Você está na página 1de 13

See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.

net/publication/363770434

LITERATURA, INSÓLITO FICCIONAL E IMAGINÁRIO: relatos de pesquisas,


desafios e perspectiva

Article · June 2022

CITATIONS READS

0 7

3 authors, including:

Josenildo Brussio
Universidade Federal do Maranhão, Brasil, São Bernardo
41 PUBLICATIONS 4 CITATIONS

SEE PROFILE

All content following this page was uploaded by Josenildo Brussio on 23 September 2022.

The user has requested enhancement of the downloaded file.


LITERATURA, INSÓLITO
FICCIONAL E IMAGINÁRIO:
relatos de pesquisas, desafios e
perspectiva
Carlos Ribeiro CALDAS FILHO (PUC-Minas)1
Josenildo Campos BRUSSIO (UFMA)2

RESUMO

O presente texto apresenta relatos de pesquisas realizadas no campo da literatura do insólito


em suas múltiplas faces com o fantástico, o estranho, o maravilhoso, o horror, o suspense e
o ficcional. Trata-se de um artigo teórico-expositivo, de caráter descritivo-bibliográfico,
dividido em duas partes: na primeira, retratamos o plano teórico-conceitual sobre a
literatura do fantástico e do insólito ficcional nas discussões de de Tzvetan Todorov (2010),
Irène Bessière (2009) e Filipe Furtado (2009), sem refutar as contribuições de Ítalo Calvino
(2009), Flávio Garcia (2007), Remo Ceserani (2006), Marisa Gama-Khalil (2013), David Roas
(2014), entre outros; na segunda, realizamos uma síntese das principais propostas e
inovações teóricas e críticas sobre o campo do insólito ficcional apresentadas no simpósio
temático Literatura, Insólito Ficcional e Imaginário do I Colóquio Internacional de Teoria e
Crítica Literária e II Encontro Nacional de Literatura, Memória e Subjetividade:

1 Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), em seu Programa de
Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciências da Religião. Research Associate ("Pesquisador Associado")
do Departamento de Teologia e Religião da University of Pretoria (Universidade de Pretoria), África
do Sul. Líder do Grupo de Pesquisa GPPRA - Grupo de Pesquisa sobre Protestantismo, Religião e Arte
- certificado junto ao CNPq.
2 Professor Associado II do Curso de Licenciatura em Ciências Humanas/Sociologia do Centro de
Ciências de São Bernardo, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Professor colaborador do
Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGLetras-UEMA), da Universidade Estadual do Maranhão.
Líder do LEI (Laboratórios de Estudos do Imaginário) da UFMA/São Bernardo. E-mail:
josenildo.brussio@ufma.br.

9
Anais

deslocamentos e identidades, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Letras, da


Universidade Estadual do Maranhão, nos dias 08, 09 e 10 de junho de 2022. Como resultados,
temos que os relatos apresentados e discutidos no simpósio trazem desafios e novas
possibilidades para os estudos do fantástico e do insólito ficcional, que eclodem em novas
perspectivas, olhares inovadores, diálogos interdisciplinares e rupturas crítico-teórico-
epistemológicas.

Palavras-chave: Literatura, Insólito Ficcional e Imaginário.

ABSTRACT

The present text presents reports of research carried out in the field of literature of the
unusual in its multiple faces with the fantastic, the strange, the wonderful, the horror, the
suspense and the fictional. This is a theoretical-expository article, with a descriptive-
bibliographic character, divided into two parts: in the first, we portray the theoretical-
conceptual plan on the literature of the fantastic and the fictional unusual in the discussions
of de Tzvetan Todorov (2010), Irène Bessière (2009) and Filipe Furtado (2009), without
refuting the contributions of Ítalo Calvino (2009), Flávio Garcia (2007), Remo Ceserani
(2006), Marisa Gama-Khalil (2013), David Roas (2014), among others ; in the second, we
carry out a synthesis of the main theoretical and critical proposals and innovations about the
field of the fictional unusual presented at the thematic symposium Literature, Fictional and
Imaginary Unusual of the I International Colloquium of Literary Theory and Criticism and II
National Meeting of Literature, Memory and Subjectivity: displacements and identities,
promoted by the Postgraduate Program in Letters, of the State University of Maranhão, on
June 08, 09 and 10, 2022. As a result, we have that the reports presented and discussed at
the symposium bring challenges and new possibilities for the studies of the fantastic and the
fictional unusual, which emerge in new perspectives, innovative perspectives,
interdisciplinary dialogues and critical-theoretical-epistemological ruptures.

