1llzC9YNE

45

46
E em abril de 2020 foi lançado o Pacto Nacional pela Primeira Infância, por
iniciativa do Conselho Nacional de Justiça, com base no Projeto “Justiça começa na Infância:
Fortalecendo a atuação do Sistema de Justiça na promoção do desenvolvimento humano
Integral”, do qual o presente curso é uma das ações.

Para saber maiores detalhes, acesse o Portal do Pacto Nacional pela Primeira
Infância: https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/pacto-nacional-pela-primeira-
infancia/

1.2.2. Como o Marco Legal da Primeira Infância coloca o Brasil na Era dos Direitos
Positivos?

De acordo com Paes de Barros e colegas (2016), no Brasil, tradicionalmente,


“temos monitorado aquilo que podemos chamar de direitos negativos, ou seja, temos
cuidado para que ninguém impeça as crianças de se desenvolverem (...), ou seja, ninguém
pode praticar uma violência contra a criança” (p. 197). Contudo, com o Marco Legal da
Primeira Infância, “mais do que não atrapalhar, ou deixar de atrapalhar o desenvolvimento
da criança, queremos também interagir de uma maneira afetiva e construtiva com ela (...),

46

47
queremos começar a promover, a ajudar. Isso é o que chamamos de direito positivo”
(idem).
Nessa perspectiva, compreendemos a mudança de paradigma representada pelo
Marco Legal da Primeira Infância como a passagem da era dos direitos negativos, tais como
não morrer prematuramente, não passar fome, não ser vítima de maus tratos ou
negligência para a era dos direitos positivos, tais como o direito ao brincar, a ser estimulada
de acordo com sua faixa etária, a desenvolver seu potencial físico, emocional, social e
cognitivo.
Esta distinção também representa a passagem de ações como proteger, defender,
prevenir, para ações mais construtivas como promover oportunidades para se
desenvolver, promover condições para poder efetivamente usufruir das oportunidades
oferecidas e estimular o aproveitamento das oportunidades disponíveis (BARROS, 2018).
Outra mudança de paradigma nesta concepção é a compreensão do recurso
destinado às ações para primeira infância como “investimentos”, não como “gastos”.
Finalmente, Paes de Barros (2018) aponta que um dos fatores que geram
diferenças entre países é justamente que os mais enriquecidos são os que investem nos
direitos positivos e assim se fortalecem. Enquanto os países com economias menos
sustentáveis despendem muitos gastos com direitos negativos, os quais não oferecem
significativo retorno e desenvolvimento nem para os indivíduos nem para a Nação. O
processo de criar mecanismos para investimento na atenção à primeira infância coloca o
Brasil na era dos direitos positivos, conforme se observa:

47

48
48

49
1.2.3 As crianças e o Marco Legal da Primeira Infância: história e políticas

Dós filhos deste solo, és Mãe Gentil,


Pátria amada, Brasil...
Trecho do Hino Nacional Brasileiro

Um breve histórico

A Lei do Marco Legal da Primeira Infância – Lei º 13.257 foi aprovada em 08 de


Março de 2016, e resultou da apresentação de Projeto de Lei 6.998/2013, de autoria do
Deputado Osmar Terra e outros membros da Frente Parlamentar da Primeira Infância,
propondo atualização do Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, assim como de
outras leis para dispor sobre a primeira infância. Sua tramitação se iniciou em dezembro
de 2013, contou com seminários internacionais, seminários regionais, audiências públicas
e reuniões técnicas, promovendo uma interlocução do parlamento com as diversas esferas
do governo, sociedade civil, especialistas e universidades
Esta lei tem grande relevância na busca da promoção dos direitos das crianças de
até seis anos de idade, que hoje somam mais de 20 milhões no Brasil. Enseja o
estabelecimento de princípios e diretrizes importantes para formulação e implementação
de políticas públicas para a primeira infância, em atenção à especificidade e à relevância
dos primeiros anos de vida no desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do ser
humano. Além de criar um campo específico para a primeira infância, em seus primeiro
dezessete artigos, na sequência a Lei do Marco Legal aperfeiçoa as seguintes legislações,
trazendo maior visibilidade ao cuidado necessário na primeira infância em diferentes
matérias, que serão objeto de atenção ao longo do curso:

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ECA
Lei 8.069/1990

POLÍTICAS Código de
PÚBLICAS Processo Penal
PARA A
PRIMEIRA Dec.-Lei
INFÂNCIA 3.689/1941

Marco Legal da
Primeira Infância
Lei 13.257/2016

Declaração de
CLT
Nascido Vivo
Dec.-Lei
Lei
5.452/1943
12.662/2012

EMPRESA
CIDADÃ
Lei
11.770/2008

Principais inovações instituídas pelo Marco Legal da Primeira Infância:

✓ A Política Nacional Integrada para atendimento aos direitos da criança na primeira


infância;
✓ A criação de comitês intersetoriais específicos, com a participação dos Conselhos
de Direitos da Criança e do Adolescente, nos diversos níveis de governo;
✓ O estabelecimento de um conjunto de áreas prioritárias para as políticas públicas
voltadas à primeira infância, que devem atuar de forma integrada;
✓ A criação/adequação de cursos especializados voltados à qualificação técnica dos
profissionais que atuam na execução das políticas e programas destinados à
primeira infância;
✓ A instituição de mecanismos de monitoramento e coleta sistemática de dados,
avaliação periódica dos elementos que constituem a oferta dos serviços à criança
e divulgação dos seus resultados;
✓ A divulgação do orçamento investido na primeira infância;
✓ A criação de programas governamentais de apoio às famílias para promoção do
desenvolvimento na primeira infância, considerando a visita domiciliar e a
intersetorialidade como estratégicas.

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51
✓ O apoio à participação das famílias nas "redes de proteção e cuidado" da criança
em seus contextos sociofamiliar e comunitário visando, entre outros objetivos, a
formação e o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, com
prioridade aos contextos que apresentem riscos ao desenvolvimento da criança e
às famílias em condição de vulnerabilidade;
✓ A necessidade de ampliação da oferta de educação infantil de qualidade para
crianças de 0 (zero) a 3 (três) anos, assim como a criação de espaços lúdicos que
propiciem o bem-estar, o brincar e o exercício da criatividade em locais públicos e
privados onde haja circulação de crianças, bem como a fruição de ambientes livres
e seguros em suas comunidades.
✓ A prisão domiciliar em caso de gestantes ou mães cumprindo prisão preventiva, de
modo a não se comprometer as condições de desenvolvimento da criança.
✓ Entre muitos outros dispositivos que propiciam condições positivas para o
desenvolvimento da criança, no momento oportuno.
Trata-se, portanto, de um artefato legal instituído no sentido de promoção de
condições para o desenvolvimento integral da pessoa em sua fase mais oportuna, que é a
primeira infância. Reforça-se que as crianças tem direito a serem tratadas com afetividade,
respeito e estímulos apropriados ao desenvolvimento de todas suas competências.
Deste modo, temos uma lei que nos proporciona melhores concepções e
dispositivos para se efetivar a plena garantia dos direitos da criança, que historicamente
reclama especial atenção do Poder Público e da sociedade civil. Esta ressalta estratégias
desde o planejamento à implementação de ações específicas, voltadas ao atendimento
qualificado das necessidades e interesses das crianças, em um momento tão relevante da
vida e que, por certo, trará repercussões positivas em toda sua existência, assim como na
sociedade como um todo.

Para saber mais:

O processo de debates, fundamentos científicos e práticos que


culminaram com a aprovação do Marco Legal da Primeira Infância pode
ser acessado por meio do e-book produzido junto ao Centro de Estudos
e Debates Estratégicos da Câmara dos Deputados, com apoio do Senado
Federal. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/a-

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52
camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-do-marco-legal-
da-primeira-infancia

VÍDEO 3

Vídeo sobre a Lei do Marco Legal da Primeira Infância, produzido pelo Senado Federal.
Disponível em:https://www.youtube.com/watch?v=jTxb1w7F9jo

Referências Bibliográficas:
ALMEIDA, Ordália Alves de. O Marco Legal da Primeira Infância: quais infâncias, quais crianças?
Em: Caderno de trabalhos e debates da Câmara Federal. Brasília, 2016, p. 133 a 140.

BARROS, Ricardo Paes; COUTINHO, D.; MENDONÇA, R. Monitoramento e Avaliação:


Desenhando e implementando programas de promoção do desenvolvimento infantil com base em
evidências. Em: Brasil. Câmara dos Deputados. Avanços do Marco Legal da Primeira Infância.
Brasília: Cadernos de Trabalhos e Debates do Centro de Estudos e Debates Estratégicos da Câmara
dos Deputados, 2016, p. 133-141.
BARROS, Ricardo Paes. Apresentação realizada na Conferência Internacional "O Poder do
Investimento na Primeira Infância para o Desenvolvimento com Equidade". Brasília: Ministério da
Cidadania, 2018.
BRASIL. Lei 13.257/2016, de 8 de março de 2016. Dispõe sobre as políticas públicas para a
primeira infância e altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do
Adolescente), o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de
1943, a Lei nº 11.770, de 9 de setembro de 2008, e a Lei nº 12.662, de 5 de junho de 2012.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13257.htm, acesso 23 de
setembro de 2020
CORSARO, W. A. A reprodução interpretativa no brincar ao faz-de-conta das crianças. Educação,
Sociedade e Cultura, Porto, Portugal, n.17, p.113-134, 2002.
DELGADO, Ana Cristina C.; MÜLLER, Fernanda. Sociologia da infância: Pesquisa com crianças.
Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n. 91, p. 351-360, Maio/Ago. 2005.
FREEMAN, Michael. Taking Children´s Rights More Seriously. Em: Children, rights and the law. Alston,
P.; Parker, S. Seymour, J. Oxford. Clarendon Press, pp. 52-71.
NASCIMENTO, Claudia T.; BRANCHER, Vantoir Roberto, OLIVEIRA, Valeska F. A Construção
Social do Conceito de Infância: algumas interlocuções históricas e sociológicas. Unijuí: Revista
Contexto e Educação. v. 23 n. 79, 2008.
PINTO, M.; SARMENTO, M.J. (Coord.). As crianças: contextos e identidades. Braga: Centro de
Estudos da Criança, Universidade do Minho, 1997.

52

53
SARMENTO, Manoel J. Gerações e alteridade: interrogações a partir da sociologia da Infância.
Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 26, n. 91, p. 361-78, mai./ago, 2005.

53
0
54
Aula 3: Teorias do Desenvolvimento e a Neurociência da
Primeira Infância

Neste tópico trataremos dos fundamentos e das teorias do desenvolvimento que


justificaram a proposição de uma lei específica para a primeira infância e fornecem as bases
para uma atuação promotora do direito ao desenvolvimento humano integral.
Procuraremos, também, responder às seguintes perguntas:

• Por que a primeira infância merece uma atenção específica?


• Como a genética e o ambiente interagem na formação do ser humano?
• Qual é o principal ingrediente para um desenvolvimento saudável?

Entre os principais pensadores e cientistas que contribuíram para a construção da


ciência do desenvolvimento humano, podemos citar os seguintes:

Figura 1 – Formas de “cuidado” das crianças no século XVII (CANDILIS-HUISMAN, 1997).

➢ No clássico “Emílio: Um Tratado sobre Educação” (1762), Rousseau (1712-1778)


pediu liberdade para o desenvolvimento infantil, pois à época as crianças permaneciam
enfaixadas desde o nascimento até o primeiro ano de vida.
➢ Charles Darwin (1809-1882) ocupou-se do estudo da evolução do comportamento
humano na obra “A Expressão das Emoções no Ser Humano e nos Animais” (1872).
➢ A Psicanálise, criada por Sigmund Freud, trouxe uma teoria da subjetividade (id, ego e
superego), com observação da gênese dos conflitos e da estrutura da personalidade na
vida infantil. Em seus estudos sobre a angústia, destacou o fenômeno da “ansiedade de
separação”, experimentada pela criança quando a mãe se ausentava.
➢ Konrad Lorenz (1903-1989) cunhou o conceito de imprinting, ou estampagem,
observando que todo animal desenvolve uma fixação com o primeiro ser vivo que
encontra ao nascer.

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➢ Harry Harlow (1905-1981) observou, a partir de um experimento com primatas não
humanos, que a necessidade de segurança e afeto sobressaía-se à necessidade de
alimento.
➢ John Bowlby (1907-1990) e Donald Woods Winnicott (1896-1971) desenvolveram a
Teoria do Apego, observando a importância da relação inicial que se desenvolve entre
o bebê e seu cuidador principal – geralmente a mãe. Notaram, ainda, que o vínculo
afetivo, denominado apego, oferece a segurança necessária para a criança explorar o
ambiente e assim aprender, como estabelece o padrão de relacionamentos
subsequentes.
➢ René Spitz (1887-1974) e Françoise Dolto (1908-1988) contribuíram para a
compreensão das correlações entre o desenvolvimento, o apego e o ambiente,
identificando efeitos da situação de privação afetiva, como a depressão anaclítica em
bebês, o hospitalismo e a importância da comunicação com os bebês.
➢ Wilhelm Reich (1897-1957) trouxe a compreensão da autorregulação do
comportamento pela própria criança como importante aspecto de desenvolvimento
humano.
➢ A antropóloga Margaret Mead (1901-1978) iniciou o debate sobre o papel do
aprendizado social na formação da identidade, questionando a crença em
comportamentos instintivos e trazendo a compreensão do papel da cultura no
desenvolvimento humano desde a infância.
➢ Albert Bandura (1925-) iniciou a Teoria Social Cognitiva, ampliando a abordagem
behaviorista para consideração dos aspectos sociais de aprendizado pela imitação.
➢ Henri Wallon (1879-1962) observou que o desenvolvimento motor precede o
cognitivo, enfatizando a importância da afetividade e dos aspectos físicos para a
construção da inteligência. A Teoria de Wallon foi muito importante para os trabalhos
relacionados à psicomotricidade, e ele foi precursor da superação da dicotomia entre
natureza e cultura, ao considerar que “o ser humano é um ser biologicamente social”.
➢ O psicólogo russo Lev Vygotsky (1896-1934) postulou a Teoria Sócio-histórica,
observando que as crianças aprendem ativamente e através de experiências práticas,
e cunhou o conceito de zona de desenvolvimento proximal, que é o espaço entre o que
a criança pode fazer com ajuda e o que ela pode fazer por conta própria.
➢ Interessando-se pela gênese do pensamento, a partir da observação de seus próprios
filhos, Jean Piaget (1896-1990) desenvolveu a Teoria dos Estágios de

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56
Desenvolvimento Infantil (sensório-motor, pensamento operacional, pensamento
formal e formal) e também inaugurou o estudo científico do desenvolvimento moral.
➢ A partir de sua experiência no cuidado de crianças institucionalizadas em Lóczy,
Budapeste, a médica austríaca Emmi Pikler (1902-1984) observou a importância do
movimento livre e do cuidado realizado por figuras de referência para a promoção do
desenvolvimento autônomo da criança. A Abordagem Pikler tem especial relevância
para compreensão da importância do respeito à individualidade e ao ritmo de
desenvolvimento de cada criança.
➢ Ampliando a compreensão de como o contexto influencia o desenvolvimento, Urie
Bronfenbrenner (1917-2005) criou a Teoria Ecológica do Desenvolvimento Humano,
definindo que este é um processo de mudanças e continuidade das características
biopsicológicas dos indivíduos, no curso da vida e das gerações, em função de quatro
elementos que interagem: o processo, a pessoa, o contexto e o tempo (PPCT).

Figura 2 – Esquemas da Teoria Ecológica do Desenvolvimento Humano (Bronfenbrenner)

➢ Após atender cerca de 25 mil crianças, o pediatra do Hospital de Boston, Thomas Berry
Brazelton (1918-2018) elaborou a Teoria dos Momentos Críticos do
Desenvolvimento (Touchpoints), considerando que o período mais decisivo do
desenvolvimento humano seria até os três anos. Ele observou que nessa fase, por um
breve espaço de tempo, o comportamento da criança se desestrutura e, sem
compreender esses processos, muitos pais ou cuidadores também se desestabilizam,

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destacando então a importância de ajudar os pais a entenderem o que acontece com
seus filhos (BRAZELTON, 2002).
➢ Abraham Maslow, em 1943, identificou uma hierarquia de necessidades humanas
básicas que orientam a motivação dos adultos, destacando as necessidades de
segurança e auto-realização.
➢ Seguindo essa inspiração, Brazelton e seu colega Greenspan (2002) buscaram
identificar as Necessidades Essenciais das Crianças para crescer, aprender e se
desenvolver, identificando as seguintes:
• Relacionamentos sustentadores contínuos.
• Proteção física, segurança e regras.
• Experiências que respeitem as diferenças individuais.
• Experiências adequadas ao desenvolvimento.
• Estabelecimento de limites justos, organização e expectativas.
• Comunidades estáveis, amparadoras e de continuidade cultural.

De acordo com esses autores, “a privação emocional pode causar tanto estrago
quanto a privação física e nutricional. Em alguns aspectos, o impacto da privação
emocional é ainda mais devastador devido à dor e à desorganização que ele causa”
(BRAZELTON; GREENSPAN, 2002, p. 179). Mas há intervenções reparadoras, que, por
meio da plasticidade cerebral e da resiliência, podem restaurar o curso do
desenvolvimento. Eles enfatizam, ainda, que “apenas indivíduos bem-alimentados e
educados são capazes de unir-se e abraçar uma ética mais ampla, de humanidade
compartilhada” (BRAZELTON; GREENSPAN, 2002, p.182).

1.4.1 Teorias do Desenvolvimento na perspectiva do ciclo de vida e da Neurociência: a


janela de oportunidades na primeira infância

Com os avanços tecnológicos foi possível realizar pesquisas com neuroimagens,


mensuração da atividade cerebral, análise biomolecular das células e do DNA, Projeto
Genoma e estudos longitudinais. A partir disso, pôde-se observar fenômenos como a
concepção e a vida intrauterina, tão incríveis que podem ser considerados como a
“Odisseia da Vida”.

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VÍDEO 4
Assista ao vídeo “A Odisseia da Vida” para experimentar as novas possibilidades de
conhecimento sobre o processo de geração e nascimento de uma criança, que se tornaram
possíveis a partir dos avanços tecnológicos e científicos. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=TajhWjYGADs>

Com o advento das Neurociências foi possível aumentar o conhecimento sobre o


que se passa no cérebro desde o início da vida, corroborando e aprimorando vários
achados científicos. O investimento científico nesta área foi tão expressivo que a década
de 1990 veio a ser conhecida como a década do cérebro, marcada por um grande
investimento em pesquisas que permitiram compreender melhor a especificidade do
desenvolvimento na primeira infância e perceber que as experiências vividas se inscrevem
nos genes, gerando-se o campo da Epigenética.

Os anos iniciais do desenvolvimento humano estabelecem a arquitetura


básica e a função do cérebro. Esse período inicial de desenvolvimento –
da concepção aos 6-8 anos de idade – afeta o estágio seguinte do
desenvolvimento, assim como os estágios posteriores. Hoje, por meio da
neurobiologia do desenvolvimento, compreendemos melhor como as
experiências no início da vida interferem nessas diferentes fases
(FRASER MUSTARD, 2010).

Embora no Brasil a primeira infância tenha sido consensuada como o período que
vai até os seis anos de idade, em outros países ela vai até os oito anos (FUJIMOTO, 2016).
E na própria primeira infância há períodos ainda mais sensíveis, conhecidos como
Primeiríssima Infância e Estratégia dos 1.000 dias. Cesar Victora, ex-presidente da
Sociedade Internacional de Epidemiologia e professor emérito da Universidade Federal de
Pelotas, destaca um período mais determinante dentro da primeira infância, que são os
1.000 primeiros dias de vida, que vão da gestação até os dois anos de idade.

9 meses x 30 dias + 365 dias + 365 dias = 1.000 dias

“Os primeiros mil dias de vida determinam a saúde e o capital humano do adulto”,
explica Victora (2016). Por capital humano entende-se “a criança atingir a altura para a
qual tem o potencial genético, atingir o nível de inteligência, avançar na escola, ser

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economicamente produtiva como adulto e ter filhos saudáveis também” (idem). Deste
modo, “os primeiros dois anos são muito mais críticos que o terceiro, o quarto e o quinto
ano. São todos importantes, mas o começo da vida é mais crítico ainda” (VICTORA, 2016).
Esta afirmação se dá a partir de estudos longitudinais, nos quais Victora e sua equipe
acompanham o desenvolvimento de grupos de crianças de Pelotas-(RS desde o
nascimento até a vida adulta. Seus primeiros estudos de Coorte iniciaram em 1982 e lhe
permitiram correlacionar diversas variáveis, como aleitamento materno e quociente de
inteligência na vida adulta.

O dado mostra que aquela criança que foi amamentada por mais tempo,
pelo menos por nove meses, tem o QI de 3 a 5 pontos mais alto aos 30
anos de idade. Isso porque o leite materno é essencial para a formação do
cérebro humano. O tipo de ácido graxo que forma a infraestrutura do
cérebro só é encontrado no leite materno (VICTORA, 2016).

Você sabia?

Graças a pesquisas coordenadas pelo cientista brasileiro Cesar Victora, na


década de 1990, milhões de crianças do mundo inteiro tiveram a chance de passar a se
beneficiar do aleitamento materno exclusivo. Além de nutritivo e afetivo, o aleitamento
materno previne a mortalidade por diarreia e tem um efeito de imunização. Isso
aconteceu porque ele revisou as curvas de crescimento que se encontravam nas
Cadernetas de Saúde das crianças. Antes de suas pesquisas, as curvas eram
parametrizadas a partir de uma amostra de crianças americanas, amamentadas
artificialmente, o que fazia os bebês ganharem mais peso em menos tempo. Ao utilizar
essas curvas, os pediatras consideravam as crianças que recebiam aleitamento materno
abaixo do peso, então recomendavam substituir o leite materno pelo leite artificial. Seus
estudos corrigiram esse equívoco e a curva de crescimento por ele construída passou a
ser adotada pela OMS em 142 países. O grande impacto disso revelou-se após
aproximadamente duas décadas e rendeu-lhe a mais importante premiação científica do
Canadá, o Prêmio Gardner, nunca antes concedido a um brasileiro, tornando-o um
potencial candidato à indicação ao Nobel.

Confirma mais detalhes no Portal do Ministério da Educação:


http://portal.mec.gov.br/component/tags/tag/42411

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60
Os avanços das neurociências no campo do desenvolvimento humano na primeira
infância

As Neurociências estudam o sistema nervoso, com ênfase no cérebro, combinando


conhecimentos da fisiologia, anatomia, biologia molecular, psicologia e ciências do
desenvolvimento em geral. O cérebro é considerado o órgão mais importante do ser
humano devido à sua extrema complexidade e ao seu papel preponderante de
coordenação das funções do corpo e da mente. Desde a formação do feto, ele é que
primeiro se desenvolve e se torna o aparato biológico responsável pela consciência, pelas
emoções, pela memória, pela inteligência e pelo comportamento.
Ao mesmo tempo em que é na primeira infância que o cérebro encontra seu maior
desenvolvimento, também é nesta fase que ele é mais vulnerável às influências do
ambiente. Em relação às outras espécies, o ser humano é o que nasce mais dependente de
cuidados, pois seu cérebro termina de se formar após o nascimento – mas é justamente
isso que lhe permitiu um nível maior de evolução, como discutido por Laredo (2016).
Enquanto um primata não humano nasce com um cérebro já em 40% de seu tamanho
quando adulto, o ser humano nasce com um tamanho de aproximadamente 25% (LAREDO,
2016). Mas no período até os sete anos de vida, o cérebro humano alcança
aproximadamente 70% de seu tamanho total (massa cerebral), o que se correlaciona à
formação de sua estrutura e organização. Isso se dá pela formação dos neurônios e das
conexões que se estabelecem entre eles, chamadas de sinapses, que configuram a
arquitetura cerebral. Por isso a cabeça da criança é proporcionalmente maior do que as
demais partes do corpo, que crescem proporcionalmente mais em outros momentos do
desenvolvimento (Figura 3).

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61
Figura 3 – Mudanças nas proporções corporais do 2º mês fetal à idade adulta (AQUINO, 2011).

As pesquisas realizadas no campo das neurociências permitiram observar que a


criança nasce com aproximadamente 100 bilhões de células cerebrais que se formaram no
período gestacional e que nos primeiros anos de vida uma criança realiza de 700 a 1.500
sinapses por segundo.
Por isso a primeira infância é um momento diferenciado, pois nela ocorre o
desenvolvimento das sinapses em uma velocidade e quantidade que não se repetirão em
nenhum outro momento da vida. Aos três anos de idade, a criança apresenta o dobro de
conexões cerebrais que um adulto (SHORE, 1997).

Neurônio Sinapse Mielinização Arquitetura cerebral

Célula cerebral Forma de comunicação Mielina é a substância Rede de neurônios que


responsável por entre as células cerebrais, composta de proteína e se estabelece a partir
transmitir por meio de um espaço gordura que envolve o dos estímulos que
informações do virtual (os neurônios não se prolongamento dos promovem as
cérebro para a tocam). Quando um impulso neurônios (axônios), conexões. O
periferia do corpo, e chega à extremidade do facilitando a condução do desenvolvimento na
vice-versa, por meio prolongamento do neurônio impulso elétrico, arquitetura cerebral na
de impulsos elétricos. (axônio), as vesículas melhorando assim a Primeira Infância pode
É formado por um sinápticas “despejam” comunicação entre os ser comparado à
núcleo e uma neurotransmissores neurônios. A mielinização construção de uma
ramificação, chamada (emissários químicos) na acontece principalmente casa em que as etapas
axônio. fenda sináptica. Difundindo- após o nascimento e pode subsequentes são
se por esta fenda, os ser afetada pela realizadas sobre uma
neurotransmissores desnutrição. fundação sólida.
encontram a membrana do O desenvolvimento da
próximo neurônio e se Durante a primeira arquitetura do cérebro
conectam a receptores infância a criança precisa de uma criança fornece
celulares que despolarizam se alimentar no mínimo de a base para todo
a próxima célula, gerando 3 em 3 horas em função da aprendizado,
um novo impulso elétrico, formação da bainha de comportamento e
que ocorre em mielina (mielinização). saúde futuros.
milissegundos.
Figura 4 – Síntese sobre neurônios, sinapses, mielinização e arquitetura cerebral (ENCICLOPÉDIA
SOBRE O DESENVOLVIMENTO NA PRIMEIRA INFÂNCIA, s/d)

61

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Desenvolvimento sináptico

A arquitetura do cérebro é construída por meio de um processo contínuo que


começa antes do nascimento e continua até a idade adulta. Entre a terceira e quarta
semana da gestação, o cérebro forma as conexões, ou sinapses, dos primeiros neurônios.
Os circuitos cerebrais vão se definindo e construindo a arquitetura cerebral, que será
moldada por algo em torno de 700 a 1.500 sinapses por segundo até os dois anos de vida
da criança. Após esse período de rápida proliferação, na segunda década de vida, as
conexões são reduzidas por meio de um processo chamado poda neural, que permite que
os circuitos cerebrais se tornem mais especializados.
A arquitetura do cérebro é composta por bilhões de conexões entre neurônios
individuais em diferentes áreas do cérebro, que permitem a comunicação rápida entre
neurônios especializados em diferentes tipos de funções cerebrais. As pesquisas indicam
que as conexões que se formam no início fornecem uma base forte ou fraca para as
conexões que se formam posteriormente (CENTER FOR DEVELOPING CHILD, 2013a).

Mensagem básica

O cérebro se alimenta de nutrientes e estímulos, a partir dos quais as crianças


formam sinapses em quantidade e velocidade que não se repetirão em nenhum outro
período da vida. Por isso, as experiências que ela tiver oportunidade de vivenciar na
primeira infância, incluindo a amamentação e os vínculos afetivos de confiança,
acompanhados de cuidados responsivos, serão a base de sua arquitetura cerebral
saudável, isto é, dos padrões a partir dos quais ela estabelecerá seu relacionamento
consigo mesma e com o mundo.

VÍDEO 5
Para visualizar a formação da arquitetura cerebral nos primeiros anos de vida, assista ao
vídeo “Arquitetura do Cérebro – Arquitetura Cerebral”, pílula do documentário: “O
Começo da Vida”. Disponível em:
<https://ocomecodavida.com.br/arquiteturadocerebrocc/>.

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Janela de oportunidades

A partir desses conhecimentos, foi estabelecido o conceito de “janelas de


oportunidades” para denominar os períodos sensíveis (ou críticos) do desenvolvimento,
nos quais o cérebro está com maior prontidão para receber estímulos relacionados a
determinada função. Se o estímulo não é oferecido, a janela de oportunidade pode se
fechar e a habilidade a qual ela se relaciona pode se tornar mais difícil de se desenvolver.
As Neurociências identificaram os seguintes períodos sensíveis do desenvolvimento:

Figura 5 – Períodos sensíveis do desenvolvimento cerebral (NELSON, 2000).

Segundo o gráfico acima, o período mais oportuno para o desenvolvimento das


habilidades auditivas, por exemplo, ocorre do 6º mês de gestação até os 6 primeiros meses
de vida, enquanto que a linguagem encontra seu momento cerebral mais propício do 6º
mês de gestação aos 4 anos de idade (aqui está o respaldo científico para a importância de
se conversar com bebê ainda na barriga). E as funções cognitivas, por sua vez, têm seu
período crítico de desenvolvimento dos seis meses de gestação aos 16 anos.
Emitir sons, falar, engatinhar, sentar e caminhar são capacidades sensório-motoras
que são acrescidas de funções cognitivas cada vez mais complexas em função das
experiências vividas. O processo de remodelação dos circuitos neurais é chamado de
plasticidade cerebral, pelo qual o cérebro remodela a função e se organiza mais
notadamente na primeira infância, mas continua se desenvolvendo sempre que acontece
uma nova aprendizagem.

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Figura 6 – Habilidades de funções executivas construídas nos primeiros anos da vida adulta
(CENTER FOR DEVELOPING CHILD, 2013b).

Funções executivas

As funções executivas são habilidades complexas que possuem um forte


componente neurobiológico e estão por trás das capacidades de autocontrole, tomada de
decisão e responsabilidade, isto é, autonomia na vida (NCPI, 2016). São elas:

• Memória de trabalho: permite armazenar, relacionar e pensar informações no curto


prazo. Sem essa capacidade o indivíduo não se lembraria do que estava fazendo após
ser interrompido.
• Controle inibitório: possibilita controlar e filtrar pensamentos, ter o domínio sobre
atenção e comportamento, e adiar gratificação. Conseguir ler um texto, mesmo na
presença de barulhos incômodos, é um exemplo de uso dessa habilidade.
• Flexibilidade cognitiva: permite mudar de perspectiva no momento de pensar e agir, e
considerar diferentes ângulos na tomada de decisão. Essa capacidade é fundamental
para o indivíduo perceber um erro e poder corrigi-lo.

Certas habilidades, como criatividade, perseverança, cooperação, respeito mútuo,


disciplina e flexibilidade são dependentes de funções executivas operantes e equilibradas.
O córtex pré-frontal, associado a outras áreas do cérebro, é fundamental para o controle
da atenção, do raciocínio e do comportamento. Na Primeira Infância, a arquitetura dessa
região se desenvolve a partir de experiências, principalmente das interações sociais. O
primeiro foco de atenção de uma criança é a face humana, por isso é muito importante
manter o olhar sustentado para ela.

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65
Conhecimento aplicado

Funções executivas prejudicadas no adulto podem ter sua raiz em situações


adversas durante o período de desenvolvimento na primeira infância, portanto, é
importante não culpabilizar ou julgar famílias que não conseguem cuidar bem das suas
crianças. Elas podem não ter tido oportunidade de desenvolver essas capacidades
operativas no momento oportuno de suas vidas e precisam ser ajudadas a aperfeiçoar suas
funções executivas bem como proporcionar o bom desenvolvimento do autocontrole e da
autonomia das crianças.
Ao estudar as funções cerebrais, Shonkoff (2016) observou que “as habilidades
para se capacitar a ser bons pais parecem ser as mesmas habilidades de que se necessita
para se conseguir um emprego”. Ele se referiu às funções executivas, que se relacionam à
mesma área cerebral, ilustrando como o desenvolvimento é sistêmico e uma habilidade
facilita a outra.
As pesquisas demonstram que memória, aprendizagem e comportamento, por
exemplo, são funções codependentes das associações com outras áreas, como as
sensoriais e motoras, que surgem primeiro na cronologia do desenvolvimento. A ruptura
desse processo, que ocorre em situações de exposição ao estresse tóxico, por exemplo,
poderá prejudicar o desenvolvimento escolar adequado, a saúde e as habilidades sociais e
de relacionamentos duradouros (SHONKOFF; PHILLIPS; NELSON, 2000).

Estresse tóxico

O conceito de estresse tóxico cerebral tem sido o núcleo de um conjunto de


avanços na compreensão da importância dos cuidados na primeira infância e suas
consequências para a vida adulta. Seu autor, Dr. Jack Shonkoff (Professor de Pediatria na
Faculdade de Medicina de Harvard e do Hospital Infantil de Boston, e Diretor do Centro
da Criança em Desenvolvimento da Universidade de Harvard) usou teorias de diversos
campos – da Biologia às Ciências Sociais, passando pela Teoria Política – para sustentar o
impacto do estresse tóxico cerebral na saúde dos indivíduos e da sociedade.
Agredir verbalmente uma criança ou menosprezá-la com frequência, mesmo que
pareça banal para certos pais, é um exemplo de estímulo repetido de fraca a moderada
intensidade, que pode ativar um processo de estresse tóxico por ser algo prolongado no

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tempo. Quanto mais experiências adversas na infância, maior a probabilidade de atrasos
no desenvolvimento e problemas de saúde posteriores, incluindo doenças cardíacas,
diabetes, abuso de substâncias e depressão, pois o elevado nível de cortisol no sangue por
ativação prolongada do sistema de resposta ao estresse repercute sobre o sistema
neuroendocrinoimunológico e pode destruir a ligação entre as sinapses que forma a
arquitetura cerebral, ou mesmo os próprios neurônios.

Figura 7 – Imagem do Cérebro de


uma criança com desenvolvimento
normal
e uma criança que sofreu negligência
na primeira infância (PEERY, 2002).

Essas imagens ilustram o impacto negativo da negligência no cérebro em


desenvolvimento. Na tomografia computadorizada, à esquerda, está uma imagem de uma
criança saudável de três anos com um tamanho médio da cabeça (50º percentil). A imagem
à direita é de uma criança de três anos sofrendo de grave negligência por privação
sensorial e afetiva. O cérebro desta criança é significativamente menor do que a média (3º
percentil) e tem ventrículos aumentados e atrofia cortical.

Sistema de resposta ao estresse

Apesar de o estresse ser algo indesejado, é importante saber que nem todo
estresse é tóxico. Shonkoff (2016) reconhece que situações de estresse fazem parte da
vida e que o sistema de resposta a ele existe nos animais para prepará-los para luta ou fuga,
em um mecanismo de sobrevivência e evolução da espécie. O hipotálamo, que está na
região central do cérebro, produz e secreta o hormônio adrenocorticotrópico (ACTH), que,
ao cair no sangue, estimula a produção do cortisol, também conhecido como “hormônio do
estresse”. Quando ocorre um estímulo adverso, este sistema é ativado, mas cessado o
estímulo, os níveis de cortisol retornam aos níveis normais, promovendo processos de
adaptação e formando resiliência.

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Estresse positivo

Experiências estressantes são muito comuns durante a infância, como receber uma
vacina, ter ansiedade para ir à escola ou enfrentar a ausência temporária da mãe nos
primeiros meses de vida. Estes são casos de estresse leve a moderado, em que a criança se
recupera logo, porque o sistema de resposta volta a seu nível inicial.
Quando a criança experimenta relacionamentos protetivos com a presença de
adultos afetuosos e responsivos bem como ambientes seguros, o estresse positivo pode
contribuir para o crescimento e desenvolvimento, desde que o estímulo não seja excessivo
ou dure muito tempo, excedendo a capacidade de adaptação da criança às situações. Estes
desafios são oportunidades para aprender diante de experiências negativas e adversas,
desenvolvendo assim a capacidade de resiliência.
O estresse é tolerável quando a criança responde a situações em que a exposição a
experiências ou estímulos apresentam um nível mais elevado de ameaça ao indivíduo, mas
em níveis toleráveis. Diante da perda de um membro da família, uma doença grave ou
desastres naturais, o impacto para a criança pode ser moderado ou reduzido se ela estiver
em ambientes protegidos ou amparada por um adulto.
O estresse fisiológico do organismo da criança pode ser minimizado ou amortecido
quando o ambiente promove alguma resposta que transmita à criança sentido de poder
contar com um adulto que a ajude a compreender o que está acontecendo, ao favorecer
uma sensação de controle sobre a situação. Isso facilita respostas adaptativas às
experiências adversas.

VÍDEO 6 e FÓRUM 1
Assista ao filme “O estresse tóxico prejudica o desenvolvimento saudável”, do Núcleo
Ciência Pela Infância (NCPI), disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=Wczs5QAyxQ0>.
Em seguida, reflita sobre alguma situação em sua vida pessoal ou profissional que ilustre
os diferentes níveis de vivência do estresse e os fatores protetivos que estavam
disponíveis para minimizar seus efeitos negativos.

Registre no Fórum de discussão como, concretamente, sua atuação pode representar um


fator protetivo contra o estresse tóxico de crianças que vivem em situações adversas.

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Epigenética: a conexão entre a genética e o ambiente = superação da dicotomia
entre o inato e o adquirido

As interações entre os genes e a experiência moldam o cérebro em


desenvolvimento. Embora os genes forneçam o projeto para a formação dos circuitos
cerebrais, esses circuitos são reforçados pelo uso repetido. Em última análise, os genes e
as experiências trabalham juntos para construir a arquitetura do cérebro e,
correlatamente, os padrões de comportamento que constituem a personalidade
(SHONKOFF; PHILIPS, 2000).

SAIBA MAIS!
Para compreender como a experiência pode moldar a genética e ser transmitida de uma
geração à outra, acesse o link e descubra o que é epigenética:
<https://developingchild.harvard.edu/translation/o-que-e-epigenetica/>.

VÍDEO 7 (opcional)
Assista ao Episódio 1 do Filme “O Começo da Vida”. O primeiro episódio da série, “O Bebê
Fantástico”, explora a importância das interações humanas nos primeiros anos de vida, que
se tornam um começo extraordinário para que os bebês alcancem seu verdadeiro
potencial.
Disponível em: https://www.videocamp.com/pt/movies/the-beginning-of-life-the-series-
fantastic-baby

Interação responsiva é a base do desenvolvimento humano

O ingrediente-chave das experiências que formam os circuitos cerebrais


para o desenvolvimento do cérebro normal são as interações que
crianças e bebês têm com os adultos na sua vida, a interação de serviço e
retorno (pingue-pongue). A criança faz uma coisa e o adulto responde, e
vice-versa. Ela começa a sorrir, a apontar, a fazer barulhinhos, e começa
a usar palavras. As crianças pequenas aprendem a partir da interação
com adultos e outras pessoas. Não podem aprender com a televisão.
Crianças mais velhas podem aprender com a televisão – não a da
violência, nós esperamos, mas a boa televisão. Bebês não podem

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aprender com a televisão, não podem aprender a partir de vídeos
educacionais. Eles aprendem a partir da interação com as pessoas, e
interação precisa ter resposta e apoio. O que a ciência tem a dizer é que
se deve cuidar das crianças que não estejam em ambiente protegido,
previsível e estável, que não estejam falando ou recebendo comunicação.
O que elas mais ouvem é “não”, “não” e “não”, em vez de “olhe essa
florzinha aqui”, ou “com que você quer brincar? (SHONKOFF, 2016).

A interação positiva promove a arquitetura cerebral saudável e sistemas


cardiovascular e imunológico positivos, reduzindo o risco de AVC, câncer, depressão e
alcoolismo. Esse conhecimento deixa cada vez mais evidente a importância de oferecer
ambientes seguros com adultos responsivos disponíveis para interagir positivamente com
as crianças, especialmente na primeira infância. Por isso, as pesquisas ressaltam a
importância da prevenção contra maus-tratos infantis. As crianças têm direito a viver sem
violência, pois a violência sofrida nos primeiros anos de vida aumenta significativamente a
chance de doenças e mortalidade precoce na vida adulta.
Alguns eventos adversos merecem especial atenção durante a infância (BRANCO;
LINHARES, 2018), já que relacionam exatamente a questões que interferem na
capacidade de os cuidadores estarem disponíveis para a interação com os bebês e crianças
na primeira infância, demandando especial apoio dos serviços:

• A depressão materna.
• A violência contra a criança ou a negligência.
• O abuso de substâncias psicoativas pelos pais.

VÍDEO 8
Assista ao filme “Construindo as competências do adulto” sobre desenvolvimento ativo de
competências, do Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI), para consolidar a importância de
apoio aos adultos para interação positiva com as crianças.
Disponível em: <https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/biblioteca/construindo-
competencias/?s=construindo,compet%C3%AAncias>.

A importância da somar saberes e competências

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70
Apesar dos importantes aportes trazidos pela Neurociência, é importante lembrar
que a hegemonia sobre certo modelo de desenvolvimento pode resvalar em um
reducionismo neurocientífico, restrito ao cérebro, como um dia foi hegemônico o
paradigma biomédico.
Cada vez mais, a Primeira Infância, terreno fértil para disputas, precisa estar
transversalmente distribuída pela via interdisciplinar e interinstitucional para escapar da
negação da diversidade humana e manter-se sensível às reivindicações de justiça social e
econômica que permitam igualdade de oportunidade para todos e para toda integralidade
que compõe o ser humano.
O novo Modelo de Desenvolvimento Humano que está em curso e tem sido
balizado pela valorização das especificidades de cada momento do desenvolvimento, que
ocorre de forma integrada, representa antes um convite ao fortalecimento da
intersetorialidade das Políticas Públicas e da parceria entre o Estado, a Sociedade e a
Família, considerando sua interdependência com o campo dos Direitos e da Justiça Social.
O que os novos achados da Neurociência, da Epigenética e das pesquisas
longitudinais trazem como contribuição fundamental é que devemos de fato começar pelo
começo, garantindo que os direitos sejam humanos e ecológicos, sem reducionismos, com
mais igualdade de oportunidades para o desenvolvimento de meninos e meninas logo no
começo da vida, em uma construção convergente entre os avanços das ciências e do
principal valor da Primeira Infância, que é o direito ao desenvolvimento do pleno potencial
humano, que tão bem se coaduna com o direito justíssimo à plena cidadania.

Com a introdução desse ciclo de geração, haverá menos trabalho a ser


feito e menos programas a serem financiados, além de resultados
melhores e diminuição da violência que ameaça esta sociedade e
qualquer outra sociedade no mundo. O que é empolgante sobre a posição
em que nos encontramos hoje e como o Brasil está se movendo é o fato
de que estamos vivendo uma revolução (SHONKOFF, 2016).

Considerações finais

Atualmente, sabe-se que a forma como o cérebro se desenvolve apoia-se em uma


complexa interrelação entre carga genética herdada e experiências vivenciadas. A
dicotomia entre inato e adquirido foi superada. O investimento de tempo e cuidados

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responsivos no início da vida trazem resultados para todas as fases posteriores do
desenvolvimento humano.
A maior janela de oportunidades para o desenvolvimento integral está na primeira
infância. Sendo assim, sem ter a oportunidade de contar com um adulto de referência para
apoiar seu desenvolvimento por meio de um relacionamento afetivo, estável e
apropriadamente estimulante para cada fase, a criança perde uma importante e
fundamental chance de desenvolver suas competências.

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Recapitulando os fundamentos do desenvolvimento humano na primeira
infância

Nesta seção, pudemos observar que o desenvolvimento infantil é o primeiro


ciclo do desenvolvimento humano. A partir disso, podemos compreender que a primeira
infância não é um fragmento do desenvolvimento humano, mas seu início (YOUNG,
2010).

Durante a primeira infância ocorrem mudanças quantitativas e qualitativas em


uma velocidade que não se repetirá em nenhum outro momento da vida. Estas
mudanças seguem uma sequência em que se interrelacionam fatores biológicos,
psicológicos e sociais. O desenvolvimento começa bem cedo, desde a concepção, e
depende de adultos cuidadores, que são mediadores do desenvolvimento, porque as
crianças dependem dos seus pais ou cuidadores primários tanto para o cuidado físico,
emocional e social, quanto para adquirirem a linguagem e a cultura que caracterizam o
universo humano.

O Desenvolvimento Infantil é parte fundamental do desenvolvimento


humano, um processo ativo e único de cada criança, expresso por
continuidade e mudança nas habilidades motoras, cognitivas,
psicossociais e de linguagem, com aquisições progressivamente mais
complexas nas funções da vida diária e no exercício de seu papel
social. O período pré-natal e os anos iniciais da infância são decisivos
no processo de desenvolvimento, constituído pela interação das
características biopsicológicas, herdadas geneticamente e das
experiências oferecidas pelo meio ambiente. O alcance do potencial

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de cada criança depende do cuidado responsivo às suas necessidades
de desenvolvimento (SOUZA; VERÍSSIMO, 2015).

Cada ser humano, desde criança, é um ser ativo e único

Significa dizer que a criança é parte ativa do seu próprio desenvolvimento,


superando a visão ultrapassada da criança como tábula rasa, passiva em seu processo de
desenvolvimento. A criança é uma pessoa, também é um sujeito de direitos, e, portanto,
cidadã.
❖ Este é um fundamento que hoje faz parte da legislação brasileira, sendo o primeiro
princípio determinado pelo Marco Legal da Primeira Infância: “atender ao
interesse superior da criança e à sua condição de sujeito de direitos e de cidadã”
(Lei 13.257/2016, art. 4º, inciso I).

De fato, a pessoa é um ser em desenvolvimento e a ciência tem cada vez mais


evidenciado que ao cuidar da criança, cuidados da pessoa desde o começo. Estudos
retrospectivos em seres humanos mostraram que o desenvolvimento no período
uterino e na infância influencia os riscos de doenças na fase adulta (diabetes tipo II,
hipertensão, ataque cardíaco, obesidade, câncer e envelhecimento precoce).
Experiências adversas nos primeiros anos de vida também aumentam o risco de
problemas de saúde mental, e adições (GILBERT, 2015). E a recíproca é verdadeira, pois
cuidado e educação nesta fase representam fatores de prevenção de doenças crônicas
e problemas psicológicos e sociais (HUGES, 2017).
Cada criança é única e traz ao mundo um conjunto de características que só
existe com ela. Sendo assim, procedimentos padronizados no cuidado e educação das
crianças precisam sempre ser questionados. A criança também precisa ser escutada, de
acordo com sua forma de se expressar.

❖ O Marco Legal da Primeira Infância também se baseou nessa premissa e para


tanto determinou como 2º princípio: “incluir a participação da criança na definição
das ações que lhe digam respeito, em conformidade com suas características
etárias e de desenvolvimento” (Lei 13.257/2016, art. 4º, inciso II).

Continuidade e mudança

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74
Esta belíssima contradição dialética desperta os sentidos para a inexistência de
um desenvolvimento linear ou mecânico, nos quais as peças vão se encaixando em uma
visão reducionista do desenvolvimento e da criança. O desenvolvimento acontece em
várias direções, ao mesmo tempo. Certas habilidades desenvolvem-se em tempos
diferentes para crianças diferentes, um apelo à valorização da diversidade.

❖ Tomando como fundamento essa questão, o Marco Legal da Primeira Infância


determinou como seu 3º princípio: “respeitar a individualidade e os ritmos de
desenvolvimento das crianças e valorizar a diversidade da infância brasileira,
assim como as diferenças entre as crianças em seus contextos sociais e
culturais”(Lei 13.257/2016, art. 4º, inciso III).

A vida acontece do presente, no dia a dia da criança

É no dia a dia dos cuidados que recebe e na interação com as pessoas e o


ambiente em seu entorno que a criança constrói o sentido da sua existência e seus
valores, com condições de aprender, crescer e se desenvolver por meio de rotinas e
novos desafios. É na vida diária que a infância acontece, não no futuro. A criança não
será: ela já é.

❖ Por esse motivo, é fundamental atender com prioridade a primeira infância, sendo
definido como 4º princípio do Marco Legal da Primeira Infância: “reduzir as
desigualdades no acesso aos bens e serviços que atendam aos direitos da criança
na primeira infância, priorizando o investimento público na promoção da justiça
social, da equidade e da inclusão sem discriminação da criança” (Lei 13.257/2016,
Art. 4º, inciso IV).

Oportunidades de exercício de seu papel social

Toda criança é cidadã e exerce um papel social, com leis que estabelecem seus
direitos e deveres, em constante tutela dos seus responsáveis e do Estado. Porém,
dependendo das concepções de infância operantes em cada núcleo da sociedade, a
criança pode perder espaço de atuação e ver limitado o seu potencial de
desenvolvimento. Por isso, é fundamental que ela conte com condições de exercício de
seu protagonismo social.

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75
O período pré-natal e os primeiros anos de vida são decisivos

Ainda no útero, organizam-se programações biológicas e psicológicas


complexas, dentre elas a do sistema de resposta ao estresse. Do ponto vista psicológico,
a criança é sensível não só ao psiquismo da sua genitora, mas do ambiente social que a
cerca. O útero é um ambiente ativo em que várias transformações acontecem
rapidamente, dependendo, porém, da qualidade do cuidado à gestante e à sua família.

❖ Em resposta à importância do apoio às gestantes e no nascimento, o Marco Legal


da Primeira Infância reforçou o disposto no artigo 8º do ECA: “É assegurado a
todas as mulheres o acesso aos programas e às políticas de saúde da mulher e de
planejamento reprodutivo e, às gestantes, nutrição adequada, atenção
humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento pré-natal, perinatal
e pós-natal integral no âmbito do Sistema Único de Saúde” (ECA, art. 8º,
modificado pelo art. 19 da Lei 13.257/2016).

Interação das características biopsicológicas (herdadas geneticamente) e


experiências oferecidas pelo meio ambiente

A dicotomia entre genética e ambiente está ultrapassada. Ambos se entrelaçam


e contribuem para o desenvolvimento na Primeira Infância. Esta dicotomia foi superada
pela concepção da Epigenética, quando se constatou que as experiências vividas
impregnam a genética.
Assim, o alcance do potencial de cada criança depende do cuidado responsivo
às suas necessidades de desenvolvimento.
A relação entre potencial da criança e cuidado responsivo é estabelecida
definitivamente no conceito de Desenvolvimento Infantil. Responder às aflições da
criança reduz seus níveis de estresse e permite o desenvolvimento seguro das suas
funções complexas: biológicas, psicológicas e sociais. Sem cuidado, não pode haver
desenvolvimento da criança em seu máximo potencial.

❖ Neste ponto, o artigo 14º do Marco Legal da Primeira Infância merece ser lido na
íntegra, pois traz a previsão de políticas públicas específicas para promoção da

75

76
responsividade, por meio de programas governamentais de apoio às gestantes e
famílias com crianças na primeira infância.

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80
Aula 4: As áreas prioritárias do Marco Legal da
Primeira Infância
Como vimos até aqui, o desenvolvimento humano na primeira infância é
multidimensional e abrange várias questões, requerendo ações associadas a vários
direitos estabelecidos em nossa legislação.
Ao planejar ações e políticas para promoção do desenvolvimento integral, nos cabe
então perguntar: - Quais são as áreas em que a criança e sua família precisam de mais
atenção?Podemos começar a pensar em relação às ações de responsabilidade
compartilhada que cabem ao Estado. Quais são as áreas prioritárias de atuação das
políticas públicas para o cuidado no começo da vida?
Segundo o Marco Legal da Primeira Infância (BRASIL, Lei 13.257/2016):

Art. 5º – Constituem áreas prioritárias para as Políticas Públicas para a


Primeira Infância:
1. Saúde;
2. Alimentação e Nutrição;
3. Educação infantil;
4. Convivência familiar e comunitária;
5. Assistência social à família da criança;
6. Cultura, o brincar e o lazer;
7. Espaço e o meio ambiente;
8. Proteção contra toda forma de violência e de pressão consumista;
9. Prevenção de acidentes e
10. Adoção de medidas que evitem a exposição precoce à
comunicação mercadológica.

Essas áreas estão indicadas no Plano Nacional pela Primeira Infância


(RNPI/CONANDA, 2010). Nessa unidade, vamos explorar a razão de estas áreas serem
prioritárias, quais ações desenvolvem-se em relação a elas e como podem começar a se
articular com a família e intersetorialmente para promoção do desenvolvimento integral
de cada criança.

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4.1. Saúde

A saúde é uma área prioritária pois ela é condição para a própria vida e para o bem-
estar em geral. Na primeira infância, vários aspectos do cuidado com a saúde configuram
um continuum do cuidado integral, entre as quais se destacam a Saúde da Gestante e da
Criança, que se desenvolvem em três grandes momentos:
• O Pré-natal – acompanhamento da gestação.
• O Parto e o Nascimento.
• A Puericultura – acompanhamento do crescimento e desenvolvimento da
criança.
Nestes processos, os grandes protagonistas são a mulher, a criança e seus
familiares, especialmente o pai ou parceiro. Os aspectos emocionais e sociais da gestação,
crescimento e desenvolvimento estão sendo cada vez mais difundidos em uma perspectiva
ampliada de atenção à saúde. Esses cuidados não são restritos ao que acontece no corpo
gravídico durante o pré-natal nem às medidas de crescimento (antropometria), como
pesar e medir o tamanho da criança.
A atenção à gestante e à criança deve ser dispensada por uma rede integrada que
ofereça o cuidado integral, respeitando a pessoa em suas dimensões físicas, psíquicas e
sociais. Esta perspectiva ampliada do cuidado deve ser centralizada na família e numa rede
integrada de serviços, que dê conta das adaptações necessárias à chegada da criança na
família.

