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Ligados pelo Espírito

Christine Feehan
Sisters of the Heart 02
O letal agente secreto Stefan Prakenskii sabia mil maneiras de matar um homem... E duas
vezes mais maneiras de dar prazer a uma mulher. Isso o fez aguardar com expectativa sua nova
missão: Ir para a cidade costeira Sea Haven e insinuar-se na vida de uma mulher de beleza
assombrosa, que possuía laços misteriosos em seu passado e um vínculo com ele perigosamente
sedutor. E não só ele, como o igualmente poderoso Senhor do Crime queria apenas uma coisa dela:
Possuí-la.
Judith Henderson é uma artista em ascensão... Um ser etéreo e assombrado. Sua beleza
perfeita agitou a alma de dois homens que fizeram dela sua obsessão. Durante anos esperou que
aparecesse alguém para desbloquear a paixão e o fogo que existe dentro dela... Esperou pelo
homem certo para entregar-se a ele. Mas apenas um homem poderia sobreviver aos seus segredos
e às sombras que serão lançadas sobre a vida de ambos.

Traduzido do Inglês
Envio do arquivo: Δίκη
Capa: MarciaDaltro©

Capítulos Revisão Inicial Revisão Final


01 ao 05 MarciaDaltro© αίδώς
06 ao 08 Flah E. MarciaDaltro©
09 ao 17 Fatima MarciaDaltro©
18 ao 21 Regina R. MarciaDaltro©
Para Judith Paul e Thomas Durden, com amor.

AGRADECIMENTOS

Naturalmente este livro não poderia ter sido escrito sem a incrível ajuda da premiada e
talentosa artista Judith Paul e suas imagens em caleidoscópio, a quem consultei sobre a criação de
caleidoscópios, restauração de pinturas e tudo o mais o que se relacionasse a um artista que vê o
mundo em cores. Um agradecimento especial a Brian Feehan, que passou horas fazendo
perseguições virtuais sobre telhados, combates corpo-a-corpo e autênticas armadilhas. Por último,
mas não menos importante, Clint Wyant, membro do departamento de polícia que gentilmente
passou algum tempo comigo explicando detalhes sobre a aplicação da lei no Litoral Norte da
Califórnia, onde acontecem os romances na cidade que criei chamada Sea Heaven. Agradeço
imensamente o tempo que me dispensou quando saía dos seus longos turnos de madrugada.

*****

Comentário da revisora MarciaDaltro©: Bem... Sou suspeita de falar desta série pq AMO os
homens Prakenskii!  Gostei muito do Ilya na série Irmãs Drake (ótima), e depois, me apaixonei
pelo Lev no livro 01 desta série que é paralela às Irmãs Drake. O livro está no blog do TW, e conta
a história de Lev e Rikki (simplesmente LINDA!). Este livro conta a história do irmão dele (Stefan) e
da “irmã do coração” da Rikki (Judith), então pude matar a saudade deles, pois, a história continua
como se acontecesse apenas algumas semanas depois de seu casamento. Stefan, tal qual Lev e
seus outros irmãos, foi criado em um complexo militar onde o ensinaram a ser uma “arma letal”
para o Governo. Eles tiveram uma infância muito sofrida e agora adultos, são homens que tem
diversas cicatrizes no corpo (pelo treinamento, por tortura, espancamento e etc.) e na alma (pois
cresceram aprendendo que não podiam confiar em ninguém e eram proibidos de mostrar, e
inclusive sentir, qualquer tipo de emoção). Cresceram ser ter nenhum apego a nada ou a ninguém,
dessa forma, tornaram-se homens duros e frios. Eles foram treinados inclusive na arte do sexo
(Ohhh yesss rs*) Treinados para seduzir uma mulher, (com o cérebro sempre no comando do
corpo) para cumprir sua missão, agora imaginem como eles ficam quando tem uma ereção "por
conta própria" por uma mulher? rs* É claro que esta mulher se tornará TUDO na vida deles. E foi o
que Judith se tornou para Stefan quando ele teve que ir à Sea Heaven para uma missão que
também a incluía.
Enfim... Quem leu o livro anterior, sabe quem é Judith rs* Se eu for escrever algo mais, este
comentário virará um testamento... rs* Então vou terminá-lo dizendo que AMO ler a forma como
os Prakenskii descobrem o que é “sentir”... Carinho, ternura, preocupação, desejo e etc. E também
como admitem suas vulnerabilidades para as suas amadas sem nenhuma vergonha. Esta é uma
série que vale “furar a fila” para ler  Beijosss.
CAPÍTULO 01

Stefan Prakenskii andava de um lado para o outro pela pequena cela. Ele sabia exatamente
quantos passos deveria dar antes de saltar para pegar as barras e fazer mais uma dúzia de flexões
antes de mudar o ritmo, caminhar até o outro lado da cela e ir ao chão para continuar fazendo
flexões. Não havia jeito de se acostumar com o cheiro da prisão, o mofo nas paredes, a forma
como os chuveiros não funcionavam e a necessidade de vigilância constante para continuar vivo,
mas ele não se importava com nada disso. Podia tolerar qualquer coisa, afinal, já havia suportado
coisas muito piores.
Ele era um homem paciente, mas, uma vez que havia decidido que era inútil permanecer
naquela cela e que sua missão tinha sido um completo fracasso, decidiu que precisava sair dali. Era
um desperdício de tempo para ele continuar naquele lugar, mas seu treinador não havia
concordado em tirá-lo de lá no mês passado. Cada dia que passava naquela cela tornava-se mais
perigoso e irritado, sua mente estava sendo consumida pela única coisa decente que havia
naquela prisão.
Xingando em voz baixa, Stefan arrancou da parede a fotografia mais recente da mulher pela
qual seu companheiro de cela era obcecado. Ela estava em uma praia e as ondas do mar
quebravam atrás dela, o mar estava um pouco turbulento e, obviamente, ventava muito, mas não
havia nenhuma outra pista que Stefan pudesse identificar o lugar. Ela era bonita, sem dúvida, com
seu longo cabelo preto balançando pelo vento. Ainda que estivesse vestida de jeans e camiseta,
conseguia parecer elegante e sexy ao mesmo tempo. Se ele fosse um homem interessado em
relacionamentos amorosos, possivelmente poderia compreender a fixação de seu companheiro de
cela. O idiota era totalmente obcecado por ela. Havia centenas de fotografias tiradas ao longo dos
anos de apenas uma mulher, aquela que estava presa nas paredes.
Parecia não importar o quão inteligente um homem poderia ser ou o que ele fazia para
viver, no final, sempre aparecia uma mulher que por vezes poderia fazer até mesmo o maior dos
criminosos desmoronar. E esta mulher em particular não era uma exceção. Stefan planejava usá-la
para derrubar o império internacional de Jean-Claude La Roux´s caso fosse necessário.
Ele olhou para a foto em sua mão. Ela parecia pensativa... Não... Parecia triste. O que
poderia ter colocado aquele olhar em seu rosto? Certamente uma mulher como ela não estaria
sofrendo por um homem como Jean-Claude. Uma pequena parte convidativa de sua barriga
aparecia entre sua blusa e o jeans tentador. Seu polegar deslizou sobre aquela pequena faixa de
pele como se pudesse sentir o quão quente e macia realmente era.
Sem dúvida, Jean-Claude era um homem de uma riqueza incalculável. Stefan imaginava que
uma mulher como ela poderia também achá-lo atraente se gostasse de um homem que
transpirava charme. Seu charme conseguia esconder uma multidão de pecados, fora isso, as
mulheres poderiam também achar excitante viver perigosamente. Elas podiam ser muito
facilmente seduzidas por coisas erradas assim como os homens poderiam ser seduzidos por sua
beleza.
— Que diabos você está fazendo com isso? — Olhando para Stefan, tentando intimidar
alguém impossível de se intimidar, Jean-Claude La Roux arrebatou a pequena fotografia das mãos
de seu companheiro de cela. — Você não tem ideia de quem eu sou.
Deliberadamente Stefan deu um meio sorriso para ele e depois cuspiu no chão da cela.
— Esse refrão está ficando velho, Rolex. — Infundiu um total desprezo em seu tom de voz,
chamando-o pelo apelido que deu a ele e ele odiava.
Um homem como Jean-Claude, chefe de um enorme império do crime detestaria que um
criminoso comum debochasse dele. Era uma afronta que o homem não aceitaria. Nos dois meses
que Stefan havia trabalhado disfarçado, tentando conseguir informações, precisou defender sua
vida em várias ocasiões... Uma cortesia da autoridade que La Roux possuía inclusive na prisão.
Jean-Claude odiava Stefan, bastava uma palavra dele que vários prisioneiros bajuladores tentavam
se livrar de Stefan, que era um espinho em sua bunda.
Não havia dúvida de que La Roux era tão poderoso na prisão quanto fora dela. Inicialmente,
sentenciá-lo por seus crimes internacionais na França pareceu uma boa ideia. O sistema prisional
francês não era considerado um lugar no qual os prisioneiros eram paparicados, porém, mesmo
com o mofo nas paredes e a infiltração no canto direito do teto da cela, Jean-Claude conseguia
parecer rico e poderoso. Todos os outros prisioneiros se mantinham afastados dele até que Stefan
apareceu. Ele havia espicaçado La Roux em cada oportunidade que teve e nenhum dos homens
pagos para dar uma lição Stefan ou inclusive matá-lo, havia conseguido o seu intento.
Não havia nenhuma dúvida na mente de Stefan de que, se conseguisse ficar pelo menos uma
hora sozinho com Jean-Claude, e se o liberassem para interrogá-lo à sua maneira, ele teria todas
as informações que o governo precisava, mas ali, naquela prisão francesa, com guardas os
vigiando dia e noite e o governo muito consciente de seu prisioneiro, não teria a chance de extrair
o que precisava do homem. O que fazia com que restasse apenas uma possibilidade. Jean-Claude
La Roux teria que escapar. Ele suspirou. Havia dito isso muitas vezes ao seu treinador ao longo dos
últimos dois meses.
Stefan fez um gesto em direção às paredes cobertas de fotografias.
— Você tem um monte de fotos, Rolex, mas com certeza não tem nenhuma carta. Eu acho
que sua mulher está naquela praia com outro homem rindo às suas custas.
Jean-Claude colocou a fotografia no lugar e sua mão alisou o papel brilhante. Stefan
percebeu, com alguma satisfação, que os dedos do Senhor do Crime tremeram quando ele tocou o
rosto da mulher.
— Você não vê nenhum homem em qualquer uma dessas fotografias, não é? — Jean-Claude
olhou-o com um desprezo óbvio.
Stefan sabia que ele não costumava se dar o trabalho de olhar para ele. Stefan era alto,
ombros largos, tórax amplo e musculoso, braços grandes com músculos salientes. Ele não parecia
ser suave, rico ou charmoso. Parecia um animal, não muito inteligente, com o cabelo comprido e
desalinhado. Cicatrizes marcavam sua pele e seus nódulos eram calejados. Possuía um queixo
quadrado e olhos de um azul escuro esverdeado que pareciam olhar diretamente a alma dos
outros homens e dessa forma, declará-los culpados. Stefan transpirava poder bruto através de sua
força física e homens como Jean-Claude automaticamente julgavam que ele só tivesse músculos e
nenhuma inteligência. Ele era o tipo de homem que nunca olhava por baixo de sua superfície para
ver se havia alguma inteligência por trás da máscara do animal.
Em sua mente, ele sempre usava o seu nome real, Stefan Prakenskii, tão frequentemente
quanto fosse possível, porque, na verdade, estava tão acostumado a usar outros nomes que tinha
medo de esquecer quem ele realmente era. E talvez já tivesse esquecido, há muito tempo perdeu
sua identidade. O que ele era? Quem ele era? E quem realmente se preocupava com essa merda
afinal? Não havia uma bela mulher de pé em uma praia com um olhar triste, adoecendo por ele...
E nunca teria. Ele era bem sucedido em seu trabalho porque se recusava a permitir que mulheres,
como a que havia deixado Jean-Claude obcecado, penetrasse em seu reino de consciência.
Olhou novamente para as imagens que cobriam a parede manchada. Havia centenas delas.
Jean-Claude manteve a mulher sob vigilância por um longo tempo. Ela havia mudado muito pouco
ao longo dos anos em que o homem passou na prisão, mas ele estava certo, nunca nenhum
homem fora fotografado com ela. Stefan amaldiçoou em voz baixa e afastou-se das fotografias.
Aquela mulher conseguia ficar sob a pele de quem ficasse olhando para ela por muito
tempo. Mas sinceramente, o que mais havia para fazer em uma pequena cela a não ser observar
seus lábios, seus olhos e todo aquele cabelo longo brilhante? Jean-Claude estava alimentando seu
próprio vício e cultivando-o dentro de um monstro. Stefan descobriu esta sua debilidade
imediatamente e resolveu usá-la contra ele, incentivando-o a pensar em uma fuga. Ele não havia
visto outros homens com ela nas fotografias, mas quem poderia suportar pensar que outro
homem poderia estar tocando toda aquela pele macia?
— Eu vou te dizer uma coisa, Rolex... Ela é linda. Onde diabos você conseguiu encontrar uma
mulher como esta? — Era hora de mudar de tática.
Pela primeira vez, Stefan permitiu que uma pequena nota de admiração se destacasse no
tom de sua voz. E como suspeitou Jean-Claude não conseguiu resistir à necessidade de falar sobre
a sua mulher ou de responder a um primeiro sinal de que um homem como Stefan, que parecia só
admirar obviamente a força bruta, parecia respeitar o Senhor do Crime, pelo menos, por sua
capacidade de atrair uma linda mulher.
— Ela era uma estudante de arte e na época estudava em Paris — disse Jean-Claude. — Ela
estava saindo do Louvre. Seus longos cabelos voaram ao redor de seu rosto e ela parou por um
momento para tirá-los do rosto... — Ele parou de falar.
Stefan não precisava que ele terminasse a frase para saber o que diria. O Senhor do Crime
provavelmente havia ficado sem ar ao ver aquela mulher, assim como aconteceu com Stefan na
primeira vez que olhou sua foto. Ela poderia facilmente ser uma modelo de capa de uma revista
ou até mais do que isso. Havia algo de indefinido nela, uma qualidade que não conseguia
descrever, algo inocente e sensual, mas ao mesmo tempo... Misterioso, distante, fora do alcance.
Algo terrivelmente desconcertante, mas que ainda assim fazia um homem querer alcança-la e
agarra-la. Prendê-la só para si.
Oh, sim, a mulher definitivamente conseguia impactar um homem, principalmente um que
estivesse preso em uma cela sem uma companhia. Stefan tinha uma paciência infinita quando
estava em uma missão, mas, sinceramente, aquela missão havia sido um fracasso. Jean-Claude
percorreria o caminho mais curto para chegar até a mulher e ao microchip que havia roubado do
governo russo, um microchip que valeria uma fortuna no mercado negro. Esse chip continha
informações que poderia fazer o sistema de defesa retroceder cinquenta anos caso fosse
descoberto.
— Ela é uma boa pintora? — Stefan perguntou.
Jean-Claude concordou com a cabeça.
— Ela é boa em tudo o que faz.
Stefan permaneceu em silêncio à espera de mais informação. Ele sabia que viria. Jean-
Claude não teria respondido se não quisesse falar sobre o assunto.
— Ela conseguiu fazer seu nome no mundo da arte. Seus caleidoscópios ganharam prêmios
internacionais. Suas pinturas são vendidas por uma fortuna e ela é uma restauradora de obras de
arte antiga para colecionadores particulares. As pinturas chegam até ela sob forte vigilância.
Jean-Claude parecia orgulhoso dela. Era raro encontrar restauradores de arte antiga,
pessoas responsáveis por restaurar uma pintura de centenas de anos de idade. Era um trabalho
difícil e poucas pessoas tinham capacidade para fazê-lo. Ele duvidava também que houvesse
muitos artistas que tivessem sido premiados por montar e pintar caleidoscópios. Esta informação
seria muito útil para descobrir sua identidade. Stefan já havia enviado várias fotografias dela a
seus contatos para iniciar uma investigação sobre quem era na realidade esta mulher misteriosa.
— Eu tenho que reconhecer que não é qualquer um que tem uma mulher como esta,
disposta a esperar por você.
Jean-Claude não disse nada, apenas olhou para ele com um rosto calmo e um pensativo
silêncio. Stefan sabia que suas palavras o incomodaram, o fizeram pensar que talvez ela não
estivesse esperando por ele. La Roux tinha uma cela melhor do que a maioria dos detentos. Ele
não era como a maioria, suicida e deprimido pelas condições do local, o que também dizia a Stefan
que os guardas contrabandeavam alguns itens para ele e faziam o seu melhor para estar nas boas
graças do prisioneiro. Há pouco tempo surgiu um rumor de que um guarda desagradou Jean-
Claude e um de seus homens retaliou contra a família dele.
Stefan havia ficado neste lugar nojento por tempo suficiente. Não havia nada mais que
pudesse tirar do Senhor do Crime. Ele havia dito ao seu treinador para tentar quebrar o homem
fora da prisão, matá-lo quando fugisse ou então que o deixasse fugir para que os levasse até o
microchip. Qualquer uma destas opções era melhor do que apodrecer nos confins daquela
pequena cela, olhando para uma mulher cujo nome ele nem sabia e ficar obcecado por ela
juntamente com Jean-Claude. Ele iria embora naquela noite, antes que perdesse a sua sanidade
olhando para uma mulher que nunca olharia para ele duas vezes.
— Eu odeio dizer algo que sei que vai te desapontar Rolex, mas ela tem o rosto de um anjo.
Eu não posso imaginar que qualquer mulher possa fazer jus a isso. — Ele precisava encontrar uma
maneira de manter o homem falando. Ele ficou ali por dois meses sem nem mesmo saber o nome
dela; Jean-Claude manteve sua boca sempre fechada.
Jean-Claude olhou para ele, e em seguida para a foto. E sorriu pela primeira vez desde que
Stefan foi colocado naquela cela com ele.
— Tenho certeza que você não pode imaginar isso. Ela fala sete idiomas. Sete. — O
sarcástico franzir de lábios de Jean-Claude disse a Stefan que ele tinha certeza de que ele nunca
conseguiria aprender mais do que um idioma.
Stefan falava francês fluentemente, com um sotaque perfeito; e seu disfarce secreto (John
Bastille) certamente não foi criado para que ele parecesse ser um homem educado e sim um
homem ligado às atividades criminosas. Mas a verdade era que Stefan poderia se igualar
perfeitamente a mulher dos sonhos no que dizia respeito a idiomas, o que significava que ela
também era educada além de sedutora. Ele estava um pouco surpreso de que Jean-Claude
gostasse de mulheres inteligentes.
— Ela é do tipo que saberia argumentar com você, — Stefan comentou permanecendo na
pele de seu personagem. Um homem musculoso que não iria querer que uma pequena mulher
discutisse com ele. Seu comentário deixava claro que Jean-Claude gostava de mulheres
inteligentes.
— Ela definitivamente fala o que pensa — Jean-Claude concordou com um pequeno meio
sorriso que passou por seus olhos, como se lembrasse de algum momento o qual tivesse achado
bastante divertido. — Você não entenderia.
Stefan teve que engolir as 101 coisas1 rudes que seu disfarce secreto teve vontade de
responder para ele porque sabia que se fizesse isso, aquela conversa acabaria imediatamente.
Jean-Claude não tinha dito mais do que três ou quatro frases nos dois meses que tinham
partilhado aquela cela. Pelo contrário, ele só olhava para o chão em uma reflexão triste.
— Eu tive uma mulher uma vez. Uma mulher de verdade, que valia a pena e não uma
prostituta. Eu deveria ter sido um pouco mais amável com ela, então talvez ela ainda estivesse
comigo e eu teria fotos dela aqui ao meu redor. — Ele deu um rápido sorriso de inveja para Jean-
Claude. — Apesar dela não se parecer nem um pouco com ela. Qual é seu nome?
Nem uma única vez naqueles dois meses Jean-Claude havia se referido à mulher pelo seu
nome ou havia comentado onde ela estava. Ele era muito discreto quando se tratava do anjo na
parede. Incomodava Stefan saber que secretamente, pensava nela dessa forma. Anjo. Misteriosa.
Irreal. E dessa forma, fora do alcance de um homem que sempre viveu completamente nas
sombras. Um homem sem uma identidade real.
— Judith. — A voz de Jean-Claude foi cortante e advertia a Stefan para não tentar saber mais
nada sobre a identidade daquela mulher.
Uma sensação de triunfo passou através de Stefan. Jean-Claude sentia-se entediado de estar
naquela cela. E queria falar sobre sua mulher. Ele precisava falar sobre ela. Stefan queria que ele
ansiasse estar com ela, que aproveitasse a oportunidade para fugir quando a opção fosse
apresentada a ele, não por Stefan, é óbvio, mas por um dos guardas. Não seria tão difícil para ele
arranjar isso. Ter alguém como Jean-Claude La Roux devendo um favor, seria como acertar na
loteria. Enquanto pensava nisso lembrou-se de que Jean-Claude não oferecia nada de graça. O que
será que ele iria querer depois?

1
101 coisas é uma gíria/termo do tipo: 101 coisas para fazer antes de morrer, 101 coisas para fazer antes da dieta e etc...
— Bonito nome. Ela parece exótica, mas este nome é americano, não é? — Na verdade o
nome era de origem hebraica, mas Stefan duvidava muito que o Senhor do Crime soubesse deste
detalhe ou mesmo que se importasse com isso. Foi um tiro no escuro de forma calculada.
Jean-Claude olhou para ele com cautela.
— E que inferno de diferença isso faz?
Stefan se permitiu mostrar uma onda de raiva apesar de se sentir mais triunfante do que
nunca. Ele havia atingido um ponto sensível. A mulher misteriosa poderia muito bem ser dos
Estados Unidos e não do Japão como havia imaginado na primeira vez que viu sua foto.
— Nenhuma. Estava apenas tentando manter uma conversa. Foda-se. — Ele virou as costas
para o Senhor do Crime em um risco calculado. Mostrar indiferença era a única maneira a qual
poderia fazer com que Jean-Claude continuasse falando. Se achasse que Stefan estava muito
interessado na conversa, o homem não diria mais uma palavra.
Ao afastar-se de La Roux ele se encontrou sozinho olhando para outra parede de fotos. Ele
estava cercado por aquela mulher misteriosa. Ela definitivamente tinha descendência japonesa,
mas não inteiramente, parecia ser alta e tinha um tom de pele mais claro. Talvez tivesse um pai
americano. O litoral na foto poderia ser nos Estados Unidos ao invés da Europa. Ele não havia
considerado essa possibilidade antes.
Uma das fotos que mais gostava era de Judith, (agora ele sabia seu nome), andando descalça
na areia. O vento soprava forte em seu cabelo longo de aparência sedosa flutuando por trás dela.
Ele podia ver suas pequenas pegadas na areia molhada. Por alguma estranha razão, esta foto o
desconcertava. Ela parecia tão sozinha. Tão triste. À espera de alguém. Seria Jean-Claude? Seu
estômago se apertou com este pensamento.
— Você é casado com ela? — Ele não olhou para Jean-Claude quando perguntou, preferindo
ouvir o tom da sua voz ao invés de encará-lo.
— Somos noivos — Jean-Claude respondeu após uma longa pausa.
— Ela sabe disso? — Ele perguntou maliciosamente. Stefan não tinha visto um anel em seu
dedo em qualquer uma das fotografias e havia olhado várias vezes para todas elas.
Jean-Claude deu de ombros.
— Não me importa o que ela pensa. Ela é minha noiva e quando chegar a hora vai estar
comigo de uma forma ou de outra. — Ele pegou um de seus muitos livros e estendeu-o para
Stefan. — Você já ouviu falar dessa porcaria?
Stefan ocultou uma pequena pontada de prazer ao saber que a mulher não estava tão
deslumbrada por Jean-Claude como ele estava por ela. Ele pegou o livro, olhou para ele
intensamente chocado com o tema, mas fingiu ignorância.
— Aura? O que é? Nunca ouvi falar sobre isso.
— Você consegue acreditar nesta porcaria? Que alguém consegue ver cores ao redor do
corpo das pessoas? New Age2, besteira, é isso o que é.

2
New Age ou "Nova Era" é um movimento religioso que surgiu na década de 1970 e atingiu seu ápice nos anos 80 ao propor o
caminho para uma nova etapa na história da humanidade baseada no amor e na iluminação espiritual. Os adeptos da New Age
seguem os princípios de um esoterismo moderno que traz uma perspectiva religiosa baseada em conhecimentos místicos.
Stefan nunca havia visto tanta raiva e amargura em Jean-Claude, esta raiva reprimida fez
com que pela primeira vez, Stefan se preocupasse um pouco por Judith.
— Sua mulher acredita nessas coisas? — Stefan perguntou, mantendo uma vaga
perplexidade em sua voz.
— Maldição! Sim. Ela acredita. E leva muito a sério. Já li tudo sobre este assunto, mas nunca
conheci uma única pessoa que acreditasse nele ou que pudesse ver cores em volta de outras
pessoas assim como ela diz que vê.
— Então ela é um pouco louca. — Stefan deu um sorriso lascivo para ele. — Mas você não
acha que seu corpo compensa tudo isso? É só manter a boca da sua mulher ocupada que você não
terá nenhum problema com isso. — Seu estômago se apertou ainda mais ao dizer isso. Sentiu sua
barriga realmente doer.
Jean-Claude lançou um olhar furioso para ele. Pegou o livro da mão de Stefan e atirou-o
contra a parede da cela.
— Eu não sei por que achei que alguém como você poderia saber algo sobre este assunto.
Stefan não queria saber de mais nada. Queria sair daquela cela fedorenta e ficar longe do
homem cuja alma estava podre. Não havia misericórdia em seu mundo. Nem pele macia. Nada de
olhos escuros nos quais um homem poderia se perder dentro deles. Ele não era sequer real, era
nada mais do que uma sombra escura entrando e saindo de lugares que algumas pessoas
chamavam de lar deixando para trás a morte e o caos. Não sabia o que era ter uma casa e já não
se importava com isso. Tinha perdido sua humanidade há muito tempo em lugares como este,
rodeado por homens corruptos que negociavam carne humana e causavam estragos no mundo
por causa do dinheiro.
Ele havia estado naquela missão por tempo demais, tanto que começou a se fixar naquela
mulher da foto porque ela era a única coisa que remotamente se parecia com a inocência naquela
cela fedorenta.
— Sabe Bastille... — Jean-Claude começou a falar.
Stefan entrou em alerta. Pela primeira vez, Jean-Claude parecia diferente. Talvez chegassem
ao assunto do porque o Senhor do Crime se dignou a falar com ele sobre sua mulher. Jean-Claude
tinha ficado resolutamente silencioso durante muito tempo e ele não estava ali para ter nenhuma
conversa amigável com ele, não importava o quanto ele precisasse conversar com alguém sobre
Judith e as fotografias. Ele já havia conseguido alguma coisa dele.
Stefan virou-se, inclinou o quadril preguiçosamente contra a cama e levantou uma
sobrancelha.
— Por que você não me matou? Você sabe que fui eu quem ordenou as surras e os ataques
contra você.
Stefan manteve sua expressão cuidadosamente em branco e encolheu os ombros.
— Porque eu não ganharia nenhum dinheiro com isso. Eu quero sair daqui. Eu vim para fazer
um trabalho e uma vez que ele seja feito vou-me embora.
Sobrancelha de Jean-Claude se levantou.
— Um trabalho? — Ele repetiu.
— Relaxe, Rolex, você não é o objetivo. — Stefan permitiu que um pequeno sorriso
aparecesse em seus olhos. — Não vou dizer que não me passou pela cabeça, uma ou duas vezes,
mas não haveria quem me pagasse por isso.
— Isso quer dizer que você me mataria se alguém te pagasse?
— Não somos exatamente amigos. — Desta vez ele deixou a diversão alcançar sua voz.
— Eu subestimei você — admitiu Jean-Claude.
Stefan registrou com satisfação que o Senhor do Crime percebeu o quão perto havia estado
da morte. Todas aquelas noites com Stefan à espreita como uma víbora letal a poucos metros
dele.
— Todo mundo o faz. — Novamente, Stefan não mostrou nenhum rancor.
Jean-Claude estudou seu rosto cheio de cicatrizes.
— Eu poderia empregar um homem como você.
— Não vou estar por aqui. Estarei fora daqui amanhã. — Stefan falou com absoluta
confiança.
— Como?
Stefan deu uma encolhida de ombros e ficou misteriosamente silencioso.
— Você tem uma forma de escapar?
Oh, sim, ele finalmente percebeu interesse na voz de La Roux. Ele queria sair dali também. E
assim que estivesse lá fora, teria dinheiro o suficiente para comprar uma nova identidade e moldar
um novo rosto. Stefan fazia isso o tempo todo.
Stefan se afastou do homem e afundou em sua cama, em silêncio, deixando claro que a
conversa havia acabado. Quando eles fossem jantar, um homem morto seria encontrado na cela
deles. Stefan, tinha a situação na prisão totalmente sob controle, John Bastille não voltaria para
cela e Jean-Claude La Roux saberia que havia uma forma de escapar. E quando fosse abordado por
um guarda dentro de duas semanas, se oferecendo ajudá-lo a escapar, ele não perderia a
oportunidade.
O prisioneiro que apareceria morto em sua cela era um traidor russo que estava preso por
tráfico de armas, mas na verdade, era culpado por muito mais do que isso. Ele trabalhou para
Jean-Claude e foi o responsável por informar ao Senhor do Crime a localização de um de seus
melhores engenheiros, Theodotus Solovyov, o qual havia projetado o atual sistema de defesa de
seu país. O ataque a Solovyov havia deixado o irmão de Stefan, Gavriil, com uma lesão
permanente após colocar sua vida em perigo.
Gavriil era sem dúvida, um dos principais agentes do governo e havia sido nomeado como
guarda-costas para Solovyov. Ele havia conseguido evitar que Solovyov fosse sequestrado, apesar
de ter sido superado em número pelos atacantes, estar desarmado e de ter sido apunhalado sete
vezes. Ele afugentou os sequestradores, mas apesar disso, eles conseguiram levar o microchip que
Solovyov havia costurado em seu casaco. Apenas Solovyov e sua esposa sabiam que o microchip
estava escondido ali. Solovyov foi vendido por sua própria esposa, ela o traiu e a missão Gavriil foi
considerada um fracasso.
Um homem como Gavriil Prakenskii não podia ser perdoado por falhar e tampouco o
aposentaram de forma elegante. Ele simplesmente foi afastado. Por este motivo, escapou do
hospital e desapareceu. Ele nunca estaria seguro novamente, não se continuasse a usar o nome
Prakenskii. O único Prakenskii que podia usar seu sobrenome tranquilamente era o mais jovem
dos seus irmãos, Ilya, que havia sido preparado para ser um agente da Interpol. Ele trabalhou para
o secreto esquadrão da morte por um curto período de tempo e graças aos seus serviços, foi
solicitado para trabalhar interna e externamente. Ele nunca precisou se esconder e viver nas
sombras como os seus irmãos mais velhos.
Stefan tinha ajudado Gavriil a escapar levando-o por ruas escuras até chegar a um carro
contrabandeado que o levaria para fora da Rússia. Tinha sido uma fuga difícil e não havia nenhum
médico que pudesse acompanhá-lo. Gavriil poderia ter morrido, mas agora estava a salvo e
usando uma nova identidade.
Stefan duvidava se teria a sorte de poder ver seu irmão novamente. Gavriil contou a Stefan
que somente Theodotus Solovyov e sua esposa Elena, sabiam sobre o microchip costurado no
casaco, por isso tinha certeza de que havia sido Elena quem traiu o seu país.
Logo que soube que Gavriil estava fora de perigo, Stefan seguiu o rastro do dinheiro e
encontrou não só a culpabilidade de Elena como também seu vínculo com Jean-Claude La Roux.
Elena morreu depois de fornecer o nome de seu amante. Ele fez seu amante abandonar o
esquadrão secreto antes de morrer. Um por um, Stefan havia caçado cada participante que havia
destruído a carreira de seu irmão e colocado sua vida em perigo. Ele havia matado todos eles,
exceto aquele que estava naquela prisão francesa. E este último detalhe começaria a ser resolvido
no início da noite.
Stefan deitou-se em sua cama ignorando o olhar perplexo de Jean-Claude. O homem queria
mais informações sobre sua fuga e provavelmente estaria se lamentando por não ter estabelecido
uma relação de companheirismo com ele. Stefan sentiu uma imensa satisfação em saber que Jean-
Claude ainda lamentaria por um monte de coisas... E acabar com a carreira de seu irmão Gavriil
seria o menor de seus arrependimentos.

*****

Quatro dias depois, Stefan aproveitou o seu tempo lavando-se demoradamente em uma
ducha de água quente, grato por estar em um quarto decente, ter um banheiro limpo e uma cama
confortável. Enrolou uma toalha na cintura e caminhou pelo frio piso de azulejo. Verificando sua
arma em cima da pia, secou os cabelos olhando para a imagem embaçada refletida no espelho.
John Bastille não existia mais e Stefan Prakenskii estava de volta. Não parecia ter uma aparência
muito melhor do que a de Bastille apesar de estar limpo. Seu corpo estava em forma, cada
músculo relaxado e pronto, sua cintura e quadris estreitos e sua força interna absolutamente
sólida. Ele era como uma máquina, treinado para enfrentar qualquer problema. Sabia mil
maneiras de matar alguém. Podia seduzir qualquer mulher, tirar dela sua roupa, descobrir seus
pontos sensíveis e seus segredos... Tinha feito isso tantas vezes que havia perdido a conta. Poderia
acertar um alvo a quilômetros de distância mesmo com um vento forte, sem nenhum problema.
Poderia cravar uma agulha em seu alvo sem que ele sentisse que aquilo fosse algo mais do que
uma picada de algum inseto irritante. Ele não tinha ideia de ser outra coisa além do que era.
Pegando sua arma, entrou no quarto que estava usando para passar as noites. A porta do
quarto estava bem trancada... Não era um homem que confiava nas pessoas e nunca seria. As
janelas davam para o rio e aquele seria seu último recurso para uma fuga caso fosse atacado e não
houvesse outra saída. Havia estabelecido uma rota de fuga pelo telhado e também pelo hotel.
Possuía várias outras rotas de fuga e seu quarto parecia um arsenal. Ainda assim, nunca se sentia
seguro.
Sentia uma inquietação a qual nunca sentiu antes. Talvez fosse hora de desaparecer. Já havia
perdido muito da sua humanidade. Seus sentidos estavam entorpecendo ou talvez estivessem
diminuindo há algum tempo e ele não havia se preocupado com isso.
Apesar de sua determinação em não olhar, ele se viu de pé, em frente à cômoda onde
colocou a fotografia que tirou da parede da prisão, sua fotografia favorita, a de Judith na praia. Ela
estava exatamente onde a havia colocado. Ele levou-a com ele, tentando convencer a si mesmo de
que a entregaria ao seu treinador. Que seria mais uma foto para ajudar a identificá-la. Sabia que
qualquer pequeno erro poderia fazer com que tudo fosse pelos ares. Inclusive os dois meses de
sua vida o qual passou em uma cela suja junto com um monstro. O que estava pensando? Ele não
podia cometer erros.
Pegou a foto e olhou para aquele rosto pensativo. Seu polegar deslizou sobre a banda de
pele macia revelada entre seus jeans e camiseta como havia feito na prisão. O que havia naquela
mulher que mexia tanto com ele? Incomodar-se com ela era um erro, e ainda assim ele pegou a
sua fotografia e a levou com ele. E não foi por sua aparência impressionante, (apesar de achá-la
linda), mas por que havia algo nela, algo que o atraia inexplicavelmente, algo que brilhava através
daquela foto.
Forçou-se a colocar a foto de volta na cômoda. Ele nunca a conheceria, nunca saberia o que
aconteceu com ela, e se estava cometendo o erro de lamentar-se por ser quem era, então, era
hora de procurar sua rota de fuga. Todos os que estavam neste meio, possuíam uma, afinal, todos
sabiam muito sobre o projeto secreto que os havia treinado.
Vestiu-se com cuidado, guardando suas armas facilmente no terno elegante e casual que se
ajustava perfeitamente em seus ombros largos. Seu rosto estava sutilmente diferente, seus olhos
eram de um azul impressionante e algumas das cicatrizes haviam desaparecido. Ele havia cortado
seu cabelo loiro-escuro em um estilo mais curto e raspado a barba. Seu relógio estava no lugar,
uma peça muito elegante, sem ser chamativa. Ele parecia um rico empresário, do tipo que lutou
para chegar onde se encontrava. Ficou parado por um longo tempo enquanto pegava novamente
a foto e passava seus dedos pelo rosto da mulher. Amaldiçoando-se por sua própria estupidez,
tamborilou os dedos na foto em sinal de frustração.
— Esta mulher será a sua morte — disse em voz alta.
Como se fora um sinal, seu pager3 tocou. Intrigado, ligou o computador e se conectou. Um
longo texto se espalhou pela tela. A mulher havia sido identificada graças às informações que ele
havia conseguido. Judith Henderson era uma artista em ascensão. Havia feito um grande nome na
área de restauração de obras antigas. Era uma perita em restaurar pinturas antigas e danificadas.
Colecionadores particulares a procuravam e pinturas no valor de milhões ficavam sob seus
cuidados. Além do seu trabalho como restauradora, era uma artista aclamada por seus próprios
méritos, como criadora de caleidoscópios, ganhou prêmios internacionais e como pintora, cujas
obras originais eram vendidas por altas soma de dinheiro. Vivia em um pequeno povoado no
Litoral Norte da Califórnia chamado Sea Haven.
Tudo nele se imobilizou. Sea Haven. Quantas vezes mais este povo ficaria perto de sua
família? Seu irmão mais novo, Ilya, morava naquele local. Seu outro irmão mais novo, Lev, havia
desaparecido lá e foi declarado morto já que se encontrava dentro de um iate que afundou no
oceano. Ele não acreditava que Lev havia morrido assim tão facilmente. Estas informações seriam
uma armadilha para ele? Ou talvez para Lev? Seria possível que o tivessem utilizando para tentar
encontrar seu irmão? Eles sabiam que um homem como Lev, com todas as suas habilidades, não
morreria facilmente. Ele não entraria em pânico mesmo nas piores circunstâncias.
Petr Ivanov, um homem sem nenhum sentimento humano, havia sido enviado para
encontrar e eliminar Lev caso ainda estivesse vivo. Ele havia informado que Lev, de fato, havia
morrido naquele acidente no iate. Apesar do corpo nunca ter sido encontrado, eles fizeram uma
investigação profunda. Se Ivanov não tivesse realmente convencido da morte de Lev, não teria
arriscado sua reputação ao fazer seu relatório. Dessa forma, todos supostamente, haviam parado
de procurar por seu irmão. Será que isso queria dizer que eles realmente acreditavam Lev estava
morto? Ou estavam criando uma espécie de armadilha para que Stefan os levasse até seu irmão?
Ele não mostrou nenhuma reação ao receber aquela notícia que rolava pela tela de seu
computador. Como Lev, ele não era um homem que cedia ao pânico. Esperou em silêncio.
Tranquilamente. Até que uma nova mensagem apareceu na tela e seu coração deu um salto antes
de se acalmar.
Sua próxima missão era ir para Sea Haven e se relacionar com Judith Henderson. A
mensagem continuava a aparecer na tela, detalhando sua missão. Ele ficou ainda mais quieto.
Originalmente, iria interrogar Jean-Claude quando ele fugisse da prisão. Ele conseguiria facilmente
todas as informações necessárias de La Roux e seu treinador sabia que ele conseguiria. Viajar para
Sea Haven, por mais que quisesse descobrir mais coisas sobre seu irmão, seria pisar em um campo
minado.
Esperou seu coração se acalmar antes de responder.
“Não estou entendendo. Minha missão era interrogar Jean-Claude.”
As ordens anônimas continuaram a aparecer na tela. O plano havia sido alterado. Se alguma
coisa desse errado quando La Roux escapasse da prisão, eles queriam ter a certeza de que
3
Pager: Também conhecido como BIP, é um dispositivo eletrônico que foi muito popular nos anos de 1980 a 1990, usado para
contatar pessoas através de uma rede (centro de controle de chamadas x destinatário). As pessoas deixavam recados na central e a
central enviava um chamado para o pager. Inicialmente o destinatário tinha que ligar para a central para receber o recado, depois,
ele foi aperfeiçoado para receber mensagens de texto com o recado que a pessoa deixava na central de chamadas. Ele foi o
precursor do SMS do celular.
poderiam agarrá-lo quando ele fosse para Sea Haven. Stefan teria que chegar lá antes dele e
através de seu disfarce, se envolver com Judith Henderson. E se fosse necessário, caso o Senhor do
Crime aparecesse, ele interrogaria tanto Jean-Claude quanto a mulher, uma vez que ambos
estariam sob custódia.
Stefan sentiu seu estômago apertar com repugnância. Ele realmente sentiu a bile na boca.
Conseguir informações de La Roux a qualquer custo era uma coisa, mas da mulher também? Ele
abriu mais os olhos para ler o texto novamente, como se dessa forma as ordens pudessem mudar
como em um passo de mágica. Devia estar malditamente cansado para ter uma reação física como
aquela.
Fechou os olhos brevemente enquanto balançava a cabeça. Definitivamente havia algo nesta
missão que não estava claro para ele. Não fazia sentido pensar que os mesmos agentes que
planejariam a fuga de Jean-Claude da prisão para interrogá-lo, o deixariam fugir. Ele não estava
sendo enviado para Sea Haven porque achavam que o Senhor do Crime poderia escapar e sim
porque seria uma isca para atrair seu irmão, Lev, para fora de seu esconderijo. No final das contas,
eles não acreditaram no relatório de Petr Ivanov sobre a morte de seu irmão. Estas ordens sem
dúvida tinham um duplo propósito. Revelar o paradeiro de Lev e se por algum milagre La Roux
escapulisse dos agentes encarregados de interrogá-lo, ele estaria no local para conseguir as
informações que eles precisavam em seguida, matá-lo.
Engolindo sua repugnância absoluta por aquelas ordens, respondeu que estava de acordo.
Momentos depois recebeu um arquivo o qual continha todas as informações que eles haviam
conseguido sobre Judith Henderson. Ele desconectou o computador, levantou-se e serviu-se de
uma xícara de café antes de sentar-se novamente na cadeira esfregando as têmporas.
Ultimamente estava sentindo fortes dores de cabeça, outro sinal de que algo não estava bem com
ele. Essa missão estava fugindo de seu controle rapidamente. E ele não podia se dar ao luxo de
sentir-se mal, não se o estavam enviando para Sea Haven.
Uma parte dele queria ir, o que enviou um estremecimento de preocupação através dele.
Ele não queria levar Petr Ivanov até Lev. E se Lev estivesse em Sea Haven, ele iria querer encontrar
Stefan, não importava o quanto estivesse escondido. Ele amaldiçoou em três línguas diferentes e
tomou um gole de seu café. Judith. Maldita mulher. Ela tinha ficado sob sua pele naquela cela da
prisão. Ele não imaginava que fosse possível alguém fazer isso com ele, muito menos uma mulher
que nunca viu pessoalmente.
Abriu o arquivo e começou a ler sobre sua vida. Mãe japonesa. Pai americano. Ambos
falecidos em um acidente de carro. Ela herdou a altura de seu pai. Tinha belas pernas longas. Ele
forçou sua mente a voltar para as informações no arquivo, precisava memorizar tudo o que fosse
relacionado à sua vida. Tinha um irmão mais velho que havia cuidado dela após a morte de seus
pais.
Paul Henderson, falecido, foi executado com um único tiro na testa, mas não sem antes ter
sido torturado. Ele tinha ido a Paris com sua irmã. Ambos desapareceram e Paul reapareceu na
Grécia. Ele foi morto lá. Judith reapareceu depois que Jean-Claude foi preso e levou o corpo de seu
irmão para casa nos Estados Unidos. O que significava isso? Jean-Claude estaria procurando por
Judith? Ele trabalhou o pensamento mais e mais em sua mente. Fazia sentido. Era possível que ela
tivesse conseguido fugir do homem com a ajuda de seu irmão. Ela era inteligente e homens como
La Roux não podiam se relacionar com mulheres inteligentes. Elas descobririam coisas. Uma vez
que Judith tivesse descoberto quem na realidade era La Roux, viu que não conseguiria ser capaz
de viver com ele. Por outro lado, ela pode ter levado algo valioso dele com ela.
Este pensamento não parecia se encaixar muito para Stefan, mas não parecia haver outra
explicação para a morte de seu irmão e o contínuo interesse de Jean-Claude por ela. Assim como o
fato de que ela sumiu de vista até que Jean-Claude fosse preso. O reaparecimento de Judith
sugeria que ela definitivamente não sabia o quão perigoso La Roux realmente era ou até que
ponto ele poderia habilmente exercer sua considerável influência mesmo estando em uma cela na
prisão.
Stefan continuou lendo o seu dossiê. O arquivo incluía diversas imagens das pinturas Judith,
não só as que ela pintou antes de deixar Paris como também as pinturas que havia feito depois.
No momento em que seu olhar tocou a primeira pintura, sentiu como se recebesse um duro soco
1-24 em suas entranhas. Sua energia e paixão literalmente roubaram o ar de seus pulmões. Ele não
conseguia tirar os olhos da sequência de imagens, estudou cuidadosamente cada pintura. Elas
eram intrigantes, belas, intensas, com cores tridimensionais e linhas incríveis. Desejo e fogo.
Mostravam sua energia e paixão.
— Aí está você, — ele sussurrou. — Eu vejo você.
Ela se entregava de corpo e alma em suas pinturas, não escondia nada, dava vida ao seu
trabalho de forma que as imagens do mar, árvores, nuvens ou arbustos pareciam ter movimento.
Cantavam e choravam. As cores eram como um instrumento musical em sua mão, tocado por uma
especialista com uma coragem surpreendente. Ela entendia as cores e os seus significados. Seus
traços desenhados pareciam uma carícia, ousada e tímida, sensual e inocente. Ela era uma
sedutora com suas cores, um sonho que poderia estar ao seu alcance, mas que parecia ser
inatingível.
Stefan passou as mãos pelos cabelos. Ela estava lá para o mundo inteiro ver. Mostrava sua
alma naquelas pinturas.
Deus. Ela era de tirar o fôlego.
Ele sentiu seu corpo pulsar, o que fez com que ficasse surpreendentemente chocado. Ele
estava sempre no comando dele mesmo, não só fisicamente como mentalmente. Foi treinado
para isso desde que era uma criança. Seu corpo reagia somente com o seu comando e executava o
que quer que fosse quando precisava dele. Que diabos esta mulher estava fazendo a ele com suas
pinturas e sua foto?
Havia muito mais da mulher real na pintura do que na foto misteriosa que ele havia furtado
do Senhor do Crime. Na foto, ela havia se ocultado, parecia realizada, porém, distante do mundo,
mas ali, em cada traço realçado de sua pintura, ele podia ver o seu fogo e sua paixão.
Stefan obrigou-se a seguir em frente. O tempo o qual ela passou com Jean-Claude, estava
bem documentado. Desde que os rumores sobre La Roux e ela haviam começado a surgir. Havia
algumas fotos de uma jovem Judith sorrindo para Jean-Claude, vestindo a felicidade como se fora
4
Soco 1-2: Tipo de soco usado na luta boxe. É uma combinação de dois golpes em rápida sucessão (um soco de esquerda, seguido
de um cruzado de direta).
uma segunda pele. Ele observou isso através de seu olhar atento. Sua reação ao ver o Senhor do
Crime com ela era primitiva, visceral, realmente animalesca. Ele queria matar o homem com suas
próprias mãos. Flexionou seus dedos e procurou abrandar a respiração, ocultando toda a emoção
de sua mente.
Stefan estudou a expressão de Jean-Claude. O braço que mantinha em volta da cintura
estreita de Judith era possessivo, assim como sua expressão, mas havia algo mais... Se um homem
como La Roux fosse capaz de amar, ali estava a prova disso. O que quer que fosse o que ele sentia.
Talvez obsessão. E Stefan infelizmente estava começando a entender o significado desta palavra.
Olhou para o rosto de Jean-Claude na imagem enquanto ele olhava para Judith sorrindo. Sua
expressão dizia que ele pagaria qualquer preço para mantê-la próxima a ele. E certamente, se o
homem conseguisse enganar os agentes que o interrogariam, ele iria para Sea Haven resgatar
tudo o que pensava que era dele e isso incluía Judith.
Stefan leu o arquivo cuidadosamente para gravá-lo em sua memória antes de examinar as
poucas pinturas que Judith fez após fugir de La Roux. Todas as pinturas eram lindas, não havia
dúvidas sobre isso, mas as pinturas feitas nesta época eram muito diferentes das primeiras. Ela
parecia se esconder apesar de mostrar a beleza perfeita da paisagem. Suas cores eram impecáveis,
traços ousados e corajosos, mas para ele, a pintura em si não possuía brilho. Elas ainda eram
lindas, mas ela, (Judith, a essência da mulher), não estava lá. Toda a sua paixão e fogo haviam sido
contidos e substituídos por uma máscara perfeita, até mesmo brilhante, mas não real.
— Tarde demais para se esconder agora. Já consegui enxergar através de você... — ele
sussurrou. — E estou indo atrás de você.
Ele apertou com força os dedos sobre os olhos, onde uma dor de cabeça estava começando.
Maldita seja! Ele não queria outra vida. Não queria sonhar com outra vida. Jogava com as cartas
que davam para ele como um autômato que aprendeu a ser. Ele não sentia. Não queria sentir. Já
não pensava mais em seus pais e na escuridão da sua terra natal, não pensava nas armas
apontadas para a cabeça de seus pais e seus gatilhos sendo puxados. Não havia segurança dentro
de quatro paredes. E nunca haveria segurança para ele em qualquer lugar... Nunca. E qualquer
pessoa que estivesse com ele estaria em perigo. Qualquer pessoa que amasse seria tirada dele.
Era melhor nunca correr este risco e por este motivo, precisava não sentir nada por ninguém.
Ele repetiu o mantra suave em voz alta. Seus passos deslizaram sobre o tapete antes mesmo
que soubesse qual seria sua intenção. Cruzou o quarto e pegou a foto de Judith Henderson
novamente, ela representava uma força maior do que ele conseguia resistir. Uma mulher que
falava sete idiomas. Inteligente. Bela. Uma artista. Ele sequer imaginava o que alguém poderia
sentir quando possuía liberdade para pintar, para derramar o seu coração e sua alma em uma tela.
Ele sabia falar várias línguas. Era inteligente. E entendia de pinturas. Na verdade, sabia tudo
sobre elas. Era necessário aprender tudo em seu trabalho quando trabalhava disfarçado e adquiria
a pele de outra pessoa. Suas têmporas latejavam e ele afundou na cadeira com a fotografia dela
na mão. Quem era esta mulher? O que significava aquele olhar perdido e solitário? O vento em
seus cabelos? O sol brilhando sobre a água? Sua imaginação há tanto tempo reprimida, começou a
trabalhar apesar do seu desejo de suprimi-la. Ela estava esperando que alguém desenterrasse a
paixão e o fogo escondidos dentro dela. Ela estava esperando o homem certo para dar isso a ele.
Que diabos ele estava pensando?

CAPÍTULO 02

Púrpuras escuras formavam redemoinhos com as linhas negras que se moviam pelo teto alto
de cor azul cobalto chorando lágrimas cristalinas. Tanta tristeza enchia a sala, indo do chão ao
teto, que a simples pedra e a madeira, mal podiam conter a intensidade de suas emoções. A
tristeza vivia e respirava.
A raiva movia-se pelas paredes, inspirando e expirando e os traços de cor vermelha e laranja
ondularam, saltando grandes baforadas de ar para controlar a força da raiva, a necessidade de
retribuição, a vingança. A fúria vivia e respirava juntamente com a tristeza naquele espaçoso
estúdio. Grande e escuro.
Uma brisa vinda do quintal passou pelas janelas francesas onde plantas altas obscureciam
qualquer visão do estúdio pelo lado de fora, provocando chamas cintilantes na ponta de cada uma
das velas escuras que iluminava as pinturas. Uma vacilante luz capturava um brilho nos cristais
destacados em sua pintura sombria e zangada. Caracteres japoneses descreviam um único nome…
Paul Henderson.
Judith Henderson inclinou-se na cadeira de encosto alto e riscou com um movimento forte
um traço negro sobre a pintura que cobria toda a luz e a consumia. Ela não perdoaria. Nunca.
Nunca perdoaria a tortura imposta ao seu irmão e sua morte absurda. Lágrimas se derramaram
por seu rosto e ela as afastou com o braço, acrescentando outro traço negro na pintura como uma
promessa feroz de vingança.
— Um dia, meu irmão… — ela prometeu em voz alta para o quadro tempestuoso. — Vou
encontrar um jeito de devolver este golpe e não hesitarei. Não desta vez. Vou usar uma força
mortal para vingar a sua tortura e o seu assassinato. — Sua alma já estava negra com sua própria
culpa. O que seria mais um pecado mortal entre tantos outros?
Judith tocou a borda da tela quase com reverência. Paul estava presente em muitas de suas
pinturas e ela o caracterizava cada vez mais na tinta a óleo, tentando desesperadamente se livrar
da raiva sombria que impregnava sua alma. Às vezes, tinha vontade de deixar seu estúdio escuro e
fechado, afastado do mundo, mas outras vezes, como naquele momento, ela era conduzida para ir
até ali, obcecada pela necessidade de deixar sair sua sombria e obscena raiva, a culpa e a enorme
tristeza que estava impregnada em seus ossos.
Este estúdio e as pinturas que estavam escondidas dentro dele guardavam todas as suas
emoções. As mais sombrias… Sentimentos que não se atrevia liberar para o universo. Raiva. Fúria.
Desafio e culpa. Ela derramava essas coisas em suas pinturas e em algumas partes individuais
quando fazia um caleidoscópio. Às vezes sentia-se estremecer quando pintava os traços escuros e
raivosos, passando pela tela, mostrando sua liberdade de expressão verdadeira. Naquele estúdio,
usava apenas pincéis grandes, nenhum deles parecido com seus finos pincéis que usava para a sua
pintura e para a restauração das obras de seus clientes.
Cada pensamento sombrio, cada necessidade sombria, forte o suficiente para acordá-la no
meio da noite e deixá-la suando entre os lençóis era cuidadosamente deixada naquele estúdio, da
mesma forma cuidadosa e deliberada que cuidava de suas tintas e pincéis que se encontravam lá.
Aquele era um estúdio de depressão e loucura. Um local escuro. Feio. Um local cheio de tristeza.
Culpa e vergonha. Desespero total e absoluto.
Judith deu outra pincelada ousada para os lados em todos os cantos, seu pincel varria ao
longo da tela, dando a qualidade intensa que precisava para conseguir expressar sua raiva.
Oferecia a mesma atenção, se não mais, para estas pinturas. Este estúdio era o único lugar no qual
ousava soltar suas emoções mais sombrias que ferviam como um vulcão profundo dentro dela.
No centro de seu estúdio estava sua melhor e mais horrível criação, um grande
caleidoscópio que mantinha coberto, da mesma forma que fazia com as pinturas. Ela não queria
que alguém acidentalmente tropeçasse naquele lugar de energia sombria. O caleidoscópio era
particularmente perigoso, cada pequena parte dele traduzia anos de fúria assassina, cinco deles
representavam os anos que se passaram após o assassinato do seu irmão. Ela possuía um estúdio
separado no qual trabalhava em seus caleidoscópios, o qual era muito diferente daquele lugar.
Deu outra pincelada que se destacou em toda a tela, seu tom escuro e profundo, quase como uma
noite sombria.
A brisa deslizou novamente pelo estúdio, fazendo com que as chamas brilhantes e o cheiro
avassalador das tintas a óleo rastejasse nas paredes do estúdio, dando um odor distinto à sua fúria
sombria a qual mantinha prisioneira naquele lugar. Pegou o pincel e pintou uma linha fina como
uma promessa da vingança que parecia um ponto de exclamação. Sua mão tinha um corte
irregular na parte interna causado por um pedaço de vidro, e como em outras vezes, ela pintou
com seu sangue misturando-se à pintura. Seu suor e suas lágrimas muitas vezes acabaram dentro
destas pinturas também, misturavam-se profundamente entre os cristais quando ela pintava
sobre os pedaços de cristal, sentia que partes dela se enraizavam nas peças profundamente.
Judith amaldiçoou seu “dom” pela milésima vez. Ela poderia vincular qualquer elemento a
ela. Compartilhava a emoção e conseguia amplificar e usar essa emoção para propósitos
destrutivos. Ali naquele estúdio era seguro o suficiente permitir-se o luxo de chorar de raiva, de
ódio, da real necessidade de vingança, mas nunca correria o risco de mostrar essas coisas fora
daquelas quatro paredes.
A brisa soprou insistentemente, trazendo com ela uma nota melódica. Suave e incessante.
Um barulho penetrou nas camadas de sua concentração.
— Judith.
Seu nome soou como um sussurro ao vento trazendo um perfume para as trevas.
— O telefone está tocando. Onde você está? Está em casa?
Judith piscou várias vezes e olhou para as grandes gotas de sangue que estavam escorrendo
pelo chão. Demorou um momento para se concentrar e lembrar onde estava e o que estava
fazendo. Ela perdeu-se completamente enquanto despejava seu ódio e culpa na tela. Reconheceu
a voz de Airiana Rydell, uma de suas amadas irmãs. Não era tão difícil imaginá-la passeando por
sua casa com seus pés descalços afundando no tapete grosso de cor marfim e seu cabelo platina
balançando enquanto procurava por Judith.
Uma ponta de urgência penetrou em sua voz melódica.
— Judith? Você está bem? Responda-me.
Judith caminhou até as portas francesas e respirou profundamente para tentar limpar a
cabeça. Havia sido consumida por sua pintura. Era como se estivesse em uma névoa profunda.
Precisava lutar para sair e se orientar para saber onde estava e o que precisava fazer. Demorou
ainda alguns minutos para se obrigar a sair das águas escuras, do turbilhão de raiva e tristeza que
ameaçava devorá-la e encontrar o caminho de volta à sanidade.
— Estarei aí em um minuto, Airiana. — Ela lutou para manter sua voz estável enquanto
enrolava sua mão com um pano limpo para absorver as gotas de sangue. — Você poderia pegar o
recado para mim?
De forma muito cuidadosa, começou a limpar os pincéis, sabendo que poderia demorar o
tempo que fosse necessário, pois Airiana atenderia ao telefone para ela e anotaria o recado.
Airiana saberia que ela estava lutando para voltar à realidade. Ela só ia a este estúdio quando a
escuridão ameaçava consumi-la completamente e precisava encontrar uma maneira de extravasar
um pouco. Temia que se não fizesse isso, mais cedo ou mais tarde, suas emoções escapariam e
poderia prejudicar alguém acidentalmente.
— Inspire. Expire. Veja a beleza do mundo ao seu redor. — Ela esperava que o mantra
familiar a trouxesse de volta a realidade.
Ela possuía irmãs. Cinco. Cada uma delas havia compartilhado uma experiência tão
traumática quanto à dela. Elas se conheceram em Monterey, Califórnia, uma cidade costeira onde
uma mulher incrível, reuniu um grupo de vítimas de violência e de assassinatos para dar
assistência psicológica. Cada uma das mulheres sentia-se responsável pelo o que aconteceu e cada
uma delas estava no limite de sua capacidade de lidar com a vergonha e culpa. Até chegarem à
Monterey. Até se encontrarem, conhecerem e assim formar uma irmandade duradoura.
Elas confiavam em poucas pessoas. E acreditavam em menos ainda. Mas juntas eram fortes.
Juntas, resolveram que poderiam viver suas vidas em paz e tentar encontrar a felicidade
novamente. Talvez não da maneira como os outros teriam pensado ser correto, mas aquele era o
caminho o qual decidiram percorrer e Judith abraçou sua vida no pequeno vilarejo de Sea Haven,
onde trabalhava.
Elas chamavam-se uma às outras de família e era isso o que elas eram. Irmãs. Muitas
pessoas no mundo possuíam uma “família do coração”, pessoas que viravam parentes por opção e
não por ter o mesmo sangue, e sua “família” apareceu em sua vida em um momento bastante
sombrio e salvou sua vida. Há cinco anos decidiram comprar uma fazenda juntas perto do vilarejo
de Sea Haven, na Costa Norte da Califórnia. A comunidade era pequena e restrita, os moradores
dependiam um dos outros para um sucesso em comum, o que os tornava muito simpáticos e
tolerantes uns dos outros.
— Você está bem, Judith? — Airiana chamou novamente, desta vez, de forma mais
insistente.
Esta era uma pergunta comum que todas sempre faziam uma para as outras.
— Já estou indo. — Disse novamente esquivando-se da pergunta. Nunca foi boa em mentir
descaradamente. O que naquele caso era um karma ruim. De qualquer forma, Airiana era muito
boa em detectar mentiras.
Airiana era a mais difícil de todas as suas irmãs para enganar. Assim como Judith, ela podia
ver a aura das pessoas, um campo eletromagnético de energia pura em torno dos seres humanos.
Ela via a energia nas cores que rodeava as pessoas, permitindo assim, vislumbrar suas emoções,
bem como seu caráter. Judith não duvidava de seu dom, assim como Airiana acreditava no dela.
Todas as suas irmãs sabiam que se Judith estava em seu estúdio particular é porque não estava
tendo um bom dia.
Judith colocou cuidadosamente todos os seus pincéis e tintas em seu lugar e envolveu a tela
na qual estava trabalhando. Ninguém jamais poderia ver este quadro. Ninguém jamais poderia
perscrutar seu caleidoscópio que parecia um turbilhão sombrio. Essas peças eram muito
poderosas sobre os sentidos, foram criadas com emoções proibidas, desesperadas, ela raramente
se deixava levar por este tipo de sentimento, mas às vezes não tinha escolha.
Deliberadamente trancou as janelas francesas e puxou as grossas e pesadas cortinas que
impediam que a luz as transpassasse, evitando assim qualquer tipo de visão do que estava dentro
daquele estúdio.
Soprou as muitas velas acesas, mergulhando o estúdio na escuridão e inspirou
profundamente o odor de lavanda suave lutando para encontrar sua paz interior novamente.
Depois de permitir por horas a liberdade de suas sombrias emoções, precisava daquele tempo
para enterrá-las novamente e dessa forma, encontrar a tranquilidade. Precisava manter a
serenidade completa e absoluta em todos os momentos os quais estivesse na companhia de
outras pessoas.
Novamente, Judith inspirou profundamente o odor de lavanda, o cheiro que agora parecia
estar se desvanecendo levemente e caminhou pelo corredor de sua casa, a suave cor marfim a
acalmava. Ela olhava para tudo como se fora uma tela, inclusive para a sua casa. Elas e suas irmãs
eram proprietárias de uma grande fazenda e cada uma delas separou dois hectares para construir
o seu lar. Cada uma projetou sua própria casa, ela havia projetado a dela em um tom
assombrosamente claro.
O andar de baixo era dedicado a tudo o que se relacionasse ao seu trabalho, havia três
estúdios, uma sala de jogos, um banheiro e um quarto apenas para o caso dela trabalhar até muito
tarde e não precisar se preocupar em subir para a sua suíte. Suas janelas eram de vitrais e
possuíam vista para os jardins ao redor da casa. Era uma área aberta e acolhedora. Ela amava sua
casa e a paz merecida que arduamente procurou e encontrou lá.
Encontrou-se com Airiana no corredor e deu-lhe um abraço rápido.
— Eu estava preocupada. — Admitiu Airiana enquanto seus profundos olhos azuis
procuravam no rosto de Judith as sombras do que ela estava escondendo. — Você só entra
naquele seu estúdio quando está realmente chateada, Judith. Você não esteve lá por algumas
semanas.
Aquilo não era realmente verdade. Nos últimos dias que precederam o aniversário do
assassinato de Paul, Judith não tinha sido capaz de dormir e passou várias noites no estúdio,
cercada por sua raiva e tristeza.
— Eu sei que isso preocupa você, — Judith disse suavemente. Apenas a visão de Airiana
restaurava seu equilíbrio interior. Ela não estava sozinha, não precisava lidar com este turbilhão de
emoções as quais se sentia forçada a esconder. Ela possuía suas irmãs. E elas a amavam,
independente de seu passado imprudente, elas sempre a apoiaram.
— O que aconteceu com sua mão? — Airiana exigiu uma resposta. — Devo chamar Lexi?
Sua irmã mais nova trabalhava, entre tantas outras coisas, com ervas medicinais. Judith
forçou um sorriso, segurando sua mão.
— Foi somente um arranhão. Nada mais. Estou morrendo por uma xícara de chá. Você
colocou a chaleira no fogo?
— Assim que você me respondeu, — Airiana disse olhando e segurando mais uma vez a mão
de Judith antes de suspirar e soltar sua mão.
— Ótimo. Já deve estar quase fervendo.
Juntas, subiram as escadas e foram para sala principal. Judith adorava olhar para Airiana, ela
estava sempre calma diante de qualquer crise. Ela era um pouco menor do que Judith, magra,
parecia uma menina, seios pequenos, cintura fina e pernas finas. Seu cabelo era da cor natural de
platina. Possuía alguns fios dourados que pareciam surpreendentes sob o sol. Seus olhos eram
enormes, de um azul profundo, com cílios loiros e pequeninas sardas polvilhadas por seu nariz.
Airiana era uma das pessoas mais inteligentes que Judith conhecia, e isso incluía Damon
Wilder, o marido de Sarah Drake, que trabalhava em sistemas de defesa para os Estados Unidos.
Airiana parecia uma pequena fada e olhando para ela, ninguém poderia imaginar o quão
inteligente era. Ela parecia muito mais com uma bailarina do que alguém que faz parte de um
grupo de pensadores5. Airiana simplesmente fazia as pessoas se sentirem bem com sua presença e
em dias como aquele, Judith agradecia a sua companhia.
— Você sempre escolhe o dia perfeito para vir me visitar, — disse Judith significativamente.
— Suponho que você já tenha escolhido o chá que beberemos e também já pegou as xícaras. —
Airiana sempre parecia saber quando Judith ou qualquer outra pessoa precisava de algum ânimo.
Airiana riu.
— Claro. Você sabe que eu não tenho vergonha de me sentir à vontade quando estou em
sua casa. Mesmo quando você tiver um marido e uma dúzia de crianças correndo por aí, eu ainda
me sentirei da mesma maneira, ou talvez até melhor, pois serei a tia favorita e maravilhosa.
Vamos tomar chá preto. Preciso de um estimulante.
Judith balançou a cabeça, sorrindo amplamente e mantendo os olhos brilhantes e alegres,
quando no fundo, chorava continuamente. Estava presa por seus próprios dons e sentia-se
totalmente aterrorizada em ter alguma chance novamente, de ter a oportunidade de sentir algo
por algum homem e confiar nele. Ela não seria a única mulher a nunca ter filhos, apesar de sempre
ter desejado tão desesperadamente construir uma família.
5
Grupo de pensadores (Em inglês: Think tank): Um grupo ou uma instituição organizada para uma intensa pesquisa e resolução de
problemas, especialmente nas áreas de tecnologia, estratégia social ou política.
A coisa mais difícil que estava tendo que controlar não era a sua expressão facial e sim,
manter uma aura de felicidade ao seu redor. Felizmente, ela estava realmente muito feliz em ver
Airiana, e desta maneira, a cor fluorescente em sua aura estaria lá, sobrepondo ao profundo
sofrimento de vergonha e culpa que escondia do mundo. Ela sempre procurava esconder sua
energia ao redor de Airiana, o que sempre resultava em uma aura cinza opaca que fazia Airiana
levantar a sobrancelha mostrando que estava percebendo que algo acontecia com ela embora não
perguntasse se ela estava bem ou se precisava de algo. Airiana sempre cumpriu sua promessa de
não bisbilhotar a vida alheia.
O andar superior da casa era espaçoso, tinha uma grande sala de estar, aberta para uma sala
de jantar e uma grande cozinha, para quem a visitasse se sentisse bem-vindo em qualquer uma
das salas. As várias janelas proporcionavam uma incrível luz solar e uma deslumbrante vista do
jardim que circulava a casa.
— Não há nada melhor no mundo do que uma boa xícara de chá no momento certo, —
Judith declarou. — Obrigada por colocar a água na chaleira para ferver. — Ela se alongou. —
Tenho gasto tempo demais sentada. Acho que minha bunda está crescendo significativamente.
Airiana fez um sinal virando o dedo em um pequeno círculo para ela virasse de costas. Judith
gentilmente se virou e Airiana arregalou os olhos.
— Você está absolutamente certa. Esta coisa de meia idade realmente faz crescer a bunda.
— Ela soltou uma grande gargalhada e deu uma corrida com Judith em seus calcanhares.
— A melhor coisa em ter longas pernas, diferentemente de você, meu pequeno camarão de
pernas curtas, é que eu posso correr mais do que você.
— Não. Com esta bunda grande, você não pode. — Airiana falou por cima do ombro
enquanto corria pela casa espaçosa. A acusação de que qualquer coisa na figura esguia de Judith
pudesse ser grande era tão absurda, que ela estava rindo tanto que quase não conseguia ver para
onde estava correndo, bateu em uma poltrona, se desequilibrou e caiu no chão piscando para
Judith.
— Caramba. Na verdade eu não acho que sua bunda esteja tão grande assim como
pensávamos.
— Eu não estou nem perto de chegar à meia-idade, entendeu sua engraçadinha.
— É verdade, mas ainda assim, você é mais velha do que eu, — Airiana respondeu
presunçosamente.
A tela da porta da frente se abriu e uma mulher enfiou a cabeça na porta. Alta e loira, ela era
a imagem de uma atleta, com o cabelo puxado para trás em um rabo de cavalo e em seu corpo em
uma camiseta de lycra apertada e short de corrida. Quando chegou ao hall, logo acima da escada,
ela bateu os pés e limpou o brilho do suor em seu rosto.
— Blythe. — Judith acenou enquanto cumprimentava a mais velha de suas irmãs e
reconhecida líder de sua irmandade. — Você foi correr novamente esta tarde? Você já não havia
corrido pela manhã.
— O que diabos vocês duas estão fazendo? — Blythe Daniels ignorou a pergunta e entrou na
sala afundando em um divã para tirar seu tênis de corrida.
— Bem, — disse Airiana ainda deitada no chão, basicamente estamos discutindo sobre a
bunda da Judith e o quanto ela cresceu enquanto ela ficou sentada hoje pintando.
— Está falando sério? — Blythe franziu a testa para ambas parecendo muito preocupada. —
Eu não trouxe meus óculos para poder enxergar melhor, mas, sinceramente Judith... Acho que não
há muita carne aí. Na verdade, sua bunda poderia ser considerada plana.
— Pois eu tenho uma bunda muito bonita. — Judith protestou.
— Pois foi você quem começou com esta ideia de que ela estava crescendo. — Airiana a
lembrou. — Eu estava apenas tentando ser solidária e te apoiar.
Judith arremessou um travesseiro decorativo em sua cabeça. Airiana enviou uma rajada de
ar para deter a almofada que parou abruptamente e caiu no chão.
— Exibicionista. — Judith a acusou. — Vou fazer o chá. Blythe, você quer um copo de água?
— Obrigada, adoraria um.
— Você não devia correr duas vezes em um mesmo dia, Blythe, principalmente hoje. Não é
hoje que Levi vai nos dar aula de autodefesa ou estou confundindo os dias? — Airiana perguntou.
Mais uma vez, seus olhos azuis inspecionavam a irmã mais velha, com um pouco de preocupação.
Judith fez uma pausa na entrada em formato de arco que levava à cozinha para ouvir a
resposta de Blythe. Todas elas tinham demônios pessoais os quais viviam lutando e Blythe não era
uma exceção. Ela era uma pessoa tão boa que a única palavra Judith poderia descrever o que
sentia por ela era angústia. Era angustiante para todas elas quando Blythe passava por esta fase
de insônia. Ela se levantava cedo e corria. Muitas vezes corria tarde da noite. Era raro para ela
correr durante a tarde.
— Você não está confundindo os dias. Levi definitivamente vai brincar com todas nós hoje à
noite no ginásio. — Blythe disse, enxugando o rosto com a bainha de sua camiseta. — Na semana
passada todos os ossos do meu corpo doeram. Ele é pior do que Lissa e seu treinamento em artes
marciais.
— Não se esqueça da aula de pilates. Seu treinamento de levantamento de peso. E as aulas
de Zumba6. — Airiana acrescentou enquanto se jogava de costas no chão e gemia. — Fico exausta
só de pensar nisso. Lissa pode pensar de um milhão de maneiras de acabar com todas nós.
Judith forçou uma risada apesar de já estar mais relaxada, era fácil sentir a emoção de suas
irmãs.
— Não como Levi. — Disse Judith.
Levi Hammond era casado com a Rikki, sua outra irmã, e Levi acreditava que todas deveriam
estar preparadas para qualquer situação. Elas praticavam movimentos de autodefesa uma e outra
vez e ele era um professor muito exigente. Ultimamente tinha acrescentado armas em seu
treinamento. Lissa, é claro, aprendia a lições particularmente rápido uma vez que era faixa preta
3º grau, enquanto Judith se sentia totalmente fora do seu elemento. Ela conseguia fazer bem os
katas7 de artes marciais, todos aqueles belos movimentos graciosos fluíam através dela pelo
6
Zumba: Um exercício de dança que incorpora vários tipos de dança diferentes tais como: salsa, merengue, mambo, dança do
ventre, tango e vários outros estilos.
7
Katas: Representa uma sequência de movimentos de ataque e defesa em uma luta imaginária. Estes movimentos estão presentes
nas mais diversas artes marciais e podem ser realizados em conjunto ou individualmente.
ginásio de forma correta e elegante, mas simplesmente parecia impossível conseguir fazer alguns
movimentos básicos de autodefesa.
Lissa sempre teve uma paciência inesgotável com ela. Levi, nem tanto. Ele estava
determinado a garantir que Judith pudesse lidar por si mesma em qualquer situação. Ela sabia que
ele estava certo, mas isso não ajudava com que fizesse melhor os movimentos de autodefesa. Ela
se ocupou derramando a água fervendo no bule e colocou uma tampa para apurar o sabor do chá.
Blythe havia acabado de beber seu copo cheio de água no momento em que o chá ficou
pronto ignorando o olhar das outras duas mulheres para ela. As três se aconchegaram nas
cadeiras confortáveis colocando suas pernas para cima.
— Eu tenho que dizer... Estava totalmente errada sobre Levi. Ele é louco por Rikki e tem sido
um homem bom para ela. Eu realmente me afeiçoei muito a ele. — Confessou Judith
— Eu também não esperava gostar tanto dele. — Airiana admitiu.
Blythe encolheu os ombros e olhou para elas por cima de sua xícara de chá.
— Ah, não! Você não ficará calada, — Judith negou com a cabeça. — Você não pode ficar em
silêncio sobre o assunto de Levi. Ele está casado com nossa amada Rikki e eu pensei ter ouvido
você dizer que eles eram bons um para o outro.
— E eu acho que são, — disse Blythe. — Ele está sempre procurando ampliar sua zona de
conforto, a aceita e parece amá-la pelo que ela é. Eles parecem uma combinação perfeita.
— Estou percebendo um, mas, em sua colocação, — Airiana apontou.
— Ninguém conhece de verdade a ninguém, — disse Blythe. — Você acaba tendo que julgar
as pessoas pelas aparências. Pelo que dizem ou como agem, mas se por algum motivo elas
mentem, se resolvem não mostrar quem são de verdade, você nunca saberá com quem está
lidando.
Judith abaixou a cabeça fingindo tomar um gole de chá. Blythe sempre dizia a verdade e
desta vez conseguiu atingi-la, Judith sentiu como se uma flecha atravessasse o seu coração. Houve
um súbito silêncio e quando ela olhou para cima, percebeu que suas irmãs estavam olhando para
ela alarmadas.
— O que houve querida? — Blythe perguntou. — Eu não quis relembrar velhos fantasmas.
Possivelmente os meus estão muito próximos de mim hoje. Não fui capaz de dormir esta noite e
estou me sentindo um pouco melancólica.
Judith respirou profundamente e obrigou-se a se afastar do precipício de desespero e
tristeza o qual se encontrava, sabendo que se chegasse até a borda, acabaria levando Blythe e
Airiana com ela.
— Desculpe-me, — ela sussurrou. — Eu estava pensando em Paul hoje e isso mexeu comigo.
A ideia de que Levi possa ferir Rikki sabendo que nos afeiçoamos a ele e o aceitamos como parte
de nossa família… É horrível. — Ela também não estava dormindo ultimamente. Seria possível que
de alguma forma estivesse afetando Blythe? Era uma possibilidade.
— Mas isso acontece, — disse Blythe.
Airiana colocou sua mão reconfortante no ombro de Blythe.
— Sim, é verdade, Blythe. Isso acontece, principalmente quando somos muito jovens e
confiamos nas pessoas erradas.
— Algumas de nós ainda somos muito jovens. — Judith disse enquanto cutucava Airiana com
o pé descalço, em um esforço para amenizar o clima.
Airiana fez uma falsa cara feia para ela.
— Eu sei disso. E eu não sou a mais nova da família. Nosso bebê chama-se Lexi.
— Mas você ainda parece ser uma menina, — Judith brincou. — Ainda não cresceu o
suficiente. Esqueceu que te pediram sua carteira de identidade na entrada do cinema semana
passada quando você quis assistir um filme impróprio para menores de dezoito anos?
Blythe caiu na gargalhada enquanto Airiana mostrava uma expressão aborrecida.
— Você não pode negar Airiana, tampouco vai esquecer isso por algum tempo.
Airiana juntou-se as risadas das irmãs e balançou a cabeça lembrando-se da cena absurda.
— Evidentemente a mulher precisava de óculos.
— Quem estava ligando aqui para casa quando você chegou? — Judith perguntou quando as
risadas diminuíram.
— Quase havia me esquecido disso, — Airiana disse. — Foi Inez quem ligou. Ela disse que
precisava que você desse um retorno a ela o mais rápido possível. Alguém está interessado em
comprar a galeria e ela está esperando que você arranje um tempo para mostrar a galeria para
esta pessoa.
— Seria maravilhoso para Inez se conseguisse vender a galeria. Dessa forma, ela e Frank se
livrariam das despesas de manutenção. — Disse Blythe. — Ela realmente se esforçou para manter
as coisas como estavam enquanto Frank esteve na prisão. Mas sua saúde está tão frágil agora que
ela não consegue mais manter a loja e a galeria. Você tem sido muito boa para eles, Judith.
Judith apontou para Airiana com sua xícara de chá.
— Estive trabalhando na galeria muito mais do que em minha própria loja. Se Airiana não
estivesse lá para me ajudar, eu não teria sido capaz de ajudá-los. — Ela sorriu para suas irmãs. —
Bem... Eu só teria tempo para fazer isso que ela está me pedindo, hoje à noite.
— Oh, não! De jeito nenhum. — Blythe protestou. — Se eu tenho que ir às aulas de
autodefesa, você também tem.
— Levi não permite nem que Rikki falte às aulas, — Airiana declarou. — Você irá à aula,
Judith. Ligue para Inez, mas não se atreva a tentar marcar uma visita à galeria esta noite.
Prometemos a Levi aprender autodefesa.
— Mas eu me sinto perdida nesta aula. — Judith lamentou.
— Só porque não quer ferir ninguém, — Airiana disse. — Pessoalmente eu gosto de bater no
homem. Tente querida, você pode gostar disso também. Basta fingir que ele é alguém que você
não gosta.
O coração de Judith disparou. Ela obrigou sua mente a se afastar daquela ideia absurda.
Airiana não tinha ideia do quão perigoso isto poderia ser. Judith poderia aproveitar a força de cada
elemento, poderia extrair toda a energia de suas irmãs e incendiar o ginásio com o fogo de Lissa,
inundá-lo com a água Rikki, enterrá-lo com a terra Lexi ou utilizar o ar de Airiana para colocar o
ginásio abaixo. Ela não podia se permitir fazer isso, não outra vez, não podia perder o controle de
suas emoções nunca mais. Ela nem sequer ousava reconhecer uma emoção mais sombria por
medo do que poderia acontecer.
A ideia de bater em alguém a amedrontava, principalmente se esta pessoa fosse alguém que
amava. Abaixou a cabeça para esconder a sua expressão e conseguiu colocar um sorriso meio
forçado em seu rosto.
— Levi pensa que eu sou uma bunda mole.
Airiana cutucou-a com o dedão do pé.
— E isso não é melhor do que ter uma bunda grande?
— Ou não ter uma bunda? — Blythe perguntou.
Judith fez uma cara feia para ambas.
— Vocês estão um pouco obcecadas com a minha bunda. — Ela estudou o rosto de Blythe.
— Mas você não veio aqui para discutir sobre nada disso, não é? O que está errado, Blythe?
Blythe suspirou e colocou sua xícara de chá na mesa.
— Vocês sabem que Elle e Jackson estão na Europa não é? Ele pegou uma licença de seis
meses e estão fazendo esta viagem de turismo neste momento. Mas eles vão voltar. A sétima filha
da família sempre viveu na casa das Drakes em Sea Haven. Eles definitivamente voltarão para
morar lá. Joley Drake se casou com Ilya Prakenskii. Podemos continuar fingindo que Levi é um
Hammond o quanto quisermos, mas Ilya descobrirá a verdade. E Jonas falará com Jackson.
Judith mordeu o lábio. Levi Hammond não seria bem-vindo a Sea Haven se dependesse de
Jackson, o marido de Elle. Levi estava naquele lugar onde Stavros mantinha Elle Drake cativa. Ele
tinha conseguido se infiltrar em sua equipe para tentar prender uma grande quadrilha de tráfico
humano e não podia arriscar tudo tentando salvar Elle. Mas, nada daquilo teria importância para
Jackson. Elle havia sido estuprada e torturada durante meses por Stavros e Jackson não se
interessaria se o que estava em causa era um objetivo maior, para ele, nada seria importante o
suficiente, nada justificaria o fato de que ele teria que fechar os olhos para o sofrimento de sua
mulher.
— Você tem medo de que façam da vida deles um inferno... — Airiana se aventurou a dar
um palpite.
— Ou algo pior. E Rikki é muito frágil para passar por isso. — Blythe esfregou as têmporas
em agitação. — Se eles obrigarem Levi a ir embora daqui, Rikki irá com ele e ela não ficará bem
fora deste ambiente. Levou muito tempo para ajustar.
— As Drakes não podem nos obrigar a sair de Sea Haven, — disse Judith. — Se elas não
conseguirem entender e superar o que Levi fez e porque fez, e dessa forma, tentar fazer da vida
deles um inferno, estou disposta a me mudar com eles.
Blythe olhou para ela.
— Precisamos pensar realmente sobre isso, Judith. Pois no final das contas, teremos que
tomar uma decisão pessoal. Precisamos pensar e ver o que faremos com os negócios que temos
aqui.
Judith concordou.
— Eu amo a Rikki. Ela é minha irmã e é autista. Ela precisa de nós. Ela precisa do oceano e
ela precisa de Levi. Se eles tiverem que ir embora, eu irei com eles. Não me importa onde vou
trabalhar. Eu amo este lugar, mas nossa família é o que mais me importa e não o local onde
moramos.
Airiana deixou escapar o fôlego.
— Eu estava preocupada demais com isso. E não sabia se alguma de vocês também estava...
— Você conversou sobre isso com as outras? Conversou com Lexi? — Judith perguntou.
Lexi passava a maior parte de seu tempo trabalhando na fazenda. Ela cultivava os legumes
que eram vendidos para os mercados locais e para os mercados das cidades vizinhas.
— Falei com Lissa e estou falando com vocês. Só não falei com Rikki e com ela, — Blythe
admitiu. — Lissa disse que se isso acontecer, também vai se mudar com eles. Mas vai ser muito
difícil para Lexi. Ela trabalhou muito duro neste lugar.
— Você realmente acha que a situação pode chegar a esse ponto? — Airiana perguntou. —
Jonas conseguiu ser imparcial quando descobriu e ele é casado com Hannah, a irmã de Elle.
— Isso não significa que Jackson terá a mesma reação, — Blythe ressaltou. — Sou prima
delas, um membro da família, e acreditem quando eu digo que elas são muito unidas, assim como
nós. Se Jackson não conseguir entrar em um acordo com Levi, Sea Haven vai se tornar um lugar
difícil para se viver. E Rikki é muito sensível. Ela vai sentir isso. — Ela encolheu os ombros. — Estou
apenas tentando antecipar que pode acontecer.
— Todas nós estamos preocupadas, — disse Judith. — E acho que Levi também se preocupa,
mas provavelmente não da mesma forma que nós. Ele realmente não se importa se é ou não
aceito pelas pessoas e suponho que Rikki pense da mesma forma caso tivesse que se manter
afastada do vilarejo.
— Mas uma criança sentiria, — Airiana arriscou um palpite. — Uma criança sempre sabe
quando está sendo excluída.
— Duvido que Rikki considere a ideia de ter um filho, — disse Blythe. — Mas pelo menos
estamos todas de acordo. Vou conversar com Lexi sobre o assunto, para que ela também se sinta
segura.
— Pode ser difícil para nós vender a fazenda, — disse Judith. A situação econômica de um
modo geral não anda boa, embora as atividades de nossa fazenda dê dinheiro.
— O que pode tornar tudo mais fácil, — disse Blythe. — Podemos provar que a fazenda dá
lucro, o que seria um bônus para nós. Mas vamos deixar para cruzar esta ponte quando
chegarmos a ela.
— Você já procurou algum lugar onde pudéssemos morar todas juntas? — Airiana
perguntou. — Isso seria muito bom para todas nós. Poder encontrar um lugar semelhante a este.
— Encontraremos o lugar ideal se precisarmos fazer isso. — Blythe respondeu com
convicção.
— Você vai conversar com Rikki e Levi sobre isso? — Perguntou Judith.
Blythe negou com a cabeça.
— Não com Rikki por enquanto. Pensei em conversar com Levi esta noite, mas não até eu
conversar com Lexi. Pensei em falar com ela assim que saísse daqui. Eu só queria ter certeza de
que vocês estariam no mesmo barco.
Judith olhou ao redor de sua casa. Ela a desenhou de cima para baixo, assim como todas
planejaram suas casas. Juntas, construíram suas casas, cada uma contribuiu em algo, inclusive na
parte de carpintaria. Ela plantou seus jardins do jeito que queria. Possuía um jardim japonês com
uma cascata caindo pelas rochas e depois em uma tranquila piscina de koi 8, o jardim era cercado
por todos os tons de verde que existiam. Todas as noites, da janela de seu quarto, olhava para o
seu jardim e via suas flores brancas levantando o rosto para as estrelas no céu. Ela amava a paz
que havia conseguido criar, o céu estrelado em cima sua de sua cabeça e o branco em seu jardim
falavam com sua alma. E mais adiante estavam os outros jardins, onde reinava um motim de
cores, várias flores disputando espaço e atenção, uma melodia selvagem de cores. Ela havia
dispensado cada um de seus dias, nestes cinco anos que viveu lá, para que seu jardim ficasse
exatamente como o que ela imaginava.
Seria doloroso abandonar tudo aquilo, mas sua família era mais importante. As necessidades
de Rikki eram prioridade. Por mais horrível fosse ir embora dali, Judith não olharia para trás. Havia
aprendido da maneira mais difícil que as pessoas que amava era o que existia de mais importante
na vida, independente de onde moravam ou onde trabalhavam.
— Você sabe o que Levi dirá Blythe? — Ela perguntou suavemente. — Ele dirá: Quero que
vão todos para o inferno!
— Eu sei, — Blythe concordou. — Mas, no final, assim como nós, ele fará o que for melhor
para Rikki.
Airiana pigarreou, mexeu na alça de sua xícara de chá e depois, focando o seu olhar em
Blythe perguntou:
— Você não pode tentar falar com Elle? Ela é sua prima.
Blythe negou com a cabeça.
— Eu não mantenho um relacionamento íntimo com elas, Airiana. Todas vocês sabem disso.
Quando nos encontramos, conversamos amigavelmente, elas nunca foram rudes comigo, assim
como nunca fui rude com elas. Pertencemos a uma família que nos ensinaram a não ser rudes com
as pessoas.
— Blythe, — Judith disse gentilmente, — todas as suas primas amam você. Ninguém a culpa
pela morte de sua mãe a não ser você mesma.
Blythe piscou para conter as lágrimas.
— Talvez isso seja verdade, mas não posso pedir nada a elas e duvido que elas se importem
com o meu pedido caso eu o fizesse. Elas apenas diriam que não estão nos obrigando ir embora, o
que tecnicamente, seria verdade. Desta forma, elas educadamente nos excluiriam.
Airiana a abraçou.
— Desculpe-me pelo que disse a você. Eu sei que você está passando por um momento
difícil e não levei isso em consideração. Foi egoísmo de minha parte sugerir isso a você. Eu
realmente sinto muito, Blythe.
— Não se preocupe Airiana. Só fico melancólica dessa forma nesta época do ano. — Seus
olhos se encontraram com os de Judith. — Esta é uma época ruim para você também… Como está
lidando com isso?

8
Koi: Palavra de origem japonesa que significa "carpa” que é uma espécie de peixe. Um homófono de koi significa "amor, carinho"
e é um símbolo de amor e amizade no Japão.
Judith deu de ombros. Não havia mais nada a fazer senão sorrir e dizer: “Bem”. Que era o
que costumava dizer. Seu irmão estava morto e não havia como voltar atrás no tempo. Paul havia
sido assassinado pura e simplesmente por causa dela. Por causa de sua estupidez. Seu descuido.
Suas ações. Blythe se culpava pela morte de sua mãe, mas ela não foi a causa direta de sua morte,
não importava o quanto ela pudesse pensar o contrário, enquanto Judith sabia perfeitamente que
ela era a causa da morte de seu irmão.
— Acho melhor eu retornar a ligação da Inez e marcar o encontro com este potencial
comprador para a galeria de arte. Espero que ele realmente esteja interessado em comprá-la. Inez
não pode se dar ao luxo de continuar financiando ambas as empresas.
— Há um tempo, circulou um boato de que Jackson havia comprado parte da loja dela, —
Airiana disse. — Você acha que isso é verdade?
— Se for, então Inez está em pior situação financeira do que eu imaginava. — Respondeu
Blythe. — Ela adora aquela loja e sempre ganhou dinheiro com ela. Se ela precisou realmente
fazer isso, significa que gastou dinheiro demais para manter a galeria aberta enquanto Frank
estava preso.
As duas mulheres olharam para Judith. Como gerente da galeria, ela saberia melhor do que
ninguém o quanto o lugar estava dando prejuízo. Ela encolheu os ombros, sem vontade de
comentar sobre o negócio de Inez nem mesmo para as irmãs. Aproximando-se da janela, olhou
para o seu jardim abaixo, a necessidade de ver a profusão de cores e o respingo da água
molhando-as, acalmava o seu espírito ferido. O vento soprava através das flores, criando ondas de
cor em todas as tonalidades.
Enquanto olhava para as flores, uma sombra passou por elas amortecendo o efeito das
ondas de cores por um momento. Olhou para cima, em direção ao céu, esperando ver uma
gaivota ou urubu voando, mas só havia um céu azul. Ela sentiu a sombra, mas não viu nada mais.
Nem mesmo Airiana que estava atrás dela conseguiu ver algo.
— O que foi isso? — Perguntou Blythe.
— Eu não sei, — disse Airiana. — Mas a sombra passou diretamente sobre esta casa e isso é
preocupante.
As três mulheres trocaram um longo olhar. Sea Haven era um lugar com muita energia, não
havia dúvida sobre isso. O local possuía uma energia própria e atraia pessoas com energia psíquica
para lá.
— Você é o elemento ar, — disse Blythe. — Todas nós sabemos disso, portanto não olhe
para mim com estes olhos arregalados. O que significa esta sombra?
— Eu não tenho ideia, — Airiana admitiu, — e não gosto disso. Acho que algum problema
pode estar vindo em nossa direção.
— Ilya? Joley e Ilya estão participando de um concerto beneficente longo, mas como ela está
grávida, talvez precise voltar para casa e descansar, — Blythe tentou adivinhar.
— Duvido que Ilya coloque seu próprio irmão para fora de Sea Haven, nem mesmo por Joley.
Mesmo que ela pedisse para ele para fazer algo parecido.
— Não acho que Ilya tenha algum tipo de envolvimento com qualquer um de seus irmãos, —
disse Blythe. — Ele está mais ligado a Jonas e às Drakes do que à sua família. Ele não foi criado
com eles e não teve nenhum contato com eles.
— Ótimo — disse Airiana, — eu também não fui criada com nenhuma de vocês, por isso, só
desta vez eu gostaria de dizer: Foda-se! Apenas Foda-se. Esta é a nossa casa e odeio a ideia de ter
que abandoná-la. Irei embora se for preciso, mas realmente odeio ter que fazer isso.
Judith forçou um sorriso.
— Vai dar tudo certo. Ainda não sabemos como as Drakes reagirão à presença de Levi.
Apenas sabemos que estamos todas dispostas nos mudar se for preciso, bem, menos Lexi. — Ela
olhou para a irmã. — Blythe, você falará com ela hoje, certo?
Blythe concordou.
— Eu não sinto que poderemos simplesmente fingir que ir embora não seja uma
possibilidade real. Então acho que podemos começar a pensar em algum outro lugar para morar
que seja parecido com este; que tenha um mar para Rikki, terra suficiente para Lexi poder plantar
e o suficiente para todas nós podermos viver juntas, não será fácil encontrar, isso levará tempo. Se
por acaso acharmos, pensaremos em vender este lugar.
— Lexi ficará muito chateada, — Airiana disse.
— Ela colocou seu coração e alma nesta terra, — Judith reconheceu. — Será muito mais
difícil para ela do que para qualquer uma de nós.
— Talvez pudéssemos simplesmente não dizer nada por enquanto, até que saibamos o que
vai realmente acontecer, — Airiana disse. — Na verdade, tudo o que estamos fazendo é especular.
— Prometemos sempre dizer a verdade uma para às outras não importa o quão difícil seja.
Esta será uma decisão que tomaremos em comum acordo. Quando tivermos certeza do que
faremos, falaremos com Rikki. — Disse Blythe. — Rikki tem que nos ver unidas e mais do que
dispostas a mudar-se com ela e Levi.
Houve um breve silêncio. Ninguém queria ir embora depois de ter passado cinco anos
trabalhando para construir a casa de seus sonhos. Lexi havia trabalhado duro para conseguir que a
fazenda produzisse o suficiente para que começassem a ganhar dinheiro. Não tinha sido fácil, mas
todas se empenharam em cada trabalho, transformando o sonho que todas compartilhavam em
realidade.
Judith se levantou, recolheu as xícaras vazias e enquanto as levava para a cozinha, falou alto
por cima de seus ombros:
— Sombras podem ser apenas sombras, poderíamos deixar de ser paranoicas.
— Você tem razão, — Blythe admitiu ficando de pé também. Ela se esticou lentamente. —
Vou conversar com Lexi agora e as vejo à noite no ginásio.
Judith se virou fazendo uma pequena careta.
— Honestamente… Detesto esta aula de autodefesa. Sinto-me como uma aluna tola.
Airiana colocou o braço em volta da cintura de Judith.
— Querida, você é uma aluna tola. Felizmente todas nós amamos você, por isso não nos
importamos se você consegue ou não chutar alguns traseiros.
— Eu sei que posso chutar alguns traseiros. Eu sei todos os movimentos. — Judith bufou sua
desaprovação, olhando para o rosto sorridente do Airiana. — Só que prefiro não ter que bater nas
pessoas. Sou mais evoluída e civilizada do que o resto de vocês.
— Bem, você fez Blythe cair na aula passada, — Airiana admitiu. — Mas então começou a
chorar arruinando todo o efeito do seu golpe.
— E Levi ficou nervoso. — Disse Blythe começando a rir com a lembrança. — Vocês viram a
cara dele? Pensei que ele ia fugir do ginásio.
Judith não pôde deixar de sorrir também, embora se sentisse enjoada ao lembrar-se do
momento em que havia derrubado sua irmã. Ouvir o som do corpo de Blythe batendo no tapete
grosso e o ar fugindo de seus pulmões foi horrível. Judith não conseguia explicar a Levi ou às suas
irmãs que ela queria aprender, só que simplesmente não queria ferir ninguém no processo. Ela
acreditava que podia defender ferozmente suas irmãs se aprendesse como fazer, mas o
pensamento de que para aprender, teria que deliberadamente bater em uma delas ou jogá-las no
chão com tanta força que elas perderiam momentaneamente a respiração, era abominável. E se
ela perdesse a paciência? Imagine o desastre que traria para todas elas?
— Ele definitivamente não gosta de ver qualquer uma de nós chorando — Airiana
concordou. — Vocês já viram como ele fica quando Rikki está chateada? Ele é louco por ela.
Blythe suspirou.
— Tenho que admitir que ele realmente é louco por ela. Costumo prestar atenção nele o
tempo todo. Ainda saio de casa nas primeiras horas da manhã para tomar um café com Rikki e ela
sempre está me esperando lá fora. Levi nos traz o café e parece feliz o suficiente em me ver, mas
raramente tira os olhos de Rikki. Estou feliz por ela.
Judith concordou sabendo que Blythe estava certa. Levi Hammond era tão apaixonado por
Rikki que seu autismo não parecia ser de forma alguma, qualquer inconveniente para ele.
— Isso te faz pensar que talvez haja alguém lá fora parecido com ele, para o resto de nós?
Ele é tão diferente que não consigo imaginá-lo se relacionando com mais ninguém. Eles realmente
foram feitos um para o outro. Talvez ainda existam homens corretos como ele.
Judith sabia que sua voz não mostrava muita convicção. Nunca existiria um homem certo
para ela. Não podia confiar em si mesma, ou no seu dom, e não colocaria as pessoas que amava
em perigo novamente. Já havia se sentido assim uma vez, atraída por um tipo errado de homem.
Nos últimos anos, ela sequer ousou olhar para qualquer outro homem com algum grau de
interesse. Não se atrevia a seguir por este caminho novamente. Pior. Ela sentia como se o seu
próprio corpo tivesse morrido. Não havia sentido atração física ou mesmo emocional por qualquer
homem que havia conhecido nos últimos cinco anos.
Blythe negou com a cabeça.
— Eu já passei da idade de sonhar que um cavaleiro de armadura brilhante aparecerá em um
cavalo branco e me conquistará.
Airiana fez alguns passos de dança pelo tapete grosso.
— É... Eu acho que Levi será um homem carente de companhia masculina. Pobre homem.
Judith forçou outra risada, mas aquela sombra que passou por sua casa não havia ido
embora. Ela deslizou para dentro dela e um profundo pavor começou a crescer e florescer.
CAPÍTULO 03

Ela apareceu caminhando em sua direção com passos lentos e sem notar sua presença.
Stefan permaneceu em um pequeno espaço próximo à porta de entrada da galeria, com as costas
na parede onde podia ver qualquer coisa que viesse na direção dele. Judith Henderson era muito
mais deslumbrante pessoalmente do que nas fotografias. Como ainda estava a uma boa distância
dele, teve bastante tempo para absorvê-la. Alta, pernas longas, vestindo um traje elegante como
ela. A recatada saia justa abraçava a curva dos seus quadris amorosamente. Sua curta jaqueta
fazia um jogo de cor entre o negro severo e a brilhante blusa de seda vermelha que usava por
baixo, agarrada a ela como se fora uma segunda pele e que parecia condenadamente sexy.
As mulheres não o faziam vibrar, não afetavam o seu corpo, mas naquele momento, em seu
interior onde ninguém podia ver, ele sentiu que a terra tremia tanto que algo havia rachado
dentro dele. Uma fissura que ele não poderia reparar. As emoções que haviam sido enterradas há
tanto tempo e que achava que estavam mortas, levantaram-se com a força de um vulcão,
sacudindo-o. Sentiu-se despido de sua armadura, vulnerável, quebrado e completamente exposto.
Deslizou sua mão para dentro de sua jaqueta para o sentir a familiar da coronha da sua Glock. No
momento em que tocou sua arma, soube que estava em apuros.
Judith Henderson o ameaçava a um nível elementar. O perigo era quase tangível e ele reagia
como se tivesse perdido a razão. Ela possuía aquele mesmo olhar distante e totalmente perdido
em seu rosto, o mesmo olhar que estava na fotografia que carregava com ele, próximo a sua pele
na parte interna do bolso de sua camisa onde mantinha uma pequena pílula que terminaria com
sua vida caso caísse em mãos erradas. Esta mulher era do tipo que colocava os homens de joelhos.
Mesmo o homem mais forte; ele despiria sua alma, entregaria seu coração para que ela cuidasse
dele e estaria perdido para sempre se recebesse apenas um sorriso daqueles lábios de anjo. Ele
poderia perder o fôlego com apenas um sorriso dela. Se ela sorrisse para ele. Apenas para ele.
Ele queria que ela levantasse o olhar. Que olhasse para cima. Queria que ela o visse.
Preparou-se para o impacto de seu olhar sabendo que agora ela estava bastante perto. Judith deu
mais dois passos tranquilos sobre seus saltos com este toque tentador de vermelho aparecendo
sob o preto implacável. Seu coração teria disparado se ele tivesse permitido, apenas com a
antecipação de seu olhar encontrando o dele, mas era muito disciplinado para permitir isso. Não
tirou os olhos dela, continuou absorvendo-a em seu ser.
Deus! Como ela era linda!
O olhar de Judith foi para as sombras e depois se desviou novamente. Deliberadamente, ele
mudou sua postura. O olhar dela foi para as sombras novamente, para onde ele estava. E ela o viu.
Seus olhos se arregalaram quando encontraram os seus. E o corpo de Stefan reagiu, o sangue
começou a correr calorosamente por cada veia, atravessando seu coração e se espalhando como
uma tempestade fogo até finalmente atingir sua virilha. Sentiu um choque implacável e feroz
sacudindo-o. Ele nunca perdia o controle, seu corpo era completamente disciplinado, entretanto,
lá estava ele, cheio, duro e latejante de necessidade com apenas um olhar que recebeu dela.
Desta vez, não houve jeito de controlar seu rebelde coração. Um trovão rugiu em seus
ouvidos, enchendo sua cabeça com um aviso, com a necessidade que sentia por ela. Seu olhar era
como um soco, um golpe baixo com uma força perversa que roubou a respiração de seus pulmões
e sua sanidade mental.
Se abrisse a boca, duvidava que conseguisse emitir algum som. Todos os seus anos de
formação e toda a sua disciplina o haviam abandonado. Poder rodeava aquela mulher vestida em
um traje perfeito sobre seu corpo perfeito. Uma inocência irradiava dela. Sua pele resplandecia.
Ainda assim, havia uma sedução inconsciente em cada movimento de seu corpo, a maneira que
seus lábios foram feitos, para noites de fantasia e aqueles olhos escuros e misteriosos como a
própria mulher.
Ele podia ver facilmente o poder que ela usava como um manto, assim como podia ver sua
aura. Ela escondia sua poderosa energia, escondia cada sombra escura que havia dentro dela,
mostrava para o mundo ser uma pessoa diferente da que havia profundamente dentro dela. Mas
ele conseguia ver, ele via tudo dela, e queria tudo o que viu nela. E que homem não iria querer?
Esta era uma mulher que nenhum homem conseguiria tirar facilmente da sua mente. Entendeu
naquele instante por que Jean-Claude La Roux era tão obcecado por ela. Ela se arrastava para
dentro de um homem sem que ele tivesse como fugir. Apenas com seu olhar ardente. E com a sua
sedução inocente.
Apesar de tudo isso, havia algo mais. Algo muito mais profundo dentro dela que o fazia
reagir. Algo elementar. Indescritível. Ela era muito mais do que a brilhante inocente sedutora que
todos os homens que a viam e queriam. Ela era uma mulher cheia de tristeza dentro dela. Sentia-
se perdida. Ele não era um herói. Ele não era aquele que havia chegado para salvar pessoas
inocentes. Ele também era um homem perdido. As sombras haviam se apoderado dele há muito
tempo atrás e havia roubado sua vida. Mas daria qualquer coisa que possuísse para ser o homem
que encontraria uma maneira de salvar Judith Henderson. Ele queria ser este homem e isso não
fazia sentido. Ela era uma desconhecida, uma completa estranha, mas aquele minúsculo pedaço
de humanidade que ainda existia dentro dele, foi atingido por aquela mulher.
— Sr. Vincent?
Sua voz era tão sedutora como todo o resto dela. Parecia um veludo macio. Acariciava sua
pele como se estivesse tocando-o com seus dedos. Ela já estava dentro dele. Ele podia senti-la em
seu interior. Em um lugar onde não poderia tirá-la.
— Senhorita Henderson?
Seu sotaque era perfeito. Já estava firmemente preso ao seu disfarce como Thomas Vincent,
um empresário americano reconhecido no mundo da arte e com credenciais suficientes para
impressionar qualquer um. Como qualquer bom disfarce, havia trabalhado nele por algum tempo,
no caso de algum dia precisar ser realmente um homem de negócios americano. Entender tudo
sobre arte foi bastante fácil, havia estudado arduamente e com sua capacidade de reter tudo o
que lia, era simples acrescentar mais este conhecimento à sua extensa educação. E ele o
acrescentou ao papel que agora representava.
Judith deu mais um passo na direção dele com o seu olhar movendo-se ao longo de seu
corpo. Mesmo em seu elegante e perfeito terno, ele sabia que não havia muito para ela olhar. Ele
possuía um físico de um fisiculturista que era impossível de ocultar. Sua cintura e quadris estreitos
só aumentavam o tamanho de seu tórax, braços e ombros. Seus olhos eram de um penetrante
azul esverdeado profundo, parecidos com a água do mar e era sua cor natural. Ele normalmente
usava lentes de contatos com cor diferente, mas achou importante oferecer um pouco dele
mesmo para aquela mulher. Algo dele que fosse verdadeiro. E o que restava dele… não era muito.
— Sim, sou Judith Henderson. Espero que eu não o tenha feito esperar muito tempo. Fiquei
entretida em minha loja e perdi a hora. Infelizmente não tinha um número que pudesse te avisar.
Desculpe-me.
Um homem perdoaria qualquer coisa desta mulher, principalmente quando ela olhava para
ele com uma sinceridade tão óbvia. Seus olhos eram o suficiente para afogar um homem. Ele
tentou acalmar sua respiração para poder assumir o controle de seu corpo e diminuir o batimento
frenético do seu coração. Deu a ela um sorriso. Um sorriso de verdade. Judith levantou
bruscamente a cabeça e piscou rapidamente, um sinal de que seu meio sorriso causou algum um
efeito sobre ela.
Ele descobriu que não queria engana-la, não da maneira que enganava as outras pessoas,
mas cada um de seus movimentos suaves eram movimentos praticados, lições que foram
impostas a ele desde sua infância. Ele não tinha sido o rapaz mais bonito da escola. Era muito rude
e mordaz para ser considerado bonito, mas possuía um inegável charme e um corpo musculoso
que uma mulher dificilmente deixaria de notar. Às vezes, as cicatrizes em seu rosto e corpo eram
um obstáculo, mas normalmente as mulheres as achavam intrigantes.
— Não há problema. Sea Haven é um lugar muito bonito. Passei algum tempo
perambulando. Você já havia dito que poderia se atrasar alguns minutos e isso me deu
oportunidade de conhecer o lugar no qual se encontra a galeria. Sea Haven certamente parece ser
tudo o que diz a propaganda.
— Se você estiver procurando um lugar para formar uma família, — Judith disse, — este é o
lugar perfeito.
Ele deu a ela outro meio sorriso.
— Sem família. Eu simplesmente decidi que queria sair da minha rotina exaustiva. Na minha
idade, um pouco de tranquilidade me parece ser muito bom.
— Você é de New York? — Ela se moveu para a porta da galeria, tirando um conjunto de
chaves da bolsa.
Ela não fazia movimentos inúteis. Cada movimento seu era gracioso. Ele deu um passo para
ficar perto o suficiente dela e poder inalar sua fragrância. Exótica. Cítrica. Totalmente feminina.
Stefan esteve em companhia de mulheres bonitas mais vezes do que poderia contar ao longo dos
anos, mas ela foi à única que capturou seu interesse. E não o interesse do agente secreto, mas o
interesse do homem. Esta era uma complicação indesejável, mas não era realmente uma surpresa.
Pela reação que teve ao ver sua foto, ele soube que esta missão seria um problema. Só não tinha
ideia do quanto, até aquele momento.
— Sim. Eu era sócio passivo9 em uma galeria lá, mas decidi que tive o suficiente de festas e
táxis. Li algo sobre esta cidade há alguns anos e arquivei. A cidade parecia ser encantadora e única,
um verdadeiro paraíso para um artista.
— Um artigo? — Ela deu um pequeno sorriso por cima do ombro enquanto empurrava a
porta da galeria e a mantinha aberta enquanto se afastava para convidá-lo a entrar.
De forma galante e também porque sempre se sentiu desconfortável em ter alguém
diretamente atrás dele, Stefan deu um passo para trás para segurar a porta para ela.
— Sim, falava sobre uma supermodelo que cresceu aqui. O escritor havia obviamente, caído
de amores por ela e pela cidade. Havia belas imagens da paisagem local, assim como do oceano
com o sol brilhando na superfície.
Ela acendeu as luzes e virou-se para ele. Sua pele parecia convidativa, macia e tão quente
que ele enrolou seus dedos em um punho e segurou-o firmemente contra sua coxa para não cair
na tentação de tentar tocá-la de forma inadequada. Esta mulher deveria ser ilegal.
— Ele deveria estar falando em seu artigo sobre Hannah Drake. Sua família vive aqui há mais
de cem anos. Eu não tenho certeza, mas penso que depois de viver em New York, a nossa pequena
e pacata cidade não deve ter muito a lhe oferecer. Não existe uma vida noturna aqui, Sr. Vincent.
Tudo aqui fecha muito cedo.
Ele manteve seu sorriso de lobo, guardado. A pequena e doce Judith achava que havia algo
suspeito nele. Por que uma mulher inocente seria no mínimo cética, sobre um comprador querer
viver em sua cidade pitoresca e encantadora? Ela continuou olhando para ele. Judith parecia ser o
epítome da cooperação com seus movimentos graciosos e calmantes. Começou a caminhar sem
pressa enquanto se movia pela galeria espaçosa e bonita para um local que parecia ser claramente
um escritório. Ele nunca imaginaria que se encontraria em uma partida de xadrez com uma mulher
tão bela, suave e que enfeitava a galeria.
Ele apontou para rua deserta.
— Não se parece com uma vida noturna, mas vi algumas pessoas entrando em uma loja,
duas portas mais abaixo.
— A cada terceira sexta-feira do mês, fazemos um evento. Trazemos um artista e várias lojas
participam. Temos provas de vinhos e um bom sorteio para os participantes. Normalmente abro a
galeria para o evento, mas desta vez resolvi sediar o evento em minha própria loja esta noite,
razão pela qual cheguei um pouco tarde. Felizmente minha irmã fechará a loja para mim.
Normalmente a cidade é muito tranquila à noite.
— Exatamente o que eu estou procurando, — ele assegurou a ela, devolvendo um charme
encantador. Ele conseguia se igualar a ela neste jogo. Era um profissional. E ela, além de parecer
suave, ainda era uma amadora. Ele encontrou-se ansioso para a próxima troca de palavras.
Ela enviou-lhe um olhar por cima do ombro, seu cabelo negro sedoso, caía como uma
cascata, acrescentando mais incômodo à sua dolorosa virilha. Ela parecia uma flor exótica,
requintada e rara. Porra. Não era seguro para uma mulher como ela mostrar uma galeria vazia, à
noite, para homens estranhos. Ela era a tentação personificada. E por mais que não quisesse