KEYWORDS: Literature, Unusual Fiction and Imaginary.

PROLEGÔMENOS (IN)SÓLITOS

A literatura fantástica é um campo de investigação que tem se destacado cada vez


mais nos estudos literários, dessa maneira, diversos caminhos têm sido delineados por
teóricos nacionais e internacionais. No presente estudo, destacaremos a linha do fantástico
enquanto gênero literário, do estranho e do maravilhoso, proposta por Todorov (2010) e a
linha que adota o fantástico como um modo literário, proposta por Irène Bessière (2009),
posteriormente entendida como ficção do meta-empírico, pelo pesquisador português Filipe
Furtado (2009).
No plano metodológico, trata-se de um artigo teórico-expositivo, de caráter
descritivo-bibliográfico, dividido em duas partes. Na primeira, retratamos o plano teórico-
conceitual sobre a literatura do fantástico e do insólito ficcional nas discussões de Tzvetan

10
Anais

Todorov (2010), Irène Bessière (2009) e Filipe Furtado (2009), sem refutar as contribuições
de Ítalo Calvino (2009), Flávio Garcia (2007), Remo Ceserani (2006), Marisa Gama-Khalil
(2013), David Roas (2014), entre outros.
Na segunda parte da pesquisa, realizamos uma síntese das principais propostas e
inovações teóricas e críticas sobre o campo do insólito ficcional apresentadas no simpósio
temático Literatura, Insólito Ficcional e Imaginário do I Colóquio Internacional de Teoria
e Crítica Literária e II Encontro Nacional de Literatura, Memória e Subjetividade:
deslocamentos e identidades, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Letras, da
Universidade Estadual do Maranhão, nos dias 08, 09 e 10 de junho de 2022.
Vale ressaltar que o presente texto não se propõe a apresentar uma proposta teórico-
metodológica inovadora para a literatura fantástica, tampouco uma nova sistematização
sobre os estudos do fantástico; outrora, demonstra as escolhas e caminhos teórico-
metodológicos dos autores para adentrar no labirinto (CALVINO, 2009) da literatura do
fantástico.
Dito isto, pretendemos fazer um convite ao mundo do maravilhoso, do estranho, do
insólito ficcional, do fantástico a partir da experiência do evento e dos relatos que trazemos
dos debates que têm sido travados em torno do tema na atualidade, com as suas diversas
vertentes teóricas a partir das abordagens tecidas nos últimos anos por pesquisadores
brasileiros e internacionais.

REVISÃO DE LITERATURA: o insólito ficcional

O cerne do presente estudo está constituído pelos conceitos sobre o fantástico do


teórico búlgaro Tzvetan Todorov, presentes na obra Introdução à literatura fantástica
(2010), pelos conceitos de Irène Bessière em seu artigo O relato fantástico: forma mista do
caso e da adivinha (2009); e pelo conceito de Fantástico (MODO) (2009), do crítico português
Filipe Furtado; além das contribuições de estudiosos como Ítalo Calvino (2009), Flávio
Garcia (2007), Remo Ceserani (2006), Marisa Gama-Khalil (2013), David Roas (2014), entre
outros.
Um passeio pela Introdução à Literatura Fantástica, de Tzvetan Todorov (2010) é um
percurso essencial para um mergulho reflexivo sobre as bases teóricas para a compreensão
da literatura fantástica. Rigoroso com a questão do método, o teórico búlgaro traduz a sua
preocupação com a escolha de um método científico que dê conta de observar o fenômeno