Conheça o Guia dos Direitos da Gestante e do Bebê. Disponível em:


https://www.unicef.org/brazil/media/2351/file/Guia_dos_Direitos_da_Gestante_e_do_B
ebe.
Pdf

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O Pré-natal e a Puericultura são cada vez mais desempenhados por uma equipe
multiprofissional e interdisciplinar, uma vez que envolve médicos, enfermeiros, técnicos
de enfermagem, agentes comunitários de saúde (caso da Estratégia Saúde da Família),
fisioterapeutas, dentistas, terapeutas ocupacionais, psicólogos e outros.
Seria possível falar em um Pré-natal e uma Puericultura intersetoriais?
Acreditamos que sim, indicando algumas interfaces.
Cada vez mais profissionais da Educação Infantil se dão conta de que podem
desempenhar um grande papel interessando-se pelas mulheres grávidas e puérperas com
seus desafios para a conquista do pré-natal e maternagem efetivos. Por exemplo, a
chegada de um segundo bebê afeta o comportamento do filho mais velho, que não raro
externaliza comportamentos desadaptativos enquanto frequenta os centros de educação
infantil. Do mesmo modo, os profissionais da Educação podem acolher a mãe que leva a
criança à creche e não deseja interromper a amamentação, precisando assim de espaço
físico e incentivo para assegurar o direito do bebê a uma alimentação saudável, incluindo
a amamentação em seus dois primeiros anos de vida. Também no Ensino Médio, muitas
adolescentes grávidas e puérperas precisam de apoio para não abandonarem os estudos e
conciliarem a amamentação e os cuidados do bebê com a vida escolar.
Já para a Assistência Social, o atendimento às famílias grávidas e com crianças de
até seis anos é mais comum, sendo as medidas de proteção social, concessão de benefícios
específicos (Ex.: Auxílio Nutriz, Auxílio Natalidade, Bolsa Maternidade), prevenção de
agravos ou atuação contra a violação de direitos parte do corpo prático de ações dos
Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) e dos Centros Especializados de
Referência em Assistência Social (CREAS), assim como também dos Serviços de
Acolhimento de adolescentes grávidas e recém-nascidos. A partir do Marco Legal da
Primeira Infância, uma atuação ainda mais específica tem sido ofertada a partir do
Programa Criança Feliz, que realiza apoio às gestantes e às famílias com crianças na
primeira infância, por meio de visitas domiciliares sistemáticas, em articulação com a rede
intersetorial.
Os operadores do Direito e os profissionais do Sistema de Justiça também
desempenham um papel essencial na garantia dos direitos da família grávida e com
crianças de até seis anos, sendo fundamentais para a atenção holística uma rede integrada

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83
de Primeira Infância e outras entidades que atuam no Sistema de Garantia de Direitos,
como Conselhos Tutelares e organizações da sociedade civil.

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância?

Art. 19. O art. 8º da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 , passa a vigorar


com a seguinte redação:
“ Art. 8º É assegurado a todas as mulheres o acesso aos programas e às
políticas de saúde da mulher e de planejamento reprodutivo e, às
gestantes, nutrição adequada, atenção humanizada à gravidez, ao parto
e ao puerpério e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral no
âmbito do Sistema Único de Saúde.
§ 1º O atendimento pré-natal será realizado por profissionais da atenção
primária.
§ 2º Os profissionais de saúde de referência da gestante garantirão sua
vinculação, no último trimestre da gestação, ao estabelecimento em que
será realizado o parto, garantido o direito de opção da mulher.
§ 3º Os serviços de saúde onde o parto for realizado assegurarão às
mulheres e aos seus filhos recém-nascidos alta hospitalar responsável e
contrarreferência na atenção primária, bem como o acesso a outros
serviços e a grupos de apoio à amamentação.
.............................................................................................
§ 5º A assistência referida no § 4º deste artigo deverá ser prestada
também a gestantes e mães que manifestem interesse em entregar seus
filhos para adoção, bem como a gestantes e mães que se encontrem em
situação de privação de liberdade.
§ 6º A gestante e a parturiente têm direito a 1 (um) acompanhante de sua
preferência durante o período do pré-natal, do trabalho de parto e do
pós-parto imediato.
§ 7º A gestante deverá receber orientação sobre aleitamento materno,
alimentação complementar saudável e crescimento e desenvolvimento
infantil, bem como sobre formas de favorecer a criação de vínculos
afetivos e de estimular o desenvolvimento integral da criança.
§ 8º A gestante tem direito a acompanhamento saudável durante toda a
gestação e a parto natural cuidadoso, estabelecendo-se a aplicação de
cesariana e outras intervenções cirúrgicas por motivos médicos.
§ 9º A atenção primária à saúde fará a busca ativa da gestante que não
iniciar ou que abandonar as consultas de pré-natal, bem como da
puérpera que não comparecer às consultas pós-parto.
§ 10. Incumbe ao poder público garantir, à gestante e à mulher com filho
na primeira infância que se encontrem sob custódia em unidade de
privação de liberdade, ambiência que atenda às normas sanitárias e
assistenciais do Sistema Único de Saúde para o acolhimento do filho, em
articulação com o sistema de ensino competente, visando ao
desenvolvimento integral da criança.” (NR)

VÍDEO 9

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O parto é uma das ações primordiais da atenção integral à saúde na primeira infância,
envolvendo questões que podem não atender ao interesse superior da criança e da mãe.
Nesse sentido, recomendamos assistir ao documentário “O Renascimento do Parto”
Versão reduzida disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=3B33_hNha_8

As ações de Saúde da Criança são organizadas em uma robusta e eficaz Política


Pública, conhecida como PNAISC – Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da
Criança. Compreender como esta Política se organiza facilita a compreensão da trajetória
das crianças nos serviços de saúde e nos programas intersetoriais que a ela se articulam.
Ela será melhor detalhada na Aula sobre Políticas Nacionais..
No Brasil, a Caderneta da Criança (ou Caderneta de Saúde da Criança) é o principal
registro do desenvolvimento da criança, do nascimento até os nove anos de idade, e todos
os profissionais da Primeira Infância podem consultá-la. Nela, inclusive, estão anotadas as
informações sobre os Marcos do desenvolvimento (etapas em que as crianças mais ou
menos estão desenvolvendo as habilidades psicomotoras, emocionais e cognitivas), numa
seção dedicada à “Vigilância do Desenvolvimento”.
Os direitos da criança, inclusive o direito ao registro de nascimento, estão contidos
na Caderneta da Criança. Neste ano, ela foi lançada em uma versão intersetorial,
tornando-se Caderneta da Criança. Agora ela inclui além da Saúde, questões da Educação
e da Assistência Social, com uma versão Menino e uma versão Menina, porque há
diferenças nas curvas de crescimento e desenvolvimento entre meninos e meninas. Os
registros sobre o desenvolvimento da criança são muito importantes para a criança, a
família e os profissionais da rede, pois servem para monitorar o desenvolvimento infantil
pelas políticas públicas.

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância?

Art. 11. (...)


§ 1º A União manterá instrumento individual de registro unificado de
dados do crescimento e desenvolvimento da criança, assim como sistema
informatizado, que inclua as redes pública e privada de saúde, para
atendimento ao disposto neste artigo (Lei 13.257/2016).

Considerações finais

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Em prol da atenção prioritária à primeira infância, no campo dos direitos à saúde, à
alimentação e à nutrição, é importante:
• Reconhecer que a saúde da criança começa no planejamento reprodutivo, na
saúde pré-concepcional e no pré-natal.
• Apoiar as ações do Pré-natal, da Humanização do Parto e Nascimento bem
como da Puericultura em todos os seus âmbitos, principalmente imunização de
gestantes, parceiros e crianças, alimentação saudável e combate à desnutrição
e à obesidade da gestante e da criança, numa visão intersetorial,
multiprofissional e interdisciplinar, sendo assim uma tarefa de todos.
• Realizar a vigilância do estado de saúde da criança.
• Promover sempre e garantir, de acordo com sua governabilidade e liderança,
os direitos das famílias grávidas e/ou com crianças de até seis anos, pois isso
permite o desenvolvimento integral da criança com repercussões na saúde, no
aprendizado e no comportamento para toda a vida.

Trabalhar os aspectos físicos, sociais e emocionais do desenvolvimento no Pré-natal, Parto e


Puerpério amplia o paradigma biomédico para o paradigma biopsicossocial da Saúde, uma
importante evolução conceitual estabelecida pela OMS. As práticas ampliadas do Pré-natal,
puerpério (pós-parto) e amamentação bem como a Puericultura ampliada consideram com
IGUAL VALOR os aspectos físicos, sociais e emocionais do crescimento e desenvolvimento
desde a gestação.

Para saber mais:


1. Linha de cuidado da Gestante, Parturiente e Puérpera (SÃO PAULO, 2018).
• Documento Técnico da Linha de Cuidado da Gestante, Parturiente e Puérpera:
Quadro, Sínteses e Fluxograma.
• Manual de Consulta Rápida Para os Profissionais da Saúde.
• Manual de Orientação ao Gestor.
• Manual Técnico do Pré-Natal, Parto e Puérpera.
Disponíveis em: http://saude.sp.gov.br/ses/perfil/profissional-da-saude/areas-tecnicas-
da-sessp/hipertensao-arterial-e-diabetes-mellitus/linhas-de-cuidado-sessp/

2. Formação em Parto e Nascimento.


Disponível em: https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/biblioteca/formacao-em-humanizacao-
do-parto-e-nascimento-v/

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3. Atenção Integral à Saúde da Criança (2016).
Disponível em:
https://ares.unasus.gov.br/acervo/html/ARES/9258/1/livro_saude_crianca.pdf

4. Compreenda as causas de morte materna das mulheres brasileira.


Disponível em: https://www.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/46970-brasil-reduziu-
8-4-a-razao-de-mortalidade-materna-e-investe-em-acoes-com-foco-na-saude-da-
mulher#:~:text=O%20Brasil%20conseguiu%20reduzir%20em,anterior%20era%20de%
2064%2C5

5. UNICEF – Brasil tem redução histórica na mortalidade infantil (2019).


https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2019-11/unicef-
mortalidade-infantil-tem-reducao-historica-no-brasil

6. Coleção Primeiríssima Infância (2014):


Formação em práticas ampliadas do pré-natal, puerpério e amamentação.
Disponível em: https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/biblioteca/formacao-em-pre-natal-
puerperio-e-amamentacao-v/

7. Formação em Puericultura: Práticas Ampliadas.


Disponível em: https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/biblioteca/formacao-em-puericultura-
praticas-ampliadas-v/

8. Conheça outros Direitos das Gestantes


Disponível em: https://www.cnj.jus.br/cnj-servico-conheca-os-direitos-da-gestante-e-
lactante/#:~:text=De%20acordo%20com%20o%20artigo,emprego%20e%20do%20sal%C3%A1r
io%20(art.)

Referências Bibliográficas

ANDRADE; LIMA, 2004. O Modelo Obstétrico e Neonatal que defendemos e com o qual
trabalhamos. Em: Humanização do Parto e Nascimento. Caderno Humaniza SUS. Caderno 4, 2014.

BRASIL. Atenção ao pré-natal de baixo risco – Cadernos da Atenção Básica. 2012. Disponível em:
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cadernos_atencao_basica_32_prenatal.pdf>. Acesso
em: 6 out. 2020.

BRASIL. Humanização do Parto e Nascimento. Caderno Humaniza SUS. Caderno 4, 2014.

BRASIL. Política Nacional de Atenção Integrada à Saúde da Criança – Orientações para


implementação. Disponível em: <https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-
content/uploads/2018/07/Pol%C3%ADtica-Nacional-de-Aten%C3%A7%C3%A3o-
Integral-%C3%A0-Sa%C3%BAde-da-Crian%C3%A7a-PNAISC-Vers%C3%A3o-
Eletr%C3%B4nica.pdf>. Acesso em: 6 out. 2020.

FRACOLI, L. A. et al. Conceito e prática da integralidade na Atenção Básica: a percepção das


enfermeiras. Disponível em: <https://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n5/v45n5a15.pdf>.
http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_da_crianca_2019.pdf>. Acesso em: 6
out. 2020.

86

87
ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Manual para vigilância do desenvolvimento
infantil no contexto da AIDPI. 2005. Disponível em: <https://www.paho.org/spanish/ad/fch/ca/si-
desenvolvimento.pdf>. Acesso em: 6 out. 2020.

SANTOS, M. D.; MARICONDI, A. M. Conversando sobre puerpério. Caderno da Equipe “Toda Hora
é Hora de Cuidar”, p. 20-23, 2013. Disponível em:
<http://www.ee.usp.br/site/dcms/app/webroot//uploads/arquivos/caderno_equipe.pdf>. Acesso
em: 6 out. 2020.

4.2. Alimentação e Nutrição

O Plano Nacional pela Primeira Infância ressalta que o aleitamento materno é um


fator essencial para o crescimento e desenvolvimento adequado do bebê, sendo uma das
ações mais eficientes na redução da mortalidade infantil e no fortalecimento do vínculo
entre mãe e filho. É fundamental que sejam asseguradas às gestantes e ao bebê as
condições favoráveis de amamentação, em sintonia com a recomendação internacional de
que o aleitamento materno seja exclusivo até os seis meses de idade e que, daí em diante,
outros alimentos sejam introduzidos de forma gradual, mantendo o leite materno até os
dois anos de idade (RNPI; CONANDA, 2010).
A alimentação e a nutrição constituem-se em requisitos básicos para a promoção e
a proteção da saúde, possibilitando a afirmação plena do potencial de crescimento e
desenvolvimento humano, com qualidade de vida e cidadania, como bem contemplado na
Política Nacional de Alimentação e Nutrição – PNAN (BRASIL, 2019). Esta área será mais
detalhada na Aula 8 - Políticas Públicas.

Para saber mais, recomendamos a leitura do capítulo:


As prioridades da Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) para a Primeira
Infância, de LIMA, A. M. C. et al., p. 202-219. Disponível em:
https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-
do-marco-legal-da-primeira-infancia

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4.3. Educação Infantil

A Educação é o um direito fundamental da criança. Agora chegou a hora de saber um


pouco mais sobre o que é Educação Infantil com qualidade e o quanto o envolvimento da família
na educação das crianças na Primeira Infância é importante.

O que é Educação Infantil

A Constituição inovou o ordenamento jurídico ao garantir o acesso à educação


infantil, em creches e pré-escolas, às crianças de zero a cinco anos de idade como dever do
Estado. Ressaltando esse direito, a Emenda Constitucional nº 59, de 11 de novembro de
2009, determinou a obrigatoriedade da matrícula na educação básica (pré-escola) a partir
dos quatro anos de idade. A inovação trazida por esses preceitos legais rompe com uma
história de atendimento à infância configurada como amparo, filantropia ou assistência
social, e confere uma nova identidade à educação infantil e um novo papel ao Estado.
A educação infantil é um direito humano e social de todas as crianças até cinco anos
de idade, sem distinção decorrente de origem geográfica, caracteres do fenótipo (cor da
pele, traços de rosto e cabelo), etnia, nacionalidade, sexo, deficiência física ou mental, nível
socioeconômico ou classe social. Também não está atrelada à situação trabalhista dos pais,
nível de instrução, religião, opinião política ou orientação sexual.
A Educação Infantil tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança
em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da
família e da comunidade (LDB, art.29), e desta forma cumpre um papel importante no
desenvolvimento humano e social. Configura-se como uma das áreas educacionais que
mais retribui à sociedade os recursos nela investidos, contribuindo para a aprendizagem e
o desenvolvimento das crianças.
O currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas que
buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que
fazem parte dos patrimônios cultural, artístico, científico e tecnológico da Humanidade,
efetivadas por meio de relações sociais que as crianças desde bem pequenas estabelecem
com professores e outras crianças, e afetam a construção de suas identidades.

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Intencionalmente planejadas e permanentemente avaliadas, as práticas que
estruturam o cotidiano das instituições de Educação Infantil devem considerar a
integralidade e indivisibilidade das dimensões expressivo-motora, afetiva, cognitiva,
linguística, ética, estética e sociocultural das crianças, apontar as experiências de
aprendizagem que se espera promover às crianças e efetivar-se por meio de modalidades
que assegurem as metas educacionais de seu projeto pedagógico.
A Base Nacional Comum (BNCC) para a etapa da Educação Infantil, fixada pela
Resolução 02/2017 do Conselho Nacional de Educação, considerando os princípios
definidos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil MEC/2009),
organiza-se a partir dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento, dos campos de
experiências e dos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, elementos esses que se
integram na articulação entre necessidades, interesses, experiências e curiosidades das
crianças de 0 a 5 anos e os patrimônios artístico, cultural, ambiental, científico e
tecnológico.
A educação infantil no Brasil registrou muitos avanços nos últimos anos. O direito
à educação a todas as crianças pequenas desde seu nascimento representa uma conquista
importante para a sociedade brasileira. Porém, para que esse direito se traduza realmente
em melhores oportunidades educacionais para todos e em apoio significativo às famílias
com crianças de até cinco anos de idade, é preciso que as creches e as pré-escolas garantam
um atendimento de boa qualidade, destaque esse feito pelo Marco Legal da Primeira
Infância:

Art. 16. A expansão da educação infantil deverá ser feita de maneira a


assegurar a qualidade da oferta, com instalações e equipamentos que
obedeçam a padrões de infraestrutura estabelecidos pelo Ministério da
Educação, com profissionais qualificados conforme dispõe a Lei nº 9.394,
de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional) , e com currículo e materiais pedagógicos adequados à
proposta pedagógica.
Parágrafo único. A expansão da educação infantil das crianças de 0 (zero)
a 3 (três) anos de idade, no cumprimento da meta do Plano Nacional de
Educação, atenderá aos critérios definidos no território nacional pelo
competente sistema de ensino, em articulação com as demais políticas
sociais. (BRASIL, Lei 13.257/2016)

Qualidade da Educação Infantil


Pensando na Educação Infantil de qualidade, há que se ter um espaço adequado,
profissionais habilitados, infraestrutura de trabalho, respeito às crianças e

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reconhecimento de seus direitos de frequentar um local que garanta as interatividades
pedagógicas promovidas pelos professores. Estes por sua vez, na medida em que planejam
os espaços e tempos, devem oportunizar às crianças a construção e desconstrução do seu
brincar, bem como de suas pesquisas corporais e sonoras, possibilitando convivências
diversas nestes espaços educacionais.

A importância da participação da família na educação da criança

A parceria com a Família é indispensável para o desenvolvimento e o aprendizado


da criança, sendo que o âmbito familiar e o institucional complementam-se em suas
especificidades e em sua participação.
A Instituição de Educação Infantil e as famílias têm papéis complementares na
formação integral da criança, por isso devem estabelecer relações de cooperação e troca
de experiências e conhecimentos, tendo sempre em vista compreender mais
detalhadamente a criança e pensar em estratégias para potencializar sua aprendizagem e
desenvolvimento.

Para saber mais:

Publicações sobre Educação Infantil. Disponíveis em:


http://portal.mec.gov.br/secretaria-de-educacao-
basica/publicacoes?id=12579:educacao-infantil

Referências bibliográficas

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Parecer CNE/CEB nº 20/2009. Diretrizes Curriculares


Nacionais para a Educação Infantil. 2009.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Resolução CNE/CEB nº 02/2017. Base Nacional
Comum Curricular. Brasília DF, 2017.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria da Educação Básica. Parâmetros Nacionais
de Qualidade da Educação Infantil. Brasília, 2018.

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4.4. Convivência Familiar e Comunitária

Crianças e adolescentes têm o direito de serem criados e educados no seio de sua


família (ECA, art. 19), que é reconhecida pela Lei Magna como a base da sociedade (CF, art.
226). Visando fortalecer o acesso a esse direito o mais oportunamente possível, o Marco
Legal da Primeira Infância enfatiza as convivências familiar e comunitária como uma área
prioritária na primeira infância.
Este direito é amplamente detalhado no Plano Nacional de Convivência Familiar e
Comunitária – PNCFC (BRASIL, 2016), que enfatiza a capacidade da família, em sua
diversidade de arranjos, exercer as funções de proteção e socialização de crianças e
adolescentes, assim como o papel das políticas públicas no apoio às famílias para a
prevenção do afastamento do convívio familiar.
O PNCFC (BRASIL, 2016) destaca que é no ambiente familiar que as crianças
constroem seus primeiros vínculos afetivos, experimentam emoções, formam sua
identidade, desenvolvem autonomia, aprendem a tomar decisões, exercem cuidados
mútuos, vivenciam conflitos e aprendem a controlar seus impulsos e tolerar frustrações.
Assim como é a partir da família que a criança se insere em uma comunidade, ampliando
sucessivamente seu pertencimento social e cultural.
No entanto, o reconhecimento da importância da família não pode ser confundido
com o desconhecimento de que é também no seu próprio meio que ocorre a maior parte
das violações dos direitos fundamentais da criança e do adolescente. A depender da
gravidade da violação, o afastamento do núcleo familiar se faz necessário para a proteção
da integridade física e psicológica da criança e do adolescente.
Nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente, a medida protetiva de
acolhimento tem caráter excepcional e provisório. Neste contexto, o direito às
convivências familiar e comunitária se alicerça na interface entre a Doutrina da Proteção
Integral trazida pela Constituição Federal e o ECA, cuja concretização requer
convergência de esforços entre Família, Sociedade e Estado, com especial articulação
entre os órgãos que integram o Sistema de Justiça e a rede das diversas políticas públicas,
como de Assistência Social, Direitos Humanos, Educação e Saúde, entre outras. Medidas
específicas para proteção, promoção e garantia do direito à convivência familiar e
comunitária serão abordadas nas Unidades 3 e 4.

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Sobre o Conceito de Família

É de senso comum em nossa sociedade a concepção de família como sendo a base


de tudo, um lugar privilegiado para o desenvolvimento da criança. A carga de atribuições,
compromissos e exigências contemporâneas que incidem sobre as famílias,
independentemente de seus recursos e possibilidades reais, pode ser muito pesada,
especialmente quando associada às tensões decorrentes de diversas situações, por
exemplo, desemprego, violência urbana, pobreza, ausência de redes sociais de apoio e falta
de acesso a serviços que a apoiem no exercício de sua função de cuidado, proteção e
educação das crianças e adolescentes.
Também é comum idealizarmos a família em sua composição nuclear conjugal,
todavia é preciso considerar as diversidades socioculturais e de arranjos familiares.
Portanto, na atenção às famílias é importante considerar as várias realidades, os múltiplos
arranjos contemporâneos e as relações intrafamiliares e da família com o contexto no qual
está inserida. É importante identificar limites e potencialidades da família para o exercício
de sua função, suas redes de apoio, demandas por acesso a direitos e serviços, e a rede
disponível localmente que possa acessar para superar dificuldades enfrentadas.
Consideramos que a melhor concepção de família está expressa na Política Nacional de
Assistência Social – PNAS/2004 (2005, p. 90):

A família é um grupo de pessoas, vinculadas por laços consanguíneos, de


aliança ou de afinidade, onde os vínculos circunscrevem obrigações
recíprocas e mútuas, organizadas em torno de relações de geração e de
gênero.

Sobre o Conceito de Comunidade

Para Dalva Gueiros (2010), as famílias das camadas populares que estão mais
comumente organizadas em rede (com participação de outros parentes e vizinhos no
convívio e em prol da sobrevivência) e que têm como foco o sistema de obrigações e ajuda
diferenciam-se das famílias das camadas sociais médias que se organizam em núcleos
centrados no parentesco. Trata-se, portanto, de uma estratégia de sobrevivência e
materialidade histórica (distante do modelo romântico ou idealizado).
Dentre os primeiros espaços e instituições sociais que ampliam a convivência da
criança além da família podemos identificar os parques públicos, os grupos de brincadeiras,

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93
a creche e a escola. Quando o afastamento da família é necessário e a aplicação da medida
protetiva de acolhimento é inevitável, a manutenção da criança em sua comunidade de
origem (relações de amizade no bairro e na escola) pode ser uma boa estratégia de redução
de danos, razão pela qual o § 7º do Art. 101 do ECA dispõe que “o acolhimento familiar ou
institucional ocorrerá no local mais próximo à residência dos pais ou do responsável”.
Como vimos nas temáticas anteriores, a criança forma memórias a partir do
convívio e do ambiente em que nasce e cresce, o que gera um sentimento de familiaridade
e senso de pertencimento que precisa ser considerado ao se buscar formas de garantir
seus direitos.

Sobre o Direito às convivências familiar e comunitária

Sabemos que famílias e espaços comunitários e institucionais são potencialmente


ou efetivamente capazes de promover desenvolvimento infantil e proteção social, e que o
contrário também é igualmente verdadeiro. Mas quantas crianças são cotidianamente
desprotegidas, maltratadas e sofrem diferentes tipos de violações de direitos em seu
núcleo familiar e sua comunidade?
Várias circunstâncias acabam afetando e até mesmo inviabilizando a possibilidade
de uma convivência familiar e comunitária saudável. Em face de tais realidades, fica
evidente a necessidade da efetivação de promoção, proteção e defesa do direito às
convivências familiar e comunitária de crianças, o que requer um conjunto articulado de
ações que envolvem a família, a sociedade e o Estado, em situação de corresponsabilidade,
conforme proposto nas Convenções Internacionais, na Constituição Federal, no ECA, no
Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa da Convivência Familiar e Comunitária
bem como no Marco Legal da Primeira Infância.

Para saber mais:

BRASIL.. Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa da Convivência Familiar e


Comunitária. Políticas Públicas sobre Convivência Familiar e Comunitária. Brasília:
CONANDA; CNAS, 2006. Disponível em:
<www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Plano_Defesa_
CriancasAdolescentes%20.pdf>. Acesso em: 6 out. 2020.

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94
4.5. Assistência Social à Família da Criança

Vimos anteriormente que a interação familiar é o principal ingrediente para o


desenvolvimento humano na primeira infância. A proteção, o cuidado e a disponibilidade
para estabelecer relacionamentos estáveis, afetivos e educativos são funções primordiais
do núcleo familiar. Mas muitas vezes “os pais não estão disponíveis para interagirem com
os filhos devido a uma série de circunstâncias desfavoráveis em sua vida, como a pobreza,
o desemprego, o uso abusivo de drogas, a violência, entre outros desafios e fontes de
estresse cotidiano” (SHONKOFF, 2016).
Em nosso país, as circunstâncias sociais, culturais e econômicas das famílias para
cuidarem dos filhos são marcadas por desigualdades e desafios históricos, configurando
para grande parcela da população um contexto de exclusão social que expõe famílias e
indivíduos a situações de risco e vulnerabilidade, que repercutem diretamente na
capacidade de exercício da parentalidade. Diante disso, o Estado tem dado respostas com
reconhecimento de direitos e organização de políticas públicas de apoio às famílias, dentre
as quais se destaca a Política de Assistência Social, que organiza um conjunto de ofertas
que apoiam as famílias por intermédio do Sistema Único de Assistência Social.
Além de destacar a Assistência Social como uma área prioritária para a proteção
das crianças na primeira infância e apoio à sua família em uma perspectiva preventiva, o
Marco Legal da Primeira Infância destaca também o importante papel dos serviços e
equipamentos desta política em casos de violações:

As famílias identificadas nas redes de saúde, educação, assistência social


e demais órgãos do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança que se
encontram em situação de vulnerabilidade e de risco ou com direitos
violados para exercer seu papel protetivo, de cuidado e educação à
criança na primeira infância, bem como as que têm crianças com
indicadores de risco ou deficiência, terão prioridade nas políticas sociais
públicas”. (Lei 13.257/2016, art. 14, § 2º).
Art. 13 § 2 o Os serviços de saúde em suas diferentes portas de entrada,
os serviços de assistência social em seu componente especializado, o
Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAs) e os
demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do
Adolescente deverão conferir máxima prioridade ao atendimento das
crianças na faixa etária da primeira infância com suspeita ou confirmação
de violência de qualquer natureza, formulando projeto terapêutico
singular que inclua intervenção em rede e, se necessário,
acompanhamento domiciliar. (Incluído pela Lei nº 13.257, de 2016).

94

95
É MUITO IMPORTANTE ENTENDER A ASSISTÊNCIA SOCIAL COMO UM DIREITO, NÃO COMO UMA
BENESSE. FAMÍLIAS CIDADÃS SÃO FONTE DE CIDADANIA DE SEUS FILHOS.

Sobre a Política Nacional de Assistência Social

A Constituição Federal de 1988 operou mudanças fundamentais na agenda das


políticas públicas, transformando necessidades antes consideradas pessoais ou individuais
em direitos sociais. Na Assistência Social, essa mudança de paradigma significou uma forte
contraposição às práticas filantrópicas correntes. A Política de Assistência Social será
melhor abordada no tópico 1.8.
A lógica que organiza esta política apoia-se na concepção de que a Assistência
Social, articulada a outras políticas e ao Sistema de Justiça, deve contemplar no
atendimento às famílias:

• A atenção a vulnerabilidades e riscos sociais enfrentados pelas famílias.


• A ampliação de acessos a direitos, serviços e oportunidades para a melhoria de
condições de vida da família, inclusão e participação social.
• A ampliação de acessos a serviços e outros suportes que possam apoiá-la no
cuidado e na proteção de seus membros, sobretudo no caso daqueles em situação
de maior vulnerabilidade, como crianças na primeira infância e pessoas com
deficiência.
• Ao enfrentamento da pobreza além da questão do acesso à renda, considerando
outras vulnerabilidades vivenciadas pelas famílias e a necessária integração do
acesso a serviços e benefícios para seu empoderamento e sua autonomia.
• A articulação estreita com outras políticas e sistema de justiça em casos de
violações de direitos que impliquem riscos à integridade física e psíquica, visando
à interrupção e superação destas situações.

Enfim, o Modelo Brasileiro de Proteção Social pode ser assim sintetizado:

1. Política de direitos que opera serviços, benefícios, programas e projetos.


2. Organizada como um Sistema, o SUAS, com comando único, gestão compartilhada
e corresponsabilidades de todos os entes federados (União, estados, DF e
municípios).

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3. SUAS hierarquizado por níveis de complexidade, em Proteção Social Básica e a
Proteção Social Especial (de Média e Alta Complexidade), conforme o nível de
agravamento das situações e especificidade do atendimento.
4. Gestão democrática e participativa com instâncias de pactuação interfederativa –
Comissões Intergestores Bipartites (CIBs), com representantes das esferas
estadual e municipal, e Comissões Intergestores Tripartites (CITs), que agregam a
área federal e o controle social – Conselhos de Assistência Social.

A centralidade da família é uma diretriz da Política Nacional de Assistência Social


(PNAS/2004) que orienta a concepção e a implementação de benefícios, serviços,
programas e projetos do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Isto pauta-se no
reconhecimento da importância da família no contexto da vida pessoal e comunitária.
Segundo a PNAS (2004, p. 40), “a matricialidade sociofamiliar se refere à centralidade da
família como núcleo social fundamental para a efetividade de todas as ações e serviços da
política de assistência social”. Portanto, a matricialidade sociofamiliar constitui um
avanço fundamental na Assistência Social, que anteriormente se detinha no atendimento
de indivíduos.
Para a Assistência Social, as atenções devem considerar a família como um todo e
a atenção às especificidades de cada um de seus membros não pode estar dissociada de
seu contexto familiar, comunitário e social. Assim, as atenções às crianças na primeira
infância não podem desconsiderar sua família e seu contexto de vida. De igual forma, as
famílias com crianças na primeira infância precisam ser compreendidas em sua
integralidade, com suas especificidades, dificuldades e potencialidades.
Mioto (2010) ressalta, todavia, que duas tendências opostas lutam entre si para
ganhar hegemonia no âmbito do trabalho social com famílias: a familista e a protetiva. Na
perspectiva familista, a família é considerada a principal responsável pelo bem-estar de
seus membros, em detrimento do Estado, na garantia de direitos e na proteção social.

O fracasso das famílias é entendido como resultado da incapacidade de


gerirem seus recursos, de desenvolverem adequadas estratégias de
sobrevivência e de convivência, de mudar comportamentos e estilos de
vida, de se articularem em rede de solidariedade e também de serem
incapazes de se capacitarem para cumprirem com as obrigações
familiares (MIOTO, 2010, p. 170).

96

97
Na perspectiva protetiva, pelo contrário, há centralidade da garantia de direitos
sociais com base nos princípios da universalidade e equidade, pois somente através deles
é possível consolidar a cidadania e caminhar para a equidade e justiça social. Nessa
perspectiva, as políticas públicas são pensadas no sentido de apoiar as famílias e fortalecer
sua capacidade protetiva.

Referências Bibliográficas

MARQUES L. A. Matricialidade Sociofamiliar do SUAS: diálogo entre possibilidades e limites.Em:.


Anais do III Simpósio Gênero e Políticas Públicas, Universidade Estadual de Londrina, 2014.
MARICONDI, M. A; KREHAN, M. C. Concepções Fundantes do Modelo Brasileiro de Proteção
Social e o Trabalho Social com Famílias: avanços e contradições. Em: Caderno de Textos do Projeto
Inovações Metodológicas para o Trabalho Social com Famílias no SUAS. São Paulo, 2020.
Disponível em: <https://psicologianosuas.com/2020/06/01/inovacoes-metodologicas-para-o-
trabalho-social-com-familias/>. Acesso em: 12 set. 2020.
MIOTO R. C. Família, trabalho com famílias e Serviço Social. Serv. Soc. Rev., Londrina, v. 12, n. 2, p.
163-176, jan./jun. 2010.
SANTOS, B. R. et al. Desenvolvimento de paradigmas de proteção para crianças e adolescentes
brasileiros. Disponível em: <http://www5.ensp.fiocruz.br/biblioteca/dados/txt_288618255.pdf>.
Acesso em: 10 set. 2020.
SHONKOFF, J. Investindo em ciência para fortalecer as bases da aprendizagem, do comportamento
e da saúde ao longo da vida. Em: Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. Câmara dos
Deputados: Centro de Estudos e Debates Estratégicos, 2016.
SPOSATI, A. Modelo Brasileiro de Proteção Social não Contributiva: concepções fundantes. 2009.
Disponível em: <http://www.ceprosom.sp.gov.br/portal/wp-content/uploads/2015/05/TEXTO-
ALDAIZA-1.pdf>. Acesso em: 10 set. 2020.
SPOSATI, A. Assistência Social: de ação individual a direito social. Revista Brasileira de Direito
Constitucional – RBDC, n. 10, jul./dez. 2007. Disponível em:
<http://www.esdc.com.br/RBDC/RBDC-10/RBDC-10-435-Aldaiza_Sposati.pdf>. Acesso em: 10
set. 2020.

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98
4.6. A cultura, o brincar e o lazer

4.6.1 Sobre a cultura

A cultura é fundadora das ações e dos pensamentos das pessoas a todo o momento
e reflete o modo de vida de cada um de nós (que é construído desde a primeira infância) e
da sociedade. É apenas a partir da garantia do direito à cultura, ao brincar e ao lazer que a
plenitude do desenvolvimento humano terá seu fluxo contínuo e a criança despertará para
a realidade cultural em que está inserida, não apenas como receptora, mas como produtora
de cultura. Com base nesse fundamento, o Marco Legal da Primeira Infância determina
que:

Art. 15. As políticas públicas criarão condições e meios para que, desde a
primeira infância, a criança tenha acesso à produção cultural e seja
reconhecida como produtora de cultura (Lei 13.257/2016).

Neste sentido, é importante que os profissionais do Sistema de Garantia de


Direitos atentem-se para a importância do reconhecimento, da valorização e do respeito à
identidade cultural de cada criança e sua interação com os elementos culturais próprios
dessa identidade, tendo em vista os diversos povos e etnias que compõem a Nação
brasileira, como afrobrasileiros, indígenas, romanis (ciganos), orientais, latinos e europeus,
além de outras características ligadas ao território, especialmente nos casos de população
rural, ribeirinha e da floresta.
É importante atentar-se também para o fato de que a promoção da igualdade e da
diversidade cultural, ao ser tratada desde a infância, cria possibilidades e diminui
preconceitos na relação com as múltiplas formas de constituição familiar, trabalhando de
maneira positiva questões adversas sobre estigmas socialmente construídos.
A atuação do Ministério da Cultura, especialmente em 2018 e 2019, no processo
de implementação do Marco Legal da Primeira Infância, destacou-se pela busca de
estratégias para fortalecer o papel dos jogos e das brincadeiras nos territórios,
considerando sua importância no desenvolvimento da criança, inclusive para promoção da
resiliência. As políticas públicas de Cultura têm importante papel na Mobilização da Rede
de Pontinhos de Cultura, identificando novos atores que possam possibilitar maior fruição
de atividades passíveis de execução para atender ao público da primeira infância. Além
disso, tange às atribuições das políticas de Cultura a indicação trazida pelo artigo 26 do

9*
8/
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Marco Legal da Primeira Infância quanto à importância de se assegurar às crianças o
direito de acesso à transmissão das crenças e culturas familiares.
Com vistas à efetivação desta área prioritária para o desenvolvimento de todas as
crianças, nos âmbitos familiar, social e institucional, a seguir você terá subsídios para uma
melhor compreensão sobre o direito de brincar, a natureza do brincar e seu papel no
desenvolvimento da criança, os impedimentos à efetivação desse direito, a importância
dos espaços para brincar e o papel do adulto, destacando a necessidade de capacitação
ampla sobre o tema. Lembrando que a criança é fruidora e produtora de cultura por meio
do brincar. O lúdico é fonte de confiança e autonomia à medida que a criança conhece os
valores culturais de sua comunidade e cria formas de ver o mundo por meio desse brincar.

Para saber mais:


LAREDO, Carlos. A Origem da Cultura na Primeira Infância da Humanidade: O que
deixaremos aos Arqueólogos do Futuro? Em: CÂMARA DOS DEPUTADOS. Avanços do
Marco Legal da Primeira Infância. Brasília: Centro de Estudos e Debates Estratégicos da
Câmara dos Deputados, 2016, pp. 145-155..Disponível em:
https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-
do-marco-legal-da-primeira-infancia

4.6.2. Sobre o brincar

O direito de brincar
Sob o ponto de vista da legislação brasileira, o direito ao brincar e ao lazer são
assegurados pelas seguintes legislações:

• Constituição Federal (1988), Art. 227.


• Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA 1989), Arts. 4º e 16. Este último trata
do direito à liberdade, abrangendo oito aspectos, entre os quais estão “brincar,
praticar esportes e divertir-se” (inciso IV).
• Lei 11.104/2005, conhecida Lei da Brinquedoteca Hospitalar, que assegura o
direito de brincar, inclusive para as crianças em hospitais.

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• Marco Legal da Primeira Infância (2016), Arts. 5º e 17. No seu artigo 5º assinala
que: “Constituem áreas prioritárias para as políticas públicas pela Primeira Infância
a saúde, (...) o brincar e o lazer (...)” e no seu artigo 17 especifica que:

A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão organizar


e estimular a criação de espaços lúdicos que propiciem o bem-estar, o
brincar e o exercício da criatividade em locais públicos e privados onde
haja circulação de crianças, bem como a fruição de ambientes livres e
seguros em suas comunidades (Lei 13.257/2016, art. 17).

Essas leis são fundamentadas no direito internacional contido no Artigo 31 da


Convenção dos Direitos da Criança (CDC/ONU 1989). O Artigo 31 “reconhece o direito
de cada criança ao descanso, lazer, jogo, atividades recreativas e livres e plena participação
na vida cultural e artística”, e foi considerado tão importante pela CDC que mereceu a
aprovação, em fevereiro de 2013, de um documento complementar denominado
Comentário Geral no 17 (GC 17), que definiu claramente as obrigações dos seus governos
signatários, inclusive o Brasil, no que se refere aos direitos contidos no Artigo 31,
reforçando ainda que devem ser desfrutados por toda criança, independentemente do
lugar onde vive, de seu patrimônio cultural ou de sua condição social.

Para saber mais:

• Guia “O Direito de Brincar de todas as crianças”, da Rede Nacional da Primeira


Infância (RNPI). Disponível em: https://www.ipabrasil.org/publicacoes

• Comentário Geral sobre o Artigo 31 – ONU/CDC. Disponível em:


http://www2.ohchr.org/english/bodies/crc/docs/GC/CRC-C-GC-17_en.doc

• Guia “Artigo 31 da Convenção dos Direitos da Criança: O Desenvolvimento Infantil e


o Direito de Brincar”. Disponível em: https://www.ipabrasil.org/publicacoes

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101
O que é o Brincar?
O brincar é caracterizado pelos seguintes atributos: diversão, incerteza, desafio,
flexibildade e não produtividade. O Comentário Geral nº 17 sobre o CDC, na sua página
5, parágrafo 14C, oferece uma definição do brincar que é amplamente reconhecido por
especialistas das mais diversas áreas:

O brincar das crianças é um comportamento, atividade ou processo iniciado,


controlado e estruturado pelas próprias crianças e tem lugar quando e onde
as oportunidades surgirem. Os cuidadores podem contribuir para a criação de
ambientes em que ele ocorre, mas brincar, por si mesmo, é não-obrigatório,
impulsionado pela motivação intrínseca e é um fim em si mesmo, e não um
meio para um fim.

É importante destacar que o direito da criança ao brincar contempla seu direito de


controlar e estruturar seu próprio brincar. Por isso, muitos especialistas se referem ao
“brincar livre” ou “livre brincar”, sendo isso distinto de uma atividade lúdica ou brincadeira
organizada, controlada e estruturada por um adulto, por exemplo, um professor de
educação infantil ou de ensino fundamental, na sala de aula.

Para saber mais:


• Guia “Brincar é preciso! Guia prático para pais e educadores". Disponível em:
https://www.ipabrasil.org/publicacoes

101

102
• Livro “A descoberta do brincar”, de Maria Ângela Barbato Carneiro e Janine Dodge.

Disponível em: https://www.ipabrasil.org/publicacoes

O Brincar e o Desenvolvimento Infantil

Ao longo das últimas décadas, inúmeros estudos científicos de diversas áreas,


incluindo a neurociência, psicologia, sociologia, pedagogia e economia vêm apontando e
destacando as diversas maneiras pelas quais o brincar é intrínseco ao desenvolvimento
saudável e pleno das crianças. Desde o seu nascimento, o brincar é um elemento
fundamental no desenvolvimento físico, emocional, cognitivo e social das crianças,
proporcionando condições para o desenvolvimento de relacionamentos afetivos positivos,
da resiliência e da criatividade, entre outras habilidades de função executiva e de
autorregulação, todas consideradas necessárias para que a criança exerça o papel que lhe
cabe na comunidade em que vive, no presente e no futuro.

Para saber mais:


• Sobre brincadeiras e jogos que apoiam o desenvolvimento infantil, indicados por faixa
de idade das crianças:
o Cartilha “Jogos e brincadeiras das culturas populares na Primeira Infância”.
Disponível em:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/arquivo/crianca_feliz/CartilhaCriancaF
eliz_web.pdf
o Guia “O Direito de Brincar de todas as crianças”, produzido pelas ONGs
internacionais Terre des Hommes e IPA Brasil. Disponível em:
https://www.ipabrasil.org/publicacoes

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• “Apostila brincar: Propostas práticas para brincadeiras inclusivas na educação infantil”
produzido pela Fundação Volkswagen em parceria com a Associação Nova Escola.
Disponível em: https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/biblioteca/apostila-brincar-
propostas-praticas-brincadeiras-inclusivas-educacao-infantil/
• Vídeos “O Jogo de Ação e Reação Modela os Circuitos do Cérebro” e “Ação e Reação”,
produzidos pelo Centro para o Desenvolvimento da Criança da Universidade de
Harvard. Disponíveis em:
https://developingchild.harvard.edu/translationcategory/pt/
• Entrevista com a Profa. Tizuko Morchida, da Faculdade de Educação da USP, “Na
Íntegra – Tizuko Morchida – O brincar na educação infantil”. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=09w8a-u-AUU (parte 1) e
https://www.youtube.com/watch?v=QomXuPFJc8c (parte 2).
• Entrevista com a psicóloga Rita Góes Bezerra de Moraes. Disponível em:
https://lunetas.com.br/para-lidar-com-criancas-e-preciso-observa-las-diz-psicologa/

Os impedimentos ao Brincar

Atualmente, o brincar é ainda, muitas vezes, reduzido a um tempo curto da rotina


da criança, além de ser frequentemente entendido como premiação para certos
comportamentos e relacionado a determinados brinquedos comercializados. Alguns
paradigmas ultrapassados, mas ainda compartilhados por grande parte dos adultos, como
“Brincar é perda de tempo”, também dificultam a compreensão de todos sobre o papel
fundamental do brincar no desenvolvimento infantil.
Além da carência de espaços qualificados e seguros para o brincar, a
comercialização das oportunidades para brincar, as altas exigências educacionais e a
crescente influência e uso das mídias digitais, quase onipresentes na vida das crianças,
também influenciam profundamente o tempo dedicado ao brincar e as formas do seu
envolvimento nas brincadeiras, atividades recreativas e nas atividades culturais e
artísticas.

Para saber mais:


Sobre o brincar e a tecnologia:
• Recomendações da Organização Mundial da Saúde sobre o uso de aparelhos
eletrônicos por crianças pequenas. Disponível em: https://nacoesunidas.org/oms-
divulga-recomendacoes-sobre-uso-de-aparelhos-eletronicos-por-criancas-de-
ate-5-anos/

VÍDEO 10
Série de vídeos “Infância e Tecnologia” produzidos pelo Instituto Alana.

103

104
Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=eKMTzYmuW0g&list=PLwtaWcfcrGsbDAJ
SXxCghgg3j30CaqI6b&index=1

A importância dos espaços para Brincar

A qualidade do brincar é fundamentalmente moldada pelo ambiente onde ele


acontece. A população urbana vem aumentando significativamente, sendo que geralmente
os espaços urbanos dispõem de menos áreas públicas para as crianças brincarem. A
presença da violência em muitas casas, escolas e ruas bem como a persistência do trabalho
infantil no País, também impedem que as crianças desfrutem do seu direito de brincar e
assim tenham assegurado o direito a seu pleno desenvolvimento.
A oferta de espaço para brincar nas cidades assume muitas formas, incluindo
parques, playgrounds, escola, parques infantis, praças públicas abertas, ruas e espaços
verdes – alguns são planejados para o brincar, outros não. Mesmo no ambiente mais
desfavorável, o impulso espontâneo das crianças para brincar vai levá-las a procurar
oportunidades para fazê-lo, o que pode expô-las a condições adversas e riscos para a sua
própria segurança e saúde. E mesmo havendo praças ou parques aparentemente
adequados para o brincar de crianças pequenas, uma pesquisa brasileira (WENETZ, 2013)
demonstra que a praça pública vem se tornando um espaço vazio, que oferece poucas
condições de sociabilidade (seguras) para as crianças brincarem. Por diferentes motivos,
os responsáveis pelas crianças estão, cada vez mais, com medo do “estranho” e da rua, e
não têm confiança nos espaços oferecidos. Há uma sensação de insegurança que configura
tanto a escolha dos lugares para o lazer das famílias quanto a frequência dessas visitas.
Frente à insegurança, a tendência é de restringir – e muito – a mobilidade e o livre brincar
das crianças.
Ao brincarem livremente ao ar livre e na natureza, as crianças espontaneamente se
engajam em atividade física, exercitam sua liberdade e desenvolvem sua criatividade,
imaginação, capacidade de observação e aceitação da diversidade. Apesar dos múltiplos
benefícios, as crianças têm cada vez menos oportunidade de se conectarem com a
natureza, de desfrutarem do livre brincar ao ar livre e de se movimentar, ao se permitir que
assumam riscos enquanto brincam (LOUV, 2009).
Definir espaços públicos compartilhados, acessíveis e inclusivos com um projeto
sensível à criança é importante para promover o brincar – e isso não se restringe aos

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espaços tradicionais oferecidos para brincar, como parques e playgrounds. Podem
também ser contemplados espaços informais e cotidianos, incluindo, por exemplo,
mudanças ao nível da rua (sinalização, regulamentação do trânsito, procedimentos
acessíveis para o fechamento de rua, intervenções de agentes do brincar, proteção de
pequenos terrenos abandonados) e engajamento da comunidade (defesa de direitos,
audiências públicas sobre o brincar, capacitação ampla sobre o papel do adulto no brincar)
(LESTER; RUSSELL, 2008).

Para saber mais:

VÍDEO 11
• Sobre espaços e materiais não estruturados para brincar:
o Vídeo “Scrapstore PlayPods – Early Years”, com legenda em português.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=bKuzWd5eSx8

VÍDEO 12
• Sobre brincar na natureza:
o Conheça brincadeiras jogadas ao ar livre nas produções visuais do
Território do Brincar. Disponível em:
https://territoriodobrincar.com.br/videos-categorias/
• “A última criança na natureza: resgatando nossas crianças do transtorno do
déficit de natureza”, de Richard Louv (2009).
• Sobre brincar no contexto urbano:
o MARTINS, Edna. O brincar educa? A brincadeira como prática educativa
na família. São Paulo: PUC-SP, 2003. Disponível em:
https://tede2.pucsp.br/handle/handle/16425#preview-link0
o LESTER, Stuart; RUSSELL, Wendy. Play for change. Play, policy and
practice: a review of contemporary perspectives. Inglaterra: National
Children’s Bureau, 2008. Disponível em:
https://www.researchgate.net/publication/263087151_Play_for_a_Chan
ge_Play_Policy_Practice_A_Review_of_Contemporary_Perspectives
o WENETZ, Ileana. As crianças ausentes na rua e nas praças. Etnografia dos
espaços vazios. Civitas, Porto Alegre, v. 13, n. 2, p. 346-363, mai./ago.
2013. Disponível em:
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-
60892013000200346&lng=en&nrm=iso

O papel dos adultos no brincar e a necessidade de capacitação sobre o tema

105

106
O brincar é um direito da criança, mas a oferta das oportunidades para brincar é
um dever dos adultos, já que as crianças dependem deles para ter esse direito assegurado.
Mas, para isso, precisam primeiro reconhecer e valorizar a importância do brincar.
Pesquisa Nacional de 2017 mostra que apenas 17% dos pais brasileiros concordaram que
brincar e passear/ receber carinho e afeto é importante para o desenvolvimento das
crianças na primeira infância. Aparentemente, o conhecimento dos brasileiros sobre a
importância do brincar não mudou significativamente em mais de uma década. Em 2006,
apenas 14% dos pais brasileiros de crianças de seis a doze anos espontaneamente
reconheciam o brincar como importante para o desenvolvimento de seus filhos
(CARNEIRO; DODGE, 2007). Sem sensibilizar os pais para o assunto, não há como esperar
engajamento deles no tema, muito menos ação efetiva para mudar a realidade atual.
A demanda por conhecimento, informações qualificadas e práticas efetivas sobre
o brincar é muito grande. Além dos pais, há necessidade de sensibilizar, informar e
capacitar todos aqueles que cuidam das crianças, incluindo jovens, idosos, profissionais e
gestores públicos das mais diversas áreas que trabalham com ou para as crianças, sobre o
brincar. Há cinco anos, juntamente com a organização Terre des Hommes e em parceria com
o Centro Paula Souza (SP), a IPA Brasil ofereceu o primeiro curso de qualificação
profissional sobre o brincar no Brasil. O curso, já na décima quarta turma, vem sendo o mais
procurado na ETEC Parque da Juventude em SP, onde é oferecido: são mais de sete
candidatos interessados por vaga. A demanda por conhecimento, informações
qualificadas e práticas efetivas sobre o brincar é muito grande. Porém, ainda há muito a se
fazer para sensibilizar os brasileiros.

Para saber mais:

• Sobre capacitação em brincar e o curso de qualificação profissional em “Agentes


do Brincar”®, procure https://www.ipabrasil.org/agentesdobrincar

• Guia “O Direito de Brincar: Guia Prático Para Criar Oportunidades Lúdicas e


Efetivar o Direito de Brincar”. Disponível em:
https://www.ipabrasil.org/publicacoes

106

107
4.7. O Espaço e o Meio Ambiente

As crianças, assim como todos nós, vivem no espaço constituído pelo ambiente
natural e pelo ambiente construído. A organização do ambiente tem especial impacto para
o desenvolvimento da criança.

A criança tem direito a uma vida saudável, em harmonia com a natureza,


a inserir-se e viver como cidadã nas relações sociais, o que implica o
direito ao espaço na cidade adequado às suas características biofísicas e
de desenvolvimento, a participar da definição desses espaços e,
finalmente, a participar da construção de uma sociedade sustentável
(RNPI/CONANDA, 2010).

Os espaços urbanos em geral não são planejados para o tamanho da criança nem
para sua segurança. Diante dessa observação, a Fundação Bernard van Leer desenvolveu
o projeto “Urban 95”, sendo que 95 refere-se a 95 centímetros, que é a altura aproximada
de uma criança de três anos de idade. Como uma criança de três anos vive, percebe e
experimenta os espaços de sua casa, de sua escola, de sua cidade?
Entre os desafios observados para a primeira infância no contexto urbano estão a
falta de locais para brincar e descansar, o distanciamento da natureza, a poluição sonora, a
poluição do ar, as distâncias entre os vários locais que devem ser frequentados pela criança
e sua família, o risco da solidão e do isolamento, devido ao modo como são construídas as
habitações, sem espaços de convivência comunitária como praças, por exemplo.
Este direito ao espaço e ao meio ambiente relaciona-se intimamente com a
importância da construção de cidades e comunidades sustentáveis. É na primeira infância
que a criança desenvolve as competências para uma relação amigável e sustentável com o
meio ambiente e a natureza, a partir das experiências que tiver oportunidade de vivenciar
no espaço em que vive.
Uma das diretrizes do Estatuto da Cidade, que dialoga com a filosofia do Marco
Legal da Primeira infância é a “(...) garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido
como direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana,
ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as gerações presentes e
as futuras (Estatuto da Cidade, art., 2º, inciso I).
Nesta área, portanto está incluída a atenção à garantia e qualidade do espaço de
moradia, com saneamento básico e acesso ao transporte e à rede de serviços. A casa é um

107

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espaço essencial para o desenvolvimento humano, especialmente na primeira infância.
Contudo, ainda precisamos avançar nas políticas de moradia vinculadas ao apoio às
famílias para promoção do desenvolvimento integral na primeira infância.

