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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

JORNALISMO
CIBERJORNALISMO I
Aluno: Pedro Azambuja de Souza Almeida
Professor: Felipe Moura de Oliveira
FICHA DE LEITURA – I
INTRODUÇÃO
• No início da segunda década dos anos 2000, tomavam forma os movimentos de ocupação
global, com novas estratégias de articulação, mobilização e intervenção no espaço público,
com as redes sociais digitais como ambiente de metabolização, das redes para as ruas.
• Primavera Árabe (2010), Occupy Wall Street (2011), Indignados (2011), Jornadas de Junho
(2013).
• Aron Pilhofer (2014), que ocupava o cargo de editor de notícias interativas do The New
York Times na época, afirmou que o campo sobreviveria à crise instaurada pela internet, mas
previu que isso aconteceria em um modelo completamente diferente do atual, acrescentando
que não estava certo do que viria para substituí-lo.
• "O New York Times ganha no jornalismo. Mas a nossa vantagem jornalística diminui à
medida que os novos meios digitais expandem as suas redações" (SIZA; GOMES, 2014).
• Esses eventos causaram uma crise no Jornalismo, uma perda no monopólio de
intermediação, e por consequente, uma necessidade de reinvenção do ofício, já que, diferente
dos últimos avanços tecnológicos, agora o poder da intermediação é, potencialmente,
descentralizado, não mais concentrado, segundo Gumersindo Lafuente, ex diretor do
Espanhol, El País.
• Como disse Ramonet (2012, p. 15), o planeta mídia está sofrendo um traumatismo de
amplitude inédita. O impacto do meteorito internet, semelhante àquele que fez desaparecer os
dinossauros, tem provocado uma mudança radical de todo o ecossistema midiático".
• Semiose da Notícia: Objeto/Acontecimento - Mente Interpretante/Jornalismo -
Signo/Notícia.
• A esfera pública é comparada a uma semiosfera, um espaço não físico onde a vida ganha
sentido, conforme o conceito de Iuri Lotman, espaço em que se constituem as condições para
a significação humana sobre o mundo, com ênfase na cultura. Sistemas de produção de
sentido agem e interagem, numa complexa negociação que, ao mesmo tempo em que resulta
na atribuição de significados aos acontecimentos, transforma-os entre si, avançando a novos
arranjos de significação.
• O jornalismo historicamente teve um papel central na definição dos temas de interesse
público e na atribuição de significados aos acontecimentos, mas com o advento das redes
digitais, outros agentes na semiosfera desafiam e muitas vezes refutam a representação
jornalística dos acontecimentos.
• Essa disputa de sentidos na esfera pública gira em torno da representação dos
acontecimentos, com as redes sociais digitais potencializando essa disputa e contribuindo
para a crise atual do jornalismo, sobretudo a partir de ciberacontecimentos, conceito de Henn
(2014)
• Entretanto, não necessariamente a crise é algo negativo, depois de investigar fenômenos
biológicos, Prigogine (1996) chegou à conclusão que é pela interação/tensão que os sistemas
abertos avançam, sem elas, em última estância, morreriam isolados.
PERCURSO TEÓRICO METODOLÓGICO
• O objetivo geral era entender os meandros da relação entre o jornalismo e os movimentos
de ocupação global
• Acontecimentos produzidos pelos movimentos de ocupação global, articulados em rede >
representação que o jornalismo faz desses acontecimentos na forma da notícia > outros
sentidos conferidos aos acontecimentos e compartilhados em rede pelos próprios ativistas
ciclicamente, incidência desses sentidos na forma como o jornalismo representa os
acontecimentos > revisão dialética das práticas jornalísticas ante a crise que o fenômeno
desencadeia > potencial de acesso à esfera pública por parte dos movimentos sociais e do
debate sobre as demandas que reivindicam.
• Como o jornalismo, que é basicamente a maneira como as notícias são feitas e contadas, é
desafiado a fornecer uma visão mais completa dos movimentos sociais online, considerando
que historicamente ele tem limitado a compreensão completa dos eventos?