9
Sócio passivo: Aquele que possui parte de ações de uma Empresa, mas não interfere na administração da mesma.
explorar a possibilidade de que talvez ela fosse um agente de outro país, o pensamento ainda
passava por sua cabeça. Ela era muito sedutora sem nem sequer tentar. Seu modo de caminhar.
Seus olhos escuros olhando para ele por cima do ombro através de seu cabelo suave e sedoso. Ela
foi feita para a fantasia. Para longas noites.
Suas maneiras não pareciam afetadas, na verdade, era exatamente o oposto. Ela parecia ser
naturalmente sensual, da forma que todos os bons agentes eram treinados para ser. Ele havia se
comportado de forma atípica para não chamar muito a atenção dela, para que ela não pedisse
informações sobre ele mais a fundo. Amaldiçoou a si mesmo por cair na inevitável armadilha onde
algumas mulheres se colocavam como isca tão facilmente. Sua reação inicial a ela, essa terrível
necessidade de achar que seria o único que conseguiria mudar aquele olhar em seus olhos, que
seria o homem que ela precisava, não fazia sentido. Ele era um homem cínico. Já tinha visto de
tudo. Não acreditava no amor e com certeza não acreditava que poderia ser atraído para uma
armadilha por uma mulher. Ele se considerava imune, mas sabia reconhecer o perigo quando o
via.
— A galeria ficou fechada por um tempo e perdeu um pouco de seu brilho, mas desde a sua
reabertura, está se recuperando muito bem, com um lucro estável. — Ela acendeu as luzes no
escritório.
O escritório era espaçoso, mas privado, com uma porta que levava ao banheiro e outra que
dava para a saída. Toda a frente da galeria era de vitrais para proteger a pintura do sol, permitindo
uma vista deslumbrante do oceano outro lado da rua.
— Frank possui a escritura definitiva do prédio. O preço inclui o prédio, o terreno no qual ele
foi construído e o inventário. Se você estiver realmente interessado, ele é dono do bloco ao lado
do edifício e acredito que poderia considerar vendê-lo também.
Pela primeira vez em sua vida, ele realmente desejou ser um empresário americano que
estaria pensando em comprar esta galeria e que se estabeleceria neste pequeno vilarejo junto ao
mar, com esta mulher ao seu lado. Não se importaria em ter sua própria galeria de arte. Franziu a
testa e apertou os dedos em suas têmporas sentindo o começo de uma dor de cabeça que
começou a deslizar por ele sem que tivesse percebido. O que estava pensando? Homens como ele
não se estabeleciam. Somente caçavam ou então eram caçados.
— Você está bem?
Seu olhar encontrou e capturou o dela. Deu-lhe outro sorriso dissimulado que a encantou.
Ele percebeu isso pelo movimento de subida e descida de seus seios sob o casaco fino quando sua
respiração tornou-se mais rápida de repente.
— Foi um longo voo e em seguida dirigi por quatro horas para chegar até aqui. Pelo menos a
paisagem era linda.
— Você voou de San Francisco ou Oakland?
A pergunta foi feita de modo ocasional, mas havia algo na maneira como seus olhos se
prenderam aos dele e apesar de tentar, ele não conseguiu se mover. Seu coração acelerou. Como
em um jogo de xadrez, ele não estava certo de quem realmente estava à frente nas jogadas. Ela
não parecia estar fazendo algo premeditado. Esta carícia sensual em sua voz conseguia colocar sua
sanidade mental em risco como nenhuma outra coisa poderia. Ela tinha que ser inocente,
ninguém poderia ser tão bom. Ele já havia se encontrado várias vezes com alguns dos melhores
agentes no negócio e nenhum deles, jamais travou um ataque tão brutal e violento em seu corpo
e em seu autocontrole.
— San Francisco. — Ele respondeu e deliberadamente desviou o olhar, precisava mostrar ser
um empresário tímido que estava se sentindo um pouco ofuscado por uma bela mulher. — Fui lá
olhar uma galeria que também está à venda, mas cheguei à conclusão que simplesmente estaria
trocando uma grande cidade por outra. É uma cidade com diferente estilo de vida, mas ainda
assim, não era o que eu estava procurando. Sea Haven me encanta.
Aproximou-se dela, fazendo-a se encolher um pouco, com o pretexto de olhar para o cofre o
qual ela havia se agachado para abrir. O pensamento de que sua cabeça estava no mesmo nível de
sua dolorida virilha, fez o idiota do seu pau engrossar muito mais. Respirou profundamente para
recuperar o controle de seu corpo, lembrando-se de que esta parte rebelde dele pertencia a ele e
não a ela. Tomou o cuidado para não tocá-la acidentalmente. Precisava parecer um empresário
forte, mas um pouco tímido com as mulheres, charmoso, mas não agressivo.
Judith sentia-se atraída por ele e isso fez com que ficasse desconfiada. O fato de que seu
corpo respondesse a um completo estranho a incomodava, obviamente, no mesmo nível
elementar que incomodava a ele. Ela pegou vários livros no cofre sentindo as mãos trêmulas, mas
conseguiu disfarçar bem. Ele deu-lhe espaço, mais satisfeito do que deveria por perceber que ela
estava tendo problemas com a presença dele, assim como ele estava com a presença dela. E este
sentimento não tinha nada a ver com sua missão. Ele queria marcá-la.
Seu trabalho era encontrar uma melhor maneira de seduzi-la para que ela confiasse nele.
Esta tinha sido a primeira vez, desde que podia se lembrar, que não havia gostado muito de sua
missão desde o início. Ele se convenceu de que havia sentido isso porque achava que esta missão
seria uma armadilha para o seu irmão… Que estaria sendo usado para tirar Lev de seu esconderijo
para que eles pudessem eliminá-lo. Agora, ele sabia que sua reserva era mais do que isso… Era
também por causa desta mulher em particular.
— Eu amo viver aqui — Judith admitiu enquanto endireitava lentamente os livros em suas
mãos.
Stefan sabia que estava dando a ela a ideia de que algo trágico e pessoal havia acontecido a
ele para que quisesse viver ali em paz… Para fazê-lo decidir abandonar a vida na cidade. Ela estava
olhando para ele com um pouco de compaixão. Ela não queria se importar com ele, mas não
conseguia resistir. Ele percebeu isso com uma intensa satisfação. Thomas Vincent tinha que
começar sua caça por Judith de forma discreta senão ela fugiria.
— Acho que adorarei também. — Ficou um pouco chocado ao perceber falou a verdade.
Levando-se em consideração que se estabelecer em algum lugar era algo que nunca havia
considerado ou sequer imaginado, ainda que a convicção em sua voz tenha sido real.
— Vocês recebem muitos estranhos na cidade?
— Todos os moradores se conhecem. Somos um grupo bastante unido… Nossa subsistência
depende um dos outros. Mas como vivemos em uma cidade turística, muitas pessoas passam
férias aqui. Como é um lugar bonito, vários artistas se estabelecem aqui e isso atrai os visitantes.
O que não era necessariamente uma coisa boa. Petr Ivanov poderia muito bem misturar aos
muitos turistas, tornando mais difícil para Stefan detectá-lo. Ivanov era muito bom em se misturar
com o povo e ainda melhor com os disfarces.
Stefan afastou o olhar de Judith novamente. Ele passou o dedo pelo colarinho da camisa
como se ela, de repente, tivesse ficado muito apertada.
— Eu tenho uma confissão a fazer. — Ele hesitou apenas por um momento e, em seguida,
deu-lhe um meio sorriso, um sorriso meio arrependido (um lobo em pele de cordeiro). — Eu vi
uma das suas primeiras pinturas na casa de um amigo. Ele é um colecionador de New York. Ela foi
intitulada como Moon Rising10 e fiquei impressionado quando a vi. Tentei comprá-la dele, mas ele
não cedeu. Cheguei a oferecer um quarto de milhão de dólares e mesmo assim ele não quis
vendê-la.
Foi bastante fácil soar honesto nesta conversa sobre a pintura porque ele estava dizendo a
verdade. Como parte de seu disfarce como um americano, ao longo dos anos, ele havia cultivado
um perfil de amigos de alto nível. Steven Cabot era o proprietário de uma empresa de prestígio
internacional. Ele também era um colecionador de arte, pinturas e esculturas. Foi pura
coincidência Thomas Vincent mencionar estar interessado nas obras de uma artista chamada
Judith Henderson e Cabot se mostrar extremamente entusiasmado. Ele delirou ao falar sobre uma
pintura que havia adquirido alguns anos antes e levou Thomas para vê-la.
Reação de Stefan ao ver o quadro havia sido a mesma que sentiu quando viu as imagens no
arquivo que recebeu sobre ela. Totalmente física. Angustiante e cativante. Ele viu muito mais do
que o céu iluminado e o luar derramando-se em um campo de flores brancas. A pintura era de
tirar o fôlego. Maravilhosa. Genial. A pintura estava cheia de paixão, sensual e inocente… Assim
como a mulher de pé diante dele. Talvez não tivesse se importado tanto pela pintura se Steve não
tivesse ficado extasiado, olhando-a fixamente como se estivesse em transe.
Pela primeira vez em sua vida, Stefan Prakenskii experimentou um negro ciúme. A emoção o
sacudiu, passando por ele como uma nuvem escura, apesar dele ser alguém que sempre se
recusou a reconhecer os sentimentos. Por um momento terrível, a vida de Steve Cabot esteve por
um fio. A pintura de Judith representava a vida e não a morte, pensando nisso ele resolveu se
obrigar a virar e se afastar da tentação escura. E então, ele havia reconhecido que precisava se
aposentar, desaparecer, antes que já não soubesse a diferença entre o certo e errado.
Contrariamente às crenças dos seus superiores, ele possuía um código sobre a forma como
vivia e tinha consciência que estava muito próximo de cruzar esta fina e imprecisa linha. Para o
bem ou mau, esta seria a sua última missão e ele havia aceitado por duas razões. Porque queria
saber se seu irmão estava realmente vivo, (e ele pretendia que continuasse dessa forma), e
porque queria conhecer Judith pessoalmente.
— Isso é um absurdo. Ele não pagou nada perto disso pela pintura.
Ela olhou com prazer e um pouco horrorizada. E ele gostou ainda mais dela por sua reação.
— Ele obviamente se apaixonou por ela tanto quanto eu, — disse Stefan. — Em qualquer
caso, sabendo que seu trabalho é vendido através desta galeria, este foi um motivo importante

10
Moon Rising: Tradução: Lua Mágica
para eu considerar minha decisão em comprar esta galeria. E por algum motivo, senti que era
importante que você soubesse sobre isso. — Ele abaixou a cabeça um pouco, mas desta vez
recusou a desviar o olhar.
Seu olhar passou pelo seu rosto, parou por um momento em sua boca e depois voltou a
olhar para seus olhos. Um sorriso lento passou pelos seus lábios. Sua boca verdadeiramente o
fascinava, oferecendo a ele fantasias suficientes que poderiam durar para sempre. Ela possuía
dentes bonitos, pequenos e delicados que combinavam com seus traços exóticos. Seus cílios eram
longos e cheios, duas meias-luas grossas que chamavam a atenção para os seus grandes olhos
escuros. Ele tomou uma decisão consciente de não se afogar naqueles olhos e se obrigou a
retroceder, pois estava à beira de um desastre. Não podia perder o controle e deixar cair o seu
disfarce por causa de uns lindos olhos sedutores.
— Sinto-me muito lisonjeada, o Sr. Vicent.
— Chame-me de Tom. Todos os meus amigos me chamam assim.
— E eu sou Judith. — Ela colocou os livros fiscais sobre a mesa e indicou a cadeira para ele.
— Por que você não dá uma olhada nestes enquanto eu pego mais alguns documentos ali no
cofre? Claro que você vai querer que o seu contador e advogado deem uma olhada nos livros
também, mas posso garantir que a galeria é um bom investimento. Se tivesse dinheiro, eu mesma
a teria comprado.
Ele franziu a testa. Seus caleidoscópios eram vendidos por todo o mundo, assim como suas
pinturas. Ela possuía sua própria loja e trabalhava como gerente da galeria.
Ela riu suavemente.
— Eu comprei uma fazenda junto com minhas irmãs. Nós investimos a maior parte de nosso
dinheiro neste empreendimento. Ela está começando a se pagar, mas os primeiros anos foram
difíceis.
— Esta falando sério? — Interesse penetrou em sua voz. — Comprou uma fazenda?
Judith riu novamente.
— É uma coisa tão absurda assim?
— Você e suas irmãs? — Ele sabia muito bem que ela não tinha irmãs. Não tinha nenhuma
família. — Somente mulheres dirigindo uma fazenda?
— Não seja tão cético. Na verdade, estamos conseguindo algum lucro.
Ele apoiou seu quadril contra a mesa enquanto seus olhos brilhavam com diversão e sua
expressão mudou para uma expressão quase ansiosa.
— Você realmente dirige um trator? Sabe como dirigir?
— Todas nós sabemos. — Ela piscou os olhos escuros para ele e pela primeira vez, ele
pensou que o sorriso que acompanhou a piscadela foi verdadeiramente genuíno. — No entanto eu
não uso esta roupa que estou usando hoje para um encontro de negócios quando tenho que
dirigir equipamentos pesados.
— Eu sempre quis dirigir um trator, — ele confessou com um sorriso de menino. — Mas
nunca tive oportunidade. — Ele balançou a cabeça e enfiou a mão pelo cabelo, cuidadosamente
despenteando-se para que parecesse um pouco menos elegante e um pouco mais charmoso.
— Já que você está pensando em ficar um tempo por aqui, qualquer dia te levarei até a
fazenda para que você possa matar a sua vontade, — disse Judith e logo depois pareceu um pouco
chocada com o convite que fez.
Ele sabia que ela estava se lamentando pela oferta impulsiva assim que a mesma saiu de sua
boca. Esperou um batimento de coração. Dois.
— Eu não quero colocá-la em uma situação difícil, Judith, — ele disse suavemente. — Você
ainda não me conhece. E apesar de sua oferta ter sido muito gentil e eu realmente adorar a ideia,
sinceramente não espero que você me leve até a sua fazenda. — Ele deu a ela o seu melhor
sorriso, um sorriso aberto e de aparência inocente, tão inocente quanto um lobo enjaulado que
quer convencer alguém a soltá-lo.
Ela caiu em sua armadilha muito perfeitamente.
— Você não me colocou em uma situação difícil. Acho que seria divertido, contanto que
você não se sinta selvagem e destrua a nossa plantação de milho.
— Então ficarei aguardando.
Surpreendentemente, a ideia realmente parecia soar divertida. Passar um tempo com Judith
era uma ideia realmente perigosa, mas de repente a ideia de montar em um trator era realmente
atraente para ele. Ele nunca imaginou poder experimentar isso, mas se estava pensando em
“desaparecer” depois desta missão, talvez trabalhar com a agricultura fosse interessante. Se não o
interessasse, pelo menos aproveitaria o tempo em que sentaria ao lado de Judith em um trator e
se distrairia olhando para o seu rosto enquanto ela mostraria como se dirigia aquela coisa.
— Vou ficar aqui por umas duas semanas. Eu pensei que seria importante passar algum
tempo aqui para começar a me familiarizar com o lugar.
— Não trabalharei na loja amanhã e o tempo tem estado bom. — Seu queixo se levantou e
sua coluna ficou reta.
Ela estava determinada a fazer isso o mais rápido possível antes que mudasse de ideia. Ele
escondeu um sorriso e afundou-se na cadeira do escritório diante dos livros fiscais abertos. Era
hora de voltar ao “trabalho” e permitir que ela se livrasse logo deste problema antes que
começasse a ficar cautelosa com ele. Sentia que ela estava prestes a fugir dele.
— Que horas nos encontraremos? Acho que será muito divertido. — Ele realmente não sabia
o que era diversão, mas o tempo que passou em sua companhia e o duelo de palavras que teve
com ela foi definitivamente desafiador. Ele teria tempo para se estabelecer em Sea Haven antes
que Jean-Claude escapasse da prisão e tentasse levá-la com ele. Felizmente, não haveria nada que
pudesse fazer a não ser permitir. Nesse meio tempo, iria estudar as pessoas e começar a se
familiarizar com cidade. Procuraria por Petr Ivanov, e se o encontrasse, Ivanov teria que
desaparecer. Stefan não podia deixá-lo vivo para tentar encontrar seu irmão Lev caso ele ainda
estivesse vivo.
— Podemos marcar às onze horas ou meio-dia. Isso me dará tempo para fazer algum
trabalho em casa.
Ele certamente não cederia à tentação de olhar para cima, então, continuou estudando os
livros cuidadosamente.
— É um bom horário para mim. Se você anotar o seu endereço, posso me encontrar com
você lá. E vou levar o almoço, caso contrário, você vai pensar que terá que fazer algo para eu
comer.
— Por que você acha isso?
Deixou que o seu olhar encontrasse o dela mostrando uma expressão de diversão em seu
rosto.
— Porque você é este tipo de mulher.
A sobrancelha dela subiu de maneira inquisitiva.
— Que tipo de mulher eu seria?
— Do tipo hospitaleiro, é claro. E não quero me aproveitar mais do que já estou, da sua
bondade, uma vez que você me convidou para passear de trator.
— Oh não, Thomas, você não vai apenas passear de trator. Você não vai simplesmente pegar
uma carona, você vai dirigi-lo.
A nota de provocação em sua voz o desarmou. Ele nunca havia tido algum tipo de
brincadeira com uma mulher e teve que conter o calor que começou a se espalhar por seu corpo.
Ele precisava lembrar que era Thomas Vincent e que estava ali em uma missão com aquela
mulher. Nada daquilo era real, não importava o quão real parecia para ele. Ou quanto real ele
gostaria que fosse. Ele sentou-se ereto.
Praguejando baixinho, se obrigou a não olhar para ela novamente. Possuía mais disciplina do
que isso. Como diabos ele estava permitindo que uma mulher balançasse seu mundo daquele
jeito? Ela era como qualquer outra pessoa em seu mundo: apenas um alvo. Uma ferramenta
descartável para ser usada e jogada fora. Ele não tinha outra forma de vida e não sabia como
poderia mudar isso, não sabia sequer se seria possível mudar.
— Você está pensando em desistir?
Ele fechou os olhos por alguns instantes. Sua voz era como um veludo macio, feita para se
ouvir dentro de um quarto, ela escorregou por sua pele e encontrou um caminho dentro dele,
perfurando sua armadura, não se importando o quanto ele tentava erguê-la novamente. Não
conseguia deixar de olhar para ela. Ela estava sentada na beira do balcão, suas pernas longas
estavam cruzadas, vestindo uma saia modesta que de repente já não lhe parecia mais tão
modesta. Mais uma vez, ele teve a sensação de que ela não tinha ideia do quão sexy era ou as
fantasias que poderia colocar na cabeça de um homem.
Seu cabelo caiu como uma cachoeira de seda, em cascata sobre um ombro, cobrindo um dos
seios, uma chuva de fios preto-azulados, lisos e brilhantes. Ele teve uma súbita vontade de segurar
um pouco dele em seu punho, puxá-la para ele e tomar sua boca, tirar suas roupas e a possuí-la ali
mesmo, em cima da bancada.
Judith prendeu a respiração bruscamente e apertou a mão em seu coração. Seu olhar
encontrou o dele. Imediatamente ele sentiu como se socassem seu estômago. Ela desencostou da
bancada e juntou as pontas de sua jaqueta como se estivesse se protegendo dele.
— Quem é você? — Ela sussurrou. — O que está fazendo aqui? Você não é um simples
homem de negócios de New York.
Sua mão foi em direção ao telefone. Ela realmente deu um passo para trás, e então,
aproveitando-se que ele ficou, de repente, paralisado em volta da bancada, ela pegou o telefone.
Ele conseguiu alcançá-la enquanto amaldiçoava sua mente rebelde, surpreso de que ela fosse tão
talentosa psiquicamente que conseguiu ler seus pensamentos ou então senti-los. Ele soube que
estava em apuros. Sua mão se fechou sobre a dela de forma muito suave, mas sua força
facilmente a impedia de ligar para alguém.
No momento em que sua pele tocou a dela, a eletricidade se espalhou por ele golpeando-o.
Sentiu o impacto através de seu corpo, uma reação física pura, o sangue correndo quente, se
espalhando por ele como um incêndio fora de controle. Ela era muito mais perigosa para ele do
que havia pensado. Todo o seu ser focava-se nela, sacudindo os alicerces que construiu ao longo
dos anos e acreditava serem fortes. Ele respirou fundo e continuou tentando manter a reação que
Thomas Vincent teria, empurrando para baixo a reação letal que um homem como Stefan
Prakenskii sentia quando percebia uma ameaça em um nível elementar.
— Apenas ouça-me. E depois, se você ainda quiser chamar a polícia ou me mandar embora,
eu irei — ele disse mantendo uma voz baixa de veludo macio.
Stefan sabia que Judith realmente não teria muita escolha naquele assunto. Ele mantinha
sua mão presa, mas ela não estava percebendo. Ele poderia jurar. Ele não cometeu o erro de
sorrir. Na verdade, ele não sentia nenhuma vontade de sorrir e duvidou que o tímido empresário
norte-americano Thomas Vincent tivesse. Ele havia acabado de ser pego com as calças abaixadas
por uma bela mulher.
— Eu não costumo falar sobre isso… — Ele parou de falar e balançou a cabeça, liberou sua
mão e balançou a cabeça novamente. — Você vai pensar que eu sou louco. Olha, vamos esquecer
esta noite e eu olharei os livros em outra ocasião. — Ele passou o dedo em volta do colarinho da
camisa novamente e esfregou a ponte de seu nariz como se estivesse procurando um lugar para
olhar, como se estivesse se sentindo muito desconfortável.
— Só me diga. — Olhar escuro Judith deslizou para longe dele, dando-lhe um vislumbre de
sua insegurança sobre o assunto.
Suas habilidades psíquicas eram fortes. Ele podia sentir a pura potência de sua energia ao
redor dele. Quando sua energia encontrou-se com a dela, o impulso foi tão poderoso que ele
esperou ver faíscas, uma explosão, algo tangível. No entanto, Judith não se sentia no controle do
seu poder, o que dava uma vantagem a ele. Se ela não tinha certeza da extensão de seu poder,
deixava uma porta aberta para que coisas inexplicáveis pudessem acontecer, como por exemplo,
Thomas Vincent enviar acidentalmente suas fantasias diretamente para sua mente.
Ele encolheu os ombros.
— Muito bem. Eu tenho certas habilidades psíquicas e acho Sea Haven tem uma energia que
as amplifica… — Ele parou de falar como se estivesse sentindo desconfortável novamente.
No momento em que a mão de Thomas segurou a dela tão suavemente, uma enorme força
oculta a impediu de ligar para o xerife, o corpo inteiro de Judith sentiu a onda de calor correndo
entre eles. Sentiu um fogo a queimando de uma forma que nunca havia experimentado, uma
faísca de necessidade cresceu e se espalhou por ela deixando-a dolorida e inquieta.
Chocada, envergonhada e certa de que aquela havia sido a maior humilhação de sua vida,
ela engoliu em seco e estudou o rosto virado de Thomas Vincent. Seu embaraço era cativante e
completamente em desacordo com sua grande e musculosa aparência, assim como sua velocidade
e sua gentileza. Ela pesquisou sobre ele no momento em que Inez pediu que fosse encontrar com
o homem. Sempre que chegava algum forasteiro à cidade ela ficava desconfiada e depois que Levi
casou-se com sua irmã Rikki, passou a desconfiar mais. Sua família era plenamente consciente de
que Levi Hammond não era seu nome real, mas nenhuma delas se importava com isso. Ele era
parte da família agora e elas o protegiam da mesma forma que protegiam uma às outras.
Ela procurou na Internet por Thomas Vincent e seu nome surgiu repetidamente em um
instante. Ele era muito mais do que disse tão casualmente. Era um homem que tinha uma
reputação de fazer negócios brilhantes, comprava empresas à beira da falência, as transformava e
depois as vendias com um excelente lucro. Ele era declaradamente um herdeiro de milhões de
dólares. Era o único filho do dono de uma ferrovia. Sua mãe havia morrido no parto e ele foi criado
por seu pai. O pai nunca se casou novamente e morreu a alguns meses de câncer. Era fácil ver por
que ele era uma figura tão poderosa no mundo dos negócios, mas um pouco tímido com as
mulheres.
Havia várias fotografias de Thomas Vincent com seu pai e os dois pareciam muito próximos.
Seu coração sentiu pena por ele. Não era de admirar que estivesse pensando em mudar algo em
sua vida. E que Deus a ajudasse, ela sentia-se atraída por ele. E aquela era a maior bandeira
vermelha de todas. Ela nunca mais correria o risco de se apaixonar por alguém e colocar as
pessoas ao seu redor em perigo. Ela não fazia boas escolhas. Mas nunca, nenhuma vez nos últimos
cinco anos, sonhou que isso poderia acontecer com ela, essa incrível resposta revigorante e
estimulante para um homem.
Ela queria ajudá-lo em seu dilema, embora ele a tivesse assustado. Ela sabia que estava
flertando com ele. Não abertamente, mas definitivamente havia mostrado um pouco mais de sua
perna na esperança de chamar a atenção dele. Ela havia tido algumas fantasias eróticas sobre ele
possuí-la sobre o balcão, algo completamente fora do comum para ela e que de alguma forma,
conseguiu colocar em sua mente.
Ela havia perdido o controle sobre suas fantasias selvagens sobre ele, ele as “apanhou” e
agora pensava ser o responsável por elas. Era evidente que ele possuía habilidade psíquica e, por
sua reação, não havia dúvida de que ficaria surpreso quando ela dissesse que as tinha também. Ela
deveria ter ficado surpresa por ele, mas a verdade era que, Sea Haven tinha poder, energia, ou
qualquer outro nome que quisessem dar. E as pessoas que tinham habilidades psíquicas eram
atraídas para o epicentro da pequena cidade.
— Se você está tentando dizer que tem habilidades psíquicas — ela disse, — eu também as
tenho.
Ele parecia infinitamente aliviado quando afundou de volta em sua cadeira.
— A maioria das pessoas pensaria que estou louco. Por isso eu nunca sequer admiti
acreditar em dons psíquicos.
Ela ficou atrás do balcão onde se sentia um pouco mais segura ou onde poderia mantê-lo
seguro. Não havia percebido até aquele momento de como estava faminta por sexo. Ela não tinha
namorados. Não confiava em ninguém o suficiente para chegar muito perto dela, perto o
suficiente para ter algum tipo de intimidade. Judith nunca aceitaria ter relações só por uma noite.
Para ela era, tudo ou nada, e por um tempo muito longo, havia sido nada. E é claro que sua vida
tinha que permanecer daquela forma mas…
Ele passou os dedos pelos cabelos, bagunçando-os ainda mais. Ela não havia percebido que
era tão longo ou como parecia ser sedoso. Ele possuía um cabelo bonito. Judith não conseguia
evitar a fascinação que sentia pelos fios grossos e ondulados, seus dedos estavam coçando para
tocá-lo. Por que ele tinha que ser tão atraente?
— Eu sinto muito sobre... — Ele parou de falar e ficou olhando-a como se fosse corar um
pouco. — Sobre… você sabe. Eu normalmente não fico imaginando fantasias eróticas sobre as
mulheres, mas, você é muito sexy e tem sido um longo tempo para mim… — Cada palavra de sua
confissão foi entregue dolorosamente.
Ela não podia deixá-lo levar esta culpa. Apesar de ser humilhante, teria que ter coragem de
confessar para ele que, o que ele pensava que era o seu pecado, na verdade era o dela. Ela não
poderia deixá-lo pensar o contrário.
Judith umedeceu os lábios.
— Na verdade, Tom, eu acho que você não teve culpa sobre o que aconteceu. Eu estou de
pé, aqui atrás do balcão porque não tenho certeza de que você estaria totalmente seguro comigo.
Parece que os pensamentos impróprios que você teve, na verdade eram os meus. Estou
profundamente arrependida.
Ele levantou a cabeça e seus olhos encontraram os dela.
— Você não tem que assumir a culpa, Judith.
— Estou somente sendo honesta com você. Acredite em mim, se não fosse verdade, nunca
te diria isso.
Um sorriso lento puxou a boca de Stefan mesmo quando seu corpo estava duro como pedra
e ele estava com medo de explodir. Um rugido estranho começou a soar em sua cabeça. O trovão
de seu coração era alto o suficiente para acordar os mortos. Ele não quis pensar muito sobre a
verdadeira razão desta euforia que varreu por ele. Estava somente fazendo um trabalho e isso
significava fazê-lo bem feito, não devia necessariamente sentir-se feliz desta forma. Ele não
possuía emoções que pudessem mexer com ele de uma maneira ou de outra, tornando-o assim
vulnerável.
Não deveria dar a mínima se Judith Henderson pensava que estava tendo exatamente a
mesma fantasia erótica sobre ele, assim como ele teve por ela. Não deveria se importar se ela
sentia-se atraída por ele embora isso fizesse o seu trabalho mais fácil. Não deveria estar em perigo
de se afogar em seus olhos incríveis. Ele estava em sua presença há apenas uma hora e estava
prestes a foder um grande momento.
— Você ainda está disposta a me levar para o passeio de trator em sua fazenda amanhã? —
Ele precisava dar uma saída digna para ela. Thomas Vincent era um homem decente e bastante
reservado com as mulheres, Stefan não tinha escolha. Se ela ficasse a mercê dele, ficar atrás do
balcão não a salvaria. Nada poderia salvá-la ou salvá-lo.
— Claro. Eu não posso condená-lo por nada quando eu mesma estava sendo tão ruim.
Vamos concordar em nos comportar, certo? — Ela ofereceu a ele um sorriso leve e esperançoso.
Oh sim. Ela acreditava em seu disfarce de Thomas Vincent ou então estaria muito mais
alarmada. Ele podia ler a cautela em seus olhos, mas o fato de que estava mantendo a distância e
ter sido corajosa em assumir a culpa por ter pensamentos eróticos por um macho saudável, era
um bom sinal. Sentia-se um pouco lisonjeado por isso também. Ele desviou os olhos dos dela, não
por causa de Thomas, mas porque ela era malditamente bonita, tão brilhante e inocente que ele
estava se asfixiando em seu próprio engano.
Nem uma única vez em sua vida havia sentido vergonha por enganar outra pessoa, mas
Judith, com sua coragem de confessar um momento embaraçoso para um completo estranho,
apesar de sua profunda tristeza e pesar que guardava tão cuidadosamente escondido do resto do
mundo, o fez sentir-se indigno.
— Acho que é uma boa ideia, — Stefan concordou. — Se você não se importar, vou manter
minha mente nos livros por algum tempo. — Decididamente, Thomas Vincent voltou sua atenção
para os livros abertos em cima da mesa, enquanto Stefan Prakenskii centrava sua atenção em seus
arredores e na mulher.
A frente da galeria era toda de vitrais, permitindo uma vista magnífica sobre o oceano
turbulento e ao mesmo tempo protegendo as pinturas e as esculturas do sol. Seria difícil, mas não
impossível, ver o interior da galeria durante o dia. Com as luzes acesas à noite, era muito fácil. O
escritório era protegido e havia saídas óbvias, quatro delas. Eles estavam na parte traseira do
prédio, o que dava uma maior cobertura assim como outra saída.
Sentiu-se estremecer um pouco quando Judith se moveu de trás do balcão indo para as
janelas, as luzes de dentro mostrariam uma posição exata para qualquer observador. Precisou
conter o desejo de chamá-la para perto dele sob algum pretexto, só para tirá-la da frente daquelas
janelas. Ela não estava em perigo, ainda, mas estaria se Ivanov estivesse por perto. O homem não
tinha nenhum respeito pela vida. Era um sociopata puro e adorava o seu trabalho. Vivia para
matar os outros. Há muito tempo, Stefan havia chegado à conclusão de que o homem matava por
prazer e não por dever. Ele não veria o brilho Judith ou a sua inocência, e mesmo se visse isso não
teria nenhuma importância para ele. Talvez apenas adicionasse mais ao seu prazer de tirar a sua
vida.
Stefan suspirou. Havia chegado a Sea Haven há duas semanas. Antes de ligar para Frank
Warner para marcar uma reunião, passou um tempo estudando os caminhos da cidade se
preparando para sua missão. Já havia andado pela cidade inúmeras vezes para se familiarizar com
cada rua e beco, cada esconderijo e rota de fuga concebível. Havia dirigido por aquelas estradas
várias vezes, investigando as estradas laterais que levavam para o mar até que soubesse que
poderia percorrê-las no escuro e em alta velocidade. Havia criado várias rotas de fuga e arranjado
um local seguro onde guardou seu dinheiro, identidade e passaportes com vários nomes
diferentes.
Petr Ivanov viria para Sea Haven, se já não estivesse lá. Stefan sabia por que havia sido
indicado para esta missão. Não era para usar seus talentos para tomar conta de uma antiga
namorada na possibilidade pouco provável de que um prisioneiro do ramo secreto do governo
fugisse da prisão, enganasse os agentes que o prenderam e fosse atrás de Judith. Isso
simplesmente não fazia sentido. O motivo de ter sido designado para Sea Haven não era Judith
Henderson ou Jean-Claude La Roux, era para que ele encontrasse Lev Prakenskii e Ivanov pudesse
eliminá-lo. Seu treinador sabia que uma vez que Ivanov matasse Lev, teria que eliminá-lo também.
Eles não permitiriam que Stefan permanecesse vivo.
Ele esfregou as têmporas. Por que será que eles haviam decidido eliminar dois de seus
melhores agentes? Esta “limpeza” estaria acontecendo por alguma razão? Algum repórter teria
descoberto a verdade sobre os “orfanatos” que na verdade havia sido realmente escolas para
capacitar agentes e assassinos? Este novo governo achava que não era interessante para o país
que estas “escolas” fossem descobertas com as alianças que foram formadas?
— Dor de cabeça? — Judith perguntou com simpatia. — Tenho a aspirina em um armário
onde guardo os remédios.
Ela o estava observando muito atentamente como ele a havia observado.
— Acho que é o cansaço. Se você não se importar, verificarei estes livros outra hora. Viajei
por muitas horas e não dormi o suficiente. — Esta era uma ótima desculpa para vê-la novamente
depois do passeio de trator.
— Claro que eu não me importo. — Judith era tão agradável quanto sabia que seria. Ele era
um mestre manipulador, treinado nas melhores escolas, cada lição representava a vida ou a morte
de cada um deles. E ele havia sobrevivido a todas elas. Alguém como Judith não teria nenhuma
chance contra ele. Provou um gosto amargo na boca e evitou o seu olhar enquanto ela guardava
os livros no cofre.

CAPÍTULO 04

No momento em que Stefan pisou fora da galeria e sentiu o frescor da noite, soube que
estava diante do maior problema de sua vida. Talvez o maior dilema de sua vida. E não era por
causa do franco-atirador que o tinha na mira ou a coceira na parte de trás de seu do pescoço que
lhe dizia que o assassino estava sem dúvida na pequena cidade de Sea Haven. Ele era um agente,
treinado praticamente desde o seu nascimento a usar as pessoas, o ambiente ou qualquer coisa
como uma ferramenta, mas ainda assim, instintivamente e sem pensar, colocou-se entre Judith
Henderson e bala de um exterminador, ao invés de usar o corpo de Judith para proteger o seu.
Tudo nele se congelou. Que diabos havia acabado de fazer? O que estava errado com ele?
Suas ações não faziam sentido. Ele se moveu, ficando completamente exposto, seu corpo cobrindo
o dela enquanto seu aroma o envolvia. O vento balançava seus cabelos e alguns fios foram na
direção dele deslizando tentadoramente sobre sua pele. Ele ficou surpreso com suas ações.
Chocado. Realmente horrorizado, mas mesmo assim, seus pés não se moviam. Se percebesse
algum outro movimento, ele a levaria para o outro lado e colocaria o seu corpo entre a torre de
água11 e ele, pois tinha certeza que Petr Ivanov estava ali por perto com uma mira de longo
alcance. Petr estava lá... Stefan podia senti-lo. Sentia a sensação de ameaça que sempre o
alertava, um dos muitos dons psíquicos que possuía. Ainda assim, não se mexeu. Onde diabos
estava o seu arraigado sentido de autopreservação? Os anos de treinamento de sobrevivência?
Todos os seus conhecimentos?
Sinais de alarmes tocavam em sua mente como pequenas explosões. Sua palma da mão
esquerda coçava tanto que ele esfregou-a ao longo de sua coxa, mas, permaneceu onde estava
como se tivesse crescido raízes em seus pés. Seu coração batia forte e ele provou paixão em sua
boca, uma fruta que nunca havia provado, mas reconheceu o seu sabor instantaneamente. Judith.
Ela preenchia todo o vazio nele. De alguma forma, no pequeno espaço de tempo que tinha
passado com ela, ela conseguiu se derramar sobre ele trazendo algo que nunca imaginou: a
esperança. Ela representava a vida. Viver.
Estava ciente das pessoas se deslocando pela calçada à sua direita em direção da torre. Ele
poderia ser capaz de usar a pequena multidão como um escudo, trabalhar uma maneira de
encontrar um caminho para chegar por trás de Ivanov. Se pudesse, rastrearia Ivanov até o seu
covil e o mataria. Desfazer de seu corpo seria bastante fácil e isso daria a ele algum tempo para
encontrar seu irmão, sem medo de expô-lo a um exterminador.
Naquele momento, a coisa mais urgente no mundo para ele era proteger Judith. Continuou
mantendo o seu corpo entre o atirador e Judith. Sua mente exigia saber o que diabos ele estava
fazendo, mas seu corpo permanecia firme em seu lugar.
Duvidava que Ivanov atirasse nele se tivesse chance. Era cedo demais. O assassino queria
Lev. Seu irmão tinha desaparecido ali naquela cidade, foi dado como morto, mas Petr Ivanov não
acreditou. Seu plano era matar os dois irmãos Prakenskii, não apenas Stefan. Dessa forma, ele não
dispararia, mas Stefan ficaria ali caso ele mudasse de ideia. Seu senso de autopreservação deveria
tê-lo forçado a se mover. Mas era impossível, apesar da terrível coceira na parte de trás do
pescoço aumentar.
Maldita mulher. Porque diabos estava demorando tanto?
— Precisa de ajuda? — Ele ofereceu educadamente, mantendo-se no papel de Thomas
Vincent.
— Parece que a fechadura travou.
Judith olhou por cima de seu ombro para ele e seu coração quase parou. Havia algo
incrivelmente sedutor em seu rosto com aquele cabelo sedoso que o cobria parcialmente. Seu
olhar passeou por ele por alguns instantes. O tempo parecia ter parado. Ele não era o único que
estava saboreando a paixão na boca. Esta mesma paixão estava ali. Em seus olhos. Percebeu
alguns vislumbres do fogo que viu em suas pinturas e não tinha dúvida sobre isso. Não importava
se ela sempre usasse uma expressão fria e controlada, o fogo estava lá, fervendo sob a superfície,
pronto para o homem certo desenterrá-lo.

11
Torre de água: Depósito de água sobre uma torre que fornece água para toda redondeza.
Afastou aqueles pensamentos rapidamente. Que homem certo? Ele não era o homem certo
para ninguém. Vivia em outro mundo, longe deste que estava vivendo no presente, e não tinha
direito de pensar que uma mulher como Judith Henderson poderia ser sua. Nem mesmo em sua
imaginação, mas de qualquer forma não se moveu, nem uma polegada.
— Deixe-me tentar. — Não esperou que ela se afastasse, chegou por trás dela e colocou os
braços ao seu redor, prendendo-a entre a porta e o seu corpo, o cuidando de mantê-la escondida
da mira da arma de Ivanov enquanto pegava a chave de sua mão.
Seus dedos roçaram os dela e ele sentiu uma onda de choque através de seu corpo, sua
energia o sacudiu. Ela era mais assustadora do que qualquer inimigo que já havia perseguido e
eliminado. Ela o desequilibrava quando nada mais o fazia. Sentia-se um cativo no círculo de seus
braços, ela ficou muito quieta, mas ele se sentia cada respiração que ela puxava com dificuldade.
Calor correu por suas veias e se estabeleceu como uma bola de fogo em sua virilha. Ele sempre
usou o sexo como uma arma eficaz, uma ferramenta perfeita, extraindo informações, controlando
seu corpo, permitindo-se ficar ereto quando necessário e mantendo-se assim durante o tempo
que fosse necessário, mas não conseguia se lembrar de nenhuma vez a qual seu corpo tivesse
respondido a uma mulher da forma como estava fazendo agora, era quase como se ele tivesse
uma mente própria.
Era um fenômeno estranho e único, era chocante e emocionante. Nunca havia estado em
uma montanha russa, mas sentia-se quase como se estivesse em uma agora, sendo jogado de um
lado para outro, sem ter como se equilibrar e quase incapaz de respirar. Seus pulmões estavam
famintos por ar. Ele estava consciente de tudo sobre ela, os fios de seu cabelo, o comprimento de
seus cílios, seu lábios entreabertos, a subida e descida de seus seios, inclusive enquanto
empurrava a chave na fechadura e mexia várias vezes para destravá-la.
— Eu tenho que te dizer Judith... — sua metade Thomas e sua metade Stefan confessaram
— Está ficando cada vez mais difícil respirar.
Ele esperava que ela o afastasse. Que fizesse qualquer coisa que pudesse salvar a si mesma
ou a ele. Talvez ela não percebesse o perigo que estava correndo e este perigo não tinha nada a
ver com bala de um franco-atirador.
— Percebi isso. Meus pulmões também estão queimando.
Ele gemeu. Sua honestidade iria matá-lo. Ele não era um homem honesto. Nem sequer sabia
se naquele momento ele a estava deliberadamente manipulando, coisa que era inteiramente
capaz. Ele não tinha ideia de mais nada e já nem sabia mais o que era. Judith parecia tão fora do
seu mundo, tudo o que ele não era e nunca poderia ser. Ela era sincera. Suave. Compreensiva. Ele
podia facilmente identificar tudo isso dentro dela.
E ele era totalmente duro e sombrio. Não tinha ideia em que tipo de mundo que ela vivia. Só
sabia que o seu era violento e feio. Não havia sorrisos ou honestidade. A trava desbloqueou com
um clique duro e ele não teve mais nenhuma razão para mantê-la enjaulada. Mas não moveu o
corpo para longe dela quando entregou a chave de volta.
— Eu não sou bom com as mulheres. — Isso foi uma mentira descarada. Ele manipulava as
mulheres sem nem sequer tentar. Thomas Vincent podia não ser bom com as mulheres, mas
Stefan sempre usou o sexo como uma arma, seduzia uma mulher dando-lhe tudo o que ela
quisesse para conseguir tudo o que queria. Ele havia sido treinado e possuía um controle completo
de seu corpo até que conheceu Judith.
Ele certamente não deveria estar tendo problemas em controlar uma enorme e dolorosa
ereção só porque estava inalando seu perfume, que era único, bem fundo em seus pulmões. Ou
tocando todo aquele cabelo sedoso.
— E eu tampouco sou boa com os homens, — ela confidenciou.
Seu olhar capturou o dela e o prendeu. Na intimidade da noite, Stefan sentiu como se o
mundo tivesse virado de cabeça para baixo. Havia mais poder em Sea Haven do que havia
percebido ou havia poder demais naquela mulher. Ele chegou ali preparado para a guerra, mas
não para lutar contra esta sedução lenta de cada um de seus sentidos. Ele não possuía emoções.
Não tinha permissão para sentir nada, mas ainda assim, com o seu corpo tão perto de Judith,
sentia que estava mais vivo do que nunca.
Ele colocou a chave em sua mão e verificou a porta antes de, lentamente, quase
relutantemente, tentar voltar para a sua posição inicial. Ele não conseguia se afastar dela e não
afastou o olhar do dela nenhuma vez. Stefan colocou uma das mãos com cuidado acima de sua
cabeça e outra ao lado, inclinando-se dois ou três centímetros mais perto até que seus quentes
seios tocaram no seu tórax e ele sentiu as batidas de seu coração.
— Nunca em minha vida, me aconteceu algo parecido com isso. — Ela não poderia deixar de
ouvir a honestidade em sua voz. Ele estava dizendo a mais pura verdade. — Na verdade, eu nem
sei dizer que diabos está acontecendo.
Esta declaração soou definitivamente como Stefan Prakenskii e ele estremeceu. Soava como
uma acusação. Um rosnado. Uma exigência de saber a verdade, e pior, ele estava saindo de seu
disfarce como o tímido Thomas.
Seria ela uma agente tão condenadamente boa, que ele não teria nenhuma chance contra
ela? Teria ela enganado Jean-Claude também assim tão facilmente? Ele havia testemunhado a
obsessão de Jean-Claude por ela em primeira mão, e agora se encontrava preso na mesma
armadilha.
Ela estendeu o braço, sua mão estava trêmula, seus dedos quase alisaram seu rosto antes
dela se conter.
— Eu não sei o que está acontecendo conosco, Thomas. Mas seja o que for não pode
acontecer. Eu não faria isso com você.
Sua declaração foi tão honesta como a sua. Ela pensou que era a única que se escondia nas
sombras. Ela se escondia por trás deste comportamento doce, escondendo a verdadeira Judith
que permanecia imóvel, congelada e prisioneira de uma parede a qual ela se negava derrubar. Ela
estava com medo de si mesma, de quem ela realmente era. Ele a viu. Viu o que outros nunca
haviam percebido. Aquele fogo latente que havia enterrado dentro dela. O fogo e um poder mais
letal, um poder que se estendeu alcançando o perigoso poder que havia dentro dele.
Ela tinha medo por ele. Sentia medo dela mesma. O que lhe dizia muito mais do que
qualquer coisa que ela pudesse ter admitido em voz alta. Ela possuía um grande poder e não
estava habituada a manipulá-lo. E por quê? O que ela poderia temer?
— Vamos ficar bem, Judith, — ele garantiu com vontade de ser para ela o único homem para
o qual ela poderia sempre dizer a verdade sem sentir medo. Precisava ser o homem que iria
libertá-la do medo que mantinha preso dentro dela. Ele nunca havia sentido a necessidade de
proteger alguém ou de salvar ninguém. O que havia com esta mulher que mexia tanto com ele?
Ela tremeu e abaixou a cabeça, mas não antes dele perceber o terror repentino em seus
olhos. Ela desviou o olhar do dele por apenas um momento e logo voltou a olhá-lo, mas ele já
havia visto a Judith real.
Ela endireitou os ombros, levantou o queixo e seus olhos o encararam corajosamente.
— Eu não sou uma boa mulher, Thomas. Você precisa saber que, o que quer que seja essa
coisa que está acontecendo entre nós, não poderá ir adiante. Você parece ser um homem
decente. Eu vou trabalhar contigo se você realmente estiver interessado em comprar a galeria e
estou disposta a te ajudar, mas você tem que saber que isso é tudo o que pode acontecer entre
nós.
Ele estava ferozmente atraído por ela fisicamente. Atraído pelo seu poder psíquico, (ou sabe-
se lá o que), mas agora algo mais penetrou nele, o que fazia com que estar na companhia dela se
tornasse ainda mais perigoso. E muito mais necessário. Admiração. Respeito. E ele estava se
afogando na necessidade de ser um homem melhor. O tipo de herói que cavalga em um cavalo
branco e resgata mulheres bonitas com olhos cheios de tristeza.
Infelizmente, Stefan Prakenskii nunca seria este tal homem. Ele era o tipo de homem que
enganava as mulheres, as via como um alvo; usava-as como uma ferramenta de trabalho e as
descartava sem pensar duas vezes. Ele sequer vivia no mesmo mundo que uma mulher como
Judith vivia. Ela podia achar que não era uma boa mulher, mas resolveu mostrar a ele sua
vulnerabilidade, e um homem como Stefan sempre agarrava o que era oferecido a ele. Agarrava e
utilizava.
Ele não se preocupava que Petr Ivanov percebesse seu interesse excessivo por Judith porque
ele imaginaria que Stefan estava cimentando seu disfarce usando a mulher. As mulheres eram
alvos fáceis e ficavam vulneráveis diante de um homem como Stefan. Ele podia “ler” sua presa,
cada expressão, a linguagem corporal e havia praticado ser gentil sabendo exatamente a coisa
certa a se dizer. Ivanov com certeza esperaria que ele usasse uma mulher local para introduzir-se
na vida do povoado.
— Eu entendo. E não sei o que está acontecendo entre nós, Judith, — ele disse, sua palma
da mão esquerda coçava tanto que o estava deixando louco. Então, antes que fizesse papel de
bobo e segurasse seu seio esquerdo através da tentadora blusa de seda vermelha, ele abaixou a
mão e esfregou-a em sua coxa. Apesar de sua declaração, (ou talvez por causa dela), ele sentiu um
desejo urgente de se inclinar através dos escassos centímetros que os separavam, para provar sua
boca.
— Não vou esperar que possa acontecer algo entre nós, mas não acredito que você não seja
uma boa mulher. Tenho um sexto sentido para estas coisas.
Isso poderia ser algo Thomas Vincent diria. Stefan Prakenskii teria se apoderado do que
quisesse, e ele queria Judith. O desejo que sentia por ela estava se transformando em algo muito
perigoso.
De repente, ele abaixou seu braço e deu um passo para trás. Ele se recusava a cair nesta
armadilha. Não importava se só havia restado uma pequena parte de sua humanidade, ele não iria
permitir ser despojado dela. Forçou-se a incorporar o papel de Thomas, o tímido, sabendo que
usar o seu disfarce seria muito mais seguro para ambos.
Judith Henderson estava obrigando-o a avaliar sua vida, reavaliar o que queria. Ele sempre
esteve sozinho no mundo, e de alguma forma, sem perceber, se viu à procura de algo que pudesse
dar sentido à sua vida. Ele era uma máquina de matar que morava nas sombras e agora, olhando
para ela, percebeu que ainda restava um lampejo de esperança dentro dele. Seus treinadores não
haviam conseguido arrancar todos os sentimentos dele. Ainda havia aquela pequena faísca. Não
era mais uma brasa incandescente, mas estava lá, escondida da vista de todos, mas ainda
resistindo valentemente.
— Vou levá-la até o seu carro.
Foi necessário mostrar para ela que Thomas Vincent era um homem que acompanhava uma
mulher a pé até chegar a seu carro ou à porta da frente de sua casa. Sempre cuidando de sua
segurança. Isso permitiria que Stefan pudesse dar a ela alguma proteção contra Ivanov, e, se fosse
honesto consigo mesmo, ficar um pouco mais em sua companhia.
— Não é necessário, embora seja muita gentileza sua. Sea Haven não é exatamente uma
área de alta criminalidade.
— Vou levá-la até o seu carro, — ele afirmou indiferente se sua voz soava como a de Stefan
ao invés de Thomas. Ele não permitiria que ela andasse pela rua sozinha com uma bala à apenas
alguns segundos de colidir com ela. — Onde ele está?
— Eu o estacionei aqui nesta mesma rua. Está logo após aquelas lojas lá embaixo à
esquerda.
Mas é claro que ela havia estacionado seu carro lá. A torre onde Ivanov estava escondido
ficava na mesma direção. Stefan enviou uma oração silenciosa para um Deus o qual ele não tinha
nenhuma fé ou confiança, que estivesse julgando a situação corretamente e que Ivanov não
apertaria o gatilho e o mataria logo após matar Judith. Ele caminhou ao lado de Judith, seus olhos,
por força do hábito, movendo-se agitadamente sobre os telhados e se aprofundando por todos os
pequenos quintais nas laterais dos edifícios e olhando para lojas bastante intrigantes.
Ele teve o cuidado de manter as mãos livres enquanto se movia ao longo da rua. A cada
segundo, seus olhos rastreavam a torre e os telhados circundantes. Era um hábito e se Ivanov os
estava observando de perto através do visor noturno, esperaria por este comportamento dele.
Havia um banco de madeira encostado em um dos edifícios em uma pequena calçada que
levava a mais lojas. Um sem-teto estava sentado no chão, apoiado no prédio, ignorando o banco.
Ele simplesmente olhava o oceano, observava as grandes ondas batendo contra as rochas.
A pequena multidão de degustadores de vinho parecia estar reunida em frente à porta de
uma loja mais abaixo, todos falavam e riam ao mesmo tempo, abafando qualquer chance real de
capturar sons que poderiam ajudá-lo localizar a posição exata de Ivanov. Não havia nenhuma
dúvida em sua mente agora; o radar de seu corpo confirmava que ele estava sendo observado
pelo visor de uma arma. O inimigo estava lá fora e o estava seguindo.
Ele virou a cabeça para Judith, curvando ligeiramente para baixo, sorrindo, ouvindo-a
enquanto analisava todas as coberturas possíveis entre o local onde eles estavam e o seu carro. O
senso de autopreservação era automático para ele, estava entranhado nele, sempre sabia todos
os detalhes de sua vizinhança, cada edifício e paisagem, conhecia o movimento natural ao seu
redor. Ele era como um camaleão, misturando-se, uma cobra que mudava de pele tornando-se
outra, uma sombra sem substância.
Estavam se aproximando do homem sem-teto. O homem tinha uma das mãos dentro do
casaco, onde poderia facilmente estar escondendo uma arma. Stefan permitiu que seu olhar
varresse o homem, observando cada detalhe. Ele já o tinha visto ao redor no povoado, todos os
dias nas duas últimas semanas, enquanto estava sondando o lugar, havia falado com ele muitas
vezes. Os moradores de rua, muitas vezes sabiam tudo sobre qualquer estranho que estivesse na
cidade, e cultivar um bom relacionamento com eles, muitas vezes mostrou-se útil. Usar um
disfarce de sem-teto era uma cobertura bastante fácil também. Ivanov poderia certamente usar
tal cobertura e por este motivo Stefan se familiarizou com todas as pessoas sem-teto no pequeno
povoado.
Manteve-se do outro lado da rua, algo que normalmente nunca teria feito. Cada passo
representava um batimento do coração. Estava em alerta máximo agora. Se estivesse errado
sobre Ivanov estar no alto da torre ou em algum telhado, um disfarce de morador de rua poderia
muito bem colocá-lo bem perto de seu alvo. Stefan possuía uma faca na manga de seu casaco e
esperava poder lançá-la antes que Ivanov tentasse atirar. O sem-teto possuía o mesmo odor e
parecia ser o mesmo homem que havia conhecido, mas ele sabia que um profissional seria capaz
de copiar tudo aquilo.
— Só um momento, Thomas. — Judith tocou em seu braço quando eles se aproximaram da
pequena quadra.
Seu toque foi quase imperceptível, mas ele sentiu o calor penetrar em seu corpo através da
pincelada de seus suaves dedos, o distraindo totalmente de sua concentração e ele não podia
permitir que isso acontecesse. Nunca havia experimentado uma coisa dessas antes. Não
importava o que estava acontecendo ao seu redor, não importava quem ele era, sua vida se
resumia em caçar e sobreviver.
Stefan não sabia se deveria arrastá-la para o beco próximo, batê-la contra a parede e beijá-la
até que estivesse tão desorientada quanto ele parecia estar, ou se deveria acabar logo com tudo
isso agarrando sua cabeça em suas mãos e com um movimento forte o suficiente, torceria e
quebraria seu pescoço. Instintivamente, recuou um passo, apenas o suficiente para colocá-la na
posição de alvo. Seu estômago se apertou. Sentia como se um torno estivesse apertando o seu
coração, de tanto que seu peito doía. Esse pensamento o trouxe para a realidade repentinamente.
Quão profundamente ele havia caído em sua magia para estar assim tão malditamente
desesperado? Cada instinto de sobrevivência gritava para ele sair dali enquanto ainda podia.
— Isso só vai levar um minuto, — Judith falou, ignorando que sua vida estava por um fio.
Interiormente ele amaldiçoou por sua incapacidade de superar quem e o que ele era mesmo
com uma inocente. E estava começando a se convencer de que ela era realmente inocente. Ele
possuía um radar para detectar o inimigo, homem ou mulher, e este radar nunca o deixou na mão.
Ela não era como se retratou para o mundo, havia muita emoção reprimida dentro dela, emoção
que mantinha longe do mundo. Mas ele a via, aquela emoção ardente e profunda sob a superfície.
Foda-se! Ela o havia retorcido por dentro, causando-lhe uma confusão de emoções que, algumas
horas antes, ele nunca teria acreditado que isso poderia acontecer com ele.
Ela se curvou para falar com o homem no chão.
— Você está bem aquecido, Bill?
Ele balançou a cabeça afirmando.
— Blythe me trouxe meias e botas novas. — Ele apontou para seus pés que estavam
aparecendo por baixo de seu cobertor. — Com isso, estou me sentindo muito bem. — Olhou na
direção de Stefan e em seguida, desviou o olhar. — Vi o diabo hoje. Ele estava do outro lado da
rua, logo ali. — Ele indicou a grade que separa a rua do escarpado. — O diabo tem a morte em
seus olhos.
Judith franziu a testa.
— Eu não sei o que isso significa.
— Como este rapaz. — Bill apontou para Stefan. — Ele tem a morte nos olhos.
Judith olhou para Stefan com uma expressão um pouco desconcertada e balançou a cabeça
como se desculpando pela acusação. Essa pequena observação disse a Stefan muito mais do que
havia aprendido sobre o velho em duas semanas. Ele, provavelmente, possuía algum dom e
certamente, aquela havia sido a razão pela qual havia sido atraído para Sea Haven. Talvez tenha
sido algum tipo de soldado que provavelmente serviu na Guerra do Vietnã.
— Bill, você quer que eu o leve para a clínica?
Stefan sabia que ela pensava que o velho estava doente, mas Bill, sem dúvida, havia visto
Petr Ivanov com seus olhos mortos e o reconheceu como um sociopata. O exterminador poderia
facilmente ser identificado como o diabo, pois levava a morte com ele. Ele não quis pensar muito a
respeito de que o homem havia visto o mesmo em seus próprios olhos.
Bill sacudiu a cabeça em negação, encolhendo-se como se a ideia de ir para uma clínica fosse
muito pior do que a de enfrentar o diabo, e talvez para ele fosse.
— Você já comeu hoje?
Bill assentiu com a cabeça.
— Ainda tenho crédito na loja e na cafeteria.
Judith sorriu para ele.
— Tenha uma boa noite, Bill.
— Você também, senhorita Judith, — o velho resmungou.
Era óbvio para Stefan que Bill sentia uma afeição genuína por Judith. Ele havia se esforçado
muito ao longo daqueles dias para conseguir que o velho falasse com ele somente brevemente,
apenas com uma troca de gentilezas. O ocasional café quente e o bolo da cafeteria não havia sido
o suficiente para fazer com que ele soltasse a língua.
— Desculpe-me pelo o que ele disse sobre você, — Judith disse. — Ele fica confuso às vezes.
Tem vivido nas ruas há anos. Todos os moradores o ajudam, até mesmo os estudantes do ensino
médio. Eles doam dinheiro para ele em forma de créditos nas lojas locais. Embora ele não goste
muito de aceitar ajuda. Ele costuma dormir em vários lugares diferentes e insiste que não quer ir
para nenhum abrigo, apesar de não termos nada parecido com um abrigo por aqui. — Ela
suspirou. — Aqui não é um local de muita ajuda para doentes mentais.
— Ele não quer ajuda, — Stefan respondeu honestamente. — Ele é livre. Vive do jeito que
quer viver.
Ela ficou em silêncio por um momento, deu alguns passos antes que parasse e olhasse para
ele novamente.
— Você acha realmente isso? Ele tem vivido desta maneira desde que eu vivo aqui, Inez diz
que quando nasci ele já vivia assim há mais de vinte anos. Dizem que ele estudou em uma escola
daqui e em seguida foi embora daqui por um tempo. E quando voltou... — Ela encolheu os
ombros.
— Ele tem o direito de escolher o que quer. Ele lutou por esse direito e tem direito de fazer
o que quiser. Se resolver sentar-se ao sol por dois dias sem se mover, ele sente que está no seu
direito de fazer isso.
O cabelo de Judith se movimentou sobre o ombro quando ela se virou e seus olhos se
encontraram com os dele. Mais uma vez sentiu aquela reação estranha e inquietante na boca do
estômago.
— Nunca pensei nesta situação desta forma. Sempre o achei triste e me sinto mal com isso,
sempre desejei poder encontrar uma maneira de tornar a vida dele melhor.
Stefan não se conteve e deixou sua mão escorregar pela sua cintura, um gesto que seria
natural para qualquer pessoa, menos para ele. Sua mão esquerda. Aquela a qual estava sentindo
uma incômoda irritação em sua palma. No momento em que ele a tocou, a irritação desapareceu.
Ele estava ciente do fato de que desta forma, não tinha como sacar rapidamente uma de suas
armas. Ele não tocava as pessoas e as pessoas não o tocavam. Esta compulsão irracional que
estava sentindo o irritava. Ele não costumava fazer coisas que poderiam matá-lo.
Apertou a mandíbula, mas não se negou a ter aquele contato com ela. Aquilo parecia um
pesadelo. Ela parecia tão desamparada. Perdida. Necessitada. Que diabos ele estava pensando? Se
havia alguém necessitado, este alguém era ele. Ele perdeu sua alma há muito tempo, perdeu toda
a sua humanidade e ainda assim, ali estava ele, pensando e querendo ser este homem que ela
necessitava. O homem que prestaria atenção no tom de sua voz e removeria a tristeza de seu
olhar. O homem que seria como um escudo para ela, para que nunca mais tivesse medo de
expressar qualquer emoção que sentisse.
Queria ser o homem que daria a liberdade a ela, o homem a quem ela procuraria no meio da
noite. Aquele que teria o direito de tocá-la e abraçá-la. Que a manteria segura. Aquele que
removeria com beijos aquele olhar triste em seu rosto e faria amor com ela até que ela não
conseguisse mais se mover, apenas olharia para ele com aqueles olhos maravilhosos mostrando o
quanto se sentia verdadeiramente feliz, sem fingimentos, sem ocultar sentimentos, apenas
aproveitando aqueles pequenos momentos de felicidade. Ele queria ser este homem para ela.
Amaldiçoou baixinho enquanto continuaram caminhando pela rua. Ela não se moveu para
longe dele, nem o havia olhado com um olhar de censura. Onde o inferno estava o seu senso de
autopreservação?
— Você não está fazendo um trabalho muito bom para nos afastar — ele acusou.
Ela parou e aqueles olhos escuros passearam pelo rosto dele e em seguida fechou seus
longos cílios baixando o olhar.
— Eu sei, — ela admitiu em um tom de voz baixo. — Eu estou fingindo. Só desta vez.
Seu coração saltou. Ela não precisava explicar o que disse. Ele estava fingindo também.
Fingindo que aquela era uma situação comum. Ele passou sua outra mão pela cascata de seda de
seus cabelos. Seguiu um longo caminho para baixo, até chegar à curva de sua bunda. Seu sangue
se agitou em seu corpo e rugiu em seus ouvidos. Calor percorreu suas veias. Sentiu uma vontade
quase incontrolável de segurar seus cabelos em um punho e puxar sua cabeça na direção dele
para que pudesse saborear a paixão em sua boca. Ele sentiu o fogo de seu desejo crescer para se
juntar à tempestade de fogo que ardia através de seu corpo.
Nunca em sua vida, até conhecer Judith, havia sentido qualquer reação física natural por
uma mulher. Ele pensava que isso era impossível. Era excitante e aterrador sentir-se desta forma,
tão fora de controle. Pela primeira vez em sua vida, sentia-se como um homem ao invés de uma
máquina. Judith tinha dado isso a ele. Ele sempre teria esses momentos com ela caso se
permitisse aceitar estas sensações.
Eles estavam apenas a alguns passos da multidão. Algumas pessoas vinham na direção deles,
elas viam Judith e acenavam com um alegre “Olá”. Ele teve alguns segundos para saborear o fato
de que havia encontrado as respostas às perguntas que sempre havia impelido para o fundo de
sua mente. Ele havia viajado ao redor do mundo caçando e muitas vezes, havia parado do lado de
fora das casas de algumas pessoas, olhando para as luzes no interior delas, ouvindo o murmúrio
de vozes, vendo uma mulher se agachar e ficar com a cabeça na direção de uma criança e sempre
se perguntou como seria sentir aquela profundidade de emoção por outro ser humano, mesmo
que apenas por um momento. Com todo aquele cabelo sedoso queimando como o fogo através
do centro da palma de sua mão, ele encontrou as respostas que estava procurando.
Quando chegaram próximo à multidão, ele deixou cair sua mão, dando-se espaço suficiente
para usar qualquer uma das muitas armas que levava escondido com ele. Ele era Thomas Vincent
e estas pessoas seriam seus vizinhos se comprasse a galeria… Se decidisse se estabelecer em Sea
Haven e encontrasse uma mulher para passar com ele o resto de sua vida.
— Judith! Sentimos sua falta, querida.
Uma loira alta cumprimentou Judith com um beijo. Seu olhar repousou sobre Thomas, com
mais interesse educado do que qualquer outra coisa.
— Thomas, esta é a minha irmã, Blythe Daniels, — Judith apresentou-o. Seus dedos roçaram
o seu braço, como se quisesse atraí-lo para mais perto dela.
Blythe notou aquela pequena intimidade, mesmo estando bastante escuro, e isso disse a
Stefan que ela era alguém que prestava atenção a tudo em seu redor. Ele abriu um sorriso e pegou
a mão que ela estendeu. Ele sentiu uma pequena corrente de energia, o suficiente para que seu
radar de alerta disparasse. Havia mais em Blythe do que ele podia ver.
— Thomas está pensando em comprar a galeria, — Judith comentou.
— Claro. Ela é linda. Eu sempre amei esse edifício e a vista é espetacular, — disse Blythe.
— Eu tenho que concordar. — Stefan dedicou outro sorriso tímido em direção à loira.
Stefan se incorporou em seu papel com facilidade, mais familiarizado com o camaleão que
era do que com Stefan Prakenskii, um homem que realmente não existia. Thomas Vincent poderia
estar interessado em Judith Henderson, e não se sentiria ameaçado por esse interesse. Thomas
poderia se sentir atraído por qualquer mulher. Ele poderia se sentir um pouco desconfortável
porque era um pouco tímido no que se relacionava às mulheres, mas não se preocuparia por
sonhar com um futuro agradável com elas.
Stefan Prakenskii sabia que ficaria em chamas com Judith, que queimaria vivo e ansiaria por
mais… muito mais. O seu corpo inteiro e sua mente respondiam a ela, acabando com seu senso de
autopreservação, destruindo anos e anos de disciplina e treinamento. Para ele, haveria apenas
esta mulher. Ela era virtualmente uma desconhecida, entretanto já a conhecia quase que
intimamente. Ele passou toda a sua vida viajando pelo mundo e este fenômeno incrível e
impossível nunca havia acontecido com ele, e sabia com certeza de que não aconteceria
novamente.
— O prédio vale uma fortuna, — Thomas concordou prontamente. Ele se virou, com o
pretexto de olhar para a propriedade o que permitiu que seus olhos fizessem uma varredura nos
telhados. — Ele é quase tão grande como a cidade.
Atrás de Blythe, outra mulher mais velha sorriu enquanto estendia a mão.
— Acho que somos muito pequenos para nos qualificar como uma cidade. Costumamos nos
referir como uma comunidade. Sou Inez Nelson. É um prazer conhecê-lo. A galeria é uma parte
muito importante de Sea Haven.
Apesar de seu pequeno tamanho, ela possuía um aperto de mão firme e olhos penetrantes.
Ela definitivamente o estava avaliando cuidadosamente.
— Thomas Vincent, — ele se apresentou.
— Não deixe que ela influencie você, Thomas, — Judith advertiu. — Ela é noiva de Frank
Warner, então tem um grande interesse neste negócio.
— Será que sua esposa veio com você? — Inez perguntou fofocando descaradamente.
Blythe e Judith riram em voz alta; claramente acostumadas com o jeito de Inez interrogar as
pessoas sem a intenção de ofendê-las. Thomas tampouco se sentiria ofendido com isso. Ele era
um homem encantador. Deu um largo sorriso de menino e negou com a cabeça.
— Não tenho esposa, senhora. Sou um homem solteiro.
Os olhos de Inez se iluminaram imediatamente.
— Oh, que bom. Este é o lugar perfeito para criar uma família.
— Ele necessitaria de uma esposa para fazer isso, Inez, — Blythe declarou.
Inez sorriu.
— Exatamente. E acredito que nenhuma de vocês é casada.
— Exatamente. — Blythe tirou a taça de vinho que estava na mão dela. — Chega de vinho
por hoje. Thomas, por favor, ignore-a. Sua língua esta noite está fora de controle.
Inez não parecia arrependida.
— Não mais do que todas as outras noites. E de que outra maneira eu poderia seduzir este
homem bonito a dar uma chance a nossa pequena comunidade?
— Talvez você devesse mostrar para ele os livros fiscais, — disse Judith.
— Eu não me importo de ouvir o que ela está oferecendo.
Stefan entrou no jogo.
— Alguma delas duas vem como brinde se eu comprar a galeria? Eu poderia aproveitar este
oferecimento para conseguir uma esposa e filhos, pois, até agora, eu falhei miseravelmente nesse
departamento.
— Eu poderia ser capaz de organizar sua vida, — Inez concordou. Seu tom de voz mudou
para um tom de falsa inocência. — Judith, você gostaria de um copo de vinho ou dois?
Judith riu.
— Você incorrigível, Inez. Aproveito a oportunidade para te dizer que estou indo para casa.
Ela pegou o braço de Stefan e o puxou. Ele percebeu que ela faria este movimento, sabia
que ela iria chegar para mais perto dele para fazer isso e poderia ter evitado o seu toque como
normalmente faria, mas deixou que seus dedos agarrassem seu pulso. Sentia como se ela tivesse
prendido seu coração em sua mão.
— Vou levá-lo comigo para a sua própria segurança, assim você conseguirá chegar ao seu
destino antes que Inez consiga vender a galeria de Frank usando meios ilícitos, — Judith brincou.
Boca de Stefan ficou seca ao sentir o seu toque. Ele pegou sua mão em seu pulso e a enfiou
na dobra de seu braço, fazendo o papel de Thomas, pois Stefan a puxaria e a colocaria abaixo de
seu ombro, se entregando aquela terrível necessidade de estar o mais próximo possível daquela
mulher. O fogo entre eles se recusava a diminuir, não importava o quão duro qualquer um deles
fingisse que não o sentia queimando de forma abrasadora e brilhante.
Pior, se pelo menos houvesse uma chance de que aquilo que sentiam fosse somente uma
simples atração física, poderiam ter um caso ardente e acabar com aquilo, mas de alguma forma, a
atração que sentiam era mais profunda, a sentia nos ossos de sua medula. E ainda assim aquilo
não parecia ser uma solução suficientemente boa para explicar o que estava ocorrendo com eles.
Enquanto caminhava com ela, percebia que a alma de Judith se movia contra a dele… talvez até
absorvendo-a. Fosse o que fosse o que estava acontecendo, ele sabia que esta mulher estaria para
sempre, gravada em seu corpo, reclamando-o.
Ela virou a cabeça e seu olhar se chocou com o dele. Sentiu seu coração apertar fortemente
diante do olhar de desejo que percebeu em seus olhos. Ele não era o único que estava sentindo
esta força, esta atração intensa.
— É porque ambos temos dons, — Judith sussurrou. — Ouvi dizer que isso pode acontecer.
Sobre alguns dons que se complementam ou algo assim.
Ela era corajosa, ele tinha que reconhecer isso. Não havia nenhuma vaidade em sua voz.
Judith podia não se mostrar para o mundo, mas estava sendo honesta com ele mostrando que se
importava com ele e ele admirava isso. Ela poderia ter permanecido em silêncio.
Sem pensar, ele fez a pior coisa possível. Pegou sua outra mão, deslizando-a sobre a dele.
Não conseguiu resistir à tentação de sentir sua pele macia, não pode resistir sentir aquela
conexão. Pela primeira vez em sua vida, ele queria alguém. Queria que alguém o tocasse. Queria
que alguém que pudesse vê-lo. Alguém que o tornasse real e não a sombra sem substância que ele
sabia que era. Não alguém… Judith.
— Você está fazendo com que eu não consiga respirar, — ela admitiu, virando a cabeça para
olhar para o oceano batendo ao longo dos penhascos.
— Eu pensei que era você que estava fazendo isso comigo, — disse Stefan enquanto mudava
a posição de seu corpo de uma forma protetora para evitar que Ivanov visse seu corpo de uma
forma muito clara caso estivesse tentando arranjar um melhor alvo conforme foi treinado. O que
disse a ela foi a mais pura verdade, não a de Thomas, mas a de Stefan, seus pulmões queimavam
pela busca por ar.
Tocá-la era um milagre. Sua pele parecia fundir-se com a sua. Ivanov leria seus gestos como
nada mais do que uma consolidação de seu disfarce, mas Stefan não queria que o exterminador
conseguisse uma boa visão de seu rosto. Pela primeira vez em sua vida, sentiu-se genuinamente
protetor com uma mulher.
— Isso já aconteceu com você antes? — Stefan perguntou.
Tudo dentro dele ficou quieto enquanto esperava pela resposta. Ele sabia sobre Jean-
Claude. Ele passou dois meses trancado com aquele homem e sabia sobre sua obsessão por Judith.
Não queria que ela tivesse respondido ao homem com a mesma intensidade que havia entre eles.
Ela negou com a cabeça.
— Nunca. Eu não costumo me relacionar com ninguém. Só aconteceu uma vez. Mas não foi
desse jeito. Eu era muito jovem e… Estúpida. As coisas aconteceram muito rápido, me senti
sufocada e não confio em relações assim. Você também não deveria confiar. Portanto vamos nos
comportar como adultos. — Seus olhos encontraram os dele novamente. — Certo?
Se Ivanov não os tivesse observando, ele teria conduzido este assunto à sua maneira e
Thomas Vincent juntamente com o seu disfarce poderiam ir para o inferno. Ele a encostaria contra
a parede do edifício mais próximo, longe de olhares indiscretos, e sua boca tomaria a dela, ela
sentiria seu corpo duro, quente e sem vergonha de sentir este desejo verdadeiro. Que era única
coisa malditamente real. Será que ela acharia que este comportamento seria suficiente adulto?
Ela respirou profundamente ao perceber a chama de desejo em seus olhos. Ele sabia que ela
podia ver este fogo ardente que sentia e não conseguia esconder.
— Certo? — Ela sussurrou novamente.
Ele quis tranquilizá-la, ela havia sido corajosa o suficiente para ser honesta com ele e ele não
poderia fazer menos por ela.
— Vou tentar fazer isso por você, Judith, mas com toda honestidade, nunca senti nada
parecido com isso por nenhuma mulher.
Ela poderia acreditar de Thomas, mas não em Stefan. Stefan não existia. Ele não era real, era
um homem que seduzia as mulheres para descobrir seus segredos e deixava suas vidas em ruínas.
Não se importava se estas mulheres eram espiãs ou trabalhavam para criminosos, não havia nada
mais fácil para ele, e, no entanto, não tinha ideia do que fazer com Judith agora.
Queria fugir com ela e nunca ter que olhar para trás em seu passado, queria esquecer o
assassino e se tornar seu herói, o homem que iria encher seus dias e noites com nada além de
felicidade. Que diabos de ilusão era aquela? Ele não sabia o que era felicidade, até que andou por
uma rua escura com uma mulher que era praticamente uma desconhecida.
— Eu posso ser este homem, — ele disse em voz alta. As palavras saíram antes que ele
pudesse contê-las.
Por um momento seus olhos pareceram se aquecer.
— Eu sei que você pode, — ela sussurrou. — Mas eu não posso ser essa mulher, Thomas.
Gostaria de ser, mas não posso.
Ele ouviu o lamento e a dor em seu suave murmúrio e seu coração deu um duro salto
mortal. Ela o estava matando, da mesma forma como bala de Ivanov faria. Thomas. Ele detestava
Thomas. Ele era o seu maior rival. Ele era o homem que destruiria qualquer chance que por
ventura tivesse com a única mulher que era importante para ele neste mundo.
— Veremos — ele disse sem se importar se ela havia escutado. Sua resposta era um aviso e
quis dizer exatamente aquilo.
Caminhando ao longo da calçada irregular, com o vento soprando uma fina névoa em seu
rosto e a mão de Judith enfiada na dobra de seu braço, Stefan sentiu uma estranha sensação de
paz. Permitiu-se aquela fantasia durante aqueles últimos metros que faltavam para chegar ao
carro de Judith.
— Este é o meu carro, — ela anunciou, colocando a mão sobre o capô do seu Mini Cooper.
Parecia estar se sentindo tão pesarosa como ele se sentia.
Stefan deu um passo na frente dela, impedindo-a de caminhar para o lado do motorista.
— Irei até a sua fazenda amanhã para dirigir o trator e vou levar o almoço.
Ela respirou profundamente e tirou de seu rosto o cabelo que o vento soprou por cima do
ombro.
— Você sabe que isso poderia nos colocar em um problema, não é?
Ele balançou a cabeça lentamente.
— Vou mantê-la segura.
Respirando profundamente, concordou.
— Tudo bem então. Estou contando com você.
Este era o seu primeiro passo para ser um homem melhor e já estava quase colocando tudo
a perder. Se a rua não estivesse cheia com seus amigos e Ivanov não estivesse à espreita na torre,
ele a beijaria até deixá-la sem sentido.
Stefan se obrigou a sair do seu caminho, quase apreensivo por deixá-la ir embora, temendo
que pudesse escapar. Na verdade, estava com mais medo de si mesmo… Medo que o homem
sombra recuperasse os sentidos e simplesmente desaparecesse no ar, deixando somente Thomas.
Ele foi com Judith para a rua e abriu a porta do carro para que ela entrasse. Ela parou por um
momento e ficou apenas olhando para ele. Ele percebeu que estava chateada porque aquele
momento tinha que terminar, assim como ele estava.
— Obrigada por esta noite estranha, porém maravilhosa, Thomas, — Judith disse e entrou
no carro.
— Sua companhia foi muito bem-vinda — ele disse quando fechou a porta do carro e deu
um tapinha em cima dele antes de dar a ela um aceno amigável e caminhar de volta para a calçada
irregular, levando o perigo com ele.
CAPÍTULO 05

Stefan continuou na calçada observando o carro de Judith até que estivesse em segurança,
as luzes desapareceram à medida que ela dobrou a esquina antes que ele se virasse em direção à
galeria. Deixou seu olhar fazer uma varredura nos telhados sem levantar sua cabeça. Na escuridão,
era impossível detectar a presença de Petr Ivanov. O exterminador não cometia erros. Mas não
era muito bom em atirar a longa distância. De qualquer forma, Stefan não gostava da ideia de
saber que havia um assassino em um local distante dele. Ele preferia encara-lo ao invés de ter que
fugir de sua mira.
Mantendo seus passos lentos com movimentos calculados e ombros retos, Stefan caminhou
pela rua principal, olhando as várias vitrines de lojas pelas quais passava como se estivesse
simplesmente procurando conhecer mais a comunidade Sea Haven. O mar se agitou, orvalhando
suas águas contra ele, as janelas das lojas refletiam a lua brilhante que havia surgido detrás de um
véu de nuvens. Seus anos de experiência deram a ele a disciplina necessária para ser paciente e
manter um ritmo constante.
Assim como Stefan não acreditava que seu irmão estava morto, provavelmente Petr Ivanov
também não. Ele havia escrito um relatório sobre a morte de Lev em um esforço para fazer com
que todos acreditassem que a busca por Lev havia acabado. O exterminador havia perdido seu
rastro aqui em Sea Haven. Stefan tinha certeza de que ele não era nada mais do que uma isca para
o assassino para terminar o trabalho com seu irmão.
A torre de água ficava a uma altura de um pouco mais de três andares, o que oferecia à
Ivanov uma boa visão da rua, das lojas e dos telhados em duas outras ruas. As várias lojas
localizavam-se em frente da rua principal e o oceano e as outras na outra rua, todas estavam no
raio de visão de alguém que estivesse deitado no chão da torre de água com uma arma de mira
com longo alcance. Havia apenas alguns poucos lugares que ficariam escondidos de seu olhar e o
corpo de Stefan coçava para chegar a qualquer um deles rapidamente, mas obrigou-se a manter o
seu passeio casual. Caminhou, estudando cuidadosamente cada prédio como Ivanov esperaria que
ele fizesse.
Entre a torre de água, onde Judith havia estacionado seu carro e o objetivo final de Stefan,
havia três lojas e a sua galeria. Sua. Este pensamento o fez parar abruptamente. Ele deveria estar
completamente envolvido em seu papel para pensar desta forma. Empurrou este pensamento
disperso para o lado e continuou com a sua caça.
O menor prédio que conseguia visualizar era a loja de vinhos que possuía um telhado plano,
os outros telhados eram inclinados ou íngremes, como a maioria dos telhados dos prédios da rua
principal. Eles ficavam bastante juntos o que proporcionava outra rota de fuga através da cidade.
Deliberadamente, desacelerou seus passos, não querendo alcançar seu objetivo até que a
pequena multidão estivesse completamente segura dentro da loja de vinhos. Música e riso
derramavam-se pela rua, as pessoas não eram conscientes que dois homens perigosos estavam se
caçando em suas ruas tranquilas.
O beco estreito que o levava de volta para a segunda fileira de lojas encontrava-se logo à
frente assim que passasse pela galeria. Uma vez que estivesse lá dentro, o prédio da galeria o
protegeria da visão de Ivanov e ele teria que mudar de posição para mantê-lo em sua mira. O rato
tornar-se-ia o caçador do gato. Stefan só precisava de alguns minutos… mais alguns passos.
Soltou a respiração lenta e uniformemente. Não havia pressa. Havia passeado pela cidade
para se familiarizar com o layout dela. Mais três passos, sem pressa, e viraria para o pequeno
jardim ao lado da galeria, que o levaria para as lojas atrás da rua principal, enganando assim o
exterminador. Correu por trás da galeria, sabendo que Ivanov não se preocuparia em perder seu
alvo por alguns minutos, pensaria que Stefan estava explorando local e reapareceria em breve. O
quintal que havia na parte de trás era pequeno, os degraus de pedra conduziam através dos
jardins de flores e ervas daninha.
Imediatamente correu por entre as flores e os arbustos dando a volta na galeria entre as
duas fileiras de prédios e se escondeu em um canto escuro de um quintal na parte de trás antes de
subir por uma estrutura que havia no canto. Quando a torre ficou na altura de seus olhos, ele
agachou-se ficando completamente imóvel, esperando com a paciência de um grande felino na
selva.
Thomas Vincent tinha ido embora e em seu lugar, Stefan Prakenskii se transformava no que
realmente era: um caçador. E quando estava caçando, sentia-se totalmente em seu elemento.
Despojando-se totalmente do personagem de um homem tímido, embora brilhante nos negócios,
para rapidamente virar a mesa e transformar-se no assassino que era. Sentia seus pulmões se
expandindo e algo obscuro se desenrolando ferozmente como um espiral dentro dele.
Os minutos passavam lentamente, um segundo de cada vez. O céu escureceu mais, com as
nuvens se movendo rapidamente, escondendo a luz da lua. Até a superfície do oceano passou de
cinza para negro com a escuridão. O vento aumentou como se uivasse e logo após diminuiu depois
de soltar rajadas de ar no mar como em um acesso de raiva.
Olhar de Stefan varria continuamente os telhados, olhando para todos os lugares os quais
um atirador poderia se esconder para ter uma vista completa da rua principal da cidade e a torre
era uma ótima opção. Havia várias torres de água na comunidade, muitas foram remodeladas para
serem usadas para outro propósito, mas a da rua principal era a que concedia a melhor vista sobre
as ruas e prédios. Havia apenas alguns pontos cegos e Stefan estava agachado especificamente em
um deles. Ele tinha certeza de que Ivanov estava naquela torre.
Os minutos continuavam passando. Aquele era definitivamente um jogo de espera e poucas
pessoas eram melhores do que Stefan neste jogo. Sua respiração desacelerou, seu coração se
acalmou e seu corpo se enroscou enquanto esperava, simplesmente esperava. Matar Ivanov
poderia causar alguns problemas na rua principal, mas precisava manter Lev em segurança e,
possivelmente, Ilya, pelo menos até os irmãos conseguirem um tempo para se reagrupar e passar
a mensagem aos outros para se prepararem para fazer uma limpeza na área. Unidos, os irmãos
Prakenskii tornavam-se inimigos terríveis e qualquer outro que viesse atrás deles saberia disso.
O céu ficou ainda mais escuro e outra rajada de vento espalhou as nuvens negras sobre as
poucas estrelas restantes no céu. Algo se moveu contra aquele céu escuro. Uma figura descendo a
escada do topo da torre para o segundo andar, desceu rápido e caminhou rapidamente para a
sombra do tanque circular, onde Stefan o perdeu de vista por um momento. Em uma fração de
segundo, Stefan percebeu que os instintos de Ivanov o haviam alertado de que o jogo havia
mudado, pois Stefan estava ciente de sua presença e agora o estava caçando.
Imediatamente, foi em direção a ele, saltando sobre o muro circundante na parte de trás do
prédio correndo ao longo dele tomando cuidado para não tropeçar nos pilares. Sem se importar
de estar correndo por um muro fino, no escuro. O vento enviou outra rajada feroz, fazendo cair as
folhas das árvores que rodeavam sua cabeça e ombros e ele saltou para o telhado inclinado do
prédio próximo ao muro. A estrutura era grande, com telhas em vários níveis. Aterrissou em uma
parte inferior e quase escorregou no musgo acumulado pela constante brisa do oceano.
Evidentemente, o sol não conseguia chegar naquela parte do telhado, fazendo com que fosse
difícil caminhar por ali.
No telhado acima dele, Stefan ouviu o ruído de passos rápidos. A inclinação do telhado
superior era mais acentuada, mas Ivanov passou por ele como um gato, com grandes passos
largos, bem à frente dele, já pulando para um telhado longo e estreito da loja de presentes de dois
andares. Stefan teve um vislumbre do assassino como uma listra através da superfície.
Stefan correu por todo o telhado coberto de musgo e pulou para o prédio ao lado. O telhado
tinha uma boa inclinação, mas ele não conseguiu seguir a pista exata de Ivanov pelo local que
pulou, Ivanov começou a ganhar terreno e graças a isso, se obrigou a correr ao longo da borda
mais inclinada do telhado, o que necessitaria muito equilíbrio, mas, se sua presa pensava que isso
o atrasaria, estava equivocado.
Cruzou velozmente o extremo inferior do telhado em busca de Ivanov e pulou sobre um
pequeno beco onde um sem-teto havia se enrolado em um cobertor se preparando para uma
noite fria.
Stefan pousou suavemente no telhado da loja de vinhos, tentando ser tão silencioso como
um gato, embora duvidasse que, com o ruído que emanava da multidão na pequena loja, alguém
ouviria sua perseguição. A última coisa que queria eram testemunhas como o velho Bill. Thomas
Vincent não era um homem que perseguiria assassinos sobre os telhados. Ele deu quatro passos
correndo quando sentiu algo queimando em sua bochecha enquanto ouvia como uma abelha
zumbia com raiva em seu ouvido. Ele se abaixou em direção à beira do telhado, agradecido de que
a especialidade de Ivanov não fosse tiros a longa distância ou disparar em alguém em movimento.
O exterminador possuía uma boa mira, mas não era bom em sua habilidade de atirar em um alvo
em movimento, enquanto todos os irmãos Prakenskii possuíam este dom.
Stefan deslizou ao longo da beira do telhado quando um segundo tiro quebrou uma telha ao
lado de seu ombro. Fragmentos dela salpicaram em seu rosto e ele quase caiu. Segurando o peso
de seu corpo na ponta dos dedos, contou até dez e puxou-se para cima. Ivanov acreditaria que ele
havia caído no chão e continuaria seu caminho por sua rota de fuga pelos telhados. Obviamente, o
assassino havia pensado em todas as rotas de fuga possíveis. Todos eles foram ensinados a fazer
isso durante vários anos, nas escolas em que haviam crescido, nas quais os tornaram monstros.
Stefan teria que ser cuidadoso. Ivanov havia feito este caminho antes, quando planejou sua
rota de fuga sobre os telhados. Ele provavelmente teria praticado esta rota todas as noites,
repetidamente… e estava armado com um silenciador, o que não era inesperado. Mas os tiros que
ele deu, foram. Ivanov queria fugir e não chamar mais a atenção para si mesmo. Ele não gostaria
de ter que desistir da ideia de matar Lev, se este era o motivo dele estar ali. Ivanov era, acima de
tudo, um homem tenaz.
A loja de vinhos era pequena e quadrada. Havia muitas pessoas lá dentro. Com um espaço
tão pequeno, os sons que as pessoas faziam estouravam através de janelas e portas. Foi difícil
ouvir o ruído de passos correndo sobre o telhado com o barulho que vinha do prédio lotado.
Movendo-se com cuidado, Stefan levantou-se de forma que seus olhos estivessem na direção do
telhado. Ivanov parecia ter abandonado aquele telhado, apenas para ir para outro lugar seguro,
Stefan permaneceu cauteloso enquanto se levantava. Quando nenhum tiro chegou, ele sentiu-se
pronto para correr novamente, mantendo-se abaixado enquanto corria e preparando-se para
saltar para o próximo telhado.
Stefan correu até o telhado ao lado da galeria de arte, agachado para se esconder tanto
quanto fosse possível e dessa forma, posicionar-se diretamente atrás Ivanov, lutando contra o
vento a cada passo do caminho. O exterminador já havia conseguido descer pelo outro lado e
saltava para uma pequena marcenaria que vendia móveis esculpidos à mão. O prédio era de uma
única planta e com um telhado normal, mas estava bem afastado da rua. Isso deu a Stefan a
chance de ganhar um pouco de tempo enquanto estava no lado inferior do telhado, deu alguns
passos e saltou sobre esse telhado enquanto Ivanov saltava para o longo prédio da marcenaria.
Ao invés de correr em linha reta, Ivanov deu a volta para a rua novamente, em direção à
frente de outro prédio, e, em seguida, desapareceu no outro lado do telhado. Esta ação avisou a
Stefan que o assassino tinha um plano. Ele não diminuiu sua velocidade na corrida, mas aumentou
sua consciência enquanto corria, tentando compreender o percurso que ele fazia, tentando
alcançar a mente do exterminador para descobrir o que ele havia planejado.
Abaixo dele ficava a rua principal da cidade. Do outro lado da calçada o oceano batia nas
rochas, a água escura salpicava pelo ar. O vento batia nele enquanto corria sobre uma e outra loja,
nesta que estava, havia camadas de telhado de vários níveis, de forma que conseguiu ter apenas
breves vislumbres de Ivanov que havia conseguido pular no telhado do bar.
Uma consciência instantânea o acertou. Um sinal de néon havia piscado duas noites antes,
quando Stefan estava verificando as ruas cuidadosamente. Uma luz pulsava em vermelho,
contrastando com o azul do céu à noite de forma hospitaleira, no momento estava apagado
deixando o telhado da varanda em um escuro silencioso, mas poderia acender a qualquer
momento. Ele mudou de ângulo enquanto saltava a distância entre os dois prédios, aterrissando
no telhado inclinado ao invés da tentadora e plana plataforma do telhado superior.
Ivanov estava há dois prédios na frente dele, correndo até o telhado do terceiro andar do
Hotel Sea Haven. Stefan tinha que mantê-lo à vista em todos os momentos. Se permitisse que o
exterminador aumentasse a distância entre eles, as chances de que escapasse aumentariam.
Stefan estava totalmente exposto à crescente força do vento enquanto corria por todo o prédio ao
lado, uma loja maior que vendia roupas e uma variedade de presentes de alta qualidade. O prédio
era muito grande e no momento em que atravessou o telhado, Ivanov havia desaparecido no
outro lado do telhado do hotel.
Xingando, Stefan correu até a curva íngreme com telhas escorregadias. Ivanov parou por um
momento, olhando por cima do ombro, enquanto seus pés se desviavam três passos para a
esquerda. Stefan teria jogado a faca contra ele, mas não conseguiu um bom ângulo e num piscar
de olhos, Ivanov pulou para outro telhado que ficava ao lado do hotel, desaparecendo de vista. Em
uma explosão de velocidade, Stefan correu atrás dele indo pelo mesmo caminho que Ivanov tinha
usado para pular para o telhado do hotel. Ele precisava seguir esse caminho exato, caso contrário
poderia estar em apuros. Afinal, por que Ivanov teria perdido tempo se deslocando para a
esquerda quando correr por uma linha reta teria sido mais rápido?
Algo agarrou o tornozelo de Stefan, apertando com força, puxando sua perna para baixo. Ele
caiu de forma dura no chão e rolou imediatamente já com sua faca em uma das mãos e a outra
mão levantada para se defender, seu radar gritava um aviso para ele. Uma sombra escura lançou-
se para ele com uma faca apontada para baixo. Ele pegou o pulso de Ivanov com uma das mãos e
o arrastou de lado até que sua faca o alcançasse.
Ele ouviu Ivanov grunhir quando a lâmina penetrou através de suas roupas perfurando sua
pele. Ivanov deu um chute forte nas costelas de Stefan que o fez escorregar para trás ficando na
beira do alto telhado. O assassino deu-lhe outro golpe enquanto Stefan tentava evitar sua queda
do telhado. O ataque com a faca veio como se ele desenhasse um número oito, alcançado seu
braço duas vezes, trincando sua mandíbula, continuou se defendendo dos golpes superficiais em
sua pele enquanto se esquivava da faca com seu braço. Ele se lançou para Ivanov uma segunda
vez, sua faca passou pelo estômago do assassino, fazendo-o afastar e recuar. Stefan continuou a
deslizar para trás enquanto cravava seus calcanhares no telhado tentando desacelerar sua descida
constante até a borda.
Encravando sua faca em uma telha, ele agarrou fortemente o cabo e puxou seu corpo
ficando de pé tentando manter Ivanov em seu raio de visão. Parte da telha que se quebrou, caiu
batendo com força na calha para depois cair no chão. Stefan virou a cabeça rapidamente
esperando pelo próximo ataque de Ivanov, só que ele foi mais rápido do que ele, o assassino fugiu,
correndo de volta até o telhado do hotel, seus passos evitavam a armadilha que havia colocado
provavelmente, dias antes, provavelmente esperando que algo assim pudesse acontecer.
Stefan tentou persegui-lo, desta vez, evitando as armadilhas. Chegou ao topo, onde o
telhado atingiu o pico e parou para olhar para o outro lado, cauteloso porque agora tinha
concedido à Ivanov alguns segundos para preparar outra emboscada. O telhado do prédio ao lado
estava vazio. Sua presa tinha desaparecido. Virou-se devagar, tentando escutar algum ruído. As
ondas golpeavam contra os escarpados, batendo nas rochas e enviando um spray branco de
espuma para o ar. O som da música e as risadas se estendiam para fora do bar, mas não havia
nenhum som de passos correndo sobre os telhados. Outra rajada de vento o chicoteou através de
suas roupas. Ele ignorou tudo isso, sua mente estava totalmente focada em sua presa.
Stefan começou a caminhar com muito mais cautela. Ivanov poderia estar esperando em
qualquer lugar, talvez à sua frente preparando uma emboscada. Ele começou a descer com calma
pela rampa principal em direção ao prédio ao lado, analisando o topo do telhado, examinando
todos os lugares com extremo cuidado. Agachou-se e tocou duas pequenas manchas na telha e
levou os dedos até o nariz. Sangue. Eram somente algumas pequenas gotas, mas este era
definitivamente o sangue de Petr Ivanov. Ele soltou a respiração devagar. Perseguir um Ivanov
ferido era muito parecido como perseguir um urso ferido, mas não tinha nenhuma outra escolha.
Se quisesse que Lev estivesse a salvo, Ivanov teria que morrer.
As manchas estavam em um padrão diagonal, por todo o telhado e não em uma linha reta.
Ivanov não teria tempo de ir para o telhado do outro prédio sem que Stefan o tivesse visto
enquanto chegava ao telhado do hotel. Isso significava uma coisa…
Stefan examinou o layout do telhado do hotel em direção à frente do prédio, a sacada se
nivelava ao prédio e havia várias sacadas nos quartos do terceiro andar. Se Ivanov tivesse
escorregado por uma delas, poderia estar em qualquer lugar neste momento, até mesmo
chegando por trás dele. A necessidade urgente de continuar sua caça era grande, mas resolveu ser
cauteloso e prestar atenção em seu instinto de autopreservação.
Agachou-se novamente, estudando três janelas. Se ele fosse Ivanov e considerando que
poderia ser perseguido através dos telhados, alugaria qualquer quarto no canto, deixaria a janela
aberta, entraria por ela, a fecharia e sairia pelo andar de baixo se misturando com as pessoas da
cidade ou voltaria a sair pela janela da frente, pularia para o telhado e chegaria por trás de
qualquer perseguidor.
Amaldiçoando, Stefan voltou para o pico do telhado, evitando a sacada e a frente do edifício.
Ele olhou para a rua abaixo. A loja de vinhos ainda estava lotada, mas a própria rua estava vazia e
escura. Duas crianças haviam saído dos banheiros do outro lado da rua e o velho Bill, o morador
de rua, mexeu-se inquieto em seu pequeno espaço entre os edifícios, mas de resto, ninguém se
moveu.
Mantendo-se agachado, continuou seu caminho até o telhado íngreme para espionar sobre
o prédio, entre o hotel e o bar. Uma sombra rápida moveu-se, era tão pequena que em um
primeiro momento, Stefan pensou que poderia ser um gato, mas resolveu arriscar e correu para o
lado para saltar sobre outro prédio. A sombra se afastou, cruzando o telhado do bar seguindo para
uma plataforma onde um sinal de trânsito quebrado, ajudava a esconder o assassino que tentava
escapar.
Stefan saltou, impulsionando seu corpo para baixo na plataforma em cima do bar caindo
diretamente em cima de Ivanov levando-o para o chão. Ele caiu duro em cima dele, a distância um
pouco longa demais pelo ângulo que estava, o fez forçar o ar a sair de seus pulmões. Ele ouviu um
estalo sinistro e Ivanov respirar soltando um silvo de dor enquanto esticava sua mão e pegava uma
faca.
Rolaram uma e outra vez, chocando-se violentamente com o sinal quebrado, o metal e vidro
cortaram as costas e o ombro de Stefan, ambos lutavam para manter as lâminas de suas facas
longe de seus corpos. Lutaram em silêncio, ferozmente, uma batalha feroz de vida ou morte, entre
dois guerreiros altamente qualificados. Separaram-se e se esforçaram para que seus pés se
mantivessem enquanto giravam um ao redor do outro em silêncio.
Stefan era um homem de poucas palavras. Não tinha necessidade de reforçar a sua coragem
com um monte de ameaças. A respiração de seu inimigo estava lenta e calculada, mas um silvo de
dor surgia a cada inspiração, acusando um osso fraturado ou talvez quebrado. Ivanov era um
inimigo mortal, rápido e habilidoso. Um passo em falso e estaria morto. O exterminador não
sentia raiva, ele simplesmente matava. Por três vezes sua faca cortou o punho de Stefan e o
antebraço. O assassino foi marcado também.
O som de risadas soou para fora da loja de vinhos, de repente, muito mais alto. Ivanov às
pressas, atacou com sua faca ao seu lado, forçando Stefan a pegar o pulso do homem. Somente no
último momento, ele percebeu a intenção do assassino, mas já era tarde demais. O impulso os
levou para a borda da plataforma e os dois caíram na calçada abaixo. Stefan aterrissou debaixo de
Ivanov, segurando seu pulso com força para impedi-lo de cortar sua garganta com a faca.
Por um momento, Stefan não conseguiu se mover, sentia-se paralisado, desesperado por ar,
seu pulmão em chamas, seu corpo mal registrava a dor que se disparava ao longo de cada
terminação nervosa. Ivanov o golpeou tão duro que a força levou o seu corpo a bater na calçada
novamente, ele percebeu que sua visão ficou um pouco embaçada. Manteve firme seu agarre no
pulso de seu agressor, enquanto o atacava com sua própria faca, passando pela guarda de Ivanov
e riscando com a ponta da faca embaixo de seu queixo e fazendo um movimento para cortar seu
braço levantado.
Ivanov jogou o sangue de seu braço no rosto de Stefan, tentando acertar seus olhos e deixá-
lo temporariamente cego, Stefan torcia o seu pulso tentando impedir que deslizasse a faca em sua
pele. Stefan não tinha outra escolha a não ser deixá-lo fugir. Empurrou Ivanov soltando-o. Ivanov
pulou para trás, virou-se e correu para longe.
A porta da loja de vinhos já estava aberta e as pessoas saíam chamando umas às outras,
sorrindo enquanto se despediam. Stefan virou-se, conteve um gemido e ficou de pé. Escondeu-se
nas sombras tão rapidamente quanto o seu corpo permitiu. Ivanov ficou ferido. Pelo menos um
osso foi quebrado e assim como Stefan, sofreu vários cortes. Stefan esperava que ele se
escondesse em outro de seus buracos para lamber suas feridas e se reorganizar, permitindo a
Stefan tempo suficiente para fazer o seu trabalho, encontrar o seu irmão e caçar novamente o
assassino.

*****

— Estou tão feliz, Blythe.