Para saber mais:


Projeto URBAN 95. Disponível em: https://bernardvanleer.org/pt-br/solutions/urban95-
pt/

Referências:
BRASIL. Estatuto da Cidade. Lei 10.257, de 10 de julho de 2001. Estabelece diretrizes gerais da
política urbana e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm

REDE NACIONAL PRIMEIRA INFÂNCIA (RNPI) e CONANDA. Plano Nacional pela Primeira
Infância. 2010. Disponível em: http://primeirainfancia.org.br/wp-content/uploads/2015/01/PNPI-
Resumido.pdf

108

109
4.8. A proteção da criança contra toda forma de violência

Entre os adultos, antigamente, a criança não passava


De um pequeno joguete. Não chegava a ser incômoda,
porque nem mesmo tinha o valor de incomodar.
Mal chegava aos quatro, cinco anos,
Tinha qualquer servicinho esperando.
Bem diziam os mais velhos: “serviço de criança é pouco
E quem o perde é louco.”
Era uma coisa restringida, sujeitada por todos os meios discricionários
A se enquadrar dentro de um molde certo, cujo gabarito era o adulto. (...)
Cora Coralina – Criança – Vintém de Cobre

Desde o artigo 227 da Constituição Federal, regulamentado pelo Estatuto da


Criança e do Adolescente, a proteção das crianças contra a violência é uma
responsabilidade compartilhada entre Família, Sociedade e Estado. A Doutrina da
Proteção Integral preconiza uma atuação em rede, a partir do Sistema de Garantia de
Direitos, pois a violência é um fenômeno complexo e multicausal, que só pode ser
enfrentado a partir de uma articulação entre vários serviços.
Ao compreendermos mais profundamente, a partir da neurociência, o impacto
epigenético das experiências vividas na primeira infância, o enfrentamento e a prevenção
de maus tratos, castigos físicos e demais formas de violência sofridas desde a gestação até
os seis anos de idade precisam ganhar ainda mais prioridade.
A criança tem prioritariamente o direito humano de viver sem violência, e esse
também é o caminho para interromper a perpetuação da violência. Conforme análise do
pediatra Antônio Lisboa (2007), a fim de “prevenir a ‘fabricação’ de violentos, temos de
atuar no período pré-patogênico, ou seja, da concepção aos 6 anos, principalmente antes
dos 3 anos”. Na unidade referente à “Parentalidade positiva”, vamos conhecer os estilos
parentais, visto ser importante promovermos uma nova cultura sobre a educação dos
filhos que não seja pautada no uso de castigos físicos ou psicológicos. E esta situação é tão
grave que ensejou a criação da Lei 13.010/2014, conhecida como Lei Menino Bernardo,
para estabelecer o direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem
o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante.
A violência representa uma das piores experiências adversas na infância (EAI),
assim conceituadas aquelas que geram estresse tóxico e interferem no curso normal do
desenvolvimento, pois tornam as crianças física, psíquica ou socialmente vulneráveis

109

110
(GILBERTI, 2010). E um dos piores efeitos da violência é fragilização do vínculo de
confiança necessário para um desenvolvimento saudável..

As violências praticadas contra a criança

Do latim violentia, o termo violência pode ser definido como o ato de violar outrem
ou de se violar. Refere-se a “algo fora do estado natural, algo ligado à força, ao ímpeto, ao
comportamento deliberado que produz danos físicos, tais como ferimentos, tortura, morte
ou danos psíquicos, que produz humilhações, ameaças, ofensas” e que expressa atos
contrários à liberdade e à vontade de alguém (PAVIANI, 2016). Trazendo para o campo da
Primeira Infância, a Lei 13.431/2017, em seu segundo artigo, ao referir-se ao gozo da
criança e do adolescente dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, diz que
para preservação da saúde física e mental e para o desenvolvimento moral, intelectual e
social são necessárias oportunidade e facilidades para a proteção integral e para viver sem
violências. Nos termos da citada legislação, são formas de violência:

I – violência física, entendida como a ação infligida à criança ou ao


adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corporal ou que lhe
cause sofrimento físico;
II – violência psicológica:
a) qualquer conduta de discriminação, depreciação ou desrespeito em
relação à criança ou ao adolescente mediante ameaça, constrangimento,
humilhação, manipulação, isolamento, agressão verbal e xingamento,
ridicularização, indiferença, exploração ou intimidação sistemática
(bullying) que possa comprometer seu desenvolvimento psíquico ou
emocional;

110

111
b) o ato de alienação parental, assim entendido como a interferência na
formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou
induzida por um dos genitores, pelos avós ou por quem os tenha sob sua
autoridade, guarda ou vigilância, que leve ao repúdio de genitor ou que
cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculo com este;
c) qualquer conduta que exponha a criança ou o adolescente, direta ou
indiretamente, a crime violento contra membro de sua família ou de sua
rede de apoio, independentemente do ambiente em que cometido,
particularmente quando isto a torna testemunha;
III – violência sexual, entendida como qualquer conduta que constranja a
criança ou o adolescente a praticar ou presenciar conjunção carnal ou
qualquer outro ato libidinoso, inclusive exposição do corpo em foto ou
vídeo por meio eletrônico ou não, que compreenda:
a) abuso sexual, entendido como toda ação que se utiliza da criança ou do
adolescente para fins sexuais, seja conjunção carnal ou outro ato
libidinoso, realizado de modo presencial ou por meio eletrônico, para
estimulação sexual do agente ou de terceiro;
b) exploração sexual comercial, entendida como o uso da criança ou do
adolescente em atividade sexual em troca de remuneração ou qualquer
outra forma de compensação, de forma independente ou sob patrocínio,
apoio ou incentivo de terceiro, seja de modo presencial ou por meio
eletrônico;
c) tráfico de pessoas, entendido como o recrutamento, o transporte, a
transferência, o alojamento ou o acolhimento da criança ou do
adolescente, dentro do território nacional ou para o estrangeiro, com o
fim de exploração sexual, mediante ameaça, uso de força ou outra forma
de coação, rapto, fraude, engano, abuso de autoridade, aproveitamento
de situação de vulnerabilidade ou entrega ou aceitação de pagamento,
entre os casos previstos na legislação;
IV – violência institucional, entendida como a praticada por instituição
pública ou conveniada, inclusive quando gerar revitimização (BRASIL, Lei
13.431/2017, art. 4º).

Segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), os dados de totalização mais


recentes referentes à violência contra a criança e ao adolescente no Brasil remontam ao
ano de 2017, com uma média de 233 agressões de diferentes tipos (física, psicológica e
tortura) por dia, segundo dados extraídos pela SBP do Sistema Nacional de Agravos de
Notificação (SINAN, Ministério da Saúde), porém não estão computados violência e
assédio sexual, abandono, negligência, trabalho infantil, entre outros tipos de agressões.
Se levarmos em consideração que esses dados se referem ao atendimento de crianças e
adolescentes na rede de saúde, e que, em muitos casos, os agressores não levam as vítimas
para receberem os cuidados médicos – o que em geral só acontece quando a violência
assume proporções graves –, podemos admitir que há uma enorme subnotificação e que
os números da violência são alarmantes.

111

112
Trabalho Infantil
Outro tipo de violência é o trabalho infantil. Atualmente, por lei, o trabalho é
permitido a partir dos 16 anos, desde que não seja em situação insalubre, perigosa ou no
horário noturno. Aos 14, é permitido o ingresso como aprendizes. Na medida em que
aumenta a vulnerabilidade das famílias, com a perda de renda, as crianças saem para ajudar
no orçamento familiar. As consequências são o aumento da evasão escolar e danos físicos
e emocionais, com grande prejuízo para o desenvolvimento da criança e do adolescente
com menos de 14 anos. A consequência disso é a perpetuação ciclo da pobreza.
O que se percebe hoje, em virtude do alto número do desemprego e da retração da
economia, em virtude da pandemia, é um aumento do trabalho infantil, seja para o
complemento da renda, seja pela ajuda no trabalho doméstico, conforme pesquisa
realizada pelo UNICEF, em um levantamento com 52,7 mil famílias em São Paulo (MELLO,
2020).

Você conhece o que é violência comunitária?

Não é suficiente intervir ou buscar a proteção apenas no âmbito da família da


criança, pois a comunidade na qual ela está vive também tem um impacto fundamental em
sua formação. A partir da compreensão da importância do ambiente no qual a a criança e
sua família estão inseridas, o conceito de violência comunitária possibilita ampliar o
espectro das ações que são necessárias para prevenção da violência na primeira infância.

A violência comunitária é entendida como a violência interpessoal na


comunidade, não perpetrada por um membro da família (...). Pode ser um
subproduto de diferentes circunstâncias, variando de um crime na
vizinhança até conflito civil contínuo ou guerra. A exposição à violência é
também definida como a experiência da violência de segunda-mão (por
exemplo, ouvir falar sobre violência), ser a vítima direta de um ato de violência
ou testemunhar violência que envolva terceiros. (RICHTERS; MARTINEZ,
199, citado em: GUERRA;DIERKHISING, 2011).

Para aprofundar este tema, sugerimos a leitura do artigo completo, disponível na


Enciclopédia sobre o Desenvolvimento na Primeira Infância: http://www.enciclopedia-
crianca.com/violencia-social/segundo-especialistas/os-efeitos-da-violencia-comunitaria-
no-desenvolvimento-
a#:~:text=A%20exposi%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0%20viol%C3%AAncia%20influ
encia,que%20interferem%20com%20sua%20adequa%C3%A7%C3%A3o.

112

113
Legislação e Sistema de Garantia de Direitos

Na trajetória iniciada no art. 227 da Constituição Federal e no art. 5º do ECA, o


Marco Legal da Primeira Infância reforça que a proteção contra toda forma de violência é
uma área prioritária na formulação e execução das políticas públicas (Lei 13.257/2016, art.
5º). Um dispositivo importante do Marco Legal da Primeira Infância é o fortalecimento das
competências dos profissionais, por meio de capacitação continuada, para efetivamente
promover a prevenção e a proteção contra toda forma de violência contra a criança (Lei
13.257/2016, art. 10º).
A articulação do Sistema de Garantia de Direitos é fundamental para mudar o
cenário de violência contra nossas crianças, em uma nova abordagem de trabalho com as
famílias, na perspectiva do atendimento integral mais precoce possível. Nas Unidade 2 e 3
abodaremos maiores detalhes dessa atuação.
O que é o Conselho Tutelar? Qual é o papel da Assistência
Social?

Qual é o papel da Saúde? Qual é o papel da Educação?

113

114
Para saber mais:

• Ouça a música Semente de Emicida que de modo poético trata de um tema delicado
como o trabalho infantil. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=C7l0AB--I3c>
• O filme “Um Crime entre nós” é um olhar ousado e provocativo para a luta pelo fim da
exploração sexual de crianças e adolescentes. Disponível em:
https://www.videocamp.com/pt/movies/um-crime-entre-nos>
• Sobre o aumento da violência no contexto da Pandemia da COVID-19:
<https://nacoesunidas.org/unicef-criancas-e-adolescentes-estao-mais-expostos-a-
violencia-domestica-durante-pandemia/>

Referências bibliográficas

BRASIL. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Disque 100. 2020. Disponível
em: <https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/disque-100-1>. Acesso em: 17 set.
2020.

BRASIL. Constituição Federal. Título VIII. Capítulo VII. Da Família, da Criança, do Adolescente, do
Jovem e do Idoso. Disponível em:
<https://www.senado.leg.br/atividade/const/con1988/con1988_06.06.2017/art_227_.asp>.
Acesso em: 17 set. 2020.
BRASIL. Marco Legal da Primeira Infância. Lei 13.257 de 8 de março de 2016. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm

BRASIL. Lei Menino Bernardo. Lei 13.010 de 26 de junho de 2014. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13010.htm

114

115
BRASIL. Lei da Escuta Protegida. Lei 13.431 de 4 de abril de 2017. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13431.htm

CORALINA, Cora. Vintém de cobre: meias confissões de Aninha. 2. ed. Goiânia: Editora da
Universidade Federal de Goiás, 1984.

GILBERT K. L. et al. Childhood Adversity and Adult Chronic Disease – An Update from Ten States
and the District of Columbia. 2010. Disponível em: <https://www.ajpmonline.org/article/S0749-
3797(14)00512-1/pdf>. Acesso em: 17 set. 2020.

GUERRA, N.;DIERKHISING, C. Os efeitos da violência comunitária no desenvolvimento da


criança. University of Delawarea, EUA, University of California at Riverside, EUA, 2011. Em
ENCICLOPÉDIA DO DESENVOLVIMENTO NA PRIMEIRA INFÂNCIA. Disponível em:
http://www.enciclopedia-crianca.com/violencia-social/segundo-especialistas/os-efeitos-da-
violencia-comunitaria-no-desenvolvimento-
da#:~:text=A%20exposi%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0%20viol%C3%AAncia%20influencia,qu
e%20interferem%20com%20sua%20adequa%C3%A7%C3%A3o.

LISBOA, Antônio M. A primeira infância e as raízes da violência: propostas para diminuição da


violência. Brasília: LGE, 2006.

MELLO, Daniel. Aumenta incidência de trabalho infantil em São Paulo durante pandemia. Agência
Brasil. 2020. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2020-
08/aumenta-incidencia-de-trabalho-infantil-durante-pandemia-em-sao>. Acesso em: 17 set. 2020.

PAVIANI, G. Conceitos e formas de violência. Conceitos e formas de violência. Caxias do Sul, RS:
Educs, 2016. Disponível em: <https://www.ucs.br/site/midia/arquivos/ebook-conceitos-
formas_2.pdf>. Acesso em: 17 set. 2020.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Manual de Atendimento às crianças e adolescentes


vítimas de violência. Sociedade Brasileira de Pediatria. 2. ed. Brasília: Conselho Federal de
Medicina, 2018.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. 233 casos de violência física ou psicológica contra


crianças e adolescentes são notificados todos os dias. Disponível em:
<https://www.sbp.com.br/imprensa/detalhe/nid/233-casos-de-violencia-fisica-ou-psicologica-
contra-criancas-e-adolescentes-sao-notificados-todos-os-dias/>. Acesso em: 17 set. 2020.

UNICEF. Violência contra crianças é crime e deixa traumas para toda a vida. Disponível em:
<https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/violencia-sexual-contra-criancas-e-
crime-e-deixa-traumas-para-toda-a-vida>. Acesso em: 17 set. 2020.

115

116
4.9. A prevenção de acidentes

É importante conciliarmos as medidas de prevenção de acidentes, pois geram


intercorrências adversas no processo desenvolvimental das crianças, com a noção de que
proteger não é tolher a liberdade da criança de explorar o mundo. As informações aqui
compartilhadas são oriundas da Organização Criança Segura e do Plano Nacional pela
Primeira Infância – Projeto Observatório Nacional da Primeira Infância – Mapeamento da
Ação Finalística – Evitando Acidentes na Primeira Infância (2014), baseadas em dados do
Ministério da Saúde l e da Organização Mundial de Saúde, assim como dos cadernos da
Equipe e da Família “Toda Hora é Hora de Cuidar”.

O que é acidente?

Segundo a Organização Mundial de Saúde, acidentes são lesões não intencionais


identificadas como eventos de trânsito (atropelamento, passageiro de veículos e ciclista),
afogamento, obstrução de vias aéreas (sufocação, estrangulamento e engasgamento),
envenenamento, intoxicação, queimaduras, choques elétricos, acidentes com armas de
fogo e outros.

Quase três mil e seiscentas crianças de até 14 anos morrem anualmente e outras 111 mil são
hospitalizadas no Brasil. As crianças são mais vulneráveis a uma série de perigos porque suas
habilidades sensório-motoras ainda não se desenvolveram totalmente. Assim, na Primeira
Infância precisam de mais atenção e cuidados para não sofrerem acidentes, porque ainda não
tem muita noção do que é perigo.

Fatores relacionados aos acidentes com crianças


Os números são contundentes e apontam que milhares de crianças perdem
oportunidades preciosas do desenvolvimento por adoecimento e/ou internações todos os
anos no Brasil. Isto se deve ao fato de que a criança não possui todas as habilidades para se
prevenir sozinha de acidentes (vulnerabilidade da criança), de modo que os adultos
ocupam um lugar privilegiado nesta função.
Crianças vivem em um mundo construído para adultos, muitas vezes realizando
atividades em discordância com sua fase de desenvolvimento, com a reprodução de
estratégias de prevenção feitas para os adultos. Assim, a possível falta de orientações
sobre prevenção de acidentes contribui para aumentar a vulnerabilidade da criança aos
acidentes. Compreendendo que os fatores socioeconômicos estão aliados aos fatores do

116

117
desenvolvimento na prevenção de acidentes, as crianças socialmente mais vulneráveis são
as que mais precisam estar no topo das prioridades da atenção e dos recursos contra
acidentes.
Diversos fatores socioeconômicos se relacionam à ocorrência de acidentes na
Primeira Infância e podem afetar o risco de acidentes de diversas formas, incluindo renda
familiar, educação materna, estrutura familiar, pais solteiros, idade da mãe, número de
pessoas na casa, número de filhos, tipo de moradia, nível de superlotação etc. Em famílias
pobres, os pais podem não ter disponibilidade para cuidar ou supervisionar
adequadamente seus filhos e terão que deixá-los sozinhos ou com irmãos para irem
trabalhar. Comprar equipamentos de segurança, como cadeirinhas para carro, protetores
de tomada e capacetes, pode não ser possível para famílias nessas condições e que em
muitos casos estão expostas a ambientes perigosos.

Medidas simples de prevenção, como mudança de comportamento, adaptação do ambiente ou


uso de um equipamento de segurança poderiam evitar 90% da mortalidade infantil por causas
acidentais.

Impacto negativo dos acidentes na vida das crianças e da família

O trauma é a principal causa de morte de crianças e adultos jovens, e uma questão


de saúde pública mundial, e o índice de sequelas temporárias ou permanentes também é
elevado. Os acidentes que mais matam crianças entre 0 e 14 anos são acidentes de trânsito,
afogamentos e sufocação.

Figura 1. Distribuição de acidentes entre crianças menores de 1 ano a 14 anos por tipo de
acidente. Disponível em: <https://criancasegura.org.br/dados-de-acidentes/>

117

118
O que trabalhar com as famílias
Alguns cuidados com a criança são essenciais, como mantê-la sempre sob a
vigilância de um adulto, não confiar que ela ainda não é capaz de rolar, evitar que crianças
cuidem de outras, tornar o ambiente seguro, impedir o acesso a locais onde haja risco de
queda, impedir o acesso a líquidos quentes ou inflamáveis, isqueiros, fósforos, fios e
tomadas elétricas, evitar a ingestão de produtos tóxicos, proteger de ferimentos,
afogamento e asfixias, e, principalmente, dar exemplo e ensinar medidas de segurança.

Prevenir acidentes não é retirar a liberdade da criança de descobrir o mundo, mas garantir que
ela possa fazer isto em segurança!

O que trabalhar com os profissionais e o Poder Público


Na área do brincar é necessário estabelecer padrões de segurança para os espaços
físicos e equipamentos destinados ao brincar das crianças de até seis anos, respeitando as
especificidades do desenvolvimento físico e psicomotor condizentes com as atividades
lúdicas e as vulnerabilidades em relação aos acidentes. É preciso estimular a construção e
a manutenção dos espaços de lazer segundo as normas de segurança e a criação ou
ampliação de oportunidades de lazer, conforme o art. 71 do ECA, que diz que a criança e o
adolescente têm direito à informação, cultura, lazer, esportes, diversões, espetáculos,
produtos e serviços que respeitem sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
No contexto do meio ambiente e dos espaços da criança, é importante promover a
adoção de normas de segurança em todos os espaços públicos e privados nos quais as
crianças vivem e naqueles que elas frequentam; estabelecer normas de segurança contra
acidentes na construção de residências unifamiliares, conjuntos residenciais, centros de
educação infantil e outros espaços públicos frequentados por crianças; fomentar a
redução de impostos para fabricação e comercialização de equipamentos que visem à
prevenção de acidentes; instituir normas de segurança para piscinas residenciais, de
clubes, de escolas e de outras áreas públicas e privadas; e incluir a prevenção de acidentes
na primeira infância como tema obrigatório nos cursos de graduação em áreas que formam
profissionais.

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119
VÍDEO 13
Assista ao vídeo “Acidentes na Primeira Infância, com isso não se brinca”. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=k3Ra3Hnnppo

Para saber mais:

• Casa segura, criança protegida – Prevenção de acidentes domésticos com


crianças e adolescentes. Disponível em: http://www.sejus.df.gov.br/wp-
conteudo/uploads/2020/05/3.pdf

• Plano Nacional da Primeira Infância: Evitando acidentes na Primeira Infância.


Disponível em: <primeirainfancia.org.br/wp-content/uploads/2015/01/PNPI-
Completo.pdf

• Toda Hora é Hora de Cuidar – Caderno da Família – Projetos Nossas Crianças:


Janelas de Oportunidade. Disponível em:
<http://www.ee.usp.br/site/index.php/paginas/mostrar/493/925/85

• Relatório de Mapeamento Evitando Acidentes, da Rede Nacional da Primeira


Infância. Disponível em: <http://primeirainfancia.org.br/wp-
content/uploads/2015/01/RELATORIO-DE-MAPEAMENTO-EVITANDO-
ACIDENTES-versao-4-solteiras.pdf

• Dicas, informações e vídeos sobre acidentes e prevenção – Criança Segura.


Disponível em: https://criancasegura.org.br/

• Mapeamento da Ação Finalística Evitando Acidentes na Primeira Infância.


Disponível em: http://primeirainfancia.org.br/wp-
content/uploads/2015/01/RELATORIO-DE-MAPEAMENTO-EVITANDO-
ACIDENTES-versao-4-solteiras.pdf

• Cartilha de Prevenção de Acidentes Domésticos. Disponível em:


https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/abril/ministerio-
publica-guia-de-prevencao-a-acidentes-domesticos-e-primeiros-
socorros/SNDCA_PREVENCAO_ACIDENTES_A402.pdf

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120
4.10. Proteção da criança contra a pressão consumista

A criança como público-alvo de mensagens publicitárias


O consumismo é uma das características mais marcantes da nossa sociedade. As
pessoas são estimuladas a consumir acima de suas necessidades e impulsivamente.
Estratégias e campanhas publicitárias cada vez mais sofisticadas e onipresentes buscam
nos convencer a adquirir produtos e contratar serviços nem sempre úteis ou necessários,
com a promessa de nos alçar a uma condição de pertencimento e destaque social.

Somos tomados por uma sensação desagradável de exclusão, de não


pertencimento. Ironicamente, quando não compramos coisas que são
validadas pelo marketing como necessárias à felicidade, nos sentimos
excluídos e até mesmo fracassados e deprimidos. Em casos extremos, o
que um indivíduo consome passa a ser sentido como uma demonstração
de sua identidade e da sua capacidade frente a seu grupo social. Algo ao
estilo: “Sou o que consumo, e o que consumo estampa aos outros o que
sou” (SILVA, 2014).

As crianças, apesar de serem consideradas hipervulneráveis nas relações de


consumo justamente por se encontrarem em um processo peculiar de formação física,
cognitiva, social e emocional, não passam imunes a essa lógica de consumo sem limites.
Desde a mais tenra idade, as crianças são estimuladas a desejar e consumir produtos e
serviços.

Atualmente, a conectividade e o consumo pautam nossa socialização e


principalmente de nossas crianças e jovens. As crianças foram elevadas,
pelo mercado, ao status de consumidoras antes de estarem ao exercício
pleno de sua cidadania e são desde cedo, incitadas a fazer parte da lógica
consumista. Isto gera impactos em seu desenvolvimento físico, cognitivo
e emocional, além de contribuir para o agravamento de questões como
obesidade infantil, erotização precoce e consumo de álcool e tabaco,
estresse familiar, violência e diminuição do brincar.

Mas qual é o interesse das empresas ao direcionar suas estratégias comerciais para
o público infantil? As crianças são consideradas fonte de intensa rentabilidade por
empresas de diversos segmentos, em razão de exercerem forte influência sobre os adultos
para aquisição de produtos e serviços no âmbito de seus lares. Segundo pesquisa do
Interscience (2003), as crianças brasileiras influenciam em até 80% as decisões de compras
domésticas. Já estudo de 2019 promovido pelo Instituto Locomotiva aponta que 9 em cada
10 pais/mães são influenciados pelas crianças nas compras do supermercado e 70%

120

121
afirmam gastar mais nas compras quando estão acompanhados dos filhos. Ainda, além de
ser entendida como a consumidora de hoje e promotora de venda dentro do seu círculo
familiar, a criança também é percebida pelo mercado como a consumidora do futuro, visto
que, como são expostas e impactadas por estratégias comerciais desde a mais tenra idade,
tendem a ser mais fiéis a certas marcas e ao próprio hábito consumista que lhes é imposto.

O que diz a legislação


Porém, a despeito de a veiculação de publicidade dirigida ao público infantil ser
prática ainda habitual, ela é ilegal no Brasil. A Doutrina de Proteção Integral, firmada no
artigo 227 da Constituição Federal, estabelece a responsabilidade compartilhada entre
família, Estado e sociedade – o que inclui empresas, meios de comunicação social e
população em geral – de assegurar direitos fundamentais às crianças com absoluta
prioridade.
No mesmo sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990)
garante o melhor interesse da criança em qualquer tipo de relação, sua proteção integral,
o respeito à sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e, ainda, o dever de toda
a sociedade na prevenção de ameaças ou violação dos direitos da criança.
Em observância ao disposto na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do
Adolescente, o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) aplica às relações de
consumo o valor social de proteção dos direitos da criança. O artigo 37, parágrafo 2º, do
CDC estabelece a ilegalidade da publicidade direcionada a crianças ao reconhecer que a
publicidade infantil se vale da deficiência de julgamento e experiência das crianças, de
modo a buscar a garantia o melhor interesse delas e protegê-las dos abusos praticados
pelo mercado de consumo. E o artigo 39, inciso IV, proíbe práticas de fornecedores que
buscam convencer o consumidor, valendo-se de suas fraquezas ou ignorância em razão de
sua idade ou conhecimento.
Além disso, com o objetivo de complementar o disposto no Código de Defesa do
Consumidor e reforçar o caráter de ilegalidade da prática de publicidade infantil, a
Resolução nº 163 do Conanda, publicada em 2014, definiu critérios para a identificação
das estratégias de publicidade e comunicação mercadológicas dirigidas a crianças, assim
consideradas aquelas cuja intenção é persuadir o público infantil ao consumo de marca,
produto ou serviço, usando, para tanto, alguns elementos típicos, como promoções,
linguagem infantil, personagens e celebridades infantis, animações, entre outros. A

121

122
Resolução ainda considera abusiva a publicidade no interior de creches e instituições de
ensino infantil e fundamental, inclusive em seus uniformes ou materiais didáticos.
Por fim, o Marco Legal da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016), em seu artigo 5º,
estabelece como prioridade na promoção de políticas públicas para a primeira infância a
proteção contra toda a forma de pressão consumista e a adoção de medidas que evitem a
exposição precoce à comunicação mercadológica.

Impactos negativos das estratégias mercadológicas dirigidas a crianças

A publicidade infantil é apontada como um dos elementos que acarreta impactos


negativos que hoje são sentidos por toda sociedade, como: formação e incorporação de
hábitos e valores materialistas e consumistas; adultização e erotização precoces;
interferência nas liberdades de pensamento, opinião e cultura; competição entre pares;
estresse familiar; superendividamento das famílias; prejuízos ambientais e modelos de
consumo alimentar.

Os maiores efeitos adversos da publicidade abusiva dirigida à criança


dizem respeito à formação de sua personalidade, seu caráter e seus
valores éticos, sociais, culturais e morais. Publicidades geram, no final
das contas, tristezas, decepções e frustações por motivos fúteis e
banais – tais como o de não possuir determinado produto ou o de não
usufruir determinado serviço – que nunca seriam dessa forma
vivenciados pela criança. Ou, quanto pior, geram inveja, ganância, gula
e um consumismo despropositado (INSTITUTO ALANA, 2009).

A pesquisa “Publicidade Infantil em Tempos de Convergência”, fruto de termo e


cooperação celebrado entre a Universidade Federal do Ceará e o Ministério da Justiça, é a
mais recente e abrangente análise de caráter público e nacional feita no Brasil sobre o
grande volume de publicidade direcionada a crianças. Uma das questões levadas às
crianças participantes da pesquisa foi sobre seu sentimento em relação a não ter coisas
que desejavam, anunciadas a elas por meio da publicidade, mas que os amigos tinham:

Tanto nas escolas públicas quanto particulares, quando os amigos


apresentam produtos que elas desejam, mas não têm, muitas crianças
relataram ficar chateadas; nutrirem os sentimentos de raiva, inveja e de
inferioridade; e até mesmo ter tido desejos condenáveis de roubar o
amigo ou quebrar a televisão que mostra o produto que o amigo tem. Se
a chateação por não ter um objeto desejado é compreensível e,
certamente, bastante comum, alguns sentimentos e desejos acima
indicados são reveladores do nível de pressão a que essas crianças
estão submetidas e do quanto o discurso desleal que associa posse e

122

123
pertencimento é cruel em relação a elas, em especial em uma sociedade
desigual como a nossa.

A publicidade infantil de produtos alimentícios não saudáveis tem contribuído para


mudanças nos padrões alimentares, por estimular o consumo excessivo e habitual de
produtos com baixo valor nutricional e altos teores de gordura, sódio e açúcar, o que vem
gerando impacto na saúde dos indivíduos, como o aumento de doenças crônicas não
transmissíveis. Assim, merece destaque a versão do Guia Alimentar para a População
Brasileira, publicado em 2014 pelo Ministério da Saúde, que cita a publicidade,
especialmente quando direcionada a crianças, como um obstáculo à alimentação saudável
por estimular o consumo habitual de produtos alimentícios ultraprocessados e influenciar
o aumento dos índices de obesidade infantil no Brasil.
Outros pontos também devem ser considerados quando refletimos sobre a
prática de publicidade infantil. Por exemplo, não são incomuns anúncios publicitários em
que pais e mães demonstram seu amor pelos filhos por meio da compra de bens. A partir
da exposição a esse tipo de estratégia comercial, a criança está absorvendo conceitos,
padrões, valores e modelos de que ela precisa ter, assim como o amiguinho tem; de que
ela não precisa refletir sobre suas escolhas de consumo; de que ela precisa consumir
determinado produto para ser aceita e admirada no círculo de amigos, e que presentes
são a forma mais autêntica de demonstração de afeto e amor.
O estresse familiar acontece quando o desejo da criança em adquirir os produtos
anunciados leva a indagações e conflitos, gerados, preliminarmente, por uma publicidade
infantil. É depois, na escola, no bairro e no círculo de amigos, que a criança se sente
confrontada ao se dar conta de que outras crianças possuem produtos que ela não tem.
A publicidade infantil incita a criança a suplicar pelos produtos e serviços anunciados,
colocando pais, mães e responsáveis na situação complicada de ter que lhes dizer “não”
inúmeras vezes. Com isso, em ver de fortalecer a autonomia das famílias, a prática de
publicidade dirigida a crianças cria uma situação de rivalidade e enfraquece a autoridade
dos adultos responsáveis ao permitir que empresas falem diretamente com seus filhos.
Em 2016, a Organização das Nações Unidas, por meio de especialistas em dívida
externa e direitos humanos e em direito à saúde, elaborou declaração com um alerta
global sobre o impacto da publicidade dirigida a crianças. No documento, os especialistas
destacam que a publicidade infantil tem o potencial de moldar o comportamento

123

124
financeiro das crianças ao incutir, desde cedo, uma cultura de consumo excessivo e
endividamento. O texto também aponta que a publicidade direcionada ao público infantil
pode levar ao endividamento das famílias, que, pressionadas a suprir necessidades e
desejos de seus filhos, acabam comprando itens desnecessários (geralmente à custa de
outras necessidades domésticas importantes) que estão além do seu orçamento e sem
levar em conta as consequências financeiras de longo prazo.

Medidas que podem evitar o consumismo infantil

Diante de a prática de publicidade infantil ser proibida pela legislação brasileira e


do dever compartilhado de toda a sociedade para garantir com prioridade absoluta os
direitos das crianças, esse tema não deve se restringir à esfera do indivíduo. Com vistas à
garantia da prioridade absoluta dos direitos das crianças, seu melhor interesse e sua
proteção integral, é necessária uma atuação conjunta entre os todos os atores da
sociedade no combate à publicidade infantil: Estado, família, educadores, população em
geral e empresas.
É perverso sustentar que as famílias, sozinhas, seriam capazes de combater a
indústria bilionária do marketing infantil e garantir uma melhor educação individualmente
do que se amparadas por políticas públicas. Justamente por isso, diversos órgãos do poder
público, no âmbito de defesa dos direitos de crianças e consumidores, e a própria justiça
brasileira, em especial por meio do Superior Tribunal de Justiça, vêm reiterando o
entendimento de ilegalidade da prática de publicidade dirigida a crianças por empresas de
diferentes setores.
Lógico que, além da aplicação do disposto na legislação brasileira, famílias e
educadores também têm um papel fundamental na formação das crianças, para
contribuírem com o desenvolvimento de cidadãos responsáveis e conscientes de suas
escolhas de consumo. As famílias e toda a comunidade escolar podem, no dia a dia, adotar
pequenas atitudes para proteger as crianças do consumismo. Em casa, por exemplo, os
responsáveis pelas crianças podem criar o hábito de realizar junto com elas atividades que
não envolvam mídia e consumo, como passeios a parques, leitura e teatro, e impor limites
e controle sobre o uso da televisão e internet. Além disso, é importante orientar as crianças
sobre a real finalidade da publicidade, ensinando-as a avaliar a necessidade de um produto
antes de adquiri-lo. Pais e mães também podem contribuir na comunidade e nas escolas,

124

125
fomentando a reflexão sobre o consumismo infantil por meio de rodas de conversa e
organização de Feiras de Trocas de Brinquedos.

Para saber mais:

• “Criança e Consumo – 10 anos de Transformação”. Instituto Alana. Disponível em:


https://criancaeconsumo.org.br/wp-
content/uploads/2017/02/CRIANCA_CONSUMO_10-ANOS-DE-
TRANSFORMACAO.pdf

VÍDEO 14
• Documentário “Criança: a alma do negócio”. Disponível em:
https://www.videocamp.com/pt/movies?query=crian%C3%A7a+a+alma+do+neg%C
3%B3cio

VÍDEO 15
• Documentário “Muito Além do Peso”. Disponível em:
https://www.videocamp.com/pt/movies/muito-alem-do-peso

• Como identificar publicidade infantil? Disponível em:


https://criancaeconsumo.org.br/noticias/duvidas-publicidade-infantil/

• Publicidade Infantil na TV paga – Monitoramento de 2019. Disponível em:


https://criancaeconsumo.org.br/wp-content/uploads/2019/10/Monitoramento-
2019_Sum%C3%A1rio-Executivo-1.pdf

• Os impactos da proibição da publicidade dirigidas às crianças no Brasil. Disponível


em: https://criancaeconsumo.org.br/wp-
content/uploads/2014/02/Relatorio_TheEconomist.pdf

• Relatório sobre o Impacto do Marketing na Fruição dos Direitos Culturais. Disponível


em: https://criancaeconsumo.org.br/wp-
content/uploads/2014/02/RELATORIO_FARIDA_ONU.pdf

• Parecer do Professor Bruno Miragem – A Constitucionalidade da Resolução nº 163


do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Disponível em:
https://criancaeconsumo.org.br/wp-
content/uploads/2017/02/Parecer_ProfBrunoMiragem.pdf

• Parecer do Professor Virgílio Afonso da Silva – A Constitucionalidade da Restrição da


Publicidade de Alimentos e de Bebidas não alcoólicas voltada ao Público Infantil.
Disponível em: https://criancaeconsumo.org.br/wp-
content/uploads/2017/02/Parecer_Virgilio_Afonso_.pdf

125

126
• Consumismo infantil: na contramão da sustentabilidade. Disponível em:
https://criancaeconsumo.org.br/wp-content/uploads/2013/02/A1.pdf
• O que você precisa saber sobre a decisão do STJ. Disponível em:
https://criancaeconsumo.org.br/noticias/o-que-voce-precisa-saber-sobre-a-decisao-
do-stj/

Legislação sobre publicidade infantil

• Constituição da República Federativa do Brasil – Documento legislativo mais


importante do país, fundante da República Federativa do Brasil e orientador de
todo o sistema jurídico nacional.
• Decreto nº: 99.710/1990 – Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da
Criança – Estabelece um novo paradigma de proteção à infância e à adolescência,
determinando que todas as crianças e adolescentes são sujeitos de direitos
titulares da chamada proteção integral.
• Lei nº: 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – Estabelece
medidas concretas para a garantia dos direitos de crianças e adolescentes.
• Lei nº: 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor (CDC) – Legislação
fundamental para regulamentar no Brasil as relações de consumo, alterando
regras tradicionais do direito civil e adequando-as para uma sociedade de
consumo.
• Resolução nº 163/2014 do Conanda – Dispõe sobre a abusividade do
direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao
adolescente.
• Lei 13.257/2016 – Marco Legal da Primeira Infância – Dispõe obre as políticas
públicas para a primeira infância.

Referências bibliográficas
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Guia alimentar para a população brasileira. Brasília: MS, 2014.
Disponível em:
<https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf>.
Acesso em 7 out. 2020.
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Sistema Nacional de Vigilância Alimentar e Nutricional.
Brasília: MS, 2018.
GRUPO DE PESQUISA DA RELAÇÃO INFÂNCIA, JUVENTUDE E MÍDIA (GRIM). Publicidade
infantil em tempo de convergência. s/d. Disponível em:
<https://www.defesadoconsumidor.gov.br/images/manuais/publicidade_infantil.pdf>. Acesso em
7 out. 2020.
INSTITUTO LOCOMOTIVA. Crianças Brasileiras. 2019. Disponível em:
https://criancaeconsumo.org.br/wp-content/uploads/2019/11/Crian%C3%A7as-brasileiras-
Locomotiva-Dotz-PPT-Outubro-de-2019.pdf>. Acesso em 7 out. 2020.
INTERSCIENCE. Como atrair o Consumidor Infantil, atender expectativas dos Pais e ainda,
ampliar as Vendas. 2003. Disponível em: https://criancaeconsumo.org.br/wp-
content/uploads/2014/02/Doc-09-Interscience-1.pdf>. Acesso em 7 out. 2020.
OFFICE OF THE UNITED NATIONS HIGH COMMISSIONER FOR HUMAN RIGHTS (OHCHR).
UN experts call for regulating advertising directed at children. 9 ago. 2016. Disponível em:

126

127
http://www.ohchr.org/EN/NewsEvents/Pages/DisplayNews.aspx?NewsID=20358&amp;LangID=
E>. Acesso em 7 out. 2020.
SILVA, Ana Beatriz B. Mentes consumistas: do consumismo à compulsão por compras. São Paulo:
Globo, 2014.

RECOMENDAÇÃO FINAL SOBRE AS ÁREAS PRIORITÁRIAS DO


MARCO LEGAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA

Como leitura complementar, você pode aprofundar o conhecimento conceitual e em


nível de metas sobre as áreas prioritárias para promoção do desenvolvimento na
primeira infância, a partir do novo Plano Nacional pela Primeira Infância, atualizado e
disponibilizado pela Rede Nacional Primeira Infância em 22out.2020.
Além de contar com maior detalhamento sobre as áreas prioritárias aqui apresentadas,
a nova redação do PNPI inclui novas áreas, como:
❖ Justiça e Primeira Infância,
❖ Povos e Comunidades Tradicionais,
❖ Direito à Beleza, entre outros.

127

128
Aula 5: Parentalidade positiva, parentalidade
brincante

Parentalidade é um conceito relativamente novo, surgido na segunda metade do


séc. XX, advindo do inglês parenting. Pode ser uma inovação positiva no sentido de oferecer
recursos às famílias para o cuidado de seus filhos, mas também pode se tornar mais uma
mercadoria na prateleira de produtos para consumo de pais e mães inseguros com a
criação dos filhos, o que leva à coisificação daquilo que nos é mais precioso, nossa
humanidade, que é diversa e imperfeita por natureza (IACONELI, 2019).
Portanto, toda atenção e respeito no trabalho com as famílias é pouco. Cada povo,
comunidade, célula familiar, pai ou mãe são constituídos de emoções, saberes, herança
cultural, modo de funcionamento e contexto social próprios. Modelos e práticas de
parentalidade podem servir como referência e inspiração, mas jamais devem ser impostos
ou adotados de modo acrítico, sob pena de gerar-se falta de autenticidade e resultar em
insegurança dos pais sobre suas próprias competências para cuidar e educar seus filhos –
o que é muito negativo para as crianças, já que elas buscam uma base segura e confiável
em seus pais.

O que é Parentalidade?

No reino animal, ao nascerem, os filhotes carecem de cuidados básicos para


sobreviver, como alimentação, proteção e aprendizado para se adaptarem ao meio em que
vivem. Onde quer que estejam na cadeia alimentar, aprendem com os pais ou com o grupo
em que vivem o modo básico para a sobrevivência, ou seja, as habilidades e competências
para se nutrir, enfrentar as intempéries, fugir, se defender do predador e/ou caçar a sua
presa. A grande diferença dos seres humanos é que o tempo de aprendizado e dependência
do bebê é muito maior que dos filhotes das outras espécies. Além disso, a vida em
sociedade é mais complexa, o que torna necessária a aquisição de um número maior de
competências e habilidades.
Quando falamos de parentalidade, estamos falando de um “conjunto de atividades
propositadas no sentido de assegurar a sobrevivência e o desenvolvimento da criança”
(BARROSO; MACHADO, 2015), ou seja, suprir as necessidades da criança para que ela
possa se desenvolver em um ambiente seguro e relacionar-se socialmente,

128

129
proporcionando autonomia para se tornar um adulto pleno, com a possibilidade de
alcançar seu potencial em habilidades física, emocional e cognitiva.
Ampliando a definição sobre o conceito de família hoje, também dizemos que ela é
o espaço mais imediato onde a criança vai ser atendida (ou não) em suas necessidades de
sobrevivência, afeto e socialização, constituindo assim sua principal rede de proteção e
afeto – motivo pelo qual precisamos valorizar o protagonismo da família como principal
responsável pelo desenvolvimento infantil.
Isso não quer dizer que a família tenha que dar conta da tarefa sozinha. Cabe ao
Estado, por meio de políticas públicas, fortalecer as famílias, em especial aquelas que se
encontram em situação de vulnerabilidade, para que possam exercer o seu papel.
Precisamos trabalhar com a perspectiva da responsabilidade compartilhada, oferecendo
suporte social, apoio financeiro, condições dignas de moradia, espaços de aprendizado e
convivência, proporcionando dignidade e reconhecimento de suas competências no
cuidado dos filhos.

Práticas parentais

As práticas parentais podem ser consideradas positivas ou negativas com reflexos


no desenvolvimento da criança.

Positivas: Segundo Macana e Comim (2015), as práticas parentais positivas favorecem


os desenvolvimentos cognitivo e socioemocional da criança, e relacionam-se a
comportamento moral, expressões afetivas, envolvimento dos pais no brincar, reforço e
disciplina adequados.

• O comportamento moral está relacionado ao modelo de valores apresentado pelos


pais ou cuidadores. As crianças aprendem pela observação da prática no cotidiano
como se processam valores, como honestidade, generosidade, empatia, compaixão,
respeito, amorosidade, entre outros.
• As expressões afetivas também são uma prática de comunicação entre
pais/cuidadores e crianças. A expressão de sentimentos por meio de abraços e beijos
contribui para o estabelecimento de um relacionamento saudável, de orgulho e
valorização da pessoa, e contribui para o desenvolvimento de competências
socioemocionais, como a autoestima.

129

130
• O envolvimento dos pais/cuidadores nas brincadeiras também fortalece os
relacionamentos por meio da afetividade, contribuindo para uma melhor comunicação
entre pais/cuidadores e crianças, favorecendo o sentimento de autoconfiança e
promovendo a habilidade relacionada à resiliência no enfrentamento de desafios.
• O reforço está relacionado ao modo como pais/cuidadores reagem diante de bons
resultados obtidos pela criança. A demonstração de alegria e elogios diante de
comportamentos adequados funcionam como reforço positivo.
• A disciplina adequada envolve diálogo e explicações diante de comportamentos e
atitudes indevidas da criança. Contribui para que ela compreenda as consequências de
suas ações sobre si mesma e sobre os outros. Entre os muitos métodos disciplinadores,
aqueles que têm maior impacto são os que promovem consciência - como retirar
liberdade, não fazer elogios e chamar a atenção para os impactos da atitude e do
comportamento errado sobre os outros e sobre si mesma – em vez daqueles centrados
na privação de objetos e privilégios.

Negativas: Segundo Macana e Comim (2015), as práticas parentais negativas são


caracterizadas por:

• Maus tratos físicos (bater, empurrar, puxar orelha etc.) e psicológicos (gritar, ameaçar,
humilhar etc.) que têm impacto negativo no crescimento, no desenvolvimento e na
aprendizagem da criança, ocasionando problemas psicológicos, emocionais, sociais e
cognitivos ao longo da vida.
• Disciplina relaxada: quando pais/cuidadores colocam regras e não as fazem cumprir.
Consiste na falta de imposição de limites e ausência de correções em circunstâncias de
mau comportamento. Essa prática pode levar as crianças a concluírem que regras não
precisam ser cumpridas e que não devem respeito às autoridades.
• A disciplina de contingência coercitiva caracteriza-se pelo uso de gritos, violência física,
ameaças ou privação de privilégios e afeto. Em geral não leva à compreensão do erro
pela criança.
• Punição inconsistente acontece quando pais/cuidadores castigam as crianças de
acordo com seus estados emocionais. Podem ignorar ou exagerar nas punições
conforme o humor do momento. Esta prática leva a criança a ter dificuldade na
identificação do certo e do errado, com possível prejuízo para sua autoestima.

130

131
• Monitoria negativa acontece quando o controle é exercido de modo excessivo e
estressante. Induz a criança a comportamento agressivo, ansiedade e depressão.
• Excesso de críticas e ausência de elogios gera comunicação negativa entre a criança e
os pais/cuidadores. Provoca desconfiança, insegurança, frustração e agressividade.

Estilo Parental

Pais e filhos constroem na relação que se estabelece pela convivência padrões de


comportamento parental, denominados estilos parentais, que são a combinação de
responsividade e exigência. A responsividade contempla as atitudes de aceitação,
aprovação, afetividade e encorajamento, já a exigência compreende as atitudes de
controle, monitoramento e imposição de limites aos filhos por parte dos pais (MACANA;
COMIM, 2015). Mediante essas características, os estilos parentais se classificam em:

• Participativos: ocorre quando existe uma comunicação aberta e de escuta entre pais e
filhos. O controle também se baseia na empatia, com orientações claras e consistentes.
Os pais se tornam um suporte emocional para os filhos.
• Autoritários: caracteriza-se por uma relação de exigência em relação ao cumprimento
de regras e normas rígidas, com muita punição e pouca empatia. Os pais não oferecem
suporte emocional, levando ao distanciamento entre pais e filhos.
• Permissivos: neste padrão, os pais muitas vezes são dominados pelos filhos, realizam
todos os desejos e acatam todas as ações sem assumirem o papel de orientação e de
imposição de limites.
• Negligentes: ocorre quando os pais não se fazem presentes na vida dos filhos e
demonstram baixo nível de aceitação, de suporte e de controle.

Os estilos parentais também servem como orientação. Seres humanos são muito
diferentes entre si, e a presença ou predominância de determinado comportamento está
condicionada a muitas variáveis, como as características dos filhos de acordo com seu
desenvolvimento, gênero, temperamento etc., assim como a maneira que os pais tendem a
reproduzir ou modificar comportamentos recebidos.

As evidências mostram que alguns estilos levam a melhores resultados


cognitivos e socioemocionais que outros. Assim, por exemplo, estudos
confirmam que, enquanto o estilo participativo promove o bom
relacionamento e tende a levar a um bom desempenho escolar, os estilos

131

132
autoritários e permissivos favorecem um baixo rendimento (MACANA;
COMIM, 2015).

O estilo participativo também tem demonstrado melhores resultados relacionados


ao desenvolvimento socioemocional das crianças, porém é importante considerar que as
boas práticas da parentalidade vão além da relação entre o pai, a mãe e o filho, pois ela se
insere em um quadro abrangente com questões sociais, econômicas e culturais, e a
responsabilidade é coletiva.

Parentalidade Desenvolvimental

A partir de estudos sistemáticos, os psicólogos Roggman, Boyce e Innocenti (2008)


propõem o conceito de developmental parenting, que pode ser traduzido como
parentalidade desenvolvimental. Eles consideram que um primeiro esforço dos pais volta-
se para manter os filhos seguros e saudáveis, e que é a partir das interações entre pais e
filhos que se promove o desenvolvimento das habilidades socioemocionais e cognitivas.
Segundo eles, quatro domínios são fundamentais para uma parentalidade promotora do
desenvolvimento na primeira infância: afetividade, responsividade, encorajamento e
ensino.

Parentalidade Brincante

Trata-se da parentalidade associada à atitude do brincar. Segundo Patrícia


Camargo (2020), atitude brincante é uma construção diária do espírito da brincadeira nas
atividades cotidianas do cuidado e tem como objetivo transformar a relação entre pais e
filhos, tornando-as mais leves, já que ela pode ser inserida em qualquer etapa da relação,
principalmente na primeira infância. Para cultivar o hábito do brincar, a autora lista 10
atitudes brincantes para pôr em prática a brincadeira no dia a dia. Veja no quadro a seguir:

132

133
Quadro 1 – Esquema de Parentalidade Brincante (CAMARGO, 2020).

Para saber mais:

VÍDEO 16
Assista ao vídeo “Como brincar na rotina”.
Disponível em:<https://www.tempojunto.com/2018/07/20/10-atitudes-brincantes-
para-voce-adotar-ja-e-ter-um-dia-a-dia-muito-melhor/>
• “Ser pai e mãe é quase sinônimo de culpa”, diz Vera Iaconelli sobre parentalidade nos
dias de hoje.
Disponível em: <https://paisefilhos.uol.com.br/familia/ser-pai-e-mae-e-quase-
sinonimo-de-culpa-diz-vera-iaconelli-sobre-parentalidade-nos-dias-de-hoje/>
• Processo de parentalidade na construção da família contemporânea e seus reflexos
jurídicos.
Disponível em: <https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53489/o-
processo-de-parentalidade-na-construo-da-famlia-contempornea-e-seus-reflexos-
jurdicos>.

133

134
VIDEO 17
Tornar-se Pai, Tornar-se Mãe.
Disponível em: <https://ocomecodavida.com.br/tornando-pais-ep-02/>.
• Avaliação dos benefícios de Políticas para a Primeira Infância para apoio à
parentalidade.
Disponível em: <http://primeirainfancia.org.br/wp-
content/uploads/2017/01/sintese_primeira_infancia_nov_16.pdf>.

Considerações finais

Os programas de cuidado oferecidos pelas políticas públicas não são capazes de suprir
integralmente as lacunas do desenvolvimento infantil no ambiente familiar. Trata-se,
portanto, de um trabalho integrado entre família, sociedade e poder público, em que as
práticas parentais como mediadoras do cuidado são de grande importância.

Referências bibliográficas

BARROSO, R.; MACHADO, C. Definições, Dimensões e Determinantes da Parentalidade. In:


Fundamentos da família como promotora do desenvolvimento infantil: parentalidade em foco.
São Paulo: Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV), 2015.
BRASIL. Imprensa Nacional. Lei 13.257, de 8 de março de 2016. Marco Legal da Primeira Infância.
Disponível em: <https://www.in.gov.br/materia/-
/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/21172863/do1-2016-03-09-lei-no-13-257-de-8-
de-marco-de-2016-21172701>. Acesso em: 29 set. 2020.
BRASIL. Ministério da Saúde. Síntese de evidências para Políticas de Saúde – Promovendo o
Desenvolvimento na Primeira Infância. 2017. Disponível em: <http://primeirainfancia.org.br/wp-
content/uploads/2017/01/sintese_primeira_infancia_nov_16.pdf>. Acesso em: 29 set. 2020.
CAMARGO, P. Atitude brincante te ajuda a ter uma parentalidade feliz. Tempojunto, 22 jan. 2020.
Disponível em: <https://www.tempojunto.com/2020/01/22/atitude-brincante-te-ajuda-a-ter-
uma-parentalidade-feliz/>. Acesso em: 29 set. 2020.
IACONELLI, Vera. Parentabilidades e Vulnerabilidades. Revista Cult, ed. 251, 2019. <Disponível
em: https://revistacult.uol.com.br/home/dossie-parentalidade-e-vulnerabilidades/>. Acesso em:
29 set. 2020.
MACANA, E. C.; COMIM, F. O Papel das práticas e estilos parentais no desenvolvimento da primeira
infância. In: Fundamentos da família como promotora do desenvolvimento infantil: parentalidade
em foco. São Paulo: Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV), 2015.
ROGGMAN, Lori; BOYCE, Lisa; INNOCENTI, Mark. Developmental Parenting: a Guide for Early
Childhood Practioners. Baltimore: Paul Brookes Publishing, 2008.
UNICEF. Convenção sobre os Direitos da Criança. 1989. Disponível em:
<https://www.unicef.org/brazil/convencao-sobre-os-direitos-da-
crianca#:~:text=A%20Conven%C3%A7%C3%A3o%20sobre%20os%20Direitos,Foi%20ratificad
o%20por%20196%20pa%C3%ADses.>. Acesso em: 29 set. 2020

134

135
Aula 6: A situação da parentalidade no Brasil:
contexto, impacto e perspectivas
Diante da importância da interação da criança com suas figuras de apego primárias,
que são as figuras materna e paterna, cabe perguntar: “Como é ser mãe e pai em nosso
País?”, “Qual é o contexto para o exercício da maternidade e da paternidade no Brasil?”,
“Quais impactos o Marco Legal da Primeira Infância tem trazido em prol dessa experiência
fundamental?” e “Quais perspectivas temos à frente?”.
Anteriormente tratamos sobre a maternidade, e agora vamos discutir sobre o
papel do pai na vida da criança, já que é de extrema importância, apesar de sabermos que
historicamente se atribuía apenas à mulher a função de cuidar dos filhos. Neste sentido, o
Marco Legal da Primeira Infância cumpre um importante papel ao destacar que a
responsabilidade pelo cuidado e educação dos filhos é tanto da mãe quanto do pai, sendo
assim uma responsabilidade compartilhada:

A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e deveres e


responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da criança,
devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas
crenças e culturas, assegurados os direitos da criança estabelecidos
nesta Lei (Incluído pela Lei nº 13.257/2016, art. 26) (BRASIL, 1990,
Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 22, grifo nosso).