11
Anais

o fantástico e descrevê-lo, sem se preocupar com a quantidade de ocorrências ou dedução


de leis universais a partir desses fenômenos em obras literárias, mas com a coerência lógica
da teoria que lhe dê consistência.
Nesta esteira, Todorov (2010) visa descobrir regra que funcione através de
vários textos e nos permita lhes aplicar o nome de e não o que cada um
deles tem de Daí a escolha de Northrop Frye como base epistemológica e teórica
para pensar as questões complexas sobre as teorizações dos gêneros literários e apresentar
o seu plano de trabalho para a literatura fantástica.
Agora bem, como sabemos, a literatura existe em tanto esforço por dizer o que a
linguagem corrente não pode dizer. Por esta razão, a crítica (a melhor) tende sempre a
converter-se em literatura; só é possível falar do que faz a literatura fazendo literatura. A
literatura pode constituir-se e subsistir somente a partir desta diferença com a linguagem
corrente. A literatura enuncia o que só ela pode enunciar. Quando o crítico haja dito tudo
sobre um texto literário, não haverá ainda dito nada; pois a definição mesma da literatura
implica não poder falar dela (TODOROV, 2010, p. 14).
No exceto acima, Todorov (2010) ratifica a prolixidade em definir, categorizar,
classificar os gêneros literários, dada a amplitude das sistematizações, mas admite que só é
possível se fazer uma crítica à literatura Segundo Calvino (2014),
como for, todas as e as só podem tomar forma através da escrita, na
qual exterioridade e interioridade, mundo e ego, experiência e fantasia aparecem compostos
pela mesma matéria (p. 84).
Definir o fantástico não é tarefa fácil, primeiro porque o desafio se intensifica quando
se pretende compreender o que se entende por que para Todorov (2010),
se trata de uma ilusão dos sentidos, de um produto de imaginação, e as leis do mundo
seguem sendo o que são, ou o acontecimento se produziu realmente, é parte integrante da
realidade, e então esta realidade está regida por leis que (p. 15).
Seguindo essa linha, Filipe Furtado (2009) afirma que o sobrenatural se caracteriza
pela impossibilidade de comprovar de modo universalmente válido a sua existência no
mundo conhecido. Para o italiano Remo Ceserani (2006), assim como para Furtado (2009),
os elementos sobrenaturais são na narrativa fantástica uma de suas características mais
expressivas, isso porque dela surge com mais ou menos intensidade a relação e o
envolvimento do leitor com a história.

12
Anais

Todorov (2010) aponta que, desde o século XIX, o tema já havia sido tratado por
diversos autores e correntes (francesa, alemã, inglesa), e destaca as iniciativas do filósofo e
místico russo Vladimir Soloviov que define o fantástico como fenômeno estranho que
pode ser explicado de duas maneiras, por tipos de causas naturais e sobrenaturais. A
possibilidade de vacilar entre ambas cria o efeito (p. 16) e pelo autor inglês
especializado em histórias de fantasmas, Montague Rhodes James, como porta de saída
para uma explicação natural, , mas teria que adicionar que esta porta deve ser o bastante
estreita como para que não possa ser (p. 16), além da concepção alemã de Olga
Reimann que afirma: herói sente em forma contínua e perceptível a contradição entre os
dois mundos, o do real e o do fantástico, e ele mesmo se assombra ante as coisas
extraordinárias que o (idem).
Para o teórico búlgaro, o fantástico caracteriza-se pela hesitação, vacilação comum ao
leitor e ao personagem, que devem decidir se o que percebem provém ou não da
Dessa maneira, o gênero fantástico que ser um gênero autônomo, parece situar-se no
limite de dois gêneros: o maravilhoso e o (TODOROV, 2010, p. 24), resultando em
novos subgêneros literários como o fantástico-maravilhoso e o fantástico-estranho.
Apesar da densidade dos argumentos de Todorov para uma teoria do gênero
fantástico, há autores que versam outra linha de pensamento, como Filipe Furtado (2009),
David Roas (2014) e Irène Bessière (2009).
Filipe Furtado (2009) postula o meta-empírico como um modo que abarca uma
heterogeneidade de textos e gêneros por intermédio de um fator que lhes é comum: o
sobrenatural, integrando o conto de fadas, o gótico, o maravilhoso, o estranho, a ficção
científica e outras modalidades e o insólito ficcional. Neste ponto, opõe-se a Todorov
ampliando o entendimento do que vem a ser o campo da ficção insólita que pode abranger
tanto o sobrenatural outras que, não o sendo, também podem parecer insólitas e,
eventualmente, (FURTADO, 2009, p. 2). Para o teórico português, elas,
com efeito, partilham um traço comum: o de se manterem inexplicáveis na época de
produção do texto devido a insuficiência de meios de percepção, a desconhecimento dos seus
princípios ordenadores ou a não terem, afinal, existência (idem).
Gama-Khalil (2013) observa que, para os dois teóricos, Todorov e Furtado,
fantástico, ocorre a permanência da hesitação/ambiguidade. Portanto, mesmo contrariando
a visão todoroviana de hesitação, Furtado chega a conclusões muitíssimo similares a
(GAMA-KHALIL, 2013, p. 23). E continua: diferença que ele estabelece é a de que a