MOVIMENTOS EM REDE E OCUPAÇÃO DO ESPAÇO PÚBLICO


• O jornalismo enfrenta desafios com o surgimento das redes sociais, que alteram a forma
como os conflitos sociais são representados.
• A esfera pública é vista como uma "semiosfera", onde os movimentos sociais modernos
produzem significados de forma própria, causando uma crise no jornalismo
• A compreensão desses movimentos exige uma redefinição conceitual e a coleta de dados
empíricos para entender sua organização e mobilização.
• Os "movimentos de ocupação global" exemplificam a ligação orgânica desses fenômenos
com as redes sociais, desde a Primavera Árabe até protestos como as Jornadas de Junho no
Brasil.
• Bourdieu destacou a natureza midiática dos movimentos sociais no século XX, concebendo
a ideia de "ações exemplares" como uma estratégia para promover suas demandas, os
militantes dos movimentos sociais aprenderam a criar eventos dramáticos para chamar a
atenção midiática e política, aproveitando seu conhecimento sobre como os meios de
comunicação funcionam.
• Bourdieu não pôde analisar a essência midiática dos movimentos de ocupação global, pois
as redes sociais digitais ainda não tinham se estabelecido como parte central da esfera
pública.
• As redes sociais não apenas servem como espaço para expressão e circulação das demandas
dos movimentos sociais tradicionais, mas também como berço para os movimentos mais
contemporâneos, e é necessário examinar esses movimentos para entender como eles afetam
sua representação pelo jornalismo.
A EMERGÊNCIA DO FENÔMENO, APORTES CONCEITUAIS
• Ninguém esperava. Num mundo turvado por aflição econômica, cinismo político, vazio
cultural e desesperança pessoal, aquilo apenas aconteceu. Subitamente, ditaduras podiam ser
derrubadas pelas mãos desarmadas do povo, mesmo que essas mãos estivessem
ensanguentadas pelo sacrifício dos que tombaram (CASTELLS, 2013, p. 09).
• Surgimento de uma nova forma de mobilização social baseada em redes, merecendo
atenção mesmo antes de se consolidar.
• Diferença entre movimentos de ocupação global e movimentos sociais ortodoxos do século
20, que enfrentavam o capitalismo de orientação marxista.
• Movimentos sociais são complexos e fluidos, tornando impossível uma teoria completa
sobre eles, mas ainda estudáveis.
• Gohn destaca a transição dos movimentos ortodoxos para os Novos Movimentos Sociais
desde a década de 1990.
• Gohn ao conceber a teoria dos Novos Movimentos listou características que diferenciam as
duas perspectivas:
• 1. Não há um sujeito vanguardista resistente ao capitalismo, mas sim uma coletividade
difusa baseada em solidariedade e crítica à modernidade
• 2. A política é diluída em ações cotidianas dos sujeitos, para além da macroestrutura,
conferindo importância maior à cultura. O elemento determinante para a explosão da
resistência é a dominação cultural, não econômica.
• 3. O aparato conceitual dos NMS apoia-se na própria cultura, que tem inspiração no
marxismo, ao trabalhar também a cultura como ideologia, mas apostando nela como categoria
da ordem do real, não como falsa representação
• Também existe uma característica que é comum aos movimentos, a análise dos autores que
compõem estes movimentos é baseada tanto nas suas ações coletivas quanto na identidade
coletiva que emerge dos processos.
• Os movimentos sociais contemporâneos, especialmente os de ocupação global, apresentam
características distintas em relação aos movimentos sociais ortodoxos do século 20. Eles se
baseiam em identidade, adversários e projetos, enquanto também refletem uma interação
complexa entre cultura, política e tecnologia.
• A "multidão", como conceituada por Negri, reconhece algo comum por trás das identidades
e diferenças individuais, representando uma noção de comunidade que transcende fronteiras
físicas e culturais.
• Os movimentos de ocupação global são definidos por uma série de características, incluindo
conexão em múltiplas plataformas, início na internet e expansão para o espaço urbano,
autonomia organizacional, simultaneidade local e global, espontaneidade, viralidade online,
transição da indignação para a esperança no espaço da autonomia, ausência de lideranças
formais, relações de companheirismo, cooperação horizontal, reflexividade, não violência,
foco em mudanças de valores sociais e engajamento político direto.
• Esses movimentos desafiam conceitos tradicionais de cultura urbana e globalização,
buscando uma "outra globalização" que prioriza a solidariedade e a democracia real sobre os
interesses do neoliberalismo.
• As redes sociais digitais são fundamentais para a articulação e mobilização desses
movimentos, servindo como espaços onde ocorrem tanto processos horizontais de
colaboração quanto verticais de disseminação de informações e influência.
• Jornalistas enfrentam desafios para compreender e representar adequadamente esses
movimentos devido à falta de "mapas de significados" cristalizados e à falta de competência
cultural para entender a dinâmica complexa desses fenômenos.
• A compreensão dos movimentos de ocupação global como formas emergentes de
participação política e social exige uma abordagem mais holística que leve em consideração
não apenas suas manifestações externas, mas também suas motivações, valores e estruturas
organizacionais subjacentes.
A INTERNET COMO CATALISADOR