A crescente participação da mulher no mercado de trabalho faz com que tanto a


mãe como o pai precisem conciliar vida profissional e familiar, e tem produzido uma
mudança no tradicional modelo de estrutura familiar, no qual os homens eram os únicos
provedores e as mulheres cuidavam somente das atividades domésticas e dos filhos
(SILVA, 2019).
No Brasil, as leis trabalhistas, por meio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),
entraram em vigor em 1943. Segundo elas, a licença-maternidade atualmente pode chegar
a seis meses, considerando a importância dos cuidados e do aleitamento materno. Já o
direito à licença-paternidade foi incluído no rol de direitos trabalhistas (art. 473, III da CLT)
com o objetivo de possibilitar ao pai que tinha carteira de trabalho ausentar-se sem
desconto salarial para fazer o registro civil do filho recém-nascido. Nessa época, a licença
era somente de um dia.
Com o passar do tempo, notou-se a necessidade de um apoio maior da figura
paterna, uma vez que, nos casos de cirurgia cesariana, a mãe precisa de mais tempo para

135

136
se recuperar, e por essa razão entendeu-se que o pai precisava permanecer pelo menos
cinco dias prestando o auxílio que se julgava necessário. A Constituição Federal de 1988
foi promulgada com a determinação de cinco dias de licença-paternidade e 120 dias de
licença-maternidade (art. 7º).
O Equilíbrio Trabalho e Família é um dos âmbitos de políticas voltadas para famílias e
também para a primeira infância. O equilíbrio trabalho e família consiste em síntese em um
problema de escassez de tempo pela qual passa a maioria das famílias. Pais e mães enfrentam
no dia a dia inúmeros desafios para arcar com suas diversas funções: profissionais e familiares
(que incluem as funções de cuidado e o trabalho doméstico). Pode-se questionar se essa não é
uma questão essencialmente de cunho privado das famílias. Porém, reconhecendo o impacto
que a ausência dos pais tem nos primeiros anos de vida da criança e o impacto sobre a
produtividade de muitos trabalhadores - dada a insatisfação e a ansiedade gerada por se
sentirem incapazes de atenderem a todas as suas responsabilidades - esse tema emerge como
prioritário na agenda de políticas públicas para a primeira infância.
Dessa forma, os governos devem estimular políticas e programas que incentivem a
adoção de boas práticas de equilíbrio trabalho e familia, tais como: teletrabalho, banco de horas,
flexibilização do horário de trabalho, redução de jornada, licenças, incluindo licenças parentais,
dentre outras. O objetivo principal de politicas nesse âmbito é aumentar a disponibilidade de
tempo para que os pais possam se dedicar ao cuidado integral dos filhos especialmente nessa
fase de intenso desenvolvimentos infantil. Tal objetivo só poderá ser concretizado a partir da
promoção de um modelo de corresponsabilidade tanto no nível social (governo, empresas,
sociedade civil e famílias) como no nível familiar (com a promoção de uma maior participação
do pai nas funções de cuidado e doméstica).
O impacto positivo do maior envolvimento dos homens na paternidade – sejam
eles pais biológicos ou não – vem sendo comprovado, especialmente, para a saúde
materno-infantil, o desenvolvimento cognitivo das crianças, o empoderamento das
mulheres, a saúde e o bem-estar dos próprios homens (PROMUNDO BRASIL, 2016).
Nesse contexto, a fim de viabilizar condições para o exercício da paternidade de
forma mais presente e equitativa, o Marco Legal promoveu o aumento da licença
paternidade para mais quinze dias, resultando agora em 20 dias. De fato, antes do Marco
Legal da Primeira Infância, indiretamente o Estado passava aos pais a mensagem de que
sua principal função era apenas de provedor, sendo o mais importante voltar logo às

136

137
atividades laborais, enquanto que a mulher ficava sozinha como responsável pelos
cuidados diretos do recém-nascido e de si mesma.
A licença-paternidade estendida foi possível apenas para os trabalhadores
vinculados ao Programa Empresa Cidadã, devido à dificuldade das empresas como um
todo para conceberem a licença-paternidade como um investimento na promoção do
desenvolvimento humano em vez de considerá-lo como um gasto.
Diante da alçada do Estado sobre os servidores públicos e considerando a
responsabilidade compartilhada também do Estado em relação à prioridade absoluta,
este direito foi concedido a todos os servidores públicos imediatamente após a
promulgação da Lei 13.257/2016. Assim, o aumento da licença paternidade foi o primeiro
ato de implementação do Marco Legal da Primeira Infância em larga escala.

Principais desafios para avançar no campo das paternidades no Brasil

Ao considerar que aproximadamente 80% dos homens se tornarão pais biológicos


em algum momento de suas vidas e a totalidade dos homens tem potencial para
desempenhar algum papel relacionado ao cuidado na vida de crianças, como educadores,
profissionais de saúde, tios ou padrinhos (PROMUNDO BRASIL, 2019), é fundamental
tratarmos da importância da primeira infância com eles.
Há uma série de questões a serem tratadas sobre a relação entre cuidadores e
crianças, quando a responsabilidade pelo cuidado é compartilhada com as mulheres e
incorporada ao cotidiano dos homens. Uma delas é o equilíbrio entre o sucesso profissional
e o bem-estar da família, ou mesmo sobre o que significa ser homem nos dias de hoje. Ao
mapear estudos, políticas e iniciativas produzidas sobre paternidade e cuidado, os
relatórios da Rede MenCare têm evidenciado a conquista de espaço na agenda pública
global de promoção da equidade de gênero, em questões como direitos sexuais e
reprodutivos, saúde dos homens, educação, segurança pública, prevenção de violências,
economia, (des)emprego e imigração. O envolvimento do pai no cuidado dos filhos tem se
mostrado uma das maiores estratégias de prevenção da violência doméstica, uso de drogas
e conflitos com a lei na adolescência, e da melhoria da saúde da mulher e do homem.

Um breve olhar sobre a situação da paternidade no Brasil

Como demonstrado no relatório sobre a paternidade no Brasil, realizado pelo


Instituto Promundo em 2016, o Brasil tornou-se um dos países de maior destaque no

137

138
campo da paternidade e cuidado, integrando ações da sociedade civil, do governo e do
setor privado, assim como da integração desse campo com a promoção da equidade entre
homens e mulheres.
No entanto, apesar da maior visibilidade e a despeito do que está escrito em nossos marcos
legais, a cobrança pelo cuidado das crianças continua recaindo sobre as mulheres. Para
uma parte significativa da sociedade, persiste certa tolerância relacionada à não
participação, ao abandono ou ao não reconhecimento de filhos por parte dos pais, o que
pode ser ilustrado pela estimativa de que mais de 5.000.000 de estudantes brasileiros
permanecem sem o nome do pai na certidão de nascimento e no documento de identidade
(CNJ, 2015). Por outro lado, também persistem lacunas da responsabilidade
compartilhada do Estado e da Sociedade em relação às condições para efetivação dos
direitos necessários para o exercício pleno da paternidade e da parentalidade. O contexto
de exclusão social que ainda caracteriza nosso país tem impactos também em relação ao
usufruto da licença paternidade, que consistiria em uma estratégia de promoção do
desenvolvimento integral das crianças na primeira infância. Segundo a Pesquisa Nacional
Saúde do Homem Paternidade e Cuidado, realizada pela Coordenação de Saúde do
Homem do Ministério da Saúde, em parceira com ouvidoria do SUS, aproximadamente
metade dos homens cujos filhos nasceram em maternidades públicas não conseguem
usufruir da licença paternidade, sendo que o principal motivo do não usufruto da licença
paternidade é que a maioria dos pais trabalha por conta própria ou sem carteira assinada.
A segunda razão apontada é o fato de estarem desempregados, em gozo de férias ou
afastados pelo INSS no período.

Gráfico 1 – Questão pesquisa “Por que o Sr. não tirou licença-paternidade?”

138

139
Parentalidade compartilhada: reflexões e estratégias para os avanços necessários

Apesar do reconhecimento da importância do pai no desenvolvimento dos filhos,


uma parcela significativa da população mundial, inclusive no Brasil, continua acreditando
que “cuidar” é uma qualidade e uma responsabilidade prioritariamente das mulheres.
Felizmente, seguindo um processo de reflexão e transformação que há anos já vem sendo
trilhado pelas mulheres em relação à maternidade, um número cada vez maior de homens
tem vivenciado a paternidade com algo muito positivo para si mesmos. Alguns achados da
pesquisa “HelpingDadsCare” (2019) no Brasil reforçam essa ideia, com informação
corroborada por dados da pesquisa IMAGES (PROMUNDO – BRASIL, 2016), indicando
que a maioria dos pais brasileiros relata brincar com as crianças (83%). No entanto,
atividades como cozinhar (46%) e dar banho (55%) são bem menos citadas.
85% dos pais entrevistados em sete países (e 82% dos pais brasileiros)
disseram “concordar” ou “concordar fortemente” coma afirmação: “Eu
farei tudo o que for necessário para estar muito envolvido com o cuidado
do meu/minha filho/a recém-nascido/a ou adotado/a nas primeiras
semanas e/ou meses” (PROMUNDO, 2016).

Seguramente, este é um momento histórico importante não apenas para refletir


sobre o maior envolvimento dos pais, como também para buscar formas concretas de
apoiar os homens brasileiros a serem os pais envolvidos que eles dizem querer ser
(PROMUNDO BRASIL, 2016). Contudo, os estudos recomendam atenção para a
valorização de paternidades “saudáveis”, “responsáveis” e “ativas” serem acompanhadas
de uma leitura crítica sobre as relações entre homens e mulheres, de modo a eles não
passarem a ser elogiados por atividades que as mulheres sempre fizeram.
Diante da importância de metodologias que respondam a essa complexidade e
atuem objetivamente para a formação da nova cultura referendada nos avanços científicos
e legislativos, o Pacto Nacional pela Primeira Infância premiou como 1º lugar em Boa
Prática da Categoria Sociedade Civil o Programa P, desenvolvido em 2011 pelo Instituto
Promundo, que possibilita um trabalho de ressignificação da masculinidade e engajamento
em paternidade e cuidado para homens e suas famílias.

139

140
VÍDEO 17
Assista no vídeo a seguir o relato de um homem sobre a importância da sua relação com o
filho e a ressignificação da experiência com seu próprio pai, a partir da participação no
Programa P: <https://promundo.org.br/recursos/curta-mencare-brasil/>.

A importância da inclusão do homem desde o começo

É importante compreender as crenças e expectativas em relação ao ser pai e mãe.


Segundo um estudo do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e o Instituto
Papai (2007), embora a gestação seja definida por mudanças observadas no corpo
feminino desde o momento da concepção, ou seja, a gestação é “visceral para as mulheres”,
para os homens a paternidade muitas vezes só se concretiza após o nascimento da criança.
No entanto, quando se questionam diretamente os homens, muitos demonstram desejo de
participar nas ações de planejamento reprodutivo ativamente durante toda a gestação,
muitas vezes até antes da concepção, de modo a compartilhar, assim, todas as etapas desse
processo gravídico.
Contudo, na esfera das políticas públicas, as ações de saúde ligadas à saúde sexual
e reprodutiva, incluindo de pré-natal, tradicionalmente são direcionadas somente para as
mulheres (SILVA, 2019). Neste sentido, um grande avanço tem se configurado desde o
lançamento da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), em
2009, pelo Ministério da Saúde, uma vez que esta incluiu como um de seus eixos
prioritários a Paternidade e o Cuidado. Isso resultou no desenvolvimento da Estratégia
Pré-Natal do Parceiro (EPNP), que tem como objetivo contribuir significativamente para
aumentar os vínculos afetivos entre pai, mãe e filhos; diminuir a violência intrafamiliar;
prevenir e diminuir a transmissão de IST/HIV; promover a ampliação da licença-
paternidade; incentivar o aleitamento materno; reduzir as mortalidades materna e infantil;
ampliar e melhorar o acesso e acolhimento dos homens aos serviços de saúde, e
consequentemente diminuir os índices de morbimortalidade da população masculina.
Para implantação da EPNP, são sugeridos cinco passos que os pais/parceiros
devem ser orientados a seguir durante todo o processo de pré-natal, parto, pós-parto e ao
longo do desenvolvimento da crianças. São eles:

140

141
Como será a participação do homem no pré-natal,
parto e puerperio no âmbito dos serviços de saúde.

Realizar exames de rotina e testes rápidos.

Atualizar seu cartão de vacinas.

Participar de atividades educativas durante o pré-natal


com temas voltados para o público masculino.

Participar efetivamente no momento do pré-parto,


parto, puerpério e cuidados com a criança.

Figura 1 – A paternidade em rede (SILVA, 2019).

Você sabia?
Durante o debate para aprovação do Marco Legal da Primeira Infância, na
Câmara dos Deputados, houve receio de que o aumento da licença-paternidade
gerasse, ao invés de apoio à mulher e à criança, mais sobrecarga decorrente de
demandas do homem em casa. Optou-se, então, por incluir o seguinte dispositivo na
Lei, para promoção da paternidade ativa:
II – será garantida ao empregado da pessoa jurídica que aderir ao
Programa (Empresa Cidadã), desde que o empregado a requeira no
prazo de 2 (dois) dias úteis após o parto e comprove participação em
programa ou atividade de orientação sobre paternidade
responsável (BRASIL, Lei 13.257/2016, art. 38).

O Ministério da Saúde teve um importante papel para essa implementação, ao


emitir a Nota técnica conjunta: Recomendações do Ministério da Saúde para
regulamentar as atividades de orientação sobre paternidade em relação ao Marco
Legal da Primeira Infância (Lei nº 13.257 de 08 de março de 2016). Além disso,
desenvolveu, com a PNAISH/Ministério da Saúde – Estratégia Pré-Natal do Parceiro,
o Curso Pai Presente Cuidado e Compromisso – EAD – AVASUS, disponibilizado
gratuitamente na plataforma do Ministério da Saúde para promoção da paternidade
ativa e consciente. Atualmente este curso conta com o registro de 76.957
participantes, dos quais 65.031 já foram certificados, tendo um aproveitamento de

141

142
conclusão de 84,5%. É o terceiro curso mais acessado do AVASUS, num rol 245 cursos
disponibilizados pelo Ministério da Saúde.
Caso deseje conhecer o curso e seus depoimentos acesse:
<https://avasus.ufrn.br/local/avasplugin/cursos/curso.php?id=67>.

Graças ao Marco Legal da Primeira Infância, milhares de crianças podem contar


com a presença e o cuidado ativo por mais tempo de seu pai em seus primeiros dias de vida.
Intervenções simples como esta para promoção da paternidade ativa ofereceram
melhores condições para o desenvolvimento humano integral na primeira infância.

VÍDEO 18
No vídeo a seguir, disponível na plataforma Viva mais SUS sobre o Pré-Natal do Parceiro,
você pode observar a importância da participação do pai desde o acompanhamento da
gestação:
<http://portalarquivos.saude.gov.br/campanhas/vivamaissus/prenatal_index.html>

Perspectivas: licença parentalidade

Uma das possíveis estratégias para a promoção de parentalidades compartilhadas é o


instituto da licença parental. Segundo a Organização Internacional do Trabalho a licença
parental “é uma licença relativamente longa concedida ao pai ou à mãe para cuidar de um bebê
ou de uma criança pequena após o período da licença-maternidade ou licença-paternidade”1 .
No entanto, sua configuração varia bastante de país para país.
A promoção da licença parental vem sendo recomendada por organismos internacionais
como estratégia para a promoção de cuidados adequados na primeira infância e da igualdade
no mercado de trabalho. Em novembro de 2019, a Assembleia Geral das Nações Unidas
recomendou aos países membros que investissem em uma ampla gama de políticas voltadas
para o equilíbrio trabalho e família, como a expansão dos serviços de cuidado e de licenças

1
https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---americas/---ro-lima/---ilo-
brasilia/documents/publication/wcms_229658.pdf

142

143
parentais, inclusive de licenças paternidade 2 , com o intuito de aumentar a participação
masculina nas tarefas de cuidado.
No Brasil, foi instalado desde o início de 2020, no âmbito da Comissão Interinstitucional
da Frente Parlamentar da Primeira Infância da Câmara dos Deputados, um grupo de Trabalho
sobre Licença Parental coordenado por Family Talks - uma iniciativa da Associação de
Desenvolvimento da Família, organização da sociedade civil. Dado o contexto de crise
econômica e pandemia que assola o país, um dos motivadores para instalação do GT foi o
aproveitar as lições do momento, sobretudo as novidades nas relações de trabalho, tais como a
ampla adoção do teletrabalho, para pensar alternativas para a configuração de uma licença
parental viável para o Brasil. O GT ainda encontra-se em funcionamento contando com a
participação de diferentes setores do governo, entidades da sociedade civil e organizações
internacionais. Os três principais desafios que vêm sendo debatidos no âmbito do grupo são:
1. A discussão sobre qual deve ser a diretriz prioritária em uma possível licença parental
no Brasil: a expansão do tempo dos pais com a criança, garantindo o direito à
amamentação até os 6 meses de vida, ou a promoção da igualdade de gênero nas
funções de cuidado com o objetivo de reduzir, também, as desigualdades entre homens
e mulheres no mercado de trabalho.
2. Caso a prioridade seja a expansão dos tempos de licença disponíveis para pais e mães,
a discussão se dirige para o campo das fontes de financiamento. Existem também outras
possibilidades para enfrentar o desafio do financiamento nesse momento de crise, tais
como a licença parental optativa não remunerada ou uma licença caracterizada pela
flexibilização da jornada, com a opção de redução da jornada de trabalho, teletrabalho
ou mesmo alternância dos dias de trabalho entre os pais. Outra possibilidade é de não
haver expansão no tempo disponível para as licenças maternidade e paternidade, mas
transformá-las em uma única licença parental, dando maior liberdade às famílias para a
a divisão do trabalho de cuidado.
3. A promoção de um duplo modelo de corresponsabilidade: seja no âmbito social, (entre
governo, sociedade civil e empresas); seja no âmbito familiar, (entre homens e
mulheres). Diante da promoção desse modelo o maior desafio a ser enfrentado é o
envolvimento e convencimento tanto do setor empresarial quanto dos homens, ante os

2
https://undocs.org/A/75/61-E/2020/4. “(d) Invest in a variety of work-family balance policies focused,
inter alia, on expanding childcare services and parental leaves, including paternity leaves”.

143

144
benefícios evidentes da garantia de melhores condições de cuidado para todas as
famílias.

Considerações Finais

A promoção da paternidade ativa, começando na primeira infância, acarreta benefícios para


todos (SILVA, 2019):

Benefícios para a Família:


* Promoção do planejamento reprodutivo,pré-natal, parto e pós parto;
* Proteção contra a mortalidade materna e infantil;
* Melhoria da saúde emocional e física da mulher, pela participação do homem nos cuidados
perinatais graças à licença paternidade estendida;
* Estabelecimento de vínculos afetivos saudáveis entre pai-mãe-filho;
* Melhoria do desenvolvimento escolar, cognitivo e afetivo da criança;

Para os Homens:
* Estímulo ao autocuidado com a saúde;
* Redução dos índices de morbimortalidade masculina;
* Incentivo ao exercício de práticas de cuidados;
* Promoção do envolvimento ativo no processo gravídico, com a realização do Pré-Natal do
Parceiro;
* Encorajamento à participação efetiva no momento do parto, com o corte do cordão
umbilical e realização do método canguru quando necessário;
* Ampliação do conhecimento de seus direitos legais em relação à licença paternidade;
* Melhoria da saúde mental e satisfação com a vida e o trabalho;
* Motivação para divisão igualitária das tarefas domésticas e consequente aumento da
equidade de gênero;
* Fomento ao ensino e aprendizado de valores de igualdade de direitos e respeito;
* Estímulo a práticas de cuidado real, como segurar a criança, dar banho, trocar fraldas,
colocar para dormir;
* Promoção do exercício de masculinidades saudáveis.

Para o Setor Educação:


* Estímulo à discussão de igualdade de direitos entre homens e mulheres;
* Ensinamento sobre a importância do exercicio do cuidado, especialmente, para os meninos
,como algo inerente ao ser humano, independente do gênero;
* Destaque da importancia da participação dos meninos nas questões de saude sexual e
saude reprodutiva;
* Encorajamento para os homens terem profissões voltadas ao cuidado, saúde, educação,
pois isso poderá acelerar mudanças sociais através da aceitação e valorização do cuidado por
todos.

Para a Sociedade:

144

145
* Fomento de investimentos em estudos relacionados ao exercício da paternidade ativa;
* Incentivo à criação de dispositivos de escuta de pais sobre suas dúvidas e anseios para o
exercício da paternidade ativa, como a formação de grupos de apoio a homens.

Para Setor Trabalho (Empresas e outros):


* Diminuição de faltas ao trabalho, pois os homens que se envolvem no exercício da
paternidade ativa e usufruem da licença paternidade, tornam-se mais saudáveis e
comprometidos com o trabalho;
* Aumento da produtividade nas empresas, pois os pais que desenvolvem vínculos afetivos
saudáveis com a família trabalham mais satisfeitos e dispostos;
* Promoção de equilibrio entre o exercício do cuidado com a saúde e a vida profissional.

Para o Governo:
* Promoção da intersetorialidade para discussão sobre paternidade ativa, garantindo maior
efetividade das políticas públicas;
* Incentivo à qualificação dos trabalhadores de diversas áreas, como saúde, educação, justiça,
desenvolvimento social, sobre a paternidade ativa ;
* Fomento e apoio a ações relacionadas ao desenvolvimento da primeira infância.
* Diminuição de gastos provenientes das violências e acidentes, onde os homens são os
maiores envolvidos.

Para o Setor da Saúde:


* Desenvolvimento de dispositvos para profissionais e gestores da saúde atuarem e
envolverem os homens na paternidade ativa;
* Ampliação do acesso e acolhimento dos homens na Atenção Primária à Saúde, prevenindo
agravos e promovendo sua saúde;
* Fomento à educação permanente de gestores, profissionais de saúde e população em geral
sobre paternidade ativa;
* Diminuição de gastos com internações, pois os homens serão mais saudáveis e cuidadosos
com a sua saúde, aumentando-se comportamento de prevenção de doenças;
* Promoção de ações voltadas para os homens, estimulando práticas de cuidado consigo, com
a parceira e a criança.

Para saber mais, materiais de apoio:

• Projeção Econômico-demográfica da ampliação da licença-paternidade no Brasil.


Disponível em: <https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/biblioteca/projecao-economica-
demografica-ampliacao-da-licenca-paternidade>.
• Manual do Programa P (de Paternidade): acesse aqui.
• Programa M(Mulheres): acesse aqui.
• Cartilha: Maternidade também é lugar para o pai/parceiro.

145

146
• Cartilha: Como envolver o homem trabalhador no planejamento reprodutivo, pré-
natal, parto e desenvolvimento da criança. Disponível em:
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cartilha_trabalhador_envolver_planejamen
to.pdf>.
• Cartilha para pais. Disponível em:
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cartilha_pais_exercer_paternidade_ativa.pd
f>.
• Folder Licença-Paternidade. Disponível em:
<http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2018/agosto/22/folder-licenca-
paternidade.pdf>.

Referências bibliográficas:

BRASIL. Lei 8069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e
dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, 1990.
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Glossário temático: saúde do homem [recurso eletrônico].
Brasília: Ministério da Saúde, 2018. 140 p.
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Guia do pré-natal do parceiro para profissionais de Saúde.
Brasília: Ministério da Saúde, 2018.
BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem:
princípios e diretrizes. Brasília: Ministério da Saúde, 2009.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ. Pai presente: O reconhecimento que todo filho
espera. 2015. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/conteudo/destaques/arquivo/2015/04/b550153d316d6948b61dfbf7c07f13ea
.pdf. Acesso em: 29 set. 2020.
PROMUNDO – BRASIL. A Situação da Paternidade no Brasil: Tempo de Agir. Rio de Janeiro:
Promundo, 2016.
SILVA, Michelle Leite da. A paternidade em rede: subsídios para o exercício da paternidade ativa
dos pais/parceiros com base na Pesquisa Nacional Saúde do Homem-Paternidade e Cuidado-Etapa
III no Distrito Federal. Dissertação (Mestrado Profissionalizante em Saúde Coletiva) –
Universidade de Brasília, Brasília, 2019.

146

147
Aula 7: A Importância do investimento na Primeira
Infância e seus reflexos

Investir na primeira infância é colocar em prática a regra da prioridade absoluta (CF,


art. 227), possibilitando o mais cedo possível que as crianças tenham acesso aos direitos
necessários para seu desenvolvimento. Assim, cumpre-se o dever constitucional de
promover efetivamente a cidadania, valorizando a maior riqueza de uma Nação, que são
seus cidadãos. Nesta compreensão, a Economia tem indicado que a primeira infância
configura-se como o maior potencial de capital humano de um indivíduo, de sua família, da
comunidade e do País.
A qualidade do cuidado na primeira infância desde a gestação trará reflexos para a
toda vida, principalmente, mas não somente, no comportamento, na saúde e na
aprendizagem. O desempenho financeiro e social dos adultos também depende das
experiências vividas na primeira infância. Quanto mais se investir na Primeira Infância,
portanto, menor será a necessidade de maiores custos com diagnóstico, tratamento e
reabilitação em fases posteriores do desenvolvimento, assim como maior a competência
produtiva no trabalho, na educação dos próprios filhos, na participação do
desenvolvimento da comunidade e na sociedade como um todo.
Diante desse cenário, nesta subunidade iremos aprender sobre as correlações
entre investimento na Primeira Infância, interrupção do ciclo de pobreza e redução da
desigualdade social. Segundo o Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016):

Art. 11 – §2º: A União informará à sociedade a soma dos recursos


aplicados anualmente no conjunto dos programas e serviços para a
primeira infância e o percentual que os valores representam em relação
ao respectivo orçamento realizado, bem como colherá informações
sobre os valores aplicados pelos demais entes da Federação.

A contribuição da Economia sobre a importância do investimento na primeira


infância

Foi necessário traduzir em equação matemática o valor do retorno do


investimento na primeira infância para esta ganhar força na agenda internacional das
políticas públicas. Essa foi uma contribuição realizada pelo Prêmio Nobel em Economia, o

147

148
americano James Heckman, juntamente com o economista português Pedro Carneiro e o
economista brasileiro Flávio Cunha. Ao estudarem políticas de capital humano que
buscavam a formação de habilidades para inclusão social e produtiva por meio de nutrição,
práticas educativas e orientação parental, Heckman e Carneiro (2003) observaram que o
retorno do investimento era significativamente maior quando as ações se iniciavam na
primeira infância.

A maior taxa de retorno do desenvolvimento na primeira infância ocorre


quando se investe o mais cedo possível, desde o nascimento até os cinco
anos de idade, em famílias carentes. Começar na idade de três ou quatro
anos é um pouco tarde demais, pois significa não reconhecer que
habilidades geram habilidades de uma forma complementar e dinâmica.
Os esforços devem se concentrar nos primeiros anos em busca de maior
eficiência e eficácia (HECKMAN, 2017).

Figura 1 – Taxa de Retorno do Investimento em Capital Humano (HECKMAN, 2006).

A partir de seus estudos, Heckman e Carneiro (2003) concluíram que cada dólar
investido na primeira infância gera um retorno de 7 a 10 dólares no futuro e representa a
melhor estratégia de ruptura do ciclo de pobreza e redução da desigualdade social que
onera em políticas compensatórias a economia de muitos países.

SAIBA MAIS!

Para se aprofundar neste tema, acesse:

148

149
https://heckmanequation.org/resource/perry-preschool-midlife-toolkit/

Heckman chegou a esta conclusão avaliando um projeto de desenvolvimento na


primeira infância, denominado Perry Preschool, realizado na Jamaica, nos anos 1960, cuja
metodologia consistia na oferta de suplementação nutricional e atividades educacionais
de qualidade em um centro de educação infantil para crianças de 3 a 4 anos de idade,
pertencentes a famílias em situação de extrema pobreza, paralelamente à realização de
visita domiciliar semanal que incluía orientação aos pais por uma pessoa altamente
treinada em desenvolvimento na primeira infância. Heckman e Carneiro (2003)
analisaram variáveis na vida adulta das crianças que participaram do programa, incluindo
desempenho dos próprios filhos delas. Os resultados mostraram que estas pessoas
conseguiram obter rendas salariais mais altas por terem alcançado maior escolaridade e
tiveram menos envolvimento com uso de drogas ilícitas e menos conflito com a lei, assim
como se mostraram capazes de oferecer educação, saúde e cidadania para seus próprios
filhos. Deste modo, observou-se que o programa integrado de desenvolvimento na
primeira infância promoveu a ruptura do ciclo da pobreza.

SAIBA MAIS!

Para se aprofundar neste tema, acesse: https://highscope.org/perry-preschool-project/

Outro projeto que demonstrou o impacto do investimento na primeira infância foi


o Nurse Family Partnership (NFP), ou “Parceria Família-Enfermeira” em português. Este
programa foi inicialmente desenvolvido nos Estados Unidos como visita domiciliar por
enfermeiras, da gestação até os 24 meses de vida do bebê, com o objetivo de apoiar jovens
mães em situação de vulnerabilidade social a cuidarem adequadamente de seus bebês e de
si mesmas (SCHNEIDER; GHESTI, 2016), e resultou em benefícios para a saúde da mãe e
da criança, e redução de maus tratos contra as crianças.

SAIBA MAIS!

Para se aprofundar neste tema, acesse: https://www.nursefamilypartnership.org/

149

150
Um terceiro programa de impacto, internacionalmente citado, é o Projeto
Abecedarian, também iniciado nos EUA, que consistiu na oferta de atenção de qualidade na
Educação Infantil, utilizando a abordagem de Vigotsky, para crianças dos 8 meses aos 6 ou
8 anos de idade. O estudo observou que crianças e suas famílias que tiveram igualmente
apoio em nutrição, assistência social e saúde diferenciaram-se significativamente em
medidas de desenvolvimento, incluindo QI, em função de um grupo ter recebido acesso à
pré-escola de qualidade durante 60 meses em tempo integral e o outro grupo não.
Observou-se que as mães também se beneficiaram, muitas que eram adolescentes tiveram
a oportunidade continuar seus estudos.

VÍDEO 19

A seguir, você pode assistir uma breve apresentação desses projetos e seus resultados:

https://ocomecodavida.com.br/tres-exemplos-de-intervencoes-na-primeira-infancia/

No Brasil, a Associação Saúde Criança, fundada em 1991, atualmente renomeada


como “Instituto Dara”, também desenvolveu um programa de promoção da saúde e do
desenvolvimento humano que demonstrou resultados positivos e retorno do investimento.
Atuando a partir da compreensão dos “determinantes sociais da saúde” com famílias em
situação de extrema pobreza que tinham crianças hospitalizadas, a pediatra do Hospital da
Lagoa Dra. Vera Cordeiro e sua equipe de voluntários obteve uma redução de 86% nas
taxas de reinternação hospitalar, segundo pesquisa realizada pela Georgetown University
(2013). Este resultado adveio do acompanhamento integral da família em cinco áreas:
saúde, renda, moradia, educação e cidadania - por um período de aproximadamente dois
anos. Esta metodologia foi construída a partir da observação das necessidades da família,
tendo critérios para conclusão do acompanhamento. A avaliação de resultados realizada
pela Georgetown University, analisando as famílias antes de entrarem no programa e três
a cinco anos após a alta constatou melhoria significativa nos indicadores de renda, moradia,
educação e bem-estar da criança e da família, que se sustentaram após cinco anos de
conclusão do acompanhamento (92% de aumento da renda, redução de 83% na percepção
negativa sobre o próprio bem-estar, aumento de 92% na aquisição de moradia própria). E
para os cofres públicos, observou-se a seguinte economia:

150

151
Quadro 1 – Cálculo do retorno do investimento no atendimento integral da criança hospitalizada
(Fonte: INSTITUTO DARA, 2013).

De acordo com o Quadro 1, para atendimento familiar de 82 crianças que haviam


sido hospitalizadas por questões de pobreza estrutural, cujo acompanhamento foi
concluído entre 1º/01/2019 e 31/12/2019, foram investidos R$ 1.476.000,00 em 2 anos,
considerando o custo aproximado de R$750,00 por família, por mês. Este investimento
gerou uma redução de 2.014 dias de hospitalização, o que equivale a aproximadamente
R$ 2.014.000,00 de economia para o Governo, sendo o custo de um dia de internação em
hospital público equivalente a R$ 1.000,00. O valor economizado pelos cofres públicos
menos o custo operacional do trabalho realizado pelo Instituto Dara (economia líquida) foi
de R$ 538.000,00, ou seja, retorno de 36,5% do investimento, em 2 anos.

Conclusões de cientistas sobre a importância do investimento na primeira infância:

➢ James Heckman, Prêmio Nobel em Economia, em 2003:

Investir na primeira infância é uma estratégia de


baixo custo para promover o crescimento econômico
de um País.

Como vimos, James Heckman demonstrou que o investimento na primeira infância


é a melhor estratégia econômica de promoção do potencial humano que um País pode
fazer. Investir em programas de suplementação alimentar e apoio aos pais, inclusive antes
de a criança ingressar na educação infantil, favorece o aproveitamento das ofertas que se
realizam pelo sistema educacional e consequente autonomia na vida adulta, reduzindo

151

152
custos com saúde pública secundária e terciária, assistência social, sistema prisional, entre
outros.

➢ Joseph Sparling, em 2010:


A intervenção educacional precoce com programas de
DPI é com frequência citada como uma solução para o
fracasso dos sistema de saúde ou educação, assim como
um meio para o crescimento econômico.

Sparling (2010) chama atenção para o fato de que apesar de inúmeras


comprovações de que os programas de desenvolvimento da primeira infância (DPI) tem
impactos estratégicos para a melhoria de resultados em todos níveis de saúde, educação,
economia ou desenvolvimento social, eles ainda não são uma atividade totalmente aceita
e estabelecida nas sociedades, como já o são o atendimento geral à saúde ou o ensino
público.

➢ Ricardo Paes de Barros, Economista do IPEA, em 2010:


Os países mais desenvolvidos investem mais em direitos
positivos que em direitos negativos. Quanto mais cedo
for realizado o investimento, maior será o tempo
disponível para sua recuperação (...). Embora existam
potenciais complementaridades entre os investimentos
nas diversas idades, os da primeira infância alimentam
definitivamente os posteriores (BARROS e col, 2010, p.
7).

No Brasil, investir na primeira infância, enquanto ação positiva de propor cuidados


para o desenvolvimento e não apenas ações para evitar riscos como fome, violência,
abandono e morte, tornou-se segundo desafio após um período de avanço na garantia das
condições mínimas para a sobrevivência.
Mais do que não atrapalhar, ou deixar de atrapalhar o desenvolvimento
da criança, queremos também interagir de uma maneira afetiva e
construtiva com ela; não queremos só deixar de atrapalhar, queremos
começar a promover, a ajudar. Isso é o que chamamos de direito positivo
(BARROS; COUTINHO; MENDONÇA, 2016).

➢ Cesar Victora, ex-presidente da Sociedade Internacional de Epidemiologia, em


2016:
Os primeiros mil dias de vida determinam a saúde e o
capital humano do adulto”

152

153
A amamentação aumenta a inteligência não só na infância, mas também na vida
adulta, portanto é fundamental apoiá-la. Por isso, essa legislação sobre a primeira infância
é tão importante: não é só para fazer a criança mais saudável, mas sim para criar um país
mais rico, mais produtivo e mais equitativo na próxima geração, dando a todas as crianças
a oportunidade de alcançarem o seu potencial de crescimento e desenvolvimento
(VICTORA, 2016).

➢ Mary Young, Consultora Sênior do Centro de Desenvolvimento da Criança da


Universidade de Harvard, em 2010:
Nós devemos às crianças e a nós mesmos algo melhor do
que já tem sido feito.

As crianças que nascem em situação de pobreza, vivem em condições de falta de


saneamento, ganham pouco cuidado ou pouca estimulação mental, e recebem uma
nutrição empobrecida nos primeiros anos de vida têm maior probabilidade que seus
contrapartes ricos de crescerem com defasagem corporal e mental. Em consequência,
tendem a ter um desempenho fraco em sala de aula, a repetir séries escolares e a não
alcançarem bons índices de desenvolvimento. Futuramente, no mundo do trabalho,
provavelmente serão capazes de desempenhar apenas trabalhos que requerem menos
habilidades e obter salários mais baixos. E quando têm filhos, um ciclo de herança de
pobreza recomeça – e isso se repete pelas futuras gerações (YOUNG, 2010).
Mary Young (2010) nos ensina que “as políticas públicas precisam investir nos
pais, para estes investirem emocionalmente em seus filhos”. Uma vez que Heckman
conclui que as capacidades não estão definidas ao nascer, mas são afetadas causalmente
pelo investimento dos pais em suas crianças e que uma medida apropriada de
desvantagem está mais relacionada à falta de qualidade do cuidado oferecido pelos pais,
do vínculo, da consistência e da supervisão que da renda familiar por si só (YOUNG, 2016).

➢ Jack Shonkoff, diretor do Centro de Desenvolvimento da Criança da Universidade


de Harvard, em 2009:
O investimento em desenvolvimento na primeira
infância cria os alicerces de uma sociedade próspera e
sustentável.

Shonkoff (2009) destaca que o que ocorre na primeira infância terá repercussões
para toda a vida. Deste modo, recomenda que:

153

154
• O desenvolvimento integral deve ser promovido.
• Deve haver relacionamentos estáveis, responsivos, estimulantes e ricos em
experiências de aprendizagem nos primeiros anos de vida que provêm benefícios
permanentes para a aprendizagem, para o comportamento e para a saúde física e
mental.
• Os avanços da neurociências precisam ser considerados, para evitar desperdício
de recursos que já são escassos.

Reflexos do investimento

O reconhecimento da importância de investimentos na Primeira Infância


promoveu muitas iniciativas nas últimas duas décadas, como ilustrado a seguir.

Figura 2 – Aumento de iniciativas e investimentos na Primeira Infância, em nível mundial


(DARMSTADT, 2016).

Na terceira edição do The Lancet, indicada acima, sobre Primeira Infância, intitulada
“Advancing Early Childhood Development: From Science to Scale” (tradução livre:
“Avanços no Desenvolvimento Infantil: da Ciência a programas em larga escala”) foi
apresentado o modelo de Cuidado Integral multissetorial (Nurturing Care Framework), que
foi indicado como referência para promoção de oportunidades equitativas de
desenvolvimento humano na primeira infância, recomendando que todos os países com

154

155
crianças em situação de risco ao não desenvolvimento implementassem programas
integrados com esse objetivo.

Nurturing Care Framework ou Cuidado Atencioso para o Desenvolvimento na


Primeira Infância: um plano para a promoção da sobrevivência e do
desenvolvimento das crianças pequenas para transformar a saúde e o potencial
humano

Os cinco componentes do Cuidado Atencioso para o Desenvolvimento na


Primeira Infância (OMS; BANCO MUNIDAL; UNICEF, 2018) são parte de uma estratégia
para a promoção do desenvolvimento integral e envolvem cinco componentes mínimos.

Quadro 2 - Os cinco componentes do Cuidado Atencioso para o Desenvolvimento na Primeira Infância

- Monitorar a condição física e emocional das crianças e dar respostas afetuosas e


adequadas às necessidades diárias das crianças; proteger as crianças dos perigos
1. BOA SAÚDE
domésticos e ambientais e ter práticas de higiene que minimizem infecções; usar
serviços de saúde promotores e preventivos e buscar atendimento e tratamento
adequado para doenças infantis.
- Prestar atenção à saúde e ao bem-estar dos cuidadores, bem como das crianças.
- Nutrição adequada da mãe durante a gestação.
- Amamentação exclusiva até os 6 meses com contato pele a pele.
2. NUTRIÇÃO - Alimentos complementares frequentes e diversos o suficiente, e que contenham
ADEQUADA os micronutrientes de que precisam para o rápido crescimento do corpo e do
cérebro após os 6 meses junto com a amamentação.
- Suplementação quando indicada ou tratamento para desnutrição e obesidade.
- Combater a pobreza extrema e a baixa renda com assistência social que pode
incluir transferências de renda.

155

156
3. SEGURANÇA - Combater vulnerabilidade de gestantes e crianças a riscos ambientais, incluindo
E PROTEÇÃO poluição do ar e exposição a produtos químicos.
- Proteger a criança de ambientes inadequados, do abandono e das violências
- Garantir a saúde mental dos cuidadores, trabalhando com eles para prevenir
maus-tratos.
- Brincar e falar com a criança, aproveitando os momentos de alimentação e
4. OPORTUNIDAD higiene para interação (o aprendizado começa na concepção).
ES DE
- Cuidados afetuosos e seguros dos adultos em um ambiente familiar com
APRENDIZAGE
M OPORTUNA orientação nas atividades diárias e no relacionamento com os outros.
- O cuidado responsivo inclui observar e responder aos movimentos, sons, gestos
e solicitações verbais das crianças.
5. CUIDADO
RESPONSIVO
- O cuidado responsivo também inclui alimentação responsiva, o que é
especialmente importante para bebês com baixo peso ou doentes.
- Vínculo emocional e interações sociais também estimulam conexões no cérebro.

Figura 2 – Componentes do Cuidado Atencioso para o Desenvolvimento na Primeira Infância


(OMS; UNICEF, 2018)

Esta série do The Lancet também apresentou um cálculo do prejuízo decorrente da


falta de cuidados nesta fase da vida, o “custo da inação”, segundo o qual 43% das crianças
no mundo tenderão a obter 26% a menos de renda pessoal potencial com consequente
redução da capacidade produtiva dos países, e indicou os gastos estimados com políticas
de redução de danos.
A trajetória brasileira tem acompanhado os períodos indicados na Figura 2, e nosso
país tornou-se destaque mundial em várias iniciativas, com progressivo aumento do
investimento na primeira infância. Acompanhe a linha do tempo de algumas de iniciativas
brasileiras de investimento na primeira infância:
2000 – Comitê de Desenvolvimento Integral da Primeira Infância – CODIPI
(Comunidade Solidária/Governo Federal)

2003 – Primeira Infância Melhor – PIM (RS)

2003 – Projeto Nossas Crianças: Janelas de Oportunidades (USP, UNICEF, Pastoral


da Criança)

2007 – Mãe Coruja Pernambucana (PE)

2007 – Rede Nacional Primeira Infância – RNPI

2009 – Comissão de Valorização da Primeira Infância e Cultura da Paz (Senado


Federal)

2009 – Programa Primeiríssima Infância (SP)

2011 – Rede Mãe Paranaense (PR)

156

157
2010 – Estudo sobre Determinantes do Desenvolvimento na Primeira Infância no
Brasil (IPEA)

2010 – Plano Nacional pela Primeira Infância (RNPI e CONANDA)

2011 – Frente Parlamentar da Primeira Infância – FPPI (Câmara dos Deputados e


Senado)

2011 – Programa de Liderança Executiva em Desenvolvimento da Primeira Infância


(FPPI, Harvard, PUC RS, USP, FMCSV)

2012 – Programa São Paulo pela Primeiríssima Infância (SP)

2012 – Primeira Infância Ribeirinha – PIR (AM)

2012 – Pacto pela Primeira Infância (DF)

2013 – Programa Família que Acolhe (RR)

2013 – Programa São Paulo Carinhosa (SP)

2013 – Programa Cresça com seu Filho (Fortaleza/CE)

2013 – Programa Ágape: Provedores de Amor (Arapiraca/AL)

2013 – Projeto de Lei 6.998/2013 (Dep. Osmar Terra, Dep. Carmen Zanotto e
outros)

2015 – Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (Min. da Saúde)

2016 – Promulgação do Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016)

2016 – Documentário “O Começo da Vida” (FMCSV, Alana, FvanLeer, UNICEF)

2016 – Programa Primeira Infância Amazonense – PIA (AM)

2016 – Programa Primeira Infância Manauara e Acreana – PIA (AC)

2016 – Programa Primeira Infância no SUAS/Programa Criança Feliz (MDS)

2019 – Pacto Nacional pela Primeira Infância (CNJ, FDDD/MJ e signatários)

157

158
Este histórico representa algo muito importante em relação aos avanços que vêm
sendo realizados no Brasil para o justo investimento na primeira infância: um diálogo
continuado, cada vez mais multisetorial e interfederativo.

Figura 3 – Reconhecimento do Primeira Infância Melhor (PIM) como 2º melhor programa de


visitação domiciliar para primeira infância da América Latina e Caribe, segundo Avaliação
realizada pelo Banco Mundial (2016).

Na linha de iniciativas acima, o Programa Criança Feliz representa a


implementação do artigo 14 do Marco Legal da Primeira Infância e promoveu um
significativo aumento do investimento em promoção do desenvolvimento integral da
primeira infância no Brasil, tendo inclusive sido lançado no mesmo dia em que foi lançada
a 3ª edição do The Lancet recomendando que todos os países do mundo tomassem essa
iniciativa.

158

159
Figura 4 – Orçamento investido na Assistência Social a Crianças e Adolescentes – Programa
Criança Feliz 2016-2020 (BRASIL, 2020).

O Programa Criança Feliz foi inclusive reconhecido como o programa de maior


cobertura do mundo, recebendo o Prêmio Wize Awards, em 2019, e está em processo de
investimento em sua qualidade, com apoio do BID e de outros organismos internacionais,
como a UNESCO, a OPAS, a Fundação Bernard van Leer, assim como instituições nacionais
como a Petrobrás. A avaliação de impacto do Programa Criança Feliz está sendo realizada
por um consórcio de universidades brasileiras, sob coordenação do Dr. Cesar Victora, com
apoio da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, visando ao monitoramento de sua eficácia
e a prestação de contas do recurso investido.

159

160
Equidade, o quarto caminho

Para Jacques van der Gaag (2010), quatro “caminhos” fundamentais vinculam o
desenvolvimento da Primeira Infância (DPI) ao Desenvolvimento Humano (DH): a
Educação (investimento nos primeiros anos de vida afeta positivamente a progressão para
os próximos anos escolares), a Saúde (investimento nos primeiros anos de vida melhora o
capital humano e a saúde a longo prazo), o Capital Social (melhor comportamento
decorrente do investimento nos primeiros anos de vida) e a Equidade (redução da
desigualdade de oportunidades na sociedade). Estes levam ao maior crescimento
econômico e, portanto, ao desenvolvimento humano em ampla escala.

Figura 5 – Do desenvolvimento na primeira infância ao desenvolvimento humano


(Fonte: VAN DER GAAG, 2010).

Como promotores do desenvolvimento, devemos apoiar as ações de educação,


saúde e assistência social, além de direitos humanos, cultura, moradia e outras ações para
promover o círculo virtuoso do desenvolvimento da primeira infância ao desenvolvimento
humano como um todo. Isso significa promover também equidade de oportunidades logo
no início da vida, contribuindo para superação do ciclo da pobreza. A equidade é um
caminho estratégico para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

VÍDEO 20

160

161
Para concluir essa reflexão, recomendamos assistr ao clipe “Políticas Públicas” do
documentário “O Começo da Vida”, disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=7M6CoOD9QXU>.

Em seguida, compartilhe no Fórum de Discussão sua conclusão sobre a importância do


investimento na primeira infância, considerando o que já foi apresentado até esta aula.

Para saber mais:

• Importância do Desenvolvimento Infantil.


Disponível em:
http://www.enciclopedia-crianca.com/sites/default/files/dossiers-complets/pt-
pt/importancia-do-desenvolvimento-infantil.pdf
• Como investir na primeira infância: um guia para discussão de políticas e a
preparação de projetos de desenvolvimento da primeira infância.
Disponível em:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/crianca_feliz/Como_Investir_na_Pr
imeira_Infancia.pdf
• Do Desenvolvimento na Primeira Infância ao Desenvolvimento Humano.
Disponível em:
https://issuu.com/fmcsv/docs/do_desenvolvimento_da_primeira_inf_ncia_ao_desenv
o
• Desenvolvimento da Primeira Infância: da Avaliação à Ação.
Disponível em: https://issuu.com/fmcsv/docs/livro_mary_young2

Referências Bibliográficas

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R.;ROSALÉN, A.; SCOFANO, A.; TOMAS, R.. Determinantes do Desenvolvimento na Primeira
Infância no Brasil. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), março, 2010.
Disponível em:
https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=5032
BARROS, R. P.; COUTINHO, D.; MENDONÇA, R. Monitoramento e Avaliação: Desenhando e
implementando programas de promoção do desenvolvimento infantil com base em evidências. In:
Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. Brasília: Cadernos de Trabalhos e Debates do
Centro de Estudos e Debates Estratégicos da Câmara dos Deputados, 2016. p. 194-201. Disponível
em: https://www2.camara.leg.br/a-camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-do-
marco-legal-da-primeira-infancia

161

162
BARROS, R. P. Ministério da Cidadania. Apresentação realizada na Conferência Internacional "O
Poder do Investimento na Primeira Infância para o Desenvolvimento com Equidade". Brasília:
Ministério da Cidadania, 2018.
BRASIL. Ministério da Saúde. Síntese de evidências para Políticas de Saúde: Promovendo o
Desenvolvimento na Primeira Infância. Brasília: Ministério da Saúde, 2016.
BRASIL. Senado Federal. Siga Brasil Painel Cidadão. Orçamento investido na Assistência Social a
Crianças e Adolescentes – Programa Criança Feliz 2016-2020. Brasília: Senado Federal, 2020.
Disponível em:
http://www9.senado.gov.br/QvAJAXZfc/opendoc.htm?document=senado%2Fsigabrasilpainelcid
adao.qvw&host=QVS%40www9&anonymous=true&Sheet=shOrcamentoVisaoGeral
DARMSTADT, G. Aumento de iniciativas e investimentos na Primeira Infância, em nível mundial.
Em: Lançamento do The Lancet Advancing on Early Childhood Development: From Science to Scale.
Apresentação na OPAS/Brasília-DF. 9 set. 2016. Disponível em:
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HECKMAN, J. Investir no desenvolvimento na primeira infância: Reduzir déficits, fortalecer a
economia. A Equação Heckman. 2017. Disponível em:
<https://heckmanequation.org/www/assets/2017/01/D_Heckman_FMCSV_ReduceDeficit_0122
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HECKMAN, J. Skill Formation and the Economics of Investing in Disavantaged Children. Science, v.
312, n. 5782, jun. 2006.
INSTITUTO DARA. Avaliando a Associação Saúde Criança. Sumário. out. 2013. Disponível em:
<https://www.saudecrianca.org.br/wp-content/uploads/Saude-Crianca-Brief-Portuguese-Final-
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n. 2, fev. 2014.

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THE LANCET. Advancing on Early Childhood Development: From Science to Scale. Series. 4 out.
2016. Disponível em: <https://www.thelancet.com/series/ECD2016>. Acesso em: 21 set. 2020.
VAN DER GAAG, J. Do Desenvolvimento da Criança ao Desenvolvimento Humano. In: YOUNG, M.
(Org). Do Desenvolvimento da Primeira Infância ao Desenvolvimento Humano. São Paulo:
Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV), 2010. p. 67-86.
VICTORA, C. Evidências científicas sobre a importância da primeira infância: a Estratégia dos 1.000
dias. In: Avanços do Marco Legal da Primeira Infância. Brasília: Cadernos de Trabalhos e Debates
do Centro de Estudos e Debates Estratégicos da Câmara dos Deputados, 2016. p. 103-117.
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Infância. Brasília: Cadernos de Trabalhos e Debates do Centro de Estudos e Debates Estratégicos
da Câmara dos Deputados, 2016. pp. 21-23. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/a-
camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-do-marco-legal-da-primeira-infancia

163

164
Aula 8: Políticas Públicas Nacionais para Primeira
Infância
Agora que percorremos a trajetória de conquistas na legislação, os fundamentos e
teorias que evidenciam a importância do cuidado integral na primeira infância, as áreas
prioritárias indicadas no Marco Legal da Primeira Infância e o valor do investimento em
políticas para promoção do desenvolvimento humano nessa fase da vida, vamos conhecer
mais detalhadamente as principais políticas públicas organizadas pelo Estado Brasileiro,
que se relacionam à primeira infância.

1.8.1. Políticas Nacionais de Saúde

SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS

Em 1988, por ocasião da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil,


foi instituído no país o Sistema Único de Saúde (SUS), que passou a oferecer a todo cidadão
brasileiro acesso integral, universal e gratuito a serviços de saúde. Considerado um dos
maiores e melhores sistemas de saúde públicos do mundo, o SUS beneficia cerca de 212
milhões de brasileiros e realiza cerca de 2,8 bilhões de atendimentos ao ano, desde
procedimentos ambulatoriais simples a atendimentos de alta complexidade, como
transplantes de órgãos. Os desafios, no entanto, são muitos, cabendo ao Governo e à
sociedade civil a atenção para estratégias de solução de problemas diversos, identificados,
por exemplo, na gestão do sistema e também no subfinanciamento da saúde (falta de
recursos).
Paralelamente à realização de consultas, exames e internações, o SUS também promove
campanhas de vacinação e ações de prevenção de vigilância sanitária, como fiscalização de
alimentos e registro de medicamentos.
Além da democratização da saúde (antes acessível apenas para alguns grupos da
sociedade), a implementação do SUS também representou uma mudança do conceito
sobre o qual a saúde era interpretada no país. Até então, a saúde representava apenas um
quadro de “não-doença”, fazendo com que os esforços e políticas implementadas se
reduzissem ao tratamento de ocorrências de enfermidades. Com o SUS, a saúde passou a

164

165
ser promovida e a prevenção dos agravos a fazer parte do planejamento das políticas
públicas. (Fonte: https://pensesus.fiocruz.br/sus)
O atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) acontece em três níveis de atenção:

Atenção Primária à Saúde Atenção Especializada à Atenção Especializada à Saúde de


Saúde de Média Alta Complexidade
Porta de entrada do SUS. Atua Complexidade
na prevenção de doenças e Atende os pacientes com
promoção da saúde. Realiza Presta atenção especializada enfermidades que apresentam
consultas, exames e em áreas como cardiologia, riscos contra sua vida. Conta com
procedimentos menos oftalmologia e profissionais altamente
complexos, como vacinação, endocrinologia. Oferta especializados que realizam
consultas eletivas, atividades exames mais avançados procedimentos mais invasivos e de
coletivas e curativos. Quando como endoscopias e risco à vida. Possuem aparelhos
necessário, encaminha os casos ecocardiogramas. Realiza para exames complexos, como
mais complexos para os demais intervenções e tratamentos ressonâncias, tomógrafos.
níveis de cuidado. Organiza de doenças agudas ou
ações para a promoção da crônicas, bem como presta
saúde em espaços atendimentos de
comunitários, campanhas de emergência.
vacinação, pré-natal, grupo de
idosos, hipertensos etc.
Equipamento: Unidades de Equipamentos: Hospitais de
Saúde da Família (UFS) ou grande porte, gerais ou
Postos de Saúde, CAPS etc. Equipamentos: Clínicas, especializados.
Unidades de Pronto
Atendimento (UPA),
ambulatórios e hospitais.