13
Anais

permanência da ambiguidade é uma questão interna à narrativa, ao passo que, para Todorov,
a hesitação estaria também condicionada à recepção do acontecimento insólito (GAMA-
KHALIL, 2013, p. 24).
O escritor e crítico literário David Roas também discorda de Todorov sobre o critério
basilar da hesitação como caracterização do fantástico. Para o teórico espanhol, se trata
simplesmente de introduzir um elemento impossível (sobrenatural) em mundo parecido ao
(ROAS, 2014, p. 97), mas provocar no receptor o escândalo racional da
possibilidade de que suas convicções sobre a realidade deixem de (idem).
Para Roas (2014), o fantástico causa uma transgressão da realidade, ele atua entre
irrompendo os limites das fronteiras do intransponível, provocando o estranhamento do
real, consequentemente, desencadeando o ameaçador, o incompreensível, o medo, a
inquietude, por fim, essa ameaça, essa transgressão se traduz no efeito fundamental do
fantástico.
Outra perspectiva crítica a obra todoroviana é apresentada pela pesquisadora Irène
Bessière, que propõe o fantástico como um modo literário, e não um gênero. Para a teórica
francesa, o fantástico não é senão um dos métodos da imaginação, cuja fenomenologia
semântica se relaciona tanto com a mitografia quanto com o religioso e a psicologia normal
e patológica, e que, a partir disso, não se distingue daquelas manifestações aberrantes do
imaginário ou de suas expressões codificadas na tradição popular. O fantástico pode ser
assim tratado como a descrição de certas atitudes (BESSIÈRE, 2009, p. 186).
Como se vê, para Bessière, o fantástico não define uma qualidade atual de objetos ou
de seres existentes, nem constitui uma categoria ou um gênero literário, mas supõe uma
lógica narrativa que é tanto formal quanto temática e que, surpreendente ou arbitrária para
o leitor, reflete, sob o jogo aparente da invenção pura, as metamorfoses culturais da razão e
do imaginário coletivo (2009, p. 186).
Apesar do engessamento genológico de Todorov em relação ao fantástico, de maneira
que a simples alteração na construção narrativa pode mudar o gênero que se realiza; para
Bessière, a simples manifestação do insólito e da incerteza na narrativa garantem a
realização do fantástico. Mesmo discordando neste ponto, ambas as teorias (Todorov e
Bessière) têm em comum o insólito, pois é necessária a manifestação, no plano narrativo, de
algo que fuja às regras convencionais da racionalidade própria do senso comum (GARCIA,
2011).