Judith não conseguia conter a alegria que transbordava por seus poros. Ela sentia. Cada
célula em seu corpo estava viva novamente, verdadeiramente viva. Não entendia como nem por
que, mas ali, na privacidade de sua casa, podia se permitir sentir-se ser absolutamente e
completamente feliz. Riu alto e se jogou em sua cama, esparramando-se, braços e pernas como
uma criança brincando na neve.
— Sua casa está brilhante, — Blythe observou. Era impossível não sentir a felicidade de
Judith. Blythe riu suavemente e se sentou na beira da cama. — Literalmente brilhante Judith. Eu
diria até que você poderia moderar um pouco este brilho, mas nunca vi você assim e isso é muito
bom.
— É ele. Thomas. — Judith abraçou um travesseiro contra seu estômago, passando sua mão
esquerda pelo delicado algodão egípcio. — Há algo nele que alcança algo em mim. Ele é tão… —
Ela parou e virou-se, olhando para Blythe. — Eu ainda não sei como explicar.
— Você tem estrelas em seus olhos. — Blythe empurrou para trás os cabelos de Judith e
estudou seu rosto. — O que aconteceu entre vocês dois?
Blythe não podia deixar de sentir-se feliz por Judith, ela a contagiou com a sua alegria. Blythe
queria ser prática e cuidadosa como sempre, falar para Judith ir devagar, para lembrar-se de que
Thomas estava ali apenas pensando em comprar a galeria e que poderia desaparecer em poucos
dias, mas a felicidade que pulsava por toda a casa era muito contagiosa.
— Não aconteceu nada. — Judith sentou-se, incapaz de ficar quieta. — Ou melhor… Tudo.
Eu o desejo. Mas não é somente desejo, Blythe. Eu queria estar dentro da sua pele. Senti-me
como a Bela Adormecida. Ele veio e me acordou e eu nem sei como. Sinto-me viva novamente
pela primeira vez em anos. Não me lembro de me sentir tão feliz, Blythe, não desse jeito.
Blythe respirou fundo. Alguém tinha que ser racional e prática.
— Querida, você não pode apenas pular de um penhasco com os olhos fechados. Você sabe
disso, não é?
Ela deveria saber disso e, essa era a maior parte do problema.
— Eu deveria estar com medo… não, apavorada… e ainda assim… sinto-me sinceramente
eufórica. É como se eu acordasse depois de um longo sono. — Seus olhos se encontraram com os
de Blythe. — Eu havia me esquecido de como é bom sentir ser despertada por um homem. Saber
que ele pensa que sou desejável e bonita.
Fazia tanto tempo. Ela estava com medo que tivesse sido danificada permanentemente
como mulher, que estaria tão marcada pelo seu passado que sua mente e o seu corpo se
recusariam a reconhecer os homens. Que estaria tão quebrada que ninguém poderia consertá-la.
No entanto, milagrosamente, sentiu-se atraída por Thomas Vincent. Uma atração real. Uma paixão
feroz que surgiu do nada e era tão avassaladora que havia acabado com todo o seu bom senso e
desta forma, a euforia vibrava dentro dela. Não havia como conter a intensidade da emoção que
estava sentindo, não havia como controlá-la. Podia respirar fundo o quanto quisesse, não havia
nada que pudesse ajudá-la. E ela não queria controlar isso que estava sentindo. Queria sentir...
Tudo.
— A maioria dos homens que te conhece, acha que você é desejável e bonita. E você não os
nota, Judith, — Blythe apontou. — Isso é estranho. É…
Ela parou de falar.
— Intenso. — Judith terminou a frase por ela e tocou os lábios percebendo que tinha dito a
palavra em voz alta. Riu suavemente. — Sinto vontade de dançar.
— Isso é um pouco assustador, você não acha? — Blythe perguntou com sua voz suave.
— Eu sei Blythe, sei que é, mas neste exato momento, estou disposta a pular de um
penhasco com os olhos fechados. Amanhã vou acordar e voltar a ser eu mesma novamente,
totalmente contida e fria, mas esta noite, só por essa noite, quero acreditar que posso viver
novamente.
Blythe franziu a testa.
— Fria? É como você se sente? Sente que não está realmente vivendo uma vida? Judith, eu
pensei que você fosse feliz aqui conosco.
— E sou. Tenho sido feliz. Mas não é a mesma coisa, Blythe. Sempre trabalhei arduamente
para conter os meus sentimentos. Você realmente acha que alguém pode ser tão perfeitamente
agradável o tempo todo? Às vezes, eu sorrio quando no fundo quero gritar. Sinto-me frustrada e
irritada como qualquer outra pessoa, mas não é seguro que eu sinta este tipo de emoção perto de
outras pessoas. Então as contenho dentro de mim e sorrio para que as pessoas pensem que sou
perfeita, agradável e inofensiva.
Judith pulou da cama e caminhou pelo quarto, sentia-se incapaz de ficar parada. Estava
agitada. Sentia-se um pouco louca com toda esta felicidade inebriante e sabia que Blythe se
preocupava por ela. Mas não tinha como se preocupar com isso agora. Não havia como conter
esta forte emoção, e uma emoção intensa como aquela podia afetar a todos ao seu redor. Viver
próxima daqueles que amava sempre foi maravilhoso, até que seu corpo acordou, até que deixou
de se sentir morta por dentro. Ela podia conter a raiva e tristeza, mas a alegria e inquietação, a
maneira como se sentia viva ao estar com Thomas Vincent… Era impossível. A alegria transbordava
dentro dela e, que Deus a ajudasse, precisava sentir esta emoção verdadeira novamente, mesmo
que somente na segurança de sua casa e por uma única noite.
Ela não conseguia parar de sorrir, mesmo com Blythe testemunhando o seu comportamento
descontrolado.
— Só hoje à noite. Apenas por agora. E dentro da minha casa, onde ninguém mais pode ser
afetado, Blythe. Liguei para você, porque você parece absorver os meus sentimentos ao invés de
reagir a eles. Eu preciso me permitir sentir esta noite, uma felicidade completa. — Sabia que havia
um apelo em sua voz, mas não conseguiu evitar. Estava feliz em saber que ainda era uma mulher
inteira e precisou compartilhar este momento incrível com alguém que amava. — Por favor, sinta-
se feliz por mim.
Era incrível sentir-se totalmente viva novamente, sentir-se uma mulher vibrante e desejável.
Claro que ela não iria fazer nada sobre isso, mas o alívio enorme de saber que se quisesse,
poderia, era tão estimulante como o melhor champanhe.
Blythe umedeceu os lábios.
— É impossível não me sentir feliz por você, Judith. Nunca te vi assim. Eu só quero que você
tenha certeza de que conhece todos os perigos ocultos. Você terá que vê-lo na galeria. Não é
como se pudesse evitá-lo se quiser.
Judith respirou profundamente e fez sua confissão de forma apressada.
— Eu o convidei para vir aqui amanhã. Para dirigir o trator comigo e almoçar. Disse que
mostraria a fazenda para ele.
Ela se sentiu tão culpada. Bem, a culpa continuava lá, mas talvez não tão grande. Podia
fechar os olhos e visualizar a imagem de Tom… Thomas, ele seria sempre Thomas para ela… com
aquele jeito como se pudesse corar e gaguejar a qualquer momento. Ele era tão incrível. Parecia
ser mais resistente do que um ferro e tinha a reputação de um brilhante homem de negócios, mas
com ela, pareceu ser quase tímido.
Ela quase sentiu pena dele, até aquele momento em que seus olhares se encontraram e ela
não viu nenhuma timidez na maneira de como ele estava olhando-a. Ele a olhou como se estivesse
fazendo um enorme esforço para evitar jogá-la no balcão, como havia imaginado. Ele parecia
capaz de ser rude, quente e estar tão necessitado como se mal pudesse esperar para tirar toda a
sua roupa.
Ela sabia que era controlada e fria, mas suas necessidades não tinham nada a ver com o
controle ou indiferença. Em seu interior havia um poço de paixão, de fogo e de alguma forma,
Thomas Vincent havia conseguido encontrá-lo. Queria chorar de alegria… E de medo. Ela destruía
as pessoas, aquelas mais próximas a ela, sua família, as pessoas que amava. E quando amava, era
com cada fibra do seu ser.
— Você fez o que? — Blythe perguntou, mostrando a surpresa em sua pergunta. — O
convidou para vir aqui?
Judith respirou fundo, pressionando a mão em seu estômago revolto. Blythe não estava mais
atordoada com seu comportamento do que ela. A fazenda, o seu lugar sagrado, seu santuário.
Todas tinham segredos, e agora, mais do que nunca, elas teriam que ter cuidado.
— E sobre Levi? — Blythe perguntou, sua voz era suave e não acusadora. — Você pensou
que precisamos protegê-lo das pessoas de fora? E Lexi? Você sabe que ela sente-se muito
desconfortável com pessoas estranhas ao seu redor.
— Eu não pretendo levá-lo em qualquer lugar que seja perto de suas casas, — Judith se
defendeu.
Onde estava o remorso e culpa que ela deveria estar se sentindo?
Abraçou a si mesma e foi até a janela. Olhou para o tapete de flores brancas que pareciam
pequenas estrelas balançando suavemente com a brisa. Acima dela, as estrelas estavam
espalhadas pelo céu, dois pontinhos brancos mais brilhantes criavam um efeito de estar no meio
de uma bela galáxia.
— Você pensou bem? Pensou se será uma boa ideia passar algum tempo com ele fora da
galeria?
— Não, claro que não. Embora eu não esteja me importando com isso, Blythe. — Ela se virou
para olhar sua irmã do coração, desejando que ela a entendesse. — Eu quero sentir isso. Quero
me apaixonar loucamente. Quero sofrer por ele, chorar por ele, quero sentir tudo isso dentro de
mim. Eu preciso disto.
Blythe estudou-a por um longo tempo, e então lentamente concordou com a cabeça.
— Eu acho que você está certa, Judith. Já se passou muito tempo e você merece ser
verdadeiramente feliz. Eu só quero que você tome cuidado com seu coração. Não o entregue
assim, sem pensar. Você é uma pessoa de tudo-ou-nada. Apenas nos deixe fazer uma pequena
investigação sobre ele.
— Eu já fiz. Assim que Inez me deu seu nome, eu procurei por informações sobre ele na
internet e ele parece ser realmente um cara decente. Tem uma boa reputação no mundo dos
negócios. Sua foto aparece em alguns eventos de caridade. Alguns artigos foram escritos sobre
ele. Não há nenhuma esposa secreta. Sem antecedentes criminais, não há divórcios. Ele é apenas
um bom homem que trabalha demais.
— E veio para Sea Haven comprar uma galeria de arte quase quebrada?
Judith deu de ombros.
— Também viemos para cá começar uma vida diferente.
— Nós temos um passado, Judith, — Blythe assinalou. — E sei que não somos os melhores
exemplos. Eu só estou fazendo o papel de advogada do diabo, porque você está realmente
pulando de um penhasco e nem está à procura de uma rede de segurança.
— Talvez eu não queira uma. Só desta vez eu quero poder sentir alguma coisa.
— Você sabe que é um elemento espiritual, Judith. Nada pode mudar isso, — Blythe expôs o
problema. — Será que ele está reagindo a você? Ou você a ele? E será que o que você está
sentindo é verdadeiro?
— Eu estou longe dele e ainda estou sentindo tudo isso, — disse Judith com um pequeno
encolher de ombros. — É uma sensação genuína. Estou tão feliz que realmente me sinto bonita e
viva.
— Então você não se importará se eu ligar para Jonas e pedir que ele faça uma pequena
investigação sobre Thomas Vincent? — Blythe perguntou.
Olhar de Judith saltou para o dela.
— Você está me testando para ver se eu tenho certeza sobre quem ele é. Eu tenho Blythe.
Aprendi a evitar os genes da espécie bad-boy e estou absolutamente certa de que tudo nele é
autêntico. Para mim, é difícil ler a sua aura, mas isso não é totalmente incomum. Pessoas dotadas
muitas vezes têm auras mistas.
— Ele é dotado? — Blythe perguntou levantando uma sobrancelha.
Judith se viu ruborizar sem uma razão aparente. Ela sentiu o espírito dele erguendo-se para
encontrar com o dela. Estar física e emocionalmente atraída por alguém já era bastante difícil para
ela, mas sentir sua alma tentando abraçar a dela, tentando absorvê-la e ser absorvido,
francamente, jamais algo parecido havia acontecido antes, e estava se sentindo como uma
adolescente, atordoada por uma paixão por uma estrela do rock.
Ela assentiu com a cabeça.
— Sim. Ele definitivamente é dotado de alguma forma.
Blythe balançou a cabeça.
— E isso não te preocupa? Nem mesmo um pouco?
— Eu me recuso a me preocupar com isso. — Atirou-se na cama ao lado Blythe e pegou as
mãos dela. — Sinta-se feliz por mim. Deixe-me sentir isso. É muito provável que talvez amanhã eu
provavelmente perceba que tudo isso vinha realmente de mim. Que ele realmente estava
sentindo as minhas emoções amplificadas em um milhão de vezes.
— E se esse não for o caso?
— Vou cruzar essa ponte quando eu chegar nela.
— Vou ligar para Jonas.
Judith deu de ombros.
— Por mim tudo bem. Ele não vai encontrar nada.
— E você terá que falar sobre isso com Levi e Rikki, — Blythe advertiu.
— Levi pode desaparecer tranquilamente, — disse Judith. — É só por umas duas horas. E eu
não levarei Thomas em qualquer lugar perto da casa dele ou de Lexi.
Blythe levantou a sobrancelha.
— Você realmente não conhece Levi, não é Judith? Ele não é o tipo de homem que vai
simplesmente “desaparecer”. Ele vai se preocupar com Rikki e com você também. Ele vai ficar por
aí e tomará conta de todos os seus passos, provavelmente com um rifle apontando para Thomas o
tempo todo.
Judith suspirou.
— A vida às vezes pode ser realmente complicada. Eu só quero passar um pouco de tempo
com ele, talvez para sentir isso uma ou duas vezes mais, mesmo se este sentimento não for
recíproco. — Seus olhos escuros encontraram com os de Blythe. — Você não gostaria de se sentir
assim novamente? Você já sentiu uma vez.
Houve um breve silêncio. Blythe se afastou dela, andando pelo quarto com suas pernas
longas, seus ombros e costas estavam rígidos. A vergonha tomou conta de Judith. Ela seguiu a
irmã mais velha até o outro lado do quarto e colocou uma de suas mãos, de forma reconfortante
em seu ombro.
— Me perdoe Blythe. Eu não quis dizer isso da maneira como soou. Não estava tentando
atacá-la. Eu só quis dizer que quero sentir isso novamente, despertar como mulher é incrível, e eu
sei que você já se sentiu assim pelo menos uma vez. E esta é a minha vez. Talvez a minha única
vez.
Ela estudou o rosto franzido de Blythe e resolveu fazer uma confissão.
— Eu era tão inocente quando encontrei Jean-Claude, tão tola, que confundi o seu estilo de
vida e sua força com a realidade. Estava tão impressionada com ele que pensava que o sol só se
erguia por causa dele. Não prestei atenção a quem ele realmente era só me preocupava com o
que eu achava que ele era, fantasiei um homem de sonhos que só existia dentro da minha cabeça.
Eu nem sequer entendia o que era o amor naquela época.
Blythe levantou a cabeça e Judith pode ver seu rosto molhado de lágrimas.
— Está tudo bem, Judith. Eu sempre me sinto desmoronar por qualquer coisa nesta época
do ano. Isso realmente não tem nada a ver com você.
— Até hoje me envergonho por ter deixado um homem como Jean-Claude entrar em minha
vida quando deveria ter prestado mais atenção. Todos os sinais de alerta estavam lá, eles sempre
estiveram lá, Blythe. Eu não quis vê-los. Eu ouvia as fofocas e as ignorava. Via um olhar
preocupado no rosto de algumas pessoas e alarmes disparavam em minha cabeça, mas não desisti
dele. Só continuei com a minha fantasia ridícula. E quando tudo desmoronou, o sonho da preciosa
princesa que vivia em sua torre de ouro, não conseguiu lidar com isso.
Judith afundou de volta em sua cama e segurou o estribo desenhado que ficava pé da cama.
— Fiz uma bagunça na vida de muitas pessoas e acabei tendo o meu irmão assassinado no
processo. Isso deveria ter acontecido comigo, não com ele. Acho que eu não mereço me sentir
assim, não é?
— Judith! — Blythe se virou para ela. — Não quero mais ouvir você dizendo isso. Você acha
que Rikki não merece ser feliz com Levi?
— Ela era inocente. Não iniciou os incêndios que mataram seus pais e seu noivo.
— E você não é mais responsável do que ela, pela morte do seu irmão, ou mesmo pelo que
aconteceu com quaisquer um dos outros envolvidos.
Judith segurou o estribo ainda com mais força.
— Sério? Você realmente acredita nisso, Blythe? Foram as minhas emoções oscilando
totalmente fora de controle que provocou o que aconteceu com todas aquelas pessoas.
— Você não tinha ideia de que era um elemento espiritual. Nunca sequer havia ouvido o
termo antes, não sabia o que era ou como funcionava. Não sabia nada sobre dons psíquicos, como
contê-los ou usá-los corretamente. Claro que suas emoções foram intensas. Seu irmão foi
torturado e assassinado na sua frente. Você acha que com tudo isso acontecendo você conseguiria
continuar sendo a Judith gentil e sorriria docemente para os homens que cometeram tal
atrocidade? Isso não seria sequer racional.
— Eu acho que nenhuma de nós é muito racional quando se trata de nossas próprias vidas.
Eu digo a mesma coisa para você, Blythe, mas você ainda insiste em assumir a responsabilidade
pelas mortes de seu padrasto e sua mãe. — Judith deu um sorriso fraco. — Mas é claro, para você,
é diferente.
Blythe deu-lhe um sorriso em resposta.
— Claro. Toda vez que acho que conseguiremos continuar nossas vidas, chega esta época do
ano e com ela, esta depressão que nos faz desabar de culpa e tristeza.
— E justamente nesta época eu conheço Thomas Vincent. Um pobre homem inocente,
entrando na grande confusão de nossas vidas. Acho que todas nós estamos nos pendendo por um
fio. Convidar um estranho para entrar em nossas vidas, mesmo que seja por somente uma tarde
provavelmente não é muito justo. Eu não pensei nisso. — Ela mordeu seu lábio inferior. — Talvez
eu deva ligar para ele.
Blythe negou com a cabeça.
— Acho que podemos receber Sr. Vicent. Lexi não vai se importar. Ela disse que queria tirar
um dia de folga para ler sobre as temperaturas necessárias da estufa para alguma planta exótica
que quer plantar.
Judith não pôde deixar de rir.
— Essa é a nossa Lexi. Ela não tem plantas suficientes ou floresta suficiente para brincar, ela
precisa trazer a selva para Sea Haven.
— Eu a amo muito, — disse Blythe. — E sofro por ela às vezes.
Judith assentiu.
— Eu também. Acho que todas nós sofremos. Embora ela esteja prosperando aqui.
— Mas ela se esconde do mundo, — Blythe assinalou.
Judith pôs a mão reconfortante no ombro de Blythe.
— Todas nós nos escondemos do mundo, Blythe, — ela disse suavemente. — Estes portões
da fazenda nos fazem sentir seguras aqui e nenhuma de nós quer se aventurar muito longe desta
nossa zona de conforto.
Blythe franziu a testa.
— Você tem toda a razão, Judith. Não me admira que eu tenha tido essa reação ao saber
que você quer trazer um homem aqui, é porque eu quero que este nosso pequeno mundo seguro
permaneça intacto. E foi também por esta mesma razão que todas nós ficamos chateadas quando
Rikki encontrou Levi.
Foi a vez de Judith para franzir a testa.
— Não exatamente. É que temos a tendência de proteger Rikki.
— Nós sempre nos protegemos, assim como protegemos umas às outras. Deixe-o vir. Acho
que precisamos de uma sacudida. Não é bom para nenhuma de nós continuarmos nos
escondendo assim. Talvez, no início, precisássemos de um santuário para nos estabilizar, mas viver
assim não é viver, não realmente.
— Vou ligar para Lexi agora, — disse Judith.
— Ela será muito compreensiva — Blythe assegurou.
— Assim como Rikki.
Blythe assentiu.
— Isso é verdade, mas Levi, não será tanto. Achamos que Jonas é mau, mas Levi tem um
instinto terrivelmente protetor que se estende em um amplo círculo em torno de Rikki e do resto
de nós. Ele vai estar de olho em você, Judith.
— Eu não estou certa de que a forma de vigiar de Levi seja algo que eu queira ver muito de
perto, — Judith admitiu.
Elas trocaram um pequeno sorriso de compreensão.

CAPÍTULO 06

A autoestrada era linda, o mar batia nos rochedos de um lado, no outro os bosques se
estendiam para as montanhas e faixas de água prateada caiam em cascata sobre as pedras entre
uma grande variedade de árvores. Stefan nunca realmente apreciou a beleza ao seu redor como
fazia neste lugar em particular. Adorava as cores, verdes intensos em várias tonalidades e toques
de flores brilhantes que disputavam espaço nas altas montanhas. Apesar da contusão no peito e
os finos ferimentos de faca em seus braços, sentia-se surpreendentemente bem. Ivanov não
estaria em forma para segui-lo e poderia ter Judith só para ele por um dia.
Balançou a cabeça para o total absurdo do que estava fazendo. Passar um tempo com Judith
Henderson era muito mais perigoso do que perseguir Petr Ivanov no escuro da noite, mas a
necessidade era forte demais para resistir. Nunca, nem por um momento, sonhou encontrar uma
mulher como ela. Apaixonar-se era um conto de fadas. Não acreditava nessas coisas, e certamente
não acreditava que fosse capaz de cair sob o feitiço de uma mulher. Não era um homem que
colocasse de lado quem, e o que era, para se entregar a um capricho. Para ele, esse
comportamento peculiar era apenas mais um sinal de que tinha estado no negócio por muito
tempo.
No final, todas as recriminações do mundo não importavam. Ele ficou acordado a maior
parte da noite pensando nela, o tempo todo esfregando a palma da mão esquerda ao longo de sua
coxa. Estranhamente, sua palma havia coçado a maior parte da noite e esta manhã tinha uma
sensação de estranho ardor. Sabia, sem sombra de dúvida, que o estranho problema na palma de
sua mão tinha algo a ver com Judith. Parte dele esperava que quando encontrasse Judith
novamente, o terrível desejo que sentia diminuiria e ele se daria conta que a loucura momentânea
havia terminado.
No momento em que dobrou para a estrada que levava à fazenda, uma sombra passou por
seu carro. Pelo canto do olho, avistou um pássaro voando, fazendo um círculo preguiçoso acima
dele, seus olhos brilhantes observavam cada movimento seu. Seu coração saltou e logo voltou a
um ritmo normal. Um pássaro o observando não queria dizer que Lev estava vivo. Sabia que seu
irmão tinha muitos dons e um desses dons permitia que ele usasse os animais como espiões.
A fazenda era um lugar perfeito para se esconder. Judith tinha cinco irmãs. Homens como
Lev procurariam por uma mulher que se mantivesse abaixo do radar... Como aquelas mulheres
que residiam na grande fazenda. Teria que perguntar a Judith sobre cada uma das mulheres e
tentar adivinhar quem seu irmão resolveu optar para se aproximar enquanto se mantinha
afastado e construía uma cobertura para si mesmo, uma que lhe permitisse permanecer morto
para sua vida passada.
Estaria seu irmão por perto? Seria possível que ele morasse perto de Judith, que ela
realmente o conhecesse? Não se atrevia a interrogá-la sobre um homem, ela com certeza se
fecharia. Lev teria dado a entender que alguém estava atrás dele e uma mulher como Judith iria
protegê-lo. Uma lenta exalação de raiva o chocou.
Diminuiu a velocidade do carro e olhou ao seu redor, contemplando sua reação às suas
conclusões lógicas. Por que o irritava que Lev usasse uma dessas mulheres... Uma das irmãs de
Judith? A sobrevivência era fundamental e quaisquer outros meios utilizados eram considerados
justificáveis. Mas será que eram? Não tinha respostas concretas, ou talvez as tivesse, mas não
queria olhar muito de perto o que estava fazendo.
Suas entranhas se retorceram quando vários pássaros se instalaram nas árvores que
circundavam o caminho enquanto atravessava o portão aberto e muito ornamentado que protegia
a fazenda. No momento em que seu corpo realmente ficou paralelo ao metal do portão, sentiu a
mudança na energia e o aumento do poder em torno dele. O campo de energia era tremendo, o
poder vinha em ondas e se estendia por toda a área cultivada. Realmente podia sentir seu corpo
responder, a atração muito forte. Seus próprios dons saltavam para essa energia, ele a reuniu e a
absorveu até que seu corpo vibrasse com a necessidade de ação.
Sem dúvida, as pessoas desta fazenda eram elementos... Fortes elementos. Não estava
errado sobre Judith. Não era de se admirar que tivesse reagido tão fortemente a ela.
Intelectualmente, ela seria compatível, alguém que acompanharia o ritmo de seu pensamento
rápido, seu corpo certamente a desejava, mas agora entendia a extensão do perigo que ambos
estavam metidos. Fosse qual fosse o seu elemento, seus talentos psíquicos respondiam aos seus
com um tremendo poder.
Stefan respirou mais lentamente e observou os pássaros. Seus olhos brilhantes estavam
definitivamente o observando, aumentando sua convicção de que seu irmão estava em algum
lugar nas proximidades. Tinha seis irmãos e todos eram psiquicamente talentosos. Lev exercia
domínio sobre os animais. Se ele estava aqui, onde estavam os cães? Com certeza ele gostaria de
acrescentá-los à sua segurança, utilizando meios de animais mais normais. Que, novamente, seria
o lógico, então isso significava que estava equivocado sobre os pássaros? Deu outro olhar lento e
cuidadoso. Havia várias espécies, não uma, e todas estavam olhando para ele, dando-lhe uma
sensação um pouco estranha.
— Então você está aqui, Lev, — murmurou em voz alta.
Judith realmente o desconcertou. Ao invés vez de estar entusiasmado por estar tão perto de
encontrar seu irmão, Stefan tinha dúvidas genuínas. Não queria Lev usando Judith. Como estou
fazendo, lembrou a si mesmo. Thomas Vincent a estava visitando e não Stefan Prakenskii, não
importava o quanto desejasse que fosse diferente.
Com a ponta de seu polegar, tocou o pequeno arranhão ao longo de sua mandíbula que
Ivanov fez na noite anterior, uma linha pequena e fina que ainda queimava. Estava louco por ter
ido ali. Não deveria sentir a esperança se espalhando por ele como o calor do sol. Não deveria
sentir esta necessidade crescente ou esta ansiedade.
Queria colocar a culpa em Sea Haven. O sol brilhava na água que brilhava como diamante. O
vento provocava as folhas das árvores e os pássaros brincavam nas correntes térmicas, criando
uma atmosfera preguiçosa convidativa. As tempestades chegavam rápidas e furiosas, dando livre
curso a uma paixão selvagem que não podia ser igualada. E havia uma mulher incrível, que o fazia
se sentir vivo.
Amaldiçoando, pisou fundo no pedal do acelerador. Ele deveria voltar, mas não queria.
Estava indo vê-la novamente e se houvesse um Deus, era melhor que estivesse ajudando aos dois,
porque Stefan Prakenskii estava prestes a foder com sua vida, e isso era muito, muito mal.

*****

A casa de Judith era muito maior do que esperava. Jardins cercavam a estrutura de dois
andares, plantas de cores brilhantes que chamavam o artista escondido nele. Tinha bloqueado
essa parte de si mesmo há muito tempo, usando-a apenas como uma ferramenta de seu ofício,
mas por alguma razão, Judith removeu tudo isso de dentro dele, exigindo libertação. Seu mundo
precisava ser um lugar maçante, sem emoção, porém ao seu redor, as cores eram tão vivas que
ele não pode negar a onda de calor que invadiu suas veias quando estacionou e saiu do carro.
Seu olhar varreu a casa, observando tudo, o equipamento de incêndio em todos os lugares,
as mangueiras e aspersores, como se ela estivesse obcecada com a prevenção de incêndios. Seria
uma parte de sua necessidade esconder a intensidade da paixão que havia dentro dela? Havia um
sistema de segurança, e, embora não estivesse perto o suficiente, parecia ser muito moderno.
Teria ela isso porque temia uma visita de Jean-Claude?
Ela estava na varanda da frente, parada ali, olhando para ele com seus olhos escuros, sérios
e um pouco apreensivos, mas que brilhavam com a mesma antecipação que ele mesmo não
conseguia negar. Seu cabelo comprido estava solto, reto como uma régua, caindo abaixo da
cintura. Usava jeans e uma camiseta fina rosa. Ele poderia dizer que ela estava em suas roupas
confortáveis, roupas que usava quando estava com sua família. Era semelhante à roupa que usava
na foto que ele havia furtado na cadeia.
A mesma extensão de pele lisa e convidativa o saudava. Uma fina corrente de ouro brilhava
contra a sua barriga plana, os elos brilhantes e polidos chamando sua atenção para a pele que
parecia mais suave do que qualquer pétala de rosa. Sua boca ficou seca. Estava completamente
imóvel, apenas esperando, como uma deusa pagã, uma oferenda. Sua pequena cintura servia para
enfatizar a plenitude de seus seios altos e suas curvas moldadas pela camiseta. Mas foram seus
olhos exóticos que o atraíram completamente. Ela o observava por baixo de longos cílios
aveludados, seus olhos escuros tentando-o com uma mistura de inocência e sensualidade.
Apesar de sua determinação, seu batimento cardíaco acelerou e seu corpo se retesou. O
impacto de seu olhar atento fundiu em seus ossos. Uma marca. Sua marca. Ela a havia deixado
sobre ele muito facilmente. Ele se sentiu... Em casa, apesar de não saber o que diabos isso
significava. Judith. Seu nome passou por sua mente. Com uma ternura que o chocou. Não sabia
que existia tal sentimento dentro dele. Estava com problemas, (graves problemas), e a julgar pela
expressão de cervo capturado pelos faróis12 que havia em seu rosto, ela também.
Ela respirou profundamente antes de começar a descer as escadas. Ele notou que estava tão
abalada quanto ele, pela estranha e irresistível atração que havia entre eles. Estava
condenadamente feliz por não ser o único atolado em areia movediça. Ela não deixou de olhá-lo
enquanto se movia muito graciosamente pelos degraus, lembrando-o uma princesa descendo um
trono.
— Você veio.
Sua voz o envolveu em seda e cetim. Ele estudou seu rosto. A necessidade crescia nela tão
fortemente como fazia com ele. Ela lutava contra aquilo, mas não tentava esconder isso dele.
— Eu não consigo manter distância de você.
A dura verdade se interpôs entre eles. Stefan sentia o vento no rosto, como a promessa de
um beijo, como o toque de seus dedos, a carícia de seus cabelos.
Judith aproximou-se dele, seu olhar escuro vagando pelo seu rosto, tocando a cicatriz
recente. Seu dedo roçou pela pequena ferida tão gentilmente que ele sentiu o toque em seu
coração.
— O que aconteceu?
Ele não queria mentir para ela.
— É melhor você não saber.
Ele não podia ajudar a si mesmo, pegou o seu pulso e a puxou para um pouco mais perto
dele até que pode sentir o calor de seu corpo e se viu recusando, (ou incapaz), de soltá-la.
— Trouxe o almoço.

12
Expressão idiomática que significa: “Estar tão assustada ou surpresa que não consegue se mover ou falar”.
Um pequeno sorriso se desenhou em sua boca e acendeu a escura sobriedade de seus olhos.
— Você mesmo o fez?
Ele quase negou a verdade para poder dar a ela uma resposta de Thomas Vincent, mas a
verdade saiu.
— Sim. Sou um bom cozinheiro.
Ela arqueou uma sobrancelha e uma pequena covinha apareceu em sua bochecha direita.
Stefan não pode deixar de esfregar o polegar sobre a pequena saliência. A respiração dela ficou
presa na garganta.
— Então, é real.
Ele não precisava perguntar o que ela quis dizer... Ele sabia. Acenou com a cabeça,
segurando-a com o seu olhar, não querendo deixar aquele momento entre eles escapar.
— Não achei que fosse possível acontecer isso comigo depois de tanto tempo.
Isso também era uma verdade de Stefan Prakenskii.
Seu coração se apertou inesperadamente. Nunca em um milhão de anos ele teria imaginado
que fosse possível se sentir da maneira como estava se sentindo agora. A euforia deveria ter ido
embora. A necessidade dentro dele deveria ter dissipado e não crescido... E ainda estava
crescendo. Estar com ela era como ser pego em um mundo de sonho, uma fantasia selvagem,
impossível.
— O que faremos Thomas? Porque isso não pode acontecer.
O tom baixo em sua voz, aquela confiança inocente nele, a crença em seus olhos de que ele
era um homem bom, o sacudiu como nada mais poderia. Ela olhava para ele como se ele pudesse
encontrar uma maneira de salvá-los. Lá estava novamente, a necessidade de ser seu cavaleiro
branco. Sua armadura foi manchada há muito tempo e ele reconhecia que não tinha ideia do que
faria sobre essa situação, mas ele não queria se afastar dela.
Seus dedos se enroscaram em torno da sua nuca e a puxou ainda mais perto. Thomas
Vincent estava muito longe e Stefan Prakenskii não estava disposto a desistir dessa mulher, não
aqui, não agora.
— Vou te beijar.
Ela piscou rapidamente. Aqueles suaves cílios longos provocaram um nó no seu estômago e
apertaram sua virilha. Sua reação física a ela permanecia assustadora e emocionante, ainda mais
forte do que na noite anterior. Esta mulher tinha um domínio sobre ele que era inquebrável. Já
estava perdido, desejando as emoções genuínas que ela provocava nele. Judith abria suas
comportas. Suas necessidades se derramavam quando estava em torno dela.
— Você acha que é uma boa ideia?
Sua voz não era mais que um sussurro suave, uma carícia que provocava o seu pau, que se
inchou dolorido.
— Não. — Ele sabia que não. Sabia que estaria condenado para sempre. — Mas vou te beijar
de qualquer maneira.
— Pode ser terrível, — ela apontou com um breve toque de otimismo.
Stefan teve que sorrir.
— Talvez. Só nos resta experimentar.
Houve um breve momento de hesitação. Seus dentes afundaram em seu lábio inferior,
traindo o seu nervosismo. Ela assentiu lentamente, sabendo exatamente como ele, que aquela era
uma ideia muito ruim.
— Ok, então.
Stefan ficou olhando seus olhos por um longo tempo. Para sempre, nunca seria o suficiente,
ele queria viver ali. Bem ali, em seus olhos. Ele viu dentro dela, algo tão bonito que fez seu coração
doer. Judith não se moveu, não se afastou, estava absorvida nele da mesma forma que ele
precisava absorvê-la.
Ele não tinha pressa. Seu desejo crescia como o sol, quente, brilhante e impactante. Queria
saborear este momento. Sua aceitação. Sentiu-a tremer ou talvez fosse ele. O grande Stefan
Prakenskii, sedutor de mulheres, tremendo, necessitando.
Sua língua tocou seu lábio inferior, os seios subiam e desciam por baixo da camiseta fina.
Inevitavelmente, ele a puxou um pouco mais, para o calor de seu corpo. Ela piscou, mas não
desviou o olhar. Seu cheiro o envolveu. Um aroma leve, fresco e indescritível, era uma fragrância
que esperava poder encontrar em uma ilha paradisíaca. Seu cabelo caiu sobre seu braço,
incrivelmente macio e sedoso. Cada detalhe dela foi gravado na sua mente, os fios de cabelo que
roçaram seu rosto quando se inclinou lentamente em sua direção. A vibração dos seus cílios, os
lábios se separando, a respiração rápida.
Sua boca roçou a dela, o mais suave dos toques. Apenas um leve roçar, apenas para
saborear aquela primeira sensação de quão macios eram seus lábios... Para testar a forte atração
magnética entre eles. Ele deveria ter pensado melhor... Deveria ter sabido que não deveria ter ido
ali. Deveria ter ouvido todos os sinais de alerta... E houve muitos. Em um momento de honesta
lucidez, reconheceu que sabia disso, mas não se importou. Ele queria aquilo e, uma vez que a
tocou, não havia maneira de parar. Ambos estavam caindo e já era tarde demais para salvá-los
agora que fizeram esse primeiro leve contato.
Ele puxou-a através do sopro de ar que os separava, com força, de modo que seu corpo
ficasse colado ao dele, toda aquela pele macia, suas curvas exuberantes, a mão livre deslizando,
inevitavelmente, pela extensão da sua tentadora pele nua. Enfiou os dedos em sua cintura,
deslizando por sua barriga e acariciou seu quadril, enquanto sua boca tomava a dela.
O mundo ao redor deles explodiu em labaredas de fogo. O calor aumentou, até que ele pode
ouvir o estrondoso crepitar de chamas. Como se inadvertidamente ele tivesse riscado um fósforo
e acendesse uma dinamite. O corpo de Judith se derretia contra o dele enquanto seu coração
rugia em seus ouvidos e ele se perdeu completamente na beleza e na maravilha da sua boca. O
sabor dela lembrava a um champanhe caro, subindo direto à sua cabeça e o embriagando rápido.
Ela o deixava fraco e sabia, sem sombra de dúvida, que ela pertencia aos seus braços.
Não conseguia parar de beijá-la, mais e mais, até que ambos estavam sem ar e seus corpos
estavam em chamas. Descobriu sua pequena corrente de ouro e puxou, rolando o ouro entre os
dedos do jeito que necessitava fazer com os seus mamilos. Ele doía por tocá-la, para memorizá-la,
devorá-la centímetro por centímetro lentamente. Tentou não ser rude, mas sua boca tinha
vontade própria, cada beijo alimentava sua fome além do suportável.
Sua mão esquerda deixou sua nuca, e segurou em seus cabelos, puxando sua cabeça para
trás, Tomando o que era seu. Seu. Homens como ele não tinham casa. Não possuíam nada que
não pudessem se desfazer num instante. Todo o dinheiro que adquiriu ao longo dos anos por
meios honestos ou sujos permaneciam em contas bancárias que ninguém conhecia, e nunca
sequer pensou que poderiam ser gastos com o luxo de uma casa... Ou com uma mulher.
Contudo, esta mulher lhe pertencia... Foi feita para ele. Não sabia nada sobre ela e ainda
assim sabia tudo. Beijou o caminho até seu queixo e voltou para o calor de sua boca. Não
conseguia resistir a sua boca e, evidentemente, ela não tinha mais senso de autopreservação do
que ele, porque se abriu para ele instantaneamente, alimentando sua fome, devolvendo-a dez
vezes mais.
Cada célula do seu corpo respondia a ela. Conhecia-a. Sabia sem sombra de dúvida que ela
nasceu para ser dele. Beijá-la só confirmou isso. Seu punho apertou e segurou-a ainda mais forte.
Um sinal de alerta no fundo de sua mente o trouxe perto suficiente da superfície lembrando-o de
que Thomas Vincent nunca a beijaria com tanta confiança. Ele não seria duro e exigente. Nunca
seria tão agressivo. Stefan impiedosamente empurrou o aviso pra longe e tomou sua boca,
explorando, provocando e exigindo. Deslizando voluntariamente em um abismo profundo.
A luxúria subiu como um vulcão, serpenteando através de pura paixão enquanto seus dedos
acariciavam seu umbigo descoberto, absorvendo toda aquela pele macia. Calor corria por suas
veias, criando um terrível vício que ele sabia que nunca conseguiria se livrar. O sabor de Judith era
bom demais. Igualando fogo com fogo. Ela o necessitava do mesmo modo que ele. Suas mãos
agarraram o cabelo dele e ela se entregou a ele, sem reter nada, alimentando ainda mais sua
necessidade, conduzindo-o além do controle.
A verdade era a única coisa que poderia tê-lo impedido de tomar o que sabia que lhe
pertencia ali mesmo, no final das escadas de sua casa. Ela era um elemento espírito. A verdade
estava lá o tempo inteiro... Havia inclusive suspeitado, e agora eles estavam apuros porque o
espírito dela inflamou o dele desmedidamente. O desejo de Judith e o dele se uniram, ardendo
quente e selvagem, um incêndio fora de controle. Seu elemento amplificava todos os dons
psíquicos que ele possuía e acrescentava um calor e uma necessidade que estava atravessando-o
como uma bola de fogo.
Forçou-se a recuar, não querendo estragar sua chance com ela... Se já não tivesse feito isso.
Ele precisava ter esta mulher, (e que diabos estava pensando), queria-a para sempre. Tudo com
ela era a primeira vez. Esse primeiro beijo, um primeiro toque, a primeira tentativa de encontrar
uma disciplina que não estava enraizada nele ou não o haviam ensinado.
Descansou sua testa contra a dela, inalando uma lufada de ar.
— Eu poderia passar a vida inteira fazendo isso contigo. — Ele esfregou sua nuca com seus
fortes dedos. — Você está bem?
O olhar de Judith se agarrou ao dele... Cheio de desejo, cheio de tristeza. Ela tocou os lábios,
inchados de seus beijos, com dedos trêmulos.
— Eu não sabia que poderia me sentir assim.
— Nem eu, — ele respondeu honestamente e respirou fundo outra vez. — Você é um
elemento espírito, não é?
Seu olhar buscou o dele.
— Você sabe sobre elementos espirituais?
Ele balançou a cabeça lentamente, pensando no que diria. Talvez Thomas soubesse, talvez
não, mas hoje era o dia de Stefan e Thomas poderia, francamente, ir para o inferno.
— Então você sabe por que isso nunca pode acontecer.
Tudo o que ele era, cada célula impiedosa em seu corpo rejeitou aquela avaliação. Não havia
como voltar, ambos havia cruzado a linha de partida com o primeiro contato de suas bocas. Ela
precisava saber, tinha que entender que ele simplesmente não aceitaria isso assim tão facilmente.
Sua vida havia mudado para sempre. Ele era um homem marcado e seria caçado pelo resto de sua
vida, mas não viraria as costas para isso. Não sabia como conseguiria mantê-los vivos fugindo, mas
não ia deixá-la pra trás. Não agora. Não depois de ter um gosto de humanidade, de civilização, de
finalmente perceber o quão poderoso o toque humano era.
Ele reconhecia o terror quando o via. Ao longo de tantos anos em seu trabalho chegou a
conhecer o medo intimamente. Podia sentir o cheiro do medo. Vê-lo. Quase prová-lo. Ele tinha
visto aquele olhar nos olhos de sua presa e detestava ver o medo gritando como gritava o dela.
— Eu não vejo dessa forma, Judith.
Inclinou a cabeça para a tentação daqueles lábios trêmulos, necessitando acabar com o seu
medo de qualquer maneira que conseguisse. Ela não resistiu ou recuou. Na verdade, se aproximou
abrindo a boca para a ele e colocando os braços em volta do seu pescoço, segurando-o perto. Não
havia nada gentil em seu beijo. Ele exigia sua resposta, precisava saber que ela estava sentindo o
mesmo calor, a mesma fome terrível que se recusava a ser saciada por um, dois ou até mil beijos.
A maneira como seu cabelo caiu sobre seu braço, seu corpo se movendo sem descanso
contra o dele, a sensação de seus lábios, e o sabor quente e doce o fez acreditar que estava certo .
Ela parecia perfeita, onde estava. Podia negar a possibilidade de haver um futuro entre eles, e se
ele tivesse um cérebro na cabeça, concordaria com ela, mas ela mudou tudo em seu mundo e
teria que enfrentar as consequências, assim como ele faria.
Novamente, foi Stefan que levantou a cabeça e respirou fundo para recuperar o controle. E
aquilo lhe disse algo mais sobre Judith. Seu espírito já havia se entrelaçado com o dele, e uma vez
solto, voava com liberdade, não querendo ser mantido trancado, sob um completo e restrito
controle.
Um treinamento intenso havia enraizado em Stefan para usar qualquer ferramenta a fim de
cumprir sua missão. Sua missão acabava de se converter em manter esta mulher para ele e ter
certeza de ambos permaneceriam vivos. Se estivesse sendo sincero consigo mesmo, na verdade
ele queria pegar este olhar em seus olhos e substituir o medo e a tristeza com felicidade... Junto
dele. Em sua mente surgiu o conhecimento de que tudo havia mudado rapidamente e ele teria
que reformular os planos. As emoções de um elemento espírito podem ser complexas e difíceis de
controlar.
Stefan abraçou-a, sabendo que estava confusa pelo seu próprio comportamento. Seu
elemento espírito a guiava, assim como seus próprios dons se estendiam tão rapidamente e com
tanta confiança para ela. Ele estava completamente à vontade com todos os talentos psíquicos
que possuía, mas Judith ainda lutava contra os dela, mantendo-os sob um controle tão restrito,
que estava adoecendo. Ele pretendia mudar isso. Só não tinha certeza de como faria.
Sua boca roçou sua orelha, acariciando a cascata de seda preta, afastando-a para o lado.
— Você vai me mostrar a sua casa?
Judith apertou os lábios e negou com a cabeça.
— Talvez mais tarde. Não confio em mim mesma, agora. — Ergueu o queixo, encontrando o
seu olhar. — Eu sei que você não entende. Estou dizendo uma coisa e fazendo outra, mas você é
tão... — Parou de falar.
Pecaminosamente tentador.
Ele ouviu claramente o pensamento dela em sua mente. Sua palma da mão esquerda ardia e
ele a apertou com força em seu quadril, contra a sua pele macia, contra a tentação daquela
corrente de ouro tão sexy.
— Então você me deve um passeio de trator.
Seus olhos se iluminaram, sorrindo para ele.
— Devo, não é?
— Pensei sobre isso ontem à noite, — ele admitiu enquanto sua mão deslizava da sua nuca e
descia pelo braço para tomar posse de sua mão. — Eu realmente poderia estar cometendo um
erro. Se eu fizer o papel de um completo idiota e conduzir essa coisa contra uma árvore, você vai
rir de mim?
— Não vou apenas rir, — ela admitiu. — Vou tirar uma foto e enviá-la para todas as minhas
irmãs. Elas rirão um bocado também.
Seu coração deu um salto. A memória era fraca, mas a ameaça conjurou uma de suas poucas
memórias de infância, o riso de seus irmãos enchendo seu pequeno apartamento. Por um
momento maravilhoso que quase podia sentir o perfume de sua mãe. Instantaneamente as solas
de seus pés queimaram e palpitaram com uma dor que enviou a lembrança para o fundo da sua
mente, substituindo-a por um menino chorando por sua mãe e irmãos, enquanto um homem com
rosto sombrio e olhos frios batia uma tábua repetidamente nas solas de seus pés e ordenava que
parasse de chorar e que nunca voltasse a mencioná-los ou sequer considerasse sua existência...
Que eles estavam mortos para ele. Empurrou a memória para longe com força, fechando a porta
de sua mente.
Judith fez um único som de alarme, seus olhos escuros saltaram cravando-se aos dele. Ela
deveria ter se afastado. Suas mãos automaticamente foram para o pescoço dela, seus dedos
envolveram sua garganta com uma delicadeza enganosa. Ninguém podia saber qualquer
informação pessoal sobre sua infância, era um risco para ele. O treinamento enraizado nele era
forte, sua primeira reação foi de autopreservação. Ficaram em silêncio, os olhos de Judith presos
aos seus. Ela não lutou contra ele. Nem sequer se moveu enquanto seu pulso batia com força sob
a ameaça de seus dedos. Ela esperou sob a força de suas mãos, com aqueles olhos escuros
confiando nele. Parecia até mesmo compreensiva.
— Maldição, Judith. Você não tem qualquer senso de autopreservação? Nem mesmo um
pouco?
— O que aconteceu com você? — Judith colocou a mão em seu coração, ao mesmo tempo
em que deslocava o peso de seus pés, como se de repente doessem. — Diga-me, Thomas. Os seus
pés... Você está sentindo dor.
Ele tinha que ser muito mais cuidadoso com ela. Ela sentia o que os outros sentiam, assim
como as suas emoções podiam afetar a todos os quais ela entrasse em contato... Principalmente
ele.
Ele balançou a cabeça.
— Foi há muito tempo. Eu não sei por que pensei nisso.
— O riso da sua mãe? Irmãos?
— Eles morreram há muito tempo.
— Então você foi adotado? Perdeu sua mãe para alguma doença?
A compaixão nela se arrastava para ele. Era uma conclusão legítima. Sua família morta e um
menino adotado. Ele nunca saiu do personagem, nunca deixou de proteger Stefan Prakenskii, mas
ele abriu a caixa de Pandora no minuto em que esteve em sua companhia. Forçou-se a dar de
ombros enquanto escorava suas defesas.
— O que aconteceu quando você era menino? Isso aconteceu na Rússia? Sua mãe é russa?
Você estava em um orfanato e alguém abusou das crianças?
Isso ele podia responder honestamente.
— Algo assim. Foi há muito tempo, Judith, e se você não se importa, prefiro não pensar mais
sobre isso.
Ele acariciou o pescoço vulnerável dela e se amaldiçoou por ser um monstro. Ela era
inteligente, brilhante e se imaginava sombria e perigosa demais para permitir a suas emoções em
uma rédea solta, mas ela realmente não sabia o que era na verdade ser um verdadeiro monstro.
Judith ficou nas pontas dos pés e deu um beijo em sua boca.
— Vamos conduzir o trator.
Seus dedos se enroscaram com os dela, segurando-a. As surpresas continuavam chegando.
Homens como ele só pensavam sobre armas. Ele nunca se prendia a qualquer arma, pois suas
mãos eram letais. Esta era a segunda vez que ele fez o impossível e, pior, não se importava. Ele
precisava daquele contato de sua mão com a dela.
Ele deixou que ela o puxasse, levando-o com ela. Judith o desestruturou, abalou tudo o que
ele sempre acreditou, ela estava transformando completamente as coisas ao seu redor. Ela se
movia como o vento, um sopro de ar fluido e gracioso ao seu lado, fazendo-o se sentir como um
rei. Ele sentiu sua explosão de felicidade se espalhar por ele, amplificando seu próprio humor e
permitindo que ele baixasse a sua armadura apenas o suficiente para absorver seu espírito mais
profundamente dentro dele.
— Percebi que você tem uma grande quantidade de equipamentos de incêndio. Você se
preocupa com incêndios florestais?
A fazenda era rodeada por hectares de floresta, uma grande variedade de árvores altas, com
aparência muito saudável, quase como guardiãs circundando a grande fazenda, protegendo-a dos
intrusos. O bater de asas era constante com os pássaros empoleirados nos galhos mais altos e,
logo empreendendo voo para rodear a fazenda, só para pousar novamente.
— Não realmente, mas gostamos de estar preparadas para tudo. Compramos esta fazenda,
juntas, eu e minhas irmãs e esperamos ficar aqui.
Houve um leve tremor em sua voz. Olhou para ela enquanto caminhavam ao longo de um
pequeno caminho sinuoso pelo seu enorme jardim de flores. Sua expressão ficou um pouco triste
novamente e ele sentiu seu espírito mergulhar, inundando-a de medo e, consequentemente a ele
também. Havia problemas ali, mais do que tinha trazido com ele.
— E por que não ficariam?
Ela afastou o cabelo sobre o ombro daquele jeito feminino que as mulheres faziam. O gesto
de repente pareceu sexy, um convite à pura tentação. Stefan encontrou-se olhando para seu
pescoço, seu perfil, seus longos cílios e sua boca sensual.
Judith abriu um sorriso.
— Pare com isso. Desta vez é você, não sou eu.
Ele sorriu para ela, espantado com as emoções genuínas correndo por ele, juntamente com
o calor.
— Sinto muito. Você é malditamente linda, Judith. E estou realmente tentando me
comportar neste momento.
— Tente com mais afinco, — ela o advertiu. — Você deveria estar me ajudando.
— Acredite em mim, querida, eu estou ajudando. Se fizesse do meu jeito... — Deixou o resto
da frase no ar, vendo o lento rubor sob a sua pele, dando-lhe um brilho sedutor. — Distraia-me.
Diga-me por que acha que teria que se mudar deste pequeno paraíso que você e suas irmãs
compartilham, porque se eu vivesse aqui, nada me tiraria daqui.
Vários corvos gritaram em voz alta, o distintivo caw caw quase como uma repreensão.
Diminutos beija-flores se moviam de flor em flor, as pequenas asas que batendo no ar tão rápido
que podia ouvir o som enquanto zumbiam ao redor de sua cabeça, perigosamente perto de seu
rosto. Seu ombro roçou o dela e ele a puxou para um pouco mais perto, sob o abrigo de seu
ombro. Ela era alta, mas ele era mais alto e achava bastante natural querer protegê-la dos
pássaros que se moviam rapidamente.
Judith permaneceu em silêncio por um longo tempo enquanto cortavam o caminho através
de flores e arbustos que conduziam aos jardins exteriores. Stefan observou que várias espécies de
flores foram plantadas em grossas fileiras de cor, criando um arco-íris espetacular e ondulante
sobre os campos de cores vivas e brilhantes. Os caules curtos davam lugar a arbustos maiores,
campos de rododendro13 de todos as matizes. Cresciam altos e largos, proporcionando um escudo
ao redor dos jardins interiores. Grandes embaúbas rosa, branco, vermelho e ouro,
proporcionavam outra camada de proteção a casa. As borboletas estavam em toda parte
juntamente com os beija-flores, disputando o doce néctar pegajoso das atraentes flores.
Stefan apertou a mão em volta da dela, parando-a no meio das imponentes fontes de
transbordante cor.
— Você não tem que me dizer, mas posso sentir como está chateada. Talvez eu possa te
ajudar.

13
Gênero de plantas ericáceas ornamentais.
Com os ombros rígidos, ela parou na frente dele, balançando a cabeça com um pequeno
sorriso artificial em seu rosto enquanto se recusava a olhar para ele.
— Acabamos de nos conhecer, Thomas. Não é como se te conhecesse bem o suficiente para
despejar meus problemas em você.
— Você me conhece suficientemente bem. Vejo-te, Judith, mesmo as partes de você que
esconde do resto do mundo, que esconde de sua família. Reconheço que você é um elemento
espírito. — Ele respirou fundo, parou no caminho que atravessava a selva de embaúbas. — Foi um
homem que te magoou? Você se protege com muito cuidado, Judith. Você me deixa te abraçar e
sei que me deixaria fazer sexo com você, mas nunca me deixaria fazer amor. Você não quer amor.
Existe outro homem?
Judith piscou rapidamente e o coração de Stefan parou. Lágrimas estavam próximas,
obstruindo sua garganta e queimando seus olhos. Ele as sentiu tão seguramente como se estivesse
prestes a chorar. Seus fantasmas estavam muito próximos e se interpondo entre eles, mantendo-o
a distancia, obrigando-o a retroceder e afastar-se dela, como espectros silenciosos que faziam com
que fosse impossível tê-la.
Stefan não temia os fantasmas, ele também tinha muitos em seu passado para se preocupar
com as aparições invisíveis que tentavam assombrá-lo, mas eles possuíam um controle firme sobre
Judith e se recusavam a abandonar este controle. Ela ia ser difícil, iria dificultar o máximo possível
para que ele ficasse com ela.
Ele queria tudo dela. Estava arriscando tudo por ela. Sua vida. Sua paz de espírito. Esse
pequeno pedaço da humanidade que havia escondido de seus treinadores. Não havia nada mais
do que um pequeno pedaço, mas estava ali e era realmente a única parte que sobrou de Stefan
Prakenskii. Ele estava entregando para ela. Para que ela cuidasse. Ele estava colocando suas
emoções reais em risco para ela e não aceitaria menos dela. Ele estava dando sua alma em troca
da dela. E, foda-se tudo, pela primeira vez em sua vida, ele seria aquele cavaleiro branco de
merda, quisesse ela ou não.
Judith ficou ali olhando para ele de um jeito triste e tão ternamente lindo que era impossível
resistir a ela. Puxou-a em seus braços com os beija-flores voando ao redor das arvores coloridas e
pôs sua boca contra o seu ouvido enquanto sussurrou fazendo com que seus lábios roçassem
aquela pequena concha tentadora e perfeita.
— Não chore ou não terei escolha senão ser seu herói e salvar você de si mesma.
Seus dentes morderam suavemente sua orelha, puxando-a.
Ele esperava que os beija-flores não fossem parte do sistema de segurança de Lev porque ia
beijá-la novamente e esperava que ela evitasse que as coisas fossem longe demais. Ele podia
imaginar qual seria o senso de humor de seu irmão, ele enviaria estes pequenos bicos afiados para
furar sua pele. Ele empurrou Judith para trás, protegendo-a mais profundamente na cobertura das
grandes árvores, com sua boca colada na dela enquanto fazia isso.
Sentiu a mudança debaixo de seus pés, a intensificação de seus sentidos, até que cada um se
aguçou enquanto o seu espírito corria livre. Poder queimava em torno deles, explodindo por ele,
aumentando o calor que corria por seu corpo. Faíscas elétricas chiavam sobre sua pele. Ele sentiu
o impulso em seus próprios talentos psíquicos e soube que eram seus espíritos se fundindo
rapidamente. Sua palma da mão esquerda ardia no centro e ele quebrou o beijo, pegando sua
mão esquerda, levantando sua palma e juntando-a a dele.
Judith parecia confusa e um pouco assustada.
— O que está fazendo?
— Eu não sei, — ele disse honestamente e empurrou o ar entre eles, da palma de sua mão
esquerda para a dela.
Ela gritou e puxou sua mão, segurando-a perto dela com uma expressão chocada.
— Deixe-me ver.
Seus dedos envolveram muito suavemente o pulso dela, acorrentando-a para si, tomando
posse de sua mão. Stefan deu um puxão implacável quando ela resistiu, sabendo que tinha ido
longe demais com o roteiro de Thomas Vincent e que teria que fazer algo rápido para sustentá-lo.
Stefan esteve no comando completo durante todo o tempo, enquanto Thomas seria cuidadoso
para não forçar Judith, muito rápido.
Virou a mão dela e viu a marca lá no meio da palma, dois círculos entrelaçados. Os círculos
pareciam em carne viva em um primeiro momento, como se fossem uma marca nova, mas sob o
toque de seu polegar a marca desapareceu. Ele empurrou ar curador para ela. Ele tinha visto essa
marca apenas uma vez antes, quando era criança, na mão de sua mãe quando seu pai levantou os
olhos pela sala e sorriu misteriosamente para ela.
— O que aconteceu? Era apenas ar... — Ela olhou para ele vendo o seu olhar firme sobre o
dela. — Não era?
— Do que você tem tanto medo, Judith? — Ele perguntou novamente, seu tom era com uma
exigência suave desta vez.
Ela puxou de volta a mão, esfregando-a de cima para baixo sobre a coxa de seu jeans com
um pequeno cenho franzido no rosto. Quando ele esticou a mão para tocar a pequena linha
franzida entre seus olhos ela se afastou.
— Eu disse a você desde o começo que eu não era boa mulher, Thomas. Fui muito sincera
contigo. Não quero te machucar.
— Portanto, seu medo é de que você alguma forma me machuque?
Ela engoliu em seco e desviou o olhar do dele.
— Sim.
Sua voz tinha saído em um tom tão baixo que era apenas um fio de voz. Ele sentiu a tristeza
batendo nele até que sentiu doer por dentro e sabia que era ela, (não ele), quem estava gerando
aquela emoção.
Ignorou a rejeição silenciosa dela e se aproximou, invadindo seu espaço, com as mãos
emoldurando seu rosto.
— Sou adulto, Judith. Eu não preciso da sua proteção e nem quero. Sei cuidar de mim.
Então, vamos ver onde isso nos leva uma vez que fui devidamente avisado.
Os olhos escuros de Judith buscaram o seu.
— Há forças que... — Ela parou, respirou fundo e tentou novamente. — Você pode ser ferido
fisicamente, Thomas, não só emocionalmente, como se isso não fosse o suficiente ruim. Não posso
deixar isso acontecer.
Ele se inclinou para ela e beijou sua boca sensual. Ela estava preocupada com ele.
Preocupada. Esse conhecimento enviou uma espiral de felicidade desabrochando por todo o seu
ser. Ele não tinha ninguém que se preocupasse com ele.
— Isso não vai acontecer, Judith. Vamos apenas andar de trator e esquecer qualquer outra
coisa agora. Estamos em sua fazenda, os pássaros estão cantando e o clima é perfeito. Temos este
momento agora e o resto do mundo está longe de nós.
— Tem certeza?
— Absolutamente. E você me prometeu.
Ele a beijou novamente e logo retornou para o caminho.
Judith hesitou, esfregou a mão ao longo de sua coxa novamente como se coçasse. Sua
própria palma queimava mais do que coçava. Ela deu um passo ao lado dele e entrelaçou os dedos
com o dele. Caminharam através do sinuoso e tortuoso caminho para dentro do círculo do
próximo ao jardim, uma clareira de árvores e salgueiros artisticamente colocados, com um riacho
borbulhante naturalmente criado em ambos os lados por variedades de samambaias incorporadas
aos extensos jardins.
No momento em que estavam fora do escudo de árvores o sistema de alerta de Stefan
golpeou em alta velocidade. Não estavam sozinhos. Alguém os estava perseguindo neste pequeno
paraíso que Judith criou e aquilo estava bem para ele. Stefan Prakenskii poderia lidar com as
cobras em seu jardim.

CAPÍTULO 07

— Quem mais mora aqui, Judith? — Stefan perguntou em um tom casual, mostrando apenas
um ligeiro interesse na conversa.
— A fazenda tem um pouco mais do que cento e trinta hectares, e cada uma de nós possui
cinco hectares para que tenhamos nossa própria casa privada. Há seis casas aqui. — Houve uma
pequena hesitação nela e ele duvidou que alguém notasse. — Minha irmã Rikki é casada. — Sua
voz ficou mais rápida. — Temos um local de encontro, onde fazemos churrasco e nos exercitamos.
Construímos um ginásio muito bom. Lissa se preocupa muito sobre a saúde da mente e corpo,
todo esse tipo de coisa.
Então, ela não queria admitir que Rikki fosse casada. Será que Lev foi tão longe assim para
cobrir seus rastros? Isso já havia sido feito antes, mas os resultados foram desastrosos para ambas
as partes. Certamente ele não iria cometer este erro terrível. Embora, se sua vida dependesse
disso... Stefan amaldiçoou a si mesmo. Claro que Lev tiraria vantagem de qualquer mulher para
permanecer vivo. Que outra opção ele teria?
Ele assumiu um risco calculado.
— Talvez você devesse me dizer que assuntos estão fora dos limites, Judith, assim eu não
cometerei erros aqui. Não posso deixar de estar interessado em sua casa e em sua família, mas se
você se sente desconfortável em revelar algo pessoal, eu tentarei compreender.
Esta foi definitivamente uma manobra de Stefan Prakenskii, empurrando-a para um canto,
algo que Thomas Vincent nunca consideraria fazer.
Judith lhe deu um pequeno sorriso em desculpa.
— Eu acho que posso dizer que não costumo sair muito. Portanto, esqueci como conversar
normalmente.
Ela era muito, muito boa adversária. Ele estava orgulhoso dela por sua resposta. Mas sua
resposta não servia a seus propósitos, sendo assim ele não podia deixá-la fugir dele, mas seu jeito
de tirar o corpo fora foi muito bom.
— Então vamos praticar. Comecemos com você me dizendo como chegou a comprar este
incrível pedaço de terra. Comece por algo pequeno, nada muito ameaçador.
Ele sentiu uma pequena chama de energia instantaneamente moderada. Ela estava
suprimindo novamente suas emoções. Era uma pista vital e uma que ele iria segurar até que
tivesse reunido informações suficientes para descobrir o que estava ameaçando Judith. Tudo o
que ela temia, de alguma forma, tinha a ver com a compra da fazenda.
— Eu conheci algumas mulheres incríveis em um momento da minha vida em que precisava
de direção e, talvez, um lugar seguro para reconstruir minha vida... Você sabe seguir em uma
direção positiva. Nós construímos um forte vínculo, primeiro de amizade e depois uma irmandade.
Rapidamente percebemos que juntas éramos mais fortes. Se reuníssemos os nossos recursos,
poderíamos construir uma vida muito melhor estando juntas, ao invés de separadas. Blythe,
minha irmã mais velha, que você conheceu na noite passada, tem família aqui. Ela tinha visto esta
pequena fazenda à venda e aproveitamos a oportunidade.
— Deve ter custado uma fortuna para comprar esta fazenda.
— Ela estava em ruínas. Trabalhamos juntas para reconstruí-la. Havia o básico e essa foi a
nossa primeira prioridade: Fazer a fazenda se manter. Inicialmente moramos juntas em um
edifício comunitário. Tinha uma cozinha e um dois banheiros, assim tivemos abrigo enquanto
plantávamos e trabalhávamos na terra.
Havia entusiasmo em sua voz. Ele percebeu e sentiu o esperado impulso de energia, levando
ambos para a um nível de paixão pelo assunto... Ela era apaixonada pela fazenda e por suas irmãs.
Ela se manteve contida com uma rédea curta, mas foi se soltando aos poucos em torno dele. Ele
podia lidar com o seu poder, até mesmo ajudá-la a controlá-lo. No momento, seu maior interesse
era permitir ao espírito dela um pouco de liberdade para que ela continuasse falando.
— Todas vocês foram criadas em fazendas?
— Não. Por que você acha isso? — Ela arqueou uma sobrancelha para ele.
O som dos pássaros voando de galho em galho soou alto no pequeno silêncio. Um corvo
grasnou. Outro respondeu. Seu olhar se deslocou para as aves e, em seguida, para longe. Ele
pegou seus óculos escuros e os colocou sob seu nariz. Lev estava lá fora em algum lugar olhando, e
agora, ele tinha bastante certeza de que estava correto. Ninguém mais tinha aquele tipo de
afinidade com animais como o seu irmão mais novo. As aves estavam ali definitivamente o
espionando.
— Olhe ao seu redor, Judith. — Stefan apontou para as plantas exuberantes, prosperando.
— Esta fazenda é incrível. Alguém tinha que saber o que estava fazendo. Eu posso assumir um
negócio e melhorá-lo, mas eu tenho que saber o que estou fazendo.
Os ombros de Judith relaxaram um pouco mais.
— Lexi, a minha irmã mais nova, passou a maior parte de sua vida em uma fazenda. Ela
administra as coisas. Nós apenas fazemos o que ela nos diz e funciona.
Ela provavelmente ajudava a prosperar tudo aquilo se uma ou mais de suas irmãs
possuíssem um elemento: ar, fogo, água ou terra. Seu coração saltou com aquela descoberta.
Talvez todos os quatro elementos estivessem representados. Com o poderoso espírito de Judith,
elas não teriam problemas se cada uma usasse seus elementos a seu favor. Os jardins
surpreendentes, as plantações, os bosques de árvores, tudo fazia sentido para ele agora.
Se ele estivesse certo, esta poderia ser uma união poderosa de elementos vivos. Elas seriam
incrivelmente poderosas juntas, especialmente com o espírito de Judith tecendo através de cada
um dos dons. Uma delas era ligada a terra: Lexi. Ela faria as coisas crescerem e prosperarem.
— Eu não posso acreditar no trabalho que vocês fizeram aqui.
Ela fez um gesto em direção a um pequeno jipe aberto.
— Nós podemos usar isso para chegar à parte principal da fazenda. Lexi estava usando o
trator em um campo novo recentemente. Ela disse que poderíamos brincar com ele lá, sem ferir
qualquer uma de suas plantas.
— Você prejudica as plantas quando dirige o trator?
Ela deu uma desdenhosa torcida de nariz.
— Ah! Você prejudicaria. Ela estava se referindo a sua falta de habilidade, não a minha.
Ele deu uma risada genuína e foi incrível. Esta mulher havia lhe dado mais primeiras vezes do
que ele considerava possível. Provocação era um conceito desconhecido para ele e ainda assim
descobriu que gostava imensamente.
— Eu estou avisando, senhorita Henderson, sou um aluno que aprende muito rápido.
— Vamos ver.
Ele encontrou-se pesando as vantagens de fingir ser um pouco inepto ou se exibir para ela.
Ele a deixou tomar o assento do motorista e deslizou para dentro do veículo, sentando-se ao lado
dela.
— Então, Lexi é uma agricultora genuína e você pinta.
— Não se esqueça dos meus caleidoscópios, — disse Judith. — Amo meus caleidoscópios.
— Você é a artista. Conte-me sobre Rikki, você disse que ela era casada. O que ela faz?
— Ela é uma mergulhadora e pescadora de ouriços do mar. Ela ama o mar.
Ele notou o orgulho em sua voz. Ela tinha uma fraqueza por Lexi, mas Rikki era muito
especial para ela. Seus olhos se iluminaram e ela exalava calor e felicidade. Ele deixou o espírito
absorvê-lo um pouco mais, para sentir essa alegria enquanto ela falava sobre suas irmãs.
— Essa é uma profissão estranha. — Uma afinidade com o mar. Com a água. Stefan olhou ao
redor da fazenda para as plantas exuberantes, e depois para o céu. Um elemento água seria capaz
de controlar a chuva, dando à fazenda a água tão necessária para prosperar.
— Você quer dizer para uma mulher?
Ele sorriu ante a pequena ferroada em seu tom. Ele cutucou-a com o ombro.
— Judith, você é uma feminista secreta, não é? Não, na verdade eu quis dizer que, um
pescador de ouriços do mar é algo que eu nunca considerei ser. Diga-me a verdade. Você alguma
vez considerou ter esta profissão?
Ela caiu na gargalhada.
— Não, claro que não. Rikki é autista. Ela precisa do mar como o resto de nós precisa de ar.
A pressão da água, a forma solitária de vida, tudo isso a atrai. Embora, você deveria vê-la, Thomas,
quando ela está em seu barco ou na água, ela é simplesmente incrível.
Autista.
Stefan tentou imaginar o que isto poderia significar. Que tipo de verme maldito se rebaixaria
tanto para usar uma mulher autista para se esconder atrás dela? Que condenado era o seu irmão.
Rikki deveria ter estado no oceano quando o iate em que Lev trabalhava havia afundado. Ela deve
tê-lo salvo e tendo sido treinado na arte da sobrevivência, Lev tinha se adaptado rapidamente,
persuadindo a pobre mulher inocente, fingindo amá-la. Stefan estava furioso com seu irmão por
ter se casado com ela.
— O marido dela também é autista?
Uma sombra passou por cima deles e ele olhou para cima para ver um bando de pássaros
sobrevoando suas cabeças.
— Por que você pergunta isso?
— Eu não sei muito sobre autismo, — admitiu. — Então pensei que talvez duas pessoas que
têm a mesma diferença, poderiam encontrar um ao outro.
— Obrigada por não dizer deficiência. Rikki é diferente, mas ela está inteira, completa e ela é
maravilhosa. Felizmente, o marido dela pensa da mesma forma. Ele não é autista, mas é muito
protetor com ela. Ele ajuda a aumentar a sua zona de conforto aos poucos, dessa forma eles se
entendem. Levi também é mergulhador. Eles formam uma ótima dupla.
Levi.
Stefan quase repetiu o nome em voz alta com desgosto.
Lev, seu canalha. Vou ter que te bater até que você esteja às portas da morte.
Encontrou-se furioso com seu próprio irmão por ter cometido tal atrocidade. Tinha que
haver um código de honra, não?
— Todas as suas irmãs se dão bem com o seu novo marido?
O carro sacudiu sobre a estrada irregular.
— Eu não disse que ele era novo.
Ele deu de ombros de forma tão casual como sempre, mas ela era esperta, não havia dúvida
sobre isso. Ele tinha que ter cuidado ao sondá-la.
— Presumi, com suas observações anteriores de que somente você e suas irmãs compraram
a fazenda. Você não o mencionou trabalhando ou construindo com vocês.
Uma cor fraca apareceu em suas bochechas. Ela passou os dedos pelo longo cabelo, um
gesto que traia seu nervosismo. Ela não gostava de falar sobre o bom e velho Levi.
Bastardo.
— Eu acho que realmente não falei.
Ela não falou mais nada, mas no fundo já havia dito tudo. Ela não diria quando Levi havia
entrado em sua vida. E isso significava que Lev havia dito a todas que sua vida estava em perigo e
elas acreditaram. Ivanov deveria ter vindo farejar esta fazenda, ele não deixaria passar que Rikki
era uma mergulhadora e pescadora de ouriço. De alguma forma ela conseguiu tirar o
exterminador do rastro de Lev por algum tempo, tanto que ele apresentou um relatório. E agora
Stefan era a isca para encontrar o irmão.
— E Blythe?
— Ela é uma fiandeira. É proprietária de uma loja de fios em Sea Haven. Ela faz belíssimas
colchas, assim como camisolas e todo tipo de coisas incríveis. Seu fio é procurado em todo o
mundo.
Mais uma vez, entusiasmo e amor se derramavam em sua voz. Ele era um homem que
percebia os detalhes e Blythe era respeitada por Judith. A aprovação de Blythe era o que mais
contava para Judith.
Ao redor dele estavam filas e filas de legumes. Ele teve um vislumbre de uma casa à
distância, mas ela não forneceu nenhuma informação sobre isso, então ele ignorou a pergunta. A
estrada se curvou e um pequeno e encantador prado surgiu em frente a eles. Podia ver uma
grande lagoa de irrigação a vários metros de distância do prado. Um dos lados estava sendo
seccionado e um brilhante trator John Deere estava convidativo ao ar livre.
— Aquele acessório é um arado, — disse Judith amavelmente. — Lexi está cultivando nesta
área.
— Como funciona?
Ela parou o jipe ali mesmo na estrada de terra e pulou do carro.
— O arado revolve grandes áreas de terra muito mais rápido do que jamais poderíamos
fazer à mão. — Ela olhou para ele. — Eu não sei quanto você quer saber e eu não quero que você
fique entediado.
Ele deslizou para fora e deu a volta para chegar ao seu lado. Inclinou-se para perto e pegou
um punhado daquela atraente queda de cabelo preto sedoso e puxou suavemente até que ela deu
um inevitável passo para ele. Sua boca desceu sobre a dela e ele teve a nítida sensação de estar de
volta à sua casa. Seu corpo se derretia no dele, os seios macios pressionados em seu peito, os
braços deslizando em torno dele, segurando-o com força, agarrando-se como se fosse uma âncora
segura.
Ele não estava seguro... E ela também não. No momento em que sua boca desceu sobre a
dela, a terra se moveu. O calor queimou. O mundo mudou. Ele era altamente habilidoso em fazer
sexo, e excepcionalmente experiente na arte da sedução, uma sedução fria e calculada, com ele
no controle total em todos os momentos. Seu cérebro sempre funcionava e controlava
completamente o seu corpo. Isso tudo foi perdido no momento em que seus lábios se moveram
contra os dela.
Ele nunca tinha sentido prazer ao beijar. Não como esse. Não esta perda chocante de si
mesmo, fundindo-se com ela até que não queria viver em qualquer lugar, apenas nela. Ele não
confiava em atração instantânea, mas isto era muito mais. Isto era necessidade. Isto varria como
uma onda as emoções que ele havia esquecido.
Provou inocência nela, provou seu lar. E aquilo era louco porque ele não tinha uma casa
desde que era menino e, provavelmente, não sabia o que significava aquela palavra. Judith. Ele
estava voltando para casa. Para ela. Para esta fazenda. Para esta pequena comunidade que
pulsava com tanto poder. Será que esta combinação teria poder suficiente para salvar um homem
como ele? Um homem destinado às sombras? Suas emoções brotavam reais e fortes, com uma
intensidade que o sacudia. Ele perdeu-se ali, em sua boca, na sensação de seu corpo que se movia,
de forma agitada contra o dele.
Ela estava relutante reconhecer que poderia ter um relacionamento, mas seu corpo se
derretia no dele no momento em que se tocavam. Ela dava-se a ele sem reservas. Ele não seria
estúpido o suficiente para se aproveitar desta vantagem e ir mais longe, mas que Deus o ajudasse,
ele não queria parar. Ele queria fazer isso direito. Ele queria tudo dela e não apenas sexo. A
atração era imensa e ele havia estado sem nada por toda a sua vida para não reconhecer um
sentimento real quando ele caía em seu colo.
A foto dela dentro do seu bolso queimava através da fina camada de material contra a sua
pele, quase tão quente quanto os seus beijos. Ele a desejava com cada fibra do seu ser. Ele tomou
fôlego e deu outro mergulho, afundando rápido. Algo o picou seu pescoço com força e ele se
empurrou para trás, quase jogando os dois no chão, com medo de uma bala, antes de ouvir o
zumbido irritado de uma abelha.
Lev, seu bastardo. Pare com esse inferno de uma maldita vez.
Stefan pressionou a mão em volta de seu pescoço. Já inchando.
— Uma abelha acabou de me picar.
Por apenas um momento Judith olhou atentamente ao seu redor, franzindo a testa, como se
talvez tivesse sentido a pequena onda de energia. Ela possuía o elemento espírito e faria sentido
que ela pudesse sentir a energia no ar quando Lev dirigiu o ataque.
— Oh, não. Deixe-me ver. — Judith voltou sua atenção totalmente para ele, com uma
expressão ansiosa.
A picada quase valeu a pena só para ver aquele olhar em seus olhos, mas ele estava furioso
com Lev e bastante satisfeito de que ela pudesse estar também.
Quem diabos você pensa que é? Eu sei que é você, Lev.
Então deixe Judith em paz. Eu sei exatamente o que você está fazendo e pode esquecer.
Procure outra mulher para usar.
Stefan fechou os olhos, alívio o inundou. Ele tinha certeza de que Lev estava vivo, mas havia
uma pequena dúvida que ele não conseguia evitar. O som da voz de seu irmão, não importava que
com uma severa saudação, enviou uma onda de felicidade através dele.
— Você é alérgico? — Judith perguntou. — Porque já está inchando. Eu preciso levá-lo para
casa e colocar algo sobre isto.
— Eu realmente não sei se sou alérgico ou não, — Stefan safou-se.
Ele estava bastante certo que não era, mas se isso significasse ficar dentro de sua casa,
bem... Ele não tinha a menor oposição.
Judith pegou sua mão e puxou-o de volta em direção ao jipe.
— Devemos ir imediatamente, apenas no caso de piorar. As picadas de abelha podem ser
graves.
Ele entrou no veículo e levantou a mão para o ar por cima do teto do jipe enquanto ela
entrava e sentava rapidamente no banco do motorista. Stefan respondeu ao seu irmão com um
gesto com o dedo do meio facilmente compreendido em todo o mundo.
Eu tenho você em minha mira.
Hipócrita, desprezível, bastardo sem honra.
Stefan repetiu o gesto com o dedo enquanto Judith ligava o jipe de forma rápida e os levava
a toda velocidade sobre o chão irregular de volta para sua casa.
Lev havia se casado com a sua cobertura, com uma mulher autista. Quem diabos ele pensa
que é para julgar Stefan quando cometeu um pecado imperdoável? Pelo menos Stefan teve uma
razão legítima para estar disfarçado, em primeiro lugar. Ele veio para encontrar o idiota do seu
irmão mais jovem e ter certeza de que ele estava seguro. Agora, ele teria que derrubar Lev com
uma pancada ou duas e ensinar a ele uma lição muito necessária sobre o certo e o errado.
— Você está chateado, — Judith observou, olhando para os músculos apertados em sua
mandíbula. — Eu sinto muito que isso tenha acontecido, Thomas.
— Não se preocupe Judith, — ele garantiu enquanto o tempo todo tocava a parte posterior
do pescoço para descaradamente lembrá-la de sua lesão. — Eu não costumo ter problemas com
insetos.
— Você disse que nunca tinha sido picado.
Ele sorriu para ela.
— Exatamente. Eles sempre me deixam em paz. Aquela abelha era incomum, talvez um
pouco cruel e invejosa porque eu estava beijando a mulher do reino.
Os cantos de sua boca foram para cima e sua covinha apareceu.
— Eu tenho certeza de que foi isso o que fez a abelha te picar.
— Se eu fosse uma abelha, eu poderia ter ficado com ciúmes. Você tem um gosto doce. —
Ele fingiu franzir a testa, pensando sobre isso. — Doce com um sabor de fogo.
Ela corou. Cor rastejando em suas bochechas.
— Você é impossível. E se formos ao hospital, eu juro, vou comer aquele almoço que você
trouxe.
— E eu voltarei para o desafio do trator. Eu me recuso a permitir que uma abelha me impeça
de provar para você que posso evitar dirigir a coisa contra uma árvore. — Ele hesitou. Franziu a
testa. Fez um teatro enquanto esfregava a ponta de seu nariz e olhava para ela.
— O quê foi? — Judith perguntou. — Apenas me diga.
— Você vai pensar que eu sou paranoico. — Era hora de empurrá-la mais um pouco.
— Eu não sei por que você acha que eu poderia pensar isso. A menos que você vá me dizer
que realmente pensa que a abelha te atacou de propósito, porque você estava me beijando.
Ele pensava isso, mas não admitiria para ela.
— Eu estive no serviço, em combate algumas vezes, Judith, e mais do que isso, eu tenho
certos dons. Eu nunca diria isso a ninguém, mas você também parece ter habilidades, constatamos
que a outra noite...
— E? — Ela solicitou, assim como ele sabia que ela faria.
— Alguém estava nos observando lá fora, no campo. Eu pude sentir. — Ele hesitou mais uma
vez, deliberadamente, parecendo escolher suas palavras com cuidado. — Isso vai soar ainda mais
louco para você e corro o risco de fazê-la pensar que sou um lunático, mas quem estava nos
observando estava armado.
Stefan enviou-lhe outro olhar rápido e desviou-o rapidamente, retratando Thomas Vincent
perfeitamente. Um homem que esteve em combate, com verdadeiros dons psíquicos, mas tinha
medo de ser ridicularizado por uma mulher pela qual estava muito atraído.
Ele amaldiçoou a si mesmo por manipulá-la. De que forma ele se julgava melhor que Lev? Ele
estava se aproveitando de seu treinamento para extrair informações dela, jogando com seu senso
de justiça e sua honestidade. Uma mulher como Judith detestaria fazê-lo sentir-se um tolo,
principalmente quando ela sabia que o que ele estava falando era a verdade. Alguém tinha estado
os observando com um rifle de longo alcance em mãos.
O olhar de Judith se afastou do dele.
— Eu sinto muito por isso, Thomas. — Sua voz era baixa. Culpada.
— Você sabia?
Ela umedeceu os lábios. Ele decidiu que não havia nenhuma satisfação em manipular Judith.
Isso o fazia sentir que era tão baixo quanto pensou que seu irmão era.
— Suspeitei que isso pudesse acontecer, — admitiu. — Eu realmente sinto muito se isso fez
você se sentir desconfortável. Esta fazenda é o nosso santuário. — Ela deu um pequeno suspiro. —
Realmente não é um grande segredo, nós simplesmente não falamos sobre nossas vidas para os
forasteiros. Minhas irmãs e eu nos conhecemos quando participamos de um grupo de
aconselhamento especial para vítimas. — Seu olhar saltou para o seu e, em seguida, se afastou. —
Cada uma de nós é, (fomos), vitimas de alguma forma de violência. Duas das minhas irmãs ainda
estão em perigo. Somos muito cuidadosas com quem deixamos entrar na fazenda... E somos
muito protetoras. Sinto muito, Thomas.
— Sinto muito, Judith. Eu não queria fazê-la se sentir desconfortável. Você não tem que me
dizer isso. Sinto-me honrado que você tenha me dito.
Era e não era uma mentira. Maldita seja toda esta confusão. Ela estava sendo honesta com
ele, a ponto de revelar coisas sobre as irmãs que a fazia se sentir culpada por contar. Ele tinha a
intenção de sondar, deliberadamente empurrando-a para um canto até que ela não tivesse outra
escolha senão mentir, deixando seu convidado pensar que ela acreditava que ele fosse paranoico,
ou confessar a verdade. Claro que Lev estava lá com um rifle, observando quem entrasse na
propriedade, mas sua intenção não era proteger as mulheres. Era para se proteger. Maldito seja
Lev também.
Judith dirigiu de volta ao galpão e estacionou o jipe.
— Deixe-me dar outra olhada em seu pescoço.
— Está um pouco inchado, — admitiu Stefan. — E arde como o inferno, mas eu não me sinto
como se não pudesse respirar. Não é disso que você tem medo?
Judith se aproximou novamente, logo atrás dele. Instintos e anos de treinamento
aprimoraram seus reflexos o que o fez girar e pegar o pulso dela quando ela o ergueu para
examinar o local da picada. Ele forçou um sorriso e deslizou seu polegar sobre a sua pele para
evitar um hematoma. Ela piscou para ele confusa.
— Ter reflexos automáticos é um inferno, — ele disse com um sorriso desarmante de
menino.
— Não seja um bebê, deixe-me ver.
Ele se virou, mantendo a posse de sua mão, forçando-a a tocar o seu pescoço com a outra. A
posição era um pouco estranha, mas ela não protestou. Seus dedos eram suaves em seu pescoço.
O roce sensual de seu toque atravessou imediatamente seu corpo. Sua virilha se apertou,
inundando-o de sangue quente, em resposta à respiração quente contra o seu pescoço enquanto
ela se inclinava mais para inspecionar o inchaço.
— Eu acho que o ferrão ainda está aqui, Thomas, — disse ela com preocupação em sua voz.
— O que significa isso?
Ele não conseguia pensar direito e, talvez, a abelha tivesse ficado dentro de sua cabeça,
porque ele podia ouvir um alto zumbido convertendo-se em trovão. Demorou um minuto para
perceber que era seu pulso que estava batendo muito alto. Ela tinha um jeito de desconcertá-lo
sem que ele mesmo soubesse o que estava acontecendo até que fosse tarde demais para
precaver-se contra o seu feitiço.
— Isso significa que vou ter que tirá-lo.
— Não podemos simplesmente deixá-lo aí dentro?
Ela passou o braço em volta de sua cintura, encaixando perfeitamente em seu ombro. Um
ligeiro vento agitou as árvores umbaúba, chamando a sua atenção para o bando de beija-flores
revoando. Ia ter que passar por este desafio para entrar na casa de Judith. Quem sabia o que seu
pervertido do seu irmão iria inventar para torturá-lo na esperança de que ele fosse embora.
— Não, não podemos deixá-lo aí — Judith o repreendeu. — E isso realmente está inchado,
Thomas. Eu preciso colocar um pouco de creme antialérgico rapidamente. Vamos.
Sem hesitar, Judith pisou na calçada estreita, que passava pelas muitas árvores umbaúba
com aquelas aves desagradáveis, apenas esperando para atender aos desejos de Lev. Deu dois
passos e os pássaros voaram em direção às suas cabeças com suas pequenas asas zumbindo alto,
os bicos afiados prontos para picar sua pele, e se desviando no último minuto. Um instinto
protetor esquecido há muito tempo o fez envolver o braço em torno da cabeça de Judith, cobrindo
o rosto dela do ataque.
Judith deixou escapar um grito chocado e acelerou o passo, embora não conseguisse ver
muito, levantou as mãos defensivamente. Ele usou seu corpo para protegê-la enquanto seus
braços protegiam seu rosto com sua raiva crescendo em um fogo lento.
Pare com isso, Lev. Se ela receber um só arranhão sequer, serei obrigado a ir atrás de você e
você realmente não quer isso.
Ele quis dizer isso a sério.
Stefan tinha vindo para salvar a vida de seu irmão, para adverti-lo que um assassino o estava
perseguindo, mas agora ele queria dar um soco bem na boca daquele presunçoso. Lev pensava
que estava fazendo uma boa encenação ali, enganando a essas mulheres, (as irmãs de Judith),
bem, ele simplesmente não iria continuar. E se sua arrogância estivesse provocando as aves a
atacá-la, Lev receberia a maior surra de sua vida.
Você poderia tentar, mas duvido que você consiga mais do que um primeiro soco.
Claramente Lev tinha esquecido quem era o irmão mais velho e no comando. Judith deixou
escapar um segundo som de aflição. Ele podia sentir o medo dela bater nele. Fúria, fria e sombria
florescia, queimava lentamente abaixo da superfície em proporção direta com o seu medo, o que
seria sempre um mau sinal.
Você está assustando-a, seu desgraçado.
Os pássaros abruptamente recuaram.
Por que diabos você apenas não me disse isso ao invés de bancar uma cobra bajuladora?
Você está certo, porque na terra eu devia acreditar que tem um cérebro?
Stefan derramou desprezo em sua voz. Estava revoltado com o seu irmão por estar usando
essas mulheres. Ele teve muito cuidado em colocar de lado sua aversão a si mesmo por pensar em
fazer a mesma coisa.
A ligação entre eles foi desaparecendo com a distância. Stefan fez questão de “sentir” uma
direção. Antes de ir embora, ele descobrira qual casa pertencia a Rikki, a suposta esposa de Lev,
para que pudesse fazer uma pequena visita ao seu irmão e arrancar-lhe as orelhas.
— Eles já foram? — Judith perguntou com a voz trêmula.
O instinto protetor de Stefan chutou-lhe com força por causa daquela voz entrecortada. Ele
tirou o braço para que ela pudesse ver. Eles estavam quase fora do território inimigo,
aproximando-se da última árvore.
— Acredito que estamos seguros, — assegurou.
— Eu nunca os vi agir dessa forma antes. Beija-flores não são agressivos, mas eles realmente
nos atacaram.
— Talvez estivéssemos muito próximos a um ninho, — Stefan sugeriu.
— Suponho que esta seja uma explicação tão boa quanto qualquer outra. — Ela parecia um
pouco desconfiada e deu outra olhada cuidadosa ao redor com olhar severo que ele achou
adorável, antes de dar-lhe atenção novamente. — Primeiro, as picadas de abelha em você e agora
o ataque de pássaros. Sinto muito, Thomas. Esta era para ser uma tarde divertida para você.
Ele apertou o braço em torno dela.
— Sou um homem aventureiro, Judith.
Ela sorriu para ele.
— Você tem espírito esportivo, eu admito. — Ela olhou para o seu pescoço com a
preocupação em seus olhos. — Seu pescoço realmente está inchado.
Ele podia senti-lo. Tinha sido baleado algumas vezes, esfaqueado, torturado e outras coisas
desagradáveis. Era irônico que algumas pequenas abelhas enviadas por seu irmão pudessem ter
feito isso a ele. Será que Ivanov sabia o que poderia estar esperando por ele? Stefan gostou
bastante de ouvir o alarme na voz dela. Ela estava genuinamente preocupada e isso era uma nova
experiência para ele, nova e desconhecida já que ninguém nunca realmente deu a mínima para
ele, ele descobriu que gostou disso um pouco demais. Esta mulher poderia torná-lo fraco muito
facilmente.
Ela segurou sua mão enquanto se moviam pelos jardins juntos, com a brisa deslizando sobre
eles, remexendo as mechas de seu cabelo a despenteando. Ele gostou da maneira como eles se
moviam juntos, da maneira como o silêncio pairava sobre os dois, fácil e amigável. Stefan
Prakenskii nunca esteve verdadeiramente à vontade com outro ser humano. Thomas Vincent não
teria dificuldade em estar na presença de outros, como faria com qualquer uma de suas muitas
personalidades, mas não Stefan, e ainda assim, era Stefan que estava andando ao lado de Judith,
segurando sua mão e sentindo como se ela tivesse feito um milagre.
Ele não podia virar a cabeça facilmente com o pescoço tão inchado. A dor não era nada para
ele, ainda mais tendo sido somente uma pequena e irritante picada que mal notava, mas
definitivamente tinha a atenção de Judith. Ela esfregava os dedos sobre o seu braço
continuamente, olhando para ele com pequenos olhares ansiosos sob seus longos e sedosos cílios,
fazendo-o sentir-se como se estivesse dando a ele o mundo de presente. Espantava-o que uma
mulher pudesse realmente mudar a forma de um homem pensar, suas ações... Ainda mais, toda a
sua razão de existir.
Ela o levou até as escadas de sua casa, uma grande estrutura de dois andares. A casa situava-
se no centro do jardim que dava para ver por qualquer uma das muitas janelas, eles estavam
cercados por cores brilhantes.
— Meus estúdios ficam no térreo, — explicou Judith, quando abriu a porta da frente.
Stefan deu um passo em seu caminho de entrada e, assim como nos portões da fazenda,
sentiu a mudança sutil de energia ao redor dele. O poder de Judith vivia e respirava nesta casa. A
energia correu para cercá-lo, construindo uma alegria dentro dele ao encontrar Judith quase em
euforia. Ele já estava lutando contra sua atração física por ela, mais uma “primeira vez” para ele,
testando seus anos de disciplina, mas agora aquela fome atroz estava se amplificando além da
medida.
Ele respirou fundo e entrou. Sua fragrância bateu-lhe com força, provocando tal necessidade
que ele simplesmente se virou e fechou a porta com o pé enquanto segurava seus cabelos em sua
mão e a fazia retroceder descendo sua boca com força sobre a dela. Seus lábios se separaram,
aceitando-o, acolhendo-o, abrindo-se a sua invasão, os braços se envolveram ao redor de seu
pescoço enquanto ele a encostava contra a porta.
Não havia nenhum outro lugar que ele quisesse estar que não fosse ali mesmo, devorando-
a, provando toda essa paixão maravilhosa, um poço profundo, derramando chamas dentro dele,
por todo seu corpo. Ele fez sua reivindicação, colocando nela sua marca e entregando a ela a sua
alma. Ele tinha que tocar sua pele, aquela extensão nua que convidava sua exploração. Sua mão a
acariciou, encontrando a intrigante corrente de ouro. Ele a puxou para ele.
— Você deveria estar usando somente isso e nada mais, Judith, — ele murmurou deixando
um rastro de beijos que descia de seu rosto até o queixo onde mordiscou suavemente. — Eu jurei
que não iria apressar isso. Eu quero fazer isso direito. Não quero um raio de paixão por uma noite
que acabe depois. Eu a quero para sempre, Judith. Quero ficar cada maldita noite com você, todos
os dias.
Ela se agarrou a ele, respirando tão fortemente como ele.
— Não podemos ter um “para sempre”. Você não me entenderia. Não o faria, Thomas, e eu
nunca deveria ter permitido isso.
— Então vamos falar sobre isso. Explique para mim. Eu sei que você é um elemento espírito.
Eu tenho os meus próprios talentos, Judith, e é claro que eles podem sair do controle, qualquer
talento pode.
— Exatamente. — Ela baixou os braços e deu um passo para trás.
Ele se sentiu inexplicavelmente vazio. Ele controlava o seu mundo, não uma mulher. Nem o
seu treinador. Nem ninguém. E ainda assim, foi ficando mais difícil e mais difícil de respirar,
sabendo que ela estava a um suspiro de rejeitá-lo.
Ele a enjaulou com ambas as mãos apoiadas na porta ao lado de sua cabeça.
— Vamos falar sobre isso, Judith. Não sou o tipo de homem que desiste de algo tão
importante.
Ele respirou fundo sabendo que ia ser absolutamente honesto com ela neste momento.
— Eu nunca, nem uma só vez, desejei uma mulher da forma que quero você. Eu quero jogá-
la no chão e mostrar um milhão de maneiras, que conheço para te dar tanto prazer que você
nunca irá olhar para outro homem. E estou sendo malditamente honesto com você. Mas é muito
mais do que isso e nunca senti esse “mais” antes. Nenhuma só vez. Não desperdice esse “mais”,
não quando é um milagre do caralho que nunca acontecerá em nossas vidas novamente. Então,
não, não vou embora até conversar sobre isso.
Seus olhos escuros buscaram os dele. Judith deveria ter ficado com medo. Ele era um
homem assustador com a sua massa muscular e suas cicatrizes. Ela não parecia estar com medo
dele, apenas dela. Sua mão escorregou por seu peito com os dedos abertos. Ela procurou ar, como
se sentisse o mesmo ardor em seus pulmões.
— Thomas, eu estou desesperadamente tentando te salvar.
Ele abaixou a cabeça e a beijou novamente, um beijo suave e persuasivo beirando a ternura.
Não tinha ideia de onde vinham essas emoções tão ternas, mas elas explodiam dentro dele e,
embora para o resto do mundo ele realmente não existisse fora daquelas sombras, ela era real
para ele, assim como estas emoções que foram reservadas somente para ela.
— Eu preciso de salvação, Judith. — Deu a ela outra dura e crua verdade. — Mas me
afastando, você não vai conseguir isso. Lute por nós. Nos dê uma chance. Isso é tudo que estou
pedindo.
— Nós mal nos conhecemos. Como posso dizer a você coisas que nunca disse a ninguém?
— Você me conhece. Nós dois sabemos disso. Você não é como as outras pessoas e nem eu.
Talvez seja por causa dos nossos dons, mas você me conhece, Judith. Seu corpo me reconheceu.
Sua mente está lutando, mas o seu coração e alma me conhecem bem. Eu sou o único para você.
Dê-nos uma chance.
Ela suspirou e deslizou sua mão até o seu pulso.
— Deixe-me ver a picada de abelha. — Antes que ele pudesse fazer exigências, ela balançou
a cabeça. — Eu preciso de tempo para pensar, Thomas. Por favor, não me pressione agora.
Ele ficou parado, prendendo-a entre o seu corpo e a parede, desejando-a descaradamente, o
desejo açoitando seu corpo sem piedade. Mais do que isso, queria que este momento fosse o
correto. Precisava lidar com isso da maneira certa e não tinha nenhuma experiência em assuntos
do coração. Ele sempre operou fora desses parâmetros.
— Você está me dando todas as primeiras vezes que eu deveria ter tido ao longo dos últimos
trinta anos.
— Eu não sei o que isso significa.
— Isso significa que você pode dar uma olhada no meu pescoço e se preocupar por mim.
Um lento sorriso curvou sua boca, enquanto ele se endireitava e estendia a mão para ela. Ela
enfiou os dedos em sua mão sem hesitação.
— Você é um homem bom, Thomas, — Judith disse com um pequeno suspiro quando soltou
sua mão e seguiu para o seu banheiro.
Era uma casa feminina. Espaçosa e cheia de objetos coloridos. A sala foi projetada para ser
tranquila e relaxante, como um mar salpicado de cores espirais em tons de azul, cinza e verde.
Sentou-se numa banqueta baixa, de costas para o espelho enquanto ela pegava uma pinça e
empurrava sua cabeça para baixo para que a luz iluminasse diretamente o local da picada.
Ele ouviu sua dificuldade de respirar e seu mundo calou nesse momento. Por Judith. Pelos
pecados com os quais ela estava determinada a colocar para fora.
— Há alguns anos atrás, quando eu era um estudante de arte em Paris, conheci um homem.
Ele era rico e bonito e muito mais experiente do que eu.
Havia tanto ódio de si mesma em sua voz que ele realmente estremeceu.
— Fiquei deslumbrada por ele, tão deslumbrada por ele que eu... — Sua voz foi sumindo e
ele sentiu um ardor quando ela pegou o ferrão com a pinça e o puxou, retirando a farpa pequena
de sua carne. — Eu vejo auras. E a dele era turva, complexa e violenta. Todos os sinais estavam lá,
mas eu não queria vê-los. Eu preferi acreditar nas coisas que ele me dizia e não em algo que
ninguém mais podia ver.
Ela colocou um pouco de creme sobre a picada. Ele esperou até que ela guardasse o tubo e
pegou o seu pulso suavemente puxando-a para virar e ficar na frente dele, metida entre suas
coxas. Suas mãos sobre a cintura dela.
— Quantos anos você tinha, Judith?
Ela balançou a cabeça.
— Eu tinha vinte e um. Muito ingênua. Uma jovem de vinte e um anos sem experiência com
os homens. Eu estudava tanto que nunca, realmente estive em torno de homens, não que eu
esteja me desculpando. Em algum lugar, lá no fundo, eu sabia o que era certo. Apenas me recusei
a prestar atenção aos sinais de alerta. — Ela se recusou a desviar o olhar do dele, as mãos
descansando sobre seus ombros. — Um dia eu fui vê-lo sem ligar antes para avisar. Entrei pela
porta dos fundos para surpreendê-lo. A porta de seu estúdio estava aberta e ouvi vozes. Um grito
entrecortado. Cheiro de sangue. — Ela apertou a mão na boca.
Ele podia ver o pesadelo em seus olhos.
— Ele estava torturando alguém.
— Não Jean-Claude. Ele só ficou olhando. Seus homens. Ele estava sempre rodeado de
homens muito assustadores e me disse que por causa do seu dinheiro e seu trabalho, que as
pessoas queriam vê-lo morto. Eu corri. — Ela umedeceu os lábios. — Saí antes que alguém me
visse. Estava tão assustada que chamei o meu irmão, Paul. Ele era mais velho do que eu e me criou
depois que meus pais morreram num acidente de carro. É claro que ele veio para me ajudar,
largou tudo e correu para a França com dinheiro e um plano para que eu pudesse desaparecer.