Atenção Primária à Saúde – APS

A atenção primária à saúde ou atenção básica é conhecida como a "porta de entrada" dos
usuários nos sistemas de saúde. Seu objetivo é orientar sobre a prevenção de doenças,
solucionar os possíveis casos de agravos e direcionar os mais graves para níveis de
atendimento superiores em complexidade. A APS é capaz de resolver até 85% das
demandas de saúde, sem a necessidade de ir a um serviço de emergência ou pronto-
socorro. A atenção primária funciona, portanto, como um filtro capaz de organizar o fluxo
dos serviços nas redes de saúde, dos mais simples aos mais complexos.
No Brasil, há diversos programas governamentais relacionados à atenção primária, sendo
um deles a Estratégia de Saúde da Família (ESF), que leva serviços multidisciplinares às

165

166
comunidades por meio das Unidades de Saúde da Família (USFs). Consultas, exames,
vacinas, atividades coletivas de promoção da saúde e prevenção de agravos são
disponibilizados aos usuários nas USFs.
A atenção primária também envolve outras iniciativas, como: as Equipes de Consultórios
de Rua, que atendem pessoas em situação de rua; o Programa Melhor em Casa, de
atendimento domiciliar; o Programa Brasil Sorridente, de saúde bucal; o Programa de
Agentes Comunitários de Saúde (PACS), que busca alternativas para melhorar as
condições de saúde de suas comunidades, o Programa Saúde na Escola, etc.
Dentre os equipamentos que compõem a APS estão Unidades de Saúde da Família (USF),
as Unidades de Saúde Fluviais, as Unidades Odontológicas Móveis (UOM), as Academias
de Saúde e os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) que auxiliam as pessoas em
sofrimento mental.

Estratégia de Saúde da Família – ESF

O que é?
A Estratégia Saúde da Família (ESF) busca promover a qualidade de vida da população
brasileira e intervir nos fatores que colocam a saúde em risco, como falta de atividade física,
má alimentação, uso de tabaco, etc. Com atenção integral, equânime e contínua, a ESF se
fortalece como a porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS).
A proximidade da equipe de saúde com o usuário permite que se conheça a pessoa, a
família, a vizinhança e as condições sociais e ambientais a que estão expostas as famílias de
um determinado território. Isso garante uma maior adesão do usuário aos tratamentos e
às intervenções propostas pela equipe de saúde, bem como amplia o olhar da equipe para
as necessidades da população, reforçando o princípio da integralidade da APS. O resultado
é mais problemas de saúde resolvidos na Atenção Primária, sem a necessidade de
intervenção de média e alta complexidade em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA
24h) ou hospital.
A Equipe de Saúde da Família está ligada à Unidade de Saúde da Família (USF) local. Esse
nível de atenção é capaz de resolver até 85% dos problemas de saúde da população.
Contudo, se a pessoa precisar de um cuidado de maior complexidade, a ESF é responsável
por realizar este encaminhamento.

166

167
A Estratégia Saúde da Família (ESF) é composta por equipe multiprofissional que possui,
no mínimo, médico generalista ou especialista em saúde da família ou médico de família e
comunidade, enfermeiro generalista ou especialista em saúde da família, auxiliar ou
técnico de enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Também há equipe de
Saúde Bucal, composta por cirurgião-dentista generalista ou especialista em saúde da
família, auxiliar e/ou técnico em Saúde Bucal.
O número de ACS deve ser suficiente para cobrir 100% da população cadastrada, com um
máximo de 750 pessoas por agente e de 12 ACS por equipe de Saúde da Família, não
ultrapassando o limite máximo recomendado de pessoas por equipe.
Cada equipe de Saúde da Família deve ser responsável por, no máximo, 4.000 pessoas de
uma determinada área.

Atividades básicas de uma equipe de Saúde da Família


● Conhecer a realidade das famílias pelas quais são responsáveis e identificar os
problemas de saúde mais comuns e situações de risco.
● Executar, de acordo com a qualificação de cada profissional, os procedimentos de
vigilância à saúde e de vigilância epidemiológica, nos diversos ciclos da vida.
● Garantir a continuidade do tratamento, pela adequada referência do caso.
● Prestar assistência integral, respondendo de forma contínua e racionalizada à
demanda, buscando contatos com indivíduos sadios ou doentes, visando promover a
saúde por meio da educação sanitária.
● Promover ações intersetoriais e parcerias com organizações formais e informais
existentes na comunidade para o enfrentamento conjunto dos problemas.
● Discutir, de forma permanente, com a equipe e a comunidade, o conceito de cidadania,
enfatizando os direitos de saúde e as bases legais que os legitimam.
● Incentivar a formação e/ou participação ativa nos conselhos locais de saúde e no
Conselho Municipal de Saúde.

Importância do Agente Comunitário de Saúde (ACS)


Os ACS têm como principal atribuição realizar atividades de prevenção de doenças e de
promoção da saúde, a partir dos referenciais da Educação Popular em Saúde, mediante
ações domiciliares ou comunitárias, individuais ou coletivas, desenvolvidas em
conformidade com as diretrizes do SUS.

167

168
Estudos de impacto indicam que a presença dos ACS tem impacto positivo na redução da
mortalidade infantil e está diretamente relacionada à qualidade do atendimento
realizado). Além da consulta médica e de enfermagem para redução da mortalidade
infantil, salienta-se a importância do papel dos ACS no incentivo ao aleitamento materno,
busca ativa das crianças com esquema vacinal em atraso ou que não foram às consultas de
puericultura, incremento na adesão ao tratamento com sulfato ferroso, consumo de água
potável, reforço dos aconselhamentos sobre acidente na infância e principalmente visitas
domiciliares com ênfase na prevenção de negligências.

POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO INTEGRADA À SAÚDE DA CRIANÇA

A PNAISC reúne o conjunto de ações programáticas e


estratégicas que visam garantir o pleno desenvolvimento da
criança em todas as etapas do ciclo de vida, considerando as
diferentes culturas e realidades, com foco na promoção da saúde,
prevenção de doenças e agravos, assistência e reabilitação à
saúde, e defesa dos direitos da criança desde a gestação até os 9
anos de idade

O objetivo da PNAISC é promover e proteger a saúde da criança e o aleitamento materno,


mediante atenção e cuidados integrais e integrados, da gestação aos nove anos de vida,
com especial atenção à primeira infância e às populações de maior vulnerabilidade,
visando à redução da morbimortalidade e um ambiente facilitador à vida com condições
dignas de existência e pleno desenvolvimento (BRASIL, 2018).
Referendada nos princípios de garantia do direito à vida e à saúde, no acesso universal de
todas as crianças à saúde, na equidade, na integralidade do cuidado, na humanização da
atenção e na gestão participativa, as ações da PNAISC se organizam a partir das Redes de
Atenção à Saúde (RAS), com ênfase para as redes temáticas, em especial à Rede de
Atenção à Saúde Materna e Infantil (BRASIL, 2018). A Atenção Básica coordena as ações
do cuidado no território.

VÍDEO 21

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Assista o vídeo do Ministério da Saúde sobre a Política Nacional de Atenção Integrada à
Saúde da Criança, para facilitar a compreensão do que vem a seguir:
<https://youtu.be/rzide7nnUp0 >.

Para saber mais:


https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/biblioteca/pnaisc/

Pré-Natal

Nem toda gestação é inicialmente planejada, embora possa ser desejada. Portanto, o Pré-
Natal deveria ser precedido do Planejamento Reprodutivo, oferecendo dupla proteção
(prevenção da gravidez e de infecções como HIV, sífilis e outras) e pela Avaliação Pré-
concepcional para o bom desenvolvimento da gestação, minimizando o impacto negativo
de doenças e fatores de risco dos genitores sobre o desenvolvimento saudável da criança
na Primeira Infância.
Toda gestante deve iniciar o pré-natal ainda no primeiro trimestre da gestação (captação
precoce da gestante) e realizar o mínimo de seis consultas do pré-natal durante a gestação,
além de participar de grupos educativos e ter acesso à realização de todos os exames e
vacinas deste período. O pré-natal de baixo risco geralmente é realizado nas unidades

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básicas de saúde. Quando há fatores de risco para a saúde do feto e/ou para a gestante
(doenças sistêmicas e/ou obstétricas, condições sociodemográficas desfavoráveis etc.), o
pré-natal é considerado de alto risco e a gestante é acompanhada em unidades de saúde
designadas para este fim.
A Caderneta da Gestante é outro potente instrumento de promoção do desenvolvimento
na primeira infância, além de conter importantes registros do Pré-natal que são muito
utilizados por profissionais das unidades de saúde e das maternidades.
Os direitos trabalhistas, sociais, de entrega para a adoção, da situação da adolescente
grávida, a vinculação a uma Maternidade para o parto, ao acompanhante durante o parto,
prevenção de violência na gravidez são conteúdos deste importante documento, ao lado
de informações sobre o desenvolvimento fetal, cuidados na gravidez, alimentação
saudável, exercícios, sono e sexo durante a gestação.
A evolução da gravidez é avaliada pelo acompanhamento da altura uterina para idade
gestacional, além dos necessários cuidados como imunizações e realizações de exames
laboratoriais, incluindo a ultrassonografia. A saúde bucal da gestante e o cuidado no
puerpério, com incentivo à realização de primeira consulta dentro da primeira semana
após o parto, também são abordadas.

Caderneta da Gestante
https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2018/agosto/31/Caderneta-da-
Gestante-2018.pdf

Estratégia Pré-Natal do Parceiro

O Pré-Natal do Parceiro foi regulamentado pela Portaria nº 1.474, de 8 de setembro de


2017. Esta ação incentiva a paternidade ativa e consciente, além de se articular com a
Saúde do Homem por meio da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem
(PNAISH). Esta é uma ação de grande impacto, pois favorece a vinculação do pai à criança,
seu apoio à mulher durante a gestação, o parto e pós parto, e o pleno exercício da função
paterna.
Contra a cultura dominante de exclusão do pai, o pré-natal do parceiro afirma que o pai ou
companheiro não é apenas coadjuvante na gestação. Além de poder realizar exames
laboratoriais e avaliar a saúde, o pai pode clampear o cordão umbilical no momento do

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parto, levar o recém-nascido ao contato pele a pele, incentivar a amamentação, cuidar da
criança e, caso a gestação seja de alto risco, com chances do recém-nascido nascer
prematuro e/ou de baixo peso, ele e a mulher podem conhecer a unidade neonatal da
maternidade de referência com antecedência.

Para saber mais:


• Guia do Pré-natal do Parceiro
https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2016/agosto/11/guia_PreNatal.pdf

VÍDEO 22
Vídeo Pré-natal do Parceiro em:
http://portalarquivos.saude.gov.br/campanhas/vivamaissus/prenatal_index.html

Política Nacional de Humanização do Parto e do Nascimento (PNHPN)

A PNHPN foi criada em 2003 e tem como foco a assistência centrada na mulher e na família,
acesso e acolhimento à família grávida, fortalecimento e participação da mulher na tomada
de decisões, proteção e promoção da gravidez e parto como processos saudáveis e
fisiológicos, uso apropriado da tecnologia e práticas baseadas em evidências científicas.
Com grande repercussão ultimamente, a violência obstétrica vem sendo combatida
principalmente por estudos baseados em evidência e pela luta das mulheres pelo
protagonismo durante o parto e ao lado do seu acompanhante, pai ou companheiro(a).
A gestante tem direito ao acompanhamento pré-natal, à vinculação prévia à maternidade
na qual será realizado seu parto e à maternidade na qual ela será atendida nos casos de
intercorrência pré-natal, a atendimento prioritário, a indicar um acompanhante durante
todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, a licença maternidade,
inclusive em casos de adoção e direito a dois intervalos, de meia hora cada, durante a
jornada de trabalho, especificamente para a amamentação (CNJ, s/d).

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância?


Art. 8º do ECA, alterado pelo art. 18 do Marco Legal da Primeira Infância:
É assegurado a todas as mulheres o acesso aos programas e às políticas de saúde da mulher
e de planejamento reprodutivo e, às gestantes, nutrição adequada, atenção humanizada à
gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral
no âmbito do Sistema Único de Saúde.

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Hospital Amigo da Criança – IHAC

O que é?
A IHAC é um título de qualidade conferido pelo Ministério da Saúde aos hospitais que
cumprem os 10 passos para o sucesso do aleitamento materno, instituídos pelo Unicef
(Fundo das Nações Unidas para a Infância) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS)
além de respeitar outros critérios, como o cuidado respeitoso e humanizado à mulher
durante o pré-parto, parto e o pós-parto, garantir livre acesso à mãe e ao pai (na ausência
deles o responsável legal), permanência deles junto ao recém-nascido internado, durante
24 horas, e cumprir a NBCAL – Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para
Lactentes e Crianças na Primeira Infância.
Bebês que nascem em Hospital Amigo da Criança têm menos chance de sofrer
intervenções desnecessárias logo após o parto, como aspiração das vias aéreas, uso de
oxigênio inalatório e uso de incubadora. O contato pele a pele com a mãe logo após o
nascimento, a amamentação na primeira hora de vida, ainda na sala de parto e o alojamento
conjunto também ocorre com mais frequência em Hospitais Amigos da Criança do que em
maternidades que não têm o título.
Nascer em Hospital Amigo da Criança também faz diferença nos indicadores de
aleitamento materno. A duração média do aleitamento materno exclusivo (oferta apenas
de leite materno para a criança até o 6º mês de vida) em crianças que nasceram nesses
hospitais foi de 60,2 dias, contra 48,1 dias em crianças que não nasceram em Hospital
Amigo da Criança. A pesquisa que mostrou esses dados revelou ainda que nascer em
hospitais com o título aumenta em 9% a chance de o recém-nascido ser amamentado na
primeira hora de vida.
Atualmente, um em cada quatro nascimentos no país ocorre em Hospitais Amigos da
Criança, uma média de 725 mil por ano.

Para saber mais:


• Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC)portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br › atencao-
mulher› i...
• Iniciativa Hospital Amigo da Criança: histórico e implementação (2008)
• Iniciativa Hospital Amigo da Criança: fortalecendo e sustentando a iniciativa hospital
amigo da criança – um curso para gestores (2009)

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• Iniciativa Hospital Amigo da Criança: autoavaliação e monitoramento do hospital
(2010)

Política Nacional de Aleitamento Materno

Esta política visa fortalecer as diversas ações de incentivo ao aleitamento materno


desenvolvidas no País, adotando como estratégia a linha de cuidado; alinhamento aos
princípios e diretrizes do SUS, no contexto de consolidação das Redes de Atenção à Saúde
(RAS) e indução de ações intersetoriais, a fim de garantir o direito das crianças, suas mães
e famílias à amamentação exclusiva nos primeiros 6 meses de vida e continuado até os 2
anos de vida ou mais, seguindo as recomendações da Organização Mundial da Saúde
(OMS) e Ministério da Saúde (MS). Segue essa orientação de passos para o sucesso do
aleitamento:

DEZ PASSOS PARA O SUCESSO DO ALEITAMENTO MATERNO:

Passo 1 – Ter uma política de aleitamento materno escrita que seja rotineiramente
transmitida a toda equipe de cuidados de saúde.
Passo 2 – Capacitar toda a equipe de cuidados de saúde nas práticas necessárias para
implementar esta política.
Passo 3 – Informar todas as gestantes sobre os benefícios e o manejo do aleitamento
materno.
Passo 4 – Ajudar as mães a iniciar o aleitamento materno na primeira meia hora após o
nascimento. conforme nova interpretação: colocar os bebês em contato pele a pele com
suas mães, imediatamente após o parto, por pelo menos uma hora e orientar a mãe a
identificar se o bebê mostra sinais de que está querendo ser amamentado, oferecendo
ajuda se necessário.
Passo 5 – Mostrar às mães como amamentar e como manter a lactação mesmo se vierem
a ser separadas dos filhos.
Passo 6 – Não oferecer a recém-nascidos bebida ou alimento que não seja o leite materno,
a não ser que haja indicação médica e/ou de nutricionista.
Passo 7 – Praticar o alojamento conjunto – permitir que mães e recém-nascidos
permaneçam juntos – 24 horas por dia.
Passo 8 – Incentivar o aleitamento materno sob livre demanda.

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Passo 9 – Não oferecer bicos artificiais ou chupetas a recém-nascidos e lactentes.
Passo 10 – Promover a formação de grupos de apoio à amamentação e encaminhar as
mães a esses grupos na alta da maternidade; conforme nova interpretação: encaminhar
as mães a grupos ou outros serviços de apoio à amamentação, após a alta, e estimular a
formação e a colaboração com esses grupos ou serviços.

Para saber mais:


Iniciativa Hospital Amigo da Criança: promovendo e incentivando a amamentação em um
hospital amigo da Criança – curso de 20 horas para equipes de maternidade (2009)
Amamentação muito mais do que alimentar a criança (BRASIL, 2010). Disponível em:

VÍDEO 23
Iniciativa Hospital Amigo da Criança: https://www.youtube.com/watch?v=i31VEa--XpE

MÉTODO CANGURU

O que é?
Em todo o mundo, nascem anualmente 20 milhões de bebês prematuros e de baixo peso
(menores de 2,5kg). Destes, um terço morre antes de completar um ano de vida.
No Brasil, aproximadamente 10% dos bebês nascem antes do tempo. O avanço da
medicina tem possibilitado que a grande maioria consiga se desenvolver e crescer com
saúde. São considerados prematuros (ou pré-termos), os bebês que vem ao mundo antes
de completar 37 semanas de gestação.
O Método Canguru é considerado a forma mais adequada de atenção ao recém-nascido
(RN) pré-termo ou de baixo peso, especialmente àqueles que necessitaram de internação
em Unidade Neonatal. A Política de Atenção Humanizada ao Recém-Nascido – Método
Canguru constrói uma linha de cuidado que tem início na identificação de risco gestacional
no pré-natal realizado na Atenção Primária. Esse cuidado segue no pré-natal especializado
e, após o nascimento, acompanha o percurso do bebê no serviço de neonatologia, seja
Unidade Neonatal ou alojamento conjunto. Segue até o domicílio, quando, então, passa a
ser acompanhado, se necessário, pelo ambulatório especializado e sempre pela Unidade
Básica de Saúde.

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O Método Canguru é um modelo de assistência que tem início na gravidez de risco e segue
até o recém-nascido atingir 2.500 g. Dessa forma, abrange pré-natal, internação materna,
parto e nascimento, internação do recém-nascido e retorno para casa. Envolve cuidado
humanizado, contato pele a pele entre o recém-nascido e seus pais, controle ambiental,
redução da dor, cuidado com a família e suporte da equipe de saúde. O contato pele a pele,
no Método Canguru, começa com o toque dos pais em seus bebês desde os primeiros
momentos da internação, evoluindo até a posição canguru.
Pilares do Método Canguru:
1. Acolhimento ao bebê e à sua família.
2. Respeito às individualidades do recém-nascido e de seus pais.
3. Promoção do contato pele a pele precoce.
4. Envolvimento da mãe e do pai nos cuidados com o bebê.
Vantagens:
1. Reduz o tempo de separação entre a criança e sua família.
2. Favorece o vínculo pai-mãe-bebê-família.
3. Possibilita maior confiança e competência dos pais.
4. Proporciona estímulos sensoriais positivos.
5. Melhora o desenvolvimento do bebê.
6. Estimula o aleitamento materno.
7. Favorece controle térmico adequado.
8. Reduz o risco de infecção hospitalar.
9. Reduz o estresse e a dor.
10. Melhora a comunicação da família com a equipe de saúde.

Para saber mais:

VÍDEO 24
Método Canguru na Atenção Básica: Cuidado Compartilhado (BRASIL, 2015).
https://www.youtube.com/watch?v=zed8GTpgtag

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QualiNEO

O que é?
Qualificação da Assistência ao Recém-Nascido de Risco
A promoção de saúde da criança e as estratégias de redução da mortalidade infantil são
eixos centrais nas políticas de saúde do Brasil nas últimas décadas. No Brasil, nascem por
ano, aproximadamente 3 milhões de crianças em 4.705 maternidades (públicas e privadas).
Visando superar o desafio de diminuir a mortalidade neonatal o Ministério da Saúde
apresenta a “Estratégia QualiNEO (EQN)”, que objetiva ofertar apoio técnico de forma
sistemática e integrada às maternidades prioritárias para qualificação das práticas de
gestão e atenção ao recém-nascido a fim de que possam contribuir para a redução da
mortalidade infantil, em especial em seu componente neonatal.
Além disto, esta estratégia pretende promover a integração dos programas estratégicos
do Ministério da Saúde voltados à qualificação da assistência e redução da mortalidade
neonatal, visto que hoje são ofertados e acompanhados de maneira isolada.
Nessa direção, busca-se a formação e qualificação do cuidado e da gestão a partir do
estabelecimento de relações colaborativas nos espaços coletivos de trabalho,
promovendo interações, trocas de experiências e conhecimento. Incorporando também
estratégias e instrumentos de pactuação de compromissos e corresponsabilização com as
práticas sanitárias no campo materno-infantil. No mais, busca ofertar métodos de
monitoramento cotidiano das práticas de atenção neonatal visando à correção de rumos
de modo dinâmica e permanente.

Para saber mais:


portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br › qualineo

ESTRATÉGIA AMAMENTA E ALIMENTA BRASIL (EAAB)

O que é?
A "Estratégia Nacional para Promoção do Aleitamento Materno e Alimentação
Complementar Saudável no SUS – Estratégia Amamenta e Alimenta Brasil (EAAB)",
lançada em 2012, tem como objetivo qualificar o processo de trabalho dos profissionais da
atenção básica com o intuito de reforçar e incentivar a promoção do aleitamento materno

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e da alimentação saudável para crianças menores de dois anos no âmbito do Sistema Único
de Saúde (SUS). Essa iniciativa é o resultado da integração de duas ações importantes do
Ministério da Saúde: a Rede Amamenta Brasil e a Estratégia Nacional para a Alimentação
Complementar Saudável (ENPACS), que se uniram para formar essa nova estratégia, que
tem como compromisso a formação de recursos humanos na atenção básica.

Para saber mais:


• Manual de Implementação da Estratégia Amamenta e Alimenta Brasil –
EAAB (2015)
• NOTA TÉCNICA DE CERTIFICAÇÃO EAAB
• MODELOS DE OFÍCIO DA CERTIFICAÇÃO – EAAB

MULHER TRABALHADORA QUE AMAMENTA (MTA)

O que é?
A estratégia de Apoio à Mulher Trabalhadora que Amamenta (MTA) consiste em
incentivar nas empresas públicas e privadas uma cultura de respeito e apoio à
amamentação como forma de promover a saúde da mulher trabalhadora e de seu bebê,
trazendo benefícios diretos para a empresa e para o país.
Desde 2010, o Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)
orientam a implementação das salas de apoio à amamentação nas empresas por meio do
Guia para Implementação de Salas de Apoio à Amamentação para a Mulher Trabalhadora.

Para saber mais:


• http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_implantacao_salas_apoio_amament
acao.pdf
• Cartilha Mulher Trabalhadora que Amamenta (2015)
• Manual de Implementação da Estratégia Amamenta e Alimenta Brasil – EAAB (2015)

ATENÇÃO INTEGRADA ÀS DOENÇAS PREVALENTES NA INFÂNCIA (AIDPI)

O que é?

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A estratégia “Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância” (AIDPI) tem por
objetivo diminuir a morbidade e mortalidade de crianças entre zero a 5 anos de idade, por
meio da melhoria da qualidade da atenção prestada à criança por profissionais de saúde,
em especial na Atenção Primária à Saúde, promovendo ações de promoção e prevenção
em saúde infantil, diminuindo a mortalidade por estas doenças, não apenas investindo na
sobrevivência das crianças, mas também no seu pleno desenvolvimento infantil (OPAS,
2005).
A estratégia da AIDPI inclui intervenções curativas e preventivas destinadas a melhorar
as práticas de saúde em unidades de saúde, em casa e na comunidade. Essa estratégia inclui
três componentes principais:
(1) melhoria nas habilidades de gerenciamento de casos da equipe de saúde através do
fornecimento de diretrizes localmente adaptadas sobre AIDPI e atividades para promover
seu uso;
(2) melhoria no sistema geral de saúde necessário para o gerenciamento eficaz de doenças
da infância; e
(3) melhoria nas práticas de saúde da família e da comunidade.
Caracteriza-se pela consideração simultânea e integrada do conjunto de doenças de maior
prevalência na infância, em vez do enfoque tradicional que busca abordar cada doença
isoladamente, como se ela fosse independente das demais doenças que atingem a criança
e do contexto em que ela está inserida.
A Estratégia AIDPI, além de propor melhor organização dos serviços de saúde, ações de
prevenção de agravos e promoção da saúde, há um melhor acompanhamento do
crescimento e do desenvolvimento nos primeiros anos de vida. Estes são primordiais para
criarmos condições que visam garantir futuras gerações de adultos e idosos mais
saudáveis.

Para saber mais:


• http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/julho/12/17-0056-Online.pdf
• http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/julho/12/17-0095-Online.pdf
• caderno do participante aidpi neonatal (2014)
• quadros de procedimentos aidpi neonatal (2014)
• manual do aidpi neonatal (2014)

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NUTRISUS – Fortificação da Alimentação Infantil com Micronutrientes em pó

O que é?
Lançada oficialmente em março de 2015, a Estratégia de Fortificação da Alimentação
Infantil com Micronutrientes (vitaminas e minerais) em Pó – NutriSUS consiste na adição
de uma mistura de vitaminas e minerais em pó em uma das refeições diárias oferecidas às
crianças de 06-48 meses de idade. Os micronutrientes em pó são embalados
individualmente na forma de sachês (1g).
Implantada inicialmente nas creches participantes do Programa Saúde na Escola, a
iniciativa tem o objetivo de potencializar o pleno desenvolvimento infantil, a prevenção e
o controle da anemia e outras carências nutricionais específicas na infância.

Para saber mais:


• https://aps.saude.gov.br/ape/pcan/nutrisus
• Prevenção e Controle de Agravos Nutricionais

EXAMES DE TRIAGEM NEONATAL

O que são?
Todo bebê que nasce no Brasil tem direito a realizar gratuitamente quatro exames muito
importantes para a sua saúde. São os chamados exames da triagem neonatal:
● Teste do Pezinho: é uma das principais formas de diagnosticar seis doenças que, quanto
mais cedo forem identificadas, melhores são as chances de tratamento. São elas
fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, doença falciforme e outras hemoglobinopatias,
fibrose cística, deficiência de biotinidase e hiperplasia adrenal congênita. O teste do
pezinho é feito gratuitamente na maternidade ou na Unidade de Saúde, entre o 3° e o 5°
dia de vida do bebê. É fundamental ter atenção a esse prazo.
● Teste do Olhinho: É um exame simples, rápido e indolor, que consiste na identificação de
um reflexo vermelho, que aparece quando um feixe de luz ilumina o olho do bebê. O
fenômeno é semelhante ao observado nas fotografias. O “Teste do Olhinho” pode detectar
qualquer alteração que cause obstrução no eixo visual, como catarata, glaucoma congênito
e outros problemas – cuja identificação precoce pode possibilitar o tratamento no tempo

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certo e o desenvolvimento normal da visão. O exame constitui uma das etapas do exame
físico do recém-nascido realizado pelo profissional de saúde nas maternidades até a alta
do recém-nascido. Se isto não ocorrer, o exame deve ser feito logo na primeira consulta de
acompanhamento
● Teste da Orelhinha: Entre os procedimentos realizados ainda na maternidade, logo após
o nascimento do bebê, está a triagem neonatal auditiva ou o teste da orelhinha. Toda
criança deverá ser submetida ao teste da orelhinha preferencialmente nos primeiros dias
de vida (24 a 48h) ainda na maternidade, e, no máximo, durante o primeiro mês de vida,
exceto em casos quando a saúde da criança não permita a realização dos exames. As
crianças que apresentaram alterações nos testes deverão ser submetidas ao reteste em
até 30 dias.
● Teste do Coraçãozinho: Todo bebê tem direito de realizar o teste de coraçãozinho ainda
na maternidade, entre 24h a 48h após o nascimento. O teste é simples, gratuito, indolor e
é feito para identificar cardiopatias congênitas críticas na criança. Consiste em medir a
oxigenação do sangue e os batimentos cardíacos do recém-nascido com o auxílio de um
oxímetro – espécie de pulseirinha – no pulso e no pé do bebê. Caso algum problema seja
detectado, o bebê é encaminhado para fazer um ecocardiograma. Se alterado, é
encaminhado para um centro de referência em cardiopatia para tratamento. Problemas no
coração são a terceira maior causa de morte em recém-nascidos. Por isso, quanto mais
cedo for diagnosticado, melhores são as chances do tratamento.
● Avaliação do frênulo lingual: Sugere-se que a avaliação do frênulo lingual seja realizada
durante o exame físico do recém-nascido, antes da alta hospitalar (entre 24h-48h de vida
do recém-nascido) por profissional de saúde capacitado que realiza assistência ao binômio
mãe e bebê. Sugere-se também que o diagnóstico da anquiloglossia (língua presa) na alta
hospitalar seja realizado por profissional habilitado para tal e amparado segundo o
exercício legal de sua profissão. Nos casos duvidosos, preconiza-se que seja realizada, na
consulta da primeira semana de vida do RN na Atenção Básica, uma avaliação minuciosa
da dinâmica da amamentação.

Para saber mais:


Exames da Triagem Neonatal – Ministério da Saúdewww.saude.gov.br › ... › Assuntos ›
Saúde para Você

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REDE CEGONHA

O que é?
Conforme estabelecido na Consolidação n° 03/GM/MS, de 28/09/2017; Anexo II – Rede
Cegonha, Art. 4°: A Rede Cegonha deve ser organizada de maneira a possibilitar o
provimento contínuo de ações de atenção à saúde materna e infantil para a população de
determinado território (região de saúde), mediante a articulação dos distintos pontos de
atenção à saúde, do sistema de apoio, do sistema logístico e da governança da rede de
atenção à saúde a partir das seguintes diretrizes:

I – garantia do acolhimento com avaliação e classificação de risco e vulnerabilidade,


ampliação do acesso e melhoria da qualidade do pré-natal;
II – garantia de vinculação da gestante à unidade de referência e ao transporte seguro;
III – garantia das boas práticas e segurança na atenção ao parto e nascimento;
IV – garantia da atenção à saúde das crianças de zero a vinte e quatro meses com
V – garantia de acesso às ações do planejamento reprodutivo.
Para tanto, a Rede Cegonha se divide em 04 componentes com ações definidas para
garantia do acesso e cuidado no período perinatal. São eles: Componente pré-natal;
Componente parto e nascimento; Componente puerpério e saúde da criança e
Componente transporte sanitário e regulação. As ações propostas para o trabalho em rede
em cada componente estão descritas na referida portaria.

Princípios da Rede Cegonha:


I – o respeito, a proteção e a realização dos direitos humanos;
II – o respeito à diversidade cultural, étnica e racial;
III – a promoção da equidade;
IV – o enfoque de gênero;
V – a garantia dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos de mulheres, homens, jovens
e adolescentes;
VI – a participação e a mobilização social;
VII – a compatibilização com as atividades das redes de atenção à saúde materna e infantil
em desenvolvimento no Estado.

Objetivos da Rede Cegonha:

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I – Fomentar a implementação de novo modelo de atenção à saúde da mulher e à saúde da
criança com foco na atenção ao parto, ao nascimento, ao crescimento e ao
desenvolvimento da criança de zero aos vinte e quatro meses.
II – Organizar a Rede de Atenção à Saúde Materna e Infantil para que esta garanta acesso,
acolhimento e resolutividade.
III – Reduzir a mortalidade materna e infantil, com ênfase no componente neonatal.

Para saber mais:


• Rede Cegonha – Ministério da Saúde
• www.saude.gov.br › Ações e Programas › Rede Cegonha
• Importante ressaltar que todas as Políticas de Saúde descritas, fazem parte da
PNAISC:

Caderneta da Criança

A vigilância do desenvolvimento compreende a promoção do desenvolvimento saudável e


a detecção precoce de problemas no desenvolvimento, é realizada por meio de consultas
para avaliação do crescimento (medidas antropométricas, com peso, altura e perímetro
cefálico) e do desenvolvimento global, incluindo avaliação do desenvolvimento
neuropsicomotor em consultas mensais até 18 meses e bimestrais até os 5 anos de idades
segundo a Caderneta da Criança (BRASIL, 2018).
A Caderneta da Criança – Passaporte da Cidadania permite aos profissionais e à família o
acompanhamento do processo de crescimento e desenvolvimento da criança e a detecção
precoce de problemas que possam afetar sua saúde, nutrição, capacidade mental e social.
Por ela também se acompanha a situação vacinal. As consultas de saúde são um momento
privilegiado para o acompanhamento do desenvolvimento global das crianças e detecção
de possíveis riscos no campo de saúde mental.
No Brasil, a Caderneta da Criança é o principal registro do desenvolvimento da criança,
do nascimento até os nove anos de idade. Gratuita, deve ser oferecida na maternidade.
O grande avanço em sua edição recém-lançada é seu ASPECTO INTERSETORIAL. Com o
avanço de outras Políticas Públicas voltadas à Primeira Infância, o processo de integração
era necessário e desejável, o que agora é realidade. Afinal, o Desenvolvimento na Primeira

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Infância engloba não só mais de uma disciplina, mas também diferentes setores como
Saúde, Assistência Social, Educação e Direitos Humanos, entre outros.
Na Caderneta da Criança, a família encontra informações e registros sobre o
desenvolvimento saudável e pode acompanhar o crescimento e o desenvolvimento da
criança.
Todos os profissionais da Primeira Infância podem consultar a Caderneta da Criança. Nela,
inclusive, estão anotadas as informações sobre os Marcos do desenvolvimento (etapas em
que as crianças mais ou menos estão desenvolvendo as habilidades psicomotoras,
emocionais e cognitivas), numa seção dedicada à “Vigilância do Desenvolvimento”.
Outros temas importantes, como prevenção de acidentes, sinais de alarme para doenças
com potencial gravidade, amamentação e alimentação saudável, sem esquecer o tema
das violências, também são abordados. A saúde ocular e a saúde odontológica também
são contempladas, importantes que são para o desenvolvimento saudável. Com a
utilização das recomendações e registros da Caderneta da Criança, crianças com
deficiência poderiam levam menos tempo para obterem diagnóstico, tratamento e
reabilitação

Nova versão da Caderneta:


• 2020 Caderneta da Criança – Menina (eletrônica)
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderneta_crianca_menina_2ed.pdf
• 2020 Caderneta da Criança – Menino (eletrônica)
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/caderneta_crianca_menino_2ed.pdf

Plano Nacional de Imunização

O Plano Nacional de Imunização é uma das mais avançadas estratégias de prevenção dos
agravos à saúde da gestante e da criança e oferecido a toda a população brasileira pelo
Sistema Único de Saúde (SUS). A vacinação evita diversas doenças imunopreveníveis:
varíola (declarada mundialmente erradicada em 1980), a poliomielite/paralisia infantil,
sarampo, tuberculose, rubéola, gripe, hepatite A e B, febre amarela, entre outras. As doses
de vacina recebidas pelas crianças são registradas na Caderneta da Criança, de acordo
com o Calendário Nacional de Vacinação. Crianças indígenas contam com calendário de
vacinação diferenciado, atendendo às suas especificidades e respeitando os aspectos

183

184
culturais envolvidos, conforme definições da Portaria nº 1.498, de 19 de julho de 2013.
Crianças comprovadamente infectadas pelo HIV possuem vacinação adaptada às
circunstâncias operacionais e epidemiológicas próprias deste grupo (BRASIL, 2018).

Programa Saúde na Escola

O que é?
O Programa Saúde na Escola (PSE), política intersetorial da Saúde e da Educação, foi
instituído em 2007. Nele, as políticas de saúde e educação voltadas às crianças,
adolescentes, jovens e adultos da educação pública brasileira se unem para promover
saúde e educação integral dos estudantes da rede pública de ensino.
O Programa Saúde na Escola (PSE) visa à integração e articulação permanente da
educação e da saúde, proporcionando melhoria da qualidade de vida da população
brasileira. Como consolidar essa atitude dentro das escolas? Essa é a questão que nos
guiou para elaboração da metodologia das Agendas de Educação e Saúde, a serem
executadas como projetos didáticos nas Escolas.
O PSE tem como objetivo contribuir para a formação integral dos estudantes por meio de
ações de promoção, prevenção e atenção à saúde, com vistas ao enfrentamento das
vulnerabilidades que comprometem o pleno desenvolvimento de crianças e jovens da rede
pública de ensino.
O público beneficiário do PSE são os estudantes da Educação Básica, gestores e
profissionais de educação e saúde, comunidade escolar e, de forma mais amplificada,
estudantes da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica e da Educação de
Jovens e Adultos (EJA).
As atividades de educação e saúde do PSE ocorrerão nos Territórios definidos segundo a
área de abrangência da Estratégia Saúde da Família (Ministério da Saúde), tornando
possível o exercício de criação de núcleos e ligações entre os equipamentos públicos da
saúde e da educação (escolas, centros de saúde, áreas de lazer como praças e ginásios
esportivos, etc.).
No PSE a criação dos Territórios locais é elaborada a partir das estratégias firmadas entre
a escola, a partir de seu projeto político-pedagógico e a unidade Primária de saúde. O
planejamento destas ações do PSE considera: o contexto escolar e social, o diagnóstico
local em saúde do escolar e a capacidade operativa em saúde do escolar.

184

185
A Escola é a área institucional privilegiada deste encontro da educação e da saúde: espaço
para a convivência social e para o estabelecimento de relações favoráveis à promoção da
saúde pelo viés de uma Educação Integral.
Para o alcance dos objetivos e sucesso do PSE é de fundamental importância compreender
a Educação Integral como um conceito que compreende a proteção, a atenção e o pleno
desenvolvimento da comunidade escolar. Na esfera da saúde, as práticas das equipes de
Saúde da Família, incluem prevenção, promoção, recuperação e manutenção da saúde dos
indivíduos e coletivos humanos.
Para alcançar estes propósitos o PSE foi constituído por cinco componentes:
a) Avaliação das Condições de Saúde das crianças, adolescentes e jovens que estão na
escola pública.
b) Promoção da Saúde e de atividades de Prevenção.
c) Educação Permanente e Capacitação dos Profissionais da Educação e da Saúde e de
Jovens.
d) Monitoramento e Avaliação da Saúde dos Estudantes.
e) Monitoramento e Avaliação do Programa.

Mais do que uma estratégia de integração das políticas setoriais, o PSE se propõe a ser um
novo desenho da política de educação e saúde já que:

(1) trata a saúde e educação integrais como parte de uma formação ampla para a cidadania
e o usufruto pleno dos direitos humanos;
(2) permite a progressiva ampliação das ações executadas pelos sistemas de saúde e
educação com vistas à atenção integral à saúde de crianças e adolescentes; e
(3) promove a articulação de saberes, a participação de estudantes, pais, comunidade
escolar e sociedade em geral na construção e controle social da política pública.

O que é a Agenda de Educação e Saúde?


A Agenda de Educação e Saúde é uma estratégia fundamental de implementação das ações
compartilhadas nos territórios municipais. São escolhidos “recortes” do território
integrando escolas e unidades de saúde, a fim de gerar uma articulação das práticas. A
Agenda definirá as propostas comunitárias para estes microterritórios onde as escolas
estão inseridas, refletindo as expectativas comunitárias em relação à interface educação e
saúde.

185

186
No âmbito da escola as atividades de planejamento e gestão do coletivo, formulação dos
inventários detalhados e da condução de processos participativos integrados aos estudos
e ao Projeto Político Pedagógico representam uma oportunidade ímpar para os exercícios
de cidadania.
Por meio do diálogo entre comunidade escolar e equipe da Estratégia Saúde da Família, a
Agenda de Educação e Saúde envolve interlocuções entre diferentes setores da sociedade
e dos programas/políticas já em desenvolvimento na escola e com parceiros locais.

Rede de Atenção Psicossocial e seu equipamento: Centro de Atenção Psicossocial –


CAPS

O que é?
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) nas suas diferentes modalidades são pontos
de atenção estratégicos da RAPS: serviços de saúde de caráter aberto e comunitário
constituído por equipe multiprofissional e que atua sobre a ótica interdisciplinar e realiza
prioritariamente atendimento às pessoas com sofrimento ou transtorno mental,
incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, em
sua área territorial, seja em situações de crise ou nos processos de reabilitação
psicossocial e são substitutivos ao modelo asilar.

Modalidades
• CAPS I: Atendimento a todas as faixas etárias, para transtornos mentais graves e
persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas, atende cidades e ou
regiões com pelo menos 15 mil habitantes.
• CAPS II: Atendimento a todas as faixas etárias, para transtornos mentais graves e
persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas, atende cidades e ou
regiões com pelo menos 70 mil habitantes.
• CAPS i: Atendimento a crianças e adolescentes, para transtornos mentais graves e
persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas, atende cidades e ou
regiões com pelo menos 70 mil habitantes.
• CAPS ad Álcool e Drogas: Atendimento a todas faixas etárias, especializado em
transtornos pelo uso de álcool e outras drogas, atende cidades e ou regiões com pelo
menos 70 mil habitantes.

186

187
• CAPS III: Atendimento com até 5 vagas de acolhimento noturno e observação; todas
faixas etárias; transtornos mentais graves e persistentes inclusive pelo uso de
substâncias psicoativas, atende cidades e ou regiões com pelo menos 150 mil
habitantes.
• CAPS ad III Álcool e Drogas: Atendimento e 8 a 12 vagas de acolhimento noturno e
observação; funcionamento 24h; todas faixas etárias; transtornos pelo uso de álcool
e outras drogas, atende cidades e ou regiões com pelo menos 150 mil habitantes.

Linha de Cuidado para Atenção Integral à Saúde de Crianças, Adolescentes e


suas Famílias em Situação de Violências

Tem o propósito de sensibilizar e orientar os gestores e profissionais de saúde. A linha de


cuidado é uma estratégia que busca articular a produção do cuidado desde a atenção
primária até o mais complexo nível de atenção, exigindo ainda a interação com os demais
sistemas para a garantia de direitos, proteção e defesa de crianças e adolescentes. O
conteúdo busca estimular o desenvolvimento de ações de prevenção de violências,
promoção da saúde e cultura de paz.

Para saber mais:

VÍDEO 24
Linha de Cuidado para a Atenção Integral à Saúde de Crianças, Adolescentes e suas
Famílias em Situação de Violências (BRASIL, 2012). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=_a0YoTPzra0

Programa Brasil Sorridente

O que é?
A Política Nacional de Saúde Bucal, intitulada Brasil Sorridente, pauta-se nos princípios e
nas diretrizes do SUS. Na Atenção Integral à Saúde da Criança essa política se insere de
forma transversal, integral e intersetorial nas linhas de cuidado direcionadas à mulher e à
criança, com o objetivo de promover a qualidade de vida desse público, por meio das ações
de promoção, prevenção, cuidado, qualificação e vigilância em saúde (BRASIL, 2004a).
O acesso à saúde bucal deve ter início no pré-natal e será incorporado no
acompanhamento do crescimento e no desenvolvimento da criança. A equipe de saúde

187

188
deve trabalhar de forma articulada, encaminhando a gestante para a consulta
odontológica ao iniciar o pré-natal. Deve-se garantir ao menos uma consulta odontológica
durante o pré-natal, com agendamento das demais consultas, conforme as necessidades
individuais da gestante. A equipe de Saúde Bucal deverá efetuar os registros das ações
realizadas nas Cadernetas de Saúde da Criança e da Gestante (BRASIL, 2004a, 2008b).
Nas ações de saúde direcionadas à criança, recomenda-se que todos os profissionais da
equipe de saúde incorporem, em sua rotina, o exame da cavidade bucal das crianças e
orientações aos pais e responsáveis sobre prevenção de doenças e agravos e de promoção
da saúde bucal, enfatizando a importância do acompanhamento da saúde bucal e
direcionando a criança para as consultas odontológicas periódicas, evitando assim que o
acesso ocorra tardiamente devido à doença já instalada (COMISSÃO NACIONAL SOBRE
DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE, 2008).
Para estabelecer um bom vínculo, os profissionais da equipe de Saúde Bucal podem
realizar o primeiro contato por meio de atividades em grupo (ex.: orientações aos pais e
responsáveis e, em seguida, o exame clínico dos bebês), interconsulta (ex.: atendimento
conjunto do médico ou enfermeiro com o cirurgião-dentista) ou consulta sequencial
programada (ex.: estipular o dia da consulta odontológica no mesmo dia e horário da
consulta de acompanhamento médico e de enfermagem).
O que diz o Marco Legal da Primeira Infância sobre isso?

Art. 24. O art. 14 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 , passa a vigorar


acrescido dos seguintes §§ 2º, 3º e 4º, numerando-se o atual parágrafo
único como § 1º :
Art. 14 (...)
§ 2º O Sistema Único de Saúde promoverá a atenção à saúde bucal das
crianças e das gestantes, de forma transversal, integral e intersetorial
com as demais linhas de cuidado direcionadas à mulher e à criança.
§ 3º A atenção odontológica à criança terá função educativa protetiva e
será prestada, inicialmente, antes de o bebê nascer, por meio de
aconselhamento pré-natal, e, posteriormente, no sexto e no décimo
segundo anos de vida, com orientações sobre saúde bucal.

Para saber mais:


Brasil Sorridente – Secretaria de Atenção Primária à Saúde aps.saude.gov.br › ape ›
brasilsorridente

188

189
1.8.2. Políticas Nacionais de Educação

EDUCAÇÃO

Apesar de apenas a Educação Infantil figurar como área prioritária no Marco Legal da
Primeira Infância, apresentamos aqui outras áreas que tangenciam o público de gestantes,
especialmente pelo fato de as pesquisas observarem alta correlação entre a escolaridade
dos pais e o desenvolvimento integral dos filhos.

Educação Infantil

O que é?
A educação infantil é um direito humano e social de todas as crianças até cinco anos de
idade, sem distinção decorrente de origem geográfica, caracteres do fenótipo (cor da pele,
traços de rosto e cabelo), da etnia, nacionalidade, sexo, de deficiência física ou mental, nível
socioeconômico ou classe social. Também não está atrelada à situação trabalhista dos pais
nem ao nível de instrução, religião, opinião política ou orientação sexual. É dever do Estado
garantir a oferta da Educação Infantil pública, gratuita e de qualidade sem requisito de
seleção.
A Educação Infantil, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança em seus
aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da
comunidade (LDB, art.29), e desta forma cumpre um papel importante no
desenvolvimento humano e social. Configura-se como uma das áreas educacionais que
mais retribui à sociedade os recursos nela investidos, contribuindo para a aprendizagem e
o desenvolvimento das crianças.
O currículo da Educação Infantil é concebido como um conjunto de práticas que buscam
articular as experiências e os saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte
do patrimônio cultural, artístico, científico e tecnológico da Humanidade. Tais práticas são
efetivadas por meio de relações sociais que as crianças desde bem pequenas estabelecem
com os professores e as outras crianças, e afetam a construção de suas identidades.
Intencionalmente planejadas e permanentemente avaliadas, as práticas que estruturam o
cotidiano das instituições de Educação Infantil devem considerar a integralidade e

189

190
indivisibilidade das dimensões expressivo-motora, afetiva, cognitiva, linguística, ética,
estética e sociocultural das crianças, apontar as experiências de aprendizagem que se
espera promover para as crianças e efetivar-se por meio de modalidades que assegurem
as metas educacionais de seu projeto pedagógico.
A Base Nacional Comum (BNCC) para a etapa da Educação Infantil, fixada pela Resolução
02/2017 do Conselho Nacional de Educação, considerando os princípios definidos pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil MEC/2009), organiza-se pelos
direitos de aprendizagem e desenvolvimento, campos de experiências e objetivos de
aprendizagem e desenvolvimento, elementos que se integram na articulação entre as
necessidades, interesses, experiências e curiosidades das crianças de 0 a 5 anos e o
patrimônio artístico, cultural, ambiental, científico e tecnológico. A ideia leva em conta que
bebês e crianças pequenas aprendem e se desenvolvem por meio de experiências do
cotidiano, que devem ser planejadas com intencionalidade pelos professores.
A educação infantil no Brasil registrou muitos avanços nos últimos anos. O direito à
educação a todas as crianças pequenas, desde seu nascimento, representa uma conquista
importante para a sociedade brasileira. Porém, para que esse direito se traduza realmente
em melhores oportunidades educacionais para todos e em apoio significativo às famílias
com crianças até cinco anos de idade, é preciso que as creches e as pré-escolas, garantam
um atendimento de boa qualidade. Este é o destaque feito pelo Marco Legal da Primeira
Infância:

Art. 16. A expansão da educação infantil deverá ser feita de maneira a


assegurar a qualidade da oferta, com instalações e equipamentos que
obedeçam a padrões de infraestrutura estabelecidos pelo Ministério da
Educação, com profissionais qualificados conforme dispõe a Lei nº 9.394,
de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional) , e com currículo e materiais pedagógicos adequados à
proposta pedagógica.
Parágrafo único. A expansão da educação infantil das crianças de 0 (zero)
a 3 (três) anos de idade, no cumprimento da meta do Plano Nacional de
Educação, atenderá aos critérios definidos no território nacional pelo
competente sistema de ensino, em articulação com as demais políticas
sociais.

Para Saber Mais: http://movimentopelabase.org.br/wp-


content/uploads/2019/04/Campos-de-Experi%C3%AAncias-PDF-interativo-2.pdf

Qualidade da Educação Infantil

190

191
Pensando na Educação Infantil de qualidade, há que se ter um espaço adequado,
profissionais habilitados, infraestrutura de trabalho, respeito às crianças e o
reconhecimento de seus direitos a frequentar um local que garanta as interatividades
pedagógicas provocadas pelos professores.
Estes por sua vez, na medida em que planejam os espaços e tempos devem oportunizar às
crianças a construção e desconstrução do seu brincar, de suas pesquisas corporais e
sonoras, e lhes possibilitar convivências diversas nestes espaços educacionais. Acolher os
bebês e as crianças pequenas, dar espaço para que elas se sintam acolhidas e adaptem-se
neste outro local de convivência social, com afeto e objetivos educativos, assim como
ludicidade, em que os conteúdos e áreas de conhecimento se entrelaçam e giram em torno
do eixo central que é a brincadeira.

Para Saber Mais: Parâmetros Nacionais da Qualidade da Educação Infantil


http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=1414
51-public-mec-web-isbn-2019-003&category_slug=2020&Itemid=30192

A importância da participação da família na educação da criança


A parceria com a Família é indispensável para o desenvolvimento e o aprendizado da
criança, sendo que o âmbito familiar e o institucional complementam-se em suas
especificidades e em sua participação.
A Instituição de Educação Infantil e as famílias têm papéis complementares na formação
integral da criança, por isso devem estabelecer relações de cooperação e troca de
experiências e conhecimentos, tendo sempre em vista compreender mais detalhadamente
a criança e pensar em estratégias para potencializar sua aprendizagem e desenvolvimento.

Para saber mais:

VÍDEO 25
Filme Pequenos Conselheiros, Grandes Ideias, da EMEI D. Leopoldina – São Paulo/SP –
2º lugar no 2° Prêmio Nacional de Projetos com Participação Infantil – 2016. Disponível
em: <https://www.youtube.com/watch?v=YfDSH5GhUtw>.

VÍDEO 26

191

192
Filme Projeto Parques Sonoros, em um CEI da Zona Leste de São Paulo, você pode
conhecer um projeto construído com as famílias. Disponível em:
https://www.tvt.org.br/parques-sonoros-apresentam-os-sons-para-bebes/

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância?

Art. 16. A expansão da educação infantil deverá ser feita de maneira a


assegurar a qualidade da oferta, com instalações e equipamentos que
obedeçam a padrões de infraestrutura estabelecidos pelo Ministério da
Educação, com profissionais qualificados conforme dispõe a Lei nº 9.394,
de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional) , e com currículo e materiais pedagógicos adequados à
proposta pedagógica.
Parágrafo único. A expansão da educação infantil das crianças de 0 (zero)
a 3 (três) anos de idade, no cumprimento da meta do Plano Nacional de
Educação, atenderá aos critérios definidos no território nacional pelo
competente sistema de ensino, em articulação com as demais políticas
sociais. (BRASIL, Lei 13.257/2016, art. 16)

A educação da criança de até 6 anos insere-se nas ações do Ministério da Educação (MEC),
que implementa apoio técnico e financeiro à educação infantil a partir dos seguintes
programas suplementares:

Programa Nacional de Reestruturação e Aquisição de Equipamentos para a


Rede Pública de Educação Infantil – PROINFÂNCIA

O que é?

192

193
É uma das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) do Ministério da
Educação, visando garantir o acesso de crianças a creches e escolas, bem como a melhoria
da infraestrutura física da rede de Educação Infantil. O programa atua sobre dois eixos
principais, indispensáveis à melhoria da qualidade da educação:

• Construção de creches e pré-escolas, por meio de assistência técnica e financeira


do FNDE, com projetos padronizados que são fornecidos pelo FNDE ou projetos
próprios elaborados pelos proponentes.
• Aquisição de mobiliário e equipamentos adequados ao funcionamento da rede
física escolar da educação infantil, tais como mesas, cadeiras, berços, geladeiras,
fogões e bebedouros.

Programa de Apoio à Manutenção e Desenvolvimento da Educação Infantil


Novas Turmas (Brasil Carinhoso) e Novos Estabelecimentos (Proinfância)

O que é?
O repasse de recursos financeiros foi criado com o objetivo de ampliar a oferta da educação
infantil, e visa prestar apoio financeiro aos Municípios e ao Distrito Federal para garantir a
expansão da oferta e o regular funcionamento das novas matrículas, seja em novos
estabelecimentos (Unidades do Proinfância) ou em novas turmas (Brasil Carinhoso) de
educação infantil, até que estas sejam computadas para recebimento de recursos do
FUNDEB.

Legislação:
- Apoio a Manutenção da Educação Infantil em Novos estabelecimentos (Proinfância):

193

194
Lei nº 12.499, de 29 de setembro de 2011 e resoluções CD/FNDE nº 15, de 16 de maio
de 2013.
- Apoio a Manutenção da Educação Infantil em Novas turmas (Brasil Carinhoso)
Lei nº 12.722, de 03 de outubro de 2012 e Resolução CD/FNDE nº 16, de 16 de maio de
2013.