14
Anais

No Brasil, merece destaque, a trajetória desenvolvida pelo pesquisador fluminense


Flávio Garcia frente ao Seminário Permanente de Estudos Literários, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (SePEL.UERJ), que iniciou em 2007, na Faculdade de Formação de
Professores de São Gonçalo (campus da UERJ), com os Painéis Reflexões sobre o insólito na
narrativa ficcional, atividades acadêmicas que resultaram na promoção de grandes eventos
nacionais e internacionais em torno do tema como os Encontros Nacionais O Insólito como
Questão na Narrativa Ficcional, surgidos em 2009, no Instituto de Letras (ILE) da UERJ, e o I
Congresso Internacional Vertentes do Insólito Ficcional, cuja segunda edição se deu em 2014,
igualmente com pesquisadores de diferentes universidades brasileiras, portuguesas e
estrangeiras.
Em 2011, grupos de pesquisa certificados junto ao Diretório de Grupos do CNPq e
pesquisadores isolados, representando seus programas de pós-graduação e dando
visibilidade aos projetos individuais, reuniram-se para criar, junto à ANPOLL, o Grupo de
Trabalho do Insólito que, tendo por objeto o conforme a
perspectiva teórica adotada e segundo as tendências da tradição crítica, congraça estudos
acerca das diferentes vertentes do fantástico, que podem ser identificados nos seguintes
modos, gêneros ou subgêneros: Fantástico, Maravilhoso, Estranho, Sobrenatural, Absurdo,
Realismo-Fantástico, Realismo-Mágico, Realismo-Maravilhoso, Realismo-Animista, Ficção
Científica, Romance Policial, Romance de Mistério, Horror, Terror, Pavor (GARCIA, 2015, p.
9).
Outro guia de estudos para os temas do fantástico é a obra A literatura fantástica:
caminhos teóricos, da pesquisadora Ana Luiza Silva Camarani (2014), que nos oferece um
quadro dos principais teóricos sobre a literatura fantástica. Sua obra nos apresenta, na
primeira parte, teóricas e críticas o precursor teórico, Charles
Nodier e as reflexões de Guy de Maupassant; em seguida, a autora apresenta as ideias de
Pierre George-Castex que, no início da segunda metade do século XX, reativa os estudos
teóricos, críticos e histórico literários sobre essa modalidade literária.
Na segunda parte do estudo, sobre os focaliza os textos teórico-
críticos iniciadores, considerando as reflexões de Vax, Caillois, Todorov, Bellemin-Noël e
Bessière, dos quais procura assinalar as ideias que julga mais pertinentes. Na terceira parte,
evolução da busca apontar alguns críticos que, a partir dos textos iniciadores
reavaliam as propostas ali contidas, trazendo sua contribuição para a definição e
compreensão do fantástico literário: Finné, Furtado, Malrieux, Tritter, Ceserani, Viegnes e

15
Anais

Roas. Por fim, na quarta parte, dedica-se à e crítica no com os textos de Paes
e Rodrigues, que datam dos anos 80 do século passado.
Como se vê, a literatura fantástica é um vasto campo de estudos, com diversas
abordagens teóricas no Brasil e pelo mundo. Mas não se pode negar que desponta como um
gênero (TODOROV, 2010) ou modo (BESSIÈRE, 2009) literário profícuo e prolixo que ainda
proverá muitos debates e discussões no campo da teoria e crítica literárias.