CAPÍTULO 08

Stefan esperou, necessitando que Judith confiasse nele o suficiente. Sua dor o consumia
totalmente. Era de partir o coração. Podia senti-la pressionando-o com tanta força que seu peito
doía. As paredes ao seu redor palpitavam com dor, (respirou profundamente), talvez Judith
estivesse acostumada ao fenômeno ou não percebia. Ele esperava que a casa chorasse, ou talvez
já o fizesse. Judith estava realmente perdida naquele momento, era como se estivesse
acontecendo tudo de novo e ele suspeitava que, para ela, estava. Ela provavelmente tinha
pesadelos recorrentes noite após noite.
A voz de Judith tremia, embora duvidasse que ela percebesse. Ela estava olhando
diretamente em seus olhos, mas não estava mais com ele, estava muito longe, em outro país,
revivendo o horror.
— Pegaram-nos na Grécia. Paul me enviou na frente dele, mas quando ele não se encontrou
comigo, voltei. O estavam torturando, tentando descobrir minha localização. Eu... — Ela parou de
novo e deu mais um grande suspiro.
Stefan apertou suas mãos para dar coragem a ela.
— Diga-me.
— Eu... Eu o perdi completamente. Minhas emoções eram muito intensas. Medo. Raiva. Dor.
Culpa. Odiava a mim mesma e a todos eles. Queria vê-los mortos. Queria Jean-Claude morto. Perdi
completamente o controle e alguém como eu não pode fazer isso. É perigoso.
Ele podia sentir as ferozes emoções girando em torno dele, puxando-o, a casa lutava para
conter a força da energia que emanava de Judith em ondas. Sentiu-se atingido como os grandes
penhascos quando o mar estava tempestuoso e turbulento. Stefan controlou sua respiração e
aceitou o assalto de emoções, absorvendo a intensidade, grato por ter aprendido a empurrar as
emoções de lado. Não tinha nem ideia, dada a sua capacidade de matar de muitas formas, o que o
contínuo martelar o teria feito se não fosse tão disciplinado. Não havia dúvida de que sentia a
mesma raiva, ódio, fúria e a terrível e interminável dor que a inundava.
— O que aconteceu? — Sua voz era um fio fino de som orientando-a, apenas se infiltrando
na memória que ela bloqueava com tanta força.
— Todos se voltaram uns contra os outros. Foi um banho de sangue horrível, o som alto das
armas reverberava nas paredes. Os homens estavam gritando e gritando. — Ela engoliu em seco o
ar, os olhos agora estavam selvagens e seu corpo tremia. Judith levantou as mãos para cima e
olhou para elas, como se as mãos e os braços estivessem cobertos pelo sangue de seu irmão.
Sua voz caiu para um sussurro.
— A polícia chegou.
Seus olhos estavam quase opacos, refletindo novamente o horror daquele momento. Ele
podia ver o sangue escorrendo pelas paredes empoçando no chão. Sangue respingado em seu
rosto e roupas quando ela se ajoelhou ao lado de seu irmão morto, seu corpo dilacerado, quase
irreconhecível como humano.
— Acho que estava em choque. Não me lembro de ter pensado em nada. Apenas sentia.
Tanta raiva. Tanta escuridão. Eu odiava Jean-Claude. Ainda o odeio. Mas o pior, a dor de perder
Paul daquele jeito, era tão viva, forte e crua que mesmo que quisesse, não poderia contê-la.
Judith, obviamente, não estava ciente das lágrimas escorrendo pelo rosto, quando piscou
para clarear a visão para vê-lo. Ela balançou a cabeça com a confusão em seu rosto.
— Não me lembro do que fiz. Eu tento, mas só posso ouvir o som dos policiais gritando um
com o outro. Eu tentei CPR14 no meu irmão, mas seu peito e cabeça estavam cobertos de sangue
com continuava espirrando sobre os meus braços e mãos. O som era tão horrível. — Colocou as
mãos sobre os ouvidos, quase ofegante.
Stefan levantou-se, o seu movimento tranquilo e muito lento. Judith estava trancada
profundamente na memória daquele momento e as suas emoções estavam, como antes, fora de
controle. O vento corria pela casa. As cortinas balançavam loucamente. Sabia que ela não via, não
via a batalha feroz em seu interior enquanto revivia o assassinato de seu irmão. Muito
gentilmente pegou os seus pulsos e puxou suas mãos as levando ao seu peito, dando um passo
perto dela. Seu corpo estava frio e suas mãos geladas.
— Então, o que aconteceu depois que a polícia chegou Judith?
Ela soltou um pequeno suspiro, olhando para ele com olhos atordoados.
— Um deles chegou perto de mim, para tentar me ajudar, eu acho. — Ela franziu a testa,
olhando como se estivesse mais confusa do que nunca. — Havia muito sangue. Tanta dor. Senti
tanta tristeza. Eu queria tomar o seu lugar, estar onde ele estava. Estava tão arrependida do que
tinha feito, tão culpada que...
Ele esperou necessitando abraçá-la, querendo acabar com isso, mas sabendo que não teria
importância. Ela sempre teria esses momentos gravados em sua memória.
Judith engoliu várias vezes, abriu a boca e fechou-a, engoliu ar e agarrou sua camisa com os
punhos como se precisasse dele para se ancorar.
— O policial sacou uma arma e a colocou na cabeça. Atirou em si mesmo, bem ali, antes que
alguém soubesse o que pretendia fazer. Ele estava de pé ao meu lado. Em um momento estendia
a mão para me ajudar e no outro seu sangue estava por toda parte e seu corpo caiu por cima de
mim.
Stefan fechou os olhos brevemente, a tristeza era tão pesada em seu coração que se sentia
esmagado. Ele sabia que era a sua dor, seu corpo esmagado debaixo do policial morto. Para um
homem que viveu a maior parte de sua existência com emoções firmemente trancadas, ele estava
recebendo um curso intensivo na vida real com uma mulher que amava um homem. A imagem
dela tombada no sangue de seu irmão com o corpo do policial inocente em cima dela, era tudo

14
Ressuscitação cardiopulmonar (CPR) é um procedimento de emergência, que é realizada em pessoas que sofrem parada
cardíaca.
muito real em sua mente. Pela primeira vez em mais anos do que poderia se lembrar, ele queria
chorar por outro ser humano.
Stefan puxou seu corpo rígido em seus braços, afastando sua resistência na base da força.
Ele a apertou contra si, desejando que o calor de seu corpo se infiltrasse nela, para aquecê-la e
trazê-la daquele lugar de morte e desespero. Suas mãos deslizaram em sua massa de cabelo,
encolhendo os fios de seda em seu punho, massageando o couro cabeludo com dedos fortes.
— Volte para mim, Judith. Você está segura comigo agora. Pode gritar se precisar. Pode
chorar. Mas fique comigo. Você não precisa ter medo de mim.
Ela balançou a cabeça e seu medo o atingiu.
— Posso receber tudo o que você sente, o pior que tenha para oferecer, il mio angelo
caduto. Não sou novo nisso. Eu estive lá, exatamente onde você está. Você não está sozinha, não
enquanto eu estiver no mundo contigo.
Judith falava sete idiomas, não poderia deixar de interpretar seu “meu anjo caído” dito em
italiano com um sotaque perfeito. Ela fez um único som de desespero que partiu seu coração.
Stefan puxou sua cabeça para trás impiedosamente pelos cabelos que agarrava firmemente
em seu punho, sem mais perguntas. Ele era esse tipo de homem. Sua boca encontrou a dela e
tomou posse, dirigindo sua língua profundamente, ordenando-lhe a reconhecer. Reconhecer que
estava segura com ele, não importando a intensidade de suas emoções. Ele vivia nas sombras.
Entendia de batalhas. Não era novato no jogo e ficaria ali para ela.
Demorou alguns segundos, mas ela o beijou de volta, segurando com força e o abraçando,
enquanto a escuridão e o ódio golpeavam seu corpo, enquanto o horror maltratava seu coração e
a tristeza feria sua alma. Seu corpo perdeu a maior parte de sua rigidez, suavizando, fundindo-se
ao seu corpo ao se entregar.
Stefan continuou beijando seu rosto, seguindo as pegadas de suas lágrimas.
— Estou aqui, Judith. Não estou fugindo. Olhe ao seu redor. A casa ainda está de pé. Estou
inteiro e tenho você segura. Você realmente quer ficar sozinha?
— Não sou a mulher perfeita a qual todos insistem pensar que eu sou.
Sua confissão foi abafada contra a boca de Stefan e ele a beijou novamente.
— Não estou procurando por perfeição. Não sou um homem que possa viver com ela. Eu
mesmo cometi alguns pecados, Judith. Você está segura comigo. Segura. Vou te dizer isso um
milhão de vezes. Você vai me ouvir dizer isso frequentemente. — Ele afrouxou o controle sobre
seu cabelo, permitindo que ela escondesse o rosto contra ele novamente.
— Eu posso sentir ambos os corpos, em cima e embaixo de mim, me imprensando. Todo o
sangue, o cérebro e pedaços de carne. — Ela engasgou, e começou a chorar de novo. — Eu o
odeio tanto. Jean-Claude. Sei que sou a responsável. O conselheiro e minhas irmãs dizem o
contrário, mas eu fui a única que ignorou os sinais de alerta. Eu vi o que queria ver e meu irmão
pagou o preço. Não controlei minhas emoções e o oficial pagou com sua vida.
Ela esfregou os braços, o rosto enterrado em seu peito, seu ouvido sobre a batida constante
do seu coração.
— Havia muito sangue Thomas, e nenhum era meu. Deveria ter sido eu, não meu irmão.
— Jean-Claude estava lá?
Ele sentiu uma leve sacudida de sua cabeça e apertou os lábios contra o seu ouvido, a
ternura jorrava como uma fonte de alguma profundidade em seu interior que ele não sabia que
possuía. Passou uma de suas mãos por suas costas, pressionando-a para mais perto dele.
— Claro que não. Ele estava seguro em seu pequeno castelo à espera de seus homens para
me arrastar de volta para ele. Me escondi por dois meses. — Sua voz se tornou amarga. — Eu não
pude nem mesmo recuperar os restos mortais de meu irmão e trazê-lo para casa. Jean-Claude foi
preso por tráfico de drogas, armas e tráfico humano, mas não por assassinato. E ele assassinou
meu irmão. Ele foi o responsável.
Ela olhou para ele.
— Não estou me absolvendo de minha parte no que aconteceu, nem por um minuto, mas
dei uma olhada na prisão que ele está e li tudo sobre ela. Supõe-se que a prisão Francesa é grande
e controlada, mas Jean-Claude tem uma pequena cela confortável e continua a executar as suas
operações de lá.
— Como você sabe disso?
Ela deu de ombros e recuou. Stefan deixou-a ir, deixando cair os braços ao seu lado, sua
mente acelerada.
— Você já o visitou?
Ela fez uma cara feia para ele, uma expressão feroz e sombria, com horror em seus olhos.
— Nunca. Eu nunca vou dar a ele a satisfação de me ver sabendo que ele tirou meu irmão de
mim apenas porque podia fazê-lo.
Stefan escolheu suas palavras com muito cuidado. A intensidade das emoções que o
golpeavam tinha diminuído um pouco e não queria provocar outro ataque. Seu corpo já se sentia
machucado e surrado.
— Você acha que ele enviou os homens atrás de você, porque queria você de volta? Ele
estava com medo do que você viu e que pudesse testemunhar contra ele? Ou será que te deu algo
e queria de volta?
Seu olhar saltou para seu rosto.
Stefan continuou.
— Um homem rico dá presentes caros. Muitas vezes o querem de volta em um acesso de
raiva, especialmente se é uma herança de família.
— Acho que ele mandou esses homens atrás de mim apenas por raiva. Uma vez ele me disse
que eu nunca poderia deixá-lo... Que ele não me deixaria fazer isso. Eu era jovem o suficiente e
estúpida o bastante para achar aquilo romântico. Pensei que isso significava que ele me amava e
iria tentar corrigir tudo o que desse errado entre nós.
Ele estendeu a mão. Judith se encolheu para longe dele. Stefan balançou a cabeça.
— Não. — Um comando rígido afiou sua voz. Ele não iria perdê-la, não agora. — Nós
chegamos até aqui, Judith, não faz sentido recuar. Olhe para mim.
Ele estendeu os braços como se quisesse abraçar a casa.
— Ainda estou de pé. Você reviveu todo o evento horrível, experimentou as mesmas
emoções intensas e eu estou lidando com isso.
Judith suspirou e afastou-se dele, foi até a janela para olhar para os seus jardins, respirando
profundamente, lutando para recuperar o controle. Stefan a seguiu, fazendo uma lenta varredura
da paisagem desde a perspectiva da grande janela. As brilhantes flores resplandeciam na suave
brisa e imediatamente sentiu uma diminuição na intensidade das emoções de Judith. Grau a grau,
ela estava colocando sua natureza apaixonada sob controle novamente.
Ele não se importava com paixão ou fogo. Poderia lidar com ambos. E poderia lidar com sua
dor, suas lágrimas. Ela era sua. Era muito simples para ele. Ela era sua. Tudo o que ela
necessitasse, ele pretendia oferecer a ela. Ela estremeceu e ele se aproximou, esfregando seus
braços para aquecê-la.
— Isso entre nós está se desenvolvendo muito rápido. Eu não consigo confiar em algo que
acontece tão rapidamente. — Ela murmurou, sacudindo a cabeça.
— Você não confia. — Stefan corrigiu suavemente. — Nem eu, mas isso não nega o fato de
que já estamos aqui. Vamos almoçar Judith. Mostre-me sua casa. Vamos apenas respirar um
pouco.
— Você acha que isso é o pior de mim? — Ela olhou por cima do ombro dele. — Não é,
Thomas. Eu queria que fosse o pior.
Estava determinada a afastá-lo, expondo seus piores segredos. Para ela, ele era Thomas
Vincent, um homem bom. Não tinha ideia de que em seu pior dia, ela não conseguiria segurar uma
vela pelos pecados de Stefan Prakenskii.
Ele abaixou a cabeça e colocou sua boca contra sua orelha.
— Diga-me então. Dê-me o seu pior.
— Você é uma pessoa boa, Thomas. No fundo, onde é importante, você é uma pessoa boa.
Não entendo por que você acha que poderia estar com alguém que não consegue controlar suas
emoções e outros pagam o preço.
— Você não é pior do que eu somente porque seu elemento se manifesta. Nunca pense que
eu não tenha feito algo muito pior em minha vida.
Ele a virou para encará-lo, automaticamente a puxando para longe da janela. O hábito
estava arraigado nele, como tantos outros que nunca superaria, mesmo que sua vida mudasse
completamente. Estava dando a ela a verdade de Stefan, não a de Thomas. Era possível que ela
menosprezasse seu sentimento ao serviço militar, enganando a si mesma, mas daria a ela a
verdade, tanto quanto podia, compartilhando a si mesmo com ela, não o seu disfarce.
Ela estudou sua expressão, sua mandíbula, a frieza do seu olhar.
— Quero vê-lo morto. Jean-Claude. Quero que ele sofra e morra. — Desta vez, ela não
desviou o olhar, olhando firme, o queixo levantado como se estivesse à espera de julgamento.
— Então você quer justiça. — Ele encolheu os ombros. — Isso não é incomum, ou algo para
se envergonhar mi ángel caído. — Desta vez mudou para o espanhol, querendo chegar a questão
de que também foi educado em línguas, e que não importava quão caída se achasse, ela era seu
anjo e sempre seria.
Judith continuou olhando-o nos olhos enquanto balançava a cabeça lentamente,
deliberadamente.
— Não justiça. Justiça foi Jean-Claude ir para a prisão por seus crimes. Eu quero vingança
pela tortura e assassinato de meu irmão. Para os outros que perderam suas vidas naquele dia.
Estou bem ciente que minha necessidade de vingança não me faz melhor do que ele, mas
encontrarei um modo de fazê-la. Minha hora vai chegar. E não vou deixar qualquer inocente sofrer
por causa da minha perda de humanidade.
Stefan a olhou por um longo tempo em silêncio absoluto, tanto tempo que Judith não estava
certa se ele responderia. Disse para ele o seu pior e se recusou a desviar o olhar para longe dele.
Ele era um homem difícil de ler. Seus olhos azuis esverdeadas a encaravam, mas não lhe diziam
nada. Ouviu o tique-taque do relógio e seu estômago deu um tombo lento. Percebeu que não
queria que ele pensasse mal dela mesmo sabendo que merecia.
— Que tipo de mulher constrói sua vida em torno de vingança? — Ela sussurrou, odiando o
silêncio entre eles, odiando não conseguir decifrar sua expressão inescrutável. — Sei que tenho
cinco mulheres maravilhosas na minha vida. A fazenda. Minha pintura e os caleidoscópios, os
quais amo e tenho alcançado algum êxito na carreira que escolhi, mas não é suficiente, nunca será
suficiente até que Jean-Claude La Roux tenha sofrido do mesmo modo que fez meu irmão sofrer.
O tique-taque do relógio ficou mais alto. Seu coração bateu forte no peito até que podia
ouvir cada batida trovejando em seus ouvidos. Não tinha percebido até aquele momento, como
ele a tinha mudado. Sentiu uma felicidade era real. Ela se sentia à vontade em sua companhia, se
sentia feliz. Realmente não tinha sido feliz desde a morte de seu irmão e, talvez estivesse um
pouco irritada e culpada por poder realmente ser feliz. Que direito tinha ela quando as últimas
horas de Paul foram de uma insuportável agonia?
Judith se recusou a abaixar o queixo, ou desviar o olhar de Thomas. Ele estava
absolutamente imóvel, seu olhar nunca deixando o dela. Havia confessado para salvá-lo... Ou
afastá-lo de modo que pudesse seguir com sua raiva e ódio reprimido firmemente, trancado em
um estúdio escuro onde ninguém jamais saberia seu segredo vergonhoso.
Silêncio se estendeu entre eles até que ela quis gritar pela terrível tensão. Stefan deu um
passo para mais perto dela, os dedos fortes ondulando ao redor da sua nuca. Ele sempre parecia
muito dominante pela forma como a tocava. Desta vez foi sutilmente diferente. Desta vez, havia
posse, como se ela lhe pertencesse.
Seu coração saltou. Ela saboreou o medo. Ele não iria rejeitá-la e uma vez que a reclamasse,
ela estaria ligada a ele para sempre. Não seria capaz de se afastar de Thomas Vincent, não com a
forma que seu espírito respondia ao dele. Ainda mais agora, com a certeza de que ele podia lidar
com suas intensas emoções e talvez até mesmo ajudar a controlá-las.
Ela balançou a cabeça e deu um passo atrás, para longe dele, longe do perigo que
instintivamente sabia que corria com ele.
Ele a sujeitou mais forte, mantendo-a quieta.
— Entendo você, Judith. A maneira como pensa e sente. Posso lidar com cada emoção que
você tem e posso diminuir o impacto em qualquer pessoa que esteja próxima a nós. Posso
proteger os outros da intensidade. Quem mais pode fazer isso? Você precisa de mim tanto quanto
preciso de você. Se você necessita de um homem para fazê-lo sofrer, eu sou este homem. Você
precisa se afastar disso para poder começar de novo, podemos fazer isso também. Tenho você,
moi padshii angel. Aconteça o que acontecer, eu tenho você.
Desta vez em russo. Meu anjo caído. Ela tinha caído. Judith sentiu como se o próprio diabo
estivesse parado em frente a ela, oferecendo-lhe o mundo e o preço era sua alma. Ele não era
bonito, no verdadeiro sentido da palavra, não com todas as suas cicatrizes, mas era todo másculo,
sensual e atraente. Ele nunca seria um homem que deixaria que o pisassem ou o manipulassem.
Havia muito mais em Thomas Vincent do que imaginava.
— Não sei nada sobre você. — Sua voz saiu num sussurro trêmulo.
— Você sabe o suficiente.
— Você deveria estar fugindo desta casa. Isso se chama autopreservação, Thomas. Eu já
estou condenada. Aceito isso.
— Isso é besteira, Judith. A vingança é uma emoção natural quando alguém passou pelo
trauma que você passou. Você ainda não se encontrou cara a cara com o homem que matou seu
irmão. Não tem a ferramenta nas mãos para fazer as coisas que quer fazer com ele. Não há
julgamento ou condenação por pensar em fazer alguém sofrer e morrer. Isso vem depois de
cumprir sua vingança real. Você pode inclusive não chegar até o fim quando chegar a hora.
Ela não vacilou.
— Irei até o fim. — Havia aço em seu tom naquele momento.
Ela não voltaria atrás, nem mesmo para fazer que ele a desejasse. Não mentiria para ele ou o
arrastaria para baixo com ela. Vivia em seu próprio inferno há muito tempo para permitir que
alguém se juntasse a ela. O isolamento e a mentira de sua vida eram difíceis o suficiente sem o
peso de outro terrível pecado, o de arrastar alguém para baixo no abismo com ela.
— É o que você pensa neste momento, Judith, não seja tão dura consigo mesma. Todos, em
algum momento de sua vida, pensam em vingança. Eu certamente também já pensei.
Olhando para aqueles olhos frios de água-marinha, acreditou nele. Ela encontrou-se
tremendo. Thomas Vincent não era apenas o empresário inocente que ela pensava. O que quer
que ele tenha feito durante o período de serviço não foi fácil e tinha um núcleo duro de força que
se encaixava com sua aparência física.
Ela balançou a cabeça confusa. Queria esse homem com todo seu ser. Havia confessado para
o conselheiro e para suas irmãs que ela era a causa do assassinato cruel de seu irmão. Não admitiu
a sua parte na morte do policial inocente. Sabia que suas irmãs se sentiam responsáveis pelas
mortes violentas em suas famílias, mas o fato era, ao contrário do resto deles, ela era responsável.
Nenhuma outra pessoa sabia disso além de Thomas. Ele não se afastou dela e não foi ferido
quando, mais uma vez, perdeu o controle de suas emoções. Havia uma incrível liberdade no
conhecimento de que pudesse falar com ele sem esconder esta parte de si mesma. Não precisava
mentir. Ele sabia o pior dela e ainda assim ficou ali olhando para ela com aquela fome perigosa e
urgente.
Ela se perderia neste homem. Se permitisse se aproximar mais, se o deixasse mais um pouco
em sua vida, ele se tornaria o seu mundo. Não haveria mais ninguém para ela e ela conhecida
aquela velha tentação, a atração sexual. Estava afundando muito rápido, ele enfrentou o pior dela
e ficou, e ela estava com medo de não haver uma maneira de salvar qualquer um deles. Ele
pensava que poderia realmente fazer um homem sofrer antes de matá-lo, mas na verdade, tudo o
que fez a serviço de seu país foi uma situação completamente diferente. Nunca poderia pedir uma
coisa tão terrível para ele e duvidava que se pedisse que ele pudesse fazer aquilo, que seria capaz
de fazer tal coisa. Ia contra a natureza.
Stefan olhou para Judith cuidadosamente. Ele era perito em ler a linguagem corporal.
Aprendeu em uma escola dura e conhecia todas as nuances da expressão humana. Ela estava
tentando encontrar uma maneira de se retirar graciosamente. Aceitou que ele pensava que
poderia entender sua necessidade de vingança, mas que ele nunca seguiria adiante. Técnicas de
interrogatório eram muitas vezes chamadas de tortura por alguns. Certamente Judith pensaria
assim. Isso também havia sido aprendido em uma escola dura. Ele sabia tudo sobre interrogatório
e as consequências de não obter as informações necessárias.
Ela não esperava nada dele que ele já não houvesse feito ao longo de sua vida, embora
tivesse certeza que ela nunca seria realmente capaz de ir até o fim. Ela poderia ser capaz de matar
Jean-Claude rápida e limpamente, e apenas, estava seguro, se ela não estivesse pensando
claramente. Mas Judith era incapaz de torturar alguém. Poderia sonhar com isso, até planejar, mas
carecia totalmente de instinto assassino.
— Você não vai fugir de mim, Judith — ele disse sério. Ele emergiu parcialmente das
sombras e incrivelmente estava em sua frente. — Sei que você está assustada, anjo, mas podemos
fazer isso. Dê a si mesma um pouco de tempo. Mostre-me sua casa. Vamos comer o almoço que
eu trouxe para nós. Retornaremos a este assunto em outro momento.
Seu polegar roçou seu pulso, o sentiu saltar e, em seguida, começou a bater com mais
firmeza. Piscou para ele antes que parte da tensão fosse drenada dela. Sua língua tocou seu lábio
inferior, chamando sua atenção completamente.
— Você me chamou de "meu anjo caído" em três línguas diferentes.
Ele abriu um pequeno sorriso.
— Isso se chama exibicionismo.
O que era verdade, mas, ainda mais do que isso, ele queria chamá-la carinhosamente em sua
própria língua então achou melhor despistá-la utilizando vários idiomas ao invés de apenas o
russo. Ele descobriu que detestava mentir para ela. Mesmo enganá-la parecia errado. Ela colocou
tudo em jogo por ele e ele não podia retribuir. Se admitisse que era irmão de Lev, a colocaria em
uma posição terrível. Uma coisa que tinha certeza sobre Judith, ela que ela era extremamente leal
e negaria conhecer Lev, ela o protegeria com cada respiração em seu corpo, algo que seu irmão
sabia que ela faria.
Judith seria obrigada a mentir para ele e pior, suspeitaria que ele fosse um agente russo
enviado para matar Lev. Sem dúvida, seu irmão havia convencido a todas as mulheres sobre a
necessidade de sigilo. Maldito seja o homem. O engano de Lev para se encobrir não deixava a
Stefan nenhuma alternativa a não ser enganar Judith também.
— Você se exibiu muito bem — Judith disse. — Em italiano, espanhol e russo.
Ele balançou a cabeça.
— E posso falar francês também se você preferir.
— Por que o seu "anjo caído"?
Stefan enquadrou seu rosto em suas mãos, se inclinou e beijou-a. Sua língua percorreu o
contorno dos lábios, ordenando-lhe a abri-los. Quando ela não respondeu de imediato, seus
dentes pegaram o lábio inferior e puxou suavemente até que ela deu um pequeno suspiro. Ele
tomou posse da sua boca se movendo sobre a dela, beijando-a mais e mais, cada beijo mais
profundo e mais exigente.
Você é meu anjo caído.
Deliberadamente, ele empurrou as palavras em sua mente, uma conexão que era tão íntima
como a troca de respiração... Como beijá-la.
Ela deslizou seus braços ao redor do seu pescoço e apertou o corpo contra o dele, disposta a
se entregar a ele. Ele estava duro como uma rocha, muito dolorido e sentindo seu corpo fazer
exigências urgentes, mas ele queria muito mais dela e, uma parte dele sabia que precisava ir
devagar. Se isso fosse durar toda a vida, ela tinha que saber que ele não a estava usando, nem que
ele estava tomando uma pequena parte dela.
— Eu quero tudo, Judith, — ele disse se afastando — não uma noite. Não apenas seu corpo.
— Não sei se sou capaz de dar mais.
Como sua voz estava muito instável, ele pegou sua mão e puxou-a para o interior da casa, se
afastando das janelas.
— Nós não temos que nos preocupar com o que você pode ou não fazer agora, Judith.
Mostre-me sua casa.
— Tem certeza que você não quer ir ao hospital?
Havia uma nota provocativa, quase esperançosa em sua voz.
— Você só quer ver se desmaio ou não, se eles me derem uma injeção.
Sua sobrancelha subiu.
— Não consigo imaginar isso.
Ele abriu um sorriso para ela.
— Eu também não. — E essa era a dura verdade. Ele permaneceu em silêncio sob todas as
formas de tortura e levou seu corpo uma e outra vez à beira da resistência humana, mas nem uma
vez vacilou em seu caminho para continuar. Ele não perceberia nem a picada da agulha. Mais de
uma vez ele havia costurado suas próprias feridas.
— Esta é a parte principal da casa. Tenho um grande quarto principal e banheiro. Sou uma
pessoa que ama banheiras, então me envergonho de dizer, ela é enorme, profunda e maravilhosa.
O quarto tinha uma janela os rodeando com vista para os jardins. Como o restante da casa,
as paredes eram de um branco cremoso, um pano de fundo para as brilhantes de colchas coloridas
cuidadosamente dobradas em um canto da sala.
Ele acenou para as seis colchas grossas. Uma sétima estava em sua cama.
Um rubor coloriu as bochechas de Judith.
— Elas são lindas e dependendo do meu estado de espírito, faço a cama de acordo com elas.
— Você tem variações de humor?
— Com certeza. — Ela parecia arrependida. — Na verdade, ele é muito instável.
Ele atravessou a sala, incapaz de impedir a imagem dela em sua mente, nua se contorcendo
embaixo dele, pressionada sobre tapete suave e espesso, toda a pele dourada nua e cabelos
negros sedosos contra aquele pano de fundo creme. Bom, tudo bem então. Ele pressionou o
polegar no centro da palma da sua mão, roçando pequenas carícias justamente onde mais
latejava. Se ele iria sofrer, ela bem poderia acompanhá-lo.
Judith ofegou, sua mão indo à garganta, seu olhar saltando para o seu.
— Eu também tenho um humor instável, — ele explicou, permitindo que seu olhar
percorresse seu corpo.
Ela empurrou a porta do banheiro para mostrar o espaçoso cômodo. Ele se aproximou tão
perto dela que ela não pôde deixar de sentir o calor que irradiava de seu corpo. Ele gostou do
formato da banheira. Se Judith estivesse ali dentro e ele parasse bem ao seu lado, tudo o que ela
teria que fazer era virar a cabeça um pouco mais e estaria na altura perfeita...
Ele gemeu, seu pau saltou reagindo com o pensamento de sua boca quente o envolvendo,
acariciando com a língua, sua boca o apertando como um punho de seda.
— Você não pode ficar muito tempo por aqui também, — ela disse puxando-o pelo braço
para levá-lo para fora. Sua respiração estava mais rápida agora, os seios subindo e descendo, um
rubor percorrendo do pescoço até seu rosto. — Você pensa em alguma outra coisa além de sexo?
— Não quando estou perto de você. Mas estou determinado a me comportar.
— Pois não está funcionando e acho que você sabe disso. — Ela fechou a porta de seu
quarto com firmeza. — É seguro mostrar a você o banheiro das visitas?
— Tem uma banheira lá?
— Sim, mas não como a do banheiro da suíte. — Ela fez uma pausa, com uma das mãos na
porta, olhando para ele um pouco maliciosamente. — Embora o chuveiro seja maravilhoso. —
Abriu a porta lentamente.
Oh sim. Sua mente podia vê-los nesse grande chuveiro juntos, os dois embaçando todo o
vidro, com as mãos ensaboando seu corpo, investigando e se aprofundando em todos os seus
segredos.
— Desta vez é você quem está pensando nisso. — Sua voz estava um pouco rouca.
— Você não é o único que tem fantasias.
Não apenas parecia travessa e presunçosa, mas estava absolutamente adorável com seus
cílios espessos, uma covinha tentadora e olhar alegre... E ele não achava as mulheres "adoráveis."
Nunca havia participado de provocações antes. Sempre viveu uma vida de sombras, anos de
sedução e intriga, matando e desaparecendo, mas agora sentia que estava vivo e estava
experimentando muitas estreias. Ele beijou muitas mulheres, mas beijar Judith era como se fosse
a primeira vez. Seu corpo ficava excitado quando ele o forçava a ficar, mas com Judith, seu corpo
respondia com uma vontade própria... Outra primeira vez. E agora as provocações. Ela o fazia rir.
— Você está me tentando deliberadamente, — ele a acusou ao perceber que era verdade.
Ela deu um sorriso para ele.
— Talvez um pouco, — ela admitiu.
— Você que me causar problemas, não é?
— Definitivamente.
Abriu a porta do quarto de hóspedes revelando outro quarto espaçoso.
— Essa cama é bastante confortável.
Ele observou que as janelas pareciam ser parte de cada quarto. Ela construiu o andar
superior pensando na vista e não na segurança. Podia ver a grandes distâncias de qualquer parte
da casa, mas com janelas abertas, mesmo com um vidro colorido, um franco-atirador poderia
facilmente obter um bom tiro. Internamente ele suspirou. Se fosse ficar na fazenda, nesta casa, (e
aquilo era malditamente o que imaginava), ele teria que achar uma solução para o problema das
janelas. Quão caro seria para colocar vidros à prova de balas em tantas janelas? Tinha dinheiro.
Qualquer pessoa na posição dele sabia como adquirir e esconder grandes quantidades de
dinheiro.
— Por que não tem cães por aqui?
Ela franziu a testa para ele enquanto fechava a porta do quarto.
— Cães? Não entendi.
— Em uma propriedade desse tamanho com muitas de vocês sendo vítimas de violência, era
de se esperar que vocês tivessem alguns cães para ajudar a proteger a propriedade.
— Ah, isso. Sim, faz sentido. Lexi e Airiana realmente pressionam para que tenhamos cães e
o marido de Rikki também.
É claro que Lev gostaria de ter cães.
— Você não os quer?
— Não até que Rikki esteja confortável com a ideia. Ela tem dificuldade com as mudanças.
Temos falado sobre isso há algum tempo, uma espécie de reforço a ideia, mas agora que ela está
casada e seu marido tem opinado sobre a questão, acho que definitivamente teremos alguns cães.
Airiana está muito animada e acho que Lexi ficará aliviada quando consegui-los. Ela trabalha muito
tempo sozinha e um cão seria um bom companheiro.
— É o seu novo sistema de segurança? — Ele indicou o painel de números em seu corredor.
— Você não o está usando.
Ela fez uma careta.
— Levi queria que instalássemos um em todas as nossas casas, de forma que fizemos isso,
mas é um incômodo. — Ela abriu caminho pela escada, seguindo para o andar de baixo.
— Incômodo? — insistiu. — Judith, ter um sistema de segurança não é um incômodo. Ele foi
instalado para protegê-la. Cada uma de suas casas está a uma boa distância das outras. E o
principal, você é uma mulher e vive sozinha aqui.
Ela revirou os olhos.
— Agora você está falando como Levi. Gosto de sair para a minha varanda no meio da noite.
Às vezes sento no jardim ou pinto até tarde, às vezes a noite toda, deixo as portas francesas
abertas. Minhas irmãs vêm sempre aqui. Gosto de uma política de portas abertas. Estamos
sempre dentro e fora das casas umas das outras. Se tivéssemos o sistema de segurança ligado
teria que desligá-lo constantemente.
— Você tem alguns sérios problemas, Judith. Precisa enraizar em você um pouco de senso
de autopreservação. Em todas vocês.
— Nunca vou te apresentar a Levi. Ele obrigou a todas nós a aprender autodefesa e inclusive
a atirar. Se vocês dois se juntarem estaremos em um acampamento militar ao invés de uma
fazenda. — Ela abriu a porta para uma sala enorme e deu um passo para trás com um sorriso
orgulhoso em seu rosto quando indicou que ele entrasse.
O estúdio de Judith era enorme e cheio de luz. A parede externa foi feita de vidro espesso,
portas francesas para um amplo e convidativo jardim externo, que cresceu selvagem com cores
brilhantes e vivas. Uns tubos derramavam luz do teto, iluminando as fileiras de perolas, pedras
preciosas, cristal, fios e pingentes. Uma genuína alegria enchia aquela sala e a felicidade se refletia
na criatividade caótica e colorida derramando-se de bandejas em cada canto da sala.
As paredes eram brancas, as luminárias, as grandes janelas e largas portas francesas atraiam
a luz ao cômodo. Judith tinha pendurado imagens de suas mandalas favoritas... Imagens repetidas
em padrões nos caleidoscópios pelos espelhos e objetos nas células. Ele os estudou por alguns
momentos, sabendo que esta sala e essas imagens continham uma das chaves para a
personalidade de Judith. Ali ela criou um local de beleza e paz. Ali era o lugar onde a artista
derramava sua alma em suas criações.
Ele olhou ao redor da sala observando cada detalhe. Este era o lugar onde Judith realmente
vivia, não no andar de cima em sua casa confortável e bonita. Ali, naquele caos feliz, sua alma
estava em paz. Quase podia ouvir a risada dela, despreocupada e confiante. Este lugar
representava Judith mais do que qualquer outra coisa que tinha visto na casa.
— Essa parede está desenhada para cortar os espelhos, — Judith explicou e apontou para a
parede oposta, onde uma grande mesa quadrada que continha algum tipo de equipamento que
nunca viu antes. — Preciso de cortes perfeitos e linhas retas sempre. Isto permite a colocação da
borda do espelho contra a barra de ferro com esta barra móvel que guia a lâmina de corte.
— Parece um pouco perigoso.
Ela deu um rápido sorriso.
— Deveria ter me visto quando comecei a utilizá-lo.
A ideia de algo machucá-la, mesmo quando estava na fase de aprendizagem, o incomodava
em um nível que ele não entendia. Stefan não percebeu que alguns instintos protetores ainda
permaneciam nele e, no entanto ela parecia estar trazendo todos eles para fora.
Olhou para a segunda mesa de trabalho na mesma parede. Lâminas, pistolas de cola,
cortadores e fitas especiais estavam em um caos feliz.
— Pelo menos você está bem armada aqui já que nunca aciona o alarme. Um intruso odiaria
tentar pegar você nesta sala.
Judith riu novamente e apontou para outra parede.
— Essa é a minha estação de lampworking15 onde retorço e esculpo as barras de cores antes
de colocá-las em uma célula.
Os óculos de proteção estavam ao lado da bomba de oxigênio e os tanques de alimentação.
Vasos altos e transparentes continham as barras de vidro coloridas, brilhantes e vívidas que ela
havia se referido.
— Uso o forno pequeno para colocar as peças cortadas de vidro que dão a forma que quero
nos sistemas de espelho.

15
É um tipo de vidraria em que uma lâmpada ou maçarico são usados para derreter o vidro. Uma vez no estado de fusão, o vidro é
modelado por fundição e moldagem com ferramentas e movimentos da mão.
Outra mesa continha caixas com material de embalagem para o transporte. Podia ver que no
meio do que parecia ser o caos, ela era realmente muito organizada. Em uma das paredes uma
fileira de mesas estreitas alojava caixas de acrílico transparente contendo uma grande quantidade
de objetos. Embaixo das mesas estavam pequenas caixas de plástico cheias de células, peças
diversas, discos, lentes e óculos, todos os tipos de coisas intrigantes que usava, bem como tubos e
bases para vários tipos de prismas.
Stefan se sentiu atraído pelos respingos de brilhantes cores que se derramavam das caixas
em cima da mesa e se aproximou para observar o tesouro dos itens. Virou para ela com uma
sobrancelha levantada.
— Esses são vários pedaços e fragmentos que uso para fazer caleidoscópios, — ela explicou.
Ela era feliz nesta sala. Ele podia sentir uma riqueza de alegria permeando as próprias
paredes, e o próprio cômodo, assim como os objetos nas caixas. Embora houvesse dezenas de
milhares de itens, cada caixa continha apenas uma cor, criando um efeito de arco-íris, bem como
seus jardins.
— Onde encontra essas coisas?
— Em todos os lugares. Não são gloriosos? Toda essa cor, textura e formas? Vejo algo e
imediatamente noto as oportunidades. Os prismas podem acalmar as pessoas, entretê-las, fazê-las
rir ou chorar. Faço prismas temáticos e pessoais. — Pela primeira vez, Judith soou um pouco
tímida. — Estou fazendo aquele lá como um presente especial para Hannah Drake, bem, Hannah
Harrington. Ela terá seu primeiro bebê a qualquer momento e prometi a Jonas que o terminarei
logo.
Ela fez um sinal com a mão e ele a seguiu até o centro da sala, onde uma cadeira com rodas
reinava no meio das mesas em forma de “U” formando sua área de trabalho. Na verdade, ele a
teria seguido a qualquer lugar, mas ele a achava excitante e sexy ali naquela sala.

CAPÍTULO 09

Stefan segurou o comprido cabelo de Judith em seu punho, envolvendo-o em seu pulso
grosso laçando-o em um movimento rápido, detendo-a de forma abrupta. Ele estava cercado por
ela, pela essência de quem ela era, e não havia uma única parte dele que não respondesse a esse
fascínio feminino. Cercado pelas cores vivas e brilhantes que pareciam expressar fisicamente a luz
e alegria que ela amplificava com a crescente necessidade que sentia por ele. Esta mulher era sua
casa.
Ela se virou para ele, se encaixou no abrigo de seu corpo e levantou a boca até à sua, sem
hesitação. Não havia nada gentil em seu beijo. Ele devorou-a, sentindo sua fome unida à dela
crescendo como um maremoto. Suas mãos encontraram a pele nua sob a sua fina camiseta, macia
e quente e muito convidativa. Ela se encaixava como uma luva, mas, o mais importante, não havia
sombras em torno de Judith para ele recuar. Ela era como um sol brilhante, um foco de luz,
brilhante, quente e tão condenadamente sedutora que não havia como resistir a ela.
Seus braços finos circularam seu pescoço, seus seios macios pressionaram tão firmemente
contra seu tórax, que ele sentiu cada respiração que ela tomou, cada batida de seu coração. Ele a
beijou até não conseguir respirar, até que não foi o suficiente e nunca seria. Sua pele o atraía
suave e quente e tão macia que quase gemeu em voz alta pelo simples prazer de tocá-la.
Judith era tudo o que ele queria e muito mais, tudo o que ele precisava para voltar à vida.
Era impossível, completamente impossível resistir a ela, ali naquela sala, onde vivia, respirava e se
cercava de tanta beleza. Ele sabia que as cores brilhantes e vivas refletiam quem ela realmente era
e ele precisava daquele brilho. Ele precisava daquela beleza. Seu mundo era sem graça, cheio de
violência e morte, e somente Judith poderia afastar isso dele. Ele ansiava por ela além de qualquer
coisa que poderia ter imaginado, ela era uma droga em seu sistema, uma necessidade urgente que
não podia mais ignorar, embora soubesse que isso faria com que fosse mais difícil persuadi-la.
Sua ereção pesada e permanente reclamava de forma dolorosa e impossível de ignorar. Sua
boca passou a ser autoritária e exigente. Ele beijou o caminho de sua garganta roçando pelo
caminho até a borda de sua camiseta.
— Não quero que você use nada além desta corrente de ouro, — ele sussurrou, beijando o
caminho de volta até a sua orelha. Seus dentes a mordiscaram. — Livre-se de suas roupas.
Ele não era o tipo de homem que pedia. Ele comandava e não podia mudar a si mesmo. Este
era Stefan Prakenskii com sua mulher, sua outra metade, não o impessoal Thomas Vincent.
Thomas que era educado, Stefan não sabia ser assim, não quando a luxúria se mesclava tão
duramente com uma desconhecida emoção que crescia de forma tão abrangente.
Ele acariciou a pele sedosa da palma de sua mão, enquanto com a outra traçou o caminho
de sua estreita caixa torácica, seduzindo-a mesmo enquanto fazia a sua demanda. Mais uma vez
ele tomou posse de sua boca, mergulhando nas profundezas de veludo, provando um sabor de
mel silvestre e sobrevivência, beijando-a de novo e, novamente, alimentando-se de sua magia.
Stefan havia aprendido em uma idade precoce a sobreviver, controlando cada aspecto da
sua vida, de seus pensamentos, suas emoções e principalmente lidar com qualquer tipo de dor.
Beijar Judith era outra forma de sobrevivência. Ele havia perdido qualquer vestígio de humanidade
e ali, naquela sala de alegria absoluta, se via cercado por ela. O espírito de Judith fundia-se com o
dele até que ele não podia dizer onde começava ela e acabava ele. Ali, mais do que em qualquer
outro lugar da casa, seu espírito estava vivo e forte, em torno dele, se fundia com o seu e ampliava
cada uma de suas próprias emoções.
As paredes de seu estúdio de caleidoscópio, o local em si, o próprio ar, continha a essência
de Judith e não havia maneira de resistir, nem mesmo com seus dons. Judith era uma mulher
naturalmente sensual, sua paixão pela vida, pela alegria, pelas as cores que estavam em todos os
lugares ao seu redor. Ela era totalmente feminina e ali, mais do que em qualquer outro lugar, sua
natureza sexual era tão fácil de ver como seu lado compassivo. Ela o fazia queimar com a
necessidade.
— Suas roupas, — ele reiterou entre os dentes, tremendo com um desejo que era mais real
do que qualquer coisa que havia conhecido. — Tire-as.
Nunca. Nenhuma quantidade de golpes, nenhuma quantidade de carícias, afago ou qualquer
outra forma de incentivo fez com que ele perdesse o controle, e agora, com esta mulher em
questão, ele mal podia respirar de tanto desejo.
Judith inclinou a cabeça para trás para que seus olhos escuros pudessem fitar os dele. Ele
podia ver que o calor que sentia também estava lá, uma necessidade tão forte quanto a sua.
Talvez ela fosse um pouco menos segura do que ele, sobre onde estava se metendo, mas ele lia
uma fome tão profunda quanto a sua própria. Muito lentamente, ela deixou cair os braços, e suas
mãos foram para a borda de sua camiseta. Seu coração subiu à garganta, ameaçando sufocá-lo.
Ela puxou o material ofensivo sobre sua cabeça e atirou-a sobre a mesa próxima, sacudindo os
cabelos de modo que ele caísse ao seu redor como um vigoroso manto negro de seda brilhante.
Sua respiração se recusava sair de seus pulmões. O sutiã meia taça rendado escorregou pelo
seu corpo, deixando seus seios fartos e empinados como uma oferenda. Seus mamilos já estavam
duros, em uma súplica secreta, seus seios ruborizados em antecipação, subindo e descendo com
uma respiração difícil. Deus, ela era linda, mais linda do que imaginava que fosse.
Ele simplesmente a arrastou para enrolar sua mão ao redor de sua nuca, com a boca mais
uma vez descendo sobre a dela. Não havia maneira de resistir a ela. Judith, rodeada pela evidência
de seu brilho, era pura sedução para um homem tão perdido quanto Stefan. Beijou-a mais e mais,
longos beijos embriagadores, enquanto suas mãos se moviam sobre a pele, cobrindo os seios, os
polegares provocando seus mamilos, sentindo como cada caricia ricocheteava através de ambos
como um chicote de um relâmpago.
Stefan beijou o caminho para os seus seios, atraindo a carne macia para o calor de sua boca
enquanto suas mãos caíam para o botão de sua calça jeans. Os nós de seus dedos roçaram seu
corpo firme quando ele puxou a frente para abrir. Enganchando os dedos ao redor dos seus
quadris, assim como em sua tanga de seda, ele puxou o material para baixo, e sua boca seguiu o
caminho para o seu umbigo, enquanto ela saia dos jeans.
Suas mãos agarraram seus quadris, enquanto seu corpo latejava e exigia.
— Até que ponto você é experiente, Judith? — Sua voz soou rouca.
— Que diferença isso faz? — Sua voz estava nervosa, pronta para recuar.
Seus olhos encontraram os dela firmemente.
— Eu não quero te machucar e não acho que eu vou ser gentil, não nesta primeira vez.
O calor ardia em seus olhos. Ela umedeceu os lábios.
— Eu não estive com ninguém em mais de cinco anos, e antes disso, somente por duas
vezes.
Ele gemeu. Não era o que ele queria ouvir embora não podia deixar de se sentir satisfeito.
Judith pertencia a ele. Duas vezes não contava. Ela podia muito bem ser uma virgem. Ele
descansou sua testa contra a sua barriga macia e respirou fundo para recuperar uma aparência de
controle. Ele nunca tinha estado sem controle... Não até Judith. Ele nunca permitiu que seu corpo
ou sua mente tivessem vontade própria... Até Judith.
— Eu quero você com cada respiração do meu corpo, moi padshii angel, mas isso pode não
ser uma boa ideia agora. — Ele se ajoelhou com os braços ao redor de sua cintura olhando para
ela. — Eu não sei quanto controle eu realmente tenho e isso é outra maldita primeira vez para
mim.
Stefan Prakenskii estava desnudando sua alma para a sua mulher e Thomas Vincent poderia
ir ao inferno. Se isso ia acontecer, então ele seria totalmente Stefan e diria toda a verdade ali
naquela sala cheia de alegria e beleza, ali com aquela mulher que ele sabia com certeza que
pertencia a ele.
— Se fizermos isso, você tem que me prometer que isso não vai acabar aqui. Eu quero ver
você me olhar nos olhos e saber que você quer isso tanto quanto eu e que não vamos destruir esta
nossa chance. Diga Judith, diga enquanto eu ainda tenho força para parar.
Ele precisava saber que ela não iria tentar cair fora depois.
As mãos dela foram para os seus cabelos, os dedos ondulando através dos fios espessos.
Seus olhos escuros fitaram os seus misteriosamente, cheios de desejo por ele... Por Stefan. Ele
tinha se dado a ela, esse pequeno pedaço de humanidade que havia sobrado e que seus
instrutores não tinham extirpado dele. Parecia uma coisa pequena, mas ele nunca permitiu que
outro ser humano soubesse nem mesmo que Stefan Prakenskii existia. Os Prakenskii viviam nas
sombras, não eram mais do que fantasmas sobre o qual sussurravam, mas realmente nunca
tiveram certeza sobre sua existência. E os mortos não podiam identificá-los.
Guardava esse pequeno pedaço de humanidade tão próximo quanto possível, profundo e
oculto, onde nenhum inimigo poderia tirar isso dele. Era a única coisa que o tornava vulnerável, a
única coisa que restava do amor de sua mãe. Sua lealdade a seus irmãos era parte disso, e era
muito, muito frágil.
Judith o via. Ela podia não saber seu nome, mas ela o via. Eles olharam um para o outro,
Judith despida, nua e aberta para ele, Stefan totalmente vestido, mas, mais nu e vulnerável do que
ela poderia imaginar.
Judith umedeceu os lábios.
— Eu te quero Thomas, de qualquer forma que eu possa ter você.
Seu corpo reagiu quase antes de sua mente compreender a suave aceitação sussurrada. Sua
ereção pesada cresceu mais grossa e muito mais dura do que nunca, uma necessidade dolorosa
misturada a uma luxúria sombria que crescia tão rápido que mal podia mantê-la sob controle. Ele
não podia salvá-la, não agora, não quando ela olhava daquela forma e com aqueles olhos. Não
com o seu corpo ruborizado e os seios subindo e descendo com a respiração entrecortada. Não
quando ela estava tão carente quanto ele. Agora... Era condenadamente tarde.
Seu perfume feminino o seduzia e tentava além de sua capacidade de resistir. Suas mãos,
por vontade própria, caíram para suas coxas, separando-as para dar o que ele necessitava tão
desesperadamente. Ele... Não podia... Esperar. Sem preâmbulos, ele a devorou com sua boca. Ele
era brilhante em duas coisas, em matar e dar prazer. Com esta mulher, o ato sexual seria real. Sua
língua deu uma única lambida por suas dobras de veludo quando sentiu seu tremor em resposta,
ela possuía um sabor de mel selvagem assim como o seu desejo.
Ele sabia que era tarde demais para voltar atrás. Ela transformou sua vida para sempre. A
maneira como suas mãos agarravam seus cabelos. O tremor de seu corpo, os seus gemidos suaves
e musicais alimentavam o seu vício e o seu sabor exótico sempre provocaria seu desejo. Nada mais
importava, a não ser tê-la. Ele esperou por toda a sua vida... Por alguma coisa, apenas uma coisa
que desse sentido a tudo. E esta coisa acabou sendo uma mulher chamada Judith.
Ela gritou quando ele a lambeu, como um gato lambendo um doce, um creme quente, seus
gritos quase sem fôlego apenas aumentaram a urgente necessidade que crescia como um tsunami
dentro dele. Ele não conseguia parar os sons guturais de prazer que saíam de sua garganta, a fome
desesperada que se convertia em uma luxúria insaciável. Sua quente vagina se contraiu,
fornecendo mais mel e ele a atacou como um homem faminto, e realmente se sentia assim.
Meu anjo, me dê tudo. Eu preciso que você se entregue a mim.
Ele estava pedindo que ela confiasse nele completamente. Quanto mais ela estivesse
relaxada, mais se colocaria em suas mãos, era o melhor que ele poderia fazer por ela. Suas mãos
apertaram sua cintura, mantendo-a quieta quando seus joelhos ameaçaram dobrar, enquanto ele
deslizava o dedo profundamente naquele quente túnel aveludado. Ele gemeu ao perceber o quão
pequena e apertada ela era. Ele era um homem grande e ela precisava estar pronta para aceitar o
seu tamanho. Seus músculos internos agarraram o seu dedo com força enquanto ele lambia,
chupava e recebia com prazer o líquido que se derramava. Um néctar dos deuses, doce, que fluía
em sua boca faminta. Ele era o diabo que tentava o anjo e nada mais importava exceto que ela
sucumbisse aquela sedução deliberada.
Judith gritou novamente, um som estrangulado quando suas duas mãos se prenderam nos
ombros de Stefan para tentar se firmar quando suas pernas viraram gelatina e seu corpo tremia
violentamente com a tensão que se acumulava. Ela abriu as pernas mais amplamente, jogou a
cabeça para trás, ofegante, entregando-se aos seus cuidados, dando a confiança que ele exigia
dela. O prazer crescia e aumentava de uma forma que ela jamais havia conhecido e ainda assim
ele não parou, sua boca perversa e pecaminosa a conduzia de uma forma que ela pensou que
romperia em um milhão de pedaços ou apenas se perderia no arrebatamento absoluto da sua
boca.
E, em seguida, ele usou os dedos novamente, enquanto sua boca permanecia em seu botão
mais sensível, sugando, friccionando e golpeando até que a respiração ofegante de Judith
começou a sair em soluços. Seus dedos a exploravam, alongavam, brincavam e esticavam-na um
pouco mais. Houve uma pequena picada de dor, um ardor que flutuava no prazer requintado e,
que em seguida, se dissipava na forma de um arrebatamento, construindo uma espiral cada vez
mais forte em seu interior.
— Eu não aguento mais. — Sua voz soou rouca com um gemido implorante.
Vamos anjo... Voe para mim.
Ela não teve outra escolha, ela realmente não teve. Não com as chamas que cresciam em
uma gigantesca tormenta de fogo e seu corpo se agitando impotente contra a sua boca e dedos.
Ela sentiu cada músculo de seu corpo se apertar, uma tensão tão forte que chegava ser
assustadora e então ela voou e seus gritos suaves encheram a sala.
Stefan segurou seus quadris para sustentá-la enquanto se levantava, arrancando sua calça
jeans com uma das mãos, virando-a contra ele. Ele pressionou uma das mãos em suas costas,
forçando-a a se apoiar sobre a mesa. Ele tirou sua camisa. Seu corpo estava coberto de cicatrizes.
Brigas, ferimentos à bala, de faca, marcas de chicote, anos de tortura permanente. Este era
simplesmente um mapa de seu corpo. Ela podia imaginar que ele havia conseguido algumas
daquelas feridas em serviço, mas seria impossível explicar todas elas e ele não queria ter que
mentir para ela.
Ela estava quase soluçando com seu corpo balançando contra o dele.
— Tranquila, anjo, nós iremos devagar.
Pelo menos ele esperava que pudesse...
Stefan esticou sua mão para segurar o seu pau e buscou sua entrada lisa com sua cabeça
grande e muito sensível. Sentiu seu canal muito quente ao redor da cabeça de seu pau e quando
ela o agarrou firme, ele teve que deter-se e jogou a cabeça para trás sentindo seu corpo tremer
com o prazer.
— Não se mova, por favor, Judith. — Ele suplicou. — Eu não quero te machucar.
Judith tentou parar de se contorcer, parar a terrível necessidade que a agitava dominando-a
quando sentiu a cabeça quente de seu grosso membro dentro dela. Sua respiração ficou presa em
seus pulmões. Entre suas pernas, sentiu como se ele estivesse esculpindo-a em aço quente,
marcando-a, invadindo-a, estendendo-a, queimando-a. Mas, era a essência do homem estava
alojada em seu interior tão profundamente que ela sabia nunca poderia tirá-la de lá. As sensações
se derramaram sobre ela tão rápido que ela não conseguia recuperar o fôlego, não podia controlar
os gritos de seu corpo, suas demandas. Ela não tinha nenhuma experiência com esse tipo de sexo,
mas tudo nela respondia a ele. Mesmo as pequenas nuvens de medo que se enrolavam
traiçoeiramente em sua mente, aumentavam o seu prazer.
Ela soltou um soluço e sentiu as lágrimas brotando, queimando por trás de seus olhos. Ela
não tinha pensado ser capaz deste tipo poderoso de paixão, desta necessidade tão grande que
nada mais importava exceto tê-lo enterrado profundamente dentro dela. Ela não se importava se
ele a estirava e se queimava. Ela queria que ele a levasse tão alto que se perderia nele. Disposta a
dar a ele tudo o que ela era, tanto quanto ele estava dando tudo dele mesmo.
— Fique parada, porra. — Ele rugiu.
Ele precisava que ela parasse de se mover tão sensualmente, que seu corpo parasse de se
deslizar sedutoramente em sua direção enquanto tentava atraí-lo ainda mais profundamente em
seu ardente interior feminino.
Ela sussurrou algo entre os dentes que soou como se ela estivesse tentando, mas a sensação
de sua bunda suave e arredondada, e a larga linha de sua coluna com o seu cabelo derramando
em torno dela era tão sensual como os seus quadris se sacudindo.
Ele balançou para frente, penetrando mais alguns centímetros mais profundamente,
empurrando por suas dobras apertadas, um sufocante fogo de seda ardente, ofegando quando as
chamas o atravessaram. Era difícil não introduzir-se profundamente naquele inferno de paraíso.
Ele parou no momento em que a sentiu tensa, apenas permaneceu onde estava rodeado pelo
tecido vivo de veludo tão apertado como um punho.
— Estou bem, — ela disse ofegante. — Continue.
— Algum problema?
Ele não podia parar, não agora. Ele fechou os olhos e rezou a um Deus que não tinha certeza
existir.
— Não. Eu quero isso, — insistiu Judith, seu tom era suplicante, sem fôlego, necessitado. —
Queima um pouco quando você me alonga, mas é uma sensação incrível. Por favor, não pare.
Ele deixou escapar o fôlego e se introduziu mais profundamente em seu apertado canal
feminino.
— É tão malditamente apertada, anjo...
Ele sentia o seu calor por todo o corpo até os dedos dos pés. Ele respirou e empurrou um
pouco mais.
— É você é malditamente grande.
Judith engasgou e empurrou para trás soltando um pequeno grito quando o sentiu afundar
mais alguns centímetros.
Ele flexionou os dedos. O sangue trovejava em sua cabeça, e sentia como se uma britadeira
estivesse pulsando entre suas pernas, de forma dura e exigente. Com ela se contorcendo daquela
forma ele mal conseguia manter a sanidade e muito menos se controlar. Ele agarrou os seus
quadris e empurrou seu corpo na direção dele, cravando-se com força, enterrando-se
profundamente, passando por aqueles apertados e quase inflexíveis músculos. Ele golpeou seu
colo do útero e ela gritou novamente enquanto respirava profundamente.
— Por favor, Thomas, por favor... — Ela deixou de rogar com um suspiro quando ele
começou a se mover.
Stefan se moveu em um ritmo lento, observando a reação dela tanto quanto possível. Ela
estava queimando-o vivo, alimentando as chamas com a sua paixão, com sua própria necessidade,
uma mulher usando uma magia negra, envolvendo-o no sexo e pecado. Seu pau estava duro como
o aço, batendo contra ela mais e mais, desaparecendo em suas profundidades escuras e quentes.
Deliberadamente ajustou sua posição, friccionando em sua parte mais sensível de modo que ela
deu outro grito.
Seus longos cabelos estavam por toda parte, seus seios balançavam com cada golpe duro.
Esta visão que teve dela rompeu seu último fio de controle e ele se rendeu a necessidade
selvagem que esteve guardando por toda a vida para esta mulher. Conteve sua respiração
bruscamente, apertou seu agarre sobre os seus quadris enquanto a empurrava mais a frente e a
puxava volta para ele novamente e novamente.
Ele conduziu a ambos a um pico tortuoso de puro prazer carnal que não sabia que poderia
existir, a tensão se acumulou até que seus gritos eram música para ele e sua respiração
entrecortada combinava com as profundas estocadas de seus quadris. Ele não podia parar, não
queria que isso terminasse, sentia-se completo com ela, com as chamas lambendo sua pele
enquanto seu pau forjava um calor que os estava fundindo.
A luxúria se converteu em uma fome frenética e se misturou com uma emoção muito mais
suave, que pegou o seu coração e colocou-o unicamente nas mãos de Judith. Ele empurrou nela
de novo e de novo, suas suplicas unindo-se ao som de seus corpos tecendo as sensações em uma
espiral escura e muito profunda. Judith ofegou, um apelo escapou com um soluço, quando onda
após onda de um orgasmo chocante rasgou através dela. Seus músculos o apertaram como um
torno arrastando-o com força, um ataque feroz e quase brutal, que o pegou de surpresa,
rasgando-o e provocando sua própria liberação violenta.
Stefan desabou por cima de Judith, tomando cuidado para não colocar muito de seu peso
sobre ela enquanto lutava para respirar. Ele pressionou o rosto contra as costas dela, inalando seu
perfume, sentindo a seda de seu cabelo contra seu rosto.
Você está bem?
Ela estendeu uma mão por trás dela e acariciou a coxa dele. Ele podia sentir o pulso do seu
coração nos músculos que o rodeavam.
Completamente. E você?
Nunca estive melhor.
Ela hesitou e ele sentiu como se recebesse uma flecha através do seu coração.
Estou um pouco assustada com o quão intenso é tudo isso entre nós. Eu não esperava que o
sexo fosse tão explosivo. Eu não pude controlar.
Stefan esperou um batimento de coração.
Não lamente isso, Judith. Isso o que temos é maravilhoso, não se afaste de mim porque isso
te parece assustador. Podemos resolver isso, juntos.
Ela ficou em silêncio outro momento.
Eu deveria ter dito a você que não estou usando um controle de natalidade. Eu não estive
com ninguém há muito tempo e não esperava estar.
Eu deveria ter protegido você. Sinto muito, Judith. Eu não estava pensando.
Ele não podia dizer isso em voz alta, mal conseguia pronunciar a mentira telepaticamente.
Ele gostaria de ter um filho seu crescendo dentro dela. A maldita verdade era que ele desejava ter
seu filho crescendo dentro dela.
E essa foi outra primeira vez chocante para ele.
Judith ficou imóvel. Ela virou a cabeça para um lado e olhou-o com seus longos cílios
baixando sobre a sua expressão aturdida.
Eu sou uma mulher adulta, Thomas. Eu posso me proteger. Eu deveria ter pensado sobre isso.
E sinceramente, há uma parte de mim que daria boas vindas a um bebê.
Meu bebê, ele corrigiu. Meu bebê.
A intimidade de falar um ao outro apenas com a mente enquanto seus corpos mantinham-se
juntos, aumentou seu prazer. Ele passou os braços em volta de sua cintura delgada e pressionou
beijos por sua espinha.
Eu amo essa sala.
Eu também.
Havia um riso suave em sua mente.
Judith não tentou se mover e ele pode sentir cada tremor que balançou seu corpo.
Esta sala será sempre a minha favorita, embora eu esteja muito disposto a verificar cada
cômodo individual da casa para ver se todos são tão excitantes como este.
Lentamente, com relutância, Stefan permitiu que seu corpo saísse do dela. Ele manteve uma
das mãos sobre os seus quadris para mantê-la no lugar, não dando chances que ela pudesse ver as
cicatrizes sobre ele, quando ele se arrastou até o seu jeans.
— Quantas mesas existem nesta sala?
Ele queria distraí-la para dar-lhe um tempo para chegar a um acordo sobre a rapidez com
que aquele relacionamento estava crescendo.
Judith se ergueu com lenta deliberação. Escovando os cabelos para trás e o encarando. Sua
semente umedecia suas coxas, seu corpo estava ruborizado, seus mamilos estavam duros e sua
corrente de ouro brilhava para ele. Ela parecia ter sido feita para o amor, os olhos estavam apenas
um pouco vidrados e olhava para ele com uma mistura de vulnerabilidade e choque.
— As mesas são para o trabalho, — ela falou.
— Eu estou disposto a trabalhar,
Ele brincou só para ver mais cor ruborizar toda aquela pele macia.
Ela fez uma careta para ele enquanto pegava um pano macio.
— Um dia desses, você pode fazer o seu próprio caleidoscópio. Eu vou te mostrar como.
O sistema de alerta de Stefan disparou alto. Judith lia as pessoas com facilidade. Ela via
coisas nos caleidoscópios e também podia fazer um caleidoscópio adequado para cada indivíduo e
de acordo com suas necessidades. Ela veria tudo dentro dele apenas pelas coisas que ele
escolhesse colocar em seu caleidoscópio. Ele não estava certo de saber o que Thomas Vincent
escolheria para o seu caleidoscópio, mas, quaisquer que fossem estas escolhas, seriam
completamente diferentes de qualquer coisa que Stefan Prakenskii escolheria.
Ele manteve o sorriso no rosto, inclusive enquanto ela o observava atentamente. Sua
natureza desconfiada não podia deixar de pensar em todos os tipos de razões que ela poderia ter
para querer sondar seu caráter. Eles tinham acabado de fazer amor, o melhor sexo que já teve em
sua vida e ele havia decidido em sua mente que esta mulher seria a sua mulher, a única que ele
queria ou desejava ter, mas sua mente imediatamente seguiu o caminho da conspiração. Isso lhe
mostrava mais do que qualquer coisa... O muito que os seus treinadores o havia fodido.
— Isso parece divertido, — ele respondeu por que ela estava esperando por uma resposta.
Sem olhar para longe dele, ela limpou a sua semente com um pano e foi a coisa mais sexy
que ele já testemunhou. Apesar de haver se saciado minutos atrás, o seu pau ficou duro
novamente. Ele quase gemeu em voz alta. Quem ele estava tentando enganar? Ele necessitaria
toda uma vida para saciar o desejo que ela tinha criado em seu corpo. Ele quase pegou o pano e
jogou para longe dela, odiando ver a evidência de sua posse apagada. Ele se forçou a ficar quieto,
sem protestar enquanto ela se vestia.
— Estou com fome, de repente, — ela anunciou com um pequeno sorriso. — Você sente
vontade de comer?
— Claro, e já que estamos aqui, assim você pode me dar um resumo rápido de sua casa.
Você realmente não se consegue ver muita coisa lá fora, neste andar de baixo, por isso fiquei
surpreso em ver tantas janelas. Eu esperava que esta sala fosse mais como um porão.
Ele queria conhecer o layout da casa. As janelas dificultavam a segurança, mas seus jardins
tinham densas plantas, pelo menos durante esta época do ano.
Ela deu um sorriso satisfeito.
— As pinturas exigem uma grande quantidade de luz. Sou uma restauradora de arte assim
como uma artista. Ambos os trabalhos necessitam de luz, assim como na criação de
caleidoscópios. Eu gosto de estar rodeada por cores e todos os jardins são diferentes. Eu misturo
as flores com gramíneas e arbustos mais altos para ajudar a me dar uma sensação de proteção.
Ele não precisava perguntar por que ela sentia necessidade de proteção, ela já havia dito a
ele. Ele colocou o braço em volta de sua cintura e se inclinou para beijá-la. Se houve a menor
hesitação da parte dela, ele ignorou. Ele precisava beijá-la, na verdade, ele poderia beijá-la para
sempre e nunca estar cansado dela.
— Vamos buscar algo para comer, Judith. Você pode ir abrindo as portas para mim ao longo
do caminho e me dar uma grande turnê.
Ela colocou os braços em volta do pescoço e segurou-o para ela.
— Eu não posso acreditar que não te conheço por toda a minha vida. Isso é totalmente novo
para mim e ainda assim tão confortável como um sapato velho. É um pouco assustador o quanto é
bom estar com você.
Atrás das costas dela, Stefan levantou sua mão para inspecioná-la, viu as cicatrizes e os calos
pelo treinamento e pelas lutas. Parte dele esperava que sua carne fosse transparente. Ele não
tinha sido real desde que era um garoto e agora, o seu sangue fluía quente e sua mente
contemplava uma vida com esta mulher e nesta casa, um sonho ousado. Ele não merecia uma
mulher como Judith. Não havia nada muito bom nele, mas lutaria até o último suspiro por ela e
faria o que fosse preciso fazê-la feliz.
— Eu sei que você deve se sentir como se o diabo tivesse aparecido em sua porta e talvez ele
realmente tenha. Mas eu só sei te dizer que isto é correto, Judith.
Ela pressionou beijos ao longo de sua mandíbula e depois recuou.
— Vamos, antes que comecemos algo novamente.
— Eu estou disposto.
Ela riu.
— Eu também, mas infelizmente, tive que pedir a Airiana para trabalhar em minha loja e ela
tem coisas para fazer, então se vamos comer, temos que fazê-lo agora e eu estou realmente
morrendo de fome. Além disso... — ela enviou-lhe outro sorriso travesso. — Eu quero ver o quão
bom cozinheiro você realmente é.
Stefan a deixou tomar sua mão e conduzi-lo em direção à porta. Ele respirou fundo e inalou
seus aromas combinados. O local cheirava a ambos agora, a pecado e sexo. Ele era o pecado e ela
era o sexo. Sorrindo para si mesmo, ele a seguiu para fora da porta em direção ao corredor. Em
frente ao estúdio de caleidoscópios havia outra porta. Ela empurrou-a e deu um passo atrás.
— Eu tenho este pequeno quarto aqui embaixo, apenas para o caso de ficar acordada a noite
toda, o que acontece muitas vezes, então simplesmente desabo aqui.
— Outro quarto para nós, — ele murmurou apreciativo e foi recompensado com sua risada.
O próximo cômodo era um banheiro com um chuveiro, sem banheira esta vez, mas o
banheiro era espaçoso. Ele estava começando a perceber que Judith gostava de tudo o mais
aberto possível. Ela fechou a porta e girou-se para a porta seguinte, que seguia pelo corredor, no
mesmo lado do estúdio de caleidoscópios.
— Aqui é onde eu pinto e faço o meu trabalho de restauração.
Stefan entrou antes que ela pudesse fechar a porta. Havia a essência de Judith também
nesta sala, ele podia sentir. Este estúdio era muito organizado, um completo contraste com o caos
feliz da sala adjacente. Mais uma vez, as portas duplas francesas davam para um jardim e largas
janelas convidavam a luz solar, mas a semelhança terminava aí. A ventilação era fundamental ali,
devido aos produtos químicos utilizados e havia vários exaustores no alto, assim como janelas
posicionadas para proporcionar uma brisa cruzada com as portas abertas. Ele podia ver que o
estúdio havia sido bem planejado.
Viu um pequeno refrigerador em um canto e levantou uma sobrancelha inquiridora.
— Eu envolvo minhas paletas de pintura em plástico e as congelo para evitar que seque.
— Vou aprender muito com você. Ele estudou as pinturas que havia em vários estágios de
tratamento e secagem.
— Você gosta de pintar?
A face de Judith se iluminou. Ela, obviamente, amava o que fazia e gostaria de compartilhar
seu amor pela criação com alguém que também gostasse.
— Eu brinco com a pintura, mas não sou muito bom. Acho que é calmante.
Ele nunca tinha dito isto a outro ser humano. Ele pintava, e em seguida destruía a tela
imediatamente. Um homem que vivia nas sombras não podia dar-se ao luxo de deixar qualquer
coisa pessoal para trás.
Ele estudou o quimono de seda requintada exibido na parede oposta às portas francesas. A
forma como o cavalete foi colocado. Ela ficaria claramente bela naquela roupa.
— Era da minha mãe, — ela explicou e havia amor e reverência em sua voz. — Eu gosto de
mantê-lo perto de mim. Na parte de trás, eu tenho um jardim japonês e algumas das plantas que
eu trouxe comigo, na realidade desenterrei o jardim da minha mãe antes de vender a casa e
trouxe as plantas para plantar aqui. Se algum dia eu mudar, vou levá-las comigo. Eu tenho um jogo
de chá dela e algumas outras coisas. Parte da minha infância foi passada no Japão e depois meu
pai nos trouxe para cá, para os Estados Unidos. Ele manteve sua casa no estilo japonês. Meu pai e
irmão amavam dessa maneira, e eu também.
Ele sentiu como sua dor crescia e como ela a oprimiu rapidamente.
— Não faça isso em torno de mim, — ele disse bruscamente. — Não tenho nenhum
problema com qualquer tipo de emoção que você esteja sentindo, Judith. Seja você mesma
comigo. Sinta tudo, do ódio ao amor, da felicidade à tristeza. Permita-se isso.
Ela abaixou a cabeça e saiu para o corredor.
— Você sabe o que pode acontecer, Thomas.
Ele detestava este nome. Thomas.
— Não comigo. Eu vi o que você pode fazer, e se você for honesta consigo mesma, você sabe
que eu posso lidar com isso. Você tem medo de si mesma, mas nunca vai aprender a controlar seu
talento a menos que comece a usá-lo.
— Talvez o que eu sinta seja ruim e não deve ser usado.
Deliberadamente, ele deu um grunhido de escárnio.
— Você não tem medo de admitir que queira vingança Judith, então por que tem medo de
algo tão puro como ser um elemento espírito?
— É exatamente por isso que tenho medo. Eu posso não só amplificar meus dons, como
também os dons de minhas irmãs e isso é algo que não posso nem pensar. Eu não quero isso para
elas. Guardo o que sinto para que não me sinta tentada.
Seu braço enjaulou-a, colocou sua mão na parede ao lado de sua cabeça, impedindo-a de se
mover.
— Você sabe Judith. Eu sou um homem violento quando necessário. Eu reconheço a
violência quando a vejo. Você pode precisar de vingança. Você pode até sonhar com a vingança,
mas torturar um ser humano em sua mente e matá-lo é totalmente diferente de fazê-lo. Você
nunca, sob quaisquer circunstâncias, irá usar suas irmãs para ferir outro ser humano.
Judith piscou para conter as lágrimas que seus olhos se recusavam a segurar. Stefan pegou
seu queixo com os dedos e forçou-a a levantar a cabeça.
— Você tem vergonha disso. Tem vergonha de ter meios para uma vingança e não usá-los.
Você se sente culpada.
Ela se afastou dele.
— Você vê muito.
— Judith, não há nenhuma culpa em não querer envolver aqueles que você ama em algo
que possa ferir outro ser, você já sabe que é um preço muito alto a pagar e há sempre um preço.
Tem que haver um código moral, uma linha que você nunca cruzará... Um código pessoal, mesmo
em algo como uma vingança.
Ela respirou.
— Parece que você sabe sobre o que está falando.
— Mais do que você imagina, meu anjo. — Ele abaixou a cabeça e beijou-a suavemente, um
beijo terno e confortador quando ela fez uma careta e balançou a cabeça. — Você não gosta de
ser um anjo, o meu anjo.
— Eu prefiro quando você me chama de “meu anjo caído”. Pelo menos sei que você não está
me colocando em um pedestal impossivelmente alto.
Ela sempre estaria neste pedestal, não importa o que fizesse. Qualquer pecado que ela
tivesse nunca iria se comparar a sua alma enegrecida. Ele recuou para deixá-la escapar. Judith
endireitou os ombros e abriu caminho em direção às escadas. Eles passaram por uma última porta
no piso inferior sem que ela a tocasse. Judith havia aberto cada parte de sua casa, obviamente,
tinha orgulho dela, mas ela pulou uma porta grande do andar de baixo sem sequer olhar para o
local, e teve cuidado para desviar o olhar dela, o que imediatamente, despertou o seu interesse.
— Onde é que vai dar esta porta?
Ela conseguiu parecer inocente quando ele perguntou, mas ele não tirou os olhos dela e
observou sua retirada súbita, seu olhar se congelou no rosto e a culpa penetrou em seus olhos. A
mão dele foi para a maçaneta, mas estava trancada.
Ela balançou a cabeça e seus olhos se deslizaram para longe dele.
— É somente outro estúdio. Eu o mantenho trancado e muitas vezes não entro lá.
Um rubor rastejou do seu rosto até o pescoço.
Ela estava mentindo abertamente para ele, ela tentou disfarçar e fingir que aquele estúdio
não era importante, mas ela não era boa nisso. E nada poderia ter levantado mais suspeita do que
aquilo. O que diabos ela estava escondendo? Ele tentou não deixar que sua mente saltasse de
volta para Jean-Claude, mas o homem estava obcecado por ela, havia alguém a observando e
tirando fotos durante cinco anos consecutivos. Seria possível que ela estivesse guardando algo
para ele? Sua aversão pelo homem soava verdadeira, mas por que ela estava mentindo?
Ele trabalhava para o governo e até que soubesse com absoluta certeza de que ele estava
em uma lista para ser exterminado, ele se asseguraria de que certos segredos de seu país
estivessem protegidos a qualquer custo. Ele tinha que se certificar de que Judith não estava
guardando o microchip que Jean-Claude havia conseguido manter escondido nos últimos cinco
anos. Ele precisava entrar naquele estúdio. Uma parte dele reconhecia e realmente não acreditava
que ela ainda estivesse ligada a Jean-Claude. Ele simplesmente não gostava que ela guardasse
segredos dele.
Ele queria que ela entregasse a ele cada parte dela mesma, sem reter nada. Ele ficou imóvel
forçando-a a olhar para ele. Ela desviou o olhar rapidamente olhando para o chão. Ele apontou
para as escadas, com um pequeno encolher de ombros. Judith assumiu a liderança e ele
deliberadamente passou as pontas de seus dedos sobre sua bunda coberta com sua calça jeans.
— Você é uma bela mulher, Judith.
Se ela precisava que o assunto mudasse, ele faria isso. Ele não teria pudores em retornar por
conta própria e descobrir as coisas que queria saber. Ela não usava seu sistema de alarme e ele
teve o cuidado de observar os detalhes de sua casa para ter o mapa em sua mente. Ele não teria
dificuldade em encontrar o seu caminho no escuro. A noite era o seu habitat na maioria do tempo.
Instantaneamente, a tensão drenou para fora dela e ela enviou-lhe um sorriso latente por
cima do ombro enquanto o levava para a cozinha.
— Eu gosto de almoçar na varanda ou no jardim, quando não estou trabalhando na loja ou
galeria, — explicou Judith. — É tão bonito lá fora, e as cores do céu e da floresta junto com as
flores sempre me inspiram.
Stefan desembrulhou os recipientes de comida e entregou a ela.
— Isso soa bem para mim.
Assegurou-se de que Judith esquecesse tudo sobre o momento desconfortável em pé em
seu corredor em frente à porta trancada. Ele conseguiu que ela risse, beijou-a completamente
mais e mais e falou sobre a criação de caleidoscópios, um assunto o qual não precisou fingir
interesse. A tarde se foi e quando ela olhou para o relógio, ele pegou a deixa e se levantou para
sair.

*****

Atenção aos detalhes, atenção meticulosa aos detalhes era a fórmula secreta, que manteve
os homens como Stefan Prakenskii... Vivo. Ele observou cada detalhe ao seu redor em todos os
momentos. Placas, marcas e modelos de carros, animais e trilhas, se as cortinas estavam para cima
ou para baixo, o menor detalhe era significativo e podia salvar sua vida. Ele aprendeu essas coisas
em uma escola difícil, onde deixar um pequeno parafuso solto o fazia receber espancamentos que
o deixavam rastejando pelo chão ou na neve gelada até que já não pudesse sentir seu corpo.
Aqueles anos de treinamento duro, o ensinaram a cumprir a sua missão sem se importar
com as dificuldades para continuar, mesmo quando o seu corpo e cérebro protestavam e apenas a
sua vontade o dirigia. Judith Henderson tornou-se sua missão. Ele não iria falhar em seu objetivo.
Ele fortificaria sua reivindicação e nada, (nem ninguém) iria impedi-lo. Stefan conhecia apenas
uma maneira de jogar este jogo que era vida ou morte. Para ele, Judith era a vida e tudo o mais
era a morte.
Stefan passou com seu carro pelos portões da fazenda com os pássaros o seguindo cada
passo do caminho. Os portões duplos abriram automaticamente e se fecharam atrás dele. Ele
dirigia em direção à estrada rodeada pela floresta, até que chegou a várias curvas e sabia que se
alguém da fazenda estivesse observando, que seu carro estava longe da vista e do som. Ele saiu da
estrada indo para a floresta densa e estacionou no abrigo das árvores. Precisou de apenas alguns
minutos para trocar de roupa, sapatos e, em seguida, pegar várias armas e ferramentas. Ele tinha
duas visitas para fazer naquela noite. A primeira era verificar o que havia naquela sala trancada na
casa de Judith e a segunda ao seu irmão. Nesse meio tempo, ele ia dormir. Ele havia aprendido a
dormir em qualquer lugar, a qualquer momento, mesmo que por alguns curtos minutos.

CAPÍTULO 10

Um som único acordou Stefan. Seus olhos se abriram quando seus sentidos o alertaram e
sua mão se deslizou para encontrar a sensação familiar de sua Glock. Em torno dele, a floresta
estava escura. Lá em cima, as nuvens se misturavam, criando uma série de ondulantes colinas
escuras no céu. Morcegos reinavam supremos, voando aqui e ali atrás dos insetos. Alguma coisa
pesada roçou ao longo dos ramos apenas uma vez à sua esquerda. Ele havia desmontado o
sistema de luz interior do carro no momento em que o comprou, pagando em dinheiro, como
sempre. Ele escorregou para fora do veículo, não fechando completamente a porta, caindo ao
chão enquanto colocava o silenciador em sua arma.
Stefan moveu-se facilmente sobre o terreno irregular, testando cada passo com a planta do
seu pé primeiro em busca de galhos recém-cortados e ramos. O chão da floresta estava coberto de
agulhas de pinheiro, folhas e outro tipo de vegetação, seus pés afundavam nos detritos.
Permanecendo agachado, ele se virou para a direita em círculos, tentando manter-se a favor do
vento entre a espessura das árvores.
Uma coruja piou e outra respondeu. A ressonância foi diminuta. Stefan enfiou a arma de
volta no coldre e tateou sua faca.
Eu sei que você está aqui em algum lugar me caçando.
A voz de seu irmão encheu sua mente. Inteligente. Ele não deu sua localização a ele. Stefan
permaneceu em silêncio. Só tinha visto Lev uma vez desde que foram separados quando eram
crianças. Ele não sabia que tipo de homem seu irmão havia se tornado. Por sua parte, Stefan teve
que se agarrar a alguma coisa para manter-se humano: sua lealdade para com os seus irmãos
ausentes. Ele não tinha ideia se eles mantinham o mesmo código que ele. Antes de encontrar
Judith, Stefan teria ido ao inferno e voltado por seu irmão, mas agora, ele estava com raiva que
Lev tenha realmente ido tão longe a ponto de se casar com a irmã querida de Judith para proteger
o seu disfarce. Isso era rigorosamente proibido. Contra o seu código. Tinha de haver uma linha que
impedisse isso, traçada em algum lugar.
Você foi enviado para me encontrar? Para me matar?
Stefan raramente perdia a paciência. Homens como ele não perdiam a paciência, eles
tinham que manter as malditas emoções firmemente em segredo. Reagir com raiva, (ou com
qualquer emoção), era geralmente era uma sentença de morte em sua linha de trabalho. Mas ele
sentiu como se um vulcão estourasse dentro dele, o magma quente brotando inesperadamente,
agitando seu intestino.
Pequeno vira-lata ingrato. Você é quem esta me caçando nesta floresta. Estou arriscando
tudo por você e este é o agradecimento que recebo. Venha adiante, então, irmãozinho.
O silêncio pairou sobre a floresta novamente. Stefan não sabia se Lev estava se aproximando
ou se estava pensando sobre as coisas que ele falou. Ocorreu-lhe que o seu irmão mais novo não
era mais uma criança. Ele era igual de letal, tinha o mesmo treinamento em seu currículo, anos de
sofrimento e dor que os havia transformado em máquinas de matar perigosas.
As escolas onde foram treinados funcionavam como escolas militares, com desafios físicos,
mentais e sofrimento, eventualmente tendo que trabalhar em todo tipo de terreno possível.
Treinamento com armas era tão importante quanto à aprendizagem de línguas e ser capaz de se
passar por um nativo em um país que não era o seu. Lev tinha sido forçado a submergir sob a
água, jogado em mares agitados e vivido em cavernas de neve, assim como Stefan tinha. Os
castigos físicos provavelmente foram semelhantes. O fato de que ele havia sobrevivido significava
que seu irmão tinha a mesma força mental que Stefan. Aqueles que não tinham vontade absoluta
e uma raia pesada de determinação resistente, não sobreviviam aos campos de treinamento.
Eu sabia que você viria até minha casa, Stefan, só que minha esposa não é como as outras.
Eu não posso permitir nem sequer que você a veja.
Isso era definitivamente tranquilizador. Stefan poderia aceitar a palavra de Lev pelo seu
valor? O engano era uma arma, assim como qualquer outra.
Não se casa com uma cobertura.
Novamente o silêncio se uniu a sua repreensão. Stefan se movia cauteloso para frente. A
brisa passava pelas as árvores, os galhos balançavam suavemente e algumas folhas flutuavam. Ele
congelou quando percebeu a agitação de um pássaro pousado nos ramos acima de sua cabeça.
Eu casei com minha esposa porque a amo. Ela é o meu mundo. Eu não vou deixar que nada,
nem ninguém, a leve para longe de mim.
Sua resposta fez com que Stefan se paralisasse. Ele não tinha considerado, nem por um
momento, que Lev poderia ter se apaixonado pela mulher. Stefan sabia com absoluta certeza que
não havia outra mulher para ele além de Judith. Ele tinha estado por volta do mundo, sabia que
era um homem cínico e esgotado. Ele certamente não acreditava em contos de fadas ou em amor
à primeira vista. E apesar disso, seus sentimentos por ela haviam crescido ao longo do tempo sem
que ele ao menos percebesse. Havia algo em suas fotografias que o atraíra para ela, e, em seguida,
suas pinturas tinham revelado muito sobre ela.
Ele havia estudado o arquivo sobre sua infância, a forma como ela era talentosa nas artes e
com as cores, a forma como havia se aplicado nos estudos, à sua maneira, ela era bem parecida
com ele. Ele abraçou a pequena sombra da escuridão nela. Ela ainda não havia aprendido a
controlar o seu talento e, portanto, considerava suas emoções mais sombrias como pontos fracos,
ao invés de pontos fortes, mas ela aprenderia, uma vez que superasse o medo. E eram essas
emoções sombrias que permitiriam que ela o amasse completamente.
Fisicamente, ele estava muito atraído por sua aparência exótica, sua boca e cabelo. Ele
amava sua herança japonesa e a forma como se movia tão graciosamente. Ele foi atraído para a
sua paixão e fogo, combinando essas características com a sua própria. Era possível que Lev
estivesse dizendo a verdade. Fazia sentido, especialmente se sua esposa era um elemento, como
Stefan suspeitava. Eles seriam igualmente atraídos. Seus dons psíquicos seriam ímãs, sempre
puxando um para o outro.
Um farfalhar suave o fez rolar para a direita, permanecendo na profunda vegetação, o seu
olhar varreu a floresta circundante. Lev estava perto. Sentia-o perto, uma onda sutil de energia se
espalhou ao redor dele, abrangendo a coruja na árvore, ele provavelmente estava usando a visão
da coruja para localizar Stefan. Embora a capacidade de ver através dos olhos do pássaro seria
uma vantagem, o fato de que Stefan sabia que irmão poderia fazer tal coisa o ajudava. Não havia
maneira de usar esse tipo de dom psíquico sem uma mudança de energia e Stefan era muito hábil
para não senti-lo.
O vento mudou novamente e um trovão retumbou. A névoa rastejava por entre as árvores,
caudas fantasmagóricas de vapor saindo do mar turvo. O som das ondas batendo contra os
rochedos incessantemente, uma parte da vida no litoral, dando certo ritmo para os sons da terra.
Stefan se esforçou para ouvir o menor de sons. A névoa se ramificou como uma grande mão,
atingindo com os dedos em direção a ele. Pelo canto do olho, ele pegou uma sombra indo na
direção dele e saltou para recebê-la com sua faca na palma da mão.
Os dois corpos duros caíram juntos no chão e rolaram. Stefan havia agarrado o pulso de Lev
em seu punho, controlando a sua faca, enquanto Lev controlava a dele. Agulhas de pinheiro,
galhos e folhas se prenderam em suas roupas e cabelos enquanto rolavam. O grosso tronco de
uma árvore bateu em Stefan com força. Os dois irmãos se detiveram abruptamente, olhando-se
mutuamente.
Eles permaneceram juntos e decidindo sobre a vida ou a morte, sem ceder, sem dar nenhum
centímetro de espaço um para o outro.
— Eu casei com ela porque a amo, — Lev reiterou. — E eu não gosto de saber que você está
usando Judith, mesmo que você tenha vindo aqui para me encontrar. Judith faz parte da minha
família e está sob minha proteção. Isso a deixa fora dos seus fora dos seus limites.
— Diabos. Você não sabe sobre o que está falando. Ivanov está na cidade.
— O inferno que está.
Lev não hesitou e seu aperto continuou forte como nunca.
— Eu o persegui sobre os telhados de Sea Haven, conseguiu dar-lhe uns poucos bons golpes.
Ele está ferido, mas conseguiu se safar do maldito telhado e fugiu.
— Eu deveria saber que ele voltaria.
— Eu acho que ele estava pensando em matar nós dois, uma vez que eu te tirasse do seu
esconderijo. Ele arranjou para me enviar para cá como isca.
Lev abruptamente saiu de cima dele, sentando-se com a faca ainda na mão.
— Maldito. Por que Sorbacov ia querer você morto? Ele é o único que poderia emitir um
contrato para Ivanov. Ninguém se atreve a passar por cima de sua cabeça.
— Um repórter fuçou alguns registros do passado e descobriu sobre os orfanatos e as
escolas. Ele interceptou um trecho de um documento contendo material confidencial sobre a
formação das crianças para operações militares, espionagem e assassinato. O trecho estava
detalhado o suficiente para fazer com que todos os repórteres de qualquer país, cavassem fundo
por mais alguma coisa. Eu acho que Sorbacov quer nos expurgar para se livrar de qualquer coisa
que possa ser uma ameaça para ele. Este foi um experimento criado por seu pai e agora eles
estão, politicamente, pisando em areia movediça com isso. Se o programa envolver o governo
atual, a fortuna e o poder que a família Sorbacov acumulou, desaparecerá e com ela, todos os
vestígios deles.
— Sorbacov massacrou muitas famílias e tudo porque eles eram seus inimigos políticos.
— O governo permitiu seus experimentos, pois aqueles que sobreviveram, mostraram-se
tremendamente valiosos e importantes para aquilo que eles precisavam naquele momento.
Lev descansou a mão sobre sua coxa com a lâmina ainda visível.
— Se nossa formação for descoberta, deixamos de ser valiosos e nos tornamos um
problema.
— Exatamente. Não é preciso ser um cientista para descobrir isso, Sorbacov me enviou para
Sea Haven para cumprir uma tarefa estúpida quando na verdade, está me usando como isca para
ver se você sai do seu esconderijo, — disse Stefan. — E se Ivanov te matar, não tem outra escolha
a não ser me matar também.
— Então vamos caçá-lo juntos.
Stefan sentou-se, deslocando para se assegurar que a árvore não iria bloquear qualquer
necessidade súbita de se mover rapidamente. Ele puxou as pernas para cima, a faca deslizando na
bainha presa a sua panturrilha, mas o punho permaneceu enrolado sobre sua mão.
— Eu pensei sobre isso, Lev...
— Levi. Você tem que pensar em mim como Levi. Eu sou Levi Hammond. Sou um
mergulhador com uma mulher que amo e um lar pelo qual vou lutar até a morte. Eu sou Levi
Hammond.
— Você está falando sério.
— É melhor você acreditar nisso. Rikki me deu minha vida de volta. Com ela voltei a sentir
emoções. Estou até começando a estender esses sentimentos a sua família. Eu nunca mais vou
voltar Stefan, e vou protegê-la e à nossa casa com todos os recursos que eu tiver disponível.
— Todas as mulheres que vivem na fazenda são elementos? Cada uma delas?
Lev balançou a cabeça lentamente, como se estivesse um pouco hesitante em admitir a
verdade.
— Todas, exceto uma. Blythe tem poder, mas ainda não descobri exatamente qual é. O resto
delas está vinculado aos elementos. Rikki é um elemento poderoso de água. Ela salvou minha vida
quando o iate que eu estava trabalhando afundou. Eu recebi uma pancada forte em minha cabeça
e ainda tenho problemas para lembrar tudo sobre o meu passado. As cenas têm chegado a mim
aos poucos e em pedaços. Eu não estou muito orgulhoso do que eu era, mas ela me faz sentir
como alguém que valha a pena. Estou feliz aqui, Stefan. Eu encontrei a paz. Eu quero mantê-la
dessa maneira. Ivanov tem que sumir.
— Deixe-me caçá-lo. Você fica oculto. Se alguém estiver observando como vão as coisas,
você ainda estará seguro.
Lev balançou a cabeça.
— Você sabe que eu nunca deixaria você fazer isso. É minha luta também. E nós dois
sabemos que ele não tem problema em usar as mulheres para chegar até nós. Ele mataria
qualquer uma ou todas elas, sem pensar duas vezes.
Stefan suspirou. Não havia sentido discutir com Lev. Se ele estava casado e tinha uma casa,
ele não esperaria que outra pessoa, até mesmo seu irmão, fosse tirá-lo de qualquer problema. Lev
não era esse tipo de homem e secretamente, Stefan estava orgulhoso desse fato.
— Você precisa de cães.
Agora foi a vez de Lev de suspirar. Ele enfiou a faca na bainha dentro de sua bota.
— Eu estou com Rikki há apenas algumas semanas. Nós nos casamos muito rápido e, sim, eu
sei o que estou fazendo. Ela amplia sua zona de conforto para mim o tempo todo, mas eu gosto de
apresentar as coisas para ela lentamente. Airiana, uma de suas irmãs, também quer os cães, então
eu estou tentando empurrar a ideia de que Airiana consiga um casal de pastores ou mastins para
que Rikki e eu possamos ter um também.
— Judith me disse que a irmã mais nova, Lexi, quer um cão.
Lev xingou baixinho.
— Judith não deveria estar dizendo nada sobre suas irmãs.
— Foda-se, Levi, você não é o único que pode encontrar alguém. Judith não traiu os
segredos de ninguém, — Stefan disparou. — E não tente interferir nisso.
— Você não vai usá-la, Stefan. — Lev não recuou nem por um momento. — Se ela é da
família de Rikki, ela é minha família também. E isso significa que ela está fora do seu alcance. Vá
encontrar outra mulher para cimentar o seu disfarce. Eu já ouvi tudo sobre Thomas Vincent, o
grande empresário de Nova York. Eu admito que sua cobertura é sólida, até mesmo
impressionante, mas você não pode usar Judith, nem mesmo para manter Ivanov longe de mim.
— O que te faz pensar que eu estou usando-a?
— Claro que está. Diga-me que você não veio aqui e a escolheu como alvo para ajudar com
sua cobertura e eu vou saber se você está mentindo.
— Besteira. Você não saberia de jeito nenhum. Eu posso enganar a qualquer um, até mesmo
você. Claro que eu vim aqui encoberto, e como regra, iria desenvolver um relacionamento com
uma mulher para ajudar a cimentar a minha cobertura, mas Judith não é isso para mim.
— O que ela é então?
— Tudo. Vida. Para mim, ela é o que a sua Rikki é para você.
Choque se registrou no rosto de Lev. Seu olhar azul examinou o rosto de Stefan de forma
deliberada. Lenta e cuidadosamente.
— Você está me dizendo que se apaixonou por Judith?
Stefan estremeceu. Colocado dessa forma, ele não sabia muito bem como responder a seu
irmão. Ele não sabia o que era amor. Ele só sabia que tinha que estar com ela. Seu corpo, sua
mente, cada parte de seu corpo sabia que ela pertencia a ele. Ele era um homem que usava o sexo
como uma arma e conseguia deliberadamente o que queria. Ele era bom nisso, realmente bom,
mas não havia sido assim com Judith. Seu corpo havia reagido por vontade própria, misturando-se
com suas emoções, até que não havia mais ninguém, exceto Judith. Seria isso o amor?
— Eu não sei como chamar isso, Levi. — Deliberadamente ele usou a nova identidade de seu
irmão. — Eu só sei que ela é a pessoa que me faria seguir em frente. Pela primeira vez na minha
vida eu quero ficar em algum lugar. Ser alguém. Isso é amor?
Lev sorriu pela primeira vez.
— Eu diria que você está seguindo pelo seu caminho. Eu lutaria com tudo em mim para
manter Rikki. Ela é feroz, Stefan, não tem medo. Ela enfrenta o mundo de frente. Eu estou tão
louco por ela que não consigo ver nada nem ninguém mais.
Stefan sentiu suas entranhas se acalmarem um pouco mais. Lev não podia fingir essa nota
em sua voz. Havia certas coisas pequenas que traiam alguém quando mentia... Ou dizia a verdade.
A luz em seus olhos, a expressão em seu rosto e aquela nota reverente e chocada em sua voz seria
impossível de falsificar. Seu irmão estava totalmente comprometido com sua mulher.
— Você está pendurado em volta de seu dedo mínimo16?
— Provavelmente. Sim. Não tenho nenhuma dúvida sobre isso. Eu caí duro por ela.
— Eu não vou embora, Levi. Eu vou ficar aqui e fazer Judith minha. E nós ficaremos muito
bem em ter alguns cães e preparar este lugar para a guerra.
As sobrancelhas de Lev dispararam.
— Guerra?
— Quando matarmos Ivanov, Sorbacov enviará outros atrás de nós.
— Ilya vive aqui, — Lev informou ao seu irmão. — Eu duvido que ele esteja em perigo,
embora tenha vindo da escola original, mas foi treinado também para outras coisas. Ele trabalhou
para a Interpol e aposentou-se legitimamente de seu trabalho. Nós vamos ter que enviar uma
mensagem aos outros. — Você viu mais algum deles?
— Só Gavriil. Eu o ajudei a fugir do hospital. Ele passou à clandestinidade. Ele estava muito
ferido, Lev.
— Podemos fazer chegar uma mensagem a ele para vir aqui se pudermos proteger este lugar
e fazer dele nosso esconderijo. Com três de nós aqui, será difícil para qualquer um vir contra nós.
— Você sabe que isso soa como um sonho, — Stefan disse com um suspiro suave. —
Homens como nós não têm casas ou nossas próprias mulheres.
16
Termo muito usado nos livros em inglês que significa que “a mulher tem o homem sob o seu comando. Que ele está disposto a
atender todos os seus desejos, tudo o que ela queira”.
— Eu tenho uma mulher e uma casa e ninguém, incluindo Sorbacov, (principalmente
Sorbacov), vai tirar isso de mim, — disse Lev.
— A única coisa que Sorbacov não está pensando, e não faz sentido, é o fato de que nenhum
de nós vai querer que esses documentos venham à tona, — disse Stefan. — Todos nós nos
tornaríamos alvos. Ninguém teria chance de ter uma vida. Nossas coberturas seriam destruídas,
nossas fotos distribuídas em todos os países nos impedindo de nos mover ao redor, nós
estaríamos sendo caçados por todos.
— Ele nunca quis que nenhum de nós tivesse uma vida, — Lev apontou. — Nós não éramos
humanos para ele. Éramos ferramentas que ele moldava em máquinas de matar. Nenhum de nós
tinha uma chance. As maiorias das crianças que começaram nessas escolas nunca terminaram
todo o caminho, não suportavam o treinamento. Ele os matava quando não conseguiam executar
a cabo sua ordem.
— No entanto, se ele estivesse pensando, teria utilizado suas armas e ido embora após saber
que todos nós estaríamos ameaçados, o que acabaria beneficiando a ele. Agora ele tem que
esperar que seus exterminadores acabem com todos nós antes que um de nós chegue até ele.
— Como eles conseguiram que você viesse parar aqui, Stefan?
Stefan sabia que a pergunta obrigatoriamente seria feita e ele ainda não tinha organizado a
sua mente a confiar em seu irmão completamente. A desconfiança era um modo de vida, uma
maneira de permanecer vivo. Ele estava realmente querendo fazer daquele lugar um lar, então,
ele precisava ser honesto com ambos, com Judith e seu irmão. Mas ainda havia a questão do
microchip. Ele era leal ao seu país. Ele podia não querer morar lá, uma vez que passou muito
pouco tempo lá e não tinha nenhum laço afetivo, mas ele amava seu país. Se a informação sobre
esse microchip era crucial para o sistema de defesa do seu país, então ele tinha que ter certeza de
que o devolveria às mãos de pessoas responsáveis.
Lev praguejou e se levantou rapidamente.
— Eu sabia que você estava cheio de merda.
Stefan se levantou igualmente rápido.
— Não é tão fácil para mim quanto foi para você, Levi. Você está morto. Eles podem
suspeitar que você ainda esteja vivo, mas não sabem ao certo. Eu tenho trabalhado para recuperar
um material sensível e muito importante nos últimos cinco anos, encontrando beco sem saída
após beco sem saída. E agora estou muito perto. — Ele falou sacudindo as mãos. — Eu ainda sou
um patriota mesmo que não seja mais útil ao nosso país. Gavriil me pediu que assegurasse que o
microchip roubado de Theodotus Solovyov fosse devolvido. Eu dei minha palavra a ele e mesmo
que não tivesse dado me asseguraria de que Rússia esteja segura.
— Judith está envolvida de alguma forma? Como rastrear um microchip o enviaria para Sea
Haven? Isso parece uma grande coincidência.
— O que você sabe sobre o passado de Judith?
A cara de Lev fechou imediatamente.
— As irmãs raramente falam uma das outras. Elas guardam seus passados com cuidado e eu
nunca espionei. Eu não quero ninguém fazendo perguntas sobre mim e eu retribuo com o mesmo
respeito. Aqui, aceitamos uns aos outros como somos.
— Eu entendo Levi, mas se você quer saber por que eu estou aqui, então você vai ter que
aceitar que o passado de Judith está misturado a tudo isso.
— Você está me dizendo à verdade? Judith Henderson é de alguma forma uma pessoa
implicada ao desaparecimento do chip que nosso irmão estava guardando?
— Essa é a verdade, — disse Stefan e esperou que seu irmão tomasse a sua decisão. Ele
podia ver por que Lev não acreditaria nele. Era absurdo pensar que uma mulher como Judith
poderia está envolvida em uma intriga internacional.
— Deixe-me ver se entendi. Nosso irmão, Gavriil, foi designado para proteger Theodotus
Solovyov e eles foram emboscados.
Stefan assentiu e continuou.
— A esposa de Solovyov o traiu. Ela estava tendo um caso e costurou o microchip no casaco
do marido. Ninguém mais sabia. Gavriil foi esfaqueado sete ou oito vezes, mas ele continuou
atirando, mantendo-os longe de Solovyov. Os agressores deixaram suas malas e foram pelo
casaco. Eles sabiam exatamente o que procurar.
— Suponho que você localizou a mulher, — a voz Lev era sombria.
— Condenadamente certo. Gavriil foi levado para um hospital sabendo que alguém teria
dado ordens de acabar com ele. Nós saímos pela janela. Eu conhecia um médico, um cirurgião que
me devia e que cuidou para que ele vivesse o tempo suficiente para que eu pudesse levá-lo dali.
Nosso irmão mais velho é duro como pregos. E então, eu rastreei a esposa e seu amante e tive
uma pequena conversa com eles. Não foi difícil obter a informação que eu precisava. Isso me
levou a França, mais precisamente, Paris.
Lev fechou os olhos por alguns instantes e falou:
— Judith foi uma estudante de arte em Paris há alguns anos atrás. Lembro-me de Rikki me
dizendo que ela havia estado na França, estudando.
— Ela conheceu o homem errado. A trilha levou em direção a Jean-Claude La Roux, que
neste momento está sentado em uma cela na prisão cercado por fotografias de Judith. São fotos
de seus últimos cinco anos. Ele a esteve vigiando durante todo esse tempo. Eu sei, porque
compartilhei com ele esta cela, tentando obter informações. Ele foi preso por trafico de armas,
mas seus crimes superam isso. Ele é impiedoso e cruel e até mesmo da prisão, mantém sua rede
em movimento.
— Você acha que ele tem o microchip. — Lev declarou.
— Eu o segui até ele. Ele o tinha em sua posse antes de ser preso pelos franceses. Eles
conseguiram chegar nele antes de mim. Se ele tivesse vendido as informações por um maior lance,
eu teria tido conhecimento. Certamente alguns dos documentos teriam aparecido em algum lugar.
E alguém já teria feito alguma ameaça. Havia muitas informações importantes naquele microchip.
Theodotus Solovyov estava transportando o chip para uma reunião. Ele é um homem brilhante, e
neste chip contém uma única cópia de seu último trabalho.
Lev coçou o queixo.
— É possível que também contenha documentos relativos às escolas de treinamento onde
fomos formados? O repórter que publicou algo sobre isso, quem era ele?
— Foi uma publicação feita na França, e o homem é um jornalista respeitado. Estamos
certos de que ele obteve alguma informação de La Roux e como isso foi muito recente, La Roux
deve estar planejando seu seguinte movimento sobre o microchip. Ele não confiou em ninguém
para tentar recuperá-lo e agir para ele, então ele tem que estar planejando recuperar por ele
mesmo.
— Será que ele tem algum plano para fugir da prisão?
— Estamos ajudando. O plano era pegá-lo para interrogá-lo. Foi dessa forma que soube que
alguém muito poderoso tinha estabelecido estes contratos sobre nós. Estive com La Roux por dois
meses. Eu o conheço melhor do que ninguém e poderia o tê-lo quebrado rapidamente e extraído
as informações que precisávamos, mas ao invés disso, fui enviado para cá, caso houvesse uma
remota possibilidade dele escapar dos nossos homens. Eles sabem que Judith foi sua namorada.
Então, basicamente estou aqui para tomar conta dela.
O rosto de Lev perdeu toda a expressão, mas Stefan ignorou as suspeitas de seu irmão. Ele já
havia dito a verdade e poderia muito bem terminar o que havia começado.
— Eu sabia que eles não iriam me enviar para cá para fazer um simples trabalho de babá, e
claro, todos sabiam que o iate o qual você estava trabalhando disfarçado, se afundou nesta costa
e você foi dado como morto. Se eu não acreditei nisso, tenho certeza que Ivanov também não
acreditou. Estou aqui há algumas semanas reconhecendo a área, mas Thomas Vincent chegou
oficialmente na cidade ontem. E Ivanov estava me observando.
— Então, você foi atrás dele.
— Eu sabia que ele estava me usando para te encontrar. Acho que o exterminador tem
permissão para matar você, mas quando eu relatei ao meu treinador sua perseguição, ele agiu
como se Ivanov estivesse sendo um canalha e me deu luz verde para matá-lo. Se ele realmente
está sendo um canalha e eles perderam o controle dele, eles teriam dado esta ordem para todos.
— E porque eles te enviaram para cá como isca, você está certo de que Ivanov vai tentar
matar você também, — Lev ponderou. — O quão ruim você conseguiu machucá-lo?
Stefan deu de ombros.
— Eu o feri o suficiente para que corresse quando poderia ter tido alguma vantagem. Acho
que tem algumas costelas quebradas, pois estava tendo dificuldade para respirar e eu o cortei um
pouco, ele está como um urso ferido neste momento. Mas não se esqueça, ele foi treinado na
mesma escola que nós. Ele foi a Sibéria comigo. Ele era apenas alguns anos mais velho e já possuía
um gosto para matar. Havia muito gelo, uma nevasca pesada e neve com ventos fortes. As
crianças caíam em todos os lugares, o frio as matava antes que tivéssemos chance de construir
qualquer tipo de abrigo. Ivanov se curvava na direção deles para vê-los morrer. Ele gostava de ver
a luz se apagar em seus olhos.
Ele nunca havia falado sobre esse inferno particular, o frio cortante, vicioso, o gelo ardente
que rasgava a respiração do corpo e tirava a vidas das crianças congeladas e aterrorizadas. Ele
estava seguro que Ivanov havia coberto as bocas e narizes de vários no chão, matando-os, ao invés
de tentar salvá-los como a maioria dos outros fizeram.
— Ele foi enviado para a escola onde fui admitido quando eu era adolescente, — Lev
admitiu. — E ele já era um filho da puta naquela época. Uma criança morreu em uma noite difícil e
todos nós soubemos que ele o havia matado. Ele foi tirado de lá uma semana depois, mas era
óbvio que estava protegido por alguém em algum posto mais alto. Inclusive os treinadores
evitavam um confronto direto com ele.
— Não o subestime, Levi. Vou caçá-lo porque ele nunca vai parar, mas quando ele estiver
morto, tenho certeza de que Sorbacov, que o enviou, vai mandar outro, porque ele sempre nos
considerará uma ameaça para ele.
— Eu vou lidar com o que vier para nós. O xerife local, Jonas Harrington, conhece todo
mundo na cidade. Ele é um homem astuto, com alguns dons próprios, dessa forma, ande com
cuidado à sua volta. Ele me reconheceu imediatamente, mas você puxou a nossa mãe, seus olhos
e cabelo, então duvido que ele o reconheça. Ele conheceu Ivanov e se eu disser para ele que o
exterminador está de volta à cidade para fazer algum trabalho sujo, ele vai encontrá-lo
rapidamente.
— Nenhum xerife local pode lidar com um homem como Ivanov e você sabe disso, Levi.
— Não, mas ele tem conexões que não temos. Deixemos que ele faça uma busca.
— É arriscado, — disse Stefan. — Deixe somente que ele saiba de antemão que Ivanov é um
assassino descontrolado. Vou continuar com minha caça até conseguir executá-lo. Nesse meio
tempo, eu não posso dizer a Judith quem eu sou ou o que estou fazendo aqui até que La Roux
esteja sob custódia russa e eu consiga devolver o microchip com segurança para Theodotus
Solovyov.
— Poderíamos querer saber o que contem neste chip, Stefan.
Stefan fez uma careta para seu irmão mais novo.
— Isso é traição.
— É autopreservação, — Lev protestou. — Solovyov havia pedido uma lista com os nomes
dos agentes destas escolas por alguma razão, para nos usar como guarda-costas ou para qualquer
outra coisa, e Sorbacov ofereceu estas informações para ele. Theodotus Solovyov possuiu uma
classificação de segurança mais alta possível e Sorbacov não tinha escolha. Nós dois sabemos
como se joga com a política.
— E de alguma forma estas informações terminaram nas mãos de La Roux, que imaginou
chantagear Sorbacov. La Roux tem muitos contatos na Rússia para planejar e realizar um ataque
contra Solovyov, ele não teria problemas ao chantagear Sorbacov, — Stefan acrescentou. —
Sorbacov quer matá-lo e provavelmente pensa que pode tirá-lo da prisão e arrastá-lo para outra
com a acusação de contrabando de armas, mas La Roux tem influência demais.
— Então você acha La Roux publicou um trecho, alguma coisa pequena que tinha conseguido
ler antes de ser preso, para avisar à Sorbacov que recuasse.
Stefan assentiu.
— Isso é exatamente o que eu penso. É por isso que Sorbacov está tentando chegar a La
Roux. Ele tentou fazer com que ele fosse transferido para a Rússia, mas a França não permitiu. Ele
tem medo de matar La Roux, pura e simplesmente porque não sabe onde esta o microchip e dessa
forma, se ele pode aparecer mais tarde. Então, ele me enviou para ver se eu poderia averiguar
quem poderia estar guardando este chip para La Roux.
— De jeito nenhum Judith está fazendo isso para ele. — Lev negou com a cabeça. — Eu
garanto a você, Stefan, eu conheço essa mulher. Eu só estive aqui por algumas semanas, mas
essas mulheres são muito unidas, elas compartilham um vínculo tão forte como um laço de
sangue. Judith nunca estaria envolvida em contrabando de armas ou em vender segredos para
países.
— Eu concordo. Mas Jean-Claude La Roux é muito, muito obcecado por ela.
— Parece que você também, — Lev disse secamente com uma pitada de humor em seus
olhos.
Stefan virou seus frios olhos azuis sobre ele.
— Nunca pense por um minuto que o que eu sinto por Judith tem algo a ver com o que
aquele bastardo sente por ela.
A sobrancelha de Lev se levantou.
— Você está realmente sentindo algo sério por ela.
— Eu disse que estava. Vou caçar Ivanov e você ficará aqui para proteger esta fazenda. Se eu
puder remover a ameaça para você, isso nos dará tempo para nos preparar para o próximo.
— Você sabe que eu não posso deixar você fazer isso sozinho, Stefan. Vamos caçá-lo juntos.
— E sua esposa? O que você está pensando em dizer a ela?
— Eu digo a verdade para Rikki, sempre. Não me lembro de tudo sobre o meu passado, mas
quando me lembro de qualquer coisa, digo a ela. Este é um acordo que temos e, mesmo sobre
isso, não vou mentir para ela. Ela lidou com Ivanov antes e o fez isso muito bem.
Stefan hesitou.
— Eu não posso dizer a Judith que sou seu irmão até que o trabalho sobre o microchip esteja
concluído, o que significa que ainda tenho que andar em uma linha fina de mentiras. Quando
estou com ela, dou-lhe tudo o que é real em mim, mas ela me conhece como Thomas Vincent, um
americano. Eu não quero colocá-lo em uma posição a qual tenha que mentir para sua mulher ou
para Judith, mas eu não posso fazer nada até que tenha certeza de que estes planos de defesa não
vão cair nas mãos erradas.
Ele não sabia se estava pedindo ou exigindo, mas sabia que estava colocando Lev em uma
posição insustentável. Se Judith pertencesse totalmente a ele, não iria querer mentir para ela
sobre o seu passado ou sobre qualquer perigo que os rodeasse. Tinha que haver confiança, um
vínculo entre um homem e uma mulher era sagrado, senão, de que valeria a relação?
Lev negou com a cabeça.
— Eu não posso mentir para Rikki. Eu posso dizer a ela que algo do meu passado veio à tona
e se ela se importaria de esperar alguns dias antes que eu possa discutir isso com ela. Mas preciso
dizer a ela que Ivanov está na cidade. Ele pode confrontá-la novamente e eu preciso que ela esteja
preparada.
A nota de proteção na voz de seu irmão convenceu Stefan de uma vez por todas que Lev
amava sua esposa e que ter se casado com ela não foi parte de um elaborado disfarce. Ninguém
poderia ser tão bom ator. O fato de que Lev arriscaria pedir que ela esperasse para ouvir as
informações pertinentes as suas vidas, falou alto. Stefan desejava esse tipo de relacionamento
aberto com Judith. Ele nunca compartilhou qualquer aspecto de sua vida com ninguém desde que
seus pais tinham sido assassinados. Suas revelações a Lev eram a coisa mais próxima que ele tinha
conseguido até agora. Qual seria a sensação... De confiar em alguém o suficiente para colocar sua
vida em suas mãos?
Stefan suspirou.
— Você deve fazer o que acha ser o certo Lev, mas eu não tenho escolha, até saber que o
microchip está seguro. E não vá atrás de Ivanov sem mim. Você não tem ideia o quão perigoso ele
é. Você pode ter tido um breve encontro com ele uma vez, mas eu cresci na mesma escola que
ele. Ele não gostava de ninguém levando a melhor sobre ele. Todo mundo aprendeu muito
rapidamente a lhe permitir ser o número um em todas as coisas, ou isso ou eles não acordariam
na manhã seguinte. Ele matou pelo menos cinco crianças, que eu saiba, e os instrutores sabiam
sobre isso também. Eles tinham câmeras tomando conta de nós vinte e quatro horas por dia.
— Ele definitivamente assassinou um menino da nossa escola. Todos nós sabíamos disso. E
não foi em um exercício de treinamento. O menino estava em sua cama.
— Se alguém o derrotou em uma situação de combate, ou ficou debaixo d'água por mais
tempo que ele, aprendeu mais rápido, qualquer coisa, podia fazê-lo perder a razão.
— Você alguma vez o deixou ganhar?
— Meu alojamento era ocupado por um grupo de meninos muito fortes. Nós prestávamos
atenção em tudo e construímos sistemas de alerta. Mesmo assim, meus talentos eram fortes e eu
sempre sabia quando ele estava por perto. Vou confessar, eu zombava dele, tentei por várias
vezes que ele viesse atrás de mim para eu ter uma desculpa para matá-lo, mas ele é esperto e
nunca mordeu a isca.
— Então ele te odeia.
— Com cada respiração de seu corpo. Eu não tenho nenhuma dúvida de que ele mexeu os
pauzinhos para conseguir que eu fosse enviado para esta missão. Isso seria sua ideia de vingança.
Ele faria de mim um instrumento para a morte do meu irmão. Ele teria a certeza de que eu saberia
que você estava morto antes de me matar, — disse Stefan.
— É possível que ele realmente tenha sido desonesto e que a sua necessidade de matá-lo
finalmente o devorou ao ponto de desobedecer Sorbacov?
— Ele sempre foi um mascote do Sorbacov. — Stefan esfregou a ponta de seu nariz,
pensativo. — Infelizmente, acho que não temos escolha a não ser continuar acreditando Sorbacov
está limpando as fileiras e aprovou o golpe.
— Sorbacov nos conhece. Será que ele não enviou uma equipe?
Stefan deu de ombros.
— Talvez ele tenha enviado, mas ninguém veio à tona ainda, de qualquer forma, duvido. Ele
quer fazer isso o mais silenciosamente possível sem ninguém saber ou levantar um alarme. Ivanov
é completamente fiel à Sorbacov, não a Rússia ou a mais alguém no governo. Acho que Sorbacov é
seu único contato com a realidade. Ele não iria quebrar isso. Não, Sorbacov o enviou para nos
matar e não quer isto apareça. Inferno, cada agente se voltaria contra ele se isso visse à tona.
— Então, dando luz verde para caçar Ivanov, — Lev pensou, — Sorbacov está apostando que
seu mascote assassino, fará o seu trabalho antes que você faça o seu.
— É isso o que eu acredito. Estou esperando a noticia da fuga de La Roux da prisão. Eles
devem tirá-lo de lá qualquer dia desses e uma vez que o microchip esteja seguro, meu dever para
com eles estará acabado. E vou dizer a verdade a Judith e espero que ela entenda.
— Stefan, eu não sou mais aquele seu irmão pequeno, — disse Lev. — Não tente me
proteger.
Stefan deixou seu olhar passear por Lev. Ele havia se tornado um homem forte e lembrava
muito o seu pai. Possuía a musculatura natural da família Prakenskii e os mesmos olhos que
lembrava a Stefan, o seu pai. Lev tinha as cicatrizes inevitáveis em sua profissão e formação, mas
para Stefan, ele seria para sempre seu irmão mais novo, um irmão que ele amava e que sim,
protegeria.
Ele avançou e pela primeira vez se permitiu estar em uma posição de vulnerabilidade. Pegou
Lev pelos ombros, proporcionando um grande alvo para o seu irmão mais novo, caso estivesse
inclinado a matá-lo. Ambos sabiam que este era o momento da verdade. Lev poderia se livrar da
ameaça à sua nova família e ninguém jamais saberia, ou então poderia entrar no abraço e aceitar
Stefan de volta em sua vida.
Lev hesitou por um momento, examinando o rosto de Stefan, e, em seguida, ele agarrou os
ombros de Stefan, mostrando a mesma vulnerabilidade. Um pequeno sorriso iluminou seus olhos.
— É bom ver você.
— Você já viu Ilya? — Stefan não pode conter o entusiasmo de sua voz.
Ilya era o mais jovem dos irmãos e provavelmente, não se lembraria de nenhum deles. Sua
mãe tentou protegê-lo, lutando para mantê-lo quando os homens entraram e tiraram seu filho
mais novo de seus braços. Todos eles tentaram proteger o menino, mas ele tinha sido arrancado
deles. Stefan sempre sentiu como se tivesse decepcionado seus pais por não ter conseguido
recuperar seu irmão mais novo.
Lev negou com a cabeça.
— Ele casou há algumas semanas com uma das primas de Blythe, Joley Drake. Joley é um
grande nome na indústria da música e, aparentemente, eles não retornaram da lua de mel ainda
porque ela está fazendo uma série de concertos beneficentes no Japão e depois em prol às vítimas
do furacão aqui nos Estados Unidos.
— E ele é amigo do xerife?
Lev assentiu.
— Muito amigo, segundo eu soube.
Stefan o puxou em um breve abraço de urso e depois o deixou ir.
— A vida de casado te fez bem.
— Rikki me faz bem, — Lev corrigiu. — Ela me salvou quando estava me afogando e eu não
estou me referindo ao oceano, embora isso também.
Stefan entendeu o que seu irmão estava tentando expressar a ele. Afogando-se em sangue,
na sombra, no frio, tudo isso era tão real como se afogar em um oceano. Ele nem sabia que estava
tão longe de ser salvo até que Judith jogou-lhe uma linha para ele se segurar.
— Eu tenho outra coisa para fazer hoje à noite antes de sair, então, me faça um favor, afaste
suas sentinelas de mim, — disse Stefan. — Eu não quero que uma de suas corujas corte o meu
rosto. Thomas Vincent passaria por uma situação muito complicada se tivesse que explicar a
Judith o que aconteceu com seus olhos caso suas corujas resolvam arrancá-los.
— Eu não tenho cães, ainda, — Lev apontou. — Eu tenho que manter as mulheres seguras,
principalmente agora que Ivanov está de volta.
— Então me apresente a elas e me dê um passe livre.
Stefan desafiou, sem disposição de deixá-lo ir. Lev podia tê-lo aceitado como irmão, mas
ainda não havia estendido esta confiança para as mulheres.
Lev estudou sua expressão por um longo tempo antes de balançar a cabeça novamente.
— Eu vou dizer isso somente mais uma vez, Stefan, e espero que você entenda. Eu faria
qualquer coisa para manter Rikki e suas irmãs seguras. Qualquer coisa. Portanto não traia a minha
confiança.
Sim. Seu irmão mais novo havia crescido.