Parâmetros Nacionais de Qualidade da Educação Infantil

O documento “Parâmetros de Nacionais de Qualidade da Educação Infantil” (MEC/2018),


define padrões de referência de organização, gestão e funcionamento das Instituições de
Educação Infantil, contribuindo para um processo democrático de formulação,
implementação e avaliação das Políticas Públicas para as crianças da faixa etária de 0 até
5 anos, promovendo iniciativas inovadoras e coletivas, que visem a aprendizagem e o
desenvolvimento integral e integrado das crianças. O documento pode ser acessado no
endereço:
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=14145
1-public-mec-web-isbn-2019-003&category_slug=2020&Itemid=30192

Base Nacional Comum Curricular – BNCC

194

195
O que é?
A Base Nacional Comum Curricular é um documento normativo que define o conjunto de
aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e
modalidades da Educação Básica. Seu principal objetivo é ser a balizadora da qualidade da
educação no País por meio do estabelecimento de um patamar de aprendizagem e
desenvolvimento a que todos os alunos têm direito.
Considerando que, na Educação Infantil, as aprendizagens e o desenvolvimento das
crianças têm como eixos estruturantes as interações e a brincadeira, assegurando-lhes os
direitos de conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se, a organização
curricular da Educação Infantil na BNCC está estruturada em cinco campos de
experiências, no âmbito dos quais são definidos os objetivos de aprendizagem e
desenvolvimento. Os campos de experiências constituem um arranjo curricular que acolhe
as situações e as experiências concretas da vida cotidiana das crianças e seus saberes,
entrelaçando-os aos conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural.
O documento da BNCC pode ser acessado em http://basenacionalcomum.mec.gov.br/a-
base e http://movimentopelabase.org.br/wp-content/uploads/2019/04/Campos-de-
Experi%C3%AAncias-PDF-interativo-2.pdf

195

196
Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) oferece alimentação escolar e ações


de educação alimentar e nutricional a estudantes de todas as etapas da educação básica
pública. O governo federal repassa a estados, municípios e escolas federais, valores
financeiros de caráter suplementar efetuados em 10 parcelas mensais (de fevereiro a
novembro) para a cobertura de 200 dias letivos, conforme o número de matriculados em
cada rede de ensino.
O repasse é feito diretamente aos estados e municípios, com base no Censo Escolar
realizado no ano anterior ao do atendimento. O Programa é acompanhado e fiscalizado
diretamente pela sociedade, por meio dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE), pelo

196

197
FNDE, pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria Geral da União (CGU)
e pelo Ministério Público.
Com a Lei nº 11.947, de 16/6/2009, 30% do valor repassado pelo Programa Nacional de
Alimentação Escolar – PNAE deve ser investido na compra direta de produtos da
agricultura familiar, medida que estimula o desenvolvimento econômico e sustentável das
comunidades.
São atendidos pelo programa os alunos de toda a educação básica (educação infantil,
ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos) matriculados em
escolas públicas, filantrópicas e em entidades comunitárias (conveniadas com o poder
público). Vale destacar que o orçamento do PNAE beneficia milhões de estudantes
brasileiros, como prevê o artigo 208, incisos IV e VII, da Constituição Federal.
Para Saber Mais Acesse: https://www.fnde.gov.br/programas/pnae

Programa Nacional do Livro e do Material Didático – PNLD

O Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) compreende um conjunto de


ações voltadas para a distribuição de obras didáticas, pedagógicas e literárias, entre outros
materiais de apoio à prática educativa, destinados aos alunos e professores das escolas
públicas de educação básica do País. O PNLD também contempla as instituições
comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos e conveniadas com o Poder
Público. As escolas participantes do PNLD recebem materiais de forma sistemática,
regular e gratuita. Trata-se, portanto, de um Programa abrangente, constituindo-se em um
dos principais instrumentos de apoio ao processo de ensino-aprendizagem nas Escolas
beneficiadas. As ações do PNLD destinam-se aos alunos e professores das escolas públicas
de educação básica, como também de instituições comunitárias, confessionais ou
filantrópicas sem fins lucrativos e conveniadas com o Poder Público.

197

198
Para Saber Mais:
Acesse: https://www.fnde.gov.br/index.php/programas/programas-do-
livro?view=default

Programa Conta pra Mim

O programa Conta pra Mim, instituído pela portaria MEC nº 421 de 23 de abril de 2020
tem como finalidade orientar, estimular e promover práticas de literacia familiar no Brasil.
Literacia familiar pode ser entendida como o conjunto de práticas e experiências
relacionadas com a linguagem oral, a leitura e a escrita, que as crianças vivenciam com seus
pais ou responsáveis. Sabe-se que tais práticas são fundamentais para o desenvolvimento
de habilidades facilitadoras da alfabetização. Além da contribuição da aprendizagem
cognitiva, tais habilidades possuem grande impacto do ponto de vista emocional. As
práticas de literacia familiar, portanto, além de contribuírem positivamente na vida escolar
dos filhos, melhoram os vínculos afetivos familiares e, consequentemente, o bem-estar de
todos. O programa Conta pra Mim se operacionaliza por meio da promoção de campanhas,
produção de cursos, vídeos, cartilhas, divulgação de materiais para orientação e para
exercício das práticas, distribuição de conteúdo para famílias carentes bem como
estabelecimento de iniciativas intersetoriais diversas. Grande parte do conteúdo do
programa pode ser livremente acessada em
<alfabetizacao.mec.gov.br/contapramim>. Ainda diversas parcerias foram estabelecidas
com outros ministérios — a exemplo do Ministério da Saúde, do Ministério da Cidadania e
do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos — para fornecimento de
cursos, conteúdo, materiais e capacitações. O Conta pra Mim é para todos e tem como

198

199
missão precípua criar, entre os brasileiros, o hábito da leitura em família, que tanto
potencial tem de melhorar a vida de todos.

Para Saber Mais:


Acesse: http://alfabetizacao.mec.gov.br/contapramim

Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE)

Criado em 1995, o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) é uma política pública
educacional implementada pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE), tendo por finalidade prestar assistência financeira, em caráter suplementar, às
escolas públicas municipais, estaduais e distritais da educação básica, às escolas privadas
de educação especial.
O programa objetiva concorrer para o funcionamento e a melhoria da infraestrutura física
e pedagógica dos estabelecimentos de ensino e o reforço da autogestão escolar nos planos
financeiro, administrativo e didático, bem como para a elevação dos indicadores de
desempenho da educação básica. Entre outras finalidades, é possível empregar seus
recursos para adquirir materiais de consumo e permanente, contratar serviços, realizar
reparos no prédio escolar e desenvolver projetos pedagógicos.
Os recursos são transferidos diretamente a entes federativos, sem a necessidade de
convênio, acordo, contrato, ajuste ou instrumento congênere, mediante crédito em contas
bancárias abertas pelo FNDE especificamente para esse fim. Os repasses são efetuados,
anualmente, das seguintes formas:

• à Entidade Executora – EEx (Prefeitura Municipal ou Secretaria


de Educação de Estado ou do Distrito Federal) – a cuja rede de
ensino pertençam as escolas públicas, no caso dessas terem até

199

200
50 (cinquenta) alunos e não possuírem Unidade Executora
Própria (UEx);
• à Unidade Executora Própria – UEx (Caixa Escolar, Conselho
Escolar, Associação de Pais e Mestres, etc.) – representativa de
escola pública ou de polo presencial da UAB; e
• à Entidade Mantenedora – EM (Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais, Associação Pestalozzi, etc.), no caso de escola
privada de educação especial.

As EEx, UEx e EM são responsáveis pelo recebimento, gestão e prestação de contas dos
recursos destinados a beneficiar as escolas a elas vinculadas.
Diversos programas e projetos de iniciativa do Ministério da Educação (MEC) passaram a
utilizar o modelo operacional e regulamentar do PDDE para destinar recursos às escolas
públicas do País. Essas transferências financeiras que, no âmbito do PDDE, passaram a ser
designadas de ações agregadas – contribuem para a implementação de políticas do MEC
com objetivos específicos, englobando desde investimentos para adequações de prédios
escolares (a fim de garantir, por exemplo, abastecimento de água potável, esgotamento
sanitário e acessibilidade) a incentivos financeiros para melhoria do Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) das escolas.

Detalhes dos valores repassados


Em relação aos repasses realizados pelo FNDE às escolas podem ser acessados no sítio
do FNDE
em:https://www.fnde.gov.br/sigpcadm/actionPublico.pu?tilesPublico=ConsultarSituaca
o

Órgão responsável pelo PDDE


Coordenação-Geral de Apoio à Manutenção Escolar/DIRAE/FNDE
pdde@fnde.gov.br

Para saber mais:


https://www.fnde.gov.br/programas/pdde

Educação de Jovens e Adultos – EJA

200

201
Jovens e Adultos – EJA é uma modalidade de ensino criada pelo Governo Federal que
perpassa todos os níveis da Educação Básica do país, destinada aos jovens, adultos e idosos
que não tiveram acesso à educação na escola convencional na idade apropriada.
Permite que o aluno, muitas vezes gestantes, retome os estudos e os conclua em menos
tempo e, dessa forma, possibilitando sua qualificação para conseguir melhores
oportunidades no mercado de trabalho.
Quanto à duração dos cursos presenciais de EJA:

I – para os anos iniciais do Ensino Fundamental, a duração deve ficar a critério dos sistemas
de ensino;
II – para os anos finais do Ensino Fundamental, a duração mínima deve ser de 1.600 (mil e
seiscentas) horas;
III – para o Ensino Médio, a duração mínima deve ser de 1.200 (mil e duzentas) horas.
IV – Para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio integrada com o Ensino
Médio, reafirma-se a duração de 1.200 (mil e duzentas) horas destinadas à educação geral,
cumulativamente com a carga horária mínima para a respectiva habilitação profissional de
Nível Médio, tal como estabelece a Resolução CNE/CEB nº 4/2005, e para o ProJovem, a
duração estabelecida no Parecer CNE/CEB nº 37/2006.

Atualmente é a Resolução CNE nº 3, de 15 de junho de 2010 que institui as Diretrizes


Operacionais para a Educação de Jovens e Adultos.
Considerando a necessidade de isonomia da Educação de Jovens e Adultos – EJA em
relação as demais etapas de formação da educação básica, a Secretaria de Educação Básica
apresentou à Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação – CNE,
consulta referente ao alinhamento da EJA às diretrizes apresentadas na Base Nacional
Comum Curricular – BNCC, na perspectiva de construir diretrizes curriculares nacionais
para orientação da política de EJA.
As mudanças propostas giram em torno da carga horária, forma de registro de frequência
dos cursos da EJA, flexibilização da oferta de forma que se compatibilize com a realidade
dos estudantes, alinhamento da elevação de escolaridade com a qualificação profissional,
entre outras demandas.
Já os cursos de EJA desenvolvidos por meio da EAD permanecerão restritos ao segundo
segmento do Ensino Fundamental e ao Ensino Médio após o alinhamento das Diretrizes da
EJA à BNCC.

201

202
No âmbito Nacional, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (Inep), realiza exames que certificam saberes adquiridos tanto em ambientes
escolares quanto extraescolares. O Exame Nacional para Certificação de Competências de
Jovens e Adultos (Encceja) pode ser realizado para pleitear certificação no nível de
conclusão do ensino fundamental e ensino médio.
Atualmente, para certificação do ensino fundamental, é preciso ter, no mínimo, 15 anos
completos, e para o ensino médio, 18 anos completos no dia de aplicação da prova. Para
mais informações acesse https://www.gov.br/inep/pt-br/areas-de-atuacao/avaliacao-e-
exames-educacionais/encceja .
Uma vez que cabe a cada instituição de ensino expedir certificados de conclusão de cursos,
e que os sistemas de ensino dispõem sobre a oferta de educação de jovens e adultos
segundo disposto na Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – LDB, também é possível
realizar a certificação de conclusão do Ensino Fundamental e Médio nos estados e
municípios.

Para saber mais:


Acesse: www.mec.gov.br

1.8.3. Políticas sociais: Cadastro Único, Programa Bolsa


Família, Programa Criança Feliz e Política de Assistência
Social

Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal – Cadastro Único

O que é?
O Cadastro Único é o principal instrumento do estado brasileiro para identificação e
caracterização socioeconômica das famílias de baixa renda em todo território nacional. A
inserção das famílias no Cadastro Único é o primeiro passo para ter acesso aos programas
sociais do Governo Federal como o Bolsa Família – PBF, o Benefício de Prestação
Continuada – BPC, o Programa Cisternas, a Tarifa Social de Energia Elétrica, o Programa
Minha Casa Minha Vida, o Programa Criança Feliz, entre outros. Além disso, pode ser

202

203
utilizado para acesso a programas ofertados pelos governos estaduais, municipais e do
Distrito Federal. Contudo, estar no Cadastro Único não significa a entrada automática
nesses programas, pois cada um deles tem suas regras específicas. O cadastramento
ocorre nos postos de atendimento do Cadastro Único nos municípios, geralmente
localizados no Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) do território de
residência da família.
Podem se inscrever no Cadastro Único:

● Famílias com renda mensal de até meio salário mínimo por pessoa.
● Famílias com renda mensal total de até três salários mínimos.
● Famílias com renda maior que três salários mínimos podem se cadastrar, desde
que o cadastramento esteja vinculado à participação em algum programa social
implementado pela União, pelos estados, pelos municípios e pelo DF.

No Cadastro Único é possível também a identificação de famílias pertencentes aos


seguintes Grupos Populacionais Tradicionais e Específicos:

● Indígenas, quilombolas, ribeirinhos, extrativistas, pescadores artesanais e outros


povos e comunidades tradicionais, principalmente que residem em aldeias ou
comunidades afastadas dos centros urbanos ou de difícil acesso.
● População que reside em zona rural ou em comunidades rurais afastadas dos
centros urbanos ou de difícil acesso (agricultores familiares, assentados,
acampados).
● Pessoas em situação de rua.

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância?

Art. 32 (atualiza Art. 101 do ECA): IV – inclusão em serviços e programas oficiais ou


comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente.

Programa Bolsa Família – PBF

Programa federal de transferência direta de renda com condicionalidades destinado às


famílias em situação de pobreza ou em extrema pobreza. Contribui para o combate à
pobreza de duas formas:

203

204
➢ Transferindo a cada mês uma quantia em dinheiro diretamente às famílias
em situação de pobreza e extrema pobreza do Brasil.
➢ Acompanhando, nas áreas de saúde e educação, as crianças, os adolescentes
e as mulheres grávidas que fazem parte do Programa.

Figura 1 – Características do Programa Bolsa Família (Fonte: Secretaria Nacional de Renda de


Cidadania/Secretaria Especial do Desenvolvimento Social/ Ministério da Cidadania, 2020).

204

205
Figura 2 – Tipos de benefícios transferidos pelo Programa Bolsa Família (Fonte: Secretaria Nacional
de Renda de Cidadania/Secretaria Especial do Desenvolvimento Social/ Ministério da Cidadania, 2020).

Podem ser selecionadas para participar do Programa:

✓ Todas as famílias com renda mensal por pessoa de até R$ 89,00, mesmo que
não tenham gestantes, crianças ou adolescentes na família.
✓ As famílias com renda familiar mensal por pessoa de R$ 89,01 até R$ 178,00
que tenham gestantes, crianças ou adolescentes.

A prioridade na seleção de beneficiários é dada a partir das informações de renda mensal


por pessoa e pela quantidade de crianças e jovens com idade de 0 a 17 anos na família.
A seleção das famílias é feita a partir das informações registradas pelos municípios no
Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. Tudo é feito por um sistema,
sem a interferência manual de nenhuma pessoa. Todo mês, o Governo Federal deposita um
valor para as famílias que fazem parte do PBF. O saque é feito com cartão emitido em nome
do responsável familiar, que é preferencialmente a mulher. O valor depositado também é
calculado por um sistema e depende do tamanho da família, da idade das pessoas e da
renda que todas as pessoas da família recebem. Por isso as famílias podem receber valores
diferentes.

205

206
A concessão do benefício depende de quantas famílias já foram atendidas no município, em
relação à estimativa de famílias pobres feita para essa localidade. Além disso, o Governo
Federal precisa respeitar o limite orçamentário do Programa.

Condicionalidades do PBF
Na área de Educação, o Bolsa Família busca garantir que as crianças e os adolescentes
beneficiários do Programa estejam matriculados e frequentando a escola, o que é um
direito social. Para isso, é feito o acompanhamento mês a mês da frequência escolar de
cada um desses estudantes, com a identificação das dificuldades que tenham neste acesso
à escola.
Na área de Saúde, o Programa contribui para o desenvolvimento saudável de meninas e
meninos ao acompanhar, duas vezes por ano, a vacinação, o peso e a altura das crianças
com menos de 7 anos, o que também é direito social. Além disso, acompanha o pré-natal
das gestantes e busca orientar as mulheres em fase de amamentação.
Por meio das Condicionalidades, o Programa Bolsa Família contribui na identificação das
famílias que estão tendo dificuldades no acesso aos seus direitos, para que a área de
assistência social possa fazer o acompanhamento necessário.

Jornada das crianças e dos adolescentes/famílias PBF – “rede de proteção social”

Figura 3: Ciclo de vida dos beneficiários do PBF e as condicionalidades do Programa.


Fonte: Secretaria Nacional de Renda de Cidadania/Secretaria Especial do Desenvolvimento Social/ Ministério da
Cidadania, 2020.

206

207
Os dados coletados durante o acompanhamento de condicionalidades pelas áreas da
saúde e da educação têm um grande potencial para se transformar em norteadores de
ações intersetoriais. Eles podem representar situações de vulnerabilidade e risco social
vividos pelas famílias, além de revelar realidades locais nos serviços ou no acesso aos
serviços.
Articulação por meio das condicionalidades

Figura 4: As condicionalidades como fonte de informações para uma atuação intersetorial


Fonte: Secretaria Nacional de Renda de Cidadania/Secretaria Especial do Desenvolvimento Social/ Ministério da
Cidadania, 2020.

Para conhecer mais sobre o Programa Bolsa Família em sua localidade, acesse o portal
Bolsa Família e Cadastro Único no seu Município:
https://aplicacoes.mds.gov.br/sagirmps/bolsafamilia/

207

208
E ainda:
• https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/cadastro-unico
• https://www.gov.br/cidadania/pt-br/acoes-e-programas/bolsa-familia
• https://bfa.saude.gov.br/
• http://tutorialpresenca.mec.gov.br/inicio-coordernador-municipal.html

Referências:
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003.
BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015.
BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.
COLIN, D. R. A e PEREIRA, J. M. F Gestão Integrada de Serviços, Bens e Transferência de Renda:
Alguns Apontamentos Sobre a Experiência Brasileira. In: CRUS, J. F.. et al. (Orgs.). Coletânea de
Artigos Comemorativos dos 20 Anos da Lei Orgânica de Assistência Social. Brasília: Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2013. 248p .

Programa Criança Feliz (PCF)

O que é?

208

209
O Programa Criança Feliz (PCF) foi implantado pelo Governo Federal em outubro de 2016
através do Decreto nº 8.869, posteriormente revogado pelo Decreto nº 9.579, de 22 de
novembro de 2018, como um programa de apoio às famílias para promoção do
desenvolvimento integral na primeira infância. Uma de suas referências metodológicas foi
o Primeira Infância Melhor (PIM), implantado no Rio Grande do Sul em abril de 2003 e a
metodologia “Care for Child Development” (tradução: Cuidados para o Desenvolvimento
da Criança – CDC), desenvolvido pelo UNICEF e OMS.
O PCF visa ao fortalecimento das competências familiares. Orientam as famílias, a partir
de sua cultura e experiências, para que promovam o desenvolvimento integral de suas
crianças, da gestação aos 6 anos de vida. As atividades ofertadas pelo Programa se
desenvolvem a partir de visitas domiciliares realizadas semanalmente por Visitadores
capacitados e supervisionados por um Supervisor vinculado ao CRAS. Tem como público
prioritário famílias em situação de risco e vulnerabilidade social cadastradas no Cadastro
Único para Programas Sociais (CadÚnico). Prevê a gestão intersetorial dos casos,
integrando prioritariamente saúde, educação e assistência social, direitos humanos e
cultura.
São objetivos do PCF, respaldados pelo Marco Legal da Primeira Infância:

I – Promover o desenvolvimento humano a partir do apoio e do acompanhamento do


desenvolvimento infantil integral na primeira infância.
II – Apoiar a gestante e a família na preparação para o nascimento e nos cuidados
perinatais.
III – Colaborar no exercício da parentalidade, fortalecendo os vínculos e o papel das
famílias para o desempenho da função de cuidado, proteção e educação de crianças na
faixa etária de até seis anos de idade.
IV – Mediar o acesso da gestante, das crianças na primeira infância e das suas famílias a
políticas e serviços públicos de que necessitem.
V – Integrar, ampliar e fortalecer ações de políticas públicas voltadas para as gestantes,
crianças na primeira infância e suas famílias.
O Programa Criança Feliz surgiu como mais uma ação de promoção do desenvolvimento
integral de crianças de até seis anos e sua execução deve ser realizada de forma integrada
aos demais serviços do CRAS e do território.
O Programa Criança Feliz tem como público prioritário:

209

210
• Gestantes, crianças de até três anos e suas famílias beneficiárias do Bolsa Família,
recentemente esse público foi ampliado para todo CadÚnico.
• Crianças de até seis anos e suas famílias beneficiárias do BPC (Benefício de
Prestação Continuada).
• Crianças de até seis anos afastadas do convívio familiar em razão da aplicação de
medida de proteção especial prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente.
São seus principais eixos de atividades:
• Visitas domiciliares voltadas a promoção do desenvolvimento infantil.
Integração das Políticas de Atenção à Primeira Infância no território

Figura 5 – Lâmina de apresentação do PIM/PCF (Fonte: Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul,
2020)

Trata-se de um programa de livre adesão dos estados e municípios, cuja avaliação externa
se realiza sob coordenação do Dr. Cesar Victora (UFPel) e um consórcio de universidades
brasileiras.

210

211
Figura 6 – Mapa de adesão ao Programa Criança Feliz
Fonte: Secretaria Nacional de Atenção à Primeira Infância, Ministério da Cidadania, 2020

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância?

Art. 14. As políticas e programas governamentais de apoio às famílias, incluindo as visitas


domiciliares e os programas de promoção da paternidade e maternidade responsáveis,
buscarão a articulação das áreas de saúde, nutrição, educação, assistência social, cultura,
trabalho, habitação, meio ambiente e direitos humanos, entre outras, com vistas ao
desenvolvimento integral da criança.
§ 1º Os programas que se destinam ao fortalecimento da família no exercício de sua função
de cuidado e educação de seus filhos na primeira infância promoverão atividades
centradas na criança, focadas na família e baseadas na comunidade.
§ 3º As gestantes e as famílias com crianças na primeira infância deverão receber
orientação e formação sobre maternidade e paternidade responsáveis, aleitamento
materno, alimentação complementar saudável, crescimento e desenvolvimento infantil

211

212
integral, prevenção de acidentes e educação sem uso de castigos físicos, nos termos da Lei
nº 13.010, de 26 de junho de 2014 , com o intuito de favorecer a formação e a consolidação
de vínculos afetivos e estimular o desenvolvimento integral na primeira infância.
§ 5º Os programas de visita domiciliar voltados ao cuidado e educação na primeira infância
deverão contar com profissionais qualificados, apoiados por medidas que assegurem sua
permanência e formação continuada.

Para saber mais:

Integração PCF e SUAS Cartilha de apoio para as visitas domiciliares do


Programa Criança Feliz às crianças com deficiência.
Brasília, Ministério da Cidadania, 2020.
http://www.mds.gov.br/webarquivos/arquivo/cria
nca_feliz/SNPDH_Cartilha_CF_Crian%C3%A7asDe
fici%C3%AAncia_0704.pdf

212

213
POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL

Reconhecida pela Constituição Federal, de 1988, a política de Assistência Social foi


regulamentada pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), Lei nº 8.742, de 07 de
dezembro de 1993. Direito do cidadão que dela necessitar e dever do Estado, é uma
política que integra a Seguridade Social não contributiva, voltada à provisão dos mínimos
sociais e à proteção social de famílias e indivíduos que se encontrem em situações
específicas de vulnerabilidade social e risco pessoal e social. Realizada por meio de um
conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade civil, é coordenada, em
âmbito nacional, pela Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), da Secretaria
Especial de Desenvolvimento Social (SEDS), do Ministério da Cidadania, com ofertas
organizadas no país por intermédio do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que são
executadas de modo preponderante pelos municípios.
Além da Constituição Federal e da LOAS, as ofertas e responsabilidades da Assistência
Social possuem interface com legislações que tratam de segmentos específicos – como o
Estatuto da Criança e do Adolescente3; o Estatuto do Idoso4; a Lei Brasileira de Inclusão5;
a Lei Maria da Penha 6
- e com Convenções Internacionais das quais o Brasil é
signatário.Com centralidade na família, os serviços, programas, projetos e benefícios
socioassistenciais são orientados pelas chamadas seguranças socioassistenciais, que a
política busca afiançar ao cidadão.

Seguranças socioassistenciais, de acordo com Colin e Pereira (2013, p. 108)7:

• “Segurança de sobrevivência ou de rendimento e autonomia: visa afiançar


condições dignas de sobrevivência em determinadas circunstâncias, por meio

3
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
4
BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003.
5
BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015.
6
BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006.
7
COLIN, D. R. A e PEREIRA, J. M. F Gestão Integrada de Serviços, Benefícios e Transferência de Renda:
Alguns Apontamentos Sobre a Experiência Brasileira. In: CRUS, J. F. et al. Coletânea de Artigos
Comemorativos dos 20 Anos da Lei Orgânica de Assistência Social. Brasília: Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2013. 248p.

213

214
do acesso ao BPC, benefícios eventuais, transferência de renda do PBF e a
outras oportunidades”.
• “Segurança de convívio ou vivência familiar: pautada na centralidade da
família e no reconhecimento do papel do Estado em apoiá-la(...) Contempla a
perspectiva de que vínculos familiares e comunitários são fundamentais para
assegurar condições protegidas de desenvolvimento humano e das relações
familiares”.
• “Segurança de acolhida: voltada à proteção em situações excepcionais, nas
quais seja necessário prover acolhimento provisório em serviços de
acolhimento. Integra também esta segurança, a perspectiva da postura
acolhedora que deve orientar desde a organização da infraestrutura física dos
equipamentos até a postura ética, de respeito à dignidade e não-discriminação,
que deve estar presente no atendimento direto à população”.

A Assistência Social reconhece a família como espaço privilegiado de proteção e


socialização primária, de desenvolvimento e construção de referências e vinculações
afetivas significativas. A proteção a seus membros – como crianças e adolescentes, por
exemplo – exige atenções à família como um todo, que considerem o contexto no qual está
inserida e busquem melhorias em suas condições de vida, apoio a processos de inclusão
social e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. A Assistência Social
reconhece que a família também se caracteriza como um espaço contraditório, cuja
dinâmica cotidiana de convivência pode ser marcada por conflitos, desigualdades e até
mesmo violência. Assim, as ofertas socioassistenciais buscam fortalecer a capacidade
protetiva das famílias e mitigar a ocorrência de violações de direitos, com base na
compreensão de cada realidade familiar, na articulação intersetorial e no trabalho em rede.

SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – SUAS

O SUAS é um sistema público, não contributivo, descentralizado e participativo, destinado


à gestão e à organização da oferta de serviços, programas, projetos e benefícios da
assistência social, por meio da gestão compartilhada dos entes federados, corresponsáveis

214

215
pela política de Assistência Social. O financiamento dos serviços, programas e projetos
socioassistenciais constitui corresponsabilidade dos entes federados, cujos recursos
devem ser alocados nos respectivos fundos de assistência social. No caso dos benefícios, a
União é responsável pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC), enquanto a
regulamentação e a concessão dos benefícios eventuais compete aos municípios, com
cofinanciamento também dos Estados.
Com a implementação do SUAS no Brasil, a partir de 2005,as ofertas da política de
Assistência Social passaram a ser norteadas por um comando único no país, com base em
parâmetros nacionalmente definidos, que asseguram uma padronização com certa
flexibilidade para adaptações em âmbito local.
Conforme previsão na LOAS, o SUAS conjuga ofertas públicas-estatais prestadas
diretamente pelo poder público e ofertas públicas não-estatais, executadas pelas
entidades e organizações de Assistência Social. As entidades de assistência social podem
ser isoladas ou cumulativamente de atendimento; de assessoramento; e de defesa e
garantia de direitos. Devem executar suas ações considerando os parâmetros do SUAS,
com inscrição nos Conselhos de Assistência Social, municipais ou do Distrito Federal. Para
que sejam reconhecidas como entidades socioassistenciais, elas também devem estar
cadastradas no Cadastro Nacional de Entidades de Assistência Social (CNEAS). Podem,
ainda, ser certificadas como entidades beneficentes, a partir de procedimentos específicos
para a concessão da Certificação para Entidades Beneficentes da Assistência Social
(CEBAS).
O SUAS conta com instâncias que asseguram transparência, pactuações interfederativas
e controle social. As Comissões Intergestores são os espaços para diálogo e pactuação de
parâmetros nacionais para organização e funcionamento do SUAS, com tomada de decisão
compartilhada e participativa, inclusive sobre critérios para partilha de recursos públicos,
dentre outros aspectos. As Comissões Intergestores Bipartites, de âmbito estadual,
reúnem gestores municipais e estaduais de Assistência Social. A Comissão Intergestores
Tripartite, de âmbito nacional, reúne gestores das diferentes as esferas da federação. Já as
instâncias de controle social são exercidas pelos Conselhos de Assistência Social, órgãos
vinculados ao órgão gestor da Assistência Social no âmbito da União, do Distrito Federal
(DF), dos estados e municípios. Compostos por representação paritária entre o governo e
a sociedade civil (nos diversos segmentos: usuários, trabalhadores do SUAS e entidades),
os Conselhos de Assistência Social possuem atribuições previstas na LOAS, dentre as quais

215

216
a deliberação sobre a política de Assistência Social, a apreciação e aprovação da proposta
orçamentária atual, a aprovação de critérios de partilha de recursos públicos, etc.
Uma função importante do SUAS é a da Vigilância Socioassistencial, que se dedica a apoiar
as atividades de planejamento, gestão, supervisão e execução de serviços
socioassistenciais por meio da produção, sistematização, análise de informações e
construção de diagnósticos territorializados sobre as situações de vulnerabilidade e risco
pessoal e social e ofertas da rede socioassistencial. Contribui, assim, para a formulação e
execução de ações que favoreçam o caráter preventivo da política, a redução de agravos e
a adequação da oferta e cobertura.
A área de Vigilância Socioassistencial é vinculada à Gestão do SUAS e deve estar
estruturada nas diferentes esferas. O SUAS dispõe de um conjunto de ferramentas
voltadas para registro de informações e gestão da informação como, por exemplo, o
Cadastro Único, o Censo SUAS, o CadSUAS, o Sistema de Registro Mensal de
Atendimentos e o Prontuário SUAS. O Censo SUAS é o principal instrumento de
monitoramento e avaliação da implantação e execução das ofertas da Assistência Social
prestadas no país. Reúne questionários com informações referentes aos equipamentos,
serviços, gestão e Conselhos de Assistência Social.
A oferta de serviços, programas, projetos e benefícios socioassistenciais é viabilizada pela
Proteção Social Básica e Proteção Social Especial (de Média e Alta Complexidade) do SUAS, cuja
estruturação considera as especificidades das situações atendidas, segundo sua complexidade e
agravamentos.
A seguir serão apresentadas de forma sintética as ofertas do SUAS, por nível de
complexidade. No que diz respeito especificamente à primeira infância, o SUAS conjuga
tanto ofertas direcionadas à família como um todo, incluindo famílias com gestantes e
crianças na primeira infância – a exemplo do Serviço de Proteção e Atendimento Integral
à Família – como ofertas mais especificamente direcionadas à criança – como o Benefício
de Prestação Continuada (BPC e os Serviços de Acolhimento – cuja provisão pode também
alcançar e ou ter reflexos sobre seu contexto familiar, conforme a especificidade da
provisão e articulações que possa impulsionar.

Saiba mais:
• POLÍTICA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. Resolução CNAS nº 145, de 15 de
outubro de 2004. Disponível em:

216

217
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/PNAS200
4.pdf
• TIPIFICAÇÃO NACIONAL DOS SERVIÇOS SOCIOASSISTENCIAIS. Resolução nº 109, de 11
de novembro de 2009:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Normativas/tipificacao
.pdf
• NORMA OPERACIONAL BÁSICA DO SUAS. Resolução CNAS nº 33 de 12 de dezembro de
2012: http://www.mds.gov.br/webarquivos/public/NOBSUAS_2012.pdf
• A CRIANÇA E SUA FAMÍLIA NO CONTEXTO DOS SERVIÇOS SOCIOASSISTENCIAIS:
Avanci, J. Q., Ferro, V. S. e Jacobina, O. M. P. (Orgs). Fundação Oswaldo Cruz e Ministério do
Desenvolvimento Social, 2018:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/2019/Curso
_crianca_fam%C3%ADlia_contexto_servicos_socioassistenciais.pdf
• CONCEPÇÃO DE CONVIVÊNCIA E FORTALECIMENTO DE VÍNCULOS:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/concepcao_f
ortalecimento_vinculos.pdf
• ATENÇÃO ÀS FAMÍLIAS DAS MULHERES GRÁVIDAS, LACTANTES E COM FILHAS(OS)
ATÉ 12 ANOS INCOMPLETOS OU COM DEFICIÊNCIA PRIVADAS DE
LIBERDADE:(http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/crianca_feliz/Documento%
20mulheres%20encarceradas%20final.pdf

217

218
Figura 7 – Equipamentos do SUAS e público-alvo
(Fonte: Secretaria Nacional de Assistência Social-SNAS/SEDS, Ministério da Cidadania, 2020).

218

219
Figura 8 – Serviços Socioassistenciais e Unidades de Oferta.
(Fonte: SNAS/SEDS, Ministério da Cidadania, 2020).

PROTEÇÃO SOCIAL BÁSICA

Proteção Social Básica: conjunto de serviços, programas, projetos, benefícios da


assistência social que visa prevenir situações de vulnerabilidade e risco social por meio do
desenvolvimento de potencialidades e aquisições e do fortalecimento de vínculos
familiares e comunitários.

CRAS – Centro de Referência de Assistência Social

O que é?
O Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) é a porta de entrada para a política
de Assistência Social. De natureza público-estatal, o CRAS é o principal equipamento de

219

220
referência do SUAS para o atendimento à população, localizado prioritariamente nos
territórios de maior vulnerabilidade social.
Oferta, obrigatoriamente, o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF).
A partir do adequado conhecimento do território, promove articulação com a rede
socioassistencial e das demais políticas, para a atenção às demandas das famílias
atendidas. Assim, apoia o acesso da população aos serviços, benefícios, programas,
projetos de assistência social e de outras políticas e representa uma referência importante
para a população e a rede local, desempenhando um papel relevante na intersetorialidade
e no trabalho em rede.
Conhecendo o território, a equipe do CRAS pode apoiar, ainda, ações comunitárias na
comunidade na construção de soluções coletivas para o enfrentamento de problemas
comuns e a potencialização dos recursos locais.
Nos territórios de grandes extensões, com populações dispersas e isoladas e populações
ribeirinhas, os CRAS podem contar com equipes volantes que se deslocam pelos
territórios.

Serviços ofertados
O CRAS oferta obrigatoriamente o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
(PAIF). Pode ofertar o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) e o Serviço
de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e Idosas. Mesmo quando
a oferta desses serviços não é realizada no CRAS, este tem a atribuição de referenciá-las,
o que significa, entre outras coisas, mantê-las integradas ao conjunto de ofertas do SUAS,
por meio do compartilhamento de informações e fluxos de atendimento e
encaminhamentos.
No CRAS, os cidadãos também são orientados sobre o acesso aos benefícios
socioassistenciais e encaminhados para a inclusão em programas e serviços do SUAS ou de
outras políticas. Estes equipamentos representam o principal posto de inclusão da
população no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.

Público Atendido:
Famílias em situação de pobreza e vulnerabilidade social; inseridas no Cadastro Único;
beneficiárias do Programa Bolsa Família, com prioridade para aquelas em
descumprimento de condicionalidades; famílias com beneficiários do Benefício de
Prestação Continuada (BPC); atendidas pelo Programa Criança Feliz, dentre outras.

220

221
Formas de Acesso: Demanda espontânea, busca ativa ou encaminhamentos da rede.

Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF

O que é?
O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF) é obrigatoriamente
oferecido pelos Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) e tem por objetivo
apoiar as famílias em situação de vulnerabilidade social, prevenindo a ruptura de vínculos,
o agravamento das vulnerabilidades e a ocorrência de situações de violência, promovendo
o acesso a direitos e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida, a autonomia das
famílias e processos de inclusão social.
O trabalho social com famílias que é realizado no âmbito do PAIF consiste em um conjunto
de procedimentos com o objetivo de contribuir para a convivência, reconhecimento de
direitos e possibilidades de intervenção na vida social de uma família. Este trabalho
estimula as potencialidades das famílias e da comunidade, promove espaços coletivos de
escuta e troca de vivências. Tem por objetivo fortalecer vínculos e a capacidade protetiva
das famílias, prevenir situações de riscos sociais, reduzir vulnerabilidades materiais e
relacionais das famílias e apoiar processos de inclusão social.

221

222
Figura 9 – Atuação do PAIF (Fonte: SNAS/SEDS, Ministério da Cidadania, 2020).

Público Atendido:
Podem participar do PAIF famílias em situação de vulnerabilidade social. São prioritários
no atendimento as famílias beneficiárias do PBF, especialmente aquelas em
descumprimento de condicionalidades; famílias com beneficiários do BPC; e famílias que
atendem os critérios de participação em programas de transferência de renda e benefícios
assistenciais.

Unidade e natureza da oferta:


O serviço, de natureza pública-estatal, deve ser ofertado obrigatoriamente no CRAS.

Objetivos:

▪ O fortalecimento da função protetiva da família.


▪ A prevenção de situações de risco social e da ruptura dos vínculos familiares e
comunitários.
▪ A promoção de ganhos sociais e materiais às famílias (autonomia de renda).

222

223
▪ A promoção do acesso a benefícios, programas de transferência de renda e serviços
socioassistenciais.
▪ O apoio a famílias que possuem, dentre seus membros, indivíduos que necessitam de
cuidados, por meio da promoção de espaços coletivos de escuta e troca de vivências
familiares.

Formas de Acesso:
Para participar do PAIF é necessário procurar o CRAS mais próximo da sua residência.
Além da busca espontânea, as famílias podem ser incluídas no PAIF por meio de ações de
busca ativa ou encaminhamentos da rede ao CRAS.

Atividades:
O PAIF oferece atendimento às famílias, visitas domiciliares, orientações e
encaminhamento a outros serviços, programas e benefícios. O serviço também apoia
ações comunitárias, por meio de palestras, campanhas e eventos, ajudando a comunidade
na construção de soluções coletivas para o enfrentamento de problemas comuns, como
nos casos de falta de acessibilidade, a violência no bairro, o trabalho infantil, a falta de
transporte, a baixa qualidade na oferta de serviços, ausência de espaços de lazer, cultura,
dentre outros.

Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos – SCFV

O SCFV integra a Proteção Social Básica do SUAS e é ofertado de forma complementar ao


trabalho social com famílias, que é realizado por meio do Serviço de Proteção e
Atendimento Integral às Famílias (PAIF) e do Serviço de Proteção e Atendimento
Especializado às Famílias e Indivíduos (PAEFI). Tem como objetivos gerais:
• Complementar o trabalho social com família, prevenindo a ocorrência de situações
de risco social e fortalecendo a convivência familiar e comunitária.
• Prevenir a institucionalização e a segregação de crianças, adolescentes, jovens e
idosos, em especial, das pessoas com deficiência, assegurando o direito à
convivência familiar e comunitária.
• Promover acessos a benefícios e serviços socioassistenciais, fortalecendo a rede
de proteção social de assistência social nos territórios.

223

224
• Promover acessos a serviços setoriais, em especial das políticas de educação,
saúde, cultura, esporte e lazer existentes no território, contribuindo para o
usufruto dos usuários aos demais direitos.
• Oportunizar o acesso às informações sobre direitos e sobre participação cidadã,
estimulando o desenvolvimento do protagonismo dos usuários.
• Possibilitar acessos a experiências e manifestações artísticas, culturais, esportivas
e de lazer, com vistas ao desenvolvimento de novas sociabilidades.
• Desenvolver atividades intergeracionais, propiciando trocas de experiências e
vivências, buscando fortalecer o respeito, a solidariedade e os vínculos familiares e
comunitários.

Os usuários do SCFV são organizados em grupos que consideram as especificidades do seu


ciclo de vida. O trabalho nos grupos é planejado com vistas a atingir os referidos objetivos
e para isso conta com a participação ativa do técnico de referência, dos orientadores
sociais e dos usuários. As atividades – conversações e fazeres – realizadas com os grupos
visam estimular as trocas culturais e o compartilhamento de vivências; desenvolver nos
usuários o sentimento de pertença e de identidade; e fortalecer os seus vínculos familiares
e comunitários, de modo a prevenir as violações de direito e as situações de risco individual
e social.
O SCFV tem objetivos específicos para cada ciclo de vida, tendo em vista as especificidades
de cada etapa do desenvolvimento dos sujeitos.
No SCFV ofertado a crianças de 0 a 6 anos, essas participam acompanhadas de seus(suas)
cuidadores(as), a fim de que sejam promovidas as interações parentais e a troca de
experiências, por meio de vivências lúdicas. Assim, são objetivos do SCFV ofertado a
crianças de 0 a 6 anos:
• Fortalecer a interação entre crianças do mesmo ciclo etário.
• Valorizar a cultura de famílias e comunidades locais, pelo resgate de seus
brinquedos e brincadeiras e a promoção de vivências divertidas/lúdicas.
• Desenvolver estratégias para estimular as potencialidades de crianças com
deficiência e o papel das famílias e comunidade no processo de proteção social.
• Criar espaços de reflexão sobre o papel das famílias na proteção das crianças e no
processo de desenvolvimento infantil.
• Assegurar espaços de convívio familiar e comunitário e o desenvolvimento de
relações de afetividade e sociabilidade.

224

225
• Complementar as ações de proteção e desenvolvimento das crianças e o
fortalecimento dos vínculos familiares e sociais.

Unidade e natureza da oferta


O serviço, de natureza pública, pode ser ofertado pelos CRAS ou unidades referenciadas,
denominadas Centros de Convivência, os quais podem ser governamentais ou prestados
por entidades ou organizações da sociedade civil.

Para saber mais:


• ORIENTAÇÕES TÉCNICAS SOBRE O CRAS:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/orientaco
es_Cras.pdf
• ORIENTAÇÕES TÉCNICAS SOBRE O PAIF (VOLUME 1 E 2) :
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Orientac
oes_PAIF_1.pdf e
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Orientac
oes_PAIF_2.pdf
• CADERNO DE ATIVIDADES DO SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA E FORTALECIMENTO
DE VÍNCULOS: Crianças de zero a seis anos de idade:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/crianca_feliz/CADERNO-
ATIVIDADES-DIGITAL-28122018.pdf
• A PARTICIPAÇÃO DO SUAS NO PROGRAMA CRIANÇA FELIZ:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/SUAS_n
o_CriancaFeliz.pdf
• SUAS E PROGRAMA CRIANÇA FELIZ: ATUAÇÃO INTEGRADA:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Interac%
CC%A7a%CC%83o%20SUAS%20e%20Crianc%CC%A7a%20%20Feliz%20final%20co
mpleto%20-%20Diagramado.pdf
• CADERNO DE ORIENTAÇÕES: SERVIÇO DE PROTEÇÃO E ATENDIMENTO
INTEGRAL À FAMÍLIA E SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA E FORTALECIMENTO DE
VÍNCULOS:

225

226
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Cartilha_
PAIF_1605.pdf

Benefícios Assistenciais

Os Benefícios Assistenciais se dividem em duas modalidades direcionadas a públicos


específicos: o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e os Benefícios Eventuais. São
prestados de forma articulada às demais garantias, por meio do um trabalho continuado
com as famílias, visando propiciar-lhes o acesso a serviços previstos e a superação das
situações de vulnerabilidade.

Benefício de Prestação Continuada (BPC)


Previsto na Constituição Federal, o BPC é um benefício individual, não vitalício e
intransferível, que assegura a transferência mensal de 1 (um) salário-mínimo ao idoso, com
65 (sessenta e cinco) anos ou mais, e à pessoa com deficiência, de qualquer idade, com
impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais,
em interação com diversas barreiras, possam dificultar sua participação plena e efetiva na
sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas. Em ambos os casos, nos
termos da legislação, devem comprovar não possuir meios de garantir o próprio sustento,
nem tê-lo provido pela família. A renda mensal familiar per capita deve ser inferior a ¼ (um
quarto) do salário-mínimo vigente.
A gestão do BPC é realizada pelo Ministério da Cidadania, por intermédio da SNAS/SEDS.
Os recursos para o custeio do BPC provêm da Seguridade Social, sendo repassados do
Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) para o INSS (Instituto Nacional do Seguro
Social).
Para solicitar o BPC, o cidadão deve estar inserido no Cadastro Único.

Benefícios eventuais
São benefícios da Política de Assistência Social, de caráter suplementar* e provisório,
prestados aos cidadãos e às famílias em virtude de nascimento, morte, situações de
vulnerabilidade temporária e de calamidade pública. Os Benefícios Eventuais devem ser
prestados com agilidade a todos que dele necessitarem, sem discriminação e sem a

226

227
exigência de qualquer contrapartida ou contribuição por parte de seus usuários. Para
garantir essa agilidade NÃO pode exigir que o requerente esteja no CADASTRO ÚNICO.

Objetivo
Os Benefícios Eventuais visam ao atendimento imediato das necessidades humanas
básicas decorrentes de contingências sociais, ou seja, de situações que fogem ao cotidiano
das famílias e indivíduos.

Quem pode acessar?


Cidadãos e famílias em situação de pobreza e vulnerabilidade social.

As modalidades dos Benefícios Eventuais são quatro:


• Natalidade – para atender preferencialmente: 1. Necessidades do bebê que vai
nascer; 2. Apoio à mãe nos casos em que o bebê nasce morto ou morre logo após o
nascimento; 3. Apoio à família no caso de morte da mãe.
• Funeral – para atender preferencialmente: 1. Despesas com urna funerária, velório
e sepultamento; 2. Necessidades urgentes da família advindas da morte de um de
seus provedores ou membros; 3. Ressarcimento, no caso da ausência do Benefício
Eventual no momento necessário.
• Vulnerabilidade Temporária – para o enfrentamento de situações de riscos, perdas e
danos à integridade da pessoa ou de sua família, podem decorrer de: 1) Falta de
acesso a condições e meios para suprir a reprodução social cotidiana do solicitante
e de sua família, principalmente a de alimentação; 2) Falta de documentação; 3)
Falta de domicílio; 4) Situação de abandono ou impossibilidade de garantir abrigo
aos filhos; 5) Perda circunstancial decorrente da ruptura de vínculos familiares, da
presença de violência física ou psicológica na família ou por situações de ameaça à
vida; 6) Desastres e calamidade pública; e 7) Outras situações sociais que
comprometam a sobrevivência.
• Calamidade Pública – para o atendimento das vítimas de calamidade pública, de
modo a garantir a sobrevivência e a reconstrução da autonomia destas.

Após a concessão do benefício, caso a equipe identifique a necessidade de


acompanhamento do requerente, ele deve ser encaminhado para realização do Cadastro
Único, como estratégia para acesso a outros programas e benefícios que possa ter direito.

227

228
Cabe aos estados, aos municípios e ao Distrito Federal a regulamentação acerca da
definição dos critérios da concessão e do valor dos Benefícios Eventuais a serem
oferecidos em seus territórios. Além disso, devem prever recursos para seu financiamento
em suas respectivas leis orçamentárias anuais.

Programa de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho (AcesSUAS Trabalho)

O Programa Nacional de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho (AcesSUAS


Trabalho) busca promover o acesso dos usuários do Sistema Único de Assistência Social –
SUAS ao mundo do trabalho por meio de informações e orientações sobre direitos e
oportunidades, de ações que estimulam o reconhecimento de potencialidades e o
desenvolvimento de habilidades, bem como da articulação com políticas setoriais.

Ações do Programa AcesSUAS Trabalho


✓ Identificar usuários do SUAS que tenham perfil para participar do Programa.
✓ Orientar os usuários sobre questões afetas ao mundo do trabalho.
✓ Promover atividades que possibilitem aos usuários reconhecer e desenvolver suas
habilidades.
✓ Viabilizar o acesso dos usuários atendidos a direitos e serviços.
✓ Acompanhar a trajetória do usuário no mundo do trabalho.

O Programa orienta os usuários sobre questões relacionadas ao mundo do trabalho e


media o acesso dos participantes a oportunidades disponíveis no território, incluindo
cursos para qualificação técnico-profissional, ações de inclusão produtiva, intermediação
pública de mão-de-obra, apoio ao microempreendedor individual e à economia solidária.
Também disponibiliza informações sobre direitos sociais relativas ao trabalho
(formalização do trabalho) e realiza mapeamentos e articulações em âmbito local que
possam fomentar a identificação de oportunidades de participação no mundo do trabalho
para os usuários do SUAS.

Eixos de atuação do Programa AcesSUAS Trabalho:


• Identificação e sensibilização.
• Desenvolvimento de habilidades e orientação para o mundo do trabalho.
• Acesso a oportunidades.

228

229
• Monitoramento do percurso do usuário.

Público do Programa:
Populações urbanas e rurais em situação de vulnerabilidade e risco social com idade entre
14 e 59 anos, com prioridade para usuários de serviços, projetos e programas de
transferência de renda socioassistenciais, em especial:

▪ Pessoas com deficiência.


▪ Jovens do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos.
▪ Pessoas inscritas no CADÚNICO.
▪ Adolescentes e jovens no sistema socioeducativo e egressos.
▪ Famílias com presença de trabalho infantil.
▪ Famílias com pessoas em situação de privação de liberdade.
▪ Famílias com crianças em situação de acolhimento provisório.
▪ População em Situação de Rua.
▪ Adolescentes e jovens no serviço de acolhimento e egressos.
▪ Indivíduos e famílias moradoras em territórios de risco em decorrência do tráfico de
drogas.
▪ Indivíduos egressos do sistema penal.
▪ Beneficiários do Programa Bolsa Família.
▪ Pessoas retiradas do trabalho escravo.
▪ Mulheres vítimas de violência.
▪ Jovens negros em territórios do Plano Juventude Viva.
▪ Adolescentes vítimas de exploração sexual.
▪ Povos e comunidades tradicionais.
▪ Público de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBTT.
▪ Entre outros, para atender especificidades territoriais e regionais.

Programa BPC na Escola

O Programa de Acompanhamento e Monitoramento do Acesso e Permanência na Escola


das Pessoas com Deficiência Beneficiárias do BPC (Programa BPC na Escola) é um
Programa Intersetorial, instituído pela Portaria Normativa Interministerial nº 18, de 24 de

229

230
abril de 2007, que envolve ações articuladas entre Assistência Social, Educação, Saúde e
Direitos Humanos.
O Programa tem como objetivo garantir o acesso e a permanência na escola de crianças e
adolescentes com deficiência, de 0 a 18 anos, beneficiários do Benefício de Prestação
Continuada da Assistência Social (BPC).
O BPC na Escola se estrutura a partir de quatro eixos principais, que visam: (1) identificar
entre os beneficiários do BPC até 18 anos aqueles que estão na Escola e aqueles que estão
fora da Escola; (2) identificar as principais barreiras para o acesso e a permanência na
Escola das pessoas com deficiência beneficiárias do BPC; (3) realizar estudos e
desenvolver estratégias conjuntas para a superação destas barreiras; e (4) realizar o
acompanhamento sistemático das ações e dos programas dos entes federados que
aderirem ao Programa.
A visitação domiciliar e aplicação do Questionário de Identificação das Barreiras são
importantes estratégias do Programa BPC na Escola.
Este é um programa muito importante para atenção às crianças na primeira infância com
deficiência.

PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL

Proteção Social Especial: conjunto de serviços, programas e projetos que tem por objetivo
contribuir para a reconstrução de vínculos familiares e comunitários, o fortalecimento das
potencialidades e aquisições e a proteção das famílias e indivíduos para o enfrentamento
das situações de violações de direitos.
Proteção Social Especial de Média Complexidade: abarca um conjunto de serviços e um
programa que objetivam prover proteção para indivíduos e famílias que vivenciam
situações de risco, violências e outras violações de direitos, com foco na superação de tais
situações, no rompimento do ciclo de padrões violadores de direitos presentes nos
territórios e na restauração e preservação da integridade e das condições de autonomia
das famílias.
PSE de Alta Complexidade: abrange Serviços de Acolhimento para proteção integral
(moradia, alimentação, higiene e trabalho) de famílias e indivíduos afastados

230

231
temporariamente do núcleo familiar e/ou comunitário (crianças e adolescentes; adultos e
famílias; mulheres em situação de violência; pessoas idosas; jovens e adultos com
deficiência). Esses acolhimentos são executados por meio de diversos tipos de
equipamentos e modalidades de acolhimento e sua organização deve considerar as
especificidades de cada segmento populacional, e respeito à legislação vigente. Também
integra este nível de proteção, Serviço do SUAS organizado para atendimento a situações
específicas de Calamidades Públicas e de Emergências.

Proteção Social Especial de Média Complexidade

CREAS – Centro de Referência Especializada de Assistência Social

O que é?
O Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) é uma unidade
pública-estatal da política de Assistência Social que oferta serviços especializados a
famílias e indivíduos que estão em situação de risco social, com violação de direitos. Estes
equipamentos são implementados pelos municípios e Distrito Federal ou pelos Estados, no
caso de oferta regionalizada para cobertura a pequenos municípios com pouca demanda
de atendimento.