• A articulação de movimentos sociais em rede não é nova, exemplos incluem a Marcha


Nacional pela Reforma Agrária no Brasil em 2005 e o movimento ambientalista a partir do
Maio de 68 na década de 1960.
• O acesso ao espaço público, mediado pelo jornalismo, depende de acontecimentos que
atendam ao estatuto do acontecimento jornalístico, gerando visibilidade e articulação.
• As redes sociais digitais, como Facebook e Twitter, permitem rápida articulação e
mobilização global dos movimentos sociais.
• Utilizar os meios de comunicação modernos vai além da mobilização, também envolve
conferir novos significados aos acontecimentos, além daqueles dados pelo jornalismo
tradicional.
• Os movimentos sociais baseados em rede são amplamente fundamentados na internet, que
não apenas facilita a ação coletiva, mas também cria as condições para uma forma de prática
comunicativa que permite sua sobrevivência e expansão.
• A facilidade de produção e a velocidade de circulação da informação reconfiguram o papel
dos meios de comunicação contemporâneos, fragmentando a atenção midiática e liberando os
fatos noticiosos de uma única versão.
MILITÂNCIA OU ATIVISMO? MAIS DO QUE SEMÂNTICA
• Malini e Antoun distinguem militância de ativismo, destacando uma evolução conceitual
que oferece esperança para uma ocupação do espaço público mais articulada e representativa.
• Antes, a resistência estava limitada a gemidos impotentes contra a globalização ou
lamentações sobre o enfraquecimento dos velhos meios de luta.
• O ativismo contemporâneo busca uma forma mais complexa de resistência, indo além das
denúncias do capitalismo para propor uma "outra globalização".
• O Independent Media Center (IMC) exemplifica essa nova abordagem, buscando globalizar
a proteção ambiental, os padrões de trabalho e a qualidade de vida decente para todos.
• O debate entre militância e ativismo também possui uma dimensão filosófica, explorada por
Malini e Antoun, onde Sartre é evocado para discutir a relação entre indivíduo e coletividade.
• A militância tradicional pode levar a projetos totalitários, enquanto o ativismo
contemporâneo busca construir uma vida ativa que una realização individual e atividade
comunitária.
• A internet é vista como um espaço de articulação para o ativismo contemporâneo,
permitindo a construção de uma vida ativa pública e secreta, onde a realização individual e a
atividade comunitária são expressões do mesmo combate político.
DO "OCCUPY WALL STREET" AO "OCUPA POA"
• A pesquisa explora estratégias dos movimentos sociais em rede para compreender seu
impacto na forma como o jornalismo representa os conflitos sociais.
• Destaca-se o contato com ativistas do Occupy Wall Street nos EUA e em Porto Alegre,
Brasil.
• Marisa Holmes, uma das ativistas, enfatiza que o Occupy Wall Street não se enquadra na
definição tradicional de movimento social, priorizando a ação pela ocupação do espaço
público.
• A ocupação do Zuccoti Park em setembro de 2011 marca o início do movimento, com
decisões tomadas em assembleias por todos os ativistas.
• As redes sociais digitais foram fundamentais para informar sobre o movimento e contrapor
a narrativa da grande imprensa.
• Holmes destaca que, apesar da cobertura negativa inicial, a visibilidade gerada pelo hype
ajudou o movimento a crescer.
• Ela ressalta que as redes sociais são apenas ferramentas táticas para ampliar o que já está
acontecendo nas ruas.
• Propõe uma internet livre e aberta como alternativa a plataformas corporativas hierárquicas.
CONEXÃO BRASIL-ESPANHA
• Scherer-Warren (2006) destacou a organização social em torno de três pilares antes da
ascensão das redes sociais digitais (identidade comum, definição de adversários, projeto de
superação).
• Exemplos recentes incluem o movimento feminista na Espanha (#7N) e no Brasil
(#MeuPrimeiroAssédio e #MeuAmigoSecreto).
• Na Espanha, a mobilização foi convocada por mais de 400 coletivos feministas e partidos
políticos como o Podemos e o PSOE.
• A marcha em Madrid reuniu quase 500 mil pessoas e destacou pautas contra o machismo,
racismo, xenofobia e homofobia.
• No Brasil, o movimento foi espontâneo e viralizou através das hashtags, permitindo que
milhares de mulheres compartilhassem relatos de assédio e opressão.
• Ambos os casos demonstram a eficácia dos movimentos em utilizar as redes sociais para
emergir temas na esfera pública e influenciar a cobertura jornalística.

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