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RESENHA ANALITICA DO MODULO III: Remoções no Brasil e nos Estados Unidos:

análises de um fenômeno do capitalismo racial global.


Disciplina: Tópicos Especiais: Fragmentação Socioespacial e Urbanização
Contemporânea;
Prof(a) Dra. Maria Encarnação B. Sposito (UNESP)
Prof° do Módulo III: Prof° Dr° Patrícia de Toledo Basile (Professora da Indiana
University – Estados Unidos)
Aluno: Jeferson Cordeiro Vieira (UFGD/FCH), orientado pela Prof° Dr° Maria José
Martinelli Silva Calixto (UFGD/FCH).

DESFECHO CRUEL - RODOLFO GOMES, TOINHO MELODIA,


RICARDINHO OLARIA – LETRA DA MÚSICA.

Esse fogo que vocês veem por aí a fora nas favelas do Brasil não é por causa da gambiarra
Nem por causa do gato, nem tão pouco por causa do botijão. É pura especulação.
E quando o bombeiro chega
O fogo já está consumado

É fogo
A vida de toda essa gente
Pra viver honestamente
Sol a sol a labutar

Mas ontem
Quando voltei do batente
Na favela queimava inclemente

O barraco que outrora já fora o meu lar

Meu olhar transbordou


Na esperança do fogo apagar
Meu peito calou
Sem lágrimas pra derramar

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Meu olhar transbordou
Na esperança do fogo apagar
Meu peito calou
Sem lágrimas pra derramar

Vou morando no sapato


Onde a faisca pode se ascender
Porque nunca bebi da bebida
Daqueles que estão no poder

É ver pra crer


O despejo é um destino cruel
Favela queimando
Para construir mais um arranhacéu

É enquanto os ratos
Invadem as casa de terno e gravata maleta na mão
Prometendo o que é de Deus pra quem não pode beber

É fogo que queima e arde sem explicação


Nem sei por quê
Mas o foco de incêndio
Deu no rádio e na TV

É fogo que queima e arde sem explicação


Nem sei por quê
Mas o foco de incêndio
Deu no rádio e na TV

(Letra da Música de DESFECHO CRUEL (Rodolfo Gomes, Toinho Melodia, Ricardinho
Olaria, Estúdio Lua (São Paulo-SP) em novembro de 2013, letra disponível no link do
youtube

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https://www.youtube.com/watch?v=VPIuSb7Qp_g&list=RDGMEMFDHdtbQF5jLxlUZ
MleBN_wVMVPIuSb7Qp_g&start_radio=1 )

Começo com uma letra de uma música que em todos os sentidos deve ser
entendida como uma denúncia, um clamor, as pessoas morrem todos os dias nas cidades
e o assassino é o capital, a letra da música, denuncia, a situação precária em que as pessoas
(negras, pobres, indígenas, minorias) forçadas a viver, expulsas para os morros, para as
várzeas, para os rios, para os lixões, empurradas pela especulação imobiliária, que gera a
cidade que a muito tem ceifados os destinos daqueles que tentam honestamente viver e
que a qualquer momento perdem suas casas, suas próprias vidas e de seus entes queridos
a violência, a desabamentos, enchentes (inundações) e ao fogo.

A apresentação da professora Patrícia, foi bastante construtiva no sentindo de


trazer novos conceitos, alguns desconhecidos ou pouco estudados (ou em fase de
estudos), que nos levam a pensar de forma desconstrutiva o país mais rico do mundo, os
Estados Unidos da América, e como a moradia financeirizada, leva milhões de pessoas a
um processo de continuo movimento (remoções) geradas por endividamentos (causados
por inúmeros fatores econômicos e sociais) que principalmente afetam um grupo social
que historicamente nos Estados Unidos marginalizados, e que sofrem os efeitos até hoje
do processo de escravidão e apartheid social, os negros (as mulheres negras) e os
extrangeiros.

As semelhanças e as diferenças no processo de escravidão e de apartheid social,


nos Estados Unidos e no Brasil, são parte fundamental para entender como estes grupos
vão ser inseridos e/ou não na sociedade. No Brasil os processos de remoção são antigos
e vieram revestidos sob projetos higienistas promovidos pelo Estado Brasileiro, como
aconteceu no estado do Rio de Janeiro em São Paulo nos séculos passados e que
continuam acontecendo em várias partes do país com novas vestes, mas que resultam no
continuado processo de fragmentação urbana, gerando uma cidade cada vez mais desigual
(e porque não racista), que segrega classes (raças).