Serviços ofertados
A unidade deve, obrigatoriamente, ofertar o Serviço de Proteção e Atendimento Especializado
a Famílias e Indivíduos (PAEFI), podendo ofertar também o Serviço de Proteção Social a
Adolescentes em Cumprimento de Medidas Socioeducativas de Liberdade Assistida e de
Prestação de Serviços à Comunidade. Pode ofertar ou referenciar, ainda, o Serviço
Especializado em Abordagem Social e o Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com
Deficiência, Idosas e suas famílias.
Realiza o acompanhamento das famílias e indivíduos em situação de risco social; orienta e
encaminha usuários para acesso a benefícios e serviços socioassistenciais e das demais
políticas públicas; realiza orientação jurídica e presta informações sobre órgãos de defesa

231

232
de direitos e como acessá-los; apoia o acesso à documentação pessoal, a inclusão no
Cadastro Único e realiza articulação intersetorial com a rede socioassistencial, das demais
políticas públicas e órgãos de defesa de direitos para atenção às situações atendidas,
visando sua superação e proteção aos usuários.

Público Atendido
Famílias e indivíduos em situação de risco pessoal e social, em situação de violência e
outras violações de direitos, como: violência física, psicológica e negligência; violência
sexual; afastamento do convívio familiar devido à aplicação de medida de proteção;
situação de rua; abandono; trabalho infantil; discriminação por orientação sexual e/ou
raça/etnia; descumprimento de condicionalidades do Programa Bolsa Família em
decorrência de violação de direitos; dentre outras.

Formas de Acesso
Busca espontânea ou encaminhamentos da rede de proteção social e órgãos de defesa de
direitos.

Para saber mais:


Consulte: ASSIS, S. G; FONSECA. T. M. A.; FERRO, V. S. (Orgs). Proteção Social no SUAS a
indivíduos e famílias em situação de violência e outras violações de direitos: rede
socioassistencial. Brasília: Fundação Oswaldo Cruz; Ministério do Desenvolvimento Social,
2018. Disponível em:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/2019/Cur
so%20de%20Prote%C3%A7%C3%A3o%20social%20no%20SUAS.pdf

O que o Marco Legal da Primeira Infância diz?


Artigo 14, § 2º As famílias identificadas nas redes de saúde, educação e assistência social
e nos órgãos do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente que se
encontrem em situação de vulnerabilidade e de risco ou com direitos violados para exercer
seu papel protetivo de cuidado e educação da criança na primeira infância, bem como as
que têm crianças com indicadores de risco ou deficiência, terão prioridade nas políticas
sociais públicas.

232

233
Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos – PAEFI

O que é?
Serviço especializado voltado para famílias e pessoas que estão em situação de risco social
ou tiveram seus direitos violados. Oferece apoio, orientação e acompanhamento, de modo
articulado à rede, visando à superação dessas situações por meio do fortalecimento ou da
reconstrução dos vínculos familiares e comunitários, ou do apoio à construção de novas
referências, quando for o caso. Atua para prevenir novas ocorrências, ou agravamento das
situações, contribuindo para romper padrões violadores de direitos. Apoia, ainda, o acesso
a serviços e direitos, como estratégia de suporte a processos de inclusão social, por meio
de encaminhamentos e articulação com outras políticas e sistema de justiça, buscando
minimizar exposição a riscos sociais e violação de direitos e oferecer oportunidades e
apoios para a promoção da cidadania.

Unidade de oferta
O serviço deve ser ofertado, obrigatoriamente, pelo Centro de Referência Especializado
de Assistência Social (CREAS).

Público Atendido
Pessoas e famílias que sofrem algum tipo de violação de direito, como violência física e/ou
psicológica, negligência, violência sexual (abuso e/ou exploração sexual); em situação de
abandono; famílias com crianças e adolescentes com medida protetiva de acolhimento;
trabalho infantil; situação de rua; discriminações por orientação sexual e/ou raça/etnia,
dentre outras.

Objetivos
▪ Contribuir para o fortalecimento da família no seu papel de proteção.
▪ Incluir famílias no sistema de proteção social e nos serviços públicos.
▪ Contribuir para superação de violações de direitos na família.
▪ Prevenir a reincidência de violações de direitos.

Ações/Atividades
Para alcançar os objetivos, o PAEFI desenvolve trabalho social realizado pela equipe
composta por profissionais de diversas áreas, como assistentes sociais, psicólogos e
advogados. Dentre as atividades estão a identificação das necessidades das pessoas que
buscam ou são encaminhadas ao CREAS; atenção especializada; atendimento

233

234
socioassistencial individual, familiar ou em grupo; orientação sobre direitos;
encaminhamento para outros serviços da Assistência Social e de outras políticas, como
saúde, educação, trabalho e renda, habitação; orientação jurídica; acesso à documentação
etc.

Formas de Acesso
Demanda espontânea ou encaminhamento por outros serviços da Assistência Social ou de
outras políticas públicas, como saúde, educação e direitos humanos; por órgãos do Sistema
de Garantia de Direitos, como Conselhos de Direitos, Conselhos Tutelares, Ministério
Público e Defensoria Pública; ou pelo Sistema de Segurança Pública.

Regionalização
A regionalização do PAEFI constitui-se como uma das estratégias de ampliação do
atendimento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), direcionada a assegurar o
acesso ao atendimento nos CREAS Regionais às populações dos municípios com até
20.000 habitantes.

Saiba mais:
Consulte o caderno de orientações técnicas: centro de referência especializado de
assistência social
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/orienta
coes_creas.pdf

Serviço Especializado em Abordagem Social

O que é?
O Serviço Especializado em Abordagem Social é ofertado de forma continuada e
programada com a finalidade de assegurar trabalho social de abordagem e busca ativa que
identifique, nos territórios, a incidência de trabalho infantil, exploração sexual de crianças
e adolescentes, situação de rua, dentre outras.
No cotidiano de suas ações deverão ser consideradas praças, entroncamento de estradas,
fronteiras, espaços públicos onde se realizam atividades laborais, locais de intensa
circulação de pessoas e existência de comércio, terminais de ônibus, trens, metrô e outros.
O Serviço deve buscar soluções mais imediatas para promover a inserção na rede de

234

235
serviços socioassistenciais e das demais políticas públicas na perspectiva da proteção,
redução de riscos sociais e acesso a direitos.  

Unidade e natureza da Oferta


O serviço, de natureza pública estatal ou pública não-estatal, é ofertado no CREAS, no
Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (CENTRO POP)
ou em Unidade referenciada a estes equipamentos.

Para saber mais:


Cartilha: Perguntas e respostas sobre o Serviço Especializado em Abordagem Social.
Disponível em:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Perguntas
_Servico_AbordagemSocial.pdf

Centro de Referência para a População em Situação de Rua – Centro POP

O Centro de Referência Especializado para a População em Situação de Rua (Centro POP)


é a unidade pública e estatal, de referência e de atendimento especializado à população
adulta em situação de rua. Nesta Unidade é ofertado o Serviço Especializado para Pessoas
em Situação de Rua, podendo ser ofertado, também, o Serviço Especializado em
Abordagem Social, conforme avaliação local. Atualmente as normativas do SUAS não
preveem atendimento de crianças e adolescentes em situação de rua desacompanhados
de seus pais ou responsáveis pelo Centro Pop. Nestes casos, é necessário que sejam
construídas alternativas para este atendimento, em estreita articulação com o CREAS, o
Serviço Especializado em Abordagem Social, o Conselho Tutelar e o Sistema de Justiça,
considerando as implicações legais e éticas no que se refere a proteção de crianças e
adolescentes em situação de risco.

Formas de Acesso: Demanda espontânea, busca ativa pelo Serviço Especializado em


Abordagem Social ou encaminhamentos da rede.

Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua

O que é?

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236
Serviço ofertado para pessoas que utilizam as ruas como espaço de moradia e/ou
sobrevivência. Tem a finalidade de assegurar atendimento e atividades direcionadas para
o desenvolvimento de sociabilidades, na perspectiva de fortalecimento de vínculos
interpessoais e/ou familiares que oportunizem a construção de novos projetos de vida.
Oferece trabalho técnico para a análise das demandas dos usuários, orientação individual
e grupal e encaminhamentos a outros serviços socioassistenciais e das demais políticas
públicas que possam contribuir na construção da autonomia, da inserção social e da
proteção às situações de violência. Deve promover o acesso a espaços de guarda de
pertences, de higiene pessoal, de alimentação e provisão de documentação civil.
Proporciona endereço institucional para utilização, como referência, do usuário.

Unidade e natureza da oferta


O serviço, de natureza pública-estatal, é prestado pelo Centro de Referência Especializado
para População em Situação de Rua.

Saiba mais:
Caderno de orientações técnicas: centro de referência especializado para população em
situação de rua – centro pop:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/orienta
coes_centro_pop.pdf

Centro-Dia de Referência para Pessoa com Deficiência e suas Famílias

O que é?
O Centro-Dia é uma Unidade de oferta do Serviço de Proteção Social Especial para
Pessoas com Deficiência, idosas com algum grau de dependência e suas Famílias, de
abrangência municipal e do DF, podendo ser pública estatal, ou não-estatal. É organizado
por ciclos de vida: Crianças e adolescentes; Pessoas Adultas e Pessoas Idosas.
Tem por objetivo ampliar a capacidade das famílias de cuidar, compartilhando os cuidados
diários, apoiando, orientando e articulando redes de serviços no território, para as devidas
atenções as necessidades das pessoas com deficiência, pessoas idosas e o (a) cuidador (a)
familiar, no acesso a renda e a outros direitos, evitando o isolamento social e promovendo
convívio e ampliação da autonomia. Visa ainda enfrentar a pobreza, a negligência e o

236

237
abandono, que podem prejudicar a independência e a autonomia de pessoas cuidadas e
cuidadores (as).

Saiba mais:
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/caderno_c
entro_dia_orientacoes_tecnicas2.pdf

Centro Dia Infantil (prioridade para crianças e adolescentes com Microcefalia)

As Unidades Centros-dia para Crianças, prioridade Microcefalia foram implementadas no


SUAS a partir de 2017, no contexto da situação de Emergência em Saúde Pública de
Importância Nacional, em razão do surto do Zika Vírus em 2015que atingiu gestantes,
sobretudo da Região Nordeste causando a Síndrome Congênita do Zika Vírus. Vale
destacar, que a condição inicial da Microcefalia pode implicar na presença de deficiências
múltiplas como: física, intelectual, da visão, da audição, autismo e outras.

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI

O trabalho infantil pode ter repercussões prejudiciais para a saúde física e mental de
crianças e adolescentes, mesmo na primeira infância. O trabalho infantil pode provocar
acidentes, diversas formas de adoecimento e até morte, além de impactos prejudiciais no
desenvolvimento físico-biológico, psicológico-emocional e social.
As Ações Estratégicas do PETI fortalecem o papel de gestão e de articulação da rede de
proteção ao prever a realização de articulação intersetorial para o enfrentamento do
trabalho infantil e prevê cofinanciamento específico para municípios e estados.
São estruturadas em cinco eixos: 1. Informação e mobilização; 2. Identificação; 3.
Proteção;4. Defesa e Responsabilização; e 5. Monitoramento. Os serviços já existentes,
como PAEFI e SCVF fazem o atendimento e o programa fortalece e organiza a rede para o
atendimento dos casos.

Saiba mais:
http://blog.mds.gov.br/redesuas/wp-content/uploads/2019/09/Caderno-de-Orietações-
Técnicas-PETI.pdf.

237

238
PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL DE ALTA COMPLEXIDADE

Serviços de Acolhimento – Crianças e Adolescentes

O que é?
São serviços que acolhem Crianças e Adolescentes em medidas protetivas de acolhimento,
por determinação judicial, em decorrência de violação de direitos (abandono, negligência,
violência) ou pela impossibilidade de cuidado e proteção por sua família. Estes serviços são
prestados de modo preponderante pelos municípios e Distrito Federal, podendo ser
prestados também pelos Estados, de forma regionalizada.
O afastamento da criança ou do adolescente da família deve ser uma medida excepcional,
aplicada apenas nas situações de grave risco à sua integridade física e/ou psíquica. O
objetivo é viabilizar, no menor tempo possível, o retorno seguro ao convívio familiar,
prioritariamente na família de origem e, excepcionalmente, o encaminhamento para
adoção.

Natureza da oferta
O serviço é de natureza pública estatal ou pública não-estatal, ofertado nas unidades de
serviços de acolhimento institucional ou por Serviços de Acolhimento em Famílias
Acolhedoras.

Oferta Regionalizada
É facultado aos Estados a organização da oferta regionalizada de Serviços de Acolhimento
para Crianças e Adolescentes em municípios abaixo de 50.000 habitantes. Nesse caso, o
estado é quem organiza, estrutura, coordena e oferece a oferta regionalizada. O serviço
regionalizado está em processo de implantação.

238

239
a) Acolhimento Institucional – Crianças e Adolescentes

O Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes pode ser ofertado nas


seguintes unidades:
▪ Abrigo Institucional: Acolhimento provisório com capacidade máxima para 20
crianças e adolescentes por unidade. O serviço deve ter aspecto semelhante ao de
uma residência e estar inserido na comunidade, em áreas residenciais, oferecendo
ambiente acolhedor e condições institucionais para o atendimento com padrões de
dignidade.
▪ Casa-Lar: Acolhimento provisório oferecido em unidades residenciais, com
capacidade máxima para 10 crianças e adolescentes por unidade, nas quais pelo
menos uma pessoa ou casal trabalha como educador/cuidador residente – em uma
casa que não é a sua – prestando cuidados a um grupo de crianças e adolescentes
afastados do convívio familiar.

239

240
O atendimento deverá ser oferecido para um pequeno grupo e garantir espaços privados
para a guarda de objetos pessoais e registros, relacionados à história de vida e
desenvolvimento de cada criança e adolescente.

Como acessar
O acesso ao Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes se dá
encaminhamento do Poder Judiciário ou Conselho Tutelar. Nesse último caso, a
autoridade judiciária deverá ser comunicada, conforme previsto no Artigo 93 do Estatuto
da Criança e do Adolescente, até 24 horas.

240

241
O que diz o Marco legal da Primeira Infância?
§ 7º Quando se tratar de criança de 0 (zero) a 3 (três) anos em acolhimento institucional,
dar-se-á especial atenção à atuação de educadores de referência estáveis e
qualitativamente significativos, às rotinas específicas e ao atendimento das necessidades
básicas, incluindo as de afeto como prioritárias.” (NR)
Estratégia de atenção à primeira infância: Qualificar os serviços de acolhimento, por
meio da formação profissional sobre cuidado integral e vínculos afetivos

b) Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora

Serviço que organiza o acolhimento de crianças ou adolescentes, em residências de


famílias acolhedoras cadastradas. Para fazer parte do serviço, as famílias devem passar por
um processo de seleção, capacitação e acompanhamento. O serviço proporciona o
atendimento em ambiente familiar, garantindo atenção individualizada e convivência em
família e na comunidade. Em cada Família Acolhedora são recebidas uma criança ou
adolescente por vez, exceto quando se tratar de grupo de irmãos.

Para mais informações sobre o serviço, entre em contato com a


Secretaria de Assistência Social do seu município.
Priorizar o acolhimento em famílias acolhedoras, em caso de
crianças afastadas do convívio familiar, na primeira infância

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância?


Art. 28. O art. 34 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 , passa a vigorar acrescido dos
seguintes §§ 3º e 4º :
“Art. 34. ...................................................................................................................
§ 3º A União apoiará a implementação de serviços de acolhimento em família acolhedora
como política pública, os quais deverão dispor de equipe que organize o acolhimento

241

242
temporário de crianças e de adolescentes em residências de famílias selecionadas,
capacitadas e acompanhadas que não estejam no cadastro de adoção.
§ 4º Poderão ser utilizados recursos federais, estaduais, distritais e municipais para a
manutenção dos serviços de acolhimento em família acolhedora, facultando-se o repasse
de recursos para a própria família acolhedora.” (NR)

Estratégia para atenção à primeira Infância: Qualificar os serviços de acolhimento, por


meio da formação profissional sobre cuidado integral e vínculos afetivos

Figura 10 - Fonte: SNAS/SEDS/Ministério da Cidadania. Dados do Censo SUAS 2018.

Saiba mais:
• ORIENTAÇÕES TÉCNICAS: SERVIÇOS DE ACOLHIMENTO PARA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES. Resolução Conjunta CNAS e CONANDA nº 1/2006.
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/orientacoes
-tecnicas-servicos-de-alcolhimento.pdf
• ORIENTAÇÕES TÉCNICAS PARA A ELABORAÇÃO DO PLANO INDIVIDUAL DE
ATENDIMENTO (PIA) DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SERVIÇOS DE
ACOLHIMENTO.
http://www.mds.gov.br/webarquivos/arquivo/assistencia_social/Orientacoestecnicaspara
elaboracaodoPIA.pdf

242

243
• PRONTUÁRIO SUAS – SERVIÇOS DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL PARA
CRIANÇAS E ADOLESCENTES
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/prontuario/Prontu%C
3%A1rio_Acolhimento_Vers%C3%A3o_Final_2.4.pdf
• PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO (PIA).
http://www.mds.gov.br/webarquivos/arquivo/assistencia_social/Orientacoestecnicaspara
elaboracaodoPIA.pdf

c) Serviços de Acolhimento – Adultos e Famílias

O que é?
Os Serviços de Acolhimento Institucional (Abrigos Institucionais e Casas de Passagem) e
os Serviços de Acolhimento em República são serviços que integram a Proteção Social
Especial de Alta Complexidade do Sistema Único de Assistência Social – SUAS. A
especificidade desses Serviços está na oferta de atendimento integral que garanta
condições de estadia, convívio, endereço de referência, para acolher com privacidade
pessoas em situação de rua e desabrigo por abandono, migração, ausência de residência
ou pessoas em trânsito e sem condições de autossustento.
A organização dos diferentes Serviços de Acolhimento para Pessoas Adultas e Famílias em
Situação de Rua tem como objetivo principal atender de forma qualificada e personalizada
de modo a promover a construção conjunta com o usuário do seu processo de saída das
ruas, com dignidade e respeito a sua vontade e nível de autonomia. O atendimento
conjunto da família mantém o convívio familiar. Crianças e adolescentes podem ser
atendidos nestes serviços quando estão acolhidas com sua família ou responsáveis.
Abrigo institucional – Unidade que oferece acolhimento provisório, inserida na
comunidade, com características residenciais, e que proporcione ambiente acolhedor e
respeite as condições de dignidade dos seus usuários. Deve ofertar atendimento
individualizado e especializado, com vistas a conhecer a história da pessoa que está sendo
atendida. É importante também que sejam realizadas abordagens coletivas a fim de
favorecer o fortalecimento de vínculos sociais, comunitários e familiares.
Casa de Passagem – Unidade de acolhimento imediato e emergencial para famílias ou
pessoas do mesmo sexo. Trabalha na perspectiva de atender a demanda específica,
verificar a situação apresentada e assim realizar os devidos encaminhamentos. Deverá
conter equipe especializada para atender e receber usuários a qualquer horário do dia ou

243

244
da noite e realizar estudo de caso para encaminhamentos necessário. O Público-alvo são
pessoas adultas do mesmo sexo ou famílias em situação de rua e desabrigo por abandono,
migração e ausência de residência ou ainda pessoas em trânsito.
República – Serviço que oferece proteção, apoio e moradia subsidiada e deve ser
desenvolvido em sistema de autogestão ou cogestão, possibilitando gradual autonomia e
independência de seus moradores. É destinado a pessoas adultas com vivência de rua em
fase de reinserção social, que estejam em processo de restabelecimento dos vínculos
sociais e construção de autonomia.
Oferta Regionalizada
O processo de implementação da regionalização dos serviços de acolhimento para adultos
e famílias ocorre sob a coordenação estadual, visa à implantação de unidades regionais de
acolhimento, com o objetivo de cobrir a demanda em municípios de pequeno porte (com
até 50 mil habitantes), principalmente para migrantes.
Nesse caso, o estado é quem organiza, estrutura, coordena e oferece a oferta
regionalizada. O serviço regionalizado está em processo de implantação.

SITUAÇÕES DE EMERGÊNCIA SOCIAL

As situações de Emergência Social são complexas e desafiadoras e podem ser pouco


conhecidas. Causam alto impacto para famílias e comunidades e exigem rápida atuação das
políticas públicas, incluindo a Assistência Social, na construção de medidas imediatas e
para médio e longo prazo, que possam mitigar riscos, prevenir agravamentos e assegurar
proteção social.

No que diz respeito à Assistência Social, as atenções no âmbito do SUAS a estas situações
volta-se à proteção de famílias e indivíduos atingidos pela Situação de Emergência Social,
convergindo esforços com outras políticas.
São exemplos de situações de Emergência Social que demandaram atuação da Assistência
Social:

• Situação de Emergência Social de Importância Nacional em razão da Síndrome


Congênita do Zika Vírus.
• Rompimento da Barragem de Brumadinho/MG.
• Pandemia da COVID-19, causada pelo novo Coronavírus.

244

245
• Crise humanitária de caráter emergencial em razão do fluxo migratório de
venezuelanos para o Brasil.

No âmbito do SUAS, estas situações podem exigir a oferta do Serviço de Proteção em


Situações de Calamidades Públicas e de Emergências ou até mesmo o incremento ou a
adoção de estratégias diferenciadas no conjunto de serviços da Proteção Social Básica e
Especial. Podem exigir, ainda, medidas específicas em relação a benefícios
socioassistenciais.

Saiba mais: http://blog.mds.gov.br/redesuas/protecao-social-2/

SERVIÇO DE PROTEÇÃO EM SITUAÇÕES DE CALAMIDADES PÚBLICAS E DE


EMERGÊNCIAS

O que é?
O Serviço de Proteção em Calamidades Públicas e Emergências é um serviço de proteção
especial do SUAS para enfrentamento de situações de Calamidades Públicas e
Emergências reconhecidas pelo Ministério do Desenvolvimento Regional – MDR. Está
previsto na Resolução CNAS nº 109, de 11 de novembro de 2009, que aprova a Tipificação
Nacional de Serviços Socioassistenciais e é regulamentado pela Portaria MDS nº 90, de 3
de setembro de 2013. O serviço promove apoio e proteção à população atingida por
situações de emergência e calamidade pública, com a oferta de alojamentos provisórios,
atenções e provisões materiais, conforme as necessidades detectadas. Assegura a
realização de articulações e a participação em ações conjuntas de caráter intersetorial
para a minimização dos danos ocasionados e o provimento das necessidades verificadas.
Todos os estados e municípios são elegíveis e podem acionar o Ministério da Cidadania
para este apoio, sempre que se encontrar em situação de calamidade pública ou de
emergência.

Usuários
Famílias e Indivíduos atingidos por situações de emergência e calamidade pública
(incêndios, desabamentos, deslizamentos, alagamentos, dentre outras) que tiveram
perdas parciais ou totais de moradia, objetos ou utensílios pessoais, e se encontram

245

246
temporária ou definitivamente desabrigados; e famílias e indivíduos que foram removidos
de áreas consideradas de risco, por prevenção ou determinação do Poder Judiciário.

Objetivos
• Assegurar acolhimento imediato em condições dignas e de segurança.
• Manter alojamentos provisórios, quando necessário.
• Identificar perdas e danos ocorridos e cadastrar a população atingida.
• Articular a rede de políticas públicas e redes sociais de apoio para prover as
necessidades detectadas.
• Promover a inserção na rede socioassistencial e o acesso a benefícios eventuais.

Saiba mais:
• https://www.gov.br/cidadania/pt-br/noticias-e-conteudos/publicacoes-
1/desenvolvimento-social
• http://blog.mds.gov.br/redesuas/
• http://blog.mds.gov.br/redesuas/apoio-tecnico/#Publicacoes
• http://blog.mds.gov.br/redesuas/regulacao/#1550514555620-8f962e97-3310
• http://blog.mds.gov.br/redesuas/regulacao/#1574791529886-14ae2aaf-70b7

246

247
1.8.4. Políticas de Direitos Humanos, Família e Mulheres

Programa de Fomento à Implantação de Unidades Interligadas de Registro


Civil

Situação do sub-registro civil de nascimento no Brasil e da implementação do art. 42 do


Marco Legal da Primeira Infância
A Meta 16.9 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estipula para, até 2030, o
fornecimento de identidade legal para todos, incluindo o registro de nascimento. De
acordo com os dados mais recentes produzidos pelo IBGE, cerca de 2,6% das crianças
nascidas no Brasil no ano de 2017 não tiveram emitidas tempestivamente suas Certidões
de Nascimento. Isto significa que, até o terceiro mês do ano seguinte ao do nascimento,
estas crianças continuavam sem o registro civil.
Políticas de combate ao sub-registro
Desde a segunda metade da década de 1990, o Brasil tem desenvolvido políticas federais
de combate ao sub-registro civil de nascimento. Os esforços, de modo geral, têm trazido
bons resultados, percebidos queda consistente do sub-registro de nascimento, que chegou
a apresentar taxas anuais superiores a 20% durante a década de 1990. Contudo, apesar
dos avanços, as taxas do sub-registro de nascimento são bastante heterogêneas quando
desagregadas por estados e municípios, mostrando que a situação ainda é muito
preocupante em algumas localidades. Como exemplo desta heterogeneidade temos, em
2017, a mencionada taxa nacional de 2,6% com variações estaduais que vão de 0,3% em
São Paulo a 18,1% em Roraima. O país teve, naquele ano, maior cobertura de partos
hospitalares (98,4%) do que do registro civil de nascimento (97,4%).
Como parte da estratégia de erradicação do sub-registro de nascimento, em 2010 a
Corregedoria Nacional de Justiça publicou o Provimento nº 13, por meio do qual instituiu
e regulamentou o funcionamento das Unidades Interligadas (UIs). Cabe destacar que a
Corregedoria Nacional, vinculada ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ, em conjunto
com as Corregedorias Estaduais vinculadas aos Tribunais de Justiça dos Estados, exercem
competências de fiscalização e regulamentação das atividades cartoriais, as quais são

247

248
desempenhadas por agentes privados que atuam como delegatários do Poder Público,
conforme determina o art. 236 da Constituição Federal, regulamentado pela Lei nº 8.935,
de 18 de novembro de 1994.
O Marco Legal da Primeira Infância, inseriu na Lei nº 12.662, de 5 de junho de 2012, a
determinação de que os estabelecimentos de saúde públicos e privados que realizam
partos teriam prazo de um ano para, mediante sistema informatizado, se interligarem com
as serventias de registro civil existentes nas unidades federativas (Lei 13.257/2016, art.
42).
Apesar de terem sido regulamentadas há uma década e de serem legalmente exigíveis
desde março de 2017, ainda é relativamente baixo o número de UIs. Ao final de junho de
2020, havia apenas 608 UIs cadastradas no sistema Justiça Aberta, mantido pelo CNJ, para
um universo superior a 5 mil hospitais que realizam partos no país, dos quais cerca de 2,5
mil integram a rede de atendimento do SUS. De todos os 5.570 municípios brasileiros, as
UIs estavam presentes em apenas 312 deles.

Compromisso Nacional pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento e acesso à


Documentação Básica

Dando continuidade aos esforços de erradicação do sub-registro, o governo federal


publicou o Decreto nº 10.063, de 14 de outubro de 2019, que reedita o Compromisso
Nacional pela Erradicação do Sub-registro Civil de Nascimento e acesso à documentação
básica", coordenado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos –
MMFDH, ao qual podem aderir estados e municípios. O Decreto prevê, no seu artigo 4º,
que a adesão dos entes federativos implica a assunção da responsabilidade de realizar
ações articuladas e integradas destinadas a erradicar o sub-registro civil e que a União
poderá prestar-lhes apoio por meio de assistência técnica ou financeira, para a
implementação das ações.

Programa de Fomento à Implantação de Unidades Interligadas de Registro Civil


Instituído, nesse contexto, pela Portaria MMFDH nº 1.242, de 2020, por meio do qual o
governo federal doa kits de equipagem compostos por um computador e uma impressora
que funcione como elemento de incentivo e de facilitação da infraestrutura institucional
necessária para a implantação e o funcionamento das UIs.

248

249
Para saber mais
Visite: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/registro-civil-de-nascimento/

Registro Civil de Nascimento — Português (Brasil)


Registro Civil do Nascimento. O acesso ao registro civil de nascimento
acesso a serviços nas áreas da educação, saúde e assistência social.
www.gov.br

Além disso, o Marco Legal da Primeira Infância, fomenta o reconhecimento da


paternidade:

Art. 33. O art. 102 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 , passa a vigorar
acrescido dos seguintes §§ 5º e 6º :
§ 5º Os registros e certidões necessários à inclusão, a qualquer tempo, do
nome do pai no assento de nascimento são isentos de multas, custas e
emolumentos, gozando de absoluta prioridade.
§ 6º São gratuitas, a qualquer tempo, a averbação requerida do
reconhecimento de paternidade no assento de nascimento e a certidão
correspondente.” (NR) (Lei 13.257/2016).

Disque 100: Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos

O Disque 100 é um serviço que acolhe denúncias anônimas ou não, sobre violências contra
pessoas vulneráveis, por meio de discagem gratuita, de qualquer terminal telefônico fixo
ou móvel (celular), bastando discar 100. Funciona diariamente, 24 horas por dia, incluindo
sábados, domingos e feriados.
A partir das denúncias são acionados os órgãos competentes, possibilitando em muitos
casos o flagrante e a imediata proteção das vítimas. Após análise a denúncia é
encaminhada aos órgãos de proteção, defesa e responsabilização em direitos humanos,
respeitando as competências de cada órgão.
O Disque 100 recebe, analisa e encaminha denúncias de violações de direitos humanos
relacionadas aos seguintes grupos e/ou temas:

249

250
✓ Crianças e adolescentes
✓ Pessoas idosas
✓ Pessoas com deficiência
✓ Pessoas em restrição de liberdade
✓ População LGBT
✓ População em situação de rua
✓ Discriminação ética ou racial
✓ Tráfico de pessoas
✓ Trabalho escravo
✓ Terra e conflitos agrários
✓ Moradia e conflitos urbanos
✓ Violência contra ciganos, quilombolas, indígenas e outras comunidades
tradicionais
✓ Violência policial (inclusive das forças de segurança pública no âmbito da
intervenção federal no estado do Rio de Janeiro)
✓ Violência contra comunicadores e jornalistas
✓ Violência contra migrantes e refugiados

Para registrar uma denúncia pelo Disque 100 é importante informar: Quem sofre a
violência, qual é o tipo da violência? (violência física, psicológica, maus tratos, abandono),
quem pratica a violência? (suspeito), como chegar ou localizar a vítima/suspeito (endereço
ou ao menos um ponto de referência), há quanto tempo ocorreu ou ocorre a violência, o
horário da ocorrência, entre outros.
Qualquer pessoa pode fazer uma denúncia e o Ministério da Mulher, da Família fornece
número de protocolo para que o denunciante possa acompanhar seu andamento.
Além do Disque 100, é possível utilizar o Aplicativo Direitos Humanos Brasil, Site
(https://ouvidoria.mdh.gov.br/), Telegram (basta digitar "Direitoshumanosbrasil) e E-mail:
ouvidoria@mdh.gov.br.
Em breve será possível fazer denúncias na língua brasileira de sinais – LIBRAS.

Para saber mais:


Informações sobre o Disque 100: https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-
informacao/disque-100-1

250

251
Dados sobre os atendimentos realizados pelo Disque 100: https://www.gov.br/mdh/pt-
br/acesso-a-informacao/ouvidoria/balanco-disque-100

Política Nacional de Promoção, Proteção e Defesa dos Direitos de Crianças e


Adolescentes

Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente

O que é?
Os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente são órgãos deliberativos
responsáveis por assegurar, na União, nos estados, Distrito Federal e nos municípios,
prioridade para a infância e a adolescência.
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA foi criado em
1991 pela Lei nº 8.242, sendo um órgão colegiado permanente, de caráter deliberativo e
composição paritária, previsto no artigo 88 da lei no 8.069/90 – Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA). Integrante da estrutura do Ministério da Mulher da Família e dos
Direitos Humanos – MMFDH.
Por meio da gestão compartilhada, governo e sociedade civil definem, no âmbito do
Conselho, as diretrizes para a Política Nacional de Promoção, Proteção e Defesa dos
Direitos de Crianças e Adolescentes. Além de contribuir para a definição das políticas para
a infância e a adolescência, o CONANDA também fiscaliza as ações executadas pelo poder
público no que diz respeito ao atendimento da população infanto-juvenil.
A gestão do Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente (FNCA) também é uma das
atribuições do Conselho. É ele o responsável pela regulamentação sobre a criação e a
utilização desses recursos, garantindo que sejam destinados às ações de promoção,
proteção e garantia dos direitos de crianças e adolescentes, conforme estabelece o
Estatuto da Criança e do Adolescente.
Outras atribuições do CONANDA:

• Fiscalizar as ações de promoção dos direitos da infância e adolescência executadas


por organismos governamentais e não-governamentais.

251

252
• Definir as diretrizes para a criação e o funcionamento dos Conselhos Estaduais,
Distrital e Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente e dos Conselhos
Tutelares.
• Estimular, apoiar e promover a manutenção de bancos de dados com informações
sobre a infância e a adolescência.
• Acompanhar a elaboração e a execução do orçamento da União, verificando se
estão assegurados os recursos necessários para a execução das políticas de
promoção e defesa dos direitos da população infanto-juvenil.
• Convocar, a cada três anos a Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente.
• Incentivar os Conselhos de Direitos na consecução do papel de acompanhamento
e monitoramento da política de atendimento a crianças na primeira infância em sua
esfera de competência territorial.
• Promover a implementação dos Planos Estaduais pela Primeira Infância e Plano
Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito da Criança e do Adolescente
à Convivência Familiar e Comunitária.
• Recomendar que os conselhos de direitos destinem recursos de seus fundos para a
consecução dos objetivos das políticas de atendimento de crianças na primeira
infância na sua esfera de competência territorial.

Fale conosco: conanda@mdh.gov.bvr

Saiba mais:
https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselho-
nacional-dos-direitos-da-crianca-e-do-adolescente-conanda/conanda

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância:

Art. 35. Os §§ 1º -A e 2º do art. 260 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de


1990 , passam a vigorar com a seguinte redação:
Art. 260.
§ 1º -A. Na definição das prioridades a serem atendidas com os recursos
captados pelos fundos nacional, estaduais e municipais dos direitos da
criança e do adolescente, serão consideradas as disposições do Plano
Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e

252

253
Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária e as do Plano
Nacional pela Primeira Infância.
§ 2º Os conselhos nacional, estaduais e municipais dos direitos da criança
e do adolescente fixarão critérios de utilização, por meio de planos de
aplicação, das dotações subsidiadas e demais receitas, aplicando
necessariamente percentual para incentivo ao acolhimento, sob a forma
de guarda, de crianças e adolescentes e para programas de atenção
integral à primeira infância em áreas de maior carência socioeconômica
e em situações de calamidade.

A Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – SNDCA é responsável


pela condução da política nacional de promoção, proteção e defesa dos direitos das
crianças e adolescentes, vinculada à pasta do Ministério da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos. Possui a função primordial de apoiar ações intersetoriais,
interinstitucionais e interfederativas, promovendo a articulação de diversos órgãos e
sociedade civil.
Entre as políticas que coordena estão o fortalecimento do sistema de garantia de direitos
de crianças e adolescentes; o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE;
o Programa de Proteção de Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte – PPCAAM e
as ações de prevenção e de enfrentamento do abuso e da exploração sexual. Também deve
propor e incentivar a realização de campanhas de conscientização pública relacionadas
aos direitos da criança e do adolescente. Coordena ainda a produção, a sistematização e a
difusão das informações relativas à criança e ao adolescente, gerenciando os sistemas de
informações sob sua responsabilidade.
O Decreto nº 10.174/2020 lhe atribui a competência de formular, coordenar e executar
políticas e diretrizes voltadas à promoção dos direitos humanos de crianças e adolescentes.

Conselhos Tutelares: políticas para seu fortalecimento

O que é?
Segundo o art. 131 do Estatuto da Criança e do Adolescente, Conselho Tutelar é "órgão
permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo
cumprimento dos direitos da criança e do adolescente". Trata-se de um órgão público
municipal que tem como missão representar a sociedade na proteção e na garantia dos
direitos de crianças e adolescentes, contra qualquer ação ou omissão do Estado ou dos

253

254
responsáveis legais, que resulte na violação ou ameaça de violação dos direitos
estabelecidos pelo ECA.
Conselho Tutelar encontra-se presente em praticamente 100% do território brasileiro,
conforme regulamentação pela Resolução nº 139/2010 – CONANDA. É composto por
cinco membros eleitos pela comunidade para um mandato de 4 anos. É preciso que o
município disponibilize os recursos básicos para seu funcionamento, porém, possui
autonomia frente à prefeitura, ao legislativo municipal, ao poder judiciário e ao ministério
público. Não tem o poder de julgar.
Cabe ao Conselho Tutelar aplicar medidas de proteção, após confirmação de violação de
direitos. A responsabilidade pela execução é das famílias, da sociedade civil e do poder
público. Esse trabalho exige de cada conselheiro sensibilidade e escuta para atuar, de
modo a compreender cada caso em suas particularidades, ouvindo todos os envolvidos,
para se chegar à medida protetiva mais adequada para a criança e o adolescente.
Principais atribuições dos Conselhos Tutelares:

• Atendimento às crianças e adolescentes em caso de violação dos seus direitos por


ação ou omissão do Estado ou da sociedade, por abuso, omissão ou em razão da
conduta o dos pais ou responsáveis.
• Receber obrigatoriamente as comunicações referentes aos casos suspeitos ou
confirmados de maus tratos, bem como nos casos de faltas injustificadas, evasão
escolar ou repetência em níveis elevados de ocorrência, esgotadas as vias de
recursos escolares.
• Atendimento aos pais e responsáveis, sendo possível a aplicação de algumas
medidas, exemplo: tratamento especializado e encaminhamento a programas de
orientação familiar.
• Encaminhar a notícia de fatos que constituem infração administrativa ou penal
contra os direitos da criança e do adolescente aos órgãos competentes.

Atualmente, existem duas políticas públicas principais para fortalecer e qualificar a


atuação dos Conselhos Tutelares:

Equipagem dos Conselhos Tutelares


A ação de equipagem é uma política nacional consolidada e visa garantir a melhoria da
qualidade dos serviços de proteção e defesa dos direitos humanos de crianças e

254
250
255
adolescentes. Para tanto, tem por escopo a doação de equipamentos essenciais ao
funcionamento dos Conselhos Tutelares.
A estruturação dos Conselhos Tutelares (CTs) garante o efetivo atendimento de crianças
e adolescentes em situação de violência ou vulnerabilidade em todo o Brasil. Ter um
espaço próprio, veículo para diligências, computadores, refrigerador, bebedouro e demais
insumos impactam diretamente na qualidade do atendimento e contribuem para que os
conselheiros tutelares realizem o trabalho em defesa dos direitos de crianças e
adolescentes, em cada Município brasileiro.
Em 2020, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), por meio
da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (SNDCA) realizou, até o
mês de agosto, a entrega de 700 (setecentos) conjuntos de equipagem completos,
fundamentais ao funcionamento e atuação do Conselho Tutelar. O kit completo é
composto por um veículo, cinco computadores, uma impressora, um refrigerador, um
bebedouro, uma cadeira para automóvel para transporte de crianças, uma TV Smart e um
ar-condicionado portátil.

Formação Continuada
Fomentar e apoiar a formação continuada dos Conselheiros Tutelares é compromisso
institucional
da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e para isso, em 2020, foi
desenvolvida a plataforma digital especializada em direitos da criança e do adolescente, a
ENDICA – Escola Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Os cursos oferecidos são gratuitos, on-line e de alta qualidade, para aprimorar a atuação
dos profissionais do SGD – Sistema de Garantia de Direitos, dos visitadores do Programa
Criança Feliz, de educadores, dos profissionais da Assistência social, do judiciário e outras
pessoas que se interessem pela temática dos direitos humanos de crianças e adolescentes.
Dentre os cursos oferecidos com temas basilares, destacam-se aqueles voltados à primeira
infância e às comunidades tradicionais e indígenas.

Saiba mais: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/crianca-e-


adolescente/dados-e-indicadores/conselhos-tutelares

255

256
Programa Criança Protegida

Para além dessas políticas para o fortalecimento do Sistema de Garantia de Direitos, a


Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente também está à frente do
Programa Criança Protegida, cujo objetivo é promover a capacitação sobre a temática da
assistência e da proteção da criança e do adolescente com direitos violados, em harmonia
com a Lei nº 13.431/2017, perpassando pelo alinhamento de fluxos de atendimento locais
a fim de fortalecer a rede de proteção às vítimas de violência, incluindo-se nesse escopo,
as crianças na primeira infância.
Ademais, a Secretaria promove, anualmente, campanhas de conscientização e
desenvolvimento de materiais relacionados aos direitos de crianças e adolescentes. As
principais iniciativas em 2020 foram:

Saiba mais:
• http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/54078-adolescencia-
primeiro-gravidez-
depois#:~:text=Portanto%20todo%20cuidado%2C%20precau%C3%A7%C3%A3o%
20e,preven%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0%20gravidez%20na%20adolesc%C3%
AAncia.
• https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/abril/ministerio-lanca-a-
campanha-maio-laranja
• https://t.co/gy3tj0490k?amp=1
• http://prevencaoevida.com.br/
• https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2020-2/julho/gibi-adapta-
linguagem-do-estatuto-da-crianca-e-do-adolescente-eca-para-publico-
infantil/estatuto_SNDCA_uso_digital_APPeWEBconvertido.pdf

Fóruns Nacionais para a Proteção de Crianças e Adolescentes

A Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente também é responsável


pela realização dos Fóruns Nacionais para a Proteção de Crianças e Adolescentes que
têm como objetivo discutir temas e disseminar experiências relevantes em matéria de
prevenção e enfrentamento das violências contra crianças e adolescentes, bem como

256

257
estabelecer diretrizes para o desenvolvimento de políticas públicas regionalizadas. Em
2020 já foram realizados dois Fóruns:

1. Vítimas de exploração sexual no contexto de pornografia na internet


2. Letalidade Infanto-juvenil

Fale conosco: gab.sndh@mdh.gov.br

Para saber mais:

VIDEOS 27 a 30
• https://www.youtube.com/watch?reload=9&v=GHdFYPyskzM
• https://www.youtube.com/watch?v=fW8VspAHyMo
• https://www.youtube.com/watch?reload=9&v=GHdFYPyskzM
• file:///C:/Users/luciana.oliveira/Downloads/E-
Book%20do%201%C2%BA%20F%C3%B3rum%20Nacional.pdf
• https://www.youtube.com/watch?v=fW8VspAHyMo

257

258
Políticas para Família

Observatório Nacional da Família

Com objetivo de incentivar o desenvolvimento de estudos e pesquisas relacionados à


temática da família, além de ser referência para a elaboração de políticas públicas, o
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) lançou o
Observatório Nacional da Família (ONF).

Eixos temáticos:
O ONF está estruturado em nove eixos temáticos, entre eles: conciliação família-trabalho
e projeção social e econômica; saúde, demografia e família; direitos humanos, sistema de
proteção social e políticas familiares; a família no contexto da educação; desenvolvimento
e fortalecimento de vínculos familiares e parentalidade contemporânea.
Integram os temas, casamento e conjugalidade; mudanças do ciclo de vida familiar e
relações intergeracionais; políticas de prevenção ao suicídio e autolesão provocada sem
intenção suicida entre adolescentes e jovens; e o impacto da tecnologia nas relações
familiares.

Biblioteca
O Observatório Nacional da Família mantém um acervo com livros, periódicos, vídeos e
materiais didáticos. Os itens estão disponíveis para consultas e reprodução por meio da
aba “Produção”, no endereço eletrônico do ONF. Mais informações podem ser obtidas
pelo e-mail observatorio.onf@www.gov.br/mdh/pt-br, com o título ACERVO.

Para saber mais:


Aacesse: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/observatorio-nacional-da-
familia

Campanha Acolha a Vida

258

259
Por meio da Secretaria Nacional da Família tem-se realizado ações de acompanhamento e
enfrentamento de situações de automutilação, a fim de direcionar as ações necessárias.
A Campanha Acolha a Vida foi lançada com foco na prevenção ao suicídio e automutilação,
voltada a todas faixas etárias, especialmente crianças, adolescentes e jovens. Segundo a
OMS, de 5,0 a 9,9 mortes por 100 mil habitantes no Brasil tiveram o suicídio como causa
no ano passado e estima-se que, anualmente, a cada adulto que se suicida, pelo menos
outros 20 possuem algum tipo de ideação ou atentam contra a própria vida. Entre os jovens
de 15 a 29 anos, é a segunda principal causa de morte e está aumentando em casos de
crianças também (OMS, 2017).

Para saber mais:

VÍDEO 31
Assista o vídeo da Campanha Acolha a Vida, disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-
br/assuntos/noticias/2019/abril/ministerio-lanca-a-campanha-201cacolha-a-vida201d-
com-foco-na-prevencao-do-suicidio-e-automutilacao

Programa Famílias Fortes

O Famílias Fortes é uma metodologia de sete encontros semanais para famílias com filhos
entre 10 e 14 anos que visa promover o bem-estar dos membros da família, fortalecendo
os processos de proteção e construção de resiliência familiar e reduzindo os riscos
relacionados a comportamentos problemáticos.
Na primeira hora de cada encontro os pais e responsáveis se reúnem em uma sala e os
filhos de 10 a 14 anos em outra. Os pais são ensinados a esclarecer as expectativas com
base nas normas de desenvolvimento de crianças e adolescentes, a usar práticas
disciplinares apropriadas, a gerenciar emoções fortes em relação aos filhos e a se
comunicar de maneira eficaz. Já os filhos aprendem habilidades para interação pessoal e
social, como, ter metas que deem sentido à vida, seguir regras, reconhecer as dificuldades
e qualidades dos pais, lidar com a pressão dos amigos, saber identificar modelos positivos
e ajudar os outros.
Na segunda hora, pais e filhos se reúnem numa mesma sala onde praticam as habilidades
que aprenderam independentemente, trabalham na resolução e comunicação de conflitos

259

260
e se envolvem em atividades para aumentar a coesão familiar e o envolvimento positivo
dos filhos na família.
Para a condução dos encontros, os facilitadores dispõem de um manual, que detalha todas
as atividades e o tempo de cada uma, e de vídeos que abordam os temas a serem
trabalhados com as famílias.
Por meio da Secretaria Nacional da Família, os municípios recebem apoio para Formação
dos articuladores e facilitadores que irão atuar no Famílias Fortes; disponibilização dos
manuais, cadernos de atividades, cartazes e vídeos.

Qual é a contrapartida dos municípios?


Designar um articulador local que ficará em contato com a Secretaria Nacional da Família
e supervisionará a execução do Famílias Fortes no município; designar a equipe de
facilitadores: de 3 a 5 profissionais (preferencialmente das áreas de assistência social,
educação ou saúde) para aplicar a metodologia com grupos de até 15 famílias. A equipe de
facilitadores deve dispor de 5 horas semanais para a realização das atividades relativas ao
Famílias Fortes; disponibilizar três salas, duas delas equipadas com TV ou projetor; e
promover uma ampla divulgação do Famílias Fortes na comunidade local.
Saiba mais: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/familia/familias-fortes

Programa Reconecte: o desafio do uso benéfico da tecnologia

O Programa Reconecte foi criado a partir da observação de que o uso imoderado de


tecnologia tem interferido negativamente nas relações familiares. Assim, tem por
propósito “reconectar” as famílias e relacionamentos sociais em geral, a partir de uma série
de projetos com ações que vão desde a educação nos diversos aspectos da dignidade
humana, até ações que visam uma reeducação tecnológica, fortalecendo relações sociais
reais, em especial a Família, promovendo assim um uso dos recursos tecnológicos de
maneira inteligente.

Objetivos específicos:
• Informar a respeito das novas práticas e das novas tendências virtuais do
comportamento humano;
• Esclarecer a respeito do uso inadequado da tecnologia, assim como seus efeitos a curto,
250
médio e longo prazo para a saúde mental;

260

261
• Informar sobre mecanismos de alerta, controle e regulação comportamental na família e
sociedade.
• Abordar questões do apoio dos recursos tecnológicos em questões de educação e
entretenimento saudável.
• Capacitar pais, professores, profissionais de saúde e a sociedade como um todo a
respeito das melhores formar de utilização da tecnologia.
• Fomentar o uso dos recursos tecnológicos sob a ótica de uma responsabilidade social.
• Informar sobre os perigos da internet, apontando mecanismos de proteção de uso.
• Fomentar a tomada de consciência e uma melhor percepção da importância da família
como o elemento gerador e protetor da saúde mental individual e social, através da
regulação e da supervisão parental.

Para saber mais:


Acesse: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/reconecte/o-que-e-o-
reconecte

261

262
Políticas para Mulheres

Programas Mães Unidas

O Programa “Mães Unidas” é uma iniciativa da Secretaria Nacional de Políticas para as


Mulheres (SNPM), com objetivo de proporcionar apoio relacional às gestantes e às mães
de crianças com até 2 (dois) anos de idade, por meio da formação de uma rede de
voluntárias. O projeto visa promover o fortalecimento de vínculos familiares, a saúde, a
cidadania e o acesso à justiça de mulheres e crianças assistidas, a partir das seguintes
ações:

• Cursos de capacitação para voluntárias.


• Formação de rede de mães voluntárias.
• Atendimento individual humanizado.
• Realização de rodas de conversas envolvendo mães, especialistas e voluntárias.
• Oferta da “Caixa do Bebê” – trata-se de uma caixa em formato de mini berço com
enxoval, materiais de higiene, fraldas e roupas. Todo o material foi pensando para as
primeiras semanas de vida da criança.
• E-book com informações básicas para gestantes e mães.

As beneficiárias diretas são as gestantes e mães de crianças com até 2 (dois) anos de idade,
com prioridade para: gestantes e mães adolescentes de até 19 (dezenove) anos; gestantes
e mães beneficiárias do Programa Bolsa Família; e gestantes e mães de crianças com
deficiências.
As voluntárias do Projeto Piloto "Mães Unidas" precisam preencher os seguintes
requisitos: I. ser mãe, não se diferenciando mães biológicas de mães adotivas; II. ter idade
mínima de 18 anos; III. ter como escolaridade mínima o ensino fundamental completo; IV.
ter concluído e ter sido aprovada no Curso de Capacitação de Voluntárias; e V. assinar
termo de adesão ao projeto.
O programa foi instituído pela Portaria nº 629, de 13 de março de 2020, do Ministério da
Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-

262

263
temas/politicas-para-
mulheres/PORTARIAN629DE13DEMARODE2020DOUImprensaNacional.pdf)
O “Mães Unidas” está em fase de projeto piloto, nos municípios de Goiânia, Aparecida de
Goiânia e Anápolis. Novas adesões serão abertas em dezembro de 2020 e em caso de
interesse, o e-mail para contato é: dpdm@mdh.gov.br

Para saber mais:


https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/politicas-para-mulheres/maes-
unidas

FÓRUM DE DISCUSSÃO
Considerando as politicas, programas e serviços apresentados, discuta no Fórum de
Discussão qual(quais) mais lhe chamaram atenção e em que medida já se encontram
acessíveis às crianças na primeira infância de sua área de atuação. Você pode incluir na
discussão quais medidas poderiam estar a seu alcance para ampliar o acesso das crianças
a estas políticas.

263

264
Aula 9: Financiamento público das políticas para a
primeira infância
O financiamento público de políticas e programas governamentais é uma
ação que apoia a solução de problemas que a sociedade considera de pública
relevância. Os bens e os serviços produzidos deverão ser devidamente justificados
em relação aos fins a que se destinam, por meio de atos jurídicos e administrativos,
de acordo com uma agenda que reflita os anseios da sociedade pela resolução de
problemas coletivos e difusos que afetam as condições de vida das pessoas, das
famílias e das empresas. Sobre o gasto público realizado, é exigida a prestação de
contas não só dos pontos de vista financeiro e legal, mas também de
responsabilização e transparência para com a sociedade, que efetivamente
financia as políticas e os programas públicos.
Os problemas vinculados ao tema da Infância e Adolescência e, em
particular, da Primeira Infância são considerados de pública relevância, portanto,
demandam políticas públicas para as quais o Estado brasileiro deve voltar sua
atenção, independentemente de governos. No entanto, as diversas estratégias de
enfrentamento e o papel do poder público em nível nacional, estadual e municipal
ainda precisam ser melhor articulados quanto às diferentes formas de
financiamento de uma política pública que é abrangente e complexa em seus
variados aspectos técnicos, sociais e econômicos. Ainda é uma tarefa árdua
rastrear o apoio financeiro do tema em nível federal, por exemplo.
O processo de despesas públicas para os temas da criança e da adolescência,
incluindo a Primeira Infância, é similar no âmbito da União e dos entes subnacionais
e segue uma lógica de gasto como qualquer outra despesa pública, ou seja, é
definido por meio de ritos legais e administrativos, mas com algumas
especificidades em nível federal, como veremos adiante. Anualmente, Ministérios,
Secretarias Estaduais e Municipais são consultados por órgãos internos dos
sistemas de planejamento e orçamento dos seus respectivos poderes executivos,
quanto a novas iniciativas governamentais a serem financiadas. Depois de uma

264

265
análise acurada das despesas realizadas e não realizadas, assim como das receitas
(ingresso de recursos por meio de tributos) nos últimos três anos (Lei 4320/64), são
previstas novamente as receitas e fixadas as despesas para o ano seguinte. Nesse
momento, são avaliadas as propostas de gastos, que são, em seguida, apreciadas e
autorizadas pelas casas legislativas (Congresso Nacional, Assembleias e Câmaras
Legislativas), que legitimarão a alocação dos recursos de acordo com as demandas
da sociedade.
Em nível federal, as despesas públicas para a infância e a adolescência têm
algumas especificidades, como já mencionamos. Seus dispêndios podem ser
realizados ora por meio de fonte especial de recursos, ora por meio de despesas
genéricas de uma forma mais difusa, pois são despesas que incluem a infância e a
adolescência no seu bojo, porém, no âmbito de outras iniciativas públicas que estão
alocadas em uma grande variedade de ações orçamentárias. No primeiro caso,
podemos citar a existência do Fundo Especial para a Infância e Adolescência (FIA),
definido no inciso IV da Lei nº 8.069/90, com algumas receitas definidas
diretamente para fomentar esse Fundo. O FIA é atualmente gerido pelo Conselho
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente - CONANDA.
No segundo caso, temos duas possibilidades. Na primeira, pode-se apoiar
financeiramente as políticas e os programas finalísticos, tendo como fontes outros
fundos, tais como, por exemplo, o Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), o
Fundo Nacional de Saúde (FNS) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação (FNDE), que financiam os respectivos sistemas de gestão
descentralizados pela União a Estados e Municípios (Sistema Único de Assistência
Social – SUAS –, Sistema Único de Saúde – SUS –, Sistema Nacional de Educação –
SNE – etc.). Nessa possibilidade, o tema da criança e da adolescência é apoiado
financeiramente para entregar bens e serviços à sociedade, como educação e
saúde infantil, creches, alimentação escolar, assistência social e outros serviços
previstos que também alcançam a Primeira Infância direta ou indiretamente.
A segunda possibilidade se refere ao aporte direto por meio do orçamento
fiscal da União e dotações orçamentárias estaduais e municipais para programas

265

266
finalísticos. Os programas podem ser desenhados e financiados para alcançar as
crianças e os adolescentes, podendo focar a Primeira Infância de uma forma mais
direcionada, visando mudar a realidade por meio de uma ou mais soluções para
problemas específicos. Ainda nessa possibilidade, as intervenções são organizadas
e os financiamentos são definidos por leis orçamentárias que criam os planos
plurianuais (PPA) a cada quatro anos e as peças orçamentárias a cada ano. No caso
federal, a Lei 13.971, de 2019, que criou o PPA, trata especificamente do tema da
Primeira Infância em seu Art. 10, parágrafo único, a saber:

Parágrafo único. O conjunto de ações governamentais voltadas ao


atendimento da primeira infância possui caráter prioritário para o
orçamento de 2020, nos termos do art. 3º da Lei nº 13.898, de 11 de
novembro de 2019, e possui antecedência na programação e na
execução orçamentária e financeira durante o período de vigência do
Plano Plurianual, conforme agenda transversal e multissetorial a ser
regulamentada pelo Poder Executivo.