PESQUISAS SOBRE O INSÓLITO FICCIONAL NO I COLÓQUIO INTERNACIONAL DE


TEORIA E CRÍTICA LITERÁRIA E II ENCONTRO NACIONAL DE LITERATURA, MEMÓRIA
E SUBJETIVIDADE: DESLOCAMENTOS E IDENTIDADES

As discussões travadas no evento nos chamaram atenção para o desenvolvimento dos


estudos relacionados ao campo do fantástico. Muito trabalhos apresentados no Simpósio
Temático 6 Literatura, Insólito Ficcional e Imaginário, realizado neste I Colóquio
Internacional de Teoria e Crítica Literária e II Encontro Nacional de Literatura,
Memória e Subjetividade: deslocamentos e identidades refletiram a diversidade das
pesquisas em torno da literatura fantástica no Brasil, visto que contamos com a participação
de pesquisadores de todos os cantos do país.
O Simpósio Temático 6 Literatura, Insólito Ficcional e Imaginário foi organizado com
previsão para submissão de, no máximo, 12 trabalhos e tivemos a boa surpresa de 21
trabalhos inscritos. Os trabalhos foram divididos em dois blocos, durante dois dias de
apresentação, dia 08/06 (11 trabalhos) e 09/06 (10 trabalhos). Houve a ausência de alguns
participantes de maneira que ocorrem 7 apresentações no dia 08/07 e 6 apresentações no
dia 09/06, totalizando 13 trabalhos apresentados no simpósio temático.
No primeiro dia, foram apresentados os seguintes temas: 1 - O INSÓLITO FICCIONAL
NO CONTO "RUMO AO OCIDENTE", DE PRIMO LEVI, apresentado por Thiago Felício Barbosa
Pereira; 2 - O INSÓLITO FICCIONAL EM BORGES: UM ESTUDO SOBRE O MILAGRE SECRETO
E A CRENÇA NO SOBRENATURAL, apresentado por Mariany Lopes Almeida, Elizete Albina
Ferreira; 3 - ESPAÇO NARRATIVO: O INSÓLITO E A VISIBILIDADE NOS CONTOS DE LYGIA
FAGUNDES TELLES E EDGAR ALLAN POE, apresentado por Mariluz Marçolla Ferreira
Avrechack, Maria José Pereira Gordo Palo ; 4 - ASTERIX E O FANTÁSTICO: ENTRE
HISTORIOGRAFIA E SUBVERSÃO, apresentado por Rafael Silva Fouto; 5 - HISTÓRIA
LITERÁRIA, MODERNISMOS E A TEMÁTICA DO INSÓLITO, apresentado por Joachin de Melo

16
Anais

Azevedo Neto; 6 - FOI UM RIO QUE PASSOU EM MINHA VIDA: O MERGULHO DA PALAVRA
LIBERTA, apresentado por Roman Lopes; 7 - AS AVENTURAS DE BAMBOLINA -
LITERATURA INFANTIL E LEITURA DE IMAGENS, apresentado por Júlio César Lima
Fernandes, André Luís de Araújo.
No segundo dia, prosseguimos com as apresentações: 8 - CONSCIÊNCIA E CORPO
DESALINHADO: O FANTÁSTICO E O INSÓLITO NO CONTO DE HARUKI MURAKAMI,
apresentado por Vitor Yukio Ivasse Alves, Elizete Albina Ferreira; 9 - COUP D'OEIL
CIENTÍFICO: UMA ANÁLISE DAS NARRATIVAS DE BERILO NEVES À LUZ DO MARAVILHOSO-
CIENTÍFICO, apresentado por Irismar Lustosa Rocha, Daniel Castelo Branco Ciarlini; 10 -
AMÉRICA LATINA É O QUINTAL: UMA BREVE REFLEXÃO SOBRE A SOLIDÃO A PARTIR DA
REPRESENTAÇÃO DA PERSONAGEM ÚRSULA EM CEM ANOS DE SOLIDÃO, DE GABRIEL
GARCÍA MÁRQUEZ, apresentado por Fábio Júnior Vieira da Silva; 11 - O SI-MESMO COMO
OUTRO EM EXCERTOS SELECIONADOS DE EDWARD LEAR E QORPO-SANTO, apresentado
por Fernanda Marques Granato; 12 - INSÓLITAS METAMORFOSES NA LITERATURA: O
FANTÁSTICO EM DE ROBERTO BELTRÃO, apresentado por Ivson Bruno da Silva;
13 - ESCONDER O QUÃO DURO É O ABRAÇO DE FERRO DA OS ESTÁGIOS
DO LUTO VIVENCIADOS POR WANDA MAXIMOFF NA SÉRIE WANDAVISION (2021),
apresentado por Vitor Hugo Sousa Oliveira, Renata Cristina da Cunha).
Os debates realizados no Simpósio Temático 6 Literatura, Insólito Ficcional e
Imaginário nos apontaram que os temas do fantástico, do insólito ficcional caminham por
novas perspectivas interdisciplinares. Muitos trabalhos utilizaram como base teórica-
referencial os textos de Tzvetan Todorov (2010), Irène Bessière, David Roas (2014), Flávio
Garcia (2007), Filipe Furtado (2009), entre outros; e teceram diálogos com a psicanálise de
Freud, as fenomenologias das imagens poéticas de Gaston Bachelard, as estruturas
antropológicas do imaginário de Gilbert Durand, a geografia humanista fenomenológica de
Yi Fu Tuan, o duplo de Otto Rank e Edgar Morin, só para citar algumas das abordagens que
sustentaram as teses apresentadas.
Por isso, a proposta do simpósio temático trilhou uma abertura entre a literatura e
fantástico, sem abrir mão da intersecção entre o fantástico e o imaginário. Para Calvino
(1990), Balzac teria sido um dos primeiros escritores a tratar as questões do fantástico, ao
citar que todas essas singularidades, o idioma de hoje só encontra uma palavra: é
indefinível (p. 82), aproximando-as do campo do imaginário: expressão, que
resume toda a literatura fantástica; ela diz tudo o que escapa às percepções precárias de