CAPÍTULO 11

Judith não estava dormindo. Stefan podia vê-la em um cômodo que ele sabia ser o seu
quarto, ela estava indo e vindo, para frente e para trás, em frente à bancada de janelas com vista
para seu jardim de flores e de estrelas. A luz atrás dela permitia ver facilmente sua imagem
através da janela. Atrás dos portões da fazenda, as mulheres se achavam a salvo de predadores,
mas lá estava ele, agachado, mais uma vez nas sombras, um fantasma vivo.
O surto de raiva que havia experimentado perante seu irmão já não o surpreendia. Ele
percebeu que Judith não só trouxe as suas emoções para a superfície em ebulição depois de
longos anos os quais ele sempre as suprimiu como também, por estar cercada pelos seus jardins e
tão perto de sua casa, cada emoção que sentia era amplificada. Judith poderia tentar conter o seu
espírito, mas seu elemento era forte demais e a energia que pulsava em torno de sua casa se
espalhava como mel quente pelos seus enormes jardins. Ele tinha um desejo selvagem de subir
até a varanda de Judith e se certificar que ela estaria cansada demais para fazer qualquer coisa
além de dormir, com o seu corpo envolvido em torno dela.
A brisa que soprava do oceano levava uma insinuação de chuva com ela, junto com os
primeiros dedos de rastejantes nevoa interior. Macias nuvens cinzentas vagavam pelo céu,
lentamente ofuscando a lua e as estrelas, como se desenhasse um véu espesso durante a noite.
Sob seus pés a terra pulsava em antecipação. Stefan sentiu uma explosão forte de energia, de
alegria, como se o chão explodisse de emoção e que depois pareceu se estabelecer em um ritmo
pulsante. Ele nunca tinha sentido tal sensação antes e afundou os dedos no solo rico para
melhorar a sua capacidade de entender o que estava acontecendo.
O ar em torno dele mudou sutilmente, a brisa se deslocou ligeiramente, o suficiente para
trazer as nuvens para a posição ao longo dos vastos campos de hortaliças e jardins deslumbrantes
de flores. O ar pulsava com energia, um único fluxo de energia que lhe disse que a brisa tinha sido
dirigida. Ele observou Judith quando ela veio para a varanda e ficou no parapeito, olhando para a
fazenda como se atraída para lá por uma mão invisível.
Ela levantou o rosto para as nuvens acima da sua cabeça, mas não se mexeu, obviamente
esperando por alguma coisa. O vento balançou seus longos cabelos e pressionou sua camiseta fina
contra os seios, de modo que o tecido embalava amorosamente suas curvas suaves. Sua saia fluía
graciosamente em torno de suas pernas longas, emprestando-lhe uma imagem mística totalmente
feminina que lhe tirou o fôlego.
A chuva começou a cair sobre o jardim de flores, suavemente, com um toque suave, quase
terno. Levou um momento para ele ouvir a música nas gotas, um claro padrão emergiu, como uma
sinfonia crescendo lentamente em direção a um clímax. Judith não estava dirigindo a chuva, quem
estava fazendo isso era uma das outras mulheres, mas ela estava definitivamente aumentando o
poder desse elemento, as mãos graciosas com as palmas para cima enquanto enfrentava a
fazenda.
A respiração de Stefan ficou presa em sua garganta. Ele estava testemunhando o poder do
trabalho combinado nos elementos. O efeito era surpreendente, fascinante e inspirador, tudo de
uma só vez. Ele estava acostumado a ocorrências psíquicas, cada membro da sua família tinha um
talento natural. Mas isso... Esta foi uma demonstração da utilização de elementos na vida
cotidiana para fins práticos.
Rikki, a mulher de seu irmão, era um elemento da água, e Stefan tinha certeza que era ela
quem liderava a chuva em várias partes da fazenda. Uma das irmãs de Judith, sem dúvida, era um
elemento ar e seu leve toque sobre o vento era magistral. A terra estava respondendo a outra
irmã, minhocas se contorciam, arejando o solo, trabalhando e prosperando na pilha de
compostos, acolhendo a chuva, respondendo ao espírito de união dos elementos juntos a partir de
algum lugar profundo. A terra levava a água nas profundezas do solo, espalhando-se como veias
correndo sob o barro rico, levando tonificante fluido para cada planta. Ele sentiu o último
elemento, o fogo, juntar-se aos outros, não como fogo, mas como uma chama brilhante
conduzindo um sonho em conjunto de uma próspera fazenda.
A chuva caía fortemente na floresta, suavemente nas hortas e ainda mais com ternura sobre
as flores, os acordes de uma guitarra chorando. Por tudo isso, o vento levou os sons de uma
sinfonia, movendo-se através das árvores e jardins com o elemento ar jogando as leves notas de
uma flauta. O tambor do elemento de fogo mantendo o ritmo para todos eles. As teclas do piano
melódico do elemento terra enquanto Judith atuava como maestro.
O coração de Stefan juntou-se ao ritmo. Se ele tentasse contar a alguém sobre esse
fenômeno único, ninguém acreditaria nele. Era a coisa mais bela e emocionante que ele já havia
testemunhado... Não, experimentado. Ele estava bem ali, atraído pelo espírito poderoso de Judith.
Stefan percebeu que o sonho combinado não era apenas sobre como usar os elementos para fazer
sua fazenda prosperar, era o caminho que todos os cinco elementos teciam um vínculo muito
forte, juntas, sustentando uma à outra, compartilhando coragem e compromisso.
Sentado calmamente e absorvendo a energia, ele sentiu algumas notas muito sutis e
masculina, entrelaçada ao elemento água e sabia que seu irmão tinha de alguma forma se fundido
com sua esposa enquanto ela chamava a água das nuvens. Outra presença feminina também
estava lá, e ele quase não a percebeu. A sexta irmã era poderosa, ele estava certo disso também,
embora não houvesse uma diferença sutil. Ela não era elemento, no entanto, parecia ser uma
parte de cada uma delas. Lev tinha dito que era difícil compreender o seu poder, e Stefan
conseguia entender por quê. Com o seu toque, o vento gemia como um violino e dançava por
entre as árvores, puxando alegremente em folhas e beijando as flores brilhantes.
Tudo ao redor, a própria natureza respondia ao ondulante poder, banhando-se nos ritmos
fortes, corujas voando nas gotas de chuva, circulando acima das copas das árvores, enquanto no
chão, raposas e veados surgiam a partir da floresta, como se atraídos para participar. Foi só então
que Stefan percebeu que ele estava absorvendo uma energia poderosa em seu próprio corpo.
Cada emoção multiplicada e reforçada. Ele podia sentir a força que atravessava seus músculos
enquanto a energia se derramava sobre ele da mesma forma que a chuva se derramava sobre a
fazenda. Rápida. Lenta. Leve. Forte. Ele absorveu todos os elementos, sentindo cada uma das
energias misturadas com os seus próprios talentos psíquicos.
Stefan flexionou cada músculo cuidadosamente antes de continuar seu caminho através do
campo florido, tomando cuidado para permanecer no caminho estreito e não deixar sinais de que
passou por ali. Ele não podia se dar ao luxo de ficar muito molhado, não quando estava prestes a
entrar na casa de Judith. Ele não queria que ela se deparasse com rastros molhados em seu tapete
cor creme. Ele se moveu para a parte de trás da casa onde os jardins selvagens, o mato alto e
arbustos pareciam uma pequena selva na chuva.
O piso inferior inteiro estava escuro. Era mais difícil evitar as altas plantas com folhas
espessas que se estendiam para capturar suas presas. Ele passou por elas, tomando cuidado para
não se esfregar contra elas. Deixar folhas ou grama no tapete seria tão ruim quanto os rastros
molhados. Ele contornou os estúdios, primeiro e segundo, dobrando através das plantas para
chegar às escurecidas portas francesas do terceiro estúdio.
Cortinas pesadas cobriam as portas, um grande contraste com os outros dois estúdios muito
mais convidativos. Com muito cuidado ele colocou sua mão a um centímetro de distância do lado
de fora do vidro, sentindo o ambiente. Seu sistema de alerta foi à loucura, cada célula nervosa e
muscular em seu corpo se encolheu. Seu coração ficou louco, acelerando, e seus pulmões
queimaram por ar. Até mesmo o cabelo na parte de trás do pescoço se arrepiou. O poder dos
elementos tinha ampliado seu radar natural, mas mesmo levando isso em consideração, havia algo
extremamente perigoso naquele estúdio.
Stefan soltou sua respiração lentamente. O que ela poderia estar escondendo no estúdio? O
perigo não parecia com traição, ou conspiração. Ele passou a mão lentamente sobre a porta,
inspecionando cada polegada, com especial atenção para a estrutura. Não conseguiu identificar
ativadores ou fios ocultos, nada que pudesse alertá-la para um roubo. Ele colocou sua mão sobre a
fechadura em primeiro lugar, sem tocar na maçaneta da porta. Nenhum calor saiu do metal. Ele
levemente enrolou a mão em torno da maçaneta. A fechadura respondeu a ele, acolhendo o seu
toque, deslizou abrindo para ele sem um empurrão. Mas a porta não abriu.
Ele nunca tinha se deparado com um bloqueio que não se abrisse a sua vontade. Nunca. Os
sistemas de segurança eram sempre muito fáceis de abrir. Mas, mesmo com outro empurrão, a
porta não abriu. Judith tinha um bloqueio duplo neste estúdio. Ela realmente não queria correr o
risco de alguém lá dentro. Sua natureza desconfiada o chutou em alta velocidade. Que diabos ela
poderia estar escondendo do mundo? Dele? Ele passou a mão mais uma vez ao longo da moldura
da porta. Na parte inferior das portas duplas sentiu a menor das resistências e sabia que ele tinha
encontrado uma segunda fechadura. Ela tinha uma fechadura no chão. Normalmente, seria
impossível de contornar a trava, sem cortar o vidro ou ir por uma janela. Ele olhou para o conjunto
de janelas utilizadas estritamente para ventilação. Ninguém poderia deslizar para dentro dessas
aberturas estreitas. Havia dezenas de janelas, longas e estreitas, abertas para permitir a passagem
do ar, mas era impossível para uma criança, muito menos um homem adulto, passar. Ela tinha
planejado meticulosamente o estúdio, certificando-se que ninguém poderia entrar sem seu
conhecimento ou consentimento. Ele se agachou e colocou sua mão sobre aquela ligeira
resistência. Paciência importava. Concentração e foco eram essenciais. Ele sentiu a viagem do
calor familiar por seu braço e mais uma vez ele flexionou os dedos. Sua mão foi aquecida,
perfeitamente imóvel, pairando sobre o local um pouco antes de descer lentamente para
descansar sobre o marco inferior. Ainda assim, a fechadura continuou teimosa. A vontade de
Judith era forte e estava trabalhando ali. Stefan empurrou o pensamento longe e concentrou-se
totalmente na mecânica da fechadura. Era uma trava simples, mas muito eficaz. Uma barra
pequena virava o fecho de metal, impedindo a porta de se mover. Uma vez que ele "sentiu" o
mecanismo, pode manobrá-lo para abri-lo.
Mais uma vez, antes de abrir a porta francesa, ele verificou por algum sistema de alarme que
poderia alertar à Judith caso alguém tentasse invadir seu estúdio seguro. Usando extrema cautela,
ele girou a maçaneta e abriu a porta. As cortinas pesadas, negras como a noite, bloquearam sua
visão, mas ele pode sentir uma explosão de raiva, uma energia explosiva que saltou em direção a
ele. Novamente, cada célula do seu corpo se rebelou. Ele deslizou para dentro e fechou a porta
atrás dele com a luz de sua caneta entre os dentes, o único alívio na escuridão do quarto.
Stefan puxou as cortinas para o lado, o suficiente para permitir sua entrada. Ele estava
respirando com dificuldade, o ar estava tão espesso de raiva que era impossível respirar
naturalmente. Ele moveu a luz ao redor da sala para uma rápida inspeção para assegurar-se que
estava sozinho, apesar de seu radar já tê-lo informado sobre isso. No entanto, ele sempre
verificava as coisas duas ou três vezes quando se relacionava com sua segurança no seu trabalho.
Atenção aos detalhes, não importava o quão pequeno fosse, isso foi a única coisa que o manteve
vivo por todos esses anos.
Todos os outros cômodos da casa de Judith foram pintados de branco ou creme, um
contraste de cores brilhantes salpicavam sua casa e as paredes. Ali, só havia uma implacável
escuridão. É verdade, havia um mural que corria do chão ao teto, grandes e grossos troncos de
árvores, galhos quebrados torcidos grotescamente, criando a ilusão de uma floresta escura,
proibida.
Isso era o que ela não permitia em suas pinturas. Ela mantinha suas emoções em
compartimentos. Esta era uma sala que abrigava todas as suas emoções destrutivas. Ele não
entendia como alguém poderia viver do jeito que ela estava tentando. As emoções mais sombrias
começavam por meio de circunstâncias muito difíceis. Havia um equilíbrio na vida e Judith tinha
tentado escapar temendo o equilíbrio do lado mais escuro de sua mente.
Mesmo aqui, neste estúdio de raiva, ele podia ver a artista que existia dentro dela. Acima de
sua cabeça o teto foi pintado em roxo profundo em círculos mais escuros de vermelho sangue com
barras quase pretas. O efeito era surpreendente. O teto parecia estar chorando lágrimas escuras.
Olhando para ele, sentiu a tristeza rastejando por seu coração, como um traiçoeiro ramo de
videira de emoção serpenteando de forma sinuosa por sua mente. Ele se obrigou olhar para longe
da montagem fascinante de cores e inspecionou as paredes.
As cores eram mais manchadas nas paredes, cordas grandes torcidas em cipós de ódio e
raiva. Dor escorria pela floresta negra de raiva. As gotas de sangue eram mais vivas, a faca
cortando através da pintura em rápidas explosões de raiva, enquanto que o roxo profundo
chorava sobre tudo isso. Velas estavam nas mesas e prateleiras, muitas queimadas
completamente, a cera agrupada em torno dos fundos das velas, tornando-se parte da atmosfera
macabra. Um cheiro assustador oleoso permeou o quarto adicionando ao clima mórbido, um
sentimento quase macabro emanava das paredes.
Ele estava cercado por ela novamente, seus momentos mais sombrios, seus pensamentos
mais íntimos e assustadores. Tão alegre e brilhante era o seu estúdio onde fazia caleidoscópios,
tão bonito e brilhante como era o seu ateliê de pintura, este era o oposto completo e absoluto,
embora, descobriu que ainda havia uma espécie de beleza na escuridão implacável,
principalmente porque não importava qual a emoção, o artista que havia em Judith sempre
aflorava.
— Oh, moi angel padshii... Você está tão perdida, — ele murmurou em voz alta.
Stefan sabia que ele era um fantasma, pertencente às sombras, mas pelo menos ele sabia
exatamente quem era e como havia chegado lá. Judith não confiava em si mesma, não percebia
que, ao criar esse lugar, ela só reforçava sua própria crença de que ela estava torcida. Cinco anos
de raiva e tristeza foram estocados em um único espaço. Ninguém poderia ficar neste quarto por
um longo período de tempo sem que estas emoções destrutivas e implacáveis, o afetasse.
Ele aproximou-se da pintura que ela estava trabalhando, lentamente, retirou a coberta e
colocou o foco de luz sobre ela. Sua respiração parou em seus pulmões. Algo difícil bloqueou sua
garganta. Este era o pesadelo de Judith. A tortura e a morte do irmão amado. Cacos de vidro,
quebrados com sangue escuro nas pontas, cortavam linhas de raiva através da tela. Negras e
largas pinceladas com golpes furiosos, nenhuma das pinceladas finas e pequenas que ele tinha
observado em todas as suas outras obras. A única cor real era um brilhante e ousado caractere
japonês. Ele sabia que era o nome de seu irmão pintado ao longo dos rios de sangue e do corpo,
quebrado atormentado.
Ele olhou mais de perto e os olhos de Judith estranhamente olharam para ele preenchidos
com uma mistura de tristeza e raiva. Seus próprios olhos queimaram e seu estomago se agitou.
Vergonha e culpa desceu sobre ele como um cobertor pesado quase esmagando o seu peito
e as imediações do seu coração. Intelectualmente, ele sabia que estava sentindo suas emoções, a
intensidade que ela sentia cada vez que se rendia a dor e incansavelmente se concentrava e vinha
a este estúdio onde achava que era seguro permitir dar às suas emoções rédea livre, para
continuar sua pintura.
Ela não tinha assinado a representação gráfica detalhada da morte de seu irmão, mas ela o
trouxe à vida. Ele quase podia ver as figuras em movimento na sala de sangue e dor. Os homens
atacavam um ao outro enquanto seu irmão estava agonizando, em seus últimos suspiros. O corpo
sem vida do policial, caindo por cima de Judith, dirigindo-a para baixo no sangue e na carne
dilacerada de seu irmão, enquanto o sangue dos policiais e carne fragmentada pulverizava sobre
ela como uma cascata.
Era uma cena horrível, mesmo para um homem acostumado à violência, principalmente
porque ela era vista através dos olhos de uma mulher que amava a vítima... Através dos olhos de
Judith. Ele sabia que ela não tinha terminado a tela porque não havia assinado o seu nome. Não
importava o quanto ele dissesse a si mesmo que eram os sentimentos de Judith, mas seu coração
quase explodia de dor. Olhando para os seus olhos, lá estava a culpa, a raiva e a tristeza, ele sentiu
uma fúria assassina começar a arder em sua barriga, cada vez mais forte quanto mais olhava para
a pintura. Ele precisava fazer as coisas corretas por ela.
Um músculo tenso marcava o seu maxilar enquanto ele cobriu a pintura. Ele disse a ela que
era o seu homem. Ele certamente era capaz de vingá-la. Seu irmão não havia sido torturado para
extrair informações vitais para a segurança de um país, ele havia sido torturado para aprender
uma lição. Ele sabia que estava justificando a sua própria vida, seus próprios pecados terríveis,
mas neste momento, ele não podia mudar o que os homens que moldaram a sua vida haviam
feito. Ele poderia fazer isso por ela e se alguém merecia sofrer antes de morrer, este era Jean-
Claude La Roux.
No centro da sala, um pano escuro cobria um objeto grande. O pano parecia se mexer,
embora no lugar não houvesse nenhuma brisa. A ondulação leve do tecido chamou sua atenção. O
quarto sussurrou um zumbido insidioso em seus ouvidos, mas não forte o suficiente para que ele
conseguisse distinguir as palavras.
Ele caminhou ao redor do objeto, que quase o atingiu em seu peito. Ele usou as pontas dos
dedos para remover o tecido. O caleidoscópio era grande, quase tão grande como um telescópio
para ver o céu noturno, e apoiava-se sobre um tripé alto. Quatro células individuais foram
empilhadas em um recipiente preto selado e uma quinta que parecia que ela ainda estava
trabalhando nela, estava em cima. Ele assumiu que cada célula representava um ano que passou
sem que o assassino de seu irmão pagasse adequadamente por seu crime, e enquanto ele não
pegasse, ela não poderia terminar de fazer as imagens para terminar a sua obra.
Intrigado, Stefan examinou cada célula de cada ângulo, colocando-as cuidadosamente em
ordem. Sua mente sempre se lembrava do mais ínfimo detalhe, mas ainda assim ele era metódico,
sempre verificava duas vezes as pequenas coisas, não querendo correr o risco de que alguém
percebesse. Nenhum fantasma real podia se dar ao luxo de ignorar o mais ínfimo pormenor.
Ele virou a primeira célula uma e outra vez. Ela foi preenchida com óleo mineral e lacrada,
claramente terminada, mas não importava o quanto ele colocasse o foco de luz sobre ela, ele não
conseguia distinguir os objetos que deviam estar flutuando dentro dela. Ele franziu a testa, sua
mente trabalhando no problema. Ela não teria as células vazias, mas ela tinha encontrado alguma
forma de proteger o que estava dentro delas. Bastava ver que, no seu estúdio de caleidoscópio,
ela havia falado que as partículas eram muito pessoais. Cada item escolhido havia sido selecionado
com cuidado e meticulosamente, o que significava ser algo importante.
Judith contava histórias com seus caleidoscópios. Ela trazia paz e alegria para a vida das
pessoas em todo o mundo. Os caleidoscópios eram mais do que uma arte, eram úteis inclusive
para questões médicas, eles ajudavam a baixar a pressão arterial e ajudava a uma criança autista
ou até os adultos a encontrar um escape saudável. Stefan estudou o grande caleidoscópio
novamente. O que ela estava querendo mostrar? E como?
O caleidoscópio em si era muito maior do que os outros que ele tinha visto em seu estúdio e
isso tinha que ser significativo, de alguma forma. O exterior era revestido de metal em pó ao invés
de um envoltório de algum tipo. A cor preta parecia implacável, mas havia algo que o fez pensar,
assim como as células, que ela havia escondido alguma coisa da vista.
Mais uma vez ele verificou o quarto com sua lanterna. Ele estava perdendo algo importante.
Era difícil pensar quando a sala estava tão viva ao seu redor. As emoções o golpeando fazendo
com que fosse difícil atrair cada lufada de ar, uma raiva fervia quente e intensa. Seu estômago
estava apertado em nós e o sangue trovejava em seus ouvidos, gritando por sua mente,
trovejando por vingança.
A luz ultravioleta portátil estava colocada na bancada, perto de sua cadeira de rodinhas.
Parecia que ela a usava com frequência, e ainda assim não se encaixava no layout da sala. A alça
aberta para fornecer o suporte e, embora não estivesse ligada, estava perto da célula que ela
ainda estava trabalhando. Stefan plugou e ligou o interruptor.
De imediato, ele viu uma variedade de objetos em um pequeno recipiente ao lado das
ferramentas. Ela havia criado os vários itens que queria usar em suas células a partir de materiais
que só se revelavam sob a luz ultravioleta. Engenhoso. Stefan balançou a cabeça com sua
criatividade. Ela não só foi capaz de esconder seu trabalho, mas a natureza secreta das células
refletia a intensidade das emoções que ela mantinha tão escondidas do resto do mundo. Em
essência, ela fechou parte de si mesma nas células seladas.
Stefan escolheu a equivalente ao primeiro ano para examinar de perto. Não só era evidente
para ele que esta célula em particular foi o começo por estar no fundo da pilha, mas quando ele
pegou perto da luz e rodou o conteúdo, ele viu claramente o número um no meio dos outros
itens. Gotas vermelhas que pareciam sangue pingavam sobre as imagens. Roxo rodando através
do conteúdo da tristeza e da dor assentada pesadamente sobre seus ombros.
O ano era tudo sobre a dor. Judith presa a sua angústia com a perda de seu amado irmão
nessa célula durante todo o tempo. A mágoa cortava profundamente, rasgando as feridas que se
recusavam a fechar. Através da célula, as imagens eram de culpa e uma trilha leve de vergonha.
Torcendo varas de metal, um coração quebrantado e armas de tortura giravam lentamente,
caindo umas sobre as outras, tudo isso enquanto a célula chorava gotas de sangue. O mesmo
objeto vermelho japonês que significava o nome de seu irmão caía na mistura. Um objeto
brilhante proclamava "Sinto muito" e outro era um notável relógio com seus ponteiros
representando uma volta no tempo.
Ele encontrou-se quase chorando e, olhando para baixo, percebeu que seu dedo acariciava o
gatilho de sua arma. De repente ele puxou sua mão, entendendo o quão intensa suas emoções
eram. Ele estava sentindo o que ela sentia. Ali, naquela sala, cercado por uma tristeza implacável,
ela pensou várias vezes acabar com sua vida, para compensar os seus pecados. Ela sabia que não
era o melhor, ele podia ler isso também, mas o pensamento estava em sua mente
ocasionalmente. Ela não podia trazê-lo de volta, ela não podia voltar o tempo no relógio da vida.
Na segunda célula, ele estudou os objetos que representavam Paris. Um pincel quebrado.
Uma tela cortada. Uma paleta de cores que corriam dos tons mais escuros até o roxo. Uma réplica
pequena do Louvre. Uma foto rasgada de si mesma e seu irmão que quase quebrou seu coração.
Pequenas coisas que lhe disse que sua culpa foi crescendo.
As células subsequentes revelaram um símbolo Kanji japonês um para a vergonha e outro
representava a culpa. Um crachá de polícia. A pequena ilha grega, onde os homens de Jean-Claude
encontraram seu irmão. Coisas que ele acreditava que retratavam a vida de seu irmão. Enquanto
os anos progrediram, a raiva em Judith, obviamente, cresceu e mais itens mostravam a lenta e
tortuosa morte, fatia por fatia, enquanto tentavam extrair informações sobre o paradeiro de
Judith. Em uma única célula que ela havia criado réplicas minúsculas de um tormento tão
detalhado que ele sabia que seu espírito havia se fundido com seu irmão enquanto ele estava
morrendo e ela sentia cada corte, cada queimadura, assim como ele sentiu.
A chama ardente pegou fogo em suas entranhas. Sua mente rosnou e se enfureceu com
intenção homicida. Seu corpo se arrastou com a necessidade de vingar o assassinato de Paul
Henderson. A fúria assassina de Stefan era desconhecida. Ele matava friamente. Sem emoção.
Seus sentimentos há muito tempo haviam sido extirpados dele. Até Judith ele não tinha percebido
que possuía um poço de paixão ainda retido dentro dele.
Isso... Esta necessidade de fazer La Roux sofrer tinha que vir de Judith e não dele. Suas mãos
não estavam trêmulas, seu corpo não estava apertado e seu cérebro não estava rugindo para
matar. Ela derramou essas emoções por esta sala, então presas ali, seu espírito, como sempre,
começou a absorver as emoções dela. Ele estava absorvendo seus sentimentos mais sombrios em
seu corpo.
Tomando fôlego, Stefan conseguiu empurrar a raiva para um segundo plano, enquanto
encaixava a célula no grande caleidoscópio e acrescentava a luz ultravioleta portátil. O foco de luz
iluminou a célula. Colocando seu olho perto do vidro, ele virou a célula. As cenas foram duplicadas
radicalmente em um padrão de sistema de espelho para ver a tortura como se estivesse olhando
através de um pesadelo macabro, provavelmente na forma que Judith tinha de revisitar a
memória quando fechava os olhos à noite. Ele virou a célula.
Instantaneamente um grande cosmos rompeu todo o sangue e toda a raiva como uma
mistura selvagem primordial de emoções puras. Os pontinhos da explosão de estrelas sem querer,
revelava Judith, não importava o quanto ela tentava se esconder, a beleza era crua e ainda
aterrorizante. Reinava o caos, e ainda havia uma ordem. Ódio apaixonado e amor misturado em
um redemoinho de emoções completamente cruas que nenhum outro ser humano tinha o direito
de testemunhar. Ele estava olhando para a alma exposta de Judith.
Ele viu a verdade do que e quem ela era. Ela havia passado cinco longos anos trabalhando
sua raiva e sua necessidade de vingança porque Jean-Claude La Roux merecia pagar pelo que tinha
feito, mas a sua verdadeira essência sempre prevaleceu. A luz dentro dela, a compaixão e a
luminosidade natural se recusou a ser regulada. Ela prendeu essas emoções escuras em um quarto
e tentou viver, tentou separar-se, tornar-se algo que ela não era e nunca poderia ser, mas ele
sabia quando viu cada célula separada que iria ver uma explosão de raios de luz que se estendia
pelo acúmulo escuro e hostil de sua necessidade de vingança.
A vergonha e a culpa que sentia não eram tanto sobre a morte de seu irmão e que a policia
havia trabalhado através de sua responsabilidade ao longo dos anos, e obviamente tinha chegado
à conclusão de que as circunstâncias eram além de suas habilidades naquela época. Mas a
vergonha e a culpa haviam crescido naquela sala, ficaram escondidas ali, como uma ferida terrível
que ela não conseguia cauterizar. Ela era incapaz de fazer outro ser humano sofrer. Ela
certamente não poderia matar alguém. Ele não tinha dúvida de que ela se defenderia e também
aqueles que ela amava apaixonadamente, mas matar a sangue-frio era impossível para uma
mulher com seu caráter e no fundo, ela sabia disso.
Judith queria vingar seu irmão, ela ainda sentia que deveria, mas ela era um tipo de mulher
que jamais faria uma coisa dessas e a culpa a devorava constantemente. Ela sentia-se como se
estivesse deixando-o mais uma vez. Não era de se admirar que não dormisse.
Era algo natural para Judith chamar seu irmão mais velho para ajudá-la a sair de uma
situação ruim. Ele a ergueu e tomou conta dela depois da morte de seus pais. Ele tinha sido a
única pessoa na qual ela sempre contou e é claro que ele tinha ido às pressas para ajudá-la. Ela,
provavelmente, fechava os olhos e o via olhando para ela acusadoramente. Em sua pintura, os
olhos de Paul tinha estado abertos, olhando para sua irmã enquanto a vida corria para fora dele e
ela via acusação e culpa. Stefan avaliando melhor percebeu que aquilo quem estava falando era a
sua consciência.
A revelação trouxe aqueles instintos protetores que não sabia que existiam até conhecer
Judith, era tudo tão cru, profundo e apaixonado como suas emoções caóticas e selvagens. Ele
precisava se enrolar firmemente em torno dela e protegê-la dos olhos alheios até que ela pudesse
trazer as duas metades de seu espírito de volta. Ela tinha que perdoar-se por ser gentil e amável.
Por ser compassiva. Judith não parecia perceber que o mundo seria um lugar muito melhor se só
existissem pessoas como ela, ao invés de pessoas como ele.
Ela temia sua própria natureza passional enquanto pensava sobre a morte e sobre as formas
de manter aquele que amava, seguros. Ela estava com muito medo que suas emoções mais
sombrias e tão naturais quanto podiam ser, pudesse contribuir de alguma forma para a dor e o
sofrimento de outras pessoas que ela amava.
Stefan balançou a cabeça. Ele não estava prestes a deixá-la se afastar dele. Ele sabia que
possuía a capacidade de preencher cada espaço sombrio com seu próprio espírito, fundindo-se tão
profundamente que ela nunca iria sentir novamente o peso de tudo isso sozinha. Seus dons de
alguma forma interligados com o dela permitiam tal proximidade tão intimamente que ele sabia
que poderia proteger não só Judith, mas as outras ao seu redor até que ela tivesse total
compreensão e controle de seu dom.
Ele tinha que deixar este lugar de tristeza e vingança antes que as emoções presas ali dentro
se tornassem demasiadamente grandes até mesmo para a sua força. Ao contrário de Judith, ele
não tinha esse espírito brilhante prevalecendo sobre todas as emoções escuras. Ele tinha escudos,
mas o poder naquele estúdio era enorme, até mesmo para ele.
Com muito cuidado, ele substituiu a luz ultravioleta, as células do caleidoscópio e o cobriu,
garantindo que o pano estivesse na posição exata que encontrou. Stefan deu uma última olhada
ao redor do estúdio para ter certeza de que tudo estava exatamente como havia encontrado e não
houvesse nenhuma evidência de que alguém descobriu segredo de Judith. As cortinas foram
colocadas de volta no lugar e ele verificou ambas as fechaduras antes de se sentar no pátio e
respirar grandes goles de ar fresco.
Ele baixou a cabeça em suas mãos, ignorando a chuva que caia. Foi um banho suave, muito
leve, e ele saudou as limpas e frescas gotas de água queimando em sua pele. A chuva parecia
lágrimas em seu rosto quando ele olhou para cima para ver a água cair do céu. Judith precisava
dele e ele era eternamente grato por essa revelação. Ele achava que ela seria sua salvação, mas
ela precisava se aceitar como era, ela era incapaz de prejudicar os outros. Ela precisava perceber
que todos tinham pensamentos sombrios, incluindo seu irmão, e que ele não iria querer que sua
irmã passasse pela vida procurando vingança. Se Paul a amava tanto quanto ela o amava, o que
era evidente após tudo o que tinha visto, a última coisa que gostaria era que Judith desperdiçasse
seu talento por temê-lo. Ela era poderosa em sua criatividade e muito apaixonada em seu espírito
que incluía todas as emoções, e não apenas as mais suaves. Stefan levantou-se lentamente,
esticando os músculos, ciente do quão tenso estava por ter ficado algum tempo no estúdio escuro.
Ele precisou lutar durante todo o tempo contra o ataque de emoções e isso havia cobrado o seu
preço. Ele sentia-se espremido, exausto e precisando de um lugar seguro para descansar. Não no
hotel que Thomas Vincent estava hospedado... Isso estava fora de questão. Se Ivanov não
estivesse tão ferido quanto Stefan suspeitava, então ele iria à sua caça. Agora mesmo poderia
haver uma armadilha no quarto do hotel e ele estava muito cansado para lidar com isso. E homens
cansados cometiam erros.
Ele foi treinado para seguir adiante, sem se importar com o pedágio que seu corpo poderia
cobrar sua vontade simplesmente lhe dava o impulso necessário para continuar até que sua
missão estivesse completa. Ele estava acostumado a trabalhar apesar do cansaço, apesar das
feridas, através de dias sem comer ou dormir, mas o preço cobrado por combater aquelas
emoções foi pior do que qualquer coisa que ele tivesse experimentado. Ele estava muito drenado
para a batalha depois de se proteger de um bombardeio de energia tão intenso e destrutivo.
Stefan começou a caminhar através das ervas altas e arbustos, rodeando a casa para o lado
onde se localizava o quarto de Judith. Ele meio que esperava que ela tivesse ido para a cama, mas
a chuva ainda estava sendo dirigida e alguém estava conduzindo uma orquestra sinfônica, cada
elemento contribuía, mas Judith amplificava a potência de cada um. Se ele fosse honesto consigo
mesmo, reconheceria que só queria vê-la mais uma vez para ter certeza de que ela estava bem.
Agora que a havia encontrado, estava relutante em ficar longe dela.
Pelo canto do olho, ele pegou alguma coisa grande que vinha para ele acima de sua cabeça
enquanto ele dobrava a esquina da casa de dois andares. Esquivando-se para baixo, ele se virou
para enfrentar a criatura que vinha em um ataque rápido. A coruja mergulhou em silêncio,
estendeu as garras, com a intenção de rasgar os olhos e no último momento reconhecendo a guia
visual de Lev tentou puxar para cima, as grandes asas batendo duro, em um esforço para parar a
descida rápida. Garras arranharam seu rosto e seu olho esquerdo e depois o pássaro foi embora,
desviando para o céu, em direção à árvore mais próxima.
Stefan tocou seu rosto, um raio de fogo ardia como uma marca. Havia tido sorte. A coruja
poderia ter tirado seu olho. Ele podia ter que rever sua opinião sobre as aves como cães de
guarda. Ela veio selvagemente e sem fazer nenhum som. As penas das asas da coruja abafavam o
farfalhar das aves em voo, permitindo que a ave de rapina atacasse na noite em completo silêncio.
Se não fosse por seu sistema de alerta, Stefan duvidava que pudesse ter escapado tão facilmente,
mesmo com o pássaro reconhecendo-o como um amigo.
A coruja voltou para os ramos superiores da árvore de pinho, dobrando as asas lentamente
perto de seu corpo, olhos redondos olhando para as árvores que cresciam espessas na colina
acima da casa de Judith. Algo sobre o modo como o pássaro concentrou-se na colina incomodou
Stefan. Ele estava exausto, lutando com as emoções desconhecidas e tentando aliviar a tensão em
seu corpo, esvaziar-se da sua experiência no estúdio escuro. Mas agora que o pássaro o havia feito
consciente, ele não estava tão certo que o sistema de alerta de seu corpo não estava gritando para
ele em alarme.
Lev, você está por aqui?
Ele enviou a pergunta com muita cautela, não querendo dar a sua localização inclusive ao
seu irmão.
A coruja tinha ido diretamente para os seus olhos. Ela tinha recuado para cima, porque Lev
havia advertindo-a ou haviam sido os reflexos de Stefan? Algo lá em cima da colina havia captado
o interesse do pássaro. Corujas possuíam um olhar aguçado e sua audição era incrível. Stefan
continuou a se mover em torno da casa até que teve a varanda de Judith à vista.
Ela estava do lado de fora, o rosto virado para cima em direção à chuva, a água moldando a
parte superior da camiseta e suas curvas exuberantes, enfatizando sua caixa torácica estreita e
quadris exuberantes. Seu cabelo devia dar a ela a aparência de um rato afogado, mas ao invés
disso, brilhava como uma cascata em torno de seu corpo. A respiração Stefan assobiou para fora,
com medo por ela. Qualquer pessoa escondida em um grupo de árvores na colina poderia
facilmente ver Judith e isso poderia ser considerado uma ofensa mortal.
Stefan? Você está bem?
O coração de Stefan trovejou em seus ouvidos. A voz de Lev era fraca, como se estivesse
chegando de uma boa distância. A gama de suas habilidades telepáticas nunca havia sido testada,
mas Stefan sabia que ele não poderia estar muito longe.
Onde você está?
Com Rikki. Você precisa de mim?
Acho que temos companhia. Na colina acima da casa de Judith. Na espessa proteção de
pinheiros.
Stefan sentiu a reação de Lev, uma espécie de sacudida de consciência. A fazenda inteira
estava pulsando com energia e quando os elementos se uniram, o poder fluiu através de Stefan
aumentando suas habilidades, mas, ao mesmo tempo, a força era tão forte, que era fácil atribuir o
mal-estar e a tensão à intensidade de energia dos elementos juntos. Lev devia estar sentindo esta
energia também e isso podia estar enganando a todos eles.
A coruja me advertiu, Lev.
Mesmo com a divisão de elementos e depois com todas as energias se fundindo?
A coruja o havia atacado, embora Lev tivesse enviado anteriormente a imagem de Stefan aos
predadores na área, claramente mostrando-lhes que ele pertencia à fazenda. Algo tinha
confundido o pássaro. Se a energia pulsando no ar poderia confundir uma ave de rapina
pertencente à noite, sem dúvida que também poderia enganar o sistema de alerta de Stefan.
Sim.
Estou a caminho.
Havia uma contrariedade afiada no tom de Lev.
Imediatamente Stefan sentiu a quebra nos fios de energia pulsante, como se um dos fios
tivesse se rompido. A energia crepitava e estalava no ar, linhas finas brilhavam, irradiando de um
ponto central. As luzes pareciam como se a eletricidade estivesse em um curto circuito fora de
controle, como um show de luz ofuscante. Sem dúvida, quando Lev abruptamente saiu de casa,
sua esposa havia parado de fazer a sinfonia com a chuva, quebrando a conexão entre todos os
cinco elementos.
Ele olhou para Judith. Ela ficou na chuva, de repente dirigindo com surpresa um olhar em
direção à casa de Rikki, mas não fez nenhum movimento para se abrigar. A visão de Stefan ficou
turva por um momento. Seu estômago se embrulhou e sua mente ficou desorientada. Quando
clareou, ele fundiu-se com seu irmão, olhando através dos olhos da coruja para dentro do bosque
de pinheiros. Havia uma figura sombria de um homem agachado lá e ele estava apontando algo
em direção a Judith.
Judith!
Ambos os irmãos gritaram um aviso ao mesmo tempo e suas vozes ressoaram na cabeça de
Judith como um trovão.
Se jogue no chão e fique parada! Agora!
Stefan derramou um aço puro em seu comando e não ficou surpreso que Lev tivesse feito o
mesmo. O resultado foi gratificante. Judith não hesitou. Stefan não sabia se pelo choque de ouvir
tal comando ou porque ouviu o comando dos dois homens em sua cabeça.
Stefan deixou cair toda pretensão de sigilo e correu para o bosque de árvores. Lev estava a
certa distância, mas estava em seu caminho. Um ramo estalou audivelmente, carregando o som
na quietude da noite. Sua presa estava fugindo pelo que Stefan pode ver.
Envie a coruja, ele instruiu seu irmão. Para bloquear o seu caminho até o seu veículo. Ele tem
que ter um. Eu não conseguirei chegar até ele a tempo. Atrase-o. Agora, Lev, atrase-o!
Ele correu com sua arma na mão, o medo que sentia por Judith disparava o seu coração. Um
homem estava tentado matá-la? Era Ivanov? Ivanov não teria nada a ganhar matando Judith. Ele
não poderia saber como Stefan se sentia por ela. Mesmo se Stefan dissesse ao exterminador a
verdade, jurasse que seus sentimentos por Judith eram profundos, Ivanov nunca iria acreditar
nele.
Ele tinha uma abundância de cobertura enquanto corria através dos jardins, as flores mais
altas e arbustos ocultavam a um bom atirador. Ele se assegurou em ziguezaguear e se agachar ao
invés de escolher um caminho reto, ele esperava uma saraivada de balas a qualquer momento.
A coruja levantou voo, juntando-se a várias outras, de repente circulando ao redor para o
outro lado do bosque onde elas desapareceram.
Onde ele está? — Stefan exigiu.
Na trilha da colina. Eu não posso ver o carro ainda, mas ele tem que ter um. Se ele conseguir
alcançar seu veículo, serei capaz de detê-lo antes de chegar ao portão da frente ou tentar fugir
pela parte de trás da propriedade. Os hectares superiores estão cercados.
Ele poderia passar por uma cerca, — Stefan apontou.
Lev tinha que estar correndo parcialmente cego se estava conectado as corujas, mas a
informação era vital para Stefan. Saber que sua presa estava correndo permitia a Stefan escolher o
caminho mais curto ao invés do mais protegido. Ele desviou do jardim e cortou através de um
campo de flores silvestres que o levaria até a encosta da colina.
Entre Judith, — ele ordenou. — Mas permaneça abaixada, e pelo amor de Deus, ative o seu
sistema de segurança. Se alguém tentar invadir a casa, chame o Xerife.
Ele esperava que ela o bombardeasse com perguntas e exigências, mas ela não fez nada
disso. Ele sentiu sua aceitação tranquila e arriscou um olhar por cima do ombro para ver as portas
da varanda se fechar com firmeza.
Vou esperar para vê-los vivos e bem, — ela respondeu suavemente. — E com uma boa
explicação.

CAPÍTULO 12

Eu nunca trabalhei com ninguém, Lev, não como uma equipe. Fui treinado para trabalhar
separadamente, completamente sozinho e sem ajuda de ninguém. Muitas vezes, quando era
adolescente, fui enviado para ambientes hostis com outro menino de minha turma, alguém que
havia treinado comigo, dormia no mesmo acampamento e comíamos juntos, inevitavelmente, no
meio da missão, quando eu estava de costas e totalmente focado em realizar a missão, o outro
menino tentava me matar, pois isso fazia parte da missão dele.
Stefan queria que seu irmão entendesse por que ele era tão relutante em confiar.
Esta era uma tática usada frequentemente, no final do nosso treinamento, os alunos haviam-
se transformando em outras pessoas, mantinham-se afastados, o que aumentava o seu sentido de
consciência, assim como a crença de que ninguém poderia ser confiável. — Lev disse.
Ele amava Lev. Não havia dúvida em sua mente que ele amava o seu irmão, mas o Lev que
ele amava e era infinitamente fiel, era um menino pequeno que, como Stefan, foi espancado e
largado ensanguentado na neve, depois de ter visto com horror os soldados assassinando seus
pais. Ele era leal ao menino que havia se agarrado a ele para logo depois ser arrancado de seus
braços e levado para outra parte do país para que eles não pudessem formar uma aliança contra
seus inimigos.
E eles fizeram a mesma coisa comigo, — continuou Lev.
Então, ele não estava tão sozinho depois de tudo. Lev tinha partilhado as mesmas
experiências na sua infância, então ele sabia como aquela situação parecia surreal, ter a sensação
de correr durante a noite perseguindo um inimigo com outra pessoa o ajudando a fechar o cerco
pelo mesmo homem. Enquanto corria por entre as árvores, ele podia ouvir a respiração pesada e
quase frenética do intruso enquanto corria em direção ao seu carro. Ele devia ter estacionado fora
dos portões, pulado a cerca e caminhado através da propriedade para chegar ate à casa de Judith.
Isso é preocupante, — disse Lev. — Há seis casas na propriedade. Como diabos ele sabia qual
era a dela?
Esta era uma pergunta malditamente boa, uma que Stefan queria a resposta.
Não o mate, — advertiu Stefan. — Precisamos de algumas respostas.
Ele estava mais perto. Ele podia ouvir o barulho dos passos e o som de pequenos galhos
quebrando enquanto o intruso corria pela floresta em direção à estrada.
Engraçado, eu estava prestes a dizer a mesma coisa para você.
Stefan irrompeu na clareira, correndo em um ritmo constante e rápido, cercando o intruso,
lentamente fechando a distancia entre eles. Havia pouca cobertura no prado e quando o homem
chegou ao outro lado, as corujas desceram, sete delas, grandes asas batendo com força, voando
direto para o rosto do homem. Ele gritou e caiu no chão, cobrindo a cabeça para escapar das
malditas garras.
Pode ser que não sejamos nós quem o matará. Chame-as agora, eu já estou em cima dele, —
disse Stefan.
Seu pai tinha sido capaz de fundir-se com animais, e ele lembrava vagamente de um tempo
em que eles estavam todos juntos em um parque e os esquilos e pássaros se reuniram em torno
deles. Os esquilos realizaram truques e brincaram junto com seus irmãos que riam. Era uma cena
muito diferente desta, onde as corujas voaram para o rosto de um homem com a intenção de
arrancar os olhos dele. Aquilo havia sido em uma época diferente, em uma época em que ele era
somente uma criança, uma passagem a qual ele não lembrava até que conheceu Judith. Ela trouxe
de volta para ele memórias preciosas.

*****

“Ela trouxe de volta para ele memórias preciosas”.


Judith se sentou no chão tremendo incontrolavelmente encostada ao lado das janelas.
Sentindo-se gelada, ela torceu o cabelo, sem se importar com a água escorrendo em seu tapete.
Ela realmente não sabia muito sobre o passado de Levi, só que ele estava trabalhando disfarçado
em um iate que se afundou e ele queria permanecer morto. Isso trouxe um pensamento
perturbador de que Thomas Vincent não era a alma gentil que ela pensava que fosse. Era muito
óbvio que Levi e Thomas se conheciam, com certeza, e os dois estavam perseguindo alguém que
havia entrado na propriedade.
Ela muitas vezes perdia a noção do tempo quando estava tecendo espiritualmente através
dos outros elementos e não tinha ideia de quanto tempo esteve na varanda antes de ouvir as
vozes ordenando-lhe para rastejar para dentro da segurança de sua casa. Ela reconheceu os dois
homens instantaneamente. A energia que estava girando em torno de seus jardins e por toda a
fazenda era muito poderosa, e os talentos de ambos os homens psíquicos tinham naturalmente
sido incluídos no círculo que ela havia tecido, ampliando suas capacidades de falar
telepaticamente. E como o seu espírito era o fio que tecia a união de todos os elementos, ela
compartilhou esta ligação natural. Sim. Foi isso o que aconteceu.
Uma parte dela queria se retrair e não saber a verdade, mas ela tinha sido pega de surpresa
uma vez e outras pessoas pagaram o preço pelo seu mau julgamento. Ela se recusava a ser uma
covarde e se esconder debaixo das cobertas. Ela havia deixado Thomas Vincent entrar em sua vida
e o queria com cada fibra do seu ser. Se ele fosse tão corrupto como Jean-Claude havia sido, ela
precisava saber. Pior ainda, se Levi tivesse enganado a todas elas e estivesse usando Rikki de
alguma forma, isso seria imperdoável e Judith teria que encontrar uma maneira de dizer a Rikki.
Ela não era telepata, não no verdadeiro sentido da palavra. As ondas cerebrais geravam pura
energia e o seu elemento aumentava esta energia, era realmente muito simples. Ela não ouvia os
pensamentos das pessoas, mas se alguém como Thomas (ou Levi), eram verdadeiramente
telepatas, seu espírito poderia facilmente ampliar e recuperar estas conversas para que ela fizesse
parte delas. Foi muito íntimo e sexy quando ela compartilhou a telepatia com Thomas, mas foi
verdadeiramente assustador quando ela ouviu Levi e Thomas. Eles, obviamente estavam
familiarizados um com o outro... Mas ela não.
Enxugando o rosto com a mão e levantou-se com seus pés cambaleando enquanto seguia
em direção ao chuveiro. Ela tinha estado mais do que a meio caminho do amor... Ou luxúria com
Thomas, era difícil dizer. Ela se sentia muito bem com ele e ainda assim ela realmente não sabia
nada sobre ele. E como poderia? Ela havia apenas se metido em algo de forma precipitada e
impulsivamente, quase da mesma forma que havia feito há cinco anos antes com Jean-Claude.
Ela deixou a água quente escorrer sobre ela, lentamente, levando o frio dos seus ossos. Eles
haviam falado com um sotaque russo e o assassino enviado para matar Levi poucas semanas antes
era russo. As conclusões que tinha extraído das imagens horríveis do passado de Thomas estavam
obviamente erradas. Ele tinha estado em uma espécie de campo de treinamento militar em uma
idade muito precoce. Ele tinha sido simpático e compreensivo... Verdadeiramente compreensivo
sobre a forma como ela se sentia sobre o assassinato de seu irmão porque ele testemunhou o
assassinato de seus pais.
Havia uma ligação entre Thomas e Levi... Ela quase pegou no aumento da súbita emoção em
Thomas. Mas a resposta foi tão evasiva como o que, ou quem Thomas realmente era. Respirando
profundamente ela saiu do chuveiro enrolando uma toalha em volta dela, determinada a não
entrar em pânico. Se não por causa dela mesma, então por Rikki, ela teria que lutar com a
necessidade de puxar um cobertor sobre a cabeça e fugir de qualquer complicação que havia se
metido.
“Ela trouxe de volta para ele memórias preciosas”.
Apesar de sua determinação de permanecer distante de Thomas, Judith não poderia deixar
de abraçar este pequeno presente que ele deu a ela. Ela tinha dado a ele algo que ele obviamente
estimava. Ela pode ouvir em sua voz e sentir em sua mente. Se ele a estava usando, suas emoções
por ela eram bastante reais.

*****

O intruso cambaleou sob seus pés no momento em que as corujas recuaram. Ele lançou um
olhar desconfiado para o céu e começou a correr novamente. Sua camisa estava rasgada em vários
lugares e havia longos cortes em sua pele. Manchas de sangue espalhavam-se rapidamente
através do material pesado. O homem estava em boa forma, mas os pássaros o haviam abalado.
De repente, ele se afastou da estrada e foi para o outro lado do prado onde a grama crescia mais
alta.
A saída repentina por uma rota mais rápida avisou a Stefan que não ele era um voyeur que
tinha vindo para espionar as mulheres que viviam na fazenda. O fato de que ele havia escolhido a
casa de Judith significava que ele não havia feito uma escolha de forma aleatória.
Impeça-o de chegar ao carro, Lev. Ele te ouviu chegando e está tramando algo. Você tem
uma visão dele?
O homem havia desaparecido nas folhagens alta e espessa e não havia qualquer movimento
para denunciá-lo. Stefan parou a perseguição abruptamente e voltou para a sombra das árvores.
Quem é ele? Ivanov?
O inferno se sei. Ele não se move como Ivanov, mas ele está tramando algo. Tenha cuidado.
Stefan estudava as folhagens enquanto respondia ao seu irmão. Que diabos o intruso estava
tramando? Ele deveria estar rastejando pela grama, permanecendo abaixado, certificando-se de
não fazer nenhum movimentos que pudesse mostrar sua posição.
Lá em cima, as corujas circulavam. Uma deu um grito e, instantaneamente, a visão de Stefan
se turvou. Ele se afastou de seu irmão imediatamente. Judith ainda estava alimentando a energia,
aumentando o poder, e ele estava pegando restos do dom de seu irmão. Ele deu um passo para a
esquerda, procurando uma melhor visão e algumas lascas de madeira salpicaram no lado do seu
rosto. Ele caiu no chão e rolou, então, sob sua barriga, ele usou os cotovelos e os dedos dos pés
para se mover rapidamente, afundado no terreno aberto para uma parte de pedras pequenas no
início do prado. Havia uma depressão rasa e ele encaixou seu corpo dentro dela.
Ele te acertou?
Não pareça tão chateado.
Stefan sabia que sua voz soava irritada, e sinceramente ele estava irritado consigo mesmo.
Uma vez que teve certeza de que eles não estavam lidando com Ivanov, ele minimizou o perigo
em sua mente.
Sim, você tem toda razão.
Stefan sentiu mais do que ouviu o alívio na voz de seu irmão. Era difícil deixar-se cuidar
quando você não tinha sido cuidado por ninguém há muito tempo. Suas emoções estavam mais
do que enferrujadas, elas se tornaram tão finas e esfarrapadas que o sentimento era quase
irreconhecível.
Você acabou de levar um tiro?
A voz de Judith ecoou em sua mente, chocada e assustada.
Thomas. Levi. Eu estou chamando Jonas.
Não!
Ambos os homens responderam simultaneamente. Stefan respirou.
Quem diabos é esse tipo, este Jonas para você?
Houve um momento de silêncio. Stefan amaldiçoou interiormente em uma mistura de vários
idiomas. Ele havia acabado de mostrar o pior traço de um homem, um que ele nunca havia
conhecido e nem sabia que tinha. Ciúme. Puro e negro ciúme do ausente e inocente Jonas.
Os risos de Lev se derramaram em sua mente.
Ele é o xerife local. — Judith torceu o nariz. — Eu te disse que estava fazendo um
caleidoscópio para a esposa dele. Normalmente, quando alguém começa a disparar tiros em
alguém, as pessoas civilizadas chamam o xerife.
A ansiedade em sua voz desmentia suas palavras. E o que diabos ela estava fazendo ainda
conectada a eles? Ele ia ter que pensar em algumas explicações rápidas. Outro tiro ressoou
através do ar como uma abelha com raiva e se chocou contra a árvore onde ele havia estado antes
e desta vez ele conseguiu localizar o intruso. Ele caminhou para o meio do campo.
Aonde ele vai, Lev? Ele tem que ter um plano de saída. Nós o impedimos de chegar ao seu
carro.
O coração de Stefan começou a bater de forma desenfreada. Assim que ele fez a pergunta, a
resposta chegou para ele. O intruso estava circulando em torno de volta para casa de Judith, com
a intenção de levar um dos veículos de lá ou usá-la como refém. Ele estava a certa distância, mas
não havia dúvida agora, esta era a sua única opção real para uma fuga bem-sucedida.
Judith é melhor você tenha ligado este fodido sistema de segurança. Você está armada?
Quando ela permaneceu em silêncio, ele insistiu.
Você tem uma arma?
Stefan moveu-se para cortar o caminho do homem, pegou uma rota para interceptá-lo antes
que ele conseguisse chegar até a casa de Judith. Mas ainda assim...
Judith é uma atiradora terrível. — Lev resolveu colocar seus dois centavos17.
Não sou não. A arma é que é uma estúpida e sempre pula no último segundo. — Judith
defendeu-se indignada.
Caralho! Eu disse para você praticar. — Lev gritou com sua voz cheia de preocupação.
Você não precisa falar assim com ela. — Stefan objetou, ignorando o fato de que ele
também foi grosseiro com ela alguns momentos antes.

17
Expressão idiomática que significa: Quando alguém resolve dar uma opinião sem ser solicitado.
Lev. Gire em volta à esquerda e envie as aves diretamente para ele novamente. Faça-o vir em
minha direção. E não o mate, ainda não, precisamos de algumas respostas.
Não o mate de forma alguma. — Judith se opôs. — Ele provavelmente é algum caçador
perdido.
Ele atirou em mim! — Stefan lembrou-a. — Ligue o sistema de segurança!
Mais uma vez houve um curto silêncio. Stefan corria através da grama alta, agora cuidadoso
para não dar nenhum ângulo ao intruso.
Judith? — Stefan a chamou.
Será que ele realmente está vindo para cá? — Sua voz tremeu um pouco.
Você não sabe como ativar o sistema de segurança, não é? — Stefan adivinhou.
Bem, na verdade eu nunca o liguei. — Judith admitiu relutantemente.
Lev deu um grunhido de desgosto.
Maldição, Judith. Quantas vezes eu te disse que é importante ligar isso durante a noite?
Não pragueje com ela, — Stefan disparou. — Apenas a ensine como ligar a maldita coisa.
Não se preocupe Judith, ele não vai chegar perto de você. É apenas uma precaução.
Ele podia ouvir o roçar de um corpo em movimento logo à direita dele. Ele estava se
aproximando dele. Lev recitou as instruções para Judith de como armar o sistema de segurança.
Stefan inclinou seu corpo enquanto rastejava sobre a grama, para interceptar o intruso, ele fez
uma anotação mental para repensar sobre a segurança de Judith até ela estivesse confortável com
a ideia.
Um estalo audível deu a posição de Lev e imediatamente o intruso se virou em direção ao
som e disparou. Stefan pulou para frente, agachando-se e depois correndo em direção ao atirador.
Lev. Responda-me.
O intruso atirou mais duas vezes em direção ao som, dando a sua posição. Stefan aproveitou
a oportunidade para fechar a distância rapidamente, com o coração na garganta, enquanto
esperava a resposta de seu irmão. Ele podia sentir Judith prendendo a respiração, assim como o
tempo pareceu suspenso por um momento.
Apenas um ego ferido. Eu tropecei em uma maldita pedra.
A grama se separou na frente de Stefan e o rosto de um homem apareceu. Choque se
espalhou sobre suas feições horrorizadas mesmo quando uma mão apareceu com uma arma em
punho. Stefan se impulsionou para frente atingindo o corpo duro, pegando o pulso e virando a
arma para longe dele quando atirou e ouviu um som quase ensurdecedor ao lado de sua orelha.
Eles rolaram junto e Stefan bateu com o joelho na virilha do homem enquanto quebrava o seu
punho contra uma rocha que se projetava do solo.
O homem tentou gritar, mas o golpe na virilha tirou o ar de seus pulmões. A arma caiu de
seus dedos moles, quando seu pulso se rompeu com um estalo audível.
Eu o tenho. Judith, permaneça em casa.
Com esse último comando, ele rapidamente construiu seus escudos para afastar a energia à
sua volta, bloqueando sua mente de forma eficaz para mantê-la longe, evitando que tivesse
conhecimento do que poderia acontecer.
Ele jogou a arma a pouca distância e fez uma busca rápida, porém completa por quaisquer
outras armas. A única coisa que o homem tinha com ele era uma câmera. Lev se agachou ao lado
dele.
— Quem é ele?
— Nenhuma carteira. Deve tê-la deixado em casa enquanto veio bisbilhotar, — disse Stefan.
— Diga-me seu nome.
O homem cuspiu nele.
Stefan puxou forte seu pulso quebrado em uma retaliação imediata. O grito foi explosivo,
mas abafado, porque Lev apertou a mão sobre a boca do homem. Stefan olhou nos olhos do
intruso.
— Você precisa saber algo sobre mim. Eu sei mais formas de infligir dor do que qualquer
outro homem que você nunca vai encontrar. Podemos fazer isso fácil ou difícil, vamos fazê-lo de
qualquer forma. Eu estou sendo muito gentil com você. Diga-me seu nome.
— Mike, — o homem murmurou. — Mike Shariton.
Stefan jogou a câmera para Lev.
— Dê uma olhada. — Ele olhou para o intruso. — Quer saber o quanto mais posso ser
educado? Eu vou te dar uma oportunidade para não mentir.
Lev estudou as imagens.
— Todas as imagens são de Judith. As primeiras foram tiradas com você e Judith fora da
galeria. Ele não tirou uma foto do seu rosto, mas elas parecem... Comprometedoras.
Ele passou a câmera para Stefan. A fotografia foi tirada quando ele estava fechando a porta
da galeria, Judith com o corpo preso entre o seu corpo e a porta. Ele entregou a câmera de volta
para Lev.
— Você trabalha para La Roux. — Ele fez uma declaração.
Shariton não respondeu, mas a verdade estava em seus olhos e sua respiração rápida o traía.
— Você já enviou estas fotos para alguém, não é?
Shariton foi um pouco lento para responder e Stefan segurou seu pulso, dessa vez de forma
mais lenta, dando tempo ao homem para pensar sobre como seria sentir aquela dor novamente.
— Sim. Sim. Na noite passada. Eu enviei ontem à noite, — Shariton deixou escapar. — Fui
contratado para tirar as fotografias e enviá-los para um homem chamado Badeaux, um guarda em
uma prisão em Paris. Eu envio as fotos para ele e ele as leva a um prisioneiro.
— Que prisioneiro?
— Jean-Claude La Roux.
Stefan não queria escutar isso, mas no fundo ele já sabia, soube no momento em que viu a
câmera.
— Talvez você devesse ir para casa, — Stefan disse ao seu irmão. — Vou lidar com ele a
partir daqui.
Lev negou com a cabeça.
— Nós temos que entregá-lo para Jonas. Eu vou pedir para Rikki chamá-lo. Eles vão levá-lo
sob a acusação de roubo e...
— Ele vai estar fora da prisão antes desta noite acabar, — disse Stefan.
Vá para casa, Lev. Não posso deixar este homem ameaçar Judith.
Se o que sente sobre ela é sério, esta não é maneira de começar uma nova vida. Vamos
deixar Jonas lidar com isso.
Shariton permaneceu absolutamente imóvel, como se soubesse que sua vida estava por um
fio e provavelmente estava. Ele era um pequeno criminoso e foi pego por homens que eram letais,
e mesmo no pouco tempo em que esteve com eles, os reconheceu.
— Se chamamos o xerife, você sabe que ele vai pagar a fiança.
Lev assentiu.
— Exatamente. Só que fora da propriedade, poderemos ir à caça.
Stefan entendeu o que Lev estava fazendo imediatamente. Shariton os ouvia atentamente.
O medo tinha um cheiro e o homem suava abundantemente. Shariton não sabia de nada
realmente. Eles não conseguiriam tirar muito mais dele. Ele carregava uma arma, mas não era
adepto a utilizá-la. Ele estava com muito medo para tentar voltar e retaliar contra Judith.
— Sua arma está ali, — Stefan indicou com um pequeno aceno de sua cabeça. — Vamos
apenas ficar confortável e aguardar a lei. — Ele cutucou Shariton. — Você pode pagar a fiança, não
pode?
Shariton ficou congelado, obviamente, com muito medo de se mover.
— O que ele está dizendo a você, Shariton, — Lev acrescentou, olhando diretamente em
seus olhos, — Confesse o que você veio fazer aqui e para quem você está fazendo para isso. Preste
uma declaração verdadeira e estará seguro. Se fizer de qualquer outra forma, nada vai nos impedir
de te caçar. Estamos entendidos?
Shariton concordou com a cabeça vigorosamente.
Jonas é um bom homem, mas é um cara durão. Ele virá para cá como um trator, luzes
vermelhas, armas e vai nos fazer abaixar e verificar se estamos armados. Vá agora e esconda
qualquer arma que você tenha, mas faça-o muito longe daqui, porque ele vai fazer uma busca
completa. Nós não temos muito tempo, — Lev aconselhou.
Stefan assentiu.
Já tive o cuidado de fazer isso, porque eu sabia que estaria com Judith. Não há muito para
ele encontrar.
Ele deixou seu irmão com Mike Shariton enquanto deslizava para fora da área para se livrar
da faca escondida na bota. O garrote costurado em sua calça jeans não seria detectado. Ele estava
muito relutante em se desfazer de sua arma favorita, mas se arriscaria em ser pego com ela e
tentar encontrar uma explicação plausível? Estar armado simplesmente complicava as coisas. O
som das sirenes à distância lhe dizia que o xerife não demoraria a chegar. Ele era uma sombra,
nada mais, um fantasma que desaparecia como se nunca tivesse existido. Ficar ali seria mais difícil
do que ele esperava. O treinamento ao longo da sua vida estava enraizando nele, sentia
necessidade de desaparecer como se nunca tivesse existido. Lev sentou e ficou esperando,
olhando para trás em direção a sua casa, como se fosse sua mulher o estivesse mantendo no
lugar, como um tigre enjaulado esperando os cães morder os seus calcanhares.
Tem certeza que este é o caminho?
Lev encolheu os ombros.
É o meu caminho agora. Esta é a minha casa. Eu cumpro as leis, tanto quanto posso. Isto é
bastante fácil. Jonas é um homem justo. Você tem que fazer sua escolha, Stefan. Se você optar por
fazer daqui o leu lar, eu vou ajudá-lo, mas se você não quiser, então vá embora agora, antes que
Judith se machuque.
Judith. Ele poderia facilmente matar por ela. Mas suportar a indignidade de permitir alguém
prendê-lo, mesmo que brevemente, era um teste que ele não esperava ter que passar.
Dois carros do xerife chegaram ao gramado, divididos, um de cada lado deles, cercando-os.
Os veículos derraparam até parar com as sirenes tocando e luzes piscando. As portas do motorista
abriram e apareceram armas.
— No chão. Eu quero ver suas mãos.
Lev imediatamente obedeceu, ficou de joelhos com as mãos estendidas para o alto e as
palmas viradas para o oficial.
— Eu estou armado, Jonas. Uma pistola no ombro e minha faca em minha bota, — ele
gritou.
— Ponha as mãos atrás da cabeça.
Lev obedeceu, colocou as mãos na cabeça cruzando os dedos. Stefan hesitou. O oficial atrás
deles havia permanecido em silêncio e ele não tinha uma boa visão dele. Ele não gostava de estar
tão exposto ou vulnerável.
Abaixe Stefan, — Lev rosnou.
Muito lentamente, ele se ajoelhou, com as mãos estendidas para mostrar que estavam
vazias. Seu intestino se apertou. Ele detestava a indignidade disto.
Shariton, obviamente, sabia o que fazer. Ele rolou de joelhos, lutando para levantar as mãos.
— Vou algemá-lo, Levi, para nossa segurança.
O oficial, (presumivelmente Jonas), segurou sua arma muito firme sem se mover da sua
posição.
O policial se aproximou por trás e pegou o pulso de Lev, levando primeiro um, e depois o
outro colocando atrás de suas costas. Era impossível ver com o brilho dos faróis, um movimento
deliberado para cegá-los, mas Lev permaneceu passivo, enquanto o ajudante retirava a arma do
cinto do ombro de Lev ombro e a faca de sua bota antes de revistá-lo completamente também.
Stefan não havia permitido que ninguém o maltratasse desde que era um menino. Ele podia
sentir a necessidade de sobreviver, o impulso para lutar crescia incansavelmente.
Por um momento, ele não conseguiu respirar e algo letal começou a se desenrolar dentro
dele.
São apenas algemas Stefan, — a voz calma Lev encheu sua mente. — Você sabe que poderia
matar qualquer um deles se precisasse, mesmo estando algemado. Em qualquer caso, eles vão
tirá-las em alguns minutos. Apenas coopere. Será breve.
Stefan lutou contra as memórias de espancamentos e de traição. Quando tinha doze anos
ele foi deixado na Sibéria com uma ordem para sobreviver, que alguém voltaria para buscá-lo
assim que quem o caçasse estivesse morto. Ele não tinha ideia de quantos homens estavam ali e
planejavam matá-lo ou até mesmo se havia algum homem. Chovia gelo em cima dele e a
temperatura estava tão fria que sentia como seu sangue fosse água gelada correndo por suas
veias. Ele não tinha comida e possuía apenas uma faca, não tinha ideia do tamanho dos seus
inimigos ou quando eles viriam para ele. Ele não podia confiar em ninguém. O que ele estava
fazendo ali permitindo que um homem viesse por trás dele? Sua respiração queimava em seus
pulmões. Seu coração acelerou. Ele sabia que o ajudante estava atrás dele, mas os faróis estavam
cegando-o e ele não conseguia ver a posição exata do oficial atrás da porta. Ele não se moveu, não
saiu de sua posição e sua arma não vacilou em suas mãos.
Thomas, fale comigo. O que há de errado? Eu posso sentir algo está errado.
Surpreendentemente, Judith violou o escudo que ele criou. A onda da sua energia era
poderosa, tão poderosa que a eletricidade estalou de forma audível e os cabelos em seu corpo se
arrepiaram. Ele não foi o único que sentiu. Ambos os oficiais e Lev olharam cautelosamente ao
redor deles. Felizmente, ele era o único que a ouvia.
Thomas, eu estou saindo. Você se machucou?
Como ele responderia a isso? Ela mostrava preocupação neste momento, mas logo que isso
acabasse ela muito provavelmente correria para longe dele e ele não podia culpá-la. Perdê-la seria
pior de todas as torturas que ele já havia sofrido e todos os jogos de sobrevivência que ele havia
sido obrigado a jogar.
Fique em casa. O xerife está aqui.
Por que você está sentindo tanto frio?
O policial atrás dele agarrou o seu pulso esquerdo. Era agora ou nunca. Ele sabia exatamente
todos os pontos de pressão, todos os alvos vulneráveis no homem. Ele respirou fundo e relaxou a
mão, permitindo que seu pulso fosse algemado e puxado para trás.
Eles estão me algemando. Eu não sou bom com esse tipo de coisa.
Isso era verdade. A última vez que ele teve as mãos amarradas, ele tinha sido espancado até
perder os sentidos e queimado seguindo um padrão em todo seu corpo por longo tempo... Uma
recordação para não deixar o inimigo tomar o controle dele. Ele começou a suar quando o oficial
pegou seu outro pulso.
Thomas, eu sinto muito. Eu vou sair. Jonas vai me escutar.
Não!
Ele não podia suportar que ela o visse daquela forma. No chão. Algemado. Vulnerável. Ela
não podia vê-lo daquela maneira. Ele nunca seria capaz de manter seu controle.
O policial foi cuidadoso em sua busca, mas não encontrou o garrote, ou o pequeno pino que
ele tinha enfiado no dedo.
Diga-me o que posso fazer para ajudar.
Ouvir sua voz tinha pendido a balança, permitiu que ele tentasse a maneira do seu irmão.
Você já fez isso me distraindo. Eu estou bem agora. Falaremos mais tarde.
Ele não sabia se isso era uma suplica, uma ameaça ou um comando.
Quando ela se foi, toda a sua potente energia se dissipou tão rápido como tinha aparecido,
ele se sentiu completamente sozinho. Ele encheu-se com sua luz e a compaixão de seu espírito
que era totalmente Judith... E que ela tentava desesperadamente suprimir. Cada parte dele que
era insubstancial, não mais do que um fantasma transparente, ela havia trazido de volta à vida.
Sem ela, ele estava de volta no frio, nas sombras, onde estava há muito tempo, Sorbacov o
moldara para ser o fantasma o qual ele se tornou.
— Este está ferido, — o ajudante disse quando ajudou Shariton a se levantar.
— Prenda-o na viatura e tome sua declaração. Eu vou conversar com estes dois.
Jonas Harrington era um homem com alguns segredos próprios. Sua energia quente e
brilhante chegou a Stefan bem antes do oficial. Alto, com os cabelos descoloridos pelo sol. Olhos
azuis mar e muito concentrado, ele cruzou o espaço até eles com longos passos confiantes. Ele
parecia ser um homem cuidadoso com tudo ao redor, mas, mais que isso, ele sentia que precisava
ser cauteloso ao seu redor e Stefan prestou atenção ao sistema de alerta dele.
Stefan reconheceu o auxiliar de Jonas imediatamente, em trabalhos que ele participou há
anos atrás em sua terra natal, embora eles nunca tivesse se cruzado antes.
Este homem tinha crescido no mesmo local que o irmão mais novo de Stefan. Ele tinha sido
um detetive da polícia formidável na Rússia e, mais tarde, como Ilya, trabalhou para a Interpol.
Aleksandr Volstov tinha olhos azul-escuros e cabelos ondulados. Stefan lia que ele era
totalmente letal.
Ele olhou para Lev com uma sobrancelha levantada. Lev balançou a cabeça, indicando que
não tinha encontrado Volstov antes, mas que reconhecia o homem por fotos em jornais na Rússia,
quando ele trabalhava como detetive.
O olhar de Volstov se tornou mais aguçado quando viu Lev, seu olhar foi diretamente para
Jonas Harrington que deu um pequeno aceno de cabeça que Stefan percebeu.
Ele te reconheceu Lev. Ele é da Rússia.
Eu sei. Deixa pra lá.
— Senhor, eu vou colocá-lo em meu carro apenas enquanto falo com Levi.
Stefan não respondeu. Ele se concentrou em permanecer passivo. Precisou disciplina para
caminhar até o carro e sentar no banco de trás. Ele tinha sido um prisioneiro mais de uma vez,
mas ele era jovem e muito mais confiante naquela época. Ele foi traído por um homem o qual
considerava seu melhor amigo. Ele havia recebido ordens de seus treinadores para enganar e
matar seu amigo, porém, Uri, não era mais do que um menino, (um adolescente), ele esperou até
que Stefan estivesse de costas para ele e o atingiu. No último momento, Stefan conseguiu ver o
ataque pelo reflexo da janela e se jogou para o lado e até hoje carregava a cicatriz onde a faca o
perfurou profundamente.
Ele olhou pela janela e viu o irmão e o policial. Ele podia ler os lábios e, com as luzes acesas,
ele pode ver o que os dois homens falavam facilmente.
— Diga-me o que aconteceu, Levi, — Jonas perguntou a Lev.
Lev deu de ombros casualmente com sua expressão completamente fechada.
— Judith convidou um estranho para vir a fazenda e eu fui observá-lo. — Ele falou sem se
desculpar. — Apenas para estar seguro, fui armado. Eu realmente não sabia muito sobre ele,
então esperei até ele se despedisse para iniciar uma conversa. Estávamos andando, conversando
sobre o seu negócio quando vimos um homem escondido na pequena colina próxima à casa de
Judith, ele estava escondido nas árvores. Ele estava fazendo barulho e deve ter ficado assustado
com as corujas que moram lá. Por isso ele está ferido.
— As aves que vivem nessa propriedade são particularmente cruéis, — Jonas observou
secamente. — Esta não é a primeira vez que alguém teve problema com elas.
— Ele atirou em nós, — Levi continuou, ignorando o comentário. — Posso lhe mostrar onde
uma das balas atingiu.
— Só uma vez? Um tiro? — Jonas perguntou.
Levi balançou a cabeça.
— Três em Vincent. Dois para mim. Cinco ao todo. Sua arma está ali.
— Vou precisar pincelar suas mãos para pegar uma amostra de resíduo. Você conhece o
procedimento. Eu tenho um kit GSR no carro. Vamos fazer isso e então eu vou falar com Vincent.
— Shariton tem uma câmera com um monte de fotos de Judith com ele, — Lev acrescentou.
A expressão no rosto de Jonas mudou. Ele andou com Lev em direção ao carro e pegou o kit.
— Meu parceiro pegará uma amostra das mãos de Shariton e obterá seu depoimento.
Ele olhava a Stefan enquanto falava. Stefan estava muito grato de ter herdado os traços de
sua mãe. Enquanto ele tinha altura e massa corporal de seu pai, a constituição sólida de um
lutador muscular, seus olhos e cor de cabelo eram significativamente diferentes dos de Lev. O
olhar do xerife era penetrante.
Ele pareceu satisfeito com os resultados de seu teste e removeu as algemas de Levi.
— Espere aí, enquanto falo com seu amigo aqui.
Ele abriu a porta, permitindo Stefan sair do veículo. Empurrando para baixo a necessidade
de retirar suas algemas, Stefan obedeceu, respirando o ar da noite.
— Seu nome?
— Thomas Vincent.
— Diga-me o que aconteceu aqui.
— Tudo aconteceu muito rápido. Eu estava visitando Judith Henderson e quando estava indo
embora encontrei com Levi Hammond. Ele vive na fazenda e é casado com uma das irmãs de
Judith. Começamos a conversar e ele estava me mostrando um pouco da propriedade, estávamos
apenas andando calmamente enquanto conversávamos, então vimos um homem na colina,
escondido entre as árvores um pouco acima da casa de Judith.
— Quem o viu?
Stefan franziu a testa e balançou a cabeça.
— Eu honestamente não me lembro. Estávamos conversando e, em seguida, um pássaro
gritou em voz alta, e ele gritou. Talvez tenha sido isso que chamou a nossa atenção. Em qualquer
caso, Levi gritou algo e o cara saiu correndo. Nós nos separamos e tentamos nos aproximar dele a
partir de duas posições diferentes, então ele atirou em mim.
— Quantas vezes ele disparou sua arma?
— Três vezes. Bem, três vezes em mim. Ele atirou em Levi mais umas duas vezes.
— Você tem algumas lascas em seu rosto.
— Aconteceu muito rápido, — disse Thomas reiterando. — Eu não tive tempo para pensar.
Só reagi. Eu o abordei quando ele estava atirando em Levi. Eu pensei que ele fosse me matar.
— Não foi a coisa mais inteligente do mundo, abordar um homem com uma arma, —
observou Jonas. Você tem sorte dele não matá-lo. Eu preciso verificar suas mãos para o resíduo de
arma.
Jonas abriu as algemas. Stefan notou como seus olhos nunca se afastaram dos dele. O xerife
estava pronto para qualquer coisa. Ele obedientemente estendeu as mãos para o cotonete.
Aleksandr Volstov se aproximou, com um pequeno gesto chamando seu parceiro para uma
conferência.
— O nome dele é Mike Shariton. Ele vive em Point Arena. Eu li os direitos dele. Ele tem teste
positivo para o resíduo de arma. Ele disse que é pago para tirar fotos de Judith e o tem feito nos
últimos cinco anos. Esta é a segunda vez que ele passou por cima da cerca sobre a propriedade.
Ele admite ter atirado nos dois homens. Na verdade, ele não escondeu nada.
Jonas lançou um olhar desconfiado para trás em Lev.
— Ele confessou ter atirado contra eles?
— Sim. Ele disse que estava com medo e apenas tentando assustá-los o suficiente para fugir.
— Ele está perseguindo Judith.
— Ele alega que é pago para tirar fotos para outra pessoa. Ele foi contatado e o dinheiro
oferecido para fazer este trabalho foi muito bom e ele o recebe imediatamente após enviar as
fotos pela internet.
Uma expressão de desgosto atravessou o rosto de Jonas. Stefan podia ver que a ideia de
alguém perseguindo uma mulher e enviar suas fotos através da Internet incomodava o xerife em
um nível muito pessoal.
— As imagens são enviadas para um guarda em uma prisão na França. Que as guarda e
entrega Jean-Claude La Roux. — Volstov disse o nome em expectativa.
— Esse nome significa algo para você, Aleksandr? — Jonas perguntou com uma pequena
cara feia.
— Ele foi condenado por tráfico de armas cerca de cinco anos atrás, mas na verdade era
suspeito por muitos outros crimes, desde espionagem a assassinato. Qualquer pessoa em tentou
se interpor em seu caminho desapareceu. Por duas vezes, agentes da Interpol que o investigavam
desapareceram, mas ninguém conseguiu ligá-lo a isso.
Jonas balançou a cabeça.
— Vou terminar aqui e falar com Judith. Vou ver se ela sabe quem é este homem ou se tem
alguma ideia de porque um criminoso na França ia querer suas fotografias. Leve Shariton para o
hospital para cuidar de seu pulso. Fiche-o por crime de assalto com arma mortal e disparo
negligente de arma de fogo. Podemos acrescentar algo mais se precisamos mais tarde.
Levou o que pareceu uma eternidade para responder todas as perguntas e recuperar duas
das cinco balas disparadas. Uma delas estava em um tronco de árvore, a segunda no ramo da
mesma árvore. As outras foram impossíveis de se recuperar, embora Jonas tenha feito uma
inspeção completa da área. Ele os interrogou novamente, tanto separadamente como em
conjunto, fazendo perguntas aparentemente fúteis e uma conversa programada, Stefan sabia que
esta conversa era para ver se algum deles caía em contradição. Ele havia interrogado mais pessoas
do que jamais admitiria e conhecia as táticas.
Stefan só queria que todos se fossem embora. Ele não tinha problema em desempenhar o
seu papel do empresário americano Thomas Vincent, mas mesmo assim, ele estava feliz o
suficiente que o olhar aguçado de Volstov o havia abandonado antes que tivesse a chance de
inspecionar Stefan muito de perto.
Aleksandr Volstov tinha uma boa reputação como detetive de polícia e agente da Interpol. O
que este homem estaria fazendo em Sea Haven? Seria ele amigo de Ilya? Não haveria forma de
falar com Judith naquela noite, não com o xerife indo para sua casa para interrogá-la.
Será que ela contaria para ele sobre o seu relacionamento com Thomas Vincent? De
qualquer jeito que ele olhasse para isso, ela sabia não o receberia de braços abertos novamente.
Ele teria que rastejar para ela e encontrar uma brecha ou duas para que ela pelo menos o ouvisse.

CAPÍTULO 13

Jean-Claude La Roux.
Judith ficou na porta observando Jonas caminhar de volta para sua viatura, sentia com o
corpo todo dormente e a cor havia sumido de seu rosto. Durante muito tempo sua mente se
recusou a trabalhar. Ela apenas ficou olhando a noite, chocada, com um sentimento de culpa e
medo. Ela estava colocando todos que amava em perigo. Jean-Claude era capaz de tudo.
Ela realmente nunca havia se livrado dele, não quando ele ainda a assombrava todas as
noites, ele invadia seus sonhos e os transformava em pesadelos. Ela nunca realmente se livrou
dele, mas saber que ele estava mantendo algum tipo de controle sobre ela... Saber que ele estava
pagando alguém para enviar fotos dela nos últimos cinco anos foi verdadeiramente assustador.
E Thomas. E sobre Thomas? Ela estava louca por ele. Isso havia acontecido muito rápido.
Eles haviam pegado fogo. Claro que aquilo não era real. E mesmo que fosse real, e houvesse uma
boa explicação para tudo aquilo, ela não ia se arriscar. Ela não o colocaria em risco também.
Ela também não podia colocar suas irmãs em risco. Jean-Claude havia ordenado a tortura e o
assassinato de mais homens do que apenas o seu irmão e ele certamente era capaz de atacar
Judith através de suas irmãs. O que ele estaria planejando? O que ele queria? Ela teria que ir
embora. O que mais ela poderia fazer? Sua mente se recusava a responder as perguntas, apenas
continuava misturando tudo até que nada mais fazia sentido para ela.
Um soluço brotou de seu peito e ela apertou a mão na boca para não chorar.
— Judith?
A voz Blythe definitivamente acabou com qualquer controle que ela poderia ter tido. Judith
se jogou nos braços de Blythe, quase antes que sua irmã conseguisse chegar ao topo das escadas
de sua casa. Blythe a abraçou firme e apenas a segurou enquanto soluçava. Judith não tinha ideia
de quanto tempo ela chorou, mas quando olhou para cima, ela estava cercada por suas irmãs...
Todas elas. Seu coração se expandiu, sentiu um nó em sua garganta e chorou ainda mais.
Blythe alisou seu cabelo comprido, murmurando sons suaves.
— Vamos lidar com isso, querida. Vamos fazer isso. Todas juntas.
— Como você soube? — Judith conseguiu conter-se pelo tempo suficiente para levantar a
cabeça e olhar para elas com os olhos ainda cheios de lágrimas.
— Rikki nos chamou. Levi disse a ela sobre as fotos e sobre Jean-Claude. Então é claro que
viríamos por você — disse Blythe.
— Airiana vai fazer um chá para nós e Lexi trouxe algumas coisas para um lanche à noite.
Nós vamos precisar de energia para resolver isso.
Blythe soava como, bem, Blythe. Ela sempre foi prática, a mãe de todas elas, a irmã mais
velha, a chefe sem ser mandona. Blythe sempre fazia todo mundo se sentir melhor apenas pela
sua presença tranquilizadora. Ou talvez fosse pelo seu toque. Judith já se sentia um pouco mais
leve, as lagrimas começaram a diminuir muito lentamente permitindo-lhe alguma aparência de
controle.
Blythe pegou o braço de Judith e firmemente levou-a para dentro de sua casa. As outras
entraram atrás dela, Lissa trancou a porta e ligou o sistema de alarme.
Judith olhou em volta ao círculo das mulheres. Estas eram as pessoas com as quais ela
poderia contar sempre, elas sempre... Estariam com ela. Elas não eram suas irmãs de sangue, mas
seu coração as havia escolhido e elas eram tão próximas quanto um parente de sangue. Essas
mulheres tinham salvado a sua vida, apoiaram-na quando ela estava no fundo do poço sem ter
para onde ir. Elas a fizeram acreditar em si mesma novamente e agora, mais uma vez, quando seu
mundo estava desabando ao seu redor, ali estavam elas, junto dela.
Judith respirou profundamente e soltou o ar devagar, viu quando Lexi começou a tirar velas
de dentro da sua bolsa colocando-as ao redor da sala. Atrás de Lexi, Lissa acendeu os pavios, e as
chamas saltaram para a vida, dançando alegremente, o aroma de cura encheu a sala.
A água encheu a chaleira ao comando de Rikki e Airiana colocou a chaleira no fogão onde
Lissa já tinha as chamas já acesas.
— Você é uma exibicionista, — Airiana brincou com ela.
Para Judith aquilo foi um show de energia e poder, daquelas mulheres vinculadas aos seus
elementos e unidas pelo amor que compartilhavam.
O coração de Judith aliviou e a dor terrível que a ameaçava esmagá-la diminuiu. Ela deixou
Blythe levá-la até uma cadeira e afundou nas almofadas macias.
— Jonas algemou Levi, — Rikki anunciou.
Houve um suspiro coletivo.
— Levi permitiu? — Lissa perguntou.
— Sim. — Rikki parecia orgulhosa, mas não havia uma pitada de riso em sua voz. Ela pegou a
cadeira mais próxima à porta. Ela sempre lutava contra sua relutância em se sentar em uma casa
com todas as portas fechadas e cheias das pessoas que ela amava.
— Como é que ele não está aqui conosco? — Judith perguntou. — Ele normalmente está
colado ao seu lado.
— Bem... — Um sorriso travesso iluminou os olhos de Rikki. — Eu disse a ele que “não”.
Isso trouxe outro suspiro coletivo, só que desta vez mais espantado e, em seguida, as
mulheres caíram na gargalhada, até mesmo Judith. O pensamento de Rikki dizendo não a Levi, um
homem tão protetor e machão, fazia com que todas elas imaginassem o homem uivando.
Judith limpou a última de suas lágrimas.
— E como ele aceitou isso?
— Não muito bem, na verdade, — Rikki admitiu. — Ele está rondando sua casa como um cão
de caça ferido, mas este é o poder das mulheres. Ele pode ser todo macho e mal-humorado, só
que lá fora.
Outra rodada de risos restaurou o equilíbrio natural de Judith. Ela enviou as suas irmãs um
sorriso amoroso.
— Obrigada. Eu estou melhor agora. Pelo menos eu posso pensar. Eu entrei em pânico
quando ouvi o nome dele. Eu mal ouvi o que Jonas disse depois que ele falou para quem estas
fotos estavam sendo enviadas.
— Eu estava com medo, quando recebi a mensagem, que talvez este homem tivesse
instalado uma câmera no seu quarto e você fosse a última sensação na internet, — disse Airiana.
— É uma loucura que qualquer pessoa possa fazer esse tipo de coisa.
— Não, não na Internet, mas eu sou a garota-propaganda para os prisioneiros na França, —
disse Judith com um pequeno sorriso triste.
— Só para um só homem, eu espero, — disse Blythe. — Eu duvido que ele esteja
compartilhando sua imagem.
Judith passou a mão pelos cabelos, tirando-os de seu rosto, em um gesto rápido e inquieto.
— Eu não entendo por que ele está mantendo o controle sobre mim. E por cinco anos,
conforme disse o Jonas. Eu nunca ouvi falar deste Mike Shariton. Ele, evidentemente, vive em
Point Arena e construiu uma vida muito boa enviando as minhas fotos e do meu trabalho, para
Jean-Claude.
Airiana se virou de onde estava derramando o chá e inclinou o quadril contra a pia da
cozinha.
— Shariton? Este é um nome incomum. Eu me lembro. Ele foi à loja e comprou um de seus
caleidoscópios. Acho que foi um caleidoscópio do mar, aquele com as ondas e conchas em células
intercambiáveis. Isto foi cerca de um mês atrás.
— Ótimo, ele pode brincar com ele na prisão, — disse Judith.
— Pelo menos você fez dinheiro com ele, — Lexi apontou com um sorriso rápido, sentando-
se no chão em frente à cadeira de Judith. — Pelo menos é alguma coisa.
— Acho que eu deveria estar feliz com isso, — disse Judith. — Sério, talvez possa ajudá-lo a
descobrir que, o que ele estava fazendo era errado.
— Airiana, eu tomo leite no meu chá, — disse Lexi.
— Eu não, — Rikki disse apressadamente.
Airiana revirou os olhos.
— Vocês duas sempre dizem a mesma coisa. Vocês dizem isso há cinco anos. Eu acho que já
sei bastante bem como preferem.
As canecas flutuaram da pia para a sala de estar, uma após a outra, um desfile delas,
fazendo o seu caminho até as mãos de cada uma das mulheres.
— Falando de exibicionistas... — Lissa disse.
— Eu estou praticando, — Airiana se defendeu. — Você notou que eu tive uma participação
um pouco fraca para conter o vento nas sequoias enquanto eu estava tentando manter um leve
toque sobre a horta. Eu ainda não consigo dividir isso muito bem. E hoje senti um poder enorme
quando Judith juntou todos os nossos elementos. O vento ficou um pouco mais difícil de controlar.
Rikki concordou.
— Eu estou me acostumando a isso. Mas sua força realmente aumentou muito esta noite,
Judith, o que foi uma coisa boa, mas quando eu puxei a água das nuvens, a água no chão quis
responder também. Eu tive que trabalhar um pouco mais o meu controle.
— Eu não sabia que estava impulsionando muito a todas vocês, — disse Judith com um
toque de alarme em sua voz. — Eu acho que sem perceber me deixei ir esta noite um pouco mais
do que o habitual.
— Só um pouco mais? — Lissa perguntou. — Você está sempre tão contida e no controle, e
esta noite você parecia estar bastante diferente. Embora, sim, fosse mais difícil de controlar o
poder num primeiro momento, foi incrível. Isso significa que você pode amplificar nossas
habilidades ainda mais?
Judith sentiu o peso de todos os olhares das suas irmãs. A regra era não mentir umas as
outras. Pecados por omissão poderiam até ser aceitos, mas as mentiras não caíam bem sempre
entre elas. Ela hesitou. Inspirando e expirando.
— Sim.
— Uau, — disse Airiana, escorregando para o chão ao lado de Lexi. — Simplesmente, uau,
Judith.
— Eu imagino que deve ser muito difícil para você controlar todo esse poder às vezes, Judith,
— disse Blythe, ir direto ao centro da questão.
Judith concordou.
— Até Levi apontar que cada uma de nós era ligada a um elemento, eu não percebia que
havia algo de útil e bom que eu pudesse fazer com todo esse poder. Eu o anulo o melhor que
posso. Tecer este poder com vocês, fez com que eu me sentisse bem com ele pela primeira vez. Eu
venho fazendo isso o tempo todo, desde que nos mudamos para cá, mas não conscientemente,
não utilizando o espírito para ligar todos os elementos em um conjunto para trabalhar para nós
melhorarmos a fazenda. Antes, quando eu podia sentir a água ou o vento, eu só os ajustava um
pouco, fazia o mesmo quando a terra me chamava.
— Para mim ficou mais fácil de entender depois que Levi explicou por que eu precisava ter
as mãos no solo, — Lexi concordou. — E de que forma estávamos todas interligadas. Você não
acha estranho que cada uma de nós tenha um elemento que nos vincula, basicamente, um dom
extraordinário, ainda que todas tenham sofrido alguma terrível tragédia ou violência em nossas
vidas? Você acha que pode haver alguma correlação?
Houve um breve silêncio, enquanto pensaram sobre isso. Como sempre, era Blythe, que
tentava responder as grandes questões.
— Há um equilíbrio em tudo, todas nós sabemos disso. Bem e mal. Felicidade e tristeza.
Você nunca tem um sem o outro. Todas vocês carregam um grande dom, muito poderoso, e o
equilíbrio pode ser difícil. Seja qual for o motivo, este é o nosso aqui e agora. Nada mudou isso.
Todas nós concordamos que não viveríamos com o que e o se. Temos nossas vidas e todas nós
fizemos uma promessa que iríamos viver da melhor maneira possível. E o que Jean-Claude criou
em sua feia cabeça não mudou isso. Só serviu para nos unir e nos tornar mais fortes. Não sabemos
o que ele quer, mas só em saber que ele está olhando por cima do ombro de Judith, nos dá a
oportunidade de explorar os talentos que temos e como podemos melhorar a utilização e controle
sobre eles. Sua presença na vida da nossa irmã só vai nos tornar mais fortes.
— Ele é muito perigoso, — Judith destacou. — Você sabe o que ele fez com meu irmão. E
Paul não foi o único. É muito possível que ele tente me atacar através de uma de vocês.
— Ninguém fugiu quando eu trouxe perigo até aqui, — Rikki disse firmemente. — E ninguém
vai fugir agora. Se o homem está planejando algo, qualquer coisa contra você, você não está
sozinha e ele terá a maior surpresa de sua vida.
— Meu irmão era forte, — Judith disse suavemente. Seu coração se apertou duramente, um
aperto de dor pela lembrança do que ele havia passado por causa dela.
— É verdade, — disse Blythe. — Mas isso é diferente, Judith. Você não é mais uma jovem
garota. Todas nós já passamos pelo fogo em nosso próprio caminho e isso nos forjou a ser o que
somos e nos fez mais fortes. Estamos juntas agora. Acredito que juntas, não há nenhuma maneira
possível deste homem nos prejudicar. Você tem que acreditar nisso também.
— Levi está nos ajudando com a segurança pessoal e autodefesa, — Lissa disse, — mas nós
podemos ser um pouco mais proativas nesse departamento, assim como trabalhar em nossa
capacidade de controlar os nossos elementos. A prática de um ofício sempre o aperfeiçoa e sei
que podemos aproveitar os nossos pontos fortes estando juntas como uma unidade.
As mulheres concordaram.
— O que fez você liberar tanta energia hoje à noite, Judith? — Blythe perguntou.
— Não só foi uma energia poderosa, — disse Airiana, — mas também feliz. Você parecia feliz
para mim.
— Para mim também, — Lissa concordou. — A verdadeira felicidade.
Judith tomou um gole de chá, permitindo que suas familiares propriedades calmantes a
ajudasse a acalmar o seu coração que de repente disparou.
— Thomas. Thomas Vincent. Foi por isso.
Suas irmãs trocaram longos olhares chocados.
Novamente foi Blythe, que pegou o touro pelos chifres proverbialmente.
— Você pode entrar em detalhes conosco, pelo menos um pouco, sobre isso, Judith?
Judith largou a xícara de chá, para não trair suas mãos que tremiam.
— Eu pensei muito sobre isso. Quando estou com Thomas, eu me sinto viva, realmente viva,
e meu espírito também. É difícil explicar, mas eu não tenho medo do poder dentro de mim. Eu me
sinto como se... — Ela parou, respirou fundo e tentou novamente. — Quando eu estou com ele,
eu me sinto como se eu estivesse totalmente livre para ser eu mesma, mas segura, ao mesmo
tempo sinto que todos à minha volta estarão seguros também.
Seus olhos encontraram os de Blythe.
— Eu sei que isso não faz sentido. Quando não estou com ele, eu digo a mim mesma, todas
as coisas que com certeza você vai me dizer. Que tudo aconteceu muito rápido. Que a atração
física não é algo em que se possa confiar, mas tudo sai pela janela quando estou com ele. Ele só...
Faz-me feliz... Sendo quem eu sou. Eu não tenho medo e não tenho que me esconder dele.
Mesmo o pior em mim... Acho que ele pode suportar.
Blythe olhou para Rikki.
— O que Levi diz sobre isso?
Rikki balançou a cabeça.
— Levi não disse muito porque eu não lhe dei chance. Eu sabia que Judith precisava de nós,
e isto era mais importante.
— Além disso, — Judith salientou, — Levi não gosta de ninguém além de nós, de modo que
sua opinião não seria muito justa.
Lissa riu e cobriu com uma ligeira tosse.
— Ela tem um ponto, Rikki.
Rikki suspirou.
— Bem, eu também não gosto de ninguém mais, acho que por isso nos damos bem.
Airiana ergueu a xícara de chá, brindando Rikki.
— Você nos ama e isso é tudo o que importa bebê. — Ela tomou um gole e olhou por cima
da borda da xícara para Judith. — Como é sua aura?
— Ela é turva, como vemos em um monte de empresários poderosos. Bem e mal. Mas às
vezes não consigo nem vê-la. — Judith suspirou. — Eu tentei não ver auras. Eu não confio na
minha leitura delas, e a dele é um pouco difícil. Quanto mais eu tentava me concentrar nela,
menos eu podia lê-la.
— Ótimo. — Airiana fez uma careta. — Eu odeio isso.
— Por quê? — Blythe perguntou.
Airiana enviou um olhar de desculpas para Judith sem encontrar seus olhos.
— Porque esse tipo de aura quase sempre é um produto de ocultação.
Blythe franziu a testa e se inclinou na direção de Airiana, esfregando a palma da mão
esquerda sobre sua coxa, um hábito que, geralmente, sinalizava que ela estava ficando chateada
ou infeliz.
— De propósito? Alguém poderia esconder sua aura de propósito? Isso não significa que ele
tem algum tipo de talento psíquico e que ele saberia esconder sua aura em torno de nós?
— Não, eu não quis dizer isso Blythe, — Airiana corrigiu. — Mais que a pessoa está
escondendo algo de grande importância.
— Isso realmente não importa, — disse Judith. — Eu não posso vê-lo com a ameaça de Jean-
Claude pairando sobre minha cabeça.
— Claro que importa, — Lexi discordou. — Eu não acho que a pessoa perfeita aparece todos
os dias. Se esta oportunidade apareceu e você se conectou com ele, minha opinião é que você
aproveite esta chance. Rikki tentou e veja como ela está feliz. Ela franziu a testa. — Eu quero
dizer... Você está feliz com Levi, não é? Apesar de ele ser um pouco intimidante... E nunca sorrir.
— Estou muito feliz com Levi, — Rikki disse, balançando ligeiramente e olhando em volta. —
Talvez possamos abrir uma janela ou algo assim. Você se importaria Judith?
— Levi está lá fora, provavelmente armado até os dentes, — disse Judith. — Pode abrir a
porta, querida. Eu estou bem com ela aberta.
— Se abrir ele vai entrar, — Rikki disse, torcendo os dedos juntos em seu colo. — Ele não
será capaz de se conter. Ele vai andar pela casa toda até ter certeza de que está devidamente
trancada. — Ela revirou os olhos. — Ele verifica as mangueiras do meu jardim para ter certeza de
que elas estão em boas condições de funcionamento.
Todas as mulheres desataram a rir. Rikki piscou e olhou ao redor da sala.
— O quê foi?
— Ele verifica as mangueiras de jardim ao redor de sua casa? — Blythe perguntou rindo. —
Da mesma forma como você faz todas as manhãs?
— Exatamente. Dar-me-ia conta se houvesse alguma coisa errada com as mangueiras, vocês
não acham? O homem é apenas bastante paranoico quando se trata de segurança. E ele quer um
cão.
— Agora estamos chegando ao que realmente está te incomodando, — disse Judith
suavemente. — Bebê, você sabe que não te incomoda nem um pouco que Levi verifique a fazenda
inteira, o seu barco e nossas lojas um milhão de vezes. É coisa dele e ele leva isso muito a sério. Ele
só quer nos manter em segurança. O problema é o cão.
— Ele não vai deixar este assunto de lado, — admitiu Rikki, batendo os dedos para trás e
para frente, obviamente, ficando cada vez mais agitada.
— Nós conversamos sobre isso antes de Levi chegar, — Blythe apontou. Ela colocou uma
mão calmante no braço de Rikki, muito levemente, cuidando para não invadir seu espaço pessoal.
— Lexi realmente poderia usar um companheiro aqui na fazenda. Ela se sente muito sozinha e
adoraria ter um cão. Airiana também gostaria de um cão. Levi não está sozinho nisto.
— Mas se tivermos um, ele terá que morar na minha casa e ir comigo no meu barco, — Rikki
protestou.
— Não necessariamente, — Blythe contradisse. — Muitas pessoas têm cães ao ar livre.
A respiração de Airiana assobiou para fora e ela abriu a boca para protestar, mas Blythe deu
a ela um olhar ameaçador. Todo mundo sabia como ela se sentia em deixar os cães do lado de
fora.
Rikki balançou a cabeça.
— Oh não, eu não poderia fazer isso, Blythe. Se conseguirmos um cão, ele teria que estar
conosco o tempo todo. Eu me preocuparia por ele estar sozinho enquanto nós mergulhamos. E
não seria capaz de dormir à noite se fizer o coitado dormir do lado de fora porque eu não quero
pelo de cachorro em minha casa.
— Há raças que não soltam pelos, — disse Airiana. — E você realmente gosta de animais,
Rikki.
— Eu sei. — Rikki esfregou o dedo no interior da palma da mão como se coçasse. — Mas foi
difícil deixar Levi ficar em minha casa, agora que estou tranquila com isso, ele quer um cão. O que
virá depois disso? São muitas mudanças e rápido demais.
Blythe sorriu para ela.
— Rikki, você sabe que quer ter um cão. Eu posso ouvir isso em sua voz. Você queria que
todas nós concordássemos com você e a dissuadisse da ideia.
Rikki suspirou.
— Você sabe que eu vou ficar obcecada sobre o maldito cão. Será embaraçoso. Levi não
sabe como eu sou ainda. Não de verdade. Não sobre quão louca eu posso ficar. O cão será só meu.
Ficará sob a minha proteção e cuidado. Eu levo esse tipo de coisa muito a sério. Eu vou começar a
ler livros sobre cães e querendo o melhor de tudo para ele. Eu provavelmente vou querer comida
de cachorro, orgânica, se existir tal coisa. — Ela soprou em seus dedos em desgosto.
— Calma... Levi não vai deixar você porque você vai amar o cachorro, — disse Blythe. — Ele
vai continuar da mesma forma se preocupando por você.
— Além disso, — Lexi acrescentou, — ele é obcecado por sua proteção e as nossas. Isso vai
dar algo para distraí-lo.
Airiana riu.
— Você está brincando? Todos os cães que vierem para esta propriedade serão treinados
como cães de guarda. O homem vai querer ter certeza disso.
Rikki assentiu.
— Ele vai conseguir cães grandes. E ele sabe que Airiana é treinadora, por isso espera que
ela trabalhe com ele e com os cães para fazê-los cães de guarda.
— E isso é uma coisa ruim? — Blythe perguntou suavemente.
Rikki se balançou mais.
— Não. Sim. Eu não sei. — Ela soprou em seus dedos novamente. — É uma grande
responsabilidade.
Judith se inclinou na direção dela.
— Querida, isso é sobre os incêndios quando você era criança? E você perdeu um cachorro
em um dos incêndios, não é?
Rikki havia perdido seus pais e noivo, assim como vários lares adotivos em incêndios. Por
muito tempo ela acreditou que ela, de alguma forma, iniciava os incêndios.
Rikki lentamente acenou em resposta.
— Eu tenho problemas com a ideia de que algo possa acontecer. Eu sei que não fui a
responsável...
— E o homem que foi o responsável está morto, — Blythe a lembrou sua voz muito suave. —
Querida, você não pode deixar que este fato te impeça de algo mais do que Judith pode permitir
que Jean-Claude se imponha a ela. Você tem Levi em sua vida e as coisas estão bem entre vocês.
Trazer um cão para a sua vida não fará com que ele esteja em perigo. E você vai cuidar muito bem
deste cão de qualquer maneira, mesmo que ele seja treinado.
Judith suspirou. Ela sabia que Blythe não estava apenas conversando com Rikki. Ela estava
lembrando a Judith que todas elas prometeram viver uma vida novamente, e nunca mais se
esconder.
Ela não tinha partilhado as suas preocupações sobre Thomas Vincent, que ele poderia ser
muito mais do que parecia. Rikki realmente não tinha indicado saber algo mais sobre ele do que
Judith, e Levi parecia ser uma pessoa que compartilhava tudo com ela, de qualquer forma,
pareceu que Thomas e Levi estavam bastante familiarizados um com o outro.
Thomas tinha chamado Levi de Lev, com um perfeito sotaque russo. As memórias da infância
de Thomas pareciam ser violentas e feias como eram as de Levi. Ela sabia que Levi era russo, e a
mãe de Thomas era russa. Haveria uma conexão? Ela estava fugindo da uma relação, porque
temia o que Jean-Claude poderia fazer ou porque tinha medo que Thomas pudesse arrancar o seu
coração?
Era muito mais fácil se esconder atrás de uma porta e ficar em seu próprio pequeno mundo
protegido do que colocar o coração na linha e correr o risco de Thomas quebrá-lo. Não, não só
despedaçá-lo, e sim estilhaçá-lo tão completamente que ela não poderia se recuperar. Thomas
não era como qualquer outro homem que ela havia conhecido. Seu espírito nunca tinha reagido a
um homem, envolvendo-se sensualmente ao seu redor, envolvendo os dois em uma única pele.
Isso soava muito dramático e ridículo. Como ela poderia explicar tal coisa mesmo para
aquelas que ela amava, quando ela não entendia nem a si mesma? Ela sabia que se encaixava
perfeitamente com Thomas. Tudo sobre ele. Tudo sobre ela. Eles se pertenciam. Não importava
que eles mal se conhecessem e ambos tivessem segredos. Ela não se importava que sua aura
estivesse turva ou insinuasse alguma ocultação. Talvez ele tivesse um ou dois segredos assim
como ela. Aquele não era o ponto.
— Eu sei que Airiana e Lexi não se importariam de cães na fazenda, mas Blythe, Judith e Lissa
não deram suas opiniões, nem sim nem não, — Rikki disse.
— Eu sou totalmente e favor, — disse Blythe. — Eu não me importaria de ter um cão para
correr comigo e provavelmente eu me sentiria um pouco mais segura.
Judith deu de ombros.
— Eu não tenho certeza se quero ou não um cão... Ainda mais um cão grande. Mas eu não
me oponho a eles na fazenda se alguém quiser.
— Lissa? — Blythe perguntou quando ela permaneceu em silêncio.
O rosto de Lissa parecia mais pálido do que o normal, seu corpo firme estava um pouco
encolhido e ela parecia menor. Ela encolheu os ombros e permaneceu em silêncio, bebendo o
último gole de seu chá.
— Você tem que pesar sobre esta questão, Lissa, — Blythe estimulou. — Todo mundo deve
ter uma palavra a dizer. Você tem medo de cães?
Lissa deu de ombros novamente.
— Parece-me que todas querem os cães então, como Rikki, eu vou me acostumar a eles.
— Suponho que acostumar-se aos pelos de cachorro não será um grande problema, —
admitiu Rikki. — Levi se encaixa na minha vida sem pedir muito. Um cão seria divertido para nós...
Talvez. — Ela não parecia muito segura de si mesma.
E esse era o problema real da vida, Judith definiu. Ninguém tinha certeza sobre nada. Rikki
amava Levi com tudo o que ele era, sua intensa lealdade, sua natureza de tudo ou nada, e ainda
assim, não era suficiente. O ordenado mundo de Rikki que ela necessitava para sobreviver estava
sendo virado de cabeça para baixo para que dessa forma pudesse acomodar as necessidades de
seu parceiro.
Judith apertou os lábios com força e balançou a cabeça. A vida havia acabado de tomar um
rumo feio. Ela olhou ao redor da sala para as mulheres que haviam deixado suas camas no meio
da noite para confortá-la. Haviam tido êxito em distraí-la tempo suficiente para acabar com a
primeira onda de choque e horror. Ela percebeu que as mudanças no assunto tinha sido para seu
benefício, habilmente dirigida por Blythe com todas as suas irmãs a seguindo de bom grado para
dar à ela tempo para se recompor.
— Eu tenho muita sorte de ter todas vocês. — A emoção intensa do que ela sentia por elas
se desdobrou e transbordou pela sala.
Lissa soprou-lhe um beijo.
— Acho que o que temos que fazer minha irmã, é descobrir por que Jean-Claude manteve
você sobre vigilância nos últimos cinco anos, porque isso não faz sentido. Se ele pagava este
homem daqui, para tirar fotos de você durante todo esse tempo, ele teve um monte de problemas
e despesas. Ele está na França. Ele tinha que ter alguém para encontrar Shariton, contratá-lo,
subornar o guarda e se encarregar dos pagamentos. Isso não pode ter sido fácil da prisão.
Judith se negou a estremecer ao som do seu nome. Jean-Claude pertencia em seu estúdio
rodeado de escuridão e ali ela o manteria prisioneiro pelo ódio e pela tristeza. Judith apertou os
dedos nos olhos. Talvez ela fosse a única a ser mantida prisioneira. Durante todo esse tempo... Ela
realmente foi uma prisioneira. Thomas havia aparecido e aberto seus olhos, embora ela não
quisesse que isso acontecesse e se sentisse mais culpada do que nunca. Se ela deixasse de lado
esses sentimentos depois de cuidadosamente cultiva-los por tanto tempo, como poderia enfrentar
a memória de seu irmão novamente?
— Jean-Claude tem mais dinheiro do que qualquer uma de nós pode imaginar. O dinheiro
compra muita lealdade e ele tem uma organização grande e generalizada. Ele tem um longo
alcance, muito maior do que imaginei.
— Mas o que ele quer de você, Judith? — Blythe perguntou. — Ele deve saber que você o
despreza. Ele não pode pensar que você poderia querer ficar com ele, isso não seria lógico. Ele
mandou assassinar seu irmão e sabe que você está bem consciente de que foi ele, não é?
Judith balançou a cabeça, mordendo o lábio inferior.
— Eu não tenho ideia do que ele quer.
— Você testemunhou contra ele? — Lissa perguntou.
Judith balançou a cabeça.
— Ele nunca foi processado por assassinato. Como eu poderia provar que ele ordenou a
tortura e o assassinato de meu irmão? Estávamos na Grécia. Ele estava na França. Eu vi um
homem sendo torturado em sua casa, mas não consegui ver quem era, tinha apenas sangue por
toda parte. E o corpo deve ter desaparecido, não há dúvida disso porque eu não li nada sobre um
corpo sendo encontrado, então o que eu poderia provar? Eu estava escondida quando ele foi a
julgamento por contrabando de armas e isso não teve nada a ver com a sua condenação.
— Então, o que pode ser se não se trata de vingança? — Lissa insistiu. — O que poderia ser?
Por que ele enviou esses homens atrás de você, em primeiro lugar? Será que ele sabe que você viu
o homem morto na casa dele?
Judith franziu a testa.
— Eu penso que não. Eu não fiz nenhum barulho e não vejo como ele poderia saber, a
menos que tivesse câmeras em sua casa, o que seria perfeitamente possível.
— Mas se ele sabia onde você estava, por que simplesmente não mandou te matar? — Lexi
perguntou.
Blythe assentiu.
— É uma boa pergunta. Se ele tivesse medo de que você poderia testemunhar sobre o
assassinato, ele a teria matado. Você o conhecia melhor do que ninguém, Judith, o que você acha?
Ele poderia ter alguma ideia retorcida de que você o aceitaria de volta?
Judith tentou separar os últimos cinco anos de culpa e vergonha, dos anos como uma
estudante de arte quando ela conheceu Jean-Claude e foi derrotada pelo seu charme. Ele tinha
sido sofisticado e elegante com ela. Ela tinha sido torpe e tímida com ele, muito inocente para
imaginar o monstro que ele podia ser. Ela não tinha ideia de que homens como Jean-Claude
sequer existiam. Envolto em seu mundo da arte, ela viu apenas as cores e a beleza do mundo ao
seu redor. Ela estava em Paris, frequentando os museus, lanchando nos pequenos cafés de rua, e
estudando, durante todo o tempo absorvendo a atmosfera da França. Ela amava toda a
experiência e Jean-Claude tinha sido uma parte disso. Ele era bonito, alto, tão francês com seus
elogios e sotaque, e de modos elegantes. Quem poderia imaginar que ele era um criminoso?
Ele conhecia policiais, políticos e estrelas de cinema. A vida ao seu lado era glamorosa. Ela
nunca tinha encontrado ninguém em sua vida como Jean-Claude. Ela olhava para ele com estrelas
nos olhos. Ele fazia parte de sua experiência na França, um homem cortês com maneiras
impecáveis, que passeava com ela em seus carros, curvava-se sobre a mão dela e a levava para
lugares que nunca tinha sonhado em ir. Ele a fazia se sentir como uma princesa.
Como ele poderia mentir nos olhares que dava a ela? Aqueles longos e intensos olhares, ele
sempre olhava dentro dos seus olhos quando dizia que a amava. Ele comprou para ela um anel
lindíssimo apenas duas semanas após se conhecerem. Ela recusou, chorando em seu quarto à
noite, mas algo lhe dizia para ser apenas um pouco mais cautelosa.
Ele não havia se importado em absoluto quando ela recusou sua proposta de casamento o
que a fez se sentir ainda mais especial, ele disse que daria tempo para ela quando ele poderia ter
qualquer mulher que quisesse. Será que tudo aquilo havia sido real da parte dele? Seria mesmo
possível para um homem, capaz de fazer as coisas horríveis como ele fez realmente sentir amor
por alguém?
Um pensamento bateu duro. Ela olhou para Blythe com os olhos atormentados.
— Eu poderia ter dado a ele capacidade de realmente sentir o amor verdadeiro apenas com
a minha presença? Pela forma como eu o amava na França? O amor que eu sentia pela pessoa que
eu acreditava que ele era?
Lissa se inclinou para frente, pegando as mãos de Judith na dela.
— Você não fez nada de errado, Judith. O que há de errado em se apaixonar? Se Jean-Claude
tivesse sido o homem que fingia ser, sua vida teria sido muito diferente e bastante surpreendente.
Ele foi o único culpado nesta história, fingindo ser algo que não era. Amar alguém nunca é errado.
— Será que projetei meu sentimento e ele achou que o que sentia era real?
Lissa balançou a cabeça.
— Você está tão confusa, carinho. Olhe Rikki com Levi. Quando eles estão juntos todas nós
podemos sentir o quanto eles se amam. Eles irradiam amor, mesmo quando estão em uma de
suas discussões ridículas. Quando eu amo, tenho a intenção de amar completamente. Não deve
haver nenhuma outra maneira. Você não sabe se o que ele sentia por você era real ou não. Talvez
ele tenha tido a sorte de, pela primeira vez em sua vida, de estar conectado com alguém bom e
não soube aproveitar isso. Você não pode ser responsável por aquilo que ele fez ou deixou de
sentir.
Airiana acenou com a cabeça em concordância.
— Nós só podemos controlar a nós mesmos, os outros não, lembra? Todas nós prometemos
que viveríamos assim. Nós somos responsáveis pela nossa própria felicidade e fazemos nossas
próprias escolhas. Você não pode permitir que Jean-Claude controle a forma de como você
escolhe viver sua vida, e você não é responsável se ele é capaz de amar ou não.
— Você sempre faz isso, Judith. Você tem medo de seu talento, — Blythe apontou. — Você
encontra maneiras de culpar a si mesma, e por causa disso, gasta metade do tempo se recusando
a reconhecer que todos precisam estar inteiros. Ninguém é de todo bom. Ninguém é de todo ruim.
Você tem que se permitir ser você mesma.
Judith sabia que o que elas estavam falando fazia sentido, mas... Ela passou a mão pelos
cabelos.
— Sinto-me inteira quando estou com Thomas. Não porque eu preciso de um homem para
me aceitar, não é isso. É porque de algum modo ele pode lidar com a intensa emoção, boa ou má,
e a intensidade não parece afetá-lo, pelo menos não negativamente. Eu não tenho medo quando
estou com ele. Nem de mim mesma, nem do meu poder. — Ela apertou o dedo profundamente no
centro da sua palma da mão esquerda. — Ele me faz rir. E eu me sinto bonita quando estou com
ele, mesmo sem nenhuma maquiagem e nos meus jeans e camiseta. Eu não posso dizer que ele é
exatamente bonito, mas ele é todo um homem e muito atraente. Acho que ele é o homem mais
quente que eu já conheci. — Ela fez a confissão rapidamente, as palavras caindo umas sobre as
outras. Ela não tinha dito alma gêmea, mas ela se sentia daquela maneira com ele. Ela não sabia se
falaria com ele novamente, não sabia como se sentia sobre o que havia acontecido entre ele e
Levi. Mas isso não negava a verdade de suas palavras.
— Demais. — Airiana disse por todas elas, um pouco atordoada.
Judith assentiu.
— Exatamente. A primeira vez que coloquei os olhos sobre ele, ele me tirou o fôlego. Ele
estava de pé nas sombras e eu juro que a terra se movia quando os nossos olhos se encontraram.
Eu soube. Naquele momento eu soube que era ele e seria sempre ele. — Ela esfregou as mãos e
empurrou o dedo com força na palma da mão, era um gesto de alguma forma reconfortante.
— Eu sei que não deveria acontecer assim, mas aconteceu. Eu nem sequer imaginava que
conheceria alguém. Eu estava atrasada e estava correndo e então olhei para cima e era como se
ele viesse dentro da minha mente e enchesse cada lugar solitário dentro de mim. Eu não deveria
confiar nele, intelectualmente sei que não deveria, mas não consigo resistir a ele.
— Isso pode acontecer dessa forma, — disse Blythe. — E talvez ele tenha sido feito para
você, como você dizem por ai... Almas gêmeas, mas Judith... — Ela se inclinou olhando-a
intensamente. — Querida, isso não significa que você não deve ser cautelosa. Eu sei por
experiência própria que, mesmo que cada parte de você saiba com absoluta certeza que ele deve
ser o único ou que ele é o único... Nem sempre as coisas funcionam como deveria.
— Quando eu estou com ele eu não tenho medo de mim mesma e me sinto como se ele me
visse por completo. Ele pode ver dentro de mim e ele não tem medo do meu poder, — Judith
deixou escapar, querendo que todas entendessem, mas especialmente Blythe. Era importante que
Blythe entendesse porque, Deus a ajudasse, se ela visse Thomas novamente, ela tinha medo de
cair mais uma vez. Mesmo se todas elas achassem que ela estava louca e dissessem isso a ela,
ainda assim ela ainda continuaria apaixonada por ele.
Seus olhos se encontraram com os de Blythe em uma espécie de agonia de necessidade. Ela
precisava que ela entendesse. Essas mulheres nesta sala com ela eram as pessoas que amava. Sua
família... Tudo o que lhe restava no mundo. Se ela estivesse cometendo um erro terrível, elas a
amava o suficiente para dizer isso a ela, mas ela não sabia se tinha a força para resistir a ele se ele
aparecesse novamente.
— Basta ir devagar, carinho, — Lissa disse. — Vamos conhecê-lo.
— Blythe o conheceu, — Judith se defendeu rapidamente, e então se sentiu uma boba. Ela
mordeu o lábio. — Vocês viram? Viram como estou? E mesmo se ele for mesmo tudo o que parece
ser, o homem perfeito para mim, como fica esta situação com Jean-Claude? Eu sei do que Jean-
Claude é capaz. Seria certo eu colocar a vida de Thomas em perigo? Jonas me disse que havia
fotos de Thomas comigo e já foram enviadas para a prisão.
— Então é tarde demais para se preocupar com isso, não é? — Lissa disse. — Diga ao seu
Thomas a verdade e deixe-o decidir se ele quer correr o risco ou não. Você só pode ser
responsável por si mesmo e suas decisões, Judith. Thomas tem que ser responsável pelas dele, e
Jean-Claude possui seus próprios pecados.
— Você faz tudo isso parecer muito fácil quando realmente é complicado, — disse Judith.
— Porque você está com medo, — disse Rikki, chocando Judith. Rikki encolheu os ombros e
largou sua caneca com o chá já frio. — Eu sei por que eu já passei por isso. É muito assustador
deixar outro homem entrar em sua vida, ainda mais quando sabemos que você o estará trazendo
para nossas vidas também. Esta é a nossa casa. Será que ele se encaixa aqui? Será que ele irá
contribuir e amar este lugar e todas nós? Mesmo quando o relacionamento é novo, você sabe que
sua vida vai ser diferente, complicada, que você vai ser a única a complicar a vida de todo mundo
também, é aterrorizante.
— Então é verdade, — admitiu Judith. — E eu sou uma covarde. Eu não quero que vocês se
machuquem. Quando eu descobri o que Jean-Claude era, eu percebi que amava a ilusão, e não o
homem. Eu estava toda enrolada com o meu amor pela arte, a ideia romântica de Paris e fiquei
totalmente apanhada na fantasia. Thomas é real para mim e apesar de eu não tê-lo conhecido há
muito tempo, estive em sua mente e o senti dentro de mim. Eu estive dentro dele e nos
encaixamos. Se ele quebrar o meu coração, eu tenho medo de não ser capaz de me colocar inteira
novamente. Seus olhos encontraram os de Blythe.
Blythe balançou a cabeça com os olhos cheios de lágrimas.
— Eu te entendo Judith. Vá devagar. Certifique-se de que ele é o homem que o seu coração
está dizendo que ele é.