Esse comando legal define formalmente que um ou mais programas


finalísticos do PPA terão suas dotações orçamentárias executadas para os
próximos quatro anos com antecedência (prioridade) sobre outras despesas
públicas. Dessa forma, um programa finalístico dessa natureza pode ser elaborado
a partir de quaisquer áreas do setor público, tais como Educação, Saúde, Cultura ou
outros setores.
Em termos gerais, a criação e a manutenção de despesas públicas que
seguem as diretrizes dos marcos legais da criança e do adolescente, Primeira
Infância e de outras políticas sociais afins podem ser implementadas por União,
Estados e Municípios, seja por meio de ações diretas de iniciativa de cada ente,
utilizando os sistemas de gestão descentralizados, ou pela sociedade civil. Contudo,
deve seguir a natureza integrativa que o tema da Primeira Infância requer, segundo
as definições legais, considerando as naturezas transversal e multissetorial
próprias dessas ações públicas. Assim, a estratégia de financiamento deve
considerar as ações que ofertam e operam benefícios, serviços, programas e

266

267
projetos, de forma integrada, visando à universalização do acesso e à
descentralização dos recursos de forma coordenada.
Por fim, o financiamento público deve considerar como regra, e não como
exceção, a natureza intersetorial e transversal das políticas sociais para crianças e
adolescentes e para a Primeira Infância. O financiamento sempre deve observar a
integralidade das ações e as especificidades do tema por se tratar de uma política
diferenciada, complexa e com muitas incertezas. Nesses moldes, o financiamento
deve ser estruturado para ampliar e aperfeiçoar a rede de proteção e promoção
social e de garantia de direitos, conforme os marcos regulatórios vigentes assim o
exigem e a sociedade assim espera.
Tudo isso é muito importante, porque é investindo na primeira infância hoje
que teremos mais cidadania e mais economia no futuro. Por isso, o Marco Legal da
Primeira Infância determina que:
Art. 11. As políticas públicas terão, necessariamente, componentes de
monitoramento e coleta sistemática de dados, avaliação periódica dos
elementos que constituem a oferta dos serviços à criança e divulgação
dos seus resultados. (...)

§ 2º A União informará à sociedade a soma dos recursos aplicados


anualmente no conjunto dos programas e serviços para a primeira
infância e o percentual que os valores representam em relação ao
respectivo orçamento realizado, bem como colherá informações sobre
os valores aplicados pelos demais entes da Federação.

Para saber mais:

• Portaria sobre o Financiamento Federal das Ações do Programa Criança


Feliz/Primeira Infância no SUAS. Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/-
/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/41227841/do1-2018-09-18-
portaria-n-2-496-de-17-de-setembro-de-2018-41227780.
• Manual Técnico do Orçamento. Disponível em:
https://www1.siop.planejamento.gov.br/mto/doku.php/mto2020.

267

268
• Manual Técnico do Plano Plurianual do Governo Federal – PPA 2020-2023.
Disponível em: https://www.gov.br/economia/pt-br/centrais-de-
conteudo/publicacoes/guias-e-manuais/manual_tecnico_ppa20202023.pdf/view.

268

269
Aula 10: o Fundo da Infância e da Adolescência como
política pública complementar na concretização dos
direitos da criança na primeira infância
O Marco Legal questiona: Como garantir a cidadania infanto-juvenil e a prioridade
absoluta previstas no art. 227 da Constituição Federal?
A busca pela garantia dos direitos infanto-juvenis, mais especificamente na
primeira infância, nos direciona para várias ações, destacando-se entre elas o Fundo dos
Direitos da Criança e do Adolescente.
Quando se trata de criança e adolescente, a ideia central é a de que a
responsabilidade pelo futuro destas gerações é de todos nós, principalmente dos adultos,
pois são civilmente incapazes e suas vontades são geralmente representadas pelos desejos
e pelas ações dos adultos. Ocorre, porém, que a promoção das ações para o
desenvolvimento integral tem um custo/investimento, razão pela qual há necessidade de
recursos para financiar projetos que alimentem uma expectativa de vida melhor para esta
parcela da comunidade.
A Lei, pensando nesta questão, de maneira inovadora, criou um fundo para catalisar
os recursos que são destinados à criança e ao adolescente. Assim, o Estatuto da Criança e
do Adolescente estabeleceu como política de atendimento a manutenção de fundos
nacional, estaduais, municipais e distritais, vinculados aos respectivos conselhos dos
direitos da criança e do adolescente (art. 88, IV).
Com essa iniciativa, a Lei busca garantir uma autonomia financeira tendo em vista
uma independência gradativa dos recursos oficiais. Não que estes não sejam bem-vindos
ou que o poder público não deva cumprir o seu papel. Muito pelo contrário.
Independentemente das iniciativas financiadas pelos Fundos da Infância e da
Adolescência, sempre haverá a cobrança da responsabilidade estatal quanto à efetivação
dos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes previstos na Constituição
Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente bem como no Marco Legal da Primeira
Infância. Ou seja, as receitas dos Fundos não excluem a obrigação do poder público de
contemplar no orçamento verbas para a garantia dos direitos fundamentais.
O fato a considerar é que a responsabilidade é de todos nós, poder público e
comunidade em geral. A obrigação do poder público decorre de lei, e a ação da comunidade

269

270
está embasada no que se denomina “cultura cívica”, que envolve a ideia de pertencimento,
engajamento e confiança nas instituições. Ideia de pertencimento implica que a ação está
direcionada para uma comunidade a qual pertence, ou seja, quando se destina o imposto
de renda ao Fundo da Infância e da Adolescência, faz-se um investimento na própria
comunidade na qual está incluído. Ao melhorar essa sociedade, também melhora-se o
meio social em que se convive.
A outra questão refere-se ao engajamento e à confiança nas instituições. Estamos
muito descrentes nas instituições, porém a cultura cívica requer essa confiança. A
comunidade e as instituições, principalmente o Poder Judiciário, o Ministério Público e os
Conselhos (Federal, Estadual, Municipal ou Distrital), devem procurar dar as respostas
adequadas às demandas que envolvem crianças e adolescentes, no estado, município ou
Distrito Federal.
Percebe-se que o aumento gradativo da arrecadação do Fundo tem uma relação
direta com a confiança nestas instituições. Dessas ações resulta que não podemos ter um
conceito de cidadania deformado ou deturpado, em que a “participação política é baseada
na dependência e ambição pessoal, a coisa pública não diz respeito a cada cidadão, a
corrupção é a norma e as leis são feitas para serem desobedecidas”. Devemos pensar em
cidadania com essa cultura cívica que acaba por mudar a realidade social vivida,
principalmente quando se refere à criança e ao adolescente. Devemos pensar a cidadania
com a dimensão de uma solidariedade social, em que “o acordo social é pensado de forma
impessoal e com o princípio fundante da dignidade dos indivíduos”.
Quando se busca a destinação de parte do imposto de renda ao Fundo da Infância
e Adolescência, todos esses conceitos estão presentes, já que provém das ideias de
cidadania ativa, cultura cívica, pertencimento coletivo, solidariedade social, dignidade da
pessoa humana, de fortalecimento da sociedade civil organizada e do exercício da
democracia, trazendo uma mudança de postura individualista e egoísta, na qual o nós
substitui o eu.
Este é o caminho da mudança social. Não basta esperar ações de terceiros. Há
necessidade de agir. Assim, se podemos contribuir para esta mudança, por que não fazer?
Como entender o Fundo da Infância e da Juventude?

O que é o Fundo?

270

271
O Fundo da Infância e da Adolescência constitui-se de recursos arrecadados para
o atendimento de projetos voltados para ações complementares de promoção, proteção e
defesa dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes. São recursos públicos
mantidos em contas bancárias específicas que têm a finalidade de receber repasses
orçamentários e depósitos de doações efetuadas por pessoas físicas ou jurídicas. Cada
estado ou município deve manter uma única conta ou Fundo, que se constitui de recursos
geridos pelos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente. Apesar de ser uma
conta pública, não integra o caixa do estado ou município, tanto que não é o chefe do
executivo que delibera a respeito de sua aplicação, mas sim o Conselho, que é o órgão
gestor do fundo – exemplo típico de democracia participativa.

Quem decide e fiscaliza a aplicação do que é arrecadado?

É o Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente – composto por membros


da sociedade e do poder público, de forma paritária – que delibera sobre a aplicação dos
recursos, sendo fiscalizados pelo Ministério Público, Poder Legislativo e Tribunal de
Contas.

Os recursos devem ser destinados exclusivamente para execução das políticas públicas
sociaispara a criança e o adolescente. São projetos que visam garantir os direitos
fundamentais da criança e do adolescente, como vida, saúde, educação, lazer,
profissionalização e convivências familiar e comunitária.

O que diz o Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.256/2016, art. 35):

Art. 35. Os §§ 1º -A e 2º do art. 260 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de


1990 , passam a vigorar com a seguinte redação:
Art. 260. § 1ºA. Na definição das prioridades a serem atendidas com os
recursos captados pelos fundos nacional, estaduais e municipais dos
direitos da criança e do adolescente, serão consideradas as disposições
do Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de
Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária e as do
Plano Nacional pela Primeira Infância.
§ 2º Os conselhos nacional, estaduais e municipais dos direitos da criança
e do adolescente fixarão critérios de utilização, por meio de planos de
aplicação, das dotações subsidiadas e demais receitas, aplicando
necessariamente percentual para incentivo ao acolhimento, sob a forma
de guarda, de crianças e adolescentes e para programas de atenção

271

272
integral à primeira infância em áreas de maior carência socioeconômica
e em situações de calamidade. (Lei 13.257/2016)

Como ajudar?

A destinação de parte do imposto de renda ao fundo municipal dos direitos da


criança e do adolescente não é um favor, não é doação, não é caridade, não é
assistencialismo, não é compaixão. É direito, é legal, é o exercício da cidadania, é
interessar-se pelos outros, é fazer algo concreto para o próximo, é um exemplo de
solidariedade.
Vale ressaltar que podemos ajudar de várias maneiras, como: fazendo a destinação
direta de parte do imposto ao fundo, divulgando a campanha em nossos meios, inspirando
um amigo a fazer a destinação, mobilizando um grupo que possui influência para adesão
em massa à campanha (empresa ou órgão onde trabalha, sindicato do qual faz parte,
condomínio onde mora, escola onde leciona, mídia onde é mandatário, escritório com seus
clientes, etc.). Basta querer. Basta ser cidadão de verdade.

As receitas do Fundo da Infância e da Adolescência

De acordo com a Resolução nº 137, art. 10, de 21 de janeiro de 2010, do Conselho


Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), os fundos devem ter
como receitas:
I - recursos públicos que lhes forem destinados, consignados no
Orçamento da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
inclusive mediante transferências do tipo “fundo a fundo” entre essas
esferas de governo, desde que previsto na legislação específica;
II - doações de pessoas físicas e jurídicas, sejam elas de bens materiais,
imóveis ou recursos financeiros;
III - destinações de receitas dedutíveis do Imposto de Renda, com
incentivos fiscais, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente e
demais legislações pertinentes;
IV - contribuições de governos estrangeiros e de organismos
internacionais multilaterais;
V - o resultado de aplicações no mercado financeiro, observada a
legislação pertinente; e
VI - recursos provenientes de multas, concursos de prognósticos, dentre
outros que lhe forem destinados.

272

273
Merece destaque a questão das doações das pessoas físicas e jurídicas. Como regra
geral, as pessoas físicas podem efetuar doação (destinação) de até 6% da sua receita
tributável, e as jurídicas, até 1%. Tal destinação não acarretará nenhum ônus ao doador,
visto que se refere à parte do valor do IR que deveria ser pago à Receita Federal. Assim, ao
invés de destinar 100% do seu imposto para o Tesouro Nacional, a pessoa física destina
94% e o restante (6%) fica para o município ou estado.
Podem contribuir as empresas optantes pela tributação pelo Lucro Real. Neste
caso, deve-se observar os períodos de apuração do IR: empresas que fecham o período
trimestralmente podem destinar a cada fechamento, e as empresas que fecham o período
anualmente podem realizar a destinação no fim do ano.
A pessoa física tem duas oportunidades para fazer a destinação. A regra geral é
destinar 6% do imposto sobre a renda apurada na declaração de ajuste anual, ou seja,
recolhe este valor até dezembro e na entrega da declaração no ano seguinte faz o devido
ajuste, descontando o valor pago. No entanto, a pessoa física pode optar pela doação de
3% do imposto apurado na declaração quando da entrega.
Ao destinar recursos a esses Fundos, os cidadãos e as empresas têm uma
oportunidade de exercer participação social cidadã, pois decidem conscientemente que
uma parte de seu IR será direcionada para ações definidas pela CF/88 como prioritárias,
cuja execução e cujos resultados poderão acompanhar. Há de se despertar esse civismo
tributário dos contribuintes, eis que o dever de pagar impostos transforma-se em ato de
participação democrática no processo de execução de políticas públicas (CONSELHO
NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO, 2020, p. 15).

Mensagem básica:

A CRIANÇA É PRIORIDADE NO FINANCIAMENTO

A prioridade precisa sair do papel. É sabido que a Constituição Federal de 1988


estabelece, no artigo 227, que a criança e o adolescente são prioridades absolutas. É o
único artigo da lei que se refere à prioridade, assim, não basta contemplar a lei em um plano
e a realidade em outro, com uma distância significativa entre o legal e o real. Há que se ter
ações que concretizem este comando legal, retirem da miséria crianças e adolescentes, e
garantam o desenvolvimento adequado nos aspectos educacional, social e psicológico.
Para isso, todos nós precisamos estar engajados nessa luta.

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Saiba mais:

Orientações sobre os Fundos da Criança e do Adolescente. Conselho Nacional do


Ministério Público, 2020. Disponível em:
https://www.cnmp.mp.br/portal/images/noticias/2020/maio/Guia_Fundos_CNMP_Re
visado_encaminhar_1.pdf

Conheça excelentes práticas nessa área:

• Projeto Declare seu Amor. Disponível em: https://www.tjro.jus.br/declareseuamor


• Grupo de Empresários e Amigos das Crianças. Disponível em: www.gepac.org.br

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Aula 11: Intersetorialidade: atenção integrada como
estratégia para promoção do desenvolvimento
integral na primeira infância

Após termos identificado o cenário, o sentido da prioridade absoluta e os recursos


das principais políticas públicas relacionadas ao cuidado das crianças na primeira infância,
chegou a hora de avançarmos na efetivação da intersetorialidade. A existência de serviços
públicos com ações ligadas à primeira infância, por si só, não significa trabalho em rede, por
isso precisamos ter em vista uma diretriz preceituada no art. 4º do Marco Legal da Primeira
Infância para efetivamente promovermos o desenvolvimento integral:

Art. 4º - As políticas públicas voltadas ao atendimento dos direitos da


criança na primeira infância serão elaboradas e executadas de forma a:
(...)
VII - “articular as ações setoriais com vistas ao atendimento integral e
integrado.”

O artigo 88 do ECA também já estabelecia a intersetorialidade como diretriz da


política de atendimento, preceituando a integração operacional de órgãos de atendimento
dos interesses da criança e do adolescente, sobretudo no tocante ao atendimento ágil do
adolescente a quem se atribui a prática de ato infracional e àqueles submetidos à medida
protetiva de acolhimento institucional, com vistas à mais célere possível reintegração
familiar ou colocação em família substituta (ECA, art. 88, Inc. V, VI e IX).
E no âmbito das políticas públicas, muitos programas intersetoriais já mostraram
resultados mais efetivos que ações que não incluíssem essa abordagem, tais como o
Programa Bolsa Família, o Brasil Carinhoso, a Estratégia Pré-Natal do Parceiro, o Família
Cidadã BH Sem Miséria, os programas elencados no tópico sobre a Importância do
Investimento na Primeira Infância e projetos desenvolvidos pela sociedade civil, como o
Plano de Ação Familiar, desenvolvido desde 1991 pela Associação Saúde Criança (atual
Instituto Dara).

VÍDEO 32

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Veja no vídeo a seguir o modelo de intersetorialidade desenvolvido pela Associação Saúde
Criança (ex-Associação Renascer, atual Instituto Dara), que tem se tornado referência
internacional: https://www.youtube.com/watch?v=4jJaaTv3620

Estas ações compreensivas das várias demandas de apoio que as famílias


apresentam para terem condições de exercer seu papel perante os filhos indicam níveis de
intersetorialidade que a ciência amplia cada vez mais.

Se em uma comunidade há alta violência, todos esses programas, de


leitura, primeira infância, Bolsa Família, não vão ser tão eficazes como
seriam aqueles que fizessem realmente algo para reduzir a violência
nessa comunidade ou pelo menos a pressão nas famílias relacionada à
violência. Não se pode fazer essa coisa maravilhosa para o
desenvolvimento da criança e esquecer as pressões na família que vive
em áreas muito violentas. Há que se encontrar um jeito de ser
multidisciplinar, com a ciência (SHONKOFF, 2016).

Estratégias para intersetorialidade

Visto que após três décadas de regulamentação da Doutrina da Proteção Integral


pelo ECA (Lei 8.069/1990), a atuação integrada ainda não foi alcançada a contento, o
Marco Legal da Primeira apresenta uma arquitetura para favorecer esse salto de qualidade.
Inicialmente, ele determina a criação de uma política nacional integrada para a primeira
infância, que só é possível pela atuação intersetorial:

Art. 6º - A Política Nacional Integrada para a primeira infância será


formulada e implementada mediante abordagem e coordenação
intersetorial que articule as diversas políticas setoriais a partir de uma
visão abrangente de todos os direitos da criança na primeira infância (Lei
13.257/2016).

Desde a criação do Marco Legal da Primeira Infância, várias iniciativas têm sido
realizadas nesse intento, destacando-se a Portaria nº 1, de 4 de abril de 2018, elaborada
pelo Comitê Gestor do Programa Criança Feliz, que factualmente representava a instância
nacional de coordenação prevista no art. 6º. Esta Portaria regulamenta a
Intersetorialidade no âmbito do Programa Criança Feliz, visto ser este um programa de
caráter intersetorial, mas seu conteúdo também é útil para articulação nas demais ações
indicadas no Marco Legal da Primeira Infância. Nesta regulamentação indica-se 60 ações

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próprias dos Ministérios da Saúde, Desenvolvimento Social, Educação, Direitos Humanos
e Cultura, assim como ações compartilhadas para atuação integrada.
Em seu artigo 7º, o Marco Legal da Primeira Infância indica a formação de comitês
intersetoriais como espaços oportunos para que se formulem e fomentem a execução de
planos – em níveis nacional, estadual e municipal/distrital – para a atenção integral e
integrada à primeira infância. Mesmo antes da promulgação do Marco Legal da Primeira
Infância, o Brasil já contava com um Plano Nacional pela Primeira Infância, de iniciativa da
Rede Nacional Primeira Infância (RNPI), aprovado pelo CONANDA, em 2010, que reúne
áreas e metas fundamentais para atuação integrada.
Os planos intersetoriais pela primeira infância são considerados como um dever do
Estado e uma forma de se conseguir operacionalizar a regra da prioridade absoluta
prevista no Art. 227 da Constituição Federal:

Art. 3º - A prioridade absoluta em assegurar os direitos da criança, do


adolescente e do jovem, nos termos do art. 227 da Constituição Federal
e do art. 4º da Lei 8.069 de 13 de julho de 1990, implica o dever do Estado
de estabelecer políticas, planos, programas e serviços para a primeira
infância que atendam às especificidades dessa faixa etária, visando a
garantir seu desenvolvimento integral (Lei 13.257/2016).

Uma estratégia para a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios


operacionalizarem a intersetorialidade e alcançar a elaboração participativa e
intersetorial das políticas, dos planos, dos programas e dos serviços, segundo o artigo 7º
do Marco Legal, é “instituir nos respectivos âmbitos, comitê intersetorial de políticas
públicas para a primeira infância com a finalidade de assegurar a articulação das ações
voltadas à proteção e à promoção dos direitos da criança, garantia a participação social por
meio dos conselhos de direitos”. À sociedade também cabe atuar solidariamente com a
família e o Estado para a proteção e a promoção do desenvolvimento da criança na
primeira infância. Entre as modalidades previstas em lei estão os deveres de criação, apoio
e participação da sociedade nas redes de proteção e cuidado à criança na comunidade,
consoante aos artigos 204, II, e 227, ambos da Constituição Federal, além do art. 12, V, do
MLPI.
A rede de proteção não pode prescindir da atuação e visão do principal
protagonista da proteção e promoção da pessoa na primeira infância, ou seja, a criança
cidadã, sendo respeitadas suas características etárias e de desenvolvimento. A

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participação da criança está prevista desde a Convenção sobre os Direitos da Criança e o
Marco Legal da Primeira Infância a ressalta desde a primeira infância (Lei 13.257/2016, art.
4º, Inciso II).
Deste modo, a intersetorialidade do atendimento e a integração operacional dos
órgãos de proteção da criança na primeira infância permitem a união de esforços dos entes
públicos, segundo suas competências, a partir do diálogo interinstitucional que aponte a
cada qual seu papel e racionalize a atuação, inclusive em termos de organização do espaços,
equipamentos e estruturas públicas necessárias. De fato, a intersetorialidade não
descaracteriza as competências de cada setor, mas nos remete a uma Governança
Colaborativa e traz à tona que, além de suas atribuições específicas, todas possuem um
mesmo objetivo, decorrente da responsabilidade compartilhada determinada no art. 227
da CF e suas regulamentações.

Qual o objetivo comum de todos?

Art. 8º - O pleno atendimento dos direitos da criança na primeira infância


constitui objetivo comum de todos os entes da Federação, segundo as
respectivas competências constitucionais e legais, a ser alcançado em
regime de colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios.
Parágrafo Único – A união buscará a adesão dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios à abordagem multi e intersetorial no
atendimento dos direitos da criança na primeira infância e oferecerá
assistência técnica na elaboração de planos estaduais, distrital e
municipais para a primeira infância que articulem os diferentes setores.

Deve-se desconstruir – se é que existe ainda essa visão parcial – o mito de que a
existência de atribuições específicas de cada órgão resulta na independência da atuação
interprofissional. A visão integral das linhas de ação em prol da proteção e promoção dos
direitos da pessoa desde a primeira infância qualifica compreensão das atribuições como
interdependentes. Não há dúvidas de que o acúmulo de atividades de cada setor pode
fomentar a crença limitante de que não há qualquer possibilidade de ocupação de seu
espaço na rede. Mas, sem o acoplamento estrutural interinstitucional, a atuação será
sempre limitada e, a longo prazo, onerará ainda mais o próprio setor.
Por fim, o Marco Legal da Primeira Infância assinala como estratégia para o avanço
da intersetorialidade a integração com as instituições de formação profissional (Lei
13.257/2016, art. 9º), e a própria noção de “universidade” merece ser potencializada para

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desde o princípio os profissionais serem fortalecidos com a visão da integralidade do
desenvolvimento humano, na área específica se especializem. Ele estipula também o
direito à capacitação pelos profissionais responsáveis por sua implementação, destacando
que, juntamente com o tema da especificidade da primeira infância, a intersetorialidade é
também fundamental em sua formação:
Art. 10º - Os profissionais que atuam nos diferentes ambientes de
execução das políticas e programas destinados à criança na primeira
infância terão acesso garantido e prioritário à qualificação, sob a forma
de especialização e atualização, em programas que contemplem, entre
outros temas, a especificidade da primeira infância, a estratégia da
intersetorialidade na promoção do desenvolvimento integral e a
prevenção e a proteção contra toda a forma de violência contra a criança.

Trabalho em rede
A habilidade de trabalhar em rede é fundamental para implementação da atuação
integrada com as crianças na primeira infância e suas famílias. A assistente social Lia
Sanicola (2015) desenvolveu uma abordagem de trabalho em rede, por meio da qual
conseguiu reunir cerca de seis mil famílias acolhedoras, na Itália. Segundo ela, redes sociais
podem ser compreendidas de várias formas, entre as quais:

a) Conjunto de ações de conexão de recursos e estratégias que tendem a produzir


concatenações de relações significativas.
b) Configuração da intervenção que prevê múltiplos percursos (com a pessoa, com a
organização de serviço, com o território), desenvolvendo-se de forma a conjugar
um modelo de problem solving (solução de problemas) com uma abordagem
sistêmico-relacional e usando estratégias de rede como o linking (vínculo), a
promoção e o apoio de grupos de auto e mútua ajuda, grupos de pais, de famílias,
etc.
c) Função própria do operador de redes, que de um lado é visto como ordenador e
construtor de redes, e, de outro, como coordenador e mediador do que já existe no
território em termos de recursos e serviços.

Em sua abordagem, ela compreende que todas as necessidades humanas são


respondidas por meio de redes que representam o capital social do sujeito. Sendo um
norteador, segundo Sanicola (2015), entenda a distinção entre redes primárias e
secundárias:

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• REDES PRIMÁRIAS se constituem por força da história dos sujeitos, não podem ser
criadas nem produzidas por força de lei, mas são geradas no tempo, pelos próprios
sujeitos em seu contexto social. Podem ser reconhecidas, promovidas e orientadas.
Elas se organizam com base no princípio da responsabilidade em relação ao outro
(sentido do cuidado primário) e suas relações são caracterizadas pelo afeto e a
lealdade (confiança).
• REDES SECUNDÁRIAS são formadas por força da lei e compostas por instituições,
organizações da sociedade civil, empresas, governo. Organizam-se sob a base da
igualdade e o princípio dos Direitos Humanos: “Todos são iguais perante a lei”. Seu
método baseia-se na redistribuição de recursos e na troca fundada no Direito,
primeiramente da Cidadania, por isso suas relações são caracterizadas pela
exigibilidade.
Esta distinção ajuda a não perdermos de vista o papel de cada ator no contexto
de implementação do Marco Legal da Primeira Infância, especialmente da família
enquanto rede primária fundamental e dos serviços enquanto atores da rede
secundária, que não devem sobrepor-se à família, mas sim apoiar e complementar as
redes primárias, e não concorrer com elas. A partir do esquema de redes sociais a
seguir, podemos visualizar as várias possibilidades de conexões para um trabalho em
rede:

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Figura 1 – Mapa de Redes na Comunidade (Fonte: Sanicola, 2015)

Como método de trabalho em rede, Sanicola (2015) propõe que o primeiro passo é
a exploração dos atores da rede primária da criança, assim como da rede secundária de seu
território, que são identificados e representados a partir de mapas de rede, como ilustrado
acima. Essa é a configuração da estrutura da rede. Em seguida, analisa-se os tipos de
vínculo que existem entre esses atores da rede primária e da rede secundária, que
configurarão a dinâmica da rede
Em relação à intersetorialidade, é útil fazer o mapa dos serviços e representar
(segundo modelo indicado a seguir) o tipo de relação existente entre eles, que favorecem
ou dificultam a atuação integrada. Assim, tem-se norteadores para trabalhar a
funcionalidade da rede e a distribuição das ações de cada ator para o trabalho integrado.

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Figura 2 – Esquema de diagramação dos vínculos entre os atores da rede (Fonte: Sanicola,
2015)

Dessa forma, primeiramente, é importante a identificação dos atores do trabalho


em rede e a criação de espaços de diálogos intersetoriais, envolvendo diversos membros
da família e da comunidade, assim como profissionais e setores que são imprescindíveis
para a concretização dos direitos da criança e do adolescente. Com efeito, a rede de
proteção não é um lugar materializado, mas sim um exercício de processo de diálogo
intersetorial permanente. A conexão entre os recursos da rede promove a resposta aos
desafios vivenciados pela criança, reduzindo assim sua vulnerabilidade (SANICOLA, 2015).
O diálogo deve proporcionar a articulação entre políticas públicas por meio do
desenvolvimento de ações conjuntas para proteção, inclusão e promoção da família, pois
só é possível cuidar da criança promovendo condições de exercício das funções parentais
e fortalecendo as competências de sua rede primária e secundária.
Para tornar mais funcional a rede local, é preciso criar instrumentos de “diálogos”
intersetoriais, por meio do exercício da referência e contrarreferência, fluxos de
atendimento e de estudos de casos em rede, e planos pela primeira infância determinados
no Marco Legal. A comunicação precisa ser cuidada, de modo que os vários atores tenham
voz e os instrumentais desenvolvidos sejam de conhecimento de todos, se possível
padronizados no tocante às informações necessárias a serem compartilhadas pelos
setores.
Ademais, os fluxos construídos devem refletir os fluxos internos de cada órgão, ou
seja, a atuação em rede não somente torna funcional o fluxo de atuação interinstitucional
na promoção e proteção de direitos da criança, mas também permite que a escuta
qualificada possa potencializar a gestão interna da ação de cada integrante do sistema
intersetorial.

Mensagem básica
Apesar de não ser tarefa fácil devido a uma série de contingências subjetivas e
culturais, além da forma como se organizou cartesianamente a sociedade, a articulação
intersetorial resgata a possibilidade de um olhar holístico pelos profissionais envolvidos e
proporciona diferentes formas de aprendizagem, construção do conhecimento e
integração das ações em rede, trazendo um salto de qualidade ao serviço.

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Ao buscar efetivamente a priorização do interesse da criança, o que se propõe
antes de tudo é favorecer o acesso dessa criança e de sua família aos serviços que
respondem à garantia de seus vários direitos, de forma coordenada, superando a
dificuldade sofrida pelos cidadãos de terem que buscar uma parte em cada lugar, em
diferentes setores, muitas vezes distantes, e, não raro, muitas vezes contraditórios entre
si.
Como o que é bom para a criança também traz benefícios para o todo, a integração
dos serviços também leva a melhores resultados, evita sobreposição de ações e reduz os
gastos públicos. Conclui-se, então, que a intersetorialidade é uma ação inteligente, que a
longo prazo facilita a vida dos profissionais e dos usuários.

Para saber mais:

• Guia para orientar ações intersetoriais na primeira infância. Disponível em:


http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/guia_acoes_intersetoriais_primeira_infan
cia.pdf
• A intersetorialidade na Visita Domiciliar do Programa Criança Feliz. Disponível em:
https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/crianca_feliz/A_intersetorialidade
_na_visita_domiciliar.pdf
• Portaria da Intersetorialidade no âmbito do Programa Criança Feliz.
• Guia para Elaboração do Plano Municipal pela Primeira Infância. Disponível em:
<http://primeirainfancia.org.br/wp-
content/uploads/2017/03/Guia_Plano_Municipal_Primeira_Infancia_RNPI.pdf>
• Primeira Infância Campineira: Cuidar para Desenvolver. Disponível em:
http://www.campinas.sp.gov.br/arquivos/comunicacao/pic-plano-municipal-pela-
primeira-infancia-campinas.pdf.Plano de Ação Familiar. Instituto Dara.

Referências bibliográficas

BRASIL, Lei 13.257 de 8 de março de 2016. Marco Legal da Primeira Infância.


BRASIL. Portaria Interministerial 1 de 4 de abril de 2018. Estabelece diretrizes, objetivos e
competências para a promoção da intersetorialidade no âmbito do Programa Criança Feliz.
Publicada no Diário Oficial da União Seção 1, pp. 170-171, em 6 de abril de 2018
SANICOLA, Lia. As dinâmicas de rede e o trabalho social. São Paulo: Veras, 2015.
SHONKOFF, J. P. Investindo na ciência para promover as bases da aprendizagem, do
comportamento e da saúde ao longo da vida. In: Avanços do Marco Legal da Primeira Infância.
2016. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/a-
camara/estruturaadm/altosestudos/pdf/obra-avancos-do-marco-legal-da-primeira-infancia>.
Acesso em 7 out. 2020.

284

285
Aula 12: O desafio da Interseccionalidade:
marcadores de gênero, de deficiência, de renda e
étnico-racial no agravamento da vulnerabilidade da
primeira infância
Interseccionalidade é um conceito que nos permite discutir as consequências
estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos, e suas implicações na vida
dos sujeitos, na construção da identidade e nas formas de tratamento pela sociedade, pelas
políticas públicas e pelo sistema de justiça e de garantia de direitos. No campo da primeira
infância, isso nos permite compreender como as posições subjetivas e identitárias das
crianças são produto das relações estabelecidas a partir de determinadas categorias,
como:
✓ povos e comunidades tradicionais,
✓ raça,
✓ sexualidade/gênero,
✓ geração,
✓ deficiência,
✓ classe e
✓ escolaridade dos pais.

Desse modo, podemos entender melhor as especificidades das experiências das


crianças e de seus grupos de pertencimento em cada uma destas categorias e na interação
entre elas. Infelizmente, essas categorias representam campos estruturantes de
opressões sociais que atingem determinadas crianças da primeira infância e seu direito ao
desenvolvimento humano integral.
Por outro lado, a interseccionalidade também permite compreender as múltiplas
(primeiras) infâncias que são concebidas e socializadas com base na articulação destes
marcadores e que desestabilizam a noção universal e idealista de (primeira) infância
moderna, incluindo os campos de atendimento institucional e regulamentação jurídica.
O Brasil é um país muito rico em diversidade cultural, sendo imprescindível
avançarmos na produção de conhecimento e no debate com o Sistema de Garantia de
Direitos sobre os caminhos para garantir o respeito à pluralidade no tratamento das
crianças, tendo por eixo central o reconhecimento das várias infâncias presentes no
território nacional. Isso significa considerar:

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1. A compreensão de que existem múltiplas formas de se conceber e vivenciar
a(s) infância(s), sempre de forma interseccional.
2. A consciência de que o reconhecimento das diferenças está relacionado ao
reconhecimento do direito à diferença – normatizado no Brasil e em âmbito
internacional em diversos documentos jurídicos – cuja finalidade é obrigar
a adequação dos serviços e o tratamento igualitário por parte da sociedade
e do Estado.
3. A importância de trabalhar as diferentes expressões sociais do ser criança,
com atenção às injustiças históricas geradoras de iniquidades que as
afetam e presentes no próprio atendimento dos órgãos da rede de proteção,
produzindo diferentes facetas da violência institucional, que têm no seu
âmago a dificuldade de lidar com as diversidades.
Há muitos elementos sociais, teóricos, normativos e institucionais necessários para
a compreensão das primeiras infâncias desde uma perspectiva interseccional até suas
implicações para as políticas públicas de atendimento às crianças. Um percurso formativo
nesta área deve abranger: concepção teórico-prática da interseccionalidade e de suas
implicações para a primeira infância; história social das infâncias plurais e suas
invisibilizações nos direitos das crianças; crianças de povos e comunidades tradicionais e
as perspectivas para o atendimento culturalmente adequado às primeiras infâncias;
racismo, negritude e suas implicações para as políticas públicas; implicações da igualdade
de gênero e da sexualidade nas políticas da primeira infância; o debate da acessibilidade e
da inclusão social de crianças com deficiência; e os desafios do atendimento interseccional
da primeira infância. Neste sentido, disponibilizamos trabalhos científicos para maior
aprofundamento sobre esta importante realidade, caso seja de seu interesse:

• Vivências de crianças ribeirinhas da Amazônia e seu processo de humanização na


creche. Disponível em:
http://www.ufopa.edu.br/ppge/images/dissertacoes/turma_2016/JEYSE_ALMEIDA.
pdf
• Infância Calin: Socialização Étnica e Identidade Social entre Crianças Ciganas.
Disponível em:

286

287
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-
98932019000500310
• O trabalho familiar extrativista sob a influência de políticas públicas.
Disponível em:
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
20032014000600010
• O contexto das brincadeiras das crianças ribeirinhas da Ilha do Combu.
Disponível em:
https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
79722008000300005&lng=en&nrm=iso&tlng=pt#:~:text=As%20atividades%20das
%20crian%C3%A7as%20ribeirinha,lazer%20e%20nas%20atividades%20religiosas.
• Primeira Infância Ribeirinha.
Disponível em:
https://idis.org.br/wp-content/uploads/2016/05/publi-Primeira-Infancia-
Ribeirinha.pdf

Um desafio para a compreensão das diferenças

Ainda não temos no Brasil dados sistematizados sobre as interseccionalidades da


infância e, por conseguinte, da primeira infância nesta interface. Tomando por exemplo a
população indígena, um ponto de partida é o Censo de 2010, que contabilizou que a
população indígena brasileira é de aproximadamente 900 mil pessoas, sendo mais de 300
povos, falantes de 274 línguas diferentes, dos quais cerca de 40% são indígenas crianças e
jovens, e mais de 50% da população indígena vive na cidade, ainda sofrendo preconceito.

Para saber mais sobre as particularidades dos indígenas:

VÍDEOS 33 a 36
Garantia de direitos das crianças indígenas: https://youtu.be/CS1jDG7KWYo
Campanha da Funai – Abril Indígena 2017: https://youtu.be/cqmTMFIsp7w
#Menos preconceito, mais índio – https://youtu.be/uuzTSTmIaUc
Pisa Ligeiro https://www.youtube.com/watch?v=FseTLA9D4jg

287

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Conhecer é muito importante para cuidar e endereçar as políticas públicas de
direito. Neste sentido, esforços também têm sido feitos para dar maior visibilidade às
crianças romani (assim chamadas as crianças ciganas). Neste caso, nunca houve um Censo
que respeitasse essa identidade étnica, por isso os únicos dados existentes são relativos à
primeira infância cadastrada no CadÚnico, sendo assim bastante subdimensionado,
refletindo que é necessário elaborar marcadores para aprimorar as políticas e ampliar a
busca ativa.
Até agosto de 2020, os dados do CadÚnico apresentavam 1.550 meninas e 1.760
meninos com idade de 0 a 6 anos nos registros. Os estados com maior nascimento são
Bahia, Minas Gerais e Goiás. Já os estados do Acre, Amapá, Mato Grosso e Roraima não
apresentam cadastro de crianças “ciganas” nessa faixa etária.
Quando enfrentamos esse desafio na prática, vemos que, além de serem
interseccionais, alguns desses marcadores sociais são indissociáveis, como é o caso de
gênero, etnia e classe.
Isso significa que, ao olhar para cada criança precisamos de fato considerar a
combinação de fatores, como o pertencimento a uma determinada classe social, agregado
a seu lugar de moradia e vivência, suas culturas, sua condição econômica e gênero para
compreensão da realidade vivenciada. Como esses marcadores podem determinar
desigualdades, que serão a base da vida dessas infâncias?

Para saber mais:


Em busca da visibilização da diversidade das infâncias:
https://www.instagram.com/amorasbr/

Trata-se de respeitar e conhecer as diferenças e as especificidades, para que se


tenha condição de elaborar iniciativas estratégicas de inclusão concretas, sustentáveis e
dignas. Esta questão é reconhecida no Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016),
que indica como um dos princípios e diretrizes para a elaboração e execução das políticas
públicas voltadas ao atendimento dos direitos da criança na primeira infância:

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Art. 4º. III – respeitar a individualidade e os ritmos de desenvolvimento
das crianças e valorizar a diversidade da infância brasileira, assim
como as diferenças entre as crianças em seus contextos sociais e
culturais.

Quando compreendemos a forma como as diferenças entre as pessoas e as


relações sociais são construídas, direcionamos nosso olhar para as desigualdades com a
lente dos valores de equidade.

Saiba mais:

http://www.escoladeconselhospe.com.br/site/escolinha-de-conselhos-de-pernambuco/

http://www.escoladeconselhospe.com.br/site/plano-decenal-comissao-e-cronograma-
principios-e-diretrizes-marcos-conceitual-legal-e-situacional/

http://www.escoladeconselhospe.com.br/site/plano-decenal-plano-de-acao-
acompanhamento-monitoramento-e-avaliacao/

Mensagem básica:

Estudar os marcadores sociais de diferença é compreender como, na primeira infância,


uma mesma criança pode sofrer duas, três ou mais vezes com desigualdades e
preconceitos pelo simples fato de ser menina, pertencer a um recorte étnico-racial
específico (como ser do Povo Romani, os assim chamados ciganos) e pertencer a uma
classe social marcada pela pobreza – como um exemplo do cotidiano de milhares de
meninas no Brasil. Assim, para que a inclusão seja efetiva em qualquer Estado/Nação, é
fundamental que os olhares sejam interseccionais, e as análises e estratégias de
atendimento respeitem as diferenças.

VÍDEO 37

Para exemplificar essa questão, vejamos a experiência infantil expressa nessa campanha
feita na Espanha em 2015 e replicada no Brasil em 2016. #NoSoyTrapacero
#NãoSouTrapaceiro: https://www.youtube.com/watch?v=uvE9DGHXEsY

289

290
Avanço regulatório para o respeito às diferentes infâncias

Em 2016, o Conanda aprovou a Resolução 181/2016, que "Dispõe sobre os


parâmetros para interpretação dos direitos e adequação dos serviços relacionados ao
atendimento de Crianças e Adolescentes pertencentes a Povos e Comunidades
Tradicionais no Brasil". Este instrumento representa um começo efetivo para garantir que
o Sistema de Garantia de Direitos tenha o olhar e a escuta necessários para cada criança e
suas diferenças culturais.

http://amsk.org.br/imagem/dialogos/AMSK-Cartilha-Dialogos.pdf

http://amsk.org.br/imagem/dialogos/AMSK-Relatorio-Dialogos2019.pdf

Em relação às crianças indígenas, desde 1988 o Brasil entende que é dever do


Estado, da sociedade e da família promover e zelar pelos direitos das pessoas indígenas,
especialmente das crianças. Neste campo, destaca-se a atribuição da FUNAI, destacando-
se a Instrução Normativa nº 1, de 13 de maio de 2016.

A atuação da Funai junto à rede de proteção da infância

Quem é a Funai?

290

291
A Fundação Nacional do Índio – Funai é o órgão federal responsável pela política
indigenista. Criada por meio da Lei nº 5.371, de 5 de dezembro de 1967, vinculada ao
Ministério da Justiça, é a coordenadora e principal executora da política indigenista do
Governo Federal, bem como o órgão de referência para a qualificação de políticas
públicas. Sua missão institucional é proteger e promover os direitos dos povos indígenas
no Brasil. A atuação da Funai orienta-se pelo o reconhecimento da organização social,
do direito originário, costumes, línguas, crenças e tradições dos povos indígenas.
Para saber mais: acesse o link: http://www.funai.gov.br/

Instrução Normativa nº 1 , de 13 de maio de 2016


As políticas públicas, especificamente a proteção e promoção dos direitos das
crianças indígenas, são de responsabilidade de todo o Estado brasileiro. A atuação da
Funai consiste em qualificar as políticas públicas, organizar e sistematizar dados sobre
os povos indígenas, e articular as políticas nos âmbitos intra e interinstitucionais, além
de contribuir com a identificação de processos de vulnerabilidade e discriminação dos
povos indígenas.
A intervenção da Funai em processos de colocação de crianças e jovens
indígenas em família substituta e medidas de acolhimento, suspensão e destituição de
poder familiar é obrigatória por força dos arts. 28, §6º, III e 157, §2º do ECA e ocorre
com equipe multidisciplinar. A Funai atua na figura de um(a) servidor(a) do quadro, que
acompanha e contribui para o entendimento e o atendimento da legislação indigenista,
quando da formulação dos procedimentos que se fizerem necessários para a garantia
dos direitos das crianças indígenas e para a análise do cenário, realizando relatórios e
estudos com a equipe multidisciplinar, buscando viabilizar o direito às convivências
familiar e comunitária da criança com seu povo, e deve acompanhar e participar dos
estudos com a família que está na cidade e sua comunidade. Nesse sentido,
recomendamos a leitura da Resolução Nº 181, de 10 de novembro de 2016, que "Dispõe
sobre os parâmetros para interpretação dos direitos e adequação dos serviços
relacionados ao atendimento de Crianças e Adolescentes pertencentes a Povos e
Comunidades Tradicionais no Brasil".
Conforme o ECA, a realização de relatório antropológico é uma ferramenta
indispensável para subsidiar as decisões em juízo e possibilitar a dissolução de eventuais

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equívocos culturais. Também é importante pontuar que em algumas situações pode ser
necessária a participação de intérpretes, com o objetivo de viabilizar os processos de
tradução e proporcionar devidamente compreensão e participação da pessoa indígena.
O Ministério Público é a instituição responsável por fiscalizar o cumprimento e a
garantia dos direitos indígenas.
Atenção para algumas situações
A Funai editou a Instrução Normativa nº 1 de 13 de maio de 2016, voltada à
promoção e proteção dos direitos de crianças e jovens indígenas. Esse normativo tem
como princípios básicos a promoção do direito às convivências familiar e comunitária, e
a proteção de crianças e jovens indígenas em circunstância de iminente ou consumado
afastamento do convívio familiar ou comunitário, e de violação aos direitos garantidos.
Assim, é preciso buscar por meio da atuação dos Conselhos Tutelares e da Funai,
garantir que crianças ou jovens indígenas nessas circunstâncias sejam imediatamente
reinseridas em suas famílias e na sua comunidade, caso haja essa possibilidade, sempre
levando em conta o paradigma da proteção integral, o fortalecimento dos vínculos
familiares e comunitários, e o superior interesse da criança, preconizados pelo Estatuto
da Criança e do Adolescente e originalmente pelo texto da Convenção Internacional das
Nações Unidas Sobre os Direitos da Criança.
Em casos de efetiva necessidade de afastamento da criança do convívio com
seus pais, a rede de proteção deve optar pelo acolhimento emergencial, que deve se dar
na mesma família nuclear, extensa, parentela, comunidade, povo ou terra indígena,
constituindo-se em uma ação que visa fortalecer a identidade sociocultural específica
da criança ou do jovem em relação ao pertencimento ao seu povo, de modo a preservar
as práticas tradicionais de proteção e cuidado, para que não haja rompimento de seus
vínculos étnicos, comunitários e tradicionais. O que se busca é que, antes de ser retirada
do cotidiano na aldeia, sejam esgotadas todas as demais possibilidades, analisando a
possibilidade de inserção da criança em seu núcleo familiar, por avós ou tios, ou em uma
família acolhedora. A infância longe de casa se torna ainda mais complexa quando se
trata de crianças indígenas, devido ao rompimento com seu modo de vida, seu
pertencimento e sua língua.

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Para saber mais:

VÍDEOS 38 e 39
O Abraço da
Serpente:https://www.youtube.com/watch?v=xD96yLs4fsE&has_verified=1
Índio Cidadão?: https://www.youtube.com/watch?v=Ti1q9-eWtc8

Ainda em relação às crianças indígenas, o Estatuto da Criança e do Adolescente se


apresenta como a mais relevante legislação de proteção e garantia das prerrogativas das
crianças indígenas, suas famílias e suas comunidades (Resolução CONANDA nº 91 de
23/06/2003). Destacamos também a Convenção dos Direitos das Crianças (CDC), de 1989,
e a Convenção 169, da OIT, que determinam, no caso do Estado brasileiro, o
aprimoramento de sua relação com os povos indígenas e com as crianças. Tanto a CDC
quanto a Convenção 169-OIT preveem que os estados signatários, inclusive o Brasil,
comprometam-se a garantir a proteção integral e especial às crianças indígenas.
As convivências familiar e comunitária são fundamentais para o desenvolvimento
da indígena criança e do jovem, o qual não pode ser concebido de forma dissociada de sua
família e do contexto sociocultural. Especificamente no Marco Legal da Primeira Infância,
que determina que as políticas públicas voltadas para o atendimento dos direitos da
criança na primeira infância, deve ser observado o respeito à individualidade e aos ritmos
de desenvolvimento das crianças, a valorização da diversidade da infância brasileira e a
compreensão de que existem dinâmicas familiares e comunitárias próprias que não podem
ser criminalizadas ou confundidas com vulnerabilização. Assim, para uma melhor
compreensão dessas diferenças de contextos socioculturais, a prática do diálogo e as
aproximações entre a comunidade local e as comunidades indígenas despontam como o
caminho mais adequado.

Para saber mais:

VÍDEOS 40 a 42
Filme-Bicicletas de Nhanderú: https://www.youtube.com/watch?v=edKtJmY65wM
O que as crianças aprendem ficando presas?: https://lunetas.com.br/ailton-krenak/

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Das crianças Ikpeng para o mundo: https://www.youtube.com/watch?v=MNIeHjdfvJg

Em relação ao marcador deficiência, avanços legislativos, como a Lei nº13.146, de


6 de julho de 2015, contribuem para o reconhecimento das crianças com deficiência como
titulares de direitos, indicando os responsáveis pelo desenvolvimento integral do cuidado
e a promoção da qualidade de vida das crianças com deficiências e suas famílias.

A condição de ser criança com deficiência na primeira infância e vivendo em


cotidiano de pobreza muitas vezes a expõe a situações desumanas que podem
comprometer diretamente o seu desenvolvimento, devido a ausência de um diagnóstico
precoce, falta de estímulo, falta de acesso às políticas públicas ou mesmo interrupção de
um tratamento adequado.
O processo de aceitação e convivência das crianças com deficiência na
sociedade é tarefa de todos e deve ser maximizado por meio de redes de apoio na
comunidade. Portanto, é na primeira infância que se oportuniza o fortalecimento
da cultura inclusiva, utilizando recursos acessíveis que respeitem suas
especificidades e as reconheçam em suas múltiplas deficiências como condição
inerente à diversidade humana.

Para saber mais:


Boa prática para atenção às crianças com deficiência – Projeto Rede de Inclusão:
https://www.unicef.org/brazil/media/1116/file/Redes_de_Inclusao.pdf

O Marco Legal da Primeira Infância, em seus artigos 11, 18, 21 e 41, também
representa um importante respaldo para criar programas, serviços e iniciativas que
promovam o desenvolvimento infantil de crianças com deficiência pertencentes a
comunidades indígenas, quilombolas, migrantes, refugiadas, ribeirinhas, romani, dentre
outras.

Paternidades pretas em pauta – Desafios e perspectivas


por Luciano Ramos

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“É muito difícil ser pai preto, pois além de todos os desafios que um pai encontra
normalmente, eu ainda preciso educar meus filhos para conviverem com o
racismo.” (relato de um pai participante de uma oficina sobre Paternidades e Cuidado em
2019)
Eu me pego aqui olhando para Laura (minha filha de 5 meses) e pensando que muitos
homens pretos não terão a possibilidade de serem pais. Entendo que eu sou privilegiado.
Um privilégio ameaçado a cada minuto, pois sou um homem preto. A cada 23 minutos
uma criança preta fica sem pai ou a cada 23 minutos um homem jovem negro não se
tornará pai, de acordo com o Mapa da Violência de 2017. Se o homem preto sobrevive
para paternar, ele tem outros desafios para vivenciar esta paternidade como, por
exemplo, ser obrigado a criar um repertório maior comparado aos pais brancos para
empoderar seus filhos e suas filhas para se desenvolverem numa sociedade que se
relaciona pautada no racismo.
O racismo estrutural não permite ao homem preto exercer a paternidade pelo fato dele
ter sido sequestrado para o ocidente para ser somente uma força de trabalho
escravizada. Não é fácil.

Mensagem básica:

Respeitar as diferenças é construir pontes e garantir que nenhuma criança fique para trás.
O desconhecimento gera o preconceito que alimenta a discriminação.

Sabia mais:

http://www.escoladeconselhospe.com.br/site/category/publicacoes/

http://www.movimentodeemaus.org/

https://radiomargarida.org.br/

https://www.unipop.org.br/

http://www.propaz.pa.gov.br/

OAB/PA:

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https://www.facebook.com/comissao.dca

https://www.instagram.com/comissaodca.oab/?utm_source=ig_profile_share&igshid=1j1
e56ccssg2r

https://www.facebook.com/saudeealegria/

Referências Bibliográficas:

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boneca? 35 fls. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Faculdades do Centro do Paraná,
Pitanga, Paraná, 2019.

BERNARDES, Liliane Cristina Gonçalves; ARAÚJO, Tereza Cristina Cavalcanti Ferreira de.
Deficiência, políticas públicas e bioética: percepção de gestores públicos e conselheiros de direitos.
Revista Ciência & Saúde Coletiva, p. 2435-2445, jul. 2011.

CARIAGA, Diógenes Egídio; NASCIMENTO, Silvania Jesus do; PEREIRA, Levi Marques. Os
problemas nos direitos: os efeitos da extensão das políticas de direitos da criança e adolescente
entre os Kaiowá e Guarani. R@U, v. 11, n. 1, p. 282-307, jan./jun. 2019.

COHN, Clarice. Antropologia da criança. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.

FELIPE, Jane. Infância, gênero e sexualidade. Revista Educação e Realidade, v. 25, n. 1, p. 115-131,
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MARCHI, Rita de Cássia. Gênero, infância e relações de poder: interrogações epistemológicas.


Cadernos Pagu, v. 37, p. 387-406, jul./dez. 2011.

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In: UNGARETTI, Maria América (org.). Criança e adolescente: direitos, sexualidades e reprodução.
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2015.OLIVEIRA, Assis da Costa. Indígenas Crianças, Crianças Indígenas: perspectivas para a
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OLIVEIRA, Assis da Costa. Por proteção integral, diversidade e enfrentamento às violências: rumo
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