Deveria ser de conhecimento comum o processo de escravidão pelo qual nosso


país passou sendo o último a decretar seu fim e que este “simples” decreto (lei), não
acabou com a escravidão e muito menos veio acompanhada de outras políticas que fora
reconhecerem o seu papel nefasto (“genocida”), tentasse inserir esses sujeitos na
sociedade, seja em moradia ou trabalho digno, seja em outras formas de políticas públicas,

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ou seja, não houve nada, os negros (e indígenas) libertos da escravidão estavam por conta
própria em uma sociedade estruturalmente racista, e muitos desses foram para as cidades.

No Rio de Janeiro e em São Paulo, houve remoções, que se diziam higienistas,


visto as epidemias pelas quais o Brasil havia passado, mas que tinham como principal
objetivo remover as populações pobres (negras) que viviam em áreas centrais, num
processo de “revitalização” desses centros, com construção de amplas avenidas e casarões
e que atendiam a interesses de classes políticas (ricas e brancas) de dentro e de fora do
país e que viam nestas cidades, essas populações como um obstáculo ao seu
desenvolvimento, tais remoções geraram ocupações destes grupos em áreas que são
distantes dos centros, em áreas periféricas, pouco valorizadas (em morros, como no caso
do Rio e em áreas de rios e várzeas em São Paulo).

No tocante essas remoções ao longo do tempo foram tomando novas formas e


complexidades, principalmente associadas a interesses cada vez mais capitalistas
(financeiros) e se escamotearam sob novas formas, assim como a Dr°(a) Patrícia trouxe,
sobre como as revitalizações, reformas, em prédios (a partir ou não da troca da venda do
mesmo para outros incorporadoras) ou pelo poder público que instala serviços e
infraestruturas em determinados lugares (principalmente atrelado a interesses privados)
encarecendo o valor da terra nestes lugares (os aluguéis) e causando movimentações
(remoções “indiretas”) que deslocam as populações mais carentes para outras áreas,
muitas vezes mais distantes ainda dos centros.

A interferência dos agentes econômicos no poder público afeta onde e como as


infraestruturas e os serviços vão ser instalados na cidade, o que muitas vezes beneficia
certas áreas de uma cidade em relação a outras, outro fator em consideração é a própria
propriedade da terra urbana (seu uso na cidade dentro do sistema capitalista), que ligados
a múltiplos fatores geram processos fragmentadores (segregação socioespacial e
desigualdade).

O mais interessando dos aspectos ligados as remoções perpassa seu caráter racial
fundamentalmente imbricado com a própria estrutura (histórica) em que as sociedades
tanto estadunidenses quanto brasileiras se formaram, as semelhanças dos processos e suas
diferenças demonstram como a escravidão foi absorvida pelo capitalismo como um motor
para sua própria estrutura e funcionamento, ligado as diferenças de gênero na sociedade,
e aos processos da própria entranha do capitalismo, formam uma sopa que transforma a

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todo momento a sociedade, gerando espaços desiguais, que afetam principalmente esses
grupos marginalizados.

Retornando as remoções é bem evidente como essas diferenças raciais são


manifestadas na sociedade, mas que diferente dos Estados Unidos parecem assumir uma
características mais individual nos processos de remoção, bem diferentes dos processos
que acontecem no Brasil, atingindo bairros (ocupações “irregulares”) bem grandes,
parecendo ser bem raro os processos de remoções de pequenas propriedades,
apartamentos ou casas (lotes) (não que não aconteçam e nem que não sejam frequentes,
mas as noticias que chegam até nós são frequentemente grandes processos).

Referindo-me novamente a música que iniciou está resenha frequente assistirmos


a grandes incêndios em áreas “não regularizadas”, nas grandes cidades como São Paulo
e Rio de Janeiro, esses “acidentes”, podem esconder neles mesmo o processo de
fragmentação socioespacial, desigualdade e expulsão das pessoas para situações
desumanas de habitação, assim como nas palavras do músico “Esse fogo que vocês veem
por aí a fora nas favelas do Brasil não é por causa da gambiarra, nem por causa do gato,
nem tão pouco por causa do botijão. É pura especulação”.

Em suma, as cidades brasileiras, precisam de uma leitura que reconheça nelas o


processo de racismo estrutural (e de classes) que formaram os atuais problemas sociais
que atingem milhões. Foi também possível a partir dos discursões em sala (virtual)
expandir os conhecimentos de cidades grandes e do fenômeno capitalista nos Estados
Unidos e no Brasil, a partir das remoções, cada qual com suas particularidades, mas que
sempre apresentam nelas a forças locais de resistência, que pavoneiam nos EUA e ganham
sustância no Brasil e mesmo com tantas batalhas perdidas, a fé na construção de uma
cidade melhor parece sempre mais forte.

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