CAPÍTULO 14

O coração de Judith pulou quando uma mão dura fechou sua boca. Seus olhos se abriram e
ela olhou para o rosto familiar que estava olhando para ela. Seu coração saltou em um ritmo
acelerado e algo profundo dentro dela derreteu em um líquido suave de boas-vindas antes que ela
pudesse se controlar.
— Você não respondeu aos meus telefonemas.
Thomas não tirou a mão de sua boca então ela apenas balançou a cabeça, desfrutando do
seu cabelo caindo sobre a testa, desgrenhado e tão atraente. Ela queria tocá-lo, empurrá-lo para
trás para sentir a textura sedosa na ponta de seus dedos. Ela mal podia respirar... E não tinha nada
a ver com o fato de que sua mão ainda estava sobre os seus lábios.
— Já faz quatro longos dias. Você não pode continuar se escondendo em sua casa, por trás
das portas e do seu sistema de segurança para evitar o que aconteceu entre nós.
Isso era exatamente o que ela estava fazendo, mas ele deveria considerar que, ela podia
estar evitando-o porque era consciente de que ele conhecia Levi. Ele, obviamente, era muito mais
do que apenas Thomas Vincent, o empresário. A indignação brilhou em seus olhos quando ela
olhou para ele.
Ele tirou a mão de sua boca com cuidado, como se ela pudesse arrancá-la com os dentes. A
ideia até passou pela cabeça dela, mas achou que mordê-lo seria indigno.
— Eu ativei o sistema de segurança. Aparentemente, ele é completamente inútil. —
Sentindo-se subitamente muito vulnerável e muito consciente de seu corpo sob o seu
perfeitamente apropriado pijama e nada sensual, ela sentou-se, puxando o lençol até o queixo. —
De que adianta um sistema de segurança caro se ele não mantem os intrusos do lado de fora? —
Ela deu um pequeno e indignado bufo. Ele tinha que ser tão incrivelmente atraente com aqueles
olhos incríveis, suas cicatrizes provocativas e músculo sólido em todos os lugares? Ela estava
zangada com ele por um bom motivo e, pior, com medo do que ele poderia fazer com ela. Ela
tinha que parar de reagir a ele. Mas seu coração se recusava a obedecer, batia tão forte que ela
podia ouvir a batida trovejante nos ouvidos. O sangue em suas veias corria com uma fome quente,
correndo por ela como um trem desgovernado. Ela odiava a felicidade que florescia em seu
interior, não importava o quando ela tentou esmagá-la. Ele tinha ido até ela.
— Seu sistema de segurança é adequado, só não é pra me manter do lado de fora.
Judith provou a paixão. Ela sabia que ela o estava bebendo com os olhos, devorando-o,
quando deveria apenas mandá-lo ir embora, gritar, fazer alguma coisa para salvar a si mesma.
— Deixe-me, Thomas.
Seus olhos se voltaram de uma pulsante água-marinha, vivos e brilhantes. Ela viu a escuridão
precipitar-se sobre ele, destruindo todas as cores de sua aura até que ele não passava de uma
sombra. Sua respiração ficou presa em seus pulmões, seus dedos seguraram o lençol mais forte
em busca de uma âncora.
— Meu nome é Stefan. Stefan Prakenskii. Levi é meu irmão.
Ele fez a confissão em tom baixo, com olhar fixo no dela. Ela não conseguia desviar o olhar
dele, fascinada pelo poder absoluto que viu lá. Este homem não era um homem de negócios. A
aura que o cercava pulsava com perigo. Por um momento ela pensou que não tinha ouvido direito.
Ela sabia que a vida de Levi era envolta em mistério e que ele era um homem muito perigoso.
Agora, ao recordar as memórias de Thomas... Não, de Stefan, fazia mais sentido. Ela balançou a
cabeça, mas nenhum som conseguiu escapar de sua garganta fechada.
— Eu não podia te dizer a verdade sem colocar sua vida em perigo. Em qualquer caso,
Judith, você teria me mandado embora imediatamente e teria me mantido longe. Há uma ordem
de aposentadoria para mim e um exterminador em Sea Haven.
Ele tocou sua mandíbula que já estava curada.
— Persegui o assassino na noite em que você me mostrou a galeria. Ele estava aqui já há
algum tempo. Eu tive que vir para Sea Haven para encontrar Levi. Eu sabia que ele ainda estaria
vivo e não ia deixar ninguém matá-lo. Depois que percebi que você era a mulher que eu queria
passar o resto da minha vida e que minhas emoções eram muito reais, eu quis te dizer a verdade.
Mas eu não podia arriscar a sua vida, não até que eu tivesse falado com ele primeiro. Espero que
você possa me entender.
Judith apertou os lábios, com medo de dizer a coisa errada. Ela não sabia o que sentia. Ela
havia caído de um penhasco com este homem, construído sonhos, deixou de lado o rígido controle
sobre ela mesma e agora ela não tinha ideia de quem ele realmente era.
Inconscientemente, ela balançou a cabeça.
— Não faça isso. Não se feche para mim, Judith. Você faria o mesmo para qualquer uma de
suas irmãs e você sabe disso. Levi sabe que eu estou falando com você. Você pode chamá-lo e
confirmar tudo o que eu estou dizendo. Ivanov está caçando-o e acho que ele nunca vai parar.
Nunca. Ele vai esperar que eu o leve até Levi e, em seguida, ele vai nos matar na primeira
oportunidade.
— Você tem que dizer isso a Jonas.
Algo letal passou por seus olhos, uma chama breve de emoção que a assustou.
— A solução é sempre este homem, Jonas. Ele não é do mesmo aço de Ivanov, Judith.
Acredite em mim, eu conheço o assassino. Jonas pode ser muito bom no que faz, mas está preso
pelas regras e ele não tem escolha senão segui-las. Ele tentaria levar Ivanov em custódia, e Ivanov
o mataria.
— Eu não sei o que isso significa. — Judith agarrou o lençol mais apertado contra ela recuou
para longe dele. Ela estava com muito medo, ela sabia exatamente o que isso significava. Uma
coisa era sonhar em fazer Jean-Claude sofrer e morrer, mas este poder que enrolava tão evidente
agora em Stefan, dizia que ele era realmente capaz de coisas que ela não poderia conceber.
— Isso significa que você pode dizer a Harrington que Ivanov está caçando Levi, mas é
provável que graças a esta informação você consiga que ele o mate. Você não está dormindo a
três noites, Judith.
Ela piscou para ele.
— Você está me espionando?
— Eu estou cuidando de você. Há uma diferença. — Ele esfregou a ponta de seu nariz. —
Tudo bem. Talvez eu estivesse espiando você, — ele admitiu. — Eu precisava saber que estava
tudo bem com você.
Seu coração se contraiu em seu peito. Não havia nada infantil sobre Stefan Prakenskii. Nem
a sua aparência ou seu tom suave e sensual, mas ele parecia tão surpreso e um pouco de
autodepreciativo, como se não conseguisse acreditar em seu próprio comportamento. Ele era um
homem ainda mais disciplinado e mais controlado do que ela, se ela estava interpretando
corretamente a sua apreensão, com ela, ele parecia estar com a moral um pouco baixa e ela não
pode deixar de responder à nota perdida em sua voz.
— Eu não tenho nenhuma experiência com as emoções, Judith. Eu sei que vou fazer tudo
errado e estragar tudo. Eu nunca estive realmente em um relacionamento real.
Seu coração pulou novamente.
— Nunca?
Ele balançou a cabeça.
— Na minha linha de trabalho, relacionamentos são impossíveis. — Ele suspirou e passou a
mão pelos cabelos até que os fios ficaram selvagens e despenteados. — Para ser totalmente
honesto, eu não achava que seria capaz de sentir alguma coisa real por alguma mulher. E então eu
vi você e é como se eu não estivesse mais no controle. Você simplesmente me capturou e eu não
tenho a menor ideia do que fazer sobre isso, Judith.
Ele parecia tão desconfortável, tão completamente perdido, que ela não pode imaginar que
as coisas que ele estava dizendo não seriam verdade.
— Eu só sei que não quero estragar tudo te obrigando tomar alguma decisão muito rápido,
mas eu praticamente já ferrei com tudo, não e?
— Eu acho que nós dois, Stefan. — Judith não o deixaria ficar com toda a culpa. — Eu faço
minhas próprias escolhas, e essa foi uma decisão consciente.
Ele balançou a cabeça.
— Eu estava interessado em uma relação em longo prazo e você estava esperando que se
queimássemos em chamas e a necessidade iria embora. Admita Judith. Uma noite sempre foi tudo
o que você planejou me dar.
Ela não pôde deixar de sorrir para ele e zombar de si mesma.
— Eu pretendia te deixar dar um passeio de trator. Isso era tudo. — Ante ao seu olhar um
pouco cabisbaixo, ela não pode deixar de dar algo para ele. — Só que eu achei um pouco difícil
resistir a você.
Ele soltou o fôlego como se o tivesse contendo por um longo tempo. E talvez estivesse. Ele
sentia como se estivesse contendo o fôlego por quatro longos dias.
— Na Rússia, os meus pais tomaram partido contra um homem muito poderoso.
Infelizmente eles subestimaram suas habilidades e uma noite os soldados vieram e mataram os
meus pais na nossa frente. Formos separados e levados para diferentes instalações de
treinamento militar. Fui criado para ser um trunfo e não conheço outra forma de vida, Judith. Eu
vivi muito tempo nas sombras, sendo um fantasma, indetectável, e então eu vi você e o mundo
em volta de mim mudou... Tornou-se real. É difícil colocar em palavras, mas sei que, o que estou
sentindo por você é real.
Stefan estava totalmente desconfortável, fora do seu elemento, expondo sua alma a esta
mulher, aquele pequeno pedaço que ele havia escondido de seus treinadores, mantido trancado e
seguro todos esses longos anos. Ele tinha sido sempre alguém sem emoções, uma máquina criada
para executar as ordens e então encontrou Judith... Ele sabia que não havia caminho de volta. Se
ela o rejeitasse, ele não tinha mais nada dele mesmo.
— Cada momento que passei com você, não importa o quão duro foi, eu realmente tentei
ser Thomas Vincent, eu passei anos construindo este disfarce, mas o meu “eu” verdadeiro
continuou me pressionando, abrindo passos aos empurrões até chegar a você Judith, em todos os
anos que trabalhei isto nunca aconteceu comigo. Eu gostaria de ser Thomas Vincent para você,
juro que gostaria, mas eu preciso ser honesto sobre quem eu verdadeiramente sou. Se você
resolver ficar comigo, eu preciso que você saiba quem eu sou. Bom ou mau. E a maior parte disso
será má.
Ele estava se despojando para ela completamente, dizendo a crua verdade sobre quem ele
era e rezando para que ela desse uma chance a ele e ao mesmo tempo sabendo que ela seria
louca se aceitasse se amarrar a ele.
— Você está fazendo um péssimo trabalho para vender a si mesmo e, lembre-se, eu estou
um pouco chateada com você agora.
Havia uma verdade subjacente abaixo daquele tom de humor. Stefan balançou a cabeça.
— Eu estou tentando ser tão honesto como posso ser. Eu não quero que você mergulhe de
cabeça sem conhecer todos os fatos. Eu tenho bastante certeza de que Sorbacov deu uma ordem
de eliminação tanto para mim como para Levi. Mesmo se eu conseguir pegar Ivanov, Sorbacov
poderá muito bem enviar outra pessoa. — Ele suspirou. — As chances são muito altas de que ele
faça exatamente isso.
O olhar de Judith se moveu por sobre o seu rosto, estudando-o pelo que pareceu uma
eternidade. Pela primeira vez o seu medo diminuiu completamente e serenidade o rodeou. Ele
adorava a maneira como o seu espírito era forte, abrangendo tudo em seu caminho, (como agora),
era como se ela o envolvesse em um cobertor de paz.
Sua expressão mudou e ela deixou cair o lençol de forma abrupta.
— Vamos lá. Nenhum de nós está dormindo. Podemos beber uma xícara de chá. — Ela saiu
debaixo das cobertas, esperando que ao ceder, ele permitisse que ela saísse da cama.
Ele não conseguiu se mover. Não quando viu que ela estava vestida em uma frágil e suave
camiseta rendada e um diminuto short de menino que abraçava os seus quadris, enfatizando suas
curvas. Ele não se moveu. Sua estrutura muito maior e solida bloqueou o caminho. Como ela havia
se deslizado para frente, seu corpo escorregou praticamente sob o dele. Ele se inclinou para
frente, pressionando seu peito contra ela, obrigando-a a se inclinar para trás. Seus olhos escuros
se arregalaram com o choque, com uma fome indefesa e o desejo se alastrando em sua expressão.
Ele olhou para a sua boca generosa, seus lábios entreabertos e sua língua pequena lambendo
delicadamente sobre o seu lábio inferior.
Ele tomou isso como uma oferta, tal como era, meio hesitante, meio desamparada. Sua boca
tomou a dela com uma implacável demanda. Uma vez que ele a tocou, assim que sua língua se
afundou no calor de veludo de sua boca, ele percebeu que estava perdido. Ele se entregou ao
prazer de beijá-la. Um braço se curvou em volta de sua cintura e ele simplesmente a levantou mais
intimamente para seu corpo. Por um momento, ela o beijou de volta, derramando-se dentro dele,
um fogo líquido enchendo suas veias, correndo direto para sua virilha e transformando-se em uma
necessidade urgente e aquecida.
Judith se afastou, descansando a cabeça contra o colchão e os olhos em buscando o dele.
— Se formos mais longe, você sabe o que vai acontecer, Stefan...
Ele colocou a mão contra sua boca.
— Você terá que me chamar de Thomas por enquanto. Se Ivanov sequer suspeitar que eu
falei a verdade para você, ele vai te usar para chegar a mim, e acredite moi anjo padshii, ele agiria
desta forma.
— Thomas, então. Veja, eu não sei o que eu deveria pensar sobre isso, não sobre não te
chamar pelo seu nome. Não importa como te chame, mas eu tenho que me sentir segura. Eu não
confio em mim mesma quando você está tão perto de mim.
— Eu seria um tolo se deixasse você escapar, Judith.
— Por favor, deixe-me. Eu preciso ter certeza. Eu não posso cometer outro erro. Você tem
que admitir que tudo isso entre nós, aconteceu muito rápido. Isso não te incomoda?
Stefan balançou a cabeça, seu estomago deu um nó apertado. Ela estava pronta para fugir.
Ela o queria, mas não confiava nela mesma. Ela não tinha confiado em si mesma desde que havia
cometido um erro com Jean-Claude La Roux. Tudo parecia sempre dar voltas na direção daquele
homem. Ele deveria ter quebrado o seu pescoço quando teve oportunidade e terminado com isso.
Ele forçou seu corpo tenso a se virar para dar espaço a ela, mesmo quando tudo nele pedia
que a abraçasse forte.
— Quando um homem passou toda a sua vida e nunca sentiu uma imensa necessidade
natural... Uma fome... De estar com uma mulher, acredite em mim, doçura, ele não se importa se
isso está acontecendo rápido demais. Ele é somente muito grato. Eu pensei que era incapaz de
sentir uma atração física real e muito menos emoção real.
Judith deslizou cautelosamente em uma posição sentada quando ele cedeu. Stefan soltou
um pequeno suspiro e pegou sua mão para ajudá-la a levantar.
— Você não sabe se isso é real, Thomas. Não quando você está vivendo uma mentira.
— Minha vida não é real, Judith. Não tem sido verdadeira desde que fui tirado de minha
família. Engraçado, eu havia bloqueado minha infância totalmente, tanto as coisas boas como as
coisas ruins, mas desde que te conheci, eu consigo lembrar o modo como minha mãe sorria e meu
pai brincando com a gente dentro de casa, longe dos olhares indiscretos. Ele era... Mágico. Assim
como também lembro todo aquele sangue vermelho brilhante que ficou rosa e lamacento na neve
quando os soldados atiraram no meu pai e depois mataram minha mãe. Meu irmão mais velho
lutou com eles. Eles o espancaram até que ele não pôde se mover, seu corpo ficou deitado sobre a
minha mãe lá na neve. Eu pude ver os seus olhos, a raiva lá, mas nunca a derrota. Talvez por isso
eu tenha sobrevivido, pela força e determinação do meu irmão.
Stefan recuou, registrando choque em seu rosto, em seu cérebro. Ele nunca permitiu que
essas memórias viessem à tona. Ele não tinha pensado em seu irmão mais velho em mais de vinte
anos. Tinha sido mais fácil deixar ir todos eles. Enquanto eles eram vagos e sombrios em algum
lugar em sua mente, longe, onde ele podia acreditar que estavam seguros e suas vidas não haviam
se acabado.
Ele não queria a compaixão que estava sentindo à sua volta ou a simpatia em seus olhos. Ele
não precisava dessas coisas. Isso o tornava frágil. Ele se afastou dela abruptamente e caminhou
pelo piso de forma rápida, de lá para cá e de cá para lá, com uma energia inquietante.
Imediatamente ele sentiu a presença reconfortante em torno dele, empurrando-o até que não
houve outra escolha a não ser, render-se.
Ele olhou para fora da janela do quarto, mantendo-se de costas para ela, abalado pelas
memórias de sua família e pelo poder do seu elemento, a manipulação de seus próprios
sentimentos. Acima dele, as estrelas brilhavam contra o céu noturno. Abaixo dele, flores brancas
acenavam suavemente, ondulando ao vento, dando-lhes o mesmo efeito que a sobrecarga de
estrelas, de modo que ele se sentia cercado pelo universo, as constelações à sua volta. O efeito
era hipnotizante e calmante. Ela havia criado um santuário, esta mulher e seus talentos
surpreendentes.
Ele se virou para encará-la, automaticamente deslizando para o lado da janela, de costas
para a parede enquanto ele a estudava. Ele permitiu seu olhar ir à deriva sobre ela, bebendo-a, e
absorvendo-a. Ele podia olhar para ela para sempre. Ele sentiu-se como se estivesse acordando
após um longo sono, uma hibernação da vida real. Ele nunca havia participado só assistido das
sombras. Judith, com seu brilho, o atraíra para a luz. Expondo-o. Ele ficou diante dela, vulnerável e
eficazmente nu.
Judith se erguia em toda sua altura, seu corpo firme, cheio de curvas, essa brilhante corrente
de ouro reluzente pegando seu olhar e chamando a atenção para sua cintura e umbigo sedutor.
Seu brilhante cabelo e olhos escuros eram exóticos e intrigantes, e toda essa pele macia exposta
acenando-lhe. Fisicamente, ela era perfeita para ele, porém mais do que disso, havia esse espírito
ao seu redor, atraindo a esperança dele, extraindo coisas que ele havia a muito esquecido ou
nunca conhecido.
— Me rejeitar está fora de questão, Judith. É simples assim. Obviamente, você não tem
compreensão real do que você fez, mas isso não a isenta das consequências.
Um lento sorriso curvou sua boca macia e penetrou em seus olhos.
— Rejeitar você está fora de questão, é?
Ele balançou a cabeça. Sério. Ele não tinha para onde ir depois que ela destruiu o que ele
tinha sido durante anos. Havia apenas... Judith.
— Exatamente.
— E eu fiz isso?
Ele balançou a cabeça novamente, sabendo que não tinha nenhum controle, não quando ela
tinha tomado o seu orgulho. Ele estava pedindo a ela para salvá-lo, salvar a sua alma para salvar
essa pequena parte do real Stefan Prakenskii que ele tinha protegido por tanto tempo. Ela abriu
suas comportas para o amor e para a dor. Ele bloqueou a dor por todos esses anos, mas agora as
lembranças estavam em carne viva e muito reais. Cercando-o. Tão perto que ele sentiu-se quase
como se estivesse perdendo a cabeça. Ela deixou-o sozinho durante quatro intermináveis dias e
três noites.
— Eu posso ser o homem que você precisa Judith, para o que você necessitar. Eu posso ser
esse homem. Você não pode me mandar embora porque você tem medo disso.
Ele tinha que tê-la para ele. Não havia saída para ele. Era muito profundo. Ele sentiu-se
como se houvesse caído de um penhasco em queda livre através do espaço sem uma ideia de
onde poderia pousar. Este era o tipo de mulher que estaria ao seu lado não importa o que
acontecesse, se ela se comprometesse com ele. Ela ficaria com ele para sempre. Não haveria volta
para ela também. Ele havia se permitido esta fantasia, Inclusive fez alguns poucos avanços
amorosos em direção a ela, mas ela ainda estava mantendo seu controle. Controlada. Cuidadosa.
Com medo de chegar a esse lugar onde ele já estava. Judith tinha uma natureza selvagem e
apaixonada e temia perder o controle que lhe permitia proteger as pessoas ao seu redor dos altos
e baixos de suas emoções intensas.
— Você não entende Thomas. — Não havia dor em sua voz. Havia necessidade. Desejo.
Ambos estremeceram quando ela murmurou seu nome falso.
Judith balançou a cabeça.
— A vida não é tudo preto e branco. Eu não posso fazer qualquer coisa que eu queira. Tenho
uma família que eu amo. Pessoas que são importantes para mim. Mulheres que salvaram a minha
vida e me fizeram acreditar em mim mesma novamente. Elas me deram esperança.
— Assim como você fez comigo, — afirmou calmamente.
Seu olhar pulou para ele. Ela engoliu em seco.
— Antes de você chegar, eu me sentia congelada. Sim, Thomas. — Desta vez, ela disse o
nome com firmeza. — Eu sentia como se nunca mais pudesse ter amor na minha vida, não o amor
de um homem ou parceiro, um amor para mim. Eu não tinha esperança de ter uma família
própria. Crianças. Risos. Amor todos os dias. E então eu vi você e antes que eu pudesse respirar
estava tão envolvida que não conseguia respirar. Eu não deixo as pessoas entrar. Eu não posso.
Você não tem ideia do quão perigoso isso pode ser e eu não quero fazer um movimento errado.
Estou protegendo você, assim como a mim e a minha família.
Ele estendeu a mão para ela. Ela parecia muito perdida e incapaz de dar esse passo em
direção a ele. Ela olhou para sua mão e lágrimas nadaram em seus olhos. Ela balançou a cabeça.
— Eu não posso Thomas. Eu não posso explicar, mas você estará melhor sem mim.
Quanto mais agitada ela se tornava, mais energia negativa enchia a sala até que as paredes
pulsavam com ela. No início, a emoção forte fustigava-o, aplainando a sua determinação e
confiança que eles se encaixavam perfeitamente, mas quando seus medos cresceram, endureceu
sua determinação e calma desceu.
— Moi prekrasnyi padshii angel18. — Ele cobriu a distância que os separava e pegou a mão
dela. — Fechaduras não significam nada para mim. Eu posso ir onde eu quiser. É impossível se
esconder de um homem como eu. Você não tem que ter segredos para mim. Eu posso viver com

18
“Meu lindo anjo caído” em russo.
eles e você não precisa deles. — Ele manteve o olhar fixo com o dela, desejando que ela
entendesse.
Seus olhos se arregalaram. Sua respiração ficou presa na garganta. Uma raiva escura se
espalhou pelo quarto. Ele não soltou a mão dela, nem mesmo quando ela ficou tensa e tentou se
afastar para longe dele. Ele a manteve presa a ele, enquanto a propagação da raiva se estendia
como um câncer. O piso ondulou sob seus pés. O poder ampliado sacudiu as janelas. Ele se aferrou
a ela e manteve a calma, no olho do furacão, não se moveu e continuou olhando fixamente para
ela.
— Basta respirar agora, Judith, — ele disse, mantendo sua voz calma. — Eu estou tão
exposto como você e nós ainda estamos de pé. Eu ainda estou de pé com você. Seu pior não é
nada, doçura. Todo mundo fica irritado, sente raiva e até ódio às vezes. Você é um elemento
espiritual de alto grau, infelizmente, se essas emoções escapam de você, outras pessoas podem
senti-las também. Mas as emoções são normais. Eles não fazem de você uma pessoa terrível.
Ela deixou de olhá-lo e olhou para baixo, culpa e vergonha fez com que seus ombros se
encolhessem. Ele sabia que sua culpa não era maior que sua raiva ou seus desejos sombrios. A
vergonha era porque ela não havia sido capaz de vingar seu irmão.
Stefan deu um passo para perto dela, perto o suficiente para compartilhar o calor do seu
corpo, sem tocar fisicamente suas curvas. Ele inclinou o seu queixo para cima, forçando-a a
encontrar o olhar dele.
— Minha vergonha, Judith, é que eu sou totalmente capaz de fazer coisas terríveis para
outros seres humanos sem piedade e sem emoção. Se você me pedisse para fazer este homem
sofrer, ou para matá-lo para você, teria o trabalho feito. Você queria uma arma e eu estou aqui,
disposto a fazer qualquer coisa por você. Infelizmente, se você pedisse isso para mim, eu te diria
que este pedido era fácil demais para eu realizar.
Ele fez a confissão olhando-a diretamente nos olhos, querendo que ela ouvisse, sentisse e
visse a verdade terrível da sua feia declaração. Ela tinha que conhecer o real Stefan não a fantasia
de Thomas. Stefan era um homem de ação e essa ação nunca foi bonita. Sua formação estava
enraizada nele. Ele não poderia ser qualquer coisa com ela, além do que ele realmente era. Ele
queria que Judith visse quem ele era, se apaixonasse e se comprometesse com ele.
— Eu não preciso de um homem para me resgatar.
— É isso o que parece para você, Judith? Um resgate? Pois eu não me importo de dizer. Eu
preciso de você. Eu posso viver sem você? Claro. Eu tenho feito isso há anos, mas posso dormir à
noite? Respirar bem? Sentir a felicidade? Eu não sei... Nunca senti felicidade antes, então agora
que eu sei como é talvez eu passe por um tempo bastante difícil. Eu quero uma parceria com você.
Eu quero a sua alegria em minha vida. Seu senso de humor. As cores brilhantes que você traz para
a vida em mim. Eu acho que você é a única que está me resgatando e não o contrário.
Ela apertou os lábios, de pé absolutamente imóvel, com medo de se mover em qualquer
direção.
— É só uma questão de tempo até você aprender a controlar seu elemento. Você já está
mais da metade do caminho agora. Você engarrafou o lado mais sombrio, mas sabe que não pode
continuar fazendo isso. Por um lado, está sentindo falta das suas pinturas e você precisa delas.
Todo mundo precisa de um equilíbrio. Uma vez que você aprenda a controlar, por que precisaria
ser resgatada, Judith? Estou aqui por mim. Suplicando para você me ver, com a minha alma em
minhas mãos, te pedindo para me salvar.
Judith sentiu seu coração se retorcer. Alguém poderia fingir aquele olhar? Ela tinha estado
quebrada por tanto tempo depois de Jean-Claude... Quebrada por dentro. Suas irmãs haviam
colado a sua volta, mas as rachaduras eram visíveis. Este homem estava diante dela, expondo sua
alma a ela. Expondo seus pecados, pondo sua vida aos seus cuidados. Tudo o que ele era, o que
ele tinha feito em sua vida, o que havia de bom nele.
Por outro lado, ele havia forçado a entrada em sua casa, em seu estúdio fechado e a
espionou. Não era essa a mentalidade de um perseguidor? Como ela podia considerar que era
razoável ele entrar em seu estúdio? Ele nem sequer tinha mostrado remorso, e ela achava que ele
não sentia esta emoção em particular. Ela soltou sua respiração lentamente em um silvo de
necessidade.
Ela não podia se ajudar. Ele nunca teve ninguém. Os vislumbres que ela teve de sua vida, as
pequenas coisas que ele disse a ela, eram de partir o coração. Alguém precisava amar esse
homem. Ela não estava fingindo para si mesma que seria fácil. Ela não estaria participando de um
conto de fadas. Ele era um homem dominador. Levi tinha as mesmas características, mas Rikki
necessitava Levi em seu mundo e Levi "tinha" a Rikki e a amava o suficiente para ceder as suas
necessidades e sempre, sempre, era gentil quando a empurrava para fora de sua zona de
conforto.
Stefan... Thomas... Não tinha essa mesma motivação. Ele dava ordens e fazia perguntas
depois. Ela seria forte o suficiente para viver com esse tipo de força? Um homem que nasceu para
dominar? Um homem que não se importava de passar por portas trancadas? Ele seria uma força
em sua vida sempre. E também seria uma firme âncora.
Seu apelo mexeu com sua natureza compassiva. Ela umedeceu os lábios.
— Como pode não ter havido uma mulher em sua vida, Thomas? Você é um homem muito
sensual.
Ele levou a mão dela ao peito, abrindo os dedos para a palma da mão se encaixar sobre o
seu coração.
— Eu não disse que não houve mulheres. Eu trabalho para um homem chamado Sorbacov.
Ele é um homem muito perigoso, sempre nos bastidores do nosso governo, mas ele exerce
enorme poder e influência. Existem diferenças entre Sorbacov e homens como eu, mas quando ele
me atribui a seduzir uma mulher, eu faço isso.
Ela ouviu o desgosto na voz dele e isso ajudou a aliviar a facada em seu coração.
— Eu fui treinado para atuar conforme me pediam, para prolongar o meu desempenho com
a intenção de amarrar uma mulher a mim através de proezas sexuais.
Ele estava, obviamente, escolhendo suas palavras cuidadosamente, sendo dolorosamente
honesto com ela quando preferia não discutir o assunto.
— Os homens como eu não tem relações, Judith. Recebemos a informação que precisamos,
usamos a mulher para nos ajudar e então caímos fora. — Ele hesitou e seus dedos se fecharam em
torno de sua mão. — Se a mulher é um agente de outro governo, às vezes se torna uma questão
de quem mata o outro primeiro.
— Isso é horrível.
Ele encolheu os ombros.
— É a única vida que eu já conheci por isso é normal para mim. Mulheres como você não
fazem parte da vida que levo.
— E Levi fazia a mesma coisa?
— Fomos treinados em diferentes campos militares e eu não estou certo qual trabalho ele
fazia. Eu sei que, como eu, ele é considerado descartável e desde que Sorbacov não possa
controlá-lo, ele é dispensável, assim como serei eu.
O coração de Judith saltou em protesto.
— O mundo pensa que o agente russo a bordo do iate que afundou está morto. Ninguém
sabe que Levi é aquele homem. Sorbacov deve saber que você é Thomas Vincent.
— Não necessariamente. Quando estou incógnito, fico fora do circuito por longos períodos.
Passei uma grande quantidade de tempo e esforço criando Thomas Vincent com a ideia de que eu
poderia usá-lo quando desaparecesse. No meu tipo de negócio sempre tem que se ter um plano
de contingência. Sorbacov sabe que estou em Sea Haven, mas não qualquer outra coisa. Ivanov
não vai se incomodar em dizer a ele qualquer coisa.
— Você veio aqui com a ideia de desaparecer como Levi fez?
Ele assentiu com a cabeça.
— Se Ivanov está em busca do meu irmão, é porque Sorbacov ordenou fazê-lo. Eu não vou
deixar isso acontecer, o que significa que estou indo diretamente contra Sorbacov. Isso é o que
meu pai fez e ele mandou matá-lo. Eu vim aqui sabendo que seria o próximo da lista a ser
eliminado se eu viesse.
— Mas mesmo assim você veio. — Judith fez uma declaração. Ela podia ver a determinação
em seus olhos. Ele teria vindo mesmo se tivesse havido um pelotão de fuzilamento esperando por
ele para leva-lo de volta para casa, e poderia haver um. Ainda assim... Ele havia vindo.
— Ele é meu irmão. Sorbacov matou meus pais. Isso é todo o sangue que ele obterá de
minha família.
Judith estremeceu. Ela podia ser o elemento espiritual, aquela que ampliava suas próprias
emoções e a dos que a rodeavam, mas ainda assim ela sentiu sua determinação absoluta e
intenção mortal.
— Eu preciso de uma xícara de chá, Thomas. Venha para a cozinha comigo e vamos
conversar lá dentro.
Se ela fosse totalmente honesta, admitiria que não confiasse nela própria para resistir a ele,
não quando a sua lealdade para com seu irmão ameaçava sua própria vida. Ou a maneira como ele
estava ante ela, revelando coisas sobre si mesmo que ela sabia que ele nunca tinha dito a outro
ser humano. Ela enroscou os dedos com os dele e deu um pequeno puxão, levando-o para a porta.
Seu coração doeu por ele. Ela foi criada no Japão por uma mãe e pai carinhosos quando era
criança. Quando seu pai quis voltar para os Estados Unidos, sua mãe não hesitou, fazendo com
que a viagem fosse divertida e aventureira. Sua mãe havia transformado sua casa em um lugar de
amor e paz, cercando-os com sua serenidade e amor a jardinagem. Seu irmão mais velho tinha
sido amoroso e protetor. Ela teve uma infância maravilhosa. Mesmo depois que seus pais
morreram em um acidente quando ainda era adolescente, ela ainda tinha Paul. Ele ocupou o papel
de sua mãe, vigiando-a e fazendo sua vida ser o mais estável possível.
Como tinha sido a vida de Thomas quando criança? Ela tinha visto seu irmão torturado e
morto, e ela já era uma mulher adulta. Qual seria a sensação de ser uma criança e ver ambos os
pais assassinados e seus irmãos tirados de você? Seu coração vacilou um pouco e se oprimiu com
força, dolorido por este pequeno menino. Olhando para Thomas, ela não podia imaginá-lo como
uma criança. Aqueles homens violentos e seus brutais "treinamento" tinham posto o menino para
fora rapidamente.
Stefan seguiu Judith pelo vestíbulo até sua cozinha. Ela não acendeu as luzes, mas todas
aquelas janelas, as estrelas e a lua proviam uma luz tênue para iluminar a sala. Seus longos cabelos
roçavam no centro de sua bunda, chamando a sua atenção para o balanço de seus quadris e o
comprimento de suas pernas esguias.
Ele mal podia suportar o flash de dor em seus olhos quando compartilhou algumas de suas
memórias com ela. Ela era muito sensível e ele não foi o suficiente sensível com ela. Ele não
deveria necessitá-la tanto. Era dar poder demais para uma pessoa, mas ele sabia que podia ser
bom nisso... Em estar com ela.
— Judith. — Sua voz doía com a necessidade de convencê-la. — Eu não vou fingir que eu já
fui um homem bom. Inferno, eu não posso nem reclamar do homem que fui. Eu sou uma
ferramenta e sou condenadamente bom no que faço. Eu não conheço outra forma de vida, mas
quero viver de forma diferente. Eu sei que poderia ser uma pessoa melhor estando com você. Eu
não vejo a ninguém mais. Eu sei quando você precisa de algo, quando você esta triste ou feliz. E eu
posso protegê-la das emoções de outras pessoas, tornar mais fácil para você quando você estiver
em público. Mais do que isso, eu sou capaz de proteger os outros de suas emoções. Isso por si só é
liberdade pura para você.
Ele sentia-se como um advogado tentando, na última hora, salvar a vida de um homem.
Judith olhou para ele por cima do ombro, um olhar completamente natural que ele
encontrou sexy. Seu corpo se excitou, apesar de seu rígido controle. Ele não ia misturar o sexo
nisso. Ela precisava querê-lo porque eles se encaixavam, não apenas porque sua química juntos
fosse explosiva, embora...
— Não, — ela o advertiu levemente, mas sem muita convicção.
Ele arquivou essa informação para usa-la mais tarde, se ele estivesse perdendo a batalha. Ela
era mais que suscetível à sedução e isso era uma coisa em que ele era malditamente bom. Então
deu a ela um sorriso amarelo.
— Eu estou lutando por nós, Judith. Você tem que me dar algo.
Ela encheu a chaleira com água e a colocou sobre o fogão.
— Sua vida tem sido tão diferente, Thomas. Eu não posso nem imaginar os lugares em que
tem estado e nem as situações que você tem vivido. Vivo tranquilamente aqui. Esta é uma cidade
pequena, uma cidade de verdade. Nós somos um estranho e pequeno grupo de pessoas, muito
tolerantes uns dos outros, mas peculiar. É pacífico aqui. Sem muita ação. Nós nem sequer temos
uma força policial, apenas chamamos o xerife se alguém está em apuros. Morte aqui é de velhice
ou pelo mar. Mergulhadores de ouriços e esse tipo de coisa. Como um homem como você,
encontraria alguma coisa interessante aqui?
Ele levou seu tempo, instintivamente sabendo que ela queria que ele pensasse no que falou.
Só que ele não precisava pensar.
— Eu nunca tive uma vida, não uma vida real com uma família e sinceramente, não acho que
posso estar perto de outras pessoas por longos períodos de tempo. Eu sempre vivi fora da
civilização. Não conheço as regras e não sou educado. Posso adaptar-me quando preciso, mas
nunca sou eu, sou outra pessoa, desempenhando um papel, qualquer coisa para alcançar meu
objetivo. Preciso de paz, preciso de um lugar onde eu possa terminar os meus dias em liberdade e
Sea Haven parece perfeito. Thomas Vincent gostaria de ter uma galeria de arte e uma mulher que
pinta e faz caleidoscópios surpreendentes.
Judith se manteve de costas para ele, ocupando suas mãos preenchendo o pequeno bule
com folhas soltas de chá.
— E sobre Stefan Prakenskii? Estou mais interessada nele e no que ele quer. — Ela virou-se
então para enfrentá-lo, recostando-se contra o balcão, estudando o seu rosto, travando o seu
olhar com o dele. — O que Stefan quer?
— Eu quero você, Judith. Eu quero viver com você. Eu te amo e quero ser tudo que você
precisa.
Ele colocou a mão ao lado de seu rosto, incapaz de evitar tocá-la, seu polegar acariciando de
frente para trás sobre toda a pele lisa e macia que ele não podia resistir. Ela era tão bonita para
ele. Sua estrutura óssea, seus os olhos exóticos, sua boca, o nariz pequeno e reto e suas covinhas
intrigantes, mas era o que havia dentro dela, derramando-se, que lhe trouxe um tipo de canto
alegre em suas veias.
— Eu posso ser bom em uma coisa, radost’ moya19, em fazê-la feliz. Mantê-la segura. Amar
você. Eu posso fazer isso.
Quando ela começou a falar, ele balançou a cabeça, colocando os dedos em seus lábios.
— Mas você tem que ter certeza. Não há como voltar atrás. Você tem que saber que tipo de
homem eu fui e o que fiz Judith. Você tem que perceber que você não é nada como eu. Todos
esses lugares sombrios dentro de você são normais, as pessoas devem tê-los. Eu sou aquelas
sombras escuras, a personificação delas. Você pode viver com um homem que está marcado por
dentro e por fora? Pessoas como eu não se recuperam. Temos algumas coisas enraizadas em nós,
e não podemos mudar. Você tem que ser capaz de amar o meu verdadeiro eu.
A chaleira começou a assobiar e Judith virou-se para despejar a água quente no bule. Stefan
não deu um passo atrás para dar-lhe mais espaço, ao invés disso, ficou perto dela, inalando sua
fragrância e desejando que ela o entendesse. Ele se conhecia, sabia que era um homem duro,
retocado no fogo do inferno e, provavelmente habitando ali a maior parte do tempo, perdido nas
fileiras dos condenados, mas ele encontrou uma saída. Bem aqui. Agora. Apesar da perseguição de
Ivanov. Apesar de Sorbacov entrar em pânico porque um jornalista tinha começado a cavar para

19
radost’ moya: tradução: Minha alegria em Russo
obter informações sobre um boato de que as crianças órfãs e filhos de inimigos políticos haviam
sido levados para campos militares e criados para todos os tipos de propósitos.
Na maioria dos casos, Stefan sabia, o mundo externo imaginava crianças sendo preparadas
como células latentes para serem enviadas para os Estados Unidos, o Reino Unido e alguns outros
países. Aquelas poucas pessoas, vivendo a céu aberto, casando-se, tendo filhos, provavelmente
nunca seriam ativadas e quanto dano real eles poderiam realmente fazer? Eram os outros,
treinados para viver nas sombras, assassinos e sedutores, homens e mulheres que poderiam
matar em segundos e desaparecer como se nunca tivessem existido, pessoas que os países
precisavam ter medo. E isso era o que Sorbacov temia que viesse à luz.
Os métodos de Sorbacov tinham sido brutais e apenas as mais resistentes crianças com as
mais fortes vontades tinham conseguido sobreviver. Se a tortura de crianças viesse à tona, se a
verdadeira natureza mortal de seu pequeno exército de agentes viesse à luz, o homem e suas
ambições políticas seriam destruídos e ele sabia disso. Ele não podia dar-se ao luxo de permitir
que estas informações se tornassem públicas.
Judith serviu duas xícaras de chá e se virou para ele, com as xícaras nas mãos.
— Precisamos de leite. Na geladeira tem. — Ela apontou para a geladeira.
Seu coração deu um salto. Pegar o leite para o chá era algo tão domestico. Forçou-se a
caminhar lento, determinado a contar a ela o máximo de verdade que podia.
— Se você me escolher, Judith, o caminho não será suave. Suas irmãs vão tentar arrastá-la
para longe de mim, — ele disse. — E eu não poderei culpá-las, elas farão isso por amor a você,
com medo de que você esteja cometendo uma loucura, amarrando-se a mim. Vai ser difícil não
escutá-las, Judith, porque as coisas que elas dirão provavelmente serão verdades. Eu não sou um
homem bom e elas vão mostrar isso para você. Eu matei pessoas e elas saberão. Eu sou capaz de
esconder minha verdadeira aura e elas vão saber disso em algum momento também. Elas terão
medo por você.
Ele derramou o leite em ambas as xícaras, observando que Judith queria mais do que ele. Ela
tomou um gole, olhando-o sobre a borda de sua xícara de chá.
— Faça um caleidoscópio para mim.
Ele franziu a testa.
— Judith, eu preciso saber se você vai me aceitar ou não.
— Eu não sei ainda. Faça um caleidoscópio para mim. Isso é o que eu preciso. Agora. Esta
noite. Vamos ao meu estúdio e faça um caleidoscópio.
— Isso é algum tipo de teste?
Ela concordou com a cabeça lentamente.
— Eu não posso confiar nos meus instintos com você. Eu não posso ouvir as minhas irmãs.
Eu não posso nem confiar na minha capacidade de ler auras. Eu estou em guerra com a minha
própria verdade. Você fará isso? Fará o caleidoscópio para mim? Tenha certeza do que vai
responder Thomas, porque dessa forma você não será capaz de se esconder de mim, — ela o
alertou.
Ele nunca havia se aberto a qualquer pessoa, mas se ele fizesse o seu próprio caleidoscópio,
ela poderia ver dentro dele, assim como ele tinha visto dentro dela quando olhou para o seu
caleidoscópio sombrio. Ela estava dando uma chance para ele. Por ela, ele sabia que fecharia os
olhos e saltaria de um precipício. Ele estendeu a mão para ela e concordou com a cabeça.

CAPÍTULO 15

— Você pode sentar ali na minha cadeira de trabalho que eu vou pegar algumas caixas com
grânulos, encantos, ervas, vidro e cristais para você escolher. Você tem que começar com um
sistema de espelhos, — explicou Judith. — Este é de cinco pontas e é um padrão de estrelas
standard. Este é um que eu gosto de usar e é um de seis pontas. Este aqui é um sistema de sete
pontas. Um sistema de sete pontas cria uma mandala mais complexa. A mandala é a imagem
criada quando se olha através do sistema de espelho no caleidoscópio.
Seu estúdio era calmante para ela, um lugar familiar, onde passou horas de felicidade,
projetando caleidoscópios e conhecendo pessoas de outros países, pessoas que ela não conhecia e
que olhariam para o mundo que ela criou e obteriam conforto ou alegria através de seu trabalho.
Judith ficou de olho em Stefan quando puxou caixas de encantos e de vidro, espalhando-os
de forma aleatória, acrescentando os cristais coloridos e fios para ele escolher. Stefan examinou
cuidadosamente cada sistema de espelho, olhando de todos os ângulos, estudando-os como se
tivesse gravando-os na memória, e talvez estivesse.
Stefan era um homem muito inteligente, não havia dúvida em sua mente sobre isso, e ele
passou a vida lendo as pessoas e dando-lhes o que eles queriam ao invés de seguir a sua própria
vontade. Ele podia tentar escolher as coisas que ele achava que ela aprovaria, mas com tantas
opções, eventualmente, sua verdadeira natureza seria revelada, ele não seria capaz de ajudar a si
mesmo.
Seu coração batia forte e ela provou o medo em sua boca. Ela estava atraindo um tigre e isso
poderia dar errado muito rápido. Seu mundo desmoronaria se ele escolhesse as peças erradas,
mas ela não tinha escolha. Ela queria esse homem. Ela queria ser essa mulher que ele construiria
sua vida ao redor. Ela queria pertencer a ele. Seu elemento o havia escolhido, e depois seu corpo o
escolheu, muito antes que ela tivesse a oportunidade de pensar com clareza. Ela já estava em
queda livre, sem saber se ele apegaria ou não, e ele a pegou.
Stefan estudou os sistemas de espelho, intrigado com a ideia de construir o seu próprio
caleidoscópio. Até que ele viu aquele no estúdio escuro de Judith, ele realmente não tinha
considerado o que um caleidoscópio poderia realmente fazer. A maioria das pessoas pensava
neles como um brinquedo de criança, e ele inadvertidamente se encontrava nesta categoria.
Mesmo quando ela disse para ele que os caleidoscópios poderiam reduzir a pressão arterial e
ajudar as mulheres no parto ou ajudar uma pessoa autista, ele ainda não tinha percebido o que o
instrumento colorido poderia fazer. Quando ele olhou para o caleidoscópio de Judith em seu
estúdio escuro, ele soube que estava olhando para a sua alma.
Ele olhou a longa mesa com os encantos, contas, arame e cristais por toda parte e sabia que
as escolhas que faria daria a Judith um vislumbre dele mesmo. Essencialmente, se ele fizesse isto,
estaria revelando o seu verdadeiro eu para ela. Havia milhares de opções estabelecidas diante
dele. Esses pequenos pedaços de metal e cristal dariam a Judith todos os motivos para ela fugir
dele, mas ele se recusou a trapacear. Ou ela poderia amá-lo como ele era quebrado e torcido
como o metal, ou eles não teriam a menor chance.
O sistema de sete pontas chamava por ele. Ele a olhou quando o entregou a ela.
Judith assentiu.
— Você é um homem complexo e eu imagino que a escolha do sistema de sete pontas
significa muito mais para você do que apenas a complexidade do mesmo.
— Eu sou um dos sete irmãos. Embora estejamos separados pela vida, nossas vidas
espelham a vida do outro. Existem escolhas para o exterior do caleidoscópio?
— Não tem segredos para o exterior, você poderia revesti-lo com pó.
— Eu prefiro uma camada de poeira, — ele disse imediatamente. Ele não era um homem
extravagante. Na verdade, ele queria algo simples que poderia ser semelhante à pólvora... Ou...
Ele viu um caleidoscópio já feito no final de sua mesa. — O que é isso?
O caleidoscópio estava montado em uma torre feita do que parecia ser vitrais. O
caleidoscópio em si estava revestido de poeira, mais em torno da borda via-se esse vidro
manchado que o atraía. O vidro parecia mudar a cor e brilhava quando ele o contemplava.
— Isso é chamado de vidro dicroico.
— É fascinante. Muda de cor quando você olha para ele de um ângulo diferente.
— É feito de metais em várias camadas micro finas vaporizadas utilizando um feixe de
elétrons em uma câmara de vácuo. Eu não fiz, mas eu adoro a versatilidade. Alguns são claros e
outros têm um fundo preto.
Judith tomou um gole de chá, enquanto ela observava-o se perder na arte de fazer seu
próprio caleidoscópio. Ela adorava dar aulas sobre como fazê-los, porque ninguém poderia ser
cercado pelos objetos luminosos coloridos e não escorregar em um sonho de criatividade. Alguns
clientes cantarolavam, outros ficaram em silêncio, mas todos sorriam enquanto eles trabalhavam.
Ela sempre sentia a alegria em torno dela, quando ensinava uma turma.
Stefan Prakenskii era um homem sério, com um passado trágico. Ela duvidava que ele visse
dessa maneira. Sua vida era simplesmente o que era. Ele aceitou que seus pais tinham sido
assassinados e seus irmãos arrancados dele. Aceitou que tinha sido moldado como um assassino
através do trabalho, disciplina severa e punição, assim como aceitou a atração magnética e
estranha entre eles. Ele era um homem que encontrava momentos de alegria em coisas bonitas.
Encontrou-a bonita, como a arte que ele tanto admirava. O tipo de trabalho que ele fazia e ela não
queria pensar muito de perto sobre o que era exatamente o havia endurecido em um homem
vigilante, letal. Ele tinha que precisar de ação depois de viver essa vida por tanto tempo, então
isso significava que ela seria uma coisa momentânea para ele?
Ela suspirou e imediatamente teve sua atenção.
— O que foi?
Até sua voz parecia tocar sua pele. Ela viu seus dedos longos e capazes rodar o vidro dicroico
mais e mais a medida que as cores mudavam e raiavam, enquanto sentia o tempo todo o peso de
seus olhos. Ele poderia ter sido um pianista com dedos assim. Ele moveu suas mãos tão
lindamente sobre seu corpo. Seu toque era adequado, como se ele soubesse instintivamente
todos os sentidos para aumentar o prazer dela até que ela foi cegada por tudo ao seu redor, até
mesmo o puro sentido comum.
— Estou tentando desesperadamente acreditar que você poderia largar o que você faz e
levar uma vida tranquila, aqui, comigo. — Ela falou apesar do nó súbito em sua garganta. — A
química só dura certo tempo, depois tem que haver algo mais, Stefan.
Deliberadamente, ela usou seu nome para lembrar que ele não era o doce Thomas. Ele era
um homem que matou outros seres humanos. Ela podia desejar que Jean-Claude morresse
horrivelmente, mas este homem realmente poderia fazer tal coisa.
Ela não poderia fingir que a tentação de usá-lo para tal finalidade, sombria e destrutiva não
tinha atravessado sua mente, e isso foi tão alarmante que a fez sentir-se envergonhada.
— O que eu faço não é viver, Judith. Não tenho prazer do meu trabalho. Eu sou bom nisso,
mas viver escondendo a minha própria identidade, inclusive de mim mesmo, não é maneira de
viver. Eu sei que este é o lugar onde eu quero estar, aqui nesta fazenda, vivendo à beira do mar
rodeado por uma bela floresta. Com você.
Ele olhou para baixo da longa mesa cheia de cor. Ele gesticulou ao redor da sala.
— Sua casa é feita de risos e amor, Judith. Para o som das crianças. Os sons de um homem e
uma mulher amando um ao outro. Você entende essas coisas como eu nunca entendi, mas eu
quero compartilhá-los com você.
— Você quer ter filhos?
Ela não soube dizer por que ele se surpreendeu com a pergunta. Ela definitivamente queria
ter filhos. Sempre quis. Ela queria que eles soubessem tudo sobre sua herança japonesa. Ela
queria ser como a mãe, tão serena, movendo-se graciosamente através da sua casa, fazendo seus
filhos se sentirem como se fosse as mais inteligentes, as mais amadas crianças de todo o mundo.
Ele balançou a cabeça lentamente.
— Eu adoraria ver meninas correndo por aí com seu cabelo e seu sorriso e meninos com os
meus olhos e o seu cabelo.
Ela tocou o cabelo e não pode conter o sorriso que surgiu.
— Você gosta de meu cabelo.
Seu sorriso se arrastou até os seus olhos.
— Eu não vou desperdiçar essa chance se entendi este seu comentário. Vou querer ter tudo.
— Eu pensei que você disse que ao se livrar de Ivanov, o homem Sorbacov enviaria alguém
atrás de você.
Ele balançou a cabeça.
— Eu não vou mentir para você, Sorbacov vai mandar outro exterminador, mas meu irmão
mora aqui também. E nós estaremos preparados. Com dois de nós aqui, acredite em mim,
querida, vamos estar seguros o suficiente.
Algo em sua voz a fez estremecer. Ele pegou um dos pequenos pedaços de fio, a cor de água
marinha o atraindo-o. O metal era suave e sem pensar, ele começou a dobrá-lo em curvas mais
suaves. Ela o viu trabalhar, incapaz de desviar o olhar da intensidade em seu rosto. Mesmo
enquanto ele se concentrava nisso com total atenção, ela sabia que ele estava ciente de todos os
movimentos da casa, e, especialmente da presença dela. Ela sentou-se no outro lado da mesa e se
ocupou com o caleidoscópio que estava fazendo para a esposa de Jonas para se concentrar
quando ela entrasse em trabalho de parto.
— Olhe para o caleidoscópio e veja o sistema de espelho de vez em quando, — ela
incentivou, sem o olhar de onde ele estava trabalhando. — E não ceda à tentação de enchê-lo. Os
objetos têm de se mover livremente no líquido.
Ela conhecia cada um dos objetos que ele pegou e descartou. Ele estava maravilhado com a
coleção de fios, encantos e cristais que se reuniam em uma área pequena perto dele. Ela deixou-o
vagar pelas caixas e estudar tudo através do sistema de espelho que ele escolheu. Seus músculos
faciais se relaxaram e a tensão saiu de seus ombros. Ele parecia um pouco menos como um tigre
enjaulado e mais como um homem contente em ampliar os limites de seu território.
Ela tentou não olhar muitas vezes, mas era impossível resistir. Ele pegou várias polegadas de
comprimentos do fio muito fino preto. Ele passou cerca de uma dúzia ou mais de pedaços do fio
em uma extremidade e espalhou com cuidado os fios para fora. Ele parecia muito determinado em
obter que os fios estivessem exatamente do jeito que ele queria o que significava que esta parte
em particular significava algo para ele.
À primeira vista, as ferramentas que ele coletou a partir do cubo de prata pareciam ser
ferramentas agrícolas, mas ela percebeu que cada item tinha um duplo objetivo. Como as cores
mutáveis no vidro dicroico, os instrumentos que ele escolheu tinham múltiplos usos. Cada um foi
usado como armas letais para defender os agricultores de senhores da guerra em tempos
passados, assim como para trabalhar a terra.
Judith desarmou o sistema de segurança que considerava absolutamente inútil de qualquer
maneira e abriu as portas francesas que conduziam ao jardim para que o ar fresco do oceano
entrasse no quarto. Ela estava inquieta e cansada de todo o experimento. Quase não queria ver o
que tinha construído, já que o caleidoscópio estava quase pronto. O ar da noite era nítido. Podia
ouvir o latido dos leões do mar como chamavam um ao outro. Quanto mais ela andava ao redor
da sala, mais estava ciente do silêncio quietude-dele. Ele viveu em silêncio. Ele estava enrolado e
pronto para atacar, mesmo quando parecia tão focado em seu trabalho.
Ele trabalhou em silêncio por mais de uma hora, metódico em sua abordagem para
encontrar apenas os objetos certos para o seu caleidoscópio. Ele não parecia estar preocupado em
satisfazê-la, uma vez que nunca olhava para ela pedindo aprovação ou para obter ajuda. Ele
parecia determinado a mostrar-lhe quem realmente era e que se danassem as consequências.
Ela esgueirou outro olhar. Ele parecia estar colocando as contas em forma de lágrima
preenchidas com líquido vermelho sobre um charmoso floco de neve branco. Suas ações eram
certeiras, precisas, sem hesitação. Ela não tinha que lembrá-lo para olhar o conteúdo de seu
caleidoscópio através do sistema de espelho. Cada vez que acrescentava algo ao seu
caleidoscópio, ele tinha o cuidado de olhar para isso através do sistema de sete pontos.
Seu estômago agitou e ela apertou a mão forte para manter fazê-lo se acalmar. Era difícil
estar na mesma sala com ele e não querer ir ao seu encontro e beijar seu pescoço, ele abaixou a
cabeça perto de seu trabalho.
De repente, ele olhou para ela, seus olhos encontraram os dela com uma luxúria sombria.
Seu estômago ficou tenso e seu corpo se umedeceu com um líquido quente. Ele sorriu para ela.
— Eu também.
Sua boca ficou seca. A palma da mão coçava. Ela estava desesperada por ele e não ajudou o
fato de terem feito selvagem, inebriante amor aqui em sua mesa.
— Usaremos a cama da próxima vez.
Ele fez uma declaração de um fato, certo de que haveria uma próxima vez. Oh, Deus, ela
queria que houvesse uma próxima vez. Por favor, deixe que haja uma próxima vez. Ela sentiu o
pincel do seu olhar como dedos acariciando sua pele. Seus mamilos endureceram sob sua camisa
fina. Ela deveria ter colocado outra coisa.
— Nós teremos anjo, — ele disse. — Tenha fé.
Engraçado ser ele a dizer a ela para ter fé.
Ele sorriu para ela.
— Você é meu anjo pessoal, caído do céu e eu cortei suas asas, doçura. Eu estou mantendo-
as seguras, bem aqui dentro. Agora me diga como selar isso.
Ela não estava segura do que ele quis dizer com ter cortado suas asas, mas ela desvendaria
este suspense e ainda assim ela não queria realmente saber se ela estava enganada sobre ele.
— Eu gostei muito de ter feito isso. — Mais uma vez ele falou com determinação absoluta,
mostrando exatamente como ele era. Uma vez que decidisse algo e tivesse certeza de suas
decisões e ele agia de acordo com isso.
— Sele tampa com o cimento acrílico, — Judith orientou. — Quando você terminar há um
buraco minúsculo, previamente furado, na parte lateral do caleidoscópio. Coloque o óleo mineral
lento com a agulha. — Ela indicou onde. — Use o parafuso pequeno para fechar o buraco depois
que você encher o caleidoscópio com o óleo.
Judith o observou trabalhar com o coração acelerado. Ela teria que olhar para o seu trabalho
em breve e tinha medo do que poderia ver. Ela cruzou a sala e foi ficar na frente das portas
francesas, olhando para o seu jardim. As plantas sempre a acalmavam. Ela amava aquelas árvores
muito coloridas, formando uma cortina, galhos graciosos suspensos acima da estreita faixa de
água corrente sobre as rochas, criando uma pequena cachoeira para alimentar o grande lago de
carpas na outra extremidade. Uma ponte estreita atravessava a parte mais profunda da água. Seu
local preferido de leitura estava localizado sob uma das árvores de tronco mais largo. Parte dela
queria ir lá fora, naquele momento, no frio da noite, e sentar ao lado do lago de carpas com o
vento em seu rosto.
— Venha olhar, — ele convidou.
Seu coração deu um salto. Seus olhos encontraram os dele e ela se preparou. Fechou os
olhos e respirou fundo. Não havia como voltar atrás depois que olhasse o seu caleidoscópio. Ela o
conheceria, conheceria sua verdadeira natureza. E ela, provavelmente, seria a única pessoa no
mundo que teria este conhecimento.
Ela pegou o caleidoscópio cuidadosamente em suas mãos e o virou para olhar para ele antes
de levantá-lo para os seus olhos. A luz se derramou através do caleidoscópio, iluminando as
imagens, de modo que o sistema de sete pontos irrompeu com vida como uma nova constelação.
Gotas de sangue caíam contra uma neve branca com um movimento fluido e gracioso, como se ela
pudesse ver o assassinato que há muito tempo havia transformado a vida de Stefan.
A cena dentro do caleidoscópio era fascinante, quase hipnótica e muito intensa, o vidro
dicroico mudando cores, claras e escuras, vermelho sangue e preto mudando para cores mais
claras, assim como Stefan mudando de pele, se livrando da velha e vestindo uma nova para
completar cada missão. A cor escura foi usada como base e destacava uma explosão de cores
pelas estrelas de cristal brilhantes, pelas várias armas e instrumentos agrícolas.
Passando através das armas, vieram coisas inesperadas, longos cabelos negros caindo como
seda macia, conchas minúsculas rolando por ondas azul-esverdeadas, um efeito dado pelo vidro
dicroico criando a cor exata de seus olhos, a paleta de cores de um artista, dois anéis de ouro
entrelaçados, um alegre pingente um pequeno talismã de estanho representando alegria de um
lado e um grifo japonês do outro. Um quimono deitado em meio a um campo de flores e estrelas
brancas.
O coração de Judith se apertou. A escuridão estriava através do caleidoscópio quando ela
lentamente o virou, jogando as sombras sobre as bordas das estrelas enquanto o sangue sobre a
neve caía como uma chuva. Este era o mundo de Stefan, de esperança, de dor e arte. Ele era ao
mesmo tempo o assassino e o amante. Era um homem de princípios, com um código rígido e uma
tremenda disciplina. Tudo em seu caleidoscópio falava sobre essa dualidade. Ele tinha dois lados, a
queda do cabelo sedoso, as conchas, as ferramentas agrícolas, os anéis entrelaçados, até mesmo
os símbolos japoneses representavam seu olhar para o futuro.
Este homem era capaz de amar, de mudar o rumo de sua vida. E a sua necessidade se
centrava em uma mulher... Uma única mulher. Suas iniciais estavam nesse caleidoscópio. J.H. Ela
as viu lá junto com a S.P. Era significativo para ela que ele não houvesse colocado um T.V para
Thomas Vincent. Para ela, (com ela), ele estava mostrando o seu verdadeiro “eu”. Ele não tentou
esconder-se dela. Ele mostrou a ela o seu passado, o seu presente e sua esperança por um futuro.
Lágrimas turvaram seus olhos. Tudo sobre o caleidoscópio a atraía. Era inteiramente
masculino e sem nenhuma exibição ou enfeite, assim como Stefan. Era uma declaração tranquila,
uma declaração de intenções e assim como suas tranquilas decisões, ela sentiu como se já o
conhecesse, sabia que ele nunca recuaria depois de uma resolução. Para ele, era como se
estivesse escrito em pedra, tal como havia sido escrito ali, naquele grande presente que ele deu à
ela.
Deve ter sido difícil para ele tomar a decisão de parecer tão vulnerável para ela. Ele tinha
que saber que ela veria sua natureza implacável. O guerreiro que havia nele que estava tão
profundamente enraizado que era impossível de reprimir. Esta ponta de dureza que ela teria que
enfrentar, às vezes. A mistura do suave cabelo preto da meia-noite contra essa terrível queda de
neve e sangue, enviou uma espiral de calor enrolando através dela. Era suave e sensual e muito
inesperado, uma declaração de amor... Uma cura. Seu Stefan era tanto um artista como um
assassino. E então, em uma última virada ela viu um ancinho preto e um conjunto de asas
douradas cobrindo-o. Um anjo caído com asas cortadas. As suas. Ele a tinha reivindicado como sua
e ela percebeu claramente o que ele queria dizer isso. Ela era sua salvação, sua alegria, sua razão.
O diabo que havia reivindicado o seu anjo.
Lá fora ela podia ouvir o vento suave que vibrava através das folhas de seu jardim japonês e
no interior, ela podia ouvir seu próprio coração batendo forte. Ela umedeceu os lábios,
cuidadosamente certificando-se de que havia virado o caleidoscópio um número suficiente de
vezes para que conseguisse ver tudo. Cada cena seria sempre diferente, mas cada uma seria
sempre um vislumbre de alma de Stefan. Ela mal conseguia encontrar forças para largar o
caleidoscópio quando o achou tão fascinante. Suas mãos tremiam e seu corpo vibrava. Ele estava
reivindicando-a com cada volta que ela dava no caleidoscópio e que Deus a ajudasse, tudo em seu
ser respondia ao seu apelo.
Ela umedeceu os lábios. Sem pensar, levou o caleidoscópio até o seu coração e seu olhar
encontrou o dele.
— Este é um presente incrível. Obrigado.
— Dei-me para você.
Seu coração deu um pequeno salto engraçado dentro do peito enquanto o seu estômago
deu um solavanco lento. Sua voz era baixa, tão silenciosa que era apenas um fio de som, mas não
havia como negar que ele estava fazendo uma declaração. Uma suplica. Ela o desafiou e ele mais
do que aceitou. Stefan não tentou suavizar sua verdadeira natureza, estava lá no caleidoscópio
que ele havia acabado de fazer, as armas e inclusive um pequeno garrote que ele torceu com um
pedaço de metal.
— Eu simplesmente me dei a você, Judith. Entreguei tudo o que sobrou de Stefan Prakenskii.
Dê a si mesmo para mim.
Ela embebedou-se nele. Ele era um homem grande, cheio de músculos, sem bordas suaves,
mas ela poderia se afogar em seus olhos azul-esverdeados, ficar cativa em seu sorriso relutante e
pegar fogo sob o seu toque. Ele seria completamente dela, ela tinha visto que este era o seu único
propósito.
— Se você me deixar ficarei destruída, — ela admitiu.
— Você é quem tem que saber se é ou não capaz de ficar comigo. Quando assumo um
compromisso, Judith é para sempre. E espero o mesmo da minha mulher. — Aquilo era tanto um
aviso quanto uma promessa. — Ela tem que confiar em mim, ter fé em mim, como eu terei nela.
Eu não sei como fazer as coisas pela metade. Portanto esteja certa de que realmente me quer meu
anjo.
— Estou aceitando um monte de coisas com fé, Stefan.
— Eu sei que estou pedindo muito de você. Nunca fui um bom homem. Vivi por um código e
tentei nunca deixar um inocente em perigo, mas eu matei Judith. Muitas vezes. E usei o que sei
para obter informações de outros agentes. As coisas que fiz não me fazem sentir orgulhoso, mas
não me envergonho disso. Essa tem sido minha vida. Eu gostaria de dizer que parte da minha vida
acabou, mas até Ivanov morrer e Sorbacov perceber que não serei uma ameaça para ele, a menos
que ele não nos persiga, eu não posso te prometer isso.
Judith assentiu.
— Eu ainda acho que devemos falar com Jonas.
— Eu não tenho nenhuma ideia de como é estar em um relacionamento e muito
provavelmente cometerei erros. Eu não sou um homem social. Sair com pessoas não é algo que
vai me fazer sentir confortável.
— Eu percebi isso. — Ela não pôde deixar de dar um pequeno sorriso. — Não se preocupe,
eu vou te proteger. Eu sou muito boa em me socializar.
Ele andou propositadamente até as portas francesas e fechou-as, conferindo as fechaduras e
mais uma vez acionando o alarme.
Judith revirou os olhos.
— Você não acha que este alarme é bobagem e bastante inútil?
— Ele manterá todos do lado de fora. — Ele se virou para ela, seu olhar brilhante, passeou
por ela com uma fome crescente nas profundezas de seus olhos. — Tire suas roupas. Eu prefiro
você vestindo apenas esta corrente de ouro sob essa pele macia.
Ela sentiu onda de calor passar através dela. Seus mamilos reagiram, tornando-se dois
pontos duros. Um rubor rastejou até o seu pescoço. Ela sentia-se quase fraca de tanto que o
queria. Havia algo muito sexy sobre aquela maneira como ele dava ordens. Ela adorava que ele
pertencesse a ela. E ele pertencia. Ela soube no momento em que seu espírito havia se fundido
com o dele. Era reconfortante saber que ela poderia soltar uma violenta tempestade de emoções
e que ele podia lidar com isso.
— Judith.
A impaciência suave na forma como ele disse o nome dela enviou outra onda de calor
correndo através de suas veias. Eletricidade faiscou no estúdio. Ela pegou a borda de sua blusa
quase sem pensar e puxou o material sobre sua cabeça. A inspiração rápida dele enviou um
arrepio por sua espinha.
Ele se aproximou dela, perto o suficiente para que seu perfume masculino a envolvesse.
— Às vezes, quando olho pra você, tenho que me lembrar de que você é real. Você é tão
linda para mim, tudo sobre você, — ele confessou e a pegou como se ela não pesasse mais do que
uma pena.
Judith, ainda estava segurando a parte inferior de sua blusa acima do seu pescoço quando
ele a pegou nos braços e a carregou para a sala. Ele não parou para ir até o interruptor de luz ou
fechar a porta, mas ela sentiu uma onda de poder e as duas coisas aconteceram quase
simultaneamente. Ela prendeu a respiração com a constatação de que Stefan não era
simplesmente telepata ou um escudo para suas emoções, ele era capaz também de telecinesia 20.
As trancas abriam-se para ele e ele podia mover objetos, um talento raro.
— Seu espírito amplia minhas capacidades, — ele disse quando a levou até as escadas. —
Percebi isso na primeira vez que compartilhamos uma fantasia erótica. Eu não sei se fui eu quem
iniciou ou você, mas o poder foi incrível. Você deve tê-lo sentido também.
Judith não pôde esperar para chegar ao quarto. Ela beijou o queixo, os cantos de sua boca e
então prendeu seus lábios com firmeza sobre os dele. Sentia como se ouro líquido estivesse se
derramando em suas veias e espalhando-se por seu corpo em um processo lento. A sensação era

20
Telecinesia: Movimento de objetos sem contato da pessoa que os provoca, movendo-os à distância.
maravilhosa e ela não conseguia parar de beijá-lo. Ela amava o seu gosto, toda a sua
masculinidade, a exigência sexy e picante e sexy em sua boca quando ele a beijava novamente e
novamente.
Ela pareceu flutuar e de alguma forma chegou ao no quarto, Stefan foi para a cama com ela,
ajoelhando-se sobre ela quando a beijou, suas mãos em seus shorts, despindo-os de seus quadris
rapidamente. Sua boca se arrastava como fogo de sua garganta para os seios, roubando sua
respiração e sua sanidade. Seu corpo tremia de fome por ele, seus quadris e pernas moviam-se
sem parar debaixo dele em uma agonia de necessidade.
Muitas vezes ela se sentiu incompleta e totalmente sozinha e vazia. Nunca ninguém a tinha
feito sentir da forma que ele fazia. Tão preenchida por ele. Ele derramava-se em sua mente, assim
como ela se derramava na dele. Eles preenchiam um ao outro, de modo que não existiam espaços
vazios, nem sombras, apenas uma fusão completa dos espíritos.
Sua língua lambeu o seu mamilo e depois o mordiscou, ela se arqueou para ele, oferecendo-
lhe seus seios fartos e agora doloridos precisando de sua atenção. Seus braços circularam sua
cabeça, segurando-o para ela, enquanto dava-lhe uma festa. Fogo chicoteando de seus seios para
sua vagina. Fogo crepitando por ela quando gritou, quase soluçando em sua necessidade de senti-
lo dentro dela.
— Tire a roupa. Desta vez, quero ver você todo, — ela suspirou.
Ele levantou a cabeça, seus olhos estavam mais escuros pela turbulência da luxúria.
— Tem certeza que está pronta para isso, Judith? Meu corpo está um pouco machucado.
Ela tocou o seu rosto... Aquele rosto querido, tão perfeitamente esculpido. Era o rosto de
um homem, não havia nenhum sinal do espírito do menino. Ela traçou suas cicatrizes com os
dedos tremendo.
— Deixe-me te amar, Stefan, — ela sussurrou. — Essas coisas que aconteceram com você o
moldou para o homem que eu quero. Deixe-me tê-lo completamente.
Stefan ajoelhou-se diante dela, sem palavras, seus olhos azuis esverdeados estavam ainda
mais brilhantes. Suas mãos caíram foram para os botões de sua camisa, ele a abriu bem devagar e
movimentou os ombros para tirá-la. Ela mordeu com força o lábio inferior. Seu peito estava
atravessado com cicatrizes e ferimentos antigos. Havia marcas em toda a sua barriga e ao redor de
seu quadril, desaparecendo em seus jeans.
Judith passou o dedo pela borda de uma longa cicatriz que havia em sua cintura antes de
abrir sua calça jeans. Ela puxou-as até os joelhos e seus olhos se arregalaram quando sua dura
ereção se projetou bem na frente de seu rosto. As cicatrizes marcavam suas coxas e passavam ao
redor dos pelos acima do pênis. Não havia dúvida de que ele tinha vivido suas batalhas.
Ainda mantendo ainda sua posição acima dela, Stefan deslizou uma perna para fora da
cama, tirou o jeans e em seguida o tirou da outra perna, mantendo ainda sua posição acima dela,
virando apenas um pouco para que ela pudesse acompanhar o ângulo de seu corpo, abrangendo-
o, permitindo que desse uma boa olhada no roteiro de cicatrizes. Judith girou o corpo ligeiramente
procurando um ângulo melhor para examinar cada cicatriz, seus dedos roçaram por elas
reverentemente. Ela inclinou-se para pressionar uma série de beijos ao longo de cada linha.
Stefan fechou os olhos e apenas permitiu que seu corpo sentisse. Ela era um milagre,
trazendo-o de volta à vida. Ele sempre mandava em seu corpo quando tinha que seduzir uma
mulher. Ele nunca se dava a elas, nunca permitia que o tocassem para reclamá-lo como Judith
estava fazendo naquele momento, e como ele achava que a amava um pouco mais do que outros
homens amavam suas mulheres, sentiu que aquilo não só era aceitável, mas inteiramente
compreensível, por isso perdoou a si mesmo por sua perda de disciplina e controle.
Pela primeira vez ele permitiu-se ser tocado. Ele sabia que nunca esqueceria este momento.
O toque de seu cabelo sobre suas coxas era tão malditamente sensual que seu pau se inchou
dolorosamente. Ele levou a mão ao seu grande e grosso membro, circundando-o levemente para
aliviar a ânsia terrível enquanto ela aproveitava o seu tempo acariciando seu corpo com os dedos.
Seu coração saltou quando sentiu o roçar de sua língua ao longo de sua coxa. Suas mãos
deslizaram em torno da sua perna, segurando seu torso para cima, enquanto ela lambia um
caminho até o interior de sua perna. Seu coração parou por um instante e depois começou a bater
forte quando sua língua encontrou o seu saco. Não havia nenhuma hesitação da parte dela, só
uma ânsia para dar prazer a ele e reclamá-lo com a mesma eficiência determinada como ele a
havia reclamado.
Ele sempre foi o sedutor, sempre se assegurou que o seu alvo escolhido sucumbisse
rapidamente a sua experiência. E ele nunca havia esperado, (ou permitido), uma mulher desse a
ele o mesmo prazer, não como aquele. Não aquele completo controle de cada um de seus
sentidos. Depois de seu treinamento, ele tinha sido incapaz de agir sem que seu cérebro tomasse
o comando, ele julgava o seu alvo e sempre decifrava o que seria melhor para o seu prazer para
que pudesse realizar a sua missão. E agora sua mente estava totalmente nublada, reforçada pelo
elemento espírito, seduzido por essa mulher a qual ele havia se apaixonado rápido e fortemente.
Suas mãos se moveram até sua bunda, massageando e apertando quando ela beijou o
caminho até o seu pau, sua língua passeou sobre suas veias grossas e escuras e ao redor de sua
cabeça. O ar sumiu de seus pulmões em uma corrida quando sua boca abriu para ele e o chupou.
Sua boca era tão apertada quanto um punho macio, quente, úmido e aveludado. Seu coração
quase explodiu. Ele pegou seus ombros e deitou-a sobre a cama, com sua cabeça ligeiramente por
cima da borda, enquanto se ajoelhava acima dela. O ângulo permitia que ele deslizasse seu pau
mais profundamente naquele paraíso incrível. Suas mãos encontraram seus seios, rolando e
puxando seus mamilos enquanto ela o chupava com um impulso forte, em depois, gentil. Sua
língua dançava sobre ele, suave e firme, em seguida, o lambendo como um gatinho.
Ele lutou por ar, lutou por um pouco de controle. Sexo era apenas... Sexo, uma ferramenta,
uma arma. Mas ela transformou-o em algo muito diferente, algo tão distante do que ele conhecia
que ele não teve a menor chance contra ela. Emoção explodiu sobre ele junto com uma intensa
sensação que transformou seu cérebro em um mingau e seu corpo em puro fogo.
Ela fez um som, um apelo, uma vibração que atravessou seu corpo até que ele estremeceu
com a necessidade de empurrar dentro dela.
Por favor.
Oh Deus. Este pequeno apelo. Tão bondosa. Judith. Sua mulher. Ela queria dar isso a ele,
para permitir que ele se rendesse ao puro desejo carnal, para usar o seu corpo para o seu prazer
exclusivo. Ela não estava pedindo nada em troca, e Deus o ajudasse, porque ele não podia fazer
nada a não ser sentir o amor crescendo junto com a luxúria, misturando-se até que os dois já não
estavam separados, mas intimamente entrelaçados, juntos para sempre.
Ela encontrou uma maneira para romper a porta de aço sólido que existia dentro dele, que
seus treinadores haviam erguido de forma tão brutal para bloquear toda a sua emoção e fechá-la.
Ela penetrou com sua serenidade suave, com sua exótica natureza generosa, compassiva, e
encontrou uma maneira de levá-lo a outro mundo, onde ele nunca havia imaginado que pudesse
entrar. Seus olhos ardiam junto com o seu peito enquanto ele lutava para respirar, lutando por
equilíbrio. Era tarde demais, ela se arrastou por seu coração em uma onda de puro desejo.
Sua boca apertada se deslizava ao longo de seu membro, incapaz de tomar toda a extensão
dele, mas ela não usou a mão para detê-lo, ela confiava nele e estava disposta a dar o melhor para
ele. Ela não atuava como as mulheres com quem ele havia estado, sua alegria e natureza generosa
estavam completamente envoltas em um sentimento de amor que o levava perto de euforia. Se
houvesse um subespaço aonde todas as sensações vinham juntas, fundidas em prazer final
envolto em emoção, ele estava lá neste lugar.
Suas mãos seguraram o seu cabelo, segurando também sua cabeça. Ele começou o mais
suavemente possível para ela se acostumar com o seu controle. Ela não lutou contra ele, e quando
ele escorregou mais um centímetro dentro dela, sentindo perto da sua garganta ela o espremeu e
apertou. Ele jogou a cabeça para trás e segurou-a quieto, ainda com a cabeça para trás, deixando a
sensação incrível inundar-se por ele. Ela respirou quando ele puxou a cabeça para trás e começou
um ritmo duro, deslizando profundamente e segurando lá por um momento, vivenciando o
paraíso. Ela agarrou suas coxas e segurou suas bolas apertadas, massageando-as suavemente e
depois quando ele deslizou mais profundamente, ela as apertou suavemente. Podia sentir seu
corpo crescendo cada vez mais quente, até que o calor fervente fez seus impulsos ficarem mais
difíceis de controlar. A sedução de sua boca não o estava ajudando. Na verdade, ela o incentivava
com as mãos e boca.
— Moya angel, ya tebya lyublu 21, — ele disse entre os dentes, as palavras arrancadas de
algum lugar profundo dentro dele. O amor era uma palavra muito insípida para a emoção que
brotava dentro dele como um vulcão. Ele teve que parar antes que fosse tarde demais, e nunca
em sua vida isso tinha acontecido com ele.
Com muita relutância, ele soltou as mãos de seu cabelo e fechando os olhos, afastou-se do
paraíso de sua boca quente.
— Eu quero adorar o seu corpo hoje à noite, Judith.
— Eu pensei que estava adorando o seu, — ela disse. — Estava enviando a você uma
mensagem de amor, Stefan. Espero que você saiba que estou dando o meu coração para você.
Ele beijou o seu queixo, sua garganta e o seu pescoço.
— Eu entendi perfeitamente e espero que você entenda o que vou dizer a você...
Judith mal pôde respirar quando sentiu sua boca em seus seios. Seus dentes e língua
provocando seus mamilos e os transformando em picos duros de dor e desejo. Ele tomou-a rápido

21
“Meu anjo. Eu te amo” em russo.
e ela já estava meio louca com a necessidade e a fome. Ela adorou tê-lo levado próximo ao seu
limite, sabendo que era a única mulher que tinha feito tal coisa com ele. Era uma experiência
emocionante, ela desejou sentir o seu sabor e a sua textura, e amou a forma de como o fez se
sentir impotente com um desejo feroz como fez. Tocá-lo e usar sua boca sobre ele alimentou
também a sua própria fome profunda.
A língua de Stefan traçou suas costelas e encontrou o seu umbigo. Ela não tinha ideia de que
poderia ser tão sensível. Estariam aqueles sons vindo de sua garganta? Desespero. Suplicas. Ela
estava em chamas e não conseguia parar de mover os seus quadris quase desesperadamente. Ela
queria chorar com a necessidade. Como poderia a química entre eles ser assim tão fora de
controle, uma tempestade de fogo ardia, que queimava tanto que ela achava que não poderia
suportar?
Eu tenho você, bebê.
Ele assegurou a ela. Sua língua mergulhou novamente em seu umbigo e abriu caminho para
a junção de suas pernas.
O roçar de sua voz dentro da sua cabeça só serviu para aumentar seu prazer ainda mais.
Havia algo muito íntimo sobre a comunicação com ele neste nível. Ela podia sentir a intensidade
de sua fome por ela, a necessidade dominá-la, possuí-la, reclamá-la como sua. Ele queria uma vida
com ela, (para sempre com ela), e ele imaginava viver por muitos anos aqui na fazenda, em sua
casa. Ele planejava fazer amor com ela em cada cômodo da casa e na varanda. As imagens eróticas
em sua cabeça reforçavam suas próprias fantasias.
E então ele baixou a cabeça e sua língua lambeu o calor líquido que se derramava ao longo
de suas coxas em boas-vindas e cada pensamento sensato desapareceu. Ela pensou que havia
gritado, mas o que saiu foi um soluço suplicante. Sua língua fez um círculo lento e, em seguida,
empurrou profundamente dentro, ainda de forma deliberadamente lenta, tirando o ar de seus
pulmões.
— Eu estou pronta. Eu estou. Você não tem que fazer isso — ela implorou porque estava
muito perto de gozar.
Eu quero fazer isso. Amo o seu sabor. Eu simplesmente poderia te comer.
Sua voz era um rosnado suave, suas fortes mãos agarravam seus quadris enquanto ela se
debatia sob ele. Judith não conseguia parar os suspiros pequenos e os gemidos lamentosos
escapando de sua garganta enquanto ele a devorava como um homem possuído.
Música. Eu amo a música que você faz.
Ele estava matando-a de prazer. Com sua boca. Com seus dedos. Até mesmo com sua voz. Se
ele mantivesse presa a um ritmo, talvez ela pudesse ser capaz de manter um pensamento claro,
mas ele mudava continuamente, ela a lambia, chupava e a acariciava de forma que ela estava se
sentindo um pouco louca e selvagem. E lá no fundo, a tensão estava se enrolando cada vez mais a
fazendo ofegar por ar e implorar para que ele a enchesse.
Seu rosto estava abalado quando ele ajoelhou-se na cama e colocou suas mãos nos quadris
arrastando-a para ele, levantando seu corpo muito facilmente. Ela era uma artista e se ela
quisesse pintá-lo, tentaria capturar esse olhar esculpido em pedra com pura sensualidade
estampada em seu rosto. O desejo sombrio brilhando em seus olhos e a fome marcada em sua
boca. Ele era tão lindo e sexy que um caroço surgiu em sua garganta, bloqueando todo o som que
ela pudesse fazer quando sentiu a cabeça larga de sua ereção pesada pressionando sua entrada
necessitada.
Ela ouviu seu batimento cardíaco trovejando em seus ouvidos quando seu pau lentamente
invadiu seu corpo, centímetro por centímetro. Ele encheu-a tão completamente que enviou
faíscas de fogo, (e relâmpago), correndo sobre a pele, inflamando cada nervo a um ponto quase
insuportável. Sua carne dura como pedra, empurrando cada vez mais fundo em seu corpo,
queimando seu corpo com um calor abrasador.
Ela o queria com todas as forças de seu ser, queria que ele pertencesse exclusivamente a ela.
Ela apertou os músculos ao redor dele, agarrando–o duramente, desesperada por ele. Seus
gemidos de agonia a chocaram, seus olhos estavam turbulentos e tempestuosos com a luxúria. Na
verdade, ele gemia um som torturado, estrangulado, que fez com que seu coração batesse forte e
seu corpo se contorcesse ainda mais por baixo dele.
— Anjo, eu vou perder o controle, se você continuar fazendo isso. Eu juro bebê, você é tão
malditamente quente, tão apertada, que eu estou perdendo a minha mente.
Ela queria que ele perdesse a cabeça, que perdesse o seu perfeito controle... Por ela. Com
ela.
— Perca, então, Stefan. Comigo. Perca a sua mente comigo, — ela sussurrou, não
compreendendo totalmente o que estava pedindo, mas sabendo que com ele, ela iria a qualquer
lugar.
Ele se afastou e começou a empurrar com movimentos duros, quase brutais, penetrando
pelas dobras de veludo de modo profundo, tão profundamente que ela subia para encontrá-lo,
seus músculos pulsando em torno de sua carne pulsante. No fundo, cada movimento que ele fazia
a preenchia, acariciando-a, mandando rastros de fogo sobre ela até que ela estava quase sem
sentido com tantas sensações rasgando através dela.
Suas mãos a seguraram ainda mais apertado e ela sentiu a diferença nele, como se ele
estivesse pronto para explodir, como se o controle que ele havia mantido por tanto tempo
estivesse no fim. Seu ritmo ficou selvagem, ele empurrou mais forte e rápido, profundamente,
enchendo-a completamente, uma britadeira tentando encontrar seu útero e se acomodar lá. Ela
ouviu seu próprio grito de entusiasmo, quando ele se enterrou de novo, mais e mais, os golpes
rítmicos marcando seu sangue com fogo e quase a levando para fora da cama, só o controle
apertado das suas mãos as seguravam no lugar.
A tensão cresceu em uma espiral cada vez mais forte que ela estava sacudindo a cabeça, e
enterrando os calcanhares no colchão, tentando desesperadamente se afastar para empurrar-se
mais duro para ele, empalar-se na lança de aço que não parava de empurrar para dentro dela. Ele
estava atormentando-a, deixando-a louca com uma necessidade tão frenética que parecia
interminável. Sua respiração ofegante ficou em soluços, enquanto a tempestade se abatia sobre
ela.
Ela abriu a boca em um grito silencioso, quando seu pau duro pressionou sobre o seu nó
sensibilizado. O corpo dela se apertou contra o dele, prendendo-o, segurando-o como um torno
de aço e seda. Onda após onda a sacudiu, varrendo ambos em uma torrente de sensações. Seu
grito rouco foi áspero, um grito assustado de triunfo em algum lugar entre o amor e a alegria de
que ele podia queimar desta forma com ela, podia sentir com ela.
Stefan, com sua força restante, arrastou-a completamente para a cama e desmoronou por
cima dela, enquanto ambos lutavam para respirar. Seus cabelos estavam úmidos e um brilho fino
umedecia os seus corpos. Seus corações estavam batendo como loucos, em um ritmo tão
acelerado que fez os dois sorrirem. Stefan passou os braços em torno dela e a rolou até que ela se
esparramou em cima dele. Ele a segurou em seus braços por um longo tempo, respirando
profundamente, antes de levantar a cabeça para trilhar beijos em seu rosto enquanto sua mão
alisava o cabelo de Judith para trás. O olhar dela passeou lentamente sobre ele, seus olhos...
Aqueles profundos olhos azul-esverdeados, estavam sorrindo e seu rosto estava relaxado.
— Nós ainda não terminamos moya angel. Estamos apenas começando.
Ela olhou para baixo sobre o seu corpo e seu membro já não estava mole, na verdade nem
perto disso.
— Isso não é possível.
Ele sorriu para ela.
— Você não tem ideia do que eu posso fazer.

CAPÍTULO 16

— Eu nunca me moverei novamente. Estes dois dias e noites na cama quase me mataram.
Judith inclinou sua cadeira para trás e colocou os pés sobre a grade da varanda com vista
para o jardim e olhou para as estrelas.
Ela estava exausta, completamente e totalmente exausta. Sentia seu corpo desossado e
todos os seus músculos estavam fracos e inúteis. Ela estava com dores em lugares que ela não
sabia que existiam, mas era uma dor deliciosa.
Os braços de Stefan a abraçaram por trás de seu pescoço e ela olhou para o rosto que
apareceu ao lado dela. Ele sempre parecia tão intenso, tão predador. Não havia nenhuma maneira
dele esconder o que era. Ela se viu sorrindo, a alegria estourando através dela.
— Se você veio para me atacar, homem louco, eu não vou me mover.
Sua boca se contorceu.
— Um desafio, então. Eu não gosto de perder.
— Não! De jeito nenhum. Não é um desafio. Eu cometi esse erro há uma hora e tive que
rastejar até aqui. Eu não consigo nem ficar em pé. — Rindo, ela estendeu as mãos para cima em
sinal de rendição.
— Nesse caso, eu vim com presentes. — Ele abaixou a cabeça e tomou sua boca.
Ela adorava a confiança que ele possuía e que beirava a arrogância. Ele sabia que a tinha
enrolado em torno de seu dedo mindinho. Ela não diria “não” ao seu beijo nem a fazer sexo com
ele. Nunca. Não precisava de muita persuasão por parte dele. Seu corpo pertencia a ele. Ela
perdeu-se no seu beijo, no calor de sua boca, no gosto da paixão e do amor. Teve que interromper
o beijo para respirar antes que simplesmente se afogasse nele.
— Chocolate quente, — ele anunciou. — Eu ia fazer chá, mas você precisa dormir se vai
trabalhar amanhã.
Ela pegou a caneca quente e lambeu o montão de chantilly por cima.
— Você é meu salvador. Eu estava pensando que chocolate me faria reviver, mas não tinha
forças para levantar e fazer.
— Eu li sua mente, — ele admitiu, pegando uma cadeira em volta para se sentar ao lado
dela.
— Você não tem que ir trabalhar amanhã. Poderíamos tirar mais um dia para nós.
— Eu não sobreviveria mais um dia, — Judith admitiu, rindo. A felicidade dançava no ar, ao
redor deles, pequenos fios de prata e ouro que brilhavam como as estrelas. — E Airiana
definitivamente me mataria, se você não o fizesse, claro. Ela está me cobrindo na loja, mas ela não
pode continuar fazendo isso por mais tempo.
— Suponho que tenho que te dividir com o mundo, — ele disse. — Eu vou com você para
Sea Haven amanhã dar uma olhada nos livros fiscais da galeria.
— Você está realmente pensando em comprá-la?
Ele encolheu os ombros.
— Eu tenho muito dinheiro, mas nunca pensei em investir em nada. Sempre aproveitei o
meu tempo livre para visitar galerias em todo o mundo talvez porque em meu subconsciente,
sempre considerei o que eu faria se possuísse uma.
— Esta é uma cidade pequena, Stefan.
— Thomas. Stefan Prakenskii não existe. Não há nenhuma fotografia dele nem impressões
digitais. Duvido inclusive que ele possua uma certidão de nascimento. Eu sou um fantasma, Judith.
Sorbacov nunca ouviu falar de Thomas Vincent, o empresário norte-americano. Todos nós
desenvolvemos inúmeros disfarces que pudessem desaparecer quando necessário, mas o disfarce
de Vincent é sólido. Ele vai morar aqui com você, vai fazer caleidoscópios, possuir uma galeria de
arte e fazer bebês.
Ela riu, bebendo um gole cauteloso do chocolate quente. Ela deveria saber que ele estaria
com a temperatura ideal. Stefan observava pequenos detalhes, ela já havia aprendido isso sobre
ele. Ele sempre se preocupava com o seu conforto, providenciando um banho, carregando-a
depois que faziam amor louco e selvagem, envolvendo-a em cobertores ou entregando-lhe uma
camisola quase antes dela saber que estava frio. Ele nunca teria servido seu chocolate muito
quente para queimar sua boca.
— Você está obcecado com bebês.
Ele sorriu para ela.
— Com fazer bebês, — ele corrigiu. — E vou continuar praticando até eu acertar.
— Se você ficar melhor nisso, Stefan... Thomas, eu vou morrer. Estou ficando esquizofrênica
apenas de pensar nisso. E assim ficará você, Thomas Vincent.
— E você será a Sra. Thomas Vincent.
— Isto é legal?
— Eu tenho todas as credenciais para provar. É mais legal do que o nome Prakenskii. Em
qualquer caso, quando tudo for feito, vou chamar alguém de nossa confiança para realizar uma
cerimônia em minha língua nativa usando o nome que meu pai me deu. — Seus olhos
encontraram os dela. — É importante para mim que você leve o meu nome verdadeiro, mesmo
que não possamos usá-lo.
Ela sentiu o amor por ele transbordar e apertou os dedos trêmulos em sua boca para se
refrear uma resposta a sua declaração. Ele não conseguia esconder a sinceridade dela, não havia
nenhuma maneira. Ele queria casar com ela usando o nome de seu pai e significava um mundo
para ela ele tentar encontrar uma maneira para isso, mesmo que eles tivessem que viver usando
outro nome.
Quando ela olhou para ele, quase não conseguiu respirar com a intensidade de suas
emoções.
— Você me surpreende com a forma como você presta uma atenção tão grande as coisas
que são importantes para mim. — Era mais do que prestar atenção, ele se concentrava muito
completamente em tudo sobre ela, observava tudo, as menores expressões, todas as nuances. Ela
nunca seria capaz de esconder nada de Stefan.
Ele estendeu a mão para pegar algumas mechas de seu cabelo comprido entre os seus
dedos. Ela notou que ele fazia isso muitas vezes, nos momentos mais estranhos.
— Eu sempre prestarei atenção a tudo o que for importante para você, — ele disse com sua
voz em um tom baixo e quase suave que ela aprendeu a amar. — Quando um homem não tem
nada, sua vida não vale nada e ele encontra um tesouro, ele o guarda com todas as suas forças.
Sou um homem de muitos talentos, anjo, e mantê-la feliz será sempre a minha primeira
prioridade.
Ela olhou-o sobre a xícara de chocolate. Seu rosto estava escondido pelas sombras. Ela
percebeu que frequentemente ele se sentava nas sombras e provavelmente ele sempre faria isso.
Havia algo no que ele disse que a fez tremer, um calafrio desceu por sua espinha, mas ela não
conseguiu imaginar o porquê.
— Às vezes você é um pouco assustador, Thomas. — Ela testou o nome. Agora que o
conhecia como Stefan, o nome “Thomas” não soava muito bem para ele, mas ela aprenderia a
viver com isso, assim como ele faria.
— Eu não me importo se você sentir um pouco de medo, às vezes, Judith. Você é uma
mulher que pode torcer um homem em torno de seu dedo mindinho.
Ela caiu na gargalhada.
— Eu juro que estava pensando que era eu quem estava enrolada torno de seu dedo
mindinho.
Ele puxou o cabelo dela até que ela soltou um gritinho. Ele levou alguns fios até a boca.
— Estou muito feliz que você goste de sexo. Sempre que eu precisar argumentar com você,
te beijarei até que você fique sem sentido.
Havia verdade demais em sua declaração tranquila para ela se sentir inteiramente
confortável. Ele realmente poderia beijá-la até deixá-la sem sentido. Ela esquecia até do próprio
nome quando ele a beijava.
— Terei que ficar atenta para isso.
Ele sorriu e seu coração disparou. Ele não sorria muito, não um sorriso genuíno que
penetrava em seus olhos como o que deu agora.
— Você não tem nada para se preocupar anjo. Você é a única mulher no mundo que é capaz
de me fazer perder todo o controle. Acho que ambos temos uma boa chance de distrair um ao
outro.
— Bem, você faz o melhor chocolate quente que já bebi. O que você colocou neste?
— É uma receita secreta russa para dormir. Você teve um banho quente, agora um
chocolate quente e terá a minha promessa que a deixarei dormir até de manhã.
— O que você considera “de manhã”? — Judith perguntou maliciosamente.
Ele abriu um pequeno sorriso para ela.
— Bem, eu ainda não decidi sobre isso. Apesar de saber que você não está dormindo o
suficiente e que tenho que parar de ser tão egoísta.
Judith tomou outro gole do chocolate e olhou para as estrelas acima de sua cabeça.
— Na verdade, acredito que fui eu quem o despertou da última vez. Você estava dormindo
tão sexy que não pude resistir à tentação, então, tecnicamente, acho que realmente a culpa e
realmente sua.
Sua sobrancelha subiu.
— Sua lógica não faz o menor sentido. Não posso ser responsabilizado por parecer sexy
quando estou dormindo.
Judith riu novamente, aquele som, baixo melodioso que Stefan definia como suave
perfeitamente sintonizado com o som do vento. Ele poderia ouvir aquele som para sempre.
Sentado em sua varanda, com aquelas estrelas cintilantes acima de sua cabeça e seu mar de flores
brancas abaixo, ele descobriu que estava perfeitamente feliz. Ele sabia que Judith estava
preocupada que ele achasse a vida a dois chata, mas pela primeira vez desde que era um menino
pequeno, ele sentia que tinha uma casa. Não havia maneira de expressar em palavras o real
significado de ter um lar. Sentado na varanda com o vento tocando o seu rosto que se arrastava da
névoa vinda do oceano ele sentia uma liberdade absoluta.
— Quando eu era menino, lembro-me de todos nós aconchegados em nossa casa, próximos
a lareira e do meu pai estendido no sofá com a cabeça no colo de minha mãe e dois bebês no
peito. Lembro-me que ele olhou para minha mãe com um amor imenso em seu rosto, pegou sua
mão e disse: “Este é um momento de ouro, meu amor”. Na época eu não sabia o que aquilo
significava, mas isso ficou gravado em minha cabeça pela forma que ele olhou para ela, com tanta
felicidade. Agora eu sei o que ele quis dizer.
Mais uma vez ele trouxe um punhado de seus cabelos à boca. Ele adorava a sensação de
toda aquela seda. Ele achava que seus cabelos pareciam uma cachoeira brilhante, escura e
misteriosa em uma noite escura. Quando Judith estava sobre o travesseiro, com os cabelos
derramando ao seu redor, ele pensava que nunca tinha visto um espetáculo mais bonito ou
sedutor. Ele esfregou os cabelos sobre o queixo, querendo que este momento durasse para
sempre. Ele olhou para ela e ficou preso imediatamente em seu feitiço. Lágrimas nadavam em
seus olhos, gotas de diamante presas em seus cílios.
Sem um pensamento consciente, ele se inclinou e beijou suas lágrimas, tirando-as de sua
pele macia.
— Nunca se sinta triste por mim, Judith. Minha vida me trouxe para você e isso é o suficiente
para mim. Isso é tudo.
Judith balançou a cabeça e acabou com seu chocolate, muito emocionada para responder
algo para ele. Às vezes, quando essas pequenas memórias voltavam para ele, Stefan partia seu
coração. Ela queria segurá-lo para sempre. Ele pensava que ela o salvou. Ela poderia dizer isso pela
forma que ele olhava para ela e pelas coisas que ele dizia, mas era o contrário. Ela havia se perdido
na sua necessidade de vingar a morte de seu irmão. Em sua crença de que não deveria viver
porque ela não conseguia encontrar uma maneira de fazer Jean-Claude sofrer. Ela suspirou. O
chocolate estava definitivamente fazendo efeito e deixando-a sonolenta. Ela se deixou levar,
pensando no homem ao seu lado. Ele era uma âncora na tempestade de emoções que a
inundavam tão intensamente. Às vezes ela não conseguia conter toda a força de sua natureza
apaixonada de tão concentrada que precisava ficar em conter o seu dom, mas quando estava com
Stefan, ela não precisava manter a vigília constante. Ela descobriu que podia relaxar e sentir o que
ela estava sentindo. Ela se sentia meio viva, desesperada para controlar o crescente poder dentro
dela, mas no momento que conheceu Stefan seu espírito o havia reconhecido como uma espécie
de escudo. Não fazia sentido... Ainda assim, fazia todo o sentido.
— Você me faz feliz, — ela disse com os olhos meio fechados, permitindo-se ir ainda mais à
deriva em direção a um lugar de sonho. Era mais do que isso. Ela sentia-se vazia e ele preenchia
todo o seu ser. Ela sentia medo de si mesma e dava-lhe confiança. Não havia nenhum sentido ou
razão para isso, mas, estranhamente, eles se encaixavam, dois desajustados que completavam um
ao outro.
Ela virou a cabeça para olhar para ele, lutando para manter os olhos abertos. Suas pálpebras
estavam pesadas e sentia seu corpo deliciosamente exausto.
— Eu sempre me senti feliz aqui, e sabia que teria uma vida digna. Eu não percebi o quanto
minha vida estava vazia até que você apareceu. E eu não tinha nenhuma ideia do que era a
verdadeira felicidade foi até que coloquei os olhos em você. Isso não é louco?
Ele balançou a cabeça.
— Não. Eu nunca considerei outra maneira de viver. Mesmo quando estava me preparando
para isso, nunca pensei que realmente desapareceria no mundo real. Homens como eu vivem
sozinhos e morrem assim. Ninguém sabe que existimos, portanto, ninguém chora por nossa
morte, porque somos fantasmas. Eu não me considero infeliz. Minha vida era só o que era.
Ele permitiu que os fios macios de seus cabelos escorregassem por entre seus dedos,
observando-os deslizar de volta ao seu redor, um manto de seda que emoldurava seu rosto e caía
com graça abaixo da cintura.
— Até que eu vi você. O ar pareceu sumir do mundo enquanto eu esperava você me notar.
Judith se sentia como se tivesse dado a ela o mundo. Ele achava que não sabia dizer as
palavras bonitas para ela, no entanto, ele sabia, pelo menos para ela. Ele a fazia se sentir como se
fosse a única mulher no mundo.
— Amanhã suas irmãs virão falar com você, meu anjo. Você sabe que vão chegar até você
com um milhão de conselhos.
Ela podia ouvir a preocupação em sua voz, a preocupação de que uma vez longe dele, ela
seria convencida de que havia cometido um erro terrível.
— O que preocupa é que quando você estiver longe de mim, você possa mudar de ideia,
Stefan, — ela admitiu.
— Thomas. Procure pensar em Thomas o tempo todo. Você não pode pensar em mim como
Stefan. E você não tem nada com que se preocupar Judith. Eu disse “para sempre” e quis dizer
isso. Eu sou um homem bastante obstinado.
— Eu também quis dizer isso. Minhas irmãs, eventualmente, o aceitarão. Elas aceitaram Levi.
E inclusive eu gosto dele. — Ela fez uma pausa, e depois deu um pequeno suspiro. — Isso é...
Quando ele não está nos obrigando a aprender autodefesa.
— Você sabe que ficarei ao lado dele sobre essa questão, — disse Stefan sem
arrependimento. — Eu provavelmente serei muito pior do que ele. E começaremos a pensar em
ter um casal de cães. Grandes.
— Estou um pouco preocupada com esta questão dos cães. Rikki comentou na outra noite e
discutimos sobre o assunto. Todo mundo parecia estar bem com isso, com exceção de Lissa. Ela é
uma espécie de mulher guerreira e eu esperava que quisesse cães na propriedade, mas ela esteve
muito silenciosa sobre o assunto. Ela não comentou nada sobre isso. Airiana sim, mas Lissa ficou
quieta. Perguntei a ela se estava tudo bem para ela a aquisição de cães, mas ela não me
respondeu exatamente.
— Será que as outras se recusarão se ela não quiser?
— Nós tendemos a fazer tudo juntas. E as coisas sempre funcionaram desta forma. Blythe é
a líder e a mais diplomática. Ela lê as pessoas muito bem, — explicou Judith.
— Duvido que ela os leia como você. Você é empática.
Ela bocejou e rapidamente cobriu a boca com a mão.
— Eu pensei que escondia isso muito bem.
— Não de mim. — Ele se levantou, tirando a caneca de sua mão e colocando sobre a mesa
na pequena bandeja ao lado de sua cadeira. — Venha, anjo, você está exausta. Vou colocar você
na cama.
— Podemos entrar em apuros se formos para a cama. Eu pensei que poderia dormir aqui.
Stefan negou com a cabeça e se abaixou para pegá-la, segurando-a junto ao peito.
— Eu não que seja uma boa ideia, bebê. Você ficaria com o pescoço dolorido. Eu posso me
conter quando é necessário.
Ela colocou os braços em volta do pescoço dele e se inclinou para ele.
— Eu não estava preocupada com você se conter ou não. Acontece que eu não tenho
nenhuma disciplina. Absolutamente nenhuma. Não quando se trata de você.
Stefan passou pelas portas francesas levando-a para o seu quarto enquanto inclinava a
cabeça para chegar até a sua boca tentadora. Ela possuía o sabor de chocolate e paixão, uma
combinação convidativa. Ele reconheceu que poderia ter sido um erro beijá-la. Quando ele
começava, sempre achava difícil parar. Beijá-la estava se tornando rapidamente seu passatempo
favorito e que definitivamente, levava a outras coisas eróticas e prazerosas, mas ela realmente
estava exausta e ele tinha um trabalho a fazer.
Com um pequeno suspiro, ele levantou a cabeça e levou-a até o banheiro principal.
— Escove os dentes enquanto lavo sua caneca de chocolate.
— Você não tem que fazer isso.
— Você nunca vai para a cama com alguma louça na pia.
Ela encolheu os ombros.
— Eu não gosto de acordar com a pia suja.
— Eu sei.
Ele enviou a ela um pequeno sorriso presunçoso sobre o ombro enquanto saía para buscar e
lavar a caneca. Ele fez disso sua missão, saber tudo sobre ela apesar do pouco tempo em que
estiveram juntos. Ele guardava todas as informações, todos pequenos detalhes, facilmente ele
conseguiu descobrir quase tudo sobre ela, o que gostava e o que não gostava, as coisas que a
incomodavam e as coisas que a intrigavam.
Essencialmente, Judith era uma pessoa feliz. Ela gostava da vida, amava suas irmãs e seu
trabalho. Ela via as cores e para ela, tudo e todos era uma tela em branco que ela pintava em sua
cabeça. Ela tinha uma grande alegria em fazer caleidoscópios para pessoas de todo o mundo,
escolhendo cada peça com um cuidado tremendo. O que ela havia terminado para Hannah Drake
Harrington, a esposa do xerife, era um exemplo perfeito. Hannah pretendia usar o caleidoscópio
para focar-se durante o trabalho de parto, e Judith tinha feito caleidoscópio muito bonito para ela
se focar nas imagens enquanto estivesse no trabalho de parto.
Talvez este fosse o seu segredo: o carinho que sentia pelas pessoas. Ele não tinha isso, e
talvez nunca tivesse, mas podia sentir a intensidade do carinho através do seu dom e isso o
deixava orgulhoso dela. Ele "tinha" ela. Ele a viu por inteira. Até mesmo suas irmãs não podiam vê-
la do jeito que ele a via... Bem, talvez Blythe pudesse. Blythe era diferente. Não era um elemento,
mas possuía vários dons extraordinários.
— Você vem para a cama?
Judith parecia sonolenta, sexy e sua voz acariciava o seu corpo da forma como suas mãos
faziam. Ele encontrou-se sorrindo, excitado e feliz por nenhuma outra razão além do que ela
conseguia fazer isso com ele. Ela era seu pequeno milagre.
— Estou a caminho.
Ela já estava na cama nua, do jeito que ele gostava, seu longo cabelo estava preso em uma
trança como se ele realmente fosse ficar assim. Ele tirou o jeans, deitou-se na cama ao lado dela
puxando-a para bem perto dele, dobrando-se em torno dela protetoramente. Seu pau duro
aconchegou perfeitamente entre os globos firmes e suaves de sua bunda. Suas mãos retiraram a
fita no final da trança para libertar a massa espessa de seus cabelos. Ele sorriu ao ouvir seu suspiro
resignado, colocou o peso suave do seu seio em uma palma da mão e com a outra a abraçou.
— Vá dormir anjo. Bons sonhos. — Ele beijou seu ombro nu e deitou em silêncio, esperando
sem sequer respirar.
Não demorou muito para que ela sucumbisse ao esgotamento. Stefan se aproveitou de
outra meia hora para si, apenas para saborear a sensação de ser capaz de sentir e de estar tão
grudado nela antes de ter que se escorregar cuidadosamente da cama como tinha feito a cada
noite em que estiveram juntos. Ele estava surpreso de como ficava cada vez mais relutante em
colocar sua pele de “sombra", mas não haveria nenhum lugar seguro para eles até que Ivanov
estivesse fora de suas vidas. Sorbacov não tinha ideia de quem era Thomas Vincent, mas Ivanov
sim. Ele estava tentando atraí-lo para fora de seu esconderijo e por isso estava saindo com Lev,
mas ou Ivanov estava realmente bastante machucado ou ele era muito esperto para ser
enganado. Stefan suspeitava que seria a última opção.
Ele olhou para Judith, para o seu rosto relaxado e seus longos cílios como meias-luas grossas
no rosto. Ele adorava quando ela dormia nua para ele e nunca protestava quando ele
desmanchava a trança do seu cabelo. Não importava quantas vezes ele a procurasse que ela
sempre o aceitava ansiosamente. Não importava quantas vezes ele tirava as roupas dela, que ela
ria e o aceitava, não importava onde eles estavam, se em sua casa ou no jardim ao redor dela.
Mesmo agora, ele estava tentado a se aproximar e acariciá-la entre as pernas sabendo que a
deixaria úmida e pronta para a sua posse.
Ele se abaixou e pegou mechas de seu cabelo sedoso entre os dedos com o coração na
garganta. Ela perdia o fôlego cada vez que olhava para ela. Ele podia segurá-la para sempre.
Parecia um milagre que ele fosse capaz de enrolar o seu corpo em torno dela, de ter o peso suave
de seu seio descansando na palma de sua mão, respirando o aroma dela, deles, juntos. Na maioria
das vezes ele ficava acordado e exultante pela capacidade de sentir uma emoção tão intensa.
Ele não tinha palavras bonitas para dizer a ela, mas tinha o seu corpo para mostrar a ela o
quanto significava para ele. Ele podia fazer todas essas pequenas coisas que aprendeu sobre ela,
ele continuaria observando e memorizando todas as coisas que eram importantes para ela, todos
os hábitos que tinha. Ele queria ser “tudo” para ela.
Stefan olhou ao redor da sala. O espaço era de uma elegante cor creme, sereno e calmo,
com salpicos de cores suaves que seriam sempre Judith, brilhante de profunda alegria e
compaixão. Ela podia tentar alimentar a paixão de sua raiva e sua necessidade de vingança, mas
sua verdadeira natureza sempre vinha à tona, sua empatia pelos outros estava sempre lá,
forçando-a a ver este seu lado. O artista nela lutava profundamente.
Com um suspiro, ele vestiu suas roupas e armas. Ele estava um pouco atrasado para sua
reunião com seu irmão e estava ficando cada vez mais difícil enganar Judith. Ele não gostava nem
um pouco do que estava fazendo. Se eles ficariam juntos, e ele não aceitaria que fosse de outra
forma, então teria que haver honestidade entre eles. Sua primeira reação foi sempre a sua
proteção e o quanto menos ela soubesse sobre Petr Ivanov, melhor. E quanto menos Ivanov
soubesse sobre ela, melhor. Mas, foda-se tudo, (ele se abaixou e passou os dedos em seus cabelos
escovando-os), deixá-la fora do que ele estava fazendo parecia ser errado.
Decididamente, ele se virou e saiu, tomando cuidado para ativar o alarme antes de correr
pela estrada para se encontrar com Lev. Seu irmão o esperava ao lado de um pequeno jipe. Ele
deu um sorriso rápido e se deslizou para trás do volante esperando Stefan entrar e sentar ao lado
do passageiro.
— Você se parece com o inferno, irmão, — Lev o cumprimentou.
— Eu sinto como se estivesse mentindo para ela, — Stefan admitiu.
Lev já estava dirigido na estrada, mas pisou forte nos freios, dando a Stefan um olhar de
repulsa.
— Você está me dizendo que está mentindo para ela sobre o que você está fazendo?
— Eu não menti para ela. Ela está dormindo.
— O que você vai dizer a ela se ela acordar?
— Ela não vai acordar. Eu me certifiquei disso.
— Você é um bastardo podre. Cai fora do meu carro. Você a drogou? Você drogou Judith?
— Eu já estou me sentindo um filho da puta — admitiu Stefan. — Caralho. Não preciso que
você me repreenda. — Ele passou as duas mãos pelos cabelos. — Você acha que eu gosto de fazer
isso? Eu não sei mais o que fazer. Eu nunca estive em um relacionamento com uma mulher. O que
você disse à sua esposa?
— Eu sempre digo a verdade para ela. Sempre. Eu disse para ela que estávamos caçando
Ivanov e que precisaríamos matar o bastardo se o encontrássemos, que não havia nenhuma outra
opção. Que se ele chegasse perto dela ou de uma de suas irmãs, que elas estariam mortas. Rikki é
autista, ela não é estúpida. Ela compreende uma questão de vida ou morte. Porra, Stefan, Judith
também compreenderia. Inferno. Qual a vantagem de estar com alguém se você não consegue
confiar nela e dizer a verdade?
Stefan considerou bater em seu irmão por expressar exatamente o que ele havia pensado.
— Eu não sei Lev. Judith gosta de Jonas Harrington. Ela acha que o homem pode resolver
tudo.
Lev balançou a cabeça.
— Não é por este motivo e você sabe disso. Você acha que foi fácil para mim deixar Rikki ver
o que eu sou? Você está se escondendo porque está com medo que ela não te aceite se descobrir
quem realmente você é. Dizer a alguém sobre o nosso trabalho é uma coisa, mas, mas pedir para
conviver com isso quando estamos caçando, são duas coisas diferentes. Você está com medo,
Stefan.
— Talvez.
— Não há talvez. Acorde homem. Você não poderá ficar com ela se ela não o aceitar, e você
não está dando a ela nem mesmo uma oportunidade de te conhecer.
— E se ela não me aceitar? O que farei, então, Lev? E não me diga que você poderia ficar
longe da sua Rikki, porque se puder, você não sente por ela o que sinto por Judith.
— Rikki é a razão da minha vida. Ela é o centro do meu mundo. Não, não haveria maneira de
eu ficar longe dela, e por isso conversamos sobre tudo. Se você quer realmente ter uma vida com
Judith, você tem que confiar nela sobre quem você realmente é. — Lev olhou para ele. — Eu acho
que você já sabe disso.
— Vou pensar sobre isso. — Era impossível para ele pensar na ideia de Judith o rejeitando.
Ele havia sido torturado, baleado, esfaqueado e enfrentado ameaças contra a sua vida todos os
dias. Nada do que ele já tinha feito o assustava tanto quanto o pensamento de Judith olhando
para ele com ódio.
Lev dirigiu pela estrada que levava a Sea Haven, ao longo do oceano, por um atalho que
permitia que estacionassem a uma pequena distância do lugar onde Stefan havia alugado um
pequeno refugio. Ele precisava verificar seu computador e não queria que ninguém o rastreasse
até a fazenda de Judith. Ele precisava pegar seus suprimentos de caça, um kit de campo e óculos
para enxergar a noite.
Quando eles se aproximaram da rua, Stefan pôs a mão no braço de seu irmão.
— Ele está aqui. Por perto. Posso senti-lo.
Lev não discutiu com ele. Ele puxou o boné de beisebol um pouco mais para baixo. Ele usava
barba e vestia-se como um morador local, de forma casual. Camisa aberta e calça jeans desbotada
e desgastada.
— Ele não vai me reconhecer.
— Não conte com isso. Nunca subestime Ivanov, — Stefan disse severamente.
— De qualquer forma, não estou associado a este veículo. Eu o remodelei completamente e
acrescentei algumas peças nele no celeiro na fazenda. Rikki e eu como regra, evitamos a cidade.
Fazemos nossas compras na loja da Inez, mas para isso usamos o caminhão. A maioria das pessoas
aqui na cidade jurará que conhece Levi Hammond há anos.
O jipe não tinha portas, mas tinha muita potência e capacidade para atravessar a floresta
onde não havia estrada. Stefan manteve as mãos dentro do casaco, perto de suas armas, onde
poderia usá-las rapidamente.
— Vire à esquerda ali. Há uma pequena casa. Use o beco. Você pode ir direto para a
garagem.
— Ele tem que estar escondidos aqui perto, — disse Lev. — Eu não ficaria surpreso se ele
estivesse ao lado deste lugar. Tem boas rotas de fuga para qualquer direção e os telhados estão
perto o suficiente para usar. Você tem o mar para cobrir o ruído e posso garantir que não há
crianças em nenhuma destas casas.
— Estas casas pequenas são antigas. E seus moradores são idosos que vivem aqui por toda a
vida cuidam de seus próprios assuntos. Eles são bastante amigáveis e não bisbilhotam a vida dos
outros.
Lev parou na garagem, Stefan saiu do jipe e abriu a porta rapidamente pedindo para Lev
entrar. Havia um veículo já estacionado lá dentro, um Audi rápido, compacto e construído para
abraçar as curvas.
— Eu vejo que você está preparado, — Lev observou.
— Existe alguma outra maneira de viver? — Stefan perguntou e checou a porta. — Fique
aqui apenas no caso de Ivanov estar aqui. Não acho que esteja, nada parece ter sido violado, mas
prefiro que você fique aqui enquanto dou uma olhada ao redor.
— Você não precisa me proteger Stefan.
Stefan atirou para o seu irmão mais novo um olhar de “cale a boca e obedeça”. Lev deu de
ombros e ficou atrás do jipe, enquanto Stefan entrava na casa. Com todos os sentidos em alerta
máximo, Stefan moveu-se pela pequena casa. Com apenas sessenta e cinco metros quadrados,
não foi difícil verificar todos os cômodos por sinais de que Ivanov tivesse encontrado o seu refugio.
Ele examinou as janelas e até mesmo a pia da cozinha e um pequeno frigobar, antes de fazer sinal
para Lev entrar.
— Eu coloquei as armas atrás da parede ao lado da cama. Pegue o que vamos precisar
enquanto verifico o meu notebook. Quando estou trabalhando sob uma cobertura profunda só
verifico minhas mensagens duas vezes por semana, mas estou esperando receber a notícia de que
La Roux foi capturado por nossos agentes.
Ele ligou seu notebook e esperou alguns instantes antes de digitar um código. Então uma
única mensagem apareceu em sua tela: “Equipe inteira morta. La Roux escapou. Recuperar
microchip e voltar imediatamente”.
Stefan se esticou na cadeira olhando para a tela. Sorbacov tinha enviado uma equipe para
tirar La Roux da prisão e o criminoso, de alguma forma, havia matado a todos e fugido? Sorbacov
teria que fornecer mais informações, principalmente com Ivanov à espreita. A coisa toda cheirava
mal. Ele desejou não ter encontrado Lev.
Ele enviou uma mensagem insistindo em uma explicação completa.
“La Roux estava agitado e ansioso para sair alguns dias atrás. Seus homens o estavam
esperando e massacraram nossos agentes. La Roux se foi. Encontre-o. Obtenha o microchip e
retorne”.
Alguns dias atrás. O que mudou? La Roux parecia ambivalente sobre a tentativa de escapar.
Ele mantinha sua organização trabalhando duro e possuía uma sentença confortável e conseguiria
uma liberdade condicional por bom comportamento em dois anos. Ele estava ligado às guardas
corruptos. Stefan conseguia entender por que o homem parecia hesitar. Ele parecia triste quando
olhava para as fotografias de Judith, mas, La Roux tinha paciência. Ele parecia disposto a esperar.
— Alguma coisa mudou, — Stefan murmurou em voz alta. Ele virou a tela para mostrá-la ao
seu irmão.
Lev assobiou.
— Você acredita nisso?
— Sim. Mais do que qualquer coisa, Sorbacov quer o microchip. Há muitas provas
contundentes sobre ele. Ele virá atrás de nós mais tarde, mas não acho que ele será capaz de tirar
o seu cão de guarda de seu foco. Ivanov está focado em nós e está ferido. Isso golpeará seu
orgulho. Ele não vai querer saber nem aceitar qualquer ordem de Sorbacov e continuará vindo
atrás de nós.
— Você o conhece bem.
— Eu aprendi muito sobre ele quando estávamos em treinamento juntos. Eu o deixava
pensar que ele era melhor do que eu. Eu nunca tive um grande ego, então por um tempo consegui
me manter longe de seu radar. O que fosse necessário para realizar o trabalho era tudo que
importava para mim. Deslizar de uma pela para outra era bastante fácil, mas ao longo dos anos, eu
não consegui mais ficar fora de seu radar. E Ivanov percebeu isso quando derrotamos um inimigo.
Ele continuará vindo atrás de nós.
Lev esfregou a ponta de seu nariz.
— Vocês dois tiveram algum desentendimento antes disso?
Stefan deu de ombros. O que ele poderia dizer? Todos tiveram problemas com Petr Ivanov à
medida que cresciam. Quando era criança, Ivanov o havia prendido debaixo d'água pensando que
conseguiria matá-lo dessa maneira. Quando adolescente, ele se tornou doente e sádico, torturava
animais e maltratava seus colegas. Ele sempre colocava uma corda em torno de uma criança
dormindo e a arrastava para a janela, jogando-o para fora só para vê-los dançar na ponta da corda.
Na maioria das vezes, as outras crianças dominavam Ivanov e resgatavam a vítima, mas às vezes,
não chegávamos até a criança a tempo.
— Vez por outra os instrutores haviam alertado Sorbacov sobre ele, mas Sorbacov o
protegia, dando-lhe cada vez mais rédea livre, até que um dos instrutores irritou Ivanov e
apareceu morto, cortado em pequenos pedaços e espalhados por um corredor, olhando com
olhos cegos para o horror das crianças quando elas saíam dos dormitórios para ir para a sala de
aula. Depois disso, Sorbacov manteve Ivanov longe do resto de nós, tanto quanto possível. Ele não
dormia mais nos dormitórios com os outros, mas todos sabiam que ele possuía seu próprio quarto
e comia refeições melhores. Não entendíamos o motivo, enquanto ele tinha uma boa vida e era
protegido por Sorbacov, todos os outros tinham que lutar por suas vidas. Aperfeiçoamo-nos a ser
máquinas de combate e ele acabou ficando de fora. O que não foi ruim, ele é uma pessoa muito
doente e tem necessidade de matar, mas não tem a resistência e a enorme vontade de sobreviver,
como o resto de nós.
Lev esboçou um ponto de interrogação na mente de Stefan.
— Quando ele está ferido, ele corre. Gostaria de ter continuado perseguindo-o, mas o
desgraçado me nocauteou. Ele poderia ter sido capaz de me matar quando eu estava no chão, mas
ele não podia aguentar de dor que estava sentindo. Ele é suave, Lev, e ele não vai matar a menos
que seja uma coisa certa.
— Então, basicamente, ele é um sádico pervertido que quer nos matar.
Stefan assentiu.
— Mas ele não é desonesto. Ele pode estar ignorando Sorbacov agora, mas não se engane
Sorbacov ordenou-lhe vir aqui, em primeiro lugar. Se ele conseguir nos matar, voltará com alguma
história de que não sabia sobre as novas ordens e Sorbacov teria que engoli-lo porque não teria
escolha. Ele tem um monstro preso a uma coleira, mas não quer que este monstro se volte contra
ele.
— Você tem que conversar sobre isso com Judith.
Stefan ocultou o medo ilógico que o inundou.
— Mantê-la viva é mais importante. Eu acho que La Roux aceitou a fuga que sugeri, mas
suspeitou que minha oferta pudesse ser uma armadilha então passou a notícia através de um dos
seus guardas para seus próprios homens. Eles mataram os nossos agentes e La Roux
provavelmente veio para cá. Ele deve ter visto a foto que Mike Shariton tirou de mim e Judith na
porta da galeria. Isso foi o que o levou a concordar em sair da prisão. La Roux não é bobo.
Lev apertou os lábios como se para evitar dizer qualquer coisa mais e seguiu Stefan para a
noite. Eles se separaram no momento em que chegaram a rua, cada um foi para um lado oposto.
Stefan pegou a calçada próxima ao oceano. Ele tinha a menor cobertura, uma cerca curta e plantas
silvestres espalhadas por toda a cerca, mas não altas o suficiente para fornecer quaisquer sombras
para ele se ocultar. Ele não estava tentando se ocultar e começou a andar como se estivesse
dando uma caminhada à noite.
Para mim, faria mais sentido que eu estivesse ai. Ele não me reconheceria.
Stefan fez uma careta e não se incomodou em responder. Ele veio a Sea Haven para advertir
e proteger o seu irmão mais novo de um assassino. Nada havia mudado em suas intenções, nem
mesmo depois de encontrar Judith. Já estava sendo ruim o suficiente ter que aceitado que Lev
estivesse ali quando ele insistiu em ir junto, mas ele não permitiria que ele ficasse em uma posição
perigosa.
O vento aumentou, batendo no mar, transformando as ondas em picos mais elevados e
maiores que batiam sobre as rochas e pulverizavam espuma branca para o alto. O mar possuía um
poder enfurecido, demonstrando nenhuma piedade a qualquer coisa que estivesse em seu
caminho, escuro e turbulento. Ele sentiu o poder, o inalou trazendo-o profundamente para os
seus pulmões. Ondas de energia manipulavam o poder do vento e do mar. Uma energia violenta.
Ele não tinha dúvida de que Ivanov estava fazendo algo sádico... E que estava perto.
Ele está aqui... Perto, Lev. Ele está ferindo algo ou alguém. — Stefan tentou restringir a
direção dele. — Permaneça nas sombras. Não venha para perto de mim.
O que quer que fosse o que Ivanov estivesse fazendo, ele tinha que estar perto, a energia
era muito forte. Ele aproveitou uma chance e atravessou a rua, seguindo na frente de seu irmão.
No momento em que ele se aproximou de uma rua transversal, ele sentiu a dor, o sofrimento e
um medo intenso. A vítima ainda estava viva, mas ele podia sentir sua força vital desaparecendo.
Ele para a rua abaixo e começou a correr. Ele era um homem grande e correu rapidamente para
baixo uma rua irregular, esperando receber um tiro a qualquer momento porque aquilo não era a
coisa mais inteligente a fazer, mas se houvesse uma chance de evitar a morte de um inocente, ele
teria que tentar.
O cheiro de sangue era forte, mas com o vento vindo do mar e mudando continuamente, ele
tinha que adivinhar a direção. Um cão começou a latir em uma rua acima então ele continuou
correndo pela estrada, esperando ter escolhido a direção correta. Em uma rua, paralela a que ele
estava, a tampa de uma lata de lixo caiu no chão. Imediatamente, Lev saiu de um monte de
arbustos e foi nesta direção assim que o cão parou abruptamente de ladrar.
Seu radar de alerta disparou, gritando para Stefan, ele sentiu a tensão contrair seu intestino.
Ele não gostava que seu irmão estivesse fora de sua vista e, possivelmente, correndo em direção a
um sádico. Ele esqueceu o pensamento de ir atrás de seu irmão quando o cheiro de sangue o
golpeou novamente. O cão havia deixado de latir, mas ele examinou a área geral e dobrou uma
esquina derrapando até parar. A casa estava escura e o cão estava dentro da cerca e sua barriga
estava cortada.
Stefan xingou baixo, deu uma olhada cuidadosa ao redor e pulo sobre a cerca para se
ajoelhar ao lado do cão. Ele ainda estava vivo, seus olhos olhavam para ele como se ele pudesse
de alguma forma o salvar.
— Fodido psicopata, — Stefan murmurou. Ele colocou a mão suavemente sobre a cabeça do
cão. — Sinto muito, rapaz. — Não havia nada a ser feito pelo animal, Ivanov tinha garantido que,
mesmo que os proprietários o encontrassem imediatamente, ele estaria muito danificado para ser
salvo por um veterinário.
Stefan ficou algum tempo acariciando a cabeça do animal e então rapidamente e
misericordiosamente quebrou o pescoço do cão. Ele escorregou para trás pulou a cerca e foi atrás
de Lev que havia dobrado na rua que ficava logo baixo. Ivanov estava fora de seu esconderijo esta
noite e estava fazendo estragos. Stefan sempre soube, desde que eles eram meninos, que Petr
Ivanov não podia ficar muito tempo sem fazer uma matança. Animal, homem, mulher ou criança,
não importava. Observar os outros sofrer e morrer dava a ele uma onda de poder divino.
Lev, tenha cuidado. Ele matou um cão.
Ele matou mais de um cão. Eu encontrei uma poça de sangue em um quintal aqui. Ele tem
estado ocupado. Eu estava seguindo uma trilha de sangue, mas ela desapareceu abruptamente.
Saia daí agora. Quero dizer, Lev, que ele está muito perto e nós temos que recuar e reavaliar.
Você está andando em um vespeiro.
Stefan ficou com o coração acelerado quando Lev não respondeu. Soltando palavrões em
russo, ele correu pela rua, deliberadamente fazendo barulho, na esperança de atrair o fogo de
Ivanov.

CAPÍTULO 17

Lev! Porra, me responda!


Stefan estava sentindo ondas de medo, mas elas eram de origem feminina, não masculina, o
que significava que seu irmão estava ligado a sua esposa e ela sabia que seu marido foi ferido.
Antes que pudesse advertir a Lev para quebrar a conexão com ela, algo bateu em seu braço com
força suficiente para fazê-lo girar. Quase simultaneamente, um som como fogo de artifício ecoou
pela rua. Ele caiu para o asfalto e rolou em direção ao quintal mais próximo em busca de
cobertura.
Fodido bastardo! — Lev falou. — Ele te acertou?
Stefan se escondeu em uns arbustos altos e rastejou de barriga para frente. Uma saraivada
de balas cortaram as folhas ao seu redor. Ele descobriu uma depressão no chão e rolou para ela,
tentando se fazer tão pequeno quanto possível. Nas ruas, os cães começaram a latir.
Um corte. E você?
O sangue escorria constantemente para baixo de seu braço e seu ombro parecia que tinha
sido atingido por um andaime, mas ele ainda podia usar o braço, e isso era o que contava.
Vou precisar de um pouco de ajuda. Eu caí em uma armadilha e não posso me mover.
Lev descreveu a armadilha de aço, acorrentada a uma árvore grossa, alternada com dentes
serrilhados e um sistema hidráulico de tortura. Stefan tinha visto essas armadilhas antes. Cada
movimento faria com que os dentes serrilhados afundassem mais no tornozelo de Lev.
Eu tentei enfiar minha faca para me soltar, mas não há maneira disto funcionar. A maldita
coisa quase cortou a minha perna.
Stefan xingou entre os dentes cerrados.
Eu estou indo em sua direção. Não atire em mim. E não se mova. Quanto mais você mexer,
pior vai ficar.
Esta parte eu já percebi.
Lev disse e seu tom gotejava sarcasmo.
Várias luzes das varandas acenderam ao longo da rua. Stefan precisava manter o foco de
Ivanov somente nele, longe de seu irmão e todos os inocentes. Não ajudava saber que a qualquer
minuto, alguns civis desavisados poderiam entrar no caminho do assassino. Ele contou até três,
levantou-se e correu contando quinze e caiu novamente rolando e rastejando em sua barriga,
usando os cotovelos e pés para impulsionar seu corpo atrás de uma proteção de rochas e
samambaias.
Balas cuspiram sujeira em seu rosto e ricochetearam nas pedras mais próximas a ele. Ele
estava agradecido que Ivanov sempre foi um assassino de curta distancia e raramente usava uma
arma para um matar. Na verdade ele preferia lâminas, dessa forma podia ver a vítima sofrer.
Apesar disso, uma metralhadora automática definitivamente funcionaria se Stefan se permitisse
continuar descuidado.
O que diabos você está fazendo, Stefan?
Mantendo-o longe de você. O que diabos você acha que eu estou fazendo? — Stefan
respondeu bruscamente.
Ele estava correndo para fora da cobertura do jardim do seu lado da rua. Poucos carros
estavam estacionados e suas únicas opções eram para ir para cima, para os telhados, ou arriscar
em atravessar a rua. Não era uma boa ideia, mas tinha que manter Ivanov focado nele.
Relutantemente, ele puxou a arma do cinto, sua forma familiar em sua palma. Ele não queria
correr o risco de balas perdidas entrando em uma casa, mas foda-se tudo, precisava conseguir
logo uma vantagem com Ivanov.
Eu não ouço fogo de retorno. — Lev disse.
Não dispararei a menos que possa acertar algo que esteja em minha mira e eu ainda não
tenho o bastardo na minha mira. Mas vou pegá-lo, — disse Stefan, derramando a confiança em
sua voz. — Agora, eu quero trabalhar em uma posição onde ele manterá o foco em mim e ainda
assim não terá uma mira clara, enquanto isso, me concentrarei a destrancar esta armadilha de seu
tornozelo.
Panturrilha, — Lev corrigiu. — Está trancada na minha panturrilha. O filho da puta,
provavelmente, sabia que estaríamos usando botas. Nós interrompemos sua matança. Alguém
certamente chamará o xerife. Esta hora da noite, Jonas e Aleksandr vão atender a chamada.
Aleksandr vai reconhecer a cena de assassinato. E minha mulher entrará em ação. Ela não vai ficar
parada, Stefan. Ela virá correndo.
Stefan não gostou da nota de dor rastejando na voz de Lev. Homens como o seu irmão
nunca demonstravam dor a menos que fosse ruim. Ele estava ferido. Realmente ferido. Se Stefan
podia sentir a dor de seu irmão, sem dúvida, sua esposa poderia também. Ele não a conhecia
ainda, mas qualquer mulher que era uma parceira para o seu irmão, tinha que ser forte. Ela era
uma mergulhadora de ouriços do mar, a capitã de um barco no mar. Ela tinha que ser destemida.
Vou chegar até você. Mantenha-se calmo e me dê dois minutos.
Lev suspirou.
Mais fácil dizer do que fazer.
Stefan ouviu atentamente. Ivanov não estava fazendo nenhum som, cuidadoso para não
revelar a sua localização, mas os tiros tinham saído à sua esquerda. Lev foi nessa direção, em
algum lugar, atrás de Ivanov. Stefan não queria dar a Ivanov a chance de circular de volta para Lev
e pegá-lo enquanto ele estava preso. Ele não tinha dúvida de Lev poderia lutar, mas quanto mais
se movesse, mais a armadilha cortaria sua panturrilha.
Descreva a armadilha em detalhe.
Stefan não poderia errar. Seria possível para ele abrir o dispositivo à distância, mas ele
precisaria de algum espaço para respirar. O pensamento de mulher de Lev correndo para Sea
Haven era desconcertante, ainda mais com Ivanov à solta e em “modo de matar”.
Parece uma armadilha para um urso velho com garras gigantes. Está em torno da minha
panturrilha e eu não consigo abri-la. Eu sou um homem forte, mas ele fez alguma coisa para que
corte a minha panturrilha cada vez que eu me movo ou tento abri-la. Há correntes enterradas ao
longo do terreno em várias direções diferentes. Pelo menos cinco delas.
A descrição de Lev confirmava a Stefan que Ivanov havia estudado este tipo particular de
armadilha em detalhe. Bastardo inteligente.
Eu já vi essas armadilhas. Ele matou um rapaz com uma antes. Portanto, presta atenção Lev.
Vou precisar de um minuto. Assim que eu te libertar, tenha muito cuidado. Essas correntes
significam que você terá pelo menos mais cinco escondidas por perto, para o caso de você
conseguir sair de uma, ser pego pela próxima. Ele a chamava de pequeno campo minado do
inferno.
E Sorbacov incentivava e protegia este sádico?
Enquanto Lev estava falando com ele, Stefan sabia que ele estava vivo. Ele pulou, dando
deliberadamente um alvo a Ivanov, determinado que o assassino não tivesse tempo para escapar
e ir atrás de Lev. Stefan precisava de tempo para lembrar cada detalhe da armadilha de aço de
Ivanov. Ele havia modificado o dispositivo há muito tempo, e, claro, Stefan estudou
cuidadosamente o seu funcionamento uma vez que tivesse que correr atrás dele. Ele havia
estudado tudo sobre Ivanov, sabendo desde adolescente que Petr Ivanov seria o seu inimigo mais
perigoso.
Sorbacov sempre o protegeu. Foi assim que eu soube que sua ordem de demissão era uma
manobra para mantê-lo aqui fora. Ele acredita que Ivanov pode matar nós dois.
Pouco importava se uma equipe de adultos o caçasse com armas automáticas no lugar mais
frio na terra, ou que ele fosse deixado em um deserto com nada além de uma faca, enquanto
adultos o caçavam por conveniência... Era Ivanov a quem Stefan temia quando era criança. E
mesmo como um adolescente, Ivanov tinha sido insaciável, necessitando a dor e o sofrimento dos
outros como quem precisa de ar para respirar.
Eu acho que essa coisa vai serrar a minha perna pela metade.
Pare com qualquer fodido movimento! Apenas fique parado. Vou tirá-la de você. E pelo amor
de Deus, quando eu fizer isso, não dê um passo sem verificar se há outras armadilhas iguais a esta.
Estou empurrando tantas coisas quanto posso por ela, esperando que se ela alimente dos
galhos e da minha faca, antes que chegue a minha perna.
Stefan não estava disposto a permitir a queda de Lev nas mãos de Ivanov. O exterminador
estava sinceramente puto que Stefan havia conseguido localizá-lo, persegui-lo e realmente feri-lo.
Era um golpe enorme para o seu ego. Stefan correu através da rua vazia e mergulhou sobre uma
cerca no meio de um tronco de árvore. Ele se moveu pelos galhos grossos em direção à folhagem
densa. Um tiro atingiu a sola de sua bota, derrubando-o, e outra arrancou um pedaço da manga
de seu casaco, demasiado perto para seu conforto. Mas Ivanov ainda estava focado nele, odiando-
o com uma fúria fria, determinado a matá-lo.
Ivanov não tinha ideia que havia prendido Lev ou teria abandonado Stefan para matar o seu
irmão. Stefan usou seus cotovelos e pés para fazer o seu caminho através do quintal, esmagando
flores, enquanto durante todo o tempo trabalhava em sua mente para destrancar a armadilha da
panturrilha de seu irmão. Seria difícil abrir as garras a esta distância e pela primeira vez, ele
desejou ter o poder de Judith para utilizar.
Você a drogou seu idiota. — Lev comentou prestativamente.
Cale a boca, você não está ajudando, — Stefan rosnou.
Dividindo sua mente, mantendo uma parte dela na sua sobrevivência e a outra ajustando
sua energia para abrir os dentes serrilhados cravados na panturrilha de seu irmão, o que era
realmente doloroso, e ele não precisava que seu irmão o lembrasse que ele estaria diante de um
pelotão de fuzilamento, quando confessasse tudo a Judith.
O vento corria no interior do oceano, trazendo um pesado véu de neblina rápido. Nuvens
construindo-se rápidas e furiosas, uma torre de raiva, caldeirões escuros, anunciando uma
tempestade feia.
Essa é a minha mulher, ela está extremamente irritada e está vindo para salvar o seu
homem, — Lev anunciou.
Esta é a última coisa que precisamos, trazendo uma mulher para essa confusão. Ele é um
velho e astuto wolverine22, Lev, o mais perigoso que você já enfrentou. Você não vai querer que ele
arranje uma maneira de chegar até você e ele vai usar uma mulher sem escrúpulos.
Ela virá Stefan. E não virá sozinha.
Stefan amaldiçoou sob sua respiração. Ele tinha que expulsar Ivanov rápido, antes que a
esposa de Lev chegasse achando que conseguiria resgatá-lo. Como se Lev necessitasse que ela o
resgatasse. Mesmo com sua panturrilha presa em uma armadilha, seu irmão era um homem
perigoso.
Stefan começou a trabalhar o seu caminho lentamente pelo jardim para tentar obter um
melhor ângulo de Ivanov. O homem tinha de revelar a sua localização em breve e tudo o que
Stefan necessitava era de uma oportunidade de fazê-lo se mostrar, porque ao contrário de Ivanov,
Stefan não desperdiçava munição... Ele não errava a sua mira.

*****

22
Também conhecido como carcaju ou glutão. É conhecido como o maior membro da família das doninhas e são caçadores ferozes.
Através de névoas de sono, Judith ouviu vozes frenéticas e barulho de passos por sua casa
em direção ao seu quarto. Tinha que ser um sonho... Ou um pesadelo. Ela tinha acabado de ir
dormir.
— Sistema de segurança estúpido é um total desperdício, — ela murmurou e colocou o
travesseiro sobre a cabeça. Ela não conseguia limpar seu cérebro o suficiente para pensar
corretamente e muito menos classificar as vozes femininas que estavam chamando-a.
— Judith! Levante-se! Acorde!
Ok, esta era definitivamente Rikki e ela parecia assustada e imperiosa ao mesmo tempo. E
por ser Rikki, Judith forçou o seu corpo pesado como chumbo a se mover. Nada funcionou. Sentia
seus braços e pernas dormentes juntamente com o seu cérebro e ela caiu em um baque no chão.
Lutando para ficar em uma posição sentada, o lençol caiu como uma poça em volta dela, ela
suspirou, percebendo que estava completamente nua. Havia marcas de posse sobre o seu corpo,
que ela possivelmente não conseguiria esconder, então ela puxou o lençol quando Rikki entrou em
seu quarto. Judith podia ouvir as outras correndo pelo corredor. Xingando sob sua respiração, ela
conseguiu puxar o lençol para se enrolar nele. Ela piscou rapidamente, tentando limpar sua visão
turva. Não havia nenhum sinal de Stefan em qualquer lugar.
— Levante-se! — Rikki exigiu. — Depressa.
Judith começou franzir as sobrancelhas até que deu uma olhada nos olhos enormes de Rikki,
negros como a meia-noite e muito assustados. Ela engoliu o seu protesto e balançou a cabeça. A
neblina estava começando a clarear e ela podia reconhecer que algo estava muito errado.
— Dê-me um segundo querida, eu tenho que me vestir.
Sua mente sentia-se invulgarmente confusa. Como regra ela acordava forte, mas era difícil
pensar e ainda mais difícil conseguir que seu corpo funcionasse. Rikki saiu de seu quarto, parando
as outras na sala e Judith correu para o seu banheiro.
— Preciso de um roupão ou roupas? — Ela perguntou.
— Roupas! — Cinco vozes responderam.
— Quem está com problemas? — Judith se atrapalhou ao redor para a pia e jogou água fria
em seu rosto. — Digam-me o que está acontecendo.
— Levi está em apuros. Depressa, Judith. Ele está machucado. Eu posso sentir isso, — Rikki
disse ansiosamente.
Stefan não estava na cama com ela. Seu cérebro estava tão frito que ela levou algum tempo
para tentar pensar em onde ele poderia ter ido tão misteriosamente. Onde Lev estivesse, Stefan
estaria. Ela correu para o seu armário, colocou um sutiã, calcinha, blusa e jeans e correu para fora
de seu quarto, indiferente ao que ela se parecia.
— Onde eles estão? Thomas está com ele?
Ela estava orgulhosa que mesmo em seu estado tão confuso ela conseguiu se lembrar do
nome Thomas não de Stefan.
— Eu acho que sim. — A tensão marcava a voz de Rikki. — Depressa, Judith. Eu preciso de
você.
— Você tem que falar conosco, Rikki, — Blythe, sempre a voz da razão insistiu. — Nós
respondemos a sua chamada, mas não sabemos o que está errado. Judith nos ajudará.
Judith não tinha ideia de como poderia ser de qualquer ajuda. Ela sentia-se como se
estivesse se movendo através de um nevoeiro, tentando desesperadamente forçar um pé na
frente do outro.
— Rikki, Levi te chamou pedindo ajuda?
— Eu senti uma explosão de dor. Aqui. — Ela agarrou sua panturrilha. — Foi horrível, como
se algo estivesse serrando minha perna. Ele cortou nossa conexão de forma abrupta, mas eu sei
que esta dor era dele.
Quando isso aconteceu, a mente dele estava desprotegida. Ele devia estar em agonia, mas
depois, quando consegui chegar até ele, ele disse que eles estavam lidando com isso. Por favor. Eu
não quero falar mais. Vamos embora.
— Podemos discutir isso no carro, então, — Blythe decidiu. — Vamos.
Suas irmãs já estavam correndo pelas escadas. Judith as seguiu, tropeçando um pouco,
tentando encontrar suas pernas.
— Onde eles estão?
— Sea Haven. Eu sei que eles estão em apuros. Nós temos que ajudá-los. — Houve um
soluço na voz de Rikki. E ela torceu os dedos firmemente.
O ar da noite bateu em Judith, neblina estava tão densa que era quase impossível ver sua
mão na frente do rosto. Ela podia ouvir a água correr para fora de suas mangueiras e olhou em
torno de seus jardins. Rikki estava muito agitada e a água estava respondendo ao seu chamado
com muita ferocidade. Seus temores começaram a se espalhar para todas as mulheres, até que
todas elas ficaram agitadas. Judith, sempre cuidadosa em manter o controle, estava tendo
dificuldade com todas as suas irmãs ao seu redor, claramente chateadas.
Era impossível controlar sua empatia natural, não quando sua mente estava tão confusa e
ela mal conseguia entender o que todo mundo estava dizendo para ela. Lá em cima, nuvens de
tempestade ferviam no céu. O vento aumentou, uivando por entre as árvores, soprando folhas e
detritos no ar. Nas nuvens escuras e ameaçadoras, chicotes de relâmpagos iluminaram as bordas
das nuvens, brilhando como brasa.
Judith fez o seu melhor para manter o controle, mas antes mesmo que todas estivessem nos
limites estreitos do carro, ela podia sentir as emoções das outras mulheres aumentando em
proporção direta à sua própria. E as emoções dela estavam fora de controle porque Rikki estava
muito assustada por Levi.
— Será que alguma de vocês poderia me explicar o que está acontecendo? — Blythe
perguntou calmamente enquanto elas entravam na quatro por quatro da fazenda. Blythe parecia
ser a única controlada quando engrenou o SUV e dirigiu pela calçada em direção ao portão
ornamentado.
— Thomas é irmão de Levi, — Judith admitiu. — Ele veio aqui para avisar a Levi que o
homem horrível que veio da Rússia nunca comprou a história de que ele estava morto e veio aqui
para encontrar Levi e matá-lo.
Stefan. Onde você está?
Ela estendeu a mente para ele, necessitando saber se ele estava bem. Por um momento ela
pensou que tinha chegado a ele. Ela realmente sentiu sua presença sólida, mas seu cérebro ainda
estava nebuloso e a conexão escapuliu.
A respiração de Lissa assobiou para fora.
— Lembro-me de Inez falando de um homem. Seu nome era Petr Ivanov. Ele fez todos os
tipos de perguntas em torno da vila, em Fort Bragg, na Noyo Harbor e Albion. Ele foi até mesmo
para Jonas e disse que representava o governo russo e estava investigando a morte de um de seus
cidadãos.
— Ele entrou na loja de Judith, — Airiana acrescentou. — Sua aura era verdadeiramente
assustadora. Eu nunca tinha visto nada parecido.
Judith lembrou-se da sensação de mal estar que ela tinha sentido quando Ivanov havia
entrado em sua loja de caleidoscópios fazendo perguntas. Ela mal tinha sido capaz de ficar no
mesmo local com ele. E ela teve o mesmo mal estar quando Stefan havia confessado que tinha
vindo para Sea Haven para alertar seu irmão sobre o assassino.
— Ivanov foi a minha casa também, — Rikki disse, arrastando um cobertor pesado em torno
dela para se confortar. — Jonas o levou lá. Eu pensei que o tinha convencido que nunca tinha visto
Levi.
— Você deve ter feito um bom trabalho, — Judith a consolou, — porque ele não tinha ideia
de onde estava Levi, ele voltou à procura de pistas. Se ele tivesse pensado que Levi estava com
você, ele estaria espionando a fazenda.
— Por que Levi e Thomas não chamaram Jonas? — Airiana perguntou. — Ele é o xerife.
Judith sentiu como se um torno estivesse apertando com força o seu coração. Ela provou o
medo em sua boca. Nada poderia acontecer com Stefan, não agora que ela o encontrou. Ela
trocou um olhar muito conhecedor com Rikki. Pelo menos Rikki entendia o medo que ela estava
sentindo.
— Esse homem, esse Ivanov, é um assassino muito assustador. Eles temiam que pudesse
matar Jonas. Eles sabem da reputação de Ivanov e sabiam que Jonas seria prejudicado em cumprir
a lei.
Blythe respirou drasticamente à medida que derrapou na curva da estrada que conduzia à
autoestrada. O céu havia escurecido ameaçadoramente e agora as nuvens estavam fervendo,
rolando no céu tão espessas e negras, que só os raios e relâmpagos já lhes forneciam luz na
escuridão implacável.
— Então, eles estão fazendo justiça com suas próprias mãos? — Blythe deu um olhar de pura
repreensão a Judith.
— Eles não sabiam onde ele estava — Rikki os defendeu. — Eles têm tentado fazê-lo sair de
seu esconderijo todas as noites.
Judith respirou profundamente, bordas da raiva começaram a se formar quando a
compreensão começou a penetrar em sua cabeça. Ela virou a cabeça lentamente para olhar para
Rikki.
— Todas as noites? O que você quer dizer com “todas as noites”? Thomas estava comigo.
— Sim, mas, Levi e Thomas sempre saiam por volta das duas da manhã e voltavam por volta
das quatro e meia, — Rikki explicou, encolhendo-se mais profundamente sob o cobertor pesado.
— Levi disse que Thomas queria caça-lo por conta própria, mas Ivanov está aqui por causa dele e
ele sente que não tem escolha. Ambos estão protegendo Jonas. — Ela roeu a unha de seu polegar
para não trair sua agitação. — Levi está convencido de que Ivanov mataria Jonas. Posso dizer que
ele acredita nisso.
— Todas as noites? — Judith repetiu. Ela podia ouvir seu coração rugindo em seus ouvidos.
Os trovões ressoaram, mas alto no céu por sobre suas cabeças e relâmpagos bifurcaram raios
irregulares da terra ao céu e de volta. A explosão foi forte o suficiente para abalar o carro.
— Acalmem-se, — Blythe, disse com firmeza. — Todo mundo precisa se acalmar.
Judith estreitou os olhos e empurrou as mãos trêmulas pelos cabelos em agitação. Não havia
como se acalmar, não agora quando a suspeita se deslizava em sua mente. Não suspeita...
Conhecimento.
— Eu tenho um sono leve. Como não poderia saber que ele estava saindo da cama... E de
casa? — Ela apertou os lábios com medo de saber a resposta. O que ele havia dito? "Receita russa
para dormir"? Ele disse a ela a verdade e ela não tinha entendido.
A terra se abalou e uma pequena rachadura abriu-se ao longo de uma duna do lado da
rodovia.
— Talvez, depende do que vocês dois estiveram fazendo que tenha esgotado você, — Lissa
tentou amavelmente.
Stefan, onde está você?
Ela tinha que saber que ele estava vivo e bem antes de decidir fervê-lo em óleo.
Seu medo por ele alimentava as emoções das outras mulheres que estavam misturadas nos
confins estreitos do carro enquanto seguiam ao longo da rodovia. Paralelo a elas, estavam as
falésias e o mar, com raiva e turbulento agora, refletindo as emoções intensificadas de todas as
mulheres no carro. O mar se levantou em direção a Rikki, ondas enormes quebrando sobre as
falésias, crescendo como um aviso, atingindo em direção à vila de Sea Haven como se pudesse
devorá-la.
— Rikki — Blythe disse em uma voz muito baixa, porém firme. — Se acalme antes de criar
uma onda gigantesca que venha ao longo da estrada e nos leve para o mar. Respire. Tudo que
você tem que fazer é respirar fundo. Vamos encontrá-lo. — Ela olhou por cima do ombro para
Judith. — Ambos.
— E então depois eu vou matar Thomas, — Judith sibilou entre os dentes cerrados. — Com
minhas próprias mãos. Ele não tem ideia com quem está brincando. Porra de homem!
Porque ela sempre acordava, não importava o quão suave fosse o som no meio da noite.
— Receita secreta, minha bunda, — ela murmurou. — Quem eles pensam que são? Sea
Haven é a nossa casa. Algum psicopata vem aqui e nos ameaça, ameaça os nossos homens ou a
Jonas, e eles querem nos manter afastadas. Nós não somos menininhas medrosas que ficam
encolhidas em nossas casas. Porra de homem!
A cada palavra de condenação, o interior do carro começou a pulsar com fúria e um medo
terrível. Um vidro quebrou ao lado do passageiro.
— Ei! — Blythe levantou a voz, pegando a entrada de Sea Haven em dois pneus. — Respire
ou algo assim. Não destrua o carro.
— Sinto muito, — Judith sussurrou — Eu estou apenas... Muito chateada. Com raiva. Medo.
Eu não tenho nenhuma ideia do que está acontecendo com eles. E você, Rikki?
Rikki arrastou para trás o cobertor pesado e balançou a cabeça em negativa.
— Ele é telepata, não eu. Eu não sei como manter a conexão se ele não iniciar para mim, não
com esta distância. Mas sei que ele está realmente machucado.
Fora no mar, uma onda enorme subiu, girando e correndo em direção aos penhascos. Uma
segunda onda e depois uma terceira juntou-se. O carro se balançou. Judith engoliu ar,
desesperada para controlar sua raiva e terror. Rikki a alimentava e ela alimentava as outras e
estava amplificando o medo de Rikki. Era um círculo vicioso e ela tentou se concentrar na voz de
Blythe.
— Precisamos de um plano. E este plano inclui chamar Jonas, — Blythe declarou — No
momento em que soubermos ao certo o que está acontecendo.
— Concordo, — Lissa e Airiana disseram em voz alta.
Lexi concordou com a cabeça. Rikki apenas balançava e olhava para frente.
Judith apertou os lábios. Ela tinha compartilhado vislumbres das memórias da infância de
Stefan e Levi, ela temia que Jonas não entendesse a profundidade de um homem tão pervertido e
doente como Petr Ivanov.
— Podemos estacionar o carro e ir a pé, teremos mais controle dessa maneira, — Judith
decidiu. — Rikki, posso localizar os homens e avaliar a situação. Chame Jonas quando soubemos se
o perigo é real e faremos o nosso melhor para ajudá-los até ele chegar. Temos energia o suficiente
entre nós se pudermos mantê-la sob controle.
Ela nunca tinha tentado tecer todos os cinco elementos juntos, quando estava chateada e
com raiva. Ela se sentia tão irritada como o mar batendo contra as falésias. A rua parecia
completamente deserta quando Blythe levou o carro para a rua principal da cidade e o estacionou
apressadamente.
— Saiam todas vocês. E pelo amor de Deus, Judith, tente diminuir o volume. Você está em
todo lugar. Está impulsionando todos os outros elementos e eles podem ficar completamente fora
de controle.
O vento uivou e pegou as portas carros, batendo-as com força e fechando-as, balançando o
veículo e correndo pela rua vazia em fúria. A formação de nuvens, ondulações de várias cores
espalhados por todo o céu, quando as nuvens negras mesclados de ebulição se abriram. Torrentes
de água derramaram encharcando as ruas, batendo-os em uma fúria implacável.
Judith sabia que Blythe estava certa, mas agora elas estavam alimentando umas as outras,
trocando emoções intensas que Judith não conseguia controlar, a tempestade de Rikki agarrou a
todas elas e a força era chocante.
Onde você está?
Judith exigiu, à procura de Stefan.
Ela estendeu a mão, empurrando o seu espírito mais do que já tinha conscientemente
experimentado antes. Poder varreu Sea Haven, chacoalhando e sacudindo as janelas dos edifícios.
O chão cedeu.
Judith?
Ela pôde sentir a rejeição instantânea de Stefan, a impressão de grande perigo, dor rasgando
e medo por ela. Ela soube imediatamente que ele estava ferido. Por um momento o mundo ao seu
redor desapareceu e só havia Stefan. Ela vislumbrou sangue, grossos e congelados em seu ombro
e descendo pelo braço. Seu coração falhou em seu peito e por um momento as bordas da sua
consciência enegreceram. A terra cedeu e cruzou uma fenda estreita da rua mais próxima do
oceano.
Oh, Deus, você está ferido.
Nada mais importava. Ninguém mais importava naquele momento. Ela o viu e se lembrou de
seu irmão, caído, com sangue, sem vida.
O barulho de trovões aumentou e um raio atingiu a rua, explodindo um pequeno arbusto,
criando chamas dançando e um escurecimento da terra em torno dela. As chamas deveriam ter
apagado com a forte chuva, mas ao invés disso, criaram vida própria, crescendo e se espalhando
até que elas formaram um longo trem, correndo pelo meio da rua, como se a água fosse um jato
de combustível.
Saia daqui agora. Ivanov é ainda mais perigoso quando está encurralado.
Uma saraivada de tiros ecoou e o coração de Judith disparou.
Stefan!
Lev!
A voz de Rikki estourou pela cabeça de Judith, angustiada, com medo por eles.
Eu estou bem bebê, está tudo bem. Acalme-se um pouco, estou me afogando.
Isso era definitivamente Levi, tentando encontrar um pouco de diversão na tempestade de
sua esposa.
Judith percebeu que ela conectando a todos eles, todos os cinco elementos, Levi e Stefan.
Ela até sentia a presença de Blythe.
Judith, já que está aqui, fique onde está. Mantenha-se fora da vista. Eu vou usar um impulso
de poder para tentar livrar a perna de Levi. A voz de Stefan era a calma no meio da tempestade
turbulenta. Levi, acima de tudo resista ao impulso de se movimentar. Você sabe como atua estas
armadilhas.
Então eu vou ter que encontrar às outras e desmonta-las antes que uma criança inocente
tropece nelas.
Judith não poderia deixar de ouvir a dor na voz de Levi. Ele estava tão calmo como Stefan,
mas estava sentindo muita dor.
Thomas. — Mesmo no meio de uma crise, ela observou que Levi mantinha a cobertura de
Stefan. — Não se arrisque. Ele está totalmente focado em você.
Stefan não respondeu e mais dois tiros soaram. O relâmpago atingiu a terra de uma rua
acima e chamas correram sobre as casas e vigas após o relâmpago. Felizmente a violenta
tempestade de Rikki pareceu ser capaz de acalmar a chama incandescente, evitando que a
madeira pegasse fogo.
— Lissa! — Blythe sussurrou seu nome. — Contenha-se, eu estou dizendo a todas vocês,
obtenham o controle antes que algo terrível aconteça.
— Se pudéssemos ver este Ivanov, — Rikki disse — nós poderíamos mantê-lo afastado de
ambos, Stefan e Levi. Talvez até mesmo levá-lo para fora da vila.
Judith não se preocupou em salientar que Ivanov certamente voltaria, ele já tinha ido e
vindo antes, mas Rikki teve uma boa ideia.
— Viemos para mantê-lo longe de nossos homens, — afirmou Judith — então vamos fazer
isso.
Blythe suspirou.
— Você sabe que não serão somente seus homens que vão querer torcer seus pescoços,
mas também Jonas. E eu estou com o meu celular fora de área. A tempestade está interferindo
com o sinal, Judith.
Judith não se importava se Jonas seria chamado, tudo que importava era fazer com que
Stefan e Levi ficassem fora do perigo imediato. Ela correu para o estreito espaço entre duas lojas
que ligavam uma rua a outra atrás dela, onde alguns dos moradores tinham suas casas. Suas irmãs
a seguiram. No momento em que ela estava perto da rua, ainda escondida da vista, ela parou e
olhou cautelosamente ao virar a esquina.
Ela ficou decepcionada quando não conseguiu localizar nenhum dos três homens, mas sabia
que estava muito mais próxima da zona de batalha real. A rua pulsava com uma energia violenta.
Um tiro estilhaçou a madeira no portão de trás da casa vizinha. O tiro veio do outro lado da rua,
mas ela não conseguiu ver ninguém, a não conseguiu ver Stefan, mas ele tinha que estar
escondido em algum lugar.
Você foi atingido? — Levi perguntou.
Não, ele é a pesca. Mas eu tenho que ir aí tirar essa armadilha de você antes que ele circule
por aí.
— Por que eles não estão atirando de volta? Eles têm armas suficientes para um pequeno
exército, — Rikki disse.
Judith deu de ombros, tentando identificar a localização exata de Stefan. Sentiu sua
concentração, uma intensa energia focada diretamente em um objeto a uma grande distância
dele. Ela pegou a imagem em sua mente e quase gritou. Sentiu uma onda de medo adicionada ao
terror crescente de Rikki. Ambas tiveram um vislumbre da armadilha medieval cruel, uma
armadilha para ursos modificada com dentes serrilhados afiados como o fio de uma navalha.
A respiração de Judith ficou presa na garganta. Um suspiro coletivo veio de suas irmãs e Rikki
deu um grito estilhaçado.
O que é essa coisa em seu tornozelo Levi?
O lamento de horror de Rikki foi alto na mente de Judith, ampliando o seu próprio pânico.
Pingos de chuva viraram pedras congeladas, golpeando na rua em forma de pequenas bolas
de golfe geladas enquanto o vento batia nas cercas.
Está na minha panturrilha, querida, mas Stefan vai abri-la. Fique calma e confie em nós para
lidar com isso. Eu preciso de você fora de perigo.
O amor em sua voz se adicionou à mistura de emoções que as mulheres estavam
compartilhando. Nuvens rodaram e o vento da chuva soprava as folhas na rua. No centro da
massa escura acima, relâmpagos dançaram na rua, impulsionada pelo vento, uma torre de chamas
cresceu apesar da chuva, ou talvez por causa dela. As chamas eram alimentadas pelo elemento de
fogo de Lissa.
Outra rajada de tiros pulverizou a dança da torre de chamas, mas a força do vento chamou a
as balas em pleno voo e segurando-as no ar.
— Airiana, — Blythe sibilou. — Pare de brincar com a munição.
— Desculpe, — disse Airiana. — Eu não tive a intenção.
— Pelo menos as balas não vão entrar na casa de alguém, — Judith apontou.
Apesar de tudo isso, a concentração de Stefan não vacilou. Ele parecia ser o olho na
tempestade. Tudo à sua volta estava um caos, o granizo batendo nos carros e telhados, o vento
girando em um tornado vicioso correndo pela rua para varrer tudo em seu caminho. Stefan
bloqueou tudo.
Judith podia sentir a sua serenidade absoluta.
Dois tiros soaram novamente em uma rápida sucessão, e Judith estremeceu quando eles
passaram pela cerca em direção ao matagal espesso onde ela temia que Stefan estivesse se
refugiado. Stefan nunca vacilou, manteve sua mente focada no que estava fazendo, separando
lentamente as mandíbulas da armadilha infame presa ao redor da panturrilha de Lev.
Ela realmente confiava em seu poder e deu-lhe tudo o que podia, chegando ao poço
profundo dentro dela para aumentar suas habilidades. Instantaneamente, a fechadura da um
portão perto dela abriu com um rangido enferrujado. Subindo e descendo as ruas, portas se
destravaram e abriram.
— Oops, — disse Judith. — Não era minha intenção que isso acontecesse.
— Controle-se, Judith, — Blythe pediu. — Eu chamei Jonas, mas você pode tecer todos os
elementos e empurrar o homem para longe de Thomas e Levi. Você os teceu todos juntos na
fazenda, você pode fazê-lo aqui.
— Eles estão por todo o lugar, — disse Judith, sacudindo a cabeça.
Para você, — Stefan disse. — Você tem o poder e o controle, anjo, pode lidar com qualquer
coisa. Você tem apenas que acreditar em si mesma.
Thomas.
A voz de Levi era absolutamente calma. Ele não disse mais nada, mas Rikki gemeu e Judith
sentiu a tensão em Stefan se apertar ainda mais. Não apenas a tensão. Decisão. Algo nele mudou,
tornou-se frio e ele soube imediatamente o que ele ia fazer.
Levi tinha localizado Ivanov indo em direção a ele.
— Rikki — A voz de Judith soou com autoridade.
— Localize o Levi. Mostre-o para mim. Tudo ao seu redor. Faça isso agora. Respire fundo,
entre em contato com ele e deixe-me ver onde ele está.
Judith conhecia cada rua e quintal em Sea Haven. Ela possuía a sua loja há cinco anos e ela
caminhou por todas as ruas ao longo desses anos, para cima e para baixo, incapaz de conter sua
energia inquieta.
Levi?
Rikki alcançou o marido com todas as forças que possuía amplificadas uma centena de vezes
pelo elemento espiritual de Judith.
Por um momento Judith ficou desorientada com sua mente tão dividida, ela sentiu-se mal e
soube que estava sentindo as emoções de Levi, mas ela vislumbrou uma velha torre de água, uma
cerca quebrada, um carrinho de madeira parcialmente afundado no chão e cheio de flores. O
conhecimento estourou através dela. Ela sabia exatamente onde estava Levi. E ela pôde sentir a
confiança absoluta de Stefan nela.
Eu vi você em ação anjo.
Judith respirou fundo, olhou por cima do ombro para as irmãs e levantou as mãos.
Imediatamente a sinfonia começou. Fogo dançou para o céu e fez chover brasas, o vento
empurrou a parede de chamas sobre a rua, fazendo com que fosse impossível ver através das
chamas. Chuva caía em frente as chamas e por trás delas, construindo uma torre que parecia
impenetrável.
Stefan saiu de seu refugio, correndo atrás do muro dançante das chamas, atravessando a rua
e indo para o quintal que ela estava certa que Ivanov havia deixado. O fogo e a chuva empurraram
para frente, em linha reta em direção ao quintal atrás de onde estava certa que Levi estava. Ao
longe, o som das sirenes penetrou na borda de sua consciência. Jonas estava a caminho.
Levi e eu temos armas ilegais conosco. Se você estiver indo interceptar Ivanov e evitar que ele
não machuque mais ninguém, faça-o agora. Temos que ter ido embora quando seu amigo chegar
aqui.
Judith atravessou a rua, atrás de Stefan, mantendo a parede de fogo avançando, Lissa a
empurrando para frente e sendo empurrada pelo vento de Airiana.
Levi, apoiando-se fortemente sobre um grande ramo, mancou em direção à extremidade do
pátio onde o carrinho de madeira com flores estava. O sangue corria consideravelmente pela
perna gotejando ao longo do terreno irregular quando ele fez o seu caminho em direção a cerca
para sair de campo minado do assassino. Ivanov estourou na esquina de um edifício com a arma
apontada para Levi. Simultaneamente, Stefan correu do outro lado disparando, a primeira bala
atingindo Ivanov e fazendo-o girar.
Mangueiras levantaram-se como serpentes furiosas, água disparando fora das bocas
escancaradas, chicotando o exterminador, levando-o para longe dos dois homens, fazendo com
que fosse impossível ele disparar um tiro. Uma mangueira enrolou-se nele várias vezes, em volta
do seu pulso e arrancou sua arma. Ivanov caiu no chão e rastejou por trás do galpão. Stefan
continuou correndo pelo quintal, pegou Levi, levando-o para baixo e arrastando-o em direção a
um refugio.
O galpão de madeira explodiu voando quando um carro pesado rompeu a frente da
estrutura, apontando diretamente para Stefan e Levi. Mesmo quando Stefan passou os braços em
volta de seu irmão e rolou para tentar sair do caminho, um ataque de água batendo encurvada,
formou um túnel e tomou conta do carro. Um segundo túnel se fundiu com o primeiro, um vento
violento pegou o carro e girou-o, empurrando-o para longe dos homens, para a rua e para baixo
em direção ao oceano.
Levi pegou o braço de Stefan e pressionou sua boca no ouvido de seu irmão, a fim de ser
ouvido acima do barulho.
— Saia daqui agora. Pegue as armas e vá para o jipe. Volte para a fazenda. Deixe-me lidar
com Jonas. Se você for pego com todas essas armas, você irá para a cadeia. Jonas vai me levar
para o hospital e Rikki e Blythe vão ficar comigo.
Judith tire-o daqui agora.
O som de estridente de freios disse-lhes que Ivanov estava tentando freneticamente
controlar o seu carro. Judith manteve a pressão, empurrando o veículo quase no caminho do
xerife antes dela aliviar com o vento. Ivanov respondeu empurrando uma metralhadora para fora
da janela do lado do motorista e liberando uma saraivada de balas no xerife, girando em torno de
seu carro e saindo da cidade. O carro do xerife o seguiu com luzes girando e sirenes tocando.
Judith dirigiu a chuva cortando o carro de Ivanov, na esperança de, não apenas atrasá-lo,
mas tornar impossível para ele ver Jonas ou Aleksandr através dos lençóis de água vertendo dos
céus turbulentos. Mais tiros e ela deixou cair um tornado de vento e chuva sobre o carro.
Atraindo-o para o mar, o ciclone selvagem varreu o carro mais perto e mais perto da borda dos
penhascos. Ele atravessou a cerca de madeira e caiu sobre a grama coberta.
Judith quase gritou de frustração, tentando desesperadamente controlar a terrível força dos
cinco elementos entrelaçados e alimentando uma a outra de poder e medo.
Lexi empurrou terra para cima, num esforço para parar o movimento na frente do veículo. O
tornado girou, a chuva caía e o carro deslizou para mais perto da borda do penhasco. Judith
tentou fechar a fúria da magia, acalmando o vento e a chuva. As chamas de Lissa tinham
desparecido há algum tempo. O carro pareceu hesitar e, em seguida, ele foi direto em direção à
borda.
A tempestade desabou sobre si mesmo. Judith caiu contra o lado do edifício.
— Eu tentei pará-lo, — ela sussurrou. — Eu não estava tentando empurrá-lo sobre a borda.
— Você não fez isso, — Stefan disse. — Ivanov moveu o carro para lá e seguiu em linha reta.
— Você tem que ir, — reiterou Levi quando Rikki e Lexi chegaram ao seu lado. — Agora,
Thomas. E nenhuma de vocês pode dizer que ele estava aqui. — Ele olhou para as mulheres. —
Vocês não tem que mentir apenas deixá-lo de fora. Ivanov estava caçando a mim.
Ele não ficou satisfeito até que todas concordaram com a cabeça... Inclusive Blythe.

CAPÍTULO 18

— Você me drogou, seu cretino! — Judith o acusou no momento em que estavam dentro da
casa dela, girando para encarar Stefan com as mãos nos quadris. — No chocolate... Com a sua
velha receita russa. Você me drogou. E não se atreva a me dizer que não fez isso.
Stefan concordou com a cabeça.
— Posso ver que isso foi provavelmente um erro.
— Provavelmente? Isso foi provavelmente um erro?
Judith olhou em volta procurando por algo para atirar na cabeça dele. Tudo o que pode
encontrar foi um caleidoscópio que estava no final da mesa. Ela lançou-o em cima dele e
imediatamente se lamentou, não porque aquilo poderia amassar sua cabeça dura, mas porque ela
amava aquele caleidoscópio. Era um que havia criado para todas as suas irmãs, uma mandala para
cada uma delas e uma para ela. Cada uma delas possuía um em suas casas.
O cilindro ornamentado parou no ar, a centímetros dele. Stefan estendeu a mão e
cuidadosamente colocou seus dedos ao redor do caleidoscópio colocando-o gentilmente de volta
no final da mesa, estremecendo um pouco quando seu braço ensanguentado protestou.
— Definitivamente, foi um erro. Você deveria ter dito claramente a palavra
“definitivamente”, — ela afirmou.
— Você tem um kit de primeiros socorros? Acho que preciso de alguns pontos. — Ele falou
isso em uma tentativa de despertar nela um pouco de compaixão, pensou que este pequeno
lembrete de que ele estava ferido certamente a afetaria.
A cara feia de Judith se aprofundou.
— Você tem que bancar o herói o tempo todo? Você me fez ficar louca com o jeito que você
estava simplesmente convidando-o a atirar em você. Você tem uma arma. Muitas armas. Eu não vi
você atirando de volta para ele.
— Eu atirei nele, — ele se defendeu, permitindo que seu olhar vagasse pelo corpo dela.
Judith estava encharcada. Completamente, totalmente encharcada e pingando água no
tapete. Seus longos cabelos negros estavam presos em um grosso rabo de cavalo e as gotas de
água deslizavam por sua pele lembrando-o do orvalho sobre as pétalas de uma rosa. Suas roupas
eram quase transparentes e ela estava tremendo continuamente, seus dentes realmente estavam
batendo, embora ela estivesse tão chateada que parecia não notar. Ela estava tremendo e não era
somente devido ao frio. Ela acreditava que ser responsável pela morte de um homem e esse tipo
de coisa poderia cobrar um alto preço em um civil. Ela estava à beira do choque.
Stefan franziu a testa e deu um passo em sua direção. Ela recuou e a impaciência
rapidamente cruzou seus traços duros.
— Judith, você está encharcada. Podemos conversar sobre isso depois que você tomar um
banho quente.
Quando viu sua cabeça balançar, virou as costas para ela e caminhou pelo corredor até o
quarto dela, se despindo enquanto andava. Ele não estava disposto a discutir com ela. Se ela não o
seguisse, ele faria mais do que agir como um cretino, ele a jogaria por cima do ombro e derrubaria
sua pequena bunda trêmula na banheira.
Seu ombro ardia como o inferno e ele estava mancando por ter perdido o salto de sua bota.
Deus, ele estava cansado e preocupado com o seu irmão. A última vez que tinha visto Levi, ele
estava sendo levado em uma ambulância. Stefan nunca acreditaria que Ivanov estava morto, até
que visse o corpo.
Empilhou as roupas molhadas na pia e começou a preparar o banho de Judith. Enrolou uma
toalha em torno dele, mais para se aquecer do que por modéstia. Estava tão encharcado como ela.
Ficou esperando no banheiro enquanto estudava o seu braço. Aquela havia sido a segunda vez
que o haviam acertado e tinha um pedaço de músculo faltando. Seus ombros eram simplesmente
muito largos para brincar de gato e rato com assassinos.
Ouviu o som de seus passos com os pés descalços no corredor do andar abaixo. No
momento em que ela entrou pela porta, ele estendeu a mão para os botões dos jeans dela,
puxando o cós para abrir e empurrando o jeans por suas coxas.
— Tire, — ele ordenou. — Basta tirar esta maldita coisa logo e entrar no banho.
Enquanto ela se livrava da calça jeans, ele pegou a parte superior de sua blusa e arrastou o
material encharcado sobre sua cabeça, jogando-o em cima de suas roupas molhadas antes que ela
pudesse protestar.
Judith colocou a mão no peito dele para se estabilizar enquanto arrancava o jeans molhado.
— Vou olhar seu ombro primeiro.
— Você vai entrar no banho. Está tremendo como uma folha. Isso não é nada que não tenha
acontecido antes. Dói como o inferno, mas não vai me matar. — Ele a pegou pelo braço a guiando
até a frente da banheira. — Entre. Vou tomar um banho e enfaixá-lo.
— Você é tão mandão, — Judith reclamou fazendo uma careta para ele enquanto entrava na
água fumegante.
— Seus dentes estão batendo e se você os apertar mais, vai acabar quebrando-os.
Ela estava compreensivelmente chateada, e embora ele ainda não estivesse totalmente
convencido do que Levi falou “a melhor política é dizer verdade sob qualquer circunstância”, se ela
ainda o quisesse, ele tentaria dar isso a ela... Contanto que ela não estivesse em nenhum perigo.
Naturalmente, como ela havia provado que se cuidou muito bem, provavelmente usaria isso como
um argumento. Ela não seria agradável com ele, mas ele a ouviria.
— O que quis dizer quando falou que Ivanov dirigiu o carro dele para o penhasco?
— Duvido que ele estivesse lá dentro. — Pronto. Essa era a verdade. Seu rosto ficou pálido e
ele amaldiçoou seu irmão sob sua respiração. — Fique sob a água e molhe seu cabelo com água
quente. Você ainda está fria, Judith. E não se preocupe com Ivanov. Se ele ainda estiver vivo... — E
ele não tinha nenhuma dúvida de que Ivanov estava vivo e cuidando de suas feridas em algum
lugar — Vamos encontrá-lo.
Ela estreitou os olhos para ele.
— Me drogando e saindo todas as noites para procurá-lo?
Ele pegou uma toalha e ficou atrás dela até que ela fez como ele pediu e mergulhou os seus
longos cabelos sob a água quente. Esperou até que ela escorreu a água dele e jogou a massa
grossa por cima do ombro com um gesto descuidado e um olhar raivoso e ardente. Ele secou com
a toalha os longos fios sedosos, esfregando e massageando seu couro cabeludo para deixá-la
quente.
— Admito que cometi um erro, Judith, — ele disse calmamente. — Nunca estive em um
relacionamento antes e meus primeiros instintos são sempre os de protegê-la. Pensei que
estivesse fazendo isso. Aparentemente, estava errado.
Ela começou a virar a cabeça, mas ele segurou-a firmemente, impedindo-a de se mover
enquanto secava o cabelo dela completamente. Ele percebeu que estava vagamente irritado. Ele
não estava acostumado a reconhecer emoções e a primeira coisa que pensou era que estava
compartilhando a raiva que ela estava sentindo, mas teve que admitir, que desta vez, a raiva era
toda dele.
— Existem ainda dúvidas em sua mente, porque você não fala como se tivesse certeza?
— Claro que tenho dúvidas. Você poderia ter morrido esta noite. Um milhão de coisas
poderia ter dado errado, Judith. Eu não vou arriscar sua vida.
Ele não tentou impedir o tom afiado de sua voz. Sua barriga estava em nós apertados e
sentia um mal estar na boca do estômago. Desde o momento em que percebeu que ela estava lá
em Sea Haven e não havia nada que pudesse fazer sobre isso, sentiu raiva de sua falta de
habilidade para controlar a situação. Precisava que ela estivesse segura e ela não estava. Ele,
obviamente, não era como seu irmão, que conseguia assistir sua esposa mergulhar no fundo do
mar e colocar-se em perigo. Passou uma vida inteira sozinho e agora que encontrou Judith,
descobriu que não conseguia lidar com ela em perigo.
A mão dele juntou os cabelos dela e puxou sua cabeça para trás, capturando sua boca antes
que ela pudesse protestar. No momento em que sua boca se apoderou da dela, no momento que
sua língua entrou neste paraíso suave quente, seu mundo se endireitou. Ele estava fora de
equilíbrio, mas até mesmo a raiva tinha um sabor muito parecido com a paixão quando estava
beijando Judith.
— Eu sei que você está fria, anjo. E que você está com raiva de mim, mas preciso de você.
Agora. Bem aqui.
Ele murmurou as palavras contra os seus lábios macios e continuou beijando-a sem ouvir sua
resposta. Ele não sabia se ela protestaria ou consentiria, mas nada importava além da sensação e
o gosto dela, o conhecimento de que ela estava viva e beijando-o de volta.
Deslizou um braço em volta de suas costas nuas, molhadas e levantou-a, estremecendo um
pouco quando o seu braço protestou. Ele não se importava que seu sangue ainda estivesse
vazando pelo ferimento e descendo por seu braço, ou que ela estava toda molhada. Ele Precisava
dela.
Ela virou-se em seus braços, inclinando-se sobre o encosto da banheira para alcançá-lo com
os pés ainda na água, deslizando os braços em volta de seu pescoço enquanto apertava o corpo
molhado contra o dele.
— Estou realmente muito brava com você, — ela sussurrou em sua boca, enquanto seus
lábios moviam-se sobre os dele, beijando-o repetidamente.
Sentiu a borda da raiva no beijo dela, a paixão escaldante levantando-se com uma demanda
de necessidade.
— Tudo bem, Judith, — ele sussurrou no calor de sua boca. — Fique com raiva de mim mais
tarde.
A boca dele abriu caminho pelo rosto dela, no queixo e seguindo para a garganta. Ergueu-a
para tirá-la da banheira, indiferente da água pingando no chão. A respiração de Judith ficou presa
na garganta.
— Eu não sou nenhuma pequena fada como Lexi ou Airiana, Thomas. Sou alta, então não
sou leve. Você vai se machucar mais.
Ele beijou o pescoço dela, com seus dentes beliscando e sua língua dançando sobre toda
aquela pele macia, seduzindo-a.
— Eu quero comer você toda, Judith.
— Seu braço, — ela sussurrou, puxando para trás.
— Foda-se meu braço. Quem dá a mínima para o meu braço? Exatamente agora, preciso
somente de uma coisa. — Ele pegou uma de suas pernas e envolveu-a em torno dele. — Preciso
estar dentro de você agora. Coloque sua outra perna em volta da minha cintura.
Sua voz ficou rouca, a urgência que havia nela o pegou de surpresa. Ele nunca havia sentido
esta necessidade. Não assim. Não como se sua própria vida dependesse disso, mas não conseguia
parar de agarrar suas coxas, os dedos de sua mão cravando-se profundamente enquanto a
levantava. Ela enganchou os tornozelos atrás dele. Se ele sentiu seu braço protestar, sinceramente
ele não registrou. A única coisa que importava era essa mulher, estar dentro de seu corpo, juntos,
pele a pele, coração a coração. Precisava da sua fusão com ele e se cercar de seu calor abrasador.
Qualquer que fosse a alma que ainda lhe restava era dela. Seu coração batia forte em seus
ouvidos. Seu sangue rugia e trovejava alto em sua mente.
Salve-me, anjo. Se entregue a mim.
Ele não podia suportar que a tivesse colocado em perigo, que foi o responsável por ela tê-lo
seguido ao inferno, abrindo caminho para um homem como Ivanov poder chegar até ela. E haveria
outro e outro depois disso. Que direito ele tinha de trazê-la para o seu mundo de sombras e de
morte?
Estou muito apaixonada por você, Thomas. Não importa. Nada disso importa. Apenas isso.
Apenas nós. Ame-me. Mostre-me que me ama.
Judith colocou ambas as mãos nos ombros dele, erguendo-se sobre ele, pressionando o
centro dela para baixo até que a cabeça de sua ereção pesada provou o escorregadio mel quente
que se derramava do corpo dela em boas-vindas.
A voz suave de Judith encheu sua mente, escorregando por cada sombra, apagando todas as
suas dúvidas e levando-o além da sanidade. Ele não esperou. Não deu a ela tempo para se ajustar.
Levantou-a em seus braços fortes e bateu-a sobre ele, dirigindo-a para cima e levando-a para
baixo para se encaixar totalmente nele. Seu corpo era apertado e quente, todas aquelas dobras de
seda estrangulavam-no com prazer requintado, abrindo caminho para sua invasão feroz.
Ela gritou e jogou a cabeça para trás, entrelaçando os dedos atrás do pescoço dele para se
segurar. Seus seios balançavam, os músculos do estômago se encolhiam e ondulavam enquanto
ele a levava a um passeio furioso sob a demanda de suas mãos. Calor brilhava através dele,
queimava-o, equilibrava-o. O medo terrível que o estava rasgando começou a aliviar com cada
estocada. Ele mergulhou nela duro e rápido, necessitando que as chamas corressem através de
sua corrente sanguínea. Precisando do fogo que engolia seu corpo, que se aproximava com seus
dedos para consumi-lo, (a ambos), fundi-los, ligá-los, coração e alma enquanto suas carnes se
derretiam juntas.
Seus gritos ofegantes e choramingo, era uma doce música que ele estava começando a
amar. Os soluços, as súplicas ofegantes enquanto ela gritava seu nome, sacudia à sua própria
essência. Ele apertou seu domínio sobre ela, indiferente à passagem do tempo, apenas perdendo-
se no calor escaldante de seu corpo, na seda de sua vagina apertada e no prazer ondulando
através dele.
Ele não podia acreditar que ela era dele. Irritada ou não, ela o acolheu, o montou de forma
quente e dura naquele passeio selvagem, louco e sem inibição, entregando-se completamente aos
seus cuidados. Seus gritos ofegantes aumentaram, ficaram mais frenéticos e ela cravou suas unhas
no pescoço dele. Os pontinhos minúsculos de dor só o deixaram mais quente, mais possuído em
sua necessidade frenética.
— Minha, — afirmou. — Diga para mim. Agora. Agora, Judith. A quem você pertence?
Seus olhos se abriram e ela olhou diretamente nos olhos dele. Por um momento, o coração
dele parou e ele sentiu-se cair. Se afogando.
— Stefan Prakenskii. Pertenço a ele e sempre pertencerei. — As palavras dela saíram em
pequenos e suaves suspiros de convicção, porque não parou de se dirigir para ela como uma
britadeira. — E ele me pertence. — Ela jogou a cabeça para trás de novo, seus seios estavam
arrepiados e sacudindo loucamente, uma imagem erótica que ele guardaria em sua mente para
sempre.
— Quem você ama?
— Você, você seu cabeça-dura. — Os músculos dela aumentaram seu aperto em torno dele
possessivamente, quente e apertado e, oh, tão perfeito. — Sempre você.
Os últimos vestígios de medo e raiva se dissiparam com a declaração dela. Os dedos dele
agarraram sua bunda mais apertado e a levantaram, puxando-a para baixo, enquanto faíscas de
raios corriam por seu corpo e cantavam uma música em seu sangue. Tudo o que ele tinha sido, o
que alguma vez fez, o levou a este lugar, para esta mulher. Ela era tudo que já esteve procurando.
Não houve ninguém antes dela e não haveria ninguém depois.
Ele não se preocupou em negar se o que sentia era amor. Aquela emoção que corria por ele
profunda e forte. Que o queimava como fogo. A emoção era tão intensa que era quase selvagem,
agitava até o âmago de sua existência. Ele queria acordar todos os dias para ela. Ir dormir com o
corpo enrolado firmemente em torno dela. Queria que ela tivesse seu filho... Seus filhos. Sabia que
queria viver o resto de sua vida com ela ao seu lado e quando morresse, queria morrer em seus
braços.
Um incêndio sensual queimou de dentro para fora, levando-o mais alto do que ele já havia
ido, empurrando todos os seus limites até que ela só podia se agarrar a ele, ofegante, implorando,
com seus gritos suaves cada vez mais frenéticos. O corpo dele explodiu como um vulcão ardente,
um foguete estourando através dele, um ataque total a todos os seus sentidos.
O corpo dela apertou o cerco contra o dele, seus músculos se apertaram ainda mais em
torno de seu pau, estrangulando e queimando-o, arrastando a última gota da essência de seu
corpo enquanto relâmpagos corriam por suas veias e se apressavam por seu sangue. Isso era o
que o amor fazia sentir. Acolhido. Era uma necessidade, frenética insaciável que deixava alguém
completamente torcido, mas estranhamente em paz.
Judith baixou a cabeça no ombro dele enquanto seu corpo continuava ondulando com
tremores, sua respiração vinha em suspiros, soluços, manteve os olhos fechados enquanto o
saboreava. Ele apertou-a, querendo a proximidade, o contato pele a pele, enquanto continuava
enterrado dentro dela, sentindo ternura absoluta, uma emoção que era desconhecida e agora o
dominava.
— Eu poderia ficar assim para sempre, enterrado profundamente dentro de você. Você é um
porto seguro, Judith, um lugar onde posso ser alguém real, — ele sussurrou, distribuindo beijos
pelo seu rosto e pescoço.
— Você é real, — ela respondeu, com a boca encostada ao ombro dele. — Pelo menos acho
que você é. Você está realmente ferido, Thomas. Você não deveria estar me segurando assim.
— Isso é exatamente o que eu deveria estar fazendo. Os russos são duros, anjo.
Ele beijou o topo de sua cabeça enquanto se obrigava a escorregar para fora dela. Ele se
permitiu escorregar. Ele não queria fazer isso, mas foi duro com ela e ela precisava do calor
reconfortante da água da banheira. Ele a baixou de volta para a banheira.
— Você precisa que eu adicione água quente?
Judith inclinou a cabeça para trás, olhando para ele com seus olhos exóticos, mais
misteriosos do que nunca com seu cabelo sedoso, brilhante e seu corpo sensual.
— Preciso saber o que está errado, Thomas. Se vamos fazer isso...
Ele juntou o cabelo dela em seu punho.
— Não existe “se”. Temos um compromisso, Judith, então não tente colocar seu pé para fora
da porta porque não gostou de algo que fiz. Isso vai acontecer muito antes que eu descubra como
funciona esta coisa de relacionamento.
Sua covinha apareceu, como se ela estivesse tentando conter um sorriso, mas ela não
conseguiu suprimir a súbita onda de felicidade que se espalhou pelo banheiro.
— Coisa de relacionamento? — Repetiu. — Posso ver que terei uma quantidade enorme de
desculpas românticas. Tome seu banho, Thomas, e depois vamos enfaixar seu braço. Basta dizer
que, se você tentar me drogar novamente, vou te bater com uma frigideira na sua cabeça.
— Você provavelmente faria.
— Não duvide nem por um minuto.
Stefan encontrou-se rindo.
— Você é tão linda.
— Entre no chuveiro Thomas, — disse Judith em sua voz mais firme de “é melhor fazer o que
estou mandando”.
Ele descobriu que gostava quando ela dava ordens a ele. Havia algo de muito sexy quando
uma mulher ficava toda dominante e perigosa com o seu homem... E ele gostava de ser seu
homem. Sorriu abertamente para ela e entrou debaixo da água do chuveiro.
A água quente afastou a exaustão de seus ossos. Ele tomou seu tempo, desfrutando o prazer
de vê-la tomar um banho enquanto ele tomava banho. Estava certo sobre essa banheira, ele podia
ficar ao lado daquilo e seria a altura certa para ela inclinar a cabeça para trás contra o lado alto,
abrir sua boca muito sexy e dar total atenção ao seu pau, de repente dolorido. A mão dele caiu,
circulando lentamente seu pau que endureceu rapidamente. O jato de água na carne sensível só
aumentava a fantasia erótica.
— Pare com isso, — ela disse sem virar a cabeça.
— Eu não fiz nada... Ainda.
— Você precisa enfaixar este ombro.
— Depois. — Sua voz era inconscientemente um comando.
Ela virou a cabeça e olhou para ele com os olhos calmos, um olhar tentador de sereia no
rosto enquanto passeava pelo corpo dele. Ela esticou o dedo e o chamou.
— Venha aqui. Acho que você é insaciável.
O ronronar na voz dela endureceu seu pau ainda mais. Ele desligou a água e caminhou em
sua direção, segurando-a com o seu olhar. Os olhos de Judith ardiam com o calor. Ela inclinou a
cabeça para trás quando o alcançou, suas mãos carinhosamente massagearam seu saco pesado,
incitando-lhe a chegar mais perto. Stefan fechou os olhos quando sua boca quente se fechou
sobre sua carne latejante e o chupou. Ela o transformou em uma estaca de aço imediatamente.
Aquela boca de seda quente em torno dele o apertava como um punho, mas foi o olhar nos olhos
dela que tirou o seu fôlego enquanto um calor abrasador percorria o seu corpo.
Ele gemia com enorme prazer enquanto ela o chupava forte, chupando-o profundamente
enquanto sua língua trabalhava em seu eixo. Sua boca era quase o céu tanto quanto o seu corpo.
Ela levou seu tempo, provocando, esbanjando total atenção nele com língua e mãos, provocando
a cabeça de seu pau e lambendo-o antes de ficar séria e sua boca trabalhar nele mais firmemente.
Ele fechou os olhos enquanto o êxtase escorregava por ele, o calor deslizando de seus dedos
dos pés até sua virilha, correndo de sua cabeça para a sua ereção pesada. Ele não conseguia parar
de traçar suavemente o rosto amado com seus dedos enquanto observava-se desaparecer nas
profundezas quentes de sua boca. Os olhos dela, as maçãs do rosto salientes, a pele macia
convidativa. Sua mão deslizou por sua mandíbula acariciando sua garganta quando entrou um
pouco mais, forçando-a para trás para que tivesse um ângulo melhor para deslizar mais
profundamente.
Ele permaneceu de forma passiva tanto quanto possível durante o tempo em que foi capaz
antes que as sensações começassem a superar o seu controle. Stefan sabia que uma boa parte de
seu prazer era o prazer de Judith, a forma como ela se oferecia para ele. Ele assumiu o controle
um pouco mais quando as chamas começaram a queimar em suas veias, lambendo sua pele. Ele
afundou seu pau um pouco mais profundamente e segurou-a lá por apenas um momento,
permitindo que ela se acostumasse com a sensação antes de se afastar.
Ela acariciou a parte inferior da cabeça larga e sensível com a língua, como se estivesse
memorizando todas as linhas com uma concentração extasiada em seu rosto. Suas mãos
agarraram os cabelos dela e segurou-a enquanto assumiu completamente o controle afundando-
se cada vez mais profundamente e mantendo-se dentro dela.
— Engula, anjo. — Ele rosnou o comando entre os dentes.
O maravilhoso aperto forçou um gemido de sua garganta. Ele recuou e viu sua língua
arrastando-se deliberadamente contra sua veia pulsante. Ele começou a definir o ritmo, tentando
encontrar um equilíbrio que ela pudesse acompanhar, aquela sensação maravilhosa e a
necessidade dela de engolir ar. Felicidade. Êxtase total, a boca, garganta e língua dela. Sentiu a
ebulição aumentar e agarrou o cabelo dela mais apertado sentindo a tensão enrolando no corpo
dele.
— Olhe para mim. Mantenha-se olhando para mim. — Ele mal conseguia articular as
palavras, enquanto a explosão começava em algum lugar ao redor de dedos de seu pé, queimando
por suas coxas, jorrando forte e rápido, enquanto o sangue trovejava nos ouvidos e seu coração
batia com amor.
Os olhos dela encontraram os dele inflexivelmente enquanto ela o engolia, sua boca
trabalhando avidamente com o amor em seus olhos tão firmes como uma rocha. Por ele. Ela tinha
visto o pior e o melhor nele, e ainda assim ficou com ele, dando-lhe seu amor e lealdade. O último
vestígio de sua raiva se afastou, enquanto ele percebia que ela aceitaria sua incapacidade de
compreender as relações ainda mais do que ele. Judith ficaria com ele. A terrível agitação na
barriga dele diminuiu e viu-se sorrindo para a mulher que amava, envolto no manto de sua
serenidade natural.

*****

Descendo a rua principal de Sea Haven, à vista dos habitantes da cidade, enquanto estava de
mãos dadas com Judith, sentia-se estranho e ainda assim alegre. Do outro lado da rua, o oceano se
agitava, as ondas batiam nas rochas e nas falésias. A espuma branca subia e caía sobre as rochas
fazendo um grande estrondo enquanto o vento as agarrava e levava de volta para o mar. A névoa
fluía para os edifícios e ruas, trazidas pela brisa vinda do oceano.
— As maiorias das pessoas aqui se incomodam mais pelo vento do que pelo nevoeiro, —
Judith disse, — mas eu amo o vento e as tempestades daqui. Sempre sinto que ninguém consegue
domar esse lugar.
Stefan admitiu que gostou de sua ideia. Ele não era o tipo de homem que passeava na rua,
corajosamente segurando a mão de uma mulher. Seu olhar se movia agitadamente sobre os
telhados e para os becos, embora uma parte dele aproveitasse cada momento da nova
experiência. Definitivamente, ele estava tendo várias “primeiras vezes” com Judith. Ele era um
homem acostumado aos disfarces que desempenhava e ficava confortável neles na sociedade
quando estava à paisana. Se pretendia tornar-se Thomas Vincent e se estabelecer em Sea Haven,
ele teria aprender a ficar completamente à vontade no mundo da arte com Judith. Ela viajava e ia
às galerias e convenções além de dar aulas. Onde Judith fosse Stefan iria, mas sempre teria a
selvageria deste lugar para fazê-lo sentir-se confortável em sua própria pele.
Uma sensação de desconforto escorregou por sua mente. Ele deu uma rápida olhada ao
redor. A neblina estava pesada e se aglomerando rápido, cobrindo os edifícios em uma névoa
cinzenta.
Judith virou o rosto para a névoa acumulada e sorriu.
— Amo este nosso mar. Ele se torna selvagem quando o clima muda. O dia estava lindo esta
manhã na fazenda, dirigimos somente alguns quilômetros e a neblina está derramando na cidade
tão rápida e espessa que mal conseguimos ver nossa mão na frente de nosso rosto.
Stefan sabia que sua “lua-de-mel” com Judith estava prestes a acabar. Podia sentir a tensão
se construindo nele, tão certo como podia reconhecer a tempestade se construindo e se tornando
iminente. Sempre sabia quando estava perto de problemas e quando se aproximaram da galeria
de arte, o cabelo da parte de trás de seu pescoço se arrepiou e cada célula de seu corpo entrou
em estado de alerta. Sem um pensamento consciente, largou a mão de Judith e foi para trás dela
para colocar o seu corpo entre o dela e os prédios ao invés da rua. Instintos eram tudo e ele não se
questionava, simplesmente reagia.
— Deixe-me ir primeiro, — ordenou à medida que se aproximavam do pequeno beco entre
os prédios, local onde o velho Bill transformou em sua casa. — Fique atrás de mim até que eu
verifique a galeria.
Judith franziu a testa para o rosto sombrio dele e seu tom tenso e dominador, mas não
discutiu com ele. Ao passarem por Bill, ela fez uma pausa. O veterano de guerra estava deitado
sob o cobertor, cobrindo a cabeça com uma das mãos, tremendo um pouco pela névoa espessa.
— Bill, você precisa de outro cobertor? O que aconteceu com seu saco de dormir?
O tempo estava cinza e sombrio, o mar batendo furioso contra o penhasco onde o carro de
Ivanov tinha seguido para as rochas abaixo. Stefan deu uma boa olhada ao redor, enquanto Judith
conversava com o homem desabrigado, ciente de tudo, enquanto estudava os telhados e torres,
Bill fez uma tentativa para sentar-se, tossiu e deitou-se novamente.
— Você precisa de um médico? — Judith perguntou.
Bill balançou a cabeça e fez sinal para ela ir embora, claramente tão independente como
sempre.
Judith franziu a testa para ele.
— Se você não estiver melhor amanhã, trarei Lexi aqui, Bill, e você sabe o que isso significa.
Ela fará alguma poção de sabor horrível para você beber e você vai bebê-la porque ninguém
consegue resistir a ela, nem mesmo você.
Bill fez um som abafado, um grunhido que podia ser de riso ou de acordo. Stefan pediu para
Judith avançar em direção à galeria, segurando o seu braço e puxando-a com força dominante. Ela
fez uma cara feia para ele, sua preocupação com Bill havia substituído seu bom senso.
O radar dele gritava, seus músculos estavam tensos e prontos para entrar em ação. O peso
de sua arma era reconfortante. Possuía uma faca amarrada na panturrilha, um em sua bota, outra
na manga e uma pequena faca presa entre as omoplatas, onde ele podia alcançar e jogá-la em
menos de um segundo caso houvesse necessidade. Mas com tudo isso, ele ainda não gostava de
ter Judith ali naquele local aberto.
Vamos, Judith. Algo está errado. Eu posso sentir. — Ele sussurrou o aviso em sua mente.
Judith deu um sorriso para Bill e levantou a mão para o homem mais velho, deixando claro
que insistiria em arranjar atenção médica a ele.
Ele odeia médicos, ela explicou, mas começou a caminhar a passos largos em direção à
galeria de arte.
Eles não deram mais do que cinco passos, quando duas figuras sombrias levantaram-se do
lugar onde estavam sentados em cadeiras. O coração de Stefan gelou. Reconheceu o casal
imediatamente. Inez Nelson e Frank Warner os esperavam, ambos com um olhar angustiado. Inez
claramente torcia as mãos, torcendo os dedos em agitação.
— O que houve Inez? — Judith se adiantou, com a compaixão em sua voz, em sua expressão
e na mão que esticou para tocar o braço da mulher mais velha.
A inclinação natural de Stefan era proteger Judith do casal. Seu sistema de alerta estava tão
alto que podia ouvi-lo aumentando através do sangue trovejando em seus ouvidos. Aproximou-se
mais de Judith, seu corpo abrigando o dela protetoramente enquanto se esticava ao redor dela
para apertar a mão de Frank.
— Há algo de errado?
— Fui à galeria esta manhã para abrir antes de você chegar, — Inez explicou, — e... — Ela
parou de falar. — Você precisa ver... Chamei Jonas.
Stefan praguejou baixinho. A última coisa que ele precisava era de um xerife intrometido ao
seu redor. Seguiu Inez e Frank para dentro da galeria, mantendo Judith na frente dele, de modo
que qualquer pessoa na rua com uma arma, não tivesse chance de matá-la. Uma vez dentro,
Stefan viu o dano imediatamente. Alguém havia tirado as pinturas da parede e jogado
descuidadamente no chão depois de arrancar as telas dos quadros retirando-as das molduras.
— Quem fez isso? — Judith perguntou. — Nós não temos este tipo de vandalismo aqui. Se
essas telas não forem esticadas em breve, as pinturas ficarão arruinadas. A maioria delas são a
óleo, mas algumas são em acrílico e estas são um problema. — Ela pressionou a ponta dos dedos
nos olhos. — Vários trabalhos destruídos.
Stefan se aproximou das pinturas espalhadas. Cada uma delas era uma pintura que Judith
havia feito. Aquilo chamou sua atenção. Isto havia sido deliberado. Ivanov estaria enviando uma
mensagem? Deu uma olhada rápida ao redor, para as bancadas das janelas. De repente, sentiu
como se Judith estivesse muito exposta. Ele a pegou pelo braço e afastou-a das pinturas, levando-
a para um canto sombrio onde seria mais difícil para um franco atirador conseguir um alvo claro.
— Inez, parece que só destruíram os meus trabalhos, — Judith disse colocando uma de suas
mãos defensivamente na garganta. — São todas as minhas pinturas?
Stefan pensou que ela parecia muito vulnerável e seu coração deu um tombo. Ele colocou o
braço em volta de sua cintura e puxou-a apertando-a contra ele.
Nós vamos chegar ao fundo disto, anjo.
— Eles não destruíram as telas, — Inez apontou apressadamente. — Eles retiraram as telas
das molduras. Você pode consertá-las, não pode Judith? Depois de Jonas vê-las, leve-as de volta
ao seu estúdio e os conserte-as antes que fiquem arruinados.
— Ele vai querer mantê-las para a evidência, — Judith destacou.
— Bem, ele não pode. Ele pode fotografá-las e se isso não for bom o suficiente para ele,
paciência. Vamos ter que insistir com ele porque a galeria, não pode se dar ao luxo de ter esse tipo
de perda, — Inez disse acaloradamente. — E não perderemos todo o seu trabalho.
— Será que os vândalos estavam procurando alguma coisa? — Stefan disse observando
atentamente a expressão de Judith.
— O que poderiam estar procurando embaixo das telas? — Judith perguntou. — Eu mesma
emolduro as telas. Eu as estico em torno da madeira e as grampeio com grandes grampos de aço
inoxidável para manter a lona esticada.
— Onde você consegue suas barras de madeira? — Frank perguntou. Ele limpou a garganta,
olhou para Stefan e depois para Inez. — Lembra-se, Judith, o problema que tive alguns anos atrás.
A máfia russa convenceu Frank a desviar tesouros roubados através da galeria de arte dele.
Ele foi para a prisão por sua participação na operação de contrabando.
Judith balançou a cabeça.
— As barras de madeira podem ser conseguidas em qualquer lugar, em qualquer loja de
arte. Não há nada de especial sobre elas.
— E as telas? — Inez perguntou.
Judith franziu a testa.
— Como a maioria dos artistas, faço as minhas próprias telas, então compro rolos de lona de
uma loja de artigos de arte. Às vezes reutilizo as telas, mas, novamente insisto, não há nada de
especial sobre elas.
Stefan podia sentir a mente de Judith trabalhando, querendo resolver o quebra cabeça,
misteriosa, tentando descobrir por que seu trabalho foi escolhido para ser vandalizado, enquanto
todas as outras obras permaneceram intactas. Em estado de alerta, sentiu a onda de energia que
parecia preceder Jonas Harrington, enquanto ele entrava na galeria. Mantendo o braço em torno
de Judith, observou o xerife, que imediatamente colocou seu braço ao redor de Inez para
confortá-la, mas seu olhar afiado foi para Stefan, percebendo a forma que ele estava segurando
Judith tão protetoramente.
— Você ouviu falar algo sobre Levi? — Jonas cumprimentou Judith. — Queria ver como ele
estava ontem, mas o tempo me escapou.
— Ele já está de volta em casa, — disse Judith. — Mancando para lá e para cá, mas está bem.
Jonas manteve o olhar firmemente sobre Judith.
— Essa tempestade na outra noite, Hannah disse que não foi natural. O aumento da energia
foi imenso e a combinação de vento, água e até mesmo os terremotos não fizeram sentido.
Algumas pessoas relataram inclusive terem visto uma das torres em chamas.
Stefan apertou seu braço em volta de Judith.
Tenha muito cuidado, anjo, ele está tentando pescar algo.
Ele sentiu a hesitação nela. Ela não gostava de mentir, ainda assim, apertou os lábios e
suspirou antes de falar.
— Você sabe que Rikki tem uma afinidade com a água. Levi estava em perigo. Acho que as
emoções se elevaram por uma boa razão. Aquele homem esteve aqui antes para caçar Levi.
— Encontramos uma confusão dentro da pequena casa que Ivanov alugou, — disse Jonas. —
Sangue por toda parte. Muito sangue e era humano. Alguém morreu lá dentro, e não de uma
forma bonito. Havia pedaços de material de uma jaqueta, de um jeans muito velho e de um saco
de dormir.
— Oh não, — disse Inez com horror. — Alguém já foi dado como desaparecido?
Jonas balançou a cabeça.
— Até agora não. E Danny, o cão de Trudy Granite foi morto também na mesma noite. Seu
filho, Davy, esta devastado. — Seu olhar penetrante saltou para Stefan. — Você não saberia nada
sobre isso, saberia?
— Como poderia saber? — Stefan rebateu de forma um pouco hostil. Ele era Thomas
Vincent, um empresário norte-americano prestes a comprar uma galeria de arte que havia sido
vandalizada.
— Estou apenas sendo meticuloso, — disse Jonas.
— E eu estou prestes a fazer uma oferta para esta galeria, — disse Stefan. — Acho que é de
conhecimento público nesta cidade que estou aqui para essa finalidade. Muitas propriedades
estão envolvidas. Esta galeria de arte, o prédio e Frank também está pensando em vender todo o
bloco seguinte com alguns prédios também. Talvez alguém aqui não queira que uma pessoa de
fora faça essa compra.
Inez arfou e agarrou Frank que se inclinou para ela com seu braço circundando sua cintura.
— Eu não posso imaginar que alguém queira sabotar o nosso negócio, — disse Frank com
firmeza, mais para benefício de Inez do que por convicção.
— Algo como isso não me assustaria, — Stefan assegurou. — Judith pode esticar as telas
novamente e as pinturas ficarão bem. Pretendo fazer uma oferta assim que acabar de analisar o
inventário e os livros fiscais.
Judith olhou para as duas paisagens de acrílicas.
— Preciso trabalhar nesta obra rápido. Jonas, preciso levar todas as pinturas danificadas de
volta para meu estúdio comigo.
— Vou começar a trabalhar e fotografar tudo, — Jonas disse imediatamente. — Por que
você não vai tomar um café, Inez? Isso não deve demorar muito.
Stefan teve que reconhecer a atitude do xerife. Inez não era uma mulher jovem e estava
verdadeiramente aflita. Ele adivinhou que financeiramente, ela e Frank precisavam vender a
galeria e ambos estavam com medo, apesar de suas promessas, que ele desistisse do negócio.
— Venha, — disse Judith assumindo o comando. — Vamos todos descer para um café.
Podemos nos distrair enquanto Jonas está trabalhando nisso. Frank, posso consertar as pinturas,
por isso não se preocupe.
Ela deu um sorriso para o casal, mas Stefan podia sentir a ansiedade nela. Como sempre, em
público, Judith escondia suas emoções, se recusando a permitir que elas se derramassem e
afetassem os outros ao seu redor. Ela mantinha este controle com muito cuidado. Ele passou a
mão carinhosamente por sua espinha apenas para lembrá-la de que ele estava lá e sabia o quão
preocupada e angustiada ela estava que alguém pudesse fazer uma coisa dessas com o trabalho
dela.
Ele duvidava que Ivanov tivesse vandalizado as pinturas. Não era o estilo do exterminador.
Ele nunca teria sequer pensado em tal coisa, a menos que fosse uma isca para levar todos ao
prédio para explodi-lo com eles lá dentro. Portanto isso significava apenas uma coisa. Jean-Claude
La Roux já estava em Sea Haven. E não desperdiçou seu tempo. Se ele estava procurando as
pinturas de Judith, removendo as telas das molduras, isso significava que teria escondido o
microchip entre alguma tela e a barra da moldura. Judith deveria ter levado a pintura com ela
quando foi embora.
Por quê? Por que levaria uma pintura com ela se estava fugindo para salvar sua vida? Isso
não fazia sentido para ele. Se ela soubesse sobre o microchip e o tivesse levado deliberadamente
com ela, por que não tentou vendê-lo no mercado negro? Sua vida estava prestes a se complicar
muito. Judith teria que ser questionada e ela não gostaria de saber que ele a havia enganado,
omitindo que estava trabalhando para o governo russo para recuperar o microchip.
Os quatro deixaram Jonas com o seu trabalho e saíram para o alpendre coberto. A neblina
estava ainda mais densa, transformando o mundo em uma espessa névoa cinza. Os contornos das
árvores e edifícios estavam sombreados e vagos. Os nós no estômago de Stefan não se
dissolveram e a tensão nele se enrolava mais apertada do que nunca, sabendo que teria que levar
Judith para casa e encontrar o microchip. Além da ameaça de Ivanov, La Roux estava à espreita.
Ele estava certo disso.
Judith apertou o suéter mais próximo ao seu redor.
— Está definitivamente frio hoje.
— E um pouco triste, — Inez acrescentou. — Normalmente não me importo com a neblina,
mas quando o tempo está assim, não dá para se ver nada e fica tudo muito sombrio.
Frank passou o braço em torno do ombro dela e sorriu para ela.
— Não se estamos em casa assistindo a um filme antigo e comendo pipoca.
Inez se animou imediatamente.
— Isso é verdade. E num dia de tempestade, escolhemos ver filmes antigos de terror, como
os de Hitchcock. Eu adoro. — Ela virou-se com um sorriso para Stefan. — Você gosta de filmes
antigos?
Filmes de entretenimento não eram exibidos para os meninos e meninas nos campos de
treinamento nos quais ele cresceu e seu trabalho ele não ia a cinemas. Deu de ombros de forma
casual.
— Os filmes que consegui ver, realmente gostei. Assistir filmes antigos quando do lado de
fora há um nevoeiro ou tempestade soa bem para mim. Estou pronto para sossegar e aproveitar
um pouco a vida.
Ficou surpreso quando disse aquelas palavras e o quanto elas realmente significavam para
ele. Ele estava mais do que pronto para negociar uma vida nas sombras por uma vida ao lado de
Judith. Uma vida real. Um lar, crianças, a fazenda, viajando para as convenções de montagem de
caleidoscópios. Ele queria o pacote inteiro.
— Você trabalha muito? — Inez perguntou enquanto começavam a descer a calçada em
direção ao pequeno café local.
— Viajo muito a trabalho, — admitiu Stefan. — Mas estou ficando velho. E já é hora de me
acalmar.
O radar dele se recusava a acalmar. O nevoeiro naquele momento era um grande problema,
pois precisava ver se algum inimigo vinha na direção deles. Ele não gostava da sensação que o
nevoeiro pesado causava a ele. Cada passo que dava, aumentava a espiral de sua tensão. Algo
ainda estava errado e seu sistema de alerta estava gritando com ele para prestar atenção. Judith e
Inez tagarelavam e ele afastou a mente da conversa para ouvir qualquer outro som revelador, som
de passos, qualquer coisa que pudesse dizer que havia algum perigo próximo.
Ivanov estava ferido, não havia dúvida na mente dele sobre o tiro que Stefan acertou, mas
não havia nenhuma maneira que ele tivesse caído no precipício com seu carro como os policiais
achavam que havia acontecido. Stefan não acreditava nisso nem por um momento. Ele havia
escapado e fugido para outro esconderijo, saindo de um disfarce e criando outro pelo caminho
conforme haviam ensinado a eles.
Sua mente começou a fazer uma rápida avaliação, encaixando peças, enquanto o tempo
todo o seu sistema de alerta gritava para ele. “Onde está seu saco de dormir, Bill?” A voz de Judith
se derramou por sua pele, chamando sua atenção. Um som suave penetrou na espessa camada de
nevoeiro. Abafado. Encoberto. “Encontrou pedaços de material de um saco de dormir.” Agora era
a voz de Jonas.
Seus instintos gritavam querendo ser ouvidos, Stefan empurrou Judith e Inez para trás com
força suficiente para caírem na calçada juntas enquanto ele atirou seu corpo para uma pequena
abertura entre os dois edifícios. O som alto de um tiro reverberou através da estreita passagem.
Ao longe, ouviu grito, um grito estridente, enquanto algo batia em seu peito, jogando-o para trás.
Ele se recusou a cair, se recusou a desmaiar e deixar o pânico tomá-lo quando não conseguiu
respirar. Fincou seus calcanhares no chão e mergulhou à frente, enfrentando o Velho Bill.

CAPÍTULO 19

Stefan e Ivanov caíram juntos, o som de seus corpos parecia um trovão no minúsculo beco.
O peito de Stefan queimava como o inferno. Era como se tivesse sido atingido por um trem, mas a
única coisa que importava, a única coisa em que estava concentrado, era impedir que a arma de
Ivanov disparasse em Judith. Conseguiu agarrar a mão de Ivanov que estava com a arma
empurrando-a para trás enquanto aplicava pressão contra o pulso. Quando fez isso, o assassino
moveu a mão esquerda rapidamente mostrando uma faca afiada apontando na direção da
garganta de Stefan.
Judith se levantou ficando de pé e gritando por Jonas freneticamente enquanto corria em
direção aos dois homens que lutavam. A única arma que possuía era uma bolsa enorme, a qual ela
bateu na cabeça de Ivanov enquanto os dois homens lutavam pelas armas.
Stefan apertou como um torno a mão esquerda de Ivanov empurrando-a para baixo
enquanto o dirigia para trás e para longe de Judith. Os dois homens bateram com tanta força na
lateral do prédio que ele tremeu. Ambos rosnaram, Stefan deu-lhe uma joelhada com a intenção
de levar o exterminador para o chão. A respiração de Ivanov deixou o seu corpo com uma lufada
de ar e ele caiu, mas seu agarre em ambas as armas permaneceu muito forte.
— Saia do caminho, saia do caminho, — ordenou Jonas. — Judith, saia daí. — Ele estendeu a
mão e com força puxou-a longe dos dois homens que lutavam perto dos limites dos dois edifícios.
Pelo canto do olho, Stefan pôde ver o xerife com a arma na mão, tentando obter uma mira
em Ivanov. Deliberadamente, ele apertou seu punho sobre o assassino.
— Fique longe de mim. Você está louco? — Desempenhar o papel do empresário americano
inocente lutando por sua vida exigia um pouco de drama.
Ele esmagou no chão a mão de Ivanov que estava com a arma, mantendo um inabalável
agarre na mão que estava a faca. Usando uma explosão de força, ele virou a faca na direção do
peito de Ivanov, enquanto se contorcia como se Ivanov estivesse levando a melhor sobre ele,
forçando o assassino a rolar e se esparramar sobre ele, dando um alvo ao xerife. Usando o
nevoeiro espesso, ele grunhiu bastante, repetindo o seu apelo para que Ivanov saísse de cima dele
e forçou a mão com a arma para se voltar lentamente, inexoravelmente na direção de sua própria
cabeça.
— Largue a arma, — Jonas disse. — Eu sou o xerife e estou te dando uma ordem.
Ivanov começou a suar, tornando-se escorregadio, respirando seu ódio vingativo no rosto de
Stefan. Stefan estava com ele em um aperto de morte, os dedos cavando seus tendões em pontos
de pressão, controlando suas ações.
— Largue a arma, — Jonas ordenou, se aproximando mais. — Largue agora.
Stefan renovou seu domínio sobre a faca, forçando-a mais próximo do peito de Ivanov,
cobrindo o corpo do assassino lutando na névoa espessa. Olharam-se fixamente nos olhos um do
outro, Ivanov reconhecendo a força física superior de Stefan. Seus olhos se arregalaram em
horror, com reconhecimento de que estava prestes a morrer. Ele poderia tentar render-se ao
xerife, mas o aperto na mão dele com a arma, virando a arma contra Stefan impediria qualquer
conversa.
— Maldição, solte a arma! — Jonas disse com a resolução já rastejando em sua voz.
Deliberadamente Stefan virou a cabeça para olhar para a arma girando lentamente em sua
direção, forçando um olhar de medo em seu rosto. Enfiou a faca para cima no coração de Ivanov,
simultaneamente, enquanto o xerife disparava um tiro. Sangue e cérebro se espalharam em sua
cabeça e ombros. O corpo de Ivanov caiu pesadamente sobre ele.
Stefan empurrou Ivanov para um lado e ficou ali, respirando com dificuldade. Judith correu
para ele, apesar da mão de Jonas tentar segurá-la e seu grito de comando. Encurralado entre ela,
o prédio e o assassino, Stefan usou a cobertura do corpo dela e do nevoeiro para transferir suas
facas e a arma para sua grande bolsa, um movimento cuidadoso de cada vez, durante todo o
tempo fazendo um bom show de falta de ar e parecendo apalpar-se para baixo procurando
feridas. Judith ignorou as ações dele, embora ele percebesse o olhar dela uma vez para a sua mão
que deslizava dentro de sua bolsa. Ainda assim, ela estava muito ocupada examinando-o
procurando por ferimentos.
Ele atirou em você. Eu sei que atirou. Eu vi.
A ansiedade dela se derramou, sua emoção se espalhou para a multidão que começou a se
reunir.
Estou vestindo um colete, doçura. Eu sabia que Ivanov ainda estava vivo e imaginei que ele
viria por mim. Tenho muito a perder para não tomar algumas precauções. Vamos apenas manter
isso para nós.
Jonas começou a avançar e chutou a arma de Ivanov para longe da mão estendida do
homem morto. Após todas as precauções, o xerife rapidamente algemou as mãos de Ivanov nas
costas.
— Acho que ele está morto, Jonas, — Judith disse com sua voz suave e cheia de compaixão.
— Eu vi homens ainda vivos depois de levarem seis ou sete tiros. Nunca se sabe. — Ele
chegou a verificar se havia pulso, mas como a metade da parte de trás da cabeça de Ivanov estava
destruída, aquilo era um ponto discutível.
Ele falou em seu rádio, respondeu a algumas perguntas e voltou sua atenção para Stefan.
— Você está bem?
— Ainda não sei, — disse Stefan tentando mostrar um olhar muito abalado. — Dê-me um
minuto. E... Obrigado. Você salvou minha vida.
— Você foi atingido? — Jonas persistiu.
— Não. Sim. Eu estava usando um colete à prova de balas porque não tenho meus guarda-
costas comigo.
O olhar de Jonas era afiado.
— Você usa coletes com frequência?
Stefan assentiu.
— Mais do que gostaria. — Ele pareceu trabalhar duro para controlar sua respiração.
— Judith, vá sentar-se nos degraus da galeria de arte, — Jonas ordenou. — Inez, se você
sentar lá no alpendre, agradeceria isso. E Frank, por favor, vá sentar no carro patrulha até que os
outros cheguem até aqui. Apenas atirei e matei seu homem, haverá uma investigação e
precisamos seguir as regras.
Inez ergueu o queixo.
— Vou sentar no carro patrulha, — ela disse com firmeza, lembrando a Jonas
silenciosamente que Frank já sofreu aquela indignidade e não precisava fazê-lo novamente. —
Judith, querida, vá você para o alpendre e saia dessa névoa úmida.
O delegado esperou até que as testemunhas fizessem o que ele havia pedido.
— Tenho meu gravador ligado, — Jonas advertiu a Stefan. — Você pode me dizer o que
aconteceu?
— Tudo aconteceu tão rápido, que eu honestamente não sei exatamente como começou, —
Stefan continuou, fazendo um show ao permitir que o xerife o ajudasse a ficar em uma posição
sentada. — Talvez Frank ou Inez possam te dizer. Eu só vi o velho levantar do seu cobertor com
uma arma. Ele estava grunhindo para si mesmo quando paramos ao lado dele mais cedo. Judith
falou com ele, mas ele não respondeu realmente. Ele deve ter surtado e pensado que estava na
guerra ou algo assim. — Stefan passou a mão trêmula pelos cabelos, olhando para ela depois
coberta de sangue e estremeceu visivelmente.
Jonas puxou a camisa cheia de sangue de Stefan, abriu-a e assobiou.
— Que bom que você estava usando isso. Essa bala teria matado você. Logo os paramédicos
chegarão e poderão dar uma olhada em você.
— Só dói como um filho da puta. Cara, sinto muito que você tenha tido que atirar nele, mas
se você não tivesse, não sei quanto tempo poderia impedi-lo de mirar a arma em mim. Podia vê-lo
se aproximando e não havia absolutamente nada que pudesse fazer sobre isso.
— Você pode ficar em pé?
— Sim. Só estou um pouco abalado. — Stefan se levantou, conseguiu dar um sorriso pálido e
deu uma olhada rápida para Judith no alpendre da galeria. Ela estava com sua sacola ao lado dela.
— Eu não faço esse tipo de coisa desde que deixei o serviço militar e isso foi a muito mais tempo
do que quero admitir.
— Preciso revistá-lo por armas. Você tem alguma com você?
Stefan fez uma avaliação rápida, mas estava certo de que pegou todas e transferiu para a
bolsa de Judith. Submeteu-se a uma avaliação rápida, porém completa, de Jonas, a procura por
armas. Ao longe, sirenes podiam ser ouvidas.
Recuando para longe de Jonas, ele balançou a cabeça, olhando para o corpo morto.
— Obrigado mais uma vez, cara, você definitivamente salvou a minha vida. Só falei com este
velho umas duas vezes. Dei-lhe um café uma vez e algumas notas que possuía em minha carteira.
Eu não sei o que qualquer um de nós possa ter feito para provocar isso. Judith notou que ele
estava agindo como se estivesse doente e conversou com ele sobre ir a um médico. Talvez tenha
sido isso que o fez surtar. — Ele deixou as palavras saírem de sua boca rápido, como se não
conseguisse parar de falar.
Jonas se agachou ao lado Ivanov.
— Este não é o velho Bill. Alguma vez você já o viu antes?
Stefan deu uma boa olhada no rosto de Ivanov. Franziu a testa e balançou a cabeça, dando
de ombros.
— Se vi não me lembro. Viajo muito e faço um monte de inimigos.
— Você pensou que ele estava tentando matá-lo?
Stefan balançou a cabeça novamente.
— Só vi a arma e não lembro muito depois disso. — Ele tocou o peito. — Ele me disparou um
tiro. Lembro que senti como se tivesse sido atingido por um caminhão. Para ser honesto, nem me
lembro de ouvi-lo. Apenas senti algo bater no meu peito com muita força.
— Vamos precisar de suas roupas e do colete. — Jonas esperou um momento, seus olhos
nunca deixando o rosto de Stefan. — A faca é a sua?
Stefan franziu a testa e olhou mais de perto Ivanov, como se fosse a primeira vez que
percebesse que uma faca tinha sido afundada no peito do falecido. Ele balançou a cabeça.
— Não. Quando agarrei a mão da arma, a faca veio para mim rápido partindo do outro lado.
Nunca a toquei. Apenas o pulso dele. Tudo que fiz foi agarrá-lo. Tudo o que me lembro era que
estava segurando e pensando que ele era malditamente forte para um homem tão velho. Ele deve
ter caído sobre isso quando atirou nele. Eu não posso nem mesmo dizer em que mão estava,
estava mais preocupado com a arma dele.
Os oficiais apareceram e assumiram o controle, afastaram Jonas imediatamente, levando
sua arma e separando-o de Stefan. Stefan teve que repetir sua história para outro oficial,
reiterando que o xerife salvou sua vida. Alguém colocou uma faixa de separação na área,
enquanto outro o levou para a galeria para mudar de roupa, dando a ele um macacão de papel
com zíper. Suas roupas e colete desapareceram em um saco de provas. Ele pôde ver um policial
falando com Judith e outros com Frank e Inez, todos separadamente.
Onde está sua bolsa?
A cabeça de Judith levantou e ela olhou para ele através da multidão de oficiais.
Na galeria. Coloquei-a atrás do balcão. Posso ver a ponta dela aparecendo um pouco.
Ela ainda estava dentro do grande alpendre, olhando através das janelas para dentro da
galeria de arte. Coloquei-a lá dentro quando vi Jonas te revistando.
Continue olhando para ela.
Como na situação da armadilha de Lev, ele só precisava da imagem na mente dela, mas
ainda assim, utilizar o seu maior dom enquanto os policiais o cercavam requereu um foco
tremendo. Stefan respirou e “empurrou” a grande sacola para muito mais atrás do balcão, fora de
vista.
Os olhos de Judith se arregalaram.
Quando você parou o caleidoscópio em pleno ar, quando o joguei em cima de você, soube
que você tinha o dom da telecinesia. Preciso te dizer que é um talento bastante sexy.
Ele lhe deu um sorriso melancólico.
Mantenha isso em mente quando você tentar bater a porta na minha cara.
Eu não planejo fazer isso a qualquer momento, não muito em breve. — Ela assegurou.
Stefan não estava tão certo disso. Teria que falar com ela sobre Jean-Claude La Roux. Ela
achava que ele havia feito uma revelação completa quando admitiu que era irmão de Lev. Ela
concordou em manter sua verdadeira identidade em segredo e viver com ele como Thomas
Vincent, mas ele não podia imaginar que ela aceitaria tranquilamente essa parte do passado dele.
Ele balançou a cabeça quando um paramédico insistiu em examiná-lo, mas permitiu que o
oficial fotografasse o enorme hematoma roxo florescendo no peito, sobre o seu coração. O
homem levantou uma sobrancelha para a miríade de cicatrizes, mas acenou com a cabeça quando
Stefan murmurou algo sobre o serviço militar.
O corpo de Ivanov foi colocado em um saco especial e marcado com um selo azul de legista
antes que fosse retirado. Todo o tempo, Stefan manteve seu olhar em todos que estavam dentro
da galeria de arte. Mesmo com a bolsa segura atrás do balcão, ele ainda se sentia vulnerável. Até
agora, ninguém havia chegado perto, ninguém realmente estava prestando atenção à galeria com
um corpo do lado de fora.
Uma multidão se reuniu do lado de fora da galeria, andando em volta do cordão de
isolamento e falando todos de uma vez. Ele estava agradecido pelo forte nevoeiro que parecia ter
piorado ao invés de evaporar. Inez acenou para Blythe no meio da multidão e indicou para o
guarda na porta que ela poderia entrar, uma vez que a polícia já havia terminado com o
interrogatório das testemunhas.
Stefan pôde ver que Inez e Frank pareciam exaustos. Ele acenou para Judith e indicou o casal
enquanto Blythe os abraçava.
Judith respondeu imediatamente.
— Nós já fizemos todas as declarações. Você pode esvaziar a galeria e nos deixar recuperar
um pouco? — Ela perguntou ao policial na porta.
Ele balançou a cabeça e acenou para todo mundo sair, passou pelo alpendre e fechou a
porta, efetivamente selando o caos e barulho na rua.
— Sr. Vincent, — disse Inez, voltando-se para ele. — Obrigada. Se não fosse por você, nós
provavelmente estaríamos todos mortos. Ainda não posso acreditar que você reagiu tão
rapidamente.
Ele deu de ombros e pegou o braço dela gentilmente.
— Você está machucada, Inez. Você deveria deixar os paramédicos olharem isso.
— Estou velha, — ela disse com um sorriso amarelo. — Eu não saltei muito bem. É uma
contusão, nada mais.
Blythe entregou um pacote de Stefan.
— Hannah, a esposa de Jonas, me ligou e contou o que aconteceu. Ela sugeriu que trouxesse
roupas para você. Eles levaram o uniforme de Jonas e tudo o mais dele, e ele foi para o hospital.
Eles sempre tiram o sangue de um policial quando ele se envolve em um homicídio...
— Homicídio? — Inez protestou. — Jonas não teve escolha. Aquele homem estava tentando
matar o Sr. Vincent. Ele teria matado todos nós. Jonas não teve escolha.
Blythe a abraçou.
— Jonas vai ficar bem. Toda vez que alguém é morto dessa forma, se por um oficial ou
qualquer outra pessoa, é considerado um homicídio. Eles vão investigar, eles já têm suas
declarações e Jonas ficará bem. Não se preocupe com ele, Inez. Hannah já está preocupada o
suficiente por todos nós. Você poderia aparecer em sua casa para vê-la mais tarde, só para saber
como ela está.
— Sim. Sim, isso é uma boa ideia, — Inez concordou. Seus ombros cederam e ela afundou
em uma cadeira. — Este foi um dia terrível. Primeiro alguém vandalizou a galeria e, em seguida,
aquele homem horrível tentou nos matar. — Ela olhou ao redor da sala com um olhar de
preocupação em seu rosto. — Será que Bill tem um lugar para dormir e deixar suas coisas, onde
está Bill?
Houve um breve silêncio. Blythe suspirou.
— Eu sinto muito, Inez. Sei que você foi para a escola com Bill.
— Ele realmente era um bom homem. Perdeu sua sanidade na guerra, isso é tudo, — disse
Inez. — Ele pertencia ao povoado. Todos nós cuidávamos dele. Eu não entendo nada disso. Por
que esse homem feriu Bill e, em seguida, tomou o seu lugar?
— Talvez nunca saibamos a resposta, — disse Blythe.
Stefan levou as roupas que Blythe trouxe para os fundos da galeria. Ele nunca se considerou
tímido, mas um macacão de papel não lhe dava muita confiança em sua capacidade de não rasgar.
Seu único consolo era o pensamento de que Jonas Harrington teve que sofrer a humilhação de
usar um também.
Judith ficou na galeria o tempo todo, mas ele podia ver a necessidade dela de ser segurada e
confortada mesmo que ela não soubesse disso. Ele não podia ir até ela com o sangue de outro
homem sobre ele e ficou muito grato pelo pequeno chuveiro que alguém instalou na galeria há
alguns anos antes. Não funcionava muito bem, a água não possuía muita pressão e às vezes saía
fervendo num momento e depois gelada no próximo, mas com algum tempo, aprendeu o truque
dele.
Ele se olhou no espelho. Porra. Estava cansado e mostrava isso em seu rosto. Pela primeira
vez permitiu a euforia varrer através dele. Petr Ivanov estava morto. Nunca poderia ser uma
ameaça para Lev novamente. Ou para Stefan e seu relacionamento com Judith. Só existia apenas
mais uma complicação para se livrar e viveria sua própria vida. Precisava encontrar o microchip e
leva-lo para casa, para a Rússia onde pertencia.
Mas primeiro, antes de qualquer coisa, precisava segurar sua mulher bem perto e ver por si
mesmo que estava tudo bem. Descalço, saiu da sala para trás e para a direita e foi até ela,
indiferente o que qualquer um deles pensaria. Ele puxou-a para perto dele, encaixando-a
firmemente contra seu corpo, seus dedos segurando os quadris dela para guiá-la para ele. Seus
braços deslizaram em torno das costas dela, seu corpo protetor, duro e muito controlado.
Judith se derreteu nele, cedendo contra ele como se estivesse aliviada. Virou o rosto até que
seu olhar escuro moveu-se sobre ele. Ele abaixou a cabeça e tomou sua boca, seus lábios se
moveram sobre os dela, moldando-a, seus dentes puxando seu lábio inferior. Sua língua se
arrastando para dentro da sua boca. Ele a beijou como se sua própria sobrevivência dependesse
dela... E para ele, isso era realmente verdade.
Ele se afastou o suficiente para descansar a testa contra a dela com sua mão agarrando sua
nuca e os cabelos dela.
— Eu gostaria de tê-la envolvida em algodão e guardada de forma segura, — ele sussurrou.
— Estava pensando a mesma coisa sobre você, — ela disse, deslizando as mãos na parte de
trás do pescoço dele enquanto levantava o rosto para outro beijo.
Stefan levou seu tempo, antes de se virar para os outros, deslizando o braço em torno de
Judith para mantê-la perto.
— Frank, estou definitivamente interessado em comprar a galeria. Dê-me um pouco de
tempo para olhar para os livros fiscais e fazer uma oferta decente.
Inez sorriu para ele e lançou um olhar rápido e satisfeito para Frank.
— Judith conhece tudo sobre a galeria melhor do que ninguém e qual o valor real do
inventário, mas estamos felizes em ajudá-lo de qualquer maneira possível.
— Você está pensando em se estabelecer aqui permanentemente, então, — Blythe disse.
Stefan não poderia dizer se ela estava satisfeita ou não. Blythe era muito reservada em volta
dele.
— Muito permanentemente, — anunciou com firmeza. — Pedi a Judith para se casar comigo
e ela disse sim.
A mão de Judith tentou escapar de sua, mas ele a segurou firmemente.
— Você não me perguntou exatamente.
— Você precisa que eu fique de joelhos? Porque, por você, eu poderia fazer isso.
Judith corou. Ele ficou de joelhos no seu estúdio de fazer caleidoscópios e não havia maneira
de esquecer isso.
— Não. — Os olhos dela se arregalaram. — Thomas, preciso voltar para meu ateliê de
pintura imediatamente. Caso contrário, toda esta arte estará arruinada.
— As pinturas são seguradas, — Inez disse suavemente. — Foi uma profanação terrível ao
seu trabalho, Judith, mas se você está preocupada sobre Frank e eu, a única coisa que fizemos
certamente... Foi manter o seguro em dia.
— Eu não entendo, — disse Blythe. — O que aconteceu?
— Alguém entrou e vandalizou a galeria, — explicou Frank. — Eles arrancaram todas as telas
de Judith para fora das molduras, retiraram as madeiras das telas.
— Eu preciso colocá-las de volta ou a pintura estará arruinada, — disse Judith.
— Você realmente vai se casar com o Sr. Vincent? Porque se você for, vou começar a chamá-
lo de Thomas, — disse Inez.
— Ela vai se casar comigo, — disse Stefan. — Ela só está se fazendo de difícil porque não
encontrei ainda o anel perfeito.
Ele levou a mão esquerda de Judith até a sua boca para um beijo enquanto seu polegar
pressionou o centro de sua palma, sobre sua marca, que havia feito nela.
— Eu não me importo com o anel, — disse Judith. — É só que você me arrebatou para fora
de meus pés tão rápido que não tive tempo para pensar.
— Esta é sempre a melhor maneira de agir com uma mulher, certo Frank? — Stefan
procurou por ajuda.
Frank se aproximou e pegou a mão de Inez.
— Vou ter que concordar com isso. Levei alguns anos para chegar ao ponto em que percebi
que se queria ter minha chance com esta mulher, teria simplesmente que tomá-la.
Inez corou.
— Homem tolo. — Ela disse, porém parecia satisfeita.
— Vou levar Judith em casa para que ela possa trabalhar nestas pinturas, — Stefan disse.
A mão dele desceu pela espinha dela para descansar na curva do quadril de forma um pouco
possessiva.
— Eu não sei como você vai alcançar seu carro sem que todos se amontoem sobre vocês, —
disse Blythe. — Dê-me as chaves do seu carro que vou trazê-lo para vocês.
Quando tirou as roupas, Stefan lembrou que jogou sua carteira e as chaves do carro sobre a
mesa. Ele beijou a mão de Judith e se moveu em volta do balcão para o outro lado da mesa. A
carteira estava à vista de todos, mas as chaves haviam caído entre uma pilha de papéis e um livro.
Estendeu a mão para pegá-las e seu olhar fez uma verificação rápida da mesa. Algo não parecia
estar certo para ele. Ele havia verificado os livros com Judith algumas noites antes, mas quando
terminaram, tudo foi empilhado ordenadamente. Nenhum dos oficiais tinha chegado nem perto
do que estava atrás do balcão.
— Frank, você ou Inez tocaram em alguma coisa nesta mesa hoje?
Frank balançou a cabeça.
— Quando chegamos e vimos as pinturas, checamos todo o estoque e depois chamamos
Jonas e olhamos para o cofre, mas como não tínhamos dinheiro aqui e não havia nada de valor na
mesa, olhamos para ele e só.
— Alguém procurou algum documento desde que eu estive aqui na outra noite.
— Você tem certeza? — Judith perguntou, vindo por trás dele. Ela passou um braço em volta
da cintura dele e olhou por cima do ombro.
— Sim. — Ele empurrou a mão dela quando ela tentou alcançar um papel. — Deixe-me fazer
isso. Depois do que acontece, não quero dar nenhuma chance de que aconteça algo com você.
Usando a ponta de um lápis, ele empurrou os papéis, separando cada um. No meio da pilha
de faturas estava uma única fotografia. A de Judith e Stefan trancando a porta da galeria, o corpo
de Stefan a apenas alguns centímetros de Judith, olhando para cada polegada de seu corpo de
forma possessiva.
Em cima da foto estava uma única linha escrita com um marcador preto de ponta fina.
“Quem é ele, Judith?”
Stefan sentiu o choque dela. O corpo dela enrijeceu, seus dedos apertaram seu ombro, suas
unhas se cravaram nele profundamente.
Oh Deus, Thomas, é ele. Eu sei que é ele.
Sua voz tremeu e as imagens sombrias da morte de seu irmão passearam pela mente dela.
No mesmo instante, a galeria se encheu de uma tristeza avassaladora e puro terror. Judith ficou
pálida, mas Frank e Inez realmente cambalearam, alcançando as cadeiras.
Tranquila, anjo. Respire profundamente.
Concentrar-se em respirar através daquela tempestade repentina e violenta de emoção foi
difícil.
Ele pegou a fotografia e casualmente a virou, puxando-a em seus braços e deslizando a foto
em seu bolso com uma suavidade praticada.
Jean-Claude está na França. Na prisão. Quem poderia ter feito isso? Ele não pode estar
aqui... Pode? — Judith pressionou o rosto duramente contra o ombro dele. — É ele. Eu sei que é.
Posso senti-lo.
— O que é isso? — Frank perguntou pressionando a mão trêmula sobre o coração.
Anjo, eu estou aqui. Este homem não é nada. Ele não pode ferir você ou qualquer outra
pessoa que você ama, não comigo atravessando o caminho dele.
Stefan precisava encontrar uma maneira de acalmá-la antes que a galeria de arte ficasse
repleta de um horror tão sombrio de tal forma que o casal de idosos tivesse um ataque cardíaco.
— Acho que não é nada, Frank, — Stefan garantiu enquanto apertava o seu domínio sobre
Judith, seus braços pareciam uma gaiola de aço, seu corpo ferozmente protetor. — O mais
provável é que algum vândalo tenha folheado as coisas sobre a mesa à procura de algo de valor.
Ele não conhece arte ou teria levado suas peças mais valiosas.
Ele podia sentir Judith tentando desesperadamente recuperar o controle. Jean-Claude era
um monstro do seu passado e se tornou um demônio nos últimos cinco anos, Judith certamente
não conseguia ter uma perspectiva realista sobre ele.
— Judith — A voz de Blythe foi sussurrada, mas direcionada e muito calma, atravessando a
espessa tristeza e o horror. — Não há nada que não possamos enfrentar juntas. Nós estamos mais
fortes do que estivemos no passado. Todas nós. Thomas está aqui com você e também Levi.
Apesar do medo, pense que você não está sozinha neste momento.
Stefan sentiu seu radar de alerta aumentar. Blythe. A mulher misteriosa. Ela era muito mais
do que parecia. Ela assumiu o controle e empurrou suas palavras através da onda de energia
emocional que Judith havia libertado. A emoção de Judith havia se ampliado ainda mais quando
Frank e Inez reagiram. Stefan sentia o poder batendo nele como ondas, golpeando-o, como o mar,
continuamente e sem misericórdia, martelando em suas emoções. Ele conseguiu manter-se acima
de tudo e ao mesmo tempo, trabalhar para proteger os outros na sala, mas Blythe, embora
claramente sentisse a influência de Judith, permaneceu incólume apesar da sobrecarga de
energia.
— Talvez tenha sido um moleque, — Inez arriscou com as mãos trêmulas, obviamente
tentando acalmar Judith. — Sei que conheço a maioria deles e não consigo pensar em qualquer
um que quisesse machucar a Frank ou a mim, mas talvez eu tenha precisado falar com mais
firmeza a um ou dois deles em alguma visita ao supermercado durante a pausa para o almoço.
Eles nunca tentaram me roubar, nunca tive esse problema, mas alguns estão fumando maconha e
cheirando.
— Quem quer que tenha sido — Stefan disse firmemente, — ele ou ela, não levaram nada
de valor e se eu conseguir levar Judith para casa, ela pode esticar estas pinturas antes de se
arruinarem. — Ele estendeu as chaves do carro para Blythe. — Eu agradeceria muito se você
trouxesse o carro de Judith e depois tranquilizasse suas irmãs de que ela está bem, mas precisa
trabalhar.
Olhos de Blythe encontraram os dele por cima do ombro de Judith. Ela lentamente estendeu
a mão para pegar as chaves, como se ainda não tivesse formado uma opinião sobre ele.
— Obrigada por salvar Judith, Inez e Frank, — ela disse calmamente enquanto pegava as
chaves. — Todos disseram que se não fosse por você, o assassino teria disparado provavelmente
em todos eles.
— Eu não sei nada sobre isso, Blythe, — Stefan respondeu com a mesma voz calma e
tranquila. Judith já estava conseguindo conter suas emoções. — Mas posso te garantir que nada
prejudicará Judith enquanto eu estiver por perto.
Blythe assentiu.
— É bom saber disso. Ela é muito amada por todos nós.
— Posso ver isso. — Ele passou os braços mais firmemente em torno de Judith, a tensão em
sua barriga havia aumentado.
Não havia nenhuma maneira de que ele quisesse conversar com ela sobre Jean-Claude La
Roux. Seria muito difícil explicar que ele não veio para Sea Haven com o único propósito de alertar
seu irmão. O pecado da omissão havia se tornado grande demais e não havia nada mais para ele, a
não ser dizer a verdade. Ele deixou cair a cabeça sobre a dela enquanto sua mente trabalhava. Ele
havia sido encurralado um milhão de vezes em sua carreira, vida e morte, matar ou ser morto. Era
a sua maneira de vida. Mas isto... Isto era totalmente diferente.
Perder Judith era inaceitável para ele e tinha a sensação de que esta era uma daquelas
coisas muito importantes sobre relacionamento que ele estava apenas começando a
compreender. Ela confiava nele. Ela acreditava nele e deu a ele todas as chances do mundo para
ser sincero com ela.
Nós vamos ficar bem, moi padshii angel. Eu cortei suas asas e coloquei-as no meu
caleidoscópio. Eu não vou a lugar nenhum, porque você é minha.
Ele sabia que o murmúrio de reafirmação que fez em sua mente era mais para ele que para
ela.
Judith levantou a cabeça e piscou para ele. O coração dele quase despedaçou quando viu o
amor nos olhos dela. O amor e uma confiança absoluta.
Acredito em você, Thomas. Jean-Claude não vai tirar mais nada da minha vida.
Ele gemeu, quase em desespero. Ele queria que ela tivesse esse tipo de confiança nele, mas
agora ele sabia que precisava confessar tudo a ela. Será que ele a compreenderia se os papéis
estivessem invertidos? Ele possuía uma natureza desconfiada, nunca confiou em ninguém.
Quantas vezes passou por sua cabeça que ela poderia estar envolvida no roubo do microchip e
que havia sido este o motivo que conduziu a obsessão de La Roux por ela? Ele até chegou a
considerar, mesmo que brevemente, que a culpa e vergonha que ela sentia pela morte de seu
irmão poderia ser pelo fato de que ela pegou o microchip e La Roux mandou seus homens atrás
dela para recuperá-lo.
Stefan esperou até que Judith estivesse segura com cinto do banco do passageiro afivelado e
foi para trás do volante do carro dela. Ela fez uma pequena careta quando ele a guiou para dentro,
colocando a sacola de viagem com as armas em um local de fácil alcance, mas não protestou
quando ele sentou no lado do motorista.
Ela apertou os lábios enquanto dirigiam para fora de Sea Haven. O nevoeiro ainda era
pesado e a escuridão havia se espalhando bastante.
— Thomas, se você quiser ir embora, vou entender. A sombra de minha vida parece estar se
aproximando de mim.
Ele alcançou a mão dela, colocou-a perto do coração dele e negou com a cabeça.
— Não seja boba, Judith. Não tenho intenção de ir a lugar nenhum.
— Ele deve estar fora da prisão. Ou mandou alguém para fazer seu trabalho sujo, mas sinto
que foi ele. Aquele “Quem é ele, Judith?” simplesmente é a maneira dele se expressar. Ele sempre
me olhou como se eu fosse o início e o fim do mundo para ele. — Ela olhou para as mãos e
suspirou. — O que provavelmente explica porque me apaixonei tão perdidamente por ele. Não há
sedução melhor do que esta como você sabe... — Ela parou com a respiração presa na garganta, o
olhar de saltando no rosto.
Ele estava tão conectado a ela em sua mente, que pôde seguir seu raciocínio rápido e quase
gemeu em voz alta. Ele precisava dela assim, tão perto que podia sentir sua respiração, seu
mundo, para ele o mundo inteiro se resumia aquela mulher ao lado dele. Sem ela, não havia
nenhuma realidade. Stefan Prakenskii permaneceria para sempre sendo uma sombra, deslizando
dentro e fora de perigo, levando uma vida como a própria morte e, eventualmente, cruzaria uma
linha a qual não poderia mais voltar.
— Como eu. Como eu, Judith. Basta dizer isso.
Um toque de raiva afiou a sua voz, porque sua perspicácia não estava tornando mais fácil
faria a sua confissão. Se ela conseguia raciocinar dessa forma, ela reconheceria um homem como
ele que estudava um alvo e descobria a melhor forma de inserir-se em sua vida para conseguir o
que queria.
Judith balançou a cabeça lentamente.
— Sim. Você me faz sentir assim, Thomas.
— Porque eu sinto como se você fosse meu mundo. Nunca haverá ninguém para mim,
Judith. Eu te amo. Eu não sei como isso aconteceu. Inferno, eu nem sabia que isso poderia
acontecer. — Virou-se na rua de baixo pegando a estrada que levava para a fazenda. — Há muito
mais nessa bagunça de Jean-Claude do que você sabe. Eu vim aqui como Thomas Vincent por uma
razão. — Ele olhou para ela, para julgar sua reação.
Ela franziu a testa para ele, os longos cílios abanando o seu rosto.
— Estou bem ciente disso.
Ele esperou enquanto os portões se abriam automaticamente e dirigiu através deles,
parando apenas tempo suficiente para assegurar-se de que os portões fecharam corretamente por
trás dele. Em sua vida, por muitas vezes que se sentiu a beira de um precipício, mas nada como
isto. Seu coração estava realmente batendo forte e ele podia sentir o suor se criando em sua testa.
Estacionou o carro e ajudou-a sair, carregando a sacola para ajudá-la a subir as escadas na
casa dela.
— Você já sabe Judith, sobre minha vinda aqui para avisar meu irmão, mas eu estava
trabalhando para o meu governo nesta época e tinha outra missão.
Judith se virou lentamente para encará-lo, lá no meio da sala de estar da casa dela, rodeado
pela beleza serena que associou à Judith. Muito cuidadosamente ela colocou as telas apoiadas
sobre a mesa laqueada e rebaixada de cor negra.
— Eu não entendo. Você disse que veio a Sea Haven para avisar a Levi que Petr Ivanov ainda
estava atrás dele.
Ele passou a mão pelos cabelos, esfregou a ponte de seu nariz e assentiu.
— E essa era a verdade, mas não toda a verdade.
Ele ativou o alarme da casa, mais para ter um tempo para poder respirar que qualquer outra
coisa.
— Basta falar, Thomas.
— Há um pouco mais de cinco anos atrás, um homem muito importante que trabalhava em
um novo sistema de defesa do nosso governo foi atacado. Sua esposa havia sido comprometida e
ela ajudou, fornecendo informações extremamente confidenciais para o homem que estava por
trás do ataque. Um dos meus irmãos, Gavriil, era um dos guarda-costas dele. Gavriil é cerca de
dezoito meses mais velho do que eu e éramos os mais ligados, pois nossa família era formada por
um monte de crianças e jovens quando nossos pais foram massacrados. Ele ficou gravemente
ferido. Em nosso negócio, isso é uma sentença de morte. Nós não recebemos cheques de
aposentadoria agradáveis. Homens como Gavriil e eu vivemos sem identidades reais. Sorbacov foi
o homem que teve a ideia de levar as crianças de seu país e treiná-los...
— Foi o que usou a força brutal para transformá-los em assassinos e espiões, — Judith o
corrigiu.
Ele concordou com a cabeça.
— Ele tem muito a perder se qualquer um de nós começar a falar. Nós somos fantasmas e
ele não pode aceitar que qualquer um de nós que apareça. No momento em que eu soube que os
ferimentos de Gavriil eram sérios, consegui chegar até ele e o ajudei a escapar do hospital. Eu o
levei a um médico que sabia que era seguro. Ele desapareceu depois disso, embora tenhamos uma
maneira de entrar em contato um com o outro para indicar que estamos vivos e bem.
Ele observou o rosto dela de perto, sabendo que estava começando a contar a história de
seu irmão ferido, porque recorreria à natureza compassiva dela. Ele não podia deixar de ser quem
era. Sua formação permitia-lhe a capacidade de ler qualquer uma expressão, de se ajustar
rapidamente se estivesse perdendo uma batalha. Até agora, ela estava olhando para ele com
olhos suaves, sem entender onde ele estava tentando chegar com aquela conversa, mas estava
disposta a entender.
— A informação foi roubada, ela estava guardada em um microchip, um chip realmente
minúsculo. Ele foi costurado em um casaco e os ladrões sabiam exatamente onde encontrá-lo. Eles
o tiraram do casaco e desapareceram. Esse chip é extremamente importante e fui enviado para
rastreá-lo.
Ele estudou o rosto de Judith. Ela ainda estava como antes e havia uma carranca muito
pequena se formando em seu rosto, como se algo estivesse confuso em sua mente.
— Encontrei a mulher e seu amante, eles me levaram direto para Jean-Claude La Roux.
A cabeça de Judith se levantou e seu olhar se fixou ao dele. A respiração deixou os pulmões
dela em uma corrida, como se tivesse recebido um soco inesperado... E ele provavelmente havia
feito isso. Ele deu um passo na direção dela e ela se afastou, balançando a cabeça, levantando
uma palma da mão para evitar que ele se aproximasse.
— Eu não estou entendendo.
— Antes que eu pudesse chegar até ele, La Roux foi trazido da França sob acusação e
enviado para a prisão. O chip nunca foi ofertado ao mercado negro e nós sabíamos que ele não
havia tido tempo para vendê-lo. Tentamos por meios diplomáticos, tentar tirá-lo da prisão da
França e transferi-lo para a Rússia, mas a França se recusou a cooperar. No final, como um último
recurso, fui enviado para a mesma prisão que ele estava para avaliar a situação. Precisávamos
saber se ele ainda possuía o chip e como poderíamos recuperá-lo.
Judith apertou a mão em seu estômago.
— Você não veio aqui para se aposentar como Thomas Vincent. Você veio aqui porque
achava que Jean-Claude poderia ter-me dado o chip. — Os olhos escuros dela ficaram
tempestuosos. — Você acha que eu o deixei matar meu irmão ao invés de devolver o chip para
ele?
— Judith... — Ele deu mais um passo na direção dela, mas ela afastou-se novamente, desta
vez colocando o balcão entre eles. — Isso não é verdade. Compartilhei a cela com ele. As paredes
estavam cobertas de fotografias suas. Acredito que ele é obcecado por você, mas não tenho
certeza do por que. Passei dois meses naquela cela sem nada para fazer, apenas olhando para as
suas fotos.
— Oh, Deus. Você quer que eu acredite que você se apaixonou loucamente por mim por
causa de algumas fotos em uma cela de prisão? Você realmente acha que eu sou tão estúpida? —
Ela olhou em volta como se estivesse desesperada por arranjar uma maneira para escapar. — O
que você quer Thomas? Ou é com Stefan que estou falando agora? Apenas me diga o que você
quer e depois vá embora.
— Eu não sei quando me apaixonei por você, Judith. Gostaria de poder lhe dizer, mas
percebi que no primeiro dia que conheci você, quando você veio em minha direção, que minha
vida iria mudar.
Ela balançou a cabeça, rejeitando a admissão dele.
— Conte-me sobre você e Jean-Claude e por que está aqui. Diga-me a razão real.
— Eu soube depois que o conheci, que a única maneira de obter dele as informações que
precisávamos era tirá-lo da prisão e levá-lo para um lugar onde pudéssemos interrogá-lo nós
mesmos. Esse era o plano e então Sorbacov entrou. Ele ordenou que outros agentes ajudassem La
Roux escapar e me enviou aqui. Soube imediatamente que aquilo era uma armadilha. Sou muito
valioso para tomar conta de uma ex-namorada, de um caso remoto de La Roux, que, de alguma
forma, conseguiu escapar dos nossos agentes. Ele deveria estar planejando me usar como isca
para trazer Lev à tona.
Estava tão angustiado que se distraiu e chamou seu irmão pelo seu nome real.
— Então você foi realmente enviado aqui para tomar conta de mim? E seu governo ajudou a
Jean-Claude escapar? Uau, você acabou encontrando uma forma perfeita para manter um olho
em mim. Todas as vezes que você admitiu que foi treinado na arte da sedução, você não estava
brincando, estava? E eu caí em suas garras facilmente. Tudo o que você precisou fazer foi estudar
minha personalidade e me tornei uma presa fácil. Você é malditamente bom em seu trabalho,
Stefan.
— Você está fazendo isso soar muito pior do que é. Eu não tive a intenção de ser sua babá...
Ou de seduzir você. Estou te dizendo a verdade, Judith, me apaixonei por você. O resto,
supostamente, não deveria acontecer. Mas La Roux estava com seus homens esperando. Eles
mataram os nossos agentes e agora ele está por aí.
— Como é útil que você esteja aqui, no lugar exato em que ele provavelmente virá.
— Judith... — Stefan começou.
Ela balançou a cabeça e recolheu suas pinturas.
— Eu não quero ouvir mais nada. Estou indo trabalhar. E você pode ir embora.
— Você sabe que eu não vou embora. Nós precisamos resolver isso.
Ela olhou-o de cima a baixo, um longo e lento escrutínio de desgosto.
— Não há tempo suficiente no mundo para que possamos resolver isso.
De repente ela deu as costas para ele e desceu as escadas.

CAPÍTULO 20

Judith recusou-se a chorar na frente de Stefan. Simplesmente não queria que ele visse que
destruiu o seu equilíbrio duramente conquistado. Como pôde tê-lo deixado entrar em sua vida,
(em seu coração), tão rápido? Era tão estúpida. Lágrimas turvavam sua visão enquanto descia
correndo as escadas carregando suas telas com ela. Estava escurecendo e ela acendeu as luzes
para iluminar melhor as telas e ver qual era o dano real que havia na obra de arte enquanto as
esticava. Ao contrário do caos feliz de seu estúdio caleidoscópio, esta sala era onde ganhava
dinheiro como restauradora de pinturas antigas e a mantinha imaculada.
Fechando a porta firmemente ponderando se deveria se incomodar em trancá-la. Um
homem como Stefan Prakenskii que podia passar através de um sistema de segurança, certamente
não teria nenhum problema em passar por uma porta trancada. Encontrou-se ali, no meio da sala,
querendo fazer uma birra infantil e lançar as telas ao redor da sala gritando sua angústia.
Ao invés disso, manteve um controle perfeito, suas lágrimas escorriam pelo rosto enquanto
colocava cada uma das pinturas sobre a mesa. Respirou profundamente tentando afastar a dor.
Por um momento, cobriu o rosto com as mãos. Ela estava muito abalada, o alicerce de toda a sua
existência estava abalado. Sua fé duramente conquistada em si mesma, construída polegada por
polegada, pedaço por pedaço ao longo dos últimos cinco anos, havia ido embora, abalada.
Sufocou um grito de angústia.
Ela não poderia voltar para a escuridão. Stefan poderia ter sido uma fraude, mas havia lhe
mostrado o caminho para sair das sombras. Ela poderia fazer isso... Poderia sobreviver sem ele.
Havia milhões de mulheres que se apaixonaram por homens errados e viveram vidas felizes e
produtivas. Ela só precisava decidir se queria ser uma delas. Seu histórico talvez fosse sombrio,
talvez fosse um dos piores da história, mas não deixaria que um agente russo a destruísse.
A tentação de chamar suas irmãs e chorar em seus ombros era enorme, mas resistiu. Ela não
queria enfrentar Rikki agora, e Rikki se sentiria ferida se não fosse incluída no grupo de apoio. Mas
dane-se tudo, Levi a havia traído também. Ele com certeza saberia o que seu irmão realmente era.
Eles contaram com sua compaixão, com sua lealdade, isso era tão arraigado nela que nunca
consideraria trair a qualquer um deles com ninguém. Eles a usaram perfeitamente... Será que Levi
estava usando Rikki também?
Ela passou a mão sobre o rosto. Mal podia respirar em seu amado estúdio. Ligou o aparelho
de som para inundar o silêncio com uma música suave, ela precisava de distração. Apenas
precisava fazer algo e estava de trabalho, tinha o suficiente para distraí-la até a metade da noite. E
se isso não fosse suficiente... Poderia sempre inventar mais, afinal, era uma profissional em
encontrar coisas para fazer no meio da noite. Olhou para fora das portas duplas francesas, para a
noite. Não havia estrelas esta noite, havia apenas uma névoa pesada, transformando seus jardins
em vagas sombras molhadas. Atravessou a sala, atraída pelo nebuloso véu cinza. Era uma das
coisas que mais amava na vida da costa. Quando via o nevoeiro se insinuando sobre a floresta
circundante, a atmosfera sempre a lembrava de um romance gótico.
— Comece a trabalhar, — advertiu para si mesma em voz alta, ainda assim desligou o alarme
para que pudesse abrir suas portas francesas. Tecnicamente, ela não precisava de ar fresco, (não
estava pintando), mas seus pulmões estavam oprimidos e o nó em sua garganta se recusava a
dissolver. Ela não reconheceria que queria gritar e atirar coisas, chorar até que não houvesse, mas
nenhuma lágrima para deixar no mundo. Ela o amava. Amava com tudo o que era. Como poderia
ter se enganado tanto?
Estava na porta, olhando para o jardim, sentindo a névoa em seu rosto, em seus olhos,
pingando lágrimas de prata em seu coração até que estava se sentindo sobrecarregada com a
tristeza, precisava voltar ao seu trabalho ou sucumbiria ao frio entorpecente... E não podia voltar
para este lugar dentro dela. Nunca mais. Nem mesmo por um homem.
Foi algo muito estúpido se apaixonar por um homem como Jean-Claude. Todos os sinais
estavam lá, apenas era ingênua demais para lê-los. Desta forma, muitas pessoas haviam cedido a
ele, saído do caminho dele ou simplesmente congelavam quando ele entrava em uma sala. Ela o
achava muito dominante e que exalava respeito, nunca parou para considerar que todos sentiam
medo dele. Achava-o atraente e cativante, apesar de se intimidar bastante com a suprema
confiança dele, então é claro que todos ao seu redor deviam sentir o mesmo.
Decididamente, endireitou os ombros e caminhou de volta para dentro de sua casa para
olhar sua obra de arte. A maioria das pinturas eram paisagens marítimas. Era impossível para um
artista viver em Sea Haven e não desejar capturar a beleza do oceano em seus humores mais
tempestuosos. Havia algumas fotos de prédios antigos e de um dos penhascos com uma longa
cerca quebrada ao seu redor, desgastadas com a idade e o tempo, que era sua imagem favorita.
Olhou para as pinturas com um olhar imparcial. O mar selvagem sempre a frustrava um
pouco. Nunca sentiu que realmente havia captado o seu humor da forma como queria. Cinzas,
azuis e roxos girando, nunca surtiam um efeito perfeito de um mar bravio, mal-humorado e
temperamental. Havia algo com a névoa que encobria às árvores, desta forma a floresta parecia
um grande exército, envolta em mistério, escondida de forma vaga e sombria.
Apertando os lábios com força, forçou-se a pegar a primeira das barras de madeira, para
esticar a lona, esperando que a pintura em si já não estivesse danificada nos dois lados. Ela se
concentrou totalmente no trabalho, tendo o cuidado de manter todos os quatro cantos perfeitos,
enquanto colocava a tela em torno da barra. Usando os grampos de aço inoxidável para pregá-la.
Era muito mais difícil fazer isso quando havia tinta sobre a tela. A tinta acrílica estava
definitivamente danificada e teria que repará-la, se quisesse salvar a tela. Se tivesse sido o
trabalho de outro artista, não teria hesitado, mas na privacidade de seu estúdio, poderia
reconhecer que sempre associaria essas pinturas com a traição de Stefan.
Ele quebrou seu coração como ninguém mais poderia fazer. Disse a ela meias verdades uma
e outra vez enquanto ela abriu sua alma para ele. Maldito seja por isso. E maldita seja ela por ter
sido tão estúpida em cair nos braços dele, só porque ele a olhou como se tivesse sua alma em seus
olhos. Jogou a tela para baixo e se empurrou para trás na cadeira, muito perturbada e inquieta
para conter as emoções amargas e tristes que brotavam e giravam em torno dela como um
redemoinho escuro.
O ar fresco da noite sussurrava para ela e saiu novamente, agora para o pátio dos fundos,
onde as flores e arbustos poderiam envolvê-la com suas cores brilhantes e sua beleza relaxante.
Sua visão se turvou, as lágrimas nadaram em seus olhos, transbordando e escorrendo por seu
rosto. Pressionou a palma da mão em seus olhos ardentes.
Sentiu a mão de alguém bater e apertar duramente sobre sua boca, enquanto um grande
corpo a empurrava contra a parede. Um aroma de colônia masculina cara derramou-se sobre ela,
levando-a de volta há outro tempo. Seu coração bateu forte em seu peito e um gosto de medo
passou por sua boca.
Jean-Claude a manteve contra a parede com uma das mãos em sua boca enquanto enfiava o
dedo no nariz dela.
— Você quebrou o meu coração, — ele acusou em um silvo baixo, seus olhos escuros a
olhavam aborrecidos. Ambas as mãos agarraram a frente de sua blusa e arrastou-a para ele
colando sua boca duramente na dela. Sua boca esmagou a dela duramente, em uma exibição de
propriedade. Sua língua forçou caminho para sua boca violando-a.
Ela provou o assassinato. Sentiu o gosto de sangue. O terror de seu irmão e seu próprio ódio.
A bílis emergiu e quando ele a largou ela cuspiu, esfregando os lábios ardentes com as costas da
mão, nunca deixando de olhar para ele. Apertou-se contra a lateral de sua casa, de frente para o
homem que ordenou a tortura e o assassinato de seu irmão.
— Você pensou que eu poderia simplesmente me esquecer de você, Judith? — Jean-Claude
exigiu dando uma olhada longa e lenta ao seu redor. — Sei que você não me esqueceu. Esperei
por você por todos estes anos e você nunca veio me ver. Nunca me escreveu. Por que, ma belle,
você me abandonou quando eu mais precisava de você?
— Como você pode me perguntar isso? — Ela não pode conter o súbito lampejo de raiva.
Não havia nenhuma maneira de suprimir o aumento dela. — Você torturou o meu irmão.
Assassinou. Você pensou que eu ainda te amaria?
Ele balançou a cabeça, os olhos escuros ainda perfurando os dela.
— Essa foi a decisão dele. Meus homens tinham ordens de deixá-lo ir no momento em que
dissesse onde você estava. Isso era tudo o que ele precisava fazer para ganhar a liberdade e sua
vida de volta. Fiz uma pergunta muito simples e ele se recusou a responder. Eu não levarei a culpa
de sua morte. A escolha foi inteiramente dele.
Ela abriu a boca para falar, mas nada saiu. Podia ver que ele não compreenderia o porquê
dela não enxergar o ponto de vista dele. Ele se considerava razoável. Judith balançou a cabeça.
— Você não está negando que estava com seus homens torturando-o.
Ele apontou o dedo para ela novamente.
— Você fugiu de mim. Nenhuma nota, nenhuma explicação. Você apenas fugiu. O que você
esperava mon amour, que eu simplesmente ficasse te esperando deitado? — Ele se aproximou
dela e ela sentiu o seu hálito quente no rosto. — Você é minha. Minha. Você não vai acabar com o
que tivemos. Nunca. Não permitirei isso, Judith. Não permitirei.
— Você estava naquela sala, Jean-Claude. Vi você dizendo para os seus homens para
machucarem aquele pobre homem. Ele estava implorando por misericórdia...
— Ele me roubou. Você não deveria ter visto isso. Aquilo não era para você ver. E você
deveria ter vindo para mim e me dito...
— Eu fiquei com medo.
— De mim? Como você pôde ter medo de mim? — Ele parecia genuinamente chocado. — Eu
não te dei nada além de amor. Tive cuidado com você, sempre fui cuidadoso. Você era muito
jovem e eu entendia isso. — Ele pegou o braço dela e a impulsionou para entrar em casa. —
Precisava me lembrar de que uma inocente como você poderia ter se sentido esmagada com o
que viu. Mas você deveria ter vindo falar comigo.
— Não é certo torturar e assassinar alguém porque cruzou em seu caminho, Jean-Claude.
O rosto dele ficou sombrio com impaciência.
— Você virá comigo e desta vez, mon amour, você vai fazer o que eu disser. Vou ficar ao seu
lado a cada momento do dia até você perceber onde é o seu lugar.
Judith tropeçou quando ele a empurrou para dentro do estúdio. Ela agarrou-se na borda de
uma mesa, girando lentamente para encará-lo.
— Você é tão previsível, — Jean-Claude disse, olhando em torno do seu estúdio. — Minha
pequena e aplicada Judith, sempre sendo responsável. Eu sabia que você desejaria proteger essas
pinturas e que você correria para o seu pequeno estúdio para arrumá-las novamente. — Ele
empurrou uma das telas. — E é claro que você ia começar a fazer exatamente isso. E você nunca
pintaria sem abrir as portas e deixar entrar o ar fresco. Tudo o que eu precisei fazer foi esperar.
Está vendo como te conheço bem?
Ela estremeceu ao ouvir o triunfo na voz dele. Certamente ela fez exatamente como ele
previu. A consciência daquilo embrulhou o seu estômago e ela apertou sua mão lá como se de
alguma forma pudesse afastar a raiva que queimava crescendo como uma bolha em uma piscina
aquecida de magma.
— O que você veio fazer aqui, Jean-Claude?
— O que eu vim fazer aqui? — Ele repetiu, mordendo cada palavra com os dentes trincados
e a raiva latente começando a queimar.
Judith sabia que estava brincando com o fogo. Sua própria raiva estava crescendo e
alimentando diretamente a dele, mas não se importava. Estava condenadamente cansada de ser
conter emocionalmente ao redor dos outros porque precisava proteger a todos.
— Isso foi o que perguntei a você, — ela retrucou.
— Eu vim por você. Você é minha. Você acha que a prisão nos manteria separados? Pensou
que estaria segura para encontrar com alguém?
Ela tirou o cabelo do rosto para olhar melhor para ele.
— Seu pequeno espião foi bem rápido ao enviar o relatório dele para você. E não é da sua
conta se eu estou me encontrando com alguém. Você matou meu irmão e nunca vou te perdoar
por isso. Saia da minha casa.
Ele se adiantou, pegou os seus braços e deu-lhe uma sacudidela. Toda a força que ela havia
confundido com suave confiança, era realmente algo ruim escondido sob a superfície. Ele era um
homem que sentia pouca emoção. Os sentimentos dela eram muito fortes e transbordavam para
aqueles que ficavam ao redor dela... Incluindo ele. Ele queria esses sentimentos de volta e sentia
que ela estava ocultando as emoções dele, não se permitindo amá-lo. Agora Judith entendia isso.
Jean-Claude era um homem frio e não possuía a capacidade para interagir com os outros.
Como uma mulher jovem, sem experiência, que admirava e amava o homem que pensava
que ele era... Ela imaginou uma fantasia em sua mente. E ele deleitou-se naquele amor e
admiração, sentindo a projeção dela fortemente, mas, uma vez que ela esteve longe dele, ele
voltou a ser aquele homem frio e sem emoção que não possuía qualquer bússola moral.
— Eu não vou discutir com você, Judith. Não quando você está sendo irracional. Onde está a
nossa pintura?
Aquela pergunta a pegou desprevenida. E isso era muito típico de Jean-Claude. Ela nunca
havia percebido todas as vezes que ele terminou abruptamente uma conversa e a fez sentir-se
jovem e estúpida, ele simplesmente a manipulava para conseguir o que queria.
— A pintura?
— Você levou a nossa pintura. A do nosso encontro. Eu adorava aquela pintura e você
também. Foi a única coisa que você levou. Até mesmo suas roupas você as deixou para trás.
Por um momento horrível, o reconhecimento reapareceu, naquele momento da verdade. Ela
se apaixonou por um assassino. Ela levou a pintura porque era jovem, tola e muito apaixonada por
aquele rico francês sofisticado. E o fim trágico de seu caso de amor seria sempre lembrado quando
olhasse para a pintura... E em seguida, seu irmão foi assassinado. Aquela pintura tornou-se sua
inimiga. Ela despejou todo o ódio, raiva e tristeza dela naquela tela nos últimos cinco anos.
— Pintei por cima. Eu não conseguia olhar para ela.
— Sua puta sem coração. Aquela pintura significava muito para mim. — Ele deu um tapa em
seu rosto com tanta força que a fez cair no chão.
O ataque foi tão rápido e tão inesperado que Judith quase não entendeu o que aconteceu, e
então seu rosto pareceu explodir, sentiu uma dor em seus dentes e os olhos, e então percebeu
que ele havia batido nela. Uma explosão de fúria estourou dentro dela, sacudindo sua essência.
Ela o chutou quando ele se inclinou sobre ela. Seu pé bateu na canela dele e ele cuspiu maldições.
Judith rolou, tentando ficar sob a proteção da mesa, mas ele a chutou com sua bota, batendo em
suas costelas fazendo-a perder a respiração. Antes que pudesse se recuperar, ele agarrou a parte
de trás de seus cabelos em suas mãos e a puxou para cima.
— Pare com isso, Judith, — ele sussurrou. — Você me entendeu? Você vai parar ou eu vou te
bater até você perder os sentidos, e em seguida, destroçarei esta casa até achar a pintura.
Independentemente disso, consciente ou inconsciente, levarei você comigo de qualquer maneira.
Você pode escolher.
Judith assentiu com a cabeça, lutando por ar e forçando o controle sob seu corpo.
— Diga-me o que há de tão importante naquela pintura, Jean-Claude.
— Coloquei algo lá e preciso dela. Algo muito importante. Onde diabos está a pintura?
Judith fechou os olhos por alguns instantes. Sabia exatamente sobre o que ele estava
falando. Quando Stefan havia mencionado o microchip, aquilo não pareceu se encaixar, mas agora
ela entendeu. Foi seu irmão quem havia esticado a primeira tela para ela. Ele tinha sido a primeira
pessoa a mostrar à ela como fazer isso e ela levou a tela com ela quando foi para Paris com a
intenção de dar à ele sua primeira pintura como uma homenagem.
Quando conheceu Jean-Claude, ela se apaixonou pelo bonito francês, ela pintou um quadro
deles, um único quadro. Ela colocou todo o amor de uma jovem garota por uma fantasia com um
lindo príncipe naquela pintura. Jean-Claude o pendurou na parede do quarto dele. Ela pegou a
pintura e na primeira oportunidade que teve, Paul ajudou-a e enviou o pouco que ela possuía na
casa antes que eles conseguissem fugir na esperança de ficar abaixo do radar de Jean-Claude até
que pudessem chegar à Grécia, onde um amigo de Paul estava esperando para levá-los de volta
para os Estados Unidos no navio dele.
— Já te disse, pintei sobre ele, mas o quadro está no meu outro estúdio. Você precisa me
deixar pegá-lo. Ir lá é perigoso.
Sinceramente ela não sabia o quão perigoso poderia ser, mas Jean-Claude já havia mostrado
ser muito suscetível às emoções dela e qualquer ambiente violento provocaria nele um efeito
extremamente forte. O acúmulo de cinco anos de raiva reprimida estava naquela sala, à espera de
encontrar uma saída.
— Eu não vou deixar você fora da minha vista, — declarou Jean-Claude, agarrando um
punhado dos cabelos dela e puxando-a para a porta. — Você acha que sou estúpido? — Ela se
manteve sob os pés de alguma forma, enquanto ele a arrastava pelo corredor.
— Onde ele está? — Ele exigiu, se virando e olhando ao redor para as várias portas.
— É aquela. Está trancada. — Deveria mentir e dizer que a chave estava no andar de cima?
Stefan poderia não ter ido embora. Será que ela precisaria de Stefan para resolver esta situação?
O coração dela acelerou e então o reconhecimento apareceu. Stefan era a máquina de
matar perfeita. Ele foi criado para ser um assassino. Jean-Claude era um criminoso a sangue frio,
mas se ela chamasse Stefan, não duvidava que ele faria exatamente todas as coisas que ela
pensou... E planejou fazer durante aqueles últimos cinco longos anos. Ele seria o instrumento que
ela poderia usar para destruir Jean-Claude. Ele era mais do que capaz de matar o francês.
A mão direita dela rastejou em direção à mão esquerda e acariciou a marca no centro da
palma da sua mão. Euforia se apossou dela. Poderia, finalmente, punir Jean-Claude, mas
precisamente, conseguir sua vingança. Vê-lo torturado e morto, assim como ele fez com Paul.
Tudo o que ela precisava fazer era chamar Stefan e sabia que poderia chamá-lo. Ele viria pelo
microchip e ela sabia onde estava o microchip. Jean-Claude não iria encontrá-lo, mas ela poderia
usá-lo para fazer com que Stefan fizesse o que ela queria.
Respirou fundo, seu polegar parou sobre o centro da palma de sua mão. Ela só precisava
pressionar para baixo com força e chama-lo telepaticamente. Mesmo que ele já tivesse ido
embora e estivesse longe demais para ouvi-la, ainda assim ele poderia senti-la.
— Maldição, Judith, — Jean-Claude empurrou a porta da sala aberta. — Estou ficando
impaciente. — Ele puxou-a e a arrastou mais para o fundo do corredor. — Onde diabos está a
pintura?
Ela estava tão cheia de ódio por este homem que não estava conseguindo enxergar direito.
Estava cansada de viver dessa maneira, com tanta raiva e fúria. Estava feliz com Stefan,
(genuinamente feliz), e empurrou as lembranças de tudo o que viveu com Jean-Claude para longe
dela, recusando-se a permitir que aquilo manchasse a sua vida. Estaria condenada se permitisse
que aquilo manchasse o amor que sentia por Stefan. E ela fez amor com Stefan mesmo sem saber
se ele sentia a mesma emoção ou não. Os sentimentos dela por ele eram muito reais e ela não
cederia à tentação de usá-lo por vingança.
Ao invés de pressionar a marca que já desaparecera embaixo de sua pele e a acariciou com o
dedo carinhosamente, até mesmo protetoramente.
— A pintura está ali naquele estúdio, — ela disse calmamente. — Eu a mantenho trancada.
A chave está em uma corrente em volta do meu pescoço.
Ela puxou a corrente fina para que ele pudesse ver que ela estava dizendo a verdade.
Jean-Claude soltou os cabelos dela e pegou a chave com um sorriso rápido.
— Sabia que você voltaria para a razão ma belle.
Ele inclinou a cabeça para beijá-la. Ela virou o rosto e seu beijo pousou no rosto dolorido
dela. Ele riu e deu um tapinha na contusão que fez antes de virar para inserir a chave na
fechadura.

*****

Stefan ficou no meio da sala de estar quase congelado. Judith estava completamente,
totalmente desconectada dele, ela fechou-o de uma forma tão eficaz que ele não conseguia
alcançá-la. Por um momento ele sentiu uma crise de angústia e dor. As emoções irromperam por
ele como um foguete, fincando-se como uma faca irregular enterrada em seu coração e, em
seguida... Nada. O sentimento de medo que já estava crescendo a algum tempo, fixando-se em
torno dele como um manto pesado. Ele sentiu a condenação no ar no momento em que saiu do
carro.
Sentiu como se estivesse se afogando. Ela acreditava que tudo o que ele disse a ela, que
tudo o que fez com ela, (inclusive o amor que fizeram), não foi nada mais do que um pacote de
mentiras. Ele estava esperando por ela, prendendo a respiração por ela, ela era toda a sua vida.
Ele só não sabia disso até que a encontrou, e agora, assim de repente, ele a tinha perdido. Estava
sozinho novamente. Nas sombras e no escuro, com o coração aos pedaços espalhados ao redor
dele. Ele não fazia ideia de como colocar todos os pedaços juntos. Relacionamento era um assunto
o qual ele não possuía nenhuma ideia de como conduzir, nenhuma experiência para recorrer.
Ela pareceu tão abalada. Tão completamente devastada... Ela sabia o que ela estava
pensando sobre ele. Pensava que ele estava jogando com ela, seduzindo-a para chegar perto dela
com a intenção de encontrar o microchip. Sua vida de repente pareceu totalmente errada, tudo o
que fazia para conseguir cumprir uma missão. Ela vivia uma vida muito diferente. Ela foi tocada
pelo mal, maltratada pelo mal, mas não se mergulhou nele, não estava coberta por ele.
Ele xingou em russo e ficou ali, sentindo-se desamparado, algo que um homem como ele
não poderia suportar. Ele era um homem de ação. E aquilo estava matando-o, ter que esperar,
deixá-la ter um pouco de espaço para perceber que ele ainda estava lá, com o coração na mão
depois de dizer a dura e feia verdade sobre sua vida e admitir que a amava, não podia ir até ela e
exigir que visse a verdade.
Seu irmão o aconselhou a dizer a verdade, de forma franca e direta. Evidentemente drogá-la
não foi tão ruim como omitir certos fatos. Ela havia perdoado aquele erro, mas não este. Nem
mesmo quando ele tentou fazer a coisa certa. Ele estava perdido... Em uma situação que ele nunca
pensou que poderia se encontrar.
Ele fechou os olhos. Queria casar com ela. Para tê-la como sua esposa e não como Thomas
Vincent. Eles poderiam viver com esse nome, mas ele precisava saber que ela era sua, uma parte
dele. Como poderia mostrar-lhe que quis dizer cada palavra que disse a ela? Cada toque? Cada
carícia? Ele não podia imaginar passar o resto da vida dele sem ela. Sem o seu sorriso e sua luz.
Sem seus beijos ou o brilho dos seus olhos escuros.
Ele só sabia de uma coisa. Não desistiria dela. Ele amava Judith Henderson com cada fibra do
seu ser. Ele podia cometer um milhão de erros, mas o principal de tudo era que ele a amava e
sabia que poderia fazê-la feliz. Com Jean-Claude nas proximidades, Judith estava em perigo. O
homem era um criminoso cruel. Então, se ele não conseguisse consertar seu relacionamento com
Judith, então, precisava fazer o que fazia de melhor. O seu trabalho. Esta era uma maneira a qual
poderia mantê-la segura. Ele podia não ser bom em relacionamentos, mas era condenadamente
bom em seu trabalho.
O microchip estava em algum lugar. Stefan havia seguido cuidadosamente a trilha que os
assassinos deixaram e o chip acabou nas mãos gananciosas de Jean-Claude. Ele foi preso antes que
Stefan pudesse chegar até ele e recuperar o chip. Não havia nenhuma maneira que ele tivesse tido
tempo de negociar o microchip roubado e claramente ele não fez isso estando naquela cela na
prisão. Stefan teria ouvido que estava à venda, se fosse esse o caso. Estaria o chip ali. Em uma
pintura? Seria esta a razão da galeria de arte ter sido vandalizada?
Era uma mensagem para Judith? Não, Judith teria dito a ele se soubesse algo sobre o
microchip. Ela estava tão magoada e irritada que teria jogado as informações na sua cara. Por isso,
tinha certeza que ela não sabia. La Roux poderia ter escondido o microchip em uma pintura
especial? Nos últimos cinco anos, as pinturas de Judith foram vendidas em galerias de todo o
mundo. Ela ganhou certa reputação e principalmente no Japão, seu nome cresceu.
La Roux poderia facilmente ter deslizado o microchip entre a barra de madeira da tela de
uma pintura. Mas por que Judith levaria uma pintura com ela quando o deixou se não possuía
conhecimento sobre o microchip? E se soubesse, não teria sido mais fácil simplesmente tirar o
chip? Não, ela não sabia sobre o chip. Então, se ele estava escondido em alguma tela que ela havia
feito, por que La Roux teria certeza de que ela ficaria com esta tela?
Uma linha de desconforto escorregou em sua mente e ele olhou para o sistema de
segurança. A luz verde estava desligada. Dane-se tudo. A mulher realmente odiava esse sistema.
Deveria saber que ela iria até o estúdio e abriria as portas... Mas ela não estava pintando. Estava
esticando as telas sobre as barras e com certeza poderia manter a porta fechada. Ele realmente
deu alguns passos em direção ao corredor que levava às escadas, mas se deteve.
Esta era a casa de Judith e ela estava sofrendo. Ela tinha o direito de lidar com aquilo da
forma que bem entendesse. O mal-estar estava crescendo aos trancos e barrancos, comprimindo
sua barriga em nós, ela o deixou tão condenadamente confuso que ele não conseguia pensar
direito. Sua conexão com ela estava desligada porque Judith estava rejeitando-o de sua mente
pelo seu bem? Ou porque sabia que Jean-Claude estava rondando por perto?
Eles precisavam de cães. Isso era tudo o que ele precisava no momento. Foi até a porta e
saiu com a intenção de dar a volta na casa, apenas para fazer uma busca lenta e assegurar-se que
o francês não encontrou o caminho para a casa dela. Olhou para o céu da noite. As estrelas e a lua
estavam completamente apagadas pelo véu cinzento desenhado tão espesso em torno deles. As
árvores eram contornos vagos e todo o som era abafado pela densa neblina.
Estava relutante em deixá-la sozinha, mesmo por um momento. Sua palma da mão esquerda
coçou. Pulsou. E logo depois ele sentiu o amor acariciando-o através dela... Uma carícia suave que
ele não poderia confundir.

*****

Jean-Claude virou a chave na fechadura e abriu a porta. Judith prendeu a respiração quando
o poder selvagem saiu, pulsando através do corredor em busca de um alvo. A energia era tão forte
que quando bateu no francês ele sentiu o impacto como um golpe físico, embora ela pudesse
dizer pelo olhar no rosto dele, que ele não fazia ideia do que aconteceu. Ele apertou a mão em seu
coração e recuou fazendo um sinal para ela entrar.
— Esta sala é perigosa, Jean-Claude, — ela o alertou mais uma vez, sabendo que ele não a
ouviria, mas sentindo como se precisasse, pelo menos, dar esta informação a ele.
Ele a empurrou para dentro e deu um passo atrás dela. O interior do estúdio estava quase
completamente escuro, tornando impossível ver qualquer coisa. A luz no corredor era muito fraca
para iluminar o interior da sala.
— Onde está o interruptor de luz? — Ele perguntou, voltando-se para Judith.
Ela já podia sentir o pulsar sinistro de poder em torno deles. Limpou a garganta.
— Eu não uso luz aqui. Apenas velas.
— Bem, acenda então. E abra as cortinas, — ele retrucou impaciente.
A porta se fechou por conta própria, um som forte, que pareceu como o baque de um
tambor em um funeral. A sala ficou imediatamente mergulhada em uma escuridão absoluta.
Judith sentiu a concentração emocional girando forte e rapidamente se adiantou com a
intenção de acender a vela mais próxima a ela. Era preta, com um centro vermelho, e ela sabia sua
posição aproximada. A sala gemeu e rangeu, ouviu passos suaves e abafados através do chão em
direção a eles.
Jean-Claude puxou-a para frente dele, descuidando-se da arma.
— Que diabos? Judith, acenda a maldita vela.
Antes que ela pudesse fazer isso, outra onda de energia ricocheteou nas paredes. Velas
ganharam vida roxa por toda a sala, pontos macabros de luz lá no mar de escuridão. Fumaça rosa,
crescendo para fora lentamente espalhada por todo o teto. A luz dançante seguiu, lentamente,
iluminando o retorcido, galhos nodosos e salpicados tristes de roxo chorando nas paredes e no
teto. Lágrimas cristalinas escorriam dos ramos e desciam pelas paredes.
As paredes estalavam e algo escuro se moveu nas sombras. Um som muito parecido com um
galho quebrando fez ambos girarem em direção ao outro lado da sala onde ela pintou um tronco
grande e escuro de uma árvore, torcida e disforme, uma aparição grotesca de uma árvore viva,
respirando. Mesmo enquanto assistia, o tronco parecia rachar e chorar veneno, grosso e negro.
— Que diabos é isso? — Jean-Claude exigiu.
— Disse que esta sala é perigosa, — respondeu Judith.
O coração dela acelerou e provou um medo real em sua boca.
Ela não sabia o quanto o estúdio era realmente perigoso até aquele momento. A presença
de Jean-Claude despertou o espírito mais sombrio que estava entrelaçado lá. Ali, onde todos os
pensamentos feios, cada emoção sombria dela, foi sobre ele. Vingança. Raiva. Mágoa. Tudo o que
ela pensou em fazer a ele em nome da vingança foi concebido nesta sala. O espírito prendeu essas
emoções sombrias ali e agora, Jean-Claude estava presente, uma chave viva para abrir aquela letal
energia sombria.
Ele mostrou a arma para ela.
— Não pense que não vou usar isto, se isso for algum tipo de truque. Onde está a pintura?
Apontou para o meio da sala onde havia um cavalete coberto com um pano.
— Está ali.
Não havia muito sentido em reiterar sua advertência. Ele não queria ouvir.
Judith olhou em volta cautelosamente. Cera vermelho-sangue escuro borbulhava dos
centros das velas fluindo em cascatas. Ela respirou fundo e a sala pulsou, as paredes inspirando e
expirando.
Os dedos de Jean-Claude fecharam sobre o braço dela com um agarre... Levando-a com ele
para o centro da sala. Ele esticou a mão para alcançar o pano. A videira agitou acima como
grandes cobras levantando sobre suas cabeças para assistirem. O ar na sala parecia mais denso,
mais difícil de respirar. O francês agarrou o pano da pintura e jogou-o no chão. A mão dele
deslizou através de uma das peças recortadas de vidro incrustadas na tela e saiu sangue.
Ele blasfemou e olhou para ela, levantando o lado cortado de sua mão até à boca. Gotas de
sangue salpicaram a pintura e bateram no chão. Abaixo dos pés deles sombras se moveram, se
estenderam através do chão escuro alcançando o líquido, avidamente absorvendo o fluído.
Silhuetas disformes surgiram a partir dos troncos retorcidos, no meio de rangidos e gemidos.
Pulsando com força, como um batimento cardíaco.
Judith pegou o braço de Jean-Claude.
— Nós precisamos ir. Vamos agora.
— Não sem o microchip. Está por trás da tela.
Sacudindo-a para fora, ele estendeu a mão para a pintura antes que ela pudesse detê-lo.
Ele arrastou a tela do cavalete, virando os símbolos mudados e o nome de seu irmão para
longe dele, mas ela teve um vislumbre dessas sombras escuras crescendo como fantasmas da
pintura em camadas irregulares, de emoções dolorosas. Os ramos que balançavam acima
colheram a batida pulsante como se um coração viesse para a vida, nascido lá naquele espiral de
espíritos mais escuros.
Judith apertou os dedos em sua palma, o próprio coração dela seguindo aquele ritmo
sinistro, medonho. Silhuetas começaram a tomar forma, criadas atrás das velas saltaram para o
centro da sala... Em direção a Jean-Claude. Do homem sem emoção, vazio, e aquela energia
procurou preencher esse vácuo. Podia ver a pele dele mudar sutilmente sob o jogo de luz roxa,
tornando a cor perfeita dele em um cinza manchado.
Ela tentou projetar a felicidade, mas o medo irradiava através da sala e as aparições,
expandiram, correndo da seiva negra venenosa que minava e crescia à medida que o medo dela
aumentava. Ele não percebeu as sombras rodando os braços dele, seus dedos escurecidos, ou as
mudanças sutis na pele. Toda vez que virava a pintura, tentando arrancá-la da barra de madeira,
as peças recortadas de vidro cravavam em sua pele. O sangue alimentava os fantasmas para que
assumissem formas monstruosas. Ela agarrou a tela, tentando tirá-la das mãos dele.
Jean-Claude rosnou, arrancando a pintura dela, quase a jogando no chão, xingando
enquanto tropeçava. O sangue escorria constantemente.
— Ele não está aí, — Judith sussurrou. — Jean-Claude, por favor, vamos embora. Não está aí.
Precisamos ir, agora.
Jean-Claude arremessou a pintura contra a parede. A batida reverberou por toda a sala, sua
raiva crescendo em proporção direta a violência que se construía através das emoções
turbulentas. A energia girou loucamente, como um ciclone terrível do teto ao chão, disparando
pela sala buscando um alvo... Procurando por Jean-Claude.
Ele bateu nela com as costas da mão, enviando-a voando, o corpo dela se esparramou
através das sombras no chão. Gotas de sangue derramaram em volta dela. Ela tentou rastejar em
direção à porta, esperando que ele a seguisse, na esperança de levá-lo para fora. Como ele podia
ser tão distraído? Como não conseguia sentir os demônios inchando, chegando para ele enquanto
as luzes roxas das velas se estendiam na direção dele? Tudo na sala, acima e abaixo, os ramos
estalando, os troncos de árvores venenosas, as lágrimas cristalinas, tudo aquilo se estendia em
direção a ele com um prazer ganancioso.
Ele a chutou várias vezes, seguindo-a exatamente como ela queria. O rosto dele, na luz
púrpura, revelou uma raiva viciosa construindo lentamente, fervendo até que a raiva explodiu e
ele pegou as pernas dela quando ela alcançou a porta, arrastando-a de volta para o centro da sala.
— Onde ele está? — Ele sussurrou, os lábios frisados em um rosnado feio. Os dentes dele
pareciam mais afiados, os lábios mais finos. A casca exterior do homem, sempre bonito, parecia
estar se dissolvendo diretamente diante dos olhos dela e o homem interior, escuro e sombrio
surgiu, como se ele tivesse nascido desses espíritos das trevas. — Sua puta traiçoeira. Você o
vendeu!
Ela balançou a cabeça.
— Eu não o vendi. Encontrei-o e Paul trabalhou para uma empresa de informática. Pensei
que ele tivesse colocado lá quando esticou a tela para mim. Eu não sabia que havia alguma coisa
nele. Pensei que fosse um símbolo de boa sorte para mim. Eu o coloquei em uma célula do meu
caleidoscópio.
A cabeça dele girou ao redor, perseguindo um perfume escuro. Ele andou para o meio da
tela, direto no nome de Paul, aquelas letras japonesas chorando, a única coisa bonita sobre o
trabalho de ódio e destruição. Vidro foi esmagado sob a bota dele e as letras vermelhas deitadas
sobre camadas de fuligem enegrecida como se as velas acesas tivessem espalhado uma camada
tênue no chão e aquilo se recolheu na sola da bota dele.
Jean-Claude atravessou a energia girando como se não a visse. A sala sibilou em triunfo
quando ele se aproximou do grande caleidoscópio e arrancou a tampa.
Judith usou os calcanhares para tentar se empurrar para a parede, fazendo-se tão pequena
quanto possível.
— Não, — ela sussurrou.
— Como isso funciona? — Ele retrucou frustrado quando a célula permaneceu escura. Ele
olhou ao redor da sala e depois olhou de volta para ela, erguendo a arma ameaçadoramente.
Judith balançou a cabeça, mas apontou para a luz ultravioleta portátil sobre a mesa ao
alcance dele. Ele apanhou a luz, empurrou-o no espaço construído dentro do cilindro e ligou a luz.
As imagens irromperam para ele de uma vez, escuras e famintas e repletas de uma energia
poderosa. Ele se viu lá, enquanto estava lá dentro, e não conseguia desviar o olhar, alcançado
pelas emoções que giravam, firmemente tecidas, tão vivas e fortes, que trouxeram à luz a
verdadeira imagem, combinando com a concha exterior dentro da substância
Judith cobriu o rosto enquanto as paredes fluíam veneno negro e sobrecarregavam as
lágrimas chorando escorrendo sangue. A porta estilhaçou. Ela não percebeu que as sombras a
trancaram. Stefan gritou o nome dela e o ombro dele bateu na porta uma segunda vez. Depois a
bota dele. A porta rachou e ele entrou e empurrando-a para abrir, correndo para a sala,
recebendo a energia.
Ele se curvou sobre ela, parecendo como o diabo... Ou um anjo vingador. Ele a pegou e a
ergueu. Ela fechou os braços em volta do pescoço dele, enterrando o rosto em seu pescoço.
— Peguei você, Judith, — ele murmurou, derramando beijos no rosto dela enquanto corria
para fora da sala. — Ya tebya lyublyu. No caso de você não me entender, significa, eu te amo. Eu
te amo com todo meu coração.
— Eu não posso acreditar que você voltou para mim.
— Sempre, Judith. Eu não estava mentindo quando disse que você é tudo para mim. Eu quis
dizer cada palavra. — Ele virou a cabeça para olhar para a sala escura com as estranhas luzes roxas
piscando, um pouco reduzidas agora. — Preciso tirá-lo de lá.
Ela agarrou o braço dele.
— Não volte lá, Stefan. É muito perigoso.
— Nós não podemos deixá-lo lá dentro. Vou trazê-lo para fora. Minhas defesas são fortes.
Vou pegar ele anjo, e nada vai me impedir de voltar para você.
Judith relutantemente permitiu que ele se afastasse dela. Deslizou para baixo na parede,
pressionando os dedos trêmulos sobre a boca. Acreditava nele. Não havia nada mau dentro de
Stefan para essas emoções escuras devorarem. A vida dele foi moldada pelas circunstâncias de sua
infância, ele não tinha nascido assim, nem havia se desenvolvido dessa forma, torcido.
Ele saiu correndo da sala, carregando Jean-Claude por cima do ombro. Depositou-o
gentilmente no chão ao lado de Judith, retirando a arma dele com aquela destreza tão familiar
para ela. O cabelo de Jean-Claude estava riscado de branco, os olhos fundos e a pele enrugada e
manchada com pontos escuros. Os olhos dele pareciam vazios, olhando para frente, as pupilas
estavam dilatadas em uma espécie de horror. Judith passou a mão na frente do rosto de Jean-
Claude. Ele não piscou.
Stefan apertou a mão dela e correu de volta ao estúdio para abrir as cortinas e empurrar as
portas francesas.
— Não! O quê...
Ele balançou a cabeça.
— As emoções se foram quase completamente. Estou abrindo para entrar ar no estúdio.
Não há nada que possamos fazer por ele agora. Ele vai precisar de um médico e não estou certo
de que adiantará muito.
— O microchip está na primeira célula que fiz para o caleidoscópio. Não olhe lá dentro, basta
pegar a primeira célula e poderemos abri-la. Pensei que meu irmão havia colocado ali. Tem estado
flutuando em óleo mineral pesado durante todo esse tempo. Duvido que alguém seja capaz de
tirar alguma informação dele depois de cinco anos em óleo. — Ela franziu a testa. — Mas acho que
poderia ser possível, embora não tenha muita chance.
Ela se ajoelhou ao lado de Jean-Claude e limpou a saliva escorrendo pelo queixo dele.
— Eu não tenho que obter as informações, só preciso devolvê-lo para a Rússia, — disse
Stefan. Ele colocou a célula no bolso depois que abriu a sala. — Enquanto nenhum outro país
puder roubar as informações, não me importo se ela está destruída ou não.
Ele ajudou-a durante todo o caminho até que ela conseguisse ficar em pé.
Judith cedeu contra ele, esfregando o rosto sobre o seu coração que batia de forma
constante.
— Obrigada por ter voltado para mim mesmo quando estava com raiva de você e lhe disse
para ir embora.
Ele passou o braço em volta dela e deixou cair um beijo em seu rosto virado para cima.
— Da próxima vez, anjo, não haverá espaço para você respirar quando tivermos uma
discussão. Acabei de criar esta regra, agora você ficará na minha vista em todos os momentos até
que tudo isso seja resolvido.
Muito gentilmente, ele pegou Jean-Claude como se não pesasse mais do que uma criança.
— Vamos ter que chamar uma ambulância. Vamos precisar dizer que o encontramos
vagando no quintal. Ele está irreconhecível, por isso, se você disser que não sabe quem ele é, vai
fazer sentido. Eles o identificarão através das impressões digitais e o levarão a um hospital.
— Stefan. — Judith prendeu a respiração até que ele olhou para ela.
Ela bebeu da imagem daquele russo alto, com olhos azul-esverdeados e cicatrizes. Ele foi tão
gentil com Jean-Claude que abalou seu coração. Ele era dela. Ela lhe deu um sorriso trêmulo.
— Eu te amo.
Seu sorriso atingiu seu olhos.
— Eu sei disso melhor do que você.

CAPÍTULO 21

— Você tem certeza que quer fazer isso? — Judith sussurrou para Stefan. Ela apertou os
dedos ao redor dos dele e olhou por cima dos ombros para suas irmãs e Lev. — Você não precisa
fazer isso por mim. A cerimônia civil que tivemos juntos foi o suficiente. Eu não me importo de ser
a Sra. Thomas Vincent. Vou manter meu nome Henderson por causa do meu trabalho, porque
meu nome já é reconhecido, sinceramente, você não precisa aproveitar esta chance só para
provar algo para mim.
Stefan colocou o braço em volta dos ombros dela.
— Sempre quis te dar meu nome e esta é uma maneira de nos casarmos como Stefan
Prakenskii e Judith Henderson. É legal aos olhos de nossos países, embora, como não existo
suponho que nosso casamento civil é mais obrigatório. Este homem é um amigo meu e vai se
certificar de que isso seja feito corretamente. Lev quer se casar com Rikki da mesma forma e nós
organizamos para que pudesse ser feito.
San Francisco, na calada da noite não era tão movimentada como durante o dia, e os carros
foram facilmente manobrados para subir e descer as colinas íngremes. A pequena igreja estava
estabelecida profundamente no meio da comunidade russa. Quando estacionaram os carros,
parecia que eram os únicos ali, mas quando se aproximaram caminhando, a porta se abriu e um
homem com túnica ficou esperando.
— Ele é um homem santo, um padre, e viajou uma grande distância para vir aqui na América
nos casar, — Stefan sussurrou. — Nós não usamos o padre local, porque se a papelada for
descoberta, não queremos que remonte a ele e esse homem é um fantasma, como Lev e eu.
Ela entendeu o que ele estava dizendo. O sacerdote foi sequestrado como seus irmãos, um
órfão político arrancado de sua casa e enviado para as escolas o moldarem como assassino. Como
Lev e Stefan, que encontraram uma maneira de escapar... De forma diferente, mas ainda assim,
encontraram uma saída.
— Nós não estamos colocando-o em algum perigo?
Ela precisava de tranquilidade depois do que aconteceu com Jean-Claude. O homem ainda
estava sem noção e trancado em um hospital psiquiátrico.
— Ele não teria vindo se achasse que poderia ser descoberto, — disse Stefan. — E se eu
achasse que ele havia sido seguido, não estaríamos aqui. Eu não correria nenhum risco com você
ou meu irmão.
Ele olhou de volta para as irmãs dela, seguindo em um nó apertado. Lev trouxe-o até a parte
de trás. Ambos os homens estavam armados até os dentes, e desta vez, seguiu o exemplo de seu
irmão, tomando o cuidado de se preparar abertamente para uma pequena guerra se houvessem
problemas, mesmo na frente de Judith. Ela o observava em silêncio, deslizando facas e armas em
vários compartimentos escondidos nas roupas dele, mas não protestou.
— Para seu presente de casamento, moi padshii angel, te darei um cão de guarda. Cada uma
de suas irmãs deve ter um. Lev e eu concordamos sobre isso.
— Não pense que você vai conseguir tudo mandando em mim, — Judith advertiu. — Isso
não está acontecendo. Temos regras na fazenda. Todas nós temos uma palavra a dizer.
Ele riu baixinho.
— Dois russos contra seis de vocês, americanas? Você é linda, minha esposa, mas não sabe
como podemos ser cabeça-dura.
— Isso é algum tipo de aviso? Você deveria ter me dito, antes da cerimônia civil.
Ele riu quando se aproximaram do sacerdote. Apenas uma única luz brilhava fracamente na
igreja e não emitia luz suficiente para iluminar o rosto do padre. Stefan cumprimentou-o em russo,
mas não apresentou Judith para ele. Ao invés disso, ela notou que ele manteve o corpo dele entre
o dela e o homem santo em todos os momentos. Ela não sabia se ele estava protegendo a ela ou
ao sacerdote.
Stefan afastou-se para permitir que as mulheres seguissem o sacerdote para dentro,
enquanto ele e Lev deram outra olhada lenta em volta antes de seguirem.
Blythe caminhava ao lado de Judith.
— Eu já estive aqui antes, — ela sussurrou, com uma voz inquieta. — E estou certa de que é
o mesmo padre que realizou a cerimônia.
— Que cerimônia? — Judith perguntou.
Blythe franziu a testa e balançou a cabeça, torcendo os dedos juntos com força,
pressionando o dedo profundamente em sua palma.
— Tem a certeza que quer fazer isso, Judith? A Rikki eu sei que está tão profundamente
apaixonada por Lev e que faria qualquer coisa que ele lhe pedisse, mas você ainda tem tempo
para sair disso. Agora é a hora de desistir se você tiver quaisquer dúvidas.
— Tenho dúvidas sobre mim, Blythe, — Judith admitiu, — mas não sobre ele. Posso ser eu
mesma com ele. Ele me segura. Eu não preciso me esconder e preciso disso em minha vida. Ele me
dá isso, me dá liberdade e me sinto amada por ele. Ele quer filhos, logo, e eu também nunca
pensei que teria essa chance e ele está me dando tanto... — Ela olhou para a irmã mais velha. —
Preciso saber que você tentará aceitá-lo em nossas vidas. Ele jura que é a vida que ele quer. Está
comprando a galeria de arte de Frank e Inez e irá comigo para as exposições de arte. Mas,
principalmente, ele quer que vivamos na fazenda com todas vocês e levemos uma vida tranquila.
— Tranquila? — Blythe disse com um pequeno sorriso. — Quantos filhos você disse que ele
queria?
Judith riu, a tensão foi diminuindo.
— Eu não tenho ideia do que ele vai fazer depois que o primeiro nascer. Vamos ver.
Stefan pegou a mão dela e inclinou-se para tocar a boca com a dela.
— É hora, meu anjo. A cerimônia será inteiramente em russo.
— E você está certo de que é legal? — Blythe perguntou com uma pequena carranca.
— Claro. Isso fará com que nosso casamento seja inegavelmente legal. — Ele puxou Judith
para mais perto. — Você não poderá usar oficialmente meu nome russo, mas vai possuí-lo. — Ele
olhou para o irmão. — Assim como Rikki. Preciso dizer, meu irmão parece estar muito feliz.
— Assim como você, — Blythe admitiu, recuando.
Judith ouviu o padre enquanto ele falava em um tom baixo e firme, uma linguagem mágica
para ela. O casamento inteiro parecia surreal, suas irmãs juntas, Rikki e Lev de pé ao lado dela e
Stefan. Sua mão estava apertada na de Stefan. Ela murmurou as respostas adequadas, quando o
padre a cutucou e ouviu Rikki fazer o mesmo. Em nenhum momento pode ver totalmente o rosto
do santo homem.
Stefan colocou um anel em seu dedo e ela se virou em seus braços. Ele prendeu sua boca em
um beijo. Seu coração deu um salto e a felicidade floresceu através dela quando enrolou os braços
em volta do pescoço de seu marido e o beijou apaixonadamente.

FIM

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