17
Anais

nosso espírito; e quando a colocais sob os olhos de um leitor, ele se vê lançado no espaço
imaginário (p. 82).
Vemos em Balzac a dificuldade em situar, pelas palavras, o universo que
caracterizamos como literatura fantástica. A palavra conduz a esfera do
aquilo que não podemos nomear, por desconhecimento ou incapacidade
linguística, mas que possui existência própria no espaço-tempo.
Para Maciel (2013), elementos insólitos não possuem ligação fixa ou
verdadeira com a realidade e são responsáveis por despertar o imaginário do leitor, fazendo
com que ele sinta a estranheza dos fatos e ao mesmo tempo não busque reminiscências na
realidade para explicá- (p. 43).
Como dissemos na seção anterior, a relação entre o imaginário e o fantástico é
estreita, uma linha tênue, conforme aparece nas palavras de Todorov: se trata de uma
ilusão dos sentidos, de um produto de (2010, p. 15), ou de Bessière: fantástico
não é senão um dos métodos da imaginação (2009, p. 186), enfim, temos a concretização
desse efeito.

CONSIDERAÇÕES CREPUSCULARES SOBRE O INSÓLITO FICCIONAL

O campo do insólito ficcional, do fantástico, do maravilhoso, é um terreno arenoso ou


um mar de surpresas, como bem atesta Calvino (2009), prazer do fantástico está no
desenvolvimento de uma lógica cujas regras, cujos pontos de partida ou cujas soluções
reservam (p. 154), recheado de complexidades e tensões entre o real e o
sobrenatural, o estranho e o maravilhoso, o imaginário e os duplos existentes na ficção
literária.
O I Colóquio Internacional de Teoria e Crítica Literária e II Encontro Nacional
de Literatura, Memória e Subjetividade: deslocamentos e identidades com o Simpósio
Temático Literatura, Insólito Ficcional e Imaginário, demonstrou-nos o quanto o tema ainda
instiga diversos pesquisadores no Brasil e no mundo para discutirem sobre a temática.
Sabemos que a literatura fantástica reflete a crise generalizada de valores que a
contemporaneidade vive, produto ficcional de um imaginário pós-moderno, que se traduz
em fenômenos sobrenaturais ou meta-empíricos, que foi, pouco a pouco, saindo da
marginalidade e ganhando espaço tanto na produção ficcional quanto nas formulações
teóricas e na crítica que sobre eles se desenvolve. Para o professor Flávio Garcia (2011),

18
Anais

o fantástico, já no século XXI, obriga a repensar as categorias, em sentido lato, que


de sua literatura (p. 8). Por essa, razão entendemos que as discussões sobre o
fantástico ou insólito ficcional são emergentes e ainda terão muito a nos oferecer neste início
de milênio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BESSIÈRE, Irène. O relato fantástico: forma mista do caso e da adivinha. In: Revista
Fronteiraz, vol. 3, nº 3, Setembro/2009. [p. 185 202].

CALVINO, Ítalo. Definições de Território: o fantástico. In: Assunto Encerrado discursos


sobre literatura e sociedade. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. p. 153-154.

__________. Rapidez. In: Seis Propostas Para o Próximo Milênio: lições americanas. São
Paulo: Companhia das Letras, 1990. p. 43-67.

CAMARANI, Ana Luiza Silva. A literatura fantástica: caminhos teóricos. São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2014.

CESERANI, Remo. O fantástico. Trad. Nilton Tripadalli. Curitiba: Ed. UFPR, 2006.

FURTADO, F. Fantástico: modo. In: CEIA, C.(Coord.). E-Dicionário de Termos Literários


(EDTL). Lisboa: Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa,
2009. Disponível em https://edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/fantastico-modo. Acesso em 16
de abr. de 2021.

GAMA-KHALIL. A literatura fantástica: gênero ou modo? In: Terra roxa e outras terras
Revista de Estudos Literários, Volume 26, Dezembro, 2013, p. 18 -31, ISSN 1678-2054.

GARCÍA, Flavio (org.). A Banalização do Insólito: questões de gênero literário:


mecanismos de construção narrativa. 1 ed. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2007. ISBN: 978-85-
86837-27-2. Disponível em:
https://www.dialogarts.uerj.br/admin/arquivos_tfc_literatura/livro_insolito.pdf. Acesso
em: 23 abr. 2022.

__________. A CONSTRUÇÃO DO INSÓLITO FICCIONAL E SUA LEITURA LITERÁRIA:


procedimentos instrucionais da narrativa. In: I Congresso Nacional de Linguagens e
Representações: Linguagens e Leituras, UESC - Ilhéus BA, 14 a 17 de outubro, 2009.

GARCIA, Flavio; PINTO, Marcello de Oliveira. Caderno de resumos e programação -


Vertentes do fantástico no Brasil: tendências da ficção e da crítica - VI Encontro Nacional O
Insólito como Questão na Narrativa Ficcional / XIV Painel Reflexões sobre o insólito na
narrativa ficcional. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2015.

GARCIA, Flavio; BATALHA, Maria Cristina; MICHELLI, Regina Silva (org.) Vertentes teóricas
e ficcionais do insólito - Comunicações em Simpósios e Livres I Congresso Internacional
Vertentes do Insólito Ficcional / IV Encontro Nacional O Insólito como Questão na

19
View publication stats

Anais

Narrativa Ficcional / XI Painel Reflexões sobre o Insólito na narrativa ficcional. Rio de


Janeiro: Dialogarts, 2013.

MACIEL, Lilian Lima. A BOLSA AMARELA COMO ESPAÇO DE IRRUPÇÃO DO INSÓLITO. IN:
GARCIA, Flávio; BATALHA, Maria Cristina; MICHELLI, Regina Silva (org.). Vertentes
teóricas e ficcionais do insólito Comunicações em Simpósios e Livres I Congresso
Internacional Vertentes do Insólito Ficcional / IV Encontro Nacional O Insólito como
Questão na Narrativa Ficcional / XI Painel Reflexões sobre o Insólito na narrativa ficcional.
Rio de Janeiro: Dialogarts, 2013. / ISBN 978-85-8199-015-6.

ROAS, David. A Ameaça do Fantástico: aproximações teóricas. São Paulo: Unesp, 2014.

TODOROV, Tzvetan. Introdução à Literatura Fantástica. 4. ed. São Paulo: Perspectiva,


2010.

20

Você também pode